livro_vesentini, carlos alberto - a teia do fato

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Acervo Proj eto Memória • FFLCH/CAPH Carlos Alberto Vesentini foi professor de História da r ede estadual de ensino em São Paulo e do Departamento de História da FFLCH da USP, no período de 1976 (Instrutor Voluntário) a 1990, ano de· sua morte. Foi um intelectual rebelde que questionou as assertivas dos procedimentos pedagógicos e do conhecimento histórico. Escreveu A Revo- lução do Vencedor, em colaboração com Edgard De Decca, A Figuração Recorr ente, em 1977, O Problema do Sujeito Polí - tico, em 1978 (inédito) e Maria Quitéria de Jesus: História e Cinema, que se transformou em roteiro para um filme his- tórico. Guardou grande parte de seus esforços acadêmi- cos para os temas referentes aos currículos de história e à análise da prática do professor: EDITORA HUCITEC HISTÓRIA SOCIAL USP ,9 ISBN 85·271 · 0391·5 c .4-J c Q) V) ê Q) ..0 <( V) o "'C ro u o o <( Ca rlos Alberto Vesentini A TEIA DO FATO EDITORA HU C ITE C HISTÓRIA SOCIAL u s p

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Page 1: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

Acervo Projeto Memória • FFLCH/CAPH

Carlos Alberto Vesentini foi professor de História da rede estadual de ensino em São Paulo e do Departamento de História da FFLCH da USP, no período de 1976 (Instrutor Voluntário) a 1990, ano de· sua morte. Foi um intelectual rebelde que questionou as assertivas dos procedimentos pedagógicos e do conhecimento histórico. Escreveu A Revo­lução do Vencedor, em colaboração com Edgard De Decca, A Figuração Recorrente, em 1977, O Problema do Sujeito Polí­tico, em 1978 (inédito) e Maria Quitéria de Jesus: História e Cinema, que se transformou em roteiro para um filme his­tórico. Guardou grande parte de seus esforços acadêmi­cos para os temas referentes aos currículos de história e

à análise da prática do professor:

EDITORA HUCITEC

HISTÓRIA SOCIAL USP ,9

ISBN 85·271 · 0391·5

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Carlos Alberto Vesentini

A TEIA DO FATO

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UN;vsRSJ0.·\08 osSAo l)·.tLO

Reitor: Prof. O r. Flávio Fava de Moraes Vice-ReitOr<l: Prof a. Ora. Myria,m )({asilchik

f ACULDADB DE" fiLOSOFIA, lETRAS. I! CU~''CJASHIJMA.NAS Dire-tor: Prof. Dr. Joao Baptista Borg~ PE,!teira Vicc·Diretor: Prof. Dr. Frtancis H~nrik Au~rt

D t:.rARTAM Eil\'TO Ofl HISTÓRIA

Chefe: Profa. Ora. Maria Lígia Coelho Prado Vice-Chefe: P·rofa. Dra. Ilana Blaj

PROGM.'IA DE Pós·GRAOUAÇAO EM H ISTORIA SociAt

Coordenadora: Prof a. Dra. Zilda Mó reia Grlroli Iokoi Vice-Coorden.ador: Pro(. D'r. José Carlos Sebé Bo1n Méihy

CARLOS ALBERTO VESENTINI

A TEIA DO FATO Uma proposta de estudo sobre a Me mória Histórica

EDITORA HUCITEC HISTORIA SOCOAL, USP

São Paulo, 1997

Page 3: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

SUMÁRIO

Apresentaçdo da Coleção

Agradecimentos

Apresentação

Parte 1-O IMPÉRIO DO FATO

Capítulo 1. A obra da transubstanciação e as nuanças do rememorar

Capitulo 2. Momento e drama da interpretação

Parte LI - A U\ISTITU!ÇÃO DA MEMÓRIA

Cnpltulo 3. A apropriação da idéia Ctlpltulo 4. Revolução ou Rept\blica

Pontes c Bibliografia

7

9

15

23 65

127 163

215

Sumlrlo I IJ

Page 4: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

1

APRESENTAÇÃO

C om que critério um hislo!iador fala das lutas e a.gentes de. uma época que nlla.é 1\..."Wl!l A interrogação ganha amplitude quando lembramos que essa época ainda projeta sua força, suas categorias sobre o presente c sobre quem a historia. )

O saber consagrado e a objetividade da ciência têm-se consli· tufdo nas armas à disposiç~o do historiador. No entanto, essa pos­tura já nllo tem conseguido convencer-me, apesar de ter sido seu defensor. Não afasto a constatação do peso intelectual de uma for­mação determinada, que me orienta a uma leitura da história, a )\ uma prática de trabalho cujas exigências têm que ver com esse sa­ber lnstitufdo.

Não posso, simplesmente, aceitar a compartimentação e a divi­são do trabalho que deram esse lugar e essa forma ao meu conhe· I cer serem suficientes para projetar-me acima c além de ngentes e \ suas práticas, dotando-me, com a armadura da ciência, de uma superioridade sobre aqueles que, em outro lugar demarcado pela mesma divisão e compartimentação do saber, lutaram cm uma so­ciedade muito próxima da nossa. Não é possível esquecer que a presente socicdndc resu ltou, entre outros desdobramentos, daque· las prátkns passadas.

De outro lado, ao tocar na memória de uma luta traduzida como revolução, poderia o historiador proceder de maneira a não se con­tagiar de simpatia pela idéia de rCllclução no presente, e sem ne­nhum grau de vinculação ao que foi perseguido no passado?

Refletir sobre revolução implica uma predisposição emotivá<Íue se coloca antes que o pensamento se debruce sobre a análise e a argumentação lógica. A cfetivação da idéia de revolução como pro-

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jcto coletivo confundm-se, também para mim mesmo, com a per­cepção de que a própria realização individual ar S<' completava Curiosamente, a objetividade da ciência e simpatia por aquela idéia coexistiam em hamlonla, à medida que revolução podia ser toma] da como forma necessária de realização coletiva da história. O doJ rnínio da emoção e da simpatia ia cedendo lugar à obra da ciência, tornada como instrumento cr[tico de valor analítico e desmis­tificador.

O movimento Pt!l.dula r entre paixão e desamor pelo tema inl· .,. brica no..E!:~esso de transformaçao da minha própr~ cónSCíencia. l <f ~/ Nesse caminhar, esmaece lentamente a atração pela 1déia de revo- ) lução. A eficiência dos instrumentos metodológicos, base inques-

1 ' ~ ,/'

tio nada de minhas prlmeiras propostas de trabalho, passam a so- . ~.ri ir" frcr permanentes transformações, a incidir diretamente na compo-1 ';) sição do meu tema, a ponto de se tomar sua razão de ser.

Inicialmente, minha proposta de trabalho residiu na elaboração de um estudo da noç~o de "projetos de reordenaç~o social" em um momento chave da história do Brasil: 1930·34. Pretendendo-se nova como problemática de análise, a noção de "projeto" n~o se desgar­rava, no entanto, dos parâmetros da bibliografia corrente.

Delimitados à região de S.'lo Paulo, como pólo capitalista dinâ­mico do pais, esses "projetos" puderam ser pensados, no decorrer da pesquisa, como um movimento progressivo de realizaç<'io do processo histórico. Suas possibilidades seriam dadas pela conjun­ção de 1929 e 1930, quando da quebra da hegemonia do setor ca­feeiro, acompanhando assim as passadas teóricas de Francisco C. Weffort e de Boris Fausto. Nessa perspectiva, 1930 era tomado como marco periodizador e Estado de Compromisso com a natureza mesma do Estado.

Para essa etapa de trabalhos encetamos amplo levantamento documél\tAI, cujas fontes fizeram referência ao bloco hegemónico paulista e ao movimento tenentista, já superando uma classifica­ção inicial pautada em cafeicultores e tenentes. No primeiro caso, visávamos englobar frações diversificadas de classe c até mesmo outras classes aliadas, caso dos industriais. No segundo caso, pre­tendfamosacentuar a pluralidade, a falta de wüdade e transforma­ções no tempo do que em ta l época era tornado como grupo.

Um momento de quebra real nesta traje tória c de questionamento profundo de seus referenciais ocorreu durante a elaboração do ar­tigo "A Revolução do Vencedor" (em co-autoria com Edgar de

Decca). O balanço do material até <.>ntão trabalhado nos le\'Ou a pensar o ângulo da memória histórica projetada pelo )'enredo.;, base de reflexão teórica do artigo.

As possibilidades intelectuais oriundas deste artigo-balanço abriram caminho para novos núcleos de pesquisa c rencxão, a cob rarem seu aprofluldamento na continuidade dcss" trajetória. Questões como n rev isfio da periodização, pel~ critica do marco periodizador da história da República; a substituição e Integração , desse m.lrco pela percepção da existência de um processo revolu- ""',,~.,., • cionário que o marco tradicional elidia; memória c critérios de i-\..,, periodização revistos, a noção de f,,to histórko tornou-se também\.,...,;>\~ v c.. passivei de negaçAo. A partir daqui, o ano de 1930, como fato, transparecia como idéia componente da memória do vencedor. Fi-nalmente, mudava a qualidade da documentaçAo compulsada: de materia] "neull'O" passava a se constituir num agente ativo de or-ganização da memória.

Ainda com Edga r de Decca escrevi um n0\'0 artigo: "O Momen­to doÊ-o Momento da História". Estava em questão reexaminar os "projetas de rnordcnação social" com base na problemática da memória histórica como componentes do processo revolucionário elidido pela constmçfio do vencedor. Tais projetos eram pretendi­dos valendo-se de propostas, ou conjw1to de propostas, engendra­das no processo de luta, e capazes de assumir um caráter geral, pretendendo confundir-se com a nação, realizando-se progressiva­mente como o próprio "sendo" da lüstória, !I medida que lhe im­primja um sentido. Localizamos, em 1928, dois projctos: o da revo­lução democrático-burguesa e, por oposição, um projeto autoritá­rio de industrialização, gerado desde a constituiçfio do Cicsp.

Um novo momento de reflexão, consubstanciado no artigo "A Fulguração Recorrente", facultou a percepção de como a memória pode set Ç!lllStanternente apror-riada e reelaborada ~lo poder em momentos históricos diversos, Vencedor e poder, identificados, rei­teram o mesmo procedimento de <'xclusão.

Ao encaminhar para a elaboração da presente tese essa ampla indicação de reflexões feitas, pensando em integrá-las e avançar com elas, persistiu em meu pensamento a necessidade de apontar e enfrentar a capaci<h1de de sobrevivência e a coerência desta am­pla construção a compor a memória, desde sua projeção inicia l pe­los vencedores. Como COI\jullto ela resiste às evidências, como fa­tos e documentos, e as absorve, e por melo delas interrogamos o

Apresentação I 17

1

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passado. Fatos e documentos constantemente ampliados, e tradu­Lidos pela acumulação da bibliografia sobre o tema, cujas interpre­tações, entretanto, n~o se libertam das malltas da coerência e indi­cações ddyu~l~ <vnjunto, definido pelos vencedores.

Como elaboração, <$S.1 obra se organi za de tal forma que dela parece fluir uma determinada lóg ica, a pe rmear o que se constitui como uma grandeexplicaç~o abrangente. E maís: com uma capaci­dade tal de atração, seja pot·colltar com pólos indica li vos para exa­me, seja pela possibilidade de in tegrar novos e lementos, que a re­flexão continua prt:.'Sa cm seu interior. Essa lógica coerente opera a inda de maneira a, quando o exame se faz pela via do (ato herda­do, ou então pela análise de documentos, eles já são,n pnori, pensa­dos nela, isto é, seus lineamentos gerais já mmandam o estudo.

~· I /-r~ Nesse sentido, entender a história como Jma memória e perce­.,. ,.-1 ber a integração que ocorre de maneira contínua entre a herança

> ,r recebida e projetada até nós, e a re flexão a debruçar-se sobre esse pns.sndo, eonstilui u·:,~ cm tJuesta.o e pareceu-me J'Cievante para a aproximação do que é tomado tão-somente por h istoriografia. Esta poderia deixar ao le itor menos avis.1dc a percepção de que o objeto mesmo sobre o qual e la se debruça- temas, (a tos, agentes ar colocados - tem exísténcia objetiva independentemente do seu cngendramento no processo de luta e da (orça de sua projeção e recuperação, como tema, em cada momento especifico que o reto­ma e o refaz. B é esse movimento e esse {az.~r a serem aqui consi­dNados.

Fato, documentos c essa lógica de explicação herdada podem ser relacionados à questi!o da objetividade e detem1h1ações orilm­das de fatores puramente econômicos- ca~o da crise do café. Es· sas considerações não se ausentavam daquela lógica i ntcg rante da memôria; no inv~e, rcccbiarn s uas indk,,çõ.es. Pt.:tt.dJl nao ser sufi­ciente tomar o fato como mero ponto sob o q ual transcorria esse imenso iceberg das determinações de outra oxlem. 81J2...EL~ se unem e sugerem àquelas determinações pontos de clivagem.

Dessa forma, a relação entre o fato e o conjunto da memória transpareceu-me questfio-chave, a insístir, afastando igualmente a díscussão sobre periodização e seus cortes mais adequados (por e)(emplo: 1922, sob ótica de revolucionários; 1924, pela operação de Mauricio de Lacerda procurando uni-los a um universo liberal; 1927/1928, pela ótíca da t-e\•olução democrático-burg uesa e do BOC; 1930, pelos dispositivos dos vencedores).

18 I Aprete<>taçio

Quís marcar este ponto: para os ' 'encidos, ~jam agentes, sejam possibilidades históricas, surge como grande desafio saber localizar onde refletir e repensar problemas e lutas já. colocadas, o momento cm que cfetivamcntc existiram e tentamm definir o movimento da história. A capacida~c de a memória imp~>di-lo paracc fluir, cm boa . \ t'tf!l parte, da fot-ça aufel'ida por se localizar em um fato- memóri i\ e R~,/':1 fatQ$.l!_n!mt1obrevive~1do ag_uela e0 esse movimento, ela deci.d!L\l' 1<)-onde as interrogações serão postas" da mesma forma que excilli âl'l- -.1'-1 gulas onde sua coerência poderia ser colocada cm questão.

Procurei fazer o :>ossívcl nesta e laboração para que esse ponto· chave alcançado nc decorrer do meu próprio trajcto não se impu· sesse, no papel de orientador do trabalho, como uma afirmação absolut,1 desde o IT.omento inicial. Quís que transparecesse, pelo menos em parte, como ponto de chegada, com base em uma dís­cussão aqui travada, facilitando ao leitor caminhar comigo e por meio do material elegido e da seqüê11cia de t•efJcxõcs,com os quais fui imprimindo o rumo da discussão.

Assim, quanto ao fato, não pressupus desde o início sua relação com o vencedor. Minha intenção fo i, ao contrá rio, mostrar o papei do fato como ponte de localização de significacões e lugar onde é entrevista a rcalizaçlo da história, mesmo levando-se em conta uma perspectiva temporal ampla. Da mesma forma que pretendi subli­nhar o peso de certos fatos na rememoração posterior até para os que poderiam indicar outros momentos e instantes cruciais na de­finição dessa efe tivaçllo, diminuindo o peso social da idé ia de que essa realização histórica ocorre em um único lugar determinado.

A seguir, umo outrn seqüência de considerações apontou para o aparato e as ins tituições mediante os quais a lguns fatos são d ifun­didos, impondo-se ~o conjunto do social antes da possibilidade de qualquer reflexao especifica voltar-se para seu exame. Is to foi en· !revis to como nec~sidade a Ugar·sc diretamcnte às considerações anteriores sobre o fato, ao lembrarmos que klCali?.amos significa­ções hístóricas com expressiva capacidade de identificação coleti­va nos fatos em geral, dotados de uma determinada lógica, e trans­mitidos também por meio dos mesmos canais.

Nesse sentido, e levando em conta a relnçllo anterior, é que in­troduzi na discussll' um ângulo bem mais próximo, o de examinar o p róprio trabalho do historiador nessa teia, e o de it1quirir a re\5l.­ção de pro~~ c 'll~bclccemos com .\Ú!l.\2· Desenvolvi par­teaesse esforço cm um ângulo preciso: o vinculo a lmir a reflexão

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"1b1<• ,, P•''S.ldo herdado a nossas próprins lutas, e em que a von· t .•d~ de liberdade e de comando sobre esse passado pode encon· tr.lr·sc com aquele ponto localizado, a transparecer, por sua vez, como dotado de uma força de indicaç~o e definição sobre a análise.

Somente assinl, tendo deixado visível a existência c peso de um fe>co inkial de projeção e localização em um dado fato -1930-, como significações da vida da história, c o foco do qual fluem, con­tinuamente, indicações-chave para a análise - é que encaminhei a discussão do fato herdado para a memória do vencedor. Visei cap· tM as operações pelas quais o poder vigente, ao cabo de um proces­so de luta, e em condições ainda de disputa ent•·e vencedores, con­s(!gue estabelecer aquele fa to como ampla iMia, por intermédio da qual tall tO o exercício do poder político quanto a temporalidade a caracterizar a história se unem no mesmo movimento. Daqui a ló· gica c a coerência entrevistas nessa memória saem e impõem-se, ao conformarem a noção de tempo. Elas são capazes de unir-se às pró· prias operações com as quais revemos o passado.

Considerando a reapropriação e reelaboraç3o dessa memória em outros momentos pelo poder vigente, a\•ancei para outra ques­tão: como entender o porquê de participantes e de sujeitos coleti­vos saldos do próprio processo de luta nao parecerem libertar-se do conjunto dessa memória, opondo-lhe outro foco de reflexão? levei em conta, de um lado, o caráter fragmentário deixado pela memória de momentos vencidos, e a possibilidade de sua atração pela construção do vencedor. De outro lado, transparecclt-me cmcial levanta•· outro viés: um sujeito concreto, que lutou em um dado momento, manteria continuidade e perccpç~o do conjunto de sua p•·át ica cm condições de opor-se a essa memória? Procurei destacar a constataç~o de essa reflexão não incidir sobre problemas essen­ciais desse passado, entendendo ser este o ponto pelo qual a pró· prla reflexão de participantes coletivos não chega a opor outras quc:>stõcs ao fato do vencedor, por onde se percebeda que possibili­dade diversa de efetivação histórica estaria realmente cm jogo.

lO I Ap•·esenuçto

Parte I

O IMPÉRIO DO FATO

"'Este livro ê um pedaço da história, da hist6rln tal cO•l\O cu '-' vi. Nao pcctel\dc ser sen~o \ I ln relato pormenoriudo da Revoluçlio de: Outubro, isto é, daqueles dias cm q\•e os bold\eviques, à (rente dos oper.irlos e soldttdos da Rússia, tomaram o poder e o depuseram nas miiOS dos soviete:;."'

Jclm Rud

"'.t uma obra que eu gostaria de ver publicada 0\0S milhões de <!'Xe:mplates, tradudda para todas as Jínguas, pol!i traça um quadro exato e extraordh\ariatnente \ 1ivo dos acontecimentos. .. "'

Page 8: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

Capitulo I

A OBRA DA TRANSUBSTANCIAÇÃO EAS NUANÇAS DO REMEMORAR

Eu nao vivi 30, nem observei o im pacto de Outubro por aqueles anos. Deixarei falar, por alguns momentos, essa vivência:

"Medeiros Lima - Como não temos seguido uma o rdem crono­lógica em nossas convcn;.1s, deixamos em aberto um longo perío­do, embora a ele tenhamos feito referências ocasionais em função de certos episódios evocados pelo senhor. Refiro-me aos anos de 1930 a 1945, que coincidem com a revolução llberal de Vargas, a imphmtaç:lo do Estado Novo e a guerra."

"Alce11 Amoroso Lima - Antes de responder a sua pergunta, dei­xeque lhecontecomo eu vi morrer a República Velha. Encontrava­me no sítio mais perigoso do Rio, naquela manhã de 24 de outubro de 1930: o gabinete do Chefe de Polícia ...

"Cláudio Gmms combinou encontrar-se comigo na Chefatura de Polkia, onde eu 111e sentia no dever de ficar nessa hora junto a Pedro de Olil'<'i 1'n Ribeiro. O ambiente já cm ali sombrio, e bastante deser­to, qun n.: •• subimos a seu gabinete. Pedro nos informou que, real­mente, as noticias não cmm nada animadoras ...

"Safmos todos em seguida. Na rua já havia um carnaval. Soube mais tarde que, mal t!nhamos saído, uma multidão desenfreada subira as csc«dns e invadira o gabinete. Perdi Pedro de vista ...

"Foi assim que vi morrer de perto a Primeira República, a que muitos ainda chamam de 'Belleépoque brasileira'. Não eu, que não sofro de nostalgia ... "'

1 LIMA. Cláudio Medeiros. Alct11 Amoroso Limn. Memórias improsirx>dhS:

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"Da história tal como eu a vi" - esta evocação pode possuir espessura inesperada. No texto acima a preocupação c <lnl o amigo ordena o relato. Coexis te uma vaga lembrança de festa e depreda­ções. A recordação, ao debruçar-se sobre o passado, entendendo-o como h istória, refer~ncia-se pelo conjunto de acontecimentos em que esse eu pa.rticipou. O pensamento traduziu a revolução liberal de Vargas, a té certo ponto, por morte da República Velha ou Pri­meixa República. Confundiram-se com um dia, to.rnaram-sc sua manhã, em que essa morte se localiza. E tal fim pôde ser entrevisto de perto, pela pessoa que o observou, dessa forma, nesse dia.

Um d ia, uma manhã- nestes a morte de uma reptíblica, a ins­tauração dle uma revolução. A aparente simplicidade do cotidianÇ>, de outras Jnanhãs, foi q uebrada por um conjunto de ações que o abala ram. Esta. quebra da rotina d iária, for te o bastante para impe­d ir o olvido, parece dotada da capacidade singular de unir o eu e o além dele, com a g randeza supostamente associada ao evento his­tórico.

Esta face do episódio, quando ele ultrapassa sua significação puramente pessoal e atinge uma abrru1gência maior, apresentan· do-se como geral, é aqui reivindicada para esse 24 de outubro. Por isso a fuga do amigo ixnplica m uito mais, ela associa-se a um vín­culo entre o pessoal e o geral, coexiste com a morte e o ínício, com fato histórico. Este trru1sparece no encerran\e.r\to de algo- Repú­blica Velha-sem dúvida geral e amplo. Agora, como tal significa· do pode situar-se em práticas vivas, c nos episódios de um ünico dia, de maneira a poder ser observado, como o foi, exige do eu um esforço para apresentar essa relação, essa abrangência a envolvê­lo, e a todos os demais. Existe aqui uma espécie de obrigação, a necessidade de explicitar esse vinculo comum. Vejamos a resposta d o Autor à questão, ou melhor, ao pedido de Medeiros Lima:

"Dep ois dessa digressão em torno desses pequenos fatos que me ocorreram de repente, passemos à sua pergunta.

"A partir de 1940 senti-me restituído a mim mesmo, olhando os acontccín1<mtos de nosso tempo com maior amplitude de visão. Fui

diálogos com Cláudio Medeiros Uma. Prefácio de Antônio Houaiss. Petropólis: Vozes, 1973. Os trechos dtados encontram-se, respectiva­mc.ntc, às páginas 213, 214,215.

24 I A o bra da transubstanciação e as noanças do ~emorar

con tra a revolução de 1930, que coíncidiu ·com o começo do meu apostolndo católico. Durante o trágico mês de outubro daquele ano, tendo, como já d isse, conhecimento, através de informações segu­ras, de que o Governo Federal n ão dispunha de meios para enfren· tar as forças revolucionárias, fiz questão de dar de público o meu testemunho de desaprovação a um movínwJ'lto que me pareciacon-

• trário aos interesses nacionais. Achava estranho que partidos tra­dicionalmente conservadores, como o Partido Republicano Minei­ro e o Partido Republicano Rio-Grandense, que durru1te o governo Bernardes haviam aprovado tod os os a tos de arbitrariedades então pr<1ticados, se a presentassem como revolucionários e ínovadores dos nossos costumes políticos e sociais ...

"Como disse, discordei da revolução de 1930 porque o método revolucionário, a meu ver, é um mé todo ínadequado. Devo dizer que continuo ainda hoje, e cad a vez mais, evolucionista. Mas o Es­tado Novo, com a Revolução de 30, que o antecedeu, apeS<Ir do seu pecado original, do seu centra lis mo e autoritarismo político, Irou· xe duas contribuições importantes à vida do país. A primeira delas foi a de ter permitido q ue a Igreja d esenvolvesse com liberdade a sua colaboração no sentido da evolução social. A segunda contri­buição traduziu-se pelas leis sociais, incentivru1do a promoção do proletariado, embora isto fosse feito de uma forma que considerei Ucgitima, já que s ustentávamos a liberdade sindical, ao p asso que o tipo oficial do síndicalismo getuliano e ra de cará ter corporativo e, portanto, urútário, centralizado. Éramos, como a inda hoje, favo­níveis à p romoção das classes trabalhadoras, através de uma parti­cipação crescente na responsabilidade do Estado, na vida econô­mica e social das ínstituições ... "'.

Que o Autor p osicionava-se, lá, fica bem claro. Que aquele dia representa uma existência outra, d e eco ampliado, Revolução de 30, também. A pressão de wn problema, qual um aríete, de amplas dimensões sociais, é visível. A penas seu tratamento, pelos que o s ugeriam, incomodava-os: estava marcado pela ínadequação do mé tod o, e pela falsidad e dos participantes. Assim o eu do a utor chegou àquela manhã de 24 já bastante posicionado quanto ao pro­blema, quru1to à forma de encaminhá-lo, quanto aos personagens

' Idem. lbidem, p. 217 e 220.

A obra da transubstanciação e as nuanças do rememonr 1 25

Page 10: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

énvolvidos. M<1s com que f<)rça os episódios então decorridos, para todos, CQ!'~!ll>~m_pcsar, tornan~e tão relevantes, e o.próprio au­to~ só percebe, "com ma ior amplitude de visão", em torno de 1940?

Ele lemb ra seu interesse e seu envolvimento na ''p romoção das dasses trabalhadoras a través de uma participação crescente", e é neste ponto no qual dois itens parecem ter·se desenvolvido. Um deles traduz-se no papel p·ermitido à Igreja, à sua atuação, e o ou­tro substantiva-se pela presença da legis lação social. Ambos ocor­rem depois. Ambos possuem a ca racteris tk a do" posteri<>ri, do que foi cumprido.

Como, no exercício do rememorar. pode o eu localizar tais im­plicações em ocorrências definidil?? Como, dentre esses ''peque­nos fatos", aparecem episódios capazes de unir sua vida diária, abalada e modifkada nesses dias, com decorrências que U1e pa­recem cfcrtos? É ev1dente que o 24 de outubro, em seu pensamento, transubst<mcia-se em revolução de 1930 e esta, juntamente com o Estado Novo, responde pela legislação citada e pela facilidade que o autor admite ' .

. Realizar um balanço, recordando, permitiu-lhe rever aquele "trá· gKO mês de ()utubro". Permitiu·Ule ampliar sua significação. já não s~ ~ata de verificar se realmente ''nossos CO$tumes políticos c so­Ciats" foran1 movados. Sua posição, de recusa da hipocrisia

1 parece

p~sar menos. Em que monumto ela foi ullrnpasSllda, permitindo-lhe observar algo mais? Por que aquele 24 não ttan.sparece apenas como queda do govemo, em nome de falsas posições, estilo nada incomum? 1\pesardo "pecado original" cresce o peso daquelas duas contribui­ções. Assinl, o "trágico mês" purifica-se em parte, deixa de o ser tan· lo, abandona esse cará ter. Sua p rojeção amplia-se incrivelmente e_ a recordação liga-o a todo um novo conjunto de relações que só pos­teriormente teria existido. Pela obrª d.a.ll:ru.lsubstansiJl~ão.uma enor­me gama de significações pode ser alocada aos episódios de um dia, de tun mês, convertidos em fa to histórico- revolução de ~930. E

3 Oexameda obra, como tal, não se cOnstitui um foco de análise aqui. O estudo do papel da Igreja e as condições nas quais esta o aceHa e age1 pode ser "'~toem ROMANO, Roberto. Brasil: Igreja co111ra Esllldo (críti­ca no ~PPII!ISnto C.'/16/ico}. São Paulo: Kairós, 1979, p. 143-54; quanto à pa l'tJClpaçao o autor, tndependente do r~memorar~ ela não está em causa •qui. Conferir sua obra: LIMA, Alceu Amoroso. ludicaçiks políticas: da Reuoluçào à Cousliluiçtio. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 1936.

26 I A obra da transubsta.ndaç5o e as nuanças do rememorar

isso com tal força d ian te das práticas sociais que soa como se fosse apenas este - o fato - responsável por todas essas implicações e decorrências capazes de anular todos os outros dias, como se estes fossem rea~nente compostos por uma rotina da q ual a criação políti· case ausenta.

Medeiros Lin1a, por meio do diálogo, apontou os parâmetros, os referenciais, para o entendin1ento histórico. E indicou Estado Novo como tais. O amigo aceita tu.do aquilo que constitui percepção co· mum, como mostra a d iferença, n:a interpretação, quando esta oco r· re. A perspectiva do tempo parece dotada de um direito peculiar: ela permjte uma revisão do passado, en1 que, aparentemente, a paixão perdeu seu donllnio e a calma da matu.ridade transparece, fala, isenta de quaisquer interesses imediatos. Mas, tra ta-se apenas de isenção? Ou na verdade a percepção posterior, vencedora, inibe nuanças e possibilidadt'S que ainda estavam lá, as quais, agora, lem­bram, sugerem apenas velhas paixões em definitivo derrogadas?

República VeU1a pode ser subsumida em um fato? Seu conteúdo pode $er identificado de tal forma que o situemos tão claramente e, mais, o encerremos com outro fa to? No d iálogo cont o amjgo, Amo­roso Lima deixa entrever que seu fim, ao menos, pode. E 24 de outu­bro traduz mais io rtemen'te q ue "Revolução Liberal de Vargas". Esta não pode ser, uma vez que ele opõe à sua significação o "centralismo c auto rita rismo". E também parte da obra, considerada quanto à sua forma- o síndicalismo sob urn -'"caráter corporativo", "unitário c centralizado" - recebe a tnesma recusa madura. A ressalva não advém do seu agora, o autor mostra seu peso anterior, no momento decisivo. A recusa retém posjcões do passado, erocurando manter uma linha d:;e:.;c;;o;::e"'rê.,J'"lc:;:io;ao.;e;,;c;.;o;.:.:n!.imlJsiade,_!!'~ em si, como oq)et~ida­õe';'tcansi&fec_e c ga!:\b.<tdominio uma realidade, a_percepção do rea­lízãêi'õ;'e este é aceito cómQ,yál)qo.

Elide-se toda uma gama de outras ações, a sere !h pensadas como dotadas da mesma significação social. Reina o fato, um fato, e nes· te, somente nele, imbrica gigantesca quantidade de implicações, as quais pressupõem outro mundo de p rátic<1S específicas, rotineiras ou não, e por meio das quais a obra que aparece como decorrência poderia surgir como aquilo que realmente é, ação e criação. A per· cepção tida por madura, por objetiva, vista segundo esse le r o re­sultado e julgá-lo, em si, vê morte - fim da Repüblica Velha- e revolução de 30 juntos, como o fato, podendo situar nesse ponto o lugar onde a criação política existe. Ela mata e ela põe. Não deixa

A. obra da ttansubstanda.çlo c as nu:u-;ças do rcm~morar 1 27

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de ~er curioso: a fo rça do cumprido, após o fato, é tal que a opera · çílo d e lqcalizar só pode completnr-se com a percepção de ter-se jog~do muito naquele momento - o passad o e o futuro.

E interessante obscrvnr esse ângulo do fato, e de sua projeção, quando, parte integrante d a memória, pode ser chamado a ilustrar e a explicar qualq uer questão, tão logo o pensamento se reporte ao passado. Não exatamente em aspectos pessoais da vida d e quem recorda <:entra-se o interesse. No entan to, ei· lo:

"Num delicioso comentário, O to Lara Resende recordou um livrino - Por Que Me Ufano de Meu Pais, do Conde Afonso Celso, leitura obrigatória na maioria das escolas primárias de nossa in· fãncia. Competia com a Nossa Pátria, de Virgílio Cardoso de Olivei· m. Devo d izer que sou muito ma is velho do que Lara, mas ambas aS obras gozavam de popula ridade até o fim da Primeira Grande Guerra.

"A visão edênica e romântica do Brasil gerou a expressão 'por . que-me-ufanismo' ou apenas 'ufanismo', substituída pelo 'naTci· sismo', oposto ao '<?assandrismo', após a revolução de 1930. Certo é que, antes dessa, os p rofessores abriam os olhos da meninada, mos­trando que o Brasil era pobre como j ó, não possuía petróleo, sofria escassez de carvão mineral e, periodicamente, de secas devastado­ras no Nordeste, contava com mais de 50% de analfabetos e, fora do Rio e de São Paulo, constituía o ' vasto hospital' deMiguelPerei· ra com {rcqüentes surtos de velhas endemias ... " '

Visto como um pequeno marco, até tutt tanto gr.~tuito, 30, tão p ronto um pensamento, instigado por outro, invoca um passado comum aos d ois, apa rece disponível para sua ilustração. Mas o texto tem mais uma ftmção, além da lembrança de tempos idos, e até agradáveis. Cede nela a inocência da simples memória e transpare­c<: a política. Quem recorda, explicita haver a lgo naq uela infâ ncia comum, a valer para muitos, e adverte:

"Debruçando-me bem na janela do jornal, vejo a inquietação dos estudantes, os rombos em cifras asttonômicas da Sudepe, da Lutfala, da UEB, etc. No passado, houve escândalos dessa ordem, porém microscópicos, que levaram à. denúncia ...

' BALE61RO, Aliomar. Ufanistas e cassanc!ras. Follln de S.Pau/o, 22/5/ ]977, p. 3.

28 I A obra da tnnsubnal\da('âo e as nuanças do (Cmt.'f'nOrar

"Talvez exngere o senador Luís Viana, classificando de 'gravís· shna' a s ituação. Odeio os superlativos. Mas o sr. Geisel não tenha a mais mínima dttvida de q ue a hora é grave e pode romper as ré­deas de sua montaria gaúcha. Poucos se u fanam d() país, embora n!ío tenha eu vocação de Cassandra.";

E a advertência pode transparecer, com a mesma operação, em textos bem menos literários, bem mai.s diretos, mas que igualmente penetram nosso cotid iano, pelas páginas d a imprensa:

"Sem apo io popula r e sem d iálogo com as elites cultura is e em· presariais, não há adminis tração que possa cumprir com eficácia a sua missão. Nesse caso, a alternativa irresponsável sugerida por José Bonifácio parece inevitável. Endurecer, provocar, baixar o pau, em suma retornar aos velhos dias de Washington Luís em q ue a questão social era considerada apenas como um caso de polícia.

"Vale a pena recordar, entretanto, que foi essa mentalidade que abriu caminho para a Revolução de 30e cond uziu o sr. Washington LuíS ao exílio ... "'

Formulações dessa ordem penetram nossa v ida diária d e forma mais simples, ao lermos um jornal. Dada a imediatez do noticiário, uma situação q ua lquer pode ser grave, como simplesmente mera ~parência criada 'exatamente pelo foco localizado e ampliado em de temünados acontecimentos, com exclusão de outros, isolando· os a inda de qua lq uer análise a maior prazo. Mas um artigo assina­do e um editorial semelhante, com alvo explícito, utilizando a lin· guagem da h is tória, podem merecer nosso c uidado exatamente nessa últi ma. Ela sugere conwaração com um passado vivido e aponta a f10Ssibi.lidadc de recorrência.

O teinpo ido, a meaçando retornar, aparece como wna situação já dada. Esta d eixou um fato ou um conjunto d eles a comporem u m depositário qualquer, cons tantemente d ispOnível, em que é possf• vel buscar umà lembrança a travessada por urn conteúdo político preciso. O su ficiente para ser entendido como tal por quem escre· v c, pelo advertido e pela multiplicidade d e leitores. A d iferença en tre as inte rp retações, as versões, joga pouco. Existem, bem

s Idem. lbidem. • Fol/1.1 de S.Pmtlo, 10/6/1977; editori~l dos "qu~drados" da página 2,

titulado "Um drama hamletia.no..,, assjnado por Sarnuel Wainer.

A obra da transubstanciação e as nuanç:as do rcl'l'lemorar I 19

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alocadas, signilicações não sujeitas a tais di,·ergências, portanto comuns a quem as traz de volta, e aos seus leitores, ou que se acre· ditam connms. Nesta base repousa a advertência.

Q ncontecim~ manipulado trnnspat~ como a situj!Ç~S-2!,!!, como o produzido durante sua validade, enquanto sua existên­cia. Lembra-se cxatamentc o fato de a política, a ação inovadora, ter ocorrido nessa existência, podendo, agora, tomar-se repetição. Como se o tempo transcorrido o tivesse sido do ângulo da administração, ou da ação entrevista dessa fom1a. Ou, tal\'ez melhor, no campo da aç~o política relativamente rotincir«, isto é, sem produzir amplas vadações, e em que se procuram os mesmos indícios do momento no qual ação assumia ou tro sentido e uma quebra ocorreu. Esta sim, então, aparece como plena de significação, sugerida pelo "poucos se ufanam" e pela "questão social" como "caso de policia".

Feitas essas observações, quero retornar um pouco e retomar o raclocínio pelo ângulo da força e da capacidade que o posterior ao momento mesmo tem de iQfluir na percepção do eu que reJlleJ).lQJ:a. Alceu Amoroso Lima sentitt·se muito próximo, leu bastante, fala com alguém nas mesmas condições'. Refletiram conjuntamente e, para ambos, realizar esse balanço constituiu-se de fato numa expe­riência, na qual lembrar e rever tornaran1-se faces a se completar". O depoín1ento de Carlos Lacerda pare~e·mc útil, nesse aspecto, dada sua relativa rudeza'. O Autor viveu o pedodo, época de sua forma­ção escolar, universitário por aqueles dias. Tambén1 pouco distante

' A propósito, veja·sco comentário de Eclóo Bosi, examinando 1--Jalbuschs: ''Na maior part~ das vozes, lembrar ,,ao é revivei', mas rcfnzcr, recons­truir, repensar, com imagens e idéias de hoje, as experiências cio passa­do. A memória n~o é sonho, é trabalho". Conforme Mtm6rin t sccieda­dt: lembrança dt vtllws. São Paulo: T. A. Queiroz, 19?9, p. 17.

• Tanto do ponto de vista do eu que concorda e corrige, quanto da pró­pria forma por meio da qual seu texto foi produzido, vcjl.'l~$e a Apre­sentação de Medeiros Lima e o Prefácio de Antônio H ou o iss, noMemó· rins improvisadas, citAdo.

' A delicadeza dessa questão, o significado do depoimento, da memó­ria entrevista dCSS(! ângulo, têm preocupado historiadores há muito tempo. Quanto à sua abordagem técnica, veja-se, por exemplo, Ronald FRASER. Refle><ioncs sobre la Historia Oral y su metodologia en relación con la Guerra Civil Espanola. ln: VILAR, I~; BROUil, P. &

JO I A obn dl t..-.tnsubstil.n<.i:IÇJo e u nu1nçu do remtmont

,l.tqueles acontecimentos. E seus rumos, lá c posteriormente, não foram os mesmos de Alceu Amoroso Lima. Vários pontos em co­mum, c também bastante d i~tãncin10•

"Eu fui criado num meio poiH!co, ouvi falar de pol(lica em casa desde que eu me lemb ro que era gel\tc. Meu pai foi politico a vida inteira ...

"Depois, naturalmente, no clima da faculdade, porque a minha geração foi uma gcr~ção muito politi1.ada desde cedo, exatame~te porque foi a geração já criada dentro da idéia de lutar cot>lra a dtla· dur.l, que então se prel\unciava. Do p1·imeiro período de grandes <'>pcranças - período da Revolução de 30, quer dizer: 29, 30 e tal -eu me lembro que logo depois de 24 de outubro de 1930, port:u:­h> da vitória da Re,·olução de 30, ocorreu o boato que meu pat ta

"'r nomeado ministro da Viação ... "Depois, veio a desilusão com a Revolução de 30 e, no caso espe­

cfrico de meu pai, pl'imeiro o rompimento dele com Cct(ollo, quan) do Cct(tlio começou a t)ão cumprir os compromissos que tinha ?sl ,tunido com os Tenentes, em grande parte, através de meu pat. Cot.Sa <JUC ele conta num livro muito polêmíco, cilamadoA ~gw~da Reptí· 1•/ír.t, c os entendimentos que ele tc,·e com Prestes, Stquctra Cam· pos, jo.'\o Alberto, juarcz Tá\'ora, no cxilio, para articulAr o apoio dl>S Tenentes à a liança liberal...

~~Quando Getltlio cotneçou a l raj 1·~ isto é, n fa7.CI' umo política igualzinha à de antes de 30, só que era pessoal dele ... Nessa oçasião nmw-;ou a perseguição aos comunistas e, entre os comunistas, pren­deu meus dois tios, o Fernando c o Paulo, que eram realmente co­munistas ...

fRASER, R. Mefl'tl~lo.~írr iri;!6riCII de/,, suura y R~'Q/uci6u l:spulvla . .Sar· cdonJ: Fontamari\, 1980; também ~ria intcrcssantc obsctvar, amda tecnicamente, para um maior alc.ln~;t.• tffl'i divergências, J::.n VA~Sr.\A. /.tlr.l.iición ~mi (tr•dução e>ran!-.oi•J· iiM<elo:>a: EditQriol t~>bor, 1967. Althn das di(enmÇ4'1~ entre vs c)\d0h'"' ,a•\'C•sc lcmbrrtr, ainda, que rni­l'lhn nnálise de mén"'tlria::; e GerL~; ,,.__.:·.h ~s nlio se prcocup~. quí'l.I'IIO ao conteúdo, c0m r.s mesmos prcbk·m,,~

1111 lÀ•poirnento pn."'>SbldCI :-. um ~fliF\, .-1. • \ na listas d~ O Eslndo tle S. Pau-ll•, nos .ncscsdc mi'l~<;o e ~.':."'n: d._ .- '>ur .m:e 3-1 horf\S gra\·ad(l'....S em ftt.,, ele procurou r~um:r :t":b . • .. :\•riil J:OHtica: .. H; "'n~o ~ueria prestar esse depoimento ... ~i pr~· .. , .. . .. ,~·c·nce-lo da !"'portanc1a que ~uas palavl'as tcl'i:un pi\tí11'.ossa I 11~1''···' /í'nml da 1nrdt, 27/5/1977.

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"N" Revolução de 32 eu ninda Cl'll do Indo do que se chama\'a ditadurd, quer dizer, eu era do lado dn Re,·olução de 30 ... ""-

A pura divergência nas posições assumidas, nas lutas enfrenta­di\s, naquele momento e no decorrer de suas vidas, não pare<:e ter provocado uma virada na face entrevista nesta análise, a da locali­Z.1Ção do fato histórico. Este cu passou a infância, a juventude, em ambiente no qual a política transparcda intensamente {a família, com personagens omito conhecidas, deste 1·i~s). Ainda não era a figura pública que então fala e cuja5 memórias irão à imprens.1, indíc.uil·o para outro lado-sua p rópria pcsso.1 tornou-se um ponto de confluência e m que se alocam sig~tificações, isto é, transparece nela a personngem histórica.

O ~u vincu la-se ao lodos por meio do pa i, da faculdade, da fa­mrl in. Mas o lugar onde essa união ocon~ também se encontra na Revolução dc30. As alocações são d iversas das observadas por nós no diálogo entre Medeiros Lima c seu entrevistado. O 24 d e outu­bro c~'lrllctcriza sonlente a "vitóJ'h'l", r o 30 é:lbn\ngc também "esp~ rança~" e "traição". A p reocupação de estabelecer o vlnwlo entre si c o geral é menor, de certa forma ela j~ está d.1da, ela é tomada como já feita. Re,·olução de 30, a priori, para quem diz. e para qu<'m grava, cumpre esse papel, uma I 'CZ pn.ossupo.~to que o fato- esse fato- é aceito por todos, no momento da recordação. J\ transubs­tanciaç.'io já foi realizada, foi herdada por muitos c, nesse círculo em•oll-ido especüicamente com a fala da lcmbranç" de um cu, já não necessita refletir sobre essas opcraçõe,, uma vez que se espera exatamcnte seu debruçar no loca l já definidt).

"Traição"~ "vitória", "esperanças" tendcn\ a con1por urn perio­d o ern que o 24 de outubro apenas se situa. Torna-se necessário reorganizar a cronologia. Revolução de 30 avança e engloba 29, al­cança 32. Trata-se de fazê-lo segundo par~metros comw1s, não é o caso de lembrar e rever, realocando, como vimos em Amoroso Lima. Veja-se sua observação magistral-

" ... período da Revolução de 30, quer dizer: 29,30 c tal"-cm que o "e tal" estabelece com clare?a o ca mpo comum de re­

llexiío e lembrança, dado por esse referencial e por esses fatos. Ex­press.io da existência de um conjunto de representações já situa-

11 Joma/ da 1i1rde, 27 / 5/ 19?7, p. 7.

32 I A obr~ d.ltransul>standa{1-o e as nuanç.u do rememorar

,11" t tU I'\ rclatin1. precisão para todos". Siluadao; no agor,1. c entre­"'·" t<'ll1o tendo sido aqucl<' passado.

\ força das significações c locais l'ingados é tal, 1·istos em seu tuluro, que me lembra, imediatamente, um tn.'Cho de Brecht, n~ 'l''"'l Virgínia diz ao inquisidor: "eu não entendo nada dessas cot­

,, .. ," <'~te, na réplica irónica, percebe o saber de um d•to popular, h ~entando:

~u pai se di1•ertirá ao se inteirar de que tudo que você sabe 1ht\' as estrelas, ensinei-lhe eu ... "

1.1nto mais quanto aquele p ré, cronologicamente anle':iorao 24 ,1,. t>utubro c ocupado por 29 e pelas "espcr.mças", lambem mcllll 11 ,,ç.1o do pai e dos tios, envolvendo por essa via, no entanto, apc~ "'" li:l1<'nles e Aliança Libera l. Os dois til limos somente acrescen­t.un-Sl', na qualid ade de dados, como componentes da rea~idade '"'~'' lil)morc'lda, porque sabcm.-no todos, esta\'nm também eles la. Trm· t 1 ,. dois assume a forma de nu tro dado, da mesma espécie. O t1,,ir" .mtcccdc-o, idem a "política igual>inha". ,\prisão dos tios

1 '''e despreú1·el. O "rompin1ento" do pai com Getúlio foi lcmbra­.lu "Desilusão" cobre esse espaço, ao mesmo tempo cronológi'? e .unplo dr conteúdos. No entanto, como dpont•r tudo, de ~anell"a ''· «'11COmitaittemente, ampliar o significado de 30 e perm1hr md•­' "nutro fato, negador daquele c s~u complemento? "A perseg~i­\•'" ,lo> comunistas" não foi cogitada, nem aprofundado o relacJo­n,unenlo pai/ Getúlio e 32 transparecendo como esse fato. Quem ' '''·'percebe o interesse d esta representaçao, s•gmf~eando um colt-11mto de idéias para si c, espedalm~nte, pnra seu.s ou~·1 ntcs:

"O pessoal de São Paulo, do l'a rt•d o DcmocrM1co, tmha aos nos­·~l)~ olhos wn matiz tnuito readOJ1árlo ...

'' O papd condicionant~ das rep"""~to~õcs presentes sobre a l~mbra~~· do passado foi visto por llcl~a tk>SI, amda comentando Hatb,aschs: A L'Xpcriência da releitura é apenas um exemplo, cnll'c mu1tos, da ~aficul­dadc, senão da impossibilidade, de rwil·cr o pa<;sado tal e qual; •mf'<?"­"bilidadc q~ todo suj<>ito que lembra tem cm comum com o lústona­dor. P.ua este também se roloca a meta Ideal de refazer, no d•sauso p~nte, acontecimentos pretéritos, o que, a rigor, exigiria se tirassem dos túmulos todos os que agiram ou tcst~nlunharar~ os ~a tos a ~rem cvocados.l'osto o limite fatal que o tempo tmpõe ao hl>tonador, nao lhe J't.ISta senão reccmstntir, no que lhe for posq,ívcl. a fisioO?mia dos acontc-­dnw:tntos" - Memória e socitdnde: lembr,wçn de ltelhos, c1t., p. 21.

A obra da transubsunelaçlo c u nu~nçon do rememorar I 33

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"A posição do Partido Democrático Paulist.l era muito conser­vadora, muito regional. Quer diLer, no sentido de combater o Ge­túlio menos os efeitos maléficos que ele pudesse ter nacionalmen­te do que o fato de que aos paulistas a Re\·olução de 30 soava como uma t('ntath·a de destruir a innuência de São Paulo na Federação. O que de fato aconteceu"''·

Se levarmos cm conta apenas a in terpre tação, obviamen te mu i­tos dos leitores, senão alguns ou\'intes, contestariam. Mas um de­bate sobre a melhor, a mais correta análise a respeito de 1932 tem pouquíssimq interesse neste discurso, do pon to de vista d<> conteú­do. O f~111damcnto foi a localização da ação decisiva c de scus.Jlu­torcs, definindo o campo e .Q_on~anscorreu a pollti_ca.'isto de\'e­mos chamar tmédiatamente a atenção. Nessa e:.pacializaç~o am­plia seu signi ficado, alocando-se ai novas representações c 32 su r­ge completando-o, à med ida que aqui ta mbém se percebe a ação ino\'adora. Por e:.sa via 32 conforma-se como outro fato histórico.

Vinte c no,·e, 30, 32, Ten<.'ntes e Aliança Liber~l constituem uma esp•'cic de fio ou corrente, referidos pcln participação do depoente, tomados a priori como os fato~ ded si I' OS daquele período recorda­do. Fatos históricos, uma ve7. que teriam pesado t.mto para ele quan­to par~ os demais, e poss(veis de serem encontrados muito após conlo l'<'presentoções nceitt'IS, a~stunidas, para uma multiplicidade de pessoas. E uma certa relaçfio de exterioridade por começar a se instalar no ato de rcmemorM, ou só conseguimos percebê-lo agora com todo o sentido assumido. Certos momentos da vida pessoal o u de suas relações familiares, ou ape110s destas, perdem intc•·esse c este cu recordantc tende a abandoná-los, deixando de lado o es­iorço p.ua pens<l-los no vinculo entre o si e uma parte dos demais de sua época. De certa forma ele transpa rece apenns como o já dado, s ua ins tituição fica dificil ele ser entrevista, ele parece ter ocorrido em algum momento, mas quem recorda não consegue recuperá-lo. O Autor aceitou-o entre a ação e a recordação posterior, ou sim­p lesmel\le nunca se voltou para o tema, por isso mesmo n exte­r ioridade se im põe. Advém, ig ualmente, do esforço em se colocar no interior de repwsentações dispon!vcis, colocadas a todos- tam­bém o autor as procurou -, daí encontrarmos este cu e elas.

" Jom.11 da Tarde, 27 /5/1'177, p. 7.

N<" pi'OC!!dimentos desse reportar-se aos tempos_ decorridos, dei­'""< ~·•' l os momentos-certas lutas c.n1 que tran~parec1a outro fto a u1111 ((U<'Il\ rcnwmora a um g rupo ao menos ~ e m razão da força do• 11utr.t< situações, a se imporem, pode ampliar-se, u.l!rapassando ,, 111di1•íduo. Ou então, quando este recorda, tal esforço chega a t1 .mspnrecer e n tomar rumos de memória çolctiva. l)ma insti:ui­~·'"· expressão coletiva para muitos, por exemplo ~~m órgão de tm­prt·n-,a, deveria ter bast,1ntc a recuperar. ~ada a d1zer s?bre a fo~-111,1ç.lo de opini.lo? Que princípios nortearam esta práttcn; Qums h1l,lq, c ele quais formas, foram entrevistas como dcciS!VOS. Qua.n­dH lembrar? -~

"),\mais se viu, no Brasil, um aspirante à pre~idência da Repu­hl"a ,1ssumir o poder e faz.er exatamente o contranodo que prega· ,,,, rcm1o oconeu com Getúlio Vargos... . _

"I ogo após o p leito de março de 1930, derrotadas as ?postç_oes n•umdas em tomo de Vargas, a ala radical retoma as arttculaçoes, ,1, quais desembocam na revolução que edod<' cm 3 dP outubro. Nt> din 24 deste mês, o p residente Washing ton Luís é deposto por ,;,•rll•rais e a lmir.mtes, que tinham passado a conspirar após o 3 de nutubro, os quais, porém, são obrigados a entregar ~~governo a ( .et<•lio Vargas, <we sobe do sul na cnsta da l'e\:oluçao. A 30 de o;>utubro o antigo oligarca gaúcho, agora travcst•do de caudtlho, , hc~:n ao Rio c, a -1 de novembrq de 1930, é empossado no governo 'pro1•isoriamente'. Este 'provisoriamente' ser~o 15 anos ....

"Nasce a Scgund~ República c, desde o pnm~•ro d ••·.~''(~ n_1aus U' presságios para a 1mpn•nsa e sua hberdade. No pruneuo Lnstan· t< da vitória da revolução, insuOnda pelos eternos demagogos c oportunistas, a fúria popular volta-se contra os órgãos que tinham defendido 0 governo Washing ton Luís, regis tra.1do-se em todo o l'a{s numerosos atentados."14

O fato aparece como a própria revolução. Ocorreu pequena am­pUaçho do ponto de vista cronológico e do de acont~men~o~ quan­do 0 comparamos com o situar revolução em um d1a deltmdo. De 3 de outubro a 4 de novembro "eclode" e cresce a revolução, CUJO

:;entido parece ser o de levar ao poder, em sua "crista", Ge~o Vargas. E 0 fato, criador per se de efeitos, torna-se um mnrco: alem

" O Estado de S. Paulo, Supt~~ento do C~ntenário - "A liberdade de informação no Bras•l - lll , 29/11/197,., p. I.

A obn dl lntUubsUncilç~ e u nulOÇU do rememorar I l S

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~o, "~5 anos" do empossado, "na$ce uma St!gunda R~pública". I od~na perguntar qual d atuação do jornal, cm ~ua própria pcrs­pec~wa, ,'}esses efeitos ~ no marco por meio do qual a história se rea.~1zou ' . M;1s tal\'ez nem a tenha. Como ent~nder <'ssa "ala mdi­cal , _quem eram os "etl.'rnos demagogos?" Deixarei de lado 0 viés P~SS11•d ab~rto pela" r_etoma as articulações", para resgistrar a inti­nlJ.da~c 1:uHor assu m 1dt1, c devidamente CtiHlCl(!rizndil pelo "no pn111e1ro mstante'' •

...._ "A re,·ogação das ' Le is compressoras' da liberdnctc de expres­são de pensam~nto fora uma das bandeiras da Aliança LiberaL Mas, Implantada a d1tadura sob a chefia do candidato derrotado da AL o que sc_f'n foi a imposiç~o, de fato, da censura aos jornais. '

Em São Paulo, terra ocupada pelosYitoriosos de 1930e submeti­da ao jugo de delegados militares da ditadura a censura aos jor-nais foi férrea ... u:~o ,

Uast~? Indica-se claramente o pós aquele marco. Mil nm·ccen­to~,e tnnt~ rc,·este-se, tlgOl'<l, pelo "ditadura'', pelo ''terra ocupa­~~~ O pre ~stcnta a roupagelll de um item programá tico e, em mzao deste, unprcnsa tiCY$11 ~ censura colorem o cspuço de ilÇão d o J~I'MI no conjunto do fato. no logo a calma d escrição de aconte­Cimentos cede, c o agente retoma sua aç.\o, é esse ângulo 0 ponto reforçado.

"Vargas ... proclamara-sem qualquer constat .. ç~o- a falênda da d<"mocracia e o inicio de uma no,·a era-não podia, obvianlen­tc, suportar que, em S.'o Paulo, seus velhos adver>ários, que tinham pC'rcebJdo o que ele era pa~sados apenas 40 d ias d a vitória de !930 mantivesse 'O Estado de São Paulo' na est<Jcada libeml. Havia n:'l; apenas que s ilenciar o grande jorn~ l paulis ta, mas to111á. Jo, para pô-lo a serv1ço do regime, com toda a sua autoridade respcitabili · da d e e credibil idade."" '

Se a censura férrça é percebida como parte constituti ,.,, da obra,

u \ ahaaçao- a f ... ' • pcrsp<.'C "'•' C os para melros, além da lunçAo petas quais o O Estmlo de S. P~ulo se estcrldia nessa época foram e<l udados por CAPELA TO, Mana Hei•"' &. PRADO, ~i~ria Ugia -Ohrauo matutino (lmprmStJ C r.-ieol"l!ia no j<>rrml "0 Esf,ldo rfe São ~arl/,>"), Sno Paulo: Atfa­Omega, 1980.

1' O Estado de S. Paulo, Suplemento do Centenário, cil., p. 2. •r Jbidem, p. 6.

, pr.ttu .. ,l fonnclh\'cl da opiniãot' sofre algtUlS entr,l\'CS. ~'la't o indi­' ,,. , .. 1.....:us.1 ,·isccr.>l daquela nada traz de no\'O para a percep<;ão • ~:undo ~ qual 30 é um marco definido c cau>ativo- abomina-se

, ;l,t'ClÍkamente e:;te resultado sugerido, ntas em nnda se reduz o t,•h>, nem sequer acrescentando-se a lgo mais ao seu vínculo com o ,,,,,.·lo, se o entendermos como dotado de ação.

No seu agora tempo p r-.:!sente d a lembronç~. <1 institu ição reta­"''' seu papel, vcndo·O na pe rspectiva c por me io da questão da hlwrdadc de impretlsa. Retorna e lembra. Mas existe uma pequena nu.tnç.t, é mais que o retomar do p roble ma lá, num daqueles pon­"" de sua vida passada, no qual ele já se manifestou. Nesse mo­m•·nto ele toma-se o problema do próprio p.>ssado, como tal. o m.licatin> de seu entendimento.

Ainda no interior de pNccp<;ões em que o ponto de vista segun­.ln o qual uma elite" c sua ação respondem pela riqueza da vida t•c>lllica, podemos procu rar a memória d e sua pa rticipação. No ca­"-P c.lo periódico, ccrt:t censura, uma espcci(ic~ censura, chmnn a .,, a ah.mçi\o c a l ib~rtlade de opinião, sua defesa, tendendo a trans-11,1rcccrcomosua Unha normativa decoerêndn, scrvindo·se do teu\-1'"· Interessa-me, cntrchtnto, procurar~ instituiç:lo do fato no intc-1 ior da elite responsável pela ação inovadora. Com uma ressalva: procurar ao menos cm parte desta, no interior dos que assim se , êem (eu não ~ei quais as divisões reais a divá·las}, aceitando a princípio a visão dada a si por eles n\esnlos. _ .

AfonsoArinos", t•m um lindo trecho, rcfere-~e às relaçoes fami­liares, ao irmão:

' 11 ··v ... , vcrdadcirojornnl ... <:<..lnStllui para o público uma verdndeirn bên· ção. DispenS<l-O do trabalho de formar opiniao. c de fonn ulor id~ias. Dá-lhas já feitilS ~polidos todas as tardes~ :rem d•sr.-vccs c sem cnfettes~ lisas, claras e purab"· O fslado d< S. Paulo, 1<1/1/19~8. Apud CAPELA­TO, M. 11. &. I'RADO, ~1. L. Op. cit., p . 10.

" "Na perspecth·a de 'OESiv um dos fatores delerminanl~ d? caos po­lítico do país residia precisamente na ausência de uma tltlt mldtctuat capaz de compr..,nder os problemas de sua época e de dar a eles solu­ção adcquoda ... " e, ainda, "a superação desse> proble':'•s s6 se pode· ria conseguir m~:dhmtc o (orjamento de uma novn chte à altura ~as 11ecessidades do pois ... " CAt'tiLA1'0, M. H & PRADO, M. L. Op. c1l.,

p. 121. " FRANCO, t\ÍOIIS<tAI'inos de Meti(). A a/,,a do lempo - memórias !forma­

(rlo e mocidade). Rio de Janeiro: José Oly111pio, !96'1, p. '165-7.

Page 16: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

"Atécntao VirgUioscenvolvera emepis<ldios p\)líticos, como os qu<' 1·ivera na campauha e leitoml de Artur Bernardes, lev.ulo pelo gosto natural do risco e da aventura. ,\ particip~ção quebrara a rotina tediosa da sua vida de rapaz farto. Ela se dC'senrolMa auto· maticamcnte nos quadros do 'bernardismo' em virtude do meio em que vivlamos; das relações c compromissos do nosso pai ...

"Com lkmardes instalado na sua espécie de ditadura republi· cana; naque le ambiente de est.1do de s ítio, censura à im prel\sil, pri· sOes e dest<'rros, a colaboração, tão forte e desinteressada, que Virgílio dera ao sistema vitorioso da política mineira, arrefeceu. O jo1•em Aquiles recolhia-se sob n sua tenda. É significativo que não haja tomado nenh" ma parte nas combinações c prov idências, que resultaram na indicação e eleição de I Va~hington Luís. Sua amiz.1· de com Berna rdes tornaria fácil o recebimento de missões, ou, pelo menos, a pa1·ticipa.ç<i.o nas convcr&"\s ... "

8 visível não tratar-se de qualquer família, uma entre milhões, nem de qualquer inn3o. A IL\3o de quem fala 6 mui to clara, elas compõem um círculo, e este é peculia1·-elite - exatmncnte por· que nele c em razão de le se desenrola o movimento da história (con· sidC'rando a prática viva do sujeito atuante). Ela dá o tom das mto· danças, pensando também é tica e mor,,hnente. l'crsonagcns, em que se a locam signHicações de âmbito geral, saem dela. E Virgílio transparece dessa maneira:

"Em 1926 amadurecia, dentro do meu irmão, o homem de 1930, de 1945, o lutador byroniano pt'la liberdade. Aliás esta vocaç~o já despontava, nele, desde pouco depois da eleição de Artur Bernardes para o Catctc.

"O primeiro indício que Virgílio oferece da su~ inconformidade com o meio político é o fo rte d lscutso ... "

Vemos o movimento vivo, a dinâmica desse gn1po, a formação de sua consciência, o crescimento de uma consciência individual. Este desenrolar, nele, envolve c permite diferenças. Estas parecem compor o tecido de seus choques.

" Lembro-me de Virgílio compondo a arenga em Copacabana, d iscutindo passagens, lendo trechos a alguns amigos. Ele próprio não percebia, ta lvez, que o seu rompimcJtto com Borges valia, de fato, como um desligamento do sistema republicano de que o pre­sidente gaúcho era o patriarca, masque, agora, tinha comosfmbolo nexp~essão máximai\rtur Bernardes.Aquclediscursodc Vlrgllio é muito importante na sua vida. É o primeiro passo, ainda incons·

38 1 A obra d.a transubstandaçlo c as nu.1nç;u do rerncmo•·ar

1 h·ntc, cJ1\ marcha do revolucionário ck.'lllO<rático, cm busca de um nuvo llr.1'il. O jo1'em Saint·Just se de>.ligavd, até certo ponto: do , ''" gmpo, do círculo de intcr.:sses dominantes a que pcrtcnc1a, ~ p.h:;twa pn1·a a trincheira adversál'in. Essa m.;u-cha se tonlOt~ cons~ , ,.,nte na i\lianÇ':1 !.ibera! e na Re\'oluçl\o de 30, sendo Washutgton 1 ui< um verdadeiro epígono de Artur Bcma~dt>s:" .

Se seu• choques caracterizam a obr<1 da h1s t6 na, esta f1ca entre:

1 I' ta co1M expressao da p rópria vida intelectua l e mo~al da elite: E "'' ,eus interesses c divcrgt,ncias. Mas pode ser percebida ~lo l'lés "''individuo, sclccionado como agente, mostrando os parametros

11t· a tunçJo desse setor social. Em Virgflio :ss~ vlnculú tr>1nsparece. 1 ,1 aç;\o individual nos quadros e ro:_EerenCI?S da v1da ?~ setor. ~ 1, "'"o quando 0 nega c até combate, se desbga~·~: .. do cucu lo de •nh•rcsscs" c "passilva para a trincheira advcrsnna . Aloça-se nele 1 .,t,1 i\tu ,tção e obser\·a-se cntilo um pcrson\'gem tomado como , h.we na "busca de um nol'o Brasil". Esta procura do "no1·o" -

11, 1 ângulo dessa ~tuação e de seus referenci ais--avançou par,, a \ li<u1ç,1 Liberal e para a Re1•oluç.'io de 1930. Mas na~ se esgota nes·

, pontos, uma vez que, posteriormente, cresce. amd<~ mrus cSI<'

1 ,,,0 de sua in1po rtância, da participação cm pnmeua mão, per· ; o•ptívt·l pcl(l n<'une1·o incontável de ~itaçC>es. de ?uh1bro, 1.930. . "

Excesso de pretensão? Al~m do maiS .:eguetra~ jo1 ~~~~ Sau>t·Just , ur*'! ~tas tah·ez. caiba observar, acin1a deste sornso 1romco, que '7'Sc:'l prl'lcns3o tem algum peso. A ironia, muitas vezes, advér~' de.so os .u·t~ilrU'moscotno classe, opostos a outras, ou de ':ê~los no m!enor da .J1,put.1 entre fraçõcs de classe. Encctaría':"os d1scuss~ ngorosns <lbn! intelectual orgfuúco. Com menos brilho e prosaJC<Il~~ente, po·

1h·damos lembrar outros pnrtíci·pes- Paulo NogucLrn l•1lho, Jullo

,,,.Mesquita filho, 0 número cresce. E .também os lemos, com o m~s­""' viés. Mas o indivíduo "''o faz a hL<;t~lJCr uma cbtc, lf11·lamos. Ela inclui outros aforei; passa por outros iugnros. Mas tal· vct., para a crítica, ta l não baste, e a superioridade da nossa ~erce.p· \•\o- fundo da ironia - pode desarmar·noo. ~centrar a açao cn<l·

1 tvra nn atuação de uma elite parece dotada, sunultaneamenle, da r.>pncidadc de situa r lutas c atorcs, d<'finindo o local onde a reflexao ~ sitmorá. Virgllio de Melo Franco,Artur Bernardes, 30 fom1am uma con.~telação muito próxima da Aliança Liberal e dos Tc~c~tes, os q11ais, jwltos, podem preencher esse c~mpo. E seus_ textos, lllllll1~ros, ponteiam-nos com mil c uma pequenas iniormaçocs, peque.nos .da· dos. Se este sctor, ou setores, do social, vêem nesse campo sua vrda,

A obra da trantubsuncla~lo e as nwnça.s do rememotar I 39

Page 17: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

:o.Uêl «luação c o resultado desta, pod<' nté mrsmosertntilteJ1ten1ente corr.·to, lúcido, do ponto de vista de momentos rele,·antes, auto­dcfulidos, dessas vida.~ que lkm esse pass.,do. E na relação entre si c o conjunto do social, conformando o lugar onde a criação política ocorreu". E quem pode dizer não? Os situados fora desses cín:ulos?

:• Ddinindo o conteúdo onde a loc.H· e, al~m do mnis, q .. •nndo alocar, d~ixam-nos um conjunto de fatos, cm seqii~nciil, omorrndos, à espera dt.1 qu{!scjnnt b uscados. E a volht posst•i mais do um vié-s; como memó­ria pode sel'\·ir à reflexão, c à corrcç:lo, O(.) sei\ tido de wna lição a tirar, clo'lr.l sornenl~ mais larde,qun ndodrnrnn S<:mclllnnt~sccoloca. Veja· se cst(l trC>chn, de 1963: "Eu era promotor ~m OC'IO J lorizor1te, c, como suC~;.?d in à.s vezes, f<mta\·a um d ia em pnl~cio COil\ o velho And rada. Est.~\·.-.mos nos pródomos da Alian~.l Llb<'l'4ll c eu ind\\gava dó rumo dns <'Oi.)aS. J\11tôn.io Carlos, que era UI"" modcrndo, manifcsta\'a sua \\precn~o em (are do radicalismo das posi('ÕC'S, que desfecharia pro· \'•"'eln~nt~ em gr;we crise ...

""Hoje, ltmdo o li\'ro recente e excelente d~ Jo.\o Neves, ,·emos como foi a cegu~ira dos grupos dominantb que "rra~ou o ljrasil ao fim da Prim4:ira República. Faltou à geração d~ 30 a C.lpacidàd~ de coexistir.

.. Naquele tempo, a situaç-ão interno\ impunh..1, t.ll,•cz mais do que hoje, a dl\·isãodada à resistên<:ia, digamo; ,-egotal, lenhosa, do Presi­dente Wdshington Luís. Hoje, no ~nt.1nto, tenho a imprt"SS.io de que as instituiÇtlei intcrn(ls são bastante nperfeiço..lclas c nc~íveis, c que só por um radicalismo ideológico ... estamos p<Jrdendo o ""nso da mode­r:~ç:io e a capacidade d a coexistência'',

Outro \'ittis, dircto, de dent-ro d o tlfício, é n C(Hl5~lho sobre o que ler, q unis textos, t! mesmo o mé todo adequado pnríl isso- "O ma terial exis tc11lt! pnrn a r 1ist6ria da Revolução ((<130 é, hoje, bastante copioso c, com apoio ne le. u m panoran'a isento dnquclos importnn tes aconte­citll(ll)los rep ublicanos pôde ser lévantodo com l'l)laliva f.1ci1idade. Pena é que, até o momento, nenhum dos nossos his loriadorcs, principal­menlc os mais jovens, tenha se decidido ílO esforço que a tarefa impõe. Ali6s cabe, aqui, uma observação marginal. Os estudantes e professo­res dos seções de História das nossas Faculdades de Filosofia estariam intervindo~ na minha opinião, com muHo mais ~rto c \'igor na vida polflka nacional, se, em vez. de radicais Jutas polftico1s cm que tantas vezes se empenham. esti,·esscm estudando a História Contemporâ­nea do Brasil na base dos fatos e intcrprctaçOcs•. Na soqüência fornece indicações do numeroso material. De um lado r~flexõo sobre a práxis pregre:.sa da elite, para si mesma. De nutro a lembrança do fato o sua Interpretação. FRANCO, Afonso A ri nos de Mello. Et'l>iup!oda crise brn· sUeirn. 55 o l'aulo: Nacional, 1965. Os primeiro~ tt<."thOS citados encon .. tmm-><> às p~ginas 14-15, e a segunda parte, b p~gina 70.

40 f A obra da t•·ansubsundação eu nuanç.as do !"('memorar

r-..1.1-. ,,finna-se, de cara, sua não·pnrticipaç~o";:, a fragilidade do ai­

'·'"',. desta. q11<1ndo ocorre. Curios.1mcntc sugere-se a estes ~ue re­llll.lm .,,,,tamente soo!\' os lugares onde, por pressuposto, nao esh· , ,.,,un ou apenas transpareceram de forma n!Ocxa, por indução, s_cm "'''"'r consciência. Que admirem a pcrfciç3o c as falhas das aspiiit· \"''S c práticas de outrem, dominante. .

\'oito, agora, àquela nuança, já apontada, da extenondade ~ue 1 ·•~lc instalar-se entre o eu e a conformaçdO do (,,to. O pessoal extge '"''"05 c domina o autor, de um texto, a falar de a lgo por suposto , omum a todos, situado no passado. )t\ se percebe um critério de •.1•i<-ç3o, entre momentos pessoais da histól"ia ele vida, permeando , "cs pontos-chave d o passado cm gemi, em que t':mbé~ j<\ está '"'"il,lcla a necessidade de rellexJo colocar-se. A seleçao é vtsível no Hlt do dos capítu los - "O Colégio", é" m momento, "Re,·oluçiio de ~lt• Revolução de 32", é ou tro, "Concurso no Rio", retoma o pn· nwiro critério, "O levante de 35"~ o Ot!trot:t., .

"!'orças poderosas ostensivas e subterrâneas con,:ergtram em I'J:10 na re~olução da Aliança Libcral. MO\'tmcnto pohhco que pa· ,.,.i,l sc conter nos limites das dissidências que, deve.< em quando, ,1~al,wam 'a família republicana', acabou a 1\linnça h~rde~a de Sl~­', ... ~i vos protestos políticos e milita~ conlra. um~ Slluaçao ~adt-1 toll<llmcnte manipulada pelas máqumclS eletlorats dos go' erna· dun•s, submissos à presidência da República. Ar,·orando o lema

u A própria pregação reformista de Rui Dnl'b\')S;I, na. Campanha Civilis!?' n(\o pCnl'trava, efetlvamc.nte, além de um grupo llm.H.ldo de bacharc1s uu elementos politizados. O verbo candente do, tnbuno, a sua com­bt'lti\'idade infat igável d avam n ilusão de populnndade a temas no hu~· do i nd i(~rente-s ao po \·o. Se Rui dcrcndC$SC no seu p rograma teses d1p \'t•rsas das que dele constam, e a té cont1·árias, se possível" o resultado popular seria o mesmo. . .. ~A~ reh·indicaçõesde Rui só vieram il ser :'lpto\:eltada~ na ren.sao cons­tiluc:ional de 1926. Ali, sim, naquela asl<!mbl4ha re:-tnta e_ capaz de~ intt!reS...'3r por tais matérias teóric-as e abstraias, sena posst\~el a germ!· nação da semente plantada pelo grande baiano, do ':""o ~ao~­ria ao aprimoramento da noss..1 estrutura conshtuc1onal - FRAN­CO, Afonso Arinos de Mel lo. A al11111 do tempo- memórus. cil., p. ~-

' LIMA, Hermes. Tr11!>t$si.1 (mtiiiCÍrh1S). Rio de Janeiro: joséOlymf>iO, 1974. O; trechos utilizados nestas obser"ações encontram-:;o, às págmas 58 e 59, em "Revolução dc30 c Rcvoluç~o d~ 32".

A obra da transubJt:tndaçlo 0 ~s nuanças do rememorar I 4!

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Representação c justiça, beneficim·a-se a opo~içJo de um estado de espírito público que, sob a bandeira da regcneraçJo dos costumes poütícos, ti,·era a aguç~-Jo acontecimentos como o levante do Forte de Copacabana, a Coluna Prestes, os dois 24 de julho, o tíltuno dos qua is culminaria na ocupação da capital pa ulista. Hav ia, na insa­tis fação de muitos espíritos, um país legal repousand o sobre uma estrutura polftic,, envelhecida ... "

Esse trecho fala sozinho. A fo rça pos te rio r do fato, en trevista já no passado e a sclcç.lodc ol\de,em quais acontecinwntos, perceber Si!ínifícaçõcs, salta à vista. t\ exterioridade em que se coloca o au­tor é tanta que poderia a té mesmo estar falando da C r& ia CJ,)ssica. . _Pode ceder um pouc?, admitindo e retomando instantes de par­

tiCipação. Entretanto, a mtNpretação é o critério, o balanço, sua exi­gência:

"No quatriênio Washington Lu ís ccssru-a a turbulência militar, suspend.eu-se o sítio, honrada era a adm i nlstn-1çilo, a iJn pn•nsa go­/.Otl de hbcrdad", c o fermento da <~gitaçJo tnh·e~ o til•esse absor­vido a providê1\cia d a anistia. A favor dela,~ ang us tiadas pela in­trans igência federal em apaixon<mtes questões scloriais, como na Paraíba e Mu1as Gerais, ouvi vozes isoladas, qual a do p residente t\ltmo Arantes, modelo de homem público, lamentar o rigidismo do Catctt> ... "

Situam-se informações, interpreta-se, mantém-se o distancia­mento entre o cu recordante- participante daqueles ev<>ntos (sem exagero, "ouvi vozes ... ")-e a instituição do próprio fa to por essas p ráticas. Procurava-se, po1· interméd io d o balanço (c d a bibliogra­fia, d iria o utro), revê-lo, clarificando-o meU10r. A j?OSiç5o de reme­nwrar confunde-se com a d o observador priyi!cglru:J,o, que "viu" aqueles fatos, tomodos como fundamentais pe la posterid ade, po­dendo narrar - record ando, interpretando, revendo - com su­gestão de extrema objetividade a verdade deles. E outra face se apresenta: exterioridade e interpretação complementam-se.

"Inicialmente, no deflagrar-se a questão sucessória de 30, inicia­tivas e medidas polfticas e financeiras, algumas p leiteadas pelo governo d e Minas Gerais, encaminhariam com probabilidad es grandes d e êxito soluções favorecedoras da estabilidade constitu­c ional. ..

"Não fora indif~ rcnle o governo à sorte do café, porém novas quedas do p reço no exterior, a repugnância oficial cm despachar providência~ para imped ir execuções de hipott-<:as de lavradores .. .

n 1orçar.m1 a urdidura dos conspiradores. O general café montar,, ,l,•tanili\'0 o cenário da te\'olução. E, no numdo, o (rock an1ericano ,t,• 29 m<>ntara o cen~rio de dificuldades que a todos atingiram. Se , , ·.trit.t resistência legal represaYa inconformismos, ambições, as­l'"•'çõcs, desejos de servir, um tiro moral no Recife il1ce11d iou a at­tl\U~fc,·a~ con1ovcu a nação e da tribuna da Câman\ Undol(o Col1or .1pvstrofo u: 'Presidente Washington Luís, que (izeste d o Presidente lo>, i o Pessoa?"'

Nesta interp•·ctaç~o d e eventos, externos a quem os recorda{?), 'ulta a pensar em um texto de seminário, em sala de aula - com , .1lma e distanciamento. Ou na situação ~ugerida linhas acima, fa­l.lr em Gr&ia, por exemplo - além da diStância, existe certo grau ,,,. em·olvimento, seja na leitura de liD1 texto, seja integrado em •··1uipe numa escavaç~o. estudando as figurns de um vaso. Não é a "''"ma posição? E n~o é também u ma dara dcmonstraç.lo a mrus ol() nominio inconteste do fato, obrigar seu contemporâneo, n it vol­t.l, a procurar entendê-lo o melhor possh·ol, cok>eando-sc tão lon­);1', q ue se o cstudn como o tema?

Sinto, a lém d() mais, transparecer nesta nunnça outra su tileza, p<·rmitindo e garantindo esta aura de objctividadc. Quando esta posição de exterioridade, por quem recorda certo passado, tme-se ,, um conjunto de representações comttnS a uma multiplicidade de outras pessoas, dos demais, esta união ocorre em tomo de "aconte­umentos", já alocados no que se memorizou como disponível a todos. Acontecimento, neste caso, descola·sc da rát · ,·v as que " i~tstittúram, assumindo este ar concreto, su sta ntivo, dado pela 1 crteza, comum a todos c prévia a q ualqllel·annlise. de sua existên­' it1 como o I uga r onde a criação se deu. E seu exame tmnqtiilo, sem p~ixões, por quem os trnz d e volta, jwllamcntc com ou tros (que .1penas os estudam, sem jamais terem se envolvido), parece supe­rar a subjetividade inerente ao "como eu a vi". Esta operação abre possibilidades- não estou afumando sempre, e em qualquer ca­so- para certa pretensão de objetividadc na análise do fato/ acon­tecimento e para certa separação entre fato c interpretação.

Retomando um pouco do aprescn tnd o até aqui c amarrando al­gumas faces mostradas pe lo brilho deste fato instaurado, tentarei mostrar a inconsistência deste equivoco. Uma série de p rá ticas, lo­calizad a cronolog icmncnte, parece ter tido a capacidade de se un ir a s ignWcações amplas, constituindo o fato, exatamente porque, no conte úd o e no in terior d estas últimas, todos (além do eu) se encon-

A obn cb: tnnsobsundaçio e as nuJnçu do ~rar I 4l

Page 19: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

tr~r.1m pelos efeitos decisivos dessas práticas, mais importantes que a pura pa.rticipação. O (ato transpé11"l"<'ia predsmnenh' corno a re­present,ção n~l<' cnvokida- ,.,, ,·olução de 30.

Se sua importâ 11cla soou, em .tiCll momento, menos reJe\·ante., a força da obra - entendendo-se por esta palav ra tudo o que foi tomi\do por decorr~ncia, em grau variável, do fato- corrigiu essa percepção. Como evento colocado à disposição do pens.1mento, na memórii\ coletiva, o fato cresce c pode retornar, obrigando à revi­são de suas p rimeii'M negações. Dessa forma e le p rojetn-sc, cada vez mais, como o momento da p rópria história, porqtle nç11o c cria­ç.1o ar se localizar<lm.

Como pressuposto de qualquer lembrança, como ponto comum a qualquer análise, O {,\tO aprgsenta;Sp mm a man;Q, aoqunJ se procura referenciar um mundo de questões, as quais teriam tido previamen­te, no pensamento, algum g rau de rei\lização e de existência lá.

Sua ins tauração pode ser ap resentada, por outro ângulo, quando um cu é l'inculado a um grupo - elite- c, pela ação desta, o fato surge. Tal e qual nos casos anterion.>s, a ''ariação nJo muda o fato. Outros agentes s.io sugeridos - tenentes - mostrando dh·ergên­cias apenas neste ângulo, o de seu cngendramen to. O q ue intens.1-mcnte me chamou a a tenção foi a u1dicação, por estas pcrspectiv<~s, de que somente nesses locais deve ria da r-se a volta da rx:flcxão, da <~nálisc, cn\ busca de uma compreens<lo sobre o passado.

l'or isso é assustador a posição do ngente quando assume a ati­tude de distanciamento relati\·o, sendo sua isenção garantida pela procura dameU,or interpretação possível. Não a atitude em si mes­ma. Como deixar de aceitá-la? Idem quanto ao lemb1·ar c refletir conjun tamente. Situ;lr o problema, revê-lo na perspecliva do tem­po, críticá-lo ou recuperá-lo, fazem parte da retomada da função do agente. Mas esse s ituar supõe responder a certas questões como: Qual problema? Onde se colocou?

E o que se clarifica, então, é, nada mais nada menos, a expressão de perguntas desse teor. As repr<'.scntnç<1es, agentes, problemas, est~o dadas no própl'io fato, e a objctivicladc está ligada à exter­ml lidade, a essa p recisa posição extcma e lide este pequeno deta­Uw. O fato solta-se das significações q ue e le já contém, pcmútindo algo semelhan te ao "vê-lo" para melhor examiná-lo, d.mdo mar­gem tanto à idéia de seu estudo objet ivo (e ele já está no pensa­m~mto de lodo~. nesse caso), isolado de versões apaixonadas, o u podendo enioca r oxclusivamente as rea lizações permitidas por ele,

,,,h,nh, a scparilç3o entre o fato c tudo o soante como ~ua interpre-11"-IHl V~ui~lvcl e sujeita a correçõt!::t, (.'Stn última.

( >,,,, creio ter ficado muito marcndo, a cada momento em que 1111 1 ,.u procurou vincular-se a um g l'upo ou a todos, um iten1 esscn .. , ,,,I. 1\ me~ma operação une fato c idéia, e precisamente por ela é l'""il·el ao memorialista sentir sua hgação com um geraL Por se •lt>e.lrem significações amplas ocorria esse ''ínculo e o fato trans­JW•'<'i« como tal, ou seja, e ra i ato em virtude da representação pe~­' .-h ida. Temos o 30 c a revolução rlc, talvez fosse ncccssáno ms1stlr "'' Llltima, é dela q ue ndv<im o 30 ou a memória do 2-1 de outubro. 1 ) pt•so fenomenal dado à significaç~o amplia a importância da­<JIII'I''" dias e torna-os ,-álidos para um geral tendente a englobar a hxlos. A necessidade de espraiar, cronologicamente c no conteúdo, "1.1to, toma a mostmr-nos o descnvoil•imento posterior das signi­llr.lçõcs nele localizadas; nesse sentido re,·oluç~o de 30 cresce , ••mo fato à mecl.icin..n,u,g.wce_s:omo.ldéia, como slgnifif-ª.0o. De '"' tra forma, d ificilmente a quebra das práticas cotidianas, rclati· \ .lln<!nte rotineiras daquele outubro, teria transparecido como fato hi,tórico. Agor,, imaginar sequer a possibilidade de abranger o 29 l•·mbrado, o 32, o Aliança Liberal c Tenentes, fora dn percepção de 1\'Vulução, (OI1fOrmadora do fato, é exagero sério.

"!a sua defu1içi\o, o fato cont~m um conjun~de idéiaâ'· o 24 .de ••utubro aparece como revolução de 30. O c•-esclmcnto c as IVergen­'''" ocorrem na faixa das s ignificações alocadas, permitindo maior nu menor abrangência cronológica e um circulo igu<tlmente amplia­do ou reduzido de novos fatos e agentes, cm sua função exigidos.

i\ transubstanciaç~o liga, no tempo, algumas ações, e ações coleti-v~s, com certas idéias, criando o fato- e neste o lugar da política. No entanto, cm um segundo momento outra operaç3o parece tomar ft>rma, pela qual o fato perde boa parte do conjunto de s ignificados, :t \'is ta imediata, assumindo essa expressão concreta, despida, como a pedir, quase a implomr, tuna interpretação. Na hora de tun balan-ço, procurar o pessoal no coletivo ou mediante o primeiro mostrar 1) último, enriquecem-no e dão-lhe alcance todo especial. Eniocar o fato ele fora, p rocurando reproduzir o trabalho do historiador, com­plementa a postura, além de ser um díreito p leno. B a junção d .t) 9$. memória viva, do rememor-ar. co.!!' <1_ nnálise.....pode apresentar possi- fllil ]2llidad~9· Mas entrever o fato com esta aurn especial, lim-po das representações originais, as que o constiluírrun como tal, pam apro vcit;1r apenas es te último sentido, o de sua disponibilidade c

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relativa precisão, parece-me problema mcrecedur de cuidados. Ex­plico-me mell1or. Com esta palavra- precis.1o -l'klu p;,nsoem ri· gor, talve7 nãosej•• este o mell10r termo. O conteúdo n.lo fica fechado e claro, o c~ntrário, até. Trnta-se mais deste "ar" concreto, pelo falo. É a 1mpress.1o de nJo possuir conteúdo, mas, cm si, indicar onde alo­cá-lo, que sinto agor,, r desejo mostrar.l1 es te como um local c.\duü­do pam a reflexão, a sugerir um primeiro sentido, que p~>rmanece. Retomá-lo para intcrprutá·lo, então, torna-se muito mais. Significa mantê-lo e ampliá· lo. 1:: se ele foi produto da açJo c pensamento dos homens e traduz, cn1 si mesmo, toda uma série de idéins, este mo­mento de sua exisl<'ncia c esta nuança podem sugerir mais um dis· pos•tt,·o para manter o pensamento \'Í\'0, preso num campo fecha­do.l\'ovammle, uma pergunta: porquê?

11

Sem abandonar a prC<)('upaç~o d essas t'dtimas considerações, n serem retomadns U Jn pouco à hcnle, volto ... me, cm dois textos, à procu ra tanto de elementos por nwio dos quais ést(: campo possa ser rompido, ou negado, q uanto para Oltlras ol>~crvações sobre as condições de sua continuidade.

Luís Carlos Pre.tcs, personagem por exece!encia, constantemente referido, possui uma trajelória notá\·el - atravessando esse mo­mento de ponta a ponta. jamais, na memória, como simples figu­rante - do "chefe supremo da Revolução Brasileira" ao "Cavalei· roda Espêrança", muittt águtl passa peJa ponte, mas, nparentC'mente, não a função a ele reservada, que numtém ccrtns carflcterísticas. Colocam•se em t>restes aspirações coletivas, (luem para o papel re· servado ao herói. E, nqul, no passado cm discuss~o, boa parte da­queles graças ao tr,lbalho, à obra, da i111prensa.

Com base em entrevis tas", checagem e le itura de documentos jornais, memórias, b ibliografia, um texto bem-cuidado" foi produ~

1' "Durante 15 dias~ C~ntre main e dezembro de 1981 l'restes contou sua

história, não deixando de r~pondcr a nenhuma' de nossas pergun· las ... Foro.n 22 horas de gl'avação ... " ~10RAES, Dênis de & VIANA Francisco. Prestes: lulas e nuloçrítims. Pet rópolis: Vozes, 1982, p. 26. Pro: fácio de f{aymundo Faoro.

" Vcj~-se o Prcfáciu de Roymundo Faoro, colcjando méri iOS e sugerindo vanaçÕéS, deixondu fluir certa inquietude.

odo, a rcspt!ito de Luís Carlos Prestes. Ele e >Ua trajetória torna­r.mt-se o foco de interesse. ah·o de mlerrogaçõt"'"'· Procurarei, a ··).tuir, apcmh,u a memória do fato e a org,mizaçãn do unin?rso em

•!"~ ela se encontra. "1924, outubro. Luís Carlos Prestes, 26 anos, c>til se preparando

para ]c,·anlaro BMalnão F<:>rro\•iário de Santo Ângelo, cidadezinha ~;~úcha csqueddn do mu ndo." . .

Os Autores j~ põem o fato, um fato. Se em F~oro tcne~losmo mn· d« é u01 tcmn, com ro1·ça ele fato, 1924 assume n expressno concreta de un\a realizaçdo, ncontecinlento substantivo. Procura-se perce­ber, alcançar nele o personagem.

"O le,·ante foi cuidadosamente preparado. Prestes já amarg.ua .mtes o fracasso do le\'anlc de??, que falhou por excesso de libera· lismo e fali., de organi.<ação dos militares.""

Cola-se aqui o c< forço para acrescentá-lo, ampliá-lo com no,·as informações, pequcMs práticas a comp(lrt'm·no. No mtenor do acontecimcntu/ fato, Prestes é humanizado, este o sentido da recu· pcração d o falo, com(> cotidiano, cm sua pe rspectiva.

" ... resolveu ousa r. Foi ao quartel e consegu iu convencer um h o· men\·chave docon'l:mdo, um capitão muito burocratizado que não

Os primeiAAJ-••Por eles, fala. o homem, integrado nas ci~c~tân­cia.s1 reconstruídas a panir de outros depoi?'4.?nt<'S .e do ~o~c1ano da in'lprenb-..1., escrupulosamente filtrado. E~te t.! o ménto prmc1pal deste livro, qut>, no ult rapassa r o depoimento, pttssi~o.rncnte ~}hido, incursioun n:l hist<.lrin or;\1, integrando o alo r no ccnnno do p<us . Den­tre i'lS qucstôl."S enfucndn~ neste texto, o meu~ devo ressnHM, en.trc as variac;{teS a serem C<..ltCjadas, mostradtlS polo prdncif'ldor, os depo1 men­tos do chamado tcmculismo (grifo do nuto1·), F2tOI'O re-~snltn esse aspec­to, o de a p~r~nngcrn engolir o terna - "O carisma !iX?u um mit<~, que se tornaria indestrutível, não dilacc~ad_? ~l~s t~rn~·e•s er:os poü­ticos a que sucumbiu e pela tenaz res&Stenctn as 1chhas ma1s tarde adoladas. O homem desapareceu, nas suas proporções reais ... " MORAES, Oo.'nis de & VIA:>;A,I'rancisco. Op. di., p. 12·3.

" A epíg(afc dos Autores, de Pablo 1\'eruda, é (!l(C•nplar, da.s capazes de eliminar qualquer dúvida- "Nenhum dirigente comumsta ;fa Amé· rica latina tem un1;'1 vid~ tão trágica 4! pol'tc:r\IOsa quanto LulS Carlos Prestes. Herói militnr c político do Brasil, sua verdade e sua lege•'lda ultrapassam h6 muito lt!mpo as l'cstriçôt!$ idcológicns. Ele se com.·er .. teu em umn cspC"Cie dé ~nc:Mnação viva dos h~l'óis antigos''.

" MORAES, !Jênis de & VI ANA, Francisco. Op. cit., ,,. 31.

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I queri~ saber de confusões, que o 1nelhor era ele ir para a fazendq f1c•u com a mulhct~ enquanto o clima de tensão passava. O cap'itão entendeu o recado e retirou-se da cen<l ..

. '~O fi.J.1a~ da his tória foi <Jssim: Prestes c um grupo de civis se <:hngll'am a casa onde morava o con1andru1te do Batall1ão e o se­qüestmram. Não foi difícil. O comandante morava sozinho com a e mpregada. Rendido, o major Siqueira dos Montes foi mandado para um poulo ~três quilometrosde Santo Ângelo, juntamente com a em pregada. As 21 horas, Prestes recebia o comando das mãos dos dois oficiais, tendo o cuidado de fazer uma pequena encenação para que mnbos não fossem coinprometidos ... "zs:

O enriquecimento do fato torna-se muito mais perceptível se prestarmos atenção ao estilo, como que um romance con temporâ· nco. Com sutis detalhes psicológicos, re.:uperados. Me u a lvo sen­do outro, renuncio à seleç!io de trechos específicos, deixando-os ao praz,) r dos lei tores. Fico com o tenentismo/ 1924, procurando a per· cepção a tua I de Prestes sobre o problem~:

"Era apenas um homem re\'oll'ado com a maneira pela qual se governa v a o país."

Atrecentando, na seqUência: "J\rlas a experiência que acumulei em 22 me ensinou que um le·

vante só aconteceria se houvesse organi2aç3.o." Se, no processo de renlemrnar .. essa era a n1otivação a levá~Jo a

assum.ir papel ativo run1o à ntudança, e mostrar t<:unbérn o alvo e \l forma pela qual concebia sua participaçãó, na página se<>uinte vê-

. D se a rell\terpretação, perspectiva do momento que fala:

"Sem dúvida, em 1922 os tenen tes se constituíam na vanguarda, à f rente mesmo da classe operária, <'juc ainda construía o seu parti· do. Não foi à toa que os tenente~ assum i mm as bandeiras de mocrá­ticas ... nN

E o mesmo vaivé.m, dado pelo agora, pode ser observado, seja pelo entrevistado, seja pelos entrevistadores:

"Eu era um homem a inda pouco lido e com uma vontade enor·

1~ Jdem. lbidem, p. 32. Ocapítuto 1 abre com o fato, o "levante", pl'eenchi· do por ~ste pro<:esso, ao mesmo tempo capaz demontarocotidi~no e de hurnamzar? perso~'agem. Ressaltam o loc:1 ). o d im\1 psicol6gico, traços de _pen;onalldade façam bem marcados, nã() somente para Prestes.

" MORAES, Dênis de & VIANA, F•ancisco. Op. cit., p. 33·4.

48 f A obra da transubstJ.f'ldação e as nuanças do rememorar

me de cons tru ir um E>tado justo, pondo fim às 1·clhas oligarquias. () p roblé ma é que não sabia como conseguir isso. A Coluna fot algo 1mportanlíssitno p(IXi:l mim. Conheci n miséria por onde passei ... u~

E os Autores: "Duns conclusões, no entanto, são inquestionáveis: 1 - ernboat

ll~rrotada, a Coluna golpeou duramenteascarx:omidas oligarquias c fe riu, mortalmente, a l{epública Velha; 2 - Prestes se proJe tou mcionalmente como líder militar e herói popular."

O eu e o nós sit-uam e il'lfleten\ tenente~ inclusive, pari\ quem pêr­gtmta, grava c ç()teja. É uma refcrên<:ia comum, tal e,~ual República Velh~, ou oligarquias. Prestes pa rece soltar-se mms, era apet~as um homem.(', lá. Nn volta, repõe o nós, "os tenent~>S se conshhJJaJ\\ na. vnnguarda'', quand<> repensa. Do passado ai.nda tnostra a forma de ntuação, a necessidade de organização nesta" , e a descoberta d a •·n1iséri~l~~. O "ainda construía seu partido" obriga-nos a jmnms cs­quecet· a releih.tra. E se um 11Esta~o justo" er~ ~ina~~dndc, -~cus me!?s uniam nada meMs que "biUldetras democrattcas com levante e "(>rgani2ação", sob tenentes, observados pelo eu participante c assu· midos como coJetivo na interpretação. I.J<> conjunto começa a tomar corpo, a libertar-se daquele tempo, apenas a pennanente. vontade de mud ar, dentro de uma leitura do agente c da forma. Mm to claro em Prestes, nesses tr~hos. E os dois autores vão percebendo, apontan­d o, um sa ldo - a própria personagem, ele "se projetou". Estaria presente mna espécie de eu perdido, naquela época, mna vez que o (uüco vínculo maior é pessoal - descoberta da pobreza - e o con· junto transparece apenas sob ''vanguarda"? ?em dúvida, devo pre­sumir o peso fenomenal do momento poste no r. . . .

Esta pe<spectiva, capaz de levar à dissolução c~u de unpnnur est,1. revisita ao l'enentismo, aparenttt*.se com. a proxtmtdade do en­trevistad o com o PC. Seus primeiros contatos e questões parecem ter-se coloca<;lo aos dois lados do g ravador e os autores voltaram· se para este ângulo, fulcro de ioteress~ constante: de referências bibliográficas e um dos pontos d e cresctnlcnto da unagem do per· sor>agem, em si.

» Jden~ p. 37 pora ambos os trechos. '' 1\'o texto, orgat,ização toma o seotid() de análise de COJ~diçõcs milita­

réS, o que sugere proximidade com o Que fazer, de resto n~o-exctudente.

A o bra da tran~ubstandat~o e as nuanças do rememorar 49

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''Prestes guardou os livros, \'Oltou ao interior da Bolívia e come­çou a estudar o marxismo-lcninismo. Astrojildo r~torna ao rio e r>.'<iige longa e~tt'C~·ista com Prestes, que 'A Esquerda' publicou ... ,, part1r de 2 de J•nctro dr 1928, data do 30.• aniversário de Prestes. Ne~se mesmo dia, os jomais que faziam opo>iç,\o 11 Washington Luts comemornrcllll o aniversário de Prestes1 como o 'Dia do Cava­leiro da Esperança', designação criada por ' A Esq uerd a'. A in fluên­cia de f>rcstes crn tal ... uJ:

. Se para Pres tes a corrcção de suas perspectivas foi crucial, s túi­Ciente mesmo para o in ício de u ma recusa do conjunto do gm po e;n que se coloca v a, c para este esfumaçamcnto posterior do seu s1gn~ftcado _(tomou-se uma distante representaç3o), para os dois analistas foto contato, ponto de interesse-cha\'c, a janela a clarear. Com simpatia- "a influência ... era tal", se nAo nos contemos che­gamos a pensar no lwrói se projetando sobre c a t(\ constituind o "os jornais q ue faZiam oposição".

Outro ponto, de enorme interesse, ligado ~s conversas, foi o da anistia. Pleno no imp rensa daqueles anos e item muito bo m para se começa{ um d iá log() sobre "bandeiras d emocráticas", democracia e até a mudança de rumos, sugestão feita acima por Hermes Uma.

"Washington Luis se obstinou em não d ar anistia aos combaten­tes da Coluna por causa de um erro politico que cometemos ... _"Nossa proposta era que ele {General Isidoro) abrisse negocia­

çoes com o novo !lovcrno, a partir de três pontos: anistia para oíi­Cmls e soldados, •nstltuição d o voto secfeto e supressão da lei de imprensa reacioná ria ...

"Os dois emiss,\rios chegaram em Paso de Los Librcs na noite d e H para 15 de novembro, véspera d e Washingtcm Luis tomar posse. E JUStamente nessa noite o Is idoro tinha concord ado co m um le­vante no Rio Grande do Su l. Foi um erro polftico. Isto de te rminou que Washington Luís tomasse aqtúlo como um insulto c não ced es­se a anistia."ll

Anistia e tenentes, passand o por Washington Luís, já o vimos,

" MORAES, D. de & VIANA, F. Op. cit., p. 39--10.

~\l ldem .. lbidem, ~· 4~; cf cm ~u~ro contexto, "Eu lllé ncnulito que se o Washmgton l.U1S llvcssc amsloado os militares da Coluna, não teria havtdo 'revoluç11o', nem ele tcrir~ caído'~, p. 47.

.obre pequeno tr(-cho movediço, início de pântano, no campo org,l· 1111~1do por revoluç3o de 30. Inspirado, de um lado, continuidade , ,,m início democr,itico e, de outro, persistência do mo,•imento re­'olucionário. Mas n.\o chega a se configurar como brecha, nem .!profundar sua lig«çilo C(\111 d ireitos civis. A. vida de Prestes, se u tnito, con1m1.da o ~·~docínio~' e vai·se em (rente, ao 29 antecedente de 30, outro pont(> bem explorado, de onde fluem ir\terrogações -1'ls quais os aut(ll"êS se moslraram insensíveis. êntre elas a quest~o di! re,·oluçílo, a p roximidade com Maurício de Lacerda, certa tna­);Cffi no a rranjo constituidor d os oposicionistas- quem e ra o que, ,ti, na visão de Prestes - o 29 no qual se pt'Cpara o movimento ,trmado.

"Defendia a formação de uma frente única de oposição para mfrentar o poder das velhas oligarquias - posiç3o que o aproxi­mou d o vereador Maurício Lacerda.

"O Brasil-dizia !'restes em entrevis ta p ublicada em novembro de 1928- está incontestavelmente d ominado por chefes políticos q ue possuem enormes latifúnd ios, onde rnl lharcs de famílias vi­vem de parcos frutos de um pedaço ele terra mal p lantado. Se os militares revolucioná rios haviam aberto e apontad o o caminho das ~ublevações regeneradoras, compe te ao po' 'O concluir esta obra e livrar-se do organismo parasitário implantado no Brasil pela polí­tica das oligarquias.""

Frente ú1úca de oposição, movimento armado, oligarquias/la­tifúndios, temos um acrescentamento no interior das versões do universo já rcfe l'ido, com pinceladas novas, bem colocadas, cm pon­tos até então menos desenvolvidos. Mesmo 29 c café não ficam d e fora:

,. Prestes trabalh> e li!: "Organizei o t rabalho c fiz o pessoal render o dobro'' e "'foi~ inclusive, a época que mais livc tempo para estudar o marxismo", p. ~2-3.

» MORAES, O. de & VIANA, F. Op. cit., p. 43. Esta cnlrcvista ITh'lJltém a ambigüidade do t~mó\ Tenentes e amplia aindl'l mnis a leitura de repre-­sentação, em conjunto mais genérico~ se possível. Diz o texto: ç'não decidira se voltaria à Uollvia, onde ainda p(!rO'Ianl.'Ciom 50 de seus ex· comandadús na Colwtn. Metade deles havia se casado, fixando resi­dêncio no país" c '1 Achava que a rcbcli5<~ popula1· era questão de ~em· po, poisosc1·rosdn'máqlLina opressom' mstalada no governo estunu .. lavam o povo fi pôr fim ~queles dcscalabros".

A obra d~ tnnsubstartdlç-Jo t as nuançn do rememorar I SI

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"Eml929" - «'Corda-se Prestes - "com a crise econômic~. cal­rant a~sustadoram~tnte os preços do café no lllC'rcadc l.!Xlcrno. F~ .. zcn.deiros vão à falência e querem a n\orat(>ria de suas dh·idas. Os governos pós-30 th•eram que queimar mais de 80 mílhO<•s de sa­cas."~

Em sua relação, cotlcooütantcmente, com tenentes c PC - por meio d e Astrojildo Pereira, Paulo Lacerda, Leôncio Basbaum -,to­mado como homem-chave, por ambos os setores, Prestes aparece como p<>nto decmZMlento obrigatório nos nunos que se imprimem à polílic,l. Sucessão presidencial c rc,·oluçãosJo os temas centrais­sua unidade ou rad ical oposiçao coloca-se imediatamente. Um co­mitê mil!t.lr re,•olucionário, do PC, foi formado. Pretendia-se man­ter conta toe "traçar planos de conspiração" com elementos da Colu­na". O fracasso e a dissolução do comitê mostravam a dificuldade de uni r os dois temas, ao menos na perspectiva desses agc1lles.

Ao rememorru· esse ponto, Prestes o s.1bc, toca um ângulo que colocou dú,·idas inúmeras e críticas ''ariáveis, posteriormente. Reto­ma-o, esclarecendo c a\·ançando respostas, a interrogações e críticas. Moraes & Viana pe1·cebem sua rcle\'ância, no que transparece como resposta viva a sua interrogação crucial. Crucial ao abrir uma nuança, um "se" de possibilid,ldeoutra, a clivar o resultado 30. A junção de sucessão presidencial e revolução poderia completar-se sob Prestes, este com<> candidato ~quele cargo. E, sem pe1-guntas, sem 1-csposta~, mesmo oo nilo·colocado sob o gr~ vador, m(\S no ar, da época- revo­lução cnvol\'e força, c sucessão a ordem constítucionaJ. nsande.iras democrátic,lS" a sério? E a obra da rcvoluc;ào sem a destruição da­quela? Novamente chegamos à borda do pântano.

"A vis~ o do PCB"- esclarece I' restes- "ern a de que o luta de fundo da época se tratava entre os irnperialismos inglês c ame rica·

" MORAES, D. de & VIANA, P. Op. cit., p. 43. " Sobre os eotendim~ntos entre PC e !'restes consulte-se: DULLES, John

IV. Fostcr. Aunrquistaseronumislastl<l Bmsil, 1900-1935. Trad. C. Parrei­ras Horta. Rio de janeiro: Nova Fronteira, 1977, p. 282 ss e 317 e ss. CHILCOTB, R. H. Partido Comuu(sla Bmsiltitv. Trad. C. M. l'aciornik. Rio de Janeiro: Gmnl, 1982, p. 70 ss. Pode· se ainda ver PEREIRA, A. A formac;~odo PCB. ln: E11s.1ios hisl_6rlco_s t polltiros. S.,o Paulo: AJfa·O•nega, 1979, p. 127-30, ou DIAS, E. Hts/Jrm das lutos «>cio;; 110 8m$il. 2.• ed., São Paulo: Alfa·Omega, p. 167-73.

Sl I A obn dJ t.ra.nsobstancbçlo tas ruanç:u do ttmemorar

1w.At6 ~ntão, os ingleses tinham maior inlht~ncia no Urasi_l po_rque w.1shington Luis governava em t~ome dos i ntc~-e~es e pnvi~e~to~ .t.1 burgui'Sia paulista, bastante hg~da ao:; c.1p1talistas mglc_Cl;. 1:: I>S ,1mcricanos vi~lumbra\·am um espaço para penetrar com f~rça no nosso pa is e desalojar os ingleses. ü?mo reflexo d~bsa luta llll· pcri;.11ista, as oligarquias de Mi11as Gerais, ~Ja raíba e R10 Grru~de do Sul rebelaram-se contra a ohgarquta paulista. O PCB acha'a que nem Júlio Prestes ou Vargas poderianl cumprir um programa que se opusesse às pretensões imperialistas.""

Flui vagament.l deste trecho uma espécie de as razões do n~o. Indica, na lembrança, uma interpretação, ligada ao PC. E retira maion.>s dt'l\·idas quanto àquele personagem, lá, por esse mesmo peso- mesmo menor, dúvida enteia! ainda, a divisão já se inst~Ja­va, nele c cm seu g1·upo. E como medir-se como agente t'nvoh-1do, com decisão, ai\'O c firmeza, em conjunto a 16m do eu, quando o n~s já não é tão claro c agentes estão progressi,·amente sendo entendt· dos como represelltação de uma exterioridade e reflexo?

0 fazer 30, a sua obr,,, e os significados referidos ao fato tom~m o sentido de só terom sido possíveis como tais pelo seu cncal!linha· mento instituidor. E o se, então, sugestivo da possibilidade perdida, toma-se daroquruldo o p<1~l c ~o post05, cnvolvcndo o per· ~onagem". As dúvidas e interrogações parecem _esgo_tar-se nesse ponto, dcsconht>ccndo e elidindo outros possíveis stgruhcados. N~m rc,·oluçilo, nem forç,, e sucessno, ou tenent~s como vanguarda po· pular; nesse momento, a distância e extcm.1hdade d~ grMdes agen­tes (vistos por i>~tcs/l'C) levam a. recolocar questocs c a 1mpor ou· tra percepção ao conjunto do campo refercncmdo em 30. É es~e,, ao im•erso, quem recupera e situa essas mesmas questões. A duv1da \'oJt,,.se para 30 c colore com o fulgor de novas nuanças.

" MORAES, D. de & VIANA, F. Op. cit., P· 46. " • Apesar das criticas sobre. o sua _não ade..'o ao ~~·imento de 1930,

Prestes se mant~ve irreduhve1. Nau ouv1u os que d1z1am qui!, com s~~ participação, a Aliança Liberal ganharia um carátc1· popular, mob1h: %-OI\do as massas e trans(ormnndo~as em força ele prc~sn~ capaz d'-l' j 11((ulr nas decisões de VatgM. Preferiu fundar • Liga de Açao Revolu· cionária (LAR), à qual aderiram Silo Meireles, lln>idio lvhranda e Aristides Lobo, este o único civil." MORA ES, D. de & VIANA, F. Op. ci 1., I'· ;;2.

Page 24: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

Os autores sen tem a aura a cercar este ponto. É bem explorado. rvtaurk1o de Lacerda e PC chocam-se, ganhrun as páginas da im­pr<•nsa. A separação consunu\·se.

"Eles disseram que não havia como Maurício se declarar soldcl­do de Prestes, se eu era contra a candidatura de Getúlio e e le a f~vor. l:-'1ce rda ficou des;sperado, O episódio se repetiu algumas ' ezes, sempre que tvfauncto se proclamava meu soldad o ... "

= Prestes ~orna p osição. Troca cartas com companheiros. Eles ped iram gue eu agua rdasse tuna carta. E a carta e ra toda

pa ra rustificar a posição de Maurício. No dia 22 de novembro cu es_cr~vi ao ~ilo Meire les e ao Cordeiro d izendo gue a divisão entre nos Já existia: eles estavam com Getú lio e defend iam Mau rício. Mas eu ~ão t~mal'ia nenhut~)~ posição pública sem prllnei ro entregar~ p~s to de co111ando nuhtar d a revolução b rasileira em Buenos All'es ... "40

A correspondência não circula, não influi . Como se o rumo esti­vesse já de finido, acordos feitos, p osições tomadas. O <;aráte r posi· tl~o~ ~en1 grande brecha, do procesS01 se alfnna, ao lado de certa d uvida sobre a posição r(•al d e força do "comandante militar da re~.-olução brasileira" . .E cresce então, deslocando·se um pouco, outro nu to, ~uperpondo·se ao primeiro.

"A partir de julho de 1929, Vargas foi ganhando pouco a pouco os tenentes. Mm ta gente afirma que eu recusei o comando militar da revolução. Aconteceu jus tamente o contrário: e u fiquei sozinho um comandante sem exén:;ito."4 ' '

. E é curioso, se a di visão é ampla no terreno do que teria sido 0 nos para Prestes, e recusando-se os elementos liberais, também no novo grupo, pelo qual ele agora rememora, o entendimento fazia· se com laivos de intranqliilidade.

~ 1~em .. l~i~ern, P· 46. Preste.~ mostra desconfiança para com os "tais l!b!rais : ~eseJam tudo, menos a revolução". E coloca: "resta-nos um Ull!CO ca~lulho: o caminho pelo qual venho há muito rnc batendo e q~e ~onstste tom levantarmos com toda a corgarn. uma bandeira de rei­vmdtcações populares, de caráter prático e positivo, capaz~ de esti­mular a vontade das amplas massas ... ", p. 47.

4! 1d~m. lbid.:m, p. 4.7. Acrescenta, ainda: "Meu mí'lnifesto ... só foi divul­

gado em Sao Pauto. Getúlio, habilmente, conseguiu impedir que ele chegas~; ao Nordeste. Lá o p0\10 fez a 'revolução' de 30 em meu nome ... , p. 51 .

54 I A obra da ViiOSubst;mci.açto e as nvan~as do rememorar

" Em jlmho de 1930, O távio Brandão, em n ome do PCB, reagiu 110 manifesto, que tinha irritado os comunista~ ... Chamand o Pres· lt'S de ' pequeno burguês', Brandão conde11ou o documento, afir­' nando q ue pretendia algo impossh·el: subs tituir o proletariado pela ['<!quena burguesia no comando da revolução. 'O manifesto'-disse llrandão - ' não menciona o fundamental: o papel d irigente d o pl'Oletariado na revolução agrária e anti·impe rialistalis ta, a hegc· monia do proletariado nessa próxima ct~pa da revolução bmsilci­rn' . Com efeito, o manifesto de Prestes soou como uma bomba den· tm do PCB.""

Encaminhada esta dúvida para a realização de 30, grande vitorio­so do pensamento rememorador, a vida pessoal d o personagem re· toma seu lugar, mostrando-nos sua reação e situação perante aquele outubro. Estas encerram quai::iquer outras considerações, afastando o rememorante da vida polttica ativa e como que preparando-o para outras lutas. Assim, outubro en1 si transparece como inércia e trar~si· çao, por isso mesmo marco, e mbora e11focado pelo pessoal.

"Foi em Montevidéu que soube da deposição do p residente Wash ing ton Luís. N um quarto d e hotel, reuniu-se com Emíd io Mirand a, Silo Mei.rcl('S e Aristides Lobo para tomar uma decisão: "cabar com a La r.

"PreMes alimentava a esperança de continuar trabalhando na 1ttesn1n e1nprcsa construtora de Buenos Ail'es~ que tinha uma fi­li<\1. .. Vitorioso, Getúlio Vargas não tinha ma is g randes interesses ~J\1 continuar cultivando o a poio de Prestes e interveio p ara afastá· lo do emprego. r .restes foi ser capataz de obra ...

"Não abandonou a política. Ao contrario, resolveu tratar de seu ingresso no Partido Comunista ... ""

Esse hiato loca liza em 30 ulll ponto terminal, um resultado. En­cerra uma a tuação e deixa cm aberto condições para o utra . Apesar d isso iniciou-se uma d issolução relativa do tema tenentismo, mas logo recuperado. Começa com aquele vago eu, a sentir-se meio sol­to, mostrando-se estupefato com suas descobertas nas área~ por onde andou, com a Colun a - e, a inda assim, "chefe militar d a Re· volução Brasileira". Recuperado comó represe11tação, d e um mes·

'' Idem. lbidem, p. 51·2. 0 Jbidem, p. 53~4.

A obra da tf'af\Substa.•ldaçlo e u nvanç:u do rememorar 1 ss

Page 25: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

mo projeto, caracterizado aí incipkntemente, crescendo após e a se completar algum dia e que, Já, soava d~sta perspectiva como primórd io e substitu ição. Sua ligação com o PC, ainda cm seus pri· melros passos, cresce, toma \'ulto c reexplica. Exis tem, na essência, laivos ele anacronismo? Estará o autor levantando questões aind a nJo suscitadas a um momento imediatamente anterior, substituin­do outras, expressas também em seu papel e no mito criado em torno dele? Mas sua posição, apesar de tudo, niio é a do autor que ru1o lisa;eJe n'\escln·n com o remcmor,lr, c est-e é o centro. Nesse caso privllegia o eu, que sente o ponto-chove, de transição, nesse conta­to. Infla-o e retoma a partir deste. Mas é problema a refletir: esse conta to e e.<;s.1 transição - o que é pessoal nela- r~metem a 30, n:io a si mesmos.

1\'o diálogo com Prestes, os doi' autores, ao seguilX'm referencial comum e a trajelól'ia do entrevistado, mantêm-se no mesmo campo, oscilando enh·c seu lineamento geral c a lembrança do autor. E com outra nuança, não despida de interesse, a possibilidade de u m mito, assumid o em algum grau e deixado transparecer como tal, começar a ceder a outro. O segundo superpôe·SC ao primeiro. Deixando um vi(.,; romântico: a a<;ão das duas per.onngens baliza o IX'Sultado.

E a percepção do - se Prestes se tivesse tomado posição de ou­tr~ maneira, quem sobe ... obre uma vnriaçãoecoloca no pensrunen­to o âng ulo d as possibilidades a ltemntlvas e divergentes. Mas não se completa, jamais se apresenta plenamente. Tendo o herói se jus­tilicado, dando novas informaç~ c explicações, aceita-se o resul­tado, \'ence a "objetividade" c nada :.c revê. ~ão se desloca o cam­po, mas talvez se o diminua um pouco. Muda-se <l S<Ju significado colocand o-se neste a f"us tração. No herói entreviu-se a esperança. Nesse passado e por meio d aquele, ela frustrou-se. Sua condição privi legiada e sua cond\cta política lOrnam·se elementos das duas emoções. Por meio de Prestes, do mito, elas trazem para 30, ao nos• so olhar, um nústo de leve amargura c curiosidade.

Estas pitadas de amargura talvez possam preencher -se com nova espéSs\n·a, ao percebermos sua exis lilnçia no pens;11nento de parti­cipante, .cuja trajc tória <l ievou a tocar nestes tenenl<:s, neste PC, e por outro lado"'. Penso em Azevedo Lima. Representação tornou· --H LIMA, João BatiSI\1 de Azevedo. Remíuiscêucinsde um car~mído. Rio de

, n (<'ntro de sua atuação, le\'andO·O da oposição dO Bloco O~rá­< 111 ,. , pois, à situoç~o. Nele poderlamos csperar_mn~or scnslb lhda­,t,. diante do dilcmn: d emocracl<~. u1·dem conslthtCionul e revolu· ~.ln. E med iante este enfocar o u niverso referendado po1· 30. Veja· mns seu balanço histórico. , _ ,

• Pertenço a uma geração cansada, geração dos carconudos · t .. nho a morte à cabeceira, mas não me queixo de hM·cr vtvtdo. :-.;,10 direi, como Rcnan, que os verdadeiros homens de progresso "''" os que consol'\•am o mais prof ur~do respeito do p_ossado. Nem penso, como Montn igne, que a \'elluce estep sentcnc1ada a louvat ,,,t~maticamente o passado c a blasfemar do p resente, responsabt­t.1,1ndo 0 mundo e os costumes humanos pela miséria dos tempos .1tu.1is e por suas mágoas. .

"Militei com desusado ardor contra os homens do meu tem po. • 11 6 . "" t '.cbc-me hoje o di re ito de lhes reobl ta r a n1em r1a... _

Mágoas à p,utc, esta "miséria" do tempo que (~ lo nss_oc1a-se ao rl'Jbilitar "os homer\S do meu tempo". Reconhcccnd(>:'se, JUntamen­t<' com eles, no epHeto atira~o -_carc~n.'idos.,lô ~. e~~~,soa lalso, o \>,1lanço posterior, na identificaçao, crrhca o nulitCI . O balanço transpareceria também como crítica? ~s r:'stções assum~das na·

11ucle passad o deve riam ser revis tns em razao d as r~allzaçocs pos­

l.:rlores? Uma d as laces desse cnv<>lvimento, a l,·o de balanço, passa pela

su.> atuação parlamentar e pelas posições delendidns c expressa· <las no próprio fato de Azevedo Lima tê-la comprt'end>do como tal, integralmente. Aqui se abre outra folha, outro ret~ato, ne~tas ~ontínuas açõcs a situarem a po\Hict> em um lugar dclm•do. \ieja· mos o espaço aqui indicado. . . . .

"Mas o Bloco Operário e Camponês ma, pela p n melf_a vez, no Urasil, lazer prova de que a exasperação do operarmdo canoca, be~1 dirigida pela tenacidade de combatentes de vanguarda, pódêrta

Janeiro: Leo Editora, 1958. Inspirando-se em Carlytc, "o P:"n.ador ~ <l poeta. é 0 vidente; E'SCre\·e o que vé, segundo o ?orn .cs~ml de vLSao. Se é senhor de (,teu idade profunda, dotado de VIsãO .nspuada, ~eve como criador, como poeta; se for de faculdade vulgi\r, poss~do_r de visão não inspirada, cotidia.,a, dcvcrl\ ser peJo m~nos C'Of'ISCicnciOSC'I,

csc•·cvcrá memórins"- p. 272. '' Idem. Ibidcm, p. 270.

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converter-se cm fator de redenção política do proletariado, inft111•

dmd o-lhe c_onsciência de classe, picando·lhe a mnarra da Sl,ljeição ao predomm•o da exploração e leitoral, elevando-o à cateaoria de força decis iva, pelo menos p onderáve l, nos pleitos em g~~c se en­vo~v:sse. Para consecução desse objctivo ofereci-lhe m inha contri­b~t<,;ao pessoal. Q~ter n~ impret~sa, quer nos sindicatos, quer na C~'n1;:ua, ~n1preste1 a~1ude a n1u1ha palavra à causa do reerg-ui­m~.nto e mdep_cndêncw d os trabalhadores organizados, que as­pJravam a utdtzar-sé das institu ições d(!mocráticas para pôr em xeque a burguesia donünan tc.'"*

O exame d o p leito nos dá algumas indicações. O proletariado como forç_a o:g.u1izada, vencendo a exploração eleitoral, por meio de consclcncm de classe, cornpõe-no. Se vilnos tenentes como re­pre~ent;ção popular~ cm seus primórd ios, um tanto p ré c no papel de ' angu~rda, ant~nor ao pa.rhd <> de classe, observe-se agora. Re­presentaç,lo possut tanto o sentido legal, eleitora l, quanto imp lica uma <;'pressão precisa de "combatentes de vanguat·da" - 0 Bloco Ope: arto c Camponês. A vanguarda, localizada neste, estaria en· volvtda com o infundir consciência, arrebentar a "amarra da su-. • ã / f ~ CC

Jetç o , w m o tornar a classe "força decisiva, pelo menos ponde­rávef".

A esta "causa" o fe receu sua "contribuição pessoal".Agora, p lei­to". B)?co Operáno e Componês clivam-se entre esta perspectiva e vana-ço~s.'_'o,.~mtet1diment:~ ~o significado trulto de " instituições demO<;taltca~ qurult~:. do . po: e~~ xeque". Poderiam $ignificar 0 cnce1 r.unento dessas mshttnçoes ? Chegar-se-ia a um acordo com aquele outro conjtmto, visto por meio de Prestes, lemb rando 24 a Coluna? '

Esta separação, para Azevedo Lima, no balanço do rc toma1; le­va-o rt 30".

. "~•(ais de u~a vez, durante a campanha preparatória da i.nsur­retçao de 1930, veio à colação, p rincipalmente em d iscursos de Mauricio d e Lace rd<i, o nt)me d o 'Cavaleiro da Esperança'. Atri·

" Tbidem, p. 171.

" lbidcm. Capítulo intitulado "Luís Carlos r restes e a Revolução de 30"· o trecho citado a seguir encontra8s~ à p. 199. '

58 I A obn da transubstanci~çio ~as nu.-.nças do re-memor.1r

huM-lhe part icipação direta nos concha,·os dos três go\·ernos esta-• I w'is que tecirun « trama da (~onsp!ração, cujo laboratório de intri­~ ~· ' "' se instalar« na rc..ctidência presidenc.iaJ de Porto J\ lcgre. Já se , 1l>ia que ele por ai passara, c~>mO outn)S caudilhos de trop as rebe l­

tlt •s, internad os em repúblicas do frata ... mas tentava-se dissiOlu-l.tr q ue ... Prestes ... alterara de tal modo (> itinerário intelectual, que J•' não aceitaria .. .

"Os líderes do pari ido comunista argcnti.tw, com q uem convivia P1·estes, im prcgnaram-the o espírito de idéias marx istas, detno­~t·ndo·o dos p•·<Jp6sitos de golpes de Estado à Bla nqui, pois outra nmsa não era que (1$$alto à mão armada o que se planeja\'a nas \ on fabu.lações ... "

Trinta expressru1do maquinação, resultado d e C<)nfabulações, in· lrlgas, concha vos. Saído de conspiração, colorido por blanquismo. Vish•elmcnte o autor em 11acla se identifica com o fato. Apesa.r d is· fi.U não o elimina. E, observo novamente. nãQ é o fato sua questão: pleito c BOC, a nte a atitude de outros agcnt<•s a respeito d as mes· 11\\lS instituições, constituem o problema.

Por que p rocurá-lo em 30? É como se o fato se aprescn tasse nnno um ponto terminaL mostrando o caminho tomado por al­guns dos agentes. Se n·c de ind icação c rítica àqueles que abando­lltlrd m as "' instituições dcn1ocráticas", a quem jamais apostou ne­ldS e, simultaneamente, cl iva "carcomidos", campo amplo, si­tuando melhor posições. Existe um resu ltado, lido como conse­qüência, enl ge rme, a transparecer nessas ações que, integralmen .. t~. fizeram esse 30.

"Tachi\ndo-os de carcomidos, tomou-os à má parte o Sr. José Américo. Mas estou certo ele que, agora arrependido, e le que já não é novo, culpará as novas gerações por não haverem correspondido ~s esperanças que nelas depositou. N inguém compôs mais veemente libelo contra os construtores do Estado Novo do que o autor do manifesto que p ela terra dentro da ditadura, em 1945. Viu como a República de 1930enfermou gmvemente. Viu que os vícios antigos l<1ram todos med rando e, no modo como os pra ticaram os assal­tJntes do poder, nem comedimento revelaram. Deve sab<:r gue se c·xtinguem aos poucos, pobres, muito pobres as gerações antigas. E ;;c ntentar nas novas, talvez infira da opulência arrogante delas que lomaranl por modelo aquele governador romano de quem disse Cicero que entrou pobre na Sicília rica e saiu rico da Sicília pobre.

A obra da transubstanda~~o e 3$ nvilnças do rememorar I 59

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S<;é verdade que herdaram um passado de pecadilhos, é certo tam­bcm que neles requint<1 rmn."" . O alvo da crítka, da lutq, lá, naquele passado parlamentar é ' ecncon trado, bast~nte ampliado. E: 30 confunde-se com Esta~io N~vo e .dtta~ura._ Ora, se cob~e desde o BOCa 45, temos período cxcess~\ o para o tesultado de mtngas. E a obsessão moralis ta tam­bém na o deve s?r a melhor forma de localizar o fato, e d e situar um ponto termmal a questão. Embora dê um color1·cto outro n · dá f - , 1ms um, este '. rustraç_ao: niio da esperança, mas a da moralidade. E se esta fot uma cxtg("1Cla sempre feita ao homem "t'lbl' A· 1 L • f .,.. te o, zevec o

nna ve no ato não a procura do aperfeiçoamento almeJ·ado 0 ap f d d · · 0 ' , mas

c ro u~' ar o VICIO. s adversários do passado, vistos em nova ~;rs~)ech~~~ t~kez o fossem menos. Há mais cnl conuun que então .ao se peJcebJa d ar,1m ente e parte das reprovações talvez tenham

SJ.do_apressad:uncnte ~i tundas somente neles, pois sua queda niio as clunmou. lr.,.z·~os a Jembrança, próxitnos do seu balanço,0utra face da ad vcrtêncta, quando esta utiliza fatos disponíveis do pas­sado. Tentemos, com ele, retomar este ~pcctro da moralidade Ne~ê uso _co~tínuo ~a. memóri~ coloc<Uli\)S no passado, em certo ;empo, ouha cpo_ca, VJCIOS espccJficos- por exemplo, as e leições fmuda­das, o legtslar em causa própria, a ausência de probidade dos intc· g t:'nte.s de cargos ~úblicos, a imprensa venal, a arbitrariedade po­~cml, etc. - e côlorunos o PRP, e osotttros PR,, centrados no paulis· t.'t, co~. ess~: ttcns, con1o sua base e por sua ação. Azevedo Lüna ~o~- t~az, entao, desse p~nto de vista estrito - como lembrança e tel :s~~ ~a reloca!Jzaçao do horror. Se, em virtude d e lutas, de a<.h eHenc1a~, no aqut e no agora, o tok)Camos no outrora - i ma· reu\ a repettr-S(', a ameaçar-nos com a catástrofe, com o sen'lell'tan­e~ tal e qual - o deslocamento lembra e afirma que a catástrofe n~o é aquele passado, aquela imagem nele situada. O honor coe­XJS~t! cono.sco, vis(veJ à nossa volta. Ele nos cerca nos envolve N~" esta no fot e si111 no é, agor.a. ' · ao

"' l~em. lbidem, p. 270-J. Em capflul? de!\Ominado Morte d a Repúblita l\ova. Acrescentando, hnhas depo1s: "E evidente que nunca anct~· e boas a~·enças com os políticos do meu tempo. Colige-se das pá~: m dt>s~~ h\To que não lhes dei trégua n<:m folgfl. Toda\·ia acin;a d~':'e~: sent11'nen•os pes«,a'ts • d ' I ' · f ' . ' · · - '~ 1scor< tu'!c•as pro undas, venca·o altamente ~senso da verdade, de modo que não temo proclamar alto c de bom som, em face dos meus contemporâneos: eles fomm. honrados".

60 I A obra da tl'!ns.ubst.lntiaç.ão ~ as nuanças do reme-mo.rar

\ l. lllicu baseada na n1ora l, com os argmncntos de outrora, pr~-1 1 .ulll·nte utilizados pelos adversáriO$ libernis do PRP e da siltta· , .\p, J'Mt~-ce servir ao rt..~ver "ccucomidos", ao indicar sua di\·isão, ao nm'\lrdl' os que desacreditaram da representação legal aonde (o-• n•\ \l.1.r ~uns csperançns. E o horror udquire outros realces, nova lttHlu,a. JMrd indica i~ alé1n dn n1oral, seu significado co.O\Q fim da

"' d1•111, do ,;Mema político, que se pretendia defender, cujo apcdei· ~.,u,mwnhJ era meta.

·\Ju ... t~lr-St:-ia, a ti, ó 13rasil, con1 pottc(l diferença, a abjurgatória III~\"·"'''· Mulato 110miue, de te fabu/1! 11nrrntur.

· f\ f~s n nacão não estn~mecéu. Tanto con1o lhe derrubaranl ~,s 111 lllllições lega is, recobrou toda a s ua resignação diante da cala­iiUd.u:.lt, no\'a, seJn pôr a met:\or d\wida de que a conden;;wam a 1 11~1" su1niço da libet'<.üde, a pretexto de remediar ma les a <ltte a

11 luzia a iJnatu ridade política.~'·t9

I ll)llnbando d esde o llOC como representação proletál'ia (dcn-1 11.1 . mstituiçôes) à imaturidade (até mesmo de se tores d aquela "' ma rep resentação), à p rocura de outras vias- blaJ1quismo à 11lt.1 - como também 35 c 37, mais Estado Novo, e ainda consti­

lillllil' de 3~- Em que medida 30 pode expressar ess~: wnjunto? lü.1lmente centra-se em 30? E onde reabilitar os inimigos do pas-

" lu, visto o resultado? Q ue se encontra em 30, como em 37. O .~dversário, do autor, referido pela ditadttra, por golpe, por

• .. ,~ exigêncins observadas - e não encontradas- no trato da 1 1 "'·' pública, poderia estar lá, à época do BOC. Em início. Entre­t.lnlo, (oi a locado apenas num lugar e talvez não o mais adequado. /vcvcdo LiJna vê a necessidade de recuperar o abandono e de, ll<tvnmente, rnostrnr o inimigo. Não se esgotou e cedeu con1 «que· d ,, do poder daqueles homens combatidos, mas dos quais também ''" aproximou, já em 30. Suponho que a última grande homenagem " eles oferecida, tendendo a reabilitá-los, esteja não só na crrtica moral aos então aliados liberais e adversários em 30, mas também

1' l~idom p. 269. O trecho 1'cfcre-se a 37. O texto citado é Napoléon-le· Pelit, e "im?tturidadt!'' d. 35-"Ser\'iram-lhede pretexto as quarteladas comunistas de 35, esmagadas a tiros de canhão, em meia hora de bombardeamento", p. 267. O conjunto da época, como desenrolar e processo é referendado explicitamente em O 18 Brumtiria de Luís IJcnaJl<ll'le.

A obra da transubst:.nci;..ç.\o e as nuar~S: do rememorar I 61

Page 28: Livro_VESENTINI, Carlos Alberto - A Teia Do Fato

~1n recupcr(lçiio da suJ análise do evento como basé m('l iOr pm·,, i1

rnh~J·prctnç;lo d<l pro~~sso, ncslé balanço posteriot·". R<•ssalt~ 29, pdo ângulo do café- sua derrocada apaCC(e como fundamental, e o mais S«undário. Cita I Vashington Luis'', remete-llw 11 origem da nn~hse. Em proftmdtdnde lavrJ a crise econômica, orientadora do rum o dos eventos. Vinte e nove explicita-a, mostrando seus eleitos na produção e pn.'ÇOS do café- retirando Azevedo Uma condu· sões surpr<-cndentes:

"A revolução foi obra - d iga-se Jogo, sem reservas-da gran­de burguesia agrícola de S. Paulo.

"Cousa curiosa, o presidente do grande Estado ia ser imolado pelo capitalismo contemporâneo.""

Além. do espanto, q uem sabe d<l riso, existe nes ta in tcrpretaç~u um~ s~ttlcza. E es tamos acostumndíssimos, nos dias que correm, a OU\'tr Jogar M cnse econômic,l, tomada como externa c repass.lda, a r.lzão última das condições políticas. A fala do <1ltO parec<' ser r~corxent<). O dctallt<· da home11ngem vai por outro Jacto. Aze,•edo I ima mostra em 29 o impasse e.:onômico, mas toma o produto de condições internas c específicas. A política financeirO\ do presidcn· te d~posto c! defe-ndida e o erro é consider.,do resultado dá polltica de v a lorízaç.1o do café implantada por presid~ntes anlel'iores c peln aht<lção dos próprios cafcicultore;.

"\'Qrifica-~. portanto, que acostumada à tutela do Estado pater· nal e pcrdu l5t·io, a ment.llidade dos lavradores perder,\ a faculda·

!lf "A mais perfunctórin análise dM cx:orrênciClS n?tcjonab, rmtcrior~?S c posteriores .1o movimento de 24 de outubn.), ensinar-nos-ia a compre~ ender ~1~1c rnzões de ordem económica, como a desvalori;.:a~ao do café ... consequentemente, o encaredm(l'nlo intoler.h·cl de- mantimentos .»· sumiam debaixo de ~i o papel subalterno de personalidades ast,;tos, na gênesuda última COillOÇ.ào intc.o:.lina". LIMA1 j Oão Batista deAzevc· do. Op. cit., p. 213.

41 •· Um ano após o tnunro re\•olucitmârio de 1930

1 concedl.'u em Paris o

Sr. \ \"ashi.ngton luis, a represent.lntt? do Corrdo d.1 Art.wh.l a única cn· lrevi:ta, !''!elizrncmtc única~ cm que deu n:sposta magi; ttt'\l às insi· rH_'açoc~ ln1U5tas ... r~conheceu que Já ~m outubro de 1929, rebentnca cnse na bolsa de :\o\'n York ... ". ldcrn. Jbidem, p. IS.:.

'' lbidem, p. t&;; à página seguinte surpre.-ndcr·nos·á mais, acr~n­t~ndo~ n<> "'esmo senti~o: ''Eis como se cont:t, em pouc.lS palavras, n h1stóna secreta c \·erfd1ca díl rew1luçãode 1930".

,(,• ct1• rwieult~t'·~~: por si m(•sn1a no dédalo da p1'odt~~ão (: d i~tribui~ , ~~~ \·'l"ll,\ll .. t,, E-;t.n·a t.•m ruinas o instituto do C~ te. ~

\pn'"'"'tndo-se do rartido Dcmocrá~iço, ~uena c efemc~a w.l"""''•'~·"' d~ políticos estrel1,1mcnte hgadoo a alt~ burgu_csta

1 •. ndi•.t.<, "'potentados da lavoum sub,·erterant a ~ptm~o do Esto· dn. 1,1, .ti,_;i~udm o tnovimcnto sub\'crst\'0 e hnanc~aram parte, se·

1 .•. #Sl ' n ,t 11\cllOr rarte das despesas te\'0 UClOI\c.~rH\S... ,

'•·IH susten lação, a. 1naquinação conspiradora Yencc. Vmte~ 1,0 ..

1, 111.,t.tura n dissolução c(\ mudança de oricnt,'\ção daqueles h dos

I h' \.•len\cntos maiores da base perrepista. Trinta, então, toma con ..

1 '"'" Jc c'pn.-s.~o desse terreno movediço, misto de~oofabulaçã?, 1111,.1.mço de sentido de gntpossodnis·chave c de ausenc1a de apo10

1 ·ll'ma lnstitucionnl, no meno> nesse momento. Portanto os de· ~ •1\.J.S deste~ tomad<b como a ordem, estão sozinho.-;. \ ,1m<1rgura exala fortemente desta anális~, impregnando o

1 , lu. Ao m.Qnos ao meu ver. Dil'ig~~sc apenas c1queJe r~to~ ou ao .. n 11111to desse processo? E qual o âmbito destes t~· rr~ vcts con· , , ,1dorcs? Vejamos: a presença do BOC ~ a conshtwnte de :J:I 11 ,1, lcrizam expressões com alguma semelhança,_ sendo a pnmct·

1, 1 mt1ito mois próxima dn ,~xperi&nda e do cnvolvuncntodo autor. l 1 momento chocante e 37 mostram a negação dessa on1em, ou

11u•lhor, de'-.e campo da política. O princípio da catástrofe é garan· tui 11 por 29. Portanto 29, 30, 34, 35, 37, ·l5 vãocon~pond~ LI';' elen~o d•• fa los, po r (mde essa discussão se descllt'Oiit . Sena ~tffctl c~ns<'· ~ui r referenciar tudo a 30, é incgd\'cl que o autor a~ettn a 1dcaa de

1101 senso da política, progreo:;ivamente d~m·olndo, t~ndo mo­uwntos diversos. A presença de 29, sob a cnsc do café, é o reforço <lll<' !;"r ante a possibilidade de 30 torna r·S~ a pnmetra gYande ex· prt.'!'-são docor'\junto, mas não total- o 1'\'fcio" medra-c 37 apa· n-cc como momento de coroação. Ao pensar esse processo, Aze\•e­clo Uma dilninui e reforça o fato. Dá-lhe um novo prisma e d~ixa-o , 0010 trad uç5o do o ut ro, do inimigo, do horror - o qual mdul, alimentando-o, todos os entregues ao "blanquismo", e os que, n111· da se entendendo liberais, recorrem ao golpe. Por isso mcs~~.o a solidão permeia o fato, no abandono do entAo entend1do por ms· t ituições democr(itic\\s".

" lb idcm, p. 185.

A obn da crtnsubsun~laçlo e as nvan;a.s do tememon.r I 63

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,..

Prestes. trouxe ·' ~ste universo composto por 30, 29, Tenentes, Aloança ~Jberdl, 32, o tema do partido e seu projeto, ,·ia PC: dessa pers~ecbva 30 soa como parte, algo apenas, do amd.1 a alcançar, do almeJad~. Aze,·edo ~i ma traz-nos o tema da representação legal do proletanado, embutido na questão da democracia e das institui· ções democráticas. O.i, além do mais, novo colorido e destaque a 29. Entretanto estas questões, como elemen tos novos, foram absor· vodas, às vezes subsumidas, naq uela constdaçl\o. Temas~ enrique· cer os mesmos fatos e a apresentar nowossombras ao múltip lo luzir d~ 30. Em nenhum dos dois o balanço posterior levou a pensar no ''onc~lo entre o s i e os demais, à procura do geral, na localização de sogruftcados em outras pr.iticas, em outros locais, que não esses fa· tos. No entanto, em ambos, representação e, por esta, a maneira de ver a politica, foi ângulo decisi\·o deste rememorar. E a divergência a~plia o peso c a necessidade do repensar. Desse modo, alocar sig· nohcados em o~tras pr:ltkas, não as mesmas daquele 24 de ou tu· bro--: con1 mato r OLI menor extensã:o -~ inlplicnria constituir ou­tros latos, caracterizados por s ignificações d ivergen tes, levando 0 pensamento por JlOvos rumos. Entretanto, ficou claro, a recolocação de questões e problemas supõe, no posterior, algo mais. É a neces· sodad~ de enfrentar este geral já dado, tomado prc\•iamcnte, estes fatos ta acellos, c. que tran.~parecem como tendo sido o passado co­mum, de todos. Enfrentar e negar, re,·endo, tal comum, é o seu gran· de problema.

~2 -MOMENTO E DRAMA DA INTERPRETAÇAO

o .. cjo, agora, tomar a posição, na continuidade desta análise, I "lude que gr.wa, pergunta, seleciona a personalidade c lê. Isto

1• ",1 tornar posslvel o exame de ouft'O viés dR existência do fato, o d ,,, d im«nSões aSSLtmictas pelas alocações 11elc situadas n postawn. l'<,.turn uúcial apcnns, pa ra não perde r de vista o angulo pelo ~I ··ln'iono Llm d ado nutor cdesconh o outros, ou en tão sou levado , <l'lt•var algum, tah•ez secun ário no proce.so hi>t6rico, pelas chn· m.,,J,l5 recebidas na imprensa, hoje. Por esse mesmo ângulo com· I' ~rtilho, aparentemente com todos, dn idéia desse passado comum, h ·nlddo pelo nós, objeli\'o e conhecido nos seus grandes momen· t•"'· entrc,·isto em seus lineamentos mais gerais.

Para a mem6ri~ do fato apresentar-se dessa forma e para todas ,,., <'perações entrevistas funcionarem perfei~ame~lte,.em m~.~~no , 111 qualquer um - abstraindo o curso LmJVersJtárJO de hostona e ,.., conhecime11tos especializados- seria ncccssJirio pensar uma ollllpla difusão dele, c:np.lz de alcançar a todos, <10 se d ebruçarem nbre o passado. Eu deveria também, como todos, ter stdo domu:o•·

<l<l pre,·iamcntc por essa percepção de fato .1dvtnda de uma lógoca .J,,qucla difusão'. Ficou óbvia a presença de revolução de 30 mes·

Esta questão já foi objcto de reflexã.o de Cramsd, e~nb<>ra po~ outro \'i és. Penso na ~taboraç3o dos concettos de hegc1n0n1n e de $0C.1cdade cil'il. O autor escreveu sobre o "QLLestão ~1cridionat" (Risorgimento) partindo d\1 cri l6rin fu•'d:1mcntado no nível culhu.,l e JX11ític~, ~bje­th·ando demolir algumas ;mri lisos marcadnmcnlc econOll\ICJStas dos pensador!;;!~ dn década. de 20 ~u intc~pret;~çõcs l!bera!s e fascistas intimamente "inculadas à •doologla dommantt!. O Rlsorgtmento colo·

~o e dnml dt interpreuçlo I 6S

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mo sob ' rc quem rentcmor.l t<>rn;mdo "'~h·el a exist~nci~ ant . d

mesma pressão sob!"(' UC'm lê ou -. ~ . ' ' cnor ,, ccntes. a lém mesm q ,· p<rgunta, em lllVCIS tq;raw• cres­•·n i E• I> ' • , ,', o da >~ntples dliu<ilo mformativa, bostante ge-<. ncneçessc•rmpa ra queeulcia . I'

por biblio rafia . . · ' mcmona •stas, passando antes g cspedflca como capa~ de alcançar jomalistas, ai-

Cilvn-secomoum ''fl!tohjstóricoH e S<> '"onõmico do lt~li<t poss"bTt '~"' toma nmplo, explicadordoatra­tas. P.ulindodo prt.~l/ osto~~ 1

an._ 0 ~ tO~"\adc) do poctcr p(;>fos fascis· no âmbito da ~--· ~ dp . ·'I q ull a dtfUSiiodosconht'Cil'ncnta.s ocorre

,......_,t.'-c:t e cn 1 tendo ro·no · · · . chamados intefecluais orgânicos . ' pru~op .. a1s artu:uladores os ··mernóti.aNa!imdedemonstra , era •(rnp~escmdJ\'el destruir Ioda a d . . r que o as.:t>mo por ev•mpl -NH\ ser JUStificado como um momento n . , . . .. . o, O...lO po· gu~~l em direçJo no ~;oci.Jfismo ou c . ece.~no ~a S<'l<lt!d,ldê bar­" revolução pas~ivn'' um;,\.. . . xp(~.lr o R•sorgtme ntocomo •una Ç~O<Io Estado~Nnç.1~ itali:m;)z ~~~e mM.gn~ lizou O upnv<t" ll(l constru~ dvil st .. ~?Strutur()u cm to~no .da' 'dft~~<'~sod Cmonstrnr fJl_tc o sociedade

ds.~~1rque, transmitido por meio da in~p~n..~ ud~s~~:~:'~~~~Cl1 . tipo ~e •ca 0!0, entre outra~ lno,.tituições acaOO ,. '. 1 te(b, sm­

no de alguns ·rde ... ·"' · ~ u un•ndooshomens .. l'mtor-"'' •mlX">tos pelo <>rt • I 1 I outro lado es~ int••l•-t . . o •po 10 c ectua domindntc. Por • · ..- ..... uctas contmuar:un t.>xe .. ce d t

~lo p~nnanente em tüd<~~ f:.>SSJ.s . r . • • n o um.l •ortc preso ('Unccit<.) d"<! hegc~rnQníd ·em ~~l~~~i~:~~.~~~~ · ~ramfj t~ntn rt~uperar o \'Unt,ldenacion:ll pop~da~ runda

111i íl e,, a lnl dtl f0 t'll1ar uma

cepç.lo de mundo m~··..'an t m~~ .·u A nr. cnação de uma no,·a con-........... ·• - ' .. --uJ e o vtes tt-úrko-prár · muudrzaçao das ma~s.as rurais e as n.>stolnt - t Jcrbo, ou SCJa, peta d~ '1-e mtegrar sob a he <"monia do • ~~ orças u a.n•'t>, paco.si\·eis concreta ao bloco dom~oanlc E _prolcld~Jad_o como umJ alternativa

· ra tmprcscmdl\'el po 1 1 o me!-mo <ami t1ho dos políticos Liber • . r .. ' r .ln?· pcrcorn;r do prt!ssuposto de uc nn soe· ,\~S c tl~tstas, ou SCJit, pat·tindo ''"'' IJI"'o sodaf sob~ oq t · ·~- .tedad(' Ctvrl ex•sle a hegún'('nia de u m o ... c •c u l O. vt' esta hcge-rno 'I' • b "d . grilÇas às instituições que se d'ze .. ~ta e.o h. a por Jntelcctuais dis.«iá,·ei doparlidoe do Est~do"~P"'." as, lslO e de outro lado in­lo de Gr am.sci er• pr-·so L.~ • m !i> ln lêse, conforme o pensarnen-

~ .. ~• comVo~~terasoc:·("<f d d · mo r,'<fefinindo-se a thnmada "Históril d' r: e • Omtn.ld.l pelo fasds· do ~nguto político c peda 6 . • • áh,, ·procurando formar nicos cap;tzes de di(undfrgn~~~~~~~~1. ~~\'CI ~r.up~ d~ i~HclcctLw is orgâ: civil um 1\0\'0 sabN :~ 1

. ~~s~s mshtlllçoes dn sociedade Cr!spi M I" - ' c. paz de desmJIIf,cn,. as figuras de Garibaldi

' ~ usso mt, <.'nh·c outros, a firn de demonstrar . , de uma cultura nacional-popular na 11 T - a ou~ncra total tuMJ entre camadas ~ubalcemas. 3 1ft, a n.lo-<:oesâo politic., e cul-

Conf~rir em GRA.\ISCI Antonio f/"R' · • Gr•nic•, 1974;também8UZZI '\R~

1 ISO'l/~lllmlo Bucno:oAircs:

B~rccfona: Fontanella, t969. 'r . • I tt>r(l P<lltllúl de AJJIOIIÍO Cramsci.

66 J Mom~rto e dn.m~ da irttrprtuç~

u•, , , •nt ('\'!dente espedaliz-ação, comandando as entrc,·istas, ten­dt • '"'''. hlmente atnbufdo caráter histdrico à personilgcm; e neces·

u"' 1\11\dJ, é born niio esquecer, a n1in., e a mu i to~, pat'a torn~·H l' '"'l'tJ\'eis as r·efcrC:ncias e as imagens ulilizad~s. manipuladas, n "l1loriais c páginas da grande imprensa.

c untudo, não pretendo organiz.u um amplo le,·antamento de t. t.•, '"canais, por meio dos quais ess.1 imposição se d.t Somente oll\1111~, rapidamente. A bibliografia nõo pode ser o c.1nal mais ge· , ~~ ~ t+mbora tenda n rcfere.nciá-los. Elíl i,~O está ao nlcílnce de todos, u11 .mo dos avançados nos estudos, anos a Cio, pob nossn época é I m.o,iado cspeciali.<ada, e a d i vis/lo do trabalho, até nwsmo a do

1 th.olho intelectual, gr.mde demais. Quero frisar o que nos atinge • r., ""·certo público leitor, pro\'il\'clmente pro\' indo de certos sc­•~~h ..,oc.lais. Nil.o tentarei discutir o~ Cilf\ais d.ir igid~ pare\ um pú-1 • Iro~ r ,\o qual a linguagem d~ história e esse fato nada dizem. Essas

~I\ l'tll'ncias, esses rdituriais, são completamente opacos a tal p ú· I·IJ, ,t. ~enl tcntan~i descobrir como chega, mas é imposta a ima-1'• m ,1,, história. Fic.1rei no ,·iés pelo qual o todos se vê por meio do 1 .~11, canais por onde .,;sa lmguagcm e esse fato ch~garam a núm , pPr undc alcançcl a n1uitos, dc!-tdC a formação inicinl, com ante­''"' id .1nca q ualquer· estudo mais elaborado e exigente. O lh•rodidn­lio " pMece-me um ólimo lugar para 1•sta discuss.~o. Isto porque e le .otu11;e público ' ·asllssimo, constituindo uma da~ primeiras \"ias pe-1 "•tua is a lmguag<:>m da história é ab!«.lrvida por qualquer um0

,

·\ ft>tmação escolar pode ser cnfocada de forma múltipla e seria '''•'t,Qro pretender aproximá-la estreitmncnte,nas históri,ls de \"ida ,I.• t\1da um. Entretanto o período escolar e certo contct:1do são co· """ "'• obm espccííi~a das ordenações do Estado. Mas as escolas ·"' ~oncretas, igua lmente seus freqücntadores.l\:elassc expressam '' diferenças de clas.<()S e crescem personalidades dh·ergentes. Ape­.tr de tudo, acho p<Xisl\·el, intrigante mesmo, o encontrar alguns

pontos em comum sobre essas diferenças. A percepção de saber c c• 'cu conteúdo interior merecem um rápido o!J,a r. Tendem a wli-

C(ln(orme texto apn-sentado originalmente na 32: Reuni~o .o-\nual da Sociedade Bra.ileira para o Progre<.o da Ciencia no >impó!.io NHC.tó­ri<t, Escola, Demoe:rada". cm 1980, J~it' de Janeiro. Este Mtigo cncon­tra*se no prelo com o título de r' Escoln ~ Uwo Didático ele llistól'ia", n >CI" publicado pela Anpuh.

MomoNo • tnma cb ln\•rp..,..ç;o I 6 7

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