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Livro Didático de Geografia e o Estudo dos Solos: Análise das Abordagens do Conteúdo para o Ensino Médio. Alda Vângela Silva Santos UEFS [email protected] Ana Carolina de Almeida Ribeiro UEFS [email protected] Ana Maria de Jesus Freitas UEFS [email protected] Resumo O livro didático é considerado um importante recurso para o ensino. Há, porém, a necessidade de discuti-lo constantemente, pois o “mal” uso do mesmo pode ocasionar sérios problemas no processo do ensino-aprendiagem. Não se pode lançar mão desse recurso sem antes se fazer uma reflexão, pois ele não é e não pode ser tratado como um manual de regras para o ensino. Por outro lado, a temática do estudo de solo se apresenta como um aspecto fundamental a ser abordado, por influenciar no uso, ocupação, alteração e produção de espaço, tendo em vista os diversos conflitos que são gerados por conta desse processo. Deste modo consideramos importante que o estudo do solo no livro didático seja feito de maneira crítica, levando em conta a função social do ensino. A proposta desse artigo tem como objetivo analisar criticamente os livros didáticos aplicados no Ensino Médio. Esse estudo foi realizado a partir da análise histórica de três livros didáticos, que tem como parâmetros de análise os seguintes tópicos: adequação da linguagem, nomenclatura, linhas de abordagem, figuras, gráficos e tabelas, o nível das atividades propostas, e a função social do ensino do solo. Estes foram escolhidos, por que entendemos que devem ser observados com cuidado antes da prática docente, para que não haja prejuízos no processo de ensino aprendizagem. Após a análise, a principal conclusão do estudo foi que apesar das diferenças entre os anos de publicação, pouco se observou mudanças em relação aos aspectos analisados, demonstrando que houve uma redução da qualidade do conteúdo proposto. Palavras-chaves: Livro Didático; Solos; Ensino-aprendizagem.

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Livro Didático de Geografia e o Estudo dos Solos: A nálise das Abordagens do Conteúdo para o Ensino Médio.

Alda Vângela Silva Santos

UEFS [email protected]

Ana Carolina de Almeida Ribeiro UEFS

[email protected] Ana Maria de Jesus Freitas

UEFS [email protected]

Resumo

O livro didático é considerado um importante recurso para o ensino. Há, porém, a necessidade de discuti-lo constantemente, pois o “mal” uso do mesmo pode ocasionar sérios problemas no processo do ensino-aprendiagem. Não se pode lançar mão desse recurso sem antes se fazer uma reflexão, pois ele não é e não pode ser tratado como um manual de regras para o ensino. Por outro lado, a temática do estudo de solo se apresenta como um aspecto fundamental a ser abordado, por influenciar no uso, ocupação, alteração e produção de espaço, tendo em vista os diversos conflitos que são gerados por conta desse processo. Deste modo consideramos importante que o estudo do solo no livro didático seja feito de maneira crítica, levando em conta a função social do ensino. A proposta desse artigo tem como objetivo analisar criticamente os livros didáticos aplicados no Ensino Médio. Esse estudo foi realizado a partir da análise histórica de três livros didáticos, que tem como parâmetros de análise os seguintes tópicos: adequação da linguagem, nomenclatura, linhas de abordagem, figuras, gráficos e tabelas, o nível das atividades propostas, e a função social do ensino do solo. Estes foram escolhidos, por que entendemos que devem ser observados com cuidado antes da prática docente, para que não haja prejuízos no processo de ensino aprendizagem. Após a análise, a principal conclusão do estudo foi que apesar das diferenças entre os anos de publicação, pouco se observou mudanças em relação aos aspectos analisados, demonstrando que houve uma redução da qualidade do conteúdo proposto.

Palavras-chaves: Livro Didático; Solos; Ensino-aprendizagem.

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1- Introdução

Estudar o solo tem se apresentado como uma necessidade real, dado a

sua importância no desempenho das atividades humanas, pois desde a

antiguidade é dele que a humanidade extrai recursos e dele se apropria para

produzir alimentos, fixar moradias e realizar suas atividades em sociedade.

(LEPSCH, 2002). Dado essa importância para as relações humanas, o estudo

dos solos está inserido nos currículos de cursos da Geografia ciência, assim

como nos conteúdos das aulas da Geografia matéria de ensino.

Sabe-se que nas aulas de Geografia o livro didático é um dos recursos

mais utilizados, seja como fonte de informação, como sequência para os

conteúdos trabalhados, ou ainda, de maneira imprópria como norteador da

intervenção do professor. Daí a necessidade de se estar sempre atentando

para os materiais que são produzidos, para que a sua escolha e utilização se

dêem de maneira mais eficaz no intuito de gerar uma real aprendizagem por

parte dos alunos.

Temos, portanto, como objetivo para este artigo analisar de maneira

crítica livros de Geografia do Ensino Médio, em três obras diferentes (COELHO

e TERRA, 2001 e 2005; MOREIRA e SENE, 2009), com a intenção de verificar

se estes acompanharam a evolução das necessidades do estudo do solo,

entendendo, assim como definem as Orientações Curriculares para o Ensino

Médio (BRASIL, 2008), que a importância da Geografia no Ensino Médio está

relacionada com as múltiplas possibilidades de ampliação dos conceitos da

ciência geográfica, além de orientar a formação do cidadão no sentido de

aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser,

reconhecendo as condições e os conflitos existentes no mundo.

2 – Materiais e métodos

2.1 – Livros didáticos analisados

Os livros didáticos escolhidos para análise são: Geografia Gera: O

Espaço natural e Socioeconômico de Coelho e Terra Moreira, datados

respectivamente 2001 e 2005, da Editora Moderna, e Geografia de Moreira

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Sene, datado de 2009, Editora Scipione, todos já utilizados na rede pública

para o Ensino Médio. A intenção em escolher livros que nos permita ter uma

visão histórica de sua produção, partiu da necessidade de saber se o livro

didático, para a rede pública de ensino é algo que vem avançando ao longo do

tempo, em favor de melhorias na aprendizagem dos indivíduos participantes

desse processo (Figura 1).

Figura 1: Livros analisados

Fonte: 1- Coelho e Terra, 2001; 2- Coelho e Terra, 2005; 3- Moreira e Sene, 2009.

2.2 – Métodos

Para desenvolvimento da pesquisa foram seguidas as seguintes

análises (Figura 2):

1- Levantamento de livros didáticos de Geografia, do ensino

Médio com conteúdos de solos;

2- Estudo sobre solos e aprendizagem significativa, com o

objetivo de constatar a contribuição do livro didático na construção do

conhecimento do aluno;

3- Estudo sobre livros didáticos com parâmetros de análise;

4- Estudo das Orientações Curriculares para o Ensino Médio

(Brasil, 2008);

5- Seleção de parâmetros de análise dos livros didáticos;

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6- Análise dos livros didáticos.

Figura 2: Fluxograma dos métodos e etapas utilizado s na produção do artigo.

Fonte: Fluxograma produzido por grupo.

3 - Resultados e discussão

3.1 – Parâmetros analisados

Os parâmetros que nos dispusemos a analisar partiram da observação

que fizemos em diversos livros didáticos, que tinham vários pontos em comum

que consideramos importantes e que apresentavam equívocos. Esse incomodo

gerado em nós, foi a primeira motivação que nos levou a estudar a temática.

Além disso, compreendemos a responsabilidade que recai sobre o (a)

professor (a) ao deparar-se com situações em que o livro didático é o único

recurso que é disponibilizado para a realização do ensino. Isso requer um

processo contínuo de auto-avaliação e auto-crítica por parte do (a) docente,

repensando sempre a melhor forma de trabalhar os conteúdos, principalmente

quando esses apresentam problemas, para que seus alunos venham a

construir um aprendizado que seja significativo.

A aprendizagem, para Ausubel, consiste na “ampliação” da estrutura

cognitiva, através da incorporação de novas idéias a ela. Dependendo do tipo

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de relacionamento que se tem entre as idéias já existentes nesta estrutura e as

novas que se estão internalizando, pode ocorrer um aprendizado que varia do

mecânico ao significativo. Para que se torne significativo à aprendizagem deve

dar lugar às novas idéias que vão se relacionando de forma não-arbitrária e

substantiva com as idéias já existentes, dando condição ao aluno de, por

exemplo, explicar o que foi aprendido de forma diferenciada, usando recursos e

exemplos distintos.

A partir da incorporação dos novos conceitos e com a estrutura cognitiva

mais desenvolvida, espera-se que não apenas o professor, como também o

aluno, tenha a capacidade de fazer um uso mais consciente do livro didático,

discernindo a partir do conteúdo aprendido os equívocos que o livro

apresentam.

Os parâmetros que analisaremos são considerados relevantes, por

entendermos que se estes apresentam problemas, podem influenciar

fatalmente na aprendizagem.

3.1.1 - Adequação da linguagem

Os livros de Coelho e Terra (2001, 2005), não demonstram mudanças

significativas de conteúdos e de linguagem embora haja diferença entre os

anos de publicação. Ambos trazem um vocabulário relativamente claro,

contendo, algumas vezes, palavras que podem dificultar a compreensão do

estudante (Figura 3).

Figura 3: Fragmento de texto

Fonte: Terra e Coelho, 2005.

O que queremos chamar a atenção, nesse fragmento retirado do livro

didático, é a falta de explicação sobre os termos que os alunos, muito

provavelmente, teriam dificuldade em compreender por serem na área

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específica do conhecimento, causando prejuízos na construção desse

conhecimento.

Nesse caso, se o aluno ainda não tem compreensão do novo conceito

que será trabalhado terá alguma dificuldade para estabelecer uma construção

teórica e estabilizar esse conhecimento em sua estrutura cognitiva, podendo

assim, utilizá-la posteriormente, pois só a partir da existência de idéias âncoras,

aquela que já existe previamente e servirá de suporte para o entendimento do

novo conhecimento, pode se conectar com o novo.

Quando ocorre essa ligação, o que se tem é o processo de interação

ocorrendo, isso acontece por que tanto a idéia nova como a idéia âncora,

modificam-se em função desta ligação. Por isso que a clareza e a firmeza das

idéias que servirão como âncora, podem determinar como se dará o

aprendizado dessa nova idéia.

De acordo com a análise feita do livro de Moreira e Sene (2009),

avaliamos que a linguagem se adéqua melhor a faixa etária a que estar

destinado, trazendo sempre que necessário às devidas explicações.

3.1.2 - Linhas de abordagem

Os livros de Coelho e Terra, 2001 e 2005 trazem uma visão de estudo

do solo mais voltada para os aspectos pedológicos no que diz respeito a sua

composição, classificação, degradação e distribuição dos solos. Eles trazem

ainda, uma abordagem um pouco determinista quando se trata, por exemplo,

de fertilidade (Figura 4) além de trazer idéias preconceituosas sobre

determinada regiões.

O exemplo a baixo traz a informação que os solos que estão em regiões

áridas ou semiáridas têm como característica a baixa fertilidade, porém não

podemos encarar isso como um fator determinante.

É necessário distinguirmos a idéia de potencial fértil e de fertilidade,

ambas relativas. O maior fator limitante a fertilidade de determinado solo em

regiões semiáridas é a baixa pluviosidade, porém se implantado a técnica da

irrigação, por exemplo, torna-se potencialmente fértil, pois estes são pouco

lixiviados e por isso há pouca perda de nutrientes, além de permanecer sendo

rico em bases (K, Mg, Na e Ca).

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O maior problema a partir daí, é o acesso a essas técnicas que em regra

encontra-se nas mãos de uma minoria abastada e há pouca mobilização do

poder público para que esse acesso seja maior. Além disso, se sabe que a

uma boa parcela da população rural de toda a extensão do Semiárido é

considerada pobre ou que está a baixo da linha da pobreza, revelando suas

contradições, pois apesar de ter grande potencial não há investimentos.

Figura 4: Fragmento de texto

Fonte: Terra e Coelho, 2005.

Já o livro mais recente, Moreira e Sene (2009) traz uma abordagem bem

mais ecológica, tendo ainda uma preocupação com o uso, manejo e

conservação do solo agrícola e ocupação do solo urbano, desarticulando a

necessidade de conservação do último e os constantes conflitos de terra do

primeiro.

3.1.3 - Nomenclatura

Em todos os livros analisados, a nomenclatura apresentada já se

encontra em desuso, não estando de acordo com a classificação atual da

EMBRAPA (1999), a observação fica ainda mais em evidência tendo em vista

que todos os livros foram publicados após essa mudança oficial, deixando,

portanto, a desejar nesse quesito.

A figura a seguir, apresenta alguns problemas quanto à nomenclatura:

O Solo LITOSSOLO a partir da mudança de nomenclatura passou a

chamar-se NEOSSOLO LITÓLICO, podendo variar a partir de suas

características de formação entre LITÓLICO, REGOLÍTICO, FLÚVICO E

QUARTZARÊNICO.

O CAMBISSOLO demanda uma maior especificação, pois atualmente

ele está classificado como CAMBISSOLO HÚMICO, HÍSTICO E HÁPLICO.

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O PODIZÓLICO antes da mudança era classificado como PODZÓLICO

VERMELHO-AMARELO, VERMELHO-ESCURO E TERRAS BRUNAS-

ESTRUTURADAS, atualmente é denominado ARGISSOLO ACINZENTADO,

AMARELO, VERMELHO-AMARELO OU VERMELHO (Figura 5).

Figura 5: Ilustração da evolução de um perfil de so lo. Ênfase na nomenclatura em desuso, de acordo com a EMBRAPA (19 99).

Fonte: Coelho e Terra, 2001-2005.

Além dessas características em comum, o livro de 2009, o mais recente,

não traz em nenhum momento ao longo do texto os nomes e definições dos

solos, exceto em uma das figuras que é trazida como exemplo num apêndice

de texto, deixando a desejar nesse quesito.

3.1.4 - Figuras, esquemas e gráficos.

Os livros de Coelho e Terra (2001, 2005) trazem figuras que apresentam

informações incorretas que comprometem fatalmente o ensino.

Ex. 1 - Por definição, um solo para ser denominado CAMBISSOLO deve

possuir o horizonte B mesmo que incipiente (Figura 6).

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Figura 6: Ilustração da evolução de um perfil de so lo. Ênfase no problema conceitual apresentado, de acordo com LEPSCH (2002) .

Fonte: Coelho e Terra, 2001-2005.

Ex. 2 – A legenda dessa imagem pode induzir o aluno a uma

interpretação equivocada e/ou extremista, pois nela vem a indicação de que 40

milhões de pessoas sobrecarregam as terras, não considerando a grande

concentração de terras em poucas mãos, além de afirmar que as terras são

frágeis, sabemos, porém que a fertilidade é um fator relativo, como já dito

antes, que pode ser influenciado inclusive por ações antrópicas.

Segundo Castrogiovanni “é importante que o livro forneça uma visão do

espaço sem idéias preconceituosas que permitam o estudo das questões no

contexto social em que se apresentam, buscando a universalidade das

relações” (2003, p.133). (Figura 7).

B

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Figura 7: Pontos mais críticos de erosão no mundo. Ênfase na visão determinista e preconceituosa abordada pelo livro ( Coelho e Terra, 2005)

Fonte: Coelho e Terra, 2001-2005.

O livro publicado por Moreira e Sene (2009) traz uma figura que

representa com maior proximidade a realidade sobre perfil de solo, porém

consideramos que uma imagem de perfil de solo real seria mais significativo

por traduzir melhor a realidade, mostrando que a natureza não é tão exata.

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Ex. 1 – Os limites de solo nem sempre são tão facilmente perceptíveis

quanto à figura a seguir demonstra, apresentando a grande maioria das vezes

sinuosidades e irregularidades que separam os horizontes do solo (Figura 8).

Figura 8: Comparativo de perfis de solo

Fonte: Moreira e Sene, 2009

O livro ainda trabalha a influência dos fatores morfoclimáticos na

formação dos diferentes tipos de relevos a partir do intemperismo e os

diferentes tipos de solos que são formados.

A questão de uso e conservação dos solos urbanos é tratada de forma

incipiente, sempre dando mais ênfase ao espaço rural como se não houvesse

uma interdependência entre ambos e o estudo do solo fosse uma

especificidade rural.

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A figura a seguir retrata essa realidade (Figura 9). A abordagem é feita

de maneira acrítica, dando ênfase aos aspectos naturais que ocasionam o

problema e propondo apenas medidas paliativas, que não entram no foco da

questão.

É necessário ser considerado ainda, a ação do homem nas modificações

e prejuízos causados através do processo de uso e ocupação inadequados,

expondo essas populações a risco. Essa questão este diretamente relacionada

ao descaso do Estado no que tange ao direito a moradia (Art. 6 da Constituição

Federal).

Figura 9: Deslizamento de terra em Petrópolis, RJ.

Fonte: Moreira e Sene, 2009

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3.1.5 - Atividades propostas

O que se verifica nas atividades propostas, com raras exceções, é a falta

de criticidade e caráter analítico que as perguntas demandam, pois elas são

estruturadas a partir da memorização mecânica ou perguntas que possuem

respostas óbvias, prontas e limitadas que não levam o estudante ao raciocínio,

sendo de fácil solução por estarem no decorrer do texto, além de não

estimularem a pesquisa do estudante em outras fontes (Figura 10).

Toda atividade deve ter um objetivo claramente definido, devendo por

sua vez desenvolver habilidades atitudinais e comportamentais que sejam

capazes de modificar a conduta do aluno frente à realidade (Castrogiovanni,

2008).

Figura10: Atividade que demonstra a apenas memoriza ção mecânica.

Fonte: Coelho e Terra, 2005.

3.1.6 - Função social do estudo do solo

De maneira geral, os livros analisadas não deixam claro a importância

social do estudo do solo, como se esse estudo tivesse um fim em si mesmo.

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Entendemos que a aprendizagem deve ter uma função prática que tenha um

rebatimento na vida do aluno. Deste modo, seria importante abordar o uso,

ocupação, manejo e conservação dos solos, não só para fins agropecuários,

como se tem dado ênfase nesses livros, mas também para o estudo dos solos

no espaço urbano, respeitando os diversos lugares de vivência dos alunos.

Tendo em vista essa perspectiva, faz-se necessária que os conteúdos

relativos a essa temática sejam trabalhados de forma articulada, deixando claro

a relação entre os fatores de formação do solo e as demais variáveis que

também exercem influência, dando destaque para o papel do homem como

agente modificador desse processo. Uma vez que a aprendizagem gerou a

consciência da ação dos indivíduos, deve proporcionar uma mudança atitudinal

no aluno, demonstrando através de suas ações que o conhecimento adquirido

foi significativo a ponto de mudar suas atitudes diante das situações que o

confrontam e exige uma postura crítica.

4- Considerações finais

Diante das análise feitas dos livros didáticos e os resultados adquiridos

nessa pesquisa, pudemos chegar a algumas inferências no que dizem respeito

a contribuições que esses livros oferecem para a construção de uma educação

geográfica.

Vale ressaltar que após as análises realizadas, um fato em especial nos

chamou a atenção: os livros de Coelho e Terra (2001, 2005), não sofreram

grandes alterações que contribuíssem para a melhor abordagem do conteúdo,

ao contrário, foram retiradas algumas informações que eram importantes,

demonstrando uma diminuição da qualidade do conteúdo proposto.

Além disso, no livro de Moreira e Sene (2009), notamos que a presença

de informações fundamentais são apresentadas em forma de textos

complementares, como se fosse apêndices do texto.

Não queremos com isso invalidar o uso do livro didático, porém ele não

pode estar ocupando o lugar de manual para o ensino, assim como os outros

recursos didáticos, esse também apresenta problemas devem ser pensados

criticamente para que chegue a soluções plausíveis, e para isso é necessário

que os professores, que não querem servir como instrumento do poder, tenham

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clareza da sua responsabilidade diante do cenário imediatista que vivenciamos,

onde o conhecimento é tratado, muitas vezes, apenas como uma mercadoria

que obedece a lógica capitalista.

Isso quer dizer que há intencionalidade no modo como cada um dos

livros traz a abordagem dos conteúdos. Ao se tratar à temática do solo, o viés

que pode ser abordado é diverso e certamente atenderá a uma lógica social.

Por exemplo, os livros analisados trazem o estudo do solo rural dissociado do

urbano, como se apenas no primeiro fosse necessário ter um manejo

adequado, a fim de conservá-lo, e o segundo como um lugar que só se

percebe esse aspecto nas periferias quando há algum deslizamento de

encosta.

Não cabe aqui indicar se os livros analisados são bons ou ruins de

maneira geral, mas ressaltar a responsabilidade que recai, também, sobre o

professor na maneira que ele vai se utilizar desses recursos a serviço de seus

objetivos e propostas de trabalho.

Para Vessentini (2003):

Ao invés de aceitar a “a ditadura” do livro didático, o bom professor

deve ver nele (assim como em textos alternativos, em slides ou

filmes, e obras paradidáticas etc.) tão somente em apoio ou

complemento para a relação ensino-aprendizagem que visa a integrar

criticamente o educando ao mundo (p.167)

Deste modo, esse trabalho está destinado a todos os professores de

Geografia em exercício, aos graduandos em licenciatura em Geografia e aos

interessados em buscar uma melhor qualidade no ensino dessa temática e no

ensino do modo geral, sendo capazes de fazer sempre uma autocrítica e uma

releitura de sua prática docente.

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Referências

BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Orientações Curriculares para o Ensino Médio: Ciências Humanas e suas Tecnologias. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008.

CASTROGIOVANNI, Antônio Carlos (org). Geografia em sala de aula: práticas e reflexões. 4ª Ed. Porto Alegre: UFRGS/Associação dos Geógrafos Brasileiros – Seção Porto Alegre, 2003.

CAVALCANTI, Lana de Souza. Geografia, escola e construção de conhecimento. Campinas: Papirus,1998.

COELHO, Marcos Amorim. TERRA, Ligia. O espaço natural e sócio-econômico. São Paulo: Moderna, 2001.

EMBRAPA, Centro Nacional de Pesquisa do Solo. Sistema Brasileiro de classificação de solos. Rio de Janeiro, 1999.

LEPSCH, Igo F. Formação e conservação dos solos. São Paulo: Oficina de Textos, 2002.

MOREIRA, João Carlos. SENE, Eustáquio de. Geografia. São Paulo: Scipione, 2005.

SILVA, Cláudio Souza Da. FALCÃO, Claire Lima da Costa. SOBRINHO, José Falcão. O Ensino do Solo no Livro Didático de Geografia. Revista Homem, Espaço e Tempo. Centro de Ciências Humanas da Universidade Estadual Vale do Acaraú/ UVA. Ano II, Número 1, março de 2008.

VESSENTINI, José William. Para uma Geografia Crítica na Escola. São Paulo: Moderna, 1992.

______________________ Org. Geografia e Ensino: Textos Críticos. Campinas: Papirus, 2003.