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Livro 3 Capítulo I Um Inferno de Gigantes

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Page 1: Livro 3 - Biblioteca RHC Oficial · - E qual seria o propósito de viajar pelo mundo a matar inocentes?! - Ouve-me. - Respondera-lhe o tio ao enervar-se. - Ao contrário do teu pai,

Livro 3 Capítulo I

Um Inferno de Gigantes

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A travessia encontrava-se calmo e o mar tranquilo.

Passados 3 anos, Sec contava agora com 19 anos, e estava

numa caravela com Sochoski, Carlosvin e Germano em busca

da ilha da miragem:

- Sec... - Chamara Carlosvin.

- Diz? - Respondera-lhe o amigo enquanto se debruçava sobre

uma borda da caravela a olhar o horizonte.

- Ainda nem tive tempo de falar contigo direito...

- É normal. - E rira-se Sec. - Afinal de contas andaste a viajar

pelo mundo, não é?

- Sim! Mas então, conta-me todas as novidades destes 3 anos

em que estive ausente... Se tiveres paciência, claro!

- Claro que tenho amigo.... Ora, por onde começar? Passei

estes anos só a treinar e o aproveitar tempo com a minha mulher.

- Mulher? Interrompeu Carlosvin.

- Sim, casamos há dois anos e já temos dois filhos, o Teranik e

o Hippei. E o Yann, por incrível que pareça, com 12 anos teve

já dois filhos, e não fez 2 meses que isto aconteceu, são a

Shirley e o Legend.

Page 3: Livro 3 - Biblioteca RHC Oficial · - E qual seria o propósito de viajar pelo mundo a matar inocentes?! - Ouve-me. - Respondera-lhe o tio ao enervar-se. - Ao contrário do teu pai,

- E os teus primos?

- O Vítor teve dois filhos, o Leonardo e o Jonas. O Sochoski

e o Izaac ainda não... E o Izaac ainda está meio doente...

- E novidades no reino?

- Ah, lembrei-me! Muitos desertaram após a guerra, inclusive o

Mateus MTS e o Castilho.... É uma pena... Mas a situação

económica do reino floresce mais a cada dia que passa.

- É muito bom saber disso, da situação do reino, claro. - E

miraram ambos Germano, que lia informações sobre a ilha nos

seus apontamentos:

- Como é que isso vai irmão? - Perguntava Sec, sorridente.

- Mais ou menos, segundo o que estou a ver estamos no caminho

certo... - E tornaram a virar-se para o mar.

- E em relação àquele assunto Sec?

- Que assunto?

- Aquele...

- Do Skaars?

- Sim!

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- Ele continua no reino e nota-se que quer saber todas as

informações que pode, por isso tivemos mesmo de ingressar

nesta jornada.

- Estou a ver...

- Pois...

- Não, estou mesmo a ver! - Exclamou Carlosvin.

- A ver o quê?

- Terra! Ali! - E apontava na direção para onde a caravela se

dirigia.

- Não pode ser! - Gritou Sec, excêntrico. - Mas já chegamos

Germano?!

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- Eu acho que não é aquela, mas podíamos lá fazer uma

paragem... - E lentamente se aproximaram da referida ilha, que

não parecia habitada. Ao atracarem foram surpreendidos pela

constituição da praia, que não tinha areia, mas sim ossos, que

formavam aquela imensa praia. Repensaram fazer ali uma

paragem, no entanto quiseram ser bravos e buscar a aventura.

Ainda não haviam visto os limites desta ilha, por isso, de certo

que não era pequena. Caminharam então em direção das

montanhas no interior e ainda assim não havia qualquer sinal de

seres vivos, contudo constava uma neblina leve no ar.

- Estão a sentir este cheiro? - Perguntou Sochoski.

- Sniff, sniff. - Cheiravam.

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- Parece um porco no espeto, não? - Comentava Germano.

- Eu também acho. - Concordou Carlosvin. - E vem da direção

daquele vale. - Disse, enquanto apontava para o conjunto

montanhoso. Não havia qualquer tipo de vegetação alta, apenas

rasa, e na abordagem ao vale conseguiram observar uma

estranha figura que dormia em posição fetal. Tratava-se de uma

espécie de gigante cinza com chifres. O cheiro a suíno queimado

realmente provinha de lá, e eram restos da comida do gigante,

que descansava tranquilamente:

- Ok, como, e o que é que é suposto estarmos aqui a fazer? -

Perguntava Sochoski.

- Viemos à procura de mantimentos, lembras-te? - Respondeu-

lhe Germano. - E a nossa aproximação ao gigante tem de ser

cautelosa.

- Viemos? Ou seja...? - Retrucava Sec.

- Ou seja, o nosso plano vai constar no seguinte: Eu e o

Sochoski vamos tentar roubar alguma comida ao gigante,

enquanto vocês ficam juntos a ele caso acorde. Ah e Sec, se ele

acordar terás de o matar com a tua mítica espada.

- Entendo parceiro. - E preparava sua pesada espada. - Vamos

lá então. - E de imediato se dividiram e se aproximaram da besta

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adormecida. Passo a passo, com muita cautela e discrição, se

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colocaram nas devidas posições:

- Cuidado agora Germano, não faças muito barulho com isso. -

E ao assustar-se com Soshoski, deixaram cair o espeto de

porco numa pedra, acordando desta forma o gigante, que se

levantava em dificuldade enquanto Sec lhe tentava cortar uma

perna, o que não surtia efeito:

- Não dá! O corpo dele não recebe dano!

- Então corre! - Gritava Carlosvin enquanto já corria

desesperadamente em direção à praia. Ao pôr-se em pé, o

gigante correu nas suas direções, agarrando em Sec, que

gritava pela sua vida:

- Não podemos deixá-lo para trás! - Exclamava Sochoski.

- Vão! Vão sem mim, eu confio-vos a missão! Vão! - E os seus

companheiros, mesmo ao hesitar, partiram sem olhar para trás.

Sec, à mercê do gigante, fora cheirado por este, e uma voz fora

ouvida do outro lado do vale:

- Chega! - Tratava-se do seu tio Gabriel, com a sua armadura

de cavaleiro negro, o que chocou Sec.

- T...Tio? É você o cavaleiro negro? - Perguntava enquanto a

besta o pousava no chão.

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- Anda comigo Sec, eu explico-te no caminho. - E o sobrinho o

seguia, com muitas questões e dúvidas. - Bem... A tua visão

sobre nós pode ser meia distorcida, mas surgimos há poucos

anos atrás com um propósito...

- E qual seria o propósito de viajar pelo mundo a matar

inocentes?!

- Ouve-me. - Respondera-lhe o tio ao enervar-se. - Ao contrário

do teu pai, a minha maneira de encarar o poder é muito diferente.

A humanidade é e sempre foi um sistema erradico utilizado para

justificar os males que nos rodeiam, o que de fato é verídico. Eu

acredito que só nos vai ser possível corrigir este sistema se

houver alguém, que com seu poder absoluto seja capaz de

estabelecer um patamar social igual para todos, não na medida

em que valessem todos o mesmo, mas que ninguém estivesse

acima da autoridade. Nós vamos eliminar todos os reinos

existentes e criar um império que sacie essas necessidades para

a humanidade, e acabaremos com o ódio existente ao criar essa

grande nação. - Sec identificava-se com a visão do seu tio, que

o criou:

- Eu.... Compreendo...

- Eu sei por que vieste cá parar Sec, mas o que não sabes é que

esta é a ilha da miragem.

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- A sério tio? - Questionara o jovem príncipe.

- Sim, e os teus companheiros foram apanhados por outro

gigante, mas estão seguros.

- Não lhes faça mal, por favor...

- Depois de te terem abandonado sabendo que irias morrer? A

minha vontade era de os matar. - E entraram numa gruta junto às

montanhas, que se tratava de um corredor muito longo e com

poucas velas a iluminar. Calaram-se e caminhavam

silenciosamente até o fundo. Nesta etapa, um túnel à esquerda

ligou-os a uma grande sala vaga, cuja iluminação era já mais forte,

onde pôde conhecer o resto dos cavaleiros negros, que

discutiam entre si:

- Estou-te a dizer, eles não te atacam! - Gritava Valmir.

- Continuo a querê-los longe de mim ainda assim. - Respondera-

lhe Kanarinho.

- Então pessoal! - Cumprimentara-os Sec.

- Quem é este, Gabriel? - Questionara o sempre calmo Toko.

- É o meu sobrinho, o Sec. Acho que ele tem potencial para

fazer parte de nós.

- Não devíamos recrutar já novos membros, por isso teremos de

testá-lo, não achas? - Explicava Afonso.

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- E qual seria esse teste? Perguntava o recém-chegado, a medo.

- O que mais seria? - E rira-se Shaman. - Vais ter de atacar,

roubar e sobreviver a uma invasão de uma cidade. - E Sec nem

pensara duas vezes, iria vingar a morte da mãe e atacar uma das

cidades da Dopácia;

- Sim, eu faço isso, tranquilo. Agora tenho um assunto a tratar.

- E virara as costas, partindo do local.

- Sec! – Chamava-o Gabriel. - O portal é na praia do outro

lado da ilha. - Mas o seu sobrinho nem se virara para agradecer

a informação. Correra em direção aos companheiros, passando

por dois gigantes que nada lhe fizeram, e deparou-se com os

seus amigos presos por cordas:

- Sec? Estás vivo! - Exclamou Germano.

- Acontece.... Vamos lá ao portal. - E soltou-os, retornando

todos ao barco. Partiram de imediato rumo ao portal, o qual

atingiram cerca de 45 minutos mais tarde. Tratava-se de uma

praia numa encosta rochosa, com um portal de talvez pouco mais

de 3 metros de altura, que era rodeado por uma aura

esverdeada, de onde era possível ouvir gemidos de dor e

lamentações. Hesitaram de primeira, mas a curiosidade falava

mais alto, e ao que parecia não haviam riscos para os vivos:

- Será que vale a pena? - Questionou Carlosvin.

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- É em nome do reino... - Constatou Sec não muito confiante.

Sochoski, por ser o mais velho, iria à frente, e não pensara duas

vezes, atirara-se logo, sendo seguido pelos seus companheiros.

Caíram de uma altura considerável no chão. Olharam em volta,

onde reinava um céu tipo encarnado, com nuvens creme. Ao que

parecia, encontravam-se no topo de uma colina e uma espécie de

espírito os recebeu, o qual não se via bem a silhueta:

- Saudações, mortais! Suponho que sei o que cá vieram fazer.

No entanto... – E teletransportou-os para outra colina, onde,

ao fundo, se encontrava um gigantesco castelo que se dividia em

dois por duas colossais pontes. Deveria ter, pensaram, cerca de

seis quilómetros de diâmetro e, à direita, uma enorme torre que

se sobressaía pela sua largura. Possuía torres em todos os seus

vértices, sendo este um castelo arredondado, porém muito

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irregular. O espírito, ao apontar para uma direção à parte

esquerda do castelo, junto à porta principal da fortaleza, disse:

- A alma do vosso amigo Gabrielvid está ali depositada. E como

este não é um lugar para mortais, todas as más almas atacar-vos-

ão. Estes são esqueletos armados, espalhados por toda esta

realidade e, para poderem retornar à Terra, terão de recolher

tantas almas quantas vos aparecerem. Dar-vos-ei uma mochila

com alguns itens específicos que apenas resultam para a cura de

feridas que aqui vos forem infligidas. Ah, e outro pormenor... Se

cá forem mortos, jamais poderão retornar à vida. Porém, para

vossa sorte, não encontrarão nenhum dos sete demónios. Boa

sorte. - E desapareceu no ar, deixando-os aos quatro cheios de

medo, mas não havia volta a dar. De súbito, Sec desmaiou e

caiu, deparando-se com uma visão, uma visão de um homem de

grande estatura, de cor avermelhada, com umas enormes asas e

chifres frontais, e continha um pentagrama na sua testa:

- Sinto o cheiro de uma alma deliciosa... - E desmanchara-se a

rir malevolamente - Pareces-me um bom partido para o futuro e

por isso vou proteger-te, miúdo. Já viste que sorte a tua?

- Quem és tu e o que queres de mim?! - Sec morria de medo, mas

tentava não o demonstrar, como se faz geralmente com os

animais.

- Depois verás. Cobrarei a minha proteção mais tarde. E já

agora, é Belzebub o nome. – E assim se retirou o demónio. -

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Acordara Sec, com os companheiros a sua volta muito

preocupados:

- Estás bem, irmão? O que é que te deu assim do nada?

- Sim, Germano. Foi apenas uma recaída. - E levantou-se,

encaminhando o grupo em direção a uma descida que conduzia

à ponte para a porta principal do castelo. Levaram as espadas

em riste e seguiam preparados para o combate. Alguns

esqueletos se sobrepunham na ponte e alguns brilhos os

rodeavam. Estavam estes armados com espadas leves, então

optaram os Recécianos pela longa distância, servindo Germano

de atirador com a sua besta. De primeira, bastaram apenas três

setas certeiras no crânio para fazer os esqueletos caírem, e

decidiram atravessar a ponte, de onde, ao olharem para baixo, se

observava uma ravina tão funda que era coberta de uma suave

neblina branca, que não lhes permitia ver mais nada abaixo disso.

- Lucka? Não achas que estamos a ficar velhos?

- Eu não me sinto velho, mas já somos avôs até. - Respondeu-

lhe o irmão, enquanto lhe sorria amistosamente.

- Já não posso com estes nossos netos. Não se calam um só

segundo!

- Pelo menos temos quem cuide deles. Menos mal... Que dizes

de irmos à taberna do Dodo tomar um copo?

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- Não vejo porque não, irmão... - E desceram ambos a colina até

à real taberna, mandada construir pelo vice-rei Dodo uns anos

antes. Não estava muito cheia, e imediatamente todos os

cidadãos que os viram entrar se levantaram, e lhes fizeram uma

vénia. Numa das mesas encontravam-se Sean, Ricox, Rafac e

Skaars, que os cumprimentaram após a vénia com um aperto

mútuo no antebraço, em sinal de companheirismo. Maycon, sem

demoras, pediu duas cervejas e sentaram-se ali:

- Então, rapaziada, como têm sido os treinos? - Perguntara

Lucka, sempre calmo e sorridente, o que tranquilizava os outros.

- Estamos a ensaiar uma nova tática de cerco. - Respondeu

Skaars a seco. – Em princípio temos melhorias em breve.

- Fico feliz, então. E relativamente aos novos talentos, que nos

tem saído na rifa? É que ando um pouco ausente desses

assuntos.

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- Bem, temos lá duas duplas de irmãos que têm bastante

perspicácia, agilidade e destreza acima de todos os restantes, o

Zico e Somboy, e o Mystogan e Phell – Explicara-lhes Sean.

- Muito bem. Há novidades do Sec e do Sochoski?

- Até agora nada, mas já tentamos entrar em contato com eles

por diversas vezes. - Respondera novamente Sean.

- Ok. E que comandantes temos disponíveis no momento?

Questionara o rei, preocupado com a própria defesa da capital.

- Eu, o Ricox, o Lord Matheus, a Mayra, o Rafac aqui, - E

apontara para o amigo ao seu lado. - O Igor Patric e o Igor Lima,

porém estes são apenas os que cá estão, muitos estão fora, ou

em outras cidades ou em missões. - Explicou-lhe Skaars.

- Muito bem... - Murmurava Maycon enquanto bebia a sua

cerveja com imensa vontade, tendo em conta que adorava aquela

bebida.

- Vamos lá, pessoal? - Perguntara Ricox enquanto já se

levantava.

- Siga. - Responderam os restantes, abandonando o local e

deixando os dois irmãos sozinhos novamente.

- Maycon.... Tens um momento para falarmos de um assunto

sério?

- Diz. Espero que não seja sobre os outros dois do costume.

- Não. Acho que vou retirar-me dos serviços de Vice-rei. – E o

Rei suspirava fundo, seguido de um sorrido de saudade.

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- Já suspeitava disso há bastante tempo e também penso o

mesmo. As coisas nunca mais foram as mesmas depois da guerra

e a minha motivação morreu para tudo quase...

- Compreendo que a morte do Hyoga tenha sido muito difícil

para ti, e já cá estamos há alguns anos. – Comentou Lucka

enquanto colocava a mão sobre o ombro do seu irmão. É

cansativo. Mas já pensaste num sucessor? Alguém para assumir

tudo?

- Um pouco. Da nossa família não vejo ninguém com a

preparação necessária, e dos meus filhos acho que o Sec não

tem perfil de líder, o Yann até tem, mas é muito novo.

- Resta mais alguém de fora? Mas tens a certeza de que queres

mesmo fazer isso, Maycon? Pensa bem acerca deste assunto.

- Ainda vou pensar melhor nisto, calma. Veremos como isto

corre.

Os enormes portões abertos davam visibilidade para um

pequeno átrio onde dois esqueletos patrulhavam. Bastaram

duas setas para os fazer cair. Toda a estrutura do misterioso

castelo parecia de certa forma destruída, dando a entender que

ali se passaram várias batalhas. De súbito, Sec caíra de joelhos,

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agarrando a cabeça e a ecoar gritos de dor. Na sua mente vira

Belzebub novamente, que se ria como um louco:

- Continuas demasiado inocente. Falta-te ódio, determinação e

dor. Matarei dois dos teus amigos, que tal? - E rira-se

infinitamente novamente, enquanto Sec se recuperava.

Carlosvin e Germano começaram a sangrar das palmas das

mãos e numa puxada repentina foram levitados para duas cruzes

de madeira, onde algumas lanças lhes foram atiradas em pleno ar,

matando-os quase de imediato. Sec permanecera de joelhos,

não podia acreditar no que ali acontecera por sua causa.

Sochoski começara a chorar e a berrar para o matarem,

enquanto esmurrava o chão com todas as suas forças.

- Não aguento mais! Nós vamos todos morrer aqui... Eu vou

procurar a saída disto! Tudo isto foi um erro, e a culpa é tua! -

E correu novamente pela ponte afora, enquanto Sec ali ficou,

ainda ajoelhado e em choque com o que acabara de acontecer.

Não parava de tremer das mãos e dos olhos, que enquanto

arregalados, pareciam ver tudo turvo. Levantara-se devagar e

olhara à sua volta. Encontrava-se no inferno, com visões de um

demónio na cabeça, com dois dos seus companheiros e amigos

já mortos, e o seu primo a abandoná-lo ali dentro.

- Respirara fundo e pegara na sua espada. Deixou de sentir dor,

já não tinha mais lágrimas por derramar de tantas desgraças que

lhe haviam acontecido em tempos recentes. Rira-se como um tolo

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e pensara para si mesmo se estaria a ficar louco da cabeça e,

após uma pausa, retomou o caminho pelo castelo. Denotou que

nenhum dos esqueletos o queria atacar. Simplesmente

ignoraram a sua presença, mas Sec não quis baixar a sua guarda.

Mais à frente, no átrio, viu uma catedral gigantesca, feita em

pedra preta, em basalto mais precisamente, altamente decorada

no seu interior, com um largo altar regozijado em ouro negro,

assim como os seus bancos, onde Sec se sentara após olhar

bem à volta. Um relâmpago assustara-o, mas uma mão no ombro

o tranquilizou. Tratava-se de Belzebub novamente, que se

sentou ao lado do jovem príncipe. E conversaram:

- Como te sentes sabendo que tudo isto foi por tua causa?

- Não me sinto. Só isso. - Respondeu Sec, muito seco.

- Vou poupar-te sofrimento desta vez. Trarei a alma do teu

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amigo cá, mas terás de me responder algo primeiro.

- Fala, ou fale, não sei como me dirigir a alguém assim.

- Podes tratar-me na segunda pessoa. Mas enfim, vamos lá. O

que tencionas fazer quando te deixar sair daqui? - Perguntou o

demónio.

- Mudar o mundo. - E levantou-se, colocando a espada no seu

encaixe.

– Sabes, sozinho nunca serás capaz disso rapaz...

- Tenho todo um mundo em busca de uma revolução, mesmo à

minha frente, porque achas que não terei meios de o fazer só?

- Hum... Boa resposta, mas não queres saber mais sobre este

lugar?

- Talvez sim, talvez não, nem sei... Mas podes falar acerca.

- Hum... Muito bem. - E levantara-se Belzebub. - Este é o

castelo do limbo, onde as almas são julgadas. Também cá

constam aqueles que não conheceram qualquer tipo de fé e

existem mais oito círculos do inferno que descem a partir daqui.

Tens sorte de eu ter gostado da tua alma, miúdo. Quem sabe,

até podemos fazer um pacto. - E riu-se. - Podes explorar o limbo

à vontade. Trarei a alma do teu amigo dentro de um instante. -

E Sec assustou-se com uma voz vinda de trás, muito familiar.

- Meu caro amigo! - E Sec reconheceu imediatamente a voz de

Gabrielvid. Ao olhar, reconheceu uma silhueta ténue, em tons

de cinza, na qual não eram visíveis os traços corpóreos. - Tenho

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uma terrível notícia para vós. O pior que pensávamos vai

acontecer.

- Confirmou-se? Tens a certeza? - Questionou o príncipe.

- Sim! E tens de te apressar porque o Skaars está quase a dar

o golpe. Repito, tens mesmo de ser rápido no retorno.

- Obrigado, irmão. Temos imensas saudades tuas.

- Também tenho vossas, nem imaginas o quanto, mas tenho vos

acompanhado sempre. Parabéns pelos teus filhotes. - E Sec

vertera uma lágrima de saudade, e agradecera:

- Muito obrigado, amigo. Por tudo. - E Gabrielvid

desaparecera pelo ar, envolto de poeira e uma névoa. O

demónio, logo após o encontro, colocara a mão no ombro de

Sec, e transportou-o num ápice para junto do seu primo, na

entrada do limbo, este que se encontrava sentado e num choro

leve. Surpreendera-se com a chegada de Sec e mirara-os com

admiração e até com medo do demónio ali presente. Belzebub

sussurrou algo no ouvido do príncipe antes de os teleportar,

juntamente com o seu primo Sochoski.

- Haverás de cá voltar. - E desaparecera. Surpreenderam-se

ao verem que se encontravam não na ilha, mas na fonteira de

Recécio, ainda relativamente perto da capital.

- O Gabrielvid confirmou-me. Temos de nos despachar e evitar

o ataque! - E correram desenfreadamente rumo à capital.

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Capítulo II

A Ditadura de Gabriel

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Ao longe era observável uma nuvem de fumo, que rodeava

toda a cidade, e eram audíveis gritos de agonia e socorro.

Apressaram-se a ir aos portões e iam perguntando à população

o que se havia ali passado, e todos estes cidadãos só gritavam:

- O que é que se passou?! - Perguntara Sochoski a um cidadão.

- Queimaram tudo e aprisionaram o Rei Gaar! - E correram

ambos novamente, rumo à cidade. Quase todas as casas ardiam,

e não se avistava uma única alma viva, tendo em conta que o

ataque já decorria há algum tempo. O clima era de suspense, e

quanto mais subiam a colina em direção ao palácio, pior ficava.

Logo no átrio se encontrava o Rei, amordaçado e amarrado, mas

nem tanto aflito quanto isso.

Ao desapertarem-no, o rei estava super calmo, e nem lhes deu

tempo de falarem:

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- O Skaars atacou a cidade e roubou grande parte das nossas

joias. Sec enraivecera-se:

- Morreram-nos dois companheiros para nada?! - E ajoelhara-

se enquanto berrava:

- Onde está o Skaars?!?!

- Ele já desapareceu do mapa, filho. - Explicou Maycon na

tranquilidade, o que causou uma reação ainda mais agressiva no

filho:

- Achou que foi fácil?! Perder dois amigos só para tentar

prevenir isto?! - E correram para o interior do palácio, onde Sec

se deitou na sua cama a descansar. Maycon observava a sua

capital a arder. Tudo o que havia completado e conquistado

ardia aos seus pés, e permaneceu reticente. Não sabia o que

fazer ou como agir face à situação, e sentia-se completamente

perdido. Lucka não se encontrava lá presente, e podia ver

Gabriel na praça, que ajudava alguns cidadãos a escaparem.

Mirava o seu irmão mais novo e pensava para si mesmo:

- Acho que darias um bom rei Gabriel. -E descera a colina a

correr para também ele auxiliar os seus súbditos no meio daquele

calor e chamas intensas:

- Maycon? Não deverias de estar no teu palácio?

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- Não, líder é aquele capaz de se sacrificar em nome do seu povo.

- E pegou na coroa, dando-a ao irmão. – A partir de hoje tu és

o rei deste povo. - E Gabriel entrara em choque, colocando-a

em si mesmo, o preço máximo do reino na cabeça:

- Não sei o que dizer, mas temos de ajudar a encaminhar as

pessoas que faltam a saírem da cidade.

- E eu vou com elas.

- Tudo bem, irmão.

- Não é isso, vou mesmo embora e vou levar o Yann comigo,

deixo o Sec a teu critério.

- Suponho que vou estar à altura... Por aqui, corram até ao

portão! - Gritara para os últimos cidadãos a fugir dos fogos. -

Vamos voltar ao palácio, aliás, eu vou, vai buscar o Yann e parte

o mais rápido possível! - E Maycon correu para o palácio

juntamente com o seu irmão mais novo, que não chegara a lá

entrar, para observar a cidade em chamas. O agora ex-Rei

dirigiu-se ao filho mais novo e pegou-o ao colo, saindo disparado

pelo palácio até fora das muralhas. Sec juntara-se ao tio no

planalto, parando ao seu lado com uma cara muito séria, que fez

Gabriel reagir:

- Olá, Sec.

Page 26: Livro 3 - Biblioteca RHC Oficial · - E qual seria o propósito de viajar pelo mundo a matar inocentes?! - Ouve-me. - Respondera-lhe o tio ao enervar-se. - Ao contrário do teu pai,

- Com que então o meu pai foi cobarde a ponto de abdicar do

trono?

- Não o julgues por isso, mas também o considerei um pouco.

Anda comigo. - E entraram ambos no palácio, subindo as

escadas rumo ao quarto de Gabriel, que abriu um armário, este

contendo duas armaduras totalmente negras. - A da direita é

tua. - E tirara-a, peça a peça, entregando-a a Sec, que a

equipava. O seu capacete era diferente daquele usado pelo seu

tio, contendo este, chifres frontais em vez de laterais como o

agora Rei. Continha ainda uma faixa entre os chifres,

preenchidas com pelos de cavalos ruivos:

- Muito grato, tio. – Agradecera o jovem príncipe. – Isto é um

convite?

- Sim sim, afinal de contas sobreviveste ao inferno, e isso não é

para qualquer um.

- Obrigado uma vez mais, mas o que vamos fazer agora?

- Nada podemos fazer além de aguardar que as chamas cessem.

Mas enquanto isso, chamas-me o Lord Matheus cá?

- Eu chamo. – E procurara pelo Duque, que andava pelo

palácio, refugiado do acontecimento no exterior. Acabou por

encontrá-lo na sala de armas, a analisar o armamento lá presente.

– O meu tio quer falar contigo

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- Hun? Assustara-se Matheus, deixando cair o maço que

segurava, quase lhe atingindo num dos pés. – Ah, já lá vou. – Ao

entrar no escritório de Gabriel, Lord surpreendera-se com a

coroa na cabeça do seu melhor amigo, e o Rei saudou-o:

- Bem-vindo ao escritório, Vice-Rei Lord Matheus.

- O quê?! Como assim?!

- O meu irmão passou-me a coroa e o trono, e quero que sejas

tu o meu Vice-Rei.

- Mas Gabriel... Isso soa-me a muito trabalho!... - E pararam

para ouvirem o barulho da chuva que começava lá fora.

- Aceitas essa honra?

- Caramba... - Pensara fora si mesmo Lord. - Digo sim?

- Lord, por favor. -Insistia o Rei.

- Pronto, eu aceito, mas temos de começar já a tomar ações se

assim é o caso...

- Skaars, podes sair. - E a mando do novo rei, o atacante de

Recécio, Skaars, aparecera por detrás de uma estante:

- Finalmente, já estava farto de me esconder... - Lord não queria

acreditar que o ataque havia sido planeado por Gabriel de

modo a tirar a coroa de Maycon. Skaars ficara ao lado do novo

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Vice-Rei, enquanto o rei andava à sua volta:

- Fizeste um trabalho exímio Skaars, mas tenho uma nova missão

para ti. - E num piscar de olhos sacara de uma espada e

apunhalara Skaars nos órgãos vitais, ficando este em enorme

dificuldade para respirar, e o rei continuara: - Ires para o inferno.

- E rira-se diabolicamente como um lunático, enquanto o

atacante caía imóvel no chão, criando-se uma poça de sangue ao

redor do corpo. Lord não era capaz de proferir uma única

palavra, mas o amigo tranquilizou-o.

- Teve de ser... Ninguém sabe de nada. Chama-me as criadas

para limparem isto e vem ter comigo lá fora. -Após tê-lo feito,

encontraram-se no penhasco em frente ao palácio, com vista

para a cidade. Chovia intensamente, e as chamas estagnaram,

restando apenas ruínas que bufavam fumo devido à diferença de

Page 29: Livro 3 - Biblioteca RHC Oficial · - E qual seria o propósito de viajar pelo mundo a matar inocentes?! - Ouve-me. - Respondera-lhe o tio ao enervar-se. - Ao contrário do teu pai,

temperaturas. Lord quebrara o silêncio:

- E agora?

- Agora? – Respondera Gabriel.

- Sim, que medidas tomaremos?

- Vamos ter de fazer investimentos pesados.

- Em que? Recursos?

- Não Lord, no exército. Quero criar um império.

- Tu o quê? Isso é muito improvável.

- Não, nem por isso. Tenho os meios para tal, mas precisamos

de investir na produção de metais. Enviarás uma carta a todas

as minas de ferro. Quero produção a triplicar. Agora, irei ao

acampamento militar, temos muita tropa lá estacionada. Trata

do que te pedi. – E ao virar-se para trás gritou: Sec!

Acompanha-me! – E desceram ambos, tio e sobrinho, pela

encosta abaixo, enquanto conversavam:

- Tio? – Perguntara Sec preocupado.

- Sim?

- Porque é que de repente apareceu o Skaars morto no palácio?

- Sabes... Às vezes temos de sacrificar pessoas de modo a se

obter a verdadeira paz, não é mesmo?

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- Ok tio. Respondera o príncipe a medo.

- Está tudo bem, não te preocupes. Já estamos a chegar. – E

puderam observar várias centenas de tropas sentadas e

deitadas pelo campo, a relaxarem depois de tanta preocupação.

Gabriel enervara-se. - Formação! – E num ápice se formaram. –

Bem, não sei se sabem das novidades, mas sou o vosso novo rei.

O Maycon deixou-me o trono porque se sentia incapaz.

Quero-vos a todos a treinar intensamente daqui pra frente.

Quero ver autênticas máquinas de guerra. Esta noite ficarão

por aqui enquanto recebo os cidadãos retornados,

nomeadamente as vossas mulheres e filhas.

A multidão aproximava-se do portão norte, o único aberto.

Foram imediatamente rodeados por 10 cavaleiros negros, que

não contavam com Gabriel, que se encontrava no portão. A

multidão tremia de medo, e ao lado do Sec juntara-se um novo

cavaleiro negro, que segundo o tio seria o seu parceiro, o

Stressor. Stressor apresentou-se de imediato a Sec:

- Boa fortuna meu parceiro. – E o príncipe, ao olhá-lo de cima a

baixo, observou-o com uma armadura igual à sua e logo o

questionou:

- Quem és tu? Também és novo?

- Sim sim, chamo-me Stressor e sou o teu novo parceiro aqui.

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- Muito bem. – Respondeu Sec. – Sabes o que temos o que

fazer?

- Sei. – E riu-se ironicamente.

. . .

- Mãe, o Teranik está a chorar outra vez! – Exclamou Diana.

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- Dá-lhe comida filha! Nota-se mesmo que nunca tiveste filhos.

– Respondera Dora, a mãe da mulher do jovem príncipe.

- Pronto, pronto... – E pensava para si mesma onde estaria Sec,

já não o via há meses e as saudades começavam a apertar.

...

- Parecem autênticas máquinas de chacina, não achas Lord?

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- Foi errado fazer aquilo Gabriel, mas que remédio.

- O que é que tem?

- Matar as mulheres e os filhos dos soldados para torná-los em

máquinas de matar? Estás insano?

- Os fins justificarão sempre os meios, meu amigo. Agora temos

um exército sem sentimento e pronto a chacinar tudo o que se

lhe aparecer à frente.

- Tudo bem, tu é que sabes. E em relação aos cavaleiros

negros?

- Lord, eles são livres, podem andar aqui se quiserem ou não.

- O problema não é esse. Não achas que vão querer matá-los?

Isto se já se souber, claro...

- Impossível!

- Matarem-nos ou saberem?

- Matarem... Não tens noção do treino que levamos...

- Se calhar até tenho, não foi aquilo que me contaste há uns

anos?

- Isso foi apenas uma parte, e acredito que não foi a pior. Somos

treinados para extinguir por completo os laços e sentimentos

que temos. – E olhara para as estrelas naquele céu noturno. –

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E eu acredito que servimos de canalizadores para a paz

anárquica. O futuro está nas nossas mãos por decidir.

- Ó Igor! – Chamara Zico, que se encontrava com Sec e Dudu

numa mesa da taberna. – Senta-te aqui connosco! – E lá veio

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Igor Lima, que gostava bastante de passar tempo sozinho

com frequência.

- Então mano... - cumprimentou-o Dudu e os restantes com um

aperto de mão.

- Já sabem das novidades pessoal?

- Quais Igor? - Questionou o príncipe Sec.

- O Gabriel vai realizar um torneio entre nobres.

- De justas? Se for já é algo habitual. - Comentara Zico, o mais

jovem da mesa com apenas 16 anos.

- Não... Será de combate corpo-a-corpo.

- Estranho... Somos muito poucos nobres atualmente, deixa-me

analisar quem temos... O Germano e o Carlosvin foram-se,

infelizmente. O Mateus MTS e o Rafac desertaram.

O Castilho tornou-se jornaleiro... Resta-nos eu, vocês os três,

o Igor Patric, a tia Mayra, o Izaac, o Sochoski, o Somboy,

o Daniel X, o Rei e o Vice-Rei, o Vítor, o Ricox, o Sean, o

Kléber, o Morosini, o Phell, o Mystogan e o Thiago. Falta

algum?

- Acho que não, mas tu sabes isso melhor que nós. Constatara

Dudu. - Ou seja, somos 20 nobres, nada mau... E para quando

está agendada essa atividade?

- Para daqui a 2 dias. - Respondera Igor Lima.

- Ok, vais avisar todos os nobres e vê quem

não queira participar.

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- Entendido. - E saiu do estabelecimento sem

sequer consumir nada. Zico pedira uma caneca de água

ao tasqueiro, mas algo não estava certo, e o homem a medo lhe

disse:

- Senhor, peço desculpa mas estamos com um problema... O

riacho de onde vem a água potável esgotou ao que parece...

- Como assim esgotou? - Perguntaram os três em uníssono.

- Recebemos a informação de que alguém tem desviado essa

água para outro sitio, senhores, desculpem-me mais uma vez.

- Pronto, eu trato disto. – Respondeu Zico – E vou levar

o Ricox comigo. - Levanta-se o mais rápido que pôde

e fora à procura do amigo, que se encontrava no tanoeiro.

- Preciso da tua ajuda!

- Diz, eu ajudo claro... – Respondeu-lhe Ricox enquanto

entregava as suas roupas de Comendador à loja e vestia as de

Barão.

- Fica-te bem esse azul marinho, foste promovido?

- Sim, então vim trocar a roupa. – E soltou um enorme sorriso

de felicidade. – Mas para que precisas do meu auxílio?

- Conheces bem estas terras, certo?

- Sim, como a palma da minha mão.

- Boa, então é o seguinte, soube que estamos sem água no

riacho do costume, e que é alguém que a anda a desviar.

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- Eu sei de onde vem a nascente, vamos buscar os cavalos. - E

após os montarem, seguiram ambos rumo a uma

montanha para Este. Cavalgaram a todo gás, contando com

boas condições climatéricas, por isso não demoraram assim

tanto a chegar. Mas a situação era completamente inesperada...

Depararam-se com uma mega estrutura, ainda em construção.

Um gigantesco aqueduto com 3 andares de arcos em ogiva e

mais abaixo Lord comandava a obra:

- Lord? - Admira-se Ricox.

- Estão chocados? - Troçara o Vice-Rei.

- Como é que ninguém é informado disto?

- Calma Ricox, era suposto ser uma obra surpresa. Isto vai-

nos permitir obter água, mais límpida, em maior quantidade

e diretamente da nascente. Digam lá se não está a ficar

maravilhoso?

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- Está incrível... - Constatara Zico enquanto contemplava

aquela magnífica obra.

- Vamos voltar, Zico. - E tornaram a cavalgar para a cidade,

desta vez a um passo menos acelerado, e conversavam. - Tenho

medo destes dois.

- Que dois, Ricox?

- O Gabriel e o Lord, Rei e Vice-Rei.

- Porquê? Até parecem gente do mais fino que existe!

- Tu não os conheces, principalmente ao Gabriel, ele é um

homem sem escrúpulos, que é capaz de passar por cima de

qualquer um para conseguir o que quer. Não sei o que é que

o Maycon tinha na cabeça para colocar um tipo destes no

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poder. Podes contar que ele vai ser um ditador, aliás, já o está a

ser.

A multidão estava em êxtase face ao torneio, e

Gabriel encontrava-se na tribuna da organização, num trono, e

com uma mulher ao seu lado, morena e de olhos azuis, que não

parecia ser de Recécio. Começará por se levantar e falar

ao público:

- Bem-vindos! Quero primeiramente fazer uns anúncios... - E

apontara para a mulher do seu lado. - Esta é a nova rainha de

Recécio, a Lelekanina. - E a mulher levantara-se, fazendo

uma vénia ao público, que rejubilou pela ação. Três homens

surgiram também ao lado do novo rei, e Sec reconhecia um

deles, que se tratava de Max, rei da Fébfa. – E estes são... O

novo marquês, Max, o novo Conde, Fox, e o novo visconde, Wii.

- Morosini ficara tão chocado quanto Sec, e comentara:

- O que é que o Gabriel tem naquela cabeça para trazer aquele

tipo para cá? Algum de vocês sabe algo sobre os outros dois?

E sobre aquela mulher?

- Eu sei. - Respondera uma voz familiar que aparecera por

detrás dos nobres.

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- Castilho! Voltaste! - Gritara Vítor, eufórico.

- Só por agora... Ando a viajar o mundo... Mas em relação a

estes novos nobres, o Max era o rei da Fébfa, que acabou

por conta de uma moça chamada Shauana, que os traiu em

diversas ocasiões. O Wii era da Dopácia e correm rumores que

o Gabriel já o queria trazer para cá há muito tempo. O Fox era

da Déasp, mas não sei muito sobre ele. A Lelekanina era uma

nobre de título muito alto na Alfária.

- Entendi... Respondera Morosini, que permanecia pensativo.

- Temos de os receber bem na mesma pessoal! - Exclamou

Igor Patric, confiante em relação aos novos nobres.

- Ei, quem são aqueles ali a aparecer? – Perguntou Mystogan

para o seu irmão Phell.

- Acho que são os cavaleiros negros… - E todo o grupo parou

para ouvir o Rei:

- Estes, estes são os nossos protetores, os cavaleiros negros, e

apresentá-los-ei por ordem: Shaman, o demoníaco, Valmir, o

eloquente, Afonso, o soberbo, Tiravéditos, o prepotente,

Toko, o bravo, Bruno Maro, o imprevisível, Stressor, o

estratega, Bruno Santos, o louco, Kanarinho, o manipulador,

Marcelo, o determinado… - E fez uma pausa, passando sinal a

Sec para aparecer. – Eu, Gabriel, o sábio e… Sec, o

magnânimo. – E com isto todo o grupo de nobres se virara para

Sec, em revolta:

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- Perdeste o juízo irmão? – Comentara Somboy.

- Deixem-me em paz, eu decido o meu futuro, agora prestem

atenção porque ele vai anunciar as batalhas do torneio. – E

Gabriel mandara extender uma lousa entre a bancada do

público e a organização, com a seguinte tabela:

Mystogan

Sec

Ricox

Thiago

Zico

Sean

Phell

Somboy

Izaac

Dudu

DanielX

Vítor

Igor Patric

Morosini

Kléber

Sochoski

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- Sec e Mystogan, para a arena! – E enquanto se dirigiam para

o centro da arena, o príncipe pôde ver na bancada Diana, com

os seus dois filhotes, Teranik e Hippei. Sorriu-lhe e ela sorriu

em retorno. – Preparados? Comecem! – E rapidamente o jovem

Mystogan correu para Sec, à procura de um golpe no pescoço.

O príncipe agarrara-lhe nos punhos, puxando aquele que

agarrava na espada para baixo, o que fez o seu adversário

desequilibrar-se. Neste momento, Sec aplicara um pontapé

colossal frontal no estômago do amigo, caindo este para muito

longe, sem se conseguir levantar mais. Parecia estar a espumar

pela boca, e acabou por vomitar para o lado.

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Restavam nas meias finais Sec, que vencera Ricox; Sean,

que ganhara contra Phell; Vítor, que derrotara Izaac, e

Sochoski, que levara a melhor sobre Igor-Patric.

- Sec e Sean, avancem! – Exclamara o Rei, e assim o fizeram

ambos, com uma notória confiança exposta no rosto.

Entreolharam-se por instantes até o grito para o começo da

batalha ser ouvido. Lentamente avançaram um para o outro, e

Sec lançara o primeiro golpe, aplicando um pontapé lateral no

tronco do amigo, que se defendeu com ambas as mãos, sendo

consequentemente arrastado para o lado. Sean imediatamente

lhe lançara um soco à cabeça, ao qual o príncipe se baixou,

recebendo, no entanto, uma joelhada inesperada no estômago.

Aproveitando-se desta fraqueza, Sean derrubou-o com uma

rasteira, seguida de um empurrão. Enquanto no chão, Sec

olhara para a multidão, onde pôde observar os seus dois filhos a

chorar enquanto assistiam àquela cena. O tempo passava tão

devagar ali, e Diana mantinha um rosto reticente, tendo em conta

que odiava lutas e violência. Reparara também que Sean

avançava na sua direção para um remate na sua cabeça, de cima

para baixo, e no momento do golpe levantara o tronco. Com

astúcia, desequilibrara o outro pé do amigo, e enquanto este

caía, deliberou-lhe um pontapé tão forte no rosto que o deixou

imediatamente sem sentidos. O público ficou ao rubro com

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aquele fim da batalha, e Sec levantava-se enquanto todos o

aplaudiam, seria este o seu destino? No entanto a cara da sua

mulher permanecia a mesma.

- O teu pirralho melhorou Gabriel. – Apontara Max, na

organização.

- Sim, é um belo guerreiro. – Concordara Wii.

- Eu sei. – E fez uma pausa na sua fala. – Um dia ele vai tornar-

se o melhor que o mundo alguma vez viu.

- Acreditas tanto nisso querido… Eu mesma já vi jovens mais

talentosos que ele. – Comentou a rainha.

- Quanto maior é o desafio para ele, melhor ele se desempenha,

acreditem em mim, mas agora vamos dar continuação ao torneio.

Izaac e Sochoski, à arena! – Mas ninguém aparecera, aclamando

o rei novamente por estes dois – Repito, Izaac e Sochoski! –

Mas novamente não houve qualquer sinal de ambos. – Lord, vai

lá abaixo ver o que se passa. – O público questionava-se sobre

o que teria acontecido aos jovens guerreiros.

- É para já. – E ao descer as escadas viu todos os concorrentes

já eliminados com um rosto de preocupação inerente, e de

imediato os questionou: - O que se passou com os outros dois?

- Bem… - Mas fora interrompido pelo Vice-Rei.

- Castilho?! Não te via há séculos! – E cumprimentaram-se. –

Continua lá.

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- Infelizmente disseram que queriam protestar contra o novo rei

juntamente com a Mayra, e mudaram-se para a Pegaéss.

- Estás a brincar, não estás? – E franziu o sobrolho Lord.

- Quem me dera estar.

- Tudo bem. – E pensava para si mesmo o Vice-Rei: - Como

raios é que vou dizer isso ao Gabriel? Ele há de se passar

completamente, mas vai ter de ser, não há opção. – E após um

agradecimento ao seu amigo que não via há tanto tempo,

retornou para junto do Rei, proferindo-lhe ao ouvido. –

Quiseram fazer um manifesto contra ti e partiram para a

Pegaéss neste espaço curto de tempo desde o último combate.

- Repete lá isso, acho que não ouvi bem.

- Eles… - Mas foi logo interrompido por Gabriel.

- Eu ouvi à primeira! Agora vou eu lá abaixo! – E levantara-se o

soberano, irritadíssimo, e desceu as escadas até aos lutadores,

com toda a população em suspense, e de imediato gritou: -

Algum de vocês tem mais algum “manifesto” para me fazer?! – E

Kléber, insolentemente, dirigiu-se até ao pé do Rei, e disse-lhe

ao pé da cara:

- Tu não mandas em nós. – E Gabriel, quase tão veloz como um

relâmpago, esmurrou-o no nariz com tamanha força que este

perdera imediatamente os sentidos e jorrava sangue pelo nariz,

pela boca e pelos ouvidos. Fora imediatamente auxiliado por

Sean, o seu primo, e Igor-Patric, que o tentavam acordar.

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- Que fique clara a lição para todos vós. – Proferiu o Rei

enquanto retornava para cima, para a organização. Todo o

grupo ficara abaladíssimo com o que havia acabado de ocorrer.

Não conseguiam de forma alguma acordar Kléber, que

estranhamente ia perdendo o pulso, assim como a respiração.

- Kléber, fica connosco, acorda! – Mas perdera por completo o

pulso, no entanto, Sean permanecia com este nos braços. –

Kléber, não! – E começara a chorar, enquanto olhava para os

amigos que permaneciam ao seu redor. – E é isto que temos

pessoal…. Ajudem-me a levar o corpo para a casa da minha

família, por favor. – Enquanto isso, Sec permanecia na arena

sem saber o que estava ali a passar, e ouvira o tio novamente:

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- Sec, parabéns, és o nobre mais forte e habilidoso de Recécio

na batalha, mas agora terás também um novo teste! – O público

admirou-se com a próxima fala do Rei. – Stressor, à arena! – E

o seu sobrinho esboçara um sorriso pelo adversário escolhido,

que não seria com certeza uma coincidência. Stressor removia a

pesada armadura negra com o auxílio de Toko e Afonso. Após

alguns momentos, entrara este na arena, pronto para a luta, e

troçara de Sec:

- Por estares em casa, vou deixar-te vencer! – O que enfureceu

a multidão, que começou a berrar pelo nome do jovem príncipe.

Dado o sinal de começo, avançaram ambos um contra o outro,

sendo Sec a lançar o primeiro golpe, e na lateral, com a espada

rumo ao pescoço. Stressor baixou-se e soltou um chute frontal,

ao qual o Recéciano agarrara e o derrubara no chão.

Seguidamente, sem largar a perna, dobrou-a com a outra e

entrelaçou-as na sua perna direita, formando nos membros

inferiores do adversário um X. Sec, neste momento, roda o seu

corpo 180 graus, indo Stressor junto, que ficou de barriga para

baixo, onde o príncipe se sentara em cima das costas deste.

Tratava-se de uma chave de pernas infalível, e o seu

companheiro berrara:

- Desisto! Desisto! Solta-me! – Enquanto batia repetidamente

com a mão no chão, e Sec assim o fez, levantando-se e tornando

à posição inicial. O Rei sorrira enquanto Stressor se levantava

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a muito custo, e chamara Afonso para junto de si, sussurrando-

lhe:

- Criei um monstro. – Mas o seu companheiro nem respondera,

apenas sorriu. Gabriel então levantou-se e dirigiu-se à

audiência: - Muito obrigado pela vossa presença neste torneio,

espero que tenham disfrutado ao máximo das habilidades dos

nossos nobres! – E após os fortes aplausos do público, desceu

para junto dos nobres, que aguardavam indicações. Enquanto a

multidão saía, Sec procurava a sua mulher desesperadamente

por entre os cidadãos, e logo que a encontrou foi ter com ela,

mas Diana parecia estranha, e o príncipe logo a questionou

enquanto pegava em Hippei e Teranik ao colo.

- O que se passa amor? Estás estranha.

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- Achas normal ficares meses sem nos visitares? - Respondeu

Diana, muito rude, o que deixou Sec reticente, e reconhecera o

erro:

- Desculpa, eu sei que tenho ficado ausente, mas como te disse

embarquei naquela viagem à ilha com o portal para o inferno, e

estive realmente lá.

- Estás-me a dizer que foste ao inferno? - Questionou a sua

mulher, sempre muito cética.

- Foste muito folte papá! - Exclamara o pequeno Teranik.

- Haha, pois fui filho. Mas sim Diana, juro-te que estivemos

realmente lá. O Carlosvin e o Germano foram mortos, e só eu e

o Sochoski sobrevivemos. Foi terrível... – Fizera uma pausa. - E

quando voltei, fui levado pelos cavaleiros negros a fazer

treinamentos especiais, e tornei-me um deles, por isso não tive

praticamente tempo para nada.

- Tens a certeza de que isso é algo bom? E como é que justificas

não teres tempo para a tua própria família?

- Tenho, mas deixa-me fazer-te a pergunta novamente. Quando

é que vens viver para o castelo? Se lá vivesses nada disto

aconteceria, porque geralmente tenho de dormir lá. - E Diana

suspirou.

Page 51: Livro 3 - Biblioteca RHC Oficial · - E qual seria o propósito de viajar pelo mundo a matar inocentes?! - Ouve-me. - Respondera-lhe o tio ao enervar-se. - Ao contrário do teu pai,

- Não sei, talvez no próximo ano... E Sec sorriu amargamente. –

Mas tu tens tempo para nos visitar, não vens porque não queres,

tudo o que importa para ti é poder, e os teus sonhos incluídos.

- Já pensaste que só penso nisso porque sei que vocês estarão

muito mais seguros comigo cada vez mais forte e influente? – Mas

Diana suspirou novamente e não lhe respondeu. – Há um

banquete daqui a pouco, não queres vir?

- Hoje não dá, tenho umas coisas para fazer em casa… - E

inclinara-se para cima, de modo a conseguir beijar o seu marido,

pegando logo após nos seus dois filhotes ao colo, e despediu-

se: Vê se arranjas tempo para a tua família. – E Sec de imediato

lhe respondera numa forma um pouco rude:

- Tu deves achar que vou para guerras por ódio ao que tenho à

minha frente, mas não, guerreiros embarcam em guerras não por

isso, mas por amor a quem têm atrás deles. – E Diana misturou-

se entre a multidão, o que deixou o seu marido entristecido.

Já perto do palácio os nobres não chegavam com boa cara,

pudera, depois do falecimento do seu amigo Kléber… As portas

abriram-se-lhes para o salão, que já se encontrava com a comida

quente na grande mesa. Sentaram-se novos, incluindo os novos

nobres que o Rei trouxera, e agradeceram o facto de Gabriel

não ter permitido a entrada dos cavaleiros negros naquele

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banquete, sentiam-se menos intimidados assim. O Rei,

obviamente e juntamente com o Vice-Rei e a Raínha,

acomodaram-se no centro daquela mesa em U, e um criado

trouxera a coroa real e uma capa negra lindíssima, que rejubilava

com as suas pedras preciosas, e colocara-a em Gabriel. Sec

chegara um pouco mais atrasado, e já pôde escutar as cantigas

de amigo, de amor e de escárnio que eram proferidas pelos

trovadores do reino. Morosini e Max conversavam enquanto

comiam:

- Já recuperaste da sova que te demos? – E riu-se o recéciano.

- Parece que sim. – E ignorou-o Max. No outro lado da mesa,

Ricox e Wii conversavam mais tranquilamente e sem

provocações:

- Então, de onde vieste tu? – E sorrira o recéciano.

- Eu? – Admirara-se Wii por tratarem-no bem.

- Sim!

- Bem, eu nasci e cresci na Dopácia…

- A sério? – Entusiasmou-se Ricox. – Conta mais.

- Eu era Visconde lá e o Gabriel, quer dizer, sua majestade

enviou-me uma carta a requisitar os meus serviços, e optei por cá

vir.

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- Fizeste bem, Recécio é um reino extremamente acolhedor e

agradável de se viver. – E encerraram a conversação quando o

Rei, Gabriel, se dirigira ao centro da mesa, pedindo a atenção

de todos:

- Atenção! Era para vos transmitir isto lá em baixo, mas passou-

me completamente ao lado. Sean?

- Sim sua majestade! – E levantara-se de imediato.

- Lembras-te de há uns anos atrás na guerra de um homem que

parecia ter sido corroído por dentro?

- Lembro-me sua majestade, foi uma visão aterrorizadora. –

Respondeu Sean, com muita raiva e ódio de Gabriel.

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- Então, retirar-me-ei durante alguns dias para visitar um

feiticeiro que tem informações sobre esse assunto. Levarei dois

de vós comigo, voluntários? – Mas ninguém se manifestou, então

tivera o Rei de escolher a dedo o próprio Sean e Ricox, que não

tiveram coragem de se opor. – Partiremos amanhã. – E assim se

prolongou noite adentro o banquete e as festividades.

Na manhã seguinte combinaram encontrar-se os 3 no

portão Norte, onde se depararam com um agricultor que não

queria pagar o imposto ao seu capataz:

- Recuso-me! A minha família precisa de comer e pouco temos

para nós mesmos!

- Oiça, tem de pagar, é a lei. – Ao ouvir isto, Gabriel saíra do

cavalo com a espada na mão e dirigira-se ao camponês:

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- Não quer pagar?

- Não se… - E o Rei decapitou-o a

sangue frio e com um só golpe,

retornando ao cavalo. Todos

ficaram em choque, mas ninguém se

atreveu a comentar. Seguiram o

seu caminho, indo Gabriel isolado

na frente, e mais atrás Sean e

Ricox conversavam:

- Ricox.

- Sim? – Respondera o companheiro.

- O que achaste dos novos nobres?

- Parecem-me boas pessoas, não?

- Pois, também a mim me pareceram, apesar de serem

estrangeiros.

- Sabes quanto tempo demoramos a chegar ao nosso objetivo

Sean?

- Pelo que ele me disse é já aqui perto, na próxima aldeia. – E

fez-se um momento de silêncio, até Ricox fazer uma pergunta

indiscreta:

- E tu? Como tens estado desde que a guerra acabou?

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- Vive-se… - Respondera-lhe pesarosamente o amigo. – Num dia

temos tudo e no outro não temos nada. Atualmente só me

agarro ao “agora”. – E nada mais comentaram acerca. Cruzaram

os seus caminhos ao longo de grandes vales, sempre sem uma só

palavra proferida pelo Rei.

Chegaram ao objetivo, e era um planalto no meio das

montanhas centrais, o qual atingiram através de uma longa

escadaria. Um templo abandonado sobressaía-se ao fundo e

todo o planalto se encontrava acima das nuvens. Era uma visão

terrífica, ao ponto de até os próprios cavalos estarem receosos

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do pior, o chamado instinto animal. Era aquele um local

parecidíssimo ao que Sec e Well estiveram anteriormente.

- Ele estará lá dentro? – Apontou Sean a medo.

- Sim. – Respondera Gabriel. – Vamos até lá. Ao adentrarem

no templo, deram de caras com um homem, uma figura angelical

com um cetro na sua mão. Não estava vestido de branco e ao

invés disso envergava uma armadura leve.

- És tu aquele que me contactou? – Pôs o Rei em questão, mas

a figura demorara algum tempo a respondê-lo.

- Eu sou o Alpha e o Ômega, o início e o fim. A segunda vinda

está por vir, mas quando os 7 anjos soprarem as suas trompetes,

será tarde demais. Abaddon chegará novamente pelo poço sem

fundo, e as suas chagas já foram lançadas neste mundo, no outro

continente. E somente quando a luz e as trevas se unirem,

poderá este apocalipse cessar, uma vez que iniciado. Irmãos, sol

e lua, o futuro é dependente deles. – E desvaneceu-se pelo ar

sem sequer deixar algum dos visitantes questionar algo, ficando

os 3 a se perguntarem sobre o que acabara de acontecer.

Enquanto isso, em Recécio, Sec e Phell conversavam na

taberna:

- Conta-me mais sobre esse Indes e esse Dodo!

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- Não há muito para dizer, eu era muito novo quando os conheci.

– Respondera o príncipe.

- Ah, queria mesmo investigar sobre eles.

- Sec! – Gritara alguém da porta da taberna, que por sinal se

tratava de Igor Patric. – Tens uma missão importante! Vai ter ao

palácio! – E saiu a correr. E lá foi o príncipe ter ao palácio, onde

Lord o abordou com um rosto de preocupação:

- Temos um problema em mãos.

- Do que se trata?

- Recordas-te do Mateus MTS?

- Claro que sim, o que tem?

- Ele desertou o reino como sabes, mas segundo umas novas

informações que recebi ele planeia atacar-nos em breve. Ou

seja, atacaremos nós primeiro. Soube que ele tem um castelo na

depressão central, e iremos invadi-lo.

- Levamos quantos homens para isso?

- 3 apenas.

- Só?! – Espantou-se Sec. – Para tomar um castelo?

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- Lembra-te que vai ser uma missão secreta, sem sermos

detetados. E irei eu, tu e o Rei. Acho que somos os mais

qualificados para esta tarefa.

- Tudo bem, mas continuo a achar demasiado arriscado sermos

apenas 3, tenho um mau pressentimento.

- Tranquilo, não devemos encontrar tanta gente como

esperamos naquele castelo.

- Mas… - Interrompeu Sec. – E o meu tio? Ele não está por cá.

- Já está a par da situação e ele encontrar-se-á connosco um

pouco antes dos arredores do castelo.

- Pronto então, vou preparar-me.

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Capítulo III

O Vampiro de Recécio

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O clima encontrava-se oblíquo: era noite e o nevoeiro era

denso, mas conseguiram encontrar-se com Gabriel numa aldeia

pertencente ao castelo de Mateus MTS. Ao se reunirem

foram abordados por um aldeão, de aparência idosa e

carrancudo rosto, que lhes perguntou:

- Quem sois vós? E o que quereis destas terras? – Mas Gabriel,

ao ignorá-lo, contra perguntou:

- A quem obedeceis? – E o agricultor fizera uma pausa, e em

seguida expressou um rosto de susto e terror:

- Não mais o pergunteis. O senhor Mateus é extremamente

cruel connosco. Agora terei de fugir. – E correu,

desaparecendo pelo meio do nevoeiro denso. Ficaram Lord e

Sec a questionar-se sobre se realmente seria o mesmo Mateus

que haviam conhecido, e logo o Rei os interpolou:

- Temos uma missão pela frente, foquem. – E cavalgaram em

direção ao local onde se encontrava o castelo. Avistaram uma

colina, lá bem no alto, com um grande castelo negro que crescia

consideravelmente em altura. A todo este rodeava uma névoa

estranha. Sec engoliu a seco, mas agora não era a hora de

recuar e duvidar. O mais estranho é que não avistavam

absolutamente ninguém, nem viam qualquer vela acesa dentro do

castelo.

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- Sec, ainda tens tochas? – Perguntara Lord.

- Tenho, tomem. – E deu duas tochas a cada um, ficando

também com uma para si. Decidiram aproximar-se dos portões, e

para sua surpresa a porta já se encontrava aberta, indo Gabriel

à frente, com a espada em riste. Ao iluminar a sala puderam

observar um longo corredor que parecia não ter fim, cujo chão

era coberto por uma carpete vermelha apenas. Não era audível

nenhum som naquele interior, o que despoletou algum medo nos

homens. Avançavam, mas sempre com um olho nas costas,

receosos do pior. Depararam-se com dois caminhos, um para a

esquerda e outro para a direita, e hesitaram. Uma música suave

começara a ser ouvida no som de badaladas de piano, e o

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compasso entre cada nota era muito lento, o que tornava a

melodia aterrorizadora. Optaram pela direita, de onde era

audível a música, e ao fundo do corredor conseguiram avistar um

salão. Depois de uma boa olhada em volta do mesmo, puderam

analisar o seu exímio papel de parede com flores-de-lis verdes, e

não continua qualquer mobília, apenas o piano num canto. O

inesperado é que não estava lá ninguém a tocá-lo, e ao se

aproximarem viram que as teclas tocadas por si só, quase como

comandadas a isso, até que a melodia parara, e uma voz se ouvira:

- Bem-vindos ao castelo do filho da fénix. Daqui não sairão os

3 com vida. – E não mais tornaram a ouvir a voz rouca e

envelhecida, optando por seguirem o restante do corredor, onde

ao fundo se sobressaía uma porta de ferro, que ligava a uma sala

redonda, toda revestida por paredes de pedra. Gabriel,

detentor de grande força, conseguiu levantar o portão o

suficiente para que passassem os 3. O piano tornara a tocar, e

de um alçapão numa parede saíra uma pantera negra, toda ela

musculosa e que rugia ferozmente. Parecia faminta e caminhava

lentamente até os 3 recécianos, que recuavam. Sem

conseguirem ter reação, a pantera começara a correr e atacara

o rosto de Lord com a pata direita, derrubando-o de imediato,

mas não ficara por aqui, e quando lhe ia morder o braço, Gabriel,

por instinto, degolara-a com um golpe de baixo para cima. Ao

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rolar a cabeça pelo chão, Sec, raivoso, chutara a cabeça com

toda a força que podia contra a parede, fazendo jorrar mais

sangue da mesma. O corpo do animal caíra em cima de Lord, que

ficara com arranhões diagonais no rosto, que sangravam. Por

pouco não lhe havia cegado, o levantara-se:

- O que é que acabou de acontecer?

- Não podemos reagir desta forma, parecíamos meninas sem

saber o que fazer. - Constatara Gabriel, enraivecido consigo

mesmo. - Já entramos aqui e não sairemos sem a nossa missão

estar cumprida!

- Mas como é que saímos desta sala? Só temos o caminho de

volta ou aquele alçapão de onde veio o bicho. - Comentava o

sobrinho do Rei.

- Pelo alçapão.

- Pelo alçapão tio?! E se houverem mais feras daquelas?

- Tens medo, Sec? - Questionava Lord, ainda com dores do

rosto.

- Não... - Respondera fervorosamente. - Vamos lá… - E andaram

pelo dito alçapão, que ligava a um túnel diagonal que subia um

piso do castelo em altura. Aquela passagem em pedra ligava a

um pequeno compartimento, que se iluminava através de uma só

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janela. Rodeava-se de estantes com livros e uma secretária,

onde pousada estava um papiro com uma mensagem escrita, e

Lord começara a narrá-la para os companheiros:

''Estou a fugir dele, aquele demónio, mas não deve tardar a

encontrar-me. Desde que ele está cá toda a minha família foi

morta. Parece ter algum poder místico, é estranho e

aterrorizador em simultâneo. Mas garanto que os espíritos deles

lá continuam, e se alguém estiver aqui dentro e ler isto, não sairá

daqui com vida, assim como eu não sairei.'' Entreolharam-se,

assustados. Naquela sala todos os livros que abriram não

continham nada, apenas páginas em branco, o que tornava a

situação ainda mais arrepiante, e de lá saíram o quanto antes.

Adentraram pela única porta daquela salinha e à sua frente

depararam-se com um enorme salão vago, com apenas uma

espécie de poste largo e gigante ao centro. Estranharam,

parecia que continha algo no seu interior. Deveria ter cerca de

3 metros de altura. O Rei aproximou-se e deu-lhe um toque com

a espada, o que despoletou de súbito que a fonte abrisse o que

pareciam ser asas enormes de um especime de morcego gigante

que atingiu e derrubou o Gabriel ao abri-las. Logo se virou a a

este, que enquanto no chão tentava afastar o gigante que lhe

queria arrancar a cabeça à força. Lord e Sec, um em cada lado,

cortaram ambas as asas do monstro, e o rei não hesitou e lançou

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as mãos ao pescoço do bicho, e demorou cerca de um minuto até

o asfixiar, concluindo Sec a matança, ao degolá-la. Foi por

pouco, mas havia sido pior com a pantera, e menos mal que

ninguém se magoara desta vez. Sentiram uma leve brisa e

Gabriel, que estava ainda deitado, olhara em cima uma espécie

de grade/alçapão que ligava ao topo do castelo, no entanto

elevava-se cerca de 3 metros e meio, e Lord logo afirmara:

- Ajudem-me a subir. - E Gabriel colocara Sec de pé aos seus

ombros, que por sua vez ajudara Lord com uma escadinha de

ladrão. Fora colocado muito esforço nisto, e o Vice-Rei

conseguira subir, encontrando-se numa torre, larga e altíssima

no centro do castelo. E lá estava ele, Mateus MTS, com o seu

rosto pálido e o seu cabelo encaracolado e ondulado, com uma

leve armadura e uma capa negra com gola alta:

- Demoraram a cá chegar. - Constatou, rindo-se.

- É o teu fim, animal. - E lançou-se a ele, causando um choque

nos dois que haviam ficado em baixo:

- É o Mateus, tio?

- Não sei, mas temos de arranjar alguma forma de subir. Vamos

usar as estantes da outra sala, anda! - E a correr foram buscar

e arrastaram as estantes até debaixo do alçapão, tudo isto

enquanto Lord e Mateus lutavam lá no cimo da torre. Subiu

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primeiro Sec, e Lord logo lhe disse:

- Não te metas, esta luta é minha! - E a príncipe recuou. Gabriel

subira logo a seguir e juntou-se ao sobrinho. Lord agarrara nos

braços de Mateus, tentando empurrá-lo para o abismo da torre,

mas este resistia. Surpreendentemente, Gabriel num só impulso

correra e empurrara o Vice-Rei, e caíram ambos pelo abismo

enquanto gritavam, perdendo-se no nevoeiro abaixo, até que

não mais os ouviram.

- Porquê tio? – Questionou o sobrinho em choque com o sangue

frio de Gabriel.

- Não faças perguntas, vamos embora.

- Manda chamar o Igor Lima. - Ordenou o Rei.

- Sim senhor. - Respondera Vitor, que apenas cerca de meia

hora mais tarde chegara ao palácio com o homem chamado, que

fora ao gabinete do Rei:

- Com licença majestade.

- Toda, entra. Podes sentar-te.

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- Em que lhe posso ser útil?

- Bem. - Suspirou Gabriel. - Acho que sabes porque é que

estás aqui meu amigo.

- Acho que não. – E franziu o sobrolho Igor.

- Pois bem, quero que sejas o meu novo Vice-Rei.

- Como?! - E levantou-se Igor.

- Aceitas essa honra? – Sorriu Gabriel.

- É claro que aceito, mas não sei se vou estar à altura das

expectativas...

- Vais, confia em ti mesmo. Eu também confio em ti. - E foram

interrompidos por Mystogan e Phell, os dois irmãos.

- Bom dia majestade, mandou chamar-nos? - Perguntara

Mystogan.

- Sim, quero que vão os dois à obra do aqueduto para avaliarem

a situação. Deve estar quase no fim.

- Sim senhor!

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Capítulo IV

Cavaleiros Negros e Cavaleiros Brancos

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- O que é que achas, Phell?

- Isto é... Magnífico. Acho que nunca vi algo tão magnânimo em

toda a minha vida. - E de facto era algo massivo, que estava

quase a atingir a capital. Dirigiram-se ao empreiteiro da obra:

- Como estamos? - Questionara Phell.

- Bem senhores, estamos perto de finalizar.

- E onde é que vai acabar e desaguar a água?

- Fora das muralhas, já estamos a escavar fossos em frente das

mesmas, e deixaremos a passagem em terra apenas junto às

portas.

- Isso é muito inteligente, quem pensou nisso? - Admirara-se

Mystogan.

- Sua majestade.

...

- Vitor! Aqui estás tu! - Exclamou Zico ao entrar na taberna de

Dodo, sentando-se ao pé do amigo.

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- Então Zico, tudo bem? - Respondera.

- Sabes o que é que ouvi falar estes dias por cá?

- Oh... - E suspirou o sobrinho do rei. - Até tenho medo, mas

conta lá, já nada me surpreende neste reino, há de tudo.

- Ouvi dizer que naquela missão secreta do rei mataram o

Mateus MTS, e que ele era nosso aliado. E acho que o

Maycon vai voltar para ajustar contas com o Rei.

- Duvido sinceramente que ele volte, nunca o vi em tantos anos

tão desmotivado com tudo isto, sem forças para nada.

- Ágata, o bebé cagou-se outra vez! - Gritara o jovem Yann.

- Qual deles?! - Respondera a sua mulher, também a berrar.

- O Legendo, como é que se limpa isto mesmo?

- Outra vez?! Raios... Não percebo como é que cagam tanto.

- Trata disto tu porque tenho de ir resolver um assunto ao

campo.

- Estás sempre a deixar-me a mim nas piores situações...

- Desculpa querida, tenho mesmo de ir! - E abandonou o

castelo, dirigindo-se à porta oeste, onde também lá estava

Somboy, com os braços cruzados, enquanto mirava os

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agricultores nos campos, que trabalhavam incessantemente:

- Que estás aqui a fazer sozinho tão cedo amigo?

- Ah Yann, que susto, és tu. - E apertaram as mãos. - Estou à

espera que os camponeses me paguem a renda mensal em

produtos. O Rei designou-se esta área como sendo da minha

responsabilidade.

- Estou a ver... Um deles tinha me enviado uma carta para o

ajudar com algo. Sabes quem é um tal de Leonardo Alves? Tu

que os conheces minimamente e que cá vens com alguma

frequência...

- Sim sei, é um dos que planta cevada, deve estar lá naqueles

campos do fundo, junto do novo aqueduto, confirma lá.

- Obrigado, até mais! - E andou por entre os campos cultivados

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sem pisar nada, com muito cuidado. Olhava para o monstruoso

aqueduto que se afirmava em toda a paisagem campestre, e

pensou para si mesmo, enquanto permanecia boquiaberto:

- Que obra... Nunca vi algo assim. - E fora abordado por um

camponês a meio caminho, que humildemente se referiu a este:

- Senhor Yann? Eu preciso da sua ajuda, lembra-se?

- Ahn? - Assustou-se Yann. – Olá, sim, diga, sem problemas…

- Desculpe se o assustei! Não foi a minha intenção!

- Não tem mal homem, acalme-se. - Tranquilizou-o o jovem

príncipe. - Diga lá, quem é você humilde agricultor?

- Então, senhor.... Fui eu que lhe escrevi há algum tempo atrás.

Eu queria comprar um título, pode ser consigo?

- Hmmm... Eu acho que sim... - Respondeu, duvidoso. - Venha

comigo até ao palácio com as moedas. - E assim o agricultor foi

e voltou da sua cabana com um grande saco cheio de moedas. -

Tudo isso?! Devem ser as poupanças de uma vida…

- Sim senhor, quero comprar cavaleiro, sempre foi um sonho ser

nobre.

- Tudo bem, vamos lá então. - E chegando à porta do escritório

do rei, Yann batera à porta, e o tio respondeu:

– Entre!

– Com licença tio...

– Entra lá jovem, ou melhor, – Reparando no agricultor – jovens.

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– Então tio.... Reparei que o Lord já não está cá, aconteceu

algo?

– O teu irmão não te disse nada? – E o jovem camponês ficou

sem perceber nada, mas não se atreveu a dizer uma palavra.

– Não... Ele não me disse nada sobre isso.

– Ele atirou-se de cima de uma torre no castelo do Mateus

MTS para o matar juntamente consigo mesmo.

– Caramba, foi um verdadeiro herói... – E fez-se um momento de

silêncio. - Mas não foi por isso que cá vim. Este jovem quer

comprar cavaleiro, enfim, deixar-vos-ei a sós. – E abandonou o

compartimento, fechando a porta velha que só gemia.

– Como te chamas, jovem? – Perguntara o rei.

– Leonardo Alves, senhor.

– Muito bem.... Entrega-me lá as moedas que vou fazer uma

contagem. – E ao recebê-las, começara a contar. Pouco tempo

depois questionara-o Gabriel. – E o que pretendes cá atingir?

- Pergunta esta à qual Leonardo rapidamente respondeu:

– Só quero ajudar cada vez mais o reino. – Mas alguém bateu à

porta, e o rei permitiu a entrada, tratava-se de Sean:

– Ah, finalmente chegaste. Aguarda lá fora um pouco.

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– Sim senhor. – E retirou-se.

– Ora bem, Leonardo, continuando… – Disse, levantando-se. –

Ajoelha-te. – E assim o fez, enquanto o rei desembainhou a

espada, e ao erguê-la, proferiu as seguintes palavras: – Eu,

Gabriel, Rei de Recécio, declaro-te cavaleiro de Recécio! – E

pousou-lhe a espada sobre ambos os ombros e logo após na

cabeça. – Agora vai lá fora e fala com o Vice-Rei, ele trata da

burocracia. E abandonara Leonardo a sala, entrando Sean de

rajada:

– O que me quer senhor? Já estou a ficar nervoso.

– Bem, estás destituído da tua honra de duque e de todas as

tuas posses. – E Sean começara a tremer:

– Porquê?! Eu não fiz nada! – E dera um passo em frente, o que

enfureceu Gabriel:

– Nem mais um passo! Eu quero e passo, por isso ou começas

toda a hierarquia do zero ou compras o título novamente. – O

Rei não era burro nenhum, tinha perfeita noção de que o nobre

de cabelo escarlate era muito rico, e que conseguiria lucrar com

ele.

– Raios... – E hesitou por momentos. – Eu compro! Já volto! –

E saiu enraivecido. Logo de seguida reentrou Leonardo,

confuso:

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– Senhor, tenho que usar roupa de que cor?

– Meu Deus, o Igor Lima não te disse? Igor! – Gritara.

– Sim?! – Respondera, ao aparecer na sala.

– Não sabes as cores do traje dele?

– Bem... – E encolheu os ombros. – Ainda não estudei isso

bem...

– Só me saem estas rifas, bem, vou reexplicar. A nossa

hierarquia funciona da seguinte forma, de ordem decrescente, e

com as suas respetivas cores:

– Rei - Preto

– Vice-rei - Cinzento

– Arquiduque - Vermelho

– Grão-Duque - Laranja

– Duque - Amarelo

– Marquês - Roxo

– Conde - Castanho escuro

– Visconde - Castanho claro

– Barão - Azul escuro

– Comendador - Azul claro

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– Cavaleiro - Verde claro

– Escudeiro - Verde escuro. Perceberam?

– Ou seja, o meu traje vai ser verde claro senhor? – Perguntara

o jovem Leonardo.

– Sim... – Respondera o Rei pesarosamente, como se estivesse

a fazer um frete ao explicar tudo aquilo.

– Está aqui! – Gritara Sean ao entrar no palácio com um

enorme saco com diamantes que quase transbordavam. – Agora

quero meu título de volta! – O Rei riu-se:

– Tudo bem, tens o teu título novamente, e como primeira missão

vais avisar todos os nobres de que teremos uma reunião este

sábado com todos.

– Sim.

– Sim o quê? – Corrigiu o Vice-Rei.

– Sim sua majestade. – Respondeu Sean em tom de ironia, que

Gabriel ignorou.

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– Diana?! – Gritou Sec enquanto batia fortemente na porta da

sua casa. Foi a mãe, Dora, que lhe abriu a porta. – A Diana está

cá? – Perguntou o príncipe.

– Não, mas os miúdos estão.

– Posso vê-los?

– Acho que é melhor não, estão a dormir. – E Sec suspirou

fundo.

– Raios, e onde está a Diana?

– Ela só me disse que ia tratar de uns assuntos, mas não sei

onde. – E a cara de Sec assumiu uma expressão carrancuda de

imediato. Virou as costas e tornou ao seu cavalo. Nem quis olhar

para trás, e nem Dora lhe disse adeus. Chegara à cidade já pela

noite, e dirigira-se ao palácio, onde ficara na varanda principal a

mirar o límpido céu e todas as suas estrelas. Sentiu alguém ao

seu lado, que por sinal era o seu tio, Gabriel. Nada disseram um

ao outro durante alguns Momentos, até que o requebrava o

silêncio.

- Não pareces bem, Sec, o que se passou contigo?

- Tio... - Chamara, sem nunca tirar os olhos do céu.

- Diz-me.

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- Não sei o que se passa com a Diana... Nós costumávamos ser

tão apaixonados um no outro, mas de há alguns meses para cá

parece que ela faz de tudo para me evitar. Não percebo. –E

Gabriel olhara discretamente para o sobrinho. Uma grande

lágrima percorria-lhe o rosto de cima abaixo, mas nada mais

dissera, e voltara para dentro, deixando o seu sobrinho sozinho.

Momentos mais tarde viera Yann à rua, que logo notou a tristeza

do irmão mais velho, e o abraçou. Sec não teve reação, e

manteve-se imóvel, enquanto o irmão o abraçava solenemente.

- Para Yann, tu não compreendes. – E o afastou-o. –Tu não

sabes o que é estares a perder o amor de tua vida e não poderes

fazer nada sobre isso. É tão... Não sei, sinto-me tão impotente.

- E dirigiu-se ao seu quarto, onde adormeceu a chorar, agarrado

ao amuleto que Diana lhe haver dado antes da grande guerra.

- Querido? Está acordado? - E Sec reconhecera aquela voz

feminina meia grosseira, que se tratava da voz da sua querida

Diana.

- Hum? Diana? És mesmo tu?! – Exclamou, enquanto se

levantava como um relâmpago, energético e feliz como nunca.

- Quem mais seria, idiota? – E deram um forte abraço. Acordara

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sobressaltado e com o coração aos pulos. Fora apenas um

sonho, para sua desilusão. Nem conseguiu sorrir mais, e era dia

de reunião, que aconteceria daí a algumas horas. Foi comer

alguma coisa ao salão e deparou-se com Stressor, que

simplesmente lá esperava, em pé. Apercebendo-se da presença

de Sec, virou-se para o seu companheiro, exclamando:

- Temos reunião amanhã no esconderijo dos montes gélidos de

Rucrúcio. Depois desta reunião de hoje iremos os 3 para lá, eu,

tu e o Gabriel. Até lá fico pela cidade a ver as vistas.

- Não. – Interrompeu Sec. – Podes ficar aqui até à hora da

reunião, sem problemas. Diz-me, tens tido novas notícias?

- Sobre o quê? Não me digas que queres saber de novos alvos?

- Não, quero saber sobre os reinos em geral.

- Deixa ver... – E parara um pouco para pensar Stressor. –

Bem, há várias novidades. O Well é o novo Rei de Rucrúcio...

- A sério? – Exclamou Sec, interrompendo o parceiro.

- Sim Sim. Na Bopénia o Júnior é o novo soberano também.

Em relação a nós, algumas têm feito caça a certas cabeças por

recompensas em dinheiro, e os nossos fundos têm aumentado

consideravelmente devido a isso. Mas acho que sei qual será a

nossa próxima grande campanha, e que é algo de grande

relevância.

- Diz lá, não me digas que vamos ter de matar algum Rei?

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- Infelizmente não, lembras-te daquele grupo do Coraggio e da

Barta?

- Claro que sim, nunca ninguém os chegou a apanhar. Lembro-

me que depois da guerra esconderam-se e nunca mais ninguém

os avistou, havia a suspeita de que poderiam ter morrido.

- Até agora. Obtive informações preciosas acerca deles. – E

riu-se.

- Já estão todos no salão? – Perguntara Gabriel

- Já. Vamos? Temos muita coisa importante para hoje.

- Atrás de ti Igor. E foram ao salão pela entrada traseira, sendo

imediatamente saudados de pé por todos os nobres presentes.

– Boas tardes. Sentai-vos. – E assim o fizeram, em obediência

ao rei. Boing, o antigo bobo da corte, que agora era cavaleiro, e

já antes de o rei sequer se poder sentar, perguntou:

- Sua majestade, quando somos promovidos subimos de título?

– E foi uma risada geral. Houve até quem tenha chorado de

tanto rir, e Gabriel tivera de berrar para que parassem.

- Calou! O próximo que eu ver a rir está expulso do reino! – E

nenhuma alma viva se tornou a manifestar. Então o Rei

continuara. – É normal ter estas dúvidas, e sim, quando és

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promovido sobes de cargo, foi uma pergunta ridícula.

- Obrigado majestade, perdoe-me pela minha insolência.

- Continuando, o aqueduto está quase pronto, e já montamos

um sistema de poços na cidade para termos água em abundância.

Agora sim, teremos excedentes de água. Alguma dúvida?

- Sim senhor! Eu tenho uma dúvida, mas não sei se é pertinente.

- Fala Ricox, em caso de dúvida dizes na mesma.

- Será preciso algum nobre para a manutenção da água?

- Não. – Respondera Igor Lima. – Os trabalhadores são

suficientes.

- Continuando, vamos ao próximo assunto. Ficarei fora uns

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dias, o Igor ficará no comando na minha ausência. – Fez uma

pausa - Outra coisa, teremos uma feira cá na capital durante

algumas semanas, o que vai atrair muitos compradores de fora.

Ou seja, teremos a cidade com uma grande abundância de

gente. E acho que é tudo, vamos agora às promoções. Os

nomes que eu chamar, fiquem em pé: Sean, Sec, Zico, Phell e

Daniel X. Estão promovidos a: Grão-Duque, Marquês,

Visconde, Barão e Conde, respetivamente. E levantaram-se,

com um sorriso no rosto, enquanto Igor Lima lhes colocava uma

capa com as novas cores que deveriam envergar. Nenhum outro

ficou chateado com as promoções dos colegas, e também

esboçaram um sorriso de ponta a ponta. Não ficaram lá por

muito tempo mais tempo, e à saída estava Stressor, com o seu

cabelo encaracolado em tons de azul escuro. Sec e Gabriel

foram buscar as suas armaduras negras, e acompanharam

Stressor até fora das muralhas, passando pelas ruas centrais.

Notava-se medo na população quando passavam com aquela

armadura, até se desviavam da frente. Sec sentia-se imponente

com aquela armadura, conferia-lhe um estranho estatuto, que

gostava. Seguiram para nordeste, pelos longos campos

cultivados, em que se destacavam os campos de trigo, muito

largos e extensos. Só algumas horas mais tarde começaram a ter

neve aos seus pés, enquanto atravessavam as montanhas da

tundra. Afonso esperava na entrada da gruta quando chagaram

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as 3, juntamente com Shaman, que veio pelos mesmos lados. Já

se encontravam todos os membros restantes no interior, cada um

em cima do seu pódio, naquela escura sala com um pequeno lago

artificial ao centro. Tomaram os seus postos, todos os 12

membros. Gabriel iniciou a reunião:

- Bem-vindos mais uma vez, como devem suspeitar, temos uma

missão. Todos se lembram dos mercenários do Coraggio e da

Barta?

- Lembro. - Responderam.

- Descobrimos onde se têm escondido este tempo todo.

- Onde? - Questionou Kanarinho.

- Conhecem o farol de Nahos? - E o grupo ficou meio

reticente.

- Eu conheço. - Afirmou Toko - É conhecido como o ponto

mais oriental do continente, pelo menos do norte, e fica num

cabo onde muitas caravelas e galés naufragam.

- Interessante - Comentou Tiravéditos - E eles encontram-se

nesse farol?

- Não sabemos. - Respondeu Gabriel. - Por isso é que vamos lá

investigar.

- Porque não agora? - Sugeriu Shaman, danado como era.

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- Vamos! - Responderam quase todos, enquanto já desciam dos

seus pódios.

- Ide buscar os cavalos. - Ordenou Afonso. Assim que estavam

todos prontos, começaram a cavalgada, rumo a sudeste, tendo

em conta que o local não se encontrava muito longe do seu

esconderijo. Seria a primeira missão que fariam todos juntos, e

surpreendentemente, apesar de todos conseguirem manejar a

espada com perícia, cada um tinha uma especialidade bélica

diferente: Tiravéditos, o especialista do arco e flecha; Valmir, o

homem da besta; Stressor, o mestre da falcione; Afonso,

utilizador da picareta pesada; Sec, com a sua espada longa;

Shaman, e a espada de duas lâminas; Gabriel, o experiente do

maço em estrela; Kanarinho, empregador do martelo leve; Toko,

com o seu maço pesado; Marcelo e a sua foice longa; Bruno

Santos, mestre do mangual atroz e Bruno Maro, especialista

do mangual pesado. Cavalgavam todos com a sua pesada

armadura negra, com capacete que incluía chifres, e todos os

seus cavalos eram negros, inclusive Alívion, o de Sec. Até ao

local foram com as suas duplas, tendo em conta que se tratava

de quem se davam melhor lá dentro, e rapidamente atingiram a

zona do farol, guiados por Toko. Tratava-se de uma zona árida,

com enormes penhascos que furavam o oceano, e não havia

qualquer sinal de vegetação, era uma espécie de tundra, mas mais

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árida. Ao fundo, num compridíssimo cabo que rompia o mar

avistava-se um enorme farol, de base circular e revestido com

tijolos. A sua luz ainda não se havia aceso, tendo em

consideração que era o início da tarde, apesar de o tempo estar

meio agreste e não se avistar o sol. Pararam para uma pausa,

estavam com fome. Tiravéditos e Valmir trataram de apanhar

umas gaivotas e uns coelhos bravos para comerem, e não

demoraram muito a apanhá-los. Reuniram-se em volta de uma

fogueira que fizeram e logo começaram a assar os animais,

depois de tratados. Comiam tranquilamente, com o som do mar

de fundo.

- Kanarinho! - Berrou Afonso, mas já era tarde. Uma seta

atravessara a cabeça do companheiro, de ponta a ponta, que

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caíra imóvel para a frente, jorrando imenso sangue. Num

movimento só, colocaram todos os capacetes e armaram-se. Não

viam ninguém em redor, o que se tornava amedrontador. Ficaram

os 11, costas com costas, com o olhar semicerrado, em busca de

algo que se movesse, até que cerca de 200 homens, vindos de

todas as direções os foram cercando. Ninguém se atacou, e

Coraggio, o mago dos cabelos negros e pele pálida se chegou à

frente:

- Se optarem pelo combate duvido que saiam de cá com vida,

então vamos lá acalmar. A cabeça do vosso amigo Kanarinho

pela vossa liberdade. – E Afonso, a roçar os dentes,

respondera em seco:

- Para que queres a cabeça?

- O que é que te parece, Afonso? - Questionava ironicamente

uma mulher, loira, mas de tom de pele mais escuro, que se tratava

de Barta. - Recompensa, claro.

- E podemos saber o preço e o comprador? - Respondera

Gabriel.

- Como é óbvio não vamos revelar essas informações, agora vão-

se embora! - Ordenou Coraggio. E devagarinho se dirigiram

aos seus cavalos e abandonaram o local, retornando ao

esconderijo.

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- Well? Que estás aqui a fazer? - Reconheceu Sec.

- Sec! Estava mesmo à tua procura. - E deram um abraço.

- Então, o que te trás por cá?

- A feira, mas também vim visitar-te para saber como estão as

coisas.

- Está tudo bem por aqui, o Rei não é mais o meu pai e sim o meu

tio Gabriel.

- Gabriel?

- Sim. O que tem? – Questionara o príncipe.

- O cavaleiro negro?

- Precisamente esse.

- Enfim, não sei o que tinha o teu pai na cabeça, ele já atacou

Rucrúcio mais do que uma vez.

- A sério? - Fez-se desentendido Sec.

- Sim, e pelos relatos é um dos assassinos com mais sangue frio

que alguma vez se conheceu, diz-se que dizima aldeias e vilas

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inteiras sem deixar uma alma viva, incluindo o gado!

- Tinha uma leve ideia de que ele era assim. Mas enfim, ouvi dizer

que te tinhas tornado Rei, é verdade?

- Bem, mais ou menos, ainda estamos num processo de

transição, mas ao que tudo indica sim.

- Não queres vir à taberna para bebermos um copo? –

Convidara Sec.

- Claro, vamos lá. – E depressa lá chegaram, e avistaram Vitor

numa mesa com alguém que desconheciam e foram lá

cumprimentá-lo:

- Então Vítor! - E apertaram as mãos.

- Tranquilo Sec?

- Tranquilo, este é o Well, de Rucrúcio.

- Boas. – E cumprimentaram-se.

- E este é o Jony Allan. Não o conheceste já Sec?

- Ah! – Lembrou-se o jovem. – Já me recordo, não te via desde

criança! – E apertaram as mãos.

- Sentem-se aí, não vão ficar em pé, não é?! – Sugerira o filho

de Lucka. E sentaram-se a conversar:

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- Podia muito bem habituar-me a este clima. – Comentara Well,

cheio de calor, enquanto afagava a roupa.

- Deve estar frio lá para cima, não? – Perguntara Jony.

- É bastante…

- E tu Jony, que tens feito estes anos todos? – Questionara

Sec, curioso.

- Bem, eu estive a prestar serviços na Alfária e raramente

permitiam a minha saída, mas gosto bastante de lá estar. Desta

vez optei por vir cá, tive algum tempo livre e vim falar com o Vítor

sobre um projeto que temos há muito tempo.

- Que projeto? – Perguntou o príncipe Recéciano.

- Ainda não te disse Sec? – Respondera o seu primo. – É o

nosso sonho de criar um reino nosso, meu e do Jony.

- Fala mais baixo primo, não te esqueças de onde estamos.

- Certo, certo.

- E por aqui, como têm andado as coisas? – Perguntara o

Alfário, e fora Sec a responder:

- Está mais tranquilo, já passaram alguns meses desde o ataque

do Skaars à capital, e felizmente o nosso tio conseguiu matá-lo

nesse dia ainda.

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- Sabes primo, eu na verdade acho que foi o nosso tio que

elaborou tudo isto para se tornar Rei.

- Tens noção do que estás a insinuar Vítor? É uma acusação

muito grave... – Comentara o primo.

- Eu sei, fala baixo! – Suspirou. – São só suspeitas.

- O que é isto?! – Surpreenderam-se ao ouvirem um rugido da

multidão, e levantaram-se os 4 de imediato para verem o ocorrido

a partir de uma das janelas da taberna, onde também se juntaram

vários indivíduos. O queixo de Sec caiu quando viu o seu pai no

seu vigoroso cavalo branco, com o seu cabelo loiro ao vento e a

sua barba que cobria apenas o bigode e o queixo. Vestia o seu

traje militar vermelho com botões em ouro por toda a vestimenta.

Cavalgava devagar e a multidão aplaudia-o fervorosamente,

estrangeiros inclusive. Mas Maycon mantinha-se estático em

cima do seu cavalo, com o seu olhar centrado em frente apenas.

E ficaram a observar o seu curso, comentando Vítor com Sec:

- Achas que ele veio cá tirar o tio Gabriel do poder?

- Não sei... E se eles lutarem?

- Isso ia ser péssimo, teríamos de escolher um lado. – E fez uma

pausa. – Que lado escolherias Sec?

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- Gabriel! - Gritara Maycon ao entrar no palácio, mas não

obteve resposta. Aguardara mais um pouco até chamá-lo

novamente. E desta vez o seu irmão aparecera, vindo de cima,

dos quartos, também ele com um traje parecido ao do irmão, mas

negro, e estava pálido como sempre, com o seu cabelo curto e

negro, complementado por uns olhos negros e profundos.

- O que te traz aqui irmão? Vieste tirar-me do trono? – E soltou

uma gargalhada irónica enquanto se mantinha imóvel no topo da

escadaria principal, de frente para Maycon, que lhe respondeu:

- Tudo o que tens feito é errado, sabes?

- Tu não...

- Não não, espera – Interrompeu-o o antigo Rei. - Eu acho que

tu mesmo sabes o que tens feito de errado, mas a tua ambição e

egoísmo continuam a levar-te para a frente, não é?

- Tu nunca vais perceber, tu simplesmente ages pelo que achas

correto aos teus olhos, e qualquer outro que não veja o mundo

dessa forma, tu descartas. No fundo és tal como eu. – E

Maycon cerrou os dentes:

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- O que é que tu pretendes atingir, Gabriel? Qual é o teu fim?

- Tu? Tu a quereres saber de alguma coisa além dos teus

interesses? Irmão... – E riu-se como um louco o rei.

- Deixa-te de rodeios e responde-me!

- A minha finalidade é a criação de um novo mundo, em que as

pessoas não tenham de lutar umas com as outras para

defenderem a sua felicidade.

- Que utópico, nem parece teu. Mas enfim, só estou de

passagem, voltarei nos próximos dias para termos uma conversa

séria. E dirigiu-se à campa de Naila para lá colocar uma flor

antes de partir e sair da cidade. Gabriel dirigiu-se à varanda de

cima, enraivecido e a chutar tudo o que lhe aparecia à frente.

Até Yann, que não sabia do que se tinha passado fora pedir ao

tio para se acalmar e fora recebido com um estalo, que o

derrubou. Já na varanda, o soberano observava Maycon a

partir, enquanto uma multidão gritava pelo seu nome:

- Porque é que eles gostam dele e não de mim? Faço tudo para

proteger esta gente! Que ingratos...

- Quer uma resposta tio? – Perguntara Yann enquanto se

levantava do chão.

- O que é que tu sabes? Não passas de um pirralho.

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- Realmente, eu não posso saber de nada, mais sei que há bons

fins revestidos de más intenções e maus fins cobertos de boas

intenções. E sei também que tudo o que toda a gente quer

acaba por ser a sua felicidade e um bem comum. As pessoas não

gostam de quem justifica os fins pelos meios, e eu também não.

Se queremos realmente combater o mal do mundo não podemos

sujar as nossas mãos com um mal maior porque só somos capazes

de mudar a nossa realidade quando os outros nos reconhecem

como capazes dessa mudança. – Sec, que tinha chegado ao

palácio à pouco, ouvira esta resposta de Yann e ficara

boquiaberto, assim como Gabriel, que não quis responder e

voltou para o seu escritório. Sec juntou-se ao irmão na varanda:

- Yann.

- Sim? – Respondeu, enquanto se debruçavam ambos sobre o

parapeito.

- Um dia seremos nós os dois a mudar o mundo, ou pelo menos

o reino. – E Yann mirava o irmão, que sorria com confiança.

- Espero que sim... Se o teu sonho for ser Rei, vou apoiar-te

sempre mano.

- Prometes?

- Claro! Porque é que não te apoiaria?

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- Não sei... E sorriram ambos um para outro antes de ser

retirarem. – Eram de facto príncipes, mas o trono de Recécio

não funcionava daquela forma, então tudo era possível. Sec

deitava na sua cama a pensar. Tinha tanto com o que se pudesse

preocupar, mas só Diana lhe passava pela mente, e soltou um

grande berro em desespero.

Enquanto isso, Gabriel esmurrava a mesa do seu

gabinete, enraivecido, até que o Vice-Rei entrou para o tentar

acalmar:

- Tem calma Gabriel, o que se passou?

- Igor, eu estou fartinho disto. Vou fazer algumas limpezas.

- O que queres dizer com isso?

- Depois verás. Enfim. – E sentou-se enquanto suspirava. –

Igor...

- Sim majestade?

- O hoje já foi o amanhã e um dia será o ontem. O tempo passa,

pessoas vão e vêm, tudo neste ciclo sem sentido que é a vida, por

isso, quem tem o direito de julgar e quem tem o direito de definir

o que é a justiça? Justiça é apenas vingança, uma vingança

conduzida de uma forma que todos achem bem, é o que eles

dizem. Caos antes da ordem, destruição antes de criação, vida

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antes da morte, e todos nos tornamos cinzas no final. Esta é a

verdade de um mundo onde os fortes devoram os fracos,

escondidos nas sombras; onde os heróis são os vilões do outro

lado; onde a ausência de resposta é um ‘’sim’’; e onde a verdade

é o que fazemos dela. – E o Vice-Rei sorriu-lhe. – Por isso vou

quebrar este ciclo, custe o que custar, e ninguém me vai impedir.

Quero que declares a exoneração do Vítor deste reino

imediatamente.

- Do Vítor? Mas ele é da família real e isso traria problemas,

não?

- É uma ordem, Igor. Carrega-a imediatamente, vai!

- Posso pelo menos perguntar o porquê de uma ordem destas?

- Ele soube de algo que não era suposto ter sabido. Informa os

guardas o mais rápido possível! - E o Vice-Rei saiu a correr para

informar os guardas que estavam com o seu turno no ativo.

Cerca de meia hora mais tarde, quatro guardas entraram no

palácio, com Vitor amarrado tanto nos braços como nas pernas,

por correntes de ferro, e atiraram-no para o chão, junto dos pés

do Rei, que soltou uma infinita gargalhada enquanto o mirava:

- Vejam só se não é o espertinho da família real. - E Vitor, que

não tinha mordaças a cobrirem-lhe a boca, começara aos berros:

- És um cobarde, não és o meu Rei! Nunca o serás, nem para

mim nem para o povo destas terras! O meu pai voltará e matar-

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te-á!

- Coloquem-lhe uma mordaça imediatamente! Estou cheio de

ouvi-lo defecar pela boca. - E assim os guardas o fizeram, apesar

de Vitor oferecer resistência. Levaram-no o mais longe possível

da cidade, pelo portão norte. Certificaram-se que não estavam

a ser seguidos por várias vezes durante o seu percurso de meia

hora pela floresta adentro. Até que chegaram a um local que

consideraram o mais resguardado e escondido. Dois dos

guardas começaram a cavar um enorme buraco na terra, até

aproximadamente um metro de profundidade. Atiraram então

Vitor para lá, que não ousou dar mais luta, e que para si mesmo

refletia:

- O meu corpo chegou ao limite.... Estou cheio de sede e sem

armas, além de ninguém saber que fui levado. Merda! Eu não

posso morrer assim... Mãe... Eu sei que morreste ao dar-me à luz.

Desculpa-me por não ter vivido às expectativas. E pai, por favor

vinga-me. Desculpa-me por tudo... - E começara a rezar

baixinho, até ser surpreendido pelos gritos de dor por parte dos

guardas, os quais não se ouviram mais. Um ligeiro alívio lhe

passou pela cabeça, mas ainda temia o pior. Quem mais ali

estaria? Sentiu alguém tocá-lo e tirar-lhe as correntes que o

prendiam. Quando Vitor foi retirar a venda, viu uma figura

vestida de preto, em trajes nobres, algo que só havia visto ser

usado pelo seu tio Gabriel. A figura usava um capuz bastante

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largo e uma máscara negra metálica, na qual se via apenas os

olhos que, pelo facto de o sol se estar a pôr no lado oposto, fazia

refletir uns terríficos olhos encarnados, num tom de vermelho

vivo. Vitor, que não tinha nada a perder, perguntou-lhe logo o

porquê de lhe ter salvo, pergunta à qual a figura lhe respondeu,

com uma voz algo distorcida, porém algo familiar:

- Tenho um réquiem a ser cumprido, mais tarde ou mais cedo.

- Um réquiem? - Vitor continuou a achar a voz algo familiar. - E

quem está por trás dessa máscara? Ou não me vais dizer?

- Perguntas demasiado, jovem Vitor, e são aqueles que

encontram respostas que dominam o mundo, já o devias saber.

- Mas quem és tu afinal e porque é que me salvaste?

- Eu não sou ninguém, e não tenciono a ser alguém. Até à hora

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do retorno, serei eu Abaddon, aquele que vos matará a todos.

- Abaddon? - Mas o homem começara a correr e desaparecera

floresta adentro, sem deixar rasto. Vitor levantara-se e saíra da

vala com bastante dificuldade, quando ouvira os passos de

alguém. Quando se recompôs e olhou, tratava-se de Jony:

- Vitor, não cheguei atrasado pois não... - E ofegante,

surpreendera-se com a visão dos quatro guardas que haviam

sido brutalmente assassinados. A traqueia havia lhes sido

arrancada do corpo, e um deles tinha o seu próprio coração nos

lábios.

- V... Vitor? Que chacina…. Foste tu que fizeste isto? Não me

digas…

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- Não, foi tudo muito estranho. Não fui eu, mas também fiquei

chocado.

- O quero diabos se passou aqui? Meu Deus…

- Eu não vi a luta, mas quem os matou e me soltou era um homem

com uma máscara negra e com olhos de fogo radiantes.

- Estou em choque. Como é que uma pessoa é capaz disso?

- Não faço a mínima ideia, nem sei quem era, mas salvou-me a vida.

Ele disse algo sobre ter de cumprir um réquiem. Sabes algo

sobre isto? Digo, sobre o sentido da palavra em si.

- Acho que tem qualquer coisa a ver com descanso... Algo similar

aos cultos religiosos, não sei bem... Mas para onde é que ele foi?

- Não sei. Começou a simplesmente correr para dentro da

floresta...

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Capítulo V

Bondade pela Maldade?

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Já quase de madrugada, Gabriel mandara chamar Sec à

varanda do andar de cima, como de costume. Ambos olharam

para as estrelas, e o Rei, sem mais demoras, quebrou o silêncio:

- Sabes, Sec, és o filho que nunca tive. Por isso quero que sejas

o primeiro e único a saber disto que te contarei. - Sec engolia

em seco, afinal, Gabriel não costumava dividir informações. Não

sem ao menos o preço de algumas vidas, o que era normal.

- Sim, tio… Não tenho a certeza se serei digno de o saber.

- Claro que és, sempre o foste, mas sabes o porquê de eu ser

assim?

- Assim como? – Fez-se desentendido o príncipe, que não quis

perturbar.

- Cruel, sem escrúpulos, malévolo, tudo o que possas imaginar...

- Porquê tio? Sempre tentei evitar questionar-me sobre isso.

- Vou contar-te uma história e o que me levou a agir desta forma.

Depois do teu pai assumir o trono, fiz uma viagem pelo mundo e

alguns até me deram por desaparecido. Realmente desapareci a

certo ponto, e entrei numa gruta que se estendia por vários

quilómetros. Um velho já ali estava à minha espera. Neste

instante não me lembro mais de nada, e acordei num pequeno

compartimento de pedra escura, acorrentado ao chão pelos

braços e pelas pernas. Tentei escapar, mas tornou-se algo

impossível. Estava mesmo tudo muito bem preso. Até que uma

mulher me veio trazer água e comida, e conversamos muito,

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durante vários dias e semanas. Mas havia um tema que a

atormentava acima de qualquer outro, o que estranhei.

- Qual? - Perguntou Sec, extremamente curioso sobre que tema

seria.

- Amor e ódio, as suas relações e disparidades.

- Mas em que é que amor e ódio se relacionam com ela?

- Já vais perceber. Ela falava muito sobre isso e perguntava-se

de onde era originário todo o ódio que as pessoas sentiam umas

pelas outras. E eu também não soube responder. Ficamos assim

durante longas semanas… Mas um dia ela transformou-se por

completo. Começou a torturar-me, tanto fisicamente como

psicologicamente e não respondia a nenhuma pergunta que eu

lhe fazia. Eu não conseguia perceber. Berrava-lhe tudo o que

podia para a tentar “acordar”, mas nada resultava. Desesperei

todos os dias durante semanas e semanas incessantes. Até que

um dia ela chegou ao meu pé para me torturar novamente e eu já

ficava cego de ódio, chamava-lhe de todos os nomes que me

podia lembrar, mas em vez de me torturar, agarrou numa faca e

matou-se, ali, mesmo à minha frente. Não pude acreditar, mas de

repente senti-me bem. Senti-me melhor, muito melhor. Todo

aquele ódio que me consumia, desaparecera. Subitamente a

morte dela fez-me bem. E então finalmente eu percebi...

- Percebeu o quê, tio? Diga lá, quero saber!

- Consegui chegar à resposta do paradoxo da mulher. - E

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olhara fixamente para as estrelas. - Odiamos porque gostamos

e amamos. Tudo o que chamamos de ódio, um dia fora amor. É

a perda, ou transformação desse amor, que cria todo o ódio do

mundo, e que poderá ser passado com muito mais facilidade do

que o amor às futuras gerações. Só quando as pessoas que

iniciaram esse ódio morrerem, o ciclo de raiva e vingança terá um

fim. É precisamente por esgotarmos tanto ódio numa só pessoa,

que acabamos por perdê-lo por completo. Por isso é que criei os

cavaleiros negros em primeiro lugar, nós somos aqueles que

espalham o medo pelo mundo, e que toda a gente odeia e quer

assassinar. Tentei fazê-lo enquanto Rei de Recécio, fui muito

cruel para a população e deixei-os numa ditadura extrema, mas

agora chegou a minha hora de tornar este reino livre de ódio. - E

num só movimento, desembainhou a espada e cravou-a no

abdómen.

- Tio! Não! - Mas o pior já estava a acontecer. Gabriel,

enquanto jorrava sangue pela boca, disse aos ouvidos do

sobrinho, que não conseguia parar de chorar com aquilo:

- Vai, Sec, anuncia a minha morte pela cidade. E quando o teu

pai voltar, ele será o herói de Recécio. E por fim estas terras

poderão viver em paz para sempre. Vai! - E o sobrinho, em

lágrimas, correu pela colina até à praça principal, onde fez ecoar

um berro tão alto, que todos os que ali viviam puderam ouvir:

- O Rei está morto! - E caiu no chão em choro, enquanto a

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notícia se espalhava. E de pouco em pouco, todos os cidadãos

saíram das suas casas, e festejos celebrativos começaram a

tomar lugar. Os nobres e a corte juntaram-se a Sec, e reuniram-

se no salão de jantar do palácio logo em seguida, pois sabiam

que alguém teria de reinar provisoriamente. Assim que todos os

nobres se encontravam presentes, Igor Lima, o Vice-Rei ainda

em atividade, deu início à reunião extraordinária que decidiria o

futuro:

- O Rei Gabriel está morto. - Mas ninguém se manifestou, nem

positiva, nem negativamente. - Sabemos que o Rei Gaar

eventualmente retornará assim que souber desta notícia. No

entanto, precisamos de uma administração provisória.

- Mas Igor, há um problema. - Comentou Ricox. – Tanto tu

como nós sabemos como o Maycon é. Se ele cá chegar e vir

alguém que não foi aclamado por ele como Rei, gerará o caos

entre a nobreza. Com certeza haverá uma guerra civil.

- Eu já ia tocar nesse ponto, Ricox. O Maycon odeia que se

façam as coisas sem o seu consentimento, no entanto não temos

notícias do período em que estará ausente e, com isso, a falta de

uma administração causará uma anarquia e o caos será maior

ainda. Por isso pergunto-vos... Quem deseja fazer parte da

administração até o Maycon voltar? – Mas ninguém se

manifestou, e o ambiente no salão tornou-se pesado. Foram

surpresos por passos, que provinham do corredor para lá da

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porta. Tratava-se de Sochoski e Izaac, e um burburinho geral

instalou-se, que Sochoski quebrou:

- Nós assumimos esse papel, Igor. – E todos os presentes se

calaram, ao olhar para o Vice-Rei, no aguardo de uma resposta.

Igor Lima permanecera um pouco a pensar, até decidir quebrar

o silêncio:

- Bem…. Vocês têm sangue real, por mim tudo bem. – E os

nobres consentiram. Então o Vice-Rei perguntara – E quem de

vós será o Rei e o Vice-Rei, respetivamente?

- Eu serei o Vice. – Respondeu Izaac assertivamente.

- Espero que compreendam que não poderei conceder-vos os

objetos reais sem a ordem do Maycon…. Então, eu, Igor-Lima,

Vice-Rei de Recécio, nomeio-vos Rei e Vice-Rei provisórios de

Recécio, sem cerimónias porque não estamos em situação para

isso. Agora vão, meus nobres, e tranquilizai a população, eu

passarei a mensagem às outras cidades. – E com isto saíram

todos a correr, rumo à praça principal, onde os guardas tentavam

conter a população. Pediram silêncio e a população conteve-se,

sendo Ricox, que por sinal era muito amado, a proferir as

primeiras palavras ao público:

- Povo de Recécio! É com muito orgulho que anuncio os novos

Rei e Vice-Rei de Recécio, Sochoski e Izaac, filhos de Andrey!

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– E receberam um forte aplauso por parte de centenas de

habitantes ali presentes.

Igor permanecera no palácio, e foi surpreendido por Yann,

que procurava algo:

- O que procuras?

- Onde é que meteram o corpo do tio Gabriel?

- Do Rei?

- Sim, do antigo Rei.

- Suponho que ainda esteja na varanda, ninguém lá foi ainda.

- Não está não. Acabei de ir lá e está apenas uma poça de

sangue, contudo o corpo desapareceu sem deixar rasto.

- Estás a falar a sério Yann?!

- Claro que estou!

- Vamos lá! – E partiram a correr para a varanda, para lá não

encontrarem nada. Apenas restava uma poça sanguínea que

não deixava qualquer rasto para ser analisado. – Meu Deus, o

que é que aconteceu ao corpo?! Como é que desaparece assim?

Viste se estava mais alguém neste andar por aquela altura? –

Questionou Igor Lima.

- Eu acho que não, eu passei por aqui e não ouvi nem vi ninguém.

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- Tens a certeza?

- Tenho.

- Esquece isso, talvez tenha sido melhor assim.

Diana,

Está tudo estranho. Há alguns anos atrás nada disto era assim,

eu costumava ser uma pessoa paciente; alguém que demorava o

seu tempo a observar, considerar e resolver tudo. Costumava

achar que não havia nada por que desesperar, e tudo

eventualmente iria ao seu lugar. Sempre que precisava de

descarregar só precisava de uma espada, e treinava sozinho

durante horas. Sentia-me melhor, estava calado e não magoava

ninguém. Uma promessa que fazia sempre a mim mesmo, apesar

do que me diziam vezes e vezes sem conta, era que nunca iria

deixar que o mundo levasse a melhor sobre mim. Prometi que não

iria ser mais uma criatura atormentada por decisões imprudentes,

e que iria chegar a algum lado mantendo-me a pessoa correta

que sempre me julguei ser. O mundo chamava, e eu insistia,

insistia em recusar perder tempo com algo que não me fizesse

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suscitar um sentimento de significância. Recordo-me de todos à

minha volta se envolverem em situações que eu achava ridículas e

desnecessárias, que claramente dariam algo errado, mas eu,

ironicamente e da minha própria maneira, isolei-me também

noutro tipo de ‘’errado’’. Eu costumava acreditar legitimamente

que um dia algo chegaria, e o meu ponto de vista sobre o mundo

se tornaria mais claro. Inicialmente sempre quis agradar, embora

algo em mim me dissesse que não deveria fazê-lo a quem quer que

fosse. Diziam-me que para eu ser significante teria de combinar

em mim todas aquelas qualidades típicas: boa personalidade,

boas maneiras, humor, beleza, ter um estado de espírito

qualquer, algo puro, acima de trivialidades. Enfim, algo maior,

para que eu legitimamente pudesse ter valor, e tentei durante

anos e anos, nunca pensando conseguir suceder ou não ser o

suficiente. Quando pensei que tudo estivesse a ir a um bom

termo, algo em mim mudou. Toda aquela imagem que diziam

significar algo e ser de valor, ninguém a via em mim, e senti uma

vontade desesperante de virar tudo ao contrário, e pensei que

iria resultar, no entanto, inicialmente, foi tudo superficial. Sentia

constantemente que o mundo me forçava a deixar a pessoa que

eu era e que idealizava ser, porque as pessoas continuavam a

recusar, e sempre pensei que algum dia, de alguma forma, eu

conseguiria justamente as coisas boas da vida e que tudo ficaria

bem, mas tudo ficou mais confuso, e continuei a resistir. Quanto

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mais resistia, pior ficava, até ao dia em que me apercebi que

talvez tudo isso pudesse ser evitado se eu simplesmente não me

contivesse mais e se parasse de tentar fazer tudo bem, porque

claramente o mundo continuaria a girar se não o fizesse. Depois

de me saturar disso comecei a ter a sensação de que a relva era

mais verde do outro lado e que se por uma vez eu fosse então

egoísta, considerasse menos e pensasse mais em mim,

complementaria a mim mesmo. E as coisas tornaram-se

obviamente visíveis para todos aqueles que me rodeavam, diziam:

- Pareces mil pessoas diferentes. Fartas-te de tudo e de todos.

Eu não te conheço. Eu conhecia um rapaz chamado Sec, que

era tímido, simples e altruísta, e tu mudaste tanto... Porque te

escondes atrás de tudo isso? Porquê essas futilidades? És

cruel, perdes tempo no desnecessário e não conheço mais

ninguém como tu. Sabes sequer o que hás de fazer da tua vida?

Enfim, ninguém te aguentará durante muito mais tempo, as tuas

palavras são como facas. – E permaneci perante isto, confuso.

Durante toda a minha vida me pediram, e tudo aconteceu para

que deixasse de me preocupar com tudo; para que “não

respondesse às coisas com a pureza de uma criança’’, para que

eu fosse esperto. Sentia agora evidentemente o orgulho em

poder desfazer agora qualquer incómodo que se me

atravessasse meu caminho como modo de vingança por tudo o

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que vi anteriormente. Talvez tudo assim fosse mais simples,

talvez tudo fosse ao seu

devido lugar, mas tenho

vindo a perder-me

demasiado em algo que

jurei nunca me tornar,

embora tivesse a sensação

que seria algum dia. É algo

que me parece mal, mas

não deixa estranhamente

de me atrair.

Recentemente tive a

impressão de que algo

estava acabado, mas isso

torna a voltar, e torna a

voltar para que eu

reconsidere mais uma vez,

e assim tem vindo a ser.

Talvez o meu desafio não

fosse finalmente deixar

que meus supostos ideais

fossem corrompidos por

causa exteriores a fim de

que não me chateasse mais, mas sim, manter-me a pessoa que

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sempre jure ser, mesmo depois de tudo. Não mentirei, tenho

medo. Sou de fato a pessoa que conheceste no início, sou-me

mesma a criatura desprezível na qual me tornei e com a qual te

deparas hoje. Inicialmente não parecia que tivesse muito que

saber: Chegar ao teu pé, encontrar coisas em comum, fazer-te

sentir que estávamos em sintonia e eventualmente, pelo menos

na minha cabeça, acabarmos juntos. Parecia simples, controlado

e seguro. Não era louco, não era algo capaz de me descontrolar,

de me fazer perder o sono, de me desesperar e sinceramente,

não era nada que juntasse duas almas numa. Não tinha de facto

más intenções, apenas quis equilíbrio por uma só vez em que não

houvesse hipótese de correr tão mal quanto tudo antes correra.

E tal como eu pensava, ‘’não tinha nada que saber’’, porque eu

podia ver ligeiramente que resultava, e gostava. Isto podia ter

sido então aquela vez em que eu digo que justamente consegui

aquilo que quis tanto. Só que nesta frase, o ‘’eu’’ já tinha sido

substituído há muito, e como e óbvio, não poderia então ter sido

perfeito, porque eu já não aspirava ser uma pessoa

completamente correta. Eventualmente, por já não ter tanta

consciência do certo e do errado, e de já mal sentir o que

originalmente dói a alguém, e fiz algumas das piores coisas que

podia ter feito, à única pessoa que nada me fez se não bem. E

mais uma vez, ironicamente, tudo teve precisamente de acontecer

quando eu comecei a perceber que talvez valesse a pena não ter

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controle. Que talvez os dias fossem mais alegres a partir do

momento em que chegavas ao meu pé; das conversas que me

permitiam saber como vias o mundo; das tuas expressões que

aos poucos aprendia decifrar; e dos teus momentos engraçados.

Das pequenas coisas que dizias que me faziam sentir bem, desde

simples elogios, até pequenas vírgulas que me indicavam que te

importavas; destes meus infinitos parágrafos que lias com

atenção apesar de ninguém mais os suportar, e a lista podia

continuar durante dias e dias. Tive alguns momentos felizes na

minha vida e todos eles são classicamente seguidos de má sorte,

imprudência, seja o que for. Mas posso com toda a certeza e

sinceridade dizer que estes momentos foram os que me fizeram

sentir mais real, sem medo de cair e em casa. Disseste-me coisas

um tempo depois que não gosto, mas sei que mereço tudo isso.

Fui eu que acabei por ceder à tentação de me transformar no

que sou neste preciso momento, e apesar da fonte de tudo o que

fiz ter sido o medo da dependência e de voltar ao mesmo, isso

não pode continuar a justificar as minhas ações perante o resto

das pessoas, especialmente das que são tão importantes para

mim. Talvez me tenhas de facto amado e talvez nunca venhas a

acreditar que te amo tanto como comecei por dizer. Talvez

nunca tenhas gostado de mim e tenhas tido a santa paciência de

me tentar ajudar, e claro que não era uma obrigação tua. Talvez

eu tenha de facto destruído brutalmente a única coisa que me

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podia ter feito feliz. Mas se esse continuará a ser o caso, só te

quero agradecer a ti por tudo o que fizeste, porque de facto

tenha vindo a acordar. Não me fosse continuar a esconder, nem

a temer, nem a regredir. Talvez inevitavelmente te perca em

todos os parâmetros e como muita pena minha. No entanto

nunca me arrependerei de ter-te conhecido e do que

diretamente ou indiretamente me tens vindo a ensinar. Só quero

que saibas que me arrependo do fundo do meu ser pelo que te

fiz; que te amo; que estarei sempre aqui se precisares de mim, e

que independentemente se ficares ou não, agradeço a tua

presença e existência perto de mim, vou tentar ser uma pessoa

melhor.

Do sempre teu Secódio.

Uma lagrima caíra pelo rosto do príncipe, que escrevia a carta

enquanto na varanda do palácio sozinho de madrugada. Apenas

se ouviam os grilos ao redor do palácio, e nada o podia consolar

naquele momento. Enquanto choramingava sozinho, um

pirilampo esvoaçava à sua frente, e seguira-o com o olhar. Será

que haveria uma luz ao fundo do túnel? Continuou a segui-lo, até

que esvoaçou para trás deste, pousando sobre a mão de Yann,

que veio ver se o irmão estava bem, e um pesado silencio se fez,

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virando-se Sec para o céu, sendo acompanhado pelo irmão no

varandim:

- Está um céu bonito hoje, não está Sec? – Mas o irmão não

conseguiu responder, prosseguindo Yann – Já pensaste de

onde viemos nós? Enfim, vou deixar-te sozinho. – E abandonara

o local, deixando-o lá sozinho.

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Capítulo VI

O Passado dos Cavaleiros Negros e o

Retorno de Abaddon

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- Onde é que será o nosso rendez-vous? – Questionou Bruno

Santos.

- Junto ao esconderijo do rio maior. – Respondera-lhe o

parceiro Bruno Maro.

- Deixa-me recapitular, dois dos nobres deles vêm espiar-nos

junto à falésia do rio e apanhamo-lo lá?

- Sim, exato, mas temos de evitar sermos separados, é isso que

eles vão querer se os confrontarmos diretamente.

- Concordo, temos de ter em mente que devem saber manejar

bem as suas armas, mas diz-me uma coisa, as informações do dia

estão corretas?

- Julgo que sim. – Respondeu o amigo Maro. – A fonte é

fidedigna, resta-nos aguardar aqui.

Cerca de duas horas mais tarde avistaram finalmente

alguém, que neste caso era mesmo Izaac e Morosini, que

caminhavam junto ao rio, sempre em alerta. Pareciam

amedrontados, o que era normal dada a situação em que se

encontravam.

- Não seria melhor os matarmos já? – Questionou Maro, sempre

impaciente.

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- Não, isso daria a conhecer a nossa posição, e a nossa

habilidade com arcos não é de todo a melhor.

- Certo, vamos deixá-los encontrarem o esconderijo e

surpreendemo-los lá. – Lá em baixo, os dois nobres caminhavam

lentamente, sempre a olharem pelo ombro um do outro, quase

como se soubessem que estavam a ser observados.

- Morosini?

- Diz-me.

- Tens a certeza de que estamos no sítio certo?

- Eu julgo que sim… - Respondeu, meio reticente, em dúvida. –

E após mais alguns metros conseguiram avistar uma enorme

entrada para uma caverna que se sobressaía na escarpa da

montanha, e aproximaram-se. Conseguiram determinar que esta

era enorme pela iluminação que provinha da gigantesca entrada.

Decidiram avançar lá para dentro, um de cada lado e sempre com

a espada em riste caso alguém aparecesse, mas não demoraram

a perceber que o local se encontrava vazio. Qualquer ruído era

o suficiente para os assustar, até de pequenos animais que na

gruta procuravam refúgio. Exploraram o local, que não continha

quaisquer vestígios de ocupação humana, o que os tranquilizou

de certa forma, até ouvirem passos pesados na entrada, e logo

Izaac berrou:

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- Quem é?! – Mas não obteve qualquer resposta por parte dos

cavaleiros negros, que impuseram os seus manguais com força no

chão. O de Santos era um atroz, com uma estrela em ambas as

pontas, e o de Maro, pesado, com uma grande estrela na ponta.

Estavam dois para dois, por isso tentariam os recécianos

separá-los, ficando Morosini atrás e Izaac à frente destes. Os

cavaleiros negros posicionaram-se costas com costas, e Santos

começou a balançar a sua arma, de modo a ganhar velocidade

nas estrelas, e subitamente lançou uma destas, que se estendia

a partir do corpo principal da arma. O vice-rei fora surpreendido

e defendera-se com o seu escudo, que se soltara das mãos

devido à intensidade do impacto, e correra para o recuperar

enquanto o cavaleiro negro continuava a balançar a arma

continuamente. Foi apenas uma investida e já receavam o pior,

eram adversários de um calibre que nunca haviam enfrentado,

além de não estarem habituados a lidar com este tipo de arma.

Morosini roeu-se de raiva e lançou-se ferozmente ao ataque,

sendo de imediato o seu golpe bloqueado por Maro, que

apenas precisou de utilizar o núcleo da arma, forçando o

recéciano a recuar taticamente.

- Quando for a nossa vez de vos atacarmos vocês não vão

sequer respirar, por isso aproveitem agora para brincarmos um

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pouco. – Provocou depois de bloquear o golpe o cavaleiro

negro.

- E aproveito. – Respondeu uma voz retorcida vinda de um

homem com vestes negras e uma máscara, que se encontrava na

entrada, tratando-se de Abaddon.

- E quem serias tu, amigo? – Perguntou Maro, num tom de ironia

aparente, e tirou o capacete. – Que calor dos diabos que isto

faz na cabeça. – Mas não contava com um ataque naquele

momento, e Izaac espetou-lhe com uma seta na parte de trás da

cabeça, que o fez cair imóvel no chão de imediato.

- Maro! – Berrou Santos, nervoso, e não perdeu tempo.

Sabendo da sua desvantagem numérica clara correu na direção

da entrada, permitindo Abaddon que passasse, e disse aos

recécianos:

- Fiquem por cá, eu vou atrás dele. – E assim permaneceram, até

que momentos depois viram com os seus próprios olhos o

cavaleiro negro a levantar-se e a arrancar a seta da sua cabeça,

também ele mesmo em choque com o que ali se estava a passar.

- O que raio é isto? Isto não pode ser humano… - Comentou

Morosini, completamente atónito.

Enquanto isso, Bruno Santos foi apanhado por

Abaddon no mesmo sítio que usara como esconderijo

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anteriormente com o seu parceiro: um pequeno descampado

numa colina à beira do rio. Já não estava tão nervoso,

considerando que já só tinha apenas um inimigo à sua frente, mas

nada quis dizer. Lançou o primeiro golpe, e atirou uma das

estrelas da sua arma, que se expandiu a partir do núcleo da arma.

Abaddon afastou-se, esquivando-se do ataque, e logo que a

estrela, pelo seu peso, tocara no chão, agarrou na corrente e

puxou-a, arrastando Santos com esta, que não esperava tal

reação por parte do seu opositor. Com um só movimento meteu

um pontapé na boca do cavaleiro negro, que soltou a arma de

imediato e estatelou-se no solo, cheio de dentes partidos e a

boca cheia de sangue. O opositor, no entanto, não quis acabar

com este já, e limitou-se a recuar e a esperar uma reação.

Enquanto isso, em Recécio, Yann conversava com o seu

primo Sochoski numa mesa de um corredor do andar de cima do

palácio. Não havia mais ninguém por lá, e refletiam sobre as suas

vidas:

- Parece que quando tudo está bem a minha mente arranja

maneira de me desmotivar de tudo. – Comentou o Rei

provisório.

- Referes-te a quê exatamente?

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- A tudo isto Yann. – E suspirou. – Sinto que não mereço e

acabo por tomar decisões aleatórias.

- Do género, está tudo bem, mas arranjas algo para que não

fique?

- Parece que sim, não sei. Do nada lembro-me de coisas e parece

que a minha cabeça está designada para arranjar conflitos

quando tudo está tranquilo. É a merda da autossabotagem.

Sinto que não estou preparado para nada disto e não me sinto

sequer suficiente.

- Suficiente para quê mesmo? – E riu-se Yann. – Eu tenho uma

pergunta muito simples, que nunca ninguém te fez, mas que é

aquela à qual as pessoas passam vidas inteiras em busca da

resposta: Quem é que tu queres ser? Não o quê, mas quem?

- Bem… - Suspirou Sochoski. – Alguém confiante de si, acho

eu. Alguém que não se sabote, ou que tenha toda a energia do

mundo e depois não se deixe estar.

- E quem és tu quando ninguém está a ver? Quem és tu?

- Eu sou alguém que está de bem consigo mesmo, tranquilo, e

até me sinto confiante de mim mesmo, e capaz de fazer. Só que

quando chega a hora de fazer…. Enfim, deixa-me triste nem me

compreender, mas nem ao mundo sou capaz de compreender.

Só me faz feliz o detalhe e as coisas mais simples.

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- Acabaste de me lembrar do meu irmão. Uma vez ele falou-me

sobre isso e disse o seguinte: “Sabes porque é que são as

coisas mais simples que nos fazem mais felizes? Porque somos

seres tão complexos que tudo o que seja mais simples é o

suficiente para ter a nossa admiração. Vivemos de momentos

que nos acrescentem uma memória, por mais pequena que esta

seja, e somos felizes a todo e qualquer momento por não

sabermos ao certo os momentos que nos recordaremos. E é

assim, a felicidade, se eu lhe pudesse atribuir uma forma, seria a

do vidro. É algo que está constantemente presente nas nossas

vidas, mas nunca somos capazes de o ver ou sentir a sua

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presença, no entanto quando é refletida luz sobre este, torna-se

tão presente que ofusca tudo ao nosso redor, e só dessa forma

podemos de facto ver que a felicidade está sempre presente.

Tudo depende da nossa visão a longo prazo e da memória que

os momentos nos acrescentarão futuramente. A nossa vida é

algo tão, mas tão complexo que gira em torno de sermos o herói

da nossa própria história, e geralmente tudo o que ansiamos é

elevarmo-nos ainda mais acima do que realmente somos.

Acabamos assim por relevar mais as grandes coisas que fazemos

e que ambicionamos fazer, sempre sem nunca proferirmos nada a

ninguém acerca, por um simples medo do julgamento externo

sobre o nosso erro ao saberem que falhamos. E assim também

acabamos nós mesmos por nos tornar em mais uns seres dessa

longa fila de perdedores da vida que temem o julgamento alheio

aos nossos sonhos e objetivos. Perdemos a visão do que é

realmente importante, centrando-nos no que temos a perder, e

não no que temos a ganhar, e o que temos a ganhar encontra-se

em tudo à nossa volta, em todo o vidro presente nas nossas

vidas. A diferença está em dar luz para que o vidro reflita; em

tornar vivo o que está morto; em fazer crescer novas folhas a uma

árvore cujas mesmas já padecem. Nós temos esse poder nas

nossas vidas.”

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- Como raio te lembras das palavras certas que o Sec usou?

Até fiquei assustado. – Reagiu o primo.

- Nem eu sei, talvez porque foi algo que me marcou.

- Enfim, isso tocou-me imenso, tenho de confiar mais em mim

mesmo se quero que o reino continue firme.

- É a oportunidade de uma vida, não a desperdices. Quem sabe,

se calhar o meu pai até te deixa ficar como rei

permanentemente…

- Achas mesmo? – Mostrou-se duvidoso Sochoski.

- Penso que sim, mas não quero que te fies apenas nisso.

Bruno Santos irritou-se de tal maneira, tendo em

consideração que não estava habituado a ficar em desvantagem

e soltou um berro. Abaddon, em vez de tornar a atacar, decidiu

perguntar algo:

- Porque matas, Santos?

- Do que é que isso interessa?! – Respondeu o cavaleiro negro

todo irritadiço.

- Morrerás na mesma, estou simplesmente a permitir que tenhas

as tuas últimas palavras.

- Não tenho outra opção, esta é a única vida que conheço.

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Não muito longe dali Gabriel acordara, num quarto escuro

à luz de uma vela, com Afonso sentado num banco a mirá-lo.

Demorou uns segundos a perceber que ainda se encontrava

vivo e de boa saúde, e virou-se para o amigo, cheio de dúvidas

em si:

- O que aconteceu? – E Afonso riu-se.

- Tentaste matar-te, mas não deixei.

- Porquê? Fazia tudo parte do meu plano… Agora já não tenho

mais nada para fazer nesta vida, não percebo porque me salvaste

Afonso…

- Não conseguia continuar isto sem ti, ou já te esqueceste que

fomos nós que criamos tudo isto? – Gabriel abanou a cabeça.

- Não, nunca me esqueci disso.

- Então? Porquê desistir já?

- Pensei que fosse a altura certa…

- E essa tua confiança do costume, onde está? Pareces tão

reticente, acorda Gabriel!

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- Não sei. – E olhou para a luz da vela. – Acho que foi a primeira

vez que aceitei e abracei a morte. Não me sinto em mim e nem

sinto que esteja aqui a fazer algo.

- Deixa-me relembrar-te de uma história então.

- Majestade Spy! – Exclamou o conde Afonso ao entrar pelo

escritório real da Dopácia adentro.

- Ah, és tu. Entra, entra. – E aguardou o rei que o seu nobre se

acomodasse. – O que te traz por cá?

- Tenho uma proposta irresistível majestade.

- Espero que seja mesmo, estou a fazer algo de muito

importante. – E cruzou Spy os braços, encostando-se atrás na

poltrona.

- Com certeza. Tome, leia esta carta. – E entregou-lha,

começando o rei a ler:

“Caro Afonso

Para começar, gostei imenso das plantas mágicas que me

enviaste na última carta.” – E fez uma pausa Spy:

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- Afonso, enviaste-lhe ervas mágicas?

- Sim majestade, há algum

problema?

- É suposto nós as

vendermos. A população

fica viciada com a sensação

que despoleta, mas não há

problema, pode ser que nos

comecem a comprar

também. – E continuou a

ler:

“(…) adorei a sensação, por

isso já agradeço aqui desde

já. Em segundo lugar, o meu

irmão absteve-se da nossa ideia, especialmente tendo em conta

que é rei há pouco tempo e não quer arranjar conflitos.

Contudo, deixou ao meu encargo esse assunto, desde que não

afetasse Recécio diretamente. Aguardo a resposta do rei Spy

na próxima carta.

Gabriel”

- Explica-me então de que se trata tudo isto aqui referido?

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- A nossa ideia é criar um grupo revolucionário, contendo os

melhores guerreiros renegados de cada reino, ou seja, um grupo

temido de mercenários.

- Hum… - Pensava o Rei. – Poderíamos de facto usar isso como

uma elite para eliminar inimigos poderosos, mas claro que tenho

de negar sempre o meu envolvimento nesse projeto. Desejo-te

por isso sorte, ficarás responsável por isso e qualquer apoio que

necessites não hesites em comunicar.

- Excelente majestade, assim irei! – E sorriu Afonso. – Vou

então até Recécio para me encontrar com ele. – E parti para

Recécio, onde me encontrei contigo numa casa, pela noite, onde

discutimos acerca do que investigamos: - Boas Gabriel, como

estás?

- Tranquilo, vamos sentar-nos, tenho informações a partilhar

contigo. – E sentamo-nos numas cadeiras que lá tinhas, com uma

mesa cheia de papiros escritos. Abriste um deles, e antes de

começares a ler disseste: - Talvez não saibas, mas o nosso

antigo vice-rei, o Dodo, andou a investigar lendas antigas do

continente e compôs vários papiros que contavam a lenda da ilha

dos gigantes, a da ilha do portal para o inferno. Vou passar a lê-

los:

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“Os trabalhadores no campo descobriram um túmulo que

continha vários papiros que se completavam uns aos outros e fui

lá investigar.

Quando os compilei a mensagem escrita foi a seguinte:

Diz-se que a Jotunheim tem praias feitas com os ossos dos

corajosos que lá quiseram ir. A sua localização perdeu-se ao

longo dos séculos, mas os gigantes, ou jotuns, mantiveram-se lá

todo este tempo secretamente. O que sei é que se localiza para

o oriente, na parte sul do continente, e vários barcos navegam

por esse mar, sem rumo. Diz-se que para controlar os gigantes é

necessário sacrificar um destes, e também lá existe, segundo

fontes, um portal místico para o inferno, e aquele que controlar

os gigantes terá direito a um desejo a Lúcifer, rei dos demónios.

Ousado é aquele que o tentar, mas a glória será eterna.”

- Ou seja, pretendes que encontremos a ilha para termos direito

a esse desejo?

- Sim, é o que tenciono fazer, mas ainda há mais, enviei uma carta

aos maiores criminosos exilados de todos os reinos, que devem

encontrar-se connosco por cá, junto ao porto.

- Antecipaste-te bem nisso, foi uma boa decisão, mas quando

partiremos?

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- Daqui a exatamente duas semanas, no porto, pela tarde.

Seremos dez.

- Aguardo por esse momento.

Passadas as duas semanas encontramo-nos lá no local

pretendido, e estavam lá todos, como havias previsto. Tanta

fama em tão poucos homens. Embarcamos, quase sem nos

falarmos, era um ambiente muito estranho. Comandavas tu o

barco, e nós mirávamos a imensidão do mar. Alguns pescavam,

outros já comiam, mas ainda pouco falavam. Levou-nos cerca de

cinco noites até avistarmos a dita ilha, que percebemos que

desta se tratava por causa das praias cheias de ossos, e

desembarcamos. Era uma tarde cinzenta, em que não se via o sol,

mas também não chovia. Juntamo-nos e explicamos ao resto do

grupo o que tínhamos de fazer ali, e todos concordaram.

Pareciam sedentos de sangue. Separamo-nos em cinco grupos

de duas pessoas, nos nossos respetivos atuais grupos, e fui com

o Kanarinho ao longo da praia, onde mais ao fundo avistamos

um gigante que pescava, numa praia debaixo de uma enorme

falésia. Por sorte não nos viu, e pensamos numa estratégia

rentável. Começamos por subir a arriba, continuando o jotun a

sua pescaria calmamente, sem nunca se aperceber de nada. Já

mesmo por cima deste, na falésia em cima, recolhemos duas

dúzias de pedras enormes para atirar para baixo. Ao as

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atirarmos, o resultado não foi o que prevíamos, só lhe causamos

meros ferimentos nas costas, e além disso ele viu-nos e começou

a correr pela montanha acima. Ele era extremamente rápido, e o

Kanarinho sacou do seu arco e começou a disparar contra o

monstro, mas não lhe pareciam afetar sequer apesar de lhe

acertarem. Quisemos tentá-lo atirar da arriba abaixo por isso

separamo-nos, mantendo uma distância de uns cinco metros, e

assim que o jotun chegou até nós, parou. Tentei de imediato

provoca-lo sendo que era eu que estava no lado da arriba, e ele

virou-se para mim. Desatei a correr e deitei-me entre as pernas

dele, que se baixou para me agarrar, e neste preciso momento o

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Kanarinho lançou-lhe uma seta para o meio do rabo, que lhe

furou o orifício anal. O gigante não aguentou a dor, e soltou

altos berros enquanto descambava para a frente, e sem se

aperceber escorregou pela ribanceira abaixo, caindo imóvel na

praia ao fundo. Foi aí que percebi que tinha uma química incrível

com o Kanarinho, e sorrimos os dois pelo bom e rápido trabalho

que fizemos. Quando descemos até ao cadáver deparamo-nos

com um problema, como é que chamaríamos os outros cavaleiros

até nós? Até poderíamos enviar sinais de fumo, mas nesse caso

atrairíamos outros da espécie deste, então tive uma brilhante

ideia. Queimaríamos a floresta à beira mar, e tendo em conta que

era um incêndio, os gigantes afastar-se-iam dessa costa.

Fizemos então uma fogueira com folhas secas e pedras de sílex

que encontramos, e demorou bastante a se propagar. Tivemos

de a reacender pelo menos três vezes. À terceira tentativa

começamos a ouvir passos de jotuns ao longe. O chão

estremecia, e como seria óbvio, queríamos evitar outro

confronto, e o nosso pensamento rápido e imediato permitiu-nos

ter uma ideia:

- Kanarinho, acompanha-me até ao cadáver do gigante que

matamos antes, rápido!

- Vamos! – E descemos numa correria desenfreada, apesar das

pesadas armaduras que carregávamos, e fomos até ao corpo do

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nosso antigo adversário. Os passos tornavam-se cada vez mais

próximos e audíveis. Sem pensar duas vezes fiz um grande corte

com a minha espada na zona lombar do jotun e disse ao meu

parceiro que nos esconderíamos lá dentro:

- Anda lá, entra! Não temos tempo!

- Cheira tão mal, não acredito que vamos mesmo fazer isto…

- Aí vamos sim. – E metemo-nos lá pelo meio das entranhas do

bicho enquanto os passos dos outros se aproximaram cada vez

mais. O nervosismo começava a atingir níveis elevadíssimos, até

que os passos pararam junto a estes e um longo suspiro se ouviu

lá de fora. Sentiram-se a serem levantados do chão, e um longo

pingo de suor nervosinho caiu-me pela testa, mas nem me mexi.

Pude ver pelo corte que fiz para entramos, que um outro gigante

levava o cadáver às costas a segurá-lo apenas por uma mão.

Permanecemos no cadáver em andamento durante alguns

minutos sem qualquer ideia de para onde nos dirigíamos, mas de

repente paramos e fomos atirados para o chão. Até fechei os

olhos porque não era capaz de olhar por entre o corte para ver

o que nos ia acontecer. O gigante solto então um berro que

ecoou, então percebi que estávamos num vale, mas não

compreendia o porquê daquele berro, até que ouvi tua voz a

gritar:

- Vamos!

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- Podes ser grande, mas não és 8! - Gritou depois o Shaman, o

que depois nos tranquilizou. Saímos muito devagar por onde

entramos anteriormente, e o gigante mirava-os aos 8 com um

olhar raivoso, especialmente para Valmir, que trazia consigo uma

cabeça de gigante fresquinha. Sem perder tempo, o Bruno

Maro correu em direção a ele juntamente com o Santos,

preparados para atirarem-lhe com os seus manguais, mas como

era de se esperar o bicho reagiu e lançou os seus punhos para

baixo, em ataque, ao qual os Brunos se esquivaram com um

rolamento. Aproveitando que o monstro se baixou, o Valmir com

a sua besta e o Kanarinho ao meu lado começaram a fazer

chover setas sobre estes, o que não surtiu muito efeito. O Maro

e o Santos, por sua vez, lançaram as estrelas dos seus manguais,

uma em cada ponta das pernas do gigante, que se recompunha,

e por mero acaso ambas as estrelas lançadas colidiram antes de

completarem sequer 180 graus em volta das pernas, causando

um estrondo ensurdecedor. O gigante levou logo as mãos aos

ouvidos em dor e agonia enquanto se ajoelhou e pousou os

cotovelos no chão. Recordo-me de Valmir ter berrado depois

disso:

- Eles parecem ser extremamente sensíveis ao som, batam armas

com armas, rápido! - E o Shaman como sempre, respondeu:

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- Não mandas em mim! Só o vou fazer porque é realmente

necessário. - E começamos todos a bater com as nossas armas

umas nas outras, e gritos de dor ecoavam do gigante a cada

segundo. Enquanto isso, os Brunos prenderam-lhe as pernas

com os manguais. Vi ali uma oportunidade. Comecei a correr

com o meu pico nas mãos, usei-o para escalar até as costas dele,

enquanto os outros continuavam a fazer ruído. Num momento de

instinto, dei um enorme salto a meio das costas do gigante com a

minha arma em riste e enfiei-a com a máxima força no início da

coluna. O bicho começou a jorrar sangue pela boca, e poucos

segundos depois caiu imóvel, e eu com ele. Quando me ergui

testemunhei uma grande cena: todos nós a olhar uns para os

outros com um largo sorriso, e tu disseste:

- Bom trabalho.

- Já imaginaram lutarmos todos juntos contra um exército? -

Perguntou o Kanarinho enquanto se aproximava a sorrir.

- Também não vamos pensar demasiado alto... - Respondeu,

sempre cético Tiravéditos.

- Enfim, temos algo a fazer, trazes essa cabeça que tens contigo

Valmir? - Disseste.

- Sim levo, mas o Shaman tem que me ajudar a carregá-la.

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- Que dizes homem? Eu só ajudo porque também vou beneficiar

com isto, que fique esclarecido!

- Shaman, controla-te, vá. - Disse eu por fim.

- Desculpa... Mas então temos de ir onde agora?

- Precisamos de subir alguma montanha para o sacrifício Toko?

- Questionou o Santos.

- Acho que não, isso é mito. - Respondeu - Façamos aqui mesmo

neste vale. Arranjam madeira Gabriel e Marcelo?

- Claro, já voltamos. - Comentou o Marcelo, e foram. Voltaram

quase meia hora mais tarde, cheios de lenha cortada. - Isto foram

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duas árvores de pequeno porte, vamos aproveitar. - Então

montamos uma fogueira, metemos a madeira a arder e lançamos

a cabeça do gigante para o meio do fogo, que de tão grande

quase o apagou. Enquanto a cabeça queimava, um estranho

fumo avermelhado juntava-se, metros acima da fogueira:

- É agora. - Afirmou o Toko, e ficamos todos um pouco

nervosos. A pouco e pouco as cinzas e o fumo começaram a

tomar uma forma de um busto de um ser vermelho, com orelhas

bicudas, e uns grandes chifres para as laterais na cabeça, com

um rosto meio humano, meio carneiro, e uns olhos vermelhos

cintilantes, que se apresentou:

- Geralmente tenho nojo de mortais, mas gosto da cor das

vossas almas. Tendo em conta a profecia, eu, Lúcifer, príncipe

do inferno, concedo-vos um desejo em troca das vossas almas

após a morte. Falem!

- Falo eu, malta? Questionaste tu.

- Sim, claro! - Respondemos todos nós.

- Ora bem então.... Quero que nos concedas a nós, cavaleiros

negros, imortalidade, a nós os 10 e aos próximos dois que aqui

entrarem. - E Lúcifer fez um ar descontente.

- Vocês e o vosso desejo pela imortalidade.... Ides todos queimar

no inferno. - Fez uma pausa. - Isso não vos poderei conceder na

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totalidade, no entanto poderei conceder uma imortalidade

parcial.

- Parcial, senhor? - Perguntou o Santos, sem acreditar.

- Exatamente. Ou seja, neste momento são meros mortais, mas

imagine-se que algum de vós morre afogado... Todos os outros

vivos tornam-se imunes à morte por afogamento, entenderam? O

que é que eu estou a fazer.... Justificar-me a mortais, patético. –

Suspirou. - Já tenho as vossas almas, por isso partirei. Até um

dia. - E o fumo dissipou-se num ápice. Ninguém foi capaz de

dizer uma única palavra durante alguns segundos de reflexão, até

que a fumaça reapareceu, e Lúcifer junto:

- Saliento um último pormenor: terão de matar tantas pessoas

quantas puderem, ou perderão o vosso desejo. Anseio juntar um

exército para tomar a Terra um dia. - E dissipou-se mais uma

vez; deixando-nos a todos em reflexão, até que foi o Marcelo a

quebrar o silêncio:

- Agora os gigantes obedecem-nos, certo?

- Suponho que sim, mas temos de o testar... - Respondi,

hesitante. - Que me dizem de fazermos desta ilha o nosso

esconderijo? É de difícil acesso e temos os gigantes sob o

nosso controle, supostamente...

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- É uma excelente ideia Afonso. - Disseste tu, e levantaste-te.

- Camaradas, somos os cavaleiros negros e hoje iniciamos o

nosso longo e duradouro projeto para libertarmos o mundo das

suas correntes e encaminharmos a nossa raça ao nível seguinte.

É connosco a libertação do mundo, não vacilemos. Organizar-

nos-emos em duplas, as que mencionei anteriormente. Enfim,

não deitem o nosso percurso a perder, por favor.

- Vou pensar sobre isso, mas quase já me esquecia dessa parte

da história.... Parou uns momentos Gabriel para repensar

acerca, e soltou um longo suspiro. - Vamos lá.

Bruno Santos irritou-se e correu em direção a Abaddon

com o mangual em riste. Lançou-o novamente pela corrente, e

desta vez o adversário, num momento instintivo lançou a sua

espada em direção ao início da corrente, o que fez bloquear o

seu trajeto inicial, enrolando-se em volta de Santos, que caiu

para a frente, enraivecido. Abaddon serviu-se da corrente do

mangual para o apertar ainda mais, e prendeu-o. Sacou de

alguns paus e fez uma fogueira. Santos fazia uma cara de terror

e terror enquanto soava e se tentava soltar, mas Abaddon

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reforçava a corrente, impedindo-o de escapar. Foi buscar mais

e mais paus, e a fogueira aumentava cada vez mais de tamanho,

mas Santos não desistia de se tentar soltar, mesmo sabendo lá

no fundo que era em vão. Tentava rastejar para trás, mas o

mascarado viu-o, e arrastou-o novamente para junto a fogueira.

Começara a tentar gritar por ajuda, em desespero:

- Ajudem-me! Alguém me ajuda! – E Abaddon chutou-o na

boca; fazendo jorrar imenso sangue pelo chão à sua volta. A

fogueira estava já bem acesa, e pegou no cavaleiro negro por um

braço e arrastou-o para o fogo. Santos não parava de se

contorcer e gritar em agonia, toda a sua vida lhe passou à frente

dos olhos, até que não mais aguentou e adormeceu pela última

vez. Abaddon estagnou durante uns segundos, sem proferir

qualquer palavra, e caminhou pelo meio da floresta,

desaparecendo pelo meio do arvoredo.

Bruno Maro levantava-se de boca aberta... Nem ele mesmo

acreditava que a maldição era realmente verdadeira. Os

recécianos não acreditavam no que viam, e recuaram uns passos,

em hesitação, e nervosos pelo que acabara de acontecer. Maro

não perdeu tempo e correu em direção à saída, sabendo que

estava em desvantagem numérica. Izaac quis impedi-lo e atirou-

lhe uma adaga para as pernas, que de raspão na armadura fez o

cavaleiro negro abrandar e virar-se para trás. Não tencionava

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mais fugir, e empenhou o seu mangual, pronto para a batalha.

Morosini e Izaac entreolharam-se, não muito confiantes, porém

dispostos a lutar. Maro aproximou-se devagar, e com um olhar

tão demoníaco no rosto que os seus olhos exibiam um desejo de

assassínio. Os adversários recuavam ao mesmo ritmo, mas

Morosini não aguentou o suspense e lançou-se ao inimigo com

um golpe direcionado à cabeça, o qual o cavaleiro se baixou, e

aproveitando a inércia do movimento, pontapeou o seu

adversário nas pernas, provocando a sua queda. Izaac surgiu

logo atrás, lançando vários golpes, os quais o adversário foi

bloqueando, enquanto recuava. Pensou Maro para si mesmo:

- Acho que os subestimei, tenho de arranjar uma maneira de sair

daqui o mais rápido possível... E enquanto se defendia dos

golpes do Vice-Rei, atacou-o por baixo com seu mangual,

projetando desta forma a espada de Izaac pelo ar, e apanhando-

o desprevenido, aplicou-lhe um golpe na cabeça, e Izaac caiu,

imóvel. Aproveitou a oportunidade e começou a correr para a

saída, sendo imediatamente perseguido por Morosini; que

enquanto corria olhava para trás, pelo ombro, para o seu

companheiro ferido. Já no exterior, Maro escapava-se ao ir

pisando as pedras do rio, até chegar a uma parte em que teria de

efetuar um grande salto para uma lagoa, onde hesitou por

momentos. Mais atrás, Morosini escorregou numa pedra e ficou

ferido a mirar o cavaleiro negro, quando viu um vulto que tapava

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o sol a saltar do penhasco acima, em direção a Maro. Era

Abaddon, e sem o inimigo perceber, encolheu a perna direita e

pontapeou-o no pescoço com a sola metálica, partindo-lhe

automaticamente o pescoço, e caíram ambos na lagoa abaixo,

onde o cavaleiro negro se afogou lentamente. Abaddon nadou

até à margem da lagoa, olhando num último lance para esta, e

desapareceu... Morosini ficara apoiado apenas numa perna, e

voltou a gruta para ver como estava Izaac, mas quando chegou

viu de imediato que o amigo já não tinha pulso. Sentou-se à

beira do corpo do amigo e suspirou:

- Porque é que o Maycon não pode simplesmente voltar e trazer

estabilidade ao reino? Porquê? - E desatou a chorar num

desespero sem fim.

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Capítulo VII

Os Esquadrões Nobres e o Regresso do

Rei

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Dois meses se passaram, e Ricox tornara-se o novo vice-

rei de Sochoski, o que despertou alguma discórdia por parte de

alguns nobres. Sec e Yann conversavam nas barracas militares,

depois de um dia de treinos:

- Oh, mas também não precisas de ficar assim por causa disso!

- Yann, estás a brincar? Parece que só me querem deixar de

parte porque sou um discípulo do tio Gabriel e um cavaleiro

negro!

- Mas mano, tenta perceber o lado de quem muito sofreu às

“vossas” custas.

- Eu sei separar as coisas! - Berrou Sec, chamando algumas

atenções indevidas.

- Fala baixo…

- Eu sei, mas eu sei separar Recécio dos cavaleiros negros e

vice-versa.

- Tens de tentar mostrar a todos que és alguém bom, não achas?

- Questionou Yann, sempre preocupado com o irmão.

- Mais do que já faço? – Suspirou a fundo. – Enfim, mas digo-

te... Um dia vou tornar-me rei, e destruirei todo este mundo

corrompido para criar um novo.

- O que queres dizer com destruir? – Mas Sec não quis

responder, e abandonou as barracas. Pelo caminho encontrou

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Igor Patric, com um sorriso de canto a canto, que não hesitou em

ir logo contar a Sec o que se passava:

- Olha para trás, ali ao fundo da rua. – E ao olhar nessa direção

viu o seu pai a chegar.

- E assim o jovem príncipe observa o seu magnânimo pai, no seu

exuberante cavalo branco, com a sua armadura cintilante e os

seus loiros cabelos ao vento. Tratava-se de Milena, uma nova

baronesa, que era detentora de uma ousadia e senso de humor

fora do comum.

- Oh, tu cala-te. – Respondeu Sec enquanto revirava os olhos.

- Não te cansas de me irritar?

- Não te cansas de ser a voz da minha consciência, queres tu

dizer? – Retrucou Milena.

- Enfim, não tenho tempo para isto, vou andando. – E enquanto

se dirigia para o palácio, o seu pai abordou-o, ainda sobre o

cavalo:

- Como têm andado as coisas por cá?

- Está tudo tranquilo. – O pai sorriu-lhe, e cavalgou até o

palácio, seguido de Sec. Ao entrarem, o príncipe pensou para

si mesmo:

- Tenho que acalmar os ânimos ao povo por aqui, ainda pode

haver mortes... – E foi até o escritório real, onde se encontrava

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Sochoski, seguido de perto pelo seu pai, que não vinha com boa

cara. Ao abrir a porta viu que o primo estava em agonia, com as

próprias mãos no pescoço.

- Sochoski?! O que passou?! – Berrou o primo, enquanto corria

em auxílio deste. Na porta, Maycon ria-se baixinho, o que

enfureceu Sec de uma maneira…

- Seu monstro! Foste tu que fizeste isto não foste?!

- Sim, e se há coisa que não admito é que usurpem o que a mim

me pertence.

- Não vou discutir isto agora. Anda Sochoski, vou levar-te a um

médico, - Disse, enquanto se fazia apoiar neste.

- Não te preocupes, daqui a pouco a umas horas ele ficará bem,

contudo, quero deixar claro que vou reassumir o trono, e este

sobrinho meu terá de desertar o reino, assim como o “pseudo

vice-rei” dele.

- Rrrrr... – Reagiu o seu filho, raivoso. E assim novamente

Maycon se tornava o rei de Recécio.

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Duas semanas se passaram, e Sochoski e Ricox haviam

desertado o reino, acompanhados de Zico e Somboy, que não

gostaram desta decisão por parte de Maycon. Dirigia-se toda

a população para os campos de treinos do exército a mando do

rei, o que realmente levantava algumas questões:

- O que será que o pai tem para dizer, Sec? – Murmurava Yann.

– Não sei, mas até tenho receio. Vindo dele nunca se sabe o que

poderá ser. – Passaram-se alguns minutos até estarem todos lá

presentes. Encontravam-se os nobres num palco de madeira, e

toda a população da capital diretamente à sua frente. O Rei

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tomou a dianteira, já com o seu vice-rei de sempre ao lado, o seu

irmão Lucka, e começou a berrar.

- Cidadãos de Recécio! Convidei-vos a cá virem para alguns

anúncios importantes! – Engoliu a seco. - Como sabem,

reassumi o trono de Recécio, e o Arquiduque Lucka von

Asterion, meu irmão, volta a ser o Vice-Rei! - Fez uma pausa. -

Aqui atrás de mim constam todos os nobres de Recécio, aos

quais irei adicionar mais alguns elementos bons do povo! Os

nomes que citarei terão de se colocar ao lado dos outros nobres,

aqui em cima: Lethícia, filha de Rodrigo; Drazi, filho de

Policarpo; Doni, filho de António; Gabriel, filho de João; Fera,

filho de Ando; Walessa, filha de Pietro; Leo e Noel, filhos de

Alves; Vinícius, filho de Matri; Sagaah, filho de Teodoro;

Decheise, filho de Diogo; Papaléguas, filho de Alessandro, e

Fly, filho de Leandrus. Por fim queria anunciar um caso

particular de um nobre, proveniente da Deásp, que se juntará a

nós. Sobe aí Marcos. – E fez outra pausa, esta que resultou na

população a comentar entre si com espanto e ânimo pelo seus

familiares e amigos. Continuou. – Agora que já temos todos os

25 nobres cá em cima, queria dizer que os organizarei em

esquadrões de 5 nobres, esquadrões estes especiais, com um

líder e escolhidos a dedo. – Os nobres ficaram a olhar uns para

os outros com ar de interrogação, mas contentes, parecia uma

boa ideia. – Ora bem, - Disse, enquanto abria um papiro. -

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Esquadrão Yann, tendo como líder o Barão Yann, e os outros

4 membros: Escudeiros Fera, Walessa, Gabriel e Doni, juntem-

se.

- Ele quer juntar o Yann com todos os novatos para fazê-lo criar

experiência, não foi uma má ideia, apesar de ele ser novo. –

Pensou Sec.

- Esquadrão Marcos - E assim que o rei proferiu estas palavras

toda a gente levantou as sobrancelhas: como poderia um nobre

acabado de chegar, ser logo líder de um esquadrão? - Tendo

como líder o Conde Marcos, e como restantes membros o

Conde Sec, a Viscondessa Milena e os dois Escudeiros

Lethícia e Drazi. - Sec não conseguiu não rir a seco. O pai teria

feito aquilo propositadamente. - Esquadrão Rafac, tendo como

líder o Duque Rafac, e os restantes quatro membros: O Duque

Sean, o Marquês Vítor, e os novos Escudeiros Vinícius e

Sagaah. Esquadrão Igor Patric, tem como líder o Marquês Igor

Patric e como restantes membros os Cavaleiros DanielX e

Phell, e os novos escudeiros Leo e Noel. Juntem-se. E por fim,

esquadrão Morosini, liderado pelo Conde Morosini, com os

restantes membros sendo: o Barão Thiago, e os Escudeiros

Decheise, Papaléguas e Fly. Juntem - se. - E assim o fizeram os

esquadrões respetivos. A vossa primeira missão será,

logicamente, conhecerem-se, por isso, passarão 2 semanas em

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várias localidades do continente como objetivo de sobreviverem

em conjunto. Lucka, as instruções da missão…

- Sim sua majestade! - E entregou uma cópia do papiro a cada

equipa. - Vão arranjar cavalos para os novos Escudeiros e

comecem a missão agora! - Viraram todos costas, em direção ao

estábulo, e o Rei continuava a discursar para o povo.

- Como podem ver, não é pela existência do estatuto de nobre

que se irá não fazer nada! Todos damos o máximo pelo reino à

nossa própria maneira! – Enquanto isso, os esquadrões

caminhavam para o estábulo.

- Hmmm, parece que vais ter de me aturar para sempre... –

Murmurou Milena para Sec enquanto se ria.

- Sou um santo por te aturar, espero que saibas disso.

- Oh, não sejas assim, sei que lá no fundo me adoras...

- Tu sonhas tão alto, é impressionante.

- És tão mau.... Ensina-me.

- Mereces Milena. – E Sec começou a recordar-se de um

episódio do passado, quando era mais novo. A sua cara de

nostalgia aparente não passou despercebida à baronesa:

- O que se passa? – Perguntou-lhe a amiga.

- Nada, nada, estava apenas a recordar-me de algo que vi há

muito tempo atrás.

- O quê? – Levantou uma sobrancelha.

- Esquece. – Mas Milena era demasiado teimosa.

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- Fala, agora deixaste-me curiosa.

- Que chata, está bem eu digo. Estava a pensar nisso dos

esquadrões e veio-me uma memória de há alguns anos atrás ver

estes mesmos esquadrões de nobres, mas acho que só havia um.

Pareciam invencíveis...

- E quem eram? – Perguntou, sempre curiosa.

- Era o meu pai e os meus tios, era o esquadrão Maycon. Uma

vez estávamos em guerra com uma fação criminosa e vimos uma

batalha fora das portas da cidade: eram cerca de 150 soldados

contra o nosso esquadrão apenas.

- Hum?! - Interrompeu, chocada. – Isso é impossível, cinco

pessoas vencerem 150? Não, não, não!

- Juro que é verdade, eu vi tudo. A coordenação e habilidade

deles em conjunto era fenomenal, pareciam saber sempre os

movimentos que os companheiros iriam fazer, e complementavam-

se para criar uma harmonia de batalha que nunca vi na vida e

possivelmente nunca mais verei. Tu não tens noção.

- E ganharam?

- Como é obvio, e sem nenhum ferimento. – Respondeu Sec,

com um sorriso de orgulho pela família.

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- E o que aconteceu com eles? Sei que no reino está apenas

sua majestade e o Vice-Rei Lucka. – A expressão no rosto do

príncipe mudou por completo.

- Bem... Lembras-te da grande guerra?

- Claro que me lembro, o que tem?

- O meu tio Douglas morreu durante um ataque e o meu tio

Andrey também, o meu tio Gabriel matou-se. – Milena não

hesitou em fazer uma cara estranha.

- Lamento pelo ocorrido, nem deveria ter perguntado... – Mas

Sec riu-se.

- Não te preocupes, está tudo bem.

- Está mesmo?

- Ora, ora, tu preocupada? – Não hesitou em fazer um sorriso

de canto.

- Claro que sim... Mas não te aches por causa disso.

- E tu rapaz, como te chamas? – Perguntou Sec a Drazi, que

parecia demasiado envergonhado. Mais atrás, Marcos e

Lethícia conversavam. Drazi era um pouco mais baixo que Sec,

de rosto pálido, magro e com um cabelo espigado para frente.

- Eu sou o Drazi, muito prazer em conhecer-vos.

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- O prazer é todo meu. – Respondeu Milena, de cabelo negro

ondulado e uns reluzentes olhos azuis.

- Hehe. – Riu Sec. – Vamos ter que nos aturar, não é? – Tentou

descomprimir o ambiente.

- Para te aturar não vai ser fácil... – Comentou a rapariga, e riram

os três.

- Cala a boca, tu é que és insuportável. Marcos! – Chamou o

príncipe, virando-se para trás. – Qual é o teu nome?

- Como assim? É Marcos… – Respondeu num tom seco.

- Não, de família! – Todos os nobres, incluindo os que são

promovidos têm o direito a escolher um nome de família para ser

carregado pelos seus filhos futuramente.

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- Ah, chamo-me Marcos van Astreus, e vocês?

- Acho que os únicos que já tem o nome de família são vocês os

3 mesmo, eu ainda não pensei num. Tu já, Drazi? - Perguntou

Lethícia, com um longo sorriso. Parecia uma menina tão amável.

- Por acaso já me decidi, adotarei o nome de Drazi Setcur.

- É um bom nome, fica no ouvido. - Complementou o príncipe -

Eu chamo-me…

- Já sabemos…. Chato. - Interrompeu Milena. - Sec von

Asterion, príncipe do Reino de Recécio. - Afirmou Milena num

tom de troça, e todos soltaram uma gargalhada. Eu chamo-me

Milena. - E interromperam momentaneamente a conversa para

montarem os seus cavalos. No caso dos novos nobres, teriam de

escolher novos cavalos, mais jovens. Uns minutos depois

partiram, com Marcos, o capitão, na retaguarda, rumo a

nordeste para a zona montanhosa. Lethícia deslumbrava-se com

as vigorosas paisagens tendo em conta que não costumava sair

da capital. Trabalhava na loja do pai como ajudante de ferreiro.

- Marcos, onde vamos dormir? - Questionou Sec, a tentar ser

simpático e quebrar o silêncio do grupo, que tinha acabado de

se conhecer.

- Num abrigo logo à saída da fronteira.

- E teremos água potável por perto?

- Sim, já me certifiquei de tudo, não te preocupes com isso.

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- Certo.

Cerca de duas horas mais tarde chegaram finalmente ao

abrigo, onde Drazi não perdeu tempo e fez uma fogueira para

assarem um leitão que haviam trazido consigo da cidade.

- Por falar nisso Sec, - Disse Milena. - Por que von Asterion?

- É assim…. Quando o meu pai assumiu o trono, ele e os irmãos

tiveram de adotar um nome de família, então escolheram este,

porque o nome do meu avô era Asterion, e “von” significa "filho

de".

- E isso não faria de ti von Maycon? - Interrompeu a amiga com

uma nova pergunta.

- Em teoria sim, mas todos eles concordaram em tornar esse

nome permanente por se ter tornado tão conhecido e temido.

- Ei Sec. - Chamou Marcos. - A Milena perguntou-me lá atrás

se eu sabia se tens namorada ou não. - E todos se riram por

perceberem que era uma provocação, menos Milena.

- O quê?! É mentira! É tudo mentira! - Ficou até corada de

vergonha e deu um beliscão no braço do capitão da equipa

enquanto negava. - Estúpido! Tu vais desmentir!

- É verdade que perguntaste isso Milena?! – Sorriu de canto,

para a irritar.

- Não Sec, não, não e não! – Respondeu, envergonhadíssima.

- Eu sou casado. – E a sua amiga deu um sorriso o mais forçado

possível, que Marcos notou.

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- Não precisas de forçar esse sorriso, sabias?

- Cala a boca! – Bateu-lhe mais uma vez. - Mas já que estamos

nesse assunto, porque é que não nos apresentamos todos?

- Parece uma boa ideia, eu começo então. Chamo-me Sec,

tenho 20 anos, estou “casado” e tenho dois filhos. Tenho

também o meu pai e o meu irmão mais novo. O meu maior sonho

desde criança é me tornar rei de Recécio, já desde antes de o

meu pai o ser.

- Colocaste o padrão tão elevado Sec, agora nem sei o que

diga. - Comentou Drazi, enquanto coçava a cabeça.

- Ah, e esqueci-me, estive todos estes anos no exército e na

corte real. – Olhou para o capitão. - É a tua vez Marcos.

- Já que insistes... Chamo-me Marcos, tenho também 20 anos,

solteiro, órfão e sem irmãos. - Fez-se um silêncio constrangedor,

que Marcos decidiu ignorar, e continuou: - Acho que não tenho

realmente sonhos, e estive durante os últimos anos a viver como

mercenário.

- Drazi? - Perguntou o príncipe enquanto lhe passava sinal com

a mão para o fazer falar.

- Ah sim, é a minha vez. – Respirou fundo, como que nervoso. -

Chamo-me Drazi, tenho 18 anos e tenho os meus dois pais e

dois irmãos. O meu sonho é tornar-me forte o suficiente para os

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conseguir proteger a todos, e antes disto era um aprendiz de

mercador... – Fez-se silêncio, e ao se aperceber disto comentou:

- Passo a palavra ao próximo. – Foi Milena a iniciar a sua fala:

- Sou a Milena, tenho 21 anos, sou filha única e tenho os meus

dois pais. O meu sonho é arranjar o meu príncipe encantado

numa manhã de nevoeiro. – Estava claramente a brincar,

adorava fazer piadas, e o capitão não perdoo:

- Pronto, quer-te a ti Sec. – Interrompeu, enquanto se ria. - A

companheira bateu-lhe uma vez mais.

- Enfim, e antes disto não fazia grande coisa da minha vida.

Lethícia...

- Certo. Chamo-me Lethícia, tenho 21 anos, tenho os meus pais

e um irmão. Antes de aqui estar era aprendiz, ou melhor, auxiliar

de ferreira e trabalhava na loja do meu pai. - Comentou, sempre

envergonhada.

- E agora estamos aqui presos uns com os outros... - Comentou

Milena a tentar descomprimir o grupo.

- Por falar nisso Lethícia. - Acrescentou Sec. - Consegues

analisar a minha espada? Eu nunca soube ao certo de que é que

é feita a parte interna.

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- Passa-ma aqui, vou dar uma vista de olhos. - E o príncipe

retirou a espada das suas costas, da bainha, e entregou-a à

companheira, que a olhou de vários ângulos:

- Está claro que as arestas são revestidas com um fio de

diamante, mas o material interior... – Ficou um pouco a pensar. -

Não sei, mas lembra-me bastante de olivina, que é um mineral

bastante duro. Diria até que esta é a melhor espada do reino, de

longe!

- E há a possibilidade de a melhorar? - Lethícia reagiu com uma

cara franzida, como que a duvidar:

- Segundo o que li, todas as 7 espadas lendárias foram forjadas

pelos 7 anjos, cada uma referente a um diferente chakra humano,

o que faz delas incrivelmente duras, acima de qualquer outra

existente no mundo. Eu achei que se tratasse apenas de uma

lenda, mas é realidade. - O grupo encontrava-se muito atento às

palavras da companheira, que até corou de vergonha. - Mas...

- Mas?! - Responderam todos em uníssono.

- Mas há outra lenda que fala de duas espadas, as mais duras de

que há memória: A trompete do fim e o flagelo de deus, feitas de

diamante e de carbonado, respetivamente.

- E como é que chegamos até elas? - Sec entusiasmou-se logo.

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- Segundo a lenda, há dois portais divinos no nosso mundo: Um

que nos levará ao céu e outro que nos levará ao inferno, e cada

uma das espada estará lá algures, a de diamante no céu e a de

carbonado no inferno. - Sec parou imediatamente para pensar

na conversa que havia tido com Belzebub, que disse que Sec lá

retornaria ao inferno um dia para cumprir o seu destino. Seria

esse? De retirar o flagelo de deus do inferno? Mas com que

motivos e finalidades?

- Em que é que estás a pensar Sec? - Perguntou Drazi, curioso.

- Não é nada, eram só umas teorias da conspiração... De

qualquer forma, onde vamos passar a noite?

- Até que aqui não era um mau local... - Comentou Marcos.

- Se o capitão do esquadrão quer aqui... - Comentou Milena,

que se riu.

- Então está decidido! - Exclamou o líder, e lá se deitaram para

passarem a noite.

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Alguns dias se passaram, o grupo dormia na zona

montanhosa, e Milena sonhava que se tornava rainha de

Recécio, o que não era impossível de acontecer.

- Majestade? - Proferiu Sec, ao ajoelhar-se com uma perna e

erguer o braço direito para a frente, de lado.

- Sim, meu cavaleiro? - Respondeu, com uma expressão

arrogante no rosto.

- Acorde deste sonho por favor. - E a pouco e pouco foi

abrindo os olhos, estava presa com cordas e a ser carregada por

algumas pessoas. Olhou ao seu redor, ainda sonolenta, e

reparou que não se tratavam de humanos, mas sim gnomos, uma

raça de pequenos anões que se julgava extinta, ou até mito.

- Será que estou a sonhar?! - Tentou procurar pelos seus

amigos à volta mas não os conseguiu alcançar. - Ei! Soltem-me!

– Não obteve resposta, mesmo tentando mais algumas vezes,

sempre sem sucesso. Encaminharam-na para uma gruta com

baixa altura, que ligava a um túnel estreito, em que ao fundo viu

uma luz ténue. Ao cruzá-la, mirou ao seu redor e observou toda

uma grande cidade subterrânea, toda iluminada por tochas. As

casas e outros edifícios eram feitos em pedra e barro, e no meio

da cidade destacava-se um grande pilar de pedra que suportava

toda aquela civilização. - O que raios é isto?! - Pensou para si

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mesma a recéciana, mas nada conseguiu dizer, e limitou-se a

observar. Também havia destaque para um palácio enraizado na

pedra, ao fundo de tudo, ligado à cidade por uma enorme

escadaria descendente, para onde pareciam estar a caminhar.

Pelas ruas mirava os gnomos, que pareciam assustados com a

sua presença, mas que apesar disso executavam as suas funções

citadinas com uma normalidade que em tudo se assimilavam à dos

humanos. Iniciando-se a subida pela escadaria, um gnomo berrou

algo lá do alto, e aqueles que carregavam Milena apresentaram-

se a levá-la. Entraram num grande salão redondo, cheio

daquelas pequenas gentes, que a observavam atentamente.

Soltaram-na, não naquele salão, mas numa pequena sala ao

lado. Foi recebida por vários gnomos, que a despiram das suas

vestes guerreiras e lhe vestiram umas vestes brancas que

pareciam ser até de realeza, assim como uma coroa de flores, e

arranjaram-lhe o cabelo. Milena não fazia a mínima ideia do que

se estava a passar, mas manteve-se quieta enquanto a

arranjavam. Não pareciam ter más intenções, de todo.

Continuava era preocupada com os seus amigos, que não fazia

ideia por onde andariam. Colocaram-na num carro votivo e

encaminharam-na para outro salão, que tinha ligação ao primeiro,

e pôde estar em pé de superioridade para com todos os

restantes, naquele pedestal. Algo estava estranho, e não estava

a compreender exatamente o que seria. Reuniu-se um grupo de

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gnomos em semi-círculo à volta desta, e proferiram algumas

palavras indecifráveis, que um gnomo mais idoso traduziu:

- Viva à nossa rainha, finalmente a encontramos! - E a recéciana

não conseguiu não sorrir, mas de surpresa. Mirou toda aquela

gente que a aplaudia como se fosse realmente a sua raínha, e

corou. O caminho abriu-se à sua frente, e chegaram ao salão o

que pareciam ser 4 prisioneiros, 3 homens e uma mulher, a sua

equipa! Milena mirou-os, e fez contacto visual com Sec. O

príncipe mirou-a, de tom de pele claríssimo, toda vestida de

branco, com os seus longos cabelos lisos e negros rejubilantes,

e desta realçavam-se os seus olhos de tom oceânico, empávidos

e serenos, que o miravam carinhosamente. Milena corou

novamente, desta vez a fazer contacto visual com Sec, muito

belo e pouco moreno, com o seu cabelo negro atirado para o seu

lado direito. Tinha também barba apenas no bigode e no queixo,

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que se unia. Os seus olhos eram da cor da noite e transpassavam

mistério envolvido e muita dor, algo que a cativava sem saber

porquê.

- Podem soltá-los, são meus amigos. - Proferiu a nova rainha dos

gnomos. Assim o fizeram, e Lethícia correu para abraçar a

companheira, tendo em conta que não sabia desta até ao

momento:

- Estás bem?! – Perguntou, logo depois do abraço.

- Sim estou, mas e vocês? O que é que vos aconteceu?!

- Não sabemos ao certo, levaram-nos enquanto dormíamos. -

Respondeu Marcos, que surgia de trás.

- Devolvam-lhes os seus pertences, por favor. - Pediu Milena ao

velho gnomo, que passou a mensagem aos restantes. Após

alguns minutos já todos possuíam todo o seu equipamento, e

foram os 5 dar uma volta pela cidade subterrânea, onde as

atenções estavam todas centradas nestes.

- Os gnomos não estavam extintos? Ou não era mito? Sempre

ouvi dizer isso… - Questionou Drazi, na sua inocência.

- Bem, acho que afinal não... - Respondeu o líder enquanto

levantava ambos os braços, como que sem saber explicar. -

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Vamos ficar no máximo três dias cá, pelo menos estamos

seguros.

Já de madrugada, Milena acordara com uns pesadelos, e

decidiu dar uma volta pelo palácio. Infelizmente acordou Lethícia

com o barulho que foi fazendo:

- Huh... – Acordou, sonolenta. – Onde… Vais… Milena…?

- Dar uma volta, estava a ter um pesadelo... - E baixou a cabeça.

- Posso… Fazer-te uma pergunta? – Esfregou os olhos e

sentou-se na cama.

– Acho que sim... – E a sua amiga mirou-a, olhos nos olhos.

– Tu sentes qualquer coisa pelo Sec, não sentes? – E Milena

encarnou por completo de vergonha, respondendo quase aos

gritos:

– Não, não, não, não! O que estás aí a dizer mulher?!

– Não te enganes a ti própria, amiga. – Afirmou Lethícia, num

tom talvez demasiado sério, e a amiga baixou novamente a

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cabeça, algo triste. – Eu sei o que estás a sentir e talvez lhe

devesses dizer o que sentes...

– Mas... E se ele não sentir o mesmo? E ainda por cima ele é

casado, eu não posso fazer isso…

– E se, e se, e se, não penses no que pode correr mal! Tu não

te vais sentir bem de qualquer das formas, tanto a lhe dizeres

como a não lhe dizeres, mas é melhor te arrependeres de não ter

dado certo do que não teres dito. E olha, eu vi-o a sair não sei

para onde, vai lá ter com ele!

– Mas...

– Vai! – E assim foi Milena, rumo ao salão de entrada, onde lá

estava Sec, de braços cruzados a mirar a cidade, imóvel. Foi até

ao seu lado e não conseguiu dizer uma única palavra. O príncipe,

por sua vez, também nada disse, e ali permaneceram em silêncio.

Só alguns segundos mais tarde é que a viscondessa foi capaz

de quebrar o silêncio:

– No que estás a pensar? – Pergunta à qual Sec não

respondeu.

– Então? Que se passa? – Insistiu Milena.

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– Só estou com um mau pressentimento. – E tornou a retirar-se

para os seus aposentos, deixando-a sozinha, que se sentou nas

escadas, a pensar:

– Talvez seja melhor não dizer nada, nota-se mesmo de quem ele

realmente gosta, e não sou eu. – Encostou a testa aos braços,

que cruzavam por cima dos joelhos, a refletir, com lágrimas nos

olhos.

Já na manhã seguinte, encontraram-se no salão de entrada

e foram dar uma volta pela cidade. Aproveitaram para parar

numa pequena taberna, onde se sentaram à mesa a beber uma

bebida tradicional gnoma, que não conseguiam decifrar os

ingredientes. O grupo conversava:

– Isto sabe-me a azevinho, não sei porquê... – Afirmou Sec,

referindo-se à bebida.

– E já alguma vez provaste azevinho por acaso? – Comentou e

riu-se Milena, enquanto o mirava.

– Parem tudo! – Exclamou Marcos ao levantar-se

repentinamente. – Estão a sentir a terra a tremer?!

– A tremer? – Questionou Drazi. – Acho que não. – Quando

num ápice sentiram todos um grande tremor de terra, e

agarraram-se imediatamente à mesa. Parecia nunca mais

terminar:

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– Parecem mil homens a correr! – Exclamou Marcos aos berros.

Assim que o tremor cessou, correram até o palácio para

averiguar a situação, mas os habitantes pareciam agir com

normalidade. Milena correra até ao velho tradutor para

perguntar o que se passava:

– O que se passou?! Porque é que estão todos a agir com tanta

calma?!

– Relaxe majestade. – E sorriu o velho. – Isto costuma

acontecer sempre que exércitos atravessam as terras aqui por

cima. – Repentinamente, o velho, que se encontrava de costas

viradas para a cidade, começou a sangrar da boca, até cair imóvel

para a frente, para choque dos 5. Armaram-se de imediato e

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fecharam as portas do palácio, suspeitando que seriam eles os

alvos. Pararam durante cerca de um, dois minutos, para

prepararem um plano:

– Preparem-se, eu e o Sec ficamos com a linha de frente, Drazi

e Milena, cubram-nos. Lethícia, ficas com a longa distância,

vamos lá equipa, é o nosso primeiro grande teste! – E após as

indicações serem delegadas, foi o próprio líder que abriu os

portões, sendo surpreendido por uma alvorada de soldados da

Dopácia, tipicamente vestidos em azul, que agarraram Marcos,

Drazi e Lethícia, sem conseguirem estes reagir. Milena recuou,

mas Sec contra-atacou, porém, assim que o seu golpe estava

pronto a degolar um adversário, foi bloqueado. Um pontapé de

grande força foi-lhe logo aplicado, derrubando-o para trás com

um grande ímpeto. Assim que abriu os olhos, ainda sentado, não

acreditou no que via: Quem lhe havia bloqueado o golpe havia-

o feito com uma rapieira, e mirava-o intensamente. Era uma

mulher com vestes azuis e brancas, de armadura leve e um liso e

longo cabelo de tons acastanhados claros, morena e possuidora

de uns serenos olhos, cor de avelã, que naquele momento

pareciam atormentados. Tratava-se da mãe dos seus filhos, da

mulher dos seus sonhos, da pessoa cuja imagem nunca lhe

abandonava a mente, era Diana. Sim, essa mesma pessoa, ao

que parecia, era uma nobre da Dopácia, o reino mais detestado

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de Sec, por razões mais que óbvias. Continuou a mirá-la, sem

conseguir mexer-se ou dizer alguma palavra, boquiaberto. Diana

ignorou-o, e dirigiu-se aos 5:

– A nossa missão aqui não vos inclui a vós, recécianos, por isso

ficarão aqui sob a nossa custódia até o nosso objetivo ser

alcançado. Prendam-nos a todos!

– Sim, Duquesa Wahlstedt!

– Duquesa? – Pensou o príncipe para si mesmo. – Como é que

ela tem um título destes e nunca foi capaz de me dizer nada?

Wahlstedt? Nunca ouvi esse nome na vida, como assim?! Como

é que ela foi capaz de me mentir durante tanto tempo?! – E os

seus olhos encheram-se automaticamente de lágrimas. Milena

olhou para Sec, e não se quis deixar estar, partiu para atacar a

duquesa, que nem se dignou a olhar para ela. A recéciana

lançou-se com tudo e lançou um golpe de ceifa ao pescoço da

adversária, que se baixou como um relâmpago. Ao aproveitar a

inércia do movimento da ceifa, enterrou-lhe uma cotovelada de

lado no rosto, deixando Milena automaticamente inconsciente,

e o príncipe continuou imóvel. Os seus olhos jorravam lágrimas

como só por uma vez na sua vida haviam jorrado, aquando da

morte da sua mãe. A sua namorada nem olhou para ele, e os

guardas amarraram-no também, à semelhança dos seus amigos.

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– Acorda Sec! – Berravam os seus companheiros, mas este não

parecia estar na mesma realidade destes. Não via nada, não

ouvia nada, só lhe vinham memórias com Diana à cabeça: Os

dois, felizes e contentes enquanto passavam tempo juntos na

floresta; enquanto passeavam pela capital; enquanto iam

apanhar fruta; enquanto viam nascer e crescer os seus filhos...

Mas descobria agora um outro lado desta que nunca havia

conhecido, oceanos continuavam a cair-lhe pelo rosto, e as

memórias continuavam a atravessar-lhe a mente.

– Se isto for um pesadelo, eu só quero que me acordem... –

Assim que as suas mãos foram atadas, foi colocado junto dos

companheiros, que acabaram por perceber de que se tratavam

aquelas lágrimas do amigo, mas apenas Marcos foi capaz de

quebrar o silêncio naquela situação:

– Na altura adequada temos pessoas que nada de nós querem,

e na altura inadequada temos pessoas que o mundo dariam por

nós. Cabe a cada um a escolha: ou circunstância ou alguém. – E

fez-se um silêncio intenso. Milena continuava inconsciente, e ali

permaneceram, quietos e calados, durante cerca de 15 minutos.

Durante este tempo só ouviam imensos gritos de dor e agonia

por parte dos gnomos, que eram cruelmente chacinados pelos

dopácios liderados pela amada de Sec. A certo ponto, quando

começaram a libertar os 5, Diana aproximou-se do namorado,

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que continuava deitado, de barriga para baixo, e com o rosto

pousado sobre o frio mármore do palácio, já com os olhos

inchados de tanto chorar. Baixou-se, fez contacto visual com

este, e disse-lhe com a maior frieza do mundo:

– Esquece-me, eu não sou quem tu pensas que eu sou. Acabou.

– E virou-se, abandonando o salão e dando ordem às tropas

para a seguirem. Sec não moveu um único músculo. Estava

pálido, cheio de lágrimas, e parecia completamente destruído

por dentro. Foi de imediato reconfortado pelos amigos,

especialmente por Milena, que o segurou no seu colo e o

abraçou. Sempre haviam falado de Sec como alguém muito

alegre e de bom humor perante a vida, nunca o haviam visto assim,

tão frágil, tão vulnerável...

- Equipa, vamos levar o Sec ao quarto e deitá-lo, tu ficas com

ele Milena, enquanto nós vamos averiguar os estragos que

fizeram na cidade. Só sairemos deste buraco quando ele estiver

bem. Ficas com ele?

- Que pergunta Marcos – Reagiu a companheira com uma cara

de aborrecimento. - Claro que fico! – E carregaram-no os 4

para a cama pelos braços, quase arrastado, onde o amigo

permaneceu tal e qual como o colocaram, sem mover um dedo.

Assim que Marcos, Lethícia e Drazi saíram, Milena ficou a mirar

o seu amado, que parecia estar noutro mundo. Estava perdido.

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Não havia mais nada que pudesse fazer. Tratava-se de um

contínuo desespero e uma profunda agonia na alma que só

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alguém com um coração partido é capaz de sentir.

- Dói muito? – Perguntou-lhe a amiga, na inocência.

- Se dói? – Respondeu em lágrimas enquanto soltou um sorriso

irónico de raiva misturado com tristeza. – Dói muito. Dói saber

que a vamos perder e nada podemos fazer. Como é que é

possível eu passar bem com isto se sei que o meu sol se perderá

no horizonte? E é difícil, é difícil ver que o outro está inerte em

relação a nós, porque o amor nada deve à indiferença, são o

oposto um do outro. O ódio por sua vez advém do amor, e nunca

o contrário, mas da indiferença nada se gera, ela anula qualquer

presença de sentimento. Enfim, pega-se em todo um muro

construído e derrubamo-lo. – Parou durante uns segundos para

chorar incessantemente, até que se acalmou ligeiramente e

tornou a falar. - Nada mais será como de antes. – Esmurrou a

parede. - Não existe lua depois do sol se pôr e tudo se torna

vazio: é retirada toda a água do nosso oceano; assim como os

milhares de estrelas do nosso céu noturno e a completa essência

da nossa alma. – Tornou ao choro obstinado por momentos, até

conseguir novamente falar. - É retirado todo o sangue do nosso

corpo, e esfriamos. Porque este é o único caminho por onde é

possível evitar a dor, o sofrimento, a solidão e… - Soluçou de

choro. - Acima de tudo a perda. – Ainda sentia imenso a dor da

perda da mãe, apesar de todo o tempo que já havia passado. -

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E só neste ponto se compreende o porquê de nunca se contar

a parte má do amor. – Tornou a soluçar e desta vez tentou limpar

o grosso das lágrimas no rosto. - Percebemos que viemos a este

mundo desprovidos de uma essência que nos faça viver

realmente, e por mais felizes que consigamos ser sem aquele

alguém, que outrora nos deu vida, nunca estaremos inteiramente

completos. Este é o lado negro do amor. Eu sou tão inútil. – E

mais lágrimas lhe tornaram a aparecer.

- Não. – Sorriu Milena enquanto também os seus olhos se

enchiam de lágrimas, mas de felicidade. Segurou na mão do

companheiro e olhou-o nos olhos, num olhar terno, carinhoso e

sincero. - Tu não és um inútil. Tu existes para algo. Sec, eu... -

E fizeram-se uns momentos de silêncio enquanto esta se tentava

inteirar do que ia realmente dizer ali. – Eu sinto alguma coisa

forte por ti como já deves ter reparado, e tu fazes o meu mundo

colorir como nunca antes alguém o fez. Adoro quando me reviras

os olhos, só me apetece irritar-te mais, só para ver a tua cara de

irritado com aquele sorrisinho de canto. Oh, esse sorriso mata-

me! Adoro quando me tocas, nem que seja só uma simples mão

no ombro para me apoiar. - E corou, com os olhos afundados em

lágrimas. – Enfim, tudo sobre ti me fascina, e eu realmente acho

que tens algo de especial. Eu amo-te, Sec. – E puxou-lhe a

cabeça, beijando-o interessantemente, beijo este que o príncipe

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não recusou, e correspondeu (pudera, a sua amiga era

formosíssima e extremamente bela). O afeto começou a evoluir,

e ambos se apalpavam ardentemente, e começaram a tirar a

roupa um o outro.

- Se fazer isto significar que ele fica melhor, eu faço sem

qualquer problema. - E todo um clima se gerou enquanto lá

estavam sem as suas roupas...

- Eles estão a dormir? – Pôs em questão Lethícia, enquanto via

Drazi a espreitar pela porta discretamente.

- Acho que sim, vamos deixá-los aí a descansar. – Afirmou.

Sentaram-se então lado a lado na grande escadaria, a

conversarem. – Depois de sairmos daqui para onde vamos

Marcos?

- Para nordeste, para as montanhas. Acho mais seguro para nós

porque temos mantimentos apenas para alguns dias.

- Rapazes, ainda não falamos sobre uma coisa... – Interrompeu a

moça, com um rosto de preocupação visível.

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- O quê? – Responderam estes, nervosos que se tratasse de

mais problemas.

- Algum de vocês sabe quem era aquela mulher da Dopácia? –

E pararam um pouco para refletir enquanto visualizavam o rosto

da tal Duquesa, e Marcos quebrou o silêncio de imediato:

- Acho que não é difícil de perceber que era a namorada dele,

agora porque é que ele ficou assim logo que lhe pôs a vista em

cima, isso eu já não sei.

- Perguntamos-lhe? – Sugeriu Drazi, sempre inocente.

- Estás tolo? Deixa-o estar, não vamos andar a perguntar-lhe

isso agora... Um dia havemos de saber isso. – Respondeu

assertivamente a rapariga.

- Pronto, pronto, já percebi. Mas como é que o podemos ajudar?

- Não podemos. – Interrompeu o líder. – Alguém magoado desta

forma não pode ser curado por outros. É algo que só ele pode

curar, e é com muito tempo. – E fez-se um silêncio infelizmente

triste. – Enfim. – Tornou a falar este: - Temos de ocupar o

nosso tempo de alguma forma, o que fazemos?

- Podemos ir até à superfície e ver como está o tempo, não? -

Sugeriu Drazi.

- Boa ideia! – Responderam ambos quase em uníssono.

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- Ei! Dissemos a mesma coisa! – Disseram um para o outro, e

riram-se porque se repetiu novamente.

Enquanto isso Sec e Milena acordaram e decidiram repetir a

dose, até que cerca de meia hora depois saíram do quarto. Nada

apagava a cara deprimida do príncipe, nem o tratamento que

tinha tido com a amiga, o que fez Milena deprimir um pouco. Ao

procurarem o resto do grupo e não os encontrarem de forma

alguma, foram até à superfície, onde os seus companheiros

repousavam debaixo de uma árvore, à sombra. Milena estava

muito envergonhada e não foi capaz de dizer uma única palavra a

Sec, que por sua vez parecia mais inerte e apagado do que

nunca. Apresentava um rosto pálido e sem emoção alguma.

- Estão prontos para ir? – Perguntou o líder da equipa,

sorridente, com a sua inconfundível barbita de cavanhaque no

queixo. Nenhum dos dois respondeu, então Marcos puxou por

ambos enquanto se levantava. – Não é por terem feito amor que

vão ficar mudos e não me vão responder, não é? – E riu-se à

gargalhada. Milena corou de imediato e encolheu-se de

vergonha, tentando negar:

- Não! Nananinanão! Não fiz... Não foi nada disso! Cala-te! –

Ficou tão envergonhada que foi a correr de volta para o palácio.

Os companheiros riram-se imenso com a situação, e teve de ser

Lethícia a meter ordem nos rapazes:

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- O que é que tu foste dizer Marcos... – Comentou, levando uma

mão à testa. Teriam então de aguardar pela companheira, e

decidiram mirar a paisagem. Encontravam-se num vale, não muito

longe da fronteira de Recécio, banhado pelo sol do início da

tarde, e abrigavam-se da sua intensidade debaixo de uma árvore,

onde se encostavam. Sec mirava o horizonte montanhoso,

completamente deprimido e com a alma vazia na sua totalidade,

ou pelo menos era o que transparecia. Ali aguardaram mais de

meia hora por Milena, que aproveitou para trazer as coisas que

faltavam para poderem partir.

- Perfeito, trouxeste os mantimentos! Bom trabalho, mas tenho

uma pergunta, vamos fazer uma paragem numa aldeia do outro

lado das montanhas a norte e passar também lá a próxima noite,

correto?

- Sim Marcos! – Responderam os 3, com exceção do deprimido

do grupo.

- Certo, demoraremos cerca de 1 hora até lá, vamos lá equipa! –

E iniciaram o seu caminho, enquanto conversavam:

- Milena! – Sussurrou-lhe o amigo Marcos ao ouvido.

- Han? Diz lá!

- Conta lá o que se passou entre vocês os dois... – E corou de

imediato, tentando desviar o assunto:

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- Com quem? – Atrapalhou-se toda. - Não temos de nos

despachar?! Sem conversas! – E Lethícia, mesmo ao lado, riu-

se baixinho enquanto pensava para si mesma:

- Que grande grupo que estamos a criar, estes foram os

melhores dias da minha vida, sem quaisquer dúvidas. Espero não

os perder nunca, são a minha segunda família. – E soltou um

genuíno sorriso de felicidade, sendo surpreendida por um berro

atrás:

- Marcos! – Chamou Sec, cativando a atenção de todos. O

amigo virou-se para trás, e o príncipe exclamou: – Luta comigo,

aqui e agora, quero testar-te contra mim. Estamos para lutar já

há uns dias e esse momento vai ser agora.

- Estás doido Sec?! – Exclamou Drazi. As raparigas nada

foram capazes de dizer, e Marcos sorriu, respondendo:

- Eu aceito o desafio, e eu também quero lutar contra ti.

- Oh, céus... – Reagiram todos, enquanto se afastavam do meio

destes, e assim que se prepararam ambos para a luta, Milena

sentou-se, extremamente preocupada, porém não quis

demonstrar à frente dos parceiros.

- Milena. – Chamou Sec, com um sorriso de canto.

- Hun? – Reagiu, ao olhar para o amado em posição de combate.

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- Disfarça essa cara de cu, ou tenta pelo menos. - E esboçou

um sorriso de canto, que ao ser notado pela amiga, lhe

respondeu:

- Cala-te idiota, foca-te no combate. - E os adversários

entreolharam-se de imediato enquanto ficavam no aguardo pelo

sinal de Drazi.

- Preparados? - Comecem! - Marcos partiu na ofensiva com um

golpe de baixo para cima, que Sec se desviou, enquanto se

baixou, e atirou um remate ao calcanhar do pé de apoio do

parceiro. O líder desviou-o com um salto, tornando a lançar um

golpe, desta vez de cima para baixo, que o companheiro

bloqueou, com a sua espada na horizontal. Separaram-se e

entreolharam-se novamente. O resto do grupo espantou-se

com tamanha velocidade e rápidas reações por parte dos dois.

O ambiente estava tenso, e uma gota de suor nervoso caía pela

testa de ambos, que mantinham a compostura de combate.

Desta vez foi Sec a partir na ofensiva, e trocaram várias

dezenas de golpes, à direita, à esquerda, em cima, em baixo, em

rotativos, a esquivarem-se, estando em igual patamar em todos

os momentos. Após um, dois minutos de combate intenso, o

príncipe julgou apanhar Marcos desprevenido a descair-se para

trás após bloquear um golpe seu, e com o braço direito do amigo

(onde segurava a espada) fora de alcance, lançou um ataque

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frontal, de cima para baixo, com ímpeto máximo. Assim que a

espada descia, em milésimas de segundo, Marcos curvou o

corpo de lado, o suficiente para se desviar. Pousou a sua mão

esquerda sobre as mãos de Sec que seguravam a sua espada

longa, e num movimento só, a uma velocidade estonteante,

aplicou um pontapé tão forte no ombro esquerdo do parceiro,

que foi automaticamente projetado para o lado, dando uma

queda feia. A sua espada foi parar ainda mais longe, e Drazi

logo exclamou, de modo a que não lutassem mais:

- Temos um vencedor! É Marcos von Astreus! – Proferiu

enquanto levantava o braço direito, do lado onde se encontrava

o vencedor. Sec, no chão, sangrava na cara devido a um grande

arranhão, e olhou para o companheiro, que o olhou de cima, e lhe

disse:

- Não tinhas a cabeça focada na batalha, só precisavas de

descarregar, eu percebo. Se eu não fosse rápido ter-me-ias

morto ali, não hesitaste... - E estendeu a mão ao príncipe em

cumprimento, que Sec retribuiu, e levantou-se.

- Desculpa lá, tens razão... Mas eu nunca mataria um amigo. - E

esboçou um sorriso de canto, baixando a cabeça, desanimado.

Pensou para si mesmo: - Ele é extremamente rápido, talvez

mesmo melhor que eu... Tenho de treinar mais intensamente…. É

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suposto ter em mim o peso de ser um dos, se não o melhor

guerreiro a seguir ao rei, tenho de melhorar tanto, raios!

- Então rapazes, vamos? - Perguntou Lethícia, pegando nas

suas coisas, meio que com alguma pressa.

- Sim, sim, vamos equipa! - Afirmou com assertividade o líder, e

rumaram à aldeia mais próxima.

Pelo caminho, Drazi parou junto de Sec, havia algo ali que

lhe estava a coçar a pulga atrás da orelha, e ao colocar-lhe a mão

no ombro, perguntou-lhe ao ouvido:

- Aquele teu último golpe, tu não ias conseguir pará-lo, pois não?

– Sec reagiu com um riso irónico:

- Eu ia, acredita. – Suspirou. – Eu nunca, mas nunca na minha

vida virar-me-ia contra um amigo, e muito menos o mataria, e

repugno todo aquele que o faz.

- Se tu o dizes… - E tirou-lhe a mão do ombro. – Eu acredito

em ti!

- Posso ser de tudo, mas um traidor aos meus amigos é algo que

nunca verás, fica tranquilo Drazi. – E sorriu-lhe genuinamente

apesar de tudo o que lhe atormentava a alma naquele momento.

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- Estão a ver? É já ali! - Drazi entusiasmou-se ao ver a aldeia. -

Vamos mais rápido, preciso mesmo de me sentar!

- Nós também, mas não estamos a apressar o grupo! - A típica

resposta de Milena, que deixou o companheiro algo

desconfortável e constrangido.

- Pronto, desculpa... - Ao chegarem à aldeia repararam que se

tratava de uma povoação típica: Casas em pedra, um forno

coletivo, vários espigueiros para armazenar pão e grão, e não

deviam haver mais de uma dúzia de casas. Apenas um habitante

se encontrava na rua, a mirar os campos cultivados em redor.

Tratava-se de um velhote com barba grande e branca, e de

cabelo grisalho, que se curvava ligeiramente para a frente.

- Olá monsenhor. – E curvaram-se os 5 como que em

cumprimento ao senhor. - Somos viajantes e paramos por cá

para fazer a paragem desta noite, e queríamos humildemente

pedir-lhe abrigo. – Requisitou humildemente o líder.

- Claro rapaz! Gostamos sempre de receber pessoas novas por

cá! – Contudo o rosto do idoso mudou totalmente de um

momento para o outro. - Mas há um problema. - O grupo, que já

sorria, deixou de lado a alegria já à espera de alguma má notícia:

- Diga lá. - Puxou Marcos.

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- A aldeia está deserta aqui fora como já devem ter olhado (o

velho camponês não falava muito bem), mas há uma razão para

isso. É porque um grupo de bandidos anda por aí neste mês e

roubam-nos, então todos têm medo de sair de casa. Ainda

ontem levaram uma criança inocente como refém porque não

temos mais nada. Vi pela vossa armadura que são guerreiros e

por favor posso-vos pedir ajuda? - E o seu rosto encheu-se de

lágrimas quase de imediato, enquanto pegou na mão direita de

Marcos. Sec deu um passo em frente e colocou uma mão sobre

o ombro do homem, dizendo-lhe com toda confiança, e quase se

sobrepondo ao líder da equipa:

- Nós vamos matar esses patifes e salvar a criança, ou eu não me

chamo Sec. - E esboçou um confiante sorriso.

- Sec? Senhor? Da família real dos von Asterion? Desculpe

pelas minhas más maneiras, príncipe Sec!!

- Pare com isso homem! Sou só um nobre normal aqui. Nós

vamos ajudá-lo, mas diga-me a que horas costumam passar cá os

bandidos?

- Já cá passaram por hoje senhor... Agora só amanhã é que

voltam, se bem que às vezes andam por aqui de madrugada um ou

dois deles.

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- Não se preocupe, amanhã vamos limpá-los e encontrar a

criança. - O idoso sorriu, bem mais tranquilizado. - Mas diga-me,

onde é que podemos ficar por hoje?

- Ah sim, quase me esquecia senhor Sec! - E limpou as lágrimas

com o trapo que vestia. - Poderão ficar na cabana dos visitantes,

aquela casota de madeira ali. - E apontou para uma pequena

casa em madeira que parecia bem apresentável. - Venham

senhores, eu levo-vos lá! - Ao entrarem viram apenas 6 camas, e

nada mais. Percebia-se que a pobreza naquela aldeia era

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extrema. Pousaram as coisas e agradeceram a hospitalidade.

Sec decidiu ficar na sua cama a repensar sobre a sua vida e

enquanto isso os seus companheiros foram conhecer e

tranquilizar os aldeões. O príncipe refletia, deitado de barriga

para cima, na sua cama, com as mãos atrás da cabeça. Pensava

sobre os porquês das ações do amor da sua vida, e recordou-se

de uma conversa que uma vez haviam tido na mítica planície:

- Sec? – Chamou Diana, mas o seu namorado demorava a

responder porque apreciava a brisa montanhosa de olhos

cerrados.

- Ah sim, sim, diz! – Levantou o tronco de repente, ficando lado

a lado com a amada.

- Agora já não digo, tanto tempo para responder... – Virou a

cara e cruzou os braços, em birra.

- Vá, diz lá.... Só estava distraído. – E deu-lhe um beijo na

bochecha, e lá Diana parou a birra e perguntou-lhe o que queria

perguntar:

- Porque é que tu lutas?

- Hum... - Ficou a pensar Sec durante uns segundos enquanto

mirava o céu límpido e azul daquele dia. - Porque tenho, creio eu.

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- Não concordo... Eu conheço-te tão bem, mas tão bem… Tu é

que ainda não descobriste porque é que lutas.

- O que é que estás para aí a dizer, mulher? – Não estava a

perceber a confiança da sua namorada ao se referir àquele

assunto, tendo em conta que ela nem lutava e detestava

violência.

- Um dia hás de perceber que nem todos os que lutam amam, mas

todos os que amam, lutam, eventualmente, e eu não sou

diferente.

Refletia sobre esta frase de Diana: "e eu não sou

diferente".

- Será que ela tinha motivos muito fortes para fazer aquilo? Mas

o quê?! Só a queria perceber... - Milena entrara na casota e Sec

nem se dignou a olhar para a companheira que, preocupada, lhe

perguntou:

- Estás melhor? – Disse, sentada na cama.

- Sim. - E levantou-se para ir até à rua, com a amiga indo logo

atrás. - Milena. – Chamou.

- Sim? - E o príncipe lançou-lhe um olhar tão vazio, quase

demoníaco, que a assustou até na alma.

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- Não quero que se preocupem comigo, há missões por cumprir,

foquem no que importa. - E continuou a andar para a frente,

rumo aos longos campos de trigo, onde se sentou a refletir por

uns minutos enquanto era banhado por um vento leve que trazia

consigo sementes. A vida era algo tão volúvel e inconstante que

a qualquer momento tanto nos trazia o melhor quanto o pior…

Já de noite, todos os habitantes foram deitar-se, e a

equipa recéciana também, e fora Milena a escolhida para ficar

acordada, de guarda.

Algures pela madrugada, a Viscondessa ouviu barulhos lá

fora e pegou de imediato na sua ceifa, dirigindo-se para a porta

em silêncio, onde encostou a cabeça de lado para ouvir:

- Os canalhas ainda não devem ter o dinheiro. – Falavam baixo.

- Então por que raio quiseste vir cá?

- São ordens do Senhor Coraggio, não as vou questionar. – E

os dois bandidos seguiram caminho para norte, em direção às

montanhas.

- Vou segui-los e recuperar a criança. – Pensou para si mesma

com um pensamento heroico. Esperou que os bandidos se

afastassem mais um pouco para decidir sair. Olhou com cuidado

à saída para os dois lados, e seguiu caminho, não pelo trilho, mas

pelo meio do trigo, enquanto os observava e os seguia de longe.

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– Com que então são os cavaleiros brancos que andam a fazer

isto.... Pelo menos os cavaleiros negros não têm interesse

económico, se não já éramos. – Suspirou, e uma gota de suor

nervosinho escorria-lhe pela pálida pele do rosto, e continuou a

sua travessia pelo meio do trigo, até os dois homens pararem:

- Ouviste aquele barulho? – E apontou com a tocha na sua mão

direita para trás, a tentar ver se via algo a se mexer no trigo.

- Eu não ouvi nada, deve ser um rato ou assim.

- Se o dizes... – Milena suspirou de alívio ao ouvir isto, e

prosseguiu na sua caminhada, até chegarem a uma pequena

gruta na montanha em que os perdeu de vista, mas quis manter a

sua ideia de resgatar a criança, e decidiu entrar. Via uma luz

ténue ao fundo e optou por segui-la, embora com muito medo à

mistura.

- Devia tê-los trazido comigo, raios! Sou tão estúpida, mas

agora vou até ao fim. – O caminho pela montanha era algo longo,

e não muito largo. Ao chegar-se mais perto da luz pôde observar

que se tratava de um compartimento maior, iluminado ao centro

por uma fogueira, cujo fumo subia continuamente, o que dava a

entender a presença de um túnel pra cima, para sair o fumo.

Encostou-se ao lado menos iluminado das paredes do corredor,

e com a sua ceifa em riste avançou lentamente. Ao atingir o limite

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do corredor decidiu, estupidamente, saltar para o meio do

compartimento sem olhar como deve ser para o seu interior ou

analisar os cantos. Enquanto no ar, sentiu uma pancada

fortíssima na cabeça, e caiu imóvel junto à fogueira.

Atordoadíssima, acordou alguns minutos depois, estonteada e

desamparada. Sentiu os pulsos e os calcanhares atados com

uma corda, atrás das suas costas, e a sua visão encontrava-se

turva e densa.

- Ora bem, quem é que temos por cá? – Perguntou um homem,

que envergava uma armadura branca e que se agachava em

frente à viscondessa. – Milena Gerhart, viscondessa de

Recécio e companheira de equipa do príncipe Sec, é um prazer.

– E soltou um sorriso extremamente irónico. - O meu nome é....

Bem, talvez isto não lhe interesse, então vou dar uma volta. – E

virou-se para os seus dois capangas, apontando com um dedo

em desprezo para trás para a recéciana: – Tratem dela. – E

abandonou o compartimento por um dos 3 corredores,

calmamente.

- Hehehe. – Riu-se malevolamente um deles. Milena tentou dizer

algo, mas nada parecia querer-lhe sair da boca. O capanga que

se riu ao ver o seu esforço para falar deu-lhe um forte pontapé

na barriga, e a viscondessa urrou de dores. Nem segundo depois

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o outro bandido fez o mesmo, e aproveitou ainda para

desembainhar a sua espada.

- Pega nela, vou arrancar-lhe o pescoço, recéciana nojenta.

Quem se dá com os cavalheiros negros tem mais é de morrer! –

Berrou mesmo na cara de Milena, que nem conseguiu reagir. O

seu companheiro levantou-a pelo cabelo, como se de um tempo

velho trapo se tratasse. O rosto de Milena encheu-se de

lágrimas, de dor; de agonia; de medo; e de desespero. Doía-lhe

tudo, tanto física como psicologicamente. O pensamento da

morte aterrorizava-a mais do que qualquer outra coisa, e estava

face a esta. A imagem de Sec, feliz e sorridente, passava à

frente dos seus olhos, e arrependia-se naquele momento por

não ter aparecido na vida do seu companheiro de equipa mais

cedo, mas agora era tarde para arrependimentos.

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- Mãe, pai.... Desculpem-me, eu não vou conseguir orgulhar-vos

ou fazer de vocês avós. Desculpa mano por não te poder

orientar durante mais tempo. Desculpem amigos e Sec,

desculpem-me todos... – E as lágrimas intensificaram-se nos

seus olhos, da cor do oceano, e percorriam-lhe a cara até caírem

no chão.

- Estás a chorar porquê, cabra? Até parece que não mereces! –

E num movimento só lhe encostou a espada ao pescoço,

fazendo jorrar algum sangue do pequeno corte provindo do

encosto. De repente, e absolutamente do nada, uma adaga veio

a voar de um dos corredores e acertou em cheio na cabeça do

bandido com a espada, que caiu para o lado, imediatamente

morto. Enquanto o outro tentava perceber o que se passou,

largou Milena, que caiu e não mais se mexeu. Outra adaga veio

do mesmo corredor, atingindo o último bandido no meio da testa,

que colapsou contra a parede, tal foi a força da arma

arremessada. Ouviu passos na sua direção vindos do mesmo

corredor, e viu Sec a andar até si. Sorriu, enquanto o amigo a

soltava, embora estivesse extremamente sério e inerte como

tinha estado ultimamente:

- Vamos lá, já passou. Segui-te até cá porque reparei que saíste

sozinha. – E pegou em Milena ao colo, encaminhando-se para a

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saída, quando, ao chegar cá fora, viu um enorme clarão na

direção da aldeia. – Um incêndio?! Raios!

- Sec... – Esforçou-se a companheira para falar. – Deixa-me e

vai, eu aguento-me.

- Não! Vamos! – E começou a correr com a amiga nos braços a

todo o gás. Ao aproximar-se viu uma multidão a olhar para a sua

aldeia, em chamas, todos num choro incessante. Junto deles

estava Marcos, que tentava tranquilizar uma mulher:

- Tem a certeza de que a sua filha está ali dentro?!

- Sim! Ela voltou! – E desmanchou-se em lágrimas. – Por favor

ajude-me! – Suplicou desesperadamente. Sec pousou Milena

e correu na direção da casa que a mulher apontou, para espanto

de todos, que o olharam atentamente. O príncipe, sem qualquer

hesitação, furou pelas chamas como se de nada se tratasse.

Momentos depois atravessou uma das paredes, partindo-a com

a menina nos braços, que tinha ferimentos ligeiros e gritava pela

mãe.

- Mãe!! – Sec pousou-a.

- Anya!! – Gritou a progenitora, e correram uma para a outra,

dando um longo abraço fraterno revestido de lágrimas de alívio.

Num ápice toda a população da aldeia rodeou o príncipe, que

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nem um arranhão tinha, apesar de ter atravessado paredes de

chamas a andar:

- O senhor é um deus! – Exclamou um jovem, pasmado.

- Onde estão os meus companheiros? E é esta a menina

perdida? – Perguntou.

- Dois deles foram rondar a área senhor, e sim, ela era a criança

sequestrada e voltou sozinha no início da madrugada. Mas

queria agradecer-lhe pelo que fez por nós.

- Não me agradeça, fizemos porque quisemos. Os bandidos já

estão mortos e não vos atormentarão mais.

- Sec! – Chamou Lethícia, que acabara de chegar à aldeia,

juntamente com Drazi.

- Vocês estão bem?

- Anda cá, já falamos. – E assim o foi. A amiga não estava com

boa cara.

- O que se passa? – Agora a preocupação passou também para

o príncipe.

- Bem, isto é tudo muito estranho: Primeiro a aldeia começa a

arder do nada; depois a menina perdida retorna, e isto não está

a bater muito certo...

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- Marcos! Anda cá! – Chamou Drazi. – A Milena onde está?

- Ah, deixei-a ali atrás, vou buscá-la. – E foi a correr buscar a

companheira atrás da multidão, que ainda chorava pela perda do

seu património pessoal e comunitário.

- Pronto, já estamos todos reunidos. Que faremos com a

população? Não têm para onde ir...

- Vamos levá-los connosco para a capital. – Afirmou o príncipe

super assertivamente. Marcos franziu a sobrancelha.

- Não, não, não! Não podemos simplesmente levar tanta gente

para lá viver sem avisar sua majestade. – Sec retrucou:

- Do meu pai trato eu, mas não as vamos deixar aqui para

morrerem, concordam?

- Eu estou de acordo, estas pessoas acolheram-nos e não lhes

podemos virar as costas. – Afirmou Drazi.

- Eu também, e podemos já partir, apesar de ainda faltarem uns

dias até a missão ser completa. – Complementou Lethícia.

- Que missão? A nossa missão é conhecermo-nos e andar por

cá. Não há um objetivo “normal” propriamente dito. – Disse

Sec.

- Pronto, mas não me responsabilizarei pelas consequências.

Que fique aqui dito. - Afirmou o líder da equipa, o que fez sorrir

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os seus membros. Lethícia tomou iniciativa de falar com a

comunidade.

- Aldeões, escutem! – Aguardou um pouco até ter a atenção de

todos estes: - Levar-vos-emos connosco para Recécio capital,

onde poderão começar uma nova vida!

- Mas, mas... Não temos dinheiro para pagar impostos... -

Relevou uma jovem mulher, preocupadíssima, enquanto ainda via

a sua casa a arder.

- Não se preocupem com isso, nós vamos arranjar uma maneira. -

Afirmou com confiança o príncipe recéciano, que se colocou ao

lado da companheira, com as mãos na cintura em repouso. Um

sorriso coletivo esboçou-se.

- Temos de partir de imediato! – Afirmou esta. - Por favor

peguem no que ainda vos resta e vamos andar. Limpem as

lágrimas, porque o futuro coleciona todos os sorrisos do mundo!

- E após uma preparação coletiva, seguiram os aldeões os

nobres de Recécio, rumo à capital. As meninas conversavam:

- Estás a conseguir andar bem Milena? - Perguntou-lhe a amiga,

preocupada.

- Sim, por agora estou a conseguir, não te preocupes. - E olhou

para a parceira, que tinha cara de caso. – O que se passa?

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- Não sei, isto foi muito, muito estranho... – Levou a mão ao

queixo, em reflexão. - A menina voltar do nada, um incêndio do

nada, isto não me está a cheirar nada bem.

- Ah! – Interpolou Milena. - Não vos cheguei a dizer, mas estes

bandidos eram vassalos dos cavaleiros brancos. Quando me

prenderam na gruta foi um deles que se dirigiu até mim.

- E o que é que ele disse? – A preocupação no rosto da

companheira era mais que evidente.

- Qualquer coisa sobre os cavaleiros negros, que quem se dava

com eles teria de morrer, mas menos mal que o Sec apareceu na

hora certa.... Vi a vida passar-me à frente dos olhos, não tens

noção. Nunca tinha estado numa situação assim, foi a pior

sensação que já tive, de longe…

- Já passou amiga, não te preocupes com isso agora, um dia de

cada vez e vamos em frente.

- Mas e tu Lethícia, quem é que tu consideras malfeitor aqui no

meio? Os cavaleiros negros ou os cavaleiros brancos?

- Aqui não existem santos... Uma organização quer enriquecer,

a outra quer a hegemonia mercenária, enfim.

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- Mas sabes que o Sec é um cavaleiro negro, certo? Por isso é

que a armadura dele é negra.

- Pois sou. - Afirmou o príncipe, que chegou de trás destas para

surpresa das mesmas.

- Assustaste-me… - Recompôs-se. - Mas porquê? - Perguntou

Lethícia, que parecia só agora perceber que o amigo pertencia

a tal organização, que tinha uma fama péssima pelo mundo.

- Hehehe. - Riu-se baixinho. - Nós temos um fundamento, não

matamos só porque sim. – Explicou, enquanto olhava para as

estrelas naquele limpo céu noturno. - O nosso objetivo, e a

razão pela qual quase todos os reinos nos odeiam é justamente

por querermos eliminá-los do mapa.

- Eliminar?! Como assim? - Retrucou Lethi, com ar de espanto

aparente.

- Cortar por completo a noção de hierarquia e de poder do

mundo; para torná-lo tão livre como nos nossos primórdios. – E

fizeram-se uns segundos de silêncio, antes de ser Milena a

quebrá-lo:

- Esqueçam isso, cada um com as suas ideologias e crenças.

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Capítulo VIII

O Contragolpe

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À medida que se aproximavam da capital, uns dias mais

tarde, uma grande nuvem de fumo foi vista a baloiçar no céu,

provinda da cidade, que alarmou os 5 nobres. Dirigiram-se para

lá de imediato, numa correria desenfreada:

- Marcos, ficas aqui a cuidar deles? – Pediu Sec, enquanto já

começava a correr para lá, virando-se para trás.

- Fico, fico! – E correram assim os restantes 4 para a cidade a

toda a velocidade, com medo de os seus entes se encontrarem

em perigo de vida. Atravessavam a floresta densa, e ao atingirem

as muralhas viram algo surreal, que nunca nas suas vidas acharam

que fosse possível: Um gigante, de cerca de 30 metros, que

destruía toda a cidade. Contudo, não era um gigante normal,

como Sec os conhecia: Este estava todo armado, da cabeça

aos pés, com uma armadura negra gigantesca. No topo da sua

cabeça encontrava-se um cavaleiro negro, que parecia lá estar

bem preso, mas não era possível decifrar de quem se tratava. Ao

perfurarem pelo portão, o príncipe começou aos gritos para o

gigante:

- Para!!! Para!!! – Mas não parecia estar a adiantar, este

continuava a espalhar destruição e caos por onde pisava. Casas

caíam, gritos ouviam-se por toda a parte e um fogo bravo

espalhava-se. A população fugia pelos portões citadinos em

agonia, aos berros e num tremendo desespero. As mães

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pegavam nas crianças ao colo, os pais tentavam carregar o

máximo de bens que pudessem, já outros.... Outros eram

esmagados impiedosamente pelo monstro. Os únicos nobres na

capital eram mesmo o Rei e o Vice-Rei, tendo em vista que os

nobres estavam ocupados com as suas missões. Sec correu

para o palácio, desenfreadamente, que não havia sofrido danos

ainda, e encontrou o seu pai e o seu tio no cimo da colina, com

uma preocupação mais que evidente no rosto, e dirigiu-se a

estes:

- Quem é que nos está a atacar?! Como é que isto foi

acontecer?!

- O teu querido tio Gabriel. – respondeu o pai, com um

desapontamento notável nas palavras, com um tom de ironia à

mistura.

- O quê?! - O mundo de Sec desabava uma vez mais. Não só

Gabriel não estava morto como agora atacava Recécio sem

piedade alguma. – Não pode ser... Eu vi! Eu vi-o matar-se!

- Pelo que me disseram o corpo dele nunca foi encontrado, tens

aqui a tua resposta. –Afirmou Lucka, muito sério e com a sua

postura habitual, apesar de tudo o que se estava ali a passar. –

Enfim, vou tentar fazê-lo descer. Sec e Maycon, vão lá para

baixo distrair o gigante, mas certifiquem-se que não morrem, por

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favor. – E começou a berrar para Gabriel: – És um cobarde,

irmão! Desce e luta comigo! – Mas não houve qualquer resposta.

- Ó matulão, estamos aqui em baixo! – Provocou o príncipe,

enquanto corriam pai e filho pela colina abaixo para tentar

distrair o gigante.

- Sec! - Chamou Milena, que se encontrava com os outros dois

companheiros. – O que fazemos?! – Estavam em pânico.

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- Ajudem a população a sair da cidade! - Ainda demoraram um

pouco a interiorizar o que iam fazer, e o príncipe relembrou-os: -

Vão! – E continuou a provocar a besta, que o notou desta vez.

– Acorda animal! Estamos aqui! – A besta virou-se, e levantou

um braço para atacar, fazendo-o descer rapidamente. Pai e filho

safaram-se, não paravam de correr. O gigante era algo lento, e

se aproveitassem a velocidade individual de cada um,

conseguiam escapar aos golpes. Lucka, em cima, não desistiu:

- És um cobarde e nunca passaste disso! Desce aqui e luta

comigo Gabriel! – E desta vez obteve resposta:

- Vou exterminar-vos a todos! Não valem o ar que respiram, sua

escumalha! – Passou desta forma uma indicação ao gigante, que

o pousou na colina do palácio, a alguns metros de Lucka, que se

virou para o encarar.

- Senhora? – Perguntou o criado, chegado ao quarto da

duquesa, todo extremamente bem decorado e requintado, em

tons de azul e branco. Parou na porta, em aguardo da resposta:

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- Diga-me. –Respondeu Diana com um sorriso na cara. – Podes

entrar! – Assim o fez o aio.

- Como se sente hoje? – Baixou-se, em cumprimento. - Ontem

não parecia muito bem...

- Oh Alfredo, não te preocupes com isso!

- Era só por preocupação, senhora. Perdoe-me a minha intrusão

na sua vida. – E esboçou um sorriso o velho servente. - Tem uma

visita senhora.

- A sério? Quem é? - E levantou-se imediatamente da cama.

Estava com a sua roupa de dormir, toda em tons de roxo claro,

e ficava tão linda com esta vestida.

- É a condessa Mia, senhora. – Fez uma pausa. - Mando-a

entrar?

- Sim, e obrigado... – Sorriu-lhe com aquele sorriso único que

Diana possuía, genuíno, límpido, inocente e maravilhoso.

- Pelo quê senhora? – O velho aio não conseguiu não corar.

- Pela preocupação, homem! E sim, estou melhor. – E esboçou

um sorriso, desta vez meio sofrido e abatido.

- É a minha função senhora. – Curvou-se em despedida. - Direi

à Condessa para subir então. – E Diana sentou-se na sua

cama, num dos quartos mais altos do enorme palácio da capital

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Dopácia, com vista para a mesma. Assustou-se com a amiga a

bater a porta.

- Hun, sim?

- Sou eu, amiga! – A voz grosseira, porém suave, não enganava.

- Entra Mia! - Levantou-se para a abraçar. - Anda, senta-te

aqui. - E assim se sentaram, na enorme cama da duquesa.

- Conta-me coisas! Como é que estão os teus meninos?

- Alegres, e umas pestes como sempre... São eles que fazem a

vida valer a pena, e estão a crescer tão rápido.

- Fico feliz por ouvir isso amiga. - E sorriu Mia, também muito

bela, e muito morena, de cabelo acastanhado, apanhado atrás. -

Mas já estás melhor?

- Do quê? – Tentou evitar o assunto.

- Vá, não te faças de desentendida.... Daquele assunto do teu

namoradinho lá de Recécio. – E riu-se baixinho.

- Não sei. – Baixou a cabeça, a desanimar. - Aconteceu tudo

tão de repente, nem sei como reagir, mas não lhe devia ter

mentido durante todo este tempo. Sinto-me uma pessoa

horrível.

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- Não te martirizes com isso agora.... Olha para o futuro e para

os filhos que tens para criar, que são tão lindos como tu!

- Senhora! - Interrompeu o aio ao aparecer na porta. - A sua

palestra iniciar-se-á mais cedo, e sua majestade Spy pediu que

descesse com urgência.

- Raios... Este Spy…. Enfim, vou-me só equipar e já desço. – O

criado, mal ouviu a resposta, correu para os andares de baixo

para avisar o Rei Dopácio.

- Quem te mandou seres a melhor nobre do reino? - Troçou

Mia, enquanto lhe dava umas pancadinhas no braço, a se meter

com ela.

- Oh, para de mentir, até parece... - E equipou-se rapidamente,

com as suas vestes nobres brancas e azuis, e desceu com a amiga

para o salão principal do castelo. Seria lá que Diana receberia

uma multidão que viria assistir à sua palestra, uma iniciativa de

Spy para que o povo conhecesse os seus nobres melhor.

Entraram pela porta traseira do salão, que estava a abarrotar

de gente, desde os mais abastados aos mais comuns. A

adoração pela Duquesa era enorme, a um nível quase do Rei, e

todos o sabiam. Uns jovens bem pobres olhavam-na a entrar ao

fundo do salão, e um destes até comentou:

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- Magnífica... Aquele rostinho moreno, aqueles olhos cor de

avelã e aquele cabelo liso, que linda!

- Não te babes! - Exclamou o amigo ao lado. Diana posicionou-

se no meio das mesas de modo a centralizar-se perante todos, e

o burburinho cessou de imediato.

- E agora, a Duquesa Wahlstedt fará um depoimento ao nosso

querido reino da Dopácia! - Anunciou o aio responsável pelo

evento. - Quando quiser senhora...

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Gabriel e Lucka entreolharam-se, preparados para a luta. Em

baixo, pai e filho continuavam numa correria desenfreada para

distraírem o gigante, que lentamente lhes lançava golpes, e

outras vezes distraía-se a olhar para o infinito como se de uma

besta irracional se tratasse. Lucka, com a sua armadura

esverdeada, a sua espada e escudo, e Gabriel, com a tradicional

couraça negra, a sua maça em estrela e o seu escudo. Lançaram-

se um ao outro, chocando escudo com escudo. O ruído do metal

a bater ecoou pela capital, e tornaram a distanciar-se.

- Mano, que estás a fazer? - Perguntou o pequeno

Gabriel, curioso.

- Não vês que estou a treinar? Hehe. - E riu-se. - Um dia pode

ser que consigas estar ao meu nível, e lutamos os dois.

- Oh Lucka... Tu vais ver! Um dia vou ser tão forte que vou

destronar-te!

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Trocavam golpe atrás de golpe, com uma velocidade e

harmonia de movimento que chocou o jovem príncipe, que mesmo

em aflição a fugir da enorme criatura, olhava de canto para a

colina e apreciava a batalha. Pareciam saber sempre que

movimento cada um iria usar, e todos, absolutamente todos os

golpes, eram desviados ou bloqueados. Trocaram dezenas e

dezenas de golpes, até mesmo com desvios e ataques

acrobáticos, algo inédito para o príncipe, que mesmo assim

queria que parassem a luta:

- Pai! – Gritou, apesar do pai estar a mais de 100 metros deste,

noutra rua. - Por favor faz alguma coisa! Eles vão se matar ali!

- Como?! - Berrou de volta Maycon, já quase sem fôlego. - Esta

besta não me deixa aproximar dali sequer!

- Parem! Parem de lutar! PAREM! – Mas não adiantou.

- Gabriel? Não devias estar num encontro? - Perguntou

Lucka, adolescente, ao seu irmão, que apareceu em casa.

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- É... Pois... Ela não apareceu. - E Andrey desmanchou-se

imediatamente a rir na cara do irmão.

- Andrey, para com isso, nem todos somos o bonitão da família

como tu! – Reconfortou o irmão Gabriel com uma mão no ombro.

- Esquece lá isso mano, vai treinar, é sempre bom para

desanuviar.

Escudo com escudo, maça com espada, o barulho

incessante de ferro a bater ecoava pela cidade, assim como o do

fogo a queimar tudo ao redor da colina. Estavam há pouco mais

de 3 minutos a trocarem golpes incessantemente, e ninguém

parecia querer ceder.

- Não chores mano... – Consolou-o Lucka.

- Tenho saudades do papá e da mamã. – E desatou a chorar

Gabriel. Estavam na sua casa, no canto mais escuro, e Lucka

Page 212: Livro 3 - Biblioteca RHC Oficial · - E qual seria o propósito de viajar pelo mundo a matar inocentes?! - Ouve-me. - Respondera-lhe o tio ao enervar-se. - Ao contrário do teu pai,

abraçou-o, soltando também este uma ou duas lágrimas. A

perda dos pais não foi algo nada fácil, nada mesmo, e

traumatizou-os de tal forma para o resto das suas vidas.

- Agora somos só nós Gabriel, eu e o Maycon vamos… -

Soluçava do choro neste ponto. - Cuidar de vocês…. Vai ficar

tudo bem... Mas também tenho tantas saudades deles, não

sabes o quanto…

- Parem! Pelo amor de tudo, parem! – Continuava Sec a

berrar, sendo continuamente ignorado. Olhou para o pai, de

canto, e viu o seu rosto todo coberto de lágrimas, que nem

tentava o monarca limpar. Gabriel apanhou um pé do irmão em

falso, desequilibrou-o, e espetou-lhe com o escudo na cabeça,

derrubando-o para o lado. Levantou-se Lucka na mesma hora,

com um corte na testa, que jorrava sangue pela sua cara abaixo.

A troca de golpes continuou, incessante, e desta vez parecia ser

o Vice-Rei a tomar vantagem. Tinha um talento nato absurdo

em si. Lá em baixo, o gigante distraiu-se por momentos, a olhar

em volta, e Maycon começou numa corrida desenfreada até à

colina. Sec, mais longe deste, viu o monstro a focar de repente

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no seu pai, que estava distraído na sua correria. Olhou à volta e

viu um martelo pesado, enorme, pertencente a um soldado morto,

e pegou neste. O gigante levantou o braço para atacar o Rei, e

o seu filho viu o tempo a apertar. Pegou no martelo e lançou-o

com toda a sua força na direção que supôs que o pai iria, e o

braço da besta descia para esmagar Maycon. Assim que o

membro do gigante estava prestes a esmagar o soberano, o

martelo bate-lhe com tamanha força na armadura costal, e tal foi

o impacto, que o tirou como um relâmpago da zona de impacto

do ataque do monstro, que bateu no chão.

- Lucka? – Perguntara Gabriel, enquanto miravam as estrelas da

noite no cimo de uma colina perto lá da aldeia.

- Hun? – Respondeu o irmão, cheio de sono.

- Como é que achas que estaremos daqui a muitos anos? –

Deitou-se para trás, apoiando a cabeça sobre os braços

abertos.

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- Não sei. – Cruzou os braços Lucka, pensativo. - Mas às vezes

imagino-me a mim e a vocês a viajar pelo mundo juntos e a

conhecer novas gentes, e tu?

- Eu? Eu vejo-nos a ser grandes guerreiros e um dia sermos

grandes nobres que são respeitados por todos...

Lucka lançou um pontapé lateral, que o irmão bloqueou

com o escudo, contra-atacando com um remate à perna de apoio

do adversário. O Vice-Rei, aproveitando o ímpeto, salta com a

perna de apoio, e ao rodar o seu corpo no ar, chutou o queixo

de Gabriel com o calcanhar, que deu uma queda para o lado.

Lucka, que podia ter aproveitado a oportunidade para chacinar

o irmão, não se mexeu, e aguardou que este se levantasse.

- Mano? – Chamou Gabriel, preocupadíssimo.

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- Hun? – Respondeu o jovem Lucka, todo ensonado como de

costume. – Ainda é tão cedo, porque é que me acordaste?

- Tive um pesadelo que parecia tão real e fiquei tão assustado….

Então vim para aqui contigo. - O irmão sentou-se na cama,

enquanto ainda esfregava os olhos.

- Sobre o que era? – E bocejou longamente, passando o bocejo

ao irmão mais novo, que se sentou mesmo ao lado deste.

- Era que estávamos a lutar e que te passavas e me matavas, os

teus olhos quase te saltavam da cara de raiva... –Lucka abraçou-

o:

- Eu nunca seria capaz de te fazer mal, independentemente do

que acontecesse. És meu irmão e contra os meus eu nunca faria

nada de mal.

Suor e sangue escorriam pela cara do Vice-Rei, que

esperou que o irmão se pusesse de pé para tornar a atacar.

Gabriel lançou-se como um louco, enfurecido pelo golpe que

tomara. Lucka defendia-se como podia, até encontrar uma

abertura, e com o seu escudo enorme golpeou o do adversário,

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que voou para longe, e Gabriel, desamparado, estava prestes a

ser degolado pelo irmão mais velho. Lucka levantou o braço

direito para lançar um ataque com toda a força.

- Ridículo, como é que algum dia esperavas derrotar-me a mim,

que sou de sangue nobre? – Comentou o rapaz com quem

Gabriel lutava e humilhava, tanto nas palavras como no combate.

Lutavam num descampado nos arredores de Recécio onde

costumavam reunir-se algumas crianças para brincar.

- Raios! – Tornou-se a levantar, pronto para outra. –Aaaaaah!

Já vais ver! - Mas na hora que ia atacar a sua espada voou pelos

ares, para longe de si.

- Falhado. – E na hora do golpe à cabeça do pobre rapaz,

Lucka bloqueou-o com a sua espada, e esmurrou o rapaz de

sangue nobre na barriga, que recuou em dores abdominais.

Dirigiu-se imediatamente a ele:

- Se te vejo por aqui outra vez, desfaço-te! Ninguém toca nos

meus irmãos, e vou protegê-los sempre! Põe-te a andar, palhaço!

– E assim o fez aristocrata de cabelo amarelado aos caracóis,

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que não era nada mais nada menos que Hyoga, futuro melhor

amigo de Maycon. – Estás bem? – Perguntou ao irmão, que

respirava de alívio, temeu pela sua vida ali.

- Sim, desculpa por isto Lucka…. Estás sempre lá para me

salvar…. Só me meto em alhadas e têm de ser sempre vocês a me

tirar delas… - Baixou a cabeça, triste.

- E vou sempre estar. – Sorriu Lucka com confiança.

O golpe do Vice-Rei, ao que parecia, propositado, passou por

cima da cabeça do irmão, que não hesitou, e enfiou a sua espada

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na barriga de Lucka, que caiu em cima deste. Fez-se um silêncio

geral pela cidade, até o próprio gigante cessou movimentos.

Gabriel olhou nos olhos do seu irmão mais velho, e em segundos,

que pareciam uma eternidade, reviu tantas boas memórias que

tiveram juntos. Os olhos de ambos se encheram de lágrimas, e

Lucka começou a sangrar pela boca, tossindo sangue.

- Eu... Nunca seria... Capaz de.... Te fazer mal... – E sorriu-lhe

com os olhos fechados, parecia estar realmente feliz naquele

momento. Várias lágrimas caíram sobre o rosto de Gabriel, e o

seu irmão colapsou para o lado, imóvel. O cavaleiro negro

levantou-se, em pânico, como um relâmpago, e começou a fugir

para uma das portas. Um brilho de lágrimas formava um pequeno

rasto pelo ar enquanto este corria.

- Pai?! – Chamou Sec, aos berros. - Pai! Viste aquilo?! – Gritou

novamente, já no começo de um choro que por mais que tentasse,

não conseguia evitar. Maycon não conseguia sequer responder,

e nem se mexeu. Uma sombra enorme passou por cima deles, mas

nem reagir conseguiram, além de mirar. Olharam, e era um enorme

dragão vermelho, que pegou no gigante pela cabeça e carregou-

o para longe da capital, com muito custo. No topo do dragão,

Yann acenava:

- Desculpem o atraso! Vim o mais rápido que pude! – E

desapareceram momentos depois pelas montanhas. Pai e filho

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correram de imediato até à colina, onde encontraram Lucka,

morto, e com um sorriso evidente no rosto, parecia que os

músculos da cara ainda estavam ativos para aquele efeito.

- Lucka!? – Berrava o Rei numa choradeira e desespero sem fim,

que agoniavam até o seu filho. – Lucka! Acorda, Lucka acorda!

Por favor, isto não pode estar a acontecer outra vez! – Tocava-

lhe no rosto, à espera de uma reação de seu irmão mais novo, o

que não ocorreu. – Lucka! – Sec, mais atrás, ajoelhou-se e

começou a chorar com as mãos a cobrirem-lhe a cara. O pai

seguia o exemplo do filho, mas com as mãos a envolverem a cara

do defunto. Sentiu então o príncipe um abraço por trás, não de

um adulto, mas de uma criança, e virou-se para ver que era a

menina que havia salvo na aldeia, Anya, que também ela chorava.

Sec tentou de imediato disfarçar e parecer bem perante a

criança, que ouvia os gritos de desespero de Maycon na mesma.

- Não te preocupes menina, está tudo bem. – Mas o choro da

criança não parecia cessar.

- Sec! – Chamou Marcos à distância, que subia a colina a

cambalear.

- Marcos?! O que se passou?! – Levantou-se de imediato,

encarando-o.

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- Fomos atacados.... Pelos cavaleiros negros... Eu consegui

aguentar-me, mas mataram todos os aldeões, menos essa

menina, que conseguiu fugir até aqui.

- Raios! Mas não há tropas nesta porra desta cidade?! – Gritou

o mais alto que conseguiu, em revolta. O pai, ainda a chorar,

mirou-o de canto e lhe respondeu:

- Mandei-os ir com a população de modo a evitarmos perdas

maiores. - Sec compreendeu, apesar da ambiguidade da

situação, e abraçou a pequena Anya, que correspondia.

- Como é que isto nos foi acontecer? – Tentou ao máximo

conter as lágrimas na presença da pequena. - Porquê?... Parece

que nada nos corre bem, que raiva! – Sec passou-se, pegou na

criança e fugiu para longe numa correria desenfreada. Só havia

um lugar no mundo capaz de o acalmar neste momento, a planície

floral entre as montanhas. Maycon lá permaneceu, a chorar, com

a cabeça encostada ao peito do irmão, e Marcos aproximou-se,

ficando a observá-lo atentamente.

Deitaram-se ambos no meio das flores, e o sol começava

a aparecer por entre as nuvens, que cobriram o céu durante todo

o dia. Acalmaram-se, mas as lágrimas ainda lhes percorriam a

cara, banhando as lindas margaridas ao lado, que cobriam todo

o espaço. Nada conseguiram dizer durante longos minutos,

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onde apenas uma leva brisa lhes acariciava os ouvidos. Sec

adormecera, entretanto, não dormia bem há dias, e acordou com

Anya a chamar por ele.

- Papá, acorda.

- Hun? - E pensou para si mesmo, ainda atordoado com o sono:

– Será que fiz mais filhos e não me lembro?

- Papá! Agora vais ser o meu papá! – E chorava Anya, mas eram

lágrimas de felicidade, que o príncipe não compreendeu

inicialmente, mas quis retribuir.

- Vai ter de ser, não é? Oh filhota... E abraçou-a.

Passados nem 2 dias, numa tarde cinzenta, degradante e

entristecida, todos os nobres reuniam-se no átrio do palácio,

todos com vestes negras, em luto. Rafac, Doni, Morosini e

Yann carregavam o caixão do seu amado Vice-Rei até onde os

aguardavam, com a campa já escavada. Vítor e Maycon não

conseguiram segurar o choro ao se abrir o caixão para se ver o

rosto do seu familiar, contudo, não lhe quiseram tocar. Foi a

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perda de uma das pessoas mais importantes, genuínas e geniais

na história de Recécio.

...

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Capítulo IX

Reconciliação

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- Podem levar isto como um desabafo. - Discursava Diana

Wahlstedt aos Dopácios. - Mas o que é o amor? É uma

questão que me tem atormentado durante muito tempo, e

ultimamente me fez sofrer muito. Quando confundimos a paixão

com o amor, justificamos o sofrimento afetivo que nos amargura

em relação a alguém. – Os seus olhos começaram a brilhar. -

Morrer de amor ainda é morrer de desamor. A rejeição, o

insuportável jogo da incerteza de nos amarem, a espera, o

impossível, ou o "não" que nos humilha. – Suspirou a fundo, e

continuou. - O amor também é humilhar-se, é rogar, suplicar,

insistir e persistir além de qualquer lógica, é esperar milagres,

retornos, o possível e o impossível que faça resistir a pessoa

amada, ou a intensidade de um sentimento que já se foi. -

Segurou as mãos ao peito, enquanto uma solitária lágrima

vertia-lhe pelos olhos enquanto pensava em Sec, que em

Recécio sofria pela morte do tio. - Coloquem isto na vossa

cabeça: Se já não o amam, aprendam a perder e retirem-se com

dignidade, porque se o amor não é visto ou sentido, não existe,

ou não vos serve. Lutar por um amor impossível, novo ou velho,

deixa demasiadas sequelas. É preferível sofrer a perda de uma

só vez do que se submeter a uma cruel e constante incerteza; é

melhor um realismo desconsolador do que uma fé cega, que

nunca move montanhas. - E uma memória veio-lhe à mente.

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- Ei! - Chamara Sec, que vinha pela floresta adentro, com o seu

cão.

- Olá amor, como é que estás? – Respondera Diana, enquanto

se dirigia ao amado. Abraçaram-se e beijaram-se, antes da

resposta do príncipe:

- Estou bem, agora que te vejo, e tu? – Diana corou.

- És um idiota! Claro que contigo aqui estou bem. - Olharam-se

olhos nos olhos:

- Tens alguma coisa para fazer hoje? – Perguntou-lhe o

namorado, com uma felicidade evidente que roçava até a timidez.

- Em princípio não, onde queres ir amor? - Sec sorriu, contente

por poder passar tempo com a namorada a dois.

- Vamos até à cidade? Tenho uma coisa para ti! – Perguntou,

enquanto lhe acariciava o rosto com a mão direita. - E o meu

irmão ainda ontem me perguntou por ti, por isso tens mesmo de

vir.

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- Tenho de parar de pensar nisto! - Refletiu para si mesma,

tenho de continuar. Sê forte Diana. - E prosseguiu o discurso.

- A vontade de saber, vasculhar e meter os dedos nas feridas

tem muito de masoquismo, e bastante de desespero, mas quando

o amor acabou, acabou. Às vezes passamos da ilusão à

desilusão num só instante, portanto é importante que saibamos

que nem todos os desamores são maus, nem todos os amores

são sustentáveis. Algumas coisas são impossíveis, não obstante

a nossa vontade e o nosso desejo. - Suspirou. - Aprender a

perder é uma capacidade que uma pessoa tem de discernir o que

depende desta e o que não, quando insistir, e quando se deixar

levar.

Passavam pelas ruas principais da capital enquanto

conversavam. Sec adorava contar histórias:

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- Há! Ainda houve aquela vez que demos uma festalhona com a

Pegaéss, e digo-te, nós temos muitos nobres homens e eles têm

imensas nobres mulheres. – Diana franziu a sobrancelha.

- E vais me dizer que não olhaste para nenhuma? - E olhou para

o namorado de canto, enquanto fazia beicinho. – O príncipe riu-

se, porque percebeu que era só para o provocar.

- Não sejas idiota, sabes que só tenho olhos para ti. - Quando

se calaram, puderam ouvir o comentário de uma padeira para o

príncipe:

- Com uma dama linda como essa ao seu lado, deve ser um

homem muito feliz príncipe Sec. - Sorriu o casal.

- E sou mesmo, como é que adivinhou? - Riu-se a mulher,

enquanto seguia o seu caminho:

- Vá meninos, portem-se bem! - E voltou ao trabalho.

- Toda a gente em Recécio é tão simpática para mim... – Até se

admirava a “princesa” com aquilo.

- Normal, vêm uma dama como tu por aqui... - Diana corou de

imediato, juntando as mãos atrás das costas, em sinal de

vergonha.

- Oh, não sou nada, cala-te! – Fez uma expressão de surpresa

no rosto. - E lembrei-me agora, o que é que me ias dar?

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- Hum. - Sorriu Sec. - É surpresa, quando formos ao palácio

vês.

- Não faz muito sentido convencer alguém a nos amar. Cada

gota de suor que se gasta em lamentações sobre o que poderia

ter sido e não foi, seria mais bem empregue na cura da nossa

própria alma. – Uma lágrima escorreu-lhe pelo rosto, motivando

tantos outros presentes a fazerem o mesmo. - Pensem nos

amores que passaram pelas vossas vidas, no que representaram

naquela altura, naquela adolescência cega e frenética de amar.

Olhem para isso agora, com a perspetiva dos anos que

passaram, porque na medida que o tempo passar e viverem a

vossa vida, chegará a calma.

- Diana! - Exclamou Yann ao ver a cunhada. - E abraçou-

a, sendo claro, correspondido com um forte abraço.

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- Estás cada vez maior Yann. – Era sempre bom revê-lo, era um

rapaz tão harmonioso e puro de alma.

- Hehe, eu sei! – E esboçou um sorriso de canto a canto.

- Vá, vamos lá, já voltamos aqui abaixo, tenho de lhe dar uma

coisa. - Salientou Sec, enquanto puxava a amada pela mão para

as escadas.

- Estou para ver o que vai sair daqui... - Pensou Diana para si

mesma. Ao entrar no quarto do seu amor, este foi de imediato

ao armário à direita da porta, e trouxe umas vestes, com uma

espada por cima.

- Diana, eu queria... - Estava muito envergonhado o rapaz. -

Queria dar-te isto! - E estendeu os braços com os presentes,

virando a cara, com vergonha. Tratava-se de umas lindas vestes

brancas, com talha azul e dourada, e uma rapieira branca e

dourada, absolutamente fantástica e com um trabalho brutal!

- Oh meu... O que é isto? - Ficou de boca aberta, enquanto

pegava nas vestes e as mirava. - Isto é demasiado requintado

para o que eu uso, caramba, mas adoro. - Deu-lhe um beijo na

boca, seguido de um: - Obrigada, eu amo-te… E vou-te sempre

amar.

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- Sim, ainda uso ambas as coisas que ele me deu... - Pensava

para si mesma, para depois se tornar a dirigir ao público. -

Sabem, nos amores impossíveis a esperança é a primeira coisa a

morrer. Se já não o amam, não esperem nada, não antecipem

positivamente, porque um pessimista inteligente é melhor que um

otimista mal informado. As palavras não vão modificar o

comportamento de quem não sente nada por vocês. Aceitem

isso com maturidade sem a necessidade de se humilharem,

porque isso não vai ressuscitar o amor. Enfiem isso na vossa

cabeça e no vosso coração: princípios não se negociam. – Até o

Rei se comovia por esta altura, abandonando a sala para que

não o vissem a “quebrar”. - Se querem sofrer, chorar, gemer em

voz alta, arrastarem-se pelo quarto quando estão sozinhos;

imaginarem o que poderia ter sido, mas não foi; se querem fazer

isso e muito mais, façam! Contudo, nunca entreguem a vossa

soberania, não esmaguem o vosso ser. Sofram o quanto

quiserem, mas não magoem o vosso amor próprio. Embora seja

difícil de acreditar, o sol continuará a nascer, e o movimento da

vida não deterá o seu curso. – A sua doce voz fazia tornar

aquelas palavras em autênticas espadas na alma de cada um que

já havia sofrido muito por amor, fosse quem fosse, que não

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resistiam às lágrimas. - Não adocem o desagradável e não

desculpem o que merece ser repudiado. Separar-se de um anjo

é muito mais complicado do que de um ser humano.

Não havia nuvens naquele céu noturno, e o casal

observava as estrelas na planície floral. Ouviam-se imensos

grilos, e um vento ligeiro de verão os banhava. Conseguiam até

ver um feixe de milhares de estrelas no céu, que nos nossos dias

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apelidamos de via láctea, que os deslumbrava de uma maneira

impressionante.

- Diana?

- Sim amor? – Mirou-o de imediato.

- Eu sei que isto vai parecer muito estranho, mas eu acho que

nós os dois estamos ligados de uma forma que nos transcende.

- Como assim? – Ponderou se o namorado estaria louco da

cabeça por momentos.

- Opa não sei... As estrelas, a lua, nós, não sei. Sinto que

estamos ligados de várias formas possíveis, e que se

renascêssemos, não obstante a distância, apaixonar-me-ia por ti

outra, e outra vez... – Diana mirou o céu novamente, e após uns

segundos de silêncio, disse:

- Eu também sinto isso Sec... E independentemente da vida,

estamos destinados a ficar juntos.

E com os olhos cheios de lágrimas proferiu por fim uma

última frase:

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- Se eu pudesse dar uma forma física ao amor, seria

inevitavelmente o da água. É o que de mais puro existe no

mundo, e é o que nos dá o dom da vida, não da existência, mas da

vida, e uma vez corrompida, toda a sua pureza se perde, e o amor

cessa. - E olhou uma última vez para o público que a ouvia

atentamente, uns até a chorarem. Retirou-se então do salão,

encontrando-se com Spy no corredor:

- Diana! - E virou-se a duquesa, enquanto ainda limpava as

lágrimas.

- Sim, sua majestade?

- Eu ouvi tudo que ali disseste e tu estás claramente a sofrer por

amor, é por causa daquele príncipe de Recécio? - Diana

suspirou e conteve-se para não se desmanchar a chorar uma vez

mais.

- Sim, é, sua majestade... – Encostou-se à parede, cansada.

- Porquê filha? – O Rei colocou-lhe uma mão no ombro para a

reconfortar, sendo esta alguém muito querida para ele, quase

como uma filha.

- Eu... - E os seus olhos tornaram a encher-se de lágrimas. - Eu

nunca fui capaz de lhe contar... – Spy demorou uns segundos a

se inteirar do que é que a Duquesa estava a falar, até perceber:

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- Da tua missão?

- Sim... – Respondeu de imediato. - Que me envolver com ele

era só uma missão de espionagem...

- Mas acabaste por te apaixonar por ele, e quiseste tanto viver

nessa vida dupla, que nunca lhe contaste sequer. - E riu-se num

tom irónico. - Devias falar com ele e contar a verdade, percebe-

se claramente que o amas. Vá, até mais. - E retirou-se o monarca,

deixando ali a Duquesa sozinha com os seus pensamentos.

- Já tens em mente um novo Vice-Rei? - Perguntara Morosini a

Maycon.

- Morosini, essa é a última coisa em que quero pensar neste

momento, por favor...

- Desculpe majestade, não lhe quis incomodar. - E caminhou

para a porta o nobre.

- Espera! – Parou e encarou o Rei novamente. - Desculpa lá,

senta-te.

- Hum, está bem. - E sentou-se.

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- Como tinhas perguntado, estou a pensar no Rafac para o

cargo.

- O Rafac?! – Até se levantou da cadeira, em espanto. - Mas

ele retornou há tão pouco tempo!

- Sim, verdade. – Encostou-se atrás na cadeira e cruzou os

braços. - Mas é um dos nobres mais velhos e experientes que

temos.

- Tudo bem majestade, era só isso que queria saber, obrigado. -

Levantou-se e retirou-se, deixando o monarca sozinho, a pensar

para si mesmo:

- Estou tão esgotado de tudo, da vida, do poder, de tudo!

Porque é que isto tem de custar tanto? O que é que fizemos nós

para merecer tudo isto?

Alguns meses se passaram, e fora de facto Rafac o novo Vice-

Rei de Recécio, que praticamente cuidava do reino sozinho,

tendo em conta que Maycon decidiu tirar um tempo fora para

descanso. O reino passava algumas dificuldades, mas começava

a crescer gradualmente. O mundo estabilizou uma vez mais,

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desta vez permanentemente, e cada dragão cuidava do seu

respetivo elemento. Por ironia, ou destino, os 7 escolhidos

acabaram por ser os irmãos mais novos dos príncipes da primeira

geração de escolhidos: Yann von Asterion, (Recécio) irmão de

Sec; Mastério Glazkov, parceiro de Well Rozovski (Rucrúcio);

Swago Hjort, irmão de Matheus (Deásp); Caio Karagoz,

irmão de Júnior (Bopénia); Pillon van Oostrom, irmão de Josiel

(Dopácia); Lorena Hennion, irmã de Sabrina (Pegaéss) e

Scattly Bellaire, irmã de Razengo (Céciot). Viviam-se dias de

paz, e as atividades dos cavaleiros negros decaiu um pouco,

essencialmente por discórdias internas.

Decorria uma reunião de nobres em Recécio, comandada

por Rafac:

- Portanto, estamos claros em relação a este assunto?

- Sim senhor! – Responderam em conjunto.

- Temos então esta semana dois promovidos. Marcos von

Astreus e Dudu Fischer, os nossos novos Grão-Duques,

levantem-se! - Tornavam-se estes assim os nobres de título mais

alto do reino, além do Rei, Vice-Rei e de Igor Patric, que era

Arquiduque. - Assim que sairmos daqui poderão ir buscar as

vossas novas vestes laranjas. – Levantou-se e abriu os braços,

como que em saudação. - Damos aqui por encerrada a reunião,

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podem ir à vossa vida! – Contudo, ainda lá permaneceram um

pouco, nem que fosse para parabenizar os promovidos, e Sec

chamou Rafac para uma sala, para conversarem.

- Olha Rafac...

- Meu querido Sec, eu já sei o que me vais dizer! - E colocou-

lhe as mãos nos ombros. - Eu sei que te sentes injustiçado por

ainda seres Marquês e eles te terem passado à frente muito

rápido, eu sei disso querido! - O príncipe não fez boa cara:

- É que só podem estar a gozar comigo, tu e o meu pai... Eu faço

de tudo pelo reino, como sempre fiz, e sou deixado para trás, é

por ser um cavaleiro negro?

- Lindo, não é nada disso, tu sabes! Eu só não sei bem o que é

que o teu pai tem reservado para ti... - Sec tirou-lhe as mãos dos

seus ombros e afastou-se.

- Não Rafac. A minha decisão está tomada. – Soltou um longo

e intenso suspiro. - Vou abandonar o reino e vou migrar para

outro, para a Pegaéss.

- Mas Sec... – Tentou falar o Vice-Rei.

- Não! - Interrompeu-o. - A decisão está mais que tomada, não

vale a pena. Vou-me embora já amanhã. - E retirou-se da sala

com má cara, precisava urgentemente de descontrair. Passou

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por companheiros seus no salão, que repararam na indignação

no rosto do amigo, mas nada lhe disseram. Parou na taberna de

Dodo e sentou-se sozinho numa mesa. Eram quase 3 horas da

tarde, hora em que o local se encontrava mais vazio no dia todo.

- Um hidromel por favor! – Pediu.

- É para já. – E assim serviu o príncipe, que foi bebendo a

caneca aos poucos. Pensava sobre a sua decisão, que já parecia

tomada, embora ainda estivesse um pouco hesitante, não era

fácil. Yann entrara pela taberna a correr, à procura do irmão,

depois de ter visto a sua reação no fim da reunião.

- Ah, Sec! Estás aqui, ufa! – Recuperava o fôlego, repousando

as mãos nos joelhos. Sentou-se logo a seguir na mesma mesa do

irmão:

- Precisas de alguma coisa? – Perguntou a seco.

- Eu não, mas tu pareces precisar… Que se passa?

- Pffff… - Soprou Sec. – Não é óbvio? Talvez não te

apercebes porque sempre foste o preferido do pai.

- Esta conversa outra vez? – Revirou os olhos Yann. – Ele

gosta tanto de mim quanto de ti!

- Oh, poupa-me…. Gosta tanto que entregou a minha educação

ao irmão mais louco e doente que tinha…

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- Isso deve ter alguma explicação lógica, porque é que nunca lhe

perguntaste?

- Não sei. – Suspirou. – Às vezes tenho medo de o encarar.

Enfim, ele já disse que não confiava muito em mim como líder e

que eras o prodígio.

- Oh, não sou nada, sempre foste melhor que eu em tudo, desde

que éramos pequenos…

- Hum… - Ficou o irmão mais velho pensativo. – Tens novidades

sobre o assassinato do Igor Lima? Já descobriram quem foi? –

Mas Yann abanou a cabeça, em negação.

- Ainda não, mas estamos a fazer os possíveis para isso…. Foi

uma grande perda para nós.

- Podes crer. – Fizeram-se uns momentos de silêncio, até o irmão

mais novo o quebrar, já mentalizado com a decisão do irmão, já

que havia falado com Rafac também. – Se fores realmente

partir, e já que não vou conseguir fazer-te mudar de ideias,

despede-te pelo menos da Milena, já que ela carrega um filho

teu.

- Eu sei, eu sei, não te preocupes.

- Bem, eu tenho assuntos para tratar, tenho de ir andando. – E

retirou-se da taberna com rapidez, sem sequer se despedir. Sec

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não demorou a fazer o mesmo, e caminhava tranquilamente pela

rua principal. Recordava-se de tantas memórias que tinha tido ali

ao longo da sua ainda jovem vida. Lembrava-se da sua mãe, dos

seus tios, dos seus primos e de todos os amigos que já haviam

partido. Os seus olhos começaram a lacrimejar enquanto refletia

sobre tudo isto, e olhou fixamente para o céu. Distraído, sentiu

uma mão suave a lhe acariciar o rosto. Estaria a sonhar? Olhou

para baixo e viu uma mulher, toda encapuçada, que começou de

imediato a correr para a porta Este, e o príncipe foi atrás.

Foram pela floresta adentro, numa correria incansável, em que

ninguém quis dizer absolutamente nada, apenas iam. Conseguiu

ver ao fundo, entre as árvores, a planície floral, e a mulher só

parou mesmo no centro desta, ainda de costas para Sec.

- Quem és tu? – E a mulher retirou o carapuço, virando-se para

o encarar. Aquele cabelo castanho claro era inconfundível.

- Estavas com saudades minhas? – O queixo do príncipe caiu,

era Diana, que nunca mais na vida pensou ver. Levou uns

segundos a se inteirar da situação: - Então? Não dizes nada?

Não estás contente por me ver? – Riu-se a Duquesa. Sec

mudou logo de cara, para uma carrancuda:

- O que é que tu estás aqui a fazer? Esta já não é a tua casa, ou

nunca foi, pelos vistos… - Notava-se uma deceção enorme na voz

deste, e Diana olhou-o, olhos nos olhos, cabisbaixa:

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- Eu devo-te uma explicação.

- Pois deves.

- Sec… Eu… - Começou logo a lacrimejar, e num só impulso

beijou o príncipe, que retribuiu. Ali permaneceram uns segundos

a se beijarem intensamente, cheios de amor envolvido, e

banhados pela brisa da primavera, que fazia esvoaçar pétalas

rosa pelos ares. As lágrimas de ambos caíam, levadas pelo vento,

e as suas almas misturaram-se naquela hora, como há muito

tempo não se haviam misturado. Foi talvez a melhor sensação

que tiveram nas suas vidas, mas Sec afastou-a:

- O que é que tu queres de mim Diana?

- Quero falar contigo. – Baixou a cabeça, e ia começar a chorar,

mas o seu ex-namorado subitamente abraçou-a, e manteve-a nos

seus braços por alguns momentos.

- Quero que me expliques tudo, com a máxima sinceridade, por

favor.

- É o que vou fazer, idiota. – Separaram-se e sentaram-se, como

costumavam fazer antigamente. – Então, vou começar… -

Suspirou bem fundo e recompôs-se: - Supostamente, pelo que

a minha mãe diz, eu nasci num templo qualquer, na neve do Norte,

e que fui abençoada por Ymir. Isto teve qualquer coisa a ver com

o Spy, Rei da Dopácia, que me garantiu um título nobre à

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nascença, mas apenas a mim, não à minha família. Cresci lá, fui

treinada durante muitos anos pelo Spy, e sempre fui

considerada um prodígio, até mais do que os próprios filhos dele,

enfim. – Sec tentava não quebrar ao ouvir aquilo tudo, que afinal

de contas, era tudo novo para ele, apesar de todos os anos que

estiveram juntos. – Acabei por herdar então, como seria normal,

muito da personalidade sociopata do Spy, e rapidamente subi

na hierarquia.

- Sociopata? – Pensou o príncipe para si mesmo. – Aquela

rapariga tão gentil que sempre conheceu?

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- Até que um dia tive uma missão especial, diferente de qualquer

outra que já tinha tido. A missão era… “Envolver-se e espiar

Sec von Asterion, príncipe de Recécio”. – Sec quebrou

imediatamente, e levantou-se enraivecido:

- Tu estás-me a dizer que tudo o que nós passamos foi uma

mentira?

- Não, não foi. De todo que não foi. O sentimento foi, e é real,

e nada nem ninguém pode mudar isso. - Levantou-se e agarrou

na cara de Sec. - Eu amo-te, como sempre te amei, desde o

primeiro dia em que nos conhecemos até ao último em que nos

virmos com vida, e até depois da morte. - E beijou-o sem pensar

duas vezes, enquanto lhe limpava as lágrimas. Quando se

largaram, continuou a justificação: - Nada do que vivemos foi

mentira, mas tive medo de dizer a verdade ao Spy, e parecia que

a nossa relação tinha estagnado.... Desculpa-me por tudo o que

te fiz sofrer. – O príncipe ficou pensativo por momentos. Não

sabia bem o que haveria de dizer naquela hora, mas o seu amor

gigantesco e incondicional por Diana era inegável. Sofreu

durante tantos meses, e agora já se estava a recuperar, ela

voltava. Milena amava-o, mas sabia que o sentimento do

Marquês não era o mesmo, e estava até grávida deste. Decidiu

dar-lhe o nome do seu pai, só que com "k" escrito, Maykon von

Asterion. De repente, veio-lhe à mente o quanto o seu tio

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Baioco havia querido ter um reencontro com Elizabete, tia da

sua amada, e decidiu seguir o seu coração:

- Diana. - Olhou-a nos olhos, enquanto lhe acariciava o rosto,

ambos muito sorridentes e genuinamente felizes.

- Sim? – Não conseguia evitar sorrir de felicidade.

- Eu sei que mesmo que voltemos não será bem a mesma coisa,

mas eu perdoo-te, e eu amo-te. - A Duquesa esboçou um

sorriso, que o seu ex não via há muito tempo, um sorriso genuíno,

puro, de felicidade, e banhado por lágrimas de alegria,

correspondidas por Sec.

- Isto quer dizer que voltamos? – Não era capaz de largar o rosto

do amado.

- Bem... - Sorriu inocentemente Sec. - Acho que sim... - E

abraçaram-se, num momento que parecia eterno, e que nunca na

memória de ambos se esqueceriam, fosse em que vida fosse.

Foram, no entanto, interrompidos por um pequeno grupo de

bandidos que apareceu pela floresta.

- Raios, tinham de estragar este momento... - Exclamou Diana,

enquanto largava o príncipe, tirava a sua capa com capuz, que

usou para não ser reconhecida, e sacou da sua rapieira. Sec

acompanhou, e desembainhou a sua espada mística. Mirou a sua

companheira, em postura de ataque, e com uma armadura leve.

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O seu lindíssimo cabelo castanho claro, liso e comprido, reluzia

face ao sol da primavera e era de notar uma paixão ardente nos

seus olhos. Sec apaixonava-se todas as vezes que a olhava, e

também ele se pôs em posição de ataque, com a sua armadura,

desta vez leve, negra, a acompanhar com o seu cabelo liso,

penteado para o lado, assim com os seus olhos negros,

apaixonantes.

- Parece que vamos lutar juntos pela primeira vez, vamos dar

tudo! – Afirmou o namorado. Os bandidos aproximaram-se a

correr, e a ecoarem gritos de guerra, prontos a atacar. Eram

apenas 5, mas não os subestimariam. Formaram uma roda à volta

do casal, e dois deles decidiram investir. O primeiro lançou um

golpe, da esquerda para a direita sobre Sec, que ao defender o

golpe partiu a espada do adversário, e rodou para a direita,

acompanhando Diana o movimento, que esfaqueou o bandido

no peito. O príncipe, ao rodar, sacou de uma adaga, e atirou à

testa do segundo bandido que atacaria a sua namorada. Foi um

golpe fatal. Não perderam tempo, e atacaram os últimos 3 com

uma rapidez incrível. Tinham muita química de combate e só

agora estavam a perceber isso. Era algo que Sec nunca na sua

vida esperou ver, ambos a lutarem juntos, mas soube tão bem, era

uma sensação única. Após assassinarem os últimos 3 e

guardarem as armas, viraram-se um para o outro, e o príncipe fez

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uma pergunta que já havia querido fazer há uns minutos: - E

agora? Vais voltar para a Dopácia? – Até rangeu os dentes, de

nervoso com a resposta.

- Hum... – Pensou, enquanto tornava a pegar na sua capa com

carapuço. - Tencionava ficar cá contigo. – Sorriu-lhe, mas Sec

lembrou-se de um pormenor:

- É melhor não... - Imaginava Milena a encontrar Diana na rua,

que escândalo. Pensou então numa desculpa: - Há um assassino

à solta pela capital, não está nada seguro por lá, além de que... -

E calou-se.

- O que foi? – Parecia preocupada.

- Vou me mudar para a Pegaéss uns tempos. - Que mau timing

para tomar estas duas decisões: Mudar-se, e voltar com Diana.

- Como assim Sec?! – Levou uma mão à cabeça, em indignação.

- Esta é a tua casa!

- Não consigo cá ficar, é injustiça atrás de injustiça, e cada vez

mais sou deixado para trás, para mim chega.

- Sendo assim fico na Dopácia mais uns tempos, tu é que sabes

o que vais fazer da tua vida Sec. – Encolheu os ombros e revirou

os olhos, como só ela sabia fazer, mas o namorado ignorou.

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- Parto ainda hoje, noite fora. Vens comigo até à cidade? - Diana

juntou as mãos atrás das costas e fez um inocente sorriso.

- Claro que sim amor! Vamos! – Caminhavam, e a conversa

mantinha-se. - Eu tenho tanto para te contar!

- Hehe. - Sorriu o namorado. - Diz lá, estou cá para isso. Como

estão os miúdos? Nunca mais os vi.

- Estão tão grandes, e chamam por ti muitas, muitas vezes, têm

tantas saudades tuas.

- Tu também, pelos vistos... - E olhou de canto a rir-se.

- Tu cala-te! - Deu-lhe um estalo no braço, com cara de amuada.

- Ahahah, vais negar? - Troçou o príncipe.

- Não.... Estúpido. – Disse, virando a cara, amuada.

- Vá! Não amues... - Abraçou-a com força, ao que Diana reagiu:

- Autch, não me apertes com tanta força, não sou as tuas amigas!

- Sec congelou. Será que ela sabia?

- Como assim?! - Perguntou, todo atrapalhado, ao que a

namorada reagiu mal.

- Hum?! Tens algo para me contar é? Só para que saibas eu não

estive com mais ninguém além de ti na vida, por isso é bom que

valorizes.

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- Sobre isso... Eu...

- Não Sec. - Interrompeu. - Não quero saber. – E esboçou um

sorriso irónico que o assustou.

- Mas tinha mesmo de te contar uma coisa, a sério Diana. - A

reação não foi de todo boa.

- Pronto, diz. Já estou preparada para qualquer coisa.

- É... Como tu acabaste comigo eu estive com uma rapariga e...

- Não, não digas mais nada. Já percebi o que foi, vamos

esquecer isto.

- Desculpa. – Não conseguiu evitar sentir-se culpado, e fez uma

cara entristecida.

- Não, eu é que peço desculpa. – Sorriu para não chorar. -

Admito que estou irritada com isso, mas não me posso queixar

de nada, eu é que causei tudo isto. - Sec deu-lhe a mão, para

sua surpresa:

- Não vou dizer que foi fácil viver sem ti, por mais que

andássemos afastados. Chorei tanto, mas tanto... - Diana

apertou-lhe a mão, ficando com os dedos entrelaçados nos do

namorado, em sinal de afeto e conforto:

- Eu também, não foste o único.

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- Isso não faz qualquer sentido, acabas comigo e choras? - A

namorada baixou a cabeça:

- Tu não percebes... E eu própria não me percebia às vezes, mas

há algo dentro de mim que me afasta de ti, e eu não sei explicar o

que é, mas existe.

- Isso é só estranho…. Vai a um xamã ou assim, pode ser que te

saibam dizer algo sobre isso, mas enfim. - Entraram pelas portas

da cidade uns minutos depois, e Sec quis levar a amada à

taberna: - Vamos até à taberna? - Queria afastá-la ao máximo

da rua, para que ninguém a visse com ele, pelo menos por agora.

- Meh, pode ser. - Ao entrarem viram Marcos sozinho numa

mesa, e foram lá sentar-se com ele.

- Hum?! - Reagiu o amigo, com cara de espanto, enquanto olhava

para Sec e Diana repetidamente. - Sec?! O que raio…. Hum?!

Explica-me isto! - E sorriu o casal:

- Sim Marcos, é quem tu estás a pensar…. Nós…. Voltamos... –

O amigo reagiu, incrédulo:

- E não me contas nada? Pensei que fossemos melhores amigos!

- E somos, animal! - Exclamou o príncipe, a brincar, com o agora

Grão-Duque. - Ah, nem vos apresentei, Diana, este é o meu

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melhor amigo, o Marcos, Marcos von Astreus. Marcos, esta é a

Diana.

- Hehe, já ouvi falar muito de ti, és famosa por estes lados. – E

riu-se, a troçar do amigo.

- Por falar nisso amor. - Fez cara de caso. - Tendo em conta que

sempre foste nobre, qual é o teu nome de família? - A dama

sorriu, e disse, calmamente:

- Wahlstedt.

- Que bonito nome, não tinha noção… Diana Wahlstedt…

- Bem, a conversa está boa, mas estou aflita para fazer as minhas

necessidades, vou ali e já venho rapazes. - E assim foi, deixando

os amigos a sós, começando Marcos a disparar imediatamente

sobre Sec:

- És estúpido por acaso?!

- Porquê? - Fez-se desentendido, com um sorriso de culpa.

- Então vais voltar para ela depois de tudo o que sofreste? És

um burro, ingénuo. - Levou as mãos à cara. - Não acredito nisto.

- Marcos.... Relaxa, estou confiante que desta vez é para

sempre, afinal, ela é a mulher da minha vida.

- Oh, disso sei eu! - Quase berrou, reagindo o príncipe:

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- Fala baixo! Olha que ela te ouve.

- Ouve o quê? Estavam a falar de mim?! - Era Milena, com uma

barriga de gravidez enorme, que entrou sem se aperceberem.

Congelaram os dois: - Vou-me sentar convosco. - Sec e

Marcos fizeram uma troca de olhares medonha. O maior medo

do príncipe acabava de acontecer.

- Não, não, não! Não estávamos! - Atrapalhou-se todo Sec, e

pensou para si mesmo. - Estou tão lixado, não acredito nisto,

elas vão se lembrar uma da outra e vai haver merda... - Milena

sentou-se ao lado do pai do seu filho, no lugar onde estava a sua

namorada. – Estou tão frito! - Pensou. Nem 5 segundos depois,

Diana sai da casa de banho, e depara-se com Milena no seu

lugar, dizendo-lhe:

- Olá! Estás no meu lugar. - Trocaram uns olhares matadores

entre elas, até a Recéciana responder atrevidamente:

- Estou ao lado do pai do meu filho, posso? – Marcos, ao se

aperceber do que se podia gerar ali, levantou-se logo, e colocou-

se entre as duas:

- Meninas, não vale a pena começarem uma guerra apenas por

um lugar. - Sec estava pálido, sem reação, e a sua namorada,

irritadíssima com a ousadia de Milena e com a surpresa que

acabara de ter, proferiu calmamente, após revirar os olhos:

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- Pois, não vale mesmo a pena. - E saiu a correr, parando no meio

da rua, perseguida pelo príncipe:

- Diana!

- O que é que tu queres? Eu já percebi tudo. – Suspirou,

enquanto os seus olhos se cobriam de lágrimas. - Não tenho o

direito de ficar assim, desculpa. - Sec abraçou-a por trás,

dando-lhe um beijo na cabeça:

- Tranquilo, está tudo bem, eu percebo.

- Sec. – Chamou, virando-se para o encarar de frente.

- Diz. – Respondeu, ao tirar os braços de volta dela.

- Nunca te consegui tirar da minha cabeça, fosse qual fosse o

momento, porque a mente repete o que o coração nunca apagou,

e não se pode escapar nem de um nem de outro. - O namorado

sorriu genuinamente, e com confiança respondeu-lhe:

- Sabes? Acho que vou partir agora mesmo, é a minha hora. Vou

buscar o Alivion e parto. Espera aqui por mim. - E correu para

o palácio, sem deixar sequer que a namorada lhe dissesse alguma

coisa. Voltou nem 5 minutos depois, estando a dama no mesmo

sítio, à espera. Trazia a sua pesada armadura negra, tirou o

capacete e desceu do cavalo.

- Só levas a espada? - Comentou Diana.

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- Preciso de mais alguma coisa? - E riu-se, confiante na sua

capacidade de sobrevivência.

- Nem de mim? – Troçou.

- Não preciso de repetir o que tu já sabes, idiota. - A sua amada

corou.

- Vê se me vens visitar com frequência, mas é.

- Já sabes que vou. - E espetou-lhe um beijo longo, tão longo,

que umas crianças que por ali passavam começaram a comentar:

- Ew, que nojo! - O casal riu-se, e ignoraram. Sec voltou então

a subir ao cavalo, e colocou o capacete:

- Avisa o povo por mim, se puderes. – Verteu uma única lágrima,

que lhe escorreu pela cara. - Eu amo-te.

- Eu amo-te mais, estúpido.

- Haha, tu gostas. - E passou sinal a Alivion para cavalgar, rumo

à Pegaéss, deixando ali a namorada, que já começara a chorar.

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Capítulo X

O Mestre e a Aprendiz

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Após 3 dias chegava à capital, uma magnífica cidade

portuária, assente sobre a encosta, de onde se destacava um

gigante castelo no topo de uma colina mais alta. Sabia que se

teria de dirigir para lá, de modo a pedir permissão ao Rei para lá

ficar, então foi andando. Trazia consigo apenas a armadura

leve, cobria a cabeça com um capuz, e observava os arredores.

As casas eram na sua generalidade brancas, e as ruas enchiam

de gente, com todos os tipos de funções aparentes. Distraiu-se

a olhar para os lados e chocou violentamente contra uma

rapariga que vinha a correr, também ela distraída, e caíram. Sec

olhou-a, assustado, não queria arranjar problemas ali. Deveria

ter mais ou menos a sua idade ela, e tinha um longo e liso cabelo,

numa cor cinza brilhante, algo que nunca havia visto,

acompanhada de uns grandes olhos castanhos. Pelas

vestimentas parecia bem abastada, e olhava-o com um ar

zangado, enquanto se levantava.

- É impressionante, não vês por onde andas?

- Peço desculpa, não vi... - Respondeu, já em pé e a sacudir a

roupa.

- Sinceramente... - E tornou a andar a moça para onde ia

inicialmente. Todos à volta pararam para observar o que ali se

havia passado, mas logo que a rapariga virou costas, retornaram

às suas vidas.

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Alguns minutos depois chegou às portas do castelo,

sendo imediatamente abordado por 4 guardas, armados até aos

dentes:

- Quem é o senhor e o que pretende? - E calmamente tirou o

capuz, e apresentou-se:

- Sec von Asterion. Venho em missão diplomática.

- Certo. - Abriram-lhe as portas, entrando este, já sem o

carapuço. A sala de entrada não era tão grande como esperava,

mas estava requintadamente decorada por estátuas de dragão,

muito famosas e procuradas, sendo estas as de escuridão,

caríssimas. Foi recebido por uma criada, que passou logo ao

assunto:

- Precisa de conversar com sua majestade, correto?

- Sim. - Mas a mulher já se tinha virado para ir até ao Rei antes

de ouvir a sua resposta. - Que remédio, vou esperar aqui. -

Pensou. Nem dois minutos depois as portas tornaram a abriram-

se, e quem entrou não era ninguém nem mais nem menos que a

rapariga com quem tinha chocado anteriormente, que se

surpreendeu ao vê-lo:

- Tu? Aqui? Já estou a ver que vou cair muitas vezes à tua pala

cá em casa...

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- Sempre simpática tu. - Respondeu.

- Lorena, onde estão as tuas maneiras? - Disse uma terceira voz,

vinda do corredor.

- Sabrina?! - Assuntou-se Sec.

- Não te esqueças que vivo aqui Seczinho, dá cá um abraço, não

te via há séculos. - E deram um reconfortante abraço, enquanto

Lorena parecia estupefacta, e comentou ao fim do abraço:

- Então espera... Tu és o irmão do Yann?

- Parece que sim. - Respondeu, meio atrapalhado. Ouviram

passos e miraram o corredor, era Daniel Hennion, o monarca da

Pegaéss, que se aproximava. Daniel não tinha rigorosamente

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nada a ver com as filhas: Era alto, loiro, de olhos azuis, usava

vestes azul marinho e douradas. Olhou de relance para Sabrina:

baixinha, de cabelo cinza escuro e umas exuberantes vestes

vermelhas. Olhou por fim para Lorena, também ligeiramente

baixa, de cabelo cinza, liso. No caso das suas vestes, apesar de

para um comum serem vigorosas, comparadas às do pai e da irmã

não tinham qualquer semelhança. Daniel aproximou-se, e de

imediato apertou a mão a Sec:

- Olá, Sec. Já vi que as minhas filhas te vieram receber, já viste?

És tão bonito quanto elas, tu e a Lorena fariam um casal

magnífico!

- Ela realmente é muito bonita. - Pensou. - Tanto ela como a

Sabrina, mas não. - Lorena reagiu imediatamente com um:

- Ew, não! Credo pai... - Sec expressou uma cara aborrecida,

notada por Daniel:

- Pronto, vamos ao que interessa rapaz.… Diz-me lá!

- Então majestade, eu vim cá pedir-lhe um favor. - O monarca

parecia distraído e não respondeu de imediato.

- Ah, desculpa lá, estava distraído a lembrar-me de como eras há

uns anos atrás. Cresceste imenso... Mas diz lá.

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- Então... – Juntou as mãos atrás das costas. - Eu queria pedir-

lhe que me deixasse cá ficar por uns tempos. - Baixou a cabeça,

e tanto Sabrina como Lorena deixaram o seu queixo cair.

Daniel, contudo, manteve a postura. - É que tive uns problemas

com o meu pai e quis afastar-me um pouco do reino. - Fez-se um

momento de silêncio, e fora a princesa mais nova a quebrá-lo,

como de costume:

- Pai, não o podes aceitar aqui, não te esqueças o que é que ele

é! - Sec, ao perceber que esta se referia aos cavaleiros negros,

comentou, a olhá-la de lado:

- Independentemente disso, ainda tenho a minha honra, e dou-

vos a minha genuína palavra de que cá venho com boas

intenções. - Curvou-se, em vénia. Sabrina, de imediato,

abraçou-o com um sorriso, para espanto do príncipe, e suplicou:

- Por favor pai, deixa-o ficar, ele é meu amigo e sei que nunca nos

faria mal, por favor! - Mas Daniel manteve sempre a cara séria, e

respondeu:

- Permitirei, contudo... - Prestaram todos atenção máxima a ouvir

o Rei. - Apenas com a condição de treinares a minha filha, a

Lorena.

- Han?! - Reagiu esta, com uma cara de espanto mais que

evidente. - Como?! Endoideceste pai?! - Sec e Sabrina riram-

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se baixinho, ainda abraçados, o que enfureceu Lorena ainda

mais. - Não tenho o direito de decidir o que quero?! - Mas o pai

ignorou-a, e continuou. - Estou a falar muito a sério, e

começarão já amanhã pela manhã. - E virou-se, de volta para o

corredor: - Vem ter mais tarde, depois do jantar, ao meu

escritório. E se tentares algo de mau cá dentro, eu próprio me

encarrego das consequências. - Esboçou um sorriso mais do

que irónico, quase diabólico, que fez o príncipe recear. -

Sabrina, leva-o a um quarto para ele cá ficar. - E seguiu caminho

para o fundo, sendo seguido pela filha mais nova, que embora

enfurecida, nada mais disse. Ainda chegou a bufar-se toda

antes de abandonar o compartimento. A princesa mais velha

soltou Sec, finalmente, que se recompôs:

- Pronto, já vou ter trabalho, ao que parece... - A amiga não

reagiu com boa cara.

- Pois vais, não imaginas o quanto. - Sec engoliu a seco. - Anda,

vou levar-te ao teu quarto. - Enquanto andavam pelo castelo,

conversavam:

- O que quiseste dizer com aquilo?

- Da minha irmã? - Riu-se com a mão na boca, por sinal de

educação.

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- Sim, até tenho medo... - A amiga colocou-lhe a mão no ombro,

e olhou-o nos olhos:

- Não te preocupes, eu sei que vais saber lidar, mas o meu pai há

de dizer-te alguma coisa mais tarde sobre isso.

- Tudo bem... De qualquer forma, vou dormir uma soneca, estou

a morrer...

- Já estamos quase lá, é já depois daquelas escadas, e vê se

descansas, mas acorda a tempo do jantar.

- Haha, vou tentar. - Assim que chegaram à porta do quarto,

Sabrina abriu-a, e Sec deslumbrou-se com o luxo naquele

quarto, desde tapetes caríssimos, a móveis deslumbrantes, e uma

mega cama no centro, encostada à enorme janela da parede do

fundo. Sem sequer pensar duas vezes, correu e atirou-se para a

cama, deixando a amiga a olhá-lo com cara de parva:

- Bem, de qualquer das formas depois aparece, a sala de jantar

é no andar de baixo. Dorme bem!

- Até logo. – Respondeu, todo ensonado, enquanto Sabrina

fechava a porta. Tirou o saco e a espada e pousou-os no chão

ao lado da cama, e nem 5 minutos depois adormeceu...

Alguns momentos depois de ter adormecido começou a

ouvir a sua própria voz, mas as palavras eram indecifráveis. Fez

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um esforço enorme por tentar perceber, até que um silêncio se

instalou, e palavras claras como água ecoaram, naquele espaço

desvirtuado:

- Há sentimentos que o tempo não apagará nunca.

Nesse sorriso vejo mais do que os teus lábios,

Mais do que o brilho inocente nos teus olhos,

Nessa tua aura reluzente vejo mais do que apenas uma alma,

Nesse teu sorriso único vejo vida, amor e felicidade.

Uma imagem começou a surgir na escuridão, como se estivesse

a abrir os seus olhos, e viu uma rapariga. Não era Diana, mas era

praticamente igual, e também era alguns anos mais nova, que

olhava para a frente, enquanto comia algo branco em forma de

disco, que não soube identificar. Olhou à sua volta e viu um

retângulo enorme com relvado, e mesmo à sua frente estavam 3

postes brancos que se uniam em cima, formando um retângulo,

cobertos por uma espécie de rede verde. Em volta da relva

estavam várias estruturas acastanhadas, e ao do fundo dizia

"Campo de Futebol Adelino Rodrigues". Ao fundo, mais longe

ainda, via uma montanha cheia de casas, que cobriam a parte mais

baixa. Olhando para os lados e para cima, notou que estava

sentado numa escadaria, baixíssima, e o chão estava regado de

pétalas amarelas, caídas das enormes árvores que preenchiam a

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escadaria. "Campo de Futebol Adelino Rodrigues"? O queria

dizer a palavra futebol, e quem seria este Adelino? Olhou para

as suas mãos para verificar se era mesmo um sonho ou a

realidade. Estava vestido de uma forma estranhíssima, com algo

preto no tronco, que não lhe cobria a totalidade do braço, e nas

pernas tinha umas calças azuis, que não eram de todo

confortáveis. Nos pés tinha uns sapatos pretos, baixos e

cómodos, decorados com uma onda branca. Não tinha a certeza

a este ponto se se tratava realmente de um sonho ou de outra

coisa qualquer parecida. Não estava a acreditar, e mirou Diana,

que até parou de comer para o olhar, que parecia completamente

perdido, e perguntou-lhe:

- Tomás? Estás bem? - Sec não percebeu, Tomás? Quem

seria este Tomás, e por que raio lhe estava a tratar por este

nome?! Decidiu interrogá-la:

- Diana? És tu? - Até arregalou os olhos perante toda esta

situação.

- Claro que sim, acho que estás a ficar louco. - E continuou a

comer o seu disco branco, tranquilamente.

- Onde é que nós estamos?! - Começou a entrar em pânico e a

ficar branco.

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- Calma amor, mas o que se passa? Estamos no liceu, não

reconheces?! - E pousou as mãos sobre a mão de Sec, que

tremia em cima do seu joelho esquerdo.

- Eu... Eu...

Acordou em pânico e desnorteado, a soar por todo o lado

e exaltado, mal conseguia respirar. Olhou para o lado,

deparando-se com Lorena em choque com o seu estado atual.

Não foi capaz de lhe dizer uma única palavra por instantes, até

ser a princesa a questioná-lo:

- Estás bem?! Eu... Eu vinha acordar-te para vires jantar e de

repente acordaste assim, tiveste um pesadelo?!

- Eu não sei... Isto foi demasiado real para ser um sonho, eu não

sei o que foi isto...

- O que é que viste?! - E Sec pensou para si mesmo se estaria

a enlouquecer, então quis tranquilizar a sua agora aluna, para

evitar más impressões.

- Esquece, acho que foi só um pesadelo, horrível por sinal, mas

já passou... - Não, não tinha passado, e ficaria a matutar sobre

aquele sonho durante imenso tempo. Entretanto levantou-se, e

foram juntos para a sala de jantar. Esta tinha uma mesa enorme,

compridíssima, onde só constavam 5 lugares, estando 3 deles

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ocupados por Daniel, Sabrina e Babyloira, rainha da Pegaéss,

que de imediato o reconheceu:

- Sec! Como estás pequeno? – O seu sorriso era incrivelmente

contagiante. Não te via desde a guerra, cresceste tanto....

Estás um homem... - E ela, sempre bonita e bem conservada. O

seu cabelo loiro era inconfundível, daí também a sua alcunha, o

seu nome verdadeiro era Camila Hennion.

- Olá senhora, há quanto tempo! - E sorriram ambos, enquanto

o rapaz lhe acenava.

- Vá, senta-te lá e vamos comer. - Afirmou Daniel, que se

sentava na outra ponta da mesa, do lado oposto ao da mulher.

Ficaram os 3 jovens no meio, onde um grande leitão até brilhava

de tão frito. Tentou comer pouco, ou o suficiente para se

alimentar, de modo a não parecer mal, o que não passou ao lado

de Lorena, que sempre muito direta, lhe disse:

- Come lá homem! Estás-te aí a fazer de fino não sei porquê,

não tenhas vergonha! - O príncipe olhou-a de canto, com cara

de aborrecido por tê-la de aturar:

- Pronto, pronto, desculpa.

- Filha, devias tratar melhor o teu tutor, não achas? - Troçou, a

puxar pela filha mais nova, que como sempre reagiu de imediato:

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- Ó pai, não me chateies! - Ao ouvir isto, conseguiu Sec de

certa forma rever-se nela em relação à maneira como tratava o

pai, e riu-se. - E tu, estás-te aí a rir porquê? - E fez uma cara

irritadíssima. O príncipe nem respondeu, e continuaram a comer,

tranquilamente e em silêncio…. Acabando-se a refeição e

levantando-se o Rei, ergueram-se também os restantes, e este

chamou Sec para o acompanhar até ao escritório, no topo do

castelo.

Lá chegando, Daniel sentou-se atrás da sua secretária, e

Sec sentou-se à frente.

- Vamos lá rapaz. Tu já percebeste que a Lorena é uma pessoa

difícil de se lidar, correto? - O príncipe suspirou e encostou-se

atrás:

- Se é o que tenciona para mim, não tenho outra opção...

- O que quero aqui com isto não é que a treines na arte do

combate apenas, mas que a faças mudar de ideias em relação ao

reino... - Entrelaçou os dedos o Rei, com os cotovelos

pousados na mesa, naquele pequeno escritório que tinha além

da secretária, apenas uma estante com livros atrás. - Como

assim fazê-la mudar de ideias, majestade? - Não estava

realmente a perceber.

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- Deixa-me explicar-te melhor... – Suspirou, numa ação que

pareceu denotar uma deceção na sua voz: - Ela não sente

qualquer interesse na administração e poder do reino, e também

sempre se recusou, tanto a combater, como a aceitar o sangue

nobre que tem. - Fazia sentido, olhando para as vestes que esta

usava, sempre sem muita opulência. - Eu sei, - Continuou o Rei

- através do teu pai, que tens uma ambição enorme, e que o teu

sonho é te tornares Rei de Recécio. Não só isto, mas que

também tens uma boa oratória, e que és um guerreiro fora do

comum. Percebes o que te peço enquanto estiveres cá? - Sem

qualquer hesitação, o príncipe respondeu:

- Percebo, e tentarei o meu melhor, majestade. - E apertaram

então as mãos, em acordo.

Eram cerca de 7:30 da manhã, e Sec estava sentado, de

pernas cruzadas, sobre uma grande pedra, à espera de Lorena,

enquanto comia uma maçã verde, das suas preferidas. Usaria o

descampado atrás do castelo, rodeado por arvoredo, para os

treinos. Aguardou mais uns minutos até a princesa chegar, toda

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ensonada, mas equipada com uma armadura leve azul, e a sua

espada às costas.

- Tanto tempo para chegares... Horários são horários menina,

não me importo com desculpas. - Respondeu então esta, com um

bocejo:

- És chato, eu podia estar a dormir descansadinha... Mas não,

decides fazer isto tão cedo…

- Anda cá. - Chamou, enquanto também fazia sinal com a mão,

fazer aproximar. - Deixa-me ver qual é a tua espada. - Lorena

tirou-a das costas, e quando a desembainhou, Sec não viu nada

mais nada menos que uma espada igual à sua, verde, e com

arestas com um fio de diamante. - Lorena. – Chamou

novamente.

- Hum? - Não se estava a aperceber de nada, e coçou os olhos.

Sec tirou a sua espada do equipamento e colocou-a lado a lado,

para surpresa da princesa. - Como assim? Elas são iguais! - Na

verdade, a de Lorena tinha uma cor mais clara, mas de resto não

havia que enganar.

- O destino é engraçado sabes? Isto quer dizer duas coisas:

Que o teu maior atributo enquanto pessoa, assim como o meu,

é um coração enorme; e que o teu dragão deve ser o Aequor,

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que era o meu também. - A princesa levou uma mão ao queixo,

pensativa, enquanto olhava para o mar, ao fundo:

- Sim, realmente é o meu dragão...

- E onde é que ele está? – Perguntou logo o príncipe, curioso. -

Queria revê-lo, tenho tantas saudades, não tens noção…

- Eu sei que ele anda por aí, mas ainda não o sei chamar direito

infelizmente... - E amarrou a sua mão direita no seu braço

esquerdo, virando a cara para baixo, como que com vergonha de

não saber fazer tal coisa.

- Não te preocupes, eu ensino-te. - E sorriu-lhe, enquanto

faziam contacto visual, algo que relaxou a princesa.

- BOOOOM! - Assustaram-se ambos com um estrondo

gigantesco, vindo da parte mais baixa da cidade. Lorena

congelou por uns momentos, e as únicas coisas que conseguiram

sair da sua boca foram:

- Balm... Balmora?! Perguntou, tremendo com os dentes e

completamente dominada pelo medo.

- Quem?! - Levantou-se Sec, também ele agora assustado.

Olhavam na direção da baixa, e por cima das árvores avistaram

um enorme tentáculo branco.

- É mesmo ela…. Voltou...

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- Explica-me, raios! - A princesa desviou o seu olhar para o

tutor, numa expressão de medo absurda:

- É... É... Um monstro que já nos atacou muitas vezes, e...

Ninguém o consegue enfrentar, nem mesmo... O meu pai... – O

príncipe roeu-se todo de raiva.

- E vais ficar aqui a ver o teu povo a morrer, sem mexeres um

dedo?! - A sua aluna estava em demasiado pânico para

responder, e Sec tomou uma atitude: - Dá-me a tua espada!

Rápido! - Tirou-a da mão esquerda de Lorena, e começou a

correr pelo castelo, escadas acima, enquanto assobiava

altíssimo, para chamar Aequor. No último andar, aproveitou uma

janela aberta e atirou-se, sem medo, com as duas espadas

empenhadas, e com o corpo de lado. Foi apanhado a meio do ar

pelo seu antigo dragão, que se colocou na posição perfeita para

Sec o montar, na zona do pescoço, e em pleno voo. Lorena

Hennion, em baixo, mirava, de mãos entrelaçadas, enquanto o

seu cabelo esvoaçava violentamente, e assim que Aequor se

afastou, correu para o fim da colina, de modo a conseguir ver o

que aconteceria. Sec acariciou a pele escamada do velho amigo,

e até lhe veio uma lágrima ao olho, por este o ter conseguido

reconhecer. Ao conseguirem visibilidade, viram vários, não,

imensos tentáculos brancos que destruíam a cidade, e não era

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visível o seu corpo principal, este que se mantinha debaixo de

água.

- Vamos aos tentáculos primeiro! - Deu dois toques fortes com

o pé em Aequor, que voou de imediato para um dos tentáculos

gigantes. - Cortamos os tentáculos primeiro, para evitar o

pânico e mais destruição! - Um a um eram cortados pelas

enormes mandíbulas do dragão, até que a sua cauda foi

apanhada por um "braço" da besta. Rapidamente, os restantes

tentáculos entrelaçaram Aequor e começaram a sufocá-lo, mas

Sec impediu, e foi cortando-os, com combinações de golpes

com as duas espadas, até conseguir soltá-lo o suficiente para

ser capaz de eliminar os restantes, incluindo o que lhe prendia a

cauda. - Vamos Aequor! Ao corpo principal! – Berrava,

enquanto o tornava a montar. Mudou rapidamente de direção, e

voou como um relâmpago, água adentro, e agarrou com a boca

uma parte do gigantesco corpo principal. Arrastou-o até à

superfície, e levou-o lá bem alto, pelo céu limpo. Só a cabeça do

que parecia ser uma lula majestosa gigante era maior que

Aequor, que mesmo em esforço, foi capaz de a carregar até ao

céu. Chegando a certo ponto, o dragão largou-a, e Sec

levantou-se, empunhando a espada da sua mão esquerda no

sentido reverso, virada para o chão, e preparou-se para saltar.

Aproveitou a inércia do voo para cima da Lula, e atirou-se,

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ganhando um ímpeto absurdo ao impulsionar-se no dragão.

Assim que efetuou o seu mega salto para baixo, iniciou uma

sequência de mortais para a frente, onde encolheu o corpo em

forma de bola, deixando os seus braços firmes, o que criou uma

rotação contínua das espadas no lado exterior. Num ápice,

cortou a cabeça enorme do monstro a meio, quebrando-se a

rotação no final, foi uma cena digna de um herói. Caía, céu

abaixo, enquanto apreciava a beleza daquela maravilhosa

cidade, apesar de estar todo coberto de sangue da Lula, cujas

partes também caíam com ele. Aequor não demorou a vir

apanhá-lo, e voaram até ao átrio principal do castelo, onde

pousou as patas sobre a muralha, fazendo ruir algumas pedras,

mas sem quaisquer problemas secundários. O príncipe levantou-

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se, e, por mero acaso, ficou exatamente de costas para o sol,

tapando-o para quem estava mesmo nas portas do castelo:

Lorena e Sabrina, que pareciam estar a contemplar uma imagem

de um deus.

- Vê mana, não te apaixones já. - Riu-se Sabrina, ao troçar da

irmã, que reagiu como de costume:

- Até parece Sabrina, até parece! Só dizes parvoíces da boca

para fora! Enfim! - Cruzou os braços, como que em amuo e

negação, ao que a irmã se riu à gargalhada. Mais abaixo, o

dragão baixou a sua cabeça até ao chão, e Sec desceu,

completamente ensopado de sangue, e foi imediatamente

recebido por Daniel, com um forte aperto de mão e um sorriso

de ponta a ponta:

- Os meus parabéns, jovem von Asterion, conseguiste o que

mais ninguém antes conseguiu... Livraste-nos da Balmora, que

só nos trouxe miséria e destruição durante tantos anos, por isso

tenho-te a dar o meu sincero obrigado. Queria não só

congratular-te, como premiar-te com o título de Duque da

Pegaéss, enquanto cá estiveres, claro. - O príncipe sorriu-lhe:

- Perfeito! - E soltaram as mãos. - Tens um banho preparado

para ti no corredor do teu quarto. Eliza, encaminha-o!

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- Sim sua majestade. - Respondeu a criada, ao fazer uma vénia,

em sinal de respeito. - Acompanhe-me por favor, senhor. -

Dirigindo-se a Sec, que a seguiu logo atrás. Ao passarem pela

porta do castelo, deu a espada de Lorena à própria, que nem

reação foi capaz de ter, e simplesmente recolheu a sua espada.

Assim que o príncipe passou, Sabrina virou-se imediatamente

para a irmã, que nem a deixou falar:

- Cala-te Sabrina, não te atrevas a dizer nada! - A irmã soltou

um riso baixinho:

- Pronto, pronto! - Foram ambas para dentro, até que um enorme

ruído de uma multidão captou as suas atenções. Viraram-se, e

viram uma enchente de gente do lado de fora da muralha do

castelo, e para lá foram novamente, desta vez para averiguarem

a situação do povo. Ao se aproximarem da roda de guardas que

os mantinha na rua, perguntaram ao pai o que se passava,

porque também ele lá estava, e com uma cara de admiração

aparente.

- Não sei se estou a perceber bem, mas acho que querem

agradecer ao Sec pelo feito.

- E não lhes vais dizer nada? - Questionou a mais nova,

preocupada com o que pudesse acontecer. Daniel reagiu com

um sorriso confiante, e virou-lhes as costas a correr. Foi até às

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escadas da muralha, e caminhou por cima até atingir o terraço do

portão principal, onde se encontrava toda aquela gente.

Passou-lhes sinal a pedir silêncio com os braços, e assim que

cumprido, iniciou o seu discurso:

- Pegaéssianos! Hoje é um dia que ficará para sempre marcado

na nossa história; - Utilizava muito os movimentos de braços a

discursar. - O dia em que Balmora foi eliminada! - A população

soltou um enorme grito de felicidade conjunta, ao qual as

princesas não conseguiram não sorrir. Era de notar o sofrimento

nos rostos de cada um que sofreu devido ao monstro. - Todos

os estragos causados pelo ataque de hoje vão ser pagos pela

coroa! - Opulência não lhe faltava, e continuou: - Pescadores,

recolham os restos da Balmora, porque hoje haverá festa na

cidade, na placa central, em honra ao nosso herói Sec von

Asterion! Até logo meu povo! - E abandonou o terraço com um

aceno e celebrações populares, retornando diretamente para

dentro do palácio. À porta de entrada estava, ninguém mais

ninguém menos que o Duque Sochoski von Asterion, que

depois de ter desertado Recécio, veio para cá.

- Sochoski? - Parou o monarca para falar.

- Quando te disse que os von Asterion tinham qualquer coisa

de especial não acreditaste em mim... - O Rei soltou um sorriso,

correspondido pelo amigo.

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- Talvez tivesses razão, o rapaz, assim como tu e o Maycon, têm

algo de excecional.

Algumas horas mais tarde, enquanto Sec dormia, foi

Lorena a acordá-lo, de uma maneira um pouco ortodoxa, mas

que teve a sua piada:

- Acorda otário! - Chamou, enquanto lhe tocava no ombro.

- Hu? Hum Zzzzz - Reagiu o tutor, enquanto se virava na cama.

- Oh diabo... - Lorena olhou em volta, à procura de algo que o

conseguisse acordar, e o prato vazio em cima da mesa de

cabeceira parecia ideal. Pegou-o, e sem pensar duas vezes

deixou-o cair na cabeça de Sec, partindo-se este por completo,

e assustando-se o homem, que de imediato se agarrou à cabeça:

- Estás parva?! Podias ter-me morto com essa merda! - Parecia

genuinamente irritado, mas a princesa, sempre com a sua cara de

quem não tinha paciência para aturar ninguém, respondeu-lhe

com a maior tranquilidade do mundo:

- Não acordavas, teve de ser.

- Como é que te vou conseguir aturar tanto tempo?! Explica-me

só... – Respondeu, indignado, enquanto esfregava a cabeça. –

Que raiva!

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- Despacha-te lá, o festival está quase a começar, veste-te! -

Sec sentou-se na cama, à espera de que Lorena saísse do

quarto, o que não aconteceu. - Não te vais vestir?! – Estava

demasiado impaciente a moça, reagindo o príncipe:

- E tu, não vais sair?! - A princesa nem se moveu. - Sim?! - Mirou-

a, arregalada, à espera de uma reação.

- Pronto! - Andou até à porta. - Já que insistes... - E ao sair,

fechou-a...

- Que chata... - Disse Sec, bem baixinho para que a

companheira não o ouvisse.

- Eu não sou chata! - Gritou Lorena, junto à porta.

- Merda, ela ouviu...

- Pois ouvi! Agora despacha-te! - Colocou umas vestes negras

com tons de branco, que Daniel lhe havia dado anteriormente, e

olhou-se ao espelho.

- Ficam-me incríveis, esquece! Pareço um Rei, só faltava mesmo

a coroa. - E riu-se.

- Não quero saber, isso já está?!

- Já, impaciente! - E abriu a porta, para se deparar com a aluna,

de braços cruzados, e com um olhar de quem já estava farta de

esperar.

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- Finalmente, acompanha-me. - Desceram a escadaria e foram

ter ao átrio do castelo, onde se reuniam mais de 20 pessoas,

todas com vestes dignas da nobreza. Pararam todos o que

estavam a fazer, ou a conversar, e olharam para Sec, admirados.

Um deles chegou-se à frente:

- Sec! - Era Sochoski, e o primo ficou feliz por vê-lo.

- Sochoski?! - Deram imediatamente um grande e forte abraço,

e assim que se largaram, Sec interrogou-o de imediato: - Que

fazes tu aqui? Fico feliz por ver que estás bem, mas conta-me

tudo!

- Vim viver para cá quando desertei Recécio, e o Daniel já me

contou sobre ti e a tua desavença com o teu pai.... Enfim, espero

que gostes de cá estar, é um reino muito focado e agradável. –

O príncipe, contudo, ainda tinha muitas perguntas para lhe

fazer, já não se viam há muitos meses.

- Mas, e a tua mãe? Onde está ela?

- Ela foi viver para Rucrúcio, e acabou ficando mesmo por lá...

- Ah... Ao menos está bem... – Acabou por não querer

perguntar mais nada, depois de perceber que Sochoski estava

meio triste por não estar a viver com a mãe, que havia sofrido

muito com a morte do marido e do filho mais novo, assim como ele.

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- Mas olha, queria apresentar-te alguns nobres de cá da

Pegaéss. – Esboçou um sorriso, apesar de tudo, e um homem

mulato parou ao lado dele. Devia ter os seus 30 e poucos anos,

e introduziu-se de imediato:

- Boas, sou o Tobiel, Arquiduque. - E estendeu a mão a Sec,

que também se introduziu:

- Olá, prazer, sou o Sec, Duque. - Apertaram as mãos, com um

sorriso cada um. O príncipe não gostava muito de conhecer

pessoas novas. Aliás, não era não gostar, mas preferia evitar,

porque se sentia demasiado envergonhado no ato de as

conhecer, mas fez o esforço.

- Já agora, introduzo-te a todos os presentes. - Afirmou o primo

enquanto se virava para toda aquela gente enquanto colocou a

mão esquerda no ombro do príncipe: - Pessoal, este é o Sec, o

meu primo e o novo Duque da Pegaéss. Sec, estes são - E

apontou para todos os presentes, um de cada vez. - Esta é a

Lense, Duquesa, e mulher do Tobiel. - Era uma trintona,

loiraça e muito bonita. - Esta é a Mari - Esta já parecia mais

nova, mas era lindíssima, aliás, todas elas eram, que nobreza de

luxo era esta? - Este é o Mattheus, Arquiduque. - Era pálido,

e tinha um cabelo parecido ao de Sec, negro e para o lado.

Parecia alguém super sério, e até algo medonho. - Este é o

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Gabrilondo, Arquiduque. - Este era moreno e o cabelo

condizia com o tom de pele. Era bastante alto e sorridente.

- Mas quê? Era tudo de Marquês para cima? – Pensou para si

o príncipe. - Esta é a Babyloira, que já conheces, rainha da

Pegaéss. Esta é a Darkss, Marquesa. - Tinha um ar estranho

esta última. Devia estar nos seus 20 e muitos, era ruiva, de

cabelo encaracolado, branquinha, e usava o cabelo amarrado

atrás. - Esta é a Mel, irmã da Darkss, Viscondessa. - Era

também ruiva, como a irmã, e de cabelo encaracolado, mas

deixava-o solto. - Parecia extremamente nova, ainda uma

adolescente. - Esta é a Sabrina, que também já conheces. Esta

é a Andresa, irmã da Mel e da Darkss, e Condessa. - Nem

parecia irmã das outras duas, continuava bastante branquinha,

mas não era ruiva, tinha cabelo preto, e parecia ter os seus 20 e

poucos. - Este é o Richard, Conde - Parecia alguém muito

amigável. Tinha o cabelo rapado, mas o seu sorriso era

dominante. - E esta é a Vivi, Marquesa. - Também devia ter mais

ou menos a idade de Sec, era morena, e tinha o cabelo azulado

escuro, encaracolado e amarrado em ambos os lados do cabelo.

- Prazer! - Exclamou Sec, acenando com a mão, sendo

imediatamente correspondido por todos os presentes.

- Agora que as apresentações estão feitas, temos um festival à

nossa espera.

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Enquanto isso, em Recécio, Yann caminhava pelas ruas,

super pensativo, e com o sol a já se pôr:

- Só pode ser um dos nossos… - Refletia. – Já são 5 cidadãos

mortos em menos de 2 meses, mas o que é que eles teriam em

comum? Pensa Yann, pensa…. Eram todos agricultores dos

arredores da cidade, menos o Igor Lima, isso implica atividade no

exterior, e durante o dia, porque estes não trabalham durante a

noite… E depois ainda há as cartas anónimas que o Marcos tem

recebido, com ameaças de morte…. Será que estão ligados os

dois acontecimentos? O Marcos também não me revelou nada

que fosse importante sobre o passado dele. Não faz sentido

algum… - Puxou com uma mão o seu cabelo à moicano, castanho

claro, para cima, e deparou-se com Milena, com a sua enorme

barriga de grávida:

- Olá Yann! – Mostrou um grande sorriso.

- Olá Milena. Como é que estás tu? – Cumprimentaram-se. – E

o meu sobrinho? – Ousou em olhar para a barriga, que a amiga

acariciava.

- Hehe, ele está bem, e eu também…

- E já decidiste se vai ser mesmo aquele nome que vocês tinham

planeado? – Perguntou, curioso. – E se for menina?

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- Tenho o pressentimento que vai ser um rapaz, não sei, mas nós

vamos mesmo dar-lhe o nome do avô… Será Maykon von

Asterion.

Escrito por: Tomás Ornelas

Editado por: Diofer Oviedo