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Linha do Tempo Página 2

Linha do Tempo Sob licença:

Prefácio: Prof. Drª. Edileusa Regina Pena da Silva

Pesquisa: Prof. Ms. Júlio César Coelho.

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Linha do Tempo Página 3

Catalogação:

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Ruy Ferreira, Linha do Tempo, 2012

Ferreira, Ruy

Linha do Tempo. Ruy Ferreira. Rondonópolis/MT: A Tribuna, 2012. 224p

ISBN: 978-85-913985-0-8

1. História do Cotidiano. 2. Artigos de Opinião. 1. Título.

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Linha do Tempo Página 4

S U M Á R I O

Prefácio, 7

Introdução, 10

Reformas do Estado, 12

Na contramão da Educação, 14

Caro Reitor eleito, 16

Educação: uma solução econômica e não um problema insolúvel, 18

Minhas desculpas aos rondonopolitanos, 20

Senhores candidatos à Prefeitura de Rondonópolis, 22

Educação - De novo não! Arghhh!, 24

Eu e o sindicato, 26

Penitenciária ou maternidade. Qual o melhor lugar para um condenado?, 28

Bobo, talvez. Burro não!, 29

Impunidade começa perto da gente, 31

O Brasil não precisa de mais faculdades de Medicina, 32

A História não perdoa!, 33

Uma estória insólita ou cada macaco no seu galho, 35

Empreendimentos, empreendedores e acadêmicos, 36

Muro de Berlim, 38

Que tal o PVC?, 40

Papai Noel ou Saci Pererê?, 42

Viva a Cultura, 45

Estória sem moral é realidade, 46

Adulto também entra em crise, 48

Autonomia universitária para nossos netos, 51

O Não! Grande vencedor das eleições no Mato Grosso, 53

Automação no gerenciamento de lavouras, 55

O “Não” ataca de novo, 58

Eu, o Nacionalismo, o Estado e os políticos, 60

Liberdade!, 64

Bezcampante, uma triste história, 68

Brasil de Hoje: “Samba do crioulo doido” ou “cego em tiroteio”, 70

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Linha do Tempo Página 5

O importado é melhor. Para quem?, 73

Sonhei um sonho, 75

A Informática e a Sociedade numa Visão Matemática, 78

Computadores nas escolas, 81

No voto ou no 44?, 84

Uso da coisa pública, 87

O público e o privado, 89

A Escola: um imenso mercado para os capitalistas internacionais, 92

Tiraram ou perdi?, 96

Réquiem ao adversário, 99

Massageando meu próprio ego, 100

Despedida, 102

O fim do sonho democrático no Brasil, 104

Seis anos, 106

Caro Amigo, 108

Trilogia do retorno – parte final, 110

Burrices e mistérios contemporâneos, 113

Você sabia..., 116

Rui Barbosa era um profeta, 117

Pelo poder vale tudo, 119

Dilson, oráculo ou gênio perspicaz?, 123

2010 – Ano de copa e de eleições, 125

Mais um adeus, 127

Avesso do avesso – Federal, 129

Avesso do avesso – Local, 131

Universidade Federal de Rondonópolis, A Tribuna e o tempo, 133

Mania de mentir, 135

Paz? Subserviência? Ostracismo? Omissão? Burrice?, 136

Aceitando o conselho de um amigo, 138

Democracia: utopia de poucos, 142

O Rio e o resto, 144

Farinha do mesmo saco: FHC, Lula, Collor, etc., 147

Coisas do cotidiano, 149

Universidade e livre pensar, 151

A vergonha de ser fluminense hoje, 153

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Linha do Tempo Página 6

Saiba por que as eleições já passaram, 156

As múltiplas formas da intolerância, 158

Viajar no Brasil é uma aula de vida, 161

Até homem chora, 163

Fora Dilma, 166

Centro de Apoio à Agricultura Familiar, 169

Técnicos da UFMT em greve: uma luta desigual, 171

Morreu mais um professor, 173

O fim de um ciclo, 176

Voltei do Porto, 178 Boas Festas, 181

Variando o tema para: Educação, 184

O tempo passou e nada mudou, 187

Cara ou coroa: toda moeda tem dois lados, 189

Artigos publicados em outros meios de comunicação

Parabéns aos noivos, 193

O texto científico e o prazer da leitura, 194

Estabilidade à brasileira: nada muda!, 197

E a Economia, como vai?, 200

Tecnologia Educacional, 203

Cotas e políticas afirmativas, 207

Universidade e mercado, 210

Sonhei que, 212

Plano para acesso dos negros às Universidades Públicas, 216

Democratizando o acesso ao conhecimento científico, 218

Se eu fosse a reencarnação de Charles Darwin – Parte I, 220

Se eu fosse a reencarnação de Charles Darwin – Parte II, 222

Conclusão, 224

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Linha do Tempo Página 7

Prefácio

Miscelâneas de pensamentos, vivências e emoções

Nos dois últimos anos tive a grata oportunidade de conviver um pouco mais de

perto com o Prof. Dr. Ruy Ferreira, a quem costumo referir-me como amigo. É bom

esclarecer que também atribuo este título aos autores com quem dialogo, trocando

experiências, sensações e emoções. Justamente porque a leitura permite este

encontro e esta intimidade entre autor, texto e leitor.

Em minha concepção, amigo e amizade, não dependem apenas de encontros

físicos para existirem. Amigo pode simplesmente ser alguém com quem você

compartilha suas divagações, seus pensamentos, angústias, sem se incomodar com

o parecer dele, porque, certamente será algo positivo e em prol de seu crescimento

pessoal.

Não acredito naquela pseudo-amizade em que você só pode falar o que

convém ao outro; nem em outras que só tem razão de existir em função das

festividades. Amigo e amizade são sinônimos de confiança, respeito, sobretudo de

conforto. E toda vez que me sinto confortável diante de alguém ou de algo, como se

estivesse em casa, no fundo do quintal ou naquela mesa da cozinha onde os maiores

segredos e desejos são revelados, chamo a isso de amigo.

A amizade não precisa necessariamente de uma convivência física, de uma

devassidão em seu cotidiano e na sua vida íntima. Não precisa preencher todas as

suas horas, participar de tudo sem estar presente. Antes, precisa da sua emoção,

compreensão, do seu apoio, do seu silêncio, da sua bronca dura com nuances leve e

suave. Precisa da sua presença constante, mas sem imposição. Muitas vezes,

preferível que seja invisível, embora você tenha a certeza de que num toque pode

alcançar seu amigo, num suspiro forte ou um simples gritinho ele virá ao seu

encontro. Amigo é alguém que valoriza sua existência e sabe extrair o melhor do seu

eu, mais até do que você próprio.

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Linha do Tempo Página 8

Por tudo dito, sinto-me mais a vontade para informar que, finalmente, chegou

o momento destes textos de Opinião do Leitor, publicado pelo Jornal A Tribuna, da

cidade de Rondonópolis, ganhar asas e serem compartilhados com mais pessoas e

leitores ávidos por conhecer, informar-se, divertir-se ou simplesmente trocar um

dedo de prosa com o autor sobre assuntos diversos do cotidiano, do mundo real ou

divagações e fantasias dos desejos secretos reproduzidos. E, assim, novas amizades

verdadeiras serão construídas.

Caros leitores embarquem confiante nesta viagem literária, pois, o professor

Ruy Ferreira é mestre e doutor na arte de hipnotizar e encantar os que o rodeiam.

Sou sua fã e suspeita para falar de seus escritos. Mas, exageros e deslumbramentos

à parte, têm-se, aqui, uma excelente oportunidade para refletir sobre a sociedade e

seu cotidiano; ou pensar no que esperar do mundo e do futuro da educação, da

política, da sociedade e do nosso planeta.

O professor Ruy Ferreira é um destes amigos invisíveis, mas, extremamente

presente em nossas vidas. Podemos encontrá-lo esporadicamente nos espaços

físicos e com mais frequência nos ambientes virtuais, intelectuais, literários e

acadêmicos. Entretanto, o lugar mais apropriado para estes encontros tem sido, há

mais de vinte anos, as páginas da Opinião do Leitor.

Talvez, nem ele mesmo saiba, mas, particularmente, faço as leituras de seus

artigos de opinião desde que cheguei a Rondonópolis, no segundo semestre de 2002.

Aliás, o primeiro recorte de material do Jornal A Tribuna para a composição do

clipping da assessoria de comunicação do campus de Rondonópolis da Universidade

Federal de Mato Grosso (UFMT) foi um artigo dele, intitulado "O Computador na

Educação", produzido em agosto de 2002. Data esta, que iniciei minhas atividades,

como assessora de comunicação da referida instituição e, na qual, ele já era

professor consagrado e admirado desde 1995. Desde então, ele sempre foi muito

especial para mim, justamente porque costumo constituir laços fortes com os autores

que eu leio e me encantam.

Assim, esta obra surge para atestar que a riqueza dos textos produzidos para

a Opinião do Leitor está em sua diversidade temática, de estilos literatos e

linguísticos, de idiossincrasia, das experiências vividas e emoções colhidas e

retorcidas e compartilhadas.

A coluna Opinião do Leitor é este espaço de construção e encontros do

sujeito-autor com o sujeito-leitor e onde o professor Ruy Ferreira soube com

maestria explorar cada milímetro, informando e emocionando. Simplesmente porque

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Linha do Tempo Página 9

só se fala daquilo que se conhece muito bem e está em nós entranhado, pulsando,

gritando bem alto.

Ruy Ferreira é assim: visceral. Transpira, respira e inspira emoção e prazer.

Sabe como os grandes autores falar com e ao coração, mesmo quando os assuntos

são tão complexos, racionais e cáusticos. Na medida do ser, é poesia, canção e

paixão.

Ao fazer a leitura destas preciosidades, sou capaz de perceber o estado de

ânimo deste autor consistente e impecável, que sabe conduzir com excelência o ato

de escrever e transformá-lo num processo de fermentação intelectual extremamente

prazeroso.

Ele sabe e nos fala com poesia. Sinto que para este autor não há nada melhor

do que o silêncio das madrugadas, num encontro com ele mesmo, deixar vir à tona

toda emoção, toda explosão de sentimentos que vão se mesclando com o real, o

possível ou imaginário. E, nesse afã de saberes e sabores deixar a mão descansar

levemente sobre o teclado. É aí que o pensamento voa e o texto acontece. Texto,

este, que sai carregado com a tinta da subjetividade, embriagado por seus saberes e

experiências vívidas. Entretanto, requintadamente poluído por sua essência livre,

leve, sem receios, nem temores.

Querido amigo, falar de você ou de seus escritos é para mim algo grandioso e

requer ou me exigirá conhecimento refinado. Por esta razão, me permita, tão

somente, endossar os meus louvores por mais uma de suas preciosas criação. Que

venham os leitores e o sucesso se faça presente, pois, esta não é tão somente mais

uma publicação em um canto qualquer de alguma livraria.

Esta obra expressa seus desejos, sonhos, anseios, rica e lindamente

construídos por devoradoras horas insones, lendo, relendo e labutando na

construção do conhecimento, do saber, do ser e do fazer melhor, sempre. Do querer

e desejar dias mais luminosos para o nosso Brasil, velho de guerra. De acreditar que

é possível mudar o mundo. Mas, inesgotável, por depositar todas as fichas na

formação e construção de mentes produtivas e muito mais participativas. Queira

Deus que seus sonhos e desejos germinem como um vírus altamente contagioso,

mas profícuo...

Edileusa Regina Pena da Silva

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Linha do Tempo Página 10

Introdução Quando um estudante me questionou sobre os motivos que me impedem publicar

em formato de livro os artigos de opinião que esse velho mestre publica a mais de 15

anos em jornais brasileiros, o olhar se perdeu num ponto fixo no vazio das respostas

difíceis e a boca balbucia sílabas como: bem ... é .... pois ...

A saia justa que vesti nessa hora me fez ir atrás de algo maior que a resposta verbal,

por em prática o questionamento do aluno. Daí nasceu à motivação para organizar

esta despretensiosa coletânea de textos publicados aqui e ali.

Como prefiro trabalhar em equipe convidei o Júlio César Coelho para me orientar na

organização do livro. O homem é historiador e sabe delinear uma linha do tempo

como ninguém. O título da obra é uma homenagem aos que registram as várias

versões da verdade para as futuras gerações. Valeu Júlio.

Ao pedir a Edileusa Pena que se encarregasse do prefácio acertei em cheio. Sem

trocadilhos, a pena da menina é veloz, precisa e concisa. O fato de sermos amigos

a tantos anos complica um pouco, pois suas palavras ficam impregnadas de amizade

e companheirismo.

Dito isso, posso oferecer ao leitor uma explicação sobre os motivos que me levaram

a organizar esta obra. Primeiro é necessário dizer que publicar um livro é um prazer

muito intenso e mexe com a vaidade de qualquer um. Logo, a vaidade é um motivo

aqui presente. Ocorre que o intento de atender às exigências dos estudantes do

Câmpus Universitário de Rondonópolis (CUR), da Universidade Federal de Mato

Grosso (UFMT) é outro motivo que alego. Mas, sempre tem um “mas”, dois colegas

me pediram um CD-ROM contendo minha produção intelectual para incluir em um

livro que estão organizando. Ora, como sou muito egoísta entreguei o pedido e fui

além, me motivei a compilar um livro. Assim, iniciamos a pesquisa na hemeroteca da

Biblioteca Regional do CUR-UFMT e no acervo digital e impresso do jornal A Tribuna.

Os velhos disquetes de backup, os CD-ROM empoeirados, as pastas de arquivo

saíram da estante e foram para a mesa do Júlio, onde ganharam uma ordenação

lógica e cronológica.

Ao colocar em ordem os textos escritos ao longo desses quinze anos fiquei surpreso

com a evolução das ideias e dos valores morais, éticos, religiosos, sociais e políticos

que ocorreu em mim mesmo.

A sensação de olhar no espelho do tempo e ver sua própria imagem se transformar,

em um polimorfismo capaz de mudar até a alma, é boa por um lado, afinal sou

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Linha do Tempo Página 11

humano e tenho a obrigação de evoluir. Enquanto por outro lado é terrível constatar

que nada é eterno, nem mesmo as ideias resistem ao tempo.

Claro que tem coisas que não abrimos mão, como a Ética, por exemplo, e aí somos

rotulados de coerentes ou de intransigentes. Se mudarmos uns nos chama de

volúveis, outros de sensatos. Difícil satisfazer a todos.

Ao colocar os artigos de opinião publicados nesses mais de quinze anos em jornais

brasileiros constato a existência de uma realidade política que teima em permanecer

engessada, substituindo pessoas para atender necessidades pouco confessáveis de

grupos. Entra um governante, sai outro, muda o nome, mas nenhuma mudança de

postura ética e moral acontecem.

É um desfile de nulidades, de gente medíocre, de gatunos de sonhos, ladrões de

esperança, nada mudou nesse período. Tanto faz o discurso anterior ser conservador

ou progressista, ao chegar ao moedor de gente do poder, todos ficam iguais. Os

governantes parecem carne moída, difícil saber a origem depois de preparada. Isso

vale para presidente, governador, prefeito, senador, deputado ou vereador. Ao

chegarem ao poder transformam-se em farinha do mesmo saco.

Mas, a dor da perda também fez parte desse lustro de tempo. Foram amigos queridos

que nos deixaram órfãos, sem contar os familiares que teimam em sucumbir diante

da idade avançada, crianças de noventa anos que se vão.

Outros se foram novos demais, arrancados da vida pela tragédia. Esses a dor é

caótica e parece que dói mais. Sem contar os desconhecidos que a catástrofe leva

sem nos dar a oportunidade de conhecê-los.

Para um professor o tema predileto não poderia ser outro se não a Educação, em

maiúsculo mesmo, envolvendo críticas, constatações e propostas. Ao ver o conjunto

posso afirmar, escrevi pouco sobre a Educação e o que escrevi foi ruim. A coisa é tão

emergente, tão importante que o escrito é uma vírgula diante da necessidade. Pisei

na bola.

Passeei por outros campos do saber, dei meus palpites, falei o que pensava. Tentei

ser coerente. Alguns temas me são sensíveis demais: liberdade, democracia,

tolerância, amor ao próximo, amizade, que não permitem jamais transgiversar na

caminhada da vida.

Espero que a coletânea demonstre os contextos históricos em que os textos foram

escritos, apresentem abertamente minhas ideias e permita ao menos um sorriso. Boa

leitura.

Ruy Ferreira (autor)

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Linha do Tempo Página 12

Reformas do Estado Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 9 de maio de 1996.

Esta semana ouvi o Presidente Fernando Henrique dizer: "... agora o Congresso

aprovará todas as reformas que o Brasil necessita. Não tenho dúvidas de que os

congressistas saberão atender aos anseios do povo ... ". Foi na posse do Ministro da

Coordenação Política.

Tenho o péssimo hábito de pensar. E, pensei:

- Que raio de anseio popular é esse?

E pensei de novo. Porque:

- Não vejo nenhum movimento de base apoiar as reformas propostas.

- Não vejo "cara-pintadas" nas ruas pedindo Reforma Administrativa.

- Não vejo aposentados fazendo passeata pela Reforma da Previdência.

- Não vejo contribuintes realizando carreatas democráticas em favor da Reforma

Tributária.

- Não vejo professores e estudantes clamando por escolas pagas, como quer esse tal

de Bresser Pereira (o mesmo do Pão-de-Açucar e do Ministério da Economia do

Sarney).

Aí, pensei de novo: - Quem está interessado nessas tais reformas? E respondi por

exclusão, já que eu (professor universitário e contribuinte), meu sogro (aposentado),

meus filhos (ex-cara-pintadas), não estão, então só pode ser gente de fora!

Confesso que estive tentado a consultar Mãe Diná (aquela vidente dos Mamonas

Assassinas) no afã de descobrir os nomes dos interessados. Mas, andei lendo uns

jornais e uns livros, e cheguei a uma conclusão:

Os grandes interessados na reforma do estado são aqueles que vão ganhar alguma

coisa com isso. Por exemplo - O Banco Mundial, o FMI, o Clube de Paris, pois

deixando de oferecer serviços públicos e arrecadando mais impostos, o Brasil pagará

regularmente a tal da dívida externa. Privatizar a miséria de 38 milhões de brasileiros

ninguém quer, mas privatizar a Vale do Rio Doce que só deu lucro até hoje, e

descobriu um filão de 150 toneladas de ouro no Pará, essa até eu quero comprar.

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Linha do Tempo Página 13

Ora, se falta dinheiro para manter a máquina estatal como apareceram oito bilhões

de Dólares para salvar o Banco Nacional e Econômico. Eu nem tenho conta lá. Se

banco privado dá lucro, os dividendos são privativos dos acionistas, se dá prejuízo, eu

tenho que socializar meu imposto para ajudar ladrão.

Parei de pensar e fui ver televisão na esperança de que a novela da Globo mostrasse

o que realmente interessa ao povo: ilusões! Quebrei a cara. Apareceu um cara

magrinho, parece doente, dizendo que saiu do time da D. Ruth porque o José Serra

(Ministro do Planejamento) está de "sacanagem" com todo mundo.

Epa! Logo o Betinho.

E o próprio irmão do Henfil disse que o programa contra o desemprego lançado nesta

semana é “conversa prá boi dormir”, não resolve os problemas de nenhum

desempregado, talvez de alguma empreiteira sim.

Betinho. Não faz isso. Eu acredito em você. Fica lá e põe a “boca no trombone”.

Desliguei a televisão e fui para a Universidade. Lá decidimos entrar em greve contra

as reformas do FHC e pela reposição salarial, já que a inflação do ano passado não foi

reposta como manda a lei e desde janeiro eu deveria ter tido um reajuste no mesmo

valor da inflação passada.

É, acho melhor voltar para Brasília e avisá-los do que o povo pensa. Pois lá ninguém

sabe dessas coisas.

(*) Professor de Computação da UFMT

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Linha do Tempo Página 14

Na contramão da Educação Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 21 de junho de 1996.

O Campus Universitário de Rondonópolis abriga sete cursos superiores. Um desses é

bacharelado em Ciências Contábeis, todos os demais são voltados para a Educação.

Após vinte anos de existência, a comunidade acadêmica persiste na busca de uma

vocação para o Campus.

Muito bonito “Seu Campus”..., tornou-se um adulto sem horizonte, sem norte e

seguir.

Sua vocação é Educação, não se envergonhe disso! Lembre-se que ninguém nasceu

sabendo, já formado “doutor”, todos passaram ou deveriam ter passado pelos

bancos escolares do ensino fundamental, alguns freqüentaram o ensino médio e

poucos, a elite intelectual, banquetearam-se no paraíso da academia. Resumindo: -

A educação prepara os cidadãos para a vida (pelo menos deveria) e isso é

importantíssimo, seja aqui ou na culta França.

Tanto é verdade que o professor Fernando Henrique, estando neste momento

Presidente da República, curvou-se diante das exigências do Banco Mundial e

congêneres na melhoria do nível escolar de nossos cidadãos. Não se iluda, o

interesse subentendido pelo capital é capacitar consumidores à produtos que exigem

melhor preparo intelectual para uso, e não, erradicar o analfabetismo, tornar o povo

capaz de pensar criticamente, etc. etc.

Assim sendo, respaldado no conhecimento real e concreto do cotidiano, vou lhe dar,

“Seu Campus”, alguns conselhos:

- É preciso estar fortalecido quando houver luta. Logo quando o interesse for coletivo

todos os seus membros devem unir-se em torno desse ideal.

- O interesse pessoal não deve subverter o interesse legítimo da comunidade

acadêmica.

- Quando o Campus cresce, seus membros crescem na mesma proporção. Mas

lembre-se, o inverso também é verdadeiro.

- Se você não ocupar seu espaço, outros ocuparão. Seja “homem” e vá conquistar

seu terreno, não deixe que o ensino privado torne-se mais importante e necessário.

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Linha do Tempo Página 15

- O Mato Grosso é carente crônico de Educação Fundamental é Média. Nossa tarefa

é reverter esse quadro caótico. Seja formando, reciclando, capacitando e

melhorando o padrão do Educador que hoje atua nessa área. Muito bem, agora

vamos às ações que o “Senhor” pode realizar:

- Implantar o Colégio de Aplicação conveniado com o município e ou Estado, onde

nossos estagiários possam exercer o magistério. Possuindo laboratório de

desenvolvimento humano para crianças de até seis anos. Quem sabe esse colégio

não seria a escola-referência para as demais?

- Desenvolver um projeto contínuo de reciclagem de professores do 1º e 2º graus,

onde novos instrumentos são colocados à disposição, aliadas à novas concepções

educacionais. Isso valorizará nossos colegas!

- Implantar um Núcleo de Tecnologia Educacional para produzir livros regionalizados,

impressos, programas de rádio e televisão, criação de audiovisuais, produção de

vídeo. Distribuindo-os às escolas que participarem do convênio de capacitação de

Recursos Humanos. Gente capaz o “Senhor” tem, só falta planejamento,

coordenação e vontade.

- Criação de Núcleos de Educação para as Ciências, Educação Básica, Comunicação e

Expressão, etc. todos voltados para a Iniciação Científica e reforço escolar, com

atuação no vácuo do ensino formal. Já pensou: nossas crianças aprendendo a

aprender e construindo seu próprio saber!

- Abraçar projetos municipais e estaduais que visem a superação do fracasso escolar.

Pois ao participar estaremos aprendendo a erradicar essa doença social.

- Criação de um programa de pós-graduação regular, próprio ou conveniado com

outra Universidade, visando dar um salto de qualidade nos seus docentes. Lógico que

no Campo da Educação Pública (áreas do ensino de Matemática, História, Geografia,

Ciências Biológicas, Letras, etc.). Não seria bom para sua saúde intelectual?

Claro que a vida da região não é só Educação. Seria ótimo, se além das ações

sugeridas, o “Senhor” lutasse por novos cursos identificados com o Sul do Estado. Por

exemplo: Agronomia, Medicina Veterinária, Tecnologia de Alimentos, Processamento

de Dados, Direito, Administração de Empresas, etc.

Ah! Já ia esquecendo. Que tal uma Empresa-Júnior para o pessoal das Ciências

Contábeis? Muito melhor que estagiar em escritórios onde alguns vícios já se

enraizaram.

Bem, “Seu Campus”, as ideias estão postas, vamos discuti-las com a comunidade?

(*) Professor de computação.

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Linha do Tempo Página 16

Caro Reitor eleito Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 25 de julho de 1996.

Após uma acirrada campanha democrática e eleições pautada pela honestidade,

chegou-se ao seu nome para administrar nos próximos quatro anos a Universidade

Federal de Mato Grosso.

Fico feliz pelo processo eleitoral e principalmente, pelo resultado obtido.

De antemão sabemos que o seu cargo é desgastante. Entretanto, bem exercido será

gratificante tanto em nível de satisfação pessoal, como também, pelo

reconhecimento público de um trabalho voltado para as Ciências, Artes e Cultura.

Muitos empecilhos serão colocados em seu caminhar: Falta de recursos públicos

(crônico na Educação); Tentativa de privatização das universidades governamentais;

Oposição sistemática a qualquer projeto que vise quebrar corporativismos arraigados

e privilégios de grupos ou pessoas; Portas fechadas em Brasília; Visão estreita do que

seja Universidade, por parte da sociedade que nunca foi bem esclarecida sobre nossa

função social, além do público interno que não conhece nosso próprio negócio;

Isolamento científico por falta de quadros capacitados, resultante de políticas

federais que pagam o mesmo salário ao Doutor no desenvolvido litoral brasileiro e no

virgem sertão do país, acreditando que as excelências mudar-se-ão para cá devido

ao mais puro sentimento patriótico; Sem falar dos políticos dessa terra que teimam

em ignorar a Casa do Saber, como cadinho de soluções para inúmeros problemas

sociais e políticos de nossa região. Além de outros que só o passar do tempo serão

apresentados.

Entretanto acredito, isto é, tenho fé inabalável, que é possível superar todo e

qualquer empecilho administrativo, social, econômico ou político, através de duas

virtudes que reputo da maior importância e que o Senhor é possuidor nato: Vergonha

na cara e competência.

Puxão de orelha? Nunca!

Disse-lhe a mesma coisa ao iniciar a campanha, estou relembrando o passado

recente com a única finalidade de oferecer-lhe total liberdade para administrar.

Diga não a pedidos pessoais de cargos, benesses, privilégios, jeitinhos, cadáveres

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para uns computadores para outros, Internet para aqueles, etc.

Implante o planejamento participativo agora! Comece com o pé-direito sua

administração. Surpreenda até o fisiologista-mor, eu próprio, que lhe cobrei

inúmeros pontos nebulosos do programa de campanha (Política de Capacitação,

programas próprios de Pós-Graduação, incentivo à Pesquisa Científica, políticas para

o desenvolvimento de programas de extensão universitária voltados para a

sociedade que nos cerca e apóia, planejamento integrado, etc., etc.), dizendo:

Gente, agora vamos planejar a curto e médio prazo como realizarei a consolidação da

UFMT no cenário científico-artístico-cultural. Primeiro quais são nossos objetivos

permanentes e vocação. Em seguida, que políticas adotaremos para atingir tais

objetivos e por fim como faremos o planejamento e execução.

Daí em diante é trabalhar com essas duas virtudes.

Acredito que muita gente capaz foi seu eleitor de carteirinha, e devem ser ouvidos

nesse planejar. Caso seja necessário reúna representantes, instale a gerência

participativa através das Congregações e Fóruns universitários já existentes. Se a

sala de reuniões da reitoria for pequena para comportar os participantes, delegue

poder ao Vice-Reitor para coordenar parte da discussão. Articule com adversários de

campanha, pois a Universidade a todos pertence. Seja grande como a investidura do

cargo requer, seja magnífico no manejo do Saber, seja o Reitor da nossa

Universidade. E, principalmente, administre de forma participativa.

Saúde e Paz.

(*) Leciona Ciências da Computação no Campus de Rondonópolis da UFMT

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Educação: uma solução econômica e não

um problema insolúvel. Ruy Ferreira *

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 22 de agosto de 1996.

O Brasil de hoje procura desesperadamente imitar os Estados Unidos da América,

seja na Língua, Cultura, Moda, Desporto, Economia, Administração de Empresas,

Telecomunicações, Violência Urbana. Enfim, em quase todos os campos da vida

humana. Os argentinos têm razão ao nos chamarem de “macaquitos”, pois

realmente imitamos tudo ou quase tudo o que os americanos inventam.

Só não vejo imitação num campo: - na Educação.

Olhem bem esses dados, comparem com os nossos, constatem o absurdo em que

vivemos, e por fim, perguntem a si mesmo: Por quê?

Calcula-se que 30% do capital dos EUA estão ligados, não a fábricas e equipamentos

industriais, mas a escolas e material de ensino. Lá, em trinta anos as despesas com

a educação acadêmica (universitária) saltou de três bilhões de dólares para 54

bilhões. Esta cifra é maior que o total do orçamento daquele país em 1950. Sendo

estimado o gasto total em 200 bilhões de dólares, se incluídos os investimentos

indiretos.

A conseqüência desse investimento é que 57 milhões de pessoas, mais de um quarto

da população americana, estudam em período integral. Diplomam-se no curso

secundário 72% dos jovens, nenhum outro país do mundo se aproxima desse índice,

salvo o Japão que começou em 1873, sua cruzada contra a ignorância. Perto da

metade desses jovens diplomados continuam seus estudos em alguma instituição de

ensino superior. Em dez anos, nos EUA cresceram o número de matriculas de três

para sete milhões de jovens em suas universidades. A maior classe profissional

americana é a de professores, com 2.600.000 profissionais ativos no mercado.

Sabem o que aconteceu em decorrência desse investimento em Educação, no

mesmo período considerado, a produção total de bens e serviços saltaram de 300

para 650 bilhões de dólares, prevendo sua chegada em mais 6 anos a cifra de um

trilhão de dólares. Considere nesses dados que os americanos representam 30% da

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produção de bens do mundo, com apenas 6% de sua população. É mole ou quer

mais?

Outras conseqüências, além das econômicas, ficaram patentes: Não houve um plano

federal ou coisa parecida, mas apenas milhões de pessoas que decidiram melhorar

suas vidas e a de seus filhos. Os índices de natalidade começaram a declinar em

função da melhoria educacional. A mulher passa a ocupar lugar mais importante no

aparelho produtivo. A renda é mais equitativamente distribuída em função da

redução das diferenças de conhecimento da população. Muitos programas de

assistência social foram revistos, sendo substituídos por programas de capacitação

pré-escolar para crianças desprivilegiadas e cursos de verão nos guetos (favelas

americanas) por serem mais eficientes do que as intermináveis esmolas. Cada

americano instruído pode produzir mais e melhor.

Procurando alguma explicação nos teóricos da Economia, encontramos o escocês

Adam Smith (viveu 200 anos atrás) afirmar que uma nação deveria esforçar-se para

que seu povo fosse inteligente, engenhoso e dinâmico. Smith é o maior pensador do

capitalismo que vivemos na atualidade, como um papa dos economistas de hoje.

Outro que fala no assunto é o inglês Alfred Marshall (viveu no final do século XIX) que

afirmava que “o mais valioso capital é o investido em seres humanos”. Interessante,

não?

E nós: Brasileiros e brasileiras! Minha gente! Caipiras! “Macaquitos”! Por que não

copiamos a idéia dos queridos irmãos do Norte e investimos, de verdade, na

Educação de nossa população? Será que existe alguém desejando nossa eterna

ignorância e pobreza?

Ah! Ia me esquecendo, todos os dados citados acima dizem respeito à década de 60

(anos dourados, para eles é claro) nos Estados Unidos.

(*) Professor de Computação da Universidade Federal de Mato Grosso

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Minhas desculpas aos rondonopolitanos Ruy Ferreira *

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 10 de setembro de 1996.

Na sexta-feira passada (06/09) vi-me diante da árdua tarefa de discursar como

paraninfo da turma de formandos em Matemática do CUR/UFMT. É terrível para

alguém inexperiente dirigir-se a uma platéia heterogênea, pois estavam presentes:

parte do reitorado da UFMT, políticos importantes, professores titulados, autoridades

dos poderes executivo e legislativo, representantes religiosos e pessoas comuns

(como eu).

O Cine Avenida lotado, pequeno para um evento tão concorrido, e eu suando

desesperadamente, parte pelo calor e também pelo natural nervosismo, esse era o

meu debut como tribuno.

Como padrinho da turma, na primeira parte aconselhei meus afilhados a cultivarem

algumas virtudes morais imprescindíveis ao profissional de nível superior, afinal não

queremos um monte de PC Farias, Osmani Ramos, Castor de Andrade e outros

bandidos escudados no diploma de um curso superior, andando por essas terras.

Foi a parte “morna”, chata até. Virtude moral é tão cafona, démodé, desatualizada

nos dias atuais, onde impera a "Lei de Gérson" e a esperteza. Sinceramente,

compreendo a cara de sono da platéia. De qualquer forma dei meu recado,

concitando os protegidos a serem corajosos, idealistas, coerentes, solidários,

honestos, éticos e criativos.

Na segunda parte do blá-blá-blá a coisa esquentou, pois muito nervoso, perdi-me

no texto que havia preparado e deixei transbordar a indignação que estava represada

em meu coração. Discursei através da emoção, sem nenhum retoque, sem palavras

frias e bem medidas. Fui “eu mesmo” no lugar do desejável paraninfo oficial, aquele

que só diz “abobrinhas”. Deixei que brotasse minhas decepções, guardadas a sete

chaves, afinal fui estudante aqui no Campus de Rondonópolis entre 1982 a 1985 e

hoje retorno como professor de Computação.

Catorze anos se passaram e não vi coisas novas vindas de Cuiabá. Raciocinem

comigo: - Em 82 havia os cursos de Ciências, Estudos Sociais, Pedagogia e Ciências

Contábeis. A partir de 88, o curso de Ciências dividiu-se em Matemática e Ciências

Biológicas. Já o de Estudos Sociais deu origem aos de História e Geografia. Tudo

divisão, adaptação, nada de novo. Os laboratórios que estudei são os mesmos hoje

em dia. A Biblioteca Regional e a Casa do Estudante são inserções no Orçamento da

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União com destinação certa de autoria do Deputado Wellington Fagundes (de

Rondonópolis). A quantidade de professores não cresceu com o aumento da

demanda local, alguns se aposentaram, outros se demitiram e nada de concurso

público para suprir essas vagas. Quando é necessário consertar um pneu do carro do

Campus, temos que colocá-lo num outro carro e levá-lo a Cuiabá para o conserto lá

acontecer. Isso devido ao Campus de Rondonópolis não possuir nenhum tipo de

autonomia administrativo-financeira. Coitados dos comerciantes de Rondonópolis,

pois quando precisamos de um brinde vamos até eles pedir, mas na hora de comprar

o necessário para funcionar o Campus, tudo é adquirido em Cuiabá, e as empresas

daqui ficam chupando o dedo. Se precisarmos acabar com a poeira e lama das ruas

do Campus, pedimos a Prefeitura de Rondonópolis e, gentilmente, ela asfalta. Ora,

nosso órgão é federal e cabe a União, através da UFMT, bancar esse gasto. Nunca a

Prefeitura disse não ao Campus e com isso a UFMT não precisa gastar por aqui. Bom

para a Universidade, ruim para a Prefeitura. Claro que a UFMT utiliza esse dinheiro

economizado em outros locais como Sinop, Barra do Garças e Cuiabá. Para montar

um Laboratório de Informática no Campus juntamos máquinas obsoletas, com peças

que trouxe de minha casa, com doações da LD Informática (de Rondonópolis). Isso

é normal? Talvez sim. Se entendermos que Cuiabá nos trata com descaso. E foi isso

o que eu disse. Nem uma palavra mais!

Disse também, que ninguém está impedido de sonhar algo possível. Sonho com a

criação da Universidade Federal Sul-Mato-Grossense. Para agora? Claro que não! O

momento é propício a fortalecer o Campus Universitário de Rondonópolis e somente

após conseguir novos cursos, com um quadro de professores capacitados, suficientes

para pesquisar e ensinar, salas de aulas na quantidade desejável, laboratórios

modernos e bem equipados, etc., devemos partir para o Ministério da Educação

buscando a criação da nova Universidade no Mato Grosso. Assim aconteceu com

Lavras - MG, Viçosa - MG, Campina Grande - PB e Santa Maria - RS, por que não pode

acontecer aqui? Temos políticos eleitos com nossos votos, espaço físico, gente

capacitada, estudantes em potencial e tudo para construir.

Caso esteja errado, me corrijam. Não sou, e nem quero ser, o dono da verdade. Mas,

paciência tem limite.

Peço desculpas publicamente aos que estavam no Cine Avenida na sexta-feira, já que

a maioria daquelas pessoas não merecia ouvir meu desabafo.

(*) Professor de Ciências da Computação da UFMT, em Rondonópolis

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Senhores candidatos à Prefeitura de

Rondonópolis Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 27 de setembro de 1996.

Esta semana a Presidência da República enviou ao Congresso Nacional um projeto de

lei que regulamenta os gastos com a Educação, principalmente a municipal. Claro

que nesse projeto o governo federal não vai tratar do ensino sob sua

responsabilidade (leiam-se, universidades). Mas ditará as regras para as prefeituras

aplicarem os 25% em Educação que a Constituição exige.

Até aí, tudo bem. Só que este projeto vai acabar com algumas distorções hoje

praticadas pelos prefeitos, como: construção de pontes nas proximidades das

escolas, asfaltamento de ruas periféricas ao estabelecimento escolar, ginásios de

esportes que alunos nunca utilizam praças com chafariz e placas de inauguração

onde estudantes nunca pisaram etc.

Primeiro alerta: 15% obrigatoriamente serão aplicados no Ensino Fundamental, o

que exige um bom funcionamento para evitar que os recursos diluam-se em projetos

burocráticos nas Secretarias Municipais e, realmente, seja aplicado na Educação.

Segundo alerta: O salário dos professores terá um piso médio (não sei como) de R$

300 reais. E planos de cargos para a carreira do magistério.

Terceiro alerta: Essa iniciativa não partiu da mente privilegiada do ministro da

Educação, mas sim, da exigência formal do Banco Mundial para melhorar a

capacidade de consumo dos brasileiros.

Ora, sabendo que estamos em período eleitoral é importante tornar público alguma

idéia que possa ajudar os candidatos a planejarem suas ações para a área da

Educação. Por exemplo:

- Viabilizar a introdução da Iniciativa Científica no Ensino Fundamental, através de

um Centro de Apoio à Pesquisa ou de Núcleos polarizados para orientação e

disseminação de atividades de pesquisa científica. O governo federal entra com

muito dinheiro quando o projeto é viável e o país ganha muito ao criar o espírito

investigativo no estudante de hoje que será o cientista de amanhã. É problema de

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segurança nacional e soberania;

- Implantar um programa de Educação Continuada para os professores que hoje

atuam nas escolas da cidade. Independente se leciona na rede pública ou privada. O

que importa é melhorar a qualidade de todos os mestres em atividade. Aí também há

muito dinheiro da União para ser empregado, depende de bons projetos municipais

e de força política para encaminhá-los. Além de parcerias com instituições privadas.

- Criar condições para a escola ser lugar desejado para o estudante, com atrativos

artísticos, esportivos e culturais ao gosto regional. Nada de aula de surfe para quem

nunca viu o mar.

- Aproveitar a “onda” de Educação Ambiental que varre os órgãos financiadores para

aprovar projetos voltados para o Meio Ambiente, Qualidade de Vida, Preservação de

Mananciais, etc.

- Acionar um conselho municipal de educação para discutir as políticas de governo

para a Educação, e, ao mesmo tempo, legitimar o envolvimento popular na proposta

educacional da cidade;

- Envolver a Universidade Federal de Mato Grosso no sistema educacional local, antes

que ela acabe. Usando e abusando das cabeças coroadas pelo Saber na assessoria e

consultoria de projetos conjuntos. Fazendo do Campus Universitário de Rondonópolis

um órgão necessário à comunidade local.

Claro que outras sugestões e ideias são bem vindas. Lembrando a história do

beija-flor que tentava apagar o incêndio na floresta, a minha parte eu já fiz, espero

que outros educadores ajudem os candidatos a pensarem como tratar a Educação

nos próximos quatro anos em nossa cidade.

(*) professor de Ciência da Computação e leciona no Campus Universitário de

Rondonópolis – CUR-UFMT

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Educação - De novo não! Arghhh! Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 04 de dezembro de 1996.

Nesse espaço democrático fiz uma breve reflexão sobre a Educação como solução

econômica e não como um problema insolúvel (22 de Agosto). Naquele momento

tinha a intenção de despertar a comunidade para discutir o único caminho para o

progresso: Educação.

Para minha decepção não li matéria contestando minha teoria, não ouvi amigos

discutindo as verdades (ou mentiras) contidas no texto. Fiquei perguntando: - Será

que o pessoal não lê o jornal? Será que o período eleitoral apagou o interesse por

temas permanentes? Será que ninguém está interessado em conversar sobre

Educação? Não sei!

Mas sei que nesse mesmo período, não aqui em Rondonópolis - Mato Grosso - Brasil,

16 presidentes de grandes empresas americanas (do norte) publicaram na imprensa

dos Estados Unidos um texto defendendo o fomento à pesquisa científica e

tecnológica como função importante do governo federal.

Vou citar alguns trechos da carta-aberta dos empresários ao povo americano:

“... a liderança tecnológica do país é resultado da parceria entre Universidade, governo e

iniciativa privada, proporcionou desenvolvimento econômico e bem-estar social...”

“...imagine a vida sem vacinas contra a pólio, sem marca-passos cardíacos, sem sistemas de

purificação d’água, sem terapias avançadas contra o câncer...”

“... por muitos anos governos de ambos os partidos (Democratas e Republicanos),

trabalhando junto com o Congresso, apoiaram consistentemente programas de pesquisa

universitária como investimento vital para o futuro de nosso país...”

“... por todas essas razões, é essencial que o governo federal continue seu papel tradicional

no ambiente universitário como financiador de pesquisa básica e aplicada. Se nós quisermos

manter o Sonho Americano intacto... Na hora do Congresso decidir sobre a pesquisa

universitária, não poderá haver dúvidas: nós estamos determinando, hoje, o século 21.” (in

totum no Boletim Informativo nº 01 de Set/96, da Sociedade Brasileira de Física)

Bem, ao ler a carta, retomei aquele mau-hábito de pensar. E pensei: Quem está

pedindo isso lá nos EUA são micro-empresários? Não! São empresários que dirigem

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empresas como a Phillips, Kodak, Motorola, Merck, IBM, Texas, GE, GM, Dupont e

outras do mesmo porte. E esses caras costumam ser muito bem informados, melhor

ouví-los.

Pensei de novo: Será que são socialistas importados de Cuba querendo derrubar o

capitalismo americano? Não. Representam à fina-flor do capitalismo internacional.

Epa! Então porque estão preocupados com as Universidades, se aqui no Brasil o

governo quer acabar com elas? Sei não, isso está me cheirando a complô de

comunista ou guerra santa.

Como a cabeça começou a doer, eu perguntei a um amigo: Por que será que os

grandes empresários americanos querem suas universidades realizando pesquisas

básicas e aplicadas. Enquanto o tal de Bresser quer acabar com as nossas? E ele me

respondeu: - Seu burrinho! Sem pesquisadores aqui no Brasil, nós teremos que

importar até caneta esferográfica de lá.

Ah! Começo a entender melhor essa história de poder econômico. Eles pesquisam

nossa biodiversidade, criam medicamentos e depois nós compramos seus remédios a

peso de ouro. Se fizermos isso por aqui, onde eles iram faturar sua riqueza?

Nesse momento lembrei-me de outro artigo aqui publicado (27 de Setembro) onde

oferecia algumas sugestões para os candidatos a prefeito, no campo da Educação. E,

decidi, agora não dou mais sugestões, entrei na fase da ação. Vamos construir

projetos de Iniciação Científica para nossas crianças, pois minha geração está

perdida. Vamos colocar tecnologia à disposição dos estudantes de todos os níveis e

ligar tudo isso à cultura, realidade e valores regionais. Vamos sair do marasmo

intelectual que nos encontramos, ou da omissão não-declarada, para buscar

alternativas para a Educação dos nossos filhos.

Pois do futuro das crianças dos americanos do norte, os empresários de lá, já estão

tratando com muita competência!

(*) Professor de Computação do CUR/UFMT

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Eu e o sindicato Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (1996)

Muitos anos de minha vida profissional foram vividos longe da possibilidade de

participar de uma instituição capaz de defender meus interesses. Hoje isso é possível,

e tornei-me filiado a uma seção sindical que representa os interesses dos docentes

atuantes no ensino superior.

Mas o que mudou atualmente em minha vida ao conquistar essa “dádiva” chamada

filiação sindical? - Bem, eu ganhei...... conquistei...... ajudei na luta pela....

Está difícil enumerar algo concreto.

Na verdade dei um azar danado. Pois o movimento sindical docente está na mesma

situação que estaria um cego participando de um tiroteio. Hoje o ANDES só consegue

interlocutores de 2º ou 3º escalões de governo, e se a coisa persistir assim, daqui a

algum tempo estará negociando com os porteiros dos ministérios. A estratégia do

FHC está dando resultados e esvaziando o movimento sindical. Por sua vez os

sindicalistas são os mesmos do tempo da “saudosa ditadura” e persistem nas

mesmas formas e eixos de luta, nas mesmas palavras de ordem. O tempo parece

estar parado para esses “companheiros”. Pena que a realidade não foi avisada que

deveria permanecer inalterada. Como renovar o nosso sindicalismo com tanto

interesse político-partidário em jogo? Como apaziguar a briga de muitos

trabalhadores pelo afastamento remunerado, jocosamente chamado de turismo

gratuito?

Bem, falar mal é muito fácil e estou sugerindo um grupo de alternativas para o nosso

sindicalismo, todas colhidas nos corredores do local de trabalho: A primeira é

transformar o sindicato numa associação cultural, filantrópica e benemerente, onde

os sindicalizados recebam assistência médica, odontológica, jurídica, psiquiátrica e

espiritual (contratando Mãe Dinah, por exemplo). Ou quem sabe, fundando uma

cooperativa onde os cooperados ganhem descontos, através de convênios nos

postos de gasolina, farmácias, supermercados, motéis, etc. Ou ainda, criando um

clube recreativo que promova baile, festa junina, encontro de casais e outras coisas

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do gênero. Por fim existe também a sugestão de transformar o sindicato em órgão

administrativo, orgânico das universidades, e essas por sua vez, forneceriam pessoal,

material e recursos financeiros para o bom funcionamento da estrutura sindical

pelega.

Como não vejo nosso movimento sindical como uma fonte de criatividade e eficácia

na luta de classes, pergunto: - Será que estamos enquadrados numa das situações

acima? Se estivermos, avisem, pois quero gritar bem alto um chavão do meu tempo

de rapaz:

- Parem o sindicalismo que eu quero descer!

(*) Professor do ICEN/UFMT

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Penitenciária ou maternidade. Qual o

melhor lugar para um condenado? Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (1996)

Tenho acompanhado pela A Tribuna a trajetória da traficante “Branca” e estarrecido,

comecei a entender o poder do dinheiro na sociedade. Não estou falando de dinheiro

ganho com o suor do rosto, num trabalho digno qualquer, mas sim na riqueza

adquirida através de atividades ilícitas como é o caso do tráfico de drogas.

Após ser condenada a 21 anos de reclusão (prisão fechada) a traficante adoeceu e foi

removida para uma maternidade particular, onde permanece até hoje. Ora, que raio

de reclusão é esta! Que juiz de execução penal permite a um condenado cumprir

pena em estabelecimento privado? Da mesma forma, a Promotoria Pública espera 30

dias para tomar providências e aguardará mais 15 dias por um laudo realizado em 15

minutos pelo IML. Tudo isso me deixa intrigado, e pior, possibilitando especulações

sobre as atitudes das autoridades envolvidas no assunto. Não faço pré-julgamento

da situação, também, não acredito que bandido tenha dinheiro lícito para financiar

estadia em maternidade particular até o final da pena e muito menos que o Estado

está pagando o tratamento hospitalar da presidiária.

Entendo que juiz ou promotor não podem decidir se a traficante está doente ou não.

Para isso temos médicos oficiais (IML), hospitais públicos e manicômios judiciários.

Mas daí o internamento por quase dois meses de uma condenada numa maternidade

particular, com direito a “segurança pessoal” e todas as mordomias que o dinheiro

pode comprar, está longe do meu entendimento.

Por fim me pergunto: - Existem outros presos doentes nas penitenciárias do Estado?

Se existe, estão tendo o mesmo direito? As respostas a estas perguntas são difíceis,

pois a população carcerária é grande, o volume de trabalho da vara de execuções

penais é enorme, a carga de atribuições da promotoria é imensa. Enquanto isso a

traficante cumpre pena na maternidade. E eu, pago.

(*) Morador e contribuinte de impostos em Rondonópolis

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Bobo, talvez. Burro não! Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 21 de janeiro de 1997.

Segunda-feira minha filha levou seu carro ao Detran para ser transferido de Campo

Grande-MS para cá. Todos os documentos em ordem e o IPVA só vencendo em

outubro de 1997. Aí veio a bomba: Primeiro é necessário pagar antecipadamente o

IPVA, no Mato Grosso do Sul (o dinheiro fica lá e o carro usa as ruas daqui!!) e o pior,

tem que reconhecer a firma do TABELIÃO que reconheceu a firma do vendedor no

DUT. É mole?

Quarta-feira foi minha vez, fui pagar o IPVA do carro, com 16 dias de antecedência

para a data do vencimento, e sai do 2ª CIRETRAN com a impressão de que fui tratado

como um sujeito muito burro.

As atendentes foram cordiais, a fila estava pequena e o ar condicionado refrescava o

ambiente com eficiência. Mas, alguns fatos me chamaram a atenção e cai na besteira

de perguntar “por quê?”. Maldita hora! Devia ter ficado de boca fechada e satisfeito

pelo atendimento recebido.

Por quê o preço do licenciamento do meu carro e de outro que nem paga mais o IPVA

custa R$ 40,00? - São despesas operacionais do DETRAN, fixadas por Cuiabá.

Respondeu-me a atendente.

Chamaram-me de burro (eu devia ter estudado Sociologia e não Sistemas de

Informações) e “tamos conversado”. Despesas operacionais são aquelas diretamente

relacionadas com a operação ou produção de um bem ou serviço. Também sei que

essa tarifa é fixada pelo governo. Mas essa droga de resposta não responde nada!

Como acredito ser meio bobo, perguntei como fazer para liberar a alienação fiduciária

do DUT (documento único de transferência). A resposta foi: Pegue uma guia de

desalienação com a moça, pague uma taxa no BEMAT e pasmem, faça a vistoria no

veículo.

Parafraseando o colunista Matraca: Arre égua!!

Fazer vistoria por quê? - Ora, haverá alteração no registro do carro, logo tem que

fazer a vistoria, foi à resposta ao novo por quê. Dessa vez tentei argumentar que não

havia nenhuma alteração no veículo, mas sim no documento do carro, logo a vistoria

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era desperdício de tempo e dinheiro. Aí a resposta foi a óbvia: - É a lei!

Claro que sei que é a lei, não sou burro. Burro foi quem fez a lei, quem a promulgou

e também, aqueles que se calam diante dessas burrices burocráticas que só

atrapalham a vida do contribuinte. Como continuo meio bobo, deixo a sugestão ao

chefe da CIRETRAN no sentido de rever procedimentos administrativos

desnecessários, solicitar mudanças nas leis, melhorando ainda mais o atendimento.

Afinal de contas ele está lá para facilitar a vida dos contribuintes, esse mesmo cara

que paga o salário desses luminares da tecnocracia brasileira.

(*) Professor de Computação da UFMT

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Impunidade começa perto da gente Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 16 de abril de 1997.

Passando por qualquer cidade brasileira estamos nos acostumando a ver as Feiras do

Paraguai. Parece algo institucionalizado, legal ou moralmente correto.

Não é! É crime vender muamba. A Polícia Federal sabe, o Ministério Público sabe, a

Receita Federal sabe os órgãos de fiscalização estadual e municipal também sabem.

Mas por que nada fazem¿ Resposta simples: Impunidade.

Ora, ao assistir o noticiário da televisão, do rádio ou dos jornais, nos deparamos com

espertalhões federais (nacionais) que por força da democracia lá estão para proteger

o direito de todos e, no entanto, legislam em causa própria. Essa de extra teto para

parlamentares, presidentes e ministros é a fina-flor da safadeza com o José da Silva

que, ao aposentar-se com um salário mínimo, não pode vender um

contrabandozinho para melhorar a renda familiar.

Ambos estão errados. O parlamentar por ser a elite (teoricamente) não pode cometer

um deslize moral dessa proporção e o José da Silva, por ganhar pouco, não pode

infringir a lei.

Não adianta falar em desculpas como o desemprego, globalização, carestia, analogia

popular: o exemplo vem de cima, etc. Crime é algo inaceitável pela sociedade e

pronto. Quem o comete tem que ser punido com o rigor da lei. Sonegação de

impostos, concorrência desleal, contrabando são crimes e como tal devem ser

tratados.

Se assim não for, qualquer um de nós terá o direito de estuprar a filha do juiz, de

roubar o gado do prefeito, de lesar os cofres públicos, de matar um desafeto. Pois se

a lei não for cumprida por uns crimes, também não será para os demais.

É hora de o cidadão tomar vergonha na cara e deixar de ser mais um esperto (usuário

da lei de Gerson), não comprando sem nota fiscal, exigindo que as autoridades

atuem em suas esferas de atribuições e ficando de olho em possíveis sinais exteriores

de riqueza, demonstrados por fiscais, policiais, banqueiros de bicho, promotores de

Justiça. Juízes, muambeiros, além dos parlamentares que juraram cumprir a lei.

(*) Professor da UFMT.

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Linha do Tempo Página 32

O Brasil não precisa de mais faculdades de

Medicina Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 17 de abril de 1997.

Será? Sob esse título o Conselho Federal de Medicina, a Federação Nacional dos

Médicos e a Associação Médica Brasileira publicaram uma nota paga no jornal

“Correio Braziliense” de 13 de abril de 1977. Ali tratam de proteger seus ganhos e

status quo, sugerindo que o Ministério da Educação não permita a abertura de novos

cursos na área médica, pois tais cursos estão preocupados com a mercantilização da

Medicina e não com uma excelente formação universitária, necessária àquelas que

tratam de vidas humanas.

Apresentam indicadores como: a OMS preconiza 1 médico para um grupo de 1000

habitantes; O Brasil possui 220000 médicos em atividade; a taxa de crescimento

anual de médicos formados é de 1,89%, segundo projeções do IBGE.

Estando em Brasília, com uma rede pública hospitalar de padrão aceitável, é

perfeitamente digerível o discurso da “turma de branco”. Só que o Brasil não é

Brasília, nada daquilo que existe na ilha da fantasia é realidade para o restante do

país. O que faltou dizer naquela nota foi se a densidade preconizada pela OMS é

atendida em todas as regiões brasileiras. Se não for verdade para todo o Brasil, o que

os representantes da classe médica sugerem para solucionar esse problema médico?

Como professor universitário de uma universidade federal que forma médicos, entre

inúmeros outros profissionais, sugiro que a Comissão Interinstitucional Nacional de

Avaliação do Ensino Médico (CINAEM) receba pedagogos especialistas em currículos,

filósofos especialistas em Ética e representantes dos usuários do serviço médico

público e privado, especialistas em sofrer. Para juntos pensarem em soluções

duradouras e abrangentes.

É mais sensato que castrar a autonomia universitária por portaria ministerial!

*Ruy Ferreira é professor da UFMT.

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Linha do Tempo Página 33

A História não perdoa! Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 08 de abril de 1997.

Desde que aqui cheguei, em janeiro de 1995, tenho tentado provocar uma discussão

entre políticos, educadores, proprietários de escolas, estudantes de todos os graus e

até mesmo a comunidade em geral. Usei o espaço disponível para denunciar, propor,

criticar e elogiar ações e fatos ocorridos com a educação no país e, principalmente,

em nossa cidade. Mas, nada de réplica, resposta, solicitação de esclarecimento. Nada

mesmo!

Minha frustração hoje é imensa, causada pelo egocentrismo de todos os que

deveriam estar falando, discutindo e planejando o futuro educacional. Só vejo

conversas de bastidores, nomeações e mais nomeações. Parece coisa de empresa

familiar, muito embora estejamos falando de educação, isto é, coisa que afeta a

todos, inclusive nosso futuro.

Propus naqueles artigos algo como: Colégio de Aplicação para as Licenciaturas

existentes no Campus Universitário; Educação continuada para professores em

atividade; Atividades extraclasses nos currículos de nossas crianças, etc., etc. Como

resposta um colega avisou: “Estou colecionando seus artigos, para cobrar ações e

coerência no futuro”. Estávamos em 1996 e éramos colegas na UFMT.

Numa reunião com os professores de 1º e 2º graus, acontecida no anfiteatro do

Campus em 1996, usei o rótulo de “analfabeto funcional” para designar os

professores que há muito tempo se formaram e nunca mais se atualizaram. Quase

levei uma surra! Será que é possível parar a evolução no tempo e no espaço,

ensinando que a terra é o centro do universo. Podemos enganar uma pessoa por

muito tempo, mas é impossível enganar a todos.

Elaborei em parceria com o Prof. Dr. Edson Oiagen (UNISC), um projeto de médio

prazo que contemplava parte daquilo que escrevi nos artigos publicados. Entreguei

este projeto à então Secretária Municipal de Educação, Profª. Ivane Borges, em

dezembro do ano passado. Na entrega estava presente o atual Secretário que ouviu

e garantiu: “Vamos analisar e daremos retorno”. Em fevereiro recebi o retorno do

amigo Secretário – “O projeto é muito ousado, tem méritos, mas não podemos

implantá-lo em Rondonópolis, nossas prioridades são outras”. Meses de trabalho

duro, estudei feito um condenado e, no final, cesta de lixo.

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Linha do Tempo Página 34

Sabem quais são as ideias básicas do projeto: - Educação Continuada; Iniciação

Cientifica; Educação Tecnológica; Produção de material didático regionalizado;

Atividades Extra-Classes e utilização de novos recursos tecnológicos na Educação.

Um dos pontos altos do projeto (que prevê a parceria entre município, Estado, União

e empresas particulares) é a criação de Núcleos de Tecnologia Educacional (NTE).

O NTE é o meu xodó por dois motivos: permite a introdução da Computação (única

área do conhecimento que tenho algum domínio) no processo educacional e é inédito

no Centro-Oeste. Adoro coisas novas, principalmente aquela que podem nos ajudar

a evoluir. Já pensaram, professores de Rondonópolis usando computadores como

ferramenta de apoio às suas aulas e atualizando-se diariamente, alunos pesquisando

dados em lugares de referência como o Museu do Louvre na França, ou coletando

dados sobre o Greenpeace em Genebra, na Suíça, ou resolvendo exercícios de

matemática com auxílio de professores-virtuais, reunidos numa videoconferência.

Tudo disponível em nossas escolas, para nossos próprios filhos, para nossos colegas

professores das redes pública e privada.

Não pensaram. E, provavelmente, não vão pensar!

Acontece que o mundo evolui apesar da minha teimosia e duas semanas passadas o

Ministério da Educação tornou público, na internet, o projeto PROINFO que, entre

outras coisas, distribuirá 100.000 computadores para as escolas brasileiras com mais

de 150 alunos.

A exigência para participar desse grande programa do MEC é que o município possua

um projeto de utilização dos computadores nas escolas e que esteja afinado com o

correspondente estadual.

O MEC lançou tal programa como forma de atacar o analfabetismo funcional de nossa

mão-de-obra (tão desqualificada) e, aos poucos, implantar o Ensino à Distância de

Ciência e Tecnologia. E como o referencial bibliográfico é o mesmo que eu utilizei

ambos são parecidos e visam os mesmo objetivos. Eles usaram um grupo de

Doutores respeitadíssimos para planejar o programa, enquanto o nosso projeto teve

a assinatura de um só Doutor e de um professor não capacitado. Na prática, um é a

cara do outro, inclusive a terminologia, só que o nosso foi apresentado seis meses

antes.

E Rondonópolis? Que faremos: - incluir nossa cidade no programa do Ministério,

recebendo todo apoio material e financeiro para desenvolvimento do projeto. – Ou

sair de “pires na mão” pedindo ao governo estadual que nos inclua em seu projeto e

aguardar nossa vez dentro da prioridade do governador?

Caro Senhor Prefeito, homem das Ciências, a História não perdoa!

(*) Professor de Computação da UFMT

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Uma estória insólita ou cada macaco no

seu galho Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 14 de maio de 1997.

Sou um pequeno empresário do ramo de confecções, tenho uma pequena fábrica,

vários fornecedores e um quadro de funcionários muito bom. Num fim-de-semana fui

para Águas Quentes, onde reencontrei um velho amigo. Conversa vai, conversa vem

e ele me disse: João, faça como eu, compre um microcomputador para sua empresa

e acabe com seus problemas de controle de estoque, caixa, cobrança, etc. Deixe tudo

por conta da máquina, demita seu pessoal administrativo, barateando seus custos e

aumentando a lucratividade da empresa. Confesso que fiquei maravilhado, tanto

pelo reencontro, como pela assessoria gratuita que recebi. Foi um fim-de-semana

completo.

Segunda-feira, bem cedinho, telefonei para o amigo e perguntei: - Onde compro o tal

computador? E ele respondeu - Não se preocupe. Tenho um amigo na feira do

Paraguai que resolve qualquer problema. Vou falar com ele e quando o bichão chegar

ele avisa.

Dias depois, recebi o microcomputador encomendado pelo grande amigo. O único

problema era a Nota Fiscal, pois o feirante não podia emitir nota. Mas, deixou bem

claro: - Se der defeito a garantia é total, por cinco anos e meio. Minha esposa tem um

sobrinho que veio do Piauí e sabe tudo da tal linguagem C. Estava fazendo um

cursinho lá em Teresina, mas foi obrigado a abandonar. Para ficar bem com a patroa

contratei o sobrinho e demiti o faturista, o estoquista e o contador. Agora é só

esperar os resultados do investimento.

Três meses se passaram, estou furioso, descontrolado, louco da vida. O infeliz do

sobrinho só quer jogar videogame no microcomputador, exigiu um monte de

programas (CAD-CAM, CASE, Multimídia, etc.) e nunca usou nenhum deles. O

computador parou de funcionar e fui procurar o feirante, soube que o danado mudou

de ramo e está guardado na Mata Grande por cinco anos. Meu amigão está com a

sogra doente e viajou para São Paulo, ninguém sabe quando volta. Meu estoque está

uma bagunça, não sei que está me devendo, pois perdi o controle de faturas, sem

contar o rombo no banco por causa do caixa que nunca mais fechou.

Mandei o sobrinho para o “olho da rua”, estou brigado com a esposa e recontratei

meus antigos funcionários. Computador. Nunca mais!

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Empreendimentos, empreendedores e

acadêmicos. Ruy Ferreira *

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 29 de agosto de 1997

Passeando pela cidade descubro um lado pouco comentado pela mídia local e menos

ainda, estudado pela academia regional (universidade, faculdade, instituto de ensino

superior, etc.): Empreendimentos.

Indistintamente os empreendimentos podem estar no campo político, social ou

econômico. São caracterizados pela visão de alguém (o empreendedor) que percebe

uma oportunidade e arrisca-se na empreitada.

Bons exemplos de empreendimentos locais poderiam ser estudados por acadêmicos

(principalmente os de Administração de Empresas) visando obter maiores

informações sobre quem e o quê se empreende em cada região. Assim, seria possível

estudar os de cunho político, como a municipalização da operação de água potável.

Buscando as raízes que os políticos locais alegam para esse empreendimento e

confrontando com a realidade da empresa.

Ainda no campo dos empreendimentos políticos, outra boa oportunidade acadêmica

é a análise do perfil, intenções e ações de um político da região. Busquem algo mais

que a biografia do homem público, pesquisem seus pensamentos sobre a sociedade

local e regional, sobre aspirações políticas e influências na vida empresarial, seus

empreendimentos futuros e traduzam para o universo dos políticos da região.

Enquanto isso, no campo econômico, proliferam ricos exemplos para estudo. Os

modismos que lançam “entrepreneurship” no mercado, substituindo o Administrador

de Empresas na condução de negócios e criando levas de empresas fadadas ao

fracasso ou a um sucesso de alto risco. Por exemplo: serviços de reparação de

pára-brisas; “lava-jato” para automóveis; moto-táxi; loteamentos imobiliários sem

infra-estrutura mínima; ambientes de leilões de gado. Questionar sobre a

esmagadora preferência pelos serviços, em detrimento da indústria, sobre como se

dá a legalização desses empreendimentos, qual sua participação no oferecimento de

mão-de-obra, etc., etc.

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Por fim, sugiro aos acadêmicos a busca da resposta para uma questão crucial, em

meu ponto de vista, que é a falta de empreendimentos sociais. Eles ocorrem de

forma cíclica? Coincidem com o calendário eleitoral? Crescem com o aquecimento de

algum movimento religioso? Quem empreende nesse campo, visa o quê? Para

atender a quem ou a que grupo?

Colegas acadêmicos, nossas cidades são fontes inesgotáveis de trabalhos de

pesquisa científica, as “oportunidades” ai estão e talvez, seja a hora de começar a

sair do indesejável ensino reprodutivista que nos é oferecido pelas “faculdades da

vida” e obrigar nossos professores a se tornarem mestres na ciência de educar, a

saírem da rotina “quadro-negro x caderno” para aprender com aqueles que fazem a

realidade, que impulsionam o mercado e gozam do sucesso ou amargam fracassos

em seus empreendimentos. Nunca se esquecendo que desses “entrepreneurship”

saíram inventos como: colheitadeira de algodão, insulina, computadores digitais,

fecho éclair, fotografia em cores, canudinhos flexíveis para refrigerantes e tantos

outros objetos e conceitos importantes para a sociedade.

(*) Professor da UFMT e Bacharel em Sistemas de Informações

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Muro de Berlim Ruy Ferreira(*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 29 de agosto de 1997.

O simbolismo contido na queda do Muro de Berlim não deixa dúvidas quanto à opção

feita por povos do Leste Europeu, pelo fim da prática comunista, da ditadura de

esquerda, do paraíso dos privilégios e do altar da incompetência na produção e

inovação científico-tecnológica.

Por outro lado ninguém optou pelo capitalismo selvagem, pelo individualismo

exacerbado (só os ianques), pela propriedade improdutiva e intocável ou pelo

amealhamento de riquezas financeiras às custas da desgraça alheia.

A sociedade globalizada tem sonhos e melhor, tem clareza do que quer, além de

saber exatamente o que não quer. Mas sociedade é ajuntamento de pessoas e essas

últimas possuem aspirações pessoais que muitas vezes tomam vulto de necessidades

coletivas, sobrepondo o possível para o momento ou o ideal para a coletividade.

Usando nossa cidade como micro-cosmo de estudo, encontramos a Universidade

como parte desse ideário coletivo. Teoricamente lá nasce e se distribui o

conhecimento tão necessário à sociedade. Será?

Difícil dizer se a Universidade é útil à nossa comunidade, pois pouco ou nenhum dado

existe para uma análise nesse sentido. Ao mesmo tempo a sociedade divorciou-se da

casa do saber, por culpa exclusiva da Universidade que construiu o seu próprio Muro

de Berlim.

Quase três anos de trabalho em Rondonópolis e pouco tenho visto de produção

acadêmica local, nada foi iniciado nesse período em prol da comunidade que tenha

berço na Universidade. Estamos estáticos, inertes mesmo, tão apáticos que nossas

greves não têm repercussão na sociedade e, ultimamente são usadas para aquela

pescaria no Pantanal ou mesmo para por a faxina da casa em dia. Esse fato leva a

lembrança da assertiva de um futurólogo cibernético americano que prevê o fim

desses “depósitos de alunos” nos próximos 30 anos. Talvez tenhamos partido na

frente!

O que fazer para derrubar esse Muro de Berlim que separa a Universidade da

sociedade, principalmente em nossa região? Não tenho a pretensão de responder a

essa pergunta. Pois se soubesse de antemão a resposta, com certeza seria candidato

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a Reitor da UFMT ou Ministro da Educação. Entretanto tenho pistas a oferecer para

demolir esse muro da vergonha.

A primeira pista vem da efetividade da instituição com a região onde está inserida.

Isto é, o Câmpus de Rondonópolis atende aos anseios da sociedade organizada do

Sudeste do Estado? Se não atende, o que falta ou deve mudar para que isso ocorra?

Outra pista se desponta pela eficácia, onde deve ser questionado se os cursos aqui

oferecidos e a produção científica local são adequados, contemporâneos e ajustados

à região. Nossa extensão universitária é eficaz ou a sociedade necessita trazer

consultores e palestrantes de outras partes do país, para suprir a lacuna não

preenchida pela UFMT? Se somos um “Centro Pedagógico” quais avanços trouxemos

para a Educação municipal e estadual? Onde estamos atuando para minorar o

desleixo dos dirigentes para com a Educação Pública? Nada de “eu acho”, mas sim

propostas, políticas, projetos e ações articuladas. Finalmente a última pista:

eficiência. O que fazemos é bem feito, em menor tempo e custa menos aos cofres

públicos? Nosso pessoal é eficiente, somos os profissionais mais adequados para

exercer as funções existentes na Universidade?

De posse dessas pistas quem sabe seria possível iniciar um debate sério sobre a

Universidade, sobre a pertinência de manter essa colônia medieval em Rondonópolis.

Discutir sobre a quem interessa manter o atual status do Câmpus, e o porquê desse

interesse.

Sei da dificuldade em reunir homens de bem em torno de ideias que não ofereçam

retorno político ou financeiro imediato. Mas como a população possui representações

legítimas é hora de instituições não governamentais, como os clubes de serviços

(Lions, Rotary, etc.), Maçonaria, OAB, CRM, CREA, CRF, AMB e tantas outras que nos

têm oferecidos inestimáveis serviços, arregaçarem as mangas e entrem em campo

para discutir o que a sociedade do Sudeste Matogrossense quer em termos de

Educação Superior, para si e para seus filhos e netos. Cabendo aos acadêmicos,

sujeitarem-se à vontade majoritária da sociedade.

Quem sabe dessa discussão possamos juntar forças para derrubar esse muro e até

criar uma segunda universidade nesse imenso estado brasileiro. Quem sabe?

* Professor da UFMT

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Que tal o PVC? Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 16 de novembro de 1997.

Já há algum tempo, eu e o Professor Peixinho fundamos um partido político

diferente. Temos dois militantes aguerridos, mordazes e, é claro, um presidente e

outro secretário-geral, respectivamente.

Todas as vezes que nos encontramos pelos corredores do Câmpus surgem novas

orientações para o PVC, recheando nosso estatuto com pérolas como: é proibida a

filiação de ex-político de qualquer outro partido, de todos os membros de comissões

de licitações, de tesoureiros, intendentes e afins, de latifundiários de qualquer terra

urbana ou rural, de corruptos ativos, passivos e os respectivos intermediários. A lista

cresce a cada dia que passa.

Quanto a linha ideológica partidária optamos pelo socialismo-tupiniquim, com ênfase

nos pensadores brasileiros e objetivos bem claros, escuros, mulatos, etc. No

recrutamento exigimos do futuro militante a ingenuidade de uma criança, mas não

admitimos figuras alienígenas como Papai Noel, Michael Jackson, Mickey Mouse e

Nacional Kid. Queremos o Saci-Pererê, Boto-Rosa, Mula-sem-Cabeça, Tonico e

Tinoco, Chico Bento, Adoniram Barbosa e a Turma da Mônica.

Ficou determinado o nível de nacionalismo partidário que exige o uso de produtos

nacionais como o guaraná, o Gurgel BR-800, a cachaça e o feijão-preto. Repudiamos

o fusca alemão, o sorvete italiano, o uísque escocês, o jeans americano, o perfume

francês e as quinquilharias asiáticas. A não ser que possuam certificação ISO-9000 e

não tenham similares nacionais.

Na Educação haverá um acerto de contas com a História. Para isso, ressuscitaremos

o Anísio Teixeira, Paulo Freire e Darci Ribeiro que governarão os destinos

educacionais brasileiros, nunca mais permitindo a interferência de políticos e

picaretas nessa área de governo. Nossos planos para a saúde privilegiam ações

preventivas e negamos qualquer ajuda à doença. Inclusive cortando toda e qualquer

verba para hospitais. Nosso negócio é saúde para todos, logo os hospitais vão falir.

O PVC oferece risco ao capital nacional e estrangeiro, com possibilidade de lucro num

prazo decente e cadeia para os fraudadores falencistas, espertos e tomadores de

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empréstimos subsidiados que nunca pagam suas dívidas. Nenhum preconceito

contra as forças armadas, desde que consigamos encontrar uma função militar para

elas que exclua a concentração de tropas no eixo Rio-São Paulo-Brasília. Para a

diplomacia externa temos política transparente: Bateu! Levou! Isto é, o Menem não

quer o Brasil como membro do Conselho de Segurança da ONU. Tudo bem, vamos

dar o troco a altura, excluindo a Argentina do Mercosul.

Já no campo social fica instituído o sorriso e a cortesia, os pais devem assumir a

criação dos filhos, os cartolas do esporte vão cumprir pena na reconstrução da

Perimetral Norte e carnaval no mês em fevereiro, sem transmissão pela TV, só ao

vivo. Todos devem trabalhar (produzir), inclusive as crianças que farão isso

estudando em período integral. Excluí-se os aposentados que farão viagens turísticas

obrigatórias e gozarão de bem-estar merecido, com direito a greve. Na área

tributária fica instituído o imposto único, progressivo e cobrado do consumidor final

de qualquer bem ou serviço, designando novas funções para o pessoal da Receita

que passarão a serem auditores de entidades filantrópicas e sem fins lucrativos.

A cada encontro surgem novidades para rechearem o ideário do PVC, pena que nos

encontramos pouco. Mas acho que faltou um pequeno detalhe: O que significa a sigla

partidária? - É mesmo! Íamos esquecendo o marketing. Nosso partido chama-se

Partido com Vergonha na Cara, o velho PVC, rígido, sem estrelismo, bastante útil e,

ainda por cima, não enferruja.

(*) Ruy Ferreira é professor da UFMT

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Papai Noel ou Saci Pererê? Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (1997)

Sou bisneto de imigrantes portugueses, lavradores que aqui vieram explorar essa

terra boa. De Portugal trouxeram a roupa do corpo e uma imagem de Santo Antônio

de Lisboa, na esperança de fazer fortuna por aqui e voltarem para além-mar com o

bolso recheado. Meados do século XIX, Sacra Família do Tinguá, município de

Vassouras, terra dos imperadores e príncipes brasileiros, no Rio de Janeiro. Ali

começaram a plantar legumes e a fazer filhos, foram 23 para ser exato.

Meu avô nasceu na fazenda, já filho de próspero fazendeiro português, radicado no

Brasil. Como todo pobre que enriquece o bisavô, não quis sua prole trabalhando a

terra, mandando os filhos estudarem. Logo apareceu um padrinho para meu avô que

lhe presenteou com um cartório do registro civil.

Nos anos trinta deste século, nasce meu pai. Nele se cumpre o ditado popular: Avô

rico, pai nobre e filho pobre. Pedreiro trabalha até hoje, pois a pensão da

aposentadoria é uma vergonha. Aí tem uma conta que não fecha no meu raciocínio

matemático: Ele recolheu suas contribuições sobre vinte salários mínimos por mais

de dez anos, aposentou-se com dezesseis e vive hoje com sete. Eita conta ruim de

fechar!

Minha mãe não quis me registrar com todos os nomes de família, preferindo a

simplicidade. Se hoje eu tivesse o nome de família completo, muita gente iria me

confundir com um quatrocentão carioca e minha identidade seria especial. Vejam só:

Ruy Goulart Soares Ferraz Rodrigues Martins Ferreira. Obrigado mãe, pelo Ruy

Ferreira.

Até bem pouco tempo vesti a camisa do nacionalista, idealista, irracional talvez.

Ajudei a escrever um capítulo da história brasileira, se boa ou ruim não sei, o tempo

dirá. Mas, uma certeza ficou marcada em meu espírito: - fui muito usado para que

outros atingissem seus objetivos pessoais. Para alguns doei trabalho braçal ou

intelectual, para outros ofereci virtudes morais, e até força bruta usei, em nome da lei

e da ordem. Não perdi a truculência, tampouco a esperteza, menos ainda a

inteligência. Entretanto, gostaria muito de obter a sabedoria. Vou tentar obtê-la com

o auxílio da Universidade e dos sábios que lá trabalham anonimamente, em seus

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laboratórios obsoletos e recebendo um salário indigno da profissão de cientista.

Como idealista permaneço com ideias estranhas a povoarem minha mente, algumas

martelam meu pensar a bastante tempo. Por exemplo: Se uma empresa de capital

aberto apresenta regularmente suas realizações aos acionistas, que podem acatar as

ações da direção executiva ou rejeitá-las, substituindo aqueles que tomaram

decisões erradas ou executaram ações defasadas com os objetivos empresarias.

Porque na administração pública (executivo, legislativo e judiciário) não há essa

transparência para os cidadãos quando se trata de apresentar as contas e realizações

públicas?

Outra idéia que não larga do meu pé é: - Por que existem cargos de livre nomeação

na administração pública? Estou falando daqueles cargos que são preenchidos por

parentes e correligionários da autoridade pública. Não me venham falar em

confiança, quando estou falando em segundo e terceiro escalão administrativo. Um

chefe de gabinete, um assessor, um secretário, um ministro, vá lá! Mas um

motorista, um chefe de setor, uma merendeira, um operador de máquina, aí é

dureza. Parece coisa de comunista ou herança da malfadada cultura portuguesa.

Por vezes sou assolado por um raciocínio obtuso. Se a justiça está atolada por

processos, sendo lenta e ineficiente, por que os juízes trabalham tão pouco? Sabem

o tamanho das férias anuais desses caras? Já ouviu falar em recesso natalino,

recesso de carnaval, recesso da semana santa? Tantas horas de trabalho não

trabalhadas durante o ano não prejudica a eficiência da Justiça?

Quando penso no legislativo fico arrepiado em constatar absurdos sem precedentes

na moral e nos bons costumes. Tem coisa que acontece no legislativo que cadeia só

não basta. Exemplo disso é a comissão de orçamento do congresso nacional. Quem

acha que cassando mandatos fez-se justiça está errado. Uma boa surra em praça

pública, seguida de uma salmoura, faria bem a minha alma. E é claro, todo o dinheiro

roubado devolvido aos cofres públicos.

Ultimamente voltei meus pensamentos para coisas de menor amplitude, algo mais

perto de minha área de atuação. Em 1996 elaborei um projeto razoável (precisando

de muitos ajustes) para colocar a tecnologia de ponta à serviço da Educação,

apresentei a idéia a um secretário da pasta e ouvi um sonoro não. Motivo? Além do

alto custo (R$ 3.000.000,00 em cinco anos), o projeto é uma UTOPIA para o sul do

Mato Grosso. Um ano depois descubro que o FHC está gastando mais de R$

400.000.000,00 em campanhas publicitárias visando sua reeleição. Até o prefeito

daquela cidade está gastando uma grana preta para melhorar sua imagem. Peraí!

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Linha do Tempo Página 44

Alto custo é essa porcaria de campanha, isso sim é custo inaceitável. Competitividade

se faz com muita, muita Educação, e não com propaganda. Hitler e Stalin usaram e

abusaram da propaganda, deu no que deu. Quero meu imposto aplicado naquilo que

dá retorno social: Educação. Com ela está garantido o emprego, saúde, cidadania,

meio ambiente, etc. Sem ela, só resta-nos a profissão de camelô ou de apadrinhado

político de alguém.

Ano novo pensamento novo. Por que será que existe candidatura natural? Será que

ao nascer a parteira bateu na bundinha do cara e disse: - esse será senador! Quero

lei partidária séria, daquelas que o político muda de partido e perde o mandato.

Quero voto distrital puro, sem essa de privilegiar sobrenomes famosos, quero olhar

nos olhos do deputado que elegi e se algo de errado ele fizer em meu nome, encho

a cara do safado de porrada. Pois ele é meu conhecido, meu vizinho, gente da minha

confiança e não um Ulisses da vida qualquer.

Minha grande dúvida é a quem devo dirigir minhas reivindicações: Papai Noel ou Saci

Pererê? Por vias das dúvidas, vou escrever através da cédula eleitoral nas próximas

eleições.

(*) Professor de Computação da UFMT

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Viva a Cultura! Ruy Ferreira (*)

Jornal A Tribuna — Rondonópolis-MT. (1997)

Domingo passado, sete e meia da noite, estamos na Avenida Lions. Motivo: - assistir

um espetáculo no circo. Fila imensa para comprar ingresso, para entrar nos portões

iluminados e ocupar uma cadeira privilegiada, um bom lugar para ver todo o

picadeiro. Vende-se de tudo: pipocas, refrigerantes, brinquedos, fotos, etc. Tudo são

festa e alegria.

As pessoas sorriem umas para as outras, cumprimentam-se e tornam-se corteses

entre si. Puxa que bem faz a Cultura para o ser humano! A criançada não desgruda

o olhar da parafernália colocada a sua frente, tudo aquilo que a televisão esconde do

espectador está ali, a um passo do público. Queixos caídos, bocas abertas diante de

tanta novidade.

Atenção, o espetáculo vai começar. São duas horas de muita emoção, com cenas de

humor oferecidas pelos eternos palhaços, outras de coração-apertado na exibição

dos trapezistas, malabaristas e equilibristas. Quanta coragem daquele domador de

tigres, quanta graça naquela maravilhosa contorcionista, quanta velocidade no

homem-bala.

Terminada a apresentação, saio radiante e saudoso, afinal por duas horas voltei a ser

um “moleque de dez anos”, aplaudi, assoviei, gritei, e principalmente, fui feliz. Volto

para casa envolto num clima de felicidade, pronto para novos e velhos desafios.

Bem, cuidei da alegria e no próximo dia 2 de setembro vou ao Caiçara cuidar da

religiosidade (outra expressão cultural), para assistir a uma palestra proferida pelo

tribuno Divaldo Pereira Franco. De antemão já sei como sairei de lá, tanto assim que

coloquei um lenço no bolso da calça.

É gente, felicidade é isso: - um conjunto de momentos felizes, armazenados em

nossas memórias. E a Cultura é responsável por muitos e muitos desses momentos.

Viva a Cultura!

(*) Professor da UFMT

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Estória sem moral é realidade Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (1997)

Ao ler um jornal sempre aprendemos algo, muitas das vezes nos chocamos com as

notícias, outras tantas, rimos. Mas sempre tiramos algum proveito da leitura, pois ler

é uma das formas de apreender.

Lendo o jornal A Tribuna esta semana, dei gostosas gargalhadas ao me deparar com

um edital da Justiça. E, ainda sob o efeito do bom humor, criei uma estorinha sobre

aquilo que li, e como toda estória essa começa assim:

- Era uma vez um juiz criminal que manda seu oficial de justiça procurar um réu para

intimá-lo. Corte da cena. Os dias passam e o réu não é encontrado, o oficial de justiça

foi até o endereço disponível e lá alguém avisou - “Moço, o Professor fulano se

mudou faz um ano”, abatido, cansado, traído pelo destino o serventuário retorna ao

cartório, e lá desolado, quase chorando, informa ao diretor de secretaria - “Doutor, o

réu mudou-se”. Homem complacente, compreensivo prá burro, o chefe diz - “Calma

meu bom homem, vamos publicar um edital de aviso para esse professor da

universidade, pois assim ele aparece”. O oficial de justiça suspira aliviado e saí em

busca de outros réus. Aí só resta ao super-atarefado juiz expedir um edital de citação,

através do jornal e torcer para o réu ler naquele dia o bendito jornal. Corte de cena.

Como está perto do recesso de Cosme e Damião, todos se juntam e vão passar uns

dias nas Águas Quentes.

Enquanto isso, o Príncipe FHC em seu Palácio da Alvorada, trama um novo ardil para

enganar o povo e jogar a culpa nos servidores públicos federal. Chama seu guru-mor

Bresser Pão de Açúcar e diz: - Vou viajar para Pasárgada, pois lá sou amigo do Rei,

enquanto isso, nada de reajuste salarial para essa turma de incompetentes e

improdutivos. Embarca num jato da FAB e se manda do reino, para só voltar nas

vésperas das eleições.

Como toda estória tem uma moral, essa não foge a regra e daí tiramos algumas

pérolas do virtuosismo que impera no serviço público em qualquer nível de governo,

em todos os poderes. A primeira é a certeza de que o dinheiro público pode ser

disposto da forma que o administrador bem quiser, sem nenhum compromisso com

o serviço que deve ser prestado. Em seguida, salta aos olhos os privilégios que

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Linha do Tempo Página 47

muitas das categorias funcionais conquistaram para si sem o menor descaramento,

esquecendo que a imoralidade é fonte inesgotável para o positivismo do Direito,

tornando em algum momento histórico o imoral em ilegal.

Outra pérola é o ato praticado deliberadamente ao arrepio da lei, pois sob a alegação

que não existe recursos financeiros o Príncipe não reajusta o salário dos servidores

públicos a quase mil dias. Embora, este ano vá sobrar dinheiro para as “obras

sociais”, isto é, ano eleitoral, dinheiro nas mãos dos políticos para comprar votos da

maneira mais suja: Toma lá, dá cá. Por fim, como não posso reclamar, como trabalho

prá burro, como tenho projeto para a Educação na cidade, no estado e para o país.

Como acredito estar no caminho certo, e claro, na contramão dessa turminha, fico

frustrado e pior, refletindo onde errei na formação dessas personagens fictícias da

estória. Esqueci de ensinar Ética e Moral ou não vivenciei exemplos suficientes para

que fossem assimilados pelos meus ex-alunos. Errei e mereço ser castigado por isso.

Bem, refleti, divaguei, critiquei e agora vou ao banco sacar meu salário de R$ 900,00

em média e continuar a formar esse time de personagens que ganham muitas e

muitas vezes mais do que ganha àquele que os iniciou na várias profissões de nível

superior. E me despeço com a saudação daqueles que iam a luta para a diversão dos

Césares: - Ave FHC, os que vão morrer de raiva e fome, te saúdam!

(*) Professor da UFMT

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Linha do Tempo Página 48

Adulto também entra em crise Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (1998)

Se perguntássemos a um grupo de psicólogos qual a fase da vida que uma pessoa de

28 anos estaria, a unanimidade diria: fase adulta. Mas, o que significa ser adulto ou

estar na fase adulta? Bem, algumas características são encontradas em praticamente

todos os adultos: aptidão para comunicação com outras pessoas; senso de

responsabilidade; capacidade de realizar coisas, em função da instrução/treinamento

recebidos anteriormente; noções de moralidade e ética; conhecimento das regras e

normas sociais; e por ai vai.

Assim, uma pessoa aos 28 anos de idade está apta a produzir e consumir, viver em

sociedade e conviver com iguais. Isso pode ser transposto, com algumas ressalvas,

para às instituições e empresas chamadas também de Pessoas Jurídicas.

A Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT atingirá essa idade neste ano e

vivendo meus três últimos anos dentro dessa pessoa jurídica posso analisar sua

performance nos dias atuais, sob ótica carregada de ideologia e preconceito. Nada

demais nessa visão, afinal qualquer análise é carregada dessa dupla, só as máquinas

são capazes de analisar algo de forma isenta.

Fundada por cuiabanos de chapa e cruz, numa época anterior à divisão do estado,

sob a égide do “Brasil: Ame-o ou deixe-o”, a UFMT teve uma infância tranqüila, como

qualquer criança do interior. Na adolescência, viu-se obrigada a conviver com

pessoas de outras plagas. Crescendo e diversificando a UFMT ramificou-se e

estabeleceu (às vezes a contra-gosto) outros campi. Mas, buscando sua

auto-afirmação, permaneceu cuiabana e interiorana.

Agora, chegada a idade adulta, com cabeça provinciana num mundo globalizado, a

Universidade parou literalmente no tempo e no espaço. Culpa só da cuiabania? - Não,

a briga pelo poder, pela manutenção da situação atual, pelo espaço político, pelas

viagens ao exterior pagas pelos cofres públicos, pelas diárias, pelas gratificações,

pela possibilidade de nada fazer e receber o salário integral, pela dedicação exclusiva

a vários empregos, enfim, por tudo o que deveríamos repudiar a UFMT está

adormecida.

Muito embora, aulas sejam dadas, pesquisas executadas, e algumas atividades de

extensão em andamento, a Universidade que deveria estar pensando o futuro e

executando o mínimo para permitir a implantação do que for planejado, está

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Linha do Tempo Página 49

impedida de evoluir nessa direção. Motivo? Por um lado a desarticulação do reitorado

com a comunidade acadêmica, por outras ações judiciais em profusão, e para piorar,

as brigas intestinas que desembocam em paradas forçadas do pouco planejado.

Exemplo disso vivi recentemente num trabalho de consultoria prestado ao Reitor,

onde o estudo de viabilidade produzido foi aprovado e ao mesmo tempo engavetado.

Estranho isso! A proposta apresentada usa o estado da arte da tecnologia, tem custo

compatível com os benefícios proporcionados, os técnicos da área em questão vêem

a proposta como solução de médio prazo, os usuários (alunos) ganham atendimento

de qualidade, e apesar disso nada pode ser executado.

Acontece que um pequeno grupo briga com outro grupo pequeno (desculpem o

trocadilho) pelo poder, além de outras coisas mais que não sei ao certo quais

seriam. Como uma dessas tribos apresentou e estava executando um amplo projeto

de modernização tecnológica na Universidade, o outro grupelho, insidiosamente

induziu uma autoridade federal a paralisar àquele projeto, pois fere interesses

pessoais confessáveis e inconfessáveis. A autoridade toma as providências legais e

suspende todo o trabalho do grupo adversário, baseada em pareceres emitidos pelo

grupo denunciante. E a Universidade, como fica? Nesse exemplo, trata-se de

infra-estrutura tecnológica necessária a todos os demais projetos e programas de

modernização administrativa e acadêmica. Resposta: - Tudo parado!

Crise na fase adulta costuma ter conseqüências desastrosas, alguém vai sofrer

seqüelas no futuro e pior, os que não estão envolvidos nessa “briga de foice no

escuro” perderão a oportunidade de serem criativos, planejadores e executores de

boas ideias, relacionadas com o mundo acadêmico. Pena não estarmos nos tempos

das barbáries, senão poderíamos criar a Douta Inquisição e mandar para fogueira

essa turminha de profissionais incompetentes, gente desqualificada para as

funções que exercem e começar tudo de novo. Isso em nome dos mais de dez mil

prejudicados pelas querelas e quedas-de-braço travadas pelos membros das

oligarquias jurássicas, aventureiros desprovidos de senso moral e interesseiros de

primeira hora. Sem contar as brigas ideológico-partidárias, até certo ponto, válidas

no ambiente plural das ideias.

Para uma pessoa jurídica, como a UFMT é hora de dar um basta nisso que aí está.

Como? Muitas formas de gestão podem ajudar a por termo nessa anarquia

acadêmica: Congresso Universitário para definir a missão da universidade no Mato

Grosso; Planejamento Participativo para estabelecer como atingir tal missão;

Mudança da estrutura organizacional herdada dos tempos militares do Brasil; Fixação

de metas, objetivos e políticas amplas, num lapso de tempo maior que um mês, e

uma boa dose de vergonha na cara, tomada de seis em seis horas por todos os

acadêmicos (professores e alunos).

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Linha do Tempo Página 50

Quem sabe uns processos administrativos conclusivos, seriam bom começo. Rua

para os que violam as normas legais, para os que nunca deveriam viver na e da

Academia e, espaço para novas cabeças vindas do mundo e não só da própria

UFMT, concursadas para ajudarem a romper o isolamento cultural e destruir feudos

e confrarias decenárias.

Como o beija-flor daquela estória moralista muito conhecida, coloco-me ao dispor da

administração para presidir processo administrativo visando começar a faxina em

nossa casa (com todo o preconceito e carga ideológica do meu ser, além do passado

espartano). Não tenho medo da morte, pois sou espírita convicto, já fui baleado e sei

o quanto dói levar tiros, nesse aspecto o Reitor também sabe. Mas alguém deve ser

o “boi-de-piranha” e não me furto a essa tarefa, acreditando piamente que muitos

outros acadêmicos também estão prontos a enfrentar a corja de maus profissionais

encastelados na Universidade.

Por tudo isso, não é hora de começar a superar a crise da idade adulta?

Enfrentar os problemas internos com determinação e aval da comunidade

universitária?

Buscar o apoio da sociedade matogrossense para superar óbices na esfera federal,

através de sustentação política dos organismos da sociedade civil (aí incluídos

conselhos profissionais, clubes de serviço, associações comunitárias e desportivas)?

Vale a pena lembrar que a UFMT é órgão federal, isto é, pertence ao Brasil e

teoricamente ao seu povo. Não está aqui para atender interesses pessoais e servir,

unicamente, à cidade de Cuiabá. A universidade está aqui para atender o estado do

Mato Grosso, sua gente e produzir conhecimentos para o mundo. Além disso, está

cheia de gente querendo trabalhar, seriamente. Pessoas capacitadas a gerar saber,

riqueza, bem-estar e conhecimento. Para isso, necessitam de modernização científica

e tecnológica da infra-estrutura universitária, agilidade e transparência

administrativa, aporte de recursos financeiros específicos para a pesquisa e claro,

uma boa faxina.

(*) Professor concursado da UFMT

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Linha do Tempo Página 51

Autonomia universitária para nossos netos Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (1998)

Enganam-se aqueles que pregam o utilitarismo-tecnicista puro e simples da

Educação, isto é, a escola que forma para o trabalho. Da mesma forma, erram os que

defendem a infinita especialização numa determinada área do conhecimento. São

pessoas limitadas ao mundinho contido em seus próprios umbigos, só enxergam o

que foram capazes de amealhar no modelo reprodutivista de Educação onde foram

adestrados.

Claro que uma das funções da escola é preparar o cidadão para o trabalho. Da

mesma forma, certo nível de especialização é desejável ao profissional

recém-formado numa universidade. Também é necessário oferecer ao estudante de

qualquer nível de ensino uma formação humanística, preparando-o para saborear as

artes em geral e entender sua própria cultura e a partir daí, deliciar-se com a

multi-culturalidade do mundo. A essa formação uma generosa dose de filosofia é

bem vinda, daquela “purinha”, afinal somos éticos, pensadores e cultuamos a moral.

Soma-se ao objetivo da escola a evolução do ser humano, tanto na integração ao

ambiente onde vive, como na sociedade onde co-habita, assim como, na capacidade

de aprender a aprender qualquer coisa (o filé Mignone do novo paradigma

educacional). Parando por aqui, já que a lista seria interminável se fôssemos

discutir os objetivos da escola, o que não é o caso no momento.

Bem, acredito ser a Educação o caminho das pedras para preparar as próximas

gerações diante dos imensos desafios que enfrentarão. Logo, vamos oferecer o que

há de melhor no campo educacional aos nossos filhos e netos. Simples, não?

Realmente a coisa não é simples, e um complicador salta aos olhos do leitor atento:

Quem irá formar as gerações futuras. O professor de hoje, atuando na Educação

Básica certamente não é capaz de realizar essa revolução. O professor que está em

fase de formação nas universidades, também não será. Então, sobraram os

professores universitários e as próprias universidades como origem primária dessa

revolução paradigmática, a meu ver ai está o caminho das pedras.

Como iniciar essa cruzada pela Educação? Pela autonomia das universidades

públicas!

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Linha do Tempo Página 52

Apenas a Universidade autônoma, desvinculada do mercado como única razão para

a formação e produção científica ou de regras burocráticas dos governos, com

autonomia financeira que proporcione a produção do saber plural, inclusive aquele

que não interessa ao mercado, porque busca uma alternativa necessária a ele, é que

poderá ser Universidade de verdade. E podem ter certeza que é esta Universidade

autônoma e livre que produzirá profissionais ajustados às necessidades do mercado,

geradores de políticas públicas suprapartidárias e mentes contestadoras, que

poderão apontar uma saída para o que não parece ter saída.

Eu, particularmente, sou contra a atitude de Galileu Galilei que diante da pressão

papal negou a Ciência e admitiu que a Terra é o centro do universo, pois foi um

péssimo exemplo de sujeição da academia ao poder temporal de um Mané qualquer.

Autonomia é algo tão importante para o ser humano que hoje é um dos objetivos da

escola, tornar o cidadão pensante e autônomo. Logo, vamos mobilizar nossos

políticos, líderes comunitários, imprensa, acadêmicos, profissionais liberais, para um

amplo debate, aberto, sobre o que pretendemos deixar para nossos netos. Pois, a

herança que deixaremos aos nossos filhos é muito pior do que aquela recebida dos

nossos pais.

(*) Professor da UFMT

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Linha do Tempo Página 53

O Não! Grande vencedor das eleições no

Mato Grosso Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (1999)

O Tribunal Regional Eleitoral divulgou num prazo recorde os resultados das eleições

em nosso estado. Que beleza! Construímos a democracia e a entregamos para outro

morar. Sem vestir a camisa do marqueteiro, do analista político ou do sociólogo

laureado, vou tentar entender o recado das urnas como um cidadão comum,

daqueles que só vale um voto.

Óbvio que qualquer análise desse tipo passa longe da isenção ideológica, dos

preconceitos pessoais e da opinião pessoal. Vou começar mostrando o pau que

matou a cobra, isto é, os números sem retoques (tão comum nos institutos de

pesquisa de opinião pública) das últimas eleições para governador:

CANDIDATOS PERCENTUAL

NÃO 42,25

DANTE DE OLIVEIRA 31,15

JÚLIO CAMPOS 21,89

CARLOS ABICALIL 4,26

MANOEL NOVAES 0,26

JAQUES 0,19

A leitura desses números é muito simples, quanto maior for o percentual, maior é a

quantidade de pessoas que optaram por um candidato. Os dados foram coletados no

Tribunal Regional Eleitoral, através da Internet, desses um em particular, me

interessou muito: 1.516.451 eleitores no Mato Grosso, significando o total de

cidadãos que são obrigados por lei a escolherem seus governantes. Desse universo,

640.743, ou seja: 42,25%, disseram NÃO aos candidatos apresentados pelos

partidos políticos mato-grossenses (somados abstenções, brancos e nulos).

Se isso tivesse acontecido durante a ditadura militar, certamente os analistas

políticos iriam afirmar que o povo, democrático até a raiz do cabelo, estaria

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Linha do Tempo Página 54

manifestando sua insatisfação com a falta de liberdade de escolha e repudiando os

candidatos que certamente representariam o poder ditatorial, as oligarquias, o

imperialismo americano, o reverendo Tim Tones, sei lá mais o quê. Exemplo disso foi

o caso do falecido “macaco Tião” que ganhou para governador no Rio de Janeiro,

mas o TRE não deu posse ao coitado, pois o símio era declaradamente um macaco

anarquista que sempre feriu a moral e os bons costumes no zoológico do Rio.

E agora, o que o povo quer dizer?

Minha visão simplória, bem ao estilo do Zé povinho, mostra que as urnas disseram

NÃO aos candidatos apresentados. Talvez o recado tenha sido compreendido pelos

caciques e xamãs da política no estado, embora publicamente só se fale dos votos

válidos, o que provoca um novo panorama na disputa eleitoral para a governança,

pois a lei eleitoral que eles mesmos elaboraram manda contar nulos e brancos como

válidos e as abstenções são esquecidas. Tome de jeitinho brasileiro!

Vou esperar a publicação dos papers, para entender cientificamente a opinião do

povo. Até lá, vou ficando com a minha própria e pensando se vale à pena transferir

meu título eleitoral para cá.

Como meu título de eleitor está vinculado à Brasília, sinto-me à vontade para

dar uma dica aos dirigentes partidários mato-grossenses: "Que tal novas propostas,

com gente nova?". Sem candidaturas naturais, pois ninguém nasce com o gene da

re-eleição, poderíamos até reverter o quadro atual e aí quem sabe, o NÃO perca a

eleição.

* Professor da UFMT

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Automação no gerenciamento de lavouras Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 04 de novembro de 2000.

Nos últimos anos tenho lecionado Computação para cursos de licenciaturas na UFMT;

a experiência ao trabalhar com pessoas de outras áreas que não a de tecnologia é

gratificante e abre um leque de visões que certamente não enxergaríamos em nossas

áreas de formação.

Ao abordar um tema como a automação no gerenciamento das lavouras no Mato

Grosso teria algumas reações típicas: na Computação, os alunos iriam buscar os

detalhes técnicos do trabalho; na Administração, o interesse recairia em novas

oportunidades de negócios; na Economia, certamente a visão seria os estudos dos

custos e impactos no preço final do produto produzido; na Agronomia, os estudantes

estariam interessados na metodologia, isto é, como a coisa é feita e como funciona.

E por aí vai.

Mas, trabalhando com as licenciaturas (Matemática, Letras e Geografia) o resultado

da leitura do texto foi uma surpresa: os estudantes querem saber o que vai acontecer

com o cidadão mato-grossense, analfabeto ou pouco escolarizado e que só sabe

manejar o velho trator, quando essa tecnologia chegar por aqui e substituí-lo na

fazenda.

Uau! Que visão de mundo!

São esses alunos que estarão atuando nas escolas de Educação Básica daqui a pouco

e que com tal consciência crítica vão fazer a cabeça dos jovens mato-grossenses. E

aí, serão chamados de retrógrados, reacionários e ultrapassados, pois questionarão

políticas públicas que atraem capitais e tecnologia como essa para o Estado.

Alguns serão taxados de comunistas, por jogarem alunos contra os patrões de seus

pais. Serão aqueles que dirão aos pais que eles ficarão sem emprego para a

eternidade. Não há como incluir no mercado o analfabeto, em particular, o

analfabeto digital. Não há curso do Qualificar que faça isso, é desemprego ou

subemprego mesmo!

Outros serão chamados de udenistas jurássicos, pois defenderão o homem brasileiro

acima do interesse das empresas, governos e capital. Vão falar aos alunos sobre o

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perigo da desnacionalização da Ciência e Tecnologia, da Agricultura e da Pecuária.

Insuflarão os estudantes a resistirem aos avanços do capital internacional sobre a

Embrapa, UFMT, etc. e tal.

Mas, também existirão aqueles que, apaticamente, verão tudo isso acontecer e como

não são agricultores ou pecuaristas, se omitirão covardemente de opinar ou agir.

Esses, com certeza, serão os professores carreiristas, que buscarão cargos

político-administrativos na escola ou fora dela. Para eles, o importante é satisfazer,

ao mesmo tempo, a Deus e ao Diabo, desde que consigam uma boquinha nas tetas

da área pública ou alguma vantagem, vindo dela.

Bem, para esclarecer que raio de assunto foi esse, vou resumir a notícia dada pelo

Jornal da Ciência, datado de 17de outubro de 2000 – Nº 1648 – Notícias de C&T –

Serviço da SBPC, sob o título: "Embrapa acelera estudos de mecanização controlada

por satélites e computadores para o gerenciamento das lavouras".

“Uma nova onda tecnológica começa a varrer o interior do Brasil. A Agropecuária,

que emprega 27 milhões de pessoas e movimenta em torno de US$ 240 bilhões por

ano – mais ou menos 40% do Produto Interno Bruto nacional -, corre contra o relógio

para ingressar no seleto clube dos países de cultivos quase robotizados – máquinas,

dirigidas por satélites, capazes de gerenciar milimetricamente insumos aplicados na

lavoura. Desenvolvido pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa),

o projeto da Agricultura de Precisão em pouco mais de um ano reduziu

consideravelmente uma dianteira que EUA, França, Inglaterra e Japão, por exemplo,

haviam alcançado em duas décadas. Ao lado das pesquisas em biotecnologia, é a

maior aposta da Embrapa para o futuro.

“Estamos no nível de aprendizagem, inicialmente na área de milho e soja do Centro

Oeste. É a fase de adaptação das tecnologias à realidade nacional”, explica o

coordenador do projeto, o engenheiro agrônomo Evandro Mantovani, da Embrapa

Milho e Sorgo, em Sete Lagoas (MG).

O programa de Agricultura de Precisão depende de fatores essenciais: o primeiro é o

localizador por satélite, o popular GPS, que faz a máquina agrícola trabalhar por

coordenadas – altitude, latitude e longitude – marcadas no computador.

Um mapeamento detalhado e digitalizado do solo para a agricultura também teve

que ser feito. O terceiro ponto, nevrálgico, é onde a Embrapa começou a atuar como

centro de excelência: a fusão dessas interfaces em um programa brasileiro, aplicável

nos quatro cantos do país. A finalidade da Agricultura de Precisão é, evidentemente,

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racionalizar custos, acrescenta o agrônomo.

O alvo número 1 é o cerrado. “É a única fronteira mundial da agricultura da

atualidade. São 225 milhões de hectares, que precisam e podem ser usados com

inteligência”, afirma (Publicado originalmente no Jornal do Brasil-RJ, de 15-10-2000).

Bem, relendo a notícia novamente sou obrigado a questionar da mesma forma

pensada pelo pessoal das licenciaturas: Onde serão colocados os atuais

trabalhadores rurais, quando essa tecnologia chegar para valer às lavouras do Mato

Grosso?

Atrevo-me a colocar uma sugestão pessoal para esse problema futuro, nascida de

boas conversas, madrugada adentro, com um cientista político e colega na UFMT:

Vamos trazê-los para as cidades, criar novas favelas, invasões e reforçar os

movimentos sociais urbanos. E pronto! Mas, e no campo? Ora, vamos fazer como as

empresas telefônicas estão fazendo, importar mão-de-obra de países mais

desenvolvidos ou como alguns agro-empresários daqui, trazendo profissionais mais

escolarizados de outros Estados do Brasil.

(*) Professor da UFMT

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Linha do Tempo Página 58

O “Não” ataca de novo Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (2000)

Parece praga de madrinha, daquelas pegajosas como cabo eleitoral precisando de

uma nova dentadura, o NÃO continua vitimando candidatos no Mato Grosso, desta

vez o fato ocorreu na Universidade Federal.

Ao conhecer os números da eleição andei fazendo umas continhas e cheguei a um

resultado terrível: tal qual ocorreu nas últimas eleições para governador o “não”

venceu as eleições na UFMT.

Com 40% do colégio eleitoral da Universidade dizendo NÃO (abstenções, brancos e

nulos) elegemos o novo reitor com 31% dos votos válidos. Interessante é a

proximidade dos valores percentuais de eleitores que disseram NÃO aos candidatos

a reitor e a governador, pois um leitor desatento poderá acreditar que a Universidade

reflete o contexto da sociedade: 40% e 42%, respectivamente.

Fazendo um exercício de leitura da mente coletiva, através da opinião pessoal,

consigo enxergar uma resposta nesse processo: uma parcela imensa de cidadãos

está se lixando para eleições, sejam elas para governador, deputado ou reitor. Dessa

leitura vejo também alguns indícios das causas dessa apatia: a mesmice, a falta de

propostas sérias e viáveis, a mediocridade e uma clara intenção de por a mão na

grana pública, esteja ela onde estiver para usá-la das mais variadas formas legais ou

não.

Como já passamos do tempo dos generais, o cidadão não está rejeitando o

totalitarismo, mas sim as crias dele nascidas tanto à esquerda como a direita volver

que teimam em conquistar o poder para numa canetada transformar o mundo no

paraíso preconizado por cartilhas carcomidas pelo tempo, nem que seja para

melhorar a própria vida ou do grupo que representa.

Voltando às eleições, deixo uma dúvida para os leitores esclarecidos: - como escolher

os candidatos a serem votados capazes de vencer o NÃO? Através de prévias

distritais? Abaixo assinado? Prova de escrita conhecimento específico para o cargo?

Indicações de pastores e padres? Decisão no palitinho? Par ou Ímpar? Atestado de

riqueza? Atestado de pobreza? Ficha limpa na polícia? Torneio de truco? Roleta

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Linha do Tempo Página 59

russa?

Qualquer proposta para a escolha de pré-candidatos será melhor que a famigerada

“candidatura natural”, materialização do casuísmo puro e fisiologismo dos brabos.

Como estou no Mato Grosso andei pensando em ver como ocorre a chegada ao poder

entre os indígenas, pois talvez daí surja uma boa opção para escolher candidatos a

qualquer cargo público eletivo.

Conheci outras formas de escolha de candidatos, por exemplo, na Baixada

Fluminense (sou de lá) o Tenório Cavalcanti mandava bala nos adversários e recebia

outras em troca e quem sobrava era candidato, outro exemplo da terrinha foi o

Odilon que roubava as urnas dos locais onde os concorrentes eram fortes. Lá

também existe uma forma amena de escolha do candidato, casar com a filha do

adversário e convencer o sogro a se aposentar, com o apoio da família.

Fórmulas existem e ao seu tempo funcionaram, fazendo um pouco de exercício de

criatividade será possível criar uma ou mais que reverta a situação de apatia eleitoral,

trazendo de volta às urnas o ator principal, ou seja, o eleitor! Em especial, aquele que

ultimamente tem dito NÃO.

(*) Professor da UFMT

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Linha do Tempo Página 60

Eu, o Nacionalismo, o Estado e os políticos Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (2000)

Se meu avô Américo fosse vivo certamente diria: “É hora de golpear as oligarquias e

o atraso no Brasil com um choque de Capitalismo”. Caramba! Ele tinha e tem razão.

Vamos fazer uns duzentos anos de Estado organizado e ainda não realizamos a nossa

revolução capitalista. Isto é, no Brasil ainda estamos na época que antecedeu a

reforma sócio-religiosa de Martinho Lutero na Europa.

Aqui tem candidato natural a cargo político, são os Lulas, Roseanas, Serras, Ciros,

Garotinhos e Enéas, em âmbito nacional. Campos, Bezerras, Oliveiras e Barros, na

esfera estadual. Natural de quê ou de quem? O PT fez jogo de cena e realizou uma

prévia entre seus militantes, com a intenção de preparar o próximo candidato,

natural é claro, os Matarazzos. Os outros partidos nem isso!

Os políticos se sobrepõem aos partidos e ai a oligarquia deita e rola. São velhos e

novos ricos querendo morder uma fatia do Estado para garantir suas boas-vidas. A

mesma que Aristóteles pregava bem antes de Jesus passar por aqui. Ele descrevia o

Estado como o instrumento para o homem realizar seu fim: a boa vida. O pessoal da

candidatura natural se apossou do conceito aristotélico de Estado e só pensa em sua

própria boa vida. Exemplo: Presidente, governador ou prefeito recebem pensão por

quatro anos de trabalho, acumuláveis com qualquer outra forma de aposentadoria. É

mole ou quer mais. Tenta você, "seu Mané", acumular aposentadorias no INSS!

A busca de um Estado Republicano sério vem de longe, para ser mais exato nasce na

Roma de Cícero. Ele procura persuadir os homens bons e honrados a participarem

ativamente na vida pública, na suposição de que a vida política é a mais alta

expressão da realização humana e de que os estadistas orientam os cidadãos para a

promulgação das leis e o desenvolvimento e consolidação dos bons costumes.

Tadinho do Cícero! Ele não conhece nossos políticos. Hahahahaha... Cícero, aqui o

mandato político serve para livrar bandido da cadeia. Pode! Quer mais?

Cícero confessa em sua teoria (República) explicitamente a igualdade natural de

todos os homens. Os homens têm a mesma sensação da dor e prazer e amam a

bondade, a retidão, ao mesmo tempo em que detestam a selvageria e a baixeza de

caráter. Se eu encontrasse o Cícero na rua enchia a cara dele de porrada. Desde

quando eu sou igual aos Barbalhos, Brizolas, Magalhães, Sarneys, entre tantos

outros?

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Linha do Tempo Página 61

Pensadores como Buchanam, Languet, Hotman, Calvino, Cartwright e Knox entre

outros, pregavam o direito revolucionário de desobediência ativa, vinda de antigas

teorias do direito popular, por ser um direito contra os governantes que violavam o

contrato social pregado por Aristóteles e Cícero. Meu avô, Seu Américo, acreditava

nisso piamente. Uma bala na nuca do safado e o Estado está salvo. Os chineses

fazem isso hoje com muita frequência e parece que freia um pouco o afã de roubar,

mas não elimina totalmente.

John Locke em sua teoria do contrato social, afirma que o governo é um mero usuário

do poder executivo que tem o apoio da comunidade até a quebra da confiança deste,

provocando, com isto, o direito de rebelião contra seu poder. Estou com Locke e não

abro! Vendeu a Vale do Rio Doce, vai pro Carandiru no dia seguinte!

Locke vai mais longe e afirma que o Estado deve ser governado pela vontade de seu

próprio povo, e não por uma classe de indivíduos. Reencarna no Brasil de hoje!

Vamos pregar isso pelo rádio, televisão, jornal e internet. Não quero a classe dos

ruralistas, nem a dos metalúrgicos governando o Brasil. Governar não significa travar

uma luta de classes. Isso é coisa do PSTU, TFP, MST, UDR e de trotskista

mumificado.

Rousseau bateu duro exigindo a transferência da soberania exclusiva e onipotente do

governo para a comunidade. Viva Rousseau! O perigo está em descobrir quem é essa

tal de comunidade. Pois pode ser entendida como aquela que reside no Lago Sul em

Brasília e ai nós estamos ferrados!

O Estado, para Kant, existe não para si mesmo, mas para servir os fins da

conveniência especial dos homens, e seus poderes se unem a outro para dar a

qualquer cidadão aquilo que lhe é devido. Para Kant o que fundamenta a

comunidade, isto é, o Estado sobre a vontade geral, é o poder legislativo. Esse poder

deriva do fato de que não deve absolutamente causar dano a qualquer pessoa com

suas leis. Oh, Kant! Você deveria baixar no terreiro do parlamento brasileiro e ensinar

aos senadores e deputados o que você quer dizer. Eles ainda não sabem que causar

dano ao cidadão, por meio de leis, é destruir o Estado e a cidadania! Você acredita

que nossos parlamentares já leram isso? Eles tão lendo é contrato fraudulento com a

SUDAM, SUDENE, BNDES e outros órgãos financiadores da pouca vergonha

brasileira.

Para Hegel, o Estado, em sua forma completa, é a comunidade político-espiritual por

excelência, e nada existe mais santo do que o elemento ético e o direito do Estado.

Nesta afirmação, Hegel introduz na história moderna a divinização do Estado

totalitário. Maldito seja Hegel! Esse cara foi o maior defensor do Estado forte e, com

razão, considerado o pai moderno da versão do totalitarismo fascista e comunista.

Stalin, Fidel e Mao se basearam nas suas ideias para matar e torturar em nome do

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Estado. Getúlio, aqui no Brasil, também!

Ai vem Marx e diz que um homem, a fim de reter o direito de propriedade (criado por

Hegel), deve possuir propriedade. De outro modo, o direito se torna vazio e faccioso.

Mas, por sua vez, isto significa que cada indivíduo deve aceitar objetivos materiais

como objetivos subjetivos em uma tentativa de assegurar sua propriedade pessoal e

seus direitos. Se ele não aceitar estes objetivos materialistas, ele será derrotado no

esforço por aqueles que os aceitarem. Isso é, ou você é capitalista no Capitalismo, ou

está fuzilado! Para Marx todo o direito é subserviente ao direito de propriedade. A

igualdade sob a lei, por exemplo, existe para proteger a propriedade. Por isso, o

homem sem propriedade não está sujeito à lei. Oba! Como não tenho porra nenhuma

estou livre de cumprir a lei. Valeu Marx. É isso aí mesmo!

Marx perguntava como se pode falar de igualdade, quando os indivíduos são

desiguais em propriedades? Indivíduos desiguais são medidos igualmente pela

mesma medida, pelo mesmo padrão nas desigualdades. Marx dizia que homens

desiguais não são homens iguais. Nem diante das leis!

Ai vem Proudhon e afirma que todos podem agir anarquicamente em suas vidas,

valorizando sua liberdade individual, resistindo às regras autoritárias, contestando

regulamentos, hierarquias e ditos poderes, recusando serem governados e

manipulados. Tô nessa! Valeu francesinho transviado!

Mas afinal onde quero chegar?

Simples. Sou contra essa porra de candidatura natural. Sou contra as oligarquias,

monarquias, monopólios políticos de esquerda, direita, centro e currais eleitorais que

garantem a perpetuação dos poderosos no poder. Quero mudar isso, no voto, na

marra, do jeito que a vida me permitir. Ou então, vou pendurar as chuteiras e me

mudar para a Argentina. Pelo menos lá o povo sabe espernear.

Sou contra Estado que vive para dar lucro. Estado capitalista faz o que Adam Smith

pregava na Riqueza das Nações: trabalha para valorizar a mais importante riqueza de

uma nação – seus cidadãos! Além do mais dizia ele, "os próprios reis e ministros...

são sempre, os maiores perdulários da sociedade." De lá para cá, nada mudou. Os

caras estão metendo a mão no meu imposto na maior cara de pau. Só que agora tem

mais gente no Executivo, Legislativo e Judiciário esvaziando as tetas da União.

Sou a favor do Brasil para brasileiros, para os que vivem aqui. Sem essa de ALCA, ou

outro estupro diplomático-comercial qualquer. Sou antiamericano, anticubano,

antipalestino, anti-israelense, antiportuguês até a raiz dos cabelos. Sou pró-brasileiro

e só!

Se isso é nacionalismo, então sou Nacionalista. Mas não sou fascista como Stalin e

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Mussolini. Nem nazista como Hitler ou Mao. Quero manter enterradas as ideias do

Integralismo dos Salgados, e também, as de defesa da propriedade do outro Plínio,

da TFP. Quero a aplicação do estatuto da Terra de Castelo Branco. Pasmem! É a

melhor reforma agrária já proposta até hoje. Faltou macho para levá-la a termo!

Quero ver franceses e alemães bebendo guaraná brasileiro, no lugar desse limpador

de vaso sanitário que os americanos vendem aqui. Quero vender água potável para

os japoneses, frango para árabes e judeus, e também ensinar, um pouco de ética

para o governo americano.

Quero educação, saúde, infra-estrutura social estatais-nacionais. Com qualidade e

universalidade no atendimento, como preconizava o pai do capitalismo. Quem quiser

pagar por isso em empresas privadas, pague! Mas, sabendo que a oferta estatal é

bem melhor. Possível é! Falta é vontade política para fazer disso uma realidade. E aí

mora o perigo, pois os políticos de hoje nunca vão enxergar nada que não sejam

benesses para si próprios.

Quero vender armas para os palestinos e receber petróleo do Iraque como

pagamento. Quero importar cientistas e engenheiros de países com problemas

internos e aqui formar um belo time de produção de Ciência e Tecnologia. E isso não

é novidade, pois os americanos do norte fizeram isso com muita competência desde

a Segunda Grande Guerra. Acho até que sem eles os Estados Unidos da América não

seria o que é hoje.

Chega de querer. Esse ano é de eleições e está na hora de agir.

Chico Xavier para presidente!

Se ele não topar existem pelo menos 169.000.000 de brasileiros sérios que

certamente toparão! Vamos votar bem? O Brasil agradece.

(*) Ruy Ferreira está professor de Computação na UFMT em Rondonópolis.

PS: Muitas ideias vieram de Luiz Alberto de Souza e Silva.

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Liberdade! Ruy Ferreira(*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 10 de março de 2001.

Quando eu era garoto, na Baixada Fluminense onde só os fortes sobrevivem, o Brasil

vivia um período democrático e a liberdade era total. Tá certo que faltava comida,

mas era melhor que na URSS, onde faltava democracia também. Minha mãe saía as

cinco da matina para a fábrica de tecidos e me deixava na fila do SAPS, onde a ordem

era: - compre feijão, arroz e gordura de coco.

Liberdade com dinheiro no bolso e prateleiras vazias. O país estava agitado com as

reformas de base e o “grupo dos onze” do Brizola ia incendiar o cenário nacional,

resistindo ao ataque das forças misteriosas que pregavam o fim do caudilhismo

(Getúlio, Jango e Brizola).

Meu pai, um pedreiro politizado, durante o jantar explicava o que estava

acontecendo e dizia: - ou garantimos a liberdade ou vamos virar uma Polônia, satélite

dos comunistas. Confesso que ficava com medo de viver num gueto (favela), como

os existentes nos países-satélites soviéticos.

Ouvia o Carlos Lacerda no rádio e lia a Tribuna da Imprensa, onde o pau comia no

lombo do Jango e do Brizola. Por força da família de origem católica era obrigado a

pensar dicotomicamente, isto é, quem não é a favor, é contra. E eu, comecei a

abraçar as causas da UDN – União Democrática Nacional, nascendo em 1963 um

udenista perpétuo.

Naquela época toda viagem ao centro do Rio era um sufoco, pois quando não havia

um comício (onde os militantes garantiam a sua livre participação na marra),

acontecia uma passeata com a gente marchando sem lenço e sem documento ou

ainda, uma sessão democrática de porrada da polícia, afinal todos apanhavam por

igual. Tinha de tudo em nome da liberdade, era gás lacrimogêneo, pedrada no

ônibus, pau de bandeira nas costas, sem contar os chatos da TFP – Tradição, Família

e Propriedade querendo converter o mundo aos ensinamentos pré-históricos na base

do fascismo religioso.

Liberdade é isso! Você apanha fraternalmente ou dos meganhas ou dos militantes de

algum partido, seita ou algo do gênero. Todos tem o sagrado direito de baixar o cipó.

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Em 1964 fui levado por meu pai ao Palácio Guanabara, a fim de garantir a liberdade

do Lacerda. Os brizolistas iam levantar o país que certamente cairia na guerra civil.

Depois da marcha dos oitocentos mil os integrantes do time do Jango amarelaram e

o Leonel se mandou pro Uruguai, dizem que fantasiado de enfermeira. Eu, com onze

anos, só não entendia por quê o Lacerda não seria o presidente? Os milicos foram prá

rua convocados pelo povo e de lá não saíram por duas décadas, quase três. Meu

velho dizia que havia acontecido uma revolução, e que duas pessoas haviam morrido.

Pasmem! Dois mortos numa revolução é sacanagem, pois em Cuba, anos antes,

tinham morrido aos milhares. Pô, eita liberdade barata essa!

Assim fui crescendo, amadurecendo e entrando pelo cano em nome da liberdade.

Mas, meu sonho era participar desse poder que a liberdade nos traz. Militei no

movimento estudantil secundarista, onde tínhamos a liberdade de comer pastel com

caldo-de-cana numa pastelaria dos chinas, na Praça da Liberdade em Nova Iguaçu,

sem ter que pagar nada. Fiz parte da UNE, com carteirinha e tudo mais, ao mesmo

tempo que havia sido incorporado às fileiras do Exército.

Tá certo que não haviam filas para comprar nada, que o salário tinha poder de

compra, que o Brasil se endividou construindo Itaipu, Tucuruí, Embratel, Telebrás,

Eletrobrás, as teles estaduais, rodovias como a BR-101 ligando o Sul ao Nordeste, a

Transamazônica que liga nada a lugar nenhum, e tantos outros empreendimentos

que depois daquele período terrível não mais se fez. Entretanto, faltava a liberdade.

Por conta disso, andei levando umas cadeias no Exército, pois questionava coisas que

eram consideradas segredos de estado. Soube que no período da ditadura militar

cerca de trezentos seres humanos foram mortos pelos militares, polícia e grupos

extremistas de direita. Ao mesmo tempo, uma quantidade parecida era justiçada com

a morte pelos militantes de esquerda, subversivos, guerrilheiros, terroristas e até

mesmo, oportunistas e traidores como o Lamarca.

Novamente o preço da liberdade foi irrisório, pois seiscentas mortes é uma vergonha

para justificar trinta anos de ditadura. Afinal, o camarada Stalin dizimou o

equivalente a vinte e dois milhões de proletários, num período parecido. Hitler

aniquilou seis milhões, sem contar os que morreram por culpa da guerra que ele

iniciou, inclusive mais de quatrocentos pracinhas brasileiros, trocados pela

Companhia Siderúrgica Nacional, pelo ditador Getúlio Vargas. Fico triste em saber

que, nesse quantitativo, perdemos feio até para o Paraguai, Chile, Camboja, etc. e

tal.

Oh liberdade! Que bom que chegastes com o Sarney dos Marimbondos, Toninho

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Malvadeza do Painel, Itamar do Topete, Arruda do Metrô, Jader Bezerra da Sudam,

Dante da Mala Cheia, Nicolau do Trabalho, Nahas dos Milhões, Fernandinho

Beira-Mar, Fernandinho Collor do PC, Fernandinho de Cayman, Fernandinho

Integrado da SUDENE, Pitta do Salim, Bulhões da Toalha, Júlio do Jaime, Íris da

Caixego, Arraes do Bolso Cheio, Paschoal do Pó e tantos outros representantes da

sociedade civil que ainda precisam conhecer Bangu II.

Pena que a sensação de impunidade nos façam sentir saudades do AI-2, aquele que

cassou um monte de corruptos. Pena que os polpudos salários do Judiciário e

Ministério Público os façam pesados demais ao ponto de manter o status quo

vergonhoso que vivemos pela omissão ou lentidão. Pena que tenhamos tantos

bacharéis em Direito ocupados demais em Direito Tributário, mas fazendo tão pouco

pelo estado de direito, pelas garantias individuais de si mesmo. Pena que tenhamos

tão poucos bacharéis em Medicina fazendo muito pela saúde dos brasileiros, gente

tipo Osvaldo Cruz e Emílio Ribas. Pena que mais valha o Xitãozinho, a Xuxa, o Xuxa,

o Tigrão e a Preparada, o time do Flamengo que o magistério oculto dos professores

nas salas de aulas ou a vida infernal dos militares nas fronteiras amazônicas ou o

desconhecido trabalho dos cientistas brasileiros em laboratórios onde tudo falta.

Desse jeito, vamos acabar matando, por asfixia moral, a liberdade. Uns tentam matar

por razões de estado, o que é prontamente rejeitado por Rui Barbosa: - “razões de

estado é o artifício usado pela autoridade para acobertar um crime ou criminoso”.

Outros buscam o poder a qualquer custo, aliando-se ao picareta de plantão, como

tem ocorrido em aqui mesmo.

Assim a liberdade não aguenta. Daqui a pouco no lugar dos militantes do MST, braço

revolucionário à antiga do PT, teremos o renascer das cinzas do CCC, agora sob o

lema de comando de caça aos corruptos. Mandando cartas-bomba para fraudadores

do INSS, realizando justiçamento público de vereadores que não honraram os

mandatos pertencentes aos seus partidos, explodindo prédios de rádios e televisões

abocanhadas por deputados, saqueando mansões de “empresários” que

enriqueceram vendendo cargas roubadas à custa da vida de caminhoneiros,

empalando delegados de polícia que levam dinheiro do tráfico de drogas.

Isso não! Se o povo começa a ter exemplos assim e considerando o grau de

impunidade reinante, vamos ter heróis às avessas. Quero o Carandiru cheio de gente

que enriqueceu com o meu imposto; Bangu II lotado de banqueiros fraudadores do

sistema financeiro nacional; Pascoal Ramos entupido de espertos lobistas que

cobram a metade para liberar uma verba pública. Quero justiça social, mas com

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liberdade. Senão fico meio perdido e sou capaz até, num gesto tresloucado, de eleger

o FHC para rei do Brasil.

A responsabilidade, essa irmã xipófaga da liberdade, tem andado em baixa, mas não

há como separá-las. Sem uma a outra morre, e nada melhor que uma boa dose de

vergonha na cara para assumirmos a responsabilidade do mal que temos causado a

liberdade.

Cassação já! Cadeia em regime fechado também, para os escolarizados que precisam

ser re-educados em estabelecimentos penais. Voto só para quem conhecemos no

dia-a-dia e de noite também. Promotores fiscalizando o cumprimento da lei. Polícia

prendendo o ladrão rico e poderoso. Juiz julgando processo em menos de dez anos.

Denúncia através da Internet de casos suspeitos de corrupção. Boicote aos artistas e

escritores que manifestam apoio irrestrito aos “impunes do Brasil”.

Tudo isso antes que a primeira bomba exploda, ou pior, que apareça um novo Vargas

nesse país.

* Cidadão carioca perdido no Mato Grosso que paga religiosamente IRPF, IPVA,

ICMS, CPMF e trabalha desde os treze anos de idade com carteira assinada.

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Bezcampante, uma triste história Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (2001)

É possível conviver com o combate à pobreza ao mesmo tempo em que se busca usar

modernas tecnologias? Respondo eu mesmo: - Creio que sim! Vamos criar uma

situação hipotética para sustentar minha tese:

- Terra dos Bezcampante é uma cidade mato-grossense de médio porte, produtora

de soja, carne bovina e algodão, possui um parque industrial irrisório frente a sua

mediocridade e os setores de serviços e comércio estão em mãos

ultra-conservadoras (burguesia, diria o Doutor Muito-Maior) e suas forças políticas

estão equilibradas em mãos de três coronéis remanescentes do século passado.

O atual prefeito bezcampanês é homem viajado, e por isso, conhecedor de outras

plagas onde prospera o progresso econômico e social. Além disso, é um homem das

Ciências, tornando-o assim “um caolho em terra de cegos”. Epa! Acho que errei o

ditado popular.

Na hora em que escolheu seu secretariado, o prefeito foi obrigado a atender pleitos

dos coronéis, capitães, sargentos e soldados eleitorais. E daí nasceu o famoso

governo “colcha-de-retalhos”.

Para a pasta da Educação, foi imposto pelo Partido da Esquerda Festiva, também

chamado de Guarda-Chuva, um correligionário que tudo conhece, inclusive dos

problemas da pobreza, miséria, analfabetismo, exploração de trabalhadores,

movimento dos sem-terras, dos sem-tetos, dos encarcerados políticos ou não, da

mortalidade infantil, do desemprego. Enfim sabe tudo sobre os problemas à sua

volta.

O único problema que aquele secretário pouco sabia é “que o tempo não pára” (@

Cazuza) e que enquanto se discutia os problemas periféricos à sua alçada o mundo

girava e a Educação em sua cidade cada dia tornava-se mais-e-mais obsoleta arcaica

e pasmem: conservadora!

Aí um dia surge no cenário político da bela cidade um revolucionário às avessas,

chamado por alguns de Dom Quixote do Pantanal e por outros de Agente da CIA.

Começa a falar em modernidades e tecnologias, aplicadas à Administração Pública e

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principalmente, à Educação.

No início foi tratado pelos governantes como um visionário, louco-varrido, um

verdadeiro crioulo-doido. Mas, o infeliz pregador continuava sua ladainha de que era

chegado o final dos tempos e que através da Educação o povo se libertaria da

ignorância escravizadora. Aí o secretário começou a usar a mídia local para

desacreditar o pregador, afirmando que o louco nada entendia das brilhantes teorias

e metodologias da Educação. Acontece que nesse ínterim o povo começou a

comentar nas casas, nas ruas, nos trabalhos, as ideias do milagreiro tupiniquim.

O tempo fechou. Passeatas, carreatas, “carroceatas”, “bicicleatas” e outras atas

aconteceram naquela pacata cidade. O povo queria a dita modernidade. Até o polícia

ficou na dúvida se reprimia ou não aquele movimento, já que sua bisavó participava

de arrastões e era conhecida líder ativa da pós-modernidade.

O prefeito, muito sábio, para evitar derramamento de sangue cedeu às pressões

populares e demitiu seu secretário da Educação, nomeando o Agente Quixote em seu

lugar.

Um ano depois a cidade mudou de nome, passando a chamar-se Aldeia Global.

Possui a maior concentração de televisão per - capita da Terra e todos os seus

habitantes assistem novelas quatro vezes ao dia.

E daí em diante foram infelizes para sempre.

Moral da estória: É possível combater os graves problemas sociais com o apoio de

modernas tecnologias, sem tornar-se um radical por este ou aquele lado da questão.

Talvez essa utilização seja o caminho das pedras para solucionar problemas como o

desperdício, a malversação do dinheiro público, desburocratização, etc.

(*) Professor do ICEN/UFMT

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Brasil de Hoje: “Samba do crioulo doido”

ou “cego em tiroteio” Ruy Ferreira(*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 15 de março de 2002.

Quando as coisas estavam confusas ou invertidas em sua ordem de valores, meu

saudoso avô (morreu udenista) dizia: - “pareço cego em tiroteio”. Traduzindo para a

linguagem dos jovens alienados, isso significava: - tudo bem, me dá uma coca.

Quando o Stanislaw Ponte Preta compôs um sambinha sobre a História do Brasil,

onde um favelado falava de um enredo enrolado pacas, coisa de louco como diz o

oportunista do Ratinho, a música foi chamada de Samba do Crioulo Doido.

Traduzindo para o fácil entendimento dos adultos alienados: - o samba parecia o

programa do Faustão. Só tinha abobrinha e nenhuma mensagem ou verdade.

Seu Américo, meu avô udenista, com aquela mão aleijada pela tortura com bambu,

praticada pela turma do Felinto Müller (o mesmo que dá nome ao prédio da

Assembléia Legislativa do Mato Grosso) juntava os netos aos domingos e contava

suas estórias anti-getulista, onde o moral da estória estava sempre na busca do valor

maior de um indivíduo: a liberdade.

Morreu em plena segunda-feira de carnaval, vivendo seus últimos momentos numa

democracia relativa, com Juscelino na Presidência. Deixou muitas saudades e lições

inesquecíveis.

O tempo foi passando e eu tentei seguir seus passos, trabalhando de dia e estudando

à noite. Nessa época (1967) conheci o movimento estudantil e a briga era para abrir

a ditadura na marra. Nunca comprei tanta bolinha de gude, para despejar sob as

patas dos cavalos da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Era um tombo só! Duro era

suportar o gás lacrimogêneo e o “esporro” do pai em casa pelas roupas rasgadas.

Mas valia a pena, pois o negócio era ter a liberdade respeitada.

A liberdade ainda não chegou, vale a pena continuar a luta. Ainda não consegui me

filiar a um partido político, afinal os valores morais que cultuo em minha vida não

estão presentes nos representantes dos atuais partidos políticos. Vou ficando

udenista e votando conforme a consciência.

Entretanto, a corrupção e a inversão de valores de hoje estão me obrigando a pensar

numa nova forma de luta. Talvez adote o patrulhamento ideológico, talvez a

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subversão capitalista, ou quem sabe o terrorismo das palavras. Vou começar pelo

terrorismo das palavras, pois isso não impede outras formas de luta.

Vamos tentar pensar juntos. Sei que pensar dói, mas vamos sobrepujar a dor e num

ato de heroísmo, vamos pensar.

A família Sarney tem sido perniciosa ao Maranhão e ao Brasil desde longa data. O

patriarca, Zé Ribamar, já passou por todos os partidos possíveis e seus filhos seguem

o péssimo exemplo do representante do Amapá. A menina Roseana, empurrada

goela abaixo pela Rede Globo dos Marinhos (sempre aproveitadores das tetas da

União), anda indignada porque o Ministério Público Federal está apurando o roubo na

SUDAM e há indícios de envolvimento dela e do marido nessa falcatrua. Até aí tudo

bem. Ela tem o direito de chiar quando o cerco aperta. Mas, ouvi uma declaração da

menina dizendo que estava furiosa, pois o FHC (ex-marxista, convertido à seita de

São Francisco de Assis) avisou o José Inácio, governador do Espírito Santo, quando

a Polícia Federal ia encanar sua linda esposa por formação de quadrilha e cobrança

de propinas. Enquanto a coitadinha da Roseana só ficou sabendo da ação policial

pela TV.

Realmente, não dá para confiar no pessoal tucano. Pois enquanto o pessoal do PFL

sempre esperou a vitória de alguém, para depois dizer que sempre esteve ao lado do

vencedor e dividir as delícias do poder. O PSDB quer jogar o bom nome da família

Sarney na lama, para beneficiar o Serra (aquele da Dengue). Isso é política suja com

as oligarquias, democracia de balcão e sacanagem, tudo a um só tempo.

Ao mesmo tempo fiquei sabendo que tem ex-senador do PMDB sendo algemado pela

Polícia Federal e levado para a carceragem à disposição da Justiça. Epa! Essa tal

Polícia é coisa da ditadura e já está na hora de acabar com ela, antes que apure

outras fontes de renda dos nossos políticos.

Quanto ao Ministério Público (esses rábulas andam muito metidos a besta, pensando

que podem fiscalizar o cumprimento da Lei. Onde já se viu isso!) tem que investigar

é ladrão de galinha e deixar os que roubam a "galinha de ovos de ouro" em paz.

Talvez uma lei da mordaça não seja o suficiente para segurar a sede de justiça desses

filhos da classe média que galgam postos de procuradores por concurso e ficam

infernizando a vida dos nossos políticos. Melhor acabar com essa Instituição!

A Justiça. Arré égua! Se nada faz é incompetente, se faz é perseguidora. Se um dia

condenar um legítimo filho da puritana classe abastada, onde irá colocar o

condenado para cumprir pena? No Palácio da Alvorada? Na sala do Estado-Maior de

uma das nossas corporações armadas? No Caribe? Em Paris? Desde que não seja em

Bangu, qualquer lugar serve.

O samba continua e o crioulo doido de Stanislaw está começando a ter razão. O Mato

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Grosso dá bons exemplos disso: PFL e PPS coligados! Os Campos noivos de

ex-comunistas (talvez nem tão comunistas assim). Essa não! O Dante comemorando

a decisão do TSE que obriga a coligação nacional ser respeitada até no município,

pois assim ele recebe o PMDB de graça. Com Bezerra e Cia Ltda.! E quem diria o PT

de braços dados com o PL (leia-se Edir Macedo, a IURD e milhões de votos

abençoados).

Dormir com esse barulho é dureza. Tem candidatura natural, como se Deus tivesse

revelado a certas oligarquias: - “Jonas Pinheiro é ungido por mim. Ele é meu

candidato”. Claro que isso acontece em todos os partidos, desafiando a liberdade de

gente como eu. Noutro é o Antero, um desconhecido senador que não resiste às

luzes das câmeras de TV para aparecer em cadeia nacional, questionando a conduta

do ACM, aquele santo baiano.

Bem como o ano é eleitoral, nada acontecerá por acaso. A dengue será combatida

até a data das eleições e depois vamos esquecer. A SUDAM e a SUDENE serão coisas

do passado e como brasileiro tem memória curta, cairá no esquecimento. O roubo do

TRT-SP será partilhado pela gangue que o pilhou e terminará com um final feliz, tipo

Collor & PC Farias, onde um morre e outro vai gozar a vida em Miami. O jogo do bicho

continuará financiando campanhas políticas, como no Rio Grande do Sul e ninguém

será preso por isso. O narcotráfico fará mais alguns deputados e ganhará a

descriminalização da maconha, como forma de desviar a atenção das drogas pesadas

que irão correr soltas nas veias de quem tem grana para comprá-las. O roubo de

cargas continuará firme e forte no Sudeste para que nossos comerciantes vendam

produtos roubados bem baratos em seus lojões pantaneiros, embora os

caminhoneiros mortos continuem protestando em sessões espíritas.

E, nós, brasileiros e brasileiras, continuaremos mais perdidos que “cego em tiroteio”

sem saber ao certo se vai haver apagão no ano que vem, se o Romário vai abrir uma

birosca em Acari, se a dívida interna pode ser paga um dia, se o FHC será canonizado

pelo Santo Ofício, como o maior algoz do Brasil ou se o George Soros vai mandar

fazer uma estátua para ele, como o maior vendilhão da História Brasileira. São

questões profundas e que vão ocupar bom tempo do Jornal Nacional e do Jornal

Record para continuar a confusão mental do povo brasileiro, aquele que acha que

tem democracia, mas que ainda não teve liberdade.

(*) Carioca de nascimento, eleitor em Brasília, morador em Cuiabá e trabalhador da

Educação em Rondonópolis. Um verdadeiro crioulo doido.

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O importado é melhor. Para quem? Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 20 de março de 2002

Existe uma idéia entre a população brasileira, pelo menos entre a que possui poder

de compra, que produtos e serviços estrangeiros são melhores em relação aos aqui

produzidos ou prestados. Senso comum ou conseqüência da propaganda?

Honestamente, não sei.

Uísque escocês, perfume francês, jeans americano, caviar russo, eletrônicos

japoneses, bacalhau português e tantos outros produtos que desejamos como itens

de consumo. No campo dos serviços a coisa fica no mesmo patamar de vontade:

notícias das agências americanas, turismo europeu, serviços automatizados a

clientes e portais da internet voltados para a Educação, Ciência e Tecnologia.

Epa! Talvez isso não seja verdade, e pior, estamos fazendo propaganda enganosa.

Nascido no Brasil, filho de pais brasileiros, desde cedo aprendi com eles a valorizar a

“prata-da-casa”. Quando jovem ingressei no Exército Brasileiro e cultuei valores

nacionais acima de quaisquer outros estrangeiros e ao dele me afastar para ingressar

numa Universidade Federal, aprofundei meus conhecimentos sobre o quanto somos

capazes de produzir e prestar serviços, com eficácia, eficiência e qualidade.

Lógico, existem campos do conhecimento humano onde ainda engatinhamos.

Entretanto, em outras áreas somos ponta-de-lança, pareados com os melhores do

mundo. Temos o refrigerante natural capaz de enfrentar qualquer outro alienígena,

somos excelentes em prospecção de petróleo em águas profundas, temos

competitividade na indústria da aviação, armas, automóveis e tantas outras. Somos

muitos bons na automação bancária, para não dizer que somos os melhores. Temos

serviços automatizados ao cidadão que chegam a dar inveja aos países ricos.

Exemplo disso: serviço eleitoral eletrônico, receita federal, detrans de muitos estados

brasileiros, e por aí vai.

Ora, o imaginário da população brasileira pode estar mudando em relação ao serviço

ou produto estrangeiro. E aí surge um complicador. O governo no Brasil anda

prestigiando o que vem de fora em detrimento ao aqui produzido!

Exemplo disso está na badalada inauguração de um portal na Internet, voltado para

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a comunidade acadêmica em geral e estudantes universitários em particular. O

Presidente da República, o Ministro da Educação, um monte de reitores e outras

autoridades estiveram reunidos para o lançamento de um portal mantido por um

banco estrangeiro. Até aí, nada demais. O problema está nas declarações das

autoridades sobre o serviço ofertado pelo portal.

A falácia corre solta, rasgando seda para os serviços inestimáveis e inéditos na Web

que o portal oferece. Ufanismos como: hoje temos um computador para cada

dezenove alunos nas universidades federais brasileiras. Parem!

Leciono numa federal para turmas de cinqüenta alunos com dezesseis computadores

no laboratório, sendo que doze funcionam regularmente. Isso é fato! Tenho mais de

mil alunos, matriculados no campus, disputando um lugar diante desses mesmos

computadores. Isso é fato!

No ano 2000, lançamos um consórcio virtual universitário, englobando quase todas

as universidades públicas brasileiras e imploramos ao mesmo Ministro da Educação

para participar do evento de inauguração, ao lado do solícito Ministro da Ciência e

Tecnologia. Um sabia o poder de fogo que estávamos criando para o Brasil, o outro

discursou elogiando uma universidade inglesa e esqueceu de anos e anos de

experiências bem-sucedidas nas instituições tupiniquins.

Um ano antes, a UFBA lançou, em parceira com o IBCTI, um portal sobre Educação,

Ciência e Tecnologia (www.prossiga.br) sem que as luzes da mídia e a presença de

autoridades fossem sentidas. Pena, pois o nosso é ótimo!

Somos bons de Internet, Educação à Distância e nossos portais nada deixam a

desejar aos estrangeiros. Com uma vantagem infernal: escritos em Língua

Portuguesa!

Pena que as coisas boas brasileiras ocupem tão pouco espaço na mídia nacional e

receba tão pouca atenção dos governantes do país. Pena, mesmo!

Fica a lição, nossos governantes ainda não acreditam em soluções nacionais para

problemas internos. Enquanto isso, os brasileiros vão bebendo guaraná, vendendo

aço, exportando automóveis, sequenciando genoma, produzindo softwares e portais

de grande utilidade e qualidade. Que pena!

(*) Professor assistente da UFMT

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Sonhei um sonho Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 19 de maio de 2002

Quando cheguei em Rondonópolis, no início de 1982, vindo de Macaé, Rio de Janeiro,

senti uma grande diferença entre as duas cidades. Se aqui faltava o mar, a brisa

fresca e o camarão barato sobravam pintados, pequi e garapa. Além disso,

Rondonópolis já possuía um campus universitário federal, com mais de dez anos de

funcionamento. Gostei, fui e voltei. Cumpriu-se o vaticínio do amigo Ariel que dizia: -

“Você vai, mas volta. Tem mais coisa por fazer aqui”. Pois é. Voltei em 1995 e

descobri um monte de coisas para fazer em Rondonópolis.

Em particular, um sonho sonhado e acalentado com muito carinho ainda está por ser

realizado: - Transformar o campus da UFMT em Centro Universitário Federal,

autônomo da cuiabania.

Embalado pelo Tati, nos idos de 96, fizemos uma enorme peregrinação na imprensa

local e nas portas dos nossos políticos tentando vender a idéia. Faltou-nos

criatividade e competência para isso. Olha que na época tínhamos quatro

parlamentares federais da cidade, presidente vindo à festa de casamento no Caiçara,

entre outros fatos políticos. Ainda assim, fracassamos.

Mas, o sonho não morreu. Continua vivo e sonhado toda semana quando entro no

campus de Rondonópolis. Permaneço um separatista incorrigível. Quero quebrar as

algemas que Cuiabá nos impõe. Quero liberdade e autonomia para Rondonópolis.

Parece fixação de doente mental, mas não é. Tenho números que mostram o quanto

seríamos bons em relação às demais instituições federais de ensino superior. Nós, de

Rondonópolis, temos doutores e mestres para dar com pau! Ajudamos, e muito, os

dados estatísticos da UFMT.

Em 1996, num discurso apaixonado de colação de grau, no antigo cinema da cidade,

baixei a lenha no lombo da surpresa reitora da época. Conheci o campus como aluno

e dez anos depois quase nada havia mudado por lá. Só que o mundo não parou para

que a UFMT pudesse dar modernidade à Rondonópolis. Nem irá parar!

Gosto de funk da favela, e num deles o Claudinho e Bochecha cantam: “... se eles não

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fazem lá, fazemos nós aqui...”. Infelizmente tem que ser assim, pois de graça só

vamos receber esmolas.

Vamos criar um projeto de transformação do Campus Universitário de Rondonópolis

em Centro Universitário Federal do Sudeste de Mato Grosso. Vamos nos desligar da

UFMT, para atender aos anseios e necessidades do povo dessa região.

Nosso campus tem razoável infra-estrutura física, possui um corpo docente bem

qualificado, tem sete licenciaturas e três bacharelados em funcionamento, mantém

várias turmas especiais na Região Sudeste. Hoje somos maiores que a FUNREI. Com

investimentos bem direcionados poderíamos ser um centro de excelência na

formação de professores e também, em áreas voltadas para o agronegócio. Falta a

vontade política para fazer!

Pensar nisso dá margens ao levantamento de possíveis empecilhos. Acredito que o

ensino superior privado da região tem interesse no fortalecimento do Campus, pois

garante formação continuada para seus próprios professores, em serviço. Para os

empresários significa um órgão federal comprando em Rondonópolis e formando

gente qualificada para suas empresas. Para o povo, significa mais oportunidades no

acesso ao ensino superior público, gratuito e de qualidade. E, por incrível que pareça,

dá importância aos políticos da região.

Então, o que falta é vontade para fazer. Sim! E, faço uma crítica aos acadêmicos do

Campus, pois enquanto estamos dormindo em berço esplêndido o pessoal de

Campina Grande, na Paraíba, conquistou uma nova universidade federal para aquela

região paraibana. Peraí! Se estão dando universidade para a Paraíba, por que não

para o Mato Grosso? Porque os políticos de lá são bairristas, para eles primeiro o

Estado, depois o Nordeste e por último o Brasil.

Minas Gerais possui seis universidades federais: UFMG, UFV, UFLA, UFU, UFJF e

UFOP, e neste mês foi contemplada com duas outras: São João Del Rei e Itajubá.

Peraí! Isso está cheirando a política do pão de queijo. Tá passando da hora de pensar

em nós mesmos.

O Rio de Janeiro possui a UFRJ, UFRRJ, UFF e a Uni-Rio, todas federais. O Rio Grande

do Sul tem a UFRGS, UFSM, UFPel e a FURG. Pernambuco tem a UFPE e a UFRPE. São

Paulo tem a UNIFESP e a UFSCar como representantes federais e três ótimas

estaduais. E nós, nesse imenso Estado?

Sou carioca e acredito que o Rio deveria ter mais universidades. Entretanto, tenho

certeza que uma só no Mato Grosso é sacanagem! Lá, se eu sair da cidade do Rio e

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viajar duzentos quilômetros para o Oeste saio do estado. Aqui nem chego a Cuiabá.

Talvez duas outras federais fossem um bom começo.

Vamos sensibilizar alunos, professores, pais, políticos, mídia, o diabo a quatro,

visando colocar a criação do Centro Universitário Federal do Sudeste de Mato Grosso

em nossas agendas. Vamos levantar bandeiras da autonomia. Vamos puxar a brasa

para as nossas sardinhas. Porque ninguém irá fazer isso por nós!

Se o governo federal criou quatro novas universidades este ano, vamos exigir que

nasça a quinta: a nossa!

Passo a palavra aos nossos queridos representantes em Brasília: Senador Bezerra,

Deputados Tetê e Wellington. Todos declaradamente a favor da idéia, seis anos

atrás.

* Professor de Computação da UFMT

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A Informática e a Sociedade numa Visão

Matemática Raimundo Bias Mendes Leão (*)

Ruy Ferreira (**)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 08 de junho de 2002

Quando começamos a pensar no tema “A Informática e a Sociedade” nos vem uma

série de ideias. Às vezes vemos a Informática contribuindo para o crescimento, no

mais amplo sentido, da sociedade. Outras vezes vemos uma grande fatia dessa

mesma sociedade sem o menor acesso a Informática em suas mais diversas formas.

Pode nos ocorrer uma frase do tipo: “A Informática multiplica as oportunidades,

racionaliza o trabalho, diminui os erros, adiciona vantagens, potencializa o

desempenho e divide benefícios". É interessante observarmos como a Matemática

esta intimamente ligada a Informática e a sociedade em sua lógica, em sua filosofia

e através das suas operações. A seguir, utilizaremos as quatro operações básicas

para dar uma visão Matemática ao tema.

Adição

A Informática está presente em nosso mundo de uma forma irreversível. Desde

nosso computador caseiro até nas viagens interplanetárias. No dia-a-dia através dos

cartões magnéticos que tanto reduz a perda de tempo, na música com seus teclados,

no cinema com os efeitos especiais cada vez mais perfeitos e, principalmente, nas

telecomunicações. O mundo, via Tecnologias da Informação e da Comunicação,

passou a ser uma grande vizinhança. Podemos, virtualmente, ter acesso a qualquer

local do planeta, interagir, comprar, vender, trocar ideias, interferir e conhecer

culturas. Nesse aspecto, a Informática contribui com uma importante parcela para

melhoria da qualidade de vida de todas as pessoas, da sociedade.

A Informática, à medida que avança, melhora a imagem da televisão, diminui a

chance de erro nos exames médicos, aprimora instrumentos de precisão nos diversos

ramos da ciência, leva e traz informações com mais rapidez e correção, otimiza

serviços, melhora a qualidade do som, diminui distâncias, abre novos mercados e

muito mais.

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Multiplicação

De certa forma, as pessoas foram tomadas de um entusiasmo crescente a medida

que a Informática foi interferindo mais e mais em suas vidas ao longo do tempo.

Surgem cursos de Informática com ambientes climatizados, instrutores são formados

as pressas, criam-se cursos superiores para Analista de Sistema, Ciência da

Computação, Informática entre outros, empresas literalmente multiplicam-se na

Internet, dando preferência a quem detém conhecimento na área. Todos querem o

seu computador caseiro, surge o programador, o criador de programas, o hacker e

por aí vai.

Olhando por esse prisma, parece que vivíamos num marasmo quebrado

repentinamente por esse advento. A vida ganha mais dinâmica, a sociedade parece

ter pressa, um minuto vale agora muito, o setor abre novos mercados, cria novos

profissionais e muitas vagas, estamos agora na “Terceira Onda” de Alvin Tofller.

Subtração

Diante desse quadro é preciso reconhecer a nossa imensa desigualdade social.

Somos um país de desigualdades econômicas e sociais. Para nossa tristeza temos

muito mais pobres do que ricos. A classe média segue uma senóide ora em cima, ora

em baixo, dependendo das atitudes dos governantes. É a parte instável da sociedade

quando deveria ser a grande consumidora, estabilizadora, o fiel da balança.

Recentemente, no final do ano, vimos uma campanha chamada “Natal sem fome”.

Nela éramos informados que cinqüenta e dois milhões de brasileiros passam fome.

Isso representa um terço de nossa população. Se estas pessoas não têm o que

comer, como poderão ter acesso a todo esse avanço tecnológico? De que forma terão

contato com a Informática e de que forma ela poderá contribuir para o crescimento

dessas pessoas? Existe uma grande possibilidade que entre elas existam gênios, ao

qual a vida negou uma oportunidade. Em outras palavras, este foi, como tantos

outros subtraídos do processo.

Divisão

Talvez, entre todas, esta seja a operação que mais tem afinidade com a Informática.

Basta vermos a imensa quantidade de computadores caseiros, vídeo games,

telefones celulares, cartões magnéticos, disquetes, CD´s, agendas eletrônicas, entre

outros subprodutos que vemos espalhados por aí. Nenhum setor distribui tanto seus

benefícios e bens como o da Informática. A cada dia surge uma novidade. Carros,

aviões e navios são equipados com computadores de bordo, os mecânicos conectam

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o veículo a um terminal e diagnosticam um possível problema. Uma raquete de tênis

calcula a velocidade da bola. Enfim, é uma tarefa realmente difícil encontrar um setor

em nossa sociedade que não se beneficie de alguma maneira da Informática. Essa é

sua vocação.

Concluindo

Muitas outras operações poderiam ser utilizadas nesta analogia. Entretanto as quatro

citadas, até pela filosofia envolvida, dão uma idéia da relação íntima entre a

Matemática e a Informática. A esperança é que o aumento da quantidade de pessoas

beneficiadas seja uma questão de tempo, donde podemos extrair a seguinte

equação:

Sendo CI uma parcela relativa à corrupção, injustiça, entre outras violências sociais,

características de cada país.

Se estivermos bem atentos na leitura de textos, tratados e trabalhos. Ouvirmos

comentários, palestras, notícias ou qualquer que outro meio de comunicação,

através da qual nos pusermos em contato com o tema, encontraremos

palavras-chaves como “cartesiana”, “progressão”, “limites”, “abstração”, “símbolos”

e tantas outras que não deixam dúvida quanto à proximidade entre a Informática e

a Matemática.

(*) Formando em Matemática pela UFMT em 2002.

(**) Professor de Computação da UFMT.

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Computadores nas escolas Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 14 de julho de 2002

Desde 1996 o governo federal vem anunciando programas espetaculares, gerando

notícias do tipo que somem na poeira, em especial, no emprego do computador na

Educação Pública. 300.000 computadores nas escolas, 100.000 computadores na

escola, e talvez uns 20.000 efetivamente colocados na escola e poucos deles sendo

utilizados.

Pois bem! Quem vai usá-los? Como serão utilizados os computadores? Adquirir

algumas habilidades motoras no teclado ou mouse basta? Com Internet ou sem?

Linux ou Windows? Formar mão-de-obra ou cidadão? Para quem será destinado o

rico filão desse mercado? O professor deve usá-lo? Devemos formar Tecnólogos

Educacionais? Vamos usar os bacharéis em Computação? Leigos e apadrinhados

políticos devem participar?

Chega de perguntas e de gastar dinheiro e tempo com tanta baboseira. 2002 será um

ano atípico, pois tem copa do mundo e eleições. A mídia só vai falar disso e de motins

em presídios. Antes disso, vamos pensar em algo que ultrapasse o mandato

presidencial.

Faço uma sugestão: - A Presidência da República cria um órgão executivo temporário

(três anos, por exemplo), inter-ministerial, com a finalidade de planejar, implantar e

concluir um programa de Informática na Educação Pública. Todas as ações serão

concentradas nesse órgão, todas as iniciativas serão debatidas e agregadas ao

programa de forma democrática e colegiada nesse órgão. Todo o dinheiro disponível

nessa área será canalizado para esse programa. Nenhuma interferência política ou

comercial será aceita no planejamento e execução do programa.

Quem iria compor esse órgão e planejar algo assim? Essa é fácil de responder: -Liane

Tarouco e Léa da Cruz Fagundes, da UFRGS, Silvio Meira, da UFPE, José Armando

Valente e Mauro Miskulin, da Unicamp, Mauro Pequeno e Hermínio Borges, da UFC,

Silvio Quezado e Maria Elenita Nascimento, da UnB, Édson Cáceres da UFMS, João

Dovich, da UFU, Sérgio Scheer, da UFPR, Ricardo Barcia, da UFSC, Antonio Sabariz,

da FUNREI, Adail Gonçalves, da UFSCar, Marcio Bunte, da UFMG, Alberto Ferreira de

Souza, da UFES, Frederico Litto e José Moran, da USP, entre tantos outros nomes que

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tenho em meu “catálogo de endereços de e-mail”, e que como eu, vem estudando e

produzindo algo nesse sentido a muitos anos.

A Rede Nacional de Ensino e Pesquisa pode servir como ponto de partida para esse

projeto nacional. Usando-a como espinha dorsal é possível obter a capilaridade

necessária para dar acesso à Internet a todas as escolas públicas do país.

As Forças Armadas obrigatoriamente participariam do programa, levando

comunicação a qualquer parte do Brasil, pois isso os militares já fazem e bem.

Interligação na “Internet-BR” de todas as Universidades Públicas, Escolas Técnicas

Federais (atuais CEFET), escolas militares, escolas públicas de Ensino Médio e

Fundamental, além de todas as bibliotecas públicas.

Petrobrás, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco da Amazônia, Banco do

Nordeste e demais empresas públicas, patrocinariam um amplo programa de

capacitação para professores em atividade.

As redes privadas de televisão e rádio fariam um massivo chamamento da sociedade

para o empreendimento (propaganda mesmo). As redes públicas de rádio e televisão

gerariam programas de apoio ao projeto, pois já fazem isso com muita competência.

Criação e oferta de cursos à distância, destinado à qualificação dos nossos

professores em atividade, a cargo da Unirede e suas consorciadas.

Estado e municípios colocando “hora-atividade obrigatória” para seus professores

freqüentarem aulas nas escolas, quartéis, bibliotecas, universidades públicas,

CEFET´s, ou onde houver acesso público à Internet.

Participação ativa de empresas privadas da área de telecomunicações e provimento

de acesso. Se houver seriedade na proposta, os empresários desse campo

respondem afirmativamente. Eles sabem do potencial que isso representa para seus

negócios.

Passado o período estabelecido, com os computadores comprados e instalados,

professores capacitados no emprego dessas tecnologias, todas as instituições

conectadas na rede Internet-BR, é hora de desfazer o órgão temporário e levar

adiante o projeto como política pública permanente.

E os alunos? Bem, enquanto não existir professores do Ensino Médio e Fundamental

capacitados para o emprego das novas tecnologias, qualquer iniciativa está fadada

ao fracasso. Exemplo disso está na Universidade, onde pouco acesso o aluno tem às

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novas tecnologias da informação e comunicação, por conta do despreparo dos

docentes no emprego dessa “caixa de ferramentas”.

Possível fazer isso? Sim!

O que falta? Visão e vontade política de todos nós. Pois o dinheiro existe e está

pulverizado em mil e uma rubricas orçamentárias.

Daí quem sabe, poderíamos assistir a copa do mundo de 2006 na telinha do micro,

torcendo com nossos alunos e conectados com a modernidade.

* Professor de Computação da UFMT.

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Linha do Tempo Página 84

No voto ou no 44? Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 15 de agosto de 2002

Ao ler os jornais da semana passada fiquei com o estômago embrulhado. As notícias

de capa falavam sobre policiais-bandidos e nas páginas seguintes de

políticos-bandidos. Uma reflexão sobre o que a impunidade provoca na sociedade me

leva a lembrar e sentir saudades de figuras estranhas que passaram pela vida

brasileira.

A primeira figura rebuscada em minha infância é a do detetive Le Coq, da Polícia Civil

do Rio de Janeiro. O homem tinha uma máxima que era seguida pelos companheiros

de trabalho: “Bandido bom é bandido morto”. Quando eles começaram a matar

por encomenda, a sociedade berrou e deu um fim oficial na escuderia policial. Minha

puberdade veio junto com o famigerado Esquadrão da Morte, que matava mesmo!

Em meu imaginário ficou aquela figura do vingador-brasileiro que não dava chance

aos advogados de livrarem a cara de bandidos. Fernandão Beira-Mar naquela época

estaria boiando no Rio Guandu há muito tempo. Por outro lado, o julgamento era

sumário demais. Hoje tenho consciência disso, mas na adolescência achava

certíssimo mandar bala num bandido que mata um caminhoneiro para roubar a carga

e vender em lojões populares no sertão brasileiro.

Existiram os bandidos-robin wood, como o Laerte, que roubava dos ricaços do Rio (lá

tem muitos) e mantinha um serviço social no bairro (não era favela) onde morava,

com endereço certo e família respeitável. Meu imaginário criava confrontos lindos,

com tiros para todo lado, entre o justiceiro Le Coq e o bandido-bonzinho Laerte.

Nunca aconteceu, pois cada um viveu e morreu em tempos diferentes.

O tempo passou e nasceu uma nova categoria de bandidos: bandido-presidente (por

exemplo o Collor, cassado por corrupção passiva), bandido-senador (Luis Estevão,

cassado por corromper o pobrezinho do Juiz Federal Ladislau dos Santos Neto que

roubaram 169 milhões de Reais), bandido-deputado (Paschoal, por chefiar quadrilha

de narcotraficantes e serrar braços de adversários), bandido-governador (Mão

Santa, por corrupção eleitoral). Todos homens públicos e com atos praticados,

processados e julgados, deixando de fora algumas centenas de prefeitos e milhares

de vereadores. Tangará da Serra, Juscimeira e Rondonópolis são exemplos disso.

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Linha do Tempo Página 85

Refletindo sobre essa categoria moderna de bandidos, fica evidente que os bandidos

voaram mais alto e querem obter o poder político do Brasil, por vias pacíficas (como

os velhos comunistas do Partidão sonharam no passado e talvez cheguem este ano).

Se juntarmos a esse contingente aos que foram executados (Santo André, Campinas,

Várzea Grande, Tangará da Serra, e tantos outros lugares) a quantidade de bandidos

atuantes na política sobe para um número assustador. E aí é bom dizer que existem

bandidos matando políticos que não se enquadram nos seus projetos pessoais. Azar

dos políticos que se dizem sérios, mas são omissos até a raiz do cabelo.

A imunidade parlamentar é um bom sinal do quê os políticos estão arquitetando,

parece um plano estratégico para transformar o Brasil num país comandado por

bandidos e para bandidos. Soma-se a isso a Lei da Mordaça contra os Procuradores

e Promotores Públicos (fiscais da lei), tirando o poder de investigar daqueles que

constitucionalmente tem essa obrigação. E, até mesmo, a Lei de Imprensa que põe o

jornalista na parede e faz o “foca” e o experiente pensar bem no que vão publicar ou

pôr no ar. Nada disso acontece ao acaso. Não estou criando uma teoria da

conspiração, só analisando os fatos que estão aí.

Agora vejo os candidatos a cargos públicos buscarem candidaturas para fugirem de

processos criminais e cíveis. Tenho razão, a bandidagem chegou ao poder!

Começo a entender como um fraco como o Dante de Oliveira governou o Mato

Grosso, jogando as polícias militar e civil nas mãos da “banda-podre”. Deixando-as à

míngua ele facilitou o projeto dos grandes bandidos do jogo-do-bicho e do tráfico de

drogas. Parece orquestração, pois o PSDB fez isso em nível federal contra as Polícias

Federal e Rodoviária Federal. Tai o Espírito Santo para mostrar onde a coisa vai

chegar. Lembram do Rio Grande do Sul petista? Pois é, um militante assumiu a culpa

pelo governador e tudo voltou ao normal nos pampas.

E aí, o que fazer? Exijo, como cidadão, que a Procuradoria Geral da República

defenda o Brasil. Tirem o Brindeiro-arquivista e ponham um cara bom de Direito e de

tiro na chefia dos xerifes da lei. Quero juiz trabalhando muito, em nome da

democracia, e acelerando o julgamento de bandidos-políticos (sem que levem 17

anos para a conclusão). Pois, a alternativa que desponta no horizonte é a

reencarnação do Le Coq.

Talvez tenhamos que ouvir mais nossos poetas populares, como Gonzaguinha, Chico

Buarque, Geraldo Vandré, Claudinho e Bochecha, com suas pregações messiânicas e

proféticas: “Se eles não fazem, faremos nós!". Uns acham que o voto é o

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Linha do Tempo Página 86

caminho, outros acham que não. Eu, balanço como um pêndulo, às vezes acho que

o voto consciente resolve, mas cada vez mais acredito que a velha "Justiça do 44"

fará melhor efeito no clima de guerra civil em que vivemos.

O problema da adoção da antiga e saudosa justiça do Mato Grosso é que os

poderosos podem fugir para Nova Iorque, Paris ou Lisboa antes que ela seja feita.

Tem uns que já se mandaram.

Por conta dessa crise institucional de bandidagem política, ando tendo uns

pensamentos retrógrados e começo a achar que o Mao Tsé Tung, Stalin, Fidel Castro,

Hitler, Pinochet, Somoza, Idi Amin Dada e tantos outros assassinos em massa que de

uma forma ou de outra “limparam” seus países de inimigos políticos e bandidos.

China, Cuba, Israel e Estados Unidos fazem isso com uma eficácia infernal.

Deixo uma pergunta no ar: - o que fazer para que os partidos políticos não dêem

abrigo aos bandidos? Afinal, como dizia o Vandré: “Quem sabe faz à hora não espera

acontecer”. E os políticos sabem muito bem disso.

(*) Professor da UFMT, militar da reserva do Exército e que paga imposto na marra.

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Linha do Tempo Página 87

Uso da Coisa Pública Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 04 de setembro de 2002

Esta semana estava observando a panfletagem nos corredores do Campus de

Rondonópolis da UFMT e fiquei impressionado com a quantidade de anúncios,

mensagens e cartazes. Chega a causar poluição visual nos corredores e entradas do

Campus. Pena!

Ao passar pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE) fiquei olhando o que estava

colado em suas vidraças: cartazes da UEE e muitos cartazes de políticos dos que

concorrem a cargos políticos na eleição 2002.

Ai a “ ficha caiu” e entrei no recinto sagrado dos estudantes, onde o presidente

estava trabalhando com afinco no folder do congresso da UEE, pedi desculpas pela

interrupção e perguntei-lhe: - “Por que não há cartazes dos quatro candidatos a

Presidente da República colados nessas vidraças? Por que só há cartazes do

candidato do PT?

O jovem parou, pensou e respondeu com firmeza: “porque eu não sou neutro”.

Que bom que o jovem tenha feito sua escolha partidária. Bom mesmo! Menos um

alienado, para se vender por um milheiro de tijolos.

Entretanto, enquanto o corpo discente do Campus de Rondonópolis não fizer sua

escolha por voto democrático ou autorizar em plebiscito o DCE a adotar um

candidato, seja ele quem for o presidente do DCE não tem o direito de ser parcial.

Mas não tem mesmo!

A lógica que move o jovem estudante é o oportunismo do cargo. Isto é, sou o

presidente, logo o DCE é petista ou coligado a ele. Negativo!

Como deputado não pode escrever nova constituição, pois não tem mandato do povo

para isso, o presidente do DCE não pode expor a instituição a uma lógica perversa

que tendo o cargo, pode-se usar a máquina pública em proveito próprio ou de

correligionários. Não cabe ao que detém o mandato de direção de qualquer

instituição supra-partidária arvorar-se no direito de fazê-la de trampolim para quem

quer que seja.

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Linha do Tempo Página 88

Certa vez, disse isso ao então presidente da ADUFMAT-ROO, quando nos convidava

para apoiar o MST. Ele, o presidente, pode apoiar quem quiser, mas nunca em nome

da instituição que representa. Afinal, não aceitamos autoritarismos vindo de

ninguém, independente da postura ideológica ou do cargo que ocupa. Basta a letra

fria da lei que já nos obriga a tantas coisas.

Certamente o estudante foi firme na resposta dada, mas a ação política é imprópria

e imoral aos olhos daqueles que não fizeram a mesma escolha do

estudante-presidente. Pois, o DCE ainda não consultou os estudantes sobre qual

candidato ou que partido a instituição estudantil apoiará nessas eleições. Até lá, o

DCE deve permanecer neutro, em especial, seu presidente.

O fato, simples e corriqueiro, vale como exemplo de como são formadas as

consciências em nosso país. Certamente, o jovem ficará amuado hoje, de cara feia

até, por tal fato ter sido tratado em público, mas quando tiver a minha idade ele

refletirá e dará boas gargalhadas do erro político que cometeu quando era presidente

do DCE em Rondonópolis e o quanto é importante dar exemplos para os que ainda

estão alienados a espera de uma oferta da dentadura em troca do voto.

Bem já que estamos falando nisso, alguém sabe se algum candidato tem usado a

máquina administrativa para arrebanhar votos nessa eleição?

(*) Professor da UFMT que votará em trânsito este ano, por falta de salário decente.

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O público e o privado Ruy Ferreira(*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 18 de dezembro de 2002

Por mais de uma vez usei este espaço para refletir sobre o perigo da Educação

privatizada. Também, defendi de unhas e dentes a Educação pública e gratuita, em

especial o Ensino Superior. Falei sobre o processo de desmonte das universidades

públicas, ou para vendê-las ou para fechá-las. Escrevi sobre os perigos dessa lógica

irracional que leva o (des)governo a ceder às pressões dos endinheirados e a

transformar a Educação num produto de comércio, igual a uma lata de cerveja.

Claro que ninguém deu ouvido. Claro que não mudarei o mundo. Claro que minhas

palavras de nada valem diante do desejo do rico em ficar mais rico. Essa é a verdade,

o resto é papo-furado.

Ocorre que participo de alguns grupos de discussão sobre temas ligados a Educação,

Computação e Tecnologia Educacional. Alguns brasileiros, outros Ibero-Americanos

e uns poucos Pan-Americanos. E nesses grupos sempre vejo alguém tocar na mesma

tecla: o mercado da Educação está sendo escancarado para os capitalistas (o cara

que tem dinheiro) brasileiros ou estrangeiros, afinal dinheiro não tem pátria.

A Comunidade Comum Européia está batendo duro nas universidades públicas da

Europa querendo que elas se auto-sustentem. Isso significa que a universidade deixa

de ser universal nos saberes e passa a direcionar seus esforços para um segmento de

mercado, onde poderá ganhar dinheiro e se auto-sustentar. Ué! E onde vai o dinheiro

dos impostos dos cidadãos europeus? Como lá o povo é mais instruído do que nós,

eles se organizam e pressionam deputados e governos para frear a ambição

desmedida dos que querem comprar, a preço de banana, universidades com mais de

quinhentos anos de existência e serviços prestados à humanidade.

Esta semana tomei conhecimento de um artigo do escritor norte-americano Noam

Chomsky que fala da mesma coisa: sucatear a universidade pública para vender

baratinho. Caramba! No país do capitalismo pragmático (o teórico é inglês) os

endinheirados estão avançando sobre as universidades estaduais americanas (que

são públicas), querendo cortar verbas e demitir professores!

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Linha do Tempo Página 90

Ocorre que Chomsky além de cientista é um escritor de renome, ele não só

bate-ponto em universidade (MIT), mas a defende de unhas e dentes. Por quê?

A resposta está na própria denúncia do escritor: “Isto é bastante parecido com as

preocupações que tinham os trabalhadores nas fábricas de Lowell, Massachusetts há

150 anos. Eles tratavam de deter o que chamavam o novo espírito da era:

"Enriquece, olvidando de tudo, menos de ti mesmo". Queremos deter isso. Não

somos assim. Somos seres humanos. Nos preocupamos por outras pessoas.

Queremos fazer coisas juntos”.

Penso igualzinho ao Chomsky: Ninguém é uma ilha isolada no oceano!

A Educação é o caminho para formar um ser humano melhor que a geração anterior

e se estiver nas mãos de uma só pessoa vamos ter gerações iguais. Isso é entropia

sistêmica e mata! Mata gerações, países e se fosse globalizada, mataria a civilização.

Quem gostaria de uma escola que formasse milhões de Hitlers ou Stalins, como numa

linha de produção de fábrica de sapatos?

Só o endinheirado quer isso, pois seus filhos vão estudar em escolas que pensam e

fazem pensar. Nada de linha de produção de alunos. Pergunte aos ricaços de

Rondonópolis se os filhos deles estudam na “Unemat”?

O cientista-escritor de lá dá uma exemplo que mostra o futuro desse desmonte da

universidade pública. Ele cita uma reportagem do Wall Street Journal que chocou os

norte-americanos no verão passado. Trata-se do caso de um estudante de

Computação do MIT que se recusou a responder uma pergunta de prova porque a

resposta poderia comprometer o sigilo de uma patente que ele estava requerendo,

em parceria com outro professor do Instituto, fruto de uma pesquisa financiada por

uma empresa.

O Mauro, da Biologia, pergunta para o aluno: - Chá de quebra-pedras é bom para a

diurese? E ele responde: - Não posso falar sobre isso, pois estou pesquisando o

princípio ativo dessa planta e o contrato com a Bayer proíbe de tratar o assunto em

público!

Ou o Flávio, de História, pergunta se o plantio extensivo de soja no Mato Grosso não

enriqueceu somente alguns poucos em detrimento da maioria do povo

matogrossense? E o estudante diz: - Professor, nosso contrato de pesquisa com a

Sementes Sachetti proíbe de colocar em risco a expansão do negócio. Por isso, não

responderei.

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A universidade é plural! É universal no sentido de pensar o mundo, de pesquisar a

natureza, o homem e a civilização. Não pode, e não deve, estar atrelada ao mercado

pura e simplesmente. O que não significa dar as costas para o setor produtivo. O

mercado não é o foco principal de estudos da universidade, em lugar nenhum do

mundo.

Quando escuto um candidato a deputado estadual falar que as florestas e cerrados

das áreas indígenas devem ser derrubadas e em seus lugares devem ser plantados

soja e algodão, pois isso dará dinheiro aos índios, tornando-os auto-sustentáveis.

Posso da cátedra, investigar e escrever com certeza: Se os índios perderem as

florestas e cerrados onde vivem a mais de 10.000 anos, eles morrem! A História, a

Antropologia e a Sociologia provam essa tese. Então, posso chamar o candidato de

irresponsável e genocida.

Se a universidade estivesse a serviço de uma pessoa ou empresa, duvido muito que

eu pudesse dizer isso. A lógica de gerir uma empresa é a mesma de uma ditadura: -

Faça o que eu mando!

Por fim, parece que a gritaria pela não-privatização da Educação está globalizada.

Tem gente de todo canto do mundo esperneando pela chance de seus filhos e netos

terem uma formação aberta, voltada para a cidadania e para a ética. Fico feliz em não

ser uma voz que clama no deserto, porque o último que fez isso teve sua cabeça

entregue numa bandeja à enteada de um ricaço.

(*) Professor da UFMT, ainda pública e gratuita.

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A Escola: um imenso mercado para os

capitalistas internacionais Ruy Ferreira(*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (2002)

Li um documento da OCDE, datado de 2000, onde era feito uma análise financeira de

um novo “mercado” para os que têm muito dinheiro e precisam ganhar mais,

também chamados de capitalistas internacionais. Até aí nada de mais. Pois análises

devem ser realizadas antes de investir uma grana num novo negócio. O problema

está no tipo de mercado que os “mercadores” estão de olho comprido: EDUCAÇÃO!

Peraí, até o mais roxo dos capitalistas sabe que existem áreas onde o capital não

deve atuar, uma delas é a Educação. Obrigatória constitucionalmente em quase

todos os países do mundo, inclusive no Brasil. Logo, pelo caráter obrigatório e para

fugir de uma formação exclusivamente voltada para o interesse de um endinheirado

qualquer ou mesmo, de um grupelho de investidores, a Educação é fornecida pelo

Estado Nacional. Os países mais capitalistas fazem da Educação, um objetivo

permanente da Nação. Afinal é questão de soberania, de independência mesmo!

Das duas uma: ou os caras não são capitalistas ou se são, devem ser rotulados de

INIMIGOS. Isto mesmo, inimigo da pátria, seja qual nação for.

No estudo, a OCDE, apresentava esse invejável mercado europeu como sendo

composto por quatro milhões de professores, 320 000 estabelecimentos de ensino

(incluindo 5 000 universidades e escolas superiores da União Européia). Já pensaram

no mundo inteiro, quanto seria o valor nominal desse mercado? Pena que Educação

não é mercadoria, produto ou serviço que se possa fabricar ou prestar em empresa

comercial. Educação é serviço público, planejado e gerenciado pelo poder público,

sob as rédeas do Estado (Nação).

Esse papo não teve início há dois anos, mas sim em Janeiro de 1989, quando a Mesa

Redonda Européia dos Industriais - ERT, um potente grupo de pressão patronal junto

da Comissão Européia, publicou um relatório intitulado "Educação e Competência na

Europa". Nele é afirmado que "a educação e a formação são investimentos

estratégicos vitais para o sucesso das empresas."

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Linha do Tempo Página 93

O relatório deplora que “o ensino e a formação sejam sempre considerados, pelos

governos, como um problema interno”, que a indústria tenha uma influência

extremamente reduzida sobre os “programas ensinados”, que os professores tenham

"uma compreensão insuficiente do ambiente econômico, dos negócios e da noção de

lucro".

Uma conclusão se impõe: a indústria e os estabelecimentos de ensino devem

trabalhar "em conjunto no desenvolvimento de programas de ensino", recorrendo,

nomeadamente, à "aprendizagem à distância", à "educação à distância" e ao

desenvolvimento de "tecno-didáticas" baseadas na aprendizagem via computador.

Agrupando os grandes patrões dos principais construtores de computadores da

Europa, a ERT procura, na realidade, novos mercados. A perspectiva da liberalização

do setor das comunicações promete lucros fabulosos ao setor privado empresarial,

não apenas pela venda de equipamentos e de software, mas também pela

exploração das empresas de telefones privatizadas. Promover ou impor a educação à

distância permite esperar tirar benefícios do crescimento do volume das

comunicações telefônicas, da venda dos equipamentos e, da não menos importante,

que são os direitos de autor, bem como os direitos sobre a comercialização e a

exploração da "tecno-didáticas".

O conjunto destas estratégias deve levar a uma melhor adequação do ensino às

exigências da indústria, uma preparação para o tele-trabalho, uma redução dos

custos de formação na empresa e uma atomização dos estudantes e dos professores,

cujas eventuais turbulências são sempre temidas, em qualquer lugar do mundo.

Já em Março de 1990, a Comissão Européia adota o documento de trabalho, "A

Educação e a Formação à Distância". Nele se pode ler " ...o ensino à distância ... é

particularmente útil ... para assegurar um ensino e uma formação rentáveis ....

Um ensino de alta qualidade pode ser concebido e produzido num provedor central e,

em seguida, difundido em nível local, o que permite obter economias de escala .... O

mundo dos negócios está se tornando cada vez mais ativo neste domínio, tanto como

utilizador e beneficiário do ensino multimídia e à distância, como com conceptor e

negociante de material de formação deste tipo". Nota-se que bastaram alguns meses

para que a Comissão Européia tomar à sua conta a necessidade de "rentabilizar" a

formação e de instaurar um "mercado" de ensino norteado por "economias de

escala".

Um ano mais tarde, em Maio de 1991, a mesma Comissão avança um passo

fundamental e afirma que: "Uma universidade aberta é uma empresa industrial e o

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ensino superior à distância é uma indústria nova. Esta empresa deve lançar os seus

produtos sobre o mercado de ensino contínuo que siga as leis da oferta e da

procura." Mais adiante, a Comissão qualifica os estudantes de "clientes" e os cursos

de "produtos". E sublinha "a necessidade de desenvolver ações para alargar o

alcance, o impacto, assim como as aplicações da aprendizagem aberta e à distância

... para se manter competitiva ao nível do mercado global". A "realização destes

objetivos... exige estruturas de educação" que "deviam ser concebidas em função

nas necessidades dos clientes ...Uma concorrência instaurar-se-á entre os

prestatários da aprendizagem à distância ..., o que pode dar lugar a uma melhoria da

qualidade dos produtos".

Rapaz. Isso é muita cara de pau pro meu gosto!

Mas, o tempo foi passando e os caras comendo o mingau pela beirada não ficaram

comendo mosca. Viviane Reding, Comissária Européia de Educação, afirma: "A

realização deste objetivo passa, antes de tudo, pela educação: aquisição na escola de

uma cultura numérica e desenvolvimento de uma aprendizagem ao longo de toda a

vida". Leia-se venda de computadores, serviços de telecomunicações e mercado

fidelizado na marra, por toda a vida. Uau! Vai ser oligopolista assim no inferno.

Parece até a turma que explora e vende derivados do petróleo.

É evidente que é necessário que os professores sigam o movimento. O Conselho

Europeu recomenda que "todos os professores possuam um conhecimento

verificável das tecnologias da informação e das comunicações (TIC) até ao fim de

2002". Nesta data haverá avaliação se isso foi atingido ou não. É preciso, por isso,

desfazerem-se dos professores que não consigam evoluir até lá. Em alguns países

europeus já se vê a "desregulamentação" do estatuto dos professores (algo como

nossa LDB). Aliás, no Reino Unido começa-se a programar os meios de "motivar"

esses professores a se atualizarem, pelo "pagamento ao mérito". Aqui prá vocês. Ó!!!

Sou professor, cidadão e brasileiro até a sola do pé. Chega de abrir os portões do

nosso mercado para os donos do dinheiro-sem-fronteiras. Educação é serviço

público, obrigatório constitucionalmente, e se algum senador, deputado ou

presidente falar em mudar isso, podem ficar sabendo: “Tá levando grana para fazer

essa sacanagem com todos os brasileiros”.

Quando se começa a estar habituado ao que estas afirmações querem dizer, quando

começamos a perceber que camuflam o desmantelamento da Escola Pública pela

substituição da instrução por formações diversificadas e hierarquizadas, a serviço dos

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patrões-empregadores, começa-se a compreender o dever de resistência dos

professores.

Os professores já devem estar habituados ao fato de que uma reforma de ensino não

tem que ser um progresso. Mas, não devem sobretudo esquecer que esta política

enunciada, não é apenas de um ministro ou comissário de educação da ONU, mas

sim a política de um patronato potente, que já está com os pés fincados aqui no

Brasil.

Estado-mínimo? Sim! Educação, Saúde, Justiça, Segurança Pública, Defesa Externa,

Diplomacia, Arrecadação e Infra-Estrutura Social (regulações do trabalho e emprego,

concessões de transporte público, proteção a grupos de riscos, distribuição de renda

e riqueza, uso da terra, proteção ambiental, etc) . Daí em diante, começa o

"capitalismo", com mercado, produto, cliente e tantas outras denominações

importantes a nossa vida produtiva como cidadãos brasileiros.

(*) Professor da UFMT, "p da vida" com a mercantilização da Educação.

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Tiraram ou perdi? Ruy Ferreira (*)

Jornal A Tribuna — Rondonópolis-MT. (Julho 2002)

Em 1998 iniciei o curso de mestrado em Educação na Universidade Federal de Mato

Grosso. No primeiro mês de aulas deflagrou-se um movimento grevista nas

universidades federais que se arrastou por longo tempo. Pela primeira vez na vida

(até 1995 eu era um militar e nunca havia participado de uma greve antes) pude

sentir na pele os dois lados da mesma moeda: o impacto da greve sobre professores

e alunos.

Como aluno foi terrível, pois havia uma interminável lista de obras a serem lidas,

resenhadas e apresentadas em seminários, e a greve me fez ler tudo duplamente. A

falta do professor na orientação das leituras fez-me enveredar por caminhos

estereotipados e quebrei a cara quando apresentei meus resultados. Sem aulas,

orientações e biblioteca, tive que partir para a compra de livros e aí, percebi o quanto

sou pobre. Moran, Khun, Lakatos, Mafessoli, Boaventura Santos, Mills, Kant e outros

clássicos custam caro. Pior quando a leitura sugerida indicava um Bogdan & Biklen ou

Ausubel que exigiam compra no exterior.

Ao mesmo tempo, como professor de Computação, as novidades tecnológicas me

obrigavam a adquirir outras leituras, como: Alencar Filho, Gupta, Stair, Ramalho e

um sem fim de revistas, jornais e periódicos da área de atuação profissional. Não

descuidando é claro, dos deveres familiares com esposa e três filhos universitários.

Naquela oportunidade faltou dinheiro, sobrou vontade de estudar, mas tiraram-me

algo que acreditava piamente: seriedade no planejamento do emprego da coisa

pública. Certamente por passar muitos anos no Exército, tenho o mau hábito de

planejar o futuro e quando o futuro chegar, executar o que foi planejado. Aí do

comandante de quartel que não prever o custo de funcionamento de sua

organização, pois vai passar a pão e água o ano seguinte, e aí, adeus generalato.

Hoje, sinto que me tiraram naquele ano algo muito mais profundo: a possibilidade de

contribuir para melhoria da sociedade através das múltiplas atividades universitárias.

Sinto que para esse governo, a Universidade pública não tem a menor importância,

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parafraseando o professor da UFRJ Carlos Lessa, em recente entrevista à Folha de

São Paulo.

Quando sai do Exército entrei na Universidade, por concurso, tinha em mente

socializar o conhecimento que acumulei, graças à Educação Pública, com outros

cidadãos brasileiros. Trilhar o caminho da pesquisa no sentido de levar Educação aos

excluídos da escola tradicional. Conheço vinte estados dos vinte e sete e o que vi por

onde vivi me obrigou a abandonar a carreira militar e abraçar a do magistério

superior. Fiz uma opção pelo país que nasci e onde pretendo morrer.

A greve atual está desnudando uma face cruel dos governantes: o descaso com o

futuro, com o país, com o povo brasileiro. O sistema de ensino superior está fora das

preocupações governamentais, parece um patinho feio na agenda atual. Isso é

burrice! Os colegas das Ciências Políticas me ajudem, mas vejo um suicídio político

daqueles que tem legítimas aspirações a cargos públicos quando discursam e age no

desmonte da Universidade Pública, berço cultural da maioria deles.

O caminho da modernidade, da inserção e da inclusão do país e de seu povo na

Sociedade Globalizada passa obrigatoriamente pela Universidade. Importar

quinquilharias, máquinas e algumas tecnologias não garantem o acesso ao

bem-estar e à cidadania planetária. Pessoa, gente qualificada e bem educada é o

passaporte para esse acesso, o que não significa estar lá, mas pelo menos nos

permitem pensar no que queremos.

A Universidade é cara. Em qualquer lugar do mundo é assim, tanto é que a sociedade

as mantém, aqui e nos Estados Unidos, no Japão e na Inglaterra. Ensino superior é

direito do cidadão como é o direito à saúde e segurança pública, cabendo ao Estado

promover tal direito.

Uma instituição cara como a Universidade não pode pagar salários irreais aos seus

professores-pesquisadores-extensionistas, sob pena de perdê-los para o mercado.

Ou pior, atrair a mediocridade.

Talvez o atual governo tenha passado sem tocar num problema tão sério quanto a

Universidade Pública com a devida atenção. Fica um alerta aos próximos candidatos

à Presidência da República: a Universidade Pública é estratégica na condução de um

país. A mesma importância que se dá à Diplomacia, Forças Armadas, Saúde e

Comércio Exterior, têm que ser dada a Universidade Pública, sob pena de matar o

futuro de nosso povo.

Se no Exército minha preocupação era a defesa territorial do Brasil, aqui na

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Universidade meu esforço e dedicação é a irrestrita defesa do futuro da sociedade

brasileira. Exemplo disso está em meu cotidiano: Antes meu negócio era conhecer o

“chip”, ligar um computador a outro. Hoje focalizo meus estudos em como o

computador poderá ocupar o vazio educacional que exclui cidadãos do mercado e da

vida.

Este mês vão cortar meu acesso à Internet por atraso no pagamento, no próximo a

livraria manda minhas duplicatas para o cartório de protesto. Daí em diante, por

confisco salarial, vai faltar luz, água e comida para minha família. Meu protesto:

Banqueiros se cuidem, pois quando isso acontecer, serei um animal feroz em busca

de sobrevivência e aí...

Claro que isso nunca irá acontecer, pois nenhum governo é tão estúpido a ponto de

jogar na lata de lixo uma jóia tão cara como a Universidade Pública.

(*) Ruy Ferreira, 47, professor da UFMT

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Réquiem ao adversário Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (Setembro de 2002)

Morreu sábado passado Salomão Malina, último secretário-geral do Partido

Comunista Brasileiro – PCB. Independente de ideologia, nós brasileiro, perdemos

uma parte de nossa História viva e, a cada dia, tornamo-nos órfãos de exemplos de

firmeza política e fidelidade de ideais.

Quando entrei no Exército Brasileiro, no início dos Anos 70, o General Médici usava o

AI-5 como o FHC usa hoje as medidas provisórias. Na tropa estudávamos a fundo a

guerra revolucionária, irradiada de pólos comunistas - imperialista como Cuba,

ex-União Soviética, China e Albânia. Aprendíamos como combater numa guerra

subterrânea e suja, onde nunca valeram os tratados e convenções internacionais.

Lembro bem que um de nossos instrutores falava do PCB como uma organização

paramilitar, organizada para enfrentar as forças armadas. Dentre outros líderes do

PCB, Salomão Malina era citado como igual. Estranho falar do adversário como igual.

Mas, o passado desse brasileiro é digno de reverência e respeito.

Malina lançou recentemente, seu livro “O Último Secretário” onde confirma que o

“partidão” chegou a planejar um golpe em 1964. No mesmo livro conta ainda que

havia uma organização militar clandestina dentro do PCB desde a Revolução de 30.

Salomão Malina recebeu a Cruz de Combate de Primeira Classe, a maior

condecoração de guerra do Exército Brasileiro devido à sua participação na 2ª Guerra

Mundial. Isto é, foi um herói na luta contra o nazi-fascismo.

Quantos homens conhecemos que foram fiéis toda vida a sua própria consciência?

Poucos! Salomão Malina foi um deles. Pena não tê-lo conhecido pessoalmente. Mas

fica o exemplo, um bom exemplo.

Ao brasileiro Salomão Malina, pelo seu passado, suas lutas (não interessando que

lado esteve) e sua guerra particular contra o câncer que o maltratou nos últimos vinte

anos, presto minhas homenagens. Tenente Malina a “cobra continua a fumar”.

(*) Militar do Exército na reserva, nacionalista e anticomunista até a raiz do cabelo

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Massageando meu próprio ego Ruy Ferreira(*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 26 de abril de 2006

Em 1982, lembro bem do momento em que dei a notícia de minha transferência para

Rondonópolis à família. No ato a esposa perguntou: - Tem escola e hospital?

Respondi: - Tem. E ela retrucou: - Então vamos! Eita baixinha decidida. Em Fevereiro

daquele ano, aqui cheguei com esposa e três filhos. Um carioca perdido no Mato

Grosso.

Como não sou chegado a botequim, fiquei deslocado entre os colegas da época. Pois,

parte deles saía do quartel, paravam no boliche da Silda e enchiam a cara de

cachaça. Outros se trancavam em casa para ver novela da Globo, aumentando o

índice de imbecis e alienados que tanto nos orgulham como brasileiros. Eu preferia

brincar com a criançada da vila de sargentos. Pique-bandeira, esconde-esconde,

passa-anel e muitos outros folguedos infantis.

No mesmo ano, houve vestibular para a Licenciatura em Ciências na UFMT. Prestei o

concurso e comecei a estudar no Centro Pedagógico de Rondonópolis. Na mesma

época, minha esposa estudava o Normal no Sagrado. Preenchemos nosso tempo

disponível estudando.

Foram ótimos anos de estudos, realizações culturais e políticas. As brigas políticas

foram maravilhosas. Uma marcou bem minha memória: alguns acadêmicos de direita

queriam impedir o anti-candidato a reitor, Prof. Scalope, de discursar no corredor do

campus. Núbia, uma colega de Pedagogia, disse-me então: Ruy, tome uma

providência! Eu, fardado e armado (estava de serviço e fui ao campus fazer prova)

ajudei o Scalope a subir no banco de concreto e gritei bem alto – Deixem o homem

falar. O discurso do homem foi só paulada nos militares. Eita vida incoerente!

Terminado o discurso, junto à caminhonete do professor-candidato, ele me disse:

“Não vencerei as eleições para reitor, mas preciso denunciar a ditadura militar”.

Apertei a mão dele e retruquei: - exclua o sargento Ruy desse time, sou democrata e

militar. Ele sorriu e ficou a saudade daquele tempo e do Scalope.

Na mesma época, o Ubaldo, Dr. Moraes e outros aguerridos carnavalescos, criaram a

Furibanda. Desfilamos na avenida, saindo do antigo Posto Guarujá com uma

caminhonete lotada de chope e caipirinha. Muita animação e pouca harmonia no

samba. Mas sambamos prá burro!

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Linha do Tempo Página 101

No esporte, as peladas no Clube da Peteca, na AABB e no campus da UFMT foram

sensacionais. Com o Oscar Sangali dando porrada até na sombra e o Natal

reclamando feito pobre em fila do INSS. O time de vôlei era bom e disputou algumas

competições regionais e estaduais. O Peixinho, Argemiro, Braite, foram às estrelas da

época.

Quando me formei em 1985, deixei um monte de amigos para trás e fui transferido

para Brasília. Cidade sem esquinas. Terra do “sabe com quem está falando”. Que

saudades de Rondonópolis e sua gente.

Quando em 1994, vi o edital de concurso para professor da UFMT em Rondonópolis

fiquei excitado e convenci a família a me deixar fazer o concurso, pois isso seria bom

para meu currículo. Na mesma ocasião havia sido aprovado nos concursos para

Auditor da Receita Federal, Analista de Sistemas do STJ e da UnB. Preferi a UFMT em

Rondonópolis. Fiz às trouxas e retornei cheio de gás.

Para evitar qualquer dispersão de meus objetivos, não transferi meu título de eleitor,

permanecendo com domicílio em Brasília. Pois não sendo eleitor de Rondonópolis,

não posso me candidatar a porra nenhuma! Decidi viver a política, sem militar em

nenhum partido político, tendo como maior interesse a política educacional, de

qualquer nível.

Desde 1995 tenho vivido na Universidade muitos bons momentos e raros ruins. Os

maus momentos, acho eu, foram provocados pelo patrulhamento ideológico de uns

merdas que se julgam grandes democratas, mas não passam de caudilhos de

esquerda. Também tenho culpa no cartório. Afinal, com minha língua grande nunca

deixei esses caras em paz. Um exemplo disso é o atual reitor que ao assumir em 2000

determinou por ofício a suspensão do projeto UFMT Virtual, do qual eu era o líder. A

desculpa do cara foi: - temos que pensar melhor esse projeto. Passados dois anos de

inércia, o cara vem a Rondonópolis dizer que ao visitar uma universidade canadense

foi aconselhado a investir na conectividade virtual da comunidade acadêmica. Porra!

Isso eu estava fazendo 36 meses antes!! Tempo não se recupera e nós, da UFMT,

perdemos o bonde da História nessa área do conhecimento. Sem perdão!

Hoje, sinto um vazio enorme ao ver a apatia de todos diante da roubalheira do

corrupto-mor que se instalou em Brasília, o tal Ali Babaca e seus 40 ladrões. E eu

aqui, nessa ilha colonial de Paraty, olhando o mar e tramando como praticar a

desobediência civil, única arma que ainda disponho para lutar contra essa esquerda

apodrecida pelo tempo e pela corrupção.

Um abraço.

(*) ex-um monte de coisas, temporariamente em Paraty-RJ/Ubatuba-SP

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Despedida Ruy Ferreira(*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 05 de dezembro de 2007

Em 2003, quando me afastei da UFMT para estudar em Campinas, segui a frente do

caminhão da mudança, com a esposa e as netas no carro. Na estrada, no meio do

nada de Goiás, um automóvel veloz me ultrapassa, buzinando e piscando os faróis.

Uma mulher e uma menina seguiam para São Carlos, no interior paulista, e

reconhecendo meu carro, saudavam o feliz encontro.

Estacionamos os carros e nos confraternizamos. Feliz coincidência!

Há meses não nos encontrávamos. Logo nós, tão amigos na dor e na saúde, na

alegria e na tristeza. Ferrenhos oponentes no campo da ideias políticas e tão

fraternos na vida real. Nem minha mulher, nem seu marido têm ciúmes de nossa

amizade. Eles sabem e compreendem o quanto prezamos a amizade.

As vezes em gestos simples, como abrir a porta do carro para ela desembarcar, eram

motivos para um largo e lindo sorriso. Outras vezes, as chispas de reprovação que

de seus olhos saíam quando eu opinava sobre certo aspecto político onde éramos

divergentes. Ou ainda, naquele olhar de aprovação quando afagávamos seus filhos.

Pequenos detalhes, mas que mostravam o que havia dentro daquela

mulher-mãe-leoa.

Quando o marido preparava um macarrão com tomate seco e nos convidava para o

repasto íntimo, sabíamos que a noite seria de afeto, carinho, bom papo e muito

debate político. O vinho fazia a língua se soltar e eu enfrentava o casal entre talheres

e queijo parmesão, defendendo Adam Smith e o macarrão delicioso. Minha mulher,

lambia as crias deles como se fossem nossos netos, afinal nosso filho caçula estava

com 24 anos, e o casal amigo nos acolhia como irmãos-avós.

Na campanha do marido dela, vi a labuta ao telefone e na rua daquela amada amiga

tentando convencer eleitores. Ele perdeu, mas nós os apoiamos incondicionalmente,

por mais incrível que isso possa parecer.

Momento de dor e sofrimento também nos aproximaram. E olhe que a leoa teve uma

dor tão forte e tão intensa que seu coração explodiu em mil pedaços. Caco a caco ela

juntou e superou externamente a injustiça da vida. Quando engravidou pela terceira

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Linha do Tempo Página 103

vez, a dor deu lugar a beleza completa da mulher-mãe. O casal amigo emanava

felicidade, após uma longa noite de dor. É a vida seguindo seu curso.

No trabalho sempre estivemos juntos, pois defendemos a mesma coisa: um Brasil

educado. Caminhando juntos ou paralelamente, sempre acreditamos que sem

educar a pessoa humana, nada vai acontecer, nada vai mudar.

Ontem, ao ler os jornais, fui surpreendido com a morte de minha amiga. O que dizer?

Um pedaço foi arrancado de minha alma e, com certeza, daquela família querida.

Junto a ela, dois outros perderam a vida. Um novo professor e um outro amigo

querido. Meu soldado no GAC, meu laboratorista no campus e meu amigo para

qualquer parada. Tiraram ele de mim. Quem eu vou por no lugar em meu coração?

Esse cara me chamava pelo nome quando estava bem e de sargento quando estava

levando um esporro. Dividimos o marmitex muitas vezes na cantina, esticamos fio

telefônico juntos em manobras militares e sacaneamos muita gente com gozações

simples, pondo leite condensado nos capacetes dos recrutas. Tenho uma foto onde

esse amigo está amarrado numa maca e sendo descido num rapel, onde eu conduzo

a descida agarrando a corda. Isso é confiança mútua. Isso me foi tirado.

Como já perdi demais nessa vida, não consigo suportar a perda com serenidade.

Ando mal do coração, pois as lágrimas surgem diante desse fato. Sou homem e

aprendi que homem não chora. Mas, elas teimam e brotam aos montes.

Como estou longe de Rondonópolis a muitos anos, nada posso fazer aí. Não poderei

velar os amigos, não poderei consolar as famílias, não poderei disfarçar meu choro.

Nem mesmo poderei aplicar a lei de Talião nos responsáveis.

Só me restou despedir da Sorahia e do Luis Mauro.

Adeus amigos-irmãos.

(*) Professor da UFMT

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Linha do Tempo Página 104

O fim do sonho democrático no Brasil Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (2007)

Sem dúvida, o ano de 2006 é o marco que separa o sonho de uma nação democrática

e a triste e cruel realidade político-administrativa do país. Os políticos conseguiram

matar a esperança do brasileiro. Demorou, mas conseguiram.

Descrédito nas instituições, nas ditas “autoridades”, nas leis e na ordem. Olhar em

volta comprova o que escrevo. Chegamos ao fundo do poço da vergonha, nada mais

é impossível. Golpe não haverá, nem da esquerda (se é que ela existe no Brasil), nem

da direita tucano-petista. Quanto aos militares, nem eles querem mais essa aventura.

Só estaremos vivendo num país que foi capaz de matar a esperança de seu povo.

Desobediência civil é coisa corriqueira em nosso dia-a-dia, logo estaremos rasgando

sentenças judiciais e esfregando no nariz do magistrado. Isso é insuportável para

gente como eu: legalista! Mas, vou aprendendo a conviver com a indignação e

transformando-a em “coisa normal”. Já viu governo pagar dívida judicial? Qualquer

nível? É prefeitura, estado e União protelando e descumprindo ordem de juiz, numa

boa. Por quê eu devo cumprir? Mau exemplo vem de cima.

No país do jeitinho, da lei do levar vantagem em tudo, o pelego-presidente faz tudo

para desacreditar o que é nacional: avião da Embraer nem pensar; filme só pirata;

uísque no lugar da boa cachaça; aluguel de deputados; esmola-família para criar o

maior curral eleitoral da República; gás boliviano no lugar do explorado na Bacia de

Santos. E por aí vai.

Eu não me surpreendo com esse cara, o Lulla, pois foi cria do General Golbery, algo

como o Cabo Anselmo da Década de 60. Oportunista, sempre esteve longe do

trabalho e junto das mamatas. Ideologia? Nenhuma, nem sabe o que é isso. Desde

que se dê bem qualquer coisa vale. Aos poucos a máscara cai e o rosto é de um

pelego, puxa-saco de patrão. Não é direitista, não é liberal, não é democrata, não é

socialista, não é comunista. Mas, é amigo do Bush e do Fidel. O pior é que gente

assim se cerca de coisas piores que ele. E aí, tome de mensalão, sebraes, correios,

gamecorp, ongs do 13, sanguessugas e coisa e tal.

O congresso é um antro de facínoras, iguais os que mataram o Rubem Paiva. Matam

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seu irmão sem atendimento médico na fila do hospital, seu pai sem remédios e o

futuro de seus filhos na “escola”. Agora matam também em aviões de carreira, com

risco de matar até parentes e apaniguados, numa estranha roleta-russa. Não

discutem o que interessa para o Brasil e seu povo, mas gastam o tempo e muito

dinheiro em armações lucrativas e debates sobre porra-nenhuma, sessões

comemorativas sobre nulidades, muita desonra e falta de decoro.

Algumas instituições de estado arranharam-se nos espinhos da desonra. Assim vimos

a Polícia Federal ser usada e abusada como polícia de governo, coisa de fascista. Até

o Ministério Público deu sinais de ter lado na fiscalização da lei. A OAB enfraqueceu

a tal ponto que parece não honrar a tradição de Sobral Pinto e ser a primeira em

defesa do estado de direito, democrático de verdade. O Banco do Brasil passou a ser

o operador de falcatruas financeiras e a Caixa Econômica Federal quebrou sigilo

bancário, por meio de seu próprio presidente. Quem ganha com isso? O que ganha?

E 2007? Vai ser melhor? As coisas vão mudar? Claro que não! Os atores desse circo

não mudaram. Logo, nada vai mudar. Ou melhor, a democracia vai acabar.

Feliz Ano Novo.

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Seis anos Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 25 de agosto de 2009

Caro amigo.

Pois é, seis anos passaram e eu estava longe de Rondonópolis. O motivo é simples:

fui estudar. Mas, ao retornar em julho passado pude ver obras magníficas que foram

construídas em nossa querida cidade. Passei por bairros que não existiam a bem

pouco tempo atrás. Visitei amigos que moravam em ruas poeirentas e hoje possuem

asfalto na porta. Quantas novas empresas funcionam aqui. Prédios altos e muito

bonitos foram erguidos em área nobre e muita gente subiu na vida ao morar no 13º

andar. Outros conseguiram encastelar-se nos condomínios novos, bonitos e isolados

do mundo real. Até a UFMT que sempre andou em passos de tartaruga construiu

novos prédios. Tudo isso eu vi em uma semana de longos passeios diários.

Vi um incêndio destruir duas lojas antigas e vi os bombeiros com equipamentos

adequados combater o fogo. Vi policiais garantindo o patrimônio das lojas em

chamas. Assisti a benção aos caminhões na festa de São Cristovão. Soube até que

o prefeito é um ex-aluno nosso. Que bom ver e participar do crescimento material da

cidade, assistir sua dor material e participar do clamor religioso-cultural próprio dos

profissionais da estrada.

Agora é hora de vivenciar o tal dia-a-dia da cidade. Achar uma vaga para estacionar

no centro. Conseguir marcar uma consulta no médico do posto e ser bem atendido.

Orgulhar-me, quem sabe, do excelente desempenho da rede pública escolar aqui

instalada. Não encontrar desempregados vagueando pelas ruas em busca de

emprego. Descobrir que não há mais tráfico de drogas por aqui. Que as pessoas são

mais importantes que as obras materiais, isto é, governos e empresários priorizam o

cidadão. Espero encontrar gente falando e compreendendo a nossa Língua

Portuguesa e nada de “ajuda nós”, “vou banhar” ou “meto-lhe os pé”. Motoristas e

motociclistas parando em faixa de pedestre para dar preferência à pessoa e não ao

suposto tempo perdido ao ser minimamente educado.

Claro que vou encontrar homem abrindo porta de carro para sua mulher entrar ou

sair. Adolescente auxiliando um idoso a atravessar a rua. Gente dizendo e desejando

bom-dia ao vizinho. Outros até sorrindo ao ser atendido numa loja. Nada de gente

arrogante, deseducada ou grosseira. Seis anos é tempo suficiente para mudar uma

cidade. Eu vi que Rondonópolis mudou, e muito. Também é suficiente para as

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pessoas tomarem consciência que estão no mundo com as outras. Oxalá uma coisa

tenha seguido outra!

Fui testado ao máximo nesses seis anos longe, velho amigo. Seja na vida familiar,

como na profissional ou social. Em lugar de enterro de amigos de meu pai comecei a

enterrar meus próprios amigos. Perdi a fé nos homens e mulheres que professam a

magistratura como profissão. Meu estômago fica embrulhado quando ouço um

especialista em porra nenhuma dar palpites em qualquer assunto. E pior, ser ouvido!

Descobri que instituições chamadas de sérias possuem gente desonesta como

naquelas em que não mais acreditamos. Vivi muitas experiências dolorosas, mas

superei essa fase.

Aprendi a respeitar a sabedoria, muito mais que a instrução pura e simples. A ouvir

mais e falar menos. Até mesmo, que os brasileiros são iguais aos outros povos do

mundo. Nem melhor, nem pior. Que do nada pode surgir um “anjo” (logo eu que não

acredito em anjos) e colocá-lo de pé novamente na vida. Foram seis longos anos,

mas valeram à pena.

Prezado amigo, amadureci. Os cabelos grisalhos mostram isso pelo lado biológico,

mas por dentro, amadureci valores morais, ideias e preconceitos. Estou hoje mais

fortalecido contra a hipocrisia de gente que mora em casas onde havia o cerrado

selvagem, usa energia elétrica vinda de usinas cujas represas destruíram imensos

sistemas biológicos e come frango turbinado com hormônio feminino para crescerem

mais rápido, mas defende o meio ambiente de forma radical, irresponsável e

insensata. Consigo ver a má-fé no coração daquela gente que discursa para a platéia

e nada faz em sua própria vida para mudar o mundo.

Companheiro de jornada, você não imagina o que a saudade provoca em nosso corpo

e mente. Falta um pedaço de nós. Sabe aquela amiga nossa que morreu? Parece que

me falta um braço! Mesmo sabendo que outros estavam e estão vivos, à distância e

o isolamento provocou um abismo que parece haver em nossas vidas em comum.

Um lapso de tempo que não volta mais.

Vou por a vida em dia. Começo a trabalhar num ambiente diferente, o que não

significa coisa nova, pois permanece cheio de velhas cabeças, hábitos e costumes

iguais aos que aqui experimentei. Espero abraçá-lo em breve e matar as saudades

presenciais. Por enquanto, fico feliz em saber que você permanece firme e ainda tem

o leme do navio em suas mãos.

Abraços fraternos e saudosos.

(*) morador de Rondonópolis desde 1º de Março 1982.

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Caro Amigo Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 13 de setembro de 2009

Em nossa última correspondência falei do fato de estar acompanhando enterros de

amigos nossos. Incrível, uma semana depois o coração decidiu dar um basta na farra

tabagista que sempre protagonizei. Um ataque cardíaco em pleno domingo depois de

saborear aquele churrasquinho entre bons amigos me pegou de surpresa.

Como fumante inveterado sempre arrumei desculpas para manter o cigarro aceso. As

vezes desculpas tão sem-vergonha quanto minha própria sem-vergonhice para

continuar “pitando” um cigarrinho. Uma das preferidas é a que minha mãe morreu de

enfisema e nunca fumou na vida. Iguais a essa, sempre tive uma desculpa na ponta

da língua com a finalidade de acabar com esse papo careta.

Meus amigos, médicos em particular, sempre caíram matando nos 40 (quarenta)

cigarros por dia, numa atitude burra e irresponsável. A esposa, mais prática, exige

que cada real gasto com cigarro o mesmo valor deve ir para a caderneta de poupança

dela.

Querido amigo, a dor começou em plena aula, numa quinta-feira. Macho como eu

respira fundo e vai em frente. Aguentei firme e brinquei com os alunos dizendo que

estava tendo um infarto. Eles riram, eu recuperei o controle da aula e fomos até o

fim.

No dia seguinte, sexta-feira, a coisa piorou e a cada cigarro fumado a dor no peito

aparecia. No sábado concluí um projeto de pesquisa entre o CTI/MCT e a UFMT, por

ironia o tema a ser investigado é a gestão hospitalar na microrregião de

Rondonópolis. Deixei o texto pronto para reunir-me com os professores dos cursos

de Enfermagem e Informática na segunda-feira.

Acordei bem humorado no domingo e fui convidado pelos vizinhos do condomínio a

almoçar. Depois de comer um pedaço de carne com aquela graxa deliciosa e beber

uns copos de guaraná, fomos para casa. Como naquela hora faltava energia no bairro

(uma vergonha), eu e a esposa deitamos no piso frio.

Amigo, o peito explodiu de dor, tão insuportável que veio em seguida suores frios e

ânsia de vômito.

A esposa ao ver meu quadro desesperador, agiu como um corisco e pediu ajuda aos

vizinhos que ainda almoçavam. Foi uma revoada geral, carros enfileirados para

socorrer-me. Sob a direção de uma vizinha, a Srª. Paula, fui levado para a Materclin.

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Lá, a coisa estava tão feia que o responsável sugeriu ir para a Santa Casa de

Misericórdia de Rondonópolis.

Prezado amigo, fui a pé entre o hospital e outro, amparado por amigos, tamanha a

dor que sentia e a pressa em ser atendido.

A novela estava só começando, pois o tal Infarto Agudo do Miocárdio precisa ser

estabilizado (ou você morre) e depois ser tratado. Foram cinco dias na UTI

Cardiológica da Santa Casa de Misericórdia. Nunca tomei tanto medicamento, foram

copinhos cheios de comprimidos, injeções intravenosas, subcutâneas, soro de todo

tamanho, como se fosse aqueles coquetéis vendidos na Exposul.

Quando chegou o quinto dia após o ataque cardíaco fui levado a uma excelente

clínica, onde fiz um exame chamado ecocardiograma e vi o coração batendo feito um

bebê no útero materno. Confesso que ao vê-lo batendo bem ritmado, perdoei a dor

que o danado me causou.

Amigo, com isso pensei: vou ter alta, vou para casa, tomo uns remédios e pronto.

Que nada!!! Tem outro exame a ser feito, chamado cateterismo, onde uma vara

plástica é introduzida na veia femural, lá na virilha e é passada por essa veia até o

coração. Como não é feito em Rondonópolis fui removido para hospital em Cuiabá e

lá com a micro-câmera filmaram as artérias cheias de gorduras das picanhas e dos

torresmos que tanto gostamos.

No meu caso o cigarro fez um estrago enorme em duas artérias coronarianas e se

não der para abrir o peito e colocar outras veias no lugar delas, você vai ter que ir ao

meu “enterro”.

Moral da história: quando eu era um adolescente os astros do cinema fumaram para

mostrar que eram machos e poderosos. Eu assimilei essa propaganda subliminar

assistindo muitos e muitos filmes e anúncios na TV e no cinema.

Com a chegada da TV no Brasil eu aprendi que “brasileiro leva vantagem em tudo.

Certo! Então fuma Plaza”. No carro de fórmula 1 do Piquet estava escrito “Malboro”.

O do Senna também. Até o Lula queima uma cigarrilha.

A propaganda ajudou muito na expansão do tabagismo. Agora eu estou pensando

em processar o fabricante de cigarros e ver se arrumo dinheiro para pagar essas

contas e os remédios que terei de usar daqui para frente.

Amigo do peito vamos falar disso para essa molecada que traga um cigarrinho hoje

sem saber que a dor do infarto parece um maçarico de solda queimando teu coração,

e pior, será que eles terão cobertura para pagar o estrago feito pelo cigarro, daqui a

alguns anos?

OS: Se não te escrever em 15 dias, o cigarro e minha burrice me mataram.

(*) Professor do curso de Informática/CUR/UFMT

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Trilogia do retorno – parte final Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 30 de setembro de 2009

Caro amigo.

Você não imagina o quanto senti tua falta. Confesso meio envergonhado que a falta

da “A Tribuna” foi do mesmo tamanho. Os dias seguiram-se com pouco ou quase

nada de informação externa. Assim, desde a última carta sou a única fonte de

informações possível e de corpo presente para alimentar nossa prosa.

Estive nos últimos treze dias no Hospital Geral Universitário, em Cuiabá. Nada de

novo na chegada, pois saí da UTI da Santa Casa de Misericórdia de Rondonópolis e

entrei direto na UTI do HGU. Claro que a cortesia, atenção, simpatia com que fui

tratado aqui não chegou lá na mesma hora. O pessoal da UTI daqui é show de bola!

Ainda escrevo um livro sobre eles.

Entrei no ambiente e vi mais leitos, mais gente ferrada como eu e um monte de

profissionais sonolentos. Eram onze e meia da noite e eu dando o ar da graça,

pedindo água e papagaio (equipamento que serve para fazer xixi). Ligaram os doze

eletrodos no meu peito sem depilar os cabelos, acho que isso é vingança por você ter

fumado, pois na hora de tirar sai eletrodo e teu peito fica depilado em formato de

rodelas de tomate. Você não imagina quantas vezes isso aconteceu.

Os doze dias passados na UTI ficam por conta de fumar “um raro prazer”, nos últimos

trinta anos. Dali saia para o setor de Hemodinâmica. Amigão, Rondonópolis precisa

de um trem desses! Já passou muito da hora de levar gente daqui para Cuiabá para

fazer exames de cateterismo e intervenções cardíacas. Nós merecemos uma unidade

de Hemodinâmica aqui nessa maravilhosa e rica cidade.

Foram três passagens pela Hemodinâmica, na primeira o negócio consistia em

examinar o estrago feito pelo cigarro no coração, veias e artérias. Os médicos

explicaram que enfiariam um cateter (tipo um fio de luz bitola 3) em minha artéria

femural ou femoral, pela virilha e dali fariam um passeio até o coração. Logo na

virilha! Somos heteros desde pequeninos e virilha para nós é local sagrado. Mas, que

fazer? Aceitei a idéia e deixei o cateter passear pelo abdômen e peito. Tudo filmado

em DVD, um luxo!

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Linha do Tempo Página 111

Uma hora depois me devolveram para a UTI e disseram que iam discutir o que viram

com os demais médicos da equipe e tomar a decisão sobre a melhor opção. Ou seja,

abrir teu peito na base da moto-serra, enfiar uns bobs de cabelo via novo cateterismo

ou deixar você morrer por conta daquele raro prazer e da lentidão burocrática.

Voltei alegre, esperançoso e comecei a ver que o pessoal especializado naquela UTI

era gente tão boa quanto ao de Rondonópolis. Meia noite não é hora de chegar à

casa de ninguém e eu cheguei por aí. Fui anotando nomes, observando atitudes,

gestos e cuidados que cada um daqueles profissionais, para pedir a coisa certa à

pessoa certa.

Os médicos logo chegaram à conclusão que o melhor seria realizar três

procedimentos num só: Angioplastia para desobstruir as artérias coronárias

comprometidas por placas de gorduras e um monte de micro-coágulo. Colocação de

Stent coronário medicamentoso que consiste na fixação de uma tela de aço

inoxidável na parede interna do vaso desobstruído durante a angioplastia, impedindo

novo estrangulamento. Uma angioplastia de saída por meio de um monte de balões

infláveis, normalizando a livre circulação do sangue nas artérias. Amigo,

Rondonópolis precisa de um negócio assim.

A burocracia quase me matou numa espera de seis dias. Recebido o sinal verde, parti

para outra visita ao setor de Hemodinâmica. Agora para tirar o mal causado pelos 30

anos de fumante burro que fui.

O procedimento começou sem problemas, até que abriram o primeiro stent (bob de

cabelo) na coronária em pior estado. A lama formada pela gordura e os coágulos

inundaram o átrio do coração e, de repente, do nada, surgiu um médico socando meu

peito e me mandando tossir. Como você vê tudo, pois não está sedado, olhei para

aquele monitor de vídeo que fica passando os batimentos do coração. Virou quase

uma linha reta!

Levando socos cada vez mais fortes e ritmados no peito, tossindo como se fosse um

pandeiro seguindo a bateria, a tal linha subia às vezes e depois teimava em se

transformar numa reta que te liga diretamente a Deus. Como são três médicos

fazendo o procedimento, o segundo enfiou um marca-passo no furo da virilha e pôs

o coração para tocar em ritmo de valsa. Aí a pancadaria cessou e eu pude ver o sinal

de cada batimento do coração aparecer no monitor.

Amigo, não vi túnel, nem voz divina ou coisa semelhante. Assisti o “piti” do coração

ao vivo e em cores. Só tive tempo de xingar um daqueles palavrões usados na hora

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Linha do Tempo Página 112

que a vaca foi pro brejo. Hoje ando preocupado em ter saudades dos socos cardíacos

e ir a consultório para pedir: Doutor bate de novo. Sabe como é... Um tapinha não

dói... Mas, nós somos heteros convictos, pega mal não é?

Mais uns dias de UTI e refiz o procedimento sem nenhum problema. Estou com três

bobs de cabelo (stent) de aço inoxidável nas artérias coronarianas. Vou tomar

remédio até morrer de novo, proibido de comer tudo que tanto gostamos: feijoada,

galinhada, mocotó, rabada, chocolate e aperitivos como o torresmo frito e o salame.

Beber só água, dois litros no mínimo por dia. Cerveja e vinho estão longe.

Amigão, perdi a chance de saborear tudo que tanto gostamos por conta de um só

“raro prazer”: o cigarro. Não valeu a pena! Nem futebol posso jogar mais, embora

meus colegas de time fiquem feliz por isso. Sobrevivi os quinze dias. Vamos adiar

nosso encontro funerário para outra época. Agora, vou olhar mais a beleza do mundo

e valorizar muito mais a prosa com os amigos.

Chega dessa conversa de doença. Burro é quem paga o maço de cigarro para ter

tanto sofrimento. Eu parei de fumar depois de tanta dor e burrice. Um forte abraço de

teu amigo equipado com coronárias de aço inox.

(*) morador de Rondonópolis

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Burrices e mistérios contemporâneos Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 15 de outubro de 2009

Pessoas são chamadas de burras quando praticam atos desastrosos para si ou para

as instituições que representam. Alguns chamam de burro o pensamento que não vai

dar certo se for posto em ação. Uma maldade com o muar.

Em minha reclusão forçada em casa sigo lendo os “jornalões” brasileiros e as revistas

semanais conhecidas. Analisando as notícias venho colecionando uma lista de gente

burra que tenta a qualquer custo exercer funções para as quais não está preparada.

Olhando criticamente para a retenção da devolução do imposto de renda retido na

fonte pela receita federal, fico indignado com isso e ao mesmo tempo constatando o

quanto é burro quem deu tal ordem. Eu trabalho o ano inteiro e doei 4 meses desse

esforço pessoal ao governo, via imposto de renda, no ano seguinte descobri em

minha declaração de renda que paguei mais imposto que devia. Ora, o lógico, o óbvio

é que a receita federal devolva imediatamente o meu dinheiro, ou no pior caso até o

final do ano em que entreguei a declaração. Caso a burocracia seja ineficaz para

devolver o que é meu, então deve pagar juros e correção monetária, pelos meses

que reteve o meu dinheiro indevidamente.

Mas, se o atraso na devolução for uma decisão política aí é assinar o atestado de

burrice. O governo Lula toma uma decisão burra ao empurrar a devolução do

imposto de renda para o ano seguinte, um ano de eleições. Ele economiza pouco e

deixa uma multidão de brasileiros p. da vida. Ninguém consegue explicar o porquê da

retenção da devolução do imposto. Se a arrecadação caiu não foi por culpa do

contribuinte. Logo, fazer o cidadão pagar a conta é pura sacanagem do governo que

empresta dinheiro para o FMI. Ou seja, com "mantega" enfio qualquer coisa goela

abaixo do contribuinte.

Outra burrice é taxar de impostos a caderneta de poupança com depósitos acima de

50 mil Reais. Ora, um carro médio hoje custa mais do que isso, se você vendeu um

carro desses e pôs o dinheiro na poupança, vou desenhar para todos entenderem,

primeiro: você está garantindo recursos para programas governamentais mantidos

pelos poupadores brasileiros; segundo: a poupança no mundo todo é incentivada,

como forma de aumentar a riqueza do país; terceiro: ao poupar você realiza uma

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Linha do Tempo Página 114

ação econômica inteligente, pois quem poupa tem dinheiro para compras

programadas em melhores condições ou para eventualidades como uma doença, um

acidente etc. Poupar é o caminho certo para a riqueza do indivíduo e da nação, diria

Adam Smith.

A caderneta de poupança dos ricos não tem 50 mil Reais de saldo! Só na cabeça de

um “burro” tal limite é sinal de riqueza. A taxação neste limite é um estupro na classe

média baixa. Exatamente aquele que só tem esse dinheiro na poupança porque

vendeu um bem qualquer ou recebeu uma grana extra (herança, loteria etc.). Um

cara como eu da classe média baixa para juntar 3 mil Reais por ano na poupança tem

que tirar um pouquinho todo mês do salário e depois de um ano talvez juntar essa

grana. Mas, se eu vender minha única casa própria talvez consiga depositar uns 50

mil Reais na poupança. Se taxarem esse meu patrimônio eu volto para o consumo e

detono essa grana em quinquilharias chinesas. Perde o Brasil, o governo e eu. Logo,

taxar a poupança é burrice das grandes.

Os ministros da fazenda do governo petista tiveram oito anos para enfiar a mão no

maior vespeiro de suas vidas: o sistema tributário nacional. Não moveram uma palha

para mudar a desigualdade com que trabalho e capital são tratados, por exemplo,

pelo imposto de renda. São dois pesos e duas medidas, o assalariado e a empresa

pagam aluguel, mas só a empresa desconta esse aluguel no imposto a pagar. Eu

paguei outros impostos (IPI, ICMS, IPTU etc.) no ano passado, as empresas também,

por que só elas podem deduzir aqueles impostos este ano e eu não? O pior é que eu

paguei o IPI e ICMS já embutido nos preços das coisas, mas quem deduz essa grana

é a empresa que vendeu e não pagou.

Uma empresa dá alimentação para seus empregados e eu dou alimentação para

minha família. Por que só as empresas podem deduzir esse gasto? Antonio Palocci e

Guido Mantega nada fizeram, em oito anos, para mudar essa desigualdade entre

capital e trabalho. Para quem se dizia socialista ou algo do gênero, ter o poder nas

mãos tanto tempo e não mexer na relação capital versus trabalho, equilibrando a

tributação em favor do trabalhador é burrice.

Ocorre que a crise de burrice que assola o país afeta também movimentos sociais.

Ora, um movimento social deixa de existir quando perde sua credibilidade na

sociedade. Ao se afastar dos sonhos que lhe deram origem, ou seja, ultrapassar os

limites de seus objetivos ou não atingi-los, um movimento social adoece e morre.

Essa é uma forma coletiva de burrice.

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Linha do Tempo Página 115

Como a UNE – União Nacional de Estudantes que hoje está moribunda, distante

demais dos estudantes brasileiros e turbinada a milhões de Reais do governo federal.

Ou, como o MST – Movimento dos Sem-Terra tão afastado de sua causa. Hoje, não

mais aglutina os cidadãos que lutam pela reforma agrária. Perdeu totalmente sua

credibilidade. Qual a razão dessa perda? Para quem começou lutando contra

latifundiários, invadir e furtar a casa de uma faxineira, levando até seus presentes de

casamento ainda dentro das caixas, chega a ser uma afronta às suas origens e

sonhos.

Confesso que usei o MST como exemplo de burrice em movimento social, mas

pensando melhor a UNE é um movimento social estudantil legítimo, apesar de

vendida ao governo federal por muita grana e inepta na representação dos interesses

estudantis. Já o MST não é! Explico, a UNE tem sede, estatuto registrado em cartório,

direção eleita seja lá como for. O MST legalmente é igual ao CV - Comando Vermelho

nas favelas cariocas ou o PCC – Primeiro Comando da Capital em São Paulo, uma

organização paramilitar clandestina, sem personalidade jurídica e por isso, sem

direção eleita, sem representatividade.

A lógica pode ser aplicada nesse caso? Pode. Se o dito MST não tem existência legal

então: suas notas ou comunicados não têm valor algum; não pode ter membros

formalmente inscritos, e pior, nem mesmo pode distinguir entre seus membros os

infiltrados; por não ter estatutos registrados, não se pode afirmar qual é seu objetivo

e como pretende atingi-lo.

Logo, quando quebra o patrimônio público o MST é igual ao PCC, composto de

ectoplasmas anônimos. Quando destroem 7 mil pés de laranja são fantasmas como

os integrantes do CV. Doar dinheiro para organização que não existe é burrice. Mas,

o MST tem dinheiro para manter suas ações. Então de onde vem essa grana?

Mistério...

(*) Morador de Rondonópolis

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Linha do Tempo Página 116

Você sabia... Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 15 de dezembro de 2009

Dizem por aí que existe universidade pública e gratuita. Mentira! Pode até ser

pública, mas de graça não é mesmo. Nós, capitalistas temos a mania de dourar a

pílula para quem será obrigado a tomá-la. Quanto custa a UFMT, por exemplo, para

cada cidadão brasileiro? Ou então, quanto custa para cada cidadão matogrossense a

UNEMAT?

Se você não sabe então fique sabendo que o governo (federal, estadual e municipal)

enfia a mão no teu bolso para bancar essas universidades. Faz a mesma coisa para

ter um posto de saúde no teu bairro, ou a coleta de lixo na tua rua. Nada é de graça!

Não existe almoço grátis no capitalismo. Ainda bem!

Bom, o foco desse papo não é o teu bolso. Pois o governo enfia a mão no teu bolso,

seja você pobre ou rico, branco ou preto, azul ou encarnado e tira 36%, sem lhe dar

chance de chiar. Isso mesmo, a cada 100 paus que você sua para ganhar o governo

fica com 36. Sobre isso nem quero falar.

Ocorre que cada estudante de universidade pública é caro para burro. Por exemplo,

o custo médio do estudante brasileiro em universidade federal é de R$ 17.100,00 por

ano, um dos mais altos do mundo. Se comparado ao aluno do Ensino Fundamental da

rede pública do Rio de Janeiro que custa R$ 392,40 por ano, a disparidade é

estupidamente absurda, ou seja: para cada um aluno do superior eu posso bancar 43

no fundamental, mais que uma turma inteira que no Rio é de 35 alunos em média.

Entretanto esse não é o foco que desejo dar ao texto. Quero falar de um roubo, de

um crime de lesa-pátria praticado no Brasil sem o menor constrangimento e

nenhuma punição: - o abandono de curso em universidade pública!

Um estudante universitário que abandona seu curso, digamos no terceiro ano,

queima R$ 34.200,00 de todos nós. Isso mesmo joga no lixo quase 35 mil Reais, sem

retorno algum para os pagantes (eu e você). Se você acha pouco, garanto que não é!

Se essa grana fosse usada para salvar três vidas humanas dependentes de uma

angioplastia no SUS, cujo custo médio por procedimento é de R$ 11.061,63, sobraria

mais de mil Reais para educar três crianças brasileiras num ano. É mole ou quer mais!

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O pior é que o estudante acredita ter o direito de abandonar o curso sem

transformar-se num corrupto. Ou quem se apropria do dinheiro público não é

corrupto? É sim, uma forma insidiosa de corrupção, sem nenhuma punição ou

mesmo ressarcimento aos cofres públicos daquilo que foi gasto com o desistente.

É um absurdo, gastar dinheiro assim! Falta dinheiro para todas as políticas públicas

brasileiras e permite-se torrar essa grana per capita sem o menor constrangimento,

na maior cara de pau. Falta lei para regulamentar esse assunto? Falta! Nossos

deputados nunca têm tempo para pensar leis que façam o Brasil mudar para melhor.

Os caras preferem pensar em obras onde a comissão é enorme. Enquanto isso o

governo vai pondo na fogueira uma montanha de dinheiro, queimando e reclamando

que continua faltando.

Finalizando é preciso pensar também que o infeliz que abandona o curso superior

escamoteou outro brasileiro que perdeu a oportunidade de estudar na universidade

pública. Sou a favor de incluir na dívida ativa o brasileiro que abandona seus estudos

superiores. Quer abandonar, pague primeiro o que todos financiamos para você. E

quem termina o curso superior numa instituição pública, deve ou não ressarcir o povo

brasileiro que o financiou?

(*) Morador de Rondonópolis

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Rui Barbosa era um profeta Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 21 de fevereiro de 2010

No tempo que se amarrava cachorro com lingüiça, Rui Barbosa, um baiano baixinho,

feio pacas e inteligente como poucos no mundo, andava indignado com as safadezas

dos políticos de sua época. Orador-demolidor, seus discursos deixavam os demais no

chinelo. Tentou ser presidente do Brasil, mas perdeu para a política café-com-leite,

aquela que só dava paulista ou mineiro no poder.

Como senador foi brilhante, como embaixador foi hábil, como jurisconsulto foi

sublime, nem tanto como ministro, Entretanto foi profético ao afirmar que “De tanto

ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a

injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem

chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.” Rui

viu em 1914 o que está acontecendo hoje!

Uma mulher rouba um pote de manteiga e fica um ano na penitenciária, enquanto

isso a direção executiva de um partido político rouba 55 milhões de Reais da União e

ninguém entra em cana, nem algemas são postas nos safados. Claro que se o ladrão

é do partido de oposição o Ministério Público pede cadeia para o safado e a Polícia

Federal cria um espetáculo midiático. É o nazismo de volta! Cadeia para todos.

Um ministro viola direito individual de um cidadão brasileiro e não sai do ministério

algemado! O presidente da Caixa Econômica executa o crime e não vai para a

penitenciária da Papuda. Isso me enoja! Alugam-se votos de deputados, como se

fossem DVDs numa locadora, para aprovarem qualquer coisa que o presidente envie

ao Congresso. Assessores presidenciais cometem crimes contra o sistema financeiro,

lavagem de dinheiro, difamação, calúnia e outros bichos e são chamados de meninos

que cometeram erros como as crianças erram. Não! São bandidos iguais aos ladrões

de carga que matam caminhoneiros, só que roubam de todos nós, inclusive a nossa

esperança num Brasil melhor. Se não fosse trágico, seria cômico e rir-se-ia da honra.

Rui profetizou tudo isso no início do século passado.

Na Educação, Rui Barbosa via a solução de todos os problemas brasileiros, já em

1883. Era um profeta do Brasil atual. Disse ele: “Uma democracia só se faz com

cidadãos, não se fazem cidadãos senão com homens, não se fazem homens senão

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pela educação”. Afinal, só o homem educado escolhe bem seus representantes

políticos e cobra dos agentes públicos o trabalho que tem a obrigação de prestar ao

povo. E foi mais além dizendo: “nosso ver, a chave misteriosa das desgraças que nos

afligem, é esta e só esta: a ignorância popular, mãe da servilidade e da miséria."

Parece que Rui Barbosa sabia do mau uso do bolsa-família há mais de 100 anos

passados. Essa esmola aviltante que cria currais eleitorais indecentes com a

dignidade humana.

Esse homem baixinho, de estatura moral altíssima e saber incomensurável, afirmava

que “Nenhuma instituição é mais relevante, para o momento regular do mecanismo

administrativo e político de um povo, do que a lei orçamentária. Mas em nenhuma

também há maior facilidade aos mais graves e perigosos abusos”. Caramba! Ele

previu a vinda dos atuais governantes, deputados e senadores sanguessugas com

exatidão profética.

Bem, como somos ignorantes, não somos educados e nem instruídos, vamos colocar

essas quadrilhas de políticos de novo no poder. Pois, cada povo tem os políticos que

merece. Nós merecemos os mensaleiros, sanguessugas e corruptos, pois votamos

neles.

(*) professor e morador de Rondonópolis

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Pelo poder vale tudo Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 24 de fevereiro de 2010

Um alemão chamado Paul Joseph Goebbels, considerado por muitos como o pai da

propaganda moderna, foi braço-direito de Adolf Hitler, com quem trabalhou desde

1926 até 1945, tanto no partido nazista alemão, como no governo hitlerista.

Goebbels sabia como mobilizar as massas, intoxicá-las e pô-las em ação a favor do

nazismo. É dele a máxima mercadológica: "uma mentira cem vezes dita, torna-se

verdade". Ele desprezava a modernidade, rejeitava o capitalismo e a democracia.

Uma coisa é certa, ele e Hitler suicidaram-se no mesmo lugar, ele um dia depois do

chefe. Os guardas da SS afirmaram que ele foi bonzinho, pois permitiu a sua mulher

matar os seus seis filhos pequenos, para em seguida cometerem juntos o suicídio.

Gente fina é outra coisa.

História serve para isso!

Para isso o quê? Dirá algum Mané esperto, mas burro feito uma porta. Para que eu

não precise passar pelo mesmo caminho que outro passou e se estrepou! Vou

desenhar: uma das funções da História é manter os registros sobre os fatos que

ocorreram no passado, descrevendo como se deram e às vezes até explicando por

que aconteceram daquele jeito.

Claro que para o Zé Ruela a explicação ainda não fez cair à ficha. E ele pergunta: - E

o quê eu tenho com isso? O Hitler não foi o cara que quase conquistou o mundo na

Segunda Guerra Mundial? Ele não morreu? Então para que ficar lembrando-se desses

caras e das coisas que fizeram?

Pois bem, somos assim. Nós, os brasileiros, somos solidários com a dor alheia,

doamos até umas garrafas de água mineral para os “catarinas” e uns quilos de

farinha para os nordestinos. Mas, odiamos ter que enfrentar os problemas do Brasil

e que, bem ou mal, teremos que resolvê-los. Pode demorar, mas um dia vamos ter

que pegar o touro pelo chifre. O seguinte exposto é um desses.

Hoje assisti a um programa partidário na televisão. O infeliz dizia que o povo (eu e

você) sabe que no atual governo não houve aumento da corrupção, mas sim que o

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governo está combatendo com firmeza essa meleca e aí o fedor exalado é sentido por

todos.

Ora, ora, ora. Olha aí o pau-mandado assumindo o papel de Goebbels! A corrupção

sempre existiu, mas hoje ela aparece porque somos honestos e a combatemos, aí

nossos companheiros e aliados são pegos com a mão na massa, com a boca na

botija, com o dólar na cueca. Uau. Vai distorcer a realidade assim no inferno!

Sempre houve corrupção? Sim. Os governos do mundo convivem com isso? Sim. Só

que nos países sérios o corrupto quando é flagrado entra em cana. Diferente daqui

que o canalha pego vira mártir. Exemplo disso? Olhe os petistas e aliados do

mensalão lulista. Para o Presidente foi uma armação dos inimigos que plantaram o

valérioduto entre os santos da base aliada só para derrubar os companheiros que

precisavam de grana para pagar umas contas e aí enfiaram o pé na jaca. Acho que o

ali babá dessa estória de quarenta ladrões ainda precisa ser indicado e preso.

Claro que distorcer os fatos pode funcionar para meia dúzia de idiotas, mas daí

funcionar para milhões de brasileiros é outra coisa. Quem lê jornal sabe que a

corrupção é uma constante do atual governo, e talvez, os que usam o jornal para

limpar o bumbum não tenham consciência disso. Mas a maioria de nós assiste

televisão e ouve rádio, então não dá para dizer “eu não sabia”. Os Goebbels da vida

estão proliferando em Brasília, inventando, distorcendo, desinformando,

subvertendo o fato em proveito da permanência de um grupo no poder.

Onde estava a CUT e a UNE quando foi instalada a CPI do Mensalão em 2005? Hoje

está nas ruas de Brasília pedindo a cabeça do corrupto Arruda. E por que não esteve

no Palácio do Planalto pedindo a cabeça do Lula que sabia do esquema de corrupção

engendrado na sala ao lado e cometeu o crime de responsabilidade ao não mandar

apurar nada? Quem disse isso foi o presidente do PTB, um dos partidos que

governam o Brasil a convite de Lula.

Os alemães de tanto serem sacaneados pelas oligarquias e aristocracia germânicas,

aceitaram Hitler no governo e deixaram o cara fazer um monte de besteiras que

custaram à vida e o futuro de milhões de pessoas. Como leio muito a História dos

povos, e acredito na função educativa dessa Ciência, não posso ficar calado diante

dessa orquestrada propaganda nazista que o governo federal vem fazendo. Daqui a

pouco o Francenildo, aquele caseiro de Brasília, vai ser considerado um criminoso por

permitir que o presidente da Caixa Econômica Federal, um companheiro petista,

quebrasse seu sigilo bancário. Ou ainda, que o dinheiro do mensalão foi doado por

fiéis de uma nova seita religiosa para financiar a campanha de seus santos bispos. Ou

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pior, que a Telemar doou 5 milhões de Reais para a micro-empresa do filho do Lula

por que é política da empresa doar milhões aos ex-guias de zoológico que queiram

abrir um novo negócio.

Bem, a corrupção é um mal a ser combatido hoje e sempre. Ela leva o remédio que

tua mulher precisa tomar para não morrer. Leva o futuro de teu filho. Por isso é

necessário enfiar em cana os corruptos e quem os protege, além de resgatar a grana

roubada. Em lugar de enviar mais um projeto de lei para o Congresso apreciar, o

governo Lula deveria incentivar seus aliados congressistas a votarem os 14 projetos

sobre o mesmo assunto que estão parados há muito tempo, inclusive aquele popular

(que eu assinei em São Paulo) de que ficha suja não poder ser candidato nem a

bandeirinha de pelada de várzea.

Um coisa é certa a propaganda ainda não pode apresentar certos personagens

incógnitos na vida brasileira, como: Alguém que foi entrevistado por instituto de

pesquisa? Quem sabe em 2010, ano de eleições, surja algum “goebbelsinho” e dê fim

a esse mistério. Fica esperto!

(*) Professor e morador de Rondonópolis

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Dilson, oráculo ou gênio perspicaz? Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 19 de março de 2010

Em 1989 eu era o diretor de tecnologia da informação (informática) de um tribunal

superior em Brasília. Ao meu lado trabalhava um analista de sistemas, chamado

Dílson Modesto, que entre outras qualidades tinha a inteligência privilegiada. Eu,

sempre aproveitador das boas cabeças, conversava longamente com ele em nossos

encontros sociais e principalmente, nas viagens regulares que fazíamos a Oracle do

Brasil em São Paulo onde estudávamos juntos sobre banco de dados.

Além de saber tudo de programação de computadores, Dílson adorava esportes, vida

e política. Nossos papos sempre duravam uma viagem de Brasília a São Paulo e dali

retomada no jantar, no hotel e no café da manhã. Nenhum assunto era proibido, até

fofocas de nossos ministros fazíamos como se fossemos adolescentes.

Ocorre que a insistência dele (em 1989) num tópico me incomodava e dava uma

discussão danada: Educação pública no Brasil. Além de trabalhar no tribunal,

também trabalhava na UnB, como professor da pós-graduação em Análise de

Sistemas e alguns dias pela manhã lecionavam nos cursos de Processamento de

Dados e Sistemas de Informações na UNEB, também em Brasília. Isso me dava o

respaldo para divergir dele e dizer das agruras da Educação brasileira com um monte

de variáveis impedindo o sucesso das políticas públicas nessa área.

Ocorre que a maldita lógica do Dílson resumia-se numa só frase, repetida

incessantemente em nossos debates: Meritocracia! Põe professor ganhando dois mil

dólares por mês nas escolas públicas e os problemas vão embora. Eu ficava roxo de

raiva e começava a citar os especialistas em educação que pesquisaram o fracasso

escolar e tinham mil outros problemas para justificar o insucesso. Ele desdenhava de

todos e voltava à cantilena: Meritocracia!

Claro que nunca perdemos a linha em nossos debates acalorados, pois ficávamos

sempre no campo das ideias. Depois atacávamos as pizzas paulistas e íamos dormir

felizes por resolver os problemas brasileiros numa mesa de pizzaria do elegante

bairro de Moema.

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Vinte e um anos depois, ele permanece servidor do tribunal, agora merecidamente

elevado a cargo de direção. Desisti do mercado e decidi socializar o conhecimento

que amealhei na vida tornando-me professor em tempo integral. Coisas da vida.

Ocorre que ao ler os resultados de uma pesquisa realizada por Eric Hanushek, líder

de um grupo de pesquisa em análise econômica de questões educacionais da

Universidade Stanford, nos Estados Unidos, fiquei estarrecido ao ver a tese do Dílson

ser comprovada e sintetizada numa frase de Hanushek: “Sem meritocracia, não há

como atrair as melhores cabeças de um país para a docência”.

Uau! Só se atrai gente inteligente, capacitada e motivada pagando bem. O Dílson é

um oráculo, ou o cara é um gênio stanfordiano enrustido de analista de sistemas. A

lógica dele é simples demais: 1. Salário inicial de professor na rede pública fixado em

US$ 2,000.00; 2. Concurso público nacional para essas vagas, independente se a

rede escolar é municipal, estadual ou federal; 3. Avaliação freqüente desses

professores e de seus alunos; 4. Se o desempenho de seus alunos cair, demissão

sumária do professor; 5. Se o desempenho do aluno melhorar, mais dinheiro no bolso

do professor, algo como dobrar o salário em cinco anos. Fim.

A tese é simples, inovadora e acaba com o maldito corporativismo onde o mérito

nunca é julgado. E quando ocorre uma avaliação, não serve para nada, a não ser

para encher uma gaveta qualquer.

E os demais problemas levantados pelos pesquisadores especialistas? A violência, a

fome, a falta de material escolar, a pobreza, o desinteresse do aluno pela escola, a

omissão dos pais em relação à educação dos filhos, a corrupção que rouba quase

80% dos recursos destinados à escola, como ficam?

Não sei! Mas sei que o Dílson tinha razão em fixar o mérito do professor como algo

capaz de mudar ou até mesmo revolucionar o quadro educacional brasileiro. Ou,

alguém acredita que algo vai mudar na Educação sem que o professor esteja na linha

de frente dessas mudanças?

Valeu Dílson Modesto, meu oráculo, o pessoal de Stanford comprovou tuas ideias.

Pena que você pensou nisso vinte anos antes e ninguém te deu ouvido.

(*) Professor da UFMT e morador em Rondonópolis.

Leia as pesquisas de Eric Hanushek, na Universidade de Stanford, no URL:

http://edpro.stanford.edu/hanushek/content.asp?contentId=49

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2010 – Ano de copa e de eleições Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 16 de junho de 2010

Será que vale a pena ser hexacampeão do mundo e eleger um novo presidente para

o Brasil se em 2012 o mundo vai acabar, conforme assisti no filme homônimo que

atribuía tal profecia aos Maias.

Sou cético, logo a chance de acreditar em profecia é menor que aceitar Papai Noel

como astro do Natal. Como não creio em Saci Pererê, nem em comunista democrata,

também não acredito que em 2012 a Terra vai virar um nada. Claro que eu posso até

não ver 2012 chegar, pelo simples fato que posso morrer hoje mesmo e aí 2012 já

era.

Enquanto não morro vou escrevendo aqui e esperando que alguém leia do lado de lá.

E, este ano teremos duas efemérides de primeiro nível: a copa do mundo de futebol

e as eleições brasileiras. Numa vamos tentar ser hexacampeões de futebol. Claro que

nada vai mudar na minha ou na tua vida se isso acontecer. Ou seja, tanto faz se os

onze guerreiros destemidos do Dunga conquistarem o título ou não, a minha vida

continua a mesma.

Vou torcer, beber uns guaranás e se perder não estarei nem aí. Embora, prefira o

Brasil campeão em lugar dos hermanos argentinos. Só isso!

Entretanto, o outro importante acontecimento nacional, previsto para outubro, me

interessa demais da conta. Por quê? Simples, mexe no meu bolso, na minha

cidadania, no meu futuro e se bobear, na minha vida e na do Brasil. Esse sim me

interessa de perto. Tem homo corianthianus que acha o contrário, tem homo

flamenguius que acha tudo igual, mas sou homo sapiens e teimo em pensar na terra

dos mentalmente anestesiados.

Ao ver os postulantes lançados pelos partidos políticos fiquei triste. Dois petistas e

um tucano. Ou seja, ou me ferro ou me ferram. Com mais de 30 partidos políticos

registrados no Brasil só três lançam candidatos? Tem maracutaia aí! Claro gente, o

objetivo de todo partido político é chegar ao poder, mas sem candidato isso nunca

acontecerá. Logo, os partidos que não lançam candidatos não devem existir! Pois não

são partidos políticos, mas sim gente reunida para se dar bem com a atividade

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Linha do Tempo Página 126

política.

Coalizão se faz entre os partidos no segundo turno das eleições. Aí dois candidatos

polarizam o apoio dos demais que foram tiveram suas candidaturas derrotadas. Se o

ajuntamento se der ainda no primeiro turno a coalizão frauda o princípio da

existência do sistema multipartidário. Como fraudar ideias é comum entre nós

brasileiros, não chega a espantar ninguém os partidos abrirem mão de chegarem ao

poder pelo voto direto do povo. Aí sobra os acertos dos safados da vida pública que

montam currais e os vendem a cada eleição, para quem der mais.

Pois é, a coisa começa fraudando ideias, princípios e daí desanda em mensalões e

corrupção como nunca se viu antes neste país. Melhor se tivéssemos 30 candidatos,

um de cada representação partidária e se não houvesse um que obtivesse a maioria

dos votos válidos, teríamos um segundo turno onde as coalizões aconteceriam de

forma ideológica. Mas, isso é sonhar no país do bolsa esmola, onde a maioria

esmagadora do seus eleitores usa o jornal para limpar o olho e não para correr os

olhos.

Então, vamos torcer pelo Brasil na Copa e refletir bastante sobre qual partido e

candidato vamos eleger para governar nosso país até 2014.

(*) É professor da UFMT e não é eleitor em Rondonópolis

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Mais um adeus Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 18 de junho de 2010

Você já notou que a vida teima em nos pregar peças? Pois é. O passar do tempo é

inexorável e cada dia tem uma coisa diferente para somar ao nosso fardo de

experiências. Alguns chamam isso de envelhecer. Eu não. É a vida! Os poetas

percebem isso bem cedo e taí o exemplo do saudoso Gonzaguinha quando alertava:

É um nada no mundo. É uma gota, é um tempo. Que nem dá um segundo...

Nossa vida é um nada no mundo, pois sabemos que tudo continuará depois de nossa

morte. Os amigos voltarão a suas rotinas e haverá aquele que descansará a cabeça

no travesseiro e sentirá uma pitada de saudade. É uma gota nesse oceano de vidas

que povoam a Terra. Pode até parecer que a vida não tem importância, mas tem sim.

Do nada sempre surge uma pessoa e lastima a perda da convivência, a esses

chamamos amigos.

Que nem dá um segundo, um ano ou um século, não importa. A vida é ser um eterno

aprendiz. No entanto, para existir o aprendiz é preciso que exista a professora,

porque é impossível alguém aprender sozinho. Professora como aquela que ensina

sobre a origem da vida e aproveita cada momento para mostrar o funcionamento da

Natureza.

Professora que mesmo no momento de lazer, quando todos os demais estão

bebericando uma e outras e falando mal dos outros, está na beirada do córrego,

segurando um monte de mãos pequeninas, ensinando o nome dos matinhos,

peixinhos e bichinhos que naquele micro mundo vivem. Pode parecer besteira, mas

para os pequeninos essa lição é lembrada trinta anos depois.

O dia a dia nos corredores da vida apresenta aquela professora sempre amiga, altiva,

de voz calma e pausada pronta para ensinar sobre a Biologia (Só entre nós, dizem

que é a Ciência que estuda a vida). Exige que o discípulo estude sobre a diversidade

de opiniões sobre de onde viemos nessa viagem terrestre. Até mesmo o colega

pastor protestante que apresenta a teoria evolucionista e depois faz sua autocrítica:

- Apesar de apresentar essa teoria eu creio na criação de Deus. Ela sorri e chama

outro grupo, mas não fere os sentimentos do crente, pois escalou um ateu para

apresentar a teoria criacionista. Isso é sabedoria.

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Linha do Tempo Página 128

Professora que no Pantanal, de bota e chapéu, com água até a cintura lança a rede

para coletar uns exemplares de lambaris do rabo vermelho. Os aprendizes entram na

lagoa e se divertem como crianças. Pena que já estávamos na Universidade. Por

sinal, uma professora fundadora do Campus de Rondonópolis da Universidade

Federal de Mato Grosso.

Professora que comprovou por triangulação ser educadora na escola e no lar. Hoje

convivo com sua filha professora nas mesmas salas onde tantas vezes aprendi com a

mãe coruja.

Eu parafraseando Gonzaguinha reafirmo que a vida é bonita, porque professora

como a Dilceni Prietch passou por ela e muito ensinou para muitos. Talvez eu sinta

saudades, talvez eu chore sua falta. O certo é que dela guardarei sempre o exemplo

de como ser uma professora. Se alguém lembrar de mim daqui a trinta anos com o

mesmo carinho e respeito que sinto por ela, serei vitorioso. Senão, direi a colega: eu

tentei ser igual a você.

(*) aluno e professor da UFMT

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Avesso do avesso – Federal Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 17 de julho de 2010

Caetanear é um verbo que significa pensar à maneira desse maravilhoso tropicalista:

Caetano Veloso. Vou caetenear e vou enfiar uns dedos nas feridas que temos na

cabeça e parece que ninguém liga, mas elas estão com bicheira e irá doer muito

logo-logo, então vamos mexer nelas e ver se dói mesmo. Inicio enfiando o dedo

anular, aquele que usamos para fazer sinal feio para o outro motorista no trânsito,

bem no meio da mais velha ferida aberta na cabeça do brasileiro: a Educação.

Desde o desgoverno do Sarney da Fundação, passando pelo Collor da Elba, pelo

Itamar do Topete, FHC (é pecado mortal pronunciar esse nome) e o Lulla Collor de

Sarney e Calheiros Jucá que o Brasil não debate Educação como política pública

permanente. Até se tentou no tempo da discussão da Lei de Diretrizes e Bases, mas

como sempre a corrupção falou muito mais alto e nada foi mudado. Isso é: os ditos

avanços daquela lei ainda nos colocam nos Anos 70 do Século passado, do Milênio

passado! Parece coisa de comunista daquele tempo.

A sociedade não discute a Educação de forma permanente. E esconjuro aqueles que

acreditam em fóruns nacionais governamentais para fazer isso. São os novos

espertalhões do templo, e como Jesus, vamos surrar esse povinho safado. Eles

marcam um fórum nacional onde as mesmas carinhas representam ninguém, mas

são ungidos por eles mesmos como representantes e debatem o que querem, ou

seja, nada. Aprovam um monte de teses que costumam servir como prendedor de

porta em Brasília e mantém a Educação atrelada a uma ideologia política que já

morreu tempos passados.

O fórum constitucional desse debate deve estar no Congresso Nacional, onde

representantes do povo (deputados) e dos Estados Federados (senadores) tem que

travar debates, ouvir o povo, especialistas, professores, alunos e quem mais puder

ajudar na concepção dessa política pública nacional.

Você dirá: - Mas, com os atuais deputados e senadores só sai notícia de polícia, logo

não vai sair nada que preste. E, respondo curto e grosso: Vote melhor. Escolha gente

honesta e comprometida com o povo brasileiro. Não reeleja quem é ou já foi

parlamentar. Ponha essa corja para fora do parlamento. Vote bem.

E se você acha que na Educação está tudo bem é melhor pensar sobre isso. O chefe

Lula diz ter criado mais universidades federais que qualquer outro. Como sempre,

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Linha do Tempo Página 130

mentiu. Vai ser mentiroso assim lá em Guaranhus! Ele decretou a criação de 5 que

ainda não decolaram e ampliou ou federalizou 8 já existentes. Bem ao estilo desse

presidente: colocar pedra fundamental em terreno baldio e deixar o mato crescer.

Enquanto isso, as velhas universidades federais vão morrendo a míngua. Claro que

reitor ou reitora atual não vai abrir a boca para reclamar, pois em ano de eleição

prudência e canja de galinha nunca fizeram mal a ninguém. Como não sou candidato

a porra nenhuma, posso levantar a bola e ver se alguém chuta comigo.

Tem dia que olho o teto do banheiro da UFMT, onde trabalho, e fico calculando o

tempo que vai passar até serem consertados todos os buracos aéreos. Vai demorar

muito! Mas, ando por aí e vi a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), uma

das mais antigas, sofrendo com a falta de estrutura e da expansão desordenada, o

que detona a qualidade dos cursos. É só pousar na realidade e ver o que está

havendo.

Planejar Educação para mandato presidencial é assassinar o futuro do Brasil. O

investimento por aluno no ensino superior caiu em 3,76% de 2000 para 2008 (de R$

15.341,00 para R$ 14.763,00). Fora FHC-Lula!

O PIB cresce e o orçamento do MEC só cresce em termos absolutos. Mas, eu sou

chegado a Matemática e sei que o orçamento caiu em termos percentuais (desceu,

diminuiu, foi para o buraco, etc.)! A Associação dos Docentes da UFRJ (ADUFRJ),

com dados oficiais, mostra que a Educação vem perdendo dinheiro no orçamento

para a roubalheira e outras formas de corrupção desse desgoverno e anteriores.

Olhe só isso: o orçamento da Educação era 1,1% do PIB em 2003 despencou para

1,04% em 2009. Isso representa cerca de R$ 188.580.000.000,00 em sete anos. Ou

seja, o Brasil tirou R$ 26.940.000.000,00 (bilhões) por ano da Educação. Pense

nisso: se o Presidente Lula Apedeuta da Silva colocasse esse dinheirão na Educação

o quanto poderia melhorar a vida de alunos, professores e de outros profissionais da

área? Para um orçamento de R$ 41, 5 bilhões um reforço de R$ 26, 9 bilhões ia

ajudar pacas! Até os corruptos iam adorar essa medida. Fazer o quê, prioridade

orçamentária é a pior das corrupções, pois mata a esperança e a chance de felicidade

dos mais pobres?

Sem tirar o dedo da ferida, vou enfiar outro dedo. Mas, deixa doer um pouquinho.

(*) É professor da UFMT desde 1995. Foi aluno da UFMT entre 1983 e 1985.

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Linha do Tempo Página 131

Avesso do avesso – Local Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 18 de julho de 2010

Ainda na esfera federal trago o debate para Rondonópolis. Vou deixar a humildade de

lado e falar em primeira pessoa. Eu levantei a bandeira da autonomia para o CPR

(Centro Pedagógico de Rondonópolis), hoje CUR – Campus Universitário de

Rondonópolis, da UFMT, junto com outros professores e alunos no decorrer da

campanha para eleger o reitor no início dos Anos 80. Luís Scaloppe era o

anti-candidato a reitor e entre outras tinha essa bandeira de luta. Discordava dele em

quase tudo e ainda discordo, mas nessa questão fechei com o então candidato. Pena

que ele aderiu ao poder e transferiu-se para a calorosa cuiabania.

Só para se ter idéia da colônia que o CPR (CUR) é de Cuiabá, um pneu furado aqui era

levado até lá para ser remendado. É mole ou quer mais! Em 1983 a sede da colônia

cuiabana montou uma escola de lata aqui (igual aquela nova da Suplicy em Sampa)

que o povo da capital não deixou montar lá para ser estufa de planta. Eu estudei na

estufa de lata aqui, suava feito um infartado durante as aulas e vi o Polizel usar toalha

de rosto para secar o suor ao ensinar Cálculo. Isso é colonialismo brabo. Coisa de

gente atrasada mesmo. Hoje estão lá a prefeitura do campus e alguns centros

acadêmicos. Parece que a vergonha nunca será demolida. Afinal, para albergar

rondonopolitano pode!

Tempos depois fui aprovado em concurso público e me juntei ao amigo Tati na

inglória luta de criar uma nova universidade federal em Rondonópolis. Desde a

divisão do Mato Grosso em dois estados que o Tati, entre tantos outros, briga pela

criação dessa universidade. Ele, como eu, anda delirando teorias conspiratórias para

explicar essa luta sem fim. Acho que é macumba ou coisa pior.

Afinal, quando houve a divisão do estado, o nosso campus era parte da Universidade

Estadual de Mato grosso do Sul, com sede em Campo Grande, que simplesmente não

queria manter um campus em outro estado. Ao mesmo tempo, a UFMT, com sede em

Cuiabá, não queria assumir um campus pertencente a outra universidade. O CUR

sempre foi um rejeitado. Ninguém queria e nem quer. E como explicar o motivo de

não nascer uma nova universidade naquele momento? Talvez, só talvez, o Tati tenha

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razão e a CIA (agência de espionagem americana) esteja por trás disso, como está

por trás do narcotráfico internacional junto das FARC colombiana.

Os mineiros aproveitaram o mesmo período e criaram a UFOP, UFV, UFLA, UFU, UFJF

e a Unifal. Sem contar a expansão da grande UFMG em Belo Horizonte. O Mato

Grosso, com toda essa extensão territorial, permanece até hoje com uma única

universidade. Se todos dizem que são a favor da Universidade Federal de

Rondonópolis, por que ela não é criada? Até no Vale do Jequitinhonha, na região mais

pobre de Minas Gerais nasceu uma universidade federal, então o que impede a

criação da nossa?

Se todos são a favor e por isso nada acontece. Então, a partir de agora eu sou contra!

Sou contra os conselhos superiores da UFMT em Cuiabá, sou contra a reitoria e suas

pró-reitorias, sou contra qualquer coisa acertada na capital. Sou contra a paz entre

rondonopolitanos e cuiabanos até a autonomia total do CUR. Quero a luta ferrenha e

feroz entre nós e eles. Quero a independência do CUR já.

Vamos recrutar os índios que ainda restam por aqui e vamos nos pintar para a

guerra. Vamos criar um novo movimento social, tipo Movimento dos

Sem-Universidade – MSU. Vamos fazer barricadas no trevão da BR163/364. Vamos

fechar o espaço aéreo e os corichos pantaneiros.

O Tati está com a cabeça branquinha e daqui uns tempos ele canta para subir sem ao

menos ver o sonho concretizado. A fila de pioneiros do CUR está andando. Eu,

infartado ultrapassei alguns mais velhos como Ubaldo, Jorge e Manoel na fila de

subida (ou descida) e pelo jeito não verei isso acontecer. Mas, agora sou do contra.

Contra o colonizador cuiabano. Sou a favor da UFR já e sei bem o quanto essa

decisão é política. Claro que tem gente aqui dando para trás, mas vamos acabar

desmascarando essas traíras que dizem ser a favor, mas puxam o barco para o

barranco. Vamos desconfiar daqueles e daquelas que dizem algo como: no ano que

vem retomamos esse tema.

Só vote em político que crie a UFR já. Quem sabe até as eleições de outubro o CUR

não vira UFR. Sonhar ainda é possível e permitido.

(*) É professor da UFMT desde 1995. Foi aluno da UFMT entre 1983 e 1985.

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Universidade Federal de Rondonópolis, A

Tribuna e o tempo Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 25 de julho de 2010

Em Janeiro de 1995 cheguei à UFMT por meio de concurso público. Naquele ano, nos

corredores do CUR falava-se em separação de Cuiabá: autonomia era a palavra de

ordem. Os dois diretores dos institutos queriam autonomia para o campus de

Rondonópolis, ambos eram rotulados como esquerdistas e não conseguiam

sintonizar o discurso. O modelo de autonomia que um queria o outro derrubava e

vice-versa. A briga era interminável, insuportável e burra! O “inimigo” estava na

capital, mas a briga doméstica impedia a reunião de esforços e forças para

combatê-lo. A guerra não começava, pois os aliados não conseguiam se aliar em

torno de uma idéia.

Discordando dos modelos de autonomia que defendiam, eu, amigo de ambos e

maldosamente rotulado por eles como direitista, abri meu coração sobre o que

pensava a respeito durante o discurso proferido como paraninfo das turmas de

formando daquele ano. Embora tivesse preparado uma fala comportada, seguindo a

tradição de saudar os novos bacharéis e licenciados, perdi o texto quando foi ligado

um ventilador de pedestal colocado bem perto do púlpito que fez voar o discurso pela

platéia e fiz um improviso demolidor e acusador. A reitora queria me enforcar, os

políticos presentes cavaram um buraco no palco do cinema e sumiram, o público

pasmo com minha brutalidade verborrágica às vezes vaiava, outras vezes aplaudia

de pé e o corpo acadêmico trepados nas cadeiras apoiava gritando palavras de

ordem.

Só para ter uma idéia da convulsão que a cerimônia de colação de grau se tornou um

amigo, Manoel Mota, trepado na cadeira do cinema urrava lá de longe: - bate mais

Ruy, baixa o cipó! A turma de formando de Contábeis, com sua maioria masculina,

sentada bem a minha frente puxava o coro de Universidade Já, mais ao fundo a voz

feminina da massa de mulheres da Pedagogia respondia em uníssono o mesmo

refrão. Uma zona!

Qual o motivo daquela convulsão? Simples, cobrei dos presentes a criação da

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Universidade Federal de Rondonópolis. Coloquei uma saia justa naqueles

espertalhões ao mostrar o quanto a nossa colônia estava sufocada pelo colonizador

cuiabano. As condições políticas eram ideais para realizar a fundação da UFR, pois a

cidade possuía um senador e três deputados federais nativos. O momento não foi

bom. Errei por não respeitar os passos do processo, atropelando egos e interesses

sempre escusos. Mas abordei o assunto de forma pública e transparente. Isto é,

coloquei a cara para apanhar.

Sabendo que nenhum aluno sensato vai me convidar para ser o paraninfo de uma

outra colação de grau quero agradecer ao jornal A Tribuna que tem sido o único

espaço de debates e exposição de ideias possível nesses tempos de ostracismo

mental e moral. Caso um dia a Universidade Federal de Rondonópolis seja criada

temos muito a agradecer a coragem editorial desse veículo de comunicação ao

difundir o justo e belo sonho da UFR.

(*) Professor da UFMT

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Mania de mentir Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 15 de agosto de 2010.

O desgoverno petista que se encerra este ano continua a utilizar a falta de verdade

como propaganda e plataforma eleitoral. Repetem tantas vezes a mentira que parece

coisa de nazista.

Agora é a publicação oficial do boletim “Economia Brasileira em Perspectiva”,

divulgado dia 10 deste mês pelo Ministério da Fazenda, editado para inflar

maldosamente feitos do governo atual e fazer comparações com o desgoverno

anterior.

O desgoverno atual faz loas de si mesmo e erra feio, tanto na análise como nas

continhas de Matemática (essa turma fugiu da escola). Nem subtração sabem fazer,

exceto aquelas denunciadas pelo Ministério Público que subtraia dinheiro público via

“Mensalão”, em 2005 e o Supremo não julgou até hoje.

O pior é que tem gente lendo e acreditando nesses dados como se fossem uma

verdade inconteste. Ao ler o boletim e os comentários dos economistas na mídia fica

claro que a divulgação do boletim não passa de um factóide criado para a campanha

eleitoral. Uso da máquina pública é crime eleitoral?

Além de mentiroso, o malfadado boletim está eivado de má-intenção, como dolarizar

o salário mínimo em tempo de moeda americana em forte baixa. Isso dá a falsa

impressão que o salário mínimo está uma beleza. Não está! Viva com ele e diga se dá

para pagar as contas?

Igualmente a exposição do custo da máquina pública sem colocar o pagamento do

funcionalismo nessa conta. Ué? Se não é custo governamental, então quem está

pagando o meu salário? E as despesas em saúde, educação e transferência de renda,

quem banca isso? É muita burrice junta, pensar que somos um monte de

mentecaptos, como essa gentalha. Tem um monte de erros e desinformação no

boletim. Leia e comprove.

Cada vez que leio um negócio mal feito desse mais me convenço que o Cazuza tinha

razão ao escrever a poesia da música “Ideologia”. Os inimigos do povo estão no

poder. Enquanto isso vamos morrendo na BR-364 sem duplicação, vamos vendo a

transformação do CUR da UFMT em Universidade de Rondonópolis ser prometida e

não cumprida, vendo doente morrer por falta de tudo nos hospitais e vendo um

futuro incerto para nossas crianças diante da baixa qualidade da educação oferecida.

E haja mentira.

(*) Professor da UFMT e morador em Rondonópolis

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Paz? Subserviência? Ostracismo?

Omissão? Burrice? Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 20 de agosto de 2010.

Estamos no terceiro milênio depois de Cristo. Século XXI. Era do Conhecimento.

Pós-Modernidade. Os cambaus a quatro! Quem está? Todos, muitos, alguns?

Os dias atuais exigem pessoas, gente de carne e osso, diferente daqueles que viviam

no tempo de Jesus. Naquele tempo, na Palestina, as pessoas divididas em castas

sociais, tribos, segregadas por gênero (mulher estava entre os homens e os animais),

uns poucos pensavam e o resto cumpria ordens.

Esse tempo se foi. O sutiã foi queimado em praça pública e o feminismo liberou a

mulher ocidental do jugo imposto pelo homem. Hoje somos iguais em quase tudo. Ou

deveria ser. Os fariseus estão confinados em Israel. As tribos judaicas se espalharam

pelo mundo na diáspora. A internet está aí. Para saber das coisas eu não preciso ficar

na dependência da família do Roberto Marinho.

Parafraseando o sociólogo francês Michel Maffesoli: hoje é preciso ouvir a grama

crescer! Pois é. O cara que babava na frente da televisão nas horas de lazer,

conforme dizia Raul Seixas, já morreu. Hoje é preciso estar antenado com o mundo,

ou como dizia Paulo Freire, entre uma dose de cachaça e outra: é necessário estar no

mundo!

Estar no mundo é mudar para o mundo mudar. É conhecer as coisas e produzir saber

para os outros. Ë compartilhar a experiência em redes sociais. É viver respeitando ao

outro, independente da diversidade onde o outro está. No fundo, é amar ao próximo

incondicionalmente. Difícil pacas, mas não impossível!

Para estar no mundo é preciso olhar os estudantes universitários na cantina e ver que

eles não mais conversam frente a frente. Ali mesmo, juntos no lugar, sacam seus

netbook, notebook e celular incrementado para bater animados papos em tempo

real, via Internet, com o colega ao lado! Eles querem mais tomadas de energia

elétrica no corredor e espaços públicos para ligarem seus equipamentos. Eles

precisam de rede wireless (WiFi) ou mesmo pontos de rede com fio em lugares

públicos.

O professor precisa olhar esse aluno com outro olhar. Os pais precisam olhar seus

filhos com outro olhar. As autoridades precisam olhar para esses moços com outro

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Linha do Tempo Página 137

olhar. Nada de paz. Os hormônios da juventude não permitem viver em paz. Isso é

para nós da última idade. Lutas são formadoras de caráter. Quem não lutou por

conquistas não tem o direito de usufruir daquilo que não conquistou. Sempre fui e

sempre serei contra a herança. Jovem tem que lutar pelo espaço próprio, sob pena

de ser um adulto medíocre e subserviente no futuro.

A geração que veio depois da minha é apática e pensa pequeno, achando que o

mundo é assim mesmo e pronto! Não lutou como eu lutei. Não esperneou como nós

esperneamos no passado. Recebeu o mundo feito por nós, os caretas atrasados, e

estão satisfeitos com essa porcaria. Eu não usava preservativos porque no início dos

anos setenta a camisinha era importada e custava 20 dólares cada. Poucos

conheciam ou tinham dinheiro para comprá-las.

Um exemplo dessa forma de pensar pequeno está no meu trabalho. Eu digo “A” e o

outro, já na defensiva, entende “a”. Fato ocorrido recentemente prova isso: uma

videoconferência sobre o ENADE é realizada durante o turno matutino e todos os

computadores do campus ficam sem Internet! Você abre a boca para perguntar o

que deve mudar e o outro se defende dizendo que o ENADE é importante. Mentira.

Importante é minha aula com 20 alunos, é a pesquisa do grupo tal, é o acesso de

tantos outros acadêmicos que estão sendo privados disso porque ninguém pensou

grande e resolveu o problema.

Solução existe e custa dinheiro. Ora, eu penso pequeno e sou subserviente à colônia

cuiabana (nesse caso), só posso mesmo me defender. Entretanto, se penso grande

posso escrever um artigo para o jornal, denunciando essa pouca vergonha que se

arrasta a anos no CUR. Posso também fazer um ofício, protocolar e esperar que um

dia alguém diga que falta verba para tal solução.

Ao entrar pela manhã, nos corredores do campus fico sonhando com um movimento

estudantil ativo, exigindo direitos negados aos alunos, com os sindicatos de

professores e servidores técnico-administrativos promovendo debates sobre temas

locais, regionais e nacionais, lutando pelas classes que representam, fazendo o mato

crescer com barulho suficiente para que todos daqui ouçam. Parece que o sonho vai

virar pesadelo daqui a alguns tempos. Quem não escuta cuidado, mais tarde vai ouvir

coitado!

A minha geração está se apresentando a Jesus. Vários de nós já cantaram para subir

(ou descer). Uns de morte morrida, outros de morte matada. Mas, gostaríamos de

fecundar as gerações seguintes com o vírus da curiosidade, da indignação, do

inconformismo, do livre pensar e do livre viver.

Uma coisa é certa, nós mudamos e mudamos o mundo. E os que vieram depois de

nós?

(*) Professor da UFMT e morador em Rondonópolis

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Linha do Tempo Página 138

Aceitando o conselho de um amigo Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 12 de setembro de 2010

Quem tem amigo nunca está só e para minha sorte tenho bons e velhos amigos.

Gente que basta um olhar para dizer muita coisa e evitar que um “mané” como eu

enfie o pé na jaca.

Às vezes o óbvio está na nossa cara e não vemos. Nesse caso um amigo é muito

importante para tirar a trave de nosso olho e obrigar-nos a enxergar um fato ou uma

idéia que está ali, mas não vemos.

Na fila do mercado encontrei um desses que tenho orgulho de chamá-lo amigo.

Estudamos na mesma época na UFMT e lá passamos juntos bons e maus momentos.

Ele seguiu seu caminho e eu o meu, mas a amizade não esmoreceu e com ela o

respeito entre os dois só aumentou. Ali, no caixa, pagando as compras feitas ele me

avisou: - Tenho lido seus artigos e você só fala do Lula.

Como bom amigo, ouvi, remoí e estou pondo para fora o que penso sobre o alerta

recebido: - Ele tem toda a razão. Com tanta gente séria, honesta, eticamente correta,

verdadeira e digna é perda de tempo falar de gente ao contrário disso tudo. A

começar por ele mesmo, que tanto estudou para exercer importantes cargos políticos

no Mato Grosso e tanto ajudou o desenvolvimento agropecuário daqui por conta do

esforço próprio. Meu amigo é e será um cara importante em Rondonópolis, pelo que

sabe e pelo que faz com o que sabe.

Assim vou falar de pessoas e de suas virtudes e não do Lula Collor Calheiros Sarney.

Vou me apoiar em Aristóteles, Sócrates e Platão. Só neles fui beber a água que mata

a sede de sabedoria na esperança de satisfazer o amigo e falar de gente que valha a

pena. Começo pela virtude da dignidade e seu exemplo na cidade.

Desde 1982 corto cabelo e faço barba com o João Maria. Homem simples, excelente

prosa e exemplo de dignidade. Veio para cá no final da Década de 70, criou seus

filhos com o suor do rosto e a habilidade com a tesoura e a navalha. Barbeiro todo

esse tempo, nos brindou há pouco com uma filha formada em Medicina. Não vi e não

sei de uma só pessoa em Rondonópolis que possa manchar o nome do João Maria.

Dignidade é isso! É decência, compostura, excelência. Ele sim merece ser chamado

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Linha do Tempo Página 139

de excelência e não o cara que se encastelou no palácio em Brasília e acha normal a

Telemar doar a fundo perdido cinco milhões de reais a seu filho. Há um abismo entre

a decência de um e de outro. Fico com a do João Maria.

E por falar em dignidade é preciso tocar noutra virtude irmã: a coragem. Bem mais

que uma virtude ela é um principio. Daí nasce o Valor, o Auto-sacrifнcio e a Honra.

Convivo com gente corajosa há muito tempo. E põe coragem nisso! Posso dizer que

a Cida, vendendo seus espetinhos toda noite é uma mulher corajosa, honrada e de

muito valor. Enfrentando um leão por dia essa mulher de fibra criou sua filha sozinha,

sem medo de encarar as adversidades que a vida impõe. Eu tenho muito orgulho de

ter amigos assim, corajosos. Claro que não dá para comparar com o infeliz presidente

que no primeiro grande escândalo (e foram muitos) de seu governo tirou o seu da

reta e saiu pela tangente como fazem os covardes, dizendo: “eu não sabia”.

Como estamos falando em virtudes é preciso apresentar a mãe de todas: a Verdade

que por sua importância é o principio de tudo. Da verdade se deriva a Honestidade,

Justiзa, Honra e Espiritualidade. Amar a verdade é um princípio filosófico, espiritual e

moral, tudo ao mesmo tempo. Quem pode se esquecer do Chico Xavier? Verdadeiro

por 92 anos seguidos, sem fugir um milímetro de sua verdade! Vivia e pregava a

mesma coisa.

Pena que a verdade não seja uma virtude cultuada pelo supremo mandatário do

Brasil. Ou alguém se esqueceu que o Roberto Jefferson o avisou sobre o mensalão do

PT meses antes do escândalo explodir e depois disso ele jurou de pé junto que nada

sabia, mentindo assim despudoradamente.

Como nossa prosa é sobre gente honrada, melhor dar exemplo de pessoa com honra.

Gente que joga limpo, porque a honra й constituída pela verdade e pela coragem.

Verdade para admitir suas verdadeiras responsabilidades e coragem para assumi-las.

Como fez recentemente o general Augusto Heleno ao defender a integridade

territorial da Amazônia, se colocando contra a demarcação de terras indígenas

continuadas em faixa de fronteira, sua tese foi derrotada no STF, mas ele não mudou

sua posição em defesa de nossas fronteiras.

Muito diferente do ocupante da Presidência da República que acha que preso político

em greve de fome em Cuba é a mesma coisa que bandido do PCC amotinado em São

Paulo. Não admitindo a própria responsabilidade de chefe de estado democrático,

signatário da carta de direitos humanos da ONU, em pedir e exigir respeito aos

princípios básicos da dignidade humana em Cuba, ou em qualquer parte do mundo.

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Linha do Tempo Página 140

Como nossa intenção é dizer que há gente boa no Brasil e citar seus nomes para

melhor provar tal tese, prossigo com exemplos de virtudes e evoco a fidelidade ou

lealdade, se preferirem. Fidelidade não apenas dar exclusividade ao seu cônjuge.

Você pode ser fiel a uma causa, pátria, pessoa ou religião. Amir Elias Donato é um

bom exemplo de fidelidade a uma causa: a filantropia. O homem é um dos

fundadores da APAE de Rondonópolis, onde foi presidente por oito anos, um dos

fundadores do Lar dos Idosos de Rondonópolis e do Rotary Clube. Em termos

pessoais, o que o "homi" de Brasília fundou ou criou?

Se você vive no caos, nada fica estável, tudo muda o tempo todo. Ninguém quer viver

assim. Por conta disso a disciplina é a próxima virtude que se apresenta para nós,

mortais. Se há liberdade demais temos o caos, se existe ordem demais temos a

estagnação (imobilidade). Mas, para qualquer desequilíbrio a destruição é certa (pela

entropia), eliminando os excessos dos dois lados. A natureza é assim! O equilíbrio

dessas três forças é a disciplina. Quando na sociedade uma pessoa invade a

liberdade de outra é necessário restabelecer a ordem perdida e usando uma força

disciplinar equilibrada estabelecer a harmonia e a justiça.

Quem estudou na Década de 80 na UFMT, como eu, há de lembrar a Professora Vera,

ensinando Química. Pergunte a qualquer um desses velhos alunos sobre a maior

virtude daquela mestra e a resposta é uníssona: disciplina! E aí fica minha gratidão a

ela, até agora o que começo eu termino. Diferente do quase ex-presidente que

inaugurou tanta pedra fundamental e nada terminou. Falta-lhe disciplina.

Dentre as virtudes uma delas é característica marcante do povo de Mato Grosso: a

hospitalidade. Nas margens das rodovias existe gente humilde que planta e colhe o

sustento. Essa mesma gente, que tem tão pouco para si, não deixa o próximo sentir

fome, frio ou sede. Ninguém precisa me avisar que existe uma família hospitaleira em

tal lugar. Eu convivo com essa gente há tanto tempo que hoje acho normal ser tão

hospitaleiro quanto eles. Os boxeadores cubanos que tentaram asilo político no Brasil

conheceram a hospitalidade do desgovernante federal. Presos, foram colocados em

um avião particular e despachados para as masmorras de Fidel, sem dó, nem piedade

e muito menos hospitalidade.

Como é preciso ganhar a vida, a laboriosidade, ou seja, trabalhar é a próxima virtude

filosófica a entrar no texto. O oposto do labor é o parasitismo, quando um vive as

custas dos outros. Eu conheci um homem laborioso: João Moraes. A lembrança é

coletiva em Rondonópolis e nada preciso acrescentar sobre a vida dele. Bem, não vou

tentar comparar esse com aquele ex-trabalhador metalúrgico. É maldade.

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Linha do Tempo Página 141

Ao longo da vida aprendi que antes de tudo é preciso ser independente. Não ter rabo

preso com ninguém. Assumir a responsabilidade dos erros e acertos. Não jogar nas

costas do diabo o meu problema. Nem clamar por Deus para resolvê-lo em meu

lugar. Nunca ser omisso de suas responsabilidades consigo próprio, com sua família

e com a sociedade.

A independência é a virtude seguinte. Para tê-la é necessário ter liberdade e não

parasitar ninguém. Conheço gigante assim, gente que não engole sapo e nem se

escora em outro. Rafael Branco foi ministro-presidente no tribunal superior onde eu

trabalhei. Todos diziam que era louco por ter depositado milhares de libras esterlinas

recebidas como propina pela compra de submarinos no fundo de Marinha. Morreu em

Copacabana sem nunca sair da classe média. Imagino a cara dos sujeitos que

contavam com aquela propina. Dá para pensar no atual presidente que compra filme

pirata fazer um negócio desses? É ruim!

A última das virtudes gregas é a perseverança e para exemplificar tal virtude vou

buscar um líder sindical que fundou o PT em 1980: Vicentinho. Nordestino, pobre,

preto, migrante para São Paulo, tornou-se líder sindical e presidiu a CUT. A trajetória

de vida do Vicentinho é muito parecida com a do quase ex-presidente Lula, a

diferença está na perseverança do potiguar que estudou e hoje é um bacharel em

Direito. Perseverança é uma virtude e com certeza o “Luisinho 51” não tem.

Pois é, querido e dileto amigo, falei de gente boa e de suas virtudes. Claro que não

poderia deixar de compará-los ao autoritário e perigoso aspirante a ditador que deixa

o governo como assassino da ética e da esperança em políticos. Afinal, o salafrário

acha normal quebrar sigilo bancário e fiscal dos brasileiros e reclama não ver

estampada nas manchetes dos jornais o produto do crime praticado. Pena que o

Brasil não é a Venezuela, pois se lá ele teria guarida, aqui ele só vai ser “ex” em

Janeiro de 2011. Mas, de qualquer forma, agradeço o conselho.

(*) Morador em Rondonópolis e professor da UFMT.

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Linha do Tempo Página 142

Democracia: utopia de poucos Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 28 de setembro de 2010

Revendo o livro “O futuro da democracia” de Norberto Bobbio, velhos sonhos da

juventude distante me assaltaram o coração e o pensamento racional me fez por no

papel aquelas utopias sonhadas em minha adolescência. Quando o Brasil será uma

democracia?

Para entender a utopia é necessário compreender a qual democracia me refiro.

Certamente não é a democracia direta onde o cidadão propõe, debate e vota tudo

que for do interesse da sociedade. Isso é burrice, impraticável e só os idiotas, com

uma imensa dose de má-fé são capazes de propor algo impossível em um pais do

tamanho e complexidade como o Brasil. Em Atenas, na Grécia de Sócrates e Platão,

onde só os homens eram cidadãos e votavam, excluindo as mulheres, os escravos e

os estrangeiros, o sistema direto podia até funcionar. Hoje é arma usada por

ditadores do tipo Hugo Chaves e Cia ltda.

Na outra ponta está a democracia representativa onde o cidadão vota num

representante e fim. Isso é igual ou pior que a tal democracia direta, pois só há um

momento “democrático” quando o eleitor vota. Hoje o Brasil está nesse extremo. Um

nome vem do nada e você ou eu, cidadão, ou vota ou vota. Ponto final. Caramba, isso

é uma m...

Lógico que minha utopia não está em nenhuma das duas pontas. Entretanto, é

possível misturar as duas e ter algo muito melhor como resultado. Sem contar as

soluções usadas em países democráticos e que funcionam muito bem.

Por exemplo: Referendos periódicos visando manter ou não o representante no

poder. Assim, ao eleger o prefeito por quatro anos haveria um referendo no meio do

mandato para que o cidadão mantenha ou tire o representante em função dos dois

anos de exercício do mandato. Isso exige melhores escolhas pelos partidos políticos

de seus candidatos e a perda de tempo irrecuperável quando um representante

fracassa ou trai o programa de governo pelo qual foi eleito. Presidente e

governadores da mesma forma. Isso vale para câmara de vereadores, de deputados

e senadores, com uma pequena diferença, caem todos juntos no parlamento se não

houver aprovação popular.

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Linha do Tempo Página 143

Outro pedaço de minha utopia está na representatividade dos parlamentares por

distrito eleitoral em lugar do nada que existe hoje. Explico: um vereador ou deputado

representa uma população que habita uma área geográfica. Hoje o vereador

representa o município todo, ou seja, não representa porra nenhuma. Da mesma

forma o deputado estadual ou federal nada representa, pois foi votado em todo o

estado. Ora, um parlamentar, exceto o senador, representa o cidadão e como a

votação se dá no total do território, ninguém tem força para chamar o safado e exigir

o cumprimento do programa que o elegeu. Caso um vereador fosse eleito por distrito

eleitoral o cidadão daquele distrito fiscaliza um só vereador que o representa. O

mesmo vale para os deputados estaduais e federais. Desse jeito é mais fácil cobrar a

conta dos parlamentares.

Outra utopia é o fim da criação de oligarquias, proibindo essa nojeira em lei. Isso

significa que nunca haveria uma família dona de estados ou municípios ou currais,

como os “Sarneys”, “Bezerras”, “Campos”, “Genro”, etc. Somos 190 milhões e não há

necessidade de uma família se arvorar a ser a escolhida por Deus para governar e

dominar uma região qualquer. Oligarquia é cancro social, apodrecido, formada por

quadrilhas de parentes, cuja intenção é tornar o patrimônio público (o nosso) uma

extensão do patrimônio familiar (o deles). Outras formas de oligarquias vão se

formando no Brasil: religiosos, ruralistas, sindicalistas, etc. Olha a Erenice do Lula.

O assunto é empolgante e parece não ter fim. Importante pensar que há outras

maneiras de organizar o estado brasileiro. Diminuindo a falta de representação e

melhorando a relação cidadão com seu político eleito. Claro que muitas outras

questões fazem parte desta minha acalentada utopia, mas o espaço é curto e a

cabeça do brasileiro prefere receber informações aos poucos, como as novelas da TV.

Voltarei ao tema no futuro. Mas, passou da hora de uma constituinte exclusiva, com

gente que nunca mais poderá ser candidato a coisa nenhuma. Outra utopia! Afinal,

deixar os políticos fazer a reforma política é entregar o galinheiro à raposa.

(*) Professor da UFMT

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O Rio e o resto Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 28 de novembro de 2010

Amigo, ao chegar do Rio de Janeiro não posso deixar de trazer notícias quentinhas da

minha terra. Afinal, carioca “sangue-bom” não acredita em notícia fabricada nos

centros de comunicação social dos órgãos públicos. O papo no botequim é muito

mais confiável que a notícia enlatada do jornal das oito na TV.

Sábado passado cheguei bem tarde ao aeroporto Santos Dumont que está muito

bonito. Claro que o péssimo atendimento e os atrasos continuam e matam a gente de

raiva, mas o prédio parece um castelo da realeza européia, lindo e vazio. Deve ter

rolado muita propina, pois usaram material de primeira.

Encarei um táxi e fui direto para o hotel, na Praça Tiradentes, bem no coração da

boemia carioca. Tendo a Lapa como vizinho, busquei logo um boteco para saber das

coisas e comecei a montar um mosaico dos fatos que estão literalmente fervilhando

na Cidade Maravilhosa.

Como o coração me sacaneou ano passado fui obrigado a beber muito guaraná para

acompanhar o noticiário que vai chegando pela boca de cada um que entra no

botequim e sem que nada lhe pergunte vai logo respondendo: - rapaz, sabe o que

aconteceu na minha comunidade (novo nome das favelas) agora a pouco... E, lá vem

notícia quente, contada por quem estava no fato, fez parte dele, sem interpretar

nada.

Pega uma notícia aqui, um boato ali, uma dica acolá e o quebra-cabeça vai sendo

montado. Como tive a madrugada de sábado e domingo o dia inteiro para papear foi

possível ter uma versão dos fatos que lá estão acontecendo agora. Usando sempre a

fonte direta, daqueles que vem do subúrbio para o Centro trazendo “a última”.

Vamos lá contar essa estória que pode virar História.

Tudo começou antes das eleições, com os políticos e marqueteiros (propagandistas)

traçando a estratégia capaz de ganhar a eleição numa boa, sem ter que enfrentar os

tais problemas da vida real. Isso aconteceu em nível federal e estadual. Os caras

decidiram montar um “país das maravilhas” no imaginário dos eleitores, onde só

existiam intrigas, fuxicos de dossiês e maledicências sobre a vida pessoal dos

candidatos, deixando de fora o tal mundo, também chamado de realidade.

Nas favelas e no asfalto (tudo o que não é favela é chamado de asfalto no Rio) o tiro

comia solto, o pó sendo vendido em toneladas e a maconha dominando qualquer

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Linha do Tempo Página 145

esquina ou porta de escola. Os políticos, os sociólogos, os antropólogos, os

especialistas em segurança pública e lógico, os propagandistas só falavam do

sucesso das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) instaladas em alguns morros do

Rio. Até a presidenta eleita chamou essa encrenca de modelo de política pública para

o Brasil e quiçá, para o mundo.

Uma mentira dita cem vezes vira verdade, já dizia Goebbels, o ministro do povo e da

propaganda de Hitler. Não foi diferente nessas eleições passadas. Mentira,

encobrimento de fatos, distorções e muita safadeza ficaram embaixo do tapete dos

palácios. A propaganda vendeu um Rio de Janeiro, limpo, organizado, sem violência,

sem bandidagem organizada, sem problemas de deslizamento de encostas. Uma

Passárdaga, de Manoel Bandeira, capaz de dar água na boca do paulista mais avesso

ao carioca.

Ocorre meu amigo que a propaganda acabou e o que virou manchete de reportagem

é a tal realidade. E aí malandro, o “bicho pega”! Primeiro as UPP foram instaladas

sem precisar dar um só tiro de fuzil. Ué? Como bandido deixa a polícia ocupar a favela

sem espernear? Só porque é época de eleição? Aí tem treta. Por baixo desse angu

tem caroço. Ninguém sobre o morro sem autorização da bandidagem seja ela ligada

ao Comando Vermelho, Terceiro Comando ou aos Amigos dos Amigos,

principalmente a polícia.

Aí surge a notícia vinda pela boca de um de “dentro” que afirma ter acontecido um

acordo entre os políticos e os chefões das facções criminosas, para deixar as UPP

serem instaladas em troca de áreas de livre comércio para a bandidagem. O

soldadinho disse que na Vila Cruzeiro o pessoal fechou com o “cara do PAC”, para

inaugurar umas obras sem atropelos dentro do Complexo do Alemão.

Então começa a clarear. Até as eleições o acordo valeu. E, foi cumprido pelos dois

lados. O problema começou quando os “manés” dos bandidos acreditaram nos

políticos da terrinha. Levaram uma bolada nas costas. A UPP que foi instalada para

dar “segurança” ao pessoal das facções e dispensar a figura do “soldado do pó” que

ganhava em média R$ 150,00 por dia começou a cobrar “quinhentinho por PM”, o

que deixou os barões muito loucos. Em lugar de baratear os custos de distribuição

dos produtos as UPP inflacionaram o negócio.

No domingo, num barzinho da Cinelândia, meu colega de trabalho, um gaúcho de

Santa Maria que estava no Rio pela primeira vez, tomou uns chopps e caiu matando

em cima do pessoal da roda de samba querendo saber por que queimar carros nas

entradas do Rio. Um “Zé Ruela” deu a ele a explicação da malandragem: o pessoal

que trabalha nesse ramo está protestando contra o descumprimento do acordo,

como qualquer outro movimento social organizado. Comentário do gaúcho: Bah! Até

a bandidagem do Rio é de esquerda.

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Linha do Tempo Página 146

Agora, os bandidos estão começando a perceber que entraram de gaiato no acordo.

O pessoal da facção tal cuja comunidade não possui UPP está vendendo seus

produtos a preços abaixo da concorrência e aí começa a morrer gente. Por dinheiro

já se fizeram todas as guerras do mundo. Rompido unilateralmente o acordo os

bandidos protestam a lá VAR-PALMARES, via terrorismo urbano, e os políticos

aproveitam para mostrar que cada UPP instalada vai custar um monte de defuntos e

milhões de Reais. Vão faturam de montão.

Na segunda-feira fui para o batente e nada mudou no Centro do Rio. Gente demais,

carros demais, congestionamentos demais, camelôs demais e nenhum PM nas ruas.

Isso mesmo, os PM sumiram do Centro e estão conquistando favelas nos subúrbios

do PAC.

Na terça-feira o ascensorista do elevador do trabalho, morador do Complexo do

Alemão, foi logo noticiando aos quatro ventos e batendo no peito: O pessoal do CV

(Comando Vermelho) já avisou que se as milícias ou a PM for lá a bala vai chover. E

não é que está chovendo tiro para todo lado naquela pacata comunidade?

A televisão chama um especialista atrás do outro para explicar porque a UPP está

fracassando e ninguém fala sobre as perguntas que estão nas bocas dos populares

cariocas nas ruas. Vamos falar: UPP invade a comunidade e para onde o bandido vai?

Acertaram antes isso com eles? Qual soldadinho do pó vai largar a profissão para

ganhar um salário mínimo por mês como servente de pedreiro no PAC? Os barões do

crime estão dispostos a abrir falência em nome da paz social no Rio? A corrupção

policial acabou de uma hora para outra? As milícias foram desmobilizadas por livre e

espontânea vontade? A UPP no morro garante que acabou a facção e o tráfico?

Cidades como Macaé, Cabo Frio, Petrópolis estão preparadas para receber a

bandidagem em fuga? Tem PM para todo o estado do Rio ou só para algumas

comunidades? Será que a bandidagem vai para São Paulo, Minas Gerais e Espírito

Santo?

A lista de perguntas que ouvi é muito maior. Mas, respeito à cabeça dos leitores e fico

por aqui. Deixou uma nacional para pensar: as prisões federais de segurança máxima

são os novos escritórios centrais das facções criminosas brasileiras?

A que saudade do detetive Perpétuo e sua máxima: “Bandido bom é bandido morto”.

Seja ele vendedor de pó ou comprador de voto.

(*) Carioca perdido no Mato Grosso desde 1982

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Farinha do mesmo saco: FHC, Lula, Collor,

etc. Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT (2010)

Em 2002 escrevi um artigo, publicado aqui na Tribuna, baixando o cipó no FHC

(traidor do Brasil, a História ainda vai confirmar minha tese) por não usar o FUST

(Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações) que acumulava, na

época, 5 bilhões de Reais e o traíra não sacava um centavo para fazer com esse

dinheirão o que a lei determina: usar em favor dos brasileiros. Por exemplo,

colocando Banda Larga (xDSL) em todas as escolas do Brasil.

O tempo passa, os brasileiros esquecem rapidinho o problema, mas eu sou um chato

que guarda tudo em disco rígido (HD) e de vez em quando abro o passado para ver

se mudou no presente. Aí fico muito indignado quando nada mudou só o ocupante da

cadeira presidencial.

O suposto chefão do mensalão (já viram quadrilha de bandidos sem chefe?) passou

quase oito anos no Palácio do Planalto fazendo sei lá o quê, mas não tocou num só

centavo do FUST e do FISTEL (Fundo de Fiscalização dos Serviços de

Telecomunicações). Agora, na hora das eleições para substituí-lo um aloprado

perigoso vaza uma fala do presidente no Twitter sobre o emprego de dinheiro público

para salvar empresa falida e re-estatizar o defunto da Telebrás. E o que ocorre? As

ações daquela empresa morta e em processo de falência dão um salto absurdo na

bolsa de valores.

Caramba, o consultor da empresa coincidentemente é o número dois do mensalão e

unha e carne do Lula! Só mesmo na cabeça de um marginal como esse a verdade não

viria a tona e tudo seria feito na moita. Esse tempo já era. Não adianta falar que vai

censurar a imprensa e o Ministério Público, isso aqui não é Cuba, menos ainda

Venezuela. Tem muito fantoche por aqui, mas também tem gente que pensa e reage.

Democraticamente é claro! Diferente dos bandidos que invadem terra, só para dar

prejuízo para o fazendeiro.

Sou um estudioso do emprego das tecnologias da informação e da comunicação

desde 1996, tanto na UFMT como na Unicamp, sei do que estou falando. Onde está

o plano brasileiro de banda larga? Existe ou é mais um PAC 3.0 fumacê? Vale um

parêntese, no Rio de janeiro PAC quer dizer Plano de Afogamento dos Cariocas.

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Linha do Tempo Página 148

Quando o cidadão poderá conhecer e debater esse plano que afeta todas as crianças

brasileiras e o meu futuro? Acha isso pouco importante? O desgoverno Lula usou do

FUST quase R$ 10 bilhões e do FISTEL mais de R$ 12 bilhões que já foram para o ralo

são 22.000.000.000,00 de Reais jogados no lixo do superávit primário. Eu paguei

essa montanha de dinheiro na conta de telefone e no cartão do celular e quero o

serviço correspondente, previsto em lei.

Até parece que só eu tenho que cumprir a lei, pagando impostos e agradecendo a

Deus por estar desempregado (sabe quantos estão assim?). Mas, por culpa de

nossos governos, o Estado brasileiro tem sido omisso, frouxo e conivente com os

maus serviços. Ao meter a mão no meu bolso o governo tem que cumprir as normas

legais e usar esse dinheiro (FUST em especial) naquilo que melhora a vida das

pessoas, como exemplo a educação e a inclusão digital de nossos filhos e netos.

Depois de quase 16 anos de governos ruins será que vamos poder eleger alguém

sério, honesto, patriota, digno de nós? Será que vamos ver a continuidade afundar o

Brasil no conjunto das nações? Sabem como estamos em saúde, educação,

corrupção no ranking mundial? Pois é. São 16 anos de safadeza neoliberal onde uns

poucos enriquecem e muitos morrem nas filas dos hospitais, engolfados pela

violência urbana, no trânsito caótico, entre outros que ainda morrem de fome

(coitado do Betinho, do Fome Zero que morreu e nada conseguiu mudar nesses dois

desgovernos neoliberais).

O dinheiro desses fundos deveria fazer uma revolução nas comunicações de cunho

social, cidadã, com foco em governo eletrônico e educação. Mas, os quadrilheiros se

juntaram para manter o curral analfabeto, recebendo bolsa-esmola e votando no

poderoso chefão e em seus asseclas, como os sarneys da vida, collor, renans,

bovinos e gente desse nível moral que frequentam o palácio como bons e velhos

amigos.

Cadê o plano nacional de banda larga para os especialistas estudarem e debaterem

com o povo? Cadê a prestação de contas do uso dos fundos de telecomunicações?

Pois é, parece que a jogada era só fazer as ações de certa empresa explodir de

lucratividade, uns poucos ganharem milhões na bolsa e o resto é fumaça, conversa

para boi dormir.

(*) Professor de Computação da UFMT, pesquisador de Tecnologia da Informação e

Comunicação.

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Linha do Tempo Página 149

Coisas do cotidiano Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 13 de janeiro de 2011

Quem ainda não viu acontecer coisas banais em suas vidas? Todos vemos e nem

damos bola para os fatos que ocorrem ao nosso redor dia após dia. Alguns são tão

banais que damos de ombro e seguimos em frente. Outros, ainda que insignificantes,

chamam nossa atenção.

Hoje, no supermercado vi três adolescentes furando a fila enquanto duas mulheres

falavam pelos cotovelos na fila do caixa. Se para as duas fofoqueiras o fato passou

batido, para mim ainda causa espécie. Minha vontade foi puxar os espertos pelas

orelhas e colocá-los no fim da fila. Mas, o coração anda falhando e agora o bom senso

me manda contar até cem.

Falando em comércio você já entrou em loja que o vendedor aparece do nada

perguntando: Posso ajudar? Calma, deixa eu olhar e se algo me interessar chamo um

vendedor. Não precisa realizar essa abordagem de venda agressiva no varejo.

Assusta, incomoda e tira a liberdade do cliente de olhar os produtos.

Na Praça Brasil, estacionei o carro e fui atravessar na faixa de pedestre. Um casal de

meia idade que também ia atravessar a Av. Cuiabá preferiu seguir pela rua e

comentando desairosamente o fato de eu ir até a faixa. Escuto mal, mas acredito ter

ouvido o cara me chamar de otário. Caramba, atravessar a rua pela faixa de pedestre

é coisa de Mané. Total inversão de valores.

Domingo passado, durante o almoço no restaurante, entra um professor universitário

pega a marmita, cumprimenta um casal ao meu lado, anota o celular deles, olha para

mim de relance, se despede do casal e vai embora. Nem “oi cachorro” o educador me

deu. Fiquei olhando para outra colega presente e por lá ele também não

cumprimentou. Como posso educar sem dar o exemplo? Valor moral se exercita no

cotidiano e de nada adianta fazer lindas preleções sobre honra, honestidade,

urbanidade, etecetera e tal. Quem não vive os valores morais não está apto a ensinar

porra nenhuma.

Fui ao dentista, pois a velhice está fazendo meus dentes caírem da boca como

bêbado cai da bicicleta, estava chovendo e vi uma mulher se aproximar da entrada.

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Linha do Tempo Página 150

Como de hábito, aguardei sua chegada e mantive a porta aberta para ela entrar o

mais breve possível. Pasmem! A vaca foi incapaz de agradecer, dizer obrigado ou

mesmo sorrir com tal intenção. Palavras mágicas como obrigado e por favor estão

morrendo por falta de uso.

Quem ainda não viu um motoqueiro ultrapassar pela direita? Puxa vida, isso é

arriscado demais. Será que o piloto da moto não pensa o perigo desse ato banal? É

proibido no código de trânsito, dá multa e as pessoas burlam a lei numa boa, como

se estivessem colocando minhoca no anzol. Fazem isso na cara da polícia militar (que

teoricamente é responsável pelo trânsito) e ainda não vi um PM parar o motociclista

e multá-lo na forma da lei.

Por falar em polícia, tenho uma dúvida: os amarelinhos do trânsito possuem o poder

de polícia para vistoriar um veículo, o motorista e a documentação do auto? Será que

há uma nova polícia na área e eu nem sabia? Daqui a pouco até vigilante de banco vai

me encostar na parede e me dar um “jabaculê”.

Será que o sucesso da interdição ao trânsito de veículos das avenidas do centro da

cidade durante a semana do Natal fará uma autoridade propor o calçadão? Afinal, até

eu notei a melhora nas vendas quanto mais os comerciantes. Calçadão é shopping ao

céu aberto. Embeleza e dá vida ao que antes só passava carros e motos.

Essas coisas do cotidiano ainda me incomodam. Pode ser que minha idade esteja

pesando no julgamento dos fatos do dia a dia. Pode ser. Mas, abrir a porta do carro

para ela entrar, puxar a cadeira para ela sentar, fazer um comentário gracioso sobre

ela, sorrir ao encontrar um amigo, colega, conhecido ou até mesmo, para um

desconhecido, ainda fazem parte do meu imaginário de um cavalheiro ou

simplesmente de um homem educado.

Ser gentil nos relacionamentos com o outro pode ser entendido até como amor ao

próximo. Ou não? Se for verdade, a modernidade está matando a urbanidade e isso

é ruim. Pode ser diferente, basta eu mudar que o mundo muda.

(*) morador de Rondonópolis

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Universidade e livre pensar Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 15 de janeiro de 2011

Em minha prática pedagógica é comum eu baixar o cipó na tentativa das religiões de

entrarem no campus da universidade para fazer o velho conhecido proselitismo

religioso. Normalmente surgem fervorosos defensores dessa ou daquela igreja para

dizer que o apostolado de suas denominações faz assim ou assado a pregação

religiosa na academia. Mas, o diabo (se é que isso existe) é que os novéis estudantes

não caem no laço lançado e descambam para a defesa irracional de um credo

religioso.

Entra semestre, sai semestre e os zés ruelinhas não buscam na fonte do saber que a

História nos coloca a disposição para entender o que tento dizer. Quando pego

veteranos colando grau para orientá-los e digo: - Não agradeça a Deus em tua

monografia. O manézinho sem pensar emburra e põe a dedicatória a Deus só para

me contrariar. Pois é, assim terminam o curso sem descobrir (fim da educação é a

descoberta do conhecimento) porque a academia se livrou da religião, em especial da

Igreja Católica Romana, lá pelos Séculos XII a XIV.

Olha que estamos no Século XXI e os que governarão o Brasil amanhã não sabem as

origens da universidade, da idéia de formação da elite de uma nação, de livres

pensadores, de gente capaz de ousar dentro de um limite ético que nada tem a ver

com a pregação moral religiosa, baseada em revelações e interpretações.

Na academia, ou seja na universidade, enfrentamos inúmeros problemas de várias

ordens e implicações no trato com nosso objeto de trabalho: o conhecimento

científico, artístico, tecnológico e cultural.

A implicação primeira é de ordem epistemológica e diz respeito aos processos de

criação e transmissão de conhecimentos, sejam eles clássicos ou de ponta. Afinal,

como fazer isso para formar os quadros superiores da sociedade in totum com as

limitações impostas por esse ou aquele credo religioso. Por exemplo, colocamos em

funcionamento um acelerador de partículas que custa milhões de reais e como é

sábado, vamos desligar tudo por conta da proibição judaica de trabalhar nesse dia da

semana. Mas, essa implicação também está sujeita a outras formas de intolerância e

de preconceito de ordem política, racial, sexual, etc.

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Linha do Tempo Página 152

Outra implicação no processo de criação e transmissão do conhecimento na

universidade é de ordem econômica. Como manter a academia autônoma sem

depender de dinheiro carimbado por grupos sociais, religiosos ou congêneres. Como

criar e distribuir conhecimentos, orientar seu consumo e a troca de bens simbólicos

sem precisar de dinheiro? Por isso as universidades transformaram-se em

instituições estatais, capazes de funcionar com o dinheiro público.

Entretanto, por conta desse atrelamento ao poder público surge a próxima

implicação para o processo de produção e difusão do saber: as alianças que a

universidade estabelece com as classes dirigentes. O primeiro impacto disso está na

redução da universidade a um tipo de aparelho ideológico do Governo. Em seguida

vem o alinhamento incondicional ao mandatário sem mais criticar sua atuação. É um

terreno movediço e perigoso, pois a academia passa a criar o que o dono do poder

deseja e não o que a sociedade necessita.

Por fim, a última implicação está no campo cultural, pois cabe a universidade

preservar o saber, inovar na fronteira do conhecimento e de fazer imparcialmente a

crítica das mais variadas formas de expressão cultural ou simbólica. Como fazer isso

se a academia estiver atrelada a uma religião, a um partido político, a um grupo ou

classe social?

Para evitar que os formados permaneçam na ignorância sobre o por quê da

veemência com que defendo a separação da academia das religiões, dos partidos

políticos e dos governantes de plantão escrevi esse texto. E da próxima vez que

alguém pensar em fazer um culto religioso no campus de uma universidade

lembre-se que está colocando em risco o livre pensar dos homens e mulheres que

habitam a academia.

(*) Professor dos cursos de Licenciatura em Informática e Bacharelado em Sistemas

de Informação da UFMT

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A vergonha de ser fluminense hoje Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 19 de janeiro de 2011

Há mais de cinquenta anos passados nasci na Região Serrana do Rio de Janeiro,

clima ameno, frio no inverno, flores na primavera e gente boa às pencas. Lugar de

curar doenças, de passar férias, de fazer visitas turísticas, terra bonita e acolhedora.

De Itatiaia até Nova Friburgo existe um monte de lugares maravilhosos para se viver.

E isso não passou despercebido por levas de migrantes.

Mineiros e nordestinos em especial, mas também muita gente estrangeira se fixou na

região montanhosa. Gente que veio passear e nunca mais foi embora. Gente que

fugiu do horror das guerras na Europa e lá se fixaram em paz e harmonia. Dos

finlandeses de Penedo aos alemães de Friburgo, passando pelo “minerim de

juzdefora” ao baiano porreta as serras do Rio de Janeiro souberam acolher todos,

sem preconceitos, possibilitando a miscigenação enunciada por Darcy Ribeiro como a

raça brasileira ou povo brasileiro.

As cidades cresceram nesse meio-século e os problemas se multiplicaram. Os

políticos pioraram em termos éticos e a competência sumiu do mapa, já não existe

mais um administrador público, daqueles que morreram com os mesmos bens que

possuíam antes de tornarem-se políticos. Gente como Carlos Lacerda, Juscelino

Kubitschek e João Goulart, só para citar inimigos políticos também. Ou seja, não é o

fato de estar à direita ou à esquerda que obriga um governante a ser honesto e

competente ao mesmo tempo. Isso é coisa pessoal, do indivíduo. Faz parte daquela

educação que se aprende em casa.

Infelizmente o Rio de Janeiro vem sendo governado por levas de canalhas a muito

tempo, tanto em nível estadual como nos municípios. É gente desqualificada

moralmente para todo lado. Vereador que comanda milícia, prefeito chefe de

quadrilha de traficantes, deputados federais quadrilheiros do mensalão petista e

estaduais sendo processados por escravidão e por ai vai. Nas mãos desses bandidos

o estado vai literalmente por água abaixo.

O covarde do governador Sérgio Cabral embarca de férias em Janeiro, some em

Paris, na França. Caramba, logo ele que como eu nasceu no Rio e sabe que de Janeiro

até Março as águas vão rolar e o governo tem que estar presente, solidário e eficaz

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Linha do Tempo Página 154

diante das catástrofes que ocorrerão. É um moleque que devia vestir saia e tornar-se

a primeira dama da presidenta.

Se no passado os safados e safadas podiam dizer que desde a colônia o clima castiga

o Sudeste brasileiro, depois de quase nove anos governando, isso mesmo, a

presidenta é cria da herança maldita do lulismo irracional e responsável por não

realizar o mínimo previsto no orçamento da União, para prevenir desastres. Os

cretinos e cretinas dizem que gastaram tanto milhões em obras, mas não explicam

como essa merreca foi usada.

No caso do Rio de Janeiro foram 80 milhões em ajuda aos desgraçados em

2009/2010 e 8 milhões em prevenção. Só gente com uma má-fé infernal faz um

negócio assim. Gasta dez vezes mais em cesta básica para desabrigado do que em

contenção de encostas e remoção de favelas. Olha que a Bahia recebeu cinco vezes

mais dinheiro que o Rio. Quantas mortes ocorreram lá em 2009, como consequência

de fenômenos climáticos? Nenhum. Pois é, mas o candidato a governador de lá foi

ministro do interior no governo da continuidade e carreou a grana para seu estado

natal. É uma pouca vergonha.

A Folha de São Paulo publicou um estudo encomendado pelo governador Sérgio

Cabral, em 2008, que afirmava cientificamente que a região hoje devastada era a

bola da vez para um desastre climático. O que foi feito? O defensor dos maconheiros

e secretário de ambiente do Rio, o Carlos Minc disse que sabia do estudo e que só

faltou tirar as pessoas de lá. Pois é, eles são responsáveis por mais de 600 mortos!

Afinal, só faltou tirá-los de lá antes da desgraça.

Mas, meus conterrâneos também são culpados, pois elegeram e re-elegeram essa

corja de aproveitadores oportunistas, tipo urubu que olha a criança morrendo de

fome, pois ali está seu próximo almoço. Esse é preço do voto burro, do voto vendido.

A dor é imensa, pois falamos de mais de seiscentos mortos encontrados e os que

ainda estão desaparecidos (23 horas de 15/01). Votar é coisa séria e não comporta

eleger um Cabrazinho ou um Tiririca ou Romário, senão dá nisso.

A presidenta segue o estilo do chefe e joga a culpa em Dom Pedro I, mas não assume

a responsabilidade de ser até ontem, a chefe da casa civil do cara pouco chegado ao

trabalho, logo a maior responsável pela execução dos programas governamentais,

inclusive na prevenção de desastres. É que ela está aquecendo as turbinas e vai

longe, quando o motor pegar talvez vá para a Bulgária.

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Linha do Tempo Página 155

São quase nove anos de desgoverno, com ela como maestrina do PAC (Plano de

Afogamento de Cariocas) e mais de seis do Sérgio Cabral. Se o estudo é de 2008,

então deu tempo de colocar os recursos no orçamento de 2009 e também no de

2010. Por que não está lá o dinheiro necessário às obras de prevenção? Dá votos

visitar zona destruída, apertar mãos de desgraçados pela catástrofe, anunciar que vai

liberar milhões para ajudar os infelizes da vez, mas fazer algo para resolver o

problema, nem morto!

Cumprindo o vaticínio de Rui Barbosa, hoje eu tenho vergonha de ser fluminense. De

ser governado por gente desse tipo. Meu estômago dá voltas quando ouço ou vejo

um desses cretinos dando entrevistas. As palavras de condolências saem de suas

bocas, mas em seus olhares há uma alegria horripilante, cuja causa é saber que os

desgraçados de hoje vão precisar estender as mãos e pedir esmolas aos governantes

incapazes de fazer o que a lei determina por si mesmo, mas ávidos pelos votos da

próxima eleição.

(*) Nascido em Vassouras, região serrana do Rio de Janeiro e criado em Paracambi,

na Baixada Fluminense.

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Saiba por que as eleições já passaram Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 06 de fevereiro de 2011

Fui a Cuiabá dirigindo meu carro e no caminho fui percebendo que o Brasil fantástico,

maravilhoso, endinheirado e de juros baixos, cantado em prosa e verso no período

eleitoral, acabou. Você notou isso? Não? Duvido que um negócio desses, tão

importante para a tua vida, tenha passado em brancas nuvens. Ah, você estava

ligado nas negociações do passe do Ronaldinho. Será você o maior babaca da Terra?

Aquele que na música do Raul Seixas babava diante da TV esperando a morte

chegar?

As placas informando que ali existia uma obra do governo federal ainda estão lá, mas

as obras e as empresas construtoras sumiram. Nem mesmo na serra vi gente

trabalhando, olhe que a obra do trecho da serra de São Vicente começou no século

passado e sempre tem um empreiteiro faturando por ali. Pode acreditar! Em 1999, os

noticiários já mostravam uma briga desgraçada pela tal duplicação da BR-364 no

trecho da serra. Era uma sopa de letrinhas de gente contra e a favor: FEMA,

Consema, DNER, MPF, os cambaus, brigando por conta da destruição no meio

ambiente que a pista de descida iria causar.

Ali já teve placa dizendo que a obra na serra estaria concluída em outubro 2007.

Lembra dessa? Não? Para com isso, assim vou acabar acreditando que o William

Bonner, da Globo, ao te chamar de Homer Simpson, por ser preguiçoso e ignorante,

estava certo. Acredito que todo mundo já inaugurou aquela obra e deu prazo para

que a gente passasse de carro por lá. Bando de mentirosos, entre outras coisas.

Só para relembrar, coletei pela Internet nos jornais do Mato Grosso algumas notícias

tratando da duplicação da rodovia BR-364 na serra de São Vicente: Em 17/12/2001

o senador Carlos Bezerra anunciava milhões para a duplicação da BR364; Em

18/04/2006 Laércio Coelho Pina (DNER) dizia que as obras estavam estimadas em R$

30 milhões. Em 04/07/2006, Luiz Munhoz, afirmava que o DNER já havia empenhado

14 milhões para a obra, num total de R$ 20 milhões previstos. Em 01/05/2008 o valor

da obra subiu para R$ 26,8 milhões conforme notícia do TCU.

Em 14/04/2009, a obra termina em um ano afirma Rui Barbosa Egual (DNER). Nilton

de Britto (DNER) e Moisés Sachetti (PR-MT) afirmam em 24/08/2009 que a obra fica

pronta em 120dias. Na mesma data, Luiz Antonio Pagot disse que a cobrança da

conclusão da obra é dor de cotovelo do senador Jaime Campos. Alfredo Nascimento

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Linha do Tempo Página 157

afirma que a expectativa é que até 2009 todas as rodovias federais em Mato Grosso

estejam em boas condições de trafegabilidade, anunciou também a abertura de

concorrência para as obras da serra de São Vicente, de mais de R$ 39,9 milhões.

Em 13/03/2010, Silval Barbosa e Luiz Antonio Pagot inauguram a obra. Pagot afirma

que em Junho 2010 a pista de descida estará pronta e funcionando. O investimento

chega a R$ 80 milhões em 2011, para uma obra orçada em R$ 20 milhões. Terminar

uma mamata dessas só se for um idiota de carteirinha. Essa obra vai acabar na Copa

do Mundo. Até lá haja dinheiro e mortos na serra.

Chegando ao aeroporto comecei a olhar as coisas, enquanto esperava a neta chegar,

e ao olhar para cima fiquei pasmo. As placas do forro do teto do aeroporto estão

caindo e a obra foi inaugurada em 2008. Ali também as coisas andam a passos de

cágado, pois aquelas obras começaram em 1999 e foram inauguradas em dezembro

de 2008.

Novamente usei a Internet para pesquisar os jornais do Mato Grosso que noticiavam

alguma coisa daquela obra: Em 04/06/2002, dizia que o Aeroporto estava passando

por reformas e ampliação e que seriam investidos R$ 18 milhões na obra. Em

29/12/2005, a notícia dizia que o aeroporto estava em reforma há cinco anos e corria

sérios riscos de desabamento. Em 14/03/2006, Erasmo Aimone Pinto (INFRAERO),

anunciava que a primeira etapa da ampliação do aeroporto seria concluída em junho

de 2006. Para o término de toda ampliação foi previsto um orçamento de R$ 34

milhões. Para a conclusão do Bloco C foi assinado um contrato emergencial de R$ 14

milhões. Existe uma estimativa de que a Infraero já tenha gasto R$ 29 milhões na

obra. Somou?

Em 24/04/2006, um deputado federal afirmava que graças ao seu esforço pessoal a

INFRAERO liberou mais R$ 32 milhões para o término da obra. Em 23/4/2008 a

notícia era de que as obras previstas para entrega em 28/05/2008 não serão

concluídas no prazo. Em 25/02/2010, outro deputado federal afirma que a previsão

de término da expansão do terminal vai até julho de 2013, e o investimento é da

ordem de R$ 85,26 milhões. Mas, a Infraero prevê mais investimentos em torno de

R$ 87,5 milhões para o aeroporto até 2014. Poço sem fundo! Soma esses valores e

construa dois outros aeroportos.

Notei que entre 2003 e 2011 as obras federais no estado foram inflacionadas, pena

que o dinheiro é meu, teu, nosso e pelo que sei nada vai mudar até 2014. Então só

tem um jeito – votar melhor. Se os partidos políticos continuarem apresentando

candidatos com o mesmo padrão dos anteriores, tipo tiririca com amendoim, só

boicotando as próximas eleições.

(*) Contribuinte e morador em Rondonópolis.

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Linha do Tempo Página 158

As múltiplas formas da intolerância Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 16 de fevereiro de 2011

Tolerância é uma palavra bem safadinha. Vem do Latim tolerare, tolerantia e na

origem quer dizer suportar, aguentar, sustentar uma dor física ou moral, conviver

com outro de opinião contrária, seja ela cultural, moral, religiosa, civil. Traduzindo:

tolerar é sustentar o cunhado só para não perder a esposa.

As pessoas não são tolerantes de nascença, ao contrário, observe as crianças bem

pequenas e perceba o quanto elas exigem que o mundo gire em torno delas. É um

negócio chamado egocentrismo, que muitas vezes agarra a alma do sujeito e o torna

um chato de galocha que inferniza os demais até sua morte.

Na primeira infância a família educa a criança, mostrando que é preciso viver com os

outros, em outras palavras, socializa o pequeno. Isso é continuado na escola e

enquanto estuda análise sintática, dia do fico, numerais romanos e outras

babaquices que não servem para nada na vida, também aprendem a conviver com o

outro, a tolerar o próximo que senta na carteira ao lado.

Às vezes o outro tem a cor da pele diferente, o formato dos olhos puxadinhos, não

tem sapato para calçar ou comida para comer, os cabelos são lisos ou crespos

demais. E por aí vai aparecendo diferenças mil que surgem na escola e na vida. Aos

poucos a molecada vai aprendendo a ser tolerante. A ver o outro como diferente,

mas isso não tem nenhuma importância para a convivência. Pelo menos a maioria

vive esse processo.

Ocorre que a metade menos um é minoria e isso pode ser gente que não acaba mais.

E, tem infeliz que não aceita bem essa coisa de tolerância e parte para a briga em

várias frentes de luta, modos de guerra e campos de batalha. São os chamados

intolerantes. Gente que não possui a capacidade ou a habilidade ou a vontade de

respeitar as diferenças. Dureza!

Não falo da intolerância da esposa em não deixar o marido ter muitas sogras, como

os mulçumanos possuem. Afinal, tem coisa melhor que sogra? Também, não falo de

corintianos exasperados contra a falta de títulos do “timinho”. A preocupação que me

faz escrever é a intolerância que fica visível ao menor ato de exercício democrático,

ou de liberdade, ou mesmo de livre-arbítrio de um cara qualquer e surge uma

multidão para linchar o “mané” que ousou falar o que pensa ou acredita.

Aceito viver com qualquer pessoa no trabalho, desde que ele seja um vascaíno como

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eu. Ora, isso é uma demonstração inequívoca de intolerância futebolística. Ou pior,

só me caso se o cônjuge for de tal raça. A intolerância é a mãe do preconceito, do

racismo e da perseguição que vem a reboque dessas indesejáveis atitudes morais e

culturais.

Andei pelo Brasil todo e vi muita intolerância velada ou aberta. Em certa cidade de

Santa Catarina riram da minha pele morena, da minha bermuda surrada, do meu

Português bem carioca, demonstrando que só os descendentes deles mesmos são

pessoas integrais. Se não fosse a minha carteira de dinheiro certamente os arianos

tropicais me colocariam dali para fora.

Em Recife, Pernambuco, a coisa foi diferente. Ao dizer que estava hospedado no

hotel tal, a pessoa que me recebia no trabalho mandou seu motorista buscar minhas

coisas, pois só gente sem vergonha vivia na naquela rua de perdição. Perdi uma

oportunidade de ouro de me perder por lá. Pura intolerância da chefa.

Aqui mesmo em Mato Grosso, me chamaram de “pau-rodado”. Nem gostando de

Cururu, do Siriri, de chupar manga, comer pacu assado e beber guaraná o adjetivo

vai embora. Parece que fui marcado como boi. Minha vingança é que pelo andar da

carruagem daqui uns vinte anos só os índios serão mato-grossenses de

“chapa-e-cruz”, como quer à cuiabania.

Até mesmo na Medicina a intolerância é indesejada. Bebê intolerante ao leite dá um

trabalho danado. Tem gente que não pode ser picado por abelha, outro nem pode

pensar em beber uma pinga, pois são intolerantes a alguma daquelas substâncias.

Coisa ruim é ser intolerante.

Respeitar as diferenças de crenças e opiniões é difícil para aquela minoria que ou

foram criados cheios de tabus, ou foram criados de maneira preconceituosa, ou

decidiram ser intolerantes apesar da educação em casa e na escola dizer que isso é

uma droga. É o cara que quebra a lâmpada florescente na cara do outro por que a

orientação sexual daquele é diferente da sua. O mesmo que atira na cara da moça

que está manifestando sua opinião contrária à tirania do fundamentalismo religioso

estatal. Ou ainda, que diz ser igual a greve de fome de libertários cubanos e bandidos

do PCC paulista em motim.

Ocorre que mesmo entre nós, os chamados acadêmicos, gente que tem a obrigação

moral de ser tolerante, a intolerância aparece a cada momento. Um voto negado por

conta da filiação partidária diferente, um parecer desfavorável por conta da diferença

de opinião política, um ataque veemente contra a idéia do outro que sugere caminho

científico novo e ponha em risco o conforto intelectual burro e indolente, um ataque

velado ao outro que defende posições divergentes em campos distantes da

universidade, mas que espanta do campus influências nocivas do preconceito, da

perseguição e da maldade. A lista não tem fim.

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Claro que não devia ser assim entre pessoas educadas exatamente para serem

tolerantes com a opinião contrária. O fim da educação é formar cidadãos para a

sociedade, isto é civilizar as pessoas. Lógico que sabedores que a verdade é

provisória e temporária jamais poderiam ser intolerantes em nome de outras

verdades nascidas longe da academia.

A Ciência é laica, não se submete ao poder do estado, não se imiscuí com o

conhecimento advindo do senso comum, da religião ou da filosofia. A Ciência é

exercida por seres humanos livres, no exercício do livre pensar e do livre-arbítrio.

Sem isso não há como produzir o tipo de conhecimento chamado científico. Com sua

organização, sistematização, observação, medições e erros a Ciência caminha com o

objetivo de melhorar a vida das pessoas.

Quando no Século XIII nasceram às universidades, lá pelos idos de 1.170, a busca da

autonomia foi à primeira luta de seus membros. Deveria ser a luta dos seus atuais

membros. Pena que não é. Tem ideologia atrapalhando, tem religião atrapalhando,

tem submissão ao governo atrapalhando, tem preconceito de vários matizes

atrapalhando, todos com a intolerância que lhes são peculiares. Como diria o ateu

brasileiro: - Oh meu Deus!

O desafio maior de cada membro da academia, e a universidade é seu lugar

privilegiado, está em conviver com o diferente e dessa convivência produzir algo bom

para a sociedade. Eu, particularmente, não gosto de flamenguista, entretanto nunca

perguntei a um estudante, no momento da defesa de uma tese qualquer, para qual

time ele torcia. É irrelevante se o colega de academia é baixo, mediano, alto, homem,

mulher, heterossexual, homossexual, transexual, rico ou pobre. O que interessa é o

que ele sabe e o que ele faz com o que sabe.

Se assim não for, vamos devolver a universidade à sua antecessora no domínio do

saber, a Igreja Católica, e deixar que ela produza subjetivamente milagres para curar

um infarto como ao que eu sobrevivi em lugar de técnicas médicas e medicamentos

farmacêuticos capazes de objetivamente salvar vidas.

Sinto-me bem na universidade porque respiro o saber dos outros, burilo pedra brutas

cujo interior possuem altíssimos potenciais de brilho e ouço a grama crescer junto ao

conhecimento humano civilizatório. Saio de lá e vou ao templo, agradecer a Deus por

me permitir conviver com a razão, com o sentimento e com a moral, itens tão

necessários para ser tolerante o bastante para amar o próximo. Inclusive o próximo

intolerante.

(*) É professor da UFMT

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Viajar no Brasil é uma aula de vida Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 23 de março de 2011

Se existe algo que gosto de fazer é por o “pé-na-estrada” e sair pelo Brasil afora

viajando e conhecendo lugares e pessoas. Mas, além do prazer, viajar tem sido uma

escola de vida. Às vezes aprendo coisas boas para por em prática na hora. Outras

vezes as lições ensinam o que não se deve fazer na vida.

De Rondonópolis até Goiânia só encontrei coisa ruim na estrada. Em Jataí - GO fui

multado por um policial rodoviário federal. Até aí nada de mais, pois eu ultrapassei

em local com faixa central contínua. Vamos aos motivos que tornaram o fato

negativo. Primeiro, as péssimas condições da estrada não permitem enxergar a

pintura da faixa central. A buraqueira transformou a faixa contínua em intermitente.

Segundo, e pior motivo de minha indignação e repúdio, o policial federal estava

escondido para flagrar motoristas desavisados e infratores como eu. Aí é uma

vergonha!

Explico: um agente policial preparar uma emboscada para autuar

cidadãos-motoristas em infrações de trânsito demonstram o despreparo moral desse

agente para o exercício da função policial. Um policial não prepara armadilhas para o

cidadão. Ou ele deixa de ser policial e torna-se um bandido. Parece filme americano,

onde o carro patrulha fica escondido para abordar os motoristas. Isso é coisa de

cinema, não da vida real.

Mas, entreguei a carteira de habilitação e o documento do carro nas mãos do

despreparado agente e ouvi que receberei em casa a notificação. Estranho isso, pois

quero assinar o talão de multa e registrar meu desagrado pela atitude canalha do

PRF. Como passei dos cinquenta anos, sei que é besteira buscar ouvidoria,

corregedoria e coisas do tipo, pois colegas sempre são parcimoniosos com iguais.

Afinal eu ultrapassei em local proibido e deve pagar a multa sem chiar.

Chegando a Goiânia. Já com noite alta, enfrento um sério e velho problema daquela

capital: a sinalização é uma porcaria. Sem saber onde estava, pois nenhuma placa

dizia minha atual localização, não conseguia encontrar outra que me dissesse para

onde estava indo. Nem os goianos sabiam me informar para onde eu devia ir. Depois

os caras ficam chateados quando sofrem a gozação de possuírem a melhor

universidade do mundo, por ser capaz de formar um goiano.

Matei minha saudade das netas, do filho e nora. Segui adiante para Minas Gerais.

Chuva terrível, estragos aqui e ali no caminho. Fui dormir em Congonhas, ao lado da

maravilhosa obra do Aleijadinho. Olhando as gigantescas estátuas em pedra aprendi

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Linha do Tempo Página 162

o quanto o artista foi mau: todos os demônios têm cara de inimigos políticos e

religiosos do autor. Ao passo que os profetas possuem rostos de amigos.

No dia seguinte andei pouco e parei em Santos Dumont. Rever velhos amigos não

tem preço e fiz isso cheio de alegria. Haja coração. A acolhida mineira é algo incrível,

você é tratado como um da família. Melhor impossível.

Já no quinto dia de viagem ultrapassei a divisa com o Rio de Janeiro. Minha terra.

Parei depois da ponte e pisei descalço naquela terra. Visitei o lugar onde nasci:

Vassouras, terra do príncipe e dos barões da Monarquia. Minha neta ficou babando

nos palácios, casarões, solares e praças daquela cidade imperial. Eu fiz questão de

almoçar, pois era sábado, dia de feijoada. Pena que minha dieta não permitiu

saborear o torresmo, o paio, a pinga com limão.

Dali fomos pela rodovia Rio-Bahia até Barra Mansa e de lá, desci a Serra do Mar até

Angra dos Reis. Que vista! Como é linda a paisagem da Mata Atlântica e do oceano lá

embaixo. No quilombo de Serra d’água tem doce caseiro de tudo quanto é jeito e

sabor. Vale à pena ganhar um quilinho extra. Chegando ao Frade, dobrei a direita em

direção a minha casinha em Ubatuba, vizinha de Paraty e trezentos anos de História

do Brasil. Caminho do Ouro, de índios Tupis, Tamoios e Tapuias, dos quilombolas de

Pedra Azul e Camburi.

Em Paraty, andando no pé-de-moleque que calça as ruas, pode-se comer um

quebra-queixo delicioso, ou um cuscuz com leite condensado capaz de revigorar o

viajante cansado. Isso sem contar o bolinho de bacalhau em Lídice. Depois de um

pastel de camarão com caldo-de-cana a viagem prossegue pela via Rio-Santos.

Quem puder vá. Não existe lugar mais bonito nesse planeta do que o trecho de litoral

denominado Costa Verde. Só vendo é possível entender isso, pois os túneis naturais

de flores formados pelo Manacá-da-Serra explodindo de cores são exuberantes.

Orquídeas floridas, Maria sem vergonha para todo lado, gengibre do mato, bananeira

de jardim, flores que não acaba mais, formam um tapete ao lado da estrada. Sem

contar as paisagens cinematográficas de Tarituba, Praia da Fazenda e tantas outras

pequenas localidades caiçaras.

Ao chegar a casa, na linda Praia do Tenório, em Ubatuba, os olhos se enchem de

lágrimas. Os netos que faltavam estão lá. Aperta aqui, abraça ali, beija acolá, e o

passeio a pé apresenta dois gigantescos navios transatlânticos ancorados na Baia do

Itaguá, despejando turistas em terra. É uma bonita visão.

Pois é, como sempre viajar mostra vários lados de um polígono de surpresas,

chamado vida. Tem gente burra, safada, inteligente, honesta, lugares ruins e outros

maravilhosos. O negócio é aproveitar o que a experiência oferece e aprender a viver.

A volta foi rápida, pois o batente chamava.

(*) Morador de Rondonópolis

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Até homem chora Ruy Ferreira(*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 14 de abril de 2011

Como eu gostaria de escrever o que realmente sinto agora em minha alma. Mas, falta

inteligência, criatividade e talento para isso, sem contar na barreira que a vida me

ensinou a levantar diante das emoções: homem não chora!

Entretanto, existem momentos que o terremoto das emoções nos joga no chão e sem

piso seguro nossas pernas fraquejam, tremulam e despencamos feito castelo de

cartas. E, parece que nos dias de hoje ao fim de um sismo sempre há um ou mais

tsunamis para destruir a fortaleza que desde tenra idade nos ensinaram a esconder

dentro.

Nem bem uma dor esmaece e já vem outra igual ou maior provocar as defesas do

macho incapaz de demonstrar sua dor, sua fraqueza, sua fragilidade, diante do

mundo e suas tragédias.

O que há conosco? Será que os pregadores da Era de Aquarius estavam certos? Um

novo tempo é chegado e o amor será colhido por todos, na marra. Uns pelo prazer,

outros pela dor, aqueles pela dedicação ao próximo, esses pela impossibilidade de

reagir aos acontecimentos. Início dos tempos? Sei lá.

Se não bastasse a dureza dos efeitos terríveis das catástrofes naturais, aquelas que

seguindo leis da Natureza (para muitos, de Deus) destroem sonhos, esperanças e

vidas, as criações humanas não resistem a tais impactos e aumentam, ampliando

negativamente os efeitos nefastos da Natureza, ceifando mais vidas ainda,

condenando gente a doenças e sofrimento imensuráveis.

Um terremoto danifica uma usina nuclear, o tsunami que se segue ao sismo traga

milhares de vidas para o mar, os que sobrevivem as duas catástrofes, sem que

houvesse tempo de erguer a fronte, descobrem-se no centro de um gravíssimo

acidente nuclear. Nada de bomba atômica, isso é sensacionalismo do jornalismo

burro brasileiro. Nada de explosão que mata instantaneamente. A radiação que vaza

do reator é invisível aos olhos, não é possível escutá-la, sentir seu gosto, nem mesmo

tocá-la com os dedos. Mas, ela está lá, impregnando ar, água e solo e preparando o

terreno para matar sem dó nem piedade.

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Linha do Tempo Página 164

Os efeitos da radiação podem demorar anos para surgir, pode ser até que o

primeiro-ministro japonês seja outro quando os efeitos tornarem-se patentes. Os

japoneses sabem que o território onde o arquipélago está vai virar outra Atlântica,

isto é, vai sumir do mapa-múndi. Vai demorar, mas as leis naturais não contam o

tempo em anos e em uma era do futuro o pessoal da arqueologia vai encontrar uma

civilização extinta, de olhinhos puxados e com uma cultura maravilhosa.

No Brasil estamos longe desse tipo de catástrofe. Entretanto as chuvas causam aqui

a mesma quantidade de mortes que os terremotos causam por lá. Só que as chuvas

têm como se prevenir, terremoto não. Nosso problema é corromper até sonhos, pois

aqui as tragédias se repetem com data marcada e nada se faz para mudar isso. Eu

mesmo vivi a destruição da Serra da Araras, em 1967. Tirei nadando crianças de

telhado de casa em bacias de banho, lá na Guarajuba em Paracambi-RJ, em 1972, vi

e vivi ano a ano meus pais e vizinhos perderem seus bens materiais por conta de

enchentes cíclicas e previsíveis. Petrópolis, Teresópolis, Nova Friburgo, favelas

cariocas desabando por conta das chuvas de verão, isso é notícia requentada.

Talvez, só talvez, devêssemos oferecer nosso território para o povo japonês fixar sua

amada nação junto à nossa, em troca nos ensinariam a enfrentar a Natureza com

dignidade e preparação rigorosa. Além de nos ensinar outras virtudes de sua cultura.

Ocorre que ainda contando os milhares de mortos do Oriente, o homem, que muitos

insistem ser a imagem e semelhança de Deus, decide matar, machucar, dilacerar a

carne de crianças e adolescentes em plena sala de aula. Não, a humanidade do

homem não é isso. Isso é doença. Isso é bestialidade. Isso nada tem a ver com

civilização.

Deixando de lado a atitude do pai que joga fora o sofá ao encontrar a filha e o

namorado transando nele e está resolvido o problema, pois sem o sofá a honra da

moça está salva. Discordo que este seja momento para acender o debate sobre porte

de arma por cidadão brasileiro. O momento é de dor, de consternação. Fora abutres.

É a segunda vez que um crime dessa natureza é cometido no Brasil, o primeiro em

2003 e agora outro. É para ficar perplexo. O queixo tem que cair. As autoridades

policiais têm dois casos para estudar em suas academias. A crueza do fato é tão

brutal que ninguém tem o direito de explorar a dor e a perda daquelas famílias.

Falar em falta de segurança na entrada da escola é uma piada de mau gosto. A UFMT

tem guarda armada e nem por isso impediram que os ladrões queimassem e

destruíssem um caixa eletrônico de banco no seu pavilhão principal. Sem contar o

fato que no Rio o assassino era ex-aluno dali e não possuía qualquer antecedente

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criminal que impedisse seu acesso à escola, à igreja, ao fórum, ao hospital ou ao

shopping.

Respeito o direito da autoridade se expressar, mas não se pode aceitar o uso da dor

do outro para se autopromover. Somos latinos e respeitamos a perda do outro com

solidariedade. Claro que também não aprovo o descontrole desesperado com que

pessoas demonstraram diante do quadro de terror em Realengo. Mas, repito, somos

latinos e nossa dor brota incontrolavelmente quando a sentimos. Os desmaios, a

gritaria faz parte da manifestação da dor. Que fazer. Berramos em restaurantes e no

consultório do dentista, quanto mais diante do desastre.

Vi gente que ouviu dizer e foi para frente das câmeras darem detalhes que não viram.

Pior, repórteres despreparados ouviam o requentamento da notícia ao vivo e em

cores. Gente que em lugar de socorrer as crianças preferiu ficar olhando o desfecho

trágico e anunciado de toda ação similar: a morte do agressor. Parece que a

humanidade do homem se compraz com a visão do cadáver do assassino sendo

trazido no saco preto.

Com a internet as imagens se multiplicaram e os vídeos postados na internet foram

usados pela televisão. Isso é novo. A televisão está sendo ultrapassada por outro

meio de comunicação e acho bom a TV ser engolida pela Internet. Entretanto,

cuidado, pois tem gente má e irresponsável postando mensagem do assassino em

nome de terceiros. Isso é uma infâmia, um total desrespeito com as vítimas. Onde

está a humanidade desses crápulas digitais?

Por fim, sucumbi à tragédia no Rio. Talvez o fato de ter sofrido alguns ataques

cardíacos tenha me deixado diferente. Pois, não foi possível impedir que os olhos

marejassem de lágrimas diante da enorme tragédia moral que teima em enlutar

todos nós. O forte, a fortaleza ruiu. E, pior, com ela se foi um pedaço de minha

própria humanidade.

Vou fingir que isso não me afetou e tentarei passar um fim de semana igual a tantos

outros. Pode ser que na segunda-feira eu sorria diante de uma coisa engraçada, mas

por dentro, eu ainda vou chorar. E depois disso, tentarei esquecer o acontecido,

deixando o fato junto a tantas outras tragédias que a vida colocou em meu caminho.

Brasileiros, meus pêsames.

(*) carioca perdido no Mato Grosso desde 1982.

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Fora Dilma! Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 02 de junho de 2011

Quando o Sarney era presidente da república o Partido dos Trabalhadores (PT) fez

inúmeros movimentos políticos para apear o coronel maranhense do poder. Era o

“Fora Sarney”. Com uma inflação maior que 2.500% ao ano, falar mal daquele “cabra

da peste” era moleza, tanto assim que o deputado Lula chamou Sarney de “um

grande ladrão” em discurso feito no dia 6 de setembro de 1987, em Aracaju.

Entrou o Collor em lugar do Sarney e o PT, até então o guardião da ética e da

moralidade, entrou de cabeça no movimento estudantil que pedia “Fora Collor”, em

1992. Afinal, o alagoano era acusado pela oposição de enriquecimento ilícito com

dinheiro arrecadado via campanha eleitoral por PC Farias, parece sacanagem, mas é

exatamente a mesma coisa que acontece agora com a dupla Dilma/Palocci. O

presidente da UNE, Lindenberg Faria (hoje senador do PT), capitaneou o grito de

indignação e as ruas ficaram cheias de estudantes com suas caras pintadas pedindo

o fim das roubalheiras do governo.

O Collor cai por não dividir o poder e o STF diz que o homem é limpo feito gaze

esterilizada, absolvido com louvores pela mais alta corte de justiça (?). Hoje é um

aliado imprescindível de Dilma, a rainha muda do castelo da alvorada. Assim caminha

a humanidade.

Mas, o tempo passa e o substituto de Collor é Itamar Franco, considerado por muitos

como um democrata honesto, mas na visão do PT ele não passa de um vendilhão do

templo que vai a banquete no FMI. Então em 1993 o partido dos socialistas impolutos

lança nova campanha difamatória contra o “topete do planalto”: É hora do Fora

Itamar e FMI. Ué? O homem que tem peito para afastar um ministro acusado pela

imprensa de corrupção, para que o ministro se defenda sem macular o cargo é

considerado um traidor pelo petismo irresponsável. E agora?

Ocorre que o povo brasileiro novamente usou as urnas para dizer ao partido que a

moralidade é individual e só se torna coletiva quando todos são moralmente corretos.

Perde o PT pela segunda vez a candidatura à presidência da república. Sem opção

decente em 1994 o povo escolhe o menos pior: FHC.

Um marxista presidente. Homem estudado, ateu convicto, chamado de maconheiro

por Jânio Quadros em 1985, auto-exilado, filho de três gerações de generais,

senador sem um voto sequer, perdedor da candidatura a prefeito de São Paulo para

Jânio e a senador em 1978, ou seja, um acadêmico ruim de voto. Tem fotos dele e do

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Lula distribuindo panfletos nas ruas, juntinhos, em plena demonstração de amor

eterno.

Outra vez, capitaneado por Lula, o volúvel, o Partido dos Trabalhadores

entrincheirado na moral e na ética lança uma campanha moderna: Fora FHC.

Demonstrando uma imensa criatividade o PT agora quer apear FHC, o traidor do

Brasil, da presidência da república. O motivo? As acusações de compra de

parlamentares para aprovação da reeleição (Mensalinho do FHC) e de falcatruas nas

privatizações das empresas estatais com o Banco Opportunity. Tinha gente do

governo levando por fora para fazer ou deixar de fazer coisas. Algo parecido com a

Erenice da Dilma.

As reformas do FHC foram atacadas pelo PT e o próprio Lula junto à aguerrida

senadora petista Heloisa Helena baixaram o pau no lombo do traidor do povo que

criou a tal idade mínima para aposentadoria. Lula discursou na Câmara dizendo que

o esquerdopata queria “criar o limite de idade para que a classe trabalhadora morra

antes de se aposentar”. O mesmo Lula que em 2003 ampliou o estrago de FHC na

Previdência, aumentando ainda mais a idade e expulsou a chata da Heloisa Helena do

PT.

Dois mandatos (um comprado e pago) para o vendedor de coisas alheias FHC foram

suficientes para o povo dizer chega. E, então, num passe de mágica do criador de

galos de briga Duda Mendonça, aquele que recebeu 10 milhões por fora do PT em

contas localizadas em paraísos fiscais, o Lula é ungido pela propaganda e vira o

“lulinha paz e amor”. Detona o esquerdinha sanguessuga Serra e vence a eleição

para presidência da república. Agora vai! Diria um cuiabano.

E foi mesmo, tanto é que em 2004 o Waldomiro Diniz é pego achacando um bicheiro

do Rio de janeiro para arrecadar dinheiro para a campanha do PT. Olhe que o

Waldomiro é assessor de José Dirceu, outro arrecadador e distribuidor da república

embananada. Como guardião da ética, da moral, dos bons costumes e das minorias

da avenida paulista, Lula demite Waldomiro e chama Sarney para aconselhá-lo.

Nasce uma nova amizade colorida: Lula se apaixona por Sarney.

Junto ao impoluto Sarney, vem a tropa de choque formada por líderes guerreiros

fiéis: Renan Calheiros, Romero Jucá, Fernando Collor e outros da mesma estirpe.

Agora o governo petista é a elite do Brasil. Só os melhores estão no poder. A ministra

Dilma do apagão elétrico é chamada ao palácio do hômi. José Dirceu caiu em

desgraça e foi pego com a boca na botija pela Procuradoria Geral da República:

estourou o mensalão do Lula. Caramba, o cara mais inteligente do PT comanda a

esquadrilha de parlamentares, empresários e dirigentes partidários que saqueiam os

cofres públicos? E a História vai se repetindo.

Roberto Jeferson avisa ao Lula que estão alugando deputados para votar de acordo

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com o governo. O mecânico 171 responde que é uma evolução: FHC comprou

deputados, ele estava alugando. Mas, o Dirceu foi cassado e Lula colocou Dilma a

“dama de ferro” em seu lugar no palácio, com a Erenice à tiracolo.

Claro que houve muitos outros escândalos no governo do petista Lula: Correios;

Bingos; a morte de Celso Daniel; a morte de Toninho do PT; Daniel Dantas do Banco

Opportunity com o filho de Lula que de vigia de zoológico torna-se mega-empresário

e do financiamento do mensalão em 2008. Lula inova e cria o “Deputado pré-pago”,

parlamentar que recebeu tantos mil reais e vota em qualquer coisa que o PT desejar.

Lúcia Hipólito, em 2005, denunciou isso e os petistas abafaram sua voz.

Ai a desgraça se abate sobre o queridinho do Lula: Palocci é acusado de quebrar o

sigilo bancário de um trabalhador doméstico. É um ministro atacando covardemente

um simples trabalhador. Estoura mais uma escândalo petista e cai outro ministro

amigo do hômi. Gente que na oposição queria o fim do superávit primário e quando

ministro da fazendo juntou uma bolada que daria para pagar até a dívida externa,

mas é claro não pagou. Gente incoerente essa. Só mesmo banqueiro gosta deles

Sai Palocci entra o Mantega, mentiroso que só, aquele que disse que a gasolina não

aumentaria até o fim do ano e aqui passou dos três reais. Lembra disso? E o governo

Lula chega ao fim, igualzinho o de Sarney, Collor e FHC.

Podia ao menos parecer com o de Itamar Franco na moralidade, mas não, preferiu o

caminho da corrupção, do encobrimento e do “eu não sabia”. As desculpas acabaram

e ai inventou a explicação enviesada: se fulano já fez isso por que eu não posso

fazer? Ou seja, em lugar de explicar o crime, arranja outro criminoso igual para

justificar o fato.

Dilma é o Lula de batom, palavras dela. Dilma é companheira de armas do Dirceu,

palavras dele. Dilma a chefe da Erenice. Dilma a que escolheu Palocci para chefiar o

governo e parece estar refém do PMDB por conta das denúncias de tráfico de

influência. Na primeira crise de governo chama o babalorixá Lula para coordenar, ou

seja, entrega o poder a outro não eleito. Como Lula virou refém do Sarney e

camaradas, Dilma tornou-se refém de Lula e companheiros. Já vi esse filme e odiei o

final. Fora Dilma!

(*) morador em Rondonópolis

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Centro de Apoio à Agricultura Familiar Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 16 de junho de 2011

O bom da democracia é que o meu pensamento pode discordar das opiniões e ações

de meu maior amigo. E mais, com a liberdade de expressão qualquer um pode

externar o que pensa, sem que isso se constitua crime. Nessas horas tenho pena dos

cubanos, venezuelanos e argentinos.

Pois bem, li no jornal “A Tribuna” que a Secretaria Municipal de Agricultura e Pecuária

daqui de Rondonópolis vai implantar uma central de abastecimento no conjunto de

prédios em final de construção ao lado da UFMT.

Que bom a prefeitura retomar a obra. Eu mesmo, pessoalmente, pedi isso ao prefeito

em dezembro do ano que passou. Obra parada é dinheiro jogado fora e isso é

inaceitável em qualquer lugar do mundo.

Ocorre que a notícia traz algo estranho em seu bojo. A autoridade entrevistada fala

na UFMT e em laboratórios, auditórios e salas de aulas sem citar o fato gerador

daquela obra. É, parece que o objetivo principal daquela obra ter sido construída foi

relegada a outro plano pela administração municipal.

Nos prédios onde se fala em armazenar bananas ou ovos também está previsto

acontecer pesquisas, experimentos, aulas, palestras e extensão universitária como

parte do projeto, possuidor de uma dimensão inédita e inovadora no Brasil:

certificação da qualidade dos produtos agropecuários desde o plantio até a

comercialização, voltados prioritariamente para a agricultura familiar.

Uau! Professor Doutor Libério e colegas arrebentaram a boca do balão ao planejar

isso. Um lugar onde se faz pesquisa de ponta sobre qualidade de alimentos e ao

mesmo tempo se entrega os resultados obtidos ao pequeno produtor rural, parceiro

do projeto. O nome disso é inovação, e o time que planejou isso sabe do que está

falando, eles convenceram com fatos o prefeito da época em que o projeto nasceu da

necessidade e importância disso.

Alinhavaram acordos entre município, estado e governo federal para viabilizar a

coisa. Envolveram a sociedade civil nisso, tendo até terra doada para o projeto. E, a

coisa começou. Obra lenta, problemas jurídicos adiando a construção, até que o

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prefeito seguinte deu o pontapé na terraplanagem e começou a sair do chão os

prédios que hoje quase estão prontos.

Aquele time de cientistas da UFMT foi escalado pelas autoridades municipais e

estaduais como responsáveis para a compra dos equipamentos dos laboratórios.

Coisas difíceis de serem compradas pela universidade, mas que recebendo emendas

parlamentares de deputados estaduais está comprado e pronto para ser colocado em

uso.

A obra civil foi construída com dinheiro da União, oriundo de emenda de um

deputado federal daqui. Ou seja, é um projeto coletivo, unindo todos os níveis de

governo. Eu diria: uma obra de arte daquela equipe e seus parceiros.

Pelo lado científico o projeto prevê o envolvimento de acadêmicos de Ciências

Biológicas, Engenharia Agrícola e Ambiental, Geografia e Sistemas de Informação,

tanto na pesquisa necessária à criação de conhecimentos, como na capacitação do

homem do campo, do produtor. Sem contar na real possibilidade de criação de um

curso de engenharia de alimentos, tão pertinente ao agronegócio aqui florescente.

Sem dúvida, a implantação do Centro de Apoio à Agricultura Familiar é um desafio

para Rondonópolis e nossos políticos. Espera-se que a visão dos administradores

municipais permaneça enxergando grandes horizontes. Pois, a grandeza do projeto

inicial é muito maior que uma distribuidora de produtos.

Transformar tudo isso em um depósito temporário de alimentos, como uma central

de abastecimento, é uma temeridade política aliada a um banho de água fria no

sonho de uma universidade sul-mato-grossense.

(*) Professor da UFMT

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Linha do Tempo Página 171

Técnicos da UFMT em greve: uma luta

desigual Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 19 de junho de 2011

Aqueles que convivem comigo sabem que sou plenamente a favor de uma máquina

pública enxuta, profissional e valorizada. Ou seja, aparelhamento estatal é uma

forma vil de destruir a oferta de um serviço público de qualidade, minimamente

compensador frente aos enormes volumes de impostos que pagamos.

Tem isso como norte, é necessário refletir sobre o movimento deflagrado pelos

servidores técnico-administrativos da UFMT, como parte da luta de seus membros

por algo que consideram justo. A greve de funcionários atingiu ontem (13/06) 27

universidades federais, inclusive a nossa universidade.

A greve, organizada pela Federação de Sindicatos de Trabalhadores em Educação

das Universidades Brasileiras (Fasubra), teve início no último dia 6 de junho e tem

como pauta principal a destinação de mais recursos para a recomposição salarial da

categoria. Além disso, reivindicam mudanças no incentivo à qualificação, na

racionalização dos cargos, o reposicionamento dos aposentados, isonomia salarial e

de benefícios e a revogação da Lei nº 9.632/98, que prevê a extinção de cargos no

funcionalismo público, que implica na terceirização nas universidades.

Partindo de baixo para cima, sinto que é meu dever denunciar essa “maracutaia”

iniciada no desgoverno do FHC e ampliada fortemente no desgoverno do Lula: a

terceirização de serviços públicos.

Quando se fala em empresa privada, com dono identificado, a maneira de

administrar só interessa a ele e a seus integrantes. Mas, quando se trata da coisa

pública, a gestão é problema de todos os cidadãos-contribuintes. Pois eu posso não

comprar o papel higiênico de tal marca e escolher outro nas compras. Enquanto no

serviço público isso não acontece, pois eu vou a delegacia de polícia registrar um

boletim de ocorrência e só ali, na delegacia, isso pode ser feito.

Quando teu filho, tua esposa ou você mesmo entra em um curso na universidade

federal a expectativa é de que ali haverá gente muito bem qualificada para formar

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um novo profissional, seja enfermeiro ou engenheiro. O estado brasileiro está

ofertando um serviço importante e custoso aos brasileiros que obtiveram sucesso nos

processos seletivos para o ingresso na academia. O teu imposto garante. Isso é

serviço público!

Ora, se o governo, malandramente, tira o dele da reta e contrata gente sem

nenhuma efetividade ou perfil profissional para exercer as funções necessárias a

formação do contribuinte ou seu beneficiário, está lesando a pátria e desvirtuando o

bom uso do dinheiro público. Afinal, no Brasil existe algo mais importante que os

próprios brasileiros?

A Dilma, o Lula e o FHC agem em conluio nesse assunto. Os governistas atuais têm

uma culpa maior, pois além de bater duro nessa porcaria de terceirização de serviços

públicos quando era oposição, agora nem querem discutir esse assunto com os

sindicatos. É uma vergonha.

Ao assistir a uma assembléia dos servidores hoje no campus vi o quanto o movimento

sindical foi enfraquecido pelos últimos governos. Sem contar o fato de que os

concursados serem hoje uma minoria entre os funcionários públicos. Ao ver a cabeça

branca do Valeriano participando do movimento fico pensando com meus botões:

será que temos outros trinta anos para formar um farmacêutico ou bioquímico como

ele, para garantir a qualidade necessária às aulas de laboratório?

Por fim, vejo essa luta dos servidores das universidades como análoga a covardia

descrita na Bíblia quando o gigante Golias (o governo) enfrentou o pequeno Davi

(servidores). Tomara que o resultado de hoje seja o mesmo daquele embate

histórico e o Davi ponha o Golias nos trilhos.

(*) Professor da UFMT desde 1995

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Morreu mais um professor Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 30 de junho de 2011

Desta vez não foi aqui do campus de Rondonópolis. O morto foi reitor da Unicamp,

em Campinas-SP. Gaúcho de nascimento, o porto-alegrense Paulo Renato de Souza

frente o Ministério da Educação por oito anos fez acontecer coisas boas e ruins.

Discordo dele demais da conta. Acho-o um tremendo entreguista. Ou seja, nunca fui

com a cara dele. Mas, jamais negaria sua obra, como faz os atuais governantes do

vermelho. Negar um fato é uma burrice colossal, eu não me incluo no time dos

ideologicamente boçais. Então vamos falar de uns fatos e de um só “causo”.

Como professor de Economia, Paulo Renato não foi brilhante. Foi um Ruy da vida, um

medíocre. Como reitor da Unicamp deixou a Moradia Estudantil da Universidade

como grande legado aos estudantes. Em sua gestão foram criadas as pró-reitorias

hoje existentes e o Conselho Universitário, realizando a reforma institucional.

Inaugurou o Hospital de Clínicas e o Centro de Saúde da Comunidade. Adquiriu em

sua gestão um importante centro de pesquisas privado e o transformou no atual

Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas. Foi sob a batuta

dele que a Unicamp deu um salto em direção à pós-graduação de alta qualidade.

Hoje estudam 17.000 na graduação e 20.000 na pós-graduação, pesquisando a

Ciência de ponta. Eu mesmo sou produto dessa política, pois tenho muito orgulho de

ser um doutor pela Unicamp.

Como ministro do traíra FHC foi de um lado um “boi de presépio” dos organismos

internacionais de financiamento, como todos do desgoverno do FHC. Entretanto, de

outro lado a frente do MEC fez uma mudança radical naquele antro de coisa ruim.

Umas coisas para melhor, outras para pior.

Por exemplo, criou o bolsa-escola federal onde a família ganhava uma compensação

por manter o filho estudando. Claro que é uma estupidez pagar para um pai para

manter o filho na escola, pois isso é obrigação legal de qualquer pai. Porém, diante da

evasão monstruosa que temos até hoje a bolsa-escola era um atrativo para a família

manter as crianças estudando. O quadrilheiro Lula mudou o nome do programa

social criado por Paulo Renato para bolsa-família e assumiu o maior curral eleitoral da

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Linha do Tempo Página 174

República.

O ministro criou o ENEM, contra a corrente dos que faturavam bilhões com o

vestibular, contra os sindicatos de professores do Ensino Médio, pois o ENEM media

o “produto final” dos três anos do segundo grau. Pena que nunca usaram os

resultados do ENEM para revolucionar o Ensino Médio. Mas, usaram para acesso ao

Ensino Superior e mataram a valiosa indústria do vestibular, que Deus a tenha.

Criou no MEC e em seus penduricalhos vários mecanismos de análise e de gestão,

como a definição de parâmetros quantitativos e qualitativos para mensurar a

educação brasileira, substituindo a política rasteira que hoje voltou à cena, pela

eficiência. Implantou um bom sistema avaliativo no Ensino Superior, inclusive na

Pós-graduação, via CAPES. Fez a merenda, o transporte e o livro chegarem à escola.

Isso eu nunca vou negar. Ele fez isso.

Enfrentou o terrorismo vermelho das longas greves, que por um passe de mágica

sumiram no desgoverno petista. Bateu de frente com a histórica independência dos

estados e municípios para subverter política pública educacional, nesse aspecto

apanhou mais que bateu. Afinal as verbas da Educação são as mais visadas pelos

ladrões estaduais e municipais.

O Professor Paulo Renato conseguiu universalizar o Ensino Fundamental, e isso, por

si só, é um passo imenso. Para isso criou o FUNDEF que redistribuía verbas entre os

entes federados, o Fundo Escola que faz o dinheiro vir direto da União para a escola,

implantou o Programa Nacional do Livro Didático e impôs um currículo nacional único

e assim garantiu a universalização do Ensino Fundamental. Tiro o chapéu para isso.

Mas, quase nada investiu na Educação Infantil e na Educação Especial. Pau nele.

Paulo Renato é culpado pela precarização da formação de professores, em especial

dos professores das séries iniciais. Nunca quis discutir uma carreira e um piso

nacional salarial para os professores. Oito anos perdidos em termos de carreira

profissional docente. Se o currículo é federalizado, a merenda é federalizada, se o

livro é federalizado, se o “laboratório de informática” é federalizado, por que o

professor não é? Errou feio.

Com certeza o trabalho de Paulo Renato frente ao MEC fincou as bases para o futuro,

deixou um MEC com recursos próprios e com instrumentos para avaliar a educação.

Pena que nos nove anos seguintes Cristovam, Genro e Haddad retrocederam cem

anos em termos de gestão, voltando ao clientelismo barato, abrindo espaço para as

empresas particulares nadarem de braçada no dinheiro da Educação como nunca

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Linha do Tempo Página 175

antes se viu neste país.

Mas, faltou contar o “causo”? Encerro com ele: - Em 1998 fui designado pelo reitor da

UFMT para representar a Universidade na criação de um consórcio de Universidades

Virtuais Públicas, regionais e federal. Em 1999 o consórcio Unirede foi fundado

oficialmente e houve uma sessão solene no auditório do INEP/MEC com a presença

do ministro da Ciência e Tecnologia e do ministro da Educação. Falou a Dóris (UnB)

em nome da Unirede, depois o ministro Ronaldo Sardenberg e por último o Paulo

Renato.

Em lugar do infeliz falar dos esforços das dezoito universidades federais que

construíram o consórcio interuniversitário, dando-lhe o nome de Universidade Virtual

Pública do Brasil – Unirede, ou mesmo, das realizações fruto do esforço nacional na

modalidade da Educação à Distância, o pelego tingido fez um baita discurso

enaltecendo a Open University, da Inglaterra. Na cara da gente! Fiquei p. da vida.

Esperei o macanudo descer as escadinhas do palco e me postei no seu caminho. Ele

sorriu abertamente e pensou que eu fosse beijar a mão dele. Tadinho. Enfiei o dedo

em riste no peito do “cabra da peste” e fiz ele lembrar que aqui no Mato Grosso havia

um time de professores da UFMT fazendo melhor que a Open lá dos quintos dos

infernos, desde 1994. Ele ficou vermelho feito pimentão. Engoliu em seco. Parou do

sorrir. E, para a sorte dele, um bando de bajuladores nos separou como se separa

briga de moleque a rua. A turma do deixa-disso.

Hoje, eu e ele passamos por um ataque cardíaco. Ele se foi. Eu peço desculpas pela

peitada. Afinal, os mesmos que defendi naquele dois de dezembro foram os que em

janeiro do ano seguinte mataram o projeto de pesquisa da UFMT Virtual, ao serem

eleitos para o reitorado de nossa Universidade.

De qualquer forma, até os adversários merecem nosso respeito pelo que fizeram.

Que Deus te julgue Paulo Renato. Mais um professor que se foi.

(*) Fundador da Unirede. Doutor pela Unicamp. Professor da UFMT.

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O fim de um ciclo Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 30 de agosto de 2011

O Brasil como qualquer outro país do mundo vive ciclos, uns econômicos, outros

sociais, e outros de vergonha na cara. O ciclo de pessoas com vergonha na cara está

encerrado. O poder é agora exercido por um novo tipo de gente: os “sem-ética” e

alguns até “sem-estética”. Ou seja, por gente desonesta.

Os fatos mostram isso com uma clareza tal que só gente muito safada é capaz de se

calar e se omitir diante deles poderiam fazer vista grossa. Agora até a imprensa

amestrada entrou no esquema, além dos tradicionais marronzinhos. É tanta safadeza

que não cabe embaixo do tapete. E pior, ocorre em qualquer nível de poder, da chefia

do departamento o supremo.

O último fato é esclarecedor até para os “manés” que ainda não entenderam sobre o

que falo: - a greve dos professores das universidades federais. Em princípio os

professores, doutores e mestres, deveriam ser éticos até embaixo d’água, afinal essa

gente forma o Brasil de amanhã, pelo menos em teoria deveriam fazer isso.

Ocorre que o movimento dos trabalhadores foi minado por pelegos e hoje se colhe

frutos ruins dessa gentalha que tiranicamente conduz o sindicato nacional dos

professores. Primeiro essa corja de assassinos da liberdade assinou um acordo com

o pelego-mor, o Lula (aquele que não desencarna) para que não houvesse greve de

2007 a 2010 no movimento docente brasileiro. Ora essa, num passe de mágica a

“pelegada” resolveu todos os seculares problemas da carreira docente e das

condições de trabalho dos professores do Brasil. Bastou um acordo espúrio e

desonesto.

Em 2011, fim daquele acordo lesa categoria, as bases sindicais existentes nas

universidades federais brasileiras se manifestaram pela abertura de negociações e,

claramente apontou a greve como legitimo instrumento de luta para essa parada. Ou

seja, as bases querem sentar a mesa e negociar com a patroa (poste do Lula que não

desencarna).

Quatro meses depois da proposta legitima dos professores chegar ao governo da

Dilma a resposta é uma piada de mau gosto para aqueles que sabem um pouco de

Matemática e vão ao mercado comprar comida. Ocorre que desgraça pouca é

bobagem e surgiu o famigerado PROIFES (braço político do governo nas

universidades) com uma pseudo-votação onde 3.900 associados resolveram aceitar

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a proposta do governo em nome dos mais de 219.947 professores do ensino

superior. Para piorar, os vinte e poucos delegados do ANDES, sindicato nacional,

também ratificaram a aprovação da proposta indecorosa.

Como carioca vou logo dizendo: “Tá dominado. Tá tudo dominado”. A ditadura do

proletariado é isso, uma meia dúzia de gatos pingados decide por centenas de

milhares e fica o dito pelo não dito. Como fiz greve contra os malditos neoliberais do

passado quero fazer greve contra os novéis neoliberais que hoje estão ocupando o

Palácio do Planalto. A turma mudou, mas a pouca vergonha continua a mesma.

Sou afeito a ditados populares, pois eles nos fazem pensar. Dois deles valem para

essa hora triste onde o governo, mancomunado com os dirigentes sindicais

(pelegos), apresenta e aprovam proposta tão indecente e imoral quanto a que foi

aprovada na sexta-feira passada. O primeiro é: “Quando as coisas estão muito ruins

é porque está perto de melhorar”, pensando sobre isso afirmo que no Brasil quando

a coisa está ruim é possível alguém piorar ainda mais as coisas.

O segundo, dito e re-dito pelo meu velho pai é “A vida é um buraco. Pior fica quando

começam a jogar terra por cima”. Esse sim reflete a minha indignação contra o

governo neoliberal petista e contra a pelegada que tomou conta do sindicalismo

brasileiro. Essa gentalha está jogando terra por cima de minha vida e me sufocando

até a morte. Os nossos aposentados ganham em média 30% a menos que eu (na

ativa), eles estão sendo enterrados vivos e nenhum sindicato os defende.

Lembrai-vos daqueles que criaram o sindicato debaixo de muita pancada.

Como professor universitário, logo um ser pensante obrigatoriamente, voltarei às

aulas na UFMT de cabeça baixa, ajoelhado diante da sociedade pedindo respeito.

Mas, diante dessa corja de pelegos que se autodenominam sindicalistas e desse

governo neoliberal, autoritário e dissimulado prefiro me aposentar que curvar minhas

costas para eles. Sou homem de outro ciclo, fui aluno forjado nas lutas estudantis, fui

militar urdido no duro treinamento e professor que entrou pela porta da frente da

Universidade. Tenho orgulho de ser honesto. Para eles afirmo: não estou à venda!

Volto na segunda-feira à sala de aula, esperando receber a solidariedade dos

estudantes e invejoso dos servidores técnico-administrativos que permanecem

firmes na greve por melhores condições de vida e de trabalho. Tiraram-me quase

tudo, mas permaneço firme na integridade moral. Enquanto eles, os dirigentes, bem

a História vai julgá-los como parceiros de Joaquim Silvério dos Reis, traidor do ciclo

anterior ao meu.

(*) Professor Adjunto da UFMT

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Voltei do Porto Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 08 de dezembro de 2011

Amigo, como sempre após uma longa viagem é hora de escrever umas linhas para

contar as peripécias vividas. Desta vez, fui longe: Portugal, passando pela Espanha.

Meu destino foi à cidade invicta: o Porto. Portugal nasceu ali, daquele Portus cale

romano fundada duzentos anos antes de Cristo. Haja História!

Sai do nosso aeroporto sob o som imaginário do sax do querido Maestro Marinho em

direção a Guarulhos, com uma aterragem horrorosa em Araçatuba. Eu depois beber

uma dúzia de doses de pinga pouso melhor um avião que a dupla que nos levou até

São Paulo. O bicho pousou numa roda só, emborcado para o lado como se fosse

passear no gramado. Depois disso aguardei em Guarulhos por seis longas horas até

embarcar com os espanhóis em um gigante de quatro reatores e duzentos e sessenta

lugares.

Rapaz, você pode achar que estou inventando, mas é a pura verdade: todos

aplaudiram o pouso do gigante no Aeroporto de Bajaras, em Madrid, na Espanha. A

tripulação deu um show de bola. Mas, ao descer naquele monstro de aeroporto a

gente fica mais perdido que cego em tiroteio. Parece o Mato Grosso antes da divisão:

gigantesco. Saímos do terminal 4S para o 4 de metrô! Vinte minutos depois cheguei

ao local para embarcar para Portugal. A Alfândega espanhola foi curta e grossa, vá de

meias novas pois eles mandam tiras os sapatos e botas. Sem contar que os caras

adoram passar a mão na gente. Sei não?

Embarcado em um vôo regional para o Porto nada demais ocorreu. Pois a paisagem

parecia o interior paulista, cidades aqui e ali e muita plantação de não sei o quê. No

final o comandante avisa que vai se aproximar do aeroporto e dá uma canja no visual

para todos a bordo. Vai até o oceano e volta pelo Rio D`Ouro. Uma vista linda! Terra

firme e malas nas mãos. Dois dias de viagem, um cansaço danado e a temperatura

assustando, 11º C fora do prédio do aeroporto ao meio-dia. Sou carioca, adoro o

calor e o frio é inimigo.

Metrô do aeroporto até o centro da cidade, um euro e setenta centavos o que

corresponde a três reais. Nem São Paulo capital tem isso. Comecei a me sentir outro

tipo de cidadão era o efeito Europa. Hotel e cama. Fim da tarde, refeito, passeio pelo

centro histórico da cidade. Casaco de lã, cachecol e suéter foram necessários. Ruas

limpas, sem lixo no chão. As pessoas não sujam a cidade por educação e são

portugueses, aqueles das piadas, lembra? Pois é. Entro em um dos muitos shoppings

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da cidade de 245.000 habitantes (parecida com Rondonópolis) e a decoração de

Natal está em todo canto. Primeira refeição no continente europeu e ataco de

bacalhau grelhado. Valeu a pena, fico até com água na boca ao lembrar a posta

generosa e deliciosa que lá inaugurei a comilança.

Olhar lojas, ver preços e comparar é claro faz parte desse primeiro contato como

consumidor. Você pode achar que estou te sacaneando, mas eles têm um só imposto

(IVA) que varia de acordo com o produto, enquanto aqui são mais de cinquenta. As

novidades de lá ainda demoram a chegar aqui. Dá vontade de comprar aqueles

sobretudos de lã mesmo sem poder usar aqui em caldeirão.

Na manhã seguinte, segunda-feira, fui à outra linha de metrô para a Faculdade de

Medicina da Universidade do Porto. Quando vi uma estação chamada Pólo

Universitário estiquei o pescoço para ver o que estava ali reunido. Caramba homem!

Um monte de universidades, centro e institutos de pesquisa, hospitais universitários

e instituições de apoio, como banco de sangue, hotéis, shopping, campo de futebol,

prédio de apartamentos para moradia e um comércio razoável. Ou seja, uma cidade

dentro de outra. Eles se orgulham de chamar aquilo de Cidade da Ciência.

Fotografei o estacionamento e o jardim em frente ao hospital universitário. Parecia

um palácio medieval com trato de rei. Os carros de nossos sonhos estacionados em

vagas destinadas a professores me fez refletir o quanto somos desvalorizados pelo

governo brasileiro. Aqui se paga 20 mil reais para um fiscal da receita e sete mil para

um pós-doutor na universidade. Lá a coisa é diferente. Temos que mudar isso.

Ao ver os alunos universitários chegando uniformizados parei para assistir algo novo

para mim. A capa e batina preta com a fita na cor do curso parecia uma nuvem negra

se aproximando. Lindo de se ver. Entrei com eles pelo térreo e vi a troca da batina

pelo jaleco branco. Hospital muito grande e eu perdido entre os estudantes, até que

consegui chegar ao local do colóquio. A pompa e o calor humano nos esperavam de

braços abertos.

Sobre o evento lhe digo que é coisa chata científica, mas sobre os detalhes é

diferente. Por exemplo: um só banheiro para todos os participantes. Ai a fila crescia

e havia uma ante-sala de espera pela vez de ir a “casa de banho”. Ao chegar a minha

vez li o cartaz que dizia: “não jogue lixo na sanita”. Pois é! Nos almoços na Faculdade

de Medicina o vinho do Porto correu solto e eu feliz feito pinto no lixo, afinal infartado

fica contente em viver em hospital.

Três dias de palestras, debates e aqueles jargões do tipo discordo frontalmente do

colega, findo os quais dois dias me sobravam para conhecer Lisboa. No entanto,

pobre tem uma maldição que na hora da diversão algo acontece e babau. Pois bem,

na quinta-feira Portugal parou em uma greve geral. Os patrícios não querem perder

direitos trabalhistas e sociais por conta da roubalheira de seus políticos e do mau uso

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do dinheiro público. Aí ficamos iguais.

Os portugueses têm três anos de salário-desemprego, aqui eram seis meses e os

petistas tiraram um mês e ninguém se aborreceu com isso. Agora somos diferentes

deles. Tudo parado, exceto as lojas cujos donos abriram seus estabelecimentos,

então o jeito foi passear por perto e fui até Vila Nova de Gaia, situada no outro lado

do Rio D`Ouro, separada por uma linda ponte. No cais do porto de Gaia estão

localizadas as caves de vinho do Porto. Rapaz aquilo é uma tentação. Vinho de

quarenta anos é maldade com quem gosta de bebericar um Porto após o jantar. Só

o preço me segurou.

A cidade tem um belo cais que atraca navios de vários calados, nacionalidades e

usos, e é um entra e sai de gente danada. Dali sai o bacalhau e o vinho do Porto que

degustamos aqui no Natal, pagos em suaves parcelas. Um funicular sobe o morro

para a volta ao centro do Porto já no cair da noite de quinta. Na sexta-feira fiz uma

visita a um cientista da Educação, português respeitado no mundo, José Alberto

Correia parecia um adolescente feliz em falar sobre o Brasil que ele tanto ama. Aqui

fomos iguais.

Os nomes das coisas são diferentes lá, por exemplo: talho é açougue, bicha é fila,

autocarro é ônibus, comboio é trem, PSP é polícia, paragem é ponto de ônibus. Mas,

todos os taxis são “mercedinhas” de verdade, com tudo que elas têm direito. Outra

coisa importante que vi por lá é que em cada esquina tem uma livraria, em lugar das

nossas farmácias. Além disso, em lugar de pipoqueiro tem castanheiros vendendo

castanhas portuguesas assadas na brasa. Comi bem.

Depois de muitos e muitos tipos de pratos do bacalhau, regados a óleo de oliva

(conheci uma oliveira carregadinha de azeitonas e uma pereira com peras maduras),

encerramos nossa estada no Porto. No sábado e no domingo a viagem de volta

começou cedo e terminou tarde. Saímos dos 5º C de lá para os 34º C daqui. Um fuso

horário diferente em quatro horas quase não mexeu com o sono.

Posso te assegurar que brasileiros são bem tratados pelos mais educados e maduros

daquela cidade (os jovens são outra estória) e eles dizem cheio de orgulho que D.

Pedro I doou seu coração à cidade que lá se encontra enterrado para sempre. Como

quem quer dizer com isso, doe você também amor pelo Porto, cidade invicta. Aqui

fico igual a D. Pedro. Amei o Porto.

(*) morador de Rondonópolis e endividado pela viagem

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Boas Festas Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 29 de dezembro de 2011

Lá se vai mais um ano e um monte de coisas ficou só na promessa. Como sempre, a

gente espalha votos de felicidades para todo lado e deseja a paz mundial até para os

inimigos. Esse espírito natalino, hoje reforçado pelo Papai Noel, nos transforma em

gente cordeira e feliz por alguma coisa que não sabemos bem o que é.

Exatamente nessa época os orçamentos públicos são votados, normalmente na

calada da noite, ferrando o ano vindouro em áreas como educação, saúde e

segurança pública. Mas, é Natal e dane-se o tal de orçamento. Em maio vou levar

minha avó ao médico e não vai ter especialista, aí um pediatra atende a boa velhinha.

Receita um remédio que eu não posso comprar, mas pelo menos eu sei a doença que

ela tem. Se ela morrer, tudo bem o “curingão” é campeão

A cidade era a rainha do algodão quando aqui aportei na Década de 1980, hoje é a

rainha do quebra-molas. Os responsáveis pelo trânsito adoram um obstáculo na pista

de rolamento. Para eles trânsito fluindo é coisa ultrapassada, bom mesmo é

ultrapassar obstáculos para todo lado. Acorda Zé!

Indo e vindo diariamente da UFMT para casa, nos últimos 16 anos notei que a

MT-270, a Rondonópolis - Guiratinga virou um moedor de gente. Ou na ida, ou na

volta tinha que ver um defunto ou um futuro aleijado na pista. Fecharam as

passagens de níveis e não vi mais gente morta no trecho. Mas, um bando de idiotas

motorizados move os bloqueios de concreto e passam entre eles com suas poderosas

motos 125 cilindradas. E, de novo lá vem a SAMU berrando e levando essas bestas

estiradas na estrada. Como é fim de ano, melhor deixar essas coisas para resolver

depois do carnaval, quando o Brasil voltar a funcionar.

Até lá vamos reclamar e continuar a fazer besteira no trânsito, como as

ultrapassagens pela direita e os avanços de sinal. Antigamente, existia um negócio

chamado Policia Militar, era um pessoal que andava com a mesma roupa, uns blocos

de papel na mão e distribuía uma coisa chamada multa de trânsito para os infratores.

Hoje, eles deixaram disso e andam com muitas roupas coloridas, chapéus bonitos e

não fazem mais porra nenhuma pela fiscalização do trânsito. Agora o negócio deles

é olhar documentos. Embora, constitucionalmente, seja obrigação daqueles caras

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fiscalizarem. Mas, é fim de ano e isso acaba virando uma confraternização entre PM

e motoqueiro abusado.

No governo do Mato Grosso o negócio é fazer carreata para pedir, pasmem, que o

governo estadual asfalte estradas. Só mesmo alguém sem compromisso com essa

terra querida faz uma sacanagem dessa. E o pior, acabam levando um monte de

gente decente a acreditar que isso é certo. Certo é incluir no orçamento e fazer.

Toma vergonha governador.

E a Câmara de Vereadores? Maravilha, sensacional, o melhor uso de dinheiro público

que conheço. Claro que no meu tempo de rapaz essa gente nada recebia para

trabalhar pelo bem público. Até hoje, em Portugal os parlamentares ganham um

salário mínimo. Mas, aqui tudo muda e ser vereador deixou de ser para homens

públicos e se tornou uma profissão. Até mesmo a principal função do legislativo foi

esquecida por esses profissionais nos três níveis de governo: fiscalizar o uso do

dinheiro público. Agora todos estão no mesmo barco e como dizia o Stanislaw Ponte

Preta: “Ou restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos!”.

A “poste do Lula” anda se arvorando de faxineira moral. Não é e nunca foi. Quem

nomeou essa quadrilha de ministros suspeitos de corrupção foi a caneta dela. Logo,

ela é a chefona dessa camarilha que ataca os cofres públicos ou você colocaria o teu

dinheiro nas mãos do ladrão para ele tomar conta? Acorda Zé Ruela! Se 2012 não

acabar conforme os idiotas americanos propagam em nome dos Maias, vai haver

eleição e você deve deixar de lado o espírito natalino. Vote em quem nunca foi

político. Radical, né? Vamos encher o legislativo de tiriricas.

O crédito está expandindo e você pode comprar o que não precisa em até 60 vezes.

Bom. Não para você, mas para as financeiras que vivem dos juros, essa excrescência

nacional. 147% ao ano! E a inflação batendo os 7% ao ano, sobram 140% de lucro

ao ano. Isso sim é paraíso petista na Terra. Aproveite e compre uma vaga em

faculdade particular e arrume um PROUNI para você. O jeito petista de garantir a

Educação pública, gratuita e de qualidade é encher os bolsos dos empresários da

Educação. Uma vergonha. Uma safadeza. Onde estão às tais universidades públicas?

O ENEM é fraudado, mas tudo bem é fim de ano e em janeiro os suspeitos farão a

matrícula por meio dessa porcaria chamada de SISU. Um sistema nacional, que

depois do ENEM ninguém sabe se há honestidade por trás dele, sistema que

matricula gente de longe em nosso campus e que os reitores e reitoras de joelhos

diante do MEC engoliram em troca de uns favorzinhos aqui e ali. Claro que eles vão

embora assim que podem. Claro que eles não ficam aqui depois de formados. Claro

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que os m. do MEC sabem disso, mas dane-se a região, dane-se o Mato Grosso.

E o sonho de uma universidade federal por aqui? Vejo o tremendo esforço de meus

colegas professores em escrever um belo projeto. Justificarem em detalhes o que se

quer como se faz e onde se deseja chegar. Mas, o ignóbil ministro da educação diz

um sonoro não. Caramba, essa mesma besta quadrada criou um monte de

“universidades federais” sem ter porra nenhuma! Eu fui avaliar a Universidade

Federal do Vale do Jequitinhonha e Mucuri, em Minas Gerais. Um monte de salas

espalhadas de Diamantina até Teófilo Otoni. Nada de nada! E, pasmem irmãos

rondonopolitanos de coração, aquela droga foi transformada em universidade federal

por que o Lula quis.

Gentalha! Como diz o Kiko amigo do Chaves. Isso mesmo: gentalha. Aqui tem que

cumprir o ritual do capeta para criar uma universidade federal onde há 38 anos

funciona um campus universitário. Mas, no ABC paulista, na cidade onde o ali babá

do mensalão petista reside, outra universidade surgiu do nada. Ele, o Lula quis e

pronto. Aqui nessa terra de trabalhadores, de gente que ainda tem vergonha na cara,

a criação de uma universidade federal é negada sistematicamente, com ajuda de um

monte de gente da UFMT, de políticos mato-grossenses e de burocratas do MEC.

Como é Natal, dou de presente a todos meu acalentado sonho de criar a Universidade

Federal do Pantanal ou, como chamávamos antigamente, Universidade Federal do

Vale do São Lourenço. É tudo que me restou nesse assunto.

Vai chegando a hora de iniciar as comemorações de fim de ano. No Natal nado contra

a corrente e quero mais que papai Noel se ferre. Prefiro o outro, aquele cujo natalício

se comemora: Jesus, de Nazaré. Gente boa sabia por chapa quente para todos

dançarem o amor ao próximo, a solidariedade. Usava o exemplo como meio de

ensino. Foi professor, foi médico, foi carpinteiro e principalmente, a meu ver, deixou

a mensagem mais importante para a civilização ocidental: amar ao próximo como a

si mesmo. Esse é o cara!

Feliz Natal. Parabéns Jesus por seu aniversário.

(*) Carioca perdido no Mato Grosso, cristão e professor.

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Variando o tema para: Educação Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 04 de abril de 2012

No início da Década de 1960 fui levado a um grupo escolar para fazer um teste e ver

em que série eu deveria ser matriculado, havia completado 6 anos em dezembro e já

estava alfabetizado, fazia as quatro operações aritméticas, escrevia pequenos

ditados, lia com facilidade. A diretora, uma senhora com quase 60 anos dizia a toda

hora: - “esse garoto tem que fazer sete anos para entrar na escola”. Minha madrinha

rebatia a cada investida da matrona – Ele está pronto para a 3ª série, eu mesma o

preparei em casa nesses últimos anos.

Prova aplicada e fui matriculado na segunda série do curso primário. Com dez anos

fiz o exame de madureza para o ginasial, fui aprovado e outra guerra com o diretor

do CNEG local: “ele é uma criança e não pode fazer o ginasial”, dizia o velho e

carcomido professor. Aí entrou o argumento do meu pai, forte pacas: - ou matricula

o moleque ou o senhor vai apanhar. Claro, fui matriculado e terminei muito cedo o

ginásio e o científico.

Isso mostra o quanto às cabeças dos gestores educacionais estavam presas ao

tempo em que foram formados na primeira metade do século passado. Ou seja, os

caras estavam 30 anos atrasados em relação ao mundo em que viviam. A vida é

assim, a gente amealha um pouco de conhecimento na graduação e usa isso o resto

do tempo até a morte. Conheço médico que nunca foi a um congresso de medicina.

Isso vale para todas as profissões com formação acadêmica.

Ocorre que nós professores, e aqui não interessa se da Educação Infantil, Básica,

Tecnológica ou do Ensino Superior, exercemos uma profissão sócio-técnica e isso

exige permanente formação. Somos um tipo de profissional em eterna formação,

nunca ficamos prontos e acabados. Se pararmos de estudar estaremos mortos.

E isso se reflete em nosso ambiente de trabalho. A escola ou universidade é reflexo

de seu corpo docente. Isso é certo como o Vasco da Gama foi vice-campeão do

Campeonato Brasileiro de Futebol de 2011. Professor qualificado, motivado e

valorizado é garantia de qualidade na Educação. Ai surge o assunto que este texto

quer tratar: motivação.

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Vou puxar a conversa para a universidade pública, onde trabalho há 17 anos, via

concurso público de provas e títulos. Com esse tempo de serviço era de se esperar

que a geração que pertenço estivesse exercendo o poder. Afinal, essa é a geração

pós-ditadura militar, chegou à academia sem medo de censura, demissão injusta,

perseguição política e coisas que a ditadura praticava. Nossa geração chegou depois

da Constituição de 1988.

É uma geração que lutou pela liberdade como estudante e venceu pelo voto como

cidadão. A democracia veio pela via parlamentar e nela os integrantes da minha

geração assumiram os postos mais baixos na carreira docente. Aqui no Mato Grosso,

longe do eixo Rio-São Paulo, chegávamos especialistas quando muito. Anos depois

cursávamos o mestrado e bem depois o doutorado. Provavelmente somos a geração

que mais se desenvolveu em atividade.

Lideramos pesquisas e grupos de pesquisas, coordenamos projetos extensionistas,

lecionamos na graduação e na pós-graduação, somos requisitados para proferir

palestras em outras universidades e escolas, o poder público nos convoca como

peritos e especialistas para realizar laudos e perícias, fazemos as coisas acontecer

nos corredores da academia, nossos projetos dão origem a prédios e programas

governamentais, permanecemos inquietos intelectualmente, insatisfeitos com o

marasmo governamental, e por ai vai.

Nossos velhos mestres foram luzes e exemplos seguidos com destemor. Para a nossa

felicidade, hoje a maioria deles está aposentada e infelizmente outros já deixaram

essa vida. A eles somos agradecidos e sabemos o quanto foram importantes ao seu

tempo e para nos preparar para a vida. O merecido descanso é o mínimo que a nação

pode lhes dar. Cuidam de seus netos e bisnetos e deixam a academia para a geração

seguinte: a minha. Eles já cumpriram a missão, agora é nossa vez.

Vamos nos candidatar aos postos acadêmico-administrativos e mostrar aos nossos

velhos mestres que aprendemos a lição. É hora de novas mentalidades, novos

saberes, novas tecnologias (saber fazer com) na universidade e nas escolas. Estamos

prontos para assumir nosso papel na História e mostrar ao Brasil o que somos

capazes de fazer. Fazer de maneira diferente, sem submissão a ideologias roídas pelo

tempo, sem interferências de partidos políticos ou oligarquias, pois sabemos que a

Ciência não se subordina à política partidária ou mesmo a governos.

Fazer valer o direito que conquistamos nas lutas do dia a dia, desde os tempos de

estudante, exigindo do governante de plantão, seja ele ou ela quem for que respeite

o preceito constitucional e tire as mãos da autonomia universitária. Que se respeitem

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as conquistas trabalhistas e que se inverta a lógica perversa deste governo neoliberal

em gerar superávit primário para pagar banqueiros no lugar de educar nossa gente,

pondo esse dinheiro no maior e melhor investimento de uma nação: em seu povo.

Pois, como lembra o maior pensador capitalista Adam Smith, “a riqueza de uma

nação se mede pela riqueza do povo e não pela riqueza dos príncipes”.

Colocando um ponto quase final nesse escrito, afirmo que pessoas como as que

convivo no cotidiano de nosso campus universitário estão preparada e à altura do

desafio de fazer melhor e muito diferente daqueles que nos antecederam, pois além

de tudo aprendemos com os erros deles. Gente como o Mauro, Eni, Simone, Flávio,

Elza, Almir, Ivanildo, Laci, Sérgio, Clarisa, Jeater, Plínio, Adenilce, Cida, Wilse, Paulo,

Luís, Ivanete, Ademar, Aloísio, Libério, Edileusa, César, Jorge Adolfo, Leida e até

mesmo eu, entre tantos outros mais novos, estão prontos para disputarem vagas na

administração superior da UFMT.

Que venham as eleições, pois já estamos maduros e preparados.

(*) Professor dos cursos de Licenciatura em Informática e bacharelado em Sistemas

de Informação, no CUR/UFMT, desde 1995.

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O tempo passou e nada mudou Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 23 de maio de 2012

Em 9 de maio de 1996 escrevi um artigo, publicado aqui em A Tribuna, com o título

Reformas do Estado. Encerrava aquela reflexão com a frase: “Desliguei a televisão e

fui para a Universidade. Lá decidimos entrar em greve contra as reformas do FHC e

pela reposição salarial, já que a inflação do ano passado não foi reposta como manda

a lei e desde janeiro eu deveria ter tido um reajuste no mesmo valor da inflação

passada”.

Hoje, passados exatos 16 anos, repito a mesma cantilena: decidimos entrar em greve

por reposição salarial. Mas, há um fato novo a ser considerado – quem governa hoje

é quem conduzia aquela greve em 1996. Os militantes sindicalistas de ontem estão

no governo hoje e para minha tristeza nada mais parecido que um governo neoliberal

tucano que um petista no poder. Nada mudou! Para nós é claro.

Hoje querem empurrar uma forma de remuneração baseada em projetos, já repelida

quando da criação da classe de Professor Associado. Essa gentalha assumiu de vez o

capitalismo selvagem e querem ferrar a vida do magistério superior de qualquer

maneira. As propostas do governo vermelho destrói a dedicação exclusiva e sugere

avaliação de níveis com critérios diferentes, Ferindo o princípio da isonomia. Isso é

inconstitucional, pois fere a autonomia e a indissociabilidade do

ensino/pesquisa/extensão.

Sobre a reposição salarial é triste dizer e constatar que estou ganhando menos que

ganhava em 1998. Isso mesmo. O “traíra” do FHC (vendedor do Brasil) pagava cerca

de 3% a mais que a “poste do Lula” paga hoje. E se fiz greve porque o salário era um

horror no tempo do FHC o que dizer de hoje após nove anos de governo Lula/poste

ganhando menos ainda?

Eu não sou militante partidário, não tenho rédeas ideológicas travando minha

opinião, me considero uma pessoa resolvida em termos políticos e sei fazer contas

com facilidade. Como explicar o seguinte: eu e um pesquisador do IPEA ou do MCT

fomos nomeados no mesmo dia, fazemos tarefas similares, temos o mesmo título de

doutor, então porque ele ganha na média 3 mil a mais que eu, professor da UFMT?

Será que um petista acha normal que seus políticos no governo pague a um escrivão

da Polícia Federal quase 12 mil reais enquanto o vencimento básico de um professor

com doutorado e dedicação exclusiva (DE) é de R$ 2.318,71? Logo, eu não vou ficar

quieto, levando porrada dessa gentalha que aparelha o governo e financia lucros

astronômicos para banqueiros a troco de “mensalão” e muita corrupção.

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Estou em greve por melhores salários, por carreira decente, por regras isonômicas e

constitucionais, por respeito à profissão docente. Sou independente, crítico e tenho

horror a militante sindical que se deixa levar pela filiação partidária, cometendo as

maiores barbaridades contra os colegas de profissão em nome de um ideal partidário.

A luta de classes é suprapartidária e dispensa filiações partidárias para ser travada.

Queremos reajuste salarial de 22%, com reposição da inflação de 2010 e 2011. E,

principalmente, reestruturação de nossa carreira, criada em 1987 quando eu ainda

tinha cabelos castanhos. Junto com outras 44 universidades e institutos federais em

greve queremos solução e não embromação. É uma vergonha a remuneração bruta

de um professor federal ser R$ 1.536,46 (auxiliar, primeiro nível, 20h).

Aos alunos e a sociedade que nos paga eu peço desculpas pelo incomodo e atropelos,

mas o tempo passou e só a greve é ouvida no Planalto. Ao ministro Aluizio

Mercadante deixo um recado: se você não sabe o motivo da greve é porque viaja

demais e trabalha de menos. Repetindo o slogan que aqui publiquei em 06/02/2011:

Fora Dilma! Pois, estou indo na contramão buscar o que é meu.

(*) Professor concursado da UFMT desde 1995

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Cara ou coroa: toda moeda tem dois lados Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Tribuna”, Rondonópolis-MT: p. A2, 03 de julho de 2012

Ao ler a extensa matéria publicada em A TRIBUNA, de 06/06/2012, cuja chamada é

“Cidade conquista curso de medicina”, fiquei com o coração novamente apertado. De

um lado a resposta de uma reivindicação que fiz aqui mesmo em A TRIBUNA por

meio de um artigo irônico com o título de: O Brasil não precisa de mais Faculdades de

Medicina, em 17 de abril de 1997, (há quinze anos atrás) em que eu esperneava

contra o Conselho Federal de Medicina (CFM) que se intrometia na autonomia

universitária e tentava limitar a abertura de cursos de medicina nas universidades. A

turma do “jaleco branco brasiliense” forçava a barra com o Ministro da Educação para

que se fizesse (e foi feita) portaria proibindo novos cursos sem o aval do CFM. Eu

encerrava assim aquele texto: “[...] isso é mais sensato que castrar a autonomia

universitária por portaria ministerial!", falando ali que o certo seria discutir isso

abertamente, em audiências públicas, nos fóruns e conselhos adequados na

Universidade.

Sobre a notícia recente, o coração fica feliz por que sei muito bem o quanto a

Medicina é importante para cada um de nós. Logo, formar médicos foi, é e será uma

necessidade para a sociedade. Viva o curso de medicina!

Claro que existem outras questões por debaixo dos panos que nem tento puxar o

assunto agora, como o ti-ti-ti que rola nos corredores do campus sobre financiar

hospital para faculdade particular com dinheiro público e outras coisas do gênero.

Isso é assunto para outra ocasião. O tema de hoje é muito mais nobre e mantém

minha firme postura diante do descalabro.

Vou repetir e divulgar o que penso. Vou até desenhar se for preciso. Mas, as pessoas

vão entender o que está em jogo nessa estória muito estranha e desencontrada. E,

aviso logo, é algo super, hiper, importante. De plano, de imediato, jogo no lixo as

declarações oportunistas como as feitas por políticos em meios de comunicação do

Mato Grosso, não vou tratar delas. Ou seja, nesse assunto o que disse o governador,

o deputado, o vereador é irrelevante e não interessa aqui.

O que realmente interessa está nos discursos do ministro, da reitora, da pró-reitora

do campus de Rondonópolis. Ai mora o perigo. Sobre isso o meu outro lado vai se

expor ao crivo da sociedade e dos colegas acadêmicos. Vou tratar de autonomia

universitária, ou seja, de um preceito constitucional.

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Em primeiro lugar esclareço ao leitor que a universidade é uma instituição do Brasil e

não do governo. Afinal, passam-se os governantes e universidade permanece, pois

como instituição estatal cabe a ela o papel de gerar o saber constituído como poder

social e que tem a inteligência da nação como instituição livre, democrática e

autônoma. Explico melhor: como reúne (ou deveria reunir) a elite da inteligência

brasileira a universidade tem a missão de produzir conhecimento, tecnologia, arte e

saber para o país. Isso só é possível se o ambiente universitário for democrático, se

houver liberdade de pensamento e de expressão, ou seja, tem que haver

autonomia.

E isso vem de um passado muito distante, para ser mais preciso vem desde o ano 859

dC, isso mesmo, com a criação da Universidade de Karueein, em Fez - Marrocos. São

mais de mil anos de tradição e serviços prestados à humanidade. Não nos confundam

com governos e políticos que possuem 4 anos de mandato. Há mil anos passados

consagrou-se a liberdade de aprender, de ensinar, de pesquisar e de divulgar o

pensamento, a arte, a técnica e o saber, como um princípio basilar da universidade.

A universidade e seus institutos e faculdades desfrutam de liberdade de ação

consagrada pela autonomia universitária. Os constituintes determinaram no Artigo

207 da Constituição de 1988 que: “As universidades gozam de autonomia

didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e

obedecerão ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e

extensão”. Está na Constituição! Isso não é brincadeira. Isso é muito sério. Muito

importante.

E na visão de nossos mais altos tribunais e pensadores do Direito basta a Constituição

para que isso tome força de lei. Então, a autonomia universitária deve ser

desempenhada de acordo com a Constituição e não nos termos da lei ou de

algo menor ainda como uma portaria ministerial. Disse isso em 1997 e repito

hoje! Logo, nem mesmo a vontade do Presidente da República, supremo mandatário

eleito do executivo, interfere na autonomia das universidades. Isso quer dizer que a

autonomia universitária é tão importante para a nação brasileira que seus limites

devem ser estabelecidos e exercidos nos limites constitucionais, longe de leis

ordinárias e de vontades de membros de governo ou de outros poderes republicanos.

Como a universidade não é a “casa da mãe Joana” é claro que há de existir normas

internas que estabeleçam limites e regras que todos seus membros devam cumprir.

Assim seus estatutos e regimentos constituem as normas fundamentadoras da vida

autônoma da academia, isso feito pelos seus conselhos democraticamente.

Os órgãos deliberativos superiores como o Conselho Universitário (CONSUNI), o

Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão (CONSEPE) e as Congregações dos

Institutos e Faculdades formam o corpo de representantes e, somente ali, os

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membros da academia exercem seu poder de normatizar a autonomia. Fora deles

tudo mais é inconstitucional na universidade.

Quando os conselhos deliberam a criação de novos cursos, com base em propostas

pedagógicas fundamentadas na realidade, exercita-se a autonomia didática e

científica prevista na Constituição. Mas, afinal qual o outro lado da moeda?

Está na subserviência da Reitora, que representa a Universidade, aos caprichos de

um ministro causando um sério ferimento à autonomia universitária e desafiando a

determinação constitucional que a institui. Estamos perdendo a capacidade de

selecionar e recrutar estudantes, transferindo-a para os “descolados” burocratas do

MEC. Deixando agora o governo determinar quais cursos serão criados na

universidade, melhor então declarar nossa incompetência, dos acadêmicos, de

exercer a autonomia, por sermos incapazes de ao menos criar e aprovar um projeto

de curso. Isso é o fim da picada.

Estamos ajoelhando diante do santo errado. Quem sabe ainda não descobrimos que

antes do ano mil depois de Cristo os árabes criaram a universidade para fazer

florescer a arte, a cultura, a ciência e a tecnologia, autônoma da religião, do poder

governamental, ideológico e partidário?

Como ex-conselheiro da Congregação do ICEN nos últimos dois anos fico me

perguntando, sem respostas: Onde e quando aprovei o projeto de curso de medicina

no Instituto de Ciências Exatas e Naturais? Ou, o curso nascerá dos dois outros

Institutos aqui existentes? Medicina agora é Ciência Humana? É Engenharia? Que

raio de projeto secreto aprovado pelo ministro é esse? Sem respostas, não se pode

aceitar em nome de uma causa nobre que se esbordoe a Constituição. Como dizia o

saudoso Presidente Dutra: “Se não está no livrinho (Constituição) nada feito”.

Concluo afirmando que quero sim o curso de Medicina em Rondonópolis. Mas, que se

cumpra a Constituição para isso acontecer. O perigo ao abrir exceções na lei foi que

levou o nazismo ao poder na Alemanha do III Reich. Como este ano tem eleições, a

dúvida cresce exponencialmente. Tomara que os colegas da Enfermagem (que vão

fazer o novo projeto tramitar) não estejam sendo usados para outros interesses

subterrâneos.

(*) Professor da UFMT, incomodado com esse fato como um siri na lata.

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Artigos

publicados em

outros meios de

comunicação

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Parabéns aos noivos Publicado em jornal extinto. Rondonópolis-MT (1996).

Sábado último, dia 4 de maio, saí para dar uma voltinha pela cidade. Grandes

surpresas me aguardavam, algumas felizes outras nem tanto.

Subindo a Av. Fernando C. da Costa, em direção ao aeroporto, deparei com um

congestionamento, costurei para lá e para cá, e fui passando. O que está havendo?

Ah! Minha esposa lembrou: Casamento da filha do Senador Bezerra. Parabéns aos

noivos!

Continuei o passeio e pasmem: - Havia, às 22h00min, policiais (civis e militares)

controlando o trânsito, na periferia do Clube Caiçara. Isto é: Polícia nas ruas. Primeira

surpresa agradável. Parabéns aos noivos!

Ao passar da entrada do Sanatório Paulo de Tarso, ainda na Fernando C. da Costa,

outra surpresa agradável, o trecho até o aeroporto estava um verdadeiro tapete,

asfalto novinho, meio-fio e acostamento. Pedi a Deus proteção para o idealizador da

obra. Mas, alguém no carro fez-me ver a realidade: Este é o caminho onde as

autoridades passaram ao vir do aeroporto para o casamento. Parabéns aos noivos!

Chegando ao aeroporto percebi vários tipos de aviões: jatinhos fretados, bimotores

potentes e uma aeronave de transporte da Força Aérea Brasileira. Mostrei ao meu

filho aquele avião, dizendo: - Esta é uma aeronave da FAB, comprada e mantida com

o dinheiro do povo, só é usada em missão de combate ou de transporte de militares

em serviço. Aí, perguntei a um soldado do Exército Brasileiro que guardava as

instalações do aeroporto: Qual a missão da FAB aqui em nossa cidade? Eu não devia

ter perguntado, qual a minha decepção. O avião trouxe autoridades de Brasília para

assistirem o casamento em Rondonópolis. Tapei os ouvidos de meu filho para que ele

não descobrisse a real missão da FAB naquele sábado. Terceira surpresa, já não

muito agradável. Parabéns aos Noivos!

Voltando do passeio, pensei: Dos convidados, principalmente os que exercem cargos

públicos, quantos estão pagando com seu precioso dinheirinho a viagem e estada em

nossa agradável cidade? E, se não estão pagando, quem está? Eu!

De qualquer forma. Parabéns aos noivos!

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Linha do Tempo Página 194

O texto científico e o prazer da leitura Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Gazeta”, Cuiabá-MT (1999)

Parece que os cientistas, pesquisadores, investigadores em Ciências criaram um

novo mundo, micro-mundo ou macro-mundo, não sei ao certo. O que sei é que a

linguagem da ciência tornou-se tão dissociada do linguajar da humanidade que hoje

os cientistas correm o risco de falarem para si mesmo.

Como numa conversa informal, a ciência deveria ser comunicada ao ser humano

não-ungido pelo bálsamo da democratização do conhecimento. Isso em qualquer

área do saber, independente de quão complexa se queira tornar os saberes nelas

inclusos ou do nível absurdo de especialização científica que chegamos.

Quando se lê um artigo científico, apresentado num congresso importante, tem-se a

impressão que o autor é o ponto final de uma cadeia de fofoqueiros. Isto é, fulano

disse, cicrano afirma que fulano estudou, conforme beltrano, citado por cicrano, e a

cadeia parece não ter fim. E pior, só os iniciados naquele ramo específico são capazes

de compreender aquilo que foi comunicado. Ora, o saber é universal e sua divulgação

é tão importante quanto a sua investigação, e um aspecto em particular salta aos

olhos do leitor de textos científicos atuais: ausência de emoção na mensagem.

Com raríssimas e honrosas exceções, os hipertextos disponíveis na Internet padecem

da mesma carência. É olhar “com olhos de pessoa comum” e constatar essa

realidade.

No ambiente familiar, onde a linguagem é mais solta, desinibida, sem subterfúgios,

os assuntos tendem a ser debatidos com ares democráticos e de fácil compreensão.

Exemplo disso cito a recente divulgação da clonagem da ovelha Dolly, na Inglaterra.

Discutiram-se em torno da mesa de jantar quais implicações científicas, morais e

espirituais, estariam ocorrendo quando aquele fato científico estiver à disposição de

todos nós, simples pessoas humanas.

A notícia da clonagem foi amplamente divulgada nos meios de comunicações

brasileiro, e baseada no Jornalismo, as discussões familiares acenderam prós e

contras a nova técnica disponível na manipulação genética dos seres vivos.

Preocupado em aprofundar tais discussões, sorrateiramente coloquei em pontos

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Linha do Tempo Página 195

estratégicos da casa, alguns artigos jornalísticos e outros científicos tratando do

mesmo tema. Na expectativa de leitura de ambas as fontes e consequente mudança

de atitudes diante de melhor aparato sobre tal fato.

Para minha surpresa os científicos (papers) foram manuseados por toda a família

(esposa e três filhos adultos e universitários), mas nenhum foi lido além do resumo

(abstract). Enquanto os recortes de revistas e jornais foram lidos exaustivamente por

todos, e citados nas conversas posteriores.

Ora, o tema é polêmico, atual e empolgante, por que os textos científicos não

despertaram a devida atenção num público constituído por pessoas instruídas acima

da média brasileira? Se o assunto era motivo de debates no almoço ou jantar, e cada

um dos participantes tinha uma posição dissonante dos demais, num ou noutro

ponto, por que não foram buscar argumentos em fontes ditas puramente científicas?

Por que preferiram os textos jornalísticos?

Vale a pena investigar tais respostas. Buscar tais razões e propor algo que

re-estabeleça a comunicabilidade entre o “mundo científico” e o mundo real.

Particularmente, vejo a frieza literária no texto científico como um aspecto a ser

considerado, a falta de emoção no corpo textual. E nesse aspecto vou buscar suporte

em textos científicos que revolucionaram a humanidade, provocaram revoluções e

mudanças de paradigmas, como bem diz Thomas Khun, exemplos não faltam:

Philosophiae Naturalis Principia Mathematica de Newton, onde o autor se expõe de

corpo e alma à sociedade em geral, incluindo os cientistas; Sidereus Nuncius de

Galileu, obra prima do perseguido por suas ideias explicitamente colocadas num

trabalho cientifico desbravador e carregado de emoções, de sentimento atualizado

para a época em que vivia. A lista poderia crescer indefinidamente, fugindo do

objetivo inicial.

Até que ponto a assepsia hospitalar tem garantido uma menor taxa de infecção

naquele lócus (o hospital)?

Até que ponto a divulgação científica deve seguir os padrões hospitalares onde o

isolamento do paciente é levado a extremos, logicamente visando sua saúde, mas

aumentando o leque de infecções resistentes aos tratamentos convencionais?

Os escritos científicos possuem muitos objetivos, um deles certamente é a educação

científica da humanidade, e isso deve estar claro para qualquer autor de obras com

cunho científico. Afinal, se escrevemos somente para um público que compartilha um

mesmo paradigma, na esperança de fazer evoluir esse paradigma, existe a

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Linha do Tempo Página 196

possibilidade de passado algum tempo estarmos escrevendo para si próprio. A

divulgação deve permitir a transcendência do paradigma, baseado em sua estrutura

contextual original, permitindo ajustar-se a novas situações que permitam evoluir e

dar formas aos paradigmas científicos do futuro.

Como escrevi um texto propositivo, sugiro a volta da emoção no corpo textual de

escritos científicos, como Galileu, deslumbrado com suas maravilhosas descobertas e

ao mesmo tempo, comunicando cientificamente quais eram suas ideias. Vale a pena

tentar escrever para todos, educando, comunicando e construindo a ciência, ao

mesmo tempo expondo os prazeres e temores causados pela experimentação ou

investigação que originou aquele conhecimento.

Insípida, indolor e inodora deve ser a água, o texto em suas múltiplas formas de

apresentação deve sim, provocar curiosidade, anseio, gozo, esperança, ilusão ou

desilusão, ou tudo ao mesmo tempo.

A isso chamamos: prazer da leitura, e deve ser proporcionado pelo autor ao leitor.

(*) Professor de Computação da UFMT, Administrador de Sistemas de Informações

e mestrando em Educação Pública

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Linha do Tempo Página 197

Estabilidade à brasileira: nada muda! Ruy Ferreira (*)

Jornal “A Gazeta”, Cuiabá-MT (1999)

Fui uma criança de sorte, pois vivi o início dos anos sessenta numa pequena cidade

do Rio de Janeiro. Lá, como em todo Brasil, havia um posto do SAPS (COBAL) onde

a população comprava alimentos e outros produtos para o lar. Estávamos no final do

governo de Juscelino e o país havia crescido para alguns, mas para a massa

permanecia uma colônia escravocrata. Minha saudosa mãe acordava às quatro da

manhã, preparava o almoço e partia para uma jornada de dez horas de trabalho,

como tecelã numa companhia de tecidos. Meu pai, um privilegiado, saía às seis horas

para enfrentar o batente como pedreiro daquela mesma fábrica. Eu, garoto de oito

ou nove anos, acordava com minha mãe e partia para uma atividade comum naquela

época: a fila do SAPS para comprar feijão, gordura de coco e outras iguarias do

cardápio dos pobres.

Anos depois, ao conhecer a realidade da ex-União Soviética, fiquei feliz ao ver o fim

daquela ditadura execrável. Lá os problemas eram parecidos com os daqui. Estranho,

pois faltavam capitalistas na ditadura stalinista. E, naquela ocasião havia um monte

de brasileiros pregando o fim da fila capitalista, para em seu lugar colocar a co-irmã

socialista.

Voltando a infância longínqua, vejo o Jango assumir no lugar dum “Jânio, louco”, e

nada mudou. Piorou, e muito. Os anos estavam passando e fui morar em Nova

Iguaçu. Lá, participei de uma organização estudantil secundarista que volta e meia

fazia manifestações em favor da escola pública, de melhor ensino e da valorização da

Educação. Às vezes levávamos porradas da polícia fluminense, outras

“saqueávamos” as pastelarias dos chineses. Sempre apareciam uns caras

desconhecidos nas passeatas, alguns para incitar o movimento e outros para

observar nossa atuação (fomos cobaias para o recém-criado SNI).

Meu pai, udenista convicto, ficava uma fera quando eu chegava em casa com a roupa

rasgada ou o nariz sangrando, trunfos das manifestações estudantis em 1963. Mais

tarde em 1967/68, os universitários botavam prá quebrar na cidade do Rio de

Janeiro, e nós começamos a participar também. Chorei com o gás lacrimogêneo, mas

vinguei-me à altura, jogando bolinhas de gude no asfalto e assistindo o tombo dos

cavalos da polícia. Que saudade daqueles tempos de juventude!

Os anos passaram e senti na própria pele o que é ser usado como massa de manobra

política. Enquanto eu levava cacetada, os políticos-safados se encastelavam em Nova

Iorque, Lisboa, Paris, Moscou, Santiago e Havana, fugindo como ratos dos “gorilas”.

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Linha do Tempo Página 198

Claro que uns poucos eram idealistas, mas a maioria era (e são) grandes

oportunistas.

Trabalhei na preparação do Censo de 70, andando pela Baixada Fluminense onde

gastei um monte de sandálias franciscanas (era só o que eu podia usar). Dali fui para

uma Siderúrgica, onde permaneci até incorporar no Exército como soldado. Lá

permaneci até 1995, vivendo grande parte da ditadura militar dentro de quartéis, e

às vezes nas ruas, protegendo o Sarney das manifestações, como o badernaço de

1996, em Brasília. Desse tempo guardo bons e maus ensinamentos como cultuar a

verdade e também, como matar com eficácia e eficiência. Apesar de tudo, jamais

perdi de vista o ideário construído em família: Mudança começa por si próprio!

Hoje em dia, quarentão muito mudado, sinto-me à vontade para opinar e participar

da vida brasileira, não perdendo de vista que atualmente colhemos o fruto do plantio

daquelas épocas. Vejo falta seriedade, caráter e espírito público em nossos políticos,

mas também era assim nos anos 60/70. Sinto que o país pouco mudou politicamente,

apesar dum marxista declarado estar no Palácio do Planalto. Quem manda é a

“direitona”, com os mesmos banqueiros, cardeais e bispos, industriais, senhores

feudais da mídia, fazendeiros e, novos e velhos político-safados.

Partido político hoje é sinônimo de falcatrua, onde caciques mantêm o poder com

“candidaturas naturais”, quando sabemos que natural é o ciclo biológico da vida.

Chavões são usados sem a menor criatividade, tanto pela direita como pela

esquerda, substituindo o pensar pelo copiar. A União manda apurar quem são os

responsáveis pelos saques no Nordeste, e ninguém manda apurar a ineficiência do

FHC diante da causa desse problema. E, esse infeliz sabia do El Ninõ a um ano atrás.

Um ex-Reitor de universidade pública é ministro da Educação e só pensa em

privatizar o que não construiu, em cortar recursos e arrochar salários. Ora, nenhum

país do mundo pode prescindir de engenheiros, médicos, advogados, enfermeiros,

professores do ensino básico, jornalistas e principalmente de cientistas. Sem as

universidades públicas seremos capazes de criar uma "linha de produção" onde serão

fabricados montões de profissionais. Mas, onde construiremos os cientistas? Sem

laboratórios, sem dinheiro para pesquisas muitas vezes demoradas, sem salário

decente para os que formam "doutores", vamos importar Ciência e Tecnologia

eternamente? Sem a universidade pública seremos eternos consumidores finais!

É muito provável que minha mãe esteja organizando uma manifestação de repúdio

contra as barbaridades que vivemos hoje na Educação, Saúde e Segurança Pública.

Provavelmente, ela (anarquista de coração) estará “peitando” São Pedro. Exigindo

que Deus corte três dedos das mãos do FHC, cada um desses dedos correspondendo

a incompetência do (des)governo federal diante dos problemas brasileiros que estão

se eternizando em benefício de uns poucos, em prejuízo de milhões.

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Linha do Tempo Página 199

Em Brasília assisto a polícia baixar o sarrafo, mas não vejo a explicação do

governador do Distrito Federal sobre tal providência. Afinal o cara é

esquerdista-roxo, entretanto bota o “bloco azulino” na rua para sufocar

manifestações populares legítimas. Ah! Quantas saudades do “Pacotão”, nosso bloco

carnavalesco que apanhava, mas se divertia nas ruas da capital brasileira cantando

enredos que sacaneavam até esposas de presidentes.

Se trouxermos o foco para o Mato Grosso, a coisa vai ficar pior. Afinal é aqui onde vou

ser enterrado e quero o melhor para nossos filhos e netos. Falta energia, mas

estamos construindo uma termo-elétrica e importaremos gás natural da Bolívia.

Quem está construindo a termo-elétrica? O Estado ou a iniciativa privada? Quem irá

trazer o gás boliviano, o governo estadual? Pô! Tá na hora de parar com propaganda

enganosa e realizar investimentos nessa terra. Todo mundo sabe que boi e soja não

dão emprego. A não ser que a industrialização de seus derivados ocorra na região,

assim como a fabricação de insumos agro-pecuários.

Da mesma forma, os pelegos-sindicalistas precisam ser reciclados, através da volta

aos postos de trabalho, onde produzirão e ganharão o pão-nosso através do suor e

não via conchavos em gabinetes refrigerados. Faz três anos que os professores

estaduais estão sem reajuste salarial, mas a “categoria” está feliz e quietinha. Por

quê? Masoquismo?

Sem-Terra, sem-teto, sem-educação, sem-cidadania, sem-esperança, todos

produtos de desgovernos que vi e vivi nos últimos trinta anos. É hora de mudar nossa

postura diante disso tudo, com uma boa dose de vergonha na cara de cada um e uma

arma eficiente: o voto. Seja para eleger o presidente, governador, parlamentar,

síndico, presidente-de-bairro, diretoria de sindicato, de clube ou de escola. Já é hora

de votar em promotor, juiz, desembargador e ministro de tribunal superior, pois isso

“agilizará a morosidade da Justiça”. Não importa onde, temos que exercer o direito

de votar e até de ser votado. Exigindo daqueles que governarão nossos destinos a

antecipação dos nomes de seus ministros, secretários, diretores e até mesmo dos

“puxas-sacos”, pois assim teremos a oportunidade de escolher que tipo de cidadão

estará conduzindo a vida pública nos próximos anos.

Depois de tanto tempo crescendo o bolo para só dividi-lo no futuro, corremos o risco

da longa espera levar os “sem” a tomarem atitudes radicais de impaciência que

obviamente ninguém deseja. Quando os coquetéis-molotov (invenção comunista), as

cartas-bombas (invenção capitalista), os atentados sangrentos, os saques, as

manifestações violentas começarem, aí será tarde demais para “pensar e viver no

Brasil mais justo e igualitário”. Nessa hora o que resta é o famoso: - “Chame o Pires!”.

Traduzindo para os mais novos, ditadura militar.

(*) Ruy Ferreira é cidadão brasileiro e morador em Cuiabá

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Linha do Tempo Página 200

E a Economia, como vai? Ruy Ferreira *

Jornal “A Gazeta", Cuiabá-MT (1999)

Bem, dirá um capitalista árabe, vendendo petróleo a preço de ouro. Mais ou menos,

responderia um multimilionário judeu, acionista majoritário de um banco suíço.

Excelente, seria a resposta de um aposentado americano do norte, ao conferir a

carteira de investimentos de seu fundo de pensão. Enquanto isso, a resposta seria no

outros extremos se perguntassem a mesma coisa a um cidadão comum, habitante de

um país do Terceiro Mundo, como é o Brasil, por exemplo.

Como é possível conviver num planetinha tão pequeno, e ao mesmo tempo, tão

desigual em inúmeros aspectos? Ora, muito simples responder: somos

individualidades. Criados, educados e adestrados para acreditar nessa mentira

deslavada. Nossa individualidade termina onde começa o interesse da família, da

comunidade, da nação, do meio ambiente e até mesmo da sociedade mundial, mas

não há escola que ensine esse pormenor. A dicotomia social imposta atualmente é :

ou somos integrados à sociedade e ao ambiente onde vivemos ou somos

ilhas-consumistas, explorando tudo o que existe à nossa volta e nada retribuindo,

lavando às mãos diante dos problemas dos outros, sejam eles graves ou não.

O rico costuma cercar-se de muros altos, segurança armada e passaporte pronto

para deixar o barco, ao menor sinal de naufrágio. A classe média, sempre aspirou a

mesma coisa e trilha o mesmo caminho. Ao pobre resta pagar a conta dos

privilegiados de algumas raças, credos e ideologias. Este é o lado amoral do

capitalismo, do neoliberalismo, do comunismo, enfim de todas as teorias

político-econômicas que necessitam de uma minoria capaz de planejar e garantir a

“felicidade” da maioria.

Tempos atrás, um privilegiado aluno me colocou na parede, afirmando: -

“Democracia de verdade, só na Grécia Antiga!”. Matutei um pouco e repliquei: - Você

perguntou aos escravos dos cidadãos gregos o que eles achavam a respeito daquela

democracia? Hoje, pouco mudou no contexto democrático do concerto das nações e,

consequentemente, das economias agora globalizadas.

Alguns líderes mundiais são pressionados durante uma partidinha de golfe à

garantirem mais e novos mercados para o capital especulativo ou não. E, tomam as

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Linha do Tempo Página 201

providências cabíveis, chamando seus assessores (membros da corte),

determinando: “nossa inflação será 4% ao ano, para garantir todo o poder ao nosso

capital e vocês devem escolher um pato para pagar essa conta".

Bem, aí o Joseph Stiglitz, vice-presidente do Banco Mundial reúne a turma da

Economia e juntos, estabelecem receitas a serem seguidas pelos escravos

pós-modernos, ou seja, pelos países emergentes. E tome de privatização, controle da

inflação, estado mínimo e liberalização do comércio.

Durante a década de 90, essa dieta foi imposta a nós outros, povo do Terceiro

Mundo, como cardápio capaz de alimentar o capital internacional (afinal dinheiro

nunca teve pátria) e ao mesmo tempo, manter uma estrutura mínima de mercado

consumidor, por aqui. Mas, esse tratamento clínico está fazendo o doente morrer,

quando a intenção era mantê-lo faminto, adoentado, ignorante, mas comprando

batatas-fritas, rádio-de-pilhas, supercomputadores capazes de lançar satélites na

órbita de Júpiter, equipamentos hospitalares de moderníssima tecnologia para

diagnosticar a senilidade antes dos 90 anos, quando as doenças que matam por aqui

são diarréia, sarampo, fome, bem antes de a criança atingir a adolescência.

No mês de janeiro, em Helsinque, esse economista brilhante, proferiu uma palestra

onde abriu seu apertado coração e emocionado admitiu o fato que a mais de dez

anos vem impondo uma política econômica aos países emergentes, cheia de

equívocos e incompleta. Ele chama essa política de “Consenso de Washington”,

nome sugestivo, né?

Como exemplo de incompletude, Stiglitz cita “... o governo deve garantir uma

regulação financeira confiável, políticas pró-competição, políticas para facilitar a

transferência de tecnologias, transparência nas informações...”. Parece até o Mao

Tse Tung falando de planificação da economia. Vade retro!

Para destruir nossa esperança, ele afirma em sua palestra que a China é um bom

exemplo de crescimento sustentado de dois dígitos, após ampliar a abrangência da

competição, sem privatizar as estatais. Epa! Estamos vendendo as nossas últimas e

vocês só avisam agora. Falha de comunicação ou má fé dos nossos governantes que

sabiam dessa abalizada informação e ainda assim continuaram a leiloar nosso

patrimônio? E ao terminar esse trecho da conferência, Stiglitz afirma que “... Tem

sido difícil administrar a privatização sem gerar corrupção e outros problemas”. Só se

for na França, pois isso será muito difícil de acontecer no Brasil, afinal corrupção é

algo fora da realidade do brasileiro, cristão de carteirinha.

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Linha do Tempo Página 202

Ao encerrar sua palestra, o economista concluiu que a questão atual não é mais

discutir se o Estado deve ou não intervir na economia, mas sim, de que forma

intervir. Certeza mesmo, o Consenso de Washington, indica uma pista para o

Terceiro Mundo: “É fundamental tentar conseguir um enfoque melhor nas questões

fundamentais – as políticas econômicas, a educação básica, a saúde, sistema viário,

segurança, proteção ambiental. Não sendo um governo minimalista...”.

Colocando tudo o que o homem falou na máquina de moer carne e levando em conta

quem ele representa, começo a entender a falta de norte do governo Fernando

Henrique, e as maquiagens que estão sendo feitas no ajuste fiscal. Afinal, a cartilha

estava errada e agora só resta esperar que a próxima fique pronta, para aí sim

estabelecer a nossa política econômica, justa, auto-sustentável e soberana.

(*) Ruy Ferreira - Professor de Computação da UFMT, Administrador de Sistemas de

Informações e mestrando em Educação Pública

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Linha do Tempo Página 203

Tecnologia Educacional Ruy Ferreira (*)

Jornal “O Diário” — Primavera do Leste, MT. 1999.

O emprego de modernas tecnologias nas escolas brasileiras é recente e ainda muito

acanhado. Embora, a algum tempo venha se realizando estudos e experiências

controladas nas universidades públicas. No ensino superior pode-se encontrar

exemplos na UFRGS, UnB, Unicamp e USP. Na pós-graduação esse instrumental é

utilizado no mestrado de Engenharia Operacional da UFSC e na PUC-SP, onde são

oferecidos cursos de especialização à distância.

Se para nós, brasileiros, o emprego de tecnologias de ponta é novidade, o mesmo

não se dá no primeiro mundo. Canadá, Austrália, Estados Unidos da América (EUA) e

Inglaterra, usam e abusam dessas tecnologias. Com características diferenciadas,

esses países utilizam novas tecnologias em seus sistemas escolares. Os EUA

entupiram suas escolas com computadores isolados, durante a década passada,

colhendo um fracasso monumental como resultado do investimento realizado. Ao

mesmo tempo, nas universidades americanas desenvolviam-se programas mais

consistentes que hoje estão estabelecidos e rentáveis.

Enquanto isso o vizinho Canadá, implantava um forte programa governamental de

emprego da tecnologia computacional em suas universidades que daí irradiaram pelo

país, com sucesso e resultados políticos positivos. Até mesmo, o pequeno Israel saiu

na frente em pesquisas de emprego das novas tecnologias educacionais, hoje é

exportador de soluções, respeitado no mundo.

Mas o que vem a ser essas tecnologias? Como devem ser utilizadas? Onde devem ser

usadas? Para responder tais perguntas é preciso criar o cenário da atual sala de aula

e daí, montar um novo ambiente. Nossas escolas utilizam como instrumento de

ensino o livro didático, descontextualizados, desatualizados muitas vezes e cheios de

erros absurdos. Os professores se apóiam nesses livros para planejar e aplicar suas

aulas, obviamente o ensino despenca em qualidade, apresentando resultados

negativos. No jargão do professorado, hoje a aula é dada na base do “cuspe e giz”,

onde o professor dita o conteúdo do livro e os alunos decoram o que lhes são

empurrados pelos ouvidos. Fracasso escolar, evasão, desinteresse pela escola são

produtos dessa forma indecente de fazer escola. A escola perdeu o glamour, o lugar

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Linha do Tempo Página 204

interessante foi substituído pelo local chato e de frequência obrigatória. A criança e,

principalmente, o adolescente vai a escola obrigado pelos pais. Pois lá o que se

ensina nada tem com a realidade que se vive.

Ora, a escola é lugar de aprendizagem, de formação de cidadãos produtivos e

conscientes. Pelo menos deveria ser! A realidade é bem diferente, havendo até uma

imensa parcela de estudantes que só aparecem na escola por conta da merenda

escolar. O lugar onde o aluno desenvolve a criatividade, a cidadania, a consciência do

valor da vida, ficou perdido num desvão do tempo.

Diante desse cenário o computador, a televisão, o vídeo, o rádio e outras tecnologias

passam a exercer um importante papel: O de reverter o quadro atual. Obviamente

que não basta comprar equipamentos e entulhar nas escolas, os EUA assim

procederam e quebraram a cara. Aqui mesmo, no Mato Grosso, há aproximadamente

dez anos atrás foram comprados computadores que nunca foram utilizados nas

escolas, numa atitude irresponsável dos dirigentes daquela época. O EEMOP em

Rondonópolis tem um pequeno laboratório de informática, adquirido pela SEDUC e

que ninguém utilizou até hoje. Não é esse o caminho da modernidade, o nome de

atitudes como essa é demagogia.

O computador é um equipamento versátil que bem utilizado pode se transformar

num importante instrumental para o professor e para o aluno. Casando o

computador com a telefonia é possível obter-se ambientes globalizados, interativos e

facilitador da criatividade, liberando o potencial do aluno na criação de seu próprio

saber. Essa caixa de ferramentas pode transformar a escola num lugar desejado

pelos alunos, onde é prazeiroso lá estar. Claro que isso não acontece num passe de

mágica. Primeiro a tecnologia chega na formação universitária, depois na sala do

professor em atividade nos Ensinos Fundamental e Médio, para em seguida, entrar

na sala de aula. Nessa ordem é possível vislumbrar o sucesso do emprego dessas

tecnologias.

Os especialistas dividem suas opiniões quando se trata de aplicação do computador

na sala de aula, uns afirmam que criar um laboratório de informática, cheio de jogos

“educativos” e colocar a criança nesse ambiente, nada mudará na qualidade do

ensino. A imensa maioria das escolas particulares fazem esse jogo de cena:

oferecendo tecnologia, cobrando valores absurdos de mensalidade, sem nenhum

projeto pedagógico. O uso das máquinas é um embuste. Outros pesquisadores

apontam a “Informática Educativa” como solução para o ensino, mas a idéia por trás

é substituir o livro didático por outro meio de comunicação e logicamente, nada

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Linha do Tempo Página 205

mudará. Afinal está-se substituindo o roto pelo rasgado!

Por fim, um crescente grupo de educadores vem empregando o computador como

instrumento de libertação do poder criativo do estudante e obtendo resultados

surpreendentes. Esses desistiram de achar uma “máquina de ensinar” que

substituísse o professor e passaram a pesquisar uma máquina que permite ao aluno

aprender através dela.

Em Primavera do Leste a Secretaria de Educação em parceria com a UFMT vem

desenvolvendo um projeto inédito no estado, onde a máquina entra pela “sala do

professor” e chegará até o aluno, numa segunda etapa. Nesse projeto a integração

do professor com a universidade se dá à distância, sem que haja necessidade de

presença física na atualização profissional. O professor é atualizado em serviço, sem

afastamento integral de suas atividades e ao mesmo tempo, entra em contato com

modernas tecnologias educacionais. Num estado com dimensões de país o projeto

tende a ser uma solução viável e exeqüível para quebrar o isolamento cultural dos

professores e conseqüentemente, melhorar a qualidade do ensino de 1º e 2º graus.

O professor de Primavera do Leste terá conhecimento do potencial do computador na

produção de material textual e gráfico, do uso de softwares educativos para fixação

de conteúdos dados em sala de aula e se integrará na grande rede mundial de

computadores, a INTERNET. A informação estará na ponta do dedo, a um clicar do

mouse. Uma visita ao mar, à floresta ou à montanha será simples como brincar no

pátio da escola. É o fim da barreira criada pela distância física! Claro que isso exigirá

novos paradigmas no educador, afinal o conhecimento está no mundo e não mais na

cabeça do professor. O aluno ganha a liberdade de pesquisar, criar seu próprio saber

e o professor a obrigação de se atualizar constantemente. Isso é Educação!

Recentemente, em reuniões realizadas no UNICEF e na UNESCO, onde o projeto foi

apresentado e debatido, a empolgação dos consultores daqueles organismos

internacionais indica que a idéia caminha por estrada segura. A vontade política dos

dirigentes municipais garante a continuidade do projeto até o ano 2000. Daí em

diante, o projeto passa a ser institucional e caminhará por meios próprios, sem o

auxílio da Universidade.

Mundo globalizado e escola isolada só apontam para desemprego, defasagem

industrial, ignorância e atraso. Até mesmo para consumir, hoje é necessário um

mínimo de conhecimento de tecnologia, exemplo disso está ao redor de qualquer

um: o controle remoto da televisão é usado para ligar e desligar, no máximo para

mudar de canal. Todos os demais botões são ignorados pelos “analfabetos

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tecnológicos” de hoje.

Com a promulgação da LDB, o poder público passa a ter responsabilidade direta na

atualização profissional de professores, exigindo o investimento na capacitação

docente e a respectiva contrapartida dos mestres, através do estudo constante e

permanente busca de conhecimentos. Para implantar um programa sério e eficaz

de atualização profissional nos municípios desse enorme estado brasileiro é

necessário buscar alternativas viáveis. O MEC, através da Secretaria de Ensino à

Distância, vem incentivando o emprego dessa modalidade de ensino como forma de

minimizar o problema da defasagem em que se encontra o professorado brasileiro. O

Ensino à Distância é usado em todos os países do primeiro mundo, sem nenhum

preconceito e com grande vantagem sobre o ensino presencial. Hoje é possível fazer

cursos de bacharelado em Direito, Administração, Economia e outros mais, sem sair

de casa. A universidade chega onde o aluno estiver. No Canadá o ensino de 1º grau

para Departamentos (Estados) distantes é oferecido através da televisão educativa,

do rádio e de redes de computadores. A Austrália é outro exemplo de sucesso, onde

até consultas médicas são realizadas através dessas modernas tecnologias.

Atualização, treinamento, extensão, especialização e outras formas de capacitação

podem e devem estar apoiadas no Ensino à Distância através de redes de

computadores, levando o conhecimento onde o aluno estiver. Adaptando

experiências internacionais à realidade do Mato Grosso é possível melhorar a

qualidade do ensino, preparar o professorado para a nova realidade mundial, e

garantir a formação do futuro cidadão, sintonizado com questões éticas, ambientais

e que valorizem a vida humana acima de tudo.

(*) Ruy Ferreira é professor de Computação do ICEN-UFMT e mestrando em

Educação no IE-UFMT. Idealizador e um dos coordenadores do Projeto Infovia da

Educação (em fase de implantação no endereço eletrônico:

nt.networld.com.br/primavera) que cria a extensão universitária à distância, apoiada

na Internet, no Mato Grosso.

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Cotas e políticas afirmativas Ruy Ferreira

Jornal “O Estado de São Paulo”, São Paulo-SP. 26 de dezembro de 2001.

"O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil". De tanto ouvir essa

asneira muita gente passa a acreditar que isso é uma verdade incontestável. As

ações ou políticas afirmativas, aplicadas nos últimos tempos nos EUA é fruto de um

movimento cívico que dura mais de trinta anos. São resultados de muita luta e

conscientização do negro americano do norte, nascido e criado numa sociedade

racista e que precisa abrir espaço na marra, pois se assim não for permanecem às

margens da sociedade.

Aí o time do FHC, aqui no Brasil tropical, cisma de adotar o modelo americano do

norte sem retoques. Será que o ano 2002 terá algo especial no País? Qual motivo

despertou a atenção dos tecnocratas em Brasília? Seria a possibilidade de perder as

eleições por nada fazer a respeito nos últimos sete anos? Claro que eu, mestiço,

gostaria muito de ver muitos generais, almirantes e brigadeiros negros e mulatos.

Gostaria de ver a mestiçagem em todos os níveis de governo, no parlamento e no

judiciário. Só um racista disfarçado seria contra isso. Mas daí criar cotas para negros

na segurança e faxina do Ministério da Justiça, colocar duas assessoras no Ministério

da Reforma Agrária, destinar um percentual de vagas das Universidades Públicas aos

negros é no mínimo uma sacanagem com todos os brasileiros, aqueles chamados de

"cidadãos".

O pior é que ainda não ouvi o "rugido" dos defensores da Cultura Afro-Brasileira. Será

que estão mancomunados com esses burocratas? Será que estão nomeando

parentes? Isso cheira a maracutaia. Vai ver alguma ONG está levando grana para

calar a boca? Viagens, passagens, turismo oficial e coisa e tal, são meios de

comprometer dirigentes. Cair no canto da sereia não é privilégio de branco. Só em

ouvir essas notícias fico pensando num baita complô para esconder qualquer outra

sujeira nos três poderes da República. Ou pior, na falta de competência para fazer o

que deve ser feito, e mais, já deveria estar pronto após sete anos de (des)governo.

O pessoal de Brasília deve desconhecer que 17,2% dos brasileiros são analfabetos e

que para eles não há política afirmativa coisa nenhuma. Em uma década seria

possível conciliar crescimento sustentado com redução da desigualdade social. A

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base de sustentação do governo é a mesma desde o Sarney (que Deus o tenha) e

pouco ou nada foi feito para erradicar analfabetismo, trabalho infantil e prostituição

infantil, entre outras vergonhas de nossa sociedade. Essas violências afetam

brancos, negros, índios, amarelos, roxos, etc. e tal.

Fico pensando em minhas netas, cursando uma escola básica de péssima qualidade,

com professores mal pagos, por isso desqualificados para o magistério, defasados

com a realidade que os cerca e na imensa maioria, entrando pela janela no serviço

público, como interinos quase permanentes. Mestiços como eu não são 100%

brancos, nem 100% negros ou índios, logo estão fora de qualquer ação afirmativa

governamental. Mérito é besteira! Basta ficar na escola para chegar ao final do

Ensino Fundamental. Ler, escrever e compreender o mundo é babaquice ou privilégio

de alguns escolhidos por lei.

Como seria o ingresso de um negro no curso de Computação da UFMT? Faria um

exame de DNA para provar sua origem 100% africana? Apresentaria um atestado de

nascimento em pais negros por três gerações, como fazem os judeus em Israel?

Seria indicação de um senador? Claro que distribuir renda é assunto proibido para os

atuais detentores do poder. Claro que criar escolas em tempo integral é sonho de

gente retrógrada. Claro que ensinar Filosofia, Tecnologia e Sociologia é baboseira,

incluo por minha conta Economia, afinal para quem vai ser faxineiro, camelô ou

segurança de supermercado não tem necessidade de entender o mundo e exercer

seu livre arbítrio. Democracia é isso? Cotas para negros, para índios e o resto que se

danem!

Vamos parar de demagogia. Vamos parar de ser “macaquito”. Vamos assumir nossa

mestiçagem e criar uma identidade própria para nós brasileiros (Ave Darci Ribeiro).

Samba, cachaça e mulata não são frutos proibidos ou vergonhosos. Educação para

poucos, sim, é uma vergonha. Concentração de renda para pouquíssimos é vergonha

maior ainda. Se preciso vamos votar em outros caras que ainda não fizeram tantas

besteiras como os FHC, Collor e Sarney da vida. Sei lá qual partido ou que nome, mas

o que importa é programa de governo registrado em cartório, reforma tributária

profunda, fomento à produção em lugar dos bancos, escolas dignas de educar

brasileiros, Universidades que produzam conhecimento tupiniquim para nós e para o

mundo, além de transmitir o estocado nos livros.

Por fim uma dose cavalar de vergonha na cara em todos nós, eleitores e políticos.

Vamos escolher bons nomes para concorrer nas próximas eleições, sem essa de

candidato natural (parece coisa da monarquia), vamos votar em gente conhecida e

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próxima de nós mesmos. Campanha eleitoral com limite nos gastos, doações

identificadas de pessoas físicas, proibição de pessoas jurídicas doarem dinheiro aos

candidatos, cadeia para quem descumprir a lei eleitoral, com perda de mandato

daqueles que a infringirem. Vamos colocar o orçamento do executivo nas mãos do

povo. Chega de emendas de parlamentares, essa nunca foi função do legislativo.

Chega de orçar e não cumprir. Dinheiro público não pode ser distribuído para ONG,

faculdades particulares, empresários socialistas no risco e capitalistas no lucro.

E, aí o sistema de cotas para negros, índios, portadores de necessidades especiais

(ex-deficientes), mulheres, gays, militares, jogadores de futebol, prostitutas, parente

de políticos e de juízes deixa de ser necessária. Para quê cotas, se todos receberam

a mesma educação com seriedade, em escolas cujas verbas são fiscalizadas pelo

Ministério Público e APM´s nas escolas e conselhos comunitários nas Universidades

públicas. Sonho? Não. Respeito à dignidade de ser Brasileiro!

Professor de Computação da Universidade Federal do Mato Grosso/UFMT

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Universidade e mercado artigo de Ruy Ferreira

O autor é professor da UFMT.

Artigo enviado pelo autor ao "JC E-Mail" e publicado em:

Jornal da Ciência (JC E-Mail) – 6 de agosto de 2001 – Nº 1846 - Noticias de C&T -

Serviço da SBPC

Afinal o que é sociedade? E, mercado? Onde entra a Universidade no contexto da

sociedade e do mercado?

Os discursos que tenho lido na mídia nacional criam na opinião publica a ideia que a

sociedade é um ente jurídico como são as empresas, onde existe meta a ser

cumprida e objetivos a serem atingidos, representantes legais etc. e tal. Idêntica

postura quando se trata do mercado. Pura balela!

O concerto continua no mesmo diapasão determinando que a Universidade deve

submeter-se a lógica do mercado. Isto é, com a carência de financiamento a fundo

perdido, as Universidades devem transformar-se em grandes incubadoras de

tecnologia.

Pouco se vê na mídia o contra-ponto, isto é, a Universidade deve impulsionar a

ciência, deixando para as empresas o empreendedorismo no campo da tecnologia.

Afinal a ciência é pública, universal e não admite patente (apesar de meia-dúzia de

pessoas acharem que não), enquanto a tecnologia vive disso.

Se a lógica que move a Universidade é o avanço da ciência, então deveríamos

repensar nossas academias sob tal ótica.

E ai, uma grande massa de experiências poderiam ser absorvidas por todas as

instituições universitárias, visando atingir novos objetivos, como: formação de

pesquisadores de alto nível (gente que sabe resolver problemas complexos);

absorção de conhecimentos do mercado e da sociedade, através da renovação de

quadros experientes (por exemplo, só admitir: doutores com mais de cinco anos de

experiência em funções empresariais afins ao doutoramento; não-doutores com mais

de dez anos de experiência no mercado, dentro do campo especifico que trabalhará

na Universidade); fomento a pesquisa básica como prioridade absoluta dos recursos

financeiros que de alguma fonte aportem nas instituições; incentivo a parcerias com

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empresas para desenvolvimento tecnológico em áreas de interesse nacional

(petróleo, energia, telecomunicações, informática, genética, medicina, etc.), cujos

resultados fortaleçam o país em áreas criticas do conhecimento.

Vejo o modelo atual de nossas Universidades como "torres de marfim" (imposto pela

mídia), onde acadêmicos que nunca foram ao mercado resolver problemas, ensinam

como resolvê-los aos futuros profissionais do mercado. Contra senso!

Vejo também, uma imensa massa de profissionais, altamente qualificados, que

nunca retornaram à Universidade para contribuir para a universalização dos saberes

que acumularam. Outro contra-senso!

Perdemos assim a oportunidade de absorção de anos e anos de experiências

bem-sucedida. Muitos deles formados com recursos públicos, e por uma questão de

cidadania deveriam ser compartilhados por muitos.

Por fim, acredito que as novas responsabilidades impostas às Universidades

deveriam vir com a devida contrapartida de recursos financeiros, humanos e

materiais, pois não é possível aumentar a oferta de vagas, formar novos

pesquisadores, implantar novas áreas de pesquisa, desenvolver tecnologia para

empresas, manter estudos visando o desenvolvimento da pesquisa básica,

desenvolver programas extensionistas, apoiar o desenvolvimento da Cultura,

atender ao ensino e administrar tudo isso, sem a devida contra-partida daqueles que

exigem essa nova atuação universitária.

Se algo não for pensado, daqui a algum tempo estaremos com muitas fundações de

apoio (sem nenhum controle ou coordenação) gerindo os destinos da Universidade,

com a desculpa que a sociedade e o mercado assim exigem.

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Sonhei que ... Ruy Ferreira(*)

Jornal A Gazeta — Cuiabá-MT. (2001)

Como qualquer “papa-goiaba” sempre acreditei que minha terra natal tem um

enorme potencial humano, capaz de mobiliar empresas, academias, governos e

todas as demais áreas da vida em sociedade no estado e no Brasil.

Por outro lado os vizinhos “cariocas”, herdeiros naturais das benesses advindas do

status de capital por tanto tempo, sempre buscaram controlar a situação, de tal

forma que o pensante nasce na cidade do Rio de Janeiro, enquanto a mão-de-obra

que realiza suas ideias vem do grande quintal fluminense.

Parece que já absorvemos tal ideologia e a colocamos como inexorável. Balela! O Rio

de Janeiro tem potencial para pensar, bastando para isso que possamos exercer tal

atividade habitualmente. Onde isso seria possível? Nas escolas e universidades, em

especial, nas fábricas, nas empresas de prestação de serviços, nos teatros, na

música, na arte em geral e também, na vida cotidiana.

Como romper o status quo da dominação cultural e da “inteligência” carioca sobre o

estado “papa-goiaba”? Bem, muitas maneiras são possíveis, todas dependentes de

vontade política e de desprendimento bairrista.

Nasci e me criei na Baixada Fluminense, e sobre uma pequena fatia dessa região

sonhei um sonho. Que tal sonhar esse sonho junto comigo!

Viajando na velocidade do pensamento desloquei-me do Mato Grosso, onde moro

atualmente, e flutuei sobre Paracambi, minha terra natal, pequenina e graciosa entre

a baixada e as montanhas, vizinha de lugares importantes e esquecida por todos.

Ah! Quantas saudades! Cada cantinho traz uma recordação diferente, são coisas

íntimas e gostosas de serem lembradas. Primeiros amigos, primeira escola, primeira

namorada, primeiro emprego com carteira assinada, primeira briga, o amor pelo

Esporte Clube Brasil Industrial. O vermelho da camisa dos jogadores do Brasil

Industrial me hipnotizava e me faz sentir orgulho dos ídolos como Eli do Amparo,

Romeiro (UCA) e meu pai, craques de uma época que não volta mais.

A vida ali era calma, organizada e previsível. Se houvesse uma discussão entre os

torcedores, com certeza a causa seria o ímpeto da Norma, do Seu Nozinho, e seu

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descontrolado amor pelo vermelho do Brasil Industrial. Se a coisa descambasse para

briga, certamente o Aderbal estaria ali.

Quantas saudades! Ainda sinto o cheiro da camisa vermelha que vestia aos domingos

para jogar no infantil do Brasil Industrial, sob a batuta do Itamar. Ipojucan, Felipe,

Pintinho, só para citar atacantes, meninos-craques que defendiam o vermelho por

meio da arte de jogar futebol. E se o adversário fosse o Tupy do Baltazar? Guerra! Na

preleção o Itamar, gago e nervoso, dizia: vamos lá ganhar deles e pronto, ali estavam

todas as instruções necessárias para jogar um futebol-arte que não se pratica mais.

Ui! Saudade dói, e muito, ainda mais quando o calor do corpo das meninas se

aproximavam do meu corpo enquanto dançávamos no Clube Brasil Industrial, o

“Cassino”, sob o som das vitrolas nas domingueiras. Terra de mulher bonita e de

gente romântica, Paracambi, viveu grandes amores, duradouros e felizes. Na saída

do turno da fábrica de tecidos a Avenida dos Operários transformava-se em imensa

passarela da beleza. Mãos dadas ou na garupa das bicicletas, quantos casais por ali

desfilaram.

Emprego para todos, inclusive para os vizinhos de outras cidades. Tínhamos duas

fábricas de tecidos, uma siderúrgica, uma fábrica de arame, uma olaria, grande

produção de bananas e laranjas e um quartel do Exército, para uma pequena

população. Hoje só restou o quartel e um inchaço populacional.

Voltando ao sonho, vi a antiga fábrica de tecidos Brasil Industrial funcionando a pleno

vapor, fervilhando de gente. Dois detalhes, jovens em profusão e as chaminés não

produziam fumaça.

Fui chegando mais próximo e vi o portal da fábrica onde se lia: “Fábrica de

Conhecimento”. Comecei a ficar intrigado com o nome, ultrapassei o pórtico de

entrada e só não cai sentado porque estava sonhando, as instalações da extinta

fábrica dera lugar a uma moderna universidade tecnológica!

Jovens doutores, ex-desempregados, trabalhavam feitos cientistas-loucos em

laboratórios espaçosos e abertos; salas de aulas repletas de estudantes assistiam

videoconferências, num auditório a platéia assistia atenta a palestra de um filósofo

francês pós-moderno, noutro um grupo de professores da Educação Básica discutia

um programa de implantação de Tecnologias da Informação e Comunicação nos

currículos escolares.

Subi um andar e pasmem: - uma grande multinacional da telefonia havia montado

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sua universidade corporativa naquele ambiente e seus funcionários freqüentavam a

Fábrica de Conhecimento regularmente e recebiam aulas, ali produzidas, por meio da

Internet de Alta Velocidade que conectava a Fábrica aos vários pontos de presença

da empresa no estado.

Nanotecnologia, Bioinformática, Telecomunicações, Sistemas Digitais, eram coisas

comuns naquele lugar. Uma fábrica não-poluente gerava oportunidades e novas

frentes de trabalho para seus egressos. Nada ali era definitivo, nada secular, nenhum

corporativismo, bairrismo, os interesses eram coletivos, negociados e amplamente

debatidos e divulgados entre a comunidade, pois todos estavam plugados na “net”.

A Fábrica de Conhecimento aproveitava a energia elétrica gerada por antigos, mas

eficazes geradores hidroelétricos ali instalados no início do Século XX. O prédio era

todo aproveitado, nada era desperdiçado, qualquer cantinho estava ocupado com

uma atividade acadêmica ou instrucional. O ar estava impregnado com o perfume da

cidadania, todos respiravam direitos e deveres sociais, intelectuais e morais. Não

havia estrelismos, a ideologia dominante não era discriminatória, nem sectária.

Parecia uma volta aos tempos gregos de Platão, Pitágoras e outras feras do

Conhecimento.

Espantado e feliz procurei saber como havia nascido tal empreendimento e

literalmente “babei” com a resposta: As lideranças políticas e da sociedade civil das

cidades de Paracambi, Japerí, Engenheiro Pedreira, Queimados, Comendador

Soares, Nova Iguaçu, Seropédica, Itaguaí, Piraí, Paulo de Frontin e Mendes haviam

se unido num ideal comum, preocupados com seus jovens, com o desemprego, com

o distanciamento da população local do saber atual, com a defasagem tecnológica de

seus parques industriais, e obtiveram o apoio irrestrito do governo do estado, da

assembléia legislativa e da bancada federal no congresso, além das representações

do mercado produtivo e dos trabalhadores, que juntos acamparam por dois meses

em Brasília, e de lá saíram com o projeto aprovado e recursos garantidos no

orçamento federal, afinal ensino superior é obrigação da União.

Ao mesmo tempo, foi criado um consórcio das prefeituras cujo objeto foi criar e

manter a Fábrica do Conhecimento. O governo do estado sofreu pressões das

universidades cariocas, e até mesmo da Rural, mas manteve o apoio incondicional à

idéia, garantindo recursos para sua viabilização.

Por fim, os empresários coçaram o bolso e colocaram dinheiro na Fábrica de

Conhecimento, além de firmar vários convênios de ensino e pesquisa. As centrais

sindicais, os sindicatos e outros órgãos de representação dos trabalhadores, também

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entraram de cabeça e carrearam recursos, via convênios, para formação profissional

de seus filiados com a Fábrica de Conhecimento. Órgãos representativos da

sociedade civil, como a ABI, OAB, associações de moradores, ONGs diversas e muitos

outros trabalharam na construção do projeto e orientaram sua implantação.

Um jornal carioca, mais vendido no estado que na cidade do Rio, estampava uma

notícia diferente: “Fábrica do Conhecimento forma seu primeiro milhão de egressos”.

Confesso que fui às lágrimas ao ler tal notícia.

O despertador tocou, acordei e descubri que sonhei um sonho. Mas que é um sonho

possível, ninguém pode negar!

(*) Ruy Ferreira, 47, paracambiense, professor da UFMT e morador em Cuiabá-MT.

PS: O governo do Rio de Janeiro implantou a fábrica do conhecimento—Centro

Universitário Tecnológico de Paracambi - CEUTEP (O espaço foi transformado em um

complexo educacional e abriga quatro pólos de ensino superior e profissionalizante;

a Escola de Música Villa-Lobos; o Planetário e a Brinquedoteca Viva. No local,

também estão sendo construídos uma Biblioteca Regional, o Museu da Ciência e a

nova sede da Escola Villa-Lobos)

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Professor propõe plano para acesso dos

negros às Universidades Públicas Ruy Ferreira

Jornal da Ciência (JC E-Mail), de 20 de Fevereiro de 2002. - Edição 1976 - Notícias de

C&T - Serviço da SBPC

Tenho acompanhado no JC e-mail e noutros meios de comunicação a profícua

discussão sobre adoção de ações afirmativas por parte do Ministério da Educação,

Universidades e instituições interessadas no assunto. As pessoas estão discutindo o

tema abertamente e isso é ótimo.

Afinal, não existia racismo no Brasil, agora há! Como mestiço (neto de português com

negra) ainda não sei como ficará a defesa dessa 'nova raça', 'brasileiros da terra',

como certa vez ouvi Darci Ribeiro denominar. Como tenho a pele clara, sofri um único

ato de discriminação em 48 anos de vida. Mas sofri! E dói muito!

Pois bem, após observar o muito que se tem escrito e proposto pelo governo e ongs,

gostaria de acrescentar uma proposta ao tema em debate.

Assunto: - acesso dos negros às universidades públicas. Proposta: oferta de curso

pré-vestibular. Condições de ingresso no programa: alunos comprovadamente

pobres; matriculados na 3ª série de qualquer escola pública; cliente de escola pública

nos últimos três anos.

Seleção por meio de apuração do rendimento escolar das duas séries iniciais do

ensino médio, realizado pela secretaria da escola pública e encaminhadas

oficialmente à coordenação do programa.

Distribuição de vagas: metade para negros (fácil de identificar) e metade para pardos

e brancos. O programa será oferecido pelas Universidades públicas, em substituição

a atual Prática de Ensino realizada nas licenciaturas (300 horas-aulas). Sob a

coordenação dos professores responsáveis por essas disciplinas.

Aulas ministradas pelos estudantes matriculados nessas disciplinas (normalmente

formandos), respeitando a área de cada um.

Justificativa: Nossos alunos das licenciaturas realizam a prática de ensino em escolas

públicas, atendendo o público-alvo do programa. Grande parte dos matriculados em

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licenciaturas (pelo menos na UFMT) advém das faixas mais pobres da população.

Tais estudantes estão muito mais próximos do problema de acesso que muitos de

nós professores. A oferta do serviço público permanecerá e irá atender um problema

social grave e imediato. Os professores das disciplinas que constituem a Prática de

Ensino podem, com facilidade, planejar os cursos pré-vestibulares, pois detém o

conhecimento sobre o tema. As Universidades podem usar espaços ociosos ou

ocupar salas de aulas no próprio colégio da rede pública.

Custos: Como o MEC pretende pagar os donos dos cursinhos pré-vestibulares (Di

Gênio e cia limitada) para que viabilizem suas políticas afirmativas, haverá dinheiro

para tal. Minha proposta é de que tal montante seja canalizado para programas

implantados nas IPES e se dê por meio de bolsas (R$ 241,00) aos participantes, como

motivação à participação e saudável ressarcimento do tempo e suor dado ao

programa.

Bem, esta aí a síntese da proposta, que usa estudantes das licenciaturas, sob a

coordenação de professores qualificados, para executar uma política pública

proposta pelo MEC. Atende a negros, pardos e brancos.

Privilegia o pobre, onde está a maior quantidade de negros e pardos. Presta um

serviço inestimável à sociedade que nos paga e começa mais cedo a engajar a

sociedade na vida universitária. É isso!

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Democratizando o acesso ao

conhecimento científico Ruy Ferreira (*)

Jornal “Folha de São Paulo”, São Paulo-SP: 23 de fevereiro de 2003

Muito se tem estudado sobre as possibilidades de armazenagem da informação em

meios digitais. Desde a simples cópia da imagem de um documento até a publicação

de periódicos, há um enorme acervo publicado, em diversas mídias, sobre teorias,

métodos e técnicas tratando do tema.

As bibliotecas digitais, baseadas em dispositivos de armazenagem óticos ou não, são

uma realidade nas instituições de ensino superior e de pesquisa. O primeiro problema

está na lógica que estrutura tais acervos digitalizados, pois mantém o modelo de

armazenagem de rígidos banco de dados, com seus campos e palavras-chaves como

forma de busca.

Com a massificação do acesso à Internet entre os estudantes do ensino superior e

pesquisadores, fica difícil entender o por quê de tal visão. Se o arquivo foi

armazenado em meio digital e publicado na Internet, então não há necessidade de

busca por campo. Os atuais mecanismos de busca (ou motores de busca) são

capazes de recuperar qualquer palavra nesses arquivos. Basta planejá-los para isso!

E por que não fazê-lo?

Os periódicos são um bom exemplo para esta discussão. Em sua imensa maioria

destinam-se a difundir o conhecimento científico para a sociedade, com foco especial

na comunidade científica. Em mídia impressa, custam caro e não atingem a

totalidade das instituições a que se destinam. Uma correção (errata) exige a espera

da publicação do próximo número da revista, prejudicando o leitor, autor e editores

do periódico. A mídia impressa não é democrática, custa caro e elitiza o

conhecimento produzido.

E por que não fazê-lo na Internet?

Transpor do meio impresso para o digital exige um investimento financeiro razoável,

mas os benefícios superam em muito, os custos iniciais. Se a filosofia que mantém os

periódicos em circulação é a difusão do conhecimento humano, produzido na

academia, então quanto maior for o público leitor, maior será a eficácia da

publicação.

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E mais, se não é a intenção primeira ganhar dinheiro com a venda dessas

publicações, então a Internet é o espaço virtual mais adequado à difusão da Ciência.

Mesmo se o periódico for auto-sustentável em termos financeiros, a sua veiculação

na Internet não impede o lucro (ou superávit).

Digitalizar o conhecimento, publicando-o na Internet, preferencialmente garantindo

acesso público e gratuito, é uma política inteligente de difusão científica. Se o

conteúdo estiver em Língua Portuguesa, melhor ainda. Afinal, nem todos nossos

acadêmicos dominam a leitura em outros idiomas. Aumentando a presença do

Português na Internet estamos afirmando nossa identidade e estreitando laços com

países que falam nossa língua.

O físico João Magueijo, em recente entrevista, quando fala de periódicos acadêmicos

é taxativo:

“Acho que eles não têm futuro. São uma perda de tempo. Não leio um periódico

desses há anos. O futuro está na internet. Os arquivos da internet não fazem uma

filtragem para excluir as coisas boas, e as coisas que não prestam também estão lá,

assim como estão nos periódicos. No futuro, as pessoas publicarão seus artigos

apenas em arquivos da internet”

Como estamos numa era de escassez de recursos financeiros, a publicação de

periódicos na Internet passa a ser algo interessante também do ponto de vista

econômico. Pois, não há como negar o barateamento de custo, quando se transpõe

uma publicação em papel para o hipertexto da Internet.

A estrutura editorial não precisa mudar. Comissões ou comitês editoriais podem

julgar o que deve ou não ser incluído em suas publicações. Arbitragem (referees)

pode ser empregado, sem que nada mude na qualidade do que se publica. Logo, o

julgamento dos pares permanece como forma de seleção para a publicação.

O que muda realmente, quando se faz a publicação digital, é o acesso. Se antes, um

periódico possuía um pequeno número de leitores, na Internet, esse número é

imprevisível. E mais, as características desse leitor deixa de ser o restrito público dos

freqüentadores de biblioteca acadêmicas, para se ampliar a qualquer leitor que tenha

interesse num determinado tema. O aumento da quantidade de leitores pode ser

visto como forma eficaz de democratização do conhecimento produzido na

academia.

Por fim, constata-se a contradição entre os acadêmicos da nova Sociedade da

Informação e do Conhecimento, defensores arraigados de uma mídia criada na Era

Medieval. Haja conservadorismo!

(*) Doutorando da UNICAMP

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Se eu fosse a reencarnação de Charles

Darwin – Parte I Jornal “Agito Ubatuba”, Ubatuba-SP: 25 de maio de 2007

Renasci 125 anos depois e fiquei muito feliz ao constatar que acertei em tudo o que

formulei. Minha teoria da evolução das espécies não sofreu uma só correção nesse

período, a seleção natural é aceita sem restrição pela Ciência como uma verdade

científica. E eu passei 21 anos com o livro pronto, sem publicar, por saber o impacto

terrível que teria até em minha própria família.

Ah, como é bom saber que tirei o véu da ignorância e da superstição que cobria os

olhos da humanidade. Só os religiosos resistem a aceitar minhas teorias, mas um

motivo justifica esse medo: ao aceitar a teoria eles perderão seus empregos,

mordomias e principalmente o poder. No fundo resistem seguindo minha teoria de

seleção natural.

Minhas cinco teorias ficaram mais fortalecidas desde minha última morte. A teoria da

evolução está ajudando os cientistas a entender porque o vírus da gripe entrou em

mutação e no lugar de matar 50 milhões de pessoas de uma tacada só (gripe

espanhola no Século XIX), agora mata pouco mas garante sua sobrevivência na

Terra, ao manter o hospedeiro vivo.

Da mesma forma, a teoria do ancestral comum é irrefutável. Nascemos todos da

ameba original há mais de 4 bilhões de anos atrás, não importa se um rato, um

elefante, uma galinha, um baiacu ou eu próprio.

Minha teoria da multiplicação das espécies foi explicada com o descobrimento do

DNA há 50 anos e hoje serve até para provar que fulano é pai biológico de cicrano. A

Natureza sábia seleciona as mutações mais oportunas e descarta as menos

adequadas à vida nesse Planeta Azul.

Ainda estou triste com a permanência do pior sentimento do ser humano – o racismo.

Gerações já se passaram e não conseguem enxergar que a teoria do gradualismo é

inexorável. Vamos ficar mais diferente do que éramos há mil anos e isso é bom e

natural. Já passou da hora de aceitar a diversidade como algo natural.

Entretanto, minha teoria da seleção natural é aceita sem restrições pela Ciência. Até

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Linha do Tempo Página 221

cientistas religiosos admitem que Deus escolheu esse caminho com sabedoria. Eu só

vi o caminho traçado por Ele. Hoje sabemos que a girafa mutou e uma geração lá trás

ganhou pescoço comprido, esse fato mostrou que no período de seca elas podiam

comer folhas verdes do alto das árvores e descartou as de pescoço curto. Viva a

Natureza e suas leis divinas.

Por fim, quero lembrar que nunca disse ou escrevi que o homem descende do

macaco. Isso é intriga de meus adversários de ideias. Afinal eu só tirei o homem da

linhagem dos anjos e coloquei no mundo natural e isso incomodou muita gente em

1859. E, parece incomodar até hoje.

Ruy Ferreira — Professor

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Linha do Tempo Página 222

Se eu fosse a reencarnação de Charles

Darwin – Parte II Jornal “Agito Ubatuba”, Ubatuba-SP: 26 de maio de 2007

Lembra que eu renasci 125 anos depois de morrer? Pois é, para minha desgraça nasci

no Brasil. Na última vida fui inglês, cavalheiro da rainha e cientista. Dessa vez tenho

que me contentar em ser professor universitário, porque aqui não existe ambiente,

nem dinheiro, para pesquisa científica. Ah, que saudade da Inglaterra de 200 anos

atrás!

Naquela vez pude fazer uma viagem de navio que durou cinco anos. Conheci o Brasil

de Dom Pedro II, moleque de sete anos e já imperador no trono em 1832. Minha

impressão não foi das melhores. Em meu livro diário anotei muitas coisas sobre o

Brasil e hoje vou comparar o que vi naquela época e o que acontece hoje, 150 anos

depois.

É bom lembrar que visitei Fernando de Noronha, Salvador, Rio de Janeiro, durante

cinco meses. No retorno parei em Recife por quase dois meses. Visitei cidades do

interior do Rio de Janeiro, onde se plantava café. Ao chegar a Salvador, por

coincidência, começaram os festejos de carnaval. Adorei a alegria dos foliões, mas

repudiei a falta de educação com que jogavam bolas de ceras nas pessoas que

assistiam a folia. Hoje, vendo o carnaval de Salvador vejo que nada mudou, pois a

alegria é a mesma, assim como a falta de educação dos foliões. Outra anotação que

fiz na Bahia foi a indolência do povo baiano, como gostam da vagabundagem.

Naquela época escrevi que devia ser o forte calor. Hoje com ventilador e ar

condicionado nada mudou logo os caras são preguiçosos mesmo.

No Rio de Janeiro passei mais tempo em terra. Ali eu entrei em contato com a

máquina burocrática do governo. Anotei em meu diário: - sem suborno as

autoridades governamentais não funcionam. Caramba, nada mudou! Sem corrupção

os governos brasileiros não funcionam. De José Bonifácio até hoje a corrupção é

marca indelével da máquina pública no Brasil.

Outra coisa que escrevi naquela época foi: - Se um crime foi cometido por um rico,

nada lhe acontecerá. Polícia e juiz podem ser subornados com migalhas. De novo o

brasileiro resiste à teoria da evolução e não muda. Hoje mesmo a polícia federal está

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Linha do Tempo Página 223

enfiando em cana um monte de juízes, desembargadores, ministros e advogados que

compram e vendem sentenças. Quanto milionários estão nas penitenciárias? Naquele

tempo só negro e pobre ficavam nas cadeias, hoje mudou o quê? Já passou da hora

de dar um basta nessa injustiça social.

Fiquei horrorizado com a escravidão no Brasil, tanto assim que prometi nunca mais

visitar uns país escravocrata. Mas, para minha tristeza, Deus me fez renascer no

Brasil e a escravidão ainda não acabou. Assim como a falta de educação. Escrevi isso

na Bahia e no Rio de Janeiro, em 1832. Em 2006 um candidato a presidente do Brasil

fez sua campanha com tema único: Educação. Até nisso eu estava certo a 150 anos

passados.

Bem, vou viver não sei quantos anos nessa encarnação brasileira. Espero que a

seleção natural, o gradualismo e a seleção natural comece a funcionar na sociedade

brasileira. Porque se isso não acontecer logo, a Natureza é inflexível e irão descartar

os brasileiros como seres que não deram certo.

Ruy Ferreira - Professor

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Linha do Tempo Página 224

Conclusão

Depois de mais de duzentas páginas fica difícil falar em conclusão. Talvez, nem deva

existir uma conclusão possível. Então, melhor é deixar o leitor concluir sobre o que

leu.

Espero, sinceramente, que a leitura tenha sido agradável e útil. Também, agradeço o

tempo que o leitor dedicou a essa obra, pois ela representa quinze anos de artigos de

opinião escritos no calor das notícias, representando meu estado de espírito naqueles

momentos.

Se houve momento de revolta e crítica, também busquei apresentar momentos de

ironia e bom humor.

Um abraço fraterno e até a próxima.

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