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Ilhéus . 2013 Letras . Módulo 5 . Volume 3 LINGUÍSTICA IV: LINGUÍSTICA APLICADA À ALFABETIZAÇÃO Cláudia Martins Moreira

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Ilhéus . 2013

Letras . Módulo 5 . Volume 3

LINGUÍSTICA IV:LINGUÍSTICA APLICADA À ALFABETIZAÇÃO

Cláudia Martins Moreira

Universidade Estadual de Santa Cruz

ReitoraProfª. Adélia Maria Carvalho de Melo Pinheiro

Vice-reitorProf. Evandro Sena Freire

Pró-reitor de GraduaçãoProf. Elias Lins Guimarães

Diretor do Departamento de Letras e ArtesProf. Samuel Leandro Oliveira de Mattos

Ministério daEducação

Ficha Catalográfica

1ª edição | Janeiro de 2013 | 462 exemplaresCopyright by EAD-UAB/UESC

Projeto Gráfico e DiagramaçãoSaul Edgardo Mendez Sanchez Filho

CapaSaul Edgardo Mendez Sanchez Filho

Impressão e acabamentoJM Gráfica e Editora

Todos os direitos reservados à EAD-UAB/UESCObra desenvolvida para os cursos de Educação a Distância da Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC (Ilhéus-BA)

Campus Soane Nazaré de Andrade - Rodovia Ilhéus-Itabuna, Km 16 - CEP: 45662-000 - Ilhéus-Bahia.www.nead.uesc.br | [email protected] | (73) 3680.5458

Letras Vernáculas | Módulo 5 | Volume 3 - Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

M835 Moreira, Cláudia Martins. Lingüística IV : lingüística aplicada a alfabetização / Cláudia Martins Moreira. – Ilhéus, BA : JM Gráfica e Editora, 2012.192p. : il. (Letras – módulo 5 – volume 3 – EAD) Inclui referências.

ISBN: 978-85-7455-301-6

1. Linguística aplicada. 2. Alfabetização. 3. Leitura – Estudo e ensino. I. Título.

CDD 418.4

EAD . UAB|UESCCoordenação UAB – UESC

Profª. Drª. Maridalva de Souza Penteado

Coordenação Adjunta UAB – UESCProfª. Dr.ª Marta Magda Dornelles

Coordenação do Curso de Licenciatura em Letras Vernáculas (EAD)

Profª. Ma. Ângela Van Erven Cabala

Elaboração de ConteúdoProfª. Dra. Cláudia Martins Moreira

Instrucional DesignProfª. Ma. Marileide dos Santos de Oliveira

Profª. Ma. Cibele Cristina Barbosa CostaProfª. Drª. Cláudia Celeste Lima Costa Menezes

RevisãoProf. Me. Roberto Santos de Carvalho

Coordenação de DesignMe. Saul Edgardo Mendez Sanchez Filho

SUMÁRIO

1ª UNIDADE

SEÇÃO 1 - A LINGUÍSTICA E OS LIMITES ENTRE TEORIA E A APLICAÇÃO AO ENSINO ................................................... 17

1. Introdução ............................................................................... 19

2. A que e a quem interessa a linguística? ....................................... 21

3. Linguística: teoria e aplicação .................................................... 23

4. A linguística aplicada e o ensino/aprendizagem da língua materna ... 26

Atividades ................................................................................ 29

Resumindo ............................................................................... 29

Referências ............................................................................. 30

SEÇÃO 2 - AS DIFERENTES ABORDAGENS E SUAS RESPECTIVAS TERMINOLOGIAS ACERCA DA LÍNGUA ORAL E ESCRITA ............ 33

1. Introdução ............................................................................... 35

2.Definindoerefletindosobretermosemtornodoestudo

da língua oral e escrita: uma questão de semântica? ..................... 35

3.Arelaçãointercomplementarentreasdiferentesabordagens

sobreaescrita:reflexãosobreostermoseospontosdevista ....... 42

Atividades ................................................................................ 47

Resumindo ............................................................................... 48

Referências .............................................................................. 49

SEÇÃO 3 - A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM .............................................. 53

1. Introdução ............................................................................... 55

2.Apesquisasobreoprocessodeaquisiçãodalinguagem ................ 56

2.1 Tipos de pesquisa ............................................................... 56

2.2Abordagensteóricassobreoprocesso

de aquisição da linguagem ................................................... 59

3. Estágios de desenvolvimento da linguagem .................................. 65

3.1Dochoroaobalbucio:operíodopré-linguístico ....................... 66

3.2Faseholofrástica:paraumbomentendedor... ......................... 67

3.3Fasetelegráfica:decifra-meeteadoro ................................... 69

3.4Fasedaexpansãodovocabulárioeaquisição

das palavras não-nucleares .................................................. 71

3.5Fasedaestabilizaçãodosistema ........................................... 71

3.6 Formalização da gramática falada .......................................... 72

Atividades ................................................................................ 74

Resumindo ............................................................................... 75

Referências .............................................................................. 75

2ª UNIDADE

SEÇÃO 1 - A ESCRITA ........................................................................... 81

1. Introdução ............................................................................... 83

2.Ontogêneseefilogênesedaescrita ............................................. 83

3.Escritapictográfica ................................................................... 85

4.Escritaideográfica ..................................................................... 86

5.Escritafonográfica/silábica ......................................................... 88

6.Escritafonográfica/alfabética ...................................................... 90

Atividades ............................................................................... 92

Resumindo .............................................................................. 94

Referência ............................................................................... 94

SEÇÃO 2 - O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DA ESCRITA NUMA PERSPECTIVA CONSTRUTIVISTA ................................................... 97

1. Introdução ............................................................................... 99

2.OconstrutivismoeaalfabetizaçãonoBrasil ................................ 99

3. Estágios de escrita segundo uma visão construtivista ...................103

4.Principaiscontribuiçõesdestemodelo ..........................................107

Atividades ...............................................................................108

Resumindo ..............................................................................108

Referências ............................................................................109

SEÇÃO 3 - O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DA ESCRITA NUMA PERSPECTIVA LINGUÍSTICA ........................................................111

1. Introdução ..............................................................................113

2. Uma nova proposta de estágios de escritura ...............................113

3. Escrita icônica .........................................................................115

4. Escrita grafemática ...................................................................118

5.Escritafonográfica ....................................................................121

6.Escritaortográfica ....................................................................130

7.Principaiscontribuiçõesdestemodeloeimplicaçõesaoensino .......131

Atividades ..............................................................................136

Resumindo .............................................................................137

Referências .............................................................................137

3ª UNIDADE

SEÇÃO 1 - A LEITURA ..........................................................................143

1. Introdução ..............................................................................145

2. Conceituando a leitura .............................................................146

3. Níveis de leitura ......................................................................149

4. Processamento ascendente e descendente em leitura ....................152

5.Estratégiasdeleitura ................................................................153

Atividades ...............................................................................155

Resumindo ..............................................................................155

Referências .............................................................................156

SEÇÃO 2 - A APRENDIZAGEM DA LEITURA PELA CRIANÇA ........................159

1. Introdução ..............................................................................161

2. Modelos de aquisição da leitura .................................................162

3.Estratégiasdeaquisiçãodaleitura .............................................166

4. Estágios de aprendizagem da leitura ...........................................170

Atividades ...............................................................................172

Resumindo ..............................................................................173

Referências .............................................................................173

SEÇÃO 3 - A LEITURA, A ESCRITURA E A ESCOLA ...................................177

1. Introdução ..............................................................................179

2. Leitura e escritura: dois lados da mesma moeda? ........................179

3.Aescolaeoensinodashabilidadesdeleituraeescritura .............181

Atividades ...............................................................................189

Resumindo ..............................................................................189

Referências .............................................................................189

APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA

Quando você descobriu a escrita? Em que escola estudava quando aprendeu a ler e escrever? Lembra da professora que o alfabetizou? E do sorriso de felicidade dos seus pais quando você começou a descobrir as primeiras letras, produzir as primeiras palavras, inventar as primeiras histórias? Certamente você, como a maioria de nós, tem boas e felizes lembranças senão de todos, ao menos de alguns desses episódios. Isso porque a escrita é fundamental para a vida em sociedade, porque, para você e para seus pais, aprender a ler e escrever significou o primeiro passo em direção à descoberta do conhecimento. Porém, você talvez não havia pensado antes na maneira como se aprende a ler e escrever, poderia nem saber que existe uma disciplina, no interior da ciência da linguagem, chamada Aquisição da Escrita, que se dedica a entender quais os processos linguístico-cognitivos envolvidos na aprendizagem da leitura e escritura.

Neste módulo, é a este assunto que iremos nos dedicar. Na primeira unidade, retomaremos alguns conceitos estudados na disciplina Linguística para fundamentar teoricamente as demais seções, uma vez que este trabalho tem fundamento na Linguística Aplicada.

Na segunda unidade, nosso foco será a compreensão dos processos envolvidos na habilidade de escrever, bem como nas fases de aprendizagem da escrita, iniciando com a abordagem construtivista e finalizando com a abordagem linguística a respeito dessas fases, e definindo esta última proposta como a base deste trabalho.

Por fim, na terceira e última unidade, iremos nos concentrar no estudo da habilidade de ler. Mostrarei que os processos envolvidos na aprendizagem de leitura são diferentes daqueles envolvidos na escritura, embora estejam inter-relacionados. Descreverei as fases envolvidas nesse processo e procurarei mostrar o papel que a escola exerce nessa fase inicial, apontando sugestões práticas para o trabalho com a escrita e a leitura na sala de aula.

Embora o assunto abordado aqui aparentemente interesse apenas aos professores de séries iniciais, defendo que o mesmo deva ser abordado e dominado pelos profissionais das Letras, pois, além de esses serem os profissionais que dominam o estudo da linguagem, tal estudo é necessário também ao professor de Língua Portuguesa, pois muitos dos aspectos apontados são importantes para que possa compreender as fontes de muitas dificuldades dos alunos, de todas as séries escolares, no uso efetivo da leitura e da escritura.

Bons estudos!

A AUTORA

Profª. Dra. Cláudia Martins Moreira

Cláudia Martins Moreira é licenciada em Letras pela Federação das Escolas

Superiores de Ilhéus e Itabuna (FESPI). Também cursou Especialização em Linguística

Aplicada ao Ensino do Português pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

(1991), além da Especialização em Alfabetização pela Faculdade de Educação da Bahia

(1994). Possui Mestrado em Linguística e Letras pela Pontifícia Universidade Católica do

Rio Grande do Sul (1999) e Doutorado em Letras/Linguística Aplicada pela Universidade

Federal da Bahia (2009).

Atuou, durante 20 anos, como professora do Departamento de Letras e Artes da

Universidade Estadual de Santa Cruz UESC - Bahia. No momento, é professora adjunta

da Universidade do Estado da Bahia – UNEB / Campus II. Nesta instituição, leciona

Linguística e Língua Portuguesa no curso de graduação e no mestrado em Crítica Cultural,

onde orienta trabalhos na linha de Letramento, Identidade e Formação de Professores.

Tendo desenvolvido sua tese de Doutorado na área de aquisição da leitura, desenvolve

pesquisas na área de Linguística Aplicada à Alfabetização e atua como formadora de

professores das Redes Públicas e Privadas em várias cidades da Bahia.

Tem experiência em outras áreas afins aos estudos de linguagem, com ênfase em

Psicolinguística Aplicada, abordando os seguintes temas: Língua Portuguesa, Linguística

Aplicada, Ensino, Cognição, Aquisição de escrita e Leitura e Patologias de leitura. Além

disso, a pesquisadora atua como avaliadora BASis – Ministério da Educação, compondo

comissões de avaliação institucional e avaliação de cursos de Educação Superior nas

modalidades presencial e EAD.

A Professora Cláudia Martins possui diversos artigos publicados em revistas

especializadas na área de Linguística e Educação, em anais de congressos nacionais e

internacionais, em periódicos impressos e digitais, além de ter produzido material didático

de EAD em Letras e Pedagogia, também na área da Pesquisa Linguística.

E-mail: [email protected]

DISCIPLINA

LINGUÍSTICA IV: LINGUÍSTICA APLI-CADA À ALFABETIZAÇÃO

EMENTA

Profª. Dra. Cláudia Martins Moreira

Conhecimento linguístico e alfabetização: problemas de aquisição da escrita decorrentes da interferência dos padrões da fala infantil. Técnicas de análise fonológica e sua utilização na alfabetização.

CARGA HORáRIA: 60 horas

1ª UNIDADE

A LINGUÍSTICA E OS LIMITES ENTRE TEORIA E A APLICAÇÃO AO ENSINO

Ao final da aula, o aluno deverá estar apto para:

• diferenciar a Linguística teórica da aplicada;• compreender as questões éticas e epistemológicas

envolvidas na Linguística Aplicada como ciência autônoma;

• entender as possibilidades de aplicação da Linguística ao Ensino.

1seção

1 INTRODUÇÃO

Se eu fosse muda e também não pudesse escrever, e me perguntassem a

que língua eu queria pertencer, eu diria: inglês, que é preciso e belo. Mas

como não nasci muda e pude escrever, tornou-se absolutamente claro

para mim que eu queria mesmo era escrever em português. Eu até queria

não ter aprendido outras línguas, só para que a minha abordagem do

português fosse virgem e límpida.

Poema Declaração de Amor, Clarice Lispector.

O poema de Clarice Lispector abre espaços para os questionamentos mais diversos sobre a língua que herdamos ao nascer, a língua que escolhemos e acolhemos, sobre a ideia de corrupção linguística, sobre a visão preconceituosa a respeito da nossa própria língua e a tendência à valorização da língua à qual pertencem as civilizações do conhecido primeiro mundo. Entretanto, não pretendo aqui trazer a discussão sobre estas questões, pois isto certamente você já fez na disciplina de introdução à Linguística.

Figura 1: Crianças em linguagem secreta Fonte:http://www.flickr.com/photos/jon_ovington/6930963721

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Interessa-me aqui, trazê-lo presente a esta disciplina não como expectador ou estudioso que se distancia do objeto de estudo. Peço a sua presença como falante do português, leitor em língua portuguesa e escritor (ou escrevente, para evitar a ambiguidade) que usa a língua portuguesa no seu dia a dia. Convido-o a buscar entender o processo de aprendizagem e ensino desta língua que é sua, que é de todos nós, mas que este percurso não se faça a distância, que possamos relembrar as primeiras palavras que aprendemos e ficaram guardadas na memória acessível: as primeiras palavras decifradas, solvidas pela memória e pela alma... os primeiros livros que marcaram... as primeiras escritas significativas... Convido a você, aluno, para que possamos, ao fazer ciência, também construir a poesia que é falar, ouvir, cantar, escrever, ler e silenciar em português.

Para adentrar o estudo do processo de aprendizagem da escrita e leitura, pretendemos, nesta seção, retomar algumas discussões acerca do papel da ciência da linguagem para o ensino da língua, uma vez que tal abordagem será feita pelo veio da Linguística. Dessa forma, discutiremos, no primeiro momento (A que e a quem interessa a Linguística?), o porquê de tomarmos esta ciência como suporte para entender o processo de aquisição da escrita do português. No momento posterior, intitulado Linguística: teoria e aplicação, abordaremos os limites entre teoria e aplicação no interior dos estudos de linguagem, trazendo à tona algumas discussões atuais que defendem uma Linguística Aplicada como ciência autônoma. Por fim, no terceiro item, intitulado A Linguística e o ensino/aprendizagem da língua materna, abordaremos as bases sobre as quais se sustentam os estudiosos da linguagem para dar contribuições aos professores de língua portuguesa – entre eles, aqueles que atuam nas séries iniciais – no exercício da sua profissão.

ALMEIDA FILHO, J. P. P. de. Maneiras de Com-preender a Lingüística Aplicada. Disponível em: http://w3.ufsm.br/revistaletras/arti-gos_r2/revista2_1.pdf.Acesso em dez, 2011.

leitura recomendada

EADLetras Vernáculas

Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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2 A QUE E A QUEM INTERESSA A LINGUÍSTICA?

No estudo introdutório sobre a ciência da linguagem, feito em

módulo anterior, certamente foi abordado, em algum momento, sobre o interesse da Linguística, qual seu objeto de estudo, quais seus objetivos enquanto ciência e quais suas tendências teóricas.

Interessa-me aqui inverter a questão: uma vez que a Linguística está consolidada como ciência, e um dos papéis da ciência é fornecer-nos elementos para lidar com o nosso objeto de trabalho de maneira eficiente e adequada. Pretendo mostrar o que a Linguística pode lhe oferecer, professor ou professora (ou futuro professor e professora) de língua portuguesa, para auxiliá-lo na sua atuação em sala de aula.

Dessa forma, estou creditando a uma ciência o papel de fornecer elementos – e talvez ferramentas – para ajudar o professor na sua atuação no ensino das habilidades de uso da língua materna. Ora, mas falar do auxílio de “uma ciência” não é algo muito frio para quem começa convocando a presença de cada um neste encontro? Sim, então, mudemos o discurso, pretendo lhe mostrar o trabalho de algumas pessoas – estudiosos da linguagem – que desenvolveram pesquisas sobre o processo de aprendizagem da escrita e da leitura para, assim, auxiliar no seu percurso como professor e professora.

Quando convoco a presença da voz, da pessoa neste discurso, é movida pela voz de outra pessoa, um estudioso da linguagem aplaudido por muitos de nós, o professor Rajagopalan – o qual se mostra tão pessoal em seu discurso que permite a nós, que sequer o conhecemos de perto, apelidá-lo de Rajan. O autor nos diz: “É desnecessário apontar que uma linguística concebida dentro de uma torre de marfim, isto é, sem se preocupar com o que ocorre no mundo real, tem pouca relevância ou utilidade no dia-a-dia para a vida das pessoas comuns“ (RAJAGOPALAN, K. 2006, p. 158).

É por pretender uma linguística voltada para questões práticas, uma linguística comprometida socialmente, que quero trazer, para nossa discussão, através de uma linguagem acessível – evitando o hermetismo que fundou a linguagem desta ciência – uma abordagem que traga no seu bojo a prática como fundamento do próprio fazer científico. Mas não falo

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de uma prática descomprometida com a teoria, nem de uma prática que estabeleça uma dicotomia com a teoria, falo de uma teoria comprometida com a prática e de uma prática tão fundamentada numa teoria que seja

Kanavillil Rajagopalan

Figura2:KanavillilRajagopalanFonte:http://www.latec.ufrj.br/educaonline/images/stories/rajan.jpg

KanavillilRajagopalan(Rajan)éProfessorTitularnaáreadeSemânticaePragmática das Línguas Naturais da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).ElenasceunaÍndia,ondeobteveB.A.emLiteraturaInglesa(UniversidadedeKerala),M.A.emLiteraturaInglesa(UniversidadedeDe-lhi)eM.A.emLingüística(UniversidadedeDelhi).FezDiplomaemLingüísti-caAplicadanaUniversidadedeEdimburgo,Escócia.ÉDoutoremLingüísticaAplicada(PUC-SP)ePós-DoutoremFilosofiadaLinguagem(UniversidadedaCalifórnia,Berkeley,EUA).Jápublicou5livros:PorumaLingüísticaCríti-ca(Parábola,2003),ALingüísticaqueNosFazFalhar(emparceria,Parábo-la,2004),PolíticasemLinguagem:PerspectivasIdentitárias(emparceria,EditoradaMackenzie,2005)eAppliedLinguistics inLatinAmerica(JohnBenjamins,2006),NovaPragmática:FaseseFeiçõesdeumFazer(Parábo-la,2010)ecolaboroucomYvesLacostenapublicaçãodaediçãobrasileiradolivroAGeopolíticadoInglês(Parábola,2005)epublicoumaisde400textos(artigosemrevistasnacionaiseinternacionais,resenhas,resumos,capítulosdelivros,etextosemanaisdecongressos).Contribuiuverbetes/capítulos para enciclopédias comoEncyclopaedia of Pragmatics (Elsevier,1998),EncyclopediaofSociolinguistics(Elsevier,2001),HandbookofAp-plied Linguistics (Blackwell, 2003), Fitzroy-DearbornEncyclopediaof Lin-guistics(Chicago,2004),KeyThinkersinLinguisticsandthePhilosophyofLanguage (EdinburghUniversity Press, 2005), Handbook ofWorld Engli-shes(Blackwell,2006),EncyclopediaofLanguageandLinguistics(Elsevier,2006),WorldEnglishes-CriticalConceptsinLinguistics(Routledge,2006),Encyclopedia of Language and Education (Springer, 2008), Key Ideas inLinguistics and the Philosophy of Language (Edinburgh University Press,2009),LanguageinLife,ALifeinLanguage(EmeraldGroup,2009),Lan-

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difícil estabelecer os limites entre as duas. No sentido de Rajagopalan, “a experiência nos mostra com clareza que uma teoria capaz de instruir a prática é teoria feita levando-se em conta as condições práticas das situações concretas em que se espera a teoria seja aproveitada” (p. 159).

Assim, cabe-nos perguntar: o que a Linguística tem a oferecer a nós, professores e professoras de língua portuguesa? Quando assim denomino, não me limito a quem atua na docência da disciplina de Português e Literatura e, sim, incluo as pessoas que atuam nas séries iniciais, as quais são, sim, professores de português, e; ainda, mais especiais, aqueles que realmente “ensinam” a ler e a escrever.

Essa colocação deixa claro, logo de saída, uma concepção que me persegue como estudiosa em linguística aplicada ao ensino: não vejo justificativa para que o estudante de Letras não seja instruído a conhecer o processo inicial de aquisição da leitura e escrita assim como não vejo cabimento em que um professor de séries iniciais atue neste campo desconhecendo a linguística aplicada.

Retomando a pergunta inicial, respondemos que, no que tange aos aspectos a serem abordados nesta disciplina, as ciências interdisciplinares (termo dos quais alguns discordamos, mas que, por ora, o utilizaremos em virtude da demanda) que fornecem mais elementos aos professores e às professoras são a psicolinguística – especialmente na área de Aquisição da Escrita – e a sociolinguística. Ao longo da disciplina, abordaremos mais amplamente o ponto de vista psicolinguístico do ensino/aprendizagem da leitura e escritura, embora façamos algumas referências a aspectos sociolinguísticos pontualmente.

3 LINGUÍSTICA: TEORIA E APLICAÇÃO

A discussão em torno do confronto entre teoria e prática no interior das ciências não é nova, nem está concluída. Também assim o é a discussão entre os conhecimentos científicos adquiridos no interior da universidade

guageandPolitics(Routledge,2010),BrazilToday:AnEncyclopediaofLifein the Republic (Greenwood Press, no prelo), e Encyclopedia of AppliedLinguistics(Wiley-Blackwell,noprelo,).Emdezembrode2006,recebeuoPrêmio de Reconhecimento Acadêmico.

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durante a formação profissional (teoria) e os métodos de ensino usados pelo professor em sala de aula, no exercício da sua profissão (prática).

O que se tem mostrado novo, todavia, no primeiro caso, tem sido a discussão acerca do lugar ocupado pela teoria e pela prática no interior dos estudos linguísticos, e da própria concepção de aplicabilidade que, tradicionalmente, tem reduzido a Linguística Aplicada a uma mera aplicação de teorias previamente estabelecidas, desvinculadas da realidade social. No segundo caso, e como consequência do primeiro, questiona-se a ideia tradicional de que a teoria cabe ao linguista enquanto a prática cabe ao pedagogo, no que se refere ao ensino na língua. Tratarei a seguir desses dois aspectos separadamente para que você possa compreender o quanto eles estão entrelaçados.

Questionar o estatuto da Linguística Aplicada (doravante LA) enquanto uma ciência que depende das descobertas e dos axiomas da Linguística Teórica é não apenas buscar desfazer os limites entre as disciplinas como questionar, revolucionariamente, a existência mesma dessa dependência histórica. Nesse sentido é que alguns autores defendem

Figura3:ATorredeBabelFonte:http://info.abril.com.br/aberto/infonews/fotos/torre-de-babel-0100317095915.jpg

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Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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uma “linguística aplicada indisciplinar”, definindo-a como uma linguística disposta a

dialogar com teorias que têm levado a uma profunda re-consideração dos modos de produzir conhecimento em ciências sociais [...], na tentativa de compreender nos-sos tempos e de abrir espaço para visões alternativas ou para ouvir outras vozes que possam revigorar nossa vida social ou vê-la compreendida por outras histórias. Isso parece ser imperioso em uma área aplicada, que, em última análise, quer intervir na ou falar à prática social. (MOITA LOPES, 2006, p. 23).

Nesse sentido, confiar à LA o papel de subsídio ao professor de língua materna implica não em trazer os conhecimentos e descobertas advindos das disciplinas ditas teóricas e descritivas, que formam a ciência da linguagem, e aplicá-las ao ensino da língua. Por outro lado, não há como ignorar tudo que se construiu no interior dessas disciplinas como suporte para compreender os modos de aprender dos sujeitos, considerando-se as restrições da sua língua. Ou seja, acredito, conforme Signorini, que a Linguística Aplicada não consegue “escapar completamente à tradição científica moderna”, entretanto, tem avançado no sentido de buscar “cada vez mais a referência de uma língua real, ou seja, uma língua falada por falantes reais em suas práticas reais e específicas” (1998, p.101). E é nesse sentido que buscarei aqui o suporte da LA, considerando os aspectos tratados como parte da realidade e como respostas possíveis e limitadas (jamais generalizáveis a todo o universo de falantes da língua portuguesa e sempre passíveis de refutação).

Considerando-se a segunda instância de discussão: a teoria e a prática no exercício da profissão de professor, há dois aspectos que pretendo chamar a atenção.

Em primeiro lugar, quero defender que o linguista aplicado não é o mero aplicador de teorias linguísticas ao ensino, nem tampouco o profissional a quem cabe refletir e opinar apenas sobre a linguagem, deixando que outro reflita sobre questões de ensino. A língua escrita e falada na escola é uma língua produzida nas condições próprias do ambiente-escola e submetida ao estigma ou ao prestígio dos seus sujeitos;

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assim, não há como entender a língua que se ensina e se aprende na escola sem entender a escola como uma instituição linguística. Por outro lado, não há como opinar sobre questões de ensino, de métodos, técnicas de procedimentos éticos entre outros – principalmente quando se trata de ensino da língua – sem o conhecimento mínimo da ciência da linguagem. Trocando em miúdos, acredito que um dos motivadores – ou uma das causas, ou um dos sintomas, não há como se discernir categoricamente – para essa separação absurda entre teoria e prática no exercício da profissão de professor de língua materna é a separação entre linguistas e educadores, cada um com seu papel restrito e restritivo, medindo força no espaço acadêmico, especialmente quando se trata da “intromissão” do linguista no ambiente tradicionalmente visto como próprio do pedagogo: a Educação Fundamental.

4 A LINGUÍSTICA APLICADA E O ENSINO/APRENDIZAGEM DA LÍNGUA MATERNA

A discussão em torno dos limites e embates entre Linguística Teórica e Linguística Aplicada, bem como as definições que daí se tiram do que seja realmente a LA têm sido frequentes nos dias atuais. Ao que me parece, este é um momento singular em que a própria ciência olha para si mesma, ou, melhor dizendo, os próprios cientistas da linguagem refletem sobre o status, as filiações, os objetos de estudo e os objetivos desta ciência denominada Linguística Aplicada. Almeida Filho traz para esta discussão o conceito de cientificidade conferido a LA, criticando as abordagens que definem ser a LA científica em virtude da sua filiação à Linguística Teórica:

Para mim, a LA é científica na medida em que definiu seu objeto de pesquisa, nomenclaturas e procedimentos explícitos de pesquisa. Não são as várias ciências de con-tato da LA, como a Psicologia, a Sociologia, a Antro-pologia, a Estatística ou a Lingüística que lhe conferem cientificidade, portanto. Elas podem até contribuir com conceitos e modelos, mas o critério final de relevância científica das contribuições será sempre o de um para-digma da própria LA, que desenvolve procedimentos

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Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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tendo em vista problemas construídos de uso de linguagem na prática que tenhamos à mão. (ALMEIDA FILHO, 2009, p. 1).

Dessa forma, em termos gerais, a despeito da profunda revolução que tem passado a LA e da ausência de uma definição precisa do escopo, do objeto de estudo e dos tipos de procedimentos de pesquisa que (in)definem a LA atualmente, como aponta Menezes et al (2009), e não pretendendo mais me aprofundar nesta discussão em virtude das limitações deste trabalho, quero enfocar a LA em termos da Linguística Aplicada ao Ensino, especialmente ao Ensino de Língua Materna, matéria de estudo do nosso curso, embora saibamos que tal delimitação constitui-se mais como um leque de opções do que propriamente como uma verticalização.

Conforme aponta Menezes (op. cit, 2009), embora a LA tenha uma diversidade quase infinita de áreas de atuação, tanto nacional quanto internacionalmente, percebe-se que a área mais produtiva desta ciência é o Ensino de Língua (materna ou estrangeira), daí porque muitas vezes o termo LA é tomado como sinônimo de Linguística Aplicada ao Ensino de Língua. Como atesta Menezes, atualmente a retomada do termo “educação linguística” por estudiosos como Moita Lopes e Bagno – antes utilizado timidamente nos Estados Unidos por poucos estudiosos da linguagem – pode contribuir para essa diferenciação, reservando o estudo da “educação linguística” para aqueles linguistas que se dedicam ao estudo do ensino de língua e formação de professores de língua materna e estrangeira.

No interior desta discussão, considero relevante também diferenciar a Linguística Aplicada ao ensino de língua estrangeira da Linguística Aplicada ao ensino de língua materna, tanto pelas diferenças empíricas que envolvem a aquisição desses dois tipos de língua como pelas profundas

MENEZES, V.; SILVA, M. M.; GOMES, I. F. Sessenta anos de Lin-güística Aplicada: de onde viemos e para onde vamos . In: PE-REIRA, R.C.; ROCA, P. Linguistica aplicada: um caminho com di-ferentes acessos. São Paulo:Contexto,2009.

leitura recomendada

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diferenças de abordagem teórico-metodológica entre esses dois campos do conhecimento.

Assim, no Brasil, observa-se que as pesquisas voltadas para a língua materna bem como aquelas voltadas para o ensino e o resgate das línguas minoritárias situam-se mais proximamente das abordagens atuais sobre etnias, identidades, abordagens sociointeracionistas, teorias de letramento entre outras. Dessa forma, o próprio conceito de língua materna tem sido questionado. Por exemplo, para um falante de língua indígena que aprende a falar e escrever o português como língua oficial do Brasil, seria o português sua língua materna? Para um falante das camadas populares que aprende uma língua escrita cuja base é a fala das camadas privilegiadas, esta é a escrita da sua língua materna? Não é minha pretensão abordar tais aspectos sociais da aquisição e do ensino do português como língua materna, mas não posso me furtar de levantar estas importantes questões que têm sido abordadas ultimamente, e levar você, aluno, a essa reflexão.

Dentre os estudos que se encontram do interior desta LA que estou aqui tratando, está a área denominada Aquisição da Escrita, que pretende, em linhas gerais, estudar o processo pelo qual passam as crianças durante a aprendizagem da escrita da sua língua materna. Como a aprendizagem da escrita não ocorre de forma natural e é, sim, ensinada por um adulto usuário e conhecedor desta escrita (o professor), no interior de uma agência de letramento (a escola), estudar a aprendizagem da escrita é, ao mesmo tempo, estudar o ensino da escrita. Dessa forma, este curso dedica-se ao estudo do ensino/aprendizagem da escrita do português como língua materna.

Figura4:ProfessorequadroembrancoFonte:http://www.school-clipart.com/school_clipart_images/a_chemistry_professor_

pointing_to_a_white_board_0521-1005-1515-0620_SMU.jpg

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Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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1 Com base no que foi aqui estudado, e a partir da leitura do texto que segue (além de outras leituras a seu critério), estabeleça um quadro comparativo entre a Linguística e a Linguística Aplicada:

Texto para referência: ALMEIDA FILHO, J. P. P. de. Maneiras de Compreender a Lingüística Aplicada. Disponível em:

http://w3.ufsm.br/revistaletras/artigos_r2/revista2_1.pdf.

2 Leia e resuma em duas páginas o texto proposto abaixo:CORREA, M. L. G. O estatuto da linguística aplicada no campo

das ciências da linguagem e o ensino da escrita. Disponível em:http://www.abralin.org/revista/rv7n2/10-Manoel-Luiz[1].pdf

Esta atividade deve ser encaminhada ao seu tutor para que ele leia e, depois, discuta sobre os aspectos mais relevantes através da plataforma moodle.

A proposta deste módulo didático é apresentar os fundamentos e as contribuições da área de Aquisição da Escrita para os estudantes do curso de Letras Vernáculas. Assim, uma vez que tal área está inserida no interior da ciência da Linguística Aplicada, procuramos, neste momento, uma exposição breve sobre esta ciência, seus pressupostos, seus procedimentos de investigação, bem como algumas convergências e divergências que ocorrem no interior dessa ciência no que tange ao processo de ensino/aprendizagem da língua portuguesa.

Julguei necessário esta abordagem inicial porque é minha pretensão mostrar que, embora a área de Aquisição da Escrita necessite lançar mão de descobertas e modelos de diversas ciências como a Psicologia, a Educação, a Sociologia entre outras, é um campo de estudo da Linguística Aplicada e, dessa forma, seu foco de estudo é a aprendizagem da língua escrita,

ATIVIDADES

RESUMINDO

Módulo 5 I Volume 3UESC

1U

nida

de

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MOITA LOPES, L. P. Uma lingüística aplicada mestiça e ideológica: interrogando o campo como lingüista aplicado. In: MOITA LOPES, L. P. da (Org.). Por uma lingüística aplicada indisciplinar. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. p. 13-44.

RAJAGOPALAN, K. Repensar o papel da linguística aplicada. In: MOITA LOPES, L. P. da (Org.). Por uma lingüística aplicada indisciplinar. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. p. 149-168.

SIGNORINI, I. Do residual ao múltiplo e ao complexo: o objeto da pesquisa em lingüística aplicada. In: SIGNORINI, I; CAVALCANTI, M. (Org.). Linguística Aplicada e Transdisciplinaridade. Campinas: Mercado de Letras, 1998.

REFERÊNCIAS

lançando-se mão dessas ciências, mas, no caso da minha opção individual, trazendo mais contribuições da Linguística e da Linguística Aplicada dentre as demais.

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Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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Suas anotações

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AS DIFERENTES ABORDAGENS E

SUAS RESPECTIVAS TERMINOLOGIAS ACERCA

DA LÍNGUA ORAL E ESCRITA

Ao final da aula, o aluno deverá estar apto para:

• diferenciar a Linguística teórica da aplicada; compreender as origens e as diferenças conceituais entre os termos aquisição, desenvolvimento e aprendizagem;

• entender a alfabetização, a aquisição da escrita e o letramento como diferentes abordagens, porém complementares, para a compreensão do processo de aprendizagem da língua escrita.

2seção

1 INTRODUÇÃO

A compreensão do escopo de qualquer estudo científico passa pela compreensão da conotação que é dada a determinadas palavras-chave utilizadas pelos estudiosos de um tema específico, especialmente quando o leitor está iniciando suas leituras sobre um determinado assunto. Pensando nisso é que decidi, antes de abordar os conceitos que pretendo trazer para o debate sobre escrita inicial, diferenciar as abordagens que iluminam tal tema a partir da terminologia comumente utilizada pelos pesquisadores neste assunto.

Dessa forma, esta seção será dividida em duas partes, além do resumo. No primeiro momento, sob o tema Definindo e refletindo sobre termos em torno do estudo da língua oral e escrita: uma questão de semântica?, tratarei de alguns termos comumente utilizados pelas pesquisas acerca da aprendizagem da língua (oral ou escrita) demonstrando que a terminologia adotada denuncia o ponto de vista do autor a respeito de um assunto determinado. No segundo momento, sob o título A relação intercomplementar entre as diferentes abordagens sobre a escrita: reflexão sobre os termos e os pontos de vista, tratarei especificamente dos termos que envolvem os estudos sobre aprendizagem da língua escrita, mostrando que os mesmos não necessariamente delimitam abordagens diversas e incompatíveis, mas, sim, que se referem a diferentes aspectos do mesmo fenômeno, dando uma visão global da aprendizagem da escrita em língua materna.

2 DEFININDO E REFLETINDO SOBRE TERMOS EM TORNO DO ESTUDO DA LÍNGUA ORAL E ESCRITA: UMA QUESTÃO DE SEMÂNTICA?

A relação entre o pensamento e a palavra é um processo vivo: o pensa-

mento nasce através das palavras. Uma palavra desprovida de pensa-

mento é uma coisa morta, e um pensamento não expresso por palavras

permanece uma sombra. A relação entre eles não é, no entanto, algo já

formado e constante; surge ao longo do desenvolvimento e também se

modifica. À frase bíblica “No princípio era o Verbo”, Goethe faz Fausto

responder: “No princípio era a Ação”. O objetivo dessa frase é diminuir

o valor das palavras, mas podemos aceitar essa versão se a enfatizarmos

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de outra forma: No princípio era a Ação. A palavra não foi o princípio

– a ação já existia antes dela; a palavra é o final do desenvolvimento, o

coroamento da ação.

L. S. Vygotsky (1993).

Quer tenha lido textos sobre o processo de aprendizagem de língua oral ou da escrita, você, aluno deve ter se deparado com diferentes termos para se referirem ao momento em que um sujeito inicia seu percurso na aprendizagem de uma língua. Talvez não tenha parado para refletir sobre o sentido de cada termo ou mesmo pensado serem eles sinônimos, ou ainda, que os autores o tenham usado por uma simples questão de estilo para determinados efeitos semânticos. Assim, para se referirem a este ingresso, os autores podem utilizar os termos: aquisição da língua, apropriação da língua, desenvolvimento da língua, iniciação à língua, aprendizagem da língua entre tantos outros. Acredito que muitas vezes os autores utilizem tais terminologias como sinônimas, sim, entretanto, nesta etapa do nosso estudo, decidimos tomar tais termos no seu sentido genético e não como mera semântica; ou seja, para melhor orientar os alunos quanto aos

Figura 5: Diálogo EgocêntricoFonte:http://imagens.kboing.com.br/papeldeparede/7116crianca.jpg

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diferentes pontos de vista acerca do processo de inserção da criança no mundo da linguagem, queremos tomar como mote a diferenciação entre três termos em especial: aquisição, desenvolvimento e aprendizagem.

É costume acreditar que o termo aquisição, por extensão, aquisição da linguagem/aquisição da escrita surgiu motivado pelos estudos gerativistas de orientação chomskyana. Ora, como sabemos, é a concepção inatista que ilumina as teorias nessa orientação; assim este termo tem forte relação com o conceito de competência linguística de Chomsky. O que está por trás deste conceito? A ideia de que a criança possui uma estrutura linguística subjacente (competência), que é universal, e a língua adquirida é um mero fator de desempenho, resultado da maturação linguística dessa criança. Assim, a aprendizagem de uma língua, seja oral ou escrita, ocorre com base nesse esquema inato estabelecido “a priori”. Dentro dessa perspectiva, muitos estudos na área de aprendizagem da língua realizaram-se tendo como foco, exclusivamente, os aspectos cognitivos e maturacionais, e ignorando os aspectos gerais do desenvolvimento infantil, dentre eles os aspectos idiossincráticos, sociais e históricos.

Uma primeira reação a esta visão veio dos adeptos de Piaget, que enfatizam o papel da interação no desenvolvimento da linguagem e defendem que o conhecimento da língua oral ou escrita se dá por etapas de evolução. Não se explica apenas em termos maturacionais, mas envolve a reflexão da criança sobre o objeto que ela adquire, ou seja, ela elabora hipóteses constantes sobre a língua e, em contato com essa língua, suas hipóteses se reelaboram progressivamente até o nível da apropriação da língua (oral ou escrita) tal qual empregada por um usuário fluente. Nesse sentido, diferentemente de Chomsky, as teorias de base piagetiana procuram compreender não apenas como se caracteriza a linguagem infantil, mas como se dá esse percurso, quais as etapas presentes, como a linguagem se desenvolve na criança. Daí porque, dentro dessa visão, é mais apropriado se falar do desenvolvimento da língua oral ou escrita.

A visão da psicologia do desenvolvimento de Piaget pode ser considerada um avanço com referência as teorias anteriores, visto que concebe a criança como sujeito ativo do seu próprio desenvolvimento. Entretanto, essa visão tem relações íntimas com a anterior, por conceber a evolução da linguagem infantil como algo que ocorre naturalmente, ou seja,

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para os adeptos da teoria piagetiana, a linguagem infantil se desenvolve na infância, a partir de categorias inatas. Por outro lado, a ideia de interação nesta teoria, não envolve uma concepção social, refere-se ao conceito biológico de interação do sujeito com o meio ambiente. O que estou afirmando pode ser comprovado por essas palavras de alguns dos seguidores da teoria desenvolvimentista de Piaget: “aprender a ler e escrever envolve

Avram Noam Chomsky

Figura6:NoamChomskynoFórumSocialMundialemPortoAlegre,2003Fonte:http://navalbrasil.com/wp-content/uploads/2012/10/noam-chomsky.jpg

AvramNoamChomsky(Filadélfia,7dedezembrode1928)éumlinguista,filósofoeativistapolíticoestadunidense.ÉprofessordeLinguísticanoInstitutodeTecnologiadeMassachusetts.Seunomeestáassociadoàcriaçãodagramáticage(ne)rativatransforma-cional, abordagemque revolucionou os estudos no domínio da linguísticateórica.Étambémoautordetrabalhosfundamentaissobreaspropriedadesmatemáticas das linguagens formais, sendo o seu nome associado à chama-daHierarquiadeChomsky.Seustrabalhos,combinandoumaabordagemmatemáticadosfenómenosdalinguagemcomumacríticaradicaldobehavio(u)rismo,emquealinguageméconceitualizadacomoumapropriedadeinatadocérebro/mentehumanos,contribuemdecisivamenteparaoarranquedarevoluçãocognitiva,nodomí-nio das ciências humanas.Alémdasuainvestigaçãoeensinonoâmbitodalinguística,Chomskyétam-bémconhecidopelassuasposiçõespolíticasdeesquerdaepelasuacríticadapolíticaexternadosEstadosUnidos.Chomskydescreve-secomoumsocialis-talibertário,havendoquemoassocieaoanarcossindicalismo.Otermochomskianoéhabitualmenteusadoparaidentificarassuasidéiaslinguísticas embora o próprio considere que esses tipos de classificações(chomskiano,marxista,freudiano)“nãofazemsentidoemnenhumaciência”,eque“pertencemàhistóriadareligião,enquantoorganização”.

Fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Noam_Chomsky

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mais o ler e escrever ativamente do que dominar habilidades específicas ou participar de instrução” (MC CARTHEY E RAPHAEL, 1993, p. 33). Nessa perspectiva pode-se defender que, para a criança adquirir a língua oral ou escrita, basta ela estar exposta aos mais diversos portadores de texto.

Um terceiro ponto de vista, radicalmente diferente dos anteriores, vem dos trabalhos de orientação vygotskyana. Mesmo defendendo a perspectiva desenvolvimentista da linguagem - ou seja, a concepção de que alguns aspectos da aquisição da leitura e escrita desenvolvem-se naturalmente, como parte do desenvolvimento biológico -, acreditam que o processo não pode se limitar a essa explicação. Ora, está claro que se não aprende uma língua apenas estando exposta a ela: a leitura e a escritura especialmente são processos aprendidos, ou seja, é necessário ou aconselhável que alguém ensine as crianças acerca das convenções da escrita. Além disso, os defensores desta visão acrescentam um dado novo e substancial: a criança só avança na escrita se, por um lado, o material com o qual ela se depara representa para ela um desafio, ou seja, as estruturas desse material devem ser mais complexas do que a hipótese que a criança tem sobre a escrita; por outro lado, o desenvolvimento da concepção da criança sobre a escrita só se dá se estiver sustentado por uma situação externa, social (por exemplo, o contexto pragmático) ou pela presença do adulto. Nesse sentido, a leitura e a escritura não são adquiridas nem apenas desenvolvidas, são aprendidas.

Para Vygotsky (1991), aprendizagem e desenvolvimento se relacionam, mas a aprendizagem é anterior; é ela que desencadeia o desenvolvimento. Segundo o autor,

O que a criança é capaz de fazer hoje em cooperação, será capaz de fazer sozinha amanhã. Portanto, o único tipo de aprendizado é aquele que caminha à frente do desenvolvimento, servindo - lhe de guia; deve voltar - se não tanto para as funções já maduras, mas principalmente para as funções em amadurecimento (VYGOTSKY, op. cit., p. 89),’.No seu livro Pensamento e Linguagem, Vygotsky autor provocou uma revolução em ter-mos de

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Lev Vygotsky

Figura7:LevVygotskyFonte:http://www.marxists.org/archive/vygotsky/images/portrait.jpg

LevSemenovitchVygotsky(emrussoЛевСемёновичВыготский,translite-ração:LevSemënovičVygotskij,sendoosobrenometambémtransliteradocomoVigotski,VygotskiouVigotsky)(Orsha,17deNovembrode*/*1896,—Moscou,11deJunhode1934),foiumpsicólogobielo-russo.Pensadorimportanteemsuaárea,foipioneirona noção de que o desenvolvimento intelectual das crianças ocorre em fun-çãodasinteraçõessociaisecondiçõesdevida.Veioaserdescobertopelosmeiosacadêmicosocidentaismuitosanosapósasuamorte,queocorreuem1934,portuberculose,aos37anos.Filhodeumaprósperafamíliajudia,formou-seemDireitopelaUniversidadede Moscovo em 1918. Durante o seu período acadêmico estudou simultane-amenteLiteraturaeHistórianaUniversidadePopulardeShanyavskii.NoanodeseubachareladoemDireito(1918),retornouparaGomel,ondehavia anteriormente lecionado. Seis anos mais tarde,em 1924, aos 28 anos deidade,desposouRosaSmekhova,comquemteveduasfilhas.AindaemGomel,ministrouumcursodePsicologiano“InstitutodeTreinamentodeProfessores”ondeimplantouumlaboratóriodePsicologia.Nomesmoperí-odofundouumaeditoraepublicouumarevistaliterária.ApesardesuaformaçãoemDireito,destacou-seàépocaporsuascríticasliteráriaseanálisesdosignificadohistóricoepsicológicodasobrasdeArte,trabalhos que posteriormente foram incorporados no livro “Psicologia daArte”,escritoentre1924e1926,incluindonaturalmenteatesededouto-radosobrePsicologiadaArte,quedefendeuem1925.OseuinteressepelaPsicologia levou-o a uma leitura crítica de toda produção teórica de suaépoca,nomeadamenteas teoriasda “Gestalt”,daPsicanáliseeo “Beha-viorismo”,alémdasideiasdoeducadorsuíçoJeanPiaget.Asobrasdessesautoressãocitadasecomentadasemseusdiversostrabalhos,tendoescritoprefáciosparaalgumasdassuastraduçõesaoidiomarusso.TendovividoaRevoluçãoRussade1917,bemcomoestudadoasobrasdeKarlMarxeFriedrichEngels,apartirdasproposiçõesteóricasdomateria-lismohistóricopropôsareorganizaçãodaPsicologia,antevendoatendênciadeunificaçãodasCiênciasHumanasnoquedenominoucomo“psicologiacultural-histórica”.Entreosseustrabalhosdecampo incluem-sevisitasàspopulaçõescam-ponesas isoladas de seu país, fazendo testes neuropsicológicos entre as

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No seu livro Pensamento e Linguagem, Vygotsky autor provocou uma revolução em termos de metodologia, para avaliar o desenvolvimento das crianças: o invés de medir o desenvolvimento mental da criança, fazendo-a resolver problemas adequados a sua idade mental, o autor fazia perguntas com nível acima do desenvolvimento intelectual dessa criança, orientando-a a resolver a tarefa. Resultado, além de mostrar que as crianças são capazes de responder perguntas mais complexas quando auxiliadas por alguém, mostrou o papel do ambiente externo nesse desenvolvimento.

Essa me parece a concepção mais adequada para o educador, pois demonstra o papel da instrução, do ambiente social e dos professores/ dos pais como aqueles que auxiliam as crianças durante sua entrada no mundo da linguagem e da cultura escrita. As demais visões minimizam o papel desses elementos externos e centralizam a aprendizagem no sujeito, enfocando apenas o aspecto individual no processo de inserção da criança no mundo da escrita. Por esse motivo, e não por uma simples escolha aleatória, procurarei referir-me sempre a esse processo, utilizando o termo aprendizagem da escritura e leitura neste trabalho.

aldeias nômades do Uzbequistão e do Quirguistão (Ásia Central), antes edepoisdorealinhamentoculturalesócio-econômicodarevoluçãosocialista,queincluíaalfabetização,cursosrápidosdenovastecnologias,organizaçãodebrigadas,fazendascoletivaseoutros,comodescreveAlexanderLuriaemseuensaiosobrediferençasculturaiseopensamento(Vigotskiietal.,1988).Aexperiênciavividanaformaçãodeprofessoreslevou-oaoestudodosdis-túrbiosdeaprendizagemedelinguagem,dasdiversasformasdedeficiênciascongênitaseadquiridas,aexemplodaafasia.Complementandoasua for-maçãoparaestudodaetiologiadetaisdistúrbios,graduou-seemMedicinaretomandoocursoiniciadoesubstituídoporDireitoemMoscoueretomadoeconcluídoemKharkov.OseuinteresseemMedicinaestavaassociadoàma-nutençãodogrupodepesquisa(“troika”)deneuropsicologiacomAlexanderLuriaeAlexeiNikolaievichLeontiev.Assuasprincipaiscontribuiçõesàdefec-tologiaestãoreunidasnolivro“PsicologiaPedagógica”.Graçasaumaconferênciaproferidano“IICongressodePsicologia”emLeni-grado,foiconvidadoatrabalharnoInstitutodePsicologiadeMoscou.Oseuinteressesimultâneopelasfunçõesmentaissuperiores,cultura,linguagemeprocessosorgânicoscerebraispesquisadosporneurofisiologistasrussoscomquemconviveu,especialmenteLuriaeLeotiev,emdiversascontribuiçõesno“InstitutodeDeficiênciasdeMoscou”,nadireçãododepartamentodeEduca-ção(especial)deNarcompros,entreoutrosinstitutos,alémdaspublicaçõessobreotema,encontram-sereunidosnaobra“AFormaçãoSocialdaMente”,ondeabordaosproblemasdagênesedosprocessospsicológicostipicamentehumanos, analisando-os desde a infância à luz do seu contexto histórico-cultural.

Fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Lev_Vygotsky

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3 A RELAÇÃO INTERCOMPLEMENTAR ENTRE AS DIFERENTES ABORDAGENS SOBRE A ESCRITA: REFLEXÃO SOBRE OS TERMOS E OS PONTOS DE VISTA

Dissociar alfabetização e letramento é um equívoco porque, no quadro

das atuais concepções psicológicas, lingüísticas e psicolingüísticas de lei-

tura e escrita, a entrada da criança (e também do adulto analfabeto) no

mundo da escrita ocorre simultaneamente por esses dois processos: pela

aquisição do sistema convencional de escrita – a alfabetização – e pelo

desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema em atividades de

leitura e escrita, nas práticas sociais que envolvem a língua escrita – o

letramento.

Não são processos independentes, mas interdependentes, e indissociáveis:

a alfabetização desenvolvesse no contexto de e por meio de práticas so-

ciais de leitura e de escrita, isto é, através de atividades de letramento,

e este, por sua vez, só se pode desenvolver no contexto da e por meio da

aprendizagem das relações fonema–grafema, isto é, em dependência da

alfabetização.

Magda Soares (2003).

Seguindo a mesma orientação anterior, estarei, neste momento, refletindo sobre mais três termos que são constantemente retomados quando se trata do estudo da inserção da criança, desta vez, especificamente, no mundo da escrita. Tratam-se dos termos aquisição da escrita, alfabetização, letramento.

Figura8:DescobrindoaspalavrasFonte: http://www.portalfuturum.com.br/escolas/futurum/upload/noticia/f7443baefb88f267d8a21f0ae3d9c073.jpg

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Defendo que, também aqui, o uso de um ou outro termo não é mero artifício estilístico. Algumas vezes, as diferenças de terminologia podem implicar uma diferença de ponto de vista teórico-metodológico, outras vezes, a utilização de um ou outro diferencia apenas as áreas de atuação - por exemplo, era comum, no início da década de oitenta, os pedagogos denominarem sua pesquisa como sendo de alfabetização, enquanto os linguistas diziam estar estudando a aquisição. Com o avanço das pesquisas e a tendência constante a realizarem-se trabalhos interdisciplinares, os limites entre um estudo e outro tornaram-se cada vez mais imprecisos.

Os trabalhos inseridos no campo dos estudos em aquisição da escrita costumam ser desenvolvidos por linguistas e estão muitas vezes vinculados a uma área maior denominada Aquisição da Linguagem. Muitos desses trabalhos surgiram sob influência da psicolinguística chomskyana (ROJO, 1998) centrando incialmente seu interesse na relação entre ortografia e fonologia. Dentro desse rótulo podem estar inclusos tanto os trabalhos dos mineiros, utilizando-se da metodologia da análise se erros (OLIVEIRA; NASCIMENTO, 1990; ALVARENGA et. al., 1989) como o trabalho de Lemle (1993), Abaurre (1992, 1997 e 1998) e Cagliari (1992 e 1998).

Sendo um termo que demarca a contribuição do linguista para a compreensão do processo inicial da criança na escrita, a palavra aquisição

[...] guarda em si uma significação inatista, com a qual certos trabalhos [...] estão, de uma ou de outra maneira, em diálogo [...], diálogo não quer dizer unicamente acor-do [...] muitas vezes, diálogo quer dizer debate, confron-tos de opiniões e posições divergentes. (ROJO,1998, p. 10).

A maioria dos trabalhos sobre aquisição da escrita numa abordagem linguística, por se preocuparem com a relação entre o sistema de escrita e a aprendizagem da ortografia, deixaram de lado o estudo do processo de leitura inicial - o que poderia aqui se chamar o processo de Aquisição da Leitura - tendo-se destacado apenas o trabalho de Kato (1985) e, muito timidamente, o de Cagliari (1992). Dessa forma, os estudos de Aquisição da Leitura tornaram-se mais um domínio da Psicologia do que da Linguística. Nos estado atual das pesquisas em LA, como já foi discutido em momento

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anterior, esses limites entre as disciplinas não mais se sustentam; assim, a um linguista aplicado que pretenda orientar o trabalho dos professores das séries iniciais, é importante que se procure compreender tanto o processo de leitura e como o de escritura. Esse deverá ser meu objetivo, como linguista aplicada, nas aulas posteriores.

O rótulo alfabetização, por sua vez, é característico dos trabalhos sobre o processo escolar de aprendizagem da escrita e leitura. Grande parte desses estudos foram influenciados pela teoria construtivista piagetiana. São trabalhos que, na sua maioria, se inserem no domínio da Educação, tendo como uma das suas lacunas a indiferenciação entre processos de leitura e processos de escritura. Os estudos nessa área, especialmente os construtivistas, veem a aprendizagem da leitura como um processo natural e, no que tange à aprendizagem da escrita, como já se afirmou, minimizam o papel do professor como mediador nesta tarefa de ensinar a escrita às crianças.

Ultimamente, o uso do termo alfabetização tem sofrido críticas diversas principalmente pelos estudiosos do letramento infantil, os quais argumentam que o estudo da alfabetização centra-se no processo escolar de aprendizagem, ignorando o ambiente sociocultural (no qual a criança está inserida) anterior à escola. Outra crítica é de que o termo refere-se exclusivamente ao aspecto da aquisição do código da língua, deixando de lado a aprendizagem da linguagem escrita como um todo, enquanto instrumento de interação social.

O termo letramento refere-se mais aos estudos que enfocam a socioconstrução da escrita. Sob o rótulo de letramento se inserem estudos diversificados sobre inserção do sujeito na cultura escrita, cujas abordagens procuram apontar para as questões políticas, culturais e sociais que envolvem o uso e proliferação da cultura escrita. Como se vê, não se limita ao estudo de crianças em processo inicial de acesso à escrita. Entretanto foram essas pesquisas que fizeram surgir um novo campo de investigação sobre os aspectos socioculturais da escrita, o letramento inicial ou letramento emergente.

O socioconstrutivismo vygotskyano influenciou fortemente os trabalhos nessa orientação, seja de uma forma direta, seja indiretamente, a partir do acesso que passaram a ter os pesquisadores brasileiros a trabalhos

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de natureza etnográfica e sociointeracionista. Alguns trabalhos brasileiros mais significativos sobre o processo de letramento infantil foram os de Terzi (1995a e 1995b), Kleiman (1995 e 1998) e Mayrink-Sabinson (1998). Todas essas estudiosas defendem que a aprendizagem da escrita e leitura não se inicia na escola, mas se desenvolve desde os primeiros contatos da criança com portadores de texto já na primeira infância. Dessa forma, quanto mais significativas forem as experiências das crianças com textos em casa, melhores condições estarão sendo oferecidas para que essas crianças apreendam a escrita com facilidade e êxito. Esse fato ocorre porque, se as crianças tiverem experiências letradas mesmo antes de aprender a ler (quais sejam, ouvir histórias, presenciarem leituras de adultos, frequentarem ambientes leitores entre outras), elas terão compreendido as funções sociais diversas dos textos, servindo a escola como ambiente de complementação dessa formação, ensinando à criança os aspectos da leitura e escrita que elas não podem aprender sem instrução explícita, como a relação entre letras e sons, a ortografia entre outros. Pode-se observar que a maior parte das pesquisas – com exceção da de Terzi (1995a), priorizam os estudo dos aspectos conceituais do letramento, ou da apropriação da habilidade da escrita, enquanto a compreensão do desenvolvimento e aprendizagem da leitura são postos de lado. Adiante mostrarei que esses dois processos, embora relacionados, referem-se a diferentes habilidades com diferentes percursos na fase inicial de aprendizagem infantil.

Enquanto as teorias linguísticas e psicopedagógicas sobre alfabetização têm praticamente ignorado o estudo da leitura, essa tem sido a principal questão discutida pelos psicólogos cognitivos. Tendo observado as dificuldades que a criança sente ao lidar com o sistema escrito de sua língua, esses estudiosos procuraram compreender os aspectos do sistema da escrita, especialmente das escritas fonográficas, que contribuíam para as dificuldades de leitura da criança, sugerindo soluções para a superação das dificuldades existentes. Como os estudos nessa área foram também motivados inicialmente por teorias inatistas, criou-se uma área denominada Aquisição da Leitura. No Brasil, poucos pesquisadores se destacam nesse campo, como exemplo cito Rego (1995) e Cardoso-Martins (1995). A principal crítica dos linguistas atuais que estudam a alfabetização é que os trabalhos desses psicólogos explicam apenas um aspecto da aprendizagem,

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a aquisição do código, e advogam que o processo de aquisição é muito mais amplo, devendo englobar questões relacionadas ao contexto sociocultural, que implica uma visão do letramento infantil. Ora, dizer que o processo de construção do conhecimento sobre a escrita é amplo, não é o mesmo que dizer que questões específicas não possam ser estudadas. O que deveria ser criticado são os estudos que concebem que ler é “apenas” decifrar o código, entretanto há pesquisas, como a de Rego (1995), que visam mostrar quais explicações podem ser dadas acerca de um dos aspectos da aprendizagem da escrita, qual seja, a aquisição do código. Outra crítica que se faz aos psicólogos cognitivistas, e com essa concordamos, é que os mesmos se concentram apenas na leitura dos elementos sublexicais e lexicais (fonemas, sílabas e palavras). Na verdade, ler é muito mais do que decodificar sílabas ou palavras e as crianças, mesmo aquelas que estão na fase inicial, são capazes de ler e compreender também frases ou o texto como um todo, como pretendemos mostrar nesta pesquisa.

Após a leitura de tais considerações, é natural que você, leitor, se questione quanto à perspectiva de análise que adoto na minha abordagem sobre a escritura e a leitura inicial. Responder tal pergunta será o mesmo que retomar tais conceitos e redefini-los numa perspectiva mais ampla.

Concordando com Magda Soares na citação que inicia esta seção, não vejo porque conceber essas três perspectivas como excludentes: uma vez que a aprendizagem da lectoescritura envolve um aspecto social e cultural por um lado e um aspecto individual por outro; e como essa aprendizagem, embora se desenvolva desde o lar, tem sido ensinada por uma instituição chamada Escola, em virtude das características convencionais que envolvem o uso da escrita, um trabalho de cunho aplicado, comprometido com a Escola, não pode ignorar nenhum desses aspectos apontados acima.

A escrita é adquirida na medida em que não a inventamos quando nascemos; submetemos-nos a ela enquanto artifício convencional usado por uma sociedade para estabelecimento de interação social. A escrita tem suas próprias leis que são, em parte, determinadas por questões políticas e sociais, e, em parte, por questões internas ao próprio funcionamento e estrutura da língua oral na qual a escrita se baseia; nesse sentido, estudar tal aspecto é estudar a escrita enquanto aquisição. Uma vez que nossa escrita é fundamentalmente alfabética e que, para usá-la como receptor ou produtor

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de texto, o leitor precisa conhecer e saber combinar esses elementos linguísticos que constituem o alfabeto – e se, até o momento, a despeito de todas as tentativas reais e ficcionais, ninguém descobriu uma forma de aprender a escrita do português sem aprender o alfabeto – aprender a ler e escrever em português envolve, sim, o processo de alfabetização. Entretanto, se aprender a usar a escrita enquanto técnica só faz sentido para a vida de qualquer sujeito se ele puder fazer uso de tais conhecimentos para compreender os sentidos do que está escrito ou produzir textos com sentido nas mais diversas situações sociais, e que tal aprendizagem, além disso, só faz sentido se puder levar o sujeito a compreender o mundo e produzir conhecimento de forma crítica, então ler e escrever envolvem mais do que apenas combinar sons e letras, envolve uma aquisição mais ampla, uma aprendizagem mais ampla, a que podemos chamar de letramento. Nesse sentido, o processo de aprendizagem da escrita do português envolve esses três aspectos complementarmente.

Assim, embora seja minha tarefa enfocar os aspectos linguísticos que envolvem a aprendizagem da escritura e leitura, procurando trazer minha contribuição como estudiosa da linguagem, deixo claro que não se pode conceber este processo excluindo-se um desses aspectos acima apontados ou considerando um aspecto como superior ou anterior ao outro: são aspectos diferentes e complementares. Nada além disso!

1 A partir das leituras feitas e da leitura dos textos recomendados, estabeleça um paralelo, diferenciando alfabetização de letramento.

2 A seguir, indico a leitura de um trabalho de pesquisa sobre escrita inicial. Você deverá, depois de ler, responder

SOARES, Magda. Le-tramento e alfabetiza-ção: as muitas facetas. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbe-du/n25/n25a01.pdf

REGO, L. B. Alfabeti-zação e letramento: refletindo sobre asatuais controvérsias.Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/alfbsem.pdf

leitura recomendada

ATIVIDADES

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aos seguintes tópicos:a) qual aspecto dentre os apontados anteriormente

(alfabetização, aquisição e letramento) o autor prioriza no seu trabalho? Justifique.

b) na sua opinião, o autor desse texto tem uma visão ampla (concebendo estes aspectos como complementares) ou restritiva do processo inicial de escrita? Justifique.

Texto para estudo:

BRITO, A. E. Prática pedagógica alfabetizadora: a aquisição da língua escrita como processo sociocultural. Disponível em: http://www.rieoei.org/deloslectores/1877Brito.pdf

Esta atividade deverá ser entregue ao tutor e, posteriormente, deverá ser feito um debate, através grupo de discussão, via moodle.

Pretendi, neste momento, mais por motivações didáticas do que propriamente teórica, definir e delimitar o sentido dos principais termos que comumente são utilizados nos estudos sobre leitura e escrita. Assim estudamos inicialmente o sentido dos termos aquisição, desenvolvimento e aprendizagem, os quais, embora sejam termos mais discutidos no âmbito da ciência psicológica, são utilizados constantemente pelos estudos de linguística aplicada ao ensino da língua materna. Procurei mostrar que, embora possam ser vistos como complementares, tais terminologias costumam ser utilizadas a depender da corrente de pensamento que rege os trabalhos de pesquisa. Em seguida, estudamos os termos aquisição, alfabetização e letramento, comumente utilizados nos estudos sobre escrita e leitura. A intenção clara foi mostrar que tais termos não se excluem, e sim, dão conta de explicar diferentes aspectos do processo global de aprendizagem da habilidade de leitura e produção textual de um sujeito sobre uma escrita determinada. O objetivo dessas delimitações foi auxiliar a você, aluno, que certamente começará a fazer leituras sobre

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este tema, quando se encontrar diante de tal terminologia, podendo tomar melhor posição e ler mais criticamente os textos a seu dispor. Esclareço que nem sempre esses termos são utilizados com as acepções que aqui apresentei, afinal, minha leitura é parte da minha individualidade e das minhas reflexões teóricas sobre o tema; por outro lado, se tal delimitação não servir para o propósito maior com que aqui a utilizei, certamente servirá para que você possa compreender meu ponto de vista sobre o tema e ler mais criticamente as colocações que farei sobre o assunto ao longo deste material.

ABAURRE, M. B. M. O que revelam os textos espontâneos sobre a representação que faz a criança do objeto escrito? In: KATO, M. A. (Org.) A concepção da escrita pela criança. 2. ed. Campinas, SP: Pontes, 1992. p. 135-142.

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Suas anotações

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A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM

Ao final da aula, o aluno deverá estar apto para:

• conhecer e diferenciar diversas abordagens sobre o processo de aquisição da linguagem na criança;

• compreender de forma genérica as fases que compõem o desenvolvimento da linguagem e aquisição da língua materna pela criança.

3seção

1 INTRODUÇÃO

O estudo da inserção da criança na escrita, como já apontei alhures, é tema de áreas do conhecimento diversas, entre elas, principalmente, a Psicologia, a Educação e a Linguística. Embora pretenda, neste trabalho, apresentar uma visão do tema pelo viés da Linguística Aplicada, ou seja, ficando numa posição intermediária entre as ciências da linguagem e as ciências da educação, quero ressaltar que procurarei lançar mão prioritariamente dos fundamentos das ciências da linguagem para as defesas que farei, as quais são frutos tanto da minha experiência como professora das séries iniciais e formadora de professores do Ensino Fundamental, como das pesquisas que já empreendi até o momento sobre o tema em questão. Tais esclarecimentos são necessários para que se possa compreender as opções que fiz nesta seção 3, da unidade 1.

Uma vez que este trabalho está fortemente vinculado às ciências da linguagem, especialmente a duas áreas componentes da Linguística Aplicada, quais sejam, a Aquisição da Linguagem e, por conseguinte, a Aquisição da Escrita, nesta seção procurarei mostrar ao leitor em que consistem os estudos de Aquisição da Linguagem. Assim, apresentarei, no primeiro momento, sob o título A pesquisa sobre o processo de aquisição da linguagem, os tipos de pesquisa e as diferentes abordagens teóricas sobre a linguagem da criança, mostrando seus pontos de convergência e divergência. No segundo momento, apresentarei, em linhas gerais, as fases por que passam as crianças no seu processo de aprendizagem da língua materna, este momento será denominado Estágios de desenvolvimento da linguagem.

Esta pequena e breve introdução ao estudo de aquisição da linguagem terá como função subsidiar a você, aluno, para entender as colocações que aqui farei, as quais se fundamentam, algumas vezes, por um lado, nas teorias de

O termo refere-se à língua que o sujeitoaprende ao nascer, a primeira língua a ser adquirida pelo sujeitoque geralmente corres-ponde ao idioma falado no seu local de nasci-mento; diferenciando-se da segunda língua ou língua estrangeira, que corresponde àque-la ou àquelas que o sujeito aprende numsegundo momento e que, geralmente, não corresponde(m) aoidiomaoficialfaladonaregião de nascimento do indivíduo, podendo ser o idioma de outra nação ou de outra ci-vilização. Em alguns casos, como entre os falantes de tribos in-dígenas na Amazônia, por exemplo, a línguamaterna do indivíduo não corresponde ao idiomaoficialdanaçãoonde ele nasceu, pas-sando o idioma oficiala ser adquirido como uma segunda língua.

Língua Materna

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Aquisição da Linguagem e nos achados de pesquisas sobre esta aquisição e, por outro lado, na opção por considerar a aquisição da escrita em termos de fases, uma opção inspirada nos estudos de Aquisição da Linguagem (AL) e que pode ser considerada a mais adequada para subsidiar o trabalho do professor em sala de aula.

2 A PESQUISA SOBRE O PROCESSO DE AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM

Antes de refletirmos sobre as etapas do processo de aquisição da linguagem, pretendo apresentar, nas linhas que seguem, inicialmente um rápido olhar sobre a história das pesquisas nessa área e, posteriormente, as diferentes abordagens teóricas que iluminam a interpretação dos dados da linguagem infantil entre os estudiosos do assunto.

2.1 Tipos de pesquisa

Os primeiros estudos sobre a linguagem infantil surgiram em meados do século XIX, mesmo período em que os estudos formais sobre a língua falada se limitavam às comparações entre línguas e historiografia das línguas. Era uma época em que, após as muitas especulações filosóficas

Quando observa a(s)língua(s), o linguis-ta pode tomar duas atitudes: ou estuda ofuncionamento da(s)língua(s) num dadomomento históricoou, então, as altera-çõesquea(s)língua(s)sofre(m) através dostempos. À primeira perspetiva damos o nome de sincronia e à segunda, de diacronia. Fonte: http://www.in-fopedia.pt/diacronia

Diacrônicos e Sincrômicos

Registros diários da fala de uma criança, feitos geralmente pelo pai ou pela mãe, que depois são utilizados como corpus de pes-quisasobreaevoluçãoda linguagem da crian-ça.

Diário parental

Figura9:AóticadaperguntaFonte: http://www.stuartteicher.com/LiveEasier/wp-content/uploads/2009/02/

istock_000006321121medium-search-photo-compressed2.jpg

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Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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anteriores sobre a linguagem, começam a surgir trabalhos voltados especialmente para o estudo da língua em si mesma.

Embora a importância desse momento histórico não deva ser minimizada – uma vez que os dados de línguas até ali coletados contribuíram para os estudos diacrônicos e sincrônicos posteriores – está claro que os estudos sobre a linguagem infantil desta época deram pouca contribuição para a compreensão do processo de aquisição da linguagem, visto que a própria Linguística ainda não tinha surgido como ciência autônoma.

Tais estudos consistiam, portanto, em diários elaborados por filólogos e filósofos da linguagem, os quais tentavam registrar a fala espontânea dos seus filhos. Os trabalhos eram exclusivamente descritivos, mas já havia aí o desejo de compreender como as crianças apreendem sua língua materna. Como ainda não havia uma ciência linguística sedimentada, capaz de iluminar a interpretação dos dados coletados, muito do que nesta época se produziu era muito mais um produto da intuição dos estudiosos do que propriamente uma reflexão científica. Essas primeiras experiências de diário parental percorreram um longo caminho, gerando, mais tarde, as pesquisas longitudinais, as quais, embora em menor escala, ainda existem até os dias atuais.

A partir do final do século XIX e início do século XX, foram surgindo pesquisas de grandes amostras, aumentando o interesse de muitos estudiosos sobre a linguagem infantil, agora já com o subsídio dos estudos psicológicos e da ciência da linguagem. Tais estudos, conforme afirma Freitas:

eram baseados na observação sistemática de vários sujeitos, objetivando descrev-er o que é o comportamento normal em aquisição da linguagem. Essas observações de grandes grupos perdiam, no entanto, desenvolvimentos individuais importantes (FREITAS, s.d.).

Que objetivam des-crever os fenômenos observados sem pre-ocupação normativa, entretantonãosãoex-plicativos, limitam-se à descrição.

Estudos descritivos

Pesquisas cujos dadossão colhidos conside-rando a evolução cro-nológica.EmALquasesempre se utiliza um único sujeito ou umnúmero reduzido de sujeitos para observaro processo evolutivo dalinguagemdesse(s)sujeito(s).

Pesquisas longitudinais

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Com surgimento da teoria gerativa transformacional de Noam Chomsky, em meados do século XX, a área de Aquisição da Linguagem ganhou um grande número de pesquisadores, ampliando-se o número de sujeitos das pesquisas e, mais tarde, fazendo surgir as pesquisas transversais.

Tradicionalmente vinculada à Linguística Teórica, as pesquisas da área costumam focar um determinado nível de aquisição, seja ele:

a) o fonológico: pesquisas que investigam as primeiras produções e a evolução da produção das vogais, das consoantes, das sílabas nas crianças, entre outros;

b) o morfossintático: produção das primeiras palavras, evolução da estrutura da frase nas produções infantis, entre outros;

c) o semântico/pragmático: relação pensamento/linguagem na criança, evolução do sentido das palavras, uso das metáforas, entre outros.

Por volta da segunda metade do século XX, motivados pelas pesquisas de diversas áreas acerca da interação humana e a partir dos trabalhos crescentes em análise do discurso, muitos estudiosos passaram a se preocupar com o padrão de interação da criança com o adulto (pai, mãe, babá, parentes etc) e levarem estes aspectos em consideração durante a coleta e análise dos dados. Entretanto esta é uma área que ainda merece mais investigação no Brasil, especialmente no que tange à compreensão dos aspectos socioculturais e afetivo-emocionais envolvidos na aquisição da linguagem infantil.

A gramática transfor-macionaléumateoriagramatical lançada por Noam Chomsky em1957. Trata do aspecto criativo da faculdade dalinguagemeabordaos processos de trans-formação pelos quais passa o sintagma. A gramática transforma-cional é um tipo par-ticular de gramática generativa, noção in-troduzida na lingüísti-canadécadade1950por Noam Chomsky,que renovou comple-tamente a investiga-ção nesta área do co-nhecimento.Épossívelconceber tipos dife-rentes de gramática ge(ne)rativa, e o pró-prio Chomsky definiue discutiu vários tipos diferentes em seus pri-meirostrabalhos.Mas,desdeoinício,elepró-prio defendeu um tipo particular, ao qual deu o nome de gramática transformacional ou GT; a gramática trans-formacional foi chama-da às vezes gramática gerativa transforma-cional, ou GGT.

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Gramatica_transfor-macional

Teoria gerativa transformacional

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2.2 Abordagens teóricas sobre o processo de

aquisição da linguagem

Tem sido frequente entre os pesquisadores em geral a recusa em estabelecer fases ou estágios das tendências teóricas em qualquer área, em virtude de que qualquer subdivisão é corrompida pelo ponto de vista do pesquisador. Por isso, quero advertir, mais uma vez, que tal tentativa de subdivisão é necessária por motivos didáticos, deixando claro que as fases apontadas aqui bem como a terminologia adotada é resultado do meu ponto de vista sobre esses estudos; entretanto, outros tipos de subdivisão também são possíveis. Além disso, embora tais abordagens marquem um determinado momento histórico e procuremos aqui seguir a uma ordem cronológica, é possível, ainda nos dias atuais, encontrarmos pesquisas que se fundamentem em uma ou mais dentre quaisquer dessas perspectivas apontadas a seguir.

Dessa forma, assim subdividimos as tendências teóricas dos estudos em aquisição da linguagem: a) comportamentalismo; b) inatismo; c) interacionismo cognitivo; d) sociointeracionismo.

a) Comportamentalismo

Baseados inicialmente nos estudos psicológicos de Skinner e nos estudos estruturalistas de Ferdinand Saussure e Bloomfield, os estudiosos comportamentalistas concebem as crianças como sujeitos passivos diante da linguagem. Esses sujeitos aprendem a língua materna através do princípio da imitação. É a ideia de E-R (estímulo-resposta) em Skinner que orienta essa visão, defendendo os estudiosos que a criança responde (output) a um estímulo externo, a língua falada no seu ambiente natural (input) através do processo de imitação da fala adulta. Quanto mais reforço positivo ela tiver (a aprovação do adulto, por exemplo), mais ela

Pesquisa que não visa compreender a evolu-ção de um fenômeno ou objeto de estudoe, sim, seu comporta-mento em um deter-minado momento. Ge-ralmente este tipo de pesquisa visa compa-rar diferentes variáveis eentenderainfluênciadessasvariáveis sobreo comportamento do objetoestudado.

Pesquisa transversal

Sistema de saída, por exemplo,afala./Sis-tema de entrada, por exemplo,aleitura.

Output / Input

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corresponderá usando um output esperado; quando tiver reforço negativo (correção do adulto, por exemplo), ela evitará as formas consideradas erradas.

Ora é esta concepção que percebemos até os dias atuais entre grande parte dos pais, pois eles ainda acreditam que, corrigindo a fala “errada” do filho pequeno, esse filho aprenderá a falar “certo”, e essa era também a forma como muitos estudiosos viam o fenômeno da linguagem infantil; mas não se pode admitir que um estudioso da linguagem na atualidade veja a linguagem da criança sob essa perspectiva.

Também os estudos estruturalistas concebiam as crianças como uma tabula rasa, uma mente vazia, pronta para se inserir as informações linguísticas do seu meio. Nessa perspectiva, a criança simplesmente assimila a língua sem refletir nem levantar qualquer hipótese sobre a mesma, do mesmo modo como um papagaio aprende a falar.

Está claro que esta visão limitada estava ligada à realidade da época e esta visão restrita devia-se aos poucos dados disponíveis sobre a linguagem da criança, ou mesmo em virtude de uma interpretação da criança como ser imperfeito e incapaz, além de, por outro lado, uma visão da linguagem como um produto, uma estrutura pronta e fechada, à qual o sujeito deve apenas se submeter.

b) Inatismo

Teorias inatistas existem não apenas no âmbito dos estudos da linguagem e não se limitam às pesquisas realizadas no século XX. Temos muitos exemplos de teorias inatistas especialmente na Biologia, na Linguística e na Psicologia nos dias atuais, como exemplo, cito as pesquisas desenvolvidas por Pinker (2002, 2003, 2005). Todavia, quando falo das teorias inatistas no âmbito da Aquisição da Linguagem, quero referir-me às pesquisas inspiradas nos pressupostos da teoria gerativa transformacional, proposta por Chomsky

Termo usado pelos es-truturalistas para refe-rirem-se à característi-ca da mente da criança. Para esses estudiosos, a criança nasce com a mente vazia, na qual o adulto deve deposi-tar as informações doambiente,entreessas,asinformaçõessobrealíngua, a qual a criança aprende pela imitação da fala do adulto.

Tábula Rasa

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e que teve seu auge entre meados e final do século XX – embora haja muitas pesquisas atuais baseadas na teoria de Chomsky.

Inicialmente, como reação aos estudos comportamentalistas, os quais acreditavam que a linguagem era completamente adquirida – dependendo, a fala, portanto, exclusivamente dos estímulos externos para desenvolver-se – os estudos inatistas defendem que a criança nasce com um dispositivo inato para usar qualquer língua – uma Gramática Universal – e, exposta a uma língua dada, é essa a língua que ela aprenderá. A gramática universal estaria no nível da competência, que é inata, enquanto a língua efetivamente falada estaria no nível do desempenho, que é adquirido.

Steven Arthur Pinker

Figura10:StevenPinkerFonte:http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/4c/Steven_

Pinker_2011.jpg

StevenArthurPinker(Montreal,18desetembro1954)éumpsicólogoelingüista canadense da Universidade de Harvard e escritor de livros de di-vulgaçãocientífica.Durante21anosfoiprofessornoDepartamentodoCé-rebroeCiênciasCognitivasdoMassachusettsInstituteofTechnologyan-tesderegressaraHarvardem2003.PinkercompletouobachareladoemPsicologia da Universidade McGill no ano 1976, e doutorado em Psicologia ExperimentaldaUniversidadedeHarvardem1979.Pinkerescrevesobrealinguagem e as ciências cognitivas em vários níveis, desde artigos especia-lizadosatépublicaçõesdedivulgaçãocientífica.EleémaisbemconhecidopelasuapesquisadaaquisiçãodafalaepeloseutrabalhosobreasnoçõesdedesenvolvimentoinatodalinguagemavançadasporNoamChomsky.Noentanto,aocontráriodeChomsky,Pinkerconsideraalinguagemcomoumaadaptação evolutiva.

Fonte:http://www.pt.wikipedia.org/wiki/Steven_Pinker

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Por ser uma teoria considerada mais evoluída na época, em virtude de considerar a criança como um sujeito criativo, que elabora hipóteses sobre a língua e vai ampliando seu desempenho à medida que amadurecem suas estruturas cognitivas e que se multiplicam suas experiências com a língua, e também baseados nos dados infantis – agora numerosos – que mostram crianças produzindo palavras e frases que ela nunca ouviu (portanto, não imitou), a teoria inatista inspirou um número considerável de pesquisas na área de Aquisição da Linguagem, e continua inspirando até hoje. Há quem afirme que o campo da Aquisição da Linguagem está inevitavelmente vinculado às teorias inatistas, especialmente a teoria gerativa transformacional. (ROJO, 1998).

c) Interacionismo cognitivista

O termo interação pode ter diferentes acepções. Vejamos o que diz o dicionário Globo: “INTERAÇÃO, s.f. Ação recíproca. (fil.) teoria cartesiana da relação entre alma e corpo”. (FERNANDES, F.; LUFT, C. P. GUIMARÃES, F. M. 2003). No Aurélio, encontramos: “interação. (De inter- + ação). S. f. 1. Ação que se realiza mutuamente entre duas ou mais coisas, ou duas ou mais pessoas; ação recíproca. 2. (Fis) Ação mútua entre duas partículas ou dois corpos”.

Recorrendo a esses sentidos dicionarizados, entendemos porque teorias completamente diferentes, e em alguns casos até mesmo excludentes, lançam mão de forma apropriada do termo interação. Assim, quando denomino esta abordagem da qual tratarei aqui de interacionista, acrescento um adjunto que caracteriza melhor a que tipo de interacionismo estou me referindo, o interacionismo cognitivista.

Uso essa denominação para referir-me aos estudos de aquisição da linguagem que, embora não contrarie a concepção inatista na abordagem anterior, pretende considerar a interação de dois aspectos dessa aprendizagem: a linguagem e o desenvolvimento cognitivo da criança. Também se pode considerar que tal teoria considera a interação do organismo com o meio em que vive.

Tradicionalmente inspirados no ponto de vista de Piaget sobre a linguagem, os estudiosos dentro desta perspectiva concebem a criança

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como sujeito ativo diante da língua. Mas essa relação aqui está vinculada à concepção de que a criança elabora hipóteses progressivas a respeito da língua falada e essas hipóteses relacionam-se à fase de maturação intelectual na qual a criança se encontra; assim, ao longo da aquisição da linguagem, interagem o desenvolvimento linguístico e o desenvolvimento cognitivo. Entretanto, nessa concepção, o desenvolvimento da linguagem é dependente do desenvolvimento cognitivo, ou seja, determinados aspectos da língua só podem ser adquiridos na medida em que o sujeito esteja intelectualmente apto a adquiri-la. Não se pergunta, por exemplo, se há aquisições intelectuais que dependem de maturidade linguística. Nesse sentido, pergunto se é possível mesmo chamar de interação uma relação de via única?

Jean Piaget

Figura 11: Jean PiagetFonte:http://skepticism-images.s3-website-us-east-1.amazonaws.com/images/

jreviews/Jean-Piaget-1970.jpg

JeanPiaget(1896-1980)foionomemaisinfluentenocampodaeducaçãoduranteasegundametadedoséculo20,apontodequasesetornarsinô-nimodepedagogia.Nãoexiste,entretanto,ummétodoPiaget,comoeleprópriogostavadefrisar.Elenuncaatuoucomopedagogo.Antesdemaisnada,Piagetfoibiólogoededicouavidaasubmeteràobservaçãocientíficarigorosa o processo de aquisição de conhecimento pelo ser humano, parti-cularmente a criança. Doestudodas concepções infantis de tempo, espaço, causalidade física,movimento e velocidade, Piaget criou um campo de investigação que de-nominouepistemologiagenética-istoé,umateoriadoconhecimentocen-trada no desenvolvimento natural da criança. Segundo ele, o pensamento infantilpassaporquatroestágios,desdeonascimentoatéoiníciodaado-lescência,quandoacapacidadeplenaderaciocínioéatingida.“AgrandecontribuiçãodePiagetfoiestudaroraciocíniológico-matemático,queéfundamentalnaescolamasnãopodeserensinado,dependendode

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umaestruturadeconhecimentodacriança”,dizLinodeMacedo,professordo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo.AsdescobertasdePiagettiveramgrandeimpactonapedagogia,mas,decerta forma, demonstraramque a transmissão de conhecimentos é umapossibilidadelimitada.Porumlado,nãosepodefazerumacriançaaprenderoqueelaaindanãotemcondiçõesdeabsorver.Poroutro,mesmotendoes-sascondições,nãovaiseinteressaranãoserporconteúdosquelhefaçamfalta em termos cognitivos.Issoporque,paraocientistasuíço,oconhecimentosedápordescobertasqueaprópriacriançafaz-ummecanismoqueoutrospensadoresantesdelejáhaviamintuído,masqueelesubmeteuàcomprovaçãonaprática.VemdePiagetaidéiadequeoaprendizadoéconstruídopeloalunoeésuateoriaque inaugura a corrente construtivista. Educar,paraPiaget,é“provocaraatividade”-istoé,estimularaprocuradoconhecimento.“Oprofessornãodevepensarnoqueacriançaé,masnoqueelapodesetornar”,dizLinodeMacedo.

Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/historia/pratica-pedagogica/jean-piaget-428139.shtml

d) Sociointeracionismo

Denomino de sociointeracionista as teorias de aquisição da linguagem que colocam em evidência o aspecto social e histórico do desenvolvimento da linguagem infantil, mais propriamente, as teorias que colocam em interação a linguagem e o contato social entre os sujeitos reais.

Um dos estudiosos mais conhecidos dentro dessa abordagem é o psicolinguista Vygotsky. As pesquisas empreendidas por esse estudioso trazem uma verdadeira mudança de paradigma nas Ciências que estabelecem diálogo mais próximo com a Psicologia, especialmente nos estudos de Aquisição da Linguagem. O maior mérito desta abordagem está em reunir axiomas das tendências anteriores, fornecendo um modelo de aquisição verificável e, ao mesmo tempo, generalizável.

Este modelo é empirista como os modelos comportamentais, no sentido de que defende que a linguagem é adquirida pela experiência da criança com o outro. Mas vai além quando concebe a criança como sujeito ativo e criativo diante da língua que adquire. Ele é inatista, pois defende que a criança possui estruturas inatas; mas vai além, quando defende que a linguagem se desenvolve a partir das interações da criança com o adulto falante. O modelo de Vygotsky guarda relação com o conceito de desenvolvimento da teoria de Piaget, uma vez que acredita que a linguagem se desenvolva em estágios evolutivos, e que essas fases estão relacionadas

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ao desenvolvimento intelectual, porém, ultrapassa aquela teoria quando não coloca o desenvolvimento da linguagem como dependente da cognição, demonstrando haver uma relação de mão dupla entre o desenvolvimento cognitivo e linguístico. Além disso, para Vygotsky, a aquisição não pode ser explicada em termos de desenvolvimento, como algo individual apenas, e sim, deve ser explicada em termos de aprendizagem, uma vez que a linguagem é aprendida na relação com o outro. Nisso consiste o aspecto sociointeracionista deste modelo. Para finalizar, resumamos com as palavras do próprio autor:

Consideramos que o desenvolvimento total evolui da seguinte forma: a fun-ção primordial da fala, tanto das crianças quanto nos adultos, é a comunicação, o contato social. A fala mais primitiva da criança é, portanto, essencialmente social. A princípio, é global e multifuncional; posteriormente, suas funções tornam-se diferenciadas.(...)Segundo a nossa concepção, o verdadeiro curso do desenvolvimento do pensamento não vai do individual para o socializado, mas do social para o individual (1991, p.17-18).

3 ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

As fases que constituem o processo de aquisição da linguagem seguem uma ordem que obedece aos níveis linguísticos formais tradicionalmente estudados pela ciência da linguagem, ou seja, parte dos primeiros sons (fonologia), passando pela construção de palavras (morfologia) até a construção de frases com efeitos comunicativos semelhantes ao padrão adulto (sintaxe/semântica/pragmática). Este tipo de ordem estabelecida tem a vantagem de ser mais didática e

Desenvolvimento lin-guístico e desenvolvi-mento cognitivo: Para uma melhor compre-ensão da teoria piage-tiana, especialmente dos estágios de de-senvolvimento infan-til, sugiro a leitura do textodoWikipédia,Te-oria cognitiva: http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_cognitiva

saiba mais

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satisfazer a metodologia das pesquisas em AL. Mas o que se pode perguntar é se estas fases correspondem

efetivamente ao processo de evolução da linguagem na criança ou esta interpretação tradicionalmente aceita é contaminada pela metodologia utilizada e pelo desejo dos estudiosos em corresponder tais fases aos níveis preconizados pela teoria linguística? Tal questionamento será retomado ao final desta exposição em que serão expostos pontos de vista atuais de linguistas e psicólogos sobre o assunto.

Por ora, explicaremos, de forma resumida, como se caracterizam os estágios de aquisição da linguagem. Esses estágios recebem diferentes terminologias por diferentes estudiosos; todavia, em geral, os pesquisadores seguem a uma ordem de evolução bem semelhante, bem como sugerem uma média de idade, em cada fase, mais ou menos iguais; além disso, tais fases parecem explicar um comportamento universal, independente da língua ambiente – mais uma característica que reafirma a filiação da AL ao inatismo.

3.1 Do choro ao balbucio: o período pré-linguístico

Este estágio envolve desde o nascimento até mais ou menos os dez meses de idade da criança. O primeiro instrumento de comunicação entre a criança e o adulto é o choro. É através dele que a criança manifesta desejos e necessidades. O choro pode ser interpretado como um código de comunicação, pois há estudos que mostram diferentes padrões de

Figura12:BebêsconversandoFonte:http://www.hdwallpapers.in/walls/cute_babies_playing-normal.jpg

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choro para diferentes situações e necessidades que a criança quer que sejam atendidas: a fome, a dor, o frio, o calor entre outros. Mais tarde, outros “símbolos” são adquiridos e usados pela criança, como o sorriso, o grito, o tato, a careta entre outros.

Dentro deste estágio, as primeiras produções realmente significativas que podem ser consideradas como precursoras da língua falada são os balbucios, que consiste na emissão de sons inicialmente repetitivos como “aaaaaa”, “eeee” e, posteriormente variados, redobrados, lembrando a produção de sílabas. Essas produções contribuem para que a criança vá condicionando a musculatura dos órgãos do aparelho fonador para produção, mais tarde, das primeiras palavras. Conforme aponta a literatura, as primeiras vocalizações iniciam com a produção de sons mais anteriores, como bilabiais (“ma ma”) e dentais (“ta ta”) para, só mais tarde, ir se produzindo os sons posteriores, como os alveolares (“ka ka”).

Por serem esses elementos caracteristicamente não-verbais, ou seja, uma vez que a criança nesta fase ainda não utiliza nenhum elemento simbólico que possa ser considerado como advindo da língua falada, chama-se este estágio de pré-linguístico. Tais códigos são os mesmos utilizados por qualquer criança de qualquer parte do planeta.

Ao final desse estágio, por volta dos 10 meses de vida, algumas crianças já produzem algumas palavras curtas, mas quase sempre se limitam à repetição de palavras ditas pelo adulto. As idades médias apontadas para início e fim desta fase podem variar de uma criança a outra; e essas diferenças podem ser influenciadas por uma série de fatores, entre eles, o estímulo externo (quanto mais houver adulto disposto a interagir com a criança, mais propensa a produzir essas palavras precocemente ela estará, e vice-versa), o sexo (pesquisas apontam que crianças do sexo feminino costumam ser mais “falantes” do que do sexo masculino) entre outros.

3.2 Fase holofrástica: para um bom entendedor...

Há um provérbio muito repetido entre nós que define perfeitamente esta fase do desenvolvimento da linguagem da criança: “Para um bom entendedor, meia (diríamos uma) palavra basta.” E parece ser este o raciocínio de uma criança por volta de um ano de idade. Este estágio

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denomina-se holofrástico. Se examinarmos o que as palavras holófrase e holofrástico quer dizer, compreenderemos melhor a característica desta etapa. O dicionário Online Caldas Aulete nos fornece o seguinte sentido de holófrase: “s. f. Incorporação, dos principais elementos de uma frase, num só vocábulo” (Aulete digital). Por outro lado, holofrástico pode ser assim descrito pelo dicionário Globo: “Diz-se dos idiomas em que os principais elementos de uma oração podem incorporar-se numa só palavra”.

Dessa forma, neste estágio em que a criança produz, durante uma situação de comunicação com o adulto, uma única palavra para expressar o pensamento, não podemos interpretar simplesmente que ele está nomeando algo ou treinando o uso de palavras pela repetição. Já existe aí uma tentativa de comunicação, mas a criança resume sua “mensagem” em apenas uma palavra. É importante ressaltar que a pronúncia da palavra enunciada pela criança é bastante diferenciada da fala adulta. Por esse motivo, muitas vezes, só os adultos que circundam o mundo da criança conseguem “traduzir” a palavra falada por ela. Em geral, as primeiras palavras produzidas consistem em palavras nucleares, podendo ser classificadas como substantivos ou verbos; isto porque, como a intenção é comunicativa, só palavras nucleares poderiam exercer o papel de uma frase. Assim, por exemplo, se a criança tem a intenção de pedir mingau, ela

Figura 13: Infância e poderFonte:http://25.media.tumblr.com/tumblr_mbrwqwRaKu1rpg14io2_1280.jpg

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pode dizer “gagau”, que tem o peso do sentido: “quero mingau”. Esta etapa de evolução do significado das palavras é bastante

complexa e tem sido muito estudada pela literatura linguística e psicológica, em que se observam várias fases internas na evolução do sentido da palavra para a criança e na relação entre a palavra e o pensamento. Conforme Vygostsky aponta:

Exatamente por surgir como um todo indistinto e amorfo, o pensamento da criança deve encontrar ex-pressão em uma única palavra. À medida que o seu pens-amento se torna mais diferenciado, a criança perde a ca-pacidade de expressá-lo em uma única palavra, passando a formar um todo composto [...] (Op. Cit. , p. 109).

No interior desta fase, ocorre um rápido crescimento vocabular, permitindo à criança armazenar muitas palavras na memória, as quais irão auxiliá-la, na fase seguinte, a construir enunciados apenas com os elementos nucleares da frase, estando ausentes os elementos “sem sentido” como as preposições, as conjunções, os artigos, os pronomes entre outros.

3.3 Fase telegráfica: decifra-me e te adoro

No interior desta fase, ocorre um rápido crescimento vocabular, permitindo à criança armazenar muitas palavras na memória, as quais irão auxiliá-la, na fase seguinte, a construir enunciados apenas com os elementos nucleares da frase, estando ausentes os elementos “sem sentido” como as preposições, as conjunções, os artigos, os pronomes entre outros.

Em torno da idade de um ano e meio a dois anos de idade, a criança começa a usar mais de uma palavra para expressar seu pensamento. Como as palavras utilizadas consistem de vocábulos nucleares de uma frase, costuma-se chamar esta de fase telegráfica. Quem já viu ou ouviu falar do telégrafo sabe que, para emitir uma mensagem, em virtude de economia, o produtor deve selecionar palavras cujo sentido sozinho dê conta de uma parte da frase, cabendo, ao receptor da mensagem, decifrá-la. Por exemplo, uma pessoa que enviasse uma mensagem de felicidade no casamento a um casal de noivos, poderia escrever: “desejamos noivos casamento feliz”, que significaria “Desejamos que os noivos tenham um casamento feliz”. Do

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mesmo modo, uma criança poderia dizer: “Rafa bicá bola”, significando “Rafa (ele mesmo) quer brincar de bola”.

Para demonstrar a universalidade desta fase, autores de diversas línguas demonstram que os tipos de relações que as crianças estabelecem nestas construções telegráficas são bastante semelhantes e também remetem ao mesmo universo de significados: referem-se aos objetos com os quais ela lida e pessoas com as quais convive, com intenção de nomeação, localização, caracterização etc. (SIM-SIM, 1995).

É interessante apontar que, a partir desta fase, em que a criança combina, de uma forma criativa, elementos através de justaposições, fica mais claro o quanto a aprendizagem da linguagem não pode ser descrita em termos de imitação, pois as produções das crianças nesta fase nunca foram ouvidas por ela no seu ambiente. São criações individuais, resultado da maneira como a criança tem “refletido”, criado hipóteses sobre a língua falada.

Figura 14: O SegredoFonte:http://wide-wallpapers.net/download/baby-opening-christmas-gift-wide-

wallpaper-1600x1200.jpg

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3.4 Fase da expansão do vocabulário e aquisição das

palavras não-nucleares

Entre os dois e três anos de idade, a criança experimenta uma expansão extraordinária do vocabulário. Embora a maior parte das palavras seja da classe dos nomes, ela já começa a expandir os verbos, produzir adjetivos, advérbios e preposições. Estas novas aquisições permitem que a criança produza frases que, embora ainda não sejam iguais ao padrão adulto, permitem ao seu interlocutor compreender melhor o que ela quer dizer. Já não é mais necessário um grande esforço por parte do adulto para decifrar os desejos e pedidos da criança. Ela já consegue expressar muitas ideias, fazer relações, dizer seu nome, sua idade, produzir palavras com mais de duas sílabas etc.

3.5 Fase da estabilização do sistema

A partir dos três anos de idade o adulto começa a notar na criança uma mudança linguística mais qualitativa do que quantitativa. Não é a quantidade de palavras e expressões que aumenta neste período, são as estruturas das orações que se tornam mais complexas, as frases ficam mais longas, com a ocorrência de conjunções, artigos, preposições, pronomes átonos, construção de períodos compostos, com orações relativas, completivas.

Nesta fase é que mais se pode notar as flexões idiossincráticas das crianças, motivadas pelas generalizações de desinências, gerando produções muito próprias. Como exemplo, denominam o feminino de cavalo como “cavala”; produzem frases como “Eu fazi direito”, “Eu comei tudo”. É também aí que a criança se encontra na conhecida fase dos “porquês”. Com a gramática em franca expansão e tanta criatividade, não é surpreendente que ela queira saber o porquê das coisas ao seu redor, até porque, ela agora está em condições de formular perguntas mais próximas ao modelo adulto.

É importante que se diga que, embora ocorra uma expansão da frase nesta etapa, a pronúncia ainda não se encontra dentro do padrão, havendo muitas crianças que ainda não ampliaram nem estabilizaram seu sistema fonológico tal qual a pronúncia padrão. Portanto, elas podem dizer “Eu faji dileito”. Assim, observa-se uma expansão do sistema gramatical mas,

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ainda, uma manutenção da pronúncia não padrão. Entretanto, isto não caracteriza uma anormalidade nesta idade; será considerado um padrão não normal se a criança continuar falando assim depois dos seis anos de idade mais ou menos.

Entre os quatro e cinco anos de idade, a criança está apta a produzir e entender o sentido de palavras e expressões de cordialidade, como cumprimentos, pedir favores e dizer obrigado. Ela já produz enunciados mais originais, no sentido de que sua fala reflete aquilo que ela sente. Ela também é capaz de representar mentalmente os objetos e os eventos, facilitando o trabalho de memorização de informações (cognitivo) e de elaboração de enunciados acerca das situações vividas (intelectual). Nessa fase, algumas crianças produzem todos os fonemas da nossa língua de acordo com o padrão, entretanto elas podem ainda não dominar as regras de flexão dos verbos.

3.6 Formalização da gramática falada

É entre os seis e sete anos de idade, que a criança atinge aquilo que podemos denominar de maturidade linguística. Ela demonstra aí um maior nível de compreensão dos contextos de ocorrência do discurso,

Figura 15: Crianças se socializandoFonte:http://2.bp.blogspot.com/-NY8YGgK7rYA/UAZbN_22HRI/

AAAAAAAAAio/0S-uyFoywcg/s1600/lost+001.jpg

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relaciona linguisticamente fatos e eventos passados com situações atuais.

Costuma-se perceber, nesta fase, que os relatos da criança acerca das suas experiências corriqueiras (na escola, no parque, com a vizinhança entre outros) tornam-se mais ricos em detalhes; além disso, a criança se torna mais crítica em relação aos outros e compreende melhor as críticas e comentários de outros a respeito da sua pessoa. Dessa forma, a linguagem exercerá importante influência na formação da personalidade e da autoestima da criança e, consequentemente, na sua adaptação social.

A idade dos sete anos é marcante, tanto por se observar que neste momento a criança possui uma gramática completa da língua, pelo domínio das estruturas gramaticais simples e complexas falando e ouvindo – isto possibilita inclusive uma melhor interação com o adulto, pois, apesar do vocabulário infantil ser mais restrito, o domínio das estruturas complexas permite uma maior compreensão, por parte da criança, da fala do adulto – como porque a aprendizagem da escrita, que se inicia mais ou menos nesta idade, permite uma maior capacidade de reflexão metalinguística da criança sobre a língua que ela fala, levando-a a elaborar e reelaborar melhor seu discurso oral. É também nesta fase que se deve estar atento aos problemas de fala, pois, caso se observem desvios de pronúncia ainda nesta idade, é necessário buscar especialistas em fala para uma análise mais detalhada, uma vez que tal fato não mais de justifica nesta idade. Apesar dessa consideração a respeito dos sete anos como idade limite para aquisição completa da língua, só se pode afirmar que a linguagem se estabiliza mesmo na adolescência, uma vez que é nesta fase, quando se ultrapassou o estágio do raciocínio formal, que algumas construções lógicas mais complexas são integralmente compreendidas e utilizadas pelo sujeito.

Usar a linguagem para refletirsobreapróprialinguagem (escrita oufalada)e/oudescrevê-la,falarsobreelacom-preendendo sua forma.

Reflexão metalinguística

SALEH, P. B de O. Aqui-sição de linguagem e ensino de língua ma-terna: um lugar para a subjetividade.Disponí-vel em:h t tp : / /www. rev i s -tas2.uepg.br/index.php/uniletras/article/view/192/190

leitura recomendada

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Para concluir, é importante salientar que as idades indicadas nestas fases se justificam a título de ilustração e que elas variam de pessoa para pessoa. Além disso, cabe frisar que essa variação vai depender de uma série de aspectos idiossincráticos que tornam única a experiência de cada pessoa com sua língua. Estimulação externa, tipos de contatos sociais e ambientes em que os sujeitos vivem, escolaridade dos pais e parentes mais próximos, entre outros, são alguns dos diversos exemplos de fatores que influenciam o desenvolvimento linguístico da criança.

1. Pesquise, em outras fontes bibliográficas, mais informações

sobre as correntes de pensamento aqui expostas: comportamentalismo, inatismo,

interacionismo cognitivista, interacionismo social (outros autores podem

propor outras terminologias, esteja atento!). Faça um quadro comparando essas

diferentes correntes.

2. Identifique abaixo qual estágio de aquisição da linguagem da

criança a frase representa. Entre parênteses, encontra-se a tradução da frase,

quando necessário.

a) “Eu preciso ir ao encontro dos meus pais!”

_______________________________________________

b) “Aua” (quero água).

_______________________________________________

c) “Biga bodeu” (a formiga me mordeu)

__________________________________________________________

d) Ba-ba-ba (sem tradução).

__________________________________________________________

e) “Mamã va gueja?” (mamãe vai para a igreja?)

__________________________________________________________

3. Leia e resuma o texto que segue:

BORGES, L. C; SALOMÃO, M. N. R; Aquisição da Linguagem:

Considerações da Perspectiva da Interação Social. Disponível em:

ATIVIDADES

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http://www.scielo.br/pdf/prc/v16n2/a13v16n2.pdf

Esta atividade deve ser entregue ao tutor para efeito de avaliação e

acompanhamento da aprendizagem; cabendo ao tutor decidir pelo retorno aos

alunos quanto ao seu desempenho, seja em forma de encontro presencial ou

virtual.

O tema tratado nesta aula foi a aquisição da linguagem. Procurei, neste

momento, fazer uma breve exposição acerca dos estudos que abordam a linguagem

da criança. Inicialmente busquei demonstrar, em linhas gerais, como surgiram

os estudos sobre a linguagem da criança, desde os trabalhos menos científicos

até aqueles fundamentados na ciência da linguagem. Também foram expostas

as principais correntes de pensamento nas quais os estudiosos da linguagem se

fundamentam para investigar o processo de aquisição da linguagem pela criança,

quais sejam, comportamentalismo, inatismo, interacionismo cognitivista,

interacionismo social. Por fim, apresentei e caracterizei, de forma sintética, todas

as etapas pelas quais as crianças passam no processo de aprendizagem da língua

desde os primeiros dias de vida até a adolescência.

FREITAS, G. M. C. Pesquisas em Aquisição da Linguagem. Disponível em:

http://www.pucrs.br/edipucrs/online/pesquisa/pesquisa/artigo7.html. Acesso

em: 10, ago, 2012.

PINKER, S. O instinto da linguagem: como a mente cria a linguagem. Tradução

de Cláudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

______. Language as an adaptation to the cognitive niche. In: CHRISTIANSEN,

M. e KIRBY, S. (Eds.), Language evolution: States of the Art New York: Oxford

University Press. 2003.

______. “So How Does the Mind Work?” Mind and Language 20 (1): 1 -24.

RESUMINDO

REFERÊNCIAS

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doi:10.1111/j.0268-1064.2005.00274.x. 2005.

ROJO, R. Apresentação. In: ROJO, R. (Org.) Alfabetização e Letramento:

perspectivas lingüísticas. Campinas, SP: Mercado de Letras, 1998. p. 7-12.

(Coleção Letramento, Educação e Sociedade).

SIM-SIM, I. Desenvolvimento da Linguagem. Lisboa. Universidade Aberta:

1995.

VYGOTSKY, L. S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

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Suas anotações

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2ª UNIDADE

A ESCRITA

Ao final da aula, o aluno deverá estar apto para:

• conhecer as fases de evolução da escrita ao longo dos tempos;

• diferenciar características linguísticas e funcionais da escrita e da oralidade.

1seção

1 INTRODUÇÃO

A linguagem é inseparável do homem, segue-o em todos os seus atos. É

o instrumento graças ao qual o homem modela seu pensamento, seus

sentimentos, suas emoções, seus esforços, sua vontade, seus atos. Instru-

mento ao qual ele influencia, e é influenciado; a base mais profunda da

sociedade humana.

Louis Hjelmslev, linguista dinamarquês.

A partir desta seção, discutiremos questões específicas da escrita e sua aquisição. Para entendermos os processos que envolvem a aprendizagem de uma escrita, é necessário compreendermos como ela se caracteriza, pois aquilo que é exigido de uma pessoa para que ela adquira o domínio de uma escrita está condicionado pelo tipo de escrita a que essa pessoa está sendo submetida. Dessa forma, no item 2, diferenciarei o ponto de vista filogenético e ontogenético da aquisição da escrita. Em seguida, adotando um ponto de vista filogenético, será feito um breve percurso pela evolução da escrita ao longo dos tempos, desde a escrita pictográfica até a escrita alfabética tal qual se utiliza nos dias atuais – percurso feito do item 3 até o item 6 – e situando, entre essas escritas alfabéticas, a escrita em língua portuguesa.

2 ONTOGÊNESE E FILOGÊNESE DA ESCRITA

Como já dissemos antes, as crianças, ao aprenderem a escrever e ler, passam por uma série de etapas progressivas. Tais etapas, embora sejam genéricas, ou seja, ocorram com todas as crianças e sejam semelhantes entre as crianças que adquirem uma mesma escrita, podem variar em maior ou menor tempo e na maneira como cada uma lida com essas etapas. Esse processo de aquisição individual da escrita é denominado a ontogênese da escrita.

Estudos detalhados mostram que a evolução da escrita pela humanidade também passou por várias fases até chegar às escritas existentes hoje. Esse processo de construção e evolução da escrita pela humanidade

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é denominado filogênese da escrita. Dito isto, resta-nos acrescentar que, curiosamente, as fases evolutivas pelas quais passou a humanidade na construção da sua escrita são análogas às fases por que passam as crianças na sua construção individual do conhecimento da escrita; e é por essa razão que exporemos, neste momento, a filogênese da escrita: para compreender melhor como as crianças aprendem a ler, escrever e entender que este processo evolutivo é comum e natural entre todas as crianças, tão comum que suas fases repetem as fases percorridas pela humanidade ao longo da história da escrita.

Nesta seção, faremos uma exposição das fases filogenéticas de evolução da escrita; entretanto é necessário ressaltar que será uma exposição resumida, ou seja, não nos ateremos nas diversas subfases que compõem cada tipo e época de escrita, mas apenas nas características gerais de cada fase, especialmente aquelas que guardam forte relação com os aspectos ontogenéticos da escrita, que serão expostos na próxima seção.

Ontogenia

Ontogenia(ouontogênese)(öντος,ontos“ser”,genesis“criação”).Estudodasorigensedesenvolvimentodeumorganismodesdeoembrião(ovoferti-lizado),dosdiferentesestágiosatésuaplenaformadesenvolvida.Aontoge-niaéestudadaembiologiadodesenvolvimento.Emtermosgerais,ontoge-niaédefinidacomoahistóriadasmudançasestruturaisdeumadeterminadaunidade,quepodeserumacélula,umorganismoouumasociedadedeor-ganismos,semquehajaperdadaorganizaçãoquepermiteaquelaunidadeexistir(MaturanaandVarela,1987,p.74).Mais recentemente o termo ontogenia tem sido usado na biologia celularpara descrever o desenvolvimento de vários tipos celulares num organismo determinando.Filogenia(oufilogênese)(grego:phylon=tribo,raçaegenetikos=relativoàgênese=origem)éotermocomumenteutilizadoparahipótesesderela-çõesevolutivas(ouseja,relaçõesfilogenéticas)deumgrupodeorganismos,istoé,determinarasrelaçõesancestraisentreespéciesconhecidas(ambasasquevivemeasextintas).NapartefinaldoséculoXIX,ateoriadarecapi-tulação,oualeibiogenéticadeHaeckelfoiamplamenteaceita.Estateoriafoiexpressacomoa“ontogeniarecapitulaafilogenia”,istoé,odesenvolvimentodeumorganismorefleteexatamenteodesenvolvimentoevolucionáriodasespécies.EstateoriaperdeuapoiantesnoiníciodoséculoXXporserincom-patívelcomaevoluçãoecomagenética,estabelecidasporCharlesDarwineGregor Mendel, respectivamente.Aideiadequeaontogeniarecapitulaafilogenia,istoé,queodesenvolvi-mentodeumorganismo individual refletedealgumaformaodesenvolvi-mentobiológicodaespéciee/oudasespéciestemsidointensamentediscuti-da.OestudodeStephenJayGouldOntogeniaeFilogenia(1977)sistematizae discute esta questão, apontando que essa ideia pode ser encontrada desde osestudosdeAristóteles.Osdoisestudosprincipaisquedesenvolveramini-

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cialmente esta questão foramos dos cientistas ErnstHaeckel, publicadosentreosanosde1862-1905,eosestudosdeKarlErnstvonBaer,publicadosentre os anos de 1814-1897.

Fontes: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ontogenia; http://pt.wikipedia.org/wiki/Filogenia.

3 ESCRITA PICTOGRÁFICA

A escrita surgiu como uma necessidade do ser humano de representar objetos e fatos vivenciados pela experiência imediata. Alguns estudos defendem que inicialmente a intenção do homem primitivo, ao registrar marcas nas pedras e nos barros, parecia de memorização, de registro de experiência. Com o uso que foi sendo feito pelos demais membros das comunidades, a função da escrita como instrumento de transmissão de informações foi surgindo. Os primeiros sinais produzidos pelos humanos que podem ser interpretados como indício de escrita ocorreram há cerca de 7 milênios, produzidos na Mesopotâmia, China e Egito, e chamavam-se pictogramas.

Essas escritas, embora muito diferentes na sua forma e nos materiais utilizados para seu registro, tinham em comum o fato de representarem objetos e fatos através de sinais cuja forma tivesse semelhança com o objeto representado. Por isso, chama-se este tipo de escrita de escrita pictográfica, no sentido de que os símbolos consistiam

Figura 16: Escrita neolíticaFonte:http://2.bp.blogspot.com/-ZNpDeZgweGw/T3mz1scQCaI/AAAAAAAAAKI/

oehex4Ue7GA/s1600/Imagem4.jpg

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em ícones, desenhos representativos dos objetos ou dos fatos – inicialmente representavam-se apenas os objetos, depois passaram a representar também fatos. Grosso modo, poderíamos dizer, em termos atuais, que, nesta fase, escrever é semelhante a desenhar. Para exemplificar, observe na Figura 16 um modelo de escrita neolítica que representa visivelmente fatos.

Como é possível observar neste e em outros exemplos, nesta fase, não se observam tentativas de representação da fala na escrita. Representam-se os objetos ou isoladamente ou em relação uns com outros (sugerindo fatos). Para efeito de compreensão da linguagem como signo, dizemos que, nesta fase, significante e significado se confundem, pois o sinal (significante) usado para representar a ideia (significado) era muito semelhante à própria forma do objeto, procurando ser-lhe o mais fiel possível. Entretanto, alguns estudos mostram que, em períodos posteriores, algumas produções parecem mesclar uma representação fiel dos fatos com uma representação mais simbólica, típica da fase posterior. Ou seja, foi usando o pictograma que o ser humano começou sentir a necessidade de expressar algo além do concreto. Foi usando esses sinais que eles começaram a sentir a necessidade de representar ideias, sentimentos, pensamentos, realidades não passíveis de representação fiel através do desenho. Assim, os mesmos sinais antes usados para representar os objetos passaram a ter um papel não mais de desenho, mas de representação de ideias, entrando num nível mais simbólico.

4 ESCRITA IDEOGRÁFICA

A necessidade de representação de elementos abstratos foi a principal motivação para o surgimento da escrita ideográfica. O homem já não mais se satisfazia em apenas representar o mundo externo através do desenho; ele

Para relembrar oconceitodesignificantee significado, leia aseguinte citação de Castelar de Carvalho:Retomandoadefiniçãoinicial de signo como ‘união do sentido e da imagem acústica’ [ r e s p e c t i v a m e n t e significado es i g n i f i c a n t e ] , verificamos que o queSaussure chama de ‘sentido’ é a mesmacoisa que conceito ou idéia, isto é, arepresentação mental de um objeto ou darealidade social em que nos situamos, r e p r e s e n t a ç ã o essa condicionada, plasmada pela formação sócio-cultural que nos cerca desde o berço.Em outras palavras, para Saussure, conceito é sinônimode significação, algocomo a parte espiritual da palavra, sua contraparte inteligível em oposição ao significante,queésuaparte sensível.Por outro lado, a imagem acústica ‘não é o som material,coisa puramente física, mas a impressão psíquica desse som. [...] Melhor dizendo, aimagemacústicaéosignificante.Com isso,temos que o signo lingüístico é ‘umaentidade psíquica de duas faces’ (1987, p.33).

recapitulando

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desejava representar o mundo filtrado pela sua experiência, ou mesmo seu mundo interior, seu pensamento, seus sentimentos etc. Como isto envolvia lidar com elementos abstratos, o uso de pictogramas não satisfazia mais suas expectativas. Assim surgiram os ideogramas, que consistem em sinais utilizados para representar ideias, daí a origem do nome. Esses sinais são representações arbitrárias, simbólicas do que se quer expressar; e quanto mais se evoluía nesta escrita mais os sinais utilizados se distanciavam das marcas dos caracteres pictográficos de onde se originaram os primeiros ideogramas.

É ainda no mundo antigo, precisamente no Egito, China, entre outros países, que esses caracteres começam a surgir. Retomando a referida relação entre significado e significante, diríamos que, nesta fase, o significante e o significado começam a se distanciar mais do que na fase anterior, pois os sinais utilizados para representar o que se deseja não tem mais relação direta com o elemento representado, passando essa relação a ser mais arbitrária, mais simbólica. Esses ideogramas foram evoluindo ao longo dos tempos, desde uma fase em que os símbolos tinham uma relação mais próxima com a ideia e o conceito, ao período em que esses símbolos ganham cada vez mais sofisticação; e aprendê-los é cada vez mais uma atividade de memorização e uso constante. Exemplos de ideogramas mais antigos são os hieróglifos egípcios na Figura 17.

Ideogramas mais modernos, utilizados até os dias atuais, podem ser exemplificados na escrita ideográfica do mandarim, como se vê na Figura 18.

Figura 17: Escritas EgípciasFonte: http://hieroglifos.com.sapo.pt/evolucao.gif

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Ideogramas mais modernos, utilizados até os dias atuais, podem ser exemplificados na escrita ideográfica do mandarim, como se vê a seguir:

5 ESCRITA FONOGRÁFICA/SILÁBICA

A maior revolução na história da escrita ocorreu quando os sinais utilizados pelos usuários não mais representavam imagens ou ideias, e, sim, representavam os sons da língua falada. Essa mudança foi considerada uma revolução por diversos motivos, dentre os quais: a) maior arbitrariedade na relação entre os sinais e aquilo que se pretendia representar; b) maior economia linguística, visto que a quantidade de caracteres passou a ser limitada e em menor número, ampliando-se a possibilidade de combinação dos elementos para compor uma palavra; c) como consequência dessa economia, a aprendizagem da escrita passa a ser mais relacionada com a língua oral, o que representa, por um lado, uma facilitação (pois os aprendiz tem a fala como referência, tornando ilimitadas suas possibilidades de elaboração de palavras e frases); e uma dificuldade, pois, para aprender a escrever, era necessário conhecer a língua falada na qual a escrita se basearia.

Inicialmente as letras do alfabeto representavam as unidades silábicas que compunham a palavra. Assim, uma vogal ou uma consoante era usada para representar a sílaba e os sons ausentes na representação

Figura 18: Escrita do mandarimFonte:http://cotidianosantanaemfoco.files.wordpress.com/2008/07/ideo03.jpg

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eram deduzidos do contexto em que a palavra ocorria. Os silabários eram mais utilizados pelas línguas cuja estrutura silábica era mais simples; como, por exemplo, a língua japonesa. Também os gregos e algumas tribos americanas chegaram a usar escrita silábica. Um exemplo de escrita silábica bastante conhecida e utilizada ainda nos dias de hoje em algumas sociedades orientais é a escrita cuneiforme. Os caracteres cuneiformes eram inicialmente ideográficos e passaram a representar unidades sonoras silábicas.

Mais uma vez, retomando a relação entre significado e significante neste tipo de escrita, observa-se que o significante (letras primitivas ou outro símbolo representativo da unidade sílaba) não representa graficamente o significado e, sim, representa outro significante, que é o som da língua; o qual, por sua vez, representa o significado (ideia, elemento representado) de uma maneira também arbitrária. Dessa forma, o nível de arbitrariedade é ainda maior do que no caso da escrita ideográfica, visto que não há nenhuma relação de semelhança, nem física nem semântica, entre o símbolo e aquilo que ele quer representar.

Observe a seguir dois exemplos de escrita silábica. No primeiro caso, temos uma escrita denominada logo-silábica, pois tem característica mista, havendo tanto sinais ideográficos como símbolos que representam unidades sonoras. No segundo caso, temos um alfabeto primitivo, composto quase exclusivamente de consoantes, sugerindo que seus caracteres eram utilizados inicialmente para representar sílabas.

Figura19:Escritalogo-silábicaFonte:http://va312aycanarin.files.wordpress.com/2010/10/hieroglyphics_of_

hatshepsut_by_andyserrano.jpg

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6 ESCRITA FONOGRÁFICA/ALFABÉTICA

Um dos primeiros alfabetos utilizados de que se tem notícia é o alfabeto fenício, utilizado pelos gregos a partir de 900 a.C. A origem do termo alfabeto costuma-se atribuir aos gregos e significa a união das duas primeiras letras gregas alpha (que corresponde ao A) e beta (que corresponde ao B). Por outro lado, antes dessa denominação, os fenícios já denominavam assim: alef (correspondente ao A) e beth (correspondente ao B) também referindo-se às duas primeiras letras do alfabeto fenício.

Também caracterizada como fonográfica, porque seus caracteres buscam representar sons, a escrita alfabética é considerada a mais elaborada dentre as demais porque: a) com um número limitado de unidades gráficas (as letras), é possível produzir uma quantidade ilimitada de palavras através de combinações mais diversificadas; b) seus caracteres representam toda a pauta sonora de uma palavra, havendo uma menor necessidade de recorrer ao contexto para deduzir a palavra na hora da leitura, como ocorria com

Figura20:AlfabetoprimitivoFonte:http://sala19.files.wordpress.com/2012/03/alfabeto_fenicio.gif

CAGLIARI, L. C. Alfabetização elingüística. São Paulo: Scipione, 1997.

leitura recomendada

O Nascimento da Escrita – 1/2 e 2/2. Disponíveis em: http://www.youtube.com/view_play_list? p=2C460B9EE0D5BAC0

filme recomendado

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a escrita silábica; c) também é possível, àquele que domina a escrita, a produção de palavras nunca lidas, a partir do recurso de representação da fala, sem haver necessidade de armazenar na memória a escrita de unidades maiores, como as palavras, nem se necessita recorrer ao contexto para decifrar uma palavra como ocorria com a escrita silábica. Graças a essa economia, a escrita alfabética passou a ser amplamente difundida e, ainda hoje, é o tipo de escrita mais utilizado em todos os continentes do mundo.

Esse tipo de escrita possui, entretanto, suas “desvantagens”. O fato de seus caracteres pretenderem representar os sons da língua e, por outro lado, o fato de a língua caracterizar-se como heterogênea, faz com que não seja jamais possível uma representação fiel da língua falada. Assim, a língua escrita oficial toma como base de representação os falares mais prestigiados, deixando de fora os falares estigmatizados. Dessa forma, um falante que usa o dialeto estigmatizado possui maior dificuldade para aprender esta escrita do que o falante do dialeto de prestígio. Por outro lado, para que a escrita seja uniforme e possa ser utilizada pelos mais diferentes grupos sociais e em diferentes épocas históricas, foi necessário criar um artefato denominado ortografia, a partir do qual, as relações entre letra e som tornam-se muito mais arbitrárias, não mais regida pela relação letra-som e sim por regras de uso; mais um aspecto que torna a escrita de base alfabética mais complexa. Por fim, ciente de que a escrita não pode limitar-se à representação de sons, uma vez que há muitos aspectos da experiência humana que não podem ser assim representadas, a escrita alfabética necessita incluir na sua pauta também caracteres ideográficos e pictográficos – um exemplo de caractere ideográfico na escrita é a pontuação, os negritos entre outros (que não representam nenhum som, e sim uma ideia). Todas essas características fazem a aprendizagem da escrita alfabética – que, já vimos, não é

Como o nome já diz,refere-se àquelas falas socialmente rechaça-das, vistas como sinô-nimo de desprestígio social, que fogem ao padrão-culto da língua.

Dialeto estigmatizado

Com sentido contrário ao anterior, refere-se à fala valorizada so-cialmente, sinônimo de status social, que se aproxima do padrão-culto da língua.

Dialeto de prestígio

Consiste na normas que regem a escrita de uma língua alfabética.Na escrita, é conside-rada errada toda es-crita que foge às nor-mas preconizadas pela ortografiavigente. Porexemplo, ao escrever“massã”, embora estaescrita possa ser lida corretamente, estan-do, portanto, de acor-do com uma hipótesealfabética, o sujeitocomete uma irregulari-dade, visto que as nor-mas determinam que esta palavra deve ser escritacom“ç”.

Ortografia

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tão alfabética assim – ser muito mais complexa do que gostaríamos que fosse. Entretanto, uma vez aprendida, vemos o quanto de possibilidades comunicativas, funcionais, artísticas, entre outras esse tipo de escrita nos fornece.

1. Assista aos filmes sugeridos no último boxe e, depois, faça um resumo de uma página sobre cada um.

Observe as escritas seguintes e, baseado em suas leituras, identifique seu tipo dentre os quatro tipos aqui expostos.

a) _____________________________________

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ATIVIDADES

EADLetras Vernáculas

Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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Estudamos, nesta seção, um pouco do processo de evolução da escrita desde os primeiros pictogramas até atingir a escrita alfabética tal qual a concebemos hoje. Vimos que a escrita passou por fases que se iniciam com o uso do pictograma, passando pelo ideograma, depois pelo silabário até chegar à escrita alfabética. Percebemos que todos os tipos de escrita têm suas vantagens e suas restrições, mas entendemos que, sem dúvida, a escrita alfabética foi um grande avanço, em virtude da economia linguística que ela representa, reduzindo um número infinito de caracteres ideográficos a um número finito de letras, cujas combinações geram uma quantidade infinita de palavras. Entretanto, por essa característica arbitrária, e em virtude de que a nossa escrita, longe de ser exclusivamente alfabética, envolve também símbolos cujas funções se assemelham a ideogramas, aprender uma escrita alfabética exige do sujeito o domínio da língua falada e conhecimento tanto das relações letra-som como das implicações arbitrárias dessa escrita. Por isso, para dominar esta escrita, é necessário que alguém a ensine a outrem e que o usuário desta escrita esteja constantemente usando-a e atualizando-a, uma vez que as regras de funcionamento da escrita são diversas e mudam ao longo do tempo, e variando de sociedade para sociedade.

CARVALHO, Castelar de. Para Compreender Saussure. 5. ed. Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1987.

RESUMINDO

REFERÊNCIA

EADLetras Vernáculas

Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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Suas anotações

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Suas anotações

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O PROCESSO DE APRENDIZAGEM

DA ESCRITA NUMA PERSPECTIVA

CONSTRUTIVISTA

Ao final da aula, o aluno deverá estar apto para:

• conhecer e diferenciar as fases por que passam as crianças durante o processo inicial de aprendizagem da escrita, de acordo com a teoria psicogenética;

• compreender quais as principais contribuições dos modelos conhecidos como construtivistas para o entendimento do processo de aquisição da escrita.

2seção

1 INTRODUÇÃO

Escrever é fácil. Você começa com uma letra maiúscula

e termina com um ponto final. No meio você coloca idéias.

Pablo Neruda.

Existem muitas teorias, pontos de vista e abordagens diferentes sobre o processo de alfabetização da criança. Estas diferenças certamente são saudáveis, pois põem em evidência o fato de que o processo de aprendizagem da escritura é um assunto complexo, ou seja, já está longe a época em que se pensava que as crianças são seres de mente vazia, onde se deve depositar o conhecimento sobre a escrita, utilizando-se do melhor método de ensino. Nesta aula, abordarei as contribuições da teoria construtivista para a compreensão de como a criança aprende. No primeiro momento, sob o título O construtivismo e a alfabetização no Brasil, será feita uma breve reflexão sobre os debates atuais no tocante ao papel exercido pelas orientações pedagógicas que se baseiam no construtivismo e seus reflexos no desempenho em escrita das crianças. Essa teoria teve uma influência marcante na educação brasileira, desde a década de oitenta aos dias atuais. Depois, no item denominado Estágios de escritura segundo uma visão construtivista, serão expostas as fases da escrita de acordo com o ponto de vista da mais influente de todas as teóricas construtivistas, Emília Ferreiro. Por fim, serão apresentadas algumas considerações a respeito das contribuições positivas desses estudos para a compreensão do processo de apropriação da escrita pela criança. Esse último item está exposto sob o título Principais contribuições deste modelo.

2 O CONSTRUTIVISMO E A ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL

Sem dúvida alguma, é a Emília Ferreiro (1987, 1989, 1990, 2007q, 2007b) que devemos, em certa medida, grande parte dos avanços dos estudos que visam compreender como a criança aprende a sua escrita. Foi também a partir do trabalho dessa autora e do seu grupo de pesquisa que os estudos científicos e investigativos sobre a linguagem escrita infantil

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chegaram à sala de aula, orientando o professor a lançar mão das teorias para sustentar sua prática pedagógica.

Infelizmente, penso que foi também aí que muitos equívocos foram instituídos; e, dentre os mais sérios, está o fato de que muitos formadores de professor, orientadores educacionais, coordenadores pedagógicos entre outros, transportaram axiomas teóricos para a prática, causando uma confusão aos professores alfabetizadores, que deixaram marcas profundas, conforme aponta, radicalmente, Fernando Capovilla numa entrevista à Folha de São Paulo, em 3 de março de 2003:

Descobertas revolucionárias com novas tecnologias, como a neuroimagem funcional, refutaram os pressup-ostos construtivistas e levaram à revolução fônica que mudou a alfabetização mundial nos anos 90. Baseados em pesquisas de ponta, documentos oficiais franceses, ingleses e americanos defendem a alfabetização fônica e condenam as práticas construtivistas como nocivas à aprendizagem. Declaram que seus alunos, sob o con-strutivismo, amargaram mais de uma década de mediocr-idade, e só prosperaram com o fônico. Entre 1995 e 1997, quando o mundo civilizado condenava o construtivismo como lesa-juventude, o Brasil, na contramão, o entroni-zava nos PCNs em alfabetização. O establishment construtivista dominou com mãos de ferro as principais publicações distribuídas ao professo-

Figura 21: MetalinguagemFonte:http://marciomariguela.files.wordpress.com/2010/05/drawing_hands2.jpg

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rado à custa do erário para impor a sua doutrina con-strutivista. O resultado dessa aposta cega foi imediato, com fracasso crescente documentado bianualmente pelo Saeb [exame do MEC que avalia a qualidade da educação] de 1995 a 2003, e com a vergonha internacional, com a pecha de vice-recordista mundial de incompetência, segundo teste da Unesco e da OCDE em 2003 (GOIS, 2006.).

Um dos principais equívocos estava na proibição em se falar em método de alfabetização. Tanto profissionais da educação quanto estudiosos em geral, com o advento do construtivismo no Brasil, passaram

Emília Ferreiro

Figura 22: Emília FerreiroFonte:http://educarparacrescer.abril.com.br/imagens/aprendizagem/emilia.jpg

EmiliaFerreirosetornouumaespéciedereferênciaparaoensinobrasileiroe seu nome passou a ser ligado ao construtivismo, campo de estudo inau-guradopelasdescobertasaquechegouobiólogosuíçoJeanPiaget(1896-1980)nainvestigaçãodosprocessosdeaquisiçãoeelaboraçãodeconhe-cimentopelacriança-ouseja,dequemodoelaaprende.AspesquisasdeEmiliaFerreiro,queestudouetrabalhoucomPiaget,concentramofoconosmecanismos cognitivos relacionados à leitura e à escrita. De maneira equi-vocada,muitosconsideramoconstrutivismoummétodo.O princípio de que o processo de conhecimento por parte da criança deve ser gradual corresponde aos mecanismos deduzidos por Piaget, segundo os quais cada salto cognitivo depende de uma assimilação e de uma reacomo-daçãodosesquemas internos,quenecessariamente levam tempo.Éporutilizar esses esquemas internos, e não simplesmente repetir o que ouvem, queascriançasinterpretamoensinorecebido.

Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/alfabetizacao-inicial

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a atuar com base na concepção de que o método deveria deixar de ser o foco de interesse do professor e, antes disso, a base para qualquer trabalho pedagógico deveria ser o conhecimento de como se aprende acima do como de ensina. Ninguém se oporia a esta máxima, não fosse ela a plantar, no meio pedagógico, a ideia de que se deve alfabetizar sem método, de que método é algo pecaminoso, de que falar em método é coisa de “gente tradicional”. Ora, aqueles profissionais que antes ensinavam, algumas vezes muito bem, com um método (seja ele sintético ou analítico) ou mudavam radicalmente sua atitude para não serem considerados “tradicionais” e “retrógrados”, ou tinham que esconder que usavam esses métodos, para continuar alfabetizando “em paz” seus alunos. O resultado está nos baixos índices de alfabetização, conforme apontado por Capovilla anteriormente. Também Frade faz uma colocação que explica em parte a contramão desse movimento:

Nos últimos anos, os estudos relativos às concepções de alfabetização, sobretudo aqueles ligados à função social da leitura e escrita e ao processo psicológico de con-strução desse conhecimento tornaram-se os baluartes da formação de professores e da divulgação de inovações em alfabetização. No entanto, esse processo fez com que uma das facetas mais importantes da alfabetização – a decodificação – tenha sido esquecida, tanto nas pesqui-sas quanto nos discursos autorizados de alfabetizadores. Cabe perguntar: os egressos destes cursos de formação têm conseguido alfabetizar? As soluções para nossos problemas metodológicos são de natureza complexa e a discussão da relação entre os métodos e a aprendizagem precisa entrar novamente na pauta das pesquisas e nos currículos de formação de professores (2003, p. 18-19).

Está claro que esse novo clima trazido pelas “teorias construtivistas” trouxeram no seu bojo uma revolução no meio educacional, gerando um desejo coletivo, entre os profissionais da educação, de renovação, de criatividade e de valorização da criatividade da criança. E certamente devemos muito disso as pesquisas empreendidas e estimuladas por Ferreiro. Entretanto, infelizmente, esses profissionais, pouco atendidos por aqueles que realmente estudam a linguagem (num momento em que a universidade tinha suas janelas e portas fechadas para a comunidade)

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cometeram o erro coletivo de transportar para a prática de sala de aula conceitos que só serviam como construtos teóricos do cientista. Faltava um cientista aplicado para intermediar essas duas instâncias. Na minha forma de conceber, faltava, e ainda falta, em certa medida, um linguista aplicado nesse meio.

3 ESTÁGIOS DE ESCRITA SEGUNDO UMA VISÃO CONSTRUTIVISTA

Embora tenha se falado dos equívocos epistemológicos que foram cometidos à luz do construtivismo, não podemos certamente ignorar as profundas mudanças provocadas pelos estudos de Emília Ferreiro na educação, e da grande contribuição dessa autora, junto com outros estudiosos que a seguiram, para a alfabetização. Dentre essas contribuições indubitavelmente a mais importante foi a sua teoria sobre as fases percorridas pelas crianças no processo de aprendizagem da escrita. É dela que falaremos neste momento.

Conquanto as fases de escrita fossem constantemente referidas em todos os trabalhos ferreirianos sobre alfabetização, é no livro Psicogênese da língua escrita (FERREIRO; TEBEROSKY, 1987) que essas fases são mais detalhadas. Nesse trabalho, as autoras expõem os níveis progressivos percorridos pelas crianças no seu processo de aprendizagem do código escrito. Digo que esses níveis são progressivos porque eles visivelmente partem de conceitos mais simples, evoluindo para conceitos mais

Figura 23: Começando a escreverFonte:http://stuffkidswrite.files.wordpress.com/2011/04/img_1000.jpg

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complexos. Vale salientar que tais níveis dão conta tanto da construção do

conhecimento da criança sobre uma escrita de tipo alfabética (o português) como do processo de apropriação pela criança dessa escrita, ou seja, da aquisição da habilidade de escrever. Como esses dois conhecimentos tratam de coisas diferentes, embora estejam relacionadas (é usando a escrita que a criança aprende sobre ela), optarei por diferenciar esses dois conhecimentos (por razões que explicaremos na próxima seção) usando a terminologia “escrita”, quando estiver me referindo ao sistema de escrita, e “escritura”, quando estiver me referindo ao uso ou apropriação da escrita pela criança, à atividade de escrever.

Para melhor esclarecer esta diferença, ofereço exemplos de duas frases com essas diferentes acepções:

Ex. 1: Eu domino o inglês falado, mas não domino a escrita do inglês.

Ex. 2: Aquela criança ainda se encontra na fase inicial de escritura, pois ainda escreve do jeito que fala.

Também quero advertir que as fases estipuladas pelas autoras dão conta da construção do conceito sobre a escrita – sendo transportada para descrever o processo de escritura, como já foi dito – mas não permitem deduzir daí as fases de construção da leitura, as quais, como iremos demonstrar na unidade 3, não são análogas às fases de escritura, ao contrário, em alguns momentos, são opostas. Retomaremos esta questão nas próximas seções. Agora, apresentaremos, em linhas gerais, uma ideia de como se dá o desenvolvimento desses níveis.

Para as autoras, a primeira hipótese que a criança tem é a de que a escrita representa o mundo de uma forma direta, não arbitrária. Portanto, os elementos que formam o sistema devem ser semelhantes àquilo que representam. Dessa forma, para a criança nesta fase, os desenhos são escritas. Esta fase é denominada icônica. Esse nível é bastante rudimentar e costuma ser descartado pela criança tão logo ela entre na escola (algumas vezes, antes mesmo disso). Retomando aquela concepção já apresentada na seção 1 desta unidade, a respeito da filogênese que

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se reflete na ontogênese, percebe-se logo que esta fase corresponde ao período da escrita pictórica, referida naquela seção. Acrescento, portanto, que, nessa fase, significante e significado se identificam, e a criança ainda não compreende o caráter simbólico da escrita; mais ainda, está longe de entender que os sinais na nossa escrita representam sons da língua falada.

A percepção do caráter arbitrário da nossa escrita surge num segundo momento, na fase denominada pelas autoras de pré-silábica. Esse termo não define bem a característica desta fase, uma vez que quer expressar apenas que a criança ainda não atingiu a hipótese silábica. Mas o que ocorre neste momento é que a criança passa a reconhecer que a escrita é formada de símbolos e que esses símbolos não representam diretamente a realidade, como ela pensava antes. A partir desta fase, observa-se que significante e significado começam a se distinguir. No entanto, a criança ainda não sabe qual símbolo usar para representar o que ela quer. Em geral, se pedirmos para ela escrever, escreverá as letras que ela já conhece (quase sempre as letras do seu nome), indistintamente. Como se pode ver, esta fase novamente é análoga à segunda fase da evolução filogenética da escrita, a escrita ideográfica, visto que, naquele tipo de escrita, o sujeito já não pretende mais representar objetos em sua forma concreta; ele representa conceitos e ideias (ou até mesmo objetos) de uma forma simbólica. E a forma desse símbolo não tem necessariamente que ser fiel à forma do elemento representado. O mesmo ocorre com a criança, com efeito, como os primeiros símbolos costumam ser as letras do seu nome, ela passa a usar indistintamente as letras do nome com valor ideográfico (sem representação de som)

Aos poucos, no contato com a escrita - e motivada pela escola -, a criança começa a perceber que o sistema de escrita do português se baseia no som; ou seja, nossa escrita não é pictográfica, como ela pensava no início. Também não é ideográfica como ela passava na fase anterior, nossa escrita é basicamente fonográfica. Entretanto, a menor unidade sonora que ela representa, nesta fase, é a sílaba. Podemos perceber essa concepção se pedirmos para essa criança escrever alguma palavra; geralmente, a quantidade de caracteres utilizados pela criança é similar à quantidade de sílabas da palavra; mas nem sempre essas letras têm relação com as sílabas que ela deseja representar. No início, a preocupação maior é com

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a quantidade de letras, não com o tipo de letra que se usa. Aos poucos as representações vão se aproximando das letras que formam o nome (por exemplo, para a palavra “boneca”, ela escreve BNC). Nisso consiste a fase silábica. Mais uma vez a ontogênese repete a filogênese, pois, como você pôde perceber, após a fase ideográfica, o homem passou a usar sinais não mais para representar sentidos e, sim, para representar a fala. Mas a unidade representada inicialmente foi a sílaba, tal ocorre com a criança neste primeiro momento de escrita fonográfica.

Compreender o caráter fonográfico da escrita em língua portuguesa é o primeiro passo na compreensão do aspecto econômico e criativo desta escrita. É essa a concepção que a criança tem quando se encontra na fase alfabética. Contudo essa compreensão não ocorre de uma hora para outra. Antes de atingir a escrita silábica, de acordo com as autoras, a criança passa por uma fase em que às vezes ela representa os elementos silábicos e, outras vezes, representa o fonema. Esta fase é denominada de silábico-alfabética.

Finalmente, a criança atinge a fase alfabética, quando é capaz de compreender que cada letra da escrita pode representar um som/fonema (salvo algumas exceções). Mas, para atingir essa fase, a criança passa por várias experiências diferentes na relação letra-som: a criança começa imaginando que a cada letra corresponde um som, e vice-versa, e acreditar nesta hipótese durante um bom tempo é importante para que ela se sinta segura para combinar as letras e formar palavras com autonomia, sem o auxílio do adulto. Num segundo momento, a criança passa a perceber que uma mesma letra pode representar sons diferentes (“s” pode representar o som de /s/ ou de /z/) e um mesmo som pode ser representado por diferentes letras (o /z/ pode ser escrito com “s”, “z” ou “x”). Por fim, ela se dá conta de que as coisas não são tão simples, pois há muitos aspectos da escrita que necessitam simplesmente de memorização, pois não são controlados por relações lógicas, como as antes mencionadas e, sim, com regras arbitrárias (“cachorro” se lê do mesmo modo caso se escreva dessa forma ou desta forma: caxorro; mas, por uma convenção arbitrária, define-se que se deva escrever esta palavra com “ch”). Aí se entra na fase ortográfica, fase não abordada pela teoria psicogenética (por razões que explicitaremos adiante) e, sim, pelas teorias linguísticas.

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4 PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES DESTE MODELO

Como já foi dito em momentos outros, conquanto se perceba, na orientação pedagógica baseada nos estudos construtivistas, reflexos considerados por muitos como nocivos à aprendizagem da escrita pela criança, considero que também houve muitas contribuições dessa teoria para a compreensão do processo de escrita, contribuições essas que só foram possíveis graças ao trabalho de articulação, feita pelos estudiosos nesta abordagem, entre a Psicologia da Aprendizagem, a Pedagogia e a Psicolinguística. Assim, considero muito substanciais as seguintes contribuições dos estudos de Ferreiro e equipe para a alfabetização no Brasil:

a) mostrar que a aprendizagem da escrita, como toda aprendizagem, se dá em fases, e querer que a escrita de uma criança pequena corresponda à escrita de um adolescente ou adulto é ignorar aquela verdade irrefutável;

b) demonstrar que os estágios perseguidos pelas crianças no processo de apropriação da escrita alfabética são semelhantes aos estágios percorridos pela humanidade na construção histórica da escrita;

c) afirmar que a criança é um sujeito ativo diante do seu objeto de conhecimento. Dessa forma, mostra que não existe uma forma infalível de ensinar, pois não existe uma única e fixa forma de aprender. As crianças têm ritmos diferentes e responderão às intervenções a depender da fase de escrita em que ela se encontra;

d) defender que a descoberta do caráter fonográfico da escrita (ainda na fase silábica) é o primeiro grande salto da criança no seu processo de construção das hipóteses sobre a escrita do português (FERREIRO; TEBEROSKY, 1987);

e) o estudo detalhado sobre as diversas etapas percorridas pela criança na construção do conceito de

OLIVEIRA, J. B. A. Construtivismo e alfabetização: umcasamento que não deu certo. Disponível em:http://www.alfaebeto.org.br/documentos/c o n s t r u t i v i s m o _alfabetizacao.pdf

REVISTA NOVA ESCOLA. Entrevista com Telma Weiss.Disponível em:http://revistaescola.a b r i l . c o m . b r /l ingua-portuguesa/a l f a b e t i z a c a o -i n i c i a l / a p o s t e -a l t o - c a p a c i d a d e -alunos-429248.shtml

leituras recomendadas

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palavra escrita é a contribuição mais significativa e produtiva fornecida pelos estudos construtivistas e merece muitos investimentos por parte de psicólogos e linguistas, podendo refletir-se na sala de aula, em como o professor pode interferir positivamente neste momento, tornando o processo de apropriação da escrita o mais criativo, produtivo e saudável possível.

Certamente muitas outras contribuições poderão ser destacadas, entretanto limito-me, por questões de parcimônia, a essas que considero as mais importantes.

Como você deve ter observado nestas linhas, o debate sobre as limitações e as contribuições do construtivismo para alfabetização no Brasil tem sido bastante acirrado. Assim, nas leituras recomendadas, foram apresentados dois textos, o primeiro claramente contrário à proposta construtivista de alfabetização, e o segundo, favorável. Você deverá ler cuidadosamente cada texto, anotando os argumentos contrários e favoráveis. Você também pode buscar outras fontes de consulta para melhorar a qualidade do trabalho. Depois disso, elabore um quadro comparativo colocando, de um lado, os argumentos favoráveis e, do outro, os desfavoráveis. O resultado desse trabalho deve ser usado pelo tutor para montar um grupo de discussão sobre este tema com a turma.

Nesta aula, foram apresentadas algumas reflexões sobre a teoria construtivista e seus reflexos sobre a aquisição da escrita infantil. Procurei expor os pontos de vista de alguns estudiosos, em geral desfavoráveis, a respeito do papel dessa teoria sobre a pedagogia da alfabetização no Brasil. Em seguida, foram apresentadas as fases de aquisição da escrita proposta pela teoria construtivista, a maior de todas as contribuições oferecidas por Emília Ferreiro aos professores alfabetizadores. Por fim, fiz algumas considerações a respeito das contribuições que, irrefutavelmente, foram dadas pelos estudos feitos dentro dessa orientação. Essa reflexão

ATIVIDADES

RESUMINDO

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foi necessária para que possamos compreender, na seção que segue, os argumentos que serão apresentados como respostas às limitações e às lacunas deixadas por este modelo, que durante décadas dominou os discursos autorizados sobre o processo de alfabetização dos sujeitos na escola.

FERREIRO, E; TEBEROSKY, A. A psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.

FRADE, I. C. da S. Alfabetização hoje: onde estão os métodos? In: Presença Pedagógica, Belo Horizonte, v. 9, n. 50, p. 17-29, mar./abr. 2003.

FERREIRO, E. Os processos construtivos de apropriação da escrita. In: FERREIRO, E; PALACIOS, M. Os processos de leitura e escrita: novas perspectivas. Tradução de Luiza Maria Silveira. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987.

______. Reflexões sobre a alfabetização. Tradução de Horácio Gonzáles (et. al.). São Paulo: Cortez, 1990.

______. Com Todas as Letras. Tradução de Maria Zilda Cunha Lopes. São Paulo: Cortez, 2007a.

______. Alfabetização em Processo. Tradução de Sara Cunha Lima. 18. ed. São Paulo: Cortez, 2007b.

GOIS, Antonio. Construtivismo e método fônico. Entrevista a Fernando Capovilla. FOLHA DE SÃO PAULO, 6. Mar, 2006. Disponível em: h t t p : / / a b r e l i v r o s . p u b l i e r . c o m . b r / a b r e l i v r o s / i m p r i m i r .asp?id=1597&foto=0. Acesso em 12, abr, 2012.

REFERÊNCIAS

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Suas anotações

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O PROCESSO DE APRENDIZAGEM

DA ESCRITA NUMA PERSPECTIVA LINGUÍSTICA

Ao final da aula, o aluno deverá estar apto para:

• descrever um novo modelo de aprendizagem da escrita, o qual está baseado numa perspectiva linguística;

• diferenciar os estágios de escrita que serão propostos nesta seção;

• compreender as principais contribuições deste novo modelo de estágios que será apresentado e suas implicações ao ensino.

3seção

1 INTRODUÇÃO

Nesta aula, apresentarei uma nova proposta de divisão de estágios de escrita fundamentada numa perspectiva linguística, sobretudo em estudos de psicologia e psicolinguística sobre o tema. Toma-se como base principal fonte os dados da pesquisa de campo empreendida por mim no ano de 2009.

No primeiro momento, intitulado Uma nova proposta de estágios de escritura, serão apresentadas resumidamente as bases teóricas e caracterizados os dados deste trabalho. Depois, será apresentado cada estágio de escrita, entre as seções 3 e 6. Assim, haverá a seguinte divisão: Estágio icônico, Estágio grafemático, Estágio fonográfico e Estágio ortográfico. Posteriormente, apresentam-se, na seção intitulada Principais contribuições deste modelo e implicações ao ensino, algumas reflexões sobre as principais contribuições teóricas e práticas deste modelo proposto.

2 UMA NOVA PROPOSTA DE ESTÁGIOS DE ESCRITURA

Iniciamos esta seção denominando de nova a proposta, que aqui será apresentada a respeito das fases ou estágios de escrita sobre as quais passam as crianças no seu processo individual de aprendizagem sobre o sistema de escrita da sua língua materna e, consequentemente, da aquisição da habilidade de escrever. Chamo de nova esta proposta porque seus fundamentos e a concepção subjacente ao processo de escrita que aqui se inscreve são muito diferentes daqueles subjacentes aos estágios preconizados pela teoria construtivista, conforme vimos antes. E chamamos também de nova porque aquelas fases continuam, até os dias atuais, sendo o discurso autorizado no meio científico sobre o tema do percurso de escrita da criança, especialmente entre os profissionais da educação do ensino fundamental.

Independente de sua novidade no meio acadêmico, especialmente no meio pedagógico, o principal aspecto a destacar a respeito das concepções que estão por trás das colocações que serão feitas neste trabalho é que se pretende mostrar aqui que o percurso de aquisição da leitura e escritura na criança traz, lado a lado e sempre correlacionadas, a fala e a escrita.

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Uma vez que o português escrito é um sistema fonográfico, ignorar esta característica basilar é negar a história filogenética e ontogenética da escrita na sua relação com a língua materna falada. Consequentemente, conceber um ensino de alfabetização que ignore a correlação oralidade e escrita, como foi a tônica das orientações construtivistas, pode levar a consequências negativas irrecuperáveis, como parece ter sido o caso do Brasil. Esses equívocos a respeito da relação oralidade/escrita são assim considerados por Abaurre:

Identifica-se, por um lado, a afirmação ingênua segun-do a qual as crianças procurariam produzir uma escrita `colada´ na oralidade, de forma a representar, através das letras, os próprios sons da fala. Essa seria a tese da dependência radical da escrita à fala. A tese contrária, também ingênua, é representada pelos defensores da au-tonomia radical da escrita com relação à oralidade. Se-gundo esses, as práticas de escrita estariam totalmente `imunes´ aos efeitos da oralidade, por se tratar de mo-dalidade que, ao longo do seu percurso evolutivo, teria já rompido quaisquer vínculos com o oral (1998, p. 172). O dado em sua singularidade, provoca naturalmente uma hipótese que se coloca no intervalo entre essas duas hipóteses radicais anteriormente mencionadas. Formula-se então a pergunta: e se a escrita se concebesse como uma modalidade autônoma, sim, a não ser confundida com a modalidade oral, mas estivesse sujeita, em deter-minadas circunstâncias, a contatos episódicos com o fônico? (Op. Cit., p. 173)

Os estágios que proponho aqui se baseiam nos dados de escrita de um sujeito que acompanho desde os dez meses de idade além dos dados dos sujeitos de pesquisa de campo empreendida no ano de 2009, na cidade de Salvador, estado da Bahia. A partir desses dados, proponho estes estágios, objetivando justamente mostrar como se dá essa relação, ao mesmo tempo correlacionada e independente, entre escrita e oralidade durante o processo de apropriação da escrita desde os primeiros contatos da criança com suportes escritos e sua utilização até a fase mais madura, quando se considera que a criança realmente domina a escrita em sua complexidade.

Antes de passar aos estágios, é necessário dizer ainda que, embora estejam organizados em ordem cronológica (sugerindo, com certa

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verdade, que as fases se sucedam), sua ordem deve ser concebida como cíclica, podendo a criança apresentar escritas que aparentemente “deram um salto” de estágio ou que tenham retrocedido.

3 ESCRITA ICÔNICA

Semelhante à primeira fase de evolução da escrita pela humanidade e a primeira fase apontada por Ferreiro, este é momento em que a criança acredita que escrever é desenhar. Como ressaltei em trabalho apresentado alhures:

para diferenciar um simples rabisco de uma “escrita” me valho da intencionalidade; ou seja, só considero os desenhos da criança como escrita a partir dos dados em que há alguma manifestação explícita por parte dela de que deseja compartilhar o que fez com o Outro (inicial-mente, quase sempre, sua mãe). (MOREIRA, 2009, p. 371).

Os pais de plantão certamente entendem o que falo. Há momentos em

que as crianças fazem rabiscos incompreensíveis e que, aparentemente, não nos

parece que tenham elas intenção de socializar conosco. Entretanto, há momentos

em que elas fazem lucubrações muito interessantes sobre o que desejam dizer a

Figura24:ExemplodeescritaicônicaFonte:http://2.bp.blogspot.com/_dbsIrCJM0F4/TPpkssHTwrI/AAAAAAAABHg/A-

gOmUx9v8E/s1600/IMG_0018.jpg

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partir dos seus rabiscos.

Os primeiros rabiscos produzidos pelo sujeito da minha pesquisa

(doravante JP) ocorreram por volta de um ano e nove meses; entretanto foi a

partir dos dois anos de idade que ele expressou desejo de socializar sua “escrita”,

estimulado pela mãe:

M: “O que é isso que você fez aqui?”, seguindo-se, como já disse,

uma série de lucubrações sobre seu escrito que sempre referem-se à finalidade

nominativa.

A partir dos dois anos de idade ele desenha rabiscos em forma de traços

e linhas curvas e, ao descrever o que fez, quase sempre diz ter “feito” alguém

conhecido.

Denomino os rabiscos desta fase de rabiscos conceptuais, pois são

rabiscos com intenção de dizer algo. Não possuem uma forma precisa, mas

podemos afirmar que são, para a criança, desenhos, uma vez que ela ainda não

domina o lápis para desenhar formas realmente precisas. Quando esses rabiscos

evoluem em precisão, temos as primeiras figuras-girino, principal marca da

primeira fase da escrita icônica. A essa primeira fase icônica denominamos escrita

icônica rudimentar.

Nesta fase, como já disse, já há uma intenção expressa na criança de

representar algo da realidade para alguém, ou seja, há o que chamo de traçado

conceptual. Esse traçado tem como protótipo a figura-girino, representando-se

nela o início da relação entre concepção e precisão. Greig descreve assim a figura-

girino:

A figura-girino é irradiante, continente e nela se recon-hecem seus dois olhos: é a combinação mental desses três elementos e a condensação no papel dos três gra-femas fundamentais que marcam a entrada na figuração. (2004, p. 38).

Quando começa a adquirir o desenho esquemático, dizemos que a criança

está na fase da escrita icônica sistemática. Luquet (1996) também chama este

tipo de desenho de realismo intencional, pois se percebe nele, ao mesmo tempo,

intenção, execução e a interpretação correspondente à intenção.

Dessa fase para a anterior ainda não existe diferença substancial nem

conceptual, mas apenas no nível da precisão, considerando-se que o desenho

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esquemático é mais evoluído do que a figura-girino. A intenção da criança

parece continuar sendo nominativa (os desenhos representam alguém ou alguma

coisa), todavia os desenhos passam a ter uma maior precisão, e já é possível um

reconhecimento, pelo outro, do que a criança está representando em matéria de

traçado, não em matéria de concepção. Daí porque a criança terá sempre que

“interpretar” para o outro o que quer dizer. Talvez seja esse um dos motivos

(além da característica da nossa escrita) da dependência íntima entre o oral e o

escrito: a criança aprende que, para o outro entender, é necessário “oralizar” o

que se pretende representar.

A última fase deste estágio, denominada escrita icônico-gráfica,

caracteriza-se pelo momento em que a criança começa a perceber que o que se

diz (concepção) não é representado pelo adulto através do desenho, mas através

de um traçado que nada diz por si mesmo (como seria o desenho). No caso

de JP, a constante observação da mãe (professora de Português e estudante de

Doutorado) escrevendo e corrigindo trabalhos e, algumas vezes, a curiosidade

manifesta em alguns episódios – em que perguntava o que a mãe estaria fazendo

e ouvia respostas sobre o uso da escrita (p. ex. M: “Tô escrevendo umas coisas

para meus alunos”, ou “Estou fazendo a lista das coisas que vou fazer hoje”, entre

outras) levou-o a manifestar essa intenção de dizer algo através do traçado muito

cedo, a partir de dois anos e quatro meses.

É neste momento que acredito situar-se a gênese da relação oralidade/

escrita na criança, como já adverti, muito antes de a criança conceber o caráter

fonográfico da escrita, quando percebo que a criança usa dois elementos distintos

para representar os dois aspectos essenciais inerentes à escrita: ela usa o desenho

para representar o que se diz (conceito) e o rabisco para representar o como

se diz (neste caso, a fala). Inicialmente esta diferença não parece clara, mas,

gradativamente, a criança passa a apontar sempre para o rabisco para dizer o

que escreveu. Embora isto me pareça indícios da emergência da concepção da

escrita como simbólica, não podemos ainda afirmar que ela já reconhece o caráter

arbitrário da escrita. Ela aponta para o rabisco simplesmente porque, para ela, é o

rabisco – e não o desenho - o “portador” da fala, como já afirmei acima.

Vale ainda retomar à primeira seção desta unidade, a respeito da filogênese

da escrita, para mostrar que esta fase da escrita é bastante semelhante à da escrita

pictórica: os sinais tomados como portadores de escrita são os desenhos.

Finalizando esta fase, esclareço que a relação entre precisão e concepção

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nos desenhos infantis não é tão simples como essa exposição

necessariamente resumida pode levar a crer. Greig (2004) acredita

que algumas crianças são mais evoluídas em matéria de precisão,

enquanto outras evoluem mais precocemente em concepção.

Podemos daí pensar sobre se essa diferença tem reflexos na

escrita das letras, pois também se pode observar, mais adiante, que

algumas crianças possuem um traçado de letra bem preciso com

uma concepção sobre escrita ainda muito emergente; enquanto,

por outro lado, observam-se crianças com uma concepção da

escrita bastante avançada para sua idade, mas com uma letra

de traçado muito irregular, às vezes incompreensível, o que até

dificulta ao professor na hora de identificar a fase em que o aluno

se encontra.

Assim, no caso específico de JP, cujo contato com adulto-

escritor foi frequente desde o nascimento, as tentativas de uso

de rabiscos conceptuais (por volta dos dois anos), ocorreu muito

antes de ele construir um desenho esquemático da figura humana

(por volta dos quatro anos e meio). Parece um caso típico de

concepção à frente da precisão.

4 ESCRITA GRAFEMÁTICA

Este é o estágio em que a criança abandona por completo

a hipótese icônica e passa a usar traçados puros nas suas tentativas

de escrever. Embora o conceito de grafema esteja relacionado

com o de fonema, referindo-se à representação escrita do som,

utilizo o termo grafemática num sentido muito restrito (já que os

Figura25:ExemplodeescritagrafemáticaFonte: Corpus da autora.

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termos existentes não dão conta do processo que investigo aqui).

Observa-se que quanto mais cedo e quanto mais frequentes forem

as vivências da criança com o texto escrito, mais precocemente ela começa a

perceber que a escrita não é pictórica, que o que se lê (quando está diante de um

sujeito que lê perto dela ou para ela) não é o desenho, são outros elementos que

se encontram nos textos. Por outro lado, ela ainda não compreende que a escrita

representa a língua falada.

Note que essa classificação põe por terra a conhecida hipótese pré-

silábica, visto que essa última terminologia não consegue dizer nada a respeito da

concepção da criança sobre a escrita nessa fase, senão reafirmar a importância da

fase posterior. E não abarca, por outro lado, as origens da relação oral/escrito que

culminará na escrita silábica. No dizer de Cagliari:

Quando, numa fase inicial, uma criança tenta escrever fazendo bolinhas ou rabiscos, ela pode ir atribuindo um rabisco a cada palavra ou a cada sílaba que vai pronun-ciando. Esse sistema de escrita que está construindo e convencionalizando para si, nesse momento, é um siste-ma logográfico (representando palavras por caracteres individuais) ou silábico (representando palavras por car-acteres isolados). Considerar este segundo tipo de es-crita como pré-silábico é, sem dúvida, muito estranho e equivocado. O fato de não usar letras do nosso alfabeto não é argumento para ser ´pré-silábica`. Ela é, simples-mente, pré-letrada (do ponto de vista do nosso sistema de escrita). (CAGLIARI, 1998, p. 73).

Poderíamos comparar este estágio à fase da escrita ideográfica, já referida

em outro capítulo, pois, ao que parece, a criança começa a perceber que a escrita

é simbólica e se dá conta de que o desenho não é símbolo da escrita, ou seja, ela

percebe o caráter arbitrário do sistema de escrita. Por isso, ao tentar “escrever”

algo, ao invés de desenhar, ela faz traçados, não mais semelhantes àqueles do

estágio anterior (visto que aqueles eram produtos da incapacidade de desenhar

esquematicamente) e, sim, semelhantes às letras. É como se a criança estivesse

usando um sistema logográfico, dando ao traçado um sentido totalmente

contextual neste momento, ou seja, qualquer traço pode dizer qualquer coisa a

depender do momento.

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Este nível pode caracterizado desta forma:

no início, os traços podem ter formas retas, curvas ou arredondadas (sua forma não interessa neste momento); ao aprender seu próprio nome, a criança passa a utilizar as letras desse nome fazendo uma série de combinações, mas essas letras não têm nenhuma relação com o som. Segue-se uma série de tentativas de compreensão da relação entre a escrita e o nome que se quer representar. (MOREIRA, 2009, p. 374).

Estes diversos tipos de relação entre a escrita e o nome que se quer

representar passa por uma série de fases, e os trabalhos de Ferreiro e equipe são

bastante explicativos desse aspecto. Um dos comportamentos típicos pode ser

exemplificado pelo que se chama de realismo nominal, que consiste da indiferença

pela criança entre o significante e o significado; assim, se uma palavra é usada

para nomear coisas grandes, sua grafia também deve ser extensa, e vice-versa. Em

outras palavras, a criança usa muitos caracteres para referir-se a coisas grandes, e

poucos para referir-se a coisas pequenas. Por isso, ao se deparar com a escrita de

GAFANHOTO, por exemplo (palavra longa para designar animal pequeno), ou

com a palavra VACA (palavra pequena para designar animal grande), ela entra em

conflito.

Outra informação fornecida pelos estudos de Ferreiro é que, numa fase

em que a criança já usa as letras com valor logográfico, ela acredita que, para

Estágio logográfico

Noestágio logográfico,acriançatrataapalavraescritacomosefosseumarepresentaçãopictoideográficaevisualdoreferente,nãoatentandoàsuaca-racterísticaalfabética,ouseja,aocódigodecorrespondênciasentreletrasecombinaçõesdeletras(grafemas)eseusrespectivossonsdafala(fonemas).Nesteestágio,aleituraconsistenoreconhecimentovisualglobaldealgumaspalavras comuns que a criança encontra com grande freqüência, como seu próprionomeeosnomesdecomidas,bebidaselugaresimpressosemrótulosecartazes.Aescritatambémseresumeaumaproduçãovisualglobal,sendoqueaescolhaeaordenaçãodasletrasaindanãoestãosobcontroledossonsdafala.Amanutençãodetalestratégiadeleituralogográficaexigiriamuitodamemóriavisualeacabarialevandoaumasériecrescentedeerrosgros-seiros,comotrocasdepalavras(paralexias)visualmentesemelhantes.Frenteaocrescentecontatocommaterialescritoeàsinstruçõessobrealinguagemescrita,acriançacomeçaaingressarnosegundoestágio,oalfabético.

Fonte: http://www.profala.com/artpsico97.htm

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que uma palavra faça sentido, deve ter uma quantidade mínima de caracteres

(no caso do português, uma palavra formada de até duas letras, não é concebida

como palavra para a criança). Curioso é observar que muito poucas palavras

do português têm menos do que três letras, portanto, se a hipótese da criança

está de acordo com o padrão estrutural da sua língua falada, isto significa que

a criança levanta hipóteses com base no seu conhecimento da língua ambiente.

Não é apenas a quantidade que está em jogo neste julgamento, mas também a

qualidade: para a criança, para algo escrito seja uma palavra, é necessário que as

letras variem entre si; ou seja, letras iguais lado a lado não sugerem que ali haja

uma palavra. Mais uma vez a hipótese está de acordo com o português escrito,

pois podemos observar que a ocorrência de letras iguais numa mesma palavra é

algo muito raro no português.

Depois de todos esses conflitos, naturais e, diria mesmo, necessários, a

criança sutilmente percebendo que letras representam sons, mas como afirmo em

outro trabalho:

o dar-se conta não a encaminha diretamente para a hipó-tese silábica, absolutamente. Alguns estudos demon-stram ser muito comum que a criança perceba inicial-mente a relação entre letra e som inicial da palavra e depois, letra e som finais, para, só depois, dar-se conta da sílaba. (MOREIRA, 2009, p. 375).

5 ESCRITA FONOGRÁFICA

Figura26:EscritafonográficadifusaFonte: Corpus da autora.

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O estágio da escrita fonográfica compreende o momento que a criança

finalmente compreende que a nossa escrita está relacionada com a fala, que os

elementos usados representam sons da língua falada e não objetos ou ideias. Mas

para chegar à concepção de que cada grafema da escrita representa um fonema,

tornando-se capaz de escrever de forma compreensível, a criança passa por várias

fases, dentre as principais estão a da escrita silábica e escrita alfabética, cada

uma delas com uma série de etapas progressivas. É essa progressão que é pouco

explicada pelas teorias anteriores, visto que, além de não estarem comprometidas

em compreender como as crianças concebem gradualmente os elementos

mínimos que formam a palavra (letras) na sua relação com as menores unidades

da língua falada (fonema), visto que o foco é na aprendizagem global das palavras;

também não há arcabouço teórico suficiente para compreender a evolução dessa

relação oralidade/escrita, só fornecida pelas teorias fonológicas, no interior da

linguística.

Os dados que tenho disponíveis fizeram ver que não existe uma hipótese

silábica simples, exemplificada pelo uso de um caractere para representar a sílaba

como unidade sonora. Esse percurso é muito mais complexo, passando por várias

etapas. O percurso que a criança segue até atingir a escrita silábica propriamente

dita é um aspecto que tem ainda muito caminho para ser explorado pela literatura.

Aqui apenas tentaremos traçar uma interpretação possível, tendo em vista os

dados coletados, mas não será uma análise detalhada como mereceria tal matéria.

Observando os dados disponíveis no meu corpus, percebo que a escrita

da palavra ultrapassou o estágio exclusivamente grafemático. Começo a observar

esses resquícios na subvocalização, usada para monitorar a escrita, além das

marcas esparsas de letras que representam alguns sons da palavra que se pretende

escrever. As escritas fazem perceber que falta à criança a percepção da linearidade

da escrita, segundo a qual as letras devem seguir na mesma ordem que seguem os

sons falados. Elas demonstram que a criança já começa a representar sons, mas

ainda não sabe onde escrever a letra correspondente ao som, ou seja, ela percebe

os sons salientes e procura representá-los, mas não na ordem em que ocorrem. A

esse respeito, manifesta-se Cagliari:

Nem sempre [as crianças] procuram atribuir uma letra a uma sílaba, mas que observam os elementos vocálicos e consonantais da fala e escrevem representando essas saliências fonéticas que, às vezes, correspondem às síla-bas e, às vezes, não. (1998, p. 74).

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Essa fase é denominada fase da escrita fonográfica difusa. Vejamos alguns

exemplos desse tipo de representação:

Carolina (6 anos): CAUBA (sábado), CAO (sapato), MROT (maestro).

Como já afirmei antes, parece mesmo que a percepção do som inicial na

fala geraria uma primeira tentativa de relacionar pares (primeiro som, primeira

letra). Observo em JP, por volta dos 3 anos e meio, uma capacidade para perceber

os sons iniciais das palavras, através de uma brincadeira que fazíamos: “Uma coisa

começada com ... (som inicial)”. Essa foi uma brincadeira que ele inventou com

o primo e que passei a usar sempre. Algumas vezes eu perguntava, outras, ele.

Nessa brincadeira, JP conseguia acertar uma série de palavras. Todavia, na escrita,

não relacionava o som com a letra inicialmente. Depois foi passando a preocupar-

se apenas com o som inicial seguido do final, os quais representava quase sempre

corretamente. Vejamos os exemplos abaixo, ocorridos aos quatro anos: PDE

MNAU (parede), TOATUROU (televisão), OEGUPEEDEDAU (olho).

Quando a criança começa a representar sistematicamente os sons iniciais

e finais (e não mais aqueles que lhes pareceram mais salientes, como na fase

anterior) ela está numa fase denominada escrita fonográfica pré-sistemática.

Assim denomino para mostrar que ainda não há uma representação sistemática

de cada sílaba que forma a palavra, como é o caso da escrita prototipicamente

silábica, mas a criança está caminhando para isso.

Estudos de diferentes áreas têm demonstrado que a capacidade de

perceber as sílabas como unidades discretas é natural (McNEILAGE; DAVIS,

1990, 1993; CARVALHO, 2003) e esta tese é confirmada nos dados desta

pesquisa: surpreendo JP, com apenas quinze dias da sua entrada na escola, “lendo”

silabicamente (escandindo a palavra em sílabas oralmente):

Estamos em casa e JP me pede para ler a história de “Pinóquio”. Pego o

livro de Pinóquio:

M: “Mas este não é o livro de Pinóquio, não”.

JP: “É sim”.

M: “Como você sabe que é?”

JP: “Ó aqui ó: PI- NÓ- QUIO” (com o dedo fixo na palavra).

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São esses fatos que me levam à suposição de que:

a criança venha usando e refletindo (não consciente-mente) sobre a sílaba durante sua aquisição oral desde a mais tenra idade. Entretanto, é a partir da fase silábica da escrita que tal conhecimento vem à tona e se torna mais consciente, auxiliado pela escrita; ao mesmo tempo, essa longa experiência de manipulação do molde silábi-co durante a aquisição da linguagem também auxilia a aquisição da escrita. (MOREIRA, 2009, p. 377).

Este é mais um exemplo que demonstra a relação de mão dupla entre

escrita e oralidade.

Após esta fase, a criança segue para um momento em que representa

não apenas os sons iniciais e finais, ou o mais saliente, ela busca representar as

unidades silábicas da palavra como um todo, entretanto, nem sempre representa

na escrita todas as sílabas que compõem a palavra, ou representa todas as sílabas,

mas não na ordem esperada. Pode omitir algumas sílabas, repetir outras, inverter

as posições. Pode também não utilizar o conteúdo esperado para aquela sílaba (a

vogal ou a consoante correspondentes). Este tipo de comportamento pode ser

considerado como escrita silábica rudimentar, porque ainda não alcançou o nível

de sistematicidade máximo.

É importante frisar que, embora esse tipo ocorra antes do silábico

propriamente dito, pode ocorrer também posteriormente (quando a criança já

domina a escrita silábica), influenciado por fatores exógenos; é o que chamo de

regressão aparente. Alguns indícios desse tipo: XAS (jacaré), MSA (madrasta),

AET [escrita espelhada] (tristeza) (Railane, 6 anos).

Por fim, ao atingir a escrita silábica sistemática, a criança atinge a

sistematicidade máxima dentro da hipótese com a qual está lidando neste momento

(a hipótese de que se representam as unidades silábicas pelo uso de uma das letras

dessa sílaba), assim ela alcança uma maneira estável de escrever palavras, e muitas

vezes é bem sucedida na tarefa, visto que quem lê já consegue deduzir, algumas

vezes, a palavra escrita. Seja esse caractere uma vogal, uma consoante ou uma letra

que não condiz com conteúdo da sílaba, pode-se mesmo assim afirmar que sua

hipótese seja silábica, visto que o que lhe interessa representar não é o conteúdo

específico (o fonema), mas o molde silábico. Quando a criança passa a utilizar o

caractere adequado para representar a sílaba (consoante ou vogal), digo que sua

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escrita é uma escrita silábica perfeita. Exemplos de escritas silábicas perfeitas:

SPT (sapato), AIA (sabiás), CTO (castelo), MCO (músculo) (Juliana, 6 anos).

A importância da fase silábica para compreensão da relação oralidade-

escrita é extremamente importante e reconhecida por todos os estudiosos, no

sentido de que é durante ela que a criança passa a fazer uma análise mais sistemática

dessa relação. Mas ela não é apenas importante, como também, necessária. Antes

que a criança comece a perceber e representar por escrito o caráter fonográfico

da nossa escrita, ou seja, que a cada segmento gráfico corresponda um segmento

fônico, é condição sine qua non, que ela tenha passado pela fase silábica.

Ressalto ainda que as fases aqui detalhadas não ocorrem necessariamente

na ordem que apresentei, nem se pode dizer que todas as crianças percorram todas

as fases apresentadas aqui. Há crianças que passam muito rapidamente por este

estágio da sílaba, há outras que, ao entrar na hipótese silábica, em pouco tempo

já escreve numa escrita silábica sistemática, ou seja, há diferenças idiossincráticas

que devem ser respeitadas tanto na compreensão do percurso individual de cada

criança como no tipo de intervenção que se deve fazer em cada caso.

Uma das características mais importantes da escrita silábica é o fato de a

criança entrar numa fase de equilíbrio, que gera um certo conforto (algo como uma

fase de acomodação, no sentido piagetiano do termo), visto que a criança satisfaz-

se com a hipótese elaborada. Mas o contato da criança com os escritos à sua volta

– especialmente com “seu” nome escrito – a faz perceber muito rapidamente que

sua hipótese não condiz com a realidade, e um dos principais desencadeadores

Figura27:EscritasilábicarudimentarFonte:http://www.psicologia.ufrj.br/oficinasleituraescrita/images/letramento/

prefoneticanome.jpg

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deste novo conflito é a atividade de leitura; pois, ao tentar “ler” silabicamente, a

criança começa a perceber que sobram caracteres a serem lidos (por exemplo, ao

deparar-se com a leitura da palavra CAVALO, ela aponta as três primeiras letras

lendo cada uma como se fosse uma sílaba, depois percebe que três letras ficaram

de fora). Além disso, ao escrever palavras diferentes cujos conteúdos silábicos

coincidem ( Ex: AEU (cabelo), AEU (carteiro)), obstem-se duas escritas iguais;

e como elas não aceitam que palavras diferentes de escrevam da mesma maneira,

entram também em conflito no nível da escrita. Assim, gradativamente, começa

se dar conta das unidades que compõem a sílaba (fonemas):

inicialmente, são as saliências fônicas que chamam a atenção, assim, passa a representar os fonemas, mas não todos os fonemas, e sim, aqueles que ganham uma saliência para ela, as demais sílabas continuam sendo es-critas silabicamente. Cito abaixo alguns exemplos desse tipo de escrita: AVOI (árvore), FAIA (faísca), CABDO (sábado) (Alan, 6 anos). (MOREIRA, Op. Cit. 379).

Todavia esta percepção não é imediata, visto que, às vezes, a estrutura

silábica da palavra permite que se escreva com compreensão mesmo omitindo

letras na sílaba (por exemplo, ao escrever CABSA, é possível ler “cabeça”),

dessa forma, isso a criança fica a meio termo entre escrever silabicamente ou

alfabeticamente. Por esse motivo denomino esse momento da aquisição de fase

da escrita transitória, pois marca a transição entre a escrita silábica sistemática e a

escrita alfabética sistemática.

Figura28:EscritatransitóriaFonte: Corpus da autora.

EADLetras Vernáculas

Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

126

Quando finalmente a criança percebe que cada letra pode representar um

fonema/som e cada fonema/som pode ser representado por uma letra, ela entra

no período da escrita alfabética. Conquanto esta não seja uma hipótese completa

(visto que existem muitos aspectos convencionais da escrita que vão além dessa

hipótese), ela é extremamente satisfatória e leva um longo período para ser

superada, visto que, ao ser capaz de ler com compreensão e escrever algo legível e

inteligível a qualquer pessoa, a criança já pode se satisfazer com as suas produções

e sentir-se alfabetizada no sentido literal do termo. Após atingir esta hipótese,

a criança é capaz de ler muitas palavras e até textos sozinha, sem intervenção

de outrem; por outro lado, o que ela escreve não precisa mais ser “traduzido”

como nas fases anteriores. Essa escrita alfabética, entretanto, também passa por

fases, que podemos dividir em duas: a escrita alfabética pré-sistemática e a escrita

alfabética sistemática.

A escrita alfabética pré-sistemática consiste no momento em que se

observa claramente que a hipótese da criança é alfabética, visto que ela usa uma

letra para cada fonema, todavia nem sempre ela utiliza a letra certa para representar

o som determinado (excluindo os casos em que esse equívoco envolve regras

ortográficas ou pronúncia diferente). Por exemplo, ela pode escrever ASGOLA

(argola), SABITO (sabido). Explicando melhor, no caso do segundo exemplo, se

esta criança escreve dessa forma por possuir dislasia e trocar os sons sonoros pelos

sons surdos na fala, essa representação está de acordo com sua pronúncia; nesse

caso, há que considerar tal fato na avaliação da fase de aquisição dessa criança.

Aparentemente essas trocas podem ser vistas como simples lapsos, mas

os exemplos acima não parecem ilustrar um simples engano, se o observarmos

cuidadosamente. Demonstram que a criança ainda se encontra em conflito quanto

ao segmento sonoro que está representando e sua letra correspondente. No

primeiro exemplo, temos um caso de conflito motivado por reflexões estruturais

(a criança já percebe que /S/ e /L/ costumam ocorrer fechando a sílaba, e isso a

coloca em conflito sobre qual elemento deve usar nesse momento; ou seja, não

está focada no som em si, mas no preenchimento do molde silábico). Muitos

exemplos como esse estão presentes no nosso corpus. No segundo caso, os

fonemas são muito próximos do ponto de vista articulatório e isso a coloca em

conflito de qual letra usar. E não se trata aqui de a criança escrever como fala (o

falante acima não troca o fonema /d/ pelo /t/), mas de ainda não representar com

sistematicidade máxima os segmentos sonoros.

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127

Dislalia

Adislalia(dogregodys+lexia)éumdistúrbiodafala,caracterizadopeladificuldadeemarticularaspalavras.Basicamenteconsistenamápronúnciadaspalavras,sejaomitindoouacrescentandofonemas,trocandoumfonemapor outro ou ainda distorcendo-os ordenadamente.Afalhanaemissãodaspalavraspodeaindaocorreremfonemasousílabas.Assimsendo,ossintomasdaDislaliaconsistememomissão,substituiçãooudeformação dos fonemas.Demodogeral,apalavradodislálicoéfluida,emborapossaseratéininte-ligível, podendo o desenvolvimento da linguagem ser normal ou levemente retardado.Não se observam transtornos nomovimento dosmúsculos queintervêm na articulação e emissão da palavra.Em muitos casos, a pronúncia das vogais e dos ditongos costuma ser cor-reta,bemcomoahabilidadepara imitarsons.Diantedopacientedislálicocostuma-sefazerumapesquisadascondiçõesfísicasdosórgãosnecessáriosàemissãodaspalavras,verifica-seamobilidadedestesórgãos,ouseja,dopalato,lábioselíngua,assimcomoaaudição,tantosuaquantidadecomosuaqualidade auditiva.AsDislalias constituemumgruponumerosodeperturbaçõesorgânicas oufuncionais da palavra.No primeiro caso, resultamdamalformações ou dealteraçõesdeinervaçãodalíngua,daabóbadapalatinaedequalqueroutroórgãodafonação.Encontram-seemcasosdemalformaçõescongênitas,taiscomoo lábio leporino ou como conseqüência de traumatismosdos órgãosfonadores. Por outro lado, certas Dislalias são devidas a enfermidades do sistema nervoso central.Quandonãoseencontranenhumaalteraçãofisicaaquepossaseratribuí-doaDislalia,estaéchamadadeDislaliaFuncional.Nessescasos,pensa-seemhereditariedade, imitaçãooualteraçõesemocionaise,entreessas,nascriançasécomumaDislaliatípicadoshipercinéticosouhiperativos.TambémnosdeficientesmentaisseobservaumaDislalia,àsvezesgraveaopontodalinguagem ser acessível apenas ao grupo familiar.Atéosquatroanos,oserrosnalinguagemsãonormais,masdepoisdessafase a criança pode ter problemas se continuar falando errado.ADislalia,trocadefonemas(sonsdasletras),podeafetartambémaescrita.UmcasoclássicocaracterísticoportadordedislaliasãoospersonagensCebolinhadaTurmadaMônicaoHortelinoTroca-Letras(“ElmerFudd”)doLooneyTunes,eMing-Ming,doSuperFofosquesempretrocamo“R”(inicialeintervocálico)por“L”,nocasodeHortelino,o“R”finaltambéméafetado.AlgunsfonoaudiólogosconsideramqueaDislalianãosejaumproblemadeordemneurológica,masdeordemfuncional.Segundoeles,osomalteradopodesemanifestardediversasformas,havendodistorções,sonsmuitopró-ximosmasdiferentesdoreal,omissão,atoemquesedeixadepronunciaralgumfonemadapalavra,transposiçõesnaordemdeapresentaçãodosfone-mas(trocarmáquinapormánica)e,porfim,acréscimosdesons.Dificuldadenalinguagemoral,quepodeinterferirnoaprendizadodaescrita.Acriançaomite,fazsubstituições,distorçõesouacréscimosdesons.Eisal-gunsexemplos:

-Omissão:nãopronunciasons-“omei”=“tomei”;-Substituição:trocaalgunssonsporoutros-“balata”=“barata”;-Acréscimo:introduzmaisumsom-“Atelântico”=“Atlântico”.

Fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Dislalia

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Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

128

Quando começa a usar a letra certa para representar um determinado

fonema – com base no critério da pronúncia e não de regras ortográficas – pode-

se dizer que ela atingiu a escrita alfabética sistemática. Os exemplos abundam:

PRIVADA (privada), MILAGRI (milagre), TRISTESA (tristeza), PRARTICO

(plástico) – neste caso, o sujeito de pesquisa pronuncia a coda (letra que fecha a

primeira sílaba) como vibrante (/R/) – JACAREIS (jacarés) (Laila, 6 anos).

Observe que, em muitos casos, a escrita não condiz com o esperado, ainda

assim considero que essa criança esteja na fase da escrita alfabética sistemática,

em virtude de estar representando fielmente a maneira como pronuncia a palavra

no momento em que a escreve. Sobre esta fase, pontuo o seguinte:

pode-se dizer que, do sentido estrito, a criança que atingiu essa fase já está alfabetizada. Entretanto, não se pode dizer ainda que esteja letrada, visto que, para fazer uso da escrita, muitos outros aspectos necessitam ainda ser absorvidos, e a aprendizagem que se seguirá refere-se aos aspectos convencionais que regem uma dada escrita, enquanto produto de uma construção social e veículo de interação. Assim, a criança passa a aprender inicialmente a representar o que deseja respeitando determinadas re-gras de uso. Do ponto de vista da compreensão, tanto faz escrever-se “casa” ou “caza”, entretanto, convencionou-se que a primeira é a escrita aceita. Superados os confli-tos alfabéticos, a criança passa agora a lidar com as regras de uso da escrita. Ela está no nível de escrita ortográfica. (MOREIRA. Op. Cit. 381).

Figura29:EscritaalfabéticasistemáticaFonte:Transcriçãodeescritadesujeitodepesquisadaautora

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6 ESCRITA ORTOGRÁFICA

A grande contribuição dos linguistas e psicolinguistas dá-se nesta

fase do processo de escrita. Como já disse, em momento anterior, por não se

fundamentar numa perspectiva linguística e subvalorizar o papel da língua

ambiente sobre aquisição da escrita, concebendo escrita e oralidade como

modalidades independentes e exclusivas, os estudos anteriores encerram sua

descrição das fases no estágio alfabético. Entretanto, muitos estudos sobre a fase

posterior à alfabética, denominada escrita ortográfica, passam a desenvolver-se,

sobretudo entre os linguistas e psicólogos, e demonstram que a compreensão do

caráter ortográfico é inicialmente, para a criança, fonte de extremas dificuldades,

porque representa uma ruptura com o sistemático, com uma hipótese fundada na

relação de elementos discretos perceptíveis. Ao se deparar com fato de que nem

sempre a relação letra/som é confiável para ancorar-se na hora de escrever, de

que há diferentes grafemas para representar o mesmo fonema ou que o mesmo

grafema pode representar diferentes fonemas (e o que define esse uso é uma regra

convencional, social) a criança entra no estágio da compreensão do maior nível de

arbitrariedade a que é possível chegar o nosso sistema de escrita: a ortografia. Sim,

porque não existe nenhuma previsibilidade ao operar com formas aparentemente

alternativas de dizer a mesma coisa.

Quando, na hora de escrever uma palavra, a criança para e reflete sobre

qual letra usar entre as alternativas possíveis, isso mostra que ela já começa a

perceber este caráter. Às vezes, é possível encontrar escritas ortográficas

(numa representação correta inesperada, como escrever CORAÇÃO, com ç,

prematuramente) em fases anteriores à ortográfica, o que pode ser explicado

como a representação de uma forma cristalizada, memorizada, ou aprendida

globalmente em algum momento do percurso evolutivo. Outra explicação

também seria a frequência com que uma determinada palavra aparece na escrita,

ou é utilizada pela criança com regularidade. Conforme aponto a respeito do meu

sujeito de pesquisa:

Isso ocorre com JP sempre que escreve palavras termi-nadas com som final /i/ ou /u/. Por ter-me questionado – quando se encontrava na fase alfabética pré-sistemática - sobre o porquê de se escrever “assim” (com “e” e “o” respectivamente), e eu ter-lhe dado uma “resposta de mãe”: M: “Porque, quando esse som tá no fim da palavra,

EADLetras Vernáculas

Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

130

a gente usa e/o”, passou a usar essa regra em quase todas as palavras que continham esse som final. (MOREIRA, Op. Cit. 383).

Dessa forma, a escrita ortográfica pode ser considerada o último estágio

do processo de aquisição da escrita como código. E esse estágio dá-se ao infinito,

ou seja, não se pode dizer que alguém ultrapassou este estágio porque, além de

a ortografia ser algo mutável (vide o novo acordo ortográfico), há sempre um

momento em que o usuário da escrita tem dúvida de como escrever uma ou outra

palavra (quanto menor a frequência com que essa palavra ocorra na escrita, maior

a probabilidade da dúvida).

É ainda importante frisar que, quando um sujeito atinge o nível da

escrita ortográfica, não implica afirmar que ele seja uma pessoa competente em

leitura e escritura, visto que a leitura e a escritura envolvem muito mais do que

decifração e codificação: é preciso que o usuário domine a habilidade de ler com

compreensão e saber interpretar o que lê com criticidade, trazendo as leituras

para sua experiência particular; além disso, é preciso escrever com lógica, com

coerência, trazendo algo de novo e original e possibilitando o diálogo e interação

com o leitor. Esses e outros aspectos da leitura e escritura são abordados pelas

teorias de letramento.

Quero ainda salientar que estas habilidades que vão além do domínio

técnico da escrita não consistem em aprendizagem que se dê depois de concluído

o processo aqui exposto. Elas vão se desenvolvendo simultaneamente, ao longo

do percurso da criança na aquisição da língua como código – e acredita-se que sua

aprendizagem inicia-se antes mesmo da entrada da criança na escola. Entretanto,

ainda não há trabalhos que expliquem em detalhes esse processo de aquisição do

letramento infantil, tal como se observam nos estudos de aquisição do caráter

técnico da escrita (como código). Talvez seja porque a aquisição do letramento,

pelo seu caráter altamente subjetivo, não possa ser explicada em termos de fases

como na aquisição descrita neste trabalho.

7 PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES DESTE MODELO E IMPLICAÇÕES AO ENSINO

A opção por propor uma nova subdivisão de estágios neste trabalho

não se justifica por uma mera escolha intelectual. Justifica-se em virtude de

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que os estágios antes conhecidos não têm condições de atender às concepções

subjacentes a este trabalho. Além disso, pela minha experiência prática anterior

como professora alfabetizadora e pela minha condição atual de formadora de

professoras das séries iniciais, observo que aqueles estágios são pouco abrangentes

e não explicam muitos aspectos importantes do processo de escrita. Dessa forma,

os estágios que proponho neste trabalho pretendem sem mais explicativos do

processo de aquisição da escrita da criança e, consequentemente, mais aplicáveis

ao ensino.

Assim, pretendo neste momento, de uma maneira bastante sintética,

expor algumas das contribuições que esta nova perspectiva traz e suas implicações

ao ensino.

Dentre as contribuições possíveis está o fato de que essa exposição

procura mostrar com mais detalhes a passagem de um estágio para outro no

processo de aquisição da escrita e as fases internas de cada um desses estágios.

Procura-se mostrar, em linhas gerais, e com base na evolução filogenética, que a

construção do conhecimento sobre a escrita passa por três grandes fases: icônica,

grafemática e fonográfica.

No primeiro estágio, a criança parece acreditar que escrever é desenhar

e que os sinais que representam algo são ícones, estão colados, vinculados ao

próprio objeto representado. Nessa fase, é muito importante observar a evolução

do desenho para escrita e o momento em que escrita e desenho se distanciam. O

que esta exposição traz de novo para este debate é mostrar a gênese da relação

oralidade/escrita, que é, ao mesmo tempo, a diferenciação entre significado

(representado pelo desenho) e o significante (representado pelos rabiscos)

numa fase mais avançada deste primeiro estágio. Nesse momento, a criança

usa o rabisco, e não o desenho, como o sinal que serve para ler. Assim, ganha

relevância a importância de ouvir histórias pela criança – e, se o adulto apontar

para as letras na hora da leitura, estará contribuindo ainda mais para ela perceber

que não se lê no desenho e, sim, nos caracteres de outra ordem (palavras)

presentes no portador de leitura. Por isso, diferentemente das orientações

construtivistas que supervalorizam a leitura silenciosa, defendemos que, nesta

fase do desenvolvimento, a leitura em voz alta do adulto dirigida à criança pode

contribuir sobremaneira para a evolução da hipótese de escrita dessa criança.

Considerando-se que, em muitos casos, esta é a fase geralmente superada

em casa, antes de entrar para escola, a orientação desse aspecto para os pais seria

EADLetras Vernáculas

Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

132

bastante recomendável. Pedir que ela “leia” a história também é importante

para vivenciar esta experiência de oralizar algo que não o desenho, facilitando a

superação da hipótese icônica, além de que a criança já começa a perceber que a

prosódia de uma “leitura oral” é diferente da fala fluente. Isto pude perceber em

JP, aos onze meses de idade. Numa fase em que ele sequer havia iniciado o estágio

icônico de escritura, após ouvir muitas histórias contadas com muita ênfase pela

mãe, ele pega um livro de banho e passa apontar para os desenhos e balbuciar

num ritmo de fala diferente do padrão espontâneo, como se imitasse a prosódia

da leitura.

O estágio grafemático consiste num momento aparentemente pouco

produtivo quanto ao avanço conceptual da escritura, entretanto, é quando a

criança está com toda a sua atenção voltada para o traçado. Por isso, penso que é

um bom momento para o desenvolvimento de muitas atividades psicomotoras e

perceptivas, trabalhando com formas diferentes, lateralidade, posição, entre outros

aspectos que proporcionarão boa coordenação motora e, consequentemente,

bom traçado e boa percepção da diferença entre as letras (pois esta é a idade que

elas aprendem a traçar as primeiras letras). O que este momento tem de muito

rico diz respeito aos profundos conflitos sofridos pela criança para entender a

natureza simbólica da escrita. Esse aspecto evidencia a semelhança entre este

estágio e o estágio ideográfico da evolução da escrita pela humanidade. Observe

que é na fase ideográfica que ocorre a maior expansão e criação de diferentes

sinais, em diferentes sociedades. Aqui também a criança está concentrada mais

na forma do que no conteúdo. Ela faz reflexões interessantes na construção do

seu conceito de palavra: coisas grandes devem ter muitas letras e coisas pequenas

devem ter poucas letras; letras não podem se repetir, uma palavra não pode

ter letras iguais, uma palavra não pode ter apenas duas letras. Essas hipóteses,

embora não sejam produtivas em curto prazo, contribuirão muito para o avanço

da criança em estágios posteriores, pois elas não se satisfazem, por exemplo,

de escrever uma palavra de duas sílabas com apenas duas letras, e esse conflito

pode levá-la rapidamente ao avanço da hipótese. Este é também um momento

em que o contato com palavras de diferentes extensões e padrões enriquecerá

seu repertório; e forçar a decifração agora não é uma orientação adequada, pois

a criança está concentrada na palavra como um todo na hora da leitura; na hora

da escritura é que ela se preocupa com o traçado de cada letra, e acredito que isto

deve ser estimulado, para evitar problemas de percepção de letras em separado,

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133

podendo tornar a experiência com a caligrafia dolorosa mais adiante. Observa-se

também que crianças pouco estimuladas a perceber as diferenças entre a forma

das letras (e seus fonemas corespondentes) também costumam ter dificuldades

quando entram no estágio ortográfico (CARVALHO, 2003).

Nesta abordagem, ressalta-se a importância da entrada da criança no

estágio em que ela percebe a real natureza da nossa escrita: ela não é logográfica

e, sim, fonográfica. Tentamos ressaltar este aspecto colocando escrita silábica e

escrita alfabética como modos diferentes de representar os sons falados, ou seja,

a escrita silábica e a escrita alfabética não estão em estágios diferentes dentro

percurso da escrita infantil. Elas são o resultado do grande salto da evolução da

criança: a percepção do caráter gráfico-fônico da escrita, diferentemente do caráter

ideológico do estágio anterior. Também pretende mostrar que a criança evolui tal

qual evoluiu a humanidade, tentando inicialmente representar a sílaba, para, só

em estágio posterior, representar o fonema. Este tipo de abordagem visa por em

relevo o papel da sílaba no processo da escritura. Pesquisas de cunho linguístico

têm demonstrado o importante papel da sílaba na fase inicial da aprendizagem da

leitura e escritura. Muitos estudiosos defendem que a percepção da sílaba como

unidade sonora é mais evidente para as crianças do que a percepção da letra como

unidade sonora, tanto na leitura/escritura (CARVALHO, 2003; MOREIRA,

2009b) como na aquisição da língua falada (MC NEILAGE, 1994 ). Também

Paulo Freire insistiu na sílaba como unidade de análise em sala de aula e no método

silábico (ressignificado) como ferramenta importante de ensino. Assim, quero

também ressaltar o papel fundamental da sílaba neste estágio de construção a

escrita. Ao defender isso, proponho que se retome o método silábico nesta fase

da escrita, estimulando a criança a perceber a quantidade de sílabas das palavras;

comparar palavras com quantidade de sílabas diferentes correlacionando com a

pronúncia; estimular brincadeiras com as sílabas, invertendo, trocando o núcleo

das sílabas (vogais) de modo a produzir palavras engraçadas (Ex: parede por

“piridi”); jogos de adivinhação, trocando o núcleo e vendo quem primeiro decifra

a palavra correta, entre tantas outras.

Quando denomino a fase intermediária entre a silábica e a alfabética de fase

transitória (ao invés de silábico-alfabética, como é a terminologia construtivista),

é porque acredito que também esta terminologia não explica a natureza desta

fase. A transição entre escrever silabicamente ou escrever alfabeticamente não

é uma questão de mera confusão. Insisto mais uma vez: está fundada na relação

EADLetras Vernáculas

Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

134

entre a escrita e a língua ambiente, e em como a criança está pensando sobre

essa relação. Ela entra nessa transição porque ainda consegue ler algumas palavras

corretamente, mesmo escritas silabicamente, mas, ao mesmo tempo, sabe que o

que se representa, na escrita, são os fonemas, não a unidade silábica. Há também o

fator condição de produção: às vezes, ela sabe que falta uma letra para representar

algo mais, mas, por ainda não saber qual letra usar, as vezes opta por não usar letra

nenhuma, ou o tipo de atividade proposta não dá tempo para ela procurar a letra

certa; então ela deixa o espaço em branco e segue para a outra sílaba. Atividades

diversificadas para corresponder a quantidade de letras à quantidade de sons (de

preferência numa relação biunívoca) de uma palavra ajudam neste momento.

Atividades que visem desenvolver consciência fonológica também são muito

importantes nesta fase. Sempre ler em voz alta (esta tão criticada leitura em voz

alta retornando mais uma vez aqui) o que se escreveu é também um excelente

exercício para detectar o fonema que ficou sem representação na escrita. E nunca,

jamais, estimular a leitura global de palavras soltas, pois, assim, sua progressão

Consciência fonológica

Denomina-seconsciênciafonológicaahabilidademetalinguísticadetomadade consciência das características formais da linguagem. Esta habilidadecompreende dois níveis: 1. A consciência de que a língua falada pode ser segmentada em unida-desdistintas,ouseja,afrasepodesersegmentadaempalavras;aspala-vras,emsílabaseassílabas,emfonemas.2. A consciência de que essas mesmas unidades repetem-se em diferen-tespalavrasfaladas.(ByrneeFielding-Barnsley,1989). Diferentes pesquisas têm apontado o papel do desenvolvimento da consci-ênciafonológicaparaaaquisiçãodaleituraeescrita.Estaspesquisasrefe-remqueodesempenhodascriançasnafasepré-escolaremdeterminadastarefas de consciência fonológica é preditivo de seu sucesso ou fracassona aquisição e desenvolvimento da lecto-escrita (Juel, Griffith e Gough,1986; Stanovich, Cunningham e Cramer, 1984;Capovilla, 1999; Guimarães, 2003). Crianças com dificuldades em consciência fonológica geralmenteapresentam atraso na aquisição da leitura e escrita, e procedimentos para desenvolveraconsciênciafonológicapodemajudarascriançascomdificul-dadesnaescritaasuperá-los(CapovillaeCapovilla,2000).Aconsciênciafonológica,ouoconhecimentoacercadaestruturasonoradalinguagem, desenvolve-se nas crianças ouvintes no contato destas com a linguagemoraldesuacomunidade.Énarelaçãodelacomdiferentesformasdeexpressãooralqueessahabilidademetalingüísticadesenvolve-se,desdeque a criança se vê imersa no mundo lingüístico. Diferentes formas lingüís-ticasaquequalquercriançaéexpostadentrodeumaculturavãoformandosuaconsciênciafonológica,entreelasdestacamosasmúsicas,cantigasderoda,poesias,parlendas,jogosorais,eafala,propriamentedita.

Fonte: http://www.fonoesaude.org/consfonologica.htm

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para a fase seguinte fica comprometida. Não estou aqui

defendendo que se deva estimular a criança a ler sempre

decifrando, pelo contrário, defendo que a leitura global só deve

ser estimulada depois que se ultrapassou o estágio alfabético, ou

em situações de leitura de textos em que uma palavra que o aluno

não decifra o impede de avançar na leitura global do texto. Com

atividades de intervenção adequadas, a passagem da fase silábica

para a alfabética torna-se ainda mais tranquila do que costuma ser,

facilitando, por conseguinte, a aquisição da ortografia.

Enfim, no estágio da escrita ortográfica, é necessário um

maior estímulo à leitura de textos, pois é pela leitura frequente

que a criança internaliza a escrita das palavras mais frequentes.

Chamar atenção para a escrita das palavras também é aconselhável

– nada de achar que corrigir é pecado – mas tem que ser uma

correção respeitosa, que permita a refacção, que garanta à criança

identificar uma regra geral para o erro, estimulando-a a chegar à

regra de uma forma construtiva, e não lhe apresentando a resposta

pronta. E, nos casos em que não há regras visíveis, estimular a

memorização. Sim, este é o momento em que a memorização

deve ser estimulada, não nas etapas anteriores, quando é sempre

possível deduzir uma regra. Este é o momento de a criança

entender que a escritura exige uso constante, e se escreve melhor

quanto maiores e mais diversificadas são suas experiências com

a escritura. E quando a isso tudo se junta o prazer, o deleite a

troca de significados entre interlocutores, escrever torna-se uma

experiência saudável e construtiva para aquele que escreve.

1. Retome a seção anterior e faça um paralelo entre

a proposta construtivista e a proposta linguística (apresentada

nesta aula) de estágios de escrita.

2. Faça um resumo de uma lauda do texto de Magda

Soares proposto como leitura recomendada.

SOARES, Magda B. Aprender a Escrever, Ensinar a Escrever. Disponível em: h t t p : / / w w w .crmariocovas.sp.gov.b r /pd f / i de i a s_28_p059-075_c.pdf

leitura recomendada

ATIVIDADES

EADLetras Vernáculas

Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

136

Esta atividade deve ser enviada ao tutor, que deverá decidir pela necessidade

ou não de remetê-la para fórum de discussão.

Expus nesta aula, como contraponto à proposta construtivista dos

estágios de escrita, uma nova proposta de estágios baseada nos pressupostos da

linguística aplicada. Propus quatro grandes estágios do processo de construção da

escrita na criança: o estágio icônico, o estágio grafemático, o estágio fonográfico

e o estágio ortográfico, cada um dos quais possui, em seu interior, uma série

progressiva de fases. Defendi que, desde a sua gênese, a escrita é concebida pela

criança sempre correlacionada à fala, opondo-me veementemente às orientações

que defendem ser a escrita uma modalidade independente da fala. Mostrei que

a oralidade é fundamental para que a criança apreenda o sistema de escrita do

português, em virtude de a nossa escrita ser caracteristicamente fonográfica. Por

fim, finalizei mostrando a amplitude teórica e as possibilidades de aplicação ao

ensino da proposta aqui apresentada.

ABAURRE, M. B. M. Posfácio: A aquisição da escrita do português: considerações

sobre diferentes perspectivas de análise. In: ROJO, R. (Org.). Alfabetização e

letramento: perspectivas lingüísticas. Campinas: Mercado das Letras, 1998. p.

205-232.

CAGLIARI, Luis Carlos. A respeito de alguns fatos do ensino e da aprendizagem

da leitura e da escrita pelas crianças na alfabetização. In: ROJO, R. (Org.)

Alfabetização e letramento: perspectivas lingüísticas. Campinas: Mercado das

Letras, p. 61-86, 1998.

CARVALHO, W. J. de A. O desenvolvimento da consciência fonológica: da

sensibilidade à consciência plena das unidades fonológicas. 330 f. Tese (Doutorado

em Letras) – Instituto de Letras, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2003.

RESUMINDO

REFERÊNCIAS

Módulo 5 I Volume 3UESC

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MC NEILAGE, P. F. Prolegomena to a Theory of the Sound Pattern of the First

Spoken Language. Phonetica, Austin, v. 51, p. 184-194, 1994.

MOREIRA, Cláudia Martins. O estatuto da sílaba na aprendizagem da leitura:

comparando o percurso de crianças e adultos. 2009. 292 f. Tese (Doutorado) -

Instituto de Letras, Universidade Federal da Bahia, Salvador.

______. Os estágios de aprendizagem da escritura na criança: uma nova leitura

para um antigo tema. Linguagem em (Dis)curso. Unisul, v. 9, n. 2, p. 359-388,

mai/ago, 2009b..

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Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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Suas anotações

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3ª UNIDADE

A LEITURA

Ao final da aula, o aluno deverá estar apto para:

• conceituar leitura e distinguir os níveis de processamento leitor;

• diferenciar os processos ascendentes e descendentes em leitura e sua importância para a compreensão do processo de aprendizagem da leitura.

1seção

1 INTRODUÇÃO

No ato de interpretar está uma asserção, aquela que foi aceita pela própria

interpretação, isto é, que foi apresentada no que está diante de nós, na-

quilo que vimos antecipadamente e na possibilidade de concepção.

Ezequiel Teodoro da Silva (1987).

Por defender que leitura e escritura caracterizam-se como proces-sos distintos, optei por dedicar unidades separadas para cada uma dessas aprendizagens. Neste momento, estabelecerei as bases teóricas para a dis-cussão acerca da leitura. No primeiro momento, Conceituando a leitura, apresento a concepção de leitura que guia este trabalho. Depois, em Ní-veis de leitura, apresento cada nível progressivo do processamento leitor, partindo das unidades sublexicais (raramente exploradas pela literatura em virtude de os estudos focarem-se na leitura fluente) até as unidades globais, como o texto. Em Processamento ascendente e descendente em leitura, procuro mostrar os tipos de processamento e um pouco das suas consequências para a compreensão do texto. Já em Estratégias de leitura, procuro diferenciar as estratégias cognitivas e metacognitivas, e mostrar por que só se pode conceber a leitura como uma atividade estratégica, ne-cessitando, por isso, de instrução para que o leitor aprenda a tirar o máxi-mo proveito do texto.

Figura 30: LeituraFonte:http://gecko-wel.com/wp-content/uploads/2012/10/preschool-games-for-kids.jpg

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2 CONCEITUANDO A LEITURA

Um olhar superficial poderia definir a leitura como iniciada no con-tato entre o olho e um material escrito. Pensar assim é reduzi-la a um ato, um acontecimento com lugar e hora marcados. Num sentido gené-rico, ler é muito mais do que ato isolado. Na citação acima, Silva diz que a interpretação é resultado de uma concepção previamente aceita no ato de concepção da leitura. Já Kramer diz que tanto a leitura como a escrita (escritura?) não podem ser descritas como um evento, um acontecimento, uma vivência. Para ser considerada no sentido pleno na palavra, o ato de leitura precisa ser um ato de experiência. E assim ela define experiência:

Quando penso na leitura como experiência (na escola, na sala de aula ou fora delas), refiro-me a momentos nos quais fazemos comentários sobre livros ou revistas que lemos, trocando, negando, elogiando ou critican-do, contando mesmo. Enfim, situações nas quais – tal como uma viagem, uma aventura – fale-se de livros e de histórias, contos, poemas ou personagens, compar-tilhando sentimentos e reflexões, plantando no ouvinte a coisa narrada, criando um solo comum de interlocu-tores, uma comunidade, uma coletividade. O que faz da leitura uma experiência é entrar nessa corrente onde a leitura é partilhada e onde, tanto quem lê, quanto quem propiciou a leitura ao escrever, aprendem, crescem, são desafiados. (KRAMER, 2000).

Pensar a leitura nesses termos é vê-la como algo além do domínio da decodificação, além do domínio técnico da escrita. E, quando ensina-mos a leitura na escola, seja em que nível for, é esse grau de leitura descrito por Kramer e Silva que desejamos que nossos alunos atinjam. Entretanto, para chegar a este nível, é necessário que, no processo aquisicional, o su-jeito tenha superado todas as etapas progressivas da leitura (as quais serão descritas na próxima seção). Além disso, a leitura, para ser bem sucedida, precisa de que o processamento de unidades menores se dê dentro das melhores condições possíveis e pelo domínio de habilidades básicas que, se não tiverem sido bem trabalhadas no período de aquisição, poderão im-pedir o acesso do leitor a níveis mais altos de processamento, até atingir a leitura fluente, significativa, resultado da vivência letrada e motivadora de

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experiência tal qual descrita por Kramer. Dessa forma, para entender como a leitura se processa, devemos

compreender também suas funções mais básicas e seus aspectos fisioló-gicos, além dos apontados acima. Embora se possa dizer que a leitura, enquanto ato, ocorre a partir do contato do olho com o escrito, não po-demos esquecer o papel da memória nesse processamento, ou seja, dos diversos papéis desempenhados por ela. No interior das teorias de leitura, o termo memória é usado para fazer menção às diversas funções exercidas pelo cérebro durante o processamento do material escrito; é uma realida-de mental e não um órgão do cérebro. Assim, pode-se dizer que, grosso modo, possuímos dois tipos de memória: a Memória de Curto Termo (ou de Trabalho) e a Memória de Longo Termo; alguns estudiosos incluem ainda uma terceira, a Memória Intermediária (KLEIMAN, 1993). A pri-meira é responsável por guardar as informações percebidas imediatamente pelo olho. Em virtude da sua capacidade limitada (só é possível reter nela, por tempo limitado, até 7 unidades discretas, que podem ser letras, síla-bas, palavras ou sintagmas) o material guardado nesta memória precisa ser remetido logo para a outra memória senão perde-se a informação visual, e o processamento precisa recomeçar. Isto explica, em parte, os recomeços numa leitura desatenta. A Memória Intermediária tem a função de integrar as informações recebidas em unidades maiores com significado local, par-cial. Pelo fato de as unidades retidas nesta memória serem significativas, seu armazenamento envolve unidades formalmente mais longas e pode fi-car por um tempo maior, mas ainda precisa ser reintegrada em outro tipo de memória, visto que sua integração é apenas local. Ao passar para a Me-mória de Longo Termo é que a capacidade de armazenamento aumenta, ficando retidos nesta memória não elementos linguísticos (como ocorre nas duas memórias anteriores), e, sim, as informações significativas, a ex-periência, que se transforma em conhecimento de mundo.

Exposto assim nesta hierarquia, pode-se ter a ideia de que o proces-samento leitor se dê nesta ordem. Numa leitura fluente, certamente não. Todavia, numa leitura pouco fluente ou naquela realizada por leitores que se encontram na fase de aquisição, é bem provável que ocorra nestes níveis. Para entender a leitura fluente, é necessário compreender o fatiamento exercido pela memória de trabalho. De acordo com Smith (1989), a leitura

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não se dá da esquerda para a direita, como temos a impressão inicial. O que existe é um movimento sacádico. Kleiman descreve este movimento da seguinte maneira:

o leitor eficiente não lê palavra por palavra, seguindo, metaforica-mente, o seu dedo na linha. Pelo contrário, os olhos se fixam num lugar do texto (a fixação) para depois pular um trecho (a sacada), e fixar-se num outro ponto mais adiante(1993, p. 33).

A distância entre as fixações vai depender de alguns fatores interve-nientes na leitura feita, como a falta de familiaridade do leitor com o tema, a complexidade linguística do texto (por exemplo, frases muitos comple-xas para um leitor mais imaturo) entre outras. Para um leitor aprendiz certamente deverá haver um maior número de fixações, visto que, além da imaturidade, há o fato fundamental de que ele ainda não domina por com-pleto a escrita da sua língua; portanto ele se concentrará mais em unidades menores (como letras, sílabas ou palavras) do texto do que um leitor pro-ficiente. Deduz, portanto, que, para medirmos uma boa leitura, umas das variáveis analisadas será quantidade de fatiamento: quanto menos fixações, maiores a unidades fatiadas, por conseguinte, mais elementos significati-vos serão armazenados, gerando uma melhor compreensão do texto.

Quero ainda reiterar que essa exposição resumida dá conta de um dos aspectos da leitura: o processamento cognitivo. Mas a leitura é muito mais que isso, ela é também regulada pela metacognição e pelo conheci-mento de mundo. Para compreendermos o que seria esta metacognição, observe esta citação: “para ler não usamos apenas processos de significa-ção, mas também processos de controle da significação, cujos instrumen-tos podem ser, inclusive, externos ao próprio material escrito” (MOREI-RA, 1999). Ou seja, a metacognição refere-se ao controle da leitura pelo sujeito que lê, como retornos, revisões, correções, planejamento do tempo que deverá ser gasto com a leitura, anotações entre outros. A seguir, serão expostas as estratégias metacognitivas de leitura, o que ampliará melhor sua compreensão sobre este tema.

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Sintagma

Sintagmaéumsegmentolingüísticoqueexpressaumarelaçãodedepen-dência.Nessarelaçãodedependência,diz-sequeexisteumelementodeterminadoeoutrodeterminante(ousubordinado),estabelecendoumelodesubordi-naçãoentreambos.Cadaumdesseselementosconstituiumsintagma.Na concepção original de sintagma, essa noção era utilizada para se referir a qualquer segmento lingüístico: a palavra, a sentença e o período. Mais recentemente,otemosintagmaécomumenteempregadoparasereferiràspartes da sentença. Dessa forma, o sintagma se caracteriza conforme o tipo gramatical dos seus elementos nucleares:•sintagmanominal(SN):quandoonúcleodosintagmaéumnome•sintagmaadjetival(SAdj):quandoonúcleodosintagmaéumadjetivo•sintagmaverbal(SV):quandoonúcleodosintagmaéumverbo•sintagmapreposicional(SP):quandoonúcleodosintagmaéumaprepo-sição•sintagmaadverbial(SAdv):quandoonúcleodosintagmaéumadvérbioNumaanálisesintática,aidentificaçãodossintagmaseseustiposébastan-teimportante.Issofacilitaacompreensãodopapelsintáticoexercidopelaspalavrasnasentençaqueestáemanálise.Vejamosumexemplo:Todos silenciosamente acompanhavam a romaria pela cidade....[todos: SN]...[silenciosamente: SAdv]...[acompanhavam: SV]...[a romaria: SN]...[pela cidade: SP]Note que um sintagma pode ser formado por uma ou mais palavras. Por issobuscamospeloelementonúcleoeclassificamososintagmasegundoacategoriasintáticadestenúcleo(ex.:pelacidade:núcleo:pela=preposição[por+ela]).Alémdisso,numasentençapodeexistirmaisdeumsintagmadomesmotipo.Quandoissoocorreéprecisoverificarqualafunçãosintáticaqueossintagmasdesempenham.Nonossoexemplo, oSNapareceduasvezes:umadesempenhandoafunçãodesujeito(todos)eoutra,afunçãodeob-jetodireto(aromaria).

Fonte: http://www.interaula.com/portugues/sintagma.htm

3 NÍVEIS DE LEITURA

Quando mencionei anteriormente a atividade de fatiamento, e, juntamente com este conceito, abordei as unidades discretas armazenadas durante este fatiamento, pretendia mostrar que há vários níveis de pro-cessamento leitor. Esses níveis atuam durante uma leitura fluente tanto quanto atuam numa leitura iniciante. Doinon e Zagar (2006) defendem que não são só os leitores iniciantes que guardam na memória de trabalho unidades de primeiro nível (letras, sílabas), mas que os leitores fluentes também o fazem, entretanto, de forma mais automática e quase impercep-tível. Acrescento que este fatiamento é também mais percebido no leitor

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iniciante porque eles realizam os fatiamentos oralmente, en-quanto o leitor fluente o faz apenas mentalmente.

Assim, podem-se dividir os níveis de processamento (ou unidades de armazenamento) da seguinte maneira:

a) Unidades de primeiro nível (unidades suble-xicais): consistem nas unidades que não possuem significa-ção. Acredito que, numa leitura fluente, seu processamento é tão rápido que não chega a armazenar-se na memória de trabalho, armazenando-se ali unidades significativas como palavras e locuções. Entretanto, numa leitura iniciante, são essas as unidades que se armazenam na memória de trabalho para serem integradas mais adiante, na memória intermedi-ária. Por isso é que textos muito longos ou com períodos muito complexos comprometem a leitura compreensiva do leitor iniciante. É claro que há leitores iniciantes – que se encontram num nível evolutivo mais avançado, como des-creverei na próxima seção – que já guardam unidades de segundo nível nesta memória; por isso não podemos gene-ralizar esta colocação, mas é preciso identificá-la para não

Figura 31: Leitora iniciante oralizandoFonte:http://apluschildrensbooks.com/wp-content/uploads/2011/12/bookforchildren.jpg

Doravante estarei usando sempre esses termos e seus corre-latos (leitor fluente/leitor iniciante) paradiferenciar a leitura re-alizadapelosujeitoquejádominaocódigodalíngua, já ultrapassouo estágio da alfabeti-zação (leitor fluente)da leitura realizada por aquele que ainda está em processo de aqui-sição da escrita, que se encontra ainda na fase de alfabetização(leitor iniciante), ca-racterizando esta lei-tura não apenas como uma leitura que en-volve a compreensão do material escrito, mas também envolvea aprendizagem sobreo sistema de escrita na qualotexto foielabo-rado.

Leitura fluente / leitura iniciante

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esperarmos de leitores alfabetizandos uma leitura tal qual a leitura adulta.b) Unidades de segundo nível: dizem respeito às menores uni-

dades significativas do texto, a palavra. Numa leitura fluente, são essas as unidades que se guardam na memória de trabalho para serem integradas na memória intermediária em forma de sintagmas ou frases, possibilitan-do a compreensão local. No leitor iniciante, especialmente aqueles que se encontram na fase de decodificação, essas unidades de segundo nível vão ocorrer na memória intermediária, através do processo de integração, ge-rando uma compreensão local lexical ou sintagmática. Para compensar este atraso em relação ao leitor fluente, a criança leva mais tempo manipulando esta memória para poder atingir a compreensão local. Se o texto for muito complexo, ela se fixará nesta memória, limitando-se à compreensão local e sua leitura será, portanto, comprometida em termos de compreensão global. Daí porque, muitas vezes, ela demonstra ter entendido trechos do texto, mas, se você pedir para ela falar sobre o que leu, ao invés de resumir globalmente focando no tema central, irá dar informações soltas sobre o que leu.

c) Unidades de terceiro nível: definidas como as unidades que trazem informações globais completas, podem ter como unidade estrutu-ral as frases, períodos ou parágrafos (nos textos que possuem este recurso), nos textos narrativos, alguns autores descrevem que o que é guardado na memória são os esquemas que formam a narração (por exemplo, apresen-tação, complicação, clímax e desfecho). Numa leitura fluente, essas uni-dades processam-se na memória intermediária e registram partes do texto para serem integrados globalmente na memória de longo termo, levando à compreensão global. Numa leitura iniciante, como já sinalizei, aqui se situa a complexidade da sua leitura, pois, não tendo ainda assimilado o conhecimento linguístico sobre as unidades como parágrafos e esquemas narrativos, o texto dirigido a elas precisa ser curto, com períodos simples e esquemas também simples para que ela possa ser capaz de integrar estas unidades e chegar à compreensão global do texto. Se o texto for complexo demais, seu processamento estaciona neste nível e ela só atinge a compre-ensão local, quando o atinge.

d) Unidades de quarto nível: referem-se às unidades de senti-do, não podendo ser mais descritas em termos de elementos estruturais.

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Chega-se ao terceiro nível quando o leitor consegue compreender o texto como um todo, integrando-lhe as partes a ponto de torná-la única em sig-nificado. Isso lhe permite dizer, de uma maneira genérica, sobre o que o texto fala, captando-lhe a ideia central, o que é essencial neste texto. Atin-gir este nível permite ao leitor transformar o texto em conhecimento de mundo, interpretá-lo e fazer dessa leitura resultado e motivação para sua experiência, nos moldes definidos por Kramer (Op. Cit, 2000).

4 PROCESSAMENTO ASCENDENTE E DESCENDENTE EM LEITURA

Para que uma leitura se realize, é preciso estar em constante ativa-ção e interação, as informações visuais e informações não visuais. Quando uma leitura é realizada, tendo como base primordialmente a informação visual, ou seja, quando o leitor se concentra nos dados fornecidos pelo texto (sejam linguísticos ou simples informações significativas), define-se essa leitura como ascendente. Quando o leitor se concentra na informação não visual, isto é, no seu conhecimento de mundo, nas informações que ela já traz para o texto, afirma-se que esta leitura é descendente. Costuma-se, na literatura sobre leitura, usar o termo bottom up para referir-se ao pri-meiro tipo de leitura e top down para referir-se ao segundo tipo. Uma lei-tura extremamente ascendente pode impedir a compreensão; por exemplo, se uma pessoa lê palavra por palavra num texto, e, com muita frequência, para e pesquisa cada palavra nova que encontra, isto impede a compreen-são global (creio que a exposição feita acima lhe fará deduzir porque esta leitura é mal sucedida). Por outro lado, é também mal sucedida a leitura extremamente ascendente: quem não conhece uma situação em que duas ou mais pessoas leem o mesmo texto e uma delas deu um sentido total-mente fora do contexto tratado ali; interpretando muito mais seu próprio ponto de vista sobre o assunto do que a abordagem feita por aquele texto lido. Essa pessoa concentrou-se tanto na informação não visual que ficou impossibilitada de interagir com o texto e produzir sentido. Disso con-clui-se que uma boa leitura implica um equilíbrio entre informação visual e informação não visual. O tipo de leitura ideal não é o ascendente nem o descendente, é o tipo interativo.

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Essas diferentes maneiras de leitura (ascendente e descendente) explicam bem as duas maneiras, ou duas vias de acesso, de o leitor ler a palavra durante o processamento leitor:

algumas teorias defendem que tudo aquilo que é proces-sado pelo leitor fluente passa pela via fonológica, ou seja, o leitor deve estabelecer a relação grafema-fonema dos elementos lidos para, a partir daí, ter acesso à palavra. A hipótese entretanto mais aceita é de que existe uma “rota dupla”, ou seja, há situações em que o leitor ne-cessita fazer uso da recodificação fonológica para com-preender a palavra; enquanto, na maioria das situações, a palavra é acessada instantaneamente pelo leitor fluente, sem que seja necessário recorrer ao estabelecimento da relação grafema-fonema na leitura. Quando o leitor lê instantaneamente, diz-se que ele fez uso da via lexical; já quando ele lê através da recodificação, ele faz uso da via fonológica. (MOREIRA, 1999, p. 51).

5 ESTRATÉGIAS DE LEITURA

Tudo que realizamos em termos de aprendizagem e conhecimento, uma vez que seja uma atividade cognitiva, fazemos através do uso de al-guma estratégia. A estratégia que usamos pode ser inconsciente, ou seja, usamos sem nos dar conta e, por isso, muitas vezes, quando alguém per-gunta sobre como conseguimos fazer aquilo, não sabemos explicar. Mas há também as estratégias conscientes, ou seja, optamos por fazer aquilo, fazemos daquela maneira visando atingir um objetivo. O mesmo ocorre com a leitura. As estratégias inconscientes são denominadas cognitivas, quanto às conscientes, denominam-se metacognitivas.

As principais estratégias cognitivas de leitura podem ser assim de-nominadas e caracterizadas (GOODMAN, 1994):

a) iniciação ou reconhecimento da tarefa: leitura exige decisão, e a estratégia de iniciação consiste na decisão de iniciar a leitura, quando, inconscientemente, o leitor ativa seus esquemas adequados à leitura da-quele tipo texto;

b) seleção: disposição para concentrar-se nos aspectos centrais do texto;

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c) inferência: é nesta estratégia que se concentra a contribui-ção do leitor ao texto, deduzindo as informações que não estão presentes ali no texto, as informações não visuais. Quanto mais o leitor souber lan-çar mão do seu conhecimento prévio sobre o assunto, mais habilitado ele estará para fazer inferências;

d) predição: capacidade de prever, antecipar o que virá nas próximas linhas. Uma boa predição é sinal de que o leitor está atento ao texto. Quanto mais o leitor puder prever o que virá, relacionando-o com as informações antes processadas, mais ele se sente seguro na sua interpre-tação. Entretanto se o texto for muito previsível, o leitor poderá perder o interesse pela leitura;

e) finalização: é o momento que o leitor conclui a leitura feita. “Os leitores [por motivos diversos] podem finalizar a qualquer momento em qualquer lugar” (GOODMAN, 1994, 1123). Algumas vezes, o leitor finaliza a leitura sem mesmo ter concluído seu processamento por já ter entendido o suficiente para o que ele pretendia. Isto acontece especial-mente quando a leitura ocorre pela busca de uma informação específica, mas há leitores que só finalizam depois que processam todo o texto.

As estratégias metacognitivas referem-se aos mecanismos cons-cientes, que podem ser controlados pelo leitor no momento da leitura. Sua função é planejadora e avaliadora. Alguns exemplos de estratégias meta-cognitivas, segundo Kato (1985, p. 107-108):

a) explicitação dos objetivos da leitura; b) alocamento de atenção para as partes mais importantes do texto; c) monitoração da compreensão; d) revisão e autoindagação para ver se a compreensão está sendo

atingida; e) correção, quando necessária; f) recobramento de atenção quando há distração.

Acrescento ainda: a) confirmação ou desconfirmação: habilidade de retornar ao que

foi lido para atestar se a inferência feita está condizente com o esperado

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ou não; b) correção: após retornar ao elemento lido, se o lei-

tor se der conta de que utilizou uma estratégia inadequada, ele poderá reconstruir o que foi lido.

Leia e resuma o texto que segue:

CAMPOS, G. P. C. O processo de leitura: da deco-dificação à interação. Disponível em:

http://www.faculdadeobjetivo.com.br/arquivos/OProcessoDeLeitura.pdf

Como já adverti em momento anterior, os proces-sos de escritura e leitura, embora relacionados, tratam-se de diferentes modalidades, por isso optei por falar inicialmen-te do processo evolutivo da escritura para agora começar a exposição do processo evolutivo da leitura na criança. Para tal, pretendi, neste momento, retomar o conceito de leitura sobre o qual me baseio para as defesas que aqui faço, bem como explicar resumidamente como a leitura se proces-sa procurando, na medida do possível, comparar a leitura fluente com a leitura iniciante. Por fim, expliquei o caráter estratégico que guia a leitura, demonstrando que, tal quais outros processos de construção do conhecimento, a leitu-ra é uma atividade estratégica. Ela não ocorre de maneira indiscriminada e desestruturada, e a compreensão não é re-sultado de uma osmose. Daí por que defendo que a leitura pode e deve ser ensinada na escola, especialmente nas séries iniciais. Mas este é um tópico para a próxima aula

FULGÊNCIO, L. e LIBERATO, Y. A leiturana escola. S. Paulo: Contexto,1996.

leitura recomendada

ATIVIDADES

RESUMINDO

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DOIGNON, N. ZAGAR, D. Les enfants en cours d´apprentissage de la lecture perçoivent-ils la syllable à l´écrit? Canadian Journal of Experi-mental Psychology, Canada, v. 60, n. 4, p. 258-274, dec. 2006.

GOODMAN, J. K Reading, Writing, and Written Texts: A Transactional Sociopsycholinguistic View. In: RUDELL, R. B., RUDELL, M. R., SIN-GER, H. (Ed.) Theorical Models and Process of Reading. 4 ed. Delawa-re: International Reading Association (IRA), 1994. p. 1093-1130.

KATO, M. O aprendizado da leitura. São Paulo: Martins Fontes, 1985.

KRAMER, Sonia. Leitura e escrita como experiência: seu lugar na forma-ção de sujeitos sociais. Presença Pedagógica, v.6, n.31, jan./fev. 2000.

MOREIRA, C. M. O uso de estratégias de leitura na fase inicial de aprendizagem da lectoescritura. 189 f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Centro de Pós-Graduação em Letras, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1999.

REFERÊNCIAS

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Suas anotações

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A APRENDIZAGEM DA LEITURA PELA CRIANÇA

Ao final da aula, o aluno deverá estar apto para:

• conhecer os modelos de aquisição da leitura;• compreender e diferenciar os estágios de aquisição da

leitura;• identificar as estratégias de aquisição da leitura

diferenciando-as das estratégias de leitura fluente.

2seção

1 INTRODUÇÃO

Pretendo, nesta aula, abordar a leitura iniciante, mostrando suas características e como ela se desenvolve. No primeiro momento, intitulado Modelos de aquisição da leitura, apresento, de forma resumida, o debate fundamental entre os dois modelos que buscam explicar a leitura infantil e apontar a orientação mais adequada para proporcionar o desenvolvimento da habilidade de leitura nas crianças. Trata-se do modelo da linguagem integral e do modelo de orientação fônica. Em seguida, no tópico Estratégias de aquisição da leitura, abordo as estratégias de leitura utilizadas pelos leitores iniciantes e mostro que suas estratégias têm dupla função: entender o material lido e aprender a ler em português escrito. No momento posterior, apresento um modelo próprio de estágios de aquisição da leitura, esta parte denominando-se Estágios de aprendizagem da leitura. A partir dessas ideias, defendo que a leitura iniciante tem status próprio, características únicas e funções específicas, não podendo ser comparada à leitura fluente; por extensão, não se pode admitir que sua abordagem pedagógica seja igual a dos leitores fluentes, ou seja, deixando que a criança aprenda sozinha e sem instrução formal.

Figura 32: Aprendendo a lerFonte:http://homeschooltherevolution.files.wordpress.com/2011/12/1996-11-books.jpg

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2 MODELOS DE AQUISIÇÃO DA LEITURA

O processo inicial de aprendizagem da leitura não é um tema muito explorado no Brasil. O que se costuma observar são trabalhos sobre processos gerais de aquisição da escrita, envolvendo processo de leitura e de escritura indiferenciadamente. O resultado é que se sabe muito sobre a evolução da escrita infantil, mas muito pouco sobre a maneira como a criança processa um texto nesta fase inicial.

Diferentemente desse perfil, nos Estados Unidos, os estudos psicolinguísticos acerca do processo inicial de aprendizagem da leitura vêm gerando, há décadas, debates acirrados entre dois modelos básicos: o modelo da linguagem integral, denominado como whole language, e o modelo de orientação fonológica, denominado phonics. Em linhas gerais, é possível dizer, grosso modo, que é este um debate semelhante àquele que subjaz às discussões que voltaram à tona no Brasil sobre métodos de alfabetização: a oposição entre os defensores do método analítico e os defensores do método sintético.

O principal representante do primeiro modelo é Goodman (1994). Ele defende, baseado em dados da estrutura linguística do inglês escrito e sua relação com a língua falada (onde as estruturas silábicas são muito irregulares, e observa-se, por exemplo, que muitos falantes não sabem definir bem onde começa e termina uma sílaba), que, na aprendizagem da leitura, é mais adequado e produtivo estimular a criança a ler uma palavra globalmente, sem escandi-la.

Tomando como base a ciência humanista de Dewey e as descobertas de Piaget, além da concepção social de linguagem de Vygotsky, ele propõe que a criança aprenda a ler de maneira natural, e opõe-se a toda instrução em leitura, por acreditar no poder inato da linguagem de desenvolver-se sem instrução explícita e sem acompanhamento e ensino. Dessa forma, para esse autor, a linguagem é um todo indivisível e não pode ser aprendida em partes, mas holisticamente. Daí o uso do termo linguagem integral. A partir dessa visão, conceber a leitura como composta de níveis progressivos é considerado um erro pelo autor, por isso, segundo este modelo, para aprender a ler basta a criança estar exposta a textos diversos. Assim, este modelo opõe-se a toda instrução que vise relacionar os grafemas e fonemas

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na aprendizagem da leitura. A respeito das orientações fonológicas, Goodman afirma:

há uma abundante pesquisa para mostrar que a instrução direta nas relações grafofônicas não é necessária nem de-sejável para produzir leitores (...) Atualmente os pesqui-

Kenneth Goodman

Figura 33: Kenneth GoodmanFonte:http://www.substancenews.net/assets/images/62273546.jpg?3e3ea140

KennethGoodmanéProfessorEméritodaLeituraLínguaeCultura,daUni-versidadedeArizona.Depoisdepublicarumlivroinfluentesobreoassunto,Goodman começou a criar um modelo de psicolingüística e sociolingüística deleitura inspiradanaobradeNoamChomsky.Goodmandecidiuqueoprocesso de leitura era similar ao processo de aprendizagem de uma língua comoconceituadoporChomsky,equeaalfabetizaçãodesenvolvidanatu-ralmentecomoconsequênciadeexperiênciascomimpressão,assimcomoacapacidade de a linguagem se desenvolveu naturalmente como consequên-ciadeexperiênciascomalinguagem.Goodmanconcluiuqueastentativasparaensinaràscriançasregrasdedecodificaçãodepalavraseraminade-quadasenãoprobabilidadesdesucesso.Depoisdedesenvolverepesquisaromodelodelinguagemcomoumtodo,GoodmanapresentouseutrabalhoparaaAmericanEducationalResearchAssociation(AERA)conferênciasepublicouumartigonoJornaldoespecialistaemleitura,naqualeleescreveuquealeituraéum“psicolingüísticajogodeadivinhação”.EleseaposentoudaUniversidadedoArizona,emagostode1998.Goodmanéumafiguracontroversa na comunidade educativa. Ele atuou em várias capacidades importantes, incluindo como Presidente da Associação Internacional de Lei-tura , o presidente da Conferência Nacional de Pesquisa em Linguagem e Alfabetização,ePresidentedoCentrodeExpansãodaLinguagemePen-samento.EletambémtrabalhouextensivamentecomoConselhoNacionaldeProfessoresdeInglês.Elerecebeuváriosprêmios,incluindooprêmiodeJamesSquireNCTEparacontribuiçõesparaaprofissãoeNCTE(2007).Goodmanpublicoumaisde150artigosecapítulosdelivros,bemcomoumasériedelivros.

Fonte:http://en.wikipedia.org/wiki/Ken_Goodman

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sadores estão evidenciando que as relações grafofônicas se desenvolvem consistentemente e proficuamente com os alunos escrevendo e lendo (tradução nossa). (1992, p. 1113).

Nessa perspectiva, defende-se que a aprendizagem deve se dar

naturalmente, construtivamente, sendo o professor um mero mediador da aprendizagem da criança. O professor não tem papel de ensinar, mas apenas de proporcionar situações ótimas para que a criança, sozinha, atinja a leitura convencional:

a criança aprende a linguagem à medida em que aprende através da linguagem e acerca da linguagem, num contex-to de autênticos fatos de fala e de lectoescrita. Não existe nenhuma sequência de habilidades no desenvolvimento da linguagem. Ensinar as crianças acerca da linguagem não facilita seu uso; a noção acerca de que “primeiro de aprende a ler e depois se lê para aprender” é incorreta: ambas as coisas sucedem ao mesmo tempo e se apoiam mutuamente. (GOODMAN, 1992).

O segundo modelo, phonics, opõe-se radicalmente ao modelo anterior. Defende que, numa língua escrita cuja base é o alfabeto (o que seria o caso da maioria das línguas ocidentais, entre elas, o português), não há justificativa plausível para não ensinar as crianças a adquirir a escrita com base nesse conhecimento. Dessa forma, acredita-se que a aquisição da leitura pela criança obedece a níveis que iniciam com a decodificação - tradução das letras em sons - e vão se ampliando até que a criança seja capaz de ler com compreensão e fluência. Um dos estudiosos que forneceu bases para essa defesa foi Walter Kintsch (1994), ao defender o papel das unidades linguísticas menores sobre o processamento leitor. Samuels é outro estudioso que fornece elementos para a defesa do ensino baseado nos níveis progressivos, com base na sua Teoria da Automaticidade. Segundo ele, no início do processo da leitura, a criança não é capaz de dividir sua atenção entre decodificar os símbolos gráficos e entender. Por isso, primeiro ela concentra sua atenção em decodificar sem compreensão, depois, ela aprende a fazer as duas coisas alternadamente, até que, com o contato frequente com os objetos escritos, ela passa a decodificar

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automaticamente, emergindo uma leitura compreensiva. A partir daí, sua leitura ganha fluência e expressividade.

A defesa da importância do conhecimento do caráter fonográfico da escrita, para que a criança aprenda a ler, une muitos estudiosos. Daí surgem muitos estudos que demonstram o papel da língua falada nesse processo de aquisição. Ao assumir a importância das relações grafofônicas para a aprendizagem da língua, e, consequentemente, o papel da língua falada no processo de aquisição, afirma-se mais do que isso: defende-se que uma boa percepção e diferenciação entre os sons da língua falada desempenha

Walter Kintsch

Figura34:WalterKintschFonte:http://www.substancenews.net/assets/images/62273546.jpg?3e3ea140

WalterKintschéProfessorEméritodePsicologiaeNeurociênciadaUniver-sidade de Colorado em Boulder. Aposentou-se de ser diretor do Instituto de Ciência Cognitiva, em 2004. Kintsch chegou ao Colorado em 1968, depois dereceberumdoutoradoempsicologiapelaUniversidadedeKansasecom-promissos do corpo docente da Universidade de Missouri e da Universidade daCalifórniaemRiverside.Seufocodepesquisafoioestudodecomoaspessoasentendemalinguagem,usandoambososmétodosexperimentaisetécnicasdemodelagemcomputacional.Emcooperaçãocomolingüistaho-landêsTeunvanDijk,eleformulouateoriaprimeiroprocessopsicológicodecompreensãododiscursoem1978.Em1988,estetrabalhofoireformuladacomoumprocessoderestriçãosatisfação.Seulivrode1998“Compreen-são”,resumeotrabalhoempíricoeteóricodosúltimosanos.KintschrecebeuoprêmioDistinguishedContribuiçãoCientíficadaAssociaçãoAmericanadePsicologiaem1992.ElerecebeuumdoutoradohonoráriodaUniversidadeHumboldtdeBerlim,em2001.ElefoiPresidentedosConselhosDiretoresdaSociedadedeCiênciaCognitivaedaSociedadePsychonomic,ePresiden-tedaDivisão3daAmericanPsychologicalAssociation.

Fonte:http://psych.colorado.edu/wkintsch

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um papel essencial na aprendizagem da leitura. Essa percepção denomina-se “consciência fonológica”. Beck e Juel assim definem a consciência fonológica:

Mesmo que as crianças saibam que as palavras são com-postas de letras, elas precisam ser capazes de projetar, ou traduzir, as letras impressas em sons. Para fazer isso, as crianças primeiro precisam ser capazes de ‘ouvir’ os sons nas palavras faladas - ou seja, ouvir o /at / em cat e fat, por exemplo, e perceber que as diferenças entre as duas palavras reside no primeiro som (...) Se as crianças não forem capazes de perceber esses segmentos sonoros, elas encontrarão dificuldade quando tentarem se dirigir pe-los sons das palavras, tanto na leitura como na escritura. (tradução nossa). (1992, p. 108).

Radicalmente diferente da concepção do modelo anterior, como seria de se esperar, as orientações pedagógicas, dentro dessa orientação, também são totalmente diferentes. Para esses estudiosos, a intervenção do professor nesse processo é fundamental, tanto para entender as necessidades da criança e buscar supri-las, como porque, tratando-se de algo convencional, a leitura só pode ser aprendida se for ensinada por aquele que já conhece esta natureza convencional da escrita e já domina a leitura de maneira fluente.

3 ESTRATÉGIAS DE AQUISIÇÃO DA LEITURA

Para entender o percurso evolutivo da leitura infantil, serão expostas aqui as estratégias usadas pelas crianças em fase de aquisição, que podem ser interpretadas (em certa medida e sem se afirmar categoricamente como níveis progressivos) como uma forma de entender como criança brasileira, em fase de alfabetização, evolui do uso de estratégias mais comprometidas com a decodificação, passando pelas estratégias de integração e de automatização, até atingir a leitura compreensiva e fluente.

Essas estratégias foram categorizadas inicialmente na minha dissertação de mestrado (MOREIRA, 1999), com base nos dados de crianças oriundas de escolas públicas e privadas da cidade de Itabuna; depois foram confirmadas e ampliadas a partir dos dados da tese de doutorado

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(MOREIRA, 2009). Por fim, mais recentemente, foram descritas com mais detalhes em forma de livro (MOREIRA, no prelo), a ser publicado pela EDUNEB em 2012.

Aqui, faremos uma consideração breve sobre essas estratégias (mais detalhes podem ser obtidos no livro mencionado). As estratégias foram reunidas em tipos, ou seja, divididas em quatro grandes grupos, quais sejam: a) Pseudoleitura; b) Decifração; c) Leitura Integrativa; d) Leitura Contínua; e) Leitura Expressiva.

a) Pseudoleitura - quem não vivenciou crianças muito pequenas, com livros na mão, fingindo estar lendo uma história? Pois este é o primeiro tipo de estratégia (ou a primeira fase de leitura?) usada no início do processo de aquisição. Mas percebe-se que existem várias estratégias diferentes dentro deste mesmo tipo, as quais são denominadas de estratégias de adivinhação. Essas invenções, ou tentativas de adivinhação, podem ocorrer no nível da palavra, do sintagma ou da frase, ou seja, a criança pode fixar-se numa palavra e tentar ler pela adivinhação sem nenhuma pista contextual. Há também adivinhações que pressupõem certo grau de previsão, que tem sua base em algum elemento textual e contextual. Também se observam situações em que, auxiliada pelo desenho e guiada pelo primeiro som do nome dado ao desenho, a criança, a partir da primeira letra, adivinha a palavra certa. Nesse caso, já começa emergir, discretamente, a fase da decifração.

b) Decifração - toda decifração tem por base a relação grafema/fonema, independente do tipo de estratégia que se use. Por isso, acredito que, quando usa a decifração, e não a adivinhação, nas suas tentativas de leitura, a criança demonstra que já evoluiu no percurso da sua aprendizagem da leitura. São de dois tipos: segmentação de letras e segmentação de sílabas. Enquanto a primeira pressupõe uma ausência total de compreensão na leitura, a segunda pode levar à compreensão, naquele sentido defendido por Samuels, de que a criança primeiro decodifica, depois, compreende o que leu.

Muitos trabalhos falam sobre a decifração em leitura, mas poucos diferenciam os tipos de decifração e demonstram o quanto a decifração em níveis diferentes (letras, sílabas, sintagmas) geram consequências diferentes para a leitura, como mostro no meu trabalho. Assim, enquanto

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a decifração no nível da letra impede a compreensão, servindo apenas como exercício de reconhecimento de letras, a decifração no nível da sílaba tem muitas chances de levar o leitor à compreensão local.

c) Leitura Integrativa - o papel da integração em leitura já foi bastante abordado por Kintsch (1994), que destaca essa estratégia como fundamental para a compreensão de partes de texto, para que, depois se chegue à leitura global. Neste trabalho, utilizo o termo integração para fazer menção a uma estratégia essencial à criança, pois consiste na recuperação das unidades menores, contidas na memória de trabalho, integrando essas unidades num todo significativo, podendo, assim, chegar até ao nível da compreensão local propositiva (não se trata apenas de entender o sentido de uma palavra, mas de assimilar uma informação local, através da integração de sintagmas e proposições).

Kinstch, no seu modelo de construção-integração (1994), que trata da leitura fluente, afirma que as integrações se processam online, ou seja, no momento imediato da leitura, para o processamento lexical e sublexical, enquanto o processamento supralexical ocorreria ao final das sentenças ou proposições. No caso das crianças em fase inicial, o processamento da integração sublexical e lexical também podem ocorrer de forma retardada, isto é, não seriam online. Isso pode mostrar que as restrições do leitor também agem como uma importante variável no processo de integração. Também esse tipo de leitura possui várias estratégias: quando a integração ocorre com partes menores que as palavras, chamo de integração parcial, quando se dá no nível da palavra, integração lexical; ocorrendo em níveis acima da palavra (como nos sintagmas ou frases/proposições), denomina-se supralexical.

d) Leitura Contínua - define a leitura ininterrupta, contínua, sem segmentação de letras ou sílabas. Podem ocorrer no nível da palavra, denominando-se leitura contínua lexical, no nível do sintagma (leitura contínua sintagmática) e no nível da frase (leitura contínua frasal). Considera-se este tipo de leitura como mais avançado do que os anteriores, porque a ausência de decifração possibilita a retenção de unidades maiores na memória intermediária, levando mais eficazmente à compreensão. Porém, ainda não se observa, na leitura oral, uma prosódia fluente, e sim uma leitura mais linear, sem prosódia, lida num único ritmo

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e sem entonação. Quando a leitura ganha fluência, digo que ela é de tipo expressiva.

e) Leitura Expressiva - quando a criança, além de adquirir a capacidade de ler ininterruptamente e continuamente um texto, já procura dar contornos prosódicos a sua leitura, expressando ênfases, exclamações, entonações melódicas (tudo isso certamente auxiliado pela aprendizagem da pontuação, da acentuação, do uso dos parágrafos e travessões entre outros) digo que ela realiza uma leitura expressiva. Pode o leitor pensar que isto não seria considerado uma estratégia (visto que estratégia pressupõe o uso de um caminho para atingir um fim) e sim o resultado da leitura. Mas queremos ressaltar que a leitura prosódica pode ser, sim, interpretada como um meio, um caminho para atingir a leitura compreensiva, tal como defende Cagliari:

Mesmo quando uma pessoa vê o texto escrito, para en-tendê-lo necessita, obrigatoriamente, de decodificá-lo e processá-lo como se fosse dizê-lo espontaneamente. E somente assim consegue dispor de todos os elementos necessários para ler algo e entender (1992b, p. 44).

Quando se trata de leitor iniciante, isto é ainda mais evidente, visto que, enquanto o leitor fluente faz a leitura prosódica em silêncio, o iniciante a faz em voz alta. Além disso, como a leitura inicial é predominantemente decifrada, a estratégia prosódica funciona como um excelente recurso para, depois da decodificação, a criança recuperar o sentido do texto, como nos pareceu em muitos casos durante a coleta dos dados.

Essa exposição pode evidenciar que, pelas estratégias descritas aqui, a criança em fase de aprendizagem da leitura tem, sim, um comportamento leitor muito diferente do comportamento dos leitores fluentes, pois, ao mesmo tempo em que ela lê para entender o texto, ela lê para aprender a ler. Certamente este fato é suficiente para afirmar que é insensato querer tratar a instrução em leitura para crianças da mesma maneira como se trata a leitura fluente. Na verdade, muitas vezes, as estratégias consideradas ideais a um leitor fluente, se usadas por um leitor emergente, podem causar efeito contrário ao esperado. Dessa forma, defender que o aluno deva aprender a ler sozinho, naturalmente, sem instrução formal, pode até ter efeito positivo para alguns leitores fluentes, mas certamente é

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uma orientação completamente inadequada quando de trata de leitores iniciantes, por todas as questões aqui apresentadas.

4 ESTÁGIOS DE APRENDIZAGEM DA LEITURA

Mais uma vez insisto na diferenciação entre processo de leitura e processo de escritura, pelos motivos já antes apresentados mas reafirmados na colocação que segue:

[...] os processos de leitura e de escritura, embora rela-cionados, constituem atividades diferenciadas, tanto do ponto de vista cognitivo como fisiológico: ler exige uma atividade cognitiva muito mais mecânica e menos con-trolada do que escrever; bem como a escritura lança mão de aparatos fisiomotores diferentes do que se exige na atividade de leitura. Por outro lado, sabe-se que, onto-geneticamente, a habilidade de leitura é dominada antes da habilidade de escritura [...]. Outro fator que me faz defender esta posição são os dados disponíveis nas pes-quisas desenvolvidas tanto em dissertação de Mestrado (MOREIRA, 1999) como naqueles disponíveis na tese de Doutorado (MOREIRA, 2009), em que se observam dois caminhos no percurso da construção da escrita in-fantil: o da leitura e o da escritura; às vezes andando lado a lado, às vezes corroborando um ao outro; outras vezes, contradizendo-se. Conflito que tem, como resultado, a própria evolução da apropriação do sistema de escrita da língua materna pelas crianças. (MOREIRA, 2010, p. 1-2).

Abordarei aqui, semelhante ao que fiz em aulas anteriores sobre o processo de escritura, as etapas que acredito caracterizarem o percurso da criança pela leitura, demonstrando qual a contribuição que um estudo de base psicolinguista pode trazer para essa discussão.

Assim, podemos dividir as fases da escrita da seguinte forma:1) Pseudoleitura: ocorre quando, ao se dar conta de que a

escrita representa algo para além dela mesma, a criança passa a buscar sentido nos caracteres à sua disposição; assim, ela inventa histórias e nomes a partir de traçados indiferenciados – sejam letras ou imagens. Nesta fase, as pistas sobre as quais a criança se baseia são estritamente visuais. Esse

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comportamento é semelhante ao que Ehri apresenta acerca da leitura logográfica:

Os leitores logográficos são capazes de ler só poucas pa-lavras: seus nomes, palavras como ‘stop’ [pare], ‘milk’ [leite], ‘exit’ [saída]; rótulos de alimentos com nomes de cereais e bebidas; e nomes de lojas. Quando às crianças eram apresentadas listas de três palavras fáceis, aquelas recusavam-se a lê-las ou apenas adivinhavam (tradução nossa) (EHRI, 1991, p. 388).

Neste aspecto, é importante demonstrar que a pseudoleitura (leitura por adivinhação), segue gradativamente em direção a uma leitura auxiliada pelo som, como aponta Moreira (1999):

Entretanto, os usos que as crianças [não alfabetizadas] fazem da estratégia de adivinhação não são tão irregula-res quanto o que ocorre com as crianças que ainda não iniciaram o processo de alfabetização. Primeiro, porque, para utilizar a referida estratégia [adivinhação], a criança lança mão do conhecimento do contexto situacional, do conhecimento prévio do assunto e do tipo de texto [...]. Segundo, porque, nesta fase, a adivinhação já começa a ser auxiliada pela decodificação, e vice-versa, naqueles casos muito comuns [...] em que, a partir de inúmeras tentativas de recodificação da letra em som, a criança tenta criar uma palavra que tenha sons correspondentes aos das letras nomeadas (p. 118).

2) Transição entre o visual e o sonoro: depois de descobrir que a escrita não é pictoricamente motivada, como parecia ser a crença da criança naquele primeiro momento tanto da leitura quanto da escritura, ela passa a realizar as atividades de leitura e escritura separadamente. Na leitura, a criança passa a focar sua atenção na decifração das letras ou das sílabas. Algumas vezes, a estratégia usada é eficiente (quando se trata de palavra com estrutura canônica, ou seja, cada letra representa um som), outras vezes, o erro leva à revisão da sua hipótese. Essa representação é responsável pela elaboração de um mapa mental fonológico que permitirá à criança, mais tarde, ler através de uma rota de acesso fonológica (decodificação).

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3) Eclosão da relação entre grafema e fonema: neste momento, a leitura é necessariamente mediada pela decodificação, seja em nível silábico, seja em nível parcial (a palavra é lida parcialmente, para depois ser integrada num todo) seja num nível lexical (decompondo palavras mais complexas e lendo globalmente palavras mais simples); entretanto, isso não impede que haja compreensão. Nossa posição põe por terra as hipóteses que acreditam que, se o sujeito lê pela via da decodificação, implica que ele não seja capaz de entender o material lido. Não há nenhuma evidência para esta defesa: tanto é possível o sujeito ler automaticamente sem entender (no caso da memorização, que não é leitura) como é possível decodificar compreendendo.

4) Leitura fluente: nesta fase, tendo o sujeito superado o período de apropriação da relação entre fonema e grafema, e depois dos inúmeros eventos de leitura através da via fonológica (decodificação), muitas palavras vão gradativamente sendo lidas através da via lexical (sem decodificação explícita, ou seja, de forma automática). Isso permite uma economia de memória, visto que o sujeito não precisa mais guardar parcelas linguísticas na memória (sílabas, letras) para decodificar. A memória passa a ser usada para guardar parcelas maiores de sentido, permitindo uma compreensão mais global do texto e uma leitura mais fluente.

Faça uma pesquisa mais detalhada sobre os modelos whole language (linguagem integral) e phonics (instrução fônica). Em seguida, produza um texto crítico comparando estes dois modelos e colocando sua opinião a respeito desse debate. Sugere-se que este debate deva ocorrer de maneira presencial ou através de grupo de discussão online.

MOREIRA, Cláudia Martins. Níveis linguísticos na leitura inicial: um aquisição gradativa? Disponível em: http://www.inventario.ufba.br/05/pdf/cmoreira.pdf

leitura recomendada

Construção da escrita. Parte 5. Disponível em:http://www.youtube.com/watch?v=sW7-fPifdQY& feature=relmfu

video recomendado

ATIVIDADES

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Apresentei, nesta aula, alguns aspectos que envolvem a leitura iniciante em sua complexidade, apontando que a leitura pode ser interpretada como uma aquisição que se dá por níveis progressivos, tal qual a aquisição da escritura. Para fundamentar esse argumento, descrevi os tipos progressivos de estratégias de leitura obtidos em pesquisas que realizei com crianças de diferentes classes sociais. Após essa descrição das estratégias, e com base nela, elaborei uma proposição (ainda em estudo) dos estágios de escrita percorridos por crianças que aprendem língua portuguesa escrita. Tais descrições permitem-me defender que a leitura é algo que pode e deve ser ensinado através de instrução formal, desde que se respeitem as fases perseguidas por todas as crianças e de que sejam levadas em consideração as diferenças individuais nesse processo.

BECK, I. L., JUEL, C. The Role of Decoding in Learning to Read. In: SAMUELS, S. J., FARSTRUP, A. E. (Ed.). 2 Ed. What research has to say about reading instruction. Delaware: International Reading Association (IRA), 1992.

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EADLetras Vernáculas

Linguística IV: Linguística Aplicada à Alfabetização

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Suas anotações

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A LEITURA, A ESCRITURA E A ESCOLA

Ao final da aula, o aluno deverá estar apto para:

• compreender a diferença entre processos de leitura e processos de escritura;

• compreender o papel dos métodos de alfabetização no processo de aquisição da leitura e escritura.

3seção

1 INTRODUÇÃO

Em todos os desenhos

Coloridos vou estar

A casa, a montanha

Duas nuvens no céu

E um sol a sorrir no papel[...]

O que está escrito em mim

Comigo ficará guardado

Se lhe dá prazer

A vida segue sempre em frente

O que se há de fazer...

Só peço, à você

Um favor, se puder

Não me esqueça

Num canto qualquer...

O caderno, Toquinho.

Finalizando este trabalho, que procurou expor algumas contri-buições das pesquisas linguísticas, especialmente psicolinguísticas, para a compreensão do processo de aprendizagem da escrita pela criança, preten-do, neste momento, retomar as discussões anteriores sobre o processo de leitura e o processo de escritura, relacionando-as.

Na primeira parte, denominada Leitura e escritura: dois lados da mesma moeda?, levanto uma reflexão sobre a correlação entre habilidades de leitura e de escritura. Na segunda parte, A escola e o ensino das habi-lidades de leitura e escritura, apresento proposições efetivas ao professor para que ele possa intervir nesse processo inicial de uma maneira instruti-va, propondo diversas atividades de estimulação das habilidades de leitura e escritura adequadas a cada fase por que passa a criança, mas, por outro lado, estimulando a criatividade, a originalidade e o vínculo afetivo com a escrita, a companheira que acompanhará a criança por toda sua vida.

2 LEITURA E ESCRITURA: DOIS LADOS DA MESMA MOE-DA?

Foi minha opção, neste trabalho, tratar os processos de leitura e es-critura separadamente, para, nesta última aula, podermos retomar as ques-

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tões tratadas e discutir sobre esses dois processos. Essa opção não ocorreu ao acaso. Deveu-se principalmente a três fatores:

a) no caso de pessoas letradas, a leitura e a escritura são pro-cessos de difícil separação: sabemos que, ao escrever, lançamos mão dos conhecimentos adquiridos durante a leitura (vocabulário mais adequado, ordem lógica das ideias, informações obtidas, estrutura textual recomen-dada); por outro lado, ao ler, são os conhecimentos e as habilidades obtidas no processo de escritura que nos guiam durante a leitura, perseguindo os esquemas textuais, guiando-nos por aquilo que já conhecemos a respeito da estrutura do texto etc. Por isso, conceber os dois processos conjunta-mente é algo natural para um leitor adulto; assim, para que fosse possível a você, leitor adulto, entender as peculiaridades de cada da leitura e da escri-tura no processo inicial, foi necessário tratá-los inicialmente, em separado;

b) a leitura implica habilidade fisiológica muito diferente da escritura, por isso, diferenciar esses aspectos é importante para que se pos-sa dar a orientação mais adequada ao desenvolvimento das duas habilida-des;

c) por serem tradicionalmente tratadas conjuntamente, tanto em estudos sobre letramento e alfabetização, como na própria sala de aula, e por haver tão poucos trabalhos que abordem especificamente a leitura e o ensino na leitura enquanto habilidade cognitiva, é comum que a aquisi-ção do processamento em leitura seja tratada como algo natural, que não necessite de instrução formal. Por isso, diferenciar estas duas modalidades, me permite refutar esta concepção e propor, a partir das informações aqui fornecidas, intervenções adequadas às crianças em processo de aquisição da leitura, tal como foi feito na aula sobre escritura.

Dessa forma, à pergunta feita no título, respondo que acredito que a leitura e a escritura não são processos inseparáveis, não constituem dois lados da mesma moeda. Constituem diferentes modalidades de uso da es-crita.

A leitura e a escritura, inclusive, no processo ontogenético, podem ocorrer em ordens diferentes, com características diferentes, correlacio-nando-se em algumas fases, mas negando-se em outras. Está comprovado que, em geral, o sujeito avança mais em leitura – por ser esta uma atividade

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mais passiva, no sentido de que o sujeito não se expõe, não expõe suas dificuldades e deficiências ao outro quando lê, não precisa parar para es-colher a letra certa, a palavra certa, estruturar as partes do texto de forma consciente – e demora mais a avançar em escritura, quando se fala certa-mente da escritura produtiva, e não de uma mera cópia de letras e palavras. Por outro lado, é raro vermos, na sala de aula, alguém ensinando a criança a ler com compreensão, a usar as estratégias adequadas para entender o texto etc. Porque, como na fase inicial, esta habilidade se desenvolveu sem o controle do professor, ele acredita que todas as demais habilidades de leitura ocorram também naturalmente. Está aí um grande equívoco: pri-meiro, porque esse desenvolvimento não se deu naturalmente, foram as experiências com a escritura, controladas pelo professor, que desenvolve-ram a consciência fonológica necessária ao processamento inicial em leitu-ra, depois, porque as demais habilidades de compreensão só amadurecerão a contento se o professor intervir, orientando a criança no processamento e compreensão textual.

Por outro lado, temos que admitir que a leitura certamente provoca os conflitos produtivos na criança, ajudando-a a avançar na sua hipótese sobre a escrita. A escritura contribui para que a criança desenvolva cons-ciência fonológica, o que implica um avanço na leitura. A leitura amplia o vocabulário, ampliando também a capacidade expressiva na hora de es-crever. Ou seja, defender que escritura e leitura são processos distintos implica, mais do que em negar a relação entre as duas, garantir esta relação profícua e necessária no processo ontogenético, mas essa relação só será produtiva na medida em que a escola estimule o desenvolvimento das duas habilidades, cada uma com sua característica própria, e não tratá-las como se fossem uma coisa só.

3 A ESCOLA E O ENSINO DAS HABILIDADES DE LEITURA E ESCRITURA

Embora haja uma diversidade de métodos de alfabetização que já passaram pelo Brasil, com os diferenciados nomes, a grande discussão acerca dos métodos hoje em dia é a mesma que guiou os dois modelos de leitura discutidos na aula anterior: centra-se no debate entre uma orienta-

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ção voltada para relações grafofonológicas na leitura e na escritura e outra orientação voltada para o desenvolvimento de habilidades de leitura ins-tantânea, sem passar pela decifração, além da liberdade em que ela cons-trua, da sua maneira, suas hipóteses de escrita, sem intervenção. Também, há, no interior dessa discussão, uma questão de cunho filosófico: permitir que a criança construa seu conhecimento sobre a escrita individualmente ou acompanhar este processo orientando a criança durante seu percurso de aquisição da escrita?

Creio que o meu ponto de vista a esse respeito seja claro: defendo a instrução formal em leitura e escritura e acredito no papel do ensino das relações grafofonológicas para o desenvolvimento da leitura e escritura. Entretanto, também sou favorável a que se estimule o desenvolvimento de estratégias de leitura global, além de defender que se respeitem as diferen-ças individuais e que se estimule a criança a ser construtora do seu conhe-cimento. Paradoxal? Absolutamente. Apenas vejo essas duas orientações como complementares, não como divergentes.

Como vimos, a leitura ocorre de maneira gradual e progressiva, caracterizando-se por uma série de fases. Então, falar de leitor iniciante é falar de um sujeito em contínua descoberta, cujas fases podem passar de um nível a outro rapidamente ou demorar-se mais em alguns casos. Daí porque, em algumas fases, deve-se fazer maior intervenção; em outras,

Figura 35: Aprendendo a ensinarFonte:http://peregrinacultural.files.wordpress.com/2008/10/professora-com-

alunos-ilustracao-dos-anos-50.jpg

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deve-se deixar a criança mais livre. Acredito que, na fase de pseudoleitura, deve-se deixar a criança li-

vre às descobertas, experimentando muitos textos, de diferentes caracte-rísticas, com ilustração, sem ilustração, livros com diferentes formatos, diferentes texturas. É o momento de contar muitas histórias fantásticas e permitir que ela as reconte. É preciso criar uma relação amorosa entre a criança e a leitura, é preciso que, desde o início, a leitura seja para a criança uma experiência vital, não um exercício enfadonho. E insistir em que ela avance para a etapa seguinte pode provocar o rompimento dessa relação amorosa. Importante, como já disse, apontar para o lugar onde você está lendo, ensinar a escrita do seu nome de maneira significativa, que a escrita do nome seja a definição da sua identidade pessoal. Fazendo isso, de ma-neira sutil, o professor estará estimulando-a a mudar sua hipótese para a etapa seguinte: a transição entre o visual e o sonoro.

Na fase da transição entre o visual e o sonoro, uma vez que a crian-ça já não mais “lê” o desenho, e sua atenção volta-se para a decifração das letras (abandonando momentaneamente a busca do significado), é a hora de estimulá-la a conhecer melhor o alfabeto, os nomes das letras, a tentar identificar um nome a partir da primeira letra, da última letra, fazer brin-cadeiras nesse sentido e continuar contando muitas histórias para que ela não perca o interesse pelo significado textual.

Na fase de eclosão da relação grafema e fonema, sugiro que haja uma interferência mais sistemática do professor, garantindo o avanço da criança nas fases por que ela está passando; sem forçar a superação da fase, mas fornecendo à criança a orientação que ela precisa naquele momento:

a) para estimular a percepção da sílaba, e superar a fase de eclosão da relação grafema-fonema, trabalhar com rimas, repetições, trava-línguas, músicas curtas e ritmadas entre outros;

b) para ajudá-la avançar para a percepção da relação letra som, na leitura de palavras, trabalhar com cartões que individualizem as letras, fa-zer brincadeiras permutando letras, fazer jogos para percepção das dife-renças discretas entre as formas das letras, ler em voz alta e pausadamen-te palavras expostas na lousa, sempre de maneira significativa. Também é importante que o professor trabalhe com textos de leitura de todo o tipo, mas que dê possibilidades de a criança desenvolver a capacidade de guardar

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informações na memória de trabalho e integrar na memória intermediária; por isso, como sabemos que essa capacidade é limitada nessa fase inicial e deve ser desenvolvido com a experiência, o professor deve proporcionar situações de leitura de palavras isoladas (sempre de forma significativa, contextualizada, como ler listas de compras, pequenas poesias compostas só de palavras etc.);

c) depois do trabalho com palavras é hora de avançar para a leitura de textos curtos, com períodos simples, como parlendas, provérbios entre outros, assim o professor estará estimulando a criança a fazer integrações parciais (no nível dos sintagmas e frases) e, consequentemente, compre-ensão local. Todo professor sabe o quanto é importante para a criança conseguir, com autonomia, construir sentido sem precisar da tradução do professor. E isso só é possível, nesta fase, se o material de leitura tiver uma estrutura linguística ao alcance da sua capacidade de processamento e, consequentemente, de sua compreensão. Com textos cheios de períodos longos e complexos, ela só consegue atingir a compreensão com a ajuda do professor; e isso não é ler! O trabalho com listas de palavras também estimula a criança a ler continuamente; depois, os textos curtos (com uma a duas frases) aumentam esta capacidade, visto que, ao focar sua atenção na compreensão de um trecho (local), a criança começa a ler muitas palavras continuamente; entretanto, se ela só estiver sendo submetida a textos mais longos, com períodos complexos, a capacidade de processamento da crian-ça estará aquém do material, e ela, portanto, ficará focada na decodificação;

Para estimular o avanço para a fase da leitura fluente, é necessário, neste momento, o professor realizar muita leitura em voz alta de textos de gêneros diversos (para que a criança assimile as diferentes prosódias dos diferentes textos, o que, como já afirmei, ajuda no processo de compreen-são), também permitir que ela realize essas leituras, estimulando-a a fazer uma leitura com entonação, pausas, ritmo correto, ênfases etc.

Todavia, para que essa leitura tenha êxito, é necessário se ter sempre cuidado para que esse exercício não seja feito sob pressão, nem se torne enfadonho, ou seja, deve ser sempre colocado dentro de um contexto sig-nificativo (por exemplo, se vai ser feita uma competição, pedir que alguém leia as regras do jogo em voz alta; no início da manhã, solicitar que o aluno leia a agenda do dia; num momento conflituoso, requerer que alguém leia

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os “combinados” e daí por diante). Também é importante não ficar fazen-do observações corretivas enquanto a criança lê, pois, além de coibi-la, o professor estará impossibilitando o acompanhamento e a compreensão do texto pelo restante da turma. Devem-se deixar as observações para o final, ou para outro momento.

Todas essas situações acima são exemplos de leitura em voz alta. E a leitura silenciosa? Penso que este é o momento mais indicado para esti-mular também a leitura silenciosa (não que antes essa leitura fosse proibi-da, mas não deveria ser usada como técnica de intervenção). Agora que a criança já lê continuamente partes do texto e compreende, ler em silêncio, sem o controle oral, é bastante recomendável. Numa leitura fluente, ler em voz alta é um fator interveniente à leitura compreensiva, pois o ritmo da fala não acompanha o ritmo do pensamento, por isso, a leitura silenciosa proporciona essa capacidade de guardar blocos de informação cada vez maiores na memória, levando a uma leitura mais compreensiva. Uma vez que a memória de longo termo não está mais ocupada em guardar unidades linguísticas e, sim, unidades de sentido, essa leitura tem mais possibilida-des de levar à compreensão, à interpretação, tornando-se, para o leitor, uma experiência valorosa e significativa.

É nesta fase que, como eu afirmei em outra publicação (MOREI-RA, 2003), finalmente (depois deste longo período de inter-relação neces-sária entre oral e escrito), a leitura e a oralidade tornam-se modalidades di-ferentes, e a criança não necessita mais da oralidade para ler e compreender o texto. É a partir daqui que ela se torna um leitor fluente. Contudo, não esqueçamos de que haverá sempre momentos episódicos neste percurso, em que será necessário recorrer à leitura (reativando a rota fonológica e recuperando os elementos memorizados) para ler alguns trechos do texto que apresentam algum tipo de dificuldade. Mas isso é atitude que ocorre com todo leitor, seja ele adulto ou criança, fluente ou iniciante, mau leitor ou bom leitor.

No tocante às intervenções mais indicadas no sentido do desenvol-vimento das habilidades de escritura, posso destacar as seguintes suges-tões:

a) No estágio de escrita icônica, é importante estimular a criança a desenhar, deixar à sua disposição lápis de todas as cores, giz de

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cera etc, mas é também indicado que o adulto interaja com a criança em al-guns momentos, pedindo que ela socialize o que fez (fazendo-a despertar para a função social e interacional da escrita), ressignificando seu desenho. Na fase mais avançada (entre o icônico e grafemático), pedir que “traduza” os rabiscos. Alguns psicólogos também advertem que deixe a criança livre para desenhar e rabiscar; por isso, em casa, se o adulto não deseja ver suas paredes riscadas, deve deixar disponível sempre um espaço na parede (ou disponibilizar um grande mural em papel madeira) onde seja permitido ris-car à vontade. Não se deve reprimir este desejo de representação da criança nessa fase;

b) Como já afirmei em momento anterior, a escrita grafemáti-ca é a fase da descoberta do caráter simbólico da escrita, então, estimular a criança a diferenciar rótulos, logomarcas, diferentes ideogramas (lembro-me de uma mãe me dizer que estava feliz com a genialidade do filho de três anos e meio, que já sabia “ler” Coca-cola na logomarca da empresa) é bastante indicado. Neste momento, é possível que a criança também já seja capaz de reter na memória palavras inteiras, como se fizesse uma leitura global. Nessa fase, esse tipo de exercício é saudável, pois essa habilidade poderá ser solicitada mais a frente, quando tiver que memorizar escrita de palavras ortograficamente, quando nenhuma regra fonológica serve para a criança saber como escrever a palavra. Mas, uma vez mais, frisamos a importância da escrita do próprio nome e, depois, do nome de outras pes-soas. Ditados visuais na escola também são bastante indicados, pois esti-mulam a escrita da palavra (reforçando o caráter simbólico da escrita), sem necessariamente passar pela via fonológica. Comparar diferentes escritas de crianças para saber quais as hipóteses elas estão criando na construção do seu conceito de palavra, mostrar que o desenho da formiga não necessa-riamente corresponde ao tamanho da formiga (trazer desenhos de formi-gas maiores do que desenhos de elefantes, por exemplo); da mesma forma, o tamanho da palavra não precisa corresponder ao tamanho do objeto. Há muitas sugestões de intervenção nesta fase, mas, por hora, ficarei nessas.

c) A entrada no estágio da escrita fonográfica certamente exi-ge algumas mudanças nas intervenções. A criança agora já sabe que a es-crita continua sendo simbólica, conclusão a que chegou na fase anterior, mas ela descobre o caráter substancial dessa escrita: os elementos gráficos

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representam sons. É claro que existem também elementos ideográficos, como mostrei em momentos anteriores, mas se o professor permitir que ela lide com essa realidade dúbia, neste momento, estará atrasando o avanço da criança pelas fases fonográficas.

Assim, é preciso que a criança confie na hipótese fonográfica para superar a fase anterior. Dessa forma, na hora de escrever, para a criança que estiver nas fases que culminam na escrita silábica, estimule-a a falar a palavra em voz alta (ou sussurrada), de modo que ela perceba as unidades sonoras antes de escrever; depois de escrever, é importante que ela releia o que es-creveu e refaça quantas vezes achar necessário. É importante também com-parar com a escrita de outros colegas; essa comparação realça as diferenças e faz a criança pensar: se ambas escreveram dentro da mesma hipótese (mas uma representou a sílaba pelas vogais, e a outra, pelas consoantes), por que as escritas são diferentes?

Se a criança costuma representar a sílaba pela consoante, é importan-te estimulá-la a identificar os sons vocálicos dentro da palavra e conhecer a letra que representa tais vogais; se ela representa as vogais, deve-se estimu-lá-la a perceber os sons consonantais e conhecer as letras que representam esses sons. Muitas outras intervenções são importantes, basta que sigam a mesma orientação: oferecer à criança a intervenção adequada para que ela avance de uma fase a outra, e não para que “queime” etapas.

A partir da sua entrada na escrita transitória, o avanço para a escri-ta alfabética é só uma questão de tempo, mas o professor pode contribuir significativamente desenvolvendo uma série de atividades de consciência fonológica. Para isso, há uma rica contribuição de estudos psicolinguísticos (há muitas sugestões de exercícios de consciência fonológica disponível na internet por sites confiáveis). Nessa fase, quando as crianças já se propõem a escrever textos curtos, o professor precisa estimular, sim, este desejo de escrever significativamente. Uma boa sugestão é instalar o “correio elegan-te” na classe: o professor disponibiliza uma caixinha onde os alunos podem escrever bilhetes para os colegas e professores. Todos os dias, um pouco an-tes de a aula acabar, o professor distribui os bilhetes; eles poderão interagir ou não com os colegas para “traduzirem” o que fizeram. Esse exercício de-senvolve a capacidade de revisar a escrita de maneira significativa e afetiva.

Por outro lado, é importante que o professor desenvolva, diariamen-

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te, atividades envolvendo escrita de palavras isoladas, pois, ao escrever textos, a fluência do pensamento faz com que a criança não foque a atenção nas partes da palavra, e escreva numa hipótese mais atrasada do que a que ela efetivamente se encontra; enquanto a escrita de palavra força-a a lançar mão da consciência fonológica e focar a atenção nas partes da palavra, gerando uma escrita que garanta a representação de todos os fonemas.

Quero também frisar que a preocupação com a es-crita correta não deve receber ênfase neste momento (tanto faz se a criança escreveu CABEÇA com “ss”, com “ç” ou “s” , desde que sua escrita possibilite a leitura). A preocupação com a ortografia só deve merecer atenção depois de com-pletada a fase alfabética: se o professor percebe que o aluno já representa todas as partes da palavra, aí, ele pode iniciar a sistematização da ortografia: partindo inicialmente das res-trições de posição e passando por várias fases até atingir a arbitrariedade máxima, quando a definição de qual letra usar deve ser regida por regras convencionais.

Esse é o momento de estimular bastantes leituras diversas, pois o contato frequente com a palavra escrita es-timula a leitura lexical e a retenção, na memória, da palavra inteira na forma ortográfica. É também o momento de es-crever textos maiores, visto que a preocupação em manter o foco nas partes da palavra já não é mais necessária, pelo contrário, este, sim, é o momento de focar na estrutura glo-bal, de superar a relação grafema/fonema na hora de escre-ver e de ler; de escrever com fluência e criatividade, focando a atenção no sentido e não mais apenas na forma. Os er-ros aparecerão na hora da escrita, especialmente porque a atenção não estará voltada para a forma, mas para isso é que existe a revisão. Afinal, se grandes escritores necessitam de revisões nos seus textos, por que não haveria de merecê-las os escritores em formação?

JOSÉ, Elias. Umaescola assim eu quero pra mim. S. Paulo: FTD, 2008.

leitura recomendada

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ATIVIDADES

Acredito que o percurso que você fez até aqui sobre o processo de aprendizagem da leitura e escritura pode ter-lhe transportado para seu processo individual de construção da escrita. Pois é este processo que in-teressa neste momento. Nesta atividade, você deverá colher o máximo de informação possível: dados escritos, testemunhos, cadernos antigos, livros queridos, professora preferida, que a despertaram para o mundo da escrita, entre tantas outras fontes que você pode ter. Depois de todos esses dados coletados, é a hora de você criar um texto, ou um vídeo, sobre o seu per-curso individual de escritura e leitura (de preferência que você destaque as diferenças entre essas duas modalidades). Depois proponho que o grupo se reúna para socializar o trabalho ou trocar experiências sobre o trabalho feito, ou isto pode ser exposto na internet e entrar em grupo de discussão. Aproveite, rememore, emocione-se e desvele o (a) escritor (a) que existe em você.

A proposta desta aula foi correlacionar processos de leitura e pro-cessos de escritura e apresentar propostas efetivas, para serem usadas pelo professor alfabetizador, visando estimular e desenvolver as habilidades de leitura e escritura nas crianças. Pretendi mostrar que essas habilidades são relacionadas, e é bom que sejam, mas que cada uma tem sua especificidade e, por isso, é necessário que o professor faça intervenções que objetivem desenvolver essas duas habilidades e não dar ênfase a uma e ignorar a outra, por achar que uma delas – a leitura – a criança aprende sozinha, enquanto a outra – a escritura – merece instrução explícita.

EHRI, L. Development of ability to read words. In: BARR, R. et. Al. (Org.). Handbook of reading research, v. II, New York: Longman, p. 383-417, 1991.

MOREIRA, Cláudia Martins. O uso de estratégias de leitura na fase ini-

RESUMINDO

REFERÊNCIAS

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Suas anotações

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