língua eletrónica potenciométrica: uma ferramenta para análise da qualidade do mel

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Língua eletrónica potenciométrica: uma ferramenta para análise da qualidade do mel. Mara E.B.C. de Sousa Dias Mestrado em Química Departamento de Química e Bioquímica 2013 Orientador Adélio A.S.C. Machado, Professor Catedrático, Faculdade de Ciências Coorientador António M. Peres, Professor Adjunto, Instituto Politécnico de Bragança

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  • Lngua eletrnica potenciomtrica: uma ferramenta para anlise da qualidade do mel.

    Mara E.B.C. de Sousa Dias Mestrado em Qumica Departamento de Qumica e Bioqumica 2013 Orientador Adlio A.S.C. Machado, Professor Catedrtico, Faculdade de Cincias Coorientador Antnio M. Peres, Professor Adjunto, Instituto Politcnico de Bragana

  • Todas as correes determinadas pelo jri, e s essas, foram efetuadas.

    O Presidente do Jri, Porto, ______/______/_________

  • FCUP

    Lngua eletrnica potenciomtrica: uma ferramenta para anlise da qualidade do mel

    i

    Ao meu marido e filhos

  • FCUP

    Lngua eletrnica potenciomtrica: uma ferramenta para anlise da qualidade do mel

    ii

    Agradecimentos

    Ao Professor Doutor Adlio Machado, orientador cientfico, pela

    disponibilidade, apoio e valiosas sugestes ao longo de todo o

    trabalho.

    Ao Professor Doutor Antnio Peres, co-orientador cientfico, pelas

    crticas oportunas.

    Professora Doutora Letcia Estevinho, pela disponibilidade e

    colaborao nas anlises polnicas e de cor das amostras de mel

    estudadas.

    Ao Eng Jorge S Morais, pelo apoio na realizao das anlises por

    cromatografia lquida (HPLC).

    Escola Superior Agrria do Instituto Politcnico de Bragana, pela

    oportunidade oferecida para a realizao deste trabalho no

    Laboratrio de Qumica e Bioqumica Aplicada.

  • FCUP

    Lngua eletrnica potenciomtrica: uma ferramenta para anlise da qualidade do mel

    iii

    Resumo Neste trabalho investigou-se a possibilidade de discriminao de diferentes tipos de

    mis monoflorais com uma lngua eletrnica potenciomtrica construda pelo mtodo print-

    screen e constituda por sensores de sensibilidade cruzada. Usaram-se 89 amostras de mel,

    provenientes de todas as regies apcolas de Portugal continental relativas a 3 anos

    apcolas (2009-2011), que foram analisadas quanto cor, perfil polnico e contedo de

    glucose e frutose. As mesmas amostras foram analisadas com recurso lngua eletrnica,

    tendo sido registados os seus perfis potenciomtricos. Constatou-se a existncia de uma

    acentuada variabilidade das amostras com base no perfil de cores obtido, desde o extra-

    claro at ao escuro; pelos nveis de concentrao de frutose que variaram entre 33 e 57

    g/100 g de mel e os de glucose entre 20 e 37 g/100 g de mel; assim como quanto ao tipo e

    nveis de plens predominantes detectados. Estes dados permitiram classificar 75 amostras

    como pertencendo a 8 tipos de mel monofloral: Lavandula sp., Echium sp., Rubus sp., Erica

    sp., Prunus sp., Castanea sp., Trifolium sp. e Eucalyptus sp. (os dois ltimos, apenas com 2

    mis presentes na amostragem realizada).

    Atendendo redundncia da informao contida nos perfis de sinais

    potenciomtricos da lngua eletrnica, foram testados trs algoritmos meta-heursticos de

    seleo de variveis (arrefecimento simulado, gentico e melhoria local), em paralelo com o

    mtodo de anlise discriminante linear, para estabelecer modelos de classificao para o

    tipo de mel. Devido ao elevado nmero de tipos de mel presentes nas amostras foi

    necessrio definir uma metodologia de tratamento de dados que permitisse efetuar de forma

    robusta, com a lngua eletrnica potenciomtrica, a classificao das amostras no respetivo

    grupo de mel monofloral. Os mis monoflorais foram divididos em 3 grupos de acordo com o

    perfil de cores obtido: branco (incluindo os mis extra-branco e branco), mbar (incluindo os

    mis mbar extra claro, mbar claro e mbar) e escuro (constitudo pelos mis escuros).

    Este procedimento, associado aos sub-conjuntos de sensores selecionados com o algoritmo

    de Arrefecimento Simulado (algoritmo que apresentou sempre os melhores resultados),

    permitiu obter um modelo de discriminao linear mais simples (com menor nmero de

    sensores no modelo de anlise discriminante linear) e com critrio de qualidade do ajuste

    elevado e, principalmente, com 100% de classificaes corretas para o procedimento de

    validao cruzada leave-one-out.

    Para as amostras classificadas de cor branco obteve-se um modelo de anlise

    discriminante linear com 6 sensores que permitiu obter 100% de classificaes corretas, na

    validao cruzada leave-one-out, entre as amostras dos dois grupos de mis monoflorais de

    Echium e Lavandula. Para as amostras de cor mbar, o melhor modelo continha 16

    sensores e permitiu discriminar corretamente os 4 tipos de mel monofloral: Echium,

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    Lavandula, Prunus e Rubus. No grupo de cor escura, o modelo selecionado possua 7

    sensores e permitiu discriminar corretamente os 3 grupos de mel monofloral: Castanea,

    Erica e Rubus.

    O desempenho analtico observado pela lngua eletrnica potenciomtrica construda

    sugere que esta tcnica poder ser uma ferramenta de auxlio na anlise rotineira de

    classificao dos mis, permitindo s empresas, que produzem e comercializam o mel, ter a

    capacidade de classificar/confirmar se uma amostra de mel monofloral e de que tipo, com

    a mais-valia econmica que essa classificao aporta por comparao com um mel

    multifloral, garantindo tambm a autenticidade do produto embalado, de um ponto de vista

    floral.

    Palavras chave: Lngua eletrnica; mis monoflorais; anlise discriminante linear; seleo

    de sensores; algoritmos meta-heursticos; algoritmo de arrefecimento simulado; algoritmo

    gentico; algoritmo de melhoramento local restringido

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    Abstract The performance of a potentiometric electronic tongue constructed by the print-

    screen method and comprising cross-sensitivity sensors, for discriminate different types of

    monofloral honeys was evaluated. In total, 89 samples of different honeys obtained all across

    continental Portugal, were used and analised concerning color, pollen profile, glucose and

    fructose contents. All samples were also analised using the electronic tongue and the

    potentiometric signal profiles were recorded. The honey samples showed a high variability

    that was demonstrated by their different colors, yielding from the extra-light to the dark

    colors; by the different fructose (ranging from 33 to 57 g/100 g of honey) and glucose

    (between 20 and 37 g/100 g honey) concentration levels; as well as by the type and levels of

    the major pollens identified. Based on the pollen analysis 75 samples were classified as

    monofloral honeys: Lavandula sp., Echium sp., Rubus sp., Erica sp., Prunus sp., Castanea

    sp., Trifolium sp. and Eucalyptus sp. (although the last two with only two samples).

    The potentiometric signal profiles recorded showed a high level of redundancy. So,

    three variable selection meta-heuristic algorithms were applied (simulated annealing, genetic

    and restricted local improvement) to establish the most informative predictors (sensors) when

    using in simultaneous a linear discriminant analysis method to establish classification models

    according to the type of monofloral honey. Due to the high variability of monofloral honey in

    the sampling database, a methodology was chosen to allow using the electronic tongue for

    monofloral honey classification.

    Samples classified as monofloral honeys were split into 3 groups according to their

    colors: white (including extra-white and white honeys), amber (including extra light amber,

    light amber and amber honeys) and dark (composed of dark honeys). This procedure

    together the subsets of sensors selected using the Simulated Annealing algorithm (algorithm

    that allowed the establishment of the best classification model), allowed a simple linear

    discrimination model (with a reduced number of sensors in the model) with high values for

    the goodness of fit criterion, and especially with 100% of correct classifications for the leave-

    one-out cross-validation procedure.

    For samples classified as white honeys, a linear discriminant analysis model with 6

    sensors allowed a 100% of correct monofloral honey classifications as Echium or Lavandula,

    using a leave-one-out cross-validation procedure. For samples classified as amber, the best

    model included the signals of 16 sensors and allowed a full discrimination between the

    samples from the 4 types of monofloral honeys: Echium, Lavandula, Prunus and Rubus.

    Finally, for the dark color group, the selected model had 7 sensors and allowed to

    discriminating correctly the 3 groups of monofloral honeys: Castanea, Erica and Rubus.

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    The results achieved with the proposed potentiometric electronic tongue suggest that

    this analytical technique may be an important tool to assist in the routine honey classification,

    allowing companies that produce and sell honey, to have the capability to classify/confirm

    whether a honey is monofloral and of which kind, with the economic added value that it

    brings in relation to multifloral classified honeys, ensuring also the authenticity of the

    packaged product, from a floral point of view.

    Keywords: Electronic tongue; Monofloral honeys; Linear discriminant analysis; Sensors

    selection; Meta-heuristic algorithms; Simulated annealing algorithm; Genetic algorithm;

    Restricted local improvement algorithm.

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    ndice geral Resumo .................................................................................................................................................................. iii Abstract ................................................................................................................................................................... v ndice geral ......................................................................................................................................................... vii ndice de tabelas ................................................................................................................................................ ix ndice de figuras .................................................................................................................................................. x Lista de abreviaturas ....................................................................................................................................... xi PREMBULO ..................................................................................................................................................... xiii a. Enquadramento ...................................................................................................................................................... xiii b. Objetivos .................................................................................................................................................................... xiii c. Estrutura do trabalho ........................................................................................................................................... xiv 1. INTRODUO .................................................................................................................................................. 1 1.1. O mel ............................................................................................................................................................................ 1 1.1.1. Produo do mel pela abelha ...................................................................................................................... 1 1.1.2. Composio qumica do mel ........................................................................................................................ 1 1.1.3. Plen no mel ....................................................................................................................................................... 2 1.1.4. Classificao do mel ........................................................................................................................................ 3 1.1.5. O mel em Portugal ........................................................................................................................................... 4 1.1.6. Controlo de qualidade .................................................................................................................................... 5 1.2. Lngua eletrnica .................................................................................................................................................... 6 1.2.1. Sensores qumicos ............................................................................................................................................ 6 1.2.2. Processamento de sinais ................................................................................................................................ 7 1.2.3. Exemplos de aplicao de LEs .................................................................................................................. 11 1.3. Gnese do trabalho ............................................................................................................................................. 12 2. Material e mtodos ..................................................................................................................................... 13 2.1. Amostragem .......................................................................................................................................................... 13 2.2. Caracterizao da cor do mel ......................................................................................................................... 13 2.3. Anlise polnica .................................................................................................................................................... 14 2.4. Anlise por HPLC ................................................................................................................................................. 15 2.4.1. Equipamento ................................................................................................................................................... 15 2.4.2. Preparao de solues .............................................................................................................................. 15

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    2.5. Anlise com a lngua eletrnica .................................................................................................................... 16 2.5.1. Montagem do sistema de multi-sensores ............................................................................................ 16 2.5.2. Sensores qumicos ......................................................................................................................................... 17 2.5.3. Equipamento ................................................................................................................................................... 17 2.5.4. Anlise com a lngua eletrnica .............................................................................................................. 18 2.6. Anlise de dados .................................................................................................................................................. 19 3. Resultados ...................................................................................................................................................... 21 3.1. Cor do mel .............................................................................................................................................................. 21 3.2. Anlise polnica .................................................................................................................................................... 23 3.3. Anlise por HPLC ................................................................................................................................................. 27 3.4. Anlise com a lngua eletrnica .................................................................................................................... 32 3.4.1. Classificao de amostras de cor branca ............................................................................................ 38 3.4.2. Classificao de amostras de cor mbar ............................................................................................. 40 3.4.3. Classificao de amostras de cor escura ............................................................................................. 43 4. Concluses ...................................................................................................................................................... 47 Referncias ......................................................................................................................................................... 49

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    ndice de tabelas

    Tabela 1 Exemplo de alguns resultados analticos referentes a anlises polnicas e

    qumicas de mis monoflorais de Castanea obtidos em vrios trabalhos [13]. ................ 4 Tabela 2 Cores padro do mel designadas pela USDA e respetivos intervalos de cor da

    escala mm PFund. .......................................................................................................... 14 Tabela 3 Composio das membranas polimricas. ........................................................... 18 Tabela 4 Nmero de amostras com cores padro do mel designadas pela USDA. ........... 21 Tabela 5 Percentagem de mis com cada tipo de plen presente e o valor mnimo e

    mximo da percentagem de cada plen nas amostras de mel. ...................................... 24 Tabela 6 Exemplo de planta associada a cada gnero identificado atravs da anlise

    polnica. ........................................................................................................................... 25 Tabela 7 Classificao e os 3 plens mais predominantes das amostras. ......................... 26 Tabela 8 Valores globais da classificao e da cor das amostras monofloral/multifloral. ... 27 Tabela 9 Intervalo de concentraes e parmetros da calibrao para a anlise da glucose

    e frutose por HPLC. ......................................................................................................... 29 Tabela 10 Resultados do estudo da repetibilidade, da preciso intermdia e da exatido

    com solues de controlo de qualidade. ......................................................................... 30 Tabela 11 Resultados do estudo da repetibilidade e da preciso intermdia de 3 amostras.

    ........................................................................................................................................ 30 Tabela 12 Concentraes de glucose e frutose nas amostras de mel analisadas por HPLC

    ........................................................................................................................................ 31 Tabela 13 Seleo de variveis independentes atravs de 3 algortmos para obter

    modelos de discriminao entre 2 grupos de mel monofloral de cor branco. ................. 39 Tabela 14 Seleo de variveis independentes atravs de 3 algortmos para obter

    modelos de discriminao entre 4 grupos de mel monofloral de cor mbar. .................. 42 Tabela 15 Seleo de variveis independentes atravs de 3 algortmos para obter

    modelos de discriminao entre 3 grupos de mel monofloral de cor escura. ................. 44

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    ndice de figuras

    Figura 1 Escala impressa de cores padro do mel e respetivos intervalos de valores mm

    PFund. ............................................................................................................................. 14 Figura 2 Sistema de multi-sensores. ................................................................................... 17 Figura 3 Montagem para a anlise com a lngua eletrnica. ............................................... 19 Figura 4 Amostras de mel usadas neste trabalho de acordo com a escala de cores padro

    do mel impressa e as definidas pela USDA. ................................................................... 22 Figura 5 Distribuio da cor Pfund (mm) e ajuste da funo de distribuio log-normal. ... 23 Figura 6 Cromatogramas da turanose, trehalose, maltose e de uma mostra de mel. ........ 28 Figura 7 Perfil dos sinais obtidos da anlise das amostras com a lngua eletrnica. ......... 32 Figura 8 Extremos quartis do potencial (mV) em funo dos sensores. ............................. 33 Figura 9 Esquema da metodologia de tratamento de dados usada para estabelecer o

    melhor modelo ADL. ........................................................................................................ 35 Figura 10 Anlise discriminante linear entre 8 diferentes tipos de mel. .............................. 36 Figura 11 Anlise discriminante linear entre 6 diferentes tipos de mel. .............................. 37 Figura 12 Anlise discriminante linear entre os 3 grupos de cor associados seleo

    primria das amostras: 1 branco; 2 mbar; 3 escuro. ............................................ 38 Figura 13 Distribuio de frequncias dos dados referentes primeira funo

    discriminante da classificao de dois grupos de mis brancos monoflorais: Echium

    (Ech) e Lavandula (Lav). ................................................................................................. 41 Figura 14 Anlise discriminante linear de 4 grupos de mis monoflorais de cor mbar:

    Echium (Ech), Lavandula (Lav), Prunus (Pru) e Rubus (Rub). ....................................... 43 Figura 15 Anlise discriminante linear de 3 grupos de mis monoflorais de cor escura:

    Castanea (Cas), Erica (Eri) e Rubus (Rub). .................................................................... 45

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    Lista de abreviaturas A mbar

    AC mbar claro

    Aca Acacia sp.

    ACP Anlise de Componentes Principais

    ADL Anlise Discriminante Linear

    AEC mbar extra claro

    AS Arrefecimento Simulado

    B Branco

    Cas Castanea sp.

    ccr12 coeficiente da primeira raiz de Roy (coefficient and Roy's first root statistic, !!) Cre Crepis sp.

    Cyt Cytisus sp.

    E Escuro

    EB Extra-branco

    Ech Echium sp.

    Eri Erica sp.

    Euc Eucalyptus sp.

    FNAP Federao Nacional de Apicultores de Portugal

    Foe Foeniculum sp.

    GEN Gentico

    Gen Genista sp.

    Hel Helianthus sp.

    HPLC Cromatografia lquida de alto desempenho (abreviatura do ingls, high performance

    liquid chromatography)

    IHC Comisso Internacional do mel (abreviatura do ingls, International Honey

    Commission)

    IR Indce de Refrao

    IUPAC Unio Internacional da Qumica Pura e Aplicada (abreviatura do ingls,

    International Union of Pure and Applied Chemistry)

    Lav Lavandula sp.

    LE Lngua Eletrnica

    Leo Leontondon sp.

    LOO deixar um de fora (abreviatura do ingls, leave-one-out)

    Med Medicago sp.

    Men Mentha sp.

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    Mim Mimosaceae sp.

    MLR Melhoramento Local Restringido

    MQP Mnimos Quadrados Parciais

    MQP-AD Mnimos Quadrados Parciais na Anlise Discriminante

    Per Persea sp.

    Pin Pinus sp.

    Pru Prunus sp.

    PVC Cloreto de polivinlo (abreviatura do ingls, Polyvinyl Chloride)

    RLM Regresso Linear Mltipla

    RNA Redes Neurais Artificiais

    Rub Rubus sp.

    San Sandix sp.

    Thy Thymus sp.

    Til Tilia sp.

    Tri Trifolium sp.

    USDA Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (abreviatura do ingls, United

    States Department of Agriculture)

    UV-Vis Ultravioleta-Visvel

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    PREMBULO a. Enquadramento

    As empresas que produzem e comercializam o mel tm a necessidade de classificar

    os diferentes tipos de mis, uma vez que o mel monofloral tem um valor econmico mais

    elevado do que o multifloral. A classificao dos mis em mis monoflorais ou multiflorais

    vulgarmente realizada atravs de uma anlise polnica, que demorada e exige um tcnico

    especializado na identificao dos diferentes tipos de plen. Quando o perfil polnico no

    permite uma classificao correta, as amostras so sujeitas a uma anlise sensorial para

    confirmao, mas esta tambm uma anlise especializada e limitada quanto ao nmero de

    amostras que possvel analisar por dia. Assim, h a necessidade de encontrar novas

    ferramentas analticas que tornem mais fcil a classificao do mel no processo industrial, a

    fim de garantir a autenticidade dos seus produtos.

    A lngua eletrnica potenciomtrica uma recente aplicao analtica cujas

    potencialidades na rea alimentar so vastas, pois permite mimetizar a anlise sensorial

    quer ao nvel qualitativo quer ao nvel quantitativo. uma ferramenta de trabalho que

    permite a classificao, discriminao e quantificao, aplicando mtodos estatsticos

    multivariados no supervisionados e supervisionados aos perfis de sinais de potencial

    referentes a parmetros qumicos presentes nas amostras lquidas analisadas.

    Foi neste mbito que se decidiu investigar se a lngua eletrnica potenciomtrica

    poderia constituir uma metodologia analtica rpida para distinguir mis monoflorais,

    permitindo reduzir o nmero de amostras que necessitariam de ser sujeitas a anlise

    polnica e sensorial, que seriam s as de classificao duvidosa.

    b. Objetivos

    O objetivo geral deste trabalho consistiu em aplicar a lngua eletrnica

    potenciomtrica na anlise de mis, com vista a estabelecer a metodologia estatstica que

    permitisse discriminar corretamente as amostras em grupos de mis monoflorais.

    Os objetivos especficos foram os seguintes:

    obter um elevado nmero de amostras de mel;

    construir a lngua eletrnica pelo mtodo print-screen com membranas polmricas

    de policloreto de vinlo baseadas na combinao de 5 plastificantes e 5 compostos

    aditivos;

    efetuar anlise polnica, da cor e dos acares maioritrios (glucose e frutose por

    cromatografia lquida de alto desempenho) em todas as amostras;

    efetuar a anlise destas com a lngua eletrnica;

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    para tratamento de dados, usar tcnicas de seleo de variveis (sensores), tais

    como, algoritmos meta-heursticos (arrefecimento simulado, gentico e

    melhoramento local restringido), aliadas ao mtodo multivariado de classificao

    anlise discriminante linear;

    definir a melhor metodologia de tratamento de dados para garantir classificaes

    corretas do grupo de mel monofloral de cada amostra com a lngua eletrnica.

    c. Estrutura do trabalho

    O presente trabalho inicia-se com o captulo de Introduo, resultante de uma

    pesquisa bibliogrfica, constituda por uma breve descrio sobre o que o mel e a sua

    composio qumica, bem como sobre a sua caracterizao por anlise polnica, fazendo

    meno sua produo em Portugal e ao seu controlo de qualidade. Neste captulo tambm

    se faz referncia ao estado da arte das lnguas eletrnicas, bem como a estudos sobre a

    sua aplicao ao mel.

    No segundo captulo, Material e mtodos, faz-se a descrio da amostragem

    realizada e descrevem-se as metodologias aplicadas na caracterizao da cor e anlise

    polnica do mel. Em relao anlise por cromatografia lquida de alto desempenho (HPLC),

    apresenta-se o equipamento e preparao de solues; para a anlise com a lngua

    eletrnica, descreve-se o sistema de multi-sensores, os sensores qumicos usados e o

    equipamento. Abordam-se tambm os mtodos estatsticos multivariados aplicados aos

    dados analticos que foram usados no captulo seguinte.

    No terceiro captulo, Resultados e discusso, apresentam-se os tratamentos de

    resultados obtidos das anlises de cor, perfil polnico, HPLC e lngua eletrnica, bem como a

    discusso dos resultados referentes aos tratamentos estatsticos aplicados.

    No quarto captulo, Concluses finais, compilam-se as concluses gerais mais

    relevantes obtidas no captulo anterior e faz-se tambm uma apreciao global dos

    resultados tendo em vista os objetivos.

    Por fim, apresenta-se a Bibliografia utilizada.

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    1. INTRODUO 1.1. O mel

    O mel uma substncia doce produzida por abelhas a partir do nctar de flores, de

    secrees doces de outras partes da planta e de excrees dos insetos sugadores de

    plantas [1].

    1.1.1. Produo do mel pela abelha

    O produto mais comum o produzido pelas abelhas melferas (gnero Apis). A

    produo do mel iniciada com um primeiro tratamento das matrias recolhidas, na boca e

    estmago do mel da abelha, usando substncias especficas prprias enzimas. Estas

    permitem quebrar os acares complexos (principalmente a sacarose) em acares mais

    simples (glucose e frutose), que so mais facilmente digerveis e permitem uma maior

    conservao do mel. Na colmeia, as abelhas coletoras (campeiras) regurgitam o nctar e

    passam-no para as abelhas operrias da colmeia que continuam com o processo de

    transformao do nctar. Aps este tratamento, o produto colocado nos alvolos de cera

    e, gradualmente, transformado em mel por evaporao da gua. O mel fica armazenado

    na colmeia para amadurecer e usado como fonte primria de alimento para o inverno [2,3].

    Como ao longo de um ano apcola o perodo de florescimento diferente de planta

    para planta, o mel uma mistura de nctares e por isso tem uma composio varivel

    dependendo das fontes florais [3,4]. Outros factores que afectam a composio do mel,

    indiretamente ou diretamente, so o clima e o processamento do mel [4].

    1.1.2. Composio qumica do mel

    Globalmente, apresentando valores mdios, o mel constitudo principalmente por

    acares (aproximadamente, 80% da sua massa), nomeadamente glucose (31,3%), frutose

    (38,2%), sacarose (0,7%), outros dissacardeos (5%) e polissacardeos (3,1%). Apresenta

    quantidades de gua geralmente inferiores a 20% (no nctar, 80%) e valores de pH entre

    3,5 e 4,5. O mel tambm contm uma grande variedade de outras substncias em pequenas

    concentraes (

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    diretamente dependente da composio em sais minerais, da fonte de nctar, de nveis

    elevados de aminocidos e da presena de compostos fenlicos [2].

    1.1.3. Plen no mel

    Outro produto que as abelhas obtm das flores o plen, rico em protenas (principal

    fonte de alimentao das abelhas), substncias lipdicas, sais minerais e vitaminas [6,7]. o

    alimento essencial para o crescimento de larvas de abelhas e jovens adultos [6]. A colheita

    do plen no feita na mesma altura do dia da recolha do nctar, pois a produo de plen

    ou nctar na maioria das flores s acontece a determinadas horas, no coincidentes [7].

    Por isso, a presena de plen no mel deve-se a trs possveis situaes, associadas

    ao das abelhas [8]:

    - os gros de plen da flor so desalojados das anteras e caem no nctar que

    sugado pelas abelhas e armazenado no seu estmago;

    - os gros de plen ficam presos aos cabelos, pernas, antenas e at mesmo nos

    olhos das abelhas e, mais tarde, quando o nctar regurgitado, parte depositado em

    clulas abertas dos favos de colmeia;

    - as abelhas coletoras de mel agitam o seu corpo para remover os plens e durante

    este processo, o plen cai em alvolos abertos.

    O teor de plen no mel est relacionado com as caractersticas morfolgicas das

    flores e plen e relativamente constante para cada uma das espcies individuais, de modo

    que possvel avaliar de forma precisa qual a abundncia de cada plen no nctar. Se

    estas caractersticas levam a uma elevada abundncia de plen no nctar, ento o plen

    classificado de sobre-representado; se a abundncia baixa, o plen considerado sub-

    representado; nos casos intermdios, o plen considerado como tendo uma

    representatividade normal [9,10].

    Como resultado da presena de plen no mel verifica-se que possvel identificar a

    origem das fontes florais (origem botnica) e geogrficas do mel produzido pelas abelhas [8-

    10] atravs de uma anlise polnica. Esta corresponde contagem dos gros de plen

    (baseada na frequncia relativa dos diversos tipos de plen) presentes no mel, segundo o

    gnero [9,10].

    Esta anlise polnica, combinada com critrios fsico-qumicos e caractersticas

    organolticas, usada para controlo de qualidade, pois permite detetar misturas de mis de

    diferentes locais e dar informaes gerais sobre a rea de recolha (clima e a condio

    geogrfica, botnica e agrcola) [11]. Esta informao importante uma vez que o mel tem

    cor, sabor e textura de acordo com as fontes de nctares.

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    Considerando os plens predominantes e a sua respectiva classificao em relao

    aos nveis de representao, o mel pode ser classificado em mel monofloral de uma

    determinada planta (origem botnica) ou multifloral. A introduo desta informao no rtulo

    do produto tambm essencial por afetar o preo do produto no mercado, pois os mis

    monoflorais tm maior valor comercial.

    1.1.4. Classificao do mel

    Em geral, considera-se um mel monofloral de uma dada espcie vegetal quando o

    plen dessa espcie predominante (superior a 45%, representatividade normal) em

    relao ao total dos plens observados [10,12]. Mas tambm h espcies vegetais com sub-

    representao em plen, ou seja, a quantidade de nctar retirado da planta no est de

    acordo com a quantidade de plen representado no mel. Um exemplo o plen de

    Lavandula sp., cuja percentagem de predominncia do plen a partir da qual se pode

    considerar esse mel monofloral de Lavandula sp. de 15% (plen sub-representado) [12].

    Situao inversa a sobre-representao polnica de espcies vegetais como o plen de

    Castanea sp., cujo mel monofloral deve ter uma predominncia deste plen a partir dos 90%

    (plen sobre-representado) [12]. No mel de Eucalyptus sp., a predominncia do plen de

    Eucalyptus sp. deve ser superior a 70% [12]. Como regra, a classificao de mel monofloral

    de Lavandula prevalece em caso de haver outro plen predominante.

    Para uma correta classificao de um mel recomendado que se obtenham outras

    caractersticas, como a sensorial e fsico-qumicas que, em conjunto, permitem ter uma

    maior confiana na determinao e controlo da origem botnica dos mis [10,13]. Como a

    variabilidade natural do mel no permite definir limites precisos de predominncia do plen

    para um dado tipo de mel (que, em geral, resulta de uma mistura de vrios nctares), a

    interpretao depende da experincia dos analistas na avaliao dos resultados globais e

    do seu conhecimento do produto [10]. Alis, quando h dificuldades em estabelecer a

    origem biolgica, a deciso final definida com base na avaliao organolptica de um

    perito [14].

    Um estudo de reviso bibliogrfica sobre as caractersticas gerais de alguns mis

    monoflorais Europeus (15 tipos de mel monofloral), referentes a anlises polnicas e fsico-

    qumicas, mostra a variabilidade nos mis de diferentes pases classificados como sendo

    monofloral do mesmo tipo de plen [13]. Como exemplo desta possvel variabilidade, na

    Tabela 1 apresentam-se alguns dos dados de caracterizao fsico-qumica e polnica de

    mis monoflorais de Castanea compilados nesse estudo [13].

    O mel monofloral Portugus tem sido alvo de vrios estudos, como por exemplo, ao

    nvel da caracterizao polnica, fsico-qumica, sais minerais, microbiolgica e de atividade

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    biolgica. Alguns exemplos de mis monoflorais Portugueses usados nestes estudos so:

    Erica sp. da regio de Trs-os-Montes [15]; Eucalyptus sp., Lavandula sp., Erica sp., Cytisus

    sp. da Serra da Lous [16]; Erica sp., Eucaliptus sp., Citrus sp., Lavandula sp. e Echium sp.

    provenientes de vrias regies de Portugal [17].

    Tabela 1 Exemplo de alguns resultados analticos referentes a anlises polnicas e qumicas de mis monoflorais de Castanea obtidos em vrios trabalhos [13].

    Parmetro Dados analticos provenientes de vrios trabalhos * % de plen especfico 95/99; >70; 981; >90

    pH 4,2/4,8; 4,4/4,8; 3,7/4,8; 4,8/ 6,8; 4,6/5,4; 4,6/6,5

    Acidez livre (meq/kg) 23,0/32,0; 31,5/56,5; 24,4/72,8; 9,3/11,3; 10,3/24,8; 13,43,3

    Frutose (g/100 g) 35,0/44,7; 34,7/41,2; 35,1/43,5; 37,1/47,4; 41,91,3; 37,6/46,0

    Glucose (g/100 g) 25,2/30,8; 25,6/30,5; 28,8/30,6; 21,0/30,0; 22,1/29,3; 23,6/32,4

    Sacarose (g/100 g) 0/6,2; 0,1/3,8; 0/0,20; 0,500,65; 0,0/1,3; 0,47/1,17

    gua (g/100 g) 17,1/19,3; 18,0/19,0; 15,6/18,7; 16,8/22,0; 15,6/17,8; 16,6/19,1 *) >mnimo; minmo/mximo; mdiadesvio padro

    1.1.5. O mel em Portugal

    A produo de mel uma atividade agrcola com um peso econmico razovel na

    economia nacional. De salientar que o sector apcola no deve ser avaliado somente pelo

    valor dos produtos diretos da atividade, como, por exemplo, o mel, a cera, o plen, a

    prpolis, a geleia real e as abelhas. Indiretamente, a ao da abelha na polinizao e

    fertilizao das plantas beneficia indiretamente outras produes agrcolas que superam

    este sector em valor [18].

    Segundo a Federao Nacional dos Apicultores de Portugal (FNAP) e os dados

    apresentados no Programa Apcola Nacional para 2014-2016, os dados referentes

    evoluo desta atividade entre os anos 2010-2013 indicam que existem cerca de 17 mil

    apicultores registados, dos quais 673 so apicultores profissionais que detm mais de 41%

    das 567 mil colmeias que esto contabilizadas no pas. A produo de mel, devido

    irregularidade do clima, corresponder a uma produo mdia de cerca de 8 mil toneladas,

    o que equivale a uma faturao de cerca de 25 milhes de euros [18]. Em geral, 30% da

    produo nacional para venda direta ao consumidor, 25% indstria, 25% a centros de

    embalagem/comrcio e 20% a retalhistas.

    A produo baixa comparativamente com a produo mundial, que se estima ser

    superior a 1.200.000 toneladas por ano. A China o maior produtor, seguida da Argentina,

    Mxico, Estados Unidos e Canad. Esta produo tem tido uma tendncia crescente nos

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    ltimos 20 anos, a par de um aumento do consumo, devido ao aumento geral do nvel de

    vida e tambm a um interesse maior em produtos naturais e saudveis. Portugal, tal como, o

    resto da Unio Europeia, deficitrio em mel, sendo necessrio incrementar a sua produo

    para no estar dependente da importao.

    1.1.6. Controlo de qualidade

    A preocupao no controlo de qualidade do mel garantir que autntico no que diz

    respeito aos requisitos legais, sendo proibido acrescentar-lhe ou remover qualquer

    ingrediente [3]. O mel comercializado deve ser analisado de forma rotineira de modo a

    garantir a autenticidade do produto. A autenticidade deve ser avaliada ao nvel da produo,

    de forma a prevenir a adulterao por adio de outros ingredientes alimentares (por

    exemplo, xaropes de sacarose ou melaos), bem como por tratamentos que levem

    alterao do produto (fermentao, aquecimento e filtrao); e, tambm, indicaes

    errneas quanto origem geogrfica e botnica [11].

    O controlo de qualidade completo das amostras de mel inclui anlises organolticas

    e fsico-qumicas, bem como a anlise de plen.

    A caracterizao fsico-qumica efetuada pela anlise dos seguintes parmetros

    (procedimentos analticos estabelecidos pela Comisso Internacional do Mel (IHC) [14]:

    humidade, condutividade eltrica, acidez livre, nveis de hidroximetilfurfural, atividade

    distsica, quantidade aparente de acares redutores (glucose e frutose), quantidade

    aparente de sacarose e matrias insolveis em gua.

    A anlise de plen importante nos estudos de autenticidade do mel ao nvel da

    origem geogrfica e botnica, mas requer tcnicos muito experientes e especializados, o

    que dificulta a anlise rotineira das amostras. Situao semelhante ocorre com as anlises

    organolticas, com a agravante de os tcnicos sensoriais estarem limitados anlise de um

    pequeno nmero de amostras por dia.

    Estas duas situaes mostram a necessidade de encontrar metodologias analticas

    que permitam auxiliar estes tcnicos, identificando com nvel elevado de confiana as

    amostras de mel monofloral. Foi neste mbito que se decidiu investigar as capacidades

    analticas de uma lngua eletrnica potenciomtrica com o objetivo de avaliar se esta pode

    ser uma ferramenta analtica auxiliar para classificar amostras de mel monofloral, deixando a

    atividade dos tcnicos da anlise organolptica e polnolgica para os mes de classificao

    duvidosa.

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    6

    1.2. Lngua eletrnica

    Segundo a Unio Internacional da Qumica Pura e Aplicada (IUPAC) [19], uma lngua

    eletrnica (LE) um sistema de multi-sensores no especficos e de baixa seletividade, ou

    seja, constitudo por sensores qumicos com resposta reprodutvel, de elevada estabilidade

    e sensibilidade cruzada a diferentes espcies em soluo e que, por isso, fornecem perfis

    de sinais que traduzem informao global sobre as amostras. No processamento dos perfis

    de sinais usam-se mtodos estatsticos multivariados para atingir os objetivos da anlise,

    que podem ser o reconhecimento da composio qualitativa (classificao e discriminao

    de amostras), a anlise quantitativa de multi-espcies qumicas e a avaliao do sabor das

    amostras.

    As LEs so sistemas com merecido interesse pois permitem adquirir informao

    global sobre amostras complexas que no possvel com outras metodologias analticas,

    principalmente mimetizar a lngua humana na apreciao de sabores. Esta informao varia

    de acordo com as caractersticas da LE usada.

    1.2.1. Sensores qumicos

    O tipo de sensores usados nas LEs depende do princpio de deteo usado que, na

    rea das tcnicas electroanalticas, pode ser a potenciometria [20-24], a voltametria [25-27],

    a amperometria [28] e a impedncia electroqumica [29].

    O sistema analtico usado neste trabalho o potenciomtrico, que tem diversas

    vantagens: o mais simples, pode ser construdo no laboratrio (como neste trabalho), tem

    grande durabilidade, permite uma vasta seleo de reagentes na preparao dos sensores

    e facilidade na sua aplicao, sendo de utilizao fcil, por exemplo, basta uma simples

    lavagem entre amostras para se proceder anlise seguinte.

    Nos sistemas potenciomtricos, vrios tipos de sensores tm sido usados, sendo os

    multi-sensores constitudos s com um mesmo tipo de sensores ou com misturas de vrios

    tipos, como por exemplo: sensores de vidros de calcogenetos [24,30], de vidro sensvel a pH

    [24,30], membranas cristalinas [24], metais [24,31], membranas polimricas de sensibilidade

    cruzada [21,22,24] e membranas seletivas a ies [23,24]. Alguns dos tipos de sensores

    referidos so seletivos, sendo usados nas LEs por permitirem uma diferenciao de

    amostras por meio de parmetros qumicos especficos. Mas, como j foi referido, o critrio

    de seleo de um sensor para um sistema de multi-sensores que se pretende usar como

    LE, ter baixa seletividade e alta sensibilidade cruzada. Esta caracterstica consiste na

    capacidade de um sensor responder a um nmero diferente de espcies em soluo e, num

    sistema de multi-sensores, implica que diferentes sensores vo produzir sinais diferentes

    para a mesma matriz, que constituem um perfil de sinais tipo espectro da amostra. O perfil

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    de sinais corresponde a uma impresso digital de multicomponentes da amostra, permitindo

    o uso de ferramentas multivariadas de estatstica para anlise qualitativa e quantitativa. As

    caractersticas de uma LE dependem quer dos materiais usados (composio) na

    preparao dos sensores, quer dos sensores usados na preparao do multi-sistema, sendo

    definidas pelos mesmos parmetros que para um sensor discreto (seletividade, limite de

    deteo, limite de quantificao, etc). Na anlise qualitativa, os trabalhos incidem no

    reconhecimento ou identificao de solues.

    O nmero de sensores num sistema de multi-sensores depende do trabalho que se

    pretende efetuar, tendo-se usado neste trabalho 40 sensores (20 sensores diferentes na sua

    composio, em duplicado) de sensibilidade cruzada. Os sistemas com um elevado nmero

    de sensores permitem um maior conjunto de aplicaes porque, quer na classificao de

    amostras, quer na anlise quantitativa de componentes em amostras, usando tcnicas de

    seleo de variveis acoplados s metodologias de anlise estatstica multivariada,

    possibilitam, selecionar os sensores mais adequados para o trabalho.

    1.2.2. Processamento de sinais

    O processamento dos sinais pode ser efetuado usando mtodos estatsticos

    multivariados no supervisionados ou supervisionados.

    Nos mtodos no supervisionados estuda-se a variabilidade natural existente nas

    amostras analisadas com o objetivo de procurar algum padro ou estrutura entre as

    amostras. Consistem em mtodos exploratrios, sem qualquer controlo do investigador, que

    permitem identificar possveis amostras estranhas e agrupamentos. A metodologia mais

    usada a anlise de componentes principais (ACP) [21,32]. Quando se pretende classificar

    ou quantificar compostos em amostras necessrio fornecer informao inicial sobre as

    amostras para que seja possvel estabelecer modelos de classificao e de calibrao,

    respectivamente, atravs da sua relao com os sinais da LE (mtodos supervisionados).

    Dentro desta categoria, as metodologias mais usadas para classificao so a anlise

    discriminante linear (ADL), o mtodo dos mnimos quadrados parciais (MQP-AD) e as redes

    neurais artificiais (RNA) [32]. Para a anlise quantitativa, os mais aplicados so a regresso

    linear mltipla (RLM) e o mtodo dos mnimos quadrados parciais (MQP) [32,33].

    Este trabalho incidiu na classificao de amostras atravs da ADL com o objetivo de,

    estabelecendo modelos matemticos com os perfis de sinais da LE destas amostras, definir

    o tipo de mel monofloral. A ADL uma tcnica multivariada supervisionada de classificao

    que visa a obteno de um modelo matemtico resultante de combinaes lineares das

    variveis independentes (sinais dos sensores) que melhor separe os diferentes grupos

    (varivel dependente) em que se pretendem classificar as amostras. A aplicao desta

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    8

    metodologia implicou a execuo de 2 passos: primeiro, o estudo de seleo das variveis

    independentes (sensores) para obter o melhor modelo; depois, o estudo da robustez do

    modelo selecionado associado classificao das amostras. Estes passos tm como

    objetivo definir as caractersticas que distinguem as amostras de um grupo de outro, de

    modo que, se possa prever a que grupo pertence uma nova amostra. Ao nvel dos

    pressupostos de aplicao desta tcnica, importante verificar se h presena de outliers,

    normalidade nas variveis, homogeneidade das matrizes de varincia-covarincia nos

    grupos e diferenas significativas entre os grupos. Mas, globalmente, a validao do modelo

    ADL efetuada testando a sua capacidade de previso pois, mesmo que um ou dois dos

    pressupostos no sejam observados, se for robusto, um modelo pode ser usado na previso

    do grupo onde se inserem novas amostras [34]. O estudo da previso, quando o nmero de

    amostras de cada grupo de classificao no muito elevado, baseia-se principalmente nos

    resultados de classificao correta obtidos com a validao cruzada usando a tcnica

    deixar um de fora (LOO, leave-one-out). Esta permite avaliar o desempenho do modelo na

    previso ao remover uma amostra do estudo (contm n amostras) e prever a sua

    classificao com o modelo ADL obtido com as restantes (n-1). Este processo repetido n

    vezes, de forma a obterem-se os erros de classificao de todas as amostras, sendo o erro

    global a soma dos erros de cada teste dividido por n.

    Na seleo de variveis (reduo), os mtodos habitualmente usados so os de

    seleo sequencial para a frente (sequential forward selection method), de seleo

    sequencial por eliminao posterior (sequential backward elimination method) e seleo

    por etapas (stepwise method) que permitem definir o modelo considerando a entrada e/ou

    remoo de uma varivel de cada vez. Na tcnica de seleo sequencial para a frente

    adiciona-se uma varivel de cada vez (a primeira a que tem maior correlao com a

    varivel dependente) de forma a aumentar a validade da discriminao entre os grupos.

    Esta metodologia ignora as inter-relaes entre as variveis que ainda no foram

    selecionadas e dificilmente remove variveis j adicionadas, o que pode causar grande

    redundncia nas adies posteriores. Na tcnica de seleo sequencial por eliminao

    posterior comea-se por considerar todo o conjunto de variveis e, posteriormente, excluir

    variveis, uma a uma, que contribuem menos para o poder de discriminao da funo,

    mostrando as mesmas desvantagens do mtodo acima referido. O mtodo de seleo por

    etapas uma combinao de ambas as tcnicas, de seleo sequencial para a frente e

    seleo sequencial por eliminao posterior. Estas metodologias podem ser importantes

    quando se espera ordenar as variveis selecionadas em termos da sua importncia na

    diferenciao dos grupos mas, verifica-se que estes procedimentos nem sempre escolhem o

    melhor conjunto de variveis independentes, principalmente quando o nmero destas

  • FCUP

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    9

    elevado e mostram multicolinearidade (situao encontrada nos sensores de sensibilidade

    cruzada da LE). Estes mtodos de seleo so chamados de mtodos heursticos (mtodos

    de seleo de um subconjunto de variveis) includos na classe chamada greedy, porque

    so mtodos que fazem uma escolha no momento mas, mais tarde, no verificam se foi

    uma boa opo [35].

    Por este motivo, deve-se verificar qual o melhor modelo de discriminao testando

    vrios subconjuntos possveis das variveis, o que permite ter modelos com menor nmero

    de variveis e eliminar variveis redundantes ou que contribuem da mesma forma para as

    diferenas entre grupos, aumentando a exatido de previso ao eliminar variveis

    irrelevantes. O modelo ser mais simples, mais fcil de interpretar e, por se conhecerem as

    variveis corretas, mais rpido nos clculos, permitindo melhores resultados de previso.

    Assim, neste trabalho, usaram-se algoritmos de seleo de variveis chamados meta-

    heursticos que identificam um subconjunto de variveis originais que correspondem a um

    timo global para um dado critrio de aproximao a uma determinada funo, num grande

    espao de busca de outros subconjuntos de variveis.

    Neste trabalho apresenta-se um estudo de comparao entre 3 algoritmos meta-

    heursticos de busca local para a escolha de subconjuntos de variveis baseados no pacote

    Subselect do programa R: algoritmo gentico (genetic algorithm), algoritmo de arrefecimento

    simulado (simulated annealing algorithm) e algoritmo de melhoramento local restringido

    (restricted local improvement algorithm) [36,37].

    O algortmo gentico (GEN) consiste em lidar com problemas de optimizao

    simulando a evoluo de uma populao para a qual se deve definir a quantidade de

    indivduos, a formao cromossmica do indivduo e as probabilidades de aplicao dos

    operadores genticos, tais como, cruzamento ou mutao. Nos indivduos selecionados

    atuam os operadores genticos (cruzamento e mutao) e os novos indivduos substituem

    os anteriores, terminando, assim, uma gerao. O algoritmo prossegue ciclicamente a partir

    dessa nova populao e s termina quando algum critrio de convergncia alcanado.

    Mais detalhadamente, definindo-se um subconjunto de k variveis para optimizar o

    problema, uma populao de n subconjuntos de k variveis selecionado aleatoriamente a

    partir do conjunto total das variveis independentes (p). Em cada iterao, n/2 casais so

    formados a partir da populao e cada um gera um filho (um novo subconjunto de k

    variveis), que herda as propriedades de seus pais (corresponde a todas as variveis

    comuns a ambos os pais e uma seleo aleatria de variveis na diferena simtrica da

    composio gentica de seus pais). Cada descendncia pode, opcionalmente, ser

    submetida a uma mutao na forma de um algoritmo de melhoria local (probabilidade

    especificada a definir no modelo). Os pais e filhos so selecionados de acordo com o seu

  • FCUP

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    10

    valor critrio de qualidade, e o melhor desses k-subconjuntos ir tornar-se na prxima

    gerao, que usado como a populao atual na iterao seguinte. O processo iterativo

    termina quando se atinge o nmero de geraes mximo definido inicialmente [36-38].

    O algoritmo arrefecimento simulado (AS) derivado de uma analogia com o

    processo de arrefecimento simulado da fsica de materiais, uma tcnica que consiste em

    aquecer uma substncia at sua fuso seguida, de uma lenta diminuio da temperatura

    para que, a substncia possa atingir a configurao mais regular possvel (livre de defeitos)

    da sua malha cristalina (estado cristalino de energia mnimo).

    O algoritmo estabelece a procura de um mnimo global para a optimizao de um

    sistema com k variveis considerando este tipo de comportamento termodinmico. Em cada

    iterao, os valores de duas solues (o corrente subconjunto de k variveis e o novo

    subconjunto, tambm de k variveis, que se pretende testar) so comparadas segundo um

    critrio que mede a qualidade desses subconjuntos de variveis. A nova soluo

    selecionada aleatoriamente na vizinhana da soluo corrente e testada segundo as regras

    de arrefecimento simulado, tornando-se a soluo corrente se o critrio tiver valores

    superiores inicial. O algoritmo prossegue a procura de novas solues at atingir o nmero

    mximo de interaes estabelecido no incio do procedimento [36-38].

    O algoritmo de melhoramento local restringido (MLR), um algoritmo de busca local

    alterado, um procedimento iterativo que progressivamente melhora uma soluo inicial por

    introduo de novas variveis, por substituio uma a uma, procurando uma soluo com

    valor maior do critrio de qualidade (optimizao por maximizao). Se a nova soluo no

    for encontrada, a soluo vigente mantm-se e o algoritmo continua com o processo de

    encontrar novo mximo.

    O algoritmo comea por estabelecer aleatoriamente um subconjunto inicial de k

    variveis (nmero de variveis definido priori para a soluo do problema), a partir das p

    variveis independentes. As p-k variveis que no entraram neste subconjunto so

    colocadas em lista de espera. O algoritmo vai substituindo uma varivel no subconjunto de

    k corrente com uma varivel em lista de espera e verifica quais das duas solues origina

    os valores de critrio mais elevados. Se a nova soluo melhora o critrio corrente, o

    subconjunto atualizado. Nesta situao, a varivel removida vai para a lista de espera,

    desde que seja a primeira vez (uma varivel no pode entrar na lista de espera duas

    vezes). O algoritmo prossegue estas iteraes at que a lista esvaziada [36,37].

    Estas tcnicas de seleo de variveis foram aplicadas aos dados analticos obtidos

    com uma LE pela primeira vez neste trabalho, na esteira de uma pesquisa efetuada com

    vista a realizar o tratamento de dados, sendo tambm objetivo do trabalho averiguar a sua

  • FCUP

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    11

    eficcia para obter subconjuntos de sensores para os estudos de discriminao de mis

    monoflorais.

    1.2.3. Exemplos de aplicao de LEs

    As metodologias multivariadas de tratamento de dados obtidos por meio de LEs

    potenciomtricas tm sido aplicadas em diferentes reas cientficas, principalmente na rea

    alimentar, devido s evidentes vantagens associadas quer construo dos sistemas de

    multi-sensores potenciomtricos, quer metodologia analtica. Por exemplo, os sistemas de

    multi-sensores so sistemas adaptveis a uma grande variedade de situaes, por haver

    variados tipos de sensores selecionveis que so tambm compatveis com a micro-

    fabricao, e que permitem a anlise de matrizes lquidas complexas com um pr-

    processamento da amostra mnimo e por meio de um processo de medio simples. Estas

    LEs permitem unidades portteis, deteo rpida, anlise em tempo til e economia na

    anlise, tambm associada ao baixo custo do equipamento, que permite aplicar qumica

    analtica verde.

    As LEs potenciomtricas tm sido usadas principalmente na anlise qualitativa de

    produtos na rea alimentar. Estes sistemas tm sido usados, por exemplo, na distino de

    bebidas [33,39] e alimentos [40,41], na classificao de vinho [42], na identificao de

    adulteraes no leite [43] e na quantificao de sabores e alguns compostos [39,44].

    Presentemente, o mel tem sido objeto de trabalho para LEs quer com base no

    princpio potenciomtrico, quer no voltamtrico.

    Quanto a estas ltimas, foi usada uma LE voltamtrica, baseada na voltametria por

    impulsos, usando o eltrodo de referncia Ag/AgCl, um contra-eltrodo de platina e seis

    metais como eltrodos de trabalho (ouro, prata, platina, paldio, tungstnio e titnio), num

    trabalho que possibilitou discriminar sete tipos de mis de diferentes origens florais (Acacia,

    Astragali, Buckwheat, Coptis, Data, Motherwort e Vitex) provenientes da mesma origem

    geogrfica, a China [25]. Outro trabalho com LE voltamtrica, baseada num sistema de trs

    eltrodos com eltrodo de trabalho de platina, eltrodo de referncia Ag/AgCl e contra-

    eltrodo de platina, usando voltametria cclica, permitiu identificar 4 tipos de mel de

    diferentes origens botnicas (Eucalyptus, Til, Leechi e Khalisa), da ndia, com elevada

    exatido [26].

    Com LEs potenciomtricas, salientam-se quatro trabalhos: o primeiro, usando um

    sistema de multi-sensores contendo 20 sensores preparados com membranas polimricas

    lipdicas e um eltrodo de referncia Ag/AgCl, permitiu discriminar de forma satisfatria 3

    tipos de mis monoflorais (mis de Erica, Echium e Lavandula) Portugueses [21]; no

    segundo, aplicou-se uma LE comercial com 7 sensores e um eltrodo de referncia

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    12

    Ag/AgCl, para classificar 3 tipos de mis (Acacia, Castanea e melada) da Crocia, com

    elevada exatido (100% de classificaes corretas) [45]; no terceiro, usando o mesmo

    sistema comercial, 8 tipos de mel chineses (Acacia, Astragali, Data, Coptis, Vitex,

    Motherwort, Radix Changll e Buckwheat) foram classificadas de forma eficiente (>90% de

    classificaes corretas) [46]; por ltimo, um sistema constitudo por 3 eltrodos metlicos

    puros e por 4 eltrodos de compostos metlicos foi usado para discriminar mis de Citrus,

    Rosemary, multifloral e melada, de forma eficiente (>93% de classificaes corretas) [47].

    1.3. Gnese do trabalho

    Neste trabalho utilizou-se uma LE potenciomtrica contendo membranas

    lipo/polimricas, de sensibilidade cruzada, com o objetivo de desenvolver alternativas de

    anlise para a classificao de mel que efetuada atravs da identificao e quantificao

    de plens presentes na amostra, uma tcnica biolgica demorada e que requer trabalho

    especializado. Este estudo a progresso de um trabalho anterior [21] desenvolvido pela

    mesma equipa de investigao, em que se usou um sistema de multi-sensores construdo

    em acrlico e com membranas polimricas de composio diferente para discriminar 3 tipos

    de mis monoflorais (Echium, Erica e Lavandula). Conforme j referido, o objetivo global do

    presente estudo de tese de mestrado foi investigar se uma nova LE construda permite

    classificar corretamente as amostras de mel nos seus grupos monoflorais. Os objetivos

    especficos foram j listados atrs.

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    13

    2. Material e mtodos 2.1. Amostragem

    As 89 amostras de mel usadas neste trabalho foram fornecidas pela Federao

    Nacional de Apicultores de Portugal (FNAP). Estas amostras referem-se a mis que

    entraram em concursos de mel no mbito dos Frum Nacional de Apicultura/Feira Nacional

    do Mel organizados pela FNAP, em 3 anos consecutivos (2010-2012), e que se referem aos

    anos apcolas 2009 a 2011 (respectivamente 29, 37 e 23 amostras). As amostras so

    provenientes de todas as regies apcolas do territrio continental de Portugal.

    As amostras foram analisadas usando vrios procedimentos, a seguir descritos, de

    forma a obter-se uma caracterizao sensorial (ao nvel da cor) da composio polnica e

    qumica (ao nvel dos acares), para ser relacionada com a informao obtida da anlise

    do mel com a LE.

    2.2. Caracterizao da cor do mel

    A cor foi caracterizada numa escala de mm PFund, a partir da medio da

    absorvncia de uma soluo aquosa de cada amostra num espectrofotmetro UV-Vis

    (Jenway, modelo Genova) a um comprimento de onda de 635 nm [48]. A soluo aquosa foi

    preparada por diluio da amostra na proporo de 1:2 (5,0 g de mel em 10,0 mL de gua

    desionizada). No caso de haver evidncia de presena de cristais de acares, a amostra foi

    aquecida a 50C previamente dissoluo. A soluo foi deixada repousar na cuvete de

    quartzo durante 10 minutos antes da medio. Como branco usou-se gua desionizada.

    A cor do mel foi expressa em unidades da escala de mm Pfund aplicando a seguinte

    expresso [48]:

    = 38,70 + 371,39 (Eq. 1)

    Para verificar visualmente os resultados usou-se tambm uma escala de cores

    padro do mel impressa, associada a intervalos de valores de cor na escala mm PFund,

    apresentada na Figura 1.

    Na classificao da cor usou-se a escala definida pelo Departamento de Agricultura

    dos Estados Unidos (USDA) [49] que considera 7 grupos de cor para o mel. Na Tabela 2

    mostra-se a correspondncia de cada cor com os intervalos de cor da escala mm PFund.

    Nos mis portugueses, a cor branco gua no usual e o mel de cor mbar escuro

    referido como mel escuro.

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    Tabela 2 Cores padro do mel designadas pela USDA e respetivos intervalos de cor da escala mm PFund.

    Cores padro do mel Intervalos de cor da escala mm PFund

    Branco gua 8

    Extra branco >8 e 17

    Branco >17 e 34

    mbar extra claro >34 e 50

    mbar claro >50 e 85

    mbar >85 e 114

    mbar escuro * >114 *) Geralmente classificado com mel escuro

    Figura 1 Escala impressa de cores padro do mel e respetivos intervalos de valores mm PFund.

    2.3. Anlise polnica

    Na anlise polnica (quantitativa), as amostras foram preparadas usando o mtodo

    de Louveaux [50]. As medies polnicas foram efetuadas a partir de 10,0 g de amostra,

    dissolvidas em gua destilada e o sedimento foi concentrado atravs de centrifugaes a

    1500 rpm durante 30 minutos. Ao sedimento adicionaram-se 10,0 mL de uma mistura de

    anidrido actico e cido sulfrico (9:1). Aps incubao em banho-maria (100 C durante 3

    min) com agitao manual e centrifugao, a soluo foi decantada. Posteriormente,

    adicionaram-se cerca de 12,0 mL de cido actico ao sedimento e, aps agitao, efectuou-

    se uma nova centrifugao e decantao. O sedimento foi lavado e ressuspenso em 12,0

    mL de gua destilada, sendo novamente centrifugado e decantado. A lavagem final foi

    mm Pfund COR10 - 20 - 30 - 40 - 50 - 60 - 70 - 80 - 90 - 100 - 110 - 120 - 130 - 140

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    15

    efetuada com 12,0 mL de hidrxido de potssio 7%, repetindo-se os passos de agitao,

    centrifugao e decantao. Em seguida, os gros de plen foram corados com uma

    soluo de fucsina bsica (Merck) e misturada com glicerina (Absolve).

    A observao microscpica dos plens foi efetuada com um microscpico (Leitz

    Messtechnik GmbH, Wetzlar, Germany), com objetivas 400x e 1000x (esta ltima

    amplificao foi usada quando foi necessrio maior pormenor da estrutura do plen para

    uma clara identificao).

    Os plens presentes em cada amostra de mel foram identificados por uma

    investigadora com bastante experincia em anlise polnica (foi contado um mnimo de 1000

    plens por cada amostra, tendo-se repetido a anlise at a obteno de valores

    concordantes), usando como base de comparao uma coleo de referncia da Escola

    Superior Agrria - Instituto Politcnico de Bragana e manuais de morfologia do plen. Os

    gros de plen foram agrupados em tipos polnicos (conjunto de gros de plen com

    morfologia semelhante, normalmente originrios de plantas do mesmo gnero).

    2.4. Anlise por HPLC

    A cromatografia lquida de alto desempenho (HPLC) foi usada neste trabalho para

    identificar e determinar a concentrao dos acares principais presentes no mel: glucose e

    frutose.

    2.4.1. Equipamento

    O equipamento de cromatografia lquida, da marca Varian, era constitudo por uma

    bomba Prostar 220, um injetor manual Rheodyne modelo 7725i com um loop de 20 L, um

    forno Jones CHromatography modelo 7981 e uma coluna Supelcogel C-610H (30 cm de

    comprimento e 7,8 mm de dimetro interno). Na anlise e quantificao dos acares

    (glucose e frutose) usou-se o detetor ndice de refrao (IR) da Varian modelo RI-4. O fluxo

    do eluente, em modo isocrtico, foi de 0,4 mL/min. O tempo de anlise de cada soluo foi

    de 30 minutos.

    2.4.2. Preparao de solues

    Eluente. Na anlise de acares, o eluente usado foi cido fosfrico (Fisher

    Scientific) a 0,1%. Todos os eluentes preparados para o HPLC foram previamente filtrados

    com um sistema de filtrao da Phenomenex, acoplado a uma bomba de vcuo da

    Laboport, usando filtros 0,2 m de nylon da marca Whatman, e desgasificados em

    ultrassons (Elma Transsonic 460/H) durante aproximadamente 5 minutos.

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    Solues padro. Para definir os tempos de reteno de vrios acares referentes

    anlise por HPLC, prepararam-se solues independentes dos seguintes acares, de

    concentrao 1,00x10-3 mol/L: D(+)-trealose (Fluka), maltose (Panreac), D(+)-manose

    (Merck), alfa-D(+)-melibiose (Riedel-de Haen), D(+)-turanose (ACROS Organics), D(+)-

    glucose (Fluka), D(+)-melezitose (Sigma), D(-)-frutose (Fluka) e sacarose (Panreac).

    Na calibrao do equipamento usaram-se solues padro de calibrao de mistura

    da sacarose, frutose e glucose. Estas solues aquosas foram preparadas por medio de

    massas de cada composto diretamente para bales volumtricos, de forma a obter

    concentraes entre 0,500 e 5,00 g/L.

    Para o estudo da preciso e exatido prepararam-se duas solues de controlo de

    qualidade usando o mesmo procedimento que para os compostos acima referidos, com

    nveis de concentrao baixo e mdio, quer para a glucose (valores aproximados de 0,74

    g/L e 2,10 g/L, respectivamente), quer para a frutose (valores aproximados de 0,75 g/L e 3,2

    g/L, respectivamente).

    Amostras. Todas as amostras foram diludas por medio de 0,30-0,50 g de mel

    para um balo volumtrico de 50,00 mL, aferido com gua desionizada. As solues foram

    filtradas com o auxlio de microfiltros descartveis (nylon 0,2 m da Whatman) e seringas

    para dentro de vials, para serem posteriormente analisadas por HPLC.

    No estudo da repetibilidade e preciso intermdia foram usadas trs amostras de

    mel.

    2.5. Anlise com a lngua eletrnica

    2.5.1. Montagem do sistema de multi-sensores

    O sistema de multi-sensores foi preparado numa placa de cloreto de polivinlo (PVC)

    atravs da impresso, nas duas faces, de um circuito usando o mtodo print-screen, por

    aplicao de uma pasta epoxlica condutora de prata (EPO-TK E4110, Epoxy Technology,

    Inc.) de cura a baixas temperaturas, preparada por mistura de dois reagentes (pasta +

    endurecedor). Em cada face do sistema possvel aplicar 10 sensores qumicos, ou seja,

    cada sistema permite monitorizar o sinal de 20 sensores.

    A temperatura de cura usada foi de 40C, permitindo a secagem da pasta em 8

    horas. Aps corte e limpeza do circuito impresso, foram vedados os pontos de colocao do

    sensor qumico e de ligao ficha RS-232, para posterior impermeabilizao do sistema,

    usando como revestimento uma resina acrlica (PLASTIK 70, Kontakt Chemie) adicionada

    por pulverizao. A fase final consistiu na colocao da ficha RS-232 de 25 pinos no

    sistema, envolvendo a sua fixao e ligao ao circuito impresso (Figura 2). Cada sistema

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    17

    foi testado com um multivoltmetro para confirmar se todas as ligaes permitiam a

    conduo de sinal eltrico.

    Figura 2 Sistema de multi-sensores.

    2.5.2. Sensores qumicos

    Os sensores qumicos usados correspondem a diferentes membranas de

    sensibilidade cruzada, preparadas com diferentes combinaes de vrios compostos

    aditivos lipdicos (entre 2,8 e 3,2%) e plastificantes (entre 64,7 e 65,2%). O polmero usado

    foi o PVC (entre 31,9 e 32,3%) da Fluka. Usaram-se 4 substncias aditivas: octadecilamina,

    lcool olelico, cloreto de metiltrioctilamnio e cido oleico (todos Fluka). As 5 substncias

    plastificantes usadas foram: adipato de bis-(1-butilpentilo), sebacato de dibutilo, 2-nitrofenil

    octil ter, fosfato de 2-etil-hexilo e fosfonato de dioctilfenilo (todos Fluka).

    Cada mistura foi preparada por medio de massas pr-estabelecidas de cada um

    dos trs produtos (ver Tabela 3) e dissolvidos com o solvente tetrahidrofurano (Sigma), de

    forma a obter-se uma soluo homognea e viscosa.

    A formao de cada membrana no sistema de multi-sensores foi efetuada usando a

    tcnica da gota (adies de uma gota a intervalos de tempo de 3-5 minutos para evaporao

    completa do solvente) at formao de uma membrana polimrica transparente e de

    aparncia cristalina.

    2.5.3. Equipamento

    A lngua eletrnica utilizada neste trabalho um sistema analtico constitudo por

    eltrodos potenciomtricos tudo-estado-slido, o que lhe confere robustez na sua

    utilizao. um dispositivo constitudo por dois sistemas de multi-sensores, iguais na sua

    constituio ao nvel dos sensores qumicos, e um eltrodo de referncia Ag/AgCl de dupla

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    18

    juno. A lngua eletrnica estava ligada a um datalogger (Agilent 34970). A aquisio do

    sinal de cada membrana foi efetuada atravs de um computador usando o software Agilent

    BenchLink Data Logger (Figura 3). As anlises foram efetuadas em solues sob agitao

    magntica (VELP Scientifica, modelo ARE Heating magnetic stirrer).

    Tabela 3 Composio das membranas polimricas.

    Plastificante Aditivo Sensor n %

    Aditivo %

    Plastificante PVC

    Adipato de bis-(1-butilpentilo) Octadecilamina S1 2,99 65,02 31,99

    lcool olelico S2 2,96 65,00 32,04

    Cloreto de metiltrioctilamnio S3 3,00 65,01 31,99

    cido oleico S4 3,00 65,04 31,96

    Sebacato de dibutilo Octadecilamina S5 3,02 65,11 31,87

    lcool olelico S6 2,96 65,02 32,02

    Cloreto de metiltrioctilamnio S7 3,00 64,91 32,10

    cido oleico S8 2,99 64,93 32,09

    2-nitrofenil octil ter Octadecilamina S9 2,98 64,68 32,34

    lcool olelico S10 3,00 65,10 31,90

    Cloreto de metiltrioctilamnio S11 2,99 65,00 32,00

    cido oleico S12 3,01 65,04 31,95

    Fosfato de 2-etil-hexilo Octadecilamina S13 2,96 64,99 32,05

    lcool olelico S14 2,97 65,04 32,00

    Cloreto de metiltrioctilamnio S15 3,00 64,99 32,01

    cido oleico S16 2,98 65,04 31,98

    Fosfonato de dioctilfenilo Octadecilamina S17 3,12 64,85 32,03

    lcool olelico S18 2,95 65,04 32,01

    Cloreto de metiltrioctilamnio S19 2,99 64,69 32,32

    cido oleico S20 3,01 65,11 31,88

    2.5.4. Anlise com a lngua eletrnica

    Para analisar as amostras com a LE prepararam-se solues aquosas de mel por

    diluio de 10,00 g de mel com 50,00 g de gua desionizada.

    As anlises implicam s um passo prvio de lavagem cuidadosa do sistema analtico

    com gua desionizada e enxaguamento leve com papel absorvente, antes de ser

    mergulhado na nova soluo a analisar. O sistema permite a monitorizao contnua dos

    sensores, pelo que foi possvel verificar visualmente a variao do sinal em funo do tempo

    de cada uma das 40 membranas polimricas usadas. Cada anlise implicou um perodo de

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    19

    estabilizao do sinal de 7 minutos, com agitao magntica, findo o qual se removia a LE

    da soluo medida para a preparar para nova anlise.

    Todas as experincias foram efetuadas temperatura ambiente.

    Os perfis de sinais de potencial de cada membrana polimrica foram transferidos

    para o programa Excel para posterior tratamento de dados.

    Figura 3 Montagem para a anlise com a lngua eletrnica.

    A - Computador; B - Agitador magntico; C - Sistemas de multi-sensores + eltrodo

    de referncia inserido numa amostra; D - Datalogger

    2.6. Anlise de dados

    Os dados multivariados obtidos experimentalmente neste trabalho foram tratados

    com o programa de estatstica R (verso 2.15.1). O estudo incidiu em estabelecer um

    procedimento de tratamento de dados de forma a permitir classificar corretamente, usando o

    mtodo estatstico multivariado ADL (tcnica supervisionada de classificao), o grupo de

    mel monofloral de um elevado nmero de amostras com intrnseca variabilidade.

    Considerando que os perfis de sinais obtidos com a LE tm uma elevada multicolinearidade

    entre sensores, os modelos ADLs obtidos so avaliados atendendo sua robustez ao nvel

    da previso, o que permite a comparao dos modelos, tendo em conta as classificaes

    corretas das amostras considerando os dados originais e, principalmente, as obtidas usando

    a tcnica de validao cruzada LOO (leave-one-out). Em simultneo com este

    A

    B

    C

    D

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    20

    procedimento, usaram-se trs algoritmos meta-heursticos de seleo de subconjuntos de

    variveis por busca local (disponveis no pacote Subselect do programa R) para efeitos de

    comparao e para estabelecer qual o que permitia obter os melhores modelos de

    classificao ADL: algoritmo gentico (GEN), algoritmo de arrefecimento simulado (AS) e

    algoritmo de melhoramento local restringido (MLR). Nas condies definidas, cada algoritmo

    apresentou o melhor modelo para cada subconjunto a variar entre 2 e 20 sensores e aps

    10.000 tentativas de obter esse modelo. Este nmero foi estabelecido por se ter verificado

    que permitia chegar mesma soluo nos subconjuntos com mais de 15 sensores, ou seja,

    ao mesmo conjunto de sensores selecionados. O critrio de qualidade usado para avaliar o

    ajuste entre a varivel dependente (grupos de mel monofloral) usando os subconjuntos de

    sensores estabelecidos pelos algoritmos foi o critrio ccr12 (coefficient and Roy's first root

    statistic, !!) [36,37]. A maximizao deste ndice equivalente maximizao da primeira raiz de Roy, que corresponde proporo entre a varincia explicada e a no explicada

    para a primeira funo discriminante (valor conceitualmente equivalente razo F na

    anlise de varincia univariada).

    Os 19 modelos obtidos com cada um dos trs algoritmos de seleo usados foram,

    posteriormente, testados para inferir da sua capacidade de classificao das amostras de

    mel de acordo com os diferentes tipos de mis monoflorais (quer com dados originais quer

    com a metodologia validao cruzada LOO), selecionando-se o que permitia um maior

    nmero de classificaes corretas para a validao cruzada LOO.

    Um primeiro estudo envolveu a classificao de todas as amostras de mel monofloral

    (excluindo as amostras de mel multifloral), usando a ADL. Em seguida, efectuou-se um

    estudo semelhante sem incluir tambm os grupos de tipo de mel representadas com menos

    de 2 amostras para averiguar se permitia obter modelos de previso mais robustos.

    Finalmente, definiu-se a metodologia a seguir, ao nvel prtico, para a discriminao de

    amostras de diferentes tipos de mis com pelo menos 3 ou mais amostras. Esta

    metodologia envolveu o uso da cor da amostra como parmetro primrio de seleo de

    amostras para simplificar o tratamento estatstico dos dados analticos e permitir obter

    classificaes corretas atravs da anlise multivariada. A soluo envolveu a diviso das

    amostras em trs grupos de cores (detalhes apresentados no captulo seguinte) e

    tratamento de dados de forma independente em cada grupo.

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    21

    3. Resultados 3.1. Cor do mel

    A cor no um parmetro de qualidade do mel, mas um factor comercial

    importante para os produtores, embaladores e consumidores. Em Portugal, no

    necessrio especificar a cor no rtulo, mas os consumidores baseiam-se neste atributo

    visual na escolha do mel que compram. Como a cor uma caracterstica que advm

    principalmente da fonte floral do mel, decidiu-se analisar os dados da anlise polnica e

    verificar se possvel obter uma relao entre os respetivos resultados e os da anlise da

    cor.

    As 89 amostras de mel foram analisadas por espectrofotometria UV-Vis e

    determinada a cor na escala Pfund (mm) atravs das absorvncias obtidas (equao 1). Na

    Figura 4 apresenta-se a classificao de cada amostra de acordo com a escala de cores

    padro do mel impressa e a definida pela USDA. Na Tabela 4 mostra-se o nmero de

    amostras e o respectivo valor de percentagem associado a cada grupo de cor padro

    definida pela USDA.

    Tabela 4 Nmero de amostras com cores padro do mel designadas pela USDA.

    Cores padro do mel N de amostras %

    Extra branco (EB) 2 2,2

    Branco (B) 20 22,5

    mbar extra claro (AEC) 10 11,2

    mbar claro (AC) 22 24,7

    mbar (A) 10 11,2

    Escuro (E) 25 28,1

    Como se pode visualizar na Figura 4, as amostras mostram uma variao de cor

    desde o extra branco at ao escuro, com variaes dentro do intervalo de 15,9 a 204,2 mm

    Pfund. Segundo a escala definida pela USDA, as amostras de cor branco, mbar claro e

    escuro so as que predominam (>22% em cada categoria). Mis de cor mbar extra claro e

    mbar esto representados medianamente (11,2% para cada categoria). As amostras de cor

    extra branco so as menos representativas (2,2%) .

    Na Figura 5 mostra-se o grfico da distribuio da cor Pfund das amostras e a

    funo que melhor se ajustou frequncia das amostras, a distribuio log-normal. Esta

    distribuio mostra que o logartmo da frequncia segue uma distribuio normal.

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    22

    Figura 4 Amostras de mel usadas neste trabalho de acordo com a escala de cores padro do mel

    impressa e as definidas pela USDA.

    Cor padro mm PFUND Cor (USDA)

    15.9 EB16.3 EB18.9 B20.0 B20.7 B22.6 B23.0 B25.6 B26.3 B26.7 B26.7 B27.0 B27.0 B28.2 B28.5 B31.5 B31.9 B32.2 B32.2 B33.0 B33.3 B33.3 B34.8 AEC35.9 AEC38.9 AEC39.7 AEC40.0 AEC41.5 AEC43.7 AEC44.9 AEC47.1 AEC48.9 AEC51.2 AC56.0 AC57.1 AC59.3 AC60.1 AC60.8 AC60.8 AC62.7 AC63.1 AC65.3 AC66.4 AC66.4 AC66.4 AC67.1 AC69.0 AC70.5 AC73.8 AC73.8 AC76.4 AC78.3 AC78.3 AC80.9 AC87.9 A88.7 A99.8 A

    100.9 A103.2 A103.5 A107.6 A111.3 A112.8 A113.6 A114.7 E118.4 E118.8 E119.1 E126.6 E126.9 E128.8 E134.0 E135.1 E135.1 E138.8 E141.4 E142.2 E147.4 E147.4 E155.5 E156.3 E171.1 E171.9 E175.6 E193.4 E196.0 E198.6 E201.2 E204.2 E

    EB - extra branco;

    B branco;

    AEC - mbar extra claro;

    AC - mbar claro;

    A mbar;

    E escuro.

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    23

    A variabilidade da cor obtida uma indicao de acentuada variao na composio

    qumica e, por isso, da fonte polnica das amostras. Esta variabilidade das amostras era

    pretendida com vista a testar as capacidades analticas da LE nos estudos do mel.

    Figura 5 Distribuio da cor Pfund (mm) e ajuste da funo de distribuio log-normal.

    3.2. Anlise polnica

    A anlise polnica realizada permitiu obter o perfil polnico das amostras. Esta uma

    anlise quantitativa, uma vez que se faz a contagem dos gros de plen com morfologia

    semelhante, originrios de plantas do mesmo gnero (por tipo de plen). A proporo de

    cada tipo de plen presente na amostra permite a sua classificao em termos de origem

    botnica, embora com limitaes associadas interpretao dos perfis polnicos. Em rigor, a

    classificao deveria ser complementada com uma anlise sensorial.

    Na Tabela 5 mostram-se os diferentes tipos de plen visualizados nas amostras, a

    indicao da percentagem de mis com o plen presente na sua constituio (ordem

    decrescente) e os valores mnimo e mximo da percentagem de cada plen obtido da

    anlise. Na Tabela 6 apresentam-se os nomes cientficos do gnero da planta cujo tipo de

    plen foi visualizado na anlise polnica das amostras de mel e exemplos de plantas com

    nomes comuns, associadas ao gnero.

    Na globalidade das amostras foi possvel identificar 23 tipos de plen. A ordem

    decrescente dos valores de percentagem de mis com um dado tipo de plen mostra que os

    plens Rubus sp., Prunus sp., Echium sp., Lavandula sp., Castanea sp., Trifolium sp., Erica

    020406080

    100120140160180200220

    Cor P

    fund

    (mm

    )

    2 4 6 8 10N amostras

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    24

    sp. e Eucalyptus sp. esto presentes em mais de 40% das amostras. A seguir, os plens

    Thymus sp., Leontodeon sp., Cytisus sp., Acacia sp. e Pinus sp. so os mais abundantes,

    estando presentes em 13 a 25% das amostras. Os restantes tipos de plen esto presentes

    em menos de 8% das amostras.

    Tabela 5 Percentagem de mis com cada tipo de plen presente e o valor mnimo e mximo da percentagem de cada plen nas amostras de mel.

    Tipo de Abreviatura do % Plen nas amostras % Mis com

    plen tipo de plen Min Mx o plen

    Rubus sp. Rub 1,1 68,6 76,4

    Prunus sp. Pru 1,4 80,1 75,3

    Echium sp. Ech 1,4 79,3 73,0

    Lavandula sp. Lav 1,2 66,5 70,8

    Castanea sp. Cas 2,5 94,8 62,9

    Trifolium sp. Tri 1,4 81,7 50,6

    Erica sp. Eri 1,2 81,7 41,6

    Eucalyptus sp. Euc 1,2 82,0 40,4

    Thymus sp. Thy 1,3 17,8 24,7

    Leontondon sp. Leo 1,1 20,1 24,7

    Cytisus sp. Cyt 1,2 7,1 19,1

    Acacia sp. Aca 0,6 21,8 14,6

    Pinus sp. Pin 1,6 6,1 13,5

    Sandix sp. San 1,5 6,6 7,9

    Foeniculum sp. Foe 1,5 24,3 7,9

    Helianthus sp. Hel 1,4 6,9 4,5

    Mentha sp. Men 1,5 3,0 3,4

    Mimosaceae sp. Mim 2,6 5,4 2,2

    Crepis sp. Cre 1,8 3,3 2,2

    Tilia sp. Til 4,7 11,2 2,2

    Genista sp. Gen 1,2 11,4 2,2

    Medicago sp. Med 19,9 19,9 1,1

    Persea sp. Per 6,9 6,9 1,1

    Os diferentes tipos de plens encontrados so comuns nos mis Portugueses [12].

    Os valores percentuais mnimos e mximos de cada tipo de gro de plen indicam que o

    espectro polnico de cada amostra varivel, tal como o nmero de tipos de plen

    presentes em cada amostra. Os perfis polnicos mostram que estas apresentam geralmente

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    25

    4 a 9 tipos de plen na sua constituio. S quatro amostras apresentaram 3 tipos de plen

    e apenas uma amostra continha dois tipos.

    Tabela 6 Exemplo de planta associada a cada gnero identificado atravs da anlise polnica.

    Gnero da planta Exemplo de planta (nomes triviais)

    Acacia sp. Accia

    Castanea sp. Castanheiro

    Crepis sp. Almeiro-branco

    Cytisus sp. Giesta

    Echium sp. Soagem

    Erica sp. Urze

    Eucalyptus sp. Eucalipto

    Foeniculum sp. Funcho

    Genista sp. Tojo

    Helianthus sp. Girassol

    Lavandula sp. Rosmaninho

    Leontondon sp. Dente-de-leo

    Medicago sp. Alfafa

    Mentha sp. Hortel

    Mimosaceae sp. Mimosa

    Persea sp. Loureiro-real

    Pinus sp. Pinheiro

    Prunus sp. Cerejeira

    Rubus sp. Amora silvestre

    Thymus sp. Tomilho

    Tilia sp. Tlia

    Trifolium sp. Trevo

    Sandix sp. Agulha de pastor

    Verifica-se t