lesão corporal - direito penal · o necessidade de realização de laudo complementar para atestar...

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Lesão corporal Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano. 1) BEM JURÍDICO Integridade física e psíquica da pessoa humana. A dor, por si só, não caracteriza lesão corporal. Discussão sobre a disponibilidade do bem Jurídico. o Parcela da doutrina entende que o bem jurídico é indisponível, admitido o afastamento da tipicidade quando houver adequação social do comportamento (FMB). o Outros defendem a disponibilidade relativa do bem jurídico, desde que não viole a moral e os bons costumes (NUCCI, BITTENCOURT). O consentimento do ofendido, nesse contexto, torna-se uma causa supralegal de exclusão da antijuridicidade. Aplicabilidade do Princípio da Insignificância o Aplicável: é necessário que o dano ao corpo ou a saúde não seja insignificante (BRUNO, FMB, NUCCI, FRAGOSO). O STJ admite a insignificância de pequenas lesões causadas culposamente, mormente em acidentes de trânsito. Não se admite quando a lesão for provocada com violência doméstica (AgRg no AREsp 19042/DF DJ 14.02.2012) Cirurgia de Readequação Sexual o Configura exercício regular de direito, porque a finalidade é terapêutica, desde que não seja realizada por mero capricho (FMB) o Fato materialmente atípico. O médico não age para causar dano, mas para curar ou diminuir um mal (FRAGOSO, NUCCI). Resolução 1652/2002 do CFM: “propósito terapêutico de adequar a genitália ao sexo psíquico”

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Lesão corporal

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano.

1) BEM JURÍDICO

Integridade física e psíquica da pessoa humana.

A dor, por si só, não caracteriza lesão corporal.

Discussão sobre a disponibilidade do bem Jurídico.

o Parcela da doutrina entende que o bem jurídico é indisponível, admitido o

afastamento da tipicidade quando houver adequação social do

comportamento (FMB).

o Outros defendem a disponibilidade relativa do bem jurídico, desde que não viole

a moral e os bons costumes (NUCCI, BITTENCOURT). O consentimento do

ofendido, nesse contexto, torna-se uma causa supralegal de exclusão da

antijuridicidade.

Aplicabilidade do Princípio da Insignificância

o Aplicável: é necessário que o dano ao corpo ou a saúde não seja insignificante

(BRUNO, FMB, NUCCI, FRAGOSO).

O STJ admite a insignificância de pequenas lesões causadas

culposamente, mormente em acidentes de trânsito.

Não se admite quando a lesão for provocada com violência doméstica

(AgRg no AREsp 19042/DF – DJ 14.02.2012)

Cirurgia de Readequação Sexual

o Configura exercício regular de direito, porque a finalidade é terapêutica, desde

que não seja realizada por mero capricho (FMB)

o Fato materialmente atípico. O médico não age para causar dano, mas para

curar ou diminuir um mal (FRAGOSO, NUCCI). Resolução 1652/2002 do

CFM: “propósito terapêutico de adequar a genitália ao sexo psíquico”

Corte de cabelo

o Fato atípico – princípio da adequação social

o Furto – cabelo tem valor econômico

o Injúria real - intenção de humilhar a vítima

2) TIPO OBJETIVO

a. VERBO NÚCLEO

Ofender: lesar ou fazer mal a alguém.

Em regra é cometido de forma comissiva. Mas pode ser cometido por omissão (CP, art.

13, §2)

É possível praticar o delito sem violência física.

A pluralidade de lesões não implica em pluralidade de crimes.

b. ELEMENTARES

Integridade corporal – inteireza do corpo.

o O dano não precisa ser perceptível externamente.

Integridade psíquica – comprometimento da regularidade do funcionamento do cérebro.

Saúde – bom funcionamento das funções biológicas

o O agravamento de uma condição preexistente pode configurar lesão corporal

3) TIPO SUBJETIVO

Dolo vontade e consciência dirigida à ofender a integridade alheia. Animus

laedendi ou Animus vulnerandi.

Não há elemento subjetivo específico.

Se não houver intenção de lesionar, a infração será a contravenção de Vias de Fato

(Art. 21, Dec. Lei 3.688/41). Ex: puxão de cabelo, tapa no rosto.

Se houver intenção de matar, o crime será de homicídio tentado.

A lesão corporal causada como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter

preventivo, pode caracterizar o crime de Tortura:

Art. 1º Constitui crime de tortura: II - submeter alguém, sob sua guarda, poder

ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso

sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida

de caráter preventivo.

4) SUJEITOS

a. ATIVO

Trata-se de Crime Comum, pode ser cometido por qualquer pessoa.

b. PASSIVO

Qualquer pessoa. Salvo nas hipóteses do §1, IV, e do §2, V, onde a vítima será

necessariamente mulher grávida.

A lei não pune a autolesão. Princípio da Alteridade.

o Autolesão x autoria mediata

o Autolesão com objetivos ilícitos: para fugir do serviço militar (CPM, art. 160);

para receber prêmio de seguro (CP, art. 171, §2)

A pena será aumentada se cometida contra índio não integrado (Lei 6001/73, art. 59)

Nas lesões corporais praticadas com violência doméstica o crime será

bipróprio

5) MOMENTO CONSUMATIVO

Trata-se de Crime Material. Consuma-se com a ofensa à integridade física da

vítima.

Necessidade de exame de corpo de delito. Crime com vestígio.

6) TENTATIVA

A tentativa é possível, salvo na modalidade preterdolosa (perigo de vida e aborto).

Crimes qualificados pelo resultado não admitem tentativa.

7) CLASSIFICAÇÃO

a. Comum (regra)

b. Material

c. De forma livre

d. Comissivo (regra)

e. De dano

f. Unissubjetivo (de concurso eventual)

g. Plurissubsistente

Lesão corporal de natureza grave

§ 1º Se resulta:

I - Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;

II - perigo de vida;

III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;

IV - aceleração de parto:

Pena - reclusão, de um a cinco anos.

Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;

o “Crime a prazo”

o Qualquer atividade LÍCITA praticada habitualmente pela vítima.

Prostituição?

o A atividade deve ser frequente. A perda ou adiamento de uma viagem, p.ex., não

é suficiente para qualificar as lesões.

o Necessidade de realização de laudo complementar para atestar a continuidade

da incapacidade. Mas o exame poderá ser suprido por prova testemunhal

(CPP, art. 168, §3º).

o Não se configura a qualificadora se a vitima pode voltar às atividades, mas não o

faz por vergonha das cicatrizes.

Perigo de vida

o Possibildiade concreta de que a vítima venha a falecer em consequência das

lesões.

o Diagnóstico x Prognóstico

o Necessariamente preterdoloso. Se houver dolo quanto à colocação em risco de

morte, trata-se de homicídio (tentado).

Debilidade permanente de membro, sentido ou função

o Não se exige debilidade perpétua, basta que seja de duração indeterminada.

Membros – apêndices do corpo (dedos são partes dos apêndices)

Sentidos – são as faculdades pelas quais o homem entra em contato com

o mundo externo: visão, olfato, paladar, audição e tato

Funções – atividades específicas dos órgãos: respiratória, secretora,

sensitiva, reprodutora, digestiva, circulatória ...

o A perda ou inutilização de órgãos duplo configura debilidade. A perda de

membro duplo não.

o Dentes?

o A recuperação da capacidade funcional por emprego de meios ortopédicos não

desconfigura a qualificadora.

o Perda da membrana himenal é lesão leve, pois o hímen não desempenha

nenhuma função orgânica.

Aceleração do parto

o Trata-se em realidade de antecipação do parto.

o Deve haver nascimento com vida.

Lesão corporal de natureza gravíssima

§ 2° Se resulta:

I - Incapacidade permanente para o trabalho;

II - enfermidade incurável;

III perda ou inutilização do membro, sentido ou função;

IV - deformidade permanente;

V - aborto:

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

Incapacidade permanente para o trabalho

o Trabalho em sentido amplo. É necessário que a vítima fique impossibilitada para

qualquer trabalho.

o Se a incapacidade não for total e permanente, desclassifica-se para o §1, III

Enfermidade incurável

o Doença irremediável, de acordo com os recursos da medicina na época do

resultado.

o Distinção da debilidade permanente. Exemplo do Frederico Marques: a agressão

provoca a fratura do osso da perna. Se o ofendido se curar, mas ficar coxo,

será uma debilidade permanente. Se, ao invés disso, desenvolver um

processo osteomiolítico tuberculoso, provavelmente incurável, verifica-se a

enfermidade.

o A vítima não precisa se submeter a procedimentos perigosos. Contudo, se há

recursos e ela não os utiliza por capricho, o crime não será qualificado.

o Não cabe Revisão Criminal se a cura da doença for encontrada após a

consumação.

Perda ou inutilização de membro, sentido ou função

o Perda é a ablação do membro ou órgão, seja por mutilação (força não cirúrgica)

ou amputação (força cirúrgica); na inutilização o membro ou órgão subsiste

anatomicamente, mas sem função.

o Impotência in coeundi x impotência in generandi

Deformidade permanente

o A doutrina majoritária vincula a deformidade a um “afeamento irreparável pela

simples ação da natureza”, imbuindo a qualificadora com um caráter estético.

o A lesão deve ser visível e capaz de causar reações de desagrado ou piedade.

o Deve ser considerada o sexo, a condição social, a profissão, etc.

o A possibilidade de dissimulação da lesão com barba, olho de vidro, dentes

postiços, maquiagem, etc, não afasta a qualificadora

NUCCI entende que não tem vinculação com a estética. Desde que o

agente provoque na vítima uma alteração duradoura nas formas

originais de seu corpo, é de se reputar configurada a qualificadora,

levado em consideração o desagrado íntimo causado a quem

efetivamente sofreu a lesão.

Aborto

o Interrupção da gravidez com a morte do feto.

o O aborto deve ser necessariamente preterdoloso. Se houver dolo em relação ao

resultado o agente responderá pelo crime de aborto qualificado.

No concurso de qualificadoras, o Juiz aplicará apenas uma e utilizará as

restantes como circunstancias judiciais desfavoráveis. Se for uma qualificadora

do §2 e outra do §1, utilizará a do §2 para qualificar e a outra como

circunstância.

Lesão corporal seguida de morte

§ 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quís o

resultado, nem assumiu o risco de produzí-lo:

Pena - reclusão, de quatro a doze anos.

Também chamado de homicídio preterdoloso. Não é crime contra a vida. A

competência não será do Tribunal do Júri.

Lesão dolosa + morte culposa + nexo causal entre a lesão e a morte

o A ocorrência de concausa superveniente relativamente indenpendente que por si

só cause o resultado, afasta a imputação, devendo o agente responder

apenas pelos atos praticados.

o Morte culposa decorrente de vias de fato ou ameaça homicídio culposo

o Quando houver concurso de agentes, lembrar da possibilidade de cooperação

dolosamente distinta (CP, art. 29, §2)

Diminuição de pena

§ 4° Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou

moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta

provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.

Substituição da pena

§ 5° O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção

pela de multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis:

I - se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior;

II - se as lesões são recíprocas.

Situação 1: o agente pratica as lesões por motivo de relevante valor social ou moral ou

sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima

Situação 2: lesões recíprocas

o Não existe legitima defesa recíproca. Por isso, um dos agentes terá agido

injustamente e o outro em legítima defesa. No caso, diminui-se a pena de

quem agiu injustamente.

Lesão corporal culposa

§ 6° Se a lesão é culposa: (Vide Lei nº 4.611, de 1965)

Pena - detenção, de dois meses a um ano.

O grau da lesão sofrida não interfere, mas deverá ser considerado no momento de

calcular a pena.

Lesão Corporal Culposa no CTB

Art. 303. Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor:

Penas - detenção, de seis meses a dois anos e suspensão ou proibição de se

obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Parágrafo único. Aumenta-se a pena de um terço à metade, se ocorrer

qualquer das hipóteses do parágrafo único do artigo anterior.

Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo

automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente:

I - não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação;

II - praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada;

III - deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à

vítima do acidente;

IV - no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de

transporte de passageiros.

Não se aplica o CTB aos homicídios e lesões corporais causadas por: a) pedestre; b)

ciclomotor com menos de 50 cilindradas, cuja velocidade máxima não exceda 50

Km/h; c) animais; d)bicicleta; e) charrete; f) trem ; g) carrinho de reolemã.

Não se aplica o CTB se o acidente ocorrer: a) mar ou ar; b) linha férrea de trem; c)

estacionamento de shopping Center; d) vias rurais não abertas a circulação.

Aumento de pena

§ 7º - Aumenta-se a pena de um terço, se ocorrer qualquer das hipóteses do art.

121, § 4º. (Redação dada pela Lei nº 8.069, de 1990)

§ 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o

crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou

se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir

as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo

doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é

praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta)

anos. (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

Se culposo:

Inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício.

o Apenas quando houver relação de causalidade entre a inobservância da regra e o resultado morte

o Imperícia é quando o agente não tem o treinamento específico. Nesse caso, o agente tem, mas não o utiliza por desleixo.

o Confusão com a própria imperícia. Bis in idem (NUCCI)

Agente deixa de prestar imediato socorro à vítima

o Prestar socorro diretamente x prestar socorro indiretamente.

o Omissão de socorro. Tutela de solidariedade.

o Se o agente não causou o resultado por culpa, mas, mesmo assim não prestar

socorro, responderá pelo crime do art. 135.

o O agente deve poder prestar socorro sem risco à sua segurança.

Não procura diminuir as consequências de seu ato

o Apoio financeiro, moral...

Foge para evitar a prisão em flagrante

o Justificar-se-ia por conta da maior facilidade que a prisão em flagrante

proporciona ao poder punitivo.

o Critério é inconstitucional, pois qualquer pessoa tem o direito de querer evitar a

própria prisão. Direito a não produzir provas contra si mesmo.

Se doloso:

o Crime praticado contra menor de 14 ou maior de 60

Perdão Judicial

§ 8º - Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do art. 121.(Redação dada pela

Lei nº 8.069, de 1990)

§ 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a

pena, se as conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma

tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. (Incluído pela Lei nº

6.416, de 24.5.1977)

Violência Doméstica (Incluído pela Lei nº 10.886, de 2004)

§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou

companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda,

prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de

hospitalidade:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. (Redação dada pela Lei nº

11.340, de 2006)

Até 2006, a política criminal era dirigida à manutenção do casamento, visando a

preservação da família, de modo que, se a pessoa se reconciliava, a

indicação era o arquivamento do inquérito ou absolvição. Hoje a Política

criminal é de redução da violência doméstica – caso Maria da Penha.

Ação Penal

O art. 88 da Lei 9.099/95 prevê que as lesões simples e as culposas são de Ação

Penal Publica Condicionada

O Art. 41 da Lei 11.340/2006 prevê que aos crimes cometidos com violência

doméstica não se aplicam as disposições da lei 9.099.

Contudo, há forte entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que a

Lei Maria da Penha afastou apenas a incidência dos institutos

despenalizadores da lei 9.099 (transação, suspensão condicional do

processo, substituição da pena).

Nucci entende que o procede-se mediante representação apenas nos crimes cuja

pena permita

STJ: Ação Penal Pública Condicionada – Resp 1.097.042/DF, DJ 24.02.2010:

“entender a ação como incondicionada resultaria subtrair da mulher ofentdida o

direito e o anseio de livremente se relacionar com quem quer que seja

escolhido como parceirro (...) para tratá-la como se fosse submetida à

vontade dos agentes do Estado.

STF: Ação Penal Pública Incondicionada – ADIn 4.424, DJ 09.02.2012

§ 10. Nos casos previstos nos §§ 1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as

indicadas no § 9o deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço).

(Incluído pela Lei nº 10.886, de 2004)

Aumento de pena nos casos de Violência Doméstica

§ 11. Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o

crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência. (Incluído pela

Lei nº 11.340, de 2006)