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A LEITURA CRÍTICA DA PALAVRA ESCRITA1
Segundo Luckesi, (1987) para que a universidade cumpra sua missão de formar
cidadãos com consciência crítica se faz necessário que os sujeitos do processo tomem uma
posição de leitor sujeito, de leitor autor. Pois a maioria das atividades acadêmicas passam
pela leitura.
A leitura da palavra escrita é ainda a forma mais usada no processo ensino-
aprendizagem, concorrendo com a palavra oral. Porém com as novas tecnologias digitais,
se faz necessário apreender a ler todas as formas de linguagem. Seja a oralidade, a escrita, o
sonoridade, a imagética. Este novo modo de comunicação exigem cada vez um sujeito
crítico e agil em seu raciocínio, com posturas claras capaz de fazer escolhas e proposições. .
Ler significa muito mais que identificar signos. Significa compreender a apropriação
do significado da mensagem. Neste sentido, se apropriar da mensagem, implica em um
conjunto de operações cognitivas que visam selecionar, organizar, interpretar, reelaborar as
mensagens, sejam elas expressas em qualquer forma de linguagem.
" Me parece indispensável, ao procurar falar de tal importância -
do ato de ler - dizer algo do momento mesmo em que me preparava
para aqui estar hoje: dizer algo do processo em que me inseri
enquanto ia escrevendo este texto e que agora leio, processo que
envolvia uma compreensão crítica do ato de ler, que não se esgota
na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita,
mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura
do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura
desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele.
Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão
do texto a ser alcançado por sua leitura crítica implica a percepção
das relações entre o texto e o contexto. Ao ensaiar escrever sobre a
importância do ato de ler, eu me senti levado - e até gostosamente -
a 'reler' momentos fundamentais de minha prática, guardados na
memória, desde as experiências mais remotas de minha infância, de
minha adolescência, de minha mocidade, em que a compreensão
crítica da importância do ato de ler se veio em mim constituindo.
(...) Os 'textos' as 'palavras', as 'letras' daquele contexto se
encarnavam no canto dos pássaros - o sanhaçu, o olha-pro-
caminho-quem-vem, o do bem-te-vi, o do sabiá; na dança das copas
das árvores sopradas por fortes ventanias que anunciam
1 Adapatado de LUCKESI, Cipriano et all. O leitor no ato de estudar a palavra escrita. In: Fazer Universidade um proposta metodológica. São Paulo, Cortez, 19987. 136-153.
tempestades, trovões, relâmpagos; as águas da chuva brincando
de geografia...( Freire 1983, p.10-12)"
Não me ocorre no momento melhor fala sobre o ato de ler do que esta de Paulo
Freire no Congresso Brasileiro de Leitura em Campinas em 1981. Me parece suficiente
para justificar a seqüência de nosso estudos, onde vamos estar desenvolvendo nossos
conceitos a respeito de alguns dos temas definidos para este módulo e ao mesmo tempo
aprendendo uma forma de ler talvez um pouco diferente do que fazemos no quotidiano. Ler
empregando uma metodologia de leitura crítica.
Segundo critério gerais, nosso país tem ainda um alto índice de analfabetismo, 18 %
da população ou seja em torno de 28 milhões brasileiros são analfabetos. A pesquisa de
Ribeiro (1993), utilizando-se de dados do profluxo, estabelecendo critérios mais rigorosos
em relação ao que significar ler, indica que 82% das pessoas consideradas alfabetizadas,
ou 60 milhões de brasileiros, são analfabetos funcionais. Sabem assinar o nome, são
eleitores, mas não entendem o que lêem. Ler não é apenas identificar signos, é compreender
o mundo e compreender-se no mundo. Embora este estudo de Ribeiro seja de 93, os novos
dados não estão muito diferentes, provavelmente.
"Sendo os textos uma fonte inesgotável de idéias e conhecimentos, deve-se ler muito e
continuadamente. Entretanto, não basta ler indiscriminadamente, é preciso saber ler. A
leitura é válida somente quando assimilada. Tanto o estudante quanto o intelectual
precisam ler constantemente ( Lakatos & Marconi,1992:15)."
"Há três espécies de leitura: uma, para entretenimento ou distração; outra, para aquisição
de cultura geral, erudição; e a terceira, tendo em vista a ampliação de conhecimentos em
determinado campo de saber. As duas primeiras não exigem, praticamente, uma grande
esforço intelectual, ao passo que a última requer atenção especial e concentração(Lakatos
e Marconi,1992:16)."
"Aprender a ler, a escrever, alfabetizar-se é, antes de mais nada, aprender a ler o mundo,
compreender o seu contextos, não numa manipulação mecânica de palavras, mas numa
relação dinâmica que vincula linguagem e realidade (Freire,1983, p 8) "
Muitos propósitos podem servir de indicadores na hora de selecionar o que ler.
Lazer, informação, conhecimento geral, pesquisa, aprofundamento, reflexão estudos. Para
selecionar uma leitura é importante ter claro o seu propósito. Pois porque ler algo é o
primeiro critério para selecionar a leitura. Neste caso vamos tratar de leitura como
instrumento de estudos seja para conhecimento geral, seja para uma pesquisa aprofundada
sobre um determinado tema. Desenvolver um método de leitura crítica pressupõe uma
técnica adequada.
Vamos seguir os passos básicos para a iniciação um processe de leitura crítica. Primeiro passo. Leitura de reconhecimento
Na primeira leitura identifica-se de forma geral do que trata o texto. Recomenda-
se não assinalar o texto nesta fase. Pois quando lemos a primeira vez corremos o risco de
selecionar da leitura o que nos fala diretamente, sensivelmente. Nem sempre o que nos
toca de imediato é a mensagem do autor. Na maioria das vezes é o que nos diríamos ou
gostaríamos de dizer. Por isso proceder a primeira leitura apenas como reconhecimento do
texto é importante, para em seguida nos distanciarmos e ouvirmos o que o autor está
dizendo
Na segunda leitura pode-se identificar os elementos subsidiários da leitura:
A leitura crítica de um texto requer uma leitura contextualizada. Isto é, situar o
texto no contexto de sua produção. Reconhecer que o pensamento escrito ocorreu em uma
determinada época, e decorre de desafios específicos. O autor não é um ser a-temporal. É
um ser situado e determinado por suas próprias experiências e intencionalidade. Portanto é
preciso conhecer o ponto de vista do mesmo para apreciar sua mensagem. Isto se faz pela
análise dos elementos subsidiários da leitura
a) Referência bibliográfica do texto e extensão da leitura a ser feita: serve para
identificar a extensão da leitura, e analisar em que bibliografia está referenciado,
quando e onde foi escrito, situando-o no contexto. Isto dá a idéia da abordagem do
autor. Por exemplo, dados bibliográficos. LUCKESI, Cipriano et all. O leitor no ato de
estudar a palavra escrita. In: Fazer Universidade um proposta metodológica. São Paulo,
Cortez, 19987. 136-153.
b) A identificação do tipo de texto. É importante saber se temos um texto filosófico,
científico, literário ou um texto de opinião. Está informação vai confirmar a escolha
apropriada ou não ao propósito da leitura. Se estamos tratando de uma leitura para
estudos certamente um texto de opinião não é recomendado. Este esforço em identificar
o tipo de texto auxilia a análise da leitura. Por exemplo: um texto de opinião ou um
texto informativo, é o que circula no jornal, nas revistas semanais, têm um
compromisso, tem a intencionalidade de formar opinião. Não tem compromisso com a a
busca da verdade ou com a ciência, mesmo as vezes referenciando-se a pesquisas e
dados. É preciso Ter clareza que a informação veiculada nos mas medias, é mercadoria
de troca, é negócio, não é ciência. Publica-se na veja, na folha, etc, veicula-se na globo
o que vende o que dá ibope. São textos de opinião. Podem e devem ser lidos porém não
são suficientes e recomendáveis em caso de estudos e pesquisas científicas. O texto
Literário, tem outro caráter e outra intenção. É artístico, é poético, explora o estético
para veicular uma mensagem. Os texto científicos buscam analisar fatos, fenômenos,
sistemas, demonstrando com rigor e sistematização caracteres, fatores, informações que
explicitam o objeto. Constituem uma tematização rigorosa, apresentam um raciocínio
construído sobre teorias e ou pesquisas exaustivas e comprovadas. Geralmente
desenvolve-se utilizando terminologia e método próprio da área. Os textos filosóficos
têm como objetivo maior expressar uma reflexão que também exigem método coerente,
raciocínio rigoroso, sobre os fatos e os fenômenos. Pode-se dizer que na ciência a
ênfase maior e revelar o que é o objeto. Na filosofia a ênfase maior é refletir sobre o
significado do objeto ou do fenômeno. Um texto pode ser ao mesmo tempo científico e
filosófico, mas não pode ser ao mesmo tempo, científico e de opinião. O texto literário,
pode ser tomado como mote para um reflexão filosófica e ou cientifica mas requer uma
transposição, pois geralmente não trata desses aspectos em si mesmo, ou diretamente.
c) Os dados biográficos do autor. Saber com quem estamos dialogando, sua história,
seus comprometimentos, sua área de produção. Possuir informações sobre a vida
intelectual, política cultural do autor, auxilia o leitor na contextualização e
interpretação de suas idéias.
d) Estudo dos componentes desconhecidos do texto. Às vezes a interpretação
equivocado de um termo significativo dentro do texto altera totalmente o sentido do
mesmo. Por isso é sempre recomendável verificar em dicionário o significado de termos
desconhecidos, e quando necessário ir a dicionários específicos da área em questão.
Da terceira leitura em diante se identifica elementos da leitura propriamente dita: o
estudo da temática do texto. Nesse momento cabe ao leitor sujeito um esforço para
compreender o que o autor está dizendo. É preciso estar aberto e procurar entender a
mensagem do autor. Não cabe nesse momento qualquer tipo de julgamento das idéias do
autor e sim a busca do entendimento da mensagem do autor. É preciso levar em
consideração os seguinte itens:
a) Identificação e análise do título do texto. De forma geral o título de um texto
cientifico ou filosófico deve indicar o tema tratado, ser um título temático. Porém,
atualmente utiliza-se para fins de propaganda títulos metafóricos mesmo quando não se
trata de texto literário ou de opinião.
a) Identificação do tema abordado. O tema indica uma delimitação do assunto dentro da
área eleita pelo autor. É importante identificar o tema e não confundi-lo com a idéia
central. O tema redimensiona a questão em termos de assunto.
b) Identificação da problematização feita pelo autor em torno do tema. A
problematização indica a perspectiva da discussão que o autor está levantando além de
situar em um determinado contexto. Em alguns casos a problematização se faz
claramente no problema levantado, em forma de pergunta, em outros está implícita, nos
parágrafos que situam a questão. A problematização indica uma pista para entendermos
o texto, pois diz das questões que levaram o autor a elaborar uma resposta ou uma
posição.
c) Identificação do ponto de vista ou idéia central. A idéia central ou a posição do autor
em relação ao problema levantado, geralmente se anuncia em todo o texto, e se faz
claramente em determinado ponto, não tendo, necessariamente um lugar definido. Sem
idéia central, explícita ou não, não há texto.
d) Identificação da argumentação. Trata-se de aspectos do texto que sustentam que
validam, que ancoram a idéia central. Chegando a esse ponto da análise é fácil
identificar esses argumentos. Podem estar em todo o desenvolvimento do texto como
podem estar agrupados em determinado espaço no texto. Em resumo o autor se situa
dentre de um determinado assunto: tematiza, isto é delimita nesse assunto o que vai
tratar; problematiza diz de sua preocupação, de suas indagações sobre a questão; toma
um aposição - a idéia central – e argumenta essa idéia. Ao ler um texto de caráter
científicos pode-se fazê-lo perquerindo estes pontos, constituem a chave para se
entender o texto.
Após esta leitura criteriosa do texto que ocorre, geralmente, a partir da terceira
leitura, e às vezes exige uma quarta ou uma quinta leitura, dependendo da profundidade da
leitura e de como ela foi produzida, ou ainda exige outras leitura complementares, pode-se
então passar para a fase de avaliação crítica e proposições.
Da avaliação crítica e proposições. Nesta fase o leitor está em condições de
dialogar o autor, de tomar, posição, de contra-argumentar. Esta é a posição do leitor crítico.
A leitura crítica exige um posicionamento frente a mesma. Esta fase desdobra-se em três
momentos. A do juízo externo, que se relaciona mais aos elemento subsidiários. Referem-se
a verificar se o autor tem autoridade científica no assunto, tem coerência ideológica, suas
idéias e posicionamentos concerne com suas ações. A do juízo interno o texto tem
coerência interna, propõe-se a defender uma idéia e tem elementos apropriados, o texto tem
valor como mensagem, tem significado atual, isto é explica ou apresenta algo que contribui
no sentido cultural-social. O texto tem uma linha de raciocínio, segue um método,
demonstra validade e fidedignidade de informações. Um autor habilidoso pode escrever um
texto convincente do ponto de vista da organicidade e argumentação, mas falso do ponto de
vista da realidade, da fidedignidade, da busca da verdade das coisas, e passar para o leitor
menos avisado uma mensagem falseada, e até chega a academia de letras como tem
ocorrido ultimamente.
Uma avaliação bem feita leva o leitor à proposição, ou seja ao desejo e à condição
de contra-argumentar propondo um novo texto, seja para ratificar ampliando o ponto de
vista do autor, seja para contrapor, ou mesmo, somente para questionar ou levantar dúvidas.
Esse processo é fundamental para formação de um leitor crítico. Pois a critica que só aponta
as falhas, ou discorda por discordar, não é crítica, é fofoca diz Gaiarça. A crítica requer
proposições, indicações alternativas.
Adapado por CATAPAN texto de LUCKESI, Cipriano et all. O leitor no ato de estudar a palavra escrita. In: Fazer Universidade um proposta metodológica. São Paulo, Cortez, 14ª edição 2005, p. 136-153.