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IRRESISTVEL IMPOSTORA

Daphne DuBois mudou-se para os Estados Unidos com a certeza de que se tornaria uma grande estrela.

Famosa nos palcos de Paris, julgava que conquistar a Amrica seria fcil. Quando seus planos no saem como esperava , Daphne acredita que para alcanar seus objetivos ter de seduzir um milionrio.

Por intermdio de Melissa, sua criada pessoal, consegue ser convidada para uma festa fantasia. Nesse momento, o destino intervm e muda drasticamente seus planos. Daphne parte para Hollywood e Melissa vai ao baile em seu lugar, se fazendo passar pela atriz francesa. A partir de ento, sua vida entra em um turbilho de emoes e mentiras, que a leva direto aos braos do rico e sedutor Seth Rhodes

Agora, Melissa est apaixonada, mas sua farsa pode colocar tudo a perder.

prlogo

Emily entrou no quarto de Melissa e olhou com carinho para a menina, que dormia. Seus cachos dourados espalhavam-se pelo travesseiro, dando-lhe um aspecto de pintura clssica. Ela era to linda!

"Que destino te aguardar, criana?", perguntou-se a mulher, cheia de esperanas venturosas, cobrindo melhor a filha.

Melissa era inteligente, boa aluna, talentosa. Estudava na melhor escola, vestia as melhores roupas, conhecia as melhores pessoas. Seu futuro parecia luminoso e feliz.

"Provavelmente se casar com algum moo bonito e fino, e ser sempre feliz", pensou Emily, fechando a porta.

Suas previses estavam certas, mas o que Emily jamais sonharia em sua dedicao de me era o estranho caminho que a vida escolheria para realiz-las...

Jias, peles, propriedades e, principalmente, o orgulho se foram para sempre.

Homens, antes vistos em luxuosos e faiscantes carros, que freqentavam clubes exclusivos, bebendo conhaque importado e fumando charutos carssimos, cujas esposas cobriam-se de diamantes e as casas mais pareciam palcios, viam-se vtimas da sua ambio e falta de juzo.

Entre eles estava Jack Anderson, famoso por sua imensa fortuna e gastos desmedidos. Sem saber o que fazer nem entender como ou por que, de uma hora para outra, seu mundo ruiu, Jack gritou e protestou at ficar sem voz. Depois, ao compreender que nada disso surtiria efeito e que seus dias dourados lhe foram tirados, como se algum mago cruel o estivesse castigando, voltou para seu escritrio, fechou a porta e se atirou pela janela. Estatelou-se, 15 andares abaixo, entre a multido enfurecida e desesperada.

famlia, chocada por tantas notcias ruins, nada mais restou seno juntar o pouco que sobrou e continuar a vida em outro lugar. Emily Anderson pegou Melissa, sua filha nica, e, com a caixa de jias dentro de uma sacola, foi bater de porta em porta, procurando compradores.

Como sempre acontece em ocasies semelhantes, as pessoas com condies de comprar ofereciam preos irrisrios por peas que valiam milhes. No meio daquela trgica crise, houve os que fizeram fortuna apenas explorando os que a perderam. Mesmo assim, Emily se desfez dos seus preciosos anis, colares e brincos, concentrando suas foras em Melissa, ento com 14 anos. Com olhos secos e ex-presso controlada, a mulher viu os credores levarem seus carros, casas, roupas, objetos de arte, assegurando filha que ficariam bem e tudo daria certo.

A vida da menina, antes dividida entre estudos, esportes e brincadeiras, era agora uma grande incgnita.

Com a ajuda de amigos, Emily conseguiu uma pequena casa em um bairro distante de onde morava em seus dias de opulncia e tratou de procurar emprego. Entretanto, naqueles dias, trabalho era algo muito raro. As poucas vagas oferecidas eram disputadas por milhares de pessoas famintas, e os empregadores, vendo-se diante de tanta mo-de-obra, diminuam os salrios de tal forma que mais pareciam esmolas e no pagamentos.

Com uma filha para alimentar e uma casa para sustentar, Emily abandonou o resto do orgulho que lhe restara e decidiu que no morreria de fome. Em seus dias de grande dama, tornara-se famosa pelos finssimos bordados que fazia e pelos dons de costura que herdara da av. Era hora de colocar em prtica o que antes era apenas um passatempo.

Decidida, procurou algumas mulheres cujos maridos tiveram mais juzo que o seu - e, portanto, no foram atingidos por aquela desgraa nacional - e ofereceu seus servios. Era uma situao estranha, para ela, ser recebida nos antigos sales, no mais para reinar absoluta, mas para suplicar - e a palavra era essa, suplicar - por uma encomenda.

Algumas das senhoras receberam-na de bom grado, mas a maioria agia pelo puro prazer em ver Emily Anderson reduzida a uma pobre coitada, implorando por trabalho.

Sentada na sala de Margareth Perry, que a olhava com maldoso prazer, Emily pensava em quantas vezes aquela mulher lhe implorara por um convite ou insistira para que comparecesse a uma das suas recepes. "A vida estranha", pensou, procurando manter o semblante inalterado e no dar vazo vontade que tinha de avanar sobre a outra.

Mas claro que vou ajud-la, querida! disse a senhora Perry, com voz afetada e ligeiramente mais aguda do que o normal. No para os meus vestidos de gala, pois voc sabe que os compro em Paris. Mas voc pode fazer algo para minha camareira, a senhorita Davis...

Emily sorriu, concentrando-se em Melissa, para no revidar o desaforo embutido naquela frase.

Ela de famlia humilde, no vai se importar. Sabe como so os empregados, qualquer coisa os alegra. continuou a outra, tagarelando com satisfao.

Quando partiu, com as medidas de Sarah Davis anotadas na bolsa, Emily deixou as lgrimas rolarem.

Emily? perguntou uma voz masculina atrs dela.

Ela se virou e viu um gordo e simptico senhor de idade avanada sorrindo amigavelmente.

Senhor Johnson!

Ele a cumprimentou com alegria:

Como bom rev-la! Andei procurando por voc, mas ningum soube me dizer seu paradeiro. Onde est morando?

Ns nos mudamos para um bairro mais distante. Depois que Jack... bem, depois de tudo, no pude continuar na mesma casa...

Uma tragdia, realmente. Eu no estava na Amrica quando aconteceu... Sinto muito por Jack. Um bom homem, realmente.

Emily concordou, com educao.

Mas o que faz por aqui? Venha, vamos tomar um caf e sair deste frio horrvel. disse ele, oferecendo-lhe o brao, que Emily aceitou de bom grado.

Oliver Johnson, amigo da famlia h anos, era um homem tranqilo e falante, cujo corao sempre fora maior que sua imensa barriga.

Como vocs esto? A quebra da bolsa no os afetou? perguntou ela, saboreando um delicioso pedao de torta que o homem pedira.

No diretamente... Como sabe, meu dinheiro est investido em outros ramos. Nunca acreditei em papis, prefiro coisas mais slidas.

Bem, o tempo provou que estava certo, no? Quem dera Jack tambm pensasse assim...

E, bem... ele fez o que pensava ser o melhor, no? So tempos estranhos estes em que vivemos. Estranhos e trgicos... Mas fale-me de voc e da pequena Melissa.

Emily, que viu em Oliver um ombro amigo, abriu o corao. Contou-lhe as dificuldades, preocupaes, humilhaes e incertezas relativas ao futuro. Ele a ouviu sem interromper e, quando percebeu que ela terminara, perguntou:

Emily, voc gostaria de trabalhar comigo? Minha secretria est se aposentando e vou precisar de algum...

Oliver, no precisa, realmente... Ns vamos dar um jeito.

No favor, Emily. Preciso mesmo de algum. E posso ajud-la com os estudos de Melissa... no bom para uma jovem ficar em casa o tempo todo...

Nem sei o que dizer... muita bondade...

Sempre fomos amigos nos bons tempos. Por que no o sermos nos maus?

Ela sorriu.

Quando comeo? perguntou.

Amanh, se quiser. O trabalho no difcil, apenas requer que voc tenha um pouco de boa-vontade e pacincia. Tenho certeza de que vai se sair muito bem.

Voc um homem raro, Oliver Johnson. Obrigada. Ele tirou um mao de notas e lhe entregou:

Considere um adiantamento. disse, diante da recusa da mulher. Compre alguma coisa para voc e Melissa.

Ele se levantou e saiu, pensando em como a sorte das pessoas mudava com o vento e lembrando das inmeras vezes em que aconselhou Jack a parar de investir em aes.

Emily guardou o dinheiro e olhou para o papel com as medidas de Sarah Davis, pensando no que fazer com elas.

"Lamento, Sarah, mas voc vai ficar sem seu vestido novo", decidiu, amassando o papel.

Nova York primavera de 1934

Daphne DuBois jogou para o lado a revista que folheava, com ar de enfado. Sacudiu os cachos dourados primorosamente arrumados e bebericou um pouco de champanhe.

Correu os olhos pela casa, admirando as peas e mveis que a decoravam. Era uma bela construo em estilo francs, slida e bem construda. E Daphne pagara uma ninharia por ela. As pessoas estavam to desesperadas por dinheiro naqueles dias que fazer bons negcios no era nenhuma novidade. Principalmente se, como ela, o comprador tivesse muito dinheiro disposio.

Vinda da Europa h poucos meses, Daphne era uma atriz famosa no teatro de variedades de Paris. Jovem, bonita, sedutora e esperta, fizera fama, sucesso e fortuna explorando ao mximo cada uma das suas qualidades. Cantava razoavelmente bem, sabia atuar, danava com sensualidade e era dona de um magnfico e invejado par de pernas, responsvel, em ltima instncia, por seu sucesso. Mas foram a esperteza e a capacidade de saber exatamente para que homem voltar sua ateno que a fizeram alcanar o estrelato. Afinal, havia milhares de mulheres como ela no mundo. Mas nenhuma, nenhuma mesmo, era sequer parecida com Daphne DuBois..

No se sente bem, mademoiselle?perguntou a moa atrs dela.

Enfado, isso que sinto, enfado! "V para a Amrica", disse meu empresrio, "ter papel garantido no cinema!" Belo negcio fiz eu! Enfurnada em casa como uma velha desdentada! E tudo que leio fala de Claudette Colbert, Ginger Rogers e Kathleen Howard!

A moa engoliu a risada e Daphne continuou:

E isso que d ser uma moa sozinha e desamparada! Uma mulher precisa de um homem forte para ampar-la, no pode ficar solta na vida... Ns, mulheres, somos to indefesas, no acha?

Sem dvida! concordou a garota, imaginando que, se havia algum neste mundo cuja definio de "indefesa" no se encaixava esse algum era mademoiselle DuBois.

O que eu preciso circular mais, aparecer em grandes festas, sair nos jornais. Ento, Hollywood se curvar perante a mim. Mas no conheo ningum neste maldito lugar e Pierre, meu empresrio, est demorando demais para vir de Paris.

Seus olhos azuis adquiriram um brilho diferente, como se tivesse uma grande idia.

Melissa, venha c. pediu, pegando a revista que jogara para o lado. Voc conhece este monsieur Seth Rhodes, de quem os jornais tanto falam? Li que ele dar uma festa fantasia em algumas semanas... Todos s falam disso.

A moa olhou a foto de um homem alto, com jeito de gal, e sacudiu a cabea negativamente.

Lamento, mademoiselle. No me lembro dele em nossa antiga casa. Mas eu era muito menina. Talvez ele freqentasse as festas de mame...

Que pena... Ele exatamente o tipo de homem que procuro: educado, bonito e, principalmente, rico. Aprenda uma coisa, ma petite: homens devem ser ricos. Essa a primeira e mais importante qualidade que eles possuem. O resto... bem, d-se um jeito aconselhou, com ar de quem sabia muito bem o que falava.

Melissa no respondeu. Estava trabalhando com Daphne desde que viera da Europa e fora contratada por falar francs com fluncia, coisa imprescindvel para mademoiselle. Por nada neste mundo arriscaria seu emprego apenas por fazer um comentrio inapropriado.

Aquela senhora... madame... madame... como se chama a amiga da sua me? A que estava nos jornais outro dia, lembra-se? Voc me falou sobre ela

Madame Johnson. lembrou Melissa.

Oui! Madame Johnson. Ela deve conhecer este monsieur Rhodes, no ?

Cest possible. disse Melissa, olhando a foto do homem mais uma vez. Quer que eu pergunte?

Oh, oui... faria isso por mim? os olhinhos azuis piscaram, sedutores.

Bem, posso telefonar para a minha me e lhe pedir que fale com a senhora Johnson.

Ser que essa senhora conseguiria que eu fosse convidada para a festa?

No sei, mas no custa tentar, no ?

Daphne sorriu e observou Melissa enquanto falava ao telefone: era uma linda jovem, de cabelos loiros e inteligentes olhos azuis. Tinha o mesmo tipo e porte fsico que Daphne, embora fosse um pouco mais alta.

"Americanos comem demais", pensou a francesa, para quem mulheres muito altas perdiam totalmente a graa. Ainda assim, a moa era bela e possua o que os franceses chamavam de "atmosphre" que, no caso de Melissa, traduzia-se em uma aura de delicada seduo e sensualidade. Se tivesse miolos, iria longe na vida. Pelo menos assim pensava a francesa.

Mame disse que far o que for possvel, mademoiselle.

Trs bien! Merci, Melissa. Agora que isso est feito, creio que pode comear a pensar em minha fantasia, no?

No seria melhor esperar a resposta? Quero dizer, talvez Victoria Johnson no conhea Seth Rhodes.

Bobagem. Mais uma coisa para aprender: os muito ricos sempre conhecem os muito ricos. Mon Dieu! Sua me no lhe ensinou nada? espantou-se Daphne.

Melissa no pde conter o riso. O salrio que Daphne lhe pagava podia no ser l essas coisas, mas ela era incrvel!

Que pensa sobre algo do tipo Salom? Ou Clepatra? perguntou a francesa, andando pela sala... No, muito comum. Preciso de alguma coisa excepcional, magnifique! Oh, que saudades do meu modista! Por que concordei em vir para a Amrica? Por qu? lamentou-se.

"Oh, Senhor, vai comear!", pensou Melissa, sabendo que teria ile ouvir uma enxurrada de lamentaes, antes de Daphne finalmente se decidir a contratar algum modista de Nova York, ao qual chamaria de provincial provinciano, caipira.

O campo de golfe na propriedade de Seth Rhodes perdia-se de vista. O gramado, que acompanhava as ondulaes do terreno, impecavelmente aparado na altura certa, era um dos seus orgulhos. Com apenas 27 anos, Seth j era um poderoso capito de indstria, cuja famlia passou praticamente ilesa pela quebra de 1929, e enriquecia mais a cada ano.

Alto, forte e muito bonito, Seth estava acostumado a arrancar suspiros femininos por onde passava. Sempre acompanhado de dois inseparveis amigos, Charles Cohen e Anthony Wilson, desfrutava de todas as formas e maneiras da vida confortvel e privilegiada que a sorte lhe dera. Trabalhava com o pai, que comeara h alguns meses a perturb-lo para que se casasse.

Est velho, crie juzo! disse. Tire essas vedetes do seu colo e arrume uma boa moa. Eu no vou durar para sempre, sabia? Quero meus netos comigo antes de morrer!

De onde tirou isso, agora? Tem uma sade de ferro!

Sua me estava lendo um artigo outro dia que dizia que homens da minha idade no duram muito mais. D um jeito!

Tenha pacincia! No v me dizer que agora est se importando com as bobagens que essa gente publica!

A discusso continuou, at Seth prometer que criaria juzo. De l para c, quase um ano havia se passado, mas nada mudara. Ele continuava rodeado de mulheres e fugindo de compromissos srios.

Ento, prncipe encantado, preparado para sua Cinderela? - perguntou Anthony, fazendo uma careta ao ver que, apesar dos

seus esforos ao dar a tacada, a bola continuava no mesmo lugar.

Um a zero para a bola! gritou Charles, divertindo-se.

Que Cinderela? Ficou maluco?

No para isso a festa fantasia? Arrumar uma mulher para voc?

Claro que no!

Anthony est certo. concordou Charles, acompanhando com olhos atentos a bola que voava sobre o campo. Isto, sim, que jogada! Aprenda com o mestre Tony. Sua me nos disse que quer ver se voc finalmente cria juzo.

Posso at ver a cena. Nosso conquistador aqui usando suas, cercado de um monte de pirralhos remelentos e chores.

Que bom que vocs esto se divertindo... Mas podem desistir da idia. Nem hoje nem nunca vo me ver casado. Para que eu escolheria uma mulher, quando posso ter tantas ao mesmo tempo?

Eles caram na gargalhada e continuaram o jogo, at que Seth precisou sair:

Continuem sem mim, senhores. O dever me chama. Vou tomar um banho e trabalhar.

Ei, Seth! gritou Charles. No v quebrar o sapatinho de cristal!

O rapaz nem respondeu. S faltava essa: a me met-lo naquela ridcula situao porque leu um artigo que algum debilide escreveu para encher lingia no jornal!

"Bem, vou ter de passar por isso", pensou, resignado, imaginando quantas moas conquistaria em uma s noite.

Senhoras, aguardem-me. Seth, o conquistador, est chegando. disse, fazendo uma mesura diante do espelho.

Casar! Cada uma! Nem em mil anos!

Desceu correndo, entrou no carro e seguiu para o escritrio. J estava atrasado para uma reunio. No caminho, passou por uma mulher cercada de crianas que gritavam e seguravam suas roupas. Lembrando-se da brincadeira do amigo, imaginou-se naquela situao.

"Deus me livre!", disse, benzendo-se. "E pensar que tem gente que implora por uma mulher!"

Naquele momento, ele acabara, sem saber, de profetizar o seu destino.

Cinderela ou no, Seth Rodhes estava muito perto de encontrar aquela que conseguiria faz-lo implorar por ela.

Captulo II

Victoria Johnson no apenas conhecia Seth Rodhes, como era amiga de infncia de Gladys, sua me, e sabia das suas preocupaes com relao ao futuro do filho. Muito religiosa e presa a rgidos preceitos de comportamento, ter um filho como Seth era um desafio para a pobre mulher.

Vive cercado de cortess, imagine! a palavra prostituta jamais seria sequer pensada por ela, que dir pronunciada. Passa noites fora, bebendo, jogando e sabe-se l o que mais! No sei o que fazer com esse menino, meu Deus! ouvira Gladys desabafar outra vez.

O "menino", belo rapaz de 27 anos, sentado na poltrona ao lado, olhou-a aborrecido, enquanto tomava ch com os Johnson.

Ele homem, Gladys, tenha pacincia. Precisa se divertir! retrucou Calvin, o marido.

Agradeo por falarem de mim como se eu no estivesse aqui. . muito gentil da sua parte. comentou Seth, azedo.

No sabe a sorte que tem, Victoria, por Arthur ser to ajuizado! Arthur Johnson, filho nico do casal, da mesma idade que Seth,

j estava casado e com filhos.

Com todo respeito e sem querer fazer pouco caso do seu menino, disse Calvin, ignorando os comentrios do filho. se Arthur tivesse a mesma aparncia de Seth, provavelmente voc tambm estaria aqui reclamando.

Arthur havia puxado ao pai: era grande, calvo e muito gordo.

Calvin, que grosseria!

Deixe disso, Gladys. Victoria nos conhece h sculos, somos amigos. Sabe que no falo por mal.

Essa cena acontecera h mais de um ano e Victoria ainda ria ao pensar nela. Pobre Gladys. Sua vergonha era tanta, que parecia estar beira de um desmaio.

Est me ouvindo? perguntou Oliver esposa.

Estou, claro. A filha de Emily precisa de um convite para a festa dos Rhodes para dar patroa. respondeu, voltando realidade.

Isso... ser que pode conseguir?

Ela trabalha para uma francesa, no ? Uma atriz de cabar?

Show de variedades, segundo dizem, mas creio que a mesma coisa... Daphne DuBois o seu nome.

Victoria ergueu as sobrancelhas. Cus, at o nome da mulher era comprometedor.

Gladys me mata se souber, Oliver. Voc sabe que ela quer livrar o garoto das ms companhias.

Ento devia comear por aqueles dois inteis, Cohen e Wilson. importante para a pequena Mel, Victoria. Elas j sofreram tanto... Quando penso na besteira que Jack fez, tenho vontade de mat-lo!

Ele j morreu, querido... Oliver olhou-a e ela suspirou:

Est bem, vou pedir a Gladys que envie o convite. Mas voc vai jurar que no sabia que a francesa uma... como mesmo que ela fala? Uma cortes.

Oliver soltou uma gargalhada.

Nem uma palavra, prometo.

Est bem, diga a Emily para me mandar o endereo da moa. Ele ter sua chance de ir festa.

Voc uma santa! disse o marido, beijando-lhe o rosto. Victoria corou. No era santa, apenas pensava que uma cortes a mais ou a menos no faria a mnima diferena na vida de Seth. Estava redondamente enganada

A casa de Daphne estava uma loucura. Tecidos, rendas, contas, tesouras e alfinetes se misturavam em uma mirade de cores e texturas, enquanto dois estilistas andavam de um lado para outro, falando pelos cotovelos em um ingls afrancesado que fazia Daphne olh-los sem entender uma palavra do que diziam.

Meu Jesus! cochichou Rubi Stevens, amiga e vizinha de Melissa, que tambm trabalhava na casa. Nunca vi tanto doido junto.

Psiu! Quieta! Sorria e concorde, como diz minha me. Sorria e concorde! aconselhou Melissa.

Onde j se viu tanta agitao por causa de uma festa? "Eu preciso ser vista, fazer contatos", ela diz, mas, no fundo, est mesmo de olho no milionrio.

Melissa riu, concordando com a amiga.

Melissa, venha aqui. No entendo o que este homem diz! pediu a francesa, com voz desesperada.

Divertindo-se muito com tudo aquilo, a moa ajudou no que pde. Enquanto via os tecidos serem desenrolados e avaliados por sua patroa, Mel lembrou-se de um ditado que dizia: "Ganha-se pouco, mas diverte-se muito". Parecia ter sido feito para aquela casa.

O modelo escolhido por Daphne, um vistoso vestido que lembrava os trajes franceses do sculo XVIII, apenas um pouco modernizado e com um decote um tantinho mais ousado, ficaria suntuoso. EIa escolheu uma seda adamascada carssima, em tons de dourado c prola, que era puro luxo, e, na opinio de Melissa, horrorosa e de mau gosto!

Posso dar uma opinio, mademoiselle? perguntou, com delicadeza.

Os olhinhos azuis de Daphne viraram-se para ela. Os dos dois modistas tambm

No creio que este tecido a favorea... pelo contrrio, ele a deixa apagada.

E desde quando uma criada entende de moda? perguntou um dos homens, temendo que a moa atrapalhasse suas vendas.

Quieto! Deixe Melissa falar... o que sugere? perguntou Daphne.

Bem, mademoiselle tem olhos azuis e pele clara... penso que tons de azul ou, quem sabe, algo rosado... Afinal, queremos causar boa impresso sem parecermos exageradas ou de mau gosto, no ?

Ouilll Bleu, voc sugere? Algo assim? a francesa indicou um tecido.

Talvez, mas creio que este ficaria melhor... e mademoiselle pode altern-lo com esta renda francesa magnfica, o que acha?

Parfait! exclamou Daphne, batendo palmas.

Sim, perfeito! ecoou o modista, feliz por fazer uma venda ainda mais cara. Mademoiselle DuBois tem olhos de guia! Ah, os franceses... sabem tudo sobre moda! exclamou, ignorando completamente o fato de Melissa, e no Daphne, ter escolhido os tecidos.

E quanto ao modelo, o que acha? perguntou a francesinha.

Bien, mademoiselle... comeou o homem, mas foi interrompido.

Voc no, ela. O que acha, Melissa?

Encostada porta, Rubi Stevens observava a tudo, incrdula. Melissa olhava os tecidos e modelos de forma to interessada que parecia ser ela, e no mademoiselle Dubois, que iria festa.

O modelo lindssimo, mas creio que podemos melhor-lo ainda mais. comentou, pensativa. Talvez subir um pouquinho o decote... nossa sociedade mais conservadora do que a parisiense, como mademoiselle sabe.

Bobagem! Mademoiselle tem um colo belssimo, por que no mostr-lo? o modista parecia indignado por Melissa querer alterar seu desenho.

Deixe-me pensar um minuto... No acredita que um decote mais generoso despertaria maior ateno de monsieur Rhodes? perguntou, olhando sria para Melissa.

Sem dvida, mas queremos que a ateno dele continue, no? Algumas vezes, despertar a curiosidade mais sbio do que deixar mostra o que se deve lutar para descobrir...

Mon Dieu! Voc est certa, ma petite! Vamos subir o decote. Algo mais?

Melissa continuou a dar opinies e Daphne a concordar com ela, de forma que o modelo original, pesado e rebuscado, transformou-se em um gracioso e provocante vestido, mais luxuoso, porm, bem menos vulgar que o primeiro.

O dia que quiser mudar de emprego, me procure. cochichou um dos homens, olhando com admirao para Melissa, que .apenas sorriu e agradeceu com graa.

Quando partiram e ela voltou aos seus afazeres, Rubi pegou-a pelo brao e perguntou:

Voc encomendou o vestido dos seus sonhos, no? Vi a maneira como olhava para o desenho e para os tecidos. No era em Daphne que voc estava pensando. Melissa baixou os olhos.

Nunca poderia usar um vestido assim, ainda que trabalhasse .1 vida inteira e mais alguns anos depois de morta. Aproveitei a oportunidade para realizar meu sonho de vestir algo suntuoso, ainda que por meio de outra pessoa.

Ser que vai funcionar? O tal Seth Rhodes vai mesmo cair de amores por ela?

Melissa se lembrou do homem que vira na foto e deu de ombros:

E quem que sabe? Ela vai dar um jeito, com certeza.

Vi a fotografia dele no jornal. comentou Rubi, limpando cuidadosamente um vaso de porcelana. Um tipo! Tem gente que sortuda mesmo! acrescentou, referindo-se mademoiselle.

Melissa sorriu, imaginando se algum dia a sorte tambm chegaria para ela.

Vamos trabalhar, antes que ela nos despea por tagarelar no servio. disse, procurando arrancar aquelas idias da cabea e esquecer o maravilhoso vestido que havia escolhido para si mesma, mas que seria usado por outra.

As semanas voaram para Daphne, imbuda que estava da idia de conquistar o milionrio. Melissa era chamada a cada prova da fantasia e acabou dando palpites tambm na mscara rebordada que cobria o rosto da patroa. Rubi assistia a tudo, preocupada. Melissa parecia no perceber que estava mergulhando naquilo como se fosse ela a estrela e no a francesa.

Uma noite, aproveitou-se da sua ausncia temporria e, enquanto tomava um caf com Emily, tocou no assunto. Aps ouvi-la atentamente, Emily Anderson suspirou:

Pobre Melissa... Nasceu com um futuro grandioso, foi criada .acreditando nisso e de uma hora para outra tudo desapareceu. natural que sonhe com festas e roupas caras, no?

Claro, mas que s vezes parece que ela no consegue diferenciar sonho de fantasia. No quero que se decepcione quando finalmente essa bendita festa chegar e ela vir mademoiselle sair toda arrumada, enquanto...

...Melissa fica em casa... completou Emily. Entendo o que quer dizer, Rubi. E agradeo que goste tanto assim da minha menina. Voc uma boa e fiel amiga, coisa rara neste nosso mundo.

Devo falar com ela? perguntou a garota, corando.

No, ela ficar bem... Apesar das aparncias, Melissa tem os ps bem plantados no cho.

A senhora no entende... outro dia peguei-a olhando sonhadora para o jornal que estampava a foto de Seth Rodhes...

Emily sorriu:

Ela apenas uma garota, isso vai passar.

Rubi no concordava com esse pensamento, mas no queria discutir com Emily. Ainda assim, achou bom ficar de olho em Melissa. No importava o quo ricas haviam sido; a verdade que agora eram to pobres quanto ela, e viver com a cabea na lua no facilitaria em nada a vida de ningum.

Era estranho que Rubi pensasse assim, j que seria ela, e no Melissa, a mentora do plano que conduziria a amiga a uma situao complicada e perigosa.

Naquele momento, entretanto, nada disso ainda havia acontecido, e Rubi continuou tomando seu caf, imaginando se no era melhor confrontar Melissa com a realidade e acabar com aqueles sonhos tolos de uma vez.

Enquanto, para Daphne e Melissa, as semanas que antecediam o baile eram de sonhos e fantasias, para Seth Rodhes a situao era bem outra. Alvo das brincadeiras dos amigos, que no perdiam a chance de amol-lo com apelidos como "Romeu," "Prncipe Encantado" e "Cinderelo", ele j estava comeando a se irritar. Como se no bastasse, o pai o sobrecarregara de trabalho, tentando evitar que passasse tempo demais em companhia de Charles e Anthony, e sua me, sempre que o via, olhava para ele com ares sonhadores.

"Que diabos!", pensava, irritado com tudo.

A histria de o baile ter sido intencionalmente preparado para encontrar uma esposa para Seth ganhou corpo e comeou a gerar boatos e gozaes por parte de vrios conhecidos, que caam na gargalhada cada vez que o encontravam.

L vai o noivo. diziam alguns.

Cinderelaaaa! Onde voc est? caoavam outros, quando o encontravam.

Reze para ela no ter chul, Seth, ou ser incrivelmente desagradvel calar-lhe os sapatos. provocou Anthony Wilson em determinada ocasio.

Querem parar? No, agento mais isso! De onde arrancaram essa idia absurda de que minha me est procurando uma mulher para mim?

Dela, u! Quer dizer, no foi bem isso que nossa querida Gladys falou. Ns apenas enfeitamos um pouco...

Como assim? Seth continuava irritado.

Estvamos tomando um refresco com sua me, enquanto voc, como bom trabalhador, suava a camisa no escritrio. Ela comentou que seria muito agradvel se voc conhecesse uma boa moa e sossegasse o facho. Claro, no com essas palavras, evidentemente. comeou a explicar Anthony.

Ento, seu mais humilde e sincero amigo, no caso, eu, continuou Charles. disse, apenas por brincadeira, que ela devia fazer como fizeram os pais do prncipe na histria da Cinderela. Dar um baile e convidar a mulherada...

No acredito nisso! rugiu Seth. Vou matar vocs!!!

Foi uma brincadeira, juro! Como amos saber que sua me ia levar a srio?

Veja pelo outro lado, meu amigo. Voc vai ter vrias beldades doidinhas para conhec-lo... e, como todo mundo sabe, para se comprar uma mercadoria preciso experiment-la antes....

Deus, vocs so podres! exclamou o rapaz, gargalhando.

Quer um conselho? No ligue para estes idiotas que ficam caoando de voc. aconselhou Charles, como se no fosse ele o primeiro a se divertir s custas do amigo. No final das contas, quem vai sair com as beldades ser voc e no eles.

Charles est certo, meu amigo. Afinal, quem sabe disso, alm di' ns e alguns gatos pingados? perguntou, com ar inocente.

A resposta a essa pergunta viria na manh seguinte, em forma de notcia, nas colunas sociais. O burburinho em torno da festa acabara chegando aos ouvidos de um dos colaboradores do jornal, que no pensou duas vezes antes de estampar a histria em sua coluna.

"Milionrio Busca Esposa em Baile Fantasia", dizia o ttulo do artigo.

Famoso por seu comportamento bomio e dotes fsicos impecveis, dono de invejvel fortuna e sado de famlia tradicional, Seth Rodhes est decidido a se casar. Diferente da maioria de ns, pobres mortais, que procuramos uma noiva entre as moas conhecidas, o jovem ricao resolveu faz-lo em grande estilo. Para tanto, promover um esplendoroso baile fantasia, ao qual sero convidadas todas as afortunadas moas que porventura tenham condies de preencher a vaga de esposa do milionrio. Ateno, senhoritas: mos obra!

Qualquer semelhana com certo conto infantil ter sido, evidentemente, mera coincidncia...

EU VOU MATAR ESSE IMBECIL! Gritou Seth, vermelho de raiva, ao ler a notcia.

Mas j era tarde. A notcia se espalhou como fogo na palha seca e ganhou a cidade, provocando gargalhadas e gozaes de aougues a casas refinadas.

Espumando de raiva e enfurecido com a humilhao, Seth nem bem chegou ao prdio das empresas e viu-se cercado de reprteres.

Ento, Seth, isso mesmo verdade? Est procurando sua Cinderela? perguntou um deles.

Que critrios vai usar para escolher sua noiva? inquiriu uma moa gordinha, que tomava notas apressadamente.

Acredita que esse comportamento pode virar moda? quis saber outro.

A ponto de explodir, Seth entrou apressadamente no prdio, mas no foi rpido o suficiente. Um dos jornalistas agarrou-o pelo brao e disparou:

No consegue encontrar uma mulher sozinho?

Foi a gota d'gua. Sem pensar duas vezes, virou-se e esmurrou o homem, derrubando-o no cho, e entrou correndo.

Vou processar voc! berrou o reprter, o olho comeando a inchar

Eu vou matar o Charles! prometeu-se, baixinho. Bem devagar e de forma muito dolorosa...

Nos escritrios, ningum tocava no assunto, mas Seth sabia muito bem que as fofocas corriam soltas. Recebeu vrios telefonemas de revistas e jornais pedindo entrevistas, de movimentos feministas querendo linch-lo, de pessoas querendo saber como conseguir um convite para o tal baile.

"Sou o palhao do ano. Charles, voc um homem morto!", pensou, cada vez mais irritado.

Ento, mais uma vez, voc est nos jornais... disse o pai, tentando manter a seriedade.

Uma amolao, isso sim! Sou a piada da cidade, pai! Calvin riu.

Vire o jogo. Use a publicidade a seu favor.

Como? Soquei um reprter hoje de manh! Acredita que ,algum vai querer colaborar comigo?

Seth, pense, meu filho. Como pode reverter essa situao? O rapaz olhou-o com ar perdido, a irritao dando lugar

a dvida.

Pelo amor de Deus, use os miolos! Voc sempre foi inteligente! Diga que isso foi um golpe publicitrio, que o baile foi divulgado dessa forma para chamar ateno para alguma causa nobre! Sinceramente, s vezes voc no parece meu filho!

Como assim?

Jesus, o que ser de voc quando eu me for? Sabe que no vou viver muito...

Pai! Chega disso! Volte ao assunto. pediu.

V aos jornais, diga que o baile est sendo feito para ajudar. um orfanato, asilo, hospital, igreja, qualquer coisa, e que essa histria toda foi apenas uma forma de chamar a ateno para o evento!

No vai funcionar, no estamos vendendo convites!

Ento, vamos vend-los! Falamos com sua me e deixamos que ela escolha a instituio que quer ajudar. Depois, anunciamos que faremos um baile aberto, em algum clube ou coisa do gnero, para quem quiser participar!

Seth encarou o pai, boquiaberto.

Agora sei como ficou rico. disse, admirado.

Oportunidade, meu rapaz. Tem de saber aproveitar as chances que a vida d.

O baile l em casa seria, ento, apenas a primeira fase da campanha "salvem os rfos, velhos, doentes, sem-teto etc.". E isso? Um baile fechado e depois outro, aberto a quem quiser...

Calvin Rhodes piscou para o filho e sorriu.

S porque somos ricos, no significa que no temos corao, certo?

Certo... respondeu, olhando para o pai com falso ar de piedade. Quem fala com a mame, eu ou voc? perguntou, enquanto pedia a ligao.

Mais calmo e certo de que no final tudo daria certo, Seth comeou a respirar aliviado.

"Ainda vou matar o Charles, mas talvez no de forma dolorosa", pensou, sorrindo.

Captulo III

Enquanto Seth e o pai tratavam de acertar as coisas com a imprensa, Pierre Touraine, empresrio de Daphne, cuidava secretamente dos interesses da sua cliente. No quis avis-la de que estava em Hollywood, tratando de lhe conseguir um contrato decente, porque a conhecia bem demais. Ficaria dias e dias atrs dele, falando sem parar, tendo chiliques e ameaando despedi-lo e contratar outro.

Sem a presso dela, trabalharia mais e melhor. Alis, naquele exato momento, estava fazendo precisamente isso.

Hollywood era um mundo parte. Quem ali estivesse no diria que o pas passou por uma quebra financeira, e muito menos que l havia pobres. Um mundo de fantasias, festas, glamour e podrido moral. Assim era aquela cidade. E era nela que ele queria enriquecer ,i cliente... e a si mesmo.

Olhava displicentemente para as pessoas que transitavam pela piscina do hotel onde estava, tamborilando os dedos na mesa. Diante dele, um copo de bebida gelada e a minuta do contrato que redi-gira para apresentar.

O homem que chegaria em instantes foi um achado. Diferentemente de outros empresrios da indstria do cinema, Mark Goldenberg no via com maus olhos a contratao de atrizes estrangeiras.Ao contrrio, gostava da idia de mesclar culturas e ficou encantado ao saber que Pierre representava Daphne DuBois. 1

Estive em Paris h dois anos havia confidenciado. e vi o espetculo de mademoiselle DuBois. Fantstico, simplesmente fantstico.

Pierre, diante desse fato, tratou logo de marcar um encontro com Goldenberg e conseguir uma boa contratao para ela.

Passou novamente os olhos pelas guas azuis da piscina pensando em Daphne. Ela era uma boa garota, afinal. Meio doida e dada a crises nervosas, mas que atriz no era? Como seu amigo e confidente, acompanhou todos os passos da sua carreira e vida pessoal. Daphne comeou a atuar cedo. Dona de beleza radiante e com uma sensualidade flor da pele, seduzia as platias com facilidade e os homens a perseguiam sem trgua. No saberia dizer se, feliz ou infelizmente, Daphne sempre se cansava deles, e trocava de namorados com a mesma facilidade que trocava suas roupas. Precisava, porm, dar crdito a ela: tinha faro para encontrar cavalheiros cuja generosidade estava acima da mdia.

Pierre percebeu, entretanto, que era hora de Daphne mudar de ares e dar mais importncia sua carreira ou acabaria como tantas vedetes: velha e abandonada.

Os anos de glria no duram para sempre, menina. Est na hora de entrar para o cinema e imortalizar o seu nome. foi o argumento definitivo que conseguiu convencer a essa apaixonada por Paris a mudar-se para Nova York.

Monsieur Touraine? disse uma voz grave a seu lado, desfazendo suas recordaes. Sou Mark Goldenberg.

Pierre olhou para o homem e sorriu. Muito mais jovem do que esperava e com um rosto que bem podia estar nas telas e no por trs delas, Mark era o que as moas costumam chamar de tpico gal: alto, forte, cabelos claros e olhos verdes. Seu charme e sua simpatia saltavam aos olhos.

"Daphne vai se derreter", pensou, aliviado.

Durante duas horas, conversariam sobre filmes, dinheiro, oportunidades e bases de trabalho. Quando Mark se levantasse para partir, Daphne teria conseguido um contrato para estrelar oito filmes, sendo o primeiro deles com um jovem gal, cuja carreira estava em ascenso: Clark Gable.

Era o dia 25 de maio de 1934, dez dias antes da festa de Seth Khodes.

A idia de Calvin Rhodes deu mais resultado do que o esperado. As pessoas abraaram a causa de ajudar as instituies e, mais ainda, de comparecer a um baile fantasia junto com a elite endinheirada da cidade. Essa segunda festa foi marcada para 5 de julho, um ms, portanto, aps o baile na residncia dos Rhodes.

Seth, cuja vontade de estrangular Charles havia passado, sentia-se agora muito mais vontade na companhia dos amigos, embora entre eles a gozao continuasse.

Estavam no amplo salo de jogos da manso Rhodes, aproveitando a tarde de sbado, tomando cervejas geladas e jogando conversa fora, como sempre:

Seu pai um gnio. No me admira que tenha ficado to rico! disse Anthony, mirando a bola colorida com o taco de sinuca.

O mais engraado que todo mundo engoliu a histria e, de | >i.ida do dia, Seth passou a benemrito nmero um. admirou-se Charles.

No estou dizendo? O homem um gnio! Calvin Rhodes para presidente!

Menos... disse Seth, acompanhando a jogada do amigo com olhos de especialista. Essa soluo milagrosa no me saiu de graa. Estou trabalhando feito um louco para "pagar" o favor.

Como eu disse, o homem um gnio. repetiu Anthony, cuja bola havia saltado da mesa.

Cus, voc um desastre ambulante! exclamou Charles, observando o fiasco do outro.

Cartas o nico jogo em que me dou bem. Sou do tipo intelectual justificou-se, arrancando gargalhadas dos outros dois.

Sua me desistiu da idia? perguntou Anthony, procurando tirar a ateno de si mesmo.

Que idia?

A de arrumar uma namorada para voc, de cas-lo, bolas! No e esse o verdadeiro motivo dessa confuso toda?

Seth olhou-o, carrancudo, levantando ameaadoramente o taco em sua direo.

No comece.... ameaou.

Anthony no falou por mal... Ela desistiu ou no? perguntou Charles, sem saber que seu pescoo, h poucos dias, estava na berlinda.

No. respondeu Seth laconicamente. Mas isso no me aborrece. Ela que pense o que quiser... Quem decide sou eu.

Claro, alteza. brincou Anthony. Mas, cuidado: e se entre as convidadas estiver aquela que dar fim sua carreira de conquistador barato e bomio inveterado?

Essa mulher ainda no nasceu, meu caro, fique tranqilo.

Ser? Charles mirava a bola com ar de assassino. Sabe como ... quanto maior o vo, maior o tombo...

Escutem, qual o problema de vocs? Querem me casar ou o qu? perguntou Seth, encarando os amigos.

Calma, Seth. S estamos conversando...

Seth Rodhes tomou um gole da bebida gelada e disparou:

Vo me ver morto, mas no casado. E isso, meus amigos, uma promessa solene.

Bem, voc sabe o que dizem... comentou Charles, dando a tacada.

Enquanto a bola rolava para dentro do buraco, ele completou:

Se o diabo tivesse uma alma para cada promessa que quebrada neste mundo, o inferno precisaria de filiais.

Anthony caiu na gargalhada e Seth sacudiu a cabea. Aqueles dois no tinham mesmo conserto.

Trs dias antes do baile o vestido de Daphne chegou. Estava perfeito. Nenhuma princesa em poca alguma havia usado trajes to maravilhosos. Ela piscou os olhinhos azuis, encantada por ver a roupa pronta e to bonita.

Cest magnifique! exclamou Parfa! Ia masque? Mon Dieu!

Melissa olhou para a mscara rebordada e suspirou. Era maravilhosa. Tudo estava perfeito e Daphne, com certeza, atrairia todos os olhares.

Vamos experimentar. disse o modista, animado. Talvez mademoiselle tenha perdido alguns gramas e precise ajustar a cintura. claro que aquilo era s uma tentativa de agradar cliente. O corpo de Daphne estava exatamente o mesmo.

Ah, que cinturinha tem mademoiselle! exclamou o homem, .ajudando-a a entrar na montanha de tecido bordado.

Como estou? perguntou a francesa, olhando-se no espelho.

Deslumbrante! respondeu o modista, batendo palmas. Daphne ignorou-o e virou-se para Melissa:

Ento?

Est linda... ningum usaria to bem um vestido destes como Mademoiselle. disse com sinceridade.

"Exceto voc", pensou Rubi que observava a tudo com ar indiferente.

E meus cabelos? O que fao com eles? perguntou a atriz, caminhando de um lado para o outro, como se fosse a prpria rainha da Frana. Devo usar uma peruca?

Mademoiselle tem cabelos lindos! disse o modista. Deve .apenas deix-los mais soltos, com os cachos caindo pelos ombros, e ficar magnfica.

Melissa concordou, com um meneio de cabea.

Trs bien, vamos pagar o homem. Rubi, minha bolsa. disse ela, com ar de grande dama.

Assim que o homem saiu, Daphne colocou o vestido em frente do corpo e comeou a danar pela sala, imaginando o efeito que causaria em Seth Rhodes. Seu pensamento, sempre febril, antecipava como seria conquistar aquele belo e riqussimo homem, na casa que compraria, nas festas em que brilharia.

Melissa olhava, sorrindo, mas havia uma nota de tristeza em seu olhar. A realidade comeava a tomar corpo e ela se dava conta de que o sonho de usar uma roupa como aquela e de conhecer um homem como Seth estava distante a anos-luz da sua vida.

O som estridente e incmodo da campainha do telefone interrompeu a folia de Daphne e os pensamentos de Melissa.

Mademoiselle, um tal Pierre Touraine quer falar com a senhora. disse que muito importante.

Pierre? os olhinhos azuis brilharam e a boca abriu-se de pronto. Mon Dieu! At que enfim ele d sinal de vida! disse, deixando o vestido no cho e correndo para o telefone.

Enquanto ela disparava a falar em francs, usando um tom nada sutil, Melissa aproximou-se e pegou o vestido com cuidado, colocando-o delicadamente estendido sobre um dos sofs.

Abra os olhos e encare a realidade. murmurou Rubi, com carinho. Isso no para pessoas como ns.

Eu sei, respondeu, suspirando. mas por algum tempo eu sonhei alto...

Acorde. Ser melhor para voc.

Hollywood? gritou Daphne to alto que assustou as garotas. Clark Gable? Oito filmes? ela continuava gritando.

As moas correram at ela, curiosas, doidas para saberem o que estava acontecendo.

Daphne continuava tagarelando sem parar em francs e Rubi olhou desesperada para Melissa, pedindo ajuda.

Espere, disse a garota. tambm no entendo tudo, ela est falando muito depressa; mas, se compreendi corretamente, mademoiselle foi contratada por um grande estdio de cinema!

Srio? E eu que sempre pensei que ela no tinha talento algum! Melissa cutucou a amiga com o cotovelo e olhou feio.

Fale baixo, Rubi!

Quando finalmente a francesa desligou, sua expresso era um misto de alegria, incredulidade, surpresa e agitao.

As malas! ordenou. Vamos fazer as malas! Oh, cus, o que vou vestir? No tenho nada que preste!

Seus guarda-roupas esto prestes a explodir de tanta coisa, mademoiselle exclamou Rubi.

E o que voc entende disso? Trapos so tudo que tenho, trapos! Melissa, ajude-me!

O que aconteceu? Quem era ao telefone? perguntou a jovem, disparando atrs da patroa, que subia os degraus correndo.

Meu empresrio! Ele estava em Hollywood todo esse tempo e no me disse nada! "Queria evitar que se aborrecesse", disse-me ele. "No queria que se cansasse em negociaes aborrecidas". Hum! Pois sim!

Melissa, que conhecia bem a patroa, imaginou que as razes do, homem eram outras e solidarizou-se com ele.

En tout cas, ele me conseguiu um contrato para fazer oito filmes. Todos, segundo diz, altura do meu talento.

Mas isso maravilhoso! Parabns, mademoiselle! Daphne sorriu e acrescentou:

Preciso embarcar amanh, logo cedo.

Mas e a festa? E Seth Rhodes? Seu vestido acabou de chegar! Daphne encarou-a com compaixo no olhar.

Minha criana, h dezenas de Seth Rhodes neste mundo, Grande parte deles em Hollywood. E o vestido... bem, s uma roupa, no? Agora vamos s malas. Quero estar deslumbrante, apotetica!

Estar, mademoiselle, estar. acalmou-a Melissa, imaginando como a vida era irnica. Enquanto ela daria tudo por um vestido como aquele e pela oportunidade de conhecer pessoalmente o bonito dos jornais, Daphne desdenhava a sorte que tinha e se preparava para ir a Hollywood.

No havia inveja nesse pensamento. Bem, talvez houvesse, mas .apenas uma pontinha. Melissa estava apenas filosofando sobre o que era sua vida e o que podia ter sido se "a maldita bolsa no quebrasse", como dizia sua me.

Na manh seguinte, vestindo um vistoso casaco de peles sobre roupas elegantes e espalhafatosas, usando perfume e jias carssimos e um salto que batucava no piso do aeroporto, Daphne e suas malas embarcaram rumo ensolarada Califrnia. Ela podia no ser ainda uma grande estrela de cinema, mas tinha estilo, isso era inegvel, tinha-se que admitir.

Como no havia nenhum conhecido para acompanh-la, Dali 11 n e recrutou Melissa e Rubi para a tarefa, obrigando-as a usarem umas roupas que lhes deu, por j estarem "velhas demais". E lindos vestidos nunca usados, que chegara do modista h apenas 20 dias, mas quem disse que isso importava para Daphne?

Serei mais famosa que esta Claudete Colbert. disse, despedindo-se das meninas.E no se preocupem, assim que tudo se acertar, volto para busc-las. At l, tomem conta da casa como se eu estivesse nela. Meu contador se encarregar de entregar os salrios de vocs.

Beau voyage, mademoiselle! despediu-se Melissa, acenando.

- Boa sorte, sucesso! acrescentou Rubi, tambm acenando.

- Bem, l se foi ela... Imagino que loucuras no aprontar por l.

- E verdade... Vamos tomar um caf? convidou Melissa. Por minha conta.

Vamos. E faamos de conta que somos grandes damas, antes de voltarmos para a vassoura e o espanador. brincou Rubi, pegando a amiga pelo brao.

Fico pensando no vestido que ela fez para a festa. To lindo e vai ficar l, sem ter ningum para us-lo... disse Melissa, quando voltavam.

Voc podia experiment-lo. Ningum vai saber, mesmo. Alm do mais, voc merece isso. Afinal, o modelo foi seu, no?

Melissa no respondeu, mas sentiu-se tentada com a idia. Que mal podia fazer?

Captulo IV

O dia 5 de junho, um sbado, amanheceu grandioso. Um cu azul e um sol dourado davam a tudo uma aura de alegria e festividade, como se fosse feriado. As pessoas pareciam sorridentes e bem-dispostas, os jardins mais verdes, as flores mais perfumadas.

Na manso Rhodes o corre-corre comeou ainda de madrugada, com um verdadeiro exrcito de empregados dando conta de cada detalhe para que o baile daquela noite fosse perfeito.

Flores, bebidas, comidas, arranjos e mais toda sorte de objetos foram levados de um lado para outro

Tornando impossvel a quem no fizesse parte da tarefa permanecer ali.

Seth e o pai saram cedo e foram para o campo de golfe, fugindo de Gladys Rhodes, que h dias insistia para que mudassem de idia e em vez do tradicional smoking usassem tambm uma fantasia.

Sua me s vezes parece no bater bem da bola! Imagine querer que um homem da minha posio use algo ridculo como roupa de pirata ou de general!

Seth riu, imaginando o pai vestido de Napoleo.

No reclame, ela encomendou um traje de prncipe para mim! Como se j no me bastasse toda gozao que tenho de suportar por conta deste baile caricato.,.

Ainda? Imaginei que depois de tudo as piadas tivessem parado. O rapaz fez uma expresso de desagrado com a boca e Calvin continuou:

Pelo menos admita que saibamos como virar o jogo! Essa idia de caridade caiu como uma luva!

Golpe de gnio, como disse Anthony.

Esto falando de mim? perguntou o rapaz, aproximando-se, acompanhado de Charles.

Estava demorando demais para aparecerem... suspirou Calvin.

Senhor Rhodes, rendo-lhe minhas mais sinceras homenagens. O senhor tem uma mente brilhante! cumprimentou o rapaz, com uma mesura.

Certo, certo... e as fantasias, o que vo usar? perguntou ele.

Eu, como bom cavalheiro que sou, usarei um traje solene. anunciou Charles, cheio de pompa. Estarei vestido de sulto.

Sulto sem harm! Essa boa! alfinetou Calvin.

E eu, para no fazer feio diante das damas, estarei vestido de poeta.

U... E desde quando existe roupa especial para isso?

Vocs vero, vocs vero. acrescentou o moo, cheio de mistrio.

Calvin balanou a cabea, desanimado. Que juventude era aquela? ;

Melissa rodava pelo quarto diante dos grandes espelhos' admirando sua imagem.

Est linda! Ficou muito melhor em voc que em mademoiselle! exclamou Rubi, sorrindo.

Ficou, no ? Este vestido um sonho! Eu me sinto uma rainha nele! Pena que foi feito para ficar empoeirando no guarda-roupa. Esta roupa merecia melhor destino... tem porte, presena, personalidade. comentou, pensativa.

Pois , mas quem podia imaginar que a doida da Daphne ia se desabalar para Hollywood? Esse Seth Rodhes no sabe a sorte que tem, isso sim! J pensou se cai nas garras da francesa? Est roubado!

Melissa riu alto, ainda olhando-se no espelho.

Coloque isto. sugeriu Rubi, entregando-lhe um estojo de< veludo azul

No! So as jias de mademoiselle!

Que nada! Acha mesmo que aquela cobra ia largar algo de valor aqui? So imitaes, isso sim. Tome este colar e estes brincos. Vou ver se acho alguma tiara por a.

A jovem colocou as jias e ajeitou a tiara nos cabelos dourados, fazendo nela prpria o penteado que o modista sugeriu a Daphne

Uma bela maquiagem e sapatos adequados e estar pronta para a festa desta noite -comentou Rubi,admirando a amiga.

Voc enlouqueceu? Eu no vou! Isso apenas brincadeira...

Mademoiselle deixou o convite em casa...

E da?

Nada... s estou falando... se algum quiser peg-lo e ir festa...

Pensei que voc fosse contra sonharmos com o que no podemos ter.

E sou. Mas tambm sou contra no aproveitarmos as oportunidades que a vida oferece. Daphne est a milhas de distncia, a roupa est pronta, o convite est aqui.

Agora s falta a fada-madrinha para transformar uma abbora em carruagem, no? desdenhou Melissa.

H dois automveis na garagem, novinhos em folha.

E quem vai dirigir, espertinha? Nem eu nem voc sabemos fazer isto.

Mas meu irmo sabe e a roupa do motorista ficou aqui, para quando Mademoiselle voltar rica e famosa.

Voc enlouqueceu! No vou fazer isso de jeito nenhum, ouviu?

Est bem. disse Rubi, dando de ombros. Como quiser, o, dirigindo-se ao vestido, completou: Lamento, amigo, mas toda a sua personalidade, vai ficar trancada no armrio

Melissa olhou-se novamente no espelho e imaginou, s por um instante o que aconteceria se seguisse a cabea maluca da amiga, teria a oportunidade de conhecer Seth Rodhes? Ele gostaria dela, danariam juntos?

, Se gostasse aps danarem algumas vezes ele a convidaria para um passeio no jardim? E uma vez l ser que ele a beijaria apaixonadamente?

"O que estou pensando?! Nunca beijei ningum na vida, s o leon Field, quando eu tinha 10 anos!", censurou-se Mel

A idia, porm, estava plantada em sua mente. Trocou de roupa, ajeitou cuidadosamente o vestido, guardou as jias. Rubi no tinha juzo, onde j se viu sugerir algo daquele quilate?

Durante todo o dia, entretanto, as palavras da moa ficaram dando voltas em sua cabea. E, se ela arriscasse, o que podia acontecer?

No, aquilo era ridculo.

Mas era s uma vez e nada mais. Sua nica chance de saber como seria sua vida se "a maldita bolsa no quebrasse".

Loucura. Melhor pensar em outra coisa.

Depois de muito remoer a idia, e brigar consigo mesma, Melissa, finalmente, cedeu aos apelos do seu corao.

V perguntar a seu irmo se ele pode nos levar festa, disse, procurando no olhar para Rubi.

Nos levar? Nos levar?

Bom, se vou usar o nome, o carro e a roupa de outra pessoa e incorrer sabe-se l em quantos crimes, no farei isso sozinha. Alm disso, a idia foi sua!

Mas eu no tenho roupa!

Bobagem, tem umas dez malas cheias com as fantasias que mademoiselle usava em suas apresentaes. Com certeza encontraremos alguma onde caibam mais que uma lantejoula e duas miangas. disse, referindo-se aos trajes sumrios de Daphne.

Rubi olhou-a sem saber o que dizer.

Ande logo, v falar com seu irmo, no temos muito tempo.

J fiz isso... Algo me dizia que voc ia mudar de idia. comentou, agora preocupada com o futuro. Em seu plano original, Melissa ia sozinha. O fato de estar includa, quela loucura, comeou a faz-la pensar se no era melhor mudar de idia.

No seria aconselhvel pensarmos melhor sobre isso?

Agora tarde, j me decidi. Vamos logo achar algo para voc vestir. ordenou Melissa, toda decidida.

Rubi suspirou, sem alternativa. Tudo o que conseguia pensar era: "O Deus, faa dar tudo certo. Prometo que ficarei meses sem jantar e irei igreja todos os domingos, mas faa dar tudo certo!".

Todas as luzes da propriedade estavam acesas e a casa brilhava como um diamante no escuro da noite. Pessoas elegantes usando as,mais variadas roupas circulavam pelos sales; os cristais dos lustres refletiam-se em arco-ris multicoloridos.A atmosfera de diverso, assim como as fofocas e comentrios envolvia os convidados, aumentando ainda mais o glamour da noite.

Ainda temos tempo de desistir! disse Rubi, enfiada em uma roupa verde-esmeralda, que no se parecia em nada com a idia que inspirara e que devia ser um traje de odalisca, mas transformara-se numa confuso de brilhos e penduricalhos, criada pela mente delirante de algum estilista louco.

Agora que estamos aqui, vamos at o final! afirmou Melissa.

Mas esta roupa ridcula! Voc diz isso porque parece uma princesa, mas olhe para mim!

Voc est deslumbrante, Rubi!

Dava para vocs duas se decidirem? perguntou John, o irmo de Rubi, que no via a hora de desabotoar o palet que lhe comprimia a barriga.

Vamos entrar! disse Melissa.

John manobrou o automvel e cruzou os portes abertos da manso. Os sons da msica chegavam aos seus ouvidos, cada vez mais altos e definidos.

A majestosa fachada da casa surgiu diante deles, imponente e luminosa.

Melissa sentiu o corao disparar. Sabia muito bem que estava a ponto de cometer a maior loucura de sua vida.Essa certeza, aliada vontade de poder circular pelos amplos e bem decorados sales como se a eles pertencesse, fazia sua cabea girar.

Desa e abra a porta para ns. ordenou Rubi. John no gostou, mas obedeceu.

Ei, no se esqueam de me trazer alguma coisa para comer! I Deve estar cheio de comida boa a dentro pediu, enquanto ,as duas moas se lanavam em direo escadaria no alto da qual, parados nos dois lados da porta,recebendo os convites e .saudando os convidados, dois homens de cor, vestidos com trajes mouros, aguardavam indiferentes a chegada das pessoas

"Deus nos ajude!", pensou Melissa, fechando os olhos por um instante antes de entregar o convite a um dos homens e ouvi-lo .inundar com voz grave e poderosa:

Mademoiselle Daphne DuBois e

Rubi sentiu o estmago contrair-se e segurou a mo de Melissa.

Vamos, agora no h mais como voltar atrs. disse ela, procurando controlar o nervosismo.

Diante delas, uma confuso de cavalheiros e damas antigas se misturava a figuras folclricas, ndios, menestris e mais um monte de outros personagens bizarros.

At agora, tudo bem. murmurou Rubi, sentindo-se mais tranqila. Seu sossego, porm, durou pouco. Mal haviam entrado no salo e um casal aproximou-se delas, sorridente.

Mademoiselle DuBois? Que prazer em conhec-la. Sou Gladys Rhodes e este meu marido, Calvin. Seja bem-vinda nossa casa.

Rubi arregalou os olhos e olhou para Melissa, apavorada. De onde saiu a calma da moa s Deus podia saber. Mas, exibindo seu melhor sorriso e sotaque afrancesado, respondeu:

Mercy, madame e monsieur. Sinto-me honrada pelo convite. Gladys sorriu. Que moa adorvel! Quem era, mesmo?

Victoria no explicara direito quem era a francesa ou o que fazia na Amrica.

A honra nossa em receb-las.. e esta jovem ...? perguntou Gladys, olhando com surpresa para os trajes de Rubi.

Uma amiga... Rubi Stevens, apresento-lhe madame e monsieur Rhodes.

Stevens.... voc no seria parente de Richard, seria? Da Filadlfia? perguntou Calvin.

Bem, no sei... Talvez minha me tenha famlia por l.

Por favor, acompanhem-nos. Queremos apresent-las a alguns amigos e ao meu filho, naturalmente.

Melissa sorriu e trocou um rpido olhar com a amiga, cuja expresso apavorada no deixava dvidas do que estava pensando.

Sem ter como fugirem, as moas seguiram os Rhodes. Somente quando Melissa viu, misturados entre os convidados, o senhor e a senhora Johnson foi que se deu conta de que tudo aquilo podia acabar muito mal. Assustada, voltou-se para a anfitri e perguntou: ;

Que lindo quadro, aquele. A senhora pode me falar sobre ele?

Naturalmente. respondeu a mulher, mudando de direo. Interessa-se por artes, mademoiselle?

Melissa fez que sim com a cabea, dando graas a Deus que o perigo havia passado. Mas estava muito enganada: ele estava .1 apenas comeando.

Daphne e suas 22 malas desembarcaram na Califrnia muitas horas depois da sua partida, procurando por Pierre. Ao v-lo, abriu um sorriso aliviado e lhe perguntou, assim que ele se aproximou:

Quando vou conhecer Clark Gable?

Depois que assinar o contrato. Tivemos muita sorte, ma petite; fizemos um excelente negcio!

Assim espero... Morro de saudades da Frana. Jamais devia ter dado ouvidos a voc, seu safado. Mas o que pode uma pobre garota contra os argumentos masculinos? gemeu, fazendo beicinho.

Guarde a interpretao pra depois, Daphne, agora temos negcios a tratar. Mark Goldenberg, o homem de quem lhe falei, est ansioso para conhec-la.

Como ele, esse monsieur Goldenberg? perguntou ela, entrando no automvel.

Pierre podia ter-lhe dito que ele era jovem e educado ou ento bem-apessoado, mas, conhecendo Daphne como conhecia, foi direto ao ponto:

Rico, chrie, muito rico.

Ela sorriu. Rico era um bom comeo. O melhor de todos.

Captulo V

Daphne piscou vrias vezes quando encontrou Mark Goldenberg. Era era muito mais que qualquer

garota podia sonhar e a tratava como se fosse a nica mulher do mundo.

Estou encantado por conhec-la, mademoiselle DuBois. Vi seu espetculo em Paris e fiquei fascinado por sua... atuao. disse ele, embora a palavra que tenha pensado estivesse muito longe de ter alguma coisa a ver com a atuao de Daphne.

Merci, monsieur! respondeu, cheia de graa, exibindo um dos seus melhores sorrisos. No sei se mereo tantos elogios.

E humilde, mademoiselle, merece isso e muito mais.

Pierre me disse que o senhor lhe props um contrato para oito filmes?

Exatamente. respondeu Mark, adquirindo uma expresso mais profissional. Ser como um termmetro... vamos ver como o pblico reage aos filmes, antes de pensarmos em algo mais longo. J tomei providncias para que sua contratao seja alardeada pelas revistas e jornais. Voc ter, claro, que se deixar fotografar e tudo mais...

Sim, eu conheo esse caminho, monsieur.

Mark sorriu. Ela era bonita e esperta. Tinha tambm um apelo de sensualidade que ficaria maravilhoso na tela.Daphne se tornaria uma estrela sem qualquer sombra de dvida e o deixaria muitos milhes mais rico.

Se no estiver muito cansada, mademoiselle, gostaria de conhecer um pouco da nossa vida noturna?

Nada me daria mais prazer. respondeu, esticando a mo para que Mark a beijasse.

"Como manhosa!", pensou Pierre, sorrindo ao ver as tentativas de Daphne para seduzir Mark.

Apesar dos protestos de Pierre, Daphne no admitiu que ele a acompanhasse em seu encontro com Mark.

Prometa que no vai discutir contratos com ele, Daphne.

E por que no? Eu sou a maior interessada, afinal!

Daphne, prometa! Voc sabe que h detalhes demais e que uma coisinha boba pode se transformar em um problemo, depois!

Est bem, est bem! Eu prometo! respondeu, de m vontade.

Trs bien. Agora vamos falar de outra coisa: como andam suas finanas?

Mais ou menos... j viram melhores dias. respondeu, fazendo uma careta graciosa.

Podemos tentar um adiantamento com o senhor Goldenberg, se for o caso.

Non! No quero que ele pense que estou falida. Quero que ele pense que precisa de mim e no o contrrio.

Est bem... mas me avise se as coisas apertarem. Ela sorriu, agradecida:

Agora v, v... preciso me arrumar! disse, colocando o homem para fora.

Abriu todas as malas, espalhou todas as roupas, at encontrar um deslumbrante vestido, cujo decote posterior ia at a cintura e era cheio de brilhos e drapeados.Esperava que a roupa causasse em Mark o efeito necessrio. E causou. Ele a achou magnfica, a mais bela criatura que j vira na vida.

Jantaram em um famoso clube de Hollywood, assistiram a um espetculo e ele a tirou para danar.

Enquanto rodavam pelo salo, Daphne pensava que aquele era n homem mais maravilhoso que havia conhecido, o homem certo para ela.Mark, entretanto, pensava em quanto sucesso aquela mulher faria nas telas e como a Amrica cairia a seus ps, caso ela conseguisse transmitir nas filmagens o mesmo charme que tinha ao vivo. Pensava, tambm, que era melhor ter cuidado com ela. I

Homem experimentado, conhecia muito bem o mundo em que vivia e trabalhava. Daphne era apenas mais uma, entre tantas, que tentava conquist-lo. A nica diferena que ela era bem mais bonita que a maioria. E mais esperta tambm.

Rodopiando pelo salo com a moa em seus braos, Mark sorriu e Daphne imaginou que aquilo era um bom sinal.

"Deve estar imaginando que vou me derreter toda e passar a noite com ele. No conhece as francesas, no faz idia das surpresas que guardamos", pensou, sorrindo de volta.

Nos sales da manso Rhodes, as coisas iam mais ou menos bem. Rubi e Melissa divertiam-se, observando as pessoas, a casa, as fantasias, sempre de olho nos Johnson, cuidando para se manterem afastadas do casal.

O vestido azul de Melissa atraa comentrios, assim como sua beleza, o que fez com que ela se visse, em dado momento, rodeada de cavalheiros, todos querendo danar com ela, conhec-la melhor.

Rubi encantou-se ao sentir que tambm era alvo dos interesses masculinos e, quando Melissa deu pela coisa, a amiga j estava danando animadamente com um rapaz que usava uma ridcula fantasia de sulto.

Dance comigo. pediu um dos moos sua volta.

Com ele no, comigo. falou outro.

Sou o prximo. retrucou um rapaz magrinho.

Sem saber o que fazer e sentindo-se desconfortvel com aquele bando de fantasias que a impediam de olhar em volta e ver onde os Johnson estavam, Melissa pensava em como se livrar deles, quando algum se aproximou e falou, com voz forte e equilibrada:

Senhores, senhores, vo assustar minha convidada. Agradeo que lhe tenham feito companhia at agora, mas daqui para frente, eu assumo. disse, com um sorriso sarcstico.

Os outros trocaram um olhar aborrecido e se afastaram.

Obrigada.disse Melissa, procurando manter a compostura, enquanto seus joelhos tremiam.

Como vai, senhorita.? Sou Seth Rhodes.

Sei quem voc ... respondeu ela, disfarando o nervosismo.

Ento est em ligeira vantagem, j que no posso lhe dizer o mesmo.

Melis... Daphne. Daphne DuBois, monsieur.

A atriz parisiense? Melissa engoliu em seco.

Oui. Mudei-me h pouco tempo para Nova York. Na verdade, esta minha primeira festa na cidade.

Uma falta que ser prontamente corrigida, sem dvida .alguma.Champanhe? ofereceu, entregando-lhe uma fina taa de cristal.

Melissa sorriu.

Gostaria de danar? No justo que algum to bela e famosa fique sozinha em uma festa destas

Merci, eu adoraria. respondeu, rezando para que Oliver e Victoria Johnson no a vissem.

Danaram vrias msicas seguidas, conversando sobre a Frana e a profisso de Daphne. Melissa improvisou o melhor que conseguiu em suas respostas e procurou conduzir a conversa para outro ponto. Nada sabia sobre o rapaz, mas estava ciente, assim como toda a populao de Nova York, do baile beneficente.

Achei uma idia maravilhosa. H tantas pessoas necessitadas, no?

E verdade. concordou ele, para quem os necessitados era apenas uma figura de retrica que os polticos usavam para conseguir votos e nada mais Mademoiselle interessa-se por caridade?

Acredito no ser justo tantos passarem fome enquanto >,uns se divertem. respondeu, arrependendo-se em seguida.

Pardon, no quis ofender, meu ingls no muito bom e... Seth riu:

Gosto de pessoas diretas, que falam o que pensam. No me ofendi, sou cnico demais para isso respondeu, olhando-a nos olhos.

Melissa tremeu em seus braos. Ele era lindo demais! E ainda por cima charmoso, educado e cheirava maravilhosamente bem!

Talvez queira descansar um pouco. sugeriu o rapaz. Gostaria de dar uma volta pelo jardim?

"Estou sonhando? Se estiver, no quero acordar!", pensou, aceitando o convite.

A noite morna, o cu estrelado e os sons da msica suave os envolveram, criando um clima agradvel e fazendo o corao de Melissa disparar ainda mais. Onde tudo aquilo ia terminar?

Fale-me de voc. pediu ela, caminhando calmamente.

No h muito a dizer... o que quer saber?

Tudo. respondeu, imaginando o que mademoiselle faria em uma situao daquelas.

Bem... Nasci e cresci nesta casa, morei na Inglaterra durante alguns anos, quando l estudei e, desde que retornei, trabalho nos negcios da famlia junto com meu pai... Como disse, no h muito...

No me contou nada que os jornais j no tenham dito...

Ah, quer saber das fofocas? brincou. Pergunte...

Vi que est sozinho e houve toda aquela histria de estar procurando uma esposa...

Ah, isso! comentou, ligeiramente irritado. Foi apenas uma maneira que encontramos para divulgar o baile beneficente. Voc sabe, para os necessitados...

Entendo... mas voc est sozinho, no est? Quero dizer, no h nenhuma moa...

No. H muitas, mas nenhuma em especial. Tenho um corao fechado. brincou.

No existe isso... Mesmo quem no quer se apaixonar ou tem medo de amar sempre acaba encontrando algum que lhe derrube as barreiras. O amor no liga muito para nossa opinio, no acha?

E o que pensa? Acredita em amor e todas essas coisas que os poetas falam sem parar? Isso me parece to antigo e fora de moda...

Creio que tudo pode passar neste mundo, que modas vm e vo. Mas, ainda assim, as pessoas vo continuar sempre se apaixonando.

Uma viso doce do mundo, mademoiselle, e confesso que no

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esperava ouvi-la de algum como voc, que conhece to bem os .enredos da vida.

"Droga, esqueci que tenho de agir e falar como Daphne", censurou-se.

Exatamente por isso penso assim, por experincia.

Bem, sendo assim, devo presumir que no sou um caso perdido, afinal?

Voc se acha um caso perdido?

s vezes, sim. respondeu ele, pensativo. Imagino que ao longo da sua vida j tenha ouvido muitas confisses e desabafos masculinos. Ento, a vai mais um para sua coleo: nunca amei na vida. No consigo. Minha me vive me dizendo para arrumar uma boa moa e casar, mas no consigo me ver preso a uma nica mulher.

Acredita que jamais haver algum capaz de faz-lo desistir d.i vida bomia?

Creio que desistiria se encontrasse algum que realmente me fizesse sentir que vale a pena, entende? Algum com quem me sentisse vontade e tranqilo, algum em cuja companhia o tempo fosse apreciado e no apenas gasto, respondeu ele com sinceridade.

Melissa olhou-o com compreenso. Apesar da boa aparncia, das farras e de todo dinheiro, aquele homem era solitrio.

Imagino que muitas moas se sentiriam felizes em desempenhar esse papel. comentou, esquecendo-se do seu '.sotaque francs.

A que est: o problema no so elas, sou eu! respondeu, olhando profundamente para ela. Os olhos azuis de Melissa brilhavam na escurido e Seth continuou:

Nem sei por que falo dessas coisas com voc, deve me achar chatssimo.

Oh, no! E bom desabafar... Falar com estranhos sobre coisas que nos vo na alma, normalmente mais fcil que faz-lo com os mais prximos de ns. Normalmente os estranhos desaparecem da nossa vida e jamais nos cobraro nada.

o que pretende? Desaparecer da minha vida?perguntou ele. Melissa no soube o que responder.

Venha, quero lhe mostrar uma coisa. disse ele, pegando sua mo e conduzindo-a a um recanto mais afastado do jardim.

Caminharam entre rvores frondosas at Seth parar em frente a uma delas.

Quando era criana e tinha algum problema, costumava subir nesta rvore e sentar-me entre seus galhos para pensar na vida. explicou. o que quer fazer agora?

Seth riu alto, mas percebeu, pela expresso da moa, que ela falava a srio.

No! Isso ... voc gostaria? Seu vestido to lindo... Melissa riu e ergueu as saias.

Voc primeiro. disse.

Surpreso e achando tudo aquilo totalmente diferente do que podia esperar quando a convidou para dar uma volta, ele a olhou, espantado:

Os franceses so mesmo diferentes, no?

Suba, vou logo atrs. disse ela. Ele se virou e comeou a subir pelos fortes galhos, ajudando

Melissa a fazer o mesmo.

Devamos ter trazido algo para comer. ele brincou.

Como se sente? perguntou ela.

Surpreso... e vontade. Voc uma mulher surpreendente, Daphne. Tem rosto de menina, alegre e totalmente diferente do que se pode esperar de algum da sua posio.

Minha posio? Ah, voc quer dizer por eu ser atriz? Seth sorriu:

Quero saber sobre voc. Como a sua vida? Tem famlia na Frana?

Melissa mordeu o lbio, sem ter idia do que dizer.

No gosto de falar sobre isso... importa-se se mudarmos de assunto?

Claro que no... fale sobre o que quiser. Melissa levou a conversa para longe da sua vida pessoal e,

quando os dois deram por si, vrias horas haviam se passado.

Acho melhor voltarmos... deixei minha amiga l dentro e ela no est acostumada a beber.

Daphne, antes de irmos...

Sim? os olhos dela brilharam mais.

Quero que saiba que nunca encontrei algum como voc. Sei que deve ter ouvido isto um milho de vezes e eu tambm j disse isso um milho de vezes para outras mulheres, mas desta vez, estou sendo sincero. Voc muito especial.

Ela sorriu, disfarando o embarao. Seth olhou-a nos olhos e, .aproximando-se de seu rosto, beijou-a com suavidade

Os lbios dela, macios e molhados, receberam os dele com carinho. Mas no havia neles nem uma gota da volpia que o rapaz esperava encontrar. Ele olhou para ela espantado. Para usar as palavras da sua me, Daphne DuBois era uma cortes e aquele beijo parecia o de uma menina inexperiente. Isso, mais do que tudo, despertou seu interesse.

O que foi? perguntou ela, certa de que havia feito algo errado.

Nada... apenas voc... Vamos, vou ajud-la a descer. disse ele, rindo. H muito tempo no se sentia to bem ao lado de uma mulher. Na verdade, no se lembrava de quando se sentiu assim pela ltima vez.

Voltaram ao salo, conversando animadamente, danaram e se divertiram e, como no podia deixar de ser, Melissa s queria que aquela noite durasse para sempre.

Rubi, para sua surpresa, parecia estar se divertindo tanto quanto ela com o rapaz vestido de sulto.

A madrugada j comeava quando alguns convidados se preparavam para sair. Victoria e Oliver Johnson estavam entre os que decidiram voltar mais cedo para casa.

Ao se despedirem dos anfitries, encontraram Gladys Rhodes radiante

Vocs viram o meu Seth? No largou de mademoiselle DuBois um minuto! Ela me parece uma excelente moa!

J era de se esperar... seu filho tem faro para esse tipo de mulher. comentou Oliver, segurando o riso e levando uma forte i cotovelada da esposa.

Que bom, querida. Tenho certeza de que se daro muito bem disse Victoria, escondendo sua preocupao. Estaria em maus lenis quando a amiga descobrisse quem era Daphne e como ganhava a vida

Venha, quero que veja como Seth parece feliz. disse a senhora Rhodes, pegando a amiga pelo brao e arrastando-a at o lado oposto onde Melissa e Seth riam um para o outro enquanto conversavam em uma roda de pessoas que inclua Rubi, Anthony,Charles e outra moa.

Veja!

Victoria olhou para o rapaz e ento seu olhar recaiu sobre a falsa Daphne. Abriu a boca de espanto e seus olhos, arregalados, se recusavam a acreditar no que via.

Gladys, est falando daquela moa? perguntou, indicando Melissa.

Claro, de quem mais? S existe uma Daphne DuBois, no? ' Victoria pensou em desfazer logo de uma vez aquela confuso

e descobrir o que Melissa estava fazendo ali, mas algo a impediu. Seth parecia muito feliz e olhava para ela com carinho. Melissa Anderson era uma excelente garota, tinha boa educao e vinha de famlia honesta e digna. Seth era um excelente partido. Ser que ela devia mesmo atrapalhar as coisas?

Claro, apenas uma Daphne DuBois... comentou, sem despregar os olhos de Melissa. Que diabos havia dado na moa para se passar por Daphne?

Ela to linda e eles ficam to bem juntos, no acha? ' Gladys no cabia em si.

Victoria sorriu amarelo.

Linda... ficam bem juntos... Escute, Gladys, tenha calma, isso pode no ser nada...

No... Sinto que meu filho gosta dela. Voc sabe, corao de me nunca se engana...

Eles acabaram de se conhecer! Alm disso, no sabemos nada sobre essa Daphne!

O que deu em voc? Pensei que ficaria feliz!

Claro, claro... desculpe-me, querida. Sou uma tola, preocupando-me assim. disse Victoria, com a cabea girando.

Aquilo no podia acabar bem e algo lhe dizia que uma erupo vulcnica comeava a se formar. Quando finalmente eclodisse, no sairia ilesa.

Pegou o marido pelo brao e correu para o carro.

O que deu em voc? perguntou ele, assustado.

Nada... dor de cabea, bebi muito champanhe, deve ser isso mentiu acreditando que era melhor pensar sobre aquele assunto antes de contar qualquer coisa ao marido.

Oliver j dormia e Victoria estava sentada na cama, tentando entender o que havia dado em Melissa quando a moa decidiu que estava na hora de irem embora

Depois de Rubi finalmente se despedir de Charles e sua ridcula roupa de sulto, caminharam at o carro, onde John dormia a sono solto.

Seth bateu no vidro para acordar o rapaz e despediu-se de Melissa, beijando suas mos com carinho.

Vamos voltar a nos ver, com certeza. disse ele com suavidade.

Nada me agradaria mais, monsieur respondeu ela, entrando rpido no carro.

Enquanto cruzavam as ruas desertas, Rubi olhou-a e disparou:

Nada me agradaria mais? Ficou maluca de vez? No pode voltar a v-lo, Melissa!

Eu sei, mas foi tudo to perfeito... E eu ia dizer o qu?

E... eu sei... Eu tambm gostaria de poder rever o Charles...

Somos duas tontas. comentou Melissa, lembrando-se do beijo de Seth.

Muito mais tarde, deitada na cama de Daphne, Melissa olhava a amiga dormir, enquanto pensava em como tudo teria sido diferente se a maldita bolsa no tivesse quebrado.

"Estou sonhando com o doce de outra. Ele jamais me olharia duas vezes se soubesse quem sou realmente", pensou, decepcionada. Mesmo assim, continuou sonhando com Seth e o beijo que trocaram, imaginando que aquele seria o nico carinho que guardaria dele. No podia estar mais enganada.

No podia estar mais enganada.

Captulo VI

/Rubi enrolou-se num dos roupes que Daphne deixara na casa e correu para atender porta . Sem ter noo das

.horas, descabelada e com a cabea ainda meio zonza,abriu a porta pronta para dar uma chamada na pessoa que no tirava o dedo da campainha.

O que quer? perguntou, irritada, para o menino que a olhava com ar espantado.

Nada no, dona, s vim entregar estas flores. respondeu ele, atirando um enorme buqu de rosas em direo a Rubi.

Hum, j entregou, e agora? perguntou ela, olhando o carto endereado a Daphne.

Gorjeta?

Rubi olhou para o garoto sem entender o que ele falava e depois lhe jogou algumas moedas que pretendia, mais tarde, cobrar da patroa. Curiosa, olhou a caligrafia do carto, firme e bem desenhada, imaginando quem estaria enviando flores mademoiselle. Ela no conhecia ningum na Amrica e, desde que Rubi comeou a trabalhar ali, era a primeira vez que chegavam flores. E que flores! Devia haver pelo menos duas dzias delas, enormes e vermelhas.

Seth! Ele enviou as flores para Melissa, claro!

Arrancou o carto e ia comear a l-lo, quando a amiga apareceu.

Flores? perguntou, esfregando os olhos. Para mademoiselle?

Tome, leia. disse Rubi, praticamente atirando o carto nela, ardendo de curiosidade.

No! So para Daphne, no para ns!

Quer ler logo, de uma vez?

Est bem... suspirou Melissa. "Querida Daphne, A noite de ontem foi a mais agradvel que passei em anos..." comeou e parou. Jesus Santssimo! de Seth!

Leia o resto!!!

T... "Voc a mais adorvel das criaturas e, caso esteja livre, gostaria de convid-la para almoarmos ou, quem sabe, tomarmos um ch durante a tarde, conforme lhe for mais conveniente." Ai meu Deus!!! exclamou.

Termine logo de ler!!! Rubi no se agentava de tanta curiosidade.

"Aguardo sua resposta com ansiedade. Respeitosamente, Seth Rhodes." leu.

Meu Deus!!!! Ele est te convidando para almoar? Seth Rhodes quer sair com voc?

Com Daphne, Rubi, no comigo. Ele nem sabe que eu existo.

No seja boba! Ele pode no saber o seu nome, mas em voc que est interessado!

Melissa olhou, incrdula, para a amiga. Onde tinha ido parar .iquela Rubi que a aconselhara a no sonhar com o que jamais podia ter? Ia responder alguma coisa, mas no teve tempo. O irlefone a interrompeu no meio do caminho.

Residncia de mademoiselle Daphne DuBois, pois no? disse Rubi, mantendo a pose.

Era Seth Rhodes. Queria saber se as flores haviam chegado, se "Daphne" as recebera, se aceitava seu convite. Tomada de surpresa, Melissa falou com ele por monosslabos, mas no conseguiu lhe dizer no. Aceitou o convite para almoar e desligou, apalermada.

Isso no vai dar certo! Nem roupa eu tenho!

Tem montanhas delas no guarda-roupa. replicou Rubi.

No sei o que me deu... no posso continuar mentindo assim! Vou contar a verdade hoje e acabar logo com isso. prometeu Melissa, que no conseguia disfarar a alegria. Meu Deus, nem arrumamos a casa.

Eu arrumo. Voc vai tomar um banho, vestir-se e se perfumar. Tem de estar linda para esse almoo!

Melissa olhou boquiaberta para a amiga mas no se recusou a fazer o que ela dizia. Voltou para cima e encontrou uma roupa que achou adequada para a ocasio. Enquanto se arrumava, imaginava uma forma elegante de dizer a verdade ao rapaz. Concluiu que o melhor seria contar tudo, logo de uma vez, e depois se levantar e i embora. Seu corao, entretanto, alheio a qualquer sensatez, bati feliz pela expectativa do encontro.

"Enlouqueci!", concluiu, desanimada, enquanto ajeitava os cabelos em frente ao espelho.

H milhas de distncia dali, a verdadeira Daphne DuBois no estava em melhor situao. Sentada no escritrio de Mark Goldenberg, ouvia, aborrecida, a conversa entre ele e Pierre sem entender muito bem o que falavam.

Ento, o que acha, Daphne? perguntou Pierre, animado.

O que te parecer melhor, Pierre. Mark olhou-a, intrigado:

No tem nada a acrescentar? No h mais nada que queira? Daphne suspirou:

No entendo nada disso. Se Pierre concordar, tambm concordo.

Muito bem. Vou mandar a secretria datilografar isto e ento podemos formalizar tudo. Assim que assinarmos, quero apresent-la a algum, Daphne.

Ela ergueu as sobrancelhas e ele continuou:

Helga Schueler. Ela veste a maioria das estrelas e atua como consultora de moda e beleza para ns. Voc vai ador-la.

Como assim? O que h de errado com minhas roupas? perguntou, com uma ponta de indignao.

Nada, querida, voc perfeita, mas tudo pode ser melhorado. E voc ficar ainda mais linda. respondeu Mark, adulando-a j com jeito. Mas ela no se deixou convencer:

Minhas roupas so todas de Paris. O que pode ser melhor?

Daphne, querida, mister Goldenberg quer dizer que, apesar de o seu guarda-roupa ser perfeito, o pblico americano prefere uma apresentao mais... mais... provincial, digamos assim. explicou Pierre com jeito.

Ela no parecia muito convencida, mas respondeu:

Eh bien, se voc diz que melhor...

Outra coisa: vamos ver um corretor de imveis para lhe arrumar uma casa decente e, claro, um carro e um motorista. Depois que tudo estiver pronto, comearemos as entrevistas e a propaganda para torn-la conhecida do pblico americano. explicou o produtor.

Temos dinheiro para isso, Pierre? perguntou, preocupada.

Oui, no se preocupe, est tudo no contrato. Voc vai se l ornar uma estrela, Daphne! exclamou o francs, animado.

Ela sorriu e replicou:

Non, chri, eu j sou uma estrela... S vou brilhar mais.

Os homens sorriram e Daphne empinou nariz, adquirindo um ,armais glamouroso. Ela estava pronta para a Amrica. Mas ser que a Amrica estava pronta para ela?

Victoria Johnson mal pregara o olho durante a noite. Por todos os ngulos que examinasse a questo, nada fazia sentido. Durante o caf, quase contou a Oliver o que vira na noite anterior mas, novamente, algo a impediu: o olhar de felicidade que vira no rosto de Melissa.

"Preciso fazer alguma coisa", concluiu, perdida em pensamentos. "Talvez seja melhor conversar com Melissa e descobrir o que est acontecendo... ou ser que devo procurar Gladys e lhe contar a verdade?

Sem saber que caminho seguir, ponderou a questo por outro ngulo: no fazer nada e esperar, para ver o que aconteceria. Havia uma grande chance de Seth e Melissa no se verem nunca mais e se ela, Victoria, dissesse alguma coisa, acabaria arrumando uma confuso desnecessria

"E isso... vou ficar quieta e ver o que acontece", decidiu, sentindo-se mais tranqila. Afinal, Melissa no era uma dessas mocinhas desmioladas, que vivem arrumando confuso. Ou era?

Seth Rhodes chegou pontualmente hora marcada, segurando uma delicada caixa de porcelana. Dentro, uma pequena jia, um mimo para Daphne Dubois.

Melissa sorriu ao v-lo, imaginando que sua tarefa seria muito mais difcil do que podia sonhar. Olhar para ele, assim elegante e sorrindo com franqueza, fez seu corao pular no peito. Por que diabos ele tinha de ser to bonito? Seria to mais fcil se fosse feio! Mas a ela no teria se interessado por ele, certo?

Est linda! Mais ainda que ontem, se que possvel. elogiou ele, beijando-lhe a mo.

Obrigada, monsieur... muito gentil. respondeu, sorrindo.

Pensei em lev-la para um passeio antes do almoo, o que acha? perguntou ele.

Eu adoraria!

J ia me esquecendo, isto para voc... Apenas uma pequena recordao. disse, entregando-lhe a caixinha.

Melissa abriu e sorriu ao ver a delicada correntinha com um pingente em forma de rvore.

E linda! Adorei!

Fico feliz... Pensei que seria uma forma de no se esquecer de mim... No que eu pretenda deixar de v-la, mas, sabe, para se lembrar de mim nas horas em que no estivermos juntos...

Foi uma experincia e tanto ontem noite.

E, eu sei... Fazia anos que no subia naquela rvore ou que no conversava to tranqilamente com algum... Voc mesmo especial, Daphne.

Seth levou-a para ver alguns locais famosos de Nova York, explicando-lhe a importncia daqueles pontos para a cidade e para seu pas.

Melissa, que j conhecia tudo aquilo de cor e salteado, sentia como se fosse a primeira vez que passava por ali.

tudo to lindo e voc faz parecer to especial!

Claro que nada aqui se aproxima da riqueza do seu pas, em termos de arte e beleza, mas temos orgulho do que possumos. explicou, enquanto caminhavam pela margem do rio Hudson.

Devem se orgulhar e muito. Este um grande pas. Basta ver como as pessoas lutam para reverter os ainda amargos resultados da grande quebra. disse, sem sotaque algum, mais para ela mesma do que para o rapaz.

Voc surpreendente. Primeiro, descubro que se interessa por caridade, agora, por economia e poltica. cheia de surpresas, Daphne. disse ele, parando de caminhar e olhando-a nos olhos

Voc nem imagina. respondeu Melissa, referindo-se sua identidade. Seth, porm, interpretou a frase como uma promessa e sorriu, abraando-a.

Naquele momento, Melissa fechou os olhos. A cada minuto ficava mais difcil tocar no assunto com ele. E tudo piorou ainda mais quando ele a beijou. O contato com os seus lbios fazia sua cabea girar e lhe tiravam qualquer possibilidade de raciocnio.

Voc to feminina, to envolvente... murmurou ele. Melissa sentiu as pernas tremerem e procurou manter o controle, o que obviamente no era nada fcil. Ele a apertava nos braos e no parava de beij-la um segundo. Quando o fazia, era para murmurar palavras doces e apaixonadas, que a deixavam ainda mais entregue e sem foras.

O almoo! exclamou ela, de repente. Seth olhou-a, sem entender.

O almoo... No amos almoar? Estou faminta! disse, procurando se recompor.

C... claro... o que voc quiser, querida... ela a olhava, intrigado. Podia jurar que Daphne estava quase encabulada e sem saber o que fazer, como se fosse uma inexperiente mocinha. "Isso ridculo!", pensou, rindo de si mesmo. "Ela deve ter mais experincia que eu! Estou ficando doido", concluiu, enquanto voltavam para o carro.

Observou-a com ateno e viu que suas faces estavam mais vermelhas e os olhos brilhavam de forma encantadora. "Quase uma donzela! Que mulher essa, meu Deus?", perguntou-se, cada vez mais desejoso de senti-la.

Voc maravilhosa, Daphne. Paris deve estar chorando a sua ausncia.

Bien, uns perdem, outros ganham, c'est le monde. respondeu ela, procurando parecer filosfica. Seth riu e beijou-a no rosto.

Vamos almoar, no quero mat-la de fome. Todos conhecem o apetite dos franceses. disse, afastando-se dali.

Rubi estava terminando a faxina das salas quando telefone tocou. Do outro lado a voz de Daphne soou cheia de estalidos e rudos de interferncia.

%

Mademoiselle! Como est? O que est achando de Hollywood?

Uma amolao, realmente. Querem mudar a cor dos meus cabelos e dizem que meus vestidos no combinam com a Amrica! queixou-se.

Lamento muito ouvir isso... Quando retorna?

No sei, mas creio que ainda vou demorar... H entrevistas, fotos e pessoas que devo conhecer. Mon Dieu, como cansa ser uma estrela neste lugar!

Rubi riu.

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