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Lago Igapó 2: patrimônio afetivo e ícone da paisagem urbana Lake Igapó 2: affective heritage and icon of the urban landscape Camila Silva de Oliveira, mestranda, [email protected].

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LagoIgapó2:patrimônioafetivoeíconedapaisagemurbana

LakeIgapó2:affectiveheritageandiconoftheurbanlandscape

CamilaSilvadeOliveira,mestranda,[email protected].

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SESSÕES TEMÁT ICA 7 : C IDADEE H ISTÓRIA

DESENVOLVIMENTO,CRISEERESISTÊNCIA:QUAISOSCAMINHOSDOPLANEJAMENTOURBANOEREGIONAL? 2

RESUMO

Apesardenãoconsistiremumpatrimônioculturallegalmentereconhecidoeprotegido,olagoIgapó2éportadordeumadimensãomenosconcretaenãomenos importante:seuvalorafetivoeseupapelcomocartãopostalda cidade.EsteartigoépartedeumapesquisademestradoemandamentoquepropõeanalisaraconstituiçãodoIgapó2nocontextodahistóriaurbanadeLondrinaecompreenderaconfiguração física e simbólicaqueénelehoje reconhecida. Para isso, forammobilizados temasqueacredita-seserembasilaresparaestaetapadapesquisa:considerandoa ideiadenaturezacomoumaconstrução cultural, oartigoprimeiramentepropõe refletir sobreos conceitosdenaturezae cultura,suas ambiguidades e aproximações ao longodahistória dapaisagemmoderna; em seguida, expõe anaturezacomoobjetocientíficoecomoobjetoculturale,porúltimo,abordaatrajetóriadanoçãodepatrimônio natural como hoje conhecemos, propondo uma reflexão sobre os valores demonumentalidade e cotidiano. As considerações propostas a partir destes temas contribuirão para acompreensãodadimensãofísicaesimbólicadolagoIgapó2.Destemodo,apesquisamostra-seguiadapelanoçãodequeéfundamentalcompreenderobjetodeestudoeasforçasqueatuamsobreeleparaquesepossamdesenvolver ferramentasqueprotejamseuuso,sua integridadeculturaleseucaráterpúblicoedinâmico.Ainda,que se façamais tangível adiscussãodopatrimôniodeslocadadoâmbitolegaldotombamento.

PalavrasChave:patrimôniocultural;patrimônionatural;patrimônioafetivo;paisagem;áreasverdes.

ABSTRACT

Althoughitisnotalegallyrecognizedandprotectedculturalheritage,LakeIgapó2hasalessconcretebutnotlessimportantdimension:itsaffectivevalueanditsroleasacitypostcard.Thispaperispartofamaster'sresearchinprogressthataimstoanalyzetheconstitutionofLakeIgapó2inthecontextofurban history of Londrina and to understand the physical and symbolic setting that is currentlyrecognizes in it. For that, wemobilized issues considered fundamental for this step: the paper firstproposes a reflection about the conceptsof nature and culture - considering the ideaofnature as aculturalconstruction-asitsambiguitiesandapproachesthroughoutthehistoryofmodernlandscape.Then we expose nature as a scientific object and as a cultural object. At last, we approached thetrajectory of the notion of natural heritage as it is known today, proposing a reflection aboutexceptional and daily values. The weightings developed from these issues should contribute tounderstand the physical and the symbolic dimensions of Lake Igapó 2. In this way, the research isguidedbythenotionthatitisfundamentalunderstandingtheobjectofstudyandtheforcesthatworkonitsothattoolscanbedevelopedtoprotectitsuse,itsculturalintegrityanditspublicanddynamiccharacter. Still, we want discussions on cultural heritage to go beyond the scope of conventionalprotectionusuallydeterminedtobuiltgoods.

Keywords:culturalheritage;naturalheritage;affectiveheritage;landscape;greenspace.

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OLAGOESEUCONTEXTO

ORibeirãoCambé– cujo sistema integrao Lago Igapó2–epertenceaumpeculiar sistemadefundosdevaleque, comoestrias, recortaa cidade, impõe suas formas,demarca ruas,bairroseregiões,impõevaloraosoloedeliberaquantoàqualidadedevidadapopulação,dependendodoseuestadodeconservaçãooudegradação.

Se na gênese da cidade de Londrina, em 1929, foi tomado o cuidado de implantá-laestrategicamentedemaneiraquenãoatingissenascentesecursosd´água,suaexpansãoterritorialrapidamenteextrapolouos limitesoriginaiseobrigou-nosa lidarcomodesafiodaexistênciadetantos córregos em plena área urbana. Alguns foram canalizados, enquanto muitos outrosmantiveramseucursooriginale,namedidadopossível,atambémmanutençãodascaracterísticasnaturaisdoseuentornoimediato.

Comoobjetivodeembelezaracidadeepossibilitaracriaçãodeáreasdelazer,amanutençãodosfundosde valee seus cursosd´água foram frutodoprimeiroplanodiretorurbanode Londrina,elaborado por Francisco PrestesMaia, engenheiro civil, urbanista e por duas vezes prefeito dacidade de São Paulo. Aprovado sob a Lei nº 133 de 1951 e apresentando soluções urbanísticasdistintasdaquelasadotadasanteriormenteporelenoplanourbanísticodeSãoPaulo,esteplanodiretor “cria uma estrutura particularizada, dando destaque a elementos da paisagem natural”(LIMA,2003,p.226),preocupando-secomapreservaçãodealagados,encostasíngremesefundosdevale.

OribeirãoCambééumdosmaisde80cursosd´águaurbanosdomunicípioecaracteriza-seporpossuirgrandepartedosseus21,5kmdeextensãolocalizadosnaáreaurbana.Parasolucionarumproblema de drenagem e pormotivo do seu Jubileu de Prata, em 1959 a cidade ganha o LagoIgapó1, resultadodo represamentodo seu leito.Comoocursod´águaemquestãoé recortadopor ruas e avenidas, alguns desses fragmentos foram posteriormente represados e tambémtransformados em espaço para lazer e contemplação, resultando nos lagos Igapó 2, Igapó 3 eIgapó4.

OartigoqueaquiseapresentaépartedeumapesquisademestradoemandamentoquepropõeanalisaraconstituiçãodolagoIgapó2nocontextodahistóriaurbanadeLondrinaecompreenderaconfiguraçãofísicaesimbólicaqueénelehojereconhecida.Oobjetodepesquisaapresenta-secomo uma porção do ribeirão Cambé que atua como elemento imprescindível no processo devalorizaçãoimobiliáriadoseuentornoequeexperimenta–etemexperimentado–significativasmudanças em relação a outras regiões da cidade. Se até os anos 2000 sua margem direitaapresentava-sepredominantementecobertapormassavegetalnativa,apartirdeentãoéiniciadoum vigoroso processo de verticalização que a consolida como a área de expansão urbanamaisexpressiva e valorizada da cidade, denominada Gleba Palhano – bairro onde grandesincorporadoras investiram pesadamente e, não por acaso, o bairromais desejado pelas classesmédiaemédiaalta.

Alémdetersetornadoumagentepropulsordavalorizaçãoimobiliáriadoseuentorno,oIgapó2étambémportadordeumadimensãomenosconcretaenãomenosimportante:seuvalorafetivoesimbólico.ApaisagemconformadapelaurbanizaçãodoribeirãoCambé–ondeestão localizadososlagosIgapó1,2e3–podeserconsideradahistóricanamedidaemquetemsidoconcebidaaolongo do desenvolvimento da cidade, no entanto, por caracterizar-se como um “espaço quecontém movimento” (SANTOS, 2012, p.79), sua relevância está relacionada principalmente à

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contemporaneidade–emgrandemedidaporserpossívelreconhecê-lacomopatrimônioafetivoecartãopostaldacidade.

Como evidência, em uma busca por imagens da cidade de Londrina na ferramenta Google em27/08/2016, 20 das 44 primeiras fotos (portanto, 45% do total), exibem grandes trechos oufragmentos do ribeirão Cambé, sobretudo os lagos Igapó 1 e Igapó 2. Ainda, de acordo com oDocumentoparadiscussãodoPlanoDiretordePreservaçãodeLondrina,elaboradoem2008,oslagosdestacam-secomoprioridadeentreos150entrevistadosquandosãoquestionadossobreoselementosmaisimportantesaserempreservadosnacidade.(YAMAKI,2002,p.37,40)

A relação que Londrina tem com suas águas, a decisão de manter seus fundos de vale comcaracterísticasnaturais,ausentedeedificaçõesecomapossível finalidadede lazernãoé,comonos pode parecer óbvio, exclusivamente resultado de uma preocupação atual e cada vez maisemergentecomapreservaçãodomeio-ambiente.Asporçõesdenaturezanacidadesãoprodutodasdecisõespolíticas edeplanejamentourbanomodernos vigentes à época (LIMA, 2003)mas,além disso: a ideia do Lago e sua paisagem como um fragmento de sonho são fruto de comopercebemosestanaturezaespecificamentenaépocaatual. Issoquerdizerquenossapercepçãocontemporâneadanaturezaéumaconstruçãosocialquetemsidoelaboradaaolongodahistória.

Aconceituaçãodenaturezanahistóriaéumaconstruçãoculturaledependede variáveis tãodistintasquantoas características ambientais epaisagísticaslocais,avisãodemundo,oconjuntodasdemandasdasociedade,areligião,afilosofia,entreinúmerosoutros.(LIMA,2004,p.11)

E comoa representaçãodanaturezaé sempre reflexodasnecessidadesedesejosda sociedadenos seus determinados e diversosmomentos históricos (VELASCO, 1971, p. 20), compreender atrajetória da construção da ideia de natureza nos auxilia a compreender sua percepçãocontemporânea–questãoqueimportaàpesquisaemandamento.

ANATUREZANACULTURA,ANATUREZANACIDADE

Os modos com que se percebe a natureza não são algo estável, mas são constantementereconsideradasaolongodahistória–umarelaçãoentreserhumanoenaturezaqueéconstituídapor aversões (medo, devastação), proximidades (idealização, preservação) e até mesmo pelaparadoxalcoexistênciadeambas.

Senopensamentoantigoanaturezasemprehaviaexistidoeenglobavaotodo-incluindohomensedeuses-,nopensamentojudaico-cristãodaIdadeMédiaoserhumanonãosesituananatureza,masdiantedela. Enquantoo fundamentocristão confiavanapossibilidadedohomemsucumbirseus impulsos e suas paixões em favor da razão, a “Natureza inteira foi igualada ao âmbito dacriação:nelamanifestam-seabondadeeasabedoriadivinas”.(KESSELRING,2010,p.6).Portanto,assimcomootemoreaadoraçãoaDeus,omedoeorespeitodiantedanatureza–produtodacriaçãodivina–eramparteintegrantedouniversocristão.Asmuralhasqueencerravamacidademedievaleramresponsáveisporprotegerseuscidadãosdetodoouniversoquecolocava-seforadela,materializadonumavastanaturezatãodesconhecidaquantoindomáveletemerosa.

De acordo com Lima (2004), entre os séculos XVI e XVIII, as sociedades antes restritivasgradualmentedãolugarasociedadesmaisliberais.Anovaordemeconômica,política,eideológicaprovoca profundas transformações na relação do homem com a natureza e tambémno ato deprojetar a paisagem – ela transpõe a escala doméstica e alcança a escala do planejamento

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abrangente. Se antes amodestanaturezadomesticadaencontrava-se intramuros e apresentavaum caráter predominantemente utilitário (para o abastecimento alimentar), na Renascençaitaliana e no Barroco francês os jardins são concebidos para servir e honrar o ser humano;materializam-se como expressão de uma natureza domesticada – “o jardim controlado, comoexperiênciameditativa, sem surpresas, entre o ser humano e a natureza”. As características doambiente físico guiavam as composições paisagísticas que seriam a expressão de seu própriotempo.

EmoposiçãoàperspectivafatalistatípicadaIdadeMédia,ondeoserhumanoexerciaopapeldecriatura, o pensamento renascentista promove-o a criador e coloca-o quase sempre como “ocentroeamedidadetodasascoisas”,oquepoderiaaantipatiaentreoserhumanoeanaturezanacivilizaçãoocidental(LIMA,2004,p.15)

Como é comum aos movimentos culturais, os princípios barrocos de composição paisagísticaforam adotados pelos demais países europeus à época, no entanto, submetendo-se – comotambém é comum – às devidas adaptações ao ambiente físico e cultural de cada um. E naInglaterra não foi diferente. Segundo Lima (2004), a topografia de leves ondulações quepredominanoscamposinglesesnãomostrou-seadequadaparaaimplantaçãodosmonumentaiseprecisoseixosaxiaisdosjardinsfranceses.Opadrãoinglêsdeseconceberjardins,conhecidocomo“jardim paisagista inglês”, tornou-se tão marcante quanto inspirador – inclusive de projetospaisagísticosurbanos–e,comosesabe,nãosecurvouàsregrascompositivasvindasdaFrança.

A Inglaterra do século XVIII encontrava-se num cenário de economia emergente; seu contextoculturalagitadomostrava-sereceptivoanovidades–ofácilacessocomercialaoOrienteeagrandtour empreendida pelos homens cultos possibilitaram o contato com estéticas e composiçõespaisagísticas muito diferentes do rigor geométrico inglês. Ademais, “no século 18, os jardinsbarrocospassarama serassociadoscomadecadênciamoraldaaristocracia francesa,oqueeraincompatívelcomoespíritodemocráticodosingleses.AInglaterrainfluenciadapeloRomantismoetomadapelo“sentimentodonatural”deRousseau,reageàartificialidadedarepresentaçãodanatureza(VELASCO,1971,p.34)

ERAINDUSTRIAL:PRESERVAÇÃOEDEVASTAÇÃO

A Revolução Industrial é considerada um ponto de inflexão na relação ser humano-natureza, enessecontextoa Inglaterraéumimportantereferencialparaseentenderquestõesrelacionadastanto à devastação quanto à preservação dos recursos naturais, de acordo com Crispim (2014,p.18),considerandosobretudoadimensãodascontradiçõesemqueseencontram.

Se, ao longo da história da humanidade, a exploração dos recursos naturais sempre estevepresente,oimpactogeradopelodesenvolvimentoindustrialirápotencializaresteprocessoemumcurtoespaçodetempo,castigandonãosóanatureza,masagora,opróprioserhumano.Ecomotoda ação está sujeita a uma reação, as ideias de preservação emergem neste período nummovimento contra a corrente dominante da devastação, ligada à uma consciência de que algoimportante está sendo ameaçado (LIMA, 2004; CRISPIM, 2014). No século XIX, segundo Lima,diversas concepções de projeto – em diferentes escalas e tipologias - foram desenvolvidas emdiversospaíses,massobretudonaInglaterra,comafinalidadedeaproximarosprocessosnaturaisdosprocessoshumanos.

Ojardimprivado,quetradicionalmente impulsionouahistóriadopaisagismoperanteastransformaçõesqueseoperaramnasociedade,cedeo lugarpara

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as novas configurações de natureza na cidade e, em última análise, para oplanejamentodacidadecomanatureza.

Mudou a cidade, e com ela olhar sobre a presença da natureza em seusespaços;opaisagismosinaliza,pormeiodosentidopúblicodesuaprodução,as transformaçõesqueseoperamnasociedadeurbana.Anatureza,quenãorarofoiidentificadacomoantítesedacidade,entraagoranoambienteurbanopararecuperaracidadania,buscandodevolverosentidodignodavidaurbana.(LIMA,2004,p.33)

PARQUEURBANOS:ANATUREZANACIDADE

DeacordocomKliass(1989,p.19),éna InglaterradoséculoXVIIIqueoparquerealiza-secomo“fatourbano”,nummovimentoquealcançatambémoutrascidadesindustriais.Nestemovimento,segundoGavira(1971),àmedidaqueascidadestornam-secadavezmaisadensadaseartificias,apopulaçãomanifestaseudesejopormaisespaçosnaturalizados.Estedesejogeraummovimentode anseio à criação de cada vez mais espaços livres e vegetados. Se antes as áreas verdes –concretizadaspelos jardinsdeestilo–eramobjetodedeleitedeumaminoria,naera industrialelas são concebidas pelo viés funcional – inclusive sanitário – e de lazer, materializando-se demodomaispermeávelemrelaçãoàcidade.

Laideadelparquenaturalesunaexpresióndenuestrotempo.Elhombrequetodavíaviveencontactoconlanaturalezanosientenecesidaddepasarpartedesutiempolibreenlosparquesnaturales;elparquenaturalsirveaesepocomás de la mitad de la población que se ve forzada a vivir apretada en lasgrandesciudades.Entodaslasmedidasydirectricesencaminadasalacreacióndeestosparquesdeberáestarelhombrecomopuntodemiraynolasimpleidea de protección de la naturaleza. Si consideramos muy valiosasdeterminadas zonas deshabitadas, debemos protegerlas del hombre por supropriovalor,peroestoseráunapartadodela“proteccióndelanaturaleza”ynolacreacióndeparquesnaturales.(ISBARYapudVELASCO,1971,p.103)

Deste modo, de acordo com Velasco (1971), o jardim e o parque tornam-se o quereconhecemos hoje como “áreas verdes” – objeto de notável preocupação na disciplina doUrbanismo.

ANATUREZACOMOOBJETOCIENTÍFICOECOMOOBJETOCULTURAL

RaymondWilliams (2011, p. 102) chama a atenção para o impacto que o cientificismo teve nopensamento em relação à natureza, defendendo que é neste momento que encontram-se asbases da cisão entre homem e natureza: “Talvez a primeira forma de separação teria sido adistinção prática entre natureza e Deus”. Ao excluir-se da natureza, torna possível ao homemexaminá-la como processos e até mesmo intervir sobre eles para finalidades exploratórias. “Anatureza era, nessenovo sentido, tudooquenãoerahumano, tudooquenão fora tocadoouestragadopelohomem:anaturezacomooslocaissolitários,comoselvagem”(Ibid.,p.103).

Dando continuidade a este pensamento, Chauí (2003) cita que as ciências contemporâneasexcedemaideiadenaturezaapenascomorealidadeexterna–dadaeobservada–paraanoçãodeum conjunto de conhecimentos construídos pelas operações científicas. Neste raciocínio, anatureza torna-se um objeto científico a ser estudado, algo “produzido pela atividade doconhecimento,comoauxíliodeinstrumentostecnológicos”.Postoisso,segundoaautora,tem-seumasituaçãoparadoxal:aNatureza“torna-sealgoquepassaadependerda interferênciaouda

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intervençãohumana,poiscomoobjetocientífico,acoisanaturalnãoésimplesmenteconstatada,maséconstruídacientificamente.”Sobesteaspecto,dissolvem-seasexplícitasdistinçõesqueatéentãoseparavamnaturezaecultura–onaturaldoartificial,aespontaneidadedaescolharacional.Aautoraconstataque“aNaturezatorna-seumanoçãoouumconceitoproduzidopelospróprioshomense,nestecaso,umaconstruçãohumana.Emoutraspalavras,aprópria ideiadenaturezatornou-seumobjetocultural”.(Ibid.,p.48)

Emrelaçãoàpaisagem,MiltonSantoscitaqueatémesmooquechamamosdeambiente“natural”é dotado de valores culturais, posto que interessam à sociedade – mesmo não tendo sidofisicamentetocadopeloserhumano:

A paisagem artificial é a paisagem transformada pelo homem; jágrosseiramente, podemos dizer que a paisagem natural é aquela ainda nãomudadapeloesforçohumano.Senopassadohaviaapaisagemnatural,hojeessamodalidadedepaisagempraticamente jánãoexiste.Seum lugarnãoéfisicamente tocado pela força do homem, ele é, todavia, objeto depreocupaçõesede intençõeseconômicasoupolíticas.Tudohoje se situanocamposdeinteressedahistória,sendo,dessemodo,social.(SANTOS,2012,p.71)

ANATUREZAEOPATRIMÔNIOCULTURAL

Considerando: 1. A noção de natureza uma construção cultural; 2. A natureza como objeto deinteressedasociedade,aindaqueintocadapeloserhumanoe3.Apaisagemcomoportadoradeumconjuntodesímbolos;quandotratamosdanaturezacomopatrimônio,estamosmobilizandovalores do universo da cultura. Portanto, como cita Scifoni (2006, p. 3), é neste campo que seinsere o patrimônio natural e não no campo do meio-ambiente, onde são mobilizadosprioritariamenteinteressestécnico-científicos.Sendoassim,énaesferadaspolíticasculturaisquedevemos buscar os elementos para compreender a evolução e o significado do que hojeconhecemospor“patrimônionatural”.

ACONSTRUÇÃODOCONCEITO

O que atualmente entendemos por patrimônio natural, é um conceito devidamente construídopor instituiçõesdepreservaçãoeelaboradonummomentohistóriconãomuitodistantedoquenos encontramos hoje. De acordo com Scifoni (Ibid., p. 58), as diferentes concepções depatrimônio podem ser compreendidas sob dois princípios: o da “monumentalidade” e o do“cotidiano”.Istosedeveaofatodeque,comocitaGonçalves(2006,p.117),maisdoqueapenascoleçõesdeobjetos,opatrimônioéconstituídodediferentesdiscursosqueexpressamtambémdiferentes perspectivas. Longe de qualquer consenso, esses discursos se opõem entre si edisputamlugaresdelegitimidade.

É possível perceber duas direções no sentido da construção da ideia de umpatrimônio natural: no plano mundial, ele firmou-se como expressão degrandiosidade e beleza, que por sua vez, advém de um sentido demonumentalidade com preocupação estética. Pressupõe, também,intocabilidade, ou seja, os grandes testemunhos da natureza que forampoupadosdaintervençãohumana.

Há também outros significado que aparece no Brasil a partir de algumasexperiências regionais: o patrimônio natural passou a ser entendido como

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conquista da sociedade, com um significado ligado às práticas sociais e àmemória coletiva; portanto, um patrimônio natural que, antes de tudo, fazpartedavidahumanaenãoalgoqueaelaseopõe.(SCIFONI,2006,p.58)

MONUMENTALIDADE

Scifoninosmostraqueexistemduasvisõesantagônicasdomonumentonatural.Sobaperspectivaoriental,omonumentoéabordado“apartirdoseucarátermemorial,sualigaçãocomatradição,oscostumes,aslembrançascoletivas”.Jánaexperiênciafrancesaamonumentalidadeestáligadaà expressividade estética – pormeio da grandiosidade e da beleza – domesmomodo que sãocritériostambémpresentesnasobrasdearteenosedifícioshistóricos.

Dopontodevistaexclusivamentedanatureza,umsegundoaspectodessamonumentalidadeseriaseucaráter“intocável”,ouseja,umaárealivredepresençahumanaeaindanãoalteradaporsuasações. Este critério encontra-se documentado e oficializado na Convenção para a Proteção daFlora, da Fauna e das Belezas Cênicas Naturais dos Países da América, estabelecida em 1940 ereferendadanoBrasilatravésdoDecretoLegislativon°3,de13defevereirode1948.(Ibid.,p.62)

Em1962,aUnescoelaborouumdocumento intituladoRecomendaçãorelativaàsalvaguardadabeleza e do caráter das paisagens e sítios que, como destaca Scifoni, “apesar de não utilizarexplicitamenteo conceitodepatrimônionatural, pode ser consideradooprecursordaquestão,uma vez que ressaltou a proteção de paisagens e sítios naturais como de interesse cultural eenfatizoua relaçãoexistenteenteadegradaçãodessas áreaseempobrecimentodopatrimôniocultural” (SCIFONI, 2006, p. 64). Neste documento, o termo “monumento natural” antecede aideiade“patrimônionatural”,queviriaaserformuladadezanosadiante.

Noanode1972,aUnesco(OrganizaçãoparaaEducação,aCiênciaeaCulturadasNaçõesUnidas)– organismo vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU) – realiza uma Convenção doPatrimônioMundialCulturaleNatural,emPariseodocumentoresultantedestaconvençãoéoresponsávelpordefiniroficialmenteoconceitodepatrimônionatural.

AConvençãode1972tambémintroduziudoisnovoselementosaotema.Umdeleséaadoçãodeuma visão sistêmica da natureza, considerando sua dinâmica e as inter-relações dos elementosqueacompõem.Issorevelaaimportânciaqueopatrimônionaturalteriaparaaciênciaeparaaconservação da natureza, introduzindo o critério ecológico nos critérios de valoração destepatrimônio.

OsegundoenãomenosimportanteelementointroduzidonaConvençãofoiacriaçãodaideiadepatrimônio universal, fruto da globalização dos valores ocidentais já iniciados no período pós-Segunda Guerra Mundial, elaborados na chave da excepcionalidade. No entanto, “até essemomento, as definição do que deveria ser um valor universal excepcional encontrava-se demaneira pouco esclarecida, dificultando assim a sua própria aplicação. Como diferencias o quetinha valor universal, nacional ou regional?” Além de uma hegemônica imposição da visãoeuropeia de mundo, o que se pode afirmar, segundo Scifoni, é que a convenção reafirmouquestõescomoaestéticadapaisagemeovalorcênico,mantendoaênfasenosaspectosformais,os quais a Unesco já se ocupava desde o documento elaborado na convenção de 1962. Destemodo, foi a partir dos dois enfoques ligados à monumentalidade – valor estético e caráterinviolável–queaideiadepatrimônionaturalconsagrou-semundialmente.

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Osanosde1960foramummarconatrajetóriamundialdopatrimônio,ummomentoderevisãodosconceitosepráticasqueresultounumaampliaçãodoseusignificado.DeacordocomChoay(2006,p.12-13), atéadécadade1960,osmonumentoshistóricos legalmente reconhecidoserailimitados a “montante” ao mesmo tempo em que “a jusante” não ultrapassava os limites doséculo XIX. A partir de então, acontece – a princípio na França – um alargamento do quadrocronológico e das áreas geográficas as quais os bens são inseridos. Novos tipos de bens sãoincluídosdemodonotavelmentecrescenteeosmonumentoshistóricos, tornam-seapenasumafração,nãomaisaúnica,de“umaherançaquenãoparadecrescer”.

Postoisso,ScifoniesclarecequeambososdocumentosdaUnesco-aRecomendaçãode1962eaConvençãode1972–participamdessecontextodeexpansãomundialqueatingemasquestõesdopatrimônio.Ainda,queessarevisãodesignificadosgerouummovimentoonde,apartirdosanos1970,anaturezaédefinitivamenteincorporadaaouniversodaculturapelaUnesco,tornandoummarconatuteladopatrimônionatural:

O caráter deste Convenção é sumamente original e consagra novas eimportantes idéias.Ela ligaasnoçõesdenaturezae cultura,atéagoravistascomo diferentes e, mais do que isso, antagônicas. De fato, durante muitotempo natureza e cultura se opunham: o homem devia conquistar umanaturezahostil,enquantoaculturasimbolizavaosvaloresespirituais.Mas,naverdade, natureza e cultura se complementam: a identidade cultural dospovoséforjadanomeioemqueviveme,emgeral,partedabelezadasmaisbelas obras criadas pelo homem provem exatamente da integração com olugaremqueseencontram.(UNESCOapudSCIFONI,2006,p.65)

Com os critérios de valor universal agora já mais esclarecidos – por conta das DiretrizesOperacionaisparaImplementaçãodoPatrimônioMundial,1977–nocasodopatrimônionaturaldefinem-setrêsparâmetrosqueregemseureconhecimentodevaloruniversal:

Ovalorestéticofoiexpressonaspaisagensnotáveisedeextraordináriabelezanaturalouemcondiçãodeexceção.Ovalorecológico,atualmentevinculadoàconservação da biodiversidade, correspondia à importância dos sítios comohábitat de espécies em risco de extinção ou como detentoras de processosecológico e biológicos importantes. Já o valor científico manifestava-se emáreas que continham formações ou fenômenos naturais relevantes para oconhecimentocientíficodahistórianaturaldoplaneta.

Outra condição essencial para o reconhecimento desse patrimônio era oestadode integridadedosbens.Destemodo,pelocritérioestéticoumaáreaguardaria condições de integridade se houvesse a preservação não somentedoatributoemsi,masdetodasascondiçõesparaasuaformação.(Ibid.,p.65-66)

COTIDIANO

Demododiversoaodiscursopredominantementesustentadopelosvaloresdemonumentalidadee de excepcionalidade que se deu no âmbito mundial, sobretudo na Europa, as açõespreservacionistasnoBrasilaproximam-sedaspráticassociaisedamemóriacoletiva.Nocampodopatrimônio natural, sobretudo, participam da discussão o valor social e o valor afetivo, ambosagindocomodispositivos legitimadores.“Umpatrimônionaturalqueantesde tudo fazpartedavidahumana”.(Ibid.,68)

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De acordo com Gonçalves (2002, p. 117), “em toda e qualquer sociedade nacional moderna épossível identificar a existência demodalidades de discurso de patrimônio em competição pararepresentar com autenticidade a identidade e amemória coletiva”. No Brasil, segundo Scifoni(2006,p.68),odiscursodamonumentalidadepredominounasprimeirastrêsaquatrodécadasdaconstituição do patrimônio nacional – período conhecido como “fase heroica –, enquanto anarrativa apoiada no cotidiano ganhamais força no final dos anos 1970, “momento em que opatrimônio ganhou também a dimensão da experiência pessoal e coletiva dos diversos grupossociais.”

No caso da narrativa monumentalista, a relação com a realidadecontemporânea, cotidiana, é bastante restrita. Valorizando o passado e atradição,emdetrimentodopresenteedaexperiência,elaestabelececomocotidiano relações fortemente policiadas. Na medida mesmo em que essanarrativasefundamentanumavisãohierarquicamentevalorizadadopassado,estedesseserdefendidocontraqualquertentativaderelativizaçãoquepossapartir de indivíduos e grupos sociais situados na realidade cotidiana. Aprimaziadanaçãocomoumatotalidadehomogênea,deveserpreservada.

[...]

Nasnarrativasdopatrimônionasquaiseleaparecesobosignodocotidiano,configura-se, tendencialmente, uma zona de máximos contatos com arealidade contemporânea. Os diversos gêneros de discurso que circulamsocialmentetranspõemasfronteirasentrenarrativaerealidadecotidiana.Daía possibilidade de se pensar em várias modalidades de patrimônio.(GONÇALVES,2002,p.120)

Énessemovimentodeaberturaede renovaçãodoconceitodepatrimônioque,deacordocomGonçalves,excedemosaideiade“monumento”paraqueeladêlugaràideiade“bensculturais”que, independentedasuanatureza,“existesempredentrodeumaredeatualevivaderelaçõesentegrupossociais”.

Fonseca (apud Scifoni, 2004, p. 68) revela que um estudo realizado pelo Iphan mostra que operíodode1970a1990foicaracterizadopornotáveismudanças.Alémdaincorporaçãodenovascategoriasquefaziamreferênciaadiversasetnias,culturas,tipologiasebensnaturais,observou-setambém uma aumento no número de pedidos de tombamento que partiram diretamente dapopulação,ouseja,depessoasougruposquenãoeramligadosao Iphan.Nota-seportanto,ummaiorreconhecimento,porpartedasociedadedopatrimôniocultural“comoumcampopossívelparaafirmaçãodeoutrasidentidadescoletivas”.Estemovimentopôdesertambémobservadonaesferadopatrimônionatural,ondecercade30processosforamabertosnesteperíodode1970a1990.

OLAGOESEUSVALORESCULTURAIS

Noquedizrespeitoaoâmbito jurídico,Londrinaviveummomentohistóriconotável:o iníciodaorganizaçãodaspolíticasdepreservação,atéentãoinexistentes.Resultadodeumlongotrabalhoiniciadoem2002,oPlanoDiretordePreservaçãodoPatrimônioCulturaltevesuaaprovaçãosobaLei11.188de19deAbrilde2011,comsuaregulamentaçãoefetivadaem2014.Conformeprevistona referente Lei, em2015 foi criadooConselhodePreservação -COMPAC,que recebe suportetécnico daDiretoria de PatrimônioArtístico eHistórico-Cultural da SecretariaMunicipal de Cultura,para seu pleno funcionamento. Desde março de 2015, o Conselho tem se dedicado a criar osprocessosdelistagemdebensdeinteressedepreservação,alémdosprocessosdetombamentoe

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de registrodebens culturais imateriais, ematendimentoaoprevistona Lei.Comoosprocessosestãoaindaemfasedeelaboração,nãoexistembensreconhecidoseprotegidoslegalmentepeloMunicípioatéestemomento.

Embora a área analisada não consista, em nenhuma instância, em um patrimônio culturallegalmente reconhecido e protegido, julga-se ser fundamental nos aproximarmosdas premissasdeste campo para melhor analisarmos a constituição simbólica do objeto de estudo. Aaproximaçãoqueserquerpromovernestemomentoéespecialmentecomosvaloresculturaisquesãoatribuídosaeleapartirdasociedade.Apesquisaemandamento-queamparaesteartigo-entendeoobjetodeestudocomopatrimônioculturalaoapoiar-senopensamentodeMeneses(2012),ondeopatrimônioé,antesdemaisnada,umfatorsocial,cujovaloréatribuídosobretudopelasociedade.

Como estamos tratando de um objeto que é constituído pelo espaço ordinário, onde seussignificadossãoconstruídosatravésdousoeinteraçãosocialcotidianos,faz-senecessárioabordá-lo a partir da noção ampliada do patrimônio cultural, considerando que a contemporaneidadedesta nova abordagem encontra-se no deslocamento da ideia de patrimônio como herança –ligadoacimadetudoàconstruçãodopassado–parasuarealocaçãonaspráticasdopresente,nocotidiano, nas dinâmicas urbanas e na incidência da sociedade sobre um determinado arranjoespacial.

Em relação à sua constituição física, o Lago Igapó 2 é um elemento que encontra-se entre aespontaneidade(comonatureza)eoprojeto(comoaçãocultural).Nãoháexcepcionalidade,aindamenosmonumentalidadenoseusuportefísico.

Elaboradacomoumaidealizaçãodaideiadenaturezademodoaatenderaconveniênciahumana,a paisagem configurada pelo Lago é o refúgio campestre que se instala no meio urbanooferecendootemponaturalemcontraposiçãoaoandamentodotempoartificialquenosrege.Aesta capacidade de intervir como um fragmento de sonho em meio ao mundo “artificial” emassivamenteedificadoéqueseatribuiaessênciadasuaconstituiçãosimbólica–umpatrimônionaturalmobilizadopelosvaloresculturaiseconstruídosobosignodocotidiano.

CONSIDERAÇÕESFINAIS

Buscou-senesteartigo,mobilizartemasimprescindíveisparaacompreensãodaconstituiçãofísicae simbólica do objeto de estudo que, embora não consista em um patrimônio legalmentereconhecido,éportadordedimensõesmenosconcretasenãomenosimportantes:suaafetividadeesuaiconicidadenapaisagemurbanadeLondrina.

Oobjetivoespecíficodainvestigaçãoaquidesenvolvidaéperceberdequemaneiraanaturezaserelacionacomosvaloresafetivosdopatrimônioemquestão.Destemodo,apesquisamostra-seguiadapelanoçãodequeéfundamentalinterpretarobjetodeestudoeasforçasqueatuamsobreele,paraquesepossamdesenvolver ferramentasqueprotejamseuusoe seucaráterpúblicoedinâmico. Espera-se, ainda, que o trabalho em desenvolvimento contribua para a promoção darelevância dos valores ligados ao cotidiano em oposição aos valores ligados estritamente àexcepcionalidadeemonumentalidadedoobjeto,e façamais tangíveladiscussãodopatrimôniodeslocadadoâmbitolegaldotombamento.

Numa escalamais abrangente, a pesquisa pretende fomentar as discussões sobre patrimônio epreservaçãoemcidadesnovas,tendoemvistaqueencontramo-nosnummomentoondeotema

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tem emergido com vigor em diversas áreas – arquitetura, cinema, literatura, em meio aosmovimentos culturais. Destemodo, torna-se evidente aproximarmos os temas de patrimônio ànossarealidade,debatermosedesnaturalizarmososvaloresqueomobilizam,erefletirmossobreos critérios e valores que nos importam, respeitando as particularidades da nossa história tãojovem,masqueé,sobretudo,anossahistória.

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