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www.unicamp.br/ju ornal U ni camp da Campinas, 13 a 19 de maio de 2013 - ANO XXVII - Nº 561 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA J IMPRESSO ESPECIAL 9.91.22.9744-6-DR/SPI Unicamp/DGA CORREIOS FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT 4 5 6 7 Cegos sofrem bullying em aulas na rede pública Assoreamento atinge hidrovia Tietê-Paraná Ferramenta controla vazamentos de gases Salto do mínimo atenua concentração de renda 3 12 A inflexão conservadora de Joaquim Manoel de Macedo Os fatores que facilitam e inviabilizam a integração entre os países da América do Sul são analisados no livro Seguridad y Defensa em Sudamérica: entre la cooperación y el conflito (Editora da Universidade de Buenos Aires), de Vitor Stuart Gabriel de Pieri, doutorando do Instituto de Geociências (IG). A pesquisa que fundamentou a obra é orientada pela professora Claudete Vitte. Entre os conflitos e a convergência AMÉRICA DO SUL Inclusão com qualidade Inclusão com qualidade Estudo da Comvest revela que estudantes egressos de escolas públicas, contemplados com bônus pelo Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social da Unicamp (PAAIS), têm desempenho igual ou superior quando comparados aos que entraram na Universidade sem a ajuda do programa. 9 Arte: Luis Paulo Silva

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Jornal da Unicamp, edição 561

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Page 1: JU561

www.unicamp.br/juornal Unicampda

Campinas, 13 a 19 de maio de 2013 - ANO XXVII - Nº 561 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA J IMPRESSO ESPECIAL

9.91.22.9744-6-DR/SPIUnicamp/DGACORREIOS

FECHAMENTO AUTORIZADOPODE SER ABERTO PELA ECT

4567

Cegos sofrem bullying em aulas na rede pública

Assoreamento atinge hidrovia Tietê-Paraná

Ferramenta controlavazamentos de gases

Salto do mínimo atenuaconcentração de renda

3

12 A inflexão conservadora de Joaquim Manoel de Macedo

Os fatores que facilitam e inviabilizam a integração entre os países da

América do Sul são analisados no livro Seguridad y Defensa em Sudamérica: entre la cooperación y el conflito (Editora da Universidade de Buenos Aires), de Vitor Stuart Gabriel de Pieri, doutorando do Instituto de Geociências (IG). A pesquisa que fundamentou a obra é orientada pela professora Claudete Vitte.

Entre os conflitos e a convergência

AMÉRICA DO SUL

Inclusão com qualidadeInclusão com qualidadeEstudo da Comvest revela que estudantes egressos de escolas públicas,

contemplados com bônus pelo Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social da Unicamp (PAAIS), têm desempenho igual ou superior quando comparados

aos que entraram na Universidade sem a ajuda do programa. 9Arte: Luis Paulo Silva

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UNICAMP – Universidade Estadual de CampinasReitor José Tadeu JorgeCoordenador-Geral Alvaro Penteado CróstaPró-reitora de Desenvolvimento Universitário Teresa Dib Zambon AtvarsPró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários João Frederico da Costa Azevedo MeyerPró-reitora de Pesquisa Gláucia Maria PastorePró-reitora de Pós-Graduação Ítala Maria Loffredo D’OttavianoPró-reitor de Graduação Luís Alberto MagnaChefe de Gabinete Paulo Cesar Montagner

Elaborado pela Assessoria de Imprensa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Periodicidade semanal. Correspondência e sugestões Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP 13081-970, Campinas-SP. Telefones (019) 3521-5108, 3521-5109, 3521-5111. Site http://www.unicamp.br/ju e-mail [email protected]. Twitter http://twitter.com/jornaldaunicamp Assessor Chefe Clayton Levy Editor Álvaro Kassab Chefi a de reportagem Raquel do Carmo Santos Reportagem Carmo Gallo Netto, Isabel Gardenal, Luiz Sugimoto, Maria Alice da Cruz, Manuel Alves Filho, Patricia Lauretti e Silvio Anunciação Fotos Antoninho Perri e Antonio Scarpinetti Editor de Arte Luis Paulo Editoração André da Silva Vieira Vida Acadêmica Hélio Costa Júnior Atendimento à imprensa Ronei Thezolin, Patrícia Lauretti, Gabriela Villen e Valerio Freire Paiva Serviços técnicos Dulcinéa Bordignon Everaldo Silva Impressão Pigma Gráfica e Editora Ltda: (011) 4223-5911 Publicidade JCPR Publicidade e Propaganda: (019) 3327-0894. Assine o jornal on line: www.unicamp.br/assineju

Campinas, 13 a 19 de maio de 20132

SILVIO ANUNCIAÇÃ[email protected]

Fotos: Antonio Scarpinetti

Método detectacompostos quecausam odor nacarne de porco

Carne suína em supermercado: métodos convencionais de detecção são mais complexos e demorados

Mais “limpa”, rápida e precisa, técnica analisacausas do mau cheiro, sobretudo no toucinho

m método “limpo” desen-volvido na Unicamp permite analisar de forma mais rápida e precisa a presença de com-

postos responsáveis pelo mau cheiro na carne suína, sobretu-

do no toucinho. A química Soraia Cristina Gonzaga Neves Braga explica que os odores, denominados cientificamente como off-fla-vours, são percebidos no momento do aque-cimento da carne.

“Em quantidades elevadas estes compos-tos causam um odor desagradável para o con-sumidor no momento em que ele vai aquecer a carne. O nosso objetivo foi determinar isso de uma forma mais simples e eficiente, uma vez que os métodos convencionais são com-plexos e demorados”, compara.

O trabalho conduzido por Soraia Braga integrou dissertação de mestrado defendida em julho do ano passado junto ao Instituto de Química (IQ) da Unicamp. A pesquisado-ra foi orientada pelo docente Fábio Augusto, que atua no Departamento de Química Ana-lítica do IQ. Ela obteve financiamento da Co-ordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

A carne de porco é a proteína mais con-sumida no mundo. Estima-se, conforme relatório da Associação Brasileira da Indús-tria Produtora e Exportadora de Carne Suí-na (Adipecs), que a produção mundial gire em torno de 115 milhões de toneladas por ano. Estudos recentes vêm demonstrando os benefícios do alimento, graças à implemen-tação de novas técnicas de manejo e nutri-ção que permitiram diminuição dos níveis de gordura e controle de doenças transmissíveis nos animais.

Dados obtidos pela estudiosa da Unicamp demonstram que o Brasil figura, atualmente, como o quarto maior produtor e exportador da commodity. “Há tendência de aumento neste consumo, só que o odor desagradável acaba sendo um problema”, dimensiona So-raia Braga.

Ela esclarece que o mau cheiro é causa-do pelo excesso de dois compostos presentes na carne: o escatol e a androstenona. Relatos científicos associam estes compostos às ati-vidades hormonais dos suínos. Por isso, sua presença é significativa em porcos machos não castrados, animais mais indicados para obtenção de alimento de boa qualidade, com menor índice de gordura. Além disso, a utili-zação de machos inteiros para a produção de carne é vantajosa devido aos baixos custos de produção e bem-estar do animal.

“Tanto o escatol como a androstenona fi-cam mais concentrados em partes com maior índice de gordura. Consequentemente, o mau cheiro é mais sentido no toucinho, que é constituído pela gordura subcutânea do por-co”, exemplifica a química, que desenvolve, no momento, pesquisa de doutorado no IQ.

Para evitar o excesso destes compostos na carne, os produtores utilizam a castração físi-

PublicaçõesArtigosBraga, S. C. G. N.; Hantao, L. W.; Bo-gus Jr, S.; Augusto, F.. Determination of Boar Taint compounds on pork fat using Hs-SPME combined to GC GC-QMS. In: Colacro XIV, 2012, Florianópolis. Resumos Colacro XIV, 2012. v. 01.Braga, S. C. G. N.; Bogus Jr, S.; Hantao, L. W.; Fidélis, C. H.; Augusto, F.. As-pectos experimentais na determinação de androstenona e escatol em toucinho de porco por HS-SPME-GC-FID. In: 34ª Reunião Anual da Sociedade Brasi-leira de Química, 2011, Florianópolis. Resumos 34ª Reunião Anual da Socie-dade Brasileira de Química, 2011.Braga, S. C. G. N.; Hantao, L. W. ; Bogus Jr, S.; Augusto, F.. Desenvolvimento de um método para quantificação de off-flavours em toucinho de porco por HS- SPME-GCxGC-qMS. In: 16º Encontro nacional de Química Analítica, 2011, Campos do Jordão. Resumos, 2011.Dissertação: “Determinação de off-flavours em carne e gordura suína por GC x GC combinada a SPME”Autora: Soraia Cristina Gonzaga Ne-ves BragaOrientador: Fábio AugustoUnidade: Instituto de Química (IQ)Financiamento: Capes

ca, realizada, muitas vezes, sem anestesia. O procedimento gera sofrimento, além de ser prejudicial à qualidade da carne devido ao estresse provocado. A estudiosa da Unicamp informa sobre a existência de novas técnicas que empregam a imunocastração, um tipo de castração química. A vantagem é a não utili-zação de métodos cirúrgicos, que geram dor aguda. O procedimento, porém, é mais caro e não impede o ganho de peso dos suínos.

COMPOSTOSHormônio esteroide produzido nos testí-

culos dos animais sexualmente maduros, a androstenona circula na corrente sanguínea e se acumula nas glândulas salivares e tecido adiposo. Já o escatol, derivado de um amino-ácido, é produzido no intestino e absorvido pela corrente sanguínea. Uma parte é elimi-nada na urina. A outra, também é acumulada no tecido adiposo.

Nem todos os porcos machos inteiros apresentam excesso de escatol e androsteno-na. Isso demonstra, conforme Soraia Braga, a importância do método para identificar a presença de tais compostos. “Sabendo se a quantidade está acima dos níveis permitidos, medidas podem ser tomadas, como retirada daquela carne do mercado”, justifica.

TÉCNICASO método desenvolvido no Instituto de

Química combinou duas técnicas que permi-

tem detectar a presença da androstenona e quantificar o escatol. “A forma convencional envolve várias etapas, que demandam tempo e alto consumo de solventes orgânicos. Por serem tóxicos, estes solventes apresentam complicações no descarte, além de riscos na manipulação. O nosso método é limpo, ou seja, livre de solventes orgânicos”, considera.

A técnica de microestração em fase só-lida, também conhecida pela sigla SPME (Solid Phase Micro Extration), é uma alter-nativa aos métodos convencionais. Menos dispendiosa, a SPME permite em apenas uma etapa a extração dos compostos. O pro-cesso consiste na utilização de um bastão de fibra ótica de sílica fundida, recoberto por um filme polimérico, que é utilizado como solvente. Os compostos da amostra ficam retidos neste filme.

O método foi proposto no início dos anos de 1990 pelo cientista Janusz Pa-wliszyn, professor da Universidade de Waterloo, no Canadá. Soraia Braga explica que, apesar das vantagens, a SPME não é uma técnica tão seletiva. Por isso, no caso das amostras de toucinho, houve também a extração de outros compostos, além do escatol e da androstenona.

Para refinar as análises, obtendo somen-te os compostos responsáveis pelo odor desagradável na carne suína, Soraia Braga associou outra técnica. Trata-se da Croma-tografia Gasosa e Bidimensional Compre-ensiva, conhecida pela sigla GCxGC (do in-

glês Comprehensive Two-Dimensional Gas Chromatography). Este processo possui um poder de separação maior que a cromatogra-fia gasosa convencional.

“Estas duas técnicas associadas foram empregadas com êxito para determinar e quantificar os compostos presentes numa matriz do toucinho de porco. O nosso ob-jetivo foi propor isso como alternativa aos demais métodos já utilizados”, situa a pes-quisadora da Universidade.

A CGxCG foi descrita em 1991 pelos cientistas John Phillips e Zaiyou Liu no The Journal of Chromatography A. No Brasil, o docente Fábio Augusto, orientador do estu-do, foi pioneiro na introdução da técnica. Ele coordena na Unicamp duas linhas de pes-quisa sobre o tema: técnicas cromatográficas multidimensionais e materiais, dispositivos e métodos de extração e microextração.

Conforme a química da Unicamp, os mé-todos convencionais não utilizam a associa-ção entre a SPME e a Cromatografia Gasosa e Bidimensional Compreensiva. “A literatu-ra científica relata que a GCxGC não é ne-cessária para determinar compostos alvos, como seria o caso do escatol e da andros-tenona no toucinho de porco. Ela seria me-lhor na determinação de perfis complexos em derivados do petróleo e óleos essenciais, por exemplo. Mas conseguimos, utilizando estas duas técnicas, determinar, com êxito, o escatol e a androstenona no toucinho de porco”, revela.

A química Soraia Braga, autora dadissertação: “O odor desagradável

acaba sendo um problema”

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3Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

LUIZ [email protected]

Foto: Antonio Scarpinetti

ServiçoObra: Seguridad y Defensa em Sudamérica: entre la cooperación y el conflitoAutor: Vitor Stuart Gabriel de PieriEditora: Eudeba

Brasil

Venezuela

Colômbia

Equador

Perú

Bolívia

Argenti na

Uruguai

ChileOceano Pacífi co

Oceano Atlânti co

Suriname

G. Francesa

LEGENDA

A integração da AS é possível?

Vitor Stuart Gabriel de Pieri, autor do livro: “As estratégias de defesa e segurança regional são primordiais”

Livro de doutorando do IG aponta fatores que podem favorecer ou inviabilizar diálogo regional

itor Stuart Gabriel de Pieri es-pera defender o doutorado pelo

Instituto de Geociências (IG) até o final do ano, orientado pela

professora Claudete Vitte. Mas o tema de sua pesquisa já embasou o

livro Seguridad y Defensa em Sudamérica: entre la cooperación y el conflito lançado pela Eudeba, da Universidade de Buenos Aires, uma das principais editoras em língua espanhola do mundo. O livro aparece dentre os destaques na 39° Feira do Livro de Buenos Aires. Nele, o autor procura levantar, sistematizar e ana-lisar os diferentes vetores que, por um lado, contribuem para a convergência de agendas entre os países da América do Sul, e por ou-tro, impossibilitam um diálogo regional am-plo no âmbito político, econômico, social, cultural e ambiental.

“A ideia do livro surgiu de alguns dados levantados na época em que atuei como pes-quisador do Gabinete Estratégico Militar do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas Argentinas. São questões que estão por trás de acordos como Mercosul [Mercado Co-mum do Sul], Alba [Aliança Bolivariana para as Américas] e CAN [Comunidade Andina de Nações]. A tendência é que esses acor-dos acabem tendo menos relevância do que a Unasul [União das Nações Sul-Americanas], que possui uma perspectiva acima de tudo política e em escala subcontinental de inte-gração”, explica Vitor de Pieri.

O levantamento é minucioso, trazendo dados e análises sobre o que o pesquisador denomina conflitos “intermésticos” (interes-tatais e domésticos) envolvendo temas como delimitações fronteiriças – um dos vetores de fragmentação na política de integração da América do Sul – e sobre uma política con-junta de defesa dos recursos naturais – vista como vetor convergente. “As estratégias de defesa e segurança regional são primordiais para um subcontinente caracterizado por im-portantes reservas de recursos naturais e um enorme potencial de produção de alimentos, frente a um mundo marcado por crises nos

Instituto de Geociências (IG) até o final do ano, orientado pela

professora Claudete Vitte. Mas o

Grupo prepara outro livroO doutorando Vitor de Pieri faz parte do grupo

de pesquisa “Geografia das Relações Internacio-nais: Estado, Economia Território e Integração Re-gional”, coordenado pela professora Claudete de Castro Silva Vitte. Ao abordar em suas pesquisas os fenômenos geoeconômicos e geopolíticos na América Latina, o grupo pretende contribuir na discussão sobre as principais transformações do papel do Estado e das atividades econômicas,

países centrais e exponencial aumento da de-manda por commodities.”

Vitor de Pieri avalia que os vetores conver-gentes para a integração sul-americana estão todos atrelados aos recursos naturais, clas-sificados como ativos estratégicos comuns. “Esse termo surgiu em reunião dos ministros de Defesa dos países da região em 2008, em meio às discussões sobre a formação do Con-selho de Defesa Sul-Americano no âmbito da Unasul. Ativos estratégicos são as fontes de recursos naturais transfronteiriças, como por exemplo, a Amazônia, que transcende o ter-ritório brasileiro e se estende por mais oito países; o Atlântico Sul, com as reservas do pré-sal e o conflito em torno das Malvinas; e as reservas de petróleo da Venezuela, já cons-tatadas como as maiores do mundo.”

Os dados coletados pelo autor mostram que a América do Sul concentra 40% da biodiversidade do planeta, considerando os aquíferos (reservas sub-superficiais de água) que ocupam enorme extensão da re-gião, bem como as geleiras continentais en-tre a Argentina e o Chile, que também repre-sentam reservas de água doce. “Uma tabela sobre a oferta sul-americana de recursos naturais estratégicos traz minuciosos per-centuais como de água, floresta, pesca, pe-tróleo e minerais, nos níveis dos territórios nacional, continental, regional e mundial. Os recursos naturais surgem como vetor convergente de integração regional, através do Conselho de Defesa Sul-Americano, bra-ço importante da Unasul.”

Na opinião de Pieri, alguns números chamam a atenção, como os referentes aos minerais, além da água e da biodiversidade. “A Bolívia possui 49% da reserva mundial de lítio, matéria-prima estratégica, utilizada na produção de baterias, enquanto o Brasil detém 96% do nióbio, que é fundamental na tecnologia da informação. Outra tabela interessante é sobre terras aptas para a agri-cultura: 33% do território argentino, que é o sexto do mundo, pode ser cultivado sem ne-cessidade de qualquer preparo; o Brasil tem 9% do território nas mesmas condições, área maior do que de países como a França e Itália juntos.”

CONFLITOS “INTERMÉSTICOS”Se acordos como a Unasul parecem plausí-

veis no papel, Vitor de Pieri aponta os vetores divergentes que dificultam esta integração na prática. Ele mapeou os principais conflitos “intermésticos” na região, desde a Guerra do Pacífico no final do século 19 até a desaven-ça entre Venezuela e Colômbia em 2010: são conflitos por demarcação de fronteiras, am-bientais, energéticos, agrários e geopolíticos. “Aponto os Estados envolvidos, o período de máxima tensão, nível atual de tensão e o grau de instabilidade (se há declaração formal de guerra, disputa sob arbitragem internacional ou ruptura de relações diplomáticas).”

As instabilidades políticas em países como Venezuela e Bolívia são exemplos de confli-tos domésticos mencionados pelo autor do trabalho, que procurou apontar as principais motivações e atores. “Não se sabe o que vai ser dos venezuelanos com a morte de Hugo Chávez e sua sucessão por Nicolás Maduro. Temos também a ‘guerra civil’ colombiana; a oposição acirrada da Igreja, meios de comu-nicação e ruralistas a Cristina Kirchner na Argentina, etc. Esses conflitos geram insta-bilidades no campo econômico, afastando in-vestidores da região e criando desequilíbrios nas contas nacionais desses países.”

Os conflitos identificados como interesta-tais, segundo Vitor de Pieri, são reflexos de conflitos clássicos como a Guerra do Pacífico (ou Guerra do Salitre), causada por questões fronteiriças e que confrontou o Chile contra uma força conjunta de Bolívia e Peru, entre 1879 e 1883. A vitória foi do Chile, que ane-xou áreas ricas em recursos naturais dos dois países rivais, sendo que a Bolívia ficou sem saída para o Pacífico e o Peru sofreu com per-da de território marítimo para o Chile. “Per-sistem até hoje diversos problemas no âmbito diplomático entre esses três países, inclusive com cortes de relações diplomáticas em diver-sos momentos da história contemporânea.”

RECURSOS NATURAIS EM JOGOO pesquisador acrescentou em seu le-

vantamento os recursos naturais em jogo nesses conflitos, como o petróleo na Guer-ra do Chaco, ocorrida de 1932 a 1935 entre Paraguai e Bolívia, resultando em dezenas de milhares de mortos por conta das even-tuais reservas naquela região. “Também ve-rifiquei o envolvimento direto ou indireto de terceiros atores (internacionais) e, no caso do Chaco, havia o interesse da ame-ricana Standard Oil e da holandesa Dutch Shell pelo território. No começo dos anos 2000, tivemos a criação do Plano Colômbia de combate ao narcotráfico, uma coopera-ção militar sob a influência direta dos Esta-dos Unidos.”

Vitor de Pieri afirma que outro conflito demonstrando a fragilidade nas relações en-tre os países da América do Sul é a crise das “papeleras” (indústrias de papel e celulose), entre Argentina e Uruguai, que vem desde 2003. Tudo começou com um protesto de cunho ambiental, por cidadãos argentinos, contra a construção pelo Uruguai de duas usinas de celulose na fronteira traçada pelo rio La Plata: eles passaram a bloquear o aces-so às pontes que ligam a cidade uruguaia de Fray Bentos à argentina Gualeguaychú, pre-judicando a circulação de turistas e de mer-cadorias entre os dois países. “O que era um conflito local, tornou-se nacional e depois mundial, indo parar na Corte Internacional de Haia.”

O Brasil não ficou livre de conflitos no período abordado pelo autor do livro, que começa registrando a disputa pelo Acre com a Bolívia entre 1899 e 1903, envolvendo re-volta armada de colonos brasileiros que ocu-param o território até então pertencente ao país vizinho, declaração formal de guerra e muita diplomacia – motivo: a abundância de seringueiras em pleno ciclo da borracha. O levantamento inclui os atritos com Argenti-na e Paraguai em torno da Usina de Itaipu, entre fazendeiros paraguaios e brasiguaios, e o recente massacre de Albina, em dezem-bro de 2009, quando garimpeiros brasileiros foram atacados com facões e pedras por qui-lombolas da pequena cidade do Suriname.

PENDÊNCIAS DIVERSASA conclusão de Vitor de Pieri é que a in-

tegração está complicada do ponto de vista geopolítico e geoeconômico, mas vem se criando um diálogo do ponto de vista geoes-tratégico, especialmente a partir do debate sobre os ativos estratégicos comuns. “Ain-da não podemos pensar em colocar os pre-sidentes da Bolívia e do Chile lado a lado, imaginando que se tornem amigos imedia-tamente, pois há muitas pendências a serem resolvidas. Mas espero que este livro, ao sistematizar os obstáculos existentes para a integração entre os países, contribua de al-guma forma com os estudos relacionados à segurança e defesa regionais. Não se pode dizer que está tudo bem na América do Sul.”

com suas consequências territoriais e sociais. Pretende, também, discutir os diversos proces-sos de integração em curso no subcontinente, observando os principais atores (governos, em-presas, sociedade civil, organizações internacio-nais). O grupo está elaborando o livro América do Sul: Estado, Economia, Território e Integração Regional, com previsão de lançamento para setembro deste ano pela Cenegri Edições.

Guiana

Região do Rio Manon

Pecuaristas eAgricultores

Paraguai

Rio Uruguai

Nacionalização dasReservas de Gás Natural

Região doAndino Central

Itaipú Binacional

Brasiguaios

Fazendeiros

Amazônia Legal

Região do Triângulodo Novo Rio

Região deEsseguibo

Região daBacia de Arica

Org.: Prof. Dr. Wanderley Messias da CostaCartografi a: George Marcel RosaApoio: Viviam Merola

2007

Confl itos por Demarcação de Fronteiras

Confl itos Ambientais

Confl itos de Controle Fronteriço

Confl itos Energéti cos

Confl itos Agrários

Confl itos Geopolíti cos

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4Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

RAQUEL DO CARMO [email protected]

Fotos: Antonio Scarpinetti

PublicaçãoTese: “O aluno com deficiência visual nas aulas de Educação Física: análise do processo inclusivo”Autora: Maria Luiza Tanure Alves Orientador: Edison DuarteUnidade: Faculdade de Educação Fí-sica (FEF)

Jovens cegos são alvo de bullying em aulas de educação física, aponta tese

Aula de educação física em escola pública: para autora do estudo, atuação de professores merece ser analisada

Alunos de escolaspúblicas têm

participação limitadae ficam isoladosem atividades

professora de educação física Maria Luiza Tanure Alves não esperava encontrar relatos de bullying tão

impressionantes tendo como vítimas adolescentes cegos que frequentavam as aulas de

educação física nos ensinos fundamental e médio em São Paulo. “As brincadeiras e zombarias envolvendo as características fí-sicas são frequentes. São comuns, também, exemplo, frases do tipo ‘que horas são?’ ou ‘está vendo tal coisa?’. Enfim, não tinha co-nhecimento de que este tipo de aluno so-fria tanto com os comentários dos colegas na escola”, destaca Maria Luiza. Ela fez en-trevistas com oito alunos deficientes visuais provenientes de diferentes escolas da capital paulista com o objetivo de analisar o proces-so de inclusão destes estudantes na escola pública e acabou descobrindo que o bullying também é um aspecto que merece atenção.

Os voluntários do estudo tinham entre 13 e 18 anos. Todos desenvolviam alguma atividade na Associação Brasileira de Assis-tência ao Deficiente Visual - Laramara, em São Paulo, entidade voltada para o apoio ao desenvolvimento humano e inclusão dos deficientes e seus familiares. Na escola re-gular, no entanto, a história era diferente. A pesquisa mostrou que esses alunos não se sentiam incluídos durante as aulas de edu-

cação física, pois tinham participação limi-tada nas atividades e se mantinham isolados do grupo.

“A realidade vivenciada por eles é muito difícil. Se sentem isolados e são mantidos sentados nos cantos das quadras sem qual-quer tipo de atividade ou interação com os colegas. Teve um caso de aluna que perma-neceu em um canto de uma quadra desco-berta até acabar o período da aula, aproxi-madamente 50 minutos”, relata.

A pesquisa de doutorado foi defendida na Faculdade de Educação Física (FEF) e teve a orientação do professor Edison Duarte. Se-gundo apurou Luiza Tanure, os professores de educação física têm papel fundamental no processo de inclusão dos alunos com de-ficiência, principalmente em se tratando de uma das disciplinas com maior possibilida-de de interação, como é o caso da educação física, pela própria natureza da prática. É

preciso, explica ela, que o professor tenha uma formação qualificada para que seja atu-ante no processo de interação social do alu-no cego nas aulas.

“Tanto a participação como a interação são aspectos indissolúveis e essenciais. Per-cebi que existe um círculo vicioso no siste-ma, uma vez que os alunos não são chama-dos a participar das aulas e, por conseguinte, não conseguem interagir com a turma. O professor acaba excluindo o aluno do pro-cesso quando não oferece a oportunidade de participação no contexto da aula”, esclarece. Na percepção dos deficientes, o professor é quem teria a voz ativa e poderia de alguma forma envolvê-los no processo para estimu-lar a interação com os colegas.

A professora defende que a inclusão se refere à educação de qualidade para alunos com deficiência no sistema regular de ensi-no. O estudo desenvolvido na FEF aponta,

justamente, a concepção e a percepção de inclusão que o aluno com deficiência visual tem nas aulas de educação física. Por isso, as questões do bullying e do papel fun-damental do professor chamaram tanta a atenção da pesquisadora no trabalho. “Não tinha ideia de que a atuação do professor precisava de uma análise e uma mudança radical de mentalidade”, avalia. O fato de colocar o aluno em sala de aula não é o su-ficiente para que o mesmo se sinta incluído no contexto escolar.

Outra questão demonstrada na pesquisa e que merece destaque na opinião de Lui-za Tanure seria em relação à aceitação por parte dos colegas. Este aspecto também é fator fundamental para a exclusão do aluno com deficiência visual da escola. Neste caso, Maria Luiza acredita que deveria ocorrer o envolvimento dos pais, pois muitas das si-tuações se referem à educação recebida em casa. “Durante a pesquisa foi observado que alguns fatores familiares interferem na questão da aceitação das diferenças em sala de aula. O professor tem dificuldades para realizar uma intervenção mais pontual neste aspecto”, analisa.

Na opinião da pesquisadora, que durante sete anos atuou como professora em esco-las públicas, as políticas públicas devem ter como foco a preparação profissional contí-nua e de qualidade, mas também um traba-lho social com mudança de valores para a aceitação da deficiência.

ISABEL [email protected]

Método avalia desgaste de sinalizaçãoO pesquisador da Faculdade de Engenha-

ria Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) Fernando Augusto Baptistini Pestana validou um método visual com potencial de aplica-ção ao sistema viário para avaliar desgaste da sinalização urbana. Testado por usuários do sistema e técnicos, mostrou-se factível e com ganhos na predição do momento em que deve haver repintura. O estudo foi feito na cidade de Sumaré.

A metodologia consistiu em aplicar faixas de pintura de três tipos de tintas em nove pontos, escolhidos conforme as variações nas características das vias e fluxo de tráfego. Fo-ram colhidas imagens das faixas e elaborado um banco de dados.

Essas imagens foram submetidas ao crité-rio testado – uma adaptação do Design Ma-nual for Roads and Bridges –, procedimento usado no Reino Unido. Foram classificadas visualmente de 0 a 5, onde 0 significava au-sência total de sinalização e 5 sinalização

nova. Os resultados foram comparados.O método buscou apresentar um padrão

visual que definisse o momento da repintura, trazendo uma ferramenta para balizamento, já que não há norma da ABNT que contem-ple parâmetros a essa definição.

A avaliação da sinalização em geral é feita visualmente, tornando-a muito subjetiva aos critérios do observador. Em outros países, há grande variação de quesitos e cada organis-mo de trânsito tem um método no momento da repintura.

Alguns baseiam-se na visibilidade notur-na (retrorrefletividade), outros na diurna (percentual de pintura remanescente sobre o pavimento) e outros ainda em ambos. Pes-tana pretendia oferecer uma ferramenta aos municípios de fácil análise do estado da sina-lização. As avaliações foram feitas de 2004 a 2006 e adentraram 2011.

Em função dessas informações, o autor da tese propôs esse método para um caso real de controle de durabilidade da sinalização urbana em diferentes lugares da cidade, mor-mente os que se mostraram mais frágeis.

Orientado pelo professor da FEC Cássio Eduardo de Paiva, escolheu Sumaré por se enquadrar bem nas condições de entorno para o qual havia sido planejado o estudo e por ter atuado naquela Prefeitura até 2004, o que facilitou algumas necessidades do expe-rimento de campo, como o procedimento de bloqueio momentâneo do trânsito.

O pesquisador viu claramente variações na durabilidade da sinalização e que elas de-correram das características físicas das vias (locais em aclive, declive, plano, tangente, curva) e do fluxo de tráfego (locais com ace-leração, desaceleração, frenagem, tráfego de veículos leves ou pesados).

Notou ainda que as tintas tinham diferen-te durabilidade e que determinadas condi-ções físicas contribuíram para o seu desgaste mais prematuro. “Em trechos contendo cur-va e aclive, a sinalização desgastou mais rapi-damente do que em trechos planos e reto”, conta ele.

INVESTIGAÇÃODe acordo com Pestana, a pesquisa foi

motivada pela observação de que os municí-pios brasileiros, a priori os de pequeno e de médio porte, não possuíam equipe técnica especializada e nem ferramentas para reali-zar o correto gerenciamento da sinalização horizontal urbana.

Trata-se de uma situação indesejável no mundo todo, já que esse tipo de sinalização se presta justamente a orientar os usuários das vias (motoristas, motociclistas, ciclistas e pedestres) a terem comportamentos que au-mentem a sua segurança pessoal e a fluidez do trânsito, ordenando o fluxo de tráfego.

Geralmente, é de se esperar que a sinali-zação esteja sempre em boas condições, e ela é pintada com determinadas cores para fazer uma advertência. Ocorre que a sua duração está muito sujeita à intensidade do tráfego, e a sua visibilidade pode ser prejudicada por situações como pista molhada ou muito suja.

Por isso, reflete ele, é preciso que haja re-

PublicaçãoTese: “Avaliação visual do desgaste da sinalização horizontal urbana em um município de médio porte”Autor: Fernando Augusto Baptisti-ni PestanaOrientador: Cássio Eduardo Lima de PaivaUnidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)

Nas bancasNas bancas

professora de educação física Maria Luiza Tanure Alves não esperava encontrar relatos de bullying tão

impressionantes tendo como

aplicação da pintura nos locais aos primeiros “sintomas” de desgaste. O ideal é que a mar-cação seja feita com tinta refletiva para ajudar os condutores na visualização à noite.

Pestana pondera que a manutenção pre-ditiva é o ideal (previsão de quanto tempo a sinalização duraria sob ação do tráfego), mas isso ainda não é possível de ser previs-to com o método proposto. “Mostramos um parâmetro para identificar o momento da re-pintura e os elementos que podem afetar a durabilidade da pintura.”

Por outro lado, o estudo sugeriu uma pre-ocupação dos órgãos de transporte de Suma-ré para obter materiais de sinalização com uma maior vida útil, apesar da carência de estudos que avaliam a durabilidade de sina-lização quando submetida a vários tipos de solicitação do tráfego urbano.

Num trajeto, há uma série de obstáculos resultantes da sinalização horizontal apli-cada àquele meio urbano. É o caso de uma sinalização inadequada e que gera gastos desnecessários quando se usam materiais mal-especificados.

Pestana aconselha que se busquem ma-teriais de maior durabilidade para locais de maiores desgastes e materiais de menor cus-to (e de menor durabilidade) para locais de menores desgastes. “Lamentavelmente ainda falta estrutura e conhecimento técnico sobre o dimensionamento da sinalização horizon-tal em meio urbano.”

Faixa de pedestres: validado, método visual

tem potencial de aplicação ao sistema viário

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5Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

SILVIO ANUNCIAÇÃ[email protected]

Foto: AES/Tietê/Divulgação

O professor e engenheiro Tiago Zenker Gireli, coordenador das pesquisas: “A situação é preocupante”

Estudos na Usina de Barra Bonita dimensionam impactos e propõem alternativas

assoreamento, fenômeno que reduz a profundidade dos rios, avança de forma crescente no trecho de remanso do reserva-

tório pertencente à Usina Hi-drelétrica do município de Barra

Bonita (SP). Pesquisas da Unicamp traçaram um cenário preocupante por conta da sedi-mentação gradativa no local.

Além do prejuízo para a geração de ener-gia, há risco de paralisação no transporte de cargas no trecho que integra traçado da mais importante hidrovia do país, a Tietê-Paraná. Em menos de cinco anos, alguns pontos fica-ram 12 metros mais rasos, conforme levan-tamentos batimétricos realizados na região.

“É preocupante, pois são duas áreas de interesse para a nação: transporte, princi-palmente, escoamento de grãos, e geração de energia”, dimensiona o engenheiro civil e eletricista Tiago Zenker Gireli, docente da Faculdade de Engenharia Civil Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp.

Sem obras para impedir o processo de as-soreamento, a previsão nos próximos anos é de que a capacidade de geração de energia para o país seja afetada. O docente informa que, atualmente, os reservatórios do Tietê respondem por parcela considerável da de-manda de energia hidrelétrica da região su-deste do Brasil.

A diminuição da capacidade de geração de energia pode ocorrer caso a prioridade do reservatório de Barra Bonita seja a navega-ção. Conforme Tiago Gireli, a hidrovia exi-ge certa profundidade, restringindo, deste modo, a utilização da água para a hidrelétri-ca, que é afetada ainda mais pela sedimenta-ção no trecho.

No plano hidroviário a situação também é crítica: já não é possível navegar utilizando a profundidade normal das embarcações, que é de 2,9 metros. “Neste trecho a hidrovia só funciona, de forma plena, seis meses por ano e a tendência é que isso piore com o aumento do assoreamento”, alerta o docente.

“Recentemente, pudemos acompanhar pela imprensa a situação caótica no porto de Santos por conta da safra de soja. Apenas um comboio utilizando a hidrovia Tietê-Paraná seria capaz de transportar o que 180 cami-nhões carregam juntos”, compara Tiago Gi-reli, que chefia o Departamento de Recursos Hídricos da FEC.

Barra Bonita é a primeira de uma cascata de usinas subsequentes, distribuídas ao lon-go da hidrovia Tietê-Paraná. A usina represa as águas do rio Tietê, um dos afluentes da bacia do rio Paraná que abastece o reserva-tório da Itaipu Binacional. A hidrovia abran-ge, por sua vez, 220 municípios em cinco Estados, sendo responsável pelo escoamen-to anual de aproximadamente 3 milhões de toneladas de grãos.

LINHAS DE PESQUISASOs trabalhos na região vêm sendo de-

senvolvidos desde 2010 no âmbito de duas linhas de pesquisas multidisciplinares: mo-delagem física e matemática de obras fluviais e marítimas; e sistema de avaliação de perdas energéticas em hidroelétricas causadas por transporte hidroviário.

“Buscamos, com estas pesquisas, criar so-luções que otimizem os dois usos, tanto para a geração de energia, como para o transporte. Impactar a geração de energia é prejudicial para o país, ainda mais num momento de es-tímulo ao crescimento econômico. Por outro lado, existe a necessidade de corrigir a nossa matriz de transporte, com estímulo às ferro-vias e hidrovias”, delineia Tiago Gireli.

USOS CONFLITANTESEle reconhece que há investimentos efeti-

vos na hidrovia, mas ainda existem gargalos. “O objetivo é entender para propor obras a fim de colaborar para uma utilização mais eficiente, tanto na geração de energia como no transporte hidroviário”. Atualmente, de-vido ao processo de assoreamento, não é

possível conciliar os dois principais usos do reservatório, que se tornaram conflitantes.

“É um conflito localizado porque o asso-reamento diminui a profundidade para na-vegação. Por outro lado, estes sedimentos também atrapalham a geração de energia. E se uso da barragem está mais voltado à hidrelétrica, como acontece hoje, há prejuí-zos para a hidrovia por conta da diminuição do nível de água”, expõe.

CENÁRIOOs estudos traçaram um cenário, esti-

mando o volume, a taxa anual de assorea-mento e a evolução espacial dos depósitos. Para simular este cenário, elaborou-se um modelo computacional baseado em dados fornecidos pelo Departamento Hidroviário do Estado de São Paulo e pela AES Tietê, concessionária que administra a Usina.

O modelo de computador foi desenvol-vido pela engenheira agrícola Maria Clara Albuquerque Moreira, que defendeu, no fi-nal de 2012, dissertação de mestrado junto ao programa de pós-graduação da FEC. O estudo foi orientado por Tiago Gireli.

“O doutorado da Maria Clara começou em seguida. É uma continuidade. No mes-trado focamos o modelo para entender o comportamento. Agora, estamos refinando este modelo e, a partir disso, vamos propor obras fluviais que possam melhorar este problema”, explica o orientador.

MULTIDISCIPLINARIDADEEle acrescenta que participam das li-

nhas de pesquisas, os docentes da FEC Paulo Sérgio Franco Barbosa e Alberto Luiz Francato, além dos pós-doutorandos João Eduardo Gonçalves Lopes e Tatiana Belan-ga Chicareli.

Joao Lopes já atuou como engenheiro na Companhia Energética de São Paulo (Cesp), e a economista Tatiana Chicareli

é doutora pelo Instituto de Economia (IE) da Unicamp. Outros dois pesquisadores também integram a equipe: os engenheiros civis Oswaldo Buzolin Junior e Victor de Barros Deantoni, doutorando e mestrando da FEC, respectivamente.

“O propósito final destas pesquisas é criar ferramentas que auxiliem os gestores públicos nas suas tomadas de decisões. Há especialistas das áreas de energia, hidráu-lica, hidrodinâmica e economia. Tentamos abarcar diferentes campos para gerar uma solução integrada e aplicável”, fundamenta.

CONTAMINAÇÃOO reservatório de Barra Bonita recebe

a água e consequente contaminação que desce pelo rio Tietê, explica o engenheiro Tiago Gireli. “Quando este fluxo de água chega ao reservatório, a sua velocidade diminui. Isso acontece porque o local foi transformado num lago por conta da barra-gem. Portanto, toda a carga de sedimentos vindos do Tietê que o rio consegue trazer acaba parando ali. É o processo que chama-mos de assoreamento”, esclarece.

Ainda de acordo com ele, há planos para obras de dragagem no trecho mais crí-tico, situado na área de remanso, onde a velocidade da água é baixa. As escavações e remoções dos sedimentos esbarram, no entanto, em vários complicadores ambien-tais e operacionais. Estas dificuldades ex-plicam, conforme Tiago Gireli, o porquê da obra ainda não ter saído do papel.

“A dragagem prevista tem um problema ambiental porque não é um simples pro-cesso de remoção. Há muitos elementos tóxicos neste sedimento: metais pesados, elementos carcinogênicos etc. Portanto, se o processo de dragagem misturar estes ele-mentos novamente na água, haveria grave prejuízo ambiental. Seria necessário remo-ver e lançar num aterro sanitário”, revela.

Vista aérea da barragem e da eclusa da Usina de Barra Bonita:

em menos de cinco anos,alguns pontos fi caram 12 metros

mais rasos

PublicaçõesFRANCATO, A. L.; GIRELI, T. Z.; LO-PES, J. E. G.; BARBOSA, P. C. F.; PÓ-VOA; M. J.; LOPES, W. P.; MOREIRA, M. C. A. Avaliação de impactos na pro-dução de energia hidroelétrica com as previsões de crescimento na demanda por transporte hidroviário. IN: XXI Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica, Flo-rianópolis, 2011.MOREIRA, M. C. A.; ABUD, R. B. S.; GIRELI, T. Z.; FRANCATO, A. L.; LO-PES, W. P. Estudo gráfico do assorea-mento do reservatório de Barra Bonita: geração e sobreposição de levantamen-tos batimétricos. In: XXV Congresso Latinoamericano de Hidráulica de San Jose, Costa Rica, 2012.

Tese: “Avaliação da influência da bar-ragem de Barra Bonita (SP) na morfo-dinâmica do rio Tietê e seus impactos à navegação”Autora: Maria Clara Albuquerque MoreiraOrientador: Tiago Zenker GireliFinanciamento: AES Tietê e CapesUnidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)

drelétrica do município de Barra

Assoreamento é ameaçapara navegação e geração de energia

Foto: Antoninho Perri

ALTERNATIVASResultados parciais dos estudos con-

duzidos na Unicamp já indicam algumas alternativas ao processo de dragagem. O docente aponta que poderiam ser empre-gados, por exemplo, diques e espigões. Ele explica que os diques são obras longitudi-nais utilizadas, neste caso, para estreitar o canal, aumentando a sua profundidade. Deste modo, a possibilidade de acumula-ção de sedimentos seria menor.

Já os espigões são estruturas dispostas transversalmente no canal para proteger a margem contra as correntes. Quando asso-ciado ao dique, este tipo de estrutura poten-cializa o efeito de estreitamento do canal e, ao mesmo tempo, retém parte dos sedimentos ao lado do curso, facilitando a sua retirada.

“Favorece a manutenção com um custo menor do que a dragagem. Basta uma retro-escavadeira convencional para remover este sedimento, sem a necessidade de embarca-ções e obras complexas que a dragagem exi-giria. Além disso, haveria um ganho na ge-ração de energia ao aumentar o volume de água, que antes era ocupado pelos sedimen-tos”, compara.

Parte da investigação sobre Barra Bonita foi desenvolvida no âmbito de programa de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) custea-do pela AES Tietê. Os estudos também con-tam com financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Supe-rior (Capes).

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6Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

CARMO GALLO [email protected]

Foto: Antoninho Perri

Controlando ovazamento de gases

O professor Sávio Vianna,coordenador das pesquisas:

ferramenta simula várioscenários para dispersão

de gases decorrentes de vazamentos

Figura apresenta a simulação fl uidodinâmica computacional (CFD) do vazamento de gás na área de processo. Os resultados da dispersão de gases são usados no OPTIMI

para solução do problema de otimização de cobertura da área analisada

Ilustração mostra o arquivo de saída do OPTIMI. A região quadricular representa aárea analisada e suas respectivas subáreas. A localização dos detectores de gás

está apresentada nos pequenos quadrados escuros

Software determina número mínimo de

detectores a serutilizado em uma

área industrial

êm sido recorrentes as notícias de acidentes de vazamentos de gases em processos industriais,

alguns profundamente trágicos em relação às perdas de vidas e às consequências ecológicas. Em uma

década, dois foram particularmente alarman-tes. Em março de 2001, ocorreram explosões na P-36, operada pela Petrobrás na Bacia de Campos, a 130 km do estado do Rio de Ja-neiro, que levaram ao afundamento da pla-taforma. Relatório da Agência Nacional do Petróleo (ANP) aponta, entre as principais causas do acidente, que deixou 11 mortos, a ausência de dispositivos de detecção e con-tenção de gases em uma área negligenciada como de risco. Em abril de 2010, no golfo do México, a 17 km da costa da Lousiana, EUA, uma plataforma operada pela British Petro-leum pegou fogo após explosão. Em decor-rência, o sistema automático de controle da válvula instalada no fundo do mar falhou e permitiu o vazamento, a muito custo contro-lado, desencadeando um dos mais trágicos desastres ecológicos de que se tem notícia. Estes dois exemplos mostram a importân-cia de desenvolvimento de controles eficazes nos sistemas produtivos que envolvem risco.

É nesse contexto que se situa o trabalho desenvolvido pelo engenheiro químico e pro-fessor da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp, Sávio S. V. Vianna, que desenvolveu a ferramenta denominada OP-TIMI, um software que permite determinar o número mínimo de detectores de gases que deve ser utilizado em uma área industrial e em que locais devem ser colocados para ga-rantir 100% de cobertura em relação à detec-ção de vazamentos.

O docente explica que todas as unidades de processos precisam manter detectores de gases. Até algumas décadas, a localização des-ses instrumentos era feita de forma empírica e baseada em experiências de campo. Com o desenvolvimento, em décadas mais recentes, da modelagem computacional de escoamen-to de gases, consegue-se obter uma descrição melhor de como se distribui espacialmente a nuvem gasosa, o que facilita a decisão sobre a alocação dos detectores.

Apesar dessa evolução, as decisões de onde colocar os detectores de gases resultam ainda de experiências de campo e de decisões pessoais dos técnicos e engenheiros. Com isso, não se tem garantia de que os detecto-res estejam em número e posições mais ade-quados e nem de que oferecem garantia de 100% de cobertura. Outro problema é o da falha espúria, assim chamada quando o de-tector dispara mesmo na ausência de gases. Dispositivos em excesso facilitam essa ocor-rência e desacreditam o sistema diante do número de alarmes falsos, que não são mais levados a sério pelos operadores, que chegam até a desligar detectores.

Esse quadro motivou o pesquisador na procura de um modelo de cunho matemáti-co, utilizando um algoritmo específico, que permitisse determinar o número de detec-tores efetivamente necessários e sua melhor localização para atingir uma forma ótima, de maneira a garantir uma cobertura de 100% de uma determinada área industrial.

A ideia, então, foi juntar as possibilidades oferecidas pela técnica Computational Fluid Dynamics (CFD), já muito bem desenvolvi-da, que faz exclusivamente a simulação da dispersão da nuvem de gás, com a otimização por ele pretendida de desenvolver um novo software que permita determinar o número ideal e a localizações ótimas de detectores.

O estudo visou desenvolver um progra-ma para juntar o melhor de dois mundos em uma nova ferramenta, que não tinha ain-da sido desenvolvida em qualquer lugar do mundo, com as características a que ele se propôs. A ferramenta combina os resultados da simulação tridimensional da dispersão de gases com técnicas de otimização. Fornece a localização espacial de detectores de gás combinado com o modelo 3D da planta do processo. O programa está customizado para resolução de problemas de cobertura de con-juntos e já foi testado no Brasil e na Europa.

Em vista dessa inovação, o docente está trabalhando junto com a Agência de Inovação

Inova Unicamp em um processo de patente para a nova metodologia. Nesse processo, ele se deu conta de que havia inovação tanto no algoritmo utilizado na ferramenta quanto na metodologia em si, mesmo porque não existe ninguém trabalhando nessa direção tanto no país como fora dele.

Por ocasião de um congresso internacio-nal em Roma, o pesquisador teve oportuni-dade de entrar em contato com um grupo norueguês que desenvolve um software de dispersão de vazamento de gases e interessa-do em comprar a ferramenta de otimização, para ampliar o atendimento a seus clientes. A empresa não dispõe de um link que permi-ta utilizar as informações correspondentes à dispersão gasosa para determinar a posição dos detectores de gases. A constatação de que se tratam de duas tecnologias inovado-ras o leva a afirmar que “nesse campo, a Uni-camp está desenvolvendo uma tecnologia de ponta”. O trabalho proporcionou o desenvol-vimento de um software que combina flui-dodinâmica computacional e programação matemática para otimização e localização de detectores de gás. O programa ainda combi-na os resultados com arquivos CAD (Com-puter Aid Design) para melhor visualização.

A FERRAMENTAO software OPTIMI permite, portanto,

determinar qual o número mínimo de detec-tores necessários e como devem ser dispos-tos para 100% de cobertura em um determi-nado espaço na forma tridimensional. Para tanto, a ferramenta utiliza os resultados da mais avançada tecnologia que simula vários cenários para dispersão de gases decorrentes de vazamentos, com a elaboração de mapas dos possíveis tamanhos de nuvens inflamá-veis que possam se formar, levando em con-sideração velocidade e direção dos ventos, temperatura ambiente, direção e localização do vazamento.

Uma vez informado do tamanho da região do espaço em estudo – como, por exemplo, o ocupado pela área de craqueamento em uma refinaria – o programa divide esse espaço em áreas menores, as subáreas (em forma de cubos), determinadas em função do tamanho

da menor nuvem de gás formado. Cada um dos cubos é candidato a receber um detector. O sistema determina quais deles deve efeti-vamente recebê-los.

Se houver necessidade, ele permite tam-bém o favorecimento de subáreas, que de-vem ser priorizados com peso maior, como aquelas em que se localizam mais válvulas, mais tomadas de instrumentos.

A ferramenta ainda permite mostrar a posição dos detectores na planta industrial tridimensional. Segundo o docente, trata-se de uma informação importante porque pos-sibilita que técnicos de manutenção e opera-ção possam antecipadamente avaliar a prati-cidade do projeto, evitando que detectores sejam colocados em locais de acesso proble-máticos ou complicados. Incorporadas as alterações necessárias, a nova distribuição dos dispositivos é então implementada, ain-da na fase de projeto, de modo a que a nova distribuição garanta ainda 100% de cober-tura. Essa etapa final do projeto, que ante-cede a sua execução, em que se realizam os chamados “testes de sanidade”, mostra que o software permite a contribuição prática de técnicos e engenheiros para a escolha da melhor solução final.

O professor lembra que o programa pode resolver problemas de otimização discreta, que são os que envolvem valores precisos, caso do número e distribuição de antenas de celulares, de viaturas policiais em uma cida-de. Vianna lembra que a ideia do estudo veio-lhe em 2002, quando se discutia o problema de cobertura dos celulares, já que demandam soluções análogas.

O docente conta que, quando ainda por ocasião do final doutorado em engenharia mecânica na Universidade de Cambridge, In-glaterra, conseguiu verba extra da Capes para trabalhar com o desenvolvimento de softwa-re para otimização de detectores de gases, retomando um estudo que embrionariamen-te já havia começado ainda por ocasião do mestrado na Coppe-URFJ, utilizando duas dimensões, embora já soubesse da possibili-dade de ampliá-lo para três dimensões.

Ao vir para a Unicamp, no início do ano passado, continuou as pesquisas nessa área

alguns profundamente trágicos em relação às perdas de vidas e às

utilizando verba do Faepex (Fundo de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e à Extensão), mantido pela Unicamp, que tem por finalidade prover recursos para incentivo e apoio a projetos e atividades de ensino, pesquisa e extensão que contribuam para o enriquecimento da vida acadêmica. Os recursos utilizados pelo pes-quisador vieram através de uma das linhas de pesquisas oferecidas pelo Fundo, que ofere-ce, entre outros, auxílios à Pesquisa Para Do-centes em Início de Carreira (PAPDIC).

DERIVAÇÕESO engenheiro químico Caio Biondi, gra-

duado na Faculdade de Engenharia Quími-ca da Unicamp, resolveu investir um tempo adicional no mestrado na Unicamp atraído pela sua projeção nacional e internacional e por desejar trabalhar em um centro de pes-quisas. Depois de cursar as matérias teóricas nos seis primeiros meses, passou a trabalhar, em 2013, com o professor Sávio Vianna com o objetivo de expandir o uso da ferramenta por ele desenvolvida com vistas à sua otimi-zação em processos químicos. Neste caso ele se propôs a fazer a customização do método, ou seja, o desenvolvimento de um software específico que permita estabelecer as melho-res condições de operação de uma planta da indústria química. Para tanto, está desenvol-vendo a modelagem matemática para proble-mas contínuos.

Como modelo inicial ele começou a estu-dar uma refinaria de petróleo, do qual se ex-traem varias frações, inclusive de gasolinas, que têm um preço de produção e um preço de venda. O software em desenvolvimento deve ter condições de determinar que quan-tidades dessas frações possíveis devem ser produzidas ao menor custo e com a máxima rentabilidade, que é uma das funções da en-genharia química.

O professor Vianna lembra que softwares com essa finalidade já existem no mercado, mas são extremamente caros, o que justifica o desenvolvimento de uma tecnologia brasi-leira, principalmente para atender empresas de menor porte. Ademais, o estudo contribui para a formação de recursos humanos para atuar no país.

Divulgação

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7Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

PATRÍCIA [email protected]

Fotos: Antonio Scarpinetti

PublicaçãoDissertação: “A política do salário mí-nimo no governo Lula”Autora: Jacqueline Aslan SouenOrientação: Anselmo Luis dos SantosUnidade: Instituto de Economia (IE)

Salto do mínimo atenua desigualdade e beneficia trabalhador de menor renda

De acordo com a pesquisa, trabalhadores domésticos tiveram até 30,8% de aumento na renda média

Jacqueline Aslan Souen: “A recuperação do mínimo contribuiu para a desconcentração da renda no mercado de trabalho”

Pesquisa analisa impactos da recuperação do salário ao longo de mandatos de Lula

palavra “desconcentração”, quando relacionada à renda na economia brasileira, soaria no mínimo im-

provável até bem pouco tempo. Pois é justamente a palavra

mais usada pela pesquisadora Jacqueline As-lan Souen, autora da dissertação de mestra-do “A política do salário mínimo no governo Lula”, apresentada ao Instituto de Economia (IE), sob orientação do professor Anselmo Luis dos Santos, do Centro de Estudos Sin-dicais e de Economia do Trabalho (Cesit/Unicamp). Com o objetivo de analisar os im-pactos da trajetória de recuperação do salário mínimo na renda do trabalho durante quase a totalidade dos dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) na Presidência da República, Jacqueline tabulou os microdados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), de 2004 e 2009, e concluiu que os trabalhadores com menor renda, so-bretudo no Nordeste do país, foram os maio-res beneficiados com a política de valorização do salário mínimo.

A base de dados de 2003 foi descartada devido a uma mudança metodológica da PNAD que tornou incompatível a análise comparativa com os dados de 2009, a última base disponível do período Lula. Não há base da PNAD referente ao ano de 2010, pois foi ano do Censo.

Os trabalhadores do Nordeste, com a menor renda média do país – abaixo de dois salários mínimos, em 2004 –, tiveram um crescimento real de seus rendimentos mé-dios da ordem de 29,3%. Comparativamen-te, no Sudeste, onde a renda média indivi-dual equivalia praticamente ao dobro de um salário mínimo em 2004, a variação também foi positiva, no entanto chegou a pouco mais que a metade: 15,3%, mostrando diminuição da dispersão dos salários. O “coeficiente de Gini” – medida comumente utilizada para calcular a desigualdade de distribuição da renda do trabalho – também caiu no Brasil, ilustrando em uma curva descendente a mu-dança desde 2004.

“Vários fatores colaboraram para o bom rendimento da renda média do trabalhador neste período, entre eles o crescimento eco-

nômico, a queda do desemprego, o aumen-to do piso das categorias. Nesse contexto, a política de recuperação do salário mínimo contribuiu para a desconcentração da renda no mercado de trabalho”, observa Jacqueline.

A pesquisadora considera que o proces-so de transformação política e da economia se deu a partir de 2004, com um governo mais afinado com as demandas sociais, e mais disposto às negociações. A retomada do crescimento da economia, inicialmente puxada pelo aumento das exportações, e que estimulou o reaquecimento da demanda in-terna, foi realimentada, posteriormente, pe-los estímulos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), além da queda de juros e ampliação do crédito ao consumidor.

Outro fator preponderante do período foi a adoção de um critério de reajuste do salá-rio mínimo baseado na inflação de 12 meses mais a variação do PIB de dois anos anterio-res. “Houve bastante pressão social e mobili-zação dos trabalhadores para que finalmente se estabelecesse um critério de reajuste. O projeto foi para o Congresso em 2007 e pas-sou a ser lei em 2011. As negociações deixa-ram de ser pontuais, ampliando a segurança da política de valorização”, salienta.

Com dados do Ipeadata, considerando va-lores reais de dezembro de 2010, entre 2002 e 2010 o salário mínimo teve valorização real de aproximadamente 56%. Em 2002, segun-do dados da pesquisa, a média anual do míni-mo girou em torno de R$ 337,00. Em 2010, saltou para R$ 525,00. Entre 2004 e 2009, o país cresceu cerca de 4% ao ano, com inflação medida pelo INPC de cerca de 5% ao ano.

A trajetória de recuperação do salário co-meçou já em 1995, com a estabilização mo-netária promovida pelo governo do presiden-te Fernando Henrique Cardoso. Não houve, no entanto, redução da desigualdade de renda em função do tímido crescimento da economia, conforme os estudos de Jacqueli-ne. “A comparação com o governo de FHC não é meu foco, mas se entre 2004 e 2009 houve aumento de 18,7% na renda média do trabalhador, no período FHC houve redução de 16%”.

O salário mínimo foi instituído por Ge-túlio Vargas e teve o primeiro valor fixado em 1940 por meio de decreto presidencial. O maior período de valorização abrangeu os anos que antecederam a ditadura militar.

Entretanto, a partir de 1963, até 1993, in-cluindo o período do chamado “milagre eco-nômico brasileiro”, houve achatamento do piso mínimo. “Na fase de maior crescimen-to do país, durante o governo militar, apesar do desempenho favorável da economia, a política de arrocho dos salários e do salário mínimo contribuiu para o aumento da de-sigualdade na distribuição pessoal da renda do trabalho, bem como para a redução da participação dos salários na renda nacional”, ressalta a autora.

A pesquisa de Jacqueline avaliou a recu-peração da renda média por faixa salarial, mas também por posição na ocupação. E, neste caso, também foram aqueles em situ-ação mais precária os grandes beneficiados. É o caso, por exemplo, dos trabalhadores domésticos com e sem carteira assinada, que tiveram até 30,8% de aumento na ren-da média. “Cheguei à conclusão de que os maiores aumentos dos rendimentos médios ocorreram nas menores faixas de renda e nas ‘piores’ ocupações. O objetivo era mos-trar que os trabalhadores nas faixas de ren-da muito atreladas ao salário mínimo e nas ocupações mais precárias foram os que mais se favoreceram”.

LIMITESA valorização do salário mínimo como

estratégia para reduzir a concentração da

renda do trabalho tem seu limite bastan-te claro, adverte a pesquisadora. Funciona e se mantém enquanto a economia cresce com aumento da produtividade e da renda per capita.

O Brasil ainda está muito longe de ter um salário mínimo com poder de compra que se equipare ao fato de a economia bra-sileira ser tida como a sétima do mundo. Jacqueline comparou o mínimo brasileiro com outros 24 países da América Latina, e o Brasil ficou em 16º lugar. Na relação com outros 23 países da União Européia e Estados Unidos, ficou em 20º. “Faço essa análise para mostrar que, se nos países de-senvolvidos a valorização do salário míni-mo é importante, que dirá em países como o nosso. Trata-se de uma política pública fundamental no Brasil, imprescindível em uma economia como a nossa”.

palavra “desconcentração”, quando relacionada à renda na economia brasileira, soaria no mínimo im-

Fonte: Microdados da PNAD - IBGE.Nota 1: Considerado valores reais corrigidos pelo deflator para rendimentos da PNAD (INPC-IPEADATA), referente ao mês de setembro de 2009 (mês de referência da PNAD).

Faixa de rendimento

Menos de 1 SM

1 SM a 1,25 SM

1,26 a 1,50 SM

Subtotal 1 a 1,50 SM

1,51 a 3 SM

3,01 a 5 SM

Acima de 5 SM

Total

Renda média e massa salarial dos ocupados de quinze anos e mais e taxa de variação,conforme faixa de salário mínimo. Brasil, 2004 - 2009

Massa salarial(Em R$)

2.661.322.582,69

5.040.059.759,22

2.227.362.990,75

7.267.422.749,97

13.742.803.748,57

11.254.121.968,06

30.038.286.959,45

64.963.961.008,74

2009

Renda média(Em R$)

Massa salarial(%)

Massa salarial(Em R$)

4.082.241.220,00

8.854.952.128,00

4.709.705.039,00

13.564.657.167,00

21.280.433.073,00

14.492.288.404,00

33.130.893.097,00

86.550.512.961,00

Renda média (Em R$)

Renda média(%)36,4

38,4

35,4

36,8

38,8

41,3

30,0

-

Variação 2004/20092004 1

Fonte: IPEADATA. Elaboração própria.

Evolução do Coeficiente de Gini. Brasil, 2004 - 2009

2007

0,575

0,570

0,565

0,560

0,555

0,550

0,545

0,540

0,535

0,530

0,5252009

0,5720,569

2004 2005 2006 2008

0,563

0,556

0,5480,543

172,89

352,49

456,07

404,28

669,98

1246,31

3685,33

-

235,84

488,37

617,41

552,89

929,87

1760,64

4789,80

-

53,4

75,7

111,4

86,7

54,8

28,8

10,3

33,2

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MARIA ALICE DA [email protected]

Foto: Antoninho Perri

Deise, uma pioneira da acessibilidade

Experiências pessoais movem ações de funcionária da Biblioteca Central Cesar Lattes

Deise Tallarico Pupo, coordenadora e uma das idealizadoras do

LAB: “As pessoas com defi ciência

fazem a diferença em nosso trabalho”

abiana Bonilha é mestre e dou-tora em música pela Unicamp e hoje lidera uma equipe no Cen-tro Nacional de Referência em Tecnologia Assistida (CTRA)

do CTI Renato Archer, em Campinas. Vi-viane Missio, pedagoga pela mesma insti-tuição, obteve excelente classificação em um concurso e hoje trabalha na Prefeitura de Valinhos. Marcos Valim foi o primeiro a circular pela Unicamp com um cão guia por perder a visão durante o doutorado. Com o apoio oferecido pelo Laboratório de Acessi-bilidade da Biblioteca Central Cesar Lattes (LAB-BCCL) e de um monitor pôde che-gar ao título de doutor em química. Essas conquistas, envolvendo três pessoas cegas acima citadas, fazem brilhar os olhos de Deise Tallarico Pupo, coordenadora e uma das idealizadoras do LAB. Todos os dias ela comemora as histórias que o LAB ajudou a escrever. Enredos propiciados pela realiza-ção de um sonho seu e de outras amigas da Universidade: a biblioteca acessível.

Como diz o diretor da BCCL, Luiz Vi-centin, o LAB é mais um filho na vida de Deise. Mas ela faz questão de dizer que não é fruto de uma só cabeça, mas de várias. Confessa ser o lugar onde ela se realiza a partir das conquistas dos estudantes que saem de lá rumo ao mercado ou à carrei-ra acadêmica. E onde assiste à recuperação do próprio filho, Fábio, vítima, aos 5 anos, de um acidente que lhe acarretou deficiên-cia motora e de fala. Fábio faz parte de um grupo de quase 700 pessoas da comunida-de externa à Unicamp já beneficiadas pela infraestrutura do espaço desde 2003, ano em que o LAB foi aberto para a comunida-de. Sua história foi inspiração para a mãe querer modificar histórias de pessoas com as quais não tinha nenhuma relação. “Mes-mo antes do acidente do Fábio, eu já pensa-va em acessibilidade. Eu tinha uma ligação muito forte com a questão da deficiência desde que eu tinha me casado. Parece que as coisas caem em nosso colo quando já te-mos uma ligação”, pontua Deise.

A partir da leitura de sua própria histó-ria, ela tentou reescrever a de centenas de desconhecidos, hoje amigos. Seu outro fi-lho, Cláudio, também foi vítima de aciden-te de trânsito em 1999 e faleceu em 2002. Neste momento, o projeto já estava em an-damento, mas, mais uma vez, ela transfor-mou sua dor em luta e passou a se dedicar ainda mais ao projeto e publicar artigos so-bre seus resultados.

Em 1992, questões pessoais que inclu-íam o tratamento e a reabilitação de Fábio levaram Deise a mudar-se para São Carlos, onde trabalhou, comissionada, na Univer-sidade Federal (UFSCar). Lá também in-tegrou uma ONG, foi diretora da escola onde Fábio estudava, além de trabalhar em uma biblioteca comunitária. Em sua volta à Unicamp, sua experiência chamou a aten-ção da então bibliotecária responsável pela Biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciên-cias Humanas (IFCH) da Unicamp, Maria Alice Rebello Nascimento, que a acolheu, além de encomendar um projeto de biblio-teca adaptada, como faz questão de lem-brar Deise. “O acidente de meu filho me levou a um aprofundamento sobre o assun-to e deparei com uma fatia grande da po-pulação ainda fora dos processos. A Maria Alice soube reconhecer minha experiência. Fiquei sem lugar ao voltar, mas ela abriu as portas do IFCH para mim”, acrescenta.

Começou então a redigir o projeto de uma biblioteca acessível, que pudesse aten-der alunos, professores e funcionários com deficiência física; mas, ao longo de sua ela-boração, as pessoas com deficiência visual manifestaram-se e argumentaram para se tornarem também seu público-alvo, devido às inovações tecnológicas que já os bene-

ficiavam. Devido a mudanças administrati-vas, o projeto do LAB migrou para a Biblio-teca Central e, aos poucos, foi atraindo um número grande de pessoas cegas, entre as quais o violonista e professor convidado do Instituto de Artes Vilson Zattera. A área de tecnologia da informação e da comunicação é responsável por atrair este público, que a cada dia pode desenvolver de forma au-tônoma suas pesquisas e outros trabalhos. Esta é exatamente a missão de Vilson na Unicamp, aprimorar softwares para que es-tudantes e docentes cegos tenham mais au-tonomia para escrever sua própria partitu-ra e fazer arranjos, entre outras atividades. “Essa interface que os softwares fazem com usuários cegos ou de baixa visão é extrema-mente importante”, complementa Deise. Hoje, alguns usuários escaneiam o próprio material num software e levam para casa para ouvir em mp3, conforme Deise.

Sem funcionários, Deise faz questão de enfatizar o envolvimento dos alunos bolsis-tas. Muito deles continuam se dedicando às atividades no LAB, auxiliando usuários com deficiência mesmo tendo vencido o período de bolsa. A presença dos jovens é de gran-de valor para o LAB, segundo Deise, por dominarem a tecnologia de ponta utilizada por alunos e professores cegos, como lei-tor de telas. De acordo com Deise, os jovens acabam se envolvendo com as áreas e com as pessoas da Bibliote-ca Central. Mesmo assim, o laboratório espera na cer-tificação a oportunidade de aumentar seu quadro de funcionários. O LAB contou com a colaboração das peda-gogas Sílvia Carvalho e Regi-na Govoni, do Centro de Rea-bilitação Gabriel Porto, agora aposentadas. Atualmente, as atividades são compartilha-das com a pedagoga Magali Arnais, vinculada ao Dedic.

Hoje, muitas famílias já sabem que podem ter o LAB como ponto de apoio. Um caso emblemático da impor-tância do envolvimento da família, para Deise, é o da estudante Franciele Cristi-na Penteado. De acordo com a bibliotecária, a estudante perdeu a visão da noite para o dia por problema no nervo óptico, e o apoio para con-cluir o ensino médio partiu dos pais. Francielle passou no vestibular para o curso de Gestão de Empreas da Facul-dade de Ciências Aplicadas (FCA), em Limeira, em 2010. Os professores do curso en-comendaram uma palestra do LAB para que pudessem ajudá-la e, a partir de então, a transcrição do material ficou a cargo da equipe de Limeira.

Ao compartilhar a realização de muitas famílias, Deise hesita em pronunciar a pa-lavra aposentadoria. Cada palavra sugere que a dedicação entre ela e o LAB é mútua. “Sinto-me realizada porque em um mo-mento muito difícil de minha vida pessoal, que foi a perda do Cláudio, eu vim para cá trabalhar em benefício de outras pessoas”. Ao tentar traduzir as percepções sobre si mesma, sobre ajudar se ajudando, decla-ra que a Deise mãe, além de dar atenção ao Fábio, a suas duas filhas e a sua mãe, com Mal de Alzheimer, pôde exercer sua profissão ajudando pessoas que não teriam condições de ler ou estudar sendo um de-grau importante de acessibilidade e inclu-são dessas pessoas na graduação e na pós da Unicamp. Além disso, teve a Unicamp como parceira no desenvolvimento de Fá-

bio, que, por acompanhá-la teve a opor-tunidade também de pesquisar, utilizar computadores e interagir com as pessoas que passam e atuam no LAB. Ao ver o per-sonal Raphael de Jesus Pinto, ex-bolsista, também assistente do professor Vilson, adentrar o laboratório, Fábio faz a festa e, quando o assunto é família, participa da entrevista elogiando os músicos da família.

Em 1999, a portaria 1.679 determinava acessibilidade nas universidades para que todos os alunos com deficiência tivessem as devidas condições de concluir seus cur-sos. Caso contrário, não seriam creden-ciadas pelo MEC. Assim, as universidades foram construindo rampas e projetando es-paços mais acessíveis, porém, o caminho é longo. Pode-se dizer que a Unicamp é uma das pioneiras em biblioteca acessível no en-sino superior, segundo Deise. Em 1999, o projeto viabilizou a compra de uma cadei-ra que possibilita a circulação de usuários com deficiência em andares superiores e ainda pode ser utilizada em caso de emer-gência, como incêndio. Mas somente em 2000 a conscientização começou a crescer.

Como uma das iniciativas responsáveis por abrir os olhos da comunidade acadê-

mica para inclusão, Deise cita o Projeto Todos Nós e o Núcleo de Informática Apli-cada à Educação (Nied). “Vejo a inclusão acontecendo a partir da participação de alunos como a Fabiana, o Vilson, a inclu-são que a professora Maria Teresa Egler Mantoan nos transmitiu. Entendemos como as pessoas com deficiência precisam estar em todos os lugares. Porque são eles que fazem a diferença em nosso trabalho”, acentua Deise.

A Deise que um dia passou por projeto de reciclagem pessoal, começou catalogan-do a Biblioteca Sérgio Buarque de Holanda (SBH), foi bibliotecária de referência, tra-balhou no IFCH, chefiou a biblioteca do Instituto de Estudos de Linguagem (IEL), hoje é convidada a apresentar trabalhos em congressos. Com o envolvimento do diretor Luiz Vicentin e da coordenadora Valéria dos Santos Gouveia Martins, ela se sente privilegiada por ter passado tan-tos anos no LAB. “É muito gratificante ver isso acontecendo na prática. Temos de continuar. A batalha está sendo vencida aos poucos, mas são essas conquistas e o sucesso de nossos usuários que nos levam a prosseguir até às maiores vitórias: essa é a nossa maior recompensa”.

Campinas, 13 a 19 de maio de 20138

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Campinas, 13 a 19 de maio de 20139

Estudo atesta sucesso do PAAISCLAYTON LEVY

[email protected]

Foto: Antonio Scarpinetti

Foto: Antoninho Perri

Candidatos fazem prova do vestibular da Unicamp: estudo acompanhou a vida acadêmica de todos os ingressantes entre os anos de 2005 e 2008

O reitor José Tadeu Jorge fala durante o lançamento do Observatório da Educação

Estudantes bonificados têm desempenho igual ou superior em relação aos que não

tiveram ajuda do programa

Unicamp integra Observatório da EducaçãoLançado dia 8, portal democratiza acesso a notícia e informações sobre educação

studo realizado pela Comissão Permanente para os Vestibu-lares da Unicamp (Comvest) mostra que estudantes oriun-dos de escolas públicas, bonifi-

cados pelo Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social da Unicamp (PAAIS), apre-sentam desempenho igual ou superior em relação aos que entraram na Universidade sem a ajuda do programa. O estudo acom-panhou a vida acadêmica de todos os in-gressantes nos anos de 2005 a 2008, com-parando o desempenho de todas as turmas após quatro anos na Unicamp.

Criado em 2004, o PAAIS concede 30 pontos de bônus na segunda fase do vesti-bular aos candidatos que cursaram os ensi-nos fundamental e médio na rede pública. Os que se autodeclaram pretos, pardos e indígenas ganham mais 10 pontos. Em to-dos os anos analisados, constatou-se que a nota dos estudantes da rede pública no vestibular foi sistematicamente mais baixa que a dos demais candidatos. Após quatro anos na Unicamp, porém, deixou de haver diferença estatisticamente significativa en-tre as notas médias dos dois grupos.

“Os resultados mostram de maneira ine-quívoca que o PAAIS permitiu à Universidade fazer inclusão social sem perder a qualidade dos seus alunos”, disse o reitor José Tadeu Jor-ge. “Fica demonstrado, estatisticamente, que os ingressantes beneficiados pelo programa se saíram muito bem durante o curso, alcan-çando o mesmo nível de formação dos demais

estudantes e, pelos resultados, até com algum ganho de desempenho”, completou.

O estudo comparou dois indicadores: a nota no vestibular e o coeficiente de rendi-mento ao final do curso de graduação. Ape-sar de obter notas menores no vestibular, os estudantes de escolas públicas bonifica-dos pelo PAAIS conseguiram melhorar seu desempenho, igualando as notas obtidas ao longo do curso com as dos demais estu-dantes. Foram analisadas as áreas de Artes, Biológicas, Exatas, Engenharias, Humanas, Medicina e Tecnológicas. A divisão possi-bilita que sejam comparadas as notas de estudantes de cursos afins, considerando que as áreas apresentam formas distintas de avaliação.

Segundo o reitor, os dados mostraram que o aluno beneficiado pelo PAAIS tinha um potencial de aproveitamento que a Uni-versidade conseguiu catalisar. “Eles apro-veitaram a oportunidade durante o curso de tal forma que eliminaram a diferença de formação que havia no ingresso”, pondera. “Portanto, o PAAIS trouxe alunos com po-tencial e fez inclusão social”.

No curso de medicina, por exemplo, área que registra a maior relação candida-to/vaga, das quatro turmas avaliadas, 347 estudantes ingressaram pelo vestibular convencional (sem bônus) e 93 entraram pelo PAAIS. Os que entraram sem ajuda do programa alcançaram nota média de 667 no vestibular, contra 644 obtida pelos benefi-ciados com o bônus, o que representa uma

diferença estatisticamente importante. Ao final do curso, o coeficiente de rendimento dos alunos do PAAIS foi de 7,8, enquanto os demais alcançaram 7,7.

“Não há diferença significativa, mas uma leve tendência de que os alunos be-neficiados pelo PAAIS se saíram melhor”, analisa o reitor. “Esses resultados mostram claramente o sucesso do PAAIS em fazer inclusão mantendo a qualidade dos estu-dantes e, portanto, dos profissionais for-mados pela Unicamp”, completou.

Para Tadeu Jorge, os resultados do estudo confirmam na prática os pressupostos que sustentaram a criação do PAAIS em 2004. Segundo o reitor, antes do programa, quan-do se aplicava o vestibular, muitos estudan-tes da escola pública ficavam próximos da nota de corte, mas não conseguiam ingres-sar por uma diferença pequena. “O nosso pressuposto era que o aluno oriundo da es-cola pública, que ficava próximo da nota de corte mas não conseguia passar, certamente tinha um bom potencial”, explica. “Com o bônus, passamos a incluir esse aluno, na ex-pectativa de ser um bom estudante que não conseguiu desenvolver todo o seu potencial porque a escola pública não conseguiu fazê-lo chegar ao nível adequado”.

Esse quadro fica mais evidente nos cur-sos de alta demanda, nos quais o número de candidatos nessa situação é significati-vo. “Tudo indica que são bons estudantes, mas que não conseguiam entrar por mero detalhe na hora da prova. Quando aplica-mos o bônus, é como se abaixássemos a li-nha de corte para esses estudantes, de ma-neira que eles consigam ingressar”.

Os resultados revelados pelo estudo ser-virão de subsídio para ampliar o alcance do programa. “Estamos seguros para avançar ainda mais, aumentando os bônus concedi-dos pelo PAAIS e fazer mais inclusão”, disse o reitor. Segundo ele, as simulações em an-damento indicam que o valor da bonificação concedida aos candidatos poderia ser amplia-do de forma significativa. Uma outra medida em estudo seria a aplicação do bônus já na primeira fase do vestibular, e não apenas na segunda, como ocorre atualmente. De acor-do com o reitor, o tema será discutido nas diversas instâncias da Universidade.

Com essas novas medidas, a expectativa é que haja um significativo aumento entre os ingressantes oriundos da rede pública, que hoje na Unicamp correspondem 33% do total. “Se, por exemplo, dobrarmos a pontuação do PAAIS, será possível chegar talvez a 40%”, diz o reitor. Somando o PA-AIS a outros programas de inclusão, como o Programa de Formação Interdisciplinar Su-perior (ProFIS), que disponibiliza 120 vagas na graduação para os melhores alunos da rede pública, a expectativa é ampliar ainda mais essa margem. “Nossa ideia é aperfei-çoar o ProFIS também para fazer inclusão”.

Segundo o reitor, outras propostas po-deriam ser estudadas para complementar o PAAIS e o ProFIS, visando atingir os indica-dores sugeridos para os percentuais de inclu-são. Com isso, a marca de 50% de ingressan-tes oriundos das escolas públicas, bem como a proporção étnica referente ao estado de São Paulo, poderiam ser atingidas sem necessida-de de lei ou de cotas, e sim por planejamento e iniciativas da própria Universidade.

cados pelo Programa de Ação Afirmativa e

BONIFICAÇÃO DO PAAIS

PAAISNÃO PAAIS

% ESCOLA PÚBLICA

PAAISNÃO PAAIS

% ESCOLA PÚBLICA

PAAISNÃO PAAIS

% ESCOLA PÚBLICA

PAAISNÃO PAAIS

% ESCOLA PÚBLICA

PAAISNÃO PAAIS

% ESCOLA PÚBLICA

PAAISNÃO PAAIS

% ESCOLA PÚBLICA

PAAISNÃO PAAIS

% ESCOLA PÚBLICA

ÁREA

ARTES

BIOLÓGICAS E SAÚDE

ENGENHARIAS

EXATAS E DA TERRA

HUMANAS

MEDICINA

TECNOLÓGICAS

N

15753623%

4571.04430%

6462.20123%

1.0431.67638%

6131.27832%

9334721%

67169649%

NOTA PADRONIZADA POR OPÇÃO

MÉDIA*

486519

497522

553573

502527

496537

644667

395428

COEFICIENTE DE RENDIMENTO

MÉDIA**

7,87,8

7,47,4

6,46,3

5,85,8

7,47,2

7,87,7

5,96,0

DESEMPENHO – ESCOLA PÚBLICA 2005 A 2008

* As diferenças entre as médias dos grupos PAAIS e Não PAAIS são estatisticamente significativas** Não há diferença significativa entre as médias dos grupos PAAIS e não PAAIS

MARIA ALICE DA [email protected]

O Observatório da Educação de Campinas, lançado no úl-timo dia 8, no Teatro Iguatemi, pela Fundação de Entidades Assistenciais de Campinas (Feac), terá como um dos parceiros o Núcleo de Estudos de Políticas Públicas (Nepp) da Unicamp. Portal do programa Compromisso Campinas pela Educação (CCE), o observatório visa democratizar e ampliar o direito de acesso, on line, a informações e notícias sobre a temática educacional, de acordo com o superintendente executivo da Feac, Arnaldo Rezende. Além dos gestores educacionais, pais e alunos podem encontrar informações relevantes a partir da nova ferramenta. A iniciativa, segundo Rezende, busca chamar a atenção da sociedade civil para a causa e o tema “educação”, evidenciando dados, promovendo estudos, discussões e deba-tes na cidade. O lançamento do novo núcleo também marcará um novo reposicionamento do CCE, que é uma célula do Mo-vimento Nacional Todos pela Educação.

Presente na cerimônia de lançamento do observatório, o reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge, manifestou a satisfação da Universidade em participar do projeto, destacando que cabe à Universidade desenvolver conhecimento que possa se aplicar à sociedade. O Nepp, segundo o reitor, conta com uma equipe dedicada à análise de dados para formulação de políticas pú-blicas. Uma das áreas que precisam de investimento é a quali-ficação na formação de professores. Para ele, a participação da sociedade é essencial para enfrentar as necessidades existentes no sistema educacional.

Na opinião do reitor, para reverter o quadro numérico

ruim apresentado pela plataforma QEDu, é preciso não so-mente identificar, mas priorizar as causas que colocam a edu-cação de Campinas em posição inferior à de algumas cidades da região. Um dos dados apresentados pelo representante do

QEDu que chamaram a atenção do reitor foi o que se refere ao rendimento dos alunos de nono ano do ensino fundamental: praticamente apenas 1 entre 10 alunos apresenta o rendimen-to esperado na disciplina de matemática.

Também presente no evento, o prefeito de Campinas, Jonas Donizette, informou que os dados apresentados pelo QEDu foram apresentados em reuniões realizadas com gesto-res de escolas municipais e estaduais de Campinas. Os dados estão servindo de referência para um projeto, já iniciado, de melhoria das escolas de Campinas. A reestruturação começa com recuperação de prédios escolares e contratação de mil funcionários, a maioria encaminhada para completar o qua-dro de profissionais da educação infantil. Segundo Donizette, a administração tem como prioridade, neste início de gestão, a saúde e a educação. O prefeito espera ter a colaboração de professores, gestores e de toda a sociedade. Entre as priorida-des na área de obras, está a construção em regiões carentes de unidades escolares. Ele enfatizou que a história conhecida por todos sobre as escolas rurais, em que as crianças precisam an-dar muitos quilômetros para ter aula, é realidade em algumas regiões de Campinas, principalmente na periferia. A previsão, segundo o prefeito, é que as obras sejam iniciadas em 2014.

Para Luiz Norberto Paschoal, um dos idealizadores do Observatório de Campinas, a ideia nasceu da necessidade de envolver a população em projetos de qualidade da educação. “Percebi que seria difícil envolver a sociedade sem que ela te-nha acesso aos números”, reflete.

JULIANA SANGIONEspecial para o JU

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10Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

Foto: Divulgação

Palestras da FCM - O Laboratório de Gené-tica Molecular do Departamento de Genética Médi-ca e o Programa de Pós-graduação em Fisiopato-logia Médica da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp organizam palestras no dia 14 de maio, a partir das 14 horas, no Anfiteatro da pós-graduação da FCM. No evento, Jason Bobe apre-senta o tema “Personal Genome Project: Creating a Global Commons of Human Data”. Misha Angrist aborda “Então veio o que eu não poderia explicar: data, expectations and personal genomes”. Mais informações: 19-3521-8242 Agrener - O IX Congresso Sobre Geração Distribuída e Energia no Meio Rural ocorre, de 15 a 17 de maio, em Itajubá-MG. Realização: Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) da Unicamp. Submissão de artigos e outras infor-mações no link http://www.nipeunicamp.org.br/agrener/. Mais detalhes pelo e-mail [email protected] Patologização da Educação e judicial-ização da vida - Dia 15 de maio, a partir das 8h30, no auditório da Faculdade de Ciências Médi-cas (FCM), acontece o III Encontro Patologização da Educação e Judicialização da Vida, organizado pelo Departamento de Pediatria e Conselho Re-gional de Psicologia de São Paulo. Consulte a pro-gramação no link http://www.fcm.unicamp.br/fcm/sites/default/files/folder_Cida.pdf. Inscrições em www.crpsp.org.br. Mais detalhes: 19-3521-7193. Arquitetura como fato cultural - O Centro Cultural de Inclusão e Integração Social (Cis-Guanabara) sedia em 15 de maio, às 19h30, o ciclo de debates “Arquitetura como fato cultural”. No evento, o arquiteto Ayrton Camargo e Silva fala sobre “Mobilidade Urbana, do âmbito municipal ao metropolitano”. A arquiteta Patrícia Ceroni Scara-belli aborda “A Mobilidade Urbana induzida pela fer-rovia”. As palestras ocorrem na rua Mário Siqueira 829, no bairro do Botafogo, em Campinas-SP. En-trada livre. Mais informações: 19-3254-4233.

Educação médica - No dia 16 de maio, às 8h30, no auditório da Faculdade de Ciências Médi-cas (FCM), acontece o seminário “Educação Médi-ca: História e perspectiva”, com a participação de Nísia Veronica Trindade Lima, da Fundação Oswal-do Cruz/Fiocruz; João Amilcar Salgado, da UFMG; Sigisfredo Brenelli, José Antonio Rocha Gontijo e Roberto Teixeira Mendes, da FCM. Programação e inscrições gratuitas no link http://www.fcm.unicamp.br/educacaoMedica/index.php. O evento é orga-nizado pelo Centro de Memória e Grupo de Estudos em História da Ciência da Saúde. Desafi os da gestão em enfermagem - No dia 17 de maio, às 9 horas, no Auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) acontece o Fórum Permanente de Esporte e Saúde com o tema “Desafios da Gestão em Enfermagem”. O evento é organizado pelo HC, Caism e Cecom. Programa-ção, inscrições e outras informações na página ele-trônica ou pelo telefone 19-3521-5039. Arena MTE 2013 - O desafio universitário ArenaMTE 2013 ocorre nos dias 17 e 18 de maio, sendo que no dia 17, haverá um curso de resolução de cases no Auditório da Biblioteca Central César Lattes (BC-CL) e no dia 18 ocorrerá o desafio, no Hotel Nacional Inn, em Campinas/SP. O evento é organizado pelo Mercado de Trabalho em Engen-haria (http://mte.org.br/arenamte/) e visa proporcio-nar aos alunos a oportunidade de Networking com as empresas participantes. Interessados podem fazer inscrição no site http://www.arenamte.mte.org.br/inscricao. Mas detalhes: 19-3521-3876 ou e-mail [email protected]

o dia 14 de maio, as alunas do curso de mi-dialogia Juliana Villiotti e Ana Cecília Araki embarcam para a cidade de Cannes, no sul da França. O curta-metragem A última rosa produzido por elas como projeto final do cur-so do Instituto de Artes (IA) da Unicamp foi

selecionado para ser exibido em um dos mais importantes festivais de cinema do mundo.

“Ter sido selecionado para a mostra do Festival Inter-nacional de Cannes já é um grande prêmio. É resultado dos trabalhos e estudos que tivemos durante os anos aqui na Unicamp. É uma grande vitória que representa todo o caminho percorrido, junto com os colegas, amigos e pro-fessores”, ressalta Juliana Villiotti, produtora e diretora de arte do filme.

A última rosa conta a história de duas senhoras doen-tes que vivem em uma região rural. O curta participa na categoria Short Film Corner, um espaço de exibição para diretores e produtores iniciantes. A 66ª edição do Festival, que confere ao melhor longa-metragem a Palma de Ouro, acontece entre os dias 15 e 26 de maio.

Ana Cecília Araki, que escreveu o roteiro e dirigiu o cur-ta-metragem, fala sobre a inspiração para o filme. A última rosa foi inspirado livremente no conto Sarapalha, do livro Sagarana, de Guimaraes Rosa. Com personalidade própria, o curta narra a história de duas senhoras doentes que vi-vem numa região totalmente desolada. Diante do grave estado de saúde das duas, uma delas revela um segredo”, relata Ana Cecília.

Também integram a equipe, as atrizes Stella Maris Vile-la, Alexandra Sanches e Vanessa Petrongari; Gabriel Ronconi (produção); Pedro Ivo Carvalho (fotografia e câmera); Gui-lherme Agostini Cruz (assistente de direção e continuidade); Vanessa Cristina Petrongari (produção local); Letícia Cabral, Pedro Bortoto e Lucas Corazzini (assistentes de produção);

Filme produzido no IA será exibido em Cannes

Equipe de A última rosa: fi lme foi feito para projeto fi nal do curso de midialogia

Tamara Gigliotti (assistente de fotografia); Myung Hwa Baldi-ni e Deborah Happ (arte); Pedro Bortoto e Marcelo Petrongari (assistentes de arte); Natália Pelizari (edição); Gabriel Tonelo (som); Victor Negri (edição de som, mixagem e trilha sono-ra); e os músicos André Batiston e Arthur Faria.

O filme A última rosa foi produzido como trabalho de con-clusão de curso dos alunos da midialogia, sob a orientação do docente Adilson José Ruiz. As gravações ocorreram na Fazenda Redenção, localizada no município de São Manuel, interior do Estado de São Paulo. (Silvio Anunciação)

Painel da semana

acadêmica

Vida

Destaques

do Portal

da Unicamp

Painel da semana

Teses da semana

Livro da semana

Vida

Teses da semana

Livroda semana

Destaque do Portal

Computação - “Uma abordagem cognitiva para autoconfiguração de protocolos de comuni-cação” (doutorado). Candidato: Neumar Costa Malheiros. Orientador: professor Edmundo Roberto Mauro Madeira. Dia 16 de maio, às 14 horas, no auditório do IC. Engenharia Elétrica e de Computa-ção - “Estatísticas de ordem superior do desvan-ecimento κ-μ extremo” (mestrado). Candidato: Érick Mascagni Ferdinando. Orientador: professor Michel Daoud Yacoub. Dia 14 de maio, às 14 horas, na sala PE 12 da FEEC.“Metodologia para avaliação de parâmetros ambi-entais em serviços de saúde” (doutorado). Candi-dato: Gustavo Alcântara Elias. Orientador: profes-sor Saide Jorge Calil. Dia 15 de maio, às 14 horas, na sala de videoconferência da FEEC.“Análise e proposta de arquiteturas de hardware para veículos autônomos” (mestrado). Candidato: Milton Felipe Souza Santos. Orientador: professor José Raimundo de Oliveira. Dia 17 de maio, às 9 horas, na sala PE-12 da FEEC.“Efeito de alargamento de linha espectral de laser de HeNe por onda acústica sobre interferômetro de Mach-Zehnder em fibra óptica” (doutorado). Can-didato: Flavio José Galdieri. Orientador: professor Evandro Conforti. Dia 17 de maio, às 14 horas, na CPG da FEEC. Engenharia Química - “Prospecção tec-nológica a médio prazo sobre pilhas a combustível e seu mercado” (mestrado). Candidata: Ana Beatriz Alves Borges. Orientador: professor Wagner dos Santos Oliveira. Dia 13 de maio, às 14 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.

“Obtenção e caracterização de recobrimentos de quitosana/ácido hialurônico e quitosana/ alginato de sódio pela técnica layer-by-layer para aplicações an-timicóticas” (mestrado). Candidato: Thiago Bezerra Taketa. Orientadora: professora Marisa Masumi Bep-pu. Dia 14 de maio, às 14 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.“Modelagem e simulação do processo de secagem dos frutos de aroeira-vermelha (Schinus terebinthi-folius raddi)” (mestrado). Candidato: Bruno Guzzo da Silva. Orientadora: professora Ana Maria Frattini Fileti. Dia 17 de maio, às 10 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.

“Estudo da preparação de catalisadores de N e RU suportados em carvão ativado para a hidrogenólise da sacarose” (doutorado). Candidata: Cristiane Za-nutelo. Orientador: professor Antonio José Gomes Cobo. Dia 17 de maio, às 14 horas, na sala de def-esa de teses do bloco D da FEQ. Linguagem - “História, política e alegoria na prosa fi ccional de Dyonelio Machado” (doutorado). Candidato: Fernando Simplicio dos Santos. Orienta-dor: professor Francisco Foot Hardman. Dia 16 de maio, às 9 horas, na sala de defesa de teses do IEL. Instituto de Matemática, Estatística e

Computação Científi ca - “Modelos matemáti-cos para dinâmica de doenças de transmissão di-reta e de presa-predador considerando parâmetros interativos e t-normas” (mestrado). Candidata: Francielle Santo Pedro Simões. Orientador: profes-sor Laecio Carvalho de Barros. Dia 17 de maio, às 10 horas, na sala 253 do Imecc. Química - “Estruturas de associação de sais complexos de copolímeros em bloco e surfatantes, polieletrólitos e nanopartículas” (doutorado). Candi-data: Letícia Vitorazi. Orientador: professor Watson Loh. Dia 17 de maio, às 14 horas, na sala IQ-14 da IQ.

Correspondência,dedicatórias e outros textos

Sinopse: A obra poética de Camilo Pessa-nha circunscreve-se a 56 composições, e a sua prosa – crônicas, contos, crítica literária, ensaio, escritos sobre a civilização chinesa, textos de caráter jurídico – está coligida num só volume. Igualmente breve é a sua corre-spondência, agora reunida. Dela constam 19 cartas que se encontravam parcial ou integral-mente inéditas, e 59 que estão disseminadas por livros esgotados e por periódicos de difícil acesso. Considerando a exiguidade da cor-respondência do escritor, este volume traz também todas as cartas que, neste momento, são de domínio público. Tendo em mente a relevância literária, cultural e cívica de Camilo Pessanha, esta edição revela ainda outros textos desconhecidos que, de forma direta ou indireta, a ele estão vinculados, como as dedi-catórias que acompanham seus livros e as fotografi as, cerca de metade das quais se en-contrava inédita. Sua inclusão neste volume justifi ca-se por demonstrarem uma profunda capacidade introspectiva e apresentarem de-talhes assinaláveis para a compreensão de sua psicologia e obra.

Autor: Camilo Pessanha nasceu em 7 de setembro de 1867, em Coimbra, Portugal, e morreu em 1o de março de 1926, em Macau. É considerado o expoente máximo do simbo-lismo em língua portuguesa.

Organização, prefácio, cronologia e notas: Daniel PiresISBN: 978-85-268-0966-6Ficha técnica: 1a edição, 2012; 336 páginas; formato: 16 x 23 cmCoedição: Biblioteca Nacional de PortugalÁrea de interesse: Crítica e Teoria literária Preço: R$ 62,00

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CARMO GALLO [email protected]

Fotos: Antoninho Perri

PublicaçãoTese: “Diretrizes solares para o pla-nejamento urbano: o envelope solar como critério para adensamento e verticalização”Autor: Denis Roberto Castro PérezOrientador: Edison FáveroUnidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)

O ‘envelope solar’e o planejamento urbano

O arquiteto Denis Roberto Castro Pérez: para autor da pesquisa, plano diretor não

contempla os anseios da população

Em primeiro plano, o bairro Nova Campinas, cujo tombamento acabou sendo cancelado por decreto municipal: impasse e polêmica

Estudo prega que revisão da legislação urbanística incorpore acesso ao sol e à luz

arquiteto Denis Roberto Castro Pérez desde há muito se sente incomodado com construções sombreadas pelas edificações próximas, que as impedem de

receber iluminação natural ade-quada e as priva dos benefícios bactericidas do sol e da possibilidade de utilizá-lo como fonte de energia. Passou então a se pergun-tar como resolver esse problema. A oportu-nidade de se dedicar à questão surgiu já no mestrado e ampliou-se no doutorado, am-bos realizados na Unicamp. Moveram-no, também, as discussões sobre o modelo de bairro mais apropriado ao desenvolvimento saudável e sustentável.

A partir delas surgiu o posicionamento a favor de uma cidade mais compacta, verticali-zada, com densidade demográfica adequada, que possibilite o aproveitamento da infraes-trutura existente, encurte o deslocamento entre moradia e trabalho e diminua a neces-sidade de transporte individual. Essa visão contrapõe-se ao modelo de cidades-jardim, com baixa densidade populacional, que se estendem para muito além dos muros da ci-dade, acessíveis apenas a segmentos sociais bem aquinhoados financeiramente e que em geral dispõem de mais de um veículo de transporte próprio.

Além de tudo, estas soluções implicam na extensão da infraestrutura municipal muito além dos limites da cidade em ter-mos de vias pavimentadas, fornecimento de água e de energia elétrica, recolhimento de esgoto. Paralela e progressivamente, ocorre a consolidação da ocupação de áreas de risco por populações carentes. Estas questões são consideradas no estudo desenvolvido pelo pesquisador no Laboratório de Investiga-ções Urbanas da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp – que trata mais particularmente das diretrizes solares a serem adotadas para o planejamento urbano – que deu origem à tese de doutorado, orientada pelo professor Edison Fávero.

O pesquisador considera que o trabalho se revela particularmente oportuno a partir da promulgação do Estatuto da Cidade (lei federal No.10 257, de 10/07/2001), em ple-no vigor, que estabelece diretrizes gerais para a política urbana através de normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.

Apesar de vigorar há quase 12 anos, as sugestões urbanísticas por ele preconizadas ainda não estão sendo aplicadas, do que de-corre o contínuo crescimento desordenado das cidades, com bairros ao redor dos gran-des centros sofrendo pressões para mudan-ças de uso, de ocupação do solo e permissão para a verticalização, enquanto paralelamen-te as periferias crescem ilegalmente. A mor-fologia atual das cidades brasileiras continua sendo o reflexo do acúmulo de edificações que não obedecem a boas orientações e nem contemplam ganhos energéticos.

Entre outros instrumentos, o Estatuto da Cidade prevê o estabelecimento, de for-

ma democrática, do planejamento municipal através de um plano diretor que discipline o parcelamento, o uso e a ocupação do solo e o zoneamento ambiental. Para controle do adensamento populacional estabelece a utili-zação do coeficiente de aproveitamento, que resulta da relação entre a área edificada e a área do terreno. Estão afetas ao Estatuto as cidades com mais de 20 mil habitantes, ex-cluindo, em decorrência, da obrigatoriedade de um plano diretor cerca de 80% dos mu-nicípios brasileiros. Recomenda que o pla-no diretor seja revisto ao menos a cada dez anos, o que torna o trabalho particularmente significativo para Campinas, que atualmente discute a sua reformulação. O autor conside-ra que, embora a cidade já disponha de um plano diretor, ele não exprime os anseios da população hoje, a exemplo do que deve ocor-rer em muitos outros municípios.

MOTIVAÇÕESDenis considera que urge a revisão da le-

gislação urbanística, tanto nos planos direto-res como nas leis de uso e ocupação do solo, de forma a incorporar propostas que garan-tam o acesso ao sol e à luz. Constata que o re-duzido aproveitamento, tanto passivo como ativo, da energia solar tem levado à frequente necessidade de climatização e iluminação ar-tificiais durante todo o ano e impedido a uti-lização de sistemas solares destinados tanto ao aquecimento como à produção de energia elétrica. Como se sabe, esta pode ser vendi-da, durante os períodos do dia em que não é utilizada, pelo consumidor à concessioná-ria distribuidora, a exemplo do que já ocor-re com sucesso em importantes cidades em todo o mundo.

O objetivo da tese é o de fornecer ele-mentos, mediante o estabelecimento de di-retrizes solares, para o planejamento urbano, utilizando o chamado envelope solar como critério de adensamento e verticalização. O conceito de envelope solar surgiu, em 1980, com Knowles e Berry, e corresponde ao maior volume que uma edificação pode ocupar no terreno de forma a permitir o acesso ao sol e à luz natural na sua vizinhança imediata.

Esse elemento de volume pode adotar for-mas as mais diversas. O estudo desenvolvido propõe a aplicação desse recurso como subsí-dio para a formulação de normas regulatórias de adensamento e verticalização nos proces-sos de planejamento urbano e de projetos de construção de edifícios. O trabalho se propõe a verificar o potencial do envelope solar como possível critério para criação de diretrizes ur-banísticas aplicáveis no controle da ocupação do solo, buscando maior eficiência no aden-samento dos espaços urbanos.

O estudo visa resolver tanto os problemas enfrentados por bairros que sofrem pressões para mudanças no uso do solo, como aten-der as vicissitudes das periferias que crescem ilegalmente. Além de tudo, pretende forne-cer ferramentas para o enfrentamento do abandono em que se encontram as pequenas cidades em decorrência de não disporem de legislação simples, eficaz e exequível não só devido à carência de recursos como à falta de pessoal qualificado. “Com o trabalho esta-mos pretendendo colaborar para a criação de legislações simples que possam ser desenvol-vidas e mantidas pelos municípios de parcos recursos financeiros e humanos, de maneira a lhes garantir um desenvolvimento racional e sustentável e que atenda os interesses de suas populações”, diz ele, referindo-se aos municípios de menos de 20 mil habitantes e não contemplados pelo Estatuto.

ESTUDO DE CASOPara o desenvolvimento do trabalho, o

pesquisador adotou como estudo de caso o bairro de Nova Campinas, próximo ao cen-tro da cidade de Campinas e vizinho do tra-dicional bairro do Cambuí, que se contrapõe como exemplo de ocupação desordenada e sem planejamento. A escolha deveu-se ao fato de tratar-se de uma região semelhante às existentes em tantas outras cidades, situada ao redor de um centro consolidado e vertica-lizado e que sofre pressões para mudança de uso, adensamento e verticalização. É caso de Nova Campinas, bairro inicialmente residen-cial. Tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural de Campinas (Condepacc), a pedido de moradores, teve esse tombamento posteriormente cancelado por decreto municipal por pressão de outro grupo de moradores, gerando naturalmente um grande conflito de interesses.

Neste estudo de caso em que prevê aden-samento, verticalização e ocupação mista do bairro, o pesquisador utilizou o software Rhinoceros, com os aplicativos Grasshopper e Diva, introduzindo os módulos construti-vos dentro dos volumes dos envelopes sola-res gerados. Esse recurso permite o dimen-sionamento das áreas a serem utilizadas e o estabelecimento das taxas de ocupação, dos coeficientes de aproveitamento e das alturas das edificações. Possibilita ainda a geração de figuras representativas de cada lote e suas respectivas construções. No caso, foram ma-peados cinco quarteirões do bairro e estabe-lecidas comparações entre o que se tem e que se poderá vir a ter.

EXPECTATIVASDenis espera que o estudo com base nas

diretrizes solares possa oferecer subsídios para a elaboração do novo plano diretor de Campinas, atendendo às suas necessidades específicas. Porque, constata ele, cada região apresenta características particulares em fun-ção da latitude, do que decorre diferenças na inclinação dos raios solares. Além disso, ou-tros fatores geográficos determinam o clima e diferenças nas temperaturas médias, míni-mas e máximas em cada estação.

Consideradas as especificidades de cada região, ele acredita que os resultados do tra-balho podem ser aplicados em bairros situ-ados em centros urbanos já consolidados, que ainda se mantêm horizontais e oferecem possibilidade de verticalização. A ideia é con-tribuir para estancar o crescimento disperso das cidades, considerado nocivo por exigir ex-tensão para as periferias das infraestruturas básicas que envolvem asfalto, saneamento básico, recolhimento de aguas pluviais, rede elétrica e linhas de transporte. Com a agra-vante de que esse tipo de desenvolvimento cria estruturas distantes e apartadas do cen-tro. ”Se temos bairros próximos ao centro da cidade, como Nova Campinas, Taquaral, Ponte Preta entre outros, a exemplo de todas as cidades do país, por que não compactar?”, pergunta ele, defendendo o aproveitamento máximo da infraestrutura já existente, por-que considera mais fácil redimensionar as redes de abastecimento de agua existentes, por exemplo, do que levá-las para a periferia. Em vista disso, ele defende o adensamento, a partir da verticalização dos bairros horizon-tais, com baixíssimas densidades populacio-nais, transformando-os em conglomerados com média ou até alta ocupação, dependen-do da infraestrutura que possam oferecer. A cada área seria então atribuído um coeficien-te de aproveitamento.

Denis conclui assegurando que “o uso do envelope solar presta-se ao estabelecimento de diretrizes solares para o parcelamento do solo urbano, adensamento e verticalização de bairros, bem como para a elaboração de pro-jetos de edifícios com garantias de direito ao acesso ao sol e à qualidade ambiental”.

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guinada conservadora12

Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

LUIZ [email protected]

Rodrigo Soares de Cerqueira, autor da tese: “Macedo ainda é um escritor pouco lido” Capa de A Moreninha, em edição de 1844

Imagens: Reprodução

Foto: Divulgação

PublicaçãoTese: “Educação pela máscara: literatura e ideologia burguesa no Brasil (1844-1856)” Autor: Rodrigo Soares de Cerqueira Orientador: Francisco Foot HardmanUnidade: Instituto de Estudos da Linguagem (IEL)Financiamento: Fapesp

Gravuras retiradas de História da vida privada no Brasil: Im-pério, de Luiz Felipe Alencastro (org.), Companhia das Letras,

1997, vol. 2; charge publicada em 1871 em A Semana Ilustrada (acima) e passeio público: E. Rensburg, Álbum do Rio de

Janeiro e seus arrebaldes, séc. XIX (à esquerda)

Da juventude extravagante à

intenção original de Rodrigo Soares de Cerqueira para o seu doutorado era estudar obras de

Joaquim Manoel de Macedo, José de Alencar e Machado de Assis visando explicar uma variação formal importante na construção

dos protagonistas do romance brasileiro: em pouco mais de três décadas, esses personagens deixaram de se caracterizar pela bondade e pureza de espírito (em Macedo) e se tornaram mais calculistas (em Machado). O pano de fundo é a sociedade patriarcal do século 19 e seu conjunto de valores, tais como submissão à vontade senhorial, respeito à tradição e manutenção da ordem.

Entretanto, quando começou a se aprofundar nas obras de Macedo, Rodrigo Cerqueira pediu autorização para alterar o projeto junto à Fapesp, financiadora da pesquisa, no que foi atendido. “O motivo é que já nesses romances encontrei o que esperava e um pouco mais. Percebi uma dinâmica interessante: eram personagens jovens, extravagantes, e outros mais velhos, que procuravam controlar os primeiros. O foco está na análise deste embate geracional entre os jovens que passaram a viver de forma mais livre – num contexto que ainda não se pode chamar de moderno, mas mais arejado – e os velhos, alguns orgulhosamente roceiros e seguidores dos ‘costumes antigos’.”

Decidido que se ateria a Joaquim Manoel de Macedo, Cerqueira analisou detalhadamente os seis primeiros romances do escritor: A Moreninha (1844), O Moço Loiro (1845), Os Dois Amores (1848), Rosa (1849), Vicentina (1853) e A Carteira do Meu Tio (1855). A tese intitulada “Educação pela máscara: literatura e ideologia burguesa no Brasil (1844-1856)” teve a orientação do professor Francisco Foot Hardman e foi defendida em março no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL). “Outro motivo para alterar o projeto foi que, apesar de três trabalhos feitos recentemente aqui mesmo no IEL, Macedo ainda é um escritor pouco lido.”

O autor da pesquisa observa que os romances são ambientados no período um pouco posterior à chegada da Corte portuguesa. “O Brasil passava por uma série de grandes transformações, como a criação da Imprensa Régia, a abertura dos portos e o contato antes inexistente com outras nações. E também por transformações na vida cotidiana do Rio de Janeiro, a mais importante delas envolvendo as mulheres, que até então não saíam de casa e se retiravam da sala quando chegavam visitas. Naquele começo de século 19, elas ganham maior liberdade de trânsito, como por exemplo, indo à sorveteria da rua do Ouvidor, comprando roupas e frequentando bailes da Corte.”

Segundo Rodrigo Cerqueira, as personagens jovens dos romances de Macedo, a despeito das suas extravagân-cias, são sempre honestas e sabedoras dos limites que não devem cruzar – e por isso podem ser reintegradas sem pro-blemas à família, núcleo da sociedade. “Já o cálculo, maté-ria bruta das personagens machadianas, implica em certa consciência, numa ação interesseira que, por ser ambicio-sa e individualizante, vai de encontro àquela visão mais co-munitarista – entendendo que comunitarismo, nesse caso, é simplesmente a aplicação da vontade do senhor-proprie-tário como a vontade da comunidade que ele governa.”

O pesquisador acredita que um diferencial do seu tra-balho foi ter lido essas extravagâncias de juventude – os galanteios nos bailes, as peças pregadas nos amigos e nos mais velhos, que fazem a graça dos romances de Macedo – baseando-se em referências teóricas do crítico literário Franco Moretti. “Para Moretti, uma das maiores inova-ções do romance foi colocar a juventude no centro do enredo e fazer do seu percurso formativo uma maneira de se entender o funcionamento de uma nova dinâmica social. Guardadas as devidas proporções, Macedo faz o mesmo, ainda mais porque uma das funções do gênero romanesco no Brasil foi de educação moral da juventude, principalmente das moças.”

De acordo com o autor da tese, um exemplo de como Macedo, nos primeiros romances, concede mais espaço para esta juventude extravagante, e ao mesmo tempo para que os velhos façam seus discursos morais, está em O Moço Loiro. “O jovem protagonista é Lauro, expulso da família acusado de um roubo. Sua avó faz uma longa descrição para uma neta a respeito do primo que chama de coração de serpente. É que os elogios que faz à sua capacidade intelectual vêm acompanhados da crítica ao desrespeito dele com a autoridade, seja com os professo-res, seja por causa da postura irônica frente às ideias dos mais velhos. O romance parece seguir para um embate entre gerações, mas no final Lauro é perdoado porque não cometera o roubo, reintegrado à família e o romance cumpre a sua função moral.”

PROTAGONISMO MINADOO que mais chamou a atenção de Rodrigo Cerqueira,

contudo, foi a mudança de dinâmica nos romances seguintes de Macedo, que deixam de ser movidos por brincadeiras como as de A Moreninha, em que jovens tomam um porre na festa e um deles se esconde embaixo da cama para ouvir a conversa das mulheres. “Com o passar dos anos, entre 1844 e 1856, a obra dele sofre uma espécie de inflexão conservadora, que chamo de ‘desfuncionalização da extravagância’. A insensatez dos jovens não é mais a característica que gera a ação, que por sua vez põe o enredo em movimento. Isso fica claro em Vicentina, romance de 1853, no qual o jovem protagonista da vez, Américo, é chamado de extravagante, se diz extravagante, mas não age de acordo.”

O pesquisador avalia que a desfuncionalização da extravagância acabou por roubar o protagonismo real dos jovens e por atribuí-lo aos velhos. “Estes se tornam cada vez mais ativos nos romances, deixando menos espaço para o desenvolvimento, ainda que infantilizado, daquele ideário mais arejado que a juventude incorporava.

intenção original de Rodrigo Soares de Cerqueira para o seu doutorado era estudar obras de

Joaquim Manoel de Macedo, José de Alencar

Parece-me que as transformações formais do romance se dão de acordo com a inflexão conservadora de meados do século 19, que ficou conhecida como o tempo Saquarema – grupo político conservador que se tornou hegemônico após o conturbado período regencial.”

O regresso conservador que coincidiu com o período estudado na tese, acrescenta Cerqueira, acabou impactando nas convenções sociais que permeavam os romances. “A liberdade de contestação deixa de ser uma característica positiva, ainda que cheia de ressalvas, e é requalificada, submetendo-se a uma autoridade central – à visão de mundo dos personagens mais velhos. Seus livros vão perdendo a graça, com protagonistas mais sérios, autoritários e sombrios. Não por acaso, os romances considerados melhores e mais conhecidos são os primeiros.”

Conforme o autor da pesquisa, o próprio Joaquim de Macedo se insere na política e vai mudando sua visão de mundo. “O último romance que analiso, A Carteira do Meu Tio, é uma sátira política que até fez sucesso e teve algumas reedições com o escritor ainda em vida. Entretanto, o que ele faz é justamente ironizar a extravagância da juventude, ponto fundamental das obras anteriores. À frente do romance está novamente um jovem, mas como um personagem cínico, uma espécie de anti-herói, que é o tempo todo ironizado e que se torna um exemplo a não ser seguido.”

O LEGADO PARA ALENCARRodrigo Cerqueira ressalta a importância do texto

“Acumulação literária e nação periférica” (segunda parte do livro Um mestre na periferia do capitalismo), em que Roberto Schwarz reflete sobre a consolidação de um sistema literário romanesco, no qual problemas e soluções formais são pensados e legados para o escritor seguinte. “Na opinião de Schwarz, o papel que cabe a Macedo no processo de consolidação da forma do romance no Brasil é muito pequeno, para não dizer nulo: a ele teria cabido apenas fixar chavões típicos do gênero no cenário do Rio de Janeiro, de maneira artificial e acrítica.”

O pesquisador considera, porém, que Macedo traz bem mais que isso, tendo reelaborado, da maneira possível em uma sociedade patriarcal, as formas que esse ideário mais moderno assumiria no imaginário da Corte, isto é, como uma transgressão um tanto juvenil. “Creio que o aspecto mais singular da tese é de dar relevo à reelaboração desse ideário, mostrando que Macedo, apesar de ser um romancista que realmente não está à altura de Alencar ou Machado, deu uma contribuição importante à literatura brasileira.”

Uma ponderação final de Rodrigo Cerqueira é que, como resultado da inflexão conservadora – quando a juventude não cumpre mais a função de dinamizar o enredo –, há um impasse informal. “Como ter um romance moderno, quando o protagonismo parece passar para as personagens mais velhas, detentoras de um ideário menos arejado? Essa perspectiva não soa nada atraente para uma nação recém-emancipada e desejosa de fazer parte do concerto do mundo? Macedo não lega apenas lugares-comuns, e sim um problema a José de Alencar, que vai tentar resolver essa questão do conservadorismo com personagens velhos menos autoritários e, em certo sentido, com personagens jovens menos extravagantes e menos contestadores do senso comum.”