josÉ estorniolo filho a representaÇÃo da imagem

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JOSÉ ESTORNIOLO FILHO Orientação: Profª Drª JOHANNA W. SMIT A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM: indexação por conceito e por conteúdo USP - ECA - CBD SÃO PAULO 2004

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Page 1: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

JOSÉ ESTORNIOLO FILHOOrientação: Profª Drª JOHANNA W. SMIT

A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM:indexação por conceito e por conteúdo

USP - ECA - CBDSÃO PAULO

2004

Page 2: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM:indexação por conceito e por conteúdo

JOSÉ ESTORNIOLO FILHO

Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentadoao Departamento de Biblioteconomia e Documentaçãoda Escola de Comunicações e Artes da USP, paraobtenção do grau de Bacharel emBiblioteconomia

Orientação: Profª Drª JOHANNA W. SMIT

SÃO PAULO2004

Page 3: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

BANCA EXAMINADORA

Monografia apresentada ao Departamento de Biblioteconomia e Documentação da

Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, para obtenção do grau

de Bacharel em Biblioteconomia.

_____________________________________________

Johanna W. Smit - Orientadora

_____________________________________________

Maria de Fátima Gonçalves Moreira Tálamo

_____________________________________________

Cássia Denise Gonçalves

Page 4: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

São Paulo, 28 de Janeiro de 2005.

Page 5: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Afinal o que é a fotografia?

A possibilidade de parar o tempo, retendo para sempre uma

imagem que jamais se repetirá?

Um processo capaz de gravar e reproduzir com perfeição imagens

de tudo que nos cerca?

Um documento histórico, prova irrefutável de uma verdade

qualquer?

A possibilidade mágica de preservar a fisionomia, o jeito e até

mesmo um pouquinho da alma de alguém de quem gostamos?

Ou apenas uma ilusão? Uma ilusão de ótica que engana nossos

olhos e nosso cérebro com uma porção de manchas sobre o papel,

deixando a sensação tão viva de que estamos diante da própria

realidade retratada?

Fotografia é tudo isso e mais um monte de coisas também.

Cláudio A. Kubrusly

Page 6: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

ESTORNIOLO FILHO, José. A representação da imagem: indexação por

conceito e por conteúdo. São Paulo, 2004. Monografia (Trabalho de

Conclusão de Curso) – Departamento de Biblioteconomia e Documentação,

Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo.

Resumo

Investigação na literatura da representação da imagem fixa considerando as

duas técnicas de indexação praticadas atualmente: a indexação por conceito

e indexação por conteúdo da imagem. Aborda também o uso dos elementos

da expressão fotográfica como informações a serem considerados como

termos de indexação pela sua relevância na busca e recuperação de

imagens.

Palavras-Chave

Imagem Fotográfica – Representação – Imagem – Conteúdo Informacional –

Expressão Fotográfica – Análise Documentária – Fotografia – Indexação –

Indexação por conceito – Indexação por conteúdo

Page 7: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

ÍNDICE

LISTA DE QUADROS

LISTA DE FOTOS

CRÉDITO DAS FOTOS

1 INTRODUÇÃO...............................................................................................................11.1 Objetivos................................................................................................................ 31.2 Metodologia............................................................................................................4

1.2.1 Considerações sobre a bibliografia..............................................................5

2 A FOTOGRAFIA COMO DOCUMENTO.......................................................................62.1 A fotografia e sua inserção na sociedade............................................................. 62.2 O referente da imagem..........................................................................................9

3 A REPRESENTAÇÃO DOCUMENTÁRIA DA IMAGEM.............................................123.1 Análise da imagem fotográfica............................................................................ 133.2 A imagem fotográfica como documento..............................................................20

4 INDEXAÇÃO POR CONCEITO.................................................................................. 234.1 Níveis de análise..................................................................................................234.2 Categorias de descrição da imagem...................................................................274.3 A organização da descrição da imagem............................................................. 29

4.3.1 Vocabulário controlado.............................................................................. 304.3.2 Linguagem natural..................................................................................... 32

5 A EXPRESSÃO FOTOGRÁFICA................................................................................345.1 A expressão fotográfica como elemento de especificidade de uma imagem......................................................345.2 Elementos de expressão fotográfica................................................................... 405.3 Tratamento documentário da expressão fotográfica...........................................57

6 INDEXAÇÃO POR CONTEÚDO.................................................................................586.1 Atributos da imagem para indexação.................................................................. 646.2 Softwares.............................................................................................................666.3 Áreas de aplicação.............................................................................................. 67

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................ 70

BIBLIOGRAFIA........................................................................................................... 73

Page 8: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Estratégias comunicacionais........................................................................ 16

Quadro 2 – Níveis de análise de imagens.......................................................................25

Quadro 3 – Categorias de descrição de imagens........................................................... 27

Quadro 4 – Método de indexação de imagens................................................................28

Quadro 5 – Elementos de expressão fotográfica:

Moreiro González e Robledano Arillo......................................................40-41

Quadro 6 – Elementos de expressão fotográfica:

Oliveira......................................................................................................... 45

Quadro 7 – Elementos de expressão fotográfica:

Smit......................................................................................................... 46-47

Quadro 8 – Elementos de expressão fotográfica:

proposta.................................................................................................. 50-51

Page 9: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

LISTA DE FOTOS

Foto 1 – Mulher, primeiro plano, cores ........................................................................... 37

Foto 2 – Mulher, plano geral, preto e branco.................................................................. 37

Foto 3 – Retrato, mulher, preto e branco........................................................................ 37

Foto 4 – Retrato, mulher, preto e branco, alto-contraste................................................ 37

Foto 5 – Iluminação frontal e difusa.................................................................................38

Foto 6 – Iluminação direcionada aos olhos..................................................................... 38

Foto 7 – Iluminação dura, de baixo para cima.................................................................38

Foto 8 – Primeiro plano....................................................................................................42

Foto 9 – Primeiro plano....................................................................................................42

Foto 10 – Plano geral com um só indivíduo.................................................................... 42

Foto 11 – Plano geral.......................................................................................................43

Foto 12 – Tomada ampla.................................................................................................43

Foto 13 – Câmera baixa.................................................................................................. 43

Foto 14 – Câmera baixa.................................................................................................. 43

Foto 15 – Plano oblíquo...................................................................................................44

Foto 16 – Plano oblíquo...................................................................................................44

Foto 17 – Profundidade de campo.................................................................................. 51

Foto 18 – Achatamento da imagem.................................................................................52

Foto 19 – Alto-contraste.................................................................................................. 52

Page 10: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Foto 20 – Estroboscopia.................................................................................................. 52

Foto 21 – Fotomontagem................................................................................................ 52

Foto 22 – Múltipla exposição........................................................................................... 52

Foto 23 – Distorção da imagem.......................................................................................53

Foto 24 – Distorção da imagem.......................................................................................53

Foto 25 – Macro-objetiva................................................................................................. 53

Foto 26 – Macro-objetiva................................................................................................. 53

Foto 27 – Correção de perspectiva................................................................................. 54

Foto 28 – Filtro estrela..................................................................................................... 54

Foto 29 – Rede de difração............................................................................................. 54

Foto 30 – Foco suave...................................................................................................... 54

Foto 31 – Foco suave...................................................................................................... 55

Foto 32 – Posterização.................................................................................................... 55

Foto 33 – Textura.............................................................................................................55

Foto 34 – Textura.............................................................................................................55

Foto 35 – Movimento....................................................................................................... 56

Foto 36 – Movimento....................................................................................................... 56

Foto 37 – Movimento....................................................................................................... 56

Foto 38 – Exposição longa.............................................................................................. 56

Foto 39 – Exposição longa.............................................................................................. 56

Page 11: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

CRÉDITO DAS FOTOS

Fotos 1; 2; 3; 4; 16; 20; 22; 24; 28; 33; 34; 38 – <http://www.stockphotos.com.br/>

(códigos: PE-226-0216; C013-00322; PE-224-029 - alterada; PE-224-029 - alterada;

PL18602; S6084; 32017; DSI 1097-TI; N-2016; SL0407 - alterada;

FEM.103.001.601 - alterada; 1427705).

Foto 5 – <http://www.bobwilkins.tv/3d2.htm>.

Foto 6 – <http://mapage.noos.fr/euromonsters/britmonsters/clee.html>, cena do filme

“Dracula prince of darkness”.

Foto 7 – <http://www.hammerfilms.com/vaults/filmography/hammer_a_z.html>, cena do

filme “Dracula prince of darkness”.

Fotos 8 a 14 –VERGER (p. 18; p. 250; p. 145; p. 182; p. 71; p. 233; p. 283).

Foto 15 – COWIE (p. 170), cena do filme “The trial”.

Foto 17 – HEDGECOE (p. 25).

Foto 18 – <http://www.corbis.com/> (código BH 001768).

Fotos 19; 21; 25; 26; 27; 29; 30; 31; 32; 35; 36; 37; 39 – EASTMAN KODAK COMPANY

(p. 284, Robert Kretzer; p. 241, Jerry N. Uelsmann; p. 189, Donald Maggio; p. 190, Alvin

Long; p. 111, Joseph F. O’Connell III; p. 133, John Murphy; p. 160, Charles Micaud; p.

132, Gary Whelpley; p. 283, Rodney Perry; p. 178, James Dennis; p. 180, Guy

Samoyault; p. 181, Andrew Greene; p. 243, David Muench).

Foto 23 – <http://www1.folha.uol.com.br/folha/especial/2003/saopaulo450/galleria.shtml>

(Mônica Vendramini).

Page 12: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM
Page 13: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

1 INTRODUÇÃO

A fotografia sempre provocou fascínio, e desde o seu surgimento o homem

acumulou imagens, primeiramente no círculo familiar, e na medida que o

processo foi se popularizando, alcançou todos os setores da sociedade. A

memória da humanidade passou também a ser guardada pela imagem

(MOREIRO GONZÁLEZ e ROBLEDANO ARILLO, p. 12) – a fotografia era

concebida como testemunho da verdade.

Coleções de imagens sempre foram motivo de interesse, mas eram recursos

pouco acessíveis pela pouca ou nenhuma forma de tratamento dos documentos

e pelas limitações de duplicação e disseminação (RASMUSSEIN, p. 169). A

resolução dos problemas físicos da duplicação, pela tecnologia da imagem digital,

e da disseminação, incrementada pelos CD-ROMs e internet, acarretou a

ampliação do número de usuários de imagens, agravando o problema do

tratamento e recuperação das coleções e tornando mais urgente resolver os

problemas inerentes ao acesso lógico ao conteúdo informacional da imagem.

A imagem apresenta cada dia mais importância como meio de expressão em

nossa sociedade, e por esse motivo o patrimônio gráfico tem aumentado

continuamente. Vivemos em uma sociedade cada vez mais voltada à criação e ao

uso de imagens – o consumo de imagens tornou-se uma atividade corriqueira,

abrangendo diversas áreas: cultural, educacional, científica, comercial etc.

Kubrusly (p. 19) cita Marshall McLuhan em Understanding media1 considerando o

surgimento do processo fotográfico como o passo decisivo da transição da era do

Homem Tipográfico para a era do Homem Gráfico.

Fatores como o constante aumento de produção, a grande variedade de

suportes, a demanda cada vez mais especializada e diversificada, e a

1 Editado no Brasil com o título “Os meios de comunicação como extensões do homem”.

1

Page 14: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

necessidade de intercâmbio com outras coleções para satisfazer a essa demanda

implicam uma crescente dificuldade no armazenamento e na recuperação dessas

imagens, justificando a existência de uma análise documentária com alto grau de

qualidade.

Como até muito recentemente a memória da humanidade havia sido dominada

por representações textuais, este foi o meio preferido para a orientação e o

tratamento dados às atividades e aos serviços profissionais da informação. O

acesso a documentos textuais tem sido objeto de estudo há muito tempo,

enquanto que são bastante recentes os estudos significativos do problema do

acesso aos documentos visuais. A preocupação com a indexação e a

recuperação de imagens baseada em conceitos (assuntos) teve início nos anos

70 (ENSER, 2000, p. 199), e somente nos anos 90 os profissionais da informação

lançaram mão da tecnologia da informática para a indexação efetuada por

programas de computador, baseada na análise dos atributos intrínsecos da

imagem2, estabelecendo um novo paradigma na indexação e recuperação de

imagens.

Mesmo sendo a fotografia inclassificável, como concluiu Barthes (p. 12-13), é

papel do profissional da informação traduzir a variada presença de signos

representados, nem sempre explicitamente, em uma imagem, com o objetivo de

tornar acessíveis os documentos de uma coleção. Essa representação

documentária é feita pelos processos de catalogação e indexação do documento.

A questão da indexação e recuperação de imagens tem atraído a atenção de

novos interessados, tanto os preocupados com o conteúdo informacional das

imagens, quanto os interessados em desenvolver formas automatizadas de

descrição e acesso às imagens. O grande desafio é representar a imagem com

finalidade documental, propiciando a sua recuperação apropriada em resposta a

uma demanda cada vez mais especializada do usuário.

O enfoque do trabalho será na indexação e recuperação da imagem fixa,

abordando as técnicas de indexação baseada nos conceitos da imagem e a

indexação baseada no conteúdo da imagem, respectivamente concept-based2 Atributos intrínsecos ou atributos inerentes são as características visuais de uma imagem quepodem ser calculadas e representadas matematicamente pelas técnicas de processamento deimagens.

2

Page 15: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

indexing e content-based indexing, os termos mais utilizados na literatura de

língua inglesa.

A técnica de indexação baseada em conceitos é aquela em que as imagens e os

objetos representados são identificados e descritos (indexados) em termos do

que eles são e do que eles representam. De maneira geral é um processo

executado por um profissional documentalista. Já a técnica de indexação

baseada no conteúdo considera alguns aspectos da imagem, tais como a cor, a

forma, a textura. Esses aspectos relevantes são mais eficazmente identificados e

extraídos do documento por meio de programas de computadores.

O trabalho apresentará um panorama do que a Ciência da Informação tem

produzido para o tratamento de imagens, considerando a indexação e o acesso

por conceitos e por conteúdo.

1.1 Objetivos

Analisar a representação da imagem fixa para fins documentais e seu uso,

estudando os tipos de indexação praticados atualmente – por conceito e por

conteúdo. Para tanto, serão investigados na literatura conceitos referentes às

seguintes áreas de estudo:

­ indexação baseada em conceitos – concept-based indexing;

­ expressão fotográfica: elementos técnicos utilizados na produção da imagem

e que auxiliam o indexador na sua descrição;

­ indexação baseada no conteúdo da imagem – content-based indexing.

3

Page 16: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

1.2 Metodologia

Os objetivos propostos serão alcançados por meio de investigação na literatura

que trata da análise documentária da informação fotográfica. As fontes da

pesquisa para obtenção de um corpus que foi utilizado para a elaboração do

trabalho foram:

­ Acervo da Biblioteca da ECA

­ Base de Dados LISA – Library and Information Science Abstracts

­ Base de Dados Web of Science

­ Internet3 (google: <http://www.google.com.br/>; vivissimo: <http://www.vivissimo.com/>)

­ Indicações da orientadora

As principais expressões de busca utilizadas nas pesquisas (termos isolados e

termos combinados) foram:

­ Fotografia – Photography - Still images

­ Indexação - Indexing

­ Imagem - Image

­ Concept-based indexing

­ Content-based indexing

­ User needs

­ User study

3 Tomou-se o cuidado de verificar a procedência dos artigos recuperados. Foram consideradossomente os documentos publicados por universidades, ou de autores já conhecidos.

4

Page 17: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

1.2.1 Considerações sobre a bibliografia

É importante salientar que na bibliografia levantada, a grande maioria dos

documentos produzidos por profissionais da informação que tratam da

representação documentária da imagem fotográfica é escrita por autores

estrangeiros e publicada em revistas internacionais, principalmente americanas.

Por aqui, a exceção é a Profª Johanna Smit, com vários artigos que abordam o

tema.

Percebe-se também que em relação à indexação por conceito a bibliografia está

consolidada com os autores da área de documentação. Para a indexação por

conteúdo há uma fase com várias publicações escritas por profissionais da área

de documentação – com a utilização de conceitos da área de informática, e uma

outra fase, mais atual, de autoria dos profissionais da área da informática, que

utilizam conceitos da área de documentação.

Sabe-se da existência de várias instituições que mantêm acervo de material

fotográfico no Brasil, mas são raros, na literatura nacional, trabalhos que

discutam ou mesmo divulguem o tratamento dado a esse material, e nem mesmo

qualquer estudo do tipo de usuário que necessita e usa imagens fixas. Essa

prática é comum aos profissionais americanos que publicam relatos sobre os

seus arquivos fotográficos.

Percebeu-se também que a análise documentária da informação fotográfica

ainda é uma área em desenvolvimento, em evolução, com muitos conceitos ainda

não sedimentados, e que apesar de encontrarmos alguns autores clássicos4, que

estão presentes em quase todas as bibliografias, não existe ainda uma

consistência nos conceitos usados.

4 Sara Shatford é referência em quase todos os documentos que abordam a indexação porconceitos. Mais recentemente encontramos John P. Eakins, Peter Enser, Margaret Graham e EdieRasmussen, entre outros.

5

Page 18: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

2 A FOTOGRAFIA COMO DOCUMENTO

Antes de tratar especificamente da representação da imagem, abrangendo a

indexação por conceito e a indexação por conteúdo, será feito um breve relato da

história da fotografia e suas relações com a sociedade, mostrando suas primeiras

utilizações como fontes de informação. Vamos observar que a produção de

imagens sempre esteve relacionada com a sua posterior recuperação, seja uma

foto familiar para ser mostrada aos parentes e amigos, seja fotos publicitárias,

científicas ou de documentação em geral. Também será apresentado um

componente, sempre presente na imagem, fundamental para o tratamento

documentário iconográfico – o referente.

2.1 A fotografia e sua inserção na sociedade

A fotografia surgiu no século XIX como conseqüência inevitável do fascínio do

homem diante das imagens da câmera escura. Sua criação é uma síntese de

várias observações e inventos em momentos distintos.

A câmara escura é um artefato bastante simples, que consiste em um

compartimento estanque à luz, com um orifício de um lado e a parede à sua

frente pintada de branco. Quando um objeto é posto diante do orifício, do lado de

fora do compartimento, a sua imagem é projetada invertida sobre a parede

branca. Esse princípio ótico já era conhecido na China no século V a.C., mas

historiadores apontam o filósofo grego Aristóteles (384-322 a.C.) como o

responsável pelos primeiros comentários esquemáticos desse dispositivo.

No século XVI é introduzido o uso de uma lente no orifício do compartimento para

melhorar o brilho e a claridade da imagem; em meados do século XVII foi

projetada uma câmera escura menor e com um espelho interno para refletir a

imagem em uma tela translúcida.

6

Page 19: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

O uso da câmara escura foi muito difundido, através dos séculos, para observar

eclipses solares; e desde o século XIV ela já era utilizada como auxílio ao

desenho e à pintura.

O fascínio provocado pela câmara escura era a perfeição da imagem

representada sobre uma superfície plana, iludindo os olhos com uma perfeita

perspectiva e pela abundância de detalhes. A idéia de aprisionar, em um suporte,

as imagens da câmara escura era geral, e é por isso que a fotografia foi

inventada por várias pessoas, quase ao mesmo tempo e em diferentes lugares,

inclusive no Brasil, por Hércules Florence (KUBRUSLY, p. 23-24). A utilização de

uma câmara escura, associada aos processos de obtenção de superfícies

sensíveis à luz e de fixação das imagens gravadas nessas superfícies, são as

bases do processo fotográfico.

No princípio a fixação das imagens em uma superfície era apenas temporária. O

primeiro processo fotográfico que de fato resolveu o problema de se fixar a

imagem em um suporte foi desenvolvido por Daguerre. Esse processo,

denominado daguerreotipia, consiste na obtenção de imagens fotográficas por

ação do vapor de iodo sobre uma placa de prata sensibilizadora; após vários

minutos de exposição sob luz forte, revela-se a imagem, que é então fixada com

hipossulfito de sódio.

À técnica de Daguerre seguiram-se outras descobertas relacionadas à impressão

de imagens pela ação da luz, com destaque para a produção de cópias sobre

papel, e a produção de uma imagem latente (calótipo) que, transformada em

negativo, gerava um protótipo passível de reprodução. Essas técnicas não foram

aceitas comercialmente, a princípio, por razões de qualidade técnica da imagem.

O daguerreótipo manteve sua primazia até por volta de 1850, perdendo, a partir

daí, terreno para a fotografia sobre papel que, com o uso de novas técnicas5,

tornou-se capaz de satisfazer à crescente disseminação de consumo imagens.

Com essas técnicas, o tempo de exposição variava entre vinte segundos e um

minuto para as paisagens e motivos arquitetônicos, e entre dois e vinte segundos

para retratos (FABRIS, p. 16).

5 Em 1851 é divulgado o processo do colódio úmido, que permite obter um negativo de qualidade,mais nítido que o calótipo e igualmente reprodutível, e tão nítido quanto a imagem daguerriotípica.

7

Page 20: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Os aperfeiçoamentos nesse processo levaram ao desenvolvimento da película de

rolo de George Eastman e à invenção da câmera fotográfica portátil em 1895.

Fabris (p. 17) identifica três etapas na relação da fotografia com a sociedade: a

primeira estende-se de 1839 aos anos 50, quando o interesse pela fotografia se

restringia a um pequeno número de pessoas, devido ao seu alto custo; um

segundo momento que corresponde à disseminação do cartão de visita

fotográfico – carte de visite photographique – colocando ao alcance de muitos o

que era somente acessível a poucos, graças ao barateamento dos produtos e

pelo modismo, conferindo à fotografia uma dimensão industrial; e a última etapa,

por volta de 1880, que corresponde ao momento da massificação, quando a

fotografia se torna um fenômeno comercial, conquistando vários tipos de mídia.

A massificação da imagem é um processo crescente até hoje, atestado pelo seu

uso cada vez mais diversificado, e pela evolução dos equipamentos – em 1993 é

lançada no mercado a câmera fotográfica digital.

Se no início a fotografia se prestava principalmente para os retratos, aos poucos

ela saiu do círculo familiar, permeando outros espaços e adquirindo usos menos

estéticos – revela-se o poder informativo da imagem fotográfica.

Fabris (p. 23) observa que a fotografia ganha destaque no terreno publicitário, no

campo científico e na documentação em geral. Como instrumento de

propaganda, a fotografia é usada em reportagens militares (Guerra da Criméia e

Guerra Civil norte-americana). Na área judiciária, a suposta fidelidade da

fotografia induz à adoção da fotografia criminal e do fotorretrato; este último

passa a ser uma imposição legal como instrumento de identificação no início do

século XX.

Os fotógrafos, além de retratarem a sociedade e suas realizações, começam a se

interessar pela captação de paisagens exóticas, distantes dos grandes centros

europeus. De acordo com Fabris (p. 29) os primeiros temas dessas fotografias se

concentram nos lugares e símbolos da imaginação: Terra Santa, Egito, pirâmides,

o cenário das Cruzadas, ruínas greco-romanas. A princípio os fotógrafos não

buscavam lugares desconhecidos, mas sim “reconhecer os lugares existentes,

como visões imaginárias, nas fantasias inconscientes das massas”; mais tarde é

8

Page 21: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

que se multiplicaram as expedições fotográficas em busca de novos registros.

Dos registros de monumentos e paisagens com objetivos informativo e

documental, “passa-se à documentação de usos e costumes diferentes dos

ocidentais, de territórios, de caminhos, com um intuito francamente

propagandista, no qual a fotografia torna-se aliada da expansão imperialista”,

como afirma Fabris (p. 32) 6.

O cartão postal ilustrado, surgido por volta de 1875, foi um importante aliado na

difusão da imagem fotográfica em seu momento de massificação, colocando ao

alcance do público um “verdadeiro inventário do mundo”, abrangendo

monumentos, paisagens, usos e costumes, profissões, instantâneos de eventos

importantes, celebridades, imagens picantes etc. (FABRIS, p. 33).

2.2 O referente da imagem

A questão do referente é um fator essencial na compreensão da imagem

fotográfica e conseqüentemente em sua representação. Barthes (p. 121)

considera que a fotografia passou a existir a partir do momento em que uma

circunstância científica (a descoberta da sensibilidade dos sais de prata à luz)

permitiu captar e imprimir os raios luminosos emitidos por um objeto iluminado, e

que a foto é literalmente uma emanação do referente. Um referente com uma

presença constante, mas que não se confunde com a imagem, pois esta não é

igual ao objeto enfocado, porque este foi selecionado – a fotografia expõe uma

imagem determinada pelo ângulo de visão escolhido, pelo enquadramento, pela

redução da tridimensionalidade do objeto a uma imagem bidimensional; isola um

ponto preciso do espaço-tempo e é puramente visual, excluindo qualquer outra

sensação. Uma imagem será uma testemunha da existência do referente, mas

isso não faz supor que ela se pareça com ele.

6 Como exemplos, a autora (p. 32-33) cita a “conquista pacífica” do Oriente Médio, propiciada pelafotografia, que registra pontualmente espaços, cidades e vilarejos vazios, sem nenhuma presençahumana (efeito causado, inicialmente, pelos longos tempos de exposição das primeiras fotografias,e mais tarde propositalmente): as imagens de um mundo vazio serviam de justificativa aos planosexpansionistas europeus; e, em contrapartida, os registros, na China, de cenas de tortura, deexecuções públicas e de consumo de drogas, e fotos de caminhos fluviais, povoações e recursoshumanos e minerais inexplorados: essa visão de uma terra bárbara e atrasada fornecia umargumento de que essa terra mereceria um novo destino.

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Page 22: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Para a análise de uma imagem é importante perceber e compreender que o

referente imagético tem uma dimensão diferente do referente textual (aquele com

o qual os documentalistas têm maior familiaridade). Barthes (p. 114-115) diz que

o referente da fotografia não é o mesmo que o dos outros sistemas de

representação; e ele chama de referente fotográfico, não a coisa facultativamente

real a que remete uma imagem ou um signo, mas a coisa necessariamente real

que foi colocada diante da objetiva, sem a qual não haveria fotografia.

Shatford (p. 45) estabelece um importante ponto de vista em relação à distinção

entre imagem e texto para a representação documentária. Ela observa que, como

tentamos classificar as palavras usadas para descrever os assuntos das imagens,

é relevante tentar determinar e definir algumas diferenças que existem entre

significado em imagens e significado em linguagem, a fim de descobrir alguns

efeitos que estas diferenças poderão ter na análise de assuntos de imagens; e

que a teoria dos significados em linguagem (a teoria referencial) parece

particularmente útil para esclarecer esta diferença entre palavras e imagens. As

palavras têm sentido e referência, e estas duas não mantêm uma correlação:

uma palavra com um sentido pode possuir vários referentes – o sentido de uma

palavra determina o conjunto de seus referentes potenciais. Na fotografia o

processo é o contrário: são os referentes que determinam o sentido da imagem.

Como o sentido de uma palavra pode ser associado a várias imagens, então uma

imagem é associada a diferentes possíveis sentidos. Na análise dos assuntos de

uma imagem tenta-se determinar os possíveis sentidos desses referentes

presentes na imagem. Uma imagem será, quase sempre, um referente para

palavras que descrevem o tema que a imagem representa: “Ponte Hercílio Luz”.

Além disso, uma imagem poderá apontar para um referente genérico, ou mesmo

abstrato: “ponte” ou “arquitetura”.

Ainda sobre a aderência do referente na imagem, Shatford (p. 51) observa que

uma imagem é DE um objeto real de uma maneira que um texto, formado por

palavras, não pode ser; e afirma que embora palavras e imagens possam ser

substituídas por objetos, as palavras são representadas por convenção, enquanto

as imagens são representadas por projeção. As palavras em um texto descrevem

um objeto porque uma convenção determinou a essas palavras certos

10

Page 23: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

significados, enquanto a representatividade da imagem é uma projeção do

próprio objeto.

11

Page 24: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

3 A REPRESENTAÇÃO DOCUMENTÁRIA DA IMAGEM

A Análise Documentária (AD) é definida como “um conjunto de procedimentos

efetuados com o fim de expressar o conteúdo de documentos, sob formas

destinadas a facilitar a recuperação da informação” (CUNHA, p. 40).

Smit (1996, p. 29) esclarece que a “representação da imagem fotográfica não

pode ser pensada a partir de uma transposição automática dos procedimentos de

Análise Documentária desenvolvidos para o texto, por duas razões primordiais: o

estatuto da imagem distingue-a do texto; a utilização da imagem fotográfica não

se baliza unicamente por seu conteúdo informacional, mas também por sua

expressão fotográfica”. Necessidades e técnicas mais recentes apontam diversas

áreas da documentação fotográfica que utilizam alguns atributos intrínsecos da

imagem para a sua representação, tais como a cor, a textura, a forma etc.

A autora sustenta que a análise da imagem fotográfica, por esta possuir estatuto

diverso de um texto, pressupõe uma metodologia que presuma um entendimento

de sua essência, daquilo que a caracteriza, das razões pelas quais é produzida,

e, sobretudo, das condições em que será utilizada (SMIT, 1996, p. 29).

Como a imagem assume um papel cada vez mais importante como meio de

expressão em nossa sociedade, o profissional documentalista deve considerar a

imagem fotográfica como documento, como informação a ser tratada e

recuperada.

Imagens estão presentes no mundo cultural (exposições de fotos, indústria

cinematográfica, identificação e difusão de objetos de museu...); no mundo

científico (visualização de processos, estudos climáticos, medições e localizações

geográficas e arqueológicas, observações e diagnósticos médicos, identificações

legais...); os processos educacionais se apóiam cada vez mais na imagem.

12

Page 25: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Existem arquivos de imagens em instituições públicas, em empresas privadas,

nas universidades, nos museus. Para a organização dessas informações, com o

propósito de torná-las acessíveis aos seus usuários, são necessárias as técnicas

documentárias – no caso a representação da imagem – que vão garantir o

aproveitamento eficaz da informação.

Como ressaltam Moreiro González e Robledano Arillo (p. 14), a representação do

conteúdo informacional das imagens não pode ser executada com uma única

interpretação, um único sentido, uma vez que elas apresentam significação em

diferentes níveis e momentos: a função do documentalista consiste em identificar

e fazer recuperar os documentos e até fragmentos deles, pensando na

multidisciplinaridade das imagens.

3.1 Análise da imagem fotográfica

Philippe Dubois traça um percurso histórico das diversas posições defendidas no

decorrer da história pelos críticos e teóricos da fotografia considerando o princípio

da realidade, que é uma característica bastante marcante da imagem fotográfica.

O autor ajusta a percepção da imagem ao seu uso, utilizando a teoria dos signos

de Charles S. Peirce. De modo geral, esse percurso se articula em três

momentos:

- a fotografia como espelho do real, ou o discurso da mimese;

- a fotografia como transformação do real, ou o discurso do código e da

desconstrução;

- a fotografia como traço do real, ou o discurso do índice e da referência.

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Page 26: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

No primeiro momento, no início do século XIX, era bastante comum a concepção

de que a fotografia era a imitação mais perfeita da realidade. O efeito de

realidade ligado à imagem fotográfica foi a princípio atribuído à semelhança

existente entre a foto e seu referente. Essa capacidade mimética procede de sua

própria natureza técnica, que permite fazer surgir uma imagem segundo as leis

da ótica e da química, sem a intervenção direta de um artista. Nesse período a

imagem se opõe à obra de arte, produto do talento do artista.

Dubois (p. 29-30) ressalta que a fotografia surge como uma técnica, e aponta a

fotografia como um simples instrumento de uma memória documental do real e,

em contrapartida, a arte como criação imaginária. À fotografia cabe a função

documental, utilizada principalmente nos retratos e nas tarefas de caráter

científico.

Pode-se associar esse momento da imagem fotográfica – a fotografia como

reprodução mimética do real – ao conceito peirceano de ícone, a representação

por semelhança.

O final do século XIX apresenta uma reação contra esse iIusionismo do espelho

fotográfico, demonstrando que a imagem fotográfica não é um espelho neutro,

mas um instrumento de transposição, de análise, de interpretação e até de

transformação do real, e portanto, culturalmente codificada. Alguns fotógrafos

contrariaram a tradição da representação do real com o propósito de tornar a

fotografia uma arte, e disso decorreu o que foi chamado de pictorialismo, e

passaram a tratar a foto exatamente como uma pintura, manipulando a imagem

de todas as maneiras.

Como destaca Dubois (p. 37), contra o discurso da mimese e da transparência da

imagem fotográfica, começam a surgir as primeiras idéias sobre a desconstrução

da imagem; e a partir dos anos 1950 encontramos as principais linhas de

pensamento que divulgam esse ponto de vista, como a divulgação de estudos da

psicologia da percepção, de estudos sobre o uso antropológico da fotografia e

pela postura ideológica de algumas publicações da área de cinema. Resulta que

a foto é codificada sob todos os pontos de vista: técnico, cultural, sociológico,

estético etc.

14

Page 27: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

A principal conseqüência da desconstrução dos códigos da imagem fotográfica

reflete na questão do realismo, ocorrendo o deslocamento de sua fundamentação

na realidade para uma fundamentação na própria mensagem – a foto vai se

tornar reveladora da verdade interior.

Essa segunda fase, da fotografia como transformação do real pode ser associada

ao conceito peirciano do símbolo, que é a representação por convenção geral.

Finalmente surge uma nova concepção, que se distingue das duas precedentes

principalmente pelo fato da imagem ser dotada de um valor particular,

determinado por seu referente – um traço de um real (DUBOIS, p. 45). Temos de

volta a questão do realismo, mas agora referencial, sem a obsessão do

analogismo mimético – a imagem torna-se inseparável de sua experiência

referencial, do ato que a cria.

Aqui cabe o conceito peirceano de índice – representação do signo como um

referente – que caracteriza a fotografia como traço de um real. Roland Barthes

enfatiza a questão do referente como elemento de aderência, de presença

constante em uma foto.

Dubois (p. 50) esclarece que Peirce, mais do que se fixar apenas na referência,

no fato que, para que haja foto, é necessário que o objeto mostrado tenha estado

ali num determinado momento do tempo, vai abrir caminho, por meio de suas

considerações sobre o índice, a uma verdadeira análise da condição da imagem

fotográfica. O ponto de partida é a natureza técnica do processo fotográfico, o

traço registrado em uma imagem, que por mais essencial que seja, marca apenas

um momento no conjunto do processo fotográfico – o antes e o depois desse

momento são marcados por gestos culturais, que dependem inteiramente de

escolhas e de decisões humanas (a escolha do sujeito, do tipo de aparelho, da

película, do tempo de exposição, do enquadramento, do ângulo de visão etc.).

Enquanto Philippe Dubois faz a análise da imagem fotográfica apoiada no seu

uso, Schaeffer trabalha essa análise considerando a sua gênese, levando-se em

conta que a imagem fotográfica é sempre constituída da combinação de três

dimensões: o representamen – algo que, sob certo aspecto ou de algum modo,

representa alguma coisa para alguém; o interpretante – signo criado (equivalente

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Page 28: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

ou melhorado) a partir do representamen; e o objeto – é a coisa representada

pelo signo7. Schaeffer monta um quadro considerando essas três dimensões e

associa-as com os conceitos de Temporalidade, Espacialidade, Entidade, Estado

de fato, Índice e Ícone.

OBJETO INTERPRETANTE

Entidades

Estadosde fato

Temporalidade (+)

Espacialidade (-)

Espacialidade (+)

Temporalidade (-)

REPRESENTAMEN

Índice (+)

Ícone (-)

Traço

Protocolo de experiência

Descrição

Testemunho

Ícone (+)

Índice (-)

Recordação

Rememoração

Apresentação

Mostração

Quadro 1 – Estratégias comunicacionais (Fonte: SCHAEFFER, p.66)

A combinação dessas variáveis resulta em oito estratégias comunicacionais:

- Traço [Temporalidade x Entidade x Índice]: é o que institui a imagem no

momento da tomada da impressão, tematizando entidades. Funciona como

procedimento de descoberta ou como procedimento de confirmação

(SCHAEFFER, p. 117).

- Protocolo de experiência [Temporalidade x Estado de fato x Índice]: é

caracterizado como interações entre entidades e funciona como prova no

domínio de categorias das relações espaço-temporais nas quais essas

entidades estão envolvidas (SCHAEFFER, p. 118).

- Descrição [Espacialidade x Entidade x Índice]: aqui a imagem não funciona

como prova ou testemunho da existência de uma entidade, nem como

protocolo de um acontecimento, mas como grafo das modalidades do “estar-

aqui” de um objeto cuja existência é pressuposta (SCHAEFFER, p. 118).

7 Os conceitos de representamen, interpretante e representamen forma obtidos em PEIRCE, p. 94.

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Page 29: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

- Testemunho [Espacialidade x Estado de fato x Índice]: define-se pela inserção

da imagem em uma narração que se diz verídica (SCHAEFFER, p. 125).

- Recordação [Temporalidade x Entidade x Ícone]: funciona como estratégia

reflexiva, isto é, de auto-afeição do receptor – a identificação indicial é, em

geral, garantida por antecipação (SCHAEFFER, p. 120).

- Rememoração [Temporalidade x Estado de fato x Ícone]: essa estratégia vai

além do ato reflexivo da recordação, ela é mais indagadora e menos

melancólica – ela reflete “o que aconteceu” e não “o que se vê”

(SCHAEFFER, p. 120).

- Apresentação [Espacialidade x Entidade x Ícone]: institui a imagem como

manifestação de entidades apreendidas como efeito de conjunto; com as

finalidades de ilustração – funcionando como coadjuvante da mensagem

verbal, e de apresentação autônoma – a imagem propõe-se como

manifestação do objeto em sua plenitude (SCHAEFFER, p. 121-122).

- Mostração [Espacialidade x Estado de fato x Ícone]: estratégia que privilegia o

acontecimento, a ação – ela escolhe um momento decisivo para exprimir o

significado universal de um fato; são imagens impregnadas de elementos

icônicos estereotipados e que provocam impacto (SCHAEFFER, p. 134).

Pensando na diversidade de usos de imagens fotográficas, as estratégias

propostas por Schaeffer para a recepção dessas imagens permitem distinguir os

objetivos que devem caracterizar os acervos fotográficos e orientar a sua

representação documentária de maneira a atender às demandas de seus

usuários.

Ao tratar da adequação das estratégias comunicacionais aos objetivos dos

arquivos fotográficos Smit (1998, p. 16-17) diz que:

­ Traço e Protocolo de experiência: caracterizam os acervos de fotografias

científicas ou arquivos ligados a instituições que usam a fotografia de maneira

extremamente normatizada, como os arquivos médicos, policiais etc.

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Page 30: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

­ Descrição e Testemunho: a maior parte dos acervos armazena imagens tendo

em vista o seu poder de descrição ou testemunho, configurando um dos

objetivos mais freqüentes dos acervos fotográficos institucionais.

­ Recordação e Rememoração: não podem ser incluídos na política de nenhum

arquivo institucional porque pressupõem um receptor particular, mas estão

presentes nos arquivos pessoais.

­ Apresentação e Mostração: a relevância do aspecto icônico da imagem pode

se justificar em alguns acervos ligados a instituições que têm na própria

fotografia o seu eixo de ação (museus ou escolas de fotografia).

Smit (1998, p. 18) enfatiza que “as estratégias da Descrição e do Testemunho

são o objetivo principal da maior parte dos arquivos fotográficos, excetuados os

científicos e os artísticos, e que os procedimentos de análise documentária

propostos referem-se às informações que são estocadas em função de seu

potencial de testemunho, podendo, ou não, apresentar uma dimensão estética ou

terem sido geradas de acordo com normas pré-estabelecidas, caso das imagens

estocadas para documentar o patrimônio histórico e artístico de países ou

instituições”.

Boris Kossoy também aborda a representação da imagem de acordo com a sua

criação. Tendo como preocupação a fotografia como documento histórico, o autor

identifica os componentes estruturais de uma fotografia, isto é, os seus

elementos constitutivos e suas coordenadas de situação: o assunto que é objeto

do registro, a tecnologia que viabiliza tecnicamente esse registro e o fotógrafo,

o autor que, motivado por razões de ordem pessoal e/ou profissional, a idealiza e

elabora por meio de um complexo processo cultural/estético/técnico (a expressão

fotográfica); sendo que tal ação ocorre num lugar definido e numa determinada

época – espaço e tempo (KOSSOY, 2002, p. 25-26). Então:

Assunto + Tecnologia + Fotógrafo = Fotografia elementos constitutivos produto final

Espaço e Tempo coordenadas de situação

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Page 31: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

A imagem fotográfica contém o registro de um dado fragmentado e selecionado

do real – o assunto (recorte espacial) congelado no determinado momento de sua

ocorrência (interrupção temporal). Sob esse aspecto, Kossoy (2002, p. 29) nos

diz que essa relação fragmentação/congelamento é um dos alicerces sobre o

qual se ergue o sistema de representação fotográfica. É evidente que essa

relação pode ser manipulada pelo fotógrafo, no ato da tomada da foto, em função

de sua experiência pessoal e amparado nos recursos tecnológicos.

Ao referir-se à representação da imagem como documento, Kossoy (2002, p. 31)

observa que a fotografia é considerada, antes de mais nada, como uma

representação a partir do real; mas que em função da materialidade do registro,

no qual se tem gravado o vestígio de algo que se passou na realidade concreta,

em dado espaço e tempo, é tomada, também, como um documento do real. Esse

pensamento corrobora o conceito de fotografia-índice de Dubois e da aderência

do referente à imagem.

Kossoy (2002, p. 36-38) apresenta os conceitos de primeira e segunda realidades

para a compreensão do documento fotográfico e sua representação. A primeirarealidade é o próprio passado, é a realidade do assunto e diz respeito à história

particular desse assunto, independentemente de seu contexto no momento do

seu registro e também de sua representação. A imagem fotográfica é, por um

único momento, parte da primeira realidade: é o instante em que ela é gerada – o

momento em que o referente “adere” à imagem, é o índice fotográfico.

A segunda realidade é a realidade do assunto representado, contido nos limites

bidimensionais da imagem fotográfica, selecionado no espaço e no tempo - é a

realidade fotográfica do documento. Para o autor, esse assunto representado

configura o conteúdo explícito da imagem fotográfica.

A fotografia envolve uma transposição de realidades: da realidade visual do

assunto selecionado em um contexto (primeira realidade), para a realidade da

representação (imagem fotográfica: segunda realidade). A realidade da fotografia

encontra-se nas diversas interpretações, nas diferentes “leituras” que cada

receptor fará em um dado momento.

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Page 32: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

3.2 A imagem fotográfica como documento

A imagem fotográfica possui uma natureza polissêmica, permitindo sempre uma

leitura plural, que depende de quem a examina. Um receptor já tem suas próprias

imagens mentais preconcebidas sobre determinados assuntos (os referentes),

que vão funcionar como filtros ideológicos, culturais, morais ou éticos na leitura

de uma determinada imagem.

Representar uma imagem com finalidades documentais é trabalho bastante

complexo e requer um tratamento específico, bastante diferenciado do tratamento

documentário de um texto. Deve-se levar em conta as inúmeras possibilidades de

sua utilização pelos mais diferentes tipos de usuários, pois uma mesma imagem

pode ser usada em diferentes contextos e por diferentes tipos de usuários.

Smit (1996, p. 29-30) conclui que o conceito da fotografia-índice é promissor

para a documentação, determinando os parâmetros do tratamento documentário

da imagem fotográfica e sua representação, pelas seguintes razões:

­ preserva a polissemia da imagem, rejeitando-a com símbolo. Uma

interpretação única acarretaria o direcionamento ou determinaria a sua leitura,

limitando a sua utilização;

­ afirma a existência de um documento, com o referente presente, mas que

não se confunde com este, como o proposto pelo conceito da imagem-ícone.

O conceito de fotografia-índice permite isolar o referente (o objeto fotografado),

mas sem desprezá-lo, e também perceber que a imagem gerada representa este

objeto, mas sem se confundir com ele – a imagem fotográfica pode ser entendida

como um documento que representa “algo”. A presença do referente e a clareza

sobre a relatividade cultural de sua leitura e, de sua utilização pelo usuário final,

são os parâmetros básicos que devem conduzir o trabalho documentário com a

imagem (SMIT, 1996, p. 30).

A fotografia abrange, de maneira geral, o registro fotográfico de temas de

qualquer natureza captados do real. Vale lembrar que toda imagem é uma

emanação de um referente, e mesmo que a imagem nos mostre uma abstração,

20

Page 33: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

sabe-se que, de alguma forma, essa representação partiu de algo real. Em tese

todas as imagens se prestam à documentação, tanto a fotografia representativa,

quanto a fotografia autoral ou abstrata.

De maneira geral, no momento da tomada de uma imagem existe um propósito

específico no registro de algum assunto ou alguma finalidade determinada, e em

função disso surgiu o hábito de se separar ou dividir a fotodocumentação por

classes ou categorias de documentos (KOSSOY, 2002, p. 51). Essas

classificações, segundo o autor, são de pouca utilidade porque as imagens

permitem leituras sob diferentes abordagens, de acordo com a formação ou

interesse pessoal dos diferentes usuários. Uma única imagem reúne uma série

de elementos icônicos que fornecem informações para diferentes áreas do

conhecimento: a fotografia sempre propicia análises e interpretações múltiplas e

multidisciplinares.

O profissional da informação também deve estar atento às imagens que

passaram por um processo de pós-produção, ou seja, aquelas cuja produção não

se finaliza com a concretização da imagem pelo processo de criação do fotógrafo.

É muito comum que as imagens, principalmente as que serão veiculadas pelos

meios de comunicação, sofram algum processo de editoração – é o que se

denomina pós-produção, isto é, quando a imagem é objeto de uma série de

alterações. Dentre tantas manipulações nas imagens, podemos citar como

exemplo a alteração de forma (os “cortes” em seu formato original); a alteração

na coloração; alteração de seus significados em função do título, legenda ou

textos que a acompanham. O problema se agrava com a digitalização e a

utilização de softwares, aumentando a facilidade de maquiar imagens, tais como

retoques, aumento e diminuição de contrastes, eliminação ou introdução de

elementos, alteração de tonalidades, aplicação de texturas entre tantos outros

artifícios. É necessário ter cautela com a imagem utilizada em veículos de

informação, pois esta é sempre objeto de algum tipo de tratamento com a

intenção de direcionar a leitura dos receptores – tudo que o documentalista deve

evitar. Essa cautela deve ser direcionada para o tratamento que implica algum

tipo de mudança de contexto na imagem, principalmente o ideológico; é claro que

a maquiagem que não altera substancialmente o sentido da imagem, não deve

ser considerada.

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Page 34: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Desenvolver um método de indexação para imagens requer a identificação das

características que podem ser usadas para descrever uma imagem e que

satisfaçam as necessidades dos usuários. Para a representação das imagens, a

literatura da área apresenta atualmente duas técnicas de indexação: a indexação

baseada nos conceitos da imagem, e a indexação baseada no conteúdo da

imagem.

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Page 35: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

4 INDEXAÇÃO POR CONCEITO

Existe uma crescente necessidade de gerenciar e recuperar imagens em várias

áreas e instituições: científica, industrial, militar, bibliotecas, museus, hospitais

etc. Uma das características desejáveis para o usuário, é identificar em uma

coleção – por meio de pesquisa pelo seu conteúdo informacional – aquela

imagem específica que corresponda ao pretendido: descrever uma imagem é

fundamental para o sucesso de sua recuperação.

Na indexação por conceito a decisão na escolha dos conceitos e do nível de

análise pelos quais uma imagem será indexada é atribuição do profissional

documentalista ou de uma política de indexação do acervo. Esse tipo de

indexação tem sido basicamente uma função humana (documentalista) porque,

exceto em domínios muito específicos, tem sido difícil consegui-lo

automaticamente.

4.1 Níveis de análise

A análise da imagem fotográfica demanda procedimentos específicos, não

podendo ser praticada nela o mesmo tratamento dado aos documentos textuais.

A presença do referente na fotografia é um fator essencial na sua compreensão e

conseqüentemente em sua representação. Considerando o caráter específico da

fotografia, Erwin Panofsky8 desenvolveu uma metodologia para o seu estudo, e

estabeleceu três níveis para a análise das imagens, com a finalidade de

descrever a informação iconográfica:

8 Citado em Rasmussen (p. 173); Shatford (p. 43); Smit (1996, p. 30; 1998, p. 28).

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Page 36: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

­ Nível pré-iconográfico: descrição dos objetos e das ações que estão

representados na imagem, baseada em conhecimento que permite

reconhecer esses objetos e ações.

­ Nível iconográfico: envolve uma interpretação dos objetos e ações presentes

na imagem, e é baseada no conhecimento adquirido da familiaridade com os

hábitos e tradições culturais.

­ Nível iconológico: implica o esclarecimento do significado intrínseco do

conteúdo da imagem, ou os seus valores simbólicos.

Kossoy (2002, p. 57-60) sugere que a fotografia esconde dentro de si uma trama,

um mistério, e propõe uma investigação da imagem (seja enquanto documento

para investigação histórica, objeto de recordação ou elemento de ficção)

sustentada pela análise e interpretação: a análise iconográfica e a interpretação

iconológica.

Na análise iconográfica, o autor aponta duas linhas de análise multidisciplinares

para a decodificação de informações explícitas e implícitas no documento

fotográfico:

­ a reconstituição do processo que originou a fotografia, determinando-se assim

seus elementos constitutivos – assunto, fotógrafo, tecnologia, lugar e época.

­ um inventário de informações codificadas na imagem fotográfica, ou seja, os

detalhes icônicos que a compõem.

Essas informações revelam dados que dizem respeito à sua concretização

documental e aos detalhes icônicos nele gravados e buscam decodificar a

realidade exterior da representação fotográfica, a sua face visível, o que o autor

chama de segunda realidade do documento.

Para a interpretação iconológica, lembrando que o documento fotográfico é

uma representação a partir do real, o registro de um aspecto selecionado do real,

com um referente organizado cultural, técnica e esteticamente, o autor sugere

dois caminhos básicos para a compreensão:

24

Page 37: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

­ o resgate da história do próprio assunto, seja no momento em que foi

registrado ou independentemente da mesma representação.

­ interpretar o processo de criação que resultou na imagem.

A interpretação iconológica busca decifrar a realidade interior da representação

fotográfica, seu significado, a sua primeira realidade, além da verdade

iconográfica.

No contexto da documentação, considerando que a realidade da fotografia

encontra-se em múltiplas interpretações decorrentes da presença de um

referente, devemos pensar a questão da interpretação dessas imagens para fins

de tratamento e recuperação da informação. Para Smit (1996, p. 31) a análise

iconológica não seria pertinente ao universo documentário, porque seu objetivo

se encontra fora da imagem.

Moreiro González e Robledano Arillo (p. 14-15) propõem, para a análise

documentária de conteúdo informacional de imagens três níveis de análise:

Identificadora, Descritiva e Interpretativa.

Função Nível e Categoria Descrição Exemplos

Identificadora Biográfico Informações sobre a imagemcomo documento

Autor, data de criação,tamanho, cor, título, técnica

empregada, local...

Conteúdo estrutural Objetos significativos e suarelação física na imagem

Tipos de objetos, composição,posição e tamanhos relativos...

Descritiva Conteúdo deconjunto

Classificação genérica daimagem

Tipo de imagem: retrato,paisagem, documentário...

Precisão dos objetos Identificação de cada objeto Nome próprio e detalhe de cadapessoa e de cada objeto

Interpretativa Interpretação daimagem em conjunto

Disposição do conjunto Palavra ou frase que resume aimagem: feliz, horrível...

Interpretação dosobjetos

Disposição dos objetosindividuais

Alguém triunfante, alguémderrotado...

Quadro 2 – Níveis de análise de imagens

(Fonte: MOREIRO GONZÁLEZ e ROBLEDANO ARILLO, p.15)

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Page 38: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Para o tratamento da fotografia, Moreiro González e Robledano Arillo (p. 47-55)

propõem a descrição e a interpretação da imagem: “a leitura do que se vê” e “a

leitura do que se interpreta”.

A descrição (a leitura do que se vê) é a representação das características

temáticas da imagem, traduzindo os significados das coisas e representando-as

pela sua aparência. Os autores especificam três níveis de significação: o que é

evidente (descrição pré-iconográfica); o que é contextual (análise iconográfica) e

o que é intrínseca e simbolicamente explicativo (interpretação iconográfica) – que

correspondem, basicamente, aos dois primeiros níveis enunciados por Panofsky

(pré-iconográfico e iconográfico).

Para a interpretação (a leitura do que se interpreta) os autores destacam a

influência do referencial pessoal do documentalista, que pode associar ao

símbolo icônico um significado distante da relação código-mensagem; e

observam que essa intervenção pessoal deve ser evitada quando da análise de

documentos científicos, mas estimulada e condicionada nas aplicações

informativas e especialmente nas publicitárias.

Imagens de diferentes tipos ou de diferentes áreas têm suas próprias

características, que são diferentes uma das outras. Shatford Layne (p. 583-585)

afirma que essas características podem ser categorizadas e generalizadas; e que

é útil pensar nestas características (atributos), usadas para proporcionar o acesso

a essas imagens, no contexto de quatro categorias: atributos biográficos9 – que

compreendem a autoria, a data e o local de produção da imagem, o título (dado

pelo autor ou atribuído pela instituição); atributos temáticos – classificáveis em

quatro facetas: tempo, espaço, atividades/eventos e objetos; atributos ilustrativos

– que envolvem a forma física da imagem; e atributos de relacionamentos – que

envolvem as ligações lógicas com outras imagens ou textos.

Para a análise de uma imagem, Sara Shatford (p. 42) também se apropria da

teoria de Panofsky e, partindo da distinção de que o nível pré-iconográfico é

composto pela conjunção de um significado factual com um significado

expressivo (PANOFSKY, citado por SMIT, 1996, p. 31), estabelece os

correspondentes “a imagem é de que?” – DE e “a imagem é sobre o que?” –9 São atributos objetivos e para algumas imagens são desconhecidos ou sem importância.

26

Page 39: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

SOBRE, isto é, seus significados objetivo e subjetivo. Shatford (p. 47) afirma

também, que a imagem é, ao mesmo tempo, genérica e específica; e que,

idealmente, toda imagem deveria ser representada, tanto ao nível pré-

iconográfico (genérico) quanto iconográfico (específico), uma vez que o usuário

poderá procurá-la, considerando qualquer um desses aspectos. Para Shatford (p.

45), nos dois primeiros níveis de análise propostos por Panofsky, é possível

descrever a imagem distinguindo os dois aspectos: DE e SOBRE. No nível pré-

iconográfico o ponto de vista DE é a descrição genérica dos objetos e eventos; e

o SOBRE é a descrição do “espírito predominante” de uma imagem. No nível

iconográfico o DE corresponde aos nomes específicos das pessoas, lugares,

objetos e ações e eventos; enquanto que o SOBRE é uma identificação de seres

míticos sem realidade concreta comprovada, de significados simbólicos e de

conceitos abstratos. Os termos DE descrevem pessoas, locais, objetos, situações

e ações que têm manifestação física; enquanto os termos SOBRE compreendem

aqueles que descrevem emoções (amor, tristeza) e conceitos/idéias (verdade,

honra).

4.2 Categorias de descrição da imagem

Como informa Smit (1996, p. 32), as categorias para descrição de imagens –

QUEM, ONDE, QUANDO, COMO/O QUE – são amplamente utilizadas como

parâmetros para análises de textos, inclusive a documentária; e já foram usadas

por Ginette Bléry no desenvolvimento de uma proposta de representação do

conteúdo de imagens, apresentada no quadro abaixo.

Categorias Representação do conteúdo das imagens

QUEM Identificação do objeto: seres vivos, artefatos, construções, acidentes naturais etc.

ONDE Localização da imagem no “espaço”: espaço geográfico ou espaço da imagem.

QUANDO Localização da imagem no “tempo”: tempo cronológico ou momento da imagem

COMO/O QUE Descrição de atitudes ou detalhes relacionados ao objeto, quando este é um ser vivo.

Quadro 3 – Categorias de descrição de imagens (Fonte: SMIT, 1996, p.32)

Fundamentada na teoria de Panofsky, Shatford (p. 48-54) propõe um método de

indexação para a descrição de imagens. As diferentes categorias para a

indexação dos assuntos respondem às questões QUEM?, ONDE?, QUANDO?,

27

Page 40: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

COMO/O QUE? Cada uma dessas categorias é subdividida segundo os pontos

de vista do DE genérico, DE específico e SOBRE, e analisados das categorias. É

interessante reproduzir o quadro-resumo elaborado por Smit que exemplifica esta

proposta.

Categoria Definição geral DE genérico DE específico SOBRE

QUEM Animado e inanimado,

objetos e seres

concretos

Esta imagem é de

quem? De que seres?

De quem,

especificamente se

trata?

Os seres ou objetos

funcionam como símbolos

de outros seres ou

objetos? Representam a

manifestação de uma

abstração?

Exemplo Ponte Ponte das Bandeiras Urbanização

ONDE Onde está a imagem no

espaço?

Tipos de lugares

geográficos,

arquitetônicos ou

cosmográficos

Nomes de lugares

geográficos,

arquitetônicos ou

cosmográficos

O lugar simboliza um

lugar diferente ou mítico?

O lugar representa a

manifestação de um

pensamento abstrato?

Exemplo Selva Amazonas Paraíso (supõe um

contexto que permita esta

interpretação)

Exemplo Perfil de cidade Paris Monte Olimpo (como o

exemplo anterior)

QUANDO Tempo linear ou cíclico,

datas e períodos

específicos, tempos

recorrentes

Tempo cíclico Tempo linear Raramente utilizado.

Representa o tempo a

manifestação de uma

idéia abstrata ou símbolo?

Exemplo Primavera 1996 Esperança, fertilidade,

juventude

O QUE O que os objetos e

seres estão fazendo?

Ações, eventos,

emoções

Ações, eventos Eventos

individualmente

nomeados

Que idéias abstratas (ou

emoções) estas ações

podem simbolizar?

Exemplo Morte Pietá Dor (emoção)

Exemplo Jogo de futebol (ação) Copa do Mundo

1994

Esporte

Quadro 4 – Método de indexação de imagens (Fonte: SMIT, 1996, p. 33)

28

Page 41: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Convém observar que nem sempre é possível identificar, em uma imagem, todas

as categorias propostas. Smit (1996, p. 33) informa que a determinação do

SOBRE nem sempre pode ser garantida pelas informações contidas no DE

genérico e/ou específico, mas pode ser produzida pela combinação de elementos

distintos.

4.3 A organização da descrição da imagem

A interpretação da imagem, na indexação por conceitos, pode ser feita em vários

níveis de análise, e para a descrição dessa imagem dispomos de várias

categorias. A descrição dos assuntos deve ser organizada para que as imagens

possam ser recuperadas de maneira simples, segura e eficaz pelos usuários.

Atualmente, a grande maioria dos sistemas que comportam a representação

documentária de imagens baseadas em seus conceitos já é automatizada,

agilizando os processos do tratamento técnico e de busca.

Serão mostradas, a seguir, as maneiras como essa imagem poderão ser

representadas10, lembrando que a escolha da forma de representação deverá ser

feita em função da coleção de imagens e do tipo de usuário desse acervo. O

essencial é o estabelecimento de acesso aos documentos, objetivando sua

recuperação.

Indexar imagens pela atribuição textual de termos é um processo que pode ser

efetuado tanto pelo uso da linguagem natural (título, legenda ou texto) como pelo

auxílio de um vocabulário controlado (tesauro ou sistema classificatório). É

comum o uso combinado desses dois sistemas, com a finalidade de manter a

consistência do acervo no momento da recuperação da informação, pelo uso de

um vocabulário controlado, e também de usar a linguagem natural, para numa

busca, recuperar imagens por critérios ou termos não previstos pelo sistema de

classificação. Por esta razão, por exemplo, costuma-se incluir a legenda na

descrição da imagem.

4.3.1 Vocabulário controlado10 O assunto será tratado de maneira superficial porque, embora importante no contexto daindexação por conceito, não é o objeto de discussão do trabalho.

29

Page 42: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Sabe-se que a dificuldade de indexar os conteúdos das imagens deve-se à

grande quantidade de informações que elas podem conter, e ao alto nível de

abstração e de subjetividade de seus componentes. Um outro fator importante

que deve ser considerado é a mudança de linguagem ao se fazer a indexação

baseada nos conceitos presentes na imagem – da linguagem visual para a

linguagem textual.

Assim como nos documentos textuais, nos documentos iconográficos é mais

conveniente fazer a representação de seus conteúdos informacionais com o

estabelecimento e o uso de linguagens controladas, proporcionando assim maior

consistência nos dados armazenados e conseqüentemente uma recuperação

mais eficaz.

Um vocabulário controlado é mais que uma simples lista de termos, pois

apresenta uma estrutura com controle de sinônimos, distinção de homógrafos, e

conexões entre termos hierárquicos e associativos. Existem diversos tipos de

vocabulários e com diferentes graus de hierarquização dos termos.

De acordo com Graham (2001, p. 23-24), são três os principais tipos de

vocabulário controlado: listas de cabeçalhos de assuntos, tesauros e sistemas de

classificação. A maioria das bibliotecas e arquivos utiliza sistemas desenvolvidos

por eles mesmos para a descrição do conteúdo informacional das imagens.

Encontramos na bibliografia11 vários exemplos de Vocabulários Controlados

desenvolvidos para o uso em coleções específicas, que embora não resolvam

satisfatoriamente o problema de indexação para a grande maioria das coleções

por terem sido concebidos para as áreas de história da arte e arquitetura, são de

grande utilidade para a consulta e referência na indexação de imagens:

­ ICONCLASS: sistema de classificação para a área de artes, organizado pela

University of Leiden. Possui mais de 28.000 definições de objetos, pessoas,

eventos, situações e idéias abstratas para a indexação iconográfica.

Disponível on-line: <http://www.iconclass.nl/>.

11 Enser (1995, p. 149-150); Chen e Rasmussen (p. 296); Graham (2001, p. 23); Moreiro Gonzáleze Robledano Arillo (p. 78-81); Rasmussen (p. 180). Os endereços dos vocabulários disponíveis nainternet foram acessados em 02.01.2005. O ICONCLASS não está disponível na integra,mas épossível visualizar partes do vocabulário.

30

Page 43: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

­ TGM1 (Thesaurus for Graphic Materials - Subject Terms): elaborado pela

Prints & Photographs Division of the Library of Congress, é derivado da

Library of Congress Subject Headings, não oferecendo arranjos facetado e

hierárquico. Foi construído como fonte de termos para a indexação de

materiais gráficos (pintura, fotografia, desenhos, caricaturas, cartazes e

desenhos arquitetônicos); sendo, portanto, destinado a um público

interessado em coleções gerais de imagens. Disponível on-line:

<http://www.loc.gov/rr/print/tgm1>.

­ TGM2 (Thesaurus for Graphic Materials - Genre and Physical Characteristic

Terms): também elaborado pela Library of Congress, com as mesmas

propostas de utilização. Disponível on-line: <http://www.loc.gov/rr/print/tgm2>.

­ AAT - Art & Architecture Thesaurus: tesauro mantido pelo Getty Research

Institute12, que contém aproximadamente 125.000 termos sobre arte e

arquitetura. É indicado para um público de pesquisadores especializados em

arte e arquitetura. Disponível on-line:

<http://www.getty.edu/research/conducting_research/vocabularies/aat/>

­ TGN - Thesaurus Of Geographic Names: tesauro também mantido pelo

Instituto Getty que oferece uma classificação hierárquica de cerca de 900.000

identificadores geográficos de todo o mundo. Disponível on-line:

<http://www.getty.edu/research/conducting_research/vocabularies/tgn/>

­ ULAN - Union List of Artist Names: mais um tesauro mantido pelo Getty, que

contém nomes de criadores artísticos de todos os tempos e países. Disponível

on-line:

<http://www.getty.edu/research/conducting_research/vocabularies/ulan/>.

­ Gibbs-Smith: sistema de classificação hierárquico baseado em apenas quatro

grandes categorias - Retrato, Topográfico, Contemporâneo e Histórico. Inclui

objetos e atividades iconográficos; e foi desenvolvido para atender os

pesquisadores dos periódicos do Grupo Hulton. 12 Segundo Moreiro González e Robledano Arillo (p. 78) o Instituto Getty é a organização que maistem trabalhado, recentemente, na questão das linguagens controladas destinadas à indexação dedocumentos artísticos e culturais.

31

Page 44: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

­ MDA Archaeological objects thesaurus: desenvolvido pelo Museum

Documentation Association (MDA), English Heritage e a Royal Commission on

the Historical Monuments of England.

­ Thésaurus du Service des Archives Photographiques (Ministério Francês de

Cultura): empregado para indexar os monumentos arquitetônicos, as

esculturas, as pinturas e outros objetos artísticos do patrimônio francês.

­ Thèsaurus d’ICONOS: desenvolvido pelo serviço Iconográfico de

Documentação da França, engloba os aspectos relativos à vida política,

cultural, científica e social.

­ RAMEAU: listagem de cabeçalhos de assuntos (gerada da lista da Biblioteca

Nacional da França) que permite indexar todo tipo de imagem; inclui

identificadores de pessoas, lugares e datas.

4.3.2 Linguagem natural

A representação dos conceitos de uma imagem pode também ser feita pelo uso

da linguagem natural. A diferença essencial entre a indexação em linguagem

natural e por vocabulário controlado é que no primeiro caso não existe controle

dos termos na entrada dos dados. Por essa razão a proposta é defendida por

aqueles que sustentam que os assuntos das imagens não se comportam de

acordo com nenhuma estrutura imposta, e que o vocabulário para descrever

esses assuntos não pode ser pré-fixado. Uma deficiência no uso da linguagem é

que existem diferenças significativas (mesmo em áreas altamente especializadas)

entre a linguagem de descrição do profissional e a da pessoa que procura pela

informação.

A indexação em linguagem natural pode ser feita pela utilização de um título, de

legenda, pela escolha de palavras-chave ou por texto livre:

­ Título: de maneira geral, as coleções de material visual são indexadas em um

nível superficial; e muito freqüentemente, em especial no caso de coleções de

32

Page 45: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

slides, os títulos fornecem o único identificador do conteúdo informacional

(ENSER, 1995, p. 152).

­ Legenda: pequeno texto, geralmente descritivo ou explicativo, que acompanha

a imagem; são provavelmente, de acordo com Rasmussen (p. 181), as formas

mais comuns de descrição de imagens, mas oferecem um resumo de

qualidade muito variável e transmitem, mais do que em qualquer outro tipo de

indexação, a interpretação particular do conteúdo informacional da imagem ou

do contexto na qual a imagem foi produzida ou utilizada. Vários tipos de

coleções podem adotar as legendas para representar suas imagens, como os

arquivos de imprensa.

­ Palavras-chave: uma alternativa em relação às estruturas rígidas de um

vocabulário controlado é o uso de palavras-chave, ou seja, de palavras que

descrevem o assunto de uma imagem, mas não contemplam o controle dos

termos. Por variadas razões, é cada vez mais freqüente as instituições

desenvolverem listas de palavras-chave para a indexação de suas coleções

voltadas para seus interesses e de seus usuários.

­ Descrição por texto livre: a ampliação na capacidade de armazenamento dos

computadores e sua alta velocidade de processamento comportam o

armazenamento de grande quantidade de texto para a descrição e

representação iconográfica; e esse texto pode fornecer informações de

grande utilidade na consulta e recuperação da imagem. De acordo com

Rasmussen (p. 180), muitos autores recomendam o uso do texto livre em

detrimento da indexação por termos de um vocabulário controlado, embora a

descrição pelo texto livre possa apresentar problemas de recuperação em

função da complexidade e ambigüidade da linguagem.

33

Page 46: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

5 A EXPRESSÃO FOTOGRÁFICA

O capítulo anterior tratou da representação da imagem pela adoção de termos

que simbolizam seu conteúdo informacional. Serão apresentados agora

elementos que os particularizam e podem até introduzir alguns conceitos novos

para a imagem – são os elementos de expressão fotográfica.

5.1 A expressão fotográfica como elemento de especificidade de umaimagem

Além dos documentos fotográficos apresentarem um conteúdo informacional, ou

seja, “alguma coisa” que foi fotografada e que aparece na imagem, esse “alguma

coisa” foi fotografado de uma determinada maneira – a linguagem utilizada pelos

fotógrafos para registrar e representar um objeto – que Smit (1997, p. 3) chama

de expressão fotográfica13.

Ginette Bléry (citada por SMIT, 1996, p. 32) já havia sugerido, em sua proposta

de representação do conteúdo de imagens, uma outra acepção para a categoria

COMO (descrição de atitudes ou detalhes), relacionando-a às técnicas

empregadas para gerar a fotografia.

Smit (1996, p. 34; 1997, p. 9-11; 1998, p. 43-49) recomenda a justaposição da

expressão fotográfica ao conteúdo informacional da imagem para melhorar a sua

representação documentária e otimizar a sua recuperação. Moreiro González e

Robledano Arillo (p. 27) observam que a representação textual da expressão

fotográfica é útil para melhorar a precisão na recuperação de imagens.

13 Também encontrado na literatura com os nomes de “Forma fotográfica” e “Código técnicofotográfico”.

34

Page 47: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Jörgensen (1996) realizou, em 1995, um estudo do uso de imagens no qual um

grupo de 82 usuários descreveu os atributos que eles reconheciam em imagens

com diferentes contextos. Análises estatísticas desses dados resultaram em doze

classes conceituais de atributos da imagem e uma dessas classes corresponde

ao uso da expressão fotográfica, com 7,2% de ocorrência. Essa mesma pesquisa

foi refeita com um grupo de 48 usuários, e suas descrições classificadas segundo

as doze classes da primeira pesquisa; a ocorrência de atributos de expressão

fotográfica correspondeu agora a 3,8%.

Em Jörgensen (1999) são utilizadas essas mesmas doze classes conceituais de

atributos da imagem para a análise de ocorrência dos termos referentes a essas

classes nos Thesaurus for Graphic Materials I: Subject Terms (TGM I), Art &

Architecture Thesaurus (AAT) e Thesaurus Iconographique: System Descriptif de

Representations (TI). Em todos esses sistemas de classificação foram

encontrados termos relacionados aos elementos de expressão fotográfica.

Outros estudos encontrados no levantamento bibliográfico (ARMITAGE e

ENSER; ENSER, 1995; GRAHAM, 1999; GREISDORF e O’CONNOR),

preocupados com o uso das imagens e as formas de busca (pessoas, objetos,

locais, ações, conceitos abstratos etc) não abordam, especificamente, a

expressão fotográfica, mas relacionam conceitos abstratos bastante procurados –

como poder, orgulho, solidão – que podem ser obtidas pelo uso de alguns tipos

de técnica fotográficas, como será explicado adiante.

Além do encontrado na literatura, pode-se verificar a importância do uso dos

elementos de expressão fotográfica na prática da busca de imagens. Diversos

bancos de imagens disponíveis na internet14 apresentam pelo menos algum tipo

de recurso de expressão fotográfica para o refinamento da busca, na interface de

pesquisa ou como termos indexados. Os recursos mais recorrentes são a

Orientação (horizontal ou vertical), Cor (preto e branco ou colorida), o

Enquadramento (close, plano geral etc.), Ponto de vista (baixo ou alto) e Efeitos

especiais.

14 Foram examinados grande parte dos bancos de imagens citados nos endereços a seguir:<http://www.sobresites.com/design/imagens.htm> e <http://www.portaldafoto.com.br/bancos.html>.

35

Page 48: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Oliveira (p. 17) aponta dois exemplos que confirmam a utilidade da expressão

fotográfica para usuários de imagens. Um deles foi uma pesquisa para a

construção de um vocabulário controlado para a indexação de mais de 100.000

imagens da agência de imagens Stock Photos Produções, que analisou formas

de busca de imagens solicitadas por usuários; o resultado apontou uma grande

procura de imagens com a solicitação da forma expressiva, ou seja, close,

panorâmica, vista submarina, luz noturna, entre outros recursos. O outro exemplo

foi a realização da Oficina de Tratamento da Informação Iconográfica, em junho

de 2000, com o objetivo de criar descritores que representassem o conteúdo de

um grupo de imagens. Também foram apontados alguns elementos de expressão

fotográfica importantes e significativos para a indexação de imagens, e tais

recursos foram considerados, pelos participantes, como características

específicas do documento iconográfico.

Para demonstrar o impacto do uso dos elementos de expressão fotográfica na

indexação da imagem no momento de sua recuperação simulamos a

necessidade de uma imagem específica: uma árvore vista de baixo. A pesquisa

ÁRVORE + CÂMERA BAIXA foi feita em três grandes bancos de imagens que

trabalham com vários recursos relacionados à expressão fotográfica: Stock

Photos, Tonystone e Corbis15. Obteve-se o seguinte resultado, respectivamente:

607, 341 e 638 registros. Caso não fosse utilizado o ponto de vista na indexação

das imagens teríamos o seguinte resultado: 8.887, 4.013 e 1.000 registros16.

É importante ressaltar que a expressão fotográfica está presente na linguagem

das imagens, e que deve ser incorporada, sistematicamente, ao processo da

análise documentária com a finalidade de auxiliar a recuperação da informação

iconográfica.

No âmbito documental, de acordo com Smit (1996, p.34), a imagem fotográfica é

constituída pelo conteúdo informacional e sua expressão fotográfica, contidas em

um suporte.

A expressão fotográfica é um elemento que auxilia na descrição do conteúdo

informacional da imagem – na indexação por conceito – e que vai outorgar a essa15 <http://www.stockphotos.com.br/>, <http://www.tonystone.com/> e <http://www.corbis.com/>.16 O banco de imagens Corbis apresenta no máximo 1.000 registros recuperados para a busca.

36

Page 49: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

descrição uma especificidade enquanto informação. Um mesmo objeto pode ser

mostrado de diferentes maneiras; teremos para esse objeto o mesmo conteúdo

informacional, mas a expressão fotográfica usada no momento da tomada da

imagem – a forma adotada para expressar o que se quer transmitir pela imagem

– vai conferir a cada uma das imagens um caráter específico que será decisivo

para o usuário no momento da busca. Essa especificidade funciona como um

filtro de busca – o usuário pode querer uma imagem na qual a expressão

fotográfica seja um elemento presente, ou pode querer um determinado tipo de

imagem, mas sem um determinado elemento de expressão fotográfica. O registro

de uma mulher em primeiro plano e em cores (Foto 1) não é o mesmo que um

registro em plano geral e em preto e branco (Foto 2). O usuário pode querer a

foto de um rosto de mulher, em preto e branco, que apresente a fisionomia do

modelo (Foto 3), excluindo todas as imagens em alto-contraste (Foto 4).

Foto 1 Foto 2

Foto 3 Foto 4

A expressão fotográfica poderá, em alguns casos, resultar num efeito visual que

será passível de ser interpretado como um conceito abstrato. Iluminar uma

37

Page 50: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

pessoa em primeiro plano de formas diferentes poderá fazer com que o retratado

assuma diferentes aspectos. Por exemplo, as fotos 5, 6 e 7 são da mesma

pessoa, o ator Christopher Lee, enquadrado em primeiro plano, mas com

diferentes tipos de iluminação. Na foto 5 foi usada uma iluminação frontal e

difusa, sem contrastes intensos e que suaviza o modelo; aqui dificilmente

poderíamos atribuir algum conceito abstrato marcante. Na foto 6 usou-se uma

iluminação direcionada aos olhos; aqui sim poderíamos, mais facilmente, atribuir

à imagem conceitos como homem pensativo, homem misterioso ou homem triste.

Na foto 7 foi usada iluminação dura, provavelmente uma única fonte de luz, de

baixo para cima, proporcionando contraste de luz e sombra e causando grande

efeito dramático na imagem; aqui os efeitos são mais extremos porque essa

iluminação altera substancialmente o rosto do modelo. Neste caso podem ser

atribuídos os conceitos como medo, ameaça, homem assustador ou mesmo o

contrário: homem assustado. A um mesmo conteúdo informacional (a pessoa)

podemos associar os vários conceitos citados.

Foto 5 Foto 6 Foto 7

A expressão fotográfica, para a representação da imagem, é o resultado das

técnicas utilizadas pelo fotógrafo durante a tomada da imagem ou durante o

processo de revelação e cópia, retoque digital ou mecânico, conforme o caso,

que produzirão os resultados gráficos da imagem considerados mais relevantes

para sua recuperação (MOREIRO GONZÁLEZ e ROBLEDANO ARILLO, p. 25-

26).

38

Page 51: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Os principais recursos técnicos que podem ser utilizados na fase de tomada da

imagem são: a escolha do ponto de vista, o ângulo da tomada, o enquadramento,

o controle da profundidade de campo, a cor da película, a iluminação, a

sensibilidade do filme, a exposição da imagem (abertura do obturador e tempo de

exposição), a escolha da objetiva e do filtro.

Durante a revelação e cópia podem ser incorporados processos por meio dos

quais se modificam parte dos recursos selecionados na fase anterior, tais como:

alteração do contraste das cores, correção tonal, viragens de coloração,

manipulação da imagem (fotomontagem, múltiplas exposições), cortes

(reenquadramento). No caso da fotografia eletrônica, Moreiro González e

Robledano Arillo (p. 27) apontam que os processos posteriores à tomada da

imagem são realizados pelo uso de ferramentas de edição de imagens digitais.

Alguns desses recursos sequer são perceptíveis em uma imagem: sensibilidade

do filme; o uso dos filtros UV, skylight, polarizador, correção de cor; o uso da

objetiva 50 mm. Por outro lado, recursos como a câmera alta ou baixa, objetiva

grande-angular, close e filtro cross são geralmente visíveis para o documentalista

treinado, e associá-los à análise documentária da imagem vai depender da

pertinência destes ao propósito do acervo. Smit (1998, p. 44) ao referir-se ao

tema observa que a escolha dos elementos de expressão fotográfica a serem

incorporados à análise documentária é um “processo que deve ser realizado de

um ponto de vista exclusivamente pragmático, diferenciando efeitos de forma

fotográfica transparentes ao usuário e os recursos formais empregados pelo

fotógrafo, editor ou laboratorista, mas não transparentes ao usuário”.

A utilização da expressão fotográfica como informação na indexação é útil para

melhorar a precisão na recuperação de imagens, não tendo a finalidade de

substituir a visualização das imagens durante a recuperação, mas agilizar este

processo. Permite uma pré-seleção mais refinada de imagens que possam

satisfazer às necessidades específicas, preservando o usuário de visualizações

desnecessárias.

39

Page 52: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

5.2 Elementos de expressão fotográfica

Serão resumidas, abaixo, as três propostas de organização e análise dos

elementos de expressão fotográfica encontradas no levantamento bibliográfico

para este trabalho, de autoria de Moreiro González e Robledano Arillo; Oliveira;

Smit. A seguir serão feitos alguns comentários sobre essas propostas e

apresentada uma quarta proposta.

Moreiro González e Robledano Arillo apresentam os seguintes elementos de

expressão fotográfica que podem ser usados pelos documentalistas, dependendo

da visibilidade na imagem e da pertinência ao acervo:

CÓDIGOS FOTOGRÁFICOS VARIÁVEIS

Ótica utilizadaEmprego de objetivas, filtros eoutros recursos que possammodificar os lugares captados

Teleobjetiva

Grande-angular

Macro ou microfotografia

Endoscopia

Panorâmica

Olho de peixe

Filtros

Prisma

LuzO tom de luz e seu reflexoqualificam expressivamente aimagem, sendo um recursosignificativo para a sua linguagem.

Natural – de dia / de noite

Luz dura – com iluminação mecânica / luz natural

Efeito americano – iluminação difusa, luz tonalque dilui as sombras / luz viva

Contraluz – destaque de perfis e silhuetas

Luz lateral, luz zenital, luz baixa

Sobre ou subexposição

Radiações

Elétrons ou partículas

Tempo de exposição Instantânea

Estroboscópica

Subexposição

Expressão de movimento

40

Page 53: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Posição do objeto no espaço Vista frontal

Vista de costas

Vista de perfil

Vista de três quartos – dianteiros ou traseiros

Ângulo de visão e eixo de tomadada foto

Ângulo médio

Ângulo plongée17

Ângulo contraplongée18

Ângulo disperso

Em submersão19

Fotografia aérea – vertical ou oblíqua

Fotografia espacial

Valores de enquadramentoSituação do objeto no espaço;marcam a amplitude do espaço queocupam as figuras representadasna imagem e determinam os tiposde plano.

Grande plano geral: representa grandes cenários

Plano geral – plano inteiro ou de conjunto: opersonagem apresenta três quartos ou mais daaltura da moldura, sempre havendo algumespaço

Plano de união: apresenta o corpo inteiro semnenhum espaço, nem abaixo e nem acima

Plano três quartos – plano americano: o marcoinferior situa-se na altura dos joelhos dopersonagem

Meio plano: o marco inferior do quadro podecortar desde a cintura até o peito

Primeiro plano: ombros e cabeça

Plano detalhe – close: um detalhe dopersonagem

Quadro 5 – Elementos de expressão fotográfica(Fonte: MOREIRO GONZÁLEZ e ROBLEDANO ARILLO p. 28-40)20

Os mesmos autores (p. 40-42) observam que o emprego de alguns dos

elementos da expressão fotográfica nem sempre produzem o mesmo efeito, e

destacam vários usos de elementos espaciais (enquadramento e ângulo de

tomada da foto) que podem resultar em interpretações. Alguns dos usos estão

reproduzidos abaixo:17 Tomada de vista de cima para baixo, ou câmera alta.18 Tomada de vista de baixo para cima, ou câmera baixa.19 Foto subaquática ou submarina.20 Alguns elementos foram suprimidos da lista original, por serem considerados dados pertinentes àdescrição física do documento: Superfície sensível (suporte, formato, apresentação da imagem);Qualidade técnica (projeção, impressão e ampliação).

41

Page 54: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

­ o primeiro plano pode supor a revelação da intimidade do personagem, uma

revelação de seu estado de ânimo (Fotos 8 e 9).

Foto 8 Foto 9

­ o plano geral com um só indivíduo sugere, normalmente, solidão e isolamento

(Foto 10).

Foto 10

42

Page 55: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

­ o plano geral ou as tomadas amplas diluem os personagens no ambiente ou

cenário: retiram o destaque dos indivíduos e o dão ao coletivo (Fotos 11 e 12).

Foto 11 Foto 12

­ o plano contraplongée exalta o representado, adquirindo potência, força e

grandiosidade (Fotos 13 e 14); pode conotar, também, prepotência e antipatia.

Foto 13 Foto 14

­ um plano oblíquo (composição na qual as referências universais – horizontal e

vertical – são alteradas) sugere, normalmente, estranheza e inquietude

(Fotos 15 e 16).

43

Page 56: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Foto 15 Foto 16

Os autores (p. 42-45) destacam que as cores dos objetos são também

transmissoras de mensagens, apresentando diversas associações entre as cores

e seus possíveis significados. A cor pode simbolizar estados de espírito, fatos,

situações, crenças e inclusive situações; e essas associações são determinadas

dentro de culturas específicas, podendo assumir valores contraditórios em

culturas diferentes e mesmo em uma mesma cultura, dependendo do contexto.

No mundo ocidental o luto é simbolizado pela cor negra, enquanto os hindus e

japoneses o fazem com a branca.

Outro trabalho interessante sobre os elementos de expressão fotográfica é o TCC

de Oliveira (p. 18-41), que desenvolve uma categorização dos recursos de

obtenção e composição da imagem tendo como referência as categorias

apontadas por Smit (1998), que serão discutidas mais adiante.

As categorias sugeridas por Oliveira compreendem algumas técnicas

relacionadas à utilização de objetivas especiais, filtros, tempo de exposição,

luminosidade, enquadramento, posição da câmera, entre outros processos, que

influenciarão no resultado da composição da imagem. O trabalho apresenta a

definição para cada categoria21 de expressão fotográfica sugerida, e um exemplo

21 As definições transcritas foram extraídas, segundo Oliveira (p. 18), dos trabalhos de MichaelBusselle, Richard Ehrlich e Leighton D. Gage & Cláudio Meyer. As definições marcadas com um (*)foram alteradas porque não as considerei apropriadas.

44

Page 57: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

de imagem com a análise do conteúdo informacional do documento e sua

dimensão expressiva.

CATEGORIAS FORMA FOTOGRÁFICA DEFINIÇÃO

Enquadramentofotográfico

Plano de conjunto Abrange uma grande área,cheia de detalhes, onde sãomostrados todos os elementosda cena (pessoas, objetos oucomponentes arquitetônicos)

Plano médio Corpo humano enquadrado dacintura para cima, destacandoa figura humana

Detalhe Abrange uma área, pedaçoespecífico de uma figura

Close Mostra apenas os ombros e acabeça das figuras em foco

Panorâmica Apresenta um ângulo de visãobastante amplo, normalmenteusado para paisagens (*)

Fish eye Objetiva grande-angular comdistância focal de 7,5 mm, queregistra num ângulo de 180graus (*)

Posição da câmara Câmera baixa

Câmera alta

Vista aérea

Vista submarina

Vista de satélite

Vista microscópica

Efeitos especiais Estroboscopia Decomposição do movimentopela técnica de múltiplaexposição, com o uso de flashsincronizado

Fotomontagem Combinação de duas ou maisimagens obtidas emmomentos distintos em umaúnica foto

Longa exposição

Movimento

Desfocado

Luminosidade Luz noturnaContra-luz

Quadro 6 – Elementos de expressão fotográfica (Fonte: OLIVEIRA, p. 19-41)

45

Page 58: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Smit (1998) apresenta também uma lista de elementos de expressão fotográfica,

enriquecida com comentários práticos que são de grande utilidade para os

documentalistas.

CATEGORIA VARIÁVEIS COMENTÁRIOS

Imagem Efeitos especiais:estroboscopia, alto-contrasteetc.

Os efeitos especiais, desde quevisíveis, são obrigatoriamenteindexados

Ótica Utilização de objetivasespeciais (fish-eye, grande-angular, teleobjetiva etc.)

A utilização de objetivas nem sempre éperceptível: somente deformaçõesevidentes devem ser descritas

Utilização de filtros especiais(infravermelho, ultravioletaetc.)

A utilização de filtros, emborafreqüente para controlar efeitos de luzou cor, é raramente transparente parao usuário: somente nestes casos deveser descrito

Tempo deexposição

Pose A pose é cada vez menos praticadaatualmente. Até 1950, em função dosequipamentos fotográficos existentes,a pose era obrigatória

Longa exposição A longa exposição, pela qual oobturador fica aberto um tempoconsiderável é sempre visível, uma vezque usado para retratar o movimento(luzes dos carros em fotos noturnas,movimentos de dança ou estrelas etc.)

Fotografia instantânea Se mencionada, enquanto suporte,quando de descreve o sistemaPolaroid, de resto a menção àfotografia instantânea não faz maissentido para os acervos fotográficosatuais

Luminosidade Luz noturna A luz noturna é sempre visível esempre deve ser mencionada, tendoem vista que altera as cores e asensação de volume

Contraluz A contraluz, desde que muito forte,pode ser mencionada, mas não o éobrigatoriamente

Iluminação artificial Vide comentário relacionado àcontraluz

Luz diurna Normalmente não mencionada,considerando-se esta a luz padrão

46

Page 59: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Enquadramentoe posição dacâmera

Enquadramento de objetos emrelação ao espaço ouabordagem do próprio espaço:vista geral, parcial,panorâmica, vista de interior ouexterior

Informação indispensável

Enquadramento de pessoas:plano geral, plano médio,americano, close, detalhe,perfil, frente, costas, 3/4

De acordo com o perfil do arquivo,informação considerada essencial ouinútil. Caso a visualização das imagenspossa ser assegurada, a relaçãocusto/benefício desta indexação édiscutível

Posição da câmera: câmeraalta, câmera baixa, vista aérea,submarina, subterrânea, demicroscópio eletrônico etc.

Excetuada a informação sobre câmeraalta e baixa, muitas vezes dispensável,os demais dados, desde queexistentes, devem ser mencionados:neste tópico constata-se unanimidadena bibliografia

Quadro 7 – Elementos de expressão fotográfica (Fonte: SMIT, 1998, p. 45-47)

Percebe-se, nesta proposta, uma preocupação com a utilização prática dos

elementos de expressão fotográfica, na qual a incorporação da forma fotográfica

à análise documentária da fotografia presume a escolha das categorias que

sejam realmente operacionais, ou pertinentes aos propósitos do acervo

fotográfico. Smit (1998, p. 44) diz que esse processo seletivo deve ser realizado

considerando-se exclusivamente o ponto de vista prático, distinguindo os efeitos

que são visíveis aos usuários e documentalistas das técnicas empregadas pelo

fotógrafo, mas que não são perceptíveis aos leigos.

Podemos perceber que as três categorizações propostas (Moreiro González e

Robledano Arillo, Oliveira e Smit) apresentam basicamente os mesmos

elementos; as diferenças residem no nome atribuído às categorias, na

nomenclatura das variáveis (ângulo e posição da câmera), na aglutinação ou

separação de algumas dessas categorias e nas variáveis (as técnicas

fotográficas) presentes em cada categoria.

A proposta de Moreiro González e Robledano Arillo é a que apresenta o maior

número de categorias e de técnicas fotográficas que podem ser utilizadas para a

concepção de uma imagem, demonstrando uma preocupação maior em detalhar

essas técnicas do que apresentar um panorama da expressão fotográfica que

seja prático para o indexador – enfatizando mais a técnica empregada do que o

47

Page 60: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

resultado obtido na imagem. Um exemplo para demonstrar esse meu ponto de

vista é a inclusão da “Subexposição” nas categorias “Tempo de exposição” e

“Luz” – corretas nos dois casos, pois a exposição fotográfica é uma combinação

da quantidade de luz (abertura do obturador) e o tempo de exposição.

A relação de elementos de expressão fotográfica de Oliveira é mais prática para a

compreensão por um indexador de imagens, pois é baseada na proposta de Smit,

e destaca os efeitos mais “visíveis” em uma imagem: o enquadramento, a

posição da câmera e a luminosidade. Falha ao apresentar definições incorretas

de alguns dos elementos como “panorâmica”, “fish-eye”, “longa exposição” e

“desfocado”; é um pouco infeliz ao incluir o uso da objetiva “fish-eye” na categoria

“Enquadramento Fotográfico”; e se equivoca ao separar, na categoria “Efeitos

Especiais”, o “movimento” e o “desfocado”. Para englobar esses dois últimos, que

são difíceis de serem distinguidos22, prefiro o termo “Expressão de movimento”

usado por Moreiro González e Robledano Arillo.

Alguns efeitos são mais visíveis, mais fáceis de serem percebidos pelo indexador.

Nos trabalhos aqui mostrados, a presença desses elementos – o

Enquadramento, a Posição da Câmera e a Luminosidade – é unanimidade, mas

encontramos algumas diferenças nos conceitos referentes aos tipos de

enquadramento, principalmente nas definições de “Grande plano” “Close”,

“Detalhe” e “Plano detalhe”. Embora sejam expressões bastante usuais,

principalmente para imagens em movimento, esses conceitos ainda não estão

claramente definidos, e a instituição responsável por um acervo de imagens deve

especificar os termos a serem usados e com qual significação.

Como foi destacado anteriormente, o mais importante em relação aos elementos

de expressão fotográfica, para fins documentais, é o seu resultado em uma

imagem e não a técnica empregada para produzi-los. É apresentado abaixo um

quadro contendo alguns efeitos que podem ser observados e a técnica que pode

causar o efeito – uso de objetivas, de filtros, do tempo de exposição e de algumas

22 Como exemplo de “Movimento” Oliveira (p. 37) apresenta uma imagem de dois ciclistas, sendoque a pista e suas demarcações estão focadas e os ciclistas estão com suas imagens levementeborradas, dando a idéia de deslocamento. O exemplo da forma fotográfica “Desfocado” (p. 38)apresenta a imagem de uma mulher (borrada) tendo ao fundo um muro de pedras e galhos deárvores (ambos focados); e essa imagem pode ser entendida como a de uma mulher dançando ouvirando-se rapidamente, ou seja, também um efeito de movimento. O efeito visual é muitosemelhante.

48

Page 61: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

técnicas de processamento da imagem. Considero importante que o indexador

tenha um conhecimento básico sobre esses efeitos para não cometer enganos

grosseiros ao indexar uma imagem, pois algumas técnicas geram efeitos

parecidos.

Os efeitos que serão apresentados são, em sua grande maioria, aqueles cujas

denominações não estão claramente identificadas com a técnica que os produz, e

por isso mais difíceis de serem conceituados com um termo para indexação.

Foram excluídos os efeitos relacionados ao uso dos elementos de

Enquadramento, Posição da câmera, Posição do objeto fotografado e alguns

tipos de Iluminação, por serem os de entendimento mais comum na literatura

sobre o tema.

A idéia principal do quadro é apresentar a questão do uso da expressão

fotográfica destacando os efeitos apresentados na imagem e não a técnica

utilizada. Para o documentalista o essencial é a percepção, o reconhecimento de

que a imagem apresenta algo – os efeitos visíveis – que seguramente a distingue

de uma imagem “normal” e que esse algo poderá ser interessante no momento

da recuperação das imagens, como característica desejada ou como elemento a

ser desprezado. As fotos às quais os efeitos remetem têm o propósito de melhor

ilustrar os efeitos descritos.

É tarefa da área da documentação da informação encontrar os termos que

possam associar e transmitir esses conceitos aos usuários. Esta proposta não

apresenta a solução para o problema dos termos a serem utilizados na

representação dos efeitos provocados pelos elementos de expressão fotográfica.

Isto seria objeto de um próximo estudo.

EFEITO TÉCNICA

Imagem sem profundidade de campo: fundos e primeirosplanos desfocados - Foto 17.

Teleobjetiva23

Achatamento da imagem, isto é, elementos que estãodistantes aparentam estar mais próximos uns dos outros:mudança de perspectiva - Foto 18.

Teleobjetiva

23 A redução da profundidade de campo também pode ser obtida com outros tipos de objetivas,pelo controle da abertura do obturador; mas com as teleobjetivas esse efeito é bem mais evidente.

49

Page 62: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Imagem apresenta somente tons de preto e de branco, semas gradações de cinza - Foto 19.

Alto-contraste

Imagem apresenta várias vezes o mesmo motivo, todos coma mesma nitidez, mostrando uma seqüência de ummovimento (trajetória de um deslocamento) - Foto 20.

Estroboscopia

Imagem formada pela composição de dois ou maiselementos cuja combinação não pareça natural – a imagemparece irreal, estranha. Ex: a imagem de um olho, cuja íris éum CD; uma imagem que apresenta três vezes o rosto deuma mesma pessoa; uma planta cuja flor é uma mulher;mais de um motivo no mesmo plano e com tamanhosdesproporcionais (uma casa e um homem do mesmotamanho) - Fotos 21 e 22.

Fotomontagem

Múltipla exposição

Distorção nos motivos fotografados – um objeto ou umapessoa pode aparecer mais compridos, mais altos, maislargos ou mais abaulados do que são ou objetossabidamente de linhas retas (poste, parede etc) queaparece curvado na imagem - Fotos 23 e 24.

Grande-angular

Pequenos objetos (flores, insetos, moedas, selos etc.)quase que em tamanho natural e sem distorções. Se não forum motivo plano (flor, inseto), somente uma parte ficaráfocada - Fotos 25 e 26.

Objetiva macro

Filtro close-up

Correção no efeito de perspectiva em fotos de prédios,evitando que os seus lados fiquem convergentes no alto -Foto 27.

Objetiva de controle deperspectiva

Transformação de pontos de luz em estrelas - Foto 28. Filtro cross ou de estrela

Pontos brilhantes de luz decompostos em faixas nas coresdo espectro - Foto 29.

Rede de difração

Foco suave (usado principalmente em rostos e paisagens):cria uma imagem levemente embaçada - Fotos 30 e 31.

Filtro difusor

Imagem com alguns tons separados e uniformes(geralmente três ou quatro) - Foto 32.

Separação de tons ouPosterização

Imagem semelhante a uma pintura a óleo - Fotos 33 e 34. Texturas ou Retículas deampliação

Imagem levemente borrada, que passa a impressão deação, de movimento – motivo principal borrado e fundonítido ou reconhecível; motivo principal relativamente nítidocontra um fundo borrado - Fotos 37, 38 e 39.

Tempo de exposiçãolongo24

Fotógrafo acompanha omotivo com a câmeradurante da exposição

24 O tempo de exposição vai depender da velocidade com que o objeto se desloca(aproximadamente 1/125 s para carros e 1/30 s para pessoas).

50

Page 63: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Imagem com borrado contínuo – acompanhamento datrajetória de um objeto por um grande período de tempo(lua, estrela etc.) ou vários objetos que têm a mesmatrajetória (carros em uma avenida, água de uma cachoeiraetc.) - Fotos 40 e 41.

Longa exposição25

Quadro 8 – Elementos de expressão fotográfica: proposta

É importante mencionar que a maioria desses efeitos pode ser obtida,

atualmente, com um editor de imagens, reforçando que para a indexação de

imagens é realmente o efeito que interessa e não a técnica utilizada.

Foto 17 – Profundidade de campo: à esquerda sem profundidade decampo, e à direita com profundidade de campo.

25 Uma distinção que pode ser feita entre os dois efeitos com imagens borradas (resultado de umlongo tempo de exposição e que passam a sensação de movimento) é o tempo que o obturador dacâmera fica aberto: para a longa exposição o tempo é tão grande que a câmera necessita de umapoio (um tripé) para os elementos fixos não ficarem tremidos; no outro caso o tempo deexposição é suficiente para captar o movimento, mas insuficiente para deixar tremido algumelemento que esteja imóvel.

51

Page 64: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Foto 18 – Achatamento da imagem

Foto 19 – Alto-contraste: acima umaimagem normal, e abaixo em alto-contraste

Foto 20 - Estroboscopia

Foto 21 - Fotomontagem Foto 22 – Múltipla exposição (provável)

52

Page 65: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Foto 23 – Distorção da imagem

Foto 24 – Distorção da imagem

Foto 25 – Macro-objetiva Foto 26 – Macro-objetiva

53

Page 66: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Foto 27 – Correção de perspectiva: à esquerda sem a correção, e à direitacom a perspectiva corrigida.

Foto 28 – Filtro estrela Foto 29 – Rede de difração

Foto 30 – Foco suave

54

Page 67: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Foto 31 – Foco suave

Foto 32 – Posterização

Foto 33 – Textura Foto 34 – Textura

55

Page 68: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Foto 35 – Movimento Foto 36- Movimento

Foto 37 – Movimento

Foto 38 – Exposição longa Foto 39 – Exposição longa

56

Page 69: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

5.3 Tratamento documentário da expressão fotográfica

Na representação documentária de uma imagem, a expressão fotográfica é um

elemento importante na descrição de seu conteúdo informacional para a sua

recuperação, e que deve ser destacada somente quando interferir efetiva e

visivelmente na imagem. O emprego de alguns desses tipos de elementos

também pode fundamentar um conceito abstrato na análise iconográfica.

A utilização dos elementos de expressão fotográfica na representação da imagem

deve também estar relacionada com o acervo e o tipo de usuário desse acervo.

Embora a fotografia tenha a característica de ser multidisciplinar, alguns efeitos

só serão úteis para um público especializado: detectar o uso da objetiva de

controle de perspectiva na foto de um edifício não faz diferença para a grande

maioria dos usuários, mas é importante para um público especializado em

arquitetura (arquitetos e publicações de arquitetura).

É importante que o documentalista conheça as principais técnicas que geram a

expressão fotográfica, mas o essencial é identificar o efeito provocado – o

resultado na imagem. Para efeito de construção de um Vocabulário Controlado

para a indexação da expressão fotográfica, acredito ser mais interessante que os

termos a serem empregados tenham mais relações semânticas com o resultado

(que deve ser aparente na imagem) do que com a técnica que gerou esse

resultado.

Pensando na representação documentária e na indexação dos elementos de

expressão fotográfica sob a perspectiva de priorizar os seus efeitos aparentes em

uma imagem, é necessária a criação de termos que possam descrever esses

efeitos. Alguns termos coincidirão com as técnicas utilizadas – termos já

consagrados no âmbito das imagens em movimento, como as técnicas de

enquadramento (plano geral, plano médio, americano, close, detalhe etc),

luminosidade (contraluz, luz noturna etc.) e ponto de vista (câmera alta, câmera

baixa etc.). Existe uma grande lacuna de terminologia na área da documentação

para descrever imagens, expressando o seu conteúdo informacional, de maneira

a facilitar a recuperação da informação. Encontrar uma resposta para esse

problema é um grande desafio.

57

Page 70: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

6 INDEXAÇÃO POR CONTEÚDO

Os dois itens anteriores tratam da representação da imagem pela indexação por

conceitos, ou seja, a indexação na qual os termos são atribuídos pelo indexador,

seja em linguagem natural ou baseado em linguagem controlada. Foi mostrado

que, a essa indexação atributiva – a identificação dos conceitos implícitos e

explícitos envolvidos no documento – é conveniente associar a expressão

fotográfica utilizada no ato do registro da imagem, quando ela for visível (para o

indexador e usuário) e puder influenciar na utilização da imagem, agregando a

essa descrição uma especificidade enquanto informação. Este item vai

apresentar uma outra técnica, desenvolvida mais recentemente: a indexação por

conteúdo26.

Indexar os conceitos associados a uma imagem tem algumas limitações. Como a

indexação por conceito é basicamente feita de forma manual, é uma operação

bastante trabalhosa e de custo bastante elevado. Outro fator importante a ser

considerado na indexação por conceitos é a dificuldade em se obter uma

consistência efetiva nos dados de uma coleção, devido à própria polissemia das

imagens, ao repertório cultural do indexador e à subjetividade que envolve a

operação. Deve ser considerada, também, a necessidade de pessoas

especializadas, ou pelo menos bem treinadas, para se alcançar um tratamento de

coleções de imagens com o menor número de imprecisões possível.

Rasmussen (p. 182) aponta uma outra limitação na indexação por conceito: a

dificuldade em antecipar, no momento da indexação, como uma imagem poderá

ser utilizada, podendo, desta maneira, não serem supridas as informações no

momento de uma consulta.

26 Também denominada “indexação derivativa”, “indexação visual automática” ou simplesmente“processamento de imagens”.

58

Page 71: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Um aspecto negativo na indexação por conceito mencionado por Graham (2001,

p. 24-25) é que a indexação de imagens similares pode variar, principalmente se

feita em momentos distintos; o próprio vocabulário muda e evolui junto com sua

área de conhecimento. Outro fator desfavorável apontado pela autora é que o

ponto de vista do indexador pode ser diferente da perspectiva do usuário, que

pode ser um especialista na área pesquisada.

Graham também observa que os usuários nem sempre são capazes de

expressar adequadamente suas necessidades de informação, ou seja, formular

uma adequada expressão de busca, porque ou não sabem exatamente o que

estão procurando, ou não compreendem como usar o catálogo disponível. Outras

limitações assinaladas pela autora na indexação por conceito em uma grande

coleção de imagens abrangem: erros de digitação nos termos (pelo indexador e

pelo pesquisador), a deficiência na estrutura de gerenciamento de dados para

superar os efeitos de descrições imprecisas, uso de tesauro não apropriado para

a coleção, e imagens do início da formação da coleção com nenhum ou com

poucos dados descritivos.

A produção de imagens cada vez maior, provocando grande aumento nas

coleções existentes e o número crescente de novas áreas que passaram a utilizar

imagens, principalmente as digitalizadas, são outros fatores que também devem

ser levados em conta no caso da indexação por conceito. Para Eakins e Graham

o processo de digitalização de imagens não faz com que a coleção seja

gerenciada mais facilmente; eles lembram que a catalogação e a indexação são

ainda necessárias para uma busca eficaz – a diferença apontada pelos autores é

que boa parte da informação desejada poderá ser, potencialmente, derivada, por

processo automatizado, das próprias imagens.

Considerando todos esses aspectos e tendo em vista o rápido desenvolvimento

na tecnologia dos recursos visuais e o advento da internet como o mais popular

meio de difusão e acesso da informação imagética, a identificação automatizada

das características de uma imagem a ser indexada parece ser a solução ideal

(RASMUSSEN, p. 183). Na comunidade científica existe um crescente interesse

em indexar e recuperar imagens usando técnicas computadorizadas, e para o

aperfeiçoamento dessa técnica – a indexação por conteúdo – têm sido realizadas

59

Page 72: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

muitas pesquisas com graus variados de êxito, dependendo do nível de

interpretação e das características desejadas (RASMUSSSEN, p. 183).

Estudos referentes às publicações sobre a indexação por conteúdo27 (CHU,

p. 1012) apontam a existência de seis subgrupos de pesquisa neste campo:

­ pesquisas que relacionam como a informação imagética é processada pelo

cérebro humano (4%).

­ pesquisas relacionadas ao campo da Óptica28 (4%).

­ pesquisas na indexação e recuperação baseadas em características visuais

da imagem, como a forma e a cor (24%).

­ pesquisas que incorporam diferentes tipos de informação imagética, incluindo

os atributos intrínsecos da imagem e também informações textuais e

semânticas com finalidades de indexação e recuperação (34%).

­ pesquisas que tratam a imagem como objetos (14%).

­ pesquisas que estudam imagens como Símbolo ou Ícone (20%).

Ainda segundo CHU (p. 1017), em 1974 foi feita a primeira publicação29 sobre

indexação e recuperação de imagens, e o número de publicações não teve um

crescimento significativo até 1996, o ano em que a Web, como plataforma

multimídia, começou a desempenhar um papel importante em nossa sociedade.

Nos anos de 1996 a 1999 foram publicados mais de 120 documentos em cada

um dos anos, enquanto que entre 1974 e 1990 a média era de 5 documentos

(com picos de 10 itens em 1984 e 24 itens em 1985), e entre 1991 e 1995 a

média de documentos publicados foi de 50 itens. Essa tendência indica o

crescente interesse pela indexação e recuperação de imagens acompanhando o

avanço dos recursos tecnológicos.

27 Baseados em 100 documentos obtidos da Web of Science.28 Parte da Física que estuda as leis relativas às radiações luminosas.29 Publicações que constam no índice de citações do ISI - Institute for Scientific Information.

60

Page 73: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Buscar uma imagem desejada em uma coleção envolve a descrição de tipos de

objetos, cenas específicas ou mesmo algo que represente um sentimento ou

sensação. Ao se referirem às características das expressões de busca das

imagens, Eakins e Graham dizem que potencialmente as imagens têm muitos

tipos de atributos que podem ser usados na recuperação, tais como:

­ a presença de uma combinação específica de atributos de cor, textura ou

forma (bolas vermelhas, estrelas amarelas).

­ a presença ou a combinação de tipos específicos de objetos (cadeiras ao

redor de uma mesa, árvores e bancos).

­ a descrição de um tipo específico de evento (jogo de futebol, casamento).

­ a presença de personalidades, locais ou eventos identificados (a posse do

presidente Lula, a rainha Elizabeth saudando a multidão).

­ emoções subjetivas associadas à imagem (felicidade, medo).

Esses tipos de necessidade estão listados em ordem crescente de nível de

abstração, e cada um deles vai se tornando mais difícil de ser adequadamente

respondido por um sistema que adota o processo de indexação e recuperação

automatizadas. Tendo como base as formulações de busca acima, Eakins e

Graham classificaram as propriedades da imagem analisadas na indexação por

conteúdo em três níveis crescentes de complexidade:

­ nível 1: que compreende a indexação e recuperação pelos atributos primários

como a cor, forma, textura e posição espacial dos elementos da imagem.

­ nível 2: compreendendo a indexação e recuperação pelos atributos derivados

(ou lógicos) da imagem, como a identidade dos objetos mostrados.

­ nível 3: que compreende a indexação e recuperação pelos atributos abstratos,

como os significados das cenas representadas.

Segundo Eakins e Graham são ainda raras as pesquisas envolvendo o nível 3

para a representação imagética pela indexação por conteúdo. Um exemplo

61

Page 74: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

apontado pelos autores é a tentativa de usar o sentido subjetivo das cores, na

qual a presença predominante de uma cor ou alguma combinação específica de

cores possibilita a recuperação de imagens que evocam alguma intenção

particular. Esse tipo de indexação ainda não teve sua eficácia comprovada.

Em relação ao nível 2, de acordo como os mesmos autores, já existem alguns

estudos mais concretos e promissores. O primeiro sistema que contemplava esse

tipo de representação era destinado a interpretar e recuperar desenhos de

objetos elaborados com traços (linhas) dentro de um domínio muito limitado.

Recentes pesquisas têm se concentrado na resolução de dois problemas: o

reconhecimento do cenário de ação da imagem, útil na busca e na identificação

de objetos presentes na imagem; e o reconhecimento de objetos. Já existem

softwares capazes de reconhecer, em uma imagem, corpos humanos, árvores,

animais etc.

Atualmente a grande maioria dos estudos da técnica da indexação por conteúdo

está relacionada ao primeiro nível, adotando um principio totalmente diferente da

indexação por conceito: a indexação e recuperação de imagens de uma coleção

são feitas pela comparação de atributos automaticamente extraídos das imagens,

usando como parâmetro de comparação medidas matemáticas de cor, textura ou

forma. Enquanto a indexação por conceito usa, para a representação da imagem,

principalmente os atributos temáticos, a técnica de indexação por conteúdo tem

empregado com eficácia, até o presente momento, os atributos primários, que

são as características inerentes da imagem.

Enquanto na indexação por conceitos a decisão na escolha dos atributos a serem

considerados para a representação da imagem é um dos principais problemas do

profissional da informação, na indexação baseada no conteúdo da imagem esses

aspectos são escolhidos pela capacidade do programa em extrair as informações

pelo processamento da imagem, e de fazer a combinação entre o atributo e o

campo de ação da imagem (por exemplo, forma e logotipos; textura e imagens de

radiologia). Cabe ao documentalista, nesta técnica de indexação, determinar e

nomear os atributos para que o programa possa recuperar as imagens com os

padrões solicitados.

62

Page 75: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

”A indexação por conteúdo é um sistema baseado na

representação automática de atributos visuais intrínsecos das

imagens (texturas, qualidades de cor, figuras obtidas a partir da

identificação de contornos, estruturas de composição etc.) e na

recuperação a partir dos mesmos atributos. Para a recuperação,

empregam-se índices visuais, que representam matematicamente

a totalidade ou parte dos atributos identificados anteriormente nas

imagens previamente digitalizadas” (MOREIRO GONZÁLEZ e

ROBLEDANO ARILLO, p. 83-84).

A técnica de indexação por conteúdo é ainda, de acordo com Graham (p. 25)

muito limitada, embora o seu potencial futuro seja enorme; e tem tido, por

enquanto, um impacto muito pequeno na maioria das coleções de imagens. Por

ser aplicada somente em imagens digitalizadas, é ainda utilizada somente em

algumas áreas altamente especializadas.

A proposta da indexação por conteúdo aborda o processamento automatizado de

todas as propriedades da imagem, mas tem trabalhado basicamente somente

com os atributos primários como a cor, a textura e a forma, devido à incapacidade

tecnológica dos computadores, até o momento, em desempenhar a análise

descritiva e interpretativa de imagens. De acordo com CHU (p. 1018) algumas

pesquisas de indexação por conteúdo estão tentando incorporar informações

textuais e semânticas aos atributos visuais da imagem, significando um promissor

início da integração entre as duas técnicas de indexação.

É interessante comentar uma das conclusões do estudo do comportamento de

usuários de imagens efetuado por Greisdorf e O’Connor (p.18). Um grupo de

usuários foi convidado a analisar algumas imagens para identificação dos seus

atributos, num primeiro momento a partir de uma lista pré-estabelecida e

posteriormente de forma espontânea. Os atributos primários (cor, forma e textura)

somente foram escolhidos para representar uma imagem quando os usuários

selecionaram os termos da lista imposta. Quando os usuários usaram seus

próprios termos na descrição, esses atributos não foram usados. Os termos

espontâneos associados à ação e ao movimento também não foram usados de

maneira significativa, embora tenham sido escolhidos da lista imposta. Os termos

63

Page 76: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

predominantes na descrição de imagens foram os associados ao objeto, ao local

e aos sentimentos e emoções.

6.1 Atributos da imagem para indexação

Os principais focos da indexação por conteúdo são a maneira de extração dos

atributos das imagens e a avaliação da medida de similaridade entre esses

atributos. Será feita uma breve apresentação30 dos atributos que até o momento

têm apresentado resultados satisfatórios na indexação e recuperação das

informações contidas em imagens. YANG (p. 256) observa, em resumo, que os

atributos cromáticos e de textura mostram melhores resultados em coleções de

imagens genéricas, não especializadas, enquanto os atributos de forma são mais

eficazes em imagens criadas por gráficos de computador (informações

representadas graficamente por computador) e os atributos de estrutura (arranjo,

disposição) funcionam melhor com objetos construídos pelo homem, como

edifícios e pontes.

▪ Cor. Existem diversos métodos para a indexação e recuperação de imagens

baseados na similaridade das cores, a maior parte com o mesmo princípio. A

imagem é submetida a uma análise na qual é obtido o seu histograma de

cor31, indicando a proporção de pixels de cada cor contida na imagem. Este

histograma de cor é então armazenado em uma base de dados. No momento

da busca o usuário pode especificar a proporção desejada de cada cor ou

apresentar um exemplo de imagem da qual é calculado o histograma de cor

para a busca; por um processo de associação são recuperadas imagens cujos

histogramas de cor equiparam-se ao da consulta (pode ser definido um índice

de proximidade desejado).

▪ Textura. Embora o conceito de textura de uma imagem seja de difícil

compreensão, pode-se descrevê-la como a característica de distribuição das

cores e de suas intensidades em uma superfície, identificada como padrões

visuais com propriedades de homogeneidade. Em fotos de uma zebra e de

30 Baseada em Eakins e Graham; Enser (2000, p. 202-203); Rasmussen (p. 184); Yang (p. 256-257).31 Determina a distribuição das cores em uma imagem, região ou objeto.

64

Page 77: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

um dálmata podemos obter histogramas de cor bastante próximos, mas

diferentes padrões de textura.

As propriedades de textura mais significativas consideradas para a indexação e

recuperação são a direcionalidade ou a aleatoriedade de sua distribuição, o

contraste e a rugosidade. Várias técnicas têm sido usadas para mensurar as

semelhanças de textura, e a mais comum baseia-se na comparação entre os

desejados com os das imagens da coleção. A consulta por textura pode ser

formulada pela seleção de exemplos de texturas desejadas em uma paleta, ou

fornecendo um exemplo de imagem; o sistema, então, recupera as imagens com

valores de textura próximos ao valor solicitado. Neste caso pode-se também

definir um índice de proximidade entre essas medidas.

▪ Forma. A forma pode ser definida em termos de limites (o perímetro externo

de uma figura) ou de regiões (o conjunto da área de cobertura de uma figura);

é, ao contrário da textura, um conceito mais bem definido e mais facilmente

compreensível. A capacidade de recuperação pela forma dos objetos talvez

seja o requisito mais evidente, dentre os atributos primários, na indexação e

recuperação por conteúdo.

Pelo processo são computadas as características de forma para cada objeto

identificado na imagem; a expressão de busca é formulada por meio de um grupo

dessas características desejadas, e são recuperadas, por comparação, as

imagens cujas características mais se aproximam das solicitadas.

Sérios problemas ainda são encontrados na indexação e recuperação pelo

atributo de forma, como a dificuldade na dissociação entre o primeiro e o segundo

plano da imagem e a dificuldade em mensurar o percentual de similaridade entre

o valor de busca e os valores das imagens do acervo, pelas discrepâncias de

rotação, translação, escala e ocultamento de parte do objeto – todos restringindo

uma recuperação eficaz.

▪ Estrutura espacial. Possibilita ao usuário efetuar uma busca, especificando

as relações espaciais entre dois ou mais objetos desejados em uma imagem.

Geralmente é permitido indicar o direcionamento dessas relações, como o de

proximidade ou sobreposição entre os objetos, ou quando um objeto deve

estar contido em um outro.

65

Page 78: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

▪ Texto. Foram criados sistemas que detectam, extraem e reconhecem textos

presentes em uma imagem. Os textos podem ser parte importante da

imagem, transmitindo uma informação que pode ser conveniente recuperar,

como um letreiro, uma inscrição, o título ou a manchete de um jornal, o título

de um livro.

6.2 Softwares

Devido às dificuldades no reconhecimento automatizado dos objetos, as

informações extraídas de uma imagem, pelo uso da indexação por conteúdo,

correspondem ainda ao primeiro nível das propriedades da imagem, ou seja, os

atributos primários como a cor, forma, textura, estrutura e suas combinações.

Serão apontados, abaixo, os principais softwares citados na bibliografia sobre a

indexação por conteúdo (EAKINS e GRAHAM; RASMUSSEN, p. 185-187; YANG,

p. 255-256), não sendo finalidade deste item discorrer sobre detalhes técnicos

desses sistemas.

Apesar das deficiências da tecnologia de indexação e recuperação por conteúdo,

já existem alguns sistemas distribuídos comercialmente. O mais conhecido deles

é QBIC – Query By Image Content. É um sistema desenvolvido pela IBM que

proporciona a recuperação de imagens por qualquer combinação de cor, textura

ou forma, como também a opção de indexação e recuperação por palavras-

chave. O sistema extrai e armazena os atributos de cada imagem acrescentada

ao banco de dados; e a consulta pode ser formulada pela seleção, em uma

paleta, dos atributos desejados ou especificando um exemplo de imagem, ou

fornecendo um esboço da forma.

Outros sistemas comerciais com funcionalidades similares são o Virage e o

Excalibur. Suas aplicações mais conhecidas são a utilização como buscadores,

respectivamente no AltaVista’s Photo Finder e no Yahoo! Image Surfer,

possibilitando a recuperação por conteúdo de imagens na WorldWideWeb.

Além desses sistemas comerciais, um grande número de sistemas experimentais

também tem sido desenvolvido, principalmente por instituições acadêmicas, a fim

66

Page 79: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

de demonstrar a viabilidade dessas novas técnicas. Esses sistemas

experimentais pesquisam a implementação da indexação e recuperação das

imagens por conteúdo, considerando também os atributos lógicos da imagem (a

identidade dos objetos mostrados) e os atributos abstratos. Os mais conhecidos

são o Photobook, desenvolvido pelo Instituo Tecnológico do Massachusetts; o

NATRA, desenvolvido pela Universidade da Califórnia; o Visual SEEk, da

Universidade de Columbia; o Cypress, projeto da Universidade de Berkley; o

MARS (Multimedia Analysis and Retrieval System), projeto da Universidade de

Illinois; Surfimage, projeto francês desenvolvido pelo Institut National de

Recherche en informatique et en automatique.

6.3 Áreas de aplicação

Existe atualmente um grande número de possibilidades de aplicação prática da

indexação e recuperação por conteúdo, a maioria delas ainda restritas a coleções

específicas de imagens, principalmente nas áreas científica e comercial. Outra

aplicação dessa técnica de indexação tem sido em acervos gerais muito grandes,

onde seria impraticável fazer uma boa representação pela indexação por

conceito.

Serão destacadas, em seguida, as áreas e aplicações que têm apresentado os

melhores resultados no uso da técnica de indexação e recuperação por conteúdo,

de acordo com Eakins e Graham:

▪ Policial. Usado para reconhecimento e identificação de um suspeito pela

comparação de suas características com as da coleção de fotos de

criminosos, impressões digitais, pegadas etc.

▪ Militar. Reconhecimento de aeronaves em telas de radar, identificação de

alvos por imagens de satélite e fornecimento de orientações para projéteis

teleguiados são alguns exemplos.

▪ Propriedade intelectual. Usado na verificação da pré-existência de conteúdo

gráfico (símbolo) de uma nova marca no momento do registro. A proteção dos

direitos autorais sobre uma imagem é também, potencialmente, uma

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Page 80: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

importante área de aplicação. Defender os direitos autorais quando as

imagens podem ser facilmente transmitidas e copiadas pela internet é uma

tarefa com crescente dificuldade. Estão em avançados estágios de

desenvolvimento protótipos de sistemas, baseados nas técnicas de indexação

por conteúdo, para a identificação de cópias ilegais de imagens da Web.

▪ Engenharia e arquitetura. Tanto os projetos de engenharia como os de

arquitetura compartilham um grande número de aspectos em comum, como

modelos em duas ou três dimensões e a necessidade de apresentar diversas

soluções para um problema do cliente entre tantas outras. A técnica é usada

na pesquisa de projetos anteriores que são, de alguma maneira, similares, e

que possam ser adequados ao problema atual.

▪ Jornalismo e publicidade. Tanto os jornais quanto as agências de

publicidade mantêm arquivos de fotografias para ilustrar seus artigos ou peças

publicitárias; geralmente arquivos muito grandes e de manutenção

extremamente dispendiosa, se indexados pelo uso de palavras-chave. Esta

área de aplicação é provavelmente uma das pioneiras no uso da tecnologia da

indexação por conceito, e no início acreditava-se que essa técnica

solucionaria os problemas da indexação e recuperação das imagens desses

arquivos, eliminando-se, ou reduzindo-se substancialmente a necessidade de

indexação por palavras-chave. Essa premissa inicial não se realizou, e

atualmente algumas agências usam um sistema híbrido de indexação, aliando

as duas técnicas.

▪ Medicina. A crescente dependência da medicina moderna nas técnicas de

diagnóstico como a radiologia e a tomografia computadorizada tem resultado

em uma explosão do número e da importância dessas imagens arquivadas

em hospitais e consultórios. Embora a principal utilidade de um sistema de

imagens para a área médica ainda seja a recuperação de imagens relativas a

um determinado paciente, o uso de técnicas de indexação e recuperação por

conteúdo tem sido incrementado no auxílio do diagnóstico pela identificação

de casos similares.

▪ Sistemas de informação geográfica e cartográfica. O interesse na análise

de imagens de satélite tem permeado múltiplas áreas de interesse além da

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Page 81: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

militar; geógrafos, agricultores e ambientalistas, entre outros, usam

amplamente essas imagens tanto em pesquisas, quanto para finalidades

práticas.

▪ Pesquisa na Web. A Web tem se tornado uma fonte indispensável de

informação e entretenimento, com crescente necessidade de efetiva

localização tanto de documentos textuais quanto de imagens. Os mecanismos

de busca textual aperfeiçoaram-se com a expansão do uso da Web, mas a

dificuldade ainda existente na localização precisa de imagens indica a

necessidade de ferramentas poderosas e específicas para esse tipo de busca.

Têm sido apresentados alguns sistemas experimentais que usam agentes

remotos para indexar e procurar imagens, as quais podem ser pesquisadas

por palavras-chave ou por similaridade de conteúdo; esses sistemas

proporcionam facilidade no refinamento da resposta obtida. Como já foi

mencionado anteriormente, dois mecanismos de busca na Web oferecem a

busca de imagens pela técnica de indexação e recuperação por conteúdo,

Yahoo! Image Surfer e AltaVista’s Photo Finder – esses sistemas oferecem

uma gama mais limitada de recursos do que os sistemas experimentais

mencionados anteriormente, mas oferecem aos usuários um método opcional

de localização das imagens desejadas.

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Page 82: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O aspecto fundamental para que se possa fazer uma boa representação

documentária da imagem objetivando sua recuperação, que é a finalidade do

tratamento documentário de qualquer tipo de informação, é o reconhecimento de

que indexar imagens é diferente de indexar documentos textuais.

A principal questão na representação de imagens é a determinação de um

conjunto de características que possa proporcionar uma boa performance na

indexação para uma adequada recuperação. Trabalhar com imagens implica

trabalhar com mais detalhes e principalmente, com informações menos

evidentes, além de demandar conhecimento das necessidades dos usuários e de

suas estratégias de busca.

Encontramos na literatura as técnicas de indexação por conceito e indexação por

conteúdo, ambas com o mesmo objetivo: a recuperação da informação imagética.

Verificamos que essas técnicas se prestam, até o momento, para usos e tipos de

acervos diferentes. Percebemos também que uma tendência apontada por

diversos dos autores que trabalham com o assunto, tanto os da área de

documentação quanto os da área de computação, é o uso combinado dessas

técnicas. Dessa forma a indexação é feita pela atribuição de termos e pela

derivação automatizada das características inerentes à imagem, como a cor, a

forma, a textura ou algumas outras que estão sendo pesquisadas.

A indexação por conteúdo tira a responsabilidade da representação da imagem

do documentalista, pois ela é executada de maneira automatizada. A

incumbência do profissional da informação seria a escolha do software mais

adequado à coleção e ao público, além da introdução, no programa, dos

parâmetros para a comparação com as imagens. Ainda está um pouco distante a

utilização em massa desse tipo de indexação, principalmente no Brasil; e essa

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Page 83: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

técnica de indexação ainda é restrita a coleções bastante especializadas e com

volume de imagens relativamente pequeno.

Nas pesquisas relacionadas a esses sistemas de indexação e recuperação pode-

se notar a presença de duas preocupações fundamentais: a rapidez e a

eficiência. Esses elementos seriam capazes de suprir uma demanda cada vez

maior por imagens, e é com este objetivo que os sistemas vêm evoluindo e

técnicas têm sido desenvolvidas para melhor integrarem as características visuais

das imagens.

Até o momento existe uma grande lacuna entre a habilidade computacional em

analisar imagens pelas suas características (cor, textura, forma) e a inabilidade

em analisá-las num nível semântico (objetos, pessoas, cenas, ações,

sentimentos, emoções etc.). O avanço na tecnologia de recursos visuais talvez

um dia preencha esta lacuna melhorando os sistemas já existentes ou criando

novas abordagens.

A questão da indexação por conceito é a que está mais próxima de nossa

realidade. A adoção dessa técnica de indexação requer cuidados especiais na

manutenção da consistência da coleção, como pessoal bem treinado, a

familiarização com o público, o uso rigoroso de controle vocabular, o

estabelecimento de política de nível de indexação, o desenvolvimento de

recursos para orientar o indexador e os usuários nos vários aspectos dos

assuntos e a avaliação de resultados.

Na decisão do nível de análise e categorias de descrição da imagem, a primeira

ponderação é a natureza e o uso da coleção – a adequação da representação da

coleção ao seu público. Coleções destinadas a um uso específico devem ser

indexadas de acordo com os assuntos de interesse; e no caso de coleções

genéricas, deve ser considerado o assunto principal da imagem, que não é tão

simples de ser identificado.

Respeitando a natureza e o uso da coleção, a representação da imagem

presume a identificação das categorias QUEM, ONDE, QUANDO e O QUE,

relacionadas aos níveis DE genérico, DE específico e SOBRE.

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Page 84: JOSÉ ESTORNIOLO FILHO A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM

Outro aspecto importante na indexação por conceito seria a valorização do uso

dos elementos de expressão fotográfica na indexação de imagens, incluindo aos

termos de assunto os conceitos relacionados aos efeitos produzidos no momento

da geração da imagem ou durante o processo de revelação e cópia.

Considero a expressão fotográfica um importante elemento de busca e de

filtragem. Se desejo encontrar, em uma coleção de imagens, uma árvore vista de

baixo posso formular a seguinte expressão de busca: [ÁRVORE e CÂMERA

BAIXA], recuperando somente esse tipo de imagem e eliminando todos os outros

tipos de árvores. Se desejar a imagem do rosto de uma mulher, mas quero que

os traços dela estejam nítidos, ou seja, não quero imagens obtidas em contra-luz,

a expressão de busca poderia ser: [RETRATO e MULHER menos CONTRA-LUZ

menos ALTO-CONTRASTE], eliminando todos os retratos de mulheres feitos

contra a luz ou produzidos em alto-contraste – um menor número de imagens

recuperadas facilita a seleção daquela idealizada. Além do menor tempo

despendido na seleção, a recuperação de um menor número de imagens

também ajuda na preservação do acervo por evitar o manuseio desnecessário,

quando se trata de coleções com imagens em suporte papel.

Fazendo uma comparação entre as duas técnicas, a indexação por conceito pode

controlar e manipular várias propriedades da imagem, identificando e

descrevendo as imagens e objetos nela contidos em termos que simbolizam o

que são e o que representam. Por outro lado, alguns atributos primários, como a

forma de uma escultura, a impressão digital ou a aparência de uma doença em

uma ultra-sonografia, podem ser mais facilmente identificados pela indexação por

conteúdo; e talvez fosse uma tarefa impraticável a recuperação pela descrição

textual. Cada uma das técnicas de indexação tem o seu espaço de aplicação e

sua potencialidade na indexação e recuperação de imagens.

A conjunção das duas técnicas de indexação deverá, num futuro, fazer parte da

pesquisa e aplicação prática nas áreas da Ciência da Informação e Computação.

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