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José Augusto Bessa de Oliveira Universidade de Aveiro Departamento de Ciências da Educação 2000 Níveis de ajustamento e auto-regulação académica em estudantes universitários Estudo com alunos do 1ºano (comum) das licenciaturas em ciências e engenharias da Universidade de Aveiro Dissertação apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Activação do Desenvolvimento Psicológico, realizado sob a orientação científica do Professor Doutor José Tavares, catedrático do Departamento de Ciências da Educação da Universidade de Aveiro

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José Augusto Bessa de Oliveira

Universidade de Aveiro Departamento de Ciências da Educação2000

Níveis de ajustamento e auto-regulação académica em estudantes universitários

Estudo com alunos do 1ºano (comum) das licenciaturas em ciências e engenharias da Universidade de Aveiro

Dissertação apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Activação do Desenvolvimento Psicológico, realizado sob a orientação científica do Professor Doutor José Tavares, catedrático do Departamento de Ciências da Educação da Universidade de Aveiro

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O júri Presidente Vogais

Prof. Doutor José Pereira da Costa Tavares professor catedrático da Universidade de Aveiro Prof. Doutor Leandro Silva Almeida professor catedrático do Instituto de Educação e Psicologia da Universidade do Minho Profª. Doutora Anabela Maria de Sousa Pereira professora auxiliar da Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da Universidade de Coimbra

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Agradecimentos

Um projecto deste tipo só é possível graças ao esforço conjunto de um grupo coeso e solidário de pessoas amigas. Ao terminar este trabalho devo deixar uma palavra de apreço para aqueles que, de algum modo, me acompanharam e se empenharam para me ajudar a concretizar este projecto. Agradeço ao Prof. Doutor José Tavares o privilégio da sua orientação crítica, o interesse e a inteira disponibilidade sempre revelada para me apoiar, encorajar e dar a confiança necessária à satisfação deste momento. Por tudo, um enorme OBRIGADO. Um muito OBRIGADO à Profª. Doutora Anabela Pereira que desde a primeira hora se prontificou a ajudar, pela sua presença amiga e pelas muitas sugestões fornecidas. Expresso o meu apreço a todas as pessoas (dirigentes, professores e funcionários) do D.C.E. da Universidade de Aveiro pela colaboração, apoio e formação. Muito particularmente, agradeço aos elementos do projecto 'Factores de sucesso/insucesso no 1ºano dos cursos de licenciatura em ciências e engenharia no Ensino Superior' (financiado pelo programa Praxis XXI- PSCH/C/CED164/96)' pelos incentivos e as solicitações que muito engrandeceram a minha experiência e pela cedência do computador portátil e os apoios concedidos para a edição deste trabalho. Aos Doutores Sousa Pinto e Luis Oliveira do Departamento de Electrónica, expresso o meu reconhecimento pela pronta colaboração e facilidade concedida na administração dos questionários. Agradeço aos alunos da Universidade de Aveiro que participaram no preenchimento dos questionários. Sem a sua dedicação não seria possível concretizar este estudo. Um forte abraço aos meus colegas do mestrado, especialmente à Fernanda, à Leonilde, à Céu e ao Emídio, meus companheiros. A amizade, o entusiasmo transmitido e os bons momentos partilhados, deixam uma enorme satisfação. Agradeço à minha amiga e colega Georgina Rolo, pelo apoio na tradução de textos e pela amizade que sempre demonstrou. Sinto-me grato pelos amigos e familiares que sempre estiveram presentes e compreenderam o quanto era importante para mim realizar este trabalho, A todos, o meu reconhecimento e um sincero BEM HAJA.

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Resumo

O presente trabalho insere-se no quadro alargado de um projecto, iniciado em 1994 na Universidade de Aveiro, no âmbito do programa Praxis XXI (PCSH/C/CED154/96), com o propósito de diagnosticar/ reflectir/ intervir sobre os principais factores responsáveis pelo (in)sucesso nos alunos do 1º ano das licenciaturas em ciências e engenharias. Com carácter exploratório e tendo em vista fundamentar eventuais intervenções futuras, fomos rever estudos e trabalhos de investigação que exploram ou justificam, á luz das recentes correntes da psicologia educacional, o papel dos processos e mecanismos auto-reguladores das aprendizagens e de ajustamento académico. Nesta linha, desenvolvemos trabalho no sentido da compreensão de algumas das principais variáveis pessoais (cognitivo-motivacionais e de ajustamento) que (pensamos) afectam as aprendizagens e os consequentes desempenhos académicos dos estudantes, no contexto dos primeiros anos do ensino superior. Na parte empírica, foram consideradas as respostas de 420 estudantes do 1ºano (comum) dos cursos de ciências e engenharias da Universidade de Aveiro, a dois instrumentos designados de 'QIVA: Questionário de Identificação e Vida Académica' e 'QACE: Questionário de Atitudes e Comportamentos de Estudo', construídos e/ou adaptados para o diagnóstico e caracterização de algumas das influências existentes (entre e intra) variáveis pessoais relacionadas com os processos de ajustamento a auto-regulação académica. No tratamento da informação, usamos procedimentos vários da análise descritiva e inferêncial através de ferramentas constantes do pacote estatístico SPSS. Seguimos uma metodologia do tipo ex-post-facto com recurso a modelos correlacionais e diferenciais. Relativamente aos instrumentos aplicados procedemos à validação interna e dimensionamento através da análise factorial (exploratória) das respostas nos itens. Complementamos ainda os estudos diferenciais com uma caracterização dos três agrupamentos obtidos, na amostra, relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens. Os resultados obtidos indicaram uma estreita relação entre as várias dimensões pessoais, interpessoais e institucionais consideradas mais implicados nos processos de ajustamento e auto-regulação académica e apontaram também para a existência de algumas diferenças significativas ao nível dos diferentes grupos analisados. Os resultados de validade interna confirmaram os instrumentos aplicados com potencial para avaliar níveis seleccionados de ajustamento e de auto-regulação académica em estudantes do 1ºano da Universidade. As principais limitações do trabalho ligaram-se à complexidade da fundamentação teórica e à dificuldade em obter instrumentos adequados e devidamente aferidos para avaliar os processos de aprendizagem e desenvolvimento ao nível do ensino superior. Com base na literatura revista e da discussão dos resultados obtidos são sugeridos alguns desenvolvimentos futuros.

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Abstract

The present work is included in the enlarged frame of a project, iniated in 1994 at the University of Aveiro (program 'Praxis XXI'-PCSH/C/CED164/96) with the main aim of diagnosing/ reflecting/ intervening over the main responsible factors for the (in)success of common 1st year students of degrees in sciences and engineerings. With exploratory character and guided to basis potential intervenes in this ambit, we re-examined literature and recent investigation works, which explore and justify, on the light of educational psychology, the role of the process and self-regulating mechanisms of apprenticeship and academic adjustment. We directed our investigation to understand the influences of some personal variables (cognitive and motivational and of academic adjustement) which (we believe) intervene in the apprenticeship and academical performances of students of the 1st year university context. For the empirical part, answers of 420 students of the common 1st year of the University of Aveiro were considered in two instruments namely 'QIVA: Questionário de Identificação e Vida Académica' and 'QACE: Questionário de Atitudes e Comportamentos de Estudo', which we constructed and/or adapted for the diagnostic and characterization of the existing influences (extra e intra) variables related to academic adjustment and self-regulating processes. For the treatment of information some proceedings of the descritive and inferential analysis with several tools of the SPSS satistical package were used. We followed a methodology of the kind ex-post-facto, under consideration of the correlational and differential models. Concerning the used instruments we procede to internal validation and dimensioning with factorial (exploratory) analysis of the answers to the itens. We complement the differential analysis with a characterization of the three obtained clusters in the sample, in relation to the use of self-regulating strategies of apprenticeship. The results lead in the sense of a close link between personal, interpersonal and institutional dimensions taked into consideration in the academic adjustment and self-regulating processes. The results of this study also stand out some significant differences on the analysed groups. The validity results underline the used instruments with some potential to evaluate levels of academic adjustement and self-regulating processes on 1st year university students. The main limitations in the study descend from the complexity of theoretical fundamentation and from the difficulty in obtaining adequate instruments to the evaluation od levels of academic adjustment and of the processes of apprenticeship and development of students in the university context. Finally, basing ourselves in the reviewing litterature and in the discussion of the obtained results, we include some suggestions to future developments and interferences.

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À Clara, minha mulher, que nunca me deixou desistir. À Catarina e ao Henrique, meus filhos.

Aquilo que é regular, ordenado, factual, nunca basta para abranger toda a verdade.

A VIDA extravasa sempre a borda de qualquer taça (Boris Pasternak, 1890-1960 ).

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Índice geral

Título 1 Júri 2 Agradecimentos 3 Resumo 4 Abstract 5 Índices 7 Índice geral 7 Índice de figuras, gráficos e quadros 11 Introdução geral 15 Enquadramento do estudo 15 Objectivos do estudo 20 Problemática e aspectos a desenvolver 21 Organização do estudo 23

PRIMEIRA PARTE : REVISÃO DA LITERATURA Capítulo 1. Modelo de desenvolvimento e ensino superior: o processo de ajustamento

académico do jovem estudante universitário

27 1. Agenda educativa universitária 28

1.1. Aspectos da qualidade 28 1.2. Missão e funções da universidade 33 1.3. Competência académica 37

1.3.1. Conhecimento, skills , estratégias e além da competência académica 37 1.3.2. Quais as competências desejadas? O caso específico da Universidade de Aveiro 44

2. Factores do ajustamento académico 48 2.1. Desenvolvimento psicológico 49

2.1.1. Delimitação do conceito: o que é o desenvolvimento? 50 2.1.2. Abordagens psicossociais do desenvolvimento 51 2.1.3. Modelo de activação do desenvolvimento psicológico: ADP 58

2.2. Gestão da transição entre subsistemas de ensino secundário e superior 62 2.3. Impacto dos contextos no ajustamento 65 2.4. Concepções de ensino e aprendizagem 71

2.4.1. Como os professores universitários vêm o seu ensino? 72 2.4.2. Como os estudantes universitários vêm a sua aprendizagem? 74

3. Análise dos processos de ensino e aprendizagem 76 3.1. Princípios enfatizados pelo behaviourismo 78 3.2. Princípios enfatizados na psicologia cognitiva 80 3.3. Princípios enfatizados na psicologia social e fenomenológica 84 3.4. Modelos heurísticos 86

Capítulo 2. Competências cognitivo-motivacionais em estudantes universitários 91 1. Cognições 91

1.1. Abordagens teóricas da Inteligência na aprendizagem 92 1.1.1. Abordagem psicométrica, diferencial ou traço-factor 92 1.1.2. Abordagem desenvolvimental 94 1.1.3. Abordagem cognitivista ou de processamento da informação 95

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8

1.2. As múltiplas inteligências 99 1.3. Os contributos da inteligência emocional 104 1.4. Competência intelectual 107

1.4.1. Perspectivas da modificabilidade e do treino cognitivo 108 1.4.2. Inteligência e conhecimento 112 1.4.3. Capacidade cognitiva e comportamento inteligente 113 1.4.4. A metacognição 115 1.4.5. Os processos inteligentes ou as competências do pensar 120

2. Motivações 126 2.1. Abordagens teóricas da motivação na aprendizagem 126 2.2. Metas e objectivos motivacionais 132 2.3. Atribuições causais 137 2.4. Sistemas de concepção e percepção escolar 141

2.4.1. Sistemas conceptuais 142 2.4.2. Sistemas de percepção das tarefas 144

2.5. Motivação intrínseca para aprender ou a competência motivacional 147 2.5.1. Modelo do investimento pessoal 149 2.5.2. Modelo da causalidade pessoal 151 2.5.3. Modelo integrativo 152

Capítulo 3. Processos auto-reguladores do estudo e aprendizagens 159 1. A auto-regulação académica: delimitação do conceito 160

1.1. Ciclos auto-regulatórios do estudo e aprendizagens 165 1.2. Modelo conceptual para análise da auto-regulação académica 168

2. Estratégias auto-reguladoras das aprendizagens 172 2.1. Tácticas, skills, estilos e outros processos cognitivos e não cognitivos 175 2.2. Estratégias e diferenças individuais fundamentais 181 2.3. Estratégias e variáveis situacionais 186 2.4. ‘Abordagens’ ou modelos de orientação estratégica 187 2.5. Modelo (comportamental) de utilização das estratégias 192 2.6. Outros modelos classificativos das estratégias 199

SEGUNDA PARTE : INVESTIGAÇÃO EMPÍRICA Capítulo 4. Metodologia 209 1. Linha condutora da investigação 209 2. Plano de investigação 211 3. Instrumentos 212

QIVA: Questionário de Identificação e Vida Académica 212 3.1. [Aja]: Ajustamento académico 213

3.1.1. Estudo de adaptação do inventário [Aja] 213 3.1.2. Validação interna e análise das respostas aos itens de [Aja] 215

QACE: Questionário de Atitudes e Comportamentos perante o estudo 223 3.2. [Ae]: Abordagens ao estudo 224

3.2.1. Selecção, tradução e adaptação do inventário [Ae] 226 3.2.2. Validação interna e análise das respostas aos itens de [Ae] 228

3.3. [Che]: Comportamentos habituais de estudo 236 3.2.1. Construção e dimensionamento do inventário [Che] 237 3.2.2. Validação interna e análise das respostas aos itens de [Che] 238

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Índice Geral 9

4. Procedimentos metodológicos 245 4.1. Descrição funcional das variáveis para investigação 246 4.2. Procedimentos estatísticos e especificação das hipóteses 248

5. População-alvo 250 5.1. Identificação 250 5.2. Plano de amostragem 251 5.3. Caracterização da amostra 252

5.3.1. Dados demográficos 252 5.3.2. Dados escolares 253

Capítulo 5. Apresentação de resultados 257 1. Existência de problemas actuais e principais atribuições do sucesso/insucesso 257

1.1. Existência de problemas actuais 257 1.1.1. Indicador agregado ‘problemas actuais’ 258 1.1.2. Variação segundo os características dos respondentes 259

1.2. Atribuição causal do sucesso e Insucesso 261 1.2.1. Internalidade/externalidade pelo sucesso 262 1.2.2. Internalidade/externalidade pelo insucesso 263

2. Níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens 266 2.1. Distribuição dos níveis de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento

académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

266 2.2. Intercorrelações entre níveis de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento

académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

267 2.3. Capacidade preditiva e estrutura factorial subjacente aos níveis de satisfação com a Universidade, confiança

em si e medida de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras

270 2.4. Medida da influência das diferenças individuais sobre o uso de estratégias auto-reguladoras das

aprendizagens

272 2.4.1. Influência dos dados demográficos sobre o uso de estratégias auto-reguladoras 272 2.4.2. Influência dos dados escolares sobre o uso de estratégias auto-reguladoras 273 2.4.3. Influência dos níveis de ajustamento académico sobre o uso de estratégias auto-reguladoras 274 2.4.4. Influência dos abordagens do estudo sobre o uso de estratégias auto-reguladoras 274

3. Estudos diferenciais 276 3.1. Efeitos dos dados demográficos e escolares sobre os níveis de satisfação com a Universidade, confiança em

si e medida de ajustamento académico

276 3.1.1. Efeitos dos dados demográficos 276 3.1.2. Efeitos dos dados escolares 277

3.2. Efeitos dos dados demográficos e escolares sobre as abordagens do estudo 279 3.2.1. Efeitos dos dados demográficos 279 3.2.2. Efeitos dos dados escolares 280

3.3. Efeitos dos dados demográficos e escolares sobre o uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens 282 3.3.1. Efeitos dos dados demográficos 283 3.3.2. Efeitos dos dados escolares 284

3.4. Estudo e identificação de grupos de sujeitos relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

286

Capítulo 6. Discussão e conclusões 289 1. Síntese e discussão dos resultados obtidos 289

1.1. Estudo da validade dos instrumentos aplicados 290 1.2. Existência de problemas actuais e atribuições causais 292 1.3. Análise (global) dos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras 293 1.4. Diferenças nos níveis de ajustamento, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras 296 1.5. Análise de clusters relativos ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens 298

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2. Conclusões 301 3. Limitações metodológicas e futuras investigações 305 Referências bibliográficas 309 Anexos 327 1. Resumo das principais características de instrumentos inseridos no modelo ‘SAL’ 2. ASI: versão de 18 itens (Newstead, 1992) 3. Síntese dos processos auto-reguladores do estudo e aprendizagens 4. QIVA: Questionário de Identificação e Vida Académica 5. QACE: Questionário de Atitudes e Comportamentos de Estudo 6. Matriz de dimensões, indicadores e itens (QIVA+ QACE)

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Índice de figuras, gráficos e quadros

1. Índice de Figuras Figura 1-I: eixo das definições de qualidade Figura 1-II: etapas na abordagem da qualidade Figura 1-III: a missão e funções da Universidade Figura 1-IV: processo de valorização intelectual dos estudantes universitários Figura 1-V: além da competência académica Figura 1-VI: modelo de Activação do Desenvolvimento Psicológico- ADP Figura 1-VII: modelo de avaliação do impacto dos ambientes universitários na aprendizagem e no

desenvolvimento cognitivo do estudante Figura 1-VIII: modelo organizativo do ajustamento académico Figura 1-IX: modelo (heurístico) de análise dos processos de ensino e aprendizagem Figura 1-X: modelo dos 3P: Presságio/Processo/Produto da aprendizagem Figura 2-I: sistema de processamento da informação Figura 2-II: a teoria triárquica da Inteligência e suas componentes Figura 2-III: esquema das interacções entre fenómenos cognitivos no modelo de Flavell Figura 2-IV: componentes da metacognição Figura 2-V: consequência da percepção da (in)controlabilidade das tarefas Figura 2-VI: factores da motivação escolar Figura 2-VII: consequências das representações acerca das metas académicas e concepção de inteligência Figura 2-VIII: componentes da percepção dàs exigências das tarefas Figura 2-IX: anteedentes do sentido e investimento pessoal Figura 2-X: modelo produtor de processos e competências subjacentes à motivação intrínseca para aprender Figura 2-XI: modelo comtemporâneo da motivação para o comportamento estratégico Figura 3-I: componentes do modelo SRL: Self-Regulated Learning Figura 3-II: ciclo das fases auto-reguladoras do estudo académico Figura 3-III: modelo conceptual para estudar a auto-regulação académica Figura 3-IV: skills e estratégias Figura 3-V: relação entre estratégias de aprendizagem e outros processos cognitivos e não cognitivos Figura 3-VI: modelo de aprendizagem em contexto Figura 3-VII: síntese das características das abordagens ao estudo e aprendizagens Figura 3-VIII: modelo de utilização das estratégias de estudo e aprendizagem Figura 3-IX: classificação das estratégias, segundo Pozo (1995) Figura 3-X: classificação das estratégias, segundo O'Malley et al. (1988) Figura 3-XI: classificação das estratégias, segundo Boulet et al. (1996)

29 31 34 36 43 62

69 70 87 89

98

103 117 118 141 142 144 146 150 153 157

164 166 171 176 179 186 189 197 201 203 204

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12

2. Índice de gráficos Gráfico 5-I: distribuição dos problemas actuais dos sujeitos da amostra (em %) Gráfico 5-II: atribuição causal do sucesso escolar na amostra Gráfico 5-III: atribuição causal do Insucesso na amostra

258 262 263

3. Índice de quadros Quadro 4-I: medidas de distribuição e sensibilidade dos resultados nos itens de [AjA] Quadro 4-II: correlações dos resultados nos itens de [AjA] Quadro 4-III: solução oblíqua dos resultados nos itens de [AjA] Quadro 4-IV: correlações nos factores de [AjA] Quadro 4-V: medidas de distribuição e sensibilidade dos resultados nos itens de [Ae] Quadro 4-VI: correlações dos resultados nos itens de [Ae] Quadro 4-VII: solução ortogonal dos resultados nos itens de [Ae] Quadro 4-VIII: correlações nos factores de [Ae] Quadro 4-IX: matriz (inicial) das dimensões e itens de [Che] Quadro 4-X: medidas de distribuição e sensibilidade dos resultados nos itens de [Che] Quadro 4-XI: correlações dos resultados nos itens de [CHe] Quadro 4-XII: solução ortogonal dos resultados nos itens de [CHe] Quadro 4-XIII: correlações nos factores de [Che] Quadro 4-XIV: distribuição da amostra por prioridade de escolha do curso Quadro 4-XV: distribuição da amostra por médias obtidas no secundário e nota de acesso à Universidade Quadro 4-XVI: distribuição da amostra por categorias de cursos Quadro 4-XVII: distribuição da amostra por % de tempo útil semanal dedicado a cada actividade proposta Quadro 5-I: elementos estatísticos no cruzamento do indicador agregado ‘problemas actuais’ com as variáveis

independentes Quadro 5-II: variação significativa no cruzamento do indicador agregado 'problemas actuais' com a variável

independente 'nota de acesso à Universidade Quadro 5-III: variação significativa no cruzamento do indicador agregado problemas actuais’ com a variável

independente ‘nível de confiança em si’ Quadro 5-IV: variação significativa no cruzamento do indicador agregado 'problemas actuais’ com a variável

independente ‘Nível de ajustamento académico' Quadro 5-V: elementos estatísticos do cruzamento do indicador agregado 'internalidade/externalidade do

insucesso escolar' com as variáveis independentes Quadro 5-VI: variação significativa no cruzamento do indicador agregado ‘Internalidade/externalidade do

Insucesso’ com a variável independente ‘abordagem [deep]

217 218 220 222 229 231 233 234 238 239 240 242 244 253 254 254 255

259

260

260

261

264

265

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Índice de figuras, gráficos e quadros 13

Quadro 5-VII: medida de distribuição e sensibilidade dos resultados nos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras

Quadro 5-VIII: intercorrelações dos resultados nos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras

Quadro 5-IX: solução ortogonal dos resultados nos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras

Quadro 5-X: resumo da regressão múltipla dos dados demográficos sobre o uso de estratégias auto-reguladoras Quadro 5-XI: resumo da regressão múltipla dos dados escolares sobre o uso de estratégias auto-reguladoras Quadro 5-XII: resumo da regressão múltipla dos níveis de ajustamento académico sobre o uso de estratégias

auto-reguladoras Quadro 5-XIII: resumo da regressão múltipla das abordagens do estudo sobre o uso de estratégias auto-

reguladoras Quadro 5-XIV índices estatísticos e valores do teste t- Student na comparação de médias dos resultados nos

níveis de ajustamento académico segundo dados demográficos Quadro 5-XV: índices estatísticos e valores de F-Fisher na comparação de médias dos resultados nos níveis de

ajustamento académico segundo dados escolares Quadro 5-XVI: índices estatísticos e valores do teste t- Student na comparação de médias dos resultados nas

diferentes abordagens do estudo segundo dados demográficos Quadro 5-XVII: índices estatísticos e valores de F-Fisher na comparação de médias dos resultados nas

diferentes abordagens do estudo segundo dados escolares Quadro 5-XVIII: índices estatísticos e valores do teste t- Student na comparação de médias dos resultados nos

factores correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras segundo dados demográficos Quadro 5-XIX: índices estatísticos e valores de F-Fisher na comparação de médias dos resultados nos factores

correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras segundo dados escolares Quadro 5-XX: medidas de distribuição das respostas nos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso

de estratégias reguladoras em cada agrupamento de sujeitos resultante da análise de Clusters

266

268

271 272 273

274

275

277

278

280

281

283

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286

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INTRODUÇÃO GERAL

1. Enquadramento do estudo

Anualmente, milhares de jovens ingressam nos subsistemas do ensino superior constituindo um 'corpo' e uma 'alma' particularmente importante para a vida académica das instituições. Mas, se por um lado estes jovens vêm sustentar e rejuvenescer os contextos que os acolhem porque são portadores de novas ideias, conhecimentos, experiências, valores, motivações e percursos; por outro, trazem consigo dificuldades que exigem das instituições (e seus agentes) uma maior implicação e atenção às mudanças organizacionais, políticas, pedagógicas e científicas (Cruz et al, 1995; Nico, 1995; Gago et al., 1994; Conceição et al., 1998). Entretanto, o aumento e a diversificação da população estudantil é de todos os fenómenos aquele que adquiriu maior visibilidade nestas últimas décadas (Tavares at al, 1998: 9). Segundo estes investigadores, as mudanças verificadas situam-se sobretudo ao nível da 'formulação de novas expectativas e aspirações sociais sobre as funções e papéis das universidades, nas alterações dos seus sistemas de financiamento, no desenvolvimento do conhecimento científico e tecnológico, nas novas estratégias de desenvolvimento interno das organizações e a influência das políticas educativas nacionais na procura de respostas para o aumento e diversificação da população estudantil. No entanto, a nível institucional, não tem sido tarefa fácil se atendermos aos enormes problemas e evidentes constrangimentos na gestão e na adaptação às novas exigências e aos desafios decorrentes dos novos estatutos que estas organizações e os seus membros passaram a gozar (Nico, 1995: 6). A problemática do sucesso/ insucesso escolar e académico surge, no contexto dos primeiros anos do ensino superior, como um fenómeno de complexidade crescente e assume proporções cada vez mais preocupantes em Portugal (basta ver os relatórios publicados pela OCDE; ME; CRSE; entre outros) quando comparado com outros países da Comunidade Europeia. Relatórios recentes, emanados de diversas instituições nacionais e comunitárias, apontam o sistema de ensino português detendo elevadas taxas de alunos em insucesso escolar no final do secundário e primeiros anos da Universidade, designadamente nas áreas de ciências ditas "exactas" (biologia, física, matemática, economia, engenharia, etc). A nível político, sublinhamos uma tentativa para tornear o problema, nomeadamente o incentivo dado pelo Despacho nº6659/99 do Ministério da Educação, de 5 de Abril às universidades portuguesas para promover estudos e investigações que identifiquem medidas de intervenção e acção conducentes a uma significativa redução das elevadas taxas de insucesso nos primeiros anos da formação e, no qual, entre vários aspectos organizacionais se apresenta uma nova concepção de aluno 'elegível' (Lei nº113/97) para efeitos de financiamento. Não obstante, constatamos que os diversos subsistemas de ensino universitário de um modo geral teimam em reduzir os conceitos de sucesso/ insucesso à quantificação de fenómenos observáveis e

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contextualmente determinados (Martins, 1991: 11) ou quando reforçam a figura do 'bom aluno'. Isto é, aquele que consegue obter classificações elevadas, cumprindo os normativos exigidos ou pré-estabelecidos pelo próprio sistema. Como exemplo, basta atender que esta designação adquire um particular relevo no acesso e ingresso ao ensino superior, designadamente quando se estabelece o numerus clausus como (única e exclusiva) determinante nas opções e prioridades de acesso ao curso ou à Universidade e ao longo de toda a frequência universitária. No contexto específico da Universidade de Aveiro, observamos que o número de alunos inscritos em algumas disciplinas do 1ºano comum (e.g., cálculo I e II) das licenciaturas em ciências e engenharias ultrapassa todos os anos e em larga medida (mais de 50%) o número de alunos previsto pelo numerus

clausus. Aceitamos que uma explicação para este facto possa estar associada a um 'insucesso institucional' (Pires, 1987: 198) pouco quantificável, implícito e bastante mais complexo que qualquer outro. Referimo-nos, designadamente à hipótese da '(des)adequação' dos modelos, critérios, regras, conteúdos, programas, formações, etc. às capacidades, vocações, expectativas, crenças, motivações dos sujeitos. Por outro lado, podemos igualmente acreditar que os objectivos, os meios, os métodos e as estratégias estejam bem definidas; que os processos estejam ajustados; que as tarefas sejam as mais interessantes e motivadoras, úteis e actualizadas e as mais adequadas às capacidades e aptidões dos alunos e, no entanto, muitos jovens estudantes universitários não aprendem nem se desenvolvem (Tavares, 1992: 57). Então, questionamos- porque será?. Para responder à questão, começamos por assumir que o 'insucesso' seria algo não redutível à sua visualização imediata, muito complexo e resultante de disfuncionalidades presentes na sociedade, nas instituições, nos sujeitos e, ainda nos mecanismos, nos processos e contextos em que estas entidades se movem ou se articulam (Martins, 1991: 9). Neste sentido, qualquer tentativa de exploração da problemática relativa ao sucesso/ insucesso deverá ser tomado a partir de diferentes pontos de vista e com base na observação de múltiplos aspectos que emergem em diversos factores, tais como:

• factores político-académicos, implicados na organização e estrutura administrativa, científica, académica das instituições e respectivas autonomias e financiamentos;

• factores pedagógico-didácticos, nos quais, se incluem a orgânica relativa aos processos de formação ensino e aprendizagem, nomeadamente: planos de estudos, docentes, materiais, conceitos e práticas de avaliação, entre outros;

• factores sócio-culturais, ligados ao contexto familiar e sócio-económico dos sujeitos e à qualidade das relações interpessoais e grupais e incluíndo as dificuldades relacionais nos sujeitos;

• factores psico-cognitivos, associados às estruturas cognitivas, às diferenças individuais, aos estilos pessoais e cognições, às aspirações e expectativas, às motivações e interesses, à satisfação, às

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atitudes e comportamentos, aos métodos e procedimentos, à qualidade da integração e adaptação aos contextos, etc.

Mas, verificamos que muitos dos estudos existentes, descritos e planeados, para explicar as relações potenciadoras de equílibrios e desenvolvimento, nos jovens universitários, nem sempre tinham em conta as idiossincrasias pessoais a par dos processos e dos contextos em que estes estudantes se inserem. Aliás, observamos que nos poucos casos em que seria possível conjugar os vários factores, nem sempre havia consistência nas respostas dadas aos problemas. Designadamente, quanto aos níveis de desenvolvimento (psicológico, axiológico, afectivo-relacional, etc.) dos sujeitos e a sua influência nas actividades e tarefas académicas, nos processos e estratégias, nos meios e contextos (Tavares, 1995: 48).

As influência recebidas ao longo do percurso de formação conduziam a uma abordagem dos sujeitos e situações de acordo com uma orientação construtivista e desenvolvimentista da pessoa, essencialmente marcada pelas correntes recentes da aprendizagem e das psicologias cognitiva e social. Contudo, preferimos não 'eleger' esta ou aquela teoria ou 'escola' de pensamento (geral ou específico) como a mais adequada a este estudo. Ao invés, encaramos cada modelo ou enquadramento teórico como mais uma componente ou estrutura conceptual aberta, genérica e complexa que possa integrar os vários aspectos e elementos em análise. Perante o grau de complexidade das respostas, dos sujeitos e das situações em estudo, bem como das analogias existentes, optamos pela linguagem do paradigma sistémico (Bertalanffy, 1977; Pocsztar, 1989). A análise sistémica é um processo de estudo da complexidade para melhor compreender e agir; é um processo recente de pensamento que, conduzindo a uma visão global das situações complexas, permite uma explicação mais completa (circular) das relações causais e efeitos (Rosnay, 1975). Neste contexto, aceitamos a tese de que os processos de ensino e aprendizagem parecem assumir a inevitabilidade histórica de 'ocorrer de forma automática, e por isso nem sempre é fácil percebermos as componentes que, nestes, intervêm' (Silva & Sá, 1993: 15). Mas, seguindo uma abordagem sistémica, é possível considerar a coexistência de diversos blocos de sistemas distintos num permanente estado de equilíbrio entre as suas componentes internas e com o sistema no seu 'todo'. Por exemplo, Biggs (1993: 10) salienta vários destes sistemas, designadamente, o sistema 'sociedade', o qual recentemente em muitos países impõe os seus próprios constrangimentos ao nível da educação, em geral, e ao nível universitário, em particular; o sistema 'institucional', o qual em si mesmo, contém subsistemas (Universidade, departamentos, secções, cursos, disciplinas) cada um com o seu potencial para promover ou, como Reid (1987, referido por Biggs, 1993) considera mais provável, impedir a prática esclarecida; o sistema 'de aula', compreende aluno, professores, pares e contexto de ensino; e por fim, o sistema 'estudante', o qual compreende um equilíbrio entre variáveis cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais e fenómenos de contexto percepcionado. Com efeito, julgamos que este equilíbrio entre sistemas é crítico no que diz respeito à compreensão da forma como uma determinada intervenção produz (ou não) uma mudança efectiva quer ao nível quer da

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promoção e desenvolvimento das competências de estudo de um jovem estudante universitário quer ao nível da formação do corpo docente para agir durante as aulas. Além disso, parece-nos fortemente implicado na tradução e melhoria da qualidade de serviços e mecanismos institucionais. Para a presente investigação, optamos por fixar o centro da causalidade no sistema 'estudante' e admitimos que os equilibrios necessários (em termos de desempenhos e rendimento académico) são o produto de processos complexos de relacionamento entre (e intra) diferentes características pessoais e de desenvolvimento. Ou seja, este alguém que aprende, as suas características pessoais, capacidades, competências, atitudes e interesses, mas, também as suas energias, vontades, motivações e sua consciência tornam-se no objecto fundamental para os processos, segundo os quais, o aprender se constitui. Em reforço desta ideia, Collier (1988, referido por Miller, 1991: 217) sugere que uma limitação da educação, especialmente no contexto universitário, prende-se com o facto de se enfatizar demasiado a análise, o intelecto e as capacidades cognitivas em detrimento de outras valências humanas, como por exemplo, o desenvolvimento afectivo e volitivo. Segundo Miller (1991), no aprender e estudar há mais qualquer coisa no que concerne ao processo e aos objectivos do que a mera cognição. E acrescenta, no mínimo importa considerar os efeitos da motivação e emoção no desenvolvimento cognitivo. É pois, neste sentido, que falamos das qualidades diferenciadoras, peculiares em cada indivíduo e relativamente estáveis na sua conduta, conduta esta produzida e gerada por um sujeito activo em continuidade consigo próprio ao longo do tempo e com importantes processos virados quer para si próprio quer para o seu exterior, principalmente aos outros sujeitos humanos com quem estabelece determinadas regras de interacção pautadas por valores, atitudes, procedimentos e comportamentos (Fierro,1995: 176). Paralelamente, no suposto que o desenvolvimento é um processo de interacção que ocorre ao longo de toda a vida ajustamos a este estudo, o conceito de 'metacognição' como o conhecimento que o indivíduo denota possuir sobre o seu próprio processo de desenvolvimento e produtos cognitivos ('conhecimento metacognitivo') e o conjunto de experiências conscientes, cognitivas ou afectivo-relacionais ('experiência metacognitiva'). Este conceito abrange, não só, o conhecimento ou crença sobre os objectos pessoais, cognitivos (capacidades, atributos) e outros (percepções, emoções, motivações), mas, de igual modo, o conhecimento sobre as próprias acções, avaliação e correcção dos seus desempenhos e resultados (Flavell, 1987). Por exemplo, num jovem estudante universitário, a competência para aprender estará, em parte, dependente da percepção ou crença relativamente às suas próprias competências e do controlo e organização pessoal que acredita exercer sobre as actividades escolares. Isto é, quando se apercebe que adquiriu os meios intelectuais, psicológicos e sociais para agir e dominar as situações e quando constata que tem sucesso onde antes não tinha (Postic, 1995: 9). Neste quadro, salientamos o carácter dado por Ralha-Simões (1995: 155) ao conceito de competência como 'a qualidade pessoal global, segundo um modelo de competência em que se interligam as

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dimensões de actividade relevantes, incluindo comportamentos, desempenhos, conhecimentos, capacidades, níveis de adequação, intenções, motivos e atitudes, não se exprimindo apenas através de uma dimensão particular, mas, pela presença de um conjunto de relações conceptuais que estão na base do exercício da actividade competente'. Aliás, é este carácter activo, intrinsicamente motivado e não apenas reactivo relativamente aos estímulos recebidos e exigências do exterior, no indivíduo, que parece constituir o princípio da acção e da interacção com o contexto e não um mero sistema de reacção ou reprodução. Paralelamente, algumas leituras efectuadas (Tinto,1993; Russell & Petrie,1992; Upcraft et al. 1989; Pascarella & Terenzini,1991; Ramsdem, 1992; Nico, 1995; Pereira, 1997, 1998; Taveira, 1997; Marton et al, 1997; Soares, 1998; Tavares et al, 1996, 1998; Leitão e Paixão, 1999, Almeida e Ferreira, 1999; Bastos e Gonçalves, 1997; Carneiro, 1999; Ferreira e Hood, 1990; Marques e Miranda, 1991; Rosário, 1999, etc.), conduziram-nos à noção de que as diferentes dimensões psico-pedagógica e afectivo-relacional (a 'envolvente' de que nos fala Tavares, 1992;1995) onde se realizam os processos de ensino/ aprendizagem/ desenvolvimento são componentes influentes e responsáveis por baixos (altos) níveis de êxito e sucesso nos desempenhos escolares e/ou académicos dos estudantes universitários. Neste contexto, a transição entre os subsistemas de ensino (secundário e superior) tem sido conceptualizado como um período particularmente difícil, crítico e desafiador para todos os estudantes. Este período da vida académica exige, entre outros aspectos que os jovens estudantes ao ingressarem numa Universidade, se desenvolvam e adaptem rapidamente às novas exigências e pressões decorrentes da utilização de diferentes metodologias, sistemas e modelos de avaliação, que por sua vez requerem novos ritmos de aprendizagem, outros métodos e hábitos de trabalho ou estudo mais eficazes. Segundo Lopes da Silva (1994: 6) 'salientar o papel das estratégias da aprendizagem é afirmar o papel activo que os estudantes podem exercer no seu desempenho escolar, ao tomarem consciência da existência, aplicabilidade e utilidade daqueles processos de aprendizagem e na auto-regulação das suas cognições, emoções, comportamentos e meio com o propósito de aprender melhor. É 'acentuar o importante papel do estudante aprender a aprender' (ibid.). Ao nível das preocupações do presente estudo (as quais vão ao encontro da compreensão das principais variáveis pessoais que, julgamos, afectam o sucesso) fomos rever alguma literatura específica acerca dos processos de ajustamento e auto-regulação académica. Constatamos que as várias investigações levadas a cabo em diferentes lugares e contextos acerca dos processos de ajustamento e auto-reguladores das aprendizagens em estudantes do ensino superior tendem a conjugar duas perspectivas que convergem na ênfase dos objectivos exploratórios e nos contextos de aplicação destas disciplinas sobre a natureza da aprendizagem individual. Ou seja, por um lado, desenvolvem e estendem as teorias e técnicas principais da investigação educacional para enquadrar as formas específicas do ensino e aprendizagem existentes nas Escolas e/ou Universidades e, por outro, aplicam os modelos e procedimentos da psicologia sócio-cognitiva a uma realidade que envolve atitudes, procedimentos e comportamentos intelectuais

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complexos. Neste sentido, as teorias da psicologia sócio-cognitiva exploram o modo e o porquê os alunos fazem a aprendizagem, em termos da sua mediatização com o meio 'natural' e as formas elaboradas de acesso a este, enquanto as teorias educacionais exploram o modo e o porquê os indivíduos falham na aprendizagem, em termos dos seus ténues e difíceis acessos ao 'não natural' mundo das ideias académicas (Laurillard, 1987). Por último, entendemos também que uma reflexão sobre este tipo de influências chamaria certamente a atenção para a importância da tomada de consciência relativamente aos métodos e aos mecanismos de ensino/ aprendizagem adoptados no contexto académico universitário, ao mesmo tempo, que implicava a compreensão do papel dos respectivos processos de intervenção. Na realidade, ninguém sabe com rigor como se desenvolvem estas competências. Sabe-se apenas que, de um modo geral:

• não são adquiridas por todos os alunos nem à chegada nem à saída da Universidade;

• não é usual fazerem parte de um plano de estudos específico, sistemático ou organizado de uma Universidade;

• que, apesar da sua rentabilidade do ponto de vista do sucesso escolar e académico, são adquiridas primordialmente pela experiência pessoal em contexto sócio-cultural em detrimento do contexto de ensino, reforçando as desigualdades perante o estudo e aprendizagens;

• que a sua aquisição e desenvolvimento não é, apenas, uma questão de planos ou programas de intervenção pedagógica, dizendo sobretudo respeito à 'forma' e 'modo' de trabalhar dos próprios alunos e à consciência que os próprios têm acerca disso. Isto é, a maneira como são orientados no estudo, convidados ou incitados a aprender a aprender (Hutmacher, 1992: 48).

2. Objectivos do estudo

A partir do enquadramento anterior, tentamos progredir no nosso trabalho seguindo a máxima de que a ‘inovação é a introdução intencional e deliberadamente assumida de um elemento novo e original, visando melhoria’ (Correia,1994:21); ou, ainda no sentido de que ‘traz à realidade algo de realmente novo’ (Patrício, 1988:8). Inseridos no vasto campo da activação do desenvolvimento psicológico, acreditamos ser possível agir sobre estes jovens estudantes, ajudando-os à mudança de atitudes e comportamentos inapropriados na resposta às dificuldades e aos problemas e no desenvolvimento das competências e skills específicos, os quais lhes permitam adequar estratégias e orientações na auto-regulação das suas aprendizagens. Nestes pressupostos, objectivamos este trabalho de investigação para:

1. reflectir sobre alguns aspectos da transição dos sujeitos entre diferentes contextos de formação e aprendizagem (secundário-superior).

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2. identificar comportamentos, atitudes e procedimentos de estudo que, uma vez caracterizados, predizem intervenções (activação) mais adequadas aos sujeitos, às situações e aos contextos;

3. ajudar no desenvolvimento (global) de cada indivíduo, conhecendo as ferramentas, os meios e as competências necessárias ao êxito e sucesso nos seus desempenhos futuros.

Por fim, desejamos também que este diagnóstico possa trazer algum contributo, mesmo que modesto, para equacionar a qualidade dos mecanismos e processos de intervenção (activação) no desenvolvimento (psicológico, cognitivo e afectivo-relacional) e nos permita construir conhecimento acerca dos processos envolvidos na transição entre diferentes subsistemas e contextos de ensino/ aprendizagem, contribuíndo assim para a promoção da qualidade (educativa, científica, pedagógica, etc.) das instituições tal como vem preconizado nas linhas gerais de orientação emanadas quer dos organismos oficiais quer das próprias instituições (conforme LBSE; UA- Plano plurianual:1995-97 e UA-Plano de desenvolvimento:1999-2003).

3. Problemática e aspectos a desenvolver

A partir de várias sugestões recebidas e na sequência dos resultados e conclusões obtidas pela equipa de investigadores do projecto 'Factores de sucesso/insucesso em alunos do 1º ano das licenciaturas em ciências e engenharia da Universidade de Aveiro', apresentados e discutidos em sucessivos relatórios (Tavares et al.,1996; 1998), bem como muitas outras reflexões (Silva e Sá, 1993; Nico, 1995; Bastos e Gonçalves, 1997; Salema, 1997; Rego e Sousa, 1998; Soares, 1998; Leitão e Paixão, 1999; etc.) conduziram-nos a várias observações que, de um modo geral, são convergentes e situadas ao nível do desenvolvimento das competências de estudo. Com efeito, 'a competência é uma condição sine qua non para um bom desempenho escolar, académico, profissional, etc.' (Tavares,1998: 28). Além disso, julgamos que qualquer intervenção ao nível das competências (de estudo ou outras) promove o desenvolvimento pessoal e quanto mais alto o nível de desenvolvimento mais preparado poderá estar o aluno para adquirir essas mesmas competências, numa ‘espiral de desenvolvimento’ (Tavares, 1992). Assim, destacamos as seguintes observações:

1. O sujeito percepciona-se como agente activo (centro causal da sua actividade cognitiva, afectiva e relacional) com a capacidade de criar representações conscientes e explícitas de acções passadas, presentes e futuras. Aliás, 'todos estes factores podem ser considerados como anteriores ao processo de aprendizagem, embora afectem os resultados que possam vir a ser obtidos'. (Biggs, 1984 citado por Silva & Sá, 1993:15);

2. É possível diagnosticar e caracterizar, nos estudantes universitários, alguns dos principais factores responsáveis por (baixos) altos níveis de (in) sucesso;

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3. É possível compreender e dar resposta a muitos dos problemas de aprendizagem e progressão destes jovens estudantes universitários, demonstrando o carácter de urgência e desejabilidade das intervenções que promovam o desenvolvimento das suas competências.

Mas, sem prejuízo de outras dimensões intervenientes, sendo evidente a carência de competências específicas, capacidades e processos (cognitivos, metacognitivos e afectivo-relacionais) que os objectivos de natureza académica implicam e, além disso, tudo levando a crer que não há uma consciência devida dessas mesmas falhas e possíveis consequências nos respectivos percursos académicos destes jovens estudantes, questionamos.

Será possível identificar e caracterizar a natureza e extensão de algumas das principais competências e motivações académicas que afectam o sucesso nos jovens estudantes universitários? Ou seja, será possível saber quais os problemas de estudo que vivenciam? qual é o seu locus de causalidade relativamente ao sucesso/ insucesso?, quais os seus níveis de satisfação, auto-confiança e de ajustamento global ao contexto académico? quais são os seus métodos e hábitos de estudo?, que concepções e estratégias de aprendizagem lhe estão associadas? qual o nível das suas respostas relativamente aos processos de gestão, organização, controlo e auto-regulação do trabalho e tarefas académicas, bem como o tipo de orientação ou abordagem (estilos) que adoptam perante a adversidade das situações e exigências das tarefas que lhes são propostas? (…).

Por outro lado, como entender e explicar o facto de um grande número destes jovens universitários evidenciarem tão acentuados problemas nos estudos e nas aprendizagens, após terem sido sujeitos a critérios rigorosos e exclusivos de avaliação no acesso á Universidade?

E além disso, 'quando?', 'com quem?' e 'como?' é possível ajudar estes estudantes a modificar as situações e inflectir no sentido do sucesso, optimizando os seus desempenhos escolares e académicos?

Mas, um estudo com o carácter do presente implicava limitações de grandeza e índole diversa. Foi a consciência dos limites impostos que levou a delimitar a problemática a estudar. Neste sentido, optamos por uma abordagem da problemática centrada no diagnóstico e na compreensão das questões para posterior intervenção. Excluímos para já, outras abordagens mais ligadas à causalidade. A ênfase nos processos de ajustamento e auto-regulação académica tem a ver com as dificuldades sentidas e enunciadas por estudantes do 1ºano relativamente à adaptação dos seus métodos e hábitos de estudo autónomo aos novos ritmos e exigências das tarefas académicas. A utilização inadequada de estratégias auto-reguladoras de aquisição, planeamento, organização e controlo da informação, entre outras estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais configuram quadros ou 'perfis' de comportamentos e competências de estudo que potenciam desempenhos e resultados académicos.

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Neste contexto, começamos por alinhar dois aspectos (pontos de partida) que julgamos ajudariam na exploração e clarificação das questões avançadas, a saber: a) Começar por posicionar, em contexto de ajustamento académico, as respostas dos jovens estudantes

universitários acerca dos seus hábitos, métodos e estratégias de estudo e aprendizagem segundo uma perspectiva cognitivista e desenvolvimental, considerando as suas competências essenciais e 'skills' específicos, como variáveis:

1. condicionadas ('moderadas', segundo Almeida & Freire, 1997:54) por efeitos simples e/ou de interacção das diferentes características dos sujeitos que pudessem vir a afectar resultados (exemplo: o género, idade, curso escolhido, prioridade no acesso, resultados escolares, etc.); 2. idiossincráticas, dependentes das representações que cada indivíduo tem acerca das suas próprias características pessoais e da forma como este as percepciona, relaciona, ajusta e desenvolve no contexto de aprendizagem; 3. diferenciadoras, susceptíveis de serem activadas e promovidas através de programas e modelos psicopedagógicos adequados aos desempenhos individuais.

b) Fraccionar as nossas preocupações gerais relativas aos processos de estudo e aprendizagem em aspectos exploratórios ou de trabalho mais específicos ou que pudessem ter uma resposta ou desfecho mais inteligível e imediato. Referimo-nos, por exemplo, à recolha de questões com aplicabilidade à prática educativa ou que sirvam para construir instrumentos válidos na avaliação dos processos de ajustamento e auto-regulação académica nos estudantes universitários.

4. Organização do estudo

Este trabalho de investigação segue a proposta de normalização do formato de teses de doutoramento e dissertação de mestrado, emanada da Comissão Coordenadora do Conselho Científico da Universidade de Aveiro, datada de 11/02/1999. Encontra-se organizado através de uma secção de índices, contendo um índice geral e um índice de quadros e figuras, aos quais, sucede esta introdução geral e o corpo de texto composto por duas partes. A primeira destas partes é composta por três capítulos (1, 2 e 3) dedicados, exclusivamente, à revisão da literatura específica considerada mais relevante e á fixação de modelos de análise da problemática. A segunda parte do estudo apresenta a nossa contribuição pessoal e inclui os capítulos 4 ,5 e 6. Assim: � O capítulo 1 concerne á análise do processo de ajustamento académico do jovem estudante

universitário. Neste capítulo começamos por procurar situar aspectos da qualidade e de competência académica na principal agenda educativa universitária e fixar o modelo de activação do desenvolvimento psicológico no contexto do ensino superior. A seguir, foram estudados aspectos relacionados com a

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gestão da transição entre subsistemas de ensino secundário e superior e observados alguns modelos ecológicos de análise do processo de ajustamento académico do jovem estudante universitário. Por fim, fomos observar alguns dos princípios preconizados nas recentes correntes da psicologia educacional acerca dos processos de ensino e aprendizagem, fixando um possível modelo (heurístico) de análise.

� O capítulo 2 é dedicado à revisão da literatura acerca do papel exercido pelas variáveis cognitivo-motivacionais nos processos de aprendizagem, em estudantes universitários. Este capítulo, subdivide-se em dois pontos, começando por fazer uma breve revisão das várias teorizações acerca da inteligência na aprendizagem e os contributos dados pelas teorias das múltiplas inteligências e da inteligência emocional para uma teorização dos comportamentos inteligentes. Neste seguimento, ajustamos o conceito de metacognição e as perspectivas da modificabilidade cognitiva. Depois, fomos estudar a importância das motivações e algumas das principais componentes e modelos de análise que se relacionam com os comportamentos motivados e a motivação intrínseca para aprender.

� No capítulo 3, seguindo o interesse pelas competências de estudo e pretendendo conhecer melhor os mecanismos e processos envolvidos na utilização das estratégias (cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais) nos processos auto-reguladores do estudo e aprendizagens, fomos tentar clarificar alguns dos conceitos envolvidos, com base em estudos e trabalhos recentes da psicologia educacional.

� O capítulo 4 apresenta a metodologia seguida e indica os procedimentos de construção e adaptação dos instrumentos utilizados, assim como, o processo de validação e dimensionamento. Incluimos, neste capítulo, uma descrição operacional das variáveis dependentes e independentes considerados no estudo e especificamos as principais hipóteses de trabalho. Finalizamos com uma caracterização da população-alvo do estudo, a amostra tomada e os principais procedimentos metodológicos tidos na amostragem e na análise dos dados.

� O capítulo 5 diz respeito à apresentação dos resultados, os quais, permitem um diagnóstico e uma caracterização dos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras dos estudos e aprendizagens nos alunos do 1ºano (comum) dos cursos de licenciatura em ciências e engenharias da Universidade de Aveiro

� No Capítulo 6, sintetizamos e discutimos alguns dos resultados obtidos e aproveitamos para tecer alguns comentários e implicações, assim como apresentar as conclusões mais relevantes. Terminamos com a indicação das limitações do estudo e avançamos algumas sugestões para desenvolvimentos futuros.

� Encerramos todo este conjunto de capítulos com uma listagem das referências bibliográficas usadas no estudo e os principais elementos em anexo.

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PRIMEIRA PARTE : REVISÃO DA LITERATURA

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CAPÍTULO 1

Modelo de desenvolvimento e ensino superior: o processo de ajustamento académico do jovem estudante universitário

Porque a dinâmica de mudança das representações tem a ver essencialmente com o contexto e com a própria instituição, facto que implica às práticas académicas um papel preponderante nessa transformação, fomos analisar a principal agenda educativa, na qual, referimos a missão e funções da Universidade dos tempos de hoje para realizações futuras. Incluímos nesta secção uma revisão acerca das principais dimensões e implicações que permitem estabelecer quais as competências desejáveis num licenciado pela Universidade de Aveiro, com base em relatórios recentes e planos de desenvolvimento para o quatriénio (1999-2003).

Por outro lado, é incontestável que hoje já não é mais possível aceitar a formação universitária como um mero adicionar de conhecimentos teóricos ou científicos. Para além da transmissão dos conhecimentos, a Universidade está implicada no crescimento global dos indivíduos, estimulando ou activando o desenvolvimento de atitudes, disposições e comportamentos. Importa então que qualquer análise ou tentativa de explicação dos objectos seja efectuada de um ponto de vista desenvolvimental do sujeito. Neste sentido, procuramos compreender alguns aspectos do desenvolvimento pessoal e analisar algumas das mais recentes abordagens psicossociais, contextualizando um modelo de activação do desenvolvimento psicológico ao nível do ensino superior universitário. Procuramos pistas para responder à questão: como se podem desenvolver as competências em jovens estudantes universitários? Também se justificava a análise dos campos de representação dos actores ou, por outros termos das modalidades através das quais cada um deles conhece o contexto em que se encontra, o reconstrói e o integra no seu universo cognitivo, afectivo e simbólico (Santiago, 1996: 8). Neste sentido, falamos das concepções de ensino (ou, como os professores universitários vêem e abordam o seu ensino) e das concepções de aprendizagem (ou, como os alunos universitários vêem a sua aprendizagem). A seguir, referimos alguns estudos e investigações que observaram os processos relativos ao ajustamento dos jovens universitários no contexto académico, nomeadamente os modelos ecológicos ou 'de impacto', tal como designados por Pascarella e Terenzini (1991) e tentamos explorar alguns aspectos ligados à gestão da transição entre diferentes subsistemas de ensino secundário e superior. Concluímos este capítulo, mencionando os principais princípios enfatizados por algumas das principais teorias psicológicas da aprendizagem e sintetizamos eventuais implicações destas diferentes perspectivas em modelos heurísticos para análise dos processos de ensino e aprendizagem.

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1. Agenda educativa universitária

Em Machado (1991) 'Universidade' (do lat. Universitate), corresponde à 'totalidade das pessoas e das coisas; centro de cultura superior em que se preparam os escóis culturais, profissionais e políticos dos povos modernos; o mesmo que Universalidade// instituição educacional que abrange um conjunto de escolas superiores, destinadas à especialização profissional e científica e tem por função especial asssegurar a conservação e os progressos das ciências, tanto pelo ensino como pela pesquisa científica'. Com efeito, um contributo a prestar pela Universidade para a conservação e desenvolvimento das sociedades modernas consiste, segundo Gouveia (1992: 54), nos seguintes aspectos:

• criação de novos conhecimentos através da investigação;

• difusão de novos conhecimentos através de programas educativos adequados às realidades do desenvolvimento empresarial e regional;

• oferta de oportunidades de aprendizagem a pessoas com aptidões de nível médio e superior;

• intensificação do enquadramento geral numa época em que a ciência e a tecnologia constituem dimensões fundamentais para todos' .

Queiró (1995: 16) parece ir mais além quando afirma que a Universidade 'e um sítio onde se estuda, se aprende, se cria e se critica o saber ao mais alto nível'. Na realidade, a Universidade pode ser entendida como a estrutura privilegiada ou o espaço específico onde se ensinam e aprendem determinados conjuntos de saberes e pensamentos a par do desenvolvimento e 'criação do saber, do mais especulativo ao mais tecnológico' (Serrão, 1995, citado por Silva, 1996: 13) visando dar respostas com qualidade aos problemas mais preementes emanados das sociedades. Mas, se é um facto que estamos diante de uma nova sociedade que aprende e se desenvolve de um modo diferente, então teremos de aceitar que os seus percursos de formação não poderão ser (mais) os mesmos (Tavares, 1996: 21).

1.1. Aspectos da qualidade

De acordo com Middlehurst (1997: 45), a 'qualidade' foi o termo sonante nas sociedades modernas da década de 80, tal como os aspectos da sua padronização parece ser uma preocupação continuada pelas sociedades do presente. Mas já antes, Barnett (1992) ressalvava que ambos os conceitos são deveras contestáveis, uma vez que dificilmente estão limitados aos diferentes conjuntos de valores e interesses além de poderem assumir diferentes interpretações consoante as sociedades, os sujeitos, os contextos, e os processos onde são aplicados.

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CAPÍTULO 1 29

Neste sentido e de um modo geral, pensamos que as universidades tendem a perspectivar a 'qualidade' de um ângulo mais subjectivo e incorporando o conceito com uma visão mais formal. Aliás, os vários estudos recentes que de um modo ou outro vêm abordando esta problemática, no contexto do subsistema de ensino superior (Albino, 1992; Queiró, 1995; Cruz et al., 1995; Gago et al., 1994; Arroteia, 1996, Conceição et al., 1998; Leitão e Paixão, 1999), têm evidenciado o carácter duvidoso do conceito de qualidade. Não obstante, as mesmas evidências tendem a sugerir que as universidades portuguesas têm procurado produzir uma boa sinergia no sentido de produzir uma cultura de melhoria progressiva dos processos e dos seus produtos, segundo parâmetros de eficiência, qualidade e excelência. A este propósito, ajustamos a descrição da 'qualidade' traduzida por Middlehurst (1997: 46), em um eixo cujos extremos indicam o sentido pelo qual a qualidade pode significar tudo aquilo que os indivíduos ou os grupos procuram fazer significar de acordo com os seus próprios interesses, necessidades e objectivos. Cabe neste modelo, em um dos extremos, as noções de qualidade como 'fitness for purpose', isto é, ajustamento de propósitos em termos de satisfação dos utentes (clientes) e, em outro extremo , a qualidade interpretada como o nível de excelência alcançada, definida táctica ou explicitamente por aqueles (os 'connoisseurs') que se pensa ou se assume serem capazes de reconhecer essa mesma excelência.

definições de 'qualidade' ajustamento de propósitos excelência

Figura 1-I: eixo das definições de qualidade

Observamos que em praticamente todos os sectores as reflexões e o debate acerca da 'qualidade' quer ao nível dos processos quer dos produtos, tem produzido fortes tentativas de determinação em torno dos diferentes processos de produção e particularmente das condições e mecanismos exigidos que possam transformar os imputs nos outputs desejados de forma válida, consistente e ajustados às diferentes condições e necessidades. E ainda os processos e produtos, os quais possam ser reconhecidos satisfatoriamente pelos clientes, interesses externos e provedores, isto é, que possam ser considerados distintos e reputáveis. Neste quadro, fomos conduzidos à tese de Tavares (1996: 103) de que a 'cultura da qualidade nas sociedades pós-modernas, começa a ser a regra tendo como grande objectivo a excelência, a qualidade total, como processo complexo que exige atenção constante, renovação da crença na excelência, desenvolvimento das competências técnicas, pessoais e profissionais para a sua realização'. Para Albino (1992: 5), as actividades de uma instituição (Escola ou Universidade) dão origem, não só, a produtos relacionados com a actividade de ensino e aprendizagem, como também, a um determinado número de outros elementos (clientes ou utentes), aos quais esses mesmos 'produtos' são destinados. É feita a referência implícita, por exemplo, aos 'produtos políticos' que os governos das sociedades adquirem

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quando financiam uma Universidade ou aos benefícios (económico e social) que são traduzidos pela produção de uma 'força de trabalho' educada e especializada ou inclusivamente, à oferta de oportunidades de promoção pessoal, social, profissional, cultural, ou outra que as universidades facultam às pessoas. Ao nível específico dos contextos de formação, importa cumprir a satisfação dos interesses e expectativas mais íntimas e pessoais dos estudantes que são indiscutivelmente os utentes mais importantes e que determinam os processos através dos quais qualquer serviço 'de' e 'para' a qualidade lhes é oferecido. No interior das universidades persiste igualmente uma necessidade em enfatizar abordagens mais holísticas ou que apresentem maior atenção às formas de promoção da qualidade quer sejam proactivas e mais dirigidas para o exterior. Ou seja, que estas formas promocionais assentem, nomeadamente na capacidade de organização e gestão, nas responsabilidades profissionais, nos recursos disponíveis e nas obrigações pessoais, mesmo ao nível dos próprios estudantes. Contudo, assistimos sistematicamente ao facto destas abordagens apresentarem-se focadas, fundamentalmente em aspectos de gestão e organização e por conseguinte, tendentes a desvalorizar outras dimensões igualmente importantes na discussão das especificações da qualidade estejam estas situadas ao nível dos contextos, dos processos ou dos recursos (pessoais, profissionais ou académicos) e dos próprios sujeitos. Por outro lado, garantir a qualidade e promover a qualidade não quer dizer necessariamente a mesma coisa. Segundo Middlehurst (1997: 54), ambos dependem de uma apreciação do contexto e do significado de qualidade para cada indivíduo, grupo ou unidade e ambos devem ser construídas a partir da especificidade dos propósitos, metas e objectivos (educativos), assim como de normas que possam guiar os juízos acerca dos produtos ou resultados. Além disso, basta atender que a garantia de qualidade diz respeito à fixação e posterior verificação da validade e consistência dos objectivos, enquanto a promoção da qualidade diz mais respeito à implementação (incremento) ou ajustamento (abordagem alternativa ou transformação) dos objectivos e metas originais. Aliás, o controle da qualidade, nomeadamente os procedimentos adoptados para testar em que medida os objectivos foram (ou não) atingidos ao nível dos desempenhos desejados situa-se antes, ou abaixo da garantia da qualidade, a qual, exige sistemas e procedimentos que garantam que os objectivos são alcançados de forma consistente e segura. Neste sentido, a promoção da qualidade pode ser concebida como etapa sequente (e consequente) de cada uma destas duas dimensões. Por fim, ao nível da transformação da qualidade são consideradas todas as fontes de retroacção e aprendizagem utilizadas para implementar e desenvolver as práticas correntes e, sobretudo os objectivos e assunções que sustentam essas práticas, as quais, são sistematicamente desafiadas a criar e desenvolver novas formas de fazer as coisas com vista á promoção da qualidade. Estas etapas na abordagem e especificação da qualidade estão representadas na figura seguinte.

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CAPÍTULO 1 31

ESPECIFICAÇÕES DA QUALIDADE

CONTROLO GARANTIA PROMOÇÃO TRANSFORMAÇÃO DA QUALIDADE DA QUALIDADE DA QUALIDADE DA QUALIDADE

Dos programas Das disciplinas Do corpo profissional Dos departamentos/ secções/ faculdades Da Universidade Das direcções e departamentos governamentais Dos Ministérios e fundações Do Conselho Nacional da Qualidade

Figura 1-II: etapas na abordagem da qualidade

Importa ainda realçar neste processo, o papel primordial das relações interpessoais porque 'a qualidade é o resultado da interacção dinâmica que é desencadeada e acontece no interior deste sistema em que a determinação, o conhecimento e o envolvimento dos diferentes actores ou autores do processo e o pacto social constituem os seus suportes fundamentais' (Tavares, 1996: 105). Parece, pois, haver um longo caminho a percorrer para se incluir na agenda das universidades a tal revolução1 de que nos fala Tavares (1996) rumo à qualidade total e objectivada para atingir os mais altos níveis ou padrões de qualidade. Ou seja, 'as aprendizagens e o pensamento estratégicos, que devem, cada vez mais, passar pelas experiências, pela vida das pessoas e das colectividades' exigem uma cultura da qualidade e excelência de um ponto de vista holístico, total, a qual passa pela articulação de um conjunto de princípios, 'condição sine qua non para uma verdadeira activação do desenvolvimento psicológico'. Mas, este conceito de 'qualidade total' implica uma grande transformação das atitudes e práticas, dos conhecimentos, das estratégias e tácticas que conduzam a um envolvimento efectivo e progressivo da sociedade, dos estudantes, dos professores e investigadores, dos técnicos, dos políticos, etc.. Ou seja, pressupõe dar resposta de modo adequado e articulado às dúvidas acerca do 'porquê?'; em 'quê?'; 'para 'quê?;' e 'com quem?'. Os seguintes axiomas acerca da qualidade total enunciados por Tavares, são um importante ponto de partida para a acção:

• aceitar a ideia da renovação e revisão da organização e da gestão;

• desenvolver um novo modo de agir nas organizações;

• a cultura da qualidade começa pelas pessoas;

• a cultura da qualidade é uma filosofia de educação renovada e permanente;

1 'uma revolução que deve começar pelos esquemas mentais das pessoas, ou seja, pelas maneiras de pensar e de agir, de estar, que pressupõem um movimento novo e universal no sentido de um envolvimento diferente, individual e colectivo no interior das sociedades, das comunidades para uma cultura de sucesso que torne as pessoas efectivamente mais realizadas e felizes' (Tavares, 1996: 103).

Níve

is

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• a cultura da qualidade é um processo lento que exige mudanças, na forma de pensar e agir, envolvimento individual e colectivo;

• a cultura da qualidade é um processo holístico que mobiliza as capacidades das pessoas e das instituições por inteiro;

• a paixão é inerente à prossecução da qualidade;

• a cultura da qualidade, inseparável de uma dinâmica de sucesso, de construção pessoal e solidária, comunitária, passa pelas vertentes fisiológica, emocional, social, espiritual, intelectual e financeira, é também e sobretudo uma questão de ética, de justiça, de cuidado com os outros como pessoas;

• a meta da qualidade total é fazer bem-feito;

• desperdício não é qualidade;

• a qualidade total faz-se com pessoas mobilizadas;

• a qualidade total faz-se com grandes lideranças assentes na credibilidade, no comprometimento, na flexibilidade e autoridade, no respeito pelo outro, na confiança.

Assentes nestes pressupostos, ao nível dos processos e contextos de ensino superior, destacamos a sugestão avançada por Middlehurst (1997: 55) que, no sentido da promoção de uma cultura 'da' e 'para' a qualidade, importa aos responsáveis educativos:

• integrar esforços clarificando e diferenciando os papéis dos diferentes agentes promotores de qualidade ao nível das instituições universitárias e ao nível mais alargado de ensino superior de modo a evitar desnecessárias duplicações de esforços ou conflitos; fixar recursos com vista à execução de um vasto e acessível leque de processos de ensino, aprendizagem, mediatização e métodos de avaliação através de redes e parcerias entre pares;

• nivelar procedimentos e celebrar sucessos através de linhas orientadoras de nível nacional (localmente interpretadas), sustentadas por bases de dados, redes de trabalho, conferências, publicações, recompensas e indicadores de desempenhos;

• determinar paridade na estimação entre ensino e investigação de modo a que as oportunidades de aprendizagem dos alunos sejam maximizadas e o corpo de especialistas (professores e investigadores) seja devidamente reconhecido e apoiado;

• investir na investigação e desenvolvimento construíndo uma efectiva base 'I+D' , a qual, possa escorar as práticas, no sistema de ensino superior, desde os níveis organizacionais e grupais até aos mais pessoais e individuais;

• aprender com as restantes organizações (mormente as empresariais), identificando e disseminando ideias e procedimentos a partir de fora da Universidade e edificar canais abertos de comunicação com todos os depositários;

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CAPÍTULO 1 33

• concentrar a atenção nos aspectos da qualidade e dar prioridade à promoção e desenvolvimento de actividades e tarefas que estabeleçam a diferença crítica nas experiências educativas e determinações dos sujeitos;

• criar uma nova cultura profissional através da auto-avaliação crítica, apoio do corpo profissional e a obrigação do desenvolvimento contínuo da instituição e dos indivíduos de igual modo;

• clarificar as responsabilidades mínimas exigidas e concentrar recursos na obtenção do essencial, enquanto se faz uso simultâneo dos máximos ganhos educativos do processo;

• tomar atenção á organização e gestão das mudanças, mormente através da responsabilização profissional e do desenvolvimento, procurando assim alcançar altos padrões/ altos níveis de qualidade e excelência no contexto do ensino superior em geral e, na Universidade em particular.

1.2. Missão e funções da Universidade

Nos últimos anos, vimos assistindo a mudanças significativas nos programas e orientações curriculares, na organização e modelo de gestão, nas leis de financiamento e autonomia das universidades. Na realidade, a generalidade destas mudanças ocorrem como consequência das políticas governamentais e frequentemente fixadas sem a devida cooperação ou, inclusivamente, à revelia das reais condições e circunstâncias com que se debatem as instituições para as quais são dirigidas essas mudanças políticas. Por outro lado, somos levados a acreditar que uma das principais consequências destas mudanças é o facto de o grupo de jovens que chega hoje às universidades, não ser mais aquele grupo homogéneo de élite ou privilegiado da sociedade. Ao contrário, este grupo é muito mais heterogéneo e representativo da população geral. Na realidade, ambos, universidades e estudantes procuram da melhor forma possível adaptarem-se às realidades vigentes e cumprir com variados graus de sucesso ou insucesso. No entanto, enquanto se discutem e operam mudanças significativas em muitos aspectos relacionados com o ensino superior, parece persistir um certo consenso entre os vários intervenientes (estudantes, professores, investigadores e políticos e sociedade, em geral) no que concerne aos objectivos e propósitos (missão) da educação superior universitária quer seja pública ou privada para os tempos de hoje. Em 1930, Ortega y Gasset estabelecia um programa de reforma para as universidades espanholas em torno de uma concepção de 'cultura geral' sem fronteiras ou limites temporais e ajustável a qualquer sistema de ensino superior. Este filósofo e pedagogo, procurava responder a duas questões essenciais: qual é o conhecimento que vale a pena ser adquirido pelos estudantes e qual a função da universidade na democracia moderna?. Baseado na sua elevada cultura pessoal e extenso conhecimento acerca dos vários sistemas universitários europeus, Ortega definiu quatro funções principais para a Universidade, a saber:

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ensino de uma profissão liberal; favorecimento da investigação científica; preparação dos lideres políticos; e, finalmente a formação de pessoas cultas com capacidade para interpretar intelectualmente o mundo em que vivemos (Ortega Y Gasset, 1997).

Figura 1-III: a missão e funções da Universidade

Mais recente, Conceição et al (1998) apontam a missão da Universidade no contexto das sociedades modernas e analisam as três componentes que constituem o actual entendimento da sua missão, isto é, o ensino, a investigação e a ligação à sociedade. Conceição et al. (1998: 33), citando respectivamente elementos da OCDE (1987) e alguns autores (por exemplo, Oakeshot, 1993) afirmam que a discussão em torno da missão da Universidade tem traduzido a 'existência de posições que, extremadas, originam um conflito entre o critério de relevância, procurado pela sociedade, e o critério da verdadeira orientação privilegiada pela Universidade'. De acordo com esta posição, a análise das funções da Universidade constitui um aspecto importante para revelar as relações e articulações profundas entre esta e a sociedade. Para se compreender a funcionalidade da Universidade, os autores sugerem a abordagem de Talcot Parsons (1973) que distingue quatro funções fundamentais da Universidade, sendo as três primeiras, caracterizadamente, instrumentais e económicas e, a última, vincadamente simbólica e social, a saber:

1. função central de investigação e de formação científica específica de novas gerações; 2. a preparação para a carreira académica; 3. a formação geral; 4. o contributo para a criação de uma consciência cultural própria e para o processo de formação

intelectual crítica.

preparação e certificação de alunos para os graus de licenciatura e mestrado

apoio científico e certificação para doutores e pós-doc

desenvolvimento de teses de mestrado e doutoramento participação em programas nacionais e internacionais

serviços à indústria formação orientada para a valorização técnica de recursos humanos formação especializada e contínua em áreas de âmbito geral

ENSINO INVESTIGAÇÃO

LIGAÇÃO À SOCIEDADE

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CAPÍTULO 1 35

Com o mesmo propósito, é igualmente referida a pluralidade de funções e missão da Universidade, apontadas no documento de trabalho da OCDE (1987: 16-19). Destas, são destacadas as dez funções seguintes:

1. providenciar educação pós-secundária; 2. investigar e desenvolver novos conhecimentos; 3. fornecer as qualificações necessárias à sociedade; 4. desenvolver actividades de formação altamente especializadas; 5. reforçar a competitividade da economia; 6. funcionar como filtro de selecção para empregos altamente exigentes; 7. contribuir para a mobilidade social; 8. prestar serviços à comunidade; 9. funcionar como paradigma de políticas de igualdade; 10. preparar os líderes das gerações futuras.

Em síntese, é defendida a ideia que a formação universitária e o processo de desenvolvimento intelectual dos estudantes se pode integrar, totalmente, em três funções básicas da Universidade (cf. Figura 1-III) que de acordo com a terminologia proposta por Caraça et al. (1996, referido por Conceição et al, 1998) é o 'ensino'- é a função principal, essencial para a individualização da Universidade; a 'ligação à sociedade'- através da prestação de serviços e envolvimento; e, a 'investigação'- que resulta do seu potencial científico e tecnológico e ainda das solicitações específicas da sociedade. Ainda, no quadro das funções da Universidade, Veloso e Felizardo (in Conceição et al, 1998: 71) atribuem à capacidade de 'empreender' um conjunto de faculdades e características pessoais (inatas ou adquiridas) que interagem entre si. Estas faculdades podem e devem ser potenciadas e desenvolvidas num processo contínuo de valorização dos indivíduos e das sociedades, através dos mecanismos do sistema educativo e designadamente através da Universidade. Para estes autores, 'um processo de educação empreendedora evidencia especificidades importantes, que é difícil incorporar nos conceitos e métodos mais tradicionais de formação'. E continuam, 'por um lado, exige intervenção continuada, sendo a vontade e o esforço dos próprios indivíduos de uma importância fundamental'. Por outro lado, as faculdades e características exigidas obtém-se normalmente por via experimental e não através da educação convencional em sala de aula, de forma a abranger a globalidade do indivíduo, o qual deverá sentir de forma real a aceitação do risco e/ou desafio, a necessidade de determinação, etc.'.

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Este processo (não linear) dinâmico de valorização dos indivíduos para interacção na sociedade, envolve fortes interacções e retro-acções ao longo de três ciclos consecutivos:

• ciclo 'aprender', correspondente à transformação da informação em conhecimento, através dos processos de formação e ensino;

• ciclo 'apreender', envolve a aplicação dos conhecimentos em novas situações e está, normalmente, associado a interacções com a envolvente e com a aquisição de competências por integração dos conhecimentos adquiridos;

• ciclo 'empreender', corresponde à transformação das competências em capacidades.

Figura 1-IV: Processo de valorização intelectual dos estudantes universitários

A Figura 1-IV procura traduzir esta visão mais integradora das diferentes funções da missão

universitária, tal como é sugerida por Conceição et al (1998: 75) ao sublinhar o facto da prioridade dever assentar no desenvolvimento intelectual dos jovens universitários através de um processo ou dinâmica de valorização das capacidades. Este processo de valorização, parte da aprendizagem de teorias e princípios (função ensino) conducentes à apreensão de conceitos e conhecimentos, por experimentação (função investigação) e, à promoção de atitudes 'pró-activas' que facilitem a interacção social e o envolvimento em actividades na sociedade (função ligação à sociedade).

Passiva Pró-activa

Aprender Apreender Empreender

Competências

individuais

Capacidades

de equipa

Adquirir conhecimentos

Participar em actividades que permitem desenvolver novos

conhecimentos

Desenvolver potencial criativo e de iniciativa

Contribuição para a sociedade

Processo de valorização

Atitude

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CAPÍTULO 1 37

1.3. Competência académica

Quando nos interrogarmos sobre o que é competência, encontramos por certo imensas dificuldades de resposta. Por conseguinte, tratando-se de uma noção que pode assumir diferentes conotações e sentidos mais ou menos restritos ou adaptados às circunstâncias em que é utilizado o termo 'competência', aliás, mesmo limitando-o ao contexto académico, este, não está livre de ambiguidades e imprecisões, 'dele se fazendo um uso (e um abuso) generalizado' (Estrela, 1991, citada por Ralha- Simões, 1995: 152).

1.3.1. Conhecimento, skills, estratégias e além da competência académica

Ralha-Simões (1995) sublinha que Piper & Houston (1980) já haviam alertado para o facto de frequentemente os mesmos termos serem utilizados em diferentes acepções e na sustentação conceptual de imensos estudos e teorias educativas, nomeadamente a 'competency-based education' 2. Com efeito, esta teoria representa uma descrição idealizada da organização mental derivada do conjunto de comportamentos que não se espera encontrar num sujeito concreto, mas numa situação ideal, a qual pode perfeitamente ser estudada de forma independente do desempenho efectivo (performance). Numa tentativa de compreender o significado do termo ‘competência’, ainda que usado a propósito de várias realidades e contextos e sem que se precise o seu sentido, este, poderá traduzir genericamente uma habilidade que pressupõe jeito e exercício e se traduz em obras bem feitas, bem executadas. Além disso, desenvolve-se progressivamente através da prática e de uma base de conhecimentos sobre a própria técnica ( Alarcão & Tavares, 1987). Do ponto de vista desenvolvimentista, o conceito de competência tende a ligar-se ao desenvolvimento pessoal e humano. No enquadramento dado pela perspectiva construtivista do desenvolvimento das competências fará algum nexo afirmar que ser competente é estar preparado para se desenvolver. Mas, se esta afirmação parece, à primeira impressão, uma visão demasiado simplista da realidade, ao invés, quando assente na reflexão acerca da preparação ou sobre quais aspectos do desenvolvimento implicados, certamente traduz dificuldades acrescidas para a utilização do conceito, bem como para a compreensão da problemática. Short (1985, referido por Ralha-Simões, 1995: 153) procura clarificar o significado de competência em educação, identificando uma concepção de competência como um processo global e unitário, tomada

2 Competency-based education é um 'processo de instrução baseado no pressuposto de que existem habilidades (abilities) e capacidades (skills) que são observáveis e que podem ser demonstradas e avaliadas' (Piper & Houston, 1980, referido por Ralha- Simões, 1995: 153).

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como qualidade pessoal global, incluindo comportamentos, desempenhos, conhecimentos, capacidades, adequações, intenções, motivos e atitudes, etc presentes no sujeito e, ainda um conjunto de relações conceptuais que estão na base do exercício da actividade competente. Num âmbito mais ou menos restrito o autor aponta três outras concepções de competência, às quais atribui as seguintes designações:

• 'competência como comportamento ou desempenho'. Referida a comportamentos específicos (desempenhos) e concebida como a apreensão ou realização de coisas precisas e mensuráveis.

• 'competência como selecção (restrita) de conhecimentos adequados ao contexto'. Referida ao domínio das capacidades ('skills') e conhecimentos específicos, traduzida já em alguma, embora limitada interferência da intencionalidade do indivíduo, assim como a sua capacidade de decisão.

• 'competência como grau de aptidão suficiente'. Ligada a aspectos valorativos (juízos de valor), tais como a identificação do grau de aptidão julgada suficiente, em qualquer domínio de actividade. Pressupõe a definição de um padrão ou de um critério de avaliação da competência.

No mesmo sentido, o que os vários termos e definições relativas aos 'conhecimentos' têm em comum é que todas concernem com a representação de factos, conceitos, princípios, procedimentos e/ou teorias num certo domínio (sujeito ou disciplina). Não obstante a extensão e natureza dos diferentes tipos de conhecimento (isto é, factos como opondo-se a procedimentos) variarem, estes são caracterizados pela aprendizagem, memorização e/ou reprodução e não tanto pela aplicação de qualquer processos de ordem superior acima ou sobre estes. Por exemplo, segundo Tavares (1995: 47), o conhecimento a um nível cognitivo é a 'actividade em que o sujeito interioriza, assimila, se acomoda e equilibra ao mundo dos objectos, das acções e das suas mútuas implicações, a um grau maior ou menor de abstracção e de complexidade. A um nível metacognitivo, compreende a 'reflexão do sujeito cognoscente sobre a sua própria actividade cognitiva para tentar identificar e compreender como é que o sujeito funciona quando está a conhecer'. Por outro lado, 'conhecimento' é também o elemento substantivo (conteúdo específico). Uma característica única do conhecimento corresponde ao facto de se demonstrar se alguém o possui (ou não) num assunto educacional (e.g., um simples teste pode tornar claro se alguém possui ou não uma forma específica de conhecimento). Outra intessante característica do conhecimento é que pode ser ensinado e aprendido num determinado sentido (conhecimento técnico). Por outro lado, não existe um só conhecimento ou que é sempre o mesmo caso com todos os indivíduos para os quais a sua aquisição possa ser obtida de um modo simples e directo. Neste sentido, um melhor conhecimento pode ser aquele que é reorganizado ou absorvido de uma maneira mais efectiva, mais eficiente, e/ou mais esquematizada para um mais rápido, melhor e simplificado uso. A presença deste tipo de conhecimento (por exemplo: a utilização de uma táctica) não significa automaticamente que o aluno seja

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CAPÍTULO 1 39

capaz de fazer uso deste tipo de conhecimento (mormente, para realizar uma determinada experiência pode ser necessária uma táctica específica e o mesmo se passará para a sua aplicação). Além do conhecimento, é também importante o desenvolvimento, no indivíduo, de capacidades específicas (skills). Das várias definições de 'skill' encontramos, na proposta de Cronbag et al. (1979, referidos por Kirshner et al., 1997), uma primeira abordagem, a qual consiste em considerar os 'skills' como operações (ou acções) medidas de acordo com a quantidade e/ou qualidade de conhecimentos que uma pessoa é capaz de obter dessas operações (velocidade, exactidão, esmero, etc.). Neste sentido, toda a operação tem um objecto e uma finalidade; a operação é obtida com ou através de alguma coisa, garantindo um determinado tipo de capacidades. Na sua proposta, Cronbag e colaboradores identificaram dois tipos de capacidades, nomeadamente as operações sobre conhecimento (on knowledge) e as operações com conhecimento (with knowledge), a saber:

• operações 'on knowledge', o primeiro tipo de skill, corresponde à capacidade de obter conhecimento, tomando este como objecto em que as operações são desempenhadas na mente ('inside the mind'). Estas operações conduzem a novo conhecimento ou novas representações do anterior e previamente adquirido. Por outras palavras, o objectivo das operações é afectar a reorganização e restruturação dentro da estrutura cognitiva existente. Mais, estas operações 'on knowledge' estão ligadas a produtos virtuais, à habilidade em manipular (gerir) o conhecimento na mente. Exemplo de uma simples operação 'on knowledge' é a memorização. Outras operações mais complexas podem ser categorizadas de acordo, por exemplo, com a taxonomia de Bloom (1956): análise, síntese e avaliação. Estas operações têm em comum a existência dentro de um campo particular do conhecimento e os seus produtos (resultados) também só existem no mesmo campo. O objectivo da operação é chegar ao conhecimento ao mais alto nível ou grau.

• operações 'with knowledge', o segundo tipo de skill, igualmente toma o conhecimento como o seu objecto, mas, ao contrário do primeiro tipo, este está voltado para a realidade ('outside the mind'), ou seja, para resultados ou produtos verificáveis, Estas operações são igualmente obtidas através de um relevante campo do conhecimento, como uso feito de um qualquer conhecimento alcançado ou aí presente, tal como o conhecimento de procedimentos. O efeito na obtenção destas operações pode em última análise ser demonstrado na realidade. Deste modo, o actor intervém na realidade e fá-lo fazendo uso de qualquer tipo de conhecimento avaliável acerca dessa realidade e obtém operações planificadas (estratégias), movendo-se entre acção e reflexão. Como regra este processo produz novas experiências e novo conhecimento acerca da realidade. (Kirshner et al., 1997: 153).

Paralelamente, outros investigadores têm mostrado interesse na observação de algo diferente (extra) que os ajude a explicar o que se poderá entender por efectivo e eficiente comportamento, mais próximo, portanto, do termo 'competência'. Neste sentido, pensamos ajustar-se a esta diferenciação uma

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ideia de estratégia como comportamento competente. Kirby (1988: 230), por exemplo, faz um corte claro na distinção entre 'skills' e 'estratégias'. Segundo este investigador, 'skills are existing cognitive routines for

performing specificied tasks, and strategies are the means of selecting, combining, or redesigning those

cognitive routines'. Ou seja, as estratégias determinam quais os skills que devem ser utilizados, e os skills inflenciam as estratégias que são aplicadas. Por sua vez, Gagné (1977) usa o termo 'cognitive strategies' (estratégias cognitivas) como um chapéu para o termo complexo 'acquired skills'. As estratégias tornam-se mais manifestas no sentido em que as pessoas pensam, no sentido em que analisam problemas, na sua aproximação à resolução de problemas, etc. Gagné defende que o termo 'strategy' significa selecção de um skill de um amontoado de disponíveis acções orientadas para a obtenção de determinada finalidade. Em aditamento à definição dos conhecimentos 'declarativo', 'procedural' ou 'estratégico', Ferguson-Hessler (1989, citado por Kirshner et al, 1997: 154) acentua os seus vários aspectos e identifica também um outro tipo de conhecimento ('situational knowledge') definindo-o como, 'the ability to recognise relevant

elements of a given problem situation, analyse the situation and predict how it may develop in due time'. Ou seja, este tipo de conhecimento 'situacional' implica que se saiba que há uma certo e limitado número de condições (tempo, equipamento e/ou aspectos parasitas) que interferem no acontecimento. Deste modo, o comportamento capaz (táctico) requer apenas aplicação de conhecimento 'declarativo' e 'procedural'. Enquanto isso, o comportamento competente (inteligente) transcende este aspecto e aparentemente envolve estratégia e também conhecimento 'situacional'. Na realidade, o aspecto mais interessante da contribuição prestada por Ferguson-Hassler, vai no sentido de considerar que é a situação a determinar o comportamento competente e não o contrário. Ou seja, quando uma pessoa 'esquece' de ter em conta as circunstâncias, nas quais age, então deixa de ser capaz de se tornar competente. Aliás, a habilidade para aceder e usar todas as formas de conhecimento pode ser vista como uma necessidade pré-condicional para a competência. Em verdade, esta definição confunde ambas, mas traz uma importante contribuição à discussão. A confusão surge, já que ela descreve o conhecimento da situação como uma forma separada de conhecimento. Dito de outro modo, para analisar uma situação, os indivíduos precisam de conhecimento procedural e declarativo. Tão cedo eles desenvolvam as operações com estes tipos de conhecimento (isto é, analisar a situação) um novo conhecimento é adicionado à sua própria escala de conhecimento (o conhecimento situacional). Na revisão das teorias do desenvolvimento, referimos Kurt Lewin (1936) e a sua célebre 'teoria de campo' que define o comportamento humano (C) como função (f) da personalidade (P) e situação (S) equacionada na fórmula C = f(P,S). Então, em analogia com esta relação de Lewin, podemos perceber competência C= f (k, s, e) em função do conhecimento (k), dos skills (s) e da situação específica (e). De um modo similar, Bloom et al. (1956: 39) aludem a esta competência funcional quando descriminam entre skills e abilities. Usando a terminologia destes autores, um 'skill' é a 'competence in using a genelazed method of

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operating or dealing with a new problem situation', tal como as 'abilities' são 'situations in which the individual

is expected to bring specific technical information to bear a new problem'. Spitzberg (1983, referido por Kirschner, 1997: 154) vai um pouco mais além quando define competência, como um conjunto de circunstâncias vinculadas pelo relacionamento entre motivação, conhecimento e skills na manifestação do comportamento apropriado a um contexto. No mesmo sentido, Wiemann & Backlund (1980, referidos por Kirshner, 1997) fazem notar que a competência é uma habilidade (ability) para escolher entre um amontoado de comportamentos disponíveis em ordem a cumprir finalidades com sucesso tendo presente os constrangimentos da situação (contexto). Em suma, se uma opção por determinada acção não resulta no intuito dos objectivos fixados, ainda que obtida por via correcta, então não pode ser questionado o comportamento competente. Isto significa que uma pessoa pode possuir os skills adequados e no entanto não ser competente. Reciprocamente, não é possível uma pessoa ser competente sem possuir os skills necessários. A diferença é, talvez, porque a competência requer o uso de informação específica sobre a situação, enquanto os skills não necessariamente. Na realidade, a 'competência' independentemente da orientação dada ao termo, pode ser entendida como a capacidade global que o sujeito tem em desenvolver todo o seu potencial pessoal e afectivo-relacional, por modo a estar apto a organizar, integrar e gerir todas as suas capacidades, percepções e motivações, ajustando e adaptando às circunstâncias particulares em que se encontra envolvido. Mais, deverá evidenciar competências para se desenvolver pessoalmente por retroacção (sentido cibernético) e em interacção com os outros, num processo sistemático de auto-avaliação e auto-regulação das próprias vivências, atitudes e comportamentos, isto é, sobre o próprio processo de crescimento e equilibração. A própria noção de maturidade, sendo para alguns autores assimilado à competência (Heath,1977 e Chickering, 1969) permite que a encaremos como uma característica que constitui quase um pré-requisito. Com efeito, a noção de competência deverá ser tomada mais na sua faceta de capacidade potencial e não enquanto efectiva adequação, tal como defende Sweeney & Manatt (1982, referido por Ralha-Simões, 1995: 150). Segundo Ralha- Simões (1995: 155), em termos pedagógicos, o conceito de competência não deverá ser confundido com outras competências (social, psicológica, linguística, etc). Ou seja, a 'competência' implica um contexto ou situações definidas e pressupõe, nos sujeitos, características próprias sejam skills específicos ou conhecimentos que deverão ser apropriadas aos desempenhos requeridos pelas situações ou que a solução dos problemas exige. Esta definição holística deve ser entendida como uma qualidade da pessoa ou uma sua maneira de ser (ou estar), caracterizada não apenas por um conjunto de comportamentos, mas, por relações conceptuais que, no seu todo, tornam possível empreender uma actividade específica. Acrescenta a autora, que este esquema interligando as diferentes dimensões de actividade relevantes, inclui comportamentos, desempenhos, conhecimentos capacidades, níveis de adequação, intenções, motivos e atitudes e não se exprime apenas através de uma dimensão particular, mas

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pela presença de um conjunto de relações conceptuais que estão na base do exercício da actividade competente. Parece ser também esta a acepção atribuída ao termo por Estrela (1991), para quem o próprio conceito de competência teve sempre um sentido mais amplo e diferente do treino de 'skills', referindo-se em vez disso, a um conjunto delimitado de conhecimentos, saberes-fazer e atitudes e procedimentos que é necessário ter em determinadas situações educativas. Neste sentido, ajusta-se a definição ampla de 'capability' avançada por Stephenson & Weill (1992), como sendo uma integração no próprio conhecimento das dimensões da auto-confiança, auto-estima, os skills e os valores. Estes autores sublinham que pessoas competentes têm confiança na sua habilidade para agir de forma efectiva e apropriada, justificam as suas acções e comportamentos, vivem e trabalham efectivamente com os outros e continuam a aprender com as experiências que realizam. Estes autores colocam a ênfase no facto que não é a mera posse de skills apenas, mas a confiança em saber como usar (estratégia) os skills no desconhecido ou nos contextos e situações pouco familiares, mudando (ajustando) às circunstâncias que realmente são importantes. Na sua vez, Barnett (1994) repete esta ideia dos constrangimentos da situação na sua definição de competência. Ele cita Jessup para definir competência como algo que não concerne apenas com predicáveis (aplicáveis) comportamentos em situações específicas, mas, que o inesperado meio requer o uso sistemático de novas configurações dos skills existentes ou, inclusivé o desenvolvimento completo de novos skills. Dito de outra forma, coping com criatividade o inesperado e o inaplicável é, de acordo com Barnett, a parte crítica do conceito de competência. Neste sentido, Barnett (1994: 73) utiliza o termo 'competence' como a habilidade para '… cope

with unpreditability and even allow for creativity'. Mas, numa época de constantes mudanças e incertezas como as que vivemos hoje, as situações nem sempre surgem claras e os conhecimentos, as competências ou os atributos específicos necessários, em cada um de nós, para lidar com as situações nem sempre correspondem às exigências e requerimentos. Assim, as possíveis significações de competência avançadas antes parecem agora menos consistentes. Uma justificação para isso poderá residir talvez no facto de que o requerido sejam, porventura, meta-habilidades, meta-capacidades ou meta-competências (cognitivas, pessoais e relacionais), as quais permitam aos indivíduos lidar com as mudanças, aberturas, conflitos ou incertezas e que nem sempre as possuem ou não são capazes de as activar e desenvolver isoladamente. Neste suposto, registamos a tese de Barnett (1997) de que para lidar com as mudanças existem, apenas, duas componentes a ter em atenção: 'reflexividade' e 'poder' para avançar na auto-reconstituição pessoal (do self) através das relações interpessoais. Ou seja, 'the self is not given; and nor are frameworks

for comprehending the world. These have to go on being subject to continual interrogation. We live effectively

and prosperously in a world of change by changing ourselves so that we in turn can contribute actively to

changes' (Barnett, 1997: 41). Para designar este contexto emergente, este autor segue o termo 'life-word

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becoming' (cuja tradução imediata nos sugere a utilização do termo ‘advir’) do grande filósofo da actualidade, Jurgen Habermas. Com efeito, a noção de ‘advir’ parece assentar em aspectos não instrumentais da vida e não se fixa a condições pessoais e existenciais da vida. O ‘advir’ incorpora o sentido das tradições, da cultura de uma comunidade e da solidariedade nas relações interpessoais. A noção de ‘advir’ sugere que as dimensões da vida têm sido, nos tempos actuais, submetidos a contínua interrogação e fazer por viver efectivamente no mundo de hoje através da mudança, trazida pela nossa própria reflexão prática e do nosso envolvimento com o outro, segundo uma compreensão colectiva do Mundo. Tal como afirma Barnett (1997: 43), 'the worlds we

live in cognitively, socially, culturally, technologically, existencially- would result from our collective

engagements with each other and in the context of our collective understandings of the world'. COMPETÊNCIA PRÁTICA

(Operational competence) COMPETÊNCIA ACADÉMICA (Academic competence)

COMPETÊNCIA PARA- O- ADVIR (Life-world becoming)

EPÍSTEMOLOGIA Saber como? Saber o que? Saber porquê?

SITUAÇÕES Definidas pragmaticamente Definidas através do campo intelectual

Definições abertas (uso de múltiplas abordagens)

FOCO Resultados Proposições Diálogo e argumentação

TRANSFERÊNCIA Meta-operações Meta-cognições Meta-crítica

APRENDIZAGEM Experiencial Proposicional Meta-aprendizagem

COMUNICAÇÃO Estratégica Disciplinar Dialógica

AVALIAÇÃO Prática Exacta Consensual

VALOR DA APROXIMAÇÃO Sobrevivência económica Específico (apoio disciplinar)

Comum

LIMITES Normas organizacionais Normas do campo intelectual/científico

Natureza prática do discurso

CRÍTICA Mais efeitos práticos Melhor discernimento cognitivo

Mais compreensão

Figura 1-V: além da competência académica (traduzido e adaptado de Barnett, 1997: 42)

De acordo com Barnett, a Universidade para os tempos modernos será aquela que é capaz de

albergar tais competências humanas (cognitivas, pessoais e interpessoais), argumentando que as duas versões rivais de competência mais usadas nos meios educacionais e de formação superior, a saber: a 'academic competence' e a 'operational competence', não fazem qualquer sentido nas circunstâncias do mundo que, hoje, percepcionamos. Em alternativa propõe (Figura 1-VI), antes, a evolução de uma forma de Universidade (no verdadeiro sentido), a qual, siga para o exame contínuo e sistemático na (re)construção do 'self', da sociedade e da cultura. Estão incluídos também os nossos modos de conhecer e compreender o

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mundo relativamente a nós próprios e aos a outros, bem como a forma como agimos sobre este. É, portanto, uma educação para-o-advir ('life-becoming') em toda a acepção do termo que se exige numa formação universitária, activando e desenvolvendo as tais meta-competências do conhecimento, da auto-compreensão e comunicação com um mundo incognoscível.

1.3.2. Quais as competências desejadas? O caso específico da Universidade de Aveiro

Tal como antes, a geração de jovens que actualmente ingressa numa Universidade, necessita não apenas de uma educação que lhes permita alcançar os sonhos e os desejos mais pessoais, mas igualmente, uma formação geral e específica que lhes rasgue os horizontes e perspectivas. Mas, algumas perspectivas (a nosso ver enganadoras) parecem sugerir que esta nova geração carece de visões amplas acerca do nosso (seu) futuro colectivo (obs: houve alguém que a classificou, erradamente, de 'rasca'). Provavelmente, isto terá sido devido ao facto desta geração parecer refugiar-se, muitas vezes, em perspectivas redutoras, maniqueístas e mais imediatistas das suas próprias aspirações e futuros. Ou até, descrevendo um quadro deveras negro, sombrio, carente de um projecto de vida e do seu lugar no mundo. Na realidade, os alunos de hoje, não são melhores nem piores que os seus antecessores, eles são apenas diferentes (Ramsdem, 1992; Levine, 1989: 21). Perguntamos, então: o que se pretende, em termos educativos, com esta geração que não se pretendia antes? Segundo Levine (1989) todas as pessoas são indivíduos e, simultaneamente, membros e actores na comunidade. Ambas as realidades têm que coexistir, uma vez que cada uma isoladamente é apenas uma caricatura. Neste sentido, individualismo no extremo significa isolamento, atomísmo e solidão; comunalidade no extremo, corresponde a massificação, sufocação e aniquilação. O importante, ou o mais essencial, é provavelmente o meio termo entre os dois. Neste sentido, acreditamos que os jovens de hoje carecem ser assistidos na criação desta equidistância. Ou seja, estes jovens precisam de pensar acerca do seu próprio futuro e no modo de o tornar consistente em detrimento de procurar 'fazê-lo'. Levine (1989) sugere que estes jovens precisam de uma educação munida dos instrumentos e mecanismos correspondentes, referindo quatro características distintas que deverão presidir em qualquer agenda educativa universitária. 1. Providenciar as competências e os conhecimentos necessárias para viver no nosso mundo. O que inclui:

• a educação das competências básicas, as linguagens fundamentais (letras e números) que as pessoas usam para comunicar;

• uma educação que enfatize a aprendizagem que possa ser partilhada. Focando os aspectos que toda a gente partilha: cultura, herança comum, relações pessoais e interpessoais com grupos e instituições, ciências e tecnologia, humanidade, preocupações, actividades, etc.;

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• uma educação que realce assuntos relativos a valores e ética. Para uma geração pragmática e demasiado materialista, este aspecto é fundamental;

• uma educação que promova e desenvolva, verdadeiramente, os três C's: pensamento 'Crítico'; 'Criatividade'; e 'Continuidade' na aprendizagem. Estes são mandatários para uma sociedade emergente (no sentido dado ao conceito por Tavares, 1996) num mundo em mudança, incognoscível.

2. Dar esperança. Hoje, os jovens têm pouca esperança e projectos de vida longa e saudável. 'If you think

about it, general education is the study of humankind's collective hopes and dreams' (Levine, 1989: 22). 3. Orientar para a responsabilidade. As instituições precisam de dar aos seus estudantes um elevado sentido

de conexão com a globalidade do mundo moderno e um profundo espírito de humanidade e cidadania, inclusivamente, a obrigação para com o outro;

4. Fornecer aos alunos um sentimento de confiança e eficácia, conduzindo-o á identidade, à autonomia, à tomada de decisão, à regulação e à diferenciação das suas atitudes, procedimentos, pensamentos, actividades, etc..

Prospectivamente, importa realçar o facto dos jovens virem a ser confrontados (in post facto, a mais das vezes) com a gestão da sua carreira profissional e das suas vocações na transição da formação para a inserção no mercado de trabalho. Se atendermos às características actuais do mercado de emprego, então é possível compreender como os jovens encontram frequentemente sérias dificuldades no início da sua vida profissional após um longo período de formação. A realidade sugere que estas dificuldades se situam, por exemplo, ao nível das oportunidades de emprego, por vezes, bastante escassas e/ou débeis, mas também, pelo sentimento de (in)preparação dos jovens para o trabalho (Hoyt, 1985; Moreno, 1995; Taveira, 1995, referidos por Soares, 1998; Gago et al., 1994; Conceição et al., 1998). Além disso, é crescente a necessidade do desenvolvimento das competências, evidenciada pelas estruturas empregadoras, levando-as a exigir, cada vez mais, competências específicas (técnicas) a par de um outro conjunto de atitudes e disposições ou competências de âmbito mais geral, designadamente competências de natureza sócio-afectiva, fundamentais para uma boa integração profissional em trabalho de equipa e desempenho bem sucedido nas tarefas que é proposto executar. Referindo Hoyt (1988) e Pires (1994), Soares (1998: 64), afirma que 'num mercado de emprego caracterizado pela incerteza e mudança, onde a inovação tecnológica marca o ritmo da evolução, a rápida obsolescência dos saberes técnicos exige um "novo" conjunto de competências profissionais, genericamente, designadas por competências gerais de empregabilidade, mais adequadas aos novos cenários marcados pela instabilidade e imprevisibilidade'. Dito de outro modo, estas "novas" competências (cada vez mais indispensáveis) de adaptabilidade profissional referem-se ao potencial do indivíduo para aceder, ajustar-se e ser capaz de produzir, facto, que engloba um conjunto de competências que passam, entre outras, por

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capacidade de auto-regulação emocional e cognitiva, tomada de decisão, relacionamento interpessoal, hábitos produtivos de trabalho, resolução de problemas e capacidade de fazer face à mudança e inovação, ou seja, um 'empreendedor' (ibid). Também neste sentido, o relatório do grupo de trabalho nomeado para a 1ªfase da acção: 'Repensar os currículos- definição das competências desejáveis para qualquer licenciado pela Universidade de Aveiro' (doc. policopiado) aponta para um conceito alargado de currículo, o qual tende a ser substituído pelo conceito de desenvolvimento curricular que abarca duas dimensões indissociáveis. Isto é, uma dimensão instituída (planos de estudos e programas das disciplinas) e uma dimensão instituinte (operacionalização, in facto, da dimensão instituída). Sugere este grupo de trabalho, que o processo de gestão e desenvolvimento curricular como, hoje, é entendido 'implica a priori uma reforma de conceitos, de estratégias e de atitudes, sem as quais qualquer intervenção posterior resultará ineficaz'. Igualmente, ao nível dos processos deverão ser tidos em conta os seguintes pontos hierarquizados: (1) perfil do licenciado; (2) filosofia de formação; (3) perfil do aluno à entrada; (4) os objectivos; (5) os conteúdos; (6) as estratégias de formação; e, (7) os processos de avaliação. Também, no plano das competências pretendidas, o grupo de trabalho referido parece assentar no pressuposto da dinâmica interactiva entre o comportamento e a atitude perante os outros e o conhecimento, a aquisição do conhecimento e a capacidade de exprimir esse conhecimento. Com efeito, são indicadas três dimensões fundamentais para promover e desenvolver junto dos licenciados da Universidade de Aveiro, que sublinhamos:

• 'Cognitiva'. Além das competências específicas conferidas em cada área científica, o aluno deverá adquirir e desenvolver várias competências potencializadoras daquelas e que, lhe permitam adaptar-se à evolução técnico-científica do mundo actual, pelo que deverá possuir: domínio de conceitos e métodos específicos; capacidade de estruturação do pensamento; conhecimento explícito dos objectivos do trabalho na sua área e da problemática da sua execução; utilizar adequadamente as fontes de informação; capacidade de resolução de problemas; integração da teoria e prática; capacidade de síntese e criatividade na busca de novas formas de pensar e actuar na resolução dos problemas; apreciação e cultura da multidisciplinaridade; capacidade auto e hetero crítica; capacidade de gestão e trabalho independente e autónomo; consciencialização e abertura a modificações conceptuais e necessidade de aprendizagem de novos assuntos, novas técnicas, conhecimentos, etc. ao longo de toda a vida.

• 'Comportamental/ atitudinal'. Inclui um determinado conjunto de atitudes e comportamentos desejáveis perante as situações e na relação com a sociedade em geral sem prejuízo do conjunto de qualidades individuais. O aluno deverá demonstrar as atitudes relativas a: responsabilidade pessoal e social; avaliação das consequências dos seus próprios actos e das atitudes evidenciadas; desenvolvimento

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de uma cultura da qualidade nas iniciativas e acções; valorização e tomada de decisão no sentido de influenciar mudanças no conhecimento científico, tecnológico e humanístico; abertura e disposição para trabalho em equipa na defesa lógica dos seus princípios e respeito para com as opiniões dos outros; abertura para um relacionamento multicultural; sensibilidade e compreensão para a leitura das complexidades do mundo real.

• 'Comunicativa'. O aluno deve ser proficiente a receber e a transmitir informação. Neste sentido, as competências operativas deverão incluir: literacia (expresssão e compreensão oral e escrita na língua materna e pelo menos uma língua estrangeira); numeracia3 (compreensão e utilização de números e expressões numéricas e algébricas); apresentação e expressão gráfica (comunicação em linguagem gráfica, simbólica ou icónica para apresentação de resultados); proficiência no recurso e utilização das novas tecnologias da informação e comunicação.

Acerca destas competências desejáveis, em um documento (policopiado) facultado pelo professor Richard Kempa (prof. visitante na UA em Outubro/Novembro de 1998), eram reflectidas as linhas gerais de orientação para uma revisão académica dos programas de licenciatura em química e confirmavam-se as dimensões referidas antes. Neste documento era sugerido um vasto leque de diferentes capacidades e competências que se esperava que os alunos desenvolvessem (no caso, das licenciaturas em química, mas, perfeitamente extensível a outras licenciaturas). Estas capacidades e competências eram divididas essencialmente em:

• 'capacidades e competências cognitivas'. Exemplo: capacidade em demonstrar conhecimento e compreensão dos factos, conceitos e princípios e teorias essenciais; capacidade para aplicar esse conhecimento e compreensão na resolução de problemas qualitativos e quantitativos de natureza familiar e/ou desconhecida; capacidade para reconhecer e analisar novos problemas e planear estratégias para a sua resolução; etc.

• 'competências práticas ou laboratoriais'. Exemplo: competência na planificação, estruturação e execução de investigações e trabalhos práticos, desde a fase de reconhecimento do problema até à avaliação a apreciação dos resultados e conclusões e seleccção dos procedimentos e técnicas mais adequadas.

• 'competências transferíveis'. Exemplo: competência de comunicação escrita e oral; competências de literacia, numeracia e das novas tecnologias da informação; competências interpessoais, relativas à capacidade de lidar com as outras pessoas e de se empenhar no trabalho em equipa; competências na área da gestão do tempo e competências de organização, demonstradas pela capacidade de

3 'Numeracia'. Palavra não consignada nos dicionários de língua portuguesa. Contudo, pensamos que corresponderá aos números o que o termo 'literacia' significa para as letras.

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planear e implementar novos modos de trabalho eficientes e eficazes; competências de estudo necessárias para o desenvolvimento contínuo profissional.

2. Factores do ajustamento académico

É comum a afirmação que o principal objectivo de um estudante quando ingressa numa Universidade seja, o de conseguir lidar e agir inteligentemente na sua arena académica. Com efeito, ao entrar na Universidade e no decurso das experiências do primeiro ano, o jovem estudante percepciona e vive inúmeras dificuldades na gestão da transição e descontinuidades entre os diferentes subsistemas de ensino. Squires (1990, citado por Holman, 1995: 261) notava que 'the idea that higher education has in some way to do with

the development of the student is a familiar enough one, but like other ideas… proves to be more complex

and elusive on closer inspection'. A este propósito, registamos a opinião de Upcraft & Gardner (1989: 2) que um aluno quando ingressa na Universidade tem sucesso (escolar e académico) se progride na consecução dos seus objectivos pessoais e educacionais. Ou seja, quando consegue tirar vantagem do contexto académico em que ingressa, activando e desenvolvendo ao máximo todo o seu potencial no sentido de:

• ' desenvolver as suas competências intelectuais e académicas'. Muitos dos alunos ingressam na Universidade com o principal objectivo de se preparar para uma carreira procurando obter boas classificações e tirar um curso, contudo, ao fim de pouco tempo apercebem-se que isso só por si não é suficiente. Estes acabam por reconhecer que podem aprender a aprender e a pensar, assim como, podem sintetizar, integrar, criticar e analisar aquilo que aprendem. Mais, estes sentem que podem desenvolver a criatividade, moral, ética, a cultura, naquilo que aprendem, bem como, refinar a sua apreciação crítica acerca do próprio conceito estético de vida (Upcraft, 1985, citado por Upcraft & Gardner, 1989);

• ' estabelecer e manter relações pessoais e interpessoais'. Há evidências que permitem concluir que a qualidade das relações pessoais e interpessoais são um elemento fundamental para o sucesso. Todos os alunos, tendo em conta o contexto e experiências, tendem a desenvolver um sistema que sustenta as suas relações pessoais e interpessoais com os demais intervenientes, pares, professores, técnicos, família, companheiros e amigos (Pereira, 1997, 1998);

• ' desenvolver a sua própria identidade'. De acordo com Erikson (1963, citado por Upcraft & Gardner, 1989), o significado de identidade é plenamente desenvolvido quando o modo como nos vemos a nós próprios é consistente com o modo como os outros nos vêem. Com efeito, a experiência universitária

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parece afectar a identidade pessoal, ao que importa, fazer sentir aos alunos ingressos que devem progredir na definição deles próprios (Taveira, 1997);

• ' decidir acerca da sua própria carreira e estilo de vida'. Embora alguns alunos entrem na Universidade sem saber exactamente aquilo que querem fazer, muitos têm já uma ideia formada e objectivos precisos. O ajustamento vocacional é de particular importância (Taveira, 1997; Soares, 1998) ao atendermos que o ensino universitário é gestor de vocações. Mudanças de interesses, falta de sucesso académico, maior independência ou autonomia relativamente às pressões vocacionais da família, e outros factores contribuem, frequentemente para as incertezas e dúvidas vocacionais quanto à carreira escolhida (Pinheiro, 1994). Os alunos ingressos têm de fazer determinados progressos na tomada de decisão acerca da carreira e abrir perspectivas de vida futura;

• ' manter o bem-estar e a promover a saúde pessoal'. Os jovens estudantes devem estar cientes do impacto do contexto universitário no seu bem-estar físico e emocional. Devem ser capazes de lidar com o stress da vida académica, gerir os seus tempos livres e actividades de descontracção. Devem tomar decisões acertadas acerca do uso do alcóol e das drogas, da actividade sexual e hábitos alimentares. Devem começar a pensar na promoção da saúde e do bem-estar, antes como processo activo e não tanto como reactivo ;

• ' desenvolver um projecto ou filosofia de vida'. Segundo Chickering (1969), a entrada na Universidade é a altura em que os indivíduos desenvolvem um sentido claro dos propósitos e personalidade que validam e orientam as suas atitudes e comportamentos. Importa reconsiderar as concepções acerca do que é correcto ou errado, as prioridades na vida, as suas convicções espirituais e religiosas e o modo como estas concepções e representações se encaixam numa determinada ordem de grandeza do Universo. Os seus valores, convicções e concepções devem ser integrados e internalizados de modo a que haja consistência entre aquilo que acreditam e a forma como procedem.

2.1. Desenvolvimento psicológico em estudantes universitários

'Le développement est toujours inachevé. L’autonomie qui en est le signe se construit à tous les instants.

Autonomie, couronnement du développement, ne signifie pas indépendance individuelle radicale par rapport

au monde des objects, au monde humain ou de la culture, à soi-même; au monde du savoir, au champ des

signifiants cognitifs et affectifs; aux modèles et aux normes des actions et réactions; à la puissance et aux

limites des langages. Au contraire, elle suppose, chez chacun, dune part, l’acceptation des inévitables

dépendances et le choix libre de certaines soumissions; d’autre part, l’affirmation et l’élaboration des visions,

de modes de penser et d’agir, de façons de comprendre, de projects propres. Elle alie, chez um même sujet,

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la conformité ou la convergence par rapport à des modèles qui lui sont extérieurs et la divergence à l’égard

des conceptions, processus ou pratiques cohérents avex ces modèles.' (Bonboir,1995: 28)

2.1.1. Delimitação do conceito: o que é o desenvolvimento?

Em qualquer fase da vida humana, o desenvolvimento, desenrola-se mediante um processo não automático e não isolado, mas, em construção interactiva, isto é, dependente das acções recíprocas entre o indivíduo e o mundo. O desenvolvimento humano é uma finalidade da educação e como tal aceita-se que o ambiente (atmosfera envolvente) deva ser estruturado de modo a permitir esse produto. Com efeito, no quadro dos processos de formação e aprendizagem têm surgido, recentemente, diversas taxonomias ou categorizações de objectivos no intuito de contribuir, no acto de aprender, para o desenvolvimento humano e pessoal. Neste sentido, muitas das teorias da aprendizagem intersectam-se frequentemente com teorias construtivistas e desenvolvimentistas. Mas, nem sempre parecem claras as relações e influências existentes, já que em algumas destas teorias os objectivos do desenvolvimento se confundem, por vezes, com uma série de comportamentos ou atitudes específicas (é o caso do behaviourismo). Ou seja, o desenvolvimento pode ser entendido como a aquisição (aprendizagem) determinada deste ou aquele assunto ou de um corpo de conhecimentos previamente fixado. Em outras teorias, como o construtivismo e o cognitivismo, os objectivos do desenvolvimento centram-se, antes, no processo de ajustamento mental que se manifesta pelas capacidades de acesso aos processos (assimilação, acomodação e equilibração) dos sujeitos às situações e resultados (metas, fases, estádios, etc.) esperados. Outras teorias há, igualmente, que procuram centrar a sua atenção no campo psicanalítico (Freud) ou humanista (Maslow, Rogers). Na realidade, para a maior parte destes estudos o desenvolvimento é tomado como uma das dimensões do desenvolvimento humano a par do desenvolvimento físico, biológico, linguístico, axiológico, social, etc. e integra aspectos de natureza cognitiva, afectiva e volitiva ou de tomada de posição do eu. Entretanto, salientamos o facto das correntes da psicologia que, de algum modo, se têm debruçado sobre a exploração dos aspectos do desenvolvimento humano necessitarem da noção de estádio ou algo semelhante (nível, fase, etapa, patamar, etc.) para explicar a organização sequencial, cada vez mais abrangente, própria do crescimento humano nas suas múltiplas vertentes. Não é pois surpreendente que os construtivistas e desenvolvimentistas lhe prestem tão grande importância na análise dos seus modelos explicativos do desenvolvimento humano. Aliás, diversas taxonomias ou categorizações de objectivos ou metas do desenvolvimento humano segundo estádios de desenvolvimento é possível encontrar em estudos que de um modo ou outro vão (re)surgindo actualmente ( Piaget, Wallon, Vygotsky, Brunner, etc.).

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Neste sentido, uma das primeiras referências à fase de desenvolvimento que integra o jovem adulto (early adultwood) foi feita por Bromley em 1966 (referido por Bischof, 1976), o qual lhe atribuiu o período etário compreendido entre os 21 e os 25 anos. Erickson, em 1959, retrata igualmente este ciclo da vida, alargando-o ao intervalo etário dos 19 aos 25 anos através da exploração do conflito 'intimidade versus isolamento'. Ou seja, o primeiro pólo seria a capacidade do jovem adulto se compromoter com os outros nas áreas do trabalho, estudo, amor e genitalidade e o segundo pólo seria, exactamente, o oposto, ou seja, a recusa dessa mesma intimidade. Com o advento das teorias do desenvolvimento humano (anos 60 e 70) surge a conceptualização necessária à compreensão e apreciação das mudanças estruturais e funcionais operadas na fase da vida do jovem universitário e inicia um movimento dedicado ao estudo do seu desenvolvimento, nas mais variadas vertentes.

Ainda que a emergência e identificação do período correspondente ao jovem adulto sejam recentes, há cada vez mais, evidência no sentido de considerar que este possui aspectos desenvolvimentais específicos e observáveis nos diferentes domínios. Também as teorias do desenvolvimento humano influenciaram o movimento gerado em torno do estudo do desenvolvimento do estudante universitário. Teorias como as de Lewin (1936), Piaget (1952) e Erickson (1968) tiveram forte impacto, nomeadamente nos contextos de ensino superior, possibilitando teorizações e potenciando intervenções. Efectivamente, são vários os autores e investigadores que se têm interessado pelo estudo deste ciclo da vida do estudante universitário, na tentativa de lhe fixar contornos (Sanford,1962; Heath,1965; Kohlberg, 1971; Chickering, 1969; Perry, 1970; Pinheiro, 1994; Tavares e Bonboir,1995; Ferreira e Hood, 1990; Costa e Campos, 1992; Nico, 1995; Bastos e Gonçalves, 1997; Silva, 1998; Leitão e Paixão, 1999; Pereira, 1997, 1998; Taveira, 1997; Soares, 1998, entre outros).

2.1.2. Abordagens psicossociais do desenvolvimento

'É a pessoa humana, como um todo, que evolui e que permanece, no decorrer da sua existência, que interessa e que é preciso explicar e compreender' (Tavares,1995: 53). Reconhecer a importância do desenvolvimento na definição das necessidades prioritárias e na concepção do projecto de mudanças não se destina só a assegurar a eficácia da intervenção mas visa também respeitar o direito que assiste ao sujeito na direcção do seu destino. Para se estudar o desenvolvimento humano, importa considerar múltiplas realidades para além do indivíduo-pessoa em si, o contexto envolvente, as acções e interacções. Todavia, ao longo da história, fomos assistindo a uma evolução por sucessivas etapas na compreensão do desenvolvimento humano e das influências de cada um destes momentos na elaboração de modelos e quadros conceptuais. Para melhor compreender estas influências, destacamos de seguida algumas das principais ideias preconizadas por pensadores e investigadores, referidos ou salientados em diversos

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manuais e obras de referência (Green, 1989; Palacios, 1995; Tavares & Bonboir, 1995) e, cujos fundamentos teóricos nos sugerem que os conhecimentos, as competências, bem como as transições para níveis superiores de pensamento se processa através de modelos do desenvolvimento psicológico. Tomando por exemplo Piaget (1970-1978) e o seu construtivismo, estes conhecimentos são descritos em termos de esquemas, conceitos e estruturas. O desenvolvimento manifesta-se em quatro níveis ou estádios, segundo os processos de abstracção, assimilação e acomodação. A equilibração é uma ilustração de como os sujeitos se adaptam às circunstâncias (contexto). Já Harvey (1966), nomeia a totalidade, através da qual a experiência individual adquire significação, como sistema conceptual. Por sua vez, Vygotsky (1980) descreve os conhecimentos dos sujeitos em termos de conceitos e funções: a aquisição dos conhecimentos é descrita como um processo de apropriação e internalização num contexto de interacção em zonas de desenvolvimento (actual e potencial). Bruner (1985) ajusta à perspectiva de Vygotsky a zona de desenvolvimento proximal, definida como o campo da diferença existente entre o que o sujeito conhece ou pode realizar individualmente e o que pode conhecer ou fazer em colaboração com o outro que detenha mais conhecimentos que ele, ou quando através, principalmente da linguagem, recebe estimulos ou é auxiliado com vista à optimização das suas potencialidades. O desenvolvimento cognitivo em Brunner assenta em três modos de representação da experiência ou estádios (representação activa, icónica, simbólica) que evoluem em espiral ao longo do desenvolvimento Por indexação a objectivos específicos dos diferentes tipos de conhecimentos, processos cognitivos, skills, competências, etc. o modelo de Bloom et al (1956) pode tanto ser considerado uma teoria (desenvolvimental) da aprendizagem como um modelo de objectivos escolares. Ou seja, a noção de hierarquia implica que algumas competências (conhecimentos, skills) são logicamente pré-requisitos para se poderem atingir os objectivos seguintes. Como resultado, a abordagem de Bloom é semelhante à de Piaget ou de Vygotsky quando assume que os níveis de conhecimento são, naturalmente progressivos. A taxonomia de Bloom assenta em seis níveis ('compreensão', 'aplicação', 'análise', 'síntese' e 'avaliação') distintos de conhecimento. Hunt e colaboradores (entre 1966 e 1987, referido por Simões, 1996: 71) caracterizam o nível conceptual como uma característica relativa quer à complexidade cognitiva (diferenciação, discriminação e integração) quer à maturidade interpessoal (aumento da auto-responsabilidade). Mas, tal como afirmam Ferreira e Hood (1990) as alterações que ocorrem no indivíduo durante a sua estadia na Universidade, processam-se em diferentes áreas do desenvolvimento e é a partir da tomada de consciência desse facto que, mais tarde, se poderá teorizar acerca do desenvolvimento cognitivo e psicossocial. Neste sentido, surgem especificamente os trabalhos relativos ao desenvolvimento moral (Kohlberg,1971), acerca do desenvolvimento intelectual (Perry, 1970), acerca do desenvolvimento psicossocial (Erickson, 1968; Heath, 1965; Sanford,1962 e Chickering, 1969) e acerca da identidade e desenvolvimento do 'ego' (Loevinger,1976).

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Em comum, o postulado de que o indivíduo se desenvolve através de uma sequência de estádios que caracterizam todo o ciclo da vida e, ainda, o realce atribuído ao processo de interacção do indivíduo com o meio sócio-cultural-académico. Estes estádios de desenvolvimento implicam processos e mecanismos que vão desde a maturação fisiológica à formação de competências, representações, atitudes e procedimentos, numa sequência combinada de aspectos cognitivos, afectivos e comportamentais. No que concerne ao desenvolvimento do estudante universitário, num artigo de reflexão assinado por Stage (1991), é evidente a preocupação em delinear os principais aspectos comuns às diferentes abordagens das teorias do desenvolvimento, sejam estas psicossociais, cognitivistas, construtivistas, interaccionistas ou fenomenológicas. Neste artigo são identificados três aspectos que são as mudanças individuais, a autonomia ou o continuum entre dependência/ interdependência e, por último as situações de desafio e ajustamento (vocacional, psicológico, social, etc.). Com efeito, na discussão acerca dos objectivos da educação universitária têm sido amplamente discutidos e sublinhados alguns destes aspectos relacionados, nomeadamente no que concerne ao desenvolvimento psicossocial e à sua ligação com o sucesso e êxito nos desempenhos. A este propósito, por exemplo Simões (1996) refere Heath (1965-1977) quando esta autora defende que os estádios e o nível de maturidade psicológica permitem prever o desempenho do adulto. Para Heath, o objectivo das instituições, mormente as de universitárias, deverá ser ajudar os seus estudantes a responderem ás adaptações e a atingirem o desenvolvimento óptimo, tornando-se competentes, equilibrados e adultos. Operacionalizando o conceito de maturidade, elaborou uma teoria descritiva do processo e objectivo reservado à educação. O modelo resultante abrange quatro sectores da personalidade que permitem verificar se a pessoa adquiriu uma progressiva maturidade que são, as capacidades cognitivas, o auto-conhecimento, os valores e motivos e as relações interpessoais. O nível de maturação do indivíduo é analisada segundo cinco dimensões independentes do desenvolvimento, cujo incremento é considerado indicador de maturidade do sujeito, isto é, 'simbolização', 'alocentrismo', 'integração', 'estabilidade' e 'autonomia'. Paralelamente, Ferreira e Hood (1990: 401) afirmam que, tornar-se autónomo na perspectiva de Heath, significa ter a 'capacidade de fazer juízos intelectuais sem ser indevidamente influenciado por tendências pessoais e inclui também a capacidade de manter a própria auto-imagem considerando selectivamente a opinião dos outros'. Entretanto, Upcraft & Gardner(1989: 41) mencionam Erickson (1968) por este relacionar o desenvolvimento da personalidade num contexto social e definir o desenvolvimento da identidade nos jovens adultos. Ou seja, Erickson define identidade como um conjunto organizado das representações e do sentido do self que expressa 'quem?' e 'como?' nós realmente somos. O desenvolvimento da identidade depende do estádio físico, do envolvimento com a sociedade e do papel social que cada indivíduo cumpre, assim como, da ordem interna de cada uma das experiências vividas. Para

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o efeito, Erikson considera oito estádios de desenvolvimento psicossocial, sendo o quinto destes estádios, designado por 'jovem adulto' (youth) particularmente importante no processo de desenvolvimento dos jovens estudantes universitários, atendendo a que o estabelecimento de uma identidade é especialmente crítica na passagem deste estádio devido quer às mudanças na maturação física quer ao nível das exigências da sociedade sobre estes jovens adultos. Mas, se é um dado adquirido que os jovens redefinem-se a si próprios, também é frequente surgirem crises de identidade ou de identificação ao longo do processo de maturação. Para muitos destes jovens, questionar sobre 'quem sou eu?' e o 'que virei a ser?' provoca um período de incertezas e dúvidas que, apenas, é ultrapassado após um novo sentido à definição da identidade ( Pinheiro, 1994; Taveira, 1997). Para outros, este período pode ser um tempo de tempestade emocional, inclusive de desorientação da personalidade (Widick, Parker & Knefelkamp, 1978, referidos por Upcraft & Gardner 1989). Com efeito, esta 'crise' de desenvolvimento é considerado, por muitos, o resultado da convergência da maturação bio-psico-social. Segundo o próprio Erickson (1972: 92) o termo 'crise' deverá ser entendido com um sentido de progresso e não com um sentido de retrocesso. Deverá, inclusivamente significar um período crucial no 'crescimento e intensificação dos potenciais'. Cada um destes momentos cruciais podem ser traduzidos por expressões como 'alternativa crítica' ou 'encontro decisivo'. Ainda de acordo com Erickson, as tarefas fundamentais que se colocam ao adolescente e jovem adulto implicam respectivamente a construção da identidade como uma representação estável, equilibrada e coerente de si próprio e a formação das relações de intimidade num processo de fusão da própria identidade com a do 'outro'. No mesmo sentido, a teoria do desenvolvimento do 'ego' em Loevinger (1966 a 1982, referido por Simões, 1996: 76) incide sobre o modo como compreendemos o nosso próprio self e a nossa relação com os outros. No quadro deste modelo são delineados uma sequência de estádios ('pré-social', 'simbiótico', 'impulsivo', 'auto-protector', 'conformista', 'consciente', 'autónomo', 'integrado') e diferentes níveis de transição entre estádios que descrevem a evolução da personalidade do indivíduo, desde a fase de indiferenciação relativamente ao mundo exterior até aos níveis superiores de funcionamento complexo, em que se torna difícil a distinção conceptual entre desenvolvimento cognitivo e desenvolvimento do 'ego'. Também Sanford (1967, referido por Upcraft, 1989: 42) tenta explicar como os jovens estudantes se desenvolvem na Universidade. Com efeito, postula que o desenvolvimento no contexto de ensino superior é um processo contínuo de integração e diferenciação em constante equilíbrio. Sanford considera que o desenvolvimento do estudante universitário se processa segundo três aspectos distintos mas relacionados, a saber: a) libertação de impulsos; b) auto-questionamento; c) diferenciação e integração do ego. A propósito deste último aspecto, é defendido que o desenvolvimento se expressa por um alto nível de diferenciação. Isto é, um elevado número de diferentes partes com diferentes e especializadas funções e um alto grau de integração, o qual, numa linguagem sistémica, corresponde a um estado de coisas nas quais a comunicação

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entre as partes é suficientemente consistente e ampla para que estas diferentes partes (sem perder a sua identidade essencial) se possam tornar num largo 'todo' organizado para servir as grandes metas e objectivos pessoais. O crescimento surge como o resultado dos diferentes equílibrios correspondentes a cada um dos ciclos desafio/resposta. King (1978, referida por Upcraft & Gardner, 1989: 43) sumaria os nove estádios propostos por Perry (1970 a 1981) na sua teoria do desenvolvimento ético e intelectual (Theory of intellectual and ethical

development). Esta teoria parece assentar no suposto de que é possível determinar uma estrutura relativamente precisa para cada um dos modos que os estudantes universitários se servem para interpretar a experiência, acontecimentos ou situações que implicam novas formas de interagir com a realidade. Com efeito, baseado nas suas pesquisas em contextos universitários, Perry elaborou um quadro teórico composto por nove posições ou estádios distintos cada um dos quais representativo do modo de pensar acerca da natureza do conhecimento. Estes estádios foram agrupados por King em:

1. 'dualismo' (estádios 1-2). Os sujeitos neste estádio observam pessoas, conhecimentos e valores através de categorias absolutas, discretas e concretas. A verdade surge como auto-evidente.

2. 'multiplicidade' (estádios 3-4). Os sujeitos reconhecem múltiplos pontos de vista, mas continuam a sentir que a simplificação das questões simples tem múltiplas respostas. Todos os pontos de vista são igualmente válidos e assim não são submetidos a juízos de valor. Questionar ou provocar pontos de vista ainda é evitado.

3. 'relativismo' (estádios 5-6). Os sujeitos acreditam que o conhecimento é contextual e relativo. Os múltiplos pontos de vista anteriores são, agora, vistos como peças que se encaixam num 'todo'. Os sujeitos que procuram o enquadramento geral das coisas são capazes de analisar e avaliar as suas próprias ideias assim como a dos outros. Não obstante, demasiado relativismo pode resultar em indecisão, uma vez que, fazer um juízo de valor poderá sacrificar outra apreciação. No final deste estádio os sujeitos começam a endossar as suas próprias escolhas a partir de uma multiplicidade de 'verdades' que existem num mundo relativista.

4. 'pluralidade' (estádios 7-9). Os sujeitos, caso alcancem estes estádios, fizeram uma afirmação activa de si próprios e das suas responsabilidades no mundo plural, estabelecendo as suas identidades ao longo do processo. As obrigações pessoais, tal como casamento, carreira, religião, etc, são entendidas fora do quadro relativista anterior. 'Identidade' e 'estilo' de vida são consistentes com os temas pessoais dos sujeitos.

Segundo Selman (1980, referido por Simões,1996: 83), são cinco os estádios que caracterizam diferenciadamente o progressivo desempenho de papéis ao longo do desenvolvimento. No primeiro destes estádios, o sujeito vê o outro em termos físicos e concebe a realidade da interacção social de modo dicotómico. No estádio seguinte, apercebe-se que as intenções e os motivos subjacentes às interacções são

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algo a ter em conta. No terceiro estádio, admite que pode haver diferenças profundas entre o self do sujeito e os aspectos inerentes, bem como tudo o que é exteriorizado, dando-se conta, de que poderão existir aspectos internos ou não aparentes. Mas, é no estádio seguinte que o outro começa a ser visto com personalidade estável e que o sujeito se apercebe da eventual ambivalência na relação. No quinto e último estádio da progressão, o sujeito passa a ver o outro, como alguém que é muito mais do que um somatório de traços, características ou reacções. Na sua vez, Simões (1996: 85) ressalta que outras abordagens do desenvolvimento humano privilegiam aspectos de ordem predominantemente interna, intrapessoal e afectiva, embora não negando, aspectos cognitivos ligados ao modo de construção do conhecimento. Este autor, salienta a teoria de seis estádios ('incorporativo', 'impulsivo', 'imperialista', 'interpessoal', 'institucional' e 'inter-individual') de Kegan (1983-1986) sobre o self em evolução. Esta teoria visa compreender como o indivíduo, no decurso da sua vida, reestrutura e auto-regula os processos mentais e constrói as suas significações em interacção com o mundo e com os outros. No âmbito da esfera intrapessoal e afectiva, o modelo da psicologia naturalística de Ausubel (1985, referido por Simões, 1996) concebe as componentes e as funções do ego como a resultante da interacção entre potencialidades geneticamente determinadas e a experiência interpessoal correspondente. Para o efeito, são considerados três estádios de desenvolvimento, designados por ''omnipotência da estrutura do ego', 'satelização' e 'des-satelização'. Um outro aspecto que importa realçar, prende-se com a distinção avançada por Simões (1996: 171) entre ego e self. Partindo de um ponto de vista construtivista e sistémico dada ao constructo, o sistema 'self' é entendido como uma construção cognitiva e integradora que se altera no decurso do desenvolvimento, não só, no controle do comportamento, como também no sentido atribuído à experiência e à interacção com o meio, a par com a modificação de outros domínios do funcionamento humano para um equilibrio, cada vez mais estável e flexível. Ao nível do desenvolvimento deste self, Simões (1996) utiliza a opção de Harter (1983) que segue uma via evolutiva e o define como sendo uma construção activa do sujeito a nível cognitivo que ao longo do percurso do desenvolvimento se encontra em contínua reformulação. A este propósito, na abordagem humanista de Mahrer & Gervaise (1985, referidos por Simões, 1996: 173) é admitida a existência de três patamares na formação e desenvolvimento progressivo do self, isto é, o 'self externalizado', o 'self internalizado' e o 'self integrado', os quais se sucedem em sequência determinada. Entretanto, os sistemas conceptuais do desenvolvimento dos processos da auto-compreensão, tendem a colocar o self nos próprios atributos pessoais que constituem a base cognitiva da identidade pessoal e da auto-estima de cada um. Para Hart e Damon (1986, referidos por Simões, 1996: 175) a auto-compreensão faz incidir o self-objecto, primeiramente, nas qualidades físicas ('self-esquema físico') e a seguir, nas qualidades activas ('self-esquema activo') e depois, nas qualidades sociais ('self-esquema social'

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e finalmente, nas características psicológicas ('self-esquema psicológico'). Simões (1996: 177) refere também a identificação que Harter faz da noção de 'eu' com a estrutura do self, num contexto, que designa como 'mim'. Ou seja, o 'eu' (self- sujeito) estaria consciente do 'mim' (self- objecto) sendo necessário ter presente que esta auto-consciência se modifica significativamente no decurso dos processos de desenvolvimento. Não obstante estar descrito no contexto desenvolvimental do professor, a perspectiva do desenvolvimento em três domínios de Pickle (1985, referido por Simões, 1996: 146) pode ser adaptado ao sujeito, em geral e, ao jovem estudante universitário, em particular. Das referidas dimensões (profissional, pessoal, processual), a primeira aborda o conhecimento artesanal ou básico (esotérico), o ideal de serviço e a neutralidade afectiva, enquanto a segunda, integra a compreensão de si-próprio e dos outros, a necessidade de realização e o estilo e a terceira, inclui o pensamento abstracto, o pensamento critico e a perspectiva. Simões (1996) menciona ainda vários outros modelos que abordam o desenvolvimento do professor assentes em perspectivas desenvolvimentistas do adulto em geral e que, de algum modo, se podem equacionar com a fase etária dos jovens universitários. Entre outros, importa referir os modelos de Sprinthall e Thies-Sprinthall que utilizam uma perspectiva de desenvolvimento cognitivo assente em concepções de Piaget, Loevinger, Kohlberg, Hunt e Perry e que são correspondentes aos domínios do desenvolvimento cognitivo, do ego, da moral e conceptual e, ainda o modelo de McNergney (1983) construído a partir da teoria de campo de Lewin e dos pressupostos dos esquemas conceptuais de Hunt e Harvey. No mesmo sentido, Upcraft & Gardner (1989) referem também a teoria do potencial funcional de Brawer e os modelos do desenvolvimento moral (segundo Kohlberg) e sócio-cognitivo (segundo Fisher). Por último, pela sua importância para a compreensão do desenvolvimento intelectual nos jovens estudantes universitários, salientamos os vectores de desenvolvimento propostos por Chickering (1969), os quais, estendem o conceito de integração/ diferenciação de Sanford (1967) e dão significado à interpretação do binómio identidade-intimidade que são características dos períodos do final da adolescência e jovem adulto em contexto de formação académica. Com efeito, Chickering vai buscar às teorias de Erickson, conceitos, tais como 'crise', 'conflito normativo', 'equílibrio', 'identidade' e 'intimidade', a par de outros, mais próximos de Sanford, como por exemplo 'desafio', 'suporte', 'diferenciação/integração' ou de Heath, como 'maturidade' e 'resposta adaptativa'. Na realidade, é feita uma distinção clara entre a faixa etária dos estudantes que frequentam a Universidade e qualquer outro período da vida em termos do desenvolvimento, postulando que o maior desafio que se coloca ao jovem estudante universitário e a fixação da sua própria identidade. São sete os vectores4 preconizados, por Chickering, para o desenvolvimento neste momento da vida, a saber:

4 Chickering (1969) utiliza o termo 'vector' em vez de 'fase' ou 'período' porque, segundo o próprio, os vectores têm direcção, sentido e magnitude. No entanto, este autor concorda que a melhor forma de representar essa direcção seja uma curva aberta espiralada ou em degrau e não, propriamente, uma linha curva fechada.

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1. 'Tornar-se competente e desenvolver competências'. Os estudantes universitários devem ser capazes de gerir e capacitarem-se intelectual e interpessoalmente com tudo aquilo que surge e fazer aquilo que é suposto ter de se fazer. Este vector, supõe três esferas inter-relacionadas que são a 'competência intelectual', a 'destreza física e manual' e a 'competência interpessoal'.

2. 'Tornar-se autónomo'. Os estudantes universitários devem estabelecer independência emocional relativamente á família e aos pares e ser livre e independente da necessidade de protecção, mimos e aprovações. Devem ser capazes de fazer as coisas por si próprios, embora recorrendo às ajudas quando necessitem. 'O estudante universitário caminha com uma certa hesitação. De repente, ele muda. Torna-se independente: mas é uma independência apoiada num cubo de gel. Move-se em terreno movediço, sem o apoio familiar' (Chickering, 1969: 12).

3. 'Gerir emoções'. Os estudantes universitários devem estar cientes das suas próprias emoções (e.g., a agressividade e violência sexual), aprender como as controlar e integrá-las nas suas próprias decisões e procedimentos;

4. 'Estabelecer a identidade'. Os sujeitos devem desenvolver o sentido do self por clarificação das suas características físicas, necessidades e aparência pessoal, fixando a identificação sexual apropriada (hetero, trans e homosexualidade), papéis e comportamentos. Para Chickering, existem três condições básicas que impulsionam e fomentam o desenvolvimento da identidade que são: a) uma relativa libertação da ansiedade e pressões; b) uma variedade de experiências e papéis; e, c) realizações globalmente significativas e interessantes.

5. 'Soltar as relações interpessoais'. Os estudantes universitários devem incrementar a compreensão e tolerância para com os outros, promover a amizade e o relacionamento baseado na sinceridade, independência e individualidade;

6. 'Clarificar objectivos e ideais' Os estudantes universitários devem desenvolver o seu projecto de vida, gerir planos, objectivos e prioridades para as suas carreiras, vocações e estilo de vida;

7. 'Desenvolver a integridade'. Os estudantes universitários devem desenvolver um conjunto pessoal de crenças e representações consistentes de modo a facultar um guião para as suas atitudes e comportamentos.

2.1.3. O modelo de Activação do Desenvolvimento Psicológico - ADP

A definição de competências e de capacidades específicas (skills) permite que se tenham referências precisas. As capacidades são as da pessoa, que se podem mobilizar para realizar uma tarefa. A aquisição de uma competência supõe a mestria das capacidades, a apropriação pelo sujeito de formas de acção nas situações dadas (Postic,1995: 92).

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CAPÍTULO 1 59

Além disso, sobre determinadas circunstâncias é suposto que os sujeitos possam e devam ser activados, incentivados, promovidos no sentido da optimização das suas potencialidades. Ou seja, é possível contribuir para a optimização do desenvolvimento psicológico dos sujeitos, facilitando desse modo a sua autonomia e integração. Contudo, importa sublinhar que o objectivo de qualquer intervenção sobre o desenvolvimento psicológico, 'não deve visar acelerá-lo ou sequer fixar-lhe um determinado ritmo', mas contribuir para que que os sujeitos se desenvolvam dentro das suas potencialidades' (Simões, 1996: 143). E continua este autor, que 'de acordo com os atributos pessoais que lhe são próprios, tendo presente que o acesso a estádios de desenvolvimento de nível superior contribuirá para assegurar a sua maior eficácia' (ibid.).

É pois, no vasto campo onde se desenvolve toda a actividade humana que é possível e se configura a construção de um determinado projecto de desenvolvimento pessoal e interpessoal (Tavares, 1995: 62). Desta natureza e acção humana, consideram-se fundamentais as seguintes componentes:

• componentes de natureza física e biológica.

• componentes de natureza psicológica: * 'a afectividade'. Cobre toda a gama de comportamentos humanos, motivações, emoções,

sentimentos, etc. * 'o conhecimento'. É uma actividade em que o sujeito interioriza, assimila, se acomoda e equilibra o

mundo dos objectos, das acções e das suas mútuas implicações, a um grau de maior ou menor abstracção e complexidade. O conhecimento reflexivo (metacognição) pressupõe uma reflexão do sujeito cognoscente sobre a sua própria actividade cognitiva, tentando identificar e compreender como é que funciona quando está a conhecer. 'Possui-se um saber metacognitivo quando se tem consciência do processo que se aplica e quando se tem a capacidade para o controlar' (Flavell, 1987; Postic,1995: 84).

* 'a tomada de decisão'. Tomada de uma forma consciente, responsável e livre, autónoma, constitui a expressão mais alta da actividade humana (Tavares,1995: 48).

• componentes de natureza axiológica. Diferentes valores (físicos, biológicos, psicológicos, éticos, artísticos, científicos, pedagógicos, políticos, históricos, religiosos, etc.) que funcionam como motivos, razões mais ou menos investidas de força anímica, cordial, afectiva e, imprimindo distintas modalidades à personalidade de base e emergente.

• componentes de natureza social e contextual. 'O sujeito humano é um ser em situação' (Tavares, 1995: 50).

• componentes de natureza linguística. A linguagem assume-se como o lugar da comunicação em que o ser humano na sua vivência e realidade quotidiana se exprime.

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Entretanto, quando se pretende identificar e caracterizar as principais vertentes do processo de activação do desenvolvimento psicológico, importa saber como funcionam estes múltiplos aspectos e como é que estes jogam em relação a outras grandes componentes do desenvolvimento humano a níveis conscientes, subconscientes e inconscientes (Tavares, 1995: 44). Com efeito, para activar o desenvolvimento psicológico é preciso começar por observar os sujeitos de modo a analisar, compreender e intervir no próprio processo tendo em conta a lógica da sua dinâmica interna e externa numa espiral do desenvolvimento. Desta concepção em espiral do processo do desenvolvimento psicológico, defendida por Tavares (1992 a 1998), sintetizamos as seguintes vertentes que passamos a descrever. 1. 'Conhecer os sujeitos e os seus estádios de desenvolvimento'. Conhecer aspectos da personalidade

(psicomotores, cognitivos, afectivo-relacionais, motivacionais, linguísticos, etc) dos sujeitos e os seus estádios de desenvolvimento e possuir um conhecimento profundo e adequado da articulação, pelo menos, de três dimensões que integram e interagem na estrutura da personalidade humana, a saber: dimensão fisico-biológica, psicológica e dimensão social ou contextual, com modalidades distintas em função das fases ou estádios do desenvolvimento em que os sujeitos se encontram.. 'Não é possível intervir, de facto, sem saber como é que os sujeitos agem (sentem, pensam, decidem), reagem e se comportam no decorrer dos diferentes estádios ou fases do desenvolvimento' (Tavares, 1995: 53).

2. 'Qual a atmosfera envolvente'. Na sua forma genérica, 'ecologia' refere-se ao estudo das relações mútuas de todos os organismos que vivem ou coexistem num mesmo meio e a sua adaptação ao contexto ambiental (Machado, 1991: vol.II). O conceito de campus ecológico assume as suas raízes em Lewin (1936). Desde então, a abordagem ecológica tem sido usada para estudar e explicar os desenvolvimentos e as influências que a atmosfera envolvente exerce nos sujeitos e vice-versa. Exemplificando, a perspectiva ecológica em Bronfenbrenner tal como o faz notar Portugal (1992: 7) ao fornecer-nos o modelo conceptual que nos permite compreender a interacção sujeito-mundo e o consequente centro em que o sujeito em desenvolvimento é colocado e que as suas mais directas interacções são realizadas com o microsistema estando os outros contextos (meso, exo e macrosistema) mais vastos igualmente envolvidos. De igual modo, Ramsdem (1992), Tinto (1993), Russel & Petrie (1992), Pascarella & Terenzinni (1991), entre outros sumariam literatura e investigações acerca do impacto do contexto nos jovens universitários e identificam algumas condições que exercem influência positiva no sucesso dos alunos, nomeadamente uma elevada interacção entre pares, uma forte associação estudante/ curso/ departamento/ Universidade, as condições das residências universitárias, além de uma vasto leque de oportunidades extra-curriculares e sócio-académicas.

3. 'Que tarefas realizar'. Realizar tarefas (actividades) de adaptação às realidades e adequadas às capacidades e estádios de desenvolvimento. O grau de especificidade ou complexidade das tarefas deve ser ajustado, tanto quanto possível, ao nível da capacidade de abstracção e desenvolvimento dos sujeitos.

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CAPÍTULO 1 61

Mais, como qualquer outra situação de aprendizagem, a promoção do desenvolvimento requer determinadas condições, mormente, o aparecimento e o aproveitamento da predisposição nos sujeitos para: aderir e envolver-se na tarefa, compreendendo e tendo uma representação rigorosa, delimitada e concreta do que é preciso fazer; ser persistente na actividade, tendo em vista o objectivo final da tarefa e, avaliar os resultados da progressão ao longo das diversas fases da sua realização e no final da mesma; suscitar o aparecimento e desenvolvimento da autonomia, do sentido de responsabilidade e do sentido de cooperação (Sousa, 1998: 103).

4. 'Quais os conhecimentos adequados'. O conhecimento pode ser encarado como a representação do mundo tal como ele existe antes de ser experienciado pelo sujeito. Na execução das diferentes tarefas os sujeitos precisam ter conhecimentos adequados, experiências envolvendo conceitos mais ou menos abstractos de acordo com a natureza das tarefas. Deste modo, importa saber que mecanismos e a que níveis de abstracção são necessários à realização das tarefas sejam concretas ou não. Esta situação conduz à ideia de contraposição do construtivismo radical (von Glasersfeld, referido por Simões, 1996: 201). Com efeito, Simões (1996), com base na perspectiva do construtivismo radical, afirma que 'conhecer não é ter imagens correctas da realidade, mas possuir processos viáveis, não importando propriamente que eles permitam a adequação ao meio, mas antes que contribuam para que o sujeito mantenha a sua identidade, apesar das dificuldades e dos obstáculos que esse meio apresenta' e defende que a construção do conhecimento nos sujeitos se processa a partir do mundo físico, mundo social, sobre si-próprio, sobre os outros e sobre as relações interpessoais.

Paralelamente, observamos um importante contributo dado por Sousa (1998: 103) para o entendimento deste modelo de ADP. De acordo com esta investigadora, a 'activação do desenvolvimento psicológico exige deliberação e intencionalidade da acção educativa'. E continua, afirmando que 'a promoção do desenvolvimento psicológico (integral) requer determinadas condições, nomeadamente o aparecimento e aproveitamento da predisposição para: i) aderir e envolver-se na tarefa, compreendendo e tendo uma representação rigorosa, delimitada e concreta do que é preciso fazer (ou seja, construíndo uma representação compreensível da tarefa); ii) ser persistente na actividade, tendo em vista o objectivo final da tarefa (ansiedade estimulante), e avaliar os resultados da progressão ao longo das diversas fases da sua realização e no final da mesma; iii) suscitar o aparecimento e desenvolvimento da autonomia, do sentido da responsabilidade e do sentido de cooperação'. A activação passa ainda por ajudar ou facultar ao aluno todas as condições para que, este, possa manifestar determinadas atitudes e comportamentos desejáveis e que sejam 'indicadores da sua capacidade de automotivação' e de auto-realização.

O modelo de ADP (Figura 1-VI) proposto e sucessivamente ensaiado por Tavares e colaboradores, pode ser resumido num processo, no qual 'o sujeito é lançado como um projecto em direcção ao seu alvo' (Tavares, 1995: 109-110) de acordo com uma certa ordem em sucessivas fases ou etapas.

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���� Ponto de partida de ADP �

� Identificação dos principais componentes. Análise da situação em relação aos sujeitos, aos contextos, às tarefas, aos conhecimentos e aos processos.

� Caracterização dos principais componentes de ADP (sujeitos, contextos, tarefas, conhecimentos, processos, recursos materiais e humanos).

� Análise das componentes de ADP ao nível dos sujeitos, contextos, tarefas, conhecimentos, processos, recursos materiais e humanos.

� Análise dos processos e estratégias de intervenção ao nível dos sujeitos, contextos, tarefas, conhecimentos, processos, recursos materiais e humanos.

� Processos de intervenção ADP, tendo em conta a função e a interacção de todos os componentes do processo.

� Avaliação da ADP, tendo em conta todos os componentes e os resultados do processo.

�Continuação do processo de ADP, no sentido da sua optimização �

Figura 1-VI: o modelo de A.D.P. (segundo Tavares, 1995: 110)

Registamos ainda a sugestão de Campos (1982: 18) de que é necessário 'levar aqueles que se

apoiam a adquirirem as competências de análise das situações e, em consequência, à elaboração das soluções alternativas'. Com efeito, para que se promova o desenvolvimento das competências necessárias que permitam, ao aluno, ser um observador activo, um descobridor, um investigador, um experimentador e o construtor do seu próprio conhecimento importa levá-lo a percorrer com êxito os seus ciclos do 'apreender- aprender- empreender' e em simultâneo facilitar o desenvolvimento dos seus ciclos da autonomia, auto-responsabilização, auto-confiança, auto-regulação e auto-aprendizagem.

2.2. Gestão da transição entre subsistemas de ensino secundário e superior

Qualquer transição entre subsistemas de ensino confronta os alunos com imensos desafios. Contudo, a transição entre a escola secundária e a Universidade será, talvez, aquela que mais implicações acarreta ou potencia crises de desenvolvimento (psicológico, relacional, afectivo). Atendendo às diferenças existentes nos níveis de desenvolvimento (psicológico, relacional, etc.) e á multiplicidade e complexidade das situações e tarefas com que os alunos que ingressam numa Universidade são confrontados. Alguns estudos (Herr & Cramer,1992; Zuncker,1994; Tavares et al. 1996,1998; Leitão e Paixão, 1999) têm sido

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desenvolvidos no sentido de avaliar as principais necessidades e dificuldades dos alunos na gestão desta transição. Entre vários destes estudos, Soares (1998: 61) salienta o de Walters e Saddlemire (1979, igualmente referido por Herr & Cramer, 1992), levado a cabo com alunos do 1º ano universitário, por concluir que uma percentagem elevada de 85% destes alunos expressavam necessidades específicas de: a) informação sobre as profissões relacionadas com a área de formação que frequentavam; b) conhecimentos dos serviços vocacionais existentes; c) experiências directas (e.g., trabalhos em part-time, visitas in loco) de trabalho nas profissões que estavam a considerar; d) compreensão de si próprios para escolher profissões que se ajustassem aos seus valores, objectivos e preferências por estilos de vida; e) conhecimento acerca do mercado de trabalho; e, f) planeamento do percurso universitário. O ajustamento académico, tem sido conceptualizado, na investigação psico-educacional, como um processo múltiplo e complexo, envolvendo factores e variáveis de índole (inter e intra) pessoais a par de outras de carácter situacional ou contextual (Ramsdem, 1992; Russel & Petrie, 1992; Tinto, 1993; Pascarella & Terenzini, 1991; Upcraft & Gardner, 1989, etc). Entre nós, os resultados do projecto Euro-Student, desenvolvido no âmbito do European Council for Student Affairs (ECSTA) por uma vasta equipa da Universidade de Coimbra (Leitão e Paixão, 1999) revelaram a importância das necessidades vocacionais na transição do ensino secundário para o superior. Neste estudo, 48,3% dos alunos que frequentam o 12ºano de escolaridade e 59,7% dos alunos que frequentam o 1ºano de ensino superior, expressaram que gostariam que lhes fosse prestado apoio no âmbito da informação, orientação vocacional e consulta psicológica, aquando da entrada e permanência na Universidade. Esta percentagem eleva-se para 70,9%, caso se consideram as respostas dos alunos que frequentam o 12ºano relativamente á sua preparação para o ingresso na Universidade. Gonçalves e Cruz (1988, citados por Soares, 1998: 58) classificam os problemas com que os estudantes universitários se confrontam no ingresso na Universidade em três grandes grupos, a saber:

• problemas ou dificuldades decorrentes do confronto com as tarefas e exigências académicas;

• problemas ou dificuldades decorrentes do confronto com as tarefas sociais (na relação com os outros, pares, docentes, etc.);

• problemas ou dificuldades decorrentes do confronto com decisões vocacionais. A Universidade constitui uma etapa fundamental no desenvolvimento da identidade vocacional, onde os processos de tomada de decisão, exploração das escolhas e a transição entre o ensino e o trabalho merecem particular ênfase.

Tavares et al. (1996;1998: 14) orientam o seu trabalho de análise aos factores de insucesso nos alunos do 1ºano de ensino superior, assumindo como ponto de partida que:

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• a entrada no ensino superior representa uma descontinuidade em relação a experiências educativas anteriores;

• os sintomas dessa (des) continuidade seriam detectáveis em vários domínios: psicológico, pedagógico/didáctico e institucional.

Acerca desta (des)continuidade, estes investigadores referem ainda que no domínio psicológico,

será necessário perspectivar todas as alterações contextuais que influenciam as experiências pessoais e académicas dos alunos. Isto é, o tipo de acesso e contactos com os professores, os diferentes estilos de intervenção e da relação com o saber, o confronto com novas formas de conhecimento e de pensar, a diferente organização curricular e, além disso, a gestão da transição para um novo espaço de vida, autonomia e liberdade mais afastado do elo familiar. Este novo contexto 'pode afectar a imagem social de si enquanto aluno e pessoa, as estruturas representacionais, as expectativas e as estruturas de motivação'. E acrescentam, que 'as lógicas e as estratégias dos alunos podem alterar-se, originando, correlativamente, transformações nos projectos de vida e vocacionais'. No domínio pedagógico/didáctico, os alunos são submetidos a ritmos de trabalho bastante diferentes dos experienciados, com requisitos de mobilização das capacidades cognitivas igualmente diferenciadas, bem como, uma maior necessidade de organização e gestão autónoma (auto-regulação) do estudo. Sobressaiem também as diferenças nos códigos linguísticos no campo científico, tornando-se a escrita o principal mediador na expressão e avaliação dos saberes. Por outro lado, no domínio da organização das aprendizagens, seria importante equacionar os processos de transmissão e manipulação da informação, nomeadamente a que sucede nas aulas teóricas e teórico-práticas em grandes grupos. Acrescenta-se também a esta dimensão do problema, outras dimensões, mais gerais, relacionadas com o tipo de intervenção dos actores e da organização dos processos de ensino e aprendizagem, designadamente: 1) possíveis deficiências nos métodos de ensino em geral; 2) algum desinteresse e desmotivação dos professores; 3) deficiências existentes no acompanhamento psico-pedagógico-organizacional dos alunos

(consultório, tutorias e programas). Finalmente, no domínio institucional são sublinhadas novas dinâmicas relacionais (pessoais e interpessoais) e os problemas que estão associados à inserção dos alunos nos espaços político-organizativos, colegiais de governo (assembleias, conselhos e senados) ou de gestão (comissões, conselhos pedagógicos) e associativos dos próprios estudantes.

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CAPÍTULO 1 65

2.3. Impacto dos contextos no ajustamento académico

Um exame, mesmo que breve, às investigações acerca das influências do contexto de ensino superior universitário sobre os jovens estudantes, revela em primeira mão uma diversidade de abordagens com vista à compreensão dessa complexidade. Para Holman (1995), esta diversidade pode ser conceptualizada nas seguintes formas:

• a tradição do desenvolvimento sócio-afectivo, focando em valores, afectos e aspectos de socialização (e.g.,Weidman, 1989; Tinto, 1993);

• a tradição cognitiva, focando em competências do pensar e desenvolvimento cognitivo (e.g., Pascarella, 1985) ou estilos cognitivos (Messick, 1976; Pask) ou formas de abordar as aprendizagens (Marton & Saljö, 1976; Entwistle & Ramsdem, 1983; Entwistle, 1987; Biggs, 1989; 1996, entre outros);

• a tradição experimental, focando na natureza experimental da aprendizagem do jovem adulto e baseada em métodos centrados de ensino (exemplo: treino de auto-instrução; autonomia; reflexão crítica; etc.); e,

• uma tradição relativamente recente (anos 80) e cuja ênfase são as competências pessoais e afectivo-relacionais em sistemas ecológicos (inserem-se por exemplo, neste grupo, os modelos designados de impacto, por Pascarella & Terenzini, 1991).

Com efeito, alguns estudos (Pascarella & Terenzini, 1991; Russel & Petrie, 1992) têm procurado analisar modelos e teorias acerca da influência dos contextos nos sujeitos e acerca do grau em que o estudante universitário comunga as normas, regras, as atitudes e os valores das instituições em que é inserido e adere às estruturas sócio-académicas (formais e informais) de modo a se ajustar e integrar, em pleno, na comunidade académica. Esta integração social e académica do estudante no contexto universitário descreve, segundo Pascarella & Terenzini (1991: 51) a percepção que o estudante tem acerca do lugar que ocupa no sistema. Neste sentido, por exemplo, Banning (1989: 56) aponta duas concepções para a análise e compreensão do ambiente nos campos académicos. A primeira destas concepções, assenta na sugestão de seis dimensões proposta por Moos em 1974 e consiste na verificação dos aspectos relacionados com a geografia, arquitectura e variáveis físicas (e.g., ergonomia) dos espaços académicos, as actividades e eventos extra-curriculares, a estrutura organizacional, as características pessoais e comportamentais dos elementos não residentes, as características psico-sociais e clima institucional e, ainda análise funcional ou reforço dos ambientes e recursos académicos. A segunda concepção assenta na perspectiva de Blocher, a qual toma o campus como um sistema ecológico composto por três subsistemas. Um destes subsistemas é estruturado através das oportunidades existentes, fornecendo as situações no interior do contexto que possam servir para promover o crescimento pessoal e o desenvolvimento. Outro subsistema de suporte, é

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definido como sendo um centro de recursos para apoiar os alunos na medida das oportunidades e actividades no campus. Por último, um subsistema de compensação na forma de reforços dados através de actividades ou oportunidades de realização. Na realidade, Banning acaba por combinar estas duas diferentes perspectivas, sugerindo uma taxonomia de análise dos campos académicos que assenta em aspectos relacionados, nomeadamente com: a 'localização', isto é, qual é a situação geográfica da instituição e campus universitário? qual a distância a que se encontra da residência habitual do estudante? qual o design e distribuição do campus?; ou com 'variáveis demográficas', ou seja, saber quem são os estudantes? qual é a instituição?; ou ainda, com os 'programas', identificando quais são as oportunidades, recompensas, intervenções e suportes associados ao currículo e ao co-currículo (oculto)? Este sistema ecológico é essencial para a compreensão dos níveis de ajustamento académico e do impacto que o contexto representa no jovem universitário, assim como, da influência recíproca exercida sobre o próprio contexto académico, tomando por base as diferentes características pessoais, afectivo-relacionais, culturais, etc. destes estudantes De acordo com Banning, o impacto do contexto académico sobre o sujeito é função das variáveis taxonomizadas e qualquer intervenção pode ser planeada com base nos conceitos de transição ecológica; congruência ecológica e governo (manning theory) através dos seguintes aspectos:

• compreendendo a relação sistémica entre o jovem universitário e o contexto académico;

• conhecer as características do campus (contexto receptor);

• conhecer as características dos jovens universitários e os seus contextos académicos ou escolares anteriores (contexto emissor);

• estudar a transição e congruência na intersecção entre contextos: receptor e emissor (interface);

• planear contextos para conseguir resultados positivos nos desajustamentos (undermanned);

• planear programas de orientação e intervenção que tenham em conta a convergência das necessidades dos jovens universitários e as condições ambientais do campus;

• planear programas que promovam pequenos contextos de proximidade ou 'nichos' de convergência de interesses.

Entretanto, os modelos ecológicos, seguidos com vista à identificação das variáveis de natureza individual (intra e interpessoal), organizacional e contextual, dimensões que se presume exercem uma importante influência no desenvolvimento psico-social-académico dos jovens universitários são designados por Pascarella & Terenzini (1991) de modelos de impacto. Segundo Soares (1998: 90), estes modelos de impacto focalizam-se sobretudo nas fontes/origens das mudanças (e.g., características do ambiente institucional, programas e serviços oferecidos, experiências do estudante, interacções com os membros da comunidade universitária) descentrando, assim, o centro de análise do indivíduo isoladamente (modelos

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CAPÍTULO 1 67

desenvolvimentais) para o indivíduo em interacção com o contexto. Neste sentido, Holman (1995) sublinha um aspecto importante que se prende com a evidente e crescente insatisfação com os quisitos, nível e exigências de ensino que predominam em muitas disciplinas, predominância que não é, caso algum, consistente com os resultados da investigação sobre as experiências de aprendizagem dos alunos no contexto de ensino superior, em geral (Richardson, Eysenck & Piper, 1987; Ferreira e Hood, 1990; Ramsdem, 1992; Rusell & Petrie, 1992; Tinto, 1993; Bastos e Gonçalves, 1997; Leitão e Paixão, 1999) e no primeiro ano, em particular (Upcraft, Gardner & Associates, 1989; Marques e Miranda, 1991; Nico, 1995; Tavares et al, 1996, 1998; Carneiro, 1999). Por sua vez, Barnett (1994) sumariza a necessidade da mudança de ênfase curricular na passagem das capacidades disciplinares específicas para habilidades pessoais transferíveis e utilizáveis em muitas áreas da vida (e também, embora em menor extensão, em competências profissionais específicas). Contudo, subsistem muitas questões acerca da forma como se podem facultar ou promover as competências necessárias ao empreendimento académico e as implicações relativamente a uma aprendizagem continuada através da vida. Com efeito, um dos principais resultados destas preocupações foi prestar maior atenção aos produtos de ensino superior e, em particular, a relação entre estes e aplicação ao mercado de trabalho. Aliás, as evidências sugerem a necessidade de prestar atenção ao desenvolvimento e promoção das competências, conhecimentos e estratégias que produzem esses produtos (Gibbs, 1992). Mas, apesar das mudanças operadas um pouco por toda a parte, há poucos estudos que descrevam as experiências do ajustamento e promoção das competências ou dos processos, através dos quais, se desenvolvem os produtos em jovens universitários. Drew & Payne (1992, referido por Holman, 1995: 263), num estudo longitudinal de carácter qualitativo, analisou as percepções de universitários relativamente à adaptação e desenvolvimento pessoal no decurso da formação no ensino superior. Estes investigadores questionaram os alunos acerca do seu próprio desenvolvimento em relação a uma lista pré-determinada de competências pessoais e qualidades, tais como a auto-consciência geral, a competência crítica, a capacidade de investigação, as competências de estudo a auto-gestão a orientação, os skills pesssoais, interpessoais e de comunicação. Estes investigadores observaram mudanças significativas durante os três primeiros anos de formação universitária referindo designadamente, que no início dos seus cursos, a maioria dos jovens universitários inquiridos tendem a apresentar dificuldades em falar relativamente às suas competências pessoais e qualidades académicas e a mencionar com maior frequência aquelas que sentem carecer ou ter mais dificuldades. No segundo ano estão mais disponíveis para descrever as suas competências pessoais e qualidades e no decurso do terceiro ano, frequentemente são capazes de identificar as maiores áreas de mudança. Estes investigadores, também descrevem um conjunto de aspectos que afectam os resultados das experiências de aprendizagem, nomeadamente:

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• factores externos. Presença de dificuldades, problemas e desafios na adaptação ao contexto académico; (in)satisfação com a estrutura organizativa e contexto universitário; actividades extra-curriculares (trabalhador-estudante e gestão dos tempos livres); feedback, suporte e estímulos recebidos de outros (pares, professores, família); pressões e liberdade.

• factores internos. Procura de relevância das actividades e tarefas do curso; auto-consciência, percepção de necessidade de mudança e clara orientação pessoal; aceitação das responsabilidades pessoais; realização de relações pessoais e interpessoais; outras características individuais.

Neste sentido, Soares (1998) sugere um conjunto de teorias e modelos de impacto, começando por descrever os principais postulados da 'theory of involvement' de Astin (1970, 1985, igualmente referido por Pascarella e Terenzini, 1991). Não sendo uma teoria na sua verdadeira acepção, mas antes um conjunto de princípios gerais que procuram explicar as dinâmicas de desenvolvimento e adaptação ao contexto universitário, esta abordagem parte do pressuposto que esta adaptação se realiza quando o estudante se envolve e desempenha um papel central. Com efeito, é o próprio estudante que determina o grau de aproveitamento das experiências desafiadoras proporcionadas pelo ambiente académico. Este 'involvement' refere-se, sobretudo, à quantidade de energia física e psíquica que o aluno devota à experiência académica (Astin, 1985, referido por Upcraft, 1989 e Soares, 1998: 91). São cinco os princípios que explicam este empreendimento nos jovens estudantes universitários, a saber:

• requer investimento de energia física e psicológica relativamente a vários objectos (objectivos, tarefas, pessoas, actividades, etc.);

• é uma variável rácio-intervalar (diferentes estudantes investem diferentes quantidades de energia);

• pode ser caracterizado quantitativa e qualitativamente (categorial). A extensão do envolvimento do estudante, por exemplo, no estudo autónomo pode ser medido quantitativamente (e.g., quantas horas semanais de estudo?) e qualitativamente (será que o aluno reviu e compreendeu a leitura dos apontamentos?);

• a quantidade de aprendizagem e o desenvolvimento pessoal do estudante em qualquer programa ou plano de estudos é directamente proporcional à qualidade e quantidade do seu envolvimento no referido programa;

• a eficácia de qualquer política ou programa educativo está dependente da sua capacidade para promover o envolvimento do estudante. Modo similar, o modelo de Tinto (1975; 1987, referido por Pascarella e Terenzini, 1991 e Soares,

1998) aponta para que os estudantes entram na Universidade com diferentes expectativas e constelações de características pessoais, familiares, académicas e de competências. Este modelo é de grande utilidade na compreensão do processo de ajustamento académico, sendo frequentemente utilizado para explicar, entre outros aspectos, como os jovens universitários desenvolvem competências académicas. Assim, quando as

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CAPÍTULO 1 69

interacções formais e/ou informais que o estudante estabelece com o contexto forem percepcionadas como satisfatórias e recompensadoras, promove-se uma maior integração do estudante no sistema. Se pelo contrário, estas experiências e interacções forem negativas, estas tendem a reduzir os níveis de integração e a afastar o estudante da comunidade académica (Soares,1998: 92). Conforme a Figura 1-VII, Pascarella (1985, referido por Pascarella & Terenzini, 1991 e Soares, 1998: 94) inclui neste seu modelo, explicitamente, as características organizacionais da instituição universitária e do seu ambiente geral. De acordo com este autor, a aprendizagem e o desenvolvimento do estudante universitário decorre dos efeitos directos e indirectos de cinco agrupamentos de variáveis que se podem observar na figura.

Figura 1-VII: modelo de avaliação do impacto dos ambientes universitários na aprendizagem e no desenvolvimento intelectual do estudante universitário

De um modo análogo, Weidman (1989, referido por Pascarella e Terenzini, 1991 e Soares, 1998: 96)

incorpora, no seu modelo de compreensão do processo de socialização dos estudantes universitários, um conjunto de atributos pessoais (sócio-económicos e culturais, preferências vocacionais, aspirações e expectativas, valores, aptidões, etc.) a par dos processos (formais e/ou informais) a partir dos quais os estudantes adquirem conhecimentos, atitudes e competências valorizadas e/ou pressionadas pela sociedade ou grupos (família, pares, etc.) em que se inserem. Estas pressões sentidas pelos estudantes com maior ou menor intensidade predispõem e influenciam as escolhas e o ajustamento dentro dos contextos sociais e académicos em que se encontra inserido.

Características estruturais/organizacionais da instituição universitária

� Modelo de acesso � Rácio professor/aluno � Selectividade � Características residênciais � Outros aspectos

Interacções com os agentes de socialização

� Faculdade/departamento (curso)/escola � Funcionários/técnicos � Docentes � Pares

Estatuto sócio-económico e cultural do estudante

� Aptidões � Realização/satisfação � Personalidade � Aspirações/expectativas � Etnia

Ambiente institucional(campus)

Aprendizagem e desenvolvimento cognitivo

Qualidade e quantidade do esforço e persistência

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Por último, ainda Soares (1998: 97) apresenta o modelo de ajustamento académico de Russel e Petrie (1992), o qual, procura sintetizar a investigação realizada acerca da problemática, bem como, fornecer o enquadramento conceptual para a sua avaliação e intervenção. Este modelo organizacional de Russel & Petrie assenta, na complexidade do processo de ajustamento académico e contempla quer factores preditores (académicos, sociais, contextuais, pessoais, etc.) quer variáveis de resultado desse ajustamento (desempenhos, ajustamento pessoal, psicossocial, cognitivo, etc.).

Figura 1-VIII: modelo organizativo do ajustamento académico de Russel e Petrie (1992)5

São assinaladas, na figura 1-VIII, algumas das intervenções possíveis (directas e/ou indirectas),

destinadas ao desenvolvimento e promoção do ajustamento académico, as quais, interrelacionam de forma dinâmica e interdependente com outros factores. A este propósito, sublinhamos uma experiência-piloto (Pereira,1998) a partir da qual foi oferecido apoio (peer counselling) entre pares através de uma linha telefónica nocturna e que produziu uma taxonomia das necessidades do estudante universitário, além de

5 Conforme Soares (1998: 98)

FACTORES PREDITORES DO AJUSTAMENTO ACADÉMICO

ACADÉMICOS SOCIAIS/ CONTEXTUAIS PESSOAIS

* aptidões e capacidades * competências de estudo * ansiedade face aos exames * motivação académica * auto-eficácia e atribuições

* stress de vida e apoio social* contexto universitário * envolvimento no trabalho * variáveis familiares * ambiente académico

* medidas de personalidade * locus de controle * auto-estima * ansiedade-traço * estilos

RESULTADOS DO AJUSTAMENTO ACADÉMICO

DESEMPENHO ACADÉMICO AJUSTAMENTO SOCIAL AJUSTAMENTO PESSOAL

INTERVENÇÕES

CONSULTA PSICO-PEDAGÓGICA PROGRAMAS APOIO/ INSTITUIÇÃO

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CAPÍTULO 1 71

sugerir que fosse dada mais atenção e relevo aos programas de desenvolvimento pessoal destes estudantes universitários.

2.4. Concepções de ensino e aprendizagem

As concepções de ensino e aprendizagem salientadas quer por professores quer por alunos, afectam as suas perspectivas acerca do seu papel nos contextos e processos de formação. Chalmers & Fuller (1996: 10) sugerem que um aluno cuja concepção de aprendizagem seja 'saber mais' terá tendência a fixar o papel do aluno e do professor de modo diferente daquele aluno que concebe a aprendizagem como entender o mundo de uma nova forma. Modo análogo, um professor que conceba o ensino como processo de transmissão verá o papel do aluno no processo de aprendizagem diferentemente de outro professor que perspective o ensino como suporte da aprendizagem. Neste sentido, Gleason (1985, referido por Chalmers & Fuller, 1996) aponta para que a prática de separação dos papéis e responsabilidades do aluno e do professor reforça uma ideia errada de que 'ensinar' é algo que ocorre num canto de uma sala sob o controle do professor e que 'aprender' toma lugar no outro oposto da sala sob o controle do aluno. A título de exemplo, professores que focam, exclusivamente o seu papel de transmissor de conhecimentos (visão quantitativa) salientam a necessidade do aluno em aprender cada vez mais e responsabilizam-no por isso, além de tenderem a utilizar estratégias de ensino que tenham mais a ver sobretudo com a transmissão e apreensão do conhecimento e, muito menos com a aprendizagem e empreendimento. Inversamente, alunos que focam, exclusivamente no seu papel de alunos como receptores passivos da informação tenderão, por isso a não procurar outros (novos) conhecimentos ou formas de entendimento, mas apenas conhecer e aprender aquilo que lhes é (ou não) fornecido pelo professor, responsabilizando-o relativamente ao processo de aprendizagem. O modo pelo qual os alunos vêem e abordam a sua aprendizagem e o modo como os professores vêem e abordam o seu ensino parece fornecer uma explanação segura acerca do porquê os alunos não atingirem determinados objectivos e metas da formação universitária. Os alunos nem sempre se envolvem e ajustam devidamente ao processo de aprendizagem e podem, por vezes, limitarem-se, apenas, a cumprir as exigências dos planos de estudos com o mínimo de esforço e empenho. Os professores parecem encorajar esta realidade, quando utilizam procedimentos de ensino e métodos de avaliação, cuja ênfase recaia sobre o acréscimo da quantidade de conhecimento e menos sobre a sua qualidade e significação.

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2.4.1. Como os professores universitários vêm o seu ensino (concepções de ensino)

Os professores, independentemente do nível de ensino em que se situam, tendem a elaborar representações relativas à natureza do processo de ensino, as quais, afectam os mecanismos e procedimentos relativos ao modo como ensinam. Ensinar envolve a transmissão de conhecimentos ou de assuntos específicos cujo fundamentos e origem assentam em fontes externas. O professor, segundo esta perspectiva, ocupa o papel central no processo de aprendizagem, controlando o que é aprendido, quando é aprendido e como é aprendido. Mas, é possível considerar outros pontos de vista, de carácter mais qualitativo, nas quais, o professor perca a sua posição central, ainda que sem prejuízo de importância no processo. O principal foco do ensino passa a ser a mudança da forma como os sujeitos vêm e usam o conhecimento que adquiriram. Ensinar passa pela facilitação da aprendizagem, envolvendo professor e alunos em cooperação e interacção para o desenvolvimento da compreensão na interpretação do mundo.

Neste sentido, Samuelowicz & Bain (1992, referidos por Chalmers & Fuller, 1996) identificam a partir de estudos recentes, cinco diferentes concepções de ensino que podem ser tomadas em docentes universitários. Estas concepções podem ser vistas, não hierarquicamente, mas antes, ordenadas num continuum de sofisticação na medida que cada concepção é qualitativamente diferente da precedente. Assim, as três primeiras concepções são essencialmente quantitativas e as seguintes de carácter mais qualitativo. A principal ênfase do processo de ensino é incrementar o conhecimento nos alunos e para isso, é necessário:

1. Conceder informação. 'Ensinar' é visto como actividade centrada no professor, a qual envolve concessão da informação ou conhecimentos, realçando a importância das matérias e conteúdos (mensagem) específicos, transmitidos através de uma correspondência unívoca (do professor para o aluno). O objectivo esperado do professor relativamente ao aluno como resultado da sua actividade docente, é que este, apreenda ou saiba mais acerca de (qualquer coisa). Neste sentido, a responsabilidade do professor é fornecer (nas melhores condições) a informação, o enquadramento e a exemplificação apropriada.

2. Transmissão de atitudes e conhecimentos, através dos modelos específicos relativos a cada disciplina académica. 'Ensinar' é vista como uma actividade centrada no professor colocando a ênfase no desenvolvimento das competências nos alunos, para que estes possam lidar com as matérias e aplicar os conceitos adquiridos. O objectivo do professor relativamente aos seus alunos é que, estes, apreendam ou saibam mais acerca de (…), mas, também empreendam as competências necessárias à utilização dos conhecimentos recebidas do professor. A responsabilidade do professor é fornecer o enquadramento conceptual das matérias e assuntos, por forma a que os alunos o possam apreender.

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3. Facilitar a compreensão. 'Ensinar' é vista como actividade centrada no professor, cujo ênfase é colocado na compreensão, por parte dos alunos, da informação de forma a que possam aplicar a novas situações e problemas quer acerca da disciplina quer for a desta. O objectivo do professor relativamente aos seus alunos é permitir que estes sejam capazes de aplicar os seus conhecimentos mesmo em circunstâncias não familiares. A responsabilidade do professor passa por tornar a compreensão possível através de arranjos adequados.

4. Objectivação para a mudança das concepções ou compreensão do mundo. 'Ensinar' é vista como uma actividade cooperativa, tomando o aluno como o menos experiente aprendiz. O objectivo do professor é mudar o entendimento primário ou naíve do aluno, tornando-o mais experiente e conhecedor através do acesso e contacto com os modelos conceptuais da disciplina específica. A responsabilidade do professor é envolver os alunos activamente na sua própria aprendizagem usando uma variedade de métodos, procedimentos e estratégias de ensino de forma a alcançar os seus objectivos.

5. Suporte da aprendizagem. 'Ensinar' é vista como actividade centrada no aluno e na qual, os alunos são responsáveis pela sua própria aprendizagem e pela selecção dos conteúdos que adquirem. O objectivo do professor é encorajar e suster os interesses próprios dos alunos. A responsabilidade do professor é auxiliar na planificação, monitorização e fornecer o feedback adequado ao trabalho realizado por alunos, bem como, a orientação conceptual subjacente. Esta concepção, embora aplicável em toda a sua substância ao nível de licenciatura universitária é no entanto, usualmente, mais aplicada ao nível das pós graduações (mestrados e doutoramentos) e formação contínua (e.g., o modelo da Universidade Aberta).

Acerca destas concepções de ensino, Chalmers & Fuller (1996: 9) avançam igualmente que, nos professores universitários, estas paracem reflectir fundamentalmente dois tipos de abordagem cujas principais características se podem resumir de seguida:

• abordagem unívoca de transmissão (transmission approach). Esta abordagem unívoca (um sentido) baseia-se no princípio ou intenção de transmissão de conhecimentos, competências e procedimentos do professor para o aluno. As aulas são conduzidas como sessões de informação, basicamente de carácter expositivo com poucas oportunidades de participação ou intervenção dos alunos. O propósito das aulas, para o professor, é apresentar (expôr) os assuntos das matérias de forma clara e precisa. A apreensão e aprendizagem da informação é da responsabilidade de cada aluno e espera-se que este processo seja empreendido ao próprio ritmo do aluno. Se tarefas de aplicação (exemplificação) são estabelecidas pelo professor deve-se apenas ao facto de permitir, nos alunos, a demonstração exacta da aplicabilidade da informação que adquiriram, ou seja, apenas são facultados exemplos das situações de aprendizagem. A aprendizagem do aluno é obtida na determinação de quanto e qual o grau de exactidão relativamente à informação recebida, em detrimento de saber o que efectivamente foi compreendido (Gow & Kember,

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1993; Samuelowicz & Bain, 1992, referidos por Chalmers & Fuller, 1996: 10). O processo de avaliação, neste modelo de abordagem, consiste sobretudo em exames, com recurso questionários ou testes de escolha múltipla ou compostos de pequenas perguntas-resposta, essencialmente, relacionadas com os conteúdos de cada disciplina curricular. Eventualmente, poderá ser complementada esta avaliação, com proposta de realização de relatórios ou pequenos trabalhos práticas de compreensão de assuntos específicos e, raramente, de aplicação e generalização teórico-prática.

• abordagem biunívoca (two-way) de cooperação. Esta abordagem baseia-se no princípio ou intenção de facilitar e encorajar a aprendizagem do estudante, ajudando-o a desenvolver as competências de resolução dos problemas e habilidades de pensamento crítico. O professor usa os conhecimentos e capacidade de compreensão existentes nos alunos como ponto de partida para o processo de ensino. O professor apresenta os assuntos das matérias como meio de introdução de conceitos e processos e é menos central nos processos de ensino e aprendizagem, donde as aulas tendem a ser, modo geral, mais interactivas e de trabalho em grupo. As actividades docentes são seleccionadas a partir de um leque de métodos e estratégias alternativas com o propósito de orientar os alunos para a construção dos seus próprios conhecimentos, estabelecer o seu próprio sentido da realidade e adoptar os modelos conceptuais no alinhamento daquilo que é partilhado por os vários especialistas na matéria. Os professores que adoptam esta abordagem salientam que uma parte importante do seu papel é fornecer a motivação e os estímulos ajustados aos interesses e vontades de cada aluno (Gow & Kember, 1993; Samuelowicz & Bain, 1992, referidos por Chalmers & Fuller, 1996: 10). A avaliação do aluno é obtida por determinação daquilo que é compreendido em vez daquilo que é sabido. Relatórios críticos de actividades, ensaios extensivos, portafólios, análise em estudo de casos, resolução de problemas e tarefas de aplicação, entre outros, são os meios mais usualmente utilizados no processo de avaliação segundo esta abordagem de ensino.

2.4.2. Como os estudantes universitários vêm a sua aprendizagem (concepções de aprendizagem)

Os estudantes iniciam um plano de estudos de um determinado curso munidos de um conjunto de representações ou crenças acerca da natureza da aprendizagem e sobre aquilo que esta pretende atingir (Ramsdem, 1992; Biggs & Moore, 1993, Marton et al., 1993; Gibbs, 1996; Chalmers & Fuller, 1996; Marton et

al., 1997, e outros). Por exemplo, Chalmers & Fuller (1996) defendem que as representações ou crenças (mitos) acerca da aprendizagem e do modo como esta se processa são chamadas 'concepções de aprendizagem'. Assenta esta terminologia em recentes experiências e investigações no contexto escolar, assim como nas motivações e objectivos dos alunos, referindo-nos, nomeadamente, aos estudos de Saljö

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(1979) realizados com estudantes universitários e com o objectivo de questionar o que estes pensavam acerca dos seus próprios processos de aprendizagem. A partir das descrições de Saljö, foram identificadas cinco diferentes concepções de aprendizagem que foram sendo sucessivamente confirmadas por vários trabalhos de investigação (Van Rossum & Schenk, 1984; Marton & Ramsdem, 1987; Ramsdem, 1992, etc) e, às quais, mais recentemente (Marton, Dall'Alba & Beaty, 1993) acrescentaram uma sexta concepção de aprendizagem. Passamos, de seguida a descrever em síntese cada uma destas concepções:

1. Incremento quantitativo de conhecimentos. 'Aprender' é visto como aquisição de informação na perspectiva do 'saber mais' ou 'saber muito'. Esta aquisição resulta, normalmente por absorção ou assimilação e posterior armazenamento de grandes quantidades de conhecimento.

2. Memorização e reprodução. 'Aprender' é visto, essencialmente, como armazenamento que possa ser evocada e reproduzida posteriormente como blocos de conhecimentos. Este processo toma lugar quando se recorre às rotinas de repetição e memorização.

3. Aplicação de conhecimento. 'Aprender' é visto como aquisição de factos, competências ou procedimentos que podem ser retidos e evocados para serem usados quando necessário. Toma lugar este processo através da aquisição de conhecimentos que podem ser usados e/ou aplicados.

4. Significação das coisas ou capacidade de abstracção. 'Aprender' é visto como o relacionamento e conexão de novas informações com conhecimentos anteriores e com o concreto (real). Processa-se por conexão entre aquilo que é aprendido e outros conhecimentos existentes.

5. Forma diferente de interpretar e compreender a realidade. 'Aprender' é visto como envolvendo a mudança de entender ou compreender o mundo por (re)interpretação do conhecimento. Este processo toma lugar quando os sujeitos identificam e seleccionam os aspectos principais ou relevantes da informação e os relacionam a partir de diferentes contextos e situações. Em consequência do reconhecimento ou identificação de novas relações ou conexões não previstas, os sujeitos mudam qualitativamente o seu entendimento e modo de compreender o mundo.

6. Mudar como pessoa. 'Aprender' é visto como compreender e situar-se no mundo de forma diferente e como consequência de mudanças internas ao próprio sujeito. Este processo toma lugar através de profunda reflexão e envolvimento na aprendizagem.

Segundo Chalmers & Fuller (1996: 6), estas seis concepções formam uma sequência cumulativa e hierárquica, começando no nível inferior numerado de um e correspondente ao 'saber mais' e evolui até ao nível seis, ao qual, corresponde o 'mudar como pessoa'. As três primeiras concepções são usualmente descritas como quantitativas essencialmente relacionadas com o ´saber mais' e associadas com a aquisição isolada de factos, assuntos, competências ou procedimentos. Geralmente, estes níveis de aprendizagem correspondem a níveis baixos de processos cognitivos, como por exemplo, as rotinas e as repetições. Ao

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invés, as restantes três concepções são de carácter mais qualitativo. Relacionam-se com a compreensão e dizem respeito, fundamentalmente, ao sentido da informação e da sua conexão com o as informações anteriores. Modo geral, esta concepção de aprendizagem envolve processos metacognitivos ou cognitivos superiores, tais como a análise crítica, avaliação e envolvimento.

3. Modelos de análise dos processos de ensino e aprendizagem

Segundo MacFarlane (1995: 54), 'education is the design, creation and management of

environments which support the learning process, and teaching is the management of the learning process

within such an environment'.

Na interacção com o mundo encontramos e usamos a informação basicamente de dois modos distintos. Um modo, caracteriza o mundo como ele é percepcionado, fornecendo, por exemplo, a informação necessária para identificar e caracterizar objectos e para construir modelos acerca destes. A outra via, caracteriza o mundo como poderia ser, isto é, dá-nos a informação necessária para agirmos em determinado sentido ou para obter um efeito desejado. Dito de outro modo, enquanto um determinado uso da informação é associado à percepção específica, outro, é antes usado com a acção específica. Na realidade, quando interagirmos com o mundo nos seus vários níveis (micro, meso, exo e macro, no sentido do modelo ecológico de Bronfenbrenner, Portugal, 1992) precisamos ser capazes de o compreender e, simultaneamente agir sobre este. Mas, para o compreender carecemos de um conjunto de conceitos, assim como para agir sobre este necessitamos de ferramentas, mecanismos e esquemas de acção. MacFarlane (1995) sugere que a apreensão e a aprendizagem resulta do progressivo desenvolvimento e aperfeiçoamento de conceitos e esquemas e cuja influência se faz sentir na apreensão de crenças e modelos coerentes com as competências necessárias à sua utilização efectiva. Por conseguinte, apreender e aprender para empreender no mundo é, manifestamente uma capacidade, habilidade ou competência para:

• usar os conceitos assimilados e os esquemas criados no processo de aprendizagem para interpretar os dados, explorar e relacionar conjuntos de acontecimentos e resolver os problemas que são colocados;

• lidar (coping) com novas situações e ajustar às circunstâncias emergentes;

• agir sobre as situações com consequências satisfatórias. Neste sentido, o processo de aprendizagem envolve sequências de capacidades e competências que se podem agrupar segundo diferentes fases, tais como: preparar para enfrentar o material relevante; adquirir a informação necessária; lidar com as novas situações e conhecimentos; ou ainda, relacionar com os

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conhecimentos anteriores; agir e transformar as circunstâncias, através de modelos organizados e que permitam uma interpretação pessoal. Tavares & Alarcão (1989), por exemplo, definem 'aprendizagem' como sendo uma 'construção pessoal resultante de um processo experiencial, interior à pessoa e que se traduz por uma modificação de comportamento relativamente estável. Tomando esta definição, Almeida (1998) fixa quatro fases essenciais na aprendizagem, a saber:

• 'aprendizagem' é construção.

• 'aprendizagem' é um processo pessoal ou acto interno ao indivíduo que aprende, embora possa ser organizado e dirigido (mediado) externamente.

• 'aprendizagem' é um processo experiencial, interior à pessoa, visível quando as situações, os esforços e as novas aquisições se enquadram em necessidades sentidas pelo aluno, ou tudo isso é movido por uma motivação intrínseca para aprender.

• 'aprendizagem' é modificação de comportamento relativamente estável. Com efeito, este processo de 'modificação' e 'estabilidade', mais relativa que absoluta, aproxima a aprendizagem do desenvolvimento cognitivo ou estruturas de conhecimentos das estruturas e competências cognitivas (Almeida, 1996 citado por Almeida, 1998: 56).

Também em reforço desta ideia, Tavares (1998: 15) acrescenta (citando, respectivamente, Söljö,1982 e Marton, Dall'Alba, Beaty,1993) que aprender é 'acumular conhecimento, memorizar e reproduzir, aplicar, perceber, descortinar algo de um modo diferente; é transformar-se, construir a sua própria personalidade', mas, também é 'apreender, agarrar a realidade que nos escapa constantemente por entre os dedos das nossas próprias concepções, intuições, juízos e raciocínios que o discurso sobre ela tece para a fazer vir á presença na espontaneidade metafórica e metonímica da sua apresentação/ocultação.' Ou seja, ''conhecer, aprender, comunicar, avaliar são os verbos, os nomes, os adjectivos e os advérbios da linguagem dessa dinâmica que avança e se retoma em cada nova espiral em que acontece o devir humano' (Tavares, 1998: 24). Mas, se esta dinâmica exige um diálogo constante e continuado entre imaginação e experiência, então, 'ensinar' permite a experiência relevante e mediatiza o diálogo subsequente no qual a imaginação conduz a acção na exploração e interacção com a ambiente. Este suporte exigido pode ser descrito em termos de funções necessárias, as quais, paralelamente sobrepõem-se às fases da aprendizagem. Estas funções mediadoras das aprendizagens incluem, na perspectiva de MacFarlane (1995: 53), os seguintes processos:

• 'orientação'. Fixar o contexto e explanar o que é exigido.

• 'motivação'. Sublinhar a relevância, evocar e suster o interesse.

• 'apresentação'. Introduzir novos conhecimentos com clareza e estrutura de suporte.

• 'clarificação'. Explanar com exemplos claros e providenciar suportes de remediação.

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• 'construção' e 'ampliação'. Introduzir material adicional com vista ao desenvolvimento mais detalhado do conhecimento.

• 'consolidação'. Promover oportunidades para desenvolver e testar o entendimento pessoal.

• 'confirmação/avaliação'. Garantir a adequação do conhecimento e o entendimento esperado. A noção que os alunos são recipientes passivos na aprendizagem e que podem ser treinados segundo vários modelos foi sendo progressivamente substituída pela perspectiva de que estes são elementos activos, processadores de informação usando uma variedade de estratégias, flexíveis, para a selecção e utilização do conhecimento (estratégias pelas quais se ligam ou desligam nos diferentes contextos em que se inserem). Modo análogo, importa realçar que o comportamento de um indivíduo é, frequentemente, afectado pelas consequências dos seus desempenhos e que, neste sentido, o reforço (reinforcement) é uma técnica que, para muitos, poderá ser usada para permitir aos alunos saber o quanto são sucedidos (Hartley, 1997). Neste contexto, é possível considerar e aceitar a definição geral de aprendizagem avançada por Shuell (1986, citado por Schunck, 1996: 2) de que 'learning is an enduring

change in behavior, or in the capacity to behave in a given fashion, which results from practice or other forms

of experience '. Mas se é um facto que as diferentes perspectivas e teorias convergem na assunção de que a aprendizagem é afectada pelas diferenças individuais (representações, expectativas, atitudes, comportamentos, etc.) e os contextos (condições, mecanismos e processos) onde ocorrem os processos. Por outro, estas mesmas abordagens tendem a divergir na ênfase relativa que dão a cada um destes factores (Schunk, 1996: 13). Sintetizemos, então, alguns dos fundamentos em que assenta a aprendizagem derivados destas mais recentes perspectivas teóricas.

3.1. Princípios enfatizados pelo behaviourismo

O 'behaviourismo', como corrente psicológica de forte tendência experimentalista, defende que os fenómenos mentais e internos não podem ser submetidos directamente à prova científica sendo que, apenas, se observam comportamentos. Ou seja, os únicos elementos fiáveis que podem servir para descobrir princípios, regras e leis do comportamento humano. No que concerne ao processo de aprendizagem a ênfase é colocada sobre os eventos exteriores e nos processos de produção de respostas e hábitos. O professor, segundo esta perspectiva, analisa preferencialmente os desempenhos (resultados) prestando pouca importância aos mecanismos e processos utilizados pelos alunos, para alcançar determinado nível (performance). Sendo fiável apenas a observação dos comportamentos será, então preferível (segundo esta perspectiva) examinar o produto ou resultado em detrimento das estratégias que permitem alcançar esse

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resultado. Os comportamentos adquirem-se essencialmente por associação, isto é, o princípio base que explica todos os comportamentos humanos, sejam estes, as formas de linguagem, as atitudes, os comportamentos afectivos, sociais ou motores, etc.. Esta associação estímulo-resposta (imput/output) 'explica, segundo esta perspectiva, todas as acções dos seres vivos' (Tardif, 1997: 64). Por conseguinte, os 'behaviouristas' tendem a focar a sua análise no produto das actividades humanas, prestando toda a sua atenção para os efeitos das consequências quando se faz alguma coisa, numa subsequente repetição e aproximação sucessiva dos comportamentos (estímulo-resposta). Assim, a organização do ambiente dos contextos de aprendizagem revela-se particularmente importante, assim como, o papel interventor que exerce o professor na planificação e qualidade das actividades e tarefas que propõe aos seus alunos. Mais, no contexto desta associação E-R, os psicólogos 'behaviouristas' insistem bastante na importância do efeito do ciclo de retroacção (feedback). Sobre esta matéria, foram realizados numerosos estudos experimentais que claramente demonstraram as influências da retroacção nas actividades humanas (Shuell, 1986) e nos animais (e.g., as experiências de Pavlov). Similarmente, nesta perspectiva os comportamentos afectivos resultam exclusivamente de factores presentes no ambiente. Ou tal como afirma Tardif (1997: 65), 'trata-se de criar as condições favoráveis para que determinado comportamento surja ou se desenvolva'. Neste quadro, assume grande importância a ideia de que o reforço incrementa e, o não reforço declina. A motivação é entendida, deste ponto de vista, como um comportamento que os reforços externos podem controlar. O mesmo sucede acerca da autoestima e do autoconceito, bem como, relativamente ás atitudes tomadas perante as tarefas de estudo e o tipo de participação na realização das actividades propostas. Em síntese, de acordo com Hartley (1996), passamos a descrever de seguida os principais princípios da aprendizagem enfatizados pelo 'behaviourismo': 1. 'A actividade é importante'. A aprendizagem é melhor quando o aluno é activo do que quando passivo.

(no sentido de learning by doing) (referindo Hilgard & Bower,1975). Contudo isto não significa que se um aluno se mantém passivo ele não aprenda. Aliás, certamente mais fácil ele aprender mais (ou melhor) se for activamente envolvido na aprendizagem.

2. 'Repetição, generalização, descriminação são noções-chave'. Se a aprendizagem consiste na apropriação de um amplo leque de conhecimentos através de um reduzido (estreito) grau de estimulo, então as noções indicadas implicam frequente prática para que aprendizagem tome lugar. Por outro lado, como sabemos, as competências específicas (ou gerais) não se adquirem sem uma prática considerável (Ericsson & Charness, 1994).

3. 'O reforço é o motor cardinal'. Os efeitos das consequências nos comportamentos subsequentes são importantes, sejam extrínsicos (prémio do exterior, como por exemplo, através do professor) ou intrínsicos (auto- recompensa). Contudo, como Hilgard & Bower (1975, citados por Hartley, 1998) descrevem 'while

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there are some lingering questions over details, it is generally found that positive reinforcers (rewards,

successes) are to be preferred to negative events (punishments, failures)'. 4. 'A aprendizagem é ajustada quando os objectivos são claros'. Os professores que aplicam o modelo

'behaviourista' tendem a enfatizar a necessidade de objectivos de comportamento, Objectivos de comportamento fixam aquilo que é esperado do aluno ou que ele seja capaz de fazer para resolver um problema, executar uma tarefa no final da aula, curso, etc. Estas expectativas são, normalmente, expressas em termos de comportamentos que podem ser medidos (e.g., testes, exames) para alcançar esses mesmos objectivos. As tarefas são, frequentemente, categorizadas em cuidadosas etapas ou fases de execução (no sentido das regras da task-analysis, por exemplo).

3.2. Princípios enfatizados na psicologia cognitiva

Quando comparada com a psicologia 'behaviourista', a psicologia cognitiva distancia-se, mais não seja, pela ênfase dada à problemática dos eventos internos. Para os cognitivistas, a aprendizagem resulta fundamentalmente das inferências, das expectativas e das conecções pessoais. Exemplificando, em vez de adquirirem hábitos para produzir resultados, os alunos, adquirem planos e estratégias para o mesmo efeito. Assim, é essencial que se preste uma especial atenção aos processos, às estratégias e aos planos que o aluno utiliza na realização das suas actividades e tarefas e não tanto aos resultados. Mais, seguindo esta orientação, o professor deverá preocupar-se mais com os processos do que com os produtos. Isto significa que, em múltiplas ocasiões, deverá concentrar-.se primeiramente no uso das estratégias cognitivas e metacognitivas por parte dos alunos para, de seguida, se preocupar com os desempenhos e resultados. Na realidade, o professor cognitivista tende a conceber que o sistema cognitivo do aluno deverá não apenas conter dados factuais, mas igualmente um conjunto de estratégias cognitivas e metacognitivas. E neste contexto, parece-nos igualmente importante destacar o papel dos conhecimentos anteriores e presentes nos alunos, assim como os processos de construção desse conhecimento. A avaliação das aprendizagens, coerente com esta perspectiva, será tanto maior quanto for o seu carácter formativo e será orientada sobre os processos de construção gradual do conhecimento. Tardif (1997: 70) sublinha que a 'retroacção (feedback) que o professor proporciona, ao aluno, concerne de igual modo os conhecimentos e as estratégias que foram aplicadas para realizar determinada tarefa, a economia e a (in)eficácia destas estratégias, assim como o seu potencial de generalização'. Por outro lado, o professor que se inspira nos princípios da psicologia cognitiva estima que o seu papel não consiste apenas em organizar um contexto de aprendizagem que contenha tudo o que é necessário ao desenvolvimento do aluno. De igual modo, acredita que deve intervir directamente de forma a ajudar o aluno

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a seleccionar os elementos mais úteis e importantes quer do ponto de vista cognitivo quer metacognitivo. Mas, não sendo o aluno somente cognição, deverá então haver também uma preocupação com outras componentes, nomeadamente as de carácter mais afectivo ou relacional. O professor, de acordo com esta orientação, é levado a reconhecer que a autoestima, o autoconceito, a motivação escolar em geral e a autopercepção que o aluno tem das tarefas e do controlo possível sobre os seus êxitos e fracassos, são fortes constrangimentos à qualidade da sua participação na vida escolar e condicionantes dos respectivos desempenhos e performances. Com efeito, a psicologia cognitiva parece realçar a importância da consciência do aluno acerca da sua própria responsabilidade nos erros e fracassos escolares. Ressalva-se, no entanto, que o professor deve intervir directamente, embora a este nível, o faça de uma forma construtiva, sensata e segundo um caminho orientado para a autonomia progressiva. Isto é, no sentido de ajudar o aluno a tomar consciência dos seus actos ou a definir objectivos realistas ou a desenvolver o seu próprio mecanismo de auto-controlo e auto-regulação dos seus insucessos e sucessos (Tardif, 1997: 71). Em síntese, os princípios básicos defendidos por esta perspectiva são, segundo Hartley (1998), os seguintes: 1. 'A aprendizagem deve ser bem organizada e claramente estruturada'. O ponto forte de uma boa

aprendizagem é uma organização clara (embora a organização de uma pessoa pode ser diferente da organização de outra). A facilidade (dificuldade) da aprendizagem passa pela boa (má) organização dos materiais de estudo. O conhecimento das relações lógicas entre assuntos, ideias e conceitos, bem como do modo como se estruturam essas relações parece tornar a aprendizagem mais acessível.

2. 'A percepção e o conhecimento acerca das características dos contextos, das tarefas e das situações é importante'. Os alunos encaram selectivamente (segundo um juízo de valor) diferentes características do ambiente, das condições e das situações com as quais são confrontados. Assim, a forma ou o modo como cada problema é colocado ao aluno parece reunir grande importância, uma vez que pode contribuir no sentido de ajudar/ prejudicar o aluno na compreensão e aceitação dos factos.

3. 'O conhecimento anterior é importante'. Fazendo uso da tautologia que as pessoas só acrescentam algo de novo ao que já sabem, parece jogar um papel importante o trabalho do professor, mormente, pela sua capacidade em mostrar, aos alunos, como o novo material encaixa naquilo que foi dado anteriormente e ao indicar o que é novo ou diferente do que já conheciam antes. No contexto dos jovens estudantes universitários pode revelar-se pertinente a monitorização pelos pares, principalmente aqueles que se encontram a um nível de conhecimentos mais avançado ou que frequentam anos académicos sequentes (work-advancers) (Tardif,1997 referindo Griffin & Tulbert, 1995).

4. 'As diferenças entre indivíduos são importantes'. Na forma como afecta a aprendizagem e os estilos, tal como as diferenças evidenciadas nas capacidades intelectuais e personalidade. As diferenças de atitudes e

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de comportamentos perante o estudo manifestado através dos métodos de aproximação e hábitos de estudo igualmente parecem afectar substancialmente o processo de aprendizagem.

5. 'Os reforços (cognitive feedbacks) são fundamentais'. Dão a informação aos alunos acerca dos seus sucessos ou falhas no que concerne às tarefas que desempenham. Este feedback pode ser intrínsico ou extrínsico. Na perspectiva do estímulo-resposta (E-R), o termo 'reforço' é frequentemente usado no sentido de providenciar informação em vez de simples prémio ou recompensa. Conquanto na perspectiva cognitivista este termo aproxima-se mais da ideia presente na fixação de metas e objectivos, isto é conhecimento dos resultados e auto-consciência dos erros e fracassos.

6. 'Aprender compreendendo (significante) é melhor que aprender por rotina ou aprender sem perceber ou apenas para reproduzir'.

Em reforço destes princípios, registamos a opinião de Richardson et al. (1987: 3) de que a principal tarefa e função da psicologia cognitiva é a investigação científica das faculdades cognitivas (todas as formas de conhecimento, percepções, representações, imaginação, conceitos, avaliação, raciocínio, outras) baseada em procedimentos experimentais sistemáticos. Paralelamente, as investigações cognitivistas parecem enfatizar e desenvolver teorias acerca dos processos e mecanismos que são comuns a todos os indivíduos. Estas abordagens, assentes em algumas evidências empíricas e fornecendo interessantes explicações acerca das competências intelectuais humanas, parecem no entanto pouco interessadas no que respeita ao estudo das diferenças associadas à função e ao comportamento cognitivo individual. Neste contexto, são ainda muitos os investigadores cognitivistas que sistematicamente tendem a ignorar a possibilidade do desenvolvimento e da modificabilidade cognitiva e comportamental no decurso do tempo. Mas, á medida que esta perspectiva vem evoluindo a sua principal função tende a associar-se, quase exclusivamente ao estudo dos processos e mecanismos responsáveis pelos comportamentos inteligentes nos próprios indivíduos. Aliás, sublinhamos o interesse manifestado nas evidências da natureza comportamental, no suposto de serem testados os modelos e teorias cognitivistas acerca das funções cognitivas contra os desempenhos verificados. Contudo, normalmente é esperado que estas evidências possam ser traduzidas quantitativamente a fim de serem submetidas às técnicas de análise estatística. Destacamos ainda um outro aspecto que se liga ao facto dos investigadores cognitivistas estarem, mais das vezes interessados nas ligações dos comportamentos às cognições humanas, as quais, apenas podem ser conceptualizadas e quantificadas em termos de procedimentos experimentais específicos. Como resultado, é a dificuldade de relacionamento entre os vários modelos teóricos e a prática das situações correntes e quotidianas. Pensamos que alguns modelos mais experimentalistas parecem ter trazido péssimas consequências para o modo de pensar dos investigadores cognitivistas acerca da aprendizagem e das perspectivas de eficácia na sua promoção (e.g., num experimento psicológico, o investigador controla os

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CAPÍTULO 1 83

parâmetros da situação testada e, como tal, manipula os processos cognitivos envolvidos na experimentação, nomeadamente o efeito Pigmaleão). Por último, Richardson et al. (1987: 4) defendem que os poucos investigadores cognitivistas que escreveram acerca da relevância da investigação experimental ao nível de ensino superior, enfatizaram a manipulação e controlo do processo de aprendizagem por parte do professor e virtualmente ignoraram a possibilidade das diferenças individuais e das mudanças qualitativas acerca dos próprios indivíduos. Resumindo, o que Richardson e colegas defendem é a evidência de que a investigação educacional acerca da aprendizagem humana, aponta em sentido contrário a estas abordagens cognitivistas. Ou seja, a investigação educacional tende a preocupar-se, cada vez mais, com as diferenças que existem entre indivíduos em termos dos seus estilos pessoais e das estratégias adoptadas por cada um e, ainda nas implicações destas diferenças no sistema educacional. Do exposto, decorre que a investigação educacional fornece em contraste com a investigação cognitivista, os seguintes aspectos que salientamos.

Primeiro: O principal foco da investigação educacional (mormente ao nível de ensino superior) são as diferenças individuais. Diversas taxonomias de diferentes abordagens ao estudo e aprendizagem têm surgido um pouco por toda a parte. Infelizmente, uma observação mais cuidada destas taxonomias sugere fraca articulação com teorias gerais da aprendizagem humana. As taxonomias são descritivas em vez de explicativas no que diz respeito á natureza da aprendizagem propriamente dita e dizem muito pouco acerca daquilo que se passa quando os alunos aprendem (e.g., a ideia do indivíduo como uma 'black box', sujeito a imputs e outputs observáveis, mas possuidor de mecanismos e esquemas internos de processamento e transformação dos conhecimentos ainda desconhecidos).

Segundo: 'Aprender' é uma competência humana, e tal como todas as competências é manifestada directamente em termos de comportamentos observáveis. Um interesse acerca dos estilos e estratégias de aprendizagem, obrigatoriamente, dirige a atenção para o modo como o indivíduo percepciona e constrói as situações de aprendizagem. Com efeito, nos últimos tempos, a investigação educacional tem sido mais sensível aos aspectos experimentais da cognição e também mais aberta na utilização das evidências pessoais e subjectivas e suas possíveis influências na aprendizagem.

Terceiro: Seria razoável esperar que a vasta investigação no campo geral da educação trouxesse implicações directas e óbvias na investigação da educação no contexto de ensino superior. Mas, a tendência para os teóricos educacionais em generalizar as situações de aprendizagem aos contextos em que esta ocorre tem vindo a decrescer com o desenvolvimento de áreas específicas de teorização e intervenção nas aprendizagens no ensino superior. A este propósito, alguns autores referem explicitamente o facto que o estudo dos processos de ensino e aprendizagem no contexto de ensino superior carece dos seus próprios conceitos, métodos e procedimentos (Knowles, 1978; Marton & Svensson, Perry, 1981, referidos por Richardson et al., 1987, ou mais recentes, Ramsdem, 1992;

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Tinto, 1993; Gibbs, 1992, 1994, 1996; Marton et al, 1997; Biggs, 1996; Tavares, 1996; Queiró, 1995; Conceição et al., 1998; Leitão e Paixão, 1999, etc.).

3.3. Princípios enfatizados na psicologia social e fenomenológica

As influências da psicologia fenomenológica sobre o universo escolar e académico são menos perceptíveis e evidentes do que as influências das abordagens anteriores. No entanto, parecem bem circunscritas na história da psicologia e da pedagogia, designadamente como orientações humanistas. No âmbito dos processos de formação, ensino e aprendizagem podemos considerar a influência exercida pela concepção humanista presente na teoria Rogers (1976), bem como o referêncial fenomenográfico6 em Marton e colaboradores. De acordo com uma concepção rogeriana, a pessoa sabe aquilo que precisa para assegurar a sua construção pessoal e esta encontra os meios de actualizar este conhecimento dinâmico na medida em que o contexto lhe permite obter os meios de descobrir o que é realmente importante para ela. Significa que 'a pessoa sabe o que é essencial para a sua própria evolução e realização pessoal' (Tardif, 1997: 67). Nesta perspectiva, é dada particular importância aos sentimentos, emoções e à experiência. Por exemplo, o conhecimento adquire-se mais facilmente vivendo. Entretanto, a experiência pode ser definida através da relação de pertença, na pessoa, na medida em que 'experiência é aquilo que se tem, que se obteve,…' e não 'aquilo que não se tem,… '(ibid.). Em relação ao processo de ensino, parece contribuir para a ideia que o professor deve adoptar uma atitude não intervencionista, utilizando grande parte das suas energias a criar um contexto de aprendizagem rico e variado, susceptível de fornecer ao aluno as experiências, meios de operar as escolhas e opções necessárias ao seu crescimento pessoal. Em resposta, o aluno deverá, ele mesmo escolher as actividades e tarefas que gostaria de realizar ou executar. Neste sentido, o papel do professor será de o acompanhar nessa caminhada permitindo-lhe que efectue uma certa objectivação da sua evolução. Ainda segundo Tardif (1997), a correspondência entre as tarefas e actividades propostas ao aluno e os seus gostos, interesses, expectativas, motivações, ocupam um lugar preponderante na planificação e organização dos contextos de estudo e aprendizagem. Deste modo, a escolha das actividades não se estabelece de modo formal ou predeterminado. Ao invés, é gerada pelas motivações e interesses próprios do aluno regulado pelo conhecimento que tem de si mesmo e do controlo que faz das suas aprendizagens.

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CAPÍTULO 1 85

Neste sentido, a evolução do aluno como pessoa global com uma individualidade ou identidade própria importa não apenas respeitar, mas, sobretudo estimular. Deverá igualmente fazer parte das preocupações pedagógicas de qualquer professor. Alinhamos, de seguida, as principais ideias chaves preconizadas para a aprendizagem tomadas a partir do ponto de vista fenomenológico, a saber: 1. 'O contexto e as situações sociais afectam a aprendizagem'. Aprender, raramente, é um acto solitário. A

atmosfera e ambiente do grupo de aprendizagem afectarão o sucesso e a vontade em aprender (exemplo, as dualidades competição vs cooperação, autoritarismo vs democracia, satisfação vs insatisfação, etc.).

2. 'Os objectivos e metas de aprendizagem são importantes'. Os alunos tem necessidades, metas e propósitos, os quais providenciam importantes motivações para a aprendizagem e para o conjunto de futuros objectivos. Muitas decisões acerca do que aprender resulta de um longo percurso que foi pensado há muito tempo atrás (a importância destas expectativas e objectivos é igualmente relevante no caso das teorias cognitivas).

3. 'Curso, relevância e responsabilidade são factores importantes na aprendizagem'. Aprender é melhor e mais fácil quando o material de aprendizagem é pessoalmente interessante e relevante ou quando os alunos sentem que o que estudam tem significado. Ou seja, quando os alunos sabem o que estão a aprender e se auto-responsabilizam pelos seus progressos. A aprendizagem significativa, argumenta-se, toma lugar quando os alunos escolhem aquilo que querem aprender, como querem aprender e quando querem aprender (Tardif,1997, referindo Holt, 1982).

4. 'Aprende-se melhor com a realidade'. Aprender torna-se mais fácil a partir do concreto da vida real do que em abstracto. As situações descontextualizadas (como por exemplo, aulas expositivas, demasiado teóricas) conduzem à passividade e ao alheamento. Similarmente, parece ser mais fácil avaliar quando orientada num contexto concreto da vida (real, profissional, académica, etc.) do que descontextualizado;

5. 'Significação (meaning) é uma coisa pessoal'. Muitas pessoas consideram o conhecimento como algo externo, objectivo e estático. Outros, tomam-no como qualquer coisa interna, subjectiva e fluída;

6. 'Reflectir e discutir acerca da aprendizagem é importante'. A discussão entre alunos e entre professores pode enfatizar reflexões e explanações com significado conduzindo a actividades e situações de compreensão e aceitação, as quais, se opõem às situações de aprendizagem rotineira. A construção do conhecimento deve ser partilhada em vez de apresentada como um processo individual. Ou seja, o conhecimento 'constrói-se socialmente' (Duffy & Jonasssen, 1992). Em aditamento, pensamos que os

6 Marton (1981: 180) designou de 'fenomenografia' a investigação assente na construção que o indivíduo faz relativamente ao mundo que o rodeia e na forma como este age em acordo com a sua concepção acerca deste. Ou seja, a investigação que procura explorar a forma como as pessoas experienciam e interpretam os vários aspectos da realidade ao seu redor. Em Machado (1991, vol.III), a fenomenografia é a descrição dos fenónemos, isto é,' tudo aquilo que aparece por oposição ao que é, ou coisa em si que os nossos sentidos apreendem ou de que nós temos consciência'.

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estudantes interpretam e elaboram uma informação mais recorrente (incoming) quando discutem com os outros (entre pares) e confrontam as suas ideias e reflexões com os professores;

7. 'A auto-regulação (monitoring) da própria aprendizagem é uma competência fundamental'. Á medida que os alunos progridem academicamente vão assumindo mais responsabilidade relativamente à gestão e controle das suas próprias aprendizagens. Com o decorrer do tempo, os indivíduos, tendem a criteriosamente seleccionar as estratégias mais apropriadas, os comportamentos e procedimentos mais adequados e a fixação das metas mais exiquíveis para as suas aprendizagens (Schunk & Zimmermam, 1994, 1998);

8. 'A concepção dos alunos sobre as suas próprias características e aprendizagens mudam'. Aprender envolve mudanças perceptuais e conceptuais nos alunos, não apenas na aquisição de novo conhecimento mas igualmente na avaliação e selecção de estratégias adequadas à situação escolar e académica. À medida que os alunos se desenvolvem, estes movem-se de um conceito objectivo daquilo que aprendem acerca dos factos para um ponto de vista mais crítico e construtivista (e.g., a ideia que 'tudo é relativo');

9. 'Ansiedade, stress, sentimentos e emoções afectam a aprendizagem'. Aprender não é apenas um processo cognitivo. Envolve igualmente emoções e sensações (Pinheiro, 1994; Pereira, 1997, 1998).

3.4. Modelos heurísticos

Objectivados para uma melhor compreensão dos fenómenos associados aos processos de ensino e aprendizagem, no contexto académico universitário, tentamos fixar algumas das suas principais componentes. Por outro lado, de acordo com uma abordagem sistémica, qualquer modelo descritivo destes processos deve apresentar uma tentativa de equilíbrio entre as suas diferentes componentes e sub-processos. Neste sentido, inspiramo-nos no modelo heurístico (Figura 1-IX) proposto por Entwistle (1987: 23), o qual identifica os principais factores intervenientes na aprendizagem dos estudantes, no contexto do ensino superior. Este modelo teórico de natureza vincadamente sistémica, traduzido e adaptado de Entwistle (1987), embora não precisando todas as relações existentes entre componentes que se articulam (para não falar das complexas interacções que possam ser antecipadas), fornece contudo um sumário dos resultados das investigações e um ponto de partida para os estudos orientados na análise dos efeitos convergentes de várias variáveis e diferenças individuais (conjuntos de características pessoais e afectivo-relacionais) que de algum modo estão relacionadas com os processos de formação e contexto académico.

Surge deste modo como uma proposta integradora das diferentes contribuições enfatizadas anteriormente, na medida em que incorpora princípios behavioristas ao encarar a forma como os alunos se comportam e decidem enfrentar o processo de aprendizagem, compreende aspectos das perspectivas

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CAPÍTULO 1 87

cognitivas na medida em que relaciona as estratégias de aprendizagem dos alunos com os seus estilos pessoais e capacidades intelectuais e assenta em princípios enfatizados na psicologia social e fenomenológica ao fixar a importância das relações interpessoais entre professor e estudante e ainda, na forma como este enfrenta as aprendizagens baseado nos requisitos e exigências das tarefas académicas.

Figura 1-IX: modelo (heurístico) de análise dos processos de ensino e aprendizagem no ensino superior

Sumariando algumas das características deste modelo, referimos a sua principal vantagem que se

prende com a sugestão de analisar os processos de ensino e aprendizagem em contexto do ensino superior e segundo três vectores distintos que se cruzam e interagem entre si. Observamos também que o papel central é ocupado pelas estratégias de estudo e aprendizagem e processos, os quais interagem directamente com os resultados de aprendizagem e consequentes desempenhos escolares e académicos. Destacamos, no vector correspondente ao estudante, o facto que as abordagens do estudo e os estilos de aprendizagem são conceitos, intrinsicamente, relacionados com estas estratégias, processos e resultados. As competências e aptidões para a aprendizagem podem ser considerados uma expressão, no contexto académico, das mais fundamentais e relativamente estáveis componentes dos estilos cognitivos e personalidade. As abordagens do estudo chamam a atenção para a importância crucial da intencionalidade e relevância da aprendizagem académica e, igualmente, na influência dos motivos pessoais para estudar não apenas em termos de quantidade de esforço mas também na direcção e qualidade desse esforço (Taylor, 1983, referido por

ESTRATÉGIAS E PROCESSOS DE

ESTUDO E APRENDIZAGEM

RESULTADOS DA APREENDIZAGEM

PERCEPÇÕES DOS REQUISITOS E EXIGÊNCIA

DAS TAREFAS

PERCEPÇÕES DO SENTIDO E RELEVÂNCIA

ABORDAGENS DO ESTUDO E APRENDIZAGEMS

Procedimentos de Avaliação

ESTILO DO PROFESSOR

APTIDÃO PARA A APRENDIZAGEM

Personalidade

Estilo cognitivo

Competências intelectuais

Conhecimentos e conceitos

Motivação

Hábitos de trabalho e métodos de estudo

Suporte e apoios no estudo

Liberdade de aprendizagem

TAREFAS E ACTIVIDADES

Feedback

Empatia

Entusiasmo

Explicação

Estrutura

Abordagem

Nível

MÉTODOS

AJUDAS MATERIAIS DE ESTUDO

Profissionalização ou conhecimentos

académicos de base

CARACTERÍSTICAS ACADÉMICAS CARACTERÍSTICAS DO PROFESSOR

CARACTERÍSTICAS DO ESTUDANTE

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Entwistle, 1987: 24). Mais, os conhecimentos anteriores e a sua conceptualização têm uma importância fundamental nas abordagens e nos desempenhos, assim como no equilíbrio e nível das competências intelectuais (cognições). O estilo do professor é escolhido como sendo a variável que mais influencía o estilo de aprendizagem. Esta implicação traduz-se por diferentes métodos de ensino e diferentes ajudas podem ser utilizadas amplamente de formas diferentes, reflectindo preferências, concepções e abordagens do professor individualmente. Não obstante, o termo 'estilo do professor' deverá ser lido, antes, como competências- aptidões acerca dos quais os estudantes percepcionam como sendo 'bom' ensino.

Ainda, segundo Entwistle (1987) as posições das componentes do modelo foram escolhidas de modo a indicarem o carácter fechado das relações entre conceitos entre (e intra) os três domínios (estudante, professor, contexto) ou características considerados. Mas, acrescenta que algumas das conexões que é possível observar no modelo carecem de evidência e suporte empírico (por exemplo, a relação entre a personalidade do aluno e o entusiasmo e empatia do professor) e que a investigação apenas só agora começa a explorar as reacções pessoais dos alunos aos estilos e respectivos modelos ideológicos que sustentam o ensino que estes experienciam nos diferentes contextos académicos. Com efeito, pensamos que uma perspectiva desejável deverá estar associada a uma maior partilha das responsabilidades ou a uma superior incidência das concepções qualitativas dos processos de formação, ensino e aprendizagem. Isto é, que sejam perspectivados os papéis de cada um (professor ou aluno) de modo cooperativo, em parceria, e em suporte dos respectivos processos. A principal ideia é que os processos de ensino e aprendizagem sejam activos e construtivos (Paris & Byrne, 1989, referidos por Schatteman et al, 1997: 113). Mas, a verdadeira compreensão e sentido das aprendizagens é mais complexo que a mera aquisição de conhecimentos, a qual ocorre num processo de integração activa, onde todos os conhecimentos anteriores, competências e experiências são importantes para o aluno construir novas representações internas. Ou seja, os estudantes obtêm, (re) organizam e generalizam as informações em processos e mecanismos de representação mental elaborados e modificados no sentido do seu progressivo refinamento com o tempo, contrariando assim, um modelo estático de integração. Na sequência dos contributos prestados pelas diferentes teorias e perspectivas na análise dos processos de formação e dos vários aspectos gerais relacionados, fomos procurar modelos que concernem à explicação e reflexão relativamente às principais diferenças manifestadas nos processos de ensino e aprendizagem. Neste contexto, salientamos as variáveis previsoras no modelo (Figura 1-X) dos 3P (Presságio/ Processo/ Produto de Dunkin & Bidle, 1974 adaptado por Biggs, 1989,1993) e do seu posicionamento quanto à complexidade dos processos de transformação da informação individuais.

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CAPÍTULO 1 89

Figura 1-X: modelo dos 3P: Presságio/Processo/Produto no estudo e aprendizagem (Biggs,1993)

Neste modelo adaptado por Biggs para representar a perspectiva do aluno no processo de ensino e aprendizagem, o factor 'Presságio' envolve duas categorias essenciais de variáveis que interagem, como por exemplo, as concepções de ensino e as percepções dos professores acerca das competências ou motivações dos alunos para aprender influencia as suas decisões de ensino, enquanto as concepções de aprendizagem e as percepções, nos alunos, acerca do contexto de ensino afectam os seus motivos e predisposições, bem como as suas decisões imediatas (estratégias) para acção (Biggs, 1993: 9). Passando a descrever estas variáveis, encontramos neste modelo:

a) características individuais dos estudantes e contexto onde funcionam as situações. Entre as variáveis pessoais, as quais são relativamente estáveis e relacionadas com aprendizagem, Biggs & Telfer (1987) incluem competências gerais e capacidades de processamento das informações, características da personalidade, diferenças fundamentais (idade e género) e experiências de aprendizagem anteriores. Estes autores, enfatizam particularmente os factores que influenciam aspectos da metacognição, entendida por estes como o grau em que os alunos reconhecem e podem controlar os seus próprios processos de aprendizagem. Deste modo, sublinha-se também a importância de aspectos motivacionais, tais como a auto-confiança e as dimensões de causalidade;

b) elementos situacionais ou contextuais que incluem as concepções, métodos, mecanismos e procedimentos de ensino, os programas de curso, as dificuldades e exigências das tarefas, os métodos de avaliação, os níveis de satisfação nos alunos acerca de todo o contexto académico e institucional, dos campos académicos e ainda as oportunidades dadas a cada aluno para estudar e aprender por si próprio (Biggs & Telfer, 1987).

meta-ensino

meta-aprendizagem

CARACTERÍSTICAS DO ESTUDANTE

� conhecimentos anteriores � capacidades � motivações/orientações � concepções da aprendizagem � cognições/ metacognições

CONTEXTO DE ENSINO

� Curriculos/ plano de estudos � Métodos de ensino � Concepções de ensino � Clima/Campus académico

ABORDAGEM DAS TAREFAS/ MÉTODO DE ESTUDO

� Abordagem/orientação específica � processamento da informação � análise da tarefa/ ESTRATÉGIAS

RESULTADOS DA APRENDIZAGEM

� quantitativos � qualitativos � académicos/institucionais � pessoais/afectivos

PRESSÁGIO PROCESSO PRODUTO

Concepções/representações do estudante do professor

feedback

feedback

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Já o factor designado de 'Processo', relaciona-se com os processos propriamente ditos (e.g., como fazer para executar uma tarefa) paralelamente com a actuação cognitiva de empreendimento ou processamento dos conteúdos, das diferentes competências e estratégias de estudo, incluíndo as formas de abordar o estudo e as aprendizagens. A este propósito, são consideradas duas formas que assentam nos níveis de abordagem avançados nos estudos de Marton & Saljö (1976) de 'deep' e 'surface

approach'. A estas duas formas de abordagem, Biggs (1987) acrescenta uma terceiro nível, o qual, designa de 'achieving approach', essencialmente, baseado na 'achieving motivation' e que envolve as estratégias e competências contextualmente dependentes, segundo as quais os alunos acreditam alcançar altos resultados nos seus desempenhos. Segundo Biggs, as abordagens 'surface' e 'deep' tendem a ser mutuamente exclusivas, enquanto a abordagem 'achieving' liga-se frequentemente a cada uma das restantes formas de abordagem.

Por último, o factor 'Produto' relaciona-se com os desempenhos e resultados obtidos. O sucesso é tradicionalmente avaliado em termos de graduação escolar ou académica no sistema de ensino correspondente. Contudo, este facto não reflecte necessariamente a qualidade da aprendizagem ou mesmo a quantidade de conhecimentos adquiridos. A este propósito Biggs & Telfer (1987) argumentam que é preferível avaliar os conceitos envolvidos em termos de complexidade estrutural dos resultados das aprendizagens, sugerindo por exemplo a utilização da taxonomia SOLO7 (Biggs & Collis, 1982; Biggs & Telfer, 1987; Biggs & Moore, 1993). Mas, seria impossível examinar todas as intervenientes nos processos de aquisição, transformação e generalização da informação dos estudantes. Assim, inserida na linha das nossas preocupações e no que concerne á compreensão das principais factores intervenientes, seleccionamos para clarificação e exploração, no presente estudo, as variáveis (cognitivas, metacognitivas e motivacionais) que julgamos serem mais preditoras ou influenciadoras do desenvolvimento das atitudes e/ou comportamentos nos jovens estudantes universitários. Esta procura será o objecto dos próximos capítulos de revisão da literatura.

7 'SOLO (Structure of the Observed Learning Outcome) apresenta uma taxonomia dos produtos escolares, baseda em cinco níveis crescentes de resposta à complexidade estrutural:

1. 'Pré-estrutural'. Centrado em aspectos irrelevantes. Caracteriza-se por respostas evasivas, lógicas ou imediatas. 2. 'Uni-estrutural'. Contém respostas com dados informativos retirados directamente do enunciado 3. 'Multi- estrutural'. Contém respostas, com vários dados informativos retirados do enunciado mas analisados em separado. 4. 'Relacional'. Contém respostas com dados que integram a informação e os seu relacionamento. 5. 'Abstracção'. Contém respostas com dados inferidos a partir de uma análise substantiva do enunciado com base num princípio

geral ou abstracto.

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CAPÍTULO 2

Competências cognitivo-motivacionais em estudantes universitários

Ao longo deste segundo capítulo, iremos explorar um conjunto de variáveis (cognitivas, metacognitivas e motivacionais) que caracterizam os individuos. Começamos por rever literatura recente em torno da noção de inteligência e da forma como as suas múltiplas definições nos conduzem à compreensão dos conceitos de competência intelectual e do pensar inteligente. Atribuímos um lugar preponderante á capacidade dos indivíduos em avaliarem as suas próprias actividades e cognições, isto é, de tomarem consciência do controlo e correcção das suas próprias produções, concebendo a metacognição na passagem progressiva dos mecanismos heteroreguladores (onde a activação depende do papel jogado pelos outros) para os mecanismos autoreguladores (onde a activação depende do próprio indivíduo). No seguimento, revemos o enfoque atribuído ao papel das variáveis motivacionais e situacionais, nos processos de estudo e aprendizagem, tal como, deriva das últimas investigações, nomeadamente as perspectivas cognitivistas que (re)emergiram e (re)colocaram o papel dos comportamentos humanos como abordagem dominante da psicologia educacional na análise dos processos de formação, ensino e aprendizagem. Depois, no capítulo seguinte, observamos a importância que ocupam as estratégias de estudo e aprendizagem no processo de auto-regulação académica. Aliás, são estas estratégias que determinam em última instância a realização dos objectivos e consecução com êxito dos desempenhos escolares e académicos nos jovens estudantes universitários.

1. Cognições

A literatura refere algumas grandes correntes ou modelos de abordagem que abarcam múltiplas definições de inteligência. No campo das diferentes psicologias, o estudo da inteligência tem ocupado lugar de relevo no processo de aprendizagem suscitando, por vezes, controvérsia. É o caso da discussão do carácter mais ou menos inato e estável ou mais ou menos adquirido e modificável da inteligência. Não obstante, as diferenças substanciais existentes nas várias abordagens teóricas retratadas em qualquer estudo acerca da inteligência e sua relação nas aprendizagens, os diferentes contributos quando tomados em conjunto permitem uma melhor clarificação dos conceitos.

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Quanto à inteligência per si e em vez de tentar estabelecer uma sua definição, optamos antes por observar este conceito segundo um eixo de análise, no qual em um dos extremos se fixam as descrições da inteligência como um traço mental (inata) até ao outro extremo, em que a inteligência é descrita em termos dos procedimentos e comportamentos inteligentes (educáveis). Isto é, começamos por assumir que a inteligência é algo que existe individualmente e se constrói progressivamente através de treino ou na promoção da sua modificação, ou seja, que é educável. Neste sentido, os processos inteligentes usados no pensar e na utilização das estratégias mais adequadas à solução das tarefas e problemas são um sintoma dessa construção progressiva. Em Almeida (1988) e Morais (1996) são referidas diferentes abordagens, cujos posicionamentos conceptuais relativos à inteligência, se podem resumir de seguida.

1.1. Abordagens teóricas acerca da inteligência na aprendizagem

1.1.1. Abordagem psicométrica, diferencial ou traço-factor

Consoante a ênfase incida sobre os instrumentos e os problemas de avaliação da inteligência, sobre a verificação das diferenças individuais ou sobre a metodologia seguida na análise de factores, traços ou aptidões mentais e cujo objecto de análise e pontos de controvérsia aparecem muito directamente relacionadas com a definição de inteligência. Os trabalhos de Galton, Catell e Binet são frequentemente referidos como os primórdios do estudo das diferenças humanas na inteligência e sua medição, que atingiria o principal impacto com os trabalhos dos autores factorialistas como Spearman, Thrustone, Vernon, Guilford, Tyler e muitos outros (Almeida, 1988: 28). Numa primeira observação, sobressai o facto da corrente psicométrica ser usualmente descrita como estando centrada, quase exclusivamente, na verificação do fenómeno que constitui o nível intelectual e consequente diferenciação intelectual dos sujeitos entre si. Contudo, a partir da aplicação e aperfeiçoamento do instrumento 'Escala de inteligência Binet-Simon', foi possível encontrar algumas diferenças, mormente o grau de importância atribuído aos resultados obtidos nestes testes. Ou seja, enquanto o modelo puramente psicométrico atribui toda a importância à mensurabilidade dos comportamentos e nível intelectual, Binet, questiona o significado dos resultados, caso a sua verificação não seja acompanhada da compreensão das causas que os determinam Esta abordagem fundamentada na análise de factores compreende a inteligência em termos de um conjunto de características ou atributos pessoais subjacentes e fixos. Por exemplo, Spearman (1927, referido por Almeida, 1988: 28) foi um dos primeiros a propor uma teoria factorial ao basear toda a actividade mental através da expressão de um factor geral (factor g), o qual está presente em todas as tarefas intelectuais e

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CAPÍTULO 2 93

(embora matematicamente menos valorizado) um factor específico (factor s) envolvido em determinada tarefa. Psicologicamente, esta perspectiva factorial pode ser definida através das componentes 'apreensão', 'inferência' e 'aplicação', exemplificáveis na resolução de qualquer analogia e tomadas, por Spearman, como leis 'neogenéticas'. Também o modelo genealógico (hierárquico) de Vernon (1962, referido por Almeida, 1988: 31) aponta que o factor g (de Spearman) pode ser decomposto em dois outros factores, os quais, por sua vez são novamente decomponíveis em função das situações ou tarefas. Isto é, um factor k/m ('espacial'/ 'mecânico') essencialmente prático e um o factor v/ed ('verbal'/ 'educativo') mais teórico e ligado às aptidões verbais e comunicacionais. Por sua vez, Cattell (1971, referido por Almeida, 1994: 25) na mesma linha de Vernon, sugere que a inteligência se subdivide numa inteligência 'fluída': gf (por exemplo, a capacidade mental básica) e uma inteligência 'cristalizada': gc (aprendizagem e conhecimentos adquiridos). Já Guilford (1967), para quem a inteligência surge como uma colectânea sistemática de aptidões ligadas às diferenças individuais, sugere um modelo (taxonómico) tridimensional da estrutura da inteligência que compreende 150 factores distintos. Segundo Almeida (1994: 32), esta teoria da inteligência de Guilford postula um amplo leque de aptidões diferenciadas, definidas em função de três vertentes. Estas três dimensões ou categorias gerais são designadas de:

• 'operação cognitiva'. Tipo de processos implicados no tratamento da informação. Exemplo: a cognição (tomada de consciência, discriminação, descoberta, compreensão); memória (retenção, fixação); produção divergente (formulação de alternativas); produção convergente (formulação de conclusões lógicas) e a avaliação (ponderação ou comparação com base em critérios de desejabilidade).

• 'conteúdos'. Tipo de material em que incide a operação. Exemplo: visual e auditivo (imagens ou figuras); simbólico (elementos integrados em códigos significativos); semântico (ideias, significações) e comportamental (conhecimento sobre o seu comportamento e o dos outros em interacção social).

• 'produto final'. Tipo de resposta que o indivíduo deve dar. Exemplo: unidades (elementos ou coisas simples); classes (conjunto de unidades, agrupamentos); relações (ligações entre as unidades, sequências da informação); transformações (redefinições, modificações) e implicações (inferência, conexões entre fontes de informação).

Embora se possa defender que a realização intelectual do indivíduo está relacionada com as suas características próprias, o facto de não equacionar a possibilidade de mudança das competências intelectuais limitou a capacidade de intervenção da psicometria na área do treino e modificação cognitiva. Com efeito, 'o artificialismo inerente aos testes, a unidimensionalidade de formato e conteúdo, a incidência em processos exclusivamente lógicos, afastam as situações de teste das tarefas quotidianas e não integram alguns dos processos de resolução implementados pelos sujeitos ou elementos associados às suas próprias concepções de inteligência' (Almeida, 1996: 72). No mesmo sentido, Roazzi et al. (1981, citado por Almeida,

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1988: 75) afirma que os estudos experimentais no campo da cognição explorando a realização das tarefas cognitivas conduziram progressivamente:

• ao abandono progressivo do conceito de inteligência como uma aptidão mental interna genérica;

• à refutação de que e a inteligência se definia melhor pelos resultados finais nos testes que através dos processos mentais usados na sua resolução; e,

• à recusa dos testes como forma exclusiva de avaliação da inteligência e capacidades cognitivas individuais nas suas múltiplas formas e quantidade.

1.1.2. Abordagem desenvolvimental

Mais do que conceber a inteligência como um conjunto de traços ou factores estáveis (corrente psicométrica), a perspectiva desenvolvimental (ou desenvolvimentista) concerne antes às estruturas e esquemas de funcionamento interno do indivíduo. Segundo Almeida (1998, 1994: 28), estas estruturas desenvolvem-se como construções ou níveis de processamento da informação com complexidade crescente e que acompanham a evolução do indivíduo. Também este autor refere Piaget como um dos maiores expoentes desta abordagem e salienta que este se preocupa menos com a medida e mais com o desenvolvimento cognitivo descrito como um fenómeno que ocorre em quatro estádios universais, sequenciais e invariáveis ('sensório-motor', 'pré-operatório', 'operatório concreto' e 'operatório formal') qualitativamente diferentes entre si, diferenciados através de uma evolução desde os níveis sensoriais ou perceptivos, até níveis de raciocínio mais abstracto. Estes estádios ou momentos do desenvolvimento, em Piaget, podem ser descritos como os correspondentes à aquisição e complexificação sucessiva das estruturas mentais no indivíduo que estão associadas ao processo de adaptação do indivíduo num jogo de equilibrio entre mecanismos de assimilação e acomodação à realidade. Ou seja, Piaget concebe o desenvolvimento cognitivo segundo quatro factores que interagem e produzem o desenvolvimento como resultado de um processo de construção progressiva:

1. a maturação do sistema nervoso central e periférico, 2. a experiência-acção sobre os objectos através de processos de interiorização e diferenciação

progressivas; 3. a influência do meio ambiente social; e, 4. o factor de equilibração (factor geral auto-regulador) através do qual novas experiências se combinam

com estruturas existentes (Piaget & Inhelder, 1979, referido por Almeida, 1994: 36). Mais recentemente, outros autores têm avançado com a hipótese de um quinto estádio, caracterizado sobretudo pelo sentido crítico, capacidade criativa e de formulação de problemas, representação sistémica dos fenómenos e da sua evolução. Paralelamente, enraízado no factor de

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equilibração, encontramos os conceitos de 'conflito cognitivo' e de 'conflito sócio-cognitivo', como mecanismos importantes no processo desenvolvimental e que estão na base da recente psicologia social genética, fundamentados em trabalhos como os de Doise, Mugny e Perret-Clermont, 1974; Mugny, Giroud & Doise, 1983; Mugny,1985; Mugny & Carugati,1985; etc. (referidos por Morais, 1996). Na realidade, segundo Morais (1996: 17), sobretudo a partir dos anos 70 enfatizaram-se as explicações do desenvolvimento cognitivo com base em variáveis sociais. Neste sentido e no que diz respeito ao conceito de 'conflito cognitivo', este, surge claramente definido como o desequilíbrio de uma dada estrutura, provocado pelo confronto com possibilidades de resposta diferentes, levando à sua reestruturação e acontecendo assim uma equilibração majorante. Para esta investigadora, o conceito referido seria coerente com a perspectiva piagetiana de que a aprendizagem de novas estruturas preconizada na aceleração do desenvolvimento cognitivo era feita através de desequilíbrios internos, como tal de natureza intra-individual. Isto quer significar que o desenvolvimento cognitivo não se libertara ainda do sujeito epistémico, ideal e individualizado. Quanto ao segundo destes conceitos, o de 'conflito sócio-cognitivo', afirma também que é um 'conceito central da explicação da interferência social no desenvolvimento cognitivo do indivíduo'. Deste modo, acerca deste conflito 'sócio-cognitivo' e face a Piaget, passaríamos de uma psicologia bipolar (sujeito-objecto) para uma psicologia tripolar (sujeito-outro-objecto). Ou seja, passaríamos a entender de que modo as interacções com os outros levam à estruturação das experiências individuais. Ou, tomando as palavras de Mugny & Curugati (1985, citado por Morais,1996: 20), o 'sujeito epistémico idealizado foi substituído por um sujeito socialmente inserido e que 'elabora os instrumentos cognitivos nas e por relações sociais múltiplas'. Entretanto, importa igualmente mencionar os trabalhos relacionados com as explicações das diferenças individuais no desenvolvimento cognitivo, avançadas por Reuchlin (1964 a 1989) e Longeot (1969 e 1978) e referidos também por Morais (1996), os quais, foram tomados a partir das leis gerais do desenvolvimento propostas por Piaget. Na realidade, estes trabalhos levantam alguns aspectos particularmente importantes numa possível teoria de diferenciação cognitiva, nomeadamente através da introdução do conceito de 'factor de grupo' e 'processo vicariante' 1, traduzindo diferentes condutas adaptativas em cada estádio do desenvolvimento cognitivo.

1.1.3. Abordagem cognitivista ou processamento da informação

'Cognitive psychology is the scientific study of mental processes' (Ellis & Hunt,1972: 13). A psicologia cognitiva desenvolve-se através da combinação entre teoria e experimentação, pela utilização da observação dos desempenhos para inferir processos psicológicos que estão subjacentes a esses mesmos desempenhos.

1 Reuchlin refere-se a processos vicariantes como processos diferenciados de tratamento da informação e subjacentes à mesma realização de uma tarefa piagetiana e que são diferentes entre sujeitos. (Morais,1996: 21)

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Ou seja, de acordo com Almeida (1994: 30) 'a abordagem cognitivista introduz na análise da inteligência o seu próprio processamento ou o estudo do seu próprio exercício', salientando deste modo, o próprio acto cognitivo. . O modelo cognitivo da mente humana, retomando uma metodologia experimental no estudo da inteligência (Almeida, 1988: 43), baseia-se na ideia do processamento de informação que surge na década de 60, nos EUA. Assume-se que todo o ser humano dispõe de um sistema básico de processamento de informação e que, em princípio, todos os processos mentais podem ser explicados em termos da operação deste sistema. Esta abordagem emerge na preocupação com a compreensão do funcionamento cognitivo e cuja ênfase recai sobre a análise das operações e processamento necessário à execução de uma variedade de tarefas cognitivas. Diremos que o 'enfoque não está nos factores internos subjacentes (aptidões ou traços, estruturas ou esquemas), mas, no próprio acto de resolução de tarefas e problemas' (Almeida, 1994: 31). Procura-se assim, compreender (laboratorialmente) o funcionamento intelectual pela via de análise experimental dos processos cognitivos e dos mecanismos utilizados na realização das tarefas correspondentes. É uma alternativa às metodologias mais quantitativas da abordagem psicométrica ou insuficiência qualitativa dos autores desenvolvimentistas. Para Morais (1996: 23), nesta perspectiva, não estará em causa a inteligência estável ou o desenvolvimento cognitivo, mas, sim a cognição. E esta, referir-se-á a processos de recolha, armazenamento, tratamento e uso da informação que vem do exterior. Com efeito, são segundo Almeida (1988 e 1994), hoje, os modelos de processamento da informação assentes no

faseamento [ Input da informação (apreensão, codificação, comparação e organização) → Processamento

(retenção, armazenamento, evocação, categorização e relacionamento) → (avaliação, decisão e resposta)� Output ], os processos mais utilizados na descrição da inteligência na aprendizagem. Na perspectiva cognitivista procura-se descrever, quase de forma exaustiva e rigorosa (recorrendo a modelos matemáticos), os passos dados pelo sujeito na execução das tarefas cognitivas e por forma a que esta realização possa ser, por exemplo, simulada em computador (Sternberg, 1995: 385). Neste enquadramento, o estudante é considerado um sistema aberto ao meio exterior que lhe fornece as informações, as quais introduz na sua estrutura cognitiva interna através de operações e mecanismos apropriados, para a seguir armazenar com carácter mais ou menos efémero ou permanente (Brien, 1993). Para o efeito, Good & Brophy (1990) sugerem que este processamento da informação se faz em série (sequencial ou consecutivo) e que, de um modo geral, implica três fases distintas:

Fase 1) 'Entrada da informação'. Identificação das tarefas intelectuais (cognitivas ou que se relacionem com a cognição).

Fase 2) 'Tratamento da informação'. Análise rigorosa das componentes cognitivas intervenientes na realização das tarefas anteriores. ou, segundo outros investigadores, algumas destas actividades intelectuais implicam também (e em parte), um outro tipo de processamento em paralelo (simultâneo)

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onde ocorre mais que um processo mental no mesmo instante. Fase 3) 'Saída da informação'. Produção de respostas ou soluções.

Aliás, tendo em conta a categorização dos vários elementos associados aos processamento da informação, alguns autores referem que a par dos processos cognitivos (ou não executivos) existem também processos metacognitivos (ou executivos). Estes últimos processos são considerados de ordem superior, na medida em que regulam e controlam os primeiros através das componentes estruturais do sistema. Neste sentido, sobretudo a partir dos anos 50, o computador tornou-se uma metáfora para integrar as diferentes perspectivas relativas ao processamento da informação e resolução de tarefas intelectuais. Exemplifiquemos então com a Figura 2-I, o processo de resolução de uma tarefa ou problema, segundo os momentos de aquisição e codificação (fase1), tratamento e transformação da informação (fase2) e, produção de uma resposta (fase3).

Imput I

Figura 2-I: sistema de processamento da informação (adaptado de Morais, 1996: 33)

Usando este esquema sugerido por Morais (1996) registamos a seguinte sequência processual. 1. A informação entra no sistema (I). 2. A informação é brevemente retida enquanto é examinada segundo a importância (recepção sensorial). 3. Alguma informação é seleccionada para ser processada e registada efemeramente (MCP ou memória

curto prazo), a restante perde-se. 4. O produto do processamento anterior é armazenado de forma relativamente permanente (MLP ou

memória de longo prazo). Neste armazenamento, já estão incluídas influências de processos mais complexos de tratamento da informação, os quais permitirão a organização do conhecimento-base e a sua acessibilidade para posterior evocação. Este percurso (encoding) envolvendo complexidade põe

(7)

Fase 3: Saída/Resposta

Fase 1: Entrada/codificação

Rece

pção

sens

orial

(2

)

MCP(3)

ML P

(4)

Processamento adicional

(1) (5)

Fase 2: Tratamento/transformação

(6)

(Lixo)

R output

Metacomponentes

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em funcionamento grande parte dos processos cognitivos e é a componente mais demorada do processamento (contorno a tracejado).

5. As respostas ou acções envolvem, em geral, a coordenação de informação previa e a informação que acaba de entrar no sistema. Ou seja, não basta apenas codificar e evocar, é também importante categorizar, inferir, deduzir, etc. (contorno a cheio).

6. A produção das respostas ou acções será, finalmente emitida para o exterior (R). 7. Todas estas fases e processos são planeados, dirigidos e monitorizados por processos (executivos)

de ordem superior, designados genericamente de 'metacomponentes'. Sobre este modelo de processamento da informação, é possível encontrar em Almeida (1994; 1988: 46)

inúmeras referências a estudos centrados nas componentes de resolução das tarefas intelectuais. De acordo com este investigador, a actividade de pesquisa que tem como objectivo a caracterização das aptidões mentais e enfatizando mais as semelhanças do que as diferenças, constitui a grande novidade do estudo da inteligência a partir dos anos 60. Ou seja, os estudos realizados no âmbito da resolução de problemas têm, independentemente das aptidões e competências abordadas, permitido definir um 'conjunto de componentes cognitivas mais ou menos gerais a toda a realização intelectual dos indivíduos'. E continua, 'a diferença a postular e a reter situar-se-á, então, na importância relativa de cada um desses processos na resolução das diversas tarefas'. Neste sentido, tomando as orientações proferidas por Resnick (1976) e referenciadas por Almeida (1994: 56), a investigação acerca da definição de inteligência 'deve dirigir-se sobretudo para os processos cognitivos e não para os traços, deve tentar uma integração de metodologias correlacionais e experimentais de análise, deve dirigir-se mais à capacidade de diagnóstico do que à capacidade de predição dos desempenhos, deve passar a incluir maiores referências à modificabilidade cognitiva'. Por outro lado, a especificação dos mecanismos e processos cognitivos que entram na realização das tarefas intelectuais, tem permitido compreender e explicar melhor os fenómenos intelectuais. O conhecimento daí decorrente justifica a garantia na promoção e activação do desenvolvimento das competências (gerais e específicas), no contexto das intervenções psico-educativas. De facto, com a corrente cognitivista, deram-se largos e significativos passos para a construção do conhecimento sobre o funcionamento intelectual da mente humana. Procurar saber, antes, o que é a inteligência? em detrimento de quem é inteligente?. Ainda no quadro das investigações acerca da inteligência, de acordo com a abordagem cognitivista, encontramos em Almeida (1994: 32) algumas linhas orientadoras que se podem agrupar, basicamente em duas grandes correntes de estudos, designadamente:

(1) A corrente 'biologizante' dos que estudam os correlatos fisiológicos da inteligência, dividida em três grandes linhas de pesquisa que são a velocidade de processamento (Galton, Eynseck, Jensen, Richardson, Hunt, outros), as teorias do potencial evocado (Weinberg, Ert & Schafer; Hendrickson,

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outros) e as múltiplas inteligências (Gardner e outros). (2) A corrente 'componencial' dos que estudam os correlatos cognitivos da inteligência mais ao nível dos

processos (Sternberg e Perkins). Além disso, a abordagem dos mecanismos e processos de realização nas tarefas cognitivas não se tem limitado apenas à observação das diferenças e interpretação de comportamentos cognitivos. Numerosas aplicações, têm-se orientado para a procura da identificação de formas de elevar essa mesma realização. Neste sentido, Reuchlin & Bacher (1989, referidos por Morais, 1996: 35) defendem que a metacognição (iremos tentar verificar mais adiante) será uma das dimensões mais significativas do processamento da informação nas diferenças individuais de realização intelectual e comportamento inteligente.

1.2. As múltiplas inteligências

No livro publicado por Gardner em 1985, com o título Frames of Mind, é proposto um amplo espectro de inteligências com sete variedades principais assentes em (oito) critérios de julgamento e divididas em três categorias, a saber:

• 'inteligências pessoais'. Competência verbal-linguística, competência lógico-matemática, aptidão espacial, aptidão musical, capacidade corporal e quinestésica;

• 'inteligência interpessoal'. É a capacidade de compreender as outras pessoas; o que as motiva, como é que funcionam, como trabalhar com elas; e,

• 'inteligência intrapessoal'. É uma capacidade correlativa, voltada para dentro. É a capacidade de criarmos um modelo correcto e verídico de nós mesmos e de usar esse modelo para funcionar eficazmente na vida (Gardner,1985 citado por Goleman, 1995a: 59).

Em outra ocasião, Gardner faz notar que o cerne da inteligência interpessoal inclui também a 'capacidade de discernir e responder adequadamente aos estados de espírito, temperamento, motivações e desejos das outras pessoas'. Na motivação intrapesssoal, o auto-conhecimento inclui o 'acesso aos nossos próprios sentimentos e capacidades de distinguir entre eles e de neles nos basearmos para guiar a nossa conduta' (Goleman, 1995a: 60). Em 1996, acrescenta às 'inteligências' anteriores um novo módulo, o qual designou de 'inteligência naturalista' (capacidade para reconhecer e descriminar diferentes características entre seres vivos (plantas e animais) ou a sensibilidade para analisar outros traços do mundo natural (classificação de minerais, rochas, etc.). Este investigador, nas entrevistas e conferências em que participa, tem admitido a possibilidade de brevemente se poderem caracterizar ou descobrir muitos outros módulos de inteligência, dando como exemplo, a 'inteligência existêncial', ou seja, aquela inclinação humana para a

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permanente interrogação acerca da nossa existência, do que somos, do que fazemos no mundo, na vida e da morte (Oliveira, 1998: 228). A visão que Gardner defende é, por consequência, uma visão sistémica (veícular) da mente humana. Revê, de algum modo as teorias desenvolvimentistas de Piaget, embora enuncie algumas das suas limitações, nomeadamente as que contrastam com a noção de multiplicidade da inteligência, como por exemplo, a incidência de Piaget em certas formas de pensar lógico-matemáticas em detrimento de algumas competências específicas evidenciadas em artistas e pintores, por exemplo. Neste sentido, as práticas de avaliação escolares (e académicas) tendem a destacar, nomeadamente aquele tipo de aluno 'bom' a matemática (leia-se inteligência lógico-matemática) ou, aquela que 'escreve e fala bem' (inteligência comunicacional). Quase todos os programas curriculares e de avaliação enformam na base destes dois tipos de inteligência e, excepcionalmente serão reconhecidas outras habilidades ou qualidades, como por exemplo, 'o jeito' para a música, desporto, para as ‘artes’, ou, mesmo, para as atitudes sociais, simpatia, amabilidade, empatia, etc. Neste sentido, Gardner sugere a utilização da noção de 'sistema simbólico', o que distingue o ser humano dos outros seres é a sua capacidade em utilizar veículos de pensamento nos processos de organização e equilibração (no sentido de Piaget) em sistemas simbólicos como a linguagem, a matemática, os gestos, a música, o corpo, etc.. Mas, algumas dúvidas surgem de imediato, as quais e de algum modo, estão relacionadas e condicionam teoricamente estes 'veículos simbólicos'. Referimo-nos por exemplo, às respostas acerca do tipo de competências e processos que estarão implicados na realização de determinado sistema simbólico. Ou, será que estas competências e processos estarão igualmente implicados em outras realizações ou em outros sistemas? Ou, o processamento da informação e condução por determinado veículo simbólico permanece constante quando veiculada por outro meio? Ou, como interagem os diferentes veículos simbólicos no sentido da promoção e desenvolvimento da inteligência?, etc.

Enquanto Gardner enfatiza a separação das várias inteligências (embora defendendo o funcionamento sistémico de todas), Sternberg (1990, referido por Jonassen & Grabowski, 1993: 45) revê diferentes interpretações do comportamento inteligente em cada indivíduo sugerindo uma lista de metáforas que sustentam os vários modelos e teorias que investigam a inteligência, a saber:

• geográfica (geographic). Um mapa da mente, componentes ou factores de inteligência, fonte de diferenças individuais, preditor de realização ou consecução;

• computacional (computational). Mente como sistema computacional, rotinas de processamento da informação ou componentes subjacentes à inteligência artificial;

• biológica (biological). Funções electro-físiológicas e bio-químicas do cérebro e do sistema nervoso central, não predizíveis ou bem compreendidas, no modelo neural;

• epistemológica (epistemological). Teoria de epistemologia genética, focada nos processos de

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assimilação e equilibração do conhecimento e períodos desenvolvimentais do crescimento com vista à estrutura do conhecimento;

• antropológica (anthropological). Inteligência como artefacto cultural, adaptação às influências culturais, inteligência culturalmente dependente;

• sociológica (sociological). Influência de Vigotsky, internalização de observações sociais, zona de desenvolvimento proximal.

• sistémica (systems). Interacção de múltiplas inteligências, combinação de diferentes metáforas. Na realidade, Sternberg tende a enfatizar os níveis de funcionamento e de processamento conjunto de cada uma das múltiplas inteligências. Defende-se que uma teoria da inteligência deva especificar como a inteligência se relaciona com o mundo interno e externo de cada indivíduo e com a sua experiência (Sternberg, 1986: 196). Para este autor, a inteligência desenvolve-se como função das interacções do indivíduo com o ambiente. E se é um facto que o ambiente ajuda a formar a inteligência, então uma teoria da inteligência tem que saber lidar com a relação entre inteligência e ambiente exterior ao indivíduo. Finalmente, ainda no que respeita à inteligência, esta, relaciona-se com a experiência do indivíduo. Neste sentido, a experiência medeia a relação entre inteligência, por um lado, e os mundos interno e externo do indivíduo, por outro. Neste sentido, Sternberg, (1985 a 1995) propõe uma abordagem triárquica da inteligência, segundo os factores 'contexto' e 'experiência', a par da componente interna dos sujeitos, constituíndo deste modo três categorias interdependentes entre si, as quais designa:

• 'contextual' (practical thinking). Relaciona o indivíduo com o ambiente exterior. Especifica como o comportamento inteligente é definido a partir do contexto socio-cultural em que os comportamentos têm lugar através da capacidade prática de adaptação, selecção, modificação e intervenção sobre o contexto exterior;

• 'experiencial' (creative thinking). Relaciona o individuo exterior e interiormente. Manifesta-se por diferentes níveis ou graus de adequação (automatização) do comportamento inteligente ao contexto em que se insere, isto é, manifestações diferentes de inteligência criativa em função das tarefas ou situações novas;

• 'componencial' (analytical thinking). Relaciona a inteligência do indivíduo internamente. Especifica as estruturas de análise e os mecanismos do comportamento inteligente, através do uso de estratégias que manobram os elementos ou as relações entre esses elementos.

Entretanto, relativamente ao uso das estratégias e acerca dos mecanismos que conduzem ao comportamento inteligente, Sternberg menciona na sua subteoria das componentes2 a existência de

2 Entenda-se componente como todo o processo elementar de tratamento da informação (Newell & Simon, 1972, referidos por Almeida, 1988: 46)

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diferentes níveis de aptidão mental (ou inteligências?) ao considerar que todo o comportamento de um sistema humano de processamento de informação é o resultado da combinação de processos elementares de realização nas tarefas (componentes de aquisição e realização) com processos complexos de planificação dessa realização (metacomponentes).

• 'Componentes de aquisição de conhecimento'. São processos utilizados na aprendizagem de informação nova e sequencial que irão constituir a experiência prévia. Isto é, componentes que recebem, codificam (separam a informação relevante) e combinam (reúnem e estruturam a informação) por comparação entre as estruturas cognitivas novas ou recuperadas com as estruturas antigas (e.g., ao nível das tarefas, são próximas dos itens do teste psicométrico do Q.I. ao incluir actividades como analogias, silogismos, classificação e completamento de séries e sequências lógico-matemáticas, etc.).

• 'Componentes de realização'. São processos (de ordem inferior) usados na implementação e execução das tarefas (e.g., análise, inferência, organização, aplicação, conexão, justificação, etc.). Estas componentes podem ser subdivididas em:

i) 'gerais', presentes na realização de qualquer tarefa cognitiva; ii) 'grupo' ou 'classe', presentes na realização de um determinado tipo ou classe de tarefas cognitivas; iii) 'específicas', presentes em tarefas específicas simples e que interferem com a sua realização.

• 'Metacomponentes'. São processos de controlo de alto nível e são usados nas tomadas de decisão; planificação, monitorização e avaliação da natureza dos problemas, controlo e estratégias de auto-regulação, tácticas do comportamento inteligente através da interpretação do feedback das situações.

Figura 2-II: teoria triárquica da inteligência e suas componentes ( adaptado de Sternberg, 1995: 395)

categoriaExperiencial

adaptação selecção

modificação intervenção

novidade adequação criatividade

Componentes de aquisição Componentes de realização

Metacomponentes

INTELIGÊNCIA

categoria Contextual

categoria Componencial

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Ainda a propósito da categoria 'contextual', importa referir que, esta, coloca a ênfase no relacionamento da inteligência com o meio exterior. Sternberg & Spear (1985) afirmam que o comportamento inteligente ocorre quando as componentes (adaptação, selecção e modificação) se aplicam à experiência para conseguir alcançar os seguintes processos:

• 'ajustamento e adaptação à envolvente'. Obtido com maior ou menor grau ou dimensão em cada indivíduo. Mas, se este nível está situado abaixo daquilo que o indivíduo considera satisfatório ou óptimo, as consequências poderão ser uma inadaptação ou uma adaptação inadequada. Com efeito, não sendo possível ajustar a envolvente às atitudes, interesses, expectativas, valores, etc. do indivíduo ou no caso deste sentir que não é viável a sua adaptação, então vêr-se-á forçado a tentar algo diferente que não seja a adaptação, como por exemplo, a selecção de alternativas à envolvente que melhor se adapte ou se ajuste a si próprio;

• 'selecção de alternativas'. Quando o ajustamento do indivíduo é suboptimal e este não está adaptado, a alternativa é seleccionar outra envolvente que melhor se ajuste a si próprio. Na realidade, o indivíduo pode reconhecer o desfasamento entre o seu envolvimento (real) e o desejado (ideal) e optar por alterar as circunstâncias em que se encontra. Esta mudança da envolvente pode assim resultar no sucesso adaptativo relativamente á nova envolvente ao invés do fracasso ou inadaptação suboptimal. Contudo, nem sempre é possível seleccionar a envolvente óptima, assim sendo, a opção poderá passar por um terceiro processo- modelação da envolvente;

• 'modelação da envolvente'. Existe modelação quando o indivíduo tenta reconfigurar o seu envolvimento com o objectivo de se ajustar e adaptar ao mesmo, com vista à compatibilidade com as suas necessidades pessoais. Deste modo, enquanto a adaptação envolve a modelação do indivíduo à envolvente, a modelação envolve a realização das mudanças necessárias na envolvente que fortaleçam o envolvimento do próprio indivíduo. Ou seja, o indivíduo faz com que a envolvente mude em função de si próprio.

Resumindo, a categoria contextual da inteligência refere-se fundamentalmente à habilidade ou competência dos indivíduos para se adaptarem, seleccionarem e modificarem os seus envolvimentos (Sternberg & Spear, 1985). Já a categoria experiencial, relaciona o conceito de inteligência com o mundo interno do indivíduo e inclui as componentes que requerem uso relativamente novo das metacomponentes e/ou das componentes de aquisição e realização das tarefas. Neste sentido, a inteligência não implica só a simples competência de aprender e raciocinar com os conceitos, implica também a competência para aprender e raciocinar com novos tipos de conceitos ou sistemas conceptuais que não lhe sejam familiares (novidade). A inteligência situar-se-á exactamente na competência ou habilidade para aprender e pensar dentro dos novos sistemas conceptuais, os quais possam servir para sustentar novas estruturas do conhecimento a partir das existentes (criatividade) (Sternberg, 1990).

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Por outro lado, Sternberg & Spear (1985: 308) colocam em relevo o conceito de 'automatização', sugerindo que a competência para automatizar respostas de um modo rápido e efectivo parece ser central no funcionamento intelectual, afirmando que 'muitas tarefas, embora não todas, são sujeitas à automatização das respostas como função de um incremento da sua prática'. Assim, embora esta teoria (triárquica) da inteligência assente em três vertentes, estas estão perfeitamente interligadas através de um triângulo, cujos vértices correspondem ao mundo interior (componencial), ao mundo exterior (contextual) e ao estudo da interacção entre estes dois (experiêncial). Em último, acerca desta teoria triárquica da inteligência, importa salientar a importância atribuída aos processos cognitivos de modificabilidade e/ou educabilidade, os quais, permitem atenuar, treinar ou prevenir eventuais défices manifestados em cada uma das três categorias da inteligência apresentadas por Sternberg (Rios et al. ,1991).

1.3. Os contributos da inteligência emocional

O termo 'inteligência emocional' surge nos finais dos anos 80, sobretudo a partir dos estudos realizados por psicólogos americanos (Salovey, Mayer, Goleman, outros) acerca dos factores motivacionais e emocionais dos sujeitos e pela caracterização de qualidades como a compreensão individual dos sentimentos pessoais, a empatia (compreensão dos outros), o controlo emocional, etc. (Concar et al., 1996; Gibbs, 1995, 1996; Goleman, 1995 a, b) A obra de António Damásio (1994) com o título 'Emoção, Razão e Cérebro Humano' é uma tentativa com êxito na demonstração da impossibilidade em separar a racionalidade das emoções, pois a ausência destas altera as decisões (racionais) e abre (cientificamente) um ciclo de relações entre a razão e as emoções. Neste contexto Goleman (1995b) apresenta uma extensa investigação sobre o valor da inteligência e o papel das emoções numa relação, cuja designação se pode traduzir por 'Inteligência Emocional '(IE). Note-se porém que para Goleman (1995a: 159), o QIE (QI Emocional) corresponde não a um parâmetro numérico, mas, à capacidade empática, à hetero e auto-motivação, á auto-regulação das iniciativas e tomadas de decisão. Seguindo estudos comparativos entre QI e QIE, na sua maioria, realizados pelo psicólogo americano Jack Block, Goleman (1995b,a: 65) vai mais além e aponta que os principais factores que explicam o porquê de muitas pessoas com QI elevado falharem, enquanto outras, com baixo QI, serem bem sucedidas nas suas tarefas e actividades, tem a ver com os seus traços emocionais, como por exemplo, o autocontrolo, a autoestima, a persistência a auto-motivação; etc.. E reafirma, que o intelecto e a inteligência emocional 'não são competências opostas, serão antes competências separadas' e além disso, 'todos nós

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misturamos intelecto e acuidade emocional; as pessoas com QI elevado e uma baixa inteligência emocional (ou QI baixo e elevada inteligência emocional) são, a despeito dos estereótipos, relativamente raros'. Assim, a 'inteligência emocional é uma aptidão fundamental, uma capacidade que afecta profundamente todas as outras, quer facilitando-as quer interferindo com elas' (Goleman, 1995b: 80). Posteriormente, Salovey (Salovey & Mayer, 1990:189 e Goleman, 1995a: 43) na sua própria definição de 'I.E.', redefine as inteligências pessoais de Gardner e distribui as capacidades descritas, por cinco áreas de aptidões ou competências.

• 'A autoconsciência'. Ser capaz de conhecer e controlar as nossas próprias emoções é crucial para a introspecção e o autoconhecimento emocional. É a 'pedra-base' da inteligência emocional (Goleman, 1995a: 63). A falta de capacidade para reconhecer os nossos verdadeiros sentimentos deixa-nos à mercê das emoções.

• 'Gerir as emoções'. Lidar com as sensações de modo apropriado e autocontrolado; as pessoas que falham nesta competência emocional “vão abaixo” com frequência, como afirma Goleman, em sentimentos de tristeza, em estado de depressão permanente, sensação de derrota e impotência perante as adversidades.

• 'A automotivação'. Mobilizar as emoções e impulsos para um objectivo é fundamental para concentrar a atenção para a competência e para a criatividade; as pessoas que desenvolvem esta competência de empenho parecem conseguir ser mais produtivas e criativas do que outras.

• 'A empatia'. Capacidade de reconhecer as emoções dos outros 'é a mais fundamental das aptidões pessoais’(ibid).

• 'A competência social'. Ou a ‘arte’ de nos relacionarmos ou a aptidão para gerir as emoções dos outros ou a capacidade de relacionamento interpessoal.

Para Gibbs (1996,1995), entre os ingredientes para o sucesso, os investigadores hoje estão na generalidade de acordo que o QI apenas contribui com cerca de 20%. Neste sentido, somos levados a concluir que o QIE parece ser melhor preditor do sucesso e adaptação aos contextos de aprendizagem do que o QI. Neste sentido, Goleman (1995b: 62) sugere que a 'I.E.', não sendo imutável, revela-se como uma competência que pode ser ensinada e promovida, em nós próprios e nos outros. Ou melhor, para se evitar os 'custos' da incompetência emocional, terá mesmo de haver uma 'escolarização' das emoções, Isto é, as instituições escolares deverão desenvolver, por exemplo, 'cursos de educação emocional'. Aliás, as descobertas realizadas na investigação neurológica mais recente acerca da arquitectura emocional do cérebro (Damásio, 1994: 185), apontam para a existência de circuitos que determinam o comportamento inteligente e formulam a hipótese de que lições adquiridas e aprendidas na infância modelam esses circuitos emocionais que comandam manifestações emocionais como a ira, o medo, a paixão ou a alegria. Damásio, inclusive fala-nos de 'marcadores somáticos' quando considera o mapa cerebral.

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Na realidade, nós temos como que 'dois cérebros', um emocional e outro racional (Miranda, 1997 e Oliveira, 1998: 254). As emoções e o pensamento (razão e emoções) estão intimamente interligados de diferentes e complexas formas. Emoções, como por exemplo, a ansiedade e a preocupação acerca das próprias capacidades para lidar com determinada situação podem alterar ou aniquilar mesmo as competências para pensar e aprender de um aluno. É esta autoconsciência dos sentimentos que alguns autores apelidam de 'meta-sentimentos' ou 'meta-emoções' (Gibbs, 1995: 65). Por último, importa referir que Hermann, na sua obra The Creative Brain (década de 80, referido por Miranda, 1997: 13), propõe uma nova perspectiva acerca das teorias de dominância cerebral esquerda ou direita, ao avançar com a metáfora dos quatro quadrantes cerebrais ('quadralidade cerebral') correspondentes a quatro 'preferências cerebrais' ou 'estilos de pensamento', cujas designações são:

• 'racional' (superior esquerdo). Lógico/ numérico, que analisa, quantifica, crítico, realista, factual, economista, conhecedor pragmático;

• 'salvaguardor' (inferior esquerdo). Prevenido, procedural, executante, confiável, organizado, esmerado, pontual e planejado;

• 'sensitivo' (inferior direito). Sensível aos outros, sociável, falador, comunicativo, sustentado, expressivo, emotivo, sensitivo;

• 'experimental' (superior direito). Conjector, imaginativo, criador, especulativo, arriscado, impetuoso, pouco cumpridor de normativos, curioso, brincalhão.

Nesta sequência, Miranda (1997: 38) propõe um modelo de cérebro que abriga um conceito de 'multipolaridade cerebral' composto por seis diferentes grupos de aptidões, designadamente, corporais/ viscerais, preventivos/ organizacionais, emotivos/ relacionais, analíticos/ factuais, intuitivos/ conceptuais, metafísicos/ espirituais. Estes grupos de aptidões procuram exibir com precisão a intelectualidade do ser humano, segundo três pólos distintos do sistema cerebral superior. E, respectivamente as emocões (operacões), segundo três pólos do sistema cerebral inferior. Este modelo parace deixar claro que o intelecto não pode dar o melhor de si sem a inteligência emocional e que esta não pode dar o melhor de si sem o suporte intelectual. A visão da multipolaridade cerebral orienta os processos de levar a inteligência à emoção e, também, a emoção à inteligência' (Miranda, 1997:101).

1.4. Competência intelectual

Não obstante, depreende-se que a 'inteligência' permanece bastante imprecisa na sua definição. Além disso, tudo leva a crer que o estudo acerca da inteligência está muito longe de ser um tema pacífico entre os diferentes investigadores. De facto, enquanto uns falam de capacidades, aptidões ou atributos

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intrapsíquicos, logo outros se orientam, ao nível da terminologia para as áreas sócio-motivacionais, dos estilos cognitivos ou das atitudes pessoais de adaptação ou na resolução de problemas quotidianos, entre outros aspectos. Tentando colocar uma certa ordem nas coisas, Almeida (1994) sublinha que algumas investigações recentes na área da psicologia cognitiva têm incidido na interacção entre a inteligência e o conhecimento 'explícito'. Este conhecimento encontra-se situado no âmbito do currículo escolar e permite obter a informação diversa necessária às tomadas de decisão quotidiana e do conhecimento 'implícito', mais representacional ou de uma linguagem mais simbólica. Isto é, um conhecimento mais abstracto e estruturador do conhecimento explícito. Referencia-se este investigador fundamentalmente nos 'esquemas pragmáticos de raciocínio' de Cheng e Holyoak (1985) onde se postula que o 'raciocínio envolve estruturas abstractas de conhecimento apreendidas do mundo real'. Exemplificando, com situações quotidianas de interacção ou de aprendizagem de hábitos tais como, permissões, obrigações, contrapartidas, compensações ou causalidade.

Também para Sousa (1995), as abordagens conceptualmente unitárias da inteligência e do seu desenvolvimento, viram-se recentemente confrontadas com novas perspectivas, tomadas essencialmente a partir dos trabalhos de Lautrey (1981), pela psicologia cognitiva diferencial, a qual, assenta numa concepção pluralista (não unitária) do desenvolvimento cognitivo. 'Trata-se de uma concepção que admite que um mesmo problema possa ser resolvido por processos diferentes havendo a partir daí uma via «pessoal» de desenvolvimento cognitivo. Esta pluralidade e as diferentes espécies de relações entre processos que ela propícia surge como uma das fontes de desenvolvimento cognitivo e um dos factores de diferenciação dos indivíduos' (Sousa, 1995: 193). No mesmo sentido, Almeida (1994: 46) conclui que a evolução verificada na investigação tem mais a ver com 'a passagem progressiva da identificação da inteligência com os traços internos (aptidões) e com os testes ou resultados, nestes obtidos, para os processos mentais, para o funcionamento da inteligência e para formas mais globais e contextualizadas de avaliação'. Tal como, a avaliação psicológica da inteligência se deveria preocupar menos com o traço ou a aptidão quantificada e mais com o porquê?, o quê?, o quando? e o como se pode (ou não) fazer?(ou se na realidade é feito).

Entretanto observamos que de um ponto de vista sistémico, o pensamento pode ter como componentes activos qualquer meio físico capaz de suster os processos necessários. Contudo, não é necessário explorar a forma como este meio processa a informação. É suficiente que o esquema geral de processamento seja considerado em termos da teoria da comunicação e controlo (isto é, em termos cibernéticos), o qual pode ser adoptado quer para sistemas artificiais como para sistemas biológicos, nos quais, a informação, codificada e modelada de determinadas maneiras é transmitida e armazenada de forma

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adequada ao sistema. As actividades eléctricas, electrónicas ou químicas contribuem todas para o mesmo fim, isto é, a auto-regulação (manipulação) controlada da informação. Na realidade, se bem que os elementos de armazenagem e operação caracterizem todos os seres humanos, é de esperar uma variação considerável entre os diferentes indivíduos. Isto é, uma pessoa consegue memorizar mais que outra e pode ser mais ou menos eficiente na sua busca na memória. Operações como memorização, prestar atenção e codificação da informação (para transferência de uma memória de curta duração para uma de longa duração) variam em velocidade e eficiência entre indivíduos e, além disso, estas variações indicam formas diferentes de inteligência (Chi et al., 1982: 10). A comparação da realização em tarefas simples entre indivíduos 'peritos (experts)' e 'novatos (novices)' tem constituído um excelente ponto de partida para inúmeros estudos que sugerem diferenças importantes no modo como os indivíduos armazenam e memorizam a informação recebida e o modo como a evocam, a médio ou longo prazo. Entre muitos autores, preocupados com os aspectos da velocidade de processamento, encontramos Hunt que em 1978, sugeria que a inteligência fosse medida em termos de velocidade, interessando-se particularmente pela velocidade de acesso lexical, isto é, velocidade com que é possível aceder e recuperar informação relativa a palavras armazenadas na memória de longo prazo. Também Sternberg (1985) se refere aos aspectos relacionados com as diferenças de 'velocidade' entre indivíduos, apontando-nos alguma tipologia para a realização de tarefas simples. Por exemplo, a velocidade de processamento (para realização das tarefas imediatas), a velocidade de tomada de decisão, a velocidade de acesso a vocabulário (inteligência verbal), a velocidade de raciocínio (analogias, pensamento lógico-dedutivo, etc.). Mas, esta tipologia da velocidade de processamento em tarefas simples suscita questões de vária índole, nomeadamente no que concerne em saber se serão (ou não) as situações da vida real, em última análise redutíveis a componentes de resolução de problemas ou à realização de tarefas simples. As diferenças observadas na realização das tarefas poderão igualmente ser explicadas pela utilização de determinadas estratégias, cuja selecção seja feita segundo critérios de adequação e eficácia à resolução das mesmas (Belmont & Butterfield, 1971; Hunt et al. 1975, referidos por Almeida, 1988: 47). A abordagem e avaliação da realização entre 'peritos' e 'novatos' seria, deste modo, mais qualitativa que quantitativa. Ou seja, o recurso a determinadas estratégias gerais, complexas ou abstractas depende das disponibilidades existentes nos sujeitos (atenção, memória) para o trabalho de reorganização da informação, de vaivém da informação (conteúdos, conceitos, estratégias) armazenadas (na memória de longo prazo) ou da atenção selectiva em relação ao processo resolutivo (Chi et al., 1982: 245) Na sua vez, Perkins (1987, referido por Baron & Sternberg, 1987: 45) partilhando igualmente da preocupação comum a muitos outros investigadores de que devemos evitar a leitura da inteligência através do Q.I., analisa trabalhos de vários psicólogos e investigadores contemporâneos acerca da inteligência e determina uma variedade de factores. Segundo Perkins, é possível equacionar estes factores segundo a

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relação [ inteligência = capacidade + táctica + conhecimento ]. Corresponde em síntese a seguinte descrição relativamente a cada um destes elementos:

• Capacidade' (power). A inteligência relacionada com a qualidade (capacidade) potencial, inata, mensurável e neurológica do cérebro, como tal pouco influenciada pela aprendizagem;

• 'Táctica (tactics). A inteligência entendida em termos de apropriação de tácticas ou estratégias. Nesta categoria, o ensino de estratégias dirigidas à execução de tarefas específicas pode melhorar substancialmente a sua realização e, neste sentido, a inteligência é treinável através da aprendizagem (Palincsar & Brown, 1984: 118); e

• 'Conhecimento' (content). A inteligência dependendo do conteúdo e nível de conhecimento prévio nos sujeitos. Mas, sublinha-se que o facto de se possuir um elevado conhecimento específico (especialização) poderá não trazer maiores vantagens ao indivíduo (neste sentido, segue a perspectiva do 'ignorante especializado'). Ao contrário, em certas áreas como, por exemplo, a matemática ou o cálculo, onde a uma exigência de conhecimento alargado e mais abrangente está, certamente subjacente um comportamento inteligente e eficaz nessa área.

Nesta composição tridimensional da inteligência por parte de Perkins, resulta ainda um aspecto a realçar e que se prende com o posicionamento em forma de continnuum entre as componentes do modelo. Exemplificando, num extremo das tácticas estão colocados princípios básicos cuja aplicação se estende a vários domínios do conhecimento (saber ler, comunicar, contar, etc.) e na extremidade do conteúdo encontram-se elementos que têm a ver com disciplinas específicas (conteúdos curriculares, conhecimentos científicos, etc.). Entre estes dois extremos, encontramos um certo tipo de conteúdos e de tácticas de generalidade intermédia (estratégia para resolução de problemas, estratégia de estudo, etc.). As implicações desta teoria, em termos educacionais, sugerem a possibilidade de intervenção sobre os sujeitos com vista à promoção ou activação das competências gerais e/ou específicas, designadamente as técnicas e estratégias mais adequadas para aprender a aprender e a pensar.

1.4.1. Perspectiva da modificabilidade e treino cognitivo

Como afirma Morais (1996: 3), 'da compreensão da natureza da inteligência emerge a necessidade de perspectivar a sua modificabilidade'. Mas, de acordo com esta autora, a presença do conceito de modificabilidade cognitiva nem sempre esteve presente nos estudos da inteligência. Salienta que na abordagem factorial, apenas, alguns dos seus autores (e.g., Guilford, Horn e Catell) ao considerarem o papel da cultura e da experiência na funcionalidade da inteligência, permitem espaço a este conceito. Não obstante, refere que a abordagem desenvolvimental, sobretudo a partir de alguns pontos mais sensíveis e críticos, não só legitimaria a questão como seria o seu fundamento para as acções e intervenções sobre os

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indivíduos. Assim, a modificabilidade cognitiva seria enquadrável na abordagem do processamento da informação onde os comportamentos inteligentes ou a cognição se operacionalizam num 'jogo de processos cognitivos e metacognitivos, identificáveis e mutáveis, mas também de estratégias que não só deles dependem sendo consequentes ainda nos percursos de vida, contextos e investimentos' (ibid).

Com diferentes níveis de concordância, evidencia-se assim uma certa importância pelo estudo de aspectos ligados à avaliação, treino e desenvolvimento cognitivo e do pensar nos indivíduos. Por exemplo, Lautrey (1980, referido por Morais, 1996 e Sousa, 1998) fala-nos em características diferenciais do meio ambiente que facilitariam a educabilidade cognitiva. Sternberg (1986) virá mesmo a construir um programa detalhado de treino cognitivo para estudantes, ao qual seguiriam muitos outros. Salientamos, designadamente o programa de enriquecimento instrumental de Fuerstein (Feuerstein, 1980), a teoria PASS (Das, Naglieri & Kirby, 1994), o Learning Strategy Instruction (Danserau, 1978), o Cognitive Research Trust- CoRT (De Bono, 1976), o programa de promoção cognitiva (Almeida e Morais, 1988), o programa da educabilidade cognitiva (Fonseca, 1998), o projecto 'Dianóia' da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (1991), etc. Aliás, em Beltrán et al. (1991), Rios et al. (1991) e Consejero & Carretero (1993) é possível encontrar um extenso conjunto de referências a programas de treino e/ou modificação cognitiva.

Ainda a este propósito, Morais (1996: 56) refere a distinção que López & Pérez (1989) fazem entre dois tipos de investimentos possíveis dentro do domínio cognitivo. Por um lado, há os trabalhos em torno da avaliação do potencial de aprendizagem. Por outro, a estruturação, aplicação e avaliação de programas de promoção cognitiva. Acerca destes programas de promoção e treino cognitivo, Frederiksen (1984) refere também uma divisão entre aqueles programas que trabalham essencialmente os processos e os outros que procuram mais o treino de estratégias, nomeadamente na resolução de problemas (heurísticos). Também Nickerson et al. (1987, referido por Morais, 1996: 58) apresentam uma categoria de programas direccionados para o trabalho de processos cognitivos para a realização de múltiplas tarefas e outra voltada para o treino de estratégias globais e resolução de problemas. Criaram ainda mais três categorias, sendo uma dedicada a programas de promoção do pensamento formal (baseada na abordagem desenvolvimental) e outra, dedicada ao treino cognitivo através da manipulação de sistemas específicos de símbolos e escrita e linguagem LOGO e a última, dedicada a programas que tomam a actividade consciente de pensar como alvo directo de abordagem (exemplo, o 'Philosophy for Children' de Lipman et al, 1980).

Mas, Rios et al. (1991) sugerem que, à luz da análise de estudos múltiplos, a conclusão geral que se pode extrair acerca da educação da inteligência, do treino cognitivo ou do aprender a aprender e pensar, é moderadamente optimista. Com efeito, estes autores apontam no sentido das seguintes observações pertinentes que sublinhamos.

• Alguns programas proporcionam evidência empírica de que a inteligência é modificável, contudo nem todos conseguem que os resultados, dessa intervenção, sejam consistentes ou apresentem os

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mesmos níveis ou graus de modificação.

• A educação da inteligência não proporciona aos indivíduos uma fórmula que estes possam utilizar à

posteriori, na solução dos problemas que se lhes deparam.

• Os programas de intervenção sobre a inteligência nem sempre incidem sobre o todo (capacidades, habilidades, conhecimentos, comportamentos, atitudes, etc.).

• Existe uma grande diversidade de teorias e práticas, orientações ou desenhos de programas que, ao invés de convergirem, tendem antes a existir dispersos.

• Os programas de intervenção fundamentam-se essencialmente em resultados obtidos em investigação básica.

No mesmo sentido, Valente et al. (1991) referem que são muitos os autores a manifestar necessidade de se realizarem mais investigações acerca dos efeitos destes programas. Além disso, importa proceder-se a uma avaliação mais consistente dos resultados das intervenções. Como sugerem Nickerson e colegas (1987, referidos por Rios et al., 1991), se o ensinar a pensar não é possível e o tentamos fazer é muito provável que percamos o nosso tempo e esforço. Mas continuam, se é possível e não o tentamos, então o custo incalculável será a existência de gerações de sujeitos cuja capacidade para pensar com eficácia será menor do que poderia ter sido. Com efeito, o que parece caracterizar a investigação cognitivista é o facto de diferentes sujeitos realizarem as diversas tarefas utilizando os mesmos procedimentos ou processos. Então, somos levados a crer que 'os processos usados, serão portanto, mais específicos das tarefas que dos sujeitos em si mesmos' (Sternberg, 1982 e Chi et al.,1982, citados por Almeida, 1988: 46). Subjacente a esta última observação e partindo, por exemplo, das provas experimentais que Hunt desenvolveu juntamente com os seus colaboradores, destacamos genericamente a recente teoria PASS (acrónimo de Planning, Attention, Simultaneous, Sucessive) da inteligência proposta por Das, Naglieri & Kirby (1996) e cujo núcleo central assenta no conceito de 'processo cognitivo' usado pelo indivíduo no seu contexto sócio-cultural. Com efeito, a designada teoria PASS 'é uma teoria multidimensional que, em consonância com a excelente e imensa investigação experimental das últimas décadas nesta área, se pode considerar mesmo um dos mais abrangentes e substanciais modelos de conceptualização da inteligência na psicologia contemporânea' (Oliveira, 1998: 256). De acordo com esta teoria, as estratégias e os planos conscientes de realização das diferentes tarefas e problemas são o que determinam, dizem Das et al (1996: 10), 'a distribuição individual das capacidades intelectuais'. E continua Oliveira (1998: 258) 'porque as estratégias podem ser mais relevantes para as mudanças de desempenho intelectual, parece crucial que elas sejam objecto de avaliação, esta teoria da inteligência, oferece-nos, uma nova perspectiva dos limites individuais, em termos das suas capacidades intelectuais, sugerindo que existe uma ampla margem de modificabilidade das capacidades

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intelectuais. Segundo Das et al. (1996), esta teoria apoia-se nos seguintes axiomas relativos ao processamento da informação:

1. uma teoria moderna de inteligência deve incluir os componentes neuropsicológicos básicos da actividade humana;

2. a utilização dos diferentes processos cognitivos é influenciada pelo estilo pessoal de processamento da informação e pelas exigências específicas a cada tarefa;

3. o conhecimento disponível obtido pelo indivíduo no seu contexto sócio-cultural influencia substancialmente a forma como esse indivíduo organiza a sua actividade mental;

4. os processos cognitivos PASS requerem, para o seu desenvolvimento, a interacção cultural e alguns instrumentos culturais, mormente a linguagem;

5. os processos de planificação fornecem ao indivíduo os meios para ele organizar e orientar todas as actividades cognitivas na direcção dos objectivos desejados.

1.4.2. Inteligência e Conhecimento

Um dos aspectos mais importantes associados à concepção cognitiva da aprendizagem é o reconhecimento do papel primordial que ocupam os conhecimentos anteriores na aprendizagem. Segundo Ausubel (1968), a 'aprendizagem significativa' implica a existência de uma estrutura cognitiva que contenha o conjunto dos conhecimentos adquiridos através da experiência do sujeito. Ou seja, para que uma aprendizagem significativa tenha lugar, importa que os novos conhecimentos possam ser colocados, logicamente, em relação com os conhecimentos anteriores adquiridos e organizados na estrutura cognitiva. No contexto da psicologia cognitiva e, nomeadamente no quadro das teorias do processamento da informação, são reconhecidos três tipos de conhecimentos, categorizados fundamentalmente a partir dos trabalhos do matemático Schoenfeld (1985, referido por Boulet et al., 1996: 8), Estes conhecimentos categorizam-se em:

• Declarativo (o 'saber'). É o conhecimento das coisas. Modo geral, este tipo de conhecimento implica o reconhecimento de factos, regras, leis, princípios, métodos, tácticas. A activação dos conhecimentos declarativos processa-se de forma consciente e é, habitualmente, lenta. O conhecimento declarativo é representado na estrutura cognitiva do aluno sobre uma forma proposicional (bivalente). Na aquisição de conhecimentos declarativos há, segundo vários teóricos cognitivistas associados às estratégias de aprendizagem (várias referências, em Boulet et al, 1996), os processos de repetição, elaboração e organização e cuja aprendizagem se pode fazer de forma automática (base) ou significativa (complexa).

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• Procedural (o 'saber fazer') ou sequência de acções. Corresponde ao conhecimento prático, à acção e as suas várias etapas ou fases. É o saber como fazer ou a habilidade de executar uma qualquer sequência de operações afim de atingir um objectivo determinado ou uma tarefa. São exemplos deste tipo de conhecimento, no campo disciplinar, o saber ler, escrever, calcular, desenhar, etc.. Este tipo de conhecimento pode ser activado automaticamente e sem grande esforço consciente e é representado na estrutura cognitiva do sujeito na forma racional (uma condição/ várias acções).

• Estratégico (o 'saber quando' e 'porquê fazer'). Concerne ao conhecimento estratégico e competente. Ou seja, a capacidade de reconhecer as condições de utilização dos conhecimentos anteriores. Gagné (1985, referido por Boulet et al: 10) descreve-o como sendo o reconhecimento de padrões através dos processos sucessivos de discriminação e generalização. É representado na estrutura cognitiva do sujeito também na forma relacional (várias condições/ uma acção).

1.4.3. Capacidade cognitiva e comportamento inteligente

Para Hébert (1994), o aluno é elemento central e membro activo no seu próprio processo de aprendizagem. Deverá aprender a processar as informações estimuladas e a organizar os conhecimentos de forma eficaz na sua estrutura cognitiva. Com efeito, sobretudo a partir dos anos 60, muitos investigadores crêem fazer mais sentido ligar a noção de inteligência aos processos e estratégias utilizadas, ou seja, as componentes (competências) ou metacomponentes que os indivíduos usam para fazer face às aprendizagens. A este propósito, Almeida (1996: 19) afirma que o termo 'inteligência' tem vindo a ser substituído na investigação e prática educacional por termos como 'cognição' e 'competência cognitiva'. Este autor justifica este facto por, nas diferentes perspectivas (cognitivistas e culturalistas), o conceito até aí estático, interno ou abstracto de inteligência passar a ser entendido como decorrente de 'um processo experiencial do sujeito numa dada cultura' . Por outro lado, a capacidade para adquirir competências implica um potencial para certos comportamentos ou atitudes. Ao afirmar-se que uma pessoa é inteligente estamos a imaginar, certamente, como é que esta pessoa se comportaria em determinada circunstância que venha a ocorrer. Para Anastasi (1986, citado por Almeida, 1996: 18) 'a inteligência não é uma entidade interna ao organismo mas uma qualidade do comportamento'. Aliás, esta posição aparece também descrita nos trabalhos de Vygostky (1981) quando, este, se refere à inteligência como uma construção social, mormente nas interacções com os outros (linguagem, princípios sociais, procedimentos de resolução de problemas, etc.). Ou como diz Valsiner (1984, citado por Almeida, 1996: 19) 'a par dos processos e das estratégias cognitivas que emergiram dos estudos cognitivistas, devemos juntar agora, também, as representações sócio-culturais da inteligência e do

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desempenho cognitivo, as significações pessoais e colectivas da capacidade ou aos artefactos culturais subjacentes à construção e manifestação da inteligência' No mesmo sentido, para Mugny & Carugati (1985, citado por Morais, 1996: 39) a 'inteligência com I maiúsculo é uma construção cultural, central nas sociedades modernas, que varia com momentos históricos, latitudes e circunstâncias sociais'. Por exemplo, nas culturas ocidentais, a inteligência é essencialmente competência ou aptidão para aprender essencialmente ligada ao raciocínio lógico-dedutivo, à dimensão tecnológica, industrial-produtiva, em detrimento de aspectos sociais, morais, emocionais, particularmente importantes em outras culturas. Tal como refere Morais, a inteligência só pode ser entendida com uma função intensamente adaptativa e por consequência, condicionada, pelos contextos, objectivos e valorizações. Com efeito, será importante distinguir na competência de realização entre aquilo que o sujeito pode (potencial) fazer e aquilo que o contexto lhe permite (condiciona) fazer. Almeida (1988: 46) afirma que os estudos dos autores cognitivistas, 'independentemente das aptidões que abordam, têm permitido definir um conjunto de componentes cognitivas mais ou menos gerais a toda a realização intelectual dos indivíduos'. E acrescenta que, 'para além da diversidade de conteúdos, de formatos ou de operações implicadas na realização das diferentes tarefas, os processos mentais requeridos são idênticos. Em todas as tarefas estão implicados canais e programas comuns de recepção, de codificação, de relacionamento, de escolha, de decisão e resposta'.

Também Gardner (1983: 283), na sua auto-denominada 'teoria das múltiplas inteligências', procurava conceptualizar a inteligência como capacidade que os indivíduos têm para resolver problemas ou criar produtos que o contexto cultural valoriza. Cada uma destas inteligências, como o próprio autor considera poderiam igualmente ser designadas por 'competências intelectuais', 'processos mentais', 'capacidades' e 'aptidões cognitivas', 'conhecimentos', 'cognições', 'estratégias', etc.. Por outro lado, cada uma destas inteligências encontra-se em interacção sistémica com as outras, no sentido de, em conjunto, produzirem aquilo que se designa, normalmente por 'comportamento inteligente'. Por outras palavras, entende-se o comportamento (estratégico) inteligente como sendo a resultante da conjugação sistémica entre os vários processos, componentes e funções cognitivas e metacognitivas que convergem para a caracterização de uma teoria geral acerca da inteligência.

1.4.4. A metacognição

Nas últimas duas décadas tem-se multiplicado o interesse e os estudos à volta da metacognição. O desenvolvimento conceptual da metacognição nem sempre tem sido pacífico, apontando frequentemente em sentidos diferentes, embora complementares entre si. O abuso do conceito, sobretudo no meio educacional, tem permitido algumas ambiguidades, problema para o qual é de crer a própria popularidade do conceito

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muito tem contribuído. Numa primeira abordagem, duas linhas de investigação têm-se revelado particulamente úteis na pesquisa e conhecimento sobre a utilização dos recursos cognitivos, nos indivíduos. Entre estes, destacamos os trabalhos realizados por:

• investigadores desenvolvimentistas. Têm seleccionado sobretudo crianças em idade escolar para estudar a metacognição e o seu considerável poder explicativo nos processos de aprendizagem, como por exemplo, a leitura;

• os investigadores cognitivistas, da área do processamento da informação. Têm seleccionado sobretudo adultos para o estudo do papel do controlo executivo nos processos de auto- regulação das aprendizagens.

É sintomático que Flavell (1981: 37) tenha descrito este conceito como a 'fuzzy concept' (conceito impreciso, indistinto,…) começando por cunhar, nos seus primeiros estudos, o termo 'metamemória' como o fenómeno de conhecimento potencialmente verbalizável que a criança (indivíduo) tem relativamente a qualquer aspecto do armazenamento da informação. Mais tarde, Flavell (1985: 104) designa metacognição como sendo 'o conhecimento ou actividade cognitiva que tem por objecto, ou regula qualquer tarefa cognitiva'. Com esta definição, Flavell distingue duas vertentes na metacognição. Ou seja, por um lado, fala-nos de 'cognição acerca da cognição' ou o conhecimento que um sujeito tem do seu próprio funcionamento cognitivo e produtos relacionados; por outro, fala-nos da monitorização desses mesmos processos. Saber a natureza e extensão daquilo que conhece (ou não), saber quando comete erros, saber avaliar o que sabe ou não sabe, constituem um saber sobre os próprios saberes e limites, é o mesmo que dizer um meta-saber, um meta-conhecimento, uma meta-percepção, uma meta-aprendizagem 3. Mas, Flavell entende que não se justifica considerar o conhecimento metacognitivo qualitativamente diferente de outros tipos de conhecimento. Caracteriza o conhecimento metacognitivo declarativo e processual como qualquer outro tipo de conhecimento. Aliás, considera que tal como ocorre relativamente à aquisição do conhecimento, este (o metacognitivo) cresce de forma lenta e gradual (construtiva) ao longo do tempo e com a experiência obtida no domínio das actividades cognitivas. Isto é, como qualquer outro tipo de conhecimento armazenado na memória, o conhecimento metacognitivo pode ser activado e desenvolvido de forma automática. Deste modo, a experiência do indivíduo é de grande importância quando relacionada com o percurso mental que é percorrido para atingir, com êxito, o objectivo de uma tarefa específica. A experiência individual fornece as oportunidades para descobrir, experimentar, reflectir acerca do próprio percurso mental. Nas variáveis associadas aos contextos escolares e académicos, a qualidade das interacções entre professor e aluno jogam um papel primordial.

3 no sentido estrito de 'meta' como o elemento que traduz a ideia de transformação além de (Machado, 1991, vol.IV). Consistente coma ideia de meta-aprendizagem defendida por Biggs(1987,1993).

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ATITUDES Estratégias cognitivas

e metacognitivas

OBJECTIVOSTarefas cognitivas

Colocando a tónica sobre aspectos construtivistas e interaccionistas, a metacognição oferece o quadro teórico e os instrumentos práticos que permitem, aos professores, optimizar o desenvolvimento das competências dos seus alunos (Doudin, 1997; Martin & Doudin, 1998: 15). Neste sentido, permitir ou facilitar a experiência metacognitiva que conduz o aluno à auto-gestão e a auto-regulação dos seus erros e fracassos, parece ser uma tarefa primordial do professor. Com efeito, no modelo de Flavell, a metacognição parece corresponder à gestão e controlo dos processos cognitivos que ocorrem através das interacções entre as seguintes quatro categorias de fenómenos.

• 'Objectivos' (tarefas cognitivas).

• 'Atitudes' (acções, utilização de estratégias metacognitvas, cognições e comportamentos para atingir os objectivos).

• 'Conhecimento metacognitivo'. Ou crença que o sujeito tem acerca de si mesmo, em termos cognitivos e relativamente às tarefas cognitivas. Este conhecimento pode ser do tipo 'pessoal', isto é, aquilo que se acredita acerca de si mesmo e das outras pessoas enquanto processadores cognitivos (crença nas diferenças intra e interindividuais); da 'tarefa' ou a informação de realização (procedimento) sobre a tarefa, ou seja, como deve ser planeada, gerida, etc.; e ainda, da 'estratégia', identificando a mais eficaz para os desempenhos ou para atingir os seus objectivos.

• 'Experiência metacognitiva'. Ocorre em situações que estimulam o pensamento e a consciência reflexiva, seja simples ou de complexidade acentuada. Pode ocorrer em e a qualquer momento da actividade cognitiva. Brown (1987: 114) define estas situações como sendo 'qualquer experiência cognitiva ou afectiva consciente que acompanha ou é própria de uma actividade intelectual'.

Figura 2-III: esquema das interacções entre fenómenos cognitivos no modelo de Flavell (adaptado e

traduzido de Nisbet & Schucksmith,1987)

CONHECIMENTO METACOGNITIVO EXPERIÊNCIA METACOGNITIVA

Variável pessoal ←→ Tarefa ←→ Estratégia

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CAPÍTULO 2 117

De acordo com Brown (1987), o termo ‘metacognição’ vem designar igualmente os mecanismos de auto-regulação ou de controlo do funcionamento cognitivo. Estes mecanismos fazem referência às actividades de orientação e de auto-regulação das aprendizagens e do funcionamento (controlo) cognitivo em situação de resolução de tarefas. São apontadas as seguintes componentes essenciais nestas actividades de 'alto nível' usadas, por exemplo, na resolução de uma tarefa académica:

• conhecimento de base orientado para o conteúdo, consistindo em redes semânticas e estruturas esquemáticas existentes;

• componente dinâmica de mecanismos e processos, consistindo em um conjunto de regras e estratégias para a realização e resolução da tarefa;

• componente metacognitiva que informa, controla e regula os mecanismos e as funções cognitivas Com efeito, as competências (conhecimentos de base, dinâmica processual e metacognição como processo de regulação e controlo) são componentes importantes no processo de selecção das estratégias mais eficazes para a resolução das tarefas (simples ou complexas) propostas. Brown distingue diferentes mecanismos ou funções cognitivas nestas acções, como por exemplo:

� a planificação. Imaginar como proceder para resolver um problema, elaborar uma estratégia; � a previsão. Estimar resultados de uma actividade cognitiva específica; � a gestão. Hierarquizar a informação, testar, revisar, reformular estratégias no decurso da actividade; � o controlo. Dos resultados obtidos, avaliar o resultado de uma actividade em função de objectivos; � a transferência, manutenção e generalização. De estratégias de realização a problemas ou contextos

conceptuais, idênticos ou diferentes, mais ou menos complexos. Este modelo de ‘controlo executivo’ de Brown, parece oferecer um vantajoso esquema para a compreensão das diferenças individuais, nomeadamente ao nível dos processos de memorização usados nas tarefas de resolução de problemas e na aprendizagem em geral. Segundo Campione & Brown (1978: 4) '…no domínio da aprendizagem deliberada e em situações de resolução de problemas, o controlo executivo consciente das rotinas à disposição do sistema é a essência da actividade inteligente'. Aliás, os diferentes modelos teóricos inscritos na corrente da metacognição, convergem todos na definição de um nível que supervisione as actividades do sujeito. Contudo, este nível assume diferentes designações consoante os modelos (exemplo, o 'nível executivo' de Campione & Brown, os 'meta-elementos' em Sternberg, a 'memória de trabalho' em Anderson, etc.).

Na sua vez, Marzano et al. (1988: 9) afirmam que a metacognição é 'ser consciente do nosso pensamento enquanto realizamos tarefas especiais e usar esta consciência para controlar o que estamos a fazer'. Deste modo, é possível questionar o papel da metacognição como determinante nas diferenças entre comportamentos inteligentes, já que, envolve os aspectos fundamentais da auto-consciência, Ou seja, o conhecimento e controlo, simultaneamente, de si próprio e dos mecanismos e processos em que está

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envolvido. No mesmo sentido, Tardif (1997: 60) defende que a metacognição faz referência explícita á pessoa através do conhecimento e controlo que a pessoa tem sobre si mesma.

Figura 2-IV: componentes da metacognição, segundo Tardif (1997: 60)

Ou seja, é possível considerar dois níveis importantes na metacognição (conforme Figura 2-IV):

• o conhecimento ( declarativo, procedural e condicional) e,

• o controlo (tomado como sinónimo de gestão, supervisão, regulação) que exercem as suas acções sobre factores afectivos (ligados á pessoa) e cognitivos (ligados aos comportamentos estratégicos).

Ao nível do conhecimento, o sujeito tem uma determinada percepção da importância da tarefa e dos objectivos pretendidos e está consciente dos factores susceptíveis de conduzir ao sucesso ou insucesso na realização da tarefa (envolvimento, participação, persistência, etc.) e além disso, deve estar consciente das estratégias disponíveis e mais eficazes para realizar essa tarefa. Ao nível do controlo, o sujeito desenvolve conhecimentos que assegurem a auto-regulação dos seus comportamentos na realização das tarefas, gerindo a aplicação das estratégias e procedendo à avaliação sistemática da sua utilidade, no decorrer das diferentes fases da resolução de uma tarefa. Finalmente, no que concerne especificamente aos processos de ensino e aprendizagem, Tardif (1997: 58) refere uma publicação recente de Paris & Winograd (1990) onde são reconhecidas e destacadas cinco vertentes fundamentais para a compreensão da metacognição. Pela sua importância para a compreensão do conceito, salientamos esses aspectos de seguida.

• A metacognição permitiu colocar a tónica sobre o papel da consciência e da gestão do pensamento, por parte do aluno, nas seus próprios mecanismos cognitivos.

• A metacognição assegura que as diferenças individuais são tomadas em consideração no desenvolvimento cognitivo e nos processos de ensino aprendizagem.

• A metacognição está implicada no desenvolvimento cognitivo e, como tal, representa um determinado tipo de conhecimentos que se desenvolve com a experiência e a escolarização.

• A metacognição implica conhecimentos construídos e estratégicos que podem ser ensinados e adquiridos de modo directo nas situações escolares.

Metacognição

Conhecimento Controlo

Estratégias cognitivas

Factores afectivos

Estratégias cognitivas

Factores afectivos

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CAPÍTULO 2 119

• A metacognição reportando-se á auto-avaliação e á auto-regulação, associa necessariamente as capacidades (skills) e a vontade (will), isto é, os factores cognitivos a factores afectivo-relacionais.

No mesmo sentido, Palincsar & Brown (1984: 118) afirmam que 'os alunos precisam tomar consciência de como as estratégias seleccionadas numa situação de aprendizagem estão a ser eficazes e também necessitam de estar preparados para mudar de uma para outra se não estão atingir os objectivos desejados'. Para estes autores, o tal ‘conhecimento’ acerca de si próprios enquanto alunos (sujeitos de aprendizagem) em conjunto com os processos de auto-regulação e controlo (gestão e avaliação) da actividade de aprendizagem é aquilo que se deveria designar por 'metacognição'. Enquanto isso, Costa (1985: 57) afirma que a metacognição é a 'nossa capacidade para produzir informação que é necessária, de ser consciente dos nossos próprios passos e estratégias no acto de resolver problemas e de reflectir, e avaliar, a produtividade do próprio pensamento'. Na realidade, um lugar preponderante deve ser dado à capacidade dos sujeitos avaliarem as suas próprias actividades e estratégias. O mesmo é dizer que deve tomar consciência das suas limitações e erros e, ser capaz de os corrigir. A fim de explicar o desenvolvimento desta capacidade de auto-avaliação, os meta-cognitivistas, parecem inspirar-se em algumas das concepções de Vygotsky (1934/1985) quando estabelece um lugar fundamental para os mecanismos de auto-regulação (no sentido de controlo de correcção das produções do sujeito).

Assim, o desenvolvimento intelectual poderá ser concebido como a passagem progressiva dos mecanismos hetero-reguladores (onde a activação depende do papel jogado pelos actores, como o professor) aos mecanismos auto-reguladores (onde a activação depende do aluno, ele próprio). Dito de outro modo, a génese da inteligência passa a consistir, justamente, no enriquecimento de uma parte do conhecimento que o sujeito tem do seu próprio funcionamento e deste relativamente aos outros.

1.4.5. Os processos inteligentes ou as competências do pensar

Se tentarmos examinar as palavras que normalmente utilizamos para transmitir a ideia de 'pensar', verificamos que estas traduzem um imenso repertório de actividades e funções mentais que poderemos designar por 'competências de pensar'. Ou seja, os processos, as técnicas ou as capacidades, essencialmente mentais que tornam os seres humanos capazes de formular pensamentos, de raciocinar ou de formar uma opinião. Mas, quando procuramos uma compreensão mais clara acerca destas competências de pensar, nos alunos, sentimos a necessidade de rendibilizar os planos e os recursos disponíveis, a começar exactamente pela sua reconceptualização e mudança. Como sugere Costa (1985: 267), 'os professores podem ter de experimentar uma mudança de paradigma quando procurarem indicadores do progresso nas capacidades de pensamento dos alunos'.

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Por outro lado, sendo o comportamento dos alunos uma extensão observável do seu pensamento é através deste que se inferem os processos intelectuais. A promoção de um comportamento mais inteligente exige porém condições específicas, nomeadamente, de tempo, de consistência de programas, de currículos bem organizados e adequados, de professores que sejam capazes de se envolver na orientação das aprendizagens dos seus alunos, etc. Todavia, todos estes aspectos contrastam frequentemente com conceitos tradicionais de avaliação. Portanto, hoje, mais do que nunca é colocado ao sistema escolar e/ou académico um enorme desafio. O modelo de avaliação é a chave, mas também é provavelmente o assunto mais difícil e controverso de compreender nomeadamente no contexto do ensino superior (a este propósito, ver Knight, 1998). Na realidade, as competências do pensar evidenciam, nos indivíduos, uma recepção que pode ser passiva (meditação, reflexão) ou activa (resolução de uma tarefa, tomada de decisão, selecção da estratégia) traduzida em atitudes e comportamentos respectivos de (meditar, reflectir, imaginar, decidir, avaliar, concluir, e outros). O desenvolvimento das competências do pensar consiste essencialmente na ajuda prestada aos alunos para que estes se apropriem dos mecanismos potenciadores de comportamentos afins, sistemáticos e eficazes. Não se trata, portanto, de ensinar a '…pensar num sentido absoluto, mas a pensar de uma forma mais crítica, mais coerente, mais criativa, mais aprofundada do que, muitas vezes, e talvez tipicamente, fazemos' (Nickerson et al., 1987: 28). Neste sentido, deverá igualmente ser prestada uma 'atenção explícita a esse objectivo caso, os alunos careçam de competências de pensar ou estratégias que se revelem adequadas à resolução das tarefas intelectuais dentro e fora da sala de aula (ibid). Mas, embora a literatura existente sobre esta temática nos ofereça uma diversidade de teorias, modelos e programas para ensinar a pensar, a falta de consenso acerca de uma definição operacional de pensamento crítico e inteligência é demasiado real. Por outro lado, para enfrentar o desafio que é levar os nossos alunos a pensar ou a desenvolver as competências respectivas, estão implicados inúmeros aspectos. Observamos os seguintes:

� acreditar que as competências intelectuais podem ser desenvolvidas; � que a promoção do desenvolvimento deve ser iniciada o mais cedo possível; � que deve atingir todos os alunos e não apenas os mais capazes ou os melhores alunos; � que o pensar é essencial a todas as disciplinas e cursos, e por isso, o seu ensino deverá ser incluído

em todas as áreas de forma explícita; � evitar a assunção que o pensamento decorre automaticamente como subproduto de outras tarefas

intelectuais; � que a qualidade do pensamento dos alunos aumenta e que as interacções suscitadas na

aprendizagem cooperativa fomentam a elevação dessa mesma qualidade de pensamento;

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CAPÍTULO 2 121

� não só os métodos quantitativos mas, em iguais circunstâncias, os métodos qualitativos devem ser utilizados para uma avaliação mais conseguida das competências cognitivas e metacognitivas.

Neste sentido, para Costa (1985: 288) quando se ensinam indivíduos a pensar a ênfase deve ser colocada na obtenção do maior número de respostas correctas que estes podem dar e nas suas atitudes e comportamentos no caso destes não produzirem as respostas mais adequadas. Ou seja, 'estamos interessados em observar como é que os alunos produzem, e não tanto como reproduzem, o conhecimento. Uma característica crítica da capacidade intelectual é não só ter a informação mas saber como agir sobre ela'. O autor menciona também a necessidade e utilidade dos professores procurarem outros indicadores do crescimento intelectual, nomeadamente, o registo, tão actualizado quanto possível dos procedimentos e comportamentos estratégicos dos seus alunos. Por conseguinte, listam-se algumas das principais características observáveis nesses procedimentos e comportamentos, a seguir:

• a preserverança perante as dificuldades na execução das tarefas cognitivas, a utilização (ou não) de abordagens sistémicas de análise dos problemas e o recurso a estratégias alternativas para a sua resolução;

• o pensamento flexível e criativo que é o aceitar, por exemplo, desafios e procurar descobrir novas respostas para os problemas;

• a metacognição, a qual dá uma medida da consciencialização dos alunos respectivamente aos seus próprios processos de pensamento;

• a revisão cuidadosa do trabalho completado;

• a precisão da linguagem, reconhecível pela utilização de analogias, de palavras descritivas na distinção de atributos, conceitos, etc.

• a transferência do comportamento intelectual promovido para além da situação original de aprendizagem.

Com efeito, a literatura investigacional acerca das competências de pensar parece destacar apenas duas problemáticas, embora, com ênfases diferentes e com a qualidade de reunir em seu torno alguma controvérsia. A primeira destas problemáticas, conduziu alguns teóricos à interrogação sobre a existência de competências ou de processos cognitivos gerais. Enquanto, a segunda, surge mais relacionada com o ambiente (circunstâncias) favoráveis ao desenvolvimento destas mesmas competências no âmbito dos conteúdos curriculares, competências de estudo, motivação, etc. Também relacionado com esta última questão, fomos levados a crer por algumas das leituras efectuadas, que a maioria dos autores dos programas disponíveis tende a defender que as competências cognitivas gerais devem ser objecto de ensino directo fora do currículo escolar e avançam como justificações, nomeadamente a disponibilidade destas competências e processos para a transferência a outras situações ser notável e o facto de, tanto os professores como os alunos, poderem considerar a combinação da aprendizagem dos conteúdos com os

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processos de realização, gestão e auto-regulação dos processos gerais de pensar e cuja aquisição prática constitui o objectivo fundamental desses programas (Glaser, 1985). Outros autores (a minoria) defendem a integração do desenvolvimento destas competências na prática do ensino das disciplinas curriculares, paralelamente à aquisição dos conteúdos das próprias disciplinas. Os seus fundamentos parecem assentar, fundamentalmente em:

• o acto de pensar está intimamente ligado aos campos específicos do conhecimento ao qual é essencial. Além disso, não pode ser ensinado ou apreendido numa separação total de qualquer corpo de conteúdos;

• sempre que confrontados com uma nova situação tentamos interpretá-la em função daquilo que já conhecemos. Deste modo, parece mais acertado desenvolver competências gerais de pensamento em contextos específicos ou mais familiares a quem aprende.

• estudos recentes, na área da resolução de problemas, têm demonstrado a existência de interacções fortes das estruturas do conhecimento e dos processos cognitivos e metacognitivos (Glaser, 1985).

De facto, é possível encontrar alguns estudos empíricos principalmente relacionados com os aspectos da escrita, leitura e compreensão de textos, ou com a atenção e memória e outros com a resolução de problemas (Chipman et al, 1985; Richardson et al., 1987; Baron & Sternberg, 1987; Jones et al, 1987; Weinstein et al., 1988; Almeida e Morais, 1988; Upcraft & Gardner, 1989; Valente, 1991; Ramsdem, 1992; Tinto, 1993; Gibbs, 1995, 1996; Marton et al., 1997;etc). Sobressai igualmente, nas várias investigações, o facto de ser preciso diversificar os meios de avaliar os progressos dos alunos. O conceito de professor como mediador da aprendizagem dos alunos (no sentido de Fuerstein) veio contribuir para uma incidência no ensino interactivo, com muito diálogo entre aluno e professor. A noção de autonomia ocupa também um lugar central, justificando que todo o professor deva ter como objectivo principal, a promoção da autonomia intelectual do aluno. Assim, um aluno que tenda para a autonomia intelectual (tendo em conta que não se trata de um estado mas sim um processo) deverá ser capaz de construir os conhecimentos sobre o seu próprio funcionamento intelectual e este relativamente aos outros, as funções metacognitivas eficazes tal como a capacidade para gerir os próprios erros e a construção de um repertório alargado de estratégias. Por conseguinte, os mecanismos e processos metacognitivos são essenciais para permitir a aquisição e activação de elementos no desenvolvimento das funções de 'controlo' e de 'auto-avaliação' das próprias performances e das estratégias que são utilizadas pelo sujeito, nas tarefas e situações. Como sublinha Baird & White (1982, referidos por Martin & Doudin,1998: 29) é 'activando a capacidade de compreensão no sujeito para auto-avaliar as suas próprias competências e estratégias de aprendizagem que se reforçam as suas capacidades gerais para aprender'.

McCombs (1988: 150) menciona que, nesta função de auto-controlo, é crítico o desenvolvimento das competências metacognitivas apropriadas para planear, monitorar, auto-regular e avaliar as actividades

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de aprendizagem. É possível argumentar que as competências metacognitivas fornecem a estrutura básica para o desenvolvimento de um auto-controlo positivo. Estas competências são por definição envolvidas no conhecimento (ou consciência de) e controlo (auto-regulação) das cognições e emoções. McCombs refere igualmente evidências que apontam para que as actividades metacognitivas contribuem para o desenvolvimento de competências auto-reguladoras e de auto-gestão, bem como um sentido de autonomia pessoal. O auto-controlo, por exemplo, é suposto contribuir não apenas na melhoria da aquisição, mas, sobretudo na melhoria da generalização e transferência de conhecimentos e competências. Estas actividades metacognitivas para auto-regular e supervisionar as aprendizagens, já antes definidas por Brown et al (1984), incluem estratégias de planeamento (previsão de resultados, inventariar tempos/ recursos), controlo (teste, revisão, re-organização) e avaliação de resultados. É suposto que a auto-consciência seja o principal suporte da auto-regulação, a qual pode ser acompanhada pelo treino sistemático e desenvolvimento das estratégias adequadas aos processos de auto-avaliação, auto-controlo e auto-questionamento. Através deste treino, os indivíduos podem ser ensinados e ajudados a reconhecer quais as actividades de estudo ou aprendizagem que são mais apropriadas, quais são as suas características individuais e limitações, qual a natureza dos materiais a serem aprendidos e, quais são as tarefas críticas na aprendizagem (Brown et al, 1981 referidos por McCombs, 1988: 150). Entretanto, perante diferentes funções metacognitivas, o sujeito constrói igualmente um repertório de diferentes estratégias para a resolução dos problemas. Segundo Schneider (1986, referido por Doudin, 1997) existe um consenso na corrente metacognitiva para considerar que determinadas estratégias, como por exemplo, a memorização, evoluem com a idade. Então, o enriquecimento do repertório das estratégias ao longo do processo de desenvolvimento do sujeito, permitirá uma grande flexibilidade na utilização das estratégias em função dos problemas a resolver. Assim, não somente o sujeito repara mais facilmente os seus erros, como as suas estratégias de correcção tornam-se sucessivamente eficazes, já que vai tomando cada vez mais conta dos múltiplos elementos e relações entre elementos que compõem o problema (Wilkinson, 1982, referido por Doudin, 1997: 15). Ainda a propósito, Meichenbaum (1987) ressalva que muitas competências e estratégias não se transferem, às vezes nem para tarefas semelhantes. Em geral, quanto mais específicas, menos transferíveis. Por outro lado, quanto mais geral é a estratégia menos utilidade parece ter. Ao ensinar os alunos a usar qualquer competência é importante ensiná-los a como transferir essa competência ou estratégia, para outras tarefas. E sublinha Meichenbaum, que há uma necessidade de instrução explícita em competências particulares, e, em alguns casos, inclusivamente subcompetências. Por sua vez Jones et al (1987: 16) defendem que há algum acordo quanto ao aluno aprender melhor quando o desenvolvimento de competências deixa de ser dirigido pelo professor, com uma forte ênfase em modelar e guiar a prática para ser um desenvolvimento dirigido pelo aluno, envolvendo aprendizagem

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independente. Neste sentido, aqueles que sabem gerir e auto-regular as suas aprendizagens são muito mais eficazes que os que não sabem. Por exemplo, estudantes preparados para pensar acerca do seu próprio conhecimento e a auto-questionar como é que este se adapta às suas reais necessidades de momento (as aprendizagens) parecem compreender melhor do que aqueles estudantes que não foram encorajados a fazer essa reflexão sobre a sua própria aprendizagem. Neste sentido, Paris et al (1988) sublinham a necessidade de auxiliar os alunos a compreenderem as suas próprias funções cognitivas e as formas como estas podem ser combinadas e organizadas para resolver problemas. De acordo com estes autores, tal ensinamento fornece o metaconhecimento e as estratégias necessárias para auto-gerir e auto-controlar os problemas de estudo e aprendizagem, ajudando os alunos a reconhecer que existe de facto um problema e a exigir, para a sua resolução, as competências necessárias que podem ser aprendidas. Aliás, pode mesmo promover-se a motivação para procurar e encontrar essa solução. Aliás, Nisbet & Shucksmith (1987) defendem que há uma séria vantagem na introdução destes ensinamentos de estratégias metacognitivas a partir da escola primária. Assentam estes pressupostos em pesquisas e intervenções baseadas nos princípios metacognitivos que têm evidenciado níveis de sucesso na melhoria dos resultados de crianças em várias tarefas escolares. Com efeito, o ensino destas estratégias metacognitivas tem-se mostrado eficaz em situações educacionais, nomeadamente, para facilitar a atenção, a motivação, a utilização da memória e na compreensão. Também, na transferência e remediação de algumas dificuldades ou 'incapacidades de aprendizagem' (Wittrock, 1986). No entanto, existem algumas modificações que Nisbet & Schucksmith consideram fundamentais em qualquer tentativa de promoção das estratégias metacognitivas junto de estudantes, nomeadamente:

1. é necessário dar mais atenção aos aspectos de desenvolvimento, especialmente à compreensão dos factores que afectam a emergência da auto-regulação consciente do pensamento.

2. a percepção da natureza e do desenvolvimento da metacognição requer uma compreensão do modo como se faz a transição do pensamento regulado por outros para o pensamento auto-regulado.

3. os investigadores necessitam de dar atenção à interacção entre processos metacognitivos e outros aspectos da auto-avaliação. Pensam que o ensino da metacognição (treino metacognitivo) carece de importância nas interacções sociais. Ou seja, tratar os alunos como co-investigadores na intervenção e considerar que os alunos de idades e capacidades diferentes estão em fases diferentes de desenvolvimento metacognitivo.

Reynolds & Wade (1986), na sua revisão acerca da metacognição, consideram que sendo o desenvolvimento de estratégias de aprendizagem uma forma de resolução de problemas, então a metacognição não pode ser ensinada em programas de intervenção directa. Mais, sendo possível treinar atitudes, conceitos e comportamentos de estudo que combinados formem as estratégias de estudo e aprendizagem, ao invés, a capacidade de pensar estrategicamente é bastante mais complicada de

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desenvolver. Ou seja, exige competências para aprender a par de mecanismos executivos e de controlo, os quais, são gradualmente desenvolvidos e automatizados ao longo de um período de tempo razoável. Estes autores mencionam ainda a importância dada às implicações da pesquisa acerca das estratégias metacognitivas no ensino, sobretudo em intervenções de remediação e no contributo para a compreensão dos problemas escolares dos alunos em insucesso. Com efeito, algumas intervenções estão a integrar o ensino de técnicas de auto-controlo e auto-regulação em programas de ensino de competências básicas. Finalmente, esta pesquisa pode contribuir ainda para compreender como variáveis afectivo-relacionais influenciam o sucesso ou insucesso na aprendizagem. Tem igualmente permitido apontar uma característica importante de qualquer programa de treino metacognitivo eficaz, isto é, a capacidade de transferência das estratégias ensinadas que nem sempre é fácil de obter. Aqueles autores relatam um estudo de Gavelek & Raphael para ensinar os alunos a responder às suas próprias questões. Os resultados destas intervenções parecem afectados pelo tipo de estratégia, pelos mecanismos de feedback, pela idade dos sujeitos, pela compreensão que o aluno tem do valor da estratégia para o sucesso pretendido (Reynolds & Wade, 1986). Estes autores sugerem ainda duas orientações pertinentes no desenvolvimento de qualquer programa de instrução ou desenvolvimento das competências, a saber:

• tornar visíveis e observáveis os processos cognitivos, modelando a competência desejada (citam Flavell & Welman, 1977).

• explicitar os processos cognitivos e metacognitivos envolvidos na tarefa ou situação de aprendizagem. Um modelo interpretativo da aprendizagem motivada em situação de aula, designado de 'SRL: Self-

Regulated Learning por Corno & Mandinach, 1983 (revisto em Corno & Rohrkemper, 1985), atribuí um papel central aos julgamentos de auto-eficácia e aribuições de controlo pessoal como processos auto-reguladores da aprendizagem motivada. Outros processos, neste modelo, são a vigilância (alertness), a selectividade, a conexão, o planeamento e a monitorização. Ou seja, processos cognitivos, metacognitivos e afectivos intrinsicamente relacionados com os procedimentos ou acções (estratégias) do estudante enquanto está envolvido em qualquer situação de aprendizagem. Aliás, Corno & Mandinach defendem que a aprendizagem auto-regulada é a mais alta forma de envolvimento cognitivo, o que implica um uso activo e frequente de processos e estratégias adequadas. Por sua vez, as expectativas de desempenho e os julgamentos de auto-eficácia tendem a influenciar o planeamento e controlo das actividades e procedimentos tomados, assim como os desempenhos associados e as atribuições causais relativas aos resultados esperados. Com efeito, Corno & Mandinach argumentam que o exercício sistemático e continuado de actividades auto-reguladoras ajuda os alunos a aprender como aprender e a desenvolver as convenientes disposições e motivações académicas. Mas, é sabido que os estudantes frequentemente chegam às situações de aprendizagem com um leque limitado e pouco consistente de experiências, conhecimentos, competências e disposições, embora a quantidade e variedade de empreendimentos cognitivos e

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metacognitivos (vigilância, selectividade, conexão) seja determinada por essas mesmas 'atitudes' ou 'disposições' (Corno & Snow, 1986).

2. Motivações

Adoptamos, neste estudo, a perspectiva avançada por Schunck (1996: 284) no sentido de considerar que as motivações estão associadas ao processo de activação e sustentação dos comportamentos dirigidos para objectivos. Para Schunck, esta é uma concepção cognitivista porque postula que as pessoas fixam objectivos e envolvem-se nas tarefas cognitiva e metacognitivamente (e.g., monitorizar a progressão para os objectivos) e manifestam comportamentos (quantidade de esforço dispendido) para atingir ao máximo os objectivos e metas fixadas.

2.1. Abordagens teóricas da motivação na aprendizagem

Na sua revisão acerca da motivação, Schunck (1996) sumaria algumas importantes abordagens e perspectivas psicológicas históricas e recentes que foram objectivadas para a compreensão do papel da motivação no comportamento estratégico para alcançar os mais elevados índices de desempenho (achieving

motivation). Seguidamente, tentamos analisar alguns aspectos, desenvolvimentos e designações mais importantes, normalmente associadas a estas teorias da motivação, conforme a revisão de literatura efectuada por Schunck (1996).

• A teoria dos 'drives' ('drive theory'). Originada como perspectiva psicológica, eventualmente, ampliada para incluir necessidades psicológicas. O autor refere Woodworth (1918) que conceptualiza 'drives' como forças internas produzidas para manter o balanceamento homeostático do corpo. Quando um organismo se vê desprovido de um seu elemento essencial (exemplo: alimentação, ar) é activado uma 'drive' que leva o organismo a responder a essa carência. Hull (1943) ampliou este conceito de 'drive' defendendo que as deficiências psicológicas são inicialmente carências que instigam 'drives' a reduzi-las à forma de comportamentos, ou seja: carência > drive > Comportamento. Neste quadro, Hull (1943, citado por Schunck,1996: 285) define motivação como a 'initiation of learned, or habitual, patterns of

movement behavior'. A aprendizagem representa a adaptação do organismo ao ambiente para garantir sobrevivência.

• A teoria do condicionamento ('conditioning theory'). Explora a motivação em termos de respostas dadas aos estímulos (classical conditioning) ou emitidas na presença dos estímulos (operant conditioning).

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• A teoria da consistência cognitiva ('cognitive consistency theory'). Assume que a motivação resulta de interacções entre cognições e comportamentos, segundo uma perspectiva homeostática quando tensões ocorrem entre elementos há uma necessidade para resolver as situações conjugando cognições e comportamentos consistentes entre si. São salientadas duas perspectivas na teoria da consistência cognitiva, nomeadamente a teoria do balanço ('balance theory') que postula existir uma tendência básica para balancear cognitivamente as relações entre pessoas, contextos e acontecimentos e, a teoria da dissonância cognitiva ('cognitive dissonance') cujo principal representante é Festinger (1957) que defende tenderem os indivíduos a manter relações consistentes entre crenças, atitudes, opiniões e comportamentos. Estas relações podem ser consonantes, irrelevantes ou dissonantes.

• a teoria humanística ('humanistic theory'). Shunck (1996: 289) refere Maslow (1968 e 1970) que visualizando os comportamentos segundo um ponto de vista holístico, defende uma hierarquia de necessidades progressivas [ fisiológicas > segurança > objectos pessoais > estima > auto-actualização ] em toda a actividade humana. As acções de cada um são unificadas para serem directamente orientadas para atingir determinados objectivos ou metas, enquanto os comportamentos, de cada, um podem servir várias funções em simultâneo. Neste contexto, para Rogers (1969) a significação (meaningful) e a experiência da aprendizagem é relevante para o 'todo' da pessoa, traz envolvimento pessoal (envolve cognições e sentimentos), é pervasiva (afecta as atitudes, comportamentos e personalidade dos sujeitos) e, é julgada pelo sujeito de acordo com o modo como lida com os objectivos ou são encaradas as suas necessidades. Sintetizando, Rogers acredita que todas as pessoas tem um potencial para aprender e estão naturalmente predispostos (motivados) para aprender.

• a motivação estratégica para os desempenhos ('achieving motivation'). Relaciona-se com a forma de executar tarefas difíceis com vista a alcançar o melhor ou o máximo de resultados. Murray (1938, referido por Schunck, 1996: 292) identificou o motivo para o desempenho entre outras necessidades fisiológicas e psicológicas que contribuem para o desenvolvimento da personalidade. Neste sentido, motivação para agir presume-se por causa do desejo de satisfação de necessidades. Atkinson (1957-1978, referido por Schunck, 1996, ibid) na sua teoria da expectativa-valor ('expectancy-value') postula que os comportamentos dependem do quanto os indivíduos valorizam um determinado desempenho (objectivo, reforço, etc.) e a sua expectativa para alcançar o desempenho como resultado desse mesmo comportamento. Esta necessidade de alcançar bons desempenhos é um motivo genérico que conduz os indivíduos a desenvolver o seu máximo em contextos em que isso é valorizado (por exemplo, no contexto académico ou profissional). Por outro lado, os comportamentos associados a esta perspectiva tendem a representar, frequentemente, conflitos entre a esperança pelo sucesso ('hope for

success') e o medo do fracasso ('fear for failure') ou ainda, mais raramente, o medo do sucesso ('fear of

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success', segundo Horner, 1978; Hoffman, 1974; Zuckerman & Wheeler, 1975, e outros, sugeridos por Schunck, 1996).

• a teoria do auto-valor ('self-worth theory'). Esta teoria refina a ideia de Atkinson de que o comportamento estratégico para os desempenhos é o resultado de conflitos emocionais entre esperança pelo sucesso e o medo de falhar, combinando este aspecto emocional com factores cognitivos (a este propósito ver Covington, 1983, 1992, Covington & Beery, 1976 sugeridos por Schunck, 1996: 299). A teoria-valor faz sobressair as percepções de competência como influência fundamental na motivação. Investigações tem mostrado que competência percebida provoca uma forte relação positiva com as expectativas de sucesso nos alunos, motivação e desempenhos (Eccles & Wigfield, 1985).

• a teoria atribucional ('attribution theory'). As 'atribuições' são causas percepcionadas de resultados. A teoria das atribuições explora como as pessoas vêem as causas dos seus comportamentos e dos outros (Weiner, 1984, 1992). Segundo esta teoria as pessoas procuram informações para formar causas. O processo de atribuição causal é, presumivelmente, governado por regras e na forma como estas regras são usadas e influenciam as crenças, emoções e comportamentos. A sua origem é geralmente atribuída a Heider (1958, referido por Schunck: 303) na sua análise naïve da acção, na qual 'naïve' quer dizer que o desempenho individual é desconhecido nos objectivos determinantes do comportamento. Heider acredita que as pessoas atribuem causas a factores internos (effective personal

force) e externos (affective environmental force). Causas internas são próprias do indivíduo, tais como necessidades, desejos, emoções, capacidades, intenções e esforços. A força pessoal (personal force) está colocada nos factores poder e motivação. Em conjunto, 'poder' e 'contexto' constituem o 'can

factor' que combinado como o 'try factor' são usados para explorar os resultados. Rotter (1966 referido por Barros-Oliveira, 1992), por sua vez, conceptualiza o locus de controle como uma expectativa generalizada que diz respeito às respostas que influenciam os resultados (sucesso, recompensas, etc.), embora, dependente da situação. Ou ainda, como a crença que as pessoas têm de que os resultados ocorrem independentemente daquilo em que acreditam (locus externo) ou que os resultados são contigentes como os seus comportamentos (locus interno). Os estudantes que acreditam controlar os seus sucessos e fracassos deverão estar mais susceptíveis para se envolverem nas tarefas académicas, dispender esforços e persistir relativamente a aqueles estudantes que acreditam ter os seus comportamentos pouco impacto nos resultados.

• a teoria sócio-cognitiva ('social cognitive theory'). Objectivos e expectativas são dois importantes mecanismos de aprendizagem. Bandura (1986, 1991, referido por Schunck, 1996: 310) vê a motivação como um comportamento dirigido para objectivos, activada e sustentada pelas expectativas das pessoas no que concerne á antecipação dos resultados das suas acções e da sua auto-eficácia para

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executar essas acções. Fixação de metas e objectivos e auto-avaliação dos progressos constituem importantes mecanismos motivacionais, segundo Bandura. A comparação social é o processso de comparação entre nós próprios e os outros. Por exemplo, segundo Festinger (1954) as pessoas avaliam as suas capacidades e opiniões através de comparações com outros, os quais quanto mais similares forem maior é a probabilidade de acções similares serem socialmente apropriadas e produzirem resultados comparáveis.

• a teoria das 'metas' ou objectivos ('goal theory'). Desenvolvida, essencialmente, por investigadores educacionais e psicólogos desenvolvimentistas como propósito de explorar e predizer comportamentos determinados, especialmente ao nível da escolaridade, representa uma nova concepção da motivação humana, uma vez que incorpora várias hipóteses importantes de outras teorias (gestão, psicologia social, clinica, etc.). Postula esta perspectiva que existem importantes relações entre objectivos, expectativas, atribuições, sistemas conceptuais, orientações motivacionais, auto e hetero comparações e comportamentos determinados (ver, por exemplo, Ames, 1992). Com efeito, o construto central desta teoria é orientação para um objectivo ou meta (goal orientation), a qual se refere ao propósito e ênfase do envolvimento pessoal nas actividades para alcançar resultados determinados. Quanto ao tipo de metas, uma distinção pode ser feita entre metas de aprendizagem (learning goals) e metas de desempenho (performance goals) (Dweck, 1991, Dweck e outros, Shunck e outros, 1993). Uma meta de aprendizagem relaciona-se com quais os conhecimentos, comportamentos, competência ou estratégia os sujeitos adquirem. Uma meta de desempenho denota que tarefa se pretende que o aluno seja capaz de executar. Alguns investigadores (Dweck, 1991, Dweck & Leggett, 1988, Tardif, 1997) sugerem que orientação para objectivos está intimamente ligada aos sistemas conceptuais relativos à natureza da inteligência e ao seu carácter mais ou menos estável e adquirido. A teoria da estabilidade (entity theory) salienta que a inteligência é relativamente estável, inata e imutável com o tempo ou condições. A teoria incremental (incremental theory) equaciona a inteligência com a aprendizagem e treino, conduzindo à crença, nos alunos, que a inteligência pode ser mudada e incrementada (treinada) com a experiência, esforço e aprendizagem.

• a teoria do controlo percebido e desânimo adquirido (learned helplessness). Shunck (1996: 323) sugere Skinner et al (1990) quando estes distinguem essencialmente três tipos de crenças que contribuem para o controlo percebido:

i) estratégicas (strategic beliefs). São expectativas acerca dos factores que podem influenciar o sucesso (capacidade, esforço, sorte, desconhecido, etc.);

ii) capacidades (capacity beliefs). Relacionam-se com as características pessoais que dizem respeito às capacidades, habilidades, esforço, outros;

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iii) controlo (control beliefs). São expectativas acerca das hipóteses de realizar com sucesso a partir de condições de referência (e.g., eu posso ter uma boa classificação se fizer por isso).

Com efeito, as investigações de Skinner e outros mostraram que estas crenças têm influencia nos desempenhos académicos através da promoção ou (des)promoção dos envolvimentos activos na aprendizagem e que os professores contribuem para estas percepções de controlo, nos seus alunos, fornecendo contingências (consistentes e claras linhas orientadoras e feedbacks) e envolvimento (mostrando interesse e dedicação relativamente aos recursos dos alunos). O desânimo adquirido refere-se a um estado psicológico que envolve perturbação na motivação, processos cognitivos e emoções relativamente a experiências anteriores desagradáveis ou incontroláveis (Maier & Seligman, 1976; Seligman,1975, referidos por Schunck, 1996: 323). O desânimo adquirido resulta da percepção da independência entre respostas e resultados. Uma manifestação do desânimo é a passividade, as pessoas podem optar por não fazer absolutamente nada quando crêem que não ser capazes de controlar a situação. A passividade não depende dos desempenhos, isto é, as recompensas (ou punições) não controladas produzem abandono (ou indolência). O desânimo adquirido retarda a aprendizagem. Este modelo tem vindo a ser reformulado de modo a incorporar a perspectiva atribucional (Abramson, Seligman & Teasdale, 1978 referidos por Schunck), a qual, postula que a exploração pessoal das atribuições dimensionais (estável/ instável, global/ específico, internas/ externas) dos resultados influencia directamente futuras expectativas de resultados e respectivas reacções.

• a teoria do auto-conceito ('self-concept'). Refere-se essencialmente às nossas auto-percepções, formadas através das experiências vividas, as interpretações que fazemos, o meio ambiente e fortemente influenciadas pelos reforços e avaliações realizadas por outras pessoas. O auto-conceito é um construto multidimensional e compreende elementos tais como: auto-confiança, auto-estima, conceito estável e auto-cristalização (Rosenberg & Kaplan, 1982 referidos por Schunck). A auto-confiança apresenta a medida pela qual cada um acredita que pode produzir resultados, alcançar objectivos ou executar as tarefas de modo competente (similar à auto-eficácia). Por sua vez, a crença na competência própria para executar uma tarefa conduz á auto-estima. A estabilidade do auto-conceito refere-se à facilidade ou dificuldade de mudar o auto-conceito. Esta estabilidade depende, em parte, o quanto cristalizado ou estruturado está o auto-conceito. As crenças cristalizam-se através da repetição de experiências similares. Com efeito, evidências indicam que o auto-conceito não é pacificamente formado, ao invés, é uma estrtura dinâmica que mediatiza os processsos pessoais e interpessoais significantes (a este propósito ver Cantor & Kihlstrom, 1987; Markus e outros, 1986 e1987, sugeridos por Schunck, 1996).

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• a teoria da motivação intrínseca/ extrínseca ('intrinsic/ extrinsic motivation'). O desejo de controlar o nosso próprio contexto pode ser classificado em competência, effectance motivation (White, 1959), mastery motivation (Harter, 1978 referida por Schunck, 1996: 330) e motivação intrínseca (intrinsic

motivation). Acerca deste último aspecto, Deci e outros (1978-1991) postularam que a motivação intrínseca é uma necessidade humana inata que origina, nos sujeitos, como que uma indiferenciada necessidade de competência e auto-determinação. À medida em que os sujeitos se desenvolvem, as necessidades diferenciam-se por áreas específicas (por exemplo: atléticas, académicas, profissionais) e as interacções com o ambiente influenciam a direcção da diferenciação. Deste modo, a motivação é conceptualizada como um continuum, cujos extremos representam as motivações intrínseca e extrínseca. Neste eixo, os comportamentos medianos que originalmente eram extrínsecamente motivados e que entretanto foram internalizados são agora auto-determinados. Entretanto, Lepper e Hodell (1989) acreditam que há quatro fontes de motivação íntrínseca que são o 'desafio', a 'curiosidade', o 'controlo' e a 'imaginação'. Quando as pessoas estão intrinsecamente motivadas tendem a envolver-se na actividade como um fim em si mesmo. Csikszentmiahalyi (1975) e Csikszentmihalyi & Rathunde (1993), referidos por Schunck (1996), estudaram pessoas que se envolviam intrinsecamente motivados nas actividades e descobriram com as suas experiências que os indivíduos que reflectiam total envolvimento pareciam 'fluir' (flow) com as actividades. Com efeito, 'flow' é um processo pessoal e reflecte a motivação emergente resultante da descoberta de novos objectivos e recompensas como consequência da interacção com o contexto. Em contraste, a motivação extrínseca envolve participação numa actividade por razões externas á tarefa. Esta actividade significa um determinado fim em si, ou seja, um objecto, uma graduação académica, um feedback, uma aprovação familiar ou social, ou apenas uma capacitação para participar numa actividade.

2.2. Metas e objectivos motivacionais

Psicólogos e educadores estudaram e exploraram respostas a questões como saber, quais as metas e objectivos que perseguem os alunos? de que modo estas metas e objectivos influenciam os seus comportamentos e motivações? ou, quais as variáveis contextuais que estão presentes nestas influências?. Neste sentido, muitos são os autores que se têm preocupado com a identificação, classificação e descrição das metas que os alunos perseguem e que determinam o seu modo de enfrentar as actividades escolares (Ames & Ames, 1984; Nicholls, 1984: Meece,1994; Deci, 1975; Dweck & Elliot, 1983, Dweck & Leggett, 1988; Tardif, 1997; etc.). As metas e os objectivos motivacionais parecem estar relacionados com o propósito de determinados comportamentos e procedimentos estratégicos. Estas acções têm a ver sobretudo com a meta

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da competência ou com as percepções de competência (Nicholls, 1984: 328). Metas para alcançar determinados resultados (achieving goals) podem ser definidas pelo tipo de antecipação desse mesmo resultado, ou seja, o resultado desejado guia o comportamento individual que envolve incremento ou demonstração de competência (Meece, 1994: 26). Consistente com outros modelos cognitivos mediadores da motivação (expectativa-valor, auto-eficácia, atribuições) esta abordagem teórica das metas para os desempenhos estratégicos enfatiza o papel activo do indivíduo na escolha, estruturação e interpretação das suas próprias experiências em alcançar resultados. De acordo com Dweck & Leggett (1988: 256) o alcance das metas individuais perseguidas 'cria o enquadramento através do qual estes interpretam e reagem aos acontecimentos'. Em Tapia & Garcia-Celay (1995: 184), encontramos as metas perseguidas pelos estudantes agrupadas em quatro categorias distintas, a saber:

• metas relacionadas com as tarefas (ou metas de aprendizagem). Este tipo de metas pode ser subdividido em: i) metas associadas ao suposto de que o sujeito aprende algo de novo (novos conhecimentos, melhorar destrezas, activar competências) quando se produz uma resposta emocional ligada á auto-percepção da competência, isto é, ao desejo de incrementar e desenvolver as competências próprias; ii) metas ligadas à vontade e desejo de executar determinada tarefa, ou seja, a experiência emocional que se produz da percepção mais ou menos consciente do facto a realizar é gratificante quando este é desejado, ao invés é aversiva quando se realiza a tarefa por obrigação; iii) metas correspondentes à absorção pela natureza da tarefa4, por superação do aborrecimento, tédio ou ansiedade relativamente a esta, ou pelo que a tarefa tenha de novidade e revelação sobre algum aspecto da realidade ou em si mesma.

• metas relacionadas com o 'ego'. Associadas à execução segundo níveis de qualidade pré-estabelecidos ou em referência a padrões (sociais, científicos, académicos, etc) determinados. Esta situação faz com que os sujeitos procurem um de dois tipos de metas: i) em situações de competetividade, tentar alcançar o máximo de êxito, procurando ter mais

sucesso que os outros, ou pelo menos, não ter menos sucesso que os demais; ii) evitar submeter-se á humilhação ou vergonha que acompanha normalmente o fracasso e

que, frequentemente, equivale à desistência ou abandono da situação ou tarefa;

• metas relacionadas com a valorização social. Não sendo metas necessariamente consideradas causa-efeito da aprendizagem ou dos desempenhos académicos são, no entanto, muito importantes uma vez que se relacionam com a experiência emocional que deriva da resposta social à actuação individual. Na realidade, a consecução destas metas pode ser um instrumento importante da motivação para conseguir objectivos académicos. Incluem-se nesta categoria as metas específicas

4 Este tipo de tarefa foi identificada por Csikszentmihalyi (1975) como a chave do que designa de actividades 'autotélicas', isto é, actividades cujo fim termina em si mesmo.

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relacionadas com a aprovação familiar, professores ou outros sujeitos importantes e a rejeição da correspondente experiência inversa da reprovação e com a aprovação dos pares, evitando a situação inversa da sua reprovação;

• metas relacionadas com recompensas externas. Este tipo de metas, como por exemplo, querer obter um curso superior ou, ganhar muito dinheiro ou, conseguir um bom emprego, etc, embora não necessariamente implicados na aprendizagem e nos desempenhos académicos, são no entanto um interessante instrumento para a sua promoção e desenvolvimento.

No que diz respeito às motivações dos indivíduos para alcançar determinadas metas (achieving

goals), Meece (1994: 26) defende que a ênfase das investigações da psicologia educacional acerca deste assunto tende a assentar basicamente em duas categorias de metas estratégicas. Por um lado, os indivíduos perseguem aquilo que é conhecido como orientação para a aprendizagem (learning-oriented, segundo Dweck & Elliot, 1983) ou orientação para a tarefa (task-oriented, segundo Nicholls, 1984). Procuram, deste modo, aumentar os seus níveis de competência ou de compreensão. Neste sentido, a aprendizagem é vista como um fim em si mesmo. Sentimentos subjectivos de êxito, sucesso e determinação derivam do alcance do sentido de mestria ou do desenvolvimento das próprias competências, baseado em normas auto-referênciadas. Em contraste, os indivíduos perseguem orientações para os desempenhos (performance-

oriented) (e.g., Dweck & Elliot, 1983 ou Dweck & Legget, 1988) ou orientação para si mesmo (ego-oriented) (Nicholls, 1984) procurando, assim, demonstrar altos níveis de competência ou conseguir avaliações externas favoráveis das suas próprias capacidades relativamente aos esforços e desempenhos dos outros. Estes indivíduos, geralmente usam referências normalizadas para julgar a adequação das seus próprios desempenhos. O sentido para a consecução dos objectivos deriva das normas do 'fazer o melhor com o mínimo de esforço' ou, o de 'fazer melhor que os outros' ou até, o procurar conhecer outra qualquer regra normalizada que conduza ao sucesso.

É possível verificar algumas consequências da representação destas metas sobre a qualidade das atitudes e realizações que o aluno define a si próprio como critério de sucesso e que evidenciam implicações nas escolhas das opções estratégicas adequadas á realização das tarefas escolares (Ames & Ames, 1984; Ames & Archer, 1988; Greene & Miller, 1996; Tardif, 1997, entre outros). Em alguns estudos observa-se que, quando o sujeito está convencido que o contexto escolar privilegia as metas da aprendizagem, então tende a desenvolver efeitos positivos dos seus sucessos, dos seus conhecimentos e dos seus erros e falhas anteriores. Ou seja, o estudante 'ne se trouve jamais dans une situation où il est soit un gagnant, soit un

perdant. Il effectue la comparaison exclusivement par rapport à lui-même, par rapport à ce quíl savait avant et

ce quíl sait maintenant, par rapport aux connaissances quíl maîtrisait avant et celles quíl maîtrise maintenant' (Tardif, 1997: 101).

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Mas, no caso das metas apontarem para o produto (resultados), então o nível de sucesso que o estudante fixa a si próprio é exclusivamente normativo e, neste caso faz algum sentido falar-se em alunos ganhadores (os que se integram e adaptam à norma ou às regras vigentes) e em alunos perdedores (os outros). Neste quadro, parece igualmente possível situar o modelo da motivação e emoção de Weiner (referido por Barros-Oliveira, 1992: 43) quando considera que a sequência motivacional se inicia com um resultado que o indivíduo interpreta como positivo ou negativo. Esta representação do resultado é acompanhada de emoções (satisfação, alegria, frustação e tristeza) seguida de uma exploração das causas (atribuição causal) para determinar porque é que este resultado surgiu.

Segundo Dweck (1989, referido por Tardif, 1997: 103), os sujeitos que reconhecem á instituição de formação apenas objectivos de avaliação dos desempenhos tendem a adoptar um comportamento estratégico defensivo. Consequentemente, tendem a privilegiar a escolha das actividades mais fáceis ou de menor investimento ou até aquelas em que exista uma maior probabilidade de sucesso, em detrimento de outras tarefas onde a aquisição de conhecimentos possa ser mais significativa. Na realidade, os indivíduos orientados para as metas de desempenho estão mais preocupados com o nível e as avaliações (classificações) das suas capacidades do que qualquer outra coisa e, defensivamente, questionam-se acerca das sua próprias competências para realizar determinada tarefa. Contrariamente, quando é sentido que as metas da formação estão orientadas para a aprendizagem, os sujeitos tendem então a auto-questionar acerca do quanto?, quando? e como? é que poderão adquirir ou desenvolver conhecimentos sobre este ou aquele assunto ou esta ou aquela competência para(...). Procurando, assim, activar e aumentar as suas próprias capacidades através da aquisição ou desenvolvimento de conhecimentos e competências essenciais.

Por outro lado, o grau de participação pelo indivíduo na realização de uma tarefa parece depender do julgamento favorável das suas próprias competências. Tardif (1997: 105) vai ao ponto de afirmar que, esta participação é 'negociada' pelo aluno a partir das ameaças eventuais que este juízo pode trazer para a sua autoestima e autoconceito. Refere inclusive, a aportação de Covington (1983) de que o aluno tem um sistema de defesas visando proteger a sua autoestima, a sua competência e seu valor pessoal, apresentando nesta perspectiva, a noção teórica de cognição motivada (motivated cognition) . Entretanto, no que concerne às consequências provocadas por estes sistemas de metas, é possível questionar como é que as diferentes metas se relacionam com as diferentes percepções de competência? e além disso, como é que estas metas modelam e influenciam a escolha das actividades e a utilização de estratégias na realização das tarefas, visando melhorar e optimizar os desempenhos escolares?

Meece et al. (1988), num estudo correlacional em situação de aula, chegou á conclusão que os alunos que perseguiam metas de aprendizagem estavam mais disponíveis para empreender estratégias em actividades auto-reguladoras, mormente aquelas que envolvem utilização de estratégias cognitivas,

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planeamento, controlo e procura de assistência. Também Nolen (1988), num estudo laboratorial acerca da compreensão de textos mostrou que os alunos que adoptam metas de aprendizagem valorizam mais e utilizam estratégias cognitivas que conduzem à compreensão do material de estudo do que os sujeitos que adoptam metas de desempenho. Paralelamente, Pintrich e colegas (Pintrich & DeGroot, 1990 e Pintrich & Garcia, 1991) demonstraram que os alunos do ensino secundário quando se apresentavam intrinsecamente orientados para metas de compreensão na aprendizagem estavam mais disponíveis para usar consistentemente estratégias de estudo, como por exemplo de planeamento, controlo da compreensão e na auto-regulação. Miller et al. (1993), estudando alunos do final do secundário, encontraram correlações significativas entre metas de aprendizagem e a utilização individual de estratégias auto-reguladoras, tais como, fixação de objectivos, auto-controlo e apropriação de estratégias cognitivas às exigências das tarefas, entre outras.

Num estudo descritivo, Boufard et al. (1995) indicavam que os alunos fortemente orientados para a aprendizagem utilizavam mais frequentemente estratégias cognitivas e metacognitivas e apresentavam melhores desempenhos académicos relativamente aos alunos menos orientados para esse objectivo. Consistente com estes resultados, Schraw et al. (1995) mostraram que os alunos com níveis elevados na orientação para metas de aprendizagem indicavam relativamente aos restantes, uma maior utilização de estratégias (integração, organização, memorização) e um maior conhecimento metacognitivo (o que para o autor significa, conhecimento acerca da cognição ou regulação da cognição), além de demonstrarem altos níveis de desempenho académico.

Mais recente, Greene & Miller (1996), observando jovens universitários, encontraram uma estreita relação entre objectivos de aprendizagem e o empreendimento cognitivo (nomeadamente, a auto-regulação e uma intensa utilização de estratégias de estudo). Também no mesmo sentido, Kong & Hau (1996) investigaram as relações entre objectivos de aprendizagem e abordagens do estudo e concluíram que as metas de aprendizagem estavam directamente relacionadas com uma 'deep approach', enquanto metas de desempenho se associavam a uma 'surface approach'. Estes autores concluiram, igualmente, que os alunos ao enfatizarem a auto-promoção tendiam a considerar-se a si próprios com superior capacidade de compreensão, enquanto os alunos que se sentiam meros executores apenas procuravam rotinas e memorizações, assentavam mais numa motivação extrínseca para aprender. Albaili (1998) examinando as relações entre metas de orientação e uso de estratégias cognitivas e desempenhos académicos em jovens universitários, chegou a resultados semelhantes. Estes mostram que os alunos com níveis mais elevados na escala de orientação para a aprendizagem faziam um maior uso de estratégias de elaboração e organização, em contraste com os alunos detentores de níveis mais elevados na escala de orientação para os desempenhos. Aliás, estes últimos faziam um maior uso de estratégias de revisão e algo menos relativamente às restantes estratégias (elaboração e organização).

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Em suma, todos estes estudos podem ser sintetizados nas conclusões avançadas por Elliot & Dweck (1988) quando sugerem os seguintes relações de causalidade:

• se realçado o valor das metas de desempenho e os sujeitos se auto-percepcionam com elevada capacidade então, estes, tendem a responder com um padrão de 'mestria' perante os obstáculos; não fornecem atribuições pelo fracasso e não expressam reacções afectivas ou emocionais negativas, persistindo na procura de soluções e estratégias ajustadas às situações e aproveitando a oportunidade para aumentar as suas próprias competências.

• se os sujeitos crêem ter baixa capacidade, então, tendem a responder com um padrão comportamental de 'desânimo' (inação, passividade, na linha defendida por Seligman, 1975) em face da diversidade; fornecem atribuições à sua falta de capacidade e manifestam reacções afectivas e emocionais negativas; assim como, desistem ou se demitem de procurar formas efectivas para superar os problemas;

• se salientado o valor dos objectivos de aprendizagem, então, as crenças (percepção) que os alunos têm acerca das suas competências mostram-se irrelevantes na determinação das suas atitudes e comportamentos. Ou seja, os alunos procuram aumentar as suas competências, independentemente da percepção alta ou baixa que tenham acerca destas (Barros-Oliveira, 1992: 141).

Igualmente, para Barros-Oliveira estes estudos tiveram a particularidade de demonstrar que as crenças relativas ao fracasso (sucesso) causado por factores fora do controlo do sujeito está associada a resultados mais fracos (fortes) após fracassos (sucessos) repetidos. Por seu lado, é de crer que o fracasso pode ser ultrapassado ou minimizado através do esforço dispendido pelo sujeito, associado a respostas mais construtivas e de maior persistência. Importa, pois, estar atento aos diferentes padrões de atribuição dos alunos para melhor compreensão dos seus desempenhos.

Resumindo, Barth (1987: 197) afirma que 'a tomada em conta dos processos cognitivos exigiu conhecimentos aprofundados sobre este assunto e uma planificação rigorosa a partir dos objectivos precisos. Isso contribuiu para o sucesso dos alunos que, por sua vez, modificaram a sua atitude, dando-lhes confiança e vontade de ter sucesso de novo. Através de um modelo cognitivo, pode-se agir sobre o afectivo; é uma forma de assegurar esta inter-relação necessária à aprendizagem'.

2.3. Atribuições causais

Weiner (1979 a 1994) desenvolveu, no seu campo de investigação, aspectos referentes às atribuições causais e demonstrou que a percepção que uma pessoa possui das causas da suas performances (mesmo se em certos momentos esta percepção poder não corresponder exactamente à

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CAPÍTULO 2 137

realidade) tem uma influência importante sobre as suas escolhas, seus interesses e seus comportamentos posteriores. Este autor reconhece que as causas do sucesso e do insucesso podem ser agrupadas segundo a dimensão do lugar da causa (locus), a dimensão da sua estabilidade e a dimensão da sua controlabilidade.

A perspectiva atribucional de Weiner (1984) baseia-se no pressuposto de que são as percepções pessoais dos sujeitos acerca das causas dos acontecimentos que guiam o seu comportamento. Segundo Faria (1998: 51), referindo Faria & Fontaine (1993) e Weiner (1984), esta perspectiva recusa o hedonismo como motor único e exclusivo da acção, isto é, o sujeito não age exclusivamente para obter prazer do sucesso e evitar a vergonha do fracasso, mas age em função da interpretação cognitiva das causas dos acontecimentos, sendo a procura causal mais frequente perante situações de fracasso, inesperadas ou atípicas. Barros-Oliveira (1992: 44) defende que a causa localizada pelo sujeito num determinado espaço dimensional e alcançada após uma decisão causal leva, o indivíduo, a experiênciar reacções (consequências) cognitivas (expectativas de sucesso) e afectivas (reacções afectivas dirigidas a si próprio ou aos outros) que 'vão, por fim, determinar e influenciar os comportamentos'. Quer significar que as reacções afectivas são geradas pelos resultados da realização (sucesso ou fracasso) e pelas dimensões causais bipolares, ou seja, 'locus de causalidade' (externo vs interno), 'estabilidade' (estável vs instável) e, 'controlabilidade' (controlável vs incontrolável) (Weiner,1984, 1992, 1994). Também as consequências cognitivas (expectativas de sucesso) 'afectam a qualidade da realização dos sujeitos, o tipo de tarefas que escolhem e o prosseguimento ou evitamento da acção perante obstáculos e dificuldades' (Faria, 1998: 52). Tipificando ao caso do jovem estudante universitário que acredita serem os seus fracos desempenhos a cálculo (exemplo genérico) provenientes do facto de não gostar de matemática ou por apresentar dificuldades de raciocínio, é possível que este venha a invocar causas sobre as quais não tem qualquer poder. Isto é, são essencialmente causas que percepciona como imutáveis ou inamovíveis. Na realidade, o acreditar que o gosto pela matemática e a capacidade de raciocínio não se adquire (ou se tem ou se não tem) parece justificar, segundo o aluno, a causalidade dos inevitáveis fracassos à disciplina de cálculo. Este jovem estudante tipificado, tende a estimar razões semelhantes para a falta de sucesso académico, levando-o a invocar causas internas, ou seja, factores que são interiores à pessoa (capacidades) e causas estáveis ou elementos que não são susceptíveis de modificar ou alterar. As causas estáveis são variáveis sobre as quais o jovem estudante não tem ou não exerce qualquer tipo de influência ou sobre as quais não tem qualquer poder. É sensivelmente o mesmo com as causas externas, as quais estão, na maioria das vezes, fora da zona de influência do aluno. Contrariamente, se um jovem universitário acredita que os seus desempenhos resultam, sobretudo do seu próprio esforço e persistência e ainda da utilização regular das estratégias que conhece e que aplica de modo rigoroso, então, tende a invocar causas sobre as quais sente exercer algum poder. De facto, o conhecimento de estratégias cognitivas e metacognitivas, assim como os esforços prestados são factores

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sobre os quais ele pode agir de forma contínua. As estratégias são aqui entendidas como factores evolutivos, isto significa, que variam e desenvolvem-se. Para fazer intervir as outras dimensões das atribuições causais, este jovem estudante, invoca para o sucesso e êxito dos seus resultados a correspondência às causas internas, incontestavelmente modificáveis (inteligência, esforço, motivação, atitudes, etc.). Um outro aspecto que importa sublinhar, prende-se com o facto de quando o sujeito estima os seus desempenhos, unicamente, a partir das tarefas propostas serem fáceis ou difíceis ou quando considera que os seus sucessos (ou insucessos) se devem ao acaso ou à sorte, então, tende a invocar causas sobre as quais não tem qualquer poder. Este nunca se sentirá, em caso algum, responsável pela facilidade ou dificuldade das actividades, na medida em que não pretende ter uma via de acesso pessoal e continuado acerca da sorte ou azar. Neste caso, tratam-se de causas externas e modificáveis. Também a sorte e o nível de dificuldade da tarefa são elementos exteriores ao aluno, e são variáveis em que o seu valor pode mudar de uma actividade para outra. Neste sentido, o lugar da causa (ou locus de causalidade) define as causas como internas ou externas ao sujeito e às quais se ligam os sentimentos de auto-estima, auto-confiança e percepção do valor pessoal (Faria, 1998: 51). A dimensão da estabilidade distingue as características fixas e invariáveis ao longo do tempo, como a capacidade e a dificuldade da tarefa das características variáveis (esforço, sorte). Está relacionada com a mudança de expectativas de sucesso gerando sentimentos de resignação, depressão e apatia quando estas são baixas e, sentimentos de optimismo, auto-confiança, excitação e activação do comportamento quando são altas. Com efeito, na óptica restrita dos processos de ensino e aprendizagem, importa ressalvar o facto de não parecer ser a causa invocada (externa/ interna ou estável/ modificável) a dimensão mais importante, mas antes o facto da causa invocada ser percepcionada como estando ou não dependente do poder do aluno. Efectivamente, a controlabilidade é uma dimensão fundamental nas atribuições causais, segundo a perspectiva da percepção da controlabilidade da tarefa. A percepção da controlabilidade da tarefa é o primeiro factor, os restantes derivam das características da causa apresentadas pelo aluno (Tardif, 1997: 127). Isto significa que não é porque uma causa seja interna ou externa que depende o poder exercido pelo aluno (por exemplo, o esforço é uma causa interna sobre o poder do aluno assim como o contexto académico é uma causa externa fora do seu poder). Por outro lado, não parece haver uma ligação directa entre a forma interna ou externa e a controlabilidade. Mas, também não são estes o tipo de relações que prosseguem relativamente à dimensão da estabilidade da causa. Toda a causa estável é por consequência não modificável; toda a causa não estável é modificável. Igual modo, na dimensão interna ou externa, há causas que são modificáveis mas que estão fora do poder do aluno (exemplo, as interacções do professor ou dos cenários pedagógicos utilizados constituem causas modificáveis que nem sempre estão no campo de acção e influência do aluno).

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CAPÍTULO 2 139

O lugar da causa (locus) faz a distinção, no sujeito, das causas internas (esforço, estratégias utilizadas, conhecimentos, atitudes; inteligência, etc.) das causas externas (assistência do professor, dificuldade da tarefa, sorte ou acaso, contexto académico, etc). A estabilidade da causa faz a distinção das causas aparentemente estáveis (inteligência, características pessoais, atitudes em geral) das causas modificáveis (estratégias de realização das tarefas, esforço, atenção, envolvimento e motivação). Já a controlabilidade da causa implica que o aluno poderá ou não manifestar comportamentos diferentes (ou não) quando assim o pretenda (Jonassen & Grabowski, 1993). Ou seja, ele comporta-se consoante a causa invocada estiver (ou não) sobre o seu poder e influência. É o caso, por exemplo, da utilização inapropriada de determinadas estratégias cognitivas se a causa responsável pelos desempenhos, no sujeito, estiver directamente condicionada pelas estratégias didactico-pedagógicas do professor (Tardif, 1997: 128). No mesmo sentido, Dweck (1989) recorda que sistematicamente as investigações indicam que a atribuição do insucesso à falta de habilidade ou inteligência (causas fora do poder pessoal) nos alunos, diminui as expectativas que estes têm de ter sucesso no futuro e provoca uma redução (amansamento) da persistência na realização das actividades e conduz os alunos a o desenvolvimento de comportamentos inadequados quando em presença das dificuldades. Esta autora sublinha ainda que, quando os alunos atribuem os seus fracassos à falta de esforço e à utilização de estratégias incorrectas (causas sobre o poder pessoal), estes parecem conservar intactas as suas expectativas de sucesso e tornam-se mais persistentes se obrigados à realização de actividades ou recorrem a estratégias operacionais em presença de fracassos ou dificuldades. Entretanto, Tardif (1997: 129) realça que a percepção da controlabilidade da tarefa é uma componente essencial na motivação escolar e académica. A motivação resulta, em grande parte desta percepção de controlabilidade. O aluno que tem uma representação ajustada das exigências necessárias á realização de uma tarefa correspondentes aos seus conhecimentos e às estratégias que pode utilizar, aperfeiçoar ou adaptar, percebe que é (co)responsável pela qualidade da execução dessa tarefa. Em caso contrário, o sucesso tal como o insucesso, não são percebidos como estando sobre o seu poder e responsabilidade. Questiona, então, porquê investir numa actividade onde o acaso joga um papel importante ou onde a influência dos seus conhecimentos e estratégias parece ser minimizada (ou ignorada)? Na realidade, as atitudes e os comportamentos emocionais são de extrema importância, na medida em que, as emoções específicas estão associadas às atribuições causais. Alguns autores ( e.g., Covington, 1987) estimam que as emoções associadas às atribuições causais (mais que as atribuições individualmente) são os principais motivos de envolvimento, participação e persistência na acção. Igualmente, Weiner (1984, 1992,1994) ligou as emoções ás atribuições causais segundo três fontes distintas numa situação estratégica específica, que destacamos a seguir:

• as emoções gerais estão fortemente manietadas pelos desempenhos. Exemplo, sentimentos agradáveis em resultado de sucessos, sentimentos desagradáveis em resultado dos fracassos;

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• as emoções específicas associadas com atribuições de desempenhos específicos. Exemplo, gratidão caso o sucesso seja devido a outros e satisfação quando devido ao próprio;

• as reacções afectivas de auto-estima, tais como, orgulho, vergonha e competência, estão ligadas com as dimensões internas de causalidade.

Este investigador sugere ainda que as emoções de satisfação, decepção, apreciação ou depreciação de si próprio, estão associadas ao lugar da causa. Por outro lado, as emoções de cólera, de culpabilidade, de regozijo ou pena estão ligadas à controlabilidade da causa. Exemplificando, quando a controlabilidade dos acontecimentos é atribuída a si próprio, os sentimentos gerados pelos eventos negativos (fracassos) são de culpa caso sejam controláveis ou, de vergonha caso sejam vistos como incontroláveis. Quando a controlabilidade é atribuída aos outros, os indivíduos tendem a gerar sentimentos de simpatia ou gratidão perante acontecimentos positivos ou sucessos e, de desânimo ou oposição perante acontecimentos negativos ou fracassos. Modo análogo, as emoções de confiança e de desespero estão associadas à estabilidade da causa (Faria,1998: 52). Com efeito, sublinhamos que certas emoções podem ter um efeito bastante destruidor no aluno. É o caso do desespero, da pena e depreciação de si mesmo e, em limite, a culpabilidade. Outras emoções são fontes estimulantes, como é o caso da satisfação, da confiança, da apreciação positiva de si mesmo, etc. Estas últimas emoções estimulantes trazem consequências positivas sobre a qualidade do envolvimento, participação e persistência no estudo e, de um modo geral, sobre todo o processo motivacional. Também as atribuições individuais parecem influenciar as variáveis motivacionais estratégicas, incluindo as expectativas dos alunos relativamente aos desempenhos futuros, escolha das actividades, processamento da informação, persistência nas tarefas e reacções afectivas. A figura seguinte, traduzida e adaptada de Tardif (1997: 131), resume e tenta ilustrar algumas das consequências da controlabilidade e incontrolabilidade da tarefa sobre as atribuições, a escolha de actividades, o grau de participação e tratamento da informação.

Controlabilidade Incontrolabilidade

Atribuição causal

Desempenhos resultantes de factores sobre o poder do aluno Desempenhos resultantes de factores variáveis

Desempenhos resultantes de factores fora do poder do aluno Desempenhos resultantes de factores estáveis

Escolha de actividades Selecção de actividades que apresentem desafios

Selecção de actividades que apresentem o mínimo de risco

Tratamento da informação Tratamento significativo (deep) das informações

Tratamento mecânico (surface) das informações

Grau de participação Participação maximal

Estratégias defensivas

Figura 2-V: consequências da percepção da (in)controlabilidade das tarefas

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CAPÍTULO 2 141

Consistente com as observações anteriores, Palmer & Goetz (1988: 49) argumentam que as escolhas das tarefas, nos sujeitos, são mediatizadas pelas suas percepções e atribuições. O nível de competência percebido influencia a selecção das tarefas de forma complexa. Perry & Penner (1990), nas suas investigações, chegaram á conclusão que fracos desempenhos académicos estão associados com baixos níveis de controlo percebido. Os alunos com uma orientação interna de controlo beneficiam mais das propriedades da instrução e treino do que os seus colegas com uma orientação externa. Nicholls (1984) argumenta que ambos, nível percebido e concepção da competência, influenciam directamente os comportamentos estratégicos individuais.

Na realidade, as evidências sugerem que estas variáveis afectam as decisões dos sujeitos acerca de quando e como usar as estratégias apropriadas. Dito de outro modo, os indivíduos que têm baixas expectativas quanto aos desempenhos futuros ou, que estão ansiosos e negativamente auto-críticos acerca das seus próprios desempenhos ou, que não se esforçam no estudo ou falham em persistir nesses esforços ou, ainda que tentam tarefas nas quais as estratégias de estudo que usam têm chances limitadas de sucesso, estão menos habilitados e disponíveis para usar as estratégias de estudo e aprendizagem mais apropriadas (Palmer & Goetz, 1988).

2.4. Sistemas de concepção e percepção escolar

Com efeito, para Tardif (1997: 108), as percepções e as concepções (ou representações) que o aluno tem das objectivações perseguidas pelo contexto de formação 'constitue vraiment la pierre angulaire de

son systeme de motivation, de sa motivation scolaire'. Aliás, salienta este autor que a discussão sobre as representações, do aluno, acerca das metas escolares ou académicas permite centrar, neste, a acção de construção do seu próprio conhecimento quer nos domínios cognitivos como em domínios de âmbito afectivo através de sistemas de concepção e percepção. Assim, de acordo com o autor, a motivação é um processo sistémico constituído essencialmente por dois sistemas conceptuais ou de representação (acerca das grandes metas da formação e sobre a inteligência) e três sistemas associados de percepção sobre a tarefa (envolvimento/ valor, participação/ exigência e persistência/ controlo) tal como é apresentado na Figura 2-VI

Figura 2-VI: factores da motivação escolar (traduzido e adaptado de Tardif, 1997: 94)

MOTIVAÇÃO ESCOLAR/ ACADÉMICA

SISTEMAS CONCEPTUAIS (REPRESENTAÇÕES) ACERCA DE:

ESCOLA/UNIVERSIDADE (Metas,ambiente,…)

INTELIGÊNCIA

SISTEMAS DE PERCEPÇÃO (CRENÇAS) SOBRE:

VALOR DA TAREFA

EXIGÊNCIA DA TAREFA

CONTROLO DA TAREFA

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2.4.1. Sistemas conceptuais

Os sistemas de concepção 'intervenientes sobre o plano afectivo' (Tardif, 1997: 97) apresentam-se, particularmente, importantes na construção e alteração das representações do sujeito. Na figura é destacada a representação da Escola/Universidade (contexto educativo) através das metas e objectivos educacionais perseguidos e, o conceito que o indivíduo apresenta acerca da inteligência. Quanto ao primeiro destes sistemas, a representação das metas e objectivos educacionais, fazendo referência a Dweck (1989), Dweck & Elliot (1983), Ames & Ames (1984) e outros, Tardif (1997: 100) sublinha que os alunos reconhecem à formação duas grandes categorias de metas, designadamente, metas de aprendizagem (learning goals) e metas de desempenho (performance goals). Acrescenta também alguns dados importantes (baseado em estudos recentes) para sugerir que as representações do sujeito acerca das metas académicas vão-se alterando com o tempo de permanência na instituição, correspondendo normalmente à mudança de um conceito assente em metas de aprendizagem para um conceito estritamente assente em metas de desempenho ou de resultados. Um segundo aspecto tem a ver com o facto de na literatura psico-cognitiva da motivação escolar a referência à concepção que o aluno tem acerca da inteligência é menos definida e precisa que o sistema referente à teorização das metas da formação. Não obstante, relativamente aos sistemas conceptuais acerca da Inteligência é admitido que existe uma concepção genérica acerca da inteligência. Neste sentido, salientamos Dweck (1989) ao sustentar que é possível considerar, no indivíduo, duas formas ou categorias distintas acerca da concepção de inteligência:

• uma concepção estável (entity stable), segundo a qual, os sujeitos acreditam ser a inteligência um traço fixo e imutável. Isto é, uma componente nata e inalterável na pessoa. Estes sujeitos tendem a orientar-se para metas de desempenho;

• uma concepção evolutiva (incremental), na qual, os sujeitos consideram que a inteligência é uma qualidade maleável, susceptível de ser incrementada e desenvolvida ao longo do tempo. Fundamentalmente, esta concepção (segundo o modelo da psicologia cognitiva) toma a inteligência como uma entidade resultante de um conjunto de conhecimentos e estratégias cognitivas e metacognitivas e estima que estes conhecimentos e estratégias podem ser alterados e desenvolvidos pela acção da pessoa, das circunstâncias e contextos. Tendem estes sujeitos a orientar-se para metas de aprendizagem (Tardif, 1997: 110).

De facto, acreditando na capacidade de intervenção de forma significativa sobre os processos e contextos em que o desenvolvimento tem lugar, este aspecto do sujeito possuir uma concepção mais estável ou mais evolutiva da inteligência, parece ocupar um papel preponderante e influente no modo de agir, trabalhar, participar e persistir nas actividades e tarefas de estudo, assim como em todo o comportamento

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motivacional. É de crer que este sistema conceptual da inteligência se possa relacionar com as representações das metas académicas. Neste sentido, Bandura (1992), Dweck (1989), Tardif (1997) e outros, assentes em experiências realizadas em contexto de aprendizagem, argumentam que a concepção que o aluno tem acerca da inteligência relaciona-se com a representação que este faz das metas preconizadas pelo contexto escolar e determina os seus níveis de envolvimento, participação e persistência nas actividades e tarefas propostas. Neste quadro, é defensável que aqueles que têm uma concepção evolutiva da inteligência têm maior tendência a perseguir representações das metas orientadas para a aprendizagem ao contrário dos que concebem a inteligência como estável.

Metas de Aprendizagem

Metas de Desempenho

Critérios de Sucesso

Referencia a critérios pessoais ligados aos conhecimentos anteriores

Referência a uma norma de grupo

Escolha de actividades

Selecção de actividades que contribuam para aumentar os conhecimentos Selecção de actividades que apresentem desafios

Selecção de actividades que contribuam para o reconhecimento da competência Selecção de actividades que apresentam um mínimo de risco

Controlo sobre a realização das tarefas

Desempenhos obtidos pelo controlo pessoal Sucesso resultante de estratégias apropriadas

Desempenhos aleatórios Sucesso resultante de factores externos ao indivíduo

Grau de envolvimento

Envolvimento máximo para aumentar as estratégias e construir o conhecimento

Envolvimento dependente do julgamento provável do desempenho

Atribuições dos desempenhos

Desempenhos sobre a responsabilidade do sujeito

Desempenhos resultantes de causas externas, frequentemente fora do controlo do sujeito

Concepção de inteligência

Estratégias cognitivas e metacognitivas evolutivas

Entidade estável

Reconhecimento dos objectivos

Objectivos relativos à construção do conhecimento

Objectivos relativos à validação dos conhecimentos

Motivação

Intrínseca

Extrínseca

Figura 2-VII: consequências das representações acerca das metas académicas e concepção de inteligência

Um outro aspecto que importa realçar, prende-se ao facto dos sujeitos detentores de uma

concepção da inteligência como entidade estável tendem a evitar correr riscos desnecessários quando executam determinadas tarefas, mormente, aquelas em que a sua competência está em jogo. Todo o juízo de valor negativo acerca das suas competências, toda a avaliação que indica que não terão êxito, interfere directamente na percepção que tem das tarefas e na sua auto-estima.

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Com efeito, as evidências indicam que estes sujeitos tendem a preferir envolver-se menos e serem julgados competentes em função dos seus conhecimentos que correr o risco de serem tomados como incompetentes. Ao invés, caso o indivíduo considere que a competência é essencialmente um conjunto de conhecimentos e estratégias evolutivas, susceptíveis de serem adquiridas, aceita correr riscos na aprendizagem porque tem a consciência que os erros cometidos e as dificuldades encontradas não serão usadas para julgar e avaliar a sua inteligência, mas antes para discutir e desenvolver outros conhecimentos e estratégias. Para este, é importante envolver-se, participar e persistir nas actividades de estudo pelo que o seu nível de motivação é elevado (Tardif, 1997: 115).

2.4.2. Sistemas de percepção das tarefas

Os sistemas de percepção passam, por um lado, pela tomada de consciência nos sujeitos dos objectivos, do quê? e para quê? Isto é, a pertinência, as (des)vantagens de determinada tarefa ou actividade; e, por outro, pela formulação de um juízo de valor relativamente a cada tarefa, assumindo forma na significação e importância atribuída a questões. Exemplificando, qual a importância (pessoal e social) destas actividades e tarefas? Terão estas actividades e tarefas efeito sobre as competências pessoais e profissionais valorizadas pela escola ou pela sociedade contemporânea? Quais as consequências (cognitivas, metacognitivas, afectivas, nível de conhecimentos, competências, etc.) imediatas da realização de determinada actividade ou tarefa? etc.

2.4.2.1. Percepção do valor da tarefa

Acerca da percepção do valor da tarefa importa mencionar a sua ligação com a significação e importância prestado pelo sujeito a determinada tarefa (Tardif, 1997: 117). Com efeito, o modo como determinada actividade contribui para o campo dos conhecimentos úteis na sociedade e quais são as consequências profissionais, cognitivas, metacognitivas, afectivas e/ou sociais de uma tal realização, são questões que determinam a valorização das próprias actividades. Segundo Tardif, as componentes da percepção do valor da tarefa podem ser categorizadas em termos da sua função (objectivo, pertinência, relevância) da tarefa e as suas consequências (pessoais, sociais e profissionais).

A percepção do valor da actividade parece influenciar a motivação para aprender, uma vez que determina a qualidade do envolvimento, da participação e da persistência na realização dessa actividade. Por seu lado, se o aluno percepciona que existem consequências importantes quer do ponto de vista pessoal quer académico, ou se a tarefa conduz à aquisição de conhecimentos utilizáveis em outros contextos, parece

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ser mais fácil dispor-se a investir toda a sua energia e esforço neste tipo de actividade, caso contrário será mais difícil esta adesão. Outro aspecto importante desta problemática reside no facto do aluno sentir, por vezes, dificuldade em reconhecer a importância e pertinência de determinadas tarefas que lhe são propostas. A este nível, o professor tenderá a ser mais persuasivo, atendendo a que é este que selecciona as actividades pelo seu valor de aprendizagem e académico. Ou seja, é o professor que privilegia determinado conteúdo ou assunto em detrimento de outro (e.g., cabe certamente aos professores, a título de exemplo, tentar persuadir e convencer os alunos da importância que tem o 1ºano comum nos respectivos planos de estudo dos cursos uma vez que este aparece, frequentemente, mal percebido e valorizado pelos alunos).

Também, com alguma facilidade seria possível assinalar actividades e tarefas que fossem susceptíveis de intrigar o aluno relativamente à pertinência, importância e valor, assim como possíveis consequências (pessoais, académicas, sociais). No entanto, não é este o principal objectivo deste estudo. Modo similar, a este nível importaria saber se determinada tarefa representa (ou não), no sujeito, o nível de conhecimentos que lhe são subjacentes ou, se este tem presente as circunstâncias, os recursos ou o tempo disponível, ou inclusivamente se reconhece os conhecimentos e as estratégias cognitivas e metacognitivas necessárias para que esta possa vir a ser executada com êxito.

2.4.2.2. Percepção das exigências da tarefa

Para o efeito, assinalamos a percepção das exigências da tarefa através da correspondência directa entre o nível de hesitação, no indivíduo, relativamente ao seu envolvimento e participação nas actividades e processos de aprendizagem e a sua percepção do tipo de metas de aprendizagem que o contexto académico persegue. Contrariamente, à correspondência existente quando o indivíduo percebe que a escola segue metas de desempenho, onde, os riscos a correr são calculados e determinantes. Para Tardif (1997), o sujeito toma em consideração para a sua decisão de envolvimento e participação, as exigências próprias dessa tarefa, atribuindo-lhe um determinado valor.

Esta percepção das exigências da tarefa, leva a que o aluno avalie quais os seus reais conhecimentos e estime as suas competências pessoais. Além disso, implica-o na procura das estratégias disponíveis para a executar adequadamente essa tarefa. Com efeito, esta percepção refere-se também às etapas presentes na realização de qualquer tarefa e ainda aos critérios que o sujeito fixa (ou entende) como norma para ter sucesso na mesma. É de crer que seja o carácter sistémico da motivação escolar a criar este conjunto de interrelações e conexões. O esquema seguinte, traduzido e adaptado de Tardif (1997: 122) procura resumir e ilustrar as componentes da percepção das exigências em determinada actividade de estudo ou tarefa.

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Figura 2-VIII: componentes da percepção das exigências da tarefa

2.4.2.3. Percepção do controlo da tarefa

Por outro lado, a percepção de controlo da tarefa é certamente, na literatura da motivação escolar e/ou académica, a componente que foi objecto de maior número de trabalhos de investigação (Rotter, 1966, Seligman, 1975; DeCharms, 1984; Weiner, 1984; Harter, 1981, 1985; Dweck, 1987; Dweck & Leggett, 1988; Skinner et al., 1990; Bandura, 1992; Barros-Oliveira, 1992; Tardif, 1997, Faria, 1998, etc.). A controlabilidade 'refere-se á avaliação da responsabilidade pessoal ou dos outros, nos acontecimentos positivos ou negativos' (Faria, 1998: 52). Além disso, suporta diversas orientações resultantes da diversidade de modelos utilizados que podem ir desde a percepção do auto-conceito até às atribuições causais, passando pela percepção da competência e auto-eficácia. No contexto dos processos de ensino e aprendizagem, a intervenção sistémica do professor exige que examine o conjunto de factores que constituem a componente em estudo. Na realidade, os sujeitos procuram saber as razões para os seus resultados nos mais variados domínios, designadamente interpessoais, profissionais e de poder (Weiner, 1979, referido por Faria,1998). Neste sentido, Grabe (1984, referido por Tardif, 1997) sugere que os programas que pretendem mudar o nível de sucesso no aluno e que têm em conta os processos motivacionais deverão não apenas considerar as atribuições causais, mas igualmente ser entendidas no sentido das experiências de sucesso, sobre o seu poder pessoal e como resultado, entre outros, dos esforços dispendidos. Ou seja, a motivação é fortemente influenciada pelo sentimento no aluno do poder fazer na realização da tarefa, para responder às exigências desta. Exemplificando, Weiner (1984), Bandura (1982), Schunck (1996) e outros demonstraram, nos seus estudos, a importância da percepção do aluno na sua própria eficácia, da percepção que ele tem de controlabilidade que deve exercer para levar a cabo a tarefa com sucesso. Se o aluno percebe que a sua performance resulta de factores que estão fora do seu controlo e poder pessoal, trata-se de uma actividade de contacto, na qual seu nível de envolvimento e participação será mínimo. Também Harter (1981,1985) sublinha a importância da percepção de competência e do controlo possível sobre a tarefa para a motivação escolar do aluno.

Na sua vez, Watkins & Hattie (1985) demonstraram que, quando os alunos se percepcionem como exercendo poder sobre as suas aprendizagens, estes tendem a tratar as informações de forma significativa

EXIGÊNCIAS DA TAREFA

CONHECIMENTOSANTERIORES DISPONÍVEIS

ESTRATÉGIAS REQUERIDAS

ETAPAS DE REALIZAÇÃO

CRITÉRIOS PARA O SUCESSO

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CAPÍTULO 2 147

que aqueles que percepcionam em contrário. Evidências resultantes de várias meta-análises permitiram concluir acerca das relações entre performance dos alunos e percepção que estes possuem deles próprios enquanto alunos, tal como a percepção que eles têm do seu poder sobre as actividades de estudo e aprendizagem. De um modo análogo, de acordo com Tardif (1997), o poder que o aluno percepciona possuir sobre uma determinada tarefa é necessariamente a resultante das causas que ele atribui aos seus sucessos e fracassos.

2.5. Motivação intrínseca para aprender ou a competência motivacional

Uma revista aos principais fundamentos das correntes teóricas recentes da psicologia educacional, evidencia aproximações cognitivas e motivacionais para examinar os diferentes factores (afectivos, cognitivos e metacognitivos) que constituem o seu campo conceptual. Entre as várias teorizações existentes destacamos, por exemplo, a teoria das atribuições causais (e.g., Weiner), a teoria da percepção da competência (White), a teoria da percepção da auto-eficácia (Bandura), a teoria da percepção do valor próprio (self-worth de Covington), o modelo da percepção das capacidades para realizar uma tarefa (beliefs

about control em Skinner), o auto-conceito (Shavelson e colegas); a teoria da causalidade pessoal (personal

causation presente em DeCharms), a teoria da auto-regulação (self-regulation defendida por Zimmerman & Martinez-Pons e Schunck & Zimmerman e outros). Educacionalmente, o conceito de motivação é frequentemente colocado em termos de motivação intrínseca e extrínseca. Para Tardif (1997) a motivação íntrínseca para aprender no quadro da psicologia cognitiva, é essencialmente definida como o índice ou nível de envolvimento, participação e persistência que o aluno coloca em cada etapa na realização de uma tarefa. Ou seja, a motivação intrínseca, a qual, associaremos o termo 'competência motivacional', encontra-se no interior da pessoa e, de acordo com esta abordagem, as acções sobre as quais a pessoa se envolve respondendo às suas necessidades, interesses e objectivos ou ainda dos gostos e expectativas que lhe são próprias e que satisfazem uma orientação pessoal ou tendência específica. Segundo Dweck (1989), a motivação para aprender influencia não apenas a escolha das actividades ou tarefas, mas igualmente a intensidade da persistência com que as realiza ou executa. McCombs (1988) menciona a aproximação à tarefa, o empreendimento sobre esta, os esforços depositados e a persistência na sua execução, como sendo as componentes que deverão ser tomadas em consideração na concepção de motivação para aprender. Nicholls (1984) por sua vez, sugere que os envolvimentos 'ego' e nas tarefas, é afectado pelas condições existentes na escola. O envolvimento centrado no 'ego' é engendrado pela competição, a qual assenta na auto-avaliação das competências relativamente aos outros. O envolvimento na tarefa é promovida através das condições individuais de aprendizagem. Ou seja, os alunos avaliam os

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seus próprios progressos relativamente a como estes, em vez de relativamente a outros, foram capazes de desempenhar as tarefas anteriormente. Já Ames (1984) defende que os alunos colocam grande ênfase nas competências como determinante dos resultados em contextos competitivos, mas que salientam o papel do esforço nos contextos ou situações não competitivos (cooperativo, individual)5. Efectivamente, é acerca desta competência motivacional que os contextos educativos parecem privilegiar ao exigerem, nos alunos, a aquisição e desenvolvimento das competências que se traduzem na manutenção ou no incremento do interesse natural e espontâneo para aprender (motivação distinta daquela que é necessária para executar actividades) que os investigadores humanistas mais têm insistido defender (ver, por exemplo, vários autores em Ames & Ames, 1984 e 1985 e em Shunck, 1996). Por outro lado, são também alguns os estudos existentes na literatura educacional, a sugerir que esta fonte importante das energias dos sujeitos para aprender se perde ao longo da escolaridade. Este facto tem conduzido as investigações acerca da motivação intrínseca para aprender na exploração e explicação de factores contextuais que produzem a sua diminuição ou em alternativa os factores que promovem o seu acréscimo (Upcraft & Gardner, 1989; Ramsdem, 1992; Gibbs, 1992, 1994, 1996; Tinto, 1993, Biggs, 1996; Watkins & Biggs, 1996, etc.) Os resultados destas investigações podem ser organizados, segundo aquilo que Ryan, Connell & Deci (1985: 16) designavam por 'teoria da estimação cognitiva' (cognitive evaluation theory), a qual, procura descrever e caracterizar as percepções dos eventos ambientais e ainda examinar como estas se relacionam com a iniciação e auto-regulação dos comportamentos motivados. Para estes investigadores, percepções de autonomia e competência são fundamentais na motivação intrínseca e estas percepções são obtidas através das significações atribuídas aos vários eventos ocorridos. Esta teoria endereça os efeitos de factores tais como recompensas (punições), avaliação externa, constrangimentos e estilos de comunicação interpessoal e assenta em três proposições fundamentais, cada uma das quais suporta os efeitos do contexto na motivação intrínseca para aprender.

• Proposição 1: Qualquer evento que facilite a percepção de um locus interno de causalidade relativamente a uma actividade ou tarefa tenderá a promover a motivação intrínseca para agir sobre a actividade ou tarefa. Contrariamente, eventos que facilitem uma percepção de um locus de causalidade externo tendem a diminuir a motivação intrínseca. Neste sentido, é fundamental a experiência de autonomia ou acção (agency) no indivíduo.

• Proposição 2: Qualquer evento que promova a competência percebida tende a promover a motivação intrínseca para aprender, enquanto aqueles que facilitam a percepção de incompetência diminuirão este tipo de motivação. Importa realçar os aspectos dos retornos (feedback) positivos produzidos pelo

5 A este propósito, ver Johnson & Johnson em Ames & Ames, 1985.

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CAPÍTULO 2 149

contexto acerca dos desempenhos individuais nas actividades e tarefas pelo ambiente. Outra condição relacionada com esta proposição é o nível de desafio e risco representado na tarefa. Por exemplo, se a tarefa é optimamente desafiante, então de um modo geral promove a motivação intrínseca (Csikszentsmihalyi, 1975).

• Proposição 3: Salienta a variação do significado dos eventos e comunicações para os receptores da informação através da indicação do potencial de significação atribuível a eventos relevantes e ainda, as dinâmicas interpessoais na motivação. Neste sentido, argumenta-se que estes eventos possam ser percepcionados segundo diferentes significações, tais como: i) 'funcionais', altamente dependentes relativamente à natureza de contextos inter e intrapessoais; ii) 'informacionais', os quais, foram experienciados como fornecedores de retornos pertinentes e relevantes no contexto das escolhas ou autonomia; iii) 'controlo', que são percepcionados inicialmente como pressões para o desempenho, pensamentos, competências ou sentimentos particulares.

2.5.1. Modelo do investimento pessoal

Maehr (1984: 117) baseia a sua perspectiva ou teoria do investimento pessoal em três proposições fundamentais.

1. O estudo da motivação começa e acaba com o estudo do comportamento. 2. O significado da situação para o sujeito determina o seu comportamento. 3. O significado da situação para o sujeito pode ser avaliado e as suas origens determinadas.

Segundo este autor, o estudo da motivação tem sido historicamente associado aos processos internos, ou seja, às necessidades, aos drives, às expectativas, metas, intenções, etc. A recente ênfase nas atribuições (Weiner), na auto-determinação (Deci), na causalidade pessoal (DeCharms), no senso de competência (Harter) e outras variáveis cognitivas não se têm afastado muito da tradição referida. Com efeito, o seu estudo da motivação começa com observações da existência e variação em cinco tipos de comportamento identificáveis, os quais, objectivam a investigação da motivação na sua compreensão, predição e exploração. Ou seja, a 'direcção' (exemplo, quando o aluno opta por um determinado curso, rejeitando outras hipóteses alternativas ou quando prefere estudar em vez de ir ao cinema); a 'persistência' (exemplo, o nº horas dispendido no estudo); a 'manutenção da motivação' (continuing motivation) (exemplo, a força que move um aluno para retomar uma actividade iniciada anteriormente); a 'actividade' (exemplo, nível de envolvimento e participação numa tarefa ); 'performance' (exemplo, avaliação dos comportamentos). Na realidade, para Maehr (1984: 133), toda a discussão em torno dos aspectos do investimento pessoal pode ser sumariada na observação de que as pessoas investem nas actividades ou tarefas em função do sentido (meaning) que possam representar para elas e no sentido de considerar que uma

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actividade ou tarefa é composto por três cognições interrelacionadas (metas, auto-conceitos e acções possíveis). Por outro lado, o que antecede e determina o sentido de uma actividade ou tarefa é o tipo da tarefa, a experiência pessoal, a informação e contexto sócio-cultural. Em aditamento, é sugerido que por detrás dos efeitos de todos os outros factores estejam factores desenvolvimentais/ maturacionais. Aliás, parece evidente que o desenvolvimento psicológico assume um papel preponderante na modificação da função destes factores. É possível observar na Figura 2-IX, adaptada de Maehr (1984: 134), algumas destas implicações dos factores que antecedem o sentido de uma actividade ou tarefa e cuja influência se faz sentir no investimento pessoal, conforme é defendido por Maehr.

Figura 2-IX: antecedentes do sentido e investimento pessoal

Finalmente, quando se pondera qualquer intervenção relacionada com a motivação, há que ter em

conta que o sujeito constrói gradualmente o conhecimento a partir dos conhecimentos anteriores, ou seja, as novas informações são colocadas em relação com as anteriores e determinam o tipo de construção que o sujeito vai poder realizar. Modo análogo, o sujeito constrói a sua motivação a partir das suas experiências, seus erros, seus sucessos e fracassos. Ele retira as conclusões dos seus envolvimentos e a partir destas extrai regras e modos de procedimento (Tardif, 1997: 91). A vontade (will), a aproximação e a atitude (abordagem e envolvimento) perante a tarefa, o recurso e selecção das estratégias necessárias à realização da tarefa com sucesso e a atitude de persistência na execução (auto-regulação) resultam num conjunto de factores sobre os quais é fundamental a experiência da acção como meta básica.

METAS DE

DESEMPENHO AUTO-

CONCEITOS

ACÇÕES POSSÍVEIS

INVESTIMENTO PESSOAL

CONTEXTO SÓCIO-CULTURAL INFORMAÇÃO

SITUAÇÃO DE ENSINO/APRENDIZAGEM

EXPERIÊNCIAS

PESSOAIS

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CAPÍTULO 2 151

2.5.2. Modelo da causalidade pessoal

Entretanto, DeCharms (1984) estudou com alguma profundidade o efeito que tem sobre as aprendizagens e os desempenhos académicos a experiência de agir sobre as situações. Este autor refere o facto frequentemente observado de que os alunos realmente aprendem e executam as tarefas que lhes são propostas quando estão intrinsecamente motivados. Por esta razão, DeCharms defende que qualquer mudança que se pretenda instituir junto de cada indivíduo só poderá concretizar-se caso este assuma como próprios os objectivos dessa mudança. Opta por usar o termo 'activar' (enhancing) em contraste com treino (de hábitos) ou ensino (de conhecimentos) porque a motivação não pode ser treinada ou ensinada, apenas promovida ou activada. Ou seja, embora métodos de ensino e treino demasiado específicos raramente produzem resultados positivos, no entanto, os professores podem activar a capacidade de acção (agency) no aluno. Indo um pouco mais além, os professores, podem facilitar o desenvolvimento e formação de hábitos e comportamentos estratégicos. Paralelamente, podem também promover a aquisição de conhecimentos para além dos factos de ensino.

Com efeito, o processo de promoção da acção permite ao sujeito que esta faça algo ou actue em um determinado sentido. Fazer algo ou agir, implica pensar além de produzir ou responder automaticamente. Ou seja, pensar e fazer envolve a pessoa na acção e na causalidade de um evento específico produzindo mudança. Neste quadro, o conceito de causalidade pessoal de DeCharms é central na combinação do 'fazer', 'pensar' e 'aprender', enquanto resultado de um hábito, recepção cognitiva ou acção. A causalidade pessoal (personal causation) será, então, qualquer coisa feita intencionalmente para produzir mudança. O hábito é aprendido para que possa ser usado na acção. O conhecimento é aprendido para que possa guiar a acção. Acção ou autonomia (agency) é o uso racional do conhecimento e hábitos (respostas aprendidas) para produzir as mudanças desejáveis (DeCharms, 1984: 276).

Mais, quando os hábitos e os conhecimentos, combinados com a motivação são (in)adequados, a

acção tem (in) sucesso. Ainda, segundo este investigador, a terminologia original-marioneta (origin-pawn), embora, correndo o risco de sobressimplificar um fenómeno complexo, apresenta a vantagem de traduzir experiências humanas comuns e ser facilmente entendida nos contextos escolares. Neste sentido, quando a acção tentada tem sucesso, o agente que causou a mudança desejada sente que foi o próprio a origem (origin) dessa mudança. Ao invés, quando a acção tem insucesso, a pessoa sente que não causou mudança. Ou seja, algum outro agente ou objecto interferiu com a causalidade pessoal e a pessoa sente que é uma marioneta (pawn) (ibid.).

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2.5.3. Um modelo integrativo

Tardif (1997) destaca os trabalhos produzidos por Dweck (1988), Borkowski e colegas. (1990) e McCombs (1988) por apresentarem a vantagem de colocar a tónica sobre a interacção sistémica dos diferentes factores que compõem a motivação para os comportamentos estratégicos e permitindo, assim, uma melhor gestão e planificação das acções e intervenções acerca destes aspectos, nos processos de ensino e aprendizagem. Sublinha, igualmente a tentativa da maioria destes autores em integrarem, num só modelo de análise os elementos cognitivos, metacognitivos e afectivos envolvidos. Neste contexto, pelo seu interesse para a compreensão das variáveis deste estudo, tipifiquemos o modelo integrativo (Figura 2-IX) subjacente à motivação intrínseca para aprender apresentado por McCombs (1988), o qual, incorpora conceitos acerca das competências motivacionais, auto-eficácia e teorias atribucionais, assim como alguns aspectos modelados pelas perspectivas volicionistas (Snow, Rohrkemper,Corno, Mandinach e colegas). Utilizando os próprios termos de McCombs (1988: 157), este modelo deriva das conceptualizações correntes da aprendizagem e da motivação, partilhando com estas alguns elementos comuns. Não obstante, difere de outros modelos similares discutidos em vários estudos de investigação (Entwistle & Ramsdem, 1983; Entwistle, 1987; Biggs& Telfer, 1987; Biggs, 1987; Biggs, 1993; Biggs & Moore, 1993) segundo alguns aspectos importantes.

Destacamos, nomeadamente a ênfase dada à compreensão do conjunto dos processos cognitivos, metacognitivos e afectivos que no interior do sujeito mediatizam a manutenção da motivação intrínseca para aprender e papel central dado ao conceito de 'controlo percebido' e consequentes relações recíprocas com a 'auto-eficácia percebida', na produção paralela dos efeitos positivos necessários à manutenção da motivação intrínseca para aprender e, na execução das competências para a auto-regulação do estudo e aprendizagens.

Além disso, é realçado o papel das expectativas de resultados e as atribuições causais do sucesso e fracassos na contribuição do 'controlo percebido' e da competência e manutenção da motivação. Quer dizer, o processo atribucional é necessário mas não suficiente na promoção da motivação para aprender. Por fim, são enfatizados os processos internos de mediatização que implicam que as intervenções para a promoção da motivação se situem no binómio, 'modificação do aluno' vs 'modificação das práticas educacionais'.

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CAPÍTULO 2 153

Figura 2-X: modelo produtor de processos e competências subjacentes à manutenção da motivação intrínseca para aprender (traduzido e adaptado de McCombs, 1988: 155)

Resumindo, neste modelo de McCombs, começa por se assumir que o sistema metacognitivo dos

processos executivos está relacionado e interage em simultâneo com o conhecimento (avaliação) e o

SISTEMA METACOGNITIVOCONHECIMENTOS GERAIS E ESQUEMAS DE CONTROLO/ AUTO-AVALIAÇÃO E

ESTRATÉGIAS DE AUTO/REGULAÇÃO E MEMÓRIAS

SISTEMA AFECTIVOESTILOS DE PERSONALIDADE GERAIS/ TRAÇOS/

ESTRATÉGIAS MOTIVACIONAIS E MEMÓRIAS DE SENTIMENTOS

SISTEMA COGNITIVO ESQUEMAS COGNITIVOS GERAIS/ CAPACIDADES/ ESTRATÉGIAS DE

PROCESSAMENTO DA INFORMAÇÃO E MEMÓRIAS DE CONHECIMENTOS DE BASE

MEMÓRIAS DE EXPERIÊNCIAS E APRENDIZAGENS ANTERIORES

INICIAÇÃO À TAREFA ACADÉMICA

PERCEPÇÕES DA EXIGÊNCIA DA TAREFA

PERCEPÇÕES DO CONTROLO PESSOAL /ACÇÃO

EXPECTATIVAS DE RESULTADOS EXPECTATIVAS DE EFICIÊNCIA

INTERESSE INTRÍNSECO INICIAL /NÍVEL DE MOTIVAÇÃO

EMPREENDIMENTO DA TAREFA

RECONHECIMENTO DAS ESTRATÉGIAS RELEVANTES

PERCEPÇAO DA UTILIDADE E CUSTO DAS ESTRATÉGIAS

ESTRATÉGIAS DE ATENÇÃO/ AQUISIÇÃO

ESTRATÉGIAS DE PROCESSAMENTO/ EVOCAÇÃO

ESTRATÉGIAS METACOGNITIVAS

ESTRATÉGIAS DE NARRATIVA

REAVALIAÇÕES DO CONTROLO PESSOAL

REAVALIAÇÕES DAS EXPECTATIVAS DE

RESULTADOS

REAVALIAÇÕES DAS EXPECTATIVAS DE EFICÁCIA

EXECUÇÃO DE ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM E DE AUTO-GESTÃO APROPRIADAS

EXECUÇÃO DA TAREFA

AVALIAÇÕES DO NÍVEL DE DESEMPENHO

ATRIBUIÇÕES DO SUCESSO/ FRACASSO

JULGAMENTOS E SENTIMENTOS DE AUTO-EFICÁCIA

JULGAMENTOS E SENTIMENTOS DE CONTROLO

PESSOAL

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controlo (auto-regulação) das cognições e afectos na produção das percepções das exigências das tarefas (McCombs, 1988: 154). Relacionados com a produção destas percepções estão, por um lado, os conhecimentos gerais e as estratégias metacognitivas para a auto-avaliação e auto-regulação, os estilos e traços de personalidade, as estratégias afectivas (motivacionais) para auto-julgamentos e aceitação das responsabilidades pessoais nas aprendizagens, os esquemas cognitivos gerais presentes nas estratégias de processamento e transformação da informação e, por outro, as expectativas de sucesso, fracasso e recompensas (punições) e as percepções de controlo pessoal ou agência (avaliação da controlabilidade das exigências da tarefa). Com efeito, estas percepções e expectativas formam a base para a produção de um determinado nível de interesse intrínseco ou motivação para concluir as exigências das tarefas e para aplicar estratégias cognitivas, afectivas e metacognitivas mais apropriadas às aprendizagens. Entretanto, assumindo que o interesse ou motivação intrínseca é produzido com base nas percepções e expectativas dos sujeitos, então, os processos cognitivos e metacognitivos envolvidos e necessários para auto-controlar as aprendizagens podem ser considerados. Destacamos, por exemplo, os processos da atenção e vigilância, selectividade e conexão, planeamento e monitorização dos desempenhos, auto-avaliação e narrativa, entre outros. Também importante parece ser o reconhecimento de quais as estratégias mais relevantes e o tipo de percepções acerca a sua importância e utilidade. Neste sentido, dependendo do repertório individual, serão utilizadas as estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivas que forem julgadas, através do sujeito, mais apropriadas às exigências da tarefa. Na realidade, para a execução de uma tarefa académica, o sujeito empreende auto-avaliações acerca da qualidade dos seus próprios desempenhos e compara-os com as metas e objectivos fixados ou com os desempenhos dos outros ou ainda com outros aspectos exteriores. É com base nestas comparações (avaliações) que se produzem as atribuições dos sucessos e fracassos, as quais, por seu lado contribuem para os julgamentos (apreciações cognitivas) e sentimentos (reacções afectivas) da auto-eficácia e controlo pessoal na determinação das exigências das tarefas. Aliás, McCombs (1988: 157) defende que as mudanças dos julgamentos de auto-eficácia e auto-controlo que resultam das auto-avaliações efectuadas durante a execução das tarefas, pode influenciar as reacções afectivas (sentimentos), alterar a motivação para a tarefa e influenciar os processos e a utilização das estratégias cognitivas e metacognitivas mais apropriadas. Assim, a motivação para aprender é grande parte função das percepções de auto-eficácia e auto-controlo das situações de aprendizagem. A este propósito, o modelo sócio-cognitivo salientando o papel das motivações no processo de aprendizagem prediz que os alunos encaram as situações de aprendizagem com um senso de auto-eficácia para aprender e que os alunos reflectem as suas experiências anteriores, as suas características pessoais, nomeadamente, atitudes, concepções, teorias, atitudes e, ainda os mecanismos sociais de suporte (Bandura, 1982, 1986). Por outro lado, a motivação pode servir o papel funcional de

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CAPÍTULO 2 155

preservação do auto-valor (self-worth), no indivíduo, na medida em que os resultados dos comportamentos motivados são avaliados em função do seu próprio envolvimento, ou pelo menos consistente como os seus próprios pontos de vista, valores, atitudes ou objectivos (Covington, 1992). De um modo similar, Corno & Rohrkemper (1985: 53) definem a competência motivacional ou motivação intrínseca para aprender, como sendo a facilidade da aprendizagem que suporta a disposição para aprender através do desenvolvimento de competências cognitivas particulares. É salientado que a motivação intrínseca deve reflectir muitos dos aspectos da responsabilidade pessoal identificados, mormente, nos trabalhos de Weiner (1979, referido por Corno & Rohrkemper, 1985: 58). Esta responsabilidade pessoal inclui elementos, como por exemplo, adiar gratificações, medir o esforço pessoal, graduar a diminuição da auto-consciência ou a redução do medo de insucesso, incrementar o sentido do controlo pessoal e auto-avaliação das próprias competências para influenciar e alterar os eventos, etc. Por outro lado, é consensual entre muitos educadores, que a motivação intrínseca para aprender envolve aspectos directamente relacionados com as competências de estudo, nomeadamente, a demonstração de capacidades e conhecimentos para adquirir os materiais de aprendizagem, saber começar e acabar um trabalho, usar os procedimentos e as estratégias que possam ser ajudas úteis nos estudos e aprendizagens, manifestar hábitos de estudo e trabalho regulares, etc. Corno & Rohrkemper (1985) mencionam uma revisão de literatura corrente acerca da motivação intrínseca produzida por Malone & Lepper (1984), segundo os quais é possível fixar uma taxonomia de análise constituída por três categorias distintas de variáveis pessoais, que são, o 'desafio', 'curiosidade' e 'controlo'. As primeiras duas destas categorias sobrepõem-se com a dimensão de competência, enquanto a terceira categoria sobrepõe-se ao primeiro aspecto referido, isto é, a dimensão da responsabilidade pessoal, tal como identificada por Weiner e outros. Na sua vez, White (1959, citado por McCombs, 1988: 142) define 'competência motivacional' como sendo a capacidade do indivíduo para interagir efectivamente como o seu contexto ambiental. Este argumenta que existe no sujeito, uma competência ou 'effectance' motivacional que é dirigida, selectiva e persistente e a qual satisfaz uma necessidade intrínseca para lidar com o meio em que está inserido. Tomando esta concepção de White, McCombs (1988: 143) refere os trabalhos de Harter, como uma tentativa na perspectiva desenvolvimentista, de compreender os processos que estão na base da formação do auto-conceito, da auto-regulação e da motivação intrínseca para aprender nas crianças e jovens adultos. Baseada em evidências, Harter defende que a compreensão dos comportamentos auto-regulados (auto-obervação, auto-avaliação, auto-recompensa, etc.) devem incluir uma perspectiva do self como elemento activo nesses processos, bem como objecto na (re)construção cognitiva em que estes processos são aplicados. Importa também destacar no seu trabalho, além do conceito de self, o sentimento do auto-valor (self-worth) na medida em que este se associa ao controlo e competência percebida e ainda, como

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integração do sistema do self na motivação e aprendizagem. No seguimento, as suas investigações conduziram ao modelo causal [controlo percebido > nível de determinação actual > avaliação da competência cognitiva > reacção afectiva > motivação intrínseca ]. A motivação intrínseca passou então a ser definida, de acordo com Harter (1981), como um domínio motivacional de âmbito geral, concreto e orientador nas situações de aprendizagem e, não apenas, como interesse ou nível de acção numa tarefa dada. A 'competência percebida' é definida como um construto dinâmico, multidimensional que envolve percepções das próprias competências em domínios cognitivos, fisiológicos e sociais. O 'controlo percebido' é definido como uma variável cognitiva relacionada com a entendimento pessoal acerca de quem é o responsável pelos resultados das tarefas, ou seja, pelo entendimento das contigências associadas aos sucessos e fracassos. McCombs(1988: 144) refere também o argumento de Thomas (1980) de que o que motiva os alunos são as suas disposições para procurar ou abordar actividades de aprendizagem. As disposições para percepcionar o controlo de uma tarefa de aprendizagem, para se sentir responsável pelos resultados (êxitos e fracassos) e para determinar a natureza e extensão dos seus esforços para lidar com o sucesso. De facto, a teoria de Atkinson (1957-1978 referido por Schunck, 1996: 299) postulava que o comportamento estratégico é resultado de um conflito emocional entre esperança de sucesso e medo de fracassar. A teoria do auto-valor de Covington (1984, 1992) refina a ideia combinando este aspecto emocional com factores cognitivos ao asssumir que o sucesso é valorizado enquanto que o fracasso ou a percepção deste é para ser evitada porque implica incompetência. Paralelamente, entendemos a motivação extrínseca consistente com a evolução da perspectiva behaviourista (estímulo-resposta) e que corresponde, em síntese, a algo que é exterior à pessoa e é influenciada pelos reforços, os feedbaks e as recompensas ou punições que a pessoa recebe do exterior. Com efeito, é sobretudo a partir dos trabalhos de Atkinson e outros (1957-1978, referidos por Schunck, 1996) que parece ter havido uma mudança efectiva do campo da motivação na perspectiva do E-R para modelos mais complexos, os quais, incorporam variáveis cognitivas tais como, metas, concepções e sistemas perceptuais. Estes modelos colocam igualmente uma grande ênfase nas influências das variáveis situacionais na motivação para alcançar bons resultados e estabelecem, por exemplo, que os sujeitos alteram as suas motivações em função das suas próprias percepções das situações e tarefas com que são confrontados. Neste sentido, Shunck (1996: 296) refere que uma contribuição importante foi dada através da ênfase atribuída a ambas, expectativas de sucesso e o valor percepcionado acerca do envolvimento na tarefa, como factores que afectam directamente os comportamentos objectivados para alcançar e êxito nos resultados. Segundo este autor, os modelos contemporâneos da motivação com vista aos resultados (achieving motivation), continuaram com esta ênfase subjectiva e em adição incorporaram outras variáveis cognitivas importantes no modelo, nomeadamente as metas e percepções das competências. Entretanto,

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CAPÍTULO 2 157

modelos correntes têm colocado grande enfoque nas influências de variáveis contextuais na motivação e postulam que as pessoas alteram as suas motivações em função das suas percepções acerca das situações e contextos em que estão inseridos (a este propósito, ver Entwistle, 1987; Watkins & Hattie, 1990; Ramsdem, 1992; Gibbs, 1996; Biggs,1996; Watkins & Biggs, 1996; Marton et al, 1997, entre outros). Schunck sugere que o modelo teórico de motivação para comportamentos estratégicos, tal como exposto por Eccles (1983) e Wigfield (1994), associada á perspectiva da teoria do auto-valor (self-worth) defendida por Covington (1984 e 1992), representa uma interessante tentativa de incorporação de novos elementos no estudo da motivação. Para uma melhor compreensão deste modelo de Eccles, apresentamos a Figura 2-XI, tal como é sugerida por Schunck (1996: 297).

Figura 2-XI: modelo contemporâneo da motivação para o comportamento estratégico

No modelo, o processo apresentado ao centro é interno ao indivíduo, enquanto os extremos representam o mundo exterior. Começando pela esquerda, observamos que vários factores no mundo social afectam os tipos de processos cognitivos e crenças motivacionais que os alunos possuem. Estas influências sociais incluem factores associados com a cultura, os comportamentos influentes de socialização do contexto individual e experiências dos resultados e desempenhos anteriores. Os processos cognitivos iniciais, no aluno em situação estratégica, envolvem as suas percepções acerca do contexto ambiental e as suas interpretações (atribuições) a acontecimentos passados (atribuições causais, causas percepcionadas dos resultados, etc.). São enfatizadas as tarefas específicas. Os processos cognitivos, no aluno, serão específicos do contexto e incluem percepções de situações semelhantes experienciadas no passado. As motivações iniciais estão centradas nas metas e auto-conceito acerca das tarefas especificas, isto é, as percepções acerca das próprias capacidades ou competências para lidar com as tarefas. Similar à noção de

Contexto cultural (e.g.- papel sexual, estrutura,

sistema económico)

Percepções do aluno acerca das expectativas e

atitudes sociais Metas do aluno

Valor da tarefa

Socializadores 1.Comportamentos 2. Auto-conceitos 3. Atitudes e expectativas

Comportamentos estratégicos: persistência, opções e

desempenhos

Acontecimentos únicos passados (e.g.- resultados

anteriores obtidos)

Interpretação do aluno acerca dos acontecimentos passados

Auto-conceito do aluno acerca de uma tarefa

específica

Percepção do aluno acerca da tarefa

Expectativas (expectancy)

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auto-eficácia em Bandura e à percepção das dificuldades da tarefa referentes às avaliações do grau de dificuldade para executar a tarefa, usualmente, relacionada com a competência percebida (Harter, 1992). O construto 'expectativa' (expectancy) relaciona-se com as percepções individuais acerca do grau de ajustamento do sucesso à tarefa. Este constructo, segundo Schunck (1996: 298), não é necessariamente sinónimo de competência percebida, ao invés, é mais próximo da noção de resultado esperado (outcome

expectation) presente em Bandura (1986), a qual reflecte a probabilidade de uma pessoa executar ou fazer bem uma tarefa. Schunck refere também que as investigações mostram que altos níveis destas expectativas para o sucesso estão positivamente relacionadas com várias formas de comportamentos estratégicos, incluíndo escolha das tarefas (Nicholls, 1984; Elliot & Dweck, 1988; Ames & Archer, 1988), esforço e persistência (em Bandura e em Covington), actual determinação estratégica (Eccles, 1983: Eccles & Wigfield, 1985; Wigfield, 1994) e formas de estudar (Graham & Golan, 1991; Nolen, 1988 referidos por Meece, 1994 e, ainda em Pintrich & Garcia, 1991). Entretanto, de acordo com Riding & Staley (1998: 43), a forma como os sujeitos se auto-percepcionam como alunos num determinada tarefa ou aspecto académico, influencia a sua motivação, os seus interesses e os seus desempenhos. O construto de 'auto-percepção como aluno' e os construtos associados de 'competência percebida' (por exemplo, em Harter,1992), 'auto-eficácia' (Bandura,1986), 'auto-conceito' (Shavelson et al, 1976; Byrne, 1996 e Hattie,1992) e 'auto-estima' (Coopersmith, 1967) e muitos outros, são frequentemente interpretados em função das necessidades. É igualmente válida a variação destas auto-percepções, nomeadamente, uma percepção mais ligeira que se traduz uma reduzida implicação nos desempenhos nos indivíduos até, uma forte influência no carácter e personalidade e a conseguinte tradução em termos de comportamentos e desempenhos. Riding & Staley (1998: 47) referem inclusivamente que o auto-conceito académico tem alguma influência nos desempenhos, mas não é a sua única influência. Isto é, interagem outras variáveis nos seus efeitos sobre os comportamentos (exemplificando com Moriarty et al, 1995 e Vrugt, 1994). Para estes investigadores, um importante papel da auto-percepção como aluno é tomado no processo de auto-regulação dos estudos e aprendizagens, referindo-se, especificamente aos trabalhos de Ryan e colegas (1992), os quais, distinguem quatro níveis da auto-regulação num continuum entre a motivação extrínseca até á motivação intrínseca. Ou seja, a 'auto-regulação externa', quando o aluno depende motivacionalmente do seu tutor; a 'auto-regulação interiorizada', na qual há um elemento de auto-controlo no aluno, mas, que deriva de um desejo de evitar experiências negativas (e.g., falhar num exame); a 'auto-regulação identificada', quando o aluno está motivado pela identificação e importância da tarefa relativamente a metas determinadas ao invés de se envolver no trabalho em si mesmo; e, a 'auto-regulação intrínseca', quando o aluno está motivado pelo interesse dos assuntos ou tarefa em si mesmo e vontade de investir pessoalmente na sua compreensão.

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CAPÍTULO 3

Processos auto-reguladores do estudo e aprendizagens

Para a realização deste capítulo começamos por nos basear na assunção que as competências de estudo seriam a deslocação para o contexto académico de certas atitudes, procedimentos e comportamentos descritos por uma série ou sequências de acções com vista a alcançar com êxito os objectivos do estudo e aprendizagem, normalmente designadas por 'estratégias' ou processos auto-reguladores do estudo e aprendizagens. Neste contexto, fomos rever alguma literatura específica que, de algum modo, se relacionava com a temática da utilização destas estratégias na auto-regulação das aprendizagens, em jovens estudantes universitários. Verificamos, na literatura consultada, uma certa convergência de pontos de vista no que concerne à responsabilidade única e exclusiva do estudante acerca da utilização das estratégias mais adequadas para enfrentar os desafios académicos e de aprendizagem. Observamos igualmente que estas competências essenciais são susceptíveis de ser activadas, melhoradas e promovidas com vista à optimização de desempenhos académicos (Riding & Rayner, 1997; Nisbet & Schucksmith, 1987; Paris, Rothkopf, Palmer & Goetz, McCombs in Weistein et al, 1988; Pozo, 1995; Boulet et al, 1996; McKeachie et al, 1987 e 1994; Chalmers & Fuller, 1996; Schmeck, Entwistle, Marton, Ramsdem, Pask, Das, Biggs in Schmeck, 1988; Gibbs, 1996; Biggs, 1993, 1996; Vermunt, 1996, 1998; Marton et al., 1997; etc). Começamos por tentar compreender o conceito de auto-regulação académica, tal como, foi avançado por Zimmermam (1986) e sucessivamente desenvolvido (Zimmerman, 1986 a 1998), Zimmermam & Martinez-Pons (1988 a 1992), Schunck (1996) e Schunck & Zimmerman (1994,1998), entre outros, no sentido de lhe fixar contornos e aspectos de análise com vista a futuras abordagens. Depois, tendo em vista analisar um conjunto de auto-competências (gerais e específicas) relacionadas com o desenvolvimento de processos e estruturas no auto-sistema, o qual, parece ser um requisito necessário e suficiente para que os jovens estudantes universitários assumam as suas responsabilidades pessoais de controle, gestão e auto-regulação académica, fomos observar como os programas de treino e desenvolvimento das competências essenciais podem (e devem) ser uma realidade na mudança das auto-perspectivas negativas, nas atitudes e orientações erradamente assumidas relativamente ao estudo e aprendizagens desses jovens estudantes universitários. No seguimento, objectivados para um melhor conhecimento e compreensão acerca deste conjunto de auto-competências relacionadas com os processos auto-reguladores do estudo e aprendizagem, fomos explorar o conceito de estratégia de aprendizagem e analisar a influência de algumas das suas principais

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componentes. Concluímos esta secção com a observação de alguns modelos classificativos das estratégias de aprendizagem.

1. A auto-regulação académica: delimitação do conceito

O conceito de auto-regulação académica relaciona-se com auto-formulação de pensamentos, sentimentos e acções, nos estudantes, sistematicamente orientadas para alcançar as suas metas e objectivos (Schunck & Zimmerman, 1994). Ou seja, nos processos de estudo e aprendizagem, a auto-regulação envolve activação pessoal e sustentação de cognições e comportamentos orientados por objectivos por parte do aluno (Zimmerman, 1986, 1994; Schunck, 1996). As várias teorizações em torno do conceito de auto-regulação académica, estas parecem concorrer no sentido de ajustar o conceito à noção que os alunos contribuem activamente na construção dos seus próprios objectivos de aprendizagem e não são apenas receptores passivos de conhecimentos (Pintrich e colegas, 1993). Por outro lado, entre os resultados mais importantes que emergem na literatura relativa aos processos de estudo e aprendizagem é a constatação que os alunos com sucesso demonstram elevada 'facilidade' em analisar, planear, executar e avaliar as tarefas académicas que lhes são propostas. Por exemplo, em Alexander e colegas (1998: 391) são apontadas várias terminologias para esta 'facilidade' descrevendo vários processos envolvidos na auto-regulação e ás quais se podem acrescentar outros termos, tais como: 'cognição', 'metacognição', 'volição', 'planeamento', 'auto-eficácia', 'expectativas de desempenho', 'auto-controlo', 'auto-instrução', 'auto-reforço', 'competências de resolução de problemas', 'controlo da compreensão', 'estratégia' e, 'auto-regulação'. Estes autores sugerem ainda algumas evidências que apontam para que os alunos quando manifestam uma grande quantidade destes atributos evidenciados em processos cognitivos, metacognitivos e motivacionais, mais facilmente desenvolvem competências e proficiência em domínios académicos. Entretanto, para Zimmerman (1994: 6) os vários investigadores que se têm debruçado sobre o estudo da auto-regulação encontram grande dificuldade ao procurarem usar o conceito como um construto interpretativo ou explicativo da maioria destes atributos. De facto, embora seja importante identificar os principais processos e mecanismos envolvidos ou usados pelos sujeitos para auto-regular os desempenhos académicos, acontece, que essa realização é bastante dificultada por um elevado número de processos auto-regulatórios que têm sido propostos a partir das diferentes perspectivas e paradigmas teóricos que procuram de uma forma ou outra descrever ou explorar os seus resultados. Neste sentido, Schunck (1996: 381) menciona diferentes perspectivas teóricas e empíricas que têm abordado o conceito de auto-regulação académica, nomeadamente, no contexto do ensino superior. Destacamos:

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CAPÍTULO 3 161

• os investigadores behaviouristas, os quais tendem a enfatizar as respostas comportamentais que envolvem processos de auto-controlo, auto-instrução e auto-reforço nas escolhas entre os vários percursos alternativos da acção. Com efeito, as investigações sugerem que os sujeitos podem ser treinados para gerir os estímulos descriminativos, estabelecer consequências e administrar recompensas e punições.

• as perspectivas desenvolvimentistas que traçam a aquisição e mudança das competências auto-regulatórias para incluir os efeitos das variáveis pessoais (self) e dos contextos ambientais. Do ponto de vista desenvolvimentista, os processos de internalização e controlo, na auto-regulação académica, parecem provir das influências exteriores (contexto, professor, pares, etc.). Neste sentido muitas das competências auto-regulatórias são aprendidas através do ensino e exposição aos modelos sociais

• a perspectiva do processamento da informação, onde a auto-regulação é similar à consciência metacognitiva (metacognitive awareness), a qual inclui tarefas e conhecimentos pessoais. A aprendizagem auto-regulada exige que o aluno compreenda as exigências de uma actividade, as suas competências pessoais e as estratégias necessárias para fazer face às tarefas. A consciência metacognitiva inclui também o tipo de conhecimento procedural, o qual ajuda o indivíduo a regular os materiais de estudo e aprendizagem, a controlar o seus esforços e nível de estudo e sugere quando deve (ou não) adoptar uma nova abordagem à tarefa e avaliar a sua disponibilidade.

• a teoria sócio-cognitiva, a qual perspectiva a auto-regulação compreendendo a auto-observação, auto-julgamento e auto-reacção. Ou seja, um aluno observa, julga e reage relativamente às percepções acerca dos progressos realizados em função dos objectivos ou metas fixadas. Factores que podem afectar os julgamentos são, por exemplo, determinadas normas absolutas ou vinculativas, algumas características dos objectivos, o grau de importância no alcance das metas e objectivos educativos, as atribuições causais dos desempenhos e resultados, etc. As auto-reacções aos progressos exercem efeitos motivacionais nos comportamentos, ou seja, o progresso percebido e satisfações antecipadas do cumprimento de objectivos sustentam as motivações. Com efeito, a motivação relaciona-se com auto-regulação através de processos tão diversos, como, a fixação de metas e objectivos, a auto-eficácia, as expectativas de desempenho, a expectativa-valor, entre outras variáveis motivacionais.

Igualmente, de acordo com Schunck (1996: 338), os investigadores das diferentes tradições postulam que a auto-regulação envolve os alunos em intenções ou fixação de metas, na aplicação de acções orientadas para objectivos, no controlo dos comportamentos e dos seus ajustamentos de forma a garantir o sucesso e êxito nos desempenhos. As teorias diferem, sobretudo nos mecanismos que baseiam a utilização dos processos cognitivos e comportamentais para auto-regular as respectivas actividades. Com efeito, somos levados a crer que as investigações acerca da auto-regulação académica emergem na exploração do

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modo como os alunos se tornam competentes relativamente aos seus próprios processos de aprendizagem. Aliás, surge como um construto central nos aspectos contemporâneos da aprendizagem académica (Pintrich, 1995: 173) quando se pretende ajudar os sujeitos a interessar-se e responsabilizarem-se pelos seus próprios processos de estudo e aprendizagem. Por outro lado, importa também explorar não apenas as competências dos alunos para estudar e aprender por auto-iniciativa, mas também conhecer as suas motivações para o fazer tal como o modo como o faz de forma autónoma, sem a dependência directa das experiências e competências de outros (professor, pares, família). Neste sentido, Corno & Snow (1986) caracterizaram o aluno auto-regulado como o aluno com auto-iniciativa (self-starter), o qual, seria capaz de manter a auto-motivação, parecendo capaz de tornar as aprendizagens mais fáceis para si próprio. Com efeito, em termos dos processos motivacionais, os alunos auto-regulados apresentam elevada auto-eficácia, auto-avaliações e auto-conceitos favoráveis e interesse intrínseco pelas tarefas (Zimmerman, 1990). Ertmer (1995, referido por Ertmer et al, 1996) define auto-regulação como a competência e motivação para implementar, controlar e avaliar várias estratégias de estudo em situações específicas de aprendizagem (case-based instruction) com o propósito de facilitar o crescimento dos conhecimentos. Deste modo, é possível considerar um aluno auto-regulado sem este possuir conhecimentos prévios acerca dos conteúdos que são ensinados, tais como, requisitos científicos específicos ou, experiências prévias acerca dos métodos de ensino usados (e.g., caloiros), uma vez, que são sobretudo as suas competências para activar, alterar e sustentar práticas apropriadas de aprendizagem, mormente, os hábitos de estudo e trabalho e a predizer o alcance do sucesso académico em contextos de aprendizagem quer estes lhes sejam (ou não) familiares (Zimmerman, 1990). Na realidade, muitos investigadores defendem que as aprendizagens efectivas são mais o resultado de estruturas e processos internos do que factores externos, tais como, materiais, professores ou sequências instrucionais. Neste sentido, o aluno auto-regulado distingue-se pela sua perspectiva acerca do estudo e aprendizagem académica como algo que este realiza para si próprio, em vez de perspectivar que é algo que é feito para si ou que é realizado por outros (Zimmerman, 1998: 1). Este aluno, acredita que o estudo e aprendizagem académica é uma actividade proactiva que exige iniciativa própria nos processos motivacionais e comportamentais, assim como em processos metacognitivos. Na perspectiva do processamento da informação, segundo Gitomer & Glaser (1987, referido por Schunck, 1996: 362), a auto-regulação é, grosso modo, sinónima de consciência metacognitiva (metacognitive awareness). Esta consciência inclui conhecimento da tarefa, isto é, conhecimento 'declarativo' e 'condicional', o que é para ser aprendido, quando e como é aprendido, bem como, auto-conhecimento das competências pessoais, interesses e atitudes. A aprendizagem auto-regulada exige alunos com um conjunto de conhecimentos de base para cumprir as exigências da tarefas, qualidades pessoais e estratégias

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CAPÍTULO 3 163

apropriadas. A consciência metacognitiva inclui, igualmente, o conhecimento procedural, isto é, o 'saber como', o qual, geralmente envolve qualquer espécie de acção ou produções que regulem as aprendizagens do material através do auto-controlo dos níveis pessoais de aprendizagem, a tomada de decisão relativa à adopção (ou não) de uma diferente abordagem á tarefa e, ainda, o modo como avaliar a prontidão para executar um exame. As actividades auto-regulatórias (metacognitivas), as quais facilitam o processamento e transformação da informação através do sistema, são como processos de controlo (Schunck, 1996) segundo as orientações do aluno. Para McKeachie et al. (1987), embora seja a consciência da cognição e o conhecimento acerca desta um aspecto importante da metacognição é contudo ainda mais importante o outro aspecto que envolve controlo e regulação da cognição, uma vez que é este que controla e regula o uso das estratégias que são conhecidas pelo aluno. Na realidade, estes aspectos de auto-controlo e auto-regulação incluem três processos gerais responsáveis por orientar, regular e supervisionar as aprendizagens (Brown et al, 1983, referido por Chalmers & Fulller, 1997), designadamente:

• 'planeamento de actividades'. Ou seja, processos adoptados antes de iniciar uma tarefa ou actividade de aprendizagem e inclui fixação de metas, predição de resultados, inventariação da ordem segundo a qual determinadas estratégias deverão ser usadas, experimentação de várias formas e caminhos e simulação para antecipação de erros e problemas. Estas actividades ajudam os alunos a decidir quais as estratégias a usar e como processar as informações efectivamente, além de ajudar os alunos na evocação de qualquer conhecimento relevante da memória de longo-prazo que possa tornar a organização ou a compreensão da informação mais acessível;

• 'actividades de monitorização'. Que são um aspecto essencial da auto-regulação e incluem testar, revisionar e inventariar ou reorganizar estratégias quando o aluno está envolvido numa tarefa de estudo e aprendizagem. A monitorização está presente quando os alunos fixam a sua atenção durante o estudo ou quando se auto-questionam durante a leitura de um texto ou assunto para avaliar a sua compreensão acerca deste. Estas acatividades ajudam os alunos a compreender as informações e a integrá-las com os conhecimentos anteriores. (McKeachie et al, 1987);

• 'actividades de verificação ou auto-regulação'. As quais, envolvem avaliação dos resultados das tarefas de aprendizagem relativamente a critérios ou metas previamente estabelecidas de eficiência ou efectividade (Brown et al, 1983). Exemplos destas actividades incluem ajustamento dos esforços e tempo de estudo em resposta às dificuldades de uma tarefa, o revisionamento da informação para testar a sua compreensão, sublinhar os aspectos mais importantes ou saltar aqueles que são mais difíceis, etc. As evidências mostram que estas actividades de auto-regulação promovem os desempenhos ajudando os alunos a testar e a corrigir os seus comportamentos à medida que vão executando uma determinada tarefa (Campione et al, 1989, referido por Chalmers & Fuller, 1997).

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Por outro lado, para Zimmerman (1998: 2), a auto-regulação académica não é uma capacidade mental, tal como a inteligência, ou uma competência académica, como por exemplo, ser proficiente na leitura. Em vez disso, é o processo auto-orientador através do qual os alunos transformam as suas capacidades mentais em competências académicas. Neste sentido, é possível considerar a noção de Bandura (1982, referido por Corno & Rohrkemper, 1985: 59) que vai no sentido de considerar que as capacidades de auto-regulação exigem mecanismos de autonomia e auto-garantia (responsabilidade) para os usar eficazmente. Exemplificando, Corno & Mandinach (1983) apresentam estes processos orientadores como um instrumento através do qual os alunos podem desenvolver competências académicas, bem como um forte sentido de responsabilidade pessoal. No seu modelo 'SRL: Self-Regulated Learning', a aprendizagem auto-regulada é definida como a mais alta forma de empreendimento cognitivo que o aluno pode utilizar para estudar e aprender em contexto académico. Ou seja, é um esforço que importa realçar nos alunos para que se intensifiquem e manipulem as redes associadas a uma área particular, as quais, não estão necessariamente limitadas aos aspectos académicos. Além disso, importa levá-los a controlar e promover este mesmo processo de elevação. Componentes do SRL

Operação

Atenção

Receber novos estímulos. Procurar e juntar as informações

Tran

sform

ação

Selectividade Conexão Planeamento

Descriminação entre estímulos. Distinção e processamento das informações relevantes nas tarefas. Procura de conhecimentos ligando nova informação com conhecimentos adquiridos antes. Organização de uma sequência de aproximação ás tarefas ou rotinas de desempenhos. Reestruturação da informação.

Aquis

ição

Controlo Procura contínua de estímulos e transformações. Revisionamento, auto-teste. Incentivos motivacionais e estratégias de controlo.

Figura 3-I: componentes do modelo SRL (segundo Corno & Rohrkemper,1985: 61)

Ainda segundo Corno & Mandinach (1983), posteriormente confirmada por Corno & Rohrkemper (1985), a definição de SRL é consistente com a perspectiva de rede cognitiva na memória humana, segundo a qual, as estruturas da memória desenvolvem-se em parte via processos estratégicos de ordem superior, conhecidos por metacognitivos ou de controlo executivo e, igualmente consistentes com as formulações de disposições cognitivas para aprender (a este propósito, ver Snow & Lohman, 1984; Corno & Snow, 1986). É também hipotetizado que estes processos são usados em maior ou menor extensão pelos alunos na aquisição e transformação dos conteúdos da informação obtidas na aulas e, neste sentido, um nível relativamente elevado de variação nas actividades de aquisição e transformação é uma condição necessária e suficiente para definir o SRL.

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CAPÍTULO 3 165

Já antes haviamos referido que os alunos auto-reguladores acreditam que a aquisição da proficiência é um processo estrategicamente controlável e assumem a responsabilidade pelos resultados dos seus desempenhos (Zimmerman & Martinez-Pons, 1992). Desenvolvendo um pouco mais, um aluno auto-regulador está cognitiva e metacognitivamente ciente das relações estratégicas que existem entre processos auto-regulatórios e resultados académicos. Isto é, sente-se competente e capaz de usar com eficácia essas estratégias, possui metas e objectivos de aprendizagem claramente definidos, controla pensamentos negativos e a ansiedade e, acredita que a utilização das estratégias o ajudará a alcançar as suas metas e altos níveis de desempenho académico (Zimmerman, 1989).

1.1. Ciclos auto-regulatórios do estudo e aprendizagens

Com efeito, Zimmerman (1989: 330) tomando a noção de 'reciprocalidade triádica' (pessoa-self]/ ambiente/ comportamento), presente em Bandura (1986), relacionou as várias características do aluno auto-regulador como um sistema intra e interactivo, o qual designou de 'análise triádica do funcionamento auto-regulado' composto essencialmente por:

• 'elementos pessoais' (self). Compreende objectivos, auto-eficácia, metacognição, conhecimento (procedural, declarativo, estratégico), percepções de valor, tomada de decisão, volição e afectividade;

• 'influências comportamentais'. Incluem os subprocessos de interacção recíproca de auto-observação, auto-julgamento e auto-reacção (designações de Bandura,1986);

• 'factores ambientais ou situacionais'. Residem em aspectos legais de aula ou instrucionais, como por exemplo, curriculos, regulamentos, mormativos, experiências, feedbacks, resultados académicos e ainda, condições e espaços de trabalho, distractores, modelos de coping, procura de assistência entre pares, professores, família ou outros, informação, fontes e recursos bibliográficos, etc.

Para Schunck (1996: 361), este sistema de reciprocidade triádica contrasta com perspectivas não-cognitivas ou puramente comportamentais, as quais, embora aplicando alguns métodos comuns (e.g., a auto-memorização) são no entanto bastante limitadas porque tendem a excluir dos seus modelos algumas estratégias cognitivas essenciais. Este sistema igualmente contrasta com os ciclos (fechados) e negativos de feedback (Carver & Scheier,1990, referido por Schunck, 1996), uma vez que se acredita que os alunos comparam sistematicamente os seus desempenhos relativamente aos seus objectivos de aprendizagem. Exemplificando, se o feedback obtido indicar que os desempenhos se situam abaixo do pretendido, então, os alunos procurarão naturalmente inverter essa tendência. Com efeito, as várias investigações e abordagens sócio-cognitivistas da auto-regulação tendem a perspectivar a aprendizagem como um processo aberto-fechado.

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Não obstante, Schunck defende que os teóricos sócio-cognitivistas tendem a argumentar que os sistemas auto-regulatórios são 'abertos' na medida em que quer as metas quer as actividades estratégicas associadas mudam em função das auto-avaliações e feedbacks, nos alunos. Ou seja, a progressão nos objectivos e o seu alcance eleva os sentimentos de auto-eficácia nos alunos e a sua capacidade para adoptar novos objectivos ou, cada vez, mais difíceis e complexos. Mais além, os alunos que se sentem eficazes acerca das suas aprendizagens seleccionam aquilo que acreditam ser estratégias úteis ou apropriadas, controlam os seus desempenhos e alteram as suas abordagens ás tarefas quando os métodos e procedimentos adoptados parecem não ser os mais indicados às situações (Zimmerman, 1989, 1990, referido por Schunck, 1996: 362). De facto, Zimmerman & Martinez-Pons (1990) sugerem nomeadamente que as evidências apontam no sentido da auto-eficácia se relacionar positivamente com o uso produtivo de estratégias auto-regulatórias. Entretanto, em Zimmerman (1998: 2) encontramos um modelo integrador de análise deste processo que ocorre em três fases fundamentais, conforme se apresenta na Figura 3-II:

Figura 3-II: ciclo das fases do estudo académico (segundo Zimmerman,1998: 3)

Neste esquema de Zimmerman, salientamos os seguintes aspectos: Fase 1) Previsão (forethought). Refere-se aos processos de influência e crenças que precedem ou

predizem os esforços para estudar ou aprender e fixam o estádio para tal aprendizagem. São cinco os processos que têm sido estudados na investigação acerca da auto-regulação académica: � 'fixação de metas'. Relaciona-se com a decisão de resultados específicos da aprendizagem; � 'planeamento estratégico'. Relaciona-se com a selecção de estratégias ou métodos designados

para atingir as metas desejadas (Zimmerman, Bandura & Martinez-Pons, 1992); � 'auto-eficácia'. Relaciona-se com as percepções e crenças pessoais acerca das próprias

capacidades para aprender ou desempenhar tarefas a um determinado nível elevado (Bandura, 1986);

Previsão

� Fixação de metas/ objectivos � Planificação estratégica � Crenças de auto-eficácia � Metas de aprendizagem � Interesse intrínseco

Auto-reflexão

� Auto-avaliação � Atribuições causais � Auto-reacções � Adaptatividade

Controlo dos desempenhos e intenções � Focar a atenção � Auto-instrução/ representações mentais � Auto-controlo/ auto-monitorização

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CAPÍTULO 3 167

� 'objectivos de aprendizagem'. Os sujeitos que apresentam uma orientação para atingir objectivos de aprendizagem tendem a aprender mais efectivamente que os sujeitos que apresentam uma orientação para objectivos de desempenho (Ames, 1992; Tardif, 1997);

� 'interesse intrínseco'. Os sujeitos que têm um interesse intrínseco numa tarefa persistem nos esforços de estudo e aprendizagem, mesmo na ausência de recompensas (Deci, 1975).

Fase2) Controlo da vontade ou desempenho (performance or volitional control). Envolve processos que ocorrem durante os esforços de estudo e aprendizagem e afectam a concentração e os desempenhos. São três os tipos de processos envolvidos que são estudados na investigação da auto-regulação académica e que permitem aos sujeitos focar nas tarefas e optimizar os seus desempenhos: � 'focar a atenção'. Há uma necessidade dos sujeitos em proteger as suas intenções para

estudar dos possíveis distractores ou intenções concorrentes (ver os teóricos volicionistas como Snow, Corno, Heckhausen, Kuhl, entre outros);

� 'auto-instrução e representação mental'. O primeiro aspecto relaciona-se com a indicação ao próprio em como proceder durante uma tarefa de estudo e aprendizagem (vários autores são referidos em Schunck & Zimmerman, 1998). O segundo aspecto tem sido amplamente demonstrado, nomeadamente a eficácia da construção de representações ou imagens mentais como técnicas de promoção da aprendizagem e evocação da informação (Santiago, 1996 e Chalmers & Fuller, 1996);

� 'auto-controlo' ou 'auto-monitorização'. É um processo vital na auto-regulação porque informa o sujeito acerca do seu progresso (ou falta dele) mas que pode interferir nos processos de implementação estratégica (Winne, 1995). Com efeito, Zimmerman (1998: 4) salienta a complexidade deste processo pelo facto de á medida que uma competência é adquirida menos controlo intencional é exigido, segundo um fenómeno que classifica de 'automatização' ou 'rotinização';

Fase3) Auto-reflexão (self-reflection). Envolve processos que ocorrem depois dos esforços colocados no estudo e aprendizagem e influenciam as reacções dos sujeitos acerca dessas experiências. Estas auto-reflexões, por sua vez, influenciam as previsões observando esforços subsequentes, completando desse modo o ciclo auto-regulatório. Quatro tipos de processos foram analisados nas investigações da auto-regulação académica: � 'auto-avaliação'. Usualmente, o primeiro subprocesso da auto-reflexão e que envolve

comparação entre a informação auto-controlada e qualquer espécie de norma ou objectivo pré-estabelecido. No caso de não haver normas formais ou objectivos standardizados, os alunos

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auto-regulares quererão avaliar-se a si mesmos em função dos desempenhos dos seus pares (Festinger, 1954);

� 'atribuições causais'. Este subprocesso é importante na auto-reflexão porque as atribuições do insucesso a causas internas no indivíduo tendem a levá-lo a reagir no sentido da sua correcção. Com efeito, os alunos auto-reguladores tendem a atribuir os insucessos a causas corrígíveis (estratégia, esforço, motivações, etc.) e atribuir sucessos a competências pessoais. No entanto, as atribuições causais são influenciadas por uma variedade de factores pessoais e contextuais.

� 'auto-reacções'. As evidências sugerem que as atribuições pessoais do sucesso e insucesso ao uso de estratégias está directamente relacionado com auto-reacções positivas, enquanto a atribuição dos resultados às capacidades individuais (e.g., a inteligência) parece estar relacionada com auto-reacções negativas (Zimmerman & Kitsantas, 1997). Por outro lado, as atribuições estratégicas além de promover auto-reacções, assistem na identificação das fontes dos erros e permitem a adaptação dos desempenhos e competências académicas de cada um (Zimmerman, Bandura & Martinez-Pons, 1992);

� 'adaptabilidade'. Assume vários ciclos que suportam as várias fases da auto-regulação académica referidas anteriormente, no sentido que cada uma destas fases cria inércia que pode facilitar ou dificultar o estudo e aprendizagens durante as fases subsequentes. É este subprocesso que fecha o elo que liga o processo de auto-reflexão e o processo de previsão, completando o ciclo auto-regulatório.

1.2. Modelo conceptual para análise da auto-regulação académica

Ao nível dos ciclos auto-regulatórios das aprendizagens, retivemos o conceito de que o aluno auto-regulador é visto, nas diferentes perspectivas, como participante activo no controlo e iniciativa acerca das suas próprias aprendizagens e que reconhece as relações funcionais entre modelos de intenção e acção (frequentemente designados de estratégias) e os desempenhos sociais ou contextuais exigidos. Aliás, Zimmerman (1989: 329) avança como uma definição de aluno auto-regulado como sendo aquele que é descrito, de um modo geral, pela medida ou extensão em que é metacognitiva, comportamental e emocionalmente um participante activo na sua própria aprendizagem . Além disso, investigações recentes (Zimmerman & Martinez-Pons, 1986 a 1992; Zimmerman, 1994; Schunck & Zimmerman, 1994, 1998 e também Vermunt, 1996,1998) mostram que os professores não parecem ter grande dificuldade na identificação dos atributos auto-reguladores nos seus alunos. Zimmermam

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CAPÍTULO 3 169

(1994: 5) sugere, inclusivamente, uma forma útil de classificar a auto-regulação, nos alunos, de acordo com os seguintes critérios facilmente observáveis:

• alunos com auto-iniciativa (self-starters), os quais, apresentam extraordinários níveis de esforço e persistência na execução de tarefas académicas;

• alunos auto-confiantes, estratégicos e com recursos disponíveis para resolver os problemas emergentes;

• alunos, usualmente, auto-reactivos aos resultados e desempenhos nas tarefas. Dito de outro modo e em outra ocasião, Zimmerman (1989: 329) afirma que para se qualificar, especificamente, um aluno como auto-regulado é necessário assumir apenas três elementos fundamentais. Ou seja: 1. 'o uso habitual de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens'. Acções e processos dirigidos para a

aquisição da informação ou competências que envolvem acção (autonomia), intenção (propósito) e mecanismos de percepção nos alunos;

2. a 'auto-eficácia'. Relaciona-se com as percepções acerca das próprias capacidades para organizar, planear e implementar as acções necessárias para atingir determinados desempenhos ou competências para tarefas específicas (Bandura, 1986);

3. 'as metas ou objectivos académicos'. Variáveis quanto à natureza e extensão no tempo (e.g., execução de um exame específico, obtenção de um curso, pós-graduação, estima social ou oportunidades profissionais, etc.)

Para o efeito, Zimmerman & Martinez-Pons (1986) categorizaram e mediram as acções estratégicas de alunos auto-regulados numa série de estudos e investigações, propondo uma classificação de 14 estratégias de auto-regulação, baseados em entrevistas e com o propósito de representar o leque de comportamentos que os estudantes manifestam na regulação do seu próprio: a) funcionamento pessoal; b) desempenhos académicos; e c) contexto de estudo. Salientamos também o facto assinalado em Zimmerman & Martinez-Pons (1988) de que o conhecimento das estratégias de auto-regulação, embora, directamente relacionado é distinto do uso destas estratégias em contextos específicos de aprendizagem. É assumido que o meio ambiente e os factores motivacionais afectam as decisões dos alunos no uso de estratégias de auto-regulação conhecidas. Por conseguinte, este modelo interactivo procura focar, fundamentalmente, o modo como os alunos selectivamente percepcionam, activam, alteram e sustentam as suas práticas de aprendizagem nos vários contextos1, os quais variam segundo a sua função, estrutura e conteúdo.

1 Em Zimmerman & Martinez-Pons (1988: 285) são apontados seis diferentes contextos de estudo e aprendizagem nos alunos, nomeadamente, as situações de aula, o estudo independente, quando se realizam trabalhos escritos, quando se resolvem exercícios matemáticos, quando se preparam para exames e quando estão pouco motivados para executar os trabalhos de casa.

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Na classificação proposta por Zimmerman & Martinez-Pons (1986), baseada sobretudo em entrevistas e estudo de casos, a qual foi sendo sucessivamente desenvolvida (Zimmerman & Martinez-Pons, 1988, 1990, 1992) inclui estratégias tão diversas como, estratégias de auto-avaliação, organização e transformação, fixação de objectivos e planificação, procura de informação, armazenamento e auto-controlo, gestão dos espaços e ambiente de trabalho, atribuição de auto-consequências, evocação e memorização, procura de assistência (da família, pares, professores, outros) e de revisão (notas, apontamentos, bibliografia). Entretanto, Nist et al. (1991: 850) referem os modelos interactivos de Jenkins e Bransford, os quais, tendo presente os processos cognitivos e afectivos que estão na base da auto-regulação académica postulam que as características pessoais do aluno, tais como, interesse, motivações, ansiedade, estilos, expectativas, capacidades, etc. em conjunto com os materiais de estudo e aprendizagem, tarefas criteriosas e actividades ou estratégias de estudo e aprendizagem, são as variáveis que devem interagir no sentido da optimização dos desempenhos académicos e para permitir que as aprendizagens ocorram. Nesta abordagem, o aluno auto-regulado não só compreende as suas próprias competências, conhecimentos e preferências de estudo (motivações), mas, igualmente compreende as características particulares de um exame ou as exigências de uma tarefa. Segundo Nist e colegas, os modelos propostos baseiam-se fundamentalmente em três assunções relacionadas com o estudo autónomo independente, ou seja:

1. É assumido que o aluno auto-regulador empreende, selectivamente, processos de estudo e utiliza estratégias em resposta às características particulares de cada tarefa. Deste modo, a eficácia e apropriação da estratégia varia em função do ajustamento entre a tarefa e as características cognitivas, metacognitivas e afectivas do aluno. Quanto mais apropriada a estratégia, mais facilmente a informação pode ser transferida para a memória de longo-prazo e, por consequência, mais efectiva é a aprendizagem.

2. É assumido que o aluno auto-regulador carece de um repertório alargado de estratégias de estudo a fim de poder fazer face ás várias exigências das tarefas que lhe surgem. Estas estratégias variam entre um leque de pouco complexas ou mais discretas como, por exemplo, a competência para analisar contextos ou estruturas, até ás bastante complexas e que envolvem processos metacognitivos como, planeamento e fixação de objectivos.

3. É assumido que o aluno auto-regulador possui controlo executivo sobre as estratégias que utiliza. Este controlo é um aspecto crítico da metacognição que envolve o aluno no planeamento, implementação, monitorização e avaliação de um plano de acção entre uma variedade grande de tarefas. Neste sentido, o aluno auto-regulado, além de possuir o conhecimento procedural que lhe permite avaliar os passos dados na utilização de uma estratégia deverá, igualmente, possuir o conhecimento condicional (estratégico) que lhe permite compreender quando e porquê a estratégia é apropriada (Paris et al,

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1983). Assim, o empreendimento efectivo da estratégia dependerá, essencialmente, da clareza com a qual a tarefa é definida, da apropriação da estratégia seleccionada, da motivação para aplicar a estratégia e, ainda da qualidade da avaliação e controlo exercido durante a implementação da estratégia (Nist et al, 1991: 851).

Efectivamente, já antes havíamos considerado que os teóricos da auto-regulação académica, tendem a perspectivar a aprendizagem como um processo multidimensional que envolve componentes intra e interpessoais (cognitivas e emocionais) e contextuais. Assim, para que uma competência académica seja desenvolvida com vista à mestria, os alunos deverão, em termos comportamentais, aplicar as estratégias cognitivas mais apropriadas a uma determinada tarefa dentro de um contexto relevante específico. Este facto, usualmente requer tentativas repetidas para aprender porque a mestria envolve a coordenação recíproca entre componentes (pessoais, comportamentais e ambientais), cada uma das quais, com uma dinâmica própria e articuladamente interactivas. As investigações acerca da auto-regulação académica procuram endereçar algumas das principais questões levantadas neste trabalho e que decorrem dos processos de estudo e aprendizagem dos jovens estudantes universitários, Referimo-nos, por exemplo, ao 'porquê?', 'como?' e 'onde?' estes estudantes auto-regulam as suas aprendizagens. Por outro lado, cada uma das questões levantadas, associa-se a dimensões psico-cognitivas mais amplas, tais como as competências intelectuais, as motivações e os métodos de estudo (Zimmerman, 1994: 7). Com vista a analisar toda a problemática associada e que concerne ao estudo dos mecanismos e processos presentes na auto-regulação académica, tentamos fixar um modelo conceptual de análise. A figura 3-III traduz essa tentativa, traduzida e adaptada de Zimmerman (1994: 8; versão modificada em Schunck, 1996: 340).

Figura 3-III: modelo conceptual para estudar a auto-regulação académica Questões Dimensões Condições Atributos da

Auto-regulação Processos

auto-reguladores

Porquê? Motivo Escolher participar Intrínseco ou auto-motivado

Metas pessoais, auto-eficácia, valores, atribuições causais

Como? Método Escolha do método Planeado ou automatizado

Uso de estratégias ou rotinização dos desempenhos. Hábitos de trabalho

O quê? Resultados dos desempenhos ou comportamentos

Escolha dos desempenhos ou comportamentos

Auto-avaliação de resultados dos desempenhos

Auto-controlo, auto-julgamento, auto-reacção, volição, controlo da acção,

Quando? Tempo Controlar limites de tempo

Atempada e eficiente Gestão do tempo

Onde? Ambiente (espaços físicos)

Controlar espaços e meio ambiente

Ambientalmente susceptível e c/ recursos

Gestão estrutural do ambiente e espaços físicos

Com quem? Social Adaptação. Escolha de pares e modelos

Socialmente susceptível e com recursos

Procura de ajuda

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De acordo com o esquema, as questões apresentadas na primeira coluna são fundamentais para compreender as formas da aprendizagem humana e cada uma destas questões implica uma dimensão psicológica na análise da auto-regulação académica. Zimmerman (1994) exemplifica que a questão 'porquê?' endereça os sujeitos para a motivação, referindo-se designadamente aos fenomenologistas (e.g., McCombs, Saljö, Marton e colaboradores) que procuram responder à questão estudando os auto-conceitos e interpretações dos estudantes acerca das suas vivências e situações e, aos teóricos atribucionais (e.g., Dweck e Nicholls) que focaram as interpretações dos alunos acerca dos resultados em termos de esforço ou capacidades. A questão 'como?' relaciona-se com os métodos e procedimentos adoptados pelo aluno para auto-regular as suas aprendizagens e desempenhos. A questão 'o quê? relaciona-se com a persistência e quantidade de esforço dispendida para auto-regular os desempenhos académicos. Os teóricos volicionistas (e.g., Corno, Snow, Heckhausen) postularam que o mero 'querer' auto-regular não é suficiente. Os alunos devem ser capazes de proteger as suas intenções dos eventuais distractores ou intenções concorrentes (como por exemplo, ir ao cinema em vez de ir estudar). Em contraste, os metacognitivistas (Flavell, Brown) discutiram o controlo pessoal dos desempenhos em termos da auto-monitorização dos processos cognitivos durante os desempenhos. As questões 'onde?' e 'com quem?' endereçam os esforços dos alunos para auto-regularem os seus ambientes sociais e espaços físicos de forma a criar as melhores condições para estudar e aprender. Neste sentido, descrições detalhadas acerca dos processos de ajustamento vocacional e académico podem ser encontradas em modelos, tais como os de 'impacto' defendidos por Pascarella & Terenzini (1991) e Russel & Petrie (1992) e, nas influências das variáveis situacionais sobre os desempenhos (Ramsdem, 1992). A terceira coluna, referente ás condições, aponta para as opções disponíveis para o aluno escolher aquelas que constituem, de acordo com Schunck (1996: 339), um aspecto crítico na auto-regulação académica que é o contraste entre a hetero e a auto-regulação. Ou seja, cabe ao estudante escolher e decidir (optar) entre uma ou mais hipóteses alternativas. Isto significa, por exemplo, que as tarefas e as condições para aprender devam ser apresentadas e estruturadas de modo ao estudante poder escolher pelo menos um aspecto entre outros alternativos. As duas últimas colunas da figura mostram os atributos mais importantes e os processos auto-reguladores envolvidos em cada uma das dimensões da auto-regulação. Descrições mais detalhadas acerca destes processos e atributos podem ser encontradas em Schunck (1996) e em Schunck & Zimmerman (1994, 1998). Igualmente se encontram nestes trabalhos, elementos importantes acerca das intervenções programadas para promover e desenvolver as competências auto-reguladoras em alunos, as quais, se associam frequentemente a uma ou a duas das áreas referidas e que têm a ver sobretudo com a instrução e treino específico nessas componentes. Efectivamente, um conjunto crescente de evidências tem mostrado

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CAPÍTULO 3 173

que estas competências auto-reguladoras podem e devem ser promovidas através de intervenções educacionais específicas (Schunck, 1996: 341).

2. Estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

No contexto dos objectivos deste estudo e tendo em vista potenciar intervenções sobre os jovens estudantes universitários, questionamos:

• quais são, na realidade, as acções, os procedimentos, as atitudes e os comportamentos que sustentam os processos reguladores do estudo autónomo e independente?

• quais as dimensões (cognitivas, metacognitivas e afectivas) que são representadas por esses procedimentos?

• que tipo de abordagem e estratégias específicas podem ser identificadas em cada uma destas dimensões e,

• como é possível ajudar a activar ou a desenvolver, nos estudantes universitários, as competências de estudo mais apropriadas à auto-regulação dos seus estudos e aprendizagens?

Pensamos que qualquer tentativa de resposta a esta problemática passava certamente pela tomada de atenção acerca do carácter da iniciativa, dos interesses, da vontade e das escolhas efectuadas pelo estudante. Por outro lado, acreditamos que estes factores jogam um papel crucial no conceito de estratégia e sugerem uma forte ênfase da motivação nas atitudes e comportamentos estratégicos perante o estudo e aprendizagens. Assumimos que as estratégias auto-reguladoras das aprendizagens são sequências integradas de actividades, procedimentos e competências, no jovem universitário, com intenção de facilitar a aquisição, transformação e utilização da informação nos momentos de aprendizagem (Nisbet & Shucksmith, 1987). Entretanto, pensamos que seria possível verificar que estas estratégias variavam segundo a sua qualidade, origem e sobretudo a sua função. Ou seja, depreende-se que as estratégias auto-reguladoras das aprendizagens possam ser distinguidas pela intensidade em que são usadas e/ou funcionam na auto-regulação do processo de aprendizagem. Neste sentido, o conjunto das atitudes e comportamentos para fazer face compreende várias competências essenciais (conhecimentos, satisfação, expectativas, auto-confiança, motivações, estilos, etc.) e diferentes níveis de acção que se traduzem, no estudante universitário, em abordagens específicas, tácticas e estratégias de vária índole e extensão, nomeadamente:

• Estratégias cognitivas, tais como, recepção, aquisição, selecção e organização da informação, manipulação, processamento e transformação do material de aprendizagem, conecção das novas informações com os conhecimentos anteriores conhecimentos, etc..

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• Estratégias metacognitivas, como por exemplo, auto-avaliação, gestão de recursos (temporais, materiais e humanos), monitorização, controlo e auto-regulação dos mecanismos e processos de aprendizagem, etc..

• Estratégias afectivo-relacionais, nomeadamente, aquelas que concernem à manutenção e promoção de um clima de aprendizagem favorável, no ajustamento académico, coping com o stress, ansiedade e problemas, na manutenção ou activação da motivação e do interesse para aprender, desenvolvimento de atitudes positivas perante as situações e problemas, relacionamento com os outros, etc..

Na realidade, tentamos seguir de perto a ideia de Vermunt (1996) de que o 'estilo' ou modo pessoal de estudar de cada um é determinado por diferentes actividades de aprendizagem (assimilação e regulação) que o indivíduo usa durante o processo de aprendizagem e pelas suas motivações relativamente às aprendizagens, assim como, as suas opiniões, expectativas e representações acerca do ensino e aprendizagem. Além disso, este 'estilo' é algo estável, mas não imutável (Schatteman et al, 1997). Por outro lado, a importância do conceito de estratégia de aprendizagem, tanto para a prática educacional como na teoria psicológica é uma constante nos diferentes contextos e processos de formação. Aliás, é um facto as recentes teorias da psicologia educacional, que haviam abandonado progressivamente os modelos behavioristas segundo os quais o conhecimento do sujeitos era uma simples réplica da realidade (E-R) baseadas nas práticas pesssoais, acercarem-se, hoje, de posições construtivistas e desenvolvimentistas recolocando o papel dos comportamentos na interacção entre a informação processada e os conhecimentos anteriores e posteriores dos sujeitos. Dito de outro modo, presentemente torna-se mais claro que as teorias recentes da psicologia educacional tendem a orientar-se, cada vez mais, para a análise da interacção entre os conhecimentos e materiais de aprendizagem e os processos psicológicos (cognitivos, afectivo-relacionais) subjacentes presentes e diferenciados em cada indivíduo. Também os professores, independentemente dos contextos académicos em que se inserem, vão progressivamente reconhecendo que o seu trabalho não pode ser apenas dirigido para proporcionar conhecimentos e assegurar determinados produtos ou resultados de aprendizagem, mas e sobretudo, facilitar e fomentar os mecanismos e processos que permitem alcançar esses mesmos produtos. Aliás, as evidências indicam que estes objectivos não são incompatíveis, ao invés, provavelmente eles implicam-se mutuamente (Pozo, 1995:201). Com efeito, este duplo interesse tem permitido um número crescente de investigações e modelos de avaliação destes mecanismos e processos que vão desde numerosos questionários e inventários, principalmente, usando técnicas psicométricas correntes e derivados dos trabalhos de medição das atitudes, sobre hábitos e procedimentos perante o estudo e os vários programas desenhados para promover esse tipo de competências. A este propósito, referem-se Nisbet & Schucksmith, 1987; Weinstein e colegas,1985; Gibbs,1992a,1995, 1996; Entwistle, 1987; Biggs, 1989, 1993; Chalmers & Fuller, 1996; Schunck &

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CAPÍTULO 3 175

Zimmerman, 1998, entre outros, até aos rigorosos estudos experimentais sobre as relações entre a aprendizagem e a memória e exploração de conceitos como nível de processamento cognitivo, nomeadamente, Brown et al., 1983; Marton, Hounsell & Entwistle, 1984, 1997; Flavell, 1975, Schmeck, 1988; Das, Kar & Parrila, 1996; Weinstein, Goetz & Alexander, 1988; etc.. Podemos ainda incluir nesta listagem, uma imensidade de estudos usando diferentes metodologias com intenção de levar os professores a ensinar os alunos a utilizarem diferentes estratégias de aprendizagem, tais como por exemplo, Danserau, 1985; Corno & Rohrkemper, 1985; Wittrock,Weinstein & Mayer, Corno & Snow, in Wittrock, 1986, Ramsdem, 1992; e, muitos outros.

2.1. Tácticas, skills, estilos e outros processos cognitivos e não cognitivos

Segundo Schmeck (1988: 5) o termo 'estratégia', na origem militar, referia-se aos procedimentos para implementar um plano de uma operação militar de larga-escala. Os passos específicos na implementação do plano eram designados de 'tácticas'. Modo geral, o termo 'estratégia' surge para referir a implementação de um conjunto ou sequência de procedimentos específicos (tácticas) para alcançar um determinado objectivo. Na realidade, é possível descrever as estratégias como uma colecção de tácticas cognitivas ou mentais que são usadas por um indivíduo numa situação particular de modo a facilitar a aprendizagem. Para Garner (1988: 64), um aspecto importante a realçar relativamente a uma estratégia, é o facto, de esta estar dependente do controlo de quem a utiliza. Ou seja, embora certas subrotinas possam ser aprendidas (ou treinadas) até um ponto de automaticidade, as estratégias são, geralmente, deliberadas, planeadas e conscientemente empreendidas nas actividades. Com efeito, o que Garner pretende dizer é que as estratégias exigem recursos de atenção ilimitados e que a utilização de estratégias podem ser examinadas, relatadas e modificadas. Neste sentido, Paris et al (1983: 185) definem as estratégias como 'skills under consideration' e lembram que para uma actividade ou táctica no aluno seja considerada estratégica, esta, deverá ser seleccionada de entre um conjunto de alternativas disponíveis e ser intencionada para alcançar determinado objectivo ou executar uma tarefa específica. Ou seja, as tácticas ou as actividades estratégicas utilizadas não são, de modo algum, nem acidentais nem automáticas. Também para Schmeck (1988: 5), estratégias e tácticas são planos conscientes e intencionais. Ou seja, se é tomada uma decisão consciente para implementar um skill, então, estão envolvidas estratégias e tácticas. 'Skills' são coisas que podemos fazer. As estratégias e as tácticas envolvem as decisões conscientes (ou planos) para implementar esses mesmos skills. Segundo Kirby (1998: 230), a recente teoria psicológica e as investigações relacionadas, tendem a dividir os processos cognitivos em dois domínios, os quais, podem ser designados, em termos gerais por estratégias e skills. Este autor faz a distinção entre

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estratégias e skills baseado no argumento que skills são rotinas cognitivas existentes para desempenhar tarefas específicas, enquanto as 'estratégias' são os meios para seleccionar, combinar ou re-desenhar essas rotinas cognitivas. Kirby sugere uma terminologia acerca dos skills e das estratégias, conforme se pode observar na Figura 3-IV. SKILLS ESTRATÉGIAS Competências Skills Táctica Estratégia Estilo

(conhecimentos, acções)

Figura 3-IV: skills e estratégias

Na figura,

• Os skills variam desde conhecimentos (knowledge skills), os quais são acedidos através de modelos estimulados por representações e associações, até acções (action skills), isto é, a transformação dos estímulos (imputs) para obter os resultados desejados. Os skills podem ainda ser específicos (e.g., saber uma regra de cálculo) ou gerais (saber para que serve essa regra de cálculo). Os skills estão essencialmente relacionados com as competências e, neste sentido, as competências representam como um certo nível ou 'potencial' (produto entre factores constitucionais e experiênciais que limita o que os skills podem obter);

• As estratégias envolvem escolha e tomada de decisão; o domínio das estratégias consiste em tácticas, estratégias, estilos e controlo. A 'táctica' é a decisão de aplicar determinado skill (exemplo, decidir usar esta regra de cálculo). A 'estratégia' é uma série ou combinação de tácticas, ou uma escolha entre tácticas que forma um plano coerente para executar ou resolver determinado problema. O 'estilo' relaciona-se com o uso habitual de uma classe de estratégias similares (um estilo analítico versus um estilo digital na resolução de um problema) e, o 'controlo' executivo do processo.

Mas, segundo Biggs (1988: 185), os termos 'estilo' e 'estratégia' referem-se sobretudo a dois aspectos diferentes da aprendizagem dos sujeitos. 'Estilos' são formas estáveis de abordar tarefas ou uma predisposição característica de um indivíduo para adoptar uma determinada estratégia de aprendizagem, enquanto 'estratégias' são sequências de acções ou formas específicas de lidar com tarefas particulares. Isto é, os estilos estão focados na pessoa; as estratégias nas tarefas. Riding & Staley (1998: 44) igualmente partilham da opinião que é útil fazer a distinção entre 'estilo' e 'estratégia', afirmando que o estilo, provavelmente tem uma base psicológica e está suficientemente fixo no indivíduo, ao contrário das estratégias que são formas passíveis de serem aprendidas e desenvolvidas para lidar com as situações e tarefas; sendo métodos particulares de utilização dos estilos que melhor se ajustam a cada situação. Já Das (1988: 102), questiona-se acerca do que são estilos cognitivos e como é que estes se relacionam com os estilos de aprendizagem. Este autor refere a citação de Messick de estilo cognitivo como

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CAPÍTULO 3 177

consistindo nos modos gerais, habituais de processamento da informação. Neste sentido, os estilos de aprendizagem são estilos cognitivos aplicados quando os indivíduos aprendem. Este definição emparelha com a definição de estratégia cognitiva, a qual, diz respeito às operações e procedimentos que um indivíduo pode usar para adquirir, reter e evocar diferentes tipos de conhecimentos e desempenhos (definido por Rigney e referido por Biggs e Das, in Schmeck, 1988). Então, é possível assumir que o estilo seja, no indivíduo, algo latente; enquanto as estratégias são manifestas nos desempenhos. Podem estes conceitos serem comparados, respectivamente, com imagens e planos. As 'imagens' traduzem o somatório dos conhecimentos, experiências, memória e tendências da pessoa. Por sua vez, os 'planos' relacionam-se com a execução de um conjunto ou série de acções. Sublinhamos também que se as estratégias expressas são como planos nos desempenhos, então, não serão apenas meras manifestações de estilos (ou imagens). Na realidade, uma poderá ser a causa e a consequência da outra. Mas, as estratégias (ou os estilos) manifestas (presentes) poderão ou não reflectir, no indivíduo, os estilos (estratégias) cognitivos convenientemente. Isto significa, por exemplo, que os planos (estratégias cognitivas) adoptados pelo indivíduo para fazer face a uma determinada tarefa poderão ser inapropriadas, mesmo no caso de este possuir o estilo cognitivo que facilita essa apropriação. Schmeck (1988: 8) hipotetiza que quando se constata que um indivíduo apresenta uma inclinação para usar a mesma estratégia em situações variadas, então, suspeita-se da presença de um 'estilo'. Refere este autor que, nomeadamente Entwistle e Ramsdem, reservam a palavra 'style' para corresponder, em cada indivíduo, ao traço estável e consistente com a forma como aborda o escutar, o perceber e o pensar. Ou seja, o que tradicionalmente é designado de 'estilo cognitivo'. Além disso, Schmeck concorda que a dimensão maior do estilo cognitivo corresponde à relação entre aspectos da atenção, percepção e pensamento (global/ holístico) versus (focado/ detalhado) nos processos de aprendizagem individual. Refere este autor, os trabalhos de Witkin e colegas (e.g., Witkin, Moore, Goodenough & Cox, 1977) que usaram os termos 'dependente 'independente' ou 'global' e 'articulado' para mencionarem os elementos da atenção e percepção nesta dimensão do estilo cognitivo. Entretanto, outros, preferem mencionar os estilos 'impulsivo' e 'reflexivo' de Kogan(1976). Também Kirby e Pask (in Schmeck,1988) usam os termos, respectivamente, 'global' vs 'analítico' e ' holísta' vs 'serialista'. Estes termos correspondem aos estilos de aprendizagem, 'compreensivo', isto é, quando o aluno se concentra em generalidades e adiciona detalhes apenas se necessário; ou 'operativo', quando o aluno se concentra nos detalhes e então extrai generalizações. Também, é possível ler em Schmeck (1988) que enquanto Das sugere poderem apresentar os indivíduos preferências estilísticas nos processos simultâneos e sucessivos de codificação (ver os pressupostos da teoria PASS, in Das, Naglieri & Kirby, 1994), por sua vez, Marton enfatiza as influências situacionais (fenómenos), referindo as formas 'holística' vs 'atomística' de estruturar as experiências.

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Mais recente, observamos uma descrição das dimensões fundamentais de 'estilo cognitivo' e alguns aspectos adicionais num artigo editorial de Rayner & Riding (1997) e na revisão da literatura acerca das diferenças individuais efectuada por Jonassen & Grabowski, (1993). Igualmente, Riiding & Cheema (1991: 196), numa ampla revisão da literatura acerca dos estilos cognitivos, propõem uma integração dos vários modelos existentes em duas grandes famílias em torno dos seguintes critérios:

• primeiro, o modo como os sujeitos processam a informação e tomam uma perspectiva relativamente ao 'todo' ou ás partes (wholistic-analytic) e,

• segundo, o modo como os sujeitos representam a informação ou pensam em termos de palavras ou figuras (verbalizer-imager).

• uma terceira família de modelos de 'estilos' de aprendizagem foi entretanto identificada, incluíndo alguns dos principais modelos associados às várias abordagens teóricas centradas nas diferenças individuais e consideradas para descrever modelos ou aspectos das estratégias e competências de estudo e aprendizagem, deixando de fora o construto de estilo cognitivo (ver por exemplo, Pintrich et

al, 1993; Vermunt, 1996; Murray-Harvey, 1994, Sadler-Smith, 1997; Busato et al., 1998, entre outros) Entretanto, Jones (in Schmeck,1988: 237) afirma que as estratégias de estudo e aprendizagem são as operações ou processos mentais que o estudante utiliza para facilitar a aprendizagem. Mas acrescenta que estas estratégias são manifestadas através de comportamentos específicos, os quais, são orientados por determinadas metas ou finalidades estabelecidas de modo consciente ou inconsciente. Também Flavell & Wellman (1977, referidos por Pozo, 1995: 202) fazem uma distinção útil entre quatro categorias de fenómenos ou processos no desenvolvimento da memória, que resultam igualmente eficazes quando são aplicados na análise das estratégias de estudo e aprendizagem. Ou seja:

• processos básicos de aprendizagem, derivados da própria estrutura e funcionamento do sistema cognitivo, tal como é analisado nos estudos do processamento da informação;

• conhecimentos disponíveis, relativos, temáticos e específicos dos diversos materiais, os quais podem facilitar ou dificultar as aprendizagens;

• estratégias de aprendizagem, definidas como séries de acção ou sequências planificadas de actividades que o sujeito realiza ou executa;

• o metaconhecimento, ou o conhecimento do sujeito sobre seus próprios processos psicológicos (cognitivos e afectivo-relacionais) e que o ajuda a utilizá-los de modo mais eficaz e flexível na planificação das suas estratégias de aprendizagem. A estas categorias seriam mais tarde acrescentadas outras duas distinções que delimitam o conceito

de estratégia de aprendizagem entre os processos cognitivos, conforme se pode observar na Figura 3-V, traduzida e adaptada de Pozo (1995: 203).

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CAPÍTULO 3 179

Figura 3-V: relação entre as estratégias de aprendizagem e outros processos cognitivos e não cognitivos

Neste esquema é possível observar uma clara distinção entre, por um lado, as estratégias de

aprendizagem, as habilidades, os hábitos ou competências de estudo gerais (Nisbet & Schucksmith, 1987; Schmeck, 1987; Richardson et al., 1987; e Weinstein et al, 1988); e por outro, as estratégias de apoio psico-pedagógico à aprendizagem (Danserau, 1985; Weinstein & Mayer; Corno & Snow, in Wittrock, 1986; Weinstein et al, 1989; Zuncker, 1994; Chalmers & Fuller, 1996; Gonçalves e Bastos, 1996; Schunck & Zimmerman, 1994, 1998; Pereira, 1997, 1998). Segundo Pozo (1995), esta distinção entre estratégias e outros processos torna-se dificultada, uma vez que se situam como causa e efeito relativamente ao sujeito em situação de aprendizagem. Contudo, importava fazer esta distinção na medida em evidencia a insuficiência de ensinar ou treinar os alunos sobre tácticas, técnicas ou competências de estudo que não sejam acompanhadas de certas doses de metaconhecimento (a auto-consciência a que se referia Biggs, 1988 e Gitomer & Glaser, 1987). A repetição cega ou mecânica de certos recursos ou hábitos não supõe em caso algum uma estratégia de aprendizagem. E, tal como afirma Pozo (1995: 203), 'esta es uma crítica severa para muchos cursos y programas de

entrenamiento en el estudio que consisten en adiestrar a los alumnos en ciertas habilidades sin que el

alumno sea capaz de realizar por si mismo las dos tareas metacognitivas básicas: planificar la ejecución de

esas actividades, decidiendo cuáles de ellas son más adecuadas en cada caso y, tras aplicarlas, evaluar su

éxito o fracaso e indagar en sus causas?. Na realidade, o jovem estudante universitário quando procura auto-regular o seu estudo e consequentes aprendizagens, deve eleger a estratégia mais adequada em função, nomeadamente dos seguintes critérios:

• natureza qualitativa e quantitativa dos materiais e tarefas apresentadas;

METACONHECIMENTO

ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM ESTRATÉGIAS DE APOIO

COMPETÊNCIAS OU HÁBITOS DE ESTUDO

CONHECIMENTOS TEMÁTICOS ESPECÍFICOS

PROCESSOS BÁSICOS

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• seus próprios conhecimentos anteriores acerca do material de aprendizagem e forma de os relacionar com a nova informação;

• condições emocionais, temporais e espaciais da aprendizagem (por exemplo, a vontade para estudar, o tempo disponível, o local e os distratores do estudo)

• metas e finalidades da aprendizagem, ou seja, a forma como vai ser avaliado (segundo metas de desempenho ou metas de aprendizagem).

Ainda a este propósito, registamos a perspectiva de Miles (1988: 334) quando defende que de um modo geral as estratégias de aprendizagem funcionam por activação do sujeito passivo, tornando conscientes e desenvolvidas as competências que antes eram insconscientes e menos desenvolvidas. Torna-se, então, fácil imaginar o impacto destas estratégias cognitivas (e não só) em diferentes tipos de sujeitos e nas diversas situações de sucesso. Miles sugere, inclusivamente, uma categorização dos estudantes sob a forma de 'traços' gerais que importa salientar:

• 'lineares' (algorithmic thinkers) são estudantes que aprendem e pensam de modo linear e mecânico. Além disso, parecem ser capazes de aprender apenas o 'quê', mas, não o 'quando' nem o 'porquê'.

• 'circulares' (mental chip thinkers) são estudantes que tratam cada ideia ou bit de informação como um facto isolado ou descontextualizado para ser gravado num círculo mental tal como um chip separado num computador.

• 'catatónicos' (catatonics) são estudantes que, talvez, adeptos da sobsessimplificação e dos problemas pouco complicados, 'bloqueiam' mentalmente quando confrontados com situações mais complicadas ou não familiares. Estes estudantes não sabem o que fazer ou onde começar de modo a dar sentido à situação.

• 'marrões' (mental muscle thinkers) são estudantes que descobriram um método de estudar e aprender e o fixaram (usualmente por memorização) para depois ser utilizado persistente e exaustivamente, excluídas que estão à partida todas as outras abordagens alternativas. Estes estudantes podem estar mais convencidos para 'estudar muito' do que propriamente 'estudar melhor'.

• 'esquecidos' (mental lobotomies) são estudantes que aparentam fazer progressos razoáveis, mas perdem muito do que aprenderam em períodos mais ou menos longos (férias). A sua compreensão dos conhecimentos é aparentemente frágil ou pouco consistente.

Por fim, importa também referir um outro aspecto que julgamos importante para a distinção entre competências e estratégias, o qual, se prende com diferenciação das estratégias de aprendizagem propriamente ditas e as estratégias de apoio às aprendizagens (métodos de estudo). Segundo Pozo (referindo Danserau, 1985) as 'estratégias de apoio' serão aquelas que em vez de se dirigirem directamente à aprendizagem dos materiais, têm antes a missão de incrementar a eficácia dessa aprendizagem através do melhoramento e optimização das condições em que esta se produz. Ou seja, estão incluídas as estratégias

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de incentivo motivacional, de coping, de atenção e concentração, promoção do auto-conceito e auto-controlo e, modo geral, de aproveitamento de todos os recursos afectivo-relacionais, cognitivos e metacognitivos.

2.2. Estratégias e diferenças individuais fundamentais

A categoria de diferenças individuais fundamentais descrevem, segundo Hartley (1998) diferenças, as quais, não é possível ou é bastante difícil alterar. Com efeito, a idade e o género dos alunos são diferenças que não se podem modificar. A um nível diferente, mas também de difícil modificação encontramos aspectos da personalidade, nomeadamente, aqueles que concernem á motivação, volição e autonomia. São vários e dispersos os estudos e debates realizados cujo âmbito concerne ao estudo das diferenças fundamentais, mormente o género e a idade, em diferentes contextos de aprendizagem. A este propósito, Meyer et al. (1994), Richardson (1987 a 1997), Upcraft, Gardner & Associates (1989), Sutherland (1997), Jonassen & Grabowski (1993) e muitos outros apresentam amplas revisões de literatura acerca destas diferenças fundamentais. Especificamente, no que concerne à utilização das estratégias de estudo e aprendizagem, é possível encontrar igualmente várias diferenças relativamente ao género e idade em trabalhos e investigações recentes (Hartley (1998), Halpern (1992), McKeachie (1994), Newstead & Franklyn-Stokes (1996), Sadler-Smith (1996), etc.). No contexto do ensino superior universitário, experiências anteriores em conexão com estas duas variáveis (género e idade) têm sugerido que, estas, não parecem ter influência particularmente significativa no modo como os indivíduos aprendem. Por exemplo, Richardson e colegas (e.g., Richardson & King, 1991 ou Richardson, 1997) após sucessivas revisões da literatura acerca das diferenças de género, no contexto do ensino superior, concluíram que havia pouca consistência ou evidência relativamente aos efeitos destas diferenças, na forma como os jovens universitários estudam e aprendem. Um exemplo característico pode ser considerando as diferenças de sexo e as capacidades intelectuais (inteligência). Com efeito, nos anos 80, o quadro que foi desenhado referente às diferenças entre sexos em termos de capacidades intelectuais foi relativamente conciso. Embora, possa ser reconhecido, por alguns, que uma excessiva sobressimplificação tivesse sido realizada, considerou-se no entanto que os rapazes e as raparigas não diferiam grandemente em termos de inteligência e que os rapazes seriam melhores a executar tarefas espaciais e as raparigas seriam melhores na verbalização. Segundo Hartley (1998), estas assunções foram baseadas largamente no livro escrito por Maccoby & Jacklin em 1974. De facto, este livro, fazendo uma revisão da literatura existente, tanto quanto possível, procurou considerar a evidência das perspectivas e crenças que pessoas tinham acerca das diferenças entre sexos. A abordagem de Macoby & Jacklin resultou então no sumário de evidências usando as ferramentas disponíveis. Com a disponibilidade de novas ferramentas estatísticas,

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como por exemplo, a meta-analise, para lidar com o assunto verificou-se que estas conclusões eram, de facto, sobressimplificações (Hartley, 1998: 37). Archer (1996) afirma que o facto de incrementar a quantidade de sujeitos nos contextos trouxe a realização que muitas das diferenças entre sexos, extensivamente discutidas e argumentadas anteriormente, eram relativamente poucas em termos de efeitos gerais efectivos. Na realidade, não apenas parecem estes efeitos ser reduzidos como os argumentos acerca da sua interpretação passaram a ser mais sofisticados (Halpern ,1992). Archer vai ao ponto de afirmar que os contextos sócio-culturais são importantes na determinação daquilo que parecem ser diferenças entre sexos, referindo-se a vários estudos realizados e que mostram este aspecto. Ou seja, a importância deste ponto de vista é sugerir que as diferenças entre sexos, no contexto académico, indiciam o facto de muitos alunos (rapazes ou raparigas; alunos mais velhos ou mais novos) se matricularem em engenharia ou ciências ser uma função do modo como percepcionam o curso de ciências ou engenharia mais que uma consequência das suas diferenças biológicas. Resumindo, muitas pessoas pensam que a simples razão de hoje estar menos socialmente estereotipada a diferença de sexos relativamente ao passado se deve a que muitas das diferenças entre géneros, medidas em termos de capacidades intelectuais, terem tendência a desaparecer por falta de justificação. No entanto, Halpern (1992) sublinha as dificuldades em estabelecer estas conclusões como certezas numa tese. Parece mais, de momento, que as pessoas que tomam parte em estudos das diferenças entre sexos em diferentes períodos de tempo igualmente diferem em todos os modos das orientações anteriores. Aliás, não é menos verdade que as recentes mudanças (económicas, políticas, sociais, etc. ) tiveram um notável efeito na composição dos alunos que frequentam o ensino superior em Portugal (como em outros países). Há menos de 20 anos atrás, a população estudantil dividia-se mais ou menos por igual relativamente ao número de rapazes e raparigas, embora fosse mais favorável ao número de rapazes. Hoje, assiste-se precisamente ao inverso, sendo o rácio bastante menos equilibrado e a favor das raparigas. Mas, uma vez no contexto universitário, questiona-se, quais as razões que antecedem este facto? Serão as raparigas melhores alunas que os rapazes? E caso afirmativo, porquê? Neste sentido, Meyer et al. (1994: 469) argumentam que as diferenças de género constituem uma potencial e neglicenciada importante fonte de variação nos estudos e aprendizagens do aluno, a qual, quando detectada num contexto específico pode e deverá ser explicitamente gerida pelos docentes. Mas, em função do reduzido número de estudos que examinaram os efeitos do género ou da idade, não nos parece possível responder com certezas às questões colocadas. No entanto, salientamos a evidência que, durante muitos anos, a expectativas de resultados positivos (e também negativos) relativamente aos rapazes, na Universidade, era bastante mais ampla que relativamente às raparigas (Hartley, 1998). Na realidade, havia proporcionalmente mais rapazes com muito bons graus e muito maus graus e em contraposição, havia mais raparigas com graus de qualidade média (isto é, as raparigas tenderiam a ser mais equilibradas nos seus

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estudos). Esta generalização foi suportada durante muito tempo por resultados obtidos em vários estudos cujas conclusões, frequentemente foram estabelecidas com base em trabalhos (alguns bastante mais antigos) e tomando alunos universitários em estudo integral (Rudd, 1984; Davies & Harré, 1989, referidos por Hartley, 1998). Não obstante, estas conclusões revelam um considerável interesse, uma vez que apresentam um enquadramento que despista a existência de mudanças massivas e sistemáticas no sistema universitário. Referimo-nos, por exemplo, ao aumento no número de universidades públicas e privadas, à diferença significativa do número de alunos que as frequentam, o maior número de módulos de creditação (modular-

based systems) em oposição às frequências finais (exames, onde é avaliado o trabalho do aluno ao longo de todo um semestre ou ano lectivo) e ao acréscimo substancial do número de raparigas e alunos mais velhos que procuram a Universidade, sobretudo para construírem conhecimentos ou se desenvolverem em termos pessoais e sociais e não propriamente á procura de uma vocação (Richardson, Hartley & Trueman, Newstead et al e outros, in Sutherland, 1997). Aliás, este acentuado acréscimo de alunos do sexo feminino e mais velhos na Universidade vem sendo acompanhado de vários (poucos) estudos empíricos com vista a examinar com algum detalhe o aspecto relativo aos desempenhos académicos destes grupos de alunos, mormente eo grupo de alunos mais velhos quando comparados com o grupo de alunos tradicionais (entenda-se jovens no final de adolescência). Neste sentido, embora sem a prescrição de uma orientação teórica particular, a obra Adult Learning: A

Reader (editada por Peter Sutherland, 1997) apresenta-nos um conjunto de referência particularmente importante, em virtude de assentar numa ampla revisão bibliográfica acerca dos processos de estudo e aprendizagem dos alunos mais velhos no contexto académico universitário. Desta obra citada, referenciamos especificamente o seguinte:

• Hettich, que revisiona quatro fundamentos teóricos do crescimento intelectual em jovens adultos, iniciando com o modelo de desenvolvimento ético e intelectual de Perry (anos 50) e consecutivamente, ampliado por Belenky e associados (estudos das mulheres estudantes-trabalhadoras que integra investigações acerca do desenvolvimento moral de Kohlberg e Gilligan, nos anos 80), passando pelo modelo do julgamento reflexivo de King e Kitchener (incorpora o trabalho de Perry e o conceito de pensamento reflexivo de John Dewey, anos 70) até ao modelo epistémico de reflexão no desenvolvimento intelectual de Baxter Magolda (anos 90, incorporando conceitos, metodologias e resultados obtidos por Perry, Belenky e associados, King & Kitchner);

• Barry Dart que explora a metacognição e o uso de estratégias metacognitivas nos alunos mais velhos (>25 anos) no contexto universitário. Assenta as suas conclusões essencialmente em duas investigações conduzidas numa Universidade australiana, as quais, o conduziram a postular o relativo fracasso dos professores de alunos mais velhos no sentido de encorajar a utilização de estratégias

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metacognitivas (o que para ele, representam sobretudo estratégias construtivistas) e argumenta que se os alunos tentam tais estratégias construtivistas para aprender, implica que os professores devam ser facilitadores e não meros fornecedores de conhecimentos, defendendo um modelo andragógico em contraposição ao modelo pedagógico de ensino (Sutherland, 1997: 193).

• Hartley & Trueman, sumarizam alguns resultados obtidos em vários estudos realizados contexto do ensino superior e cujas evidências apontam para os seguintes aspectos: (1) os alunos mais velhos apresentam desempenhos iguais ou superiores, quando comparados com alunos tradicionais (18-22 anos); (2) os alunos mais velhos, de um modo geral, são similares em termos de competência de estudo relativamente aos alunos mais novos, além disso, tendem a adoptar uma abordagem mais profunda e sistemática do estudo e aprendizagem e a gerirem com maior eficácia os tempos de estudo; (3) os alunos mais velhos, não diferem nas sua preferências acerca dos diferentes estilos profissionais adoptados pelos docentes, além disso tendem a adoptar concepções mais apropriadas ao ensino superior que os restantes alunos. Ainda, Hartley & Trueman complementam esta revisão da literatura elaborando um pequeno estudo empírico com vista a compararem os desempenhos dos alunos mais velhos com alunos de 18-22 anos de uma Universidade inglesa. Neste estudo, não encontraram diferenças significativas, facto, que levou a argumentarem que não havia necessidade dos professores modificarem os seus processos de ensino em função da existência de alunos mais velhos entre alunos tradicionais nas suas aulas.

• Richardson, já referenciado antes e cujas conclusões são consistentes com as de Hartley & Trueman, procurou rever literatura acerca da forma como os alunos mais velhos lidam com o estudo no contexto particular do ensino superior. Acrescenta algumas evidências no sentido de, pelo menos nos últimos anos, terem os alunos mais velhos desempenhos iguais ou até superiores relativamente aos seus pares mais novos (18-22 anos) e conseguem gerir com mais eficácia os seus tempos de estudo. De acordo com a posição de Richardson, os alunos mais velhos não têm, modo geral, carências particulares ao nível das estratégias (cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais) e competências de estudo e aprendizagem essenciais;

• Newstead e colegas, procuram focar os seus estudos sobre a problemática de copiar (cabular) em exames e ensaios. Para este efeito, recolheram alguma informação acerca do tipo de motivações que orientam os vários alunos que frequentam a Universidade. O quadro geral a que chegaram aponta para o facto de os alunos mais velhos, comparativamente aos tradicionais, tendem a alcançar níveis mais elevados no que concerne à motivação intrínseca para aprender e tendem a orientar-se mais para objectivos de desenvolvimento pessoal e social do que para necessidades vocacionais. Também porque estão mais interessados nos assuntos de aprendizagem, os alunos mais velhos são mais honestos nas

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atitudes e comportamentos perante o estudo (cabulam menos), pelo que carecem de menor vigilância nas tarefas por parte dos professores.

• Schmeck, focando aspectos mais próximos ao conceito de 'táctica' e menos ao de 'estratégia', examinou a correlação entre o uso de algumas tácticas particulares associadas ao estudo e aprendizagens com alguns descritores de personalidade geral, nos alunos adultos mais velhos. Para o efeito utilizou as escalas do ILP-Inventory of Learning Processes, para categorizar os alunos em dez tipos diferentes que variam segundo as categorias de tácticas de aprendizagem resultantes de extensivas análise factoriais e que vão desde as categorias2 de (1) 'agente analitico' (sujeito pragmático e centrado nos problemas, trabalhador persistente) até (10) 'convencionalidade' (sujeito preocupado com a manutenção da ortodoxia e seguir as instruções

• Hilendra Pillay, fornece uma análise prática e útil acerca das estratégias que os adultos usam para adquirir conhecimentos necessários e competências. Esta autora argumenta que os alunos mais velhos, normalmente estudantes-trabalhadores encontram algumas dificuldades na aprendizagem de domínios específicos e conhecimentos gerais em simultâneo, que tal como Blaxter e colegas (mais adiante na obra referida), ampliam alguns aspectos relacionados com o carácter limitado e pouco flexível do estudo académico. Consideram, estes autores, o trabalho (emprego), a casa, a família e a vida social dos alunos mais velhos e até que ponto estes factores afectam as aprendizagens académicas destes alunos universitários.

Entretanto, Hartley (1998) indica um conjunto de autores e de estudos que examinaram as experiências de alunos mais velhos e diferenças de género, no contexto académico universitário, agrupando-os basicamente em quatro tipos de estudos que importa realçar, nomeadamente:

• estudos que utilizam questionários3

• estudos que complementam questionários com entrevistas4

• estudos baseados apenas em entrevistas5

• estudo de casos6 Ao nível das abordagens do estudo e aprendizagens destacamos, entre outros, as investigações de Richardson e colaboradores (1987-1997), Biggs e colaboradores (1987-1998), Watkins & Hattie (1985, 1990), Entwistle e colaboradores (1983-1994), Christensen et al. (1992), Jonassen & Grabowski (1993), Winne et al.

2 Mais descrições em Sutherland (1997: 60) 3 refere, por exemplo, Tracker,C & Novak,M (1991).'Student role supports for younger and older middle-aged women: application of a life event model', The canadian Journal of Higher Education, 21, 1:13-36 4 refere Slotnick et al. (1993). Adult Learners on Campus, London: Taylor& Francis. 5 refere King, E. (1994).'An investigation into the learning experiences of mature students entering higher education', in G. Gibbs (ed.) Improving Student Learning: Theory and Practice, Oxford: O.C.S.D., Oxford Brookes University; Pascall,G & Cox,R. (1993).Women Returning to Higher Education, Milton Keyes: Open University Press 6 refere Arksey et al. (1994). Juggling for a Degree: Mature Student's Experience of University Life, University of Lancaster: UIHE.)

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(1994) e Sadler-Smith (1996, 1998), Chalmers & Fuller (1996), Marton e colaboradores (1987-1997) junto de estudantes universitários e tomando a idade como uma variável categorial (alunos mais velhos versus alunos mais novos, com limite de 23 anos). Na sua maioria, os várias investigações consultadas, determinam que são os alunos mais velhos tendem a apresentar uma abordagem mais profunda ('deep') relativamente aos alunos mais novos e vive-versa quanto a uma abordagem ligeira ou superficial ('surface' ) (Sadler-Smith, 1996: 376). No mesmo estudo, os alunos do género masculino apresentavam uma abordagem mais 'deeper' que os elementos do sexo feminino, mas este facto não parece conferir qualquer tipo de vantagem em termos das medidas usadas na avaliação dos desempenhos académicos.

2.3. Estratégias e variáveis situacionais

Partilhamos da perspectiva defendida por Ramsdem (1992, 1988) que as diferentes tarefas e contextos impõem ou sugerem, aos alunos, o uso de diferentes estratégias de estudo e aprendizagem. Os indivíduos tentam adaptar-se o melhor possível às exigências e oportunidades apresentadas pelos contextos académicos e aos conteúdos que são supostos serem aprendidos. O modelo de Ramsdem (1992, 1988: 159) postula haver três domínios contextuais que influenciam o desenvolvimento de estratégias de estudo e aprendizagem no contexto académico do jovem universitário. Estes domínios são, nomeadamente, o ensino (método de transmissão daquilo que é aprendido), a avaliação (método de medição daquilo que é aprendido) e os programas (conteúdo e estrutura daquilo que é aprendido).

Figura 3-VI: modelo de aprendizagem em contexto

Conforme a figura, o ponto de intersecção entre o contexto e os conhecimentos e experiência do aluno é definida como a percepção (e representações) que o aluno tem acerca do ensino, da avaliação e dos programas. Este elo experimental é um mecanismo que explica como o contexto constrange e influencia directamente os processos de estudo e aprendizagem. Indirectamente, o contexto influencia os processos de abordagem e uso de estratégias através das percepções do valor e exigências das tarefas de aprendizagem.

CONTEXTO ENSINO

AVALIAÇÃO PROGRAMAS

CONHECIMENTOS E EXPERIÊNCIA DO ALUNO

PERCEPÇÕES E REPRESENTAÇÕES

ABORDAGENS E USO DE ESTRATÉGIAS

ESTUDO E APRENDIZAGEM

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Esta percepção das tarefas descreve a relação entre a experiência do aluno e os três domínios considerados. Contudo a forma como cada aluno empreende uma tarefa é apenas parcialmente explicada pela relação entre contexto e experiência. Com efeito, um modelo mais completo deverá incluir muitos outros elementos, tais como, cultura, conhecimentos, formação, estilos, aspirações e todo o conjunto de variáveis motivacionais, as quais, pensamos jogam um papel primordial. De acordo com o modelo proposto, as diferentes estratégias de estudo e aprendizagem serão adaptativas em diferentes contextos e situações, em termos de qualidade, quantidade e esforço. Segundo Boulet et al (1996: 31) cada tarefa de aprendizagem possui características próprias que fazem com que esta seja mais ou menos apropriada ou tenha mais ou menos chance de sucesso. No conjunto das variáveis situacionais que podem influenciar a escolha e natureza de uma estratégia de estudo e aprendizagem é possível considerar os seguintes aspectos relacionais:

• tipo de conhecimentos (declarativo, condicional e procedural);

• a forma como se processam as aprendizagens (mecânica ou significativa); as abordagens pedagógicas (magistral ou experimental); a natureza da avaliação das aprendizagens;

• as circunstâncias da aprendizagem (antes, durante, depois das aulas e preparação de exames); e, finalmente,

• a natureza dos próprios conteúdos disciplinares e plano de estudos do curso.

2.4. 'Abordagens' ou modelos de orientação estratégica

Entretanto, um conceito fundamental para descrever como os alunos estudam e aprendem é, efectivamente, o de abordagem (approach). Por exemplo, segundo Ramsdem (1988: 162), as abordagens apresentam uma componente 'referencial', que diz respeito á intenção do aluno ou, até que ponto cada indivíduo foca determinado sentido dos números, palavras ou sentenças no material de estudo ou nas componentes elas próprias, até à exclusão daquilo que significam. Por outro lado, apresentam também uma componente 'relacional', acerca do processo ou modelo de aproximação cognitiva, isto é, uma orientação no sujeito próxima da manipulação da estratégia a modo de reter a estrutura subjacente, à qual, corresponde uma abordagem profunda e holística (uma deep approach) ou uma orientação para compor as componentes da tarefa de modo a que o seu conteúdo e estrutura sejam distorcidos, correspondendo a uma abordagem ligeira ou atomística (surface approach). Ainda segundo Ramsdem (1992), o conceito de abordagem é fundamentalmente um conceito contexto-dependente (situação específica) e aluno-dependente (estilo). Ou seja, a forma como os alunos aprendem e se envolvem no estudo e aprendizagens representa relações entre estes e o mundo que os

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rodeia. A percepção das tarefas descreve a relação entre os contextos e a experiências dos alunos. Neste sentido, a 'deep' e a 'surface approaches' descrevem a relação entre as percepções do aluno e as aprendizagens (Laurillard, 1984, referida por Ramsdem, 1992). Neste sentido, é consistente a ideia que as abordagens são relações e não, propriamente, características individuais (estilos) nos alunos (Marton & Saljö, 1976; Entwistle e colegas (e.g, Entwistle & Ramsdem, 1983); Biggs, 1987; Weinstein et al, 1989; Schmeck et al, 1991; Marton et al, 1997; Vermunt, 1996; entre outros). Consistente, é também o postulado por Biggs e colaboradores (e.g. Biggs e Telfer, 1987) de que o termo approach é implicado pela interacção entre estilos e estratégias, a qual se relaciona com os processos de estudo e aprendizagem que emergem das percepções acerca das tarefas académicas, influenciadas pelas características pessoais. Para Biggs (1987), em termos motivacionais, o estudante que adopta uma 'surface approach' está instrumental ou pragmaticamente motivado. Exemplificando, supondo que um aluno entra para a Universidade com intuito de obter uma qualificação com o mínimo de esforço, então, uma tarefa, como por exemplo, um exame é visto como um mecanismo de informação ou, uma imposição necessária no caso de se pretender alcançar uma meta a médio ou longo prazo. Estas aspirações são frequentemente acompanhadas de preocupações acerca das formas e tempos requeridos para lidar com a tarefa. A estratégia geral, salientada nesta orientação, é focar aquilo que é 'essencial' no material de estudo, normalmente, informação factual e concreta e o modo como é representada simbolicamente com vista à sua reprodução o mais fiel e exacta possível. Ao contrário, a motivação, no aluno, para adoptar uma 'deep approach' começa com o interesse intrínseco na tarefa e a expectativa de satisfação em a desempenhar. Consequentemente, o aluno tende a adoptar estratégias que o ajudem a satisfazer a sua curiosidade na procura do significado inerente à tarefa, a personalizar a tarefa, tornando-a coerente com a sua própria experiência e integrando-a com conhecimentos adquiridos antes ou teorizando acerca disso, levantando hipóteses, etc. Esta orientação para que um aluno adopte uma ´deep approach' baseia-se na manifestação da própria excelência relativamente aos pares ou outros, especificamente no sentido de obter classificações e níveis académicos o mais elevados possível. A estratégia associada distingue-se das estratégias adoptadas nas restantes orientações, uma vez que não se relaciona tanto em como o conteúdo da tarefa é encarado, mas, antes com a auto-organização, particularmente no que diz respeito á gestão dos tempos e materiais de estudo. A conjunção das orientações neste tipo de abordagem com uma 'deep approach' pode ser entendida como uma característica dos 'bons' alunos (Biggs, 1987: 187). Entretanto, o conjunto das investigações realizadas por Marton, Ramsdem, Entwistle e colaboradores (e.g., Marton, Hounsell & Entwistle, 1997) recorrendo a metodologias maioritariamente qualitativas e assumidamente mais relevantes do ponto de vista educativo, começaram por investigar a forma como os alunos realizavam determinadas actividades escolares específicas (por exemplo, ler um texto ou um

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artigo). Seguidamente, identificaram e diferenciaram entre uma 'deep' e uma 'surface approach' como termos que representam níveis de processamento e envolvimento. Neste sentido, um enfoque 'deep' corresponde, desde a abstracção de significados até á tentativa de compreender as realidades, enquanto um enfoque 'surface' corresponde a um incremento ligeiro e gradual dos conhecimentos por memorização e reprodução literal da informação até, nomeadamente, à concepção subjacente, ao próprio aluno, acerca do que é para si a aprendizagem e como este evidencia ou utiliza as atitudes e procedimentos para a alcançar com êxito. Segundo Pozo (1995: 206), estes enfoques claramente extremos do mesmo contínuo, 'deep/meaning' e 'surface/reproducing', correspondem a dois tipos de cultura ou tradições no estudo das aprendizagens, os quais, remontam a muito tempo antes, podendo encontra-se antecedentes desta distinção na Grécia antiga. Pozo refere as principais características de cada um destes enfoques ('deep' e 'surface') nos processos de estudo e aprendizagem, tomadas a partir dos trabalhos de investigação de Selmes (1988), o qual, procurou transportar para o susbsistema de ensino secundário, a terminologia e resultados das investigações de Marton, Saljö, Entwistle, etc. ao nível do ensino superior. Sendo independente o contexto e sujeitos em causa e para uma melhor compreensão destas diferentes abordagens ou orientações estratégicas para enfrentar o estudo e as aprendizagens, apresentamos de seguida esta caracterização avançada por Selmes (referido por Pozo, 1995: 207).

'Deep approach': d1)

Integração pessoal � intenção de criar uma interpretação pessoal dos materiais � sublinha a importância de comparar a interpretação pessoal com a de outro; � indicação do desejo de relacionar a tarefa com a situação pessoal fora do contexto imediato � intenção de vincular as ideias e experiências pessoais com o tema da tarefa � indicação do desejo de relacionar a tarefa/conceito com as situações quotidianas � consideração da tarefa como parte do desenvolvimento pessoal.

d2) Interrelações

� intenção de relacionar as partes da tarefa (todo) entre si � intenção de relacionar a tarefa com outros conhecimentos relevantes � relacionamento do que já conhece acerca de outro problema com um novo � relacionamento dos materiais estudados anteriormente com os novos materiais ou de estes com

materiais que venha a adquirir no futuro � intenção de relacionar materiais precededentes de diferentes fontes � pensamento activo e dinâmico acerca das relações entre as partes do material � tentação de relacionar sistemicamente os aspectos de um problema.

d3) Transcendência

� intenção de centrar-se no significado do conteúdo � intenção de pensar acerca da estrutura subjacente à tarefa � tentativa de utilizar parte do material para representar o todo (inferência).

'Surface approach' s1)

Isolamento � centralização nos elementos particulares de procedimento ou execução de uma tarefa � tendência a tratar o material de estudo como se estivesse separado de outros materiais � consideração que as tarefas constam de fases e partes discretas � centralização nos aspectos específicos da tarefa

s2) Memorização

� consideração que o contexto da tarefa exige a memorização dos materiais � aluno define a tarefa como actividade de memorização � o aluno indica a sua intenção de memorizar o material

s3) Passividade

� a tarefa é definida por outro � indicação de uma ênfase irreflexiva ou passiva da tarefa � indicação de dependência relativamente ao professor ou outro � tratamento extrínseco do material

Figura 3-VII: síntese das características das abordagens do estudo e aprendizagens

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Estudos recentes (Biggs, 1988, 1993; Ramsdem, 1988, 1992; Entwistle e colaboradores) têm considerado uma terceira dimensão designada por Biggs de 'achieving approach' e por Ramsdem e Entwistle de 'strategic approach', na qual, a motivação para obter elevados resultados e altos níveis de cumprimento dos objectivos académicos, ou seja, a tornar-se um 'bom aluno' jogam um papel primordial. Entwistle (1987: 16) sumaria as principais características desta dimensão que correspondem, no estudante, designadamente:

• uma intenção em obter as mais altas classificações e o mais elevado grau académico;

• uma organização e distribuição estratégica dos esforços e da persistência para o máximo de efeito e rendimento;

• na garantia dos melhores recursos e condições (temporais, espaciais e materiais) apropriados ao estudos e aprendizagens;

• na atenção a tópicos ou assuntos destacados nas aulas e às preferências dos professores;

• na optimização das experiências e conhecimentos anteriores para predizer e controlar problemas futuros.

Segundo Biggs (1988,1989,1993), a auto-consciência para se tornar um 'bom aluno' consiste numa abordagem planeada e controlada do estudo e das aprendizagens, a qual, exige que este esteja bem ciente dos seus motivos e intenções, dos seus próprios recursos cognitivos e das exigências das tarefas académicas (meta-aprendizagem) e seja capaz de auto-controlar os seus recursos e monitorizar as consequências dos seus desempenhos (metacognição). Aliás, Biggs (1993: 187) referindo-se a vários autores, tais como, Kirby e Das (in Schmeck, 1988), apresenta o termo 'meta-aprendizagem' para traduzir 'the specific application of metacognition to the area of student learning'. Na sua vez, Schmeck (1988: 9), refere também estes aspectos argumentando que existem essencialmente dois tipos de influências que afectam as atitudes e comportamentos, nomeadamente as características das pessoas (inclui aspectos genéticos, estilos cognitivos e conhecimentos prévios) e as características das situações específicas nas quais os comportamentos ocorrem. Mas, fazer a distinção entre estas duas fontes de influências torna-se algo complicado pelas seguintes razões que aponta: primeiro, não há forma cuidada de observar os aspectos genéticos, os estilos e as experiências que elevam a pessoa (ou a sua personalidade); segundo, também não é possível fazer observações directas das influências situacionais (a ideia geral é que, apenas, é possível verificar as influências de alguns estímulos de cada situação nos comportamentos individuais). Os vários estudos e investigações que analisaram os efeitos e influências do tipo de abordagem nos desempenhos académicos, tendem a confirmar a sua influência directa na qualidade das aprendizagens, nos sujeitos, nomeadamente no contexto universitário (Murray-Harvey, 1993; Entwistle & Entwistle, 1991; Trigwell& Prosser, 1991; Drew& Watkins, 1998). Exemplificando, Murray-Harvey (1993) usa uma análise

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funcional (path-analysis) para investigar os processos de estudo e aprendizagem dos alunos no ensino superior para concluir que as variáveis de processo tais como a forma de abordagem do estudo são factores particularmente importantes na determinação dos progressos académicos individuais. Neste sentido, uma abordagem 'surface', geralmente ocasiona uma compreensão superficial dos conteúdos das matérias e um baixo nível de conceptualização enquanto uma abordagem 'deep' suscita compreensão e integração dos princípios e conceitos. Paralelamente, os resultados alcançados por investigadores americanos igualmente sugerem que os alunos academicamente bem sucedidos podem ser distinguidos dos menos sucedidos em função dos seus processos habituais de estudo e aprendizagem e pela utilização regular de estratégias características de uma abordagem 'deep' (McKeachie, 1988, 1994; Schmeck, 1988; Weinstein & Mayer, 1986; Zimmerman & Martinez-Pons, 1988, 1990, 1992; Schunck & Zimmerman, 1994, 1998). Em outras partes do mundo o panorama não é muito diferente. Com efeito, basta observar os imensos trabalhos de investigação levados a cabo na Austrália (Murray-Harvey, 1993; Watkins e colegas (e.g., Watkins & Hattie,1990), médio-oriente (Albaili, 1998) e a oriente (Kember& Gow, 1991)7 Ainda acerca deste assunto, Boulet et al (1996: 35) salientam a relação que existe entre a aplicação de certas estratégias de aprendizagem e as circunstâncias funcionais e estrategicamente diferentes na vida académica do jovem universitário. De acordo com as suas observações, são quatro estas circunstâncias particulares (situação de leitura, estudo e trabalho escolar regular durante a aula; a situação de estudo e trabalho escolar regular antes e depois da aula; a situação de estudo e trabalho com vista à preparação de exames; e, finalmente, a situação de trabalho no ínicio, ao longo e no final de um exame). Na realidade, os vários autores (Biggs, Entwistle, Marton, Ramsdem, etc.) adoptam os termos 'approach' e 'orientation' para se referirem às estratégias e tácticas observadas no empreendimento dos alunos nos estudos e aprendizagens. Aliás, segundo Schmeck (1988) é importante reconhecer que a origem do conceito de 'abordagem' (approach) é experimental ou fenomenológico (Marton & Saljö, 1976; Marton, 1981; Marton et al., 1997; Vermunt, 1996, 1998). Este conceito salienta relações entre intenção, processos e resultados relativamente a um contexto específico tal como descrito pelo indivíduo. Neste sentido, Busato et al (1998: 428) define as orientações de aprendizagem como metas pessoais, intenções, expectativas, circunstâncias, etc., que cada indivíduo pode experiênciar ao longo da sua carreiras académica. Quanto às orientações propostas por Entwistle (1987, referido em Schmeck, 1988: 11), é possível conceptualizá-las segundo uma orientação para o estudo, isto é, um factor segundo o qual são sumariadas as abordagens, motivos e estilos e que inclui elementos relativos a métodos, hábitos e atitudes perante o estudo e, ainda uma outra orientação voltada para a educação, bastante mais ampla e a envolver objectivos de vida e metas, razões culturais, sócio-económicas, pessoais para obter um determinado curso ou grau académico.

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Por sua vez, Vermunt (1996, 1998) faz uma distinção segundo quatro estilos de orientação, a saber: uma orientação indefinida (undirected), outra, dirigida para a reprodução (reproducing directed); outra, dirigida para a aplicação prática (application directed); e ainda, uma orientação dirigida para o sentido do estudo (meaning directed). Exemplificando, os estudantes caracterizados por uma orientação 'indefinida' evidenciam, por exemplo, problemas no processamento do material de estudo, experienciam dificuldades acerca dos assuntos de estudo e na descriminação da importância dos materiais. Esta caracterização é similar à orientação 'non-academic' proposta por Entwistle (1988) ( ver Anexo 1). Os estudantes identificados com uma orientação 'reproducing', tendem a manifestar comportamentos de estudo dirigidos principalmente para a reprodução dos materiais que pensam satisfazer as exigências das tarefas ou requerimentos, de modo a dar consistência ao binómio 'mínimo de esforço / máximo de desempenho'. Esta caracterização é similar à orientação com a mesma designação (reproducing approach) proposta por Entwistle & Ramsdem (1983) e seguida por outros investigadores (e.g., Biggs, 1987). Os estudantes dirigidos para a aplicação prática das suas aprendizagens tentam aplicar aquilo que aprendem a situações concretas, actuais, da vida real, bastante comparável com a categorização de 'convergers / assimilators' proposta no modelo experiêncial da aprendizagem de Kolb (1984). Finalmente, os estudantes dirigidos para o sentido das aprendizagens, desejam encontrar o sentido exacto dos materiais de estudo, conectar as informações recebidas com conhecimentos anteriores, interrelacionando-os de modo crítico e desenvolvendo uma perspectiva pessoal acerca dos assuntos. Esta sentido de orientação é similar ao que Pintrich et al (1993) chamam a 'mastery goal orientation' e que é consistente com a designação de 'deep/meaning' approach',. Igualmente, mais próxima de uma orientação para a educação, referida por Schmeck (1988) e defendida por Entwistle (e colegas), Ramsdem, Biggs (e colegas) e muitos outros investigadores educacionais.

2.5. Modelo (comportamental) de utilização das estratégias

Nas concepções mais recentes da aprendizagem ao nível do ensino superior, o jovem estudante universitário é visto como o primeiro responsável pela sua formação e por ir construíndo, activamente, as elaborações mentais que tornem a aprendizagem pessoalmente significativa. Mas, para que este jovem aceite a responsabilidade pelo seu próprio processo de aprendizagem, ele, tem de estar motivado e ser capaz de reunir as competências gerais e específicas para activamente encaixar as estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais mais apropriadas à realização das tarefas e exigências académicas.

7 para uma revisão de literatura, ver Watkins e Biggs (1996).

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Como argumenta Paris et al. (1985, referido por McCombs, 1988) se queremos que os alunos sejam auto-motivados e auto-controlados nas situações de estudo e aprendizagem, necessitamos de orientar processos que se relacionem com as percepções do controlo pessoal dessas mesmas situações. Ou seja, necessitamos de compreender aquilo que eleva, de facto, as competências e a vontade (will) para estar e manter a motivação na utilização das estratégias mais apropriadas às tarefas propostas. O aluno auto-motivado é aquele que consegue gerir, planear, regular e avaliar os suas próprias competências, procedimentos, atitudes e comportamentos. Por outro lado, qualquer programa de promoção das estratégias de estudo e aprendizagem tem, como um dos seus aspectos mais fundamentais, o objectivo de activar o auto-controlo e a auto-regulação da aprendizagem (McCombs, 1988: 141). De facto, já Flavell & Wellman (1977, referidos por Palmer & Goetz, 1988: 43) assinalavam que os desempenhos dos indivíduos poderiam ser influenciados pela percepção das suas próprias características, características das tarefas, uso de estratégias e a interacção entre estas três componentes. Estes autores sugeriam que a evocação da informação depende de quem a armazena (pessoa/tarefa), de qual a estratégia que melhor se adapta ao indivíduo (pessoa/estratégia) e da tarefa que o indivíduo deve desempenhar (pessoa/estratégia/tarefa). Para Wittrock (1986) o facto de tomar o aluno como um processador activo e transformador da informação tem contribuído para o consenso na identificação e exploração dos mecanismos e processos específicos que mediatizam as aprendizagens e os desempenhos. Nestes processos estão incluídos inevitavelmente as motivações pessoais, os sistemas conceptuais (representações e percepções) e as atribuições. Segundo McCombs (1988: 153), a par do papel activo que o aluno representa, as perspectivas correntes da aprendizagem e da motivação têm salientado o reconhecimento que para que a aprendizagem efectiva tome lugar, o aluno deve empreender a auto-gestão e auto-controlo das suas próprias aprendizagens. Para assumir esta responsabilidade é requerido que os alunos sejam detentores de atitudes e comportamentos apropriados perante o estudo e que estejam devidamente orientados para as aprendizagens. Isto implica que, estes, possuam capacidades para se auto-motivarem e se percepcionarem, a si próprios, como competentes no empreendimento das estratégias de estudo e aprendizagem mais apropriadas ao controlo, gestão e auto-regulação das aprendizagens. Neste sentido, é possível descrever, segundo uma perspectiva comportamental, três formas correntes na abordagem dos processos de ensino e aprendizagem, tal como sugerido por Mayer (1988).

• O quanto é aprendido? Esta abordagem toma quatro elementos (ensino, processamento, ligações, resultados ou produtos) fundamentais. O ensino 'bom' ou 'mau' é facultado ao aluno que, respectivamente, processa a informação recebida segundo uma abordagem forte (deep) ou ligeira (surface). Alguma da informação é armazenada na memória, esta informação pode ser usada para responder a mais ou menos questões ou resolver problemas. Se o aluno processa a informação com

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mais (menos) sucesso, então, mais (menos) será aprendido e como resultado, maior (menor) a retenção e transferência. A promoção das estratégias de estudo, segundo esta perspectiva será, orientada para influenciar a quantidade do sucesso no processamento do material de estudo. Os efeitos desse processamento serão quantitativos, isto é, determinarão o 'quanto é aprendido'.

• O que é aprendido? De um modo análogo à versão anterior, consiste nos mesmos quatro elementos. O ensino é orientado para, por exemplo, a atenção global ou para a narrativa organizada ou para gerar codificações. O aluno processa a informação correspondente, respectivamente, através da tomada de atenção global ou, atenção selectiva ou organização ou elaboração. Isto resulta em muitas redes e ligações (gerais ou específicas) e em conexões (internas ou externas) através de uma retenção global e selectiva relativamente ao processamento da informação. A promoção das estratégias de estudo e aprendizagem, segundo esta perspectiva, orienta-se para influenciar a selecção de um tipo de processamento que seja apropriada aos objectivos antecipados dos alunos. Os efeitos deste processamento seriam qualitativos, ou seja, deveria influenciar o tipo de resultado da aprendizagem obtida.

• O quanto comportamento/ resposta é obtido. Aos modelos anteriores é possível adicionar uma abordagem do tipo behaviourista (E-R), segundo a qual, os dois elementos cognitivos (processamento e resultados de aprendizagem) sejam ignorados. De acordo com este modelo, os desempenhos pós-teste dependem apenas da quantidade de ensino que é facultada. Contudo são poucos os autores que suportam esta perspectiva de aluno como um elemento passivo (recipiente), no qual o conhecimento pode ser colocado.

Na realidade, os estudos acerca do uso de estratégias de estudo e aprendizagem (Nisbet & Schucksmith, 1987; Weistein et al., 1988, Wittrock, 1986; Boulet et al, 1996; Chalmers & Fuller, 1996) têm sugerido que este uso depende essencialmente das escolhas e dos julgamentos realizados pelos alunos, incluíndo aspectos de apropriação aos contextos, intenções, capacidades percepcionadas, alternativas disponíveis e possiveis 'custos'. O uso de estratégias igualmente depende do conceito de instrumentalidade, isto é, a ligação entre significado e metas e entre acção e propósito (Paris et al, 1985, referidos por McCombs, 1988: 152). No mesmo sentido, por exemplo, Paris & Cross (1983, referidos por McCombs, 1988) postularam que as influências motivacionais no uso de estratégias incluem valores, percepções e atitudes dos alunos, as quais constituem a base na fixação de metas e objectivos com significado e intenções. Ou seja, as metas justificam os comportamentos estratégicos. Em aditamento, os valores, as percepções e as atitudes ajudam os alunos a organizar e gerir os seus esforços e determinam as intenções. Dito de outro modo e segundo esta perspectiva cognitiva da motivação, são focadas as atribuições, percepções, expectativas e valores para explorar a perseverança e o esforço dispendido nas tarefas de estudo e aprendizagem. McCombs (1988)

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menciona a classificação de 'dimensão personalizada' da motivação em que assenta o argumento de Oka & Paris que permite ao aluno fazer escolhas adaptadas às aprendizagens, as quais, incluem um senso de controlo, metas e valores com significado, competências de auto-gestão e interpretações dos sucessos e fracassos. Este argumento é consistente com o construto de 'motivated cognitions' avançado por Covington (1983) como consistindo em uma espécie de ego-defesas, as quais, asseguram a auto-estima (como por exemplo: as atribuições, justificações e desculpas), reflectindo percepções e intenções que permitem preservar sentimentos de competência e de auto-valor (self-worth). Com efeito, Oka & Paris (citados por McCombs, 1988: 153) usam o termo 'comportamento motivado' para compreender a aprendizagem. Ou seja, competências que são influenciadas por sentimentos de eficácia e valor ao invés de meras competências cognitivas. Por último, McCombs conclui que a motivação é uma componente necessária do comportamento estratégico e percursora do uso de estratégias apropriadas, referindo ainda a seguinte definição presente em Nickerson e outros (1984) de comportamento estratégico como sendo, a aplicação deliberada de competências e conhecimentos num contexto de resolução de problemas e orientada para metas determinadas. Entretanto, tem sido amplamente argumentado que a motivação intrínseca está relacionada com o sentimento de competência relativa a uma actividade (White, 1959; Riding & Staley, 1998). De facto, Bandura (1986) postulou que as fontes que mais influenciam as expectativas acerca das próprias performances, nos alunos, são os seus resultados em desempenhos anteriores. Riding & Staley (1998: 47), defendem que os níveis de auto-regulação adoptados pelos alunos e ainda as suas motivações serão duplamente influenciadas quer pelas experiências de estudo e aprendizagens quer através dos resultados escolares ou académicos obtidos. A experiência de aprendizagem inclui o quanto fácil (ou difícil) é entendido na forma de lidar com a tarefa, o quanto atractivo e significante é percebida a tarefa (exemplo, o quanto uma determinada exposição de aula faz sentido para o aluno). Neste contexto, o desempenho académico será entendido, usualmente, em termos das classificações ou graduações obtidas em exames ou mecanismos de avaliação durante e no final de cada curso. Na sua vez, Weiner (1984, em Ames & Ames, 1984) e Schunck (1996, para uma revisão de literatura) sugerem que as percepções acerca dos acontecimentos para obter êxito nos desempenhos, incluem julgamentos e atribuições relativamente às próprias capacidades, esforço e dificuldade das tarefas. Aliás, é sugerido também que os alunos vêm o uso das estratégias diferindo de acordo com a especificidade das tarefas e o nível de esforço, inteligência e conhecimentos anteriores que são requeridos. De igual modo, a conexão entre as concepções e percepções acerca das próprias características enquanto alunos e os atributos das estratégias afectam os julgamentos da eficácia pessoal na estratégia e, em consequência, a decisão de a (não) usar.

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Investigações recentes apontam relações significativas entre o tipo de estratégias adoptados pelos alunos na abordagem do estudo e o locus de controle a par de um elevado auto-conceito académico (Watkins & Biggs, 1996, para uma revisão da literatura). Este conceito de ligação entre as características percepcionadas pelo aluno e os atributos das estratégias é similar à distinção apresentada por Covington (1983 e 1984, referido por Palmer & Goetz,1988: 45) acerca do papel das atribuições na metacognição e comportamento estratégico. Salili (1994), por exemplo, através de uma análise funcional (path-analysis) concluiu que as atribuições externas do sucesso/insucesso estão mais relacionadas com uma abordagem 'surface' em contraste com as atribuições internas que estão mais relacionadas com uma abordagem 'deep' ou 'achieving'. Com efeito, este último tipo de abordagens exige que os alunos não se fixem tanto nos professores, mas antes no processamento das informações e conteúdos de aprendizagem por si próprios de forma a chegar pelos seus próprios meios às conclusões (caso existam). Estes aspectos exigem uma elevada dose de auto-confiança, bem como de um elevado auto-controlo (Watkins & Biggs, 1996). Por outro lado, activar e manter a motivação para aprender, modo geral, é uma função das percepções de auto-eficácia e auto-controlo das situações de aprendizagem. Ou seja, as variáveis motivacionais podem servir o papel funcional de preservar o sentido do auto-valor no aluno na medida em que os resultados dos comportamentos motivados são julgados pelo aluno para servirem de auto-promoção, ou no mínimo, consistente com as suas perspectivas pessoais, atitudes, valores ou objectivos. Outro papel funcional importante das variáveis motivacionais, são segundo McCombs (1988: 142), a contribuição para a manutenção de auto-conceitos positivos e de percepções apropriadas de auto-eficácia e de controlo pessoal que estão subjacentes às competências para mudar atitudes, orientações negativas ou comportamentos desajustados perante o estudo e as aprendizagens. Ainda neste sentido, Palmer & Goetz (1988: 43) referem o modelo proposto por Humphreys & Revelle (1984), segundo os quais os factores da personalidade, nomeadamente a impulsividade ou a ansiedade ou a intenção em obter bons resultados (achieving motivation) influenciam as motivações (activação, esforço, persistência, controlo). Por sua vez, estas variáveis motivacionais parecem intervir, directamente, sobre as disposições e locação dos recursos cognitivos, nos alunos, durante o estudo e aprendizagem e por consequência afectam os seus desempenhos em tarefas que requerem memória e armazenamento da informação (como por exemplo, em exames). Os autores referem também as investigações de Borkowski e colegas acerca da interacção entre as crenças motivacionais e a metamemória, na exploração da razão porque determinadas indivíduos (observados em funcionamento intelectual) usavam determinadas estratégias, transferidas entre tarefas e outros, não as usavam. Neste contexto, Borkowski et al. (referidos por Palmer & Goetz, 1988: 44) postulam que a 'metamemória' consiste nas componentes interactivas do conhecimento estratégico específico, estratégico relacional, estratégico geral e ainda, dos procedimentos de aquisição e manutenção na memória.

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A primeira destas componentes, o conhecimento específico para cada estratégia, inclui factores como, as metas e objectivos apropriados, as tarefas adequadas, um leque de aplicabilidade, ganhos esperados nos desempenhos, esforços exigidos e ainda, o valor de satisfação. Acerca desta componente, Borkowski e colegas defendem que os alunos competentes possuem um amplo repertório de estratégias e são portadores de um conhecimento específico e adequado a cada uma delas, além de fazerem um uso eficiente destes conhecimentos e estratégias. A segunda componente, designada de ‘conhecimento estratégico relacional’, associa-se à compreensão, no aluno, da oportunidade ou qualidade de uma estratégia quando comparada com outra para fazer face a uma tarefa específica. O conhecimento estratégico geral, a componente motivacional do modelo, concerne à compreensão, no aluno, do esforço exigido e na persistência orientada para o êxito nos desempenhos das tarefas. A propósito desta componente, Borkowski e colegas sugerem que o conhecimento estratégico geral é afectado pelas atribuições individuais relativamente aos seus desempenhos e experiências em tarefas similares. A aquisição dos procedimentos da metamemória, dizem respeito às decisões livres e espontâneas tomados pelo aluno em quando e como usar uma determinada estratégia. Com efeito, somos levados a crer que a motivação e o envolvimento de um aluno relativamente a um assunto ou uma tarefa são promovidos em função da compreensão que o aluno tem acerca de si próprio e do porquê este julga determinados aspectos da tarefa mais fáceis ou mais difíceis. Harackiewicz et al. (1992, referido por Riding & Staley, 1998: 48), propõem um modelo processual da motivação intrínseca, de acordo como o qual, os aspectos gerais da competência e utilização de estratégias afectam a competência percebida que por sua vez afecta a motivação intrínseca. Entretanto, no contexto das recentes tentativas para incluir as variáveis motivacionais e volitivas (Corno & Snow, 1986) em modelos de funcionamento cognitivo, salientamos a proposta de Palmer & Goetz (1988: 44) relativamente ao uso de estratégias de estudo e aprendizagem, cujo modelo esquemático apresentamos de seguida:

Figura 3-VIII: modelo de utilização das estratégias de estudo e aprendizagem

CONHECIMENTO DAS ESTRATÉGIAS * conhecimentos gerais * atributos de estratégias de estudo específicas

* Experiências de estudo e resultados de comportamentos estratégicos obtidos * Contexto escolar e académico (metas)

Conexão entre as características do estudante e os

atributos das estratégias

Eficácia das estratégias

Utilização consciente das estratégias

Características doaluno e das tarefas

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Como ilustrado na figura, os principais elementos são as representações e percepções do aluno acerca dos atributos das tarefas, metas, atributos das estratégias e as suas próprias concepções e atributos como alunos. Segundo Palmer & Goetz (1988) quando confrontados com tarefas académicas em contexto de ensino e aprendizagem, os alunos trazem consigo grande variedade de conhecimentos, experiências de base, histórias de funcionamento cognitivo e resultados académicos. Estas características contextuais e individuais, na sua vez, influenciam as percepções que os sujeitos têm de si próprios, das tarefas de aprendizagem e as estratégias com as quais estão familiarizados e as quais sentem poder aplicar. Além disso, Chalmers & Fuller (1997: 22) defendem que a aprendizagem universitária requer a utilização coordenada das várias estratégias por parte dos alunos. Dito de outro modo, um aluno raramente usa uma estratégia isoladamente. Assim, é mais importante se as estratégias são consideradas em termos das tarefas, às quais estão destinadas, do que propriamente em termos das suas componentes separadas. Esta classificação das estratégias focadas nas tarefas é mais apropriada e ajusta-se melhor á definição de estratégias como uma colecção de tácticas cognitivas e metacognitivas usadas para executar uma tarefa especifica de aprendizagem. De acordo com estes investigadores, no desenvolvimento desta classificação, foram identificados um conjunto de tarefas mais comuns no contexto universitário e o conjunto das estratégias subjacentes a essas mesmas tarefas. Ou seja, cada tarefa inclui um determinado número de estratégias categorizadas, por exemplo, a partir da taxonomia avançada por McKeachie et al. (1987, sugestão dos autores citados) e, devidamente, organizadas segundo quatro categorias distintas que representam diferentes propósitos ou objectivos educacionais.

• 'Estratégias para aquisição da informação'. Particularmente orientadas para o incremento dos conhecimentos no sujeito. O objectivo destas estratégias é facilitar a aquisição de uma base de conhecimentos substanciais que lhes permitam lidar com a sua compreensão (por exemplo, enquanto pode haver conhecimento sem compreensão, não é possível haver compreensão sem conhecimento). A meta é, ajudar os alunos a organizar a informação de modo a que conheçam campos da informação que precisem de aprender, assim como, desenvolver uma base de conhecimentos acerca do enquadramento conceptual de cada disciplina específica. As estratégias específicas à aquisição da informação incluem, nomeadamente, sublinhados, tomadas de notas e apontamentos, sombreados, memorização de aspectos principais, acessibilidade, etc. Estão também compreendidas, nesta categoria, muitas das estratégias cognitivas (revisão, elaboração e organização) e metacognitivas (planificação, monitorização e auto-regulação) mencionadas antes.

• 'Estratégias para trabalhar com a informação'. Particularmente dirigidas ao trabalho do aluno com a informação que adquiriu com vista à sua compreensão. Estas estratégias permitem formas, segundo

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CAPÍTULO 3 199

as quais, os alunos podem pensar acerca daquilo que aprenderam e identificar os princípios e associações subjacentes. Exemplos de estratégias para trabalhar a informação, incluem a organização das ideias, exploração de ideias, realização de sumários e resumos, estudo em grupo e abordagem sistemática do estudo, além da compreensão de utilidade relativamente às próprias estratégias cognitivas, metacognitivas e de gestão de recursos.

• 'Estratégias para confirmar as aprendizagens'. Especificamente, dirigidas para a confirmação das aprendizagens. Estas estratégias concernem às avaliações formais e/ou informais das tarefas, assim como a tarefas geradas pelos próprios alunos, tais como, simulações e questões de revisão para confirmar as aprendizagens. Estão incluídas nesta categoria, as estratégias utilizadas na preparação de exames, análise de questões, preparar um relatório e aprender a partir dos feedbacks dados em avaliações formais e em todas as situações que, normalmente, envolvem estratégias cognitivas, metacognitivas e de gestão de recursos.

• 'Estratégias de gestão pessoal'. Especificamente orientadas para a gestão autónoma do estudo. Incorporam algumas das estratégias de gestão de recursos identificadas anteriormente e incluem estratégias de coping com o papel de aluno, hábitos de estudo e gestão dos tempos.

1.6. Outros modelos classificativos das estratégias

Como referimos antes, as estratégias de estudo e aprendizagem variam segundo a sua qualidade, origem e função. Com efeito, é possível considerar o funcionamento das estratégias relativamente ao controlo das aprendizagens e na influência exercida nos processos de auto-regulação para aquisição, tratamento e transformação da informação e dos conhecimentos. De acordo com as diversas classificações existentes acerca das estratégias de aprendizagem, encontramos em Boulet et al. (1996: 13) uma referência à distinção de Resnick & Glaser (1976) entre as estratégias gerais (habilidades gerais associadas ao raciocínio e pensar) e as estratégias intermediárias (habilidades particulares ou processos utilizados para executar uma tarefa). É também possível observar a distinção efectuada por Sternberg (1983), segundo o qual, são reconhecidas duas categorias principais de estratégias, nomeadamente as habilidades executivas (tipo de habilidades postas em prática na planificação, controlo e revisão das tácticas utilizadas na execução de uma tarefa) e as habilidades não executivas (habilidades utilizadas na execução das tarefas). Estes autores fazem também referência à classificação proposta por Nisbet & Schucksmith (1987) que consideram haver três categorias principais de estratégias, ou sejam as estratégias centrais (estilo, abordagem), as macro-estratégias (processos executivos altamente generalizáveis e estreitamente associados aos conhecimentos cognitivos) e as micro-estratégias (processos executivos pouco generalizáveis). Neste sentido, por exemplo, Danserau (1985) faz a distinção entre estratégias primárias

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(centradas directamente sobre a aquisição da informação e que podem ser cognitivas ou metacognitivas) e as estratégias de apoio (exercem uma acção indirecta sobre as aprendizagens ao permitirem a utilização das estratégias primárias). Paralelamente, Mayer (1988) postula que a questão central na literatura das estratégias de aprendizagem é o modo como os alunos conseguem (ou não) controlar os seus próprios processos cognitivos durante as aprendizagens. Avança este investigador com três exemplos de potenciais técnicas ou estratégias de aprendizagem para seleccionar a informação (e.g., controlar a atenção); construir conexões internas (controlar a procura e transformação da informação); e construir conexões externas (controlar a recuperação, evocação e narrativa da informação). Segundo Cook & Mayer (1983, referidos por Weistein & Mayer, 1986: 317), o processo de transformação da informação no sujeito pode ser analisado em quatro componentes principais, sendo as duas primeiras estratégias a determinar o quanto é aprendido, enquanto as duas últimas determinam a coerência organizacional entre aquilo que é aprendido e como é organizado. Deste modo, são consideradas as seguintes componentes do processamento da informação:

• 'selecção'. O sujeito toma activamente atenção a alguma da informação que chega aos sensores de recepção e transfere estas informação para a memória de trabalho ('active consciousness');

• 'aquisição'. O sujeito activamente transfere a informação da memória de trabalho para a memória permanente onde fica armazenada;

• 'construção'. O sujeito constrói conexões entre ideias na informação que foi rejeitada na memória de trabalho. Estas conexões internas envolvem o desenvolvimento de esquemas de organização paralelos que mantêm a informação agregada;

• 'integração'. O sujeito activamente procura conhecimentos anteriores na memória permanente e transfere estes conhecimentos para a memória de trabalho onde constrói conexões externas entre novas informações e conhecimentos anteriores.

Na sua vez, Pozo (1995: 206) menciona as principais diferenças entre uma aprendizagem efectuada por associação (de carácter mais mecanicista, segundo a qual, o sujeito adquire uma cópia ou reprodução mais ou menos elaborada da realidade) e uma aprendizagem por reestruturação cognitiva (de carácter estrutural e organicista, segundo a qual, se aprende reorganizando os próprios conhecimentos a partir da confrontação com a realidade e vive-versa). A cada um destes tipos de aprendizagem está vinculado (ver Figura 3-IX) a uma série de estratégias de estudo e aprendizagem que lhe são próprias. Assim uma aprendizagem associativa relaciona-se com aquelas estratégias que incrementam a probabilidade de recordar ou reproduzir fielmente a informação, sem introduzir mudanças estruturais na mesma, como por exemplo, uso de estratégias de revisão. Ao invés, numa aprendizagem por reestruturação, consegue-se

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CAPÍTULO 3 201

mediante estratégias que proporcionam um novo significado à informação e a reorganizam na forma de conhecimentos, nomeadamente, relacionando os materiais de aprendizagem com conhecimentos prévios.

Aprendizagem Estratégia Finalidade ou objectivo Táctica ou técnica

Associação

Reprodução

Reprodução simples Apoio á reprodução (selecção)

Repetir Sublinhar, destacar, copiar, etc.

Reestruturação

Elaboração Organização

Simples (significado externo) Complexa (significado interno) Classificação Hierarquia

� Palavra-chave � Imagem, representação-esquemas � Rimas, abreviaturas � Códigos, mnemónicas � Formar analogias e conexões � Sintetizar textos e efectuar resumos � Formar categorias � Formar redes conceptuais (nodos) � Identificar estruturas � Fazer mapas conceptuais

Figura 3-IX: classificação das estratégias, segundo Pozo (1995)

Também Weinstein & Mayer (1986: 316) estabelecem categorias sobre as principais estratégias de estudo e aprendizagem que podem ser usadas para alcançar determinadas metas ou para elaborar comportamentos que influenciam os processos cognitivos de transformação da informação. Dito de outro modo, cada uma destas categorias inclui métodos desenhados para influenciar certos aspectos do processamento da informação e, por conseguinte, facilitar um ou mais tipos de resultados e desempenhos académicos. Esta listagem compreende estratégias:

• de revisão básicas (basic rehearsal strategies). Exemplo, ordenar itens ou assuntos tratados na aula;

• de revisão complexas (complex rehearsal strategies). Exemplo, copiar, sublinhar ou sombrear o material mais importante apresentado na aula;

• de elaboração básicas (basic elaboration strategies). Exemplo, formar uma imagem ou elaborar uma representação mental acerca de um assunto ou aspecto do material de estudo;

• de elaboração complexas (complex elaboration strategies). Exemplo, parafrasear, sumariar ou descrever como a nova informação se relaciona com os conhecimentos anteriores;

• organizacionais básicas (basic organizational strategies). Exemplo, agrupar ou ordenar os itens ou assuntos que devem ser estudados a partir de um plano ou programa de estudos;

• organizacionais complexas (complex organizational strategies). Exemplo, realçar uma determinada passagem ou criar uma hierarquia de importância dos assuntos estudados;

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• de controlo da compreensão (comprehension monitoring strategies). Exemplo, auto-questionar para avaliar o entendimento do material de estudo;

• afectivas (affective strategies). Exemplo, estar alerta e relaxado para poder lidar com a ansiedade; algumas estratégias nesta categoria incluem a redução dos distractores dos estudo, a vontade em frequentar e participar nas aulas, etc.

Por outro lado, McKeachie e colaboradores (1987) desenvolvem uma taxonomia de estratégias de estudo e aprendizagem que procura descrever um leque de estratégias necessárias para a aprendizagem efectiva ao nível universitário. Estes autores começam por fazer a distinção entre estratégias cognitivas relacionadas com a aprendizagem e compreensão da informação, as quais, compreendem as seis primeiras categorias de estratégias de revisão, elaboração e organização (básicas e complexas) propostas por Weinstein & Mayer, das estratégias metacognitivas, as quais, compreendem estratégias de planificação, controlo e regulação. A estas, é ainda adicionado um terceiro grupo de estratégias que são designadas por estratégias de gestão de recursos, as quais, compreendem a gestão dos ambientes e recursos temporais, humanos e esforços disponíveis. Já Sternberg (1985) havia identificado estas estratégias de gestão de recursos como importantes na medida em que permitiam aos alunos adaptar-se mais facilmente aos ambientes e a alterá-los para que se ajustassem às suas necessidades. Neste sentido, para Chalmers & Fuller (1996: 21) as estratégias de gestão de recursos são particularmente importantes. Estes autores sublinham que este tipo de estratégias são uma componente tradicional dos programas de desenvolvimento das competências de estudo. Aliás, salientam o facto da gestão dos tempos de estudo individual e actividades de lazer, inclui uma planificação semanal, mensal e semestral ou outra. Com efeito, este tipo de estratégias, envolve a fixação de metas, identificação de prioridades e gestão flexível dos tempos livres e de lazer. Também a gestão dos ambientes e espaços de estudo implica, no sujeito, a identificação das melhores condições físicas para estudar, mormente, aspectos de iluminação, arejamento e a adaptação destes mesmos ambientes às suas necessidades pessoais, como por exemplo, precisar de um lugar calmo para estudar, reduzir os distractores, etc.. Finalmente, a gestão dos esforços relaciona-se com as motivações pessoais, com a persistência e as atribuições acerca dos desempenhos nos alunos, entre outros aspectos. Ainda de acordo com Chalmers & Fuller (1997: 22), as estratégias cognitivas e metacognitivas assinaladas na taxonomia de McKeachie et al. (1987) focam sobretudo estratégias que facilitam as aprendizagens de conhecimentos declarativos (saberem o quê) e conhecimentos condicionais (saber quando e porquê), mas, não incluem estratégias que facilitem o conhecimento procedural (saber como). Neste sentido, em algumas disciplinas podem ser exigidas estratégias que facilitem a demonstração e aplicação de conhecimentos (e.g., computação, desporto, ciências laboratoriais, outras) de forma prática. De acordo com

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CAPÍTULO 3 203

esta questão, a necessidade deste tipo de competências implica uma nova categoria de estratégias (practical

skills strategies), a qual, se acrescenta à taxonomia proposta por McKeachie e colaboradores. Entretanto, O'Malley et al. (1988) baseiam a sua classificação das estratégias segundo o esquema de Brown & Palincsar (1982) que compreende estratégias metacognitivas e cognitivas. A estas categorias, é acrescentada uma terceira que inclui as estratégias sócio-afectivas. Pretende-se compreender aquelas estratégias usadas pelos alunos que exigem interacção social, como por exemplo, a cooperação e a procura de ajuda entre pares, professores, familiares ou outros. Uma possível descrição das estratégias de aprendizagem e respectiva classificação pode ser observada no esquema seguinte, traduzido e adaptado de O'Malley et al. (1988: 230). Estratégias Descrição

Metacognitivas Programação Atenção dirigida Atenção selectiva Auto-gestão Planeamento funcional Auto-monitorização Produção retardada Auto-avaliação

� Fazer uma previsão geral, mas compreensiva, do conceito ou princípio na antecipação de uma actividade de

aprendizagem. � Decidir antecipadamente a atenção, em geral, sobre uma tarefa (exame) de aprendizagem e ignorando

distractores irrelevantes. � Decidir antecipadamente a atenção para aspectos específicos da informação e estímulos ou detalhes situacionais

que venham a permitir a sua retenção. � Compreensão das condições que possam ajudar o próprio a aprender e estruturação em função dessas mesmas

condições. � Planeamento para e revisão das componentes necessárias à evocação da informação. � Auto-correcção no sentido da apropriação às situações, contextos e pessoas. � Decisão consciente de retardar falar sobre determinado assunto sem antes o ter aprendido � Testar os resultados e desempenhos do próprio relativamente a medidas internas de execução e apropriação.

Cognitivas Revisão Investigação Resposta física directa Translação Agrupamento Tomada de notas Dedução Recombinação Representação Chaves (mnemónicas) Contextualização Elaboração Transferência Inferência

� Reprodução de modelos, incluindo práticas de repetição e de revisão silenciosa. � Definição ou exploração de definições, conceitos e conhecimentos usando referências. � Relação de novas informações a acções físicas ou directivas. � Uso das primeiras informações ou conhecimentos como base para a compreensão e/ou produção de outros. � Reordenação ou reclassificação e, eventualmente, catogorização dos materiais em estudo baseados em atributos

comuns. � Escrever as ideias principais, pontos importantes, sublinhados e sumarização ou resumo das informações

apresentadas oral ou por escrito. � Aplicação consciente de regras para produzir ou compreender as novas informações. � Construção de proposições com sentido ou sequências gerais por combinação ou rearranjo dos elementos de

uma nova forma. � Relação da nova informação a conceitos visuais na memória de modo familiar, conjugações fáceis,

locações,esquemas, etc. � Evocação da nova informação através da identificação de um aspecto particular ou especial; gerando imagens

mentais associadas á informação que sejam facilmente evocáveis (mnemónicas). � Colocação da nova informação numa sequência de ideias ou linguagem com sentido. � Relação da nova informação com outros conhecimentos existentes na memória. � Uso de conceitos ou conhecimentos previamente adquiridos para facilitar a aquisição e utilização de outros

elementos nas tarefas de aprendizagem. � Uso de informação disponível para produzir significados de novos itens, resultados preditos ou falhas de

informação. Afectivo-relacionais

Cooperação Questionamento

� Trabalhar com um ou mais pares para partilhar e obter retornos, sectores de informação ou modelos de acção. � Questionar professores, pares ou outros para repetir, explicar, explorar e/ou exemplificar

Figura 3-X: classificação das estratégias, segundo O'Malley e colegas

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Boulet et al. (1996: 16) referindo-se a Lise Saint-Pierre (1991) da qual partilhamos a perspectiva que é importante a influência exercida por variáveis afectivas na aprendizagem, propõem uma classificação bastante semelhante à descrita por McKeachie et al. (1987), mas adicionam a esta, uma quarta categoria que compreende as estratégias afectivo-relacionais. Com vista à adopção de um modelo classificativo das estratégias de aprendizagem, passamos a descrever este conjunto de estratégias:

• 'cognitivas'. Incluem tácticas e estratégias de revisão, elaboração, organização, generalização, discriminação e compilação dos conhecimentos.

• 'metacognitivas'. Incluem tácticas e estratégias de planificação, controle e regulação.

• 'gestão de recursos'. Incluem tácticas e estratégias para gerir o tempo eficazmente, organizar os recursos materiais e gerir o ambiente e espaços de estudo e trabalho e para identificar os recursos humanos e a procura de apoio psico-pedagógico.

• 'afectivo-relacionais'. Incluem tácticas e estratégias para estabelecer e manter a motivação, manter a atenção e concentração, controlar a ansiedade.

Boulet e colegas, defendem que esta classificação tem em conta a natureza (declarativa, condicional e procedural) dos conhecimentos e a forma (mecânica ou significativa) das aprendizagens. Uma possível reclassificação da taxonomia proposta pode ser observada no seguinte esquema:

Estratégias cognitivas

Estratégias Conhecimentos Tácticas ou técnicas

Repetição Elaboração Organização

Declarativos

Aprend. Mecânica Aprend. Significativa Aprend. Mecânica Aprend. Significativa Aprend. Mecânica Aprend. Significativa

� � Repetição � Tomada de notas e apontamentos � Sublinhar, salientar, sombrear � Mnemotécnicas � Anotação pessoal, parafraseamento, resumos, sínteses, analogias � Formulação de questões, conexões, implicações, exemplos � Listagens, conjuntos, agrupamentos � Mapas das matérias, planos de acção, hierarquias, redes e

esquemas Generalização Discriminação

Condicionais

� Identificação de exemplos, criação de exemplos, encontrar semelhanças

� Identificar contra-exemplos; criar contra-exemplos, encontrar dissemelhanças

Compilação de conhecimentos

Procedurais � Praticar por partes, praticar na globalidade � Comparar os desempenhos relativamente a modelos

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CAPÍTULO 3 205

Estratégias metacognitivas

Estratégias Descrição de tácticas ou técnicas

Planificação

� Fixar metas e objectivos � Julgar o nível de tratamento da informação exigido � Estimar o número e tipo de tratamentos de informação necessários � Prever as etapas a seguir � Estimar as hipóteses de sucesso e insucesso � Estimar os tempos necessários e a sua gestão

Controlo � Identificar o tipo de actividade cognitiva activada (classificação) � Tomar consciência dos seus progressos e resultados (verificação) � Avaliar a qualidade e eficácia das actividades cognitivas (avaliação) � Antecipar as alternativas possíveis de solução e os resultados esperados (previsão)

Regulação � Regular a capacidade de tratamento � Regular o material tratado � Regular a intensidade do tratamento � Regular a velocidade do tratamento

Estratégias afectivas

Para estabelecer e manter a motivação

� Estabelecer objectivos pessoais de desempenho � Colocar em marcha um sistema de recompensas e punições

Para manter a concentração � Eliminar os possíveis distractores � Criar um clima ou ambiente de trabalho favorável

Para controlar a ansiedade � Identificar e utilizar técnicas de relaxação � Identificar e utilizar técnicas de redução do stress e ansiedade

Estratégias de gestão dos recursos

Para gerir os recursos temporais � Estabelecer horários fixos de trabalho e estudo � Fixar objectivos em certos aspectos ou detalhes � Estabelecer planos de trabalho e de estudo organizando os tempos disponíveis

Para organizar e gerir os recursos materiais e ambiente de estudo

� Identificar os materiais e recursos disponíveis e apropriados � Fazer uma gestão eficaz e adaptada ás suas necessidade e ao seu próprio estilo,

materiais e recursos

Para providenciar a protecção dos recursos humanos disponíveis

� Identificar os recursos disponíveis � Solicitar ajuda e apoio junto dos recursos disponíveis

Figura 3-XI: classificação das estratégias, segundo Boulet et al. (1996)

Na revisão da literatura que efectuamos até este momento, dedicamos uma atenção especial aos modelos relativos aos processos auto-reguladores do estudo e aprendizagens no contexto académico do ensino superior. O estudo das estratégias de aprendizagem, tal como descrito antes, envolvia a assunção de que importava conhecer melhor os processos envolvidos para mais facilmente saber como ajudar os jovens estudantes universitários a promover as suas competências académicas. Sublinhamos o consenso entre

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diferentes investigadores psico-educacionais acerca do aparente fracasso ou desapontamento no que concerne ao treino destas competências. Por outro lado, pensamos que a observação da qualidade dessas mesmas competências e o modo como são aplicadas ou processadas pelos indivíduos nos contextos académicos em que estão inseridos, poderia contribuir em algum modo para refinar e consolidar algumas das várias abordagens teóricas possíveis. Assim, os capítulos que seguem tentam fornecer alguns exemplos destes processos recíprocos, traduzindo a nossa própria contribuição para a investigação. Começamos pela descrição da metodologia e os procedimentos adoptados para a adaptação e construção de instrumentos de avaliação, com base na bibliografia referida e com vista a avaliar níveis de ajustamento académico e utilização de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens, em jovens estudantes universitários. De seguida, tomando os dados recolhidos, analisamos e apresentamos os resultados do estudo empírico que consistiu na identificação e caracterização de diferenças nos alunos do 1ºano da Universidade de Aveiro, no que concerne à utilização de estratégias auto-reguladoras dos estudos e aprendizagens e das possíveis relações entre e intra diferentes variáveis consideradas. Julgamos, assim, poder vir a conhecer as situações concretas para melhor agir sobre os sujeitos e problemas existentes, optimizando desempenhos e contribuíndo para o sucesso.

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SEGUNDA PARTE : INVESTIGAÇÃO EMPÍRICA

Níveis de ajustamento académico e auto-regulação académica em estudantes do 1ºano (comum) dos cursos de licenciatura em ciências e engenharias da Universidade de Aveiro

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Capítulo 4

Metodologia

Apresentada a primeira fase de revisão da literatura específica versando aspectos relativos ao processo de ajustamento académico e ao desenvolvimento das competências de estudo em jovens estudantes universitários, segue o presente capítulo no qual se descreve a metodologia geral utilizada na parte empírica do estudo. Começamos por rever a linha condutora da investigação e traçar o plano de investigação (geral) adoptado. Depois, descrevemos os critérios e os principais aspectos tidos nos processos de escolha, adaptação e validação dos instrumentos aplicados. Na sequência, apresentamos as principais opções metodológicas e efectuamos uma descrição funcional das variáveis usadas na investigação e especificamos as hipóteses de trabalho. Por último, identificamos a população-alvo, o plano de amostragem e efectuamos uma primeira caracterização da amostra tomada. Nos capítulos seguintes analisamos e discutimos os resultados obtidos e apresentamos as nossas conclusões.

1. Linha condutora da investigação

A reflexão acerca do conjunto de resultados obtidos em diversas investigações e no quadro teórico subjacente conduziu á necessidade de investigar um pouco mais no que dizia respeito aos processos de ajustamento e auto-regulação académica em estudantes universitários. Com a realização deste estudo, pretendemos inserir-nos no quadro alargado do projecto 'Factores de sucesso/insucesso no 1ºano comum

das licenciaturas em Ciências e Engenharia da Universidade de Aveiro', iniciado em 1994 por uma vasta equipa de investigadores desenvolvendo trabalho em diversas instituições e assente nos pressupostos de que a entrada na Universidade representa uma descontinuidade em relação às experiências educativas anteriores e os seus sintomas são detectáveis em domínios psicológicos, pedagógico/didácticos e institucionais. São avançadas duas grandes metas específicas a atingir:

1. Identificar e caracterizar os factores responsáveis pelos níveis de sucesso/ insucesso nos alunos do primeiro ano das licenciaturas em ciências e engenharias (fase de diagnóstico ).

2. Identificar, conceber e desenvolver possíveis formas de intervenção sobre os alunos (intra-individual, interindividual ou intragrupal e institucional) (fase de intervenção) (Tavares et al.,1996; 1998: 15).

No que concerne aos sujeitos produtores das representações no presente estudo (alunos que frequentam o 1ºano comum da Universidade de Aveiro) e à diversidade de variáveis em causa, assentamos numa preocupação genérica mas convergente entre os diferentes pontos de vista, referenciados nos

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capítulos anteriores, susceptíveis de constituírem elementos pertinentes na compreensão da extensão e natureza dos problemas presentes nos sujeitos, contextos e processos de formação, ensino e aprendizagem. Para o efeito, começamos por assumir nesta investigação, que a maioria dos estudantes quando ingressa na Universidade transporta consigo o sentimento ou a consciência que precisa de desenvolver um método1 de estudo eficaz para enfrentar as tarefas académicas que lhe serão propostas. Este 'caminho' ou abordagem inclui cognições (capacidades, conhecimentos) e motivações (interesse, objectivo) e uma orientação estratégica (atitude ou procedimento tomado pelo jovem universitário) com vista a alcançar um determinado fim ou meta específica. A este propósito, Janssen (1989: 471) refere que, algumas ideias similares foram já antes descritas por Heider, em 1958, na sua 'análise da acção'. Na realidade, Heider considerava que os resultados, efectivos, das atitudes e dos comportamentos equalizavam com o produto entre os factores do 'tentar' (to try) e os factores do 'ser capaz' (to can). Isto é, o 'tentar' (factor motivacional) associa-se a tudo aquilo que o indivíduo quer e tenta fazer (intenção/ atitude/ orientação) e a persistência e grau de esforço dispendido. Este é o factor central na causalidade e investimento pessoal, trazendo alguma ordem à variedade de acções possíveis ou sequências destas (estratégias)) através da sua coordenação em função dum resultado ou produto final (e.g., concluir uma tarefa académica). O 'ser capaz' (o factor de capacidade) inclui as características (intra e inter) psíquicas individuais (cognitivas e metacognitivas) e ainda, a própria componente afectivo-relacional (motivacional). Deste modo, prestamos uma atenção particular à avaliação dos níveis de ajustamento académico, através das medidas de satisfação com o contexto académico segundo distintas vertentes, a percepção e auto-confiança que o indivíduo julga possuir relativamente a si próprio, a existência de problemas actuais, as atribuições causais do sucesso e insucesso. Procuramos igualmente analisar as suas principais formas de abordagem (motivo e orientação) relativamente ao estudo e o uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens. A avaliação da natureza e extensão destas variáveis, nos alunos do 1ºano da Universidade, prende-se sobretudo com a possibilidade destas variáveis cognitivo-motivacionais constituirem um dispositivo qualitativo dos respectivos processos de ensino e aprendizagem. A fim de dar seguimento a esta linha orientadora e à exploração dos aspectos mencionados, passamos a descrever o plano de investigação, os processos de adaptação e validação dos instrumentos aplicados e os principais procedimentos metodológicos e estatísticos adoptados.

1 no sentido do termo grego 'hodos' (caminho) e 'meta' (para dentro de…).

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CAPÍTULO 4 211

2. Plano de investigação

Para a compreensão do fenómeno em estudo, fomos orientados para o diagnóstico pedagógico em contexto natural, seguindo uma metodologia do tipo não experimental (ex-post-facto), exploratório de acordo com o modelo ‘correlacional-diferencial’ (Arnal et al., 1992; Bisquerra, 1996; Almeida & Freire, 1997). Em relação ao método correlacional, podemos afirmar que este se situa entre os métodos descritivos, ou simplesmente compreensivos da realidade (estudos qualitativos) e os estudos experimentais (estudos quantitativos). A correlação, embora, não explique nem forneça as provas de causalidade entre variáveis, pode contudo assumir-se como um dos aspectos da causalidade (Pinto, 1990: 63) permitindo a sua previsibilidade (Almeida & Freire, 1997: 92). Também, para Arnal et al. (1992: 184), o método correlacional vai mais além da mera descrição gerando com frequência estudos preditivos. A perspectiva diferencial inserida, neste estudo, decorreu da possibilidade em se considerarem algumas diferenças nos resultados (medidas) entre grupos em análise e/ou, os eventuais efeitos de moderação (Pinto, 1990; Bisquerra, 1996: 142) nas variáveis individuais, nomeadamente o género, a idade, o local de residência, o curso frequentado e a prioridade de escolha de curso. Por outro lado, segundo Almeida & Freire (1997) os resultados numa investigação e por conseguinte as conclusões daí decorrentes dependem muito dos meios usados na avaliação (instrumentos), de quem é tomado para ser avaliado (amostra) e o modo como ocorre e se procede nessa avaliação (metodologia). Neste sentido, entendemos que seria conveniente descrever, ainda que de uma forma breve, as várias fases consideradas no desenvolvimento deste estudo empírico e registar os principais cuidados e procedimentos estatísticos tidos. Assim,

1ºfase. Seleccionar, adaptar, construir e aplicar instrumentos de medida com base investigacional acerca da problemática e objectivos do presente estudo.

2ªfase. Estudar as características e qualidades psicométricas dos instrumentos de medida aplicados recorrendo à análise descriminatória, de validação interna (robustez e consistência) e análise factorial exploratória dos resultados nos itens.

3ºfase. Estudar as (co)relações e influências existentes entre (e intra) variáveis e indicadores do estudo, identificando e caracterizando eventuais efeitos (simples ou de interacção) ou diferenças relativamente estáveis através da análise descritiva, dos valores das variâncias e dos coeficientes de regressão linear.

4ºfase. Procurar identificar através do método de clusters possíveis grupos ou perfis nos sujeitos, relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens tomando em simultâneo o conjunto dos níveis de ajustamento académico e abordagens do estudo.

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212

Os dados recolhidos foram previamente introduzidos numa base do SPSS for Windows (Release

7.5.1, Dec 20 1996) Standard Version, através de uma verificação dupla e submetidos a análise e tratamento segundo os processos e procedimentos habituais das estatísticas descritiva, factorial e correlacional.

3. Instrumentos

Os instrumentos a serem utilizados na investigação das representações agem, com frequência como factor de limitação das mesmas ao nível da sua expressão, problematizando a análise dos diferentes elementos...' (Santiago, 1996: 122). Por outro lado, estamos cientes que qual seja o fenómeno, não é possível reduzi-lo, apenas, ao que se retira do que acerca deste dizem ou pensam os indivíduos. Ou seja, são necessárias outras informações que deverão ser recolhidas por diferentes pessoas, formas e circunstâncias. Contudo, atendendo aos enormes constrangimentos e limitações que um estudo desta natureza implicava, optamos nesta fase da investigação por recolher informação quantitativa através de inquérito por questionário, com vista ao diagnóstico e caracterização de algumas relações existentes entre dimensões pessoais (entre e intra variáveis) comprometidas com as competências de estudo, nos jovens estudantes do 1ºano de ciências e engenharias da Universidade de Aveiro. O 'inquérito por questionário pode ser definido como uma interrogação particular acerca de uma situação englobando indivíduos, com o objectivo de concluir e generalizar' (Chiglione & Matalón, 1993: 8). Após um processo inicial de pesquisa, recolha e selecção junto da bibliografia específica consultada e que de algum modo se relacionava com a problemática do ajustamento académico, competências de estudo, hábitos, métodos e estratégias de aprendizagem, elaboramos uma lista de questões e aspectos exploratórios que viriam a tomar forma de itens em dois questionários, os quais designamos por 'QIVA: Questionário de Identificação e Vivência Académica' e 'QACE: Questionário de Atitudes e Comportamentos perante o estudo' e que viriam a ser aplicados nos sujeitos. Pelo facto das avaliações, os resultados obtidos e a testagem das hipóteses específicas dependerem sobremaneira da qualidade psicométrica dos instrumentos utilizados (Almeida & Freire, 1997) passamos, nos pontos seguintes, à caracterização das variáveis e indicadores utilizados nesta investigação e indicar os processos de selecção, adaptação e construção dos instrumentos aplicados. Seguidamente, descrevemos os principais procedimentos tidos no estudo das características psicométricas (distribuição, sensibilidade e consistência interna), estrutura factorial e correlacional nos itens e nos factores e apresentamos os respectivos resultados obtidos.

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CAPÍTULO 4 213

QIVA: Questionário de Identificação e Vida Académica Questionário2 composto por 3 blocos de questões composto por itens retirados e/ou adaptados de Questionário1 (Tavares et al., 1996): Bloco 1- 'Dados pessoais'. Identificação dos sujeitos pelo nome e nº mecanográfico (facultativo), idade, sexo

e local de residência (em período de aulas e férias); Bloco2- 'Dados escolares'. Identificação dos sujeitos pelo curso, número de frequências do 1ºano, prioridade

de escolha do curso, médias das notas escolares do ensino secundário (10º,11º e 12º anos) e acesso à Universidade, e percentagem de tempo útil semanal dedicado a actividades de frequência aulas, estudo independente, lazer (descontracção, desporto, convívio, etc.) e outras actividades;

Bloco3- 'Dados de integração académica'. Questionário específico composto por 3 grupos (4 itens cada) de resposta múltipla forçada em escala de 6 pontos, formato lickert gradual (1= mínimo/ discordância

total a 6= máximo/concordância total), tendo em vista a avaliação dos níveis de expectativas, satisfação e auto-percepção como estudante. Segue um grupo constituído por 13 itens de resposta dicotómica nominativa (Sim/Não) acerca da existência e natureza de problemas actuais. Ainda um último grupo composto de 11 atribuições causais acerca do sucesso e do insucesso, das quais se solicita aos sujeitos que indiquem, no seu caso a atribuição causal considerada mais importante.

3.1. [Aja]: Ajustamento académico

3.1.1. Estudo de adaptação do inventário [Aja]

O estudo de adaptação do Bloco 3 do QIVA, incluiu procedimentos qualitativos e quantitativos que permitiram obter uma escala mais ajustada aos objectivos da presente investigação. Num primeiro momento, a versão adaptada foi submetida à apreciação de um grupo de doze alunos da Universidade de Aveiro com características semelhantes à amostra definitiva. Foram registadas as reacções dos alunos e o tempo médio de duração no preenchimento dos dois questionários3. Num segundo momento, foram interrogados individualmente cada um dos respondentes acerca das impressões tidas, dúvidas e dificuldades no preenchimento e efectuada uma breve análise crítica (seguiu de perto o método da 'reflexão falada' de Almeida & Freire, 1997: 122).

2 Cf. Anexo 4. 3 QIVA+ QACE

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A atitude que sobressaiu acerca do inventário foi de aceitação e foram tidas em conta todas as sugestões dadas que se traduziram em algumas rectificações, nomeadamente na forma de apresentação dos itens relativos aos problemas pessoais e institucionais e no formato das respostas aos itens4. correspondentes às atribuições causais do sucesso e insucesso no desempenho escolar. Entretanto, constatamos também algumas dificuldades nas respostas aos itens relacionados com as classificações escolares. Relativamente a estes itens, optamos por explicitar a instrução para que os respondentes indicassem as classificações na escala 0-20 valores. A análise quantitativa do Bloco 3 do QIVA, baseou-se em medidas descritivas de discordância/ concordância e de sensibilidade nas respostas a todos os itens (Quadro 4-I). Em primeiro lugar, registamos e analisamos as frequências e percentagens de respostas aos itens e observamos os seus parâmetros de centralização e dispersão, assim como a representação gráfica de algumas variáveis. Em segundo lugar, procuramos observar mais atentamente as relações entre os dados ordinais do Bloco 3 e as respostas dicotómicas (não/sim) correspondentes à existência de problemas actualmente. Deste modo, começamos por considerar os 12 itens ordinais e seleccionamos 4 itens dicotómicos (sim/ não) correspondentes à existência de problemas actuais com maior poder5 descriminativo e tentamos verificar se estes itens (em conjunto) concorriam para uma medida global de ajustamento académico, a qual, designamos por [AjA]. Este conjunto inicial foi constituído por: Grupo 1) 'Expectativas'

Exp1- As matérias correspondem ao que esperava Exp2- Os docentes correspondem ao que esperava Exp3- Os colegas correspondem ao que esperava Exp4- O ambiente geral de trabalho corresponde ao que esperava

Grupo 2) 'Satisfação' Sat1- Com o curso que frequento Sat2- Com o 1ºano comum Sat3- Com o equipamento(material de apoio, meios informáticos, etc.) Sat4- Com a Universidade (espaços, serviços, informação, etc.)

Grupo 3) 'Percepção como estudante' Est1- O meu nível de preparação trazido do secundário é elevado Est2- Estou confiante quanto aos resultados académicos Est3- Não vou ter grandes dificuldades relacionadas com os estudos Est4- Sou uma pessoa que se adaptou bem à Universidade

4 O formato inicial destes itens era ordinal, em escala de Lickert de 6 pontos. Atendendo aos objectivos do estudo relativamente a

estes itens, optamos pela sua simplificação passando-os a resposta de opção única (indicar a atribuição mais importante). 5 Os restantes 9 itens referentes a outro tanto número de problemas actuais apresentaram pouco poder descriminativo com

índices de respostas negativas acima de 95% do total da amostra (N=420).

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CAPÍTULO 4 215

Grupo 4) 'Problemas actuais' Pro1- Problemas de ansiedade Pro2- Problemas de atenção e concentração Pro3- Problemas de mal estar físico (dores cabeça, cansaço, sono, etc.) Pro4- Dificuldades relacionadas com estudos.

Uma análise prévia aos índices e relações existentes entre os itens que formam o grupo 4) 'Problemas actuais' e a sua contribuição para uma medida do ajustamento académico (medida [AjA]) levou a que estes fossem excluídos6. No entanto, os resultados obtidos nestes itens (em grupo ou individualmente) poderão vir a ser considerados no relacionamento com outras variáveis que venham reclamar a sua utilização.

3.1.2. Validação interna e análise das respostas aos itens de [Aja]

Campbell & Stanley (1973, citados por Bisquerra,1996: 157) referem que a ‘validade interna é a mínima imprescindível, sem a qual é impossível interpretar o modelo. Existe validade interna quando fica claramente demonstrado que as mudanças das variáveis dependentes são devidas à variável independente e não a outras causas'. E continua, ‘a validade interna é condição sine qua nom para a validade externa'.7 A aferição e validação dos resultados numa prova constitui um momento decisivo com vista á sua futura utilização (Almeida & Freire, 1997: 141). Segundo estes autores, a aferição não se circunscreve apenas à fixação de normas de interpretação, mas importa conhecer a sensibilidade, a fidelidade e a validade, não ao teste em si mesmo, mas aos resultados na amostra. Assim, na análise das características psicométricas dos resultados são indicados:

• os índices de sensibilidade (frequências, medidas centrais e de dispersão, assimetria e curtose) das respostas nos itens de acordo com as leis e propriedades da distribuição 'normal' ou 'gaussiana'.

6 Salientamos, os seguintes aspectos que pesaram na opção em não considerar estes itens para uma medida de ajustamento

académico:

a) estes itens apresentaram fraca associação com os restantes, evidenciada nos reduzidos (negativamente) ou quase nulos coeficientes de correlação entre itens e item- total (-.25 ≤ r ≤-.02);

b) estes itens apresentaram fraca apropriação à escala, com índices de determinação muito fracos ( r2≤ .23);

c) a quase total independência deste grupo de itens relativamente aos restantes, evidenciado em análise factorial exploratória dos resultados (os quatro itens saturam sós num factor acima .46, a explicar cerca de 9% do total de variância);

d) o formato dicotómico (sim/não) destes itens relativamente ás ordens (formato Lickert de 6 pontos) dos restantes itens. 7 A validade externa relaciona-se com a probabilidade de estender as conclusões e generalizar os resultados.

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• a fidelidade dos resultados nos itens através do cálculo do grau de uniformidade ou de consistência interna (coeficiente alpha de Cronbach8) e na indicação do poder descriminativo dos itens com a determinação dos coeficientes de correlação de Bravais-Pearson9 (item-total) e de determinação r2 (squared multiple correlations)10 entre todos os itens;

• a validade dos resultados, associada ao facto de procurarmos saber se o instrumento mede (prediz) aquilo que se pretende que ele efectivamente meça (Almeida & Freire, 1997: 154). Neste sentido, é suposto que o instrumento [AjA] possa servir para medir (predizer) diferentes níveis de ajustamento académico.

O re-dimensionamento do instrumento [AjA] foi obtido por análise factorial exploratória dos resultados nos itens (N=420) através do recurso ao procedimento 'factor reduction' do SPSS, com extracção da matriz de componentes principais segundo diferentes soluções normalizadas (Kaiser) através de rotações oblíquas ( método- direct oblimin) e ortogonais (método- Varimax) com e sem especificação de factores.

3.1.2.1. Distribuição e sensibilidade dos resultados nos itens

A distribuição das respostas aos itens do inventário [AjA] pode ser observada no Quadro 4-I, assim como, a respectiva medida de tendência central (média) e de dispersão (Desvio Padrão). Indicam-se também os coeficientes de sensibilidade (assimetria e curtose) dos resultados relativamente à distribuição estatística 'normal'.

8 O coeficiente α (alpha) de Cronbach é o procedimento considerado como a melhor estimativa da fidelidade de um teste e resulta do pressuposto que os itens de uma escala apresentam correlações positivas entre si (suposto medirem, algo semelhante) e obtém-se pela correlação média entre os itens, se estes forem normalizados para um D.P. igual a 1 ou, não sendo, através da covariância média entre eles (Cronbach, 1990).

9 O coeficiente de r de Bravais-Pearson traduz o grau de associação linear entre duas variáveis. Um valor próximo de zero indica independência, enquanto um valor próximo da unidade indica dependência entre variáveis. O valor positivo de r permite-nos considerar uma associação directa, ao contrário de um valor negativo que aponta para uma associação do tipo inversa (Howell, 1982).

10 Quadrado dos coeficientes de correlação múltipla (r2) ou coeficiente de determinação mede a redução proporcional dos desvios resultantes de utilizar o modelo de regressão linear. Ou seja, reflecte a variabilidade de uma variável dependente ou explicada pela variável independente. Obtém-se expressando em % o quadrado do valor de r de Bravais-Pearson. Um valor próximo de zero indica fraca apropriação entre o item e o resto da escala, enquanto um valor próximo da unidade indica forte apropriação.

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CAPÍTULO 4 217

Quadro 4-I: medidas de distribuição e sensibilidade dos resultados nos itens de [AjA]

Ordens (%)

Item

Média

DP

assim

etria

Curto

se

1

2

3

4

5

6

Exp1 Exp2 Exp3 Exp4 Sat1 Sat2 Sat3 Sat4 Est1 Est2 Est3 Est4

3,5 3,8 4,6 4,3 4,5 3,1 4,8 5,1 3,8 3,6 3,1 4,3

1,4 1,0 1,1 1,1 1,4 1,6 1,0 0,9 1,0 1,0 1,0 1,2

- - - - - + -

- - - - - -

↓ ↓ ↓ ↓ ↑

↓↓ ↑

↑↑ ↑ ↓ ↓ ↓

11,2 1,7 1,0 1,2 5,0 24,5 0,2 0,5 3,8 2,1 5,5 1,7

12,6 8,3 4,0 5,5 5,5 14,5 2,4 1,0 7,9 13,8 19,5 6,2

23,8 24,8 10,0 14,8 11,4 18,6 10,2 3,3 21,0 29,0 39,8 16,9

28,1 38,6 26,9 31,2 18,8 20,7 21,4 13,8 44,3 38,3 27,4 28,3

19,3 22,9 38,6 36,7 31,9 16,2 41,2 43,1 21,7 15,2 7,4 34,3

5,0 3,8 19,5 10,7 27,4 5,5 24,5 38,3 1,4 1,4 0,5 12,6

Legenda: i) + : Assimetra positiva (soma de desvios acima da média); ++ : Acentuadamente positiva; - : Assimetria negativa (soma dos desvios abaixo da média); - - : Acentuadamente negativa. ii) ↑ : Curva leptocúrtica (afunilada); ↑↑ : Acentuadamente leptocútica ↓ : Curva platicúrtica (achatada) ; ↓↓ : Acentuadamente platicúrtica. [ Outros casos: 'normal'] Uma análise da distribuição das respostas aos itens do inventário [AjA] permite registar que todos os itens tiveram frequências de discordância/ mínimos ou de concordância/ máximos com valores razoáveis (abaixo de 5% ou acima de 95%), com excepção do item Sat4, que regista ordens de concordância superiores a 95%, parecendo resultar uma tendência de resposta, neste item, do tipo socialmente desejável. Os valores obtidos nos coeficientes de assimetria11 e curtose12 aproximam-se de zero na generalidade das situações, evidenciando uma distribuição 'normal'. Optamos por representar as oscilações

11 O coeficiente de assimetria informa-nos da assimetria relativamente a valores centrais (média ou mediana) encontrada na

distribuição geral dos resultados. Numa distribuição 'normal' dos resultados a soma dos desvios acima e abaixo da média anulam-se, obtendo-se um coeficiente próximo de zero. Um valor positivo deste coeficiente indica uma maior predominância dos desvios acima da média, ao invés de um valor negativo. Para este estudo consideramos que a distribuição é acentuadamente assimétrica sempre que a distribuição se aproxima dos extremos da escala (isto é, mediana Md=1 ou Md=6 ou no caso da média, M> 5 ou M< 2).

12 O coeficiente de curtose tem a ver com o grau de elevação ou achatamento da curva de distribuição dos resultados. Graficamente, quanto maior for a dispersão dos resultados na distribuição, mais a forma da sua distribuição se mostra achatada (platicúrtica) e quanto mais concentrados junto da média mais a sua forma é afunilada (leptocúrtica), assumindo a forma de um sino (curva mesocúrtica) se a distribuição for 'normal'. Acerca do coeficiente de curtose, importa destacar que quanto mais próximo de zero for o seu valor mais 'normal' é a distribuição. Por outro lado, a um valor positivo crescente, deste coeficiente, corresponde um maior afunilamento da curva (relativa à 'normal') e a um decrescente valor negativo corresponde um maior achatamento da curva (relativa à 'normal' ).

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existentes através de sinais para que a sua interpretação fosse mais clara e sugestiva. Da sua leitura, verificamos ser o item Sat4 aquele que apresenta uma distribuição menos dispersa com assimetria acentuadamente negativa e curtose acentuadamente positiva. A análise descritiva dos resultados indica que os itens têm valores de variância e desvio padrão

aproximados ( 0,80 ≤ variância ≤ 2,48 e 0,9 ≤ DP ≤ 1,6: índices extremos, respectivamente, nos itens Sat4

e Sat2) relativamente a índices médios de variância = 1,43 e média DP=1,1. Com efeito, é o item Sat4 aquele que evidencia uma distribuição menos adequada e com maior especificidade, logo com menor poder descriminativo. Contudo, outros elementos estatísticos poderão replicar (ou não) este dado.

3.1.2.2. Consistência interna dos resultados nos itens

A análise de consistência interna dos itens de [AjA] foi obtida através da análise do coeficiente α de

Cronbach (caso o item fosse excluído da escala) e pela leitura dos valores de correlação Item-total. Estas correlações (item-total) são traduzidas pelo coeficiente r de Bravais-Pearson. Uma outra forma de olhar para a relação entre duas variáveis, ou entre uma actividade individual e o resto da escala é tentar predizer a contribuição desse elemento para a actividade com base nas cotações obtidas nas restantes. Este valor pode ser obtido através do coeficiente de determinação r2 (neste caso, considerou-se a variável dependente o item e cada um dos restantes itens, como variável independente). O cálculo destes coeficientes foi realizado através do procedimento 'scale reliability' do SPSS e os resultados obtidos (N=420) podem ser observados no quadro seguinte:

Quadro 4-II: matriz de correlações dos resultados nos itens de [AjA]

Itens Correlação Item-Total (corrigida)

α de Cronbach (item excluído)

Determinação r2

Expectativas Exp1 Exp2 Exp3 Exp4 Satisfação Sat1 Sat2 Sat3 Sat4 Percepção c/estudante Est1 Est2 Est3 Est4

.42

.46

.32

.41

.36

.39

.30

.29

.38

.53

.47

.52

.74

.74

.76

.75

.75

.75

.76

.76

.75

.73

.74

.73

.35

.26

.30

.32

.18

.30

.28

.32

.26

.45

.39

.30

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CAPÍTULO 4 219

Os resultados anteriores, permitiram constatar que a escala apresenta um coeficiente α de

Cronbach , ligeiramente acima do limite mínimo de satisfação13 de α = .76 (α= .77 se normalizado). A

análise das respostas nos itens, permite verificar que mesmo agrupando um número (12 itens) relativamente

reduzido para construir uma escala, os valores encontrados para α de Cronbach caso algum destes seja

excluído da escala, se situam na gama de valores considerados aceitáveis (α ≥.73). A reduzida variação

entre os valores do coeficiente α deve-se provavelmente ao facto dos itens apresentarem valores de

variância muito próximas. Além disso, todos os itens apresentam correlações com o total da escala

(corrigido) moderados (.29 ≤ r ≤ .53). Entre todos os itens da escala, o item Sat1 é o que apresenta

coeficiente de determinação mais próximo de zero (r2= .18), o que significa menor apropriação à escala (3,24%).

3.1.2.3. Dimensionalidade e saturação factorial dos resultados nos itens

A distribuição das respostas aos itens foi observada em termos de validade de construto14 e foram apreciadas15 as diferentes soluções encontradas a partir do procedimento 'factor reduction' do SPSS. Começamos por testar a hipótese do instrumento representar as três dimensões específicas (expectativas; satisfação e percepção como estudante), no conjunto da amostra (N=420). Assim, observamos os dados estatísticos obtidos em diferentes extracções das componentes principais de [AjA] e com diferentes tipos de solução (oblíquas e ortogonais) sem e com uma imposição tri-factorial. Os resultados obtidos nas

13 Vários autores consideram que α=.85 é o limiar ideal para o coeficiente alpha de Cronbach , no entanto α=.75 pode ser

considerado o limite mínimo satisfatório (Almeida & Freire, 1997). Contudo, outros entendem que valores acima de .60 já se podem considerar satisfatórios (Veiga, 1995).

14 A análise de validade de construto consiste em estudar se determinada escala avalia as dimensões ou os aspectos psicológicos (teóricos) que é suposto explicarem atitudes e comportamentos (práticas) (Veiga, 1995: 102). Ou seja, ‘a validade de construto, de conceito ou hipotético-dedutiva, agrupa um conjunto de procedimentos visando inferir quanto à adequação dos resultados aos principais princípios teóricos subjacentes ao instrumento’ (Almeida, 1988: 124).

15 Consideraram-se os seguintes aspectos na apreciação das várias soluções factoriais:

a) observar a tabela de communalities e registar os itens com valores de extracção inferiores a (.25);

b) verificar a contribuição da solução encontrada para a explicação da variância total do conjunto e o número de valores próprios (eigenvalues) superiores a 1.

c) analisar e procurar interpretar, sequencialmente: (1) a matriz de componentes principais; (2) a matriz da rotação (oblíqua ou ortogonal) e, (3) registar os itens com critério limite mínimo de saturação de ± .40, no factor (Obs, em casos justificados (Kline, 1995: 6), podemos considerar limite mínimo de saliência no factor de ± .30;

d) seleccionar e reter uma solução, contrastando-a com outras soluções avançadas em estudos revistos na literatura;

e) apresentar a solução escolhida que apresenta maior clareza e parcimónia na distribuição dos itens pelos factores.

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diferentes soluções rodadas foram bastante aproximados, não obstante o facto dos itens se encontrarem correlacionados16 . Passando a descrever o processo de escolha da melhor solução, iniciamos com a extracção em componentes principais sem qualquer tipo de imposição factorial dos resultados nos 12 itens do instrumento [AjA] e obtivemos uma matriz de extracção que apontava para a existência de 4 factores a explicar 61,58% do total de variância, sendo o primeiro destes factores responsável por 28,9% da variância. Contudo, a estrutura factorial obtida não era facilmente interpretável. Seguidamente, procuramos outras soluções de entre as várias rotações oblíquas (direct oblimin) realizadas sobre a estrutura principal, retendo uma destas para análise. Melhoramos a sua interpretação e parsimónia através da imposição de soluções com 3, 2 e 1

factores e fixando os itens que saturavam em pelo menos um factor acima do valor absoluto de |.40|.

Quadro 4-III: solução oblíqua (δ=,1) dos resultados nos itens de [AjA]

Item

Comunalidade ESTRUTURA FACTORIAL

Componentes

% 1 2 Expectativas relativamente a: Exp1- matérias Exp2- docentes Exp3- colegas Exp4- ambiente geral de trabalho

34 38 27 46

.59 .45

.55

.51

.68

Satisfação com: Sat1- o curso Sat2- o 1ºano comum Sat3- o equipamento (material de apoio,…) Sat4- a Universidade (espaços, serviços, …)

29 31 44 58

.54 .56

.65

.74

Percepção, como estudante: Est1- do nível de preparação secundário Est2- da confiança nos resultados académicos Est3- na ausência de dificuldades escolares Est4- de adaptação à Universidade

31 63 54 42

.55 .79 .73 .57

.49

Eigenvalue% de Variância

3,1 28,90

2,5 12,65

Método de extracção: Principal component analysis Método de rotação: Oblimin c/ normalização Kaiser

16 Segundo Almeida & Freire (1997: 185), por uma rotação ortogonal (exemplo, o método Varimax) obtém-se factores

independentes entre si, ou seja, factores não correlacionados ou ortogonais. Ao invés, por uma rotação oblíqua (exemplo, o método direct oblimin) onde os factores obtidos estão correlacionados.

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CAPÍTULO 4 221

O modelo que melhor se ajustou à distribuição dos resultados nos itens e com maior poder interpretativo pode ser representado por uma solução rodada (direct oblimin) da matriz de componentes principais, a qual define em [AjA] uma estrutura bidimensional17 explicando 41,5% do total de variância, como se pode observar no Quadro 4-III. Indica-se também a percentagem de comunalidade18 respectiva a cada item, assim como os valores próprios (eigenvalues) e variância esperada para cada factor. A estrutura factorial obtida na rotação oblíqua da matriz de extracção em componentes principais mostra-se interpretável. Assim, quase todos os itens saturam num só factor com valores acima do valor critério (carga factorial acima de .51), excepto os itens Est4 e Exp2 que saturam acima do valor critério em dois factores, o que contribui certamente para a sua ambiguidade em termos de indicação conceptual. Contudo, o objectivo da resposta à questão levou-nos a associar estes itens aos factores onde o seu valor de saturação é mais elevado. Por outro lado, a estrutura factorial obtida rodada não reflecte a organização dos itens realizada anteriormente. Mas, sendo esta estrutura factorial obtida directamente das respostas nos itens e uma vez que se ajustava aos objectivos da presente investigação, optamos por efectuar um re-dimensionamento do instrumento [AjA]. Neste sentido, passamos a considerar na medida do ajustamento académico apenas os dois indicadores que correspondem a cada um dos factores obtidos na extracção. Ou seja: Factor 1: 'Confiança em si'. Apresenta um valor próprio (eigenvalue) rodado igual a 3,12 e a explicar 28,90%

da variância total. Neste factor, estão presentes todos os itens relacionados com a percepção dos sujeitos da amostra como estudantes e, ainda, a satisfação global com o curso e com o 1ºano comum e expectativas relativamente às matérias. O item que satura mais alto neste factor é o item Est2, cujo enunciado deixa transparecer a designação para o indicador definido por este factor. Ou seja, a medida de confiança em si, nas suas capacidades e suas competências enquanto estudante do 1ºano de um curso universitário.

Factor 2: 'Satisfação com Universidade'. Consideramos que este factor representa uma medida de satisfação com a Universidade e o contexto académico em geral, por representar a correspondência das expectativas face aos docentes, colegas e ambiente geral de trabalho e a satisfação com o campus académico e escolar, isto é, infra-estruturas, material de apoio, meios informáticos, espaços, serviços, estrutura organizacional da Universidade, etc,. O item que satura mais alto neste factor é o item Sat4. Este factor tem valor próprio rodado de 2,49 e explica 12,65% da variância total.

17 Este dado revela alguma consistencia com o resultado encontrado por Soares e Taveira (in Soares,1998) no QIAV utilizado no

seu estudo. 18 Índice de comunalidade mostra a percentagem de covariância de cada item que foi considerada na extracção dos factores. No

presente estudo adoptamos como critério de inclusão, um valor de comunalidade não inferior a 25% (Howell, 1982; Kline, 1995).

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222

3.1.2.4. Intercorrelações dos resultados nos factores

O quadro seguinte mostra-nos os coeficientes de correlação de Bravais-Pearson entre os 12 itens redimensionados de [AjA] e o somatório total em cada um dos factores (indicadores) que foram obtidos através da extracção factorial exploratória e as correlações corrigidas19 de cada item com os pontos totais do

factor em que foi inserido. Indica-se também o grau de homogeneidade ou de consistência interna (α de

Cronbach) quando o item é excluído da factor e o coeficiente de determinação r2 .

Quadro 4-IV: correlações nos factores de [AjA]

CORRELAÇÕES (Item- total)

Itens α Cronbach r2 múltiplo [CA] [SU] Factor 1- [Ca]: Confiança em si Exp1 Sat1 Sat2 Est1 Est2 Est3 Est4

.72 (total)

.69

.71

.70

.71

.67

.68

.69

.29

.16

.29

.25

.43

.39

.22

.45a

.35a

.42a

.37a .58 a .52 a .45a

.21b .23 b .21 b .25 b .26 b .23 b .40 b

Factor 2-[SU]: Satisfação com Universidade Exp2 Exp3 Exp4 Sat3 Sat4

.64 (total) .58 .62 .53 .61 .58

.17 .23 .31 .27 .30

.38 b .24 b .28 b .21 b .17 b

.40 a .33 a .49 a .34 a .41a

a: Coeficiente de correlação r de Bravais-Pearson (Item –total) corrigido; b: Coeficiente de correlação r de Bravais-Pearson (item- total) r2: Coeficiente quadrado de correlação múltipla (coeficiente de determinação) Os resultados apontam para correlações fracas a moderadas entre itens e os totais das dimensões onde não estão incluídos, o que sugere uma relativa independência entre estas. Os coeficientes de

correlação (.29 ≤ r ≤ .58) corrigidos (item-total) no seu próprio factor são moderados, indicando dependência

entre itens do mesmo factor. Entre estes, o item que apresenta maior índice de determinação é o item Est2, contribuindo com 18,5% para a variância total no factor e, ao qual corresponde o maior grau de associação

(r= .58) e menor valor do coeficiente de fidelidade (α= .67), caso seja excluído. Ao invés, o item Sat1

contribui com menor (2,6%) percentagem de variância para o total no seu factor, mas com índice de associação moderado (r= .35). O item Sat4 apresenta a mais fraca (r= .17) associação entre um item e total de outro factor, ao invés dos itens Est4 e Exp2 que apresentam associação mais forte, respectivamente (r= .40) e (r= .38) confirmando alguma ambiguidade nestes itens. No que diz respeito às correlações entre os dois factores

19 Excluíndo o item do score total.

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CAPÍTULO 4 223

oblíquos, a correlação encontrada entre estes (r= .40; p< .001) ilustra uma relação positivamente moderada.

Os coeficientes α de Cronbach para cada uma das dimensões, embora possam ser considerados aceitáveis,

apresentam contudo valores abaixo dos limiares mínimos desejáveis de (α= .72) e (α= .64), respectivamente

nos indicadores [Ca] e [Su]. Mas, em nenhum dos casos há acréscimo do valor do coeficiente se algum dos seus itens é excluído.

QACE: Questionário de Atitudes e Comportamentos perante o Estudo

A revisão da literatura existente no domínio da avaliação dos métodos, hábitos, abordagens e comportamentos reguladores do estudo e aprendizagens, conduziu-nos à problemática das diferenças individuais, aos estilos e orientações e às estratégias auto-reguladoras das aprendizagens. Os aspectos exploratórios prendiam-se com o saber quanto? e que modo (como?) os estudantes universitários procedem e se comportam relativamente às tarefas propostas e aos métodos e actividades de estudo autónomo que realizam para auto-regular as suas aprendizagens. Com efeito, julgamos que um observatório das atitudes e comportamentos relativamente ao estudo e aprendizagens seria a análise da relação do estudante com a situação específica de estudo, a qual é evidenciada nas diferenças de estilo pessoal e nas respostas, mais ou menos estáveis no tempo e contexto. Referimo-nos, nomeadamente às suas orientações e motivos (abordagens) perante o estudo e/ou às estratégias estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais que utiliza nas situações específicas (tarefas) de estudo e aprendizagem. Neste sentido, privilegiamos a aplicação de um instrumento sobre os jovens estudantes universitários que nos permitisse medir essa utilização (habitual) de estratégias, enquanto dimensões dos processos auto-reguladores subjacentes. Passamos a descrever alguns dos procedimentos tidos na adaptação, tradução, construção e validação de dois inventários que constituem o QACE20 , os quais designamos de 'Ae: Abordagens do estudo’ e ‘Che: Comportamentos habituais (estratégias) de estudo e aprendizagem’.

3.2. [Ae]: Abordagens do estudo

Newstead (1992: 299) refere que nas ultimas décadas houve como que uma ‘explosão’ da investigação acerca das características individuais de aprendizagem. Muito deste esforço centrou-se explorando as noções de ‘deep' e 'surface approaches to studying’ de Marton & Saljö (1976).

20 Cf. Anexo 5.

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224

Uma orientação ‘deep/ meaning approach’ corresponde, no sujeito, à intenção ou tentativa em dar uma significação ao estudo, a procurar compreender o que se estuda e as tarefas que se realizam, generalizando e fazendo a sua transferência para contextos mais amplos, a adoptar um sentido crítico e a reconhecer que o material de estudo tem valor intrínseco. Esta atitude pode ser contrastada com uma ‘surface/ reproducing approach’ na qual, ao invés, o material de aprendizagem é apenas reproduzido de forma rotineira com o objectivo expresso de alcançar resultados e objectivos imediatos e extrínsecos ao sentido do material em estudo (por exemplo, estudar para passar em exames). Entretanto, estudos recentes identificam uma terceira abordagem, a qual, numa conjugação de terminologias se designa frequentemente por a ‘strategic/ achieving approach’. Nesta abordagem, a motivação para a obtenção de bons resultados e para o cumprimento dos objectivos académicos através de um estudo bem organizado, estratégico e altamente determinado jogam um papel central. Na presente investigação, uma referência fundamental são os vários trabalhos de Entwistle e colaboradores (Entwistle & Ramsdem, 1983; Entwistle & Waterson, 1988; Entwistle & Tait,1994, Tait & Entwistle, 1996, e outros) realizados no Reino Unido, os quais se apresentam altamente congruentes com o trabalho de investigação sobre as formas e métodos de estudo, nos alunos no ensino superior, que vem sendo apresentado desde 1992 pelo investigador holandês Jan Vermunt (1992; 1996) e também com os inúmeros estudos que John Biggs e muitos colaboradores têm realizado no Canadá, Austrália e Ásia. Quanto aos respectivos instrumentos utilizados nas várias investigações produzidas um pouco por toda a parte, nomeadamente Biggs (1993: 4) citando Christensen et al. (1991) contrasta os vários questionários de avaliação dos processos de estudo e aprendizagem e que parecem emergir segundo três grandes modelos com base investigacional, cuja categorização pode ser a seguinte:

a) Instrumentos teóricos de cariz qualitativo (theoretical qualitative). Que avaliam a forma como os alunos executam e se envolvem em determinadas tarefas ou actividades (e.g., observações em situação específica ou estudo de casos) que podem ser explicadas e conceptualizada pelas correntes da psicologia recente (exemplo, os trabalhos de Marton & Saljö,1976);

b) Instrumentos teóricos de cariz quantitativo (theoretical quantitative). Que cohabitam no amplo e ambíguo campo conceptual dos estilos de aprendizagem (para uma revisao, ver Riding & Cheema, 1991 e Sadler-Smith, 1997) e que usam desenvolvimentos da psicologia cognitiva segundo os modelos teóricos de avaliação quantitativa do processamento da informação. Entre outros, o ILP: Inventory of Learning Processes (Schmeck e colaboradores,1991); o CSA: Cognitive Styles Analysis (Riding,1994); o CSI: Cognitive Styles Index (Allinson & Hayes,1996); o LSQ: Learning Styles

Questionnaire (Honey & Munford, 1992); o LASSI-HS: Learning and Study Strategies Inventory (Weinstein et al.,1987); etc..

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CAPÍTULO 4 225

c) Instrumentos ateóricos de cariz quantitativo (atheoretical quantitative). Resultantes, na sua grande maioria, do desenvolvimento e aperfeiçoamento de séries de vários instrumentos e escalas tradicionais derivadas de análises qualitativas (entrevistas e relatos dos processos de estudo) e que permitem identificar diferenças individuais de atitudes e comportamentos perante o estudo. Este tipo de instrumentos fundamentam-se, segundo Biggs (1993), em técnicas psicométricas assentes naquilo que identifica como sendo a ‘atheoretical quantitative framework’ e referido como modelo ‘SAL: Student Approach to Learning’, em cujo campo parecem convergir entre si instrumentos, tais como, o ILS: Inventory of Learning Styles (Vermunt, 1992; Busato et al., 1998), o SPQ: Study Process

Questionnaire (Biggs, 1987; 1993); o ASI: Appoaches to Studying Inventory (64 itens) (Entwistle & Ramsdem, 1983) e, o RASI: Revised Approaches to Studying Inventory (38 itens) (Entwistle & Tait,1994) e muitas outras versões reduzidas (ASI de 30 itens, Duff, 1997; ASI de 18 itens, Newstead,1992; Gibbs, 1992); etc.

A propósito destes instrumentos inseridos no modelo 'SAL' (ver Anexo1), salientamos que o estudo acerca da robustez dos construtos presentes na avaliação das orientações de aproximação ao estudo têm sido objecto de múltiplas análises e demonstrações em distintos contextos educativos de culturas ocidentais e também experimentados em culturas orientais, nomeadamente, por Biggs, Kember & Gow (1990), Watkins e colaboradores (e.g, Watkins & Biggs, 1996), Marton et al., 1997; Sadler-Smith e colaboradores (e.g., Sadler-Smith & Tsang, 1998) e outros. Aliás, Meyer & Parsons (1989) argumentam que os eventuais construtos teóricos baseados no SAL são universais, pelo que, podem ser assumidos em qualquer contexto cultural. Importa, pois, sublinhar que independente do contexto cultural (ocidental ou oriental) em que estes instrumentos são aplicados, parece ser pacífica a distinção, nos estudantes universitários, entre uma orientação do tipo significativa ou intencional (deep/ meaning) e a simples reprodução (surface/ reproducing) (Richardson et al.,1987 e Chalmers & Fuller,1996). Contudo, dada a dificuldade em obter atempadamente estes instrumentos e em virtude do desconhecimento acerca da existência de estudos realizados e discutidos21, no nosso país, acerca desta temática específica das abordagens ou orientações estratégicas para fazer face ao estudo e aprendizagens no contexto académico do ensino superior, fomos procurar possíveis pistas e indicações em alguns artigos de revistas da especialidade na sua maioria de origem anglo-saxónica. Com efeito, nas leituras de alguns artigos específicos (e.g., Christensen et al., 1992 e Speth & Brown, 1992) e várias notas de investigação, julgamos que seria possível obter um denominador comum aos vários instrumentos inseridos no modelo SAL (Biggs, 1993) e cujos parâmetros psicométricos fossem suficientemente simples e robustos para serem

21 Entretanto, tivemos conhecimento que no âmbito de uma tese de doutoramento realizada no Centro de Estudos em Educação

e Psicologia do I.E.P. da Universidade do Minho, decorre uma investigação que pretende analisar as diferentes abordagens ao estudo em estudantes do final do ensino secundário de acordo com o modelo proposto por Biggs (1993).

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importados e aplicados no nosso contexto de estudo. Em Anexo 1, segue um resumo das principais características encontradas em alguns destes instrumentos inseridos no modelo 'SAL' (Biggs, 1993) e que vieram a servir de base na selecção e adaptação do inventário [Ae].

3.2.1. Selecção, tradução e adaptação do inventário [Ae]

Após recolha e apreciação dos diversos instrumentos disponíveis, optamos pela tradução e adaptação da versão22 reduzida de 18 itens do ASI (Entwistle & Ramsdem, 1983) apresentada, estudada e aplicada por Newstead (1992) e advogada por Gibbs et al. (1988) e Richardson (1992,1997). Salientam-se alguns os principais critérios que pesaram na decisão em escolher este instrumento para a presente investigação, a saber:

1. O instrumento inserido no âmbito do modelo 'SAL' (Biggs, 1993) resulta de grande reflexão teórica sobre as principais diferenças individuais nos processos de formação e aprendizagem, nomeadamente ao nível dos subsistemas de ensino superior e permite captar e avaliar com alguma garantia a extensão e natureza das variáveis cognitivo-motivacionais em análise;

2. O instrumento apresenta características psicométricas aceitáveis e cuja base (o ASI) foi ampla e devidamente validada nos vários contextos sócio-educativos (ocidental e oriental), entre os quais se incluem vários estudos realizados com a população estudantil universitária asiática, árabe (e.g., Albaili,1997), australiana e, sobretudo, populações estudantis europeias (Inglaterra, Escócia, Bélgica, Finlândia, Dinamarca e Suécia) cuja proximidade geográfica, cultural e civilizacional, deixava antever a sua fácil adaptação e utilização sobre os sujeitos que frequentam as nossas universidades;

3. Esta versão traduzida e adaptada da versão reduzida (18 itens) do ASI, apresentada por Newstead (1992) e defendida por Gibbs et al.(1988) pareceu-nos também ser um compromisso possível, pelas seguintes razões:

a) o seu formato reduzido facilitava-nos a sua aplicação atendendo às condições existentes, mormente as limitações (tempo) e os constrangimentos associados a uma investigação com a natureza e extensão da presente ;

b) este instrumento assenta numa selecção criteriosa de itens da escala original (64 itens, Entwistle & Ramsdem, 1983) que desde a sua origem tem sido objecto de inúmeros estudos de validade usando os mais variados processos. Além disso, é suposto medir exactamente as três linhas de abordagens ou orientações de 'deep/ meaning', 'surface/ reproducing' e 'achieving/ strategic approach' sugeridas no modelo 'SAL' (Biggs, 1993);

22 Cf. Anexo 2

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CAPÍTULO 4 227

c) esta forma reduzida do ASI foi utilizada e convenientemente demonstrada no contexto académico

universitário como medida de suficiente confiança (médias de coeficiente α entre 0.47 e 0.69) e

elevado potencial avaliativo (conforme, Gibbs, 1993; Richardson, 1992, 1994, 1998; Newstead, 1992). Partindo para a tradução e adaptação dos itens da versão referida, tentamos (na medida do possível) não perder o sentido vocabular e semântico das expressões e linguagem originais. Deste modo, ciente dos riscos inerentes a uma tradução linear independente e da exigência de um nível de leitura e compreensão adequado aos sujeitos a que o questionário se destinava, solicitamos a dois licenciados, professores da disciplina de inglês do ensino secundário, para que procedessem a uma tradução da escala original. Estas traduções foram comparadas e realizados os ajustes considerados convenientes. Seguidamente um docente da disciplina de português reviu a tradução, verificando a sintaxe e tentando garantir que o texto se adequaria ao nível dos sujeitos. De seguida, os itens traduzidos foram incluídos num questionário piloto. Este questionário (piloto) foi ensaiado num grupo reduzido de alunos (10 raparigas e 2 rapazes) de vários cursos e do primeiro e segundo anos da Universidade de Aveiro que casualmente se encontravam na mediateca. Só foram considerados neste estudo piloto, os alunos que, sendo solicitados, concordaram em colaborar. Este procedimento seguiu de perto o método da 'reflexão falada' (Almeida & Freire, 1997: 122) e constituiu uma pequena entrevista (não directiva) orientada para o preenchimento do questionário e levantamento de questões acerca deste (interesse, objectivos, justificação, adequação etc.). Paralelamente procurou-se com este processo verificar se os itens das várias escalas eram compreendidos, detectando eventuais deficiências na sintaxe e semântica dos termos utilizados na sua redacção. Aliás, esperava-se evidenciar recusas e equívocos nas respostas aos itens, contudo não foram levantadas quaisquer objecções ou dúvidas. O tempo médio de preenchimento dos dois questionários (QIVA + QACE) foi de 20 minutos. Concluído o procedimento e após pequenos ajustes, no questionário QACE, resolvemos manter o formato inicial das ordens de resposta aos itens. A propósito do formato das ordens, optamos por uma escala ordinal de escolha forçada tipo Lickert de 6 pontos entre o valor 1= mínimo (discordância total) a 6= máximo (concordância total). A escolha do formato Lickert de resposta forçada pareceu-nos a mais adequada, já que obriga os indivíduos a expressarem o valor da sua apreciação ou grau de discordância / concordância para cada uma das opções apresentadas. Sublinha-se que, embora alguns autores sustentem que o formato de escolha forçada não serve para eliminar ou minimizar o efeito de desejabilidade social, outros argumentam que o uso deste formato será o mais indicado para eliminar esse efeito (e.g., Barros- Oliveira, 1992: 176). Relativamente ao inventário [Ae], optamos por não alterar a ordem dos itens apresentada na versão original (Anexo 2), embora, alterando o número de 5 para 6 pontos na escala (Lickert). Quanto ás dimensões de abordagem do estudo, designadas inicialmente por Marton & Saljö (1983) e sucessivamente desenvolvidas e referenciadas por inúmeras investigações (Ramsdem, Entwistle e colaboradores), julgamos

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que os termos na língua inglesa reflectiam melhor os níveis de intensidade nas orientações e motivos na abordagem do estudo e aprendizagens que os seus homólogos, na língua portuguesa. Neste sentido, salvo alguma dúvida na sua interpretação, usaremos os termos originais para identificar cada uma destas abordagens ao estudo e cujos itens traduzidos são os seguintes: Abordagem [deep] Ae4- Usualmente procuro entender completamente o sentido das matérias que estudo Ae7- A razão principal para frequentar este curso é que posso aprender mais acerca dos assuntos que me interessam Ae10- Geralmente esforço-me por tentar compreender as coisas que inicialmente me parecem difíceis Ae13- Frequentemente questiono-me sobre coisas que ouvi nas aulas ou que li em livros Ae16- Passo algum do meu tempo livre procurando saber mais acerca de tópicos interessantes que foram discutidos nas aulas Ae17- Acho alguns tópicos ou assuntos do curso bastante interessantes e gostaria de poder estudá-los com mais profundidade

Abordagem [surface] Ae2- Gosto que me indiquem exactamente aquilo que tenho de fazer em cada tarefa Ae5- Quando estudo, tento fixar (memorizar) aspectos importantes que penso possam ser úteis mais tarde Ae8- Preocupo-me mais com a classificação do exame das cadeiras do curso do que com o que possa aprender ao frequentá-las Ae11- Frequentemente sinto que tenho de aprender coisas sem ter a oportunidade de realmente as entender Ae14- Tenciono estudar seriamente apenas aquilo que é dado nas aulas ou que é obrigatório para concluir as cadeiras do curso Ae18- Acho que tenho de memorizar uma boa quantidade daquilo que devo aprender

Abordagem [achieving] Ae1- Sinto que é fácil organizar o meu horário de estudo independente Ae3- É importante para mim reflectir sobre o meu estudo e sentir que este está de acordo com a realidade do curso Ae6- Quando estudo ou executo uma tarefa, tento orientar-me para o que penso ser a pretensão ou exigência do professor Ae9- Geralmente, no final do dia (depois das aulas) ainda estou disposto a continuar o trabalho Ae12- Se as condições para estudar não forem as mais adequadas, geralmente tento fazer alguma coisa para as mudar Ae15- Caso seja possível, é importante para mim fazer melhor que os meus colegas

3.2.2. Validação interna e análise das respostas aos itens de [Ae]

O estudo realizado acerca das características psicométricas e de validade interna do inventário [Ae] relativamente à amostra totalizou os seus 420 elementos. Foram incluídos vários procedimentos de validação interna (indicados no ponto 3.1.2) através do uso das ferramentas estatísticas fornecidas pelo programa SPSS. De seguida indicam-se alguns resultados deste estudo.

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CAPÍTULO 4 229

3.2.2.1. Distribuição e sensibilidade das respostas nos itens

A distribuição das respostas aos itens do inventário [Ae] pode ser observada no quadro seguinte, onde se indica a média e Desvio Padrão. Indicam-se também os coeficientes de sensibilidade relativamente à distribuição estatística 'normal' ou 'gaussiana'.

Quadro 4-V: medidas de distribuição e sensibilidade nas respostas aos itens de [Ae]

Ordens (%)

Item

Média

DP

assim

etria

Curto

se

1

2

3

4

5

6

Ae01 Ae02 Ae03 Ae04 Ae05 Ae06 Ae07 Ae08 Ae09 Ae10 Ae11 Ae12 Ae13 Ae14 Ae15 Ae16 Ae17 Ae18

3,5 4,7 4,7 4,7 4,6 4,5 4,5 3,6 3,3 4,2 4,2 4,5 4,3 3,5 3,5 2,7 3,9 4,0

1,2 1,2 1,0 1,0 1,1 1,0 1,3 1,4 1,3 1,1 1,3 1,1 1,1 1,5 1,4 1,2 1,3 1,2

- - - - - - - + - - - -

+ - -

↑ ↑ ↑ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↑

↓ ↓ ↓

5,2 1,7 0,5 0,5 1,7 0,7 2,6 6,9 7,9 1,2 1,7 0,7 1,4 7,9 11,0 15,5 4,0 2,4

19,0 3,6 1,7 2,4 3,3 4,3 5,7 15,0 22,1 6,0 8,3 2,9 4,8 19,8 16,4 33,3 10,2 9,3

25,5 13,8 10,2 9,5 8,3 9,5 13,6 24,3 28,6 16,7 17,4 11,0 15,2 23,3 21,2 28,3 21,4 20,2

29,0 18,1 25,5 25,2 29,0 29,8 21,2 25,2 21,9 31,9 27,1 30,5 30,5 18,8 25,2 14,5 27,1 32,9

17,1 33,6 36,2 41,4 38,8 43,1 30,5 21,0 15,2 32,1 29,0 35,7 35,7 20,7 18,1 6,0 25,0 26,9

4,0 29,3 26,0 21,0 18,8 12,6 26,4 7,6 4,3 12,1 16,4 19,3 12,4 9,5 8,1 2,4 12,1 8,3

Legenda: i) + : Assimetra positiva (soma de desvios acima da média); ++ : Acentuadamente positiva; - : Assimetria negativa (soma dos desvios abaixo da média); - - : Acentuadamente negativa. ii) ↑ : Curva leptocúrtica (afunilada); ↑↑ : Acentuadamente leptocútica ↓ : Curva platicúrtica (achatada) ; ↓↓ : Acentuadamente platicúrtica. [ Outros casos: 'normal'] Uma análise da distribuição das respostas aos itens da escala permite registar que todos os itens tiveram frequências de discordância/ mínimos ou de concordância/ máximos com valores aceitáveis23

(discordância ≥ 12,3% e concordância ≤ 87,7%, item Ae04). Os resultados indicam que as médias das

respostas em cada item, oscilam entre um mínimo (2,7 no item Ae16) a um máximo (4,7 no item Ae03) para uma média de (4,0). Todos os itens têm valores de DP e de variância muito próximos entre si (DP(médio)= 1,20; variância (média)= 1,47).

23 Por se afastarem dos extremos (abaixo de 5%, ou acima de 95%).

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230

Os coeficientes de assimetria e curtose (ver nota de rodapé, no ponto 3.1.2) são valores bastante próximos de zero (correspondente à curva 'normal') na generalidade das situações. Tal com antes, optamos por assinalar as pequenas oscilações existentes por forma a melhor perceber a distribuição. Assim, a sua leitura permite verificar que apenas os itens Ae09 e Ae16 apresentam valores assimétricos positivos, enquanto os restantes se anulam ou são negativos. Os itens Ae02, Ae03, Ae13 e Ae16 têm coeficiente de curtose nulo (ou quase nulo), pelo que o gráfico da distribuição dos resultados nestes itens tem a forma de uma curva mesocúrtica ('normal'). Nos restantes itens existem pequenas oscilações relativamente à 'normal' (afunilamento ou achatamento) pouco acentuados. Verificamos também que todos os itens apresentam bons índices de descriminação, embora outros dados estatísticos devam ser analisados (Bisquerra, 1996).

Referimo-nos, nomeadamente aos índices de homogeneidade ou de consistência interna ou coeficientes α

de Cronbach que passamos a apresentar de seguida.

3.2.2.2. Consistência interna dos resultados nos itens

A análise da consistência interna dos itens do inventário [Ae] (através do procedimento scale

reliabiliy analysis do SPSS) permitiu verificar que a escala (total) apresenta um coeficiente α de Cronbach

moderado de .67 (ou α = .70 se for normalizado). Para uma análise dos resultados dos itens mais fina,

indicam-se também as correlações (coeficientes r de Bravais-Pearson) item-total e os coeficientes α de

Cronbach (caso o item seja excluído da escala) e os coeficientes de determinação r2 (quadrados de correlação múltipla).

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CAPÍTULO 4 231

Quadro 4-VI: correlações dos resultados nos itens de [Ae]

Itens

Correlação Item-Total

(corrigida)

α de Cronbach

(se o item for excluído)

Correlação múltipla

r2

Ae01 Ae02 Ae03 Ae04 Ae05 Ae06 Ae07 Ae08 Ae09 Ae10 Ae11 Ae12 Ae13 Ae14 Ae15 Ae16 Ae17 Ae18

.21 .21 .34 .36 .37 .34 .27 -03 .35 .41 .20 .36 .41 -.11 .25 .38 .33 .33

.67 .67 .65 .65 .65 .65 .66 .70 .65 .65 .67 .65 .65 .71 .66 .65 .65 .65

.21 .11 .21 .27 .30 .15 .13 .15 .31 .28 .17 .23 .29 .10 .12 .31 .27 .29

Os valores correspondentes à coluna ‘correlação item-total’ podem ser tomados também como coeficientes de descriminação dos itens. Neste sentido, os itens apresentam valores fracos a moderados, sendo os itens Ae10 e Ae13 a apresentar maior poder descriminativo (r = .41). Dois dos itens da escala, nomeadamente os itens Ae08 e Ae14 apresentam correlações item-total negativas o que corresponde,

respectivamente à igualdade ou aumento do coeficiente α de Cronbach de (. 70) para (.71), caso os itens

sejam excluídos, sugerindo que estes devam ser retirados da escala. Com efeito, uma observação mais atenta ao enunciado (Anexo 5) destes itens deixa transparecer respostas ambíguas e socialmente desejáveis, nos sujeitos.

Relativamente aos coeficientes α de Cronbach, os valores encontrados são aceitáveis (α >.65),

embora no limite mínimo de aceitação, pelo que importará observar o que se passa entre factores (ver

Quadro 4-VI). Os baixos valores ( r2≤ .15) do coeficiente de determinação apontam para a existência de

alguns dos itens com fraca apropriação ao total da escala, nomeadamente os itens Ae02, Ae06, Ae07, Ae08, Ae14 e Ae15. Contudo, a eventual exclusão destes itens (com excepção dos itens referidos antes) não faria

oscilar o valor de α de Cronbach, o que sugere, no momento, a sua manutenção na escala.

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232

3.2.2.3. Dimensionalidade e saturação factorial dos resultados nos itens

Seguindo de perto o estudo de Newstead (1992) e tendo igualmente em vista verificar até que ponto a divisão em três dimensões do inventário [Ae] poderia ser replicada nos sujeitos desta investigação, efectuamos uma análise factorial em extracção de componentes principais seguida de rotação (ortogonal e oblíqua) com imposição de três factores. Ou seja, começamos por efectuar uma redução factorial dos resultados nos 18 itens do inventário [Ae] (procedimento factor reduction do SPSS) sem qualquer tipo de restrição. Encontraram-se 6 componentes com valores próprios (eigenvalues) superiores a 1 (método de normalização de Kaiser) a explicar 54,8% da variância total, sendo o primeiro destes responsável por 3,5% do total da variância. Como pretendíamos considerar três dimensões, foi imposto uma solução tri-factorial. A extracção em componentes principais permitiu considerar a saturação dos resultados nos itens em três componentes iniciais com valores próprios (eigenvalues) superiores a 1,31 e explicando 36,4% do total da variância. Uma análise aos resultados obtidos levou-nos a verificar que a primeiro factor extraído antes da rotação explicava 19,4% da variância total e salientava todos os itens da abordagem [deep] e da abordagem [achieving] (excepto o item Ae15) acima de (.37) e dois itens (Ae05 e Ae18) da abordagem [surface] acima de (.36). O segundo factor extraído salientava todos os itens da abordagem [surface] acima de (.34) e negativamente (-.34) o item Ae01. O terceiro factor salienta os três itens (Ae01, Ae03 e Ae12) da abordagem [achieving] acima de (.33) e o item Ae08 da abordagem [surface] com (.35).

Estes resultados sugeriam uma distribuição geral bipolar composta em um dos polos, pelas abordagens [deep] e [achieving] e, no outro polo, pela abordagem [surface]. Estes dados revelam consistência com estudos anteriores quando contrapoêm os dois tipos essenciais de abordagem do estudo, nos sujeitos, tal como referenciadas inicialmente nos trabalhos de Marton & Saljö (1976).

Por outro lado, os resultados sugeriam a necessidade de se proceder a uma rotação da matriz principal. Mantendo a imposição tri-factorial, optamos por uma rotação ortogonal (método Varimax) da matriz de componentes principais. A solução obtida (Quadro 4-VII) é consistente com os resultados obtidos na versão original (Newstead, 1992: 306). indica-se também a percentagem de 'comunalidade' ou índice de contribuição para a variância total de cada item.

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CAPÍTULO 4 233

Quadro 4-VII: solução ortogonal dos resultados nos itens de [Ae].

Comunalidade

Componentes

Item % 1 2 3 [deep]

Ae04 Ae07 Ae10 Ae13 Ae16 Ae17

38 27 36 40 47 56

.34 .40 .44 .57 .65 .75

.51

[surface] Ae02 Ae05 Ae08 Ae11 Ae14 Ae18

32 39 44 36 18 48

-.45

.

-.36

.45 .55 .49 .59 .20 .61

[achieving] Ae01 Ae03 Ae06 Ae09 Ae12 Ae15

47 32 27 46 42 20

.32

.68 .52 .30 .62 .58

.40

.31 Eigenvalue

% de Variância

2,33

12,92

2,24

12,42

1,99

11,01

Método de extracção: Principal components analysis Método de rotação: Varimax com normalização Kaiser A matriz principal obtida através da rotação Varimax (com normalização Kaiser) permitiu identificar o factor 1 com a abordagem [deep], uma vez que todos os itens supostos pertencerem a esta dimensão saturam acima do valor mínimo (.34: item Ae04). Observa-se que este item Ae04 da abordagem [deep] satura mais forte (.51) no factor 2. Além deste item, saturam no factor 2 quatro itens da abordagem [achieving] acima de (.52) e o item Ae06 com (.30), mas a salientar-se mais fortemente (.40) no factor 3. Quanto ao item Ae15, este satura negativamente no factor onde é suposto estar inserido e duplamente satura acima de (.31) nos outros dois factores. O factor 3 também parece não oferecer grande dúvida acerca das suas componentes se atendermos que cinco dos seis itens da abordagem [surface] saturam acima de (.45), exceptuando, o item Ae14 que regista uma saturação baixa de (.20) no factor respectivo, embora se salientando negativamente nos restantes dois factores. A análise factorial exploratória destes resultados, aponta para um fraco ajustamento de alguns destes itens à distribuição sugerida por Newstead (1992). O modo como alguns destes, nomeadamente os itens Ae04; Ae06; Ae14 e Ae15 foram interpretados pelos sujeitos da amostra, evidenciam dificuldades de

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234

apropriação aos factores em que era suposto pertencerem. Entretanto, algumas soluções tri-factoriais realizadas com rotação Varimax da matriz principal e com a exclusão sucessiva destes itens, tendia a melhorar a interpretabilidade. Observamos que em futuros estudos utilizando esta versão, os itens mencionados devam ser reformulados e confirmado o seu valor psicométrico avaliando-se assim o seu nível de apropriação ao instrumento.

3.2.2.4. Intercorrelações dos resultados nos factores

Tendo em atenção os resultados obtidos nas análises precedentes acerca das características psicométricas da validade interna dos resultados, nos itens, consideramos igualmente as intercorrelações entre cada um dos itens do inventário e os pontos totais das respectivos factores (corrigidas). Indicam-se

também os coeficientes α de Cronbach (item excluído) e coeficiente quadrado de correlação múltipla (r2-

coeficiente de determinação) entre o item e o total no próprio factor, assim como o coeficiente de correlação de Bravais-Pearson entre cada um dos itens e total obtido relativamente aos outros factores.

Quadro 4-VIII: correlações nos factores de [Ae]

CORRELAÇÕES

(Item- total)

Itens α Cronbach r2múltiplo [deep] [surface] [achieving] .67 (total) Factor [deep]

Ae04 Ae07 Ae10 Ae13 Ae16 Ae17

.63

.67

.63

.61

.61

.62

.18

.09

.17

.23

.21

.20

.39a

.29a

.39a

.46a

.45a

.41a

.01b .08 b .12 b .09 b -.01 b .03 b

.34 b

.19 b

.33 b

.31 b

.37 b

.26 b

.54 (total) Factor [achieving] Ae01 Ae03 Ae06 Ae09 Ae12 Ae15

.49

.49

.51

.42

.47

.58

.16

.11

.07

.22

.16

.04

.21

.30

.24

.38

.28

.19

-.06 .10 .21 -.06 .13 .18

.30a

.29a

.26a

.42a

.35a

.14a .42 (total) Factor [surface]

Ae02 Ae05 Ae08 Ae11 Ae14 Ae18

.39

.38

.39

.33

.48

.30

.04

.16

.05

.12

.01

.23

.10 b

.28 b -.20 b .09 b -.13 b .22 b

.19a

.21a

.19a

.28a

.06a

.34a

.17 b

.26 b -.01 b .07 b -.14 b .15 b

a: Coeficiente de correlação r de Bravais-Pearson (Item –total) corrigido b: Coeficiente de correlação r de Bravais-Pearson (item- total) r2: Coeficiente quadrado de correlação múltipla (coeficiente de determinação)

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CAPÍTULO 4 235

Os resultados obtidos permitem verificar que os itens se encontram moderadamente correlacionados com os demais itens que constituem cada factor. Os itens do factor [deep] apresentam correlações mais fortes com os itens do factor [achieving] e mais fracas (r mais próximo de zero) com itens do factor [surface]. Por sua vez, os itens que constituem o factor [surface] apresentam correlações negativas ou muito fracas (próximo de zero) com os itens dos outros dois factores, com excepção dos itens Ae05 e Ae18 que apresentam alguma correlação (fraca) com itens de outros factores e o item Ae02 também com fraca correlação com os itens do factor [achieving]. Quanto aos itens deste factor [achieving], apresentam algumas correlações (fracas a moderadas) com itens do factor [deep]. Dois dos itens correlacionam-se negativamente com os itens do factor [surface] e os restantes apresentam correlações fracas. Estes resultados sugerem uma dependência relativa entre os itens que constituem as abordagens [deep] e [achieving] e uma independência destes itens relativamente à abordagem [surface], o que confirma as suspeitas avançadas no ponto anterior.

Calculamos o coeficiente α de Cronbach entre cada item e o total no factor a que pertence e as

restantes e verificamos que todos os itens, embora e de um modo geral, fracos, apresentam valores de

correlação esperados. Quando comparados os valores item- total do factor corrigidos e o coeficiente α de

Cronbach quando o item é eliminado, verificamos algumas variações crescentes do valor de α. É o caso dos

itens Ae14 e Ae15 que sendo excluídos provocam uma variação positiva da fiabilidade da escala em que

estão inseridos, aliás como se verifica pela acréscimo do coeficiente α de, respectivamente (.42) para (.48) e

de (.54) para (.58). Os índices de determinação evidenciam também algumas dificuldades (r2 ≤ .09) de

apropriação dos itens ao seu próprio factor, nomeadamente os itens Ae07; Ae02; Ae08; Ae14; Ae06 e Ae15. Aliás, estes resultados parecem vir confirmar algumas dúvidas acerca da validade destes itens, já evidenciada em pontos antecedentes. Conquanto, quase todos os itens parecerem contribuir suficientemente para avaliar as abordagens

em que foram inseridos (basta verificar os coeficientes α de Cronbach de cada um dos itens para medir a

sua fiabilidade ao factor) os resultados sugerem uma relativa (ligeira) dependência entre os vários itens quando são tomados os dois polos [deep + achieving] versus [surface] e, similarmente, confirma os dois eixos principais na abordagem do estudo e das aprendizagens já discutida em estudos anteriores (Newstead, 1992; Richardson, 1992, 1998; Biggs, 1993). Com efeito quando considerados, em conjunto os itens que constituem as duas dimensões ([deep] + [achieving]) e retirado o item Ae15, o coeficiente de Cronbach

aproxima-se do limiar mínimo de satisfação (α= .73 ou α= .74 se normalizado).

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236

3.3. [CHe]: Comportamentos Habituais perante o estudo

A psicologia cognitiva tem defendido que a aprendizagem efectiva é mais resultado dos processos e estruturas internas do que devido a factores externos, tais como, materiais, contexto, professores, etc (Resnick, 1981 referido por Nist et al, 1991: 850). Nesta perspectiva, os sujeitos são responsáveis activos no controlo e gestão consciente das suas aprendizagens, as quais, resultam de um conjunto de relações funcionais entre os seus modelos de pensamento e acção e o contexto socio-educativo em que estão inseridos. Estes participantes activos são, frequentemente, descritos como auto.regulados. Neste sentido, a psicologia sócio-cognitiva avalia a auto-regulação pela extensão em que os sujeitos são 'metacognitively,

motivationally and behaviorally active participants in their own learning processes' (Zimmerman, 1986: 308). Neste sentido, segundo Schunk (1996: 362) o uso de estratégias é uma parte integral da auto-regulação académica, nas actividades de estudo e aprendizagem, uma vez que fornece aos estudantes o controlo sobre o seu próprio processamento da informação e conhecimentos Introduz, inclusive, o termo ‘metacognitive awareness’ como sinónimo de auto-regulação. Esta auto-consciência a que ser refere Schunck, inclui a análise das situações, contextos e das características pessoais, definição de um plano para cumprir os objectivos, implementar o plano, monitorizar e gerir o seu progresso e modificá-lo caso necessário, o conhecimento metacognitivo que guia as operações em cada uma das fases e, ainda a seleccão das estratégias e tácticas mais adequadas ao alcance das metas e objectivos fixados. Por outro lado, embora as ‘tácticas’ possam ser mais específicas que as estratégias, traduzem igualmente procedimentos interdependentes e regulares, os quais, associados a determinados aspectos afectivos, volitivos e relacionais (Weinstein & Mayer, 1986: 315) levam à constituição de planos cognitivos, metacognitivos e motivacionais. Estes planos, por sua vez, são orientados para o êxito nos desempenhos, no que pode ser designado por 'comportamento estratégico'. Assumimos, na presente investigação, que os comportamentos auto-reguladores das aprendizagens incluem nos estudantes universitários:

• actividades cognitivas de procura, seleccão e processamento da informação, de transformação e integração na memória de novos dados e materiais de aprendizagem, de sentido e significação do material de estudo de acordo com perspectivas de generalização e transferência entre contextos e, também, de gestão e organização do tempo, espaços, materiais, etc.;

• técnicas de criação e manutenção de um ambiente favorável ao estudo (motivação, fixação de metas, reforço (como por exemplo, reforço das formas de lidar com a ansiedade antes dos exames), dos sentimentos de auto-eficácia e de auto-estima, do valor da aprendizagem e para o desenvolvimento de atitudes e expectativas positivas (Weinstein & Mayer, 1986); e,

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CAPÍTULO 4 237

• actividades metacognitivas de reconhecimento das exigências das situações de aprendizagem, na auto-avaliação das competências, dos interesses, atitudes e qualidades pessoais e, ainda na monitorização, gestão e tomada de decisão para controlar os próprios processos e mecanismos reguladores das aprendizagens;

Na realidade, pensamos que o conceito de ‘estratégia’ se ligava ao 'comportamento' intencional e orientado (de acordo com Biggs) e/ou aos planos de acção (na perspectiva de Heider, Sternberg e Perkins) adoptados na aquisição, selecção e processamento da informação, planos estes associados à competência académica que envolve intervenção, propósito (objectivo) (segundo Entwistle, Marton e Ramsdem) e à sua instrumentalização com vista à auto-regulação (Schunck, Zimmermam & Martinez-Pons). Inspirados neste conceito alargado de estratégia auto-reguladora das aprendizagens fomos identificar e tentar medir em jovens estudantes universitários do 1ºano os níveis da sua utilização, associando acções, processos e elementos de realização cognitiva e metacognitiva a factores de índole afectivo-relacional (motivacional) e de ajustamento académico.

3.3.1. Construção e dimensionamento do inventário [Che]

Com excepção da categorização avançada por Biggs (1993), designadamente os instrumentos de avaliação usados nos diversos trabalhos de investigação com base no modelo 'SAL', constatamos que de um modo geral a literatura existente relativa à exploração e análise das estratégias ou dos processos auto-reguladores das aprendizagens é ainda muito insipiente e dispersa, sobretudo, no que concerne ao contexto académico universitário Com efeito, não nos foi possível oportunamente encontrar e seleccionar um destes instrumentos que estivesse constituído e devidamente validado para a identificação e caracterização das competências de estudo em estudantes universitários. Perante a limitação, optamos em primeiro lugar, por recolher da revisão da literatura algumas sugestões e aspectos que nos permitissem formular um conjunto de itens com vista a medir a natureza e extensão dos processos auto-reguladores do estudo e aprendizagens. Em segundo, fomos validar o instrumento resultante seguindo de perto o método da reflexão falada (Almeida & Freire, 1997: 122) e efectuando uma análise às qualidades psicométricas, consistência e robustez interna. Para a selecção e distribuição dos itens por grupos afins (construtos) apoiamo-nos também na pesquisa bibliográfica efectuada junto de alguns artigos e notas de investigação, nomeadamente nos modelos da auto-regulação. Entre outros, já antes referenciados, destacamos a categorização presente no modelo SRLS: Self-Regulated Learning Strategies (Zimmerman & Martinez-Pons, 1986; 1988) ou, no modelo volitivo, designado de SRL: Self-Regulated Learning (Corno & Mandinach,1983 e aperfeiçoado por Corno & Rohrkemper, 1985). Para uma melhor estruturação das diferentes variáveis, inspiramo-nos num esquema

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238

classificativo de hábitos de estudo e trabalho proposto por Archer & Gleason (1995). Um sumário das principais ideias e aspectos resultantes e que serviram de mote á construção e dimensionamento do inventário [Che] pode ser observado no Anexo 3. Após alguns acertos realizados a partir do questionário piloto, resultou o inventário [Che] que ficaria constituído por 25 itens com resposta forçada [formato Lickert de 6 pontos, entre um valor mínimo =1 (discordância total) a um valor máximo = 6 (concordância total)]. A distribuição feita á priori dos itens em dimensões seguiu de perto as componentes do modelo SRL (Corno & Rohrkemper, 1985) e pode ser observado no quadro seguinte.

Quadro 4-IX: matriz (inicial) das dimensões e itens de [Che]

PLANIFICAÇÃO He19; He20; He21; He22; ATENÇÃO He26; He27; He28; CONEXÃO He33; He34; He35

AQUI

SIÇÃ

O

TRAN

SFOR

MAÇÃ

O

MONITORIZAÇÃO

Decisão: Controlo: Auto-avaliação:

He36; He37; He38 He39; He40; He41 He42: He43

ESTR

ATÉG

IAS

AUTO

-REG

ULAD

ORAS

AFECTIVO-RELACIONAL He24; He25

3.3.2. Validação interna e análise das respostas aos itens de [Che]

O estudo realizado acerca das características psicométricas do instrumento [Che] totalizou os 420 elementos da amostra e os dados foram sujeitos a procedimentos idênticos aos adoptados para os instrumentos anteriores (conforme os pontos 3.1.2 e 3.2.2). Apresentamos de seguida algumas das características psicométricas de validade interna do instrumento, relativamente à amostra considerada.

3.3.2.1. Distribuição e sensibilidade das respostas aos itens

A distribuição das respostas aos itens do instrumento [Che] pode ser observada, no quadro seguinte, onde se indicam, as médias e o Desvio Padrão. Assinalam-se também os coeficientes de sensibilidade dos resultados relativamente à distribuição estatística 'normal'.

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CAPÍTULO 4 239

Quadro 4-X: medidas de distribuição e sensibilidade nos itens de [Che]

Ordens (%)

Item

Média

DP

(i) A

ssim

etria

(ii) C

urtos

e

1

2

3

4

5

6

He19 He20 He21 He22 He23 He24 He25 He26 He27 He28 He29 He30 He31 He32 He33 He34 He35 He36 He37 He38 He39 He40 He41 He42 He43

5,4 4,9 4,4 4,9 2,7 3,0 2,6 4,0 4,9 3,4 5,5 4,2 3,1 4,3 3,6 3,5 3,9 3,1 5,0 4,1 4,5 5,5 4,8 3,8 2,7

0,9 1,1 1,5 1,1 1,3 1,6 1,6 1,4 1,0 1,4 0,8 1,4 1,4 1,5 1,4 1,4 1,2 1,2 1,1 1,3 1,4 0,7 1,0 1,1 1,5

- - - - - + + + - - + - - - + - - - - + - - -

- - - - +

↑↑ ↑ ↓ ↑ ↓ ↓ ↓ ↓ ↑ ↓

↑↑ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↑ ↓ ↓

↑↑ ↑ ↓ ↓

0,2 2,4 4,5 1,0 21,4 21,9 33,3 4,5 0,7 9,5 0,2 4,3 13,8 5,2 7,6 8,8 2,1 7,9 0,2 1,7 3,1 0

0,7 3,3 25,5

2,1 2,1 12,1 2,6 25,2 24,3 24,3 9,5 1,2 19,0 1,0 7,4 26,0 8,8 16,9 17,1 12,4 24,5 1,7 10,5 9,0 0

1,9 9,8 26,7

2,4 7,4 11,2 6,9 25,0 17,6 14,3 20,2 8,1 26,2 2,9 17,9 21,7 16,4 22,4 23,6 17,9 33,3 9,3 20,0 11,0 1,9 6,7 25,7 20,5

6,9 16,4 17,6 15,7 19,3 15,2 9,5 24,5 20,2 22,1 6,0 22,1 22,9 19,3 25,7 23,3 31,2 19,0 17,4 27,9 18,8 8,1 22,9 35,5 11,7

30,7 38,6 22,4 37,4 7,6 13,8 10,5 27,4 40,2 15,7 25,7 27,9 10,5 24,5 19,3 20,0 29,0 12,4 33,1 24,0 29,0 32,9 40,0 21,0 9,3

57,6 33,1 32,1 36,4 1,4 7,1 8,1 13,8 29,5 7,4 64,3 20,5 5,2 25,7 8,1 7,1 7,4 2,9 38,3 16,0 29,0 57,1 27,9 4,8 6,4

Legenda: i) + : Assimetra positiva (soma de desvios acima da média); ++ : Acentuadamente positiva; - : Assimetria negativa (soma dos desvios abaixo da média); - - : Acentuadamente negativa. ii) ↑ : Curva leptocúrtica (afunilada); ↑↑ : Acentuadamente leptocútica ↓ : Curva platicúrtica (achatada) ; ↓↓ : Acentuadamente platicúrtica. [ Outros casos: 'normal'] A observação do quadro com a distribuição das respostas, permite verificar que quase todos os itens têm frequências de discordância/mínimos ou de concordância/máximos com valores aceitáveis, com excepção dos itens He19 (concordància igual a 95,3%); He29 (concordância igual a 96,0%) e He40 (concordância igual a 98,1%) cujos valores são extremos. A elevada percentagem de concordância encontrada nos resultados destes itens, poderá eventualmente dever-se ao carácter de desejabilidade social que o tipo de resposta representa na amostra considerada (alunos a frequentar aulas), senão atente-se no enunciado destes itens (Anexo 5). Entretanto, os itens He23, He24, He25, He28, He31; He36 e He43 apresentam predominância de desvios acima da média, embora com valores reduzidos, enquanto os itens

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240

He19, He29 e He40 mostram coeficientes de assimetria acentuadamente negativos, retirando-lhes sensibilidade. São também estes itens que registam um coeficiente de curtose mais afastado de zero, o qual implica um estreitamento, da curva de distribuição das respostas nestes itens, relativamente à 'normal'. Os restantes valores deste coeficiente apresentam-se relativamente próximos de zero na generalidade das situações, embora com pequenas oscilações que foram assinaladas. Com efeito, esta identificação dos itens He19, He29 e He40 com menor poder descriminativo e sensibilidade, certamente, é justificável na amostra considerada. Aliás, outras análises poderão confirmar este dado aconselhando a exclusão (ou manutenção) destes itens na escala.

3.3.2.2. Consistência interna dos itens

A análise da consistência interna dos itens de [Che], através do procedimento scale reliabiliy

analysis do SPSS, permitiu verificar que a escala, quando são tomados todos os itens, num factor global,

apresenta um coeficiente α de Cronbach de .85 (ou α = .86 se for normalizado), portanto, bastante acima do

limiar ideal dos .75 (Almeida & Freire, 1997).

Quadro 4-XI: correlações dos resultados nos itens de [Che]

Itens

Correlação Item-Total (corrigida)

α de Cronbach (se o item for excluído)

Correlação múltipla r2

He19 He20 He21 He22 He23 He24 He25 He26 He27 He28 He29 He30 He31 He32 He33 He34 He35 He36 He37 He38 He39 He40 He41 He42

He43 (-)

.36

.39

.50

.57

.50

.04

.02

.41

.44

.37

.20

.31

.54

.58

.45

.42

.38

.58

.33

.58

.29

.29

.42

.54

.31

.84

.84

.84

.84

.84

.86

.86

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.84

.35

.33

.38

.49

.31

.28

.30

.25

.33

.36

.27

.43

.48

.30

.26

.39

.27

.50

.24

.43

.25

.27

.33

.43

.24

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CAPÍTULO 4 241

Os valores correspondentes à coluna ‘correlação item-total’ tomados como coeficientes de

descriminação, mostram que quase todos os itens registam valores valores moderados (r= .29 a r= .58) de correlação, sendo os itens He32, He36 e He38 a apresentar maior poder descriminativo. Por conseguinte, os itens He24 e He25 apresentam correlações com o total da escala bastante fracas (r= .02 e r= .04) e aos

quais, corresponde um acréscimo no coeficiente α de Cronbach de (.85) para (.86), caso estes dois itens

sejam excluídos da escala.

Relativamente aos restantes coeficientes α, os valores encontrados podem ser considerados

bastante satisfatórios (α= .84) e os valores do coeficiente quadrado de correlação múltipla são aceitáveis (r2

≥ .24) em todos os casos. Contudo importará observar o que se passa na análise da dimensionalidade e nos

valores de intercorrelação entre itens nas várias dimensões a considerar de seguida.

3.3.2.3. Dimensionalidade e saturação factorial dos resultados nos itens

Tendo igualmente em perspectiva verificar até que ponto a distribuição inicial dos itens na escala [Che] poderia ser aplicada nos sujeitos deste estudo, efectuamos uma extracção factorial (procedimento factor reduction do SPSS) em componentes principais, seguida de rotação (oblíqua e ortogonal) com normalização Kaiser. Partimos da hipótese que o conteúdo da escala representava um factor geral e cinco dimensões (em acordo com as sugestões retidas da revisão de literatura) que avaliavam o uso de estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais para fazer face ao estudo. Para o efeito, procedemos a uma redução factorial dos resultados nos itens da escala [Che] sem qualquer tipo de restrição. Encontramos 6 factores com valores próprios (eigenvalues) superiores a 1 explicando 54% da variância total, sendo que o primeiro factor acumulava cerca de 25% dessa variância. A observação da matriz de extracção em componentes principais, permitiu verificar que todos os itens se salientavam no primeiro factor acima de (.37), exceptuando os itens He24 e He25 que se salientavam no segundo factor. Os restantes factores não eram interpretáveis. A solução obtida foi comparada com soluções resultantes da específicação para cinco, quatro, três e dois factores, tendo-se obtido soluções semelhantes com diferentes índices de simplicidade e clareza. Atendendo aos critérios, optamos por fixar a solução obtida pela imposição de 5 factores, efectuando sobre a matriz principal uma rotação ortogonal Varimax e uma rotação oblíqua dos eixos segundo o procedimento direct oblimin (delta=,1). Analisando os outputs estatísticos dos dois procedimentos não se observaram diferenças dignas de registo entre ambos os processos.

A solução que mais se aproximou do dimensionamento dos itens estabelecido inicialmente e com maior parsimónia e interpretabilidade, ficou composta por cinco factores (com valor próprio superior a um) a

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242

explicarem 49,5% de variância total. Como valor mínimo para a selecção dos itens a incluir nos factores,

optamos pelo critério do (±.40). A estrutura factorial obtida através de uma rotação ortogonal (método

Varimax, com imposição de 5 factores) a partir da matriz de componentes principais que apresentamos no quadro seguinte. Indicamos também as percentagens de comunalidade parta cada item e os valores próprios e percentagem de variância correspondentes aos factores.

Quadro 4-XII: solução ortogonal dos resultados nos itens de [CHe].

Comunalidade

Componentes

Item % 1 2 3 4 5

He19 He20 He21 He22 He23 He24 He25 He26 He27 He28 He29 He30 He31 He32 He33 He34 He35 He36 He37 He38 He39 He40 He41 He42

He43(-)

55 57 40 65 37 71 71 48 58 63 36 51 57 40 40 55 34 63 36 46 45 47 50 53 21

.41

.49

.52

.70

.56

.61

.70

.53

.44

.40

.71 .74 .41 .71

.40

.43

.41

.57

.41

.66

.61

.64

.58

.32

.64

.59

.75

.63

.84

.84

Eigenvalue % de Variância

3,43 13,7

2,60 10,4

2,60 10,4

2,15 8,6

1,59 6,3

Método de extracção: Principal components analysis Método de rotação: Varimax com normalização Kaiser Observando a matriz da rotação ortogonal com extracção de cinco factores, verificamos que as percentagens de comunalidade de cada item são aceitáveis, excepto o item He43 que apresenta ma

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CAPÍTULO 4 243

percentagem abaixo do valor critério24. Os restantes valores oscilam entre um mínimo de 34% (He35) a um máximo de 71% (He24,He25). Todos os itens saturam no factor acima de (.40) com excepção do item He43 (.32). Os itens He21, He27, He30, He36 e He38 saturam acima do valor critério em dois factores. Neste caso e atendendo aos objectivos do presente estudo, optamos por incluir o item no factor onde fosse maior o valor de saliência. Relativamente ao item He21 que satura exactamente com o mesmo valor (.41) no 1º e 2º factor, o seu enunciado25 sugeria que fosse eliminado ou incluído no segundo factor porque este salientava itens de dimensão teórica mais próxima. Sumariando, a análise factorial exploratória das respostas aos itens da escala [Che] conduziu-nos ao seguinte (re)dimensionamento: Factor1: Apresenta valor próprio rodado de 3,43 e explica 13,7% do total da variância e parece representar o

uso de 'estratégias cognitivas de transformação e manipulação da informação' e como tal, mais relacionado com a distinção e selecção da informação relevante e com o seu fecho (conexão) para interiorização. Inclui os itens He23; He30; He31; He32; He33; He34; He35, entre os quais o item He31 que apresenta maior saturação (.70) e o item He23 que apresenta menor saturação (.49).;

Factor2: Este factor tem valor próprio rodado de 2,60 e explica 10,4% do total de variância e parece representar o uso de 'estratégias cognitivas de planeamento ou sequências de aproximação' (rotinas de comportamentos) e inclui os itens He19; He20; He21; He22 e He29 e salienta-os entre mínimo de (.41, item He21) a máximo de (.74, item He20);

Factor3: Apresenta valor próprio rodado de 2,6 e explica 10,4% do total de variância e parece representar o uso de 'estratégias cognitivas e metacognitivas de gestão e monitorização', nomeadamente itens relacionados com: a gestão e controlo da informação; consciencialização dos distractores do estudo e procura de condições de trabalho; decisão e fixação de metas; autoavaliação, etc. Inclui os itens He37 até He43 com valores de saturação muito próximos entre si (.41) a (.67) à excepção do item He43 com um valor de saturação abaixo (.32) do critério;

Factor4: Com valor próprio rodado de 2,15 e explicando 8,6% do total de variância parece representar o uso de 'estratégias cognitivas de aquisição e recepção de estímulos'. Salienta com valores satisfatórios (entre .59 a .75) os itens: He26; He27; He28 e He36, relacionados com a atenção e participação nas aulas e na busca de esclarecimento sobre a informação, junto dos docentes;

Factor5: Parece representar, essencialmente o uso de 'estratégias afectivas de incentivo motivacional'. Inclui os itens He24 e He25 que saturam com valores satisfatórios (.84) no factor e tem valor próprio rodado de 1,6 explicando 6,4% do total de variância.

24 Critério: considerar valores de comunalidade acima de 25%. 25 He21- Consagro pelo menos 5 h de estudo por semana (ou 1h por dia) para estudar (além do tempo de assistência a aulas)

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244

3.3.2.4. Intercorrelações dos resultados nos factores

O quadro seguinte mostra-nos as corrrelações entre cada um dos itens do inventário [Che] e a cotação total em cada uma das dimensões (factores) e as correlações corrigidas relativamente ao total do

factor onde o item está incluído. Indica-se também o coeficiente α de Cronbach para o total em cada factor e

quando o item é excluído, assim como o coeficiente de determinação (quadrado de correlação múltipla) entre o item e o total no próprio factor.

Quadro 4-XIII: correlações nos factores de [Che]

CORRELAÇÕES (Item- total)

Itens α Cronbach r2 múlt. Factor1 Factor2 Factor3 Factor4 Factor5 .77 (total) [Factor1]

He23 He30 He31 He32 He33 He34 He35

.75

.74

.71

.75

.75

.73

.76

.20

.31

.43

.25

.23

.36

.22

.43a

.50a

.62a

.47a

.45a

.55a

.41a

.39 b

.49 b

.39 b

.37 b

.29 b

.33 b

.22 b

.35 b

.40 b

.34 b

.31 b

.29 b

.28 b

.25 b

.35 b

.27 b

.42 b

.28 b

.25 b

.37 b

.29 b

.05 b

.01 b

.05 b -.04 b

0 b -.01 b

0 b .70 (total) [Factor2]

He19 He20 He21 He22 He29

.65

.63

.69

.58

.70

.30

.29

.20

.40

.13

.31 b

.31 b

.45 b

.59 b

.27 b

.48a

.51a

.42a

.62a

.33a

.21 b

.26 b

.41 b

.38 b

.28 b

.24 b

.26 b

.29 b

.38 b

.18 b

-.11 b -.06 b -.04 b -.05 b -.14 b

.70 (total) [Factor3] He37 He38 He39 He40 He41 He42 He43

.67

.65

.68

.68

.65

.62

.70

.19

.24

.20

.17

.26

.39

.20

.26 b

.48 b

.21 b

.17 b

.28 b

.39 b

.26 b

.22 b

.48 b

.17 b

.32 b

.27 b

.33 b

.22 b

.40a

.48a

.37a

.37a

.47a

.59a

.30a

.18 b

.38 b

.17 b

.15 b

.33 b

.36 b

.19 b

-.03 b -.01 b

0 b -.10 b .01 b .05 b 0 b

.70 (total) [Factor4] He26 He27 He28 He36

.66

.68

.61

.60

.21

.17

.33

.35

.32 b

.27 b

.32 b

.51 b

.25 b

.40 b

.23 b

.32 b

.25 b

.36 b

.22 b

.40 b

.46a

.41a

.53a

.56a

.10 b -.02 b -.06 b .05 b

.66 (total) [Factor5] He24 He25

.

.

.25

.25 .02 b 0 b

-.07 b -.11 b

-.01 b -.01 b

0 b .03 b

.50a

.59a

Legenda: a) Coeficiente de correlação r de Bravais-Pearson (Item –total) corrigido b) Coeficiente de correlação r de Bravais-Pearson (item- total) r2) Coeficiente quadrado de correlação múltipla (coeficiente de determinação)

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CAPÍTULO 4 245

Os resultados obtidos permitem verificar que os itens se encontram positivamente correlacionados

com os itens do seu factor, com coeficientes corrigidos de (.41 ≤ r ≤ .62 no factor1); (.33 ≤ r ≤ .62 no

factor2); (.30 ≤ r ≤ .59 no factor3); (.41 ≤ r ≤ .56 no factor4) e (.50 ≤ r ≤ .59 no factor5). Todos os itens

apresentam correlações fracas a moderadas (.17 ≤ r ≤ .59) com os totais das restantes dimensões, excepto

o caso dos itens (He24 e He25) do factor5 que apresentam valores de correlação muito fracos ou nulos com os totais dos restantes factores. Estes resultados sugerem uma clara dependência entre os quatro primeiros factores e uma independência relativamente aos itens que constituem o factor 5.

Se comparados os valores item- total (corrigidos) e o coeficiente α de Cronbach, quando o item é

eliminado, verificamos que todos os itens apresentam valores esperados. O caso mais extremo, situa-se para o item He43 que sendo excluído não afecta a fiabilidade do seu factor. Os índices de determinação, embora aceitáveis indicam algumas dificuldades na capacidade de apropriação de determinados itens aos respectivos factores, nomeadamente os itens He27, He29, He37 e He40.

4. Procedimentos metodológicos

Tratando-se de um estudo essencialmente correlacional, onde as relações causa-efeito não deverão ser postuladas (Almeida & Freire, 1997) torna-se, então, mais difícil fixar quais as variáveis dependentes e/ou independentes para investigação. Exemplificando, poderemos questionar com relativa facilidade se é a atitude de abordagem de estudo que influi no ajustamento académico ou no uso de estratégias cognitivas e metacognitivas ou, se essa influência é antes inversa (o ajustamento académico ou o uso de estratégias influenciam as abordagens do estudo) ou ainda, se estaremos perante uma interacção recíproca mais ou menos moderada pelo efeito de uma outra variável não considerada à partida (como por exemplo, o género, a prioridade de escolha do curso, etc.). Neste estudo, tomando como ponto de partida, a exploração de alguns aspectos que emergiram das ideias e das leitura realizadas, orientamo-nos para avaliar as relações existentes entre diferentes níveis de ajustamento académico (confiança em si, satisfação com a Universidade e medida global), as abordagens ou orientações e as estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais usadas no processo de auto-regulação académica. Paralelamente, incluímos estudos diferenciais que exploram eventuais efeitos (simples ou de interacção) dos dados demográficos e escolares e caracterizadores de grupos de alunos do 1ºano em 'perfis' ou traços relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens.

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246

4.1. Descrição funcional das variáveis para investigação

Em termos metodológicos, começamos por ressalvar que algumas das variáveis que á partida poderiam influenciar os resultados, porque associadas às variáveis em estudo, foram previamente controladas. Foi o caso da frequência (caloiros ou repetentes) e o contexto onde ocorreu a recolha de dados (sujeitos que frequentam aulas). No entanto, não foram controladas as variáveis independentes que serviram, primeiro para caracterizar a amostra e depois para a apresentação e análise dos resultados. Referimo-nos aos dados demográficos (género, idade e local de residência) e dados escolares (curso, prioridade de escolha, média obtida no ensino secundário, nota de acesso à Universidade, percentagem de tempo semanal dedicada a diversas actividades) e ainda, um conjunto de variáveis nominais/categoriais que indicam os sujeitos, em termos da atribuição causal que fazem do seu próprio sucesso e insucesso escolar e da sua percepção relativamente à vivência (ou não) de problemas actuais. Quanto á definição operacional destas variáveis independentes qualitativas (ou categoriais), umas são dicotómicas, por exemplo o género (feminino/ masculino) ou foram dicotomizadas, como por exemplo, a

idade (idade ≤ 21 e idade >21anos), residência (residente/ deslocado) e ainda outras são categoriais, tais

como, a área de curso frequentada (ciências naturais, ciências aplicadas, ciências da computação e ciências de gestão e planeamento); a prioridade de escolha (1ª, 2ª, 3ªou+) ou, as notas escolares (as classificações médias foram distribuídas por três grupos distintos [notas inferiores ou iguais a 13 valores; notas compreendidas entre 13 e 16 valores (inclusivé) e nota superior a 16 valores]. As atribuições causais do sucesso e insucesso referem-se ao processo de avaliação cognitiva pelo qual o sujeito atribui causas (factores) às suas experiências passadas. No presente estudo, procuramos conhecer as principais dimensões causais (locus interno/ externo de causalidade) que os sujeitos atribuíam ao seu sucesso e insucesso escolar. Optamos por considerar estes indicadores agregados, segundo as dimensões da internalidade/ externalidade pelo sucesso e insucesso. Nestes indicadores nominais e/ou categoriais agregados a observação assentou, fundamentalmente, na análise das frequências e contigência dos resultados e na determinação dos valores do qui-quadrado com interesse estatístico (p< .05) relativamente aos grupos de sujeitos considerados nas variáveis independentes (demográficos, escolares, níveis de ajustamento e abordagens). Quanto à definição operacional das variáveis intervalares (independentes e/ou dependentes), começamos por assumir estarem reunidos para a presente investigação, os preceitos do teorema do 'limite

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CAPÍTULO 4 247

central' (Frankfort-Nachmias, 1997: 503) e seus corolários26 que asseguram, sendo a amostra baseada num número suficientemente grande de sujeitos (N=420), a distribuição dos resultados tende a ser 'normal' ou 'gaussiana'. Isto implica, por exemplo, que há homogeneidade das variâncias na comparação dos diferentes grupos independentes da amostra. Por outro lado, há vantagem na utilização de escalas intervalares que seguem uma distribuição 'normal', uma vez que, cada unidade de desvio em torno da média faz corresponder uma determinada percentagem de casos e, vice-versa (Almeida & Freire, 1997: 167). Além disso, conseguem-se níveis mais elevados ou mais baixos de diferenciação dos sujeitos entre si. Como critério geral, optamos por considerar que as pontuações obtidas nas variáveis intervalares fossem classificadas

segundo três intervalos, tomados em torno da média e com idêntico valor de desvio padrão [média ± 2/3 DP]

(classes normalizadas). Quanto às variáveis dependentes, estas foram obtidas fundamentalmente nas respostas dadas a cada um dos factores derivado da análise factorial exploratória dos instrumentos utilizados. Por conseguinte, a definição destas variáveis coincide com a descrição dos factores, tal como foram interpretados no estudo dos instrumentos utilizados. Acrescenta-se que alguns destes factores (também designados de dimensões ou indicadores) foram estudados enquanto variáveis independentes e dependentes. É o caso dos níveis de ajustamento académico, nas suas três vertentes (confiança em si, satisfação com Universidade e medida global de ajustamento) conforme o instrumento [Aja] e nos (3+1) indicadores das abordagens estudo, conforme o instrumento [Ae]. Entretanto, em função dos aspectos exploratórios, as variáveis dependentes principais foram tomadas a partir da análise factorial exploratória do instrumento [Che], as quais, assumiram a seguinte descrição funcional:

Vd1: uso de estratégias cognitivas de selecção, manipulação e conexão (fecho) da informação e material de estudo (Factor1); Vd2: uso de estratégias cognitivas de planeamento e sequenciação de rotinas de comportamentos (Factor2); Vd3: uso de estratégias cognitivas e metacognitivas de gestão, controlo e auto-avaliação (monitorização) do estudo (Factor3); Vd4: uso de estratégias cognitivas de aquisição e procura de estímulos (Factor4); Vd5: uso de estratégias afectivo-relacionais para frequência de aulas (Factor5), e Vd6: uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens (medida global).

26 Corolário 1: Numa população, quanto maior for o tamanho N da amostra, mais a média da distribuição se aproxima da média

da população-alvo;

Corolário 2: Numa população, quanto maior for o tamanho N da amostra, menor é o erro ou o desvio padrão cometido relativamente á média da população-alvo.

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248

4.2. Procedimentos estatísticos e especificação das hipóteses

Antes de avançarmos para a verificação empírica das hipóteses e aspectos exploratórios, analisamos e apresentamos os índices estatísticos descritivos (média, mediana, desvio padrão, leque) e os coeficientes de sensibilidade (assimetria e curtose) na distribuição dos resultados em cada uma das variáveis e indicadores do estudo. Depois, importava conhecer o grau de relacionamento entre diferentes medidas de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens. Era suposto que esta análise nos fornecesse indicações sobre eventuais sobreposições das variáveis por se encontrarem normalmente associadas (Howell, 1982). No seguimento, fomos avaliar a capacidade preditiva do conjunto dos indicadores, através da estrutura factorial subjacente (procedimento 'factor reduction' do SPSS, seguida de rotação varimax, com normalização Kaiser, com e sem especificação de factores) e determinação da medida de linearidade, através do procedimento 'linear regression' (método stepwise) do SPSS, entre as variáveis dependentes e o conjunto de previsores constituído pelas variáveis independentes (demográficas, escolares, abordagens e níveis de ajustamento académico). Para os estudos diferenciais (validação externa) dos indicadores e à carência de dados comparativos, aferidos e devidamente validados para a população-alvo, procuramos ter em atenção os eventuais efeitos principais (simples ou de interacção) dos dados demográficos e escolares sobre as pontuações médias em cada indicador ou dimensão do estudo. A opção pelas variáveis caracterizadoras das diferenças individuais fundamentais (género, idade) justifica-se por serem estas com frequência consideradas como critério externo, nos estudos com base investigacional, além de estarem directamente associadas aos processos e produtos de estudo e aprendizagem. Nestes estudos diferenciais, usamos a análise de variância (simples e múltipla) para amostras independentes, na comparação das médias não planeadas (post hoc) em presença de dois ou mais grupos de sujeitos em oposição27. Tomamos níveis de significância estatística de

(α=.05 ou α=.001 (two-tailed) e gl (graus de liberdade)= ∝ (Frankfort- Nachmias, 1997: Appendix C) e incluímos o

teste de homogeneidade da variância de Levene28. Para uma análise mais fina das diferenças entre médias e

27 Quando comparados apenas dois grupos, utilizamos o procedimento 'compare-means-independent samples t-test de student'

do SPSS. Quando comparados três ou mais grupos, utilizamos o procedimento 'compare-means, oneway-ANOVA' com teste de contraste múltiplo (GLM: General Linear Model) do SPSS (Stevens, 1992, Wright, 1997; Frankfort-Nachmias, 1997).

28 Considerando o valor de F-Fisher não significativo (p> .05) a variância pode ser assumida como homogénea e, nesta caso é considerado o valor da linha de saída 'equal variances' do SPSS para o t-test. No caso de p< .05, assumimos que é violada a homogeneidade da variância e, então são tidos em conta os valores da linha de saída 'inequal variances' (Kinnear & Gray, 1994: 92).

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CAPÍTULO 4 249

existindo mais de dois grupos de sujeitos em oposição, especificamos29 indiscriminadamente os testes de Scheffé e o Tukey's HSD para a comparação múltipla (Stevens, 1992; Schweigert, 1994; Wright, 1997). No presente estudo, as hipóteses de trabalho vão no sentido de diferenciar, com um intervalo de confiança de 95% de significância estatística (Howell, 1982), grupos de sujeitos em função dos seus dados demográficos e escolares e os resultados médios obtidos em cada um dos indicadores e variáveis do estudo. Para o efeito, fixamos as seguintes hipóteses de trabalho (nulas):

Ho1: Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados demográficos (género, idade, local de residência) relativamente aos níveis médios de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico. Ho2: Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados escolares (média obtida no ensino secundário, nota de acesso á Universidade, curso frequentado, prioridade de escolha do curso) relativamente aos níveis médios de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico. Ho3: Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados demográficos (género, idade, local de residência) relativamente às cotações médias obtidas em cada uma das abordagens [deep], [surface], [achieving] e [deep+achieving]. Ho4: Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados escolares (média obtida no ensino secundário, nota de acesso á Universidade, curso frequentado, prioridade de escolha de curso) relativamente ás cotações médias obtidas em cada uma das abordagens [deep], [surface], [achieving] e [deep+achieving]. Ho5: Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados demográficos (género, idade, local de residência) relativamente às cotações médias obtidas em cada um dos factores correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens. Ho6: Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados escolares (média obtida no ensino secundário, nota de acesso á Universidade, curso frequentado, prioridade de escolha do curso) relativamente às cotações médias obtidas em cada um dos factores correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens.

Para a identificação e determinação, nos sujeitos da amostra, de gupos em função de 'traços' ou 'perfis' caracterizadores do uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens, tomando em simultâneo os níveis médios de satisfação com a Universidade, confiança em si, medida de ajustamento académico e

29 o Tukey'sHSD (Honest Significant Difference) é igual á menor diferença entre quaisquer duas médias que são significativas

para uma probabilidade de (.05) e/ou (.001). Segundo Schweigert (1994: 230), o teste de Scheffé tem a vantagem de comparar combinações complexas entre médias e reduz o risco de se cometer um erro de tipo 2 (aceitar a hipótese Ho falsa), Contudo, é mais conservador que o Tukey's HSD, o que leva a aumentar o risco de se cometer um erro do tipo 1 (rejeitar a hipótese Ho verdadeira).

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250

abordagens. A análise de 'clusters' permite agrupar os indivíduos com base na sua proximidade (Bisquerra, 1996: 241). Para o efeito, recorremos30 a uma análise de agrupamentos, fixando para confirmação/ infirmação a hipótese de que, no 1ºano (comum) dos cursos de ciências e engenharias da Universidade de Aveiro, é possível considerar:

H1: Estudantes que indicam um uso reduzido de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens, apresentam níveis baixos a moderados de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico e evidenciam cotações médias pouco favoráveis em termos de abordagens [deep] e [achieving] em contraste com as cotações elevadas na abordagem [surface]. H2: Estudantes que indicam um uso moderado de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens, apresentam níveis moderados a elevados de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico e evidenciam cotações moderadas na abordagem [deep], moderadas a elevadas na abordagem [achieving] e cotações moderadas a reduzidas na abordagem [surface]. H3: Estudantes que indicam um uso elevado de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens, apresentam níveis elevados de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico e evidenciam cotações elevadas nas abordagens [deep] e [achieving] e reduzidas na abordagem [surface].

5. População alvo

5.1. Identificação

A população em estudo são os alunos que frequentam as aulas do plano de estudos do 1º ano comum dos cursos de licenciatura em ciências e engenharia da Universidade de Aveiro no ano lectivo de 1998/98. O número total de alunos ingressos nos cursos de ciências e engenharias da Universidade de Aveiro, no ano lectivo de 1998/99 foi obtido através do GAP- Gabinete de Apoio Pedagógico. O primeiro ano comum abrange uma população de cerca de 600 novos alunos distribuídos por 21 cursos das licenciaturas nas áreas de ensino de ciências exactas, ciências aplicadas, design, engenharias, gestão e planeamento.

30 procedimento 'Classify-K-means clusters analysis' do SPSS.

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CAPÍTULO 4 251

5.2. Plano de amostragem

Respeitando o princípio da singularidade de cada acção humana, de cada grupo social, e aceitando que 'as representações individuais se inspiram em parte nas representações colectivas próprias de um grupo social determinado' (Mollo, 1979: 19) importava conhecer o campo de observação, a sua especificidade condiciona os resultados. Mas, o processo de amostragem requer cuidados metodológicos particulares que tornem a amostra representativa, por forma a permitir generalizar resultados e a obter conclusões sólidas nos sujeitos de onde esta é retirada. Neste sentido, indicamos alguns dos procedimentos adoptados na planificação da amostragem para, de seguida caracterizar a amostra considerada em função das respostas nas variáveis seleccionadas para identificação pessoal (demográficos) e escolares. Procuramos tomar uma amostra na população-alvo, de modo a que 'as unidades que a formam sejam escolhidas por um processo tal que todos os membros da população tenham a mesma probabilidade de fazer parte da amostra' (Chiglione & Matalon, 1993: 32), ou seja, que fosse suficientemente representativa da população-alvo. Para isso, procuramos cumprir os seguintes critérios:

1. Acidentalização ou incidentalização da amostra31 2. Aleatorização da amostra; 3. Minimização de eventuais enviesamentos32 de amostragem;

31 Sujeitos que se encontram em determinado momento, em determinado local ou a realizar determinada tarefa (Almeida &

Freire, 1997: 105). 32 Resultantes dos aspectos anteriores, nomeadamente:

a) escolha e selecção de uma disciplina específica (introdução à informática) de entre um leque de disciplinas de tronco comum. A opção tomada orientou-se pelo facto de ser esta disciplina a garantir (á priori) menor perturbação académica e a reunir o menor número de ausências entre os sujeitos;

b) a recolha ser realizada em contexto de sala de aula, tendo presente todos os contrangimentos (actores, espaço, tempo, etc.) inerentes;

c) possíveis recusas provocadas por circunstâncias momentâneas ou imprevísiveis no preenchimento e nas respostas aos itens dos questionários. Neste sentido, procurou-se antecipadamente: i) redigir os itens dos questionários em linguagem clara, concisa e adequada aos respondentes; ii) indicar no cabeçalho dos instrumentos as principais finalidades e objectivos da investigação, assim como as instruções e procedimentos necessários ao correcto preenchimento dos mesmos; iii) elaborar um questionário piloto.

OBS: Todavia, no momento do entrega dos questionários e, após apresentação pessoal dos investigadores, objectivos e possíveis consequências da realização dum trabalho com esta natureza, foi ainda reforçado o carácter confidencial do preenchimento e os cuidados a ter na leitura e resposta aos itens propostos. Foi pedido aos alunos que respondessem de forma sincera e honesta. Não foi estabelecido limite de tempo, contudo estimularam-se os alunos para que respondessem com rapidez. Todas as questões surgidas (esporadicamente) foram prontamente esclarecidas pelos investigadores.

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252

4. Tentar manter uma ajustada33 proporcionalidade entre a amostra e a população; 5. Redução do ponto de vista pessoal34.

A planificação e cedência dos tempos (± 30 minutos) lectivos para a aplicação dos instrumentos, foi

efectuada em parceria e combinada entre os investigadores e o responsável pela disciplina de Introdução á Informática do 1ºano comum da Universidade de Aveiro. Participaram no estudo 438 sujeitos que preencheram o questionário em regime de voluntariado. A este número subtraíram-se 18 questionários, 12 dos quais por não terem sido devolvidos e 6 por apresentarem incorrecções várias (ausência de resposta ou respostas incompletas a alguns dos itens). Estes números representaram uma mortalidade pouco significativa (próximo de 4%) relativamente ao total da amostra tomada.

5.3. Caracterização da amostra

5.3.1. Dados demográficos

A amostra retida ficou constituída por um total de N=420 indivíduos. Destes, 186 [44,3%] são do género masculino e 234 [55,7%] do género feminino, com média de idades, respectivamente de 18,85 (DP=1,96) e 18,74 (DP= 1,80) com moda e mediana estatísticas em ambos os casos de 18 anos. A maioria dos elementos da amostra (62,7%) indica estar deslocado35 da residência durante o tempo de aulas.

33 Optamos por proceder à recolha de dados num período de aulas do primeiro semestre (Outubro a Janeiro) por forma a garantir

a presença de um maior número de sujeitos:

a) de ambos os sexos;

b) de todos os cursos;

c) ingressos em diferentes prioridades de escolha de curso;

d) não repetentes; 34 A administração do questionário foi precedida de:

a) conversas informais com o orientador e outros investigadores;

b) questões apresentadas a outros investigadores e estudo de adaptação de forma e conteúdo com recurso a análises de natureza qualitativa e quantitativa.

35 São considerados alunos ‘deslocados’ aqueles que indicam residir em locais diferentes durante o período lectivo e durante as férias, enquanto que os alunos ‘residentes’ aqueles que indicam a mesma residência nos dois períodos.

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CAPÍTULO 4 253

5.3.2. Dados escolares

Os dados escolares permitiram considerar a amostra do seguinte modo: a maioria (92,1%) dos sujeitos a frequentar o 1º ano destes cursos fazem-no pela primeira vez (alunos ‘caloiros’) e apenas uma pequena percentagem (7,9%) são alunos repetentes.

5.3.2.1. Sujeitos distribuídos pela prioridade de escolha do curso

Os alunos ingressaram no curso respectivo em diferentes prioridades de escolha (conforme quadro seguinte)

Quadro 4-XIV: distribuição da amostra ( N=420) por prioridade de escolha do curso

N %

1ª prioridade de escolha 2ª prioridade de escolha 3ª ou outra prioridade de escolha

195 95 130

46,4 22,6 31,0

Total 420 100

5.3.2.2. Sujeitos distribuídos segundo as médias escolares obtidas no final do secundário e nota de acesso á Universidade

Para o efeito, os sujeitos da amostra indicam ter obtido médias de classificações no final do secundário (10º+11º+12º anos) entre um mínimo de 11 a um máximo de 18 valores (na escala de 0-20). A média das notas no final do secundário situam-se, na amostra em 14,35 (valores) sendo a medida da moda e mediana igual a 14 valores. Quanto à nota36 de acesso à Universidade, esta oscila entre os valores: 9,5 (mínimo) a 20 (máximo) na escala 0-20 valores. A média de notas de acesso à Universidade, na amostra situou-se em 13,75 valores, para um valor mediano de 13,6 e uma moda de 12 valores. Após uma recodificação dos resultados escolares, segundo três grupos de resposta, a amostra ficou distribuída como se observa no quadro seguinte:

36 A nota de candidatura à Universidade é determinada pela combinação dos resultados finais no final do secundário e as

classificações das provas específicas realizadas.

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Quadro 4-XVI: distribuição da amostra por médias obtidas no final do secundário e nota de acesso à Universidade

M´édia obtida no secundário Nota de acesso Universidade

N % N %

nota ≤ 13

13 < nota ≤ 16

nota > 16

72 235 113

17,1 56,0 26,9

160 180 80

38,1 42,9 19,0

Total 420 100 420 100

5.3.2.3. Sujeitos distribuídos por cursos

A amostra distribui-se por um total de 20 licenciaturas em Ciências, Engenharias e Design que funcionam na Universidade de Aveiro. A fim de simplificar a apresentação da amostra, optamos por redistribuír os sujeitos por categorias de cursos, segundo áreas curriculares e/ou científicas afins (Tavares et

al, 1996; 1998). Os resultados podem ser observados no quadro seguinte:

Quadro 4-XVII: distribuição da amostra ( N=420) por categorias de cursos

N %

Área das Ciências Naturais: Biologia/Geologia + Biologia + Eng. Geologica + Eng. Ambiente Área do Planeamento e Gestão: Gestão Planeamento Turismo + Planeamento Rural Urbano + Design + Eng. Cívil + Eng. Gestão Industrial Área das Ciências Aplicadas: Eng. Física + Eng materiais + Eng. Mecânica + Eng. Cerâmica Vidro + Química + Quimica Iindustrial Gestão + Fisica/Química Área das Ciências da Computação: Eng. Telecomunicações + Electrónica+ Eng. Computação e Telemática + Matemática Aplicada Computação

110

115

126

69

26,2

27.4

30,0

16,4

Total 420 100

5.3.2.4. Sujeitos distribuídos segundo a % de tempo útil semanal dedicada a cada actividade

Apresentamos os resultados médios da percentagem de tempo útil semanal (base=100%) que os sujeitos da amostra indicam a cada uma das actividades propostas. Indicam-se também os índices

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CAPÍTULO 4 255

estatísticos, média e DP (desvio padrão). A fim de facilitar a leitura dos dados, optamos por considerar, apenas, dois grupos de respondentes, a saber: Grupo 1- sujeitos que indicam percentagem acima da média; e Grupo2- sujeitos que indicam percentagem abaixo da média.

Quadro 4-XVIII: distribuição da amostra (N=420) por percentagem de tempo útil semanal em cada uma das actividades propostas e por grupos de respondentes

Para frequência de aulas

Média = 48,4 DP = 15,4

Para estudo independente

Média = 20,0DP = 9,9

Em lazer ou Outra actividade

Média = 31,6

DP = 17,8 N % N % N %

Abaixo da média Acima da média

147 273

35,0 65,0

154 266

36,7 63,3

271 149

64,5 35,5

Total 420 100 420 100 420 100

Relativamente à percentagem de tempo útil semanal podemos observar que as médias de percentagem dedicadas a cada uma das actividades assumem valores distintos, sendo que a maior percentagem do tempo útil é dedicada á frequência de aulas (48,4%), seguida da actividades de lazer (convívio, descontracção, desporto, etc.) com cerca de 31,6% de tempo semanal. Por último a média de tempo dedicada ao estudo independente que se pode observar nas respostas dos sujeitos da amostra situa-se nos 20% do total tempo semanal. Na totalidade da amostra, observa-se que a maioria (65%) dos respondentes dedica um tempo semanal para frequência de aulas acima da média (48,4%). Ao invés, 36,7% do total da amostra indica dedicar percentagem de tempo semanal para estudo independente abaixo dos 20% da média. Por outro lado, 35,5% dos respondentes indica dedicar uma percentagem de tempo semanal para actividades de lazer (convívio, descontracção, desporto, etc.) acima de 31,6% do total semanal. Uma análise mais fina destes resultados permite registar que mais de metade dos alunos dedica entre 40% a 60 % do seu tempo semanal para frequência de aulas e entre 20% a 40% para actividades de lazer (convívio, desportos, descontracção, etc.) e apenas entre 10 % a 25% do seu tempo semanal para actividades de estudo independente. Este decréscimo é confirmado pelo valor mediano que corresponde a 50% dos sujeitos, no caso da frequência de aulas, 30% para actividades de lazer e 20% para estudo independente. Por outro lado, o leque de extremos é mais marcado no caso da percentagem semanal de tempo para frequência de aulas

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256

(excluíndo os valores mais extremados, mínimo=15% a máximo de 85%) do que nas restantes actividades respectivamente, entre 0-45% e 0-70% para estudo independente e em actividades de lazer. Resumindo, ao longo deste capítulo, procuramos salientar e justificar os procedimentos metodológicos seguidos na parte empírica deste estudo com a preocupação de fundamentar, na medida do possível as opções tomadas com vista à sua validação, bem como os resultados obtidos e a discussão e conclusões que lhes seguem.

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Capítulo 5

Apresentação de resultados

Neste capítulo, passamos a apresentar e a descrever os resultados obtidos nas análises estatísticas, tomando os dados demográficos e escolares e as variáveis seleccionadas. Procuramos desenvolver os aspectos exploratórios enunciados e testar as hipóteses avançadas acerca da natureza e extensão das diferenças existentes entre sujeitos no que concerne aos níveis de ajustamento e auto-regulação académica. Iniciamos esta apresentação com o estudo dos resultados (globais) obtidos nos indicadores nominais e/ou categoriais seleccionados para indicar a existência de problemas actuais e quais as principais atribuições causais do sucesso e insucesso. Depois, apresentamos e analisamos os resultados (globais) obtidos nas variáveis rácio-intervalares (níveis de ajustamento académico, confiança em si e satisfação com a Universidade, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens). A análise dos resultados inclui a indicação da sua sensibilidade relativamente a uma distribuição 'normal' e as intercorrelações e influências existentes entre e intra variáveis. Apresentamos também os resultados do estudos diferenciais efectuados em função das variáveis demográficas (género, idade e local de residência) e escolares (curso, frequência, prioridade de escolha e resultados escolares). Por último, apresentamos os dados correspondentes á análise de agrupamentos dos sujeitos através do procedimento 'classify clusters analysis', o qual, permitiu identificar e caracterizar três diferentes perfis na amostra, quanto ao uso de estratégias (cognitivas, metacognitivas e afectivas) para auto-regulação do estudo e aprendizagens, tomando em simultâneo os níveis de ajustamento académico e as abordagens do estudo.

1. Existência de problemas actuais e principais atr ibuições causais do sucesso/ insucesso

1.1. Existência de problemas actuais

Quando inquiridos sobre os principais problemas de entre um leque de treze situações possíveis com que se debatiam, actualmente, os jovens estudantes universitários, uma esmagadora maioria assinalou ter pelo menos um tipo de problema actualmente. Conforme Gráfico 5-I, de entre estes destacamos para a totalidade da amostra os problemas de ansiedade (42,1%), económicos (21,4%), atenção e concentração (56,9%), mal estar físico [dores de cabeça, cansaço, perturbações de sono,…] (33,8%) e dificuldades relacionadas com os estudos (60,7%). Outros tipos de problemas mostram-se com menor visibilidade. Destes os problemas na relação com os outros, não é um factor relevante para este grupo de alunos, no entanto

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258

para os 9,8% que assinalaram possuir este tipo de problema, o grupo-alvo reside sobretudo na família e nos colegas, sendo igualmente referidos os amigos, a mãe, o pai e o(a) namorado(a).

Gráfico 5-I: distribuição dos problemas actuais dos sujeitos da amostra (N=420) em percentagem

Perante os resultados obtidos no indicador relativo à existência de problemas actuais, optamos por considerar nas análises sequentes apenas o conjunto das respostas dadas (N=420) que se evidenciaram como as mais importantes e/ou mais directamente ligados aos objectivos deste estudo, designadamente:

• dificuldades relacionadas com estudos, com 60,7%;

• problemas de atenção e concentração, com 56,9%;

• problemas de ansiedade, com 42,1%;

• problemas relacionados com mal estar físico (dores de cabeça, cansaço, etc.), com 33,8%.

1.1.1. Indicador agregado 'problemas actuais'

De seguida, os quatro itens destacados foram tomados como parcelas para a formação do indicador agregado, designado de 'Existência de problemas actuais' e, cujas respostas foram dicotomizadas em grupos de respondentes na amostra, conforme a descrição seguinte:

Grupo1. Integra sujeitos que, no conjunto dos quatro problemas considerados, declaram não ter qualquer tipo de problema o o que corresponde a 15,7% do total da amostra;

9,014,0

42,1

2,1

21,4

56,9

4,5

33,8

3,6 4,0

12,6

60,7

9,8

010203040506070

Isolam

ento/

solidã

o

Depres

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Prob. E

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Prob na

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s

%

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CAPÍTULO 5 259

Grupo2. Integra sujeitos que, no conjunto dos quatro problemas considerados, declaram ter pelo menos um destes problemas. Corresponde a 84,3% do total da amostra.

1.1.2. Variação segundo as características dos respondentes

A seguir, efectuamos o cruzamento do indicador agregado com os dados demográficos, escolares, níveis de ajustamento académico, abordagens e medida (global) relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens, com vista a verificar se ocorreriam variações com interesse estatístico entre os dois grupos de sujeitos. Para o efeito, aplicamos o teste do 'qui-quadrado' (p< .005). No quadro seguinte são indicados os resultados obtidos no cruzamento do indicador agregado, designado por 'Problemas actuais' e as variáveis independentes. É também indicado o valor do qui-quadrado (observado), a probabilidade (observada) e o nº de graus de liberdade. Quadro 5-I: elementos estatísticos do cruzamento do indicador agregado 'problemas actuais' com as variáveis

independentes

Dados Variável

Qui-Quadrado Graus liberdade Prob (observada)

Variação

Género .23 1 n.s. Não varia Idade .08 1 n.s. Não varia

Demográficos

Residência .37 1 n.s. Não varia Curso 5,47 3 n.s. Não varia Prioridade de escolha 2,09 2 n.s. Não varia Média do secundário .29 2 n.s. Não varia

Escolares

Nota acesso à Universidade 7,44 2 <.05 Varia [Ca]: Confiança em si 18,18 2 <.0001 Varia [Su): Satisfação c/ Universidade 4,65 2 n.s. Não varia

Ajustamento Académico

medida global 12,20 2 <.01 Varia [deep] 3,35 2 n.s. Não varia [achieving] 4,15 2 n.s. Não varia [surface] 2,96 2 n.s. Não varia

Abordagem do estudo

[deep]+[achieving] 3,17 2 n.s. Não varia Uso de estratégias medida global 5,8 2 n.s. Não varia

Conforme se pode constatar no quadro anterior, ocorrem variações significativas no cruzamento

entre as variáveis independentes, 'nota de acesso à Universidade' [χ2(2,420)= 7,44: p<.05], 'confiança em si'

[χ2= 18,18: p<.0001] e medida (global) de ajustamento académico [χ2=12,20: p<.01], relativamente ao

indicador agregado 'problemas actuais', nos grupos considerados da amostra. De seguida apresentamos as respectivas tabelas de contigência e procedemos à sua leitura.

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260

1.1.2.1. Variação segundo a nota de acesso à Universidade

Quadro 5-II: variação significativa no cruzamento do indicador agregado 'problemas actuais' com a variável independente 'nota de acesso à Universidade'

Nota de acesso à Universidade Problemas actuais Nota ≤ 13 13< Nota ≤16 Nota > 16

Total

Não 35 21,9%

21 11,7%

10 12,5%

66 15,7%

Sim 125 78,1%

159 88,3%

70 87,5%

354 84,3%

Total 160 100%

180 100%

80 100%

420 100%

Qui-Quadrado (observado) = 7,44; g.l.= 2 ; Probabilidade (observada) = .02

O quadro permite constatar que, na totalidade da amostra, a maioria (84,3%%) dos sujeitos responde afirmativamente à existência de problemas actuais. No que respeita à variável 'nota de acesso á Universidade' e considerando as respostas afirmativas, a maior percentagem (88,3%) situa-se no grupo de elementos com notas de acesso à Universidade entre 13 e 16 valores (inclusive), enquanto os restantes grupos apresentam valores percentuais próximos. Verificamos também, que a maior parte das respostas negativas, com frequência observada de 21,9%, se situam no grupo de elementos com nota de acesso á Universidade inferiores ou iguais a 13 valores. O valor do qui-quadrado, foi significativo a um nível de p< .05

(χ2 =7,44; gl=2), o que leva a concluir que as proporções nos grupos de sujeitos considerados variam em

função da resposta ao indicador agregado

1.1.2.2. Variação segundo o nível de confiança em si

Quadro 5-III: variação significativa no cruzamento do indicador ‘problemas actuais’ com a variável independente 'nível de confiança em si’

Nível de confiança em si Problemas actuais Baixo Médio Elevado

Total

Não 8 6,7%

27 14,7%

31 26,7%

66 15,7%

Sim 112 93,3%

157 85,3%

85 73,3%

354 84,3%

Total 160 100%

180 100%

80 100%

420 100%

Qui-Quadrado (observado) = 18,18 ; g.l.= 2 ; Probabilidade (observada) = .000

No que concerne à variável 'confiança em si', observamos que os elementos do grupo de nível baixo apontam, maioritariamente (93,3%) no sentido afirmativo quanto à existência de problemas actuais. Algo análogo se passa com os restantes grupos, enquanto uma boa parte (26,1%) dos elementos do grupo de

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CAPÍTULO 5 261

nível elevado apontam no sentido negativo relativamente á existência de problemas actuais. O valor de qui-

quadrado foi significativo a um nível de p< .001 (χ2=18,18; gl=2), levando a crer que as proporções, nos

grupos de sujeitos considerados, variam substancialmente na resposta à existência de problemas.

1.1.1.3. Variação segundo o nível de ajustamento académico

Quadro 5-IV: variação significativa no cruzamento do indicador ‘problemas actuais’ com a variável independente ‘nível de ajustamento académico'

Nível de ajustamento académico Problemas actuais Baixo Médio Alto

Total

Não 9 8,7%

31 14,4%

26 26,0%

66 15,7%

Sim 95 91,3%

185 85,6%

74 74,0%

354 84,3%

Total 160 100%

180 100%

80 100%

420 100%

Probabilidade (observada) = .002 ; g.l.= 2 ; Qui-Quadrado (observado) = 12,20

No que concerne à variável 'ajustamento académico', observamos que os elementos do grupo de nível baixo apontam, maioritariamente (91,3%) no sentido afirmativo quanto à existência de problemas actuais e algo análogo se passa com os restantes grupos, excepto uma parte (26,0%) dos elementos do grupo de nível elevado indicam em sentido contrário. O valor de qui-quadrado foi significativo a um nível de

p< .005 (χ2=12,20; gl=2), facto que permitiu concluir que as proporções, nos grupos de sujeitos considerados, variam relativamente à resposta sobre a existência de problemas actuais.

1.2. Atribuição causal do sucesso e do insucesso

Formulamos no QIVA, uma questão que incitava os sujeitos a indicar de entre um leque de 11 atribuições possíveis, qual destas os sujeitos consideravam ser a primeira causa do seu sucesso (e do seu insucesso) escolar. Na instrução que antecipava as respostas era pedido que fosse escolhida apenas aquela atribuição que seria considerada a mais importante para cada situação (sucesso/ insucesso). As percentagens atribuídas a cada atribuição causal do sucesso e do insucesso apresentam-se a seguir, respectivamente.

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262

1.2.1. Internalidade/ externalidade pelo sucesso

As percentagens atribuídas a cada atribuição causal do sucesso escolar, nos sujeitos da amostra, podem ser observadas no gráfico circular seguinte.

Gráfico 5-II: atribuição causal do sucesso escolar nos sujeitos da amostra ( N=281)

outro (0,4%)

contexto acad.(1,4%)

professor (0,4%)

sorte ou acaso (2,1%

dif. exames (0,4%)

estratégia (6,4%)

atitude(12,1%)

motivação (20,3%)

esforço (30,2%)

inteligência (17,1%)

conhecimento (9,3%)

Na totalidade da amostra, observamos que a maior percentagem (30,2%) atribui como causa mais

importante do sucesso, o esforço, seguida da motivação (20,3%) e da inteligência (17,1%). Com menor percentagem é atribuída como causas de sucesso, a atitude adoptada para fazer face ao estudo (12,1%), os conhecimentos (9,3%) e o uso de estratégias (6,4%). O restante conjunto de atribuições externas apresentam percentagens pouco significativas.

1.2.1.1. Indicador agregado 'Internalidade / externalidade pelo sucesso'

Após observadas as percentagens de adesão a cada atribuição causal do sucesso que permitiram formar o indicador agregado 'Internalidade/externalidade pelo sucesso escolar', consideramos dois grupos de respondentes conforme atribuem o seu sucesso escolar a:

• causas internas (conhecimento, inteligência, esforço, motivação, atitude perante o estudo e estratégia usada no estudo), o que correspondente a 95,7% do total da amostra.

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CAPÍTULO 5 263

• causas externas (dificuldade dos exames, sorte ou acaso, professor, contexto académico, ou outro aspecto, o que correspondente a 4,3% do total da amostra.

Na realidade, a distribuição das respostas segundo os grupos considerados revelou pouco interesse estatístico e reduzido poder descriminatório, no total da amostra considerada (N=281). Deste modo, optamos não efectuar o cruzamento deste indicador agregado com as variáveis independentes considerados no estudo.

1.2.2. Internalidade / externalidade pelo Insucesso

As percentagens atribuídas a cada atribuição causal do insucesso nos sujeitos da amostra podem ser observadas no gráfico circular seguinte.

Gráfico 5-III: atribuição causal do insucesso nos sujeitos da amostra (N=295)

contexto académico (5,9%)

professor (4,9%)

sorte-acaso (4,5%)

dificuldade dos

exames (34,8%)

estratégia (12,9%)

atitude (15,3%)

motivação (9,4%)

esforço (7,7%)

inteligência (1,0%)

conhecimento (3,5%)

Na totalidade da amostra observou-se que a maior percentagem (33,9%) atribui como causa principal do seu insucesso, a dificuldade dos exames, seguida da atitude perante o estudo (14,9%) e da estratégia usada (12,5%). Queremos acreditar que estas últimas atribuições, tenham sido percepcionadas como correspondendo, nos próprios alunos, a uma atitude para fazer face ao estudo incorrecta ou que a(s) estratégia(s) utilizadas não tenham sido as mais adequadas. Este dado, poderá ser de grande relevância, caso corresponda efectivamente ao processo de auto-avaliação e auto-consciencialização das responsabilidades pessoais, nos indivíduos, acerca dos próprios fracassos e insucessos.

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264

Com menor percentagem, surgem as atribuições relativas à motivação (9,2%) e ao esforço dispendido no estudo (7,5%) seguidas de outras atribuições de cariz interno, embora, evidenciando fracos índices estatísticos.

1.2.2.1. Indicador agregado ' Internalidade/externalidade pelo insucesso escolar'

Modo análogo, ao efectuado no ponto 1.2.1.1. e, após analisadas as frequências dos itens parcelares que permitiram formar o indicador agregado: Internalidade/externalidade pelo insucesso escolar optamos por tomar, no total da amostra (N=295), as duas categorias distintas de atribuições causais do insucesso escolar, a saber: causas internas (cat1), o que correspondente a 48,5%, do total da amostra e a causas externas (cat2), a qual correspondente a 51,5% do total da amostra. Seguidamente, realizamos o cruzamento deste indicador agregado com as variáveis independentes e aplicamos o teste do qui-quadrado, com o objectivo de verificar eventuais variações com significado estatístico (tomando .05 como limite mínimo de significância). Os resultados obtidos podem ser observados no quadro seguinte onde se indicam, a probabilidade (observada), o valor do Qui-quadrado (observado) e o nº de graus de liberdade

1.2.2.2. Variação segundo as características dos respondentes

Quadro 5-V: elementos estatísticos do cruzamento do indicador agregado 'internalidade/externalidade do insucesso escolar' com as variáveis independentes

Dados Variável Qui-Quadrado Graus liberdade

Probab. (observada)

Variação

Género 1,61 1 n.s. Não varia Idade 2,35 1 n.s. Não varia

Demográficos

Residência 3,66 1 n.s. Não varia Curso 2,52 3 n.s. Não varia Prioridade de escolha ,21 2 n.s. Não varia Média do secundário ,31 2 n.s. Não varia

Escolares

Nota acesso Universidade 1,49 2 n.s. Não varia [Ca]: Confiança em si ,72 2 n.s. Não varia [Su): Satisfação c/ Universidade 2,84 2 n.s. Não varia

Ajustamento Académico

Medida global ,20 2 n.s. Não varia [deep]l 9,06 2 <.05. Varia [achieving] ,39 2 n.s. Não varia [surface] 3,15 2 n.s. Não varia

Abordagens do estudo

[deep+achieving] 4,86 2 n.s. Não varia Uso de estratégias medida global 3,44 2 n.s. Não varia

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CAPÍTULO 5 265

Conforme se pode constatar a partir do quadro anterior, ocorre uma variação significativa no cruzamento do indicador agregado com as variáveis independentes. Esta variação é obtida no cruzamento

do indicador com a dimensão referente a uma abordagem [deep] [χ2(2,295)= 9,06: p<.05]. De seguida

apresentamos a respectiva tabela de contigência.

1.2.2.2.1. Variação segundo uma abordagem [deep]

Quadro 5-VI: variação significativa no cruzamento do indicador ‘Internalidade/externalidade do insucesso’ com a variável independente ' [deep]'

Abordagem [deep]

Internalidade/externalidade do insucesso escolar Fraca Média Forte

Total

Causas internas 47 63,5%

64 42,7%

32 45,1%

66 48,5%

Causas externas 27 36,5%

86 57,3%

39 54,9%

354 51,5%

Total 74 100%

150 100%

71 100%

420 100%

Qui-Quadrado (observado) = 9,06 ; g.l.= 2 ; Probabilidade (observada) = .001

O valor de qui-quadrado apresentou-se significativo a um nível de p< .01 (χ2=9,06; gl=2), permitindo

concluir que variam as proporções na internalidade / externalidade do insucesso escolar relativamente aos grupos considerados numa abordagem do estudo do tipo [deep]. Na totalidade da amostra, a maioria (51,5%) dos respondentes atribui a causas externas o seu insucesso escolar. No que respeita à variável '[deep]', observamos que a maioria (63,5%) dos elementos do grupo de nível mais fraco, atribui a causas internas o seu insucesso escolar, enquanto o grupo classificado com um nível médio neste tipo de abordagem atribui o seu insucesso escolar, maioritariamente (57,3%) a causas externas. Algo semelhante se passa para o grupo classificado com nível mais elevado, ao indicar maioritariamente (54,9%) causas externas como sendo aquelas que são responsáveis pelo seu insucesso escolar.

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266

2. Níveis de ajustamento, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

2.1. Distribuição dos níveis de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

As medidas de tendência central, dispersão e sensibilidade1 na distribuição (N=420) dos resultados globais obtidos em cada uma das variáveis rácio-intervalares consideradas pode ser observada no Quadro 5- VII. Quadro 5-VII: medidas de distribuição e sensibilidade dos resultados nos níveis de ajustamento académico, abordagens

e uso de estratégias reguladoras

Assim

etria

Curto

se

Leque

Variáveis Média Md DP i) ii) Min - Max Ajustamento académico [Ca]: Confiança em si [Su]: Satisfação com Universidade : medida global

25,72 22,57 48,29

26 23 49

5,34 3,31 7,33

- - -

↓ ↓ ↓

8-38 12-30 26-67

Abordagens [deep] [achieving] [[deep + achieving] [surface] Estratégias auto-reguladoras [F1]: Transformação e manipulação [F2]: Planeamento e rotinas [F3]: Gestão e monitorização [F4]: Aquisição e recepção estímulos [F5]: Incentivo motivacional : medida global

24,38 20,50 44,88 21,04

25,27 25,06 31,87 15,38 5,60

105,99

24 21 45 21

25,5 26 32 15 5,5 106

4,36 3,47 6,71 3,48

6,18 3,83 4,96 3,64 2,78

14,91

- - - - - - - - + -

↑ ↓ ↓ ↓

↓ ↑ ↓ ↓ ↓ ↑

8-36 10-29 25-62 11-30

7-41 8-30

16-42 5-24 2-12

51-145

i) (+) : Assimetra positiva (soma de desvios acima da média); (-) : Assimetria negativa (soma dos desvios abaixo da média);

ii) ↑ : Curva ligeiramente leptocúrtica (afunilada); ↓ : Curva ligeiramente platicúrtica (achatada); [Outros casos, curva mesocúrtica: Normal] Em termos gerais, os resultados indiciam que a maioria dos alunos têm representações favoráveis acerca da Universidade, está confiante em si mesmo enquanto aluno do 1ºano e, seguramente sente que se ajustou ao contexto académico. Estes resultados sugerem que a maioria dos sujeitos manifesta uma

1 simbolizamos as ligeiras oscilações destes coeficientes (assimetria e curtose) para uma mais fácil visualização.

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CAPÍTULO 5 267

abordagem do tipo [achieving] relativamente ao estudo, apresentando nas restantes abordagens medidas de tendência central inferiores á média geral. Referimo-nos, por exemplo a uma atitude do tipo [deep] ou à sua contraposição [surface]. Acerca das abordagens adoptadas, e tal como levantado na revisão da litertura e sugerido por alguns autores (ver Anexo1) optamos por incluir também na análise, os resultados obtidos na dimensão conjunta [deep+ achieving] tomada a partir dos indicadores de abordagem [deep] e [achieving]. Neste sentido, observamos que a maioria dos sujeitos apresenta uma ligeira pontuação acima da média nas cotações registadas neste indicador conjunto. Pensamos que algumas destas cotações médias reflectem o efeito moderador das cotações obtidas nas variáveis parcelares. Relativamente ao uso de estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais, os índices descritivos relativos a cada uma destas variáveis evidenciam, de um modo geral, que a maioria dos sujeitos da amostra indica usar regularmente estratégias cognitivas de transformação e manipulação da informação e de planeamento e sequências organizadas (rotinas) de estudo e, ainda estratégias cognitivas e metacognitivas de gestão e monitorização do material e próprio estudo. Por outro lado, os índices estatísticos também sugerem que a maioria dos sujeitos, recorre menos a estratégias afectivas de incentivo motivacional (para frequência de aulas) e indica fraca utilização de estratégias cognitivas para aquisição e recepção de estímulos, o que sugere baixos níveis de atenção, concentração e participação activa nas aulas e esclarecimento de dúvidas através dos docentes. Verificarmos também que os coeficientes de assimetria e curtose se situaram bastante próximos de zero, apoiando uma distribuição 'normal' ou 'gaussiana' para cada um dos indicadores e variáveis consideradas, atenuando a eventual tendência da desejabilidade social nas respostas aos respectivos itens.

2.2. Intercorrelações entre níveis de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

No quadro 5-VIII, apresentamos os coeficientes de correlação r de Bravais-Pearson2 entre cada um dos indicadores e variáveis consideradas.

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268

Quadro 5-VIII: intercorrelações dos resultados nos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias

auto-reguladoras das aprendizagens

Ajustamento académico

Abordagens do estudo Estratégias auto-reguladoras

[Ca] [Su] Global

[deep

]

[achie

ving]

[deep

+

achie

ving]

[surfa

ce] [F1] [F2] [F3] [F4] [F5] Global

[Ca]

[Su] .40**

Ajus

tamen

to

Global .91** .75**

[deep] .37** .21** .36**

[achieving] .33** .34** .40** .42** [deep + achieving] .43** .34** .47** .89** .82**

Abor

dage

ns

[surface] .01 .09 .04 .15** .17** .18**

[F1] .17** .17** .20** .44** .51** .55** .18**

[F2] .07 .13** .11* .25** .46** .40** .20** .55**

[F3] .24** .23** .28** .32** .52** .49** .17** .49** .47**

[F4] .24** .18** .25** .43** .42** .51** .10* .49** .40** .41**

[F5] .06 .04 .06 .01 .04 02 .07 .01 -.11* -.01 .02

Estra

tégias

auto

-regu

lador

as

Global .24** .24** .28** .46** .61** .63** .22** .85** .72** .76** .70** .17**

(**)- Correlação significativa ao nível de .001 (2-tailed)

(*) - Correlação significativa ao nível de .005 (2-tailed) A observação do quadro das intercorrelações entre as vários indicadores e variáveis em estudo, permite fazer a seguinte interpretação: � As variáveis do ajustamento académico encontram-se moderadamente correlacionadas entre si (r=.40:

p<.001), no entanto, quando considerado uma medida global de ajustamento académico os valores de correlação com as variáveis sobe para valores de r (r=.91: p<.001) e (r=.75: p<.001), respectivamente para as variáveis da confiança em si e satisfação com a Universidade.

� Quando correlacionadas as variáveis do ajustamento académico com outros indicadores e/ou variáveis do estudo, constata-se que os valores, de um modo geral, são fracos ou muito fracos, o que, embora com algumas associações estatisticamente significativas, sugere uma relativa independência em função das restantes áreas da análise.

2 Ver Howell, 1982 e D’Hainaut (1992, vol.II: 23)

Comment: H bcvxvn, º.çoijmyugrtdhu87ij9o0’p8i7008-

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CAPÍTULO 5 269

� Mas, quando tomada, globalmente, uma medida de ajustamento académico encontramos uma corrrelação positivamente moderada (r=.40: p<.001) entre esta medida e uma abordagem do estudo do tipo [achieving].

� Mais, se considerarmos a dimensão conjunta [deep+achieving] então verificamos que os índices de correlação sobem, apresentando-se positivamente moderadas relativamente aos indicadores: [Ca]: Confiança em si (r=.43: p<.001); [Su]: satisfação com Universidade (r=.34: p<.001) e, ainda com a medida global de ajustamento (r=.47: p<.000).

� Relativamente aos três indicadores correspondentes a cada uma das atitudes perante o estudo, verificamos que a dimensão correspondente à abordagem [achieving] apresenta uma correlação moderadamente positiva (r=.42: p<.001) com a dimensão de abordagem [deep] e uma correlação fraca (r=.17: p<.001) com uma dimensão de abordagem [surface].

� São também os dois primeiros indicadores [deep] e [achieving] a correlacionar-se moderadamente no sentido positivo com a variável [F1], respectivamente (r=.44: p<.001) e (r=.51 p<.001) e com a medida global, considerada para o uso de estratégias auto-reguladoras, respectivamente (r=.46: p<.001) e (r=.61: p<.001).

� A variável [achieving] correlaciona-se moderada e positivamente com as variáveis [F2] com (r=.46: p<.001), [F3] com (r=.52: p<.001) e [F4] com (r=.42: p<.00).

� Quando tomada o indicador conjunto [deep+achieving], os índices de correlação tendem a elevar-se relativamente a cada uma das restantes variáveis, assumindo índices de correlação positivamente

moderados (mínimo) de .40 ≤ r ≤ .63 (máximo), ambos significativos (p<.001), com excepção da variável

[F5] com coeficiente de correlação quase nulo (r=.02: n.s.). Este facto, reforça a ideia que esta medida conjunta [deep+achieving], é a que melhor reflecte uma atitude na abordagem ao estudo nos estudantes universitários inquiridos(ver ponto anterior).

� Quanto ao uso de estratégias auto-reguladoras, observámos que as variáveis se encontram moderadamente intercorrelacionadas, com excepção da variável [F5] que apresenta correlações muito fracas (quase nulas) quer com os restantes tipos de estratégias (consistente com os resultados de validade interna) quer também com os outros indicadores e variáveis do estudo. Com efeito, estes resultados parecem apoiar o carácter independente desta variável [F5] relativamente ás restantes.

� Quando tomado uma medida global relativa ao uso de estratégias auto-reguladoras, esta, apresenta

índices de correlação positivamente fortes (mínimo) de .70 ≤ r ≤.85 (máximo), ambos significativos

(p<.001) com os outros factores, excepto com o factor [F5] com o qual apresenta índice de correlação muito fraco (r=.17: p<.001). Aliás, em reforço do referido antes, esta situação e os restantes índices de

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270

correlação levam-nos a pensar que, de facto, esta variável [F5]3 não se integra facilmente quer no conjunto das outras variáveis que constituem o indicador do uso de estratégias auto-reguladoras (ou no seu conjunto, contribuem para uma medida global) quer relativamente aos outros indicadores do estudo.

Das restantes intercorrelações entre variáveis, muito embora algumas atinjam significância estatística, os seus valores podem considerar-se irrelevantes pelo que fomos levados a rejeitar qualquer hipótese que postulava eventuais sobreposições destas variáveis. Porém, face aos resultados obtidos, reservamos uma atenção particular à variável [F5] e fomos verificar se a interpretação dos resultados sofria (ou não) especial alteração quando, esta, era excluída do indicador. Não registamos alterações significativas, pelo que nossa opção foi no sentido de considerar todos as indicadores e variáveis, tal como estabelecidas á partida. De seguida, ainda no quadro da validade dos construtos em análise, fomos observar os resultados obtidos nos factores resultantes do redimensionamento dos instrumentos com vista à estimação de eventuais efeitos de moderação para cada um dos indicadores considerados.

1.3. Capacidade preditiva do conjunto das variáveis intervalares e estrutura factorial subjacente aos níveis de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

No quadro seguinte encontram-se as cargas factoriais resultantes de uma análise de componentes principais seguida de rotação ortogonal (método Varimax) tomando as três primeiras componentes que, em conjunto explicam 65,66% da variância total dos resultados. Pretende-se com esta estrutura factorial estimar possíveis diferenciações dos resultados obtidos nos vários indicadores e variáveis em estudo, bem como tentar explorar algumas sugestões metodológicas. Os resultados obtidos vão de encontro às indicações encontradas na análise factorial dos itens que serviu de base ao dimensionamento dos instrumentos. Verifica-se, por um lado a importância de um factor mais global que conjuga as várias abordagens de estudo ([deep], [achieving] e/ou [deep+achieving]) e praticamente todos os factores correspondentes ao uso de estratégias cognitivas e metacognitivas para a auto-regulação das aprendizagens. Por outro lado, verifica-.se alguma diferenciação entre este conjunto de dados e os níveis de confiança em si, satisfação com a Universidade e medida de ajustamento académico. Por último, registamos uma aproximação entre o indicador de abordagem [surface] e o uso de estratégias de incentivo motivacional (factor [F5]) eventualmente por este reunir menor especificidade.

3 [F5]: uso de estratégias de incentivo motivacional (para frequência de aulas)

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CAPÍTULO 5 271

Quadro 5-IX: solução ortogonal dos resultados nos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias

auto-reguladoras das aprendizagens

Indicadores e variáveis Comunalidade Componentes

% 1 2 3 Ajustamento Académico [Ca]: Confiança em si [Su]: Satisfação c/ Universidade : medida global Abordagens [deep] [achieving] [deep + achieving] [surface] Estratégias auto-reguladoras [F1]: Transformação e manipulação [F2]: Planeamento e rotinas [F3] Gestão e monitorização [F4]: Aquisição/ recepção estímulos [F5]: Incentivo motivacional : medida global

76 55 94

46 61 77 28

68 59 54 49 83 93

.57

.69

.73

.81

.77

.71

.68

.93

.87 .73 .96

.49

.47

.90

Eigenvalue

% de Variância

4,53

34,84

2,89

22,21

1,12

8,61 Método de extracção: Principal components analysis Método de rotação: Varimax com normalização Kaiser

Mais explicíto, no factor1 que explica 34,84% do total de variância e valor próprio= 4,53 (rodado), saturam positivamente acima de (.57) as variáveis [deep] e [achieving] (e a dimensão conjunta destas duas) e as quatro primeiras variáveis relativas ao uso de estratégias auto-reguladoras. O factor 2 liga-se à dimensão do ajustamento académico, salientando as duas variáveis e a medida global acima de (.73) e, ainda a dimensão [deep+achieving] com carga factorial acima do critério mínimo (.40). Este facto, indicia alguma independência entre níveis de ajustamento académico (confiança em si e satisfação com a Universidade) adoptados e as variáveis associadas aos processos auto-reguladores das aprendizagens, mas uma relativa dependência quando se toma a dimensão conjunta [deep+achieving]. Aliás, este resultado é consistente com as investigações efectuadas e que foram descritas na revisão de literatura. Não obstante, futuras análises poderão confirmar ou infirmar, esta e outras, hipóteses de ligação entre estas dois indicadores.

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272

Por outro lado, nota-se que o distanciamento dos valores próprios entre factores, assim como o seu peso na variância total, parece reflectir um factor principal (mais geral, factor1) salientando as várias variáveis correspondentes em estudo e, um outro factor (factor2) que assume alguma especificidade na sua realização. Em último, o factor 3 salienta fortemente (.90) a variável [F5] e a variável [surface] com (.47). Este dado, algo curioso, levanta no entanto muitas dúvidas acerca quanto à sua interpretação. Além disso equaciona o interesse pelo estudo deste factor, conduzindo-nos à hipótese alternativa4 entre duas situações possíveis.

2.4. Medida (linear) da influência das diferenças sobre o uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

2.4.1. Influência dos dados demográficos sobre o uso de estratégias auto-reguladoras

No quadro seguinte apresentamos o resumo do procedimento de regressão múltipla por etapas ('stepwise'), considerando os dados demográficos (género, idade e residência) como variáveis independentes e os resultados em cada um dos factores e medida global do instrumento [Che] como variáveis dependentes. Quadro 5- X: resumo da regressão múltipla dos dados demográficos sobre o uso de estratégias auto-reguladoras das

aprendizagens

Variável Dependente

Modelo Variável independente

MultR r2 ANOVA F- rácio

[Factor1] 1 Género .30 .09 39,96*** [Factor2] 1

2 Género

Residência .30 .31

.09

.10 40,61*** 22,41***

[Factor3] 1 Género .19 .04 15,87*** [Factor4] 1 Idade .12 .01 5,76* [Factor5] … … … … …

Medida global 1 Género .28 .08 34,93***

(*)- Significativo a menos de .05; (***)- Significativo a menos de .001

4 Hipótese 1) Tem-se em conta o factor, supondo que este reúne especificidade na sua realização e não se encontra agrupado em factor de ‘grande grupo’ e, então, o factor3 parece representar um determinado tipo de abordagem (negativa) relativamente ao estudo, consolidada por uma necessidade de incentivo motivacional para frequentar as aulas do curso. Esta situação não nos parece totalmente descabida de senso, no contexto em que ocorre a investigação e vem reforçar algumas perspectivas investigacionais referenciadas

Hipótese 2) Não se tem em conta o factor, supondo que os resultados correspondem a efeitos residuais ou considerando que este factor não reúne especificidade suficiente para poder representar algum construto ou dimensão, até porque se trata do último factor a ser extraído e o menos importante do conjunto dos factores (valor próprio=1,12 e 8,61% da variância total).

Obs: Optamos por considerar para o presente estudo a segunda destas hipóteses, por nos parecer ser aquela que se apresenta a mais concertada com as análises efectuadas até ao momento e, por conseguinte mais próxima dos seus objectivos e limitações.

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CAPÍTULO 5 273

Das três variáveis independentes consideradas na análise, verificamos que o género é a variável que apresenta mais contribuições (8-9%) para a explicação da variância dos resultados nos factores. Com efeito, o género contribui significativamente (p<.001) para explicar, individualmente, a variância dos resultados nos factores. Isto é, no factor1 (uso de estratégias cognitivas de transformação e manipulação da informação) com 9%; no factor 3 (uso de estratégias cognitivas e metacognitivas de gestão e monitorização do estudo) com 4%; e, na medida global com 8%. A variável género contribui também com cerca de 9% para explicar a variância, no factor 2 (uso de estratégias cognitivas de planeamento e rotinas) em conjunto com a variável residência [esta explica 10% da variância, F(2,406)=22,41:p<.001]. Destaca-se ainda o contributo fraco (1%), mas, estatisticamente significativo (p< .05) da variável independente 'Idade', sobre a explicação da variância dos resultados no factor 4 - correspondente ao uso de estratégias cognitivas de aquisição e recepção de estímulos.

2.4.2. Influência dos dados escolares sobre o uso de estratégias auto-reguladoras

No quadro seguinte apresenta-se o resumo da regressão múltipla considerando os dados escolares (curso, prioridade de escolha, média obtida no final do secundário e nota de acesso à Universidade) como variáveis independentes e os resultados em cada um dos factores e medida global do instrumento [Che] como variáveis dependentes. Quadro 5-XI: resumo da regressão múltipla dos dados escolares sobre o uso de estratégias auto-reguladoras das

aprendizagens

Variável Dependente

Modelo Variável independente

MultR r2 ANOVA F (regressão/residual)

[Factor1] 0 … … … … [Factor2] 1

2 Média E. Sec. Prior. escolha

.11

.16 .01 .02

4,78* 5,13**

[Factor3] 1 2

Média E. Sec. Prior. escolha

.18

.21 .03 .04

13,98*** 9,12***

[Factor4] 0 … … … … [Factor5] 0 … … … …

Medida global 1 2

Média E.Sec. Prior. escolha

.12

.15 .01 .02

5,70* 5,10**

(*)- Significativo a menos de .05; (**)- Significativo a menos de .01 ; (***)- Significativo a menos de .001

Verificamos que as variáveis 'média obtida no final do secundário' e a 'prioridade de escolha do curso' são as melhores preditoras relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras quer quando tomada a medida global quer quando considerados alguns dos factores, individualmente. Mas, sendo

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274

estatisticamente significativas (p<.001 ou p<.05) as percentagens de contribuição destas variáveis independentes para a variância dos resultados nos factores, apresentam-se, contudo, bastante fracas (entre 1 a 4%). Por outro lado, segundo os resultados obtidos na análise de regressão linear, os factores 1, 4 e 5 não são preditos por qualquer das variáveis independentes correspondentes aos dados escolares.

2.4.3. Influência dos níveis de ajustamento académico sobre o uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

No quadro seguinte apresenta-se o resumo do procedimento de regressão múltipla, considerando os níveis de ajustamento académico (medida global), confiança em si e satisfação com a Universidade, tomadas como variáveis independentes e os resultados obtidos em cada um dos factores e medida global correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras, como variáveis dependentes. Quadro 5-XII: resumo da regressão múltipla dos níveis de ajustamento académico sobre o uso de estratégias auto-

reguladoras

Variável Dependente

Modelo Variável independente MultR r2 ANOVA F- rácio

[Factor1] 1 Ajustamento(global) .20 .04 17,67*** [Factor2] 1 Satisfação c/Univers. .13 .02 7,33** [Factor3] 1 Ajustamento(global) .28 .08 34,96*** [Factor4] 1 Ajustamento(global) .25 .06 28,88*** [Factor5] 0 … … … …

Medida global 1 Ajustamento(global) .28 .08 35,61***

(*)- Significativo a menos de .05 ; (**)- Significativo a menos de .01 ; (***)- Significativo a menos de .001

Constatamos que o indicador do ajustamento académico (medida global) é o melhor preditor da variância dos resultados nos factores relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras. As

contribuições, não sendo fortes (.04≤ R2 ≤.08) são, no entanto, de algum interesse estatístico (índices de

significância de F-rácio a menos de<.001). Assinala-se ainda, a influência significativa (p<.01), embora fraca (2%), na variância dos resultados no factor 2 (uso de estratégias cognitivas de planeamento e rotinas de comportamento) em função da variável independente [Su].

2.4.4. Medida da influência das abordagens do estudo sobre o uso de estratégias auto-reguladoras

No quadro seguinte apresenta-se o resumo do procedimento de regressão múltipla, considerando os resultados nas variáveis [deep], [achieving] e [surface] e ainda a dimensão conjunta [deep + achieving], como

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CAPÍTULO 5 275

variáveis independentes e os resultados obtidos em cada um dos factores e medida global correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras, como variáveis dependentes. Quadro 5-XIII: resumo da regressão múltipla das abordagens do estudo sobre o uso de estratégias auto-reguladoras

das aprendizagens

Variável Dependente

Modelo Variável independente

MultR r2 ANOVA F- rácio

[Factor1] 1 2 3 4

[deep+achieving] [deep+achieving], [achieving] [deep], [achieving], [surface] [deep], [achieving]

.55

.56

.57

.57

.30

.31

.32

.32

178,28*** 93,46*** 65,97*** 97,75***

[Factor2] 1 2

[achieving] [surface]

.46

.48 .21 .23

114,22*** 61,94***

[Factor3] 1 2

[achieving] [deep]

.52

.53 .27 .28

152,77*** 81,49***

[Factor4] 1 [deep+achieving] .51 .26 144,76*** [Factor5] 0 … … … …

Medida global 1 2 3 4 5

[deep+achieving] [deep+achieving], [achieving] [deep+achieving], [achieving], [surface] [deep+achieving],[achieving],[surface],[deep] [achieving],[surface],[deep]

.63

.65

.66

.66

.66

.39

.42

.43

.44

.44

268,78*** 153,04*** 106,10*** 81,17***

108,23***

(*) Significativo a menos de .05 ; (**) Significativo a menos de .01 ; (***) Significativo a menos de .001

Os níveis de significância (p<.001) dos valores de F-rácio mostram que todas os indicadores da abordagem contribuem para explicar a variância no uso de estratégias auto-reguladoras quer globalmente quer tomando os factores individualmente. Contudo, as variáveis [achieving], [deep] e conjunta [deep+achieving], parecem ser aquelas que, isoladamente, são melhor preditoras dos resultados em cada um dos factores. Com efeito, no factor 1, que correspondente ao uso de estratégias cognitivas de transformação e manipulação da informação, verificamos que as duas variáveis [deep] e [achieving] explicam o mesmo valor de percentagem (32%) de variância no factor, que quando tomadas em simultâneo com a dimensão [surface] para predizer o factor. Por outro lado, quando tomada a dimensão conjunta [deep+achieving] esta, tomada isoladamente, é responsável por 30% da variância dos resultados [F(1,418)=268,78: p<.001]. Quanto ao factor 2 (uso de estratégias cognitivas de planeamento e rotinas) são as variáveis [achieving] e [surface] as principais responsáveis com, respectivamente, 21% e 23% pela variação dos resultados neste factor. Enquanto no factor 3 (uso de estratégias cognitivas e metacognitivas de gestão e monitorização) é a dimensão [achieving] com 27% (p<.001) e a dimensão [deep] com 28% (p<.001) as principais responsáveis pela variação dos resultados. São os resultados obtidos na dimensão conjunta [deep+ achieving] a explicar, significativamente (p<.001), cerca de 26% da variância dos resultados no factor 4 (uso de estratégias cognitivas de aquisição e

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276

recepção de estímulos).Quando considerada a medida global, verificamos que não se altera a percentagem de variância explicada (44%) quer se considere os três indicadores de abordagem ([deep], [achieving] e [surface]) que constituem o instrumento original quer se considere também a contribuição do indicador conjunto [deep+achieving] na equação de regressão.

3. Estudos diferenciais

3.1. Efeitos dos dados demográficos e escolares sobre os níveis de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico

A fim de caracterizar os níveis de ajustamento académico, nos sujeitos, passamos de seguida a apresentar os resultados obtidos nas variáveis (confiança em si, satisfação académica e medida global de ajustamento académico). Julgamos com esta descrição dos resultados obtidos, facilitar a compreensão de alguns aspectos exploratórios nomeadamente, aqueles que consideram os efeitos de moderação de algumas das variáveis demográficas e escolares nos níveis de ajustamento académico, assim como, identificar eventuais diferenças (significativas) entre e intra grupos. Com vista à validação externa e ao controlo das variáveis independentes, não verificamos quaisquer efeitos estatisticamente significativos (p<.005) na interacção entre as diferentes variáveis tomadas. Por conseguinte, passamos ao segundo momento, ou seja, á análise das influências (simples) e constatamos a existência de alguns efeitos significativos dos dados demográficos (género, idade e local de residência) e escolares (curso, prioridade de escolha, médias obtidas no final do secundário e de acesso á Universidade) sobre os níveis médios obtidos para a confiança em si, satisfação com a Universidade e medida (global) de ajustamento académico.

3.1.1. Efeitos dos dados demográficos

Com vista á análise de eventuais efeitos entre dados demográficos e níveis de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico, fixamos para investigação hipótese de trabalho (ou nula) Ho1: 'Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados demográficos (género, idade, local de residência) relativamente aos níveis médios de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico'. Os resultados obtidos, tomando a totalidade (N=420) da amostra, podem ser observados no quadro seguinte:

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CAPÍTULO 5 277

Quadro 5-XIV: índices estatísticos e valores do teste t- Student na comparação de médias dos resultados nos níveis de

ajustamento académico segundo dados demográficos

Confiança em si

Satisfação com Universidade

Ajustamento Académico (medida global)

Média DP t Média DP t Média DP t

Feminino 25,53 5,50 22,66 3,27 48,19 7,32

Masculino 25,96 5,13 22,46 3,35 48,41 7,36

Géne

ro

Total 25,72 5,34 -.82 n.s. 22,57 3,31 .63 n.s. 48,29 7,33 -.31 n.s.

≤ 21anos 25,68 5,39 22,63 3,24 48,31 7,31

> 21 anos 26,36 4,29 21,59 4,27 47,95 7,68 Idad

e

Total 25,72 5,34 .20 n.s. 22,57 3,31 -1.5 n.s. 48,29 7,33 .22 n.s.

Local 25,79 5,18 22,57 3,64 48,37 7,10

Deslocado 25,66 5,47 22,58 3,08 48,24 7,51

Resid

ência

Total 25,71 5,36 .24 n.s. 22,58 3,29 -.01 n.s. 48,29 7,31 -.91 n.s.

(n.s.) Não significativo [p>.05: gl (graus de liberdade) = 418]

Como se pode constatar no quadro anterior que inclui as médias, desvio padrão e valores do teste t- Student das cotações obtidas para a confiança em si, satisfação com a Universidade e medida global por características pessoais (género, idade e residência) dos sujeitos da amostra, registamos não haver qualquer efeito (diferença) estatisticamente significativo5.

3.1.2. Efeitos dos dados escolares

Com o mesmo objectivo que presidiu à apresentação anterior e, de acordo com as assunções tomadas, indicamos de seguida as cotações médias obtidos no ajustamento académico relativamente aos dados escolares (curso, prioridade de escolha e resultados escolares obtidos no final do secundário). Igual modo, pretendemos testar a hipótese Ho2: 'Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados escolares (média obtida no ensino secundário, nota de acesso á Universidade, curso frequentado, prioridade de escolha do curso) relativamente aos níveis médios de satisfação com a Universidade, confiança em si e medida de ajustamento académico'. Os resultados obtidos, tomando a totalidade da amostra (N=420), podem ser observados no quadro seguinte.

5 até ao nível de .05, considerando gl (graus de liberdade) = 418 para um valor crítico de de t = 1.960 para rejeição de Ho [obtido analisando uma tabela de distribuição de t, tomando α=.05 e/ou α=.001 (two-tailed) de com gl (graus liberdade)= ∞]( ver Appendix C; conforme Frankfort- Nachmias, 1997).

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278

Quadro 5-XV: índices estatísticos e valores de F-Fisher na comparação de médias dos resultados nos níveis de

ajustamento académico segundo os dados escolares

Confiança em si

Satisfação com Universidade

Ajustamento académico (medida global)

Média DP F-rácio Média DP F-rácio Média DP F-rácio

Ciên. Plan.Gestão 26,48 5,03 22,69 2,91 49,17 6,64

Ciên. Computação 26,41 5,31 22,45 3,44 48,85 7,89

Ciên. Naturais 24,54 5,44 22,71 3,52 47,24 7,48

Ciên. Aplicadas 25,67 5,41 22,40 3,40 48,08 7,42

Curso

Total 25,72 5,34 3,0* 22,57 3,31 .25 n.s. 48,29 7,33 1,48 n.s.

1ª Escolha 26,85 5,14 22,75 3,19 49,59 7,07

2ª Escolha 25,70 5,10 22,47 3,39 48,18 7,11

3ª+ Escolha 24,03 5,40 22,38 3,43 46,41 7,25 Prior

idade

Total 25,72 5,34 11,39** 22,57 3,31 .55 n.s. 48,29 7,33 7,63**

Nota ≤ 13 25,38 5,32 22,61 3,35 47,99 7,41

13 < Nota ≤16 26,05 5,15 22,53 3,21 48,58 7,13

Nota > 16 25,25 5,72 22,63 3,50 47,88 7,70

Média

secu

ndár

io

Total 25,72 5,34 1,03 n.s. 22,57 3,31 .03 n.s. 48,29 7,33 .42 n.s.

Nota ≤ 13 25,90 5,23 22,83 3,05 48,73 7,00

13 < Nota ≤16 25,62 5,43 22,24 3,48 47,86 7,81

Nota > 16 25,57 5,34 22,79 3,35 48,36 6,85

Nota

de ac

esso

Total 25,72 5,34 .15 n.s. 22,57 3,31 1,56 n.s. 48,29 7,33 .60 n.s.

(n.s.) Não significativo (p>.05)

(*)- significativo a .05 ; (**)- significativo a .001 A análise do quadro anterior (que inclui as médias, desvio padrão e valores de variabilidade F-rácio de Fisher6, no teste oneway-ANOVA, às cotações obtidas para a confiança em si, satisfação com a Universidade e medida global relativamente aos dados escolares, permitiu (embora com valores de F- Fisher, em alguns dos casos pouco elevados) detectar alguns efeitos com interesse estatístico, nomeadamente, nas variáveis relativas à confiança em si como função da área do curso frequentado [F(3,416)= 3,00 : p<.05] e da prioridade de escolha do curso [F(2,417)= 11,39 : p<.001]; e, ainda o efeito [F(2,417)= 7,63 : p< .001] da prioridade de escolha do curso nas cotações médias da medida global do ajustamento académico.

6 F- rácio (Fisher) das médias dos quadrados é igual ao quociente entre a estimativa da variância entre grupos e a estimativa da variância intra grupos (Wright, 1997).

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CAPÍTULO 5 279

Á menor diferenciação dos resultados nas restantes variáveis poderá não ser totalmente alheio o condicionalismo metodológico relativo às diferenças de efectivos nos grupos considerados para os sujeitos da amostra. Na folha estatística das comparações múltiplas (contrastes) entre médias, quer o teste de Scheffé quer o teste TukeyHSD não apresentaram diferenças particulares entre si, ao que optamos (sem qualquer critério específico) por considerar apenas o teste TukeyHSD. Verificamos que algumas diferenças entre cotações médias se apresentavam estatisticamente significativas, nomeadamente, nos grupos:

• entre o curso da área das ciências naturais e ciências aplicadas em função da média na confiança em si (Diferença= 1,35: p<.05: TukeyHSD);

• entre a 1ª e 3ª + prioridades de escolha de curso e a média de confiança em si (Diferença= 2,82 : p<.001: TukeyHSD); e, entre a 1ª e 3ª prioridade de escolha do curso e a medida global de ajustamento académico (Diferença= 3,19 : p<.001 : TukeyHSD).

3.2. Efeitos dos dados demográficos e escolares sobre as abordagens do estudo

Com esta análise, procuramos igualmente conhecer eventuais efeitos sobre as cotações médias dos resultados obtidas nos diferentes indicadores das abordagens do estudo e, se este efeito seria (ou não) estatisticamente significativo. Mais concreto, pretendemos saber se existiam diferenças entre cotações médias e se estas seriam de interesse estatístico para cada uma das variáveis [deep], [surface], [achieving] e [deep+achieving] relativamente a cada um dos grupos considerados para os dados demográficos e escolares.

3.2.1. Efeitos dos dados demográficos

Objectivados para analisar os efeitos principais (simples) de cada uma das variáveis presentes, fomos testar a hipótese Ho3: ' Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados demográficos (género, idade, local de residência) relativamente às cotações médias obtidas em cada uma das abordagens [deep], [surface], [achieving] e [deep+achieving]'. Os resultados obtidos para a totalidade da amostra (N=420) podem ser observados no quadro seguinte.

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280

Quadro 5-XVI: índices estatísticos e valores do teste t- Student na comparação de médias dos resultados nas abordagens do estudo segundo dados demográficos

Abordagens [achieving]

[deep] [deep+achieving] [surface]

Média DP Média DP Média Média DP

Feminino 21,24 3,24 19,93 3,71 45,94 6,52 21,21 3,37

Masculino 19,56 3,53 19,42 4,03 43,55 6,74 20,83 3,62

Total 20,50 3,47 19,71 3,86 44,88 6,71 21,04 3,48 Géne

ro

t-Student 5,07** 1,36 n.s. 3,67** 1,13 n.s.

≤ 21 anos 20,48 3,44 19,61 3,84 44,76 6,68 21,08 3,49

> 21 anos 20,82 4,01 21,50 3,81 47,14 7,15 20,27 3,28

Total 20,50 3,47 19,71 3,86 44,88 6,71 21,04 3,48 Idad

e

t-Student .85 n.s. .34 n.s. -1,62 n.s. -2,14n.s.

Local 20,45 3,59 19,75 3,98 44,91 6,83 21,47 3,49

Deslocado 20,53 3,42 19,70 3,82 44,84 6,68 20,73 3,45

Total 20,50 3,47 19,72 3,87 44,90 6,72 20,99 3,49 Resid

ência

t-Student -.24 n.s. .13 n.s. .02 n.s. 2,07 n.s.

(n.s.) Não significativo [p>.05: gl (graus de liberdade) = 418]

(**) Significativo a menos de .001 Como se pode verificar no quadro anterior, que inclui as médias, desvio padrão e valores do teste t- Student das cotações obtidas para as três variáveis [deep], [achieving] e [surface]) e ainda a dimensão conjunta [deep+achieving], segundo características pessoais (género, idade e residência) dos sujeitos, registamos uma diferença, estatisticamente, significativa7 da variável 'género' sobre uma abordagem [achieving] (t= 5,07: p<.001) e sobre a variável conjunta [deep+achieving] (t= 3,67: p<.001), sendo que em ambos os casos, as cotações médias obtidas pelos sujeitos do género feminino são superiores às cotações médias dos sujeitos do género masculino.

3.2.2. Efeitos dos dados escolares

Com os mesmos objectivos da apresentação anterior indicam-se a seguir as cotações médias obtidos nos quatro indicadores relativos ás atitudes de abordagem do estudo, procurando igualmente observar os efeitos principais (simples) com os dados escolares (curso, prioridade de escolha e resultados escolares obtidos no final do secundário e testar a hipótese Ho4: ' Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados escolares (média obtida no ensino secundário, nota de acesso

7 Ao nível de (.001)e tomando o valor crítico de t=3,291 (Wright, 1997; Frankfort-Nachmias, 1997: Appendix-C).

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CAPÍTULO 5 281

á Universidade, curso frequentado, prioridade de escolha de curso) relativamente ás cotações médias obtidas em cada uma das abordagens [deep], [surface], [achieving] e [deep+achieving].' Os resultados obtidos, na totalidade da amostra, podem ser observados no quadro seguinte.

Quadro 5-XVII: índices estatísticos e valores de F:Fisher na comparação de médias dos resultados nas abordagensdo estudo segundo dados escolares.

Abordagem do estudo [achieving]

[deep]

[deep]+[achieving]

[surface]

Média DP Média DP Média DP Média DP

Ciên. Plan.Gestão 20,65 3,08 19,81 3,47 45,09 5,93 20,72 3,56

Ciên. Computação 20,38 3,73 20,32 3,74 45,36 6,95 21,36 3,49

Ciên. Naturais 21,06 3,19 20,20 4,04 46,04 6,61 21,22 3,46

Ciên. Aplicadas 19,94 3,83 18,85 3,99 43,43 7,15 21,01 3,43

Total 20,50 3,47 19,71 3,86 44,88 6,71 21,04 3,48

Curso

F-rácio 2,19 n.s. 3,33* 3,26* .62 n.s.

1ª Escolha 20,65 3,55 20,30 3,72 45,70 6,53 20,95 3,36

2ª Escolha 19,72 3,32 18,99 3,74 43,88 6,45 20,78 3,67

3ª+ Escolha 20,85 3,40 19,35 4,04 44,75 7,03 21,37 3,51

Total 20,50 3,47 19,71 3,86 44,88 6,71 21,04 3,48 Prior

idade

F-rácio 3,31* 4,57* 3,91* .91 n.s.

Nota ≤ 13 20,50 3,99 19,40 4,05 44,56 7,07 20,74 3,85

13 < Nota ≤16 20,19 3,36 19,67 3,77 44,48 6,54 20,94 3,42

Nota > 16 21,13 3,28 19,97 3,92 45,94 6,78 21,45 3,35

Total 20,50 3,47 19,71 3,86 44,88 6,71 21,04 3,48

Média

secu

ndár

io

F-rácio 2,80 n.s. .50 n.s. 1,92 n.s. 1,16 n.s.

Nota ≤ 13 20,28 3,67 19,51 3,75 44,37 6,79 20,91 3,58

13 < Nota ≤16 20,54 3,34 19,88 3,90 45,12 6,58 21,36 3,59

Nota > 16 20,84 3,36 19,72 3,99 45,37 6,88 20,60 2,96

Total 20,50 3,47 19,71 3,86 44,88 6,71 21,04 3,48 Nota

de ac

esso

Un

iversi

dade

F-rácio .71 n.s. .39 n.s. .80 n.s. 1,49 n.s.

(n.s.)- Não significativo (p>.05) ; (*) - significativo a .05

O quadro anterior inclui as médias, desvio padrão e valores de F do procedimento oneway- ANOVA sobre as cotações médias obtidas em cada uma das abordagens do estudo em função dos dados escolares. A análise das variâncias e o teste de comparação múltipla produziu algumas diferenças com interesse estatístico que passamos a descrever:

• existe diferença significativa [ F(3,416) = 3,33 : p< .05] e [F(3,416) = 3,26 : p<.05] entre médias relativamente ao curso, respectivamente, numa abordagem [deep] e numa abordagem [deep+

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282

achieving]. TukeyHSD permite constatar que estas diferenças (diferença de médias= 1,35: p<.05) e (diferença médias=2,61: p<.05) são estabelecidas entre sujeitos dos cursos da área das ciências naturais e os de ciências aplicadas.

• a prioridade de escolha de curso afecta significativamente as médias obtidas nas variáveis [achieving] com F(2,417) = 3,31 : p< .05 e em [deep] com F(2,417) = 4,57 : p>.05. Uma análise mais fina ao teste de comparação múltipla apontava no sentido destas diferenças serem significativas, respectivamente entre a 3ª ou+ e 2ª prioridade de escolha (Diferença= 1,14: p<.05 : TukeyHSD); e, entre a 1ª e 2ª prioridade de escolha (Diferença= 1,31: p<.05 : TukeyHSD)

• Não sendo significativa a diferença entre uma abordagem [achieving] e as notas obtidas no final do secundário [F(2,417)= 2,80 : n.s.], o teste de comparação múltipla das variâncias produziu um efeito estatisticamente significativo (Diferença= .94 : p<.05 : TukeyHSD) nas diferenças entre cotações médias dos sujeitos com média obtida no secundário maior que 16, e com média obtida no secundário, compreendida entre 13 e 16 em função desse tipo de abordagem.

3.3. Efeitos dos dados demográficos e escolares sobre o uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

Tal como aconteceu com outras variáveis estudadas, tomamos os factores8 correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens e fomos analisar os efeitos principais das variáveis demográficas e escolares nas cotações médias dos resultados. Pretendemos, deste modo, averiguar se existiam diferenças com interesse estatístico entre as cotações médias obtidas em cada grupo, considerado nas variáveis demográficos e escolares, relativamente ao uso de estratégias (cognitivas, metacognitivas e incentivo motivacional).

8 A estrutura factorial resultante do redimensionamento da escala [Che] ficou constituída por:

Factor1: Representa o uso de estratégias cognitivas de transformação e manipulação da informação, incluíndo estratégias de distinção, selecção, conexão e fecho para interiorização da informação relevante; Factor2: Representa o uso de estratégias cognitivas de planeamento e organização do estudo através de rotinas de aproximação ou sequências de comportamentos de estudo; Factor3: Representa o uso de estratégias cognitivas e metacognitivas de gestão e monitorização do estudo. Inclui estratégias de auto-avaliação, controlo, decisão e fixação de metas e consciencialização dos distractores do estudo. Factor4: Representa estratégias cognitivas de aquisição e recepção de estímulos relacionadas com a atenção, concentração e participação nas aulas; Factor5: Representa estratégias cognitivas e metacognitivas de Incentivo motivacional para frequência das aulas.

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CAPÍTULO 5 283

3.3.1. Efeitos dos dados demográficos

Procuramos avaliar os efeitos de cada uma das variáveis (género, idade e residência) sobre os factores correspondentes ao uso de estratégias reguladoras do estudo. No caso, testamos a hipótese de trabalho Ho5: ' Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados demográficos (género, idade, local de residência) relativamente às cotações médias obtidas em cada um dos factores correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens.' Os resultados obtidos, (N=420), podem ser observados no quadro seguinte: Quadro 5-XVIII: índices estatísticos e valores do teste t- Student na comparação de médias dos resultados nos factores

correspondentes ao uso de estratégias reguladoras segundo dados demográficos.

Estratégias auto-reguladoras

Factor1

Factor2 Factor3 Factor4 Factor5 Medida Global

Méd DP Méd DP Méd DP Méd DP Méd DP Méd DP

Feminino 27,02 5,39 26,12 3,04 32,73 4,77 15,58 3,63 5,59 2,71 107,0 13,2 Masculino 23,08 6,43 23,73 4,28 30,79 5,01 15,15 3,66 5,61 2,88 98,3 15,2 Total 25,27 6,18 25,06 3,83 31,87 4,96 15,38 3,64 5,60 2,78 103,2 14,8 Gé

nero

t- Student 6,69**a 6,45**b 4,04** 1,21 n.s. -,08 n.s. 6,24** ≤ 21 anos 25,24 6,17 25,04 3,86 31,89 4,92 15,30 3,59 5,56 2,73 103,0 14,8 > 21 anos 25,91 6,60 25,41 3,23 31,45 5,88 16,91 4,23 6,32 3,63 106,0 15,4 Total 25,27 6,18 25,06 3,83 31,87 4,96 15,38 3,64 5,60 2,78 103,2 14,8 Ida

de

t-Student -.19 n.s. .49 n.s. -.71 n.s. 1,49 n.s. .84 n.s. -.91 n.s. Local 25,78 6,45 25,49 3,48 32,24 4,92 15,56 3,76 5,26 2,74 104,3 14,5 Deslocado 25,02 5,96 24,88 3,98 31,72 5,03 15,29 3,61 5,78 2,80 102,7 15,0 Total 25,29 6,14 25,09 3,82 31,91 4,99 15,39 3,66 5,60 2,79 103,3 14,8 Re

sidên

cia

t- Student 1,20 n.s. 1,55 n.s. 1,00 n.s. .72 n.s. -1,82 n.s. 1,07 n.s.

(n.s.): Não significativo [p>.05: gl (graus de liberdade) = 418]; (**): Significativo a .001

a): Igualdade de variâncias não assumida ( Teste de Levene; F= 6,799, p< .01 com g.l=360,35)

b): Igualdade de variâncias não assumida (Teste de Levene; F = 20,406, p< .001 com g.l= 321,67) Observando o quadro anterior, que inclui as médias, desvio padrão e valores do teste t- Student das cotações obtidas em cada factor segundo características pessoais (género, idade e residência) dos sujeitos da amostra, registamos o efeito estatisticamente significativo (ao nível de .001e tomando o valor crítico de t=3,291, ver nota de rodapé anterior) da variável género sobre os factores: 1, 2 e 3 e medida global. Com efeito, uma análise mais fina das diferenças permite registar o efeito da variável género no uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens. Este efeito é sempre favorável ao género feminino quer nos factores 1,2 e 3 e medida global, ou seja:

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284

• no factor1, correspondente ao uso de estratégias de manipulação e transformação da informação, a diferença de médias [Feminino-Masculino] = 3,94, t= 6,6: p<.001.

• no factor2, correspondente ao uso de estratégias de planeamento e organização do estudo, a diferença de médias [Feminino-Masculino] = 2,40, t= 6,45: p< .001.

• no factor3, correspondente ao uso de estratégias de gestão e monitorização do estudo, a diferença de médias [Feminino-Masculino] = 1,94, : t= 4,04: p<.001.

• na medida global, a diferença de médias [Feminino-Masculino] = 8,68, t= 6,24: p<.001.

3.3.2. Efeitos dos dados escolares

Indicam-se a seguir as cotações médias obtidos nos cinco factores correspondentes ao uso de estratégias reguladoras considerados neste estudo em função dos dados escolares (curso, prioridade de escolha e resultados escolares obtidos no final do secundário e testa-se a hipótese (nula) Ho6: ' Não há diferenças estatisticamente significativas entre dados escolares (média obtida no ensino secundário, nota de acesso á Universidade, curso frequentado, prioridade de escolha do curso) relativamente às cotações médias obtidas em cada um dos factores correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens.' Os resultados obtidos, (N=420), podem ser observados no quadro seguinte.

Quadro 5-XIX: índices estatísticos e valores de F-Fisher na comparação de médias dos resultados nos factores

correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras segundo dados escolares

Factor1

Factor2

Factor3

Factor4

Factor5

Medida global Estratégias auto-reguladoras

Méd DP Méd DP Méd DP Méd DP Méd DP Méd DP

Ci.Pl.Gestão 25,05 5,84 24,89 3,75 31,94 4,68 15,59 3,69 5,63 2,57 103,1 14,3

Ci.Comput. 24,46 6,82 24,52 4,39 31,74 4,85 15,64 3,28 5,94 2,96 102,3 15,2

Ci.Naturais 26,30 5,97 25,83 3,26 32,73 4,78 15,14 3,56 5,56 2,72 105,5 14,4

Ci.Aplicadas 25,02 6,28 24,84 3,97 31,13 5,35 15,28 3,88 5,41 2,93 101,7 15,3

Total 25,27 6,18 25,06 3,83 31,87 4,96 15,38 3,64 5,60 2,78 103,2 14,8

Curso

F- rácio 1,53 n.s. 2,15 n.s. 2,07 n.s. .44 n.s. .55 n.s. 1,46 n.s.

1ª Escolha 25,07 6,39 24,90 4,07 31,65 5,08 15,51 3,59 5,36 2,69 102,5 15,4

2ª Escolha 24,38 6,17 24,21 3,74 31,22 4,81 15,08 3,68 6,00 2,47 100.9 14,5

3ª+ Escolha 26,24 5,78 25,92 3,33 32,67 4,83 15,42 3,71 5,67 3,10 105,9 13,7

Total 25,27 6,18 25,06 3,83 31,87 4,96 15,38 3,64 5,60 2,78 103,2 14,8 Prior

idade

F-rácio 2,70 n.s. 5,95** 2,71 n.s. .45 n.s. 1,76 n.s. 3,6*

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CAPÍTULO 5 285

Nota ≤ 13 25,18 5,94 24,17 3,87 30,93 5,11 15,62 3,44 5,72 2,99 101,6 13,8

13 < No ≤16 24,91 6,26 25,09 3,81 31,63 4,89 15,19 3,54 5,74 2,82 102,6 14,7

Nota > 16 26,10 6,16 25,57 3,76 32,96 4,87 15,65 3,97 5,22 2,55 105,5 15,4

Total 25,27 6,18 25,06 3,83 31,87 4,96 15,38 3,64 5,60 2,78 103,2 14,8

Média

secu

ndár

io

F-rácio 1,43 n.s. 2,99* 4,32* .79 n.s. 1,44 n.s. 1,98 n.s.

Nota ≤ 13 25,59 5,98 24,85 3,79 31,49 4,86 15,32 3,32 5,55 2,76 102,8 14,1

13 < No ≤16 25,17 6,33 25,11 3,90 31,79 5,15 15,42 3,65 5,71 2,87 103,2 15,1

Nota > 16 24,89 6,30 25,37 3,76 32,80 4,67 15,44 4,25 5,45 2,65 103,9 15,6

Total 25,27 6,18 25,06 3,83 31,87 4,96 15,38 3,64 5,60 2,78 103,2 14,8 Nota

de ac

esso

F-rácio .39 n.s. .53 n.s. 1,89 n.s. .04 n.s. .28 n.s. .16 n.s.

(n.s.): Não significativo (p>.05); (*) significativo a .05; (**) significativo a .001 O quadro anterior inclui as médias, desvio padrão e valores de F-rácio do procedimento oneway- ANOVA, sobre as cotações médias obtidas em cada um dos cinco factores correspondentes ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens, em função dos dados escolares. A análise do quadro permite constatar algumas diferenças significativas nas cotações médias nos factores que passamos a descrever:

• Existe diferença significativa [ F(2,417)= 5,95 : p< .05] entre as cotações médias no uso de estratégias de planeamento e organização do estudo e a prioridade de escolha do curso. O teste de comparação múltipla permitiu constatar que as diferenças de médias se situam: (1) entre o grupo de sujeitos da amostra que ingressaram na 1ª prioridade relativamente à 3ªou + prioridades de escolha do curso [Diferença= -1,02 : p<.05 : TukeyHSD]; e, (2) entre a 2ª prioridade e a 3ªou+ prioridades de escolha do curso [Diferença= 1,71 : p<.01 : Tukey HSD];

• A média obtida no final do secundário afecta, significativamente, as médias obtidas no uso de estratégias de planeamento e organização do estudo [F(2,417)= 2,99 : p< .05] e no uso de estratégias de gestão e monitorização do estudo [F(2,417)= 4,32 : p>.05]. O teste de comparação múltipla sugeria que estas

diferenças eram significativas, no primeiro caso entre o grupo de sujeitos com média ≤ 13 valores e o

grupo com médias superiores 16 (Diferença= -1,40: p<.05: TukeyHSD) e, no segundo caso: entre o

grupo de sujeitos com médias ≤ 13 e superiores a 16 (Diferença= -2,03: p<.05 : TukeyHSD) e entre o

grupo de sujeitos com médias compreendidas entre 13 e 16 (inclusive) e o grupo de médias superiores a 16 (Diferença= -1,32: p<.05 :TukeyHSD);

• A prioridade de escolha do curso afecta as cotações médias da medida global. A diferença de médias é estatisticamente significativa [F(2,417)= 3,6 : p< .05]. O teste de comparação múltipla indica que estas diferenças se situam entre os sujeitos que ingressaram na 2ª e 3ª ou + prioridades de escolha do curso, sendo favorável ao último destes grupos (Diferença= -5,02: p<.05:TukeyHSD).

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286

3.4. Estudo e identificação de grupos de sujeitos relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

A classificação que mais se aproximou das hipóteses formuladas (Ponto 4.2: Capítulo 4) é composta por uma solução com três agrupamentos (clusters) cujos índices estatísticos descritivos (média e DP-desvio padrão) obtidos nos vários indicadores ou variáveis em estudo, podem ser observados no quadro seguinte. Quadro 5-XX: medidas de distribuição das respostas nos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de

estratégias auto- reguladoras em cada agrupamento de sujeitos resultante da análise de Clusters Agrupamento 1

N=151 Agrupamento 2

N=152 Agrupamento 3

N=117 Amostra N=420

Variáveis

Média DP Média DP Média DP Média DP

Ajustamento académico [Ca]: Confiança em si [Su]: satisfação c/ Universidade : medida global Abordagens [deep] [achieving] [deep+ achieving] [surface] Estratégias auto-reguladoras [F1]: Transformação e manipulação [F2]: Planeamento e rotinas [F3]: Gestão e monitorização [F4]: Aquisição e recepção estímulos [F5]: Afectivas de incentivo motivacional : medida global

29,18 24,32 53,50 22,54 23,41 51,09 21,97 29,65 27,16 35,32 17,48 5,67 115,3

3,90 2,68 5,08 2,89 2,34 4,37 3,24 4,97 2,43 3,20 3,24 3,09 9,19

25,49 22,22 47,71 17,76 18,09 40,23 19,96 20,20 21,99 28,06 13,17 5,40 88,82

5,37 3,26 7,22 3,22 2,64 4,97 3,54 4,75 3,85 4,14 2,89 2,47 10,54

21,53 20,78 42,31 18,58 19,87 42,92 21,26 26,22 26,34 32,37 15,56 5,76 106,2

4,25 3,39 5,67 3,37 2,63 4,86 3,54 4,13 2,49 4,32 3,36 2,76 8,15

25,72 22,57 48,29 19,71 20,50 44,88 21,04 25,27 25,06 31,87 15,38 5,60 103,2

5,34 3,30 7,33 3,86 3,47 6,71 3,48 6,18 3,83 4,96 3,64 2,78 14,79

Observamos os vários índices estatísticos (média e DP) obtidos nos indicadores e variáveis do estudo, por cada agrupamento seleccionado na análise de clusters. De seguida, passamos a descrever estes índices, indicando também os resultados mais importantes obtidos em cada agrupamento em termos das suas características individuais (demográficas, escolares, etc.). Relativamente à totalidade da amostra (N=420), consideramos que:

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CAPÍTULO 5 287

Agrupamento1. Agrupa estudantes do 1ºano (comum) da Universidade de Aveiro que apresentam9:

• níveis moderados (bastante acima da média) de confiança em si e satisfação com a Universidade e quando tomada uma medida global de ajustamento académico evidenciam níveis elevados;

• níveis elevados nas dimensões de abordagem [achieving] e/ou [deep] e níveis moderados de abordagem [surface] (ligeiramente acima da média);

• cotações elevadas no uso de estratégias cognitivas de transformação e manipulação da informação, gestão e monitorização e medida global; cotações moderadas (bastante acima da média) no uso de estratégias de planeamento e rotinas de estudo e na aquisição e recepção de estímulos (atenção e concentração nas aulas) e cotações moderadas (ligeiramente acima da média) no uso de estratégias de incentivo motivacional para frequência de aulas;

• este agrupamento explica 36,0% (N=151) do total da amostra, no qual, predominam os elementos do género feminino (66,9%), com idades inferiores a 21 anos (93,4%), mas, com a maior percentagem (6,6%) de elementos do grupo com mais de 21 anos de idade e, a maioria (63,5%) de alunos deslocados da sua residência;

• é composto por elementos de todas as áreas de curso consideradas [planeamento (29,8%); computação (17,9%); ciências naturais (28,5%) e aplicadas (23,8%)], a maioria (49,7%) ingressados na 1ª prioridade de escolha e com médias obtidas no final do secundário (50,3%) e de acesso á Universidade entre 13 e 16 valores (42,1%). Reúne também a maior percentagem (33,1%) e (19,9%), respectivamente de elementos dos grupos com médias obtidas no final do secundário e acesso á Universidade superiores a 16 valores;

• a maioria (79,5%) indica ter pelo menos uma problema actualmente, sendo que o grupo dos elementos a indicar não ter qualquer tipo de problema assume, neste agrupamento, a sua maior expressão (20,5%). Por último, a maioria (58,1%) dos sujeitos atribui a causas externas o seu insucesso escolar.

Agrupamento2. Agrupa estudantes do 1ºano (comum) da Universidade de Aveiro que apresentam:

• níveis médios de ajustamento académico, confiança em si e satisfação com a Universidade;

• níveis fracos nas dimensões de abordagem [deep] e/ou [achieving] e níveis moderados de abordagem [surface];

• níveis fracos em todos os factores correspondentes ao uso de estratégias cognitivas, com excepção dos factores correspondentes ao uso de estratégias cognitivas de recepção e aquisição de estímulos (atenção e concentração) e de incentivo motivacional para frequência de aulas, em que apresentam níveis moderados (embora, abaixo da média global). Na medida global, os níveis são igualmente fracos;

9 Considerando a classificação (fraco, moderado, elevado) consoante os valores médios obtidos (abaixo, em, acima) dos intervalos definidos por I= [média ± 2/3 DP[.

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288

• este agrupamento explica 36,2% (N=152) do total da amostra e é constituído por elementos de ambos os sexos, a maioria (59,9%) são do género masculino (40,1%-género feminino), a quase totalidade (96,1%) da amostra com idades inferiores a 21, maioritariamente (70,1%) deslocados da sua residência;

• é composto por elementos de todas as áreas de curso consideradas [planeamento (27,6%); computação (19,1%); ciências naturais (20,4%) e aplicadas (32,9%)] a maioria (50,0 %) ingressados na 1ª prioridade (2ª prioridade com 32,2%) de escolha do curso, apresentando, maioritariamente médias obtidas no final do secundário e de acesso á Universidade entre 13 e 16 valores, respectivamente (64,5% e 42,1%), sendo que no que respeita à variável nota de acesso, os elementos do grupo com notas inferiores a 13 valores assume a sua maior expressão (40,1%) contrariamente é menor expressividade do grupo com notas superiores a 16 valores (17,8%);

• a maioria (84,2%) dos sujeitos indica ter pelo menos um tipo de problema actualmente e cerca de 51,7% atribui a causas internas o seu insucesso escolar.

Agrupamento3. Agrupa estudantes do 1ºano (comum) da Universidade de Aveiro que apresentam:

• níveis fracos de ajustamento académico, confiança em si e satisfação com a Universidade;

• níveis moderados (abaixo da média global) nas dimensões de abordagem [achieving] e/ou [deep] e níveis moderados (ligeiramente acima da média) de abordagem [surface];

• cotações moderadas (ligeiramente acima das médias globais) em todos os factores correspondentes ao uso de estratégias cognitivas e metacognitivas e afectivas, assim como na medida global;

• este perfil explica 27,8% (N=117) do total da amostra e é constituído por elementos de ambos os sexos [maioria (61,5%) do género feminino], predominando sujeitos com idade inferior a 21 anos (94,9%), maioritariamente (57,9%) deslocados, mas com a maior percentagem (42,1%) de elementos do grupo que indica residir no local de estudo;

• é composto por elementos de todas as áreas de curso consideradas [planeamento (23,9%); computação (11,1%); ciências naturais (30,8%) e aplicadas (34,2%)], a maioria (46,2%) ingressados na 3ªou + prioridade de escolha de curso, mas com a maior percentagem (35,6%) do total de alunos que ingressaram na 3ªou + prioridades de escolha do curso;

• as médias obtidas no final do secundário, situam-se na maioria (52,1%) dos casos, entre 13 e 16 valores, contudo é sentida a maior presença (20,5%) de elementos do grupo com notas inferiores a 13 valores. No que respeita á variável 'nota de acesso', são os elementos do grupo com notas entre 13 e 16 valores a estabelecer a maior parte (47,0%) dos casos;

• no que respeita á variável 'existência de problemas', o grupo de elementos indicando não ter qualquer tipo de problemas, assume, neste agrupamento, a sua menor importância (9,4%), ao contrário da maioria (90,6%) que indica ter pelo menos um tipo de problema.

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Capítulo 6

Discussão e conclusões

Neste capítulo, procuramos interpretar e comentar os resultados obtidos á luz da literatura revista e

em função dos aspectos exploratórios avançados de início. Começamos por efectuar uma síntese do

processo de investigação para, de seguida, registamos alguns dados relativos aos processos de adaptação,

construção e aplicação dos instrumentos utilizados e sintetizamos os principais resultados obtidos nos

diversos indicadores utilizados na parte empírica. Por fim, apresentamos algumas conclusões possíveis e

apontamos as principais limitações metodológicas encontradas que possam vir a ser estendidas para além

da amostra tomada ou susceptíveis de serem desenvolvidas em futuros trabalhos.

1. Síntese e discussão dos resultados obtidos

Na linha das nossas preocupações gerais, fomos desenvolver um estudo empírico junto de alunos

do 1ºano (comum) das licenciaturas em ciências e engenharias da Universidade de Aveiro, acerca da

natureza e extensão de relações existentes entre níveis de satisfação com a Universidade, confiança em si e

medida de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens.

Assim, na primeira parte deste estudo, procuramos integrar os vários construtos em análise

observando a forma como estes têm sido modelados, apresentados e investigados ao nível do contexto

académico universitário. Referimo-nos, nomeadamente à exploração de alguns aspectos relacionados com o

processo de ajustamento académico e como é possível situar um modelo de activação do desenvolvimento

psicológico no ensino superior. A seguir, procuramos conceptualizar um conjunto de competências

cognitivas e motivacionais no contexto das recentes orientações cognitivistas que (re)emergiram e

(re)colocaram o papel dos comportamentos humanos como abordagem dominante da psicologia

educacional. Neste sentido, fomos delimitar o conceito de auto-regulação académica procurando fixar um

modelo conceptual de análise e explorando a importância das estratégias de estudo e aprendizagem.

A segunda parte deste estudo, ou empírica, foi subdivida em duas alíneas. Numa destas alíneas,

apresentamos o nosso esforço no sentido da construção e/ou adaptação de dois questionários para avaliar

níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens em

estudantes universitários. Na outra, testamos estes instrumentos junto de uma amostra de alunos do 1ºano

(comum) da Universidade de Aveiro. Ou seja, fomos caracterizar níveis de ajustamento e auto-regulação

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290

académica nestes estudantes, assim como avaliar algumas influências existentes entre (e intra) variáveis. A

seguir sintetizamos e comentamos os principais resultados obtidos.

1.1. Estudo da validade dos instrumentos aplicados

Pretendemos, observando a literatura específica e alguns estudos realizados, construir e validar um

questionário que englobasse um conjunto de variáveis e indicadores pessoais, interpessoais e contextuais,

tidas como preditoras nos processos de ajustamento e auto-regulação académica dos jovens estudantes

universitários. Mas, antes de se proceder à discussão dos resultados propriamente dita, importava analisar

alguns dos resultados obtidos no estudo de validade e garantia dos instrumentos adaptados e/ou

construídos para serem aplicados na amostra (N=420).

Assim, no que concerne ao instrumento [Aja] do QIVA, os resultados obtidos, evidenciam que os

itens, de um modo geral, apresentaram qualidade psicométrica aceitável. Não obstante, pareceu-nos que

seria útil acrescentar mais alguns itens e outras dimensões contributivas para uma medida global de

ajustamento académico, pelo que , seria importante aprofundar a análise destes indicadores em estudos

futuros. Quando avaliado seu dimensionamento, os resultados obtidos indiciaram que a opção bi-factorial

poderia ser utilizada, relativamente à amostra, com relativa segurança e garantia para medir níveis de

confiança em si (auto-percepção enquanto aluno) e de satisfação com a Universidade. Além disso, estes

indicadores poderiam ser tomados como dois fortes contributos para uma medida (factor) mais global, ou

seja, que pudesse reflectir um nível de ajustamento académico, nos estudantes do 1ºano (comum) da

Universidade de Aveiro.

Quanto ao instrumento [Ae] do QACE, a observação dos elementos estatísticos anteriores

resultantes da análise descritiva e factorial dos resultados nos itens neste instrumento, permitiram concluir

que os valores de validade interna e interrelacionamento dos resultados nos itens são consistentes com os

resultados obtidos no instrumento original e versões sequentes (Newstead, 1992; Biggs, 1993; Richardson,

1992; 1998). Com efeito, os resultados apontaram no sentido de considerar que a tradução e adaptação

efectuada da escala para este estudo seria uma versão válida, apresentando, inclusivamente resultados

mais seguros e fiáveis que algumas das referências indicadas. Mas, de um modo geral, alguns itens

evidenciaram fraca qualidade psicométrica, apresentando características discriminatórias e de sensibilidade

fracas ou moderadas, levando a questionar a utilidade da sua manutenção, no instrumento. Aliás, estes itens

revelaram também dificuldades na apropriação quer à medida global quer tomando as dimensões

separadamente. Referimo-nos, designadamente aos itens Ae04, Ae06, Ae14 e Ae15 (ver Anexo4) com

baixos índices de sensibilidade e/ou consistência interna, sugerindo uma profunda reformulação em futuros

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CAPÍTULO 6

291

estudos que venham a usar esta versão. No presente estudo, a exclusão dos itens Ae14 e Ae15 levaria a

uma melhoria da consistência e validade interna do instrumento.

Além disso, os resultados obtidos sugeriam também que este instrumento poderia ser rentabilizado,

no caso de se considerarem apenas duas dimensões na avaliação das abordagens do estudo. Ou seja, uma

das dimensões seria tomada como uma atitude de cariz negativo na abordagem do estudo, para a qual

contribuiriam os itens que constituem a dimensão de abordagem [surface] e, outra dimensão, de cariz mais

positivo e estratégico na abordagem do estudo, que seria tomada a partir do conjunto dos itens que

constituem as dimensões [deep] e [achieving]. Com efeito, nas analises que se seguiram, procuramos estar

atentos a estas limitações e observamos eventuais diferenças que resultariam de considerar (ou não) as

duas ou as três dimensões originais e, ainda, incluíndo esta dimensão de abordagem conjunta, a qual,

representamos por [deep+achieving]. No entanto, pareceu-nos possível concluir que este instrumento [Ae],

embora com algumas limitações, poderia ser tomado como instrumento com algum potencial avaliativo

relativamente ás abordagens do estudo nos estudantes universitários do 1ºano.

Por outro lado, dada a dificuldade em encontrar atempadamente um instrumento adequado e

devidamente validado que pudesse servir os objectivos do presente estudo e que pudesse vir a ser aplicado

nos sujeitos avaliando os seus métodos, estratégias e hábitos de estudo, observamos os elementos

estatísticos resultantes da análise de validade interna, consistência e dimensionamento dos itens de um

inventário de 25 itens ([Che]) construído e dimensionado para o efeito. Os resultados de validade e

consistência interna obtidos neste inventário permitem, com alguma confiança, considerar que a construção

deste instrumento se mostrou bastante válida (internamente) e suficientemente robusta em termos

metrológicos para que pudesse ser aplicada na medição de estratégias cognitivas, metacognitivas e

afectivo-relacionais usadas pelos estudantes do 1ºano da Universidade de Aveiro.

Quanto aos resultados nos itens, de um modo geral revelaram qualidades psicométricas aceitáveis

para os objectivos em vista. Os itens que ofereceram mais problemas, em termos metrológicos e de validade

interna, foram os itens He19, He29, He40 e He43 (Anexo 5: QACE), este último recodificado negativamente

no estudo. Entretanto, em termos de indicadores, a análise factorial exploratória dos resultados nos itens,

apontava no sentido de uma possível bipolarização deste inventário, ao salientar os itens em dois factores

principais. Com efeito, enquanto praticamente todos os itens se apresentavam relacionados entre si e

pareciam convergir de modo aceitável para a medição do uso de estratégias cognitivas e metacognitivas (de

atenção, processamento e monitorização do estudo), ao invés, os itens He24 e He25 que avaliam

estratégias afectivo- relacionais (exemplo, auto-reforços para frequência de aulas) revelavam uma quase

total independência relativamente aos restantes. Os índices de consistência e validade interna obtidos, na

análise das respostas aos itens deste inventário, podem ser considerados bastante satisfatórios quer

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292

considerando a medida global (todos os itens) com coeficiente alpha de Cronbach = .84, muito próximo do

limiar ideal, de acordo com Almeida & Freire (1997) quer tomando individualmente os cinco factores

correspondentes (coeficientes alphas acima do limite mínimo de satisfação de (.65), de acordo com vários

investigadores: e.g.,Veiga, 1995).

Por conseguinte, julgamos que este instrumento [CHe] e o respectivo dimensionamento (obtido

através da análise factorial exploratória dos resultados nos itens) poderia ser tomado com um elevado

potencial para medir o uso de processos auto-reguladores das aprendizagens e ainda, medir o seu grau de

relacionamento com outros indicadores, designadamente abordagem do estudo e os níveis de ajustamento

académico considerados na presente investigação.

1.2. Existência de problemas actuais e atribuições causais do sucesso/ insucesso

Os resultados obtidos nas variáveis categoriais, de um modo geral, vieram confirmar outros

resultados já apresentados e que tomaram uma amostra equiparável (Tavares et al, 1996, 1998; Rego e

Sousa, 1998). Assim, inquiridos sobre os principais problemas com que se debatiam actualmente, os jovens

estudantes universitários elegeram, maioritariamente, os problemas com os estudos e problemas

relacionados com a ansiedade. Embora com menor incidência, são também salientados os problemas da

atenção e concentração nas aulas, o mal estar físico (dores de cabeça, saúde, perturbações de sono, etc.) e

por último, problemas económicos. No cruzamento do indicador agregado relativo á existência de problemas

actuais, encontramos apenas variação significativa (p< .005) relativamente à variável 'nota de acesso à

Universidade e ao nível considerado para medir a 'confiança em si'. As proporções nos grupos considerados

variam em sentido inverso das suas cotações.

Quanto às atribuições causais do sucesso e insucesso, os resultados são consistentes com os

vários estudos realizados acerca do locus da causalidade (Weiner, 1984, 1992; Barros-Oliveira, 1992; Faria

e Fontaine, 1995; Drew & Watkins, 1998). Confirma-se que os jovens estudantes universitários tendem a

atribuir a causas internas o seu sucesso e a justificar o seu insucesso por causas externas. Destacamos que

segundo os jovens inquiridos, o esforço, seguido pela motivação e inteligência, são os principais

responsáveis pelo seu sucesso, tal como a dificuldade dos exames, as atitudes e os comportamentos

perante o estudo e as estratégias específicas utilizadas são as responsáveis pelo seu insucesso. Ainda a

propósito deste último indicador, apenas, encontramos uma variação significativa nas proporções da

internalidade/ externalidade do insucesso, segundo uma abordagem [deep] do estudo. Os sujeitos com

cotação mais baixa neste tipo de abordagem, tendem a atribuir a causas internas o seu próprio insucesso.

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CAPÍTULO 6

293

Este dado curioso, vem ao encontro das nossas hipóteses iniciais e que concernem à necessidade de

intervir sobre a auto-consciencialização, nos sujeitos, dos seus próprios erros e fracassos .

Com efeito, estes resultados vão ao encontro do pressuposto teórico de vários investigadores

quando admitem que os 'bons' alunos tendem a fazer, em termos de locus da causalidade, hetero-

atribuições internas do seu insucesso, enquanto os 'maus' alunos fazem auto-atribuições externas para o

insucesso obtido. Por outro lado, os resultados obtidos apoiam igualmente a hipótese avançada por Senos

(1996) que, ainda por vezes, a atribuição realizada se revele pouco adaptativa (como se verificou na análise

das relações e variações existentes entre resultados nos vários indicadores considerados), a atribuição

causal desempenha um papel importante na manutenção dos valores da auto-estima, auto-conceito, mas, é

pouco protectora no que concerne à auto-percepção de competência académica. Aliás, esta aparente

impossibilidade que os alunos, com problemas escolares, exibem na preservação do seu sentimento de

competência relativamente às tarefas académicas (exemplo, a atribuição causal às dificuldades dos exames,

34,8%), poderá contribuir para explicar o carácter cumulativo do insucesso escolar e académico.

1.3. Análise (global) dos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

Sintetizando, os resultados obtidos nas variáveis escolhidas para medir o ajustamento académico,

parecem contribuir para considerar, que os jovens estudantes da amostra, estão relativamente seguros

quanto ao seu lugar e objectivos educacionais e sentem que correspondem ao que lhes poderá ser exigido.

Além disso, sentem que são correspondidos nas suas percepções, expectativas e satisfação de

necessidades escolares (basta atender aos níveis de confiança em si e de satisfação com a Universidade).

Aliás, importa salientar o nível de concordância superior a 95% do total da amostra quando inquiridos acerca

da sua satisfação (item Sat4) com a Universidade (espaços, serviços, informações, campus académico, etc.)

e a elevada percentagem (58%) de discordância relativamente á satisfação (item Sat2) com o 1ºano comum

(item Sat2). Embora analisado segundo a perspectiva dos alunos, este último dado chama a atenção para

uma discussão urgente acerca da importância e (des)vantagens deste 1ºano comum aos vários cursos. Por

outro lado, os resultados obtidos parecem apoiar as recentes abordagens e teorias da investigação psico-

educacional, nomeadamente aquelas que têm demonstrado que uma boa ligação indivíduo/ meio académico

(Upcraft & Gardner, 1989; Pascarella & Trenzini, 1991; Russel & Petrie, 1992; Ramsdem, 1992; Tinto, 1993;

Nico, 1995; Tavares et al., 1996, 1998; Leitão e Paixão, 1999; Carneiro, 1999) conduz a resultados positivos

na auto-confiança, auto-percepções e ajustamento para a realização das tarefas propostas e respectivas

competências académicas.

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294

Da análise global efectuada aos resultados obtidos nas várias variáveis e indicadores e partindo do

pressuposto de que o indivíduo é capaz de se avaliar a si próprio em domínios tão restritos como as suas

competências, fomos levados a crer que seria possível aceitar com alguma confiança e segurança, os

indicadores escolhidos para medir e predizer os níveis de ajustamento académico (satisfação com a

Universidade, confiança em si enquanto estudante e medida global), as diferentes atitudes de abordagem do

estudo e os comportamentos estratégicos para auto-regulação das aprendizagens. Na realidade, na

amostra, os resultados obtidos parecem igualmente apoiar com clareza os seguintes aspectos:

• é possível considerar níveis diferenciadores do ajustamento académico, segundo indicadores

separados ou tomados em conjunto. Estes níveis são mais evidentes quando o ajustamento

académico é definido pelas vertentes da auto-percepção e confiança em si que o estudante julga

possuir acerca de si mesmo para fazer face ao estudo e aprendizagens e ainda pela vertente da

satisfação das suas expectativas relativamente ao contexto académico universitário em que está

inserido.

• é possível considerar níveis diferenciadores nas atitudes de abordagem ao estudo. Mais uma vez,

estamos em presença de informação empírica que nos permite falar na diferenciação ou

independência entre atitudes positivas evidenciadas por uma abordagem que dá significação ao

estudo e à aprendizagem, de carácter forte e intencional ([deep]) e/ou até uma atitude de carácter

mais estratégico e objectivada para alcançar bons resultados ([achieving]) de uma terceira atitude

([surface]), de carácter negativo que seja orientada apenas para a superficialidade e reprodução da

informação e materiais de estudo. Estes resultados são consistentes com as conclusões dos vários

investigadores que se têm debruçado sobre estes aspectos (Biggs e colaboradores; Entwistle e

colaboradores; Marton e colaboradores, etc).

• é possível considerar diferentes comportamentos adoptados para fazer face ao estudo e

aprendizagens, ou seja, existe uma diferenciação relativamente ao uso de estratégias cognitivas,

metacognitivas e afectivo-relacionais apropriadas aos processos de auto-regulação académica. Neste

sentido, os resultados obtidos vão ao encontro das perspectivas contemporâneas que reconhecem

que, para haver uma aprendizagem eficaz, os alunos envolvem-se de maneira diferente com vista a

maximizar os seus desempenhos, a potencializar e actualizar as suas competências para aprender e

na coordenação de todas as suas aptidões cognitivas, metacognitivas e motivacionais (Corno &

Rohrkemper, 1984; Richardson et al., 1987; Weinstein et al, 1988; Pintrich et al., 1990, 1991,1993;

Schunck & Zimmerman, 1994, 1998; Zimmerman & Martinez-Pons, 1986, 1988, 1990, 1992; Vermunt,

1996, 1998; etc.).

• é possível considerar que há uma estreita relação entre níveis de ajustamento académico, diferentes

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CAPÍTULO 6

295

abordagens e uma utilização diferenciada de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens. Em

reforço desta observação e no que concerne à análise de regressão múltipla nos estudos diferenciais,

registamos que, embora sendo fracas ou moderadas as percentagens de variância nos resultados

obtidos para o uso de estratégias auto-reguladoras do estudo e aprendizagens pelas variáveis

independentes tomadas em conjunto, os níveis de probabilidade estatística obtidos são significativos

(na maior parte dos casos, a menos de .0001). Não obstante, fomos ainda pesquisar a possibilidade

dos resultados obtidos escamotearem a verdadeira medida de influência que cada variável

independente exercia nas respostas ao uso de estratégias auto-reguladoras. Obtivemos uma

resposta para esta questão, através da observação dos índices de correlação entre cada uma das

variáveis intervenientes e, neste sentido, quanto maior foi o valor absoluto do coeficiente, mais a

ligação entre as variáveis se aproximou de uma relação linear.

• é possível verificar que os níveis de ajustamento académico influenciam positivamente o tipo de

abordagem [deep] e/ou [achieving] e, modo similar, o uso de estratégias cognitivas e metacognitivas.

Neste sentido, é aos resultados obtidos no tipo de abordagem [deep] e/ou [achieving] que se devem

atribuir maior importância, como preditores dos resultados correspondentes ao uso de estratégias

cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais nos alunos do 1ºano (comum) da Universidade de

Aveiro.

Tratando-se de um estudo correlacional, os dados obtidos não permitem estabelecer a existência

de uma relação de causalidade entre estas variáveis. Neste sentido, os resultados obtidos dão suporte ao

modelo sistémico de análise dos processos de ensino/aprendizagem dos 3P (Presságio/Processo/Produto)

advogado por Biggs (1987, 1993), se atendermos que cada variável analisada parece interagir com as

restantes no sentido de se atingir um certo equilibrio. A compreensão dos motivos, níveis de satisfação,

confiança em si, abordagens e estratégias de aprendizagem que orientam as atitudes e comportamentos

dos alunos perante o estudo e as aprendizagens parece ser um contributo fundamental para explicar os

processos envolvidos e os consequentes desepenhos académicos.

Por outro lado, investigações recentes realizadas no âmbito das teorias sócio-cognitivistas da

aprendizagem, permitem estabelecer que há efectivamente consequências cognitivas, metacognitivas e

afectivas na auto-regulação das aprendizagens nos jovens estudantes universitários ao focarem as suas

observações no 'como' o indivíduo activa, altera e mantém as suas práticas de aprendizagem (Zimmerman,

1989). Ou seja, estas teorias apoiam o facto da aprendizagem não ser qualquer coisa que acontece aos

alunos, ao invés, é algo que acontece pelos próprios alunos. No plano cognitivo, este torna-se mais apto a

seleccionar e a resolver, estrategicamente, os problemas. No plano afectivo-relacional, ele está mais

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296

inclinado a envolver-se nas actividades que representam desafios, a participar e a sentir que pode controlar

as suas acções.

Maehr (1984) referia que a vontade (will), a atitude (aproximação e envolvimento) perante as tarefas

académicas, o recurso e selecção das estratégias necessárias e a persistência na execução (auto-

regulação) eram a resultante de um conjunto de factores sobre os quais era fundamental a experiência da

acção. Neste sentido e num plano mais geral, McCombs (1988) sugeria que os programas de intervenção

relativamente à motivação académica deveriam, em primeiro lugar, levar o aluno a compreender qual o

enquadramento do estudo, quais as exigências da aprendizagem e qual a sua responsabilidade pessoal.

Depois, deveriam assistir na antecipação do sucesso e na optimização dos desempenhos, apoiando e

ajudando o aluno a saber como proceder com as estratégias mais apropriadas à avaliação de si próprio, das

situações e dos processos em que está implicado.

1.4. Estudo das diferenças nos níveis de ajustamento académico, abordagens e uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

Quanto, à análise dos efeitos principais ou de interacção entre variáveis, os resultados obtidos, vão

de encontro aos de outras investigações realizadas anteriormente com características semelhantes,

nomeadamente, os resultados obtidos e apresentados no Relatório1 (Tavares et al, 1996, 1998) e na

pesquisa levada a cabo por Rego e Sousa (1998). Assim, neste estudo, não registamos efeitos

estatisticamente significativos, tomando um intervalo de confiança superior a 95%, na análise da interacção

entre variáveis. No entanto, na análise dos efeitos principais, registamos alguns com significado estatístico

(p<.005) que passamos a salientar:

1. Não foram encontrados efeitos principais das variáveis demográficas sobre os níveis de ajustamento

académico nas suas duas vertentes e medida global. Este facto levou-nos, embora podendo cometer um

erro do tipo II (Ho ser falsa) a não rejeitar a hipótese Ho1 que postulava nesse sentido.

2. Efeitos de alguns dados escolares sobre os níveis de ajustamento académico sugerindo a rejeição

parcial1 da hipótese Ho2 se atendermos aos seguintes resultados:

a) os sujeitos frequentando cursos na área das ciências naturais indicam ser, em média, menos

confiantes em si próprios que os restantes. Esta diferença é significativa quando são comparados

estes sujeitos com os que frequentam o curso na área das ciências aplicadas (os mais confiantes);

1 O termo ‘parcialmente’ resulta da rejeição incidir apenas sobre os casos descritos, uma vez que não são estatisticamente

significativas as diferenças em todos os resultados. Isto significa que, embora sendo pouco provável que as cotações médias sejam iguais nos grupos considerados, não está garantido na amostra que estas cotações médias se mantenham iguais para todos os restantes grupos considerados em cada variável (Wright, 1997).

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CAPÍTULO 6

297

b) os sujeitos ingressados na 1º prioridade na escolha do curso revelam, em média, um nível mais

elevado de confiança em si próprios do que os sujeitos ingressados na 2ª ou 3º ou mais escolha. Esta

diferença é estatisticamente significativa relativamente a estes últimos;

c) os sujeitos ingressados na 1ª prioridade na escolha do curso revelam níveis significativamente

superiores no ajustamento académico relativamente aos alunos ingressados na 3ª ou mais escolhas.

3. Os elementos do género feminino apresentam cotações médias superiores relativamente aos elementos

masculinos no que diz respeito a uma abordagem com vista a alcançar 'bons' resultados [achieving] e,

ainda quando se considera a dimensão conjunta [deep+achieving]. Esta diferença, embora com valores de

t-Student relativamente baixos revela interesse estatístico (p< .001), razão pela qual rejeitamos a hipótese

Ho3 avançada.

4. Efeitos de algumas variáveis escolares sobre as abordagens do estudo, que nos levaram a rejeitar

parcialmente a hipótese Ho4 que postulava em contrário. As diferenças estatisticamente significativas

situaram-se, essencialmente entre:

a) grupo de sujeitos que frequentam cursos na área das ciências tendem a abordar o estudo, em

média, segundo uma dimensão mais [deep] e/ou [achieving] que os colegas que frequentam cursos

na área das ciências aplicadas;

b) grupo de sujeitos ingressados em distintas prioridades de escolha, revelam cotações médias

diferentes no que respeita ao tipo de abordagem [deep];

c) grupo de sujeitos com médias obtidas no secundário superiores a 16 indiciam, em média, um nível

superior na atitude de abordagem [achieving] que relativamente aos restantes. Contudo, esta

diferença é, apenas, estatisticamente significativa relativamente aos sujeitos que obtiveram médias

no secundário entre 13 e 16 valores.

5. O efeito da variável género sobre as médias relativas ao uso de estratégias cognitivas de transformação

e manipulação da informação, de planeamento e sequência de rotinas e ainda, sobre o uso de estratégias

metacognitivas de gestão e monitorização do estudo. Assinala-se a diferença estatisticamente significativa

(p<.001) a favor do género feminino. Em função destes resultados, fomos levados a rejeitar parcialmente a

hipótese Ho5 que postulava em contrário.

6. O efeito de alguns dados escolares sobre o uso de estratégias auto-reguladoras, o que nos levou a

rejeitar parcialmente a hipótese Ho6. Os efeitos obtidos sugerem que:

a) os sujeitos ingressados na 1º prioridade e 2ª prioridade na escolha do curso distinguem-se nas

cotações médias relativas ao uso de estratégias cognitivas de planeamento e organização do estudo,

não entre si, mas relativamente aos sujeitos ingressados em 3ª ou + prioridades de escolha.

Curiosamente, a diferença significativa (p< .05) é favorável aos que ingressaram na 3ª ou + prioridade

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298

de escolha do curso. Algo semelhante se observa, quando se analisa o teste de comparação múltipla

das médias obtidas na medida global (regulação), entre os grupos que ingressaram na 2ª e 3ª

prioridade de escolha [ a diferença entre 2ª e 3ª é igual a 5,02 (p< .05)];

b) as notas obtidas no secundário afectam as cotações médias obtidas no uso de estratégias:

cognitivas de planeamento e sequência de rotinas de estudo e uso de estratégias metacognitivas de

gestão e monitorização do estudo, sendo favorável a diferença aos alunos com notas mais elevadas.

1.5. Análise de clusters relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens

De acordo com Pintrich e colegas (e.g., Pintrich & De Groot, 1990), os processos de auto-regulação

ou as estratégias auto-reguladoras das aprendizagens fazem convergir um conjunto muito diversificado de

elementos que dizem respeito, por exemplo, à gestão e controlo (monitoring), à recepção e compreensão de

estímulos, ao auto-registo, á fixação de metas, à planificação e organização dos recursos e condições, aos

incentivos e auto-reforços, etc. Em síntese, podemos afirmar que a auto-regulação académica refere-se ao

grau em que os alunos são metacognitiva, motivacional e comportamentalmente proactivos (e não meros

reactivos) reguladores dos seus próprios processos de aprendizagem (Zimmerman & Martinez-Pons, 1986).

Neste sentido, a auto-regulação académica é, pois algo bastante complexo que envolve várias

componentes, algumas das quais são impossíveis de avaliar. No entanto, é possível considerar os vários

processos envolvidos operacionalizados pela utilização habitual ou sistemática de determinadas estratégias

metacognitivas, cognitivas e afectivo-relacionais durante os processos nos quais o aprender se constitui.

Assim, ao nível da componente metacognitiva (Flavell,1985; Brown, 1987; Reynolds & Wade, 1986; Tardif,

1997) destacamos por exemplo, os processos de planificação, fixação de objectivos, gestão e controlo

(monitoring), a auto-avaliação e auto-aprendizagem. A vertente motivacional concerne às auto-percepções

de auto-eficácia, às auto-atribuições (Weiner, 1992; Faria, 1998), aos auto-reforços positivos ou incentivos

afectivo-relacionais (Bandura, 1992) e, ainda ao interesse intrínseco pelas tarefas (Deci, 1975, Lepper &

Hodell, 1989) e sentido do investimento pessoal (Maehr, 1984). De facto, os alunos auto-regulados não são

apenas os que se orientam e realizam activamente mas também, aqueles que investem e evidenciam

capacidades automotivatórias na resposta às situações de aprendizagem, intrinsecamente motivados. Por

último, os aspectos atitudinais e comportamentais prendem-se com as competências mais ligadas aos

aspectos de operacionalização e reestruturação cognitiva, nomeadamente a actualização dos meios, a

selecção das estratégias mais adequadas á aprendizagem, a utilização das técnicas e tácticas para recolha,

organização, armazenamento e evocação da informação. Neste sentido, é suposto que os alunos auto-

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regulados seleccionem, estruturem, criem e utitilizem as estratégias de aprendizagem que lhes permitam

optimizar desempenhos (Zimmerman & Martinez-Pons, 1986).

Por outro lado, segundo Krahé (1992, referido por Lima, 1997: 22) algumas linhas de investigação

têm contribuído para firmar alicerces teóricos acerca do conceito actual de 'traço' ou 'perfil'. Entre os vários

esforços neste sentido, destacamos uma orientação virada para a pesquisa das dimensões gerais e básicas

nos traços que permitem uma descrição parcimoniosa, ainda que compreensiva, das principais

características e diferenças existentes nos sujeitos quando considerados individualmente ou em grupo. Em

ordem à identificação de grupos de estudantes, na amostra tomada, com base em possíveis similaridades

nos indicadores relativos ao uso de estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais, efectuamos

uma análise de clusters, considerando estas variáveis como dependentes e os restantes indicadores do

estudo, como variáveis independentes. Os resultados obtidos suportam a nossa assunção inicial de que é

possível diagnosticar e caracterizar, nos alunos do 1ºano (comum) da Universidade de Aveiro, atitudes,

comportamentos e procedimentos de estudo que, uma vez identificados predizem intervenções mais

adequadas aos sujeitos, ás situações e contextos de aprendizagem. Neste sentido, obtivemos três possíveis

agrupamentos de alunos (perfis) que passamos a caracterizar, em síntese:

Grupo 1: O primeiro agrupamento obtido, pode ser identificado com o perfil de alunos do 1ºano (comum),

mais próximo com a hipótese que caracterizava os sujeitos que, apresentando elevados níveis de

ajustamento académico e adoptando uma abordagem [achieving] e/ou [deep], tenderiam a indicar níveis

elevados relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras das aprendizagens. Efectuando uma

breve análise descritiva dos elementos que constituem este agrupamento, fixamos as seguintes

observações.

1. Ao contrário do esperado, porém com índices acima da média, os alunos que integram este perfil

tendem a apresentar níveis moderados de confiança em si, de satisfação com a Universidade. No

entanto, pensamos que estes dados não aparentam uma importância significativa, se atendermos

ao facto destes níveis passarem a ser elevados quando tomada, antes, uma medida global de

ajustamento académico. De modo análogo, os alunos deste agrupamento apresentam níveis

moderados (próximo da média global) no indicador de abordagem [surface]. Mas, é de crer que

uma razão para isso possa ser a fraca qualidade psicométrica evidenciada no estudo deste

indicador.

2. Subjacente a alguns aspectos exploratórios enunciados e presente uma preocupação geral que

começa a tomar forma acerca dos ‘maus’ hábitos de estudo, nos alunos, estes resultados sugerem

e parecem confirmar o facto dos sujeitos que constituem este agrupamento, tendem também a

apresentar falhas no uso regular de estratégias de planeamento e rotinas de procedimentos

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(hábitos de trabalho), aliás, bem evidenciadas pelos níveis moderados correspondentes a este tipo

de estratégias auto-reguladoras.

Grupo 2: O segundo perfil, mais próximo da hipótese que fixava aqueles alunos que indicavam níveis

reduzidos relativamente ao uso de estratégias auto-reguladoras e além disso, tenderiam a abordagens

pouco favoráveis do estudo, com fracos índices na abordagem [achieving] e/ou na orientação [deep] e

elevados índices numa abordagem do tipo [surface] e, a apresentar níveis baixos a moderados de

ajustamento académico. Justificamos que uma possível designação para este agrupamento seja 'alunos

em risco', em virtude dos elementos que o constituem, se caracterizam por baixos níveis de abordagem

[deep] e/ou [achieving] e elevados níveis na abordagem [surface]. Este facto, associa-se aos baixos

níveis de utilização de estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivas para a auto-regulação das

aprendizagens. Este perfil identifica também aqueles alunos do 1ºano que apresentam os níveis mais

reduzidos em cada uma dos indicadores e variáveis consideradas na presente investigação. Não

obstante, na amostra tomada, os elementos deste agrupamento apresentam níveis moderados (embora,

abaixo da média global) no que respeita à confiança em si, satisfação com a Universidade e medida

global de ajustamento académico. A este propósito, julgamos que uma justificação para estes dados

possa ser encontrada numa análise sócio-académica ao contexto universitário em que decorreu esta

investigação. Ou seja, as excelentes condições materiais, físicas e humanas do campus académico da

Universidade de Aveiro certamente terão contribuído para atenuar os efeitos esperados. Próximos

estudos poderão confirmar (ou não) estes dados. Entretanto, contrariamente aos níveis reduzidos

esperados no que concerne ao uso de estratégias cognitivas de aquisição e recepção de estímulos

relacionados com os processos de atenção, concentração e participação nas aulas e no uso de

estratégias de incentivo motivacional, os alunos deste perfil, evidenciam níveis moderados (abaixo da

média global). Sublinhamos que a estes resultados não terá sido alheio o facto de que a recolha dos

dados ter sido efectuado no início do 1º semestre lectivo e, portanto, antes de qualquer processo de

examinação final.

Grupo 3: Este terceiro grupo encontra-se mais próximo da hipótese que indicava os sujeitos com um uso

moderado de estratégias auto-reguladoras, níveis moderados de ajustamento académico e na

abordagem [deep] ou níveis moderados a elevados na abordagem [achieving] e níveis reduzidos na

abordagem [surface]. Este perfil quase coincide, na sua totalidade, com os aspectos identificadores

avançados previamente. Excepção é feita, relativamente aos níveis moderados para a ‘confiança em si’,

‘satisfação com a Universidade’ e ‘medida global’ de ajustamento académico. Assim, os alunos deste

agrupamento, tendem a apresentar níveis fracos (bastante abaixo da média global) nos indicadores

referidos. Justificamos, deste modo a categorização ‘alunos em processo de adaptação’, para

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CAPÍTULO 6

301

identificarmos os elementos tomados na amostra com este perfil. Entretanto, uma análise diferenciadora

destes elementos, evidenciava que uma maioria indicava ter ingressado na 3ªou + prioridades na

escolha do curso. Além disso, a maior parte eram alunos residentes (mesma direcção em tempo de

aulas e férias). Este facto, poderá ter pesado nos fracos níveis obtidos para a confiança em si (menor

autonomia e auto-responsabilidade?) e satisfação com a Universidade (menos interacção com o

contexto sócio-académico?). Ou seja, questões que no nosso entendimento deverão ser consideradas

em estudos futuros.

2. Conclusões

A entrada na Universidade constitui uma fase da vida académica em que o jovem estudante tem

que conciliar competências, interesses, vocações e objectivos pessoais com condições extrínsecas que

exigem mudanças, transformações e investimentos em múltiplas áreas e aspectos. A autonomia, a

responsabilidade, a independência e a interdependência resultantes da maturidade são dimensões que

marcam fortemente as mudanças operadas e situam o desenvolvimento global do indivíduo, neste período

de transição da adolescência para a vida adulta. De igual modo, implicam condições relacionadas com o

auto-conceito, a auto-estima e a auto-percepção das competências e capacidades, assim como afectam o

reconhecimento e auto-consciencialização de si próprio enquanto pessoa e na relação com os outros.

Foi pois, seguindo esta orientação que tentamos conhecer os padrões do desenvolvimento, em

paralelo com aspectos de agenda educativa. E neste sentido, somos levados a concluir que a modificação e

transformação das práticas ao nível dos contextos académicos universitários é uma invevitabilidade

histórica. Ou seja, é fundamental que se promovam de imediato as acções e as intervenções mais

concertadas sobre os sujeitos, situações e contextos. Neste sentido, é urgente que as universidades

instituam mecanismos e orgânicas, designadamente centros de apoio, aconselhamento ou de

acompanhamento ao estudante, visando ajudá-lo na resolução dos problemas existentes e prevenindo

fracassos.

Entretanto, a noção que os alunos são recipientes passivos na aprendizagem e que podem ser

treinados segundo vários modelos foi sendo progressivamente substituída pela perspectiva de que estes são

elementos activos, processadores da informação e proactivos na construção da sua própria aprendizagem.

Ou seja, o aluno percepciona-se como agente activo (centro causal da sua actividade cognitiva, afectiva e

relacional) com capacidade de criar representações conscientes e explícitas de acções passadas, presentes

e futuras. E na realidade, os resultados obtidos apontam no sentido de considerar que os alunos utilizam

uma flexibilidade e variedade de estratégias cognitivas, metacognitivas e afectivo-relacionais para a

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selecção, aquisição e utilização do conhecimento (estratégias pelas quais se ligam ou desligam nos

diferentes contextos em que se inserem, de acordo com Ramsdem, 1992). Mas, os procedimentos e

comportamentos de um indivíduo são, frequentemente afectados pelas consequências dos seus

desempenhos e, nesse sentido, os apoios, as ajudas e os reforços positivos são técnicas que certamente

permitirão, aos alunos, ter sucesso e saber o quanto são bem ou mal sucedidos. Então, será pois legítimo

considerar e aceitar a definição geral de aprendizagem, como aquela que foi avançada por Shuell (1986,

citado por Schunck, 1996: 2) de que 'learning is an enduring change in behavior, or in the capacity to behave

in a given fashion, which results from practice or other forms of experience '.

Por outro lado, o presente estudo nos seus aspectos mais gerais, foi orientado para ir ao encontro

de uma determinada perspectiva de aprendizagem. Referimo-nos à mudança de paradigma que constitui a

concepção contemporânea da aprendizagem auto-regulada. Nesta nova perspectiva, parecem convergir

várias correntes da aprendizagem e da motivação, nomeadamente, aquelas que reconhecem o papel

autónomo e activo do aluno e salientam a importância de que o processo de aprendizagem assume uma

forma efectiva, quando o jovem estudante investe e se envolve conscientemente na auto-motivação, auto-

gestão e auto-regulação das suas próprias aprendizagens. Ou seja, importa considerar, na análise dos

processos, não só os aspectos intelectuais e de conhecimento (declarativo e procedural) mas igualmente

outras variáveis associadas aos comportamentos estratégicos que os sujeitos adoptam para enfrentar as

suas aprendizagens (conhecimento situacional ou estratégico) num quadro motivacional de auto-atribuições

e auto-percepções de competência, confiança em si e satisfação.

Com efeito, ultimamente a psicologia educacional vem concebendo a motivação como mais uma

das componentes do sistema cognitivo e metacognitivo do sujeito, a qual, parece ser essencial na

compreensão das atitudes e comportamentos virados para o sucesso e êxito nos desempenhos. Cabe pois

aos jovens estudantes universitários demonstrar as atitudes e os comportamentos de aprendizagem mais

apropriados (ou seja, devem ser capazes de se munir dos conceitos, das competências e das estratégias

necessárias à motivação e á auto-regulação das suas aprendizagens). Além disso, devem percepcionar-se a

si mesmos como competentes nesses processos auto-reguladores (e.g., possuirem as percepções de auto-

confiança e auto-eficácia para activarem e desenvolverem as suas competências essenciais perante o

estudo e as aprendizagens).

Acerca destes sistemas de auto-percepção, as diversas investigações (Weinstein et al.,1988, 1989;

Zimmerman e colaboradores) convergem na demonstração que o aluno, desde cedo na sua vida escolar,

tende a apresentar um alto nível de consciência das consequências das actividades, nas quais se vê

envolvido ou a participar. Este alto nível de consciêncialização tem a ver com a concepção das metas

perseguidas pelo contexto educativo, mas também com a percepção, do próprio indivíduo, para apreender,

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CAPÍTULO 6

303

aprender e empreender determinada actividade ou tarefa que lhe seja proposta. À medida do seu

desenvolvimento, o conhecimento de si mesmo, como aluno, refere-se ao conhecimento das características

pessoais e preferências, as quais têm um impacto significativo na organização e gestão do estudo (que

matérias tenho mais dificuldade?, quais os meus ritmos e tempos de estudo? quais as estratégias mais

adequadas a cada tarefa de aprendizagem?, etc). Aliás, este nível crescente de consciência conduz o aluno

a elaborar juízos de valor sobre as tarefas e actividades em que se vê envolvido e a avaliar se as reúne, em

si próprio, por forma a poder executá-las com êxito (ou fracasso).

Mas, a especificidade do contexto académico universitário obriga que sejam tomadas em

consideração outras variáveis que interagem no sistema. Por exemplo, para que os alunos possam

estabelecer objectivos de aprendizagem realistas, importa que consigam identificar a utilidade e pertinência

dos conteúdos e objectivos das suas aprendizagens. Ou seja, é certo que as suas representações acerca

dos objectivos de aprendizagem afectam as decisões e consequentes acções que concernem ao seu

envolvimento e à auto-consciêncialização acerca da exigência das tarefas de aprendizagem. Pensamos que

quando os alunos estabelecem objectivos realistas, ajustáveis às situações conseguem melhores

resultados, ao invés dos seus colegas mais irrealistas que tendem a experienciar dificuldades, frustações e

fracassos. Neste sentido, os resultados desta investigação, permitem reflectir sobre um aparente

desfasamento no que se refere às situações e problemas existentes e às realidades dos sujeitos.

Pensamos também que quando os alunos são e se sentem implicados na situação pedagógica, a

sua aprendizagem constrói-se e torna-se, de facto, significativa. Este grau de significação ou de sentido que

as tarefas trazem ao sujeito, exerce uma forte influência particular nos processos auto-reguladores da

aprendizagem, nomeadamente, nas suas componentes comportamentais (estratégias de aprendizagem).

Mas, julgamos que a grande maioria dos subsistemas de formação se encontram ainda bloqueados em

processos de ensino/ aprendizagem, cujo enfoque são os aspectos intelectuais, demasiado convencionais e

através dos quais se torna pouco provável, senão impossível, uma aprendizagem significativa. Neste

sentido, associamos a afirmação de que 'se reuníssemos num mesmo conjunto, elementos tais como um

programa obrigatório, a identidade de tarefas para todos os estudantes, a exposição magistral como único

modo de ensino ou quase, os exames uniformizados que avaliam os estudantes a partir do exterior, as notas

ou menções dadas pelo mestre como única medida da aprendizagem, poderíamos então garantir, sem

grande risco, que a aprendizagem significativa será reduzida ao mínimo (...). De facto, existem outras

possibilidades quer seja ao nível dos meios concretos de conduzir uma aula ou um curso, no plano dos

princípios e das hipóteses sobre os quais se pode edificar o ensino, quer ao nível de objectivos e de valores

no sentido dos quais professores e estudantes podem tender' (prólogo de Liberté pour apprendre, Dunod,

1972, citado por Barth, 1987).

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304

Na realidade, uma abordagem mais associada a uma partilha das responsabilidades e a uma

superior incidência das concepções qualitativas dos processos de formação, ensino e aprendizagem, nos

quais possam ser perspectivados os papéis de cada um (professor ou aluno) de modo cooperativo e em

parceria, no suporte aos respectivos processos de acção e construção, é o que se requer e deseja. Mas, a

verdadeira compreensão e sentido das aprendizagens é mais complexo que a mera aquisição e construção

de conhecimentos, ou seja, ocorre na forma de um processo de integração activa, onde todos os

conhecimentos anteriores, competências e experiências são importantes para o aluno construir novas

representações internas. Neste sentido, o modo pelo qual os alunos vêem e abordam a sua aprendizagem e

o modo como os professores vêem e abordam o seu ensino, fornece uma explanação acerca do porquê os

alunos não atingirem determinados objectivos e metas da formação universitária. Os alunos nem sempre se

envolvem e ajustam devidamente ao processo de aprendizagem e podem, por vezes, limitar-se a cumprir as

exigências dos planos de estudos com o mínimo de esforço e empenho. Os professores parecem encorajar

esta realidade, quando utilizam procedimentos de ensino e métodos de avaliação, cuja ênfase recaia apenas

sobre o acréscimo da quantidade de conhecimentos.

Ao invés, há que responsabilizar o aluno pela sua própria aprendizagem. Há que preparar o aluno

para o sucesso, ajudando-o a munir-se dos conhecimentos, competências e skills específicos que lhes

permitam auto-regularem as suas aprendizagens. Promover alunos auto-regulados implica facilitar a

consecução dos seus ciclos auto-regulatórios das aprendizagens. A este propósito, retivemos a sugestão de

Chalmers & Fuller (1996) para que os professores registem as diferenças positivamente e que desafiem os

seus alunos a reflectirem criticamente no modo como encaram os seus próprios processos de

aprendizagem. Que os ajudem a (re)adpatarem as estratégias de estudo e aprendizagem ao nível da

proficiência (Zimmerman & Martinez-Pons, 1992). Mas, para isso, tem de haver algum consenso acerca de

quais as competências exigidas e quais as que são desejadas no final dos processos de ensino e

aprendizagem.

Embora, sem estar devidamente validado pela carência de estudos ligados à problemática,

sentimos que muitos dos estudantes universitários completam a sua licenciatura sem conseguir atingir as

metas e os objectivos preconizados2. Neste contexto, pensamos que o debate acerca da qualidade e

competência que assistimos presentemente é um sintoma de uma fase em que as instituições académicas

2 Nesta linha, sublinhamos as conclusões de Dahlgren (1997), na sua revisão de estudos acerca de alunos finalistas em várias

universidades, de que estes eram geralmente habilitados para reproduzir grandes quantidades de informação factual, completar rotinas complexas de competências e computações, aplicar algoritmos, demonstrar detalhadas aspectos do conhecimento, usando terminologia apropriada e susceptíveis de passar num conjunto de exames, mas, no entanto, continuavam a evidenciar graves limitações conceptuais, incapacidades várias na demonstração do que realmente entenderam o aprenderam na sua formação universitária e, ainda, acentuadas dificuldades na aplicação prática dos seus conhecimentos em novos problemas e situações, momeadamente aquelas que exigiam trabalho cooperativo e em equipa.

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CAPÍTULO 6

305

vêm, de uma forma ou outra, demonstrando e que resulta da tentativa de adaptação, às realidades da

sociedade em particular e, à vida em geral. Não obstante, somos levados a crer que estas instituições de

formação assentam toda a sua legitimidade em projectos à volta do saber e do conhecimento presente, ou

seja, à volta do conhecimento acerca do mundo de hoje. Acontece que o mundo de hoje é cada vez mais

incognoscível, não apenas epistemológica, social e culturalmente, mas, sobretudo em termos das nossas

identidades pessoais (Barnett, 1997). Assim, uma educação para um mundo incognoscível (porque nós

estamos a reconstruír a nós próprios e ao nosso mundo) requer novos conceitos de competência, ou antes

novos conceitos de educação das competências.

Além disso, num mundo em mudança, incerto e inesperado o que se exige são capacidades do

desenvolvimento humano, as quais, desafiam qualquer noção existente de competência. Isto é, em tempos

de mudanças radicais e de incertezas, as situações não são fixas e as competências específicas são

claramente contestadas. Concluimos então, que o importante será certamente uma efectiva educação para o

advir, cuja legitimidade reclama das Universidades as competências (humanas, científicas e tecnológicas)

mais adequadas à obtenção e aperfeiçoamento do conhecimento que temos do mundo em que vivemos, dos

contextos em que nos inserimos, de nós próprios e dos outros.

3. Limitações metodológicas e futuras investigações

Antes de finalizarmos este trabalho importa fazer referência a algumas limitações surgidas no

desenvolvimento do presente estudo e apontar ideias ou sugestões para trabalhos futuros. Ou seja, a

concretização das limitações permite falar em alguns aspectos que deverão ser tomados em conta em

futuros desenvolvimentos do tema, entre os quais, descrevemos os seguintes.

Em primeiro lugar, a preocupação acerca do desenvolvimento das competências de estudo em

contexto universitário é matéria muito recente da investigação psico-educacional. Com efeito, atendendo às

dimensões em causa, os estudos publicados, apresentam-se ainda bastante dispersos e pouco

consistentes, além, das existências serem, na sua esmagadora maioria, artigos ou notas de investigação

publicados em revistas da especialidade anglo-saxónica. De facto, no que concerne às experiências e

investigações realizadas em Portugal, estas ainda se caracterizam pela sua raridade e orientadas sobretudo

para o estudo da problemática da utilização de estratégias em contexto de aula, ao nível do ensino

secundário (e.g., Projecto Dianoia) e a aspectos intra-psicológicos, vivênciais ou de ajustamento vocacional,

ao nível do ensino superior universitário que irregularmente vão surgindo em artigos, na sua maioria,

referentes a dissertações de mestrado e/ou doutoramento. Estes factos, aliados às limitações inerentes á

obtenção ou aquisição de obras de referência específica fora do nosso fácil alcance, dificultou e

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306

comprometeu seriamente a nossa revisão bibliográfica e a escolha de modelos e instrumentos mais

adequados e apropriados à problemática e objectivos desta investigação.

Em segundo lugar, decorrente do estudo de validação e aplicação dos instrumentos surgiram, de

forma algo inesperada, questões susceptíveis de registo. Poderemos ensaiar uma explicação para o facto de

não ter sido encontrada uma estrutura factorial semelhante ao estabelecido inicialmente, uma vez que a

distribuição dos itens foi efectuada segundo uma assunção puramente teórica, ao contrário dos resultados

da análise factorial que assentaram numa base empírica. De acordo com Almeida (1988), a realização dos

cálculos tem subjacente o facto das características psicológicas se encontrarem distribuídas segundo as leis

da curva 'normal'. E continua, tendo presente os constrangimentos que este princípio representa para a

psicologia, aceitou-se que a sensibilidade dos resultados teria mais a ver com as características do

instrumento e da população observada e menos com a dimensão psicológica em si mesma. Por outro lado,

sublinhamos o facto de não ter sido possível validar (externamente) os resultados obtidos nas várias

dimensões e subdimensões, cruzando-os com outras provas e resultados afins.

Em terceiro lugar, para além da avaliação quantitativa, seria importante utilizar outros indicadores

(formais e informais) de carácter qualitativo. Nomeadamente, no que concerne aos produtores das

representações (estudantes universitários), referimo-nos á recolha de informação mais pormenorizada sobre

os seus métodos e hábitos de estudo, a sua agenda semanal de trabalho, as suas próprias dificuldades de

organizar e controlar o seu estudo autónomo, etc. No que concerne a outros agentes, seria interessante

recolher o testemunho dos docentes acerca dos processos auto-reguladores das aprendizagens desejados

ou perspectivados para os seus alunos.

Em quarto lugar, sentimos a necessidade de incluir outras (mais) variáveis desdobráveis ou

representativas de modelos mais complexos e elaborados, com vista a investigar melhor as influências

existentes entre e intra dimensões, nomeadamente, no que diz respeito ao processo de ajustamento

académico e aos processos auto-reguladores do estudo e aprendizagens. Sublinhamos, por exemplo, que

neste estudo, não foram analisadas as relações existentes entre as atribuições causais do

sucesso/insucesso e os níveis de ajustamento académico ou as abordagens ou o uso de estratégias auto-

reguladoras. Contudo, o valor do sucesso parece desempenhar um papel preponderante na aprendizagem,

ajudando os sujeitos a compensar os seus baixos níveis de utilização de estratégias cognitivas e

metacognitivas. Por outro lado, seria igualmente necessário prestar uma maior atenção aos efeitos de

interacção entre variáveis, assim como, as eventuais variações quando se tomam diferentes grupos de

sujeitos. Os aspectos da relação causa-efeito entre os níveis de ajustamento académico, abordagens e uso

de estratégias reguladoras sobre os resultados e desempenhos académicos, são questões que permanecem

em aberto e só poderão ser devidamente esclarecidas através da realização de estudos longitudinais e com

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CAPÍTULO 6

307

carácter mais qualitativo ou recorrendo a estudos quantitativos mais elaborados ( e.g., análise estrutural).

Julgamos também que este estudo realça o valor de se usar formas complementares de análise quantitativa,

no caso, recorrendo a procedimentos da análise de clusters e análise factorial exploratória dos resultados

nos itens. A análise factorial mostrou pequenas relações sistémicas entre indicadores e variáveis. Por sua

vez, a análise de clusters mostrou que há uma estreita relação entre níveis de ajustamento e auto-regulação

académica.

Em quinto lugar, tal como foi postulado antes, as estratégias auto-reguladoras são atitudes e

comportamentos orientados, nos estudantes, para manipular os processos cognitivos, metacognitivos e

afectivo-relacionais durante as aprendizagens. Neste sentido, os poucos estudos existentes têm procurado

investigar programas de treino e promoção das estratégias mais apropriadas, nos quais se evidenciam

aprendizagens dos alunos para a selecção de informação relevante e na construção de conexões. No

entanto, estes estudos ainda salientam muitos aspectos insolúveis no vasto campo das metodologias de

estudo, ensino e aprendizagem. A este propósito, sublinhamos que são precisos melhores técnicas e

melhores instrumentos para descrever e avaliar os processos auto-reguladores e os respectivos resultados

da aprendizagem. Neste estudo não conseguimos saber de que modo o uso das estratégias auto-

reguladoras das aprendizagens afectam a construção de conexões externas ou internas e consequentes

resultados académicos. Com efeito, carecemos de medidas dependentes que sejam sensíveis às diferenças

existentes nos estudantes observados, nomeadamente medidas de carácter qualitativo do rendimento

destes estudantes (e.g., a utilização da taxonomia SOLO (Biggs & Collis, 1982)). Analisando apenas as

percentagens (globais) de sucesso e de insucesso não é possível alcançar este objectivo.

Por último, carecemos também de uma investigação de base, assente na preocupação relativa à

questão de saber como se pode agir sobre os problemas, fornecendo aos alunos os mecanismos que os

ajudem a estudar e a aprender através da aquisição e treinamento de estratégias de estudo e aprendizagem

gerais, independentes ou sujeitas a domínios específicos. Ou seja, saber como é possível desenvolver as

competências de estudo em estudantes universitários. Neste sentido, importa referir por exemplo, que as

concepções sócio-cognitivistas da aprendizagem têm suscitado o aparecimento de programas de

intervenção visando o desenvolvimento, nos alunos, das estratégias (cognitivas, metacognitivas e afectivo-

relacionais) mais apropriadas à auto-regulação das aprendizagens. Estas concepções implicam também que

um aluno tem responsabilidades muito importantes acerca das suas performances e desempenhos, nos

seus sucessos e fracassos. Não obstante, mesmo ao nível universitário, é muitas vezes por via das acções

pedagógicas e estratégicas do professor que o estudante universitário adquire os conhecimentos e as

estratégias indispensáveis à gestão dos seus desempenhos e à auto-regulação das suas aprendizagens.

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308

Como orientação geral, investigações futuras deverão interessar-se pela exploração e

aprofundamento do conceito de auto-regulação académica com vista a trazer para a discussão toda a

riqueza informativa que este comporta para a compreensão e conhecimento das respostas capazes a muitos

dos problemas de aprendizagem e progressão dos estudantes universitários. Além disso, investigações

futuras deverão igualmente ser dirigidas para a análise de experiências e projectos de intervenção em vários

domínios e conjugando diferentes metodologias na observação dos sujeitos, situações e problemas.

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ANEXOS

ANEXO 1. Resumo das características de instrumentos inseridos no modelo 'SAL' ANEXO 2. ASI: versão de 18 itens (Newstead, 1992) ANEXO 3. Síntese de processos auto-reguladores do estudo e aprendizagens ANEXO 4. 'QIVA': Questionário de Identificação e Vida Académica ANEXO 5. 'QACE': Questionário de Atitudes e Comportamentos perante o Estudo ANEXO 6. Matriz de dimensões, indicadores e itens (QIVA+QACE)

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ANEXO 1

Resumo das principais características de alguns instrumentos do modelo ‘SAL: Students Approaches to Studying' (Biggs, 1993)

SPQ: Students Processe Questionnaire (Biggs, 1987) O SPQ é um questionário com 42 itens com vista a medir a extensão, pela qual, os alunos do ensino superior endossam diferentes abordagens do estudo e aprendizagem, identificando os motivos e as estratégias para cumprir essas aproximações (Biggs, 1987). Implícito na base teórica do SPQ está que os motivos e as estratégias usadas pelos alunos e trazidas para o contexto de aprendizagem podem ser alteradas. A investigação acerca das abordagens do estudo e aprendizagem têm dado forte suporte à perspectiva que o sucesso (qualidade) nos desempenhos está alinhada com os processos de intenção (deep) e forte determinação (deep-achieving) na abordagem do estudo e ainda que os sujeitos podem ser orientados e ajudados na adopção de uma destas formas de abordar o estudo. Uma síntese do motivo e estratégia que caracterizam cada uma das três dimensões de abordagem, de acordo com Biggs (1987) é sumariada no quadro seguinte:

Motivo e estratégia na abordagem do estudo, segundo Biggs (1987)

Abordagem Motivo Estratégia superficial (surface)

Para saber o mínimo. O meio termo entre falhar e trabalhar mais quando necessário

Limitar objectivos para obter apenas o essencial e procurar saber de cor os assuntos em estudo

profunda (deep)

Interesse intrínseco naquilo que é aprendido e em se envolver e em desenvolver competências académicas

Descobrir o sentido dos assuntos estudando-os com profundidade e relacionando-os com os conhecimentos anteriores

objectivada (achieving)

Obter satisfação do ego e autoestima através da competição, obter altas classificações, independentemente das matérias em estudo

Organizar tempo e espaços de trabalho; seguir as sugestões, gerir o tempo, tornar-se um aluno ‘modelo’

O SPQ é composto por uma escala ordinal de 5 pontos (formato Lickert) com itens acerca dos comportamentos e modos habituais de estudo, nos alunos. Os resultados totais nas três escalas (surface, deep, achieving) de abordagem compostas cada uma de duas subescalas, designadas por, 'motivo' e 'estratégia', são obtidas pelo somatório dos resultados nos itens. A partir destas escalas, deriva uma quarta escala, designada de ‘deep-achieving’ e obtida pela conjunção dos totais das duas escalas componentes. Uma avaliação dos totais das dez dimensões permitiu considerar, nos sujeitos, seis perfis diferentes de aproximação ao estudo (Murray-Harvey, 1994:378). O modelo de Biggs, reforça a ideia que os estudantes podem tomar uma de três opções perante o estudo, cada uma destas consistindo em motivo e estratégia para estudar. Ou seja, à distinção entre as duas dimensões (‘deep’ vs ‘surface’) mencionadas por Marton & Saljö (1976), Biggs faz corresponder uma terceira abordagem que denomina por ‘achieving approach’, ressalvando que qualquer uma das três dimensões propostas no seu modelo, resultam de um motivo e de uma estratégia (Biggs, 1993). Ainda, relativamente ao SPQ vários estudos de validade têm sido realizados e modo geral, têm procurado assentar nos três modelos de aproximação ao estudo. Estudos independentes usando o SPQ sugerem que este instrumento providencia uma ferramenta útil, com o qual é possível medir as dimensões da aproximação ao estudo, contudo com algumas sérias limitações no que concerne aos baixos coeficientes de saturação obtidos em várias extracções factoriais e aos baixos índices de validade interna em algumas das suas escalas, mormente, a escala ‘surface’. Mas, os resultados nas outras escalas ‘deep’ e ‘achieving’ do SPQ têm eveidenciado valores do coeficiente α de Cronbach aceitáveis (na vizinhança de .70) (Christensen et al, 1991 e Watkins& Hattie, 1990). Finalmente sublinhamos a aportação de Murray-Harvey (1994) quando este salienta que uma utilização inapropriada do SPQ, caso o objectivo seja inferir informação acerca das preferências de aprendizagem, nos estudantes. No mesmo sentido, Curry (1990, referido por Murray-Harvey, 1994:385) igualmente argumenta que seria insensato ou imprudente utilizar um instrumento que mede construtos a um determinado nível se o objectivo é predizer comportamentos governados por outro nível.

I.L.S. Inventory of Learning Styles (Vermunt, 1992) Vermunt, em 1992, publica na Holanda a sua dissertação sobre os modos e comportamentos de estudo em alunos universitários. Considera estes modos como ‘estilos’ de estudo e estabelece que o estilo individual perante o estudo é determinado por diferentes actividades (estratégias gerais) de assimilação e regulação que os sujeitos usam

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ii

durante o processo de estudo e também as motivações e concepções (opiniões) que estes têm acerca do estudo e aprendizagem. Defende que os estilos pessoais de estudo são sem dúvida estáveis, não sendo, contudo inalteráveis. Para medir estes estilos, Vermunt desenvolveu o ILS: Inventory of Learning Styles, instrumento de diagnóstico de aspectos relacionados com os métodos e motivações para o estudo e modelos mentais acerca do estudo, no contexto do ensino superior. O ILS contém mais de 120 expressões acerca do estudo e da aprendizagem, classificados em 16 escalas principais. Estas, por sua vez, estão agrupadas em quatro categorias principais, que são, a aproximação ao estudo, a regulação do estudo, as motivações para o estudo e, as concepções e expectativas acerca do estudo e da aprendizagem. Uma síntese das categorias e dimensões do ILS pode ser observado no quadro seguinte:

ILS- Categorias principais ABORDAGEM DO ESTUDO Intencional Superficial Elaborado

O estudante desenvolve processos cognitivos, tais como: - relaciona, estrutura, analisa criticamente, selecciona - analisa passo-a-passo, reproduz, memoriza, reitera - concretiza, aplica conhecimentos

REGULAÇÃO DO ESTUDO: Auto-regulado Regulação externa Falta de regulação

O estudante desenvolve actividades metacognitivas de regulação, como: - preparar-se para enfrentar um problema ou tarefa - planear, diagnosticar, avaliar, controlar, reflectir O docente (outro) é chamado para a activação e execução das actividades de regulação no aluno Falha qualquer tentativa para regular o processo de estudo. por parte do aluno

ORIENTAÇÕES DE ESTUDO: Para o diploma (certificado) Segundo as competências Segundo aspirações pessoais Segundo a vocação Ambivalência

Motivado para a obtenção, no futuro, de graus ou certificados O estudante é motivado para testar as suas próprias capacidades, provando a si mesmo do que é capaz de fazer. Motivação emerge de genuínos interesses num domínio específico ou na oportunidade de auto-enriquecimento O primeiro objectivo é reunir as competências para uma vocação específica Insegurança, atitude dúbia e insegurança acerca do estudo

Concepções mentais sobre: Aquisição de conhecimento Construção do conhecimento Uso do conhecimento Estímulos Co-operação

Desenvolver actividades de estudo é considerado tarefa da aprendizagem: o estudante vê-se a si mesmo como um absorvente passivo do conhecimento O estudante assume para si mesmo a responsabilidade em desenvolver actividades de estudo: estudar é visto como penetrar no material de estudo e compreender as relações entre as suas componentes A ênfase é colocada no aspecto prático do uso do material de estudo; realizar actividades e tarefas de estudo é vista como importante. O estrudante aceita as tarefas como parte do material de estudo, mas espera que a aprendizagem providencie os estímulos necessários Com colegas e partilhando tarefas de estudo é altamente considerado

(Traduzido e adaptado de Shatteman et al., 1997: 114) De acordo com este inventário, são quatro os estilos distintos que permitem caracterizar os alunos ao nível do ensino superior. Ou seja, o estilo de alunos que procuram dar significação ao estudo, relacionando e analisando criticamente os materiais de estudo e desenvolvendo os seus próprios esquemas de assimilação e regulação (meaning-directed); o estilo de alunos com comportamentos de estudo orientados para a reprodução e memorização dos materiais de estudo, objectivados para a obtenção de certificados com o mínimo exigível (reproducing-directed); o estilo de alunos que procuram aplicar tudo aquilo que estudam ao real, actual ou a aspectos concretos do estudo (application-directed) e, por último, um estilo de alunos revelador de carências na regulação e processamento do material de estudo e evidenciando um carácter problemático (undirected) (Vermunt, 1996; 1998).

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ANEXO 1

iii

Com diferentes amostragens de entre alunos universitários, Busato et al. (1998) têm procurado e conseguido replicar com exactidão grande parte dos resultados de Vermunt. Além disso, concluiram, inclusivamente, que o estilo problemático é um preditor negativo do sucesso académico. Ao invés, foi possível assumir que os protótipos dos estilos, nomeadamente, orientado para o sentido do estudo (meaning-directed) e para o real (application-directed) ou, mais realisticamente a conjunção dos dois estilos, nos estudantes, são os que oferecem a melhor perspectiva de sucesso no ensino superior (Schatteman et al, 1997: 113).

ASI: Approaches to Studying Inventory (64 itens) De acordo com Duff (1997: 530), o ASI de Entwistle & Ramsdem (1983) desde que surgiu no Reino Unido, tem sido um dos mais amplos e frequente instrumento utilizado na análise dos processos de aprendizagem ao nível do ensino superior. A sua mais comum versão é composta de 64 itens (com indicação do grau de concordância/discordância em formato Lickert de 5 pontos) reunidos em 4 escalas e 16 subscalas.

Quadro: descrição das escalas e subescalas do ASI

Escalas/subescalas Abordagens ao estudo

Descrição

Meaning orientation Deep approach Relating ideas Use of evidence Intrinsic motivation

questionamento activo na aprendizagem conexão entre diferentes temas e disciplinas relação entre dados e conclusões interesse pela aprendizagem

Reproducing orientation Surface approach Syllabus-boundness Fear of failure Extrinsic motivation

centrada na memorização e reprodução de factos depósito da confiança nos docentes para a definição das tarefas de aprendizagem pessimismo e ansiedade relativamente ao fracasso interesse no estudo em função de recompensas externas

Strategic orientation Strategic approach Disorganised study methods Negative attitudes to study Achievement motivation

centrado nas exigências das tarefas incapacidade para trabalhar e organizar o estudo regular ausência de interesse e atitudes incorrectas face ao estudo motivação determinação e competividade para obter altos rendimentos

Styles and Patologies Comprehension learning Globettroting Operation learning 'Improvidence'

facilidade em organizar o material de estudo e pensar divergente excessivo facilitismo e precipitação na obtenção de conclusões ênfase em factos e deduções lógicas excessiva confiança nos detalhes e aspectos de minúcia

Não obstante, estudos considerando as propriedades psicométricas do ASI convergem paara a indicação de que os seus pontos (scores) tendem a apresentar uma validade e confiança limitadas (Meyer & Parsons, 1989; Richardson, 1994). Sucessivas análises factoriais (exploratórias e confirmatórias) das respostas aos 64 itens, em alguns casos, dificilmente reproduziram a estrutura inicial, principalmente, nas escalas ‘achieving motivation’ e ‘styles and patologies’ onde os valores produzidos ficaram muito aquém do esperado, assim como parâmetros de consistência interna (α de Cronbach) relativamente baixos (Entwistle & Ramsdem, 1983; Clarke, 1988; Entwistle & Waterson, 1988; Speth & Brown, 1988; Meyer & Parsons, 1989; Newstead, 1992). Posteriormente, vários estudos utilizaram versões mais consistentes e reduzidas do ASI, mantendo a ênfase nos seus dois grandes domínios: as dimensões ‘meaning orientation’ e ‘reproducing orientation’. Por exemplo, Entwistle & Ramsdem (1983:52) usam uma versão reduzida de 32 itens do ASI numa amostra de ‘caloiros’ universitários que produziu níveis moderados de confiança e consistência interna (Entwistle & Waterson, 1988; Richardson, 1990 e Newstead, 1992) com coeficientes alfa relacionados, nas escalas, entre 0,46 e 0,79 (meaning) e 0,44 e 0,77 (reproducing) ( Duff, 1997: 530). A este propósito, nomeadamente, Richardson (1990) argumenta que é mais apropriado reduzir as escalas originais do ASI, abordando um máximo de 8 subescalas, as quais sejam, empiricamente identificadas com as duas dimensões referidas, tal como desenvolvido por Entwistle & Ramsdem (1983). O instrumento composto de duas escalas e 8 subescalas e 32 itens foi reproduzido por análise factorial das respostas geradas numa amostra de ‘caloiros’ universitários e demonstrou uma variação interna de consistência com coeficientes α entre 0,37 e 0,73 nas oito subscalas e entre 0,66 a 0,77 nas duas escalas: ‘meaning’ e ‘reproducing’.

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iv

O ASI tem sido submetido a sucessivas revisões, traduzido nas várias reduções produzidas a partir da sua versão inicial e resultante, modo geral de análises factoriais e confirmatórias da validade e consistência interna. Por exemplo, Entwistle & Waterson (1988: 259) retiram 30 itens do ILP ( Schmeck, 1983) e 30 itens da escala original do ASI que melhor combinavam abrangência com descriminação. A estes, acrescentam um grupo de 15 itens que avaliavam questões recorrentes das escalas originais e onde se incluía uma escala adicional (social motivation) sugerido pelo trabalho de Taylor (1983). Resultou num inventário composto de 75 itens. Correlações entre as subescalas deste inventário revelou substancial concordância entre os principais dimensões usadas nas duas tradições teóricas que procuravam descrever as estratégias de estudo utilizadas pelos alunos. Clarke (1988) prefere usar também uma versão modificada do ASI para investigar a validade preditiva das correlações lineares entre as respostas ao questionário e os resultados de exames de avaliação de final de ano em alunos de ciências médicas. No seu estudo, mostra que os desempenhos escolares são melhor preditos pelas escalas e subescalas do ASI que avaliam as orientações motivacionais dos alunos (citando como exemplo, as dimensões: ‘strategic approach’ e a ‘achieving motivation’) do que as escalas que avaliam mais os estilos cognitivos (como por exemplo a ‘deep approach’). Sadler-Smith (1996) encontrou algumas correlações, embora fracas (r=0,25:p<.01) entre resultados da subescala ‘deep approach’ e desempenho escolar em alunos de economia. Contudo, este investigador salienta que o instrumento ASI parece demonstrar algum sucesso como preditor do desempenho escolar. RASI: Revised Approaches to Studying Inventory Um exemplo bem característico dos processos de revisão e redução do ASI é o RASI: Revised Approaches to Studying Inventory (versão de 38 itens) concebido e desenvolvido por Entwistle & Tait (1994), designadamente, para medir as abordagens do estudo em estudantes universitários. Os itens foram conceptualizados e descritos a partir de cinco orientações perante o estudo, correspondendo a cinco escalas do inventário: a ‘deep/meaning approach’ (10 itens relacionados com significação e sentido do estudo, activo e sentido crítico, relacionamento e organização de ideias, uso de evidência e lógica), a ‘surface/reproducing approach’ (10 itens relacionados com memorização, dificuldade em dar sentido e significado às aprendizagens, ausência de referência, preocupações com a actividade escolar ), a ‘strategic/achieving approach’ (10 itens relacionados com a determinação para a qualidade e excelência nos desempenhos, esforço no trabalho e estudo, estudo organizado e gestão do tempo), a ‘ lack of direction’ (4 itens relacionados com preocupações de carácter vocacional, orientacional e acompanhamento do estudo ) e ‘academic self-confidence’ (4 itens relacionados com a autopercepção enquanto estudante). Uma versão mais recente de 44 itens do RASI, com 15 subescalas foi desenvolvida para medir seis escalas: deep/meaning, surface/reproducing e strategic/achieving approach, lack of direction, academic self-confidence e metacognitive awareness of studying (Entwistle & Tait, 1995). Tomando como base esta versão do RASI (44 itens), Duff (1997) estuda o grau de confiança e validade, produzido por uma versão mais reduzida (30 itens). Evidencia, no seu estudo, valores moderados a elevados de consistência interna (α de Cronbach) e de confiança entre as escalas e subescalas. Uma análise factorial das 15 subescalas do RASI permitiu reconstruir as três dimensões (deep/meaning, surface/reproducing, strategic/achieving). Por outro lado, a análise factorial dos itens confirmou também a existência de três outros factores adicionais, contudo a relação entre estes factores encontrados e algumas das subescalas do RASI revelava alguma ambiguidade. Ainda Duff (1997: 536) sublinha que esta versão (30 itens) utilizada por si, permite medir os construtos (dimensões ou orientações de abordagem ao estudo) amplamente compreendidos no contexto académico do ensino superior e frequentemente aplicados no desenvolvimento de programas e planos de estudos. Recentemente, Tait & Entwistle, utilizando uma amostra de ‘caloiros’ universitários e aplicando uma versão inicial do RASI (60 itens) encontraram índices satisfatórios de validade e consistência interna (0,73 < α < 0,83) para as 5 escalas. Contudo, os índices de validade encontrados deverão ser metodologicamente questionados, uma vez que, a análise factorial realizada tomou os totais produzidos em cada uma das 15 subescalas e não os itens individualmente. Aliás, contrariamente ao que sucede por exemplo com o ASI, uma breve revisão à literatura existente em algumas revistas de especialidade, revela-nos poucos trabalhos considerando as propriedades psicométricas do RASI. Uma excepção foi a de Waught & Addison (1998) que, num estudo das propriedades psicométricas do RASI (38 itens), através de um modelo de análise designado de RASH: Extended Logistic Model of Rash (Rash, 1980 referido por Waught & Addison, 1998:98) mostraram que o instrumento apresentava resultados satisfatórios, quando alguns dos itens eram eliminados (nomeadamente, os itens 20 e 33). O desenho conceptual das cinco orientações perante o estudo foram, entretanto, confirmadas. Mas, apenas 15 itens apresentaram níveis satisfatórios de variância entre quatro dos subgrupos. As características psicométricas das três subescalas (deep/meaning, surface/reproducing e strategic/achieving approach) foram moderados e as variações entre itens das restantes dimensões (lack of direction e academic self-confidence) foram bastante insatisfatórios.

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ANEXO 1

v

ASI: Versão reduzida de 18 itens Newstead (1992) estuda uma forma reduzida do ASI, composta por 18 itens, impondo uma solução factorial tridimensional correspondente às três orientações do ASI (meaning, reproducing e achieving). A análise factorial, através de rotações ortogonais Varimax, permitiu que os factores preditos (três) emergissem salientando os itens do seguinte modo: 5 de 6 itens da dimensão ‘achieving’ saturam no factor 1 (coeficientes entre .39 e .66); todos os itens da dimensão ‘meaning’ saturam no factor 2 (coeficientes entre .32 e .67) e 5 de 6 itens saturam no factor 3 (coeficientes entre .43 a .66). Entretanto, subsistem também alguns contrangimentos, nomeadamente o facto de dois dos itens saturarem negativamente nos factores em que são supostos pertencer. Aliás estes itens mostraram igualmente baixas correlações com os elementos da mesma escala (Richardson, 1992) já havia encontrado problemas idênticos relativamente a estes itens). Por outro lado, Newstead (1992:307) encontrou também algumas correlações significativas entre os pontos do ASI (18 itens) e os desempenhos académicos dos sujeitos (r=.32: p<.01 para a dimensão ‘achieving’ em sujeitos do 3ºano; r=.22 : p<0,5 para a dimensão ‘meaning’ na globalidade), factos, que o levaram a concluir que, embora, esta forma reduzida do ASI seja um instrumento com validade moderada, a sua estrutura factorial é razoavelmente robusta, pelo que pode ser considerado de elevado potencial utilitário nos estudantes universitários.

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ANEXO 2 Versão de 18 itens do ASI: APPROACHES TO STUDYING INVENTORY (Entwistle & Ramsdem, 1983)

Fonte: Newstead,S.E. (1992). A study of two 'Quick- and- easy' methods of assessing individual differences in student learning. British Journal of Educational Psychology, 62, 299-312.

(A1) I find it easy to organise my study time effectively (R1) I like to be told precisely what to do in essays or other set work (A2) It’s important to me to do really well in the couses here (M1) I usually set out to understand thoroughly the meaning of what I am ashed to read (R2) When I’m reaading I try to memorise important facts which may come useful later (A3) When I’m doing a piece of work, I try to bear in mind exactly what that particular lecturer seems to want (M2) My main reason for being here is so that I can learn more about the subjects which really interest me (R3) I suppose I’m more interested in the qualification I’ll get than in the courses I’m taking (A4) I’m usually pompt in starting work in the evenings (M3) I generally put a lot of effort into trying to understand things which initially seem difficult (R4) Often I find I have to read things without having a chance to really understand them (A5) If conditions aren’t right for me to study, I generally manage to do something to change them (M4) I often find myself questioning things that I hear in lessons or read in books (R5) I tend to read very little beyond what’s required for completing assignments) (A6) It 's important to me to do things better than my friends, if I possibly can (M5) I spend a good deal of my spare time in finding out more about interesting topics which have been

discussed in class (M6) I find academic topics so interesting, I should like to continue with them after I finish this course (R6) I find I have to concentrate on memorising a good deal of what we have to learn

(A)- Achieving approach (R)- Reproducing approach (M)- Meaning approach

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ANEXO 3

SÍNTESE DE PROCESSOS AUTO-REGULADORES DAS APRENDIZAGENS

Procura-se saber se o jovem estudante universitário do 1ºano da Universidade de Aveiro:

usa estratégias cognitivas (de processamento e organização do estudo);

promove atitudes, procedimentos e comportamentos com vista a rendibilizar o estudo, optimizando os processos de aquisição da informação (escuta e atenção, leitura, observação, tomada de notas, registo, procura, etc)

promove atitudes, procedimentos e comportamentos no sentido da tomada de conhecimento dos mecanismos e processos individuais de transformação e restruturação da informação (organização, selecção, planeamento, processamento, conexão, recuperação, integração, generalização e aplicação).

usa estratégias metacognitivas (de resolução e execução, 'monitoring' do estudo);

promove atitudes, procedimentos e comportamentos no sentido de rendibilizar o estudo e aprendizagens, tomando consciência dos distractores de estudo e orientando-se para a optimização dos processos de decisão, gestão, controle e auto-avaliação dos seus próprios sucessos e insucessos, reflectindo e redefinindo metas e objectivos (académicos, profissionais, pessoais, etc).

uso estratégias gerais (afectivo-relacionais)

promove atitudes, procedimentos e comportamentos que contribuem para a mudança de hábitos, mitos e crenças inadequadas às realidades e reforça o interesse pelas aulas, tarefas e práticas escolares e académicas.

Atitudes, procedimentos e comportamentos perante o estudo Antes das aulas

Ser assíduo Ser pontual Preparar os materiais para aula Preparar os assuntos para aula Estar pronto para aprender Estar motivado

Durante as aulas Seguir as regras da aula Escutar com atenção Efectuar as tarefas propostas Seguir as orientações dadas Questionar Ser activo e participativo Tirar notas ou apontamentos

Após as aulas Realizar os trabalhos fora das aulas Rever os apontamentos Fazer anotações Procurar informação (Biblio, internet) Tirar dúvidas c/docentes Trabalhar em equipa Fazer revisões e sínteses

Organização e gestão do estudo Tempo Materiais Espaços Materiais

nº de horas (horário) de estudo. calendário, agenda, etc.

Utilização de caderno de apontamentos, dossier, portefólio, etc.

local de estudo, distractores, conforto, arrumação, etc.

esquemas, resumos, sublinhados, anotações, mnemónicas, etc

(adaptado de Archer & Gleason, 1995)

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ANEXO 4

UNIVERSIDADE DE AVEIRO Departamento de Ciências da Educação

CARO ESTUDANTE

Estamos a realizar um estudo sobre o adaptação ao ensino superior dos alunos do 1º ano dos cursos de ciências e engenharias da Universidade de Aveiro. Para isso precisamos que preenchas este Questionário de Identificação. As respostas são confidenciais e utilizadas somente para fins estatísticos, pelo que a sinceridade das respostas é um factor fundamental para melhor podermos ajudar na sua integração e sucesso académico. Agradecemos a tua colaboração.

QUESTIONÁRIO DE IDENTIFICAÇÃO E VIDA ACADÉMICA 1. Dados pessoais

Nome (facultatativo) NºMec : .

Idade Sexo : � M � F Local de residência: . durante o período lectivo . durante as férias 2. Dados escolares

� Curso: Frequência do 1º ano pela 1ª vez? � Sim � Não � O curso que frequento foi a minha... � 1ª escolha � 2ªescolha � 3ª ou outra escolha � As minhas notas escolares no ensino secundário foram: . Média obtida no final do Secundário (10º,11º e 12ºano) ( indica na escala de 0-20 valores) . Nota de acesso à Universidade ( indica na escala de 0-20 valores) � Numa base semanal (100%) de tempo útil, a percentagem que dedico a cada uma das seguintes actividades é: % : para frequência de aulas % : para estudo independente % : em lazer ( descontracção, desporto, convívio, etc.) % : outra actividade. Qual? . 100 % : Total

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3. Dados da integração académica [assinala com uma cruz, em cada opção, o número que corresponde mais á tua apreciação entre ➀ = mínimo(discordância total) e o ➅ = máximo(concordância total)] � Relativamente às minhas expectativas face ao curso que tenciono concluir, considero que: min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � As matérias correspondem ao que eu esperava min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Os docentes correspondem ao que eu esperava min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Os colegas correspondem ao que esperava min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � O ambiente geral de trabalho corresponde ao que esperava � Em geral, estou satisfeito com: min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � O curso que frequento min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � O 1º ano comum min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � O equipamento (material de apoio, meios informáticos, etc.) min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � A Universidade (espaços, serviços, informação, etc.) � Como estudante, sinto que: min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � O meu nível de preparação do Ensino Secundário é elevado min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Estou confiante quanto aos meus resultados académicos min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Não vou ter grandes dificuldades relacionadas com estudos min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Sou uma pessoa que se adaptou bem à Universidade � Actualmente, os meus principais problemas são: [assinala com uma cruz o quadrado que corresponde mais á tua situação em cada problema]:

Sim Não Problema Sim Não Problema � � Isolamento/solidão � � Mal estar físico (dores de cabeça, cansaço, � � Depressão perturbações do sono, de alimentação, etc.) � � Ansiedade � � Comportamentos agressivos � � Rejeição social � � Abuso de álcool e/ou drogas � � Problemas económicos � � Dificuldades de adaptação à universidade � � Atenção e concentração � � Dificuldades relacionadas com os estudos � � Problemas de natureza sexual � � Dificuldades na relação com outros (Indica) Quem? (Ex: pai, mãe, companheiro(a), colega, etc…): . � Considero que a primeira causa do meu sucesso (e do meu insucesso) escolar é o seguinte aspecto: [selecciona e assinala com uma cruz APENAS UMA (a mais importante) atribuição para cada situação escolar]: Sucesso Insucesso Atribuição � � Conhecimento � � Inteligência � � Esforço � � Motivação � � Atitude perante o estudo � � Estratégia de estudo � � Dificuldade dos exames � � Sorte ou acaso � � Professor � � Contexto académico � � Outro aspecto: (Indica) Qual ? .

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ANEXO 5

QUESTIONÁRIO DE ATITUDES E COMPORTAMENTOS DE ESTUDO

Com este questionário pretendemos saber mais acerca das tuas atitudes e comportamentos de estudo.

Estes dados são absolutamente confidenciais e destinam-se apenas a tratamento estatístico. Lê com atenção e responde com sinceridade a todos os itens, caso contrário não poderemos considerar as tuas

outras respostas. INSTRUÇÃO: Assinala com uma cruz, em cada opção, o número que corresponde mais á tua apreciação ou grau de concordância entre ➀ = mínimo (discordância total) a ➅ = máximo (concordância total). A] ABORDAGEM AO ESTUDO: [Tradução e adaptação por Bessa,J. e Tavares,J. (1998) da versão de 18 itens do ASI: Approaches to Studying Inventory

(Entwistle;N.& Ramsdem,P ,1983, in Newstead,S.E.,1992)]

1. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Sinto que é fácil organizar o meu horário de estudo independente

2. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Gosto que me indiquem exactamente aquilo que tenho de fazer em cada tarefa

3. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � É importante para mim reflectir sobre o meu estudo e sentir que este está de acordo com a realidade do curso

4. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Eu usualmente procuro entender completamente o sentido das matérias que estudo

5. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Quando estudo, tento fixar (memorizar) aspectos importantes que penso possam ser úteis mais tarde

6. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Quando estudo ou executo uma tarefa, tento orientar-me para o que penso ser a pretensão ou exigência do professor

7. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � A razão principal para frequentar este curso é que posso aprender mais acerca dos assuntos que me interessam

8. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Preocupo-me mais com a classificação do exame das cadeiras do curso do que com o que possa aprender ao frequentá-las

9. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Geralmente, ao final do dia ( depois das aulas) ainda estou disposto a continuar o trabalho

10. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Eu geralmente esforço-me por tentar compreender as coisas que inicialmente me parecem difíceis

11. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Frequentemente sinto que tenho de aprender coisas sem ter a oportunidade de realmente as entender

12. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Se as condições para estudar não forem as mais adequadas, geralmente faço alguma coisa para as mudar 13. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Frequentemente questiono-me sobre coisas que ouvi nas aulas ou que li em livros

14. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Tenciono estudar seriamente apenas aquilo que é dado nas aulas ou que é obrigatório para concluir as cadeiras do curso

15. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Caso seja possível, é importante para mim fazer melhor que os meus colegas

16. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Passo algum do meu tempo livre procurando saber mais acerca de tópicos interessantes que foram discutidos nas aulas

17. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Acho alguns tópicos ou assuntos do curso bastante interessantes e gostaria de poder estudá-los com mais profundidade

18. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Acho que tenho de memorizar uma boa quantidade daquilo que devo aprender

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B] COMPORTAMENTOS HABITUAIS PERANTE O ESTUDO:

19. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Assisto regularmente às aulas ( T, TP, P)

20. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Sou pontual

21. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Consagro pelo menos 5 h de estudo por semana (ou 1h por dia) para estudar (além do tempo de assistência às aulas)

22. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Transporto para a aula os materiais necessários

23. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Estudo previamente os assuntos que irão ser discutidos nas aulas

24. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Vou às aulas quando sinto que estou preparado para aprender

25. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Vou às aulas quando os assuntos me interessam

26. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Procuro participar activamente nas aulas práticas ou teórico-práticas

27. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Tento que o meu nível de atenção e concentração durante as aulas seja elevado

28. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Na aula, quando não tenho a certeza acerca de determinado assunto ou tópico da matéria, questiono o docente

29. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Utilizo um caderno ou “dossier” para fazer anotações ou tirar apontamentos das aulas

30. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Depois de uma aula ou laboratório, releio e organizo (em dossier, portafólio, etc.) os meus apontamentos

31. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � A seguir à aula, costumo ler a bibliografia recomendada ou consultar a “sebenta”

32. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � É frequente sombrear ou sublinhar leituras sugeridas da “sebenta” e/ou livros para mais tarde evocar essa informação

33. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Acontece-me frequentemente usar métodos mnemotécnicos para fixar exercícios ou um aspecto da matéria em estudo

34. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Dirijo-me com regularidade à biblioteca para ler ou pesquisar (livros, documentos.) ou apenas para estudar

35. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Usualmente, confronto ideias e realizo tarefas em conjunto com os colegas

36. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Procuro regularmente esclarecer dúvidas junto dos docentes

37. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Quando se aproximam os exames, revejo os meus apontamentos e elaboro pequenos resumos da matéria

38. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Trabalho consistentemente ao longo do semestre e aprofundo mais as matérias quando se aproximam os exames 39. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Quando trabalho isolo-me ou tento evitar os efeitos de possíveis distractores do estudo (conversas, rádio, etc.)

40. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Procuro estudar num local adequado e onde me sinta confortável

41. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Normalmente, fixo a mim mesmo uma meta ou objectivo a atingir a curto prazo com o trabalho que realizo

42. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Considero o meu método de estudo adequado às exigências do curso

43. min➀ ➁ ➂ ➃ ➄ ➅ Max � Na realidade acho que não sei estudar

[ OBS: Verifica se respondeste a todos os itens ]

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ANEXO 6 Matriz de dimensões, indicadores e itens

QIVA: Identificação Dados demográficos Dados escolares

Idade, Sexo, local de residência Curso, frequência, prioridade escolha de curso Classificações (médias) do secundário e acesso à Universidade

Q:1; Q:2

Atribuição causal do Sucesso e do Insucesso

Internos Externos

Conhecimento; Inteligência; Esforço; Estilo; Estratégia Natureza do exame; Sorte ou acaso; Professor; outro

Q: 3.5

QIVA: [Ae]- Ajustamento Académico Confiança em si

As matérias correspondem às expectativas Satisfação com o curso Satisfação com o 1ºano comum Sentimento de nível elevado de preparação do e. secundário Confiança nos resultados académicos Sentimento de ausência de dificuldades relacionadas com estudo Percepção de boa adaptação à universidade

EXP1 SAT1 SAT2 EST1 EST2 EST3 EST4

Satisfação com Universidade

Os docentes correspondem às expectativas Os colegas correespondem às expectativas O ambiente geral de trabalho corresponde ás expectativas Satisfação com o equipamento (material, meios informáticos, etc.) Satisfação com a Universidade ( espaços, serviços, informação, etc.)

EXP2 EXP3 EXP4 SAT3 SAT4

Problemas

Problemas de ansiedade Problemas de atenção e concentração Problemas de mal estar físico (dores cabeça, cansaço, sono, etc.) Dificuldades de estudo

PRO1 PRO2 PRO3 PRO4

QACE: [Ae]- Abordagens do estudo

Abordagem do estudo

(Deep/meaning) (Surface/reproducing) (Achieving/strategic)

Ae04; Ae07; Ae10; Ae13; Ae16; Ae17 Ae02; Ae05; Ae08; Ae11; Ae14; Ae18 Ae01; Ae03; Ae06; Ae09; Ae12; Ae15

QACE: [Che]- Comportamentos habituais de estudo Processos auto-reguladores das aprendizagens

Factor4: Estratégias cognitivas de aquisição e selecção da informação Factor1: estratégias cognitivas de transformação da Informação Factor2: Estratégias cognitivas de organização e planeamento de rotinas Factor3: estratégias cognitivas e metacognitivas de gestão e monitorização Factor5: Estratégias de reforço motivacional

Integração (atenção) Selecção Recuperação Evocação Conexão Aulas Tempo Materiais Decisão Controlo Fixação de metas Auto-avaliação Frequência de aulas

He26; He27; He28; He36 He23; He30; He31 He32; He33 He34; He35;

He19; He20; He21; Q:2.4 He22; He29 He37; He38 He39; He40; He41 He42; He43(-) He24; He25