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Jornalismo Policial Responsável * Alex Rômulo Pacheco 2005 Índice 1 Conceituação de notícia 3 2 Critérios de noticiabilidade 5 3 Características do rádio 6 4 O jornalismo de proximidade 9 5 A notícia como espetáculo 11 6 O jornalismo policialno rádio 13 7 O rádio em Concórdia e o jornalismo policial 16 8 Rotinas de produção no jornalismo concordiense 18 9O jornalismo policial responsável: uma proposta a título de conclusão 22 10 Referências 23 Resumo Este trabalho é uma reflexão sobre o jorna- lismo policial praticado no rádio. Resgata as origens dessa editoria e discute a forma como as informações da área da segurança são comumente abordadas pelas emissoras. Defende que a ênfase em fatos que se sobres- saem pelo sensacionalismo e espetaculariza- ção contraria a função social da mídia e en- tende que, acima de tudo, ao rádio compete * Monografia apresentada como exigência para ob- tenção do grau de Jornalista, pela Universidade do Contestado – UnC, sob a orientação do professor Dr. Leandro Ramires Comassetto. contribuir para o esclarecimento da socie- dade e o fortalecimento da opinião pública. O estudo recai sobre o rádio local e chama as emissoras ao compromisso com as ques- tões que dizem respeito à realidade em que estão inseridas. Repensa a prática em vigor e sugere uma proposta que dê sua contribui- ção para o desenvolvimento da sociedade. Introdução No Brasil, o rádio, desde a primeira trans- missão no Rio de Janeiro do alto do Corco- vado, no dia oito de setembro de 1922, está entre os principais meios de comunicação da sociedade contemporânea. Após oito dé- cadas, as emissoras radiofônicas ainda pos- suem um papel social e cultural fundamental dentro da comunidade. O rádio, na sua es- sência, busca refletir a cara do povo, como ele pensa, os seus costumes, suas idéias, os anseios, e seu modo de viver. Por ser um meio de comunicação com baixo custo e de acesso para todas as classes sociais, o rádio tem um público bastante vari- ado. Atinge todas as camadas da sociedade. É nesse sentido, e sabendo do impacto que o radiojornalismo tem diante da comunidade, que este trabalho pretendeu aprofundar a dis- cussão na editoria de polícia, uma das mais populares, que há décadas vem ocupando es-

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Jornalismo Policial Responsável∗

Alex Rômulo Pacheco

2005

Índice

1 Conceituação de notícia 32 Critérios de noticiabilidade 53 Características do rádio 64 O jornalismo de proximidade 95 A notícia como espetáculo 116 O jornalismo policialno rádio 137 O rádio em Concórdia e o jornalismo

policial 168 Rotinas de produção no jornalismo

concordiense 189 O jornalismo policial responsável:

uma proposta a título de conclusão 2210 Referências 23

Resumo

Este trabalho é uma reflexão sobre o jorna-lismo policial praticado no rádio. Resgataas origens dessa editoria e discute a formacomo as informações da área da segurançasão comumente abordadas pelas emissoras.Defende que a ênfase em fatos que se sobres-saem pelo sensacionalismo e espetaculariza-ção contraria a função social da mídia e en-tende que, acima de tudo, ao rádio compete

∗Monografia apresentada como exigência para ob-tenção do grau de Jornalista, pela Universidade doContestado – UnC, sob a orientação do professor Dr.Leandro Ramires Comassetto.

contribuir para o esclarecimento da socie-dade e o fortalecimento da opinião pública.O estudo recai sobre o rádio local e chamaas emissoras ao compromisso com as ques-tões que dizem respeito à realidade em queestão inseridas. Repensa a prática em vigore sugere uma proposta que dê sua contribui-ção para o desenvolvimento da sociedade.

Introdução

No Brasil, o rádio, desde a primeira trans-missão no Rio de Janeiro do alto do Corco-vado, no dia oito de setembro de 1922, estáentre os principais meios de comunicaçãoda sociedade contemporânea. Após oito dé-cadas, as emissoras radiofônicas ainda pos-suem um papel social e cultural fundamentaldentro da comunidade. O rádio, na sua es-sência, busca refletir a cara do povo, comoele pensa, os seus costumes, suas idéias, osanseios, e seu modo de viver.

Por ser um meio de comunicação combaixo custo e de acesso para todas as classessociais, o rádio tem um público bastante vari-ado. Atinge todas as camadas da sociedade.É nesse sentido, e sabendo do impacto que oradiojornalismo tem diante da comunidade,que este trabalho pretendeu aprofundar a dis-cussão na editoria de polícia, uma das maispopulares, que há décadas vem ocupando es-

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paço volumoso na programação das emisso-ras. Sobretudo, pela capacidade de conquis-tar audiência.

A crítica que geralmente se faz é que emnome da audiência, atropelam-se conceitoséticos, com a veiculação de informações detom sensacionalista preocupadas em apenascausar impacto e chocar a sociedade, como

Notícias que salientam incidentes e as-suntos que têm pouco a ver com ques-tões públicas e que são selecionadas pelasua capacidade de chocar, ou de entreter,podem distorcer a percepção que as pes-soas têm da realidade. Nos anos 90, porexemplo, as notícias sobre crimes “dis-pararam” e as pessoas acreditaram que ataxa de criminalidade estava a aumentar,quando, na realidade, estava a diminuir(PATTERSON, 2003, p. 22).

Além dos interesses particulares da em-presa jornalística e do capitalismo que sus-tenta as informações nas redações, é impor-tante o jornalismo mostrar-se compreensivoaos valores humanos. Sobretudo, encarara realidade, mas mostrando qual caminhodeve-se seguir para a construção de uma so-ciedade mais digna. As cenas que manchamde sangue a televisão, as fotos em jornais erevistas, e a narração de episódios chocan-tes pelo rádio são estratégias para causar im-pacto e chamar a atenção para o fato que estáocorrendo, isso tudo, sem buscar as soluçõespara os problemas, que é o mais importante,pensando-se na ação social dos meios de co-municação, que deveriam estar comprometi-dos com o desenvolvimento da sociedade eo fortalecimento da cidadania. Embora se-jamos parte dessa mídia marcada pela vio-lência em todos os sentidos, ainda é possível

apostar que os formadores de opinião pos-sam esclarecer de forma correta a população,acreditando em mudanças de atitudes dos in-divíduos.

Atualmente, do ponto de vista jornalístico,de maneira geral, o jornalismo policial prati-cado pela imprensa brasileira segue uma li-nha sensacionalista. Nesse sentido, o obje-tivo desse estudo foi mostrar o processo deconstrução da notícia policial para o rádio,como ela é selecionada, qual seu formato, odestaque recebido na programação das emis-soras e o interesse que desperta na comuni-dade, além de chamar a atenção para outraspossibilidades de jornalismo mais compro-metido com a função social da mídia.

Nosso objeto de estudo são os programasjornalísticos de duas emissoras de Concór-dia. Metodologicamente, para o desenvolvi-mento da pesquisa, foram selecionados cincoprogramas de polícia de cada emissora dosperíodos da manhã, entre o horário das 6h30às 6h50, de 14 a 18 de fevereiro de 2005.Atualmente, as duas emissoras que passampela avaliação estão com programas policiaisdiários e no mesmo horário, dando ênfase,na maior parte, para o jornalismo local e re-gional, e deixando um espaço pequeno parafatos que chamam a atenção em âmbito esta-dual e nacional, o que está de acordo com aproposta do rádio local.

A idéia não é foi fazer uma avaliação nocontexto global, mas discutir o tipo de pro-grama levado ao ar e sugerir a produção deum programa jornalisticamente mais profis-sional e esclarecedor, zelando pela reputaçãodas pessoas e contribuindo para o desenvol-vimento da comunidade, ou seja, a intençãofoi apresentar um programa policial piloto,que atenda a um padrão comercial e social,privilegiando ainda a qualidade da informa-

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ção e respeitando as regras do bom jorna-lismo.

Os meios de comunicação são conside-rados peças fundamentais para a educa-ção, cultura e desenvolvimento dos cidadãos,para que possam compreender o mundo deforma mais humana. A necessidade da notí-cia para sobreviver no século XXI é apenasum dos requisitos básicos para a sociedademoderna, pois conhecer tudo o que acontecee que pode influenciar na sua vida é essen-cial numa época em que o mundo globali-zado mostra-se cada vez mais exigente. Es-clarecer a opinião pública e transformar osveículos de comunicação em mediadores so-ciais é um desafio que deve ser vencido todosos dias para quem trabalha na área.

1 Conceituação de notícia

A notícia ainda não possui uma explicaçãoclara e concisa do seu significado. De acordocom Erbolato (1991), a notícia tem um sen-tido vasto e pode ser interpretada de váriasformas e com muitos conceitos. “Não obs-tante a importância da notícia, no chamadoimpério do jornalismo, ninguém conseguiudefini-la satisfatoriamente. Os teóricos di-zem como eladeve ser, mas não o quereal-mente é”(p. 53). As informações divulgadasnos meios de comunicação são, na maioriadas vezes, as mais impactantes e provocamdiscussão entre a sociedade.

Para Erbolato (1991, p. 55) o “leitor quernovidades”. O relato de acontecimentos quesaem da rotina causa maior repercussão porser atrativo e ao mesmo tempo desconhe-cido. A matéria prima do jornalista são, ge-ralmente, as notícias que ocorreram ontemou estão acontecendo neste momento. Seum carro de passeio colidir com um ônibus e

dez pessoas ficarem feridas, além do impactoe a comoção que a notícia causará, muitaspessoas estarão acompanhando pelos veícu-los de comunicação toda a cobertura jorna-lística. Quantas pessoas estão hospitaliza-das, quantas correm risco de morte, e se al-guma vítima morreu. Através do desenrolardos fatos, sempre com dados atualizados, épossível complementar a notícia.

Nessa linha de pensamento, Comassetto(2003), define que a atualidade é uma exi-gência básica para a notícia se tornar interes-sante. O mesmo autor ainda destaca outroconceito importante:

A notícia, em sentido amplo, é freqüente-mente tomada como toda e qualquer in-formação nova, bem como toda e qual-quer matéria veiculada pelos meios decomunicação, sejam relatos de aconte-cimentos, comentários, opiniões, desdeque expressem algum tipo de novidadee despertem interesse publico, sem nítidaintenção publicitária (p. 41).

Comassetto (2003) pontua que fatos iné-ditos que não foram publicados e fogem àregra de tempo e validade noticiosa tambémpodem incluir-se como notícias,

de acordo com a sua própria conceitu-ação, a notícia é tida como informaçãonova. Daí decorre que os eventos maisrecentes de qualquer acontecimento ten-dem a ser considerados também os maisimportantes. Essa é uma regra que sebaseia no principio de atualidade da im-prensa; a exceção se aplica a aconteci-mentos não recentes, mas inéditos, isto é,desconhecidos do público. (p. 47).

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Nessa variação que observa Comassetto(2003), podemos citar um exemplo muito fá-cil para entender como um fato não recentepode tornar-se notícia. A informação de umbrasileiro que morreu na guerra do Iraque hácerca de 20 dias. O acontecimento que nãofoi veiculado pela imprensa, dessa forma,pode ser considerado atual e novo, por serdesconhecido. Mesmo que o fato ocorreu hádias, ele ainda é de interesse popular.

Comassetto (2003) observa que, atual-mente, os meios de comunicação também es-tão passando por algumas transformações. Énesse ponto que o conceito de notícia ampliaos seus horizontes e traz novos rumos parao jornalismo. Para ele, a imprensa noticiosa,sobretudo o rádio, está ofertando de formamais ampla as informações de serviços, in-cluindo previsão do tempo, entre outras notí-cias de utilidade pública,

de forma que a informação de fato tidacomo noticiosa hoje “compartilha espaçocom uma oferta generalizada de informa-ção de serviços”, que incluem desde bo-letins sobre as condições do tempo e dotrânsito até receitas de cozinha, orienta-ções para o enfrentamento de problemá-ticas individuais e familiares, conselhospara a saúde, informações do mundo ar-tístico, compra e venda de objetos diver-sos, bolsa de empregos, etc. (COMAS-SETTO, 2005a, p. 17).

Claro que essa enxurrada de informaçõesnão contribui para o fortalecimento do jor-nalismo, considerado sob o ponto de vistado rigor científico e do aprofundamento dasproblemáticas sociais. E às vezes atrapalhaesse propósito. Segundo Fontcuberta (1993,p. 36), “o excesso de informação acaba por

criar no público um efeito narcotizador, umdesinteresse, que acaba por incapacitar qual-quer operação de análise ou aproximação àrealidade”.

De qualquer forma, notícias de toda a or-dem permeiam os noticiários, o que é umatendência da nova era, tendo em vista a abun-dância de informações. O que os pensadoresdo chamado bom jornalismo se questionamé até que ponto isso contribui para uma me-lhor compreensão dos fatos de real importân-cia no meio em que estamos inseridos. Masessa é outra discussão, que não vem ao casoaprofundar neste momento.

Pereira Júnior (2001, p. 63) ressalta que“a notícia é uma forma de ver a realidade”,onde todas as informações que são veicula-das pela imprensa são para fortalecer a cida-dania na sociedade contemporânea. O jorna-lismo pode ser considerado um grande refe-rencial para a transmissão de conhecimento,dessa forma, abrindo espaço para a cultura,o conhecimento e a democracia.

Noutra visão, Marcondes Filho (apudPE-REIRA JÚNIOR, 2001, p. 69) analisa quea notícia, além de ser informativa, é tambémum produto para a massa popular, visto o ca-ráter comercial da mídia, como

Notícia é a informação transformada emmercadoria com todos seus apelos estéti-cos, emocionais e sensacionais; para issoa informação sobre um tratamento que aadapta às normas mercadológicas de ge-neralização, padronização, simplificaçãoe negação do subjetivismo.

É preciso entender que a notícia é um con-junto de pressupostos, em que cada um temum valor importante dentro do conceito deinformação. De fato, a notícia, em todos os

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sentidos, deve ser informativa, atual, nova eque interesse ao maior número possível depessoas. No entanto, é possível afirmar que amutação dos meios de comunicação permiteincluir como notícia as informações de uti-lidade pública, ou seja, previsão do tempo,bolsa de emprego e negócios. Contudo, jor-nalisticamente falando, é importante que anotícia esclareça a opinião pública e atendaàs necessidades da sociedade.

2 Critérios de noticiabilidade

A noticiabilidade é uma das preocupaçõesdo jornalismo moderno, pois, a partir desseponto, pode-se definir quais são as informa-ções que serão veiculadas pelos meios de co-municação. No momento em que as reda-ções são bombardeadas por informações, aimprensa tende a atribuir valores e critériospara selecionar o que é mais importante parao interesse público e social. Para Erbolato(1991, p. 19), “a primeira tarefa do jorna-lista é saber o que publicar”. A partir dessaassociação, o valor/notícia passa a ser a tô-nica para escolher qual notícia que causa amaior repercussão.

De acordo com Erbolato (1991), Wolf(2003) e Parada (2000), o valor da notíciapode ser encontrado naproximidade. Osmeios de comunicação, não generalizando,cada um no seu contexto, procuram locali-zar as notícias com intuito de aproximá-la doreceptor. Segundo Parada (2000, p. 24) “anotícia precisa falar de algo que seja de inte-resse do ouvinte. Temas relevantes, em ge-ral, são aqueles próximos”. As informaçõeslocais e que envolvem o dia-a-dia de cada ci-dadão são mais atraentes, mais importantespara o contexto local. Para Erbolato, a mídiado interior tem usado esse tipo de percepção

para ganhar espaços e evitar que as grandesredes, como Globo, SBT, BAND, entre ou-tros, se ocupem de maiores espaços no cená-rio global. A mesma visão é de Wolf (2003,p. 2100:

As notícias culturalmente próximas se re-ferem a eventos que pertencem à esferanormal de experiências do jornalista e doseu público. São os tipos de aconteci-mentos que implicam uma esfera com-partilhada de linguagem e aceitação cul-turais comuns.

Por exemplo: Um acidente de ônibus queenvolve um número pequeno de vítimas émais significante do que a queda de umavião em um local mais distante. A proxi-midade é predominante para valorizar a notí-cia. Ainda nessa linha de pensamento, Erbo-lato afirma que a notícia mais global tambémpode tornar-se interessante, a ponto de poderrepercutir localmente e em setor vitais da co-munidade.

Galtung e Ruge (apudTRAQUINA, 2005,p. 71), entendem que o acontecimento deveser relevante tendo em vista “o impacto quepoderá ter sobre o leitor ou os ouvintes”.Com isso, “provocar, conforme o tema, co-mentários e discussões entre grupos interes-sados” (ERBOLATO, 1991, p.56).

De acordo com Galtung e Ruge (apudTRAQUINA, 2005, p.71), “o inesperado éoutro valor-notícia”. Segundo os autoresas notícias “mais inesperadas têm maioreshipóteses de serem incluídas” (apud TRA-QUINA, 2005, p. 71). Por menor que sejao fato, o valor da notícia pode ser medido deacordo com o interesse popular. Para Parada(2000, p. 24), “o assunto deve ser do inte-resse do maior número de pessoas possível,deve ter alguma utilidade em suas vidas”.

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Escreve Erbolato (1991) que araridadetem um aspecto interessante no contexto denotícia. Um homem que se jogará de um pré-dio sem pára-quedas, dois candidatos a pre-feito de uma cidade com o mesmo nome, ouo nascimento de uma criança à meia-noite dodia 31 de dezembro, são casos que saem danormalidade e podem ser incluídas como no-tícia de valor. Isso tudo numa visão jornalís-tica e dentro do contexto de cada meio decomunicação.

A imprensa mundial acompanhou comuma mega-cobertura os últimos meses devida do papa João Paulo II, representantemaior da igreja católica. Nesse tipo de caso,a proeminênciaé fundamental. Erbolato(1991), diz que acontecimentos que envol-vam celebridades ou pessoas públicas esti-mulam o interesse público.

A facilidade como as informações são pro-pagadas é grande. Qualquer acontecimentodivulgado, por exemplo, na China, pode serconhecido no Brasil em poucos segundos. Apartir daí, a importância de se apurar ascon-seqüênciascom rapidez, a fim de também seprevenir contra desencadeamentos indispen-sáveis, por exemplo, a tomada de medidaseconômicas tendo em vista um abalo finan-ceiro em outro país.

Erbolato (1991) destaca ainda que auti-lidadepública com as informações sobre osserviços básicos para a comunidade é essen-cial e destacam pela necessidade veementeda utilização, em qualquer hora ou qualquerdia. No caso de uma pessoa necessitar pro-curar atendimento médico, através da im-prensa, ela poderá saber qual é a unidade desaúde que está atendendo durante o feriado.Mesma coisa com a divulgação de bolsa deempregos, documentos que foram encontra-

dos e chamados de órgãos públicos e priva-dos.

Outro ponto importante para assinalar dizrespeito àpolítica editorial do meio de co-municação. Conforme Erbolato (1991), cadaveículo segue uma determinada idéia ou pro-posta de acordo com as necessidades ou con-texto. Dessa forma, dando maior destaquepara certas atividades, como: agricultura, es-porte ou política.

O critério de seleção é fundamental paraos meios de comunicação se manterem di-ante da comunidade como um formador deopinião, estimulador da discussão e do escla-recimento do público. Dessa forma, mostrarque a notícia é de fato importante para o de-senvolvimento da sociedade e da cultura. Aavaliação criteriosa das notícias e a apuraçãode forma correta garantem a qualidade noti-ciosa do fato, sempre primando pelos con-ceitos básicos de atender o maior número depessoas e ampliando o princípio do jorna-lismo dentro da responsabilidade social.

3 Características do rádio

O rádio, entre os meios de comunicação demassa, pode ser considerado o mais populare o de maior alcance do público. Longe deser um meio ultrapassado, o rádio reafirmaa sua condição de veículo indispensável nocotidiano e está presente de forma intensano dia-a-dia da sociedade. Por ser um veí-culo de comunicação com baixo custo, o rá-dio atinge um público bastante numeroso eheterogêneo, o que caracteriza sua populari-dade.

O rádio é um veículo diferente de qualqueroutro. Ele se destaca pela flexibilidade. Essaqualidade é basicamente ponto fundamentalpara o rádio, que, a qualquer momento, pode

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alterar sua programação sem afetar a quali-dade. Tecnicamente, o repórter, apenas comum aparelho de telefone, pode falar de qual-quer ponto, ultrapassando as fronteiras e oslimites territoriais separados pela geografiaou nacionalidade. Mcleish (1999), reiteraque a programação do rádio, por ser simples,pode sofrer alterações de rotina. “As ma-térias inseridas em programas, ou mesmo oprograma todo, podem ser eliminadas e subs-tituídas, quase de modo imperceptíveis, poralgo mais urgente” (p. 17). Vamos imaginara morte de um representante da sociedadelocal. De fato, o rádio tem a possibilidadede interromper a programação para veiculara informação sem causar danos para a pro-gramação normal da emissora, o que dificil-mente acontece na televisão e outros veícu-los.

Por ser essencialmente falado, o rádioatinge um público composto de várias cama-das sociais, começando pelo ouvinte analfa-beto até o ouvinte com nível cultural maisacentuado. De acordo com Mcleish (1999,p. 15) “trata-se de um meio cego, mas quepode estimular a imaginação, de modo que,logo ao ouvir o locutor, o ouvinte tenta vi-sualizar o que ouve, criando na mente a fi-gura do dono da voz”. Para Barbosa Filho(2003), o rádio chega mais próximo do ou-vinte, sempre falando do cotidiano e se apro-ximando da sua realidade. “O regionalismoé uma marca fundamental do rádio, pois ofe-rece visibilidade às informações locais. Esseprincípio dinamiza as relações entre rádio ecomunidade” (p. 46).

O rádio é um dos meios de comunicaçãode maior impacto na sociedade local e regio-nal, comparando com outros de maior aportee que atingem diretamente a massa no con-texto global. O rádio pode transmitir com

facilidade, em tempo real, dessa forma ace-lerando a disseminação do conteúdo e dei-xando informado o ouvinte sobre o que estáocorrendo. Para Ortriwano (1999, p. 79)“o rádio pode estar presente com mais facili-dade no local dos acontecimentos e transmi-tir as informações mais rapidamente do quea televisão”. Tal visão também é descrita porBarbosa Filho (2003, 47):

O rádio possui caráter imediato, possibi-litando que o ouvinte se inteire dos fatosno momento em que acontecem. A trans-missão de um jogo de futebol, a cober-tura de acidentes no local do ocorrido sãoagilidade para o meio. O rádio acelera adisseminação em curto espaço de tempo,subsidiando a sociedade, os grupos e in-divíduos em dada formação cultural.

No caso de um acidente automobilístico,por exemplo, o rádio tem o poder e a autono-mia de informar o fato, minutos depois queele tenha ocorrido, transmitindo de formainstantânea e imediata. Nesse ponto de vista,para Comassetto (2005b), mesmo com o sur-gimento de novas mídias, o rádio não deixade ser surpreendente, destacando-se pela fa-cilidade que tem de informar com rapidez,deixando o ouvinte mais próximo do aconte-cimento. O autor explica que o rádio “dis-pensa aparatos sofisticados na cobertura dosacontecimentos”, dando mais “mobilidadeao veículo, reconhecido pela imediaticidadecom que põe o ouvinte em contato com a re-alidade”.

O imediatismo na transmissão é funda-mental para atender aos objetivos do rá-dio, mas também são importantes os noti-ciários como periodicidade fixa, que per-mitirão a quem não possa ouvir rádio

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o dia todo saber quando poderá encon-trar reunidos fatos que, ao menos teorica-mente, foram os mais importantes (OR-TRIWANO, 1999, p. 95).

Partido desse ponto de vista, Barbosa Fi-lho (1985, p. 80) reitera que “o rádio permitetrazer o mundo ao ouvinte enquanto os acon-tecimentos estão se desenrolando”. É notó-rio também que a radiodifusão tem uma faci-lidade maior para cobrir eventos, e o ouvinte,para acompanhá-los, pois “está livre de fiose tomadas” (ORTRIWANO, 1999, p. 79).

O rádio é considerado o principal meio decomunicação, atingindo quase 100% dos do-micílios. Conforme Ortriwano (1999, p.81),“ao mesmo tempo, a atividade de “ouvir”não exclui a possibilidade de desenvolver ou-tras tarefas, como ler, dirigir e trabalhar”.Dessa forma, é comum o rádio estar ligadona cozinha, carro e empresas. Barbosa Fi-lho (2003, p. 48) garante que “tal fato ocorreporque seu preço é quase sempre acessívele sua abrangência alcança basicamente qual-quer lugar, mesmo onde não existe energiaelétrica”. O rádio pode ser considerado um“pano de fundo” em qualquer ambiente, des-pertando interesse somente dos fatos maisatinentes ao ouvinte.

Nesse contexto, o rádio atende um públicode classes sociais das mais diversas, tem umafunção social fundamental para o desenvol-vimento da comunidade regional, tanto edu-cacional como cultural. Na sua essência,funciona como um agente de informação, so-bretudo, com a grande missão de fortalecer aopinião pública e tornar-se um instrumentopara a democratização dentro do seu própriocontexto regional. Cabe aqui destacar, o quediz Friderichs, (2005, p. 51) para quem

(...) se encontra na característica regional

o impulso que poderá fazer do rádio uminstrumento de expressão igualitária detodos os membros de uma comunidade,no qual os diferentes sujeitos poderão ex-por suas idéias, problemas e manifesta-ções culturais no mesmo instante; assim,podem, juntos, debater, discutir e elabo-rar soluções que melhorem as condiçõesde vida de toda a comunidade.

Preocupados em conquistar ouvintes, osprofissionais do rádio desenvolvem técnicaspara informar o público de forma corretae para serem bem compreendidos. Come-çando pelo vocabulário sempre coloquial,evitando palavras rebuscadas e que são dedifícil entendimento. Deve-se ter em menteque pessoas de todos os níveis de conheci-mento estão ouvindo. Além disso, o rádioainda apresenta um texto leve e que imprimeclareza e objetividade no que está sendo vei-culado.

O rádio proporciona uma discussão maisampla com a comunidade, abordando fatosrelevantes e que precisam de solução. ParaMcleish (1999, p. 20), o rádio “atua comoum vigilante sobre os que detêm poder, pro-piciando o contato entre eles e o público”.Além disso, é considerado um multiplicadorde informações, propiciando o debate, pro-pondo soluções práticas e unindo mais a co-munidade em que está inserido.

É frente a essas questões que o rádiodestaca-se no cenário contemporâneo comoum veículo sedutor, atraente e envolve os ou-vintes com a facilidade de cativar e interagirdiretamente com a sua própria localização.É um dos meios de comunicação mais próxi-mos da comunidade, atendendo às suas ne-cessidades, desenvolvendo o papel de escla-recer a opinião, estimular o debate e acres-

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centar no conhecimento cultural de toda a so-ciedade. O rádio é indispensável no dias atu-ais, quando a informação e o conhecimentosão quesitos básicos para entender melhor omundo globalizado.

4 O jornalismo de proximidade

Diante do caráter cada vez mais globalizadoda mídia, uma discussão em evidência naatualidade é a que diz respeito à coberturados fatos locais. Não adianta querer es-perar isso das grandes organizações, nacio-nais e internacionais, que operam em redesou cadeias, transmitindo para público amplo.Nesse sentido, cumpre ao rádio local um im-portante papel no que tange ao jornalismo deproximidade.

Conforme Comassetto (2005), a informa-ção de real interesse no rádio local é a queestá relacionada aos acontecimentos próxi-mos, aos valores, situações e vivências deseu entorno. As emissoras de rádio, com osurgimento da televisão, foram praticamenteobrigadas a tornar-se cada vez mais locaispara sobreviver. Conforme Chantler e Harris(1998, p. 21), a “força do jornalismo numaemissora de rádio local é o instrumento quedá a ela a sensação de ser verdadeiramentelocal”.

A televisão, por sua vez, aborda as notíciasde contexto global. As retransmissoras têmpouco tempo para o local, predominando osnoticiários veiculados em rede. A TV Globo,ao desenvolver um padrão de programa parao Jornal Nacional, optou em um novo con-ceito para selecionar as notícias. “As maté-rias deveriam ser de interesse geral e não re-gionais ou particulares. Os assuntos tinhamque chamar a atenção tanto do telespecta-dor de Manaus quanto de Porto Alegre” (TV

GLOBO LTDA, 2004, p. 39). A necessi-dade de redimensionar o espaço, ao mesmotempo em que foi necessário para a televisão,foi inevitável também para o rádio.

Ao rádio local, não restou alternativa, se-não estreitar ainda mais seus laços comas comunidades em que está inserido eacentuar o trabalho jornalístico realizadonesses lugares, pois é isso que justificaa existência, confere a identidade e forta-lece a presença do rádio nas comunidades(COMASSETTO, 2005a, p. 76)

Diante desta situação, ao rádio “o mais im-portante é cobrir as notícias que os demaisnão dão”. A concorrência é desnecessária,pois “ao rádio não convém querer compe-tir com quem, por ter mais recursos, podeoferecer produtos mais espetaculares” (CE-BRIÁN HERREROS, 2001, p. 157).

Segundo Comassetto (2005), por ser es-sencialmente local, o rádio necessariamentedeve “retratar e aprofundar os acontecimen-tos da comunidade”, sem, todavia, ignorarinformações que são regionais, estaduais, na-cionais ou internacionais (p. 77), pois, “coma globalização, ocorrências originadas emum lugar têm conseqüências planetárias”, epor isso influenciam também na comuni-dade.

Observa ainda que “a notícia é condiçãobásica para a busca de resultados, mas sem-pre observada a credibilidade da informaçãoe, sobretudo nos meio locais, os laços com ascomunidades a que servem” (2005b). Aindanessa visão, o autor menciona que o rádio,além de possuir um poder de informar o queenvolve a sua realidade, tem a possibilidadede ater-se às discussões de abrangência loca-lizada, contemplando seu papel fundamen-tal diante da sociedade e destacando-se como

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um meio de comunicação indispensável paraa população.

Frente a essas questões, o que é questio-nado por vários teóricos que estudam o jor-nalismo praticado atualmente pelas emisso-ras radiofônicas é voltado à qualidade das in-formações que estão sendo veiculadas na mí-dia. Para Del Bianco (2004), as emissoras dointerior, por possuírem uma estrutura menor,no quesito recursos humanos e tecnológicos,apresentam uma produção precária de notí-cias jornalísticas. Explica que “nessas emis-soras predominam os programas de entrete-nimento centrados na figura de comunicado-res, ummix de músicas, fofocas e pouca ouquase nenhuma informação jornalística so-bre a cidade ou região” (p. 319). A autoraafirma que na grande maioria das emisso-ras radiofônicas do interior não existe equipede jornalismo, e ao mesmo tempo interesseem investir nessa área para produzir notíciascom qualidade e que seja interessantes paraa comunidade local.

Percebe-se nas emissoras de rádio, namaior parte, que a grande preocupação é coma audiência e com o retorno financeiro para oproprietário, que, na maioria das vezes, sãopolíticos e empresários que nem sobrevivemda comunicação. Para eles, o rádio é sinô-nimo de ganhar dinheiro fácil, com poucoinvestimento em funcionários, equipes e tec-nologia. Segundo Del Bianco (2004), a aber-tura de espaços nas emissoras para progra-mas religiosos ou outros que possam ser re-vertidos em lucros para a empresa, estãotendo um espaço volumoso. A autora con-firma que “não se sabe exatamente quantasemissoras adotam essa prática, até pela au-sência de um controle legal sobre o conteúdoda programação” (p. 319).

Contudo, Del Bianco (2004) aponta que a

implantação dos novos conceitos para o rá-dio será necessária, ainda mais com a che-gada da era digital, quando a qualidade seráponto crucial para manter as emissoras di-ante das concorrentes. O rádio praticadohoje, segundo a autora, passará por uma ino-vação e “tudo indica que as emissoras terãode se estruturar melhor para oferecer à au-diência não somente programação de qua-lidade de CD, como também serviços adi-cionais de dados e informação qualificada”.Lembra que “a era digital traz em si a pro-messa de integrar e convergir vários meiosde comunicação numa aldeia global consti-tuída a partir das redes informatizadas inte-rativas” (p. 318).

Para Del Bianco (2004), as emissoras radi-ofônicas que “continuarem arraigadas a ummodo antigo de fazer rádio – sem compro-misso com a audiência e direcionadas apenasà promoção política ou religiosa” estarão empoucos anos perdendo espaço para a concor-rência, e para “aqueles que souberem ofere-cer informação e serviço com qualidade” (p.321).

O rádio necessariamente tem que atenderà sociedade que vive em seu entorno, poisé responsabilidade dele, além das cobertu-ras jornalísticas dos acontecimentos, o de-bate das problemáticas, o esclarecimento dequestões públicas. Segundo Barbeiro (2004),as novas tecnologias estão influenciando orádio a partir para um novo formato. Dianteda globalização, há necessidade de ampliaro rool de serviços disponibilizados à socie-dade, principalmente no que diz respeito ajornalismo que esclareça a opinião pública eatenda a demanda sociedade que procura fi-car informada diariamente através do rádio.

Barbeiro (2004) afirma que o público está,de certa forma, mais exigente no que diz res-

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peito ao esclarecimento da opinião pública.Portanto, fica claro que só a notícia de quali-dade é capaz de salvar o rádio do redemoinhoprovocado pelas novas tecnologias eletrôni-cas, informáticas e cibernéticas que ativamoutros meios. O autor confirma que a inte-ração entre o rádio e receptor está cada vemmais forte.

O radiojornalismo tem uma contribuiçãogrande a dar quando está comprometido como senso de responsabilidade pública, conhe-cimento dos problemas básicos da sociedadee o respeito e o cultivo da tolerância, ad-versidade, pluralidade política e ideológicae a constante vigilância da ação do Estado(BARBEIRO, 2004, p. 146).

Essa mescla de explicações serve para tor-nar mais claro que o rádio precisa melhorarseu padrão qualificativo. As emissoras aindacontinuam ocupando um espaço importantena sociedade e sendo um referencial de in-fluência na educação e na cultura local. Ce-brián Herreros (2001) entende que o rádio lo-cal dos novos tempos nada mais tem a vercom a antiga rádio de reprodução de discos,de baixo custo e quase nenhum profissiona-lismo, ou seja, o novo modelo exigirá maiorqualidade sonora e recursos adicionais. En-fim, o rádio cada vez mais exigirá qualifi-cação dos profissionais, equipes estruturadase informação adequada para as necessidadesdo público que espera receber conhecimentoe esclarecimentos.

5 A notícia como espetáculo

Na sociedade atual, os meios de comuni-cação de massa produzem, selecionam, ex-cluem e transformam aspectos da realidade,reproduzindo-a parcialmente e formando aopinião pública. Na guerra pela audiência,

as regras de um bom jornalismo são comu-mente esquecidas. As notícias sensacionaise que chocam atraem o público; contudo, namaior parte, são apuradas de forma inade-quada, sem profundidade e com grandes pos-sibilidades de distorcer o contexto real dosfatos. Baseado em autores que discutem essaproblemática, interessa aqui discutir até queponto o jornalismo segue a tendência de su-pervalorizar as notícias de impacto ao invésde informar o público com responsabilidade.

O sensacionalismo na mídia não é novi-dade, desde o século passado os meios decomunicação têm explorado acontecimentoscom conteúdos apelativos, com matérias ca-pazes de emocionar ou escandalizar, issopelo fato da mídia estar “cada vez mais con-dicionada aos índices de audiência” (CO-MASSETTO, 2005a, p. 211). SegundoMarshall (2003, p. 75), “ainda nos tempos dapré-imprensa, a fórmula “sexo, sangue e vio-lência” já era um ingrediente que atraía a cu-riosidade”. Exemplo são as primeiras mani-festações impressas que circulavam pela an-tiga Roma, na verdade, “boletins sobre cri-mes e divórcios afixados em vias públicas”.

Os jornais populares também faziam su-cesso na França no século XIX. A maiorparte tinha apenas uma página, com títulos,ilustrações e textos. Por relatarem fatos maischocantes, eram os mais procurados pela po-pulação da época. Ao longo do tempo, omesmo modelo de fazer notícia foi ganhandoforça e atualmente é utilizado por parte dosmeios de comunicação. O conceito sensaci-onalista é até hoje o grande “filão” do apelopopular.

Conforme Comassetto (2005a, p. 214), aidéia de que “as notícias ruins são as boasnotícias” há muito que virou ditado no jorna-lismo”. Portanto, a maior parte das notícias

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veiculadas são de fatos negativos. “Quantomais um acontecimento for negativo nas suasconseqüências, maior será sua probabilidadede se tornar notícia” (GALTUNG-RUGEapudWOLF, 2003, p. 215). Wolf tambémmenciona que “quanto maior, mais insólitoou mais cruel for o espetáculo”, maior o im-pacto que a informação terá perante o pú-blico (2003, p. 216).

A mesma preocupação é manifestada porPatterson (2003). O pesquisador garanteque na maior parte das notícias veiculadas,principalmente policiais, os critérios utili-zados visam à audiência, pois “o sensacio-nalismo atrai a atenção das pessoas no pri-meiro instante”. Adverte, entretanto, que umsensacionalismo interminável pode, por fim,aborrecê-las. Além do que pode distorcer apercepção que as pessoas têm da realidade.

O mesmo autor reitera que “as notíciasque salientam incidentes e assuntos que tempouco a ver com questões públicas e que sãoselecionadas pela sua capacidade de chocarou entreter” são mais veiculadas (PATTER-SON, 2003, p. 22). Dessa forma, nota-se que“as notícias estão cada vez mais orientadaspara o que interessa à audiência, em vez depara o que a audiência precisa saber” (p.21).Para Patterson, “as matérias do gênero têmgrande aceitação popular”, mas assinala quea idéia segue uma linha contrária ao “ideal dojornalismo de fornecer aos cidadãos a com-preensão clara do seu papel na sociedade” (p.43).

O mesmo autor ressalta ainda que “asnotícias consideradas sensacionalistas redu-zem a qualidade da informação”, dentrode uma percepção crítica, visto que notí-cias que não contribuem para o desenvolvi-mento da sociedade estão sendo veiculadasde forma intensa nos veículos de comuni-

cação. Frente à questão, também observaComassetto (2005b) que se deve manter umsenso crítico das informações, sobretudo daárea policial, que segundo apurou o autor,são divulgadas de forma exagerada,

A busca pela audiência a qualquer custo,pelo recurso do exagero, da espetaculari-zação do conteúdo, da concorrência, dabaixaria, do excesso de improvisação ecoloquialismo, tende a gerar desgastes,afeta a credibilidade e impõe riscos fu-turos.

Em se tratando de rádio, Comassetto des-creve que “o rádio perdeu qualidade, bai-xou de nível e tornou-se, especialmente nocaso das AMs, um veículo apelativo”. Des-taca que o rádio está tratando as notícias com“exagero na emoção e apelo ao sensaciona-lismo, quando não descambando para a “bai-xaria”, em função de demasiada atenção àsocorrências do submundo das cidades, a vio-lência, o crime os desastres”.

Mais do que apontar os problemas sobreo sensacionalismo na mídia e a falta de éticana cobertura jornalística, é necessário propornovas alternativas para incentivar uma cons-ciência mais humana e estabelecer a divulga-ção de notícias que sejam úteis para a socie-dade. O jornalismo sensacionalista é tomadopor uma competitiva briga de organizaçõesnoticiosas, sempre ressaltando os incidentesdramáticos, crimes e desastres, além da vio-lência urbana que assusta a população. Di-ante disso, é que se deve repensar a formaem que os meios de comunicação, principal-mente o rádio, estão se utilizando para a se-leção da informação, já sabendo que a mídiaeletrônica é de origem pública e deve estarpreocupada também com a responsabilidadesocial.

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6 O jornalismo policialno rádio

O jornalismo policial no rádio teve inícioainda no século passado e atualmente aindaé considerado um dos principais produtosdas emissoras. Segundo Lopes (1988), amaior parte das informações policialescasera transmitida normalmente por emissorasradiofônicas não populares, e através de in-serções durante os noticiários. No sentido derepassar ao ouvinte uma notícia mais séria,devido ao caráter do meio na época, os fatoscomo assaltos, roubos e crimes eram agru-pados em uma única seção. Dessa forma,dava-se mais espaço para informações ge-rais, abordando política, economia e esporte,e determinando sempre um conteúdo infor-mativo. As notícias policiais também ganha-vam tratamento especial, evitando-se a dis-torção e o exagero na veiculação dos fatos.

Nas emissoras radiofônicas mais popula-res, a abordagem para o fato policial já apa-recia com mais destaque. As notícias eramveiculadas através de programas durante aprogramação das emissoras como: Gazeta,Globo e Tupi. De acordo com Lopes (1988),as informações eram transmitidas por um“repórter policial com locução agressiva ecerto toque sensacionalista” (p. 125). Osprogramas policiais nas emissoras popularesainda destacavam-se pela fórmula de trans-mitir a notícia juntando um estilo de rádio-teatro e jornalismo.

Nesse contexto, a expressividade do jorna-lismo policial foi tomando proporções cres-centes, destacando-se como de maior audi-ência no rádio e na penetração das classessociais de baixa renda. Isso, por ser um veí-culo de fácil acesso, barato e que pode serouvido em qualquer local. Além disso, so-mente o rádio tem a vantagem de difundir

a informação localizada e que está próximado acontecimento. Conforme relata Lopes(1988), a receita de sucesso do noticiáriopolicial baseia-se simplesmente na narraçãoe dramatização dos próprios fatos, “criandoum clima de suspense crescente e de envolvi-mento emocional da rádio novela” (p. 125).Os efeitos e trilhas sonoras para tornar ocenário mais real possível contribuíam paraampliar a tensão dos ouvintes que acompa-nhavam os fatos contados em forma de his-tória.

O programa policial de maior audiênciaentre as rádios de São Paulo foi o principalguia para o aumento do gênero mais contado,utilizando como base trilhas sonoras e o sus-pense, tornando a narração do locutor maisrealista. Gil Gomes, naquela época, na RádioRecord, das 08h às 10h da manhã, atingia pi-cos de 53% de audiência, configurando umnovo gênero radiofônico. “De fato, os pro-gramas de maior audiência da rádio Record,a emissora mais ouvida pelas classes popu-lares em São Paulo, são do gênero policial,sertanejo e de variedades” (LOPES, 1988, p.107).

Na programação da emissora Record, queno final da década de 70, início de 80, era arádio de maior audiência do país, mantinha-se uma grade de gêneros voltados à “músicapopular, variedades e policial”, consideradapela autora povão e “que é característico deSão Paulo para todo o Brasil” (p.116). Con-forme Lopes (1988), o conjunto dos gêne-ros variados é que “melhor expressam o dis-curso popular”, principal motivo que man-teve a emissora com grandes picos de audi-ência.

Os programas policiais nas emissoras derádio são, na maior parte das vezes, os de au-diência e que atraem com mais veemência a

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atenção do público. Atualmente os meios decomunicação, sem restrições a qualquer veí-culo, têm direcionado espaços para aconte-cimentos do gênero. Para o apresentador deum programa policial no SBT (Florianópo-lis, SC), Hélio Costa1, os programas policiaistêm que informar, denunciar e divulgar as in-formações sobre o dia-a-dia do que aconteceem cada região. Ele explica que existe umabriga entre os veículos para divulgar a maté-ria “em primeira mão, com exclusividade”,para “valorizar” o trabalho que é feito pelorepórter da área. É comum, segundo Costa,uma atenção grande com a manchete de im-pacto, isso para garantir a audiência e apelopopular. Pontua ainda que as notícias poli-ciais que são veiculadas são as mais relevan-tes e que podem despertar maior interesse dopúblico. Contudo, ressalta que, “se o caraé vagabundo, eu chamo de vagabundo, se ocara é bandido, é bandido”. Defende aindaque a idéia não é só mostrar o “marginal”,mas mostrar para a população o trabalho dapolícia.

De acordo com o repórter da RBS-TV(Chapecó, SC), Claudério Augusto2, o jorna-lismo policial tem que informar. As notíciasmais veiculadas são de “assaltos, tráfico, fur-tos e roubos”, ou seja, informações que sãocolhidas junto à delegacia e principalmentecom autoridades policias que são as fontesoficiais. Reitera ainda que somente notíciasde maior impacto são veiculadas com o sen-tido de atender os interesses da comunidade.

Nesse contexto, o repórter da Rádio

1 COSTA, Hélio. Depoimento ao autor,21/03/2005, Florianópolis.

2 AUGUSTO, Claudério. Depoimento ao autor,01/06/2005, Chapecó.

Guaíba (Porto Alegre, RS), Márcio Pessoa3,mostra-se mais preocupado com a notíciapolicial. Relata que “a editoria de políciapresta hoje no Brasil um desserviço à popu-lação”, ainda mais quando uma parcela dasociedade vive “em áreas de baixa renda”.Para Pessoa, o jornalismo policial praticadoatualmente pela imprensa brasileira “seriamais interessante para países desenvolvidos,onde o público-alvo na maior parte das vezestem aporte cultural para interpretar de formamenos nociva os crimes”. O repórter criticaa forma atual dos programas do gênero e de-clara que “a imprensa brasileira incentiva ocrime e glamouriza o bandido”. Nessa vi-são, descreve que algumas matérias veicu-ladas pela mídia amedrontam a população,produzindo criminosos e mostrando a facili-dade de se cometer os delitos.

Para Pessoa, o bom repórter “é aquele queconsegue narrar o contexto social dos pro-tagonistas desta guerra social, os crimino-sos, as vítimas e os policiais”, a ponto de“contextualizar as circunstâncias do crime,os motivos pelos quais ele foi cometido, e di-vidir isto com o público”. O jornalista aindamenciona que o jornalismo policial do rá-dio se “tornou pretensioso, despreocupado epouco cuidadoso com os efeitos”, pela ne-cessidade da mídia brigar pela audiência.

No Rio de Janeiro, onde a violência é to-mada por proporções mais significativas, orepórter da Rádio Tupi, Alberto Brandão4

(RJ) afirma que a informação nem sempreé “agradável”, por isso, os acontecimentossão narrados conforme os dados são colhi-dos junto à fonte (polícia ou vítimas). O

3 PESSOA, Márcio. Depoimento ao autor,18/04/2005, Porto Alegre.

4 BRANDÃO, Alberto. Depoimento ao autor,31/05/2005, Rio de Janeiro.

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papel do jornalismo policial é buscar a notí-cia de forma objetiva e verdadeira, contudo,ressalta que “qualquer notícia” é importante,pois toda sociedade gosta de ficar sabendosobre um acidente e uma enchente ou fatosque envolvem o setor de segurança pública.

De acordo com Brandão, o sensaciona-lismo na mídia é muito comum. Segundoele, em alguns veículos de imprensa, “se avítima não chorar”, a matéria não é aprovadapelo departamento de jornalismo. O repór-ter da Rádio Tupi explica ainda que os pro-gramas policiais da atualidade nos meios decomunicação estão dentro de um padrão queconta com a audiência e a necessidade de co-mercial do veículo de imprensa, que precisade “dinheiro” para manter-se, como qualqueroutra empresa.

O apresentador dos programas policiais daRádio Aliança (Concórdia, SC), Luiz Anto-nio Paludo5, descreve que a editoria de po-lícia tem a função de “esclarecer e investi-gar os acontecimentos”. Afirma que a mí-dia explora e supervaloriza a violência, porisso, trata os fatos com sensacionalismo. Oapresentador explica também que o discursopara tornar a notícia policial mais “digerível”é utilizando o humor, já que garante que esseestilo não prejudica a credibilidade e nem aqualidade da informação que está sendo vei-culada.

Na visão dos dois repórteres policiais daRádio Rural (Concórdia-SC), Sérgio Pri-man6 e Marcos Feijó7, o jornalismo de po-lícia é para informar, investigar e orientar a

5 PALUDO, Luiz Antonio. Depoimento ao autor,20/05/2005, Concórdia.

6 PRIMAN, Sérgio Luiz. Depoimento ao autor,11/04/2005, Concórdia.

7 FEIJÓ, Marcos. Depoimento ao autor,11/04/2005, Concórdia.

população. Priman diz que o profissional daárea não deve omitir opinião sobre o fato.Contudo, Feijó ressalta a importância da no-tícia de polícia para “abrir os olhos da co-munidade”. Alerta ainda que a editoria deveevitar o excesso, ou seja, o repórter “deve iraté o limite do que é necessário. A partir daí,vira exploração barata do assunto”. Primanconfirma que a notícia policial está, de fato,supervalorizada nos meios de comunicação.Ele acredita que o ouvinte está acostumadoa receber todos os dias informações que cho-cam ou escandalizam a sociedade. “Se con-tinuar assim, dar uma informação da mortede um bebê será a mesma coisa que falar daviagem do presidente”.

O repórter da editoria de polícia da Rá-dio Gaúcha (Porto Alegre, RS), Giovani Gri-zotti8 , explica que é preciso tratar a no-tícia policial com isenção, sem explorar astragédias pessoais de todas as partes envol-vidas, incluindo também o “bandido”. Se-gundo ele, a imprensa tem que cobrar me-lhorias na segurança, identificar as falhas eouvir da população quais são suas necessi-dades. O repórter verifica ainda que “talvezfalte um pouco da mídia identificar tambémas “causas da criminalidade”, que não estãoapenas ligadas à deficiência na segurança pú-blica, mas também à falta de educação e em-prego”.

A notícia de polícia é uma das áreas maiscomplexas do jornalismo moderno e que co-meça a despertar da crítica um embate maisforte sobre o que está sendo veiculado emprogramas jornalísticos do gênero. O dis-curso dos repórteres e apresentadores de pro-

8 GRIZOTTI, Giovani. Depoimento ao autor,18/04/2005, Porto Alegre.

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gramas policiais não condiz, na maior parte,com a própria realidade do que está sendopraticado. Atualmente, a mídia não estácumprindo com a sua principal função, queé a de esclarecer a opinião pública e de le-var conhecimento e cultura à sociedade emque está inserida. Os programas, nesse sen-tido, seguem uma linha, a grosso modo, maisinteressada na audiência e na questão econô-mica. Relatam episódios envolvendo a socie-dade, mas sem o devido aprofundamento dascausas e conseqüências. Na maioria das ve-zes, apenas lêem ocorrências conforme co-letadas na fonte, ou seja, nos departamentospoliciais e outros órgãos de segurança.

7 O rádio em Concórdia e ojornalismo policial

A implantação do rádio em Concórdia foifundamental para o desenvolvimento da so-ciedade, mesmo quando utilizado para a co-municação agroindustrial de pequenos agri-cultores integrados e no campo político.Desde a sua origem no município, o rádiojá tinha parte de sua programação voltada àárea agrícola, por isso, desde o início, foivisto como um instrumento importante paraa comunicação com os agricultores.

A partir da década de 60, por ser oúnico meio de comunicação que chegavaaos domicílios de forma mais acentuada, epela precariedade das linhas telefônicas, quenão estavam disponíveis ao interior, o rádiomostrava-se verdadeiramente útil, servindocomo meio de difusão de novas tecnologiasna criação de suínos e aves. Desde sua ori-gem, a ainda Rádio Sulina, hoje Rural AM,adquirida pela Sadia em 1956, tinha a fina-lidade de ser essencialmente voltada ao “ho-

mem do campo”. Contudo, foi utilizada tam-bém com finalidade política, “seja para aprojeção de candidatos de interesse da em-presa, seja para evitar críticas de grupos nãoalinhados com a conduta da Sadia ou dospolíticos que interessavam a ela” (COMAS-SETTO, 2005, p. 120).

Décadas se passaram, o rádio con-cordiense modernizou-se tecnologicamente,profissionalizou-se e se enraizou como meiode comunicação essencial não somente aoagricultor, mas também à população da re-gião urbana, que buscava informação e en-tretenimento. Por isso, a necessidade deuma programação mais popular, eclética eque atingisse necessariamente o maior nú-mero de cidadãos e não mais somente aclasse agrícola, como era o objetivo quandode seu surgimento. Os interesses comerciais,já pensando em retorno financeiro, fizeramcom que os programas voltados ao gosto po-pular se acentuassem.

É nesse sentido que programas polici-ais, que já vinham conseguindo audiênciaem emissoras populares em capitais, vieram,com grande resistência, a ser implantadostambém em rádios de Concórdia. A RádioRural, ainda sob o comando da empresa Sa-dia nos anos 80, abriu espaço para a implan-tação de um programa do gênero, por isso éconsiderada a pioneira em programação es-pecífica de jornalismo de polícia. Segundoo relato de antigos funcionários da emissora,o primeiro programa de polícia, o “RepórterPolicial”, foi ao ar no início de 1981. An-tes disso, as informações eram incluídas den-tro dos programas de jornalismo geral. Deacordo com Júlio Mocelin9, apresentador do

9 MOCELIN, Júlio. Depoimento ao autor,02/05/2005, Concórdia.

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primeiro programa de polícia do rádio con-cordiense, o início foi agitado, pois o ge-rente da Rádio Rural, na época Clélio IvoDal Piaz, não acreditava no novo programa,que se destacaria no futuro. O grande negó-cio nos anos 80 era o jornalismo geral e aatenção redobrada com o esporte, que tinhabastante destaque na programação da emis-sora.

De acordo com Mocelin, o “Repórter Po-licial” tinha duração de 15 minutos e come-çava às 6h45, terminando às 7h. Era o únicoque fazia essencialmente cobertura dos fatosque ocorriam na cidade, como: assaltos, pri-sões e acidentes de trânsito. Para ele, o jor-nalismo policial praticado naquela época ti-nha diferenças bem distintas do que é feitoatualmente, mas confirma que as notícias, namaioria, vinham da Delegacia de Polícia oufontes oficiais. Segundo o apresentador, naépoca o jornalismo policial “não se atinhaaos detalhes pequenos”. Sem concorrência,a emissora dava atenção somente às notíciasde maior impacto. Lembra ainda que, peladeficiência dos meios de contato, a comuni-cação era muito precária, até “para localizaruma vítima era muito difícil”. As matériaseram feitas a pé, no centro da cidade, devidoà emissora não possuir carro, e eram poucosos que tinham telefone.

Segundo o relato de Mocelin, o repórter,na época, que “cuidava exclusivamente depolícia”, tinha um contato muito próximocom as autoridades, além disso, “era muitorara a ação policial que não nos convidassepara ir junto”, e para dar mais realismo aofato. Lembra ainda que a polícia tratava aimprensa de forma diferenciada, pela neces-sidade de mostrar à população o que estavasendo feito.

Em 1985, Mocelin deixou a emissora e

adaptou o programa de polícia que vinhasendo feito pela Rádio Rural na Rádio Ali-ança, levando grande parte da audiência quefora conquistada na emissora em que traba-lhava. No ano seguinte, para dar mais forçaao jornalismo policial, que era um dos prin-cipais produtos de apelo popular e comercial,a Rádio Aliança contratou Luiz Antonio Pa-ludo, que já havia trabalhado na Rádio Rural,mas tinha saído para atuar em uma emissorade Aratiba, no Rio Grande do Sul. A du-pla, segundo Paludo10, acompanhou e narrouos dois principais fatos que marcaram a áreapolicial de Concórdia em toda a sua história.Um é a morte do empresário Narciso Colla,quando teve seu estabelecimento comercialassaltado, e o outro é o assassinato do almo-xarife Edemar Tondello, que foi morto comviolentos golpes de faca, tendo partes de seucorpo mutiladas. O crime, provavelmentepor motivos passionais, ainda hoje está en-volto em mistérios.

No primeiro caso, relata Paludo, o traba-lho da polícia foi acompanhado de perto, aponto, de transmitir a prisão dos “bandidos”.Lembra ainda que a troca de tiros foi trans-mitida ao vivo, para deixar o acontecimentomais real. No segundo caso, que muitos daimprensa consideram o assassinato mais bár-baro de toda a história de Concórdia, Moce-lin afirma que, duas vezes por semana, du-rante muitos anos, o assunto voltava a sermanchete no programa “Plantão de Polícia”(Aliança). De acordo com ele, o trabalho dosmeios de comunicação era tão intenso, que ogovernador da época, Pedro Ivo Campos, au-torizou o repórter a participar das prisões dosenvolvidos junto ao DEIC, em várias regiões

10 PALUDO, Luiz Antonio, Depoimento ao autor,06/05/2005, Concórdia.

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do país, como: São Paulo, Rio de Janeiro eMato Grosso. Além disso, Mocelin tambémviajou com a Polícia para o Paraguai, com ointuito de encontrar mais suspeitos de parti-cipação no crime que “comoveu Concórdiapela crueldade como ocorreu”.

Em 1986, a Rádio Rural, para tentar de-sestruturar a equipe de polícia que estava naemissora concorrente, contratou João Car-los Fortes11 , que trouxe de Chapecó umestilo novo de fazer programas policiais.Implantou-se o programa “Páginas Amare-las do Crime”, que, com um toque sensaci-onalista, alcançava bons índices de audiên-cia. De acordo com o apresentador, o pro-grama seguia uma “linha mais investigativa”e também supervalorizava a notícia, que eraapurada paralelamente com a investigaçãoda própria polícia. Afirma ainda que erao responsável pela matéria mais impactantedo dia, ficando responsável pelas ocorrên-cias corriqueiras, menos importantes, comoextravio de documentos, briga de marido emulher, golpes e pequenos acidentes, o en-tão repórter Dolmar Frizon.

De acordo com Fortes, há 20 anos, os pro-gramas policiais que estavam no auge eramos que desafiavam os “bandidos”, “autorida-des” e quebravam o protocolo. O “agito”que era feito em cima das notícias era o quemais chamava a atenção e causava impactona sociedade. Um “jargão”, segundo Fortes,que marcou o jornalismo policial da emis-sora durante o programa “Páginas Amarelasdo Crime”, foi o seguinte: “tem peixe grandena rede”. A frase sempre dava a entender aoouvinte que a polícia havia efetuado uma pri-são, às vezes, de pessoas conhecidas na so-

11 FORTES, João Carlos, Depoimento ao autor,27/05/2005, Concórdia.

ciedade, que merecia até um destaque maiordentro da programação policial.

O gerente da Rádio Rural, na década de80, Clélio Ivo Dal Piaz12 afirma que os pro-gramas policiais se intensificaram a partir de1985 nas emissoras locais. Segundo Clélio,“não se apostava tanto em polícia”, pela re-gião não ser violenta e o esporte e o jorna-lismo geral apresentarem mais representati-vidade na sociedade. Contudo, pelo fato daaudiência e retorno financeiro, os programasdo gênero “emplacaram”, e hoje ainda estãoem destaque na programação das duas emis-soras de rádio de Concórdia.

Passados quase 25 anos, o jornalista cri-tica o exagero e a grande atenção dispen-sada pelas emissoras de rádio aos progra-mas de polícia, devido à “região ser muitotranqüila”, comparando com outras do Es-tado e país. Clélio lembra ainda que os pro-gramas policiais modernos evoluíram. Comisso, a notícia é “melhor tratada”, e a lei deimprensa e os danos morais estão evitandocertos abusos nos programas policiais volta-dos ao esclarecimento público.

8 Rotinas de produção nojornalismo concordiense

Atualmente, as duas emissoras AM de Con-córdia têm diariamente programas específi-cos de cobertura policial. A rádio Aliançaveicula o “Plantão de Polícia” nos horáriosdas 6h35 às 06h50, 7h30 às 7h45 e 11h10às 11h25. A Rural, por não possuir um pro-grama específico de jornalismo policial, in-tercala as notícias do gênero no programa Vi-são Geral, das 6h30 às 6h50, no programa

12 DAL PIAZ, Clélio Ivo. Depoimento ao autor,02/05/2005, Concórdia.

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Show da Manhã, das 11h05 às 11h50, e às15h no programa Tarde Legal. Todas as par-ticipações são feitas pelos repórteres que fa-zem a cobertura local e regional dos fatos.

As informações não se limitam a esses ho-rários. Ambas as emissoras dedicam acentu-ada atenção às ocorrências do gênero durantea sua programação. Tanto que boa parte dasnotícias veiculadas nos principais noticiososdas rádios Aliança e Rural refere-se à área dasegurança.

Em se tratando especificamente dos pro-gramas dedicados à cobertura policial, o quese percebe é o foco nos fatos rotineiros, fac-tuais, com exploração do ocorrido em suasconseqüências, sem maior preocupação eminvestigar as causas dos problemas e os re-flexos para a comunidade.

Na Aliança, o programa policial tem emmédia 20 minutos. Desse tempo, o apre-sentador utiliza aproximadamente 11 minu-tos para divulgar os fatos repassados diaria-mente pelas Polícias Militar e Civil, Corpode Bombeiros, Polícia Rodoviária Estadual eFederal, ou seja, o relatório das fontes ofici-ais. As narrativas policiais das demais ocor-rências pouco escapam do supérfluo, pelofato de as notícias serem relacionadas, nagrande maioria, a pequenos acontecimentosdo cotidiano, como: acidentes de trânsito,arrombamentos, pequenos furtos e brigas fa-miliares, entre outros, que, observados cri-ticamente, não contribuem para o esclareci-mento da sociedade e o fortalecimento daopinião pública.

O repórter ainda faz a leitura na íntegra derelatórios e ocorrências, intercalando as cha-madas publicitárias “ao vivo” entre as notí-cias. A necessidade de informar em quanti-dade e não em qualidade é de fato uma re-alidade. Os patrocinadores também são uti-

lizados pelo apresentador para se sobressairna ausência de informações. Os comerci-ais em média utilizam apenas quatro minu-tos do programa. Contudo, são feitos em ho-rários impróprios, como na abertura do pro-grama. Ao invés de apresentar informaçõesque atraiam o interesse do ouvinte, o repór-ter abre o programa com um “Bom Dia” emenciona a lista com os patrocinadores13.

As informações de utilidade pública14 sãotambém veiculadas nos programas policiais.São assuntos de ordem administrativa da De-legacia de Polícia, Fórum, entre outros, quetambém permeiam os programas do gênero,utilizando uma média de três minutos do pro-grama. Os avisos são feitos pelo apresenta-dor em um bloco de forma bastante objetiva.A utilidade pública também é função do rá-dio local (Cebrián Herreros, 2001). O pro-blema é quando informações dessa naturezase sobrepõem ao conteúdo de maior impor-tância para um programa do gênero.

Ainda é notório o número pequeno de ma-térias (reportagem) que são produzidas pe-los dois repórteres que são ligados à editoriade polícia da Aliança. Durante os cinco diasobservados, somente uma notícia foi veicu-lada15 . A entrevista “ao vivo” durou aproxi-

13 O programa “Plantão de Polícia” da Aliança temcinco patrocinadores. Ambos são lidos “ao vivo” peloapresentador três vezes durante os 20 minutos do pro-grama.

14 O apresentador todos os dias faz o anúncio deuma lista com nomes de pessoas que devem compare-cer na Delegacia e Fórum. Ainda, inclui-se no mesmotempo a divulgação de “achados e perdidos”, ou seja,o apresentador divulga a perda de documentos, cha-ves, entre outros.

15 A única matéria produzida era sobre o assassi-nato de um agricultor no interior de Concórdia, e umdos suspeitos estava próximo de se apresentar às au-toridades policiais.

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madamente dois minutos e foi feita pelo tele-fone, sem a necessidade de deslocamento derepórter para apuração mais aprofundada dofato. Isso sugere que a emissora não possuiuma estrutura de reportagem, e, além disso,o repórter se limita à fonte oficial, como defato ocorreu na única matéria divulgada du-rante os cinco dias do programa observadopor este estudo.

A fonte do jornalismo policial, como já foicitado, é basicamente a oficial16. As cober-turas feitas no local do acontecimento estãopraticamente extintas das redações. Somentequando o fato apresenta proporções real-mente graves é que a cobertura é feita atravésde um repórter selecionado pela emissora.As fontes oficiais, na maior parte das vezes,repassam ao repórter o acontecimento, masnão com uma visão jornalística, de formaisenta. Dessa forma, pode a notícia perderem qualidade, uma vez que o repórter apre-senta dificuldade para relatar o fato ao ou-vinte. Além disso, é fácil ocorrer equívo-cos17 na veiculação da notícia. Algo comumem Concórdia é a rivalidade entre as duasemissoras. Há uma disputa na divulgaçãodas informações, no sentido de furar o con-corrente, sem se certificar primeiro do ocor-rido, o que pode acarretar erro ou superficia-lidade na divulgação dos fatos.

16 Todas as informações que foram veiculadas naprogramação dos cinco dias na Aliança (quase 100%),foram repassadas pela fonte oficial. Ex: Delegacia dePolícia, PRE, PRF, etc.

17 Um fato que chama a atenção para essa questãofoi quando um repórter da Rádio Rural ligou para aPolícia Militar, e o soldado de plantão informou queno centro da cidade estava acontecendo uma tentativade homicídio, quando era uma tentativa de suicídio. Amanchete do repórter foi ao ar, criou-se uma expecta-tiva e falsa idéia do ocorrido, porque depois teve quese retificar a notícia.

Os comentários personalizados tambémsão constantes nos 20 minutos de programa.Isso diminui a credibilidade e a qualidade dainformação, visto que, não raramente, cai-sena baixaria, como, por exemplo: O locutor,ao ler na íntegra uma ocorrência registradana Delegacia de Polícia, que se tratava deuma briga familiar, relatou o caso conformeo boletim, tornou público o nome dos envol-vidos, e, além disso, divulgou frases ditaspelos envolvidos, baixando o nível do pro-grama desnecessariamente18. Para finalizar,ainda comentou o apresentador: “brigar eofender sogra é pedir para levar na cabeça”.

Em outra situação, o repórter começouuma discussão com o apresentador do pro-grama de jornalismo geral, que o indagoupedindo sua opinião sobre as declarações dopresidente do Câmara dos Deputados, Seve-rino Cavalcanti, que disse que uma de suasmetas era aumentar o salário dos parlamen-tares. O apresentador do “Plantão de Polí-cia” mostrou-se desinteressado e desatuali-zado no assunto. No entanto, não perdeua chance e ironizou o deputado federal19 .Num jornalismo policial que se pretende sé-rio e esclarecedor, fatos como esses nadaacrescentam.

Com um estilo mais jornalístico, pelo me-nos é o que se percebe, a rádio Rural incluias informações policiais dentro de um pro-grama noticioso que também traz informa-

18 O relato feito pelo apresentador do programa daAliança foi o seguinte: “Ele me chamou de P.U.T.A efedida”.

19 De forma irônica e com risos, no estilo de fa-lar nordestino, o apresentador comentou: “O Severinoagora assumiu a presidência... é brincadeira”. Outrotrecho: “Bom, eu morro e não vejo tudo”, comentáriosobre a eleição do deputado federal Severino Caval-canti.

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ções gerais20 . Ao contrário do que faz aemissora concorrente, o programa policial daRural traz primeiro as manchetes dos assun-tos que serão posteriormente mais detalha-dos pelos dois repórteres da editoria.

O programa da Rural tem duração médiade 15 minutos. Aproximadamente oito mi-nutos são de informações, incluindo divulga-ção de ocorrências registradas na Delegaciade Polícia, que tem cerca de cinco minutosdiariamente, utilidade pública21, e as maté-rias produzidas pela própria editoria da emis-sora. Os comerciais22 ocupam em média trêsminutos da programação, intercalados entreas notícias, com textos “ao vivo e gravados”.

Além do que já foi dito, a Rural ainda têmveiculado com freqüência matérias com par-ticipação de entrevistados. Das seis veicu-ladas durante a semana observada, quatro seativeram a fontes oficiais23, e duas com pes-soas ligadas às vítimas. As matérias em mé-dia tinham duração de dois minutos, e cons-tituíram o principal assunto do dia.

20 O programa que utiliza a equipe com dois repór-teres de polícia está incluído dentro do noticioso Vi-são Geral, que começa às 6h30 e vai até as 8h. Con-tudo, das 6h35 até 6h50, somente notícias policiaissão divulgadas.

21 A utilidade pública do programa da Rural segueo padrão do apresentado pela Aliança. Os avisos sãode ordem administrativa da Delegacia de Polícia e Fó-rum, e são divulgados pelo próprio repórter.

22 Dentro do bloco de notícias de polícia na Ruralsão veiculados comerciais de quatro patrocinadores.Ambos são lidos “ao vivo”, exceto um em que a pro-paganda é gravada.

23 Uma das matérias feitas pelo repórter policialda Rural foi com o mesmo entrevistado da Aliança.Ambas as notícias foram veiculadas no mesmo dia ese tratando do mesmo assunto. O assassinato de umagricultor no interior de Concórdia e a possibilidadede um dos autores do crime se apresentar às autorida-des.

Em algumas situações também é possívelverificar que o repórter utiliza, ao relatar asnotícias, a linguagem técnica e o jargão po-licial, que, em algumas situações, pode serconsiderada pejorativa24.

As narrações das ocorrências policiaistambém são feitas na íntegra, sem uma apu-ração minuciosa do fato. O que parece, noentanto, é que os programas divulgam o queestá escrito na ocorrência policial, sempre to-mando o relato como verdadeiro, sem outraversão. Na maior parte dos casos, o repórterda Rural evita a divulgação de nomes de víti-mas ou envolvidos com a polícia. São veicu-ladas somente as iniciais, o que ajuda a dimi-nuir possíveis problemas com a justiça, pelofato de alguém se sentir ofendido25.

Outro ponto importante para destacar dizrespeito à leitura de informações que são pu-blicadas em jornais de circulação em todoo Estado, como: A Notícia, Diário Catari-nense, entre outros. São notícias de âmbitonacional, estadual e regional com apelo po-pular26. A seleção é feita às pressas, minutosantes do programa entrar no ar.

Por fim, os comentários são desnecessá-rios em algumas matérias veiculadas pelo re-pórter. Em uma das notícias que tratava so-

24 Nas entrevistas com as fontes oficiais, por váriasvezes, o repórter utilizou-se de “elementos”, como écomum na linguagem policial, para referir-se aos sus-peitos de envolvimento em um crime.

25 Caso a vítima tenha o nome veiculado pela im-prensa, e caso esteja sentido-se prejudicada, poderárecorrer na justiça, pedindo indenização por danosmorais, etc.

26 Durante a semana, o repórter noticiou três in-formações sem nenhuma ligação local. Entretanto, asnotícias causavam impacto perante o público, por tra-tar da condenação de quatro pessoas envolvidas comestupro na região da cidade Itapiranga, no meio oestecatarinense.

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bre a confissão de um assassino que assumiua autoria do crime no ar, em uma emissora delitoral, o apresentador comenta: “Se tem al-guém aí pensando em matar alguém, aborteesse pensamento, pra não dar uma declara-ção dessas depois aqui. Eu estou arrepen-dido. Aí não adianta nada”.

Os programas policiais da Rural e Aliançaseguem a mesma tendência de supervalorizara notícia policial, disponibilizando, na pro-gramação das emissoras, espaços significa-tivos para veiculação. Além disso, grandeparte das informações é voltada à busca deaudiência, às vezes, ultrapassando os limiteséticos da profissão de jornalista. A apuraçãodas causas e aprofundamento dos fatos estáfora de cogitação em ambas as emissoras. Amaior preocupação é no sentido de cativar aaudiência pelo relato da intriga ou do cho-cante, às vezes, ressaltado pelo comentáriopessoal do apresentador. Não se investiga,pouco se entrevista e não se importa se o re-lato contribuirá ou não para melhorar a soci-edade. O importante é o show. Isso é jorna-lismo?

9 O jornalismo policialresponsável: uma proposta atítulo de conclusão

Os meios de comunicação são peças funda-mentais para o desenvolvimento da socie-dade, conforme já citado nos capítulos an-teriores. No entanto, é importante ressal-tar essa função essencial, que muitas vezes édesconsiderada pela maior partes dos veícu-los de informação. A mídia atualmente estáse atendo muito ao apelo popular e ao gostoda audiência. Por isso, está esquecendo o

que é o mais importante para a informaçãocom responsabilidade social.

Confirma Patterson, que “a procura in-cessante de matérias apelativas vai contrao ideal do jornalismo de fornecer aos ci-dadãos a compreensão clara do seu papelna sociedade”. Alerta ainda que “a melhorforma de atrair o público para as notícias éoferecer-lhe um relato equilibrado das ques-tões” (2003, p. 43). É nesse sentido que amídia pode contribuir, ao passo de fortalecera opinião pública, esclarecer a sociedade etrabalhar para o desenvolvimento comunitá-rio.

O jornalismo responsável tem como ob-jetivo propor uma investigação mais apro-fundada dos fatos, coberturas mais amplas ediscussões mais democráticas, para melho-rar as condições culturais e sociais dos ci-dadãos. Apurar também com mais funda-mentação todas as notícias que são veicula-das nos meios de comunicação, filtrando oque pode ou não contribuir para melhorar odia-a-dia das pessoas. Segundo Medina, “háno compromisso social da comunicação po-pular a busca pela clareza e pela precisão aserviço da eficiência da mensagem; se issonão acontecer, não se estabelece comunica-ção” (apudFRIDERICHS, 2002, p. 68). Damesma forma, o sensacionalismo não devese sobrepor ao acontecimento.

Especificamente sobre o rádio, é visí-vel a necessidade de uma reestruturação daprogramação, em parte, até pela importân-cia que o veículo apresenta como media-dor social e cultural. Escreve Rosen, queo jornalismo tem função de atuar no “re-forço da cidadania, melhorando o debate pú-blico”, dessa forma, estabelecendo uma liga-ção mais forte com a sociedade, que é umdos pontos importantes do rádio local, ainda

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mais numa época em que os conglomeradosque atendem o público no contexto mais am-plo e global estão em evidência (apudTRA-QUINA, 2001, p. 180). Por isso, ao invés deinformar o público com notícias apelativas,o melhor a fazer é divulgar informações quepossam desenvolver o conhecimento e aju-dar a comunidade a ter uma visão mais am-pla dos assuntos, elevando-se, de forma maisética, o interesse da audiência, já que está énecessária para a viabilização comercial daemissora.

Por este motivo é que este estudo entendeuque deveria sugerir uma nova proposta dejornalismo policial. Não que tenhamos a pre-tensão de ser os donos da verdade. Tambémnão queremos dizer que o que está sendofeito é errado. Acreditamos, todavia, que di-ante da função social da mídia e de acordocom as idéias dos autores aqui citados, épossível trabalhar em prol de um jornalismomais profissional e esclarecedor, sem, con-tudo afetar a audiência das emissoras. Estas,pela maneira como abordam as questões, atéreduzem parcela significativas da população.Entretanto, ao ligar o rádio, o ouvinte estáquase sempre exposto aos discursos que nãodemonstram nenhuma orientação para a so-lução dos problemas existentes na comuni-dade.

Perguntamos, então, se é possível conci-liar as duas coisas: audiência e responsabi-lidade social. Acreditamos que sim e, comoparte prática deste trabalho, acrescentamos aproposta de um programa policial que julga-mos relevante e atrativo, sem ser sensacio-nalista a atingir a identidade moral dos cida-dãos, não importando a que classe social per-tençam. Estamos cientes também de que talproposta contribui para o estabelecimento de

uma sociedade menos violenta e mais dignade seus valores morais e culturais.

O programa aqui anexado aborda um pro-blema corriqueiro em Concórdia, que são osacidentes envolvendo condutores de motoci-cletas. Pela proposta, ao invés de meramenterelatarmos os acidentes, como geralmenteacontece nas emissoras locais, preferimosdiscutir as causas do problema, as limitaçõesdo trânsito local, os perigos a que estão ex-postos os motoqueiros e também as possíveisinfrações praticadas por estes. Eventuais so-luções ou diminuição das ocorrências tam-bém foram discutidas.

O programa teve por proposta abordar umúnico assunto e discuti-lo a fundo. Em nossoentendimento, de nada adianta relatar umasérie de ocorrências sem nexo entre elas,com o fito apenas de angariar audiência peloviés hilário, vulgar ou chocante. Tambémcondenamos o jornalismo fácil, de simplesleitura das ocorrências apanhadas em cimada hora nos departamentos ou órgãos de se-gurança. Se tal proposta ao menos contribuipara um repensar do jornalismo hoje prati-cado pelas emissoras, acreditamos que estetrabalho terá valido a pena.

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EntrevistasAUGUSTO, Claudério.Apresentador e re-

pórter policial da Rádio Super Condá,Chapecó, SC.Entrevista: 01/06/2005.

BRANDÃO, Alberto. Repórter da RádioGlobo. Rio de Janeiro, RJ.Entrevista:31/05/2005.

COSTA, Hélio. Apresentador de TV doSBT. Florianópolis, SC.Entrevista:21/03/2005.

DAL PIAZ, Clélio. Jornalismo e ex-gerenteda Rádio Rural. Concórdia, SC.Entre-vista: 02/05/2005.

FEIJÓ, Marcos. Repórter da Rádio Rural.Concórdia, SC.Entrevista: 11/04/2005.

FORTES, João Carlos.Ex-funcionário daRádio Rural. Concórdia, SC.Entre-vista: 27/05/2005.

GRIZOTTI, Giovani. Repórter da RádioGaúcha. Porto Alegre, RS.Entrevista:18/04/2005.

MOCELIN, Júlio. Ex-funcionário da Rá-dio Rural, atualmente Repórter da Rá-dio Aliança. Concórdia, SC.Entrevista:06/05/2005.

PALUDO, Luiz Antonio.Ex-funcionário daRádio Rural, atualmente apresentadore repórter da Rádio Aliança. Concór-dia, SC.Entrevista: 20/05/2005.

PESSOA, Márcio. Repórter da RádioGuaíba. Porto Alegre, RS.Entrevista:18/04/2005.

PRIMAM, Sérgio Luiz. Repórter da Rá-dio Rural. Concórdia, SC.Entrevista:11/04/2205.

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