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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM JÉSSICA VASCONCELOS DORTA PALAVREANDO: uma proposta de aplicativo educacional para a aprendizagem de português escrito pelos surdos CAMPINAS 2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

JÉSSICA VASCONCELOS DORTA

PALAVREANDO:

uma proposta de aplicativo educacional para a aprendizagem de

português escrito pelos surdos

CAMPINAS

2017

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JÉSSICA VASCONCELOS DORTA

PALAVREANDO:

uma proposta de aplicativo educacional para a aprendizagem de

português escrito pelos surdos

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Instituto de Estudos da Linguagem da

Universidade Estadual de Campinas para

a obtenção do título de Mestra em

Linguística Aplicada, na área de

Linguagem e Educação.

Orientadora: Profa. Dra. Claudia Hilsdorf Rocha

Co-orientadora: Profa. Dra. Ivani Rodrigues Silva

Este exemplar corresponde à versão final

da Dissertação defendida pela aluna

Jéssica Vasconcelos Dorta e orientada pela

Profa. Dra. Claudia Hilsdorf Rocha.

CAMPINAS 2017

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Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CNPq, 133495/2015-9

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas

Biblioteca do Instituto de Estudos da Linguagem

Crisllene Queiroz Custódio - CRB 8/8624

Dorta, Jéssica Vasconcelos, 1991-

D739p DorPalavreando : uma proposta de aplicativo educacional para a aprendizagem de português escrito pelos surdos / Jéssica Vasconcelos Dorta. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.

DorOrientador: Claudia Hilsdorf Rocha.

DorCoorientador: Ivani Rodrigues Silva.

DorDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem.

Dor1. Surdos - Educação. 2. Estudantes surdos. 3. Língua portuguesa - Ensino auxiliado por computador. 4. Língua portuguesa - Português escrito. 5. Educação bilíngüe. 6. Aplicativos móveis. 7. Tecnologia educacional. I. Rocha, Claudia Hilsdorf,1965-. II. Silva, Ivani Rodrigues,1955-. III. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. IV. Título.

Informações para Biblioteca Digital Título em outro idioma: Palavreando : a proposal of educational app for written Portuguese learning by deaf people Palavras-chave em inglês: Deaf - Education Deaf students Portuguese language - Computer-assisted instruction Portuguese language - Written portuguese Bilingual education Mobile apps Educational technology Área de concentração: Linguagem e Educação Titulação: Mestra em Linguística Aplicada Banca examinadora: Claudia Hilsdorf Rocha [Orientador] Carmen Zink Bolognini Ruberval Franco Maciel Data de defesa: 11-08-2017 Programa de Pós-Graduação: Linguística Aplicada

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BANCA EXAMINADORA: Claudia Hilsdorf Rocha Carmen Zink Bolognini Ruberval Franco Maciel

IEL/ UNICAMP 2017

Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA – Sistema de Gestão Acadêmica.

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DEDICATÓRIA

Ao meu sobrinho Guilherme, quem me

inspira a estar no mundo com amor e por

amor.

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AGRADECIMENTOS

O arrojo do rio, e só aquele estrape, e o risco extenso d’água, de

parte a parte. Alto rio, fechei os olhos. Mas eu tinha até ali agarrado

uma esperança. Tinha ouvido dizer que, quando canoa vira, fica

boiando, e é bastante a gente se apoiar nela, encostar um dedo que

seja, para se ter tenência, a constância de não afundar, e aí ir

seguindo, até sobre se sair no seco. Eu disse isso. E o canoeiro me

contradisse: — “Esta é das que afundam inteiras. É canoa de peroba.

Canoa de peroba e de pau-d’óleo não sobrenadam…” Me deu uma

tontura. O ódio que eu quis: ah, tantas canoas no porto, boas canoas

boiantes, de faveira ou tamboril, de imburana, vinhático ou cedro, e a

gente tinha escolhido aquela. Até fosse crime, fabricar dessas, de

madeira burra! A mentira fosse — mas eu devo de ter arregalado

dôidos olhos. Quieto, composto, confronte, o menino me via. —

“Carece de ter coragem…” — ele me disse.

(ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. São Paulo: Nova Aguilar, 1994, pp. 144 - 45.)

“Carece de ter coragem” é o que diz o menino Diadorim em meio à travessia

do Rio São Francisco ao pequeno e medroso Riobaldo. Na vida, fazemos inúmeras

travessias e ao longo delas há sempre aqueles que, longe ou perto, nos são canoas,

dessas que podemos nos apoiar para não afundar. As próximas páginas materializam

uma longa travessia, na qual muitas pessoas, cada uma a sua maneira, me ajudaram

a “sobre se sair no seco”.

Agradeço, dessa forma, minha orientadora, Profa. Dra. Claudia Hilsdorf

Rocha, por acreditar neste trabalho tanto quanto eu, por iluminar os meus estudos e

a minha visão de mundo com sua sensibilidade, sua determinação e sua presença

constante.

Agradeço à minha coorientadora neste trabalho, Profa. Dra. Ivani

Rodrigues Silva, pela parceria em muitos projetos e por ter me aberto muitas portas

no universo da comunidade surda.

Agradeço à Profa. Dra. Carmen Zink Bolognini, uma das minhas pessoas

preferidas no mundo, por me ensinar sobre amor, respeito e ética, por me incentivar

a seguir os meus estudos na área da educação de surdos, por ser inspiração, em

todos os sentidos, e por estar presente em mais uma etapa de minha formação

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acadêmica.

Ao Prof. Dr. Ruberval Maciel pela leitura atenta do texto de qualificação e

por suas contribuições inestimáveis para o aprimoramento deste trabalho. Também

por aceitar integrar a Banca Examinadora para a defesa de minha Dissertação.

Agradeço à Profa. Dra. Cátia Pitombeira e ao Prof. Dr. Esteves de Lima

Lopes pelo aceite da Suplência e pelo apoio, assim, demonstrado.

Aos meus colegas do Grupo de Pesquisa, agradeço, em especial, Tiago

Pellim, Stênio Carvalho, Daniel dos Santos e Airton Pretini, pelas contribuições dadas

ao meu trabalho e pelas trocas constantes.

Agradeço aos funcionários do IEL, em especial aos da Secretaria de Pós-

Graduação do DLA e do CEDAE, pelo apoio e colaboração.

Agradeço às professoras e amigas Rosemeire Desidério e Luciana Rosa

pelo companheirismo durante o período em que realizei minha especialização no

CEPRE e por me mostrarem, com paciência, quão rica é a Língua de Sinais e quão

maravilhoso é o universo da comunidade surda.

Ao Tales Bicudo e ao Fagner Silva pelas contribuições preciosas para o

delineamento do protótipo proposto nesta Dissertação.

Agradeço a todos os surdos que cruzaram meu caminho ao longo dessa

trajetória, especialmente os alunos surdos participantes desta pesquisa, por me

mostraram uma perspectiva completamente diferente sobre o que é língua e

linguagem e, consequentemente, sobre o mundo.

Ao André, Denis, Naiara, aos moradores da República Pqp e República

Hellmanns, agradeço o companheirismo e a amizade.

Aos meus amigos que, diariamente, me incentivam e vivem comigo os

momentos de “crise”: Amanda e Rodrigo.

Às minhas amigas, irmãs de alma, Luciana e Ricelli, por estarem sempre

presentes, me incentivando e me apoiando incondicionalmente.

Ao Alex, o primeiro leitor deste trabalho, quem acreditou em mim e me fez

acreditar também. Obrigada por me ajudar a me organizar, pelas palavras de incentivo

e por olhar para mim.

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Ao Bruno por ser amigo, irmão e professor. Obrigada pelo apoio

incondicional, pela dedicação, pelas doses de amor e amizade diárias, sem você teria

sido muito mais difícil.

Ao Cauê por trazer, com seu olhar doce e compreensivo, mesmo em um

momento delicado, amor, leveza e paz à minha vida.

À minha família, Rovilson, Cecília, Kelly, Júlio e Guilherme, razão de tudo.

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Chega mais perto e contempla as

palavras. Cada uma tem mil faces secretas

sob a face neutra e te pergunta, sem

interesse pela resposta,

pobre ou terrível, que lhe deres:

Trouxeste a chave?

Procura da Poesia, Carlos Drummond de

Andrade

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RESUMO

Esta pesquisa propositiva, de natureza qualitativa e base etnográfica (ANDRE, 2003),

tem como objetivo central delinear e analisar as principais características de uma

proposta de aplicativo educacional móvel voltado à comunidade surda, Palavreando,

cuja finalidade é a aprendizagem de palavras, vista como um processo

multimodalizado e discursivo de construção de sentidos em Português. Para isso,

investigamos o perfil e as percepções de um grupo de aluno surdos, inseridos em um

programa bilíngue de apoio escolar a crianças e jovens surdos, situado em uma

universidade pública do interior paulista, em relação à aprendizagem de português

escrito, mediada pelas tecnologias digitais móveis. O referencial teórico que norteou

o nosso trabalho constitui-se pelos estudos voltados ao (i) campo da Aprendizagem

Móvel (McQUIGGAN et al, 2015; SHARPLES, M., 2005); (ii) ao conceito de novos

letramentos, tal como definidos, principalmente, por Lankshear e Knobel (2007, 2011);

(iii) e à visão sócio-histórica e dialógica da linguagem (BAKHTIN/VOLÓCHINOV,

2011, 2015, 2017). Para cumprir os objetivos traçados para esse estudo, foram

adotados como instrumento de produção de dados um questionário online, registros

da observação das aulas do programa bilíngue em diário de campo e dois grupos

focais. O cruzamento dos dados produzidos a partir desses instrumentos

evidenciaram algumas categorias teórico analíticas relevantes para orientar a

condução da análise e, portanto, a composição da proposta do app. As noções de

multimodalidade, palavra/enunciado, contexto, colaboração e interação entre os

usuários foram os conceitos mais significativos. Considerando o contexto

sociolinguisticamente complexo dos surdos, Palavreando foi pensado em conjunto

com os alunos participantes da pesquisa. Além disso, deve ser compreendido como

um objeto aberto e inacabado que ganha vida apenas no uso pela comunidade, ou

seja, ele se caracteriza como um recurso que deve estar em constante (re)construção.

Palavras-chave: educação de surdos; aprendizagem móvel; aprendizagem de

Português; aplicativos educacionais móveis.

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ABSTRACT

This qualitative and ethnographic research proposal (ANDRE, 2003) aims to delineate

and analyze the main characteristics of a proposed mobile educational app destined

to the deaf community, Palavreando, whose purpose is word learning, seen as a

multimodal and discursive process of meaning making in Portuguese. For this, we

investigated the profile and perceptions of a deaf student group, inserted in a bilingual

program of school support to deaf children and youth, located in a public university in

a small city in the countryside of São Paulo State, in relation to learning written

Portuguese, mediated by mobile digital technologies. The theoretical framework that

guided our work is constituted by the studies focused on (i) the field of Mobile Learning

(McQUIGGAN et al, 2015; SHARPLES, M., 2005); (Ii) the concept of new literacies, as

defined mainly by Lankshear and Knobel (2007, 2011); (Iii) and to the socio-historical

and dialogical view of language (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2011, 2015, 2017). In order

to fulfill the objectives outlined for this study, an online questionnaire, records of the

observation of bilingual program classes in research diary and two focus groups were

adopted as an instrument of data production. The crossing of the data produced from

these instruments showed some analytical theoretical categories relevant to guide the

conduct of the analysis and, therefore, the composition of the proposal of app. The

notions of multimodality, word/enunciated, context, collaboration and interaction

among users were the most significant concepts. Considering the sociolinguistically

complex context of deaf people, Palavreando was constructed together with the

students participating in the research. In addition, it must be understood as an open

and unfinished object that comes to life only in the use by the community, that is, it is

characterized as a resource that must be in constant (re)construction.

Key words: deaf people education; mobile learning; written Portuguese learning; mobile

educational applications.

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LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS

APP: Aplicativo móvel

AM: Aprendizagem móvel

CAF: Ciência e Arte nas Férias

GF: Grupo focal

LIBRAS: Língua Brasileira de Sinais

LA: Linguística Aplicada

PL2: Português como segunda língua

TDIC: Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação

TIC: Tecnologias de Informação e Comunicação

Q1: Questionário de perfis e necessidades

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Benefícios da Aprendizagem Móvel. (McQUIGGAN et al., 2015, p. 10, tradução nossa) ... 20

Figura 2 - Desafios da Aprendizagem Móvel. (McQUIGGAN et al., 2015, p. 13, tradução nossa) ...... 21

Figura 3 - Algumas dimensões entre diferentes mentalidades. (LANKSHEAR E KNOBEL, 2007, p. 11,

tradução nossa) ..................................................................................................................................... 29

Figura 4 - Classificação da pesquisa. Adaptado de Gonsalves (2003, p. 64) ...................................... 46

Figura 5 - Perfil dos alunos participantes da pesquisa. ......................................................................... 49

Figura 6 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 15 do Q1. ................................................ 50

Figura 7 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 17 do Q1. ................................................. 50

Figura 8 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 18 do Q1. ................................................. 51

Figura 9 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 21 do Q1. ................................................. 52

Figura 10 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 24 do Q1. ............................................... 52

Figura 11 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 30 do Q1. ............................................... 53

Figura 12 - Resumo das aulas selecionadas para análise. (Adaptado de SÃOPEDRO, J. 2016) ....... 57

Figura 13 - Instrumentos de produção de dados e objetivos alcançados ............................................. 59

Figura 14 Logo do app Palavreando desenvolvido por Diogo Melani ................................................... 63

Figura 15 - Tipos de aplicativos educacionais. (McQUIGGAN et al., 2015, p.60, tradução nossa)...... 64

Figura 16 - Prototipagem das telas de cadastro e login ........................................................................ 66

Figura 17 - Prototipagem da tela de preenchimento do perfil do usuário ............................................. 67

Figura 18 - Prototipagem da tela de resultados da busca da palavra “político”. ................................... 68

Figura 19 - Prototipagem das telas de inserção de sinal e imagem, respectivamente. ........................ 69

Figura 20 - Prototipagem das telas de inserção de vídeo e definição escrita, respectivamente .......... 69

Figura 21 - Prototipagem da tela que contém uma possibilidade de definição para a palavra “político”.

............................................................................................................................................................... 70

Figura 22 - Prototipagem da tela de perfil do usuário. ......................................................................... 71

Figura 23 - Prototipagem da tela de perfil de outro usuário .................................................................. 72

Figura 24 - Prototipagem da tela do feed de conteúdos ....................................................................... 73

Figura 25 - Prototipagem da tela de atividades recentes dos usuários ................................................ 74

Figura 26 - Prototipagem da tela dos resultados da busca da palavra “político”. ................................. 75

Figura 27 - Prototipagem da tela de cadastramento de novas palavras ............................................... 76

Figura 28 - Prototipagem das telas de palavras cadastradas e lista de palavras ................................. 77

Figura 29 - Prototipagem das telas Dicionário e palavras com a letra “A” ............................................ 77

Figura 30 - Prototipagem da tela com informações sobre o app. ......................................................... 78

Figura 31 - Gráfico gerado a partir das respostas dadas à questão 26 do Q1. .................................... 80

Figura 32 - Quadro gerado a partir das respostas dadas à questão 27 do Q1. .................................... 80

Figura 33 - Meme Chapolin. Fonte: http://geradormemes.com/media/created/jqw4g5.jpg .................. 83

Figura 34 - Prototipagem das telas com os vídeos dos sinais em Libras da palavra “político”. ............ 88

Figura 35 - Resultado da busca pela palavra “Fanfic” no Google Imagens .......................................... 90

Figura 36 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político” através de imagem ...................... 91

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Figura 37 - Tabela com as definições escritas produzidas pelos alunos para a palavra “político”. ...... 94

Figura 38 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político”, através de vídeo do aluno J ....... 98

Figura 39 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político”, através de vídeo da aluna L ....... 99

Figura 40 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político”, através de vídeo da aluna I ........ 99

Figura 41 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político”, através de vídeo do aluno L ..... 100

Figura 42 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político” através de imagem .................... 102

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SUMÁRIO

QUANDO OS OLHOS OUVEM ........................................................................................... 17

CAPÍTULO 1 – ABRINDO OS OLHOS ............................................................................... 20

1.1 Breve contextualização da educação de surdos ............................................................ 21

1.2 Tecnologias digitais móveis e os aplicativos educacionais ............................................. 25

1.3 Os contornos da investigação ........................................................................................ 27

1.3.1 O problema de pesquisa ............................................................................................................................. 27

1.3.2 Objetivo do estudo ........................................................................................................................................ 29

1.3.3 Justificativa do estudo ................................................................................................................................... 30

1.4 Organização da dissertação .......................................................................................... 31

CAPÍTULO 2 – DIREÇÕES A SE OLHAR .......................................................................... 33

2.1 Aprendizagem móvel: espaço conceitual ....................................................................... 34

2.1.1 Compreendendo a Aprendizagem Móvel ...................................................................................................... 35

2.1.2 Implicações da Aprendizagem Móvel ........................................................................................................... 36

2.1.3 Desafios da Aprendizagem Móvel ............................................................................... 37

2.2 A Pedagogia dos Multiletramentos e os Paradigmas da aprendizagem ......................... 39

2.3 Novos Letramentos ........................................................................................................ 43

2.4 A lingua(gem) em Bakhtin e seu círculo ......................................................................... 46

2.5 Avaliando aplicativos móveis ......................................................................................... 50

2.5.1 Personalização ............................................................................................................................................. 52

2.5.2 Compartilhamento e acesso ......................................................................................................................... 53

2.5.3 Pluralidade de língua, linguagens, cultura .................................................................................................... 54

2.5.4 Âmbito pedagógico ....................................................................................................................................... 54

2.5.5 Modos de aprendizagem............................................................................................................................... 55

CAPÍTULO 3 – UMA MANEIRA DE OLHAR ...................................................................... 57

3.1 Observando a partir da Linguística Aplicada .................................................................. 57

3.2 Natureza e caráter do estudo ......................................................................................... 59

3.3 O contexto e os participantes da pesquisa ..................................................................... 63

3.4 Procedimentos e instrumentos para produção de dados ................................................ 70

3.4.1 Questionário .................................................................................................................................................. 70

3.4.2 Diário de Campo ........................................................................................................................................... 71

3.4.3 Grupo focal ................................................................................................................................................... 73

3.4.4 Procedimentos para análise dos dados produzidos ...................................................................................... 76

CAPÍTULO 4 – DELINEANDO O APLICATIVO E SEUS PRINCÍPIOS ............................... 78

4.1 Palavreando: apresentação do protótipo ........................................................................ 79

4.1.1 Acesso ao aplicativo ..................................................................................................................................... 82

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4.1.2 Funções de uso geral do aplicativo ............................................................................................................... 83

4.1.3 Menu do aplicativo ........................................................................................................................................ 70

4.1.4 Perfil dos usuários ........................................................................................................................................ 71

4.1.5 Feed de conteúdos ....................................................................................................................................... 72

4.1.6 Atividades recentes dos usuários ................................................................................................................. 89

4.1.7 Buscador de palavras ................................................................................................................................... 90

4.1.8 Acesso às palavras cadastradas .................................................................................................................. 92

4.2 Palavreando: processo de concepção e análise das características constitutivas do protótipo............................................................................................................................... 94

4.2.1 Concepção do protótipo ................................................................................................................................ 95

4.2.2 Aprendizagem é visual ................................................................................................................................ 101

4.2.3 Aprendizagem é social ................................................................................................................................ 110

CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE A TRAVESSIA ........................................................ 120

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................. 126

ANEXOS ........................................................................................................................... 131

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QUANDO OS OLHOS OUVEM

Há cinco anos, eu me preparava para entrar pela primeira vez em uma sala

de aula com alunos surdos em um projeto de leitura e escrita de Português como

segunda língua1. Antes disso, eu pouco sabia sobre a situação dessa comunidade e

menos ainda sobre as riquíssimas e complexas questões de lingua(gem) que

subjazem as relações estabelecidas entre eles e o mundo.

Na época, eu dava aulas de Português como segunda língua para

estrangeiros e me sentia constantemente desafiada pelas perguntas, a princípio

óbvias, feitas pelos alunos, mas que eu, com a distração de uma falante nativa, não

sabia responder prontamente. Cada aula era uma oportunidade de desconstruir

conceitos já naturalizados e de refletir sobre as questões sociais, políticas e culturais

que a língua faz emergir. Por isso, até aquele momento, esse certamente era o tema

que eu escolheria para pesquisar. Não esperava que, ao fim da minha primeira

semana de aula para surdos, eu é que seria escolhida.

O desafio começou quando tive que planejar as primeiras aulas. O que eu

sabia era que o “surdo é visual” e que, portanto, eu deveria usar muitas imagens. Já

havia feito um workshop de Língua Brasileira de Sinais (Libras), mas nem imaginava

quão rica era essa língua e o quanto sua estrutura poderia me ensinar sobre novas

formas de se construir sentidos. Tinha experiência com aulas de Português para

estrangeiros, mas era notavelmente ignorante a respeito do contexto educacional dos

surdos. Bastou a primeira manhã de aula para perceber que eu estava diante de um

dos maiores desafios da minha formação como professora e, principalmente, como

ser humano.

Nos cinco anos em que atuei no projeto, o curso foi planejado de modo que

o Português escrito fosse explorado a partir do trabalho com textos que fornecessem

noções básicas de disciplinas do ensino médio: história, geografia física e política,

biologia e temas da atualidade. Para além do trabalho com aspectos gramaticais da

língua portuguesa, o objetivo central do projeto sempre foi a busca constante por

1 O curso “Leitura e escrita em português para surdos”, coordenado pelas Profas. Dras. Carmen Zink Bolognini e

Ivani Rodrigues Silva, está inserido no programa Ciência & Arte nas Férias, da Pró-Reitoria de Pesquisa da Unicamp, e é direcionado a adolescentes surdos do ensino médio das escolas públicas regulares de Campinas e região. O curso acontece anualmente durante o mês de janeiro e conta com a colaboração e orientação de docentes, pedagogos, intérpretes educacionais e monitores/professores dos cursos de Letras e Fonoaudiologia da Unicamp.

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estratégias de ensino que se mostrassem mais sensíveis ao contexto translíngue em

que se encontram os surdos e que privilegiassem a formação cidadã e crítica desses

alunos.

O contato com a comunidade surda me fez perceber o quanto ainda somos

ignorantes em relação às especificidades educacionais que a envolvem e, mais que

isso, o quanto somos indiferentes. Anualmente, recebemos alunos cujas dificuldades

são, principalmente, reflexos de uma educação e uma sociedade que não os enxerga.

Dessa forma, é importante que a agenda das pesquisas em Linguística Aplicada (LA)

continue se debruçando sobre o complexo contexto translíngue dos surdos, em

especial a importância da aprendizagem de Português escrito por essa comunidade,

não apenas em relação ao seu caráter instrumental, mas para que o surdo ao engajar-

se nesse processo, também esteja apto a participar ativamente das práticas sociais,

construindo sentidos e se constituindo como cidadãos.

O desejo de pensar essas questões como com mais profundidade, me

incentivou a realizar, em 2015, juntamente com o mestrado, um curso de

aprimoramento profissional e especialização na área de surdez oferecido em um

centro de estudos ligado a uma universidade pública do interior do Estado de São

Paulo. Neste curso, atuei como professora de Português escrito em um programa

bilíngue de apoio escolar a crianças e jovens surdos, contexto no qual os sujeitos

desta pesquisa estão inseridos e que será descrito no capítulo 3 desta Dissertação.

Há, em âmbito nacional, uma evidente fragilidade no que se refere aos

estudos sobre educação de surdos. Por isso, inserido no campo da LA, a partir de sua

natureza inter/transdisciplinar (SIGNORINI E CAVALCANTI, 1998), em que se

estabelece um diálogo com os conhecimentos e com as lógicas de outras disciplinas,

o trabalho aqui apresentado narra o início de uma interminada jornada pessoal e

acadêmica em busca de estratégias que amparem de forma mais contundente o

ensino de Português escrito como segunda língua para surdos.

Desse modo, o objetivo desta pesquisa é delinear e analisar uma proposta

de aplicativo móvel (app) que se apresente como um recurso multimodalizado para a

aprendizagem de palavras em Português pelos surdos. Mais do que um compromisso

acadêmico, este estudo é movido pelo desejo de somar esforços à luta por maior

equidade, pelo diálogo com a diversidade e por maior participação social dos grupos

minoritários.

Inspirada em Gabas (2016) que pede a seus leitores para tirarem seus

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sapatos ao adentrarem no universo sul-coreano de sua dissertação, termino este

prelúdio convidando você, leitor, a me acompanhar nessa travessia de olhos bem

abertos para “ouvir” as vozes dos surdos que inspiram cada parte deste trabalho.

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CAPÍTULO 1 – ABRINDO OS OLHOS

Lady signs flower on pink background (Yiqiao Wang2) http://yiqiaowang.com

Neste capítulo inicial, procedo a uma breve contextualização da história da

educação de surdos, com o intuito de delinear o atual cenário educacional dessa

comunidade no Brasil, principalmente, em relação à aprendizagem de Português

escrito. Além disso, inicio uma reflexão sobre as possibilidades que a presença das

tecnologias digitais móveis trazem para esse processo. Ao fim, apresento os objetivos

e a pergunta de pesquisa que nortearam o desenvolvimento dessa investigação, bem

como os fatores que a justificam.

2 De Pequim (China), Yiqiao Wang, artista plástica surda, mudou-se para os Estados Unidos, onde estudou Ilustração e artes gráficas. Suas obras, que combinam o desenho feito à mão com a ilustração digital, são cheias de cores vivas, em traços característicos que marcam suas criações (...) Wang foi uma das responsáveis pela parte gráfica do app bilíngue Baobab, projetado por um grupo de pesquisadores da Gallaudet University para o ensino de American Sign Language para os pequeninos. Disponível em: https://culturasurda.net/category/artes-plasticas/. Acesso em: 17 nov. 2016.

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1.1 Breve contextualização da educação de surdos

Inicialmente, interessa, neste trabalho, conhecer a trajetória pela qual os

surdos passaram em seu processo de escolarização, uma vez que é ela quem nos dá

subsídios para compreender o atual cenário educacional dessa comunidade e as

necessidades que eles enfrentam em relação a aprendizagem de português escrito,

tema que impulsiona as reflexões presentes nessa Dissertação.

O processo de escolarização dos surdos foi marcado, desde seu início, por

um constante conflito entre duas tendências de ensino: a oralização (com ou sem o

apoio dos sinais) e a instrução via língua de sinais para aprendizagem de leitura e

escrita (SILVA E FAVORITO, 2009). Essas tendências subjazem as diferentes

representações do sujeito surdo presentes até hoje e refletem no atual cenário

educacional.

Os primeiros registros sobre a educação de surdos datam do século XVI.

Nesse período, tutores atendiam filhos pertencentes a famílias nobres. Entre esses

tutores, o mais conhecido é o monge espanhol beneditino Pedro Ponce de Leon

(1520? - 1584), considerado o primeiro professor de surdos da história. Embora se

reconheça que o foco de sua educação estivesse voltado ao ensino da fala aos

surdos, o método usado pelo monge privilegiava a escrita, uma vez que se acreditava

que a ela cabia a chave do conhecimento. Com isso, seu trabalho não apenas

influenciou os métodos de ensino para surdos ao longo do tempo, como também é

marco importante na luta contra a visão patológica de médicos e filósofos da época

que consideravam os surdos incapacitados para o desenvolvimento de linguagem e,

portanto, para qualquer tipo de aprendizagem.

Em alguns estudos, como os de Skliar (1997), Rée (1999) e Moura (2000),

que, à luz de diferentes teorias, delineiam e discutem a educação de surdos nos

últimos cinco séculos, é possível observar que os debates acerca das duas tendências

de ensino sempre estiveram relacionados a questões ligadas à(s) língua(s). Por um

lado, havia aqueles que acreditavam que os surdos deveriam desenvolver a língua

oral e, consequentemente, defendiam uma educação pensada a partir do modo de se

ensinar a língua oral aos ouvintes. Por outro, havia aqueles que acreditavam que

deveria ser permitido aos surdos (uma vez que a educação dessa comunidade sempre

foi determinada por ouvintes que se auto-empoderaram para a tomada dessa decisão)

o uso da língua de sinais.

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É importante notar nessa história que, embora as discussões façam referência à educação, as questões próprias das esferas educacionais nunca foram enfatizadas. Os métodos de ensino, as práticas realizadas, assim como os conteúdos ensinados foram submetidos ao fator linguístico e abordados com o objetivo de descrever e sustentar a defesa pelo desenvolvimento dessa ou daquela língua (oral ou de sinais). Esses aspectos só começaram a ser discutidos no final da década passada, juntamente com críticas sobre a determinação e subordinação dessa educação à de ouvintes (SKILIAR, 1997b, 1998 apud LODI 2005, p. 411).

Até o final do século XVI, os surdos eram considerados, de maneira geral,

incapazes de aprender. Consequentemente, por muito tempo foram impedidos de

exercer seus direitos legais. Para o pensamento da época, debruçado na concepção

aristotélica de superioridade do mundo das ideias e da razão representada pela

palavra, quem não tinha desenvolvido a fala espontaneamente não poderia ser

considerado cidadão. Nesse período, predominou a crença de que a oralização era o

meio necessário para humanizar os surdos. Segundo Moura (2000), essa crença de

que os surdos estariam fora da condição humana pela falta de audição e da fala

começa na Antiguidade, atravessa os séculos e ainda persiste em nossos dias.

No século XVIII, em 1760 aproximadamente, um movimento social

contrário à ideologia oralista começa a delinear-se na educação dos surdos. Esse

movimento nasce na França, com o abade Michel de L’Epée (1712 – 1789), que funda

a primeira escola pública de surdos no mundo, o Instituto Nacional de Surdos-Mudos

de Paris. L’Epée, com o objetivo de realizar um trabalho de catequização com os

surdos, reconheceu que eles possuíam uma linguagem gestual pela qual se

comunicavam com seus pares. Com base nisso, desenvolveu um método, usado até

meados do século XIX, chamado sistemas de sinais metódicos, que consistia no uso

de sinais na ordem gramatical do francês. A importância de L’Epée para a história dos

surdos deve-se, principalmente, “ao espaço que, de alguma forma, a língua de sinais

passou a ter em sua escola, tanto como meio de instrução quanto como meio de

interação entre os alunos surdos” (SILVA E FAVORITO, 2009, p. 12).

É importante ressaltar que entre meados do século XVIII e a primeira

metade do século XIX a educação de surdos, pautada no uso da língua de sinais, se

tornou habitual. Os surdos alcançaram o direito à cidadania, escolas de surdos foram

fundadas e houve um incentivo à formação de professores surdos que assumiram

grande parte dessas instituições. Após esse período, depois da metade do século XIX,

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“uma história de predomínio absoluto da língua oral na educação de surdos se tornou

realidade por quase cem anos” (SILVA E FAVORITO, 2009, p. 13). Surgiram

movimentos sociais em toda a Europa buscando a consolidação dos estados

nacionais e tendo na língua a maior expressão de centralização sociopolítica e

cultural. “Era necessário acabar com o plurilinguismo social, subjugando-o à língua

oficial do país” (LODI, 2005, p. 416). É nesse contexto que ocorre, em 1880, o que

talvez seja a maior marca de retrocesso na história da educação dos surdos – o

Congresso de Milão -, em que se decretou a proibição do uso das línguas de sinais

na educação de surdos.

A partir disso, apenas em 1960, inicia-se uma série de críticas aos métodos

orais, uma vez que essa abordagem não era suficiente para resolver as complexas

questões que envolvem a escolarização dos surdos. Nasce, então, um método que

ficou amplamente conhecido como Comunicação Total (CT). Ele consistia em usar

tudo aquilo que melhorasse a comunicação dos surdos com seus pares: desenho,

escrita, pantomima, a fala, o alfabeto, a língua de sinais. Acreditava-se que era preciso

promover a comunicação e não a aprendizagem de uma língua em particular. Apesar

dos usos de todos esses recursos serem reunidos sob o nome de Comunicação Total,

havia uma grande diferença entre os vários métodos adotados, cada um privilegiando

um aspecto da comunicação. Embora a CT tenha tido uma grande repercussão no

Brasil nos anos 80 e tenha sido de grande importância para a revitalização das línguas

de sinais que haviam sido banidas das escolas desde o final do século XIX, ela

também não foi suficiente para melhorar o rendimento escolar do aluno surdo.

Os sinais eram utilizados meramente como apoio da fala, e os professores serviam-se da língua de sinais cada um a sua maneira, o que resultou em críticas, pois tal funcionamento significava pouca autonomia da língua de sinais, que era utilizada de forma, por vezes, muito artificial (SILVA E FAVORITO, 2009, p. 19).

De qualquer maneira, o movimento da CT fez emergir estudos sobre as

línguas de sinais que favoreceram o movimento seguinte na educação dos surdos: a

Educação Bilíngue. O ensino bilíngue para surdos surge no Brasil por volta dos anos

90, defendendo um espaço mais significativo para a língua de sinais no ensino. Nessa

abordagem educacional é proposto que duas línguas sejam ensinadas para essa

comunidade: a primeira seria a língua de sinais, e a segunda, a língua oral, em sua

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forma escrita e/ou oral.

Como vimos, no Brasil as experiências com a educação bilíngue na área

da surdez ainda são bastante recentes. Apenas em 2005, foi assinado o decreto nº

5.626 que regulamentou o texto do Decreto-Lei nº 10.436, de 2002, reconhecendo a

libras como meio legal de comunicação e expressão e tornando obrigatório o seu

ensino nos cursos de formação de professores3. Sobre o Decreto, cabe ressaltar que

o texto acentua a impossibilidade de que a Libras substitua o Português escrito, ou

seja, a leitura e a escrita em Português permanecem sendo obrigatórias para a

comunidade surda.

Ainda que a promulgação da lei tenha atraído olhares para as questões que

envolvem essa comunidade, infelizmente, a realidade da educação de surdos no

Brasil está longe de se configurar como uma educação bilíngue de qualidade.

Normalmente, os surdos que têm acesso à libras como L1 são filhos de pais surdos

que se constituíram através dessa língua. A maioria deles, filhos de pais ouvintes,

desconhece ou conhece muito pouco da língua de sinais, busca aprender o português,

frequenta escolas regulares e dada a dificuldade de aprendizagem acaba por

abandoná-la ou se forma sem uma educação de qualidade. Outros são impedidos de

aprendê-la, porque ainda hoje há a crença de que os surdos precisam ser oralizados

para ter acesso à escrita. Souza e Góes (1999), afirmam que a grande maioria dos

professores, nas salas de aulas regulares, não está preparada para oferecer uma

educação inclusiva que considere as especificidades da educação de alunos surdos

e até mesmo nas escolas especiais, que dizem aceitar a língua de sinais, poucas são

aquelas que abrem suas portas para que professores surdos componham o quadro

docente.

A atual escolarização de alunos surdos, portanto, pode seguir duas

orientações: monolíngue ou bilíngue. No primeiro caso, os alunos surdos estão

imersos em escolas regulares, nas quais a língua de instrução é o português e os

métodos de ensino se pautam no modo de ensinar para alunos ouvintes que pouco

contribui para o processo de aprendizagem do aluno surdo. Além disso, não há

presença de intérprete de libras. No segundo caso, há diferentes cenários bilíngues,

3 A Libras foi oficializada pelo Decreto-lei nº 10.436 de 24/04/2002, cujo texto foi regulamentado pelo Decreto nº

5.626, publicado em 23/12/2005, do Diário Oficial da União, nº246 (págs. 28, 29 e 30). Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm. Acesso em: 17 jun 2017.

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nos quais, além de português, também circula a libras: escolas regulares com

presença de intérpretes ou em escolas de surdos.

Nesse contexto, a recente inserção da libras no mundo escolar é de

altíssima relevância, uma vez que isso não só pode contribuir para que os surdos

tenham acesso às informações, como amplia a visibilidade dessa comunidade (SILVA

E FAVORITO, 2009). No entanto, a simples presença da libras nas atividades

escolares como instrumento de comunicação ou transmissão de conteúdos não

garante o processo de construção de conhecimentos e sentidos ou o processo de

aprendizagem de uma segunda língua, como é o caso do português escrito, por

exemplo. Nesse contexto, é importante, portanto, considerar as especificidades

linguísticas dessa comunidade, a fim de elaborar projetos educativos formais e

informais que possibilitem experiências de aprendizagem mais significativas para eles

e com eles.

1.2 Tecnologias digitais móveis e os aplicativos educacionais

Considerando o contexto translíngue em que se inscreve a educação de

surdos e as novas formas de aprender, de conhecer e fazer provocadas, em grande

parte, pelo desenvolvimento das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação

(TDIC), passo agora a uma breve reflexão sobre como o advento das novas

tecnologias, em especial, das tecnologias digitais móveis têm influenciado o

desenvolvimento dos aplicativos educacionais móveis.

O conjunto de avanços desencadeados pela Revolução Industrial impactou

profundamente os modos de produção e, consequentemente, as relações econômicas

e sociais, criando condições estruturais necessárias para o surgimento da Sociedade

da Informação. Segundo Coll e Monereo (2010), essa nova forma de organização

social, política, econômica e cultural comporta novas formas de trabalhar, comunicar-

se, relacionar-se, pensar, aprender, ou seja, novas formas de viver. Ainda segundo os

autores, essa nova sociedade se sustenta, principalmente, no desenvolvimento das

Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC).

Acompanhando esse conjunto de avanços, “as linguagens desenvolvidas

para uso em meios analógicos ou impressos migraram para meios digitais” (BRAGA,

2013, p. 39), o que permitiu reunir em um mesmo espaço - o ciberespaço -, a

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possibilidade de se desenvolver autoria e interação; a integração de semioses, o

hipertexto e a circulação de discursos polifônicos, que passaram a desenhar novas

práticas de letramento na hipermídia (ROJO, 2014, p.7). Tais transformações não são

simplesmente consequência dos avanços tecnológicos, mas estão relacionadas a

uma nova conduta (novo ethos) e a uma nova mentalidade que serão melhor

trabalhadas no capítulo seguinte. As novas tecnologias, combinadas a essa nova

mentalidade sintetizam aquilo que os autores chamam de “novos letramentos”.

Temos, por um lado, a convergência virtual que permite incluir no mesmo

espaço textos escritos, sons, imagens estáticas e em movimento. Por outro lado,

cresce exponencialmente o número de pessoas com acesso à internet.

Consequentemente, as necessidades de alfabetização digital aumentam (COLL E

MONEREO, 2010, p. 17). Nesse contexto, é importante que a sociedade se prepare

para uma educação que considere a pluralidade cultural e que sirva a cidadãos cada

vez mais digitais. Segundo dados da TIC Educação4, as salas de aula têm sido

apontadas como o lugar mais frequente de uso de TDIC, no entanto, esse uso ainda

é meramente instrumental e centrado no professor. Ou seja, esse uso não se volta

para os novos letramentos viabilizados pelas TDIC (ROJO E BARBOSA, 2014, p. 3).

Pensando nessas questões, a tecnologia não deveria ser tratada, portanto, como algo

à parte que deve ser inserido de alguma forma no cotidiano escolar. Pelo contrário, os

artefatos tecnológicos, em especial, os dispositivos móveis (smartphones, iphones,

tablets, ipads, lap-tops, etc.) estão cada vez mais presentes nos espaços educativos

e são trazidos pelas mãos dos próprios alunos, costumeiramente pouco orientados

sobre a forma de se relacionar educacionalmente com essas tecnologias (ALMEIDA E

SILVA, 2011, p. 5). Nesse sentido, o papel da escola seria criar condições para que

os alunos participem ativamente das práticas sociais e, sob a luz dessa visão, as

novas tecnologias deveriam ser parte do aprendizado, uma vez que novas habilidades

precisam ser incluídas nos objetivos de aprendizagem.

No atual contexto, se o advento dos dispositivos móveis tem impactado

profundamente o cotidiano da sociedade, para os surdos, esses dispositivos

provocam mudanças ainda mais significativas. Como vimos, as práticas escolares que

4 CGI.BR; NIC.BR; Cetic.BR. TIC Educação 2012 – Pesquisa sobre o uso das Tecnologias de Informação e

Comunicação no Brasil. Disponível em: http://cetic.br/educacao/2012/apresentacao-tic- educacao-2012.pdf.

Acesso em: 07/07/2015

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envolvem a educação dessa comunidade sempre estiveram distantes das

necessidades de aprendizagem desses alunos. No entanto, cada dia mais, é possível

perceber que a apropriação desses dispositivos por esse grupo (dentro e fora dos

espaços escolares) tem propiciado processos discursivos e de socialização que

favorecem a autonomia dessa comunidade, uma vez que essas tecnologias têm

democratizado o acesso à informação, à comunicação e à construção de

conhecimento em diferentes modalidades de linguagem (imagens estáticas, imagens

em movimento, etc.) antes bastante restritos quando pensamos no contexto da

surdez.

Nesse sentido, os mercados para aplicativos móveis têm investido

consideravelmente no desenvolvimento de softwares para dispositivos móveis. Entre

eles, destaca-se o crescimento exponencial dos aplicativos educacionais. Um estudo

recente constatou que, em 2011, foram baixados mais de 270 milhões de aplicativos

pedagógicos – um número dez vezes maior que os anos de 2009 e 2010 (McKINSEY

e COMPANY, GSMA, 2010 apud UNESCO, 2014, p. 23). Ainda segundo esse estudo,

embora alguns desses aplicativos tenham sido projetados para atender metas

curriculares, a maior parte deles visa a aprendizagem informal. Dessa forma, o que se

espera para os próximos anos, com o crescente aumento do uso dos dispositivos

móveis nos ambientes de educação formal, é que os aplicativos se tornem parte

importante do ecossistema de aprendizagem móvel (AM) (UNESCO, 2014, p. 23).

1.3 Os contornos da investigação

Nesta seção, discorro sobre o problema que motivou a elaboração dessa

pesquisa, os objetivos que nortearam o seu desenvolvimento, bem como a pergunta

de pesquisa que foi base para a apresentação da proposta de aplicativo móvel. Além

disso, busco situar a relevância que o trabalho pode ter para o campo da LA, no que

diz respeito à educação de surdos e sua relação com a aprendizagem móvel.

1.3.1 O problema de pesquisa

O modo como a educação de surdos vem sendo conduzida ao longo dos

anos tem levado pesquisadores a voltarem seus olhares para as práticas escolares

que envolvem esses alunos. Segundo Silva et al (2013), não só os métodos escolares

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não são adequados aos alunos surdos, mas as estratégias de ensino utilizadas não

atendem às necessidades dessa comunidade. Os materiais de ensino de português,

bem como os métodos usados em sala de aula são, em sua maioria, métodos

tradicionais voltados para ouvintes e, exatamente por isso, são direcionados ao ensino

do português como língua materna e não como segunda língua, o que pouco contribui

para o processo de aprendizagem do aluno surdo. É preciso se perguntar, portanto,

que estratégias poderiam contribuir para a autonomia e agência dos alunos surdos

como aprendizes de português escrito e como tornar esse processo de aprendizagem

mais significativo. É justamente esse o problema geral que motivou a realização da

pesquisa aqui descrita.

Ao longo dos anos, os surdos foram caracterizados não por suas

potencialidades, mas pelas limitações que a própria sociedade atribuiu a eles.

Segundo Vygotsky (1989), dois tipos de deficiência acometem o ser humano: a

deficiência primária, fruto de uma má formação ou disfunção de algum caractere

biológico ou hereditário e a deficiência secundária, resultado do isolamento social do

sujeito com seu entorno. Nós, como educadores e linguistas aplicados, temos pouco

a fazer a respeito da deficiência primária, mas podemos contribuir significativamente

para minimizar a deficiência secundária. É preciso educar o entorno (MAHER, 2007,

p. 267) para que as especificidades linguísticas e culturais dos grupos minoritários

sejam respeitadas e eles possam se empoderar e participar ativamente das práticas

sociais.

Nesse contexto, é importante enfatizar que, embora a promulgação da Lei

10.436, que legitima a língua de sinais como meio legal de comunicação e expressão,

tenha atraído o olhar de alguns pesquisadores para o campo da educação de surdos,

as produções acadêmicas a respeito do ensino de Português escrito como segunda

língua para essa comunidade são ainda muito escassas, principalmente no Brasil, o

que espero poder contribuir para justificar essa pesquisa, cujos objetivos descrevo a

seguir.

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1.3.2 Objetivo do estudo

Para traçar os objetivos deste estudo, amparo-me no referencial teórico da

LA, como campo transdisciplinar, conforme asseveram Celani (1998) e Rojo (2006).

Levo também em consideração o perfil e as percepções de um grupo de alunos surdos

em relação à aprendizagem de português escrito como segunda língua, mediada

pelas tecnologias digitais móveis. Além disso, a fim de acentuar o caráter colaborativo

do trabalho, considero as ideias e as expectativas desse grupo frente a uma proposta

de aplicativo móvel que possa contribuir para a aprendizagem do português escrito,

levando-se em conta a multiplicidade de modos ou linguagens no processo de

construção de sentidos.

Diante do exposto, tomo como objetivo central do estudo que me proponho

a desenvolver:

Investigar e delinear as principais características de um protótipo de

aplicativo móvel voltado à comunidade surda, cuja finalidade seja a

aprendizagem de palavras, vista como um processo multimodalizado e

discursivo de construção de sentidos em Português.

Cabe ressaltar que o principal propósito vinculado à proposta em questão

é contribuir para a aprendizagem de português escrito pelos surdos, bem como

colaborar com a ampliação de possibilidades de construção de sentidos por essa

comunidade. Por isso, diante do objetivo central apresentado, cumprem ser indicados

os objetivos especificamente traçados para o desenvolvimento do estudo proposto:

• Delinear o perfil dos participantes surdos e suas percepções frente à aprendizagem

de português como segunda língua;

• Efetuar um levantamento bibliográfico de estudos relacionados à aprendizagem e

às tecnologias móveis;

• Investigar como os alunos surdos participantes deste estudo, relacionam-se com

essas tecnologias e como eles fazem uso de variados modos/linguagens para

construir sentidos em Português;

• Levantar as principais ideias dos participantes frente à proposta de um aplicativo

voltado à aprendizagem de palavras em Português.

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Levando-se em conta as particularidades e pressupostos teóricos até o

momento apresentados e atrelados ao estudo em pauta, a pergunta de pesquisa que

visa à operacionalização dos objetivos estabelecidos para este trabalho assim se

apresenta:

Com base em uma visão enunciativo-discursiva da linguagem, como

se delineiam as principais características de um protótipo de aplicativo móvel

para surdos que pretende se mostrar um recurso em potencial para a

aprendizagem de palavras em Português?

1.3.3 Justificativa do estudo

Embora haja vários estudos sobre o ensino de português escrito como

segunda língua para surdos, entre eles Cavalcanti (1999), Silva (2005), Fernandes

(2006), Zajac (2011), há ainda poucos trabalhos que relacionam aprendizagem de

português como segunda língua ao campo da aprendizagem móvel descrito por

McQuiggan et al (2015), Pachler (2010) e Sharples (2005).

As leis de inclusão e o reconhecimento da Libras como meio legal de

expressão e comunicação contribuiu para dar visibilidade às questões que envolvem

a educação de surdos, especialmente, no que diz respeito às línguas que envolvem

essa comunidade. No entanto, estudos que considerem as especificidades linguísticas

dos surdos e as relacionem com as novas tecnologias, como já dito, são ainda muito

incipientes. Embora a LA venha se ocupando com pesquisas a respeito de grupos

minoritários, há ainda muito a ser feito em relação ao contexto da surdez,

principalmente, no que tange sua relação com a Aprendizagem Móvel.

As tecnologias digitas estão sendo desenvolvidas e atualizadas em um

ritmo acelerado e apresentam uma oportunidade significativa de alcançar esses

grupos. Assim, o presente estudo se justificou, justamente, por se debruçar sobre essa

área de investigação. Por terem participado dos grupos focais e das reflexões

propiciadas pelas atividades envolvendo a presença das tecnologias digitais móveis

conectadas à internet, esta pesquisa também se justifica pela possibilidade que

ofereceu aos alunos participantes da pesquisa de compreenderem o contexto

linguístico no qual estão inseridos e como poderiam lidar educacionalmente com

essas tecnologias.

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Há ainda a expectativa de que esta Dissertação possa contribuir para que

pesquisadores, desenvolvedores, pais, alunos e professores possam refletir

criticamente sobre as possibilidades que as tecnologias móveis apresentam para os

processos de aprendizagem. Segundo McQuiggan et al. (2015), para que apps

educacionais de qualidade sejam desenvolvidos, programadores precisam de

professores e professores precisam de programadores. Dessa forma, o presente

estudo pretende contribuir para o fortalecimento das discussões sobre as

possibilidades educacionais que os dispositivos móveis conectados à internet trazem

não apenas para os grupos minoritários e minoritarizados, mas para a comunidade

escolar em geral.

1.4 Organização da dissertação

Essa dissertação está organizada em quatro capítulos. No primeiro, além

de apresentar os motivos que me inspiraram a realizar esta pesquisa, tracei um breve

panorama da história da educação de surdos e do contexto translíngue no qual eles

se inserem, a fim de fundamentar a necessidade de repensar os processos de

aprendizagem de português escrito como segunda língua por essa comunidade.

Descrevi, ao fim, os objetivos, a pergunta e a justificativa da pesquisa em questão e o

modo como esta Dissertação está estruturada.

No capítulo 2, apresento os pressupostos teóricos sobre os quais essa

pesquisa se debruça e que, portanto, embasam o delineamento das características

do protótipo de aplicativo móvel. Nesse percurso discorri sobre a Pedagodia dos

Multiletramentos, os Novos Letramentos, o crescente campo da Aprendizagem Móvel,

que envolve o desenvolvimento de app educacionais e a visão de língua(gem) como

fenômeno social, histórico e dialógico, proposta por Bakhtin e seu círculo.

Assim, no capítulo 3, discorro sobre a LA, em sua vertente antidisciplinar

(PENNYCOOK, 2006) e transdisciplinar (CELANI, 1998; ROJO, 2006), campo no qual

este trabalho está afiliado. Apresento a natureza qualitativa-interpretativista e

propositiva do estudo e os participantes da pesquisa. Por fim, indico os procedimentos

metodológicos adotados para a produção e análise dos dados.

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No capítulo 4, a partir de duas macrocategorias, apresento e defino as

principais características do aplicativo móvel, retomando a pergunta de pesquisa que

guia o trabalho. O capítulo está organizado em três partes, a primeira corresponde ao

processo inicial de desenvolvimento da proposta, bem como à apresentação das

principais características do app e as outras duas correspondem às categorias básicas

de análise que serão apresentadas no capítulo metodológico. O último capítulo,

corresponde às minhas considerações finais.

Finalizo esta seção reiterando as limitações deste trabalho, devido à

complexidade constitutiva do contexto sociolinguístico da comunidade surda e dos

desafios impostos pelo trabalho com o desenvolvimento de tecnologias digitais. Nesse

sentido, reforço o caráter inacabado, flexível e aberto da proposta de app

apresentada, na expectativa de que ela, de algum modo, possa contribuir para a

elaboração de outras propostas para esse público.

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CAPÍTULO 2 – DIREÇÕES A SE OLHAR

Obra sem título (Omeima Mudawi-Rowlings5)

http://www.omeima-arts.com/

Há ainda poucos estudos que relacionam aprendizagem móvel à

aprendizagem de línguas estrangeiras. Isso é ainda mais evidente quando se trata de

ensino de línguas orais para surdos e, sobretudo, de aplicativos educacionais móveis

que considerem, em sua concepção, as especificidades dessa comunidade em

relação à aprendizagem. Dessa forma, este capítulo volta-se essencialmente à

articulação dos fundamentos da aprendizagem móvel, dos novos multiletramentos e

da visão de língua(guem) com princípios e conceitos que embasam o delineamento

da proposta de aplicativo móvel, delineada para este estudo.

Os pressupostos teóricos aqui discutidos visam, principalmente,

fundamentar a aprendizagem móvel como um movimento que tem o potencial de abrir

portas para novas oportunidades educacionais, principalmente, no que diz respeito à

educação de surdos. Além disso, esse capítulo pretende apresentar a visão sócio-

histórica e dialógica bakhtiniana da linguagem que embasa esta pesquisa.

5 Nascida no Sudão (um dos maiores países do mundo árabe), Omeima Mudawi (surda) radicou-se na Inglaterra, onde se bacharelou em design têxtil pelo Instituto de Arte e Design de Surrey (hoje University for the Creative Arts – UCA). A artista exibe um padrão (re)corrente de conchas/orelhas que, de acordo com ela, traz à tona questões como identidades e comunicação, expressando em suas obras – produzidas sobretudo em papel, seda e veludo – o ethos de sua criação: “a beleza pela diversidade”. Disponível em: <https://culturasurda.net/category/artes-plasticas/>. Acesso em: 17 nov. 2016.

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2.1 Aprendizagem móvel: espaço conceitual

Aprendizagem móvel é um campo emergente e de contínua expansão que

vem se estabelecendo de forma complexa dentro dos estudos educacionais. Muitos

pesquisadores como McQuiggan et al (2015), Santaella (2013), Pachler (2010),

Sharples (2005) têm direcionado seus olhares a esse campo por acreditarem que a

AM tem um enorme potencial para transformar o sistema educacional, apresentando

novas oportunidades de aprendizagem.

“O termo móvel não é apenas uma qualificação para o atemporal

conceito de aprendizado, a aprendizagem móvel está emergindo como

um conceito inteiramente novo e distinto, junto a uma força de trabalho

móvel e uma sociedade conectada. Os dispositivos móveis criam não

apenas novas formas de conhecimento e novas formas de acessá-lo,

mas novas formas de fazer arte e acessá-la, novas formas de

comércio e atividades econômicas. Assim, a aprendizagem móvel não

diz respeito somente à mobilidade ou à aprendizagem como pode ter-

se compreendido inicialmente, mas como parte de uma nova

concepção de sociedade móvel” (TRAXLER, 2008 apud SANTAELLA,

2013, p. 299).

Segundo Pachler, N., Bachmair, B. e Cook J. (2010), não existem quadros

teóricos e conceituais suficientes para explicar a complexa inter-relação entre o

desenvolvimento tecnológico, seu potencial para a aprendizagem e sua inserção no

cotidiano dos usuários. Para os autores, há ainda uma falta de clareza sobre como o

termo “móvel” pode ser entendido. Eles questionam se existe, de fato, a necessidade

de um campo separado de investigação sobre aprendizagem móvel ou se o sufixo

apenas qualifica aspectos da aprendizagem, ao invés de configurar um novo tipo de

aprendizagem. Entretanto, Santaella (2013) destaca que os dispositivos móveis

conectados à internet têm inaugurado uma nova forma de aprendizagem que se

caracteriza como espontânea, assistemática e não linear. Nesse contexto, o acesso à

informação e ao conhecimento, nas palavras da autora, “tornam-se colaborativos,

compartilháveis, ubíquos e pervasivos”.

Segundo Pachler, N., Bachmair, B. e Cook J. (2010), os princípios básicos

que definem o trabalho com a AM não são novos: a “aprendizagem" em geral, mediada

ou não pelas tecnologias digitais, é um campo bastante explorado e dificilmente se

pode afirmar que o conceito de "mobilidade" não tem sido uma preocupação de

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pesquisadores, acadêmicos e profissionais da educação já há algum tempo. “O que é

novo, no entanto, é a capacidade e a funcionalidade da tecnologia, em particular a

convergência de serviços e funções em um único dispositivo, sua ubiquidade,

portabilidade e multifuncionalidade” (PACHLER, N.; BACHMAIR, B.; COOK, J., 2010,

p. 6, tradução nossa). Segundo eles, a aprendizagem móvel não é sobre transportar

conteúdos para dispositivos móveis, mas sobre o processo de conhecer e ser capaz

de produzir sentidos em novos contextos e espaços de aprendizagem em constante

mudança. Trata-se de compreender e saber como utilizar nossa vida cotidiana como

espaço de aprendizagem. Para Santaella (2013), os dispositivos móveis permitiram

os processos abertos de aprendizagem, uma vez que, a partir deles, o acesso à

informação tornou-se livre e contínuo, a qualquer hora do dia ou da noite, em qualquer

lugar.

2.1.1 Compreendendo a Aprendizagem Móvel

Considerando a proposta desta pesquisa, entendemos que a AM não é

primariamente sobre tecnologia, ou seja, tem pouco a ver com os dispositivos físicos

em si. Ao invés disso, ela se define pelas experiências e oportunidades possibilitadas

pela evolução das tecnologias educacionais que nos permitiram produzir nosso

próprio conhecimento, acessando um mundo personalizado, a qualquer momento, em

qualquer lugar, colaborando com outras pessoas e cultivando experiências

improváveis em outros momentos da história da educação.

Enquanto falamos de tecnologia nesta Dissertação, é importante entender

que aprendizagem móvel não é o mesmo que dispositivos móveis. Aprendizagem

móvel “seria o resultado do que essas tecnologias permitem quando usadas de modo

criativo e apropriado” (McQUIGGAN et al., 2015, p. 8). Portanto, a aprendizagem

móvel implica adaptação, redefine responsabilidades para professores e estudantes

e ofusca as linhas entre a aprendizagem formal e informal. Nesse contexto, como

veremos a seguir, há muitas implicações relacionados a esse tipo de aprendizagem.

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2.1.2 Implicações da Aprendizagem Móvel

Figura 1 - Benefícios da Aprendizagem Móvel. (McQUIGGAN et al., 2015, p. 10, tradução nossa)

A AM oferece muitas oportunidades e possibilidades de personalizar e

tornar mais significativo o modo como as pessoas aprendem, como mostra a Figura

1. Uma dessas possibilidades, segundo McQuiggan et al. (2015), é a de aprender em

movimento. Tradicionalmente, o espaço de aprendizagem era o espaço da sala de

aula. No entanto, com o advento das tecnologias digitais móveis, a aprendizagem não

está mais limitada a um espaço ou a um tempo determinados. Com esses dispositivos

conectados à internet, a aprendizagem pode ocorrer em qualquer lugar e a qualquer

momento. O crescimento constante do número de smartphones indica uma mudança

cultural no modo como nos comunicamos, acessamos informação, nos conectamos

com outras pessoas, aprendemos e nos socializamos. (McQUIGGAN et al., 2015, p.

11). Portanto, considerando que o papel da educação é garantir que os cidadãos

participem ativamente das práticas sociais, não se pode ignorar que os dispositivos

móveis estão cada vez mais pervasivos em nossa cultura e, por isso, essas

tecnologias precisam ser incorporadas aos objetivos de aprendizagem.

Segundo os autores, AM é também um importante caminho para alcançar

crianças carentes e escolas. Tecnologias móveis, quando comparadas a outras

iniciativas tecnológicas, apresentam um custo relativamente baixo, dada a sua

durabilidade e potencialidade tecnológica. Além disso, oferecem um diferente modelo

financeiro e tecnológico, que é muito mais fácil de manter sob orçamentos apertados.

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Dispositivos móveis também oferecem um poder substancial no que diz

respeito a oportunidades de aprendizagem fora das quatro paredes da sala de aula.

“Museus virtuais, aulas online e experiências simuladas são possibilitadas através de

dispositivos móveis conectados à Internet” (McQUIGGAN et al., 2015, p. 11, tradução

nossa). Além disso, segundo os autores, esses dispositivos fornecem subsídios para

melhorar as habilidades de pensamento de ordem superior, uma vez que incentivam

o pensamento crítico, a resolução de problemas, comunicação, colaboração,

criatividade e inovação. As características inerentes à aprendizagem móvel

incentivam o desenvolvimento dessas habilidades, uma vez que possibilitam

compartilhar facilmente informações com outras pessoas, utilizar criativamente uma

ampla variedade de recursos e avaliar criticamente a veracidade e o valor das fontes.

Finalmente, a aprendizagem móvel fornece novos caminhos para motivar

alunos, promovendo altos níveis de engajamento e novidades, personalização e

autonomia. Segundo McQuiggan et al. (2015, p. 12), a habilidade de usar

constantemente novos apps ou encontrar caminhos para manter o dispositivo atual

faz com que os estudantes permaneçam interessados. Permitir e incentivar que os

alunos lidem educacionalmente com os dispositivos móveis traz novos significados

para esses dispositivos.

2.1.3 Desafios da Aprendizagem Móvel

Figura 2 - Desafios da Aprendizagem Móvel. (McQUIGGAN et al., 2015, p. 13, tradução nossa)

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A aprendizagem móvel vem acompanhada de uma série de dificuldades.

Um dos obstáculos que as iniciativas de aprendizagem móvel podem enfrentar é o

acesso diferenciado a dispositivos e à internet. Disponibilidade e custo da banda larga

nas escolas e nas casas, assim como a memória disponível no dispositivo podem ser

grandes desafios. Segundo McQuiggan et al. (2015, p. 14), embora estudos recentes

tenham apontado uma queda nos custos de aparelhos eletrônicos, ainda há uma

notável lacuna em relação a famílias de menor renda.

Outro desafio diz respeito ao monitoramento do uso desses dispositivos.

McQuiggan et al. (2015, p. 14) salientam que, ao mesmo tempo que esses aparelhos

podem ser usados para o enriquecimento de atividades educacionais, eles também

podem ser uma oportunidade para distração ou comportamentos antiéticos. Há

também uma preocupação em relação à saúde decorrente do tempo de permanência

em frente à tela, além de questões sobre o compartilhamento de informações pessoais

e privacidade. Nesse contexto, seria importante incluir nos objetivos de aprendizagem

o uso responsável dessas tecnologias, bem como o letramento digital.

Há ainda muito preconceito em relação ao uso de tecnologias digitais

móveis para fins educacionais, uma vez que o sistema permanece estruturado de

forma a reforçar os métodos educativos tradicionais (McQUIGGAN et al., 2015, p. 14).

Enquanto uma série de estudos sobre o potencial da aprendizagem móvel para a

educação é realizado, ainda não há uma teoria aceita e, portanto, há muitas

divergências entre educadores, administradores e legisladores sobre o real valor da

presença desses dispositivos para fins educacionais. A consequência disso é que,

muitas vezes, essas atitudes refletem em leis de proibição categórica do uso desses

dispositivos em sala de aula, como acontece na maioria das escolas públicas

brasileiras.

Embora dispositivos móveis como smartphones e tablets ofereçam muitos

benefícios quando comparados a computadores de mesa e laptops, há algumas

limitações físicas que podem dificultar o seu uso. McQuiggan et al. (2015, p. 15)

destacam que muitos dispositivos móveis não vêm acompanhados de teclados, por

exemplo, o que dificulta a digitação, uma vez que suas telas normalmente são

pequenas. No entanto, enquanto isso pode ser um desafio para alguns, os chamados

nativos digitais não encaram isso como um problema.

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Há também uma ressalva a se fazer em relação a atividades em grupo

quando os dispositivos móveis precisam ser compartilhados entre mais pessoas, sua

funcionalidade e benefícios são comprometidos. Segundo McQuiggan et al. (2015, p.

15), em situações como essa, usar dispositivos móveis pode ser mais difícil e menos

envolvente para os alunos. No entanto, há muitas ferramentas que permitem que os

dados dos estudantes sejam transferidos entre dispositivos e armazenados na nuvem.

Finalmente, o modo como os dispositivos móveis são implementados

impactam a efetividade destes. No caso das escolas, por exemplo, a TIC Educação6

nos mostra que, embora nos últimos anos, tenha havido um crescimento significativo

do uso de TDIC nas salas de aula, esse uso ainda é meramente instrumental e

centrado no professor, ou seja, o uso não envolve os multiletramentos e nem os novos

letramentos que serão descritos a seguir.

2.2 A Pedagogia dos Multiletramentos e os Paradigmas da aprendizagem

Não é recente, na literatura da área, a compreensão de que os letramentos,

no plural, são múltiplos. Porém, até poucos anos atrás, não havia se pensado em uma

pedagogia que pudesse abarcar essa multiplicidade de maneira apropriada às

interações verbais contemporâneas. A pedagogia dos multiletramentos surge,

portanto, em 1996, quando pesquisadores que integram o chamado Grupo de Nova

Londres se reúnem em New London, Estados Unidos, para discutir o ensino e a

pedagogia dos letramentos.

Esse encontro dá origem ao manifesto de 1996 intitulado “Uma pedagogia

dos multiletramentos – desenhando futuros sociais” que propõe o deslocamento de

um ensino formal, monolíngue, monocultural e orientado para uma só linguagem, para

um ensino que valorize as diversidades linguística, multicultural e de linguagens e

mídias. Para abranger essas duas multiplicidades – de cultura e de modos/linguagens

– o grupo cunhou o termo multiletramentos.

A principal razão pela qual o Grupo de Nova Londres afirmou a

6 CGI.BR; NIC.BR; Cetic.BR. TIC Educação 2012 – Pesquisa sobre o uso das Tecnologias de

Informação e Comunicação no Brasil. Disponível em: http://cetic.br/educacao/2012/apresentacao--‐tic-

-‐educacao--‐2012.pdf. Acesso em: 17 nov 2016.

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necessidade de uma nova pedagogia que abarcasse essas duas multiplicidades é

que, na visão dos autores, a sociedade contemporânea, marcada especialmente pelos

fenômenos de globalização, passou por mudanças profundas, tanto no âmbito do

trabalho, quanto na vida pública e privada e, dessa forma, a escola precisava tomar a

seu cargo os novos letramentos emergentes, em grande parte, devido ao

desenvolvimento das TIC.

Em relação à multiplicidade de culturas, vemos circular em nossa

sociedade uma série de produções culturais letradas que se constituem por textos

híbridos de diferentes letramentos: vernaculares e dominantes, populares e eruditos.

Segundo Rojo (2012), essa visão descentralizada de cultura(s) faz com que a

hibridização, as mestiçagens e as misturas sejam cada vez mais valorizadas.

Nessa perspectiva, a multimodalidade ou a multissemiose, ou seja, a

multiplicidade de linguagens, modos ou semioses dos textos em circulação (ROJO,

2012, p.19), exige práticas de compreensão e produção cada vez mais elaboradas.

Portanto, são necessárias novas ferramentas, de áudio, de vídeo, de tratamento de

imagem, edição e diagramação, como aponta Rojo (2012, p. 21) e novas práticas de

produção e compreensão. Portanto, são necessários novos e multiletramentos.

A partir de 1996, os autores do Grupo de Nova Londres focalizaram, cada

um, em interesses específicos dentro da pedagogia, ficando os autores Bill Cope e

Mary Kalantzis responsáveis por defender, reformular e ampliar a proposta original da

pedagogia. Dessa atribuição, os dois autores lançaram, em 2009, um artigo que

buscou refletir sobre as mudanças ocorridas desde a publicação do manifesto, em

1996. Neste momento, Cope e Kalantzis (2009), redefinem alguns aspectos da

pedagogia original com a justificativa de que novas práticas sociais e novos

letramentos haviam emergido desde então.

No âmbito do trabalho, os autores ressaltaram a aceleração do “novo

capitalismo” que trouxe muito mais exigências sobre o saber tecnológico do que em

1996. Enquanto isso, a escola continuou com seus moldes tradicionais, sem promover

a cultura da flexibilidade, criatividade e iniciativa. Com o fim do welfare state, no âmbito

da vida pública, os sujeitos se tornaram cada vez mais responsáveis pelo seu próprio

bem-estar, o que refletiu em uma sociedade muito mais individualista. Já na vida

privada, com a convergência das mídias, as pessoas vivenciaram uma mudança na

agência, ou seja, espectadores e consumidores passivos passaram a ser usuários,

produtores e jogadores.

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É importante salientar que a principal mudança observada na reformulação

de 2009 é o valor que a multimodalidade passou a ter dentro da pedagogia, uma vez

que, a partir da expansão da Web e das novas mídias e tecnologias, houve um

aumento da complexidade da multimodalidade dos textos circulantes nas esferas

sociais. Cope e Kalantzis defendem, dessa forma, o potencial sinestésico do ensino

das diversas modalidades que são descritas como: linguagem escrita, linguagem oral,

representação visual, representação sonora, representação táctil, representação

gestual e representação espacial.

Para o que aqui nos interessa, que é a criação de um protótipo de app

móvel, outra reflexão relevante de Cope e Kalantzis pode nos ajudar a chegar mais

perto do nosso objeto de análise. Cope e Kalantzis (2012) apresentam três

abordagens da pedagogia e do currículo que têm orientado as práticas sociais:

mimesis, synthesis e reflexividade.

Segundo Cope e Kalantzis (2012, p. 261), a mimesis se fundamenta,

basicamente, a partir da repetição e da imitação, ou seja, da aprendizagem pela

absorção de fatos e informações. Já a synthesis inicia um processo de ruptura com o

padrão homogeneizador da mimesis, porque nesse paradigma os estudantes podem

descobrir fatos através da observação e da experiência, embora isso não esteja

necessariamente relacionado a seus interesses e motivações. Por fim, em uma

abordagem reflexiva, cabe ao sujeito refletir criticamente sobre suas ações através

das diversas formas do conhecimento, relacionando-o com as suas experiências

identidades.

Para compreendermos melhor essas abordagens, Cope e Kalantzis (2012)

nos mostram que a mimesis está fundamentada na tradição grega antiga de

Aristóteles que valorizava o processo artístico da cópia. Na abordagem pedagógica

da mimesis, a repetição e a imitação são valorizadas, uma vez que o sistema é

baseado na transmissão e na reprodução de saberes. Como consequência,

estabelece-se uma relação autoritária entre professor e o aluno já que, nesse

contexto, o professor é o detentor de todo o conhecimento a ser ensinado. Como

salientam os autores, esta abordagem surge e é valorizada dentro de um contexto

sócio-histórico específico: o do Estado-Nação, fundamentado em uma mentalidade

físico-industrial (COPE E KALANTZIS, 2012), pois ela se relaciona com o mesmo

paradigma da produção em massa, do homogêneo e da uniformização, valorizados

pelo Estado-Nação.

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E isto reflete, inclusive, na concepção e nos princípios de aplicativos

educacionais móveis para aprendizagem de línguas que pouco ou nada relacionam o

conhecimento científico com a vida do aluno. Os autores ainda apontam que, muitas

vezes, a mimesis pode ser associada a um ensino antigo e ultrapassado, embora

muitas práticas que incorporam as tecnologias móveis, inclusive os aplicativos,

também reproduzem este tipo de pedagogia.

No que diz respeito à synthesis, abordagem mais valorizada nos tempos

atuais, conforme afirmam Cope e Kalantzis (2012), o aprendiz descontrói e reconstrói

o conhecimento, pois em sua dimensão pedagógica estão presentes práticas como o

trabalho empírico e o experimento científico. Nesta abordagem, fórmulas e

informações simplesmente dadas não são valorizadas e, portanto, os estudantes são

incentivados a demonstrar o processo que os levam a uma resposta correta. Ou seja,

embora ainda exista uma resposta correta única, é preciso que se mostre como.

Segundo os autores, o construtivismo, baseado nos estudos e pesquisas de Jean

Piaget, é um exemplo desta pedagogia. Sob esta perspectiva, o estudante não

absorve o conhecimento, mas o constrói, internalizando-o. Portanto, fica claro que o

indivíduo e a cognição são centrais nesta abordagem, faltando pensar no aspecto

social e identitário da educação.

Em oposição a estas duas abordagens, o paradigma da reflexividade,

segundo Cope e Kalantzis (2012), valoriza o aluno e sua identidade, fazendo uma

conexão entre o conhecimento e sua realidade e entre os conhecimentos prévios e as

experiências. Isto se traduz em práticas pedagógicas de construir hipóteses como

cientistas, analisar para tirar suas próprias conclusões, fazer teorias e co-construir

conceitos e termos, trazendo uma importante dimensão para este processo: o da

análise e do pensamento crítico acerca do que se aprende. Nesta abordagem, o aluno

é construtor e, sobretudo, questionador do conhecimento. A esta perspectiva, os

autores relacionam a teoria de Vygostsky e seu conceito sobre a zona proximal de

desenvolvimento (ZPD). Também, na abordagem reflexiva, a metacognição é

valorizada e o aprendiz deve “aprender a aprender”, para se tornar mais autônomo

em seu processo de aprendizagem. Por fim, também são considerados os diversos

modos de significação. O conhecimento pode ser representado de diversas maneiras

e através de diferentes mídias, portanto, outras linguagens como as visuais se tornam

muito mais significativas e presentes em sala de aula.

Como podemos ver, o paradigma da reflexividade está diretamente

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relacionado aos pressupostos da Aprendizagem Móvel, pois valoriza o conhecimento

prévio, a análise crítica, a metacognição e os diversos modos de significação, ou seja,

a multimodalidade. A grande discussão que devemos fazer acerca de uma pedagogia

da reflexividade e da aprendizagem móvel é como transpor isso para aplicativos,

ambientes virtuais de aprendizagem, games educacionais, uma vez que estes

também têm sido espaço para a reprodução do paradigma da mimesis ou, no máximo,

de synthesis.

2.3 Novos Letramentos

Como explicam Rojo e Barbosa (2014, p. 4), as TDIC, com seus novos

textos, procedimentos e mentalidades, tem transformado a maneira como nos

comunicamos, interagimos, aprendemos e ensinamos. Consequentemente, nas

últimas décadas, a educação tem enfrentado um desafio não apenas em relação aos

letramentos convencionais, da letra e do impresso, mas, principalmente, em relação

aos novos e múltiplos letramentos (multiletramentos).

Lankshear e Knobel (2007, 2011) são dois dos principais autores que têm

se dedicado a defender a existência dos novos letramentos e justificar a presença do

prefixo “novo”. Na obra de 2007, A new literacies sampler, os autores definem pela

primeira vez o que seriam esses novos letramentos. Já no livro de 2011, New

Literacies, embora a definição teórica de novos letramentos permaneça a mesma, os

autores aprofundam e atualizam os estudos das novas práticas que surgiram desde

então.

Em geral, quando pensamos em novas tecnologias, pensamos em alguns

dispositivos digitais, como computadores, notebooks e smartphones. Entretanto,

Lankshear e Knobel (2007, p.7) nos lembram que, atualmente, um conjunto muito mais

amplo compõe o leque das novas tecnologias. Os programas, códigos-fontes e os

aplicativos são alguns exemplos. Essas tecnologias, como lembram Rojo e Barbosa

(2014, p. 6) fazem emergir novos procedimentos, tais como clicar, cortar, colar,

arrastar.

No entanto, para Lankshear e Knobel (2007), esses procedimentos (mera

técnica) não são os novos letramentos. De acordo com os autores, os novos

letramentos incluem, sim, novas tecnologias, mas principalmente colocam em cena

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um novo ethos, os quais chamam de “new technical stuff” e “new ethos stuff”,

respectivamente. Esse novo ethos vem acompanhado de uma nova mentalidade, que

denominam Mentalidade 2.0, em analogia à Web 2.0, como veremos mais adiante.

Os autores explicam que na perspectiva dos novos letramentos é possível

haver um novo ethos, sem que haja novas tecnologias. No entanto, o uso de novas

tecnologias não garante necessariamente a emergência de um novo ethos. Por

exemplo, uma atividade escolar em que o professor pede aos alunos para digitarem o

texto do livro envolve o uso de novas tecnologias, mas não uma nova conduta e uma

nova mentalidade, pois os alunos poderiam ter copiado o texto à mão sem que a

atividade sofresse grandes modificações em sua natureza. “Logo, não é o mero uso

das novas tecnologias que caracteriza novas práticas de letramento, mas sim as

novas condutas e a nova mentalidade que emergem com a Web 2.0” (ROJO;

BARBOSA, 2014, p. 7). Nas palavras de Lankshear e Knobel (2007, p. 10, tradução

nossa),

O mundo tem mudado em certos aspectos fundamentais pelo fato das

pessoas imaginarem e explorarem novos modos de fazer coisas que

são possibilitados por novas ferramentas e técnicas e não por usarem

as novas tecnologias para fazer as mesmas atividades de maneira

mais “tecnologizada” (primeira mentalidade).

O novo ethos e a nova mentalidade que Lankshear e Knobel (2007)

denominam Mentalidade 2.0 consiste, portanto, em uma realidade de maior

participação, colaboração, distribuição, autoria, por isso suas regras e normas são

mais fluidas e menos formatadas, caracterizando uma nova mentalidade. Ao

contrastar essa nova mentalidade com a anterior, os autores expõem algumas

diferenças fundamentais.

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Mentalidade 1 Mentalidade 2

O mundo opera basicamente a partir de

princípios físicos/materiais e de uma lógica

industrial.

O mundo opera, cada vez mais, a partir de

princípios e lógicas não materiais (ou seja,

ciberespaciais) e pós industriais.

O mundo é “centrado” e “hierárquico”. O mundo é “descentrado” e “plano”.

O valor varia em função da escassez. O valor varia em função da dispersão.

A produção baseia-se no modelo “industrial”. Visão “pós-industrial” da produção.

Produtos são artefatos materiais e mercadorias. Produtos viabilizam serviços.

Produção é baseada na infraestrutura e em

unidades ou centros (por exemplo, uma firma ou

uma companhia).

Foco no processo de alavancagem

e participação contínua.

Ferramentas são, majoritariamente,

ferramentas de produção.

Ferramentas são, cada vez mais,

ferramentas de mediação e de tecnologias

para relacionamento.

O indivíduo é a unidade de produção,

competência e inteligência.

O foco está, cada vez mais, no “coletivo”

como unidade de produção, competência e

inteligência.

O espaço é fechado e obedece a propósitos

específicos. O espaço é aberto, contínuo e fluido.

Prevalecem as relações sociais marcadas pela

hegemonia do livro; uma “ordem textual”

estável.

Relações sociais marcadas pelo “espaço da

mídia digital”; textos em mudança.

Figura 3 - Algumas dimensões entre diferentes mentalidades. (LANKSHEAR E KNOBEL, 2007, p. 11, tradução nossa)

Dessa forma, essa nova mentalidade da hipermodernidade (Mentalidade

2), aberta, fluida e colaborativa, altera profundamente certos valores e condutas do

letramento convencional. Para Rojo e Barbosa (2014, p. 9), “se no letramento

convencional a autoria individual é um valor precioso, nos novos letramentos o valor

é a colaboração, a participação contínua, a relação em rede”, características

fundamentais no que diz respeito à concepção de aplicativos educacionais móveis.

O que se propõe, portanto, não é que as tecnologias digitais dentro do

campo da Aprendizagem Móvel solucionem os problemas que afligem o sistema

educacional, mas salientar que os dispositivos tecnológicos possuem um significativo

potencial para mudar a maneira como os estudantes aprendem. Entretanto, modificar

o status quo do sistema educacional depende diretamente da pedagogia em que

esses dispositivos são tecidos e da visão de língua/linguagens que a sustenta, como

a que veremos a seguir.

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2.4 A lingua(gem) em Bakhtin e seu círculo

A forma linguística é dada ao falante apenas no contexto de certos enunciados e portanto apenas em um determinado contexto ideológico. Na realidade, nunca pronunciamos ou ouvimos palavras, mas ouvimos uma verdade ou mentira, algo bom ou mal, relevante ou irrelevante, agradável ou desagradável e assim por diante. A palavra está sempre repleta de conteúdo e de significação ideológica ou cotidiana. É apenas essa palavra que compreendemos e respondemos, que nos atinge por meio da ideologia ou do cotidiano (BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], p. 181).

Nesta seção, explicitarei as teorizações bakhtinianas sobre o

funcionamento da palavra como quadro teórico que embasa a concepção do protótipo

de app proposto neste estudo. Sobre isso há que se fazer duas considerações. A

primeira é que, segundo Stella (2005, p. 175), Bakhtin e seu círculo inauguram, nas

primeiras décadas do século XX, uma visão de palavra e de linguagem em geral, que

as concebe a partir de um ponto de vista histórico, social e cultural, isto é,

necessariamente contextualizado. Nesse sentido, trabalhar com o conceito de palavra

sob a ótica de Bakhtin é esbarrar em questões mais amplas inerentes à lingua, é

considerar a palavra em sua acepção mais ampla, como discurso e enunciação.

Dessa forma, ainda que o app em questão tenha como foco a aprendizagem de

palavras, ele não se limita à uma visão de palavra como vocábulo de dicionário.

Em segundo lugar, cabe ressaltar que no aprofundamento da concepção

de palavra, bem como em outras noções tratadas em Bakhtin, esbarramos na não

linearidade dos textos e discussões, o que aponta para a complexidade em se

compreender esse conceito e para a necessidade de uma atitude responsiva do leitor

diante do desafio de se compor significados para ele. Nesse sentido, é necessário

ainda salientar que existem diferentes possibilidades de tradução do vocábulo palavra

no russo, língua original dos textos do Círculo de Bakhtin. Sobre isso, Stella (2005, p.

183) afirma que justamente pelos textos não terem sido traduzidos em

ordem cronológica, alguns termos variam de um livro para o outro de acordo com as

escolhas do tradutor e do público para o qual ele se destina. Para exemplificar essa

variação, Stella (2005, p. 183) nos revela o duplo significado de palavra em russo.

Segundo o autor, o vocábulo pode tanto corresponder à palavra em Português, como

pode designar outro termo que é discurso.

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Diante do exposto, passamos agora a percorrer as discussões iniciais

sobre língua e linguagem na perspectiva bakhtiniana. Partindo do pressuposto de que

a linguagem é essencialmente ideológica, Bakhtin e Volóchinov (2017 [1929], p. 174)

explicam que devemos nos afastar de um ponto de vista unicamente objetivo que

tende a olhar a língua de forma independente e isolada, ou seja, como sistema de

normas indiscutíveis e fixadas.

Assim, ressalta-se que a consciência subjetiva do falante não se constitui

a partir de um sistema de formas normativas e idênticas, mas na significação nova e

concreta que as estruturas linguísticas assumem em um determinado contexto

concreto. Para os autores não importa o aspecto dessas formas, que permanece o

mesmo em todos os casos do seu uso. “O que importa para o falante é aquele aspecto

da forma linguística graças ao qual ela pode aparecer em um contexto concreto”

(BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], p. 177). Tendo isso em vista, a proposta de

app deve abarcar a situação concreta de enunciação para que a palavra ganhe vida

e seja compreendida dentro do processo de significação.

Em essência, a língua como concretude socioideológica viva, como opinião heterodiscursiva situa-se, para a consciência individual, na fronteira do que é seu e do outro. A palavra de uma língua é uma palavra semialheia; só se torna palavra quando o falante a satura de sua intenção, de seu acento, assume o domínio da palavra, fá-la comungar em sua aspiração semântica e expressiva. Até este momento de apropriação, a palavra não está numa língua neutra e impessoal (pois não é do dicionário que o falante tira a palavra!), mas em lábios alheios, em contextos alheios, a serviço de intenções alheias: é daí que deve ser tomada e tornada sua (BAKHTIN, 2017 [1934-1935], p. 69).

Portanto, se a forma linguística só tem relevância como um signo mutável

e flexível, faz-se necessário que seu processo de compreensão não seja confundido

com o processo de reconhecimento. Por se tratarem de processos significativamente

distintos, Bakhtin e Volochinov (2017 [1929]) chamam a atenção para a diferença

existente entre os processos de compreensão e reconhecimento: enquanto o sinal é

reconhecido, o signo é compreendido.

O aspecto constitutivo na compreensão da forma linguística não é o reconhecimento do “mesmo”, mas a compreensão no sentido exato dessa palavra, isto é, a sua orientação em dado contexto e em dada situação, orientação dentro do processo de constituição e não “orientação” dentro de uma existência imóvel (BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], p. 178).

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Imutável e inflexível, o sinal se desvincula do domínio da ideologia, isso

significa que ele não substitui, reflete ou refrata algo. Para os autores, uma forma

linguística não será compreendida enquanto sinal, mas quando se constituir como

signo ideológico, orientado pelo contexto. Compreendemos, portanto, que no

processo de aprendizagem de uma língua estrangeira é importante que as formas

linguísticas sejam assimiladas não como imutáveis e idênticas no sistema abstrato da

língua, mas na estrutura de um enunciado concreto, como um signo flexível e mutável.

Desse modo, a palavra nunca poderá ser empregada como um termo dicionarizado,

mas nas mais diferentes situações de enunciação.

É nesse contexto que retomamos a citação que inaugura este capítulo.

Para Bakhtin e Volochinov (2017 [1929], p. 181), a palavra estará “sempre repleta de

conteúdo e de significação ideológica ou cotidiana”, uma vez que “nunca

pronunciamos ou ouvimos palavras, mas ouvimos uma verdade ou mentira, algo bom

ou mal, relevante ou irrelevante”. É, portanto, na enunciação que as palavras se

orientam para um interlocutor. Bakhtin e Volochinov (2017 [1929], p. 184) elucidam

que qualquer enunciado monológico é um elemento indissociável da comunicação

discursiva e, por isso, “responde a algo e orienta-se para uma resposta”. Nesse

sentido, toda palavra, isto é, todo enunciado reverbera as que a procederam,

“polemiza com elas, espera por uma compreensão ativa e responsiva, antecipando-

a, etc”.

A realidade efetiva da linguagem não é o sistema abstrato de formas linguísticas nem o enunciado monológico isolado, tampouco o ato psicofisiológico de sua realização, mas o acontecimento social da interação discursiva que ocorre por meio de um ou de vários enunciados. Desse modo, a interação discursiva é a realidade fundamental da língua (BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], pp. 218 - 219).

Nesse contexto, evidencia-se o trato da palavra como parte do processo de

interação entre o falante e o interlocutor, relacionada à vida e à realidade, imbuindo-a

das entoações, dos valores conferidos e/ou agregados ao dito pelos interlocutores.

Assim sendo, a palavra é vista como um ato bilateral, determinada tanto por aquele

que fala quanto por aquele que a escuta. “Ela é uma ponte que liga o eu ao outro [...]

É o território comum entre o falante e o interlocutor” (BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017

[1929], p. 205).

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O enunciado se forma entre dois indivíduos socialmente organizados, e, na ausência de um interlocutor real, ele é ocupado, por assim dizer, pela imagem do representante médio daquele grupo social ao qual o falante pertence. A palavra é orientada para o interlocutor, ou seja, é orientada para quem é esse interlocutor: se ele é integrante ou não do mesmo grupo social, se ele se encontra em uma posição superior ou inferior em relação ao interlocutor [...] Não pode haver um interlocutor abstrato, por assim dizer, isolado [...] Na maioria dos casos, pressupomos um certo horizonte social típico e estável para o qual se orienta a criação ideológica do grupo social e da época a que pertencemos.” (BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], p. 205)

De maneira resumida, a palavra apresenta quatro propriedades que a

definem: pureza semiótica, possibilidade de interiorização, participação em todo ato

consciente e neutralidade. Segundo Stella (2008), a pureza semiótica faz referência à

capacidade de funcionamento e circulação da palavra como signo ideológico em toda

e qualquer esfera. Quanto à interiorização, a palavra, como vimos, é o único meio de

contato entre o conteúdo interior do sujeito, ou seja, sua consciência constituída por

palavras e o mundo exterior construído através das palavras. A visão de mundo de

cada sujeito se constrói a partir do confronto entre as palavras da consciência e as

palavras que circulam nas esferas sociais, ou seja, entre o interno e o externamente

ideológico (STELLA, 2008, p. 179). O processo de interiorização de uma palavra

ocorre, portanto, como uma palavra nova que surge da interpretação desse confronto.

No que se refere à participação em todo ato consciente, a palavra ganha

vida tanto nos processos internos da consciência, por meio da interiorização, quanto

nos processos externos de circulação da palavra nas esferas ideológicas, ou seja,

nós, enquanto sujeitos históricos e dialógicos participamos da construção e

negociação de sentidos das palavras.

A neutralidade da palavra, por sua vez, está relacionada aos contextos

concretos de enunciação. Dependendo de como ela aparece em um enunciado

concreto, ela irá assumir uma determinada função ideológica. Nessa propriedade, a

palavra pode ser compreendida como um “signo neutro”, não porque ela não possui

uma “carga ideológica”, mas porque como signo, recebe significados a cada momento

de seu uso.

Assim sendo, no que diz respeito ao processo de aprendizagem de línguas,

ao ressaltarem o caráter ideológico do signo, bem como a importância do contexto

ideológico para a compreensão das formas linguísticas, Bakhtin/Volóchinov (2017

[1929]) contribuem para se pensar a importância de desenvolvermos através da

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educação uma postura consciente e crítica frente à linguagem e à sociedade (ROCHA,

2006, p. 115). Dessa forma, há um desafio para a construção de apps nessa vertente.

É importante, portanto, levar em conta o contexto e as situações concretas de

enunciação, de modo não artificial ou demasiadamente didatizado, como entendidos

em abordagens tradicionais. Assim, na proposta de app é necessário haver um espaço

para que essa situação concreta possa ser realizada, ou seja, para que as definições

das palavras sejam construídas a partir de um contexto concreto de uso e para que

possamos analisar e compreender quem são os interlocutores, ou seja, quem está

falando, com quem, em que situação etc.

Passamos agora à apresentação dos critérios técnicos que, relacionados a

essa visão de lingua(gem) contribuem para o delineamento da proposta do aplicativo

educacional móvel.

2.5 Avaliando aplicativos móveis

Esta seção buscará apresentar e fundamentar os critérios de análise,

delineados por Farhat (2016), para aplicativos móveis direcionados à aprendizagem

de línguas, articulando essas proposições aos propósitos e contextos de meu estudo.

Os critérios estabelecidos pela citada autora são, fundamentalmente baseados, na

análise crítica e situada de uma checklist ou ficha de avaliação de apps proposta por

McQuiggan et al. (2015)7. As reflexões de Farhat (2016), bem como os critérios

elencados por ela, contribuirão para a análise do processo de desenvolvimento da

proposta de app móvel e de suas características.

Conforme pontuam McQuiggan et al. (2015), há ainda uma escassez de

critérios explícitos e teoricamente fundamentados, voltados à avaliação de aplicativos

educacionais, o que é ainda mais evidente quando se trata de aplicativos de

aprendizagem de línguas estrangeiras, principalmente, em contextos de minorias,

como é o caso da comunidade surda. Por isso, trabalhos como de Farhat (2016) como

é o caso da comunidade surda. Por isso, trabalhos como de Farhat (2016) contribuem

significativamente para o campo da aprendizagem móvel.

Para Farhat (2016), existem alguns aspectos básicos que servem de

parâmetro de avaliação para qualquer tipo de app móvel, no entanto, segundo

7 Ambas checklists estão disponíveis na seção ANEXO I deste trabalho.

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Andrade, Araújo e Silveira (2015, p. 546) citados por Farhat (2016, p. 96):

No caso dos aplicativos com fins educativos, esses parâmetros

incluem características pedagógicas e aquelas relacionadas aos

aspectos técnicos. Um aplicativo não deve, obrigatoriamente, conter

todas as características de qualidade, e sim, ter a qualidade

necessária para o alcance de seus propósitos e satisfação de seus

usuários. Entretanto, considerando a construção de soluções de

aprendizagem com mobilidade, é necessário que estas devam

priorizar os critérios de usabilidade, acessibilidade, mobilidade,

colaboração/cooperação.

Dessa maneira, a autora considera os âmbitos determinados por

McQuiggan et al. (2015) basilares para o processo de avaliação de apps móveis. São

eles: propósito, alinhamento, âmbito pedagógico, personalização, compartilhamento,

facilidade no uso, privacidade, cidadania do aplicativo e acessibilidade. Entretanto, a

autora ressalta que esses critérios são insuficientes quando se trata de apps

destinados à aprendizagem de línguas, especialmente, línguas estrangeiras. Por isso,

ela problematiza questões relacionadas ao domínio do âmbito pedagógico e

acrescenta critérios relacionados à pluralidade de língua e linguagens, aprendizagem

de gramática e vocabulário, produção e compreensão oral e escrita, trabalho

colaborativo, letramentos e criticidade), além de flexibilidade e mobilidade.

Tendo em vista as especificidades do contexto linguístico da comunidade

surda, entendemos que nem todos os critérios propostos por McQuiggan et al. (2015)

e Farhat (2016) são compatíveis com a avaliação de um app destinado a esse público.

Alguns desses critérios incluem aspectos envolvendo compreensão oral e feedbacks

auditivos, por exemplo, por isso precisam ser adaptados.

Considerando que o objetivo do presente estudo é apresentar uma

proposta de app que ainda não está materializada, entendemos que o checklist se fez

importante não para a avaliação da proposta, mas para que os aspectos técnicos

fossem delineados. Apesar disso, nesse momento, mais do que descrever esses

aspectos, este trabalho tem como foco a análise e a fundamentação das

características relativas ao processo de aprendizagem, a partir de uma visão situada

de língua(gem).

Nesse contexto, é importante ressaltar que dificilmente um app será capaz

de contemplar todos os aspectos elencados pelos autores. Por isso, para o que aqui

é proposto, os pontos selecionados para a condução deste estudo se justificam a partir

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das teorizações dos citados autores e conforme os alunos surdos expressavam suas

necessidades e percepções em relação à tecnologia e à aprendizagem de Português.

Desse modo, para o delineamento do app consideramos os aspectos a seguir, os

quais sigo explicitando.

2.5.1 Personalização

McQuigganet al. (2015), no que diz respeito ao quesito personalização,

focam na criação de logins e nas experiências de aprendizagem baseadas nos

interesses, nas habilidades e nos conhecimentos dos usuários. Para Pegrum (2014),

o m-learning é representado por três elementos característicos: personalização,

individualização e customização. Isso significa que os apps devem oferecer a

possibilidade de personalização, para que seu funcionamento esteja sempre o mais

próximo possível dos desejos do usuário.

Além disso, para que possamos nos envolver em um processo de

aprendizagem significativa é preciso criar espaços para que o usuário aprenda de

forma situada e personalizada, rompendo barreiras da educação formal e da simples

transposição de conteúdo para os dispositivos móveis (PEGRUM, 2014). Nesse

contexto, a autora defende a presença da auto avaliação dentro do app, com o intuito

de incentivar que o usuário reflita sobre seu processo de aprendizagem.

• O aplicativo permite ou exige que o usuário crie logins?

• O aplicativo oferece ao usuário a criação de um perfil com possibilidade de escolher, de

acordo com seus objetivos as habilidades no idioma estrangeiro que gostaria de

trabalhar/focar?

• O aplicativo realiza desafios relacionados aos conhecimentos adquiridos pelo usuário e

assim moldar o conteúdo para mais complexo ou mais fácil diante dos resultados (por

exemplo: testes)?

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2.5.2 Compartilhamento e acesso

• O trabalho criado e realizado pelo usuário no aplicativo pode ser exportado ou

compartilhado em redes sociais?

• O aplicativo está ligado a uma rede social, ou outros meios de compartilhamento de

conhecimento de fácil acesso ao usuário?

• O aplicativo disponibiliza recursos para que os aprendizes interajam entre si (trabalho

com aprendizagem compartilhada)?

• O aplicativo permite que os usuários realizem atividades simultâneas entre si, que

incentivem a colaboração e trabalho em equipe (ex: jogos, competições, testes, tarefas)?

No conjunto de critérios proposto por Farhat (2016), apoiado na checklist

de McQuiggan et al. (2015), a presença das redes sociais é abordada em vários

domínios, uma vez que, ao se vincularem a redes sociais, os apps móveis

potencializam as chances de promover uma aprendizagem situada, significativa e

colaborativa, através das conexões (em rede) com outras plataformas e com outros

usuários.

Segundo Sharples (2013), a aprendizagem colaborativa pode influenciar de

maneira bastante positiva a aprendizagem móvel. Desse modo, as redes sociais

contribuem para colocar o app dentro de uma perspectiva sociocultural bastante

defendida no campo da aprendizagem móvel (PEGRUM, 2014). Portanto, possibilitar

que os usuários explorem essas potencialidades através da conexão com outros apps

e plataformas, significa contribuir para uma aprendizagem mais efetiva.

Segundo Farhat (2016), a popularização das redes sociais tem levado a

comunicação para outros limites que, quando aproveitados, podem resultar em troca

de informações, conhecimentos, culturas, etc. Além de compartilhar, é possível

conversar e colaborar com a aprendizagem de outros usuários (PEGRUM, 2014),

enquanto também se aprende uma língua estrangeira. Assim, seguem abaixo as

questões que devem ser respondidas ao se analisar o quesito compartilhamento e

acesso.

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2.5.3 Pluralidade de língua, linguagens, cultura

• O aplicativo apresenta pluralidade cultural e de linguagens, por meio da diversidade de

exemplos em diferentes atividades sociais, grupos sociais e eventos culturais?

• O aplicativo apresenta diversidade étnica, racial, de gênero e de cultura por meio de

textos verbais e não verbais?

• O aplicativo evidencia diversas formas de cultura ou sempre trabalha com a cultura

denominada padrão, estereotipada por meio de textos escritos e imagéticos?

Em relação à pluralidade de língua, linguagens e cultura, o app deve buscar

promover, a partir de seus princípios, a interação entre conhecimento e sociedade,

propiciando aos alunos o reconhecimento do hibridismo constitutivo das línguas e

linguagens, dos saberes e das culturas. O objetivo principal é o desenvolvimento da

consciência do papel das línguas na sociedade e o reconhecimento da diversidade

cultural (ROCHA, 2012), levando os aprendizes a questionarem verdades impostas

como únicas, fixas e estáveis, fazendo emergir novos paradigmas sociais e

educacionais.

Diante do desenvolvimento das novas tecnologias aplicadas à educação, a

internet tem sido “fundamental no que diz respeito à pesquisa e à expansão do

conhecimento construído na escola, colaborando, portanto, para o aparecimento de

novos olhares sobre o outro” (CHAGAS, L.A., 2013).

2.5.4 Âmbito pedagógico

• O aplicativo oferece ao usuário feedbacks de suas ações?

• O aplicativo trabalha com o usuário a capacidade de associar, planejar, hipotetizar, entre

outras, de maneira efetiva?

• O aplicativo disponibiliza outras formas de informações/aprendizagem (links, sites, bate-

papos) que permitam ao usuário navegar em busca de outras fontes de conhecimento e

não só as disponibilizadas no app?

Os critérios relacionados ao Âmbito pedagógico, fazem menção a

feedbacks, experiências de aprendizagem, funções mentais superiores, colaboração

e motivação. Na aprendizagem móvel, é importante garantir que os usuários

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continuem motivados a usar os apps. Segundo Moura (2010) e Pegrum (2014), citados

por Farhat (2016), o oferecimento de materiais e respostas/retornos aos usuários

podem mantê-los motivados, tornando a aprendizagem mais efetiva, uma vez que o

aprendiz tem a chance de identificar o erro e saná-lo.

Além disso, outra importante questão está relacionada à capacidade de

associação, planejamento, entre outras, possibilitadas pelas atividades oferecidas no

app. De acordo com Pegrum (2014), essas atividades, especialmente quando há

utilização de jogos, permitem ao usuário associar, planejar, relacionar ao seu próprio

contexto, o que torna a aprendizagem mais significativa.

Finalmente, é interessante que o conteúdo existente no app não seja a

única fonte de informação do usuário. O conjunto formado pelo dispositivo móvel e

seu acesso à internet revela-se um enorme potencial para aprendizagem e busca de

informações (FARHAT, 2016, p. 112). Portanto, os apps devem possibilitar que os

usuários façam pesquisas em outras fontes, consultando, inclusive, outros usuários,

com os quais possam construir e compartilhar sua aprendizagem. Para Pegrum (2014)

e Sharples (2013), “o m-learning precisar fornecer ao usuário ferramentas que

possibilitem a busca por informações e conhecimentos em diversas fontes,

potencializando a aprendizagem móvel” (FARHAT, 2016, p.112). Portanto, para esse

quesito são determinadas as questões expostas abaixo.

2.5.5 Modos de aprendizagem

• As atividades propostas favorecem o condicionamento, a repetição e a formação de

hábitos linguísticos em detrimento de propostas mais contextualizadas, que explorem

a criatividade?

• As atividades trazem evidências de aprendizagem programada, ou seja, de

procedimentos pré-orientados para um reforço positivo imediato, com vistas ao

máximo de acertos por parte do usuário?

• As atividades evidenciam uma visão de linguagem como estrutura?

• As atividades propostas favorecem o uso de capacidades de associar, hipotetizar,

planejar, etc., e que explorem a criatividade?

• As atividades evidenciam uma visão de linguagem com construção de sentidos?

• O aplicativo trabalha atividades de vocabulário, gramática, compreensão oral e escrita

de forma contextualizada, partindo do texto e não de modo isolado?

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Farhat (2016) relaciona esse quesito às três perspectivas de aprendizagem

propostas por Cope e Kalantzis (2012), já discutidas nesse trabalho. A saber: mímesis,

synthesis e reflexividade. Segundo Farhat (2016), essas perspectivas permeiam o

modo como os conteúdos são oferecidos e explorados nos apps, já que cada uma

apresenta características representativas no que se refere à aprendizagem móvel em

língua estrangeira.

Essas três abordagens são importantes para a definição e/ou avaliação dos

princípios dos apps móveis de ensino de línguas, uma vez que auxiliam na

compreensão dos mecanismos de aprendizagem que orientam os conteúdos e

possivelmente contribuem para que a aprendizagem aconteça em uma perspectiva

situada (SHARPLES, 2005). Portanto, os critérios propostos nesse âmbito podem

auxiliar tanto usuários quanto desenvolvedores.

Considerando a palavra “uma ponte que liga o eu ao outro”

(BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], p.205), um app educacional voltado para o

ensino-aprendizagem de língua deve estar alinhado à ideia de prática da linguagem

em contextos socialmente e historicamente constituídos e, portanto, situados

(ROCHA, 2006, p. 115), assumindo o compromisso de possibilitar o diálogo com

outras culturas.

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CAPÍTULO 3 – UMA MANEIRA DE OLHAR

Taurus Horoscope (Ganesh Shetty8)

http://abstractartistganesh.blogspot.com.br/

Este capítulo está dividido em quatro partes. Na primeira, discorro sobre o

campo de investigação, no qual o trabalho está inserido. Na segunda, apresento a

natureza e o caráter da pesquisa. Na terceira, apresento o contexto e os participantes

da pesquisa. Por fim, apresento os instrumentos metodológicos utilizados para a

condução da pesquisa, bem como o processo de prdução de dados.

3.1 Observando a partir da Linguística Aplicada

Como pesquisadora em um programa bilíngue de apoio escolar a criança

e jovens surdos, minha atuação envolveu, além da pesquisa aqui delineada, o trabalho

8 Por figuras geométricas e cores cheias de contrastes, as telas do pintor indiano Manur Chandrashekar Ganesh Shetty (ou M.C. Ganesh Shetty, como é conhecido) recriam formas humanas, cenas cotidianas, imagens devocionais, etc., em traços abstratos que se assemelham a obras em vitrais. Shetty, aos cinco anos, perdeu a audição e, desde então, pintar firma-se como um meio privilegiado de comunicação, ao lado da língua de sinais e da língua majoritária do país. Disponível em: <https://culturasurda.net/category/artes-plasticas/>. Acesso em: 17 nov. 2016.

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com o ensino de leitura e escrita em português como segunda língua para onze alunos

surdos do ensino médio, da rede pública de ensino. O cenário sociolinguístico de

minorias e, nesse caso, especificamente, da comunidade surda, é complexo e diverso.

Por isso, como aponta Cavalcanti (2003), as escolhas metodológicas e teóricas dessa

pesquisa esbarraram em questões de ordem ética e política.

Nesse sentido, cabe registrar aqui a constante preocupação em abandonar

conceitos e procedimentos cristalizados que, como reforça Cavalcanti (2003),

pudessem ser prejudiciais à imagem dessa comunidade que luta para se tornar visível

e ter seus direitos social e legalmente reconhecidos. Este capítulo, portanto, narra os

(des)caminhos percorridos por mim enquanto pesquisadora dentro de uma

perspectiva interpretativista (ERICKSON, 1986) no fazer pesquisa aplicada em LA9.

Para dar conta da complexidade sociolinguística de minorias e de outras

questões envolvendo a linguagem, torna-se relevante destacar o campo da LA como

um campo que se sustenta em um referencial teórico antidisciplinar (PENNYCOOK,

2001). Isso implica que o linguista aplicado, para tentar entender a questão de

pesquisa com a qual ele se defronta, precisa se envolver com conhecimentos teóricos

que atravessam outras áreas de conhecimento (MOITA LOPES, 2006). É

corroborando para a compreensão da LA como um campo transdisciplinar, conforme

asseveram Celani (1998) e Rojo (2006), que este trabalho contou com o apoio de

pesquisadores e técnicos da área de tecnologia e com a coorientação da Profa. Dra.

Ivani Rodrigues Silva, docente do curso de fonoaudiologia, da Faculdade de Ciências

Médicas, na Universidade Estadual de Campinas.

Na tentativa, portanto, de contribuir para redimensionar, no campo da LA,

o estudo da educação de surdos, assumo que o contexto educacional dessa

comunidade, atrelado à presença das novas tecnologias, pode ser estudado como um

objeto complexo (SIGNORINI, 1998). A complexidade, nesse caso, como aponta

Bunzen (2005), não deve ser entendida como “dificuldade”. Trata-se, na verdade, de

uma escolha de cunho epistemológico e metodológico em relação à construção do

objeto de investigação que é, notoriamente, um objeto multifacetado.

Isso implica dizer que as escolhas metodológicas foram processuais e

9 A linguística aplicada é entendida aqui como parte das ciências sociais. Concordo com Rojo (2006) que sugere

que a LA não “trata de qualquer problema – definido teoricamente -, mas de problemas com relevância social

suficiente para exigirem respostas teóricas que tragam ganhos a práticas sociais e a seus participantes, no sentido

de uma melhor qualidade de vida, num sentido ecológico”.

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constituídas “por ações orientadas mais por um plano que por um programa fixo pré-

montado, por ações orientadas e gradativamente reorientadas em função dos meios,

interesses e obstáculos em jogo” (SIGNORINI, 1998, p. 103). Esse processo, não

linear, que exige, muitas vezes, um olhar crítico do pesquisador, bem como seu

reposicionamento, está ilustrado, por exemplo, na escolha de um dos instrumentos de

registro de dados – questionário online - que ao priorizar o português escrito, segunda

língua de grande parte dos alunos surdos, levou mais tempo que o esperado para ser

aplicado, além disso, demandou uma explicação detalhada de cada questão presente

no questionário. Dessa forma, os dados registrados a partir dele tiveram que ser

apoiados por outros instrumentos, como veremos no final deste capítulo.

3.2 Natureza e caráter do estudo

Esta pesquisa define-se como interpretativista, de natureza qualitativa e

de cunho etnográfico, segundo a perspectiva de Erickson (1986), Santos Filho e

Gamboa (2002), André (2003), Lankshear e Knobel (2008), entre outros.

No que se refere aos paradigmas quantitativos e qualitativos relacionados

a pesquisas científicas, devemos salientar que a pesquisa qualitativa adota uma

visão epistemológica contrária à abordagem quantitativa, na medida em que

Supõe que, para entender o mundo, precisamos concentrar-nos nos contextos – o que, diversamente, envolve prestar atenção à história, à temática, ao uso da linguagem, aos participantes de um evento em especial, a outros acontecimentos que ocorram ao mesmo tempo, e assim por diante (LANKSHEAR e KNOBEL, 2008, p. 35).

Dentro dessa perspectiva, segundo André (2003), o processo de

construção e interpretação de significados é realizado de forma indutiva e descritiva.

Dessa forma, uma vez que a pesquisa de natureza qualitativa privilegia a interpretação

e a compreensão de significados, a partir de um contexto específico (ANDRÉ, 2003),

ela revela-se também uma pesquisa interpretativista ou interpretativa (ERICKSON,

1986).

Segundo Ress (2008), há uma série de abordagens para a pesquisa

qualitativa que se utiliza de técnicas distintas, a depender do campo de estudo. Por

isso, interessa aqui explicar os fatores que nos levam a conceituar essa pesquisa no

paradigma qualitativo.

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Esse estudo, portanto, revela sua natureza qualitativa (SANTOS FILHO E

GAMBOA (2002); ANDRÉ (2003); LANKSHEAR E KNOBEL (2008); entre outros) e

propositiva, uma vez que busca propor e descrever um protótipo de aplicativo móvel

que auxilia a aprendizagem de palavras em português, com base na compreensão e

interpretação do perfil e das percepções de um grupo de alunos surdos em relação a

essa aprendizagem; sem o envolvimento de “manipulação de variáveis ou tratamento

experimental” (ANDRÉ, 2003, p. 17), ou seja, através de uma abordagem naturalística

do fenômeno em questão.

Além disso, a natureza qualitativa desta pesquisa também se justifica

porque, nesse estudo, nos interessou muito mais compreender quais características

um aplicativo móvel deveria ter para auxiliar o processo de aprendizagem de palavras

em português escrito, a partir da percepção dos próprios alunos, ou seja, a situação,

dentro de um contexto específico, do que nos centrar no aplicativo como “produto final”

(ANDRÉ, 2003, p. 29).

Nesse estudo, há ainda que se ressaltar que estando na condição de

pesquisadora e professora do programa bilíngue de apoio escolar a crianças e jovens

surdos, faço parte do contexto de pesquisa e, portanto, estou imersa no fenômeno de

interesse (SANTOS FILHO E GAMBOA, 2002, p. 45). Dessa forma, esse trabalho

também pode ser caracterizado como uma pesquisa de campo, como aponta

Gonsalves (2003, p. 67), ao destacar que esse tipo de pesquisa demanda do

pesquisador um encontro direto com a população pesquisada, estabelecendo uma

relação de proximidade com o fenômeno investigado.

Dentro dessa perspectiva, esta pesquisa se define também como sendo de

cunho etnográfico. Segundo Ress e Mello (2011, p. 32), revozeando Spradley (1980,

p. 7-8), “o etnógrafo deve ir além da observação do comportamento e dos estados

emocionais das pessoas”. Segundo as autoras, Spradley busca evidenciar que a

pesquisa qualitativa de cunho etnográfico não se restringe apenas à visão étnica ou

ética, mas sustenta-se, também, na êmica:

O termo êmico significa “interno” (insider) e sugere que a interpretação de um fato ou valor cultural, seja de um indivíduo ou de um grupo, étnico ou fenomenológico, deve levar em conta a verdade como ela é entendida pelas pessoas que vivenciam aquela determinada cultura. (RESS E MELLO, 2011, p. 32)

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Nesse sentido, ao se fazer pesquisa sobre grupos minoritários, devemos

assumir o compromisso de olhar criticamente para o contexto estudado, (re)ler e

(re)avaliar teorias que se estabelecem muitas vezes sem considerar a existência

desses grupos e possibilitar, dentro de nossos estudos, que as vozes desses sujeitos

sejam ouvidas e que essas pesquisas sejam feitas “de dentro” (SMITH, 1999).

Sendo assim, a observação, uma das técnicas utilizadas na produção de

registros desta pesquisa, tem papel fundamental, uma vez que ela possibilita uma

“primeira aproximação a um determinado fenômeno que é pouco explorado”, o que

caracteriza esse estudo, de acordo com alguns teóricos, um estudo de caráter

exploratório (GONSALVES, 2003, p. 65) e participante (MATOS E VIEIRA, 2002, p.

46), já que este tipo de pesquisa “caracteriza-se pelo envolvimento e identificação do

pesquisador com as pessoas pesquisadas”.

De modo geral, o presente estudo fundamenta sua natureza qualitativa e

seu cunho etnográfico, na medida em que, enquanto pesquisadora e professora,

estive durante um ano dentro da sala de aula de um programa bilíngue de apoio

escolar a crianças e jovens surdos, imersa no contexto e próxima dos alunos

participantes da pesquisa, por vezes extrapolando o tempo e o espaço da

investigação. Nesse sentido, a pesquisa caracteriza-se também como um trabalho de

campo de base etnográfica, uma vez que, como já explicitado, exigiu um encontro

direto com os participantes e com o contexto da pesquisa (GONSALVES, 2003, p. 67).

É importante salientar que o caráter participante da pesquisa apresenta-se

também na forma como os dados foram gerados, o que irei explicar de modo mais

detalhado em seções posteriores. Nesse sentido, cabe destacar que os dados foram

sendo produzidos de maneira processual e horizontalizada, sendo (re)pensados e

(re)construídos a partir da constante colaboração e interação com os participantes do

estudo.

Com o intuito de explicitar os critérios utilizados para a classificação desse

estudo, apresento, com base em Gonsalves (2003, p. 64) a tabela a seguir, onde estão

resumidos os aspectos norteadores do trabalho segundo os objetivos, os

procedimentos de coleta, as fontes de informação e segundo a natureza dos dados:

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Tipo de

pesquisa

segundo os

objetivos

Tipo de

pesquisa

segundo o

procedimento

de coleta

Tipo de

pesquisa

segundo as

fontes de

informação

Tipo de

pesquisa

segundo a

natureza dos

dados

Explorató

ria

Propositi

va

Participativa

Campo Qualitativa de

cunho

etnográfico

Figura 4 - Classificação da pesquisa. Adaptado de Gonsalves (2003, p. 64)

Há ainda um último ponto a ser elucidado no que diz respeito à

caracterização deste estudo. Para a construção de protótipos de aplicativos, conforme

aqui proposto, dois campos de conhecimentos específicos emergem: a) tecnológico

b) educacional. Como apontam McGuiggan et al (2015), desenvolver tecnologias

educacionais móveis requer a compreensão de como os estudantes aprendem, das

práticas escolares efetivas, do design intuitivo e das inovações tecnológicas.

Desse modo, para que os objetivos colocados pudessem ser atendidos, foi

importante que a pesquisa assumisse um caráter interdisciplinar. Por isso, além da

participação constante dos alunos no delineamento das características do protótipo,

contei com a ajuda de um aluno do curso de Midialogia do Instituto de Artes, da

Universidade de Campinas, Tales Bicudo10, que possui em sua trajetória acadêmica

trabalhos de desenvolvimento de aplicativos móveis educacionais. Dessa forma,

realizamos sete encontros, registrados através de gravação em áudio, nos quais

discutimos as definições técnicas do protótipo: necessidade de um ambiente para

hospedar o app, interface, usabilidade, etc.

Além disso, uma vez que não há tempo hábil e recursos financeiros

disponíveis para, nesse momento, contratar programadores que possam colocar o

app em funcionamento, o projeto do app está cadastrado em uma plataforma

chamada GitHub. A plataforma se define como uma rede social colaborativa de

programadores ou uma fábrica social de software, em que é possível compartilhar e

construir projetos, a partir da colaboração de programadores que fazem parte da rede.

10 A divulgação do nome foi autorizada pelo aluno em consulta anterior.

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Dessa forma, a construção desse app por ser descentralizada e colaborativa também

ocorre dentro da nova mentalidade, ou seja, do novo ethos proposto por Lankshear e

Knobel (2007).

3.3 O contexto e os participantes da pesquisa

O cenário em que se desenvolveu o trabalho de campo apresentado nesta

pesquisa foi o programa bilíngue de apoio escolar a crianças e jovens surdos,

desenvolvido em um centro de estudos de uma universidade pública, localizada no

interior da região sudeste do país. O programa, focado em leitura e escrita do

português como segunda língua, atende crianças e jovens surdos da rede pública de

ensino, residentes no município onde está localizado o centro e também nas cidades

vizinhas11.

O centro de estudos em questão, apoiado em uma visão interdisciplinar,

atua no desenvolvimento humano e suas alterações, trabalhando especificamente

com deficiência visual, surdez, língua, linguagem e alterações de linguagem em todas

as faixas etárias. Dessa forma, são disponibilizados atendimentos fonoaudiológicos,

acompanhamento psicológico individual e em grupos familiares, orientação do Serviço

Social, aulas de língua brasileira de sinais a crianças surdas e seus familiares e

atendimentos pedagógicos, cujo objetivo é trabalhar leitura e escrita do português, em

parceria com projetos de Artes.

Minha inserção no contexto se deu através de um programa de

aprimoramento profissional realizado no centro de estudos, durante todo o ano de

2015, onde atuei como professora de leitura e escrita do português como segunda

língua, em conjunto com uma professora surda. No total eram dezenove crianças e

adolescentes surdos divididos em dois grupos: o primeiro com sete alunos do ensino

fundamental e o segundo com onze alunos do ensino médio, os quais serão

apresentados na sessão seguinte deste trabalho.

As aulas tinham duração de duas horas e eram realizados duas vezes por

semana em cada grupo. As atividades desenvolvidas no programa eram elaboradas

por mim, em consonância com o projeto de pesquisa elaborado para cumprir as

exigências previstas pelo curso de aprimoramento profissional. Dessa forma, a

11 O mesmo contexto de pesquisa foi descrito por Nogueira (2010) e Kumada (2012).

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elaboração desse projeto, bem como o planejamento dos atendimentos, foram

direcionados para a investigação do perfil dos alunos surdos, no que se refere à

aprendizagem de português escrito, e a relação que eles estabeleciam com as novas

tecnologias digitais, mais especificamente com o smartphone.

Uma vez que minha experiência e inserção no contexto da surdez havia se

dado no Ciência e Arte nas Férias (CAF), onde trabalhei com jovens surdos do ensino

médio, o grupo escolhido para participar da pesquisa aqui apresentada seguiu a

mesma faixa etária e o mesmo grau de escolaridade. Trata-se, portanto, de onze

alunos de 15 a 18 anos de idade, cursando o ensino médio em escolas regulares e

públicas, sendo que três deles não possuem intérprete na sala de aula. A todos os

participantes e pais dos participantes menores de 18 anos foi entregue o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)12 e esclarecidas todas as dúvidas em

relação à pesquisa, seus procedimentos, implicações e seu sigilo.

A imersão prolongada no contexto da surdez me possibilitou colocar em

prática a questão da alteridade ao estar próxima desses alunos e de suas

perspectivas. Apesar de já ter tido um contato prévio com a comunidade surda no

projeto de leitura e escrita do CAF, foi o contato diário e a reflexão constante suscitada

por ele que me fizeram mais sensível a esse complexo contexto sociolinguístico e,

mais que isso, me fizeram assumir um compromisso político com essa comunidade,

o que considero imprescindível para o desenvolvimento da pesquisa com grupos

linguísticos minoritários.

A fim de fazer o levantamento sobre o perfil dos participantes e suas

percepções em relação à aprendizagem de português e às tecnologias digitais

móveis, apliquei um questionário online, cujos detalhes serão retomados na seção

3.4.1 deste capítulo. As informações expostas nesta seção provieram desse

instrumento, o qual dei o nome de Questionário de Perfis (Q1)13, desenvolvido a partir

de uma ferramenta do Google Drive. As respostas das questões objetivas que

compõem o questionário de perfis dos alunos surdos serão aqui apresentadas em

quadro e gráficos.

12 Uma cópia do Termo está presente no ANEXO II dessa dissertação. Cabe ainda dizer que, em se tratando de

um estudo realizado com a presença de seres humanos, essa pesquisa passou pela análise e posterior aprovação do Conselho de Ética em Pesquisa da Unicamp. Número do CAAE: 46000015.6.0000.5404. 13 Questionário disponível no endereço:

https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSeBbxAyXgHk4PyuSMZF4CwWwBgW3qjQJ1-

829fxM8rH2m6mbA/viewform. Acesso em: 11 jul 2017

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Como ocorre em pesquisas qualitativas e de cunho etnográfico, segundo

André (2012), os dados referentes ao perfil dos alunos surdos, neste capítulo, estão

organizados com base em aglutinações por recorrência temática (COHEN et al, 2000).

Assim sendo, aglutinei as questões, a partir dos temas tratados por cada uma delas

através dos quadros já mencionados. Esta forma de organização de dados é proposta

também por Lankshear e Knobel (2008).

O quadro a seguir resume, de forma objetiva, as questões iniciais do Q1

referentes à surdez e à(s) língua(s) com as quais os alunos têm contato diariamente:

14 Há diferentes classificações referentes aos graus de perda auditiva, mas segundo a classificação divulgada pelo

MEC (BRASIL, 1997), baseada na classificação do Bureau Internacional d’Audiophonologie (BIAP) e na portaria

Interministerial nº 186 de 10/03/78, a surdez leve compreende a perda auditiva até 40dB, a surdez moderada entre

40 até 70dB, a surdez severa entre 70 até 90dB e a surdez profunda acima de 90dB.

Nome e idade do

aluno surdo

Grau de perda

auditiva do

aluno14

Uso

aparelho

auditivo

Intérprete na

escola onde

estuda

Língua(s) mais usada(s) para se comunicar

em casa

Língua(s) mais

usada(s) para se comunicar na

escola

J.: 17 anos

Profunda (Implante

Sim

Sim

Português oral Libras/ Português oral

K. 18 anos

Profunda

Sim

Sim

Libras

Libras/ Português oral e

A.: 18 anos

Severa

Não

Sim

Libras

Libras/ Português escrito

Is.: 17 anos

Severa Não

Sim

Libras

Libras/ Português escrito

I.: 17 anos

Profunda (Implante

Sim

Sim

Português oral

Português oral/ Libras

S.: 18 anos

Profunda

Sim

Sim

Libras

Libras/ Português

M.: 18 anos

Profunda

Sim

Sim

Libras

Libras/ Português escrito

In.: 18 anos

Profunda

Sim

Sim

Libras/ Português escrito

Libras/ Português escrito

N.: 15 anos

Leve/ Moderada

Sim Não Português oral Português oral e

L.: 15 anos

Leve/ Moderada

Sim Sim Português oral Português oral

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Figura 5 - Perfil dos alunos participantes da pesquisa.

Como é possível observar, trata-se de um grupo bastante heterogêneo no

que diz respeito ao grau de perda auditiva e ao uso da libras e do português escrito

e/ou oral. É importante destacar que não é possível estabelecer uma relação clara

entre esses dois fatores, uma vez que outras questões influenciam os surdos a usarem

mais ou menos a língua de sinais e/ou o português nos ambientes formais e informais.

A presença (ou a ausência) de surdos na família e a postura familiar em relação ao

aprendizado da língua de sinais na infância são alguns dos fatores que influenciam

essa questão.

Embora haja diferenças significativas em relação ao uso dessas línguas,

todos os alunos participantes dessa pesquisa reconhecem a importância de se

aprender o português escrito, uma vez que as atividades cotidianas com as quais eles

se envolvem demandam o exercício da leitura e da escrita. No entanto, como já

demonstrado na introdução deste trabalho, os alunos surdos apresentam uma série

de dificuldades relacionadas ao processo de aprendizagem do português escrito.

Vemos a seguir, portanto, os gráficos que resumem as respostas das questões

relacionadas a esse processo:

Figura 6 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 15 do Q1.

J.: 15 anos

Leve/ Moderada

Não

Não Português oral/ Libras

Português oral

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Figura 7 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 17 do Q1.

Figura 8 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 18 do Q1.

Como aponta a questão 15, a principal dificuldade dos alunos em relação à

aprendizagem do português escrito está relacionada à compreensão de vocabulário.

É possível notar ainda que a maioria dos alunos também apresenta dificuldades no

que se refere à gramática e à interpretação de textos, o que está diretamente

relacionado à dificuldade em conhecer os significados das palavras.

Além disso, os alunos apontaram os trabalhos de escola e as mensagens

enviadas através dos dispositivos digitais como as principais necessidades

envolvendo escrita e leitura do português. É importante salientar que as questões

acima permitiam assinalar mais de uma opção de resposta.

Dando continuidade à descrição do perfil dos participantes desta pesquisa,

passamos agora para as respostas das perguntas referentes à relação dos alunos

com os dispositivos móveis, ressaltando que todos eles assinalaram que possuíam

pelo menos um dispositivo móvel, entre smartphones, tablets e notebooks.

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Figura 09 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 21 do Q1.

Figura 11 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 24 do Q1.

Conforme ilustrado pelos gráficos acima, os alunos utilizam os dispositivos

móveis para diversos fins, a saber: redes sociais, comunicação e pesquisa. Embora

no momento de aplicação do questionário, os alunos ainda não conhecessem muitas

ferramentas educacionais e de aprendizagem de línguas, como veremos a seguir,

segundo eles, os dispositivos móveis eram instrumentos importantes para auxiliar a

aprendizagem do português escrito. Apesar disso, quase todos os alunos não faziam

uso desses dispositivos nas escolas onde estudavam. Isso se deve em grande parte

ao Decreto nº 52.62515, de 15 de janeiro de 2008, que proíbe, durante as aulas, o uso

do telefone celular nas escolas estaduais de São Paulo.

15 Mais informações em: http://governo-sp.jusbrasil.com.br/legislacao/156993/decreto-52625-08.

Figura 10 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 22 do Q1.

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Por fim, traçamos características relacionadas ao perfil dos alunos

enquanto usuários de aplicativos móveis direcionados à aprendizagem de português

escrito. Antes de discutirmos as respostas, vejamos os gráficos a seguir:

Figura 12 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 28 do Q1.

Figura 13 - Gráfico gerado a partir das respostas à questão 30 do Q1.

Interessa aqui o fato de que, embora pouco orientados sobre como lidar

educacionalmente com os dispositivos móveis, grande parte dos alunos conhecia

aplicativos que eles consideravam como aplicativos para aprender Português já que

estes apresentavam listas de palavras em Português escrito. Ao longo da pesquisa e

a partir das reflexões suscitadas pelo trabalho mediado pelas tecnologias, os próprios

alunos perceberam que os aplicativos que eles apontaram nas questões do formulário

são, na verdade, tradutores de Português para Libras, cuja proposta é melhorar a

comunicação entre surdos e ouvintes, através da aprendizagem da Libras e não de

Português escrito.

Embora o questionário de perfis online não tenha sido um instrumento de

registro de dados eficaz como veremos mais adiante, seu processo de aplicação e a

reflexão sobre ele foram fundamentais para a escolha dos outros instrumentos de

produção de registros.

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3.4 Procedimentos e instrumentos para produção de dados

Quando nós, linguistas aplicados, linguistas, antropólogos, médicos, enfim, sujeitos formados em instituições reconhecidas como científicas, entramos numa comunidade específica, cuja cultura é diferente da nossa, dificilmente nos questionamos sobre a bagagem que levamos para adentrar o território do outro, principalmente quando o outro está numa situação subalterna, diante do poder das instituições, através das quais se dá a nossa intervenção na área como profissionais especializados (CAVALCANTI E CÉSAR, 2004)

Por se tratar de um estudo qualitativo, interpretativista, de cunho

etnográfico e, principalmente, por se tratar de uma pesquisa aplicada realizada em

contexto de minoria linguística, foram utilizados diversos instrumentos metodológicos,

com vistas a dar subsídios para a criação do protótipo de aplicativo móvel e alcançar,

então, os objetivos delineados para essa pesquisa. Conforme destacam Lankshear e

Knobel (2008), pesquisas dessa natureza demandam o uso de diferentes

instrumentos para que haja maior possibilidade de triangulação, ou seja, a

possibilidade de uma visão mais complexa e profunda do fenômeno estudado,

garantindo a credibilidade e a autenticidade da pesquisa (LINCOLN E GUBA, 2000).

Considerando o contexto de pesquisa, já devidamente especificado, o

processo de produção de dados foi realizado ao longo de 6 meses de trabalho (agosto

a dezembro de 2015). Dessa forma, a partir dos objetivos estabelecidos para este

estudo, foram utilizados, portanto, diferentes instrumentos para produção de dados,

como sigo explicando em ordem cronológica nos subitens seguintes. Ao final desta

seção, encontra-se um quadro que elenca, de forma resumida, os instrumentos

utilizados para alcançar cada um dos objetivos traçados para esta pesquisa.

3.4.1 Questionário

Para cumprir o objetivo de identificar o perfil e as necessidades dos alunos

surdos em relação a aprendizagem de português escrito e sua interface com as

tecnologias digitais móveis, foi elaborado o supracitado Q1 através de uma ferramenta

do Google Drive que compila as respostas dadas a ele em tabelas e/ou gráficos

resumidos.

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Este questionário foi composto por 31 questões a respeito da idade dos

alunos, grau de perda auditiva, presença de intérprete na escola, percepções em

relação à importância da aprendizagem de Português e às dificuldades desse

processo. Finalmente, o questionário também apresentou perguntas sobre a presença

das tecnologias digitais móveis dentro e fora do ambiente escolar. Algumas questões

eram múltipla escolha, com a possibilidade de assinalar uma ou mais respostas e

outras eram dissertativas objetivando, sobretudo, conhecer as justificativas das

respostas dadas nas questões de múltipla escolha.

A aplicação do questionário ocorreu nas aulas do dia 06, 13 e 20 de agosto

de 2015, totalizando, portanto, seis horas de duração e ocorreu em um laboratório de

informática de um Instituto pertencente a mesma universidade do programa bilíngue.

Ao elaborar o questionário de perfis, ainda no início da pesquisa e sem a sensibilidade

que mais tarde viria a me constituir, não considerei a língua materna da maioria dos

alunos participantes da pesquisa, uma vez que se tratou de um questionário em língua

portuguesa escrita. Isso fez com que sua aplicação tenha sido longa e trabalhosa, pois

havia questões que, apesar de terem sido explicadas detalhadamente por mim, em

Libras, demandavam justificativas escritas em Português.

Segundo Chaer (2011), o questionário é uma técnica bastante utilizada em

estudos cujo objeto de pesquisa refere-se a questões de cunho empírico, envolvendo

opinião, percepção, posicionamento e preferências. Entretanto, ao ser realizado em

língua portuguesa, segunda língua de grande parte dos alunos surdos, este

instrumento limitou não apenas a compreensão do que estava sendo perguntado, mas

o desenvolvimento das respostas. Portanto, para que as informações advindas do

questionário pudessem ter validade, todas as questões elaboradas para compor o Q1

foram interpretadas não apenas a partir das respostas escritas dos alunos, mas pela

observação constante das aulas, registradas no diário de campo.

3.4.2 Diário de Campo

Em se tratando de uma pesquisa de caráter exploratório, a observação

participante, modalidade de observação em que o pesquisador, segundo Matos e

Vieira (2002), faz parte do grupo sobre o qual se faz a pesquisa (natural) ou passa a

fazer parte (artificial), demanda registros que podem ser feitos através de diário de

campo ou filmagens, gravadores, máquinas fotográficas (MATOS E VIEIRA, 2002).

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Dessa forma, como já mencionado, além das gravações em vídeo e áudio,

minhas observações a respeito das aulas foram registradas em Diário de Campo

(FETTERMAN, 1989), a fim de identificar e compreender a percepção dos alunos a

respeito da aprendizagem do português escrito como segunda língua e a relação que

eles estabeleciam com as tecnologias digitais móveis para amparar, então, a

elaboração do protótipo de aplicativo móvel.

Além de ser utilizado como instrumento reflexivo para o pesquisador, o gênero diário é, em geral, utilizado como forma de conhecer o vivido dos atores pesquisados, quando a problemática da pesquisa aponta para a apreensão dos significados que os atores sociais dão à situação vivida. O diário é um dispositivo na investigação, pelo seu caráter subjetivo, intimista. (MACEDO, 2010, p. 134)

É importante ressaltar que as observações no Diário de Campo começaram

a ser escritas no dia 4 de agosto, primeiro dia de aula do segundo semestre de 2015,

e se encerraram no último dia de atividades previsto no calendário, 8 de dezembro.

Dentre um total de sessenta e oito aulas, escolhi 5 aulas para compor o corpus de

análise dessa dissertação. O critério de seleção dessas aulas se deu pela qualidade

das discussões suscitadas durante o processo de aplicação do Q1, dos grupos focais,

e das atividades desenvolvidas, principalmente por envolverem a presença das

tecnologias digitais móveis e possibilitarem o trabalho situado com o português

escrito, dando subsídios para responder à minha pergunta de pesquisa.

Selecionei, portanto, as aulas 38, 45, 52 e uma aula em que simulei o uso

do app (Aula teste), que podem ser conferidas, de modo resumido, no quadro que se

segue. Os registros escritos sobre essas aulas estão inteiramente transcritos nos

anexos deste trabalho.

Aula 38

20 ago 2015

Tema da aula: Memes

Atividade desenvolvida: Os alunos analisaram uma série de memes,

a fim de compreender os sentidos e intenções de cada um deles.

Depois disso, investigaram, na Internet, quais representações da

comunidade surda eram postas em cena através dos memes.

Finalmente, produziram seus próprios memes através da

ferramenta Webmaker.

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Aula 45

15 set 2015

Tema da aula: Fanfic

Atividade desenvolvida: Os alunos, através da internet, investigaram o

conceito de Fanfic. Depois disso, em um acervo de Fanfics, escolheram

algumas histórias para lerem e se familiarizarem. Finalmente, reunidos,

produziram uma fanfic em grupo secreto no Facebook.

Aula 52

15 out 2015

Tema da aula: Grupo focal 1

Atividade desenvolvida: Grupo focal sobre as implicações das novas

tecnologias, em especial das móveis para a aprendizagem formal e

informal.

Aula teste 18 mai 2017

Tema da aula: Palavreando

Atividade desenvolvida: Discussão do nome do app e atividade

simulando as possibilidades de construção de sentido existentes dentro

do app através da palavra “político”.

Figura 12 - Resumo das aulas selecionadas para análise. (Adaptado de SÃOPEDRO, J. 2016)

Como salienta Cavalcanti (2006), atuar como professora, além de

pesquisadora, envolve observação com anotação mental constante, o que, por vezes,

ultrapassa também os limites da sala de aula e se estende aos corredores e intervalos

das aulas, onde acontecem as ricas conversas informais. Ainda segundo a autora,

realizar as duas atividades – as aulas e a produção de registros – é um grande e

cansativo desafio, porém crucial em pesquisas dessa natureza.

3.4.3 Grupo focal

Foram realizados dois grupos focais (GF) de 1 hora e meia de duração,

também registrados em diário de campo, com o objetivo de fornecer subsídios para

delinear a configuração do aplicativo móvel e definir suas principais características.

Os dados gerados através desse instrumento estão relacionados às percepções dos

alunos surdos sobre a relação que eles tinham com as novas tecnologias, em especial,

com os dispositivos móveis e suas expectativas no que diz respeito a um app

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educacional que se mostre um recurso para a aprendizagem de palavras em

Português. Segundo Westphal, Bógus, Faria (1996) revoziados por Matos e Vieira

(2002),

grupo focal é uma técnica de pesquisa que utiliza sessões grupais como um dos foros facilitadores da expressão de características psicossociológicas e culturais... prevê a obtenção de dados a partir de discussões cuidadosamente planejadas onde os participantes expressam suas percepções, crenças, valores, atitudes e representações sociais sobre uma questão específica num ambiente permissivo e não constrangedor (WESTPHAL, BÓGUS, FARIA, 1996, p. 473).

O “ambiente permissivo e não constrangedor” possibilitado pelo grupo focal

foi, justamente, o fator decisivo para a escolha desta técnica. Os dois grupos focais

foram realizados com todos os alunos participantes da pesquisa durante os próprios

atendimentos pedagógicos, ao final do ano letivo. O primeiro deles (GF1), gravado em

vídeo, no dia 15 de outubro de 2015 e registrado em diário de campo, teve como tema

central a relação que os alunos haviam estabelecido com as tecnologias digitais

móveis e a percepção deles sobre as potencialidades dessas tecnologias para a

aprendizagem de português.

O segundo grupo focal (GF2), também registrado em diário de campo, no

dia 24 de novembro, e gravado em áudio16 foi promovido após a apresentação da ideia

do protótipo do aplicativo móvel desenvolvido nesta pesquisa. Nesse momento, os

alunos puderam expressar suas opiniões acerca do design e do funcionamento do

aplicativo, bem como expor suas expectativas em relação a ele.

Portanto, como já indicado anteriormente, o Questionário de Perfis (Q1),

buscou identificar o perfil dos alunos surdos em relação à aprendizagem de português

e sua interface com a tecnologia móvel. Através dele, foi possível identificar o

interesse dos alunos no que diz respeito a aprendizagem do português escrito

relacionada à tecnologia, em especial, aos aplicativos móveis. As observações

registradas em diário de campo, bem como o GF 1 foram essenciais para investigar

como os alunos surdos se relacionam com as tecnologias digitais móveis e como eles

16 Foi possível realizar a gravação em áudio, porque todos os alunos presentes eram oralizados. Além disso, não havia ajuda externa, por isso não foi possível realizar a gravação em vídeo.

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fazem uso de variadas linguagens para construir sentidos. Por fim, o GF 2 foi uma

etapa fundamental para levantar as principais ideias dos participantes frente à

proposta de um aplicativo voltado à aprendizagem de palavras em Português.

Tanto as perguntas que compuseram o questionário quanto as atividades

realizadas nas aulas e o tema dos grupos focais foram elaborados a partir do objetivo

traçado, da minha experiência prévia com os alunos e das reflexões suscitadas

durante o programa bilíngue e o projeto de leitura e escrita do Português para surdos,

no Ciência e Arte nas Férias.

O quadro a seguir sintetiza as explicações tecidas em relação aos objetivos

traçados para esse estudo e os instrumentos selecionados para alcançá-los.

Q1

GP1

Aulas GP2

Reuniões

técnicas

Diário de campo e gravações em vídeo ou áudio

Perfil e

percepção

dos alunos

surdos

sobre

suas

necessidades

em relação

a

aprendizage

m de PL2 e

uso de

tecnologias

digitais

móveis.

Percepção

dos alunos

surdos

em relação

a

presença

das

tecnologias

digitais

móveis na

aprendizage

m de PL2.

Percepção

das

necessidades

dos alunos

em relação

ao

Português

escrito,

bem

como do

modo como

eles se

relacionam

com as

tecnologi

as

digitais móveis.

Participação

e colaboração

dos alunos

no

desenvolvimen

to e validação

das

características

do protótipo de

app móvel.

Definição

do

s aspectos

técnicos,

envolvendo

a

interface e

o

funcionament

o do

protótipo.

Figura 13 - Instrumentos de produção de dados e objetivos alcançados

Cabe salientar, mais uma vez, que busquei desenvolver o estudo de forma

horizontalizada e processual. Isso quer dizer que os dados foram emergindo e sendo

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(re)construídos continuamente no processo constante de interação entre mim e os

alunos participantes.

3.4.4 Procedimentos para análise dos dados produzidos

Em pesquisas de natureza qualitativa, a análise de dados pode ser

realizada a partir de variados encaminhamentos. Como já apontado neste capítulo,

segundo Cohen et al (2000), uma das formas mais comuns é o agrupamento de dados

por sua recorrência temática. Neste trabalho, portanto, lancei mão dessa estratégia.

É importante explicar que os dados analisados servem para justificar e

sustentar as especificidades constitutivas do aplicativo proposto. Assim sendo, para

buscar compreender, de forma mais significativa e organizada, quais seriam os

principais elementos advindos da análise que poderiam sustentar minha proposta,

inicialmente desenvolvi uma leitura cuidadosa de todos os dados. A partir dessa

leitura, observei quais temas e aspectos eram mais recorrentes, tanto na literatura,

quanto na fala dos participantes e em minhas observações e registros e fui, assim,

promovendo um agrupamento, ou seja, estabelecendo um grupo de categorias que

ofereceriam subsídios para o desenho do protótipo.

Os pontos considerados importantes e que orientaram de modo mais

saliente as particularidades do protótipo foram assim se delineando:

• Com relação aos dados gerados a partir da aplicação dos questionários e grupos

focais, se sobressaiu a importância do uso de imagens (estáticas e em movimento)

para a composição de sentidos. Assim, a categoria proeminente recai na diversidade

de linguagens.

• Os resultados da pesquisa bibliográfica, por sua vez, ao serem cruzados com os

outros gerados neste trabalho, evidenciaram algumas categorias teórico analíticas

relevantes para orientar a condução da análise e, portanto, a composição da proposta

do aplicativo. As noções de multimodalidade, palavra/enunciado, contexto e

colaboração foram os conceitos mais significativos;

• Os dados gerados a partir da observação das aulas que foram, posteriormente,

registradas nos diários de campo, confirmaram a importância dos elementos

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elencados.

Na parte destinada à descrição justificada dos princípios e características

principais da proposta, optei por seguir uma forma de organização com base nos

estudos sobre design de interface (PETERS, 2014) que levasse em conta duas

macrocategorias: a) aprendizagem é visual e b) aprendizagem é social, uma vez que

esses são os principais âmbitos (de forma mais ampla) ligados ao campo do

desenvolvimento de aplicativos educacionais e também corroboram os pontos mais

relevantes que emergiram dos dados.

Recorri, então, a estudos realizados na área para descrever, de forma mais

detalhada, aspectos ligados a essas macrocategorias, a fim de explicitar algumas

outras especificidades do protótipo proposto. No escopo das macrocategorias serão

indicadas também categorias subjacentes, ou seja, um agrupamento de

microcategorias relacionada ao âmbito mais amplo de organização de dados.

Assim sendo, a partir dos dados, dos pressupostos teóricos e das

especificidades contextuais de meu trabalho, os elementos e as categorias (macro e

micro) organizacionais a partir das quais desenvolverei a descrição e análise do

protótipo são as que descrevo a seguir:

1. Apresentação do protótipo:

Nessa etapa descreverei o protótipo a partir dos desenhos de cada tela que

compõem o app, apresentando, então, um possível percurso de navegação.

2. Aprendizagem é visual:

Nesse âmbito as principais características do protótipo de app serão justificadas e

analisadas a partir da pluralidade de línguas e linguagens e multimodalidade.

3. Aprendizagem é social:

Nesse campo as principais características do protótipo de app serão justificadas e

analisadas a partir da natureza discursiva da linguagem.

É importante destacar que, dada a natureza da pesquisa, essas categorias

não são estanques. A divisão em macro e microcategorias se deu para fins

organizacionais. Assim sendo, devem ser compreendidas como dinâmicas,

sobrepostas e não lineares ou segmentadas.

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CAPÍTULO 4 – DELINEANDO O APLICATIVO E SEUS PRINCÍPIOS

Silêncio (Rolando Sigüenza17) http://www.rolandosiguenza.com.mx

Neste capítulo, a partir do cruzamento dos dados gerados com o referencial

teórico delimitado para este trabalho, procedo à apresentação e análise das principais

características do protótipo de aplicativo móvel com vistas a responder à pergunta de

pesquisa, retomada a seguir:

Com base em uma visão enunciativo-discursiva da linguagem, como se

delineiam as principais características de um protótipo de aplicativo

móvel para surdos que pretende se mostrar um recurso em potencial

para a aprendizagem de palavras em Português?

17 Nas telas de Rolando Sigüenza, as marcas de sua terra natal sulcam traços e cores, tornando viva a ascendência de Oaxaca – estado ao sul do México onde o artista nasceu e onde, ainda pequenino, encontrou na pintura uma potente forma de expressão. Em sua trajetória artística, destacam-se a passagem pelo Taller de Artes Plásticas Rufino Tamayo e as várias exposições realizadas (desde os seus 21 anos) em vários países do mundo, como Estados Unidos, Espanha, França, Japão, Argentina, etc. Ao Jornal 20 Minutos (edição México), Rolando, usuário da Língua de Sinais Mexicana, afirma querer fundar uma associação com enfoque cultural destinada a crianças surdas, para lhes propiciar um futuro feliz e com autossuficiência econômica. Disponível em: <https://culturasurda.net/category/artes-plasticas/>. Acesso em: 02 fev. 2017.

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Este capítulo está dividido em três seções nas quais discorro sobre o

protótipo, como detalhei no capítulo metodológico. Na primeira parte, descrevo as

principais características técnicas do app Palavreando, a partir do desenho das telas

que o compõem, a fim de ilustrar um possível percurso de navegação. Na segunda,

considerando os dados gerados e a literatura na qual esse estudo se apoia, justifico e

analiso a concepção e as principais características do protótipo, no que diz respeito à

visão de língua(gem). Uma vez que o foco do Palavreando é a aprendizagem, cumpre

aqui retomar as duas categorias organizacionais básicas, apoiadas nos estudos sobre

o design de interface para aprendizagem (PETERS, 2014) e nos dados gerados que

confirmaram a importância desses aspectos. São elas: 1) A aprendizagem é visual e

2) A aprendizagem é social.

4.1 Palavreando: apresentação do protótipo

Figura 14 Logo do app Palavreando desenvolvido por Diogo Melani

Palavreando18 é uma proposta de aplicativo educacional móvel, destinado

à comunidade surda brasileira, composta, em uma acepção mais ampla, por surdos e

ouvintes que compartilham experiências visuais e trocas simbólicas, sobretudo, em

língua de sinais.

18 O título do app foi estabelecido colaborativamente nas discussões de orientação e discussão do trabalho e validado pelos alunos surdos na Aula teste de 18 de maio de 2017 (ANEXO VI). O logo do app, acima apresentado, também é fruto da colaboração do especialista em Marketing, Diogo Melani.

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Considerando as especificidades linguísticas que envolvem os surdos

brasileiros e a importância que a modalidade escrita da Língua Portuguesa assume

diante da vida social, a principal finalidade do aplicativo é a aprendizagem de palavras

em Português, vista como um processo multimodalizado e discursivo de construção

de sentidos nessa língua. Diante disso, é possível compreender o app Palavreando

como um dicionário aberto, dinâmico, situado e multimodal, cujo conteúdo, ou seja, os

sentidos das palavras, são construídos colaborativamente e validados pelos próprios

usuários.

Ideias para o desenvolvimento de apps móveis podem surgir a partir de

diversas fontes. No entanto, é essencial determinar qual tipo de app se deseja

desenvolver. Quando compreendemos qual é a sua finalidade, torna-se mais fácil

identificar quais conteúdos irão compô-lo e como ele será usado. Por isso, McQuiggan

et al. (2015) elencam sete tipos de apps educacionais que estão descritos no quadro

abaixo:

Tipo Definição Exemplo

Jogo

Oferece informações educacionais de forma divertida, geralmente através de exercícios ou ambientes baseados em competição

Math Chomp, Pocket Law Firm, Stack the Countries, Rocket Math

Utilidade

Não tem nenhum valor educacional específico, mas oferece uma função básica e pode ser combinado de forma a acomodar projetos, lições e aprendizado.

Notes, iBooks, SAS Gloss, Camera, Voice, Animoto Video Maker, Dropbox, Evernote

Administração

Permite aos professores administrar mais eficientemente a educação e gerir as suas responsabilidades profissionais

Poll Everywhere, Class Dojo, Too Noisy

Ferramenta

Projetado para a educação, mas oferece uma lousa em branco. Eles fornecem andaimes para ações de educação comuns, mas exigem que o aluno ou professor forneçam o conteúdo

SAS Flash Cards, Explain Everything, Google Drive, SAS Reading Records, SAS Gloss, SAS Data Notebook, Popplet

Conteúdo Específico

Fornece uma grande quantidade de informações sobre um tópico

To The Brink, Elements 3D, EcoMobile, SAS Math Stretch, DuoLingo, companion apps for Smithsonian American Museum of Natural History

Referência

Fornece informações básicas em formato conectado e pesquisável

Dictionary.com, Wolfram Alpha

Social Permite conexão e compartilhamento fácil

Edmodo, Twitter, Edublogs

Figura 15 - Tipos de aplicativos educacionais. (McQUIGGAN et al., 2015, p.60, tradução nossa).

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Cope e Kalantzis (2012) discutem, como já vimos, três abordagens da

pedagogia e do currículo que podem nos ajudar a compreender os propósitos do

nosso objeto de análise. São elas: a mimesis, a synthesis e a reflexividade. Segundo

os autores, na mimesis a aprendizagem se dá através da absorção de fatos e

informações e da simples cópia. Na synthesis, embora os estudantes possam adquirir

conhecimento através da observação e da experiência, isso não significa que esse

processo esteja relacionado a seus interesses e motivações. Por outro lado, no

paradigma da reflexividade, o aluno é construtor e, sobretudo, questionador do

conhecimento e a aprendizagem se relaciona diretamente às experiências dos

estudantes e suas identidades.

Desse modo, entendendo que a abordagem reflexiva valoriza o

conhecimento prévio do aluno, a análise crítica, a metacognição e os diversos modos

de significação, julgamos necessário não só pensar em um app afinado com os

propósitos dessa abordagem, mas garantir que o seu processo de desenvolvimento

também incorporasse esses propósitos. Isso acarretou a participação dos alunos

surdos na definição de cada uma das etapas de desenvolvimento do protótipo.

Considerando o paradigma da reflexividade, portanto, o protótipo se

constitui como um espaço onde o usuário pode construir conceitos, termos e hipóteses

e analisa-los para tirar suas próprias conclusões. Por isso, dentro das possibilidades

delineadas por McQuiggan et. al (2015) no quadro acima, o tipo de app que se afiliaria

a essa abordagem seria o do tipo ferramenta19 que demanda dos professores ou dos

estudantes a produção do conteúdo que será veiculado dentro do app. No protótipo,

portanto, como veremos mais adiante, os usuários serão os responsáveis por

produzir, analisar e validar as informações que irão circular dentro do app.

É importante ressaltar que, para ampliar o alcance de um app educacional,

é interessante que ele esteja disponível no maior número de plataformas possíveis.

Atualmente, existem ferramentas, conhecidas como frameworks, para o

desenvolvimento de apps que funcionem simultaneamente em vários sistemas

operacionais, por isso é importante que, futuramente, o Palavreando esteja disponível

em diversos sistemas, como Android, iOS, Windows Phone, etc.

19 Ferramentas, neste trabalho, são compreendidas como sendo tecnologias de mediação e relacionamento conforme a Mentalidade 2.0 descrita por Lankshear e Knobel (2007).

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Para compreender melhor o funcionamento do app, as próximas seções

desta primeira parte do capítulo serão dedicadas à apresentação de suas principais

características, a partir de um storyboard contendo a prototipagem das quinze telas

que dão base ao aplicativo. Os desenhos das telas foram elaboradas através do

Ninjamock20, uma ferramenta online de criação de wireframes para apps móveis e

sites. Vale ainda destacar, como já mencionado nesta Dissertação, que o protótipo

aqui apresentado foi pensado para os surdos e com os surdos participantes da

pesquisa.

4.1.1 Acesso ao aplicativo

Para acessar o aplicativo, os usuários deverão se cadastrar através de um

telefone e um e-mail ou poderão logar através do Facebook. Ao efetuar o login através

do Facebook, as informações são automaticamente transferidas para o Palavreando.

Caso contrário, o usuário deverá preencher os itens: Nome, nome de usuário,

biografia, e-mail e telefone, como indicam as telas a seguir.

a) Cadastro e login

Figura 16 - Prototipagem das telas de cadastro e login.

20 Disponível em: https://ninjamock.com/. Acesso em 12 de jul 2017.

v

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b) Preenchimento do perfil

Figura 17 - Prototipagem da tela de preenchimento do perfil do usuário

4.1.2 Funções de uso geral do aplicativo

Como mencionado, as funcionalidades do app, bem como seu design, têm

como objetivo a aprendizagem de palavras em Português. Para tanto, os usuários, de

maneira colaborativa, irão construir os sentidos das palavras, inserindo no app suas

próprias definições, a partir de quatro macro categorias: a) sinal, b) imagem, c) vídeo

e d) definição escrita, descritas mais detalhadamente nas caixas de texto a seguir.

Na tela abaixo, “político” é a palavra que receberá as definições dos

usuários. A escolha dessa palavra, neste momento, é ilustrativa, mas será justificada

na segunda parte deste capítulo, através de uma atividade realizada com os alunos

surdos, participantes da pesquisa, que simulou o percurso no app. O que nos interessa

nesse momento é compreender que as definições podem ser construídas a partir de

linguagens diversas. O cadastramento das palavras será explicitado nas seções

seguintes.

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Figura 18 - Prototipagem da tela de resultados da busca da palavra “político”.

Na aba SINAL, os usuários encontram vídeos contendo o sinal da palavra. Ao pressionar o ícone, é possível também que o usuário grave o seu próprio vídeo através da câmera de seu smartphone ou carregue um arquivo de sua galeria de imagens e vídeos.

Na aba IMAGEM, os usuários encontram imagens estáticas que podem representar ou exemplificar a palavra. Ao pressionar o ícone, é possível também que o usuário tire uma foto usando a câmera do smartphone ou carregue a imagem de sua galeria.

Na aba VÍDEO, os usuários encontram vídeos com encenações ou explicações em Libras sobre a palavra. Ao pressionar o ícone, é possível também que o usuário grave um vídeo através da câmera de seu smartphone ou carregue um arquivo de sua galeria de imagens e vídeos.

Na aba DEFINIÇÃO, os usuários encontram definições escritas da palavra ou exemplos de uso em frases. Ao pressionar o ícone é possível também que o usuário escreva sua própria definição ou exemplificação.

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Ao pressionar cada um dos ícones, temos as seguintes telas:

Figura 19 - Prototipagem das telas de inserção de sinal e imagem, respectivamente.

Figura 20 - Prototipagem das telas de inserção de vídeo e definição escrita, respectivamente

v

v

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Após inserir o conteúdo em qualquer uma dessas modalidades, o design

da tela será compatível com o desenho abaixo, possibilitando comentários, curtidas e

compartilhamento em outras redes sociais como o Facebook e o Instagram, caso o

usuário que fez a postagem habilite esse recurso em suas configurações de

segurança e privacidade.

Figura 21 - Prototipagem da tela que contém uma possibilidade de definição para a palavra “político”.

4.1.3 Menu do aplicativo

Além das macrocategorias descritas anteriormente, o Palavreando possui

um menu que leva o usuário a cada uma das abas listadas a seguir que serão

descritas com mais detalhes nas próximas seções do capítulo.

: Perfil dos usuários

: Feed de conteúdos

: Acesso às palavras cadastradas e informações sobre o app

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: Atividades recentes dos usuários

: Buscador de palavras

4.1.4 Perfil dos usuários

a) Perfil próprio

Cada usuário possui uma página de perfil como a desenhada na tela a

seguir. Uma vez que o Palavreando se propõe a conectar os usuários entre si

como em uma rede social, é possível que ele siga e seja seguido por outros. Esse

recurso permite que no feed de conteúdos, descrito na seção seguinte, apareçam

prioritariamente as publicações dos usuários que estão sendo seguidos.

Além disso, também é possível realizar conversas privadas e em grupo

através do ícone dos “balões”. Estando no próprio perfil, esse ícone dá acesso às

conversas já iniciadas e permite que o usuário inicie uma conversa coletiva. Nesta

aba, também é possível acessar e editar todo o conteúdo postado pelo usuário no app

e realizar mudanças no perfil, clicando em: Editar Perfil.

Figura 22 - Prototipagem da tela de perfil do usuário.

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b) Perfil de outro usuário

Ao visitar o perfil de outro usuário, clicando no ícone da engrenagem, é

possível selecionar as opções: bloquear, para que ele não tenha mais

acesso ao seu perfil; denunciar, em caso de publicações impróprias e

ocultar história para que as publicações dele não apareçam no feed de conteúdos.

Além disso, na aba que corresponde ao perfil de terceiros, é possível segui-lo ou deixar

de segui-lo e também iniciar uma conversa clicando no ícone dos “balões”.

Figura 23 - Prototipagem da tela de perfil de outro usuário.

4.1.5 Feed de conteúdos

Esta aba corresponde ao feed de conteúdos, no qual aparecem os

conteúdos mais recentes inseridos pelos usuários do aplicativo. Além da

ordem cronológica, os conteúdos publicados por usuários que estão sendo

seguidos aparecem com prioridade.

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Nesta aba também é possível validar os conteúdos, clicando no botão

identificado com um sorriso, escrever um comentário ou ainda compartilhar o

conteúdo em seu próprio perfil, no Facebook ou no Instagram, caso o dono da

publicação tenha autorizado em suas configurações de segurança esse

compartilhamento, como já mencionado anteriormente.

Figura 24 - Prototipagem da tela do feed de conteúdos.

4.1.6 Atividades recentes dos usuários

Nesta aba é possível acompanhar as atividades recentes dos usuários no

app, ou seja, o que os usuários estão curtindo, quais conteúdos estão

comentando e quem estão seguindo.

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Figura 25 - Prototipagem da tela de atividades recentes dos usuários.

4.1.7 Buscador de palavras

Esta aba corresponde ao buscador de palavras. Se já houver conteúdos

disponíveis sobre a palavra pesquisada, aparecerá uma tela com as

principais publicações, dispostas pela quantidade de validações positivas dos

usuários, como indica a figura 27.

Clicando nos ícones Sinal, Imagem, Vídeo ou Definição, o usuário poderá

selecionar a modalidade em que deseja ver as definições. Pressionando os mesmos

ícones, o usuário poderá colaborar inserindo suas próprias definições, como já vimos

na seção 4.3 deste capítulo.

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Figura 26 - Prototipagem da tela dos resultados da busca da palavra “político”.

Caso a palavra pesquisada ainda não tenha sido cadastrada no app, o

usuário poderá cadastrá-la. A partir disso, ela estará disponível, como veremos na

próxima seção, na Lista de Palavras e será transposta para o Dicionário, assim que

houver a primeira inserção de conteúdo sobre ela.

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Figura 27 - Prototipagem da tela de cadastramento de novas palavras.

4.1.8 Acesso às palavras cadastradas

Nesta aba, acessando o item a) Lista de Palavras, o usuário encontra as

palavras cadastradas por ele ou por outros usuários, cujos conteúdos ainda

não foram inseridos. No item b) Dicionário estão registradas, em ordem alfabética,

todas as palavras que já foram trabalhadas dentro do app. No item c) Sobre há uma

breve explicação do que é o aplicativo Palavreando, o e-mail de contato da equipe

idealizadora, o ícone para avaliação do aplicativo na loja virtual e o patrocinador.

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a) Lista de palavras

Figura 28 - Prototipagem das telas de palavras cadastradas e lista de palavras.

b) Dicionário

Figura 29 - Prototipagem das telas Dicionário e palavras com a letra “A”.

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c) Sobre

Figura 30 - Prototipagem da tela com informações sobre o app.

4.2 Palavreando: processo de concepção e análise das características constitutivas do protótipo

Nesta seção, busco justificar a finalidade do protótipo e suas principais

características à luz dos dados gerados e do referencial teórico que sustenta esse

estudo. Uma vez que os app educacionais, de maneira geral, não devem ser vistos

como construções homogêneas, puramente técnicas e autônomas em relação às

práticas sociais, as características do Palavreando, tanto as relativas ao âmbito

técnico quanto ao âmbito educacional, serão aqui apresentadas concomitantemente.

Após a apresentação da concepção do protótipo, esta seção se encontra

dividida, a partir das macrocategorias já mencionadas no início do capítulo. a)

aprendizagem é visual e b) aprendizagem é social, nas quais serão apresentadas

e analisadas tanto as características do âmbito técnico quanto as do âmbito

educacional, evidenciando, dessa forma, que as características técnicas,

propriamente ditas, só se configuram através das práticas sociais que as produzem e

as tornam relevantes.

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4.2.1 Concepção do protótipo

Os dispositivos móveis na educação apresentam uma evidente

oportunidade de alcançar grupos minoritários excluídos pelos modelos de escola

tradicionais que, sob uma perspectiva monolíngue, congelam as formas de

representação e construção de sentidos (GEE; HAYES, 2011). As tecnologias móveis

têm oferecido novos caminhos para descongelar e personalizar a aprendizagem,

tornando-a mais acessível e significativa, principalmente porque os dispositivos

digitais móveis, sobretudo, quando conectados à internet, possibilitam que o acesso

à informação, à aquisição de conhecimento e à comunicação ocorra a qualquer hora

e em qualquer local, de forma multimodalizada, pervasiva, compartilhável e

colaborativa.

Nesse sentido, cresce o número de apps disponíveis nas lojas virtuais.

Segundo Mc Quiggan et al (2015), em 2013, o número de apps na Apple Store

alcançou a marca de 1 milhão. Os dispositivos móveis tornaram-se nossas câmeras,

relógios, filmadoras, agendas, calendários, calculadoras, navegadores, lanternas,

diários. Por isso, investir em um smartphone para estudantes tem reduzido custos

com outras ferramentas adicionais. A Unesco (2014) acredita que nos próximos anos,

com o crescente aumento desses aparatos tecnológicos nos ambientes de educação

formal, os apps se tornarão parte importante do ecossistema de aprendizagem.

Pensando nisso, McQuiggan et al. (2015) destacam que uma importante

etapa no desenvolvimento de apps educacionais móveis é investigar a existência de

outros apps no mercado voltados para o mesmo público e com propostas semelhantes

ao que se pretende desenvolver. As resenhas realizadas por usuários, por exemplo,

podem contribuir para que desenvolvedores e professores identifiquem novas

oportunidades de criação. Além disso, outras mídias não devem ser descartadas, pois

muitas possibilidades, inspirações e questionamentos podem surgir a partir da análise

de livros, ferramentas físicas, websites, etc.

Entretanto, uma rápida pesquisa pelas lojas virtuais de app móveis nos

mostra que, no Brasil, o número de apps voltados para o público surdo é ainda

bastante reduzido se levarmos em conta a gama de possibilidades que as tecnologias

móveis oferecem. Sobre isso, os alunos participantes da pesquisa, em resposta à

questão 27 do Q1, indicaram, majoritariamente, dois aplicativos que eles acreditam

auxiliar a comunidade surda na aprendizagem do Português.

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Figura 31 - Gráfico gerado a partir das respostas dadas à questão 26 do Q1.

Hand Talk 4 ProDeaf 4

Pesquisa Google 2 Google Imagens 2

Dicionário de Português 1

Figura 32 - Quadro gerado a partir das respostas dadas à questão 27 do Q1.

No que diz respeito a apps direcionados à comunidade surda, os dois mais

citados pelos alunos estão também entre os mais baixados nas lojas virtuais. São eles:

Hand Talk, tradutor de português para libras, premiado na World Summit Award

Mobile, competição bianual promovida pela ONU que reconhece aplicativos de

relevância para a humanidade e o ProDeaf, primeiro aplicativo tradutor de português

para libras.

Lançado em 2013, o aplicativo Hand Talk começou a ser planejado em

2008 para um trabalho de faculdade. Segundo a descrição que consta no FAQ do

aplicativo, o Hand Talk é uma ferramenta gratuita de tradução automática para Língua

de Sinais através de um intérprete virtual, o Hugo. Atualmente, a tradução é feita do

Português brasileiro para Libras e o app pode ser utilizado por pessoas de todas as

idades, surdas ou não, que queiram aprender e/ou se comunicar utilizando a libras.

O aplicativo está disponível para os sistemas operacionais iOS (Apple), nos iPhones

(3Gs ou superiores) e em todos os modelos de iPads e iPods Touch com acesso à

internet. No sistema Android, está disponível em todos os tablets e smartphones, a

partir da versão 2.3 com acesso à internet e nos smartphones BlackBerry Z10, Q5 e

Q10 com acesso à internet.

Recorrência Temática

27. Se você respondeu sim para a última questão, qual ou quais aplicativos você conhece?

Número de alunos que mencionaram algo relacionado

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Assim como o Hand Talk, o ProDeaf foi idealizado em uma disciplina do

curso de Ciências da Computação. De acordo com a descrição do aplicativo,

disponível no site da empresa, o ProDeaf Móvel é o primeiro aplicativo tradutor de

português para a Língua Brasileira de Sinais através de um avatar animado em

tecnologia 3D. Segundo a empresa, é possível traduzir automaticamente pequenas

frases para libras através de texto escrito ou reconhecimento de voz. Além disso, o

app possui um Dicionário de Libras em português acessível sem a necessidade de

conexão com a internet. O ProDeaf Móvel está disponível para download gratuito em

aparelhos Android, iOS e Windows Phone 8.

Como já descrito, tanto o Hand Talk quanto o Pro Deaf se propõem a ser

tradutores de português para libras. Em ambos, o usuário pode solicitar a tradução de

uma palavra ou de uma sentença curta em português através da escrita ou de

reconhecimento de voz. O Hand Talk reconhece também palavras enviadas através

de imagens, como em placas, por exemplo.

No entanto, o uso deles durante as aulas do programa bilíngue foi bastante

restrito. Em apenas um atendimento, uma das alunas usou o dicionário disponibilizado

no aplicativo ProDeaf para conferir a grafia de algumas palavras, como descrito a

seguir.

Excerto extraído do Diário de Campo da Aula 52 – 15 out. 2015

Após realizarmos o grupo focal sobre as percepções dos alunos em relação as

possibilidades que as tecnologias móveis trazem para a aprendizagem em

contextos formais e não formais, pedi a eles que escrevessem um texto, em formato

de carta, para algum professor, expondo o que eles acreditavam ser uma educação

de qualidade para o surdo. O objetivo era fazer com que eles refletissem sobre o

próprio processo de aprendizagem e sobre como eles gostariam que os

professores usassem as tecnologias em sala de aula. Durante a produção textual,

a aluna M recorreu ao dicionário do ProDeaf para confirmar a grafia das palavras

“intérprete” e “importante”. A aluna conhecia a letra inicial de cada palavra e tinha

uma ideia da imagem da palavra. Por isso, ela procurou cada uma delas através

das letras iniciais e, então, conferiu a grafia. No entanto, a aluna não clicou na

palavra para conferir o sinal e por isso acabou se confundindo. Ao invés de

“intérprete”, escreveu “interpretação” e ao invés de “importante”, M. escreveu

“importação”.

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Embora tenham sido apontados pelos alunos como exemplos de apps

voltados para surdos aprenderem Português, o excerto acima ilustra o único momento

em que ele foi usado com esta finalidade. Além disso, a grafia de uma palavra pode

ser verificada através de outros mecanismos, como o próprio dicionário tradicional,

impresso ou digital, ou seja, nesse contexto específico, os apps são utilizados apenas

como mera ferramenta. Portanto, tanto o Prodeaf quanto o Hand talk, embora possam

auxiliar a comunicação entre surdos e ouvintes através da Libras, não envolvem ou

mobilizam de maneira significativa o processo de aprendizagem de Português.

Como registrado em meus diários de campo, na maioria das vezes, ao se

depararem com palavras desconhecidas, os alunos recorrem não aos apps descritos

acima, mas ao Google Imagens. Apesar de fazerem isso com frequência, esse

mecanismo nem sempre é eficiente, pois o conjunto de imagens resultante da

pesquisa nem sempre é capaz de representar aquilo que está sendo buscado,

principalmente quando se trata de palavras, cujos significados são abstratos ou mais

complexos como, por exemplo, o conceito de fanfic ou a compreensão da palavra

político, como veremos a seguir. O mesmo ocorria com os dicionários tradicionais

impressos ou dicionários ilustrados: os verbetes contendo outras palavras em

Português não facilitam a compreensão dos alunos.

Excerto extraído do Diário de Campo da Aula 45 – 15 set. 2015

Com o intuito de compreender como os alunos faziam pesquisas na internet, pedi

a eles que me explicassem o conceito de Fanfic. Todos eles recorreram à

Pesquisa Google e ao Google Imagens digitando a palavra “Fanfic” ou “O que é

Fanfic?”, no entanto, os resultados levaram a sites com explicações em Português

contendo outras palavras desconhecidas por eles, como por exemplo: “ficcional”,

“midiático”. Alguns deles me mostraram imagens contendo notebooks, livros, etc,

mas não sabiam de fato qual era a relação das imagens com Fanfics. Perguntei a

eles, então, o que eles faziam quando precisavam fazer trabalhos em casa, sem

a presença de intérprete ou de professor, e quando a Pesquisa Google ou o

Google Imagens não eram suficientes para fazê-los compreender o significado

das palavras. A resposta: “desistimos”. Os alunos só compreenderam o que era

uma fanfic quando fiz uma explicação em Libras e mostrei alguns exemplos.

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Ao longo das aulas, eles percebiam e me faziam compreender que a

dificuldade em se ler um texto em Português e interpretá-lo, por exemplo, estava em

grande parte relacionada a uma lacuna não apenas em relação ao desconhecimento

do vocabulário, mas à compreensão dos sentidos das palavras em contextos

concretos.

Na aula 38, do dia 20 de agosto de 2015, ANEXO III, iniciei com os alunos

um projeto de produção de memes. Para que pudéssemos refletir sobre o conceito de

memes, apresentei a eles uma coletânea de imagens, evolvendo variados temas.

Uma delas, relativa aos políticos, me chamou atenção. Ao apresentar o meme,

reproduzido abaixo, os alunos não compreenderam o seu sentido, porque

confundiram o significado da palavra “graça” e muitos deles também desconheciam a

palavra “políticos”. Além disso, ao desconhecerem o sentido dessa palavra não

atrelaram a ela a ideia de que políticos são corruptos, como sugere o meme.

Figura 33 - Meme Chapolin. Fonte: http://geradormemes.com/media/created/jqw4g5.jpg

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Excerto extraído do Diário de Campo da Aula 38 – 20 ago. 2015

Este episódio evidenciou que conhecer o sinal da palavra em Libras não

certifica ao surdo a compreensão dos enunciados que, por meio de diferentes

linguagens, circulam na sociedade. Isso evidencia a falta de letramento pelo surdo,

inclusive na língua de sinais.

Em escolas regulares, por exemplo, nas quais os surdos participantes

desse estudo estão inseridos, não há na matriz curricular letramento em língua de

sinais. A língua de instrução, como sabemos, é o português, o que se constitui como

uma barreira para o acesso ao conhecimento e aos processos de produção de sentido

pela comunidade surda, o que interfere também na constituição da visão de mundo

por esses alunos, uma vez que é através da língua que isso acontece.

A língua tem sua origem em uma exigência interior do homem e não somente em uma necessidade exterior de sustentar as relações humanas; essa exigência está situada na própria natureza humana e consiste na condição necessária ao desenvolvimento da força do espírito e à aquisição da visão de mundo, que é atingida somente quando o pensamento de um indivíduo se torna claro e determinado para o pensamento de todos e de cada um” (HUMBOLDT, 2013 [1859], pp. 10-11 apud BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], p. 20 )

Nas teorizações bakhtiniana, a consciência linguística do falante e daquele

que escuta e compreende não se forma através de um sistema abstrato de formas

linguísticas normativas e idênticas, mas através da língua como “opinião concreta e

heterodiscursiva sobre o mundo” (BAKHTIN, 2017 [1934-1935], p. 69). Nessa

perspectiva, a “palavra exala um contexto e os contextos em que leva sua vida

A compreensão do meme do Chapolin ficou comprometida, porque os

alunos confundiram a palavra “graça”, com “gratuito”, ou seja, algo que é ou se tem

“de graça”. Além disso, alguns desconheciam a palavra “políticos”. Mesmo depois

de apresentar a eles o sinal referente a essas palavras em Libras, apenas a aluna

G. conseguiu estabelecer a relação entre políticos e corrupção, o que me faz refletir

sobre o quanto as barreiras da língua interferem também na participação social

desses alunos. Não estar ciente dessa relação é estar alheio à sociedade, à

cidadania. Isso me deixa preocupada.

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socialmente tensa” (BAKHTIN, 2017 [1934-1935], p. 69).

Dessa forma, mostrou-se necessário pensar em um protótipo cujo objetivo

seria a aprendizagem de palavras, a partir de um processo multimodal que

possibilitasse aos alunos enunciar essas palavras em contextos concretos. Dessa

forma, dois aspectos se sobressaíram diante do que foi exposto até aqui: a

multimodalidade, ou seja, a necessidade de que o app envolvesse diferentes

linguagens, uma vez que elas se inter-relacionam e se complementam no processo

de construção de sentidos e a natureza discursiva da linguagem, uma vez que a

palavra é sempre perpassada pela palavra do outro e se dá em um contexto de

enunciação preciso, ou seja, em um contexto ideológico preciso

(BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], p. 181).

Passamos, então, primeiramente à análise de como o aspecto que envolve

a multimodalidade, isto é, a diversidade de modos/linguagens, se configura no

Palavreando. Em seguida, passaremos à natureza discursiva da linguagem.

4.2.2 Aprendizagem é visual

Há menos de vinte anos, qualquer pessoa, no país, dotada do privilégio de ter obtido escolaridade média para cima, acordava pela manhã ao som do rádio transmitindo notícias ou música. Antes de sair para o trabalho, ligava a televisão para ouvir as notícias ou as lia no jornal impresso, enquanto tomava seu café. No caminho para o trabalho, continuava com notícias, prestação de serviços ou músicas no rádio do carro ou, então, escutava seu rádio portátil no trajeto do ônibus ou metrô. [...] De volta para casa, à noite, o programa era ligar a televisão, tomar conhecimento das notícias do dia no país e no mundo e, depois disso, passar a assistir a alguma programação de seu gosto. Em alguma noite especial ou nos finais de semana, a ida ao cinema com amigos ou familiares poderia ser um item obrigatório (SANTAELLA, 2013, p. 236).

Santaella (2013), com o objetivo de explicitar o processo de convergência

das mídias, possibilitado pelo desenvolvimento do computador, objeto complexo que

reúne todas as formas de comunicação humana descritas no trecho acima, acaba por

evidenciar a presença constante das linguagens verbais, em sua modalidade oral, no

cotidiano de grande parte da sociedade. Há menos de duas décadas, como salienta

a autora, o acesso à informação se dava, sobretudo, a partir da língua oral, o que nos

leva a refletir sobre o lugar dos surdos dentro dessa sociedade.

Se fossemos retratar o cotidiano de um sujeito surdo, a narrativa acima

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seria muito diferente. Ele não ligaria o rádio pela manhã, tampouco teria um rádio

portátil para ouvir notícias ou músicas durante o trajeto para o trabalho. Ao chegar em

casa, ligar a televisão para tomar conhecimento das notícias do país, com certeza não

seria uma tarefa acessível, visto que até hoje, poucos são os canais que apresentam

tradução para Libras. Em relação ao cinema, assistir um filme só seria possível caso

fosse uma produção internacional para haver a possibilidade de assistir com legendas.

Dessa forma, as fontes de informação para o surdo, nesse momento, se restringiam

a jornais, revistas e livros que, de maneira geral, não consideravam as especificidades

dessa comunidade em sua concepção.

Nesse contexto, o mundo digital, segundo Santaella (2013, p. 235), trouxe

“mudanças substanciais na constituição das linguagens humanas que agora se

manifestam nas misturas inextricáveis entre o verbal, o visual e o sonoro”. As

tecnologias digitais permitiram reunir em um mesmo espaço – o ciberespaço – todas

as linguagens pré-existentes, afetando nossa constituição como sujeitos culturais e

nossas maneiras de acessar o mundo e produzir sentido.

Dessa forma, as telas dos dispositivos digitais ao permitirem uma densa e

complexa fusão de diferentes linguagens – imagens, fotos, desenhos, animações,

textos – inauguram um novo modo de construir e configurar informações muito mais

acessível aos surdos. Trata-se de “uma espessura de significados que não se

restringe à linguagem verbal, mas se constrói por parentescos e contágios de sentidos

advindos das múltiplas possibilidades abertas pelo som, pela visualidade e pelo

discurso verbal” (SANTAELLA, 2013, p. 245).

Assim sendo, um protótipo de app voltado para o público surdo precisa,

necessariamente, envolver diferentes sistemas de representação e de significação

que são possibilitados pelo contato entre palavras escritas em Português, sinais em

Libras, imagens, fixas e animadas, vídeos, etc.

Para exemplificar como as diferentes línguas e linguagens se configuram

dentro do Palavreando e para justificar a presença de cada uma delas, retomei o

meme do Chapolin com os alunos e pedi a eles que trabalhássemos o(s) significado(s)

da palavra “político” através das quatro modalidades presentes no app: a) sinal, b)

imagem, c) vídeo e d) definição escrita. O intuito era compreender como eles

alimentariam a palavra “político” dentro do Palavreando e quais sentidos seriam

produzidos a partir das diferentes linguagens.

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a) Sinal

Assim como as línguas orais, as línguas de sinais apresentam uma

gramática própria, em que se pode identificar unidades mínimas de formação de

sinais, tais como os fonemas nas línguas orais. São elas: configuração de mão,

movimento, ponto de articulação, orientação de mão e expressões não manuais

(corporais e faciais). Isso contribui significativamente para a confirmação do seu status

de língua.

Além disso, outro fator preponderante para que as línguas de sinais sejam

compreendidas como línguas e não como linguagens é o fato de serem marcadas por

variações linguísticas. Dessa forma, há na Libras, assim como nas línguas orais, uma

série de sinais diferentes para representar uma mesma palavra. Por isso, mostrou-se

importante criar um espaço dentro do protótipo para que essas variações sejam

registradas e disseminadas.

Em relação ao sinal de “político” em Libras, apareceram dois sinais

distintos, gravados em vídeo, que estariam dispostos no app da seguinte maneira:

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Figura 34 - Prototipagem das telas com os vídeos dos sinais em Libras da palavra “político”.

Além do aspecto da variação linguística, outro fator que justifica a existência da aba

destinada aos sinais é que muitas palavras em Português, principalmente os termos

técnicos, ainda não possuem correspondentes na Libras, por isso sinais estão sendo

constantemente criados e validados pela comunidade surda. Sendo assim, esse

espaço também se constitui como uma possibilidade de fazer circular os sinais que

estão emergindo nas esferas sociais.

b) Imagem

Embora a expressão “O surdo é visual” tenha se estabelecido como um

truísmo no contexto educacional dos surdos, as escolas tradicionais, como já vimos

neste trabalho, partindo de um ensino formal, monolíngue, monocultural e orientado

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para uma só linguagem (GRUPO DE NOVA LONDRES, 1996), congelam as formas

de representação e construção de sentidos (GEE; HAYES, 2011). Isso se confirmou

no GF1, quando os alunos relataram que em suas escolas, os recursos tecnológicos

que poderiam possibilitar o trabalho com imagens quase nunca eram utilizados.

]Excerto extraído do Diário de Campo do GF1 – 15 out. 2015

Uma vez que grande parte dos surdos se comunicam em uma língua que é

(predominantemente) visual, sua maneira de apreensão do mundo também o é. Dessa

forma, as imagens, bastante acessíveis a esse grupo, são parte essencial do processo

de construção de sentidos. É nesse contexto, portanto, que a multimodalidade se

configura como um dos conceitos fundamentais da pedagogia dos multiletramentos

(GRUPO DE NOVA LONDRES, 1996), uma vez que ela tem se tornado característica

intrínseca dos textos e Designs contemporâneos.

Como já mencionado nesse capítulo, os alunos surdos, participantes da pesquisa,

recorriam, em primeira estância, ao Google Imagens. As imagens resultantes das

pesquisas nem sempre eram suficientes para a apreensão dos significados, mas

mesmo nessas ocasiões, quando associadas a outras linguagens, se constituam

como parte importante da construção dos sentidos.

Ao pesquisar no Google o que era Fanfic, a aluna N. se deparou com a seguinte

imagem:

Quando perguntei aos alunos sobre a presença de imagens durante as

aulas, eles responderam que o uso de smartphones e tablets era proibido dentro

da sala de aula, por isso as únicas imagens com as quais eles tinham contato eram

as presentes nos livros didáticos. Além disso, relataram que os professores vão

pouquíssimas vezes à sala de recurso e quando isso acontece, normalmente, é

apenas para exibir filmes. A aluna L. relatou que a professora de Biologia

costumava exibir vídeos na sala de aula, mas esses vídeos não eram legendados,

por isso ela tinha muita dificuldade em compreendê-los.

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Figura 35 - Resultado da busca pela palavra “Fanfic” no Google Imagens.

Excerto extraído do Diário de Campo da Aula 45 – 15 set. 2015

Portanto, embora as imagens isoladas possam, muitas vezes, não ser

suficientes para a compreensão dos sentidos, quando relacionadas a outras

linguagens, se complementam e passam a compor possíveis significados. Por isso, é

importante destacar que as diferentes modalidades presentes no app não podem ser

vistas como autônomas, elas se inter-relacionam dentro do app e fora dele.

Assim, para construir o significado da palavra “político”, a aluna G.

selecionou a imagem do atual presidente do Brasil para mostrar aos demais colegas.

Pedi a ela que me explicasse o que havia na imagem e o que ela poderia

inferir sobre o conceito de Fanfic a partir dela. A aluna, embora tenha descrito que

se tratava de alguém escrevendo uma história, não conseguiu elaborar uma

resposta para o que era Fanfic. Após explicar em libras que Fanfic era um texto

construído colaborativamente e mostrar aos alunos alguns exemplos disponíveis em

sites da internet, eles compreenderam o conceito. A aluna N, então, perguntou se

era por isso que o texto da imagem estava escrito em cores diferentes. Ou seja, se

cada cor representava um autor diferente.

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Figura 36 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político” através de imagem.

Excerto extraído do Diário de Campo da Aula teste – 18 maio 2015

Essa interação entre usuários e a discussão desencadeada pela imagem

e pelo comentário escrito, como veremos mais adianta neste capítulo, é fundamental

para que os sentidos sejam construídos colaborativamente, de forma situada, a partir

do horizonte social em que cada sujeito encontra-se inserido (BAKHTIN/VOLÓCHINOV,

2017 [1929]).

No momento em que G. mostrou a imagem de Temer para os demais, a

aluna L., (como ilustrado na figura acima), comentou que ela não gostava do atual

presidente, pois ele queria acabar com a aposentadoria.

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c) Vídeo

Como mencionado anteriormente, alguns conceitos, palavras/ enunciados

em Português não são compreendidos pelos surdos, muitas vezes, porque esses

sentidos não são produzidos, inclusive, na própria língua de sinais. A matriz curricular

das escolas regulares não prevê o ensino de Libras, o que implica na falta de

letramento do surdo não apenas em Língua Portuguesa, mas em língua de sinais.

Embora a convergência das mídias, principalmente nas redes sociais,

possibilite que informações em Libras circulem e sejam mais amplamente acessadas,

os surdos participantes da pesquisa estão pouco habituados a se engajar em práticas

que envolvam o uso da língua de sinais. Só mais recentemente isso tem acontecido

de forma mais significativa através dos recursos de chamada de vídeo e as

transmissões ao vivo do Facebook.

Excerto extraído do Diário de Campo da Aula 38 – 20 ago 2015

Por isso, mostrou-se importante que as definições no Palavreando

pudessem ser construídas também em Libras, a fim de possibilitar que a produção de

sentidos aconteça em ambas as línguas. Para tanto, a aba vídeos permite explicações

em língua de sinais e também qualquer outra estratégia visual que o surdo considere

relevante para explicar o significado de uma palavra. Para a palavra “político” foram

gravados três vídeos que serão transcritos e analisados com mais detalhes na seção

Aprendizagem é social, deste capítulo.

Ao final das aulas sempre deixo que os alunos usem seus smartphones

conectados à internet, de maneira livre, para observar como eles estão usando

esse artefato. Em quase todas as aulas, eles tiram fotos individuais e em grupo e

postam no Facebook. Rolam a tela e observam de forma rápida o feed de notícias.

Param para ver imagens e fotografias. Voltam a rolar a tela. Quando mostrei a eles

os vídeos produzidos em Libras pela TV Ines, me espantou saber que nenhum

deles os conhecia.

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d) Definição escrita

Em se tratando de um app cuja finalidade é a aprendizagem de palavras

em Português e, consequentemente, a produção de sentidos nessa língua, é coerente

que o Palavreando incluísse a linguagem verbal, em sua modalidade escrita, como

um dos campos de construção de significados. Além da importância da aprendizagem

dessa modalidade ser reforçada pela Lei 10.436 que salienta a impossibilidade da

Libras substituir a Língua Portuguesa escrita, nossa sociedade ainda se configura

como uma sociedade grafocêntrica que insiste em “normalizar” o surdo, se não pela

fala, como era no oralismo, pela escrita (Cavalcanti & Silva, 2007) e pela norma

padrão.

Nesse contexto, é importante conceber a aprendizagem escrita de forma

mais participativa, colaborativa e distributiva, caminhando no sentido contrário daquilo

que se define, comumente, como práticas letradas convencionais, vistas como mais

centradas na noção de autoria e com regras e normas fixas. Assim, a possibilidade

de construir sentidos a partir de definições escritas no Palavreando contribui para o

processo de inclusão dessa comunidade e se configura também como um espaço

de resistência política.

Portanto, para essa modalidade, os alunos produziram os seguintes textos escritos21:

I: O político é alguém que ocupa de assuntos públicos.

Exemplo: as pessoas culpando a Dilma que roubou dinheiro.

I.: A política é que reunir os políticos para apresentar cada

projetos, discutir para criar declaração ou lei. Ex: A ação dos políticos aprovado pela lei de direitos humanos.

L.: Político é muitos que passar na televisão que tem presidente e

que falam muito e que tem microfone, no quadrado da mulher interpretação. O brasileiros são evolvidos e roubo muito.

G.: Político explicar o muito importante nova lei e regras. Também

Brasília, prefeitura e qualquer cidade. Problema é dinheiro e trabalhar melhor, mas não adianta.

J.: Os políticos são homens e mulheres de ministro, prefeito,

secretário, presidente e entre outros, na camara dos deputados na Brasília e nas cidades também se reúnem com o prefeito, secretários e outros numa camara municipal para discutir sobre os projetos, leis e outras propostas.

21 Essas definições, especificamente, estão apresentados aqui sem nenhuma modificação.

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L.:

Político muito falou homeino. Começou o brasil todos o que falam teloração a falam muito. Problema mas dinheiro o pouco queiram pessoas de trabalho.

I.:

Muitos políticos brasileiros estão envolvidos em fazer roubos.

Figura 37 - Tabela com as definições escritas produzidas pelos alunos para a palavra “político”.

É possível observar que, assim como na aba vídeos, diferentes estratégias

aparecem na modalidade escrita. Alguns deles descrevem as atividades exercidas

pelos políticos, outros explicitam juízos de valor e opiniões sobre o assunto, outros

definem exemplificando e outros expõem a palavra através de uma frase. Essas

definições que partem de um contexto concreto de enunciação serão melhor

trabalhadas na seção seguinte.

4.2.3 Aprendizagem é social

Nas teorizações bakhtiniana, a palavra, compreendida em seu significado

mais amplo, ou seja, como enunciado e discurso, é vista como um fenômeno

ideológico e dialógico por excelência.

A consciência linguística do falante e daquele que escuta e compreende não lida na prática ou na fala viva com um sistema abstrato de formas linguísticas normativas e idênticas, mas com a linguagem no sentido do conjunto de diferentes contextos possíveis em que essa forma linguística pode ser usada. Para o falante nativo, a palavra se posiciona não como um vocábulo de dicionário, mas como uma palavra presente nos enunciados mais variados da combinação linguística A, B, C etc., e como palavra de seus próprios enunciados multiformes. (BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], p. 180).

Nessa perspectiva, a palavra não poderia ser abordada no app fora de seus

contextos de uso e decorada de acordo com a sua significação em Português. Caso

isso acontecesse, ela se tornaria aquilo que Bakhtin/Volóchinov (2017 [1929])

compreendem como um sinal, ou seja, passaria a ser somente objetiva, fechada e

estagnada. Dessa forma, para que as palavras em Português sejam interiorizadas

pelos alunos surdos, elas precisam ser concebidas na estrutura de um enunciado

concreto, como um signo mutável e flexível que não se encerra em uma palavra de

dicionário.

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Compreendendo, portanto, que os significados de uma palavra não podem

ser estabilizados e isolados de seu contexto, as definições no Palavreando, como

vimos anteriormente, serão produzidas pelos próprios usuários, permitindo a eles

fazerem parte de um processo contínuo, aberto e autoral de produção de sentidos e

significados.

Para Santaella (2013, p. 246), a multiplicidade e a diversidade de

linguagens se manifestam a partir de três matrizes fundamentais: a verbal, a visual e

a sonora. Segundo ela, como vimos no capítulo teórico desta Dissertação, todas as

variadas formas de linguagem originam-se dessas três matrizes. Interessa-nos agora

a matriz verbal que, segundo a autora, subdivide-se no discurso descritivo, narrativo

e dissertativo.

Durante o programa bilíngue do qual os sujeitos participantes dessa

pesquisa fizeram parte, desenvolvi atividades envolvendo a presença das tecnologias

digitais móveis, a partir de diferentes gêneros discursivos. Uma delas, já citada

anteriormente, foi a produção de uma carta ao professor sobre o que seria, para os

alunos surdos, uma educação de qualidade voltada a esse público. Uma das

exigências da proposta era dar dois exemplos do que o professor poderia fazer para

melhorar a qualidade da aula para o surdo. Reproduzo abaixo dois textos, um

produzido pela aluna A., surda profunda, e outro pela aluna I. que tem implante

coclear:

Campinas, 15 de outubro de

2015 Professor,

Na escola tem intérprete também alunos surdos inclusão ouvintes. Mas

não é difícil muito não, só pouco difícil por isso minha intérprete falta para escola que eu

junto surdos de professor falando para eu não entendi, porque eu é surda também surdos

então minha amiga é surda chama para professor esquecer que ela falou que eles não

entendem de ele ajudou escrever da lousa como fazer estuda também responda.

Depois minha intérprete explica para surdos entendem também ajuda como fazer estuda

e aprender é bom que não difícil.

Mas eu entendo ver imagem também filme como jeito aprender também entende.

A.

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Tradução minha22:

Professor,

Na escola tem intérprete e também tem outros alunos surdos que convivem com

ouvintes para haver inclusão. Não é muito difícil, não. Só é um pouco difícil quando a

minha intérprete falta na escola. Eu, junto com os outros alunos surdos, não

entendemos o que o professor fala, porque eu sou surda e os outros alunos surdos

também não entendem. Por isso, minha amiga chama o professor para que ele não se

esqueça que nós surdos não entendemos. Então ele nos ajuda escrevendo na lousa

o que é preciso estudar e também as respostas.

Depois, minha intérprete explica para os surdos poderem entender como aprender e

estudar. É bom, não é difícil.

Mas eu entendo imagens e também filmes são um jeito bom para aprender e entender

também.

A.

22 É importante ressaltar que a tradução dos excertos se deram a fim de que os leitores não familiarizados com a escrita do surdo pudessem compreender o conteúdo do texto no espaço dessa Dissertação. No entanto, o alinhamento, ou seja, o ponto para compreensão no app Palavreando será produzido na própria interação dos usuários.

Campinas, 15 de outubro de 2015

Professores,

Eu queria se voces saibam sobre da minha e o que eu faço na vida, então eu nasci surda

depois cresci uns 3 anos fui em Bauru fazer cirurgia dentro da implante na cabeça e

começei ser feliz que eu estava escutando tudo, pássaros, barulhos, crianças e meus pais

falam.

Depois tantos anos aprendi a falar e cresci, quando eu tinha 12 anos que eu tava no 5 ano

eu aprendi muita coisa na sal de aula e também fiz amizade, pois eu era única surda da

escola particular.

E os professores nao sabiam que eu era surda e também eles perguntaram "como você

escuta? e como você aprende a falar as pessoas?" eu aprendi na fonoaudiologo que me

ensinaram a falar, então os professores me ensinaram muita coisa que já aconteceu na

minha vida e também eles comunicava comigo e os meus amigos que falam devagar, as

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Tradução minha:

Professores,

Eu queria que vocês soubessem sobre a minha vida e o que eu faço. Então, eu nasci

surda, depois cresci e quando tinha 3 anos fui para Bauru fazer a cirurgia de implante

coclear na cabeça. Comecei a ser feliz porque eu estava escutando tudo, os pássaros,

os barulhos, as crianças e os meus falarem.

Depois de tantos anos aprendi a falar e cresci, quando eu tinha 12 anos e estava no

5º ano, aprendi muitas coisas na sala de aula e fiz amizade, pois eu era a única surda

da escola particular.

Os professores não sabiam que eu era surda e me perguntavam “como você escuta?”

e “como você aprendeu a falar com as pessoas?”. Eu aprendi na fonoaudióloga que

me ensinou a falar. Então, os professores me ensinaram muitas coisas que já

aconteceram na minha vida e também eles e meus amigos se comunicavam comigo

falando devagar, usando palavras simples e também ensinando palavras novas que

eu não conhecia, também me ensinavam as matérias. Eu nunca tive intérprete.

Hoje que estou no 1º ano do ensino médio na escola pública que aprendi mais coisas,

pois é a primeira vez que tenho intérprete, amigos surdos e uso libras. Fiz amizade

com ouvintes e aprendi novas matérias.

Então, eu queria que os professores ensinassem de uma maneira mais simples para

os surdos, porque a gente tem um pouco de dificuldade. Quero aprender matérias

simples e a me comunicar.

I.

palavras simples e também ensina as palavras novas que não conheço, também me

ensinava as matérias. E nunca tive intérprete.

Até hoje que to no 1 ensino médio na escola pública que aprendi mais coisas, primeira vez

que teve intérprete, amigos surdos e libras, fiz amizade com ouvinte, aprendi novas

matérias.

E então eu queria que e os professores ensinam mais simples para os surdos e e, porque

agente tem pouca dificuldade, aprender matérias simples e comunicação.

I.

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Ao analisar essas e outras produções escritas e em língua de sinais feitas

pelos alunos surdos, percebi que independente do gênero solicitado, os alunos estão

sempre narrando histórias e descrevendo situações. Portanto, é a partir,

principalmente, dos textos narrativos e descritivos, citados por Santaella (2013), que

os alunos surdos produzem sentido. Por isso, mostrou-se fundamental que houvesse

um espaço no Palavreando para que as definições das palavras pudessem ser

construídas a partir da história pessoal de cada sujeito. Dessa forma, tanto a aba

vídeo, quanto a aba definição escrita, permitem que o surdo produza textos verbais e

visuais, longos e complexos.

É o que acontece nas definições da palavra “político” gravadas para compor a aba vídeo:

Figura 38 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político”, através de vídeo do aluno J.

“Políticos são homens ou mulheres,

tanto faz, que participam de grupos,

palestras, discussões. Pessoas que são

vereadoras, prefeitas, deputadas,

várias coisas, secretários. Eles vão no

Congresso Nacional, na Câmara

Municipal discutem leis, propostas e

projetos para melhorar ou as vezes

piorar a vida.”

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Figura 39 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político”, através de vídeo da aluna L.

Figura 40 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político”, através de vídeo da aluna I.

“No horário político, as pessoas

falam, falam, falam. Discutem

muito e eu tenho que ficar

esperando para assistir à novela.”

“Muitos políticos são corruptos”

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Figura 41 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político”, através de vídeo do aluno L.

Os quatro alunos que produziram os conteúdos expostos acima usaram

diferentes estratégias para compor o significado da palavra “político”. A primeira

definição trata-se de uma descrição do que é um político e do que ele faz. A segunda

diz respeito a uma opinião pessoal sobre uma atividade específica dos políticos: as

propagandas eleitorais televisivas. A terceira não traz uma definição para a palavra

“político”, mas a insere dentro de uma frase que representa um sentido que circula no

meio social em que a aluna está inserida.

Todas as definições, portanto, fazem emergir um contexto imediato de

intercâmbio social. Nele estão presentes os lugares e papéis sociais, a posição de

cada sujeito envolvido em relação aos outros, à sociedade e às formas legítimas de

interação social entre os sujeitos envolvidos.

Nesse contexto, surge também outro aspecto de extrema relevância para

a concepção do protótipo. Esse aspecto diz respeito a interação entre os usuários.

Para Bakhtin (2015 [1979], p. 379), todas as palavras (enunciados e discursos), além

de nossas, são palavras do outro.

“Na minha cidade, o prefeito foi

visitar a casa das pessoas, ele

chegou e falou com as pessoas.

Prometeu melhorar a vida, mas

ele não quer trabalhar, quer

dinheiro.

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A importância da orientação da palavra para o interlocutor é extremamente grande. Em sua essência, a palavra é um ato bilateral. Ela é determinada tanto por aquele de quem ela procede quanto por aquele para quem se dirige. Enquanto a palavra, ela é justamente o produto das inter-relações do falante com o ouvinte. Toda palavra serve de expressão ao “um” em relação ao “outro”. Na palavra, eu dou a forma a mim mesmo do ponto de vista do outro e, por fim, da perspectiva da minha coletividade. A palavra é uma ponte que liga o eu ao outro. (BAKHTIN/VOLÓCHINOV, 2017 [1929], p. 205)

Segundo Peters (2014), uma das principais maneiras pela qual o design de

interface pode apoiar a aprendizagem é facilitando a interação e a participação.

Embora a participação em si não garanta o aprendizado, os pesquisadores mostraram

que ela tende a aumentar a produtividade do grupo, melhorando os resultados da

aprendizagem (PETERS, 2014, p. 120). Por isso, corroborando a ideia de que a

aprendizagem é um processo inseparável do contexto social e que a palavra, como

discurso concreto (enunciado), “encontra o objeto para o qual se volta sempre, por

assim dizer, já difamado, contestado, avaliado, envolvido ou por uma fumaça que o

obscurece ou, ao contrário, pela luz de discursos alheios” (BAKHTIN, 2017 [1934-

1935], p. 48), mostrou-se importante que o protótipo de app permitisse aos usuários

interagirem uns com os outros, através de comentários, curtidas e em bate-papos

privados ou coletivos.

Dessa forma, a interação possibilitada por esses recursos permite que os

valores sociais expostos em cada uma das definições sejam confrontados e os

significados negociados, como vemos no exemplo a seguir, em que uma aluna

expressa sua visão sobre a imagem escolhida para representar a palavra “político23.

23 Considerando a atual conjuntura política vivenciada no país, sinto a necessidade de registrar o meu

posicionamento político, a fim de salientar que, almejando uma sociedade igualitária e, portanto,

democrática, não posso corroborar as propostas do atual governo.

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Figura 42 - Prototipagem da tela de definição da palavra “político” através de imagem.

Segundo Bakhtin/Volochinov (2017, [1929]), o enunciado se forma entre

indivíduos socialmente organizados. Nesse sentido, partindo do pressuposto de que

a palavra é sempre orientada para o interlocutor, devemos sempre considerar quem

é esse interlocutor, que posição hierárquica ele assume em relação a quem enuncia,

quem enuncia. Por isso, para discutir o(s) sentido(s) de político, devemos considerar

essa situação concreta de enunciação, que prevê um interlocutor de forma não

isolada.

Além do que já foi descrito, um dos critérios de avaliação de apps

adaptados por Farhat (2016), diz respeito ao compartilhamento. Um app educacional

ao se vincular a redes sociais, potencializam as chances de promover uma

aprendizagem situada, significativa e colaborativa, através das conexões (em rede)

com outras plataformas e com outros usuários. Dessa forma, todas as definições

produzidas no Palavreando podem ser compartilhadas em redes sociais como o

Facebook e o Instagram. Esse recurso amplia as possibilidades de significação, ao

“Esse é o presidente! Eu não gosto

do presidente ele quer acabar com

a aposentadoria! Não é?”

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passo que envolve outros interlocutores, ou seja, “opiniões comuns, pontos de vista,

avaliações alheias, acentos” (BAKHTIN, 2017 [1934-1935], p. 48).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE A TRAVESSIA

Diadorim

Arlindo Daibert

Por que era que eu estava procedendo à-toa assim? Senhor, sei? O senhor vá pondo seu perceber. A gente vive repetido, o repetido, e, escorregável, num mim minuto, já está empurrado noutro galho. Acertasse eu com o que depois sabendo fiquei, para de lá de tantos assombros... Um está sempre no escuro, só no último derradeiro é que clareiam a sala. Digo: o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia.

(ROSA, João Guimarães. Grande Sertão:

Veredas. São Paulo: Nova Aguilar, 1994, p. 85.)

Ao entrar pela primeira vez em uma sala de aula com alunos surdos e

encontrá-los concentrados em seus smartphones, me senti instigada a iniciar uma

travessia. Essa travessia, repleta de descobertas e inquietações, me conduziu à

pesquisa aqui descrita e, consequentemente, ao Palavreando, uma proposta de app

educacional construída e amparada pelas relações que estabeleci entre minha

vivência como professora de Português para surdos, os constantes diálogos de

orientação para o desenvolvimento do trabalho e o que reuni a partir dos estudos

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sobre aprendizagem móvel e, principalmente, sobre visões de língua(gem), isto é,

visões de mundo, do homem e suas relações.

Assim, se iniciei esta Dissertação convidando você, leitor, a me

acompanhar nessa travessia, proponho, agora, que vivenciemos juntos outros

caminhos – aqueles que dinamicamente se (re)constroem para que possamos tecer

os percursos que “encerram” esse trabalho, mas que certamente marcam o “início” de

muitos outros. Assim, aqui fica o convite para reflexões que, ao retomarem a

experiência vivida ao conduzir minha pesquisa, podem nos levar a novos recomeços,

a “novas” questões e desafios.

Antes de retomar os objetivos deste estudo e sucintamente retomar seus

resultados, julgo pertinente dizer que os surdos brasileiros representam

aproximadamente cinco por cento da população e, embora esse possa ser visto por

alguns como um número pequeno, entendo que não podemos enxergar pessoas a

partir de uma perspectiva quantitativa. Todos importam, em suas diferenças. Assim,

as considerações suscitadas por este trabalho envolvem questões abrangentes e de

profunda importância, que me levaram a compreender que aquilo que é

distintivamente humano em nós, ou seja, nossas capacidades de linguagem,

comunicação, pensamento e cultura, desenvolvem-se nas relações históricas e

sociais e que essas relações precisam ser constantemente alvo de reflexão, se

almejarmos viver relações de maior equidade.

Acreditava-se, há alguns séculos, conforme discuti no capítulo inicial deste

estudo, que os surdos estariam à margem das relações sociais, porque não poderiam

se comunicar com as pessoas ouvintes. Esse pensamento está sendo aos poucos

revisitado e as relações vivenciadas pelos surdos, assim como ocorre com todos nós,

estão sendo redesenhadas pelo avanço das tecnologias digitais que inauguraram um

outro modo de produzir e configurar conhecimento. Os dispositivos móveis, definidos

por Santaella (2013, p. 248) como qualquer recurso que possa ser transportado com

informações e que se mostre mais acessível, fazem emergir um ambiente digital

altamente flexível, que reúne misturas criativas do verbal e do visual e que, ao se

ampliar para outras formas de construção de sentidos, não restritas à modalidade oral,

mostra-se interessante para experiências de aprendizagem por pessoas surdas.

Sabemos que os surdos, ao adentrarem o contexto escolar ou acadêmico,

irão se confrontar com a palavra escrita. Aprender o português escrito, portanto,

revela-se um conhecimento importante, na medida em que permite ao surdo ter

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acesso a letramentos considerados relevantes socialmente, ampliando as formas de

participação social desse grupo. Não se trata, desse modo, de apenas aderir às

facilidades trazidas pelas tecnologias digitais e móveis, mas de explorar o potencial

interativo transformador que esses dispositivos podem apresentar para os processos

de aprendizagem. Para isso, é interessante que investiguemos e exploremos o

potencial hipermidiático, interacional e colaborativo das interfaces computacionais.

Nesse contexto, surgiu o desejo de investigar possibilidades de

desenvolvimento de um app que pudesse se mostrar um recurso favorável à

aprendizagem de palavras pela comunidade surda. Dessa forma, o objetivo deste

estudo foi investigar e delinear as principais características de um protótipo de app

móvel voltado à comunidade surda, cuja finalidade fosse a aprendizagem de palavras,

vista como um processo multimodalizado e discursivo de construção de sentidos em

Português. Partindo da ideia de língua/linguagem como um como um processo

multimodalizado e discursivo de construção de sentidos, o resultado do estudo

desenvolvido foi a construção de um conjunto de princípios e recursos que configuram

um protótipo de app educacional denominado Palavreando.

É importante salientar que a natureza discursiva, multimodal, colaborativa

e interativa da proposta de app aqui delineada só foi definida a partir de um longo

processo de investigação, conduzido junto aos participantes e, assim, de natureza não

linear. Ao longo deste trabalho, busquei relatar a construção desse processo e, assim

sendo, sigo abaixo recapitulando brevemente como se delineou este estudo.

No primeiro capítulo, contextualizei brevemente a história da educação de

surdos, evidenciando que, no Brasil, as discussões sobre translinguismo e diversidade

são muito recentes, o que significa que há ainda muito a ser feito em relação aos

contextos minoritários e minoritarizados, invizibilizados ao longo de muitos séculos.

Além disso, busquei afirmar a importância de se refletir sobre as línguas que

constituem esses contextos e o papel fundamental que a aprendizagem de Português

assume dentro de uma sociedade que é marcadamente grafocêntrica.

Ainda no primeiro capítulo, numa tentativa de caminhar no sentido contrário

às práticas de letramento da escola convencional que congela as formas de

representação e construção de sentido, busquei situar o potencial dos app

educacionais móveis para a aprendizagem dentro do estágio em que nos

encontramos, nomeado por Santaella (2013) como estágio da conexão contínua.

Com vistas a responder à pergunta de pesquisa colocada para este

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trabalho discuti, no segundo capítulo, o recente e desafiador campo da Aprendizagem

móvel, estabelecendo relações com os estudos sobre os Novos multiletramentos e os

Paradigmas da aprendizagem. Além disso, discuti as bases dialógicas e discursivas

da visão bakhtiniana de linguagem, em especial suas teorizações em torno da palavra,

compreendida em sua acepção mais ampla, como enunciado e discurso. A fim de

perceber como essas bases teóricas poderiam ser materializadas dentro de um app,

descrevi alguns critérios de avaliação de apps educacionais, voltados ao ensino e à

aprendizagem de línguas, propostos por pesquisadores da área.

No terceiro capítulo, relatei o meu percurso metodológico que não poderia

assumir outro caráter, senão processual e horizontalizado. Considerando o sujeito

bakhtiniano que emerge na enunciação, entendida como um processo em que o eu

se constitui através do outro e como outro do outro, o processo de produção dos

dados, bem como o olhar direcionado a eles, foi (re)pensado e (re)constituído ao longo

da pesquisa, a partir da interação e colaboração constantes entre mim e os sujeitos

desse estudo.

Os surdos que, por muitos anos, viram suas vidas serem determinadas por

escolhas feitas por ouvintes, adotaram um lema conhecido como “nada sobre nós,

sem nós”. Dentro dessa perspectiva e considerando o campo transdisciplinar da LA,

seria incoerente e contraditório realizar esta pesquisa sem que os surdos ocupassem

um lugar de destaque no delineamento de cada uma das características que

configuram a proposta de app.

Assim, no quarto capítulo, buscando afinar as teorias que deram base a

esse trabalho com o que a leitura cuidadosa e minuciosa dos dados produzidos fez

emergir, apresento e analiso as principais características do Palavreando que se

estabeleceram, principalmente, a partir das noções de multimodalidade,

palavra/enunciado, contexto e colaboração. Se tomarmos o ensino-aprendizagem de

línguas na perspectiva bakhtiniana devemos considerar que a palavra só ganha vida

em uma situação concreta de enunciação. Devemos ainda levar em conta que cada

palavra exala um contexto (BAKHTIN, 2017 [1934-1935], p.69). Esses contextos são

inúmeros e não podem ser artificiais, como entendidos em abordagens tradicionais.

Dessa forma, para que essas teorizações estivessem presentes na

proposta de app aqui apresentada, criamos espaços para que situações concretas de

enunciação possam ser realizadas. Assim, as definições das palavras, atreladas ao

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sinal em Libras, poderão ocorrer através de exemplos concretos de uso, a partir de

vídeos e frases em que os alunos surdos terão a possibilidade de narrar ou descrever

situações, em Libras e/ou em Português escrito, colocando a palavra em sua

existência concreta e viva. Isso permitirá, futuramente, que possamos analisar,

compreender quem está falando, com quem, em que situação etc, uma vez que

através de comentários e bate-papos, os alunos poderão interagir, negociar e

colaborar para a construção dos sentidos.

Um app móvel tende a ser visto como um objeto fechado e acabado, no

entanto, em se tratando do âmbito educacional, o Palavreando, bem como outros apps

que sirvam a esse propósito devem ser vistos como recursos em eterna construção.

O Palavreando materializa apenas algumas das muitas questões, ideias e convicções

que surgiram durante a minha travessia em busca de estratégias mais sensíveis às

necessidades educacionais dos surdos. Chego à etapa “final” desse trabalho com o

entendimento de que essa proposta ganhará (mais) vida na continuação desse trajeto,

ou seja, quando os meus alunos e a comunidade surda estiverem com seus

smartphones nas mãos, (re)construindo colaborativamente suas definições para as

palavras em Português e, consequentemente, enunciando suas visões de mundo.

Desse modo, chego final desse trajeto com a sensação de inacabamento. Mas essa

sensação não se revela como algo negativo para mim, no entanto. Desse

inacabamento emergem outras questões e outras dúvidas, como também se revelam

outros percursos ainda a serem vividos.

Finalizo este capitulo com uma convicção: se por um lado o convívio diário

com surdos me fez perceber nossa vulnerabilidade diante das limitações biológicas e,

especialmente, daquelas impostas pelos processos sociais e culturais, por outro, o

desenvolvimento desta pesquisa me apresentou a possibilidade de revisitar minhas

verdades e me ofereceu uma concepção completamente inesperada da linguagem,

fazendo-me perceber a força que temos para nos adaptar e também de resistir e

encontrar maneiras outras de estar no mundo.

Eu atravesso as coisas – e no meio da travessia não vejo! – só estava era entretido na idéia dos lugares de saída e de chegada. Assaz o

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senhor sabe: a gente quer passar um rio a nado, e passa; mas vai dar na outra banda é num ponto muito mais embaixo, bem diverso do em que primeiro se pensou. Viver nem não é muito perigoso?

(ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas.

São Paulo: Nova Aguilar, 1994, p. 42.)

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ANEXOS

ANEXO I:

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DE

APLICATIVOS DIRECIONADOS À

APRENDIZAGEM MÓVEL

PROPOSTA DE AVALIAÇÃO DE

APLICATIVOS MCQUIGGAN; KOSTURKO; MCQUIGGAN E SABOURIN (2015)

1. Propósito 1. Propósito

1.1 O aplicativo atende às necessidades

do usuário/aprendiz em relação aos conteúdos

disponíveis?

1.1 O aplicativo atende às minhas

necessidades, como educador/usuário, para a lição na

palma da

mão?

1.2 O aplicativo ofereceu atividades demos

ou descrições detalhadas de seus conteúdos e atividades

para que

o usuário possa experimentar e identificar se aquele app é

realmente adequado às suas necessidades ou não?

2. Alinhamento: 2. Alinhamento:

2.1 O aplicativo avalia o nível de

conhecimento do usuário na língua estrangeira, antes de

iniciar o uso a fim de saber seu nível de conhecimento na língua?

2.1 O aplicativo se encaixa no padrão da

minha escola?

2.2 O aplicativo oferece conteúdos

claros (gramaticais, compreensão oral e escrita,

vocabulário),

adequados e com diferentes graus de dificuldade, baseados

na proficiência do usuário?

2.2 O aplicativo está de acordo com o

currículo escolar?

2.3 Em relação ao nível de proficiência

do usuário, o conteúdo oferecido, o tempo para a

realização das

tarefas e a quantidade de tentativas até a finalização foi

adequado?

2.3 O aplicativo possui níveis de

dificuldades apropriados para os alunos?

2.4 Os conteúdos dos aplicativos se

mostraram significativos motivadores dentro de suas

propostas?

3. Personalização: 3. Personalização:

3.1 O aplicativo permite ou exija que o

usuário crie logins?

3.1 O aplicativo permite aos usuários a

criação de logins?

3.2 O aplicativo oferece ao usuário a criação

de um perfil com possibilidade de escolher, de acordo com

seus objetivos as habilidades no idioma estrangeiro que

gostaria de trabalhar/focar?

3.2 O aplicativo oferece ao usuário

diferentes experiências de aprendizagem baseadas em seus

interesses?

3.3 O aplicativo realiza periodicamente

pesquisas de opinião sobre seu conteúdo, a fim de que o

usuário de posicione, direcione e contribua com o material

que será disponibilizado?

3.3 O aplicativo oferece diferentes desafios

baseados nas habilidades e conhecimentos do usuário?

3.4 O aplicativo realiza desafios

relacionados aos conhecimentos adquiridos pelo usuário e

assim moldar o

conteúdo para mais complexo ou mais fácil diante dos

resultados (por exemplo: testes)?

3.5 O aplicativo permite que o usuário crie

um plano de estudo?

4. Compartilhamento e acesso: 4. Compartilhamento e acesso:

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4.1 O trabalho criado e realizado pelo usuário

no aplicativo pode ser exportado ou compartilhado em redes

sociais?

4.1 O que acontece com o trabalho criado

no aplicativo? Pode ser exportado ou compartilhado nas

mídias

sociai

s?

4.2 O aplicativo está ligado a uma rede

social, ou outros meios de compartilhamento de

conhecimento de fácil acesso ao usuário?

4.2 O trabalho é armazenado nas nuvens?

Pode ser acessado por computadores?

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4.3 A forma de armazenamento on-line

do aplicativo permite que ele seja acessado em

outros dispositivos, sejam eles móveis ou não

(desktops),

trabalhando com a portabilidade e facilitando o acesso do

usuário ao conteúdo para estudar?

4.3 É possível ver relatórios de atividades e

acessos de alunos/usuários?

4.4 O aplicativo disponibiliza ao usuário

relatórios de atividades e relatórios de evolução do usuário

ao longo do uso?

4.5 O aplicativo disponibiliza recursos para

que os aprendizes interajam entre si (trabalho com

aprendizagem compartilhada)?

4.6 O aplicativo permite que os usuários

realizem atividades simultâneas entre si, que incentivem a

colaboração e trabalho em equipe (ex: jogos, competições, testes, tarefas)?

5. Facilidade no uso/usabilidade: 5. Facilidade no uso/usabilidade:

5.1 O aplicativo é bem desenhado/projetado,

ou seja, o design é interativo e simples (“user-friendly”),

onde o usuário consiga intuitivamente entendê-lo?

5.1 O aplicativo é bem desenhado?

5.2 O usuário é capaz de iniciar o processo

de uso do aplicativo sem orientação?

5.2 A navegação no aplicativo é lógica e

simples?

5.3 O aplicativo oferece suporte ao usuário,

ou seja, oferece ícones de ajuda quando ele tiver alguma

dúvida em relação a algo do app como um todo?

5.3 O aplicativo oferece ao usuário

navegação de forma intuitiva, ou seja, sem orientação

prévia?

5.4 O aplicativo permite, facilita a

realização das tarefas por meio dos dispositivos

móveis?

6. Privacidade e segurança: 6. Privacidade

6.1 O aplicativo possui política de

privacidade, ou seja, os dados pessoais e gerados pelo

usuário ao longo do uso do aplicativo são compartilhados

ou mantidos em sigilo e de forma responsável?

6.1 O aplicativo possui política de privacidade?

6.2 O aplicativo possui mecanismos de

segurança (senhas, logins) adequados para que o usuário

tenha suas informações seguras?

6.2 Os dados do usuário são

compartilhados, vendidos ou mantidos em

privacidade?

6.3 Os dados dos usuários coletados

são mantidos de forma responsável?

7. Uso Social do aplicativo 7. Uso Social do aplicativo

7.1 O aplicativo é financeiramente acessível

ou gratuito?

7.1 O aplicativo é razoavelmente barato

ou totalmente gratuito?

7.2 O aplicativo foi considerado um

bom investimento?

7.2 O aplicativo pode ser considerado um

bom investimento?

7.3 O tamanho do aplicativo é apropriado para

o dispositivo móvel onde ele é oferecido, ou seja, o tamanho

dos

arquivos, softwares do aplicativo são adequados

permitindo acessibilidade e mobilidade?

7.3 A rede disponibilizada permite que o

app seja acessado de forma adequada e

satisfatória?

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7.4 O aplicativo apresenta ferramentas

adequadas para anotações e lembretes?

7.4 O tamanho do app é apropriado?

7.5 As mídias utilizadas e disponibilizadas

pelo aplicativo (áudio, vídeo, animações) para a

aprendizagem

podem ser acessadas por pacotes de dados ou wifi, sem

problemas com carregamentos? Sistema leve e compatível.

7.5 O aplicativo é frequentemente atualizado?

7.6 O uso do aplicativo ocorre somente com acesso à internet?

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7.7 O aplicativo possui atualização constante

como forma de melhorar o programa e os conteúdos oferecidos aos usuários?

8. Âmbito Pedagógico: 8. Âmbito Pedagógico:

8.1 O aplicativo oferece ao usuário feedbacks

de suas ações (visuais ou auditivos)?

8.1 O aplicativo oferece feedback

apropriado e imediato?

8.2 O aplicativo trabalha com o usuário a

capacidade de associar, planejar, hipotetizar, entre outras,

de maneira efetiva?

8.2 O aplicativo fornece uma experiência de

aprendizagem amparada (scaffolding)?

8.3 O aplicativo disponibiliza outras formas

de informações/aprendizagem (links, sites, bate-papos)

que permitam ao usuário navegar em busca de outras

fontes de conhecimento e não só as disponibilizadas no app?

8.3 O app facilita o desenvolvimento de

habilidades relacionadas às funções mentais superiores?

8.4 O aplicativo providencia experiências

autênticas que se espelham no mundo real? (Por exemplo,

anotação no app e anotação com caneta no caderno)

8.5 O aplicativo faz a tarefa na “palma da

mão” mais eficiente?

8.6 O aplicativo transforma as tarefas em

mais atrativas?

8.7 O aplicativo facilita e

possibilita a colaboração?

9. Acessibilidade

9.1 O aplicativo está disponível em diversas

plataformas para acesso? 9.2 O aplicativo permite ao aluno acessar

as referências de acessibilidade nos dispositivos móveis a

serem usado

s? 9.3 O suporte necessário ao idioma

encontra-se disponível?

9. Modos de Aprendizagem:

9.1 As atividades propostas favorecem o

condicionamento, a repetição e a formação de hábitos

linguísticos em detrimento de propostas mais

contextualizadas, que explorem a criatividade?

9.2 As atividades trazem evidências de

aprendizagem programada, ou seja, de procedimentos pré-

orientados para um reforço positivo imediato, com vistas

ao máximo de acertos por parte do usuário?

9.3 As atividades evidenciam uma visão

de linguagem como estrutura?

9.4 As atividades propostas favorecem o uso

de capacidades de associar, hipotetizar, planejar, etc., e

que explorem a criatividade?

9.5 As atividades evidenciam uma visão

de linguagem com construção de sentidos?

9.6 O aplicativo trabalha atividades de

vocabulário, gramática, compreensão oral e escrita de

forma contextualizada, partindo do texto e não de modo

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isolado?

10. Aprendizagem Significativa/Situada e Letramentos Críticos:

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10.1 O aplicativo oferece conteúdos que

auxiliem na aprendizagem individual do usuário, ou seja, conteúdos flexíveis, amigáveis e adaptáveis?

10.2 O aplicativo permite aos

usuários descarregar e publicar uma multiplicidade

de recursos multimidiáticos enquanto trabalham em

grupo ou estão realizando outras atividades

(Letramento multimodal)?

10.3 O aplicativo oferece mecanismos de

desenvolvimento para que os usuários aprendam e se

identifiquem em meio a comunidades de prática, ou seja,

em contextos considerados mais autênticos,

significativos e colaborativos de aprendizagem (Letramento intercultural)?

10.4 O aplicativo traz textos sem adaptações

ou são utilizados textos adaptados, em sua maioria?

10.5 O aplicativo oferece a possibilidade de

recebimento de feedbacks de outros usuários a todo o

momento, quando o usuário solicitar, por meio de bate-

papos, chats, fóruns (letramento intercultural)?

10.6 O aplicativo apresenta ao usuário

situações de uso da língua que dêem a ele autonomia para

entender e

discernir em quais situações utilizar o conhecimento

aprendido (Letramento em rede)?

10.7 O aplicativo apresenta diversidade de

gêneros discursivos?

10.8 O aplicativo permite que o

aprendiz/usuário siga caminhos determinados por ele, ou

seja, crie atividades para si dentro de seu contexto, evitando

que se

repitam sempre os mesmos padrões determinados pelo

aplicativo (Letramento Crítico móvel)?

11. Pluralidade de Língua, linguagens,

cultura e Letramentos Críticos:

11.1 O aplicativo apresenta pluralidade

cultural e de linguagens, por meio da diversidade de

exemplos em

diferentes atividades sociais, grupos sociais e eventos

culturais (Letramento visual, intercultural)?

11.2 O aplicativo apresenta diversidade

étnica, racial, de gênero e de cultura por meio de textos

verbais e não verbais (Letramento visual, intercultural)?

11.3 O aplicativo evidencia diversas formas

de cultura ou sempre trabalha com a cultura denominada

padrão, estereotipada por meio de textos escritos e imagéticos

(Letramento visual, intercultural)?

11.4 O aplicativo trabalha com habilidades

integradas ou de maneira segmentada (escrita-fala) (letramentos multissemióticos)?

12. Agentividade e Letramentos Críticos:

12.1 O aplicativo permite que expandamos o

limite do caráter opinativo para uma reflexão sobre

implicações sociais das posições que assumimos

(Letramento móvel Crítico)?

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12.2 O aplicativo promove o

questionamento das temáticas trazidas/apresentadas a

partir de diferentes perspectivas (Letramento em Rede)?

12.3 O aplicativo promove o

questionamento sobre o senso comum e os estereótipos,

por meio de textos escritos e imagéticos (Letramento

visual, intercultural)?

12.4 O aplicativo promove a oportunidade

para o usuário criar, ao invés de repetir padrões (Letramento

Móvel Crítico)?

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13. Gramática e Vocabulário

13.1 O vocabulário é trabalhado de forma

multimodalizada (vídeos, imagens, áudios e outros

recursos multimodais)?

13.2 O aplicativo se restringe à norma

culta quando trabalha com gramática?

13.3 O aplicativo trabalha com vocabulário,

de forma contextualizada, abordando variações?

13.4 O aplicativo permite marcar palavras

e/ou criar listas de palavras?

13.5 O aplicativo permite a criação de hipertextos?

13.6 O aplicativo trabalha com habilidades

integradas ou de maneira segmentada (textos orais e

escritos)?

14. Leitura, escrita, produção e compreensão

oral

14.1 O aplicativo oferece correções em

relações à escrita e propõe maneiras de memorizar as

formas corretas e quando utilizá-

las?

14.2 O aplicativo disponibiliza atividades de

escrita que identificam grafia errada e guiam para a

correção, que pode ocorrer por meio da oralidade ou outras

formas de dicas reconhecidas pelos dispositivos?

14.3 O aplicativo oferece atividades que

trabalhem pequenos turnos de fala-escrita?

14.4 O aplicativo trabalha com a conversação

e escrita assíncrona? (escrita virtual por meio de fóruns

ou compartilhament

os)

14.5 O aplicativo trabalha com a

conversação e escrita síncrona?

(negociação/conversação entre usuários ocorre em tempo real).

15. Jogos

15.1 O aplicativo trabalha com jogos e

sistemas de recompensas que estimulam o usuário de forma

desafiadora

e significativa, permitindo o trabalho das dimensões

linguística, sociocultural e pragmática?

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ANEXO II:

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (PARTICIPANTE

MAIOR DE IDADE)

EDUCAÇÃO DE SURDOS E PARTICIPAÇÃO SOCIAL: TECNOLOGIAS MÓVEIS

NO ENSINO DE PORTUGUÊS PARA SURDOS

Pesquisadora Responsável: Jéssica Vasconcelos Dorta

Número do CAAE:

Você está sendo convidado a participar como voluntário de um estudo. Este documento,

chamado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, visa assegurar os seus direitos e deveres

como participante e é elaborado em duas vias: uma que deverá ficar com você e outra com a

pesquisadora.

Por favor, leia com atenção e calma, aproveitando para esclarecer suas dúvidas. Se houver

perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você poderá esclarecê-las com a pesquisadora.

Se preferir, pode levar para casa e consultar seus familiares ou outras pessoas antes de decidir

participar. Se você não quiser participar ou se quiser cancelar sua participação, a qualquer

momento, não haverá nenhum tipo de penalização ou prejuízo.

Justificativa e objetivos:

A utilização das tecnologias digitais móveis (smartphones, tablets, notebooks, pen drives, etc.)

no ensino/aprendizagem de línguas ainda precisa de estudo e pesquisa. Acredita-se que é

importante, para os estudos da linguagem e seu papel na educação, investigar a relevância do

uso dessas tecnologias nas práticas pedagógicas, principalmente, na educação da comunidade

surda. Dessa forma, por se tratar de um estudo voltado para a educação de um grupo minoritário,

percebe-se que a investigação proposta neste projeto justifica-se por sua atualidade e relevância

no âmbito educacional.

O objetivo geral do estudo é investigar como a apropriação das tecnologias digitais móveis pode

(ou não) contribuir para o processo de aprendizagem de português como segunda língua por um

grupo de jovens surdos inseridos no programa “Surdez: desenvolvimento e inclusão”. Os

objetivos secundários são: a) Identificar o perfil, as necessidades e as expectativas de um grupo

de alunos surdos pertinentes ao contexto de ensino-aprendizagem de português como segunda

língua; b) Observar atividades que envolvam o uso de tecnologias digitais móveis

desenvolvidas no programa bilíngue de apoio escolar a crianças surdas e analisar, a partir dos

discursos dos alunos, como esse uso auxiliou o processo de aprendizagem do português como

segunda língua e c) A partir dessas informações, delinear um projeto de aplicativo móvel que

auxilie o processo de aprendizagem de português como segunda língua pela comunidade surda.

Procedimentos:

Serão aproveitadas as atividades de leitura/escrita rotineiras desenvolvidas no programa

“Surdez: desenvolvimento e inclusão”, para introduzir discussões sobre o uso das tecnologias

móveis e verificar como elas são acessadas. Serão registradas em vídeo e em diário de campo a

maneira como os alunos usam essas tecnologias ou como recorrem a elas no momento de ler ou

escrever sobre temas que serão levados para a discussão durante as atividades do referido

Programa.

Participando do estudo, você estará sendo convidado a responder um questionário online, de

Perfis e Necessidades, aplicado no primeiro atendimento pedagógico de agosto nos quinze

minutos iniciais. Além disso, você também será convidado a participar de uma entrevista semi-

estruturada em grupo sobre o uso das tecnologias móveis nas atividades realizadas no programa

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e nas atividades diárias, sejam elas escolares ou não, com duração de cerca de meia hora, no

último atendimento pedagógico de dezembro, no final do semestre.

Desconfortos e riscos:

Apesar de não haver riscos previsíveis é garantido que você pode cancelar sua participação na

pesquisa a qualquer momento, caso venha a se sentir constrangido ou desconfortável com

alguma situação, seja esta decorrente da filmagem, da abordagem e/ou do tempo gasto para

participação no estudo sem qualquer penalidade. Você é livre para recusar a participação e/ou

interromper a participação deste a qualquer momento. A sua participação é voluntária e não

compromete de nenhuma maneira a sua participação no programa.

Benefícios:

Este estudo apresenta vantagens potenciais aos sujeitos participantes no que diz respeito ao uso

de tecnologias digitais móveis, voltado não só para a aprendizagem de português, mas para o

acesso à comunicação e à multiplicidade de informações. Ainda que os dispositivos móveis

propiciem uma aprendizagem mais individualizada, pretende-se incentivar o processo de

aprendizagem em grupo. Também será dado um retorno, através da divulgação do trabalho final

resultante deste projeto de pesquisa, para os alunos do programa, bem como para a comunidade

surda e, para outros possíveis interessados, a fim de que reflitam sobre suas práticas de ensino

e aprendizagem.

Armazenamento de material:

A participação neste estudo envolve gravação em vídeo e geração de dados. Após a finalização

da pesquisa, os vídeos e os dados gerados ficarão sob a guarda da pesquisadora responsável, de

sua orientadora e coorientadora, dentro do banco de dados do programa “Surdez:

desenvolvimento e inclusão”, até a finalização do estudo, em dezembro de 2016.

Sigilo e privacidade:

Ao assinar este termo, você terá a garantia de que sua identidade será mantida em sigilo e

nenhuma informação será dada a outras pessoas que não façam parte da equipe de

pesquisadores. Na divulgação dos resultados desse estudo, o seu nome não será citado, bem

como nenhuma informação que possa identificá-lo.

Ressarcimento:

A participação no estudo não acarretará em nenhum tipo de custo pra você e não será disponível

nenhuma compensação financeira adicional, uma vez que toda a pesquisa será realizada no

período compreendido pelo programa “Surdez: desenvolvimento e inclusão” do qual você

participa.

Contato:

Em caso de dúvidas sobre o estudo, você poderá entrar em contato com Jéssica Vasconcelos

Dorta pelo endereço Rua Roxo Moreira, 137, cep 13083590, Campinas, estado de São Paulo,

Brasil, telefone: 012 9 8132 2487 ou através do e-mail: [email protected]. Em caso

de denúncias ou reclamações sobre a participação de seu(ua) filho(a) no estudo, você pode

entrar em contato com a secretaria do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP): Rua: Tessália Vieira

de Camargo, 126; CEP 13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19) 3521-

7187; e-mail: [email protected]

Consentimento livre e esclarecido:

Após ter sido esclarecida sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios

previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, aceito participar:

Nome do participante: .

Autorizo a gravação em vídeo: ( )Sim ( )Não

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Data: / / .

(Assinatura do participante ou nome e assinatura do responsável)

Responsabilidade do Pesquisador:

Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares na

elaboração do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma cópia deste documento ao responsável pelo

participante. Informo que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi

apresentado. Comprometo-me a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa

exclusivamente para as finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento

dado pelo responsável e com o assentimento do participante.

(Assinatura do pesquisador)

Data: / / .

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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (PARTICIPANTE

MENOR DE IDADE)

EDUCAÇÃO DE SURDOS E PARTICIPAÇÃO SOCIAL: TECNOLOGIAS MÓVEIS

NO ENSINO DE PORTUGUÊS PARA SURDOS

Pesquisadora Responsável: Jéssica Vasconcelos Dorta

Número do CAAE:

O menor pelo qual você é responsável está sendo convidado a participar como voluntário de

um estudo. Este documento, chamado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, visa

assegurar os direitos e deveres dele como participante e é elaborado em duas vias: uma que

deverá ficar com você e outra com a pesquisadora.

Por favor, leia com atenção e calma, aproveitando para esclarecer suas dúvidas. Se houver

perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você poderá esclarecê-las com a pesquisadora.

Se preferir, pode levar para casa e consultar outros familiares ou outras pessoas antes de decidir

participar. Se você não quiser que o menor participe ou se quiser retirar sua autorização, a

qualquer momento, não haverá nenhum tipo de penalização ou prejuízo.

Justificativa e objetivos:

A utilização das tecnologias digitais móveis (smartphones, tablets, notebooks, pen drives, etc.)

no ensino/aprendizagem de línguas ainda precisa de estudo e pesquisa. Acredita-se que é

importante, para os estudos da linguagem e seu papel na educação, investigar a relevância do

uso dessas tecnologias nas práticas pedagógicas, principalmente, na educação da comunidade

surda. Dessa forma, por se tratar de um estudo voltado para a educação de um grupo minoritário,

percebe-se que a investigação proposta neste projeto justifica-se por sua atualidade e relevância

no âmbito educacional.

O objetivo geral do estudo é investigar como a apropriação das tecnologias digitais móveis pode

(ou não) contribuir para o processo de aprendizagem de português como segunda língua por um

grupo de jovens surdos inseridos no programa “Surdez: desenvolvimento e inclusão”. Os

objetivos secundários são: a) Identificar o perfil, as necessidades e as expectativas de um grupo

de alunos surdos pertinentes ao contexto de ensino-aprendizagem de português como segunda

língua; b) Observar atividades que envolvam o uso de tecnologias digitais móveis

desenvolvidas no programa e analisar, a partir dos discursos dos alunos, como esse uso auxiliou

o processo de aprendizagem do português como segunda língua e c) A partir dessas

informações, delinear um projeto de aplicativo móvel que auxilie o processo de aprendizagem

de português como segunda língua para esse público.

Procedimentos:

Serão aproveitadas as atividades de leitura/escrita rotineiras desenvolvidas no programa

“Surdez: desenvolvimento e inclusão”, para introduzir discussões sobre o uso das tecnologias

móveis e verificar como elas são acessadas. Serão registradas em vídeo e em diário de campo

a maneira como os alunos usam essas tecnologias ou como recorrem a elas no momento de ler

ou escrever sobre temas que serão levados para a discussão durante as atividades do referido

Programa.

Participando do estudo, o menor estará sendo convidado a responder um questionário online,

de Perfis e Necessidades, aplicado no primeiro atendimento pedagógico de agosto nos quinze

minutos iniciais. Além disso, ele também será convidado a participar de uma entrevista semi-

estruturada em grupo sobre o uso das tecnologias móveis nas atividades realizadas no programa

e nas atividades diárias, sejam elas escolares ou não, com duração de cerca de meia hora, no

último atendimento pedagógico de dezembro, no final do semestre.

Desconfortos e riscos:

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Apesar de não haver riscos previsíveis é garantido que você pode retirar seu consentimento a

qualquer momento se o menor se sentir constrangido ou desconfortável com alguma situação,

seja esta decorrente da filmagem, da abordagem e/ou do tempo gasto para participação no

estudo sem qualquer penalidade. Você é livre para recusar a participação e/ou interromper a

participação deste a qualquer momento. A participação é voluntária e não compromete de

nenhuma maneira a participação dele no programa.

Benefícios:

Este estudo apresenta vantagens potenciais aos sujeitos participantes no que diz respeito ao uso

de tecnologias digitais móveis, voltado não só para a aprendizagem de português, mas para o

acesso à comunicação e à multiplicidade de informações. Ainda que os dispositivos móveis

propiciem uma aprendizagem mais individualizada, pretende-se incentivar o processo de

aprendizagem em grupo. Também será dado um retorno, através da divulgação do trabalho final

resultante deste projeto de pesquisa, para os alunos do programa, bem como para a comunidade

surda e, para outros possíveis interessados, a fim de que reflitam sobre suas práticas de ensino

e aprendizagem.

Armazenamento de material:

A participação neste estudo envolve gravação em vídeo e geração de dados. Após a finalização

da pesquisa, os vídeos e os dados gerados ficarão sob a guarda da pesquisadora responsável, de

sua orientadora e coorientadora, dentro do banco de dados do programa “Surdez:

desenvolvimento e inclusão”, até a finalização do estudo, em dezembro de 2016.

Sigilo e privacidade:

Ao assinar este termo, o menor pelo qual você é responsável terá a garantia de que sua

identidade será mantida em sigilo e nenhuma informação será dada a outras pessoas que não

façam parte da equipe de pesquisadores. Na divulgação dos resultados desse estudo, o nome

dele não será citado, bem como nenhuma informação que possa identificá-lo. Ressarcimento:

A participação no estudo não acarretará em nenhum tipo de custo pra você e não será disponível

nenhuma compensação financeira adicional, uma vez que toda a pesquisa será realizada no

período compreendido pelo programa “Surdez: desenvolvimento e inclusão” do qual o menor

participa.

Contato:

Em caso de dúvidas sobre o estudo, você poderá entrar em contato com Jéssica Vasconcelos

Dorta pelo endereço Rua Roxo Moreira, 137, cep 13083590, Campinas, estado de São Paulo,

Brasil, telefone: 012 9 8132 2487 ou através do e-mail: [email protected]. Em caso

de denúncias ou reclamações sobre a participação de seu(ua) filho(a) no estudo, você pode

entrar em contato com a secretaria do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP): Rua: Tessália Vieira

de Camargo, 126; CEP 13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19) 3521-

7187; e-mail: [email protected]

Consentimento livre e esclarecido:

Após ter sido esclarecida sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios

previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, autorizo a participação do

menor:

Nome do menor participante:

Nome do responsável legal: RG:

Autorizo a gravação em vídeo: ( )Sim ( )Não

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Data: /_ / . (Nome

e assinatura do responsável)

Responsabilidade do Pesquisador:

Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares na

elaboração do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma cópia deste documento ao responsável pelo

participante. Informo que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi

apresentado. Comprometo-me a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa

exclusivamente para as finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento

dado pelo responsável e com o assentimento do participante.

(Assinatura do pesquisador)

Data: / / .

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ANEXO III:

Aula 38

20 de agosto de 2015

Tema: Memes

Para iniciarmos a atividade, eu mostrei a eles uma série de memes famosos

do ano de 2015. Os alunos já conheciam os memes, porque esse tipo de imagem

circula com frequência nas redes sociais, mas não sabiam explicar exatamente o que

era e também não imaginavam que pudessem produzir esse tipo de conteúdo.

Analisamos e interpretamos cada um dos memes que eu apresentei e nem

todos foram compreendidos, uma vez que os alunos surdos têm bastante dificuldade

com as palavras em português. Um dos memes que eles não entenderam, por

exemplo, foi o meme em que aparece a imagem do Chapolin Colorado dizendo: Eu

até poderia fazer uma piada com os políticos, mas eles roubariam a graça.

A compreensão do meme do Chapolin ficou comprometida, porque os

alunos confundiram a palavra “graça”, com “gratuito”, ou seja, algo que é ou se tem

“de graça”. Além disso, alguns desconheciam a palavra “políticos”. Mesmo depois de

apresentar a eles o sinal referente a essas palavras em Libras, apenas a aluna G.

conseguiu estabelecer a relação entre políticos e corrupção, o que me faz refletir sobre

o quanto as barreiras da língua interferem também na participação social desses

alunos. Não estar ciente dessa relação é estar alheio à sociedade, à cidadania. Isso

me deixa preocupada.

O conceito de meme é um conceito instável, por isso não há uma definição

exata. O importante é compreender a importância da imagem escolhida, o que ela

expressa, o tom humorístico das mensagens veiculadas e o tema.

Depois de analisarmos uma série de memes, fomos ao laboratório de Imacs

do IEL para que os alunos pudessem navegar na internet e realizar pesquisas. Pedi a

eles que pesquisassem memes sobre surdos ou sobre o contexto da surdez. Ao

realizarem essa pesquisa, os alunos perceberam que provavelmente quem fazia esse

tipo de meme eram ouvintes, já que eles estavam reproduzindo uma série de

estereótipos sobre essa comunidade. Essa etapa da atividade foi muito importante

para que eles percebessem que eles precisam desenvolver algumas habilidades para

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começarem a participar efetivamente dessas redes sociais, não apenas como

usuários passivos, mas como produtores de conhecimento.

Depois disso, ensinei a eles a usar o Webmaker que envolve a linguagem

da internet, html5, para produzir os memes. Eles produziram memes muito

interessantes não só sobre a cultura surda, mas sobre a vida de cada um deles.

Depois de finalizarmos a produção de memes, os alunos quiseram criar

uma conta no Instagram para poderem publicá-los. Além disso, alguns deles também

publicaram em suas próprias redes sociais, o que me deixou bastante contente, uma

vez que um dos objetivos dessa atividade é que eles pudessem de fato ter uma

participação mais efetiva nessas redes sociais.

Essa aula foi bastante interessante porque pude perceber ainda mais a

urgente necessidade por alguma estratégia de ensino que permita a eles conhecerem

o significado de uma palavra e toda relação que ela tem com o mundo de uma maneira

mais significativa. Além disso, eles precisam aprender a ler criticamente as imagens.

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Todos os teóricos da surdez falam muito que o surdo é um sujeito visual e exploram

muito pouco essa visualidade.

Ao final das aulas sempre deixo que os alunos usem seus smartphones

conectados à internet, de maneira livre, para observar como eles estão usando esse

artefato. Em quase todas as aulas, eles tiram fotos individuais e em grupo e postam

no Facebook. Rolam a tela e observam de forma rápida o feed de notícias. Param

para ver imagens e fotografias. Voltam a rolar a tela. Quando mostrei a eles os vídeos

produzidos em Libras pela TV Ines, me espantou saber que nenhum deles os

conhecia.

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ANEXO IV:

Aula 45

15 de setembro de 20

Tema: Fanfic

Com o intuito de compreender como os alunos faziam pesquisas na

internet, pedi a eles que me explicassem o conceito de Fanfic. Todos eles recorreram

à Pesquisa Google e ao Google Imagens digitando a palavra “Fanfic” ou “O que é

Fanfic?”, no entanto, os resultados levaram a sites com explicações em Português

contendo outras palavras desconhecidas por eles, como por exemplo: “ficcional”,

“midiático”. Alguns deles me mostraram imagens contendo notebooks, livros, etc, mas

não sabiam de fato qual era a relação das imagens com Fanfics. Perguntei a eles,

então, o que eles faziam quando precisavam fazer trabalhos em casa, sem a presença

de intérprete ou de professor, e quando a Pesquisa Google ou o Google Imagens não

eram suficientes para fazê-los compreender o significado das palavras. A resposta:

“desistimos”. Uma das alunas me mostrou a imagem a seguir:

Pedi a ela que me explicasse o que havia na imagem e o que ela poderia

inferir sobre o conceito de Fanfic a partir dela. A aluna, embora tenha descrito que

se tratava de alguém escrevendo uma história, não conseguiu elaborar uma resposta

para o que era Fanfic. Após explicar em libras que Fanfic era um texto construído

colaborativamente e mostrar aos alunos alguns exemplos disponíveis em sites da

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internet, eles compreenderam o conceito. A aluna N, então, perguntou se era por

isso que o texto da imagem estava escrito em cores diferentes. Ou seja, se cada cor

representava um autor diferente.

Depois de discutirmos e compreendermos o que era uma fanfic nos

reunimos em círculo para eleger um tema para que o grupo pudesse produzir uma

história colaborativa. O tema escolhido foi eleições. Dessa forma, criamos um grupo

no Facebook para poder iniciar o texto que reproduzo a seguir:

Vale ressaltar que eu iniciei a narrativa e L. e R., alunos de estágio, estavam

observando o grupo e também participaram.

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J.: Em um dia muito, muito quente, Sandy, Junior, Chitãozinho e Xororó

estavam caminhando na Lagoa do Taquaral. Fazia muito calor e a lagoa estava seca.

Eles pararam em um quiosque para comprar uma água de côco e se assustaram

quando foram pagar a conta. 10 reais. 10 reais cada uma. Um absurdo!

Voltaram a caminhar e um pouco mais a frente encontraram Luan Santana, Michel

Teló, Gustavo Lima, Jorge e Mateus...

L.: Jorge e Mateus, Luan Santana, Michel Teló e Gustavo Lima estavam

muito cansados de andar pela lagoa e procuravam um lugar para beber água, mas

não encontraram. Quando viram Sandy, Junior, Chitãozinho e Xororó, foram perguntar

se eles sabiam onde tinha água. Ninguém sabia, porque fazia tempo que o bebedouro

foi quebrado. Jorge e Mateus tiveram uma ideia de tentar melhorar a lagoa. E

resolveram se reunir para fazer uma manifestação. Foram chamar vários amigos para

apoiar a ideia.

I.: Eles foram chamar o prefeito shelbourne ( prefeito de ta chovendo de

hambúrguer), e porque ele tem ideia pra ajudar, pois ja teve experiência, aconteceu

antes q faltava comida na cidade, só comiam sempre peixes..... como ele era magro

e baixinho, um geek criou maquina feito de comidas, aconteceu a chovendo comidas

e prefeito engordou muito por isso.... ate ele pode ter ideia chovendo aguas q estava

faltando....

L2.: Jorge e Mateus,chamaram o Dylan O´brien pra fazer reunir de

manifestação.

J.: Shrek e Fiona que estão sempre conectados no facebook e adoram

passear na lagoa decidiram criar um evento para convidar todos a irem na

manifestação!

R.: Então a Sandy e Junior combinaram que iriam todos aparecer na Av.

Francisco de Glicério, para fazer a manifestação em prol do Hamburguer e água....E

todos foram e deu a maior confusão porquê....

I.: ..... porque gordos quer mais hambúrguer, magros quer aguas por isso

deu muito confusão ..... (kkkkkk)

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L2.: Eles estão com sede querem agua,não querem mais hamburguer ja

encheram a barriga kkk

I.: eles manifestam, e votam em eleição, e shelbourne quem foi eleito....

conseguiram resolver, mais hambúrgueres e mais aguas .....

J.: Além do problema da falta de água, a cidade de Campinas tinha vários

outros problemas: os ônibus estavam velhos, as ruas esburacadas, faltava emprego...

J2.: e então o prefeito de Springfield, Diamond Joe Quimby, era amigo do

Shelbourne apareceu na reunião dos manifestante c a ideia de aumentar onibus

novos, ruas novas, mais empregos, mais igualdade para os cidadãos ...

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ANEXO V:

Aula 52

15 de outubro de 2015

Tema: Grupo focal 1

Nesse grupo focal, conversamos sobre as implicações das tecnologias

digitais, em especial das móveis para a aprendizagem do surdo. No geral, os alunos

disseram que durante o programa bilíngue eles usaram celular, computador e

notebook e que isso ajudou bastante o processo de aprendizagem, porque através

dessas tecnologias eles puderam fazer pesquisa, ver vídeos e imagens, etc.

Eles acham que seria importante que os professores usassem essas

tecnologias em sala de aula. Quando perguntei aos alunos sobre a presença de

imagens durante as aulas, eles responderam que o uso de smartphones e tablets era

proibido dentro da sala de aula, por isso as únicas imagens com as quais eles tinham

contato eram as presentes nos livros didáticos. Além disso, relataram que os

professores vão pouquíssimas vezes à sala de recurso e quando isso acontece,

normalmente, é apenas para exibir filmes. A aluna L. relatou que a professora de

Biologia costumava exibir vídeos na sala de aula, mas esses vídeos não eram

legendados, por isso ela tinha muita dificuldade em compreendê-los. Uma vez,

inclusive, ela exibiu um vídeo com conteúdo para prova e a aluna L. foi muito mal por

conta disso.

A aluna N. disse que na escola dela os professores colocam legenda, mas

usam muito pouco esse recurso. Para ela, seria mais interessante estudar em uma

escola de surdos, porque na escola onde ela estuda, uma das alunas ouvintes

reclamou que a professora estava mostrando muitos vídeos e, então, a professora

passou a mostrar menos vídeos.

A mesma aluna me perguntou: "Jéssica, será que se eu falar com a

professora, a diretora e o diretor para eu usar o celular para pesquisar eles deixam?

Falar para eles confiarem em mim que eu não vou usar o "Zap"?"

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Após realizarmos o grupo focal sobre as percepções dos alunos surdos em

relação as possibilidades que as tecnologias móveis trazem para a aprendizagem,

pedi a eles que escrevessem um texto, em formato de carta, para algum professor,

expondo o que eles acreditavam ser uma educação de qualidade para o surdo. O

objetivo era fazer com que eles refletissem sobre o próprio processo de

aprendizagem e sobre como eles gostariam que os professores usassem as

tecnologias em sala de aula. Durante a produção textual, a aluna M recorreu ao

dicionário do ProDeaf para confirmar a grafia das palavras “intérprete” e

“importante”. A aluna conhecia a letra inicial de cada palavra e tinha uma ideia da

imagem da palavra. Por isso, ela procurou cada uma delas através das letras

iniciais e, então, conferiu a grafia. No entanto, a aluna não clicou na palavra para

conferir o sinal e por isso acabou se confundindo. Ao invés de “intérprete”, escreveu

“interpretação” e ao invés de “importante”, M. escreveu “importação”.

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ANEXO VI:

AULA TESTE

18 de maio de 2017

Tema: discutindo o Palavreando

Depois de alguns meses, retornei ao programa bilíngue para conversamos

um pouco a respeito da proposta de app. Após apresentar a prototipagem das telas e

relembra-los do objetivo do app, mostrei novamente o meme do Chapolin (anexo III)

e pedi a eles que construíssem suas próprias definições de políticos. Deixei que eles

ficassem livres para escolher em qual modalidade iam produzir as definições.

Deixei meu notebook sobre a mesa para que os alunos pudessem usá-lo

para pesquisar imagens ou o que quisessem. A aluna G., então, inseriu a palavra

político na Pesquisa Google e seguiu para o Google Imagens. Apareceu uma série de

imagens e ela abriu uma imagem do presidente Temer. No momento em que G.

mostrou a imagem aos demais, a aluna L. comentou que ela não gostava do atual

presidente, pois ele queria acabar com a aposentadoria.

Após a atividade, os alunos mostraram uns aos outros as definições que

eles fizeram, a fim de que todos pudessem colaborar e produzir sentidos sobre a

palavra “político”. Esse “teste”, que simulou o uso do Palavreando, me fez acreditar

ainda mais no potencial que essa proposta de app traz para a comunidade surda.

Espero que, de fato, ela venha a se concretizar para que dela emerjam reflexões que

irão auxiliar pesquisadores e professores na compreensão de quem são esses alunos

e como eles estão produzindo sentido.

Depois do teste, expliquei a eles as formas nominais do verbo (infinitivo,

particípio e gerúndio) para que eles pudessem compreender o significado do nome

Palavreando, isto é, que as definições das palavras no app serão construídas de forma

processual e colaborativa, a partir do que cada um vive em relação a determinada

palavra. Após a compreensão dessa característica fundamental ao app, os alunos

concordaram com o nome dado a ele e criaram um sinal para nomeá-lo em Libras. O

sinal que dá nome em Libras ao Palavreando é a junção dos sinais PALAVRA +

LIBRAS, como vemos na imagem abaixo desenhada pelo aluno J.:

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