jean plaidy - a saga dos platagentas vol.01 - prelúdio de sangue

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Ttulo: A Saga dos Plantagenetas, volume 1: Preldio de Sangue.Autor: Jean Plaidy.Ttulo original: The Plantagenet Prelude.Dados da edio: Editora Record, Rio de Janeiro, 1993.Gnero: romance.Digitalizao: Dores Cunha.Correco: Edith Suli.Estado da obra: corrigida.Numerao de pgina: rodap.

Esta obra foi digitalizada sem fins comerciais e destina-se unicamente leitura de pessoas portadoras de deficincia visual. Por fora da lei de direitos de autor,este ficheiro no pode ser distribudo para outros fins, no todo ou em parte, ainda que gratuitamente.

Contracapa: A ascenso de Henrique II ao trono ingls marcou o alvorecer da era Plantageneta. Preldio de Sanguereconstitui a trajetria do monarca: suacoroao, o assassinato do arcebispo deCanterbury Thomas Becket e o conflituosocasamento com Eleanor de Aquitnia que,ferida e humilhada por Henrique, plantano corao dos filhos a sementeda vingana...

Obras da autoraA Srie Lucrcia BorgiaA madona das sete colinasLucrcia Borgia

A Saga dos PlantagenetasPreldio de sangue - Livro IO crepsculo da guia - Livro IIO corao do leo - Livro iiiO prncipe das trevas - Livro IVA batalha das rainhas - Livro VA rainha de Provence - Livro VIEduardo I- Livro VIIAs loucuras do rei - Livro VIIIO juramento do rei - Livro IxPassagem para Pontefract - Livro XA estrela de Lancaster - Livro XIEpitfio para trs mulheres - Livro XIIA Rosa Vermelha de Anjou - LIvro XIIISol em Esplendor - Livro XIV

PRELDIO DE SANGUEJEAN PLAIDYTraduo de LUIZ CARLOS DO NASCIMENTO SILVA5a EDIOEDITORA RECORDRIO DE JANEIRO, 1997.Ttulo original: The plantagenet prelude Copyright (c) 1976 by Direitos exclusivos de publicao em lngua portuguesa para o Brasil adquiridos pela DISTRIBUIDORA RECORD DE SERVIOS DE IMPRENSA S.A. Rua Argentina 171 - Rio de Janeiro, RJ-20921-380-Tel.: 585-2000 que se reserva a propriedade literria desta traduoImpresso no BrasilISBN 85-01-03597-1

SUMRIOELEONORE E HENRIQUEDuquesa e RainhaPetremelle e o CondeOs Amantes de AntioquiaO Divrcio RealRainha da InglaterraHENRIQUE E THOMASA Vontade do ReiA Bela RosamundA Ascenso de BecketA Noiva AbadessaA S VagaA Tempestade CrescenteO Triunfo do ReiFuga da InglaterraA Casa de Vero de RosamundA Campina do TraidorAssassinatoO Remorso do Rei

ELEONORE E HENRIQUEDuquesa e RainhaDE UMA JANELA do castelo de L Ombrire, o duque de Aquitnia olhava o que se passava embaixo no roseiral sombreado. Era uma cena que o deixava encantado. Suas duas filhas - ambas jovens encantadoras, embora a mais velha das duas, Eleonore, sobrepujasse, em beleza, a irm Petronelle - estavam cercadas por membros da corte, rapazes e moas, decorativos e elegantes, ouvindo naquele momento o menestrel que cantava sua cano de amor.Os olhos do duque pousaram em Eleonore, pois ela estava ao centro do grupo. Uma certa qualidade fazia com que ela se destacasse dos demais. No era s a beleza, nem tampouco a sua posio social. Era, afinal de contas, a herdeira de Aquitnia at que o duque gerasse um filho homem e, como ele era vivo, teria que agir depressa se quisesse fazer aquilo porque, embora tivesse apenas 38 anos, j perdera duas esposas, e o nico resultado daqueles dois casamentos eram suas duas filhas, Eleonore e Petronelle. Eleonore era alta e bonita; havia algo nela de imponncia; tinha o aspecto de uma pessoa nascida para governar. Havia tambm sensualidade. O duque suspirou, pensando no pai, cuja vida tinha sido dominada pela devoo ao sexo oposto, e imaginando se sua atraente filha no iria sair ao av sob aquele aspecto.13Ela estava com quatorze anos de idade, e Petronelle era trs anos mais moa. No entanto, havia nas duas, mesmo na pequena Petronelle, um ar de amadurecimento. Quantoa Eleonore, estava pronta para o casamento. E se qualquer coisa acontecesse a ele antes de que o evento tivesse lugar, quem iria proteg-la? O duque a imaginou emum roseiral s seu, cercada por seus menestris e pelas damas de sua corte; e um pretendente entrando no castelo a cavalo. Para atra-lo, haveria no apenas as imensasterras e fortuna de Eleonore, mas tambm a fascinante Eleonore. E se ela se recusasse a se casar? Ele conhecia os hbitos da poca. A bela donzela seria raptada, mantida prisioneira, deflorada se no cedesse de boa vontade, e colocada numa posio tal que a famlia ficaria ansiosa por cas-la com o seu estuprador.Era difcil imaginar um destino daqueles para Eleonore. No entanto, at ela poderia ser obrigada a submeter-se.O duque agradeceu a Deus o fato de as coisas no terem chegado quele ponto. Ali estava ele, um homem de 38 anos, com duas filhas atraentes. Precisava casar-se e gerar um filho homem. No entanto, e se se casasse e no houvesse filho algum? Como era frequente no surgirem herdeiros! Por que lhe haviam sido dadas apenas filhas? Como era costume entre os homens de sua poca, ele se perguntava se Deus no o estaria punindo pelos seus pecados ou, talvez, pelos pecados de seus antepassados.Seu pai fora um dos mais famosos pecadores de sua poca. As mulheres tinham sido a sua derrocada. Abandonara a mulher e instalara a amante com grande pompa, chegando at a mandar gravar uma imagem dela em seu escudo. Guilherme, o nono duque de Aquitnia, no dera importncia para as convenes e, embora o maior motivo de sua vida tivesse sido correr atrs das mulheres, isso era uma qualidade - ou defeito, dependendo do ngulo de observao- bastante comum, e ele ficou mais conhecido pelo amor poesia e s canes. O estado ideal do duque fora ficar deitado com a amante do momento e ouvir o dedilhar da harpa e as canes, que com frequncia eram de sua autoria, cantadas pelos seus menestris. Ele era chamado de o Pai dos Trovadores, e Eleonore herdara o seu talento nessa parte; ela escrevia um poema, musicava-o, tocava-o e atraa para si os melhores intrpretes do ducado. O que mais ela herdara do av? Percebendo a expresso naqueles grandes olhos lnguidos ao pousarem em vrios cavalheiros bem-apessoados, o duque refletia.14O que tinha a fazer era arranjar um filho logo e encontrar um marido para Eleonore. Mas nenhum dos dois projetos podia ser realizado sem muita reflexo. Um marido para Eleonore agora, quando era a herdeira, poderia ser fcil de arranjar, mas era preciso ter em mente que ela poderia perfeitamente perder a sua posio se o pai tivesse um filho homem. E para ter um filho, primeiro teria que arranjar uma esposa! No que isso apresentasse muita dificuldade. O que ele precisava era de uma mulher frtil. E a estava o cerne da questo. Quem poderia dizer, enquanto um homem no se casasse, se a sua mulher iria dar-lhe um filho homem? E se se casasse para descobrir que a moa era estril ou s tinha condies de lhe dar filhas?Era este o dilema do duque. Deveria casar-se outra vez e tentar ter um filho homem? Ou deveria aceitar Eleonore como herdeira da Aquitnia? E o marido dela, se ela se casasse? Estava perfeitamente claro que, se continuasse sendo a herdeira da Aquitnia, s havia um marido que seria digno dela, e era o filho do rei de Frana. O duque estava cheio de dvidas enquanto apreciava a cena no jardim.O duque mandou chamar Eleonore. Porque ela era inteligente e sabia ler e escrever - uma faanha rara -, porque ela j parecia considerar-se a governante em potencial da Aquitnia, porque sua mente era gil e devia ser to admirada quanto sua beleza, ele vinha falando com a filha havia algum tempo como se falasse com alguns de seus ministros.Eleonore passou do sol quente para o que, comparando-se as duas temperaturas, parecia o frio do castelo, franzindo o nariz um pouco, porque o cheiro dos juncos, depois do aroma do roseiral, no tinha nada de agradvel. Iria mandar o criado purificar o ar. Aquilo deveria ter sido feito h uma semana. Os juncos ficavam muito depressa com um cheiro desagradvel.O pai estaria em seus aposentos, ao qual se chegava por uma escada que ficava ao fundo do grande salo. Aquele salo era o principal cmodo do castelo. Estendia-se de uma ponta outra e subia at os caibros do telhado. Os aposentos ducais eram pequenos, se comparados com ele, pois era no salo, com suas grossas paredes de pedra e janelas estreitas, que a corte passava a maior parte do tempo. Ali, cortesos danavam, tocavam harpa e cantavam; ali, as damas ficavam sentadas e bordavam enquanto contavam histrias15e cantavam suas canes; e como o castelo no podia acomodar todos, eles moravam em casas que ficavam prximas, onde podiam atender prontamente os chamadosda corte.Eleonore subiu a escada para os aposentos do pai.O duque se levantou quando ela entrou e, colocando-lhe as mos sobre os ombros, atraiu-a para si e beijou-lhe a fronte.- Minha filha, gostaria de falar com voc.- Foi o que pensei, papai, j que o senhor me pediu para vir at aqui.Havia pessoas que poderiam ter dito "mandou". Eleonore tinha que ser solicitada, nunca mandada, e gentilmente atendia ao pedido.O pai sorriu-lhe. Ele no aceitaria de outra forma.- Sabe, Eleonore, minha querida filha, estou muito preocupado.- Qual o motivo?- No tenho um herdeiro homem. Ela ergueu a cabea, orgulhosa.- E por que iria precisar de um herdeiro homem, quando tem uma filha?- Sim, uma bela filha. No me interprete mal. Estou ciente de suas qualidades. Mas parece que os homens obedecem aos homens.- Faremos com que compreendam que h momentos em que, para o bem deles, devero obedecer a uma mulher.Ele sorriu.- No tenho dvidas de que voc faria com que compreendessem isso.- Ento, papai, o senhor no precisa se preocupar. Venha para o jardim e ouvir meus menestris cantando minha mais recente cano.- Estou certo de que irei gostar, minha querida filha. Mas os meus ministros me sugerem que meu dever est no casamento.Os olhos de Eleonore brilharam de uma raiva repentina. Outro casamento! Um meio-irmo para deserd-la! Aquilo era uma coisa que ela faria tudo o que pudesse para evitar. Adorava aquela bela terra de Aquitnia. O povo a adorava. Quando ela saa do castelo, as pessoas deixavam seus chals para v-la, para fazer muitas saudaes sinceras. Acreditava que eles nunca dedicariam tamanho calor a ningum mais, a no ser a ela. Oh, era mulher, e talvez o seu16sexo agisse contra ela; mas o seu av, o duque Guilherme IX, adorara mulheres, idealizara mulheres; institura as Cortes do Amor; escrevera poemas e compusera canes em favor do amor, e as mulheres tinham sido o fator mais importante de sua vida. Ento, por que a prxima pessoa a governar a Aquitnia no poderia ser uma duquesa, em vez de um duque? Era aquilo que o povo queria. Ela mesma queria; e Eleonore j havia decidido que conseguiria tudo que quisesse.- E se o senhor se casasse - bradou ela -, como poderia estar certo de que iria conseguir esse herdeiro a quem d tanta importncia?- Estou satisfeito com as minhas filhas. - Ele se acovardara diante da fria dela, que era ridcula. Ele, pai e duque, sendo intimidado por uma garota, e ainda porcima sua filha! Por que devia sentir aquela necessidade de acalm-la? - So os meus ministros...- comeou ele, delicado.- Ento, os seus ministros precisam cuidar da vida deles.- Minha querida filha, isso um assunto que interessa ao ducado- Pois muito bem, case-se, e juro que dentro de muito pouco tempo estar fazendo uma peregrinao ao santurio de algum santo para pedir um casamento frtil.- Uma peregrinao?- o costume. Mas tenho dvidas quanto ao senhor Ter pecados pelos quais responder, papai. Precisa tanto de redeno quanto meu av.- Nunca levei a vida que ele levou.- Os pecados dele foram cometidos nas Cortes do Amor. H outros pecados pelos quais preciso responder. O senhor ofendeu a muita gente, papai. Pode ser que as preces de seus inimigos sejam atendidas, preces que pedem castigo, e no as suas, que pedem perdo de seus pecados.- Minha filha, voc faz com que tudo se transforme em vantagem para voc.- Talvez eu esteja com a verdade. Sempre fui uma pessoa que gostou de falar com franqueza, e serei sempre assim.- Pois ento vamos falar com franqueza. Voc a herdeira de Aquitnia e est decidida a no perder esse direito.- o que desejo, e em mim isso natural. Eu seria uma governante incompetente se no ficasse contrariada ao perder aherana.17Se o senhor se casar e houver um filho homem, estarei deserdada. O povo iria lamentar isso.- No, ele no lamentaria o fato de eu lhe dar um duque.- Primeiro, preciso que consiga o seu duquezinho, e Deus j lhe mostrou, em dois casamentos, que para o senhor s vm filhas.- Se voc acredita nisso, no ficar perturbada diante da perspectiva de que eu me case.- Ficarei perturbada com o seu desapontamento, papai. Ele riu.- Minha querida Eleonore, voc j uma diplomata. E s tem quatorze anos!- Usei plenamente meus quatorze anos, e algo me diz que Deus nunca lhe dar um filho homem.- Voc se tornou profetisa, ento?- No. Tantos senhores de sangue real se casam na tentativa de terem filhos homens! O rei da Inglaterra, por exemplo: pense em como ele lutou por um filho. E o que aconteceu? O casamento foi estril. Ali estava um homem que espalhara seus filhos bastardos por todas as regies da Inglaterra e da Normandia, mas que teve um nico filho legtimo que morreu afogado no mar, e ele nunca pde gerar outro. Deus recusou-se a atender ao seu mais caro pedido, como bem poder negar o seu. Acredito que Henrique da Inglaterra se arrependeu do segundo casamento. De que adiantou? No lhe deu exatamente aquilo pelo qual ele se casou. Filhos homens.- Ele foi um homem que teve uma vida de grande imoralidade.- Ele e seu pai eram parecidos quanto a isso. Talvez ele no tenha se arrependido o suficiente e, assim, os cus no atenderam s suas splicas.- Eu no sou Henrique I da Inglaterra.- No, papai, no . Mas ficou contra o papa. Pode ser que ele esteja pedindo aos cus que no atendam aos seus pedidos, exatamente por isso.O duque ficou em silncio. Ele prprio havia pensado naquilo. Ser que os cus estariam contra ele por ter apoiado Anacleto II contra Inocncio II, quando quaseo mundo inteiro concordava que Inocncio era o verdadeiro papa? com o tempo, vira-se obrigado a ceder, mas aquilo seria lembrado contra ele. Quando Henrique da Inglaterra morrera e Estvo de Blois se proclamara rei, o duque se unira a Geofredo de Anjou e tentara dominar a Normandia e levar aquele perturbado ducado para Geofredo, marido de Matilda,18filha de Henrique, que muitos diziam ter mais direito Inglaterra- e Normandia - do que o presunoso Estvo. E o que acontecera? Uma amarga derrota!Ele, tal como o pai, nunca fora homem de se dedicar guerra. A Aquitnia vinha sendo mantida havia geraes, e seu povo gozava de uma vida pacfica. O duque odiava a guerra. No conseguia esquecer a viso de homens morrendo sua volta; as lamentaes, de partir o corao, de mulheres e crianas retiradas de seus lares.Talvez ele tivesse, mesmo, ofendido a Deus e que, at receber a absolvio, no pudesse alimentar esperana de ter um filho?Queria explicar quela sua vivaz filha o motivo pelo qual desejava um herdeiro homem. Queria que ela compreendesse as dificuldades que uma mulher poderia encontrar. Eleonore nunca encontraria, porque no via dificuldade alguma. Mas elas estavam l.Queria ver um filho tornar-se maduro, um filho que tomasse as rdeas do governo em suas mos antes que o pai morresse. Isso faria com que a Aquitnia continuasse em paz.Teve, ento, a ideia que havia ocorrido a tantos outros antes dele. Precisava aplacar o seu Deus, e a nica maneira de faz-lo era ir em peregrinao para prestar homenagem aos santurios dos santos. Os pecadores mais ardorosos conseguiam absolvio daquela maneira. Ele, o dcimo duque Guilherme de Aquitnia, iria seguirlhes o exemplo.- O que preciso fazer, filha, partir em peregrinao. Irei visitar um santurio e, l, conseguirei o perdo de meus pecados. Aps, ento, voltarei e me casarei, e Deus me conceder a bno de um filho homem.Eleonore apertou os olhos.A peregrinao no seria realizada numas poucas semanas; depois, viria o problema de escolher uma esposa adequada.Era sempre melhor adiar o mal o tempo que fosse possvel. Havia muita coisa a ser feita antes que o pai pudesse se casar e gerar um filho.Alguma coisa dizia a Eleonore que ele nunca conseguiria.Houve a agitao dos preparativos. Uma vez tomada a deciso, o duque Guilherme sentia-se de esprito tranquilo. Iria viajar at o santurio de So Tiago de Compostella, e ali rezaria por um casamento frtil. A filha observava os preparativos com uma certa satisfao cnica, como se soubesse que suas preces no seriam atendidas.19De certo modo, ele se sentia pesaroso, pois amava muito a filha. Admirava-a, como faziam todos aqueles que reconheciam sua personalidade dominadora. Se ao menos ela tivesse sido do sexo masculino, o duque no teria pedido nada mais. Queria que Eleonore compreendesse que s fracassara por ser mulher. E no que ele pensasse assim; tal como o pai, ele admirava muito o fato de ela ser mulher, mas precisava pensar nos outros.Naquele momento, ela era a herdeira de vastas possesses. A rica Aquinia poderia ser dela e, com isso, coloc-la no comando de um territrio to grande quanto o que pertencia ao rei de Frana. Era verdade que eles eram vassalos do rei de Frana, mas apenas no nome. Os reis de Frana sabiam que os duques de Aquitnia exerciam tanto poder - e talvez mais - quanto eles. Era por simples formalidade que os duques se curvavam diante do rei.- A viagem at Compostella perigosa - disse o duque filha, certo dia. - isso que d a certeza de que aqueles que chegarem at l, pela prpria natureza rdua da viagem, tero suas preces atendidas.- O senhor um tolo ao correr tais riscos.- Acho que meu dever.- Dever! Mas faa a viagem, se o quiser. E veja qual ser o resultado.- Quem dera que Deus achasse que isso no necessrio, Eleonore. Penso em voc, sempre. Acho difcil afastar-me de voc.- A escolha foi sua - retrucou ela, com frieza.- Minha, no, mas daqueles para com os quais tenho um dever. Levarei poucos homens comigo.- No seria apropriado viajar em grande pompa em uma misso dessas, papai.- E vou deixar meus homens mais valentes para proteg-la.- Eu sei me proteger.- No custa nada ter uma guarda corajosa. E irei conversar com o rei de Frana, pois ele ficar ansioso por vir ajud-la, se voc pedir.- O senhor confiaria nele?- Confiaria, se o filho dele fosse meu e se minha filha fosse dele.- Est falando em casamento!- Estou. Um casamento entre voc e o filho do rei de Frana. Ela soltou um sorriso. Ora, no era uma perspectiva desprezvel.20Se ela fosse abrir mo da Aquitnia, seria rainha de Frana.Lus VI era to grande, que era conhecido como Lus, o Gordo. No era possvel que fosse viver muito tempo ainda. Em Aquitnia infiltravam-se rumores de que estavaconfinado ao leito e que, devido ao seu imenso tamanho, ningum conseguia levant-lo. Ele gostara demais de comer, e o resultado fora aquele. O filho era cerca de um ano mais velho do que Eleonore. Ela gostava do que ouvira falar do jovem Lus. Seria facilmente governado por uma esposa dominadora. E ela precisava casar-se logo. S ela sabia o quanto estivera perto de se submeter aos ardores de alguns de seus admiradores. Outras meninas eram mulheres aos quatorze anos de idade. Eleonore de Aquitnia era uma delas. Era uma felicidade o fato de ser ambiciosa e orgulhosa; aquilo evitava que se deixasse levar por seus intensos desejos fsicos.Eleonore, mais do que ningum, sabia que, para ela, o casamento- no deveria demorar muito.- Quando eu voltar, minha filha, irei me casar; e ento dever haver um casamento duplo. Quando minha noiva vier para a Aquitnia, voc ir para a corte de Frana.- Mas ser que o rei de Frana iria querer que o filho se casasse comigo se eu no fosse sua herdeira?- O rei de Frana ir regozijar-se com uma aliana com a rica Aquitnia. Ele suficientemente astuto para saber o quanto ela vale. E no h alianas que se comparem com as forjadas por laos matrimoniais.Ela concordou, sria, com um gesto da cabea.A perspectiva era brilhante, mas Eleonore estava em dvida. Se pudesse levar a Aquitnia para o marido, teria uma recepo calorosa. Mas, e se ocorresse o contrrio?Foi num dia frio de janeiro que o duque partiu para Compostella.As duas filhas estavam no ptio, envoltas em seus mantos forrados de zibelina, para desejar-lhe boa viagem.- Adeus - disse o duque, abraando primeiro Eleonore e depois Petronelle. - Deus as proteja.- melhor pedirmos a Ele que o proteja, papai - disse Eleonore.- Ele sorrir de satisfao com a minha misso, fiquem seguras disso. Quando voltar estarei livre da minha carga de pecado.Eleonore ficou calada; sugerira ao pai que a viagem fosse adiada,21porque era tolice partir no inverno. Acreditara que era sempre melhor adiar aquilo que se esperava que nunca acontecesse. Mas o duque estava certo da urgnciada situao e no quis pensar em adiamento.- Ele vai sofrer por causa de sua tolice - confiou Eleonore a Petronelle.Ela concordou com a irm, porque Petronelle, como muitas outras, adorava a estonteante irm mais velha.Quando o cortejo, com as patas dos cavalos ecoando nas pedras, deixou o ptio, Eleonore e a irm subiram para o torreo mais alto, para de l ver o seu avano.Nunca se teria adivinhado que era o duque de Aquitnia que cavalgava frente. Estava humildemente vestido, como cabia a um peregrino, e levava muito poucos de seus homens junto.O castelo era bem fortificado, e Eleonore era a sua senhora. Se qualquer pessoa ousasse atac-la, haveria cavaleiros decididos a proteg-la. E ningum ousaria atac-la, pois no estava ela meioprometida ao filho do rei de Frana?Foi uma poca de espera, uma poca em que a grande fogueira no centro do salo lanava sua fumaa para o teto abobadado e o cheiro de carne de veado tostada enchia o castelo. Fazia frio demais para brincadeiras nos belos jardins; era-se obrigado a contentar-se com o salo do castelo; e ali as pessoas comemoravam e danavam; cantavam baladas; dedilhavam suas harpas, e as doces notas do alade eram ouvidas por todo o castelo.Sobre os divertimentos reinava a ousada e bela Eleonore. Muitos dos homens galantes suspiravam pelos seus favores, e muitas vezes ela pensou em atend-los; mas, por enquanto, eles teriam que se contentar em cantar o amor.Assim, enquanto o duque Guilherme atravessava as geladas estradas a caminho de Compostella, Eleonore reinava absoluta, cercada por seus trovadores. Poderia estar destinada a tornar-se a rainha de Frana, mas era a primeira Rainha dos Trovadores.O duque Guilherme percebeu, logo, o quanto fora imprudente ao partir no inverno. As estradas acidentadas estavam cobertas de gelo; o vento era cortante. Valentes, os cavalos esforavam-se para avanar, mas o progresso era lento. No entanto, o duque disse ao seu pequeno grupo de peregrinos que o fato de sofrerem essas dificuldades significa que mais prontamente os pecados deles seriam perdoados.22Qual seria o objetivo de viajar com conforto? Como poderiam esperar que os pecados deles fossem perdoados se no sofressem pela redeno deles?Quando caa a escurido, eles descansavam onde estivessem. s vezes, era num castelo; outras, na modesta casa de um campons.O duque pensava muito no castelo de Ombrire e imaginava Eleonore no grande salo, a lareira brilhando sobre seu orgulhoso rosto bonito; os rapazes a seus ps, observando-a com nsia nos olhos. Aquele poder que havia nela iria atrair os homens at o fim da vida. Era mais outro dos traos herdados por aquela jovem ricamente dotada. Sabia cuidar de si mesma. Esse era o grande consolo do duque. Eleonore chefiaria outras pessoas; ningum a obrigaria a fazer o que no quisesse. O duque pensou nela - aqueles olhos grandes que sabiam ser especulativos quando ela pensava no futuro, e tristes quando ouvia as canes de seus trovadores, aqueles cabelos espessos que lhe chegavam at a cintura, o rosto oval, a linha forte do queixo. O grande consolo do duque era que Eleonore sabia cuidar de si mesma, independente do que acontecesse.Quando ele voltasse com as bnos de So Tiago, quando se casasse e seu filho nascesse, Eleonore ainda seria um partido disputado. Ser que o rei de Frana iriaconsider-la digna de seu filho sem as ricas terras da Aquitnia?Aquilo era um assunto a ser pensado quando chegasse o momento. Primeiro, ele precisava arranjar o filho. No, pensou ele, primeiro precisava chegar a Compostella.O duque havia tossido muito a noite toda, e os ventos gelados lhe haviam afetado os membros, que pareciam duros e inflexveis. Aquilo passaria quando ele voltasse ao conforto do lar. No se podia esperar que uma peregrinao fosse umas frias confortveis. O santo ficaria satisfeito por ele ter suportado tais dificuldades para prestar-lhe homenagens em seu santurio. E quando o tempo mudasse e o duque pudesse voltar a viver com conforto, a tosse iria embora e a rigidez deixaria seus membros.O grupo havia atravessado a fronteira com a Espanha, mas ali o avano era bem mais difcil. O interior era habitado de forma muito esparsa, e por ser muito difcil avanar, muitas vezes eles no achavam abrigo algum quando caa a noite. O duque estava agora to fraco que seus seguidores decidiram que, na primeira oportunidade, deviam construir uma liteira para que ele pudesse ser carregado.Disposto a suportar o mximo de dificuldades, a princpio o23duque protestou. S se ele sofresse, o santo iria interceder com tal fervor que seus pecados seriam perdoados e ele atingiria seu objetivo. Mas no adiantou; ficara doente demais para permanecer montado em seu cavalo; teve que concordar.No era confortvel ser carregado por aquelas estradas acidentadas. Em pouco tempo ficou sofrendo muito, e de repente ocorreulhe a ideia de que talvez nunca chegasse ao santurio, que nunca iria acontecer o casamento que lhe daria o herdeiro para Aquitnia.Taciturno, ele contemplava o futuro enquanto era levado aos trancos.Eleonore, a mais rica herdeira da Europa e uma menina de quatorze anos. Ele deveria ter ficado satisfeito com o que lhe havia sido dado. No um filho, mas uma filhaque era to boa quanto qualquer menino, uma menina cujo nico defeito era o sexo. E porque no se contentara com o que Deus lhe dera, ele se arriscara naquela peregrinao,da qual comeava a ter dvidas se voltaria.Todos os dias, seus pensamentos sombrios voltavam a Ombrire. O que aconteceria se ele morresse? Assim que o fato se tornasse conhecido, os caadores de fortuna ficariam solta. Uma adolescente, atraente e, acima de tudo, rica ficava desprotegida, e Eleonore estava preparada para o casamento. Viriam aventureiros de todos os cantos; ele imaginava um homem ousado e ambicioso atacando o castelo, capturando a orgulhosa Eleonore e obrigando-a a submeter-se a ele. Haveria algum que pudesse peg-la fora? Sim, se tivesse ajudantes para auxili-lo a atingir seus objetivos malignos. O pensamento o deixava louco.Quem estaria l para proteg-la? Raymond, irmo do duque, estava muito longe, na Antioquia. Se ao menos Raymond estivesse por perto. Ele tinha um certo qu de heri, e o duque muitas vezes pensara que o pai teria preferido que Raymond tivesse herdado a Aquitnia. Muito alto, elegante, Raymond de Poitiers nascera para mandar. Tinha sido o cruzado ideal e agora era o prncipe de Antioquia, pois se casara com Constance, neta do grande Bohemund da primeira cruzada. Mas no adiantava pensar em Raymond, que estava na longnqua Antioquia, como protetor.Ser que ele, o duque, iria morrer? medida que cada dia ia passando, a sua convico se tornava mais forte. Estava achando cada vez mais difcil respirar; havia momentos em que no tinha certeza se estava a caminho de Compostella ou lutando pela posse da Normandia com o duque de Anjou.24Em seus momentos de lucidez, sabia que devia abandonar a esperana de chegar a Compostella. Seus pecados seriam perdoados, mas ele teria de pagar o perdo com a vida. E seus negcios precisavam estar em ordem. Precisava ter certeza de que Eleonore estava protegida.Havia uma maneira de fazer isso: pedir ajuda ao homem mais poderoso da Frana: o seu rei.Iria oferecer a sua Eleonore ao filho do rei. No tinha dvida alguma de que a oferta seria aceita com satisfao. H muito que Lus cobiava as ricas terras da Aquitnia, e aquele casamento iria lev-las para a coroa da Frana.O duque chamou at sua liteira dois dos homens em quem mais confiava.- Sigam o mais rpido possvel para Paris. Digam que vo a mando do duque de Aquitnia. Ento o rei em pessoa ir receblos. Levem esta carta a ele. Se ela for extraviada antes de chegarem at ele, digam-lhe que quero, sem demora, um casamento entre o filho dele e minha filha, pois receio que meus dias estejam contados, e se o casamento no estiver arranjado, outros podero chegar antes dele.Aps despachar os mensageiros, o duque sentiu-se de esprito mais tranquilo. Se morresse, Eleonore estaria em boas mos, com o futuro garantido.O rei Lus VI de Frana, conhecido como o Gordo, jazia na cama, a respirao difcil. Lamentava a sua condio, e no lhe servia de consolo perceber que nunca deveria ter-se deixado engordar tanto. Regalara-se com boa comida e nunca refreara o apetite, pois estava-se numa poca em que os homens eram apreciados pelo tamanho. Se se era rico, podia-se comer at mais no poder; s os camponeses passavam fome. Cabia, portanto, a um rei mostrar a seus sditos que estava em condies de consumir tanta comida quanto o corpo pudesse assimilar. Mas que nus aquilo representava para as foras de um homem!Sentia saudades de sua juventude, quando montava em seu cavalo sem esforo algum; agora, no havia cavalo suficientemente forte para transport-lo.Era tarde demais para arrepender-se. De qualquer modo, o fim estava prximo.Dizia com frequncia a seus ministros que, se ao menos tivesse25tido o conhecimento na juventude e a fora na velhice, teria conquistado muitos reinos e deixado a Frana mais rica do que quando chegara ao trono.Mas no havia um conhecido ditado que dizia: se a juventude soubesse e a velhice pudesse fazer...Ele agora precisava fazer planos para o futuro, e agradecia a Deus o fato de ter um bom herdeiro para legar ao pas.Deus havia sido bondoso para com ele quando lhe dera o jovem Lus. Era conhecido em todo o reino como Lus, o Jovem, assim como ele era conhecido como Lus, o Gordo. Ele nem sempre fora gordo, claro, como o filho tambm no seria sempre o Jovem; bastava saber-se que eram esses os apelidos pelos quais os dois eram conhecidos na poca.O jovem Lus estava com dezesseis anos - um rapaz srio, inclinado religio. Isso no era mau para um rei, refletia o pai. O jovem Lus tinha sido destinado Igreja e no ao trono, em absoluto, pois tivera um irmo mais velho. Passara os primeiros anos de vida em Notre-Dame, e gostara da vida por l. Mas tal no aconteceria. O Destino ordenara o contrrio.Bernard, o muito incmodo abade de Clairvaux, que tinha tendncias de vituperar contra todos aqueles que no se enquadrassem em suas crenas - e ningum sabia mais do que os governantes o quanto os prelados assim eram irritantes, pois no houvera sempre um certo atrito entre Igreja e Estado? -, havia profetizado que o filho mais velho do rei no usaria a coroa, e que ela caberia ao irmo, Lus, o Jovem.O rei ficara perturbado, porque Bernard tinha a reputao de fazer profecias que se tornavam realidade; e sem dvida, com aquela isso aconteceu.Certo dia, Filipe, o herdeiro, depois de caar na floresta, entrou em Paris e l um porco, ao atravessar de repente a estrada correndo, fez o seu cavalo tropear. Filipe caiu, bateu com a cabea numa pedra e morreu quase que instantaneamente.quela altura, Bernard se tornara reverenciado como um santo que previa o futuro, e o jovem Lus, muito a contragosto, fora levado de Notre-Dame para estudar a arte de ser rei.O rapaz sempre sentira saudades da vida religiosa. Talvez no fosse um mal. Um certo grau de religiosidade era bom para um rei, desde que no interferisse em seus deveres. Ele seria convocado, de vez em quando, a defender o seu reino, e o pai esperava que quando26chegasse a ocasio no tivesse escrpulos quanto a punir os que se rebelassem contra ele. O jovem Lus era demasiado delicado. E tambm precisava ter um herdeiro.Lus nunca se envolvera com mulheres. Eram muitos os rapazes de sua idade que haviam gerado bastardos quela altura. Lus, no.Agora, o rei mandou chamar o filho.Suspirou um pouco quando o rapaz parou sua frente.- Ah, filho, voc me v prostrado. Nunca satisfaa o seu apetite como eu fiz. No vale a pena.- Vejo que sim, majestade.- Sente-se, meu filho. Tenho novidades para voc. Lus sentou-se.- Meu amigo e aliado, o duque de Aquitnia, encontra-se no mesmo triste estado em que eu. Parece que nenhum dos dois vai continuar muito tempo neste mundo.O rei viu as luzes do medo surgirem nos olhos do filho. Elas no significavam tanto que ele no poderia suportar a perda do pai quanto que temia a pesada responsabilidade que aquela morte colocaria sobre seus ombros. Um rei nunca deveria ter medo de sua coroa, pensou Lus, o Gordo. Era realmente uma pena que tivesse criado o filho ligado religio. Mas como poderia esperar que o futuro herdeiro ao trono tivesse uma morte to prematura?Lus iria esquecer ter adorado as cerimnias da Igreja quando as do Estado lhe fossem impostas. Era simplesmente a expectativa do grande poder que o amendrontava.- Portanto, acho bom que voc se case, e isso sem demora. O rapaz ficou realmente com medo. Aquilo de nada serviria.Era uma pena ele nunca ter brincado com uma garota em algum lugar escondido das florestas destinadas caa. Mas mudaria quando estivesse casado com uma jovem e bela moa, e sob todos os aspectos Eleonore era essa moa.- J no sem tempo que voc arranje um herdeiro, meu filho. Tenho uma esposa para voc. Eu no poderia ter arranjado outra que me agradasse mais. O duque de Aquitnia est morte, segundo informam seus mensageiros. Ele sofreu muitas dificuldades a caminho de Compostella. Sua herdeira a filha mais velha. Ela tem quatorze anos e muito atraente. Vai haver um casamento entre vocs dois.- Casamento - gaguejou o jovem Lus -, to cedo...- Sem demora. o que o duque deseja. Ele colocou a filha27sob a minha proteo. a melhor coisa que poderia ter acontecido Frana. Eleonore a herdeira de todos os domnios do duque, Poitou, Saintonge, Gascnia e o pas basco. Eu no poderia ter escolhido uma esposa mais adequada a voc.- Pai, ainda me sinto despreparado...- Bobagem, meu filho. No precisa de muita experincia para conseguir um herdeiro. Ns o colocaremos na cama com essa atraente e muito rica jovem, e voc saber o que fazer. Pense no bem que ela poder trazer para a Frana. Quanto mais terras sob a nossa proteo, menor a probabilidade de guerras. Quanto mais poderosos formos, mais poderemos trabalhar pelo bem da Frana.- A posse de terras conduz muitas vezes disputa. Elas devem ser protegidas.- Isso mesmo, e para elas devem ser feitas leis boas e inteligentes. Ser seu dever proporcionar uma vida feliz ao seu povo.O jovem Lus fechou os olhos. Por que aquilo tinha que lhe acontecer? Por que aquele porco miservel havia-lhe arruinado a vida? Filipe teria sido um bom rei; fora preparado para isso. E ele, Lus, teria passado a vida na atmosfera rarefeita da Igreja. Teria sido o Prncipe da Igreja; como adorava o cantar sonoro, a bela msica, a atmosfera santificada! E havia perdido aquilo porque Deus o convocara para cumprir o seu dever numa esfera diferente daquela para a qual havia sido preparado.- Estou enviando uma mensagem ao duque de Aquitnia dizendo que tratarei a filha dele com carinho e que no estou perdendo tempo no sentido de arranjar um casamento entre ela e meu filho.- Pai, no h como evitar isso?- No, meu filho. Esse casamento tem que acontecer sem demora.- Quanto falta para chegar ao santurio? - sussurrou o duque moribundo.- Cerca de um quilmetro, meu bom senhor.- Graas a Deus, ento, chegarei a Compostella.S um pouco mais de sofrimento a suportar, e a salvao lhe seria concedida. Quem teria pensado que ele fosse to longe e suportasse tanto sofrimento para pedir um herdeiro homem e, em vez disso, encontrasse a morte!- Mensageiros, senhor duque - disse um dos que o carregavam - Eles vm a mando do rei de Frana.28Graas a Deus, ento. Graas a Deus, repito. Quais so asnotcias?O rei, meu senhor, envia saudaes. Ele tomar conta desua filha como se fosse filha dele, porque na verdade diz que quando o senhor receber esta mensagem ela quase o ser. Porque ele est celebrando o noivado de seu filho com ela e o casamento da Frana com a Aquitnia acontecer sem demora.- vou morrer feliz - disse o duque.Ento aquela era a resposta. Eleonore estaria a salvo. Seria a rainha de Frana, e o que mais poderia o duque desejar para a filha? Ela nascera para governar - no apenas por sua herana, mas devido sua natureza. Tinha o poder inato de inspirar respeito e amor.Dizia-se que o filho do rei era um menino srio, j que fora destinado Igreja. Ele se mostrara um grande clrigo em formao, e teria sido se um porco teimoso no tivesse feito dele um futuro rei de Frana e marido de Eleonore de Aquitnia.- Ergam-me para que eu possa ver o santurio de So Tiago. Eles assim fizeram, e ele ficou contente.Desde a ausncia de seu pai, Eleonore vinha sendo a indiscutvel senhora do castelo. Durante as frias noites de inverno, ela e sua corte se colocavam ao redor da grande fogueira no centro do salo; havia cantos e msica instrumental, e ela julgava os mritos das composies literrias e, s vezes, cantava uma de sua autoria.Disso ela gostava; sentar-se entre eles, vestida com mais elegncia do que qualquer uma das outras damas, mais brilhantemente espirituosa, enquanto que a seus ps sentavam-se os cavaleiros olhando-a com adorao. A primeira lio da fidalguia era a adorao de mulheres. O romance era a maior aventura da poca. No era tanto o ponto culminante quanto as brincadeiras no percurso, embora Eleonore soubesse que aquele clmax teria inevitavelmente que ser atingido. Ela vibrava com os olhares ardentes; permitia-se sonhar com a satisfao, mas em seu corao sabia que deveria haver uma certa demora.s vezes, jogava uma partida de xadrez com um admirador, pois fazia parte da educao na corte o fato de que todo aquele que aspirasse a uma vida prendada devia, primeiro, dominar aquele jogo. Ela sempre encontrava um pouco de emoo no conflito sobre o tabuleiro; porque estava travando uma batalha e, disso, invariavelmente, saa vencedora.29Na intimidade de seu quarto de dormir, conversava com a irm. Petronelle acreditava que tudo o que Eleonore fazia estava certo. Imitava a irm mais velha em tudo. Agora, a conversa das duas girava em torno do pai. Ficavam constantemente imaginando o que estaria acontecendo a ele nas perigosas estradas.Petronelle voltou-se para Eleonore e disse:- Voc acha que ele vai voltar?Houve um olhar distante nos olhos de Eleonore; ela olhava o futuro.- Foi tolice dele, Petronelle, fazer uma viagem dessas nesta poca do ano.- Por que no esperou at o vero?- Teria sido uma viagem demasiado fcil. Tinha de ser perigosa, a fim de que ele fizesse por merecer o perdo de seus pecados.- Ele tinha tantos assim? Eleonore riu.- Ele achava que sim. Estava obcecado pelos pecados, tal qual o nosso av.- E voc, Eleonore? J cometeu algum pecado? Eleonore encolheu os elegantes ombros.- Sou demasiado jovem para ficar preocupada com pecados. S quando se est com idade para temer a morte que o arrependimento necessrio.- Por isso, no precisamos nos preocupar com arrependimento por enquanto, irm. Podemos pecar o quanto quisermos.- Que agradvel perspectiva! - bradou Eleonore.- Todos no castelo a respeitam - disse Petronelle em tom de adorao. - Acho que a adoram mais do que adoravam nosso pai. Mas se ele tornar a se casar e tivermos um irmo... - Petronelle ergueu um olhar temeroso para Eleonore, que fazia uma careta. Isso no vai acontecer, irm - continuou Petronelle, rpida. - E se ele se casasse, no conseguiria um filho.- Isso me deixa louca - bradou Eleonore. - Por que essa reverncia para com o sexo masculino? As mulheres no so mais bonitas, mais sutis, muitas vezes mais inteligentes do que os homens?- Voc, Eleonore, mais inteligente do que qualquer homem.- No entanto, porque eles se metem em batalhas, porque tm maior fora fsica, consideram-se to superiores que um filho fraco vem em primeiro lugar do que uma bela filha.30- Nenhum filho que nosso pai tivesse iria igualar-se a voc,Eleonore.- Mas ele tinha que realizar essa peregrinao na esperana de que So Tiago intercedesse em nome dele e ele pudesse voltar salvo, casar-se e conseguir um filho.- Os santos jamais iro ouvi-lo. Iro cham-lo de ingrato. Deus deu voc a ele, Eleonore, e ele no est satisfeito!Eleonore deu uma gargalhada e jogou um beijo para a irm.- Pelo menos voc me aprecia - disse ela com um sorriso. Foi at a estreita janela e olhou para a estrada gelada.- Um dia, Petronelle, veremos um grupo de cavaleiros naquela estrada. Ser meu pai voltando triunfante ou...- Ou o qu, Eleonore? - perguntou Petronelle, j ao lado da irm.Eleonore sacudiu a cabea. No diria mais nada.Poucos dias depois, um mensageiro chegou ao castelo.Eleonore, ao ser avisada de que ele fora avistado, aguardava-o no ptio para saud-lo; ela mesma estendeu-lhe a taa de vinho quente.- Trago ms notcias, minha senhora - disse ele, antes de tomar o vinho. - O duque morreu. No suportou a jornada. Tenho uma histria triste para contar.- Beba. Depois, entre no castelo - disse Eleonore.Ela o levou at o salo e sentou-se com ele ao lado da lareira. Mandou que lhe trouxessem comida, pois havia cavalgado de longe e estava exausto. Primeiro, porm, ela precisava ouvir as notcias.- Ele sofreu mais para o final, minha senhora, mas nunca se desviou de seu propsito. Ns o carregamos at o santurio, e isso o deixou feliz. Ele morreu ali, em sua liteira, mas no antes de ter recebido a bno. Foi desejo dele ser enterrado em frente ao altar principal da igreja de So Tiago.- E isso foi feito?- Foi, minha senhora.- Louvado seja Deus por ele ter morrido em paz.- A nica preocupao dele era pelo seu bem-estar.- Neste caso, ele estar feliz no cu, pois quando olhar para mim aqui embaixo saber que sei tomar conta de mim mesma.- Antes de morrer, ele recebeu uma garantia por parte do rei de Frana, minha senhora.Eleonore baixou os olhos.31Haveria um casamento. O dela. com o filho do rei de Frana. Lus, o Gordo, no teria ficado to ansioso por unir o filho a ela se ela no tivesse sido a herdeira da Aquitnia.Como poderia se lamentar? Como poderia ficar de luto? Seu pai, que havia planejado conseguir um herdeiro que a tirasse da linha de herana, j no existia. Os planos dele de nada valiam.S havia uma pessoa para herdar a Aquitnia. Era a duquesa Eleonore.O jovem Lus estava muito apreensivo. Deveria viajar Aquitnia, para se apresentar sua noiva e pedir-lhe a mo em casamento. Aquilo era uma formalidade. Os pais dos dois j haviam decidido que haveria um casamento entre eles.Como seria ela - aquela jovem que haviam escolhido para ele? Pelo menos era um ano mais moa do que ele. Muitos prncipes reais casavam-se com mulheres mais velhas do que eles. Aquilo o teria deixado horrorizado.Quem dera que ele tivesse ficado em Notre-Dame! Sentia saudades das cerimnias em que havia tomado parte, o sonoro cntico dos padres, o cheiro do incenso, o hipntico murmrio das vozes em orao. E em vez disso, haveria festanas e celebraes, e ele teria que ser iniciado nos mistrios do casamento.Gostaria de ter sido como tantos jovens; eles viviam para suas brincadeiras com as mulheres; ele os ouvira jactando-se de suas aventuras, rindo juntos, comparando suas bravas aventuras. Ele nunca poderia ser assim. Era demasiado srio; ansiava por uma vida de meditao e orao. Queria ser bom. Para os governantes, no era fcil isolar-se da vida; eles tinham que se manter no cerne dela. Diziase que os reis governavam, mas com frequncia eram governados por ministros. Tinham que ir para a guerra. A ideia de guerra o deixava aterrorizado, mais ainda do que a do amor.O rei jazia em Bthizy, e para l tinham ido os mais influentes de seus ministros, entre eles o abade Suger. O casamento entre o jovem Lus e Eleonore de Aquitnia merecera sua imediata aprovao. S poderia ser uma vantagem para o pas o fato de as ricas terras do Sul passarem para a coroa da Frana. O rei poderia estar tranquilo que seus ministros fariam tudo o que estivesse ao seu alcance para apressar o casamento.O abade Suger em pessoa providenciaria a viagem e ficaria ao lado do prncipe como principal conselheiro.32O rei, ciente de seu precrio estado de sade, estava ansioso para que o avano de Bthizy at Aquitnia fosse absolutamente pacfico. No deveria haver pilhagem de cidades e aldeias quando a cavalgada passasse por elas. Os povos do reino da Frana e do ducado da Aquitnia deveriam saber que aquilo era uma misso pacfica que s poderia causar o bem de todos os interessados.Ele podia ficar seguro de que seus desejos seriam executados, disse-lhe o abade.Mandou chamar o filho. Pobre Lus! Era to evidente que ele tinha sido destinado Igreja! E o rei havia ouvido falar de Eleonore. Uma garota voluptuosa, pronta para o casamento, apesar de muito jovem. Ela saberia como conquistar Lus, disso ele estava certo. Talvez, quando o rapaz visse aquela jovem que, sob todos os aspectos, era a mais desejvel do pas - e no apenas pelas suas posses- percebesse a sua boa fortuna.O rei lhe disse isso quando ele chegou ao lado de seu leito . "- Boa fortuna, no apenas para voc, meu filho, mas para o seu pas, e o primeiro dever de um rei para com o seu pas.- Ainda no sou rei - disse Lus com voz trmula.- No, mas os indcios, meu filho, so de que o ser em breve. Governe bem. Faa leis sbias. Lembre-se de que chegou ao trono pela vontade de Deus e sirva-O bem. Ah, meu querido filho, que Deus todo-poderoso o proteja. Se eu tivesse a infelicidade de perdlo e perder aqueles que envio com voc, nada mais me importaria, quer com respeito minha pessoa, quer com respeito ao meu reino.O jovem Lus ajoelhou-se ao lado do leito do pai e recebeu suas bnos.Depois, saiu com sua comitiva e tomou a estrada para Bordeaux.A cidade de Bordeaux brilhava luz do sol; o rio Garonne parecia uma serpente de prata e as torres do castelo de TOmbrire subiam para um cu sem nuvens.O prncipe ficou parado s margens do rio, olhando para o lado oposto. No poderia haver demora para o momento em que deveria ficar frente da noiva.Estava com medo. O que deveria dizer-lhe? Ela iria desprezlo. Se ao menos pudesse fazer meia-volta e retornar para Paris! Ah, a paz de Notre-Dame! O abade Suger no gostava dele. Como homem da Igreja, poderia esperar-se que isso acontecesse, mas tudo em que Lus podia pensar - assim como todos os demais - era33o bem que aquele casamento representava para a Frana.- Senhor, devemos tomar os barcos e atravessar para Bordeaux. A Srta. Eleonore j ter sido avisada de que estamos aqui. Ela no dever esperar que haja demora.Ele se preparou. No adiantava protelar, nem fugir. Devia seguir em frente.- Vamos, ento - disse ele.Seguia a cavalo para o castelo, frente da pequena comitiva que levara junto. O seu porta-estandarte mantinha erguida, com orgulho, a bandeira dos lrios dourados. Lus ergueu os olhos para a torrinha e ficou imaginando se ela no o estaria observando.Ela estava l, olhando exultante para os lrios dourados, o braso do poder. A Aquitnia podia ser rica, mas um rei exercia necessariamente uma posio mais elevada do que a de um duque ou de uma duquesa, e ainda que o reconhecimento da suserania fosse mera formalidade, ela existia, e a Aquitnia era, na verdade, um vassalo da Frana.E eu serei a rainha de Frana, disse Eleonore para si mesma.Foi para o ptio. Tivera cuidados ainda maiores do que os de costume com a aparncia. A elegncia natural era ampliada pelo vestido azul-claro que usava; e que era preso na fina cintura com um cinto que cintilava de jias. No estava usando a touca que era moda, pois queria exibir os exuberantes cabelos que usava caindo sobre os ombros, com uma faixa incrustada de jias na testa.Ergueu os olhos para o rapaz montado a cavalo e estendeu-lhe a taa de boas-vindas.Jovem, pensou ela, malevel. E seu corao deu saltos de triunfo.Lus olhava para ela com ar bestificado. Nunca imaginara uma jovem to bonita; os olhos dela lanaram aos seus um olhar de tranquilidade; o diadema na testa ampla dava-lhe dignidade. Lus a achou encantadora.Saltou do cavalo e, curvando-se, beijou-lhe a rno.- Bem-vindo Aquitnia. Faa o favor de entrar no castelo. Lado a lado, os dois entraram.- Meu prncipe francs no deixa de ter seus encantos. Esses francos so refinados. Fazem com que alguns de nossos cavaleiros paream grosseiros. Suas maneiras so perfeitas. A princpio, porm, percebi certa relutncia - comentou ela com Petronelle quando a irm foi ao seu quarto naquela noite.34- Isso passou quando ele viu voc - disse Petronelle, sempre idlatra.- Acho que sim - respondeu Eleonore, ponderada. - Ele tem um ar delicado. Foi criado para ser padre.- No consigo imagin-la casada com um padre.- No, dentro em breve vamos deixar o padre para trs. Eu gostaria de que no tivssemos que esperar pela cerimnia. Gostaria de t-lo como amante logo.- Voc sempre quis um amante, Eleonore. Papai sabia disso e tinha medo.- perfeitamente natural. Voc tambm, Petronelle. Petronelle suspirou e ergueu os olhos para o teto.- Infelizmente, tenho que esperar mais tempo.As duas, ento, conversaram intimamente sobre os homens da corte, suas virtudes e suas potencialidades como amantes. Eleonore recordou algumas das proezas do av.- -Ele foi o maior amante de sua poca.- Voc ser melhor at mesmo do que ele - sugeriu Petronelle.- Isso seria muitssimo chocante numa mulher - disse Eleonore, rindo.- Mas voc ser igual aos homens em tudo.- Estou ansiosa por comear - disse Eleonore, com uma gargalhada.O prncipe adorou ouvi-la cantar e observar os longos dedos brancos dedilhando o alade e a harpa.- vou cantar para Vossa Alteza uma de minhas canes disse Eleonore.E cantou a nsia do amor e que a nica felicidade que havia no amor era atravs da satisfao que ele podia provocar.- Como pode saber? - perguntou ele.- Um instinto me diz. - Seus olhos brilhantes estavam cheios de promessas; at Lus descobriu um certo desejo despertando nele. J no pensava com tanta frequncia na solene atmosfera da Igreja. Comeou a imaginar que mistrios ele e sua esposa iriam descobrir juntos.Eleonore jogou xadrez com ele e derrotou-o. Talvez tivesse mais prtica. Enquanto Lus estudava para ser padre, ela tinha sido educada na cultura da corte. Foi umabatalha ligeira entre os dois. Quando35lhe deu o xeque-mate, ela riu e ficou encantada; aquilo foi como que um smbolo para Eleonore.Os dois caminharam juntos pelos jardins do castelo. Ela mostrou-lhe as flores e ervas que davam no Sul. Explicou-lhe que era possvel fazer remdios e unguentos, loes para embelezar a pele e fazer os olhos brilharem, uma bebida para estimular um amante relutante.- Acha que precisarei fazer uma bebida para Vossa Alteza? Lus lhe agarrou a mo e fitou-a de frente.- No - disse, com veemncia. - Isso no ser necessrio.- Ento acha meus encantos suficientes, meu senhor?- Plenamente suficientes.- com que ento est ansioso pelo nosso casamento?- Estou ansioso para que chegue o dia, Eleonore. Ela recuou, um sorriso estampado no rosto.Nada mau para o meu monge, confidenciou depois a Petronelle.O abade Suger, vendo o relacionamento dos dois amadurecendo, acreditava que no deveria haver demora para o casamento. Era verdade que Eleonore estava de luto pela recente morte do pai, mas se tratava de um casamento de Estado, e quanto mais cedo fosse solenizado, melhor para todos os interessados.Falou sobre isso com o prncipe e ficou assombrado com o entusiasmo com que ele - antes to relutante - concordou.- A duquesa de Aquitnia uma feiticeira - disse o abade. O casamento aconteceu em julho.As damas de Eleonore vestiram-na em seu resplandecente vestido de noiva e ela usou seus longos cabelos soltos. Sentou-se em seu cavalo brilhantemente ajaezado e seguiu pelas ruas de Bordeaux at a igreja de Santo Andr, onde a cerimnia deveria ser celebrada pelo arcebispo de Bordeaux. Que dia de triunfo para a noiva! Havia apenas um ano, ela no sabia se teria a herana roubada por um meio-irmo. Mas o destino havia intervindo. Agora, ningum poderia se intrometer entre ela e sua ambio.Estava exultante e um pouco triste por ter precisado obter o triunfo atravs da morte de um pai que ela, sua maneira, havia amado bastante. Mas no havia dvidas quanto ao seu sucesso.Duquesa de Aquitnia sem ningum para questionar o seu direito, e em breve - ela acreditava que muito breve, e todos concordavam com isso - rainha de Frana.36Eleonore desabrochara. Sensual ao extremo, achou o casamento a seu gosto. O pobre Lus era um pouco menos ardente - embora no houvesse dvida de que a amava comuma emoo mais profunda do que a que ela podia exibir por ele. Eleonore amava o amor; soubera que iria ser assim quando, muito nova, cantara o amor nos jardins.L, o amor - o amor romntico - tinha sido glorificado. Ela queria esse tipo, mas tambm queria o amor fsico. Era ela que tomava a iniciativa quanto paixo. Poderia ter adquirido experincia naquelas artes, mas no era esse o caso; ele foi o seu primeiro amante; nela, porm, havia um conhecimento e uma compreenso naturais.Foram esplndidos dias de vero, passados observando as comemoraes do casamento, e noites passadas fazendo amor.Havia msica e cantos, e Eleonore o estava iniciando numa apreciao das canes e poemas nos quais ela era excelente. Foi uma existncia deliciosa mas, claro, no podia continuar. As disputas e os torneios na rea do castelo tinham que chegar a um fim, porque o prncipe precisava voltar para Paris com sua jovem esposa.Por intermdio dele, Eleonore se tornara princesa de Frana; por intermdio dela, Lus deveria tornar-se o duque de Aquitnia.Para onde quer que fossem, eram recebidos por multides em regozijo. Todos sabiam que aquela aliana s podia ser benfica. O povo da Aquitnia poderia abrigar-se sob os lrios dourados da Frana, e o reino da Frana inclura um poderoso vizinho em sua vida unio.Aquilo s podia significar mais esperanas de paz e, como o que era mais temido do que qualquer outra coisa pelo povo humilde eram exrcitos invadindo-lhes as casas e levando com eles seus bens e suas mulheres, aquela situao era vantajosa.Eles haviam chegado a Poitiers e estavam gozando de uma grande acolhida, quando o abade Suger foi aos aposentos do castelo em que tinham recebido hospitalidade, e pela sua expresso estava claro que era portador de ms notcias.O abade no era homem de dar notcias com delicadeza.Curvou-se de forma acentuada.- Viva o rei! - disse ele.Lus ento soube que seus temores tinham-se confirmado, e Eleonore, que sua ambio fora realizada.Seu marido era, agora, o rei, e ela era a rainha de Frana.- Ento meu pai morreu - disse Lus, sem emoo.37- Ele faleceu com grande sofrimento fsico - explicou o abade. - Mas suas dores passaram. Se Vossa Majestade obedecer aos desejos dele, ir governar como ele gostaria que fizesse... isto , com inteligncia, e bem.- Isso irei esforar-me para fazer, de todo o corao e com toda a minha inteligncia - retrucou Lus com fervor.Mas a ua-de-mel despreocupada havia acabado. Havia um nmero demasiado de elementos conflitantes no pas para que o jovem Lus fosse aceito sem oposio.No se tratava de o povo da Frana querer colocar outro rei no lugar de Lus. O pai dele havia mantido o povo em ordem, mas nem sempre lhe dera o que ele achava que merecia. Agora que um jovem e sem experincia estava no trono, era o momento de exigir aqueles direitos.Poucos dias depois de a notcia da morte de Lus VI ter chegado ao grupo que festejava o casamento, houve mais notcias. Dessa vez, de um levante em Orlans.O abade Suger disse ao rei que chegara a hora de afirmar a sua autoridade. A maneira de agir, agora, era da mxima importncia Ele tinha de mostrar ao seu povo que,embora pretendesse ser um governante benevolente, seria um governante firme. Tinha de dizer au revoir esposa e partir j, e rpido, para Orlans e, de l, paraParis. Eleonore e sua corte o seguiriam sem tanta pressa.Lus, menos perturbado pelos acontecimentos do que pouco antes ele teria acreditado ser possvel, cavalgou com seu exrcito para Orlans. Devia agir como um rei;no iria querer que Eleonore o desprezasse, pois sabia que ela, uma jovem muito forte e eficiente, iria realmente desprezar a fraqueza. Por isso, no devia ser fraco.Rezou com fervor para que tivesse a sabedoria de tomar a deciso certa e a fora para execut-la.Levaria uma flor que Eleonore lhe dera - uma rosa dos jardins de Ombrire. Ela mesma a havia colhido e prensado. Lus deveria lev-la perto do corao, dissera-lhe ela. Ficara encantado com a mistura de romantismo e sensualidade que formava o carter de sua mulher, e com a insistncia dela para que as leis da fidalguia fossem obedecidas. Eleonore o fascinava, ela que estava to determinada a ser tratada como uma mulher delicada e, ao mesmo tempo, to ansiosa por ser obedecida. Iria esperar que ele sasse com honras daquela nova prova.E assim Lus cavalgou frente de seus soldados, e ficou muito38satisfeito com o fato de os cidados de Orlans, vendo-o chegar com o seu exrcito, intimidarem-se diante de seu poder e, em vez de in sistirem em pedir o que lhesera devido, ansiarem pelo perdo para a insolncia de fazerem exigncias ao seu senhor feudal.Uma conquista fcil, e Lus no tinha vontade alguma de ser rigoroso. Seus assessores insistiram para que um ou dois lderes da rebelio fossem executados, mas eleno permitiria que outros fossem punidos. Chegou at a conceder algumas das reformas solicitadas pelos rebeldes.O povo de Orlans o ovacionou. Nas mesmas ruas em que as pessoas tinham-se reunido em grupos e procurado tramar contra ele, o pblico agora gritava: "Vive l Ri!"Aquela situao estava resolvida. Lus prosseguiu viagem para Paris, e l se encontrou com Eleonore. O reencontro foi carinhoso; haviam sentido muita saudade um do outro.- Agora, precisamos pensar na coroao - disse Eleonore.Em dezembro daquele ano, as comemoraes j haviam sido planejadas e o grande evento aconteceu.Que longo caminho ela havia percorrido no curto espao de um ano!, pensou Eleonore, satisfeita.39Petronelle e o CondeSUA SATISFAO durou pouco. Ela era a rainha de Frana, a lder da corte, adorada pelo rei, venerada por aqueles que reunia para que pudesse ensinar as regras da fidalguia. Cercara-se de poetas e trovadores. Para obter um favor, um homem precisava portar-se com fidalguia; precisava conhecer as regras das Cortes do Amor; precisava poder expressar-se com graa e, se tivesse uma boa voz para cantar, tanto melhor.Ela era a juza dos esforos literrios; aplaudia ou ridicularizava. Nos dias de vero, sentava-se nos terrenos do castelo cercada de rapazes e moas e transmitia-lhes a sua filosofia de vida.As moas tinham que obedec-la, admir-la e emul-la o mximo possvel, de modo que eram plidas sombras de Eleonore, que brilhava ainda mais por causa disso. Os rapazes tinham, todos, que estar apaixonados por ela, ansiar pelos seus favores e estar prontos a morrer por eles, e ela era corts ou distante; e a paixo deles jamais deveria enfraquecer-se. Eles deviam escrever seus versos, cantar suas canes para ela; deviam misturar o talento com o desejo. Eleonore decidira que a corte da Frana deveria ser a mais elegante do mundo.Havia Petronelle, que crescia muito depressa como uma flor cujo desabrochar fosse forado, naquela atmosfera superaquecida.40Homens faziam versos e cantavam-lhe, pois, afinal, ela era quase to bonita quanto Eleonore e era irm dela.Como era muito mais emocionante viver na corte da Frana do que na de Aquitnia, ser uma rainha em vez de a herdeira de um duque, desde que ele no arranjasse um filho!A coisa funcionara muito bem.Petronelle, seguindo Eleonore em tudo, ficava cada vez mais impaciente com relao sua juventude.- Devemos encontrar um marido para Petronelle - disse Eleonore ao rei.- Ora, ela ainda uma criana - retrucou Lus.Pobre cego Lus, pensou Eleonore, o rei que sabia to pouco!- Algumas pessoas atingem a maturidade mais cedo do que outras. Eu acho que Petronelle atingiu a dela.- Pensa assim, ento? Talvez devesse falar com ela, preparla. Ela deve ser despertada aos poucos para o fato de ter um marido. Poderia ser um choque para uma menina inocente.Eleonore sorriu, mas no comentou as conversas que ela e Petronelle tinham juntas e vinham tendo h muitos anos. Petronelle nada tinha de inocente. Virgem, talvez,mas por quanto tempo continuaria assim, se no lhe arranjassem um casamento?Lus julgava os outros por ele mesmo. A inocncia dele a atraa... naquele momento... embora comeasse a ter dvidas sobre se no iria diminuir. s vezes, seu olhar se dirigia para homens mais velhos, experientes, com muitas aventuras amorosas em seu passado, e ela ficava um pouquinho impaciente com a ingenuidade do marido. Mas ainda lhe agradava ser a lder no relacionamento dos dois, lev-lo a uma paixo da qual ele nunca teria acreditado ser capaz.Por isso, no comentou nada sobre Petronelle. Ao mesmo tempo, acreditava ter chegado a hora de achar um marido para a irm.Petronelle no era de esperar que os outros cuidassem de seus interesses.Tal como a irm, ela adorava o sensual dedilhar dos instrumentos musicais e as lnguidas letras que insinuavam o amor.Ser jovem era frustrante. Sempre fora. E ter uma irm fascinante como Eleonore no a ajudava a suportar o seu destino com maior facilidade.Eleonore prometera arranjar-lhe um marido, mas o rei considerava-a ainda muito jovem.41- Muito jovem - gemeu Petronelle. - O rei pensa que todo mundo tem um sangue to frio quanto o dele.- Tenha pacincia, irmzinha - aconselhou Eleonore. - No penso assim. Sei que se no lhe dermos um marido muito em breve, voc vai arranjar um amante. Mas tenha cuidado. sempre mais conveniente arranjar primeiro um marido. Isso parece dar-lhe o direito a amantes. Mas um amante primeiro... Creio que poderia ser um pouco chocante.- Voc est sempre cantando o amor - bradou Petronelle.- De que adianta isso?A Eleonore s cabia repetir o conselho, acrescentando:- Tenha pacincia. - Ela mesma tinha pouco daquela til virtude. Queria emoes fortes. Estaria ficando cansada de dirigir a corte, de passar as noites com o seu srio e jovem marido?Enquanto ela pensava na presteza com que poderia encontrar um marido adequado para Petronelle e deixar a moa com um casamento seguro, havia sinais de agitao no pas. Eleonore sempre estivera interessada em aumentar o seu poder, e a ascenso de duquesa para rainha a deixara extasiada. Fora o sonho de muitos reis da Frana estender seu territrio por todo o pas. A Normandia, claro, estava firmemente nas mos do rei da Inglaterra - bem, talvez no firmemente, porque o conde de Anjou nunca iria aceitar o fato de que ela no pertencesse sua mulher, Matilda, e como os dois tinham um filho, era natural que quisessem devolv-la a ele.quela altura, Estvo de Blois havia assumido a coroa da Inglaterra e parecia muito provvel que fosse mante-la, embora a Inglaterra no estivesse numa situao muito boa. Matilda, que muitos acreditavam ser a verdadeira herdeira, por ser filha do falecido rei Henrique I, enquanto Estvo era apenas sobrinho, nunca deixaria de insistir com o marido e o filho para que se mexessem, visando ter de volta o que lhes era devido.Bastava ento que Eleonore e Lus deixassem a Normandia fora de suas pretenses. Mas, e Toulouse? O fato de os condes de Toulouse afirmarem ser os verdadeiros governantes daquela provncia sempre deixara Eleonore exasperada. O av dela se casara com Philippa de Toulouse, e Eleonore afirmava que, por intermdio desse casamento, Toulouse havia passado para a Aquitnia.Eleonore discutiu isso com Lus. Ele entendeu o seu ponto de vista.42- Veja bem - contemporizou ele -, duvido que o conde v concordar conosco.- No se trata de um assunto com o qual ele possa concordar ou no. A verdade que tenho direito a Toulouse pelo casamento de meu av e no vejo razo para abrir mo dele.- Por que seu av e seu pai nunca tomaram Toulouse?Eleonore deu de ombros, num gesto de impacincia. No queria lembrar que nem o pai nem o av tinham sido notveis pelo sucesso nas batalhas. O pai fora um tanto inepto sob o aspecto poltico, e o av estivera mais interessado na conquista de mulheres do que de territrios.Ela, no entanto, era mais ambiciosa. No seu ntimo ainda ardia o ressentimento provocado pelo desejo do pai de deserdar uma jovem vigorosa, possuidora de todos os atributos que um governante devia ter, por causa de um filho ainda no nascido, porque ele poderia ser homem.- O fato deles permitirem que outros tirassem aquilo que lhes pertencia no significa que devamos fazer o mesmo.Lus estava inquieto. Ela sentiu vontade de sacudi-lo.- Mas Toulouse independente h muitos anos.- Eu sei, eu sei! Quando meu av partiu numa cruzada, colocou-a sob os cuidados de Raymond Saint-Gilles. Era para ser uma medida temporria.- Mas continuou na famlia dele desde ento.Como ele a deixava impaciente! Eleonore franziu o cenho e depois permitiu-se um sorriso para tornar-se ternamente exasperadora.- Meu caro Lus, voc to delicado, sempre pronto a defender seus inimigos! Eu o amo por causa disso, claro, mas no assim que se governa.Lus no podia suportar o fato de Eleonore decepcionar-se com ele. Ela o prendera por completo sob seus encantos. s vezes, ficava imaginando se ela no lhe teria dado uma daquelas poes que mencionara certa vez. No podia suportar que a esposa viesse a deixar de admir-lo. Sabia que precisava ser belicoso. Seu pai o avisara de que devia ser forte e que isso poderia ser duplamente difcil para ele, devido a sua criao para o celibato.- O que voc sugere, Eleonore? O sorriso dela foi radiante.- Primeiro, chame todos os seus vassalos corte. Ento digalhes que pretende declarar guerra a Toulouse, pois aquilo que pertence43 coroa atravs de seu casamento dever ser entregue a ela. Diga-lhes que espera... no, que exige... o apoio deles. o que lhe devido e obrigao deles.No so seus vassalos?- Eleonore, confesso que a ideia de ir guerra me deixa perturbado.- um sentimento que ter de dominar, meu rei.- claro que tenho sempre voc a meu lado.Ela tomou-lhe a mo e sorriu de forma estonteante.- Sempre, para ajud-lo e confort-lo. Ele se sentiu muito confortado.Nos jardins, estavam reunidos em torno de Eleonore as damas e os cavalheiros da corte. Havia moas cujas famlias as haviam enviado rainha para serem instrudas em todas prendas e habilidades que no conseguiam encontrar em outra parte. Eleonore se deliciava com aqueles jovens. Seu amor pelo poder ficava, mesmo em grau modesto, satisfeito. Eles a consideravam sua professora. Sob sua orientao, faziam seus vestidos; cantavam, compunham msica e canes; e aprendiam a jogar xadrez. Eleonore no suportava analfabetos a sua volta. Aprendera a ler e a escrever, e acreditava que aquilo era uma parte importante da educao de toda moa - bem como dos rapazes. Estava decidida a fazer com que no houvesse discriminao alguma contra o seu sexo. Nunca iria esquecer-se de que poderia ter sido desviada de um futuro muito brilhante simplesmente porque era mulher.Aquelas horas em que governava a sua pequena corte eram o descanso. Quem quer que compusesse um poema ou uma cano submetia-os sua aprovao. Ela ento mandava que a obra fosse lida ou cantada, conforme o caso, e dava o seu parecer.Estava decidida a fazer valer a fidalguia, e isso significava a adorao da mulher. O homem precisava estar preparado para cortejar a dama de sua escolha; devia ficar agradecido pelos seus sorrisos; devia estar preparado para esperar pela realizao do amor. Devia lutar pela sua dama, e morrer por ela se preciso fosse. Essa era a essncia do amor romntico.Eleonore era sensual ao extremo, mas sua sensualidade tinha tons de romance. Estava profundamente cnscia dos homens viris de sua pequena corte, e o mesmo ocorria em relao a eles. Muitas vezes, permitia-se imaginar tomando-os como amantes. Isso lhe teria causado uma grande satisfao. Que pena uma rainha no poder44dar-se ao luxo dessas ligaes romnticas! O dever de uma rainha era dar um herdeiro ao trono, e at ela - por mais dona de si mesma que pudesse ser - estavaciente de que no deveria haver dvida alguma quanto paternidade do herdeiro da Frana.Havia um homem que a atraa muito, e era o primo de Lus, Raul, o conde de Vermandois. No era exatamente jovem, mas possua forte personalidade e uma reputao de conquistas no apenas na guerra, mas no amor.Muitas vezes, ele se sentava aos ps de Eleonore e a cortejava com os olhos, os gestos e o desejo na voz. No havia dvidas de que Raul a estava convidando a jogar para o alto os escrpulos. Ele no chegou a dizer isso; era suficientemente inteligente para saber que nas Cortes do Amor de Eleonore no devia haver grosserias. Insinuaes eram muito mais excitantes do que palavras; e ele assim o fizera para demonstrar seus sentimentos.Eleonore gostava que ele se sentasse a seus ps enquanto seus olhos brilhavam de paixo. Gostava de se imaginar fazendo amor com um parceiro daqueles; como ele seria diferente de Lus! Pobre Lus! No era um amante com imaginao; ela precisava sempre tomar a iniciativa. Tudo muito bem, s vezes, mas seria divertido, intrigante e muito emocionante, em certas ocasies, sentir-se dominada.Lamentavelmente, precisava lembrar-se de que tinha que gerar o herdeiro da Frana.Raul continuava a ador-la com os olhos; sua voz grave continuava a atra-la a uma indiscrio. Eleonore resistia. Ele ficou um tanto impaciente. Gostava de cortejar a rainha, mas comeava a perceber que nunca iria obter sucesso com aquilo... pelo menos enquanto ela no fosse engravidada por Lus e pudesse arranjar um amante em segurana. Um assunto desses no podia ser mencionado na atmosfera romntica da corte de Eleonore, embora estivesse na cabea dele e, talvez, na dela, mas Raul no podia ter certeza.Pobre Lus, pensava Raul. Talvez fosse incapaz de ter filhos. Talvez um dia Eleonore ficasse disposta a deixar que ele fosse suplantado por esse motivo. Era uma mulher esperta; tinha alguns escrpulos, disso ele estava certo, ou pelo menos se tivesse alguns quela altura, eles seriam eliminados dadas as circunstncias apropriadas. Mas Raul era um homem impaciente. Embora continuasse a venerar aos ps de Eleonore, seus olhos muitas vezes se desviavam para outra jovem, e foi assim que pousaram em Petronelle. Que cria-45tura encantadora! - pensou Raul. Quase to bonita quanto a prpria Eleonore, e ele poderia jurar que to atraente quanto ela. Quanto mais pensava em Petronelle, mais encantado ficava.Petronelle podia ser inexperiente, mas no havia dvidas de que no lhe faltava conhecimento; sabia o significado dos ardentes olhares que ele lanava em sua direo. Como no era a rainha de Frana, no precisava ter os escrpulos de uma rainha; era muito jovem; solteira, possivelmente virgem - ele, o conhecedor, acreditava que bem poderia ser esse o caso, embora fosse um estado que a jovem estivesse ansiosa por abandonar. Um pouco perigoso em vista do parentesco dela com a rainha, e o fato de no ter marido. Raul era um homem ousado; tinha ficado frustrado durante um tempo demasiado longo pela irm de Petronelle. Veria at onde poderia ir.Abordou Petronelle nas alias do jardim.- Que deliciosa surpresa! - bradou Raul, em direo a ela.- tanta surpresa assim, meu senhor? - perguntou Petronelle, a cabea pendendo para um lado, alegremente provocadora.- Bem, confesso que houve um pouco de estratgia.- sempre recomendvel admitir aquilo que j se sabe. No havia dvidas de que ela aprendera suas respostas prontas com a irm.- Que prazer v-la sozinha.- Por qu? Ser que pareo diferente sozinha do que na companhia de terceiros?- Parece. E qual a sua impresso a meu respeito?- Naturalmente deverei sentir-me um tanto alarmada, ao me lembrar de sua reputao.- Ah, reputao! Como pode ser cruel uma reputao! To falsa! To injusta!- As pessoas tm sido injustas para com o senhor?- Uma grande parte iria depender do que dissessem de mim- Dizem que teve muitas conquistas.- Creio que tenho me empenhado com honra nas batalhas.- E na batalha do amor?- No considero o amor uma batalha.- No entanto, as pessoas falam em conquistas.- Talvez eu mesmo esteja correndo o risco de ser conquistado?- Pela senhora sua esposa, sem dvida. E creio que minha irm, a rainha, tenha causado algum efeito sobre o senhor.- As vezes as coisas no so como parecem.46- No compreendo.Ele se aproximou mais um passo e agarrou-lhe a mo.- s vezes no se olha em direo ao sol. Ele demasiado deslumbrante. Desvia-se o olhar.- Est olhando para o sol agora, senhor conde?- Diretamente para ele.- Creio que est cego por ele.- Cego a ponto de chegar indiscrio. Ele me deixou louco.- Agarrou-a de repente e a beijou.Petronelle soltou uma exclamao do que pretendia parecer consternao e, soltando-se dele, correu pela alia para um lugar mais pblico nos jardins.Aquilo foi um comeo.O conde Theobald de Champagne chegara corte da Frana. Era um homem com a reputao de governar com sabedoria sua provncia; era um bom soldado, e Lus contara com a sua ajuda para executar a campanha contra Toulouse.Eleonore estava com o rei quando ele recebeu o conde. Ela fazia questo de estar presente a reunies como aquela, pois queria que o mundo soubesse que a Frana tinha tanto uma rainha quanto um rei.- Bem-vindo a Paris - saudou Lus. - Espero que esteja bem de sade.- Nunca estive melhor, majestade.- E com boa disposio para o combate.- Se Vossa Majestade est se referindo a essa questo de Toulouse, no poderei ajud-lo. No acho que teria as bnos de Deus.Eleonore estava de cenho franzido.- Talvez possa explicar-nos - retrucou ela, com frieza. O conde se curvou.- Claro, majestade. Eu no me aliaria campanha porque iria consider-la injusta para com o conde de Toulouse.- Injusto arrancar de um homem aquilo a que ele se agarra, quando no tem direito algum de faz-lo!- Parece que ele tem os direitos de propriedade, majestade.- O senhor sabe que Toulouse passou para meu av atravs do casamento, e que ele colocou Saint-Gilles como zelador durante sua ausncia para participar de uma cruzada?- Se assim foi, no consigo compreender por que ela no foi reivindicada antes, majestade.47- Porque a questo s foi resolvida agora, mas isso no motivo para que nunca o seja.- Vejo muitas razes, majestade.- O senhor esquece que corre o risco de desagradar ao seu rei e sua rainha.O conde fez uma curvatura e pediu licena para se retirar Depois que ele se retirou, Eleonore explodiu de raiva:- Co insolente! Como ousa nos dizer o que devemos fazer?- Ele tem o direito de expressar sua opinio - disse Lus, com delicadeza.- Voc o rei? Serei a rainha? Devemos ser insultados em nosso prprio castelo? Eu lhe digo que o senhor conde de Champagne vai se arrepender.Lus tentou acalm-la, mas no conseguiu.Theobald dirigiu-se aos aposentos da irm. Ela era mulher de Raul, o conde de Vermandois, e a encontrou melanclica.Theobald se achava nas mesmas condies. No gostara do tom de voz da rainha quando ela expressara decepo diante de sua recusa em apoiar a campanha contra Toulouse.- Ora, Eleonore - disse ele, pois a irm tinha o mesmo nome da rainha -, voc me parece um pouco triste. Raul est sendo infiel outra vez?Sua irm Eleonore encolheu os ombros.- No se trata de um fato raro.- Eu lamento esse casamento, minha irm, muito embora Raul seja primo de Lus. Quem a mais recente namorada dele?- No sei. No tentei descobrir. s vezes acho melhor ficar sem saber.- Ele no devia trat-la assim.- Claro que no, mas isso no o impede de faz-lo. Sei que ele est envolvido num caso de amor que lhe d grande prazer. mantido em segredo, claro. Alguma mulher que est enganando o marido, sem dvida, assim como Raul est me enganando.- Voc nunca ir mudar a natureza dele, Eleonore.- Receio que no. Ele ir correr atrs das mulheres enquanto tiver pernas para suport-lo.- vou ter uma palavra com ele. Ela sacudiu a cabea.- melhor no fazer isso. Talvez seja o destino de gente como48ns, ter maridos infiis. s vezes penso que seria melhor se tivssemos nascido em bero mais humilde. Pense em como a nossa famlia est espalhada. A infnciaparece muito curta, e quando se a caula de uma grande famlia, os mais velhos j saram de casa antes que nos apercebamos deles. Muitas vezes penso em Estvo.- Ah, o rei da Inglaterra. Sim, pense nele com frequncia e reze por ele. Como rei da Inglaterra, ele precisa de suas oraes, minha irm.- Lembro-me da alegria que houve na famlia quando ele recebeu a coroa.- . E das lamentaes quando parecia que Matilda iria tirla dele.- Eu gostaria de que pudssemos v-lo com mais frequncia. Isso s ocorre quando ele visita a Normandia.- Pobre Estvo, talvez uma coroa tenha suas vantagens e suas desvantagens.- Voc achou que sim, Theobald. Tinha mais direito coroa da Inglaterra do que Estvo. Era o filho mais velho de nossa me, e o Conquistador era tanto seu av quanto de Estvo.- Estvo fora criado na Inglaterra. Houve nitidamente uma poca em que o rei Henrique pensava em torn-lo seu herdeiro.- No teria havido aquelas lamentveis guerras na Inglaterra se o marido de Matilda no tivesse morrido e ela tivesse ficado na Alemanha.- No entanto, ela era filha do rei e, segundo muita gente, a verdadeira herdeira. Estvo nosso irmo, e eu o ajudaria de todas as formas ao meu alcance, mas Matilda era, de fato, filha do rei e estava na linha direta de sucesso. No se pode fugir a isso.- Pobre Estvo. Espero que seja feliz. Quanto sofrimento ele tem que suportar!- Ele tem uma boa esposa. Nenhum outro homem poderia ter uma melhor.- No entanto, ele no lhe fiel. Ser que h homens fiis? Theobald apertou-lhe a mo.- No leve a infidelidade de Raul tanto a srio. o jeito dele. A rainha de Estvo ter, por fora, que aceitar isso. Tente esquecer.- algo que est sempre comigo, Theobald, mas no gostei de voc ter desagradado rainha.- Ao rei tambm, receio.- Oh, a rainha que importa. Ela governa a corte; quer aumentar49o reino da Frana, para que possa tornar-se cada vez mais poderosa. Ela pode ser uma mulher vingativa.- Saberei como proteger a mim mesmo e as minhas terras, Eleonore. O rei jovem e inexperiente. uma pena terem-no casado com uma mulher to dominadora. O abade Suger um homem inteligente, e Lus, o Gordo, deixou o filho em boas mos... no contando as da mulher. Mas quem teria esperado que uma adolescente se interessasse tanto pelos negcios?- A rainha uma mulher que pretende governar. Voc vai voltar para a Champagne, agora?- vou. Achei que devia expor o meu caso ao rei. sempre bom, quando se discorda, expor pessoalmente os motivos.- Ento, me despeo de voc, meu irmo. Foi bom v-lo. Como eu gostaria de ver o Estvo!- No deseje isso. No h dvida de que haveria problemas na Normandia se ele estivesse aqui.- So constantes os problemas da Normandia.- E receio que continuaro durante anos. Anjou est quieto, no momento, mas seu filho est crescendo. Dizem que o jovem Henrique Plantageneta j um timo guerreiro, e que ir querer no apenas a Normandia, mas a Inglaterra tambm.- Mais guerras... mais problemas!- assim que deve ser, quando existe um nmero demasiado grande de pretendentes a um trono. Veja esse problema, agora... com Toulouse. Mas no tenha medo, Eleonore. O rei, estou convencido, tem um esprito fraco para a guerra. No h dvida de que essa questo de Toulouse ir passar. No acho que serei o nico que no quer segui-lo para a guerra.Os dois se despediram.A rainha ficou vendo o conde de Champagne afastar-se, cavalgando frente de seu squito.- Maldito seja. Como ousa zombar da rainha! Vai pagar por isso - disse Eleonore.A escurido cara sobre o castelo. Petronelle envolveu uma capa em volta do corpo e deslizou para o ar fresco da noite.Ningum iria reconhec-la, se a visse. Iriam pensar que se tratava de uma das damas da casa cumprindo uma misso, o que seria a verdade, mas nunca iriam suspeitar de que ela era a jovem irm da rainha.50Sabia que estava sendo ousada e caprichosa; estava provocando a desonra. Mas o que podia fazer? Quando Raul a abraava, ficava fraca e submissa; j quase prometera, e recuara. Dissera: "No posso e no me atrevo."E ele lhe havia mordido ternamente a orelha e murmurado em seu ouvido: "Mas pode e se atreve."Ela sabia que acabaria havendo uma rendio. No era isso que estava nas canes? Elas falavam de fazer a corte, de romance e de cavaleiros que morriam por suas damas, mas era to mais atraente amar do que morrer! A morte era horrvel, com sangue e sofrimento. O amor era belo; havia o desejo e a paixo e a intensa satisfao da realizao que ela ainda no havia experimentado.Iria experimentar dentro de pouco tempo. Em breve, eles iriam cas-la. E se a casassem com algum velho impotente, s porque seria bom por questes do Estado? Haviam casado Eleonore com Lus. Apesar de ser o rei, na verdade no era muito atraente. Chamavamno de molengo nas questes importantes. Eleonore praticamente dissera isso. Se eles a casassem com algum de que no gostasse, teria amantes. Iria escolher algum como Raul...Raul! Ia encontr-lo, agora, e dessa vez no haveria hesitao. Ele no iria permitir. Da ltima vez, dissera um tanto zangado que j esperara demais. E ela ficara emocionada com o tom de zanga em sua voz.Dessa vez, no haveria hesitao.Ele a estava esperando na moita de arbustos.Seus braos a envolviam, mantendo-a firme.- Raul, no tenho coragem...- Eu conheo o lugar. Venha.- Preciso voltar.Mas ele estava rindo dela.- Minha irm vai ficar furiosa. No se importa com a raiva da rainha?- Esta noite, no me importo com coisa alguma, a no ser isto.Petronelle fingiu esforar-se para se livrar, mas sabia, e Raul tambm, que era apenas fingimento.Os dois encontraram um lugar escondido entre os arbustos.- Outras pessoas podero vir para c, Raul.- No, ns no seremos perturbados.- Preciso voltar.51- Deve ficar aqui. - Ele a estava levando para o cho.- S me resta entregar-me, Raul.Eleonore percebeu logo a mudana na irm e adivinhou o motivo. Mandou cham-la ao seu quarto e, certificando-se de que estavam a ss, disse:- melhor me contar.Petronelle arregalou os olhos, fingindo inocncia. Eleonore segurou-a pelos ombros e a sacudiu.- No finja inocncia comigo. Est claro. Se gritasse l da torrinha: "Tenho um amante", no poderia ser mais clara.- No vejo por que...- No, voc uma criana. Tambm uma tola. Deveria ter esperado pelo casamento.- Como voc...- Como eu. Sabe que eu era virgem quando me casei com o Lus. Era necessrio que fosse. Agora, teremos de arranjar um marido para voc. Quem o seu amante? Talvez possamos cas-la com ele sem demora. vou falar com o rei.- Isso impossvel - gaguejou Petronelle.- Por qu?- Ele... ele j casado.- Louquinha!- No pude evitar, Eleonore. No era minha inteno. A princpio, foi apenas uma espcie de representao... como cantar e conversar sobre o amor... e depois...- Eu sei. No me pode contar nada que eu no saiba sobre esses assuntos. Deveria ter me consultado. Deveria ter me dito que ele estava fazendo investidas. Quem ele?- Raul...- O conde de Vermandois! Petronelle confirmou com a cabea.Eleonore sentiu uma onda de fria. Raul, que fingira admirla, que dera a entender que s ela poderia satisfaz-lo, que todas as outras mulheres de nada valiam para ele! E o tempo todo cortejava sua irm!- No acredito. Ora, ele velho...- dez anos mais velho do que voc. Isso no muito, em um homem.- E voc se entregou a ele.52Petronelle ergueu a cabea.- Entreguei-me e no me importo. Eu o faria novamente. E voc tambm, se no estivesse casada com o rei.Eleonore sacudiu a irm, zangada.- No se esquea de que est falando com a rainha. Eu me preocupo com o meu dever. Voc se portou como uma criada prostituta.- Ento, muitas damas da corte fazem o mesmo. Sentam-se com voc e conversam de forma elevada sobre o amor, e depois, noite, vo ter com os amantes. Poesia e canes no so substitutas para o ato amoroso, e voc sabe disso.- Ento, deve nos ensinar! Mas no percamos tempo com recriminaes. Voc no pde esperar pelo casamento. isso que temos de levar em considerao.- Eu amo Raul - disse Petronelle, com firmeza.- E ele a ama, suponho que vai me dizer.- Oh, ama, oh, ama!- Mas no o suficiente para poup-la dos desejos dele.- Foi amor - retrucou Petronelle, em xtase.- E ele sabia para que desastre a estava levando. Ele sabia que era casado, e voc tambm. Ele casado... - Ela parou de repente e um sorriso espalhou-se lentamente em seu rosto. - ...ele casado- continuou, pausadamente - com aquela mulher que tem o mesmo nome que eu. irm do nosso insolente Theobald de Champagne.- Ele no a ama - disse Petronelle, bem rpido. - O casamento deles s uma representao. Faz anos que os dois no so amantes. Ela no o compreende em absoluto.- Isso foi o que ele lhe disse, irm. uma reclamao comum do marido inconstante. Tudo o que ela no consegue entender por que se deve esperar que seja fiel enquanto ele namora onde quer. algo que tambm no compreendo. O que interessa que voc j no mais virgem. E isso deplorvel. vou falar com o rei. Precisamos cas-la sem demora.- Se me casarem com outra pessoa qualquer, nunca irei abrir mo de Raul.- E se fosse possvel casar com Raul? Petronelle bateu palmas de satisfao.- Ah, se fosse!- vou estudar o assunto.53A rainha recebeu Raul, conde de Vermandois, com muita frieza. No lhe deu permisso para sentar-se.- Estou contrariada.- Espero que no seja comigo, majestade.- com quem mais? Sei a respeito do senhor e minha irm. Ela me confessou que o senhor a seduziu. Que tem a dizer?- Que um homem ofuscado pelo sol volta-se para a lua em busca de conforto.- Tem havido um nmero demasiado de metforas com relao ao sol e lua. J no aguento mais. Est dando a entender que por no me encontrar disponvel, o senhor se voltou para minha irm?Ele curvou a cabea.- Minha irm no ficar contente se eu lhe contar isso.- Sua magnanimidade e sua discrio no permitiro que faa isso.- Nunca permito que algum ou alguma coisa evite que eu faa o que pretendo.- Vossa Majestade a lei e nosso desejo obedec-la. O que quer que eu faa, minha rainha? Diga, e eu o farei, ou morrerei tentando.- No exatamente um dos trabalhos de Hrcules.- Eu quisera que fosse, para que pudesse mostrar minha devoo.- Tenha cuidado. Um dia, poderei dar-lhe uma tarefa impossvel.- Nada poderia exigir mais de mim do que estar perto de Vossa Majestade e no poder am-la.- No est falando como o marido em perspectiva de outra mulher.- Marido! - Ele estava alerta. - Majestade, infelizmente sou casado.- com uma mulher pela qual deduzo que no est desesperadamente apaixonado.- Ela minha esposa. Quando estou na presena do irresistvel, sou forado a sucumbir.- Est se referindo a mim, ou minha irm?- Vossa Majestade conhece meus sentimentos. No estou sozinho na minha admirao.- E Petronelle? Est apaixonado por ela?54- Ela se parece com Vossa Majestade. Que mais posso dizer?- Que se fosse livre iria concordar em casar-se com ela?- De todo o meu corao.- No lhe pergunto se iria ser para ela um marido fiel. Sei da futilidade dessa pergunta. Ela gosta do senhor.- Eu gostaria de ser livre.- Poderia ser, se houvesse laos de sangue entre o senhor e sua esposa.- No sei...- O senhor obtuso, conde. H sempre laos de sangue entre famlias do nosso sangue. Tantos casamentos dentro da mesma famlia, atravs dos sculos, significam que se vasculharmos poderemos encontrar a conexo.- Se ela pudesse ser encontrada...- Se! Pode ser encontrada. Tem que ser encontrada. O senhor seduziu minha irm. Pelo que sei, ela j pode estar grvida. O senhor o responsvel. No se esquea de que ela irm da rainha. Casaria com ela?- Se pudesse ser encontrada uma justa causa para que eu j no esteja casado.- Ento, ser encontrada - disse a rainha, com firmeza. Sorria para consigo mesma. Claro que Petronelle tinha que se casar com o seu sedutor; e como era divertido o fato de a mulher de Raul ser irm de seu inimigo Theobald. Aquilo iria ensinar a famlia a no zombar do rei e da rainha.Era desconcertante. O conde Theobald no foi o nico baro a ignorar o chamado do rei. Deveria ter ficado claro que o pas no estava com disposio alguma de entrar em guerra por causa de Toulouse. O nico entusiasmo vinha da rainha, e isso ela transmitia ao seu dcil marido.Eleonore deixou Paris ao lado do marido, pronta para o cerco que faria com que Toulouse passasse s mos deles. Eleonore estava ocupada com os planos; j traara o parentesco entre Raul e a mulher. Se se vasculhasse o suficiente, sempre haveria laos de sangue. Ela pusera os bispos trabalhando no caso, e eles sabiam que se no encontrassem a resposta provocariam sua irritao.Lus realmente no gostava de guerra. Odiava a morte, e no queria castigar o seu povo. Quando fora vitorioso em Orlans, havia concedido aos sditos rebeldes o que eles pediam, e acabara com55o que considerava a lei cruel de cortar os dedos das pessoas se estas no pagassem suas dvidas. De que adiantava aquilo, perguntara ele, se elas precisavam das mos intatas para trabalhar e liquidar as dvidas?A ideia de pessoas inocentes sofrendo o deixava preocupado; mas, o que podia fazer? Eleonore insistia que Toulouse era dela, e portanto dele, e ela no conseguia esquecer a insolncia de Theobald de Champagne.- Vamos permitir que nossos sditos nos tratem assim? - perguntara ela. - Se assim for, no seremos governantes.Ele tivera que concordar com a esposa; sempre tinha de concordar com ela. Por isso, ali estava ele, marchando sobre Toulouse.Penetraram no rico territrio. Os nimos de Lus tomaram nova vida. Claro que ele gostaria de acrescentar aquelas frteis provncias ao seu reino. Os olhos de Eleonore brilhavam. Lus ficou imaginando se era a viso da terra que os tornava to brilhantes e ansiosos, ou a realizao de uma vingana. Ela estava muito certa de que dentro de pouco tempo Toulouse seria deles. Teria subjugado no s o conde de Toulouse, que se recusara a devolver aquilo a que no tinha direito algum, mas tambm o insolente Theobald. E quando ele soubesse que sua irm estava para ser divorciada do conde de Vermandois, ficaria duplamente humilhado!Veria o que significava desafiar a rainha de Frana. Seria uma lio para todos.Azar de Lus e de Eleonore. Toulouse estava bem defendida, e em pouco tempo tornou-se claro, para o rei, que mesmo aqueles que haviam aderido sua bandeira no pretendiam lutar.Enquanto se achava acampado fora do castelo ocupado por Raymond Saint-Gilles, grupo aps grupo de seus seguidores lembravam-no de que haviam concordado em lutar ao seu lado apenas durante um perodo especfico. O tempo estava se esgotando, e eles precisavam retornar a suas propriedades.Lus estava perturbado.- Ordene que fiquem! - bradou Eleonore.