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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS DE JUSTIÇA CRIMINAL E SEGURANÇA PÚBLICA SISTEMA PENITENCIÁRIO POLICIAL MILITAR Análise dos Policiais Militares Presos e Acautelados Luiz Alexandre de Oliveira Martins Niterói 2015

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monografia sobre o sistema penitenciário policial militar na PMERJ

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Page 1: JCSP - Monografia Sistema Penitenciário Policial Militar - Luiz Alexandre de Oliveira Martins - Orientador Lênin Pires

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS DE JUSTIÇA CRIMINAL E

SEGURANÇA PÚBLICA

SISTEMA PENITENCIÁRIO POLICIAL MILITAR

Análise dos Policiais Militares Presos e Acautelados

Luiz Alexandre de Oliveira Martins

Niterói

2015

Page 2: JCSP - Monografia Sistema Penitenciário Policial Militar - Luiz Alexandre de Oliveira Martins - Orientador Lênin Pires

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Luiz Alexandre de Oliveira Martins

SISTEMA PENITENCIÁRIO POLICIAL MILITAR

Análise dos Policiais Militares Presos e Acautelados

Trabalho monográfico de conclusão do Curso de

Especialização em Políticas Públicas de Justiça

Criminal e Segurança Pública da Universidade

Federal Fluminense.

Orientador: Lênin Pires.

Niterói

2015

Page 3: JCSP - Monografia Sistema Penitenciário Policial Militar - Luiz Alexandre de Oliveira Martins - Orientador Lênin Pires

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SUMÁRIO

1. CONTEXTO DA PESQUISA......................................................................................04

2. IDENTIFICAÇÃO DO PROBLEMA E JUSTIFICATIVA.........................................07

3. APRESENTAÇÃO DOS DADOS................................................................................13

4. DESENVOLVIMENTO...............................................................................................17

4.1 A Unidade Prisional da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro.....................17

4.2 Dinâmica Interna da Unidade Prisional..................................................................21

4.3 Rebelião na Unidade Prisional................................................................................24

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................26

6. ANEXOS.......................................................................................................................28

ANEXO 1 – Entrevista Rodrigo Souza (ex policial militar)........................................28

ANEXO 2 – Entrevista Marcos Aurelio Guimaraes (Sargento policial militar)........31

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................34

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1. CONTEXTO DA PESQUISA

A pesquisa que eu desenvolvo parte do levantamento e análise do banco de dados da

Seção de Custódia da Unidade Prisional da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro

(UP/PMERJ)1. Buscarei retratar a situação dos policiais militares presos e comparar com a

situação dos presos comuns. Chamo a atenção para o desconhecimento sobre os policiais

militares presos, a falta de dados e de conhecimento do sistema penitenciário da PMERJ, o

que evidencia a falta de accountability no gerenciamento da polícia e dos policiais. A própria

instituição não possui dados conhecidos, a não ser o banco de dados da Seção de Custódia da

UP/PMERJ, que não produz nenhum conhecimento para que se possa analisar os crimes

cometidos, o número de presos provisórios, a reincidência, proporção das condenações, entre

outros.

O principal entrave para a pesquisa foi a falta de textos que estudem diretamente os

presos policiais, sendo necessário muitas vezes a utilização de dados de textos sobre os presos

comuns e comparação com os dados obtidos da Seção de Custódia. Além disso, enfrentei

adversidades na tentativa de conversar com os internos, já que se faz necessária autorização

da VEP. Ora, isso demandaria um tempo maior, o que esta pesquisa não permitiria.

Realizei pesquisa qualitativa dos aspectos que diferenciam o sistema penitenciário

policial militar daqueles encontrados no sistema penitenciário civil ou comum. Através de

pesquisa bibliográfica sobre o sistema comum e pesquisa de campo para levantamento de

dados do sistema policial militar, busco realizar uma análise comparativa dos dois sistemas

prisionais. Exploro para esta pesquisa um estudo quantitativo do número de presos

provisórios, duração da prisão provisória, tipo penal mais recorrente, proporção de

condenações, reincidência e evasão. Após a análise e comparação desses dados com os

obtidos do sistema penitenciário comum, trato de analisar casos de rebelião no sistema militar,

realizando pesquisa de casos vivenciados e entrevistas com gestores do sistema.

Quero verificar a hipótese de que o sistema penitenciário policial militar seria

benéfico para a instituição PMERJ, trazendo vantagens na ressocialização e segurança dos

1 É o setor da Unidade Prisional da PMERJ responsável por toda a vida administrativa do policial acautelado,

desde sua entrada no sistema, passando por audiências e até sua liberdade ou condenação. Cuida de trâmites

burocráticos, do banco de dados e estatisticas, do reistro e autorização de visitantes, contato com advogados, etc.

Page 5: JCSP - Monografia Sistema Penitenciário Policial Militar - Luiz Alexandre de Oliveira Martins - Orientador Lênin Pires

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policiais militares acusados de cometimento de crimes. As acusações que se fazem de se ter

policiais presos sendo cuidados por outros policiais e que isto produz tratamento diferente do

dado a outros presos comuns resulta em clamor popular e um senso comum na mídia de que

seria melhor a extinção da Unidade Prisional da PMERJ e, apesar de ir contra as legislações

vigentes, faz com que a própria Policia Militar anunciasse a possível desativação da unidade.

Nesta pesquisa busquei comparar os dois sistemas prisionais para verificar se os

prejuízos apontados e os supostos benefícios que se apresentam justificam ou não a

desativação do sistema penitenciário policial militar. Sendo assim, o tema da pesquisa é o

sistema penitenciário policial militar, as diferenças e/ou igualdades encontradas quanto à

forma de tratamento dado aos internos, seus direitos e garantias, problemas e benefícios

encontrados nos dois sistemas quando comparados.

Tendo em vista a variedade de assuntos abordados e as peculiaridades de cada um

desses assuntos e como a gama de teorias e correntes de pensamentos seria muito vasta, para

concentrar o foco, busquei apenas demonstrar os dados estatísticos de cada sistema e o que,

segundo os autores tratados, resulta tais dados, prendendo-se apenas aos dados relativos ao

número de presos provisórios, duração da prisão provisória, tipo penal mais recorrente,

proporção de condenações, reincidência e evasão.

O intuito desta pesquisa é justamente verificar se o sistema penitenciário da PMERJ

vale a pena ser mantido, já que tais policiais, quando inocentados ou condenados com penas

que não exijam a perda da função pública, acabarão voltando para a instituição e para as

atividades inerentes à profissão, revelando a peculiaridade de tal sistema.

A questão que se busca é quais aspectos do sistema penitenciário da PMERJ foram

diferentes e/ou iguais do sistema penitenciário comum e se há vantagens no sistema

penitenciário militar. Um breve histórico da UP/PMERJ e apresentação de legislações e

normas que organizam seu funcionamento, demonstração a quantidade de policiais militares

reintegrados à PMERJ, após passarem pelo sistema, e quantos são reincidentes, além do

número de presos provisórios, evasão e tipo penal mais recorrente nos dois sistemas, do

estudo sobre o tratamento rotineiro dado aos detentos nos dois sistemas e em casos de

rebelião, demostrando, por fim, a visão do adminisrador do sistema penitenciário da PMERJ

sobre a gestão dos presos policiais através de entrevista.

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Desta forma, o estudo busca responder se houve ou não, vantagens em se manter um

sistema penitenciário militar na PMERJ, levantando a hipótese de que tal sistema

penitenciário militar dentro da própria PMERJ é benéfico para a instituição e para os policiais

militares facilitando sua reinserção na instituição e o retorno ao trabalho, o serviço à

sociedade, pelo menos dos que não foram expulsos da PMERJ após a prisão e/ou julgamento.

Realizei este trabalho com base em pesquisa bibliográfica que demonstrasse a

situação do sistema penitenciário comum e que situasse a UP/PMERJ como uma unidade de

internação prisional. Posteriormente, uma pesquisa documental no banco de dados do sistema

penitenciário militar da PMERJ, para fins de comparação entre os dois sistemas

penitenciários. E por último, uma pesquisa empírica que buscou a observação do

administrador do sistema penitenciário militar da PMERJ no que trata sobre a rotina dos

presos policiais e os casos de rebelião no sistema penitenciário militar.

Fiz uma abordagem qualitativa na comparação entre os sistemas penitenciários e uma

abordagem quantitativa no levantamento e análise do banco de dados da Seção de Custódia da

UP/PMERJ. Foram selecionados textos que tinham o interesse proposto em capítulos de

livros e artigos, a busca deu-se nas bases de dados SCIELO – Scientific Electronic Library,

Biblioteca do InEAC (Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de

Conflitos) da Universidade Federal Fluminese, Periódicos em Revistas e textos de autores

estudados ao longo do curso que foram disponibilizados pelos professores, além de normas,

portarias e publicações inseridas no Boletim da Policía Militar da PMERJ (Bol PM) e

legislações pertinentes à UP/PMERJ e ao sistema penal como um todo.

Ao abordar o assunto sobre rebelião e a rotina dos presos no sistema penitenciário da

PMERJ, foi utilizado a técnica de observação na UP/PMERJ; conversa com um ex policial

que ficou 40 dias presos e que até hoje, três anos depois, ainda não foi condenado; e entrevista

com a chefe da Seção de Custódia da UP/PMERJ. Isso foi feito através de questionário, tendo

em mente a função de administração da UP/PMERJ como um todo e especificamente da vida

intramuros dos policiais militares presos, sendo realizada uma abordagem analítica dos dados

obtidos através das entrevistas.

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2. IDENTIFICAÇÃO DO PROBLEMA E JUSTIFICATIVA

Procurei indagar se a figura do policial suspeito de cometer crimes pode ser

relacionada com o da figura do criminoso comum ou "bandido". Para isso recorri aos

conceitos identificados por MISSE (2010) sobre crime, sujeito e sujeição criminal, além de

demonstrar que os policiais também são sujeitos aos mesmos rótulos que ajudam a construir e

propagar, sendo-lhes negados os mesmos direitos que são negados ao criminoso comum.

Ocorre a incriminação do próprio policial e da atividade policial:

...entre acumulação de desvantagens e incriminação preventiva de certos “tipos

sociais”, desenvolveu-se um persistente processo de “sujeição criminal” de uma

parcela de agentes de práticas criminais. Tal dinâmica terminou por constituir algo

como uma “cultura” associada a esses sujeitos.

Como tal, não pode ser compreendida exclusivamente apenas no plano da interação

contextual e do desempenho de papéis sociais, pois se mostra ancorada num plano

macro de acumulação social da violência em tipos sociais constituídos e

representados por sujeitos criminais produzidos em contextos sócio-históricos

determinados.

Também por isso podemos considerar que a sujeição criminal é um processo de

criminação de sujeitos, e não de cursos de ação.

Assim, o conceito de sujeição criminal engloba processos de rotulação,

estigmatização e tipificação numa única identidade social, especificamente ligada ao

processo de incriminação e não como um caso particular de desvio.2

O policial militar acaba sendo visto como um criminoso em potencial, qualquer

acusação já o faz ser culpado aos olhos da sociedade e do sistema de justiça criminal,

independente do crime que tenham cometido. Assemelha-se com a ideia apresentada por

COELHO (1978) quando fala sobre status, audiência e roteiro típico:

O processo todo consiste numa avaliação social de indivíduos em várias categorias

sócio-econômicas, e na subseqüente atribuição de status a estes indivíduos ou

classes de indivíduos. Trata-se de um processo de categorização de pessoas em

termos de certas características (negativa ou positiva). E, neste processo, o que

2 MISSE, Michel. Crime, Sujeito e Sujeição Criminal: Aspectos de Uma Contribuição Analítica Sobre a

Categoria “Bandido”. In: Lua Nova, núm. 79, 2010. São Paulo: Centro de Estudos de Cultura Contemporânea, p.

18-23.

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importa menos é o que as pessoas fazem ou deixam de fazer, mas o que a audiência

faz a elas ou para elas (a resposta social). Por essa forma são criados vários papéis

sociais.

O que define um papel social é o fato de a certos tipos sociais atribuirmos maiores

probabilidades de desempenhar certos papéis, mas não outros; e a estes tipos sociais

imputamos classes limitadas de comportamento. Assim, papéis sociais são roteiros

típicos que atribuem a certas classes de comportamento a probabilidade (provável,

possível, improvável, impossível) de que ocorram em conjunção com tipos

particulares de atores sociais.3

O problema deste estudo surge quando durante o curso foi apresentado o conceito de

accountability e percebi que não se busca responsabilização quando se verifica os erros

cometidos pelos policiais. Antes disso, procuram-se culpados que possam apaziguar a opinião

púbica e números para os gestores apresentarem.

Surgem assim os discursos de que na atual gestão um número “X” de policiais foram

expulsos. Entretanto, não se verifica o motivo pelos quais tais erros estão sendo cometidos e

nem formas de controlar ou mitigação dessas ações. Não há números, estatísticas, estudos ou

qualquer produção de conhecimento que leve a uma mudança de rumo, continua apenas a

busca de culpados.

Durante o Curso de Especialização em Justiça Criminal e Segurança Pública pude

observar a falta de pesquisas relacionadas à Policía Militar e mais especificamente aos crimes

praticados por policiais, no exercício ou não da atividade policial.

Como ter uma polícia melhor se não a conhecemos? Como esperar atitudes

diferentes se não conseguimos definir o atual quadro em que se encontram?

O tema desta pesquisa busca justamente demostrar que existe uma vasta área que

ainda tem muito que ser pesquisada. Inexiste no Brasil a definição clara e objetiva do mandato

policial, como nos demonstra MUNIZ e JÚNIOR (2007), bem como a prática do

accountability:

3 COELHO, Edmundo Campos. A Criminalização da Marginalidade e a Marginalização da Criminalidade. Rio

de Janeiro: R. Adm. Públ, 1978, p. 158.

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A especificidade do mandato policial é a produção autorizada de enforcement em

prol da paz social ou da sustentação das regras do jogo social estabelecidas pela

polity, sem cometer violações ou violências. (...) Desta forma suscinta, é isso que

define o mandato policial: o exercício do poder coercitivo autorizado pelo respaldo

da força de forma legítima e legal.

A isso se soma, ainda, as demandas que produzem accountability pelas ações

policiais no exercício do seu mandato no sentido estrito. O questionamento quanto

ao uso autorizado da coerção com o respaldo da força, frequentemente expresso nas

suspeitas de violências, violações ou corrupção nas atividades policiais, inaugura a

produção de accountabilities que servem como insumos, exemplos ou pontos de

partida para a criação de diversas rotinas dentro e fora das organizações policiais.

Pode instituir a elaboração e publicação de relatórios sobre atendimentos policiais,

sobre o uso de armas de fogo por policiais, sobre desvios de conduta, sua apuração e

o desempenho da corregedoria.4

Vivemos ainda uma época inquisitorial que se preocupa apenas em encontrar

culpados e não em resolver problemas, procura-se punir as consequências sem antes

identificar e tratar as causas destes problemas.

Precisamos saber o por quê de nossos policiais estarem respondendo a crimes em

grande quantidade, quais crimes têm cometido e o que os levou a tais práticas. Já que é

estranho que uma instituição que tem por fim a aplicação da lei e o controle social possuir em

seus quadros em grande número de pessoas que transgridem a lei.

Precisamos trazer luz a este tema com o fim de evitar o uso único do controle

repressivo-legal da atividade policial para não corrermos o risco de voltarmos a uma caça as

bruxas em pleno século XXI, só que agora nossas bruxas são aqueles que devem zelar por

nossa segurança e que tem o diferencial de ser a instituição autorizada a utilizar a força em

nome da sociedade.

Tais policiais se tornaram acusados de cometer crimes após sua entrada para a

instituição policial, muitos deles não serão condenados e voltaram para sua atividade fim nas

ruas.

4 MUNIZ, Jacqueline de O.; PROENÇA JÚNIOR, Domicio. Da Accountability Seletiva à Plena

Responsabilidade Policial. In: Haydee Caruso; Jacqueline Muniz; Antonio Carlos Carballo Blanco. (Org.).

Polícia, Estado e Sociedade: Saberes e Práticas Latino-americanos. 1 ed. Rio de Janeiro: Publit Seleções

Editoriais, 2007, v. 1, p. 38; 51-52.

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O que esperar de um policial que vivenciou a experiência de ver a justiça negar

benefícios dados a criminosos comuns, ou sentirem que a força contra os policiais em alguns

casos chega a ser mais excessiva do que àqueles que foram levados à justiça por esses

mesmos policiais?

Nossos policiais já não se sentem bem vistos pela sociedade como nos traz BRETAS

E PONCIONI (1999):

Nota-se que o modo como é apreendida e vivenciada esta relação com o Estado e a

sociedade demonstra o profundo isolamento social experimentado pelo policial por

conta de suas atividades. (...)

“Ninguém gosta de policial, ninguém aceita. (...) É... já tem uma visão deturpada...

não quer saber, „esse cara não vale nada..., é sinônimo de corrupção, do matador, do

grupo de extermínio‟... (Detetive de 2ª Categoria, 37 anos, 3ª G.)”

É oportuno observar que os estereótipos negativos a respeito da polícia manifestam-

se ainda nas relações interpessoais mais próximas, evidenciando que ao policial

“colam-se” inumeráveis atributos pejorativos, os quais afetam a sua vida social em

vários níveis.

“Minha esposa não gosta. (...) Quando eu namorei, eu não era [policial]. Quando eu

casei, eu já era. (...) Ela não gosta da profissão, ela não gosta daonde eu tô, do meio

que eu vivo, entendeu? (...) Perigoso, viciado, corrupto... maus colegas, tudo. Tudo

de ruim passa. (...) Inclusive, até tô me separando... por causa desses problemas,

né?(Escrivão de polícia, 33 anos, 3ª G.)”5

O que dizer daqueles que foram acusados e tiveram seus direitos suprimidos e sua

imagem arranhada pela opinião pública, muitos após o escárnio público e o aprisionamento

provisório excessivo serão reintegrados à insituição e novamente estarão nas ruas para

cumprir suas funções.

Acredito que este trabalho pode contribuir com o despertar do interesse de nossos

pesquisadores sobre tais temas e dados, que até então não eram conhecidos, podem ser

conhecidos pela academia e pelo público interno da polícia, gerando transformação efetiva no

controle da atividade policial e no estudo dos presos policiais.

5 BRETAS, Marcos Luiz e PONCIONI, Paula. A Cultura Policial e o Policial Civil Carioca. In: Cidadania,

Justiça e Violência. PANDOLFI, Dulce C. et al. Rio de Janeiro: Ed. Fundação Getulio Vargas, 1999, p. 161-162.

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Por exemplo, com a identificação de quais crimes nossos policiais estão cometendo

podemos propor programas de prevenção e treinamento contra o uso antiprofissional, não

profissional ou pouco profissional da força física pelos policiais, utilizando a estratégia de

mecaniso de controle interno e informal/convencional como nos indica NETO (1999):

(...)a importância de mecanismos de controle interno e informal/convencional das

polícias, através da profissionalização das polícias e dos policiais, apoiados em

standards claros e precisos de competência e responsabilidade profissional (...)

(...) existem muitos comportamentos legais, legítimos e normais que podem ser

considerados não-profisionais ou pouco profissionais. Todavia, existem poucos

comportamentos profissionais que podem ser considerados ilegais, ilegítimos e

irregulares. Assim, estratégias dirigidas para o controle de comportamentos ilegais

dificilmente serviriam para controlar comportamentos não-profissionais. Mas

estratégias dirigidas para o controle de comportamentos não-profissionais

provavelmente serviriam para controlar comportamentos ilegais.6

Esta pesquisa traz de diferente o fato de se mapear fatores importantes para o

controle das polícias através dos dados dos policiais acusados de crimes, com foco em se

encontrar formas de prevenir tais delitos e dar um relato de como é a vida de um policial que

esteve preso. Saber se realmente manter policiais em um estabelecimento separado dos

criminosos comuns tem algum efeito benéfico para a sociedade e para a instituição.

Para chegar a algum resultado efetivo, permaneci algumas vezes na UP/PMERJ e

obtive a oportunidade de falar com policiais que trabalham na administração do presídio e de

policiais acautelados que possuem permissão de trabalhar na administração do presídio como

forma de remir dias da pena com base no trabalho como permite a Lei de Execuções Penais

ou presos provisórios com bom comportamento.

Conta também a minha experiência pessoal de quando estive no Batalhão de Polícia

de Choque, nos anos de 2012 a meados de 2014, e obtive a experiência de ter participado de

algumas operações dentro da UP/PMERJ que tinham o objetivo de retirar objetos não

autorizados e controlar rebeliões.

6 NETO, Paulo M. Violência Policial no Brasil: Abordagens Teóricas e Práticas de Controle. In: Cidadania,

Justiça e Violência. PANDOLFI, Dulce C. et al. Rio de Janeiro: Ed. Fundação Getulio Vargas, 1999, p. 137-138.

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Foi escolhido o período de 2008 a 2014 para análise dos dados dos presos policiais,

pois coicide com a mudança de política adotada pelo governo no tratamento da polícia com a

população através da doutrina de polícia de proximidade e da implantação das Unidades de

Polícia Pacificadora, o que pode ter influenciado a uma nova composição nos crimes

praticados por policiais.

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3. APRESENTAÇÃO DOS DADOS (ETNOGRÁFICOS OU ESTATÍSTICOS)

Aqui farei um breve descritivo dos dados, que estarão demonstrados nos anexos

respectivos.

Os dados estatistícos utilizados nesta pesquisa foram retirados do banco de dados

conseguido junto à Seção de Custódia da UP/PMERJ. Vale destacar que inicialmente minha

ideia era retratar os dados desde o ano de 2008, porém não foi possivel tendo em vista que o

banco de dados é apenas um arquivo do programa Acess e que, apesar de possuir muitos

elementos interessantes, carece de organização e método.

Decidi deixar de lado os dados passados de ano a ano e os outros objetivos como

reincidência, evasão etc, que inicialmente propus e decidi me concentrar no que achei mais

importante e que poderia ser retirado do banco de dados.

Durante a pesquisa e o levantamento de dados não achei necessário a utilização da

comparação com os presos do sistema comum, já que boa parte dos condenados que se

encontram na UP/PMERJ acabam por ir para o sistema comum. A UP/PMERJ se destaca por

ser uma prisão prioritariamente de presos não condenados como se verá adiante.

Atualmente são mantidos em medidas de restrição de liberdade 168 policiais

militares e 1 advogado, que deram entrada em anos diferentes, sendo: 1 em 2004; 1 em 2007;

1 em 2008; 1 em 2009; 4 em 2010; 9 em 2011; 10 em 2012; 44 em 2013; 63 em 2014 e 35

nos quatro primeiros meses de 2015.

Dos 168 policiais, 16 são reformados, o que equivale à aposentadoria dos policiais

militares. Os outros 152 são da ativa, ou seja, estão em efetivo serviço público e trabalham

normamelnte nas unidades da polícia.

Estabeleci a quantidade de policiais que atualmente se encontram na UP e qual tipo

de medida restritiva de liberdade cumprem (reclusão, prisão preventiva, prisão temporária,

prisão em flagrante etc):

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14

GRÁFICO 1 – Tipos de medidas restritivas de liberdade

0

20

40

60

80

100

120

140

160

TOTAL SENTENCA E VEP FLAGRANTE E

TEMPORÁRIA

PREVENTIVA

155

27

31

97

Sendo que 14 policiais não possuíam no banco de dados o tipo de prisão que estão

cumprindo, totalizando 8,28% dos policiais presos. As prisões por sentença (25 prisões)

foram agrupadas com as prisões por determinação da Vara de Execuções Penais (02 prisões),

por já haver ao menos uma condenação, mesmo que recorrível, totalizando 15,98% dos

policiais presos.

As prisões em flagrante (19 prisões), presos no momento do crime, foram agrupadas

com as prisões temporárias (12 prisões), prisões para investigação no inquérito policial ou

inquérito policial militar, totalizando 18,34% dos policiais presos.

Já as prisões preventivas (97 prisões), aquelas que mantem o preso aguardando

julgamento, totalizam 57,40% dos policiais presos.

Como as prisões em flagrante, temporária e preventiva são prisões de pessoas que

ainda não possuem condenação, quase todas se transformam em prisões provisórias, temos

um efetivo de 128 policiais ou 75,74% de todos os internos mantidos presos aguardando

julgamento ou acusação formal, destes 79 ou 46,75% foram transformadas em prisões

provisórias, que na prática permitem que uma pessoa permaneça presa até o julgamento o que

pode demorar alguns anos.

No sistema penitenciário comum há 40,1% dos presos na condição de prisão

provisória, conforme Forúm Brasileiro de Segurança Pública (8º Anuário Brasileiro de

Segurança Pública 2014, p. 06). No Rio de Janeiro, esse número está em torno de 31% de

presos provisórios segundo o INFOPEN do Ministério da Justiça (População Carcerária –

Sintético, 2010).

Page 15: JCSP - Monografia Sistema Penitenciário Policial Militar - Luiz Alexandre de Oliveira Martins - Orientador Lênin Pires

15

Tal constatação caracteriza a UP/PMERJ como uma unidade de internação

prioritariamente de presos que não tiveram nem uma condenação sequer. E deste universo de

169 presos, apenas três foram excluídos da PMERJ e ainda cumprem pena na UP/PMERJ,

todos os outros ainda integram as fileiras da instituição.

Cabe ressaltar que quando um policial é sentenciado a pena de reclusão superior a

dois anos ou é excluído da PMERJ, ele perde a função pública e faz o que internamente se

chama de “atravessar o sistema”, o que significa que após a perda da função eles são

transferidos para presídios comuns e não mais cumprem pena na UP/PMERJ.

Posteriormente, verifiquei quais os tipos penais que mais são imputados aos policiais

acautelados, sendo importante ressaltar que um mesmo policial pode ser acusado de mais de

um delito:

GRÁFICO 2 – Tipo Penal

0

10

20

30

40

50

60

70

Homicídio Associacao

Criminosa

Roubo Posse ou Porte

de Arma

67

11

22

9

O crime de Homicídio (Art. 121, do CP), nas mais diversas variantes, aparecem com

67 casos ou 39,88% dos policiais são acusados ao menos uma vez deste crime. O que nos traz

um número alarmante e já nos direciona para qual crime devemos tentar prevenir ou

desestimular que os policiais cometam.

O crime de Associação Criminosa (Art. 288, do CP) aparece com 11 casos ou 6,55%

possuem ao menos uma acusação deste crime, olhando mais perto tais casos foi possível

identificar ao menos 5 casos relacionados com a milícia.

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O crime de Roubo (Art. 157, CP) e Roubo (Art. 242, do CPM) foram agrupados por

se tratarem do mesmo tipo de crime, apenas estão sendo acusados em instâncias diferentes do

judiciário, um na justiça comum e outro na justiça militar. Totalizam 22 casos ou 13,1% dos

policiais são acusados ao menos uma vez deste crime.

E por último o crime de Posse ou Porte Ilegal de Arma de Fogo (Art. 16, da Lei

10.826 de 2003) possue 9 casos ou 5,36% das acusações aparece ao menos uma vez

relacionada a este delito.

Para comparação no sistema comum, os Crimes Contra o Patrimônio aparecem com

49% dos casos; seguidos de Tráfico de Drogas com 26%; e Homicídios com 12%, conforme

Forúm Brasileiro de Segurança Pública (8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2014, p.

07).

Entrevistei dois policiais que estiveram na UP/PMERJ, um deles é um cabo recém

excluído da PMERJ, mas que ainda aguarda julgamento com trânsito em julgado. Foi acusado

de facilitar a fuga de um preso e condenado em 1ª Instância, cumprindo 1 ano de Sursis. Cabe

ressaltar que apesar do acordo na justiça e da não determinação da perda da função o policial

foi excluído pelo Comando da PMERJ, indo contra o parecer favorável do Conselho Regular

de Disciplina que votou por sua permanência. (Anexo 1)

E o outro um sargento que após ficar preso na UP/PMERJ por cerca de sete meses e

respondendo processo por cerca de dois anos, foi absolvido com trânsito em julgado. Ele foi

acusado de roubo, sequestro, ameaça e atentado violento ao pudor, ficando preso por cerca de

sete meses e absolvido. Um fato interessante é que este policial chegou a ser promovido por

bravura quando realizou a maior apreensão de cocaína e não ter aceitado suborno, além de ter

estado na Força Nacional e indicado para a segurança do, à época Presidente, Sr. Lula, sendo

preso na semana que embarcaria para Brasília para compor a equipe presidencial (Anexo 2).

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4. DESENVOLVIMENTO

Mostrarei nesta parte aspectos do sistema penitenciário da polícia. Na primeira parte

será feito um detalhamento da Unidade Prisional, funcionamento e regulamentação. Depois,

terá foco o policial que se encontra cumprindo alguma medida restritiva de liberdade na

Unidade Prisional, sua rotina, prática etc. E por último, farei um breve comentário sobre

minhas impressões acerca das rebeliões e um paralelo das rebeliões do sistema comum.

4.1 A Unidade Prisional da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro

CRIAÇÃO E LOCALIZAÇÃO

A UP/PMERJ se situa à Rua Célio de Nascimento s/nº - Benfica – Rio de Janeiro –

RJ. Onde anteriormente funcionava uma prisão comum para presos oriundos de uma facção

criminosa e que foi tranformada em prisão militar.

A atual UP/PMERJ foi criada como Batalhão Especial Prisional (BEP/PMERJ) em

2004, através da Resolução da Secretaria de Segurança Pública nº 736 de 28 de outubro de

2004. Anteriormente os policiais cumpriam pena nos próprios batalhões da polícia militar e

em casos especiais no Batalhão de Polícia de Choque. Em sua justificativa traz a necessidade

de instalações adequadas ao previsto no parágrafo 1º, do artigo 72, da Lei 443/1981, Estatuto

dos Policiais Militares.

Art. 72 – Somente em caso de flagrante delito, o policial militar poderá ser preso

por autoridade policial, ficando esta obrigada a entregá-lo imediatamente à

autoridade policial militar mais próxima, só podendo retê-lo na delegacia ou posto

policial durante o tempo necessário à lavratura do flagrante.

§ 1º - O Comandante Geral da Polícia Militar deverá ter a iniciativa de

responsabilizar a autoridade policial que não cumprir o disposto neste artigo e a que

maltratar ou consentir que seja maltratado qualquer preso policial militar ou não lhe

der o tratamento devido ao seu posto ou à sua graduação.

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Interessante que apesar da criação da UP em outubro de 2004 e os primeiros 57

policiais presos chegarem no mesmo mês ao atual prédio, o Boletim Interno nº 148, que tratou

da criação e regulamentou o funcionamento da unidade, só foi publicado pela PMERJ quase

um ano após já estar em funcionamento, ou seja, em 20 de setembro de 2005.

Em seu artigo 1 a norma de criação idetifica a unidade como sendo destinada a “(...)

Oficiais e Praças (...) para fins de cumprimento de penas privativas de liberdade e medidas de

segurança(...)”. No artigo 2 trás a “(...) finalidade de promover a execução administrativa das

penas privativas de liberdade e das medidas de segurança detentiva (...)”.

O documento, no artigo 4, trazia rotinas que deveriam ser seguidas para os policiais

internos, mas só trazia o horário que deveriam acordar (05h30min ou 6h dependendo do dia),

fazer as refeições, visitas com familiares e advogados, e, por último, o horário que deveriam

dormir, chamado de silêncio (22h).

O regulamento se identifica com os usados para gerir um batalhão comum da polícia

militar, não observando a peculiaridade de tal unidade e a missão diferente que possui. Nas

normas estão definidas como serão feitas o hasteamento do Pavilhão Nacional, formaturas,

instruções, revistas etc. A partir do artigo 8 começam as normas que identificam a justiça

como órgão responsável pela permanência, liberdade e determinadora de benefícios.

Nos artigos seguintes são definidas as revistas, visitas, visitas íntimas e os bens que o

policial acautelado pode ter como refrigeradores, rádios, televisão etc. Determinando o que

pode ou não ser utilizado e como pode.

ADMINISTRAÇÃO

A Unidade Prisional (UP) funciona oficialmente como um batalhão comum da

polícia militar, sendo dirigida por um Coronel ou Tenente Coronel Policial Militar e contando

com as seções normais de unidades da polícia militar. Sendo os internos regidos pelo

regulamento disciplinar que rege todos os outros policiais militares, além das normas da Lei

de Execuções Penais.

Page 19: JCSP - Monografia Sistema Penitenciário Policial Militar - Luiz Alexandre de Oliveira Martins - Orientador Lênin Pires

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A única seção peculiar da UP é a seção de Cústodia, oriunda da antiga P2 do BEP7 e

responsável pela recepção e cadastramento do policial preso, ficando responsável pelas fichas,

documentação, apresentação para audiências, exames, escoltas, transferências, atividades

extra muros, confere, localização e controle dos acautelados. É também responsável pelo

Banco de Dados dos Acautelados.

Os policiais presos são supervisionados por outros policiais que trabalham na

UP/PMERJ, os chamados “galerias”. Responsáveis pela rotina, movimentação interna,

trânsito interno etc. A peculiaridade nesta situação é que tanto os que desempenham a função

de carcereiro como os presos se veêm como iguais.

Os presos não se veem como culpados ou condenados, por estarem dentro de um

quartel e a grande maioria não estar condenada, esperam tratamento referente a seus postos e

graduações militares. Exigindo muitas vezes o tratamento digno e respeitoso por parte dos

galerias, já que muitas vezes são presos não condenados e com graus hierárquicos superiores

ao dos galerias.

Em contra partida, os galerias tratam os presos, em regra, com urbanidade e respeito,

não enxergam um transgressor da lei mas sim um igual. Alguém que se assemelha e que pode

ser no futuro acusado de um crime e acabar junto com os presos. O carcereiro e o preso se

enxergam mutuamente como iguais.

CLIENTELA

Atualmente possui um advogado em prisão provisória por homicidio e alguns

policiais excluídos da PMERJ, porém seu público principal são policiais acusados de delitos e

que aguardam o julgamento presos. A maior parte entra no sistema por meio de prisão

preventiva e permanece por tranformação das prisões por flagrante, temporária e preventiva

em prisão provisória.

Policiais que tenham sido excluídos, em regra, são transferidos para presídios

comuns, a exceção cabe quando se tem determinação judicial para que o excluído permaneça

7 Em batalhões da polícia militar a P2 é o setor responsável pela inteligência policial, levantamento de dados e de

informantes, bem como a investigação de desvios policiais. Na UP/PMERJ suas responsbilidades foram

ampliadas e focadas nos policiais que cumprem medidas de restrição da liberdade.

Page 20: JCSP - Monografia Sistema Penitenciário Policial Militar - Luiz Alexandre de Oliveira Martins - Orientador Lênin Pires

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na UP. Em caso de condenação os policiais que tiverem penas acumuladas com a perda da

função pública também são transferidos para o sistema comum.

Isso caracteriza e individualiza a Unidade Prisional da PMERJ como um

estabelecimento prisional exclusivo de policiais militares, em regra, não condenados (75%

conforme análise do banco de dados). Os que foram condenados a penas baixas e não tiveram

a perda da função cumprem os regimes fechado, semi-aberto e aberto na própria UP.

Interessante destacar um ofício do Cel PM Erir Ribeiro, à época Comandante Geral

da PMERJ, endereçada ao Diretor da UP/PMERJ, que passava por uma interdição que

impedia o acautelamento de novos internos pela Vara de Execuções Penais, e que trazia em

seu texto a identificação da UP como unidade própria para policiais militares presos

provisoriamente a disposição da justiça comum ou militar.

Nesta época a UP estava com 310 internos e teve 35 ex-policiais transferidos para o

sistema comum, além da soltura de outros 20 que estavam presos preventivos, restando na UP

255 internos. Com a possibilidade de vagas foi solicitada e autorizada pela VEP a tranferência

de 35 policiais que aguardavam julgamento e que estavam em Bangu 8, que não ocorreu pois

a juíza da 2ª Vara Criminal de Duque de Caxias não concordou.

Com a abertura de vagas, o Cel PM Erir Ribeiro determinava a continuidade do

acautelamento de novos policiais até que o número de 310 fosse atingido. Tal fato se torna

importante, pois tempos depois o mesmo oficial que passou a ser o Secretário de

Administração Penitenciária estava em conversa com o atual CMT Geral para a desativação

da UP e a total transferência para o sistema comum, mesmo que em unidade separada, mas

administrada pela SEAP e não pela PMERJ.

Esta noticia foi veiculada em jornais de grande circulação e noticiada em plataformas

de noticias da internet:

O BEP (...) será desativado na próxima semana... os 231 presos irão para a

Penitenciária Vieira Ferreira Neto... Segundo a instituição, a medida é fruto de um

acordo entre o secretário estadual de Administração Penitenciária, coronel Erir

Ribeiro Costa Filho, e o comandante da PM, coronel Alberto Pinheiro Neto. 8

8 Reportagem do G1 de 30/04/2015. Fonte: <http://www. g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2015/04/batalhao-

especial-prisional-sera-desativado-no-rio.html> Acessada às 11h16min.

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Tal fato demonstra a falta de zelo pelas legislações vigentes que determinam a prisão

de policiais em local próprio e sob a administração da polícia militar, tal desrespeito é

cometido pelo MP, Judiciário e pela própria cúpula da PMERJ. A vida e liberdade de dezenas

de policias fica sob decisão puramente política e que muda com a vontade destes mesmos

gestores.

4.2 Dinâmica Interna da Unidade Prisional

ROTINA DOS POLICIAIS ACAUTELADOS

Conforme o regimento interno da UP os policiais presos devem seguir os horários

estabelecidos para acordar, realizar refeições e dormir. Não há atividades programadas para

ocupar o tempo ou preparar os policiais acautelados. O proprios internos organizam o tempo

livre para realizar atividades como prática religiosa, leitura e musculação, ações de reinserção

são raras.

As visitas acontecem três vezes por semana, mas sem local próprio para tal, os

familiares e amigos acompanham os policiais dentro de suas celas. Durante as visitas é

possível ver policiais vendendo comidas trazidas por familiares para poderem complementar a

renda, principalmente aqueles que foram expulsos.

Atualmente tal prática não é comum, pois há poucos policiais expulsos cumprindo

pena na UP e, após denúncias na mídia de benefícios gozados pelos policiais, a unidade

passou por diversas intervensões com o fim de adequar a UP aos padrões exigidos pela VEP.

Foram retirados diversos eletrodomésticos que antes eram permitidos, alguns

autorizados pela VEP, além de copos, facas, utensílios etc. Participei de algumas dessas

intervenções quando estava trabalhando no Batalhão de Polícia de Choque, o que permitiu

uma visão bem próxima de como os policiais viviam. Importante dizer que em todas as

intervenções e retiradas de pertences dos policiais era precedida de muita conversa para evitar

revoltas, tudo era bem conversado com os policiais acautelados antes da entrada da tropa de

choque para realizar as revistas.

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Os visitantes passam por revistas antes de entrarem na UP, bem como possuem os

pertences trazidos revistados. O rigor das revistas varia de acordo com o comando da UP, com

a pressão exercida pela mídia e pela VEP. Tal situação traz grande desconforto para os

policiais, pois eles não se veêm como condenados e não aceitam esse tratamento aos seus

familiares, bem como para os próprios policiais que realizam as revistas que se sentem

fiscalizando colegas de farda e familiares de seus pares.

Quando há um aumento no rigor das revistas e que podem gerar situações

desconfortaveis para os familiares como revistas íntimas, acontece uma pressão interna muito

grande, que muitas vezes pode desencadear rebeliões até que suas necessidades sejam

ouvidas. São usadas muitas conversas com policiais do Choque, com o Comandante da UP e

em casos extremos com o próprio Corregedor da PMERJ para que o impasse seja resolvido.

ORGANIZAÇÃO INTERNA

Os policiais, em regra, são separados internamente por seus postos e graduações na

hierarquia militar, o térreo é destinado aos oficiais de todos os postos, o 2º andar aos

sargentos e o 3º andar aos cabos e soldados.

Nos andares, eles são subdividos por galerias, que são grupos de celas fechadas que

possuem uma área comum de convivência no fundo onde se pede realizar refeições, lavar

roupas etc. As galerias possuíam grades que as isolavam do corredor principal do andar e as

celas possuíam grades que as isolava da área comum da galeria, mas todas foram retiradas. O

que permite que os policiais circulem livremente entre uma cela e outra e entre as galerias,

ficando apenas a entrada do andar trancada e guardada.

As celas são isoladas por tapumes que permitem uma privacidade maior dos policias

no dia a dia e nos dias de visita. Cada um adapta sua cela como bem entender e com os

pertences autorizados e trazidos por familiares, como colchões, armarios, quadros de fotos

etc. Todas as melhorias ou reparos para manutenção realizadas nas dependências são

custeadas pelos próprios policiais.

Quando chega um policial, ele fica em uma cela vazia e uma galeria determinada

pela Seção de Custódia, porém as trocas de celas são comuns quando um dos policiais ganha a

liberdade. Com a saída de alguém a cela esvaziada é oferecida ao policial com mais tempo de

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prisão naquela galeria e se ele recusar, é oferecida para o subsequente até alguem manifestar

interesse e passar a própria cela para outro, aproveitando assim as melhorias realizadas por

seu antecessor.

Há horários definidos para a realização de banho de sol, práticas esportivas e

musculação, alem de cultos religiosos. Nestes horáros os policiais possuem certa liberdade

supervisionada para transitar dentro dos prédios.

SITUAÇÕES QUE FOGEM À REGRA

Não há uma separação dos presos pela periculosidade ou tipo penal acusado, mas em

alguns casos específicos existem galerias separadas para certos grupos, como os acusados de

milícia. Mas tal separação não é institucional e fica na esfera do relacionamento pessoal dos

internos. Os policiais acusados de milícia se isolam e chamam pouca atenção para si

internamente.

Quando um policial conhecido adentra, o sistema também acontece o mesmo.

Geralmente policiais que conhecem outros internos vão para próximo deles ou se separam

internamente pelo tipo de acusação, já que muitas vezes foram acusados juntos.

Mas não há tratamento diferenciado dos presos pelos galerias. Todos são tratados

igualmente por eles, sendo o tratamento baseado na hierarquia militar e na visão de que são

presos não condenados e que podem voltar para a rua normalmente.

Alguns policiais com bom comportamento ou que estejam no semi aberto podem

trabalhar na administração da UP, tais serviços são prestados voluntariamente. Crachás

permitem o acesso diferenciado de cada parte do complexo da UP.

Os mais comuns são autorizações para trabalharem na parte de logística, secretaria,

limpeza, manutenção e obras, sendo os conhecimetos pretéritos dos policias usados para

melhorar o serviço da UP como pedreiro, eletricista, oficiais com experiência em áreas

administrativas.

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4.3 Rebelião na Unidade Prisional

Episódios de rebelião não são comuns na Unidade Prisional, são esporádicos. Um

evento que leva a uma revolta contra o sistema ou comando da unidade é o aumento no rigor

das revistas realizadas nos familiares dos policiais, colocando os familiares em situações

constrangedoras.

Episódios de arbitrariedade ou abuso por parte de comandantes também são usados

como pretexto para surgir um movimento de reclamação que pode ser usado para realizar uma

rebelião.

Outra situação peculiar que pode desencadear transtornos é quando policiais são

condenados e perdem a função pública, tendo que “atravessar o sistema”, ou seja, sair da UP e

ir para uma unidade administrada pela SEAP.

Há algum tempo, quando havia um grande número de ex policiais na UP e a justiça

determinava a transferência destes, era quase certo uma rebelião, atualmente tal situação fica

mais dificil dado ao inespressivo número de ex policias na UP, o que dificulta organizar uma

revolta.

Quando há grupos de policiais presos, condenados e expulsos as chances de rebelião

aumentam já que fica mais fácil uma organização de um grupo grande de insatisfeitos com o

sistema que temem pelo mesmo destino, geralmente tais situações são contornadas com

conversa do comandante da UP com os internos para apaziguar os ânimos, já que quem não

foi expulso pode responder disciplinarmente e agravar sua situação, mesmo que inocentado na

justiça, a figura de autoridade do comandante é extremamente importante.

Todas as rebeliões ou quase rebeliões que ocorreram na UP foram resolvidas com o

diálogo, ora com o próprio comandante da UP, com o comandante da tropa de choque ou com

o corregedor. As que possuem problemas internos, como revistas, são facilmente

administradas, quando envolvem problemas de relacionamento do comandante com os

acautelados pode acontecer a troca de comando para contornar o problema.

O principal entrave e que demandam mais horas de negociação são as que começam

por causa da transferência de presos para o sistema comum. Dado a ordem judicial para

transferência e a pouca margem de manobra para os negociadores, se espera o esvaziamento

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do movimento até que fique apenas o grupo pequeno que será transferido permaneça revolta,

até que desistam e sejam transferidos.

Não há relatos ou registros do uso da força por parte da PMERJ na resolução destes

conflitos, sendo usada a argumentação para como mecanismos de dar fim à rebelião.

Durante as intervenções que realizaei, enquanto oficial comandante de tropa do

Batalhão de Choque, pude participar e realizar tais argumentações. No meu caso em particular

deveria retirar objetos não autorizados pela VEP e utilizei o argumento de que deveríamos

manter a UP em ordem para que não se desse motivo para a mídia e a justiça pressionarem o

governo para a extinção da UP.

Tal temor existe entre os policais que estão presos e os que nunca foram acusados,

mas que por dolo ou culpa podem acabar acusados de um delito, não se imagina entre os

policiais ficarem presos junto com pessoas que prenderam, como ladrões, homicidas,

traficantes etc.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não foi possível realizar todos os objetivos propostos no início da pesquisa. Há

enorme ausência de material, publicações, livros, arquivos e outros, sobre o tema de policiais

presos. O banco de dados da UP mostrou-se simplório e não permitiu a obtenção de tantos

dados que se imaginou inicialmente. A tentativa de entrevistar gestores e ex gestores do

sistema também não foi concluída, questionários foram distribuídos, mas não foram

respondidos a tempo de integrar esta pesquisa.

A importância da teoria de Michel Misse sobre sujeição criminal, que a meu ver, cola

na imagem dos policiais em geral e acarretam tratamento diferenciado por parte do judiciário

com restrições a liberdade excessivas, contrariando o arcabouço legal.

Produz ainda a desmotivação dos policiais e a aversão da sociedade, principalmente

daqueles que foram acusados de delitos, tiveram sua liberdade e imagem afetadas

permanentemente e no fim foram inocentados e voltaram para o trabalho nas ruas.

O accountability policial ainda se mostra ineficiente e permite que o senso comum

dite as regras para punição, acusação e prevenção dos desvios policiais. Se tais desvios

fossem melhor conhecidos, poder-se-ia controlar e prevenir erros, levando a uma

profissionalização maior da atividade policial.

Bem como a mudança de visão de políticos e gestores sobre o enfrentamento ao

desvio como mero erro individual e a consequente responsabilização do policial e não de todo

um sistema problemático que dá brechas e muitas vezes incentiva o desvio de conduta.

Ficou claramente definido que a Unidade Prisional da PMERJ é um presídio

prioritariamente para cuidar de presos provisórios, número que gira em torno de 75% dos

policias acautelados, restando ainda pendente pesquisar a proporção de condenações dos

policiais.

O que pode refletir no retorno de grande número de policiais para o serviço nas ruas

após passarem pelo sistema e pela humilhação pública sem o cuidado do acompanhamento,

compensação ou programa de reintegração na instituição e na sociedade.

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A importância de pesquisar os erros cometidos pelos policiais também demonstrou a

situação gravissima de cerca de 40% das acusações serem de homícidio, demandando uma

resposta da intituição e do governo com um programa sério e responsável para diminuição das

mortes praticadas por policiais, sejam em serviço ou não.

Um programa que busque a prevenção e o controle dos policiais, e a

profissionalização da atividade policial. Não apenas um programa que busque a

responsabilização individual como forma de atender ao clamor público por vingança e de

resolver os problemas.

Espero que o conhecimento da estrutura, rotina, cotidiano e dinâmica das relações

internas da UP/PMERJ gerem mais pesquisas nessa área e uma visão da importância da

unidade para a reinserção destes policiais com o mínimo de trauma ao serviço policial.

A própria gerência de situações extremas como rebeliões é mais facilmente

administrável por conta de ser uma unidade policial militar e o uso da verbalização como

forma de resolução do conflito se mostra extremamente eficaz, evitando-se o uso da força.

Durante a pesquisa, fui surpreendido por notícias veiculadas pela grande mídia que

davam pela desativação da UP e consequente transferência de todos os policiais para a

administração da SEAP, o que causou uma grande apreesão e revolta tanto nos policiais que

trabalham na UP, que estão acautelados nela e na polícia de um modo geral.

Mais revolta ainda porque tal decisão partiu de dentro da polícia através da conversa

entre dois coronéis, um ex comandante geral e o outro o atual comandante geral. O que

demostra o descaso com a situação dos policiais e a prioridade do atendimento à questões

políticas em detrimento do respetio do direito dos policiais.

Até o fim desta pesquisa, a UP continua em funcionamento, muito pela atuação da

Defensoria Pública da AJMERJ que intercedeu e impediu a transferência de todos os

policiais, o que fere os regulamentos, normas e leis afetas ao tema.

Por fim, fica evidente o desconhecimento pela própria PMERJ do que acontece no

seio de sua tropa e a pouca atenção pelas ações do comando e suas consequências dado o

descaso e a falta de critérios claros e definidos de políticas de controle e correição.

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6. ANEXOS

- ANEXO 1 – Entrevista Rodrigo Souza (ex policial militar)

UFF ­ Universidade Federal Fluminense

Curso de Especialização em Políticas Públicas de Justiça Criminal e Segurança Pública

Monografia: Sistema Penitenciário Policial Militar

Orientando: Luiz Alexandre de Oliveira Martins

Orientador: Lênin Pires

Questionário com Acautelados no Sistema

Identificação do Entrevistado

Nome: Rodrigo Souza.

Quanto tempo permaneceu na UP/PMERJ: 40 dias.

Qual delito foi acusado: Fuga de preso.

Houve sentença? Quais instâncias? 01 ano de Sursis em 1ª instância.

1 – Qual o contato que o Sr(a) possui com os gestores(as) da Unidade Prisional da PMERJ

(UP/PMERJ)?

“Não tive nenhum contato com nenhum gestor.”

2 – Qual é a visão/idéia que tem de si mesmo como policial que se encontram na UP/PMERJ?

“Como um excluído e que não amparo de ninguém por parte da polícia.”

3 – Como é o dia-a-dia dos policiais, sua rotina?

“Acorda, toma café, assisti ao culto, praticar esporte, assisti o culto, tomar café, jantar e

dormir.”

4 – Como é feita a organização interna dos policiais?

“É feita através de hierarquia e o quem tem mais „nome‟ ou se é chefe de algo.”

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5 – Quais crimes são mais cometidos pelos policiais que se encontram na UP/PMERJ?

“Acredito que seja extorsão.”

6 – Existe alguma diferença de tratamento dos policiais levando em conta o tipo de crime que

está sendo acusado?

“Sim.”

7 – Pela sua experiência, já vivenciou, assistiu ou soube de casos de rebeliões na UP/PMERJ?

Como ocorreram? Como funcionam? Quais os motivos?

“Na minha época o maior problema era de uma suposta saída dos ex-policiais e o BEP

estava interditado.”

8 – Como são tratadas e resolvidas tais rebeliões?

“Clima muito tenso e através de muitas conversas com as lideranças do BEP.”

9 – A questão hierárquica e disciplinar dos policiais influencia na resolução desta crise?

“Sim.”

10 – Quais os principais problemas da Unidade Prisional hoje?

“Hoje não tenho como responder porque saí da unidade prisional em 2013.”

11 – Qual a visão que tem da sociedade hoje?

“Que falta conhecimento e educação para a sociedade.”

12 – Qual a visão que tem da PMERJ hoje?

“De uma instituição com muitos problemas de organização e não consegue prestar um bom

serviço para a sociedade.”

13 – No tempo que esteve na Unidade Prisional teve seus direitos como acusado garantidos?

“Não tive.”

14 – Quem cuida diretamente dos policiais presos ou acautelados e qual o tratamento recebido

destes?

Page 30: JCSP - Monografia Sistema Penitenciário Policial Militar - Luiz Alexandre de Oliveira Martins - Orientador Lênin Pires

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“Tratamento de desprezo, mesmo que você não tenha sido condenado.”

15 – Quais efeitos sua prisão e o período que esteve na UP/PMERJ teve na sua vida e na sua

carreira?

“Aprendi a dar mais valor a minha família e consegui terminar a minha faculdade e já estou

na segunda Pós Graduação e esperando um resultado de mestrado.”

Page 31: JCSP - Monografia Sistema Penitenciário Policial Militar - Luiz Alexandre de Oliveira Martins - Orientador Lênin Pires

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- ANEXO 2 – Entrevista Marcos Aurelio Guimaraes (Sargento policial militar)

UFF ­ Universidade Federal Fluminense

Curso de Especialização em Políticas Públicas de Justiça Criminal e Segurança Pública

Monografia: Sistema Penitenciário Policial Militar

Orientando: Luiz Alexandre de Oliveira Martins

Orientador: Lênin Pires

Questionário com Acautelados no Sistema

Identificação do Entrevistado:

Nome: Marcos Aurélio Guimarães.

Quanto tempo permaneceu na UP/PMERJ: 07 ( sete meses), 10 (dias) e 12 (doze horas).

Qual delito foi acusado: Roubo, Sequestro, Atentado Violento ao Pudor, Ameaça.

Houve sentença? Quais instâncias? Sim, absolvição. Primeira.

1 – Qual o contato que o Sr(a) possui com os gestores(as) da Unidade Prisional da PMERJ

(UP/PMERJ)?

“Muito pouca. Ou quase nenhuma.”

2 – Qual é a visão/idéia que tem de si mesmo como policial que se encontram na UP/PMERJ?

“ De abandono por parte de nossos superiores e de ser sobretaxado pelo Estado, pelo simples fato de

ser policial tendo direitos constitucionais negados enquanto os piores marginais usufruem das

benesses que a lei outorga.”

3 – Como é o dia-a-dia dos policiais, sua rotina?

“Sem afazeres ou atividades de reinserção ( como sou cristão e procurava me ocupar na igreja.”

4 – Como é feita a organização interna dos policiais?

“Cada galeria era divida em boxes e cada boxe tinha suas próprias regras de convivência e

organização, tendo sempre um representante.”

5 – Quais crimes são mais cometidos pelos policiais que se encontram na UP/PMERJ?

“Homicídios e concussão, ao meu ver.”

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6 – Existe alguma diferença de tratamento dos policiais levando em conta o tipo de crime que

está sendo acusado?

“Não, com exceção dos policiais que cometem crimes como assalto ou latrocínios.”

7 – Pela sua experiência, já vivenciou, assistiu ou soube de casos de rebeliões na UP/PMERJ?

Como ocorreram? Como funcionam? Quais os motivos?

“Quando estive acautelado, iríamos começar uma rebelião por conta dos maus tratos e pela

falta de respeito do gestor para com os acautelados.”

8 – Como são tratadas e resolvidas tais rebeliões?

“No nosso caso, foi feita uma reunião com o corregedor da PMERJ, que fez a troca do gestor e

resolveu o problema; pois só precisávamos ser tratados com dignidade.”

9 – A questão hierárquica e disciplinar dos policiais influencia na resolução desta crise?

“Com certeza, pois somos militares e obedecemos e entendemos que hierarquia e disciplina nos

mantém a cima de qualquer organização, desde que seja usada com profissionalismo e seriedade,

exemplo disso foi o Cel. Salema que assumiu o 7º BPM, um dos piores Batalhões do RJ, e o levou a

ser o 1º, através de uma gestão pautada na hierarquia e disciplina e na liderança. Ao contrário do

Cel., que a época em que passei pela UP PMERJ, tentou ser ditador e autoritário tentando dirigir e

não gerir a unidade.”

10 – Quais os principais problemas da Unidade Prisional hoje?

“Sai de lá em 2010, e não retornei mais desde então, mas quando estive lá eram os gestores.”

11 – Qual a visão que tem da sociedade hoje?

“Hipócrita, que não merece que eu cumpra meu juramento de dar minha vida por ela.”

12 – Qual a visão que tem da PMERJ hoje?

“Melhorou em alguns aspectos, mas existem duzentos anos de mandos e desmandos, que levará tempo

para esquecer, eu por outro lado mesmo com tudo isso tenho na sensação de missão cumprida aos

longo dos meus 19 anos de caserna.”

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13 – No tempo que esteve na Unidade Prisional teve seus direitos como acusado garantidos?

“Não. Estive preso preventivamente 270 dias, por ser policia( mesmo sendo primário sem nunca ter

tido nenhum tipo de desvio de conduta, pesando somente uma denuncia de uma pessoa de idoneidade

totalmente questionável), quando pra qualquer marginal da lei dura 81 dias como reza o diploma

legal.”

14 – Quem cuida diretamente dos policiais presos ou acautelados e qual o tratamento recebido

destes?

“São os galerias (fazem ligação entre os internos e a administração) e o tratamento

dispensado por eles é de respeito, tanto deles quanto o nosso, pois não nos víamos como diferentes,

mas sim como em situações diferentes.”

15 – Quais efeitos sua prisão e o período que esteve na UP/PMERJ teve na sua vida e na sua

carreira?

“Na minha vida apesar de estar encarcerado, tenho uma história de vida perante a família, a

sociedade civil, militar e religiosa da qual pertenço e todos sabiam da minha índole, mas fui julgado e

tratado com todo rigor pelas autoridades que me julgavam, pois toda minha historia de honras e

glórias em prol da sociedade, incluindo deixando de servir na Presidência da República para fazer

parte da segurança do Presidente Lula, (estava preso quando fui posto a disposição) ter sido

promovido por bravura por ter feito a maior apreensão de pasta de cocaína do RJ, e rejeitado

suborno de um carro e dois milhões de reais (motivo pelo qual fui acusado das barbáries que

capitularam o inquérito, depois que o tráfico não conseguiu me matar em duas tentativas), não

valeram nada contra a acusação de uma mulher que era esposa de um traficante, a fé pública que

consta na minha carteira de identidade não tem valor nenhum, pois a inversão de valores transforma

um vagabundo no mais confiável delator e a lei é burlada quando não cumprida, e eu tenho que

provar que sou inocente invertendo o ônus da prova.”

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8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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