jaqueline da silva albino - ufsc
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Jaqueline da Silva Albino
Tese submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Direito da Universidade
Federal de Santa Catarina para obtenção do
Grau de Doutor em Direito.
Orientador: Luiz Otávio Pimentel
Co-orientador: Araken Alves de Lima
Florianópolis/SC
2016
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO CIÊNCIAS JURÍDICAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO Campus Universitário – Trindade Caixa Postal 476
CEP: 88040-900 - Florianópolis - SC - Brasil
Fone: (48) 3721-9287 | Fax: (48) 3721-9733
http://www.ppgd.ufsc.br/ E-mail: [email protected]
Marco jurídico-institucional para gestão de transferência de
tecnologia para os núcleos de inovação tecnológica: estudo de caso
da universidade do Estado de Santa Catarina e Universidade do
Estado de Mato Grosso
JAQUELINE DA SILVA ALBINO
Esta tese foi julgada e aprovada em sua forma definitiva pelo Orientador
e demais membros da Banca Examinadora, composta pelos seguintes
membros:
Prof. Dr. Luiz Otávio Pimentel
UFSC – Orientador
Prof. Dr. Araken Alves de Lima
INPI – Co-orientador
Prof. Dr. Cláudio Eduardo Régis de Figueiredo e Silva
ESMESC – Membro
Profa. Dra. Ana Paula Martins Amaral
UFMS – Membro
Profa. Dra. Liliana Locatelli URI – Membro
Prof. Dr. Edgard Costa Oliveira UnB – Membro
Prof. Dr. Orides Mezzaroba
UFSC-Membro
Prof. Arno Dal Ri Jr., PhD
Coordenador do PPGD
Florianópolis, 29 de fevereiro de 2016.
Dedico esta tese às pessoas mais
importantes para mim, minha querida
mãe Rosires da Silva Albino e meu pai
Mário Albino pessoas responsáveis
pela minha trajetória de vida a quem
devo meu caráter e oportunidade de
sonhar voos altos. Ao meu irmão
Gustavo Tiago da Silva Albino e
cunhada Fabiana Cristina Baioni
Albino que na minha ausência
supriram os cuidados com meus pais.
Ao mesmo tempo, estendo esta
dedicatória aos meus amigos e colegas
Cristiani Fontanela, Maria Isabel
Araújo Silva dos Santos, Suelen Carls,
Valter Moura do Carmo e Fabíola
Wüst Zibetti que nesta jornada me
auxiliaram a permanecer forte e
determinada para conclusão deste
trabalho. Da mesma forma, dedico à
Sandra Nascimento da Nóbrega e
Zamira Xhaferri que no período de
pesquisa na Holanda contribuíram
para potencializar minha resiliência às
diferenças e adaptação em Maastricht.
Esta dedicatória se estende também ao
querido professor e orientador Dr.
Luiz Otávio Pimentel, quem acreditou
e confiou em minha capacidade como
pesquisadora e que transmitiu seus
ensinamentos e caminhos sobre a vida
e o Direito de Propriedade Intelectual.
AGRADECIMENTOS
O principal agradecimento à Deus que nos momentos mais
difíceis e solitários pude contar com sua mão invisível e todo amor para
que eu pudesse avançar e alcançar o término desta caminhada.
Agradeço especialmente à Universidade do Estado de Mato
Grosso, instituição que tenho orgulho em pertencer ao quadro de
servidores que possibilitou minha ausência de minhas atividades
jurídicas para que eu pudesse dedicar ao sonhado objetivo de concluir
um doutorado. À Universidade Federal de Santa Catarina, pelo
Programa de Pós-graduação em Direito (PPGD), através da
Coordenação e Secretaria do Curso possibilitaram gratuitamente
desenvolver este trabalho. Em especial, agradeço a servidora Maria
Aparecida de Oliveira, que incansavelmente demonstrou sua atenção e
carinho com os professores e pós-graduandos; também ao servidor
Fabiano Dauwe que ofereceu sua paciência e solicitude nos trabalhos do
PPGD. À Universidade de Maastricht que propiciou uma experiência
riquíssima de realizar pesquisa e apreender com o renomado Professor
Anselm Kamperman Sanders (A.W.J.). Ao Doutor Araken Alves de
Lima pela co-orientação nos momentos finais da realização desta tese.
Ao professor Doutor Everton das Neves Gonçalves, que sempre
esteve aberto para as dúvidas e discussões sobre o tema desta tese; aos
Professores Doutores Luis Carlos Cancellier de Olivo, Orides
Mezzaroba, Rogério Silva Portanova, Antônio Carlos Wolkmer, João
dos Passos Martins Neto, José Isaac Pilati e aos demais professores do
programa que contribuíram com seus ensinamentos para o
amadurecimento deste trabalho de conclusão. Aos professores Doutores
João Artur de Souza e Gertrudes Aparecida Dandolini pelas discussões e
sugestões metodológicas no desenvolvimento desta tese.
Aos Doutores Cláudio Eduardo Regis de Figueiredo e Silva,
Liliana Locatelli e Edgard Costa Oliveira que através de sugestões e
críticas deram robustez à finalização desta tese.
À amiga e professora Tânia Paula da Silva que abriu horizontes
com sua experiência e permitiu uma visão positiva para realização e
continuidade no exercício de reflexão acadêmica.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES) pela bolsa de estudos de Doutorado Sanduíche que
proporcionou uma experiência ímpar em minha carreira acadêmica.
A todos os amigos, amigas e familiares que contribuíram direta
ou indiretamente, muito obrigada.
“Tudo o que fizerem, seja em palavra seja em
ação, façam-no em nome do Senhor Jesus,
dando por meio dele graças a Deus Pai”.
Colossenses 3:17
RESUMO
A partir da vigência da Lei de Inovação (Lei nº 10.973/2004)
abriu-se oportunidade para o setor acadêmico e privado estabelecerem
relações e fomentar a inovação no país. Contudo, muitas críticas são
dirigidas ao marco legal brasileiro, que mesmo visando a melhor
interação dos atores de inovação (governo, academia e empresas), os
avanços não ocorreram na velocidade esperada. E alterações na
legislação nacional foram requeridas e recentemente realizadas. Porém,
esta pesquisa através de análises de casos reais, vislumbrou demonstrar
que apenas a mudança da lei geral não é suficiente, pois isto deve ser
implementado e acolhido dentro das instituições, principalmente, das
universidades. Assim, dedicou-se a observar o modelo jurídico-
institucional de gestão de transferência de tecnologia e conhecimento
nas universidades públicas estaduais e atuação dos núcleos de inovação,
o que possibilitou identificar as dificuldades intrínsecas de sua política
de inovação. Objetivamente, o estudo concentrou-se na compreensão do
ambiente produtivo de inovação que estejam presentes as universidades
e as empresas, bem como, compreender a dinâmica da inovação e dos
mecanismos que estimulam a geração e comercialização de tecnologia,
sendo essa uma negociação vantajosa para as duas partes. O estudo teve
a preponderância da pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental,
pois se baseou em normas e regulamentos internos de determinadas
organizações. A pesquisa ainda trouxe um viés qualitativo com estudo
de caso, em particular, os casos da Universidade do Estado de Mato
Grosso e Universidade do Estado de Santa Catarina. O desenvolvimento
das atividades serviu para consolidar os fundamentos teóricos através de
busca de casos e boas práticas e pela realização da revisão bibliográfica
e análise de documentos eleitos pela ordem de importância de
estruturação de cada instituição objeto de pesquisa e, para o
desenvolvimento regional e local. A partir da análise realizada
constatou-se que as universidades têm questões muito similares e
mesmo estando em Estados da federação diversos, ambas pontuaram a
importância de reforçar a autonomia na gestão da transferência de
conhecimento e tecnologia, principalmente, quanto à questão
orçamentária e políticas institucionais. Além de ser confirmado por
dados publicados por organizações reconhecidas na matéria
(FORMICT), constatou-se que as dificuldades em realizar a
transferência de conhecimento e tecnologia está muito conectada com o
modelo jurídico-institucional e políticas adotadas dentro da instituição
que propriamente falhas na Lei de Inovação. Compreendeu-se que os
estatutos jurídicos da administração pública representam a parte central
do modelo institucional, bem como dos instrumentos de controle e
orientação como os conselhos e instâncias decisórias. Todavia, com as
alterações trazidas pela Lei nº 13.243/2016, pode-se afirmar que as
Instituições de Ciência e Tecnologia poderão eleger, a priori, dois
modelos jurídico-institucionais, o que para este estudo convencionou-se
denominar de "modelo autônomo" e "modelo independente" (ou
interdependente), que este último compreendido na atual previsão de
constituição de NIT com personalidade jurídica própria, novidade que
traz a visão empreendedora de países desenvolvidos, que estão na
vanguarda do processo de inovação.
Palavras-chave: Inovação. Transferência de tecnologia. Núcleo
de Inovação Tecnológica. Parcerias. Modelo jurídico-institucional.
universidade.
ABSTRACT
After the effective implementation of the Innovation Law (Law
No. 10.973/2004) opened up the opportunity for academic and private
sector establish relations and foster innovation in the country. However,
many criticisms are directed at the Brazilian legal framework, that even
with a view to better interaction between innovation actors (government,
academia and business), progress has not occurred at the expected rate.
And changes in national legislation were required and recently held.
However, this research through real case analysis, glimpsed demonstrate
that only the change of the general law is not enough, as this should be
implemented and accepted among the institutions, especially the
universities. Thus, this research devoted to observe the legal-
institutional model of technology transfer and knowledge management
in public state universities and activities of innovation centers, allowing
to identify the intrinsic difficulties of its innovation policy. Objectively,
the study focused on understanding the productive innovation
environment that are present universities and companies, as well as
understand the dynamics of innovation and mechanisms stimulating the
generation and commercialization of technology is a win-win
negotiation for both parties. The study was the preponderance of
literature and documentary research; it was based on internal rules and
regulations of certain organizations. And yet, research has brought a
qualitative bias with case study in particular cases at the State University
of Mato Grosso and Universidade do Estado de Santa Catarina. The
development of activities served to consolidate the theoretical
foundations through search cases and best practices and for conducting
the literature review and analysis of documents chosen in the order of
importance of structuring each object of research institution, and for
regional and local development. From the analysis it was found that
universities have very similar issues and despite being in different states
of the federation, both scored the importance of strengthening the
autonomy in managing the transfer of knowledge and technology,
especially as the budget issue and institutional policies. Besides being
confirmed data published by recognized organizations in the field
(FORMICT), it was found that the difficulties in carrying out the
transfer of knowledge and technology is very connected with the legal
and institutional model and policies adopted within the institution itself
than actually failures in Innovation Law. It understood that the legal
status of public administration represent the central part of the
institutional framework, as well as control tools and guidance as the
advice and decision-makers. However, with the changes introduced by
Law No. 13.243/2016, it can be said that the institutions of science and
technology may elect, in principle, two legal and institutional models,
which for this study conventionally be called the "autonomous model"
and "independent model" (or interdependent), the latter understood in
the current NIT constitution forecast with its own legal personality,
novelty that brings the entrepreneurial and private vision of developed
countries, which are at the forefront of the innovation process.
Keywords: innovation. technology transfer. Technological
Transfer Offices. Partnerships. legal and institutional framework.
university.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Ambiente de inovação – Pimentel....................................... 44
Figura 2 – Triplice Hélice......................................................................59
Figura 3 – Tríplice Hélice – Livro ....................................................... 60
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art. – Artigo
AGU – Advocacia Geral da União
CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica
Cap. – Capítulo
CC – Código Civil (Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002)
C&T – Ciência e tecnologia
CT&I – Ciência, tecnologia e inovação
Dec. – Decreto
Dec.-Lei – Decreto-Lei
Dec. Leg. – Decreto Legislativo
EUA – Estados Unidos da América
FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
FHC – Fernando Henrique Cardoso
FMI – Fundo Monetário Internacional
FORMICT- Formulário de Informações sobre a Política de Propriedade
Intelectual das Instituições Científicas e Tecnológicas, do Ministério da
Ciência, Tecnologia e Inovação da Secretaria de Desenvolvimento
Tecnológico e Inovação
FORTEC – Fórum Nacional dos Gestores de Inovação e Transferência
de Tecnologia
GATT – Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio (General
Agreement on Tariffs and Trade)
ICT – Instituição de Ciência e Tecnologia
INPI – Instituto Nacional da Propriedade Industrial
ISI - Política de Industrialização por Substituição de Importações
LC – Lei Complementar
LP – Lei de Patentes (Lei n. 9.279, de 14 de maio de 1996)
MCTI – Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação
MERCOSUL – Mercado Comum do Sul
NIT – Núcleo de Inovação Tecnológica
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico
OEA – Organização dos Estados Americanos
OMC – Organização Mundial do Comércio
ONU – Organização das Nações Unidas
OP – Organização de Pesquisa
PA – Procedimento Administrativo
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PADCT (I,II e III) - Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico
e Tecnológico
PEC – Proposta de Emenda à Constituição
P&D – Pesquisa e Desenvolvimento
P,D&I – Pesquisa, desenvolvimento e inovação
PI – Propriedade intelectual
PIB – Produto interno bruto
PNB – Produto nacional bruto
PITCE - Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior
PNCTI - Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação
PPP – Parceira público-privada
RDC – Regime Diferenciado de Contratação
SNCTI – Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação
TIC – Tecnologia da informação e da comunicação
TT – Transferência Tecnologia
UE – União Europeia
U-E- Universidade e empresa
UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina
UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina
UNEMAT – Universidade do Estado de Mato Grosso
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 23
1 A INOVAÇÃO: CONCEITOS, SISTEMAS E MODELOS 37
1.1 Os conceitos sobre inovação 37
1.2 Ambiente de Inovação 42
1.3 Modelos de inovação (linear ao interativo) 44
1.4 Sistemas de Inovação: conceito e papel dos atores 52
1.4.1 A Teoria da Tríplice Hélice 57
1.5 A inovação e o processo de transferência de
tecnologia 62
1.5.1 O pensamento utilitarista e sua relação com a
pesquisa 63
1.5.2 A importância do modelo jurídico-institucional
para realizar inovação 70
1.6 Um olhar mais abrangente: modelos de transferência
de tecnologia de instituições ensino em Israel e Países Baixos 74
1.6.1 Modelo de Transferência de Tecnologia na
Holanda 76
1.6.2 Modelo de Transferência de Tecnologia em Israel
83
2 POLÍTICAS E MARCO LEGAL BRASILEIRO PARA
INOVAÇÃO 103
2.1 A política de inovação no Brasil e seu impacto nas
relações entre universidade pública e empresas 103
2.1.1 O que é Política de Inovação? 105
2.1.2 O diagnóstico brasileiro sobre as dificuldades ou
insuficiência na transposição do grande conhecimento
científico e tecnológico no país: Brazilian Paradox 109
2.2 Sistema Nacional de Inovação 110
2.2.1 Diferença sobre pesquisa básica e aplicada: vale a
pena insistir na dicotomia? 113
2.2.2 A evolução da ciência e pesquisa no Brasil 116
2.3 A lei brasileira de inovação e influências da lei
francesa e norte americana 121
2.3.1 Bayh-Dole Act 121
2.3.2 A Lei de Inovação Francesa de 1999 (Loi sur
l’innovation et La recherche) 127
2.4 Lei de Inovação no Brasil: Para que uma lei de
inovação? 131
2.4.1 Pontos controvertidos: aplicação da Lei de
Licitação em razão da generalidade da Lei de Licitação 135
2.4.2 Dificuldades na contratação: ausência de
regulamentação para os contratos de ICT 139
2.4.3 É possível pensar num Regime Diferenciado de
Contratação (RDC) para Inovação? 144
2.5 O que pode mudar com o novo marco legal proposto:
comentários ao Código de Ciência e Tecnologia 148
2.5.1 Objetivo do Código Nacional de Ciência,
Tecnologia e Inovação 150
3 A RELAÇÃO UNIVERSIDADE E EMPRESA E
GESTÃO DA TRANSFERÊNCIA DE CONHECIMENTO E
TECNOLOGIA 161
3.1 Aspectos que influenciam a relação entre universidade
e empresa no ambiente de inovação brasileiro 161
3.2 Políticas científicas do governo brasileiro 162
3.3 O processo de industrialização brasileiro 164
3.4 A Relação Universidade e Empresa: os dois lados da
moeda 167
3.4.1 A Velha dicotomia entre público e privado: a
influência nas relações entre as instituições públicas e
privadas 167
3.4.2 O setor empresarial e industrial brasileiro: A
industrialização tardia e o atraso tecnológico e seus efeitos
173
3.4.3 As Instituições de Ciência e Tecnologia-ICTs e seu
papel na relação Universidade e Empresa 178
3.5 A gestão da transferência de tecnologia e
conhecimento nas universidades 196
3.5.1 A transferência de tecnologia realizada pelas ICTs
197
3.5.2 O papel dos Núcléos de Inovação Tecnológica no
Brasil 198
3.5.3 O Modelo jurídico-institucional atual da gestão de
transferência de tecnologia 210
4 ESTUDO DE CASO: UNIVERSIDADES DOS
ESTADOS DE MATO GROSSO E SANTA CATARINA 219
4.1 Procedimentos metodológicos de pesquisa 219
4.1.1 Métodos de Pesquisa e do Estudo de Caso 220
4.1.2 Escolha da Técnica e Instrumento de Coleta 222
4.1.3 Seleção dos casos 223
4.2 As universidades estaduais e seu contexto 225
4.2.1 Universidade estudada: UNEMAT 228
4.2.2 Universidade estudada: UDESC 232
4.3 Análises dos casos estudados 238
4.3.1 Da análise e interpretação dos dados coletados 238
4.3.2 Quadros comparativos: análise das entrevistas 241
4.4 Modelo jurídico-institucional: mudanças e
alternativas 248
4.4.1 Questões relevantes sobre o modelo jurídico-
institucional 250
4.4.2 Orçamento 253
4.4.3 Da natureza jurídica e modelo institucional 262
CONCLUSÃO 275
REFERÊNCIAS 285
APÊNDICES 305
APÊNDICE A: Roteiro pesquisa empírica 305
APÊNDICE B: Roteiro de entrevistas 307
ANEXOS 314
ANEXO A: Lei nº13.243, de janeiro de 2016 314
ANEXO B: Resolução nº 090/20014 CONSUNI-UDESC 340
ANEXO C: Resolução 080/2008 CONEPE-UNEMAT 349
23
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, muitos países buscaram seus lugares na
corrida da tecnologia e estes consideraram usar o termo "inovação"
como ferramenta de auxílio nesta corrida. Inovação encontra-se entre
dois aspectos de orientação, portanto, um voltado para o avanço
tecnológico e outro para o mercado consumidor, sendo este último de
maior interesse do setor privado e indiretamente ao governo. Neste
contexto, foram feitos esforços para ampliar o diálogo entre as entidades
promotoras de inovação (setor público e privado), incluindo questões
legais e de investimento do poder público. Assim, a relação entre
indústrias, empresas, universidades e institutos de pesquisa reafirmou-se
neste cenário com objetivo de desenvolver novas tecnologias. É
primordial a capacidade de adotar e criar novas tecnologias, afetando
vários aspectos, desde o custo de produção de bens de capital até a renda
per capita.
A inovação tecnológica tem função estratégica no
desenvolvimento, porque aperfeiçoa a utilização de matérias-primas,
agrega valor aos produtos e serviços, é um diferencial na concorrência,
e, da mesma forma permite encontrar soluções a problemas práticos da
sociedade. A importância da utilização da inovação como ferramenta
para o crescimento econômico e o desenvolvimento pode ser
demonstrada por edições de Manuais da Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico (OCDE), como o Manual de Frascati
(primeira edição em 1963) e o Manual de Oslo (primeira edição em
1995). A organização apresenta regularmente um documento que define
quatro tipos de inovação, a saber: inovação de produto (um bem ou
serviço que é novo ou significativamente melhorado); inovação de
processo (novo ou significativamente melhorado de produção ou
método de entrega, incluindo mudanças significativas em técnicas,
equipamentos e ou software); inovação de marketing (um novo método
organizacional envolvendo mudanças significativas na concepção do
produto ou embalagem, colocação de produtos, promoção de produtos
ou preços); e inovação organizacional (um novo método organizacional
nas práticas de negócios, na organização do local de trabalho ou nas
relações externas).
Ao se considerar que a inovação na sua execução necessita da
atuação de agentes para seu desenvolvimento, emerge a visão sistêmica
na organização e compreensão da inovação. O conceito de Sistema
24
Nacional de Inovação surgiu em 1980, quando pesquisadores como
Freeman, Lundvall e Nelson defenderam a vigência desta forma
sistêmica, em que foi indicado que o sistema de investigação composto
por setores (governo, universidade e indústria) e seu ambiente têm a
inovação como principal objetivo. Reconhecendo que o termo ganhou
destaque na década de 1980, contudo, é possível perceber que este
conceito já estava sendo aplicado muito antes pela Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e outros autores,
pois desde 1960 já se utilizava a abordagem do sistema para estudar
decisões e escolhas sobre ciência tecnologia e inovação. Quando se
pensa em sistema de inovação, o termo "sistema" indica um conjunto de
elementos que se interagem e se complementam, de forma ordenada,
possibilitando a melhor atuação de cada um destes elementos. Portanto,
envolve atores, formas de interação, políticas e marco normativo
(legislações e regras). Neste ponto de vista, o sistema tem intensificado
a integração das indústrias, empresas, universidades e governo ao longo
dos anos.
O Brasil, para apoiar a inovação tecnológica criou um sistema de
instrumentos legais e mecanismos (políticas) para colocar em prática a
previsão constitucional presente nos seus artigos 218 e 219. Assim,
surgiu a Lei de Inovação, no âmbito federal, a Lei 10.973/2004, a qual
trouxe o escopo de ampliar e tornar eficiente a transferência do
conhecimento existente no ambiente acadêmico para o setor produtivo,
visando estimular a cultura de inovação, bem como, fomentar o
desenvolvimento industrial brasileiro. Replicou-se esta visão em alguns
estados brasileiros que, a partir de 2004, organizaram seu sistema de
inovação regional, a exemplo de Mato Grosso, com a Lei Complementar
nº 297/2008 e Santa Catarina com a Lei nº 14.328/2008, sendo pioneiros
nesta iniciativa.
Ressalta-se que mesmo após a publicação das leis federal e
estaduais no país, suscitam-se, ainda, discussões quanto à aplicação das
normas. Os receios do setor privado em estabelecer parcerias com as
instituições de ensino público, a ausência de investimento robusto em
pesquisas e estrutura, a morosidade nos procedimentos institucionais, as
condições restritas da Lei de Licitação (Lei Federal nº 8.666/93) para
comprar produtos, materiais e equipamentos, adicionados à grande
extensão geográfica do país, são alguns dos entraves neste contido
desenvolvimento no campo da inovação nacional. Assim, a falta de
informação, ou mesmo o receio de se envolver com a burocracia pública
25
são fatores determinantes para o desestímulo do setor privado em
realizar parcerias com o setor público.
Por certo a lei é uma realidade formal, que se transformará em
uma realidade concreta com o decorrer do tempo, possibilitando gerar
inovação nas empresas, porém, é necessária a harmonização de ações e
adequações quanto aos procedimentos e a desburocratização,
principalmente, nas instituições de ensino e pesquisa públicas.
Comprendendo estes fatores e dificuldades de interação entre os
setores, o estudo concentra-se na compreensão do ambiente produtivo de
inovação no qual estão presentes as universidades e as empresas, na
dinâmica da inovação e dos mecanismos que estimulam a geração e
comercialização de tecnologia, como políticas e normas. Da mesma
forma, quanto à gestão de transferência de tecnologia encontrada,
particularmente, na estrutura universitária, visando uma negociação
vantajosa para ambas às partes. Acredita-se que o estudo, após
realização de um diagnóstico do sistema de inovação e políticas no país,
e a participação de seus atores, sejam eles, instituições de ensino e
pesquisa, setor privado e governo, e a dinâmica quanto à transferência
de tecnologia, focará em uma análise mais crítica institucionalmente,
com exemplos de outras nações. Isso contribuirá para que os ambientes
de ensino e pesquisa sejam propícios para a aplicação do marco jurídico
de inovação no país, e a a sociedade terá o benefício com o
desenvolvimento tecnológico.
Para este estudo, definiram-se três áreas de conhecimento que
integram as ciências sociais aplicadas, conforme critério Conselho
Nacional de Pesquisa e Pós-graduação (CNPQ), sendo estas: Direito,
Administração (gestão) e Economia, ressaltando que o objeto de estudo
envolve conhecimentos interdisciplinares.
Reconhece-se que no ambiente de inovação destacam-se dois
setores que necessitam se comunicar, o setor público e o privado. Para o
primeiro setor, estão compreendidos tanto o governo com suas políticas
e diretrizes de inovação e financiamentos, quanto para a participação de
instituição de ciência e tecnologia pública que figuram neste ambiente.
Já o setor privado é representado pelas indústrias e empresas que
diretamente atuam no mercado e disponibilizam produtos e serviços.
Ressalta-se que existem papéis distintos e relevantes desempenhados
pelas organizações no processo de inovação, que são: academia,
governo e empresas/indústrias, nominados pelo modelo da Tríplice
Hélice. Estes atores relacionam-se (com parcerias, prestação de
serviços), transferem-se (conhecimento, informação, dinheiro,
26
tecnologia) e dinamizam a inovação. Por conseguinte, cada qual exerce
um papel, assim: as universidades e os governos exercerm a função de
suporte estrutural, científico e financeiro, auxiliando o setor privado a
exercer seu papel no desenvolvimento de novas ideias, ações e produtos.
Tradicionalmente, cada ator participa com sua ação sendo que a
produção e comercialização é papel do setor privado; o governo é o
responsável por implementar políticas e legislação; e as universidades
ou institutos de pesquisa são fontes de conhecimento e tecnologia.
A própria Lei de Inovação (Lei Federal nº 10.973/2004) indica
como uma forma de fomentar o sistema de inovação, a interação
universidades e empresas. Porém, esta comunicação ainda encontra
ruídos, principalmente, quanto à diferença da dinamicidade de soluções
de problemas aos dois setores. Da mesma forma, há dificuldades em
razão dos interesses diversos que uma universidade pública e uma
empresa têm quanto à cooperação e compartilhamento de
conhecimentos e resultados de pesquisas. No âmbito estadual,
vislumbra-se também um cenário de inovação, evidentemente em menor
grau, que se vincula mais diretamente às diretrizes e políticas estaduais e
neste ponto as universidades públicas estaduais estarão em evidência
juntamente com o setor produtivo local para fomentar a inovação.
As parcerias são indicadas como um instrumento facilitador de
inovação na legislação nacional e estadual sendo, muitas vezes,
obstaculizadas pela diferença de objetivos entre os parceiros
(instituições e empresas), entre a compreensão sobre os conceitos
pesquisa básica e aplicada e, a tímida política de investimento no setor.
Portanto, mesmo com o incentivo legal para realizar parcerias, em quase
todos os estados da federação, quase se tratar de parcerias com
instituições públicas e o setor privado, há um receio de utilizar, por
exemplo, os artigos de dispensa de licitação que estão previstos na
legislação pátria, definir a titularidade da propriedade intelectual gerada,
dificultando e desestimulando a cooperação. E pode-se considerar que
não tem havido uma efetiva implementação da legislação pátria citada.
Confiando no papel importante que as instituições de pesquisa
exercem, particularmente, que as universidades públicas estaduais
exercem no Brasil, como o faz a Universidade de Campinas
(UNICAMP) e a Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, parte-
se da compreensão que é possível analisar o papel de uma instituição
estadual no Sistema Regional de Inovação e repensar um modelo
jurídico-institucional mais compatível para desenvolver a inovação, o
que norteou este estudo. As variáveis estudadas foram: modelo jurídico-
27
institucional de gestão de transferência de tecnologia e conhecimento e
da organização das universidades públicas, atuação dos núcleos de
inovação, papel da universidade pública no sistema nacional e regional
de inovação, diretrizes políticas para efetivação do marco normativo de
inovação.
A pesquisa buscou refletir o questionamento a seguir:
Os modelos jurídico-institucionais de gestão de transferência de
tecnologia e conhecimento aplicados nas instituições públicas de ensino,
Unemat e Udesc, têm influência na dinâmica da relação universidade e
empresa?
Portanto, para responder esta indagação, a pesquisa concentrou-se
na análise e proposição de um modelo jurídico-institucional de gestão de
transferência de tecnologia em universidade pública estadual, a partir da
consolidação do marco normativo nacional (Lei de Inovação em 2004 e
seus desdobramentos). Para entender as políticas de inovação no país, e
a sua aplicação em âmbito estadual, foi utilizada a pesquisa empírica nas
universidades estaduais de Mato Grosso e Santa Catarina, e quanto à
atividade de transferência de conhecimento e tecnologia e sua relação
com o setor privado.
A pesquisa foi realizada com objetivo principal em refletir e
analisar o modelo jurídico-institucional de gestão de transferência de
conhecimento e tecnologia adotada pelas universidades públicas
estaduais e verificar formas para dinamizar a inovação baseadas no
marco jurídico brasileiro. Tendo em vista que, a observação dos textos e
práticas de ações sobre o tema, mesmo com legislações incentivadoras à
inovação, as instituições brasileiras de ensino e pesquisa e,
consequentemente, as estaduais, encontram limites e dificuldades no
processo de contratação, titularidade da propriedade intelectual,
principalmente quando realizam parcerias com o setor privado.
Inicialmente, observou-se o contexto nacional, em seguida,
verificou-se nas instituições de ensino e pesquisa estudadas suas
dificuldades. Assim, foram propostos caminhos jurídico-institucionais
para que haja auxílio às universidades públicas estaduais no
desenvolvimento de seu papel participativo na geração de novos
produtos, processos inovativos.
A pesquisa foi desenvolvida nos seguintes objetivos específicos,
quanto ao cumprimento do objetivo geral, quais sejam:
a) identificar os conceitos, políticas que influenciam a inovação e
a relação entre a universidade e a empresa em uma visão geral,
inclusive, comparando os modelos e boas práticas de gestão de
28
compartilhamento de conhecimentos e tecnologia adotados por
universidades estrangeiras;
b) analisar o marco normativo brasileiro direcionado à inovação e
apontar evoluções legislativas importantes;
c) apontar as lacunas existentes entre a interação Universidade e
Empresa e verificar quais os pontos de convergência para
incentivar as parcerias e desenvolver uma melhor política de
inovação;
d) identificar o modelo jurídico-institucional atual adotado pelas
universidades públicas no país, suas vantagens e desvantagens e
apresentar propostas a este modelo para uma melhor gestão da
transferência de tecnologia e conhecimento nas universidades
públicas estaduais.
No método de abordagem foram formuladas hipóteses, pois a
pesquisa iniciou-se pela percepção de uma lacuna de abordagem sobre o
tema, da mesma forma, utilizou-se do processo dedutivo, tendo em vista
que existem situações gerais que foram observados nos casos
escolhidos, nas instituições escolhidas, verificando-se a ocorrência de
fenômenos abrangidos pela hipótese. Quanto ao método de
procedimento, foi em grande parte monográfico, pois abordou um
estudo sobre um tema específico de suficiente valor representativo e que
obedeceu a uma metodologia. E ainda, o método comparativo que
verificou e explicou fatos segundo suas semelhanças e suas diferenças.
O tipo de pesquisa adotada segundo seus objetivos foi
exploratório, portanto, considerou os variados aspectos relativos ao fato
estudado, envolvendo um levantamento bibliográfico, entrevistas com
pessoas experientes e análise de exemplos que facilitaram a
compreensão do problema pesquisado.
No que se refere ao delineamento da pesquisa (design), levou-se
em consideração o ambiente de pesquisa, a abordagem teórica e as
técnicas de coleta e análise de dados, o estudo teve a preponderância da
pesquisa bibliográfica e, situações pontuais, a pesquisa documental,
pois, teve como fonte normas e regulamentos internos de determinadas
organizações. E ainda, o estudo de caso que visou concentrar esforços
em estudar instituições públicas como objeto para que permita seu
amplo e detalhado conhecimento e que é utilizado para contribuir ao
conhecimento dos fenômenos individuais, grupais, organizacionais,
sociais, políticos e relacionados. Assim, no tocante aos procedimentos
técnicos e desenho da pesquisa, sendo uma pesquisa bibliográfica, a
partir da escolha do tema foi realizado um levantamento bibliográfico
29
preliminar que baseou a formulação do problema e possibilitou a
elaboração do plano provisório do assunto escolhido e definição das
fontes para pesquisa. Após identificação das fontes e leitura do material
escolhido, teve uma organização lógica da pesquisa e a redação do texto
final.
O levantamento bibliográfico incluiu fontes bibliográficas nas
três áreas de conhecimento identificando as palavras-chave seguintes:
gestão da inovação e/ou tecnologia, transferência de tecnologia
relacionados à universidade e empresa, bem como, universidade pública
e/ou estadual, universidade multicampi e modelos institucionais.
O desenvolvimento das atividades serviu para consolidar os
fundamentos teóricos através de busca de casos e boas práticas e pela
realização da revisão bibliográfica e análise de documentos eleitos pela
ordem de importância de estruturação de cada instituição objeto de
pesquisa e, para o desenvolvimento regional e local.
A análise qualitativa trouxe em particular, os casos da
Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT) e da Universidade
do Estado de Santa Catarina (UDESC), perpassando pelo referencial
teórico sobre sistema de inovação, relação universidade e empresa,
papel da universidade e modelos institucionais adotados em outros
países. Sabe-se que o Estado de Mato Grosso é conhecido pela sua
vocação agrícola e extrativista, sendo consagrado como grande
exportador de soja e carne bovina. O Estado de Santa Catarina tem uma
economia diversificada e bem distribuída em diferentes regiões dentro
do Estado e desenvolvem diferentes atividades desde agroindústria,
turismo, empresas de eletrodomésticos, indústria metal mecânica,
extrativismo, pecuária e também mais recentemente empresas de
tecnologia de informação. Estas universidades estão inseridas em
estados da federação, que apesar de estarem em regiões diferentes e a
economia com características próprias, foram pioneiros na publicação de
uma lei estadual para a inovação.
Assim, realizou-se a análise qualitativa através de entrevistas
semiestruturadas visando constatar as dificuldades ou vantagens
apresentadas pelo modelo jurídico-institucional atual adotado. As
entrevistas visaram obter informações sobre situações específicas das
instituições, bem como, escolheram-se os entrevistados em razão do seu
grau de envolvimento direto em cooperação ou negociação na relação
universidade-empresa. As entrevistas foram realizadas através de visitas
aos agentes de Núcleo de Inovação de cada universidade pública
estadual, através de um roteiro em que foram elaboradas perguntas
30
abertas e não estruturadas. A seleção das instituições ocorreu devido ao
tema de estudo, problema de pesquisa e os objetivos, bem como, sua
natureza jurídica e inserção geográfica. O que possibilitou uma
abordagem pontual sobre os pontos relevantes nestas parcerias, estrutura
universitária e veio corroborar a proposta de mudanças legislativas e
estruturais do modelo analisado.
A pesquisa adotou o método de estudo de caso, especificamente
quanto às instituições científicas estaduais (Universidades do Estado de
Mato Grosso e do Estado de Santa Catarina). Desta forma, realizou um
estudo de caso institucional comparado. Os critérios de escolha das
instituições permearam em razão destas serem universidades públicas
estaduais multicampi, já que existem poucos estudos direcionados para
estas instituições estaduais; pelo fato de terem institucionalizado, seu
Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT), porque, é a partir deste órgão
que as universidades passaram a aprimorar e realizar gestão de
transferência de tecnologia e administrar os projetos e contratos que
envolvam inovação; também por terem adotado regras mínimas sobre a
transferência de conhecimento e tecnologia e políticas institucionais que
podem demonstrar os reais reflexos do direcionamento da legislação e
política nacional sobre inovação, e, comprovar se a realidade está se
refletindo nos documentos institucionais, bem como, por que tiveram ou
têm contato com o setor privado após a Lei de Inovação. Adicionando-
se a estes critérios, o interesse desta pesquisadora em razão de
experiências quanto às atividades e funcionamento de uma universidade
pública estadual, somadas às facilidades de acesso a documentos e
disponibilidade dos profissionais em participar dos estudos, os quais
também foram fatores que complementaram a escolha das instituições.
Uma cultura de inovação é fundamental na construção do
conhecimento e a inovação tecnológica passa a ser uma mola propulsora
nas políticas de desenvolvimento regional e nacional. Deve-se também
enfatizar que existem papéis distintos e relevantes que são
desempenhados pelos atores responsáveis em fomentar a inovação.
Estes atores são nominados pelo modelo Tríplice Hélice, quais sejam a
academia, governo e empresas (e indústrias) que interagindo
possibilitam a dinâmica da inovação. Assim, cada qual exerce um papel,
as universidades e governo servem como suporte estrutural, científico e
financeiro, para que o setor privado possa também exercer seu papel no
desenvolvimento de novas ideias e ações.
A visão tradicional indica que a produção e a comercialização
estão dedicadas à indústria; o governo deve ser o responsável em
31
implementar políticas e marco normativo; e as universidades ou
institutos de pesquisa como fonte de conhecimento e tecnologia. Os
sistemas nacionais de inovação devem orientar o relacionamento entre
os atores, incluindo legislações, políticas específicas, fundos de
investimentos para melhorar o desempenho da produção tecnológica e
distribuição das tecnologias. E o governo brasileiro, seguindo, de certo
modo, uma visão internacional tem construído um sistema de inovação
com políticas de incentivo a pesquisa, desenvolvimento e inovação
(P,D&I) e legislações para introduzir esta cultura inovadora.
Porém, este papel inovador das universidades, principalmente, as
públicas brasileiras, apesar de muitos esforços realizados, têm
encontrado dificuldades em alcançar os níveis desejáveis para inovação,
quando comparadas às instituições em outros países também
emergentes, como os asiáticos. Não surpreende que após o período de
quase uma década da promulgação da Lei de Inovação (Lei
10.973/2004), o país voltou a discutir um novo marco jurídico para
inovação, comumente denominado Código da Inovação, que culminou
na aprovação de alterações emo seu texto em 2016 (Lei 13.243/2016),
que busca efetivar os objetivos e políticas inovadoras e empreendedoras
do conjuto de normas criado anteriormente.
Neste contexto, a pesquisa desenvolvida tem sua relevância, uma
vez que nestes mais de 10 anos de existência da legislação citada, não se
verificam os resultados esperados e voltou-se a discutir a possibilidade
de promulgação da citada legislação. Contudo, mesmo entendendo
necessários os ajustes legais, deve-se ter em conta as especificidades,
fatos concretos e dificuldades das instituições que estão além do marco
legal, como questões internas na forma de decidir e prioridades
institucionais, uma política em prol da inovação, procedimentos entre
outros. Estas questões são muitas vezes desconsideradas, em textos
científicos e os casos estudados ofereceram uma percepção da sua
importância privilegiada.
A relevância desta investigação também decorre da escassa
bibliografia existente sobre a absorção da legislação de inovação
internamente nas instituições, pois, a literatura apesar de tratar da
aplicação da lei, o faz de forma muito genérica. Existe uma posição
dominante nos estudos e relatórios sobre a gestão de inovação e
implementação da lei, reafirmando que a lei é falha, porém, pouco se
discute a forma que esta legislação foi recepcionada institucionalmente,
esquecendo-se das estruturas, políticas institucionais que se somam aos
elementos que influenciem qualquer relação entre a universidade e
32
comunidade externa. Logo, esta pesquisa é relevante porque representa
uma abordagem mais específica sobre a discussão.
No que concerne ao ineditismo, este se apresenta em razão de
existirem poucas discussões sobre o universo das universidades
estaduais fora da região Sudeste e Sul, quiçá multicampi, a carência de
estudos sobre esta universidade multifacetada, por si só justificaria
estudos na área, reconhecendo que a maiorias das universidades
estaduais assumiu uma constituição multicampi e estão presentes em
todas as regiões do país, e em 16 Estados da Federação. E atualmente,
representam mais de 35 universidades estaduais (em geral) pelos dados
da Associação Brasileira dos Reitores das Universidades Estaduais e
Municipais (ABRUEM). As universidades estaduais são integrantes do
Sistema de Ensino Superior no país, porém, seu financiamento está
atrelado aos repasses do Estado diretamente, ou indiretamente através da
Secretaria de Estado em que a instituição está vinculada. O fomento
federal baseia-se em aderência de programas do Governo Federal,
esporadicamente. Ressalta-se que entre as peculiaridades das
universidades estaduais está o seu modelo de constituição e natureza
jurídica. A maioria está constituída como fundação e outras como
autarquia estadual, com regime especial e com dotação orçamentária
própria, mantidas pelo Estado ou por repasses da Secretaria de Estado de
Educação ou de Ciência e Tecnologia que estão vinculadas, e as
decisões de suas políticas dependem também do Conselho Estadual
(Educação ou Ciência e Tecnologia). Verifica-se que os estudos sobre as
universidades públicas estaduais, mesmo que em âmbito geral são
escassos, muito menos sobre sua gestão em transferência e tecnologia,
que neste ponto se concentram nas universidades federais e do sudeste
do país. Particularmente, o Estado de São Paulo possui um conjunto de
universidades estaduais internacionalmente reconhecidas, sendo
referência, tanto pela qualidade de ensino, quanto pelo volume de
atividades de pesquisas e consequentemente, transferência de resultados,
como a Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual
Paulista (UNESP) e Universidade de Campinas (UNICAMP). Já o
Estado do Paraná retém o maior número de instituições estaduais
distribuídas nas diversas localidades do estado, apesar de serem
destaques nacionais, estas não são foco desta pesquisa.
No mesmo sentido, realizou-se a pesquisa de maneira singular, já
que não reafirma estudos das regiões e padrões de instituições do Sul e
Sudeste, evitando a repetição de discussões apresentadas na literatura
sobre a temática. Objetivou-se visualizar universidades com um
33
reconhecimento nacional sim, porém, com um compromisso atrelado ao
desenvolvimento regional e que diferentemente não estão em fases tão
avançadas como as estaduais paulistas, o que possibilita uma
identificação das dificuldades e barreiras de forma efetiva, o que permite
uma visão mais realista das muitas universidades brasileiras, o que
contriubui, também, para ampliar a bibliografia que ainda é escassa
sobre os casos de universidades estaduais em fase de implementação da
gestão de transferência de tecnologia. A não trivialidade da mesma
forma é demonstrada quando se refere aos modelos internacionais de
transferência de tecnologia, trazendo países que geralmente não são
evidenciados nas pesquisas sobre o tema, a saber: Israel e os Países
Baixos, que em contraste com o Brasil, possuem uma extensão
territorial ínfima, porém, mantém resultados consideráveis
internacionalmente.
Portanto, as relações entre universidade e empresa, a gestão
estratégica do conhecimento são tópicos fundamentais na melhoria da
competitividade e índices regionais mediante a captação, interiorização
e propagação do conhecimento adquirido na universidade ou instituto de
pesquisa. E verificando que o modelo brasileiro de universidades
voltado preferencialmente para formação de profissionais a mercado de
trabalho já não subsiste sozinho, as instituições devem assumir um papel
mais dinâmico para desenvolverem, com evidência, pesquisas aplicadas,
convergindo, também interesses do setor privado e promoção da
inovação. Contudo, percebe-se que o país mesmo com marco legal e
políticas para inovação constituídos, a interação entre universidades
públicas e empresas precisa de ajustes. O sistema universitário deve ser
repensado e reestruturado, de modo que se compreende que a
comunidade acadêmica no seu papel propulsor de gerar novos
conhecimentos científicos e tecnológicos para inovação, deve repensar a
sua agenda de pesquisa, comunicando-se mais com a sociedade.
Dentro desta premissa, há relevância, ineditismo e singularidade
do estudo sobre a interação entre estes atores na transferência e
caracterização dos conhecimentos e tecnologias, tendo como principal
objeto investigado a universidade pública estadual, analisando modelos
jurídico-institucionais para que estas universidades possam desenvolver
melhor este papel no cenário regional de inovação.
A tese apresentada tem correspondência à área de concentração:
Direito, Política e Sociedade; e congrega com as ideias da Linha de
Pesquisa: Direito da Sociedade da Informação e Propriedade Intelectual
do Programa de Pós-graduação em Direito (PPGD/UFSC). Admite-se
34
que o conhecimento tem transformado radicalmente nossa sociedade,
compreende-se que a utilização responsável deste, conjuntamente com a
tecnologia, desempenha um papel preponderante e decisivo para o
desenvolvimento regional. Deve-se reconhecer que a informação traz
um novo modelo, uma nova ordem social que rompe com o antigo, pois,
tem como característica primordial a circulação e modificação de ideias
de uma forma totalmente disruptiva. É neste ponto em que a dinâmica
das relações universidade-empresa, público-privado emergem como
uma solução determinante para desenvolver inovação. Reafirma-se que
a inovação passou a ser um elemento importante para nações que
pretendem continuar em patamares elevados de produtividade e
competitividade, sendo um tema de interesse da sociedade, com
finalidades práticas para as soluções dos problemas sociais. Em mesmo
sentido, este estudo relaciona-se com o grupo de Pesquisa em
Propriedade Intelectual, Transferência de Tecnologia e Inovação da da
Universidade Federal de Santa Catarina.
A pesquisa, de igual modo, pode ser caracterizada como um
estudo interdisciplinar, em razão da necessidade da análise conjunta de
mais de uma disciplina do conhecimento, para se estudar a inovação,
seus sistemas e modos, a legislação e a gestão de transferência de
conhecimento e tecnologia nas universidades, envolvendo, portanto,
áreas da Administração, Direito, Economia, como também, Psicologia e
Sociologia.
A pesquisa está adstrita temporalmente nos anos seguintes à
promulgação da Lei de Inovação (2004), conquanto, foram necessárias
retomadas históricas para contextualizar situações e comportamentos
institucionais. Dadas às características próprias e o delineamento
proposto, a pesquisa foi focada nas universidades públicas estaduais, e
evidenciando sua inserção regional, particularmente, quando mantém
parcerias com o setor privado visando a inovação. Apesar de possuir um
panorama geral e contextualização, a atuação dos Núcleos de Inovação
foi também foco do estudo empírico e, geograficamente, limitou-se a
casos de universidades estaduais dos Estados de Mato Grosso e Santa
Catarina, em que encontrou pertinência para explorar empiricamente a
temática. Todavia, salienta-se que a pesquisa não aspirou ter respostas
conclusivas para o questionamento que foi delineado, porém, trouxe à
tona a discussão sobre o modelo jurídico-adotado pelas instituições de
ensino, as políticas e a adoção das normas de inovação internamente,
com reflexão crítica e visão menos paradigmática sobre a gestão de
transferência de conhecimento e tecnologia.
35
Estruturou-se a presente tese em quatro capítulos, partindo-se de
uma visão geral nos capítulos iniciais e findando com especificidades
dos casos estudados.
O primeiro capítulo traz os conceitos basilares sobre inovação e
as discussões sobre seus sistemas e modelos clássicos, bem como, a
correlação com a transferência de conhecimento e tecnologia. Também
trata sobre a importância da apropriação do conhecimento pelas
universidades, trazendo exemplos de outros países.
O segundo capítulo aborda sobre a política brasileira de inovação
e o marco legal da inovação no país, abrodando das leis que inspiraram a
lei brasileira de inovação e a aplicação desta nos contratos de parceria
que a universidade possa realizar. E, amplia a discussão para as políticas
de inovação adotadas no Brasil para possibilitar a compreensão do
quadro legal e a estrutura industrial. No mesmo sentido, observa as
críticas sobre a Lei nº 8.666/93 e sua influência nas relações entre
Universidade e Empresa e a visualização do Regime Diferenciado de
Contratação. Em destaque, ao final do capítulo, apontam-se as
novidades trazidas pela proposta de reformulação da lei e seus possíveis
impactos.
Já o capítulo terceiro emerge a discussão sobre a relação
Universidade e Empresa avaliando os dois lados da moeda, portanto,
compreendendo a industrialização tardia e a evolução do ensino e
pesquisa no país, bem como, os ruídos de comunicação que dificultam
esta interação U-E. E adentra na estrutura universitária, em geral,
reconhecendo que a gestão da inovação realizada pelos Núcleos de
Inovação ainda necessita de adaptação ou de melhor implementação da
Lei de Inovação no enquadramento interno legal.
O capítulo quarto aborda sobre as duas instituições eleitas para a
pesquisa empírica e os seus resultados organizados em três vertentes:
Ambiente Produtivo de Inovação (verificando a sustentabilidade e
confiança), a Relação Universidade e Empresa (dificuldades e
benefícios da relação), e as Políticas e Marcos Legais (interna e
externamente) e a atuação dos NIT. E aborda sobre o modelo jurídico
adotado nas universidades públicas estaduais e sua influência na gestão
de transferência de tecnologia e conhecimento, apresentando alternativas
e sugestões sobre sua organização em razão do advento do novo marco
legal de inovação em 2016, que oportunizou a constituição dos núcleos
de inovação sob uma personalidade própria, que esta autora compreende
em dois modelos jurídico-institucionais o "modelo autônomo" e
"modelo independente" (ou interdependente).
37
1 A INOVAÇÃO: CONCEITOS, SISTEMAS E MODELOS
Porque as coisas invisíveis, desde a criação do
mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua
divindade, se entendem, e claramente se vêem
pelas coisas que estão criadas, para que eles
fiquem inescusáveis [...]. (Romanos 1:20).
1.1 Os conceitos sobre inovação
A inovação é conhecida como a melhoria e/ou desenvolvimento
de novos produtos, processos e serviços, agregando valor e interesses
comerciais. É difícil imaginar, hoje em dia, que as pessoas não viajem
de avião ou não usem a rede internacional de computadores (internet),
essas ideias inovadoras mudaram a estrutura social, relações entre as
pessoas e economia.
Se você afirmasse a qualquer pessoa na década de 1950 que o
sítio eletrônico (site) é o melhor lugar para comprar uma televisão ou
roupas, esta não saberia dimensionar sobre o que você estaria falando. A
rede internacional de computadores permite que pessoas realizem suas
compras a partir de sua casa e também pagá-las com as facilidades do
mundo virtual. Desta maneira, a invenção do produto como computador,
um processo como a internet influenciam os serviços como compras on-line, transformando uma ideia inovadora em negócio.
Como apontado por Smits et al. (2010), a inovação é o
desenvolvimento e a adoção de novas e melhores maneiras de lidar com
as necessidades sociais e econômicas, a inovação tem um papel muito
importante em combinar as necessidades. Inovação também reúne em
seu significado termos como acessibilidade e disponibilidade. Um
produto pode ser inventado, porém, se apenas seu inventor, ou um
número escasso de pessoas podem usá-lo, não tendo um impacto notável
na sociedade, deixa de ser inovador. Ao mesmo tempo, produto
inovador, modelo ou serviço não precisa ser algo sem precedentes, como
é a ideia da invenção, pode ser uma melhoria ou uma maneira de
incorporar algumas facilidades em uma ideia já existente e torná-la
diferente, mais útil, trazendo impacto na sociedade. Por exemplo, o
modelo "Henry Ford T" foi uma inovação, porque propiciou produzir
um automóvel mais acessível e que pode ser amplamente
comercializado, nas dimensões da época. Certamente, Ford não inventou
o automóvel, já que este é associado ao inventor alemão Karl Benz, que
em 1886, depositou o pedido da patente Benz Patent Motorwagen; ou
ainda pelo francês Nicolas-Joseph Cugnot, que em 1771 concluiu a
38
construção de um automóvel movido a vapor. Apesar desta invenção,
idealizada pelos europeus, o novo processo de Ford mudou a indústria
automobilística para produção em massa, em 1908, o que permitiu que
as pessoas pudessem adquirir e utilizar a grande invenção dos citados
europeus.
Esta diferença é fundamental nos negócios, assim, a inovação
consiste na aplicação prática das invenções no mercado. O iPod, é outro
exemplo, uma vez que é um produto memorável para a empresa da
Apple Inc., não porque foi uma invenção de dispositivo de música
portátil (ou MP3), pois, isto já existia, a inovação trazida por este
produto foi no desenho e na facilidade de usá-lo. O iPod é, na verdade,
um tipo de MP3 player, porém tem um conjunto distinto de recursos e
design adequados os quais, através do software iTunes da Apple, é
possível transferir e armazenar um arquivo de música para os
dispositivos de músicas, ou ainda, transferir vídeos, fotos e jogos. Após
esta nova visão do uso do dispositivo, em 2001, sem dúvida, a indústria
da música não poderia ficar no mesmo formato, demonstrando, portanto,
seu impacto na sociedade e no mercado. Assim, o iPod é uma grande
inovação.
Independentemente disso, Joseph Alois Schumpeter foi
considerado o primeiro economista a incluir a inovação em suas análises
quando trouxe sua teoria do desenvolvimento, em 1911. Schumpeter
destacou o importante papel do empreendedor inovador no processo de
desenvolvimento. A inovação foi definida como um fator de "mutação"
constante e chamou-o como uma "destruição criativa", em que os
inovadores oferecem novas combinações de ideias desconexas,
domínios de conhecimento, tecnologias ou mercados. Para Schumpeter
(1982), o capitalismo traduz-se num método de transformação
econômica, sendo que, o que o impulsiona e o mantém em movimento
são os novos bens de consumo, novos métodos de produção ou
transporte, novos mercados e as novas formas de organização industrial.
Aponta que: As inovações no sistema econômico não
aparecem, via de regra, de tal maneira que
primeiramente as novas necessidades surgem
espontaneamente nos consumidores e então o
aparato produtivo se modifica sob sua pressão.
Não negamos a presença desse nexo. Entretanto, é
o produtor que, via de regra, a iniciar a mudança
econômica, e os consumidores são educados por
ele, se necessário; são, por assim dizer, ensinados
39
a querer coisas novas, ou coisas que diferem em
um aspecto ou outro daquelas que tinham o hábito
de usar (SCHUMPETER 1982, p. 48).
Schumpeter (1982, p.90-91), afirma ainda que o processo de
"destruição criativa" é básico para se entender o capitalismo, uma vez
que é dele que se constitui o capitalismo e a ele deve se adaptar toda a
empresa capitalista para sobreviver, em destaque: A inovação é arriscada, impossível para a maioria
dos produtores. Mas se alguém estabelece um
negócio relacionado com essa fonte de
fornecimento, e tudo vai bem, então pode produzir
uma unidade de produto de modo mais barato, ao
passo que de início os preços vigentes continuam
substancialmente a existir. Então tem um lucro.
Dessa maneira, a inovação é criativa quando traz novas
indústrias, mais emprego, em contraste como a competição e é essencial
para os negócios, também é destrutivo para aqueles que não podem
resistir às novas ideias ou processo e sobreviver frente a um competidor,
uma empresa inovadora. Ainda argumenta que a liderança econômica
(ou inovação que se traduz em liderança) deve ser distinguida da
invenção, já prenunciando o conceito de inovação com a visão de
mercado: Enquanto não forem levadas à pratica, as
invenções são econonomicamente irrelevantes. E
levar a efeito qualquer melhoramento é uma tarefa
inteiramente diferente da sua invenção, e uma
tarefa, ademais, que requer tipos de aptidão
inteiramente diferentes. Embora os empresários
possam naturalmente ser inventores exatamente
como podem ser capitalistas, não são inventores
pela natureza de sua função, mas por coincidência
e vice-versa (SCHUMPETER, 1982, p.62).
Neste prisma, a inovação é resultado de uma aplicação comercial
e econômica de uma invenção, possibilitando o acesso desta novidade a
uma gama de pessoas interessadas em adquirir o produto, processo ou
serviço inovador.
Mas, antes de qualquer discussão, vamos compreender qual o
significado da palavra inovação para este estudo?
A inovação está entre dois aspectos orientadores: o avanço
tecnológico e o mercado consumidor. Neste contexto, esforços foram
realizados para ampliar a interação entre os agentes de inovação,
40
incluindo questões legais e de investimento do poder público. Deve-se
também enfatizar que existem papeis distintos e relevantes que são
desempenhados pelos atores responsáveis por fomentar a inovação.
Portanto, estes atores, representados pela academia, governo e empresas
e indústrias, nominados pelo modelo da Tríplice Hélice, que se
relacionam e dinamizam a inovação. Com tal característica, cada qual
exerce um papel: as universidades e os governos servem como suporte
estrutural, científico e financeiro, para que o setor privado possa também
exercer seu papel no desenvolvimento de novas ideias e ações. E a visão
tradicional indica que a produção e comercialização é papel da indústria;
o governo é o responsável por implementar políticas e legislação; e as
universidades ou institutos de pesquisa como fonte de conhecimento e
tecnologia. Então, toda esta complexidade relacional de forma macro
tem uma forma sistêmica de interagir, que se destacará em momento
oportuno.
Vale ressaltar que a tecnologia é um ativo intangível, um bem
imaterial que também pode ser protegido. E sua origem etimológica vem
do grego "tekhne" que significa "técnica, arte, ofício" e o sufixo "logia"
que significa "estudo". A tecnologia se constitui em um conjunto dos
instrumentos, métodos e técnicas que geram um produto aproveitando-
se do conhecimento científico, com uma aplicação nas soluções de
questões e problemas que a humanidade necessita. E este conhecimento
científico e tecnológico tem uma forma de proteção e valoração
econômica que gera um produto. Desse modo, podendo ser mensurável
economicamente, podem ser transferidos estes direitos gerados pelo
intelecto, seja através de métodos, técnicas ou instrumentos. A
transferência de tecnologia pressupõe um ato de negócio, o qual aquele
que detém um produto, uma tecnologia, poderá comercializá-la a outros
com aproveitamento e utilização desta. Apenas para finalizar esta
discussão rápida sobre o tema, vale dizer que a fórmula de participação
nos resultados, assegurada no acordo, deve levar em conta a proporção e
a equivalência. Por um lado o montante do valor agregado do
conhecimento já existente no início da parceria e o alcançado no final
dela, e por outro, os recursos humanos, financeiros e materiais alocados
pelas partes contratantes ou convenentes.
À vista disso, compreende-se que dependendo do modelo de
inovação adotado é possível compreender a classificação ou posição no
ranking dos países ou regiões que se destacam nesta matéria. Por
exemplo, os países asiáticos, na década de 1990, tiveram a capacidade
de adaptar suas indústrias às novas tecnologias, em comparação com os
41
países latino-americanos. É o caso da Coreia do Sul que apresentou
diferentes mecanismos de integração entre institutos públicos de
pesquisa e as empresas privadas. Neste caso, o governo utilizou uma
política para fomentar a inovação tecnológica aproximando estes atores
desde meados da década 1980 e com estes arranjos consistentes
conseguiu ganhos de produtividade muito superiores que o Brasil
(DUBEUX, 2010, p.23).
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), com patrocínio da Eurostat (Comissão Europeia),
trouxe na terceira edição do Manual de Oslo, em 2005, a dimensão dos
tipos de inovação, auxiliando na compreensão do termo (OCDE, 2005,
p. 23-24). Este manual teve como objetivo propor diretrizes para coleta
e interpretação de dados sobre inovação tecnológica e o texto trouxe
orientação e uniformização dos conceitos, metodologias, e organizou
estatisticamente indicadores da pesquisa, nos diferentes países.
Referindo-se a terceira edição do Manual de Oslo, a inovação foi
definida como uma "implementação de um produto novo ou significante
melhora do bem ou serviço, ou processo", seja um novo "método de marketing", ou um novo "método organizacional" nas práticas de
negócios, na organização do local de trabalho ou nas relações externas.
Neste aspecto, o principal requisito é que o produto (bem ou serviço),
processo, marketing, devem apresentar uma melhora significativa ou
mesmo algo novo (OCDE, 2005, p. 24).
Para Chesbrough, inovação significa a invenção implementada e
levada ao mercado (CHESBROUGH, 2003, ix). Por isso, invenção é a
criação de novos produtos, processos e modelos, e pode ser considerada
parte da inovação. Porém, a inovação é medida pelo impacto que
provoca na sociedade.
Pimentel (2005, p. 11) aduz que a inovação tecnológica tem
função estratégica no desenvolvimento, porque aperfeiçoa a utilização
de matérias-primas, agrega valor aos produtos e serviços, é um
diferencial na concorrência, em razão que se permite encontrar soluções
a problemas práticos da sociedade.
Este estudo coaduna com estes autores, e compreende que a
inovação deve trazer consigo a dimensão de acessibilidade e
disponibilidade para a sociedade. Reforça-se, portanto, que um produto
que é inventado, mas se apenas pode ser usado pelo seu inventor ou
pouquíssimas pessoas, não tendo um impacto na sociedade, é apenas
uma ideia é inventiva, porém, não é inovadora.
42
1.2 Ambiente de Inovação
A Lei de Inovação e seu decreto regulamentador (Dec. nº
5.563/2005) reafirmam o incentivo à inovação e à pesquisa científica e
tecnológica no ambiente produtivo ou social nos textos referentes à
matéria sobre o ambiente de inovação.
Apesar do termo ser mencionado diversas vezes, não é
encontrado no texto legal sua definição. Certamente, em razão de sua
complexidade, o legislador preferiu ater-se aos conceitos que necessitam
uma limitação conceitual, como exemplo, sobre o que vem a ser uma
Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação (ICT), o que vem a ser
um NIT (Núcleo de Inovação Tecnológica) ou o que é parque
tecnológico (na redação proposta da Lei de Inovação). Assim, no Projeto
de Lei (PL 77/215) não há uma definição sobre o que venha ser o
ambiente de inovação, contudo, está evidente a preocupação do
legislador em construir, fomentar um ambiente produtivo e social, ou
um ambiente de inovação. De acordo com as alterações constantes na
proposta estão, exemplificadamente, a alteração do Artigo 1º da Lei nº
10.973/2004,1 ressaltando o "ambiente produtivo", sendo que um dos
princípios da Lei é o incentivo à constituição de ambientes favoráveis à
inovação e às atividades de transferência de tecnologia (parágrafo único,
VIII), ou ainda no Artigo 3º, parágrafo único,2 indicando que os entes da
1 Art. 1º Esta Lei estabelece medidas de incentivo à inovação e à pesquisa
científica e tecnológica no ambiente produtivo, com vistas à capacitação
tecnológica, ao alcance da autonomia tecnológica e ao desenvolvimento
do sistema produtivo nacional e regional do País, nos termos dos arts. 23,
24, 167, 200, 213, 218, 219 e 219-A da Constituição Federal.
Parágrafo único. As medidas às quais se refere o caput deverão
observar os seguintes princípios:
I- [...]
VIII – incentivo à constituição de ambientes favoráveis à inovação
e às atividades de transferência de tecnologia;
IX- [...]
2 Art. 3º A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as
respectivas agências de fomento poderão estimular e apoiar a constituição
de alianças estratégicas e o desenvolvimento de projetos de cooperação
envolvendo empresas, ICTs e entidades privadas sem fins lucrativos
voltados para atividades de pesquisa e desenvolvimento, que objetivem a
43
Federação poderão estimular e apoiar a constituição de alianças
estratégicas e o desenvolvimento de projetos de cooperação envolvendo
empresas, ICT e entidades privadas sem fins lucrativos voltados para
atividades de pesquisa e desenvolvimento, e este apoio poderá
contemplar, dentre outros, as ações de empreendedorismo tecnológico e
de criação de ambientes de inovação.
Este ambiente de inovação deve ser analisado nas dimensões
internas e externas. De acordo com Machado et al (2012), para o estudo
sobre o ambiente de inovação necessária é a inclusão de uma análise de
comportamentos coletivos organizacionais. Dessa maneira, propuseram
uma adaptação do modelo de ambiente de inovação de Van de Ven et al
(2000) com base na cultura organizacional. Portanto, o ambiente
propício para inovação envolve não apenas processo, como também
deve incluir pessoas que interagem com as áreas desenvolvedoras de
inovação como na de Pesquisa e Desenvolvimento, verificando o antes e
depois da geração de ideias (MACHADO et al, 2012, p. 716).
Destaca-se que no tocante à organização e sistematização a
pesquisa vai analisar o ambiente de inovação (Figura 1) abaixo
delineado por Pimentel, em especial em relação às universidades e
empresas, nas fases de pesquisa e desenvolvimento (execução de
projeto/contrato), transferência de conhecimento e resultado de pesquisa
(PIMENTEL, 2010).
geração de produtos, processos e serviços inovadores e a transferência e a
difusão de tecnologia.
Parágrafo único. O apoio previsto no caput poderá contemplar as
redes e os projetos internacionais de pesquisa tecnológica, as ações de
empreendedorismo tecnológico e de criação de ambientes de inovação,
inclusive incubadoras e parques tecnológicos, e a formação e a
capacitação de recursos humanos qualificados.” (NR)
44
Figura 1 – Ambiente de Inovação
Fonte: Pimentel (2010).
Assim, o ambiente de inovação congrega vários aspectos, sejam
eles internos ou externos à instituição em que ações conjuntas e
coordenadas possam propiciar o desenvolvimento dos novos processos,
produtos ou serviços. Conforme observação acima, o ambiente de
inovação é tão importante quanto o processo de inovação. O primeiro
evidencia-se por congregar estrutura, cultura organizacional (liderança,
interação dos profissionais), influências externas (como políticas,
investimentos) que ao agregar estes elementos preparam um "terreno
fértil" para desenvolver a inovação. No caso do processo de inovação
existem teorias que explicam as etapas em que ocorre a inovação, como
se inicia e quais as suas etapas para chegar à solução do problema
proposto ou demanda requerida.
1.3 Modelos de inovação (linear ao interativo)
Para explicar o processo de inovação, os autores em destaque
abaixo buscaram evidenciar através de modelos e quadros
demonstrativos e neste tópico, apresentam-se os modelos clássicos
discutidos nos textos acadêmicos que representam também a evolução
do pensamento quanto à inovação. Neste estudo, tem maior relevância o
modelo sistêmico que é o que enfatiza melhor o envolvimento e a
valorização das instituições de ensino, porém, é interessante comentar as
visões dos outros modelos. Deve-se também compreender que existem
papéis distintos e relevantes que são desempenhados pelos atores
responsáveis por fomentarem a inovação. Portanto, os fatores como
mercados, pesquisa científica, ou os agentes (academia, governo e
45
empresas/indústrias), nos diversos modelos, ora podem estar como
ponto central do modelo, ora são coadjuvantes.
Destaca-se também, o estudo de Rothwell (1994, p. 07,08) que
realiza várias análises sobre o modelo linear indicando que este tipo tem
cinco gerações, que se dividem em períodos históricos, cada uma
aprimorando a outra. Toma como "primeira geração" (1950 a meados de
1960) o modelo de Vannevar Bush,3 em que a ciência básica é a
propulsora do processo e, com o seu desenvolvimento, chega-se a
pesquisa aplicada e isto é que gera a tecnologia. Constata-se que neste
modelo linear, portanto, saindo de um ponto para outro, não há qualquer
preocupação com o que o mercado necessita ou deseja, por isso é
chamada de technology push (empurra-se a tecnologia), quanto mais
pesquisa e desenvolvimento (mais investimentos), maior sucesso em
novos produtos.
Já a "segunda geração" (meados 1960 e início de 1970) tem uma
preocupação com o mercado, porque admite que este é o impulsionador
do processo inovativo, assim, denominado Market Pull. A partir da
necessidade do mercado, os novos produtos são introduzidos
basicamente nas tecnologias existentes ou direciona a pesquisa e o
desenvolvimento para solucionar o problema proposto pelo mercado e
desenvolver o produto.
A "terceira geração", início dos anos 1970 e meados de 1980, foi
o período de uma alta inflação e saturação da demanda (stagflation) e
desemprego estrutural crescente. Portanto, nesta geração as empresas
foram forçadas a adotar estratégias de consolidação e racionalização,
com a crescente ênfase em benefícios de escala e de experiência. Desta
3 Vannevar Bush, um engenheiro, inventor e político, que foi uma figura
decisiva no desenvolvimento do complexo militar-industrial norte-
americano. É tido como um incentivador das inovações tecnológicas e do
financiamento do Estado. Escreveu um relatório respondendo
questionamentos feitos pelo então presidente dos Estados Unidos,
Rooselvet (1944), concernentes ao futuro da ciência no pós-guerra.
Posteriormente, apresentou suas ideias através de um artigo intitulado
Ciência - a fronteira sem fim (Science - The Endless Frontier). Bush
defendia uma política que apoiasse continuadamente a pesquisa científica
e a educação, com financiamentos governamentais através de
organizações sem fins lucrativos, incentivando projetos científicos.
Também é conhecido como precursor da bomba atômica.
46
forma, o processo de inovação bem-sucedido teve por base um portfólio
de amplo e sistemático estudo que abarcam muitos setores e países
(ROTHWELL, 1994, p. 07), necessitando este modelo combinado
(coupling, model of innovation).
Já na "quarta geração", as empresas estavam inicialmente
concentrando-se em determinados negócios e tecnologias, no início dos
anos 1980 e começo dos anos 1990. O foco estava na estratégia de
manufatura que gerou um crescimento rápido em número de alianças
estratégicas entre empresas. Neste prisma, devido à necessidade do
encurtamento dos ciclos de vida do produto, levou-se às estratégias
baseadas em tempo e a integração e desenvolvimento paralelo, portanto,
o modelo integrado (integrated model). Ganzer, Craco, Camargo, Olea e
Dorion (2013, p. 5) afirmam que o processo de inovação nesta fase
ocorre em um sistema integrado de trabalho, com integração de P&D,
produção em uma colaboração horizontal, uma relação de joint-venture
entre empresas e fornecedores. Teve como base as empresas japonesas
que aplicaram a integração e o desenvolvimento paralelo, uma interação
com o cliente para identificar novas oportunidades de negócios.
A "quinta geração", identificada a partir dos anos 1990, é
essencialmente um desenvolvimento da anterior, em que a tecnologia
advinda da mudança tecnológica está mudando em si (um processo de
trabalho em rede). Portanto, o networking model é caracterizado por
uma intensa interação vertical dentro da empresa, uma interação
horizontal externa (com pesquisa colaborativa, desenvolvimentos e
risco, alianças estratégicas para o P&D de base), desenvolvimento de
processos integrados e paralelos e o uso de sofisticadas ferramentas
eletrônicas (GANZER et al., 2013, p. 6).
Apesar desta quinta geração buscar uma conjugação dos
elementos, ainda teve uma visão horizontal, indicando que se deve
respeitar uma linha de acontecimentos, estando muito próxima da
linearidade. E sofre também as mesmas críticas apontadas ao modelo
linear, que acusam não incluir os efeitos de um feedback, de uma
retroalimentação, durante o processo que se desenvolve a inovação,
desprezando a experimentação e o caráter interativo inerente; bem
como, considera o processo de inovação como uma consequência da
ciência, ignorando que o conhecimento tecnológico precede o
conhecimento científico em alguns casos (GANZER et al., 2013, p. 11).
Quanto a esta última observação, pode-se verificar que esta conclusão
não é nova, já no período da Idade Moderna houve uma ênfase na visão
utilitária, concentrando-se no uso das técnicas com aplicação prática.
47
Calderan e Oliveira (2013, p. 8-11) destacam que existem três
principais modelos conceituais de inovação, quais sejam: Modelo
Linear, Modelo Elo da Cadeia e o Modelo Sistêmico. Quanto ao
primeiro, relembram que foi configurado com o Relatório de Vannevar
Bush, em 1945 (Science: The Endless Frontier) que concebeu o
processo de inovação como uma ordem sequencial de eventos, partindo
de uma pesquisa científica básica, que vai avançando com níveis mais
aplicados de pesquisa e, finaliza com sua aplicação e desenvolvimento,
podendo gerar produtos para o mercado. Vale ressaltar que a visão sobre
ciência e sua relação com novas tecnologias foi intensificada após a II
Guerra Mundial, em que muitos experimentos e diferentes tecnologias
testadas serviram para convencer governos a direcionar e influenciar a
ciência em seus territórios. Portanto, esta lógica linear para explicar a
inovação ficou conhecida como transferência de tecnologia. E conforme
dito no item anterior, através deste modelo, muitos países tiveram a
compreensão que apenas os investimentos em P&D seriam suficientes
para acelerarem o processo inovativo. Por certo, este é um importante
elemento, porém, não único, como se verá.
O segundo modelo clássico é o modelo interativo ou chain-linked
model (Elo de cadeia), defendido por Kline e Rosenberg (1986). Estes
autores contestaram frontalmente o modelo linear afirmando que este
modelo distorce a realidade da inovação em várias formas, uma vez que,
compreenderam que: "a inovação não é nem suave, nem linear,
tampouco frequentemente bem-comportada; pelo contrário, ela é
complexa, variada e difícil de medir [...]." 4 (KLINE; ROSENBERG,
1986, p. 185). Em resumo, demonstraram que a inovação (ou
tecnologia) não ocorre apenas a partir da pesquisa científica e sim da
interação entre diversos agentes econômicos e sociais através de uma
diversidade de informações e conhecimentos. E ainda, apontaram um
dos maiores problemas no modelo linear que é a ausência de caminhos
de feedback, da retroalimentação dos eventos durante o
desenvolvimento do processo. Reconheceram que os feedbacks são
inerentes ao desenvolvimento do processo de inovação, seja sobre a
opiniões dos números de vendas ou dos usuários individuais, todas as
formas de feedback, retorno de resposta positiva ou negativa do
4 Texto original: We have already seen that innovation is neither smooth nor
linear, nor often well-behaved. Rather, it iscomplex, variegated, and hard
to measure.
48
consumidor neste exemplo, são essenciais para a avaliação do
desempenho e formulação das etapas seguintes e alcance da posição de
competitividade. E mais, constataram que valorizar apenas os
investimentos de P&D não resultaria satisfatoriamente ao
desenvolvimento tecnológico esperado, devendo observar e impulsionar
as interações entre ciência, tecnologia e o processo de inovação em
todos os estágios. Por isso, o modelo proposto por eles tem como
impulsionador o mercado, a ideia do uso potencial de mercado, o que
está traduzido em um desenho que prevê o ciclo de feedback que
eventualmente se conecta novamente com as necessidades dos usuários,
ao contrário do modelo prévio que indica a pesquisa como parte central.
Portanto, o processo de inovação envolve interações no núcleo das
empresas, entre as empresas individualmente e também com as
instituições de ciência e tecnologia operando em uma cadeia
(CALDERAN; OLIVEIRA, 2013, p. 9).
Dessa forma, cada qual exerce um papel: as universidades e os
governos servem como suporte estrutural, científico e financeiro, para
que o setor privado possa também exercer seu papel no
desenvolvimento de novas ideias e ações. De fato, tradicionalmente tem-
se atribuído à produção e comercialização como papel da indústria e
empresas; o governo sendo o responsável em implementar políticas e o
quadro normativo (legislações); e as universidades ou institutos de
pesquisa como fontes de conhecimento e tecnologia. Neste prisma, se
introduz o modelo interativo (sistêmico), com vários atores atuando
conjuntamente para um fim que é a inovação.
Quando se pensa em Sistema de Inovação, o termo sistema indica
um conjunto de elementos que se interagem e se complementam, de
forma ordenada, possibilitando uma melhor atuação de cada um destes
elementos. Portanto, envolve atores, formas de interação, políticas e
marco normativo (legislações e regras). A ideia de pensar
sistematicamente a relação de políticas voltadas para desenvolvimento
(regional, nacional), e posteriormente, pesquisa e inovação é
indubitavelmente atribuída a Friedrich List, que escreveu o clássico
"Sistema Nacional de Economia Política", em 1841. De acordo com
Freeman (1995, p. 2) as análises de List são aplicáveis ainda nos dias
atuais. List foi um economista alemão que enfatizou a importância de ter
instituições de educação e formação, ciência e de acumulação de
conhecimento. Usou como exemplo, a própria Alemanha que era uma
49
nação considerada atrasada quando comparada com a Inglaterra naquele
período (Século XIX) e que utilizou a engenharia reversa5 como aliada
para seu desenvolvimento. Ele explica que a preocupação principal de
List estava em reconhecer o atraso da Alemanha em relação à Inglaterra
quanto à questão tecnológica, in verbis: […] ele defendia não só a protecção de indústrias
nascentes, mas uma ampla gama de políticas
destinadas a acelerar, ou tornar possível,
industrialização e crescimento econômico. A
maioria dessas políticas estava preocupada com a
aprendizagem sobre novas tecnologias e como
aplicá-las, (FREEMAN, 1995, p. 1)6
Também enfatizou que List acreditava no papel que o Estado
deveria assumir em longo prazo, com políticas para a indústria e
economia. Ele defendeu que o Estado deveria tomar decisões,
desenvolver e investir em tecnologia, bem como, no desenvolvimento
técnico nacional por esforços próprios, defendendo inclusive a
engenharia reversa. É o que se percebe no discurso de List: Um erro fundamental da Escola é a sua relação ao
sistema de protecção como uma concepção falsa
de políticos especulativos. História atesta que esta
política de protecção tem a sua origem, quer na
luta natural das pessoas para a prosperidade,
independência e poder; na guerra, ou nas medidas
5
Engenharia reversa é o termo utilizado quando empresas/indústrias
visando um mercado competitivo examinam um produto pronto,
desmontando-o peça por peça, para descobrir como foi construído, com
intenção de reproduzi-lo da melhor maneira possível, evitando o
pagamento de propriedade industrial (patente), por exemplo, da
tecnologia empregada no produto. O que atualmente é visto
negativamente, porém, muitos países utilizaram para alavancar suas
indústrias, a exemplo do Japão, República da Coreia. 6 Texto original: […] he advocated not only protection of infant industries
but a broad range of policies designed to accelerate, or to make possible,
industrialisation and economic growth. Most of these policies were
concerned with learning about new technology and applying it.
50
hostis de poderosas nações industriais (LIST,
1856, p. 268). 7
Acrescenta-se a possibilidade de incentivar a formação de
especialistas, proporcionando aos profissionais aprenderem novas
técnicas no exterior. O próprio List teve uma experiência nos Estados
Unidos da América, que o marcou de forma definitiva, especialmente a
partir do Relatório de Manufaturas (Report on Manufactures) de
Alexander Hamilton (1791).8 Através da análise deste relatório, ele
reconheceu que o país norte-americano tinha uma forma generalizada
para promover a educação, diferentemente da Alemanha, que adotava
uma forma mais concentrada em treinamento industrial; e concluiu que
os Estados Unidos eram um bom exemplo, porque foram bem-sucedidos
em ultrapassar a Grã-Bretanha na segunda metade do Século XIX
(FREEMAN, 1995, p. 3). Em suas palavras: A existência da indústria transformadora nos
Estados Atlântico mudou completamente a face
das coisas, e produz os seguintes resultados:
população, capital, habilidade artística, recursos
intelectuais, de fluxo em abundância a partir de
vários países europeus; como matéria-prima vem
do oeste, a demanda para os produtos fabricados
desses Estados, aumenta, a população, o número
ea importância das suas cidades, com sua riqueza,
7Texto original: A fundamental error of the School is its regarding the
protective system as a spurious conception of speculative politicians.
History attests that this policy of protecntion had its origin either in the
natural struggle of people towards prosperity, independence and power; in
war, or in the hotile measures of powerful manufacturing nations. 8 O relatório defendia a tese que para garantir a independência americana,
os Estados Unidos precisariam ter uma boa política de incentivo ao
crescimento da produção e garantir o seu futuro como uma característica
permanente do sistema econômico da nação, inclusive com prémios e
subsídios à indústria, regulamentação do comércio com tarifas moderadas
que não desencorajassem as importações, e outros incentivos do governo.
Destaca-se que as ideias de Hamilton serviram de base para a Escola
Americana de Economia.
51
aumenta em proporção ao progresso da cultura
nas solidões Ocidentais. 9 (LIST, 1856, p. 176)
Portanto, assegurava que uma infraestrutura nacional deve ser
construída; bem ainda, que uma instituição forte para promover a
acumulação de "capital mental" (mass of intelectual and corporeal power of the nation)
10 que é necessária para acelerar o desenvolvimento
econômico, que foi posteriormente denominado catching-up (LIST,
1856, p. 309). Chang (2003, p. 15; 38 e ss.) reforça a visão de List que
nações como a Grã-Betanha apesar de se nominarem liberais e
incentivavam a livre concorrência, na verdade percebendo que sua
indústria nacional nascente não lograria sucesso frente a outras nações,
adotaram restrições, incentivos e privilégios. De mesmo modo, Chang
pontua que ao examinar as experiências de países como Grã-Betanha,
Estados Unidos, Alemanha, França, Suécia, Bélgica, Holanda, Suíca,
Japão, Coreia e Taiwan, demonstrou que a maioria deles aplicou
políticas quase opostas das que recomendam para os países em
desenvolvimento atualmente, sabendo que as estratégias de catch up que
adotaram no passado, quando estavam em patamares de
desenvolvimento, podem afetar as relações internacionais e o mercado
mundial. Em outras palavras, o conceito de catching-up, explicitado por
Abramovitz (1986), indica que é possível que um país tecnologicamente
atrasado possa crescer a taxas maiores que os países com tecnologia
avançada, tornando-se um technology follower (seguidor tecnológico),
aproveitando conhecimentos já desenvolvidos pelos que estão na
fronteira tecnológica (leaders).
9 Texto original: The existence of manufacturing industry in the Atlantic
States changes enterely the face of things, and produces the following
results: population, capital, artistic skill, intelectual resources, flow in
abundance from the various European countries; as the raw material comes
from the West, the demand for the manufactured products of those States,
increases, the population, the number and importance of their cities, with
their wealth, augments in proportion to the progress of culture in the
Western solitudes.
10
List enumera, em seus estudos, que existem três tipos de capital: o natural
(recursos minerais, por exemplo), intelectual ou mental (com pessoas
habilitadas, ciência e tecnologia, educação) e, material (que seria mais
voltado ao setor produtivo), para o desenvolvimento de uma nação estes três
elementos devem estar presentes.
52
Neste ponto, dependendo do Sistema de Inovação adotado por um
país e a interação de seus atores, é possível compreender a classificação
desta nação ou sua posição entre países ou região que se destacam nesta
matéria. Por exemplo, os países asiáticos na década de 1990 tiveram a
capacidade de adaptarem suas indústrias às novas tecnologias em
comparação com os países latino-americanos. Como no caso da Coréia
do Sul que apresentou diferentes mecanismos de integração entre
institutos públicos de pesquisa e as empresas privadas, em que o
governo utilizou uma política para fomentar a inovação tecnológica,
aproximando estes atores desde meados da década 1980 e com estes
arranjos consistentes conseguiu ganhos de produtividade muito
superiores que o Brasil (DUBEUX, 2010, p. 23). O que se verifica na
América Latina que ainda está em desvantagem com baixos índices de
crescimento e interação, conforme relatório sobre Economia na América
Latina sobre Educação, Capacidades e Inovação, publicado pela
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) em 2015.11
Abaixo, preferiu tratar separadamente sobre o modelo sistêmico
de inovação, em razão de sua relevância para a discussão neste estudo e
a compreensão melhor do conceito, que em seguida é elucidado pela
Tríplice Hélice.
1.4 Sistemas de Inovação: conceito e papel dos atores
Reconhecer a concepção interativa de inovação, certamente foi
um passo para o modelo sistêmico que basicamente trouxe a abordagem
e o foco não apenas às empresas e mercado, ou ainda na pesquisa,
reconheceu na verdade, um sistema e interação de agentes. Cassiolato e
Lastres (2005) ao abordarem sobre uma coevolução do processo e da
formulação de políticas para inovação, afirmam que a inovação não
pode ser vista como um ato isolado por parte de uma empresa ou
organização individualmente, mas como um processo sistêmico e
interativo e também na possibilidade de reformulação das políticas
voltadas à inovação com base nestas concepções (p. 35). Portanto,
11
Latin American Economic Outlook 2015- Education, Skills and
Innovation for Development (OECD, 2015) relatório está disponível on-
line no endereço eletrônico: <http://www.keepeek.com/Digital-Asset-
Management/oecd/development/latin-american-economic-outlook-
2015_leo-2015-en#page28>. Acesso em: 02 jun. 2015.
53
afastando-se da visão linear, apresentando-se como um processo
cumulativo, específico da localidade e conformado institucionalmente.
Calderan e Oliveira (2013) destacam que o modelo sistêmico
mais conhecido é o denominado Sistema Nacional de Inovação (SNI),
que tem sua abordagem institucionalista que acomoda arranjos
cooperativos como de universidades e empresas, considerando-os como
arranjos geradores e difusores de inovação (p. 10). Salienta-se que o
termo Sistema Nacional de Inovação surgiu na década de 1980 e 1990,
sendo creditado em ordem cronológica a Freeman (1987), Lundvall
(1992) e Nelson (1993), entre outros. Todavia, Freeman em seu texto "O
Sistema Nacional de Inovação em perspectiva histórica" admitiu que foi
Lundvall a primeira pessoa a usar a expressão; ao passo que Lundvall
também reconheceu que a visão sistêmica veio de Friedrich List, que foi
o precursor do conceito. Não é surpresa que estes nomes apareçam em
destaque no histórico de mudança de paradigma sobre a inovação, pois,
de acordo com Cassiolato e Lastres (2005, p. 35) esta revisão do
conceito ocorreu em razão de dois principais programas de pesquisa,
quais sejam: o Projeto Scientific Activity Predictor from Patterns of Heuristic Origins (SAPPHO)
12 e a Yale Innovation Survey. O primeiro,
coordenado por Christopher Freeman, através do departamento Science
and Technology Policy Research (SPRU), fundado pelo mesmo
cientista, em 1966, na Universidade de Sussex, Reino Unido. Este
projeto teve como foco a comparação entre 50 inovações que tinham
obtido sucesso com outras que não lograram êxito, no estudo
enfatizaram a importância do ambiente nacional e apontaram como
pontos de sucesso a comunicação da empresa, mesmo com seu
laboratório de P&D, com fontes externas, e ainda, as tentativas
explícitas de compreender as necessidades dos usuários, geralmente
obtidas por processos cooperativos e interativos (CASSIOLATO;
LASTRES, 2005, p. 35). Os resultados do estudo inglês influenciaram a
formulação da proposta de modelo interativo de Rothwell.
O segundo (Yale Survey) estudo foi realizado nos Estados Unidos
da América, em que foram analisadas as estratégias de grandes empresas
no país (entre os anos de 1983 e 1984) para o desenvolvimento de novos
produtos e processos, sendo que um resultado importante sobre a
12
O projeto SAPPHO é Scientific Activity Predictor from Patterns of
Heuristic Origins, que teve o envolvimento dos estudiosos como Freeman,
Rothwell, Horlsey, Jervis, Robertson, Townsend, e iniciou em 1972.
54
pesquisa foi à constatação que a frequência e intensidade das relações de
cooperação que dependeram de políticas públicas, que se direcionavam
para o desenvolvimento científico e tecnológico (KLEVORICK et al.,
1993; CALDERAN; OLIVEIRA, 2005).
Christopher Freeman foi um economista que dirigiu a unidade de
ciência de política de pesquisa (SPRU), da Universidade de Sussex, no
Reino Unido (1966 -1981) e foi o autor do Manual de Frascati,
estatística publicada pela OCDE sobre Pesquisa e Desenvolvimento
(P&D). Suas ideias sobre o Sistema de Inovação foram estabelecidas no
livro "Technology Policy and Economic Performance", em 1987,
inaugurando a terminologia ao analisar o sistema japonês.13
Bengt-Åke Lundvall14
foi um dos diretores-adjunto no Diretório
da Ciência, Tecnologia e Indústria da OCDE (DSTI) e publicou um
livro sobre o assunto com um título "National Innovation Systems"
(Sistemas Nacionais de Inovação), em 1992. De forma mais precisa,
Lundvall definiu Sistema Nacional, como uma constituição de
elementos e relações que interagem na produção, difusão e uso do novo
e economicamente útil, bem como, do conhecimento. Para ele, esta
visão em sistema serviu como uma ferramenta para analisar o
desenvolvimento e o crescimento econômico dos países analisados
(LUNDVALL, 2007, p. 99-100).
Seguindo as ideias desses estudiosos citados, Richard R.
Nelson,15
economista americano, conhecido como teórico da inovação,
escreveu com Sidney G. Winter o texto "An Evolutionary Theory of Economic Change" (Uma teoria Evolucionária da Mudança Econômica)
(1982), combinando ideias de Schumpeter e as teorias comportamentais
de Herbert Simon e outros, explicando o conhecimento organizacional
das empresas. Porém, seu livro digno de nota é o "National Innovation
Systems: A Comparative Study" (Sistema Nacional de Inovação: Um
Estudo Comparado) que foi publicado em 1993, apresentando um
primeiro estudo comparativo em sistema de inovação em diferentes
países. Outro autor à época foi Nathan Rosenberg, que em seus estudos,
13
Disponível em: <http://www.innoresource.org/5-2-christopher-
freeman/>. Accesso em: 13 jan. 2014. 14
Disponível em: <http://www.innoresource.org/5-8-bengt-ake-
lundvall/>. Accesso em: 13 jan. 2014. 15
Disponível em: <http://www.innoresource.org/5-1-richard-r-nelson/>.
Acesso em: 13 jan. 2014.
55
argumentou sobre uma relação interativa entre o conhecimento
científico e tecnológico no processo de inovação e trouxe as diferenças
entre as tecnologias nas características da interface ciência-tecnologia.16
Por outro lado, Benoît Godin, em seu trabalho em 2007 sobre
uma perspectiva histórica do Sistema Nacional de Inovação, solicita a
atenção de um "pedaço esquecido da história", em que denunciou que a
abordagem sistêmica deve ser creditada à OCDE a partir dos anos 1960.
Godin destaca que o conceito pode vir como uma explicação sobre as
disparidades no desempenho tecnológico e econômico entre os países,
especialmente europeus, norte-americanos e sistema japonês, analisando
a forma como a instituição executa e se relaciona com o outro, em que
foram realizadas análises pela organização (GODIN, 2007, p. 05-07).
Em síntese, Godin afirma que os estudiosos nos anos 1980 não
iniciaram a abordagem sobre os sistemas, apenas deram um rótulo para
destacar questões de desempenho econômico e tecnológico. Na verdade,
afirma que estes buscaram trazer a discussão para a agenda política e
intelectual, e, destaca que o termo foi previamente empregado em
documentos da OCDE. O que não deixa ser algo a se observar já que
estes proeminentes teóricos em algum momento contribuíram direta ou
indiretamente para os relatórios e manuais da organização.
De outro lado, apesar do termo Sistema Nacional de Inovação ser
comum, a prática em cada país pode mostrar sua diversidade. Por ser um
resultado da interação entre os agentes, sua configuração mostrará
diferenças na maneira como estes atores estão estruturados e o nível de
seu envolvimento. Por exemplo, na década de 1960, os europeus
estavam preocupados com seu atraso em seu potencial tecnológico
comparado com os Estados Unidos, e indicavam como consequência do
parco investimento em P&D. Também foram realizados estudos sobre
as universidades, estrutura de ensino entre outros. A OCDE foi à
organização que defendeu (e defende) em seus manuais e relatórios
questões que envolvem (cronologicamente) temas como: pesquisa
fundamental das universidades, com comentários sobre suas diferenças
internacionais (1968); lacunas na tecnologia com comparações entre
países em educação, P&D, inovação tecnológica, intercâmbios
internacionais (1970); alocação de recursos para P&D, com uma
16
Disponível em: <http://www.innoresource.org/5-3-nathan-rosenberg/>.
Accesso em: 13 jan. 2014.
56
abordagem sistemática (1974); indústria e universidade: novas formas
de cooperação e comunicação (1984) entre outros estudos.
Ademais, ainda na década de 1990, outros teóricos buscaram a
abordagem voltada para a economia regional, em destaque está Cooke
(1992), que escreveu sobre "Regional Innovation Systems: competitive regulation in the new Europe" (Sistemas Regionais de Inovação:
regulação competitiva na Nova Europa), que veio disseminar a ideia de
Sistema Regional de Inovação. Posteriormente, Asheim e Isaksen
(2002) trouxeram esta mesma visão, sendo que estes focaram suas
análises em regiões, devido ao destaque de mudanças e
desenvolvimento industrial em determinada área geográfica. Em outras
palavras, estes perceberam que o desenvolvimento industrial de
determinada região tinha uma relação com as políticas regionais de
inovação, o que diferenciava aquele espaço geográfico de outras área do
globo. Já Doloreux e Parto (2003, p. 3) atribuíram o conceito de
Sistemas Regionais de Inovação como um conjunto de interações de
interesses privados e públicos, instituições formais e outras organizações
que funcionam de acordo com arranjos organizacionais e institucionais e
relações propícias para a geração, uso e disseminação de conhecimento.
Gertler e Wolfe (2003, p. 4) também enfatizaram que nesta visão
regional, os atores produzem efeitos penetrantes e sistêmicos que
incentivam as empresas na região para desenvolver formas específicas
de capital, que é derivado de relações sociais, normas, valores e
interação dentro da comunidade, a fim de reforçar capacidade regional
de inovação e competitividade.
Deveras, constata-se que a visão sistêmica tem uma
fundamentação teórica e a inserção dos atores (governo, empresa e
universidades) que influencia nos resultados. A visão sistêmica tem sido
muito bem aceita para explicar e analisar as diferenças ou similaridades
entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento. Por certo, os
sistemas nacionais, ou regionais, ou locais de inovação, devem orientar
a forma da relacão entre os atores, incluindo legislações, políticas
específicas, fundos de investimentos, para melhorar o desempenho da
produção tecnológica e distribuição das tecnologias. O governo
brasileiro seguindo, de certo modo, esta visão internacional, tem tentado
construir um sistema de inovação com políticas de incentivo a pesquisa,
desenvolvimento e inovação (P,D&I), inclusive, utilizando legislações
para introduzir esta cultura inovadora. Compreende-se que as
legislações compõem este sistema e influenciam nas atividades destes
atores, seja regional ou nacionalmente. As legislações sobre inovação
57
estão interligadas sistemicamente e buscam incentivar a aproximação do
poder público ao setor privado com intuito de desenvolver e inovar
melhor. No âmbito nacional, a Lei nº 10.973/2004 (Lei de Inovação),
Lei nº 11.196/2005 (conhecida como Lei do Bem) e Decreto nº
5.563/2005 buscam flexibilizar ou desburocratizar as formas de
conjugar estes interesses dos setores (público e privado), porém, mesmo
após 10 anos de existência, ainda encontram entraves para sua aplicação.
Contudo, percebe-se que no país mesmo com marco legal e
políticas para inovação, a interação entre universidades públicas e
empresas ainda está em fase de construção. E o sistema universitário
deve ser repensado e reestruturado de acordo com o que foi defendido
por Buarque (2014), o qual acredita que a universidade deve ser
repensada por estar em uma "encruzilhada", entre ficar com as ideias
dos séculos anteriores na formação e ensino, ou avançar reavaliando seu
papel na sociedade. Do mesmo modo, Arbix e Consoni acreditam que a
comunidade acadêmica no seu papel propulsor de gerar novos
conhecimentos científicos e tecnológicos para inovação deve repensar a
sua agenda de pesquisa e comunicar-se mais com a sociedade (ARBIX;
CONSONI, 2011, p. 220-221). Neste contexto, não é absurdo pensar em
um novo modelo ou uma melhor estrutura a ser adotada pelas
universidades públicas brasileiras. De outra forma, entende-se que o
conceito de inovação aqui empregado, não limita a responsabilidade
para as instituições de ensino, que devem desenvolver e disseminar o
processo inovativo. Dessa maneira, um modelo que elucida a
participação destes atores e esta interação é o modelo da Tríplice Hélice.
1.4.1 A Teoria da Tríplice Hélice
Os teóricos da Tríplice Hélice, Henry Etzkowitz e Loet
Leydesdorff, contextualizam que a partir do final da Guerra Fria, o
aumento da competição econômica internacional, somados a uma
emergência de novos modelos de conhecimento baseados em
desenvolvimento econômico, confrontou o papel da universidade
refutando o status de "torre de marfim".17
Consoante o que já foi
percebido por Nelson (1993), muitos programas de cunho internacional
17
Ivory tower (torre de marfim) - Termo utilizado na academia para designar
um lugar ou ambiente em que as pessoas encontram-se felizes sem ter
contato com outras pessoas e isolam-se em suas ideias e teorias.
58
ou multinacional (Nações Unidas, OCDE, World Bank e União
Europeia) foram baseados em desenvolvimento econômico que
dependeram da relação entre academia, indústria e governo, o que exigiu
um novo modo de produção alicerçado no novo modelo de tríade
(ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 1995, p. 2, 3). Em suas análises,
estes compreenderam que um novo "contrato social"18
entre a
universidade e a sociedade, numa visão mais ampliada, estava sendo
negociada em termos específicos, uma vez que, o contrato anterior
estava baseado no modelo linear de inovação, prevendo apenas uma
contribuição em longo prazo da academia para a economia. Porém, os
dois planos de contratos são possíveis, seja a curto ou longo prazo,
principalmente, quando envolvem áreas como a biotecnologia e ciência
da computação. E reforçaram a afirmação de que modelos lineares como
o demand pull e technology push já estão superados, sendo a Tríplice
Hélice uma componente chave para estratégias nacionais e
multinacionais para o final do Século 20, lembrando que a teoria se
propagou no final dos anos 1990 (ETZKOWITZ; LEYDESDORFF,
1995, p. 2). Aqui vale citar a observação destes estudiosos na mesma
obra que ressaltam um comentário de um antigo diretor de Pesquisa e
Desenvolvimento da empresa química Helken USA, nos Estados Unidos
que afirmou que: "a Transferência de Tecnologia está morta! O velho
modelo dos anos 1950 não funciona mais [...]" 19
– fazendo referência ao
modelo linear de Vannevar Bush, e indicando que não há mais tanto
tempo para esperar que somente os investimentos em P&D vão originar
algo brilhante, isto só ocorreria se não houvesse a competitividade, em
outras palavras. Então, fala-se mais em transferência de conhecimento
do que a transferência de tecnologia, já que ambas ocorrem atualmente,
porém, a sinergia na primeira é mais visível para todas as instituições de
ensino e pesquisa.
Este estudo prefere focar nas instituições de pesquisa e
universidades avaliando seu papel e algumas vantagens e desvantagens
18
Fazem alusão ao Contrato Social de Rousseau que de forma resumida
acreditou que para criar uma sociedade esta deveria ser através de um
acordo entre indivíduos, sendo que o governo é instituído pelo povo, o
soberano é o próprio povo que decide sobre como deve ser a governança e
não se submetem a um governo imposto, superior. 19
Technology transfer is dead...The old 1950 model doesn't work anymore
[...].
59
de sua participação no processo de inovação. Dentre os modelos
reconhecidos por diversos autores, a Tríplice Hélice é o que melhor
valoriza a participação das universidades. Etzkowitz e Leydesdorff
indicaram nesta teoria que a universidade pode desempenhar um papel
reforçado na inovação e cada vez mais nas sociedades do conhecimento,
contrapõem-se, assim, à tradição schumpeteriana, que associa a
inovação às empresas. Percebe-se que os autores conferem lugar de
destaque às universidades e também colocam o governo como ator
relevante em seu modelo. Esta teoria tem a adesão de inúmeros outros
estudiosos, porque se diferencia de outras abordagens por não ser linear
ou interativa. Os autores admitem que seu modelo seja analítico e, que
este contribui para a descrição da variedade de arranjos institucionais e
modelos de políticas, de uma forma dinâmica. Todavia, explicam que
este modelo também é diferente do modelo analítico proposto por
Nelson e Lundvall (tratado pelo Sistema Nacional de Inovação), visto
que estes consideram que a empresa tem o papel de liderança, da mesma
forma, distingue-se do Triângulo de Sábato que privilegia o Estado.
Portanto, diferentemente, a Tríplice Hélice foca na sobreposição de
comunicações e expectativas que reformulam os arranjos institucionais
entre universidades, indústrias e agências governamentais
(ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 2000, p. 109-112). O modelo é
representado por uma espiral com três hélices (Figura 2) que se
entrelaçam por meio de múltiplas interações entre as três esferas por elas
representadas, quais sejam: a universidade, a indústria e o governo. A
figura é a imagem de capa do livro destes autores, representando esta
tríade de forma elíptica.
Figura 2 – Tríplice Hélice
Fonte: ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 2000.
60
Figura 3 –Tríplice Hélice
Fonte: ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 2000.
Portanto, através destas hélices, configura-se a dinâmica da
inovação, com as redes de comunicações e de expectativas que estariam
permanentemente remodelando os arranjos institucionais entre
universidades, indústrias e o governo, através de suas agências. Em
razão de estas relações estarem representadas numa espiral e seus
agentes representados em hélices, os arranjos não são estáveis, sendo
que cada hélice, ao se relacionar com qualquer das outras duas, produz
novas relações, redes e organizações entre elas. Cada hélice também
estaria em transformação contínua e suas reconstruções, seriam
consideradas um nível de contínuas inovações sob a pressão das
mudanças do ambiente. As fontes de inovação na configuração da
Tríplice Hélice não são sincronizadas inicialmente, não obedecem a uma
ordem predeterminada, mas geram quebra-cabeças para seus
participantes, analistas e formuladores de políticas resolverem. Desse
jeito, redes trilaterais e organizações híbridas seriam criadas para
solucionar problemas sociais e econômicos com os agentes das
diferentes esferas interagindo e definindo novos projetos.
De acordo com Etzkowitz e Leydesdorff, atualmente, a maioria
dos países estaria buscando conformar esse tipo de arranjo institucional,
tentando fortalecer um ambiente inovador, com iniciativas trilaterais
para o desenvolvimento econômico baseado no conhecimento e alianças
estratégicas entre empresas, grandes ou pequenas (operando em
diferentes áreas e diferentes níveis de tecnologia), laboratórios
governamentais e grupos de pesquisa acadêmicos. Esses arranjos seriam
encorajados, porém, não controlados, pelos governos, que proveriam,
eventualmente, assistência financeira direta ou indireta, através de novas
61
"regras do jogo", ou por políticas ou leis (como a Bayh Dole, no caso
americano). Completam dizendo que a inovação pode surgir na solução
do quebra-cabeça, que tipicamente leva o governo a mudar a forma de
vislumbrar soluções de uma vertente dupla (como demanda e
fornecimento produção e distribuição) para uma tripla que é a Tríplice
Hélice (ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 2000, p. 115).
No tocante às universidades, afirmam que estas continuarão a
serem as instituições principais no setor de conhecimento, ao longo do
que elas permaneçam na sua missão educacional original. Da mesma
maneira, reforçam que a grande e exclusiva vantagem da universidade é
combinar continuidade com mudança, memória organizacional e
pesquisa com novas pessoas e novas ideias, através da passagem de
gerações de estudantes. Enfatizam que a universidade tem sido
transformada de uma instituição de ensino para aquela que combina
ensino com pesquisa, uma revolução que ainda está ocorrendo em todo
o mundo.
Verifica-se que apesar destes modelos que explicam o processo
de inovação e auxiliam o governo a orientar suas políticas e ações para
dinamizar este processo, ainda existem barreiras. No Brasil, na opinião
desta pesquisadora, a teoria da tríplice hélice pode explicar as
dificuldades no avanço nesse processo por algumas peculiaridades das
universidades brasileiras, seja quanto a sua estrutura organizacional,
natureza jurídica ou forma de gestão, principalmente às públicas,
indicando que uma das hélices necessita de definição ou adequação de
seu papel. Diante deste contexto, esforços têm sido realizados para
ampliar o diálogo entre os agentes de inovação, incluindo questões
legais e de investimento do poder público brasileiro. A aproximação
entre as universidades (privadas ou públicas) e empresas privadas
também é uma das modalidades do modelo de inovação aberta (open innovation), cunhado por Henry Chesbrough, que permite uma nova
configuração dos processos de inovação das empresas, abrindo a
pesquisa para outros agentes. Cheesbrough destacou também que até
empresas reconhecidas pelo seu caráter inventivo adotou o novo modelo
com sucesso como a Procter & Gamble, que abriu suas pesquisas para
outros desenvolverem (CHEESBROUGH, 2003, p. 24). Isso já era
realizado pelas universidades e institutos dos países desenvolvidos, que
possuíam políticas específicas e legislações que formalizavam a relação
com empresas.
Pensando na evolução da ciência e tecnologia no Brasil, também
é a partir da década de 1990 que aqui surgiram as novas leis que
62
regulamentam a propriedade intelectual. Introduziu nas instituições de
ensino e pesquisa a necessidade em discutir o tema e formular ações e
internalizar o processo inovativo. Estas legislações, sem dúvida, foram
inspiradas pelo Bayh-Dole Act, dos Estados Unidos e na Lei Francesa de
Inovação, sobre a qual se comentará no capítulo II, o que auxilia na
compreensão do marco legal brasileiro.
É possível concluir que, provavelmente, este mesmo período da
política de inovação norte-americana inspirou os estudiosos como
Etzkowitz e Leydesdorff a formular o modelo da Hélice Tripla (ou
Tríplice Hélice) em 1995-1996, ao mesmo tempo em que levou a
interpretação da relação moderna e interativa. Os autores definiram a
Triple Helix como um modelo analítico que contribui para a descrição
da variedade de arranjos institucionais e modelos de políticas e trouxe a
explicação dessa dinâmica, conforme já descrito.
1.5 A inovação e o processo de transferência de tecnologia
Nos itens anteriores, esboçou-se sobre o significado do termo
inovação e seus modelos. Contudo, dentro do processo de inovação,
existe a transmissão de tecnologia e conhecimento, que inicialmente foi
cunhado pelo modelo linear. Porém, este conceito é ainda utilizado
quando existe o repasse ou transmissão de um bem intangível, protegido
ou não pelos Direitos de Propriedade Intelectual (DPI) e seus
respectivos pedidos de proteção, por meio do licenciamento ou cessão
de direitos. Isso possibilita, também, a transferência de know-how,
serviços técnicos e científicos, serviços de capacitação, serviços de
informação e qualquer meio de transferência do conhecimento ou
qualquer outra forma de utilização do conhecimento. Nas discussões
travadas neste estudo, a transferência de tecnologia ou conhecimento
será focada na relação entre a universidade e as empresas, evidenciando
o papel das universidades na transmissão de conhecimento e tecnologia.
Neste contexto, propiciar uma cultura de inovação é fundamental
na construção do conhecimento, sendo que a inovação tecnológica tem
sido um elemento propulsor nas políticas de desenvolvimento regional e
nacional. Desta forma, constata-se que a relação entre instituições de
ensino e o setor privado deve alcançar maior destaque nos países da
América Latina, com a aproximação da pesquisa científica com a
realidade e necessidade da sociedade, em que o setor privado está
inserido.
Realmente, conforme apresentado pelo relatório sobre a América
Latina, o "capital de inovação" está concentrado, a exemplo no Brasil
63
está nas universidades brasileiras, principalmente, nas universidades
públicas que ao longo da história qualificaram seu quadro e mantiveram
professores e servidores em razão de uma política institucional de
admissão e permanência estáveis. Portanto, algumas destas instituições
são os alvos desta pesquisa quando se trata do desenvolvimento de
inovação e transferência de conhecimento e tecnologia. Afinal,
compreendendo que mesmo com a abertura ou tentativa de
flexibilização pela Lei de Inovação (Lei nº 10.973/2004), ainda são
notórios os ruídos na comunicação entre o setor privado e as
universidades, principalmente as públicas, porque não se conseguiu
instituir esta relação com o setor privado de forma eficaz e que alcance a
disseminação da tecnologia e inovação esperada.
1.5.1 O pensamento utilitarista e sua relação com a pesquisa
No livro "O quadrante de Pasteur: a ciência básica e a inovação
tecnológica", Stokes (2005) sintetiza que a pesquisa básica funda-se no
termo "entendimento" e é aplicada no termo "uso", "utilização".
Identifica a pesquisa básica como aquela que procura ampliar a
compreensão dos fenômenos de um campo das ciências, conhecimento
explicativo geral, e tem como qualidade específica seu ímpeto em
direção ao mais amplo entendimento dos fenômenos de determinado
campo. Entretanto, a pesquisa aplicada, volta-se para alguma
necessidade ou aplicação por parte de um indivíduo, de um grupo ou da
sociedade, ou seja, tenha uma utilidade prática, direcionada (STOKES,
2005, p. 21-23).
Vislumbrando a história, Stokes (2005) justifica a visão
separatista entre ciência pura e aplicada desde os tempos da antiguidade
clássica. Reconhece que foram os gregos os inventores da investigação
científica, pois, conseguiram cortar os laços entre a investigação
filosófica e as atividades práticas. Desta forma, foi uma característica do
pensamento científico grego, o interesse primordial era pelo
conhecimento e entendimento, raramente a utilidade pública, o que
auxiliou no abismo entre a investigação e a utilidade. E esta visão ecoou
no período medieval e influenciou sobremaneira as primeiras
universidades, porque quando a ciência grega foi traduzida para o latim,
depois de ter passado pelo árabe, se constituiu a base sobre a qual se
erigiu a ciência europeia. Os "tesouros intelectuais" do mundo clássico
serviram como estímulo inicial à criação das novas universidades em
Oxford, Paris, Bolonha e Pádua, em que oportunizaram em seus
currículos espaços para a "nova ciência" (STOKES, 2005, p. 53-57).
64
Por outro lado, Mathias (1972) acredita que a ligação entre
ciência e indústria tem relação com o que ocorreu no Século XVII e
XVIII, em que o estado ativamente pressionou os cientistas para um
esforço utilitário. Com percepção histórica, ressalta que, o que toca ao
desenvolvimento institucional da ciência e o padrão de desenvolvimento
nem sempre acompanha ou encaixa-se, sequencialmente, na inovação e
desenvolvimento na indústria. Evidencia que mesmo com a fundação da
Sociedade Real20
e a Sociedade Lunar,21
que são sempre cotadas como
evidência do desenvolvimento e o nexo entre a ciência e indústria,
devem ser estas observadas mais atentamente. A própria Royal Society
teve seu declínio na primeira metade do Século XVIII, e em parte do
Século XIX e, uma considerável fragilidade em comparação a Academia
Francesa.22
Igualmente, a Sociedade Lunar entrou em um estado de
20
The Royal Society of London for the Improvement of Natural Knowledge
(A Sociedade Real de Londres para o Melhoramento do Conhecimento
Natural) foi fundada em 1660, que teve seu intuito de ser a promotora do
conhecimento científico e continua a existir nos dias de hoje. Mais sobre a
sociedade pode ser encontrado no sítio eletrônico:
<https://royalsociety.org/~/media/Royal_Society_Content/about-
us/history/Charter1_English.pdf>. Acesso em: 20 maio 2015. 21
The Lunar Society – Sociedade Lunar ou Círculo Lunar, denominado por
Joseph Priestley, era uma associação um club de intelectuais que se
encontravam ao menos uma vez por mês no domingo ou segunda-feira mais
próxima da lua cheia, o que os auxiliava a retornar para suas casas com uma
certa segurança e luminosidade natural, o período de reuniões mais
marcantes foram entre os anos de 1765 e 1813, em Birmingham, Inglaterra.
Seus mais ilustres membros foram James Watt, Erasmus Darwin, Josiah
Wedgewood, Joseph Priestley, contudo, sempre contavam com visitas de
outros ilustres como Thomas Jefferson, Benjamin Franklin, Sir Richard
Arkwright, Thomas Bedoes, Anna Seward, John Smeaton, etc
Disponível em: <http://www.historic-uk.com/CultureUK/The-Lunar-
Society>. Acesso em: 20 maio 2015 e Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/programmes/p00548z8>. Acesso em: 20 maio 2015. 22
Academia Francesa (Académie Française) foi criada pelo decreto do
cardeal Richelieu, em 1635, e sua composição abriga 40 membros
denominados imortais, lembrando as Academias de Letras Brasileira e
estaduais. Sua função principal é normatizar e aperfeiçoar a língua francesa
e formalmente é a responsável pela regulamentação da gramática, ortografia
e literatura francesa.
65
colapso depois do Século XIX. Portanto, entende-se que o
desenvolvimento da tradição baconiana23
de ciência experimental, a
tradição de pesquisa baseada em experimentação sistemática, como a
química no final do Século XVIII, teve mais proximidade com o
processo de inovação que os avanços em cosmologia, mecânica ou física
no Século XVII. Reafirma que nestas relações, a ciência provavelmente
aprendeu da tecnologia, assim como a tecnologia aprendeu da ciência,
uma vez que, até o Século XIX, muitos cientistas estavam mais
preocupados em tentar responder questões sugeridas para técnicas
industriais, que propriamente trazer novos conceitos. Concluiu que tanto
ciência e tecnologia demonstraram que a sociedade filosófica e
científica da época tinha um sentimento questionador, curioso, de
experimentar e querer melhorar (MATHIAS, 1972, p. 78-80).
Vale ressaltar que as Artes e Ciências (Artes Liberais24
) eram
vistas apenas como pré-requisito para se especializar em outras
carreiras, não estando no mesmo nível "superior" das faculdades de
Teologia e Direito, por exemplo. Esta emancipação pode ser
evidenciada através da propagação dos princípios humbolditiano25
(a
partir de 1800) que trouxe a visão da "proteção da liberdade acadêmica"
que pode ser definida em dois subprincípios: liberdade de aprender,
exercer e escolher qualquer currículo (Lernfreiheit) e a liberdade para
ensinar (Lehrfreiheit), também conhecido como o direito à livre
investigação. A adoção destes princípios permitiu que professores
23
Ideias de Francis Bacon que foi o mais influente defensor da visão
utilitarista de sua época e defendia que o propósito das ciências era o
domínio da natureza, pois, somente pode ser subjugada por meio de
submissão a ela, e é reconhecido por promover o método experimental e
empírico. 24
Nos ensinamentos de Charle e Verner (1996, p. 32): “[...] Delas vem
inicialmente a ideia de que existiam disciplinas propedêuticas, preparatórias
para os estudos propriamente superiores. Elas eram reagrupadas sob a
denominação de ‘Artes Liberais’. Distinguiam-se as três artes do trivium,
artes das palavras e dos signos (Gramática, Retórica, Dialética) e as quatro
artes do quadrivium, artes das coisas e dos números (Aritmética, Música,
Astronomia, Geometria) e adquiriu-se, então o hábito de falar da ‘Faculdade
de Artes’, faculdade preparatória e generalizante”. 25
Humboldt foi uma figura essencial para o período de fundação da
Universidade de Berlim e difusão das “novas ideias sobre universidade” e
trouxe alguns princípios importantes para desenvolver a pesquisa e ensino.
66
tivessem uma liberdade de investigação sobre suas linhas de pesquisa e
ensino, portanto, enfatizando a importância da ciência e pesquisa na
academia. Principalmente, a liberdade de escolha de currículo
influenciou o sistema norte-americano que diversificou não apenas na
opção curricular pelo aluno, como também, na popularização do ensino
superior.
Em contrapartida, no período da Idade Moderna, houve uma
ênfase na visão utilitária. Mathias (1972) destacou que a ligação entre
ciência e indústria tem relação com o que ocorreu no Século XVII e
XVIII, em que o Estado ativamente pressionou os cientistas para
realizarem um esforço utilitário. Cita como exemplos, os avanços em
balísticas e navegação, sendo que esta última contou com a melhoria da
cartografia, instrumentos científicos, astronomia, tabelas matemáticas
etc. Neste prisma, a indústria e habilidades científicas provaram ser úteis
em guerra e receberam atenção especial. De forma mais abrangente,
rivalidades nacionais tornaram-se importantes no Século XVII por
estimular invenções em muitas indústrias, as quais houveram mais
progresso tecnológico – indústrias de exportação, refinamento de açúcar,
destilarias, vidros, seda, tabaco impressão de livros, indústria de papel,
entre outros. Destarte, com a proteção do Estado houve uma valorização
das artes e das ciências (astronomia, biologia, botânica, química,
clássicos, geologia, história, matemática, filologia, filosofia, física e
ciência política), o que levantou ao status acadêmico da tradicional
(humanista) faculdade de Artes Liberais para o mesmo nível da
Teologia, Direito e Medicina, considerando-a como pesquisa pura
(FALLON, 1980, p. 28-30, 34; SCOTT, 2006, p. 20). Por isto, a
filosofia moral estava sendo substituída pela ciência, assim como o
ensino, pela pesquisa, em sua ordem de importância (KLERR, 2005, p.
15).
Indica também que a transação filosófica no Século XVII
exemplifica o conceito comum do período, assim sendo, os
experimentos e relatórios intentaram ter uma aplicação prática para
agricultura como para a indústria e tinha tanto espaço ou mais espaço
que muitas outras pesquisas e práticas. Afirma que isto certamente foi o
breeding ground (terreno fértil) para a inovação. A partir deste período,
as inovações se espalharam, ou parece que se espalharam, no solo fértil
do discurso científico e social, do nexus entre o homem da ciência e da
indústria. Neste florescimento, a matemática, por exemplo, teve um
papel maior como base inovativa tanto para a navegação, técnicas de
67
pesquisa na terra, quanto para a contabilidade para negócios, desenhos
arquitetônicos entre outros (MATHIAS, 1972, p. 61-63).
Realmente, a partir do Século XVII, houve uma grande
"revolução" nos conceitos e formas sobre a ciência, o que é considerado
pelos historiadores como a Revolução Científica, com o surgimento das
ciências modernas. A ideia de revolução se deu em razão de alguns
estudiosos contestarem teorias aristotélicas, como Simon Stevin nos
seus livros "Princípios da estática" e "Princípios da hidrostática" e
Francis Bacon com sua obra Novum Organum. De igual modo, Nicolau
Copérnico contrapôs-se ao modelo de Ptolomeu, ao apresentar sua teoria
heliocêntrica. Porém, foi revolucionário o período não apenas por
confrontar estudos anteriores, mas também, por apresentar avanços, na
física, química, botânica, anatomia, zoologia microbiologia, fisiologia, a
própria matemática e astronomia. Assim, grandes nomes como Galileu
Galilei, René Descartes, Isaac Newton, Leonardo da Vinci, Jerome
Bock, Otto Brunfels, Simon Stevin, Giordano Bruno, Johanes Kepler,
Daniel Fahrenheit, Anders Celsius, Robert Hooke, Robert Boyle,
Francis Bacon, Christian Huygens, Evangelista Torricelli, Blaise Pascal,
entre outros, endossaram a lista dos "filósofos naturais" como eles
mesmos se intitulavam por realizarem estudos sobre a natureza.
O aumento do interesse dos cientistas europeus pelas atividades
práticas caminhou lado a lado com seu experimentalismo. Na verdade,
os avanços científicos do Século XVII devem-se em parte à sua
disposição em aplicar à ciência as técnicas que haviam tomado
emprestado dos ofícios e das profissões. Como exemplo, aqueles
intelectuais acabaram emprestando seus talentos para melhorar
tecnologias, como o fez Tartaglia e Galileu, para os equipamentos
militares, Stevin para a engenharia hidráulica, Leibniz e Huygen para o
maquinário de potência, e, ainda o grupo de intelectuais (Galileu,
Torricelli, Descartes, Huygens e Newton) para o melhoramento do
telescópio (STOKES, 2005, p. 59-60).
Todavia, Francis Bacon é destacado como o mais influente
defensor da visão utilitarista26
de sua época, pois, para Bacon, o
propósito das ciências era o domínio da natureza, e seus procedimentos
investigativos promoveram o método experimental e empírico. Este
26
O termo utilitarismo foi utilizado pela primeira vez por Jeremy Bentham
e adotado na filosofia por John Stuart Mill, em sua obra Utilitarismo, de
1861.
68
ideal utilitarista propagou-se por gerações, principalmente, nos
enciclopedistas franceses do Século XVIII, e se firmou como uma parte
importante do pensamento ocidental sobre a ciência que conhecemos e
classificamos hoje. Afinal, para eles o estudo da natureza não tinha a
conotação de ciência como é agora. Outra influência destacada por
Stokes (2005) foi à criação da Royal Society, que acredita ter sido
inspirada pela ideia do Instituto de Pesquisa (Casa de Salomão) da obra
de Bacon, "Nova Atlântida" (STOKES, 2005, p. 61). A forte inclinação
dos experimentos e a utilidade do que está sendo pesquisado, testado,
também pontuada por Mathias (1972), pode ser vista no próprio texto do
estatuto da referida Sociedade de Intelectuais Ingleses (1662), em que
houve uma afirmação clara sobre o trabalho dos cientistas focarem em
tecnologia. Verifica-se que este período é anterior a Bentham que
certamente foi o maior entusiasta e disseminador do princípio
utilitarista, ou filosofia utilitarista, que inspirou outros no Século XVIII
e Século XIX.
Convém transcrever um excerto do estatuto da Royal Society para
compreender melhor o que foi mencionado: "O negócio da Royal
Society é: melhorar o conhecimento das coisas naturais, e todas as artes
úteis, Produção, Práticas, Mecânico, Motores e Invenções pela
experiência.", (MATHIAS, 1972, p. 61).27
Mathias apresentou ainda a
relevância do utilitarismo nas melhorias na agricultura no Século XX e
sua relação forte com a ciência, sendo que estas melhorias foram
prioridade naquele período. Indubitavelmente, teve apelo maior às
classes altas e médias da sociedade inglesa, já que estes grupos sociais
tinham mais interesse sobre o desenvolvimento do solo e da terra. As
melhorias na agricultura ocorreram tal como estão os estudos de Francis
Bacon (Sylva Sylvarum, or a Natural History, In Ten Centuries-1670)
que trouxe uma análise comparada de diferentes modos de fertilização;
ou de Boyle (1671) que instou fazendeiros a realizarem experimentos
químicos para melhoria no milho, árvores e gramas (MATHIAS, 1972,
p. 74-75).
Com essa percepção histórica, verifica-se que no tocante ao
desenvolvimento institucional da ciência, o padrão de desenvolvimento
nem sempre acompanha ou encaixa-se, sequencialmente, na inovação e
27
Texto original: The business of the Royal Society is: to improve the
knowledge of natural things, and all useful arts, Manufactures, Mechanic
Practices, Engynes and Inventions by experiment.
69
desenvolvimento na indústria. Ressalta-se que mesmo com a fundação
da Sociedade Real e a Sociedade Lunar, que são sempre cotadas como
evidência do desenvolvimento e nexo entre a ciência e indústria, deve-se
observar que a própria Real Society teve seu declínio na primeira metade
do Século XVIII, e em parte do Século XIX e, uma considerável
debilidade em comparação a Academia Francesa.28
Da mesma forma, a
Sociedade Lunar entrou em um estado de colapso depois do Século
XIX.
O que pode ser reafirmado por Stokes (2005) quando trata da
relação entre ciência e tecnologia e critica as errôneas suposições que se
formaram nos anos mais recentes. Para ele, a primeira premissa
equivocada é que toda ou quase toda inovação tecnológica tem suas
raízes na ciência e; a segunda, é que os fluxos de ciência e tecnologia se
dão sempre num mesmo e único sentido, partindo da descoberta
científica para a inovação tecnológica. Explica que a primeira é errônea
porque se verifica que nos séculos anteriores ao Século XXI, a ideia de
que tecnologia teria como base a ciência seria falsa, de modo que,
durante a maior parte da história da humanidade, as atividades práticas
têm sido aperfeiçoadas por "melhoradores" de tecnologia, os quais
conheciam pouco da ciência. Afirma ainda, que nos dias atuais, grande
parte de inovação tecnológica tem sido produzida sem o estímulo de
avanços da ciência, como ocorreu no Japão que teve um grande avanço
tecnológico no setor automobilístico, porém, não se baseou em novas
aplicações das ciências e sim em melhorias e mudanças em seus
processos de criação e produção. Quanto à segunda, observa que os
desenvolvimentos tecnológicos tornaram-se uma fonte muito mais
importante de fenômenos para os quais a ciência precisou buscar
explicações; assim, os estudiosos muitas vezes buscavam explicar uma
máquina já existente e o porquê de sua funcionalidade, mais que o
inverso. E conclui que cada vez mais a ciência tornou-se derivada da
tecnologia. Em adição, acredita que a influência da tecnologia sobre os
rumos da ciência básica é visível nas inovações tecnológicas envolvendo
28
Academia Francesa (Académie Française) foi criada pelo decreto do
cardeal Richelieu, em 1635 e sua composição abriga 40 membros
denominados imortais, lembrando as Academias de Letras Brasileira e
estaduais. Sua função principal é normatizar e aperfeiçoar a língua francesa
e formalmente é a responsável pela regulamentação da gramática, ortografia
e literatura francesa.
70
processos tanto quanto no caso dos produtos (STOKES, 2005, p. 41;
44).
1.5.2 A importância do modelo jurídico-institucional para
realizar inovação
Com a inicial abordagem sobre Sistemas de Inovação e Modelos
de Inovação, tem-se auxílio na compreensão do universo que este estudo
se concentra, que é a atividade de transferência de tecnologia e
conhecimento nas instituições de ensino, através de seus órgãos
gestores. A partir dos anos 1980, as discussões sobre inovação e suas
interações se intensificaram, e também foi nesta década que as
universidades e institutos de pesquisas norte-americanos puderam se
beneficiar e obter lucros com suas pesquisas e tecnologias desenvolvidas
e financiadas com fundos federais, com a promulgação da Bayh-Dole
Act. Assim, as universidades passaram a ter um papel fundamental na
comercialização de suas descobertas inclusive influenciando no
crescimento econômico de sua região e país trazendo novas ideias e
invenções ao mercado licenciando, transferindo estes direitos às
empresas (constituídas ou novas) e consequentemente ao mercado. A
transmissão destes direitos, ideias, invenções é denominada na literatura
de Transferência de Tecnologia (TT) e esta atividade é organizada e
gerenciada por instituições que facilitam a comercialização e interação
com a comunidade externa, os denominados Escritórios de
Transferência de Tecnologia, Núcleo de Inovação Tecnológica (termo
adotado pela Lei de Inovação Brasileira) que são os Technology
Transfer Offices (TTO).
Contudo, Bradley, Hayter e Link (2013, p. 03-18) apontam que
grande parte da literatura concentra-se em representar o processo
transferência de tecnologia em um modelo tradicional conhecido como
modelo linear. O modelo tradicional do processo de transferência de
tecnologia simplifica-se apresentado o fluxo de conhecimento linear,
retomando o modelo linear de Bush. Portanto, o "Modelo Tradicional de
Transferência de Tecnologia" é caracterizado por linearidade e
formalidade. Este modelo funda-se na ideia de que o processo se inicia
com uma descoberta pelos cientistas da universidade e, segue um
caminho linear apresentando esta nova descoberta ao Escritório de
Transferência de Tecnologia (TTO), que decidirá sobre seu
patenteamento ou não, e posteriormente a invenção ou ideia protegida,
poderá ser comercializada através de licenciamento para uma empresa
71
existente ou futuras empresas (spin off ou star up
29) que serão
estabelecidas para desenvolveram a invenção.
Na visão dos autores, este modelo tem suas impropriedades e
limitações (p. 35-45) que são apontadas como inocorrências e
inadequações. As inocorrências são apontadas em relação às
discrepâncias entre as postulações acadêmicas e como a transferência de
tecnologia é praticada nas universidades na realidade. Acreditar que a
estrita observância da linearidade e que a transferência de tecnologia
deve ser desenvolvida nesta sequência de mão única é subestimar a
complexidade do processo de TT, já que muitas vezes este processo
precisa ser reorganizado para seu melhor desenvolvimento. Portanto, a
simplificação do processo de TT, e assunção de que esta fórmula deve
servir para todos os casos, realmente é muito simplista.
Outro ponto de crítica é a ênfase exagerada no patenteamento
como uma fonte primária da transferência de tecnologia, esquecendo-se
que existem outros mecanismos que levam à comercialização e
rentabilidade, como as Marcas e Direitos do Autor. Quanto às
inadequações, destacam que o modelo tradicional despreza os
mecanismos informais e mais flexíveis de transferência de tecnologia
(conhecimento), que são as consultorias e as pesquisa colaborativas, e
ainda, as interações entre os membros das faculdades e a indústria,
publicações conjuntas e até mesmo as transferências de conhecimento
informais, principalmente, quando existe uma relação mais longa entre
estes pesquisadores e a empresa. Inclusive alertam que muitas vezes
quando os cientistas percebem que existe ou existirá uma
"inflexibilidade", barreiras na relação com a empresa interessada, como
também desvantagens com o envolvimento do Escritório de
Transferência de Tecnologia e os canais oficiais, o inventor poderá
preferir "burlar a divulgação" de sua invenção ao Escritório e adotar um
29
A similaridade entre as duas formas está em que ambas são novos
empreendimentos comerciais com interesse em desenvolver algo novo,
contudo, a spin off tem a característica de ser gerada dentro de uma outra
organização existente, portanto, nasce necessariamente (ou dentro) de uma
organização quer seja uma empresa ou uma universidade; já as start up são
novas empresas, geralmente na área de tecnologia, que tenham como
objetivo principal desenvolver e comercializar uma ideia nova, não
nascendo de uma organização anterior, apesar de poder basear-se em ideias
de universidades e ter estudantes e profissionais que desenvolveram a ideia.
72
mecanismo de transferência informal (p. 48). E de igual modo, destacam
a importância do sistema de recompensas da instituição, uma vez que
este acaba traduzindo as prioridades da mesma. Neste prisma, se a
instituição incentiva mais o cientista a publicar ou direcionar-se a
assuntos estritamente acadêmicos, evidente que a transferência de
tecnologia não é uma prioridade. Todavia, se houver um incentivo ao
empreendedorismo e comercialização dos ativos intangíveis, bem como,
aproximação com o setor privado, incluindo formas de premiações e
classificações internamente, é possível vislumbrar uma atividade mais
contundente de TT.
Quanto maior a valorização e recompensa ao inventor (ou grupo
de inventores), mais interesse estes terão em se envolverem no processo
formal de transferência de tecnologia. O modelo tradicional também
deixa de observar a cultura da instituição. Assim, a trajetória da carreira
acadêmica tradicional incentiva e premia a produção de novos
conhecimentos científicos, com publicações, participação em eventos,
influenciando os cientistas universitários estarem menos propensos a
comercializar os seus conhecimentos. Outra questão que influencia é a
desconexão entre as subculturas de cientistas universitários e os
administradores da universidade. Na opinião desta autora, por mais
inovativo que estes cientistas sejam e se dediquem para ideias
inovadoras, se a administração da instituição não se organizar política e
normativamente, investir e estruturar a universidade para que tenham
uma visão mais empreendedora, evidente que a transferência de
tecnologia não terá resultados animadores.
Neste ponto sobre a cultura institucional e a forma de organizar a
gestão e comercialização destes conhecimentos e tecnologias, é possível
reconhecer o modelo jurídico-institucional adotado, e se este apoia ou
não a internalização da inovação na universidade. De acordo com
estudos realizados pelo Centro de Gestão de Estudos Estratégicos
(CGEE, 2010, p. 20), sobre organizações de pesquisas, define-se "o
modelo jurídico-institucional como o conjunto de regras, leis e macro
diretrizes que delimitam o espaço e as direções nas quais uma
organização pode mover-se no cumprimento de sua missão". Portanto,
os estatutos jurídicos da organização, sua estrutura e política constituem
parte central do modelo institucional, bem como, os instrumentos de
controle e orientação (conselhos e outras instâncias) que influenciam na
atuação da instituição, o que de certa forma enunciam sua cultura,
missão ou visão. Neste horizonte, é importante analisar este modelo
jurídico-institucional destas entidades de pesquisa, inclusive
73
comparando com modelos de outras instituições estrangeiras. Destaca-se
que esta preocupação chega com certa urgência ao Brasil, visto que,
países como Dinamarca, França, Alemanha, Hungria, Itália, Noruega,
Portugal, Suíça e Reino Unido, também passaram por reestruturações
em seus modelos (ASTRÖM et al., 2008). A exemplo da Suécia que
compreende os institutos de pesquisas do país (IRECO30
) não tem
modelo de inovação formalizada. No entanto, o processo de
reestruturação que se submeteu o Grupo é permeado com uma nova
visão da inovação do processo. Desta forma o modelo tradicional
"linear" da inovação é substituído por um modelo que reconhece que as
inovações são desenvolvidas em interação entre universidades, institutos
de investigação e as empresas e que pesquisa básica, orientada para uma
missão de P&D, desenvolvimento e inovação são processos que estão
interligados e sobrepostos (ASTRÖM et al., 2008, p. 80). Os Estados
Unidos, em sua vanguarda na inovação, reconheceu que mecanismos
jurídicos-institucionais são instrumentos cruciais para incentivar a
produção e disseminar o conhecimento e transferência de tecnologias
comercializáveis, estabelecendo parcerias entre laboratórios federais,
indústrias e universidades, principalmente, com a adoção da Bayh-Dole
Act, legislação que permitiu às universidades a terem a titularidade dos
Direitos de Propriedade Intelectual quando financiadas pelo Governo
Federal e consequentemente, um aumento nos investimentos privados
(MATTOS; ABDAL, 2010, p. 15-16).
Importante estudo sobre a definição do papel das instituições de
pesquisa e das universidades no Sistema Nacional de Inovação
Brasileiro traz à tona a definição sobre o que deve ou não ser publicado
quanto aos resultados das atividades de pesquisa, a relação entre modelo
jurídico das instituições e seu desempenho, entre outras questões que
mereceram atenção (CGEE, 2010, p. 16). No Brasil, na contramão
destes esforços, perpetuam-se problemas de burocratização do setor
público, morosidade e burocracias dificultando a dinâmica das ações. E
a universidade pública brasileira juntamente com instituições públicas
30
IRECO Holdin AB, que atualmente se denomina RIS (Research Institutes
of Sweden - Institutos de Pesquisa da Suécia), é uma sociedade anônima
sueca que atua como empresa do governo sueco de exploração para a
propriedade estatal dos vários institutos de pesquisa no país, constituída sob
a forma de uma sociedade de responsabilidade limitada em que o Estado
sueco não é o único proprietário.
74
de pesquisa apresentam modelos jurídico-institucionais que podem
delimitar sua atuação e retardar o desenvolvimento do processo de
transferência de tecnologia.
1.6 Um olhar mais abrangente: modelos de transferência de
tecnologia de instituições ensino em Israel e Países Baixos
Destaca-se que qualquer sistema tem seus elementos de interação.
Lundvall sublinha que o sistema não é somente a soma das partes, é
,também, as inter-relações e interações entre os elementos, que são tão
importantes para os processos e os resultado. Portanto, espera-se que
cada sistema possa desenvolver a sua própria e única dinâmica
(LUNDVAL, 2007).
O conceito de Sistema de Inovação geralmente envolve o Sistema
de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) que é desenvolvido nas
universidades e institutos de pesquisa, bem como, nas indústrias. Isso
também é destacado na legislação sobre Propriedade Intelectual,
principalmente, as patentes, as formas de transferência de tecnologia e,
políticas governamentais que visam estimular a inovação. Por isso,
aproxima-se do conceito de "sistema" envolvendo governo,
universidades, institutos de pesquisa e indústrias, sendo estes os atores
principais.
Dedicou-se neste estudo a conhecer o papel da universidade e sua
participação neste Sistema de Inovação. O viés desta pesquisa
concentrou-se no Brasil, todavia, principalmente, neste tópico, convém
tratar, mesmo que de forma breve, sobre outros exemplos internacionais.
Os países escolhidos foram os Países Baixos e Israel. A escolha destes
países tem suas razões peculiares, que apresentam evolução da
inovação, com destaque na organização da educação superior e
científica, com modelos de sucesso diferenciados, bem como, por razões
mais particulares, de forma que, quanto aos Países Baixos, o interesse
partiu da oportunidade desta pesquisadora realizar um Doutorado
Sanduíche na Universidade de Maastricht, através de um programa que
envolveu as universidades (Universidade de Santa Catarina-UFSC e
Universidade de Maastricht) através das agências de pesquisas brasileira
e holandesa (CAPES e a NUFFIC) que originou um artigo publicado.
Quanto a Israel, este país foi objeto de estudo durante a pós-graduação,
que motivou uma pesquisa mais detalhada e um artigo que destacou a
75
referência deste país quanto à forma de transferir tecnologia e sua
inserção internacional, mesmo sendo tão pequeno.
Apesar de Sistema Nacional de Inovação ser um termo comum, a
prática em cada país pode mostrar a diversidade de sua composição,
porque o Sistema de Inovação é o resultado da interação entre os atores
(universidade, governo e inicitaiva privada) e que faz diferença na forma
como esses atores estão estruturados e ao nível do desenvolvimento do
país, logo, é interessante um olhar mais abrangente neste texto. A
passagem, o mover da inovação tecnológica de uma instituição que
desenvolve Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) para outra instituição
receptora é o que se conceitua a Transferência de Tecnologia (TT). Para
Rogers, Takegani e Yin (2001), a transferência de tecnologia é a
aplicação de informação (que eles denominam como inovação
tecnológica) dando-lhe utilidade; e o processo de Transferência de
Tecnologia geralmente envolve o movimento de uma inovação
tecnológica de uma instituição de P&D para uma organização receptora,
como uma empresa, para que esta comercialize o produto desenvolvido
para o mercado (ROGERS; TAKEGAMI; YIN, 2001, p. 254). Este
processo de transmitir ou compartilhar uma tecnologia tem ocorrido
com frequência entre as instuições de ensino e pesquisa e o setor
privado, sendo organizado através dos Escritórios de Transferência de
Tecnologia destas organizações os denominados TTO (Technology
Transfer Offices). Países desenvolvidos como Estados Unidos,
continente europeu e também os países emergentes como os asiáticos
reconheceram que a maioria do conhecimento tecnológico é produzida
dentro da universidade (ou institutos de pesquisas). É nestes lugares que
estão as fontes de geração de novos conceitos e tecnologias, o que não
ocorre com as empresas nas quais seus investimentos em Pesquisa e
Desenvolvimento é sempre limitado ou muito direcionado,
principalmente, nas médias e pequenas empresas. Assim, pensando
numa interação entre estas organizações (universidade e empresa)
através de políticas, legislações e estruturas, bem como, incentivos
fiscais ou fomento, o governo incentiva esta relação Universidade-
Empresa para que haja uma transferência de conhecimento e tecnologia.
O que possibilita que o setor privado possa avançar tecnologicamente e
ao mesmo tempo as instituições de ensino possam ver suas pesquisas
tornarem-se produtos e ter uma utilidade mais concreta, com um retorno
financeiro a ser investido na própria universidade, desta forma, todos
ganhando. A forma e organização em que estas transferências são
realizadas são aqui denominamos de Modelo de Transferência de
76
Tecnologia ou Modelo de Gestão de Transferência de Tecnologia, sendo
que estes modelos são diferenciando quanto à missão da universidade,
função da pesquisa, conceito de tecnologia e o processo de transferência
de tecnologia adotado.
Entendendo a importância de um Sistema Nacional de Inovação,
é interessante verificar a posição dos Países Baixos em comparação aos
outros países, inclusive o Brasil. Conquanto, apesar do Brasil e Holanda
possuírem suas diferenças em território, posição geográfica, população e
cultura; existem similaridades como a vocação ao agronegócio, um
desempenho satisfatório em termos de inovação e, particularmente,
ambos gozam da dificuldade de traduzir os resultados das instituições de
ensino e pesquisa como ideias comercialmente viáveis. Além disso,
outra similaridade existe em razão do direcionamento em metas de curto
prazo para a produtividade, portanto, a ênfase na inovação incremental31
é maior que na inovação radical. Então, o texto aborda panorâmicamente
a estrutura dos Países Baixos.
Da mesma forma, discorre sobre Israel que como a Holanda
possui um território pequeno, ainda conta com escassos recursos
energéticos, hídricos e em solo. Não obstante, o Estado de Israel tem se
destacado no cenário internacional pelo alto nível de qualificação de
recursos humanos e posiciona-se entre as grandes potências mundiais
quando se trata de inovação tecnológica.
1.6.1 Modelo de Transferência de Tecnologia na Holanda
Este tópico visa proporcionar um panorama conciso sobre o
Sistema Nacional de Inovação Tecnológica dos Países Baixos, com
destaque para as instituições de ensino e pesquisa. Evidentemente, não
esgotando toda a temática, entretanto, possibilitando uma visão
perfunctória da política adotada.
O País é uma monarquia parlamentarista, sendo o Conselho de
Ministros que nomeia o Primeiro-Ministro para governar o Reino e este
conselho conta com um ministro plenipotenciário de Aruba, um ministro
plenipotenciário de Curaçao, e um ministro plenipotenciário de Sint
Maarten. Lembrando que a (s) Holanda(s) é (são) na verdade regiões
31
Representam pequenos avanços no produto ou em linhas de produto, não
significando grandes mudanças na forma, porém, significativos benefícios
ao consumidor.
77
(províncias) dos Países Baixos, existindo a Holanda do Norte, que tem
como capital a cidade de Haarlem, sendo Amsterdam a cidade principal;
e a Holanda do Sul que tem Haia como capital. O país tem ainda mais
10 províncias denominadas: Drenthe, Flevoland, Friesland, Gelderland,
Groningen, Limburg, Noord-Brabant, Overijssel, Utrecht e Zeeland.
Apenas para elucidar, Maastricht, onde esta pesquisadora realizou parte
de seus estudos, está no extremo sul do país, localizada na região de
Limburg, sendo sua capital.
Apesar de ser um país com pequenas proporções territoriais,
possui um desenvolvimento tecnológico expressivo dentro da
comunidade europeia e internacional. Tem destaque para o agronegócio
e indústria química e está entre as grandes potências mundiais quando se
trata de inovação tecnológica.
1.6.1.1 As universidades e institutos holandeses
O Sistema de Ensino Superior Holandês é dividido em dois tipos
principais de instituições: as universidades e o HBO-setoriais (HBO-
Hoger Beroepsonderwijs), chamado de sistema binário. Sua função é
formulada na Lei Nacional de Ensino Superior e Investigação de 1993.
A Holanda tem 13 universidades e uma universidade com ensino à
distância (Universidade Aberta) – dados coletados no ano de 2013. A
primeira universidade foi criada em 1575, em Leiden, Universiteit
Leiden. Entre as 13 universidades, três são direcionadas para programas
tecnológicos e de engenharia, uma voltada para a agricultura e nove são
as universidades que se dedicam a uma gama generalizada de áreas.
A maior parte da pesquisa básica é desenvolvida nessas
instituições. Ao contrário, os 42 Hogescholen (universidades de ciências
aplicadas) referem-se, principalmente, a programas de educação
orientados vocacionalmente e ajustados às profissões específicas e nos
quais a pesquisa aplicada é cada vez mais engajada. Estas entidades de
ensino não podem conceder doutorado. As universidades são
representadas pela VSNU (Associação das Universidades dos Países
Baixos), e os Hogescholen defendem seus interesses comuns através do
Conselho da HBO (HBO Raad), em que são discutidos os programas e
políticas para as respectivas instituições.
1.6.1.2 Do modelo de Transferência de Tecnologia nas
universidades e institutos Quanto ao modelo de transferência de tecnologia entre as
instituições holandesas, geralmente, cada instituição tem um roteiro e
regulamento designado sobre a comercialização do conhecimento e
78
resultados gerados. Estas regulamentações internas basicamente seguem
o determinado na legislação holandesa de patentes (PATENT ACT,
1995); e de direitos autorais contendo regulação para Direitos do Autor
(COPYRIGHTS ACT, 1912) e suas alterações: como em relação à
reprodução e gravação de imagens ou de som para uso pessoal
modificada em 1990, ou a proteção de programas de computador em
1994. Existe também uma legislação sobre sementes e variedades de
plantas, comercialização e propagação material e concessão de direitos
do criador (SEEDS AND PLANTING MATERIALS ACT, 2005), entre
outras normas esparsas.
Nos regulamentos de cada universidade estão definidas as
relações das instituições e seus trabalhadores, bem como, relação com
terceiros e suas licenças. Dessarte, conforme os atos citados, no caso de
patente, os direitos conexos revertem-se para o empregador, na medida
em que a natureza das invenções esteja relacionada ao desenvolvimento
de suas atividades (pesquisador/inventor), conforme os artigos 12.1 e
12.3, bem como, de atividades de estágio (Artigo 12.2).32
E em relação à
legislação de direitos autorais, o empregador (universidade e instituto) é
visto como o criador do trabalho, conforme o Artigo 7º.
Para exemplificar e compreender como funciona a relação entre a
universidade e terceiros interessados (organização ou empresas) destaca-
se algumas peculiaridades de duas universidades: a Universidade de
Maastricht (University Maastricht-UM) conjuntamente com sua unidade
dedicada à saúde (University Hospital Maastricht-AZM); e a
Universidade de Amsterdam (VU) e do Centro de Medicina da referida
universidade (VUmc). Ambas possuem um Escritório de Transferência
de Tecnologia (TTO) que cuidam da comercialização dos
conhecimentos, pesquisas realizadas na entidade, bem ainda, com a
chamada política de "valorização" do profissional, oferencendo cursos,
palestras e apoio aos processos e atividades dos seus trabalhadores e
pesquisadores. No caso da Universidade de Amsterdam (Vrije Universiteit Amsterdam-VU) a atuação do escritório está na tecnologia
de informação, energia e ambiente, ciências da vida, promoção à saúde e
de cuidados de gestão de saúde; e em Maastricht está mais voltado para
empreendedorismo (Maastricht Centre for Entrepreneurship-MC4E) e
32
As informações estão disponível em:
<http://english.rvo.nl/sites/default/files/2013/12/ROW95_ENG_niet_officie
le_vertaling_0.pdf.> Acesso em: 05 mar. 2013.
79
saúde (BioMedbooster). Os centros médicos das citadas universidades
são renomados e buscam adaptar o papel da universidade com a
sociedade, principalmente, quanto aos cuidados de saúde, conforme
citado, trazendo inovação para o mercado e promovendo o
conhecimento e a transferência de tecnologia.
Estes escritórios funcionam como um empreendedor institucional
e gerenciam o portfólio de Propriedade Intelectual das respectivas
instituições, entretanto, não funcionam como empresas separadas ou
órgãos totalmente independentes. Estes TTO também orientam os
pedidos de patentes e oferece aconselhamento e apoio no processo de
comercialização (em cooperação com o inventor e departamento
envolvido). Os profissionais do escritório também prestam
aconselhamento jurídico sobre a troca de informações confidenciais
materiais ou contratos de pesquisa, bem como, ajudam no processo de
patenteamento e licenciamento. Ademais, os escritórios de tranferência
de tecnologia auxiliam no desenvolvimento de estratégias de negócios,
análises de mercado, planos de negócios, formação de novas empresas, e
ter acesso a instrumentos financeiros particularmente voltados para a
valorização do conhecimento e desenvolvimento de produtos. Da
mesma forma, poderão coordenar os contratos para colaborações
universidade-indústria. Os escritórios ainda oferecem capacitação aos
cientistas com cursos e treinamentos, e com o desenvolvimento de
planos de negócios e aplicações de subsídios. Como também fornecem
acesso a empréstimos para a realização de estudos de viabilidade de
oportunidades de negócios, particulamente no caso da Universidade de
Amsterdam.
De acordo com a Lei de Patentes holandesa, qualquer invenção
feita pelo trabalhador de uma instituição universitária ou investigação, é
legalmente de propriedade da instituição. Assim, todas as patentes
devem ser apresentadas em nome das respectivas instituições. Mas, no
caso da Universidade de Maastricht há flexibilidade nas invenções
relacionadas à saúde, conforme seu regulamento (Artigo 3º), em que é
possivel que a UM deixe os direitos de propriedade decorrentes da
aplicação, invenção, de trabalho ou de banco de dados desenvolvido,
matérias sobre saúde, medicina e ciêncas da vida, para compor de forma
conjunta com a Faculdade de Saúde, Medicina e Ciências da Vida.
80
No caso da UV, todas as patentes devem ter o pedido em nome da
universidade (Vereniging VU Windesheim33
), a menos que medidas
legais no exterior tornem isso impossível, a patente deverá ser
transferida para a Vereniging (Associação) o mais rápido possível após
o depósito, convergindo também à gestão da carteira de patentes.
Entretanto, observa-se nos regulamentos destas instituições que
existem formas de flexibilização, com previsão de casos excepcionais, e
acabam não necessitando seguir à risca o regulamento, podendo
negociar com terceiros, evidentemente, após justificativas e
recomendações das respectivas faculdades, e passar para decisão de
diretoria respectiva, como no caso do Artigo 11 da UM.
No que concerne à divisão dos Royalties, de acordo com as
legislações apontadas, a propriedade intelectual pertence à universidade.
No entanto, o inventor pode receber valores, como uma parte do lucro
líquido, quando uma tecnologia por ele criada entra no mercado com
sucesso e ganha receita. Este lucro líquido é dividido entre a
universidade (orçamento central), faculdade/divisão/instituto e o próprio
inventor ou inventores, sendo de um terço para cada um (33%).
Interessante mencionar que a VU tem um fundo para patentes,
utilizado para financiar atividades relacionadas com patente, incluindo
os custos de aplicação. Por isso, é o TTO que administra os fundos
atribuídos e decide se deve prosseguir ou não com uma patente após
análise. Cada universidade tem seu modelo contratual e seria
interessante discutir estas modalidades de forma mais detalhada em
outra oportunidade, tendo em vista que este texto se dedica a uma visão
geral sobre a Transferência de Tecnologia.
1.6.1.3 A posição inovadora dos Países Baixos
Estudos são realizados para mensurar e classificar países
desenvolvidos e em desenvolvimento, inclusive quanto ao seu caráter
33
Associação das Universidades de Amsterdam. Até o final de 2011, a
universidade era parte da pessoa jurídica e da cúpula administrativa
'Windesheim University Association, que além da VU também contava com
o Centro Médico da Universidade VU, a Universidade Windesheim Cristã.
E desde 01 de janeiro de 2012 foi dividido e foram estabelecidas as
fundações para as instituições VU e VUmc (Fundação- Medical Center) e a
instituição Windesheim (Fundação Faculdade Cristã Windesheim).
81
inovativo. Destaca-se neste tópico o relatório de competitividade global
promovido pelo Fórum Econômico Mundial 2013/2014 que apresentou
a Holanda na 8ª posição, à frente do Japão e Reino Unido, 9 e 10,
respectivamente.34
De forma diferenciada da abordagem da OCDE em
relação ao relatório apresentado, os Países Baixos apresentaram uma
melhoria em sua qualificação comparável ao ano de 2008. Na verdade,
para o ranking do Fórum Econômico Mundial, o país perdeu três
posições desde o último ranking e o motivo atribuído refere-se aos
dados do mercado financeiro enfraquecido e, em particular, o aumento
com preocupações sobre a estabilidade dos bancos. Em média, o país
tem um desempenho satisfatório e considerado uma economia altamente
produtiva.
Empresas holandesas foram consideradas pelo relatório como
altamente sofisticadas e inovadoras, ficando em quarto lugar, foi
também apontado que o país tem aproveitamento de novas tecnologias
para melhorias de produtividade, classificado em oitavo. Isto é atribuído
ao sistema educacional excelente (4º classificado para a saúde e
educação primária e 6º para a Educação Superior e formação).
Apresentou um eficiente mercado de bens em 8º posição, sendo que são
altamente favoráveis à atividade empresarial. E, embora o país tenha
registrado déficits fiscais nos últimos anos (4,15 % do PIB em 2012), o
seu ambiente macroeconômico é mais forte que a de uma série de outras
economias avançadas. Por último, mas não menos importante, a
qualidade de sua infraestrutura está entre os melhores do mundo,
refletindo excelentes instalações para transporte marítimo, aéreo e
ferroviário, que são classificadas 1º, 4º e 11º, respectivamente.
De forma um pouco mais crítica, Rob de Graat, Patrick van der
Duin e Ton Langeler (2010) realizaram o estudo empírico realizado por
um grupo de pesquisadores, apresentaram um cenário menos entusiasta
sobre o sistema de inovação holandês desenvolvido. No estudo,
entrevistaram profissionais das áreas da educação, empresas e governo e
34
O relatório contribui para a compreensão dos principais fatores que
determinam o crescimento econômico, ajuda a explicar por que alguns
países são mais bem sucedidos que outros na elevação dos níveis de renda e
das oportunidades de suas respectivas populações, e oferece aos políticos e
líderes empresariais uma importante ferramenta para a formulação de
melhores políticas econômicas e reformas institucionais.
82
identificaram sete razões como limitativas da melhoria na capacidade de
inovação da economia do país. Entre as falhas pontuadas destacam-se
três: a) as dificuldades de empresas holandesas para absorver
conhecimento acadêmico - a razão indicada que as universidades não
são capazes de traduzir seus resultados em ideias de negócio, e,
empresas não são capazes de ver as instituições como realmente capazes
de agirem de forma empreendedora; b) pouco uso das Tecnologias de
Informação e Comunicação (TIC), no entanto, apesar de existir uma
estrutura grande de TIC, ainda é muito lenta a implementação destas
tecnologias em novos produtos, serviços e melhoria de processos, até
mesmo o processo de inovação em si; c) a falta de pessoal qualificado
destacando que o financiamento governamental ainda é insuficiente para
o sistema educacional, especialmente na área técnica.
É relevante a tendência que o país vem adotando na agricultura e
indústria de alimentos, investimentos são feitos para florescer as start-
ups e pequenas e médias empresas. Da mesma forma, denota-se a
importância de um fundo para universidades como a Erasmus,35
Groningen e Radboud (HAN), que treinam os alunos para estabelecerem
seu próprio negócio e auxiliam os pesquisadores a traduzirem os seus
conhecimentos para produtos, como também, formas de atraírem
trabalhadores para o mercado holandês. Verifica-se o comprometimento
do governo em concentrar capacitação-graduação e ciência para ter
profissionais mais qualificados para as indústrias e permitir ações mais
interativas entre ciência e setor privado. Por exemplo, a possibilidade de
mudar regime de educação para uma visão mais empresarial,
incentivando a colaboração com setores-chave.
Não obstante, no período desta pesquisa (2013), a Holanda teve
um índice de Pesquisa e Inovação abaixo da média da Organização para
a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e caiu
substancialmente desde o início de 1990, comparando com o que foi
demonstrado pelo relatório sob a perspectiva de Ciência, Tecnologia e
Indústria em 2008. Um dos fatores apontados no relatório foi a estrutura
da economia centrada no setor de serviços, tendo um pequeno setor de
35
Erasmus Universiteit Rotterdam é uma universidade sediada na cidade de
Roterdã que recebeu este nome em 1973, sendo reconhecida pela sua
dedicação na área de Economia, sob a influência da Escola de Comércio dos
Países Baixos (1913), fundada pela iniciativa privada e apoio da
comunidade de negócios da cidade.
83
alta tecnologia e elevada concentração de P&D em um número limitado
de empresas multinacionais (Philips, Unilever, Shell, Akzo/Nobel, DSM
e outras), algumas das quais estão em setores de baixa e média
tecnologia, conforme o relatório OCDE de 2008.36
A falta de sucesso em transformar o conhecimento em um
desempenho econômico mais forte foi uma das "fraquezas" destacadas
no referido documento. Apesar da força tradicional do país ser serviços
relacionados ao comércio e distribuição, medidas de inovação e
crescimento da produtividade nos serviços mostram-se tímidas no
desempenho comparativamente a outros países da OCDE, e que pode
ser uma preocupação para o crescimento de longo prazo e futura posição
competitiva. Comenta-se que, neste aspecto, a Holanda congrega as
mesmas dificuldades dos países em desenvolvimento como o Brasil.
1.6.2 Modelo de Transferência de Tecnologia em Israel
Apesar de ser um país com pequenas proporções territoriais e
com escassos recursos energéticos, hídricos e solo, o Estado de Israel
tem se destacado no cenário internacional pelo alto nível de qualificação
de recursos humanos e se colocado entre as grandes potências mundiais
quando se trata de inovação tecnológica.
O País ficou conhecido como a nação de startups, após a
publicação do livro propaganda Start-up Nation, (2009), que teve como
autores o jornalista israelense Saul Singer e o pesquisador Dan Senor.
Se Israel depositasse suas expectativas nos recursos naturais disponíveis
para desenvolvimento de agricultura, potencial energético, indústrias em
geral, à primeira vista, não se poderia esperar tanto sucesso desta nação
em comparação ao Brasil, uma vez que, em extensão territorial, Israel
representa o estado de Sergipe com pouco mais de vinte e dois mil
quilômetros quadrados. Mesmo com estes fatores de desvantagens,
Israel registrou no ano de 2011 uma taxa de crescimento do PIB de
4,9%, percentual, acima de outras economias desenvolvidas. E, mais
importante é que Israel foi considerada a nação que esteve em primeiro
lugar no mundo, em 2010, quanto à proporção de investimento nacional
36
Relatório sobre Inovação em empresas e os resultados de uma análise
comparativa da inovação em pesquisa de micro dados.
84
em P&D, 4,40% do PIB (excluindo a defesa), conforme dados da
OCDE.37
Mesmo com a população que não ultrapassa oito milhões de
habitantes, conta com a concentração de cientistas renomados com 10
prêmios nobel em diversas áreas. Em contrapartida, O Brasil pode
somente citar um caso de um brasileiro (britânico) que ganhou um
prêmio nobel, o zoólogo Peter Medawar, que ganhou o prêmio Nobel de
Medicina de 1960 e mesmo tendo nascido no Brasil, preferiu a
nacionalidade inglesa. Verifica-se que a extensão territorial e quantidade
e habitantes não geraram vantagens nesta comparação com o Brasil.
1.6.2.1 Entidades geradoras de conhecimento – universidades e
institutos de pesquisas As universidades israelenses possuem autonomia administrativa e
pedagógica e seu orçamento é formado por fundos públicos, que
representam 70%,e, pelas mensalidades pagas pelos estudantes (em
torno de 20%) e o restante é proveniente de várias fontes particulares.
As atividades de pesquisa científica são desenvolvidas pelas
universidades e institutos que são agentes importantes para os avanços
tecnológicos de Israel. Porém, a forma de organização da transferência
de tecnologia difere um pouco do modelo brasileiro, pois, a pesquisa e
desenvolvimento são realizados pelas universidades e institutos de
pesquisas, mas, a comercialização do produto de P&D é realizada por
uma empresa privada, uma organização que administra a propriedade
industrial.
Primeiramente, convém destacar o Instituto Weizmann de
Ciência, que foi uma das primeiras instituições a adotar esta sistemática,
criando uma organização, denominada YEDA, em 1959, para
administrar a comercialização e marketing da pesquisa realizada. O
sucesso adquirido levou as universidades israelenses a replicá-lo,
gerando um ciclo de inovação, em que conjuga a visão empresarial na
Propriedade Industrial, possibilitando um retorno, um investimento na
pesquisa para o desenvolvimento de novas ideias e produtos, deixando
os pesquisadores desenvolverem seu papel de forma mais aplicada. Esta
visão empresarial também pode ser observada na criação de parques
industriais com base na pesquisa científica, em indústrias paralelas para
37
Disponível em: <http://www.oecd.org/israel/sti-outlook-2012-israel.pdf>.
Acesso em: 20 mar. 2013.
85
a comercialização de produtos específicos, baseados em suas pesquisas,
possibilitando associações com parceiros comerciais locais e
estrangeiros e também assessorias técnicas.
A interdisciplinaridade está presente nas pesquisas israelenses
como no estabelecimento de institutos de análise e teste, em vários
campos científicos e tecnológicos vitais à indústria do País como nas
áreas de construção, transporte, educação, agricultura, aproveitamento
de águas, aeronáutica, dado que estes são os pontos fundamentais da
pesquisa aplicada. Esta parceria (universidade e setor privado) é de
fundamental importância no Sistema de Inovação israelita, visto que
indica a visão governamental deixando claro que o desenvolvimento da
inovação não está voltado apenas para a ciência em si, mas também,
para a produção e comercialização dos resultados e de reinvestimento
dos valores arrecadados em royalties, através de premiações à
instituição inovadora e seus profissionais, bem como, em incentivos em
relação aos impostos.
Essencialmente, Israel está usando a pesquisa como a plataforma
indicadora de crescimento de sua economia. Esta ambição certamente
não é exclusividade de Israel, mas a combinação de circunstâncias e
atitudes possibilitou maior sucesso em termos de crescimento
econômico se comparado com outros países. De acordo com estimativas
da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), Israel investe mais de seu PIB em pesquisa e desenvolvimento
que qualquer outro país membro.38
E mesmo com a crise financeira
global, houve apenas uma pequena desaceleração de seu crescimento em
2010. A organização internacional, em suas estatísticas, observou que
Israel, não só tem um nível médio-superior da participação em registro
de patentes triádicas,39
como também o registro de marcas está acima da
média, liderando também o ranking da OCDE de empreendimento de
capital de risco.
38
Idem. 39
Definido pela OCDE, a Família de Patente Triádica é o conjunto de
pedidos de patentes apresentado junto ao Escritório Europeu de Patentes,
(EPO, na sigla em inglês) e ao Escritório de Patentes Japonês (JPO, na sigla
em inglês), e concedido pelo Escritório Norte-Americano de Patentes
(USPTO, na sigla em inglês), que compartilha um ou mais pedidos de
prioridades, protegendo o mesmo conjunto de invenções.
86
Considerando que a academia tem seu papel de destaque no
Sistema de Inovação de Israel, convém destacar algumas universidades e
institutos de pesquisas que possuem renome internacional. Neste rol
sobrepõem-se algumas universidades: Universidade Hebraica de
Jerusalém; Universidade de Tel Aviv; Universidade de Haifa;
Universidade Ben-Gurion do Negev; Universidade Bar-Ilan e
Universidade Aberta de Israel. Entre os Institutos estão o Instituto
Weizmann da Ciência e o Instituto Technion.
No caso da Universidade Hebraica de Jerusalém, esta teve sua
fundação em 1925, e é composta por faculdades que abarcam
praticamente todas as áreas do conhecimento, como História da Arte até
Zoologia, e ainda abriga a Biblioteca Nacional de Israel. Desde a sua
criação, os cientistas da Universidade Hebraica estão envolvidos em
todas as fases do desenvolvimento nacional e seu Departamento de
Estudos Judaicos é um dos mais completos do mundo. E para o
marketing e comercialização de toda sua Propriedade Intelectual, esta
universidade conta com o apoio da Yissum Techology Transfer, que é a
empresa de comercialiçao dos resultados de pesquisa.
A Universidade de Tel Aviv (TAU), com fundação em 1956, é
resultado da incorporação de outras instituições: Faculdade de Direito,
Economia de Tel Aviv, do Instituto de Ciências Naturais e um Instituto
de Estudos Judaicos. Situa-se na região mais populosa do país e, na
atualidade, é a maior universidade de Israel, oferecendo uma ampla
gama de disciplinas e dando ênfase especial à pesquisa pura e aplicada.
A universidade possui institutos especializados nos campos dos estudos
estratégicos, administração de sistemas de saúde, previsão tecnológica e
estudos energéticos. O braço comercial de sua PI é a RAMOT.
Já a Universidade de Haifa (1963) é considerada o centro de
ensino superior da região norte do País, com estudos interdisciplinares.
A universidade tem um Departamento para o Estudo sobre Kibutz40
e
40
Kibutz, no plural, kibutzim, significa a coletividade comunitária israelita,
concentrada no campo, que tiveram função essencial na criação do Estado
de Israel. Estas comunidades combinavam o socialismo e o sionismo
(trabalhista), em que pela necessidade de vida comunal e inspirados por
ideologia socialista, seus membros desenvolveram uma forma de vida em
comunidade. Atualmente, são vistos como empresas, pois, apesar de
viverem em uma comunidade, contratam trabalhadores que não fazem parte
do sistema e recebem salários, evidenciando sua vertente capitalista.
87
um centro dedicado à melhoria da compreensão e cooperação entre
judeus e árabes em Israel. Uma curiosidade é que na Universidade de
Haifa tem um projeto arquitetônico assinado pelo brasileiro Oscar
Niemeyer, que não chegou a ser totalmente concluído. O que foi
concretizado do projeto do arquiteto brasileiro, basicamente, foi o
edifício principal, que é uma extensa placa horizontal, e o edifício-torre
da administração da Universidade, a Torre Eshkol,41
que seguiram o
traço original, ressaltando que um de seus edifícios foi o mais alto da
cidade de Haifa até 2002. Da mesma forma, esta universidade conta com
o apoio da CARMEL Haifa University Economic Corp. Ltd. para
desenvolver a transferência de tecnologia.
A Universidade Ben-Gurion do Neguev foi fundada em 1967, em
Beer Sheva, visando possibilitar a formação da população da região
meridional de Israel e estimular o desenvolvimento social e científico da
região deserta do país. Esta universidade tem como foco de pesquisa as
zonas áridas e sua Faculdade de Medicina foi a pioneira nacional na
prática da medicina comunitária. Tem um campus universitário situado
no Kibutz Sde Boker que abriga um centro de pesquisa para o estudo dos
aspectos históricos e políticos da vida e época de Ben-Gurion, o
primeiro Primeiro-Ministro (chefe de governo) de Israel e que também
foi o líder do movimento do sionismo socialista no País. Para esta
universidade, a transferência de tecnologia é realizada através da BGN
Technology Transfer Company of Ben-Gurion University.
A Universidade Bar Ilan, fundada em 1955, em Ramat Gan, adota
uma abordagem integrativa especial, que combina programas sobre a
tradição judaica com a educação liberal, numa vasta gama de
disciplinas, especialmente Ciências Sociais. Interagindo o tradicional e o
moderno, nos Institutos de Pesquisa de Física, Química, Matemática,
Economia, Estudos Estratégicos, Psicologia Evolutiva, Musicologia,
Bíblia, Talmude, Legislação Judaica e outros. Para desenvolver a
comercialização da PI, a universidade de Bar Ilan tem o apoio da Bar-Ilan Research & Development Ltd., da Bar Ilan University.
41
HOLMER, Renato. Oscar Niemeyer e a Universidade de Haifa.
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Outubro/2011. Disponível em:
<http://www.ufrgs.br/propar/publicacoes/ARQtextos/PDFs_revista_10-
11/8_FIORE.pdf>. Acesso em: out.. 2012.
88
Da mesma forma, que em muitos países como o Brasil e a
Holanda, existe a Universidade Aberta em Israel, criada em 1974. Tem
uma influência notória do modelo inglês, oferecendo diferentes
oportunidades não tradicionais de graduação superior em nível de
bacharelado, utilizando-se de métodos flexíveis que se baseiam,
principalmente, no estudo individual independente, através de livros de
texto e guias, complementados por exercícios estruturados, tutoria e
exames finais.42
Quanto aos institutos, destacam-se ao menos dois dos mais
conhecidos, como o Instituto Weizmann de Ciências e o Instituto
Technion. O primeiro foi criado em 1934, com a denominação de
Instituto Sieff, e a partir de 1949, recebeu o nome do Dr. Chaim
Weizmann, que foi o primeiro Presidente de Israel e um químico
renomado. Atualmente, é um reconhecido centro de pós-graduação e
pesquisas em Física, Química, Matemática e Ciências Biológicas. Seus
pesquisadores dedicam-se a projetos para acelerar o desenvolvimento
industrial e à criação de iniciativas científicas. A empresa Yeda é o
braço na comercialização da PI do instituto e sua atuação será abordada
mais adiante.
O Technion é o Instituto Tecnológico de Israel, que no ano de
2012, comemorou 100 anos de existência, ao considerar a sua pedra
fundamental no ano 1912. É tido como um dos maiores centros
acadêmicos do mundo, que formou uma grande parte dos engenheiros,
arquitetos e planejadores urbanos desta nação. Este instituto funciona
como centro de pesquisa pura e aplicada nos campos da Ciência e
Engenharia, contribuindo para o desenvolvimento industrial israelita. A
transferência de tecnologia deste instituto é realizada pela T³-Technion
Technology Transfer. Abaixo, se verificará como é vista esta estrutura
universitária se comunicando com o setor privado.
1.6.2.2 A pesquisa antes da fundação do Estado de Israel
Para o Estado de Israel, a inovação é vista como atividades de
pesquisa, desenvolvimento e de demonstração, que apresentam novos
produtos ou processos a serem comercializados no mercado global.
42
Ministério das Relações Exteriores de Israel. Fatos sobre Israel.
Impressora do Governo de Israel. Jerusalém, 2010. (p. 96). Disponível em:
<www.mfa.gov.il>. Acesso em: out. 2012.
89
Israel é apontado no cenário internacional pelo vultoso percentual de
recursos investidos anualmente em Pesquisa & Desenvolvimento (P&D)
em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) no mundo, cerca de 1,5
bilhões da moeda local, aproximadamente quatrocentos milhões de
dólares distribuídos em centenas de instituições e companhias.43
Este
investimento demonstra o nível competitivo que o país obtém no
contexto global, e isto ocorre em razão de uma política definida em
atividades em áreas específicas. Israel é altamente competitivo nas áreas
de Agricultura, Medicina, Química, Computação, Engenharia e Ciências
Naturais. Instituições como o Instituto Weizmann de Ciência e o
Technion têm em seus currículos profissionais que ganharam prêmio
Nobel, como o de Química em 2009, com a cientista Ada Yonath
(Diretora do Centro de Estrutura Biomolecular Helen y Milton A.
Kimmelman) do Instituto Weizmann e Daniel Shechtman, na mesma
área em 2011, pela Technion, que foi o responsável pela descoberta dos
quasicristais,44
estruturas da matéria antes consideradas impossíveis.
Exemplo de ação inovadora reconhecida internacionalmente foi a
pesquisa da Universidade Hebraica, Faculdade de Agricultura, Alimento
e Ciência de Qualidade Ambiental, que produziu o tomate cereja,
cultivado em estufa desenvolvida para ter maior vida útil, rendimento e
qualidade, revolucionou a indústria de produtos frescos do mercado. A
variedade denominada "Daniela" é considerada uma das cultivares de
variedades estufa líderes no mundo, com grande produção,
principalmente, na Europa.
Neste contexto, compreende-se com a história de P&D israelita,
que a infraestrutura científica e tecnológica do país já estava alicerçada
antes de 1948, ocorreu antes mesmo da criação do Estado, como no caso
da pesquisa agrícola, que remonta ao fim do Século XIX. Como
exemplo, tem-se a criação de instituições pioneiras na pesquisa agrícola
como a Escola Mikve Israel, em 1870 e, o estabelecimento da Estação
43
Ministry of Industry, Trade and Labor. R&D Incentives Programs. 2012.
Disponível em: <www.moital.gov.il/madan.htm.>. Acesso: out. 2012. 44
Os quasicristais são estruturas ordenadas da matéria, mas que não são
periódicas. Também chamados sólidos quase-periódicos, são maus
condutores de eletricidade e extremamente duros e resistentes à deformação,
por isso podem ser usados como materiais protetores antiaderentes.
Disponível em: <http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/israelense-ganha-
nobel-de-quimica-por-quasicristais#quase-cristais> Acesso em: out. 2012.
90
Agrícola, em Tel Aviv em 1921, que posteriormente passou a designar a
Organização de Pesquisa Agrícola (ARO), e atualmente é a principal
instituição de pesquisa e desenvolvimento agrícola do país.
Da mesma forma, no que toca às universidades com maior
importância para o país na atualidade, estas foram criadas anteriormente
a 1948, como a Universidade Hebraica, fundada em 1925 que é uma das
pioneiras no desenvolvimento da ciência e tecnologia básicas e o
Instituto de Tecnologia Technion-Israel, fundado em Haifa em 1924.
Este último, que em 2012 comemorou 100 anos de existência, ao longo
do tempo foi se organizando como Centro de pesquisa Avançado, sendo
que a partir de 1950, expandiu-se desde a Faculdade de Engenharia para
desenvolver pesquisas na área de Microeletrônica.
O Instituto Weizmann de Ciência foi inicialmente o Centro de
Pesquisa Daniel Sieff, fundado em 1934 e apenas em 1949, passou a ter
a denominação atual. Outra instituição importante é o Instituto de
Microbiologia e dos Departamentos de Bioquímica, Bacteriologia e
Higiene da Universidade Hebraica de Jerusalém que foi criado em
meados da década de 1920. Eles constituíram a base do Centro Médico
Hadassa, a mais expressiva instituição de pesquisa médica de Israel.45
O
que evidencia que o país tem um histórico importante e uma estrutura
organizada para desenvolver suas tecnologias, sendo a pesquisa uma
peça-chave para o sucesso científico de Israel.
1.6.2.3 A transferência de tecnologia das universidades e
institutos israelenses: relacionamento UNIVERSIDADE –
EMPRESA
As instituições de pesquisa além de suas funções voltadas para
investigação poderão manter relações com a iniciativa privada. Portanto,
poderão comercializar sua Propriedade Intelectual, realizar parcerias e
assessorar empresas, com seleção e acompanhamento de projetos,
poderão também, disponibilizar o acesso a laboratórios e equipamentos
e realizar consultorias.
Como exposto anteriormente, a transferência de tecnologia entre
as universidades e o setor privado é efetivada pelas empresas e
45
Ministério das Relações Exteriores de Israel. Fatos sobre Israel.
Impressora do Governo de Israel. Jerusalém, 2010. Disponível em:
<www.mfa.gov.il>. Acesso em:out. 2012.
91
organizações que administram a Propriedade Intelectual da academia.
As pesquisas realizadas em universidades israelenses e institutos de
pesquisa são compartilhados com o setor privado por meio destas
unidades de transferência de tecnologia. As empresas de Transferência
de Tecnologia (TT) geralmente têm um acordo de exclusividade com
suas instituições apoiadas (universidades e institutos) para comercializar
a propriedade intelectual e gerar renda para subsidiar mais investigação
e educação. Portanto, a propriedade do bem imaterial é da empresa de
transferência que, com o recebimento dos royalties, repassa o valor
devido à universidade ou instituto, como também ao pesquisador e ao
laboratório, conforme regulamento de relacionamento existente entre as
partes.
A maioria das empresas de transferência de tecnologia está filiada
à Organização de Transferência de Tecnologia de Israel (ITTN).46
A
ITTN serve como a organização guarda-chuva para as empresas de
transferência de tecnologia. É uma organização privada sem fins
lucrativos e que congrega as 12 maiores empresas de TT de Israel. A
primeira instituição a ter uma unidade de TT foi o Instituto de Ciência
Weizmann, através da YEDA, o Yeda Research and Development
Company Ltd., que desde 1950, desenvolvem esta relação e
comercialização da propriedade industrial. Seguidamente, outras
instituições implantaram sua respectiva empresa de TT já assinaladas.
Para exemplificar e compreender como funciona a relação entre a
universidade e a empresa promotora de transferência de tecnologia e
destaca-se, em homenagem ao pioneirismo, o caso da YEDA x
INSTITUTO WEIZMANN. A empresa Yeda tem um acordo de
exclusividade com o Instituto Weizmann para comercializar sua
Propriedade Intelectual e gerar renda para apoiar mais investigação e
educação. Através desta organização são geradas rendas a partir de taxas
de licença e royalties. A Yeda Research and Development CO. Limited é
o braço comercial do Instituto Weizmann de Ciência (WIS), sendo que
sua principal função é a promoção da transferência para o mercado
global dos resultados das investigações e tecnologias inovadoras
desenvolvidas por cientistas do instituto.
Além do acordo entre o instituto e a YEDA, são realizados
acordos tripartites entre estas duas primeiras partes e os inventores
46
Organização de Transferência de Tecnologia. Disponível em:
<http://www.ittn.org.il/about.php?cat=18&in=0>. Acesso em: out. 2012.
92
(equipe que realizou a pesquisa). Estes acordos são regidos pela própria
legislação nacional, como também por um regulamento ou normatização
interna que se denomina Regras de Propriedade Intelectual e Conflito de
Interesses do Instituto. Ao verificar as informações disponibilizadas na
página do Instituto, visualizaram-se instrumentos importantes para a
empresa realizar suas atividades. O acordo de equipe é um acordo
tripartite envolvendo a Yeda, o Instituto Weismann e os cientistas
envolvidos na pesquisa e tem como escopo fornecer a Yeda instruções
relativas à atribuição de cada cientistas, bem como, sua participação e
seus rendimentos dentro da equipe. Este acordo é de suma importância,
já que define a participação e percentual de rendimentos para cada um
da equipe, o que auxilia a Yeda a realizar suas atividades, evitando
discussões sobre a problemática, quando comercializarem com empresas
que se interessam pelas invenções.
No caso de patentes, existe um acordo específico que define
regras, responsabilidades de cada parte e suas limitações. Esta repartição
dos lucros entre os cientistas são propostos pelo investigador-chefe, com
base na contribuição direta que cada cientista participa ou irá participar
ativamente, da pesquisa e outras atividades que são objeto do contrato.
Estes acordos têm como regra a exclusividade, podendo destacar outras
regras como a confidencialidade, o acesso às informações pela Yeda, a
titularidade da PI, o status dos cientistas entre outros. Neste aspecto, nos
acordos há previsão sobre o acesso às informações pela Yeda aos
procedimentos e documentos da pesquisa todas as vezes que for
solicitado, isto significa que todos os documentos, incluindo os
instrumentos de transporte, transferência, cessão, os cientistas devem
prestar assistência que eficazmente possibilite a transferência, cessão,
coleta ou ainda o que for necessário para auxiliar e permitir a defesa de
quaisquer litígios e processos relativos à invenção ou resultados
posteriores. Todos os custos e despesas incorridos na tomada de
qualquer uma das ações ditas acima serão suportados pela Yeda. A
confidencialidade sobre a invenção é questão cláusula que está presente
nos acordos. Os pesquisadores se comprometem a manter sigilo e não
divulgar a invenção ou invenções ou qualquer parte do processo, ou
qualquer informação relativa, exceto quando permitida pela Yeda.
Evidentemente, a obrigação de confidencialidade não se aplica a parte
da invenção que é considerada domínio público, nem se aplica a
publicações científicas, ou conteúdo do que foi aprovado pela Yeda.
Quanto aos pesquisadores envolvidos nas pesquisas e invenções,
estes são considerados como empregados ou inventores, por força de lei
93
israelense (Lei de Patentes) e das Regras de Propriedade Intelectual e
Conflito de Interesses. Portanto, os inventores são considerados
empregados do instituto, inclusive quaisquer pessoas que mesmo não
sendo funcionários da instituição, mas, que utilizam suas instalações,
incluindo estudantes e pós-doutores, cientistas e todos aqueles que
realizam qualquer tarefa ou participam de qualquer pesquisa nos
laboratórios ou outras instalações, são equiparados como inventor pela
Lei de Patentes, podendo participar dos ganhos com a invenção.
A titularidade da PI é estritamente da YEDA. Ela é a responsável
pelo registro de patente e tem o direito, a seu critério, de registrar em seu
nome, pedidos de patentes e outras aplicações para direitos de
Propriedade Intelectual em matéria de invenção.
Outra empresa de TT que também se deve descatar é a Yissum Technology Transfer, que é a apoiadora da Universidade Hebraica de
Jerusalém. Sua atividade consiste em identificar os projetos com
potencial econômico, não interferindo na liberdade acadêmica, bem
como, proteger as invenções através de registros de patentes ou outros
meios, identificando parcerias comerciais e estratégicas. Objetiva
também a gestão de acordos para que a tecnologia não seja
desperdiçada, gerenciando fundos para a continuidade da pesquisa e seu
desenvolvimento através de recebimento de royalties. Apesar de ser uma
empresa separada da universidade, a Yissum é composta por pessoas da
universidade, sendo esta a sua acionária majoritária.
Convém citar a visão da Diretora do Departamento de
Propriedade Intelectual, Reneé Ben-Israel,47
que explica que o termo
Yissum, significa "aplicação" em hebraico. Esta empresa foi criada com
a ideia de ser uma organização claramente distinta da universidade, com
um enfoque definido no desenvolvimento da pesquisa científica, ou
melhor, para a criação de fundos para a pesquisa através de atividades
comerciais. A diretoria afirma que os resultados passíveis de
comercialização merecem um tratamento distinto e profissional,
devendo ser tratados como ativos da instituição. Pontua também, que
quando há receita, o inventor poderá receber 40% pessoalmente e mais
47
BEN-ISRAEL, Reneé. Transferência de Tecnologia Universitária:
Yissum, um modelo interessante. Revista Conhecimento e Inovação.
jan/fev/mar/2009. Disponível em:
http://www.conhecimentoeinovacao.com.br/materia.php?id=209>.Acesso
em: out. 2012.
94
20% como incentivo para continuar a desenvolver a pesquisa em seu
próprio laboratório, sendo que os outros 40% são divididos entre a
Yissum e a universidade.
Demonstra-se que a Yissum entende que a transferência de
tecnologia na maioria das vezes é realizada pela forma clássica de
licenciamento, no qual a universidade entra como provedora do
conhecimento, ofertando uma licença para desenvolver, produzir, vender
ou distribuir esse direito, comunicando-se com a indústria para juntas
encontrarem uma solução para um problema, um produto, um processo,
um melhoramento técnico, que possa ser aplicado como vantagem dos
seus competidores. Mas, não descarta outras formas de interação com o
setor privado.
Denota-se que observando comentários em outras empresas de
TT, como em qualquer situação de transferência de tecnologia, ainda
apresentam problemas de comunicação, principalmente, com relação
entre empresários, cientistas e a própria empresa, quanto à expectativa
de aplicação da invenção no mercado, a cobrança por resultado dos
investidores e a visão de superioridade dos cientistas. Mas, com esta
abordagem simples sobre as empresas de TT israelenses, pode-se pensar
no formato brasileiro que muitas vezes encontra obstáculos na
burocracia, principalmente, das universidades públicas que são em sua
maioria as que possuem um grupo de pesquisa e profissionais com alta
capacitação.
Ainda sobre esta relação entre universidades e empresas,
pontuam-se algumas ações que as empresas exercem frente à P&D,
como: analisar novas invenções e conceitos desenvolvidos, verificando a
possibilidade de produção e comercialização; conceder licença com
royalties para a prática da tecnologia licenciada e/ou resultados da
pesquisa patrocinada; incorporar empresas spin-off48
baseada na PI da
universidade; participar do/no conselho de administração de empresas
afiliadas; negociar e aprovar aspectos da PI e de negócios de acordos
com a indústria; financiar pesquisas; garantir que tecnologias cheguem
ao mercado em tempo hábil para o benefício do público.
48
O termo de origem inglesa é utilizado para descrever atividades
empresariais novas que surge a partir de um grupo de pesquisa de uma
empresa, universidade ou centro de pesquisa público ou privado, com o
intuito de explorar um produto ou serviço novos, geralmente nas áreas de
tecnologia e iniciam-se nas incubadoras.
95
1.6.2.4 O Marco Legal para o Sistema de Inovação Tecnológica
de Israel
A implementação da Lei de Incentivo à Pesquisa e
Desenvolvimento Industrial, a Lei nº 5.744/198449
está sob a
responsabilidade do Ministério da Indústria, Comércio e Trabalho e do
Ministério das Finanças. Esta lei instituiu a Administração de Pesquisa e
Desenvolvimento Industrial, através da Comissão ou Comitê de
Pesquisa e do Escritório do Cientista-Chefe (OCS). De acordo com o
item 6 da lei, para gerenciar a P&D industrial, existe uma Chefia de
Administração que é exercida pelo Escritório do Cientista-chefe do
Ministério da Indústria e Comércio e pelo Comitê de Pesquisa. Este
comitê é composto por 9 membros, previstos no item 9, distribuídos
entre o próprio Chefe de Administração do OCS e mais um indicado e
paritariamente, por dois representantes do Ministério da Indústria e
Comércio, dois representantes do Ministério da Fazenda nomeado pelo
Ministro das Finanças, sendo funcionários de seu ministério; dois
representantes do público, entre os industriais, que serão nomeados
pelos ministros, um deles, na medida do possível, que tenha uma
educação ou capacitação no campo das ciências naturais e tecnologia;
um representante do público, não sendo funcionário público, precisa ter
experiência de pelo menos 10 anos em negócios ou gestão industrial.
Dentre os objetivos da lei estão: a criação de locais de trabalho na
indústria e absorção de recursos humanos, científico e tecnológico; o
aumento do benefício econômico resultante da pesquisa e
desenvolvimento; o desenvolvimento da ciência aplicada para a
indústria, através da utilização e expansão da infraestrutura tecnológica
e científica, e os recursos humanos existentes no Estado; bem como, a
melhoria da balança comercial do Estado através da fabricação e
exportação de produtos desenvolvidos, por meio do incentivo à pesquisa
e desenvolvimento industrial. Para efeitos da Lei de Incentivo à
Inovação, a Pesquisa e Desenvolvimento e Inovação significam
atividades de P&D e de demonstração destinadas ao desenvolvimento de
novos produtos ou processos a serem comercializados no mercado
global.
49
Sobre a lei verificar sítio eletrônico do Ministério a Indústria Comércio e
Trabalho: <http://www.moital.gov.il/NR/exeres/9F263279-B1F7-4E42-
828A-4B84160F7684.htm>. Acesso em: jan. 2016.
96
Importante destacar que a legislação israelense, no seu bojo,
adotou as seguintes definições para seu sistema de inovação, o que
auxilia na compreensão e visão sobre o assunto. Considera "produto"
qualquer bem corpóreo ou know-how, incluindo o processo de produção
e um programa de computador, e, "produto novo" uma criação com uso
ou produção comercial possível através da descoberta de qualquer know-
how, processos ou métodos que anteriormente não eram conhecidos ou
geralmente não estavam disponíveis. A "pesquisa" significa qualquer
investigação planejada, a fim de descobrir qualquer novo conhecimento
na expectativa de que ele seja útil no desenvolvimento de um novo
produto ou processo novo ou substancialmente, na melhoria de um
produto ou processo. Já "desenvolvimento" é compreendido como a
aplicação dos resultados de qualquer pesquisa ou qualquer outro know-how, que visa à fabricação de um novo produto ou o desenvolvimento
de um novo processo ou uma melhoria substancial em um produto ou
processo, incluindo: a consolidação ou o exame das características de
um plano, a elaboração de programas e projetos, a construção de um
protótipo e da operação de um modelo experimental ou uma instalação
semi-industrial; e ainda a considerada "melhoria substancial de um
produto existente" ou uma melhoria substancial em um processo
existente quando inclui o desenvolvimento de um produto
complementar ou processo.
Uma abordagem interessante desta legislação (Lei nº 5.744/1984)
pode ser verirficada quando trata do conceito de "transferência de
conhecimento", previsto na Seção 18, do Capítulo IV da lei. Neste item,
está determinado que toda a pesquisa financiada necessariamente é
proveniente de plano aprovado, conforme regras de editais específicos e
exige que todo o know-how resultante da pesquisa e desenvolvimento e
quaisquer direitos, inclusive aqueles que não tenham sido utilizados na
produção, não serão transferidos para outros fora de Israel. Todavia, há a
possibilidade de transferência quando o Comitê de Pesquisa, em casos
especiais, aprovar pedido para transferir para o exterior o conhecimento
resultante de P&D de acordo com um plano aprovado. Estas exceções
estão dispostas na Seção 19B da lei, estando previsto que após a
aprovação pelo Comitê, o conhecimento poderá ser transferido, sob as
formas previstas na legislação, inclusive quanto à forma de pagamento,
e conforme a exigência do mesmo. Exemplifica-se nos casos em que a
intenção é apenas vender o know-how, o destinatário deve pagar em
dinheiro. O valor do pagamento deverá ser igual à relação entre as
subvenções globais recebidas pelo destinatário (para quem foi
97
homologado o plano) para os investimentos (agregados) financeiros
investidos na execução do plano aprovado, multiplicado pelo preço de
venda do know-how, desde que tal não seja menor que o agregado de
tais concessões, acrescido de juros. Caso a intenção seja transferir o
know-how e se o beneficiário da aprovação deixou de ser uma empresa
constituída em Israel, o destinatário da aprovação (plano aprovado)
também pagará o valor em dinheiro, de acordo com o percentual
previsto pela lei. De outro lado, se for uma transferência de
conhecimento para o exterior sob a forma de troca de know-how
substituto para o destinatário do plano em Israel, poderá, neste caso,
ocorrer inclusive sem cobrança de royalties.
Outra previsão que merece atenção nesta legislação é a
possibilidade de aplicar penalidades, em razão de seu descumprimento.
Desse modo, aquele que, sem a autorização do Comitê de Investigação
ou em violação das condições de autorização, por ação ou omissão,
transferir ou que tornar possível a transferência fora de Israel de
conhecimento desenvolvido como parte de um plano aprovado, ou em
consequência de seus direitos de execução, ou de propriedade intelectual
decorrentes do know-how que tem sido desenvolvido na forma indicada,
será passível de pena de três anos de prisão (item 47A). Vislumbra-se
importância e seriedade sobre o tema.
O Estado de Israel não deixou dúvidas quanto à distribuição de
royalties no tocante a esta legislação de incentivo de P&D Industrial e,
em 1996, editou o Regulamento nº 5.756/1996,50
que dispõe sobre o
produto resultante da pesquisa fabricado no país e sobre a produção no
exterior com diferenças no percentual de royalties. De acordo com o
regulamento, na produção nacional, o titular da certificação (plano
autorizado) deve pagar royalties ao Tesouro do Estado a taxas variáveis,
calculadas como porcentagens do preço de venda que variam de 3%
(primeiros três anos), 4% no quarto ao sexto ano e, 5% a partir do
sétimo ano. Se for produção no exterior (Seção 4 do regulamento),
50
Sobre o Regulamento verificar o sítio eletrônico do Ministério das
Finanças de Israel. Disponível em:
<http://www.financeisrael.mof.gov.il/FinanceIsrael/Docs/En/legislation/Ind
ustryAndComrc/5756-1996
Encouragement_of_Industrial_Research_and%20Development_Regulations
_(Rate_of_Royalties_and_Rules_for_their_Payment).pdf>.Acesso em: jan.
2016.
98
conforme a autorização do Comitê de Pesquisa, dependendo da extensão
do volume de produção que é realizada fora de Israel, o limite máximo
dos royalties passaria a ser de 120% - quando até 50% da atividade de
produção for realizada no exterior; de 150% - quando 50% da atividade
ou mais da produção é realizada no exterior; de 300% - quando 90% da
atividade ou mais da produção é realizada no exterior. Nesta visão,
evidencia-se o incentivo para produção em empresas de Israel, por
residentes no País. Porém, é possível ocorrer parte da execução fora de
Israel ou por não residentes, o que deverá ser avaliado pelo Comitê de
Pesquisa, modificando os valores de subvenções. É notória a vontade de
incentivar a produção nacional em razão das pesquisas realizadas nos
planos aprovados.
Israel também definiu legalmente quanto ao registro e obtenção
de patentes, através da Lei nº 5.727/1967.51
Por esta lei, será
considerada "invenção" o que tiver novidade, utilidade e originalidade,
suscetível de aplicação na indústria ou na agricultura, seja processo ou
produto que constitui um ato inventivo. Considera ainda novidade
universal qualquer publicação (escrita ou oral ou por demonstração) ou
exploração de uma invenção em qualquer lugar do mundo antes do
depósito, impedindo o registro da patente, nestes casos. O prazo de
proteção é de 20 anos, a partir da data do pedido, sendo que o país deve
ser membro da Convenção de Paris. O processo de registro de patente
deve ser relativo a apenas uma invenção, sendo o requerente o titular da
invenção ou seu preposto, o requerimento deverá ser endereçado ao
Escritório de Patentes e a avaliação poderá ocorrer até 3 anos da data do
depósito. O processamento é um pouco parecido com o brasileiro, pois,
logo após investigação e aprovação será emitido um comunicado de
aceitação, publicado na Revista de Patentes e a seguir a publicação,
abre-se período de 3 meses para impugnação. Caso não haja
impugnação, será concedida a patente.
A temática da Propriedade Intelectual em Israel está basicamente
distribuída em diversas legislações, naquelas acima citadas e que aqui
apenas indica-se como forma de informação: Direitos Autorais
(Copyright Act de 2007); Marcas (Trade Marks Ordinance –Lei
51
Sobre a Lei de Patentes verificar sítio eletrônico da Organização Mundial
da Propriedade Intelectual. Disponível em:
<http://www.wipo.int/wipolex/en/text.jsp?file_id=341499>. Acesso em:
jan. 2016.
99
5.732/1972); Circuitos Integrados (Lei 5.760/1999); Cultivares (Plant
Breeders Rights Law – Lei 5.733/1973) e Denominações de Origem e
Indicações Geográficas Lei nº 5.725/1965.
De forma suscinta, verificaram-se quais os objetivos e
direcionamentos das legislações israelitas e até aqui, se objetivou a
discussão quanto à aplicação da inovação na indústria em razão do foco
da lei de incentivo estar voltada para pesquisa e desenvolvimento
industrial, conforme termo utilizado pela legislação. Contudo, não se
pode desprezar o papel importante que a academia tem neste processo
inovativo em Israel.
1.6.2.5 A Posição Inovadora de Israel
Outro ponto relevante sobre Israel, sob o ponto de vista desta
autora, é que a temática de Inovação, Pesquisa e Desenvolvimento
(P&D) estão vinculadas ao Ministério da Indústria, Comércio e do
Trabalho, reconhecido pela sigla MOITAL. O controle e organização da
política de P&D é realizado pelo Escritório do Cientista-Chefe (OCS).
Através deste escritório, o MOITAL executa a política governamental
de suporte à P&D industrial, por força da Lei de Incentivo à Pesquisa &
Desenvolvimento Industrial, nº 5.744/198452
(Lei da P&D), com
participação financeira em projetos aprovados, designando um
orçamento anual (em média de US$ 450 milhões) e na sua estrutura
funcional, conta com a rede de especialistas e um Comitê de Pesquisa.
As principais funções do Escritório de Cientista-Chefe (OCS)53
são: supervisionar todo o apoio em P&D na indústria israelense
patrocinado pelo Governo; operar, através de fundos destinados à P&D;
fomentar anualmente uma gama de produtos nacionais e programas
internacionais, acordos e colaborações. Os programas desenvolvidos e
apoiados em P&D podem ser para incubadoras, empresas start-up ou
através de pequisa industrial autônoma das empresas. Uma das formas
de atividades de supervisão e arrecadação pode ser verificada no
percentual de receita exigidos de projetos que recebem o suporte
52
Idem. 53
Sobre as atividades do Escritório de Cientista-Chefe verificar o sítio
eletrônico do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Indústria de Isreal
(MATIMOP). Disponível em: <http://www.matimop.org.il/ocs.html>
Acesso em: jan. 2016.
100
financeiro, um retorno de 3-5% dos royalties (previstos na Lei
5.744/84), e ainda em auditorias a cada 6 meses, que verifica o
cumprimento das condições para um possível suporte futuro. O apoio é
direcionado para o desenvolvimento de novos produtos com base em
tecnologias novas e inovadoras de todo o setor como um todo, bem
como, as novas empresas e nos setores de alta tecnologia e tradicional.
Este apoio também se estende a um amplo número de empreendimentos
de cooperação com entidades comerciais estrangeiras.
No campo internacional, a OCS tem se consolidado com a
cooperação industrial em P&D com entidades estrangeiras, tanto em
nível governamental e empresarial. Esta cooperação pode ser expressa
por meio de parcerias com empresas e fundações de apoio com os
Estados Unidos, Canadá, Coréia do Sul e Cingapura; cooperação com
empresas multi-nacionais, como a Deutsche Telekom, a IBM, a
Microsoft, Merck e, participação ativa nos principais programas com a
União Europeia, como EUREKA e 7.54
Outro ator que promove a inovação no sistema israelense é o
Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Indústria Israelense, nomeado
como MATIMOP, que funciona como um braço do Escritório de
Cientista-Chefe. É a agência nacional encarregadada promoção da P&D
industrial, cooperação e inovação, que atua em nome do Escritório do
Cientista-Chefe e consequentemente, do Ministério da Indústria,
Comércio e Trabalho de Israel. A função do centro é promover o
desenvolvimento de tecnologias industriais avançadas e para isto,
mantém um banco de dados atualizado de perfis de empresas industriais
israelenses que buscam a cooperação e apoio, principalmente
internacional. É nesta esfera internacional que o MATIMOP promove e
auxilia a participação de empresas israelenses em programas
internacionais de cooperação bilateral ou multilateral para P&D
industrial com entidades estrangeiras, tanto governamentais como
empresariais.
Neste prisma, pode-se dividir a política de P&D em Nacional e
Internacional. A Política Nacional de P&D tem efoque na pesquisa e
desenvolvimento industrial, com uma visão mais competitiva, nas
incubadoras de tecnologicas e no apoio aos programas específicos. A
54
Ministry of Industry, Trade and Labor. Disponível em:
<http://www.moital.gov.il/NR/exeres/A1541A69-E947-4FAF-8577-
76864F59CD1F.htm>. Acesso em: out. 2012.
101
Política Internacional concentra-se nos fundos binacionais, programas
com a União Europeia e outros países, e ainda, acordos paralelos com
países como o Brasil, conforme dados na página eletrônica do
Ministério responsável. A FAPESP, por exemplo, tem um Acordo de
Cooperação Técnica e Científica com este órgão (MATIMOP), assinado
em novembro de 2012, que objetiva promover, facilitar as atividades
bilaterais de P&D e inovação e, em particular, projetos conjuntos de
P&D e inovação, entre as Entidades do Estado de São Paulo, República
Federativa do Brasil e do Estado de Israel.55
Todavia, mesmo com tantos pontos positivos da política adotada
em Israel evidencia-se um investimento focado em pesquisas aplicadas
(indústria) e as pesquisas básicas não recebem o mesmo volume de
financiamentos e incentivos como as primeiras. O próprio Ministro de
Ciência e Tecnologia israelita, Daniel Hershkowitz, admitiu em
entrevista ao Jornal Unesp (dezembro de 2012), que há uma lacuna entre
a pesquisa básica e industrial e que sua missão inclui a busca do "elo
perdido" entre as duas formas de pesquisa. Outra vertente propagandista
do país é a existência de muitas multinacionais no seu território, em
razão do alto nível dos profissionais nas áreas tecnológicas, o que é uma
realidade. Porém, verifica-se que na verdade estas multinacionais
compram muitas empresas nacionais que se destacaram por suas
inovações causando certa dependência do capital e não fortalecendo a
indústria nacional ou as pequenas empresas. Há críticas de que o país
parece estar mesmo voltado para acolher estes estrangeiros, uma vez
que, adotam uma postura de sell out (vender tudo), sendo que muitas das
startups servindo de empresas-isca para o peixe grande que são as
multinacionais. Apesar de Israel ser comparada com o Vale do Silício
(São Francisco nos Estados Unidos), tendo uma concentração
significativa de empresas novas de tecnologia, essa ousadia inerente aos
nativos, bem como sua rápida resposta às inovações requeridas pela
indústria mundial, pode não trazer tanto benefício para o setor
empresarial nacional. Outro ponto considerado como vantagem para o
espírito inovador do país é a animosidade com os vizinhos. Para alguns,
pode ser uma desvantagem, dado que o imediatismo para solucionar as
55
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. (Convênios e
Acordos de Cooperação). Disponível em: <http://www.fapesp.br/7336>.
Acesso em: out. 2012.
102
questões latentes dificultam o exercício de pensar e traçar muitos planos
estratégicos a longo prazo.
Neste último tópico do capítulo, verificou-se que as instituições
de ensino possuem um papel relevante para o desenvolvimento da
Política de Inovação e a Propriedade Intelectual de um país e deve ser
tema recorrente nas políticas de todos os países. Conquanto, é inegável
que a inciativa privada pode ser uma grande parceira no Sistema de
Inovação, quando a Pesquisa e Desenvolvimento estiverem voltados
para uma aplicação industrial. Todavia, impossível ignorar a postura do
governo que, verificando suas deficências, busca apoiar a P&D, o que
em muito incentiva e facilita as empresas a investirem em inovação,
sendo evidente que isto foi assumido pelo Governo de Israel. Porém, a
lacuna entre os institutos de pesquisa/universidades e empresas é um dos
grandes desafios a ser enfrentado, tanto pelos holandeses e israelenses,
como pelos brasileiros.
103
2 POLÍTICAS E MARCO LEGAL BRASILEIRO PARA
INOVAÇÃO É preciso reconhecer que C&T e inovação têm
necessidades específicas, diferentes daqueles
lidam com a construção de escolas, rodovias, etc.
Com os atuais marcos legais, os pesquisadores
brasileiros realizam pesquisas limitadas pela
burocracia, diferentemente dos nossos
competidores coreanos e chineses, que como os
europeus e norte-americanos, avançaram na
questão dos marcos legais para C&T e inovação.
Evaldo Ferreira Vilela (2011, p.298)
2.1 A política de inovação no Brasil e seu impacto nas relações
entre universidade pública e empresas
O conhecimento tem transformado radicalmente a sociedade, na
qual a utilização responsável deste, conjuntamente com a tecnologia,
desempenham um papel preponderante e decisivo para o
desenvolvimento local, regional e global. É neste ponto em que a
dinâmica das relações Universidade-Empresa (U-E), Público-Privado
(PP), está emergindo como uma das soluções determinantes para
fomentar a inovação. Dessa maneira, com o conhecimento científico e a
técnica é possível trazer tecnologia, novos processos que influenciem
inclusive no comportamento social, econômico de uma localidade. A
capacidade inovativa tem sido o balizador entre os países quando se
verificam os relatórios e diretrizes da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE). Há muito tempo, a organização
tem defendido a inovação como um de seus indicadores de crescimento
econômico em seus países membros, o que ficou explícito no Manual de
Oslo.56
Anteriormente, os estudos enfatizavam a importância dos
investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de cada país,
demonstrando que quanto maior os investimentos, melhor a capacidade
inovativa da nação. Contudo, nos últimos anos, a OCDE tem entendido
56
O Manual de Oslo é a principal fonte internacional de diretrizes para
coleta e uso de dados sobre atividades inovadoras da indústria e tem como
objetivo orientar e padronizar conceitos, metodologias e construção de
estatísticas e indicadores de pesquisa de P&D de países industrializados.
Suas edições são publicadas pela OCDE.
104
a inovação não apenas como um fator de crescimento econômico, como
também um indicador de solução de problemas e determinante para o
futuro da economia dos países membro (OCDE, 2010).
No que toca à região da América Latina, um recente estudo
demonstra que a região apresenta uma baixa capacidade de inovar e
disseminar ideais e ações. O estudo econômico sobre a região quanto à
educação, competências e inovação para o desenvolvimento, o Latin
American Economic Outlook 2015- Education, Skills and Innovation for
Development (OCDE, 2015),57
indica que os países da região que
apresentaram maior crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em
2014 foram: Bolívia, Colômbia, Costa Rica, Equador, Panamá, Peru
(4%) e República Dominicana (7%); enquanto que o México e o Brasil,
mesmo sendo considerados as maiores economias da região, cresceram
respectivamente 2,5% e 1%. E este baixo crescimento é relacionado
pelas mudanças nos preços das commodities58
e questões internas de
gestão econômica. A análise também aponta que a educação,
competência e inovação são fatores-chaves para atingir um crescimento
mais dinâmico e inclusivo. Afirma também que melhorias na qualidade
de educação e competências e "estoque", conjuntamente com um
contexto macroeconômico estável e um ambiente amigável de inovação,
determinam a capacidade dos países em dirigir seus modelos de
crescimento em direção a atividades de maior valor agregado. Ainda
pontua que apesar dos investimentos em P&D terem crescido nos
últimos anos, o estoque de "capital de inovação" – que significa um
indicador de competência adicional, medindo a capacidade de inovar e
disseminar inovação – é significativamente baixo na América Latina, em
torno de 13% do PIB, quando comparado com outros países da
organização que apresentam 30% do PIB (p. 28). Por isso, nos países
latinos, este capital de inovação está concentrado no "estoque" da
educação terciária, enquanto que nos outros países, consiste nos gastos
de P&D.
57
O relatório está disponível on-line no endereço eletrônico:
<http://www.keepeek.com/Digital-Asset-
Management/oecd/development/latin-american-economic-outlook-
2015_leo-2015-en#page28>. Acesso em: 02 jun. 2015. 58
Plural da palavra inglesa commodity que significa mercadorias,
geralmente utilizadas para produtos primários como minérios e agrícolas.
105
O relatório ressalta que é importante fortalecer laços entre as
instituições de educação superior e o setor privado na área da ciência e
tecnologia para melhor, orientar e promover atividades de pesquisa e
desenvolvimento na região. Reafirma-se que é primordial fortalecer o
desenvolvimento em governança para as instituições de ciência e
tecnologia, de modo que um eficiente quadro institucional pode ser
desenvolvido para disseminar tecnologia e inovação.
Deste modo, diante deste quadro apresentado da região,
compreender o aspecto histórico de políticas e estruturação no país e a
importância dos modelos de inovação auxiliará no delinear do texto a
seguir.
2.1.1 O que é Política de Inovação? Política de Inovação pode ser vista como ações, decisões que
buscam a interface entre a investigação, o desenvolvimento tecnológico
e industrial propiciando um ambiente de inovação. Destarte, o Estado,
entendendo a necessidade de direcionar e apoiar o papel dos agentes de
inovação, entidades que atuam na dinâmica inovativa, define uma
política para a sociedade agregando ações, medidas de incentivo e
fomento, infraestrutura, capacitação, investigação, visa minimizar
possíveis falhas no processo de inovação e assegura uma perspectiva
comum dos atores envolvidos. Neste ponto, retoma-se aqui a ideia de
List59
, que de certa maneira, defendeu a interferência do Estado para
dinamizar o desenvolvimento nacional em razão de acreditar que as
decisões do Estado, como o investimento em tecnologia e a formação de
especialistas, auxiliaria no desenvolvimento da nação.
Smits et al. (2010, p. 10-12) afirmam que a política pode ser
definida como uma "clara e intencional ação seguida por um ator ou um
conjunto de atores para lidar com um assunto"; sendo as políticas
públicas "aquelas políticas que são desenvolvidas pelos órgaõs
governamentais e seus servidores." Cada país tem suas políticas que
dependem da sua realidade e planejamento estratégico. Contudo, deve-
se admitir a visão da OCDE, que tem uma perspectiva mais ampliada,
visto que, inclui políticas direcionadas para indústrias inovadoras e
crescimento econômico, políticas de inovação em um sentido mais
amplo, o que visa também, melhoraria na qualidade de vida. Dessa
forma, enuncia-se que a teoria sobre inovação e Sistemas de Inovação,
59
Sobre Friedrich List e a visão sistêmica verificar capítulo I.
106
difundida nos anos de 1990 e 2000, começou a ser aplicada pelos países
desenvolvidos, a exemplo do Reino Unido que em 2007, criou um
departamento para Inovação, Universidades e Competências. Isso
trouxe em conjunto, políticas em matéria de competências, educação
superior e inovação pela primeira vez, objetivando a integração.
Da mesma forma, em 2006, o Governo da Alemanha anunciou
uma estratégia global de alta tecnologia que buscou uma política
destinada à inovação de forma holística, com medidas que definiram
área de compentências do Ministério da Educação Pesquisa e do
Ministério de Economia e Tecnologia, bem como, para fomentar os
contratos públicos para a inovação melhor regime de Propriedade
Intelectual, programação temática, modelos de parceria pública-privada,
capital de risco, spin-off,60
financiamento em educação e organização de
clusters.61
Outros países, como Holanda e os Escandinavos, também
adotaram iniciativas políticas relevantes (SMITS; KUHLMANN;
SHAPIRA, 2010, p. 11-12).
Mais recentemente, autores reconhecidos como Edquist (2014),
Smits, Shapira e Kuhlmann (2010) têm falado da "política holística de
inovação". Para Edquist, é necessária política de inovação que integre
todos os diferentes fatores que influenciam inovação, dentro de um
contexto em que é importante influenciar o modo de funcionamento do
sistema de inovação que ele denomina, abordagem holística da política
de inovação. Enuncia: "A política de inovação global é definida como
uma política que integra todas as ações públicas que influenciam ou
podem influenciar os processos de inovação [...] de forma coordenada."
62 (EDQUIST, 2014. p.04). Estariam, portanto, as atividades como:
60
O termo Spin-off, significa que algo surgiu de uma derivação de outro
conceito ou ideia anterior, que já tinha sido desenvolvido ou pesquisado.
Atualmente, utiliza-se para designar um termo em inglês que significa um
desdobramento, de uma tecnologia que se derivou de outra, ou ainda
empresas que surgem para se dedicarem a desenvolver uma tecnologia,
desenvolvida por outra empresa, por exemplo. 61
Cluster para o sentido da indústria e inovação pressupõe um
conglomerado de empresas que se tornam mais eficientes em razão da
constante interação por possuírem características semelhantes e coabitarem
no mesmo local. 62
Texto original: A holistic innovation policy is defined as a policy that
integrates all public actions that influence or may influence innovation
processes [...] in a coordinated manner.
107
forrnecimento de insumos de conhecimento para o processo de
inovação; prestação de resultados de P&D e criação de novos
conhecimentos, principalmente em engenharia, medicina e ciências
naturais; a criação e mudanças das organizações necessárias para o
desenvolvimento de novo campos de inovação; networking por meio de
mercados e outros mecanismos, incluindo a aprendizagem interativa
entre diferentes organizações (potencialmente) envolvidas nos processos
de inovação; criar e mudar as instituições-por exemplo, as leis de
patentes, leis fiscais, meio ambiente e normas de segurança, de P&D de
investimento rotinas, normas culturais, etc., que influenciam a inovar
organizações e processos de inovação, fornecendo incentivos para e
remoção de obstáculos à inovação; serviços de apoio para empresas
inovadoras; as actividades de incubação como o fornecimento de acesso
a instalações e apoio administrativo para inovar esforços entre outros.
(p. 04). Todavia, para que isto ocorra, necessita-se de decisões
importantes, inclusive, na correlação com outras políticas que podem em
algum momento ser preteridas pela política de inovação. Acreditam,
Smits et al. (2010, p. 04), que esta forma holística de política de
inovação foi em certa medida adotada pela OCDE, que preferiu uma
definição mais ampla e direcionou as recomendações de seus membros.
Por conseguinte, acredita-se que o "todo é melhor que a soma das
partes", ou seja, os indivíduos, as instituições e a ideologia, tudo
importa, mesmo que haja desacordos.
Neste mesmo sentido, aponta Evaldo Vilela (2011) que:
O conhecimento tornou-se assim imprescindível.
Porém, não é suficiente, é preciso tê-lo em
quantidade e saber aplicá-lo com agilidade, o que
obriga governantes de países ou regiões a
organizarem políticas públicas e sistemas de
inovação, com a implantação de mecanismos de
incentivo à geração e adoção de inovações. (p.
294).
Sublinha Boekholt (2010, p. 345), que o conceito de Sistemas de
Inovação levou algumas décadas para ser aceito na prática de políticas,
108
sendo adotado inicialmente pela Suécia (VINNOVA)
63 e Holanda. Em
sua opinião, esta reflexão sobre o conceito de sistemas de inovação
sendo manifestados em instrumentos políticos tinha intenção de reparar
os furos, ou problemas, entre dois ou mais agentes do sistema, através
de instrumentos que facilitariam a relação entre indústria e ciência
(pesquisa), por exemplo. Verifica-se a seguir que no Brasil não foi
diferente, porque apesar de possuir uma pesquisa científica consolidada,
esta não se traduziu (ou traduz-se) efetivamente em inovação, isto posto
importante o direcionamento através de políticas que expressam o
caminho que estes agentes devem se organizar no Sistema de Inovação.
Historicamente, as infraestruturas e redes de sistemas de
pesquisas e inovação institucionais não surgiram de forma espontânea e
sem controle, pois, nos últimos 150 anos, esta área da sociedade foi
moldada por intervenções políticas. Nos países industrializados, os
sistemas de inovação que foram desenvolvidos ao longo do Século 20,
em coevolução com suas políticas nacionais, assumiram uma
característica específica para cada país. E é este entrelaçamento com o
sistema politíco que representa o denominado Sistema Nacional de
Inovação, que Smits, Kuhlmann e Shapira indicam como uma
abordagem holística (2010, p. 3-4).
KOELLER (2009, p. 119-120) testifica que o Brasil definiu suas
diretrizes de inovação dos anos de 1999 a 2002, baseadas no que
ocorreu na União Europeia, a partir de 1995. Existem inclusive
semelhanças na nomenclatura de ações e documentos, como o "Livro
Verde" e Brazilian Paradox. O "Livro Verde", publicado em 2001 e
organizado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, buscou o
planejamento da Ciência, Tecnologia e Inovação no país, trazendo os
desafios para a sociedade brasileira. Procurou identificar o papel do
conhecimento e da inovação na aceleração do desenvolvimento social e
econômico do país. Ele foi dividido em seis capítulos e tratou de um
panorama geral da base científica e tecnológica brasileira: sua dimensão
e distribuição, seu processo de construção e evolução, assim como, do
padrão de gastos e investimentos realizados na montagem do sistema;
seguiu em temas como avanço do conhecimento, qualidade de vida,
desenvolvimento econômico, desafios estratégicos. Da mesma forma,
63
É conhecida como a agência sueca de inovação, criada em 2001 e está
subordinada ao Ministério da Empresa, Energia e Comunicação (Ministryof
Enterprise, Energy and Communications).
109
como fora definido na Europa, que ao desenvolver estudos e debates
sobre o tema, resultou num diagnóstico (European Paradox) que
apontou dificuldades ou insuficiência na transposição do grande
conhecimento científico e tecnológico existente em produtos ou
serviços, sendo que a versão brasileira foi intitulada Brazilian Paradox.
Chegaram a uma conclusão similar de que existia uma fraca inovação no
setor produtivo.
Boekholt (2010, p. 340) aduz que para reparar esta situação na
Europa, a primeira política adotada foi estimular a transferência de
tecnologia, visto que, era evidente que os institutos de pesquisa pública
não tinham incentivos suficientes para comercializar seus trabalhos,
enquanto o setor de negócios não estava suficientemente consciente
sobre o que as universidades e institutos poderiam oferecer. Diante
disto, estas instituições foram encorajadas e apoiadas a estabelecer um
liaisons offices (escritório de relação/ligação), que foram os TTO na
primeira geração. Porém, a crítica que se faz é que estes escritórios
acabavam apenas tentando "vender" as boas ideias e expertise que já
tinham, praticando ainda a visão linear acima citada, eram pouco
proativos em buscar as necessidades reais do setor privado, ou qual o
tipo de conhecimento que o setor produtivo necessitava. Boekholt
(2010, p. 341) também tece crítica ao que ocorreu nos Estados Unidos,
que mesmo na vanguarda, na transferência de tecnologia com a adoção
da Bayh-Dole Act, em 1980, que encorajou o crescimento dos escritórios
de transferência, inclusive em suas estruturas, e ainda com a criação dos
parques científicos, a sua primeira geração não obteve muito sucesso.
Apesar de estarem nas proximidades das universidades, com criação de
incubadoras e parques de alta tecnologia, proliferando as spin-off, ainda
eram baseadas no modelo linear, o que quer dizer que, em sua maioria,
apenas desenvolviam projetos que tinham pouco inclinação para
incentivar jovens empreendedores e direcioná-los para um modelo de
negócio viável.
2.1.2 O diagnóstico brasileiro sobre as dificuldades ou
insuficiência na transposição do grande conhecimento
científico e tecnológico no país: Brazilian Paradox
O Brazilian Paradox teve uma conclusão bastante próxima dos
europeus: que o conhecimento aqui gerado também não produzia avanço
tecnológico, tampouco inovação no setor produtivo. A partir da segunda
edição da Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia e Inovação, em
110
setembro de 2001, após as discussões e resultados apresentados, surge o
"Livro Branco", para o decênio de 2002-2012. Este livro intencionou
uma ampla reforma no Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e
Inovação, que foi estruturado em quatro seções centrais. Quanto aos
riscos e oportunidades associados às transformações econômicas e
tecnológicas, foram examinados os principais desafios para a
consolidação de um Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e
Inovação, criando condições de um desenvolvimento sustentável. Pode-
se destacar algumas ações do livro como a reestruturação de fundos
setoriais e crédito da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), a
definição de um novo papel para o Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), incorporação da
Agência Espacial Brasileira (AEB) e da Comissão Nacionalde Energia
Nuclear (CNEN) ao Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação
(MCTI), a criação do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE)
para assessorar as políticas de C&T, por meio de estudos prospectivos e
a definição de grandes gargalos e oportunidades de investimento, entre
outros.
Constata-se que este período acima citado foi um grande marco
para a discussão de políticas e diretrizes para a Ciência, Tecnologia e
Inovação.
O período anterior contava com a Política Industrial, Tecnológica
e de Comércio Exterior e do Programa de Apoio ao Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (PADCT I, II e III) que previam,
respectivamente, incentivos fiscais e concessão de crédito de agências
federais de desenvolvimento tecnológico, adoção de políticas voltadas
para a criação de um ambiente apropriado à inovação tecnológica, como
também, desenvolver atividades de promoção de pesquisa científica e
inovação tecnológica de forma eficiente. Apesar disso, última edição
não foi propriamente implantada, em razão de ausência de uma política
consistente de investimento, mesmo porque, os anos de 1995 a 1998
foram marcados pela instabilidade econômica. Já o período posterior aos
livros (verde e branco) teve outro fôlego com a Política Industrial,
Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) que visava o estímulo e a
promoção da inovação nas empresas, como um de seus pilares e
juntamente com a Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação
(PNCTI) promoveram a inovação e o diálogo interministeriais sobre a
temática. De outra ponta, os anos 2004 e 2005 foram marcados pela lei e
regulamento sobre a inovação.
2.2 Sistema Nacional de Inovação
111
As políticas públicas e o sistema nacional de inovação devem
orientar o relacionamento entre os atores, incluindo legislações, políticas
específicas, fundos de investimentos para melhorar o desempenho da
produção tecnológica e distribuição das tecnologias. O governo
brasileiro seguindo, de certo modo, uma visão internacional, tem tentado
construir um sistema de inovação com políticas de incentivo a pesquisa,
desenvolvimento e inovação (P,D&I) e legislações para introduzir esta
cultura inovadora. Apesar de entender que existe uma interação, um
sistema com seus atores de fato, como o país tem uma visão positivista e
legalista, tramitou uma Proposta de Emenda Constitucional
(PEC/290/13) e que foi aprovado o texto pela Emenda Constitucional nº
85/2015, que pretende conferir status de política de Estado à Ciência,
Tecnologia e Inovação. O texto, além de obrigar os estados e os
municípios e a União a fomentarem o desenvolvimento científico em
diversas formas, inclusive estabelecendo que os entes federados devam
concorrer para criar legislação sobre o tema, também os compelem a
empenharem recursos financeiros para esta área. Entre outras questões,
que este marco legal trouxe, destaca-se a organização de um Sistema
Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, com a colaboração entre
prefeituras, governos de estado e executivo federal, institucionalizando
este modelo, in verbis:
Art. 219-B. O Sistema Nacional de Ciência,
Tecnologia e Inovação (SNCTI) será organizado
em regime de colaboração entre entes, tanto
públicos quanto privados, com vistas a promover
o desenvolvimento científico e tecnológico e a
inovação. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1998).
Neste ponto, constata-se qual a postura da política de Estado e
que admite a visão sistêmica como principal para inovação e
desenvolvimento científico e tecnológico. Como foi mencionado
alhures, o termo "sistema" indica um conjunto de elementos que se
interagem e se complementam, de forma ordenada, possibilitando uma
melhor atuação de cada um destes elementos. Portanto, envolve atores,
formas de interação, políticas e marco normativo (legislações e regras).
List (1856) acreditava que o Estado deveria tomar decisões, desenvolver
e investir em tecnologia e no desenvolvimento técnico nacional por
esforços próprios, defendendo inclusive a engenharia reversa, bem
como, realizar incentivos a especialistas, proporcionando aos
profissionais a aprenderem novas técnicas no exterior.
112
Keith E. Maskus (2012, p. 82) informa que a história demonstra
que muitos países conseguiram subir na "escada mundial" e outros não.
Contudo, afirma que não existe uma política simples para seguir porque
quanto mais uma economia se movimenta para a fronteira global, mais
esta depende muito de fatores e circunstâncias específicas, como o
capital, a acumulação de habilidades, imitação ou aquisição de
tecnologia global, inovação doméstica, entre outros.
Fazendo um panorama de alguns países, reforçando o exemplo da
Coreia do Sul, assevera que no caso deste país, que é um exemplo de
"seguidor tecnológico, se transformou em uma economia inovativa e de
alta tecnologia". Todavia, indica que seu sucesso aumentou os custos do
trabalho e forçaram a produzir para a escala global, fazendo a creative
imitation (imitação criativa), parafraseando a creative innovation
(inovação criativa) de Schumpeter. Acrescenta-se a isto à "frouxa"
legislação sobre propriedade industrial que de certa forma encorajava as
empresas locais a copiarem e adaptarem as tecnologias mais simples.
Diferentemente, Israel construiu um extenso conjunto de leis com
antecedência, já em 1924, quando ainda estava sobre o mandato
britânico e foi implementado o regime de patentes. E alguns estudiosos
como Meir Pugatch, Morris Teubal, e Odeda Zlotnick (2009, p. 09)
acreditam que isto contribuiu para o país se destacar no cenário mundial
principalmente, porque este regime de proteção ofereceu tanto para
pequenas como para grandes empresas. A segurança para atrair
investimentos externos, e ainda, posto que os direitos de propriedade
intelectual, em certa medida, apoiaram negociações de alianças
estratégicas, atraíram capital de risco e arranjos de licenças cruzadas
com multinacionais, trazendo assim, tecnologias que poderiam ser
melhoradas in loco.
No caso do Brasil, afirma que apesar de existirem surtos
ocasionais de desenvolvimento tecnológico e bolsões de excelência, o
desempenho industrial brasileiro ficou muito atrás dos asiáticos e na
verdade, não teve um período sustentado de catching up. Mesmo
considerando a preocupação com a propriedade intelectual (PI), de
modo que, desde 1920, o país tem acolhido normas de PI no seu sistema
legal, porém, assinala que este sistema tratou estes direitos de forma
subservientes à política industrial e de saúde pública. Esclarece que ao
invés de um forte regime de patentes, houve uma política permissiva,
com esperança de encorajar o crescimento de empresas nacionais
competitivas, as quais puderam usar livremente as tecnologias
disponíveis. Isto contribuiu para uma política global de estimular a
113
industrialização por substituição de importações por trás de barreiras
comerciais, sendo o final disto nos anos 1980 como uma resposta para a
estagnação econômica.
Maskus, ao comparar o Brasil com a China, afirma que existe
uma diferença significante entre as empresas chinesas de médio e grande
porte que desenvolveram suas capacidades internas de pesquisa e
desenvolvimento, enquanto que a indústria brasileira não o fez durante o
período de importação-substituição (MASKUS, 2012, p. 82-91).
Compreende-se que as legislações compõem este sistema e
influenciam nas atividades dos atores, seja regional ou nacionalmente.
As legislações sobre inovação estão interligadas sistemicamente e da
mesma forma, buscam incentivar a aproximação do poder público ao
setor privado. No Brasil, a Lei nº 10.973/2004 (Lei de Inovação), Lei nº
11.196/2005 (Lei do Bem) e Decreto nº 5.563/2005, no âmbito nacional
buscam flexibilizar ou desburocratizar as formas de conjugar estes
interesses do setor público e privado. Diante deste contexto, esforços
têm sido realizados para ampliar o diálogo entre os agentes de inovação,
incluindo questões legais e de investimento do poder público. Desta
forma, pensando nos papéis destes atores, neste item verifica-se que o
Governo, sendo uma das hélices, tem realizado sua parte através de
políticas e legislações. A seguir se discutirá sobre a inovação e o
processo de transferência de tecnologia.
2.2.1 Diferença sobre pesquisa básica e aplicada: vale a pena
insistir na dicotomia?
O desenvolvimento da inovação e investimentos passa pela
classificação de pesquisa ou formas de direcionar a pesquisa científica.
Isto tem sua relevância em assuntos de inovação e desenvolvimento
econômico. Verifica-se que a própria OCDE, organização que trata de
desenvolvimento econômico internacionalmente, preocupou-se em
diferenciar estas formas no famoso Manual de Frascati.64
A OCDE já há
64
O Manual de Frascatti é um documento que trata da metodologia para
coleta de estatística sobre pesquisa e desenvolvimento, sendo o primeiro
produzido em 1963. O Manual foi elaborado e publicado pela Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Ecônomico, sendo sua primeira
edição baseada na versão elaborada por Christopher Freeman, publicada em
2002. O nome faz homenagem a uma reunião de especialistas da
organização com o grupo NESTI (Peritos Nacionais em Ciência e
114
muito tempo vem avaliando seus membros através de investimentos em
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Esta organização internacional
conceitua a pesquisa em duas vertentes: básica e aplicada. É pesquisa
básica quando se dedicar a trabalhos experimentais ou teóricos
desenvolvidos, principalmente, com a finalidade de adquirir novos
conhecimentos sobre os fundamentos de fenômenos e fatos observáveis,
sem considerar uma aplicação ou uso particular. Já a pesquisa aplicada
consiste igualmente em trabalhos originais empreendidos com o
objetivo de adquirir novos conhecimentos, com um propósito mais
específico e aplicação (MANUAL FRASCATI, 2013, p. 38).
Martin (2010, p. 28) assevera que a primeira direciona-se ao
conhecimento produzido para "seu próprio interesse/vontade", porém, a
segunda, a pesquisa aplicada, está direcionada para conhecimento
produzido com uma aplicação específica em mente.
Neste tópico, destaca-se o estudo realizado por Donald Stokes
que sugere cautela nesta visão bipartida de pesquisa, uma vez que
acredita que não condiz com a realidade e pode, muitas vezes, justificar
erroneamente a alocação de recursos para uma ou outra forma de
pesquisa, ou deixar dúvidas entre qual categoria ela se encaixa. Em
resumo, se o gestor tiver sempre que realizar esta diferenciação e
classificação acabará privilegiando uma ou outra forma. Um exemplo
citado por Greenhalgh e Rogers (2010, p. 95), descreve a opinião de
Roger Kornberg, um dos cientistas médicos e professor da Universidade
de Stanford reconhecido pela Academia Nacional de Inventores norte-
americana, que em seus discursos demonstra sua oposição à
supervalorização da pesquisa aplicada, pois, argumenta que "os grandes
novos tratamentos médicos surgem das descobertas básicas por
pesquisas que não foram diretamente voltadas para produtos
comerciais." (GREENHALGH; ROGERS, 2010, p. 95). Portanto, é
importante não marginalizar uma privilegiando a outra.
Para Stokes, a pesquisa básica procura ampliar o campo de
entendimento fundamental, mas, a pesquisa aplicada volta-se para uma
necessidade ou aplicação para um indivíduo, grupo ou sociedade
(STOKES, 2005, p. 24). Da mesma forma, Machlup (1972) já apontava
indicadores de Tecnologia) na Villa Falconieri, em Frascati, Itália. As
definições contidas no manual e seus princípios utilizados servem como
guia para muitos países e no Brasil, por exemplo, como base para Lei do
Bem, Lei da Informática, dentre outras.
115
esta diferença, afirmando que a pesquisa básica cria conhecimento
básico, em que o conhecimento prático, aplicável pode existir, mas que
por si só é muito geral, muito ampla ou profunda. Para ter aplicações
diretas, busca-se leis gerais, sem ter em conta o uso prático; de outro
modo, a pesquisa aplicada cria conhecimento diretamente aplicável, o
pesquisador olha para os resultados que prometem ser de uso final na
prática (MACHLUP, 1972, p.146, 147).
Stokes ainda reforça que a posição defensora da investigação
pura, básica é reverberação do relatório de Vannevar Bush, citado
anteriormente. O relatório trouxe, portanto, uma forte recomendação
para o país (Estados Unidos) estabelecer seu investimento em pesquisa
científica, no pós-guerra, sendo que a ciência básica e sua relação com a
inovação tecnológica tornou-se o alicerce da política científica nacional
para as décadas posteriores. Para Bush, aqueles que investissem em
ciência básica obteriam seu retorno em tecnologia à medida que os
avanços da ciência fossem convertidos em inovações tecnológicas pelos
processos de transferência (STOKES, 2005, p. 17).
As ideias de Bush (1949) sobre a ciência básica se resumiam em
duas premissas: [...] a pesquisa básica é realizada sem se pensar
em fins práticos – assim, a característica
definidora da pesquisa básica reside na sua
contribuição ao conhecimento em geral e ao
entendimento da natureza e de suas leis; e que, a
pesquisa básica é precursora do progresso
tecnológico – pois, cria que com a separação da
consideração prematura de sua utilidade, provará
ser uma remota geradora de progresso
tecnológico, à medida que a pesquisa aplicada e o
desenvolvimento forem convertendo as
descobertas da ciência básica em inovações
tecnológicas. (STOKES, 2005, p. 17,18).
Neste mesmo sentindo, Derek Bok (2003, p. 60) aponta que o
relatório de Vannevar Bush continha a afirmação que novos produtos e
medicamentos para tratamentos dependeriam de um vigoroso programa
de pesquisa básica e somente as universidades poderiam provê-la. E foi
assim que o governo americano investiu bilhões em laboratórios,
criando a mais forte capacidade de pesquisa básica do mundo. Contudo,
existem aqueles que defendem a vocação prática da pesquisa,
116
demonstrando que muitas vezes o interesse em pesquisar deriva das
questões práticas, voltando os olhares para a teoria utilitarista.
2.2.2 A evolução da ciência e pesquisa no Brasil Merece destaque a compreensão da evolução sobre a atividade
científica no país. Entendendo como se orientou a ciência e pesquisa
brasileira será possível detectar, ao longo deste estudo, quais foram os
pontos determinantes, seja para a discussão sobre a relação entre
academia e setor privado, tipo de pesquisas que tiveram maior destaque
(básica ou aplicada), dificuldades das instituições de pesquisa em se
"adequarem" à exigência para se continuarem competitivas em razão de
sua estrutura entre outros aspectos.
Schwartzman (2001, p. 81-82) afirma que até o princípio da
instauração da República a atividade científica no Brasil era muito
precária, isto ocorreu em razão das iniciativas instáveis e dos impulsos
do Imperador, bem como, pelas limitações das escolas profissionais
burocratizadas, sem autonomia e com objetivos puramente utilitários da
época. Mesmo com as escolas superiores, como a Escola Politécnica do
Rio de Janeiro, mais voltada para engenharia civil ou, a Escola de
Minas, direcionada para mineração (Minas Gerais), representavam
claramente o tipo de intelectual de elite que se destacava da sabedoria
convencional dos sacerdotes e advogados, em nome da ciência moderna
da época.
Portanto, ainda no Século XIX e início do Século XX, os
cientistas brasileiros trabalhavam com as linhas já validadas na Europa,
não trazendo algo que impactasse e ultrapassasse a fronteira do
conhecimento. Silvia Velho aponta que a Revolução de 1930 foi um
marco importante para o país, uma vez que, nesta década, houve a
Reforma Francisco Campos (1931), a criação da Universidade de São
Paulo (USP) (1934), a tentativa da UDF (1935).65
Quanto à USP,
65
A UDF foi criada no Rio de Janeiro (antiga capital do país) por iniciativa
do reconhecido educador e escritor Anísio Spínola Teixeira, em 1935, que
trouxe para a realidade as aspirações da Associação Brasileira de Educação
e Academia Brasileira de Ciência (ABE e ABC), defendidas no Manifesto
dos Pioneiros da Educação Nova (1932). Todavia, pelo regime político da
época, o “sonho” de uma universidade moderna foi fatalmente atingido pela
conjuntura do regime político da época. E Anísio Teixeira e outros
117
relembra que esta instituição foi criada com intuito de apresentar um
modelo de universidade a qual a pesquisa estaria identificada como
ciência e não exclusivamente com a tecnologia, buscando firmar linhas
de pesquisas, inclusive com a contratação de professores estrangeiros
(VELHO, 1996, p. 37). Somam-se a estes acontecimentos, mais tarde, a
criação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)
(1948), da instituição da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (CAPES) e Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq) ,na década de 1950, e da Universidade
de Brasília (Unb), em 1961.
No entanto, quando se trata da relação entre ciência e sistema
produtivo, nos anos 1950 e 1960, mesmo com a criação destas
instituições públicas, estes conceitos estiveram dissociados. Esta
disjunção permaneceu por décadas, a exemplo das pesquisas de pós-
graduação financiadas pelo Estado, que visavam linhas de pesquisa mais
básicas, em detrimento até de uma boa pesquisa "dita aplicada", uma
vez que esta era considerada, muitas vezes, de segunda categoria,
porque não contribuía para o avanço do conhecimento. Isto é refletido
nos próprios critérios de escolha para concessão de bolsas de estudos
das entidades de fomento (VELHO, 1996, p. 47, 48).
Em busca de alterar o quadro de baixa demanda de pesquisa
aplicada, o país decide ser o demandante de pesquisa, com a criação de
empresas estatais em áreas prioritárias como petroquímica, de
comunicações e aérea, o que possibilitou algumas universidades se
aproximarem e participarem com projetos de pesquisa nas áreas de seus
interesses. Com destaque às instituições de fomento de pesquisa que
atuaram no cenário da modernização e evolução do ensino superior no
país. Primeiramente, a Sociedade Brasileira para o Progresso da
Ciência-SBPC (1948), em que a sua institucionalização teve como
objetivo incentivar a ciência para promover o desenvolvimento social e
econômico. Igualmente, a Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior que atualmente é denominada Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), foi
idealizadores sofreram restrições e mesmo com tentativas de manterem a
nova universidade com professores estrangeiros, esta subsistiu por apenas
04 anos e seus cursos foram transferidos para a Universidade do Brasil, pelo
Decreto nº 1.063/39.
118
instituída pelo Decreto nº 29.741/51, como o próprio nome sugere, com
intuito de: "assegurar a existência de pessoal especializado em
quantidade e qualidade suficientes para atender às necessidades dos
empreendimentos públicos e privados que visam ao desenvolvimento do
país". E teve também Anísio Teixeira, um dos importantes nomes que
figurou na instituição como Secretário-geral da Comissão (1952-1964) e
incentivou a vinda de professores visitantes estrangeiros, atividades de
intercâmbio e cooperação entre instituições, bem como, a concessão de
bolsas de estudos.66
Já o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) foi
criado pela Lei nº 1.310, de 15 de janeiro de 1951, com finalidades de
promover e estimular o desenvolvimento da investigação científica e
tecnológica, mediante a concessão de recursos para pesquisa, formação
de pesquisadores e técnicos, cooperação com as universidades
brasileiras e intercâmbio com instituições estrangeiras.67
Relembra Ana Waleska P. C. Mendonça (2000) que a partir dos
anos 1920 até 1945, constituiu-se em um momento complexo marcado
pela crise do sistema oligárquico tradicional, que resultou na
transferência do foco de poder dos governos estaduais para o âmbito
nacional e igualmente caracterizado pela maior atuação das massas
urbanas que se diferenciam de forma acelerada como resultado do
processo de industrialização e urbanização. Isto ocasionado pela própria
dinâmica da economia exportadora e do processo de burocratização,
com ampliação das funções do Estado e da principiante industrialização
brasileira (MENDONÇA, 2000, p. 137).
Neste contexto, as leis implementadas por Gustavo Capanema,
Ministro da Educação entre os anos de 1934 a 1945, trouxe inovações
no ensino secundário e profissional no país e surgem os ensinos
profissionalizantes com a criação do Sistema Nacional de Aprendizagem
(SENAI) pelo Decreto-Lei nº 4.048/1942, e, o Sistema o Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) pelo Decreto-Lei nº
8.622/1946. Estas medidas expressam a política governamental da
época. Não seria diferente, porque, já nos anos 1930, conforme Silvia
Velho, o processo de urbanização e de industrialização se iniciou e
acabou modificando a composição de classes sociais brasileiras, o que
66
Dados encontrados no sítio eletrônico da CAPES. Disponível em:
<http://www.capes.gov.br/historia-e-missao>. Acesso em: 03 abr. 2015. 67
Dados encontrados no sítio eletrônico do CNPq. Disponível em:
<http://cnpq.br/a-criacao>. Acesso em: 03 abr. 2015.
119
refletiu no modelo educacional. As instituições educacionais de primeiro
e segundo graus serviram como instrumento do Estado para controle das
classes desfavorecidas (trabalhadores). Contudo, também se ressalta que
a década de 1980 foi marcada pelo deslocamento dos recursos públicos
destinados à pesquisa e desenvolvimento das instituições de ensino
superior para os centros de pesquisas do governo e as empresas estatais
(VELHO, 1996, p. 36, 50).
Pode-se ainda afirmar que mesmo na década de 1970, já se tem
indícios deste deslocamento, a exemplo, a Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), que foi criada em 1972. Logo no
final do ano de 1973, assumiu a herança do Departamento Nacional de
Pesquisa e Experimentação (DNPEA) com seus institutos e estações
experimentais, quando passou a administrar todo o sistema de pesquisa
agropecuária no âmbito federal. Já em 1974, a empresa pública criou
seus primeiros centros nacionais por produtos como a de Trigo (em
Passo Fundo, RS), Arroz e Feijão (em Goiânia, GO), Gado de Corte (em
Campo Grande, MS) e Seringueira (em Manaus, AM).68
Outro evento significativo para a política de inovação no país foi
à constituição, em 1985, do Ministério de Ciência e Tecnologia, que nos
dias de hoje leva em sua nomenclatura o termo inovação (MCTI). Suas
principais ações para a ciência centram-se na promoção da inovação
tecnológica nas empresas, pesquisa, desenvolvimento e inovação em
áreas estratégicas e científicas, até mesmo na inovação tecnológica para
o desenvolvimento social. As linhas prioritárias do ministério
atualmente são traduzidas em programas de P&D em biotecnologia e
nanotecnologia, agronegócio, Amazônia, áreas semiáridas, a
biodiversidade e os recursos naturais, energia, hidrogênio e energias
renováveis e de petróleo, gás e carvão. Há também programas para as
áreas nucleares e espaciais, meteorologia e mudanças climáticas, defesa
e segurança nacional. É importante ressaltar que o sistema brasileiro de
inovação tem entidades de financiamento como o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Financiadora de
Estudos e Projetos (FINEP) que auxiliam na realização de programas
em empresas e indústrias (BNDES) e as universidades com projetos
(Finep) através de seleção pública. Incluem-se na estrutura de ciência e
68
Informações obtidas no sítio eletrônico da empresa pública. Disponível
em: <http://hotsites.sct.embrapa.br/pme/historia-da-embrapa>. Acesso em:
13 abr. 2015.
120
tecnologia universidades e instituições públicas e privadas de P&D,
empresas que introduzem inovações no mercado e o governo que
contribui com suas agências, políticas e leis que regulam as relações de
inovação no país. Neste ponto, a despeito do governo militar ter sido
extremamente repressivo e controlador quanto ao ensino e evolução da
ciência, constata-se algumas medidas e contribuições relevantes para os
dias atuais, considerando o período entre 1964 a 1985.
Por outro lado, na década de 1980, percebeu-se que enquanto o
Brasil restringia-se a garantir minimamente a sobrevivência do seu
sistema de P&D, os países desenvolvidos viviam um momento de
reestruturação e de mudança na base técnico-produtiva, trazendo um
novo paradigma tecnológico com inovações tecnológicas de base
microeletrônica e da informática que sem dúvida alterou todo o modelo
de produção global existente. Percebe-se ainda que em relação aos
investimentos em pesquisa e desenvolvimento, o setor privado foi pouco
incentivado a investir, seja porque houve um processo acentuado de
importação de tecnologias subsidiadas, seja porque, no final dos anos
1970 e início dos anos 1980, através de iniciativas protecionistas e
subsídios para exportação, o governo incutiu certo conforto à indústria
nacional, o que se comentará abaixo.
Pensando na evolução da ciência e tecnologia no país, também é
a partir da década de 1990 que surgiram às novas leis que regulamentam
a propriedade intelectual (Lei 9.279/96-direitos e obrigações de
propriedade industrial; Lei 9.609/98 – programas de computador)
consequência do Acordo TRIPIS,69
assinado em 1994. Introduziu nas
instituições de ensino e pesquisa a necessidade em discutir o tema e
formular ações e internalizar o processo inovativo.
Todavia, mesmo com todos estes trilhos traçados na política
brasileira e nas universidades, verifica-se que não basta ter o suporte
legal, de modo que, ainda persistem barreiras para a inovação, existindo
maior dificuldade na aplicação da norma. Percebe-se que no país,
mesmo com marco legal e políticas para inovação, a interação entre
universidades públicas e empresas, o sistema universitário deve ser
69
TRIPS significa Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade
Intelectual Relacionados ao Comércio. Este, firmado em 1994 estabeleceu
os atuais padrões de proteção de propriedade intelectual no mundo e é
obrigatório para todos os países membros da Organização Mundial do
Comércio (OMC).
121
repensado e reestruturado, e que a comunidade acadêmica no seu papel
propulsor de gerar novos conhecimentos científicos e tecnológicos para
inovação, deve repensar a sua agenda de pesquisa e comunicar-se mais
com a sociedade (ARBIX; CONSONI, 2011, p. 220, 221).
Destarte, não é nenhuma surpresa ver que as políticas de
inovação apenas obtiveram mais vigor e se articularam a partir de 2003
com a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE).
Embora a parceria seja uma das formas de implantar o processo de
inovação entre universidade e empresa, principalmente nas públicas,
sempre se evidencia uma desconfiança do setor privado quanto à
burocracia das instituições públicas e até mesmo conflitos internos
(institucionais) sobre os valores e os benefícios advindos destas
parcerias. Este estudo pretende realizar uma abordagem diferente,
focada não apenas nas dificuldades que a universidade pública tem para
interagir com o setor privado, mas, uma busca por um pensamento mais
abrangente, talvez altruísta, de como o modelo jurídico, mais que o
administrativo das instituições de ensino e pesquisa, deve ser discutido e
repensando. Neste contexto, não é absurdo pensar em um novo modelo
ou uma melhor estrutura a ser adotada pelas universidades públicas
brasileiras, conforme discussão que se seguirá neste estudo.
2.3 A lei brasileira de inovação e influências da lei francesa e
norte americana Em acordo com o que foi dito no capítulo anterior, o ambiente de
inovação necessita de atores, políticas que geralmente são concretizadas
em legislações. Isto ocorreu com a maioria dos países que desejaram
entrar na corrida da inovação, partiram ou desenvolveram um marco
regulatório que traduziu sua política e visão, o que não foi diferente com
o Brasil, apesar de ter sido tardia. Evidentemente, existiram legislações
esparsas que de alguma forma influenciaram no processo de
industrialização e desenvolvimento econômico do país, inclusive a Lei
de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/96). Porém, em destaque neste
capítulo, estará a Lei de Inovação, Lei nº 10.973/2004. Vale observar
que os legisladores brasileiros buscaram inspiração em outros
ordenamentos jurídicos, que se abordará a seguir.
2.3.1 Bayh-Dole Act
A conhecida legislação americana que influenciou a transferência
de tecnologia de modo global foi a Bayh-Dole Act. Principalmente,
122
nesta seara de relação universidade-empresa, patenteamento e
licenciamento dos direitos de propriedade intelectual, o ano de 1980 é
reconhecido internacionalmente como um marco na política de
transferência de tecnologia nos Estados Unidos da América com a
promulgação da lei Bayh-Dole ou Bayh-Dole Act. Para melhor entender como esta legislação surgiu, vale comentar
as palavras do próprio Senador Birch Bayh, um dos seus idealizadores,
que após 25 anos da edição da lei, no ano de 2006, discursou para
executivos em Nova Iorque, intitulando seu discurso com a frase "Bayh-
Dole: Não volte o relógio".70
No seu discurso mostrou os bastidores da
criação da lei e apresentou algumas defesas quanto às críticas que a
legislação obteve durante este período. Em suas palavras iniciais, o
antigo Senador Bayh disse que, nos dias atuais, os experts em
transferência de tecnologia aparentemente não entendem os fatores
intrínsecos e qual o sistema em que as empresas norte-americanas estão
baseadas. Destaca que a Bayh-Dole não ocorreu de repente e sim contou
com ações daqueles que tinham um conhecimento sobre pesquisa na
universidade, lei de patentes e motivadores econômicos básicos.
O cenário econômico em que se encontravam os Estados Unidos
no início dos anos 1970 representava uma perda da vantagem
tecnológica e os números mostravam que nos anos de 1993 a 1998, a
quantidade de patentes concedidas para não nacional tinha crescido em
35%; além disso, os investimentos em pesquisa e desenvolvimento nos
10 anos anteriores tinham ficado "adormecidos". Outro aspecto
importante citado pelo parlamentar foi que as pequenas empresas
haviam demonstrado um impressionante recorde em inovação
tecnológica e recebiam uma pequena porcentagem do governo federal,
enquanto que o número de invenções patenteáveis oriundas de pesquisas
apoiadas pelo governo federal teve um acentuado declínio. Diante deste
quadro, o país estava perdendo sua liderança tecnológica. Dentro deste
70
Discurso do antigo senador Birch Bayh para a Licensing Executives
Society, intitulado “Bayh-Dole: Don’t turn back the clock”, no encontro
anual em Nova Iorque, em 12 de setembro de 2006. Birch Bayh atualmente
é sócio de uma firma de advocacia em Washington D.C., denominada
Venable LLP. Disponível em:
<https://www.venable.com/files/Publication/d2a75f28-abdd-4c68-80bd-
6f1e3f02950c/Presentation/PublicationAttachment/e38935e1-1e1d-4486-
9142-51befe3f0147/1621.pdf>. Acesso em: 20 fev. 2015.
123
contexto, o então Senador Birch Bayh recebeu uma ligação telefônica de
Ralph Davis, chefe do Escritório de Transferência de Tecnologia da
Universidade de Purdue, em 1978, iniciando a ideia e discussão sobre a
legislação. Afirmou que Davis argumentou que a política governamental
que proibia as universidades de serem proprietárias das patentes de
pesquisas financiadas pelo governo federal e que também obstava o
licenciamento para empresas, "matava" os incentivos necessários às
empresas inovadoras desenvolverem completamente estas novas ideias.
Após refletir sobre os argumentos de Davis, o senador solicitou a sua
equipe que pesquisasse sobre a questão e estes descobriram que apesar
do governo federal ser proprietário de 28.000 patentes, à época, não
licenciava nem 4% para as indústrias e, conclui que o restante estava
"juntando poeira" no Escritório norte-americano de Patentes e Marcas
(USPTO), em suas palavras. A partir destes dados, resolveu marcar uma
reunião com o próprio Davis, e outros envolvidos, como Howard
Bremer (diretor da Universidade de Wisconsin Alumnae- Fundação de
Pesquisa) e Norman Latker (que foi membro do Conselho de Patentes
no Departamento de Saúde, Educação e Bem-estar do país), e após
pensarem conjuntamente sobre o problema, redigiram uma primeira
versão da legislação, tendo em vista as legislações encontradas no
campus e as habilidades empreendedoras das pequenas empresas. Em
seguida, o senador Bayh convidou o senador Bob Dole para apoiar a
proposta e, conjuntamente, ambos apresentaram a proposta,
concordando que o país não poderia suportar mais este desperdício de
bilhões de dólares em pesquisa universitária e pequenas empresas sem o
retorno financeiro devido.
Todavia, declarou que no próprio Senado a proposta encontrou
muita resistência, especialmente do Senador Russel Long71
que
acreditava que a proposta ofendia os pagadores de impostos e condenou
a ideia como o "pior projeto de lei" que já havia visto. Para Birch Bayh,
o Senador Long não havia compreendido que estas patentes eram
embrionárias e precisavam de maiores investimentos para se
desenvolver e transformar-se em produto ou sistema aplicado para
benefício da população.
71
Deve-se observar que o senador Long no ano de 1971 defendeu propostas
de manutenção da propriedade de invenções para o governo em questão da
NASA e saúde pública.
124
Pontuou que os objetivos da proposta eram simples e diretos:
universidades e pequenas empresas reteriam a propriedade das ideias
que eles desenvolvessem através de fundos governamentais e ainda,
poderiam licenciar cada ideia patenteada para indústria em geral, para
comercialização e, receberiam royalties por isso, bem como, os
inventores teriam direito de receber uma parte dos royalties se eles
assistissem no desenvolvimento da patente para o mercado. Ao rebater
as críticas feitas à lei, o Senador Bayh disse que insistir na ideia de que
os pagadores de impostos, os que pagam a pesquisa (através do governo
federal), e que seus resultados deveriam estar disponíveis para todos,
significava um retrocesso. Salientou que seguir este curso de ação
voltaria o "relógio da história", remetendo-se ao título do discurso.
Em síntese, ele aduziu que a lei fez duas grandes mudanças de
uma só vez, primeiro, transferiu propriedade de uma invenção ou
descoberta das agências do governo que tinham ajudado a pagar por
estas pesquisas, para a instituição acadêmica que tinha realizado a
pesquisa, na prática; segundo, garantiu que os pesquisadores tivessem
uma parte nesta ação. Somando-se a isto, lembrou que o sistema de
patente norte-americano e a Bayh-Dole ofereceram incentivos e
recompensas pelo sucesso de tomada de risco e que todos deveriam estar
orgulhosos e defender a iniciativa (BIRCH BAYH, 2006).
Uma interessante crítica apresentada por David C. Mowery e
Bhaven N. Sampat sobre a adoção da Bayh-Dole como modelo pelos
países, é que eles acreditam que existe um "endeusamento" sobre a lei, o
chamaram de "emulação", denunciando o que a OCDE tem feito com
seus membros enaltecendo a adoção de legislações similares nos seus
territórios. Entendem que cada país tem uma estrutura diferente em seus
sistemas de educação superior e que isto não pode ser desprezado.
Portanto, reforçam a ideia de Ortega y Gasset (2004), que em sua obra,
La misión de la Universidad, refutavam a "imitação", pois acreditavam
que cada nação tem suas particularidades, principalmente, na educação
superior, conforme se verá no tópico seguinte. Mowery e Sampat
explicam que os Estados Unidos, na adoção da lei tinha um sistema não
usual de infraestrutura de educação superior que misturou autonomia
financeira, financiamentos públicos de Estado e fontes locais com apoio
federal de pesquisa, o que incentivou as universidades a focarem seus
esforços em atividades de pesquisa com economia local e benefícios
sociais. Portanto, ao invés de concentrarem em pesquisas de princípios
científicos fundamentais, muitas das universidades durante o final do
Século 19 e no Século 20 buscaram entender e resolver problemas de
125
agricultura, saúde pública e indústria (MOWERY; SAMPAT, 2005, p.
124).
A crítica maior foi direcionada na reflexão da real importância de
a lei ser a propulsora da transferência de tecnologia no país, já que
muitos autores afirmam que foi a partir da Bahy-Dole que passou a se
pensar em transferência de tecnologia e licenciamento. Citando, por
exemplo, a Associação de Universidades Americanas, que apresentam
números de crescimento de universidades que estão engajadas em
transferência de tecnologia, sendo mais de 200 e, que adicionam mais de
21 bilhões a cada ano para a economia (MOWERY; SAMPAT, 2005, p.
122, 125). Contrariamente, eles apresentam o argumento de que mesmo
antes de 1980 já existiam atividades patentárias nas universidades, com
base em colaboração em pesquisa entre universidade e pesquisadores
industriais que mediram muitos canais de tecnologia e troca de
conhecimento, incluindo publicação, treinamento industrial de
pesquisadores, consultoria de professores e outras atividades
(MOWERY; SAMPAT, 2005, p. 118). Acreditam que foi a década de
1970 o divisor de águas, tanto quanto, ou maior que dos anos 1980,
quando se trata de crescimento de patenteamento ou licenciamento
universitário. Inferem que foi neste período que as universidades
expandiram sua política de patenteamento, especialmente, em áreas
como a biomédica, e assumiram um papel de destaque em
gerenciamento de suas patentes e licenças. E mais, apontam que o
número de universidade que estabeleceram escritório de transferência de
tecnologia ou de contratação de escritórios começou a crescer nos anos
finais da década de 1960, portanto, antes da promulgação da Bayh-Dole.
Desta forma, corroboram seu argumento entendendo que a lei de 1980
foi mais um efeito do que causa para o crescimento de gerenciamento de
patentes e licenças, quando se verificam os acontecimentos dos anos
1960 e 1970. Na verdade, para a sua aprovação houve uma campanha,
lobbying, das universidades de pesquisa para que ela ocorresse
(MOWERY; SAMPAT, 2005, p. 119). O que não deixa de ser uma
verdade, como foi relatado pelo próprio senador Birch Bayh acima, uma
vez que houve uma provocação de pessoas diretamente ligadas com a
transferência de tecnologia universitária, denotando uma inquietude
anterior a 1980.
De outro lado, também criticam esta ênfase no patenteamento ou
licenciamento, enfatizando que um pensamento tacanho, focado no
licenciamento como o principal ou único canal para transferência de
tecnologia, pode ter um efeito inibidor na operação de outros canais
126
importantes, que são canais através dos quais as universidades
contribuem para inovação e crescimento econômico (MOWERY;
SAMPAT, 2005, p. 124).
Da mesma forma, convém citar opiniões de outros estudiosos que
discutem sobre a inovação e a transferência de tecnologia como Michael
A. Gollin e Keith E. Maskus. Gollin, no livro Driving Innovation:
Intelectual Property Strategies for a Dynamic World (Promover a
Inovação: Estratégia de Propriedade Intelectual para um Mundo
Dinâmico), em 2008. Buscaram, em poucas palavras, explicar o objetivo
da legislação. Informa que antes da lei, os investimentos e liderança em
pesquisa estavam em declínio e o governo possuía todas as patentes
derivadas de fundos federais para pesquisas, porém, uma minúscula
porcentagem destas patentes era utilizada, não era sequer licenciada,
muito menos comercializada. O marco da lei foi estabelecer modelo de
parcerias que se configuraram com envolvimento de instituições de
pesquisa sem fins lucrativos, pesquisadores, corporações que poderiam
investir seu capital necessário para desenvolverem invenções em
produtos e levá-las para o mercado. Reforça que o objetivo da Bayh-Dole centrava-se na oportunidade para que as universidades, que
recebiam fundos federais, fossem capacitadas a buscar a proteção de
patentes em resultados de invenções e encorajá-las a licenciar aquelas
patentes para as empresas desenvolvê-las, com os inventores retendo
uma parte dos royalties (GOLLIN, 2008, p. 33, 34).72
Keith Maskus, o reconhecido economista que é consultor do
Banco Mundial e da OMPI (Organização Mundial de Propriedade
Intelectual), em seu ponto de vista, acredita que a lei encorajou
universidades a registrarem suas patentes e que seu principal objetivo
era esclarecer a possibilidade das universidades serem proprietárias e
poderem licenciar patentes, mesmo com exclusividade. Grande
quantidade das ciências das universidades atuais estão no que se
denomina "Quadrante de Pasteur", definido por Stokes, que significa
implantação de métodos de pesquisa básica para resolver problemas que
envolvem a ciência difícil, mas que tenham uma utilidade comercial
(MASKUS, 2012, p. 298, 299). Afirma que, mesmo com as críticas,
inclusive citando Mowery e Sampat, defende que a partir deste período
os pesquisadores universitários têm amplas perspectivas de carreira para
72
Vale lembrar que Gollin é sócio do antigo Senador Bich Bayh na Firma
de Advogados Venable LLP.
127
se envolverem na investigação e divulgar os seus resultados através de
publicações. Ainda justifica que para a inovação e a comercialização,
entretanto, as universidades norte-americanas agora registram muito
mais patentes que no passado. Informa também que, no ano de 1965,
apenas 96 patentes foram concedidas para 28 universidades, todavia, em
meados de 2006, isto cresceu para 3.384 concessões e para mais de 150
universidades (MASKUS, 2012, p. 301).
Apesar dos elogios e críticas, notavelmente, a Lei Bayh-Dole
(1980) nos Estados Unidos foi uma ferramenta de extrema importância
para alavancar a gestão de propriedade intelectual nas universidades e
melhorar a sua política de transferência de tecnologia, que inspirou
outros países. A lei introduzida pelos senadores Birch Bayh e Robert
Joseph Dole certamente proporcionou para as instituições, os institutos
de pesquisa e pesquisadores individuais que mantivessem a propriedade
das invenções com possibilidade de patentear as novas invenções que
surgiram com os investimentos públicos, e isto foi um inescusável
avanço. Acerta Mowery e Sampat (2005) ao enfatizar que a lei em si não
fez milagres e que houve um processo histórico dos anos anteriores,
pode-se aqui dizer que não somente os anos 1960 e 1970, mas, antes
disto nos períodos de guerras que já foram citados anteriormente,
também contribuíram. Porém, inegável que a partir deste evento de
1980, houve facilitação na negociação para as universidades e
instituições de pesquisa e que abriu um novo capítulo para os acordos
entre academia e indústria.
Nos dizeres de Greenhalgh e Rogers (2010), esta legislação foi
um incentivo memorável para as universidades promoverem suas
inovações, também para encorajar as empresas a investirem em novas
áreas do conhecimento. Além disso, a motivação para a legislação era
acelerar tecnologia do laboratório para o mercado e permitir que as
universidades pudessem direcionar recursos para o processo de patentes
de arquivamento e tecnologias de licenciamento por escritórios especiais
chamados Gabinetes de Transferência de Tecnologia (TTO)
(GREENHALGH; ROGERS, 2010, p. 96, 97), o que se corrobora nesta
pesquisa.
2.3.2 A Lei de Inovação Francesa de 1999 (Loi sur l’innovation et
La recherche)
Alguns autores como Dennis Barbosa, Isak Kruglianskas, José
Matias-Pereira, Mario Sérgio Salemo, Laura Ibiapina Parente entre
128
outros salientam que a lei de inovação brasileira de 2004 teve uma forte
influência da lei de inovação francesa.
A Lei de Inovação Francesa foi publicada em julho de 1999,
denominada Lei da Inovação e Pesquisa (Loi sur l’innovation et La
recherche, nº 99-587). Vale destacar que esta legislação surgiu como
resposta às mudanças necessárias do modelo tradicional correspondente
à organização industrial e sistema de pesquisa francês, bem como, a
estruturação da inovação a partir do pós-guerra. Relembram Salemo e
Parente (2010, p. 127) que o país tinha uma organização político-
administrativa fortemente centralizada, com produção industrial
concentrada em grandes empresas de setores tradicionais e o
investimento estatal se dirigia a programas especiais, com
fortalecimento (historicamente) de empresas dos setores como
aeronáutica (Dassault, Airbus) automobilística (Renault, Peugeot),
telecomunicação (Telecom) e alimentação (Danone),
exemplificativamente. Da mesma forma, o apoio público à pesquisa
dava maior atenção às Grands Écoles,73
que se diferenciam das
universidades de modo geral, pela sua especialidade. E,
consequentemente, alijou as universidades a um papel pouco
significativo quanto as suas pesquisas e o relacionamento com as
empresas, de modo que, dedicavam-se preponderantemente à pesquisa
básica. Igualmente, os anos 1990 demonstraram o colapso deste modelo
com a internacionalização da economia e com a consolidação da União
Europeia (Tratado da União Europeia ou Tratado de Maastricht, em de
1993; Tratado de Amesterdã, em 1999) evidenciou a fragilidade do país
quanto a setores emergentes como tecnologia da informação,
biotecnologia, energias limpas, entre outros (SALEMO et al, 2010). Este
sistema foi bastante questionado em 1998 e houve um Congresso de
Inovação, considerado o evento propulsor da nova lei de inovação
francesa. Particularmente, a lei francesa está dividida em quatro eixos
temáticos, quais sejam: a mobilidade dos pesquisadores para a
indústria/empresas; a cooperação entre estabelecimentos de pesquisa do
73
São escolas de nível superior que se dedicam a determinada temática e
são altamente qualificadas e selecionam seus alunos através de seleções
concorridas que geralmente garantem seus altos postos, tendo em vista a
formação do alto nível. Exemplos destas escolas superiores são: a Escola de
Minas (Ècole dês Mines), Escola Nacional de Administração (École
Nationale d’Administration), Escola Politécnica (École Polytechnique).
129
setor público e as empresas; questões fiscais e, incentivos às empresas
inovadoras; marco jurídico para empresas inovadoras, principalmente,
estímulo à criação de empresas de pequeno e médio porte de base
tecnológica e propriedade intelectual. Este último eixo, que trata de
empresa de pequeno e médio porte, veio ao encontro à estrutura
produtiva francesa que estava fortemente baseada em empresas estatais
de grande porte que foram privatizadas nos anos 1990.
Priscila Koeller (2009) destaca também que apesar de já existir
uma legislação em 1982 que buscou a aproximação da academia com o
setor produtivo, foi em 1998, com uma análise requisitada pelo governo
francês realizada por Henri Guillaume (1998), a qual ficou demonstrada
que esta legislação não teve resultado positivo, porque, apenas um
número reduzido de pesquisadores efetivamente participou do processo.
Guillaume (1998) em sua análise, ao comentar o Estudo do Ministério
da Economia, Finanças e Indústria (MEFI) do governo francês, apontou
que em 1995, a França teve uma melhora no plano científico muito
maior do que no plano tecnológico. Afirmou que pelos números
apontados no referido estudo, a posição tecnológica do país apresentou
falhas, ou muitas falhas, quando se verificava o número de patentes
frente a outros países europeus. Acrescentou que havia urgência na
implementação de uma visão tecnológica para a inovação, tendo em
vista que o sistema francês baseava-se ainda na pesquisa básica. No
relatório, Guillaume (p. 19) apontou que o modelo adotado fragilizava o
sistema de inovação. Em suas palavras, disse que: "A fraqueza da
investigação tecnológica é uma séria desvantagem para o Sistema
Nacional de Inovação".74
Da mesma forma, que reconhece que a
mobilidade dos investigadores ao negócio legal é quase inexistante,
referindo-se a pífia atuação da lei de 1982 (p. 42). Outro destaque para o
relatório de Guillaume é sua crítica ao modelo linear que as instituições
políticas ainda adotavam, como o Ministério da Educação Nacional do
Ensino Superior e da Pesquisa (MENRT) e do Ministério da Economia e
Finanças (MEFI) que ainda acreditavam que a pesquisa fundamental
deveria ser o pontapé para posteriormente chegar-se à pesquisa aplicada
e depois pensar em produção. Ao contrário, defedeu o processo
inovativo sistêmico, temas já discutidos no capítulo I. Nas palavras de
Guillaume:
74
Lafaiblesse de La recherchetechnologique est un handicap sérieuxpour
Le systèmenational d’innovation.
130
Embora tenha se tornado comum lembre-se que o
processo de inovação tecnológica não identifica
mais com o modelo linear, que vai desde a
pesquisa básica para pesquisa aplicada, em
seguida, o desenvolvimento do produto aplicado.
(1998, p. 153).75
Portanto, o capítulo introdutório sobre os sistemas de inovação e
seus modelos, auxilia na compreensão destas políticas que seguiram
estas teorias. Assim como Guillaume, Patries Boekholt (2010, p. 339)
reconhece que levou mais de duas décadas para que a mensagem
"inovação não é linear", chegasse ao nível da política, porém, ainda
encontra-se o pensamento linear que é fortemente presente em muitas
estratégias e instrumentos de política nacional e regional. Afirma
também que o pipeline model em que o governo investia suas fontes de
financiamento em pesquisa pública e pensava que invenções seriam
"automaticamente" derivadas para as indústrias e posteriormente,
desenvolvidas e comercializadas no futuro, como em desenvolvimento
comercial, portanto, na visão linear demonstrou que esta política não
obteve os resultados esperados, e em diversas vezes, defende a visão
sistêmica. Nas suas conclusões, Boekholt aponta que a necessidade de
uma estratégia para o desenvolvimento do sistema nacional de inovação
no contexto europeu, e no texto citado anteriormente, somando-se com o
número não expressivo de pesquisa tecnológica, eram latentes para o
desenvolvimento do sistema de inovação. Consequentemente, sua
análise foi um sinal para o governo francês em aceitar mudanças para
alcançar o objetivo de melhorar a relação da academia com o setor
privado, principalmente, quanto à revisão da lei.
Neste quadro, observa-se que a legislação brasileira, Lei
10.973/2004 tem como objetivo principal incentivar a comunicação com
o setor público e privado, com tentativa de absorção da pesquisa
acadêmica visando um aproveitamento mais efetivo. A partir desta
legislação, buscou-se intensificar a comunicação da pesquisa pública
com o setor privado, através de incubação de empresas e parcerias.
75
Texto original: Même si c’est devenu une banalité, rappelons que le
processus d’innovation technologique ne s’identifie plus au modèle linéaire,
allant de la recherche fondamentale vers la recherche appliquée puis le
développement dês produits. (1998, p. 153).
131
Evidencia-se aqui a influência da lei francesa na lei de inovação
brasileira, que no seu bojo, teve como tema principal a interação
Universidade-Empresa (U-E). Possivelmente, isto decorreu em razão da
França também ter um sistema de educação superior público e ter
características de um Estado intervencionista e por ser, ao longo do
período, o principal financiador da pesquisa; bem ainda, assemelhando
na criação e fortalecimento de empresas estatais, com destaque nas áreas
de telecomunicações, aeroespacial e de energia. Estas seriam as
similaridades, porém, deve-se considerar que existem muitas diferenças
que levam a crer que a Lei de Inovação atual brasileira merece um
ajuste, não apenas temporal, mas conceitual, como se tem debatido
nestes últimos dois anos. Afinal, o Brasil nas décadas de 1980 e 1990,
optou por uma abertura econômica e pouco incentivo em pesquisa no
setor privado. Em alguns períodos, houve um escasso apoio às agências
de fomento à pesquisa. Deve-se considerar também que as universidades
públicas brasileiras sempre se destacaram na produção de conhecimento
e pesquisas, sejam elas básicas ou aplicadas, diferentes das
universidades francesas, portanto, há necessidade de encontrar um
caminho para que a Lei de Inovação seja um pouco mais efetiva e
menos burocrática.
2.4 Lei de Inovação no Brasil: Para que uma lei de inovação?
O Brasil também percebeu que estava com atraso no
desenvolvimento de tecnologias e apesar do país estar na vanguarda de
exportação de commodities, principalmente, grãos, fazendo frente a
países desenvolvido como os Estados Unidos e países da Europa, ainda
apresenta um atraso tecnológico. Mesmo tendo investido em tecnologia
para o setor agrícola, mais especificamente, em biotecnologia, que tem a
EMBRAPA como pioneira em muitas descobertas científicas, quando a
discussão se aproxima das tecnologias voltadas para indústria e TIC
(Tecnologias de Informação e Comunicação) e patentes de empresas ou
inventores brasileiros, percebe-se que persiste a lacuna (gap)
tecnológica. E da mesma forma como Guillaume e outros estudiosos
utilizam a Propriedade Intelectual como parâmetro, constata-se que as
empresas brasileiras, no que toca às patentes, não possuem uma
expressividade em invenções de alta tecnologia, bem como, protegem
pouco no exterior, demonstrando, dessa maneira, uma defasagem
assustadora.
132
O Brasil está numa posição não muito animadora no Índice
Global de Inovação (Global Innovation Index)76
de 2014, ficando atrás
de países como Panamá (52ª), África do Sul (53ª), Grécia (50ª), Chile
(46ª) e Turquia (54ª), alcançando a 61ª colocação, apesar de ser
reconhecido como um país de renda média, inclusive no BRICS, (12-
13). A análise indica que o desempenho mais forte do Brasil é na
absorção de conhecimento (sub-pilar); a fraqueza ainda permanece nas
instituições, especialmente no ambiente de negócios (sub-pilar) (THE
GLOBAL INNOVATION INDEX, 2014, p. 35, 36).
Deve-se ter em consideração que a pesquisa brasileira de
qualidade está nas universidades públicas, não aqui desprezando as
universidades privadas, que atualmente demonstram uma qualidade
notável e uma celeridade impressionante na execução de parcerias e
desenvoltura para a transferência de tecnologia. Neste contexto, era
inevitável um arcabouço jurídico com objetivo de dinamizar e diminuir
esta defasagem, conjugando os atores que estão envolvidos no processo
de inovação, aqueles já identificados no sistema de inovação e também
pela Tríplice Hélice, como explicitado no capítulo anterior. Desta forma,
veio o marco legal, a Lei nº 1.0973/2004, denominada de Lei de
Inovação,77
juntamente com a Lei 11.196/2005, Lei do Bem.
Certamente, um fator notável na Política Nacional de Inovação
foi à promulgação das leis que buscaram regular e incentivar a inovação
no território brasileiro. No país, a Lei de Inovação (Lei nº 10.973/2004)
e a Lei do Bem (Lei nº 11.196/2005) foram os divisores de águas. A
primeira lei tem como pontos principais: o incentivo de parcerias em
P&D entre universidades ou instituições de pesquisa e empresas; a
regulação da transferência de tecnologia e a criação de incubadoras,
partilhamento de equipamentos, infraestrutura e de pessoal no
desenvolvimento de novas atividades de tecnologia; além disso, o
estabelecimento de subsídios e recursos para essas atividades. A lei foi
organizada em três eixos para a constituição de ambiente propício a
76
Disponível em: <
https://www.globalinnovationindex.org/content.aspx?page=gii-full-report-
2014>. Acesso em: 25 ago. 2015. 77
Esclarece-se que ao tempo da escrita desta tese alterações para esta lei
estava em discussão no Congresso Nacional e que a partir de janeiro de
2016 alguns pontos cruciais já foram adotados, o que se tratou ao final do
capítulo, que anteriormente era uma previsão, agora uma realidade.
133
parcerias estratégicas entre as universidades, institutos tecnológicos e
empresas, visando estimular a participação de Instituições de Ciência e
Tecnologia (ICT) no processo de inovação e, incentivar que a inovação
na empresa ocorra.
A Lei nº 11.196/2005 determina incentivos para apoiar a
transferência de tecnologia, por exemplo: isenções e deduções fiscais
para a compra de máquinas e equipamentos relacionados com as
atividades de inovação e de exportação; deduções relativas aos gastos
com P&D, possibilidade de contratar investigadores e de registro de
patentes ou incentivos fiscais para compensar os custos de registro e
manutenção de marcas e patentes registradas no exterior. No entanto, em
quase uma década de existência a implementação adequada das leis
ainda em discussão.
Neste estudo, merece maior atenção a primeira lei, tendo em vista
que seu foco está na relação universidade-empresa e a segunda está mais
voltada para incentivos fiscais. Deste modo, a Lei de Inovação (e
alterações) tem como ponto central criar um ambiente produtivo
guiando-se por pontos principais, quais sejam: incentivar parcerias em
pesquisa e desenvolvimento (P&D) entre universidades, instituições de
pesquisa e empresas; regular a transferência de tecnologia, com acordos
de parceria, seja para desenvolver tecnologia ou seu licenciamento;
fomentar a criação de incubadoras; flexibilizar a atuação de cientistas e
pessoal técnico nas empresas e indústrias; partilhar equipamentos e
infraestrutura; definir questões de propriedade intelectual dos resultados
de P&D e estabelecer percentuais de divisão de benefícios advindo
destas parcerias e, principalmente, criar os Núcleos de Inovação
Tecnológica (NIT) nas instituições de pesquisa e valorizar o inventor
independente.
Evidencia Denis Barbosa (2006, p. 1, 2) que a lei compreende
grupos de normas, respectivamente: a criação de parcerias estratégicas
entre universidades, institutos tecnológicos e empresas; incentivar a
figura do pesquisador-criador; incentivar a inovação nas empresas;
definir os direitos de apropriação de tecnologias. Também está prevista
a participação remuneratória dos seus pesquisadores quando existir uma
exploração comercial de sua criação pela Instituição de Ciência e
Tecnologia, como forma de instigar a produção acadêmica.
Já no artigo primeiro da lei, observa-se sua finalidade que é
incentivar à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente
produtivo, com fulcro em uma autonomia tecnológica e no
desenvolvimento industrial do país. Esta lei é uma norma em resposta
134
aos artigos 218 e 219 da Constituição Federal de 1988. Portanto, a
legislação teve como alvo criar um melhor ambiente para desenvolver a
inovação, respeitando as regras burocráticas que envolvem as parcerias
público-privada, buscando flexibilizar ao utilizar contratos e convênios
realizados pelas Instituições Científicas e Tecnológicas (ICT).
Neste sentido, as ICT estão claramente definidas no Artigo 2º, da
Lei de Inovação: órgão ou entidade da administração pública direte
ou indireta ou pessoa jurídica de direito privado
sem fins loucrativos legalmente constituída sob as
leis brasileiras, com sede e foro no País, que
inclua em sua missão institucional ou em seu
objetivo social ou estatutário a pesquisa básica ou
aplicada de caráter científico ou tecnológico ou o
desenvolvimento de novos produtos, serviços ou
processos. (Lei nº 10.973/2004, com alterações da
Lei 13.243/216).
Por isso, as universidades e institutos de pesquisa públicos estão
contemplados neste conceito. Foram previstas algumas formas
diferenciadas de parcerias, como: o compartilhamento e a permissão de
uso de infraestrutura, contratos de transferência de tecnologia e
licenciamento, prestação de serviços especializados, acordo para
pesquisa e/ou desenvolvimento de tecnologia, produtos ou processos.
No mesmo sentido, prevê contratos de parceria indicando Contrato de
Cessão, Licenciamento e Transferência de Tecnologia. De forma
panorâmica, pode-se afirmar que a lei buscou minimizar as dificuldades
que as instituições de pesquisas, precipuamente as universidades
públicas, enfrentam quando realizam parcerias com o setor privado,
inclusive excepcionando situações previstas na Lei de Licitações (Lei nº
8.666/93).
O texto legal contemplou uma das formas mais comuns de
relação entre universidade e empresa que é a parceria, o acordo para
pesquisa científica e tecnológica de desenvolvimento de tecnologia,
produtos ou processos, no Artigo 9º e seus parágrafos. Geralmente, as
universidades buscam este tipo de parceria para desenvolverem pesquisa
com auxílio e apoio financeiro das empresas ou instituições públicas.
Nestes tipos de parcerias, a transferência de conhecimento está presente,
pois, haverá certamente troca de knowhow e deve-se ter o cuidado de
estar bem definida a relação, com objetivos concretos evitando que se
transmitam informações em demasia que possam comprometer a
atividade acadêmica e/ou outros projetos, tampouco arriscar em revelar
135
questões sigilosas da empresa. Evidentemente, que mesmo antes da
legislação as empresas já buscavam as universidades para
desenvolverem uma tecnologia ou um produto e em contrapartida, as
universidades recebiam equipamentos e bolsas de estudos para
realizarem projetos de pesquisas, porém, com a legislação esta parceria
tomou uma formalidade e exigências para a segurança entre as partes.
2.4.1 Pontos controvertidos: aplicação da Lei de Licitação em
razão da generalidade da Lei de Licitação
Estudos sobre as parcerias entre universidades e empresas
indicam a burocratização como maior entrave e, ainda o excesso de rigor
formal das ICTs públicas desmotiva a realização de contratos entre estes
atores, principalmente, quando exige a observância da Lei de Licitação.
Por serem entidades que integram a Administração Pública, as
universidades federais, estaduais e municipais estão obrigadas a cumprir
as regras procedimentais de aquisição e contratação previstas pela Lei n.
8.666/93. Neste horizonte, a universidade deve buscar formas de
motivar a prática de inovação no seu interior para alcançar as empresas.
A inovação, além de trazer a realização da função social, traz a
incorporação de novas formações no processo de ensino e pesquisa e
resolução de problemas técnicos conjugando o interesse privado.
Um destaque nacional da promulgação desta legislação para
inovação foi a grande aceitação pelos entes federados que replicaram
seu texto no âmbito estadual. Muitos estados como Mato Grosso, Santa
Catarina, Bahia, São Paulo, Minas Gerais, Amazonas, Mato Grosso do
Sul, entre outros, adotaram, na esfera estadual, estas normas
incentivadoras do processo de inovação. No entanto, mesmo após mais
de uma década de existência e implementação desta lei, seu objetivo de
fortalecer a interação entre instituições de pesquisa tecnológicas e
empresas, com atuação e sinergia entre os atores (governo, academia e
setor produtivo), através de contratos e convênios de pesquisa para criar
produtos e processos, visando um crescimento econômico, ainda está a
desejar. Estas leis estaduais de inovação auxiliam na consolidação do
Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI),
fortalecendo em âmbito regional a interação entre os agentes do sistema
já comentado anteriormente.
Não se pode olvidar que, sem dúvida, a partir da lei de inovação
os acordos entre empresas e universidades foram obrigatoriamente
136
formalizados, com contraprestações claras, ofertando uma segurança
jurídica tanto para a universidade, que não vê seus Direitos de
Propriedade Intelectual negligenciados ou simplesmente subtraídos,
quanto para a empresa, a segurança e formas de exigir o cumprimento
dos compromissos assumidos. Houve uma aproximação entre a
academia e a indústria, não apenas por força da lei, mas, pelas políticas
públicas subsequentes e incentivos fiscais adotados. A criação dos
Núcleos de Inovação Tecnológica (NIT) e a viabilidade de
compartilhamento de instalações e equipamentos auxiliaram no
desenvolvimento das pesquisas e contribuíram para a mudança dos
conceitos nestas entidades, impondo uma cultura de inovação e
transferência de tecnologia quase inexistente em algumas instituições
em todo o país.
A Lei de Inovação também prevê uma contratação mais elástica,
conforme previsão no Artigo 20. Com intuito de flexibilizar e dinamizar
a interação entre as ICT e o setor empresarial, a Lei de Inovação
excepcionou a Lei de Licitação no Artigo 20, in verbis:
Art. 20. Os órgãos e entidades da administração
pública, em matéria de interesse público, poderão
contratar empresa, consórcio de empresas e
entidades nacionais de direito privado sem fins
lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, de
reconhecida capacitação tecnológica no setor,
visando à realização de atividades de pesquisa e
desenvolvimento, que envolvam risco
tecnológico, para solução de problema técnico
específico ou obtenção de produto ou processo
inovador.
§ 1o Considerar-se-á desenvolvida na vigência do
contrato a que se refere o caput deste artigo a
criação intelectual pertinente ao seu objeto cuja
proteção seja requerida pela empresa contratada
até 2 (dois) anos após o seu término.
§ 2o Findo o contrato sem alcance integral ou com
alcance parcial do resultado almejado, o órgão ou
entidade contratante, a seu exclusivo critério,
poderá, mediante auditoria técnica e financeira,
prorrogar seu prazo de duração ou elaborar
relatório final dando-o por encerrado.
§ 3o O pagamento decorrente da contratação
prevista no caput deste artigo será efetuado
137
proporcionalmente ao resultado obtido nas
atividades de pesquisa e desenvolvimento
pactuadas. (Lei nº 8666/1993).
Assim, os órgãos e entidades da Administração Pública, em
matéria de interesse público, poderão contratar empresa, consórcio de
empresas e entidades nacionais de direito privado sem fins lucrativos
voltadas para atividade de pesquisa, de reconhecida capacitação
tecnológica no setor, visando à realização de atividades de pesquisa e
desenvolvimento, que envolvam risco tecnológico, para a solução de
problema técnico específico ou obtenção de produto ou processo
inovador. Faz uma alusão aqui à mesma visão da lei francesa, que teve o
intuito de incentivar a interação do profissional universitário com as
empresas, desde que isto não influenciasse ou prejudicasse o
desenvolvimento das pesquisas e projetos da universidade ou instituto
de pesquisa. Entretanto, o ambiente de pesquisa e desenvolvimento
destacado no Artigo 1º da lei, carece de uma urgente mudança de
paradigma institucional e que estas relações cada vez mais sejam
desprovidas de burocracia, com procedimentos mais ágeis e flexíveis.
Cita-se o caso dos processos de aquisição e prestação de contas, ou no
processamento interno das instituições na formulação das parcerias, que
necessitam decisões mais rápidas e eficazes, para que não venham
desestimular a outra parte. A demora ou a dificuldade na decisão
afugenta a iniciativa privada que tem um ritmo muito diferente da
Administração Pública e as universidades estão inseridas neste contexto.
Cita-se também as situações em que as regras de importação de
equipamentos ou sanitárias para material de pesquisa atrasam o
desenvolvimento de pesquisas importantes no país. Não são poucas as
reclamações, como do cientista médico Antônio Carlos de Carvalho, que
teve seus reagentes detidos por três semanas em 2010.78
Conforme
matéria veiculada, em mídia nacional, afirma que para importação de
reagentes, quando corre tudo na normalidade, os pesquisadores devem
esperar entre 1960 a 1990 dias para tê-los em mãos, indicando uma
desnecessária demora. Outra situação similiar foi relatada pelos
professores renomados da UFRJ que em 2004, apesar de terem recebido
78
Notícia. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/851192-
pesquisador-nao-sabe-importar-material-cientifico-diz-governo.shtml>.
Acesso em: 15 ago. 2015.
138
prêmios em pesquisa e doações de equipamentos que se aproximavam
do valor de meio milhão de reais (destinados ao Instituto de Ciências
Biomédicas da UFRJ) esperaram meses para receberem estes
equipamentos para desenvolver pesquisas em muitos laboratórios
daquela instituição.79
Também na opinião da pesquisadora Lygia da
Veiga Pereira, que trabalha com células-tronco, a burocracia é o fator de
atraso das pesquisas que acabam sendo pouco inovadoras e superficiais.
Em suas palavras: "Apesar de dizer que valoriza a atividade de pesquisa,
o governo criou um labirinto legal para importações que não distingue
um pesquisador de um potencial contrabandista."80
O que demonstra um
descompasso entre a Política de Inovação apregoada e a realidade.
A proliferação de incubadoras, startups e criação de parques
científicos e tecnológicos apoiados pelos estados da federação,
indubitavelmente consolida a cultura de inovação e podem ser uma
aposta para dinamizar estes ambientes. Porém, as questões de gestão dos
parques, por exemplo, devem ser observadas com muita atenção, quando
existem órgãos da administração pública envolvidos, para não voltar ao
problema de burocracia. Conquanto, para a inovação estão previstas
situações de dispensa à licitação quando se refere às atividades de
Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) desenvolvidas pelas instituições
de ensino e pesquisa públicas e institutos públicos de pesquisa. Por isso,
em razão da matéria e importância, a licitação que seria exigida, é
dispensada. O Art. 24, da Lei n. 8.666/93, ao estabelecer os casos de
dispensabilidade de licitação, prescreve em seu Inciso XXI, com
alteração dada pela Lei n. 9.648/98, a possível dispensa para "aquisição
de bens destinados exclusivamente à pesquisa científica e tecnológica
com recursos concedidos pela CAPES, FINEP, CNPq ou outras
instituições de fomento a pesquisa credenciadas pelo CNPq para esse
fim específico." (BRASIL, 1998).
Embora o texto legal coloque como hipótese de dispensa,
verifica-se posicionamento doutrinário que o aponta como de
79
Notícias. Disponível em: <http://www.renorbio.org.br/portal/noticias/as-
dificuldades-para-a-importacao-de-material-cientifico-no-brasil-texto-de-
stevens-kastrup-rehen-e-ronaldo-mohana-borges.htm>. Acesso em: 15 ago.
2015. 80
Notícia. Disponível em:
<http://noticias.uol.com.br/opiniao/coluna/2014/03/25/burocracia-para-
importar-insumos-trava-pesquisa-no-brasil.htm>. Acesso em: 19 set. 2015.
139
inexigibilidade. O caso é muito mais de inexigibilidade, eis que não se
pode cogitar de "competição". Constata-se, então, que o fundamento da
dispensa não reside diretamente na destinação à atividade de pesquisa,
está na natureza dessa atividade. As peculiaridades da atividade de
pesquisa excluem adoção dos critérios usuais de julgamento e seleção de
propostas (JUSTEN FILHO, 2005, p. 261-262). Contudo, não se
pretende aprofundar nesta seara.
2.4.2 Dificuldades na contratação: ausência de regulamentação
para os contratos de ICT
Vislumbra-se o Inciso XXV, do Art. 24 da Lei n.º 8.666/93 que
prevê a possível dispensa de licitação quando na contratação tiver
envolvida instituição científica e tecnológica ou por agência de fomento,
e, quando o objeto do ajuste for à transferência de tecnologia ou o
licenciamento de direito de uso ou de exploração de criação protegida.
Desta forma, está incluída neste conceito a invenção, modelo de
utilidade, desenho industrial, programa de computador ou qualquer
outro desenvolvimento tecnológico, do qual possa resultar o surgimento
de novo produto, processo ou aperfeiçoamento de natureza tecnológica.
Evidente que o legislador entendendo a dificuldade que o gestor
teria nesta área, procurou flexibilizar o processo e adicionou uma
exceção permitindo a dispensa de licitação. Apesar desta previsão que
autoriza esta forma de contratação, a execução ou aplicação destes
artigos encontram algumas barreiras, uma vez que, carece de critérios e
detalhamento sobre como estes contratos deveriam ser disciplinados.
Isto também não foi contemplado no Decreto n.º 5.563/05, que apenas
previu a obrigatoriedade de edital, quando houver a cláusula de
exclusividade. Este hiato disciplinar acaba obrigando o gestor da ICT
pública, na dúvida, a preencher esta lacuna com as regras contratuais da
Lei de Licitação. E isto ocorre em respeito ao princípio da legalidade
que a Administração Pública está vinculada, portanto, o Poder Público
apenas poderá fazê-lo na forma da lei. Neste ponto, convém entender
esta "desvantagem" para as questões de inovação.
A Lei de Licitação foi criada visando regulamentar o Artigo 37,
XXI, da Constituição de 1988 e para evitar superfaturamentos e
favorecimentos, mormente, nas obras públicas. Vale dizer que o sistema
de seleção e contratação era antes regulado pelo Decreto-Lei nº 200/67 e
Decreto-Lei nº 2.300/86 e foi enrijecido pela Lei nº 8.666/1993, após
140
alguns escândalos de corrupção no início dos anos 1990. Apesar do
anseio legítimo de um controle maior e de diminuir a corrupção, não
afastou por completo os casos de favorecimento nas obras e compras da
Administração Pública, como se verifica na atualidade, a exemplo das
obras da Copa do Mundo de 2014 em alguns estados da federação. A
perquirição de julgamento por valores menos custosos e maior vantagem
para o Poder Público acaba sendo frustrada, pois, após estas duas
décadas de existência, ficou demonstrado que a busca pelo melhor preço
não garante um serviço de qualidade ou a conclusão de uma obra, o que
não atende o princípio de eficiência das compras públicas e o bom uso
do dinheiro público.
O objetivo do processo licitatório é dar garantia na contratação
sem conluios, no entanto, a lei parte do pressuposto de que
administradores e empresas não mereçam uma autonomia e confiança na
forma de escolha, na contratação e no uso do dinheiro público. Verifica-
se que mesmo após sua entrada em vigor, os escândalos e conluios não
cessaram e que cada vez se constata uma ineficácia no processo, muitas
vezes, em razão do excesso de formalidade. Aqui a crítica não defende a
ausência total de controle, o controle e fiscalização são necessários,
todavia, no processo licitatório, na lei geral há um temor demasiado com
a forma para evitar favorecimento, principalmente, financeiro dos
agentes envolvidos, o que acaba transformando algo benéfico
(regularidade), em situações de morosidade e ineficiência. O excesso de
cuidado, proteção e privilégios da Administração Pública como parte da
relação, não impede que o mau uso e os acordos paralelos ocorram. E
deve-se ter um olhar mais abrangente para verificar como em outras
nações este processo é realizado, como os escândalos são também
resolvidos, se estes existirem. O que se deve pontuar é que para a
inovação importa o resultado, o objeto, a agilidade na tomada de
decisões, na solução, porque muitas vezes, não há como esperar meses
para manifestar sobre as cláusulas e ou forma de pagamentos, sendo a
eficiência uma preocupação a ser observada pela Administração Pública.
A adoção desta visão de eficiência pode ser vislumbrada na
postura da Administração Pública brasileira no Artigo 37 da
Constituição Federal de 1988 (CF/88), que em seu caput traz a eficiência
como princípio, juntamente com a legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade, a partir da Emenda Constitucional nº 19/1998.
Explicitamente no parágrafo 8º deste artigo, destaca-se a autonomia
141
gerencial, orçamentária e financeira da Administração Pública mediante
a possibilidade de firmarem contrato (com prazos definidos) entre os
administradores e o Poder Público, fixando metas de desempenho do
órgão ou entidade, reforçando a responsabilidade dos dirigentes, através
de Contratos de Gestão. A instituição das Agências Reguladoras (Lei nº
9.986/2000) em mesmo sentido, focaliza na observância da eficiência.
Haja vista que suas atividades se concentram na fiscalização, regulação
e planejamento do serviço público, mesmo realizado pela iniciativa
privada, através de concessões e outros instrumentos. Desse modo, estes
serviços públicos concessionados necessitam de verificação quanto a sua
execução em eficácia e eficiência. Neste prisma, para compreender a
diferença entre os termos, a eficácia está relacionada ao objetivo final,
portanto, eficaz será o serviço que alcançou a meta desejada, tratando da
performance, do desempenho, como por exemplo, cumprimento de
prazos; já a eficiência se vincula à forma (processo) de executar a
atividades (BUGARIN, 2001, p. 41), mas, não pensando na legalidade
estrita (como na Lei de Licitação) e sim em uma forma, procedimento
que se maximize melhores resultados. Hely Lopes Meirelles afirma que
a eficiência é imposta ao agente público para realizar suas atribuições
com presteza, perfeição e rendimento funcional (MEIRELLES, 1989, p.
90). Brugarin (2001, p. 48) relembra que o princípio da eficiência pode
estar ligado ao princípio da economicidade,81
que está evidenciado no
Artigo 70 da CF, possibilitando, portanto, uma melhor aplicação de
recursos públicos.
Apenas para elucidar, nos Estados Unidos da América, quanto se
trata do processo de licitação (bidding process, government acquisition
process, public procurement) e das contratações, as partes envolvidas
são vistas com igualdade, com responsabilidades recíprocas. O que se
prioriza na legislação norte-americana é a competitividade, sendo este o
princípio que garante justa e equitativa contratação e o melhor uso ao
contribuinte. Demonstrando a influência do conceito de eficiência
defendido por Posner que se inclinava para decisões que vislumbrassem
81
Para melhor elucidar, verificar TORRES, Ricardo Lobo. O Tribunal de
Contas e o Controle da Legalidade, Economicidade e Legitimidade, Rio de
Janeiro, Revista do TCE/RJ, n 22, jul/1991, pp. 37/44, e BUGARIN, Paulo
Soares. Reflexões sobre o Principio Constitucional da Economicidade e o
Papel do TCU, Brasília, Revista do TCU, nº78, out./dez. 1998, pp.41/5.
142
a maximização da riqueza e o melhor aproveitamento (POSNER, 2003,
p. 29). Outro fator interessante, destacado pelo jurista Márcio Pestana,82
em comentários a uma revista de notícias, é que os contratos norte-
americanos estão focados no resultado ou conclusão da obra, utilizando,
por exemplo, o performance bond, que é um seguro que garante a
conclusão da obra, o que além de ter o Poder Público interessado na
conclusão, também a seguradora fiscalizaria o andamento e conclusão
do projeto, que deve ser planejado e verificado com maior observação,
já que a garantia passa a ser 100% do contratado. Isto também evitaria
os famigerados aditamentos contratuais e adequações da obra que não
prezam pela eficiência.
Outra questão interessante é o Value Engineering (Engenharia de
Valor) que possibilita a construtora propor uma alteração de projeto que
interesse as partes ou que possa fazê-lo de forma mais barata e que os
ganhos entre a construtora e o contratante sejam compartilhados, o que
estimula a inovação e interesse da empresa em criar e encontrar
alternativas positivas para a questão. Também existe uma espécie de
cota para empresas que tenham seu capital majoritário de grupos de
minorias (indígenas, afrodescendentes, nativos, mulheres etc.) que
deverão ser subcontratadas, visando garantir alguma reserva de mercado
e oferecer maior competitividade a estas pequenas empresas em
comparação com as demais, tendo uma visão mais social no processo.
No Brasil, a Lei 8.666/93 faculta aos órgãos públicos cobrarem,
além de atestados de competência técnica, o percentual de 5% do valor
da obra como forma de garantia do contrato. O pagamento pode ser feito
por meio de uma caução (em dinheiro ou títulos da dívida pública) ou
por meio de um seguro-garantia, mas, é uma escolha da contratada, que
raramente opta pelo seguro. Deve-se destacar que esta escolha pelas
regras licitatórias em geral não é voluntária e é imposta nas contratações
para transferência de tecnologia, ou, de forma indireta, no
desenvolvimento de projetos de pesquisas, como uma segurança para
evitar nulidade. Principalmente, nas instituições federais, as
procuradorias, para evitar questionamentos dos órgãos de controle
externo, exigem que sejam realizados em cumprimento da Lei Geral de
82
Notícia. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/licitacoes-
o-que-eles-tem-que-nos-nao-temos/>. Acesso em: 20 set. 2015.
143
Licitação. Dessa maneira, uma atividade que deveria ser eficiente e
célere, é eivada de formalismo, e, definitivamente, não responde à
postura pró-inovação que se espera. Indubitavelmente, a diferença do
período de promulgação das referidas leis (licitação e inovação) geram
uma visão um pouco antagônica, sendo que a Lei de Inovação prima
pela modernidade e a de Licitação pela formalidade. O resultado desse
paradoxo, além das observações citadas acima, pressupõe insegurança
jurídica, dificuldade por parte das instituições científicas e tecnológicas
em transferir o produto de suas pesquisas inovadoras ao setor produtivo,
bem assim, empecilhos que inibem a participação das empresas.
E estas discussões sobre a desconexão das legislações têm gerado
inclusive nos parlamentares um anseio de mudança legislativa. Existem
várias propostas que tramitam no Congresso Nacional para modificação
do texto atual, inclusive com previsão de inversão das fases de licitação,
como é adotado na modalidade Pregão. Neste último, as propostas são
analisadas primeiramente para depois verificar a documentação,
dinamizando o tempo de análise processual. Muitos são os debates com
interesse em aprimorar ou modernizar as instituições públicas com
meios mais eficazes modificando o modo de aquisição de produtos e
equipamentos, por exemplo, o que evitaria atraso no desenvolvimento
da pesquisa. Nos debates são sugeridas as modalidades e procedimentos
mais modernos como o Pregão Eletrônico e o uso de Certificação
Digital. Uma crítica direta que se realça é do ex-presidente do Conselho
Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap),
Odenildo Sena, que em um debate, em 2008, na Câmara dos Deputados,
reverberou que a Lei de Licitação "trava inteiramente a implementação
da inovação tecnológica". Citou inclusive que a questão da subvenção
econômica (prevista na Lei de Inovação), que permite às empresas
privadas que investe em pesquisa e desenvolvimento receberem recursos
diretamente do poder público (por exemplo, do governo estadual), são
pressionadas pelos órgãos de controle, como os Tribunais de Contas,
para realizarem licitação para adquirir equipamentos ou serviços e,
reafirmou: "isso mata a inovação"83
.
83
Notícia. Disponível em:
<http://www.protec.org.br/noticias/pagina/1384>. Acesso em: 01 ago. 2015.
144
Em razão destas discrepâncias entre os objetivos das leis citadas,
acredita-se que uma forma de minimizar estes confrontos é a adoção de
uma norma específica que regulamente ou excepcione literalmente os
casos que envolvam ICT para a inovação. Consequentemente,
dissipariam as dúvidas que a Regra Geral prevista na Lei 8.666/93 e
também o medo do gestor de ser compelido pelos órgãos de controle por
uma interpretação mais elástica da lei. Foi o que ocorreu com a Copa do
Mundo, que possibilitou um regime especial de contratação com
especificidades que a lei não previa e buscou uma celeridade processual.
Desta forma, pensando em uma forma diferenciada para realizar
contratações e licitação que envolva a Ciência, Tecnologia e Inovação,
dar-se-á um destaque à lei especial criada para os grandes eventos
esportivos, a seguir.
2.4.3 É possível pensar num Regime Diferenciado de Contratação
(RDC) para Inovação?
A proposta de discussão neste tópico é repensar a legislação sobre
licitação e imaginar uma possível adequação à inovação, pensa-se que
este é um caminho importante que o país pode trilhar. É bem verdade
que a discussão aqui será sobre mudanças na legislação, de modo que, já
se percebe esta necessidade como um ponto pacífico na doutrina e
discussões legislativas.
Quanto às alterações refletidas, pode-se pensar, inicialmente, em
uma modificação na própria Lei de Licitação dedicando uma seção
minuciosa, explicando e pormenorizando o processo licitatório e
contratual para incentivar o desenvolvimento da Ciência, Tecnologia e
Inovação (CT&I), desta forma, estaria claro o regime e forma de
contratar, evitando a generalidade. Ou ainda, pensar na alternativa
encontrada para as obras públicas dos grandes eventos esportivos no
país (Copa do Mundo e Olimpíadas), que optou por um regime
diferenciado e demonstrou que o interesse e a vontade política fazem a
diferença, já que, conseguiu-se estabelecer um regime especial, o
denominado Regime Diferenciado de Contratação Pública (RDC), o que
não impediria de fazê-lo para a temática de inovação. Abaixo, comentar-
se-á sobre esta novidada legislativa.
O Regime Diferenciado de Contratação Públicas foi instituído
pela Lei nº 12.462/2011 com fito a dar maior celeridade e eficiência nas
contratações públicas, em particular às obras de eventos esportivos,
como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.
145
Este novo regime apresenta-se como uma lei especial à lei geral
de licitação, que apesar de ser facultativo, logo em seu Artigo 1º exclui a
aplicação da Lei 8.666/93, o que difere da Lei do Pregão (Lei nº
12.232/09) que admite aplicação subsidiária da lei geral. De acordo com
Gasparini, o RDC tem como objetivos claros: [...] os objetivos legalmente declarados de ampliar
a eficiência nas contratações públicas e a
competitividade entre os licitantes; promover a
troca de experiências e tecnologias em busca da
melhor relação entre custos e benefícios para o
setor público; e incentivar a inovação tecnologia.
(2012, p. 761)
A aplicação da nova regra licitatória, como dito anteriormente, é
especial e facultativa. E no artigo primeiro, já afasta a aplicação do
regime geral, Artigo 1º: Art. 1
o É instituído o Regime Diferenciado de
Contratações Públicas (RDC), aplicável
exclusivamente às licitações e contratos
necessários à realização:
I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016,
constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser
definida pela Autoridade Pública Olímpica
(APO); e
II - da Copa das Confederações da Federação
Internacional de Futebol Associação - Fifa 2013 e
da Copa do Mundo Fifa 2014, definidos pelo
Grupo Executivo - Gecopa 2014 do Comitê
Gestor instituído para definir, aprovar e
supervisionar as ações previstas no Plano
Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para
a realização da Copa do Mundo Fifa 2014 -
CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras
públicas, às constantes da matriz de
responsabilidades celebrada entre a União,
Estados, Distrito Federal e Municípios;
III - de obras de infraestrutura e de contratação de
serviços para os aeroportos das capitais dos
Estados da Federação distantes até 350 km
(trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades
sedes dos mundiais referidos nos incisos I e II.
IV - das ações integrantes do Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC) (Incluído pela
Lei nº 12.688, de 2012)
146
V - das obras e serviços de engenharia no âmbito
do Sistema Único de Saúde - SUS. (Incluído pela
Lei nº 12.745, de 2012)
VI - das obras e serviços de engenharia para
construção, ampliação e reforma de
estabelecimentos penais e unidades de
atendimento socioeducativo; e (Redação dada pela
Medida Provisória nº 678, de 2015)
VII - ações no âmbito da Segurança Pública.
(Incluído pela Medida Provisória nº 678, de 2015)
§ 1o O RDC tem por objetivos:
I - ampliar a eficiência nas contratações públicas e
a competitividade entre os licitantes;
II - promover a troca de experiências e tecnologias
em busca da melhor relação entre custos e
benefícios para o setor público;
III - incentivar a inovação tecnológica; e
IV - assegurar tratamento isonômico entre os
licitantes e a seleção da proposta mais vantajosa
para a administração pública.
§ 2o A opção pelo RDC deverá constar de forma
expressa do instrumento convocatório e resultará
no afastamento das normas contidas na Lei no
8.666, de 21 de junho de 1993, exceto nos casos
expressamente previstos nesta Lei.
§ 3o Além das hipóteses previstas no caput, o
RDC também é aplicável às licitações e contratos
necessários à realização de obras e serviços de
engenharia no âmbito dos sistemas públicos de
ensino. (Incluído pela Lei nº 12.722, de 2012)
[...]
X – das ações em órgãos e entidades dedicados à
ciência, à tecnologia e à inovação. (incluído pela
Lei nº 13.243/2016) (grifos nossos).
Verifica-se que o legislador foi admitindo a ampliação dos casos,
que inicialmente pensou-se nas estruturas para eventos esportivos, pela
urgência e necessidade de contratação de obras públicas, contudo, estes
casos foram sendo ampliados para as obras do PAC, SUS,
socioeducativo, Segurança Pública e Sistemas Públicos de Ensino. Neste
prisma, as obras de grande vulto e de áreas cruciais de estrutura foram
acrescentadas, transparecendo que este regime poderá ser uma opção
mais interessante para a Administração Pública, conjugando a eficiência,
o aproveitamento dos atos com o máximo de economia.
147
Portanto, além da excepcionalidade de aplicação, existe a adoção
de dois princípios balizadores, a economicidade e a eficiência, que
trazem uma percepção de maior autonomia e uma visão de celeridade no
processo de seleção. Uma vantagem na adoção do novo regime está na
forma licitatória única, com previsão a partir do Artigo 12 da lei,
evitando, assim, a dúvida e discussão sobre qual melhor modalidade de
licitação (se concorrência, tomada de preços ou convite) a ser adotada
no caso concreto. Neste prisma, outra vantagem é que a empresa
vencedora será responsável também pelo projeto básico, portanto, todas
as etapas da obra ou serviço contratado, a contratação integrada,
possibilitando também uma inversão de fases da regra geral em que a
habilitação poderá ser posterior à fase de apresentação e julgamento das
propostas ou que haja habilitação apenas ao licitante vencedor; uma
novidade, apesar de críticas é o sigilo do orçamento estimado, sendo
apenas divulgado no final da licitação (apenas os órgãos de controle
poderiam ter acesso antes); e ainda a previsão de remuneração variável.
Estas diferenças e tentativa de evolução no processo licitatório podem
ser consideradas como problemas e foi objeto de Ações Diretas de
Constitucionalidade (ADI), porém, inegável que houve uma celeridade
no processo com sua adoção.
Neste mesmo sentido, admitindo-se que a adoção de um regime
especial de licitação que tenha trazido um resultado satisfatório, mesmo
com as críticas, não é absurdo pensar numa hipótese para a inovação,84
com exclusão da aplicação da Lei de Licitação. O que felizmente
aconteceu com a publicação da Lei nº 13.243/2016, que trouxe muitas
alterações na Lei de Inovação e no próprio RDC. Destarte, o novo
regime pode modernizar o processo (forma) e focar na eficiência e
resultado para a transferência de conhecimento e tecnologia. Permite ao
gestor pensar na forma mais eficiente de realizar pesquisa, evidenciando
a qualidade e a celeridade no desenvolvimento do projeto, por exemplo,
na simplificação de compra de equipamentos e material de pesquisa
regulada em apenas um instrumento, não de forma esparsa e sem uma
interlocução entre as legislações, bem como, definir a modalidade e
forma de selecionar as propostas, simplificando fases, e ainda, dar mais
autonomia contratual para as agências e núcleos de inovação, entre
84
A inclusão deste texto ocorreu em 12 de janeiro de 2016, o que
possibilitou esta autora a revisar este item e incluir esta nova permissão
legal para a área da Ciência, Tecnologia e Inovação.
148
outras mudanças que poderiam ocorrer para adequar à realidade. Estas
modificações são reconhecidamente necessárias e também permeiam as
discussões sobre o Código Nacional de Ciência e Tecnologia, tema a ser
desenvolvido no próximo tópico, assim, seja qual a escolha do
legislador, toda a mudança será bem vinda.
2.5 O que pode mudar com o novo marco legal proposto:
comentários ao Código de Ciência e Tecnologia
A iniciativa de alteração das legislações sobre a inovação veio em
momento oportuno após mais de uma década de existência da Lei de
Inovação. Nestes anos, percebeu-se que esta lei não alcançou seu
objetivo de promover a inovação a contento. Da mesma forma,
percebeu-se que outras legislações que tinham influência direta nas
relações de transferência de tecnologia ou desenvolvimento de pesquisa
mereciam (e merecem) ser modificadas também.
A competitividade que as empresas almejam, através de inserção
de produtos inovadores, em certa medida não foi efetivada, reafirmando
a deficiência na capacidade científica e tecnológica do país. A forma
como se depreendeu a Política de Inovação brasileira que apostou muito
na legislação e por isto novamente vem uma proposta de alteração
legislativa para adaptar as situações já vividas e lograr o êxito esperado.
Nesta oportunidade, se destacará alguns pontos que esta pesquisadora
entendeu importantes, que o projeto de lei (agora lei em vigor) trouxe
positivamente.
Deve-se evidenciar que ao final das discussões, optou-se, não por
um código propriamente dito, mas por uma legislação totalmente nova
em que reuniu e vislumbrou todas as condições necessárias para
desenvolver o ambiente produtivo de inovação. De forma mais
cautelosa, a nova legislação apresentou-se alterações cruciais em
legislações dispersas que conjugadas, poderão realizar os impactos
desejados. Porém, como a proposta legislativa ficou conhecida como
Código Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, aqui irá
acompanhar esta tendência para facilitar a referência da proposta
legislativa, e denominar novo marco normativo da inovação.
Antes de adentrarmos sobre as principais mudanças trazidas pela
PL 2.177/2011, convém salientar as mudanças trazidas pela Emenda
Constitucional nº 85, que entrou em vigor em fevereiro de 2015. A
proposta de Emenda Constitucional surgiu, na verdade, a partir das
discussões do projeto de lei para inovação, em que através dos
questionamentos da comunidade acadêmica e necessidade de atualizar o
149
texto constitucional, houve a preocupação com a uniformização do texto
constitucional com outras legislações sobre o tema, que foi o objetivo
principal da emenda. Com esta sintonia entre o texto constitucional e
infraconstitucional, pode-se viabilizar a institucionalização do Sistema
Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI) de forma
expressa. Para viabilizar alguns dos resultados esperados, o legislador
optou pela criação de um Projeto de Emenda Constitucional (PEC), que
atualizou alguns artigos da Constituição Federal, prevendo incentivos à
cooperação entre os diversos entes (públicos ou privados), incluindo os
temas de CT&I, no Artigo 24 (CF), que dispõe sobre a competência
concorrente entre a União, Estados e Municípios, evitando assim, que a
legislação seja aplicada e não necessite aguardar os textos e
regulamentos. Isso quer dizer que uma lei federal sobre tais temas não
precisa ser replicada nos Estados para ter validade nas instituições destas
esferas, como ocorreu com a Lei da Inovação, que até hoje, não tem uma
aplicação plena em alguns aspectos, como criação de órgãos e políticas
em alguns estados (pela falta de uma Lei de Inovação local ou pela falta
de sua regulamentação).
Particularmente, a Emenda Cosntitucional nº 85/2015 apresenta
alterações nos artigos 23, 24, 167, 200, 213, 218, 219, bem como,
acrescentou os artigos 219-A e 219-B à Constituição Federal de 1988.
Os destaques da emenda estão na adequação terminológica na
Constituição de 1988, que incluiu os termos tecnologia, pesquisa e
inovação, elevando a importância das discussões para âmbito
constitucional, comprometendo os entes federativos, o que facilita a
abordagem e aplicação da proposta do "Novo Marco de Inovação"
(alteração legal). Outro destaque está na adoção (oficialmente) do
Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI), que deve
ser organizado em regime de colaboração entre entes federativos e suas
normas gerais serão dispostas por uma lei federal. Trouxe também
alterações quanto à competência legislativa, permitindo que os entes
federativos possam legislar concorrentemente sobre Ciência,
Tecnologia, Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação. Avançou também
quanto aos recursos e orçamento permitindo o remanejamento ou
transferência de recursos de uma categoria para outra, sem prévia
autorização legislativa, o que demonstrou flexibilidade na administração
de recursos nesta área, através de um ato do Poder Executivo. Por falar
em aporte financeiro, o texto constitucional permitiu também que as
instituições de educação profissional e tecnológica pudessem receber
apoio financeiro compreendendo que estas realizam atividades de
150
estímulo e fomento à inovação, valorizando a extensão tecnológica. A
emenda também estimula a cooperação e execução de projetos entre os
atores do setor (públicos ou privados) para executarem atividades de
pesquisa, capacitação científica e tecnológica e inovação, inclusive
compartilhando recursos humanos especializados e capacidade
instalada, mediante contrapartida financeira ou não. Um ponto
importante é o incentivo aos profissionais da área na sua formação por
meio de atividades de extensão, concedendo aos que dela se ocupem
meios e condições especiais de trabalho. Pontuou sobre a atuação das
instituições públicas de Ciéncia, Tecnologia e Inovação no exterior, bem
como, a formação e o fortalecimento da inovação nas empresas, entes
públicos ou privados e, ainda a criação de parques e pólos tecnológicos;
a criação, absorção, difusão e transferência de tecnologia. Abaixo, ver-
se-á os reflexos destas mudanças constitucionais e pontos principais da
proposta de alteração da lei.
2.5.1 Objetivo do Código Nacional de Ciência, Tecnologia e
Inovação
A proposta de alteração legislativa ou "Código de Inovação" tem
como seu principal objetivo promover e incentivar o ambiente de
inovação e o desenvolvimento da pesquisa e da inovação no país,
trazendo uma regra mais flexível e especializada com alterações
essenciais em legislações que envolvem a temática, principalmente,
quanto à Lei de Inovação.
O texto legal proposto na Câmara dos Deputados tramitou como
Projeto de Lei 2.177/2011 de iniciativa do parlamentar Bruno Araújo,
juntamente com os deputados federais Antônio Ibassahy, Ariosto
Holanda e outros, tendo como relator o Deputado Federal Sibá
Machado. O projeto de lei referido foi aprovado no mês de julho de
2015, sendo encaminhado para apreciação no Senado. O que se deve
salientar na tramitação e aprovação do texto na Câmara foi à abertura e
possibilidade da comunidade acadêmica participar com representantes
nas comissões e discussões diretas com os parlamentares. É o que se
observa nas alterações propostas pelo texto aprovado que está
direcionado para questões contratuais, cooperação, financeira,
importação entre outras, que nestes mais de dez anos, têm recebido
críticas. A seguir, irá se tratar dos pontos relevantes para fomentar o
ambiente de inovação.
A proposta do novo Marco Regulatório Nacional de Ciência,
Tecnologia e Inovação (C, T & I) inicialmente traz, na parte
151
introdutória, alterações no Artigo 1º estabelecendo 14 princípios, como:
a promoção das atividades científicas e tecnológicas como estratégicas
para o desenvolvimento econômico e social; redução das desigualdades
regionais; descentralização das atividades de ciência, tecnologia e
inovação em cada esfera de governo, com desconcentração em cada ente
federado; simplificação de procedimentos para a gestão de projetos de
ciência, tecnologia e inovação e a adoção de controle por resultados em
sua avaliação; utilização do poder de compra do Estado para fomento à
inovação, apoio aos inventores independentes, entre outros.
Basicamente, a proposta tem efeitos nas legislações elencadas no
seu primeiro artigo, modificando os textos ou aplicação, quais sejam: a
Lei da Inovação (10.973/04); o Estatuto do Estrangeiro (6.815/80); Lei
da Contratação Temporária no Serviço Público (8.745/93); Lei das
Relações Entre as Universidades (8.958/94); Plano de Carreiras das
Universidades (12.772/12); Lei de Licitações (8.666/93); Lei do Regime
Diferenciado de Contratações Públicas (12.462/11); Lei sobre
Importações de bens destinados à Pesquisa Científica e Tecnológica
(8.010/90); Lei sobre isenção ou redução de impostos de importação
(8.032/90).
As maiores alterações ocorreram na própria Lei de Inovação,
assim, a alteração do Artigo 2º, da Lei de Inovação, também trouxe
importantes conceitos e modificações em seus incisos, já no Inciso III,
explica que o criador pode ser qualquer pessoa física, não apenas
pesquisador como no texto anterior. No Inciso IV, do mesmo artigo, a
inovação introduz novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo
e social que resultou novos produtos, serviços ou processo e acrescenta
ao conceito a agregação de novas funcionalidades ou características a
produto, serviços ou processo que possam resultar em melhorias na
qualidade e desempenho; no Inciso V, alargou o conceito de ICT, para
órgão ou entidade da administração pública direta e indireta, bem como
à entidade privada sem fins lucrativos, desde que incluam em sua
missão institucional, objetivo social ou estatutário, a pesquisa básica ou
aplicada de caráter científico ou tecnológico, ou o desenvolvimento de
novos produtos, serviços ou processos, vislumbrando neste ponto, a
discussão sobre missão das universidades ou institutos de pesquisa.
Incluiu algumas instituições que não sejam necessariamente
universidades ou institutos de pesquisas, como empresas públicas ou
fundações de pesquisas, por exemplo.
Outra salutar alteração e, particularmente necessária, foi sobre a
definição de Núcleo de Inovaçãoi no Inciso VI. Neste inciso, acredito
152
que houve uma crucial preocupação com a gestão da inovação e
procurou dar uma autonomia e celeridade a estes núcleos, que poderão
ter personalidade jurídica própria. Desta maneira, os NIT poderão ser
uma entidade com independência e autonomia, não necessitando
departamentos, extensões das estruturas já existentes, obrigando-se a
seguir regras restritas da administração pública, porém, poderão ser
pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, o que também é
abordado na modificação do Artigo 16. Contudo, conjugando a alteração
trazida à Lei 8.958/1994, (§ 8º, do Artigo 1°), que trata da relação entre
as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) e as fundações de
apoio, agora se admite que os NIT poderão assumir a forma de fundação
de apoio, o que é intrigante ter uma previsão sobre a estrutura dos NIT
em legislação voltada para fundação de apoio, mas que reforça o
interesse de dar independência aos NIT. Já no Inciso VII (Artigo 2º
alterado da Lei de Inovação), quando define as fundações de apoio,
apenas complementa a finalidade de estimular a inovação de interesse da
ICT e registro e credenciamento nos Ministérios de Educação e da
Ciência, Tecnologia e Inovação, indicando que legislações das esferas
estadual, distrital e municipal deverão ser observadas. No Inciso VIII,
explicita melhor a condição de pesquisador público. O texto do Artigo
2º trouxe também a definição de parque tecnológico, polo tecnológico,
extensão tecnológica, bônus tecnológico, capital intelectual,
acrescentando os incisos X a XIV, termos que eram tão discutidos
doutrinariamente e que deixavam para interpretações por vezes
confusas. Destas definições, coloca-se aqui evidência ao bônus
tecnológico, que é uma subvenção às microempresas e empresas de
pequeno e médio porte, valores que serão destinados ao pagamento do
compartilhamento e uso da infraestrutura de pesquisa e desenvolvimento
tecnológicos, na contratação de serviços tecnológicos especializados ou
transferência de tecnologia, como atividade complementar.
As alterações do Capítulo II da Lei de inovação, que trata do
estímulo à construção de ambientes especializados e cooperativos de
inovação, introduziram novos artigos, incisos e parágrafos aos artigos
3º, 4º e 5º. Assim, ao Artigo 3º abordou sobre as alianças estratégicas e o
desenvolvimento de projetos de cooperação; quanto ao parágrafo único,
houve a extensão do apoio à formação de ambientes de inovação
(incubadoras e parques tecnológicos) e capacitação de recursos humanos
qualificados. O texto adicionou os artigos 3º B, C e D que de forma
geral, busca promover o ambiente produtivo, com intuito de incentivar o
desenvolvimento tecnológico e aumento da competitividade, bem como
153
a interação entre empresas e ICT, possibilitando aos entes federativos
apoio a criação, implantação destes ambientes, inclusive de parques e
polos tecnológicos e incubadoras de empresas.
Um destaque deve ser feito quanto ao envolvimento da União,
Estados, Distrito Federal, Municípios e suas respectivas agências de
fomento e as ICT. Admite-se que estes possam ceder o uso de imóveis
para empresas ou outras ICT interessadas, ou ainda, através de entidades
com ou sem fins lucrativos. Estas entidades são gestoras de parques e
polos tecnológicos e de incubadoras de empresas, mediante
contrapartida, bem ainda, participam da criação e da governança de
entidades gestoras de parques ou incubadoras (incisos I e II, §2º, Art. 3º-
B). Destaca-se também a previsão de programas específicos para as
microempresas e empresas de pequeno porte (Art. 3º-D). Outro destaque
está no texto do Artigo 4º, com alterações sutis sobre compartilhamento
e permissão de utilização de laboratórios, equipamentos, instrumentos,
materiais e demais instalações que prevê em parágrafo único a
observância de prioridades, critérios e requisitos aprovados e divulgados
pela ICT pública (concedente), verificando a disponibilidade e
assegurarando a igualdade de oportunidade aos interessados.
Atenção especial foi dedicada ao Artigo 5º, que trata da
participação da União e dos entes federados, minoritariamente do capital
social de empresas, por meio de contribuição financeira ou não
financeira economicamente mensurável, com o propósito de desenvolver
produtos ou processos inovadores. O referido artigo passou a ter seis
parágrafos e explicou de forma mais detalhada esta participação, que já
não está limitada à empresa privada de propósito específico, que pode
participar de empresas em geral. Da mesma forma, no parágrafo 1º,
trouxe oportunidade para que a Propriedade Intelectual sobre os
resultados obtidos para que pudessem pertencer à empresa e não mais as
detentoras do capital social. E no §3º, oportuniza a dispensa de
realização de licitação para venda dos ativos desta participação
societária, sendo que os recursos devem ser aplicados em pesquisa e
desenvolvimento ou novas participações societárias.
A partir do Artigo 6º até o Artigo 18, trata-se do estímulo à
participação das ICT no processo de inovação. A proposta traz
inovações relevantes, nas quais se destacam algumas na sequência. O
Artigo 6º trouxe também importantes modificações do texto anterior,
tratando dos contratos de transferência de tecnologia e licenciamento
para outorga de uso ou exploração desenvolvida pelas ICT e por
parcerias. A grande diferença está no § 1º, que exclui a exigência de
154
edital para contratação com cláusula de exclusividade e simplifica para
ser ofertado em forma de extrato em sítio eletrônico oficial da ICT.
Acrescenta no §1º-A, quando houver desenvolvimento conjunto com
empresas, esta poderá ser contratada com cláusula de exclusividade,
dispensando oferta pública, sendo já prevista a forma de remuneração
em convênio ou contrato, que na opinião desta autora, corrigiu uma
questão que parecia óbvia, já que as parceiras teriam o maior interesse
em obter a exclusividade, porém, carecia de uma previsão e permissão
explícita. Outro ponto que se destaca é a inclusão do §6º que obriga os
criadores, outros servidores, empregados ou prestadores de serviços a
repassarem os conhecimentos e informações necessários à efetivação do
contrato celebrado, sob pena de responsabilidade administrativa, civil e
penal, o que coloca em cheque a falta de compromisso de alguns
profissionais que não cumpriam estas obrigações.
O Artigo 8º trata dos serviços técnicos especializados que
dependerá de aprovação pelos dirigentes da instituição, o que obriga os
profissionais a observarem as regras institucionais, antes de desejarem
prestar serviços nesta área. De outro modo, abre a possibilidade do
profissional (pesquisador público), inclusive em regime de dedicação
exclusiva, exercer atividade de pesquisa em outras instituições, tanto em
outras ICT ou empresas, para exercer atividades remuneradas de
pesquisa, desenvolvimento e inovação, como na participação da
execução de projetos aprovados ou custeados com recursos previstos na
legislação, sendo definida sua participação financeira, nos termos do
Artigo 14 e 14-A.
Já o Artigo 9º tem previsão sobre acordos de parceria e acrescenta
no §1º os beneficiários de bolsa de estímulo à inovação, que além de
servidor ou empregado público, podem ser incluídos os alunos de curso
técnico, de graduação ou pós-graduação. Uma grande evolução de
pensamento ocorreu quanto à cessão dos direitos de propriedade
intelectual e a participação nos resultados, que autoriza no §3º,
conquanto, a cessão ao parceiro privado da totalidade dos direitos de
propriedade intelectual mediante compensação financeira ou não
financeira, desde que economicamente mensurável, desembaraçando
claramente as discussões da PI estar adstrita à instituição pública e da
mesma forma, possibilita a negociação, a "venda" dos direitos de
propriedade intelectual (PI), permitindo a opção de cessão, situações que
já ocorrem em universidades de países desenvolvidos. Este é um avanço
significativo na lei, de forma que, muitas vezes atrapalhava a execução
da parceria, já que o parceiro sempre desejava ter a PI, ou outras vezes
155
quando desenvolvido o resultado da pesquisa e protegido, em razão do
impedimento de cessão de direitos a PI poderia ficar anos na prateleira,
como ocorria nos Estados Unidos antes da Bayh-Dole e que foi alvo de
muitas críticas. Todavia, agora poderá ser explorada ou desenvolvida
por terceiros, auxiliando na disseminação de tecnologia e inovação. O
Artigo 9º-A incluiu a possibilidade dos órgãos e entidades dos entes da
federação conceder recursos, pagando diretamente aos pesquisadores,
por meio de outorga, convênio, contrato ou outro instrumento, em razão
do plano de trabalho aprovado. O Artigo 11, apesar de uma pequena
inclusão final, traz outra maleabilidade quanto à cessão dos direitos de
propriedade intelectual, que além ao próprio criador, poderá ser cedida a
terceiro mediante remuneração.
Agora no Artigo 14, §3º há previsão sobre as gratificações
específicas do pesquisador público em regime de Dedicação Exclusiva,
que poderão ser garantidas quando houver o completo afastamento de
uma ICT pública para outra ICT, desde que seja de conveniência da
instituição de origem. Outra inserção relevante é o Artigo 15-A que
determina que a ICT pública institua sua política de inovação, dispondo
sobre organização e a gestão dos processos que orientam a transferência
de tecnologia e a geração de inovações no ambiente produtivo, em
consonância com a política nacional de ciência, tecnologia e inovação,
como com a industrial e tecnológica. Este artigo expressamente obriga a
ICT a pensar suas políticas e planejamentos, tratando da temática,
inclusive com diretrizes e objetivos já definidos no parágrafo único do
respectivo artigo, como por exemplo, a atuação institucional neste
ambiente produtivo, a extensão tecnológica e a prestação de serviços, do
compartilhamento e permissão de uso, gestão da propriedade intelectual
e de transferência de tecnologia, entre outros. A obrigatoriedade de
organizar o fluxo procedimental também demonstra o anseio da
comunidade acadêmica em ter regras claras sobre tramitação e gestão
processual.
Na mesma visão reformadora, o Artigo 16 trouxe mudanças
cruciais para a gestão de política de inovação nas ICT e propriamente
dos NIT. Nele, observa-se a proposta de ampliação de sua competência
reforçando as particularidades da gestão de políticas e acordos de
inovação, promoção e acompanhamento da relação entre U-E, nos
incisos VII ao X. Esta reafirmação também é ecoada no §2º, que
explicitamente prevê a possibilidade de representação institucional, por
delegação, ao gestor do Núcleo de Inovação Tecnológica, no âmbito da
política de inovação, o que certamente dará ao gestor uma maior
156
liberdade de atuação, inclusive, se o NIT tiver uma personalidade
jurídica própria. Quanto a este último ponto, o § 3º deixa evidente o
interesse da comunidade acadêmica em dar maior autonomia ao NIT e
celeridade nas relações com outras instituições, moldando-se aos
modelos de outros países, como de Israel, dando o especial tratamento
jurídico adequado para uma organização que cuide de temas ligados à
dinâmica do desenvolvimento econômico e celeridade nas relações com
o setor privado. Em momento oportuno, foi tratado de modelos de
outros países e demonstrará o quanto isto é salutar nesta relação U-E.
Neste mesmo intuito, o Artigo 18 também reflete solução para
problemas encontrados na execução da atividade de inovação, quando
trata de forma mais direta sobre os recebimentos de receitas e
pagamento de despesas decorrentes dos acordos e contratos, cessão de
PI, bolsas, gratificações, bem como, pagamento de despesas e os
pagamentos devidos aos criadores etc. Principalmente, nesta seara,
muitas instituições não previam em seu orçamento a manutenção dos
pagamentos referentes aos direitos de propriedade intelectual, ou tinham
dificuldades em classificar estas receitas oriundas destes direitos que
algumas vezes eram diluídos na receita geral da instituição. No mesmo
sentido, possibilita à fundação de apoio à captação, gestão e aplicação
das receitas da ICT, por delegação, devendo a aplicação ser exclusiva
para dar suporte à pesquisa, desenvolvimento e inovação.
No que se refere ao estímulo à inovação nas empresas, no Artigo
19 há o acréscimo do §2º que elenca os instrumentos de estímulo à
inovação nas empresas, acrescendo àqueles da redação legal anterior,
tendo além da subvenção econômica, financiamento, participação
societária, o bônus tecnológico, a encomenda tecnológica, uso do poder
de compra do Estado, incentivos fiscais, cessão de bolsas, fundos de
investimentos, fundos de participação e títulos financeiros, incentivados
ou não, previsões de investimentos em P&D.
Buscando estimular a relação com a comunidade externa, o
Artigo 20 incluiu a possibilidade de contratação de outra ICT, entidade
de direito privado sem fins lucrativos ou empresas, com vistas a realizar
atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação, e esta contratação
destas instituições poderá ser concomitante. Previsão importante foi a
adição do Artigo 20-A que se destinou a tratar da possibilidade de
dispensar o procedimento licitatório quando a Administração Pública
contratar serviços ou fornecimento de bens com micro, pequena e média
empresas obedecendo aos requisitos ali determinados.
157
No tocante ao inventor independente, previsto no Capítulo V da
Lei de Inovação, traz uma definição melhor desta ideia adicionando a
inserção no mercado como outra dimensão para avaliação sobre a oferta
do inventor, no caput do Artigo 22. E este estímulo está mais bem
alicerçado no Artigo 22-A, que autoriza os entes da federação, as
agências de fomento e ICTS públicas a apoiarem os inventores que
possuem depósito de patente de sua criação, inclusive, em questões
sobre orientação para a transferência de tecnologia para empresas já
constituídas, assistência para constituição de empresas com intuído te
produzir o objeto da invenção, análise de viabilidade técnica e
econômica do objeto de sua invenção, entre outros.
Quanto às disposições finais da Lei de Inovação, convém pontuar
a inclusão dos incisos V e VI, do Artigo 27, que da mesma forma,
requer simplificação de procedimentos na gestão de projetos de C,T&I e
no controle de resultados, também incluiu a promoção do
desenvolvimento e difusão das tecnologias sociais e fortalecimento da
extensão tecnológica para inclusão produtiva e social. Prezando ainda,
pela celeridade e simplificação, conforme o princípio, já citado no início
destes comentários e o Artigo 27-A agrega os procedimentos de
prestação de contas a seguirem estas formas simplificadas, sugerindo o
envio eletrônico de informações.
Conforme mencionado, a proposta também abarca mudanças em
outras legislações já citadas. Igualmente, depois da Lei de Inovação,
outra lei que necessitava mudanças era a Lei de Licitação, que é muito
criticada e apontada como barreira para desenvolver pesquisa e
contratações neste âmbito. Portanto, a alteração nesta lei trouxe a
definição sobre o que seriam os produtos de pesquisa e
desenvolvimento, acrescentando o Inciso XX, ao Artigo 6º. Esta
definição auxilia no tratamento especial para estes produtos,
principalmente, na forma de aquisição. Tratou também da dispensa de
licitação, Artigo 24, alterando o Inciso XXI que possibilita a aquisição
ou contratação de produto para pesquisa e desenvolvimento, limitados
em 20% do valor de tomada de preços no caso de obras de engenharia.
Outra mudança indicada no §3º, do mesmo Artigo 24, permite a
aplicação de procedimentos especiais previstos em uma regulamentação
específica para obras de engenharia.
Sabe-se que uma inquietação dos profissionais que querem
desenvolver pesquisa e inovação está no procedimento de licitação
como já foi discutido, e conforme sugerido, as alterações previstas pode-
se satisfazer e resolver a inquietação com a possibilidade de aplicar o
158
Regime Diferenciado de Contratações. Com o acréscimo do Inciso VII
ao Artigo 1º, o RDC poderá ser aplicado para "ações em órgãos e
entidades dedicados à ciência, à tecnologia e à inovação",
definitivamente houve um grande avanço.
A alteração à Lei 8.745/1993 amplia a oportunidade de instituição
voltada para pesquisa, desenvolvimento e inovação contratar
temporariamente pesquisador ou técnico, com nível tecnológico ou
intermediário, nacional ou estrangeiro baseado em projeto de pesquisa
com prazo determinado. Esta abertura para contratação visa aumentar as
chances de a universidade poder receber pesquisadores de outras regiões
e países para desenvolverem projetos específicos sem precisar esperar
por concurso público. Isso representa um ganho excepcional para a
pesquisa.
Voltando-se sobre o tema de importação de produtos para
pesquisa, houve uma preocupação em alterar artigos da Lei 8.958/1994,
Lei 8.010/90 e Lei nº 8.032/90. Quanto à primeira, que trata das relações
entre as instituições federais de ensino superior e de pesquisa científica e
tecnológica com as fundações de apoio, esta prevê um tratamento
prioritário e procedimentos simplificados para o processo de importação
e de desembaraço aduaneiro de bens, insumos, reagentes, peças e
componentes para a pesquisa científica e tecnológica ou projetos de
inovação. Quanto as duas últimas legislações, estas tratam, em síntese,
sobre isenção e redução de impostos nas importações, Imposto sobre
Produtos Industrializados e do adicional de frente da marinha mercante
referente às importações de máquinas, equipamentos, aparelhos e
instrumentos, como peças de reposição, acessórios, matérias-primas e
produtos intermediários relacionados à pesquisa científica, tecnológica e
de inovação, a ser realizado pelo CNPq, cientistas, pesquisadores, ICT e
empresas na execução de projetos de P, D&I. Também inclui a garanti
da dispensa de exame de similaridade, emissão de guia de importação e
controles prévios ao despacho aduaneiro.
No que se refere ao Estatuto do Estrangeiro, uma alteração
importante foi a encontrada no Artigo 13 da Lei 6.815/1980, ampliando
o visto temporário para pesquisador sob regime de contrato e de bolsista
vinculado a projeto de pesquisa, desenvolvimento e inovação concedida
por órgão ou agência de fomento.
Para finalizar estes comentários, uma das principais alterações
para modificar a carreira do profissional universitário foi à ampliação
das horas em que o professor/pesquisador pode dedicar ao exercício da
pesquisa e da extensão, que poderá chegar até 416 horas nas instituições
159
federais de ensino superior e, estes professores poderão receber também
bolsa de fundações de apoio credenciadas. Outra importante abertura
para que os pesquisadores possam receber mais incentivos para
realizarem suas pesquisas.
Constata-se com estes comentários que houve uma ampla
discussão e visão do que a comunidade acadêmica e o setor privado
desejavam e não havia sido contemplado ou garantido pela Lei de 2004,
bem como foram vislumbradas outras regras sobre o tema. Com
algumas decisões ousadas sobre a maior liberdade de atuação das
instituições, quanto a personalidade jurídica, cessão de direitos de PI,
participação no capital de empresas, entre outros se busca promover as
parcerias entre as ICT (públicas e privadas) e as empresas e
definitivamente dinamizar o aproveitamento das atividades de pesquisas
a serem aproveitados pela iniciativa privada. Isso certamente auxiliará
no aumento da competitividade frente ao mercado internacional no
desejado desenvolvimento econômico e social do país e na melhoria nos
índices e pontuações em ranqueamentos internacionais, portanto, espera-
se que após a publicação desta lei, que a partir de janeiro de 2016, passe-
se uma década com maior autonomia e que traga melhores resultados
para o país.
161
3 A RELAÇÃO UNIVERSIDADE E EMPRESA E GESTÃO DA
TRANSFERÊNCIA DE CONHECIMENTO E
TECNOLOGIA We may conclude that together both science and
technology give evidence of a society increasingly
curious, increasingly questing, increasingly on the
move, on the make, having a go, increasingly
seeking to experiment, wanting to improve. This
may be the prime significance of the new
popularisers of science and technology […]. Peter
Mathias (1972, p.80)85
3.1 Aspectos que influenciam a relação entre universidade e
empresa no ambiente de inovação brasileiro
Deve-se reconhecer que para desenvolver este ambiente de
inovação, conforme comentado no primeiro capítulo, convém ampliar a
discussão sobre a evolução da ciência e pesquisa no país, a estrutura das
instituições de ensino, bem como, do processo de industrialização
brasileiro que direcionaram o atraso tecnológico no país.
Ora, como se demonstrou em momento anterior a inovação
conjuga a ciência, pesquisa, tecnologia e a indústria para gerar novos
produtos, processos e serviços. E não se deve desprezar a história, pois,
no caso do Brasil, houve uma tardia implantação de universidades no
país e logo se verá que as instituições também demoraram a serem
criadas e consolidadas para o desenvolvimento da ciência. Da mesma
forma, houve industrialização tardia que afetou e influenciou o
desenvolvimento nesta área no país. Destarte, não é nenhuma surpresa
ver que as políticas de inovação apenas obtiveram mais vigor e se
articularam a partir de 2003 com a Política Industrial, Tecnológica e de
Comércio Exterior (PITCE).
Aponta Silvia Velho (1996) que o sistema científico composto
por universidades, institutos de pesquisas e instituições governamentais
de apoio (CNPq e CAPES) e de outro lado, o sistema produtivo,
representado pelas empresas privadas e públicas direcionadas na
85
“Podemos concluir que, tanto a ciência como a tecnologia dão evidência
de uma sociedade cada vez mais curiosa, cada vez mais em busca, cada vez
mais em movimento, em fazer, ir, cada vez mais, tentar, experimentar,
querendo melhorar. Este pode ser o significado principal dos novos
divulgadores da ciência e da tecnologia.”(tradução livre)
162
produção de bens de consumo e serviços, desenvolveram-se de forma
independente, com rara articulação. Conseguintemente esta ausência de
relação entre os setores resultou numa dependência aos países
exportadores de tecnologias, portanto, o processo de industrialização
brasileiro foi baseado em importação de tecnologias (VELHO, 1996, p.
41; 42). Pode-se assim afirmar que houve uma falha grade de
comunicação e planejamento, uma dissociação entre as políticas de
inovação industrial e à política de exportação, sendo necessária a revisão
de regras para incentivar a inovação. O que gerou ao longo das décadas
um baixo investimento em infraestrutura de serviços técnicos e
tecnológicos e não existiram centros de inteligência para atrair novos
projetos de empresas transnacionais, o que transparece na gritante
necessidade de estimular a Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) no país,
a qual está abaixo da média internacional.
Atualmente, a discussão trata também da desindustrialização no
país, que é consequência dos traços negativos trazidos ao longo do
tempo ante a estrutura econômica brasileira e seus impactos no exterior,
como a inércia da estrutura produtiva, devido à precária inserção nas
novas tecnologias ancoradas na microeletrônica, por exemplo, e na
heterogeneidade na evolução da produtividade e comércio exterior, em
que a produtividade ampara-se em setores produtores de commodities86
, preponderantemente, agroexportador. Isso não supriria a demanda de
consumo de massa que vigora nos dias atuais, já que a maioria desta
demanda estaria sendo abastecida com produtos importados, o que
potencialmente abalaria a sua sustentabilidade (CGEE, 2013, p. 36; 37)
Neste capítulo iremos permear estes dois lados dos setores quanto
ao desenvolvimento e inovação: o público e o privado, representado o
primeiro pelas universidades públicas e o segundo pelas empresas.
3.2 Políticas científicas do governo brasileiro
No caso brasileiro, admite Silvia Velho (1996, p. 43; 44) que as
políticas científicas implementadas a partir da década de 1960,
principalmente, após o golpe militar são paradoxais, uma vez que apesar
ser um momento que restringiu direitos de um lado, de outro,
propiciaram saltos qualitativos para a ciência brasileira. Nestes anos,
86
Relacionadas a mercadorias utilizadas para produtos primários como
minérios e agrícolas.
163
então, se configurou um Sistema Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico, envolvendo a geração de amplo programa de
pós-graduação nas universidades federais, a criação do Fundo Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e da Financiadora de
Estudos e Projetos (FINEP). O fundo foi criado pelo Decreto-Lei nº
719/1969 para apoiar programas e projetos de desenvolvimento
científico e tecnológico. A FINEP foi criada em 1967, para
institucionalizar o Fundo de Financiamento de Estudos de Projetos e
Programas, criado em 1965, que posteriormente, substituiu e ampliou o
papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES) para gerir o Fundo de Desenvolvimento Técnico-Científico
(FUNTEC), constituído em 1964 com o fim de financiar a implantação
de programas de pós-graduação nas instituições no país87
. Foi também
neste momento que se incentivou a aproximação com o setor privado,
com a preocupação em formar mão de obra qualificada, porque
acreditou-se que através da Ciência e Tecnologia, poderiam alcançar um
desenvolvimento nacional.
Não se pode esquecer que na década de 1990 houve uma intenção
do governo federal em modernizar e tornar o setor produtivo mais
competitivo e essa foi a postura mais nítida do Governo Collor, o
primeiro presidente eleito de forma direta na nova fase democrática que
vivia o país. Velho (1996, p.54; 56) ao comentar a política industrial de
Collor, relembra que a associação entre empresa e universidade foi
colocada como estratégia importante, visando não apenas a
modernização tecnológica do parque industrial brasileiro, como
também, o indicativo de uma maior participação do setor privado em
investimentos em Ciência e Tecnologia, porém, na realidade pouco se
concretizou.
Partindo desta premissa, grande parte da pesquisa brasileira está
nas universidades ou institutos públicos de pesquisa e a Lei de Inovação
tratou de forma particular estas Instituições de Ciência e Tecnologia
(ICTs), conforme antecipadamente comentado. Dedicou uma
preocupação quanto à titularidade de ativos intangíveis e "forçou" uma
formalidade maior na relação entre estas entidades e o setor privado.
Percebeu-se que as instituições de pesquisas apesar de já manterem
87
As informações foram colhidas no sítio eletrônico da FINEP. Disponível
em:<http://www.finep.gov.br/pagina.asp?pag=institucional_empresa>
Acesso em: 04 abr. 2015.
164
relação harmonizada com o setor privado, muitas vezes não se discutia
sobre a garantia a propriedade das tecnologias envolvidas, e em certa
medida, pesquisadores apenas queriam ver equipados seus laboratórios e
obterem a constância de bolsas de seus acadêmicos. Alguns projetos de
pesquisa que criavam conceitos importantes e que poderiam gerar um
benefício econômico maior para a universidade, como patentes,
cultivares, desenhos industriais entre outros, acabavam não entrando na
pauta de negociação e as empresas "herdavam" estes ativos. Com a
legislação específica, este tipo de situação precisou ser estruturado e
formalizado e a criação de um órgão para gerir a transferência de
tecnologia impôs uma observância maior para as relações estre a
universidade e setor privado, que valorizou a apropriação do
conhecimento pela instituição de pesquisa.
3.3 O processo de industrialização brasileiro
Para discorrer sobre o processo de industrialização no país, volta-
se ao período colonial e da dominação portuguesa que não incentivou a
educação superior no território colonial e não permitiu o
desenvolvimento de indústrias, já que a colônia servia de mercado
consumidor da metrópole. Este quadro só veio ter uma mudança quando
a família real se instalou no Brasil, porém, nada expressivo. Conforme
assevera Suzigan (1988, p.01) o Brasil é considerado um latecomer (um
retardatário) no processo de industrialização, como muitos países da
América Latina.
O processo de industrialização brasileira teve seu início, de fato,
na segunda metade do Século XIX. Deve-se observar que existia uma
indústria incipiente, entretanto, a partir deste período é que o setor
industrial recebeu uma atenção do governo federal. O grande impulso
foi com o governo de Getúlio Vargas a partir de 1930, que perdurou até
metade dos anos 1950. Anterior a este período, a base econômica do
país era agro-exportadora de café, o que permitiu acumulação
monetária, porém, com a queda da Bolsa de Nova Iorque, em 1929, que
também refletiu na economia brasileira, o governo e investidores (até os
próprios cafeicultores) viram a necessidade de diversificar os
investimentos em outros setores da economia no país. O
desenvolvimento de infraestrutura facilitou a instalação de fábricas e o
escoamento de mercadorias, o que atendeu ao crescente mercado
consumidor interno, principalmente, no período das grandes guerras
mundiais, pela escassez e dificuldade na importação.
165
A partir da metade dos anos 1950 até a década de 1970, os
investimentos em infraestrutura continuaram com foco na questão de
rodovias e hidrelétricas. Em razão da necessidade de grandes
investimentos, houve abertura ao capital estrangeiro, o qual permitiu às
empresas multinacionais e montadoras de automóveis se instalarem no
país, como a Vemag (Veículos e Máquinas Agrícolas S.A.), a Ford do
Brasil (que deixou de importar seus produtos e a montar no país),
Volkswagen do Brasil (1953) etc, o que facilitou a instalação de fábricas
e indústrias no ABC paulista (Santo André, São Bernardo, São
Caetano), com aumento de um crescimento urbano nos anos 60. Outro
ponto marcante do período foi à construção de Brasília no governo de
Juscelino Kubitschek (1956-1961).
Certamente, a Segunda Guerra Mundial propiciou este ambiente:
a escassez do petróleo e as dificuldades de importação obrigaram o
governo federal a assumir um papel mais ofensivo, constituindo a
indústria de base e empresas de serviços essenciais como, a Companhia
Siderúrgica Nacional, em 1940/1; a Vale do Rio Doce, em 1942, a
Hidrelétrica do Vale do São Francisco em 1945; a Petrobrás S.A, em
1953; a Embraer, em 1969; a Telebrás S.A, em 1972 entre outras.
A década de 1980 ficou conhecida como "década perdida", com
pouco crescimento mundial, e no país com uma inflação "galopante".
Houve também descentralização do parque industrial, em que as
indústrias buscaram encontrar outros pontos de produção com mão de
obra mais barata e incentivos fiscais, deslocando-se para o interior de
São Paulo e Nordeste. Com a política industrial adotada no país, o
governo garantia uma competitividade que não era real, como fatores
naturais de preço e qualidade, o que levou o empresariado a deixar de
investir em modernização e competitividade, somadas à política de
importação/substituição, mantendo o empresariado brasileiro em uma
letargia comparado às empresas estrangeiras. Mas, este período de
desilusão não ocorreu apenas no Brasil. Chang (2003) indica que o
periodo 1960 a 1980 foi um periodo de políticas "ruins" em grande parte
do globo terrestre que o crescimento desacelerou acentuadamente, sendo
fortemente sentida nos países em desenvolvimento. Concluiu que as
reformas políticas neoliberais se apresentaram incapazes de cumprir a
promessa de crecimento econômico (p. 212).
O comodismo empresarial foi brutalmente abalado nos anos
1990, a exemplo do setor automobilístico, que sentiu um choque através
da abertura do mercado externo, no governo de Fernando Collor, que
apesar de todos seus tropeços, teve clara intenção de modernizar e tornar
166
o setor produtivo mais competitivo. Reconheceu que para desenvolver a
indústria, precisava da aproximação entre o sistema produtivo e o
sistema nacional científico e tecnológico. Para evidenciar sua posição,
Collor expressou algumas palavras que ressoaram nos ouvidos do setor
automobilístico brasileiro, quando chamou os carros brasileiros de
"carroças". Esta abertura ocasionou "um verdadeiro pânico no setor
industrial que se viu repentinamente, sujeito a comparações com a
indústria internacional de bens de consumo", como explica Silvia Velho
(VELHO, 1996, 52; 56). A década de 1990 também foi marcada pela
privatização e continuidade da descentralização industrial. Isto também
evidencia o quadro político internacional dos anos 1990, com término da
Guerra Fria, queda do Muro de Berlim (1989), consolidação da União
Europeia pelo Tratado de Maastricht88
(1992), criação do Mercosul
(1991), entre outros eventos, prenunciaram que o mundo deixava de se
preocupar com questões de ordem político-ideológicas e militares e
vislumbrava então, uma nova ordem econômico-tecnológica que estava
latente.
De outro modo, a partir dos anos 2000, verificou-se um
crescimento mais tímido das indústrias, sendo que o governo federal
continuou incentivando as privatizações, afastando-se cada vez mais da
posição intervencionista, excetuando o caso da indústria de petróleo e
naval.
Em resumo, a insistência no processo de inovação é crucial para o
país, pois com a globalização, a inovação passa ser uma ferramenta
fundamental para garantir a competitividade, bem como, uma posição de
destaque no cenário internacional. Deve-se vislumbrar um futuro
econômico não mais sustentado apenas por commodities, mas também
em tecnologias, como ocorreu nos países asiáticos. Vilela (2011, p.
295) destaca que diferentemente do período dos anos 1970 e 1980, em
que as empresas viveram da adaptação de tecnologias e não buscaram
implantar centros de pesquisa e desenvolvimento, sofrem ainda nos dias
de hoje este impacto, porque, se a cultura de pesquisa tivesse sido
implantada efetivamente no período anterior, isso as auxiliaria no
sucesso comercial e competitivo com os países dos quais importavam,
88
O tratado assinado em 07 de fevereiro de 1992, na cidade holandesa
denominada Maastricht, que representou um marco na união da Europa
fixando a integração econômica e conseqüente unificação política. Assim a
União Europeia substituiu a antiga Comunidade Europeia.
167
no entanto, apenas viveram da adaptação de tecnologias. Isso as obriga,
agora, a buscarem apoio nas universidades, criando uma expectativa e
cobrança das instituições de ensino e pesquisa para resolver esta falha,
este gap tecnológico.
3.4 A Relação Universidade e Empresa: os dois lados da moeda
Como se demonstrou acima, a inovação conjuga a ciência,
pesquisa, tecnologia e a indústria para gerar novos produtos, processos e
serviços. Evidenciando a teoria da Tríplice Hélice, as pás necessitam
funcionar num mesmo ritmo, o que possibilita uma interação completa.
Quando se trata da relação entre a universidade (aqui a relevância
é a pública) e o setor privado, há sempre um choque de visões e
interesses, porque cada entidade está inserida em um contexto jurídico-
organizacional que exige ações diferenciadas. A instituição pública tem
que realizar suas atividades estritamente na letra da lei e o setor privado
tem maior liberdade de atuação, desde que não transgrida a legislação
vigente. Essa diferente posição é uma das faces da dicotomia entre o
público e o privado.
3.4.1 A Velha dicotomia entre público e privado: a influência nas
relações entre as instituições públicas e privadas
Partindo do pressuposto que a Tríplice Hélice se desenvolve não
apenas pelos sujeitos envolvidos, como também leva em conta a inter-
relação entre estes agentes envolvidos, importante verificar qual a
intensidade e nível da relação dos mesmos e quais as dificuldades para
realizar ou manter estas relações em efetivo funcionamento. Com base
no modelo da Tríplice Hélice, sabe-se que os agentes motores são: o
governo, empresas/setor privado e as instituições de ensino e pesquisa.
Nos temas tratados anteriormente, principalmente no primeiro capítulo,
ficou evidente qual seria a função de cada agente motor, sendo o
governo presente com suas políticas, leis e regulamentos, investimentos;
as empresas com investimentos e principalmente com a visão do
mercado; e as instituições de ensino com conhecimento, novas teorias,
ideias e processos. Aqui se justifica a afirmação de Cristovam Buarque
sobre a universidade: "A universidade não perdeu a tradicional
qualidade de ensino que tinha, mas perdeu sua função ao deixar de
formular perguntas e de apresentar respostas aos problemas novos,
porque deixou de ser vanguarda" (Cristovam Buarque, 2014, p. 93).
168
Reconhece-se que a maiorias das universidades brasileiras que
estão em destaque no cenário nacional quanto à transferência de
conhecimento e tecnologia são públicas, devendo seguir regras
restritivas e quando necessitam se comunicar com o "externo", como o
setor privado, geralmente causa um descompasso de comunicação como
no processo inovativo que precisa de uma dinâmica peculiar.
Compreende-se que se trata de uma questão híbrida que envolve
instituições públicas e privadas com regras, estruturas, visão diferente
que precisam ser conjugadas. A inovação necessita uma flexibilidade,
ações negociais e não há muito espaço para a rigidez que estas
instituições públicas impõem com seu modelo jurídico.
Na verdade, não existe falta de instrumentos legais para fomentar
e facilitar a relação, uma vez que o legislador em 2004 dedicou a Lei nº
10.973/2004 para avançar nesta questão, previu parcerias como um
instrumento legal desta relação, como também, o compartilhamento de
laboratórios entre outras. Acredita-se também que os interesses não são
diversos, como muitos afirmam, ou seja, a instituição de ensino quer
realizar um papel importante na sociedade que está inserida, seja na
formação, no ensino e ou na pesquisa. Apesar de críticas sobre a
pesquisa ser "desinteressada" (desconectada) dos problemas atuais,
muitas universidades já realizam a pesquisa aplicada, mas, a primeira
(pesquisa básica) jamais poderá ser totalmente desprezada pela
academia, uma vez que é igualmente essencial, pois a partir dela, novos
conceitos e teorias surgem. Do mesmo modo, as empresas, apesar de sua
natureza econômica e visão de lucros, são parte desta sociedade e são
convocadas para exercer um papel social em relação aos empregos,
contribuição com a previdência, meio ambiente, responsabilidade social
etc. Assim, a afirmação de que o setor privado deseja somente "usar" os
conhecimentos e investimentos na pesquisa de forma predadora, fica
prejudicada também, embora casos extremos existam. Admite-se que
existe um interesse comum em participar de um desenvolvimento
econômico (incluindo aqui a terceira missão citada por Etzkowitz)
gerando capital intelectual, produtos e serviços para uma sociedade. A
problemática está nas estruturas enrijecidas que dificultam a
comunicação entre os agentes. Aqui se tece uma crítica mais
aproximada das instituições públicas, da forma e rígida que é limitada a
uma caixa de regras com dogmas e que devem ser superadas. Pensando
nesta superação, inicia-se a discussão sobre a dicotomia do público e
privado.
169
Ao retomar as palavras de Norberto Bobbio (1987, p. 16) há a
afirmação que a clássica dicotomia entre o direito público e privado
derivam do Corpus Iuris (Justiniano), 89
com definição de singulorum utilitas (uso privado) e o status rei publicae (status do Estado). Desta
forma, há prévia diferenciação entre o que pertence a um grupo, ou
coletividade, e o que pertence a uma pessoa, individualizada.
Reconhece-se que o termo público tem maior peso na atualidade.
Contudo, nem sempre foi desta forma. O Direito Privado teve
predominância quando o Direito Romano foi recebido e difundido na
parte ocidental através do direito das Pandette, que se voltam mais para
as questões de Direito Privado: família, propriedade, contrato e
testamento. Portanto, o direito positivo e histórico (Corpus Iuris)
transformou-se com o tempo em um direito da razão, o direito
propriamente discutido e evidenciado nos tratados de Hegel (direito
abstrato) e Marx (contrato), por exemplo; bem como, o cuidado que o
Estado ainda tem em questões de desapropriação, privilegiando o direito
de propriedade/privado sobre o público ou em questões contratuais
livres, seja de compra e venda entre os "súditos", desde que não violem
a lei, citando respectivamente Bodin e Hobbes. Mesmo porque, Bobbio
(1987, p.21-24) afirma ainda que o Direito Público, inicialmente, era
encontrado dentro das questões de Estado, do Poder Político, e passou a
ter maior significância após a maior ingerência do Estado na regulação
dos indivíduos. Assenhorou-se do espaço conquistado pela sociedade
civil burguesa, afastando-se da concepção de estado mínimo.
Houve na verdade um sistema de normas (de Direito Público), na
formação do Estado moderno, em que o Direito Romano não conseguiu
resolver questões entre o Estado e a Igreja, reinos e impérios, entre
outros, e precisava-se de "outra forma de direito" menos individualista
(BOBBIO, 1987, p. 21; 25). Rudolf von Jhering (1943, p. 161- 162)
também defendeu a primazia do Direito Privado, já que a concepção de
Estado, como se tem atualmente, denota a concentração de poder, seja
da criação das leis, da organização e da coerção que nasceram com o
89
Justiniano foi um imperador romano que diante da necessidade de
unificar e expansão do império bizantino, resolveu criar uma legislação para
atender os litígios de sua época. E assim, designou grupo de estudiosos para
redigir, compilar e explicar inúmeras normas que indica a ideia de
jurisprudência atualmente, em compilações como o Corpus Iuris Civilis.
170
Estado Moderno. Esta diferenciação na deliberação de questões que
envolviam o Estado e o indivíduo foi "resolvida" com a divisão dos
interesses nas sociedades modernas e que ficou bastante evidenciada no
liberalismo e também na visão do Estado como um ente superior, com
natureza própria e que não se confunde com os indivíduos. Portanto, os
interesses deste ente poderoso (Estado) passaram a serem públicos.
Sendo público o direito que estes interesses estão relacionados, de outro
lado, os interesses individuais foram considerados direito privado.
Ferraz Júnior (2007, p. 138) destaca que esta visão tem origem nas
concepções modernas que contrapõem a sociedade e o indivíduo,
ressaltando que possuem interesses diversos. Para a primeira, os
interesses são comuns e neutros, em que abarcam a coisa pública e
Economia, contrapondo-se ao interesse privado, ao "egoísmo" dos
particulares.
De outro lado, Bobbio (1987, p. 26; 27) aponta que esta
dicotomia por vezes vem sido "ameaçada", nas duas vertentes as quais o
público invade a esfera privada e vice-versa. Um exemplo de
predominância do público sobre o privado está nas questões de
regulação da Economia que é denominado de "publicização do
privado", o contraposto à "privatização do público", em que grupos de
pessoas, como sindicatos (contratos coletivos) e partidos (coalizões de
governo) se utilizam de aparatos públicos para alcançarem interesses
próprios. Veja que a divisão tem um significado valorativo, que são
descritos como contraditórios e entendidos como tal, uma vez que um
ente não pode ser ao mesmo tempo público e privado, e, também que
este ente não poderá estar fora desta classificação e é necessário se
"enquadrar" em um ou outro caso (BOBBIO, 1987, p. 20), portanto, não
se fala de uma situação híbrida.
Gisele Mascarelli Salgado (2014) ressalta que existem dois
critérios para classificar os direitos em público e privado, seja o critério
do interesse e o critério da soberania ou dominação. As teorias se
dividem neste mesmo sentido. A primeira, teoria do interesse, teve
Jhering como fundador, objetivava os interesses privados ou públicos. A
teoria da dominação, que oposta à primeira que tem tem seu foco no
sujeito, o Estado é soberano e deve ditar normas para o bem comum.
Defende também que esta classificação não é derivada da técnica. Na
171
realidade, chama-a de imaginária
90, mas envolve uma questão filosófica
que tem como pano de fundo a construção social e histórica, apontando,
inclusive, que autores modernos como Kelsen, Radbruch, Ross, Reale e
Ferraz Júnior, de algum modo, manifestam sua insatisfação com a
classificação, apesar de a utilizarem em seus estudos.
Por sua vez, quem realmente supera esta discussão e apresenta
uma alternativa diversa é Paulo Dourado Gusmão (1997), que defende
um terceiro tipo de direito que denomina de Direito Misto.
Considerando a visão da teoria dos interesses, Gusmão adverte que não
se pode desprezar a ordem econômica atual e o que a globalização
acarretou ao logo dos anos, em que as fronteiras culturais e econômicas
foram diminuídas. Portanto, as questões sociais e internacionais
necessitam de uma nova visão, de classificação mais atualizada e a
limitação rígida entre o público e o privado deve ser repensada. Como
exemplo, Gusmão cita a descentralização do Direito Civil com seus
estatutos especializados e uma constitucionalização do Direito Privado,
quando se impõe a este, princípios constitucionais reguladores de suas
relações que são de particulares. Acrescenta-se a visualização dos
clássicos direitos que ora necessitam de uma lupa de Direito Privado,
ora de Direito Público, como o Direito de Família, do Trabalho,
Sindical, Econômico, Agrário, Aeronáutico, entre outros. Gusmão
propõe um Direito Misto, pela própria natureza mista (GUSMÃO, 1997,
p. 224). O Direito Misto será identificado tanto pelo critério de tutela de
interesse (público e privado), tanto por aqueles constituídos por normas
e princípios de Direito Público e de Direito Privado, ou ainda, de Direito
Nacional e de Direito Internacional. Para os primeiros (princípios) estão:
o Direito de Família, do Trabalho, o Profissional, o Sindical, o
Econômico e o Agrário. Para o segundo estão: o Direito Marítimo, o
Aeronáutico, o Falimentar e o Direito Nuclear (com abrangência
internacional e público interno). Isso demonstra que a dicotomia não
responde à realidade jurídica aplicada no Brasil. Inclui-se aqui o
denominado Direito Industrial, que na visão de Gusmão, abrange o
Direito de Propriedade Industrial, considerando-o um direito misto, já
que tem normas de Direito Público e Privado que atendem ao interesse
90
Em suas palavras: “A classificação em esferas de direito privado e direto
público pode ser entendida como uma significação imaginária social que
ordena o modo de se entender o Direito, que é uma instituição imaginária
social.”(p.12)
172
da empresa, mas também, o interesse social e público que ao mesmo
tempo possui normas penais que protegem marcas, patentes e punem a
concorrência desleal. Também admite critérios de normas
internacionais, pois, como fonte de direito, além da lei e regulamento,
possuem as convenções internacionais, como a Convenção de Paris e
Berna (GUSMÃO, 1997).
Neste prisma, pode-se incluir as relações e questões atinentes à
inovação, que envolvem acordos com pessoas jurídicas tanto de Direito
Público quanto Privado, com interesses de natureza diferentes, porém,
não exatamente conflitantes, uma vez que conjugam normas das esferas
públicas e privadas, como ocorre com acordos entre universidades
públicas e empresas. Denis Borges Barbosa admite até o Direito da
Inovação, quando apresenta comentários à Lei nº 10.973/2004
(BARBOSA, 2006, p. 01). Ele indica que um dos objetivos da lei, criada
para obedecer à norma constitucional (Art. 218 e 219), é "propiciar a
cooperação entre os atores do processo inovador, reduzindo as barreiras
institucionais que impedem a via de mão dupla entre setor privado e
ICTs".
É neste ponto que este estudo compreende a dificuldade destas
relações, já que esta dicotomia entre público e privado reflete na
natureza jurídica das instituições que se comprometem a inovar. No
entanto, encontram barreiras na sua composição estrutural, mais
propriamente as ICTs públicas, que possuem normas rígidas quanto à
contratação e procedimentos e são confrontadas com a dinâmica da
inovação, que exige maior agilidade e flexibilidade nas relações
sinalagmáticas.
Entretanto, a dificuldade maior não está na identificação se este
ou aquele direito é misto ou não. Apesar de compreender bem a noção
de Gusmão, a dúvida está em como enfrentar estas relações que
envolvem agentes de naturezas jurídicas diferentes em situações híbridas
e alcançar o fim comum que é a inovação. Se partir para o radicalismo,
as ICTs públicas não estariam habilitadas para desenvolverem este papel
e deveriam ser excluídas desta "nova missão", o que seria uma visão
radical, já que as melhores pesquisas e equipes são encontradas nas
universidades públicas. Igualmente, esta decisão seria contrária ao que o
legislador desejou na Lei de Inovação, que direcionou o texto às ICTs
públicas. Prevendo estes descompassos a lei apresentou alternativa,
como a faculdade de celebração de parcerias para realizar pesquisas
conjuntas científicas e tecnológicas, desenvolvimento de tecnologia,
produto ou processo (Art. 9º). Cita-se também, a licença remunerada do
173
pesquisador no Artigo 15, ou ainda, a possibilidade da instituição ceder
seus direitos de propriedade intelectual aos seus pesquisadores a título
não oneroso (Artigo 11). Apesar das ICTs privadas utilizarem esta
mesma norma para orientar suas atividades conjuntas com o setor
privado, inclusive instituindo núcleos/agências de inovação, prevista no
Artigo 16, as instituições privadas possuem liberdade maior em compor
seus contratos e minimizar conflitos. Fica evidente que a grande barreira
não está no interesse destes dois agentes se comunicarem (empresas e
universidades públicas), mas na utilização das ferramentas de
comunicação através de suas estruturas, particularmente das
universidades. É como se as instituições agissem, de forma figurada,
utilizando a tecnologia do rádio amador, com o argumento de que assim
prevê a legislação que limita de certa maneira sua atuação, por mais que
saibam que necessitam realizar uma conversa através de vídeo
conferência, que já está à disposição.
Convém salientar que este estudo não pretende apresentar a
discussão entre público e privado de uma forma profunda e exaustiva,
mesmo porque ela não é nova e necessitaria de uma investigação mais
profunda e direcionada. Todavia, busca-se aqui aproximar esta discussão
para a aplicação neste ponto específico da relação entre universidade-
empresa (U-E), demonstrando que nela também se reflete a
problemática desta divisão cirúrgica e inflexível.
Neste item, abriu-se oportunidade para discutir as diferentes
visões entre as instituições de ensino e pesquisa e as empresas, bem
como, das dificuldades que estes atores (pás) da tríplice hélice
encontram nesta interação.
3.4.2 O setor empresarial e industrial brasileiro: A
industrialização tardia e o atraso tecnológico e seus efeitos
Voltando à cronologia sobre a industrialização no país, sabe-se
que nos primeiros Séculos, o Brasil era colônia portuguesa (1500 a
1822) e não foi permitida a produção no país. A razão era a
obrigatoriedade de a colônia servir de mercado consumidor comprando
produtos manufaturados e trazidos pelos portugueses, no conhecido
Pacto Colonial.
À vista disso, compreende-se que dependendo do modelo de
inovação adotado é possível compreender a classificação ou posição no
ranking dos países ou região que se destacam nesta matéria. Por
exemplo, os países asiáticos, na década de 1990, tiveram a capacidade
174
de adaptar suas indústrias às novas tecnologias em comparação com os
países latino-americanos. Reforça-se aqui a diferença produtiva que
ocorreu na República da Coreia, que já visava o mercado internacional
na sua estruturação e veio se preparando ao longo dos anos para adentrar
na visão global de economia.
Ressalta Dubeux (2010, p. 77) que no Brasil, a industrialização
teve sua aceleração a partir de 1951 quando Vargas retoma o poder. Em
seu estudo comparativo entre o Brasil e Coreia do Sul, Dubeux destaca
que dentre as políticas que contribuíram para este desenvolvimento além
da criação do Banco de Desenvolvimento Econômico (BNDE) em 1952,
a Petrobrás, entre outras instituições, como já citado, foi a Política de
Industrialização por Substituição de Importações (ISI). O que o governo
de Vargas intencionava era acelerar o processo de industrialização
através da substituição do que era importado pela produção interna. A
ISI também foi bem recepcionada pelo governo subsequente de
Kubitschek, entre os anos 1950 e 1960. Através da abertura para o
capital internacional, atraiu as empresas multinacionais que vieram a se
instalar no país. Estas empresas buscaram "nacionalizar" seus produtos,
evitando taxas mais enrijecidas de importação, o que foi visível na
indústria autombilística que não queria perder o mercado consumidor
brasileiro importante. Segundo Ardissone (2014, p. 85- 86), o modelo
de industrialização por substituição de importações perdurou entre 1930
e 1990, de modo que ao longo da história, teria mudado apenas as visões
sobre qual a maneira melhor de alcançar o desenvolvimento. Ressaltou
que desde a Era Vargas (1930-1945), havia um Estado autocrático e
desenvovimentista e que prevaleceu até os anos 1990, pois o Estado
visou cumprir o papel de núcleo organizador da sociedade e de alavanca
para a construção de um capitalismo industrial, nacionalmente
integrado, porém, que dependia do capital externo através desta política
de susbstituição de importações. Sem dúvida, isso auxiliou na
construção de um parque industrial bem diversificado, o que possibilitou
certa autonomia industrial. Foi diferente do que ocorreu com a Coreia do
Sul também neste ponto, porque o modelo sulcoreano de produção para
exportações representaram um papel central, apesar de ter esta política
de substituição também (DUBEUX, 2010, p. 79).
Wilson Suzigan (1986) ao explicar o processo de
desenvolvimento industrial brasileiro apontou que existem quatro
formas distintas de interpretá-lo, quatro teorias. A primeira é a teoria dos
"choques adversos", momentos em que as importações foram
dificultadas, o que obrigou a produção nacional ter um papel mais
175
decisivo, como na Primeira Grande Guerra Mundial. A interpretação
pela segunda teoria que é a visão da industrialização liderada pela
ampliação das exportações, pensamento linear que entende que as
divisas geradas na exportação incentivariam a industrialização. A
terceira teoria é a do "capitalismo tardio", que pressupõe que a
industrialização no país foi consequência do processo de
desenvolvimento do capitalismo. Portanto, a acumulação e o capital
evidenciam que existe desenvolvimento dependente do capital industrial
em relação ao setor exportador, limitado ao capital adquirido pelo setor
exportador dentro da capacidade deste setor em exportar produtos
primários para os países mais desenvolvidos. A visão foi estendida para
a ideia de industrialização tardia. Pode-se verificar que os eventos da
Primeira Guerra Mundial e a Crise Econômica que eclodiu com a queda
da Bolsa de Nova Iorque (a partir de 1929) contribuíram para explicar
esta teoria, uma vez que o setor industrial nacional foi forçado a buscar
alternativas além da produção agrícola exportadora. Enquanto nos
Estados Unidos já vivam as formas de produção propagadas desde o
Século XIX com o Taylorismo de Frederick Winslow Taylor,91
e o
Fordismo.92
de Henry Ford, que foi o fundador da Ford Motor Company
(Detroit), o Brasil ainda buscava se estruturar industrialmente. A última
teoria trata da industrialização promovida por políticas estatais, portanto,
programadas e fomentadas pelo Estado. Isso também pode ser
associado com as políticas adotadas no país a partir de 1930, no
Governo de Vargas, que assumiu a postura intervencionista e
nacionalista, desenvolvendo uma estratégia para consolidar um parque
industrial no Brasil, tendo em vista que a base agro-exportadora foi
posta em cheque com a Grande Depressão Econômica a partir de 1930.
91
O taylorismo defendia que o trabalhador não teria mais a necessidade de
conhecer toda a cadeia de produção, bastando conhecer seu ofício e
procurar um aperfeiçoamento constante apenas desta parte. 92
O Fordismo refere-se aos sistemas de produção em massa e gestão
defendidopelo empresário americano Henry Ford (1863-1947), que traze a
ideia de um modo de produção em massa, com linhas de montagem e semi
automatizado. O que proporcionou o aumento de consumo dos produtos
oriundos deste sistema em razão do custo e da grande escala de produção, a
partir de 1914. Portanto, produção em massa visando um consumo em
massa seguindo as ideias de Taylor, porque aplicou a produção setorizada
em sistema de produção em massa, através de linhas de montagem.
176
Ao verificar o cenário nacionalista da indústria brasileira
(iniciada em 1930), nos anos 1950, Suzigan assevera que esta postura
serviu também para disseminar uma mentalidade protecionista,
prejudicando o desenvolvimento tecnológico que manteve (e ainda
mantém) a indústria do país com baixos níveis de eficiência, que
também é pouco competitiva. Segundo Suzigan (1988, p. 10): De fato, as políticas de industrialização
implementadas desde os anos 50 foram
predominantemente defensivas e se
caracterizaram por um protecionismo exagerado e
permanente. Juntamente com a política cambial,
essas políticas favoreceram taxas de rentabilidade
mais elevadas no mercado interno relativamente à
exportação, criando assim uma tendência à
produção para o mercado interno. O resultado foi
o desenvolvimento de uma indústria com elevado
grau de ineficiência, e por isso mesmo não-
competitiva interna e internacionalmente, e com
pouca ou nenhuma criatividade em termos
tecnológicos. (SUZIGAN, 1988, p. 10)
Para este autor, as causas desta ineficiência e ausência de
competitividade da indústria nacional foram na verdade consequências
da falta de uma estratégia de desenvolvimento científico e tecnológico
como inerentes às politicas de industrialização, a partir de 1950.
Reafirmando, estas políticas pretenderam tão somente à substituição de
importações, "blindando" a economia, reservando o mercado para
produtores internos. Isto significou ausência de absorção e
desenvolvimento de tecnologias, já que, a proteção defendida pela
indústria brasileira trouxe atraso tecnológico em razão da falta de
contato com a produção internacional e o possível confronto
comparativo que as importações causariam com o produto nacional, o
que trouxe o comodismo dos empresários no país. Acrescenta Suzigan
que isto se reflete nas características das indústrias brasileiras que
possuem mercado interno cativo, sendo que a mentalidade protecionista
foi uma barreira para a implantação de um processo amplo de
assimilação, adaptação e desenvolvimento de tecnologia no território
brasileiro.
Volta-se aqui a visão diferenciada da Coreia do Sul, que teve
outra postura e seguiu um modelo diferente. Neste sentido, comparando
o país com os mercados emergentes asiáticos, especialmente a
República da Coreia, verificam-se as desvantagens na escolha deste
177
processo de industrialização importador. Na verdade, as empresas
brasileiras tinham proteção e segurança de seu mercado consumidor
internamente e ainda, como destaca Dubeux (2010, p.83, 85), não
tinham uma visão inovadora. A pesquisa e desenvolvimento também
não tiveram avanços com a instalação das empresas estrangeiras porque
estas se limitaram em "tropicalizar" os produtos: faziam apenas uma
adaptação do que era produzido no exterior, não se interessando em
manter centro de pesquisas, laboratórios ou institutos para desenvolver
novos produtos no país. Portanto, pensando no acrônimo P,D&I
(Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação), a "Pesquisa e
Desenvolvimento" não faziam parte da agenda do empresariado
brasileiro, quanto mais o "I" de inovação. Acrescenta que mesmo com a
utilização da engenharia reversa ou até da cópia dos produtos
estrangeiros por algumas empresas (como de fármacos), isto pouco
contribuiu para a geração de novas tecnologias.
Outro fator que colaborou para este distanciamento entre público
e privado foi que a política de desenvolvimento científico nacional
esteve dissociada do setor industrial. Era mais voltada para o
desenvolvimento científico em si, em resposta de políticas educacionais
e não industriais. E em síntese, nas palavras de Dubeaux: "a prática dos
empresários industriais brasileiros não estava relacionada fortemente à
inovação, mas sim, à adaptação e à cópia" (Dubeux, 2010, p. 85). De
outro lado, o governo sulcoreano apostou numa política para fomentar a
inovação tecnológica aproximando os institutos públicos de pesquisa e
as empresas privadas, além das subvenções de incentivos fiscais e de
créditos direcionados, desde meados da década de 1980. Através destes
arranjos consistentes, bem próximo da teoria da Tríplice Hélice,
conseguiu ganhos de produtividade muito superiores que o Brasil
(DUBEUX, 2010, p. 23).
Freeman (1995), em mesmo sentido, em seu estudo clássico
sobre Sistema de Inovação, indicou que as políticas adotadas pelo
Brasil, em comparação à Coreia do Sul (oficialmente República da
Coreia), nos anos 1980, demonstram as desvantagens brasileiras, com
diferenças importantes, peculiarmente: em percentuais de investimentos
no Sistema de Educação Superior, na Pesquisa e Desenvolvimento
(P&D), nível de pesquisa de empresas em P&D, infraestrutura em
telecomunicações e a difusão de novas tecnologias. Estes fatores podem
demonstrar que no país asiático houve maior interesse nacional em
transformar o país, mesmo que nos anos 1950 a Coreia do Sul também
tivesse um nível de industrialização muito baixo, como o brasileiro.
178
Complementa-se esta visão retomando o estudo de Dubeux (2010, p.21),
que explica que apesar de existirem elementos históricos que
aproximam a Coreia do Sul e o Brasil- como o início do forte processo
de industrialização, urbanização e crescimento econômico nos anos
1950 e 1960, e, a existência regimes militares- houve, contudo, no caso
brasileiro, a predominância da estratégia de substituição de importações,
enquanto que na Coreia do Sul, o foco foi na industrialização orientada
para a exportação.
Ao se pensar na evolução da Ciência e Tecnologia no país, é a
partir da década de 1990 que surgiram as novas leis que regulamentaram
a Propriedade Intelectual. Elas introduziram, nas instituições de ensino e
pesquisa, a necessidade em discutir o tema e formular ações e
internalizar o processo inovativo, o que veio a ser mais contundente
(obrigatório) com a Lei de Inovação, a partir de 2004. O despertar do
empresariado brasileiro ou o desencantamento com o governo federal
ocorreu no governo Collor, como salientou Silvia Velho (VELHO,
1996). Apesar de grandes críticas em seu plano econômico, através de
um amplo programa de desestatização e uma nova Política Industrial e
de Comércio Exterior, e como já mencionado, a associação entre
empresa e universidade, foi colocada como estratégia importante,
visando não apenas a modernização tecnológica do parque industrial
brasileiro, como também, o indicativo de uma maior participação do
setor privado em investimentos em Ciência e Tecnologia, porém, não se
concretizou. O investimento em P&D realmente ocorreu a partir de
2003. A Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior
(PITCE) vem sendo destaque nas discussões acadêmicas atuais e
"forçando" as empresas a se relacionarem com as instituições públicas
através de ações de fomento. Todavia, esta relação apresenta algumas
falhas na comunicação e abaixo se verificará como o setor privado
enxerga as instituições de ensino e pesquisa e porque existe resistência
em interagir e vice-versa.
3.4.3 As Instituições de Ciência e Tecnologia-ICTs e seu papel na
relação Universidade e Empresa
179
Para inaugurar este capítulo, foi transcrito um trecho de
Cristovam Buarque, em "universidade na encruzilhada",93
que traz
textos de reflexão sobre a universidade brasileira e seu papel no cenário
nacional. Nas diversas reflexões nesta obra, Buarque defende que as
instituições precisavam tomar decisões e para encontrarem novos rumos
e transformarem-se. Conforme suas palavras é necessário "compreender
as dificuldades e as limitações da universidade, bem como formular uma
nova proposta, novas estruturas e novos métodos de trabalho"
(BUARQUE, 2014, p. 119).
Destarte, pretende-se demonstrar este papel que a universidade
está exercendo, ou sendo forçada a exercer, nos dias atuais, com uma
visão mais econômica e sistêmica, devendo inserir a inovação e
transferência de tecnologia nas pautas de discussões. Da mesma forma,
não se desprezará a visão sociológico-histórica que a questão merece.
Contudo, a universidade pública brasileira, com seu regime de
administração pública e legislações rígidas, tem enfrentado dificuldades
para realizar este novo papel, inclusive, para se "adequar" aos modelos
internacionais e teorias que analisam esta relação U-E, como a Tríplice
Hélice.
Reconhece-se que as universidades são importantes para o
processo inovativo, porém, qual será seu papel? Desde a segunda
revolução acadêmica (WEBSTER; ETZKOWITZ, 1991), a universidade
passou a assumir, além de suas clássicas atividades de ensino e pesquisa,
a função de agente de desenvolvimento econômico, local e regional. Por
isso, a universidade passa a desempenhar um papel mais central na
economia ao combinar ensino e pesquisa com transferência de
conhecimento. Afirmam Calderan e Oliveira (2013, p. 13) que a
universidade deverá buscar uma readaptação urgente dos papeis
desempenhados nos sistemas de ensino, de qualificação para o trabalho,
de produção de ciência e tecnologia, entre outros, sendo a vinculação
com o setor produtivo um dos aspectos mais destacados deste processo.
Da mesma forma, destacam que a universidade deve ser a instituição
núcleo da economia do conhecimento e a cooperação entre o governo,
universidade e empresa, elemento importante para viabilizar o
desenvolvimento científico e tecnológico exigido pela economia
93
Texto apresentado na “Conferência Mundial de Educação Superior +5”
realizada na UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação),
em Paris entre os dias 23 e 25 de junho de 2003.
180
moderna. Todavia, quando se trata de universidade brasileira e pública,
surge uma questão crucial que é o ponto de discussões e acusações das
formalidades que o setor público tem, como a burocracia, a forma de
gerenciar e decidir suas ações, bem como, sobre o pouco envolvimento
nas soluções dos problemas sociais latentes, entre outros. Quanto a este
último ponto, trata-se da discussão tanto sobre a missão da universidade,
que se discutirá abaixo, quanto ao primeiro (burocracia), que já foi
explanado acima.
Salientam Smits et al (2010) que desde as primeiras discussões
sobre o desenvolvimento econômico capitalista orientados para a
inovação quanto à prática de inovação nas empresas e pesquisa e
desenvolvimento, seja público ou privado, tem-se envolvido de forma
entrelaçada com a ordem pública, corroborando a ideia de List (1856) já
comentada. Portanto, nestas relações entre universidade e empresa, a
gestão estratégica do conhecimento é elemento fundamental na melhoria
da competitividade e índices regionais mediante a captação,
interiorização e propagação do conhecimento adquirido na universidade
ou instituto de pesquisa. Infere-se, em vista disso, que o modelo
brasileiro de universidades voltado para formação de profissionais,
visando mercado de trabalho, ou apenas produção de conhecimento
"descomprometida" com as necessidades práticas da sociedade já não
subsiste sozinho, pois, as instituições estão sendo "impelidas" a
assumirem um papel mais dinâmico para desenvolverem pesquisas
aplicadas, além da básica, que é de sua natureza, convergindo também
interesses do setor privado (e sociedade) e promoção da inovação.
É importante uma autoavaliação da academia, como também
ocorreu em outras regiões do globo. As experiências chinesas indicam
que houve uma reforma econômica com investimento significativo em
P&D e reformas nas políticas científicas e educacionais a partir de 1979.
Foi perceptível que a visão de determinar a tecnologia como motor
propulsor do crescimento econômico, a partir de 1988, contou com
reforma educacional que colocou maior ênfase em ciência e tecnologia
como parte dos esforços em pesquisa e desenvolvimento (KIM; MAH,
2009, p. 263). Este direcionamento de atividades de pesquisa e relação
das instituições com a sociedade ocasionou uma modificação na
estrutura legal, organizacional e de governança nas universidades.
De acordo com Arbix e Consoni (2011, p. 220, 221), o sistema
universitário deve ser repensado e reestruturado e a comunidade
acadêmica, no seu papel propulsor de gerar novos conhecimentos
científicos e tecnológicos para inovação, deve repensar a sua agenda de
181
pesquisa e comunicar-se mais com a sociedade. Neste contexto, não é
absurdo pensar em um novo modelo a ser adotado pelas universidades
públicas brasileiras. É neste ponto que este estudo quer trazer uma
contribuição.
3.4.3.1 O papel da universidade no processo de transferência de
tecnologia: repensando o passado e sua missão
Como foi ressaltado acima, as universidades exercem papel de
domínio intelectual em alguns momentos da história e refletiram os
movimentos sociais de sua época, em que as ideias gregas tiveram seus
espaços e havia espaço para a discussão de "artes e filosofia", que
certamente representavam as ideias de religiosos, como John Henry
Newman, João Calvino, John Stuart Mill. Este último, principalmente,
demonstrou sua grande influência no período revolucionário científico,
já que é considerado o propagador da teoria utilitarista de Jeremy
Bentham que inspirou as escolas norte-americanas em seus cursos
voltados para a terra e a agricultura, ou ainda, a utilização de
conhecimento para resolução de problemas na sociedade norte-
americana. Isto posto, é importante entender como estes pensamentos
influenciaram a sociedade naquele período em que foram introduzidas
na academia e refletiram nas políticas empregadas pelos governos.
Derek Bok (2003, p. 11) afirma que nos Estados Unidos, a
contribuição da ciência para a guerra convenceu a liderança política em
Washington em investir pesadamente em pesquisa, ambos em ciência
natural e na área de medicina e saúde, principalmente, com o
desenvolvimento do Instituto Nacional de Saúde. Entre os anos de 1948
a 1968, houve robusto apoio federal para pesquisas científicas básicas,
que chegou a 3 milhões de dólares por ano. Os resultados apareceram
com a bomba de hidrogênio, a descoberta do DNA, lançamento de
satélites no espaço entre outros. A partir dos anos 1970, a ênfase na
pesquisa básica teve diminuição, saiu do campo militar para o
econômico, o qual os Estados Unidos buscaram garantir competitividade
na economia mundial, principalmente, com o Japão e a Europa. Desse
modo, as políticas direcionaram-se para mudanças importantes com o
intuito de estimular o crescimento econômico, como o Bayh-Dole Act
(1980), que oportunizou a apropriação e licenciamento de pesquisa pelas
universidades. Esta legislação possibilitou as instituições de ensino e
pesquisa a se estruturarem com escritórios e agências (de inovação) para
182
buscarem descobertas promissoras comercialmente e patenteando-as
para um futuro licenciamento para as empresas interessadas.
Machlup (1972, p. 148) sublinha que esta separação de campos
de estudo nas universidades é perceptível quando se aceitam linhas de
divisões em dois tipos de pesquisas e dedicação de departamentos, dessa
maneira, os departamentos relacionado com a Física e Química, na
divisão de artes e ciência, são geralmente engajados na pesquisa básica,
enquanto que os departamentos de Elétrica e Engenharia química, nas
escolas de Engenharia, atuam na pesquisa aplicada. Mas, mesmo nestas
análises do pós-guerra, Machlup percebia que esta separação não
poderia ser radical e que a linha divisória entre uma e outra é muito
tênue. Identificou, por exemplo, a dificuldade que os pesquisadores
tinham, já naquele período, em relatar suas pesquisas e justificar os
fundos recebidos e enquadrar suas atividades no projeto proposto para o
tipo de pesquisa que os recursos foram destinados. Ao se dedicarem
"intencionalmente" à pesquisa básica, poderiam resultar em novas
substâncias ou dispositivos. Da mesma forma, ao se dedicarem
"intencionalmente" à pesquisa aplicada, ao final seus resultados,
poderiam trazer um melhor entendimento físico ou orgânico do
fenômeno, observa (MACHLUP, 1972, p. 147). Stokes alerta que esta
visão recortada entre a pesquisa básica (que usou como sinônimo de
pura) e aplicada é uma ideia integrada ao paradigma dominante da
política científica e tecnológica, bem como, nas formas de ver a ciência
dos governos, da comunidade, dos pesquisadores e dos meios de
comunicação, o que ele rebate no seu livro (STOKES, 2005, p. 27).
Outra interessante observação de Machlup está na identificação da parte
dedicada ao desenvolvimento na pesquisa. Na sua concepção, se o
objetivo primário é fazer mais melhorias no produto ou processo, então
o trabalho se enquadra na definição de "pesquisa-desenvolvimento". Ele
chamou a atenção para o conhecimento e desenvolvimento da pesquisa,
indicando que significa um sistemático uso de conhecimento científico
direcionado para a produção, seja de material útil, dispositivos, sistemas,
métodos (ou processos), sistemas exclusivos de desenho e engenharia de
produção, e também de desenho e desenvolvimento de protótipos, que
fazem parte do todo que é fazer pesquisa (MACHLUP, 2005, 1972, p.
149).
Esta observação de Machlup, referente aos 1970, aplica-se às
universidades contemporâneas e a discussão sobre sua missão,
programas de pesquisas, investimentos. Atualmente, é muito visível à
prevalência da pesquisa aplicada nos acordos de parcerias com o setor
183
privado em que as universidades têm buscado estreitar laços com
indústrias e direcionarem suas descobertas para desenvolvimento de
produtos, e raramente, de "conceitos". Porém, existem receios,
questionamentos e contrariedades a esta aproximação. Alguns críticos
até radicalizam ao dizer que a pesquisa universitária está sendo
comercializada e deixando seu papel impulsionador e transformador
para a ciência, porém, deve-se considerar que um equilíbrio pode ser
sugerido e não visões extremistas.
Bok (2003, p. 13-15) afirma que a visão econômica e comercial
que as universidades assumiram e o aumento de possibilidades de fazer
dinheiro estendeu entre as instituições. Os docentes começaram a ganhar
muito com consultorias e treinamentos. Isto ocorreu em várias áreas nas
universidades norte-americanas, seja na biotecnologia que teve um
crescimento extraordinário (um boom) e nas ciências da vida em que os
pesquisadores não só patenteavam como davam consultorias. Os juristas
também começaram a dar consultorias e orientações para seus clientes
de corporações, no que tange aos Direitos de Propriedade Intelectual e
contratos. Outro ponto perceptível foi o crescente investimento das
empresas na academia que gerou novos produtos e melhorou a
tecnologia. Como resultado, as empresas ao aumentarem seu apoio às
universidades e institutos e "aliviaram" o governo de seus investimentos
em pesquisa. Isto não agradou toda comunidade acadêmica norte-
americana, que acusava a universidade de ter se transformado em
"fábricas do conhecimento" e que as ideais acadêmicas estavam voltadas
para busca de dinheiro. Continuou Derek Bok (2003, p.16) destacando
que o receio e argumentos dos contrários a este movimento era que a
orientação comercial nas atividades da universidade poderia encobrir
outros valores intelectuais e que programas universitários seriam
julgados primeiramente pelo dinheiro que eles trariam e não pela sua
qualidade intelectual intrínseca. Realmente, ainda nas palavras de Bok
(p.18), há a explicação de que a "comercialização não é uma palavra
neutra", ao contrário, comercializar significa engajar-se em práticas
amplas, o que certamente faz com que a comercialização seja uma
prática largamente suspeita na academia.
Neste ponto, indaga-se qual seria então o "papel" ou "missão" da
universidade neste contexto de comercialização e interação com o setor
privado?
Da mesma forma que as empresas têm suas características que as
identificam, as universidades também são reconhecidas pelas suas
atividades de ensino, pesquisa e extensão. Também são vistas como
184
transformadoras da sociedade, oferecendo formação de alto nível,
serviços de informação, capacitação, tecnológicos e mais recentemente,
a transferência de tecnologia. Verifica-se que a partir do período pós-
guerra, a pesquisa passou a ter papel principal para a sociedade,
inclusive, auxiliando na resolução dos problemas, em que surgiram
críticas sobre qual a "verdadeira missão" que a universidade deveria
assumir.
Conforme dito anteriormente, a universidade foi criada com a
missão de preparar intelectuais e na formação de profissionais
qualificados para a sociedade. Ortega y Gasset (2004) ao escrever sobre
La Misión de La Universidad, em 1944, foi opositor da visão em que a
pesquisa deve ser exaltada como uma missão da universidade. No caso
de Ortega y Gasset, essa visão, possivelmente, foi influenciada por sua
formação jesuítica e por ter sido professor de Filosofia Moral na
Universidade de Madri durante o período de 1910 a 1936. Ao analisar as
universidades, e principalmente, os diferentes rumos que as
universidades europeias tomaram, em comparação do que ocorria nas
instituições norte-americanas, Ortega y Gasset entendia que observação
do "vizinho" não pode ser utilizada para criticar as próprias instituições
nacionais, mas, que isto pudesse auxiliar para determinar qual o
caminho a ser tomado. Para ele, a imitação não é o caminho, pois, isto
seria fatal. Na imitação, deixar-se-ia de elaborar o problema e
emprestaria a solução de outros, sem considerar que se devem incluir os
limites e defeitos próprios de sua sociedade modelo. Em outras palavras,
trazer modelos de outras nações para a realidade de seu país poderia não
resolver a questão, tendo em vista que cada nação tem sua "real
natureza" (ORTEGA y GASSET, 2004, p. 18). Explica seus
pressupostos criticando a conclusão simplista de que as nações são
grandes porque suas escolas são boas e refuta ao dizer que isto é um
clichê e que é resquício do idealismo do século passado. Demonstra que
a importância que se quer dar à "Escola", à organização de ensino, não
tem ou não pode ter esta força. Acredita que quando a nação é grande,
então grandes serão também suas escolas, portanto, não há grande nação
sem grandes escolas. Por isso, se as pessoas estão mal politicamente,
não podem esperar alguma coisa perfeita no sistema de ensino
(ORTEGA y GASSET, 2004, p. 19). Defende também que a escola,
quando realmente é um órgão funcional da nação, depende muito mais
da atmosfera da cultura nacional em que ela está imersa do que sua
atmosfera pedagógica criada artificialmente nela própria. Na visão deste
autor, ao comparar à universidade medieval, a universidade
185
contemporânea (à sua época) teria desenvolvido a mera semente da
instituição profissional dentro de uma atividade enorme, e ao adicionar a
função de pesquisa, a levou a abandonar quase que inteiramente o
ensino ou transmissão de cultura. Para este estudioso, a função básica da
universidade direciona-se ao imperativo que se ajuste o ensino de
cultura, de sistema de ideias vitais, referenciando o ensino das "culturas
gerais" da universidade medieval (teologia, filosofia, artes etc).
Não é para menos que Scott (2006, p. 3) detecta em Ortega y
Gasset a necessidade de excluir a pesquisa e defende o foco na educação
liberal e profissional como missão. John Scott admite que virtualmente,
todas as políticas de hoje e questões sobre educação superior, desde a
admissão até a tecnologia de armas, derivam da missão institucional.
Nota que as declarações de missão hoje são frequentemente baseadas
numa tríade (do Século XX) de ensino, pesquisa e serviço público (ou
extensão, para alguns). Em síntese, identifica algumas fases desta
missão ao longo da história, sendo elas: missão de ensino, missão de
pesquisa, Estado-nação, missão de nacionalização, missão de
democratização, missão de serviço público e internacionalização.
Convém, portanto, apresentar agora sua visão quanto a estes períodos
históricos para alcançar a visão contemporânea. Nas palavras de Scott
(2006), o que se deve observar nestes mais de 850 anos é que
verdadeiramente a Universidade Europeia enfatizou sua missão de
ensino na fase de pré-estado-nação, e, a antiga Universidade Moderna
Europeia e da América Latina adotaram a missão de nacionalização ou
ainda serviço para o governo do Estado-nação. Em contraste, os colégios
em formação nos Estados Unidos avançaram no ideal de democratização
ou no serviço para o indivíduo do Estado-nação. Simultaneamente, a
geração "humbolditiana"94
promoveu a missão de pesquisa. Quanto à
visão humbolditiana, um dos princípios inovadores foi a proteção da
liberdade acadêmica, que pode ser definida em dois subprincípios:
liberdade de aprender, exercer/escolher qualquer currículo (Lernfreiheit) e a liberdade para ensinar (Lehrfreiheit), também conhecido como o
direito à livre investigação. A adoção destes princípios permitiu que
94
Wilhelm von Humboldt foi uma figura essencial para o período de
fundação da Universidade de Berlim (1810), juntamente com Fichte e
Schleiermacher introduziu ideias e mudanças institucionais, em que ficou
marcado como o modelo alemão, que trouxe uma visão diferente sobre
universidade e formas de aprender e ensinar.
186
professores tivessem liberdade de investigação sobre suas linhas de
pesquisa e ensino, portanto, enfatizando a importância da ciência e
pesquisa, o que introduziu a importância da pesquisa na academia. A
liberdade de escolha de currículo foi a principal influência no sistema
norte-americano, que diversificou não apenas nesta opção curricular
pelo aluno, como também, na popularização do ensino superior.
Já no Século 20, a universidade moderna norte-americana
assumiu a missão de serviço público ou serviço para o público do
Estado-nação. Percebe-se que, com a globalização na sociedade pós-
moderna, a universidade apontou para a direção de uma missão de
internacionalização, em que a instituição passou a oferecer serviços para
uma gama de Estados-nação de todo o mundo, recebendo estudantes
estrangeiros.
Contudo, deve-se frisar que as guerras mundiais influenciaram
também a missão e visão nas universidades. Principalmente, em relação
à Segunda Guerra Mundial, no caso dos Estados Unidos, por exemplo,
as universidades que tinham uma participação indireta no serviço
público passaram a se envolver em pesquisas para o governo e indústria.
Houve, portanto, um investimento do governo federal que se tornou um
padrão dominante para as universidades, sejam elas públicas ou
privadas. Neste cenário bélico, as instituições norte-americanas foram
chamadas pelo governo federal para realizarem pesquisas para a guerra
em razão de sua "missão pública de serviço". Dessa maneira, cientistas
contribuíram com invenções militares como a bomba atômica, radar, e o
napalm,95
. Posteriormente, com o final da guerra, as pesquisas tiveram
outro direcionamento, o que deixou a pesquisa básica e militar para
pesquisa tecnociência civil, nos anos de 1980-1990 (SCOTT, 2006,
p.28).
Há quem afirme que a universidade tem buscado uma terceira
missão em razão da crescente saliência de conhecimento e pesquisa, o
que gera nela, um papel no desenvolvimento econômico. Desde a
Segunda Guerra Mundial, e com mais intensidade na Guerra Fria, como
período de transição que foi, foi conduzida a uma reavaliação da missão
95
O napalm foi um composto químico usado em lança-chamas e bombas
incendiárias pelos Estados Unidos e nações aliadas, era misturado em
substancias inflamáveis auxiliando na transformação destas em gel, como
na gasolina, aumentando sua eficiência e maior alcance. Foi um invento que
teve a participação de um grupo de cientistas da Universidade de Havard.
187
e papel da universidade (ETZKOWITZ & LEYDESDORFF, 2000, p.
110). Diante da expansão universitária e consequentemente, observando
o "sucesso" americano na aproximação com o setor empresarial,
verifica-se que há uma tendência na forma de desenvolver a pesquisa
acadêmica nos dias atuais. Nos Séculos XVIII e XIX, existia uma rara
aproximação e interação das instituições (ensino) com o mundo
empresarial. No caso norte-americano, exceções ocorreram com as
instituições, como do Instituto Tecnológico de Massachusetts (1920-
1930) que conseguiu estabelecer um primeiro departamento de
engenharia eletrônica com recursos de um fundo da empresa General
Electric e depois a AT&T (SCOTT, 2006, p. 27), entre outros exemplos:
A Escócia, com James Watt,96
e a Alemanha (Universidade de Geissen),
que mantinha uma relação com indústrias químicas e de mineração. Já
na Inglaterra, de forma mais particular, existiam as ações e pensamentos
dos membros da Sociedade Lunar, porém, não eram a regra
(GREENHALGH; ROGERS, 2010, p. 93).
Todavia, o que determinava a pesquisa naquele período era a
escolha do tema de pesquisa pelos cientistas e seus departamentos. A
visão sobre ciência e sua relação com novas tecnologias foi intensificada
com o pós II Guerra Mundial, em que muitos experimentos e diferentes
tecnologias testados serviram para convencer governos a direcionar e
96
James Watt era cientista químico, engenheiro, com uma visão para a
exploração comercial e produção em escala industrial. Ele via as
descobertas na área têxtil realizadas por Berthollet (branqueamento por
cloro) e Black (produção alcalina usando sal e limão) como descobertas
importantes para serem exploradas comercialmente. Watt possuía um
considerável conhecimento da química de branqueamento, tingimento, e
produção alcalino, mas nestes domínios seus contributos foram à química
industrial, não com a teoria química. Sua maior contribuição entre suas
pesquisas na área química e seus inventos de engenharia, durante o século
XVIII, foi em favor de uma fusão da engenharia com a ciência experimental
e teórica; em obra de Watt (área química), em suas associações com os
químicos e os filósofos naturais, em seu emprego na Universidade de
Glasgow, e em sua participação nas sociedades científicas britânicas foram
mais marcantes. Pode-se aqui mencionar que esta diferenciação de
interesses e motivações e seus efeitos entre engenheiro e cientistas foram
nítidas neste período através das ações e posicionamento de Watt, sendo um
contributo para um entendimento sobre o desenvolvimento da ciência
moderna (http://www.encyclopedia.com/topic/James_Watt.aspx)
188
influenciar a ciência em seus territórios. Paula Stephan (2007) aponta
que a ciência emergiu da Segunda Guerra Mundial com maior respeito e
seu sucesso demonstrou que poderia encurtar a guerra e reduzir mortes
de tropas aliadas. Houve ainda uma valorização no papel da ciência
como ferramenta para auxiliar o crescimento econômico e o emprego
em tempos de paz. Essa foi uma bandeira defendida por Vannevar Bush
(1945), que apresentou à presidência dos Estados Unidos uma proposta
de ciências mais expansionista, através dos seus escritos: Science: The
Endless Frontier,97
. Ele indicou que a ciência proporciona uma fronteira
sem fim e que deveria ser melhor amparada pelo governo. Resultou,
dentre outras ações governamentais, a fundação da National Science Foundation nos Estados Unidos em 1950 (STEPHAN, 2007, p.38).
Abre-se aqui um parêntese para voltar a comentar sobre a
pesquisa básica/pura e aplicada98
e o sistema linear, já que, a pesquisa
pura foi amplamente sustentada por Bush, através de sua forma de
pensar linear e horizontalmente, quando tratou de desenvolvimento
tecnológico e inovação. Para Bush, aqueles que investissem em ciência
básica obteriam seu retorno em tecnologia à medida que os avanços da
ciência fossem convertidos em inovações tecnológicas pelos processos
de transferência. Portanto, a inovação é concebida através de uma ordem
sequencial de eventos que começa com a pesquisa básica, avança para
níveis aplicados de pesquisa e culmina na aplicação e desenvolvimento
de produtos para o mercado, sendo que esta lógica linear é denominada
de "transferência de tecnologia",99
(CALDERAN & OLIVEIRA, 2013).
Stokes (2005) relembra que esta posição defensora da investigação
pura/básica, que ainda existe, é reverberação do relatório de Vannevar
97
Atrevo-me aqui a fazer correlação deste título com o programa Ciências
sem Fronteiras do Governo Brasileiro, que oferece bolsas de graduação e
pós-graduação visando formação de brasileiros no exterior. E curiosamente,
o programa prevê bolsas para estudantes de graduação e pós-graduação em
áreas das “ciências naturais” e engenharias, deixando à margem as Ciências
Sociais e Humanas, com as mesmas ideias do conceito ciência tratado pelo
Presidente Roosevelt e do relatório de Vannevar Bush. 98
Para Stokes, a pesquisa básica procura ampliar o campo de entendimento
fundamental, porém, a pesquisa aplicada volta-se para uma necessidade ou
aplicação para um indivíduo, grupo ou sociedade (STOKES, 2005, p.24). 99
Verifica-se que atualmente este conceito tem sido empregado de forma
mais ampla significando a transmissão de conhecimento e tecnologia.
189
Bush. O relatório traduziu a forte recomendação para o país (Estados
Unidos) em estabelecer seu investimento em pesquisa científica, no pós-
guerra, sendo que a ciência básica e sua relação com a inovação
tecnológica tornou-se o alicerce da política científica nacional para as
décadas posteriores. Neste mesmo sentindo, Derek Bok relembra que no
relatório de Vannevar Bush continha a afirmação que para ter novos
produtos e medicamentos para tratamentos dependeria (inevitavelmente)
de um vigoroso programa de pesquisa básica, e, somente as
universidades poderiam provê-la. Efetivamente, o governo investiu
bilhões em laboratórios, criando a mais forte capacidade de pesquisa
básica do mundo (BOK, 2003, p. 60). Caraça (2008, p. 2) aponta que o
pioneiro em requerer investimentos em P&D para ter melhor impacto
em crescimento econômico foi J. D. Bernal nos anos 1930 (The Social Function of Science). Ele defendia o aumento do percentual de 0,2%
para 2,0% no Reino Unido para gerar mudanças sensíveis nos resultados
da economia.
Isto remete ao que Etzkowitz e Leydersdorff (2000) chamaram de
"terceira missão da academia", adicionada à pesquisa e ensino.
Explicam que a crescente relevância do conhecimento e pesquisa para o
desenvolvimento tecnológico desencadeou a terceira missão e
direcionou o papel da universidade para o desenvolvimento econômico.
A isto se deve ao que denominam de "Segunda Revolução Acadêmica",
que teve seu início desde a II Guerra Mundial e se intensificou na
Guerra Fria, sendo que esta, durante os anos 1970 a 1980, desencadeou-
se uma reavaliação da missão e papel da universidade na sociedade.
Conforme destaca Calderan e Oliveira (2011), a Primeira Revolução
Acadêmica diz respeito às atividades de pesquisa na academia,
rompendo com o papel exclusivo de ensinar (período de transição do
Século XIX para o Século XX) e coincidiu com o período das
universidades alemãs influenciadas por Humboldt. Já a Segunda
Revolução Acadêmica é determinada pelo forte sinergismo entre a
academia e a indústria, como uma resposta à necessidade do setor
produtivo de gerar P&D de uma forma mais rápida e com qualidade,
através das instituições de pesquisa. Realmente, a partir do Século XVII
houve uma grande "revolução" nos conceitos e formas sobre a ciência, o
que é considerado pelos historiadores como a Revolução Científica,
contemporâneo ao surgimento das ciências modernas. A ideia de
revolução se deu em razão de alguns estudiosos contestarem teorias
aristotélicas, como Simon Stevin nos seus livros "Princípios da Estática" e "Princípios da Hidrostática", Francis Bacon com sua obra "Novum
190
Organum", Nicolau Copérnico ao apresentar sua teoria heliocêntrica
contrapondo-se ao modelo de Ptolomeu, entre outros. Porém, foi
revolucionário o período não apenas por confrontar estudos anteriores,
mas também, por apresentarem avanços na física, química, botânica,
anatomia, zoologia microbiologia, fisiologia, a própria matemática e
astronomia. Desta maneira, grandes nomes como Galileu Galilei, René
Descartes, Isaac Newton, Leonardo da Vinci, Jerome Bock, Otto
Brunfels, Simon Stevin, Giordano Bruno, Johanes Kepler, Daniel
Fahrenheit, Anders Celsius, Robert Hooke, Robert Boyle, Francis
Bacon, Christian Huygens, Evangelista Torricelli, Blaise Pascal e outros
endossaram a lista dos "filósofos naturais" como eles mesmos se
intitulavam por realizarem estudos sobre a natureza.
Para Stokes (2005), o aumento do interesse dos cientistas
europeus pelas atividades práticas caminhou lado a lado com seu
experimentalismo e, que na verdade, os avanços científicos do Século
XVII deveram-se em parte "à sua disposição em aplicar à ciência as
técnicas que haviam tomado emprestado aos ofícios e às profissões".
Tomam-se como exemplos alguns intelectuais que emprestaram seus
talentos para melhorar tecnologias, Tartaglia e Galileu para os
equipamentos militares; Stevin para a engenharia hidráulica; Leibniz e
Huygen para o maquinário de potência; ainda o grupo de intelectuais
(Galileu, Torricelli, Descartes, Huygens e Newton) para o
melhoramento do telescópio (STOKES, 2005, p. 59-60).
Existiram também críticas sobre esta intensa interação entre a
academia e o setor privado. Cunha (1993), em seu texto intitulado
"Universidade e sociedade: uma nova dependência?" indica que esta
nova função atribuída às instituições de ensino superior, que é a
produção de conhecimentos para acelerar o desenvolvimento econômico
e reinserção dos países no mercado mundial, pode gerar a dependência
diante do mercado, não mais como antes, transferindo a antiga
dependência da Igreja ou do Estado.
Estas críticas, conforme já comentado, ocorrem em razão de
muitas universidades dedicarem-se mais às pesquisas "encomendadas",
que visem suprir uma necessidade comercial, geralmente, através de
parcerias com indústrias, e possivelmente, realizando poucas pesquisas
voltadas para princípios científicos, que são consideradas mais
descomprometidas em apresentar resultados ou produtos direcionados
ao mercado. Na realidade, o que ocorre é que a pesquisa básica, com sua
visão mais amplificada e sem uma pretensão definida, pode parecer
desinteressante para as soluções "emergenciais" que a indústria requer,
191
porém, não pode ser desprezada pelo impacto que causa quando
identificada. Contudo, esta tendência comercial dos estudos e pesquisas
vem de outros períodos históricos, como no caso de James Watt (1736-
1819), o estudioso químico (membro da Sociedade Lunar) que é um
evidente exemplo de um cientista que desenvolveu esta precisa ligação
entre conhecimento científico e aplicação comercial nas séries de
experimentos formais para analisar as propriedades do vapor e a
condutividade dos metais sobre a química têxtil, portanto, aliançou a
ciência com a prática (MATHIAS, 1972, p. 72). Bok (2003) aponta que
longe da preocupação que os cientistas das universidades sejam
corrompidos por negócios, alguns observadores acreditam que ativar
colaboração com colegas na indústria é na verdade útil para estimular a
pesquisa básica por ter contato com a realidade. É o que foi defendido
por Hery Etzkowitz e Loet Leydersdorff (1995), que afirmam que os
cientistas não mais acreditam na necessidade de isolamento (Ivory
tower100
) para trabalharem fora da lógica da descoberta científica. Mas,
Caraça et al (2008, p.6) alerta que a interação entre ciência e indústria é
um importante aspecto da "ecologia da inovação", porém, pode ser um
equívoco fazer as universidades e a pesquisa básica subordinadas aos
mercados ou ditames políticos, principalmente quando formuladores de
políticas assumem que a ciência é uma fonte direta ou a maior fonte de
inovação, colocando um fardo pesado na ciência que é apenas parte do
sistema de inovação e não um todo. Coaduna-se deste pensamento, uma
vez que, é neste momento, quando surgem as frustações e quando os
resultados não correspondem às expectativas exageradas, eles (setor
privado ou governo) assumem que o problema é nas universidades e as
acusam de ser a inacessível Torre de Marfim.
Entre as críticas quanto ao alijamento das universidades públicas,
exigência de eficiência e visão capitalista do ensino público, estudiosos,
seja sobre a temática do ensino superior- inclusive com uma visão
menos economicista- reconhecem que uma mudança se impõe em
relação ao papel desempenhado pela universidade no contexto atual, que
se deve concordar. Cita-se aqui Boaventura (2011, p. 41-42) que aponta
100
Ivorytower (torre de marfim) - Termo utilizado na academia para
designar um lugar ou ambiente em que as pessoas encontram-se felizes sem
ter contato com outras pessoas e isolam em suas ideias e teorias.
192
que ao longo do Século XX, o conhecimento universitário foi
predominante como modelo disciplinar e de certa forma,
descontextualizado em relação às necessidades do quotidiano das
sociedades. Por sua vez, eram os pesquisadores quem determinavam os
"problemas sociais" que entendiam importantes e ainda, a relevância,
metodologias e ritmo das pesquisas. Isso transparece na distinção entre
pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico, autonomia do
investigador, que para Boaventura, se traduz até em irresponsabilidade
social. Entretanto, destaca que ao longo dos últimos anos, existiram
alterações que apontam para a emergência de outro modelo. Boaventura
denominou "conhecimento pluriversitário". Neste conhecimento
importa o contexto, a possibilidade de utilização pela sociedade, de
modo que sua aplicação corre "extramuros", buscando resolver
problemas pontuais. Entende-se por fim que este conhecimento
pluriversitário tem sido concretizado nas parcerias universidade-
indústria. Acredita-se que esta mudança traz no mundo uma alteração
também da relação entre a ciência e sociedade, pois esta deixa de ser
"um objeto das interpelações da ciência para ser ela própria sujeita de
interpelações à ciência". Portanto, o conhecimento pluriversitário
desloca o foco da unilateralidade para a interatividade que está
potencializada pela tecnologia de informação e de comunicação. Em
razão disso, ocorre um confronto entre privatistas e publicistas, que
acabam desestabilizando a institucionalidade da universidade, conforme
já foi enfocado neste estudo, o que evidencia a crise institucional, em
razão da autonomia científica e pedagógica da universidade, em termos: Esta contraposição entre uma pressão
hiperprivatista e uma pressão hiperpublicista não
só tem vindo a desestabilizar a institucionalidade
da universidade, como tem criado uma fratura
profunda na identidade social e cultura desta, uma
fratura traduzida em desorientação e estaticismo;
traduzida, sobretudo, num certa paralisia
disfarçada por uma atitude defensiva, resistente à
mudança em nome da autonomia universitária e
da liberdade acadêmica. (BOAVENTURA, 2011,
p. 45)
Evidentemente, Boaventura não defende estas visões extremistas.
Como sociólogo, analisa e apresenta suas observações: entende que por
um lado, houve um ataque ao "projeto nacional" (criação do
conhecimento e formação dos quadros) pela globalização neoliberal,
193
tirando a importância da educação nas políticas econômicas e sociais
(p.47-48), entretanto, reconhece que é necessário "resituar" o papel da
universidade pública na definição e resolução de forma coletiva dos
problemas sociais, que devem ter em conta a contextualização global.
Esta pesquisadora coaduna com este entendimento e com a visão de
Buarque abaixo.
No mesmo passo, Cristovam Buarque (2014) aduz que após
quase mil anos desde sua criação, a universidade se encontra em uma
encruzilhada civilizatória e que "é necessário que se transforme e
reinvente a si própria, para servir a um projeto alternativo de civilização,
[...] tem que entrar em sintonia com esse novo rumo, corrigindo
descompasso gerado pela turbulenta virada de Século". Também indica
que as mudanças precisam ser focadas em pontos determinantes, quais
sejam: o retorno da vanguarda da produção e centro de distribuição do
conhecimento, afirmação e capacidade de assegurar o futuro de seus
discentes, assumir responsabilidade ética com o futuro da humanidade e
reconhecer que não está isolada e pertence a uma rede mundial.
Diante desta multifunção das universidades, Clark Kerr, ao
conceituar a nova fase das instituições americanas, transladou o nome de
universidade para "multiversidade" reforçando o modelo universitário e
multifuncional americano que trouxe a conjunção destas novas ideias,
que consagrou a missão da universidade na tripla missão de ensino,
pesquisa e serviço público. Desta forma, a "multiversidade" é uma
instituição multifuncional: Ela não é uma única comunidade, mas várias – a
comunidade dos alunos da graduação e dos pós-
graduandos; a comunidade dos humanistas, a
comunidade dos cientistas sociais e a comunidade
dos cientistas das exatas; as comunidades das
escolas profissionais; a comunidade de todos os
funcionários não-acadêmicos; a comunidade dos
administradores. Seus limites são imprecisos – ela
alcança até os ex-alunos, legisladores,
agricultores, empresários, os quais se relacionam
com uma ou mais dessas comunidades internas.
[...] Ao mesmo tempo em que promove a
igualdade de oportunidade, ela é uma sociedade
de classes [...]. (KERR, 2005, p. 27; 28)
Ainda na visão de Scott (2006), a universidade pós-moderna tem
como forte inclinação outra missão, a de internacionalização, em que
necessita de um modelo gerencial de excelência para melhor competir
194
no mercado global. Em todo o mundo, vê-se uma ênfase em uma
educação global e a universidade transformou-se em uma corporação
transnacional, servindo não apenas os nacionais, mas muito mais aos
"consumidores" globais.
Ressalta-se ainda que estas reflexões tenham ocorrido também
deste lado do hemisfério, como exemplo, Brisolla et al (1997, p. 203-
204), ao analisarem a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP),
concluíram que a universidade teria papel determinante,
"transcendental", nas redes que constituem a base da sociedade do
conhecimento. Reconheceram que predomina uma convicção de que as
instituições de ensino e pesquisa devem e podem desempenhar um papel
importante para diminuir o hiato tecnológico que dificulta o crescimento
econômico, porém, também naquele período, não se sabia ainda as
formas em que se constituirá esta inserção em um Sistema Nacional de
Inovação, que apesar das tentativas governamentais, ainda não se logrou
o resultado esperado.
Cabe então o questionamento: a inovação e a transferência de
tecnologia são as novas missões da universidade?
Sobre este prisma, deve-se refletir e observar com cuidado a
afirmação de que a nova missão da universidade é a inovação. Ora,
como se verá a seguir, a inovação não ocorre da forma linear apontada
por Bush, conjuga ações de vários participantes, sendo a universidade
apenas um destes participantes no processo inovativo. Ainda mais
considerando o conceito econômico de disponibilidade para o mercado
do produto ou processo desenvolvido. Portanto, melhor dizer em
transferência de conhecimento e tecnologia. Quanto a transmitir
conhecimento, esta missão é encontrada desde o início nas instituições
de ensino, contudo, os sujeitos eram estudantes ou profissionais que
recebiam o conhecimento para aplicá-lo em uma função ou profissão.
Conquanto, a transferência de conhecimento ampliou-se para uma
relação de troca também com instituições, através de consultorias e
acordos de parcerias, que acontecem com o setor público e privado. Já a
transferência de tecnologia, que notadamente resulta de pesquisas e
desenvolvimento, é particularmente bem desempenhada pela academia,
já que congrega em seu seio, cientistas e profissionais da mais variada
especialidade em um ambiente favorável. Este papel (pesquisa e
desenvolvimento) tem sido fortemente requerido das instituições de
pesquisa para solucionar o hiato do crescimento econômico acima
comentado. Assim, academia tem sido impulsionada a deixar o laissez faire (deixar passar, deixar fazer por si mesmo) da pesquisa pura para
195
observar os problemas da sociedade (incluindo o setor privado)
ofertando respostas e assumindo um compromisso de uma participação
mais efetiva neste ponto.
Acredita-se que a inovação não pode ser tomada como uma
missão da universidade, se considerarmos o conceito de inovação com
vistas a desenvolver produtos para o mercado, pois isto cabe, no
entendimento desta autora, ao setor privado, que tem maior habilidade
para lidar com o mercado. As instituições de ensino e pesquisa não
devem se preocupar com produção e marketing de produtos para o
mercado, e sim, na promoção de pesquisas, em certos casos, voltadas
para uma função prática, pontual. Evidentemente, não se pode desprezar
por completo a pesquisa básica porque os novos conceitos de ciência e
tecnologia geralmente derivam deste tipo de pesquisa. Porém, o
processo inovativo depende também das instituições de pesquisas que
podem auxiliar com sua natureza própria investigativa e proporcionar
uma visão mais precisa para desenvolvimento de produtos ou processos
que a sociedade necessita.
Contudo, é inegável que se está exigindo das universidades e
institutos de pesquisa uma postura mais proativa e mais arrojada, mais
empreendedora. Burton Clark (2003) em seu livro "Creating
Entrepeneuria Universities" (Criando Universidades Empreendedoras)
trouxe o estudo sobre algumas universidades europeias entre os anos de
1980 a 1995 e identificou que estas mudaram significantemente sua
forma de operar assumindo um papel mais proativo. Concluiu que estas
mudanças foram induzidas por cinco caminhos de transformação, quais
sejam: uma base de captação de recursos diversificada, um núcleo de
direção fortalecido, periferia de desenvolvimento expandida, coração
acadêmico estimulado e cultura de empresarial integrada. Em um livro
mais recente, Burton Clark continua sua análise com universidades. Em
"Sustaining Change in Universisties: Continuities in Case Studies and
Concepts" (2004), o autor prove um olhar para expandir
substancialmente a análise anterior e fornece um novo olhar para o
caráter evolutivo da universidade empreendedora.
Destaca três pontos que influenciam esta mudança: uma interação
de apoio mútuo entre os elementos de transformação; uma recente
prospectiva de impulso duradouro (perpétuo); nos bastidores, uma
vontade institucionalizada, uma vontade coletiva, que estimula e orienta
uma auto-sustentável e auto-seletiva contundência na resposta às
exigências da sociedade. Sumariza afirmando que os casos institucionais
estudados permitem que se identifiquem exemplos instrutivos de
196
universidades de sucesso que se adaptaram a uma vasta gama de
situações e condições culturais em várias sociedades e pode-se
demonstrar através de seu estudo que é possível combinar pesquisa para
uso com pesquisa para compreensão (2005, p.01). Audy (2006) reforça
que com a segunda revolução acadêmica nos textos de Etzkowitz (1998)
originou o conceito de "Universidade Empreendedora" ou
"Universidade Inovadora", sendo este último mais aceito e tratado por
Burton Clark. Para Etzkowitz, a universidade empreendedora foi
definida como uma instituição que tem a capacidade de gerar uma
direção estratégica formulando objetivos academicos claros e capaz de
transformar o conhecimento gerado na universidade em valor
economico e social. Para Clark, como mencionado acima, a
universidade empreendedora é uma instituição ativa que gera mudanças
na sua estrutura e no modo de reagir às demandas, sejam internas ou
externas (AUDY, 2006).
Vale destacar o texto de Kerr que reflete muito sobre como as
universidades na atualidade e detecta suas possíveis crises existenciais e
sintetiza o panorama histórico acima:
Uma universidade, em qualquer lugar do mundo,
tem como objetivo último ser o mais britânica
possível em prol de seus alunos de graduação; o
mais alemã possível em prol de seus pós-
graduandos e equipes de pesquisa e o mais
americana possível em prol da comunidade – e tão
confusa quanto possível, pelo bem da preservação
do incômodo equilíbrio social. (KERR, 2005, p.
27).
Nas palavras da Professora Branca Terra (2001, p. 22-23), no
mesmo prisma, quando se trata da universidade empreendedora, define
que a universidade deve assumir papéis múltiplos reorganizando seus
recursos para concentrar-se em novos problemas [...]. A universidade
empreendedora forma indivíduos empreendedores [...]. Portanto, a
universidade deve ser vista de uma forma mais dinâmica e conectada
com a sociedade e seus problemas.
3.5 A gestão da transferência de tecnologia e conhecimento nas
universidades
Retomando a discussão sobre transferência de tecnologia,
convém esclarecer que não trata da visão linear propriamente dita.
197
Conforme apontado nos capítulos iniciais, a transferência de tecnologia
é uma transmissão de um resultado de pesquisa que seja considerado
tecnologia, para a relação entre universidade e empresa, que pode ser
uma transferência de conhecimento e tecnologia. Quanto a transmitir
conhecimento, esta missão é encontrada desde o início nas instituições
de ensino, contudo, os sujeitos eram estudantes ou profissionais que
recebiam o conhecimento para aplicá-lo em uma função ou profissão.
Conquanto, diria que a transferência de conhecimento ampliou-se para a
relação de troca também com instituições, através de consultorias e
acordos de parcerias, que acontece com o setor público e privado. A
transferência de tecnologia, que resulta de pesquisas e desenvolvimento,
é particularmente bem desempenhada pela academia, pois congrega em
seu seio cientistas e profissionais da mais variada especialidade e com
ambiente favorável. Este papel (pesquisa e desenvolvimento) tem sido
fortemente requerido das instituições de ensino e pesquisa para
solucionar o hiato do crescimento econômico. Destarte, a academia tem
sido impelida a deixar o laissez-faire da pesquisa pura para observar os
problemas da sociedade (incluindo o setor privado) ofertando respostas
e assumindo um compromisso de uma participação mais efetiva neste
ponto.
3.5.1 A transferência de tecnologia realizada pelas ICTs
A Lei de Inovação previu as parcerias U-E como uma alternativa
para suprir uma necessidade tecnológica que as empresas brasileiras
possuem, principalmente, as pequenas e médias, uma vez que estas não
possuem em sua estrutura pesquisa e desenvolvimento, bem como, de
pessoal dedicado a estas atividades que são inerentes à inovação. A
parceria para realizar pesquisa é uma das formas mais comuns e antigas
das universidades se aproximarem com o setor privado e continua sendo
o principal canal. Esta interação sempre surtiu uma vantagem para
sociedade. Muitas vezes, a academia traz novos conceitos e tecnologia
para a indústria, e outras vezes, a indústria traz uma visão mais aplicada
e condições de se desenvolver e testar a tecnologia ou conceito gerado.
Pela legislação, as formas de contratos são: Contrato de Cessão,
Contrato de Licenciamento e Contrato de Transferência de Tecnologia.
O Contrato de Cessão significa a transferência de titularidade do direito
de propriedade intelectual. É o mesmo que dizer que o seu proprietário
"vende" a outrem este direito, não mais exercendo domínio sobre ele. Já
o Contrato de Licenciamento transfere os poderes, os direitos de
198
exploração e uso, porém, não há transmissibilidade de propriedade.
Equipara-se a um "aluguel" do bem, por tempo determinado e com fins
próprios. Este licenciamento poderá ser exclusivo (apenas o licenciado)
ou sem exclusividade, o que significa que o proprietário pode licenciar
para outros, com regras estabelecidas e certamente que não ofendam os
interesses e interesses de seus licenciados, geralmente em áreas e/ou
utilização diversa. O Contrato de Transferência de Tecnologia que trata
de transferir informações que não estão amparadas pelos Direitos de
Propriedade Intelectual e também não trata de Serviços de Assistência
Técnica. Este último tipo contratual é de mais fácil compreensão, já que
significa uma assistência técnica voltada para a área de inovação e
pesquisa científica. Portanto, é possível contratar patente de invenção e
de modelo de utilidade, desenho industrial, registro de topografia de
circuito integrado, programa computador, obra científica, certificado de
cultivar, pedido de patente, ou, aquelas não passíveis de patenteamento,
registro ou certificado, como no caso do segredo industrial, da
informação tecnológica não divulgada.
No entanto, os tipos mais comuns de parcerias entre as
universidades e as empresasa são: desenvolvimento de pesquisas e
licenciamento de tecnologia. Este último é a forma mais direta de
aproveitar o que foi desenvolvido na academia, ou seja, um resultado,
um produto, para ser levado ao mercado, transformando-o em inovação.
Quanto ao primeiro caso, tem-se o Contrato de Pesquisa ou de Pesquisa
e Desenvolvimento, ou também denominado, Acordo de Parceria ou
Cooperação com o fim de realizar atividades em conjunto de pesquisa
científica e tecnológica, e ainda, desenvolvimento de tecnologia,
produto ou processo, unindo interesses e esforços entre as duas
entidades. Mais precisamente, os contratos de transferência de
tecnologia são instrumentos que regularizam a relação entre
Universidade-Empresa (U-E), que envolvam Direitos de Propriedade
Intelectual.
No Brasil, é a partir da Lei de Inovação, em 2004, que estas
parcerias foram incentivadas e para gerir esta relação, determinou que
todas as universidades e institutos possuíssem um Núcleo de Inovação
Tecnológica, sendo o interessante agente intermediador, a seguir.
3.5.2 O papel dos Núcléos de Inovação Tecnológica no Brasil
Com a publicação da Lei da Inovação, foram criados, nas
Instituições de Ciência e Tecnologia (ICT) do país, os Núcleos de
199
Inovação Tecnológica (NITs). Esta lei foi regulamentada pelo Decreto
nº 5.563, de 11 de outubro de 2005, recentemente foi modificada pela
Lei nº 13.243/2016. Assim, com este marco legal intencionou-se ter
isonomia entre as ICTs para a gestão da transferência de tecnologia,
através desta nova figura, nova estrutura, que são os NITs. O NIT
passou a existir como órgão dentro da instituição responsável pela
gestão dos ativos intelectuais das instituições de pesquisas nas quais
estão inseridos. Convém ressaltar, que em alguns centros de pesquisa e
universidades, a figura do NIT já existia, porém, com outras
denominações, chamados de "agência de inovação", "escritório de
transferência de tecnologia" ou "escritório de propriedade intelectual".
Arbix e Consoni (2011, p. 214-215) resgatam a história e afirmam que
antes mesmo da norma geral obrigatória para criação dos NITs, foram
identificadas algumas iniciativas anteriores. Exemplificando, o caso da
PUC do Rio Grande do Sul ,que desde 1999 contou com a Agência de
Gestão Tecnológica (AGT), que integrou a Rede Inova PUC ,e, logo em
2002, foi instituído o Parque Científico e Tecnológico (TECNOPUC).
Promulgada a lei, foi criado o Escritório de Transferência de Tecnologia
(ETT) como um órgão apoiador da AGT na transferência de tecnologia
e propriedade intelectual. Da mesma forma, em Campinas, a Agência
Inova foi criada em 2003 abarcando não somente a gestão da incubadora
de base tecnológica, como também, no que se refere aos registros e
licenciamentos de patentes na Universidade de Campinas (UNICAMP).
Os NITs foram inspirados nos escritórios de transferência e de
tecnologia dos países mais avançados, os TTOs (Technology Transfer
Offices) reconhecidos nas universidades e centros de pesquisas norte-
americanos e europeus. O intuito foi ter um órgão especializado para
lidar com os ativos intangíveis gerados pelas instituições de pesquisa e
profissionalizar, organizar a transferência de tecnologia. Todavia, apesar
desta "boa intenção", os núcleos de inovação no Brasil também sofreram
(sofrem) os reflexos burocráticos da estrutura pública, já que a sua
maioria foi criada como órgão ou departamento interno das
universidades, faltando-lhe a independência jurídica na sua constituição
e dificultando uma articulação mais efetiva que este tipo de atividade
requer. Deve-se salientar que foi a Lei de Inovação que fez proliferar
estes núcleos e por esta razão, o subtítulo indicando que estes foram
estes "criados por força de lei".
Então, o que seriam os núcleos de inovação?
A própria Lei de Inovação os define, em seu Artigo 2º, inciso VI,
como "um núcleo ou órgão constituído por uma ou mais ICT com a
200
finalidade de gerir sua política de inovação" e na redação atual, como
"estrutura instituída por uma ou mais ICTs, com ou sem personalidade
jurídica própria, que tenha por finalidade a gestão de política
institucional de inovação e por competências mínimas as atribuições". A
própria redação indica que a finalidade principal do núcleo que é "gerir
a política de inovação", pressupondo-se que as ICTs precisaram
(precisam) organizar sua política de inovação. Portanto, a partir de 2004,
aquelas instituições que ainda não tivessem em suas normativas
diretrizes sobre a temática, principalmente, quanto à política de
propriedade intelectual, foram obrigadas a ajustarem seus estatutos ao
Artigo 29, do Decreto 5.563/2005, tendo um prazo de 06 meses, in verbis: "As autarquias e as fundações definidas como ICT deverão
promover o ajuste de seus estatutos aos fins previstos na Lei no 10.973,
de 2004, e neste Decreto, no prazo de seis meses, contado da data da
publicação deste Decreto."
Em tópicos anteriores neste estudo, falou-se do Sistema de
Inovação e teorias que explicam esta relação entre Universidade-
Empresa. É neste ponto que o NIT se torna um agente importante. Estes
núcleos de inovação ou agências de inovação têm um papel fundamental
como intermediador nas relações U-E, buscando dinamizar e equalizar a
linguagem entre os pesquisadores e os empresários, pois, conhecem bem
a instituição e seus processos e, ao mesmo tempo, devem ter uma visão
mais empreendedora para conduzir uma intermediação. A criação destes
núcleos e suas competências encontram dispostas no Artigo 16 da Lei nº
10.973/2004 e no artigo 17 do Decreto 5.563/2005. De forma resumida,
pode-se dizer que o objetivo principal de um NIT é intermediar estas
relações de transferência de tecnologia, através de parcerias, bem como,
buscando apoio financeiro junto aos órgãos governamentais. Pode-se
admitir que a gestão é uma ferramenta organizacional que visa velar
para que ocorra o processo contínuo e permanente desde a criação até a
disponibilização dos resultados para os terceiros interessados.
A estes órgãos a legislação dirigiu competências mínimas de
atuação, tais como: cuidar que esta política institucional seja efetiva
através da proteção das criações; licenciamento e contratos de
transferência de tecnologia; fomentar a gestão da política de inovação,
avaliando e classificando os resultados de projetos de pesquisas e
parcerias, como também, da conveniência das criações e sua proteção
intelectual; avaliar solicitação de inventor independente para adoção de
invenção; acompanhar o processamento dos pedidos e a manutenção dos
títulos de propriedade intelectual da instituição junto ao INPI.
201
Os NITs são encontrados nas universidades (públicas ou
privadas), institutos de pesquisas ou centros tecnológicos e sua estrutura
e missão dependerá da política institucional, não sendo uniforme no
país. Poderá ser encontrado como agência, escritórios, coordenadoria ou
núcleos de inovação e as ações podem variar dependendo da cultura
institucional e temática que a instituição de pesquisa se dedica, bem
como, diferenciando-se nas áreas que já possuem uma aproximação com
as indústrias ou empresas locais. Basicamente, os NITs auxiliam na
elaboração de acordos e contratos que envolvam titularidade de ativo
intelectual e transferência de tecnologia, políticas de confidencialidade,
gestão de relacionamento com os potenciais parceiros auxiliando na
identificação destes. Auxilia o pesquisador, que não tem contato com o
setor privado ou aqueles que já possuam contatos, porém, necessitem de
orientação na consecução das parcerias já iniciadas informalmente,
assessorando os profissionais com técnicas de negociação, que lhe são
próprias, e protegendo os interesses da instituição. Este órgão
intermediador busca captar recursos para realizar projetos institucionais,
através de parcerias, como também, capacitação de profissionais, seja
dentro da instituição ou para o público externo, difundindo o conceito de
inovação e formas de gerenciamento.
Logo após a publicação do marco legal, as instituições que ainda
não tinham esta política definida tiveram que se adequar e buscaram ter
um NIT próprio ou em conjunto com outra instituição, como a própria
legislação permite. Todavia, mesmo com este amparo legal e estrutural,
o desejado ambiente de inovação do Artigo 1º da Lei de Inovação não
está totalmente contemplado. Convém, pontuar estas dificuldades.
3.5.2.1 As dificuldades na Relação Universidade e Empresa (U-E)
A comunicação entre o setor público e privado denotam
problemas que ocorrem em razão dos distintos interesses, características
de cada área e questões ideológicas. Reconhece-se que as empresas e
indústrias estão na atividade empresarial para obtenção de lucro, o que é
inerente ao negócio que realizam e por isto assumem riscos. E estas
instituições privadas oferecem produtos e serviços para o mercado em
geral e devem constantemente buscar melhorias, através de tecnologias,
novos métodos, para manterem-se competitivos e na liderança. Porém,
na contramão da história, viu-se que as empresas brasileiras durante sua
evolução tiveram (ou têm) pouca cultura de inovação e um baixo nível
de investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Desta forma,
202
as empresas não tiveram preocupação em instalar centros de pesquisa e
desenvolvimento no território nacional, nem com as grandes, muito
menos com as pequenas e médias empresas. Percebe-se que o setor
privado direciona o conhecimento para o lucro, e preferencialmente,
absorvem recursos humanos com formações técnicas e científicas das
instituições científicas e tecnológicas.
Nesta relação U-E, o setor privado aponta como maior entrave a
burocracia e a morosidade do setor público em tomar decisões, neste
particular, as universidades e institutos públicos. Recordando a visão de
Maximilian Carl E.Weber (WEBER, 1982),101
a burocracia seria um
tipo ideal de organização que funcionaria como um modelo de análise
sociológica e política nas pesquisas e no desenvolvimento da teoria das
organizações e também na formulação da teoria administrativa.
Portanto, não tinha esta visão pejorativa que se vê nos dias atuais porque
visava uma organização sistematizada hierarquicamente, com visível
divisão de responsabilidade em que cada atividade desempenhada e
procedimento adotado contribuísse para o funcionamento do todo. Neste
prisma, para a estrutura burocrática, seria importante ter trabalhadores,
funcionários que ganhassem salário e tivessem jornada de trabalho
estáveis (fixos), sendo escolhido por suas competências técnicas, o que
garantiria uma rapidez e racionalidade na resolução de problemas e no
desenvolvimento do trabalho (WEBER, 1982, p. 229-249). A
"burocracia" na concepção de Weber não deveria ser uma barreira ou
problema, mas, uma forma de organizar o serviço público, por exemplo,
para que este funcionasse como uma engrenagem em que todas as
atividades funcionassem de forma complementar e eficiente.
Particularmente, quanto à transferência de tecnologia, as
empresas e indústrias quando desejam manter parcerias com as ICTs
reclamam da legislação desfavorável ao licenciamento exclusivo da
tecnologia que as ICTs estão adstritas e preferem investimentos em
curto prazo. Isso dificulta esta comunicação, pois, muitas pesquisas
científicas necessitam de um prazo maior para desenvolverem inovações
radicais, rompendo conceitos, e não apenas inovações incrementais,
melhorando o que já existe. E mais, as empresas dificilmente se
101
Max Weber foi um intelectual e jurista alemão, sendo mais reconhecido
na sociologia moderna, porém, suas ideias também encontraram eco na
Economia, a Filosofia, a Ciência Política e Administração, sendo
contemporâneo.
203
interessam em investir em pesquisas que estejam em estágio inicial, uma
vez que a visão empresarial requer um imediatismo e resultados rápidos.
Inclusive, necessitam justificar para a direção da empresa seus novos
investimentos, dificultando conseguir investimentos mais vultosos para
poucos resultados efetivos. Para a academia, a relação entre
investimento em pesquisa geralmente não se traduz em produto ou
resultados, portanto, não é um contrato que obrigatoriamente deve
produzir resultados satisfatórios, o que não agrada o setor privado. Por
isso, alguns desentendimentos acontecem quanto: à profundidade do
estudo requerido, velocidade de entrega de resultados e publicações dos
resultados, o que por vezes contraria os interesses das partes, inerentes
aos acordos de cooperação e contratos entre universidades e empresas.
As universidades recebem críticas das empresas nas quais firmam
parcerias quando realiza publicações de suas pesquisas através de
artigos científicos, o que por vezes prejudica o sigilo que estas relações
requerem. Algumas empresas entendem que as universidades e
pesquisadores devem fazê-lo, porém, em tempo acertado e não podem
expor de forma aleatória, para não prejudicar os interesses do seu
parceiro, que busca prioridade e inovação para manter a competitividade
em seu ramo. Muitas empresas que possuem uma interação melhor com
as instituições de ensino e pesquisa não defendem a proibição, mas, o
momento adequado, quando estiver protegida a tecnologia, por exemplo.
Estas relações entre universidade e empresa e a gestão estratégica
do conhecimento são elementos fundamentais na melhoria da
competitividade e índices regionais mediante a captação, interiorização
e propagação do conhecimento adquirido na universidade ou instituto de
pesquisa. Compreende-se que o modelo brasileiro de universidade está
mais voltado para formação de profissionais para o mercado de trabalho,
como herança do início da educação superior no país, porém, esta
"missão" já não subsiste sozinha uma vez que as instituições estão sendo
impelidas a assumir um papel mais dinâmico para desenvolverem
pesquisas voltadas para soluções práticas da sociedade.
As universidades e institutos de pesquisas têm suas características
próprias e alguns interesses pré-estabelecidos, como produção
acadêmica e científica, o conhecido tripé (ensino, pesquisa e extensão),
presta serviços (informação, capacitação, tecnológico), formação de
capital intelectual, gerencia conhecimento pelo conhecimento, visa
transformar a sociedade e defende a autonomia e liberdade acadêmica.
Estas atividades são importantes para a pontuação em notas de
rendimento junto aos órgãos avaliadores, como quantidade de docentes
204
com títulos de mestrado e doutorado, programas de pós-graduação,
capacidade de internacionalização, publicações em revistas de renome,
inclusive internacional, número de evasão de discentes etc. São estes
interesses que por vezes conflitam com os interesses do setor privado. A
proteção da propriedade industrial, por exemplo, passou a figurar como
critério de avaliação, pelo número de patentes, marcas, cultivares entre
outros. Portanto, o contato com o setor privado, com instituições com
missões e visões diferentes, por vezes, levantam um embate no
momento da contratação ou realização de acordos. A publicação de
artigos científicos por vezes inviabiliza o patenteamento da invenção ou
modelo de utilidade, o que tem sido muito criticado. Em razão da
complexidade, a "universalidade" e gestão democrática das instituições
de ensino têm em seu interior visão diferentes que não são
compreendidas pelo parceiro externo que muitas vezes ,aponta a
ineficiência na utilização dos recursos de fomento à pesquisa. Dos
valores que são aportados e depositados, não compreendem que a
execução financeira é complexa e existe dificuldade na gestão dos
projetos de pesquisa em parceria com as empresas, possivelmente, pela
ausência de empreendedores tecnológicos ou pessoas que consigam
dialogar de forma mais coerente com o setor privado. A criação dos
Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs) surgiram com a intenção de
facilitar esta interlocução, contudo, muitos destes estão em estágio
inicial de operação e ainda não atingiram a maturidade que estas
relações requerem.
Outro ponto interessante nesta relação é a propriedade intelectual
que passou a ser requerida e defendida pelas instituições de ensino. Na
verdade, até a promulgação da Lei da Inovação existiam universidades
que realizavam contratos e parcerias com o setor privado, entretanto,
não havia obrigatoriedade da apropriação destes direitos pela instituição,
cada caso era resolvido conforme a ocasião. Os contratos firmados
poderiam inclusive ter a total apropriabilidade do conhecimento gerado
pela empresa, o que as agradava muito. Era uma parceria em que as
universidades ficavam bastante satisfeitas também em ver seus
laboratórios bem equipados e com muitos estudantes bolsistas e
pesquisadores sendo financiados pelo projeto. Não se discutia sobre a
valoração dos resultados da pesquisa e transferência de tecnologia. Após
a legislação (Lei de Inovação), esta discussão passou a fazer parte da
negociação, reforçando a cláusula de propriedade intelectual e a
apropriabilidade dos resultados nesta interação U-E, que trazia um
205
patamar mais formal destas relações, direcionando o papel da
universidade no processo de inovação.
Da mesma forma, observa-se pelos dados apresentados neste
capítulo, para a academia, passaram a ser mais interessantes os contratos
de maior duração do que apenas atender demandas pontuais das
empresas, o que é positivo, tendo em vista os tipos de pesquisas a serem
desenvolvidas. Em algumas universidades (como a UFSC) por vezes
tem sido acordado que o prêmio a ser pago pela tecnologia ocorra a
partir da comercialização do produto pela empresa, não apenas com o
depósito de patente, diminuindo os conflitos e discordâncias. As
universidades também criticam o setor privado pelo seu imediatismo e
por quererem sempre ter as melhores vantagens do projeto investindo o
mínimo necessário, não respeitando o tempo e a forma de trabalhar dos
seus grupos de pesquisas. Este é um entendimento que o setor privado
necessita entender e ponderar quando for relacionar-se com as
universidades.
Através da história e evolução da universidade, é possível
compreender a "crise de identidade" ou reafirmação que as instituições,
principalmente, públicas, vivenciam, apontada por Buarque (2014) e
Boaventura (2011). Sabe-se que estas instituições tem papel primordial
e deve acompanhar as mudanças na própria sociedade, ora adequando-se
para servir a sociedade, ora as instituições participando ativamente nas
mudanças sociais e políticas. Também se demonstrou que a forma que o
país se estruturou industrialmente afetou diretamente no seu
desenvolvimento econômico e resultou no seu atraso tecnológico.
Preferiu-se aqui demonstrar as visões destes reconhecidos
estudiosos da temática de ensino superior, universidade e
desenvolvimento econômico, que em seus textos, apresentam visões
sociais, econômicas ou econômico-social que evidenciam a mudança no
papel e organização da universidade, principalmente a pública. Ela não
está adstrita aos apoiadores do capitalismo, mercantilização da educação
e se faz necessária. Há uma crise que precisa ser superada de forma
madura pelas instituições, com pensamento não apenas corporativista e
individualista, protecionista, mas, de alguma forma cooperativista (com
a sociedade) e global. Nos últimos anos, as instituições que atuam em
pesquisa têm sido questionadas a assumirem um papel proativo no
desenvolvimento econômico dos seus países, portanto, mais
empreendedoras. Há um estímulo à realização de projetos tecnológicos
com o setor empresarial, que visa favorecer o acesso aos conhecimentos
e habilidades tecnológicas dos parceiros, focando em minimizar os ricos
206
financeiros e permitir o aporte de novos recursos em outras atividades
de pesquisa. É uma forma de acelerar e superar o gap tecnológico que o
país ressente, mas não deve ser vislumbrado como único.
De outro modo, o setor empresarial não pode requerer tudo da
academia e que esta estejam a disposição dos interesses privados, uma
vez que, pelo histórico aqui apresentado este estágio de defasagem
industrial, cabe especialmente ao setor privado buscar e também investir
contundentemente em P&D e arriscar mais na inovação de produtos ou
processos. A indústria também necessita investir para superar o gap
tecnológico, recuperando o "tempo perdido" em sua letargia nos anos
1960 até 1990, em razão da política de substituição e importações. É
uma relação que deve ser sadia e de aprendizado, porém, muitas
empresas querem apenas ter a visão de ganho só para a própria empresa,
o que não é plausível.
Deve-se recordar que já havia uma fragilidade na interação entre
as universidades/institutos de pesquisas e as empresas, principalmente
quanto à cultura destas organizações. As indefinições sobre a
propriedade intelectual quanto à mobilidade de pesquisadores das ICTs
para as empresas, restrições legais e insuficiência de mecanismos de
incentivo e financiamento à pesquisa e desenvolvimento e inovação
também são questões a serem trabalhadas (KOELLER, 2009). Evaldo
Vilela (2011) afirma que a universidade pública e institutos de pesquisa
públicos brasileiros têm relevância no cenário nacional porque
concentram a maioria dos doutores do país, e, são nestas instituições que
se desenvolve, além da pesquisa científica, também a pesquisa básica,
mesmo porque, os centros de P&D no país ainda são muito incipientes.
Desta maneira, convém concentrar as discussões nas relações
entre universidades e empresas, apresentando as evidentes diferenças e
pontos de discordância. A universidade tem sua autonomia econômico-
financeira e como missão o ensino, pesquisa e extensão. Também presta
alguns serviços (informação, capacitação, tecnológicos), ocupa-se de
formar recursos humanos com alta qualidade e fazem transferência de
tecnologia. As empresas têm uma visão de lucro, oferecem produtos e
serviços para o mercado, absorvem recursos humanos, gerenciam
conhecimento para o lucro e também fazem pesquisa e
desenvolvimento, visando tecnologia para competir no mercado.
As críticas cruzadas na relação U-E e a insatisfação nas parcerias
destes dois grupos poderiam ser resumidas desta forma:
207
CRÍTICAS À
UNIVERSIDADE
CRÍTICAS À
EMPRESA
Incentivo maior à
publicação, inviabilizando o
patenteamento;
Poucos profissionais
qualificados para desenvolver a
parceria;
Ausência de empreendedores
tecnológicos, não visando o que a
indústria precisa;
Querem investir o mínimo
possível e pouco incentivo e
investimento em longo prazo;
Certa ineficiência na
utilização dos recursos de fomento
à pesquisa e má gestão de projetos
de pesquisas desenvolvidas em
parceria;
Dificuldades em
estabelecer parcerias em pesquia
conceituais e desejam parcerias
predatórias e desvantajosas para
universidade;
NITs em estágio embrionário
ou ausência de agencias/núcleos
especializados;
Querem parcerias com
licenciamento exclusivo de
tecnologia, prejudicando a
negociação;
Pouco interesse em
dinamizar a relação (burocracia).
Pouco interesse em
disseminar a inovação e
vislumbra apenas lucro.
Pode-se afirmar que com a promulgação da Lei de Inovação, as
parcerias e a relação entre estes dois setores, que já existiam, ficou um
pouco abalada, principalmente, porque a formalidade passou a ser
obrigatória. Passaram a importar nestas relações o instrumento
contratual com cláusulas precisas e com certa especificidade. Os
contratos de transferência de tecnologia são negócios jurídicos intuitu personae, que compreendem certas categorias de contratos típicos e
atípicos, que podem ser celebrados em separado, porém, geralmente são
em conjunto. Assafim (2005, p.102) define-o como "aquele através do
qual uma concedente transmite a um adquirente de direitos patrimoniais
sobre bens imateriais juridicamente protegidos, mediante imposição de
determinados limites ao seu exercício". Podem ser classificados como:
contratos de bens tecnológicos protegidos por direitos de exclusivos,
envolvendo, por exemplo, licenciamento ou transferência de patentes ou
marcas, e, contratos de bens imateriais não protegidos por direitos
exclusivos, como os de franquia know-how e assistência técnica.
Destaca-se que além das cláusulas comuns aos contratos em geral
sobre o objeto, as obrigações recíprocas, prazos, forma de extinção,
penalidades, forma de contraprestação, preço e condições de pagamento,
208
que neste caso é através de royalties, exigem cláusulas que são cruciais a
este tipo de contrato. É a partir da cláusula sobre os Direitos de
Propriedade Intelectual que estes direitos devem ser negociados, quando
já existentes, ou com previsão de direitos que poderão surgir, conforme
estabelecida a parceria, e serão regularizados, inclusive, quanto à
cotitularidade, no caso de geração de novas tecnologias ou
aperfeiçoamentos. O que se deve atentar são para as definições quanto à
manutenção deste direito, como responsabilidade sobre as despesas de
depósito, bem como taxas, anuidades, despesas de acompanhamento
dentre outras, relacionadas às patentes protegidas. Outra cláusula em
destaque é a da confidencialidade, que é crucial, já que através dela,
podem-se prever as obrigações das partes em manterem o sigilo próprio
e dos demais funcionários ou contratados (prestadores de serviços) para
proteger a patente, evitando assim, que terceiros tenham acesso a
documentos que possam prejudicar todo andamento contratual e
beneficiar indevidamente terceiros de má-fé. No que concerce à claúsula
de exclusividade, prevista no Artigo 6º da Lei de Inovação, Pimentel
(2009) afirma que os pedidos de patente originados dos convênios de
pesquisa ou parcerias realizadas entre empresas e universidades, para
aperfeiçoamento ou geração de novas tecnologias, a publicação de edital
é dispensada. Contudo, caso haja contratação contendo cláusula de
exclusividade, e que não se encaixe como dispensa, a oferta pública será
obrigatória (que atualmente deverá ser publicada em sítio eletrônico da
entidade), em consonância com o parágrafo primeiro do artigo 6°, da Lei
de Inovação. Pimentel ainda pontua que os contratos de transferência e
licenciamento de patente, por exemplo, poderão ser celebrados sem
exclusividade com as empresas interessadas, o que possibilita mais de
uma empresa produzir, comercializar, estudar e usar uma patente.
Antes da norma geral, o quadro relacional apresentava-se da
seguinte forma:
Antes da Lei de Inovação
Havia incertezas sobre o papel da universidade no processo de inovação;
As relações mais informais U-E e, pouco incentivada;
Havia ênfase na geração do conhecimento e na publicação de resultados
de pesquisa;
A ausência de preocupação com a proteção do conhecimento e PI;
A inexistência de regulação específica para a transferência de
tecnologia;
As soluções ocorriam conforme situação.
209
Todavia, com a entrada em vigor da lei, a situação modificou-se
para este quadro:
Apó a Lei de Inovação
Valoriza-se o papel das Instituições de Ciência e Tecnologia no
processo de inovação;
Institucionaliza-se e legitimam-se as atividades relacionadas à
inovação e as parcerias entre ICTs e o setor privado;
Estabelece-se a gestão da inovação por meio de núcleos especializados
(NITs);
Maior atenção à proteção da Propriedade Intelectual gerada na
instituição;
Cria necessidade de regulamentação interna sobre a gestão de
propriedade intelectual;
Maior profissionalismo nas soluções e organização dos resultados de
pesquisa e parcerias através de documentos (contratos) com cláusulas
mínimas e procedimentos internos.
Frise-se que de acordo com os dados apresentados pelos
relatórios do FORMICT, principalmente nos anos de 2014/2015, os
NITs, na sua maioria, enfrentam dificuldades orçamentárias e de
recursos humanos. Quanto às dificuldades orçamentárias, alguns núcleos
possuem uma receita mínima garantida para a execução de suas
atividades, entretanto, isto não é comum. Geralmente, necessitam estar
atentos aos editais de entidades de fomento, não existindo uma
independência ou autossuficiência orçamentária. Quanto à segunda, a
partir de 2004 (Lei de Inovação) houve uma excelente oferta de
treinamentos e qualificação, conquanto, ainda há uma escassez de
profissionais, de um lado, por exigir um conhecimento específico, sendo
poucos no mercado, e por outro lado, há uma rotatividade intensa nestes
órgãos, o que não auxilia na perpetuação do conhecimento e
procedimentos. Isto ocorre, inclusive, com os modelos mais atuantes do
país, como relata Glauco Arbix e Flávia Consoni ao comentarem sobre a
Agência Inova da Unicamp, que em 2009, tinham em seu quadro de
profissionais 52 colaboradores, apontando um quadro de fragilidade de
pessoal temporários, notadamente bolsistas, bem ainda, que o
observando o mapeamento das fontes orçamentárias da agência revela
que a sustentabilidade financeira depende, em larga medida, de recursos
externos por agências financiadoras, estando à mercê de objeto e prazo
de execução delimitados (ARBIX; CONSONI, 2011, p.219). Uma das
grandes ênfases de dificuldades encontradas também nos índices do
210
Relatório FORMICT (Formulário de Informações sobre a Política de
Propriedade Intelectual das Instituições Científicas e Tecnológicas, do
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Secretaria de
Desenvolvimento Tecnológico e Inovação) que aponta que a maioria das
instituições ainda sofre com a escassez de pessoal e muito mais
profissionais especializados.
3.5.3 O Modelo jurídico-institucional atual da gestão de
transferência de tecnologia Para melhor avaliar a situação atual da gestão da inovação nas
universidades ou institutos de pesquisa, observam-se os dados de
relatórios recentes sobre os NITs, dados estes coletados pelo Ministério
da Ciência, Tecnologia e Inovação, através do Formulário para
Informações sobre a Política de Propriedade Intelectual das Instituições
Científicas e Tecnológicas do Brasil (FORMICT). Neste mesmo
sentido, a pesquisa recente da Universidade de Cambridge publicado em
2014 (com apoio da Inova Campinas) aponta que ainda há muito que
evoluir e melhorar.
Para elucidar, a possível reflexão dos próprios NITs inicia-se com
os dados do Formulário para Informações sobre a Política de
Propriedade Intelectual das Instituições Científicas e Tecnológicas do
Brasil (FORMICT), que é disponibilizado pelo MCTI e que tem estreita
relação com o Fórum Nacional dos Gestores de Inovação e
Transferência de Tecnologia (FORTEC). O FORMICT é um formulário
que deverá ser preenchido através do endereço eletrônico,
https://www.mcti.gov.br/formict ,e, apesar de não ser obrigatório seu
preenchimento, é a maneira que os NITs encontram para cumprir os
requisitos do artigo 17 da Lei nº 10.973/2004. As ICTs prestam
informações anuais quanto sua política de propriedade intelectual, as
criações desenvolvidas no âmbito da instituição, as proteções requeridas
e concedidas e aos contratos de licenciamento ou de transferência de
tecnologia firmados ao Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação
(MCTI). Com estes dados, o MCTI elabora um relatório anual, que teve
sua primeira edição em 2006. Nota-se que os resultados não destoam
das opiniões e análises de alguns estudiosos e corroboram as
dificuldades sobre disparidade regional, estrutura, recursos humanos e
financiamento.
Salienta-se que o FORTEC é uma associação civil de direito
privado sem fins lucrativos, de duração indeterminada, como
211
representação dos responsáveis nas universidades e institutos de
pesquisa e instituições gestoras de inovação e pessoas físicas, em prol
do (melhor) gerenciamento das políticas de inovação e das atividades
relacionadas à propriedade intelectual e à transferência de tecnologia,
incluindo-se, neste conceito, os núcleos de inovação tecnológica (NITs),
agências, escritórios e congêneres. O fórum foi criado em 2006, tendo
um encontro anual que traz discussões e reflexões quanto à inovação,
propriedade intelectual e transferência de tecnologia. Com base no seu
estatuto, tem como objetivo disseminar a cultura de inovação,
auxiliando na institucionalização dos NITs, bem como, promover e
difundir as melhores práticas para estes núcleos ou "Instâncias Gestoras
de Inovação" (IGI), e, fomentar e cooperar com a capacitação, formação
e o desenvolvimento dos profissionais envolvidos. Principalmente, neste
último item, a atuação do FORTEC e sua contribuição foram
sobremaneira importantes. Na sua composição estão entidades públicas
ou privadas que mantenham ou tenham interesse em atividades de
pesquisa, desenvolvimento e inovação, como também pessoas físicas
que se dediquem à pesquisa na área.
Atentando para os dados do formulário, em relação aos contratos
de tecnologia, os dados do FORMICT (2014) demonstram que é
inegável a preferência pelos contratos de licenciamento de PI, existindo
poucos compartilhamentos, cessões de direitos ou permissões. Portanto,
das 264 instituições que preencheram o formulário no ano base de 2014,
194 são instituições públicas e 70 como instituições privadas. Sendo que
69,1% correspondem ao nível federal e 27,8% em nível estadual,
enquanto que as instituições em nível municipal, apenas 3,1%. O total
de instituições públicas foi de 73,5%, e o de instituições privadas, 26,5%
(p.10). Justifica-se este estudo e sua pertinência em focar nas
instituições públicas de ensino e pesquisa, uma vez que, conforme se
verá, estatisticamente, são estas instituições que mantêm no seu interior
a grande parte dos NITs no país. Convém destacar quais são os pontos
de conflitos e dificuldades que necessitam serem transpostas,
designadamente quanto aos resultados dos contratos de tecnologia,
questões sobre a proteção.
Compreendendo que a criação dos NITs seria uma ferramenta
para fomentar a inovação e relação com o setor privado, através de
parcerias e compartilhamentos, como já fora reafirmado neste estudo.
Quando se vislumbram os resultados, nota-se que este retorno não está
ocorrendo na velocidade esperada. Em suas respostas, os participantes
informaram que possuem política de inovação já implementada e que há
212
cooperação, através de projetos com terceiros, confidencialidade e
acordos de parcerias, sendo estas às atividades que tiveram maior
incidência nesta política de inovação. Entretanto, quando se verifica
quanto a parceria mais efetiva e simbiótica, os números demonstram que
a maioria (Total de 216, 158 instituições públicas e 58 privadas) não
firmou contratos de transferência de tecnologia. Somente 48 instituições
informaram possuir contratos firmados em 2014 (36 instituições
públicas e 12 privadas), estando às universidades federais com
expressivo número (p.34-35). Uma observação a ser feita é que apesar
dos NITs informarem que a cooperação e acordos de parcerias foram as
atividades que tiveram maior incidência, verifica-se que os contratos de
compartilhamentos e permissões, em que a lei desejou maior interação
entre os atores da inovação (ICTs e empresas), quase não são praticados.
Dos 2.171 Contratos de Tecnologia, 63,6% são contratos de
licenciamento de Direitos de Propriedade intelectual. Ficam 17,5% para
os Acordos de Parceria de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação; 8,9%
para os Contratos de Know-How; 4,4% para Acordos de
confidencialidade; 3,4% para o contrato de co-titularidade; 1,2% para
contrato ou convênio de compartilhamento de laboratórios,
equipamentos, instrumentos, materiais e instalações com microempresas
e empresas de pequeno porte em atividades voltadas à inovação
tecnológica, para a consecução de atividades de incubação; 1% para
contrato ou convênio de permissão de utilização de laboratórios,
equipamentos, instrumentos, materiais e instalações por empresas
nacionais e organizações de direito privado sem fins lucrativos, voltadas
para atividades de pesquisa; e 0,4% outros. Outro ponto interessante que
chama atenção é o relato de pouquíssimos casos do art. 10 da lei, que
trata da licença sem remuneração para o pesquisador constituir
empresas, da cessão de direitos sobre a criação para exercer em seu
nome e do afastamento para prestar colaboração à outra ICT. Neste
último, apenas 0,1% é de Contrato de Cessão de Direitos de Propriedade
Intelectual, e deve se considerar que a cotitularidade não é muito
utilizada também. Isto vem se repetindo desde a primeira edição do
relatório, o que se perpetua neste último que foi publicado em 2015 (ano
base 2014). Depreende-se que não existe uma cultura empreendedora
para que estes profissionais decidam desenvolverem suas ideias e
empreendimentos. É o reflexo da forma que a carreira de docente é
estruturada, principalmente, nas instituições públicas em razão da
construção histórica.
213
Outro apontamento curioso extraído da análise do Global
Innovation Index foi que alguns países como Brasil, Chile e Estados
Unidos apresentaram um dado que apesar de suas escolas conseguirem
melhores pontuações na ciência, ainda tendem a possuir níveis mais
baixos de interesse dos alunos em ciência, o que sugere que os modos
predominantes de ensino e aprendizagem podem desenvolver
conhecimento disciplinar à custa de um mais aprofundado pelo tema ou
curiosidade, portanto, não instigativo para a pesquisa (THE GLOBAL
INNOVATION INDEX, 2014, p.79).102
Quanto à proteção dos ativos intangíveis, estando mais presente
nas instituições públicas, foram 66% (128 instituições) das instituições
no país que informaram possuírem pedidos de proteção de propriedade
intelectual requeridos ou concedidos no ano-base de 2014, outros 34%
(66 instituições) informaram que não possuem pedidos; para as privadas
inversamente, a maioria 52,9% (37 instituições) dizem não possuir
pedidos de proteção em 2014, contra 47,1% (33 instituições) que
apresentaram pedidos de proteção de propriedade intelectual (p.23).
Ainda neste item, percebe-se que há tendência para requerimento de
patentes de invenção aos tipos de pedidos de proteção requeridos
(1.284), seguidas do Programa de Computador (444), Registro de Marca
(263), Modelo de Utilidade (58), Desenho Industrial e Proteção de
Cultivar (44, cada) e Direito Autoral (apenas 03), nenhum requerimento
para Circuitos Integrados e Indicação Geográfica (FORMICT, 2014,
p.27).
Não muito distante destas conclusões, o Relatório de Pesquisa
sobre os Escritórios de Transferência de Tecnologia no Brasil, realizado
pela Universidade de Cambridge, publicado em 2014 e patrocinado pelo
Ministério das Relações Exteriores Britânico e Commonwealth, as quais
confirmaram os dados do FORMICT. Para a pesquisa, foram contatados
193 núcleos de inovação que responderam de forma voluntária.
Buscaram cobrir todas as regiões do país, através de e-mails tendo um
prazo de coleta de respostas entre janeiro e fevereiro de 2014
(Cambridge University, 2014, p. 3). Pelas respostas encaminhadas foi
possível mapear mais a região sul, sudeste e nordeste, sendo que a
região norte e centro-oeste foi pouco expressiva. Dos tópicos
102
Para consultar os dados estão disponíveis
em:<https://www.globalinnovationindex.org/content.aspx?page=gii-full-
report-2014>. Acesso em: 25 ago. 2015.
214
abordados, destacam-se: a interpretação da transferência de tecnologia e
comercialização, a integração dos NITs, estrutura dos NITs e
necessidade de mudança na legislação. Sobre transferência de tecnologia
e comercialização, conforme conclusão da pesquisa, não há uma
concordância nacional sobre qual o melhor caminho (p.5). Inicialmente,
parecia que estava focada pesadamente em patenteamento, porém, na
pesquisa não há uma escolha definida entre os entrevistados. Já quanto à
integração dos NITs (p.06), apesar de a legislação obrigar a existência
de Nits nas ICTs, isto não significou homogeneidade, seja na forma de
criação ou estrutura, uma vez que isto depende da escala e foco da
própria instituição. Mais da metade (54%) acredita que tem o apoio
necessário e financiamento, porém, aproximadamente dois terços (63%)
dos entrevistados não acreditavam que a transferência de tecnologia está
estabelecida como parte da estratégia da universidade. Há pouca
concordância, por exemplo, nas regiões sudeste e nordeste que a
constituição de novas empresas é o melhor caminho por outro lado,
metade dos NITs da região Sul concordam que spin-out103
é a melhor
maneira de transferir uma tecnologia. Sobre as patentes, notou-se que
cada região tem um nível muito diferente de apoio para as patentes,
sendo que somente 20% do Nordeste entendem que é crítico para o
desenvolvimento do trabalho, contra 50% no Sudeste e 75% no Sul
(p.11). Quanto à capacitação e habilidades para gerir o processo de
transferência de tecnologia, o Nordeste obteve a mais franzina resposta,
com apenas 20% que acreditam que tenham habilidades comerciais e
legais e ninguém respondeu que teria habilidade técnica necessária,
enquanto o Sudeste é muito mais confiante sobre suas habilidades legais
(60% concordam), entretanto, esta região tem a menor pontuação na
realização de acordos em habilidades comerciais e é a segunda em
competências técnicas, sendo que somente 20% concorda que tenham
competências técnicas necessárias (p.11-12). Sobre financiamentos,
identificou-se que existe uma fraca cultura de investimento de empresas
"anjos", bem como, sobre investimentos de capital de risco no país que
não ficou muito clara. Sobre a legislação voltada para inovação, foi
questionado se as instituições concordam que a lei funciona (bem) e não
precisam de mudanças. As respostas demonstraram que 75% não
103
Um tipo de reestruturação societária que ocorre quando uma corporação
se divide para formar uma nova corporação em que a empresa-mãe pode ter
uma participaçãono capital daempresa recém-formada.
215
concordam com esta afirmação, o que indica que um grande corpo de
profissionais que trabalha com a transferência de tecnologia não acredita
que o atual quadro jurídico está a trabalhar de forma eficaz (p.09). Este
é o ponto relacionado ao quadro jurídico institucional e sua influência na
desenvoltura dos NITs.
Sobre a legislação aplicável e estrutura dos NITs nas
universidades e a influência no seu desempenho, ressalta-se que ainda
não houve estudo direcionado. Contudo, vale-se do estudo apresentado
sobre os "Modelos Institucionais das Organizações de Pesquisa"
publicado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), em
2010, que não destoa da realidade dos NITs. Este estudo identificou 17
tipos de estatutos jurídicos destas organizações e admitiram que as
diferentes formas de organização jurídico-institucional podem interferir
em diferentes maneiras nestas organizações, influenciado o grau de
autonomia, tanto nas questões contratuais, gestão de recursos humanos,
composição de receitas orçamentárias e financeiras, bem como, nos
aspectos políticos-institucionais. A relação deste estudo com as
universidades, que expressamente foram excluídas, é historica,
inclusive, reconhece que muitas destas Organizações de Pesquisa (OPS)
são spin offs das universidades. A classificação apresentada abarca
forrmas jurídicas também adotadas pelas universidades brasileiras,
principalmente, quanto à administração pública indireta (fundações e
autarquias), que, por conseguinte também sofrem as mesmas
adversidades. Dessa forma, os tipos de institutos encontrados nos
grandes grupos estão distribuídos (dentro da estrutura federal) em:
administração pública direta, autarquia/fundação pública/órgãos
autônomos; fundação (estadual) de direito privado; organização social;
empresa pública; sociedade de economia mista (tesouro maior) e
sociedade de economia mista (tesouro menor). Conjugando os dados, os
pesquisadores indicaram duas determinantes importantes que influencia
o desempenho das OPs como: o modelo jurídico-institucional e as
influências polítco-mandatórias, que acabam por definirem o modelo
gerencial. À vista disso, as competências internas e os modelos
gerenciais adotados pelas organizações de pesquisa podem fazer com
que a interferência da estrutura jurídica e a ingerência política avancem
ou recuem sobre a autonomia da entidade, variando o grau de
flexibilidade interna (CGEE, 2010, p. 18- 21, 39).
Corroborando o que já fora mencionado, estes Núcleos de
Inovação Tecnológica foram, em sua maioria, constituídos nas ICTs
pela obrigatoriedade da Lei de Inovação a partir de 2004, impondo-lhes
216
a função de gerir e manter a política institucional de inovação e
principalmente, a transferência de tecnologia e a propriedade intelectual.
Com esta década de experiência, pode-se afirmar que o país está
formulando uma história diferente sobre inovação quando se compara
com as décadas anteriores, ao menos nas ICTs (públicas ou privadas)
em sua organização e formalização de políticas de inovação e
transferência de tecnologia. Todavia, apesar deste decênio, ainda se
percebe dificuldade na efetiva execução e implementação dos artigos da
própria lei, que se verá na análise da pesquisa empírica no último
capítulo. É importante então analisar não somente o que o setor privado
ou a comunidade externa que se relaciona com estes núcleos pensam,
mas também, ouvi-los internamente para entender se existe maturidade e
autoreflexão sobre problemas e soluções. Estas dificuldades ou
debilidades transparecem na coleta de dados citados e estarão presentes
nos casos estudados.
Necessita-se, portanto, sair da postura de inércia e conformismo e
avançar para uma postura mais assertiva quanto à transferência de
tecnologia, não apenas pensando em paliativos e aranjos. Sair da
posição de path losers para path finders, conforme visão de Salles-Filho
e Bonacelli (2007, p. 01; 09). Para estes autores, ao tratarem sobre as
tendências das organizações públicas de pesquisa no caso brasileiro,
existem três diferentes trajetórias que podem ser identificadas conforme
a tendência adotada pelas instituições públicas de pesquisa: os path
finders, que são as instituições que adaptaram seu ambiente original
através da introdução de uma perspectiva de inovação; os path founders,
são aquelas que iniciaram a construção de trajetória totalmente diferente
da que seguiu ao longo de décadas, com uma tentativa clara de buscar
mudanças, e, por último, os path losers (os perdedores), que são
instituições que têm experimentado grandes dificuldades na sustentação
de suas atividades, porém, ainda não tomaram medidas para mudar o
curso e para reponder ao ambiente em mudança. Esta classificação
referente aos caminhos escolhidos foi determinada pelo resultado das
decisões tomadas pelas próprias organizações. São, portanto, o reflexo
das decisões tomadas ante o desafio sobre inovação. Destarte, algumas
decidiram desenvolver e implementar novas capacidades, especialmente
para a gestão das atividades de P&D no contexto dos sistemas de
inovação (path finders). Outras, tomaram a iniciativa de fazer uma
melhor utilização do espaço de manobra que tiveram (path founders);
Ainda há aquelas que não fizeram muito e mantiveram uma atitude
passiva (path losers). Isso, analogicamente, pode-se aplicar às
217
universidades e seus núcleos de inovação, considerando que muitos
NITs já possuem mais de 10 anos de existência. Resulta na necessidade
de aprimoramento desta implementação na política de inovação
institucional. Em razão da estrutura jurídica apresentada pela legislação
de 2004, a forma encontrada para flexibilidar ou desburocratizar as
ações das instituições públicas são os serviços prestados pelas fundações
de apoio à pesquisa que exercem um papel importante na configuração
atual dos NITs. Contudo, a partir de 2016, a alteração da Lei de
Inovação permite que o próprio NIT possa configurar como fundação de
apoio, sendo uma tentativa em dar mais independência ao NIT.
219
4 ESTUDO DE CASO: UNIVERSIDADES DOS ESTADOS DE
MATO GROSSO E SANTA CATARINA Pesquisar sobre a universidade é debruçar sobre
a tarefa intrigante de abordar um objeto de longa
trajetória e muitos desafios. Entre eles, o de
procurar compreender fenômenos sociais,
estruturais, tecnológicos, produtivos e
organizacionais que tiveram – e têm – lugar na
história do homem, das sociedades e das suas
instituições. Tratando-se, pois, ela própria, de
uma instituição que estuda instituições,
compreendê-la significa lidar com um objeto que
procura falar sobre e para si mesmo. (FIALHO,
2005, p. 15).
4.1 Procedimentos metodológicos de pesquisa
Ao descrever sobre método, Roberto Jarry Richardson (2015, p.
23), define-o como: “um caminho ou a maneira para chegar a
determinado fim ou objetivo”. O método científico funda-se,
caracteriza-se pela escolha de procedimentos sistemáticos para
investigar ou estudar a natureza, o que origina um pensamento
científico. Richardson (2015, p. 70) ao tratar método científico afirma
também que este: “consiste em delimitar um problema, realizar
observações e interpretá-las com base nas relações encontradas
fundamentando-se, se possível, nas teorias existentes”. Da mesma
forma, Orides Mezzaroba e Cláudia Servilha Monteiro afirmam que o
método é um caminho para alcançar um objetivo, mas, para realizar os
seus objetivos conforme o caminho que se escolheu deverá, na
sequência, definir o(s) procedimento(s) técnico(s), os instrumentos que
serão adotados. E será científico o método, o caminho seguido pelo
cientista na persecução de seus resultados investigativos almejados,
desde que siga etapas para a solução do problema proposto
(MEZZAROBA; MONTEIRO, 2009, p.50, 55- 56).
No método científico é possível separá-lo em duas abordagens, a
qualitativa e a quantitativa. A abordagem qualitativa tem se dedicado à
visão empírica que busca respostas em situações concretas e no
comportamento e vida humana, como nos estudos de caso, histórias de
vida, experiências pessoais e profissionais, rotinas etc. Já a abordagem
quantitativa ocupa-se com os dados que devem ser quantificados,
através da técnica estatística, que possibilita classificação e descrição do
objeto visando sua relação de causalidade nos eventos estudados.
220
4.1.1 Métodos de Pesquisa e do Estudo de Caso
Compreende-se que existe uma dificuldade em verificar todos os
casos e fenômenos que envolvam um problema, o estudo de um caso
determinado ou múltiplos casos pode ser utilizado como um exemplo de
um todo, expressando uma realidade típica que seu estudo possa ser
aplicado em outros casos. Portanto, é possível aplicar um método para
estudos de caso que pode envolver tanto situações de estudo de um
único caso como de múltiplos casos. Para Gil (2010, p. 37) o estudo de
caso é uma modalidade de pesquisa que consiste no estudo profundo e
exaustivo de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo e
detalhado conhecimento. Também destaca que na atualidade, o estudo
de caso é visto como um delineamento mais adequado para realizar uma
investigação de um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto
real permitindo que os investigadores foquem um “caso” e retenham
uma perspectiva holística e do mundo real, o que deve ser uma
manifestação concreta da abstração (YIN, 2015, p. 4; 36). Robert Stake
(1994) indica que: “o estudo de caso não é uma escolha metodológica,
mas uma escolha de objeto a ser estudado; nós é que escolhemos estudar
o caso”.104
E afirma que um estudo de caso é ambos, o processo de
aprender sobre o caso e o produto do nosso aprendizado (STAKE, 1994,
p. 236 - 237).
O estudo de caso, para Mezzaroba e Monteiro (2009), é uma
pesquisa monográfica (um assunto) característica da pesquisa qualitativa
que examina uma situação empiricamente verificável e não sobre o tema
geral. Desse modo, o objeto sofre um recorte metodológico radical, de
maneira que o pesquisador assume o compromisso de promover sua
análise, de forma profunda, exaustiva e extensa, portanto, examinando o
objeto sempre levando em consideração os fatores que influenciam
direta ou indiretamente na sua natureza e desenvolvimento. E o que
importa e que o caso deve existir no plano prático, histórico e que possa
ser experimentado pela percepção da realidade (MEZZAROBA et al,
2009, p. 121-123). Assim, deve-se reconhecer que o fator predominante
para a escolha da estratégia de estudo de caso em contraposição ao uso
de experimentos, levantamentos de dados, pesquisa histórica, está na
forma da pergunta de pesquisa, do controle exigido sobre eventos
comportamentais e do foco sobre acontecimentos contemporâneos ou
104
Texto original: Case study is no a methodological choice, but a choice of
object to be studied. We choose to study the case.
221
não. E uma das vantagens é que a coleta de dados é realizada a partir de
múltiplas fontes, tendo como base, documentos ou observações, relatos,
percepções e ainda a própria pesquisa quantitativa. Neste ponto, Yin
(2015, p. 45) esclarece que os estudos de caso não representam
amostras, como o faz o cientista de experimentos, bem como, não
procura casos representativos de uma população para qual deseja
generalizar seus resultados, busca na verdade, a partir de uma questão
particular possibilidade de gerar proposições teóricas a serem aplicadas
a outros casos ou situações, o que denominou de generalização
analítica105
. Desta forma, não preocupa com questões quantitativas
como na generalização estatística que necessita de representatividade.
Nas palavras de Robert Yin: O principal ponto nesta conjuntura é que você
deve tentar mirar em direção à generalização
analítica ao realizar os estudos de caso, evitando
raciocinar em termos confusos como, a
“amostragem de casos” ou o “tamanho pequeno
da amostragem de casos” como se um estudo de
caso único – ou de casos múltiplos – fosse
equivalente aos respondentes em um
levantamento [...]
De forma semelhante, mesmo se referir ao seu
caso como “amostragem intencional” pode gerar
problemas conceituais e terminológicos. Você
pode querer dizer que a proção “intencional” dos
termos reflete sua seleção de um caso que
elucidará as proporções teóricas do seu estudo de
caso. Contudo, o uso da porção de “amostragem”
dos termos ainda tem o risco de erroneamente
levar outras pessoas a pensar que o caso vem de
um universo maior ou de uma população de casos
similares maior, indesejavelmente reacendendo o
espectro da generalização estatística. A postura
mais desejável pode ser evitar remeter a qualquer
105
Para Robert Yin, a generalização analítica tem como base a
corroboração, modificação, rejeição ou, de uma forma, avanço de conceitos
teóricos que foi referido no projeto do estudo de caso, bem ainda, de novos
conceitos que surgiram com a conclusão do seu estudo de caso (2015, p.
44).
222
tipo de amostragem (intencional ou não) (YIN,
2015, p. 45).
De outro modo, para Robert E. Stake (1994, p. 240) vale
questionar o que pode ser aprendido de um caso singular e, na sua visão,
este caso poderá se relacionar com casos semelhantes ou diferentes
através das comparações do leitor. Por isso, acredita que quando a
narrativa do pesquisador proporciona oportunidade de uma experiência
vicária, possibilita leitores a alargarem as suas memórias de
acontecimentos. Então, naturalistas, casos etnográficos, em certa
medida, a experiência atual paralela, alimentando os processos mais
fundamentais da consciência e compreensão,106
é o que chamou de
generalização naturalística107
, pensando em uma reprensentatividade de
uma população estudada.
Este estudo adota também o método de estudo de caso,
especificamente quanto às instituições científicas estaduais, sendo
selecionadas as Universidades do Estado de Mato Grosso e do Estado de
Santa Catarina. Deste modo, é um estudo de caso institucional
comparado, sendo institucional, pois, investiga sobre instituições
(universidades públicas), sendo ela(s) o objeto de estudo, em uma
abordagem no tempo, espaço e nos aspectos relevantes ao caso; e
comparado, por estabeler relações comparativas entre dois ou mais casos
específicos, com a finalidade de verificar as conexões entre eles
(MEZZAROBA et al, 2009, p. 124- 127).
4.1.2 Escolha da Técnica e Instrumento de Coleta
Para Yin (2015, p. 109- 122), a forma de coletar dados poderá ser
realizada por variadas fontes de evidências destacando-se neste estudo a
entrevista, a análise documental e a observação, sendo que estes foram
os instrumentos adotados para esta pesquisa. Para realizar as entrevistas,
106
Texto original: When the researcher’s narrative provides opportunity for
vicarious experience, readers extend their memories of happenings.
Naturalistic, ethnographic case materials, to some extent, parallel actual
experience, feeding into the most fundamental processes of awareness and
understanding. 107
Sobre as posições de Robert Yin e Robert Stake ressalta-se artigo de
Alda Judith Alvez-Mazzotti, Usos e Abusos dos Estudos de Caso, in
Caderno de Pesquisa, v. 36, n. 129, p. 637-651, set./dez.2006.
223
foi preparado um roteiro, constante no apêndice, em que foram
elaboradas perguntas abertas e não estruturadas permitindo ao
entrevistado que tivesse maior liberdade em transmitir a realidade que
percebe a sua volta, o que contribuiu para a investigação. Apesar de
existirem questões previamente definidas, houve a possibilidade de
inclusão de outras questões na condução das respostas ao problema de
pesquisa, tendo como base a literatura abordada no estudo nos capítulos
iniciais. As entrevistas foram realizadas pessoalmente nos meses de
outubro e novembro de 2015 com os agentes que exerciam atividades
junto ao NIT na UNEMAT, a Coordenadoria de Projetos e Inovação e o
Núcleo de Apoio à Inovação Tecnológica e Captação de Recursos
Externos (NITEC) na UDESC. Na UNEMAT foram entrevistas 2
agentes de inovação que exerciam suas atividades no período da
pesquisa (Diretor e Supervisor) do NIT; na UDESC foi entrevistada a
Coodernadora de Projetos e Inovação e os docentes que estiverem à
frente do Núcleo de Apoio à Inovação Tecnológica (Joinville).
A observação realizada nas visitas e contato com os entrevistados
também foi um meio de coleta de dados durante visitas realizadas aos
Núcleos de Inovação. Outro meio foi à análise documental que focalizou
o histórico das universidades, contexto regional e importância de cada
uma, através de livros e revistas, informativos nos sítios eletrônicos e
matérias veiculadas e, principalmente, em documentos internos das
instituições, como regulamentos e normativas políticas.
4.1.3 Seleção dos casos
Yin (2015, p. 36-37) esclarece que o caso a ser estudado pode ser
uma pessoa, um produto ou uma instituição ou um grupo de instituições,
configurando casos múltiplos. Portanto, existe um ou mais casos em que
se poderá identificar o fenômeno a ser estudado, no qual possibilite uma
comparação e de certa forma um grau de generalização e que tenham
relação com a realidade. E estes casos escolhidos deverão preencher
requisitos como viabilidade de estudo (acesso aos dados, tempo
necessário etc), bem como princípios éticos. Acrescenta que é salutar
realizar um estudo de caso de “dois casos”, considerando que as chances
de realizar um bom estudo de caso serão melhores que ser for um caso
único (YIN, 2015, p. 67). Vale ressaltar que esta pesquisa através do
estudo de caso institucional teve como objeto duas instituições de ensino
superior, com o intuito de verificar a oportunidade das instituições
investigadas servirem de “luz empírica” sobre conceitos ou princípios
224
teóricos assumindo a forma de hipóteses e que poderão ser aplicados na
reinterpretação dos resultados de outras instituições, podendo assim,
realizar uma generalização analítica (YIN, 2015, p. 44).
A seleção das instituições que compuseram a o “caso de estudo”
ocorreu em razão do tema de estudo, problema de pesquisa e os
objetivos, bem como, sua natureza jurídica e inserção geográfica.
Assim, os critérios de elegibilidade foram:108
a) Universidade pública estadual, multicampi;
b) Universidade pública estadual que tenham núcleo de inovação
instituído;
c) Universidade pública estadual que tenha normas mínimas
internas sobre os procedimentos e organização da transferência de
conhecimento ou tecnologia;
d) Universidade pública estadual que tenha política de inovação
em implantação ou implantada e exerçam um papel de
desenvolvimento estadual;
e) Universidade pública estadual que tiveram ou tenham um
contato com empresas, principalmente, casos após a Lei de
inovação;
O critério em razão de ser universidade pública estadual
multicampi foi definido em razão de existirem poucos estudos
direcionados para estas instituições estaduais, neste aspecto, destaca-se o
reconhecido estudo de Nadia Hage Fialho (2005), com título
“Universidade Multicampi”, e o estudo realizado pelo Núcleo de
Pesquisa sobre Ensino Superior (NUPES) em 1998,109
pela
Universidade de São Paulo que tratou sobre a formação e atuação destas
Instituições de Ensino Superior (IES). Contudo, pouco se encontra sobre
a aplicação da política de inovação no país e nos Estados, o que
pressupõe um ineditismo, já que a maioria dos estudos volta-se para as
108
As observações e experiências desta autora quanto às atividades e
funcionamento de uma universidade pública estadual, somadas às
facilidades de acesso a documentos e disponibilidade dos profissionais em
participar dos estudos, foram fatores que complementaram a escolha das
instituições como caso. 109
O estudo foi um projeto financiado pela Secretaria de Ensino Superior do
Ministério da Educação e do Desporto. Os dados das universidades referem-
se ao ano de 1995. As informações foram coletadas, pelo NUPES, entre
novembro de 1996 e abril de 1997.
225
universidades federais, ou aquelas que mesmo sendo estadual, já foram
bastante estudadas e já possuem uma política de inovação consolidada,
como a UNICAMP. A institucionalização de um Núcleo de Inovação
Tecnológica (NIT) é relevante em razão de que é através deste órgão
que as universidades passaram a aprimorar e administrar os projetos e
contratos que envolvam inovação e Propriedade Intelectual, sendo
constituído formalmente em consonância com a Lei de Inovação. As
regras mínimas sobre a transferência de conhecimento e tecnologia e
políticas institucionais podem demonstrar os reais reflexos do
direcionamento da legislação e política nacional sobre inovação e
comprovar se a realidade está refletindo os documentos institucionais. O
interesse e foco em manter a relação U-E é crucial, pois configura o
objetivo do trabalho. Dentro dos critérios de ilegibilidade acima
apresentados, as universidades selecionadas foram a Universidade do
Estado de Mato Grosso (UNEMAT) e a Universidade do Estado de
Santa Catarina (UDESC) que também somam na sua trajetório a missão
desenvolvimentista e inserção regional, contribuindo também a
proximidade da pesquisadora com o objeto de pequisa.
4.2 As universidades estaduais e seu contexto
As universidades estaduais integram o sistema de ensino superior
no país, contudo, seu financiamento está adstrito aos repasses do Estado
onde está inserida e em alguns editais ou ações específicas da União.
Estas universidades encontram-se entre o dilema de serem estaduais no
financiamento, porém, impelidas a ter a mesma qualidade encontrada
nas universidades federais que são financiadas pela União. Nádia Fialho
destaca que a situação das universidades estaduais é no mínimo
paradoxal, já que, tendo ou não o apoio governamental (estadual ou
federal) incidem os mesmos padrões acadêmicos de qualificação
institucional. E ainda, o que realmente existe no país é um sistema
federal e não nacional de educação superior, denotando a valorização às
universidades do sistema federal (FIALHO, 2011, p. 6). Importante
salientar que muitas universidades federais também surgiram de
iniciativas dos Estados e que ao longo de sua atuação foram assumidas
pelo governo federal.
Cumpre comentar que as universidades federais surgiram de duas
formas, seja pelo desmembramento ou agregação de estabelecimentos
públicos (federais, estaduais ou municipais), seja pela inauguração de
novos estabelecimentos. Através das leis que as instituíram, cada
226
universidade federal brasileira, das 37 universidades criadas entre 1920
e 1986, apenas duas se constituíram puramente do início, da “estaca
zero”, nominalmente a Universidade de Brasília e a de Rondônia e,
quatro da transformação de instituições públicas (Federal de Viçosa,
Federal do Acre, Federal do Mato Grosso do Sul, Federal do Rio de
Janeiro), sendo que todas as demais resultaram da transformação de
instituições privadas, ou de um conjunto de estabelecimentos privados e
públicos, em universidade sob a forma de autarquia ou de fundação
pública federal (COSTA, 2014, p. 200). Federalizaram-se, por exemplo,
A Universidade do Rio Grande do Sul (1950), de Minas Gerais (1949),
da Bahia (1950), do Paraná (1951) entre outras (SAVIANI, 2010, p. 6-
7). E àquelas que estavam sob o domínio de governos locais como a
Universidade Federal do Rio Grande do Norte e a Universidade Federal
do Acre, que foram iniciativas estaduais e se federalizaram em 1960 e
1974, respectivamente. Esta mudança de comando das instituições de
ensino ocorreu no final da década de 40 e durante as seguintes (50, 60 e
70) e foi descrito como fenômeno da “federalização” das
universidades110
. Este foi o processo histórico de expansão de
instituições de ensino superior e significou a avocação pelo governo
federal de algumas universidades locais, estaduais e privadas
(SAVIANI, 2010, p. 6). Patrícia Cláudia da Costa (2014, p. 192) definiu
a federalização como um processo de aglutinação de escolas, faculdades
ou institutos isolados que passam a integrar uma unidade
institucionalizada como universidade, administrada por uma reitoria
comum ou de criação de uma nova instituição, sendo que neste caso
pode ser resultado de aglutinação acrescida de criação de novos cursos e
campi, sob a administração do governo federal. Cunha em sua obra
"Universidade Temporã" (2000, p. 172) afirma que o populismo e o
desenvolvimentismo foram fatores condicionantes da federalização que
era tida como um ideal de garantia da excelência institucional a partir
dos anos de 1950. O processo de federalização foi marcante para a
criação da maioria das universidades federais consolidadas atualmente e
do aumento da oferta do ensino superior gratuito. Deve-se observar que
as universidades estaduais, ou melhor, as instituições de ensino
estaduais surgiram antes mesmo das universidades federais. Aqui se
110
Um estudo mais detalhado poderá ser encontrado na Dissertação de
Mestrado de Isamara Martins Vasconcelos com o título: A federalização do
ensino superior no Brasil, UnB, 2007.
227
buscará fazer uma perfunctória contextualização das universidades
públicas estaduais, uma vez que se verifica que na maioria dos relatos e
estudos sobre universidade no Brasil, trata com maior cuidado das
universidades federais, com discussões específicas de universidades
estaduais que são destaques nacionais como as encontradas em São
Paulo, o que não se deseja repetir neste estudo.
De acordo com as estatísticas do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), tratadas no censo
publicado em 2015 (referência ao ano de 2013) no universo de
universidades públicas no país, as universidades estaduais são
representadas com 119 unidades (campi), suplantando o número das
universidades federais (106) e municipais (76), estando distribuídas em
todas as regiões do país (INEP, 2015). Destacando-se que os Estados de
Paraná, Bahia, Ceará e São Paulo são os estados que mais concentrar
universidades estaduais: o primeiro tem 7 universidades (UEL, UEM,
UEPG, UNIOESTE, UNICENTRO, UENP e UNESPAR) 111
, o segundo
4 universidades (UEFS, UESB, UNEV E UESC)112
e o terceiro e
quanto com 3 universidades (São Paulo: UNICAMP, USP, UNESP) 113
e
(Ceará: UECE, UVA/CE E URC)114
.
Vale ressaltar que entre as peculiaridades das universidades
estaduais está o seu modelo de constituição e natureza jurídica. Muitas
destas universidades estaduais foram constituídas como fundação ou
autarquia estadual com regime especial e com dotação orçamentária
própria, mantidas pelo Estado ou por repasses da Secretaria de Estado de
Educação ou de Ciência e Tecnologia que estão vinculadas. As decisões
de suas políticas dependem também do Conselho Estadual (Educação ou
Ciência e Tecnologia). Contudo, é possível encontrar universidades com
111
Universidade Estadual de Londrina, Universidade Estadual de Maringá,
Universidade Estadual de Ponta Grossa, Universidade Estadual do Oeste do
Paraná, Universidade Estadual do Centro-Oeste, Universidade Estadual do
Norte do Paraná e Universidade Estadual do Paraná. 112
Universidade Estadual de Feira de Santana, Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia, Universidade do Estado da Bahia e Universidade
Estadual de Santa Cruz. 113
Universidade de Campinas, Universidade de São Paulo e Universidade
Estadual Paulista- Julio de Mesquita Filho. 114
Universidade Estadual do Ceará, Universidade Estadual Vale do Acaraú,
Universidade Regional do Cariri.
228
uma constituição diversa, como é o caso da UNITINS (Universidade de
Tocantis) que mesmo se intitulando universidade estadual, tem
personalidade de direito público privado, o que indica que estas
universidades possuem algumas peculiaridades diferentes das federais
que merecem atenção.
4.2.1 Universidade estudada: UNEMAT
A Unemat foi criada inicialmente como o Instituto de Ensino
Superior de Cáceres (IESC), em 20 de Julho de 1978, como uma
entidade autárquica municipal, mantendo a visão de ter nascido “no
interior para o interior”, já que a Universidade Federal concentrou-se
muitos anos na capital do Estado. Através do Decreto Federal 89.719, de
30 de maio de 1984, foi autorizado o funcionamento dos cursos
ministrados pelo IESC. Em 1985, com a Lei Estadual 4.960, de 19 de
dezembro, o Poder Executivo institui a Fundação Centro Universitário
de Cáceres (FUCUC), entidade fundacional, autônoma, vinculada à
Secretaria de Educação e Cultura do Estado de Mato Grosso, com
intuito de promover a pesquisa e o estudo dos diferentes ramos do saber
e a divulgação científica, técnica e cultural. Posteriormente, sofreu
alterações nos anos 1989 (Fundação Centro de Ensino Superior) e 1992
(Fundação de Ensino Superior de Mato Grosso - FESMAT). Houve a
expansão da instituição para outras regiões do Estado de Mato Grosso
ocorre na década de1990, quando há a abertura dos núcleos fora de sede
(Cáceres), nos municípios de Sinop (1990); Alta Floresta, Alto
Araguaia, Nova Xavantina, Pontes e Lacerda e Luciara (todos em 1991);
Barra do Bugres e Colíder em (ambos 1994), Tangará da Serra (1995);
Juara (1999). Mas, através da Lei Complementar 30, de 15 de dezembro
de 1993, que foi instituída a Universidade do Estado de Mato Grosso
(Unemat), com natureza jurídica de fundação, o que possibilitou
transformar os núcleos pedagógicos criados em campi universitários.
Recentemente, no ano de 2013, a Unemat pode encampar novos cursos
que eram oferecidos por universidade privada e municipal aumentando
seu número de campi para 13, agregando os cursos de graduação da
Faculdade de Ciências Sociais e Aplicadas de Diamantino (Uned) e da
Uninova (União do Ensino Superior de Nova Mutum), do município de
Nova Mutum.
A universidade tem uma atuação marcante em Mato Grosso, já
que mantém além dos campi citados, 10 Núcleos Pedagógicos e 18
Pólos Educacionais de Ensino a Distância visando atender as demandas
229
específicas do Estado. A universidade tem como trabalho pioneiro a
nível nacional e internacional a Educação Indígena com cursos de
licenciaturas direcionados e diferenciados para mais de 30 etnias.
4.2.1.1 Histórico e estrutura jurídico-institucional
O Estado de Mato Grosso é conhecido pela sua vocação agrícola
e extrativista, sendo consagrado como grande exportador de soja e carne
bovina. Albues e Heinzmann (2012) destacam como atores de inovação
do estado, na área de pesquisa e desenvolvimento: a Universidade
Federal de Mato Grosso (UFMT), Universidade do Estado de Mato
Grosso, Instituto Federal de Mato Grosso, com seus respectivos núcleos
de inovação, bem como, o Centro de Pesquisa Agropecuária de Mato
Grosso (CPA/MT), EMBRAPA AGROPASTORIL; apoio e fomento da
Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e Inovação (SECITECI), a
Agência Regional de Inovação, vinculada ao Instituto Nacional de
Tecnologia (INT), Fundação de Amparo a Pesquisa no estado de Mato
Grosso (FAPEMAT), Fundação MT, SEBRAE/MT, Federação das
Indústrias (FIEMT) e o Núcleo Mato-grossense de Inovação. Desta
forma, parte-se do pressuposto que existe um Sistema Regional de
Inovação, com base na legislação estadual de inovação.
A ciência e tecnologia tiveram sua maior expressão no cenário
estadual a partir de 2001, com a criação da Secretaria de Estado de
Ciência, Tecnologia e Educação Superior – SECITES (atualmente
SECITECI-Secretaria de Estado de Ciência, Tenologia e Inovação),
através da Lei Complementar nº 96 em 12 de dezembro de 2001, com
objetivo de fomentar políticas de desenvolvimento científico e
tecnológico em setores estratégicos para o desenvolvimento sustentável
e duradouro do Estado. A criação da secretaria teve como base o Plano
de Ciência e Tecnologia que continha entre seus objetivos, diretrizes e
estratégias para culminar no delineamento de programas de apoio às
pesquisas em áreas temáticas, capacitação de recursos humanos e
programas de incentivos fiscais visando à criação de fundos para o
desenvolvimento tecnológico e a inovação.
Com o advento da Lei Complementar Estadual nº 297/2008, o
Estado declarou seu compromisso em desenvolver a autonomia
tecnológica, capacitação e o desenvolvimento do Estado em
cumprimento dos artigos 352 e 353 da Constituição Estadual e ainda,
priorizar as regiões menos desenvolvidas na sua extensão territorial. Em
Mato Grosso, o setor industrial tem pouca expressividade quando
230
comparado com o setor agrícola-produtor, contudo, há uma aproximação
destes setores sendo possível trazer inovação na agroindústria. Mas, o
desafio está em alcançar empresas de pequeno e médio porte para
possibilitar o aumento na produção agro-industrial. A vocação principal
da Lei Estadual de Inovação é priorizar as regiões menos desenvolvidas
do Estado, assim as instituições de ensino públicas, Universidade do
Estado de Mato Grosso, Universidade Federal de Mato Grosso e
Instituto Federal de Mato Grosso, através de suas estruturas e oferta de
cursos nas regiões mais longínquas e podem atender às possíveis
parcerias a serem desenvolvidas no campo científico e tecnológico.
Neste contexto, uma cultura de inovação é fundamental na construção
do conhecimento e a inovação tecnológica e que passa ser uma mola
propulsora nas políticas de desenvolvimento. Deve-se também enfatizar
que existem papeis distintos e relevantes que são desempenhados pelos
atores responsáveis por fomentar a inovação. Estes atores, como
academia e governo, têm como escopo servir de suporte estrutural e
financeiro para as empresas que também exercem seu papel no
desenvolvimento de novas ideias e ações que possam contribuir para o
desenvolvimento regional. E neste ponto, a Universidade do Estado de
Mato Grosso como uma universidade que nasceu dos anseios do Estado
em formar seus cidadãos e ainda por sua forma multicampi, (atualmente
13 campi) tem demonstrado uma maior inserção nestas localidades mais
longínquas.
4.2.1.2 Políticas e regras internas para a inovação na UNEMAT
A Política de Inovação da universidade está calcada internamente
na Resolução nº 080/2008(Ad Referendum) do CONEPE. Apesar da
instituição não explicitar a inovação como uma missão da universidade,
na Resolução nº 001/2010 (Estatuto da Instituição), do Conselho
Curador, logo no artigo 2º, que prevê a multidimensionalidade do
conhecimento humano nos campos científico, tecnológico, filosófico,
político, social, ecológico e cultural. E ainda no artigo 3º, XII, visa
promover e fortalecer a ciência, a tecnologia, a cultura, a arte, as
manifestações da cultura corporal e o lazer.
A Resolução nº 080/2008 – Ad Referendum do Conselho de
Ensino e Pesquisa (CONEPE)- é a regulamentação interna sobre os
incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente
produtivo e a proteção da Propriedade Intelectual na instituição (art.11).
A resolução traz regras gerais que representam a Lei de Inovação
231
(2004), todavia, em alguns artigos a resolução apresentou uma
flexibilidade maior, admitindo, por exemplo, que a titularidade do
direito de propriedade intelectual poderá ser de outra instituição ou
empresa após parecer favorável do NIT e aprovação no Conselho de
Ensino e Pesquisa. Existe ainda a tentativa de tramitação de um
Regimento Interno do NIT que dimensiona especificamente as
atividades e ações do núcleo, possibilitando maior autonomia e inserção
nos procedimentos, porém, as dicussões têm se pautado com certa
cautela, o que retarda sua aprovação.
4.2.1.3 Estrutura de gestão para inovação (NIT)
O Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT) da Universidade do
Estado de Mato Grosso (UNEMAT) teve sua criação no ano de 2008,
através da Resolução 015/2008 - CONSUNI e regulamentado no mesmo
ano pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CONEPE), por
meio da Resolução 080/2008 Ad Referendum do CONEPE,
(homologada pela Resolução 098/2008). Sua criação formal ocorreu em
observância à Lei de Inovação de 2004, com o intuito de estabelecer
incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente
produtivo e a proteção da PI na UNEMAT. Sua estrutura está vinculada
à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-graduação (PRPPG). A instituição do
NIT teve (tem) como objetivo a realização da gestão da propriedade
intelectual da UNEMAT e promover o intercâmbio entre a instituição e
os setores produtivos do Estado de Mato Grosso para a transferência de
tecnologia. E ainda como missão, promover o desenvolvimento
científico é tecnológico da UNEMAT e do seu entorno com incentivo à
inovação e a transferência de tecnologia com a integração
Universidade/Empresa/Sociedade. As principais competências do
núcleo estão previstas no artigo 6º da Resolução citada, sendo elas: Art. 6º Compete ao NIT da UNEMAT:
I. Zelar pela manutenção da política institucional
de estímulo à proteção das criações, à inovação,
ao licenciamento e outras formas de transferência
de tecnologia;
II. Avaliar e classificar os resultados decorrentes
de atividades e projetos de pesquisa para o
atendimento das disposições da Lei 10.973/2004;
III. Avaliar solicitação de inventor independente
para adoção de invenção na forma do art. 22 da
Lei 10.973/2004;
232
IV. Opinar pela conveniência e promover a
proteção das criações desenvolvidas no âmbito da
UNEMAT;
V. Opinar quanto à conveniência de divulgação
das criações desenvolvidas no âmbito da
UNEMAT, passíveis de proteção intelectual;
VI. Acompanhar o processamento dos pedidos e a
manutenção dos títulos de propriedade intelectual
da UNEMAT;
VII. Identificar e incentivar, na sociedade, as
oportunidades de realização de projetos de
inovação que poderão ser executados em parceria
com a UNEMAT;
VIII. Opinar quanto à celebração dos contratos e
convênios objeto da Lei 10.973/2004 e que
incluam cláusulas de propriedade intelectual;
IX. Divulgar os resultados obtidos com os
projetos de inovação desenvolvidos no âmbito da
UNEMAT, resguardado o dever de sigilo previsto
em contratos, convênios ou termos firmados pela
UNEMAT ou seus servidores.
X. Emitir parecer, antes da manifestação da
procuradoria jurídica competente, sobre os
contratos previstos no inciso VIII deste artigo,
acordos e termos de sigilo vinculado à pesquisa.
Verifica-se que nas competências definidas a instituição
manifestou interesse em deter um controle sobre as criações intelectuais
pertencentes à universidade, na realização de projetos e contratos, bem
ainda, sobre os direitos de propriedade intelectual. Contudo, uma crítica
deve ser levantada quando estas competências forem mais opinativas do
que vinculadas, não afirmando a autonomia do núcleo que poderia ter
uma postura mais decisiva nos processos de inovação. Acredita-se que
por meio das alterações da própria Lei de Inovação, estas competências
deverão ser reavaliadas.
4.2.2 Universidade estudada: UDESC
O marco de sua criação da Universidade do Estado de Santa
Catarina (UDESC) foi o ano de 1965, através do Decreto Estadual nº
2082/1965. Antes da criação propriamente na roupagem de
universidade, já existiam algumas faculdades, como a Faculdade de
233
Engenharia de Joinville (FEJ), em 1956, através da Lei 1.520 e que já
está em funcionamento desde 1965. A faculdade de Educação (FAED),
pela Lei Estadual nº 3.191/63 (que iniciou as atividades em 1964)
compondo o Instituto Estadual de Educação (artigo 173 e 174), a
Fundação Escola Superior da Administração e Gerência (FESAG),
através da Lei Estadual nº 3.530/64. A Lei Estadual nº 3.191/63, que
dispôs sobre o Sistema Estadual de Ensino do Estado, da mesma forma,
autorizou a criação da Fundação Educacional de Santa Catarina (FESC),
com personalidade jurídica privada, nas Disposições Especiais,
disciplinando sua organização nos artigos 190 a 205. Também a
Faculdade de Educação (FAED) e o Centro de Estudos e Pesquisas
Educacionais (CEPE). O ano de 1965 (maio) foi marcado pela outorga
do Decreto Estadual nº 2.802/1965, que possibilitou a Fundação
Educacional de Santa Catarina a constituição da Universidade para o
Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina (UDESC) e definiu sua
estrutura e forma, com a junção da Faculdade de Agronomia e de
Veterinária de Lages e a incorporação das instituições de ensino
superiores já existentes, no caso, as citadas FEJ, FAED e FESAG
(ESAG). Destaca-se que a FESC foi criada como fundação privada
sendo uma entidade autônoma que adquiririu personalidade jurídica a
partir de Registro Civil das Pessoas Jurídicas do seu ato constitutivo
(art. 2º), como mantenedora da UDESC (art. 3º). Neste mesmo ano, em
novembro, o Decreto Estadual nº 3.354, aprova o primeiro Estatuto da
Universidade. Outro importante marco da universidade foi seu
reconhecimento pelo Ministério da Educação (MEC), através da Portaria
nº 893/1985, com base no Parecer do Conselho Federal de Educação nº
632/85. Este reconhecimento conferiu uma autonomia didático-
científica, saindo da autonomia assistida junto à FESC dos seus
primeiros 20 anos de existência.
Acompanhando a visão política trazida pela Constituição Federal
de 1988, o Estado de Santa Catarina promulga no ano seguinte a
Constituição Estadual que determinou a autonomia da UDESC por meio
da criação da Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina, no
artigo 39 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:
Art.39 - Para garantir a autonomia estabelecida no
art. 169 da Constituição, a Universidade do
Estado de Santa Catarina - UDESC - será
organizada sob a forma de fundação pública
mantida pelo Estado, devendo seus recursos ser
repassados em duodécimos.
234
Parágrafo único. Ato do Chefe do Poder
Executivo, no prazo de trinta dias, de signará
comissão específica destinada a elaborar os atos
constitutivos, através de escritura pública, e a
efetuar levantamento dos bens, direitos e
obrigações que deverão ser incorporados ao
patrimônio da fundação, bem como dos servidores
da Fundação Educacional de Santa Catarina –
FESC -, que serão absorvidos.
Já em outubro de 1990, foi sancionada a Lei Estadual nº 8.092 em
que a “Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa
Catarina” é transformada em “Fundação Universidade do Estado de
Santa Catarina”, mantendo a sigla UDESC, passando a ser uma
fundação pública mantida pelo Estado, conforme disciplinou a
Constituição Estadual e texto acima descrito. Com estas alterações
trazidas pela Constituição e lei stadual houve impacto quanto à adoção
da manutenção da universidade e ainda o regime dos seus servidores.
Quanto à manutenção, extinguiu-se a cobrança de anuidade dos alunos,
passando a ser gratuita e pública; quanto ao regime dos servidores,
deixou de ser regido pelas Leis do Trabalho (CLT) e passou a ser pelo
Regime Estatutário do Estado. E ainda, a partir de 1990 a gestão
administrativa passou a ser escolhida através de eleição, não mais sendo
dividida entre Reitores da UDESC e Superintendente da FESC, sendo o
Reitor eleito pelos votos da comunidade acadêmica.
Ressalta-se que no ano de 2015, a UDESC celebrou seu jubileu
de ouro, marcando a história da Educação Superior do Estado com seus
50 anos. Muitas destas informações também foram coletadas através da
publicação da revista comemorativa (UDESC 50 Anos - Formar para
Transformar) editada e disponibilizada pela própria instituição115
.
4.2.2.1 Histórico e estrutura jurídico-institucional
O Estado de Santa Catarina apesar de ser o menor Estado em
extensão na região sul do país é um dos mais competitivos. Conforme o
Indíce de Desnvolvimento dos Municípios (IFDM) da FIRJAN
115
A revista comemorativa do Jubileu de Ouro está disponível em:
<http://www.udesc.br/agencia/arquivos/13068/files/revistaUdesc50anos_V
ERSAOCORRETA.pdf>
235
publicado em 2015, Santa Catarina ocupou o terceiro lugar no índice
geral, estando atrás apenas do Paraná e São Paulo. Este estudo baseia-se
em estatísticas públicas oficiais, disponibilizadas pelos Ministérios
do Trabalho, Educação e Saúde116
. O Estado também logrou o terceiro
lugar no ranking geral de Competitividade dos Estados Brasileiros, em
2015, conforme dados apresentados pelo Centro de Liderança Pública
em São Paulo que tem como foco a atuação de líderes públicos para
melhorar a competitividade entre os estados. Pelos indicadores avaliados
como sustentabilidade social, ambiental, eficiência da máquina públca,
educação, solidez fiscal, capital humanos, infraestrutura, segurança
pública, inovação, potencial do mercado, Santa Catarina obteve a
pontuação de 77,8, sendo que em sustentabilidade social recebeu a
maior nota 100 (de uma avaliação de 0 a 100) 117
. Ressalta-se que a
economia catarinente é diversificada e bem distribuída em diferentes
regiões dentre do Estado. Esta diversidade também é influenciada pela
geografia e clima em que se desenvolvem diferentes atividades desde
agroindústria, turismo, empresas de eletrodomésticos, indústria metal
mecânica, extrativismo, pecuária e também mais recentemente empresas
de tecnologia de informação. Esta abrangência atrai investidores de
segmentos distintos e permite que a riqueza não fique concentrada em
apenas uma área, e isto requer também uma interlocução com as
instituições de pesquisas, o que as universidades públicas como a
UDESC realiza há anos e a Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC) tem se expandido mais recentemente.
4.2.2.2 Políticas e regras internas para a inovação na UDESC
Entre as regras que se destacam nas normativas da UDESC,
primeiro evidencia-se a Resolução nº 090/2004. Neste momento,
abordam-se apenas disposições que se diferenciam seja numa maior
abrangência, como melhor regulamentação do que foi proposto na Lei
de Inovação. O Primeiro destaque se dá ao artigo 7º que ao tratar sobre
as criações e inovações desenvolvidas pela instituição, buscou esmiuçar
116
O estudo está disponível em :<
http://publicacoes.firjan.org.br/ifdm/2015/>. 117
Estes índices podem ser verificados no sítio eletrônico do Centro de
Liderança Pública, especificamente disponível em:
<http://www.rankingdecompetitividade.org.br/indicador/sustentabilidade-
social/sc>.
236
o conceito de criadores, incluindo pessoas que já não tenham vínculo
com a instituição, possam ter garantidos estes os recebimentos dos
ganhos econômicos, desde que comprove sua participação. Quanto ao
compartilhamento e permissão de uso dos laboratórios, a avaliação e
decisão ficam a cargo do Departamento em que a pesquisa está sendo
desenvolvida, devendo priorizar as microempresas e principalmente em
instrumento jurídico estando definidas as remunerações referentes aos
gastos de manutenção geral, infraestrutura e depreciação do laboratório.
Explica também, no artigo 12, a forma de remunerar os colaboradores
através de uma Bolsa de Estímulo à Inovação, que serão
extraorçamentários. Os valores poderão ser recebidos pelos
colaboradores da UDESC (docentes, técnicos e alunos), sendo que
estarão limitados ao valor bruto do servidor beneficiado, bem ainda, que
estas atividades executadas não poderão ser contadas como cargas-
horárias institucionais não podendo ultrapassar 20 horas. Já no artigo 13,
há previsão de destinar até 10% do valor total os recursos financeiros
para execução do projeto, para cobrir despesas operacionais e
administrativas na execução dos acordos que entre a universidade e
instituições de apoio ou agências de fomento e entidades nacionais de
direito público ou privado. Sobre o licenciamento e transferência de
tecnologia, no artigo 14, a decisão sobre exclusividade ou não,
transferência ou do licenciamento está adstrita à decisão do Reitor. No
que concerne aos ganhos econômicos estão previstos no artigo 17 e tem
sua regulamentação na Instrução Normativa nº 003/2013. Sobre a regra
de inventor independente, além do que foi previsto pela lei, a resolução
em discussão prevê que responsabilidade administrativamente, civil e
penalmente pelos prejuízos que ocorrerem em razão desta sua criação e
da não observância das normas de Propriedade Intelectual.
Outra normativa interna que merece atenção é a Instrução
Normativa nº 003/2013, que regulamenta a distribuição dos ganhos
econômicos resultantes dos Direitos de Propriedade Intelectual,
nomeadamente, patentes de invenção, modelos de utilidade, softwares,
cultivar e desenho industrial. Neste documento, a titularidade dos
Direitos de Propriedade Intelectual é da UDESC, quando desenvolvida
com recursos institucionais, meios, dados, materiais, instalações ou
equipamentos da universidade, conforme art. 2º. Há possibilidade de
compartilhar a propriedade com outras instituições, órgãos de fomento,
e outras entidades que tenham participado da atividade, desde que
previsto em instrumento jurídico próprio, explicitando a cotitularidade,
benefícios e ônus dos custos, conforme o §1º do citado artigo.
237
Também reafirma a gestão das atividades de transferência dos
Direitos de PI no artigo 3º, que abarca a análise do interesse da
instituição no depósito da patente ou pedidos de registro para outras
modalidades de PI, verificando a viabilidade econômica, interesse
social. Caso não haja interesse da instituição esta poderá ceder ao
pesquisador o direito de proteger o resultado em seu nome.
Ao ponto central da normativa, o artigo 4º e seus parágrafos
prevêem que os ganhos econômicos devem ser divididos entre a
instituição (75%), que deste percentual da instituição deverão ser
empregados 35% para o Departamento dos inventores e 40% para o
Fundo de Apoio à inovação da universidade; e os inventores (25%).
Dentro deste ponto, esta norma trouxe uma interessante disposição, em
que as despesas de depósito ou registro do Direito de Propriedade
Intelectual, excetuando o depósito nacional, os encargos periódicos de
manutenção ou encargos administrativos e judiciais deverão ser
deduzidas do valor total dos ganhos econômicos a serem distribuídos,
deixando claro que algumas despesas indicam corresponsabilidades.
4.2.2.3 Estrutura de gestão para inovação
A gestão da inovação na universidade é exercida pela
Coordenadoria de Projetos e Inovação (CIPI) que é um órgão
suplementar vinculado e subordinado à Reitoria, tendo um setor de
projetos e Escritório de Direitos Autorais. Tem como objetivo
coordenar as atividades inerentes às parcerias com instituições públicas
e privadas, inovação, transferência de tecnologia e de propriedade
intelectual, bem ainda, prospectar parcerias nos diversos segmentos com
intuito de viabilizar projetos institucionais. Ainda conta com o Núcleo
de Apoio à Inovação Tecnológica e Captação de Recursos Externos
(NITEC), em Joinville, sendo este um órgão subordinado à Direção
Geral e vinculado à Coordenadoria de Projetos e Inovação (CIPI). Este
núcleo dedica-se a apoiar a Inovação Tecnológica, visando à captação
de recursos externos, coordenando e assessorando as atividades
inerentes à inovação tecnológica, propriedade intelectual, parcerias,
convênios, captação de recursos externos e projetos de interesse da
UDESC- Joinville.
Interessante destacar que o Estado de Santa Catarina foi um dos
pioneiros também na instituição de um Sistema Estadual de Inovação,
através da Lei nº 14.328/2008 e Decreto nº 2.372/2009. A UDESC,
conforme o artigo 4º, V, da Lei de Inovação Estadual (Lei nº 14.328, de
238
15 de janeiro de 2008), integra o Sistema Estadual de Ciência,
Tecnologia e Inovação do Estado.
4.3 Análises dos casos estudados
A coleta de dados documentais e trabalho de campo ocorreu no
segundo semestre do ano de 2015, com foco em estudo de casos
múltiplos. Escolhidas duas universidades estaduais em Estados da
federação diversos, porém, com características próprias (UDESC e
UNEMAT). Conforme explanado, a pesquisa se dedicou a um estudo de
caso institucional comparado (MEZZAROBA; MONTEIRO, 2009, p.
124-27), em que a análise e interpretação dos dados dos objetos de
estudo serão feitos de forma concomitante e analítica como resultado da
utilização das técnicas de pesquisa empregadas.
Na coleta de dados destacam-se a entrevista sendo elaborado um
roteiro com perguntas abertas e não estruturadas apresentadas no
apêndice. Foram utilizados também, análise documental com consulta à
notícias e instrumentos normativos das universidades e a observação nas
visitas realizadas nas entrevistas.
4.3.1 Da análise e interpretação dos dados coletados
Para a interpretação dos dados colacionados as informações
foram organizadas de forma comparativa indicando-se similaridades,
diferenças e destaques das instituições de ensino e pesquisa. As
universidades apresentam similaridades quanto à motivação de sua
criação, visando desenvolver os respectivos Estados mantenedores e
para alcançarem localidades mais distantes da capital, reafirmando sua
importância regional. Porém, quanto ao Estado de Mato Grosso, a
iniciativa ocorreu no interior do Estado e sua sede administrativa ainda
está organizada no local de origem. Já a universidade catarinense tem
sua estrutura administrativa na capital do Estado.
Quanto à gestão de inovação, a universidade do centro-oeste
apresenta apenas uma unidade do NIT em que se concentram todas as
atividades. No caso da universidade catarinense, existe uma
coordenadoria e um núcleo, que está mais próximo das empresas e
indústrias do norte do Estado. Apesar de ambas estarem inseridas em
Estados que tenham uma vocação agrícola, percebeu-se que a
universidade do sul do país tem uma predominância na área de
239
engenharia, em razão de também agregar uma concentração industrial
no norte do Estado, enquanto que do centro do país a tendência está
voltada para área ambiental e agrícola. Para ambas, a inovação é um
fator estratégico, reconhecendo que houve um avanço com a
implantação do Núcleo de Inovação Tecnológica e que a instituição
deve incentivar projetos que envolvam pesquisas com uma aplicação
mais prática para a sociedade, não se esquecendo de manter a pesquisa
básica, que atualmente é a mais frequente em ambas. A lei de inovação
foi citada como um referencial para estimular o ambiente produtivo de
inovação e que trouxe benefícios. Contudo, muito se tem a fazer com as
normas institucionais para que possibilitem a melhor aplicação e
compreensão da legislação nacional.
No que se refere às parcerias com o setor privado, estas são
consideradas como uma vantagem para as instituições, significando
aporte financeiro, geração de conhecimento, de produtos e processos,
direitos de propriedade industrial, que poderá gerar royalties quando
existir a transferência. Destacaram a troca de conhecimento, como
elemento principal, em que os pesquisadores para desenvolverem novas
tecnologias para o mercado são forçados a buscar por informações do
mercado externo. Esta interação traz um choque de realidade,
confrontando o ensino com a aplicação prática e resolução de problemas
da sociedade. Da mesma forma, os entrevistados compreenderam que é
possível que a demanda da empresa possa dar novos caminhos, novos
direcionamentos para pesquisas que estavam aguardando um foco ou
redirecionamento. Foram apontadas também as desvantagens que
podem ser externas e internas. Internas, quando os pesquisadores não
buscam informações ou não querem relatar suas pesquisas para o Núcleo
de Inovação, realizando inclusive parcerias e compartilhamento de
laboratório à revelia do NIT. Também deixam de observar normas de
proteção e formalidade sobre um possível resultado de pequisa, podendo
prejudicar os interesses institucionais. Apontaram como desvantagem
externa os interesses das empresas que não coadunam com os interesses
da instituição de pesquisa ou que as empresas buscam de forma
“predatória” tirar um proveito das instalações e profissionais da
universidade sem uma contrapartida justa e que isto não interessa em
nada a instituição. Ambas relataram que há momentos que se cria um
impasse e fica impossível um acordo, dificultando a intermediação, em
razão da forma irredutível em que as partes se comportam. Nos dois
casos, se verificou que esta relação U-E é pouco explorada e percebeu-
se que não existe um empenho no que se refere à prospecção tecnológica
240
e uma postura mais pró-ativa na política institucional, pois conforme os
relatos, a inciativa geralmente é mais pessoal (pesquisador com
proprietário ou gerente da empresa), o que transparece que a cultura de
inovação internamente precisa ser totalmente implantada, pois alguns
pesquisadores desconhecem (ou preferem não conhecer) a profundidade
e importância das atividades do NIT. De outro lado, a percepção que se
teve é que este incentivo à busca por demandas não ocorre também por
não haver uma robusta oferta de tecnologias desenvolvidas e de igual
forma, as instituições não parecem estar preparadas para uma quantidade
volumosa de pedidos de parcerias, seja em razão da necessidade de uma
melhor estruturação física e de pessoal do NIT ou de uma definição das
normas procedimentais e decisões.
Os entrevistados (agentes de inovação de cada instituição)
reconhecem que os Direitos de Propriedade Intelectual (PI) podem ser
entendidos como uma forma de garantia e afirmação da instituição, além
de ser uma forma de gerar receita. Na maioria dos casos, a propriedade é
exclusiva das universidades e a cotitularidade é bem aceita. Contudo,
quanto à possibilidade de cessão destes Direitos de Propriedade
Intelectual, numa hipótese de haver previsão legal, os respondentes
acreditam que a priori não se vislumbra esta ação como vantajosa para
universidade. Ainda sobre a PI, uma das instituições admite que exista
uma dificuldade procedimental quanto ao depósito e pagamento de
taxas, na outra instituição, isto foi parcialmente solucionado com a
contratação de uma empresa especializada, que trouxe maior
tranquilidade e segurança no seu processamento. Contudo, se verificou
também, que o quantitativo de ativos intangíveis não é ainda expressivo
e a maioria está em fase de análise no Instituto Nacional de Propriedade
Intelectual (INPI), o que diminui o ritmo da transferência de tecnologia
já que não possuem a titularidade e o bem intangível reconhecidamente
protegido.
Quanto à aplicação e pontos de atrito com a Lei de Licitação,
entre os entrevistados as opiniões se dividiram entre afirmar
contundentemente que dificultam a realização de pesquisas (UDESC),
até na possibilidade de que a lei possa ser utilizada favoravelmente
(UNEMAT). Entretanto, as críticas maiores foram quanto à necessidade
de organizar e melhorar as normas internas, inclusive procedimentais
para uma melhor atuação do NIT, dando-lhe legitimidade para agir
eficaz e eficientemente. As instituições foram uníssonas quanto a
importância de o NIT ser autônomo, apesar de que na instituição da
região Sul, reconhece que a forma de criação e vinculação diretamente
241
com a Reitoria auxilia sobremaneira neste contexto. Todavia, quando
perguntadas sobre uma futura permissão legal do NIT ser constituído de
forma independente e com personalidade jurídica própria, os
respondentes não reagiram positivamente, dividindo-se entre a total
discordância com esta possibilidade e uma opinião não esclarecida sobre
o assunto, acreditando que existam outras formas de garantir esta
autonomia.
E por fim, consentiram que as fundações de apoio pudessem ser
utilizadas como uma forma de flexibilizar algunas atividades no
processo de transferência de conhecimento e tecnologia, principalmente,
quanto aos procedimentos de aquisição de equipamentos, reagentes
entre outros. Contudo, igualmente concordam que a fundação deve estar
engajada em um efetivo apoio à universidade e sua atuação deve estar
bem definida em normas que definem esta relação com a universidade.
Abaixo foi elaborado um quadro que representa de forma
resumida os resultados e conclusões a partir das entrevistas aplicadas e
respostas dos entrevistados. Em razão de o questionário ter sito
realizado com perguntas abertas e semiestruturadas a síntese apresenta
elementos importantes que foram reforçados pelos entrevistados e que
não foi diretamente questionado, porém, e acrescentou dados e opiniões
complementares à pesquisa.
4.3.2 Quadros comparativos: análise das entrevistas
Quadro 01: Ambiente produtivo e social de Inovação:
Questões 01 a 05
Item de análise UNEMAT UDESC
Perfil da universidade
quanto à pesquisa
Predomínio de
pesquisa básica,
porém,
existindo casos
de pesquisa
aplicada;
Predomínio de
pesquisa básica,
porém, existindo
casos de pesquisa
aplicada;
Vantagens do ambiente
produtivo para a
universidade
Aproximação
com o setor
privado através
de parcerias;
Geração de
recursos para
Aproximação com
o setor privado
através de
parcerias;
Geração de
recursos para
242
universidade,
pesquisador e
NIT.
Projetos de
extensão;
universidade,
pesquisador e NIT.
Patentes;
Projetos de
extensão;
Compartilhamento e/ou
permissão de utilização
da estrutura
(laboratórios e
equipamentos)
Ocorrência
esporádica,
preferência para
pesquisas em
conjunto com a
equipe de
pesquisadores;
Ocorrência
esporádica,
preferência para
pesquisas em
conjunto com a
equipe de
pesquisadores.
Prospecção de
oportunidades pela
Universidade
Realização de
eventos com
participação das
empresas;
Projetos de
captação de
talentos de
estudantes
(FIPROATEC)
Realização de
eventos com
participação das
empresas;
Aporte financeiro Orçamento
destinado para
realizar
pagamentos de
taxas do INPI,
despesas com
viagem, para
realização de
eventos.
Não há previsão
de fundo
específico;
Não há
recebimento de
royalties;
Orçamento
executado
conforme
disponibilidade
da administração
central;
Tentativa de
institucionalizar
fundo específico;
Há recebimento
de royalties;
Estrutura do NIT Núcleo de
Inovação
Tecnológica
(NIT) é órgão
Coordenadoria de
Projetos e
Inovação (CIPI) é
órgão vinculado à
243
vinculado à Pró-
Reitoria de
Pesquisa e Pós-
graduação
(PRPPG) –
apenas 01
unidade;
Recursos
Humanos
Reduzido;
Reitoria e o NIT
está em Joinville
– 02 unidades;
Recursos
Humanos
Reduzido;
Fonte: Elaborado pela autora (2015)
Quadro 02: Relação U-E e transferência de tecnologia:
Questões 06 a 14
Item de análise UNEMAT UDESC
Parcerias mais
frequentes
Com ICTs
públicas, órgãos
públicos e
poucas parcerias
com empresas;
Com ICTs
públicas, órgãos
públicos e
parcerias com
empresas com
evidência em
Joinville
(Engenharias);
Inciativa das parcerias A iniciativa
geralmente parte
do pesquisador
que tem
interesse em
desenvolver a
pesquisa e
aplicá-la;
Da empresa
diretamente com
o docente;
Projetos
conjuntos com
órgãos públicos
e associações de
A iniciativa
geralmente parte
do pesquisador
que tem
interesse em
desenvolver a
pesquisa e
aplicá-la;
Da empresa
diretamente com
o docente;
Projetos
conjuntos com
órgãos públicos;
244
produtores,
principalmente,
na área da
agroindústria.
Benefícios das parcerias Aporte
financeiro;
Geração de
conhecimento,
produto,
processo ou
ativos
intangíveis;
Visão
empreendedora
na academia e
adequação da
pesquisa a casos
concretos;
Aporte
financeiro;
Geração de
conhecimento,
produto,
processo ou
ativos
intangíveis;
Visão
empreendedora
na academia e
adequação da
pesquisa a casos
concretos;
Dificuldades nas
parcerias
Demora nos
procedimentos e
tomada de
decisões pela
universidade
(burocracia);
Irredutibilidade
da empresa
quanto a
titularidade dos
resultados da
pesquisa;
Visão
exploratória da
empresa;
Tempo da
universidade é
diferente do
tempo da
empresa;
Demora nos
procedimentos e
tomada de
decisões pela
universidade
(burocracia);
Irredutibilidade
da empresa
quanto a
titularidade dos
resultados da
pesquisa;
Visão
exploratória da
empresa;
Tempo da
universidade é
diferente do
tempo da
empresa;
Áreas de atuação da Fármacos Engenharias;
245
universidade (própolis),
Engenharia,
Ambiental
(tecnologia) e
Social.
Gestão;
Procedimento de
Registro de Propriedade
Intelectual
Custo Elevado;
Depósitos não
concedidos;
Docentes não se
interessam em
divulgar a
pesquisa para
proteção;
É um
procedimento muito
burocrático e
demorado (tempo de
análise - backlog) e
o custo para manter
uma patente não é
muito barata, para
empresa é mais
fácil, mas para
universidades é mais
difícil, pois não quer
ter custos elevados.
Precisa de melhoras.
Titularidade dos direitos
de PI
Pedidos junto
INPI com
titularidade
exclusiva;
A cessão de
direito de PI à
empresa não
seria
interessante para
a universidade;
Pedidos junto
INPI com
titularidade
exclusiva;
A cessão de
direito de PI à
empresa já foi
cogitada em
negociação com
uma empresa,
mas não foi
concretizada;
Concessão de licença
sem remuneração
(artigo 15 da lei de
inovação)
Não ocorreu
nenhum caso;
Não ocorreu
nenhum caso
Fonte: Elaborado pela autora (2015)
246
Quadro 03: Políticas e Marco Legal para a Inovação:
questões 15 a 19
Item de análise UNEMAT UDESC
Lei de licitações e
influência no processo
de inovação
Pode trazer
vantagens se
bem utilizada;
Conflitos
ocorrem quando
das aquisições de
bens para a
pesquisa;
Procedimento
que limita a
atuação;
Conflitos
ocorrem quando
das aquisições de
bens para a
pesquisa, como
compra de
quantidades
menores;
Papel das Fundações de
Apoio
Melhor forma de
acelerar os
procedimentos,
principalmente
de compras;
A relação
necessita de
trâmites e
legislações bem
definidos e que
facilite a atuação
do NIT.
Atualmente está
suspensa a
relação entre
universidade e
fundações de
apoio (Ação do
Ministério
Público no
Estado), porém,
favorável a sua
atuação;
A relação
necessita de
trâmites e
legislações bem
definidos e que
facilite a atuação
do NIT.
Procedimentos e
legislações
internas/fluxo de
processos
UNEMAT
Resolução nº
080/2008 –
Politica de
Inovação e
criação do NIT
Fluxo de
UDESC
Resolução nº
090/2014 –
Política de
Inovação e
criação da
Coordenadoria;
247
processos ainda
necessita melhor
definição;
Fluxo de
processos ainda
necessita de
definição;
.
Gestão, autonomia dos
NITs
Autonomia
limitada em
quanto à
contratação de
pessoal, decisões
sobre políticas
de inovação, em
razão de estar
numa hierarquia
mais distante da
Reitoria;
Local de atuação
depende do
gestor do NIT;
Personalidade
Jurídica própria
do NIT, ainda
não vê
necessidade;
Autonomia
limitada quanto à
contratação de
pessoal, decisões
sobre políticas
de inovação;
Posição não
favorável que o
NIT tenha uma
personalidade
jurídica própria.
Perspectivas
Melhor Estrutura
e especialização
do NIT;
O NIT tenha
conhecimento de
todas as
informações da
instituição sobre
questões de
inovação,
aproximando o
núcleo dos
pesquisadores.
Melhor Estrutura
e especialização
do NIT;
Manuais de
transparência
para desenvolver
ações com as
empresas.
Fonte: Elaborado pela autora (2015)
248
4.4 Modelo jurídico-institucional: mudanças e alternativas
Para este estudo, parte-se do entendimento que os estatutos
jurídicos da organização, sua estrutura e política constituem parte central
do modelo institucional, bem como, os instrumentos de controle e
orientação (conselhos e outras instâncias) que influenciam na atuação da
instituição, o que denota a cultura, missão ou visão da organização.
Evidencia-se que ao iniciar a pesquisa para elaborar a tese, esta
pesquisadora questionava sobre a regra geral da universidade pública no
país, desejando inclusive discutir sobre a dicotomia público-privado,
pensando inclusive numa posição híbrida, unindo às críticas sobre a
burocracia, a estrutura pública que tanto dificulta a interlocução com o
“estranho” mundo exterior da academia. E existem casos híbridos, como
nos casos de universidades que se dizem pública, porém, assumem
personalidade jurídica de direito privado como o caso da universidade
estadual do Tocantins (UNITINS) que é uma fundação pública de
Direito Privado (Lei Estadual nº 874/96), sendo mantida pelo Estado e
por particulares (taxas de matrículas) (SAMPAIO et al, 1998, p.63).
Todavia, esta discussão além de ser “penosa” é bastante controvertida
que sustentaria uma discussão teórica, mas que não era o foco principal
desta pesquisa, que é sobre inovação, transferência de tecnologia e
conhecimento, atuação dos Núcleos de Inovação. Por conseguinte,
aprimorando a discussão esta autora preferiu adentrar no modelo
instituticional dos NITs.
Ao ser introduzida discussão sobre modelo jurídico-institucional,
afirmou-se que é através da característica organizacional de uma
instituição é possível reconhecer qual o modelo jurídico-institucional
adotado. Ressalta-se que nestas instituições de ensino e pesquisa,
existem dois aspectos que colocam determinantes importantes para seu
desenvolvimento quais sejam, o modelo jurídico-institucional e as
influências político-mandatórias. Segundo o estudo apresentado pelo
Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE, 2010, p. 16), separa-se
o conceito de modelo jurídico-institucional e modelo gerencial. Explica
que o modelo jurídico-institucional é o conjunto de regras, leis e
macrodiretrizes que delimitam o espaço e as direções nas quais uma
organização pode se mover no cumprimento de sua missão.
Compreendendo, portanto, que os estatutos jurídicos da administração
pública representam a parte central do modelo institucional, bem como,
dos instrumentos de controle e orientação como os conselhos e
instâncias decisórias; do mesmo modo, para a administração privada
estão seus estatutos jurídicos (sobre sua constituição) e conselhos
249
acionários e de direção. Conquanto, o modelo gerencial está relacionado
ao conjunto de definições e características relacionadas à liderança,
governança, processos, pessoas, sistemas informacionais, gestão de
recursos (financeiros, equipamentos, instalações etc.) de uma
organização (CGEE, 2010, p. 20). Reconhece-se que a interferência do
marco legal e político/acionário/mandatório têm variações que se
traduzem em capacidade interna de organização e de adoção de modelos
gerenciais compatíveis com o modelo institucional escolhido. Desta
forma, conclui-se que as diferentes formas de organização jurídico-
institucional podem interferir em diferentes maneiras nas organizações,
influenciando o grau de autonomia para compor receitas orçamentárias e
financeiras, celebrar contratos e no gerenciamento de recursos humanos,
inclusive, nos aspectos político-institucionais (CGE, 2010, p. 40). O
estudo apresentou uma discussão sobre os modelos institucionais de
organizações de pesquisa no Brasil em que foram apontados 17 modelos
jurídicos diferentes com variação de graus de autonomia de gestão,
sendo os que tiveram maior dificuldade em agilizar contratos foram os
de administração pública direta (foco na esfera federal). Em síntese, os
institutos de pesquisas foram divididos em três grandes categorias e
esferas da administração pública (fundações e autarquias), do setor
privado (empresariais) e aqueles sem fins lucrativos. Em certa medida,
as conclusões do estudo podem ser aplicadas às universidades
brasileiras, compreendendo que as mesmas podem estar na esfera
pública com as universidades federais, estaduais e municipais, privada
sem fins lucrativos (as comunitárias) e as instituições que são
constituídas e imbuídas no setor privado, às universidades propriamente
privadas. Esta pesquisa buscou referenciar sobre o modelo jurídico
adotado nas universidades públicas estaduais, que foram seu foco
principal, contudo, isto não impede que as conclusões aqui apresentadas
se apliquem a outras instituições como as federais, através da
interpretação analítica referida por Robert Yin (2015). O que se buscou
foi verificar, na realidade, as hipóteses de barreiras identificáveis e
principalmente a afirmação que a Lei de Inovação necessitava de
adequações, como também na comprovação de que não é somente o
marco legal o ponto problemático que dificulta a inovação. Através da
pesquisa empírica, pode-se entender que nas instituições pertencentes à
administração pública (universidades estaduais) também são refletidas
as dificuldades similares apontadas pelo estudo apresentado pela CGEE
(2010), confirmando a importância do seu modelo jurídico adotado.
250
A nova legislação, que entrou em vigor neste mês de janeiro de
2016, beneficamente, auxiliou nas discussões propostas desta pesquisa e
direcionou sua atualização não apenas com propostas, mas com uma
visão mais realista com base no disposto nas alterações legais da Lei de
Inovação. Tendo em vista que seus pontos principais e inovadores foram
discutidos em capítulo anterior, convém, aqui pensar em pontos
importantes para adoção de um modelo jurídico de inovação, pontos que
são nevrálgicos, ao entendimento desta autora, que diante da alteração
legislativa as instituições têm a oportunidade de avançar. Inicialmente,
esta autora pensou em propor uma legislação, uma minuta para servir de
guia para as instituições públicas de ensino e pesquisa, sobre seu modelo
jurídico, porém, diante da publicação do novo marco legal e alterações
trazidas pela Lei 13.243/2016 e reconhecendo que cada instituição tem
normativas diferenciadas, preferiu-se apontar sugestões sobre os pontos
cruciais que se compreendeu ser relevantes registrar e que as instituições
poderão adotar nas suas legislações específicas. Portanto, com o novo
marco legal, pode-se atualmente afirmar que as ICTs poderão eleger, a
priori, dois modelos jurídico-institucionais, o que para este estudo
convencionou-se denominar de “modelo autônomo” e “modelo
independente” (ou interdependente), sendo o primeiro muito próximo do
que já existe, com uma estrutura dependente da instituição, sem
personalidade jurídica, porém, com uma “autonomia reforçada” pró-
inovação; o segundo comporta a previsão de constituição de NIT com
personalidade jurídica própria. Contudo, antes de adentrar nesta
discussão de modelos e forma de constituição dos NITs, sublinham-se as
questões pontuais que devem ser observadas pelos gestores de inovação,
independentemente do modelo adotado.
4.4.1 Questões relevantes sobre o modelo jurídico-institucional
De acordo com Salles-Filho e Bonacelli (2007, p. 09-10) ao
tratarem dos institutos e centros de pesquisa, trouxe a classificação das
instituições conforme seus “caminhos” eleitos de gerir a inovação.
Conquanto, classificou-os como path finders, path founders, path losers,
indicando que os primeiros são aqueles que conseguiram introduzir
práticas e construir capacidades para estabelecer uma política interna
para gerir a propriedade intelectual, transferência de tecnologia,
contratos de pesquisa, criação e participação em redes, entre outros,
portanto, adaptaram seu ambiente original, introduzindo a perspectiva de
inovação. Em segundo lugar, está aqueles que iniciaram a construção de
uma trajetória totalmente diferente do que seguiram por décadas,
251
buscando este caminho para inovação. Os últimos são os “perdedores”,
aqueles que têm experimentado grandes dificuldades para sustentar as
suas atividades e, no entanto, ainda não tomaram medidas para mudar “o
rumo” em resposta ao ambiente em mudança, em que os orçamentos
estão a diminuir, a pesquisa em ciência, tecnologia e inovação tornou-se
cada vez mais complexos. Por conseguinte, as diferenças entre estas
instituições públicas de pesquisa referem-se ao caminho escolhido em
adotar uma atitude interna de fazer mais ou menos quanto às mudanças
radicais em direção à inovação. Os principais obstáculos mencionados
pelos autores relacionados à profissionalização e valorização da
propriedade intelectual e transferência de tecnologia e são as seguintes:
custos de instalação e manutenção das atividades PI, a falta de recursos,
falta de pessoal capacitado e competências em PI, insuficiente
valorização do profissional no processo de transferência de tecnologia; a
ausência de cultura para endereçar estas questões pelas instituições de
pesquisa; falta de consciência indicando que o problema não consta na
agenda da maioria das instituições; a capacidade de analisar o processo
de geração de inovações desde a ideia inicial; a falta de recursos de
gerenciamento de projeto e falta de empreendedorismo. As barreiras
quanto aos recursos humanos e política de treinamento foram
identificadas como: a dificuldade de contratação de novos pesquisadores
devido ao quadro regulatório brasileiro (estatutário); desequilíbrios entre
equipe titular e pessoal paralelos (como bolsistas); mecanismos de
compensação inadequados; média etária elevada e a falta de estímulo
para melhorar as qualificações acadêmicas; educação e treinamento
fornecido apenas para continuidade da carreira e remuneração, não com
diretrizes estratégicas para a área; falta de perspectivas de suporte (como
promoção orientada para desempenho, recompensas, etc.); perspectivas
insuficientes de promoção (como o sistema de avaliação não reflete o
novo ambiente para promover a inovação); falta de capacidade de gestão
de recursos humanos adequada; desfasamento entre a formação dos
pesquisadores e as novas formas do processo inovativo. E em todos
estes pontos e decisões, a cultura institucional também influencia na sua
autonomia. Neste prisma, Salles-Filho e Bonacelli (2007, p.10)
apontaram três tipos de restrições e fatores: o quadro legal em relação de
domínio público; a influência política das autoridades governamentais
sobre organismos públicos de investigação; a inércia institucional
interna (ou cultura institucional). Há situações que podem ser aplicadas
para as instituições de ensino e pesquisa que tem estrutura e uma cultura
própria.
252
Aqui convém lembrar que neste sentido Bradley, Hayter e Link
(2013, p.03-18) ao tratarem do modelo tradicional (linear), indicaram
que este apresenta inadequação, uma vez que, também deixa de observar
a cultura da instituição que é traduzida nos sistemas de recompensas,
valorização de publicações, participação em eventos, focando mais na
parte estritamente acadêmica e privilegiando as subculturas de cientistas
universitários e os administradores da universidade. Confirma-se que o
modelo-jurídico trata não apenas de questões normativas institucionais,
mas de forma mais abrangente (holística) importando a questão
gerencial e legal. É o que se vislumbra nas ICTs em que as mudanças
devem abarcar várias questões estruturais e política.
4.4.1.1 A estrutura do NIT
A primeira questão deve ser observada pelos dos gestores de
inovação, para um modelo mais adequado sem dúvida é a estrutura
física dos NIT. Evidente que sem um espaço físico com equipamentos
necessários, com mínimo de uma estrutura predial, salas para reuniões,
meios divulgação e locomoção não é possível acreditar que será
realizada uma gestão da inovação de forma eficiente. Deve-se pensar o
NIT como uma agência promotora dos ativos realizados na
universidade, portanto, bens valiosos que possam gerar receitas, com
caráter mais profissional e gerencial. Nas universidades pesquisadas,
verificou-se que a instituição catarinense tem uma vantagem, de maneira
que, há uma subdivisão de atuação com a Coordenadoria (Florianópolis)
e a unidade em localidade diversa (Joinville), ampliando sua atuação,
contudo, com espaços reduzidos, problema comum o que é um
problema estrutural de muitas universidades públicas brasileiras. Em
contrapartida, a universidade mato-grossense, apenas contava com uma
sala para exercer suas atividades.
Da mesma forma, é necessária a estruturação de recursos
humanos especializados que nos estudos apontados acima uma
reinvindicação constante dos agentes dos NITs. Principalmente, quanto
à política de “atração e fixação” de profissionais altamente preparados
para lidar com as questões que envolvam as atividades de inovação,
como os contratos, prospecção tecnológica entre outros, que fortalecem
o órgão gerando uma confiabilidade e uma autonomia na execução.
Quanto mais profissionais com conhecimentos específicos envolvidos
nas atividades de inovação, sejam eles, especialistas em gestão,
marketing, assessoria jurídica e inclusive os próprios cientistas das
diversas áreas da universidade, mais eficaz será o NIT para apresentar
253
resultados. Há que se sublinhar que neste ponto, a partir de 2004, com a
Lei de Inovação, ocorreram ofertas de treinamentos e qualificação,
conquanto, ainda há uma escassez de profissionais, de um lado, porque
estas atividades exigem conhecimento específico, sendo poucos no
mercado, e por outro lado, por haver rotatividade intensa nestes órgãos,
o que não auxilia na perpetuação dos conhecimentos e procedimentos, o
que pode ser observado nos dados do FORMICT (2015).118
Pensando
na estrutura mais adequada de NIT, verificou-se que a quantidade de
colaboradores junto aos núcleos das universidades estudadas ainda
precisa ser aumentada, como por exemplo, a UNEMAT tinha na sua
composição apenas dois servidores efetivos, o diretor (gestor geral) e
servidor (assessor), e os outros colaboradores diretamente envolvidos
eram alunos bolsistas, existindo participação esporádicas de outros
pesquisadores. Verifica-se o como um exemplo brasileiro de estrutura
mínima a Universidade de Campinas (UNICAMP), que já tem história
sobre sua agência de inovação, sendo esta criada antes mesmo da Lei de
Inovação de 2004, em 2013. A UNICAMP apresentou ao FORTEC, em
2012, a composição de 33 contratados, sendo cinco estatutários e 28
contratados pelas regras da CLT, e ainda sete bolsistas e três
estagiários119
, distribuídos nas áreas de Gerência, Parcerias,
Comunicação, Tecnologia de Informação, Propriedade Intelectual,
Convênios/Contratos, compostos com analistas, pareceristas,
coordenadores e bolsistas. Já em seu relatório de 2015 (referência
2014)120
, demonstrou que sua agência de inovação tinha na sua
composição 34 contratados e 11 temporários (bolsistas, CLT e
estagiários). Isso corrobora que os núcleos necessitam de uma estrutura
mais profissionalizada e flexível para um bom funcionamento.
4.4.2 Orçamento
118
Sobre o relatório do FORMICT foi discutido no capítulo III. 119
Informação pode ser consultada no sítio eletrônico:<
http://sites.unicentro.br/wp/9fortec/files/2015/06/Milton-Mori-
Ag%C3%AAncia-de-Inova%C3%A7%C3%A3o-Inova-Unicamp.pdf >
Acesso em: jan. 2016
120
Informação pode ser consultada no sítio eletrônico:
<http://www.inova.unicamp.br/sites/default/files/images/Inova_relativ_201
5_final_digital.pdf> Acessom em: jan. 2016.
254
Outra questão em destaque que deve ser considerada para
qualquer dos modelos é a orçamentária que recebe muitas reivindicações
dos gestores quanto aos investimentos que devem ser significativos,
principalmente nos primeiros anos de implantação do NIT. Dificuldades
orçamentárias são comuns nos NITs das universidades, como também
apontado pelos casos estudados e também indicadas pela doutrina.
Alguns núcleos possuem uma receita mínima garantida para a execução
de suas atividades, todavia, isto não é comum, e para complementarem,
necessitam estar atentos aos editais de entidades de fomento, não
existindo uma independência ou autossuficiência orçamentária. Sobre
financiamentos nos casos descritos, identificou-se que existe uma fraca
cultura de investimento de empresas “anjos”, bem como, de iniciativa da
instituição em procurar por estes investidores, o que é inibido pela
organização orçamentária e distributiva atinente às instituições públicas.
E isto influencia nas atividades dos NITs como na contratação de
profissionais por período menores e pontais, no pagamento de despesas
frequentes como taxas do INPI, requerimentos e manutenção das
proteções dos Direitos de Propriedade Industrial, seja as patentes,
cultivares ou marcas, para a capacitação dos profissionais, viagens para
divulgar trabalhos (principalmente quando a instituição é multicampi) e
eventos. É importante que a instituição garanta um valor orçamentário
significativo para que as atividades fluam no ritmo desejado. Sobre o
tema, alguns autores destacaram que as principais limitações impostas
aos institutos públicos de pesquisa em razão da legislação que rege a
administração pública direta estão relacionadas com a gestão
orçamentária e financeira e de recursos humanos. Particularmente
quanto à captação de recursos, que se tornou necessário em razão das
restrições orçamentárias do Tesouro paras as instituições públicas
federais, os institutos utilizam dos serviços das fundações de apoio ou
outras estruturas jurídicas que são intermediadoras de contratos
possibilitando mais agilidade. Sobre a gestão de recursos humanos, as
maiores dificuldades estão na contratação que apresenta uma baixa
flexibilidade, de modo que, em sua maioria, deve ser realizada através
de concurso público, que requer um rigor e procedimento específico. Em
pesquisa realizada em 63 NITs, através de survey, relata por Bortolini et
al (2014) que a maioria dos NITs no país tem orçamento anual médio
que gira em torno de 20 e 50 mil reais, enquanto apenas 23% dos NITs
respondentes afirmaram possuir R$ 50 mil ou mais disponíveis durante
o ano, sendo que estes valores não são suficientes para realizar as
atividades mínimas para seu funcionamento. A pesquisa da
255
Universidade de Cambridge (p.17) também alertou para a concordância
dos entrevistados que acusaram a falta de apoio, especialmente, em
termos de financiamento, sendo que 40% dos envolvidos informou que
o apoio é não adequado para o seu trabalho. Isso demonstra que o nível
de insatisfação com o financiamento para os NITs é similar em todas as
regiões, mas que o nível de incorporação é mais fraco no Nordeste.
Uma solução para esta questão é garantir orçamento mais robusto
para estas unidades voltadas para o gerenciamento da inovação,
demonstrando, desta forma, o real interesse institucional em se tornar
mais pró-ativo para a inovação. Mais especificamente, para garantir
recursos direcionados à área de inovação poderia se adotar uma rubrica
orçamentária para estas questões. Desse modo, no orçamento
institucional, admite-se um percentual destinado para aquelas atividades
designando sua fonte.
Outra forma de fomentar e recompensar a atividade inovadora
seria a criação de fundo específico para inovação. Um fundo é
estabelecido para financiar projetos que atuem na garantia da promoção,
proteção e defesa de direitos ou ações sociais e de desenvolvimento,
sendo que os recursos devem ser aplicados para os fins que ele foi
criado. Dessa forma, os fundos públicos são mecanismos de
descentralização do orçamento das entidades públicas que explicitam na
peça orçamentária a destinação específica de recursos públicos para um
determinado fim. Neste prisma, o fundo vem proporcionar um suporte
financeiro à realização de ações e políticas definidas pelo ente criador
(como programas), que visa à promoção e viabiliza a captação, o repasse
e a aplicação de recursos necessários à sua implementação. E é através
da sua lei de criação do fundo que serão estabelecidas suas normas,
procedimentos e condições operacionais e sua aplicação. As receitas
poderão ser compostas por recursos (públicos ou privados), portanto,
por dotações orçamentárias exclusivas do ente da federação que o
institui, definida anualmente nas peças orçamentárias; ou por dotações
orçamentárias dos recursos repassados ao Ente federado que esteja
vinculado aos objetivos do fundo por convênios, parcerias, consórcios,
programas de cooperação que o ente federativo celebre com outros
entes, instituições públicas ou privadas, nacionais ou até mesmo
estrangeiras; por transferências e aplicação dos recursos, contribuições,
auxílios e doações de pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou
estrangeiras, legados e heranças jacentes; por aporte de capital por meio
da realização de operações de crédito em instituições financeiras
oficiais, quando previamente autorizadas por lei específica; ainda, por
256
rendas provenientes da aplicação de seus recursos no mercado
financeiro. Esta variedade de captação de recursos pode proporcionar os
meios necessários para o financiamento dos empreendimentos
econômicos destinados à inovação e deve ter contabilidade própria, em
que serão registrados e publicados todos os atos e fatos que decorrerem,
permitindo a apuração de resultados separados que são auditáveis. Estas
receitas deverão ser depositadas em conta especial em instituição
financeira oficial, sendo que os recursos financeiros não utilizados
poderão ser transferidos para o exercício seguinte, a crédito deste. Os
fundos especiais ou público tem previsão na Lei nº 4.320/1964 e sua
forma de criação está descrita no artigo 71: "Art. 71. Constitui fundo
especial o produto de receitas especificadas que por lei se vinculam à
realização de determinados objetivos ou serviços, facultada a adoção de
normas peculiares de aplicação."
Conforme os comentários à Lei nº 4.320/1964, Flávio Cruz et al
(2006, p.113-115) explicam que um fundo é um tipo de gestão
administrativa e financeira de recursos ou conjunto de recursos
vinculados ou alocados a uma área de responsabilidade, para
cumprimento de objetivos específicos, mediante a execução de
programas com ele relacionados. Porém, existem fundos que na verdade
comportam-se como um órgão da administração pública indireta e
assumem personalidade jurídica própria, que não é o caso que se
mencionou acima. Estes tipos de fundos, apesar de serem permitidos por
lei, não configuram a definição legal do Artigo 71 da Lei 4.320/64,
como o caso do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE), que apesar de levar o nome de fundo, é na verdade uma
autarquia pública federal vinculada ao Ministério da Educação,
devidamente criada por lei. A forma de captação de recursos pelo fundo
é uma vantagem para a instituição pública que em razão das regras que
está obrigada a seguir, tem dificuldades de evitar, mesmo com os
contratos de transferência de tecnologia e rendas advindas de royalties,
que estes valores não sejam direcionados para outras áreas, pois, deve
obdecer as regras de conta única da instituição, prejudicando o incentivo
à inovação e seu reinvestimento. Através da captação direcionada,
permitiria pessoas interessadas em apoiar “a causa” através de doações,
como no caso de egressos da universidade, doações testamentárias e
investidores âncoras, sem o receio de investimento divergente do
doador, como ocorre em países mais desenvolvidos. Acredita-se que a
Lei nº 13.243/2016, vislumbrou estas questões em certa medida, uma
vez que o Artigo 18 também reflete solução para problemas encontrados
257
na execução da atividade de inovação, quando trata de forma mais direta
sobre os recebimentos de receitas e pagamento de despesas decorrentes
dos acordos e contratos, cessão de PI, bolsas, gratificações, bem como,
pagamento de despesas e os pagamentos devidos aos criadores. De igual
modo, permite que a fundação de apoio possa captar, gerir e aplicar as
receitas da ICT, por delegação, devendo a aplicação ser exclusiva para
dar suporte à pesquisa, desenvolvimento e inovação.
4.4.2.1 Nível de comprometimento institucional com a inovação e
fluxos de processos Importante questão implícita ao modelo mais dinâmico voltado
para inovação é a forma de tomada de decisões e fluxo de processo
adotado pela instituição. A gestão da transferência de conhecimento e
tecnologia das instituições públicas brasileiras tem sido influenciada (ou
dificultada) pelas formalidades procedimentais e a tomada de decisão,
que devem percorrer nas variadas instâncias ou campi. Sabe-se que o
setor público prefere a formalidade que a informalidade na realização de
suas atividades, todo contrato, parceria ou solicitação necessita ter um
trâmite mínimo para ser realizado ou respondido. É a conhecida
burocracia! Destaca-se uma "reclamação" dos gestores entrevistados que
diz respeito aos processos que envolvem inovação que não são claros e
existem situações que escapam ao conhecimento do NIT, seja em razão
do desinteresse do pesquisador em relatar para o núcleo ou por falta de
esclarecimento sobre assuntos que realmente devam ter a intermediação
do NIT. As parcerias, para serem institucionalizadas se organizam
através de projetos de pesquisas, consultorias ou contratos e cada um
destes instrumentos necessita nascer (ser requerido) em um setor,
geralmente, nos departamentos ou faculdades e apenas chegam ao NIT
em etapa avançada. Dificilmente se inicia o procedimento nos núcleos,
já que, as relações iniciam-se na relação do pesquisador com as
empresas interessadas. Estes trâmites podem durar até 06 meses, pois,
sempre haverá uma assinatura a ser colhida, uma decisão colegiada a ser
manifestada e isto demanda tempo. Dependendo da complexidade da
questão envolvida e principalmente, se existe uma subdivisão de campi
em localidades diversas da administração central, este tempo é muito
maior. Uma boa prática é a definida pela UNICAMP que para dirimir
estas barreiras, foi adotado um procedimento mais célere de uma câmara
de decisão, em que os membros se reunirão somente após a análise do
processo, sendo que cada membro recebe o conteúdo necessário para
emitir sua decisão em prazo comum e que foi distribuído de forma
258
concomitante, não necessitando aguardar um encaminhamento
sequencial que é inerente do fluxo processual da administração pública,
pondendo na reunião defirem o assunto e colherem os pareceres
necessários.
Na mesma visão reformadora, o Artigo 16, que foi alterado em
2016, trouxe mudanças cruciais para a gestão de política de inovação
nas ICTs e propriamente dos NITs. Neste artigo, houve a proposta de
ampliação da competência dos NITs quanto gestão de políticas e
acordos de inovação, promoção e acompanhamento da relação entre U-
E, nos incisos VII ao X. Da mesma forma, o §2º, do mesmo artigo
explicitamente prevê a possibilidade de representação institucional, por
delegação, ao gestor do Núcleo de Inovação Tecnológica, no âmbito da
política de inovação, portanto, dando poderes ao gestor do NIT de
representar a instituição, inclusive, assinar pelo Reitor quando o assunto
tratar de inovação.
4.4.2.2 Sistema de valorização do pesquisador – sistema de
recompensas Na pesquisa empírica realizada, houve a confirmação das
situações apresentadas nos dados do FORMICT e dos estudos
relacionados (CGEE, 2010; SALLES-FILHO et al, 2007; BRADLEY,
HAYTER, LINK, 2013) quanto à relação entre a Universidade-
Empresa, que na maioria das vezes é iniciada pela aproximação do
pesquisador com a iniciativa privada, em que já existe uma relação de
confiança. Já existem casos em que a iniciativa privada ou outra
entidade interessada pode aproximar-se da instituição de ensino e
pesquisa através de informações disponibilizadas pela própria instituição
ou pelo portofólio de serviços, porém, muitas vezes, é a partir do
pesquisador, que já tendo uma aproximação com empresas relacionadas
com sua pesquisa, por exemplo, quando já trabalhou na iniciativa
privada, ou tenha estudantes em atividade na empresa, tenha colegas de
profissão que atuam no setor empresarial, entre outras situações. Isto
deve ser valorizado pela universidade. Em momento anterior, foi
explanado que mesmo nos Estados Unidos, referência em inovação e
transferência de tecnologia, confirma-se que é nos departamentos e
grupos de pesquisas que as relações com o setor privado é mais estreita.
Bradley, Hayter e Link (2013, p. 48) frisam que para a instituição
alcançar bons níveis de inovação e comprometimento dos
pesquisadores, é importante ter um sistema de recompensas, que
desestimula suas equipes de pesquisa a negociar diretamente com o
259
setor externo, sem qualquer controle institucional. Havendo incentivo ao
empreendedorismo e comercialização dos ativos intangíveis, através de
premiações e classificações dentro da política da instituição, será
possível encontrar pesquisadores motivados a compartilhar suas
descobertas e realizar parcerias com a intermediação dos NITs. Por
consequência, quanto maior a valorização e recompensa ao inventor (ou
grupo de inventores), mais interesse estes terão em se envolverem no
processo formal de transferência de tecnologia.
Atualmente no Brasil, a forma mais comum de se “premiar” o
pesquisador é através de bolsas ou certificação, quando for um
voluntário. Esta situação decorre da própria estrutura jurídica que
dificulta à administração pública realizar pagamentos extras aos seus
efetivos ou voluntários, e por outro lado, as bolsas são preferidas pelos
pesquisadores porque não têm incidência do Imposto de Renda e, para a
instituição, esta remuneração acaba não sendo incorporada ou
confundida com salário. Também é comum existir premiações
pecuniárias de teses e dissertações, portanto, falar em prêmios
pecuniários não é algo novo. Contudo, é necessário a instituição ter
criatividade e permitir casos de premiação como formas de estruturação
dos laboratórios, viagens para congresso de toda equipe, pagamento de
uma publicação internacional (após proteção dos Direitos de PI), até
mesmo valores pecuniários diferentes de bolsas, mesmo com incidência
de imposto, para incentivar o ambiente de inovação. Entretanto,
necessita-se de uma institucionalização. Estas recompensas devem fazer
parte da política institucional com regras claras de concorrência para não
dar margem a privilégios sem critérios, o que poderia acarretar uma
reação adversa ao objetivo do incentivo.
Barros e Lazzarini (2012, p.14), do Instituto Insper de Educação,
apresentaram um estudo sobre o sistema de recompensas ou premiações
em algumas empresas no país, focando no sistema de premiação
individualizado e sua influência no comportamento inovativo da
organização. Apesar de ser um estudo voltado para iniciativa privada,
acredita-se ser possível sua aplicação também na administração pública,
aproveitando-se os resultados apresentados. Destacam os autores duas
modalidades de mecanismos de incentivos: o pagamento e a promoção
pelo desempenho. Das 370 empresas pesquisadas, constataram que os
mecanismos de gratificação tem uma influência positiva para promover
a inovação e basicamente nos efeitos distintos de valorização, através de
pagamentos ou de promoção referente ao desempenho, que pode
impactar a capacidade das empresas de transformar ideias em fontes
260
reais de receita. Descobriram que o efeito de desempenho com base na
promoção é altamente significativo. Além disso, os resultados sugerem
que este mecanismo deve ter níveis moderados, pois, uma utilização
acima destes níveis não tem resultados diferentes desta margem e não
aumenta proporcionalmente a capacidade de inovação. Destarte, o
estudo mostrou que para além de considerar as recomendações usuais
(por exemplo, os investimentos em P&D, a proteção dos direitos de
propriedade, capacitação), as empresas interessadas em estimular a
inovação também devem prestar atenção para as práticas
organizacionais que podem desencadear esforços para gerar novas
ideias. Os resultados também indicaram que a adoção do mecanismo de
desempenho através de promoção poderá gerar índices interessantes e
aumentar a produtividade, sendo uma interessante aplicação também nas
instituições pública no que couber. Em mesmo sentido, Clancy e
Moschini (2013, p. 20-28) ao discutirem sobre mecanismos que possam
assegurar a inovação, apontam três, quais sejam: patentes, pesquisa
contratada e premiação. Afirmam que basear a inovação nos dois
primeiros é problemático, uma vez que as patentes impõem um
monopólio e a pesquisa contratada deve superar o risco moral e
problemas atrelados a ela. Pontuam como uma alternativa que pode
potencialmente superar estas limitações dos primeiros, o “prêmio de
inovação”, ou seja, uma recompensa. Se o prêmio for adequado, pode
gerar investimento suficiente e esforços para trazer uma inovação
desejada. E contrapondo o monopólio garantido pela patente, afirmam
que após a compensação ao inventor, a inovação, inclusive, pode ser
colocada em domínio público, se a instituição preferir. Apesar destes
estudos citados não estarem relacionados à instituição de ensino, seus
resultados devem ser considerados com atenção pelos gestores, com a
devida adequação, pois este mecanismo demonstrou ser importante
ferramenta para fomentar a inovação. Destaca-se que o Artigo 9º da Lei
de Inovação, com nova redação, tem previsão sobre acordos de parceria
e acrescenta, no §1º, que os beneficiários de bolsa de estímulo à
inovação podem ser incluídos os alunos de curso técnico, de graduação
ou pós-graduação, trazendo um estímulo para as equipes. O Artigo 14-
A, com as alterações de 2016, trouxe uma resposta aos anseios de
pesquisadores que tinham interesse em atuar na iniciativa privada, mas a
legislação não era clara quanto a recebimentos de valores extras em
razão de sua participação em projetos ou programas. Este artigo agora
permite que profissional (pesquisador público), mesmo em regime de
dedicação exclusiva, possa exercer atividade de pesquisa em outras
261
instituições, tanto em outras ICTs ou empresas, atividades remuneradas
de pesquisa, desenvolvimento e inovação. Estas modificações legais, por
certo, devem aumentar os índices de contratações e relação com as
empresas através de forma institucionalizada. Esta autora aposta que
aumentarão as relações com o setor privado, já que os pesquisadores “de
carreira” em sua maioria estão em Regime de Dedicação Exclusiva, o
que limitava sua atuação e remuneração em outras organizações, de
forma regulamentar.
4.4.2.3 Relação com o inventor independente
A transferência de conhecimento e tecnologia nas discussões
apresentadas nesta pesquisa tem por base àquelas em que a ICT
transfere seus conhecimentos e ativos através de instrumentos próprios,
possibilitando que as empresas desenvolvam e comercializem o
resultado advindo de pesquisa própria ou parceria. Contudo, esta
transferência pode ocorrer entre um terceiro para a universidade,
situação menos comum, porém, não deve ser negligenciada. Este
terceiro, pessoa física, é denominado pela legislação de “inventor
independente”, que mesmo sem a estrutura institucional própria
(universidade, empresas, institutos) conseguem desenvolver descobertas
que necessitem de proteção e orientação para serem desenvolvidas. A
nova legislação (Lei 13.243/2016) em seu Artigo 1º, inciso XIV, aponta
como princípio o apoio, incentivo e integração dos inventores
independentes às atividades das ICTs e ao sistema produtivo. No Brasil,
os casos de inventores independentes não é algo raro, nas patentes
concedidas pelo INPI é possível observar que existe um número
considerável de invenções registradas por inventores independentes.
Porém, para estes chegarem ao patamar de ter a proteção de sua
invenção garantida, necessitam ultrapassar os desafios sobre os custos
elevados para uma patente (ou outra forma de proteção) até a
comercialização de ativo intangível. Sabe-se que a concessão da patente
pelo INPI tem tempo de espera considerável. É nesse ponto que a
universidade poderá ajudar recebendo a invenção, por exemplo,
proporcionando oportunidade para esta pessoa física possa proteger sua
invenção ou descoberta e futuramente negociar esta ideia, ou deixar que
a universidade faça isto por ele. Para esta relação, também é necessário
um instrumento jurídico que garanta ao inventor independente que sua
invenção possa ser desenvolvida, não lhe sendo usurpada e, também que
a instituição possa receber valores advindos desta comercialização
posterior com o setor privado. Algumas universidades quando recebem
262
pedidos de apoio e investimento em invenções externas da instituição
não sabem como agir e acabam afastando esta possibilidade. Este figura
de inventor independente é relevante já que até mesmo a legislação
sugere formas de atuação e apoio a estes inventores que em alguns
Estados da federação são custeados através de órgãos de fomento que
prevêem apoio financeiro para a proteção dos direitos, exigindo como
contrapartida o comprometimento de partilhar os ganhos econômicos
auferidos com a exploração da criação protegida, o que também pode ser
realizado por instituições de ensino e pesqusia. Algumas ICTs como as
federais do Rio de Janeiro, Paraná, Espírito Santo, Uberlândia já
possuem procedimentos específicos para atender ao inventor
independente, o que pode ser replicado em outras instituições.
4.4.3 Da natureza jurídica e modelo institucional
Considerando que os comentários anteriores que trataram do
modelo gerencial e jurídico, resta-se saber quais as possibilidades de
constituição deste modelo, principalmente, com a publicação do novo
marco legal de inovação. E nesta pesquisa, convencionou-se que, de
forma geral, podem ser considerados dois modelos, o autônomo e o
independente.
4.4.3.1 Autonomia do NIT
Constatou-se nas pesquisa citadas e nos estudos de caso que a
autonomia nos “TTOs” brasileiros é sempre reivindicada. Por isso, seus
agentes e servidores envolvidos nas ações dos NITs requerem maior
visibilidade dos núcleos que vai desde a estruturação e qualificação de
servidores e estagiários, oportunidade de discussão com as instâncias
superiores, agilidade nos processos internos, na visão pró-inovação dos
conselhos, até no investimento no setor, entre outras reivindicações. Nas
duas universidades pesquisadas, percebeu-se que a constituição e
vinculação dos NITS influenciam no desenvolvimento de suas
atividades. É na verdade uma antiga discussão desde a imposição legal
em 2004, que incomodava gestores para definirem como seriam criados
os núcleos e em qual formato institucional. As instituições criaram seus
NITs como núcleos, escritórios, departamento ou agências de inovação,
e estes em sua maioria, estão vinculados diretamente à Reitoria, Vice-
Reitoria, ou Pró-Reitoria. Nos casos estudados, observou-se que a
vinculação direta com a Reitoria é mais interessante para o núcleo, pois,
263
as decisões e ações já estão conectadas com o dirigente máximo da
instituição, o que auxilia numa solução mais imediata121
, como ocorre
com a UDESC. Diferentemente na UNEMAT, o NIT está vinculado à
Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-graduação, da mesma forma que o
Departamento de Inovação Tecnológica (DIT) da UFSC está ligado à
Pró-Reitoria de Pesquisa. Esta formatação para a universidade mato-
grossense tem demonstrado ser importante, porém, algumas vezes
prejudicada quanto às decisões urgentes e de comprometimento
institucional. Porquanto, a autonomia também está refletida nas decisões
sobre a temática da inovação dentro da instituição. Conforme relato de
entrevistado da universidade do Centro-Oeste, ficou demonstrado que
por vezes as propostas apresentadas para uma mudança ou agilidade de
suas atividades não foram atendidas, não foram discutidas pelos
conselhos, adiando-se sua implantação. A política institucional e o apoio
institucional das instâncias superiores, defendem a visão pró-inovação
tem reflexo imediato na comunidade acadêmica e auxilia na
compreensão desta visão empreededora. Um exemplo desta visão pró-
inovação institucionalizada está na Universidade Federal do Amazonas
que instituiu a Pró-Reitoria de Inovação Tecnológica (PROTEC),
composta pela Diretora do Departamento de Gestão da Inovação,
Propriedade Intelectual e Transferência Tecnológica (DePI), Direção de
Departamento de Gestão do Patrimônio Genético e Conhecimentos
Tradicionais (DCT) e Coordenação Operacional do Observatório
Estadual de Economia Criativa (OBEC-AM), denotando a importância
que a inovação tem para a universidade. Esta Pró-Reitoria tem como
missão a gestão de instrumentos da Política Institucional de Inovação
Tecnológica da universidade, visando fomentar, apoiar, promover e
acompanhar as ações que tenham por finalidade a inovação tecnológica,
a proteção e valorização dos saberes dos povos tradicionais. Ainda é
responsável pelas pesquisas que envolvem o uso das tecnologias sociais,
com interesse em transferir e comercializar os ativos intelectuais
produzidos para o setor produtivo, fornecendo subsídios qualificados
para o desenvolvimento social, cultural e tecnológico da região122
. Fica
121
Situação similar da que ocorre na UNICAMP que adotou esta visão e a
Agência INOVA está diretamente ligada ao Gabinete do Reitor (artigo 1º da
Resolução GR-051/2003, de 23/07/2003). 122
Informações obtidas no sítio eletrônico da Universidade Federal do
Amazonas (UFAM). Disponível em: <
264
evidente que a instituição assumiu uma posição pró-ativa para inovação,
elevando seu comprometimento em instância superior da universidade.
Pontua-se que as regras reformadoras de janeiro de 2016
trouxeram no Artigo 16 mudanças importantes para a gestão de
inovação nas ICTs. Houve a proposta de ampliação da competência do
NIT, que valorizou a promoção e acompanhamento da relação entre U-
E, nos incisos VII ao X. Da mesma forma, no §2º do mesmo artigo
explicitamente prevê a possibilidade de representação institucional, por
delegação, ao gestor do Núcleo de Inovação Tecnológica, já citado.
Atende a reivindicações da comunidade acadêmica em certa medida,
reafirmando o modelo autônomo.
4.4.3.2 Independência do NIT
Ao longo do período de estudos e pesquisas no doutorado,
compreendo as teorias aprendidas e informações colhidas, o que
incomodava mais esta pesquisadora era a comparação com os núcleos de
inovação no Brasil e com os países mais desenvolvidos, como Estados
Unidos da América, países Europeus, e até aqueles emergentes como a
Coreia do Sul. Esta pesquisa também não deixou de fazê-lo nos
capítulos iniciais. Contudo, a inquietação veio em razão de que não
poderia comparar estruturas organizacionais tão distantes por causa de
as organizações dos países desenvolvidos não estão na mesma condição,
neste caso, que não têm a mesma estrutura jurídica. Os escritórios de
inovação de outros países têm uma conformação diversa da brasileira e
são bastante independentes, ao contrário das nacionais, que em sua
maioria, tem vinculação com a instituição de ensino e pesquisa e
consequentemente, dependentes e suas características devem
acompanhar a rigidez do órgão público que o instituiu. Esta formatação
jurídico-institucional dificulta a atuação mais ostensiva dos NITs nas
universidades e institutos públicos que deveriam ter uma ação mais
empreendedora, voltada para questões contratuais e comerciais,
funcionando como uma agência. Nos casos de universidades e modelos
de transferência de tecnologia já discutidos, viu-se que tanto nos Países
Baixos como em Israel existe uma independência dos escritórios de
inovação, ou melhor, uma interdependência entre a instituição de ensino
e pesquisa e a agência de inovação. Os Escritórios de Transferência de
http://www.ufam.edu.br/index.php/pro-reitorias/pro-reitoria-de-inovacao-
tecnologica-protec> Acesso em janeiro de 2016.
265
Tecnologia (NITs) funcionam como agências de inovação propriamente
dita, como uma empresa que auxilia a instituição a organizar,
administrar, comercialização e fazer o marketing da pesquisa realizada
no seu interior, conjugando a visão empresarial. Envolve assim temas
como a propriedade intelectual, os contratos de transferência de
tecnologia, captação de recursos e parceiros, trazendo um retorno
através de investimentos na ICT, pelos valores contratados,
possibilitando que seus investigadores e inventores possam ter mais
segurança e se dediquem ao ensino e pesquisa. Israel é um exemplo
claro de que os escritórios de transferência de tecnologia são empresas
constituídas com a finalidade de promover a transferência destes ativos e
conhecimentos da universidade para os mercados. Por vezes, apesar de
serem empresas “divorciadas” da universidade, são compostas por
pessoas da universidade nos seus conselhos e a ICT pode figurar como
sua acionária majoritária. Para que isto ocorra, estas empresas mantêm
uma relação de exclusividade com um instituto ou universidade com
intuito de comercializar a PI e possibilitar a geração de renda a partir
dos contratos celebrados e recebimento de royalties. Como descrevem
em seus sítios eletrônicos oficiais, estas agências são braços comerciais
das instituições de pesquisa e organizam esta matéria para a ICT. Para
realizarem estas negociações com desenvoltura, a titularidade da PI é
estritamente da agência, que se responsabililza pelo registro de patente e
tem o direito, a seu critério, de registrar em seu nome, pedidos de
patentes e outras aplicações para Direitos de Propriedade Intelectual em
matéria de invenção. É a empresa que decide qual invento é relevante e
se deve investir naquela ideia. A decisão é realizada de forma colegiada
em que estão envolvidos membros da academia e especialistas da
agência. Desta forma, quem contrata diretamente com a empresa
interessada é a agência de inovação, porém, existem outros instrumentos
que garantem a execução deste contrato e devem fazer parte de acordo
de exclusividade, bem como, os acordos tripartites entre estas duas
primeiras partes e os inventores (equipe que realizou a pesquisa). Estes
acordos são regidos pela própria legislação nacional, como também por
um regulamento ou normatização interna que se dedica a resolver
conflitos, denominando-se "Regras de Propriedade Intelectual e Conflito
de Interesses" da ICT123
.
123
O assunto foi apresentado de forma mais detalhada no primeiro capítulo.
266
Outro exemplo é o das universidades holandesas, em que se
destacam estes escritórios de transferência de tecnologia que funcionam
como um empreendedor institucional e gerenciam o portfólio de
propriedade intelectual das ICTs. Contudo, diferentemente das
israelenses, não funcionam como empresas separadas ou órgãos
totalmente independentes, mas não estão envoltos de uma estrutura
administrativa como ocorre no Brasil, sendo privados. Estes escritórios
também orientam os pedidos de patentes e oferecem consultorias e apoio
no processo de comercialização (em cooperação com o inventor e
departamento envolvido). Da mesma forma, auxiliam no
desenvolvimento de estratégias de negócios, análises de mercado,
planos de negócios, formação de novas empresas, coordenação dos
contratos para colaborações universidade-indústria. Quando se percebe
que uma área é bastante desenovlvida e necessita de uma agilidade e
independência, como na área de Saúde ou Engenharia, tem sido comum
a universidade ter uma Holding (empresa mãe)124
em que a instituição
participa como majoritária, para desenvolver a inovação em áreas
específicas.
E é neste aspecto, o novo (ou novíssimo) marco legal para
inovação no país trouxe o grande avanço, a possibilidade do NIT ter
personalidade jurídica própria. De pronto, no Artigo primeiro da Lei nº
13.243/2016, inciso, IV, define Núcleo de Inovação Tecnológica como:
"estrutura instítuida por uma ou mais ICTs, com ou sem personalidade
jurídica própria, que tenha por finalidade a gestão de política
institucional de inovação". Neste inciso, acredita-se que houve uma
crucial preocupação com a gestão da inovação e procurou-se dar
independência e celeridade a estes núcleos, que passam a ter opção de
ter personalidade jurídica própria ou não. Desta maneira, os NITs
poderão ser organização com independência não figurando mais como
departamentos, extensões das estruturas já existentes, que os obrigam a
seguir regras restritas da administração pública. Esta abertura legal na
forma de constituição dos NITs foi uma posição salutar do legislador em
acatar esta reivindicação da academia de maneira que modifica o
modelo jurídico-institucional dos Núcleos de Inovação Tecnológica,
possibilitando uma nova configuração. Esta decisão veio ao encontro do
que esta autora acredita e que apresentaria como proposta, como modelo
jurídico institucional quando se iniciou esta pesquisa, que felizmente
124
Tema comentado no capítulo I.
267
tornou-se uma possibilidade real. Esta independência não signfica total
inobservância das regras atinentes à utilização do dinheiro público,
assim, pode-se também dizer que seria um modelo interdependente, em
que existe um interesse recíproco entre o NIT e a universidade e regras
de relacionamento, encontradas nas normativas internas de ambas as
instituições para que a relação flua com transparência, como atualmente
é previsto com as fundações de apoio.
Mas, talvez fique a dúvida sobre qual forma poderão assumir
como pessoa jurídica de direito privado e o Artigo 16 trouxe algumas
indicações. Sendo também alterado pela Lei 13.423/2016, indica que
poderá ser uma pessoa jurídica sem fins lucrativos. O Código Civil (Lei
nº 10.406/2002) prevê estas pessoas no artigo 44, sendo estas pessoas
jurídicas de direito privado: Art. 44 - São pessoas jurídicas de direito privado:
(Art. 16 CC Lei 3.071/16)
I - as associações;
II - as sociedades;
III - as fundações.
IV - as organizações religiosas; (Acrescentado
pelo art. 02, da Lei 10.825/03)
V - os partidos políticos. (Acrescentado pelo art.
02, da Lei 10.825/03)
§ 1º. São livres a criação, a organização, a
estruturação interna e o funcionamento das
organizações religiosas, sendo vedado ao poder
público negar-lhes reconhecimento ou registro dos
atos constitutivos e necessários ao seu
funcionamento. (Nova redação dada pelo art. 02,
da Lei 10.825/03)
§ 2º. As disposições concernentes às associações
aplicam-se subsidiariamente às sociedades que
são objeto do Livro II da Parte Especial deste
Código. (Acrescentado pelo art. 02, da Lei
10.825/03)
§ 3º. Os partidos políticos serão organizados e
funcionarão conforme o disposto em lei
específica. (Acrescentado pelo art. 02, da Lei
10.825/03)
Destarte, os NITs poderão ser de direito privado, conforme
Artigo 16 citado, e também serem sem fins lucrativos, configurando as
possíveis alternativas como: associação, fundação ou sociedades civis,
adequando seu objeto. Evidentemente, não se aplica à visão comercial
268
comentada anteriormente, o que é mais aceitável no cenário brasileiro
que ainda tem resistência a esta posição. Contudo, neste ponto,
vislumbra-se maior liberdade de contratar e executar as atividades de
inovação e possibilita uma personalidade jurídica própria,
principalmente, em razão de contratação de pessoal, compra de
materiais, recebimento de valores externos etc. Deve-se ressaltar que
combinando a alteração trazida no Artigo 16, a alteração também na Lei
8.958/1994 (§ 8º, do Artigo 1°), que trata da relação entre as Instituições
Federais de Ensino Superior (IFES) e as fundações de apoio, admite-se
que os NITs poderão assumir a forma de fundação de apoio. O que é
intrigante ter uma previsão sobre a estrutura dos NITs em legislação
voltada para fundação de apoio, mas que reforça o interesse em ofertar
independência aos NITs, in verbis: Art. 1
o As Instituições Federais de Ensino
Superior - IFES e as demais Instituições
Científicas e Tecnológicas - ICTs, de que trata
a Lei nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004,
poderão celebrar convênios e contratos, nos
termos do inciso XIII do caput do art. 24 da Lei
no 8.666, de 21 de junho de 1993, por prazo
determinado, com fundações instituídas com a
finalidade de apoiar projetos de ensino, pesquisa,
extensão, desenvolvimento institucional,
científico e tecnológico e estímulo à inovação,
inclusive na gestão administrativa e financeira
necessária à execução desses projetos.
(...)
§ 8º O Núcleo de Inovação Tecnológica
constituído no âmbito de ICT poderá assumir a
forma de fundação de apoio de que trata esta Lei.”
Resta compreender o que seria uma fundação de apoio. A
fundação definida como patrimônio personalizado para consecução de
fim social (Art. 62 do Código Civil). Neste sentido, esta instituição é
criada para um determinado fim (social, médica e hospitalar, educação,
ensino, pesquisa, atividades culturais) com um patrimônio próprio que
se desprende da figura do instituidor e deve ser sem fins lucrativos. Caso
o patrimônio destinado advenha de particulares, como doação,
testamento ou investidores esta será “inteiramente” privada, com
personalidade jurídica de direito privado. Desse modo, o seu instituidor
o fará por escritura pública (inter vivos) ou testamento (causa mortis)
com dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se
269
destina, inclusive podendo declarar a forma de administração. Para sua
viabilidade, o fundador deve também dotar a entidade de bens, moveis
ou imóveis, legalmente disponíveis, suficientes para propiciar o
funcionamento da fundação, conforme discriminado no instrumento de
sua criação que é o Estatuto. Neste instrumento estará definida a sua
denominação, fins e sede, bem como, o patrimônio e rendimentos e os
órgãos de sua administração, como o Conselho Curador e Diretoria
Executiva, bem ainda, condições de extinção e destino de seu
patrimônio, seu exercício financeiro e condições de reforma do estatuto.
Deve-se salientar que sua fiscalização é feita pelo Ministério Público
(Curador) que inclusive analisa e aprova ou não a criação de uma
fundação, bem ainda, opina sobre modificações estatutárias, sem
prejuízo de serem também fiscalizadas pelos controles institucionais
internos. Demonstra que as fundações possam garantir uma segurança
no seu funcionamento. De forma resumida, após a designação dos bens
patrimoniais, elaboração do estatuto aprovado pelo Ministério Público,
com a lavratura de escritura de constituição da fundação, esta adquire
personalidade jurídica após ter inscrição no Cartório de Registro Civil.
Porém, apesar do Decreto nº 200/67 (com as alterações trazidas
pela Lei nº 7.596/87), no Art. 5º, IV, indicar que a fundação pública
poderá ser entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado,
sem fins lucrativos, quando há dinheiro público (parcial ou total)
destinado para sua criação, o entendimento dos juristas é que a fundação
será pública também, em razão das características do seu instituidor e
deverá ser autorizada sua criação por lei. Isto deve ser observado pelos
dirigentes das universidades e interessados em constituir um NITs nesta
modalidade, para garantir ao NIT a personalidade jurídica de direito
privado. A fundação poderá ser inicialmente constituída com patrimônio
de investidores ou até mesmo de pesquisadores, oriundos de bens
particulares, para que se desvincule totalmente, não retomando as
mesmas dificuldades de procedimentos do setor público. Através desta
nova estrutura, os NITs poderão assumir esta posição de fundação
comprindo uma dupla função de modo que permitem a captação e/ou o
remanejamento dos recursos extraorçamentários nas universidades, que
não dispõem de flexibilidade orçamentária e permitem se “esquivarem”
da estrita legalidade que é imposta às instituições públicas no processo
de compra de materiais e de equipamentos, permitindo, inclusive,
contratações de profissionais de forma temporária, por terem orçamento
desvinculado do público, mas não deixando de observar algumas regras
que ainda se impõe quando da utilização do dinheiro público. É comum
270
ver a intermediação das fundações na administração dos recursos
obtidos pelos cursos de Extensão e/ou de Pós-Graduação lato sensu
(Especialização), como também os resultantes de consultorias, prestação
de serviços e outras relações entre a instituição de pesquisa e o setor
privado.
Verifica-se que a Lei de Inovação de 2004 teve como ponto de
partida a situação das ICTs públicas, portanto, visando adequar suas
estruturas de caráter público nas suas relações com o setor privado.
Mesmo com a criação dos Núcleos de Inovação Tecnológica, os
entraves continuaram e neste ponto deve-se ter em vista que o NIT,
como gestor da inovação da instituição, sem uma independencia, uma
personalidade jurídica própria, acaba negociando com o setor privado e
impondo a estes os ditames da relação pública, não considerando o
dinamismo que a situação requer. Algumas ICTs preferiram se "apoiar"
em outras instituições para gerenciar estes contratos e as receitas
oriundas desta relação, portanto, as fundações de apoio e vale aqui
compreender como esta relação é estabelecida. Para esta relação, seja na
esfera federal, como estadual ou municipal foram criadas leis que a
regulam. A mais conhecida é a federal, Lei nº 8.958/94, que trata da
relação entre as instituições federais de ensino e sua respectiva fundação
de apoio (FAP) e regulamentada pelo Decreto nº 7.423/2010. A
legislação citada permite que as IFES (Instituições Federais de Ensino
Superior) celebrem contratos (artigo 24, XIII, Lei 86666/93) e
convênios com estas fundações para que estas apoiem "projetos de
ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e
tecnológico e estímulo à inovação, inclusive na gestão administrativa e
financeira necessária à execução desses projetos". Neste último ponto,
gestão administrativa e financeira é a grande oportunidade que as ICTs
evidenciam para dar maior celeridade aos seus projetos e contratos que
envolvam a inovação. A fundação de apoio serve como intermediário da
relação da ICT com empresas e busca tornar mais ágil a relação U-E, em
projetos (pesquisas) ou na própria contratação, de modo que gerencia de
forma mais imparcial nas negociações, evidentemente cobrando pelos
serviços. Por sua constituição legal, as fundações são de direito privado,
porém, sem fins lucrativos, conforme artigo 62 do Código Civil: Art. 62. Para criar uma fundação, o seu instituidor
fará, por escritura pública ou testamento, dotação
especial de bens livres, especificando o fim a que
se destina, e declarando, se quiser, a maneira de
administrá-la.
271
Parágrafo único. A fundação somente poderá
constituir-se para fins religiosos, morais, culturais
ou de assistência. (CÓDIGO CIVIL, Lei nº
10.406/2002)
Para maior controle destas pessoas jurídicas de direito privado,
que cuidam de interesse público, estas estão sujeitas à fiscalização do
Ministério Público, conforme previsão no Código Civil e do Código de
Processo Civil, e também trabalhista, devendo inclusive realizar um
prévio registro e credenciamento nos Ministérios da Educação e do
Ministério da Ciência e Tecnologia, dando-lhes legitimidade para atuar
no suporte administrativo e finalístico aos projetos das ICTs. Sendo um
mecanismo conhecido pela ICTs e que pode ser aproveitado para a
relação com o NIT, especificando seu objeto para a transferência de
tecnologia e conhecimento.
Distanciando-se ainda das mudanças legais, na visão desta autora,
outras formas a serem pensadas de constituição jurídica dos NITs seria a
empresa pública, como organização social, associação. A primeira traria
uma visão mais comercial e possibilitaria uma inserção mais negocial
dos NITs. Um bom exemplo de uma instituição de excelência na área da
agricultura e com patentes registradas inclusive no exterior é a Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), que é uma empresa
pública pioneira em muitas descobertas científicas relacionadas ao
feijão, arroz, trigo, gado de corte entre outros. Todavia, uma empresa
pública terá sempre nuances do setor público, sendo a hipótese prevista
no novo marco legal mais independente.
Outra forma que a administração pública tem utilizado para
relacionar com o setor privado é através das Organizações Sociais,
também criadas sem fins lucrativos. Logo, o Poder Público transfere a
produção dos serviços competitivos ou não-exclusivos do Estado,
estabelecendo-se um sistema de parceria entre o Estado e a sociedade.
Visando alcançar maior eficiência, o Estado deixa de executar ou prestar
os serviços diretamente, porém, permanece sua função de fiscalizar e
controlar a execução dos serviços, através de um contrato, denominado
contrato de gestão. É através deste contrato que a organização social
firma um compromisso institucional com a administração pública para
realizar atividades de interesse social não-exclusivas, conforme definido
na Lei nº 9.637, de 1998. Esta nomenclatura, contrato de gestão,
significa que através deste instrumento o Estado poderá supervisionar e
272
acompanhar, avaliar as políticas públicas em que são definidas ações,
metas e prazos, formas de repasse de recursos, bem como, indicadores
exigindo um resultado mais eficaz. É, portanto, um modelo de gestão
que visa melhorar a eficiência e qualidade na prestação de serviços,
sendo que estas organizações que já possuem experiência prévia sobre o
serviço a ser prestado, como na área da saúde, cultura, educação ou
esportes possam realiza-lo com presteza. Um exemplo de aplicação
desta figura na área de inovação é na gestão de parques tecnológicos, no
caso da Agência de Desenvolvimento e Inovação de Sorocaba (INOVA
Sorocaba) que é uma Organização Social (OS) responsável pela gestão
de Ciência, Tecnologia e Inovação, além de ser responsável pelo
programa de incubação de empresas de base tecnológica no Parque
Tecnológico de Sorocaba; ou ainda o Parque Tecnológico de São José
dos Campos (PqTec – SJC) que tem como gestora uma associação
(Associação Parque Tecnológico de São José dos Campos-APTSJC),
entidade privada sem fins lucrativos, qualificada pelo poder público
municipal como Organização Social, que foi com quem esta associação
firmou contrato de gestão. O Centro de Gestão de Estudos Estratégicos-
CGEE, sediado em Brasília, é outro exemplo de OS, criado com
objetivo de promover e realizar estudos e pesquisas prospectivas de alto
nível nas áreas de educação, ciência, tecnologia e inovação e suas
relações com setores produtores de bens e serviços.
De outro lado, conforme já mencionado, a proposta de mudança
no marco regulatório para a inovação já vislumbrou a possibilidade do
NIT inclusive assumir uma personalidade jurídica muito próxima da
fundação de apoio, possibilitando maior independência e autonomia
destes gestores de inovação. O que poderá gerar algumas dúvidas e
desconfianças da academia, porém, busca introduzir práticas que já
ocorrem em outros países, como Holanda e Israel, que apresentam
resultados positivos. Por conseguinte, os modelos adotados por
instituições de pesquisa brasileira, que foi estruturada a partir da Lei de
Inovação em 2004, em que houve a obrigatoriedade de criação de NITs
e uma maior preocupação em proteger os resultados de pesquisas e
tecnologias desenvolvidas, evidenciou que o Brasil tem dificuldades em
alavancar este modelo, em razão deste estar adstrito às normas da
administração pública. Inúmeras vezes é acusada de carregar a herança
da morosidade e burocracia, o que ainda acompanha as relações entre
universidade e empresa no âmbito nacional. Necessita-se, portanto, sair
da postura de inércia e conformismo e avançar para uma postura mais
assertiva quanto à transferência de tecnologia, não apenas pensando em
273
paliativos e arranjos, sair da posição de path losers para path finders,
conforme visão de Salles-Filho e Bonacelli (200, p.01-09). A adoção do
modelo mais independente poderá ser aprovada ou não pelo decurso do
tempo e das experiências vividas pelas instituições que o adotarem.
Como demonstrado nos casos estudados, este modelo sofre resistências
quanto sua implantação. Seria ideal ter universidades também menos
burocráticas e NITs mais independentes como no caso israelense ou
ainda a possibilidade das universidades serem acionistas majoritárias
formando holdings, mas, para estes modelos, a mudança teria que
acontecer na estrutura da universidade, o que não se vislumbra em curto
prazo. As opções das alterações trazidas pela Lei 13.243/2016
possibilitam mudanças importantes e servem como uma transição, quem
sabe, para um futuro mais independente.
275
CONCLUSÃO
A apresentação deste estudo buscou trazer uma visão geral sobre
a temática que envolve a inovação, passando por questões que estão
inseridas no país e na relação U-E, que partem para situações
particulares que foram descritas na parte empírica da pesquisa.
Reconhece-se que a parte conclusiva não é exaustiva, como não
pretendeu ser a pesquisa, porém, após o que fora apresentado
coordenadamente, é possível realizar um julgamento acerca do valor das
ideias reunidas com o escopo já demonstrado. Na realidade, a conclusão
foi delineada ao longo da escrita da tese, respeitando o processo de
argumentação e que geraram sugestões inseridas nos capítulos.
Verificou-se que no primeiro capítulo, buscou um panorama geral
sobre a inovação trazendo seus conceitos e teorias mais referenciadas
nos textos científicos e reconhecidas internacionalmente. Desse modo,
tratou-se sobre o conceito de termo inovação, ambiente, sistemas e
modelos, como também, sobre o modelo jurídico-institucional. Ficou
evidenciado que a inovação é compreendida entre dois aspectos
orientadores, quais sejam o avanço tecnológico e o mercado
consumidor. Para o bom funcionamento desta engrenagem, a pesquisa
adotou a teoria e visão da Tríplice Hélice que admite ao menos três
agentes de inovação, que desenvolvem papeis distintos e relevantes para
a fomentarem. Portanto, as universidades e os governos servem como de
suporte estrutural, científico e financeiro, para que o setor privado possa
também exercer seu papel no desenvolvimento de novas ideias e ações.
Todavia, percebeu-se com as leituras e entrevistas que no Brasil, mesmo
com marco legal e adoção de políticas para inovação, esta engrenagem,
esta relação ainda carece de alguns ajustes. E esta pesquisa de forma
intencional preferiu estudar mais pontualmente o papel das
universidades, por razões pessoais, profissionais, já que a pesquisadora
desenvolve suas atividades profissionais de advocacia junto a uma
universidade estadual. E ainda compreendeu que algumas perguntas
práticas não poderiam ser respondidas pela pura interpretação legal.
Como defendido por Cristóvão Buarque (2014), acredita-se que a
universidade deve ser redefinida e que realmente precisa tomar uma
decisão crucial nesta "encruzilhada", inclusive decidindo quanto a
reavaliar suas ações e visão, repensar seu papel na sociedade.
Deve-se ressaltar que no início da pesquisa, as impressões e
hipóteses estavam direcionadas para a estrutura geral da universidade
pública no país e unia-se às críticas sobre a burocracia e quanto à
276
estrutura pública que tanto dificulta a interlocução com o "estranho"
mundo exterior da academia. Dentro da instituição, tudo deve funcionar
diferente do que ocorre externamente e o tempo é realmente relativo.
Esta visão procurou respostas numa possível mudança de paradigma e
modelos híbridos de universidades porque quando se fala em inovação,
os melhores exemplos são de outros países, particulamente, Estados
Unidos e Europa. Entretanto, a percebe-se que comparação acaba sendo
inócua no seu nascedouro, já que existe uma grande diferença quanto ao
modelo jurídico-institucional que estas universidades estrangeiras
adotam. Esta formatação pública e estatal, conforme comentado e a
dicotomia entre o público e privado, deixam as universidades brasileiras
em desvantagem. Como falar em inovação se muitas universidades
públicas no país têm dificuldades em organizar a execução financeira de
recursos externos ou ainda cumprir a finalidade dos recursos destinados
que ficam "perdidos" na conta única do governo estadual
(principalmente do Mato Grosso) e dificultam a execução orçamentária
de um projeto de pesquisa que tenha uma parceria entre universidade e
empresa. No entanto, com a evolução da pesquisa, reconheceu-se que a
discussão sobre os modelos de universidades por si só justificariam uma
tese de doutorado, porém, o foco da pesquisa estava na gestão da
inovação ou transferência de tecnologia e conhecimento. Assim, a
discussão foi canalizada para os Núcleos de Inovação Tecnológica e sua
atuação nas relações entre universidade e empresas, discutindo em
concreto suas vantagens e desvantagens. Aqui sim caberia uma
discussão sobre a autonomia e estrutura jurídica de criação dos NITs,
sua formatação institucional, o que o legislador brasileiro já estava
discutindo conforme as considerações da proposta de alteração de lei.
Após, concentrou-se na discussão quanto ao marco legal e
política de inovação no país, direcionando o enfoque para a Lei de
Inovação, pois, a discussão principal fixou-se nas Instituições de Ciência
e Tecnologia e sua importância neste Sistema de Inovação. Tratou-se da
Política de Inovação Brasileira que demonstra como o país se organizou,
quais as decisões que buscou para o desenvolvimento tecnológico e
industrial propiciando um ambiente de inovação. Isso inclui a adoção de
análises similares dos países europeus: o Brazilian Paradox obteve
conclusões sobre a dificuldade de que o conhecimento gerado não
produzia avanço tecnológico, tampouco inovação no setor produtivo e
com os diagnósticos, o governo pode direcionar suas políticas. Abordou-
se também sobre as legislações estrangeiras que inspiraram a lei
brasileira, compreendendo um misto de ideias europeias e
277
norteamericanas, bem como, um possível conflito ou dependência de
outras legislações para que seus objetivos fossem alcançados e que as
parcerias formalizadas pelos contratos e cooperações não sejam
obstados. Mas, o destaque neste capítulo está nas mudanças legais já
realizadas, como a Emenda Constitucional nº 85/2015, das alterações
trazidas pela Lei nº 13.243/2016. Esta lei entrou em vigor em janeiro de
2016 e apresentou mudanças legislativas em normas que incidem sobre
a inovação no país. Para esta nova legislação, felizmente, houve ampla
discussão com a comunidade acadêmica e o setor privado, o que poderá
ser uma resposta mais realista das necessidades reais destes segmentos,
pois, bravamente, trazem à baila soluções que inovam e rompem com
um paradigma na universidade, como a possibilidade de estruturar os
NITs com personalidade jurídica própria e de direito privado e de poder
remunerar melhor o pesquisador. Com estas alterações, busca-se
promover as parcerias entre as ICTs (públicas e privadas) e as empresas
e definitivamente dinamizar o aproveitamento das atividades de
pesquisas serem aproveitados pela iniciativa privada. Certamente
auxiliará no aumento da competitividade frente ao mercado
internacional, no desenvolvimento econômico e social.
A seguir adentrou-se na discussão relação U-E e nas atividades
dos NITs. Inicialmente, foi apresentado o contexto em que as indústrias
e universidades brasileiras foram criadas, reafirmando as diferenças de
visão e interesses entre estas partes, sendo relacionado com seus
históricos. O processo de industrialização brasileiro, que faziam apenas
uma adaptação do que era produzido no exterior, não se interessando em
manter centro de pesquisas, laboratórios ou institutos para desenvolver
novos produtos no país, o que explica o porquê de a pesquisa e o
desenvolvimento serem colocados em segundo plano para o setor
privado. Da mesma forma, o modelo brasileiro de universidades esteve
em grande parte da história se dedicando para formação de profissionais,
visando mercado de trabalho, ou apenas produção de conhecimento
"descomprometida" com as necessidades práticas da sociedade,
"pesquisar por pesquisar". Esta postura institucional, no entendimento
desta pesquisadora tem sido confrontada e as instituições estão sendo
"impelidas" a assumirem um papel mais dinâmico para desenvolverem
pesquisas aplicadas, além da básica, que é de sua natureza, convergindo
também interesses do setor privado (e sociedade) para a promoção da
inovação. Isto é salutar, quando existe uma estruturação de políticas e
incentivos apropriados, para gerar uma cultura de inovação nas
instituições de ensino e pesquisa. Conquanto, das discussões
278
apresentadas no capítulo II, o que deve ser considerando como crítico
são a visão e missão que a universidade quer desenvolver para o futuro.
Esta autora acredita que não há mais espaço para acusações sobre a
comercialização e privatização das ICTs, a universidade precisa evoluir
e discutir ou inserir a questão da inovação nas suas políticas e decisões.
Não se pode ignorar que estudiosos como Boaventura Sousa Santos e
Cristóvam Buarque, que conhecem profundamente a temática
universitária, estão buscando alertar as instituições para uma discussão
madura, reconhecendo que uma mudança é necessária. Coaduna-se,
portanto, com as observações do sociólogo Boaventura, que reconhece
que é necessário resituar o papel da universidade pública na definição e
resolução de forma coletiva dos problemas sociais, que deve ter em
conta a contextualização global; bem como, do educador, engenheiro
mecânico, economista e político. Buarque afirma que a universidade
encontra-se em uma encruzilhada civilizatória. Sobre os NITs, falou-se
da sua constituição em torno do país que se tonificou com a
promulgação da Lei de Inovação e também sobre sua vocação na
intermediação dos assuntos de transferência de conhecimento e
tecnologia, bem ainda, de proteção dos direitos de propriedade
intelectual. Não obstante, com toda esta vontade em instituir uma
cultura nacional de inovação, verificou-se que alguns pontos da Lei de
Inovação necessitam de mecanismos para implantação.
Os comentários sobre a proposta de alteração legal demonstrou
que era importante redefinir a história e caminho a ser traçado sobre a
inovação no país. Percebeu-se que houve ampla discussão com a
comunidade acadêmica e o setor privado contemplando e garantindo
situações que não puderam ser previstas na Lei de Inovação de 2004. A
proposta também abarca outras legislações, reafirmando o entendimento
de que as normas também necessitam trabalhar sistematicamente.
Espera-se que as alterações promovam as parcerias entre as ICTs
(públicas e privadas) e as empresas e definitivamente possa dinamizar o
aproveitamento das atividades de pesquisas serem aproveitados pela
iniciativa privada. Certamente auxiliará no aumento da competitividade
frente ao mercado internacional, visando o desenvolvimento econômico
e social, melhoria nos índices e pontuações em rankings internacionais,
podendo a nova legislação fazer história com maior autonomia e com
melhores resultados para o país.
Através do estudo dos casos propostos, a percepção inicial desta
pesquisadora foi confirmada, pois compreendendo que a inovação é
explicada sistematicamente, não se pode esperar resultados apenas de
279
uma legislação, precisa-se de uma adequação da organização para sua
implementação. Observando as instituições estudadas Universidade do
Estado de Santa Catarina (UDESC) e Univeridade do Estado do Mato
Grosso (UNEMAT) é possível concluir que as instituições tiveram ou
têm dificuldades em realizar suas atividades em razão de lacunas
normativas internas que ainda não traduzem a visão de inovação, bem
como seus procedimentos e órgãos não se comunicam devidamente. O
que significa que não é apenas a questão da lei de inovação nacional em
si que dificulta a realizar inovação e sim como a legislação é
internalizada institucionalmente no seu modelo jurídico, político e
gerencial. Quanto à autonomia e independência financeira e gerencial
nas universidades estudadas, foram uníssonas quanto à sua importância.
Mas, quando se trouxe a baila situações que possam romper com o
padrão nacional instituído, houve parcimônia, principalmente quando
foram perguntados sobre a possibilidade de personalidade jurídica do
NIT ou em relação à cessão dos direitos de PI. Demonstra que apesar de
desejarem desenvolver suas atividades com maior relevância e
vislumbrarem casos dos países desenvolvidos, as mudanças estruturais
ainda causam estranheza.
Foram apresentados os históricos das instituições de ensino e
pesquisa pública estadual e através das técnicas de observação e de
entrevistas, pode-se perceber a realidade das universidades e a forma de
gestão da inovação e perceber as dificuldades que além de serem legais,
também são estruturais. Portanto, utilizou-se a observação como meio
de coleta de dados durante visitas realizadas aos Núcleos de Inovação e
análise documental, que focalizou o histórico das universidades,
contexto regional, através de livros e revistas, informativos nos sítios
eletrônicos e matérias veiculadas e, principalmente, em normativas
internas das instituições e suas políticas.
Da análise realizada, destacam-se o resultado advindo das
entrevistas e visitas à Coordenadoria de Projetos e Inovação (CIPI) e
Núcleo de Apoio à Inovação Tecnológica e Captação de Recursos
Externos (NITEC) da UDESC e NIT (Núcleo de Inovação) da
UNEMAT. O roteiro com perguntas abertas e não estruturadas, auxiliou
na percepção da realidade de cada instituição e seu estágio de evolução
quanto à getão da inovação. Para a interpretação dos dados colacionados
as informações foram organizadas de forma comparativa indicando-se
similaridades, diferenças e destaques das instituições de ensino e
pesquisa. De igual modo foi utilizada a análise documental com consulta
280
a notícias e instrumentos normativos das universidades e a observação
nas visitas realizadas nas entrevistas.
A pesquisa constatou que para ambas insitiuições, a inovação é
um fator estratégico, reconhecendo que houve um avanço com a
implantação do Núcleo de Inovação Tecnológica e que a instituição
deve incentivar projetos que envolvam pesquisas com uma aplicação
mais prática para a sociedade, não se esquecendo de manter a pesquisa
básica, que atualmente é a mais frequente em ambas. A lei de inovação
foi citada como um referencial para estimular o ambiente produtivo de
inovação e que trouxe benefícios. No tocante às parcerias com o setor
privado, estas foram consideradas como vantajosas para as instituições,
significando aporte financeiro, geração de conhecimento, de produtos e
processos, direitos de propriedade industrial, que poderá gerar royalties
quando existir a transferência. A troca de conhecimento foi relatada
como elemento principal, em que os pesquisadores para desenvolverem
novas tecnologias para o mercado são forçados a buscar por informações
do mercado externo. Ficou evidenciado que esta interação traz um
choque de realidade, confrontando o ensino com a aplicação prática e
resolução de problemas da sociedade, que é uma crítica ao meio
acadêmico.
Verificou-se também, que o quantitativo de ativos intangíveis não
tem expressividade nas instituições e a maioria está em fase de análise
no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), o que
demonstra que o ritmo da transferência de tecnologia é ainda tímido, já
que não possuem a titularidade e o bem intangível reconhecidamente
protegido. Esta autora constatou que a autonomia do NIT é uma visão
uníssonaentre as instituições, apesar de que na instituição da região Sul,
reconhece que a forma de criação e vinculação diretamente com a
Reitoria auxilia sobremaneira neste contexto. Contudo, igualmente
concordam que a fundação que se destinam a dar apoio institucional nas
parcerias que a universidade firma, necessita de um verdadeiro
engajamento e sua atuação deve estar bem definida em normas que
definem a relação entre a universidade e a própria fundação.
Notou-se que as universidades têm questões muito similares,
mesmo estando em Estados da federação bem diferentes e com
economia diversificada. Ambas apontaram a importância de terem sua
autonomia melhor definida, principalmente, quanto à questão
orçamentária e políticas institucionais mais pró-ativas. Outra questão
confirmada pela pesquisa foi que várias vezes as entidades tiveram
dificuldades em relacionar com empresas porque os interesses são
281
diversos, o tempo e prazos praticados na universidade desestimulam o
setor privado, da mesma forma, em razão das empresas buscarem
parcerias desvantajosas à universidade, visando apenas tirar um proveito
das instalações e profissionais da instituição sem ofertar uma
contrapartida justa. O estudo de caso institucional teve como objeto as
instituições citadas, UDESC e UNEMAT, visando serem confirmadas
ou confrontadas as hipóteses iniciais da pesquisa nas situações concretas
das universidades estaduais. Possibilitou-se a utilização da generalização
empírica defendida por Robert Yin, servindo como "luz empírica" sobre
os conceitos ou princípios teóricos que poderão ser aplicados na
reinterpretação dos resultados de outras instituições.
Esta pesquisa buscou referenciar sobre o modelo jurídico adotado
nas universidades públicas estaduais citadas (UDESC e UNEMAT) e
sua influência na gestão de transferência de tecnologia e conhecimento,
já que a natureza jurídica institucional pertencente à administração
pública indireta atingia diretamente nas ações dos NITs. O advento do
novo marco legal oportunizou a constituição dos núcleos de inovação
sob uma personalidade própria, assim esta pesquisadora compreende
que na atualidade basicamente existem dois modelos jurídico-
institucionais que os NITs podem assumir o "modelo autônomo" e
"modelo independente" (ou interdependente). Frisa-se que os dois
modelos são importantes para a atuação dos NITs, desde que garantidas
a liberdade de decisão e gerenciamento, inclusive, para assumir
obrigações em nome da instituição, no caso do NIT ainda estar na
estrutura da universidade.
Esta autora acredita que o primeiro modelo (autônomo) está
muito próximo do que já existe, com uma estrutura dependente da
instituição, sem personalidade jurídica, porém, com uma "autonomia
reforçada" pró-inovação. O segundo modelo (independente) trata da
previsão atual advinda das alterações de 2016 que possibilitou a
constituição dos NITs com personalidade jurídica própria, o que
particularmente esta pesquisadora acredita ser uma opção mais vantajosa
para as instituições e mais interessante e apropriada para o avanço na
gestão da inovação internamente. Estas alterações foram importantes e
afetam a estrutura jurídico-institucional. E é neste aspecto, que as
alterações trazidas pela Lei nº 13.243/2016, ao definir Núcleo de
Inovação Tecnológica como: "estrutura instítuida por uma ou mais
ICTs, com ou sem personalidade jurídica própria, que tenha por
finalidade a gestão de política institucional de inovação", houve uma
crucial preocupação com a gestão da inovação. Denota-se que houve
282
intresse do legislador em dar independência e celeridade a estes núcleos,
que passam a ter opção de ter personalidade jurídica própria ou não.
Desta maneira, os NITs poderão ser organização com independência não
figurando mais como departamentos, extensões das estruturas já
existentes, que os obrigam a seguir regras restritas da administração
pública, sendo assim, independentes. Todavia, esta independência não
signfica total inobservância das regras atinentes à utilização do dinheiro
público, significa, sobretudo um modelo interdependente, em que existe
um interesse recíproco entre o NIT e a universidade com regras claras de
relacionamento, encontradas nas normativas internas de ambas as
instituições para que a relação flua com transparência, como atualmente
é previsto com as fundações de apoio que está como uma formatação
sugerida pela alteração legal.
Na discussão também foram apresentadas sugestões sobre
questões orçamentárias, estruturais (física e pessoal), nível de
comprometimento do sistema de valorização dos profissionais (técnicos
e pesquisadores) e relação com o inventor independente, que poderão
ser aplicadas em ambos os modelos, o que pode fomentar uma melhora
na gestão da inovação em cada instituição.
Reconhece-se que estas discussões apresentadas na pesquisa não
são estanques e virão com maior intensidade com o decurso do tempo e
aplicação das novas regras trazidas pela Lei nº 12.243/2016. Esta
pesquisa concentrou-se no modelo jurídico-institucional, organização
política e orçamentária que podem determinar o desenvolvimento mais
célere da transferência de tecnologia e conhecimento. As mudanças
trazidas pela Lei nº 13.243/2016 e as constações apresentadas neste
estudo proporcionam vários outros voltados para o que estas mudanças
influenciarão as relações entre as ICTs e o setor privado ou público.
Como este estudo, ateve-se mais sobre os Sistemas de Inovação e o
modelo jurídico frente às relações entre Universidade-Empresa. Ainda
restam espaços para discutir, por exemplo, quanto à alteração do artigo
6º, § 1º-A, que possibilita simplificação da forma (extrato em sítio
eletrônico oficial da ICT) e a dispensa de oferta pública por edital para
contratação com cláusula de exclusividade para empresas que
desenvolveram projetos conjuntos com a ICT, desde que já prevista a
forma de remuneração em convênio ou contrato. Na opinião desta
pesquisadora, a mudança legislativa corrigiu uma questão óbvia, já que
as parceiras (empresas) teriam o maior interesse em obter a
exclusividade, porém, carecia de uma previsão e permissão explícita.
Também a oportunidade para apresentar estudos sobre o artigo 8º
283
alterado da Lei de Inovação que trouxe maior atenção quanto aos
serviços técnicos especializados prestados pelos profissionais das ICTs,
o que indica que isto depende de aprovação pelos dirigentes da
instituição, disciplinando os profissionais a observarem as regras
institucionais, antes de desejarem prestar serviços nesta área. Outra
modificação importante que poderá aumentar interesse de profissionais
acadêmicos em participar ativamente da política institucional de
inovação é a previsão do artigo 14-A da Lei de Inovação com a readação
atualizada, pois admite a possibilidade do profissional (pesquisador
público), inclusive em regime de dedicação exclusiva, exercer atividade
de pesquisa em outras instituições, tanto em outras ICTs ou empresas,
para exercer atividades remuneradas de pesquisa, desenvolvimento e
inovação. Estas situações devem aumentar os índices de contratações e
relação com as empresas. Esta autora acredita que será relevante a
análise sobre a relação U-E quando se observar casos de cessão de
Direitos de Propriedade Intelectual e participação nos resultados
autorizados pelo §3º, do artigo 9º (alterado) da Lei de Inovação, que
permite a cessão ao parceiro privado da totalidade dos direitos de
propriedade intelectual mediante compensação financeira ou não
financeira, desde que economicamente mensurável, desembaraçando
claramente as impasses sobre a PI ser obrigatoriamente da instituição
pública. Talvez aqui, a desatenção dos administrativistas quanto ao
patrimônio público intangível, conforme alerta Silva (2015, p.81, 86)
que a previsão tenha ocorrido sem muitas discussões. Contudo, em
razão desta falta de princípios e regras definidas ao caso, esta previsão
poderá facilitar as negociações com o setor privado, o que será traduzido
em números no futuro nos dados do FORMICT, uma vez que, da mesma
forma, possibilita a negociação, a "venda" dos Direitos de Propriedade
Intelectual (PI), que permite a opção de cessão, vislumbrando situações
que já ocorrem em universidades de países desenvolvidos.
Para este estudo, em particular, houve a necessidade de se
direcionar o modelo jurídico-institucional das instituições de ensino e
pesquisa públicas brasileiras para galgarem os números desejáveis de
produção e eficiência, seja no ensino propriamente dito e na pesquisa.
Esta pesquisa defende a autonomia e também acredita que o novo
modelo independente possa dar grandes resultados se for bem
empregado e se os paradigmas foram gradualmente desafiados para uma
solução pró-inovação, aproximando-se dos modelos apresentados,
holandês e israelense. A relação U-E é essencial pelas vantagens já
apontadas nesta pesquisa, porém, exige flexibilidade compatível com a
284
velocidade que estar na vanguarda da história. A questão que se deve
compreender é que para a academia não há mais espaço para
pensamentos e posições retrógradas, a inovação é uma realidade.
Certamente, não se concebe uma situação sem qualquer controle ou que
venha afetar (modificar) a missão da universidade, que desde sua
fundação, vem disseminando conhecimento. Porém, deve-se estar mais
atento sobre as mudanças que já existem e observar exemplos claros nos
países desenvolvidos em que a reorganização ou realinhamento
institucional foi fundamental para a subsistência das instituições de
ensino e pesquisa, sendo a inovação uma das formas de ampliar a
comunicação com a sociedade em que está inserida. Indubitavelmente,
não há uma receita pronta para se copiar, conforme Ortega y Gasset
afirma, a imitação deve ser evitada porque cada nação tem suas
particularidades, principalmente, na educação superior, entretanto, a
intransigência também não resolverá a questão.
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APÊNDICES
APÊNDICE A: Roteiro pesquisa empírica
Indicadores
verificáveis
Objetivos Meios de
verificação
Ambiente de
inovação
(sustentabilidade,
confiança)
Compreender
conceito de
inovação,
sistemas e
ambiente de
desenvolvimento;
Inovação como
missão e
estratégia de
competitividade;
Literatura;
Regulamentação
interna das
instituições;
Relação
Universidade-
Empresa
(TT e NIT)
Processo de
transferência de
tecnologia;
Tipos de acordos
e contratos de TT;
Identificar os
problemas e
vantagens da
relação U-E;
Aimportância da
Propriedade
Intelectual nos
acordos e
contratos;
Literatura;
Levantamento:
Questionário e
entrevistas
realizadas em Santa
Catarina (Joinville e
Florianópolis) e
Mato Grosso (Barra
do Bugres);
Documentos
seminários e
discussões
apresentando
dificuldades;
Relatórios com
estatísticas:
FORMICT,
Cambridge;
Políticas e Marco
Legal Verificar
políticas de
inovação e
Documentos sobre
políticas (relatórios e
estudos);
306
trajetória;
Verificar o
marco legal de
inovação no
país;
Verificar
proposta do
Código de
C,T&I.
Regulamentação que
eles adotam;
Entrevistas; Dados
no sítio eletrônico
das instituições;
Literatura
(internacional e
nacional)
307
APÊNDICE B: Roteiro de entrevistas
Identificação do entrevistado(a):
1) Qual sua relação com o NIT da universidade?
2) Há quanto tempo trabalha com a temática de inovação?
Ambiente produtivo e social de Inovação: 1) De acordo com o perfil de sua instituição qual destas opções,
em sua opinião, melhor a descreve?
a) Universidade desenvolve mais pesquisa básica;
b) Universidade desenvolve mais pesquisa aplicada;
c) Ambas, igualmente.
2) Considerando que a Lei da Inovação instituiu normas que
dispõem sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e
tecnológica no ambiente produtivo. Em sua opinião, a atividade
da universidade direcionada para desenvolver um ambiente de
inovação tem oferecido vantagens para a instituição?
( )Sim ( ) Não
Aponte algumas vantagens –Vantagens do ambiente produtivo
( )A aproximação com o setor privado, através de
parcerias,possibilita a transferência de conhecimento e
tecnologia;
( ) A possibilidade de realizar mais pesquisas direcionadas para
soluções práticas;
( ) O reconhecimento da Universidade em âmbito nacional e/ou
internacional;
( ) O aumento de captação de recursos financeiros através de
editais de entidades de fomento para inovação;
( ) O aumento na captação de recursos financeiros oriundos do
setor privado;
( ) A proteção aos direitos de propriedade intelectual
possibilitando a transferência de tecnologia e recebimento de
benefícios econômicos através dos royalties;
( )Outro(s):
____________________________________________________
_______________________________________________.
308
3) Caso tenha ocorrido compartilhamento e/ou permissão para
utilização da estrutura da universidade (laboratórios,
equipamentos), em sua opinião, esta interação tem trazido
vantagens para o desenvolvimento de um ambiente de inovação e
social? Por quê?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
________________________________________________.
4) Em sua opinião, a instituição em que trabalha tem identificado
oportunidades para o desenvolvimento tecnológico através de
análise e monitoramento de tendências para inovação com
pesquisa e/ou tecnologia?
( ) Sim ( ) Não
Se você respondeu sim, como descreveria esta ação? Através de:
(por favor, marque mais de uma opção, se necessário)
( ) Participação em conferências, feiras, congressos e seminários;
( ) Realização de eventos abertos para que as empresas conheçam
a universidade e possam contatar seus estudantes e pesquisadores
nas áreas de interesses;
( ) Realização de eventos em que possam identificar talentos
entre seus estudantes e pesquisadores;
( ) Verificação de demandas nas empresas ou associações
comerciais;
( ) Verificação de demandas junto ao poder público (Municípios,
Estados, Empresas públicas, Fundações etc)
( ) Verificação de interesses de investidores;
( ) Análises de especialistas sobre as tendências de mercado;
( ) Apresentação de Portfólio de tecnologias da universidade para
interessados;
( ) Outro(s)
____________________________________________________
__________________________________________________.
309
5) Você entende ser importante que a universidade tenha
uma reserva financeira ou fundo específico para apoiar e
desenvolver Inovação (produtos, processos e serviços no
ambiente produtivo)? Por quê?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
__________________________________________
Relação U-E/Transferência de Tecnologia
6) A Lei de Inovação prevê a possibilidade das ICTs realizarem
parcerias com outras entidades públicas ou privadas, no caso da
instituição que você trabalha qual o tipo de parceria mais
freqüente? (por favor, marque mais de uma opção, se necessário)
( ) Com universidades e/ou institutos de pesquisasnacionais
públicas;
( ) Com universidades e/ou institutos de pesquisas nacionais
privadas;
( ) Com universidades e/ou institutos de pesquisas
internacionais;
( ) Com empresas de pequeno e médio porte nacionais;
( ) Com grandes empresas nacionais;
( ) Com empresas multinacionais;
( ) Com o setor público (que não sejam as instituição de pesquisa
e ensino)
( ) Com Parques Tecnológicos ouPólos Tecnológicos;
( ) Outros:
____________________________________________________
___________________________________
7) Estas parcerias na maioria das vezes são iniciadas por:
a) Iniciativa da instituição, pelo órgão gestor de inovação;
b) Iniciativa do terceiro interessado com demandas próprias;
c) Iniciativa dos pesquisadores da Universidade;
d) Outra:___________________________________________
8) Em sua opinião estas parcerias apresentam benefícios para a
instituição de ensino em que trabalha porque? Porque
proporciona: (por favor, marque mais de uma opção, se
necessário)
310
( ) Maior aporte de recursos financeiros para a pesquisa;
( ) Aprendizagem compartilhada e troca de experiências;
( ) Dinamismo nas pesquisas e seu tempo de desenvolvimento;
( ) Desenvolvimento de tecnologias e conhecimentos complexos;
( ) Incorporação de tecnologias e conhecimentos complexos na
instituição;
( ) Incorporação da visão de mercado e empreendedorismo na
instituição;
( ) Outros:
____________________________________________________
__________________________________________________.
9) Em sua opinião estas parcerias apresentam dificuldades
para a instituição de ensino em que trabalha porque proporciona:
(por favor, marque mais de uma opção, se necessário)
( ) Interesses divergentes entre a instituição e o parceiro;
( ) Imposição das condições do parceiro nas pesquisas da
instituição;
( ) Baixa credibilidade na transferência de informações;
( ) Dificuldades de comunicação;
( ) Baixo índice de comprometimento das setores internos da
instituição;
( ) Baixo índice de comprometimento das setores internos do
parceiro;
( ) Ineficiência e imobilismo das partes;
( ) Outros:
____________________________________________________
________
10) Quais são as áreas e/ou tecnologias que sua instituição
geralmente desenvolve: (por favor, marque mais de uma opção se
for o caso):
( ) Ciências das vida
( )Dispositivos Médicos;
( )Tratamentos ou procedimentos médicos;
( ) Farmacêuticos;
( ) Tecnologias da Informação e Mídia;
( )Materiais;
( ) Engenharia (automação, controle de processos entre outros);
( ) Ambiental;
311
( )Energia;
( ) Social;
( )Outros _____________
11) Quanto ao registro de Propriedade Industrial (patente de
invenção, patente de modelo de utilidade, desenho industrial,
cultivar), a instituição em que trabalha tem conseguido realizar
este procedimento com facilidade ou ainda encontra dificuldades?
Quais? (Por favor, se houver dificuldades aponte ao menos três).
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
12) Você entende que é importante que a universidade mantenha
titularidade exclusiva da patente, marca, desenho industrial,
cultivar, ou acredita que estes direitos devem ser cedidos aos
parceiros de pesquisa e desenvolvimento? Por quê?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
13) Você entende que se a universidade em que trabalha pudesse
ceder/transferir (totalmente) seus direitos de propriedade
intelectual aos parceiros de pesquisas ou terceiros interessados,
isto dinamizaria a interação com o setor privado? Por quê?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
14) A instituição já concedeu licença sem remuneração para
professor(a) ou pesquisador(a) público para este constituir
312
empresa com finalidade de desenvolver atividade empresarial
relativa à inovação (artigo 15 da Lei de Inovação)?
a) Sim. Número de pesquisadores: __________
b) Não. Nenhum caso.
c) Não. Porém, existem casos em tramitação;
Políticas e Marco Legal para Inovação: 15) Como você vê a aplicação da Lei de Licitações (Lei 8.666/93)
para os casos de transferência de tecnologiaem sua instituição. É
um facilitador ou um entrave? Por quê?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
16) Você entende que a intermediação realizada por uma
Fundação de Apoio na administração ou gerenciamento dos
acordos e contratos de transferência de tecnologia e
conhecimento é importante para a interação com o setor privado?
Por quê?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
17) Existe um procedimento próprio(regimento, resolução,
regulamento) para tramitação de processos administrativos (fluxo
de processos) referentes às atividades de transferência de
tecnologia, seja nos contratos ou convênios? Você entende que
este fluxo de processos é importante?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
313
18) Em sua opinião, você acredita que o órgão gestor de inovação
(NIT) de sua instituição tem autonomia e independência para
realizar suas atividades? Você gostaria de compartilhar alguma
sugestão ou modelo para fortalecer esta atividade?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
19) Existe alguma sugestão que gostaria de apontar para melhorar
a interação entre a universidade e as empresas ou outras
instituições?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
314
ANEXOS
ANEXO A: Lei nº13.243, de janeiro de 2016
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 13.243, DE 11 DE JANEIRO DE 2016.
Mensagem de veto
Dispõe sobre estímulos ao desenvolvimento científico, à
pesquisa, à capacitação científica e tecnológica e à inovação e altera a
Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004, a Lei no 6.815, de 19 de
agosto de 1980, a Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei no
12.462, de 4 de agosto de 2011, a Lei no 8.745, de 9 de dezembro de
1993, a Lei no 8.958, de 20 de dezembro de 1994, a Lei no 8.010, de 29
de março de 1990, a Lei no 8.032, de 12 de abril de 1990, e a Lei no
12.772, de 28 de dezembro de 2012, nos termos da Emenda
Constitucional no 85, de 26 de fevereiro de 2015.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso
Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Esta Lei dispõe sobre estímulos ao desenvolvimento
científico, à pesquisa, à capacitação científica e tecnológica e à inovação
e altera a Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004, a Lei no 6.815, de
19 de agosto de 1980, a Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei no
12.462, de 4 de agosto de 2011, a Lei no 8.745, de 9 de dezembro de
1993, a Lei no 8.958, de 20 de dezembro de 1994, a Lei no 8.010, de 29
de março de 1990, a Lei no 8.032, de 12 de abril de 1990, e a Lei no
12.772, de 28 de dezembro de 2012, nos termos da Emenda
Constitucional no 85, de 26 de fevereiro de 2015.
Art. 2o A Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004, passa a
vigorar com as seguintes alterações:
315
“Art. 1o Esta Lei estabelece medidas de incentivo à
inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo,
com vistas à capacitação tecnológica, ao alcance da autonomia
tecnológica e ao desenvolvimento do sistema produtivo nacional e
regional do País, nos termos dos arts. 23, 24, 167, 200, 213, 218, 219 e
219-A da Constituição Federal.
Parágrafo único. As medidas às quais se refere o caput
deverão observar os seguintes princípios:
I - promoção das atividades científicas e tecnológicas como
estratégicas para o desenvolvimento econômico e social;
II - promoção e continuidade dos processos de
desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação, assegurados os
recursos humanos, econômicos e financeiros para tal finalidade;
III - redução das desigualdades regionais;
IV - descentralização das atividades de ciência, tecnologia e
inovação em cada esfera de governo, com desconcentração em cada ente
federado;
V - promoção da cooperação e interação entre os entes
públicos, entre os setores público e privado e entre empresas;
VI - estímulo à atividade de inovação nas Instituições
Científica, Tecnológica e de Inovação (ICTs) e nas empresas, inclusive
para a atração, a constituição e a instalação de centros de pesquisa,
desenvolvimento e inovação e de parques e polos tecnológicos no País;
VII - promoção da competitividade empresarial nos
mercados nacional e internacional;
VIII - incentivo à constituição de ambientes favoráveis à
inovação e às atividades de transferência de tecnologia;
IX - promoção e continuidade dos processos de formação e
capacitação científica e tecnológica;
316
X - fortalecimento das capacidades operacional, científica,
tecnológica e administrativa das ICTs;
XI - atratividade dos instrumentos de fomento e de crédito,
bem como sua permanente atualização e aperfeiçoamento;
XII - simplificação de procedimentos para gestão de projetos
de ciência, tecnologia e inovação e adoção de controle por resultados em
sua avaliação;
XIII - utilização do poder de compra do Estado para fomento
à inovação;
XIV - apoio, incentivo e integração dos inventores
independentes às atividades das ICTs e ao sistema produtivo.” (NR)
“Art. 2o ..................................................................
.......................................................................................
III - criador: pessoa física que seja inventora, obtentora ou
autora de criação;
III-A - incubadora de empresas: organização ou estrutura
que objetiva estimular ou prestar apoio logístico, gerencial e tecnológico
ao empreendedorismo inovador e intensivo em conhecimento, com o
objetivo de facilitar a criação e o desenvolvimento de empresas que
tenham como diferencial a realização de atividades voltadas à inovação;
IV - inovação: introdução de novidade ou aperfeiçoamento
no ambiente produtivo e social que resulte em novos produtos, serviços
ou processos ou que compreenda a agregação de novas funcionalidades
ou características a produto, serviço ou processo já existente que possa
resultar em melhorias e em efetivo ganho de qualidade ou desempenho;
V - Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação (ICT):
órgão ou entidade da administração pública direta ou indireta ou pessoa
jurídica de direito privado sem fins lucrativos legalmente constituída sob
as leis brasileiras, com sede e foro no País, que inclua em sua missão
institucional ou em seu objetivo social ou estatutário a pesquisa básica
317
ou aplicada de caráter científico ou tecnológico ou o desenvolvimento
de novos produtos, serviços ou processos;
VI - Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT): estrutura
instituída por uma ou mais ICTs, com ou sem personalidade jurídica
própria, que tenha por finalidade a gestão de política institucional de
inovação e por competências mínimas as atribuições previstas nesta Lei;
VII - fundação de apoio: fundação criada com a finalidade
de dar apoio a projetos de pesquisa, ensino e extensão, projetos de
desenvolvimento institucional, científico, tecnológico e projetos de
estímulo à inovação de interesse das ICTs, registrada e credenciada no
Ministério da Educação e no Ministério da Ciência, Tecnologia e
Inovação, nos termos da Lei no 8.958, de 20 de dezembro de 1994, e das
demais legislações pertinentes nas esferas estadual, distrital e municipal;
VIII - pesquisador público: ocupante de cargo público
efetivo, civil ou militar, ou detentor de função ou emprego público que
realize, como atribuição funcional, atividade de pesquisa,
desenvolvimento e inovação;
...................................................................................
X - parque tecnológico: complexo planejado de
desenvolvimento empresarial e tecnológico, promotor da cultura de
inovação, da competitividade industrial, da capacitação empresarial e da
promoção de sinergias em atividades de pesquisa científica, de
desenvolvimento tecnológico e de inovação, entre empresas e uma ou
mais ICTs, com ou sem vínculo entre si;
XI - polo tecnológico: ambiente industrial e tecnológico
caracterizado pela presença dominante de micro, pequenas e médias
empresas com áreas correlatas de atuação em determinado espaço
geográfico, com vínculos operacionais com ICT, recursos humanos,
laboratórios e equipamentos organizados e com predisposição ao
intercâmbio entre os entes envolvidos para consolidação, marketing e
comercialização de novas tecnologias;
318
XII - extensão tecnológica: atividade que auxilia no
desenvolvimento, no aperfeiçoamento e na difusão de soluções
tecnológicas e na sua disponibilização à sociedade e ao mercado;
XIII - bônus tecnológico: subvenção a microempresas e a
empresas de pequeno e médio porte, com base em dotações
orçamentárias de órgãos e entidades da administração pública, destinada
ao pagamento de compartilhamento e uso de infraestrutura de pesquisa e
desenvolvimento tecnológicos, de contratação de serviços tecnológicos
especializados, ou transferência de tecnologia, quando esta for
meramente complementar àqueles serviços, nos termos de regulamento;
XIV - capital intelectual: conhecimento acumulado pelo
pessoal da organização, passível de aplicação em projetos de pesquisa,
desenvolvimento e inovação.” (NR)
“Art. 3o A União, os Estados, o Distrito Federal, os
Municípios e as respectivas agências de fomento poderão estimular e
apoiar a constituição de alianças estratégicas e o desenvolvimento de
projetos de cooperação envolvendo empresas, ICTs e entidades privadas
sem fins lucrativos voltados para atividades de pesquisa e
desenvolvimento, que objetivem a geração de produtos, processos e
serviços inovadores e a transferência e a difusão de tecnologia.
Parágrafo único. O apoio previsto no caput poderá
contemplar as redes e os projetos internacionais de pesquisa tecnológica,
as ações de empreendedorismo tecnológico e de criação de ambientes de
inovação, inclusive incubadoras e parques tecnológicos, e a formação e
a capacitação de recursos humanos qualificados.” (NR)
“Art. 3o-B. A União, os Estados, o Distrito Federal, os
Municípios, as respectivas agências de fomento e as ICTs poderão
apoiar a criação, a implantação e a consolidação de ambientes
promotores da inovação, incluídos parques e polos tecnológicos e
incubadoras de empresas, como forma de incentivar o desenvolvimento
tecnológico, o aumento da competitividade e a interação entre as
empresas e as ICTs.
§ 1o As incubadoras de empresas, os parques e polos
tecnológicos e os demais ambientes promotores da inovação
319
estabelecerão suas regras para fomento, concepção e desenvolvimento
de projetos em parceria e para seleção de empresas para ingresso nesses
ambientes.
§ 2o Para os fins previstos no caput, a União, os Estados, o
Distrito Federal, os Municípios, as respectivas agências de fomento e as
ICTs públicas poderão:
I - ceder o uso de imóveis para a instalação e a consolidação
de ambientes promotores da inovação, diretamente às empresas e às
ICTs interessadas ou por meio de entidade com ou sem fins lucrativos
que tenha por missão institucional a gestão de parques e polos
tecnológicos e de incubadora de empresas, mediante contrapartida
obrigatória, financeira ou não financeira, na forma de regulamento;
II - participar da criação e da governança das entidades
gestoras de parques tecnológicos ou de incubadoras de empresas, desde
que adotem mecanismos que assegurem a segregação das funções de
financiamento e de execução.”
“Art. 3o-C. A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios estimularão a atração de centros de pesquisa e
desenvolvimento de empresas estrangeiras, promovendo sua interação
com ICTs e empresas brasileiras e oferecendo-lhes o acesso aos
instrumentos de fomento, visando ao adensamento do processo de
inovação no País.”
“Art. 3o-D. A União, os Estados, o Distrito Federal, os
Municípios e as respectivas agências de fomento manterão programas
específicos para as microempresas e para as empresas de pequeno porte,
observando-se o disposto na Lei Complementar no 123, de 14 de
dezembro de 2006.”
“Art. 4o A ICT pública poderá, mediante contrapartida
financeira ou não financeira e por prazo determinado, nos termos de
contrato ou convênio:
I - compartilhar seus laboratórios, equipamentos,
instrumentos, materiais e demais instalações com ICT ou empresas em
320
ações voltadas à inovação tecnológica para consecução das atividades de
incubação, sem prejuízo de sua atividade finalística;
II - permitir a utilização de seus laboratórios, equipamentos,
instrumentos, materiais e demais instalações existentes em suas próprias
dependências por ICT, empresas ou pessoas físicas voltadas a atividades
de pesquisa, desenvolvimento e inovação, desde que tal permissão não
interfira diretamente em sua atividade-fim nem com ela conflite;
III - permitir o uso de seu capital intelectual em projetos de
pesquisa, desenvolvimento e inovação.
Parágrafo único. O compartilhamento e a permissão de que
tratam os incisos I e II do caput obedecerão às prioridades, aos critérios
e aos requisitos aprovados e divulgados pela ICT pública, observadas as
respectivas disponibilidades e assegurada a igualdade de oportunidades
a empresas e demais organizações interessadas.” (NR)
“Art. 5o São a União e os demais entes federativos e suas
entidades autorizados, nos termos de regulamento, a participar
minoritariamente do capital social de empresas, com o propósito de
desenvolver produtos ou processos inovadores que estejam de acordo
com as diretrizes e prioridades definidas nas políticas de ciência,
tecnologia, inovação e de desenvolvimento industrial de cada esfera de
governo.
§ 1o A propriedade intelectual sobre os resultados obtidos
pertencerá à empresa, na forma da legislação vigente e de seus atos
constitutivos.
§ 2o O poder público poderá condicionar a participação
societária via aporte de capital à previsão de licenciamento da
propriedade intelectual para atender ao interesse público.
§ 3o A alienação dos ativos da participação societária
referida no caput dispensa realização de licitação, conforme legislação
vigente.
321
§ 4o Os recursos recebidos em decorrência da alienação da
participação societária referida no caput deverão ser aplicados em
pesquisa e desenvolvimento ou em novas participações societárias.
§ 5o Nas empresas a que se refere o caput, o estatuto ou
contrato social poderá conferir às ações ou quotas detidas pela União ou
por suas entidades poderes especiais, inclusive de veto às deliberações
dos demais sócios nas matérias que especificar.
§ 6o A participação minoritária de que trata o caput dar-se-á
por meio de contribuição financeira ou não financeira, desde que
economicamente mensurável, e poderá ser aceita como forma de
remuneração pela transferência de tecnologia e pelo licenciamento para
outorga de direito de uso ou de exploração de criação de titularidade da
União e de suas entidades.” (NR)
“Art. 6o É facultado à ICT pública celebrar contrato de
transferência de tecnologia e de licenciamento para outorga de direito de
uso ou de exploração de criação por ela desenvolvida isoladamente ou
por meio de parceria.
§ 1o A contratação com cláusula de exclusividade, para os
fins de que trata o caput, deve ser precedida da publicação de extrato da
oferta tecnológica em sítio eletrônico oficial da ICT, na forma
estabelecida em sua política de inovação.
§ 1o-A. Nos casos de desenvolvimento conjunto com
empresa, essa poderá ser contratada com cláusula de exclusividade,
dispensada a oferta pública, devendo ser estabelecida em convênio ou
contrato a forma de remuneração.
...................................................................................
§ 6o Celebrado o contrato de que trata o caput, dirigentes,
criadores ou quaisquer outros servidores, empregados ou prestadores de
serviços são obrigados a repassar os conhecimentos e informações
necessários à sua efetivação, sob pena de responsabilização
administrativa, civil e penal, respeitado o disposto no art. 12.
§ 7o A remuneração de ICT privada pela transferência de
tecnologia e pelo licenciamento para uso ou exploração de criação de
322
que trata o § 6o do art. 5o, bem como a oriunda de pesquisa,
desenvolvimento e inovação, não representa impeditivo para sua
classificação como entidade sem fins lucrativos.” (NR)
“Art. 8o É facultado à ICT prestar a instituições públicas ou
privadas serviços técnicos especializados compatíveis com os objetivos
desta Lei, nas atividades voltadas à inovação e à pesquisa científica e
tecnológica no ambiente produtivo, visando, entre outros objetivos, à
maior competitividade das empresas.
§ 1o A prestação de serviços prevista no caput dependerá de
aprovação pelo representante legal máximo da instituição, facultada a
delegação a mais de uma autoridade, e vedada a subdelegação.
.............................................................................” (NR)
“Art. 9o É facultado à ICT celebrar acordos de parceria com
instituições públicas e privadas para realização de atividades conjuntas
de pesquisa científica e tecnológica e de desenvolvimento de tecnologia,
produto, serviço ou processo.
§ 1o O servidor, o militar, o empregado da ICT pública e o
aluno de curso técnico, de graduação ou de pós-graduação envolvidos na
execução das atividades previstas no caput poderão receber bolsa de
estímulo à inovação diretamente da ICT a que estejam vinculados, de
fundação de apoio ou de agência de fomento.
§ 2o As partes deverão prever, em instrumento jurídico
específico, a titularidade da propriedade intelectual e a participação nos
resultados da exploração das criações resultantes da parceria,
assegurando aos signatários o direito à exploração, ao licenciamento e à
transferência de tecnologia, observado o disposto nos §§ 4o a 7o do art.
6o.
§ 3o A propriedade intelectual e a participação nos
resultados referidas no § 2o serão asseguradas às partes contratantes, nos
termos do contrato, podendo a ICT ceder ao parceiro privado a
totalidade dos direitos de propriedade intelectual mediante compensação
financeira ou não financeira, desde que economicamente mensurável.
323
§ 4o A bolsa concedida nos termos deste artigo caracteriza-
se como doação, não configura vínculo empregatício, não caracteriza
contraprestação de serviços nem vantagem para o doador, para efeitos
do disposto no art. 26 da Lei no 9.250, de 26 de dezembro de 1995, e
não integra a base de cálculo da contribuição previdenciária, aplicando-
se o disposto neste parágrafo a fato pretérito, como previsto no inciso I
do art. 106 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966.
§ 5o (VETADO).” (NR)
“Art. 9o-A. Os órgãos e entidades da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios são autorizados a conceder
recursos para a execução de projetos de pesquisa, desenvolvimento e
inovação às ICTs ou diretamente aos pesquisadores a elas vinculados,
por termo de outorga, convênio, contrato ou instrumento jurídico
assemelhado.
§ 1o A concessão de apoio financeiro depende de aprovação
de plano de trabalho.
§ 2o A celebração e a prestação de contas dos instrumentos
aos quais se refere o caput serão feitas de forma simplificada e
compatível com as características das atividades de ciência, tecnologia e
inovação, nos termos de regulamento.
§ 3o A vigência dos instrumentos jurídicos aos quais se
refere o caput deverá ser suficiente à plena realização do objeto,
admitida a prorrogação, desde que justificada tecnicamente e refletida
em ajuste do plano de trabalho.
§ 4o Do valor total aprovado e liberado para os projetos
referidos no caput, poderá ocorrer transposição, remanejamento ou
transferência de recursos de categoria de programação para outra, de
acordo com regulamento.
§ 5o A transferência de recursos da União para ICT estadual,
distrital ou municipal em projetos de ciência, tecnologia e inovação não
poderá sofrer restrições por conta de inadimplência de quaisquer outros
órgãos ou instâncias que não a própria ICT.”
324
“Art. 10. (VETADO).” (NR)
“Art. 11. Nos casos e condições definidos em normas da
ICT e nos termos da legislação pertinente, a ICT poderá ceder seus
direitos sobre a criação, mediante manifestação expressa e motivada e a
título não oneroso, ao criador, para que os exerça em seu próprio nome e
sob sua inteira responsabilidade, ou a terceiro, mediante remuneração.
.............................................................................” (NR)
“Art. 13. ................................................................
.....................................................................................
§ 2o Entende-se por ganho econômico toda forma de royalty
ou de remuneração ou quaisquer benefícios financeiros resultantes da
exploração direta ou por terceiros da criação protegida, devendo ser
deduzidos:
I - na exploração direta e por terceiros, as despesas, os
encargos e as obrigações legais decorrentes da proteção da propriedade
intelectual;
II - na exploração direta, os custos de produção da ICT.
.....................................................................................
§ 4o A participação referida no caput deste artigo deverá
ocorrer em prazo não superior a 1 (um) ano após a realização da receita
que lhe servir de base, contado a partir da regulamentação pela
autoridade interna competente.” (NR)
“Art. 14. .................................................................
.......................................................................................
§ 3o As gratificações específicas do pesquisador público em
regime de dedicação exclusiva, inclusive aquele enquadrado em plano
de carreiras e cargos de magistério, serão garantidas, na forma do § 2o
deste artigo, quando houver o completo afastamento de ICT pública para
outra ICT, desde que seja de conveniência da ICT de origem.
.............................................................................” (NR)
325
“Art. 14-A. O pesquisador público em regime de dedicação
exclusiva, inclusive aquele enquadrado em plano de carreiras e cargos
de magistério, poderá exercer atividade remunerada de pesquisa,
desenvolvimento e inovação em ICT ou em empresa e participar da
execução de projeto aprovado ou custeado com recursos previstos nesta
Lei, desde que observada a conveniência do órgão de origem e
assegurada a continuidade de suas atividades de ensino ou pesquisa
nesse órgão, a depender de sua respectiva natureza.”
“Art. 15-A. A ICT de direito público deverá instituir sua
política de inovação, dispondo sobre a organização e a gestão dos
processos que orientam a transferência de tecnologia e a geração de
inovação no ambiente produtivo, em consonância com as prioridades da
política nacional de ciência, tecnologia e inovação e com a política
industrial e tecnológica nacional.
Parágrafo único. A política a que se refere o caput deverá
estabelecer diretrizes e objetivos:
I - estratégicos de atuação institucional no ambiente
produtivo local, regional ou nacional;
II - de empreendedorismo, de gestão de incubadoras e de
participação no capital social de empresas;
III - para extensão tecnológica e prestação de serviços
técnicos;
IV - para compartilhamento e permissão de uso por terceiros
de seus laboratórios, equipamentos, recursos humanos e capital
intelectual;
V - de gestão da propriedade intelectual e de transferência de
tecnologia;
VI - para institucionalização e gestão do Núcleo de Inovação
Tecnológica;
326
VII - para orientação das ações institucionais de capacitação
de recursos humanos em empreendedorismo, gestão da inovação,
transferência de tecnologia e propriedade intelectual;
VIII - para estabelecimento de parcerias para
desenvolvimento de tecnologias com inventores independentes,
empresas e outras entidades.”
“Art. 16. Para apoiar a gestão de sua política de inovação, a
ICT pública deverá dispor de Núcleo de Inovação Tecnológica, próprio
ou em associação com outras ICTs.
§ 1o São competências do Núcleo de Inovação Tecnológica
a que se refere o caput, entre outras:
......................................................................................
VII - desenvolver estudos de prospecção tecnológica e de
inteligência competitiva no campo da propriedade intelectual, de forma
a orientar as ações de inovação da ICT;
VIII - desenvolver estudos e estratégias para a transferência
de inovação gerada pela ICT;
IX - promover e acompanhar o relacionamento da ICT com
empresas, em especial para as atividades previstas nos arts. 6o a 9o;
X - negociar e gerir os acordos de transferência de
tecnologia oriunda da ICT.
§ 2o A representação da ICT pública, no âmbito de sua
política de inovação, poderá ser delegada ao gestor do Núcleo de
Inovação Tecnológica.
§ 3o O Núcleo de Inovação Tecnológica poderá ser
constituído com personalidade jurídica própria, como entidade privada
sem fins lucrativos.
§ 4o Caso o Núcleo de Inovação Tecnológica seja
constituído com personalidade jurídica própria, a ICT deverá estabelecer
as diretrizes de gestão e as formas de repasse de recursos.
327
§ 5o Na hipótese do § 3o, a ICT pública é autorizada a
estabelecer parceria com entidades privadas sem fins lucrativos já
existentes, para a finalidade prevista no caput.” (NR)
“Art. 17. A ICT pública deverá, na forma de regulamento,
prestar informações ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.
I - (Revogado);
II - (Revogado);
III - (Revogado);
IV - (Revogado).
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput à ICT
privada beneficiada pelo poder público, na forma desta Lei.” (NR)
“Art. 18. A ICT pública, na elaboração e na execução de
seu orçamento, adotará as medidas cabíveis para a administração e a
gestão de sua política de inovação para permitir o recebimento de
receitas e o pagamento de despesas decorrentes da aplicação do disposto
nos arts. 4o a 9o, 11 e 13, o pagamento das despesas para a proteção da
propriedade intelectual e o pagamento devido aos criadores e aos
eventuais colaboradores.
Parágrafo único. A captação, a gestão e a aplicação das
receitas próprias da ICT pública, de que tratam os arts. 4o a 8o, 11 e 13,
poderão ser delegadas a fundação de apoio, quando previsto em contrato
ou convênio, devendo ser aplicadas exclusivamente em objetivos
institucionais de pesquisa, desenvolvimento e inovação, incluindo a
carteira de projetos institucionais e a gestão da política de inovação.”
(NR)
“Art. 19. A União, os Estados, o Distrito Federal, os
Municípios, as ICTs e suas agências de fomento promoverão e
incentivarão a pesquisa e o desenvolvimento de produtos, serviços e
processos inovadores em empresas brasileiras e em entidades brasileiras
de direito privado sem fins lucrativos, mediante a concessão de recursos
328
financeiros, humanos, materiais ou de infraestrutura a serem ajustados
em instrumentos específicos e destinados a apoiar atividades de
pesquisa, desenvolvimento e inovação, para atender às prioridades das
políticas industrial e tecnológica nacional.
.......................................................................................
§ 2o-A. São instrumentos de estímulo à inovação nas
empresas, quando aplicáveis, entre outros:
I - subvenção econômica;
II - financiamento;
III - participação societária;
IV - bônus tecnológico;
V - encomenda tecnológica;
VI - incentivos fiscais;
VII - concessão de bolsas;
VIII - uso do poder de compra do Estado;
IX - fundos de investimentos;
X - fundos de participação;
XI - títulos financeiros, incentivados ou não;
XII - previsão de investimento em pesquisa e
desenvolvimento em contratos de concessão de serviços públicos ou em
regulações setoriais.
.....................................................................................
§ 6o As iniciativas de que trata este artigo poderão ser
estendidas a ações visando a:
329
I - apoio financeiro, econômico e fiscal direto a empresas
para as atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica;
II - constituição de parcerias estratégicas e desenvolvimento
de projetos de cooperação entre ICT e empresas e entre empresas, em
atividades de pesquisa e desenvolvimento, que tenham por objetivo a
geração de produtos, serviços e processos inovadores;
III - criação, implantação e consolidação de incubadoras de
empresas, de parques e polos tecnológicos e de demais ambientes
promotores da inovação;
IV - implantação de redes cooperativas para inovação
tecnológica;
V - adoção de mecanismos para atração, criação e
consolidação de centros de pesquisa e desenvolvimento de empresas
brasileiras e estrangeiras;
VI - utilização do mercado de capitais e de crédito em ações
de inovação;
VII - cooperação internacional para inovação e para
transferência de tecnologia;
VIII - internacionalização de empresas brasileiras por meio
de inovação tecnológica;
IX - indução de inovação por meio de compras públicas;
X - utilização de compensação comercial, industrial e
tecnológica em contratações públicas;
XI - previsão de cláusulas de investimento em pesquisa e
desenvolvimento em concessões públicas e em regimes especiais de
incentivos econômicos;
XII - implantação de solução de inovação para apoio e
incentivo a atividades tecnológicas ou de inovação em microempresas e
em empresas de pequeno porte.
330
§ 7o A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
poderão utilizar mais de um instrumento de estímulo à inovação a fim
de conferir efetividade aos programas de inovação em empresas.
§ 8o Os recursos destinados à subvenção econômica serão
aplicados no financiamento de atividades de pesquisa, desenvolvimento
tecnológico e inovação em empresas, admitida sua destinação para
despesas de capital e correntes, desde que voltadas preponderantemente
à atividade financiada.” (NR)
“Art. 20. Os órgãos e entidades da administração pública,
em matéria de interesse público, poderão contratar diretamente ICT,
entidades de direito privado sem fins lucrativos ou empresas,
isoladamente ou em consórcios, voltadas para atividades de pesquisa e
de reconhecida capacitação tecnológica no setor, visando à realização de
atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação que envolvam risco
tecnológico, para solução de problema técnico específico ou obtenção de
produto, serviço ou processo inovador.
.....................................................................................
§ 3o O pagamento decorrente da contratação prevista no
caput será efetuado proporcionalmente aos trabalhos executados no
projeto, consoante o cronograma físico-financeiro aprovado, com a
possibilidade de adoção de remunerações adicionais associadas ao
alcance de metas de desempenho no projeto.
§ 4o O fornecimento, em escala ou não, do produto ou
processo inovador resultante das atividades de pesquisa,
desenvolvimento e inovação encomendadas na forma do caput poderá
ser contratado mediante dispensa de licitação, inclusive com o próprio
desenvolvedor da encomenda, observado o disposto em regulamento
específico.
§ 5o Para os fins do caput e do § 4o, a administração pública
poderá, mediante justificativa expressa, contratar concomitantemente
mais de uma ICT, entidade de direito privado sem fins lucrativos ou
empresa com o objetivo de:
I - desenvolver alternativas para solução de problema
técnico específico ou obtenção de produto ou processo inovador; ou
331
II - executar partes de um mesmo objeto.” (NR)
“Art. 20-A. (VETADO):
I - (VETADO);
II - (VETADO).
§ 1o (VETADO).
§ 2o Aplicam-se ao procedimento de contratação as regras
próprias do ente ou entidade da administração pública contratante.
§ 3o Outras hipóteses de contratação de prestação de
serviços ou fornecimento de bens elaborados com aplicação sistemática
de conhecimentos científicos e tecnológicos poderão ser previstas em
regulamento.
§ 4o Nas contratações de que trata este artigo, deverá ser
observado o disposto no inciso IV do art. 27.”
“Art. 21-A. A União, os Estados, o Distrito Federal, os
Municípios, os órgãos e as agências de fomento, as ICTs públicas e as
fundações de apoio concederão bolsas de estímulo à inovação no
ambiente produtivo, destinadas à formação e à capacitação de recursos
humanos e à agregação de especialistas, em ICTs e em empresas, que
contribuam para a execução de projetos de pesquisa, desenvolvimento
tecnológico e inovação e para as atividades de extensão tecnológica, de
proteção da propriedade intelectual e de transferência de tecnologia.
Parágrafo único. (VETADO).”
“Art. 22. Ao inventor independente que comprove depósito
de pedido de patente é facultado solicitar a adoção de sua criação por
ICT pública, que decidirá quanto à conveniência e à oportunidade da
solicitação e à elaboração de projeto voltado à avaliação da criação para
futuro desenvolvimento, incubação, utilização, industrialização e
inserção no mercado.
......................................................................................
332
§ 3o O inventor independente, mediante instrumento jurídico
específico, deverá comprometer-se a compartilhar os eventuais ganhos
econômicos auferidos com a exploração da invenção protegida adotada
por ICT pública.” (NR)
“Art. 22-A. A União, os Estados, o Distrito Federal, os
Municípios, as agências de fomento e as ICTs públicas poderão apoiar o
inventor independente que comprovar o depósito de patente de sua
criação, entre outras formas, por meio de:
I - análise da viabilidade técnica e econômica do objeto de
sua invenção;
II - assistência para transformação da invenção em produto
ou processo com os mecanismos financeiros e creditícios dispostos na
legislação;
III - assistência para constituição de empresa que produza o
bem objeto da invenção;
IV - orientação para transferência de tecnologia para
empresas já constituídas.”
“Art. 26-A. As medidas de incentivo previstas nesta Lei, no
que for cabível, aplicam-se às ICTs públicas que também exerçam
atividades de produção e oferta de bens e serviços.”
“Art. 26-B. (VETADO).”
“Art. 27. ..............................................................
.....................................................................................
III - assegurar tratamento diferenciado, favorecido e
simplificado às microempresas e às empresas de pequeno porte;
.....................................................................................
V - promover a simplificação dos procedimentos para gestão
dos projetos de ciência, tecnologia e inovação e do controle por
resultados em sua avaliação;
333
VI - promover o desenvolvimento e a difusão de tecnologias
sociais e o fortalecimento da extensão tecnológica para a inclusão
produtiva e social.” (NR)
“Art. 27-A. Os procedimentos de prestação de contas dos
recursos repassados com base nesta Lei deverão seguir formas
simplificadas e uniformizadas e, de forma a garantir a governança e a
transparência das informações, ser realizados anualmente,
preferencialmente, mediante envio eletrônico de informações, nos
termos de regulamento.”
Art. 3o O art. 13 da Lei no 6.815, de 19 de agosto de 1980, passa
a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 13. ....................................................................
..........................................................................................
V - na condição de cientista, pesquisador, professor, técnico
ou profissional de outra categoria, sob regime de contrato ou a serviço
do governo brasileiro;
.............................................................................................
VIII - na condição de beneficiário de bolsa vinculada a
projeto de pesquisa, desenvolvimento e inovação concedida por órgão
ou agência de fomento.” (NR)
Art. 4o A Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, passa a vigorar
com as seguintes alterações:
“Art. 6o. .......................................................................
............................................................................................
XX - produtos para pesquisa e desenvolvimento - bens,
insumos, serviços e obras necessários para atividade de pesquisa
científica e tecnológica, desenvolvimento de tecnologia ou inovação
tecnológica, discriminados em projeto de pesquisa aprovado pela
instituição contratante.” (NR)
“Art. 24. ......................................................................
334
............................................................................................
XXI - para a aquisição ou contratação de produto para
pesquisa e desenvolvimento, limitada, no caso de obras e serviços de
engenharia, a 20% (vinte por cento) do valor de que trata a alínea “b” do
inciso I do caput do art. 23;
.............................................................................................
§ 3o A hipótese de dispensa prevista no inciso XXI do caput,
quando aplicada a obras e serviços de engenharia, seguirá
procedimentos especiais instituídos em regulamentação específica.
§ 4o Não se aplica a vedação prevista no inciso I do caput do
art. 9o à hipótese prevista no inciso XXI do caput.” (NR)
“Art. 32. ......................................................................
............................................................................................
§ 7o A documentação de que tratam os arts. 28 a 31 e este
artigo poderá ser dispensada, nos termos de regulamento, no todo ou em
parte, para a contratação de produto para pesquisa e desenvolvimento,
desde que para pronta entrega ou até o valor previsto na alínea “a” do
inciso II do caput do art. 23.” (NR)
Art. 5o O art. 1o da Lei no 12.462, de 4 de agosto de 2011, passa
a vigorar acrescido do seguinte inciso X:
“Art. 1o .......................................................................
...........................................................................................
X - das ações em órgãos e entidades dedicados à ciência, à
tecnologia e à inovação.
...................................................................................” (NR)
Art. 6o O inciso VIII do art. 2o da Lei no 8.745, de 9 de
dezembro de 1993, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 2o ........................................................................
............................................................................................
335
VIII - admissão de pesquisador, de técnico com formação
em área tecnológica de nível intermediário ou de tecnólogo, nacionais
ou estrangeiros, para projeto de pesquisa com prazo determinado, em
instituição destinada à pesquisa, ao desenvolvimento e à inovação;
...................................................................................” (NR)
Art. 7o A Lei no 8.958, de 20 de dezembro de 1994, passa a
vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 1o .......................................................................
............................................................................................
§ 6o Os parques e polos tecnológicos, as incubadoras de
empresas, as associações e as empresas criados com a participação de
ICT pública poderão utilizar fundação de apoio a ela vinculada ou com a
qual tenham acordo.
§ 7o Os recursos e direitos provenientes dos projetos de que
trata o caput e das atividades e dos projetos de que tratam os arts. 3o a
9o, 11 e 13 da Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004, poderão ser
repassados pelos contratantes diretamente para as fundações de apoio.
§ 8o O Núcleo de Inovação Tecnológica constituído no
âmbito de ICT poderá assumir a forma de fundação de apoio de que
trata esta Lei.” (NR)
“Art. 3o Na execução de convênios, contratos, acordos e
demais ajustes abrangidos por esta Lei que envolvam recursos
provenientes do poder público, as fundações de apoio adotarão
regulamento específico de aquisições e contratações de obras e serviços,
a ser editado por meio de ato do Poder Executivo de cada nível de
governo.
............................................................................................
§ 3o Aplicam-se às contratações que não envolvam a
aplicação de recursos públicos as regras instituídas pela instância
superior da fundação de apoio, disponíveis em seu sítio eletrônico,
respeitados os princípios mencionados no art. 2o desta Lei.” (NR)
“Art. 4o ......................................................................
336
...........................................................................................
§ 8o (VETADO).” (NR)
Art. 8o O § 2o do art. 1o da Lei no 8.010, de 29 de março de
1990, passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 1o ........................................................................
...........................................................................................
§ 2o O disposto neste artigo aplica-se somente às
importações realizadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), por cientistas, por pesquisadores e por
Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação (ICT) ativos no
fomento, na coordenação ou na execução de programas de pesquisa
científica e tecnológica, de inovação ou de ensino e devidamente
credenciados pelo CNPq.” (NR)
Art. 9o Os arts. 1o e 2o da Lei no 8.032, de 12 de abril de 1990,
passam a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 1o .........................................................................
Parágrafo único. As ressalvas estabelecidas no caput deste
artigo aplicam-se às importações realizadas nas situações relacionadas
no inciso I do art. 2o.” (NR)
“Art. 2o .........................................................................
I - .................................................................................
.............................................................................................
e) por Instituições Científica, Tecnológica e de Inovação
(ICTs), definidas pela Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004;
.............................................................................................
g) por empresas, na execução de projetos de pesquisa,
desenvolvimento e inovação, cujos critérios e habilitação serão
estabelecidos pelo poder público, na forma de regulamento;
.............................................................................................
337
§ 1o As isenções referidas neste artigo serão concedidas com
observância da legislação respectiva.
§ 2o (VETADO).” (NR)
Art. 10. A Lei no 12.772, de 28 de dezembro de 2012, passa a
vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 20. ........................................................................
..............................................................................................
§ 4o ...............................................................................
..............................................................................................
II - ocupar cargo de dirigente máximo de fundação de apoio
de que trata a Lei no 8.958, de 20 de dezembro de 1994, mediante
deliberação do Conselho Superior da IFE.” (NR)
“Art. 20-A. Sem prejuízo da isenção ou imunidade previstas
na legislação vigente, as fundações de apoio às Instituições de Ensino
Superior e as Instituições Científica, Tecnológica e de Inovação (ICTs)
poderão remunerar o seu dirigente máximo que:
I - seja não estatutário e tenha vínculo empregatício com a
instituição;
II - seja estatutário, desde que receba remuneração inferior,
em seu valor bruto, a 70% (setenta por cento) do limite estabelecido
para a remuneração de servidores do Poder Executivo federal.”
“Art. 21. .....................................................................
...........................................................................................
III - bolsa de ensino, pesquisa, extensão ou estímulo à
inovação paga por agência oficial de fomento, por fundação de apoio
devidamente credenciada por IFE ou por organismo internacional
amparado por ato, tratado ou convenção internacional;
.............................................................................................
§ 4o As atividades de que tratam os incisos XI e XII do
caput não excederão, computadas isoladamente ou em conjunto, a 8
338
(oito) horas semanais ou a 416 (quatrocentas e dezesseis) horas anuais.”
(NR)
Art. 11. Os processos de importação e de desembaraço aduaneiro
de bens, insumos, reagentes, peças e componentes a serem utilizados em
pesquisa científica e tecnológica ou em projetos de inovação terão
tratamento prioritário e observarão procedimentos simplificados, nos
termos de regulamento, e o disposto no art. 1o da Lei no 8.010, de 29 de
março de 1990, e nas alíneas “e” a “g” do inciso I do art. 2o da Lei no
8.032, de 12 de abril de 1990.
Art. 12. Em atendimento ao disposto no § 5o do art. 167 da
Constituição Federal, as ICTs e os pesquisadores poderão transpor,
remanejar ou transferir recursos de categoria de programação para outra
com o objetivo de viabilizar resultados de projetos que envolvam
atividades de ciência, tecnologia e inovação, mediante regras definidas
em regulamento.
Art. 13. Nos termos previamente estabelecidos em instrumento
de concessão de financiamentos e outros estímulos à pesquisa, ao
desenvolvimento e à inovação, os bens gerados ou adquiridos no âmbito
de projetos de estímulo à ciência, à tecnologia e à inovação serão
incorporados, desde sua aquisição, ao patrimônio da entidade recebedora
dos recursos.
§ 1o Na hipótese de instrumento celebrado com pessoa física, os
bens serão incorporados ao patrimônio da ICT à qual o pesquisador
beneficiado estiver vinculado.
§ 2o Quando adquiridos com a participação de fundação de
apoio, a titularidade sobre os bens observará o disposto em contrato ou
convênio entre a ICT e a fundação de apoio.
Art. 14. Ao servidor, ao empregado público e ao militar serão
garantidos, durante o afastamento de sua entidade de origem e no
interesse da administração, para o exercício de atividades de ciência,
tecnologia e inovação, os mesmos direitos a vantagens e benefícios,
pertinentes a seu cargo e carreira, como se em efetivo exercício em
atividade de sua respectiva entidade estivesse.
339
Art. 15. Em consonância com o disposto no § 7o do art. 218 da
Constituição Federal, o poder público manterá mecanismos de fomento,
apoio e gestão adequados à internacionalização das ICTs públicas, que
poderão exercer fora do território nacional atividades relacionadas com
ciência, tecnologia e inovação, respeitados os estatutos sociais, ou
norma regimental equivalente, das instituições.
§ 1o Observado o disposto no inciso I do art. 49 da Constituição
Federal, é facultado à ICT pública desempenhar suas atividades
mediante convênios ou contratos com entidades públicas ou privadas,
estrangeiras ou internacionais.
§ 2o Os mecanismos de que trata o caput deverão compreender,
entre outros objetivos, na forma de regulamento:
I - o desenvolvimento da cooperação internacional no âmbito das
ICTs, inclusive no exterior;
II - a execução de atividades de ICTs nacionais no exterior;
III - a alocação de recursos humanos no exterior.
Art. 16. (VETADO).
Art. 17. Revogam-se os incisos I, II, III e IV do art. 17 da Lei no
10.973, de 2 de dezembro de 2004.
Art. 18. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 11 de janeiro de 2016; 195o da Independência e 128o da
República.
DILMA ROUSSEFF
Nelson Barbosa
Aloizio Mercadante
Valdir Moysés Simão
Armando Monteiro
Celso Pansera
*Este texto não substitui o publicado no DOU de 12.1.2016
340
ANEXO B: Resolução nº 090/20014 CONSUNI-UDESC
RESOLUÇÃO Nº 090/2014
Cria e normatiza o Programa Institucional de Inovação e o
Programa de Bolsas para Inovação da Fundação
Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC.
O Presidente do Conselho Universitário - CONSUNI da
Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, no uso
de suas atribuições, considerando a deliberação do
Plenário relativa ao Processo nº 1460/2014, tomada em sessão de
16 de outubro de 2014,
R E S O L V E:
CAPÍTULO I
Conceituação
Art. 1º - Inovação é a introdução de novidade ou aperfeiçoamento
no ambiente produtivo ou social que resulte em novos produtos,
processos ou serviços.
Art. 2º - O Programa Institucional de Inovação estabelece a
política de estímulo às interações no âmbito da UDESC com os diversos
segmentos produtivos, em consonância à Lei de Inovação e da
Propriedade Intelectual.
Art. 3º - O Programa de Bolsas para Inovação oferece suporte aos
membros da comunidade universitária, docentes, técnicos e discentes,
envolvidos com atividades de inovação, em cooperação técnico-
financeira com agência(s) de fomento(s) e/ou entidade(s) produtiva(s)
externa(s), públicas ou privadas.
341
Art. 4º - No que concerne à Lei de Inovação, lei nº 10.973, de 2
de dezembro de 2004, a UDESC, entidade da administração pública
com missão institucional, dentre outras, de executar atividades de
pesquisa básica ou aplicada de caráter científico ou tecnológico,
caracteriza-se como Instituição Científica e Tecnológica - ICT.
Art. 5º - Para efeitos específicos desta Resolução, entende-se por:
I. Propriedade intelectual: é a soma dos direitos relativos às obras
literárias, artísticas e científicas, às interpretações dos artistas intérpretes
e às execuções dos artistas executantes, aos fonogramas e às emissões de
radiodifusão, às invenções em todos os domínios da atividade humana,
às descobertas científicas, aos desenhos e modelos industriais, às marcas
industriais, comerciais e de serviço, bem como às firmas comerciais e
denominações comerciais, à proteção contra a concorrência desleal e
todos os outros direitos inerentes à atividade intelectual nos domínios
industrial, científico, literário e artístico;
II. Criação: invenção, modelo de utilidade, desenho industrial,
programa de computador, topografia de circuito integrado, nova cultivar
ou cultivar essencialmente derivada e qualquer outro desenvolvimento
tecnológico que acarrete ou possa acarretar o surgimento de novo
produto, processo ou aperfeiçoamento incremental, obtida por um ou
mais criadores;
III. Patente: é um título de propriedade temporária sobre uma
invenção ou modelo de utilidade, outorgado pelo Estado aos inventores
ou autores ou outras pessoas físicas ou jurídicas detentoras de direitos
sobre a criação. Em contrapartida, o inventor se obriga a revelar
detalhadamente todo o conteúdo técnico da matéria protegida pela
patente;
IV. Colaboradores: servidores docentes, técnicos universitários,
alunos de cursos de graduação ou de pós-graduação, estagiários,
professor visitante, pesquisador visitante e residentes da Área de Saúde.
CAPÍTULO II
Dos Objetivos
Art. 6º - São objetivos:
342
a) Atender as necessidades de terceiros (entidades
públicas e privadas) e as vocações cientifica, tecnológica, cultural e
artística em consonância com as necessidades dos processos de ensino,
pesquisa e extensão;
b) Apoiar a participação dos docentes, discentes e técnicos
universitários na realização de interações acadêmicas que contribuam
para o fortalecimento da cultura e economia Catarinense.
CAPÍTULO III
Das Criações e Inovações Desenvolvidas na Udesc
Art. 7º - Qualquer criação ou inovação, nos termos definidos nos
incisos II e IV do art. 2º do Decreto Presidencial 5.563/2005, e dos
incisos I, II e VII do art. 2º da Lei Catarinense de Inovação n.
14.328/2008 que tenham resultado de atividades realizadas com a
utilização das instalações da UDESC ou com o emprego de seus
recursos, meios, dados, informações, conhecimentos e equipamentos
poderão ser objeto de proteção dos direitos de propriedade intelectual, a
critério da UDESC, respeitado o disposto nesta Resolução.
§ 1º A UDESC figurará sempre como titular exclusiva ou
cotitular sobre criação ou inovação obtida nos termos do caput.
§ 2º Os colaboradores da UDESC responsáveis ou
corresponsáveis pela geração da criação ou inovação, figurarão como
criadores, conforme definido no inciso VIII do art. 2º da Lei
14.328/2008, mesmo que não tenham mais vínculo com a UDESC na
época em que ocorra a proteção, transferência ou licenciamento dos
respectivos direitos.
§ 3º Toda pessoa física que não se enquadre na condição de
colaborador da UDESC, que efetivamente contribuir na geração de
criação ou inovação, poderá ser reconhecido como criador pela UDESC,
garantindo o recebimento dos ganhos econômicos previstos no inciso I,
art. 17, da presente Resolução, desde que seja apresentado documento
comprobatório que demonstre a sua participação para a obtenção da
criação, a exemplo de, mas não se restringindo a, convênio de pesquisa,
termos de outorga, publicações científicas, credenciamento na pós-
343
graduação como orientador ou coorientador externo, convênio de
cotutela, dentre outros.
CAPÍTULO IV
Da Gestão da Inovação Tecnológica da Udesc
Art. 8º - A gestão das atividades de inovação e de propriedade
intelectual da UDESC será exercida por seu Núcleo de Inovação
Tecnológica - NIT, Coordenadoria Projetos e Inovação
– CIPI, órgão suplementar superior vinculado à Reitoria,
conforme seu regimento interno, atendidas as disposições da Lei
10.973/04 e art. 17 do Decreto 5.563/2005, cominadas com a Lei nº
14.328/08 e esta Resolução.
CAPÍTULO V
Do Compartilhamento e Permissão de Uso da Infraestrutura da
Udesc
Art. 9º - A UDESC poderá, a seu critério, mediante remuneração
e por prazo determinado, nos termos do instrumento jurídico próprio
compartilhar seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e
demais instalações com instituições públicas ou privadas para ações
relacionadas a esta resolução, sem prejuízo de sua atividade fim e dando
preferência a microempresas, empresas de pequeno porte, empresas
nacionais e organizações de direito privado sem fins lucrativos, nesta
ordem.
Parágrafo único - O Departamento, irá realizar a avaliação e
decidirá sobre a aprovação da demanda dos interessados na permissão e
compartilhamento, devendo tal decisão obedecer às disposições dessa
Resolução e prever, no mínimo, os seguintes aspectos:
a) previsão de remuneração para o Centro/ Departamento/
Órgão que sedia o laboratório e para a UDESC, com o intuito de cobrir
os gastos de manutenção geral, infra-estrutura compartilhada e de
depreciação dos equipamentos envolvidos;
344
b) que as empresas e organizações interessadas deverão
responsabilizar-se pelas obrigações trabalhistas e seguro contra
acidentes de seus colaboradores e pessoal que porventura vier a
participar da execução do projeto, bem como de seguro de
responsabilidade civil geral com patrimônio do Laboratório/UDESC;
c) a existência de instrumento jurídico a ser celebrado,
para avaliar se os direitos de propriedade intelectual da UDESC estão
sendo resguardados.
Art. 10 - Caso seja obtida qualquer criação ou inovação pela
empresa ou organização que compartilhar ou usar os laboratórios da
UDESC, a propriedade sobre a criação ou inovação obtida deverá ser
tratada em instrumento jurídico próprio.
Art. 11 - As partes deverão prever, em contrato, a titularidade da
propriedade intelectual e a participação nos resultados da exploração das
criações resultantes da parceria, assegurando aos signatários o direito à
transferência de tecnologia e ao licenciamento, observado o disposto nos
parágrafos 4º e 5º do art. 6º da Lei 10.973/2004.
CAPÍTULO VI
Da Remuneração dos Partícipes
Art. 12 – Fica criada a modalidade de Bolsas de Estímulo a
Inovação, pelas quais os Colaboradores da UDESC (docentes, técnicos e
alunos), envolvidos nas pesquisas, recebam bolsa, observados aos
seguintes critérios:
I - Os recursos para pagamento destas bolsas deverão
obrigatoriamente ser extra orçamentários, oriundos de fontes externas à
Universidade definidos e estabelecidos mediante instrumento contratual
próprio, com objetivo específico e valores, periodicidade, duração e
beneficiários previamente identificados no Plano de Trabalho da
Pesquisa;
345
II - As atividades executadas com percepção de bolsas não
implicarão em cargas-horárias institucionais e não poderão ultrapassar
20 horas semanais;
III - Os valores das Bolsas de Estímulo à Inovação ficam
limitados ao valor do vencimento bruto do servidor beneficiado.
Art. 13 - Os acordos firmados entre a UDESC, as instituições de
apoio, agências de fomento e as entidades nacionais de direito público
ou privado, com ou sem fins lucrativos, voltadas para as atividades de
pesquisa e inovação, deverão prever a destinação de até 10% (dez por
cento) do valor total dos recursos financeiros destinados à execução do
projeto, para cobertura de despesas operacionais e administrativas
incorridas na execução destes acordos.
§ 1º Poderão ser lançados à conta de despesa administrativa
gastos indivisíveis, usuais e necessários à consecução do objetivo do
acordo, convênio ou contrato, obedecendo sempre o limite definido no
caput.
§ 2º Os acordos a serem firmados deverão passar por prévia
análise da PROPLAN – Pró-Reitoria de Planejamento, quanto ao
equilíbrio das contrapartidas de recursos entre as partes.
§ 3º Os acordos deverão contar com um Gestor Administrativo,
técnico universitário, a fim de operacionalizar os trâmites
administrativos.
CAPÍTULO VII
Do Licenciamento e Transferência de Tecnologia
Art. 14 - É facultado à UDESC celebrar instrumentos jurídicos de
transferência de tecnologia e de licenciamento para outorga de direito de
uso ou de exploração de criação por ela desenvolvida, protegida ou não,
em que seja titular ou cotitular, a título exclusivo e não exclusivo.
§ 1º A decisão sobre a exclusividade ou não da transferência ou
do licenciamento cabe ao Reitor.
346
§ 2º A contratação com cláusula de exclusividade, para os fins de
que trata o caput deste artigo, deve ser precedida da publicação de edital,
que obedecerá ao disposto no parágrafo 3º, do art. 6º da Lei 10.973/04 e
no art. 7º do Decreto 5.563/05 e do § 1º do art. 8 da Lei 14.328/08.
§ 3º Ainda que não seja concedida exclusividade ao receptor de
tecnologia ou ao licenciado, os contratos previstos no caput deste artigo
deverão ser precedidos da publicação de edital.
§ 4º A empresa que tenha firmado com a UDESC contrato de
transferência de tecnologia ou de licenciamento deverá informar na
divulgação da inovação que a respectiva criação foi desenvolvida pela
UDESC - Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina.
CAPÍTULO VIII
Da Possibilidade de Cessão da Tecnologia ao Criador
Art. 15 - A UDESC poderá ceder seus direitos sobre a criação
ao(s) criador(es), a título não oneroso, para que este(s) exerça(m) em seu
próprio nome e sob sua inteira responsabilidade, nos termos da
legislação pertinente e a partir de solicitação ao Reitor.
§ 1º Havendo mais de um criador, a cessão apenas poderá ocorrer
caso seja aprovada formalmente por todos os criadores.
§ 2º Realizadas as etapas previstas no presente artigo, e aprovada
a cessão, os termos da cessão serão estabelecidos em instrumento
jurídico próprio a ser firmado entre a UDESC e o(s) respectivo(s)
criador/criadores.
CAPÍTULO IX
Da Desistência sobre a Criação
Art. 16 - Conforme artigo 11 da Lei 10.973/04 e por iniciativa da
CIPI, a UDESC poderá desistir de manter a proteção de criação de sua
propriedade em âmbito nacional ou internacional.
347
Parágrafo Único - Sendo aprovada a desistência em todas as
instâncias, a UDESC poderá, a seu critério, verificar se o(s) criador(es)
tem interesse em manter a proteção da criação em seu próprio nome e
sob sua inteira responsabilidade, nos termos da legislação pertinente.
Havendo interesse, será elaborado instrumento jurídico próprio entre a
UDESC e o criador(es) interessado(s) para tratar das condições de
cessão da criação, o que ocorrerá de forma não onerosa.
CAPÍTULO X
Da Destinação dos Ganhos Econômicos
Art. 17 - Os ganhos econômicos resultantes da exploração de
resultado de criação intelectual, protegida por direitos de propriedade
intelectual, dos Pesquisadores da UDESC, no exercício do cargo, serão
distribuídos entre:
I - a UDESC; e
II - o(s) inventor(es).
§ 1º As parcelas serão, respectivamente: 75% (setenta e cinco por
cento) para a UDESC e 25% (vinte e cinco por cento) para o(s)
inventor(es).
§ 2º Os ganhos econômicos previstos neste artigo não se
incorporam, a qualquer título, aos vencimentos do(s) inventor(es) e será
definida em documento próprio a ser celebrado na época da
comercialização.
§ 3º A UDESC reservará, a título de incentivo, 35% (trinta e
cinco por cento) da parte que lhe é cabível, sendo 10% (dez por cento)
ao(s) Departamento(s) e 25% (vinte e cinco por cento) ao(s) Centro(s)
em que estiver(em) lotado(s) o(s) inventor(es).
§ 4º O restante do valor dos ganhos econômicos será destinado
exclusivamente ao apoio à inovação da UDESC, com a criação no
sistema de gerenciamento dos recursos orçamentários e financeiros de
um centro de custo específico para a gestão desses recursos.
348
CAPÍTULO XI
Do Atendimento ao Inventor Independente
Art. 18 - O inventor independente, assim considerado a pessoa
física não ocupante de cargo efetivo, cargo militar ou emprego público
que seja inventor, obtentor ou autor de criação, que comprove depósito
de pedido de patente, ou pedido de registro de criação de sua autoria,
poderá solicitar a adoção de sua criação pela UDESC, observado o
disposto no art. 19 da Lei 14.328/08.
CAPÍTULO XII
Da Responsabilidade Do Inventor
Art. 19 - Fica estabelecido que o inventor responderá
administrativa, civil e penalmente pelos prejuízos decorrentes da
inobservância das normas que regulam a Propriedade Intelectual e o
disposto nesta Resolução.
CAPÍTULO XIII
Disposições Finais
Art. 20 - Esta Resolução entrará em vigor na data de sua
publicação, revogam-se as disposições em contrário.
Florianópolis, 16 de outubro de 2014.
Antônio Heronaldo de Sousa
Presidente CONSUNI
349
ANEXO C: Resolução 080/2008 CONEPE-UNEMAT
ESTADO DE MATO GROSSO SECRETARIA DE ESTADO DE
CIÊNCIA E TECNOLOGIA UNIVERSIDADE DO ESTADO DE
MATO GROSSO
REITORIA
RESOLUÇÃO Nº 080/2008 – AD REFERENDUM DO CONEPE
Dispõe sobre os incentivos
à inovação e à pesquisa
científica e tecnológica no
ambiente produtivo e a
proteção da Propriedade
Intelectual na Universidade do
Estado de Mato Grosso.
O Reitor da Universidade do Estado de Mato Grosso –
UNEMAT, no uso de suas atribuições legais que lhe confere o art. 29,
IX do Estatuto da UNEMAT, e considerando a necessidade da
UNEMAT incrementar o desenvolvimento da Política Científica no
Estado de Mato Grosso, por meio do estabelecimento de normas que
regulem a propriedade intelectual e a transferência de tecnologia
ancorada na política nacional de Inovação Tecnológica que possam
trazer benefícios para a sociedade matogrossense, Processo nº 018/2008,
Parecer nº 042/2008-PRRPG e o Ofício nº 277/2008-
PRPPG,
RESOLVE AD REFERENDUM DO CONEPE:
Art. 1º Dispor sobre os incentivos à inovação e à pesquisa
científica e tecnológica no ambiente produtivo e a proteção da
Propriedade Intelectual na Universidade do Estado de Mato Grosso,
como segue:
CAPÍTULO I
DO OBJETO
350
Art. 2º A Propriedade Intelectual na Universidade do Estado de
Mato Grosso será uma ferramenta necessária para a gestão dos direitos
sobre as criações intelectuais, para as medidas de incentivo à inovação,
assim como à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo
na perspectiva de proporcionar uma maior inserção do Estado de Mato
Grosso no cenário nacional de desenvolvimento científico e tecnológico.
CAPÍTULO II
DAS DEFINIÇÕES
Art. 3º Considera-se para entendimento de propriedade intelectual
os conceitos:
I. Inovação – a introdução de novidade ou aperfeiçoamento no
ambiente produtivo ou social que resulte em novos produtos, processos
ou serviços, podendo ser radicais ou incrementais.
Parágrafo Único Quanto aos seus aspectos podem ser
classificadas como:
a) Inovação de produto – introdução de um novo produto
ou mudança qualitativa em produto existente;
b) Inovação de processo – implantação/adoção de
métodos de produção ou comercialização de novos ou
significativamente aprimorados;
c) Inovação de mercado – abertura de um novo mercado;
d) Inovação organizacional – melhorias significativas no
desempenho da instituição;
II. Propriedade Intelectual: É o conjunto de instrumentos
jurídicos que servem para proteger os direitos que qualquer cidadão,
empresa ou instituição que resultem da sua inteligência ou criatividade,
contra o uso não autorizado de terceiros. A Propriedade Intelectual é um
ativo intangível, portanto não possui existência física sendo baseado em
conhecimento.
III. Criação: descoberta, invenção, aperfeiçoamento,
modelo de utilidade, desenho industrial, programa de computador, novas
variedades vegetais e qualquer outra forma de criação que possa ser
protegida;
351
IV. Criador: pesquisador que seja inventor, obtentor ou autor de
criação intelectual;
V. Participação: a parte do servidor da UNEMAT criador e
demais criadores, se for o caso, nos ganhos econômicos decorrentes da
exploração econômica de criação intelectual;
VI. Ganho econômico: royalties, remunerações e quaisquer
benefícios financeiros resultantes, seja de exploração direta da criação
protegida, seja de licenças para exploração de terceiros;
VII. Núcleo de Inovação Tecnológica: órgão suplementar da
UNEMAT com a finalidade de gerir a política de inovação;
VIII. Inventor ou autor independente: pessoa física, não
servidores da UNEMAT, que seja inventor, obtentor ou autor de criação
intelectual;
IX. Contrato: é todo e qualquer ajuste celebrado entre a
UNEMAT e órgãos ou entidades da Administração Pública,
particulares, fundações, em que haja um acordo de vontades para a
formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas de dar,
fazer ou não fazer alguma coisa;
X. Convênio: é o acordo que tem por partes órgãos, entidades da
Administração e organizações particulares; os objetivos são recíprocos e
a cooperação mútua; os interesses das partes são convergentes.
Art. 4º A criação intelectual na UNEMAT surge da pesquisa e/ou
desenvolvimento decorrentes da atuação de recursos humanos; da
aplicação de dotação orçamentária, com ou sem a utilização de dados,
informações ou conhecimentos, de meios ou de equipamentos,
independentemente da natureza do vínculo existente entre a UNEMAT e
o autor de criação intelectual.
§1º Podem realizar criação intelectual no âmbito da UNEMAT:
I. Servidores docentes e Profissionais Técnicos da Educação
Superior que possuam vínculo permanente ou eventual com a
UNEMAT, no exercício de suas funções ou em atividades de pesquisa;
II. Discentes e estagiários que realizem atividades
curriculares de cursos de graduação ou de programas de pós-graduação
na UNEMAT, ou que participem de projeto que decorra de acordo,
contrato ou convênio;
III. Outras pessoas físicas não contempladas nos incisos
anteriores, como professores visitantes, discentes participantes de
352
programas de intercâmbio, pesquisadores que participam de projeto que
decorra de contrato ou convênio com a UNEMAT.
§2º Não será considerada criação intelectual realizada no âmbito
da UNEMAT quando for utilizado o espaço do Campus por terceiros,
como fundações de apoio ou incubadoras, mediante convênio ou
comodato autorizado na forma do Estatuto da UNEMAT.
§3º Não se inclui na exceção do parágrafo anterior a criação
intelectual que resultar da participação de servidores e discentes no
exercício de suas atividades profissionais, ou curriculares, ou projetos
institucionais com participação da UNEMAT.
CAPÍTULO III
DO ÓRGÃO DE ADMINISTRAÇÃO
Art. 5º Fica criado o Núcleo de Inovação Tecnológica - NIT da
UNEMAT vinculado a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação -
PRPPG, para a gestão de ações decorrentes desta Resolução.
§1º O Diretor será designado pelo Reitor a contar da publicação
desta Resolução, que encaminhará a Reitoria uma minuta de Regimento
que contemple estrutura e procedimentos administrativos, a ser aprovada
pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão.
§2º A Diretoria do Núcleo de Inovação Tecnológica,
motivadamente, poderá designar consultores ad hoc para manifestar
sobre os projetos, propriedade intelectual, transferência de tecnologia e
incentivo à inovação da UNEMAT.
CAPÍTULO IV
DA COMPETÊNCIA, RESPONSABILIDADE E DO SIGILO
Art. 6º Compete ao NIT da UNEMAT:
I. Zelar pela manutenção da política institucional de estímulo à
proteção das criações, à inovação, ao licenciamento e outras formas de
transferência de tecnologia;
353
II. Avaliar e classificar os resultados decorrentes de
atividades e projetos de pesquisa para o atendimento das disposições da
Lei 10.973/2004;
III. Avaliar solicitação de inventor independente para
adoção de invenção na forma do art. 22 da Lei 10.973/2004;
IV. Opinar pela conveniência e promover a proteção das criações
desenvolvidas no âmbito da UNEMAT;
V. Opinar quanto à conveniência de divulgação das criações
desenvolvidas no âmbito da UNEMAT, passíveis de proteção
intelectual;
VI. Acompanhar o processamento dos pedidos e a manutenção
dos títulos de propriedade intelectual da UNEMAT;
VII. Identificar e incentivar, na sociedade, as oportunidades de
realização de projetos de inovação que poderão ser executados em
parceria com a UNEMAT;
VIII. Opinar quanto à celebração dos contratos e convênios
objeto da Lei 10.973/2004 e que incluam cláusulas de propriedade
intelectual;
IX. Divulgar os resultados obtidos com os projetos de inovação
desenvolvidos no âmbito da UNEMAT, resguardado o dever de sigilo
previsto em contratos, convênios ou termos firmados pela UNEMAT ou
seus servidores.
X. Emitir parecer, antes da manifestação da procuradoria jurídica
competente, sobre os contratos previstos no inciso VIII deste artigo,
acordos e termos de sigilo vinculado à pesquisa;
Art. 7º Todas as pessoas referidas no §1º do artigo 4º deverão
apresentar à UNEMAT, por meio do NIT, suas criações, obrigando-se a
manter segredo sobre as mesmas e a apoiar as ações, visando à proteção
jurídica e à exploração econômica pertinentes.
§1º A obrigação de manter segredo, de que trata este artigo,
estende-se a todo o pessoal envolvido no processo de criação intelectual
ou grupo que dela tiver conhecimento, até decorridos 90 (noventa) dias
da comunicação ao NIT, prazo para que este providencie o depósito de
pedido de título de propriedade intelectual, assegurando a proteção
jurídica.
§2º O NIT, mediante ofício motivado, poderá recomendar a
prorrogação deste prazo, especialmente durante o período de 18
354
(dezoito) meses de pedido de patente nacional, ou quando se tratar de
segredo industrial ou do cumprimento de cláusula de contrato ou
convênio firmado pela UNEMAT.
Art. 8º Nos casos de criação intelectual resultante de projeto ou
atividade financiada ou realizada em conjunto com outras instituições,
entidades de apoio ou empresas, nacionais ou estrangeiras, será
celebrado contrato regulando os direitos de propriedade intelectual,
participação e as condições de exploração da criação.
Art. 9º O envio de amostra, material, conhecimentos, informações
ou dados relacionados à criação intelectual da UNEMAT para outras
instituições ou empresas, nacionais ou estrangeiras, só poderá ser
efetuado após contrato ou convênio, elaborado com a participação do
NIT, prevendo expressamente os direitos de propriedade intelectual,
como titularidade, segredo, publicação e participação na exploração
econômica respectiva.
Art. 10 O direito de propriedade intelectual poderá ser exercido
em conjunto com outras instituições ou empresas, nacionais ou
estrangeiras, devendo ser fixado expressamente o percentual e as
obrigações das partes no instrumento do contrato celebrado entre as
mesmas.
§1º A participação nos resultados, será assegurada na proporção
equivalente ao montante do valor agregado do conhecimento já existente
no início da parceria e dos recursos humanos, financeiros e materiais
alocados pelas partes.
§2º A titularidade do direito de propriedade intelectual poderá ser
de outra instituição ou empresa, nacional ou estrangeira, se houver
parecer favorável do NIT e aprovação do CONEPE, após assegurada
para a UNEMAT a participação nos resultados da exploração das
criações intelectuais conforme parágrafo anterior.
§3º A relação da UNEMAT com instituições estrangeiras, para o
desenvolvimento ou transferência de tecnologia, deverá seguir normas
aplicáveis à espécie.
355
Art. 11 A criação intelectual realizada parcialmente fora da
UNEMAT por pessoas mencionadas no artigo 4º, §1º, mas que tenha
utilizado recursos e instalações da UNEMAT pertencerá às instituições
envolvidas na atividade de criador.
§1º A UNEMAT e as instituições envolvidas celebrarão contrato
regulando os direitos de propriedade intelectual, participação e as
condições de exploração da criação, observando o artigo 10 desta
Resolução.
§2º Enquadram-se nas situações previstas no caput deste artigo,
os servidores afastados para formação ou aperfeiçoamento.
CAPÍTULO V
DOS PEDIDOS DE PROTEÇÃO JURÍDICA
Art. 12 O NIT incumbir-se-á do requerimento e acompanhamento
dos pedidos de proteção de criação intelectual da UNEMAT junto aos
órgãos encarregados de patente, registro e certificado de propriedade
intelectual no País e no exterior.
Parágrafo Único A UNEMAT poderá contratar entidade de apoio,
escritório ou agente especializado em trâmites de registro, patente ou
certificado de propriedade intelectual, sempre que as exigências ou
especificidades da criação intelectual e da respectiva proteção assim o
determinarem.
Art. 13 No pedido de proteção jurídica de criação intelectual
figurará, como depositante ou requerente, a UNEMAT e, como criador,
o autor ou autores da criação intelectual.
§1º O líder do grupo, quando houver, indicará os pesquisadores
envolvidos efetivamente na criação intelectual, como co-criadores, e o
percentual de contribuição de cada um, a fim de ser apurado o direito de
que trata o art. 15 desta Resolução.
§2º Nos casos autorizados nesta Resolução, a UNEMAT será co-
titular ou não figurará como depositante ou requerente de pedido de
privilégio ou de proteção de criação intelectual.
356
Art. 14 Caberá à UNEMAT, diretamente ou através de entidade
de apoio, também ao criador e, se for o caso, conjuntamente ou não, a
outras instituições de que tratam os artigos 10 e 11, a responsabilidade
pelas despesas decorrentes do processo dos pedidos de proteção jurídica
da criação intelectual, dos encargos periódicos de manutenção da
proteção da propriedade intelectual e quaisquer encargos administrativos
ou judiciais, observadas as obrigações previstas no contrato ou convênio
firmado entre as partes.
Parágrafo Único A UNEMAT, diretamente ou por entidade de
apoio, poderá custear as despesas a que se refere o caput deste artigo,
que seriam da responsabilidade do criador, ressarcindo-se
posteriormente da parte que lhe couber nos ganhos econômicos, a serem
compartilhados nos termos do art. 15, desta Resolução.
CAPÍTULO VI
DA EXPLORAÇÃO ECONÔMICA
Art. 15 A análise do interesse da UNEMAT no pedido de
proteção da criação intelectual deverá levar em conta a viabilidade de
exploração comercial do produto ou processo desenvolvido pelo criador,
através de parecer do NIT.
§1º A decisão sobre a extensão da proteção da criação intelectual
para outros países será tomada após parecer do NIT e aprovação do
CONEPE.
§2º Quando o resultado do estudo da viabilidade econômica
recomendar a não proteção jurídica da criação intelectual, a UNEMAT
renunciará ao direito de requerer respectiva proteção, mediante parecer
aprovado pelo CONEPE, cedendo gratuitamente ao criador o direito de
fazê-lo em seu nome, sendo vedada a indicação do nome da UNEMAT
neste caso.
§3º O exercício do direito de que trata o parágrafo anterior, não
poderá conflitar com as normas que regulamentam as atividades de
docentes em regime de dedicação exclusiva e as referentes às atividades
de consultoria.
357
Art. 16 Os ganhos econômicos resultantes da exploração da
criação intelectual protegida por direitos de propriedade intelectual,
consubstanciados nos rendimentos líquidos efetivamente auferidos pela
UNEMAT, serão divididos em parcelas iguais entre:
I. A UNEMAT para o cumprimento das finalidades constantes no
artigo 6º, do custeio das despesas de que trata o artigo 14, cujo
excedente deverá servir ao estímulo às atividades de pesquisa na
UNEMAT.
II. A unidade ou unidades acadêmicas onde foram
realizadas as atividades das quais resultou a criação intelectual
protegida, respeitada a obrigatoriedade da sua aplicação em atividades
de pesquisa e a prioridade à área de ensino onde se originou a referida
criação intelectual.
III. O autor ou autores da criação intelectual protegida,
indicados no §1º do artigo 4º desta Resolução.
§1º As parcelas referidas no inciso I e II poderão ser objeto de
execução administrativa e financeira por entidade de apoio contratada
para gerir a transferência de tecnologia.
§2º A parcela a que se refere o inciso III deste artigo será
repassada ao criador, a título de participação, obedecida a periodicidade
da percepção dos ganhos econômicos por parte da UNEMAT, em prazo
não superior a 01 (um) ano após a realização da receita que lhe servir de
base, durante toda vigência da proteção intelectual, descontadas
proporcionalmente as despesas referidas no parágrafo único do artigo
14.
§3º A participação a que se refere o parágrafo anterior, não se
incorporará, a qualquer título, aos vencimentos do servidor.
§4º Se a autoria da criação intelectual for compartilhada, a parte
que couber a cada autor será dividida, conforme disposto no §1º do
artigo 13 desta Resolução, sendo que as participações estão sujeitas à
incidência dos tributos e contribuições aplicáveis à espécie.
Art. 17 Quando a execução financeira e assessoria para
transferência de tecnologia não for realizada por entidade de apoio
deverá a Pró-Reitoria de Gestão Financeira adotar as medidas previstas
na Lei 10.973/2004, artigo 18, regulamentada pelo Decreto 5.563, artigo
19, e os procedimentos cabíveis, no orçamento da UNEMAT, para
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permitir a distribuição das parcelas dos ganhos econômicos referidas no
artigo 16 desta Resolução.
CAPÍTULO VII
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 18 Será obrigatória a menção expressa do nome da
UNEMAT em todo trabalho realizado com o envolvimento parcial ou
total de bens, como dados, meios, informações e equipamentos, serviços
ou pessoal da instituição, sob pena do infrator perder os direitos
referentes à participação fixada na forma desta Resolução, em favor da
Instituição.
Art. 19 Os resultados de pesquisas protegidos por direitos de
propriedade intelectual previstos nesta Resolução, ressalvada a cláusula
de segredo, serão associados às ações de formação de recursos humanos.
Art. 20 Compete a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação
estabelecer os procedimentos para atender o previsto na Lei
10.973/2004, artigos 14 e 15, regulamentados pelo Decreto 5.563/2005,
artigos 15 e 16.
Art. 21 Os casos omissos ou excepcionais serão dirimidos pelo
Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão - CONEPE.
Art. 22 Esta Resolução entra em vigor na data de sua
publicação.
Art. 23 Revogam-se as disposições em contrário.
Sala da Reitoria da Universidade do Estado de Mato Grosso, em
Cáceres/MT, 23 de outubro de 2008.
Prof. Ms. Taisir Mahmudo Karim
REITOR DA UNEMAT