jacques alfonsin. sujeito, tempo e lugar da prática jurídico-popular emancipatória que tem origem...

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  • 8/3/2019 Jacques Alfonsin. Sujeito, tempo e lugar da prtica jurdico-popular emancipatria que tem origem no ensino do Direito.

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    aquilo que ouvem e falam em sala de aula, formarem juzo sobre algumas questes

    relevantes que envolvem o ensino do direito na atualidade, particularmente no que dele

    se espera em defesa da dignidade humana, da cidadania e dos direitos humanos

    fundamentais que pretendem garanti-las. Aqui vo ser examinadas quatro:

    a) Que grau de ateno, motivao e interesse o ensino do direito

    consegue alcanar hoje entre a(o)s suas (seus) aluna(o)s no sentido de bem prepar-los

    para uma prtica jurdico-popular emancipatria?

    b) A quem o ordenamento jurdico brasileiro vigente garante

    preferncia de proteo efetiva, e como isso se reflete no ensino do direito e nas

    prticas por ele inspiradas?

    c) Como a linguagem, prpria de tal garantia, compreendida pela(o)s

    aluna(o)s do direito, e como ela(e)s a utilizam em suas prticas emancipatrias?d) As prticas emancipatrias da(o)s aluna(o)s junto ao povo pobre,

    encontram lugar e tempo necessrios nos programas atuais de ensino do direito?

    Convm tentar responder cada uma dessas questes, a partir de

    opinies que no se restrinjam ao meio universitrio. Que elas alcancem, alm da(o)s

    professora(e)s e a(o)s prpria(o)s aluna(o)s, as pessoas do povo a quem essas prticas

    tm servido. o que se pretende fazer com este apontamento.

    1. Ateno, motivao e interesse.

    Salvo melhor juzo, a maioria da(o)s estudantes de Direito comparece

    aborrecida em aula, cheia de enfado, indiferente, presente de corpo mas ausente de

    esprito, mal e mal interessada na avaliao que se seguir.

    Pelo que se ouve da(o)s estudantes, uma das causas principais para

    isso, talvez, resida nos contedos arcaicos que ainda presidem em grande parte as aulas,

    inteiramente desligados da realidade cotidiana, embalados ideologicamente emabstraes artificiais, repetidos at a exausto, girando quase todos em torno dos

    direitos patrimoniais. A riqueza do estudo que pode ser retirado do fenmeno

    possessrio, por exemplo, to necessrio vida e aos demais direitos humanos

    fundamentais do povo, ainda patina hoje, salvo honrosas excees, em torno do Direito

    romano, na forma requentada que lhe deu Ihering e Savigny ainda no sculo XVII...

    Para a(o) jovem estudante isso um saber que no tem nenhum sabor,

    e no por acaso que a primeira palavra tem a mesma raiz da segunda. Ernst Bloch

    lancetou esse tumor de maneira precisa, h muito tempo:

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    ...o sofrimento na escola pode ser mais revoltante do quequalquer outro mais tarde, exceto o do prisioneiro. Da o desejo,similar ao do prisioneiro, de escapar: o mundo l fora, aindaimpreciso, acaba se tornando estranho. (O princpio esperana,

    I. Rio de Janeiro: UERJ, trad. de Nlio Schneider, 2005, p. 31)....o que foi suplanta o que est por vir, a aglomerao das coisashavidas obstrui totalmente as categorias do futuro (idem, p. 18).O carter formador-retratador do verdadeiro, em nenhummomento to passvel de ser interrompido quando o processoem curso no mundo tido por decidido. (idem, p. 28).

    como se a possibilidade de outro futuro ficasse indefinidamente

    barrada para as novas geraes, por um saber castrador da prpria histria:

    ...como saber contemplativo, ele per definitionem unicamente

    um saber do que pode ser contemplado, ou seja, do passado, esobre o que ainda-no-veio-a-ser ele estende os contedosformais fechados provindos do que-j-se-efetivou.Conseqentemente, este mundo, onde ele compreendidohistoricamente, um mundo da repetio ou do grande sempre-outra-vez. (...) O evento torna-se histria; o conhecimento,rememorao, a festividade, comemorao do que j ocorreu.(Idem, p. 16).

    O desafio didtico da sala de aula para vencer essas poderosas travas,

    ento, pode se socorrer, precisamente, das prticas jurdicas emancipatrias da(o)sestudantes, quando eles e suas (seus) professora(e)s, tm a humildade de reconhecer

    que precisam aprender a compreender o povo necessitado de libertao de outras

    travas, mais poderosas ainda, como aquelas que impedem o acesso dele, at, ao po e

    casa.

    A(o)s aluna(o)s comeam tais prticas abraando junto esse povo -

    como diz Edgar Morin, interpretando a etimologia da palavra com-prender - trocando o

    seu prprio lugar social por aquele onde esse mesmo povo vive e sofre, freqentando

    as assemblias das associaes de moradores, por exemplo, os acampamentos e os

    assentamentos dos sem-terra, as festas, os cultos, o rico folclore onde ele celebra sua

    convivncia, mesmo sob o aguilho das muitas carncias que o vitimam.

    Ela(e)s no fazem isso como turistas ou curiosos eventuais das

    desgraas alheias. Diferentemente da(o)s estudantes de medicina, por exemplo, que

    podem estudar e pesquisar sobre cadveres, a prtica jurdica emancipatria s lida com

    gente viva, sobrecarregada com todo o tipo de urgncias, males, dios surdos

    reprimidos que, no raro, se voltam at contra ela.

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    O tempo e o lugar dessa prtica, portanto, mudam completamente o

    tempo e o lugar de onde ela pretende se preparar, com o cuidado e a responsabilidade

    prprias da sua extraordinria importncia. O antigo e sonolento tempo perdido (!) e o

    lugar pouco desejado das aulas, se enchem, a partir de ento, de um gosto (saber-sabor)

    e de um sentido libertrio e entusistico at ali desconhecido pela(o) aluna(o),

    justamente pela distncia, pela impreciso que os contedos a estudados guardavam

    com essa realidade agora conhecida, a qual faz nascer na mente e no corao da(o)s

    ltima(o)s, uma irreprimvel e corajosa indignao tica, disposta a prestar um servio

    eficaz de prtica jurdica emancipatria em favor desta(e) outra(o), agora prxima(o),

    um sujeito de direito que deixou de ser abstratamente hipottico, tem nome e

    patronmico, lugar de moradia, precria embora, vtima da pobreza, da injustia, da

    necessidade no satisfeita, dos seus direitos humanos fundamentais violados. . modorra medocre de ontem, sucede hoje uma postura de motivao

    atenta e vigilante, agora equipada com olhos de ver, de observar, de querer estudar e

    conhecer, mesmo a custa de sacrifcio (at de lazeres de fim de semana), para no se

    deixar enganar pelas aparncias to inquestionveis quanto falsas, que certos estudos

    de antanho ainda apregoam.

    A freqncia s aulas adquirem uma nova motivao. O dilogo com

    a(o)s professora(o)s - quem dera que toda(o)s ela(e)s valorizassem isso - ganham vida,

    comeam a esquentar. Comentrios de leis, doutrinas, jurisprudncia, perdem aquele

    peso tradicional de preocupao com a decoreba que os despeje nas provas de avaliao

    sem a mnima preocupao crtica, no raro sem nem terem sido entendidos.

    Um sentimento tico dessa envergadura ultrapassa aquele nvel

    primrio de questionamentos prprios do tipo que regra (por mais incompreensvel ou

    at hipcrita que ela venha a ser) devo seguir? para alcanar o como devo viver,

    depois dessa experincia?

    Procura-se garimpar, at dentro do direito puramente regulatrio,espaos garantes de liberdade e posse que l ficaram interrompidos, de acordo com a

    lio de E. Bloch supra transcrita.

    essa interrupo, responde a prtica jurdica emancipatria com

    uma fora de irrupo muito prpria da juventude, em busca, ora de resistncia uma

    ordem institucionalizada que ela j capaz de diagnosticar como desordem, ora de

    desobedincia civil, para a qual ela contribui de maneira responsvel junto com a frao

    de povo ao qual serve, sem outro ideal que no esse, o do servio, longe de buscar

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    liderana ou fama. Da mesma forma como prprio E. Bloch identifica tais movimentos,

    por sinal:

    ...processos caractersticos da juventude, dos perodos demudana, da aventura da produtividade, de todos os fenmenos,

    pois, em que est contido e quer articular-se o que-ainda-no-veio-a-ser. (...) ...o sentido de ultrapassar o curso natural dosacontecimentos. (op. cit. p. 22)

    Nesse ponto, j existe condies para a decolagem efetiva dessa

    mesma prtica jurdico-popular emancipatria.

    2. Viso crtica do direito que prefere as garantias do ter de uns

    poucos contra o ser de muitos.

    O encontro entre os saberes da conscincia da(o) estudante de direito,

    com os saberes da experincia do povo, alm da proximidade que motiva a(o)

    primeira(o) para o estudo e a prtica jurdica emancipatria, alm de provocar um

    profundo sentimento de urgncia da ao em favor do povo, capaz de logo convenc-

    la(o) de que Castanheira Neves tinha razo quando dizia que, hoje, o direito

    normativamente inadequado e institucionalmente ineficiente (O direito hoje e com

    que sentido?. Lisboa: Instituto Piaget, 2002, p. 10). que a realidade das carncias observadas e con-vividas, demonstra

    faticamente o seguinte: embora existentes e vlidos os direitos humanos fundamentais

    dos pobres, particularmente os sociais, eles so reduzidos ineficcia, tanto pelo

    descaso que lhes atribui o Poder Pblico, quanto pela indiferena que aquela parte da

    sociedade civil j satisfeita (com direito adquirido sobre propriedade privada acumulada

    sem limite, por exemplo, desinteressada em sua funo social ) lhes reserva.

    H uma clara cumplicidade, se assim pode-se dizer, na interpretao

    do direito que se faz na doutrina, na jurisprudncia, e no prprio ensino, que o vincula

    cultural e preferentemente ao particular, ao privado, ao exclusivo, ao patrimonial, ao

    civil, em detrimento do comum, do pblico, do coletivo, do social, do constitucional.

    No so poucas as reaes doutrinrias que, felizmente, esto

    impugnando de maneira convincente, esse vcio hermenutico visivelmente contrrio s

    prticas jurdico-populares emancipatrias que, de regra, tm a multido pobre como

    beneficiria dos seus servios.

    s dificuldades inerentes ao reconhecimento da eficcia dos direitoshumanos fundamentais do povo, Pietro Perlingieri responde se insurgindo contra uma

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    O juiz no poder negar tutela a quem pea garantias sobre umaspecto da sua existncia que no tem previso especfica,porque aquele interesse j tem uma relevncia ao nvel deordenamento e, portanto, uma tutela tambm em via judicial.(Perfis do Direito Civil, Introduo ao Direito Civil

    Constitucional. Rio: Renovar, 1997, traduo de Maria Cristinade Cicco, p 155/6.)

    Vrios juristas brasileiros, igualmente, pregam uma tal postura

    hermenutica em favor dos direitos humanos fundamentais, particularmente naqueles

    casos em que, implicados em lide de aparncia puramente "privada", eram

    tradicionalmente ignorados pelos construtores da dogmtica tradicional do pas,

    indiferentemente daquilo que a Constituio Federal dispusesse a respeito.

    Um testemunho eloquente desse fato se encontra na coletnea de

    artigos de doutrina que a Ordem dos advogados do Brasil publicou em comemorao ao

    cinquentenrio da Declarao Universal dos Direitos Humanos. (50 anos da declarao

    universal dos Direitos Humanos 1948 - 1998, Conquistas e Desafios. OAB: Comisso

    Nacional de Direitos Humanos, Brasilia, 1998).

    No comentrio que faz ao art. 1 da Declarao, Fabio Konder

    Comparato iguala as disposies da Declarao Universal aos princpios gerais de

    direito, os quais

    formam, na verdade, uma categoria especial de normas jurdicas,que se distinguem das demais (as simples regras de direito) porum conjunto de caractersticas prprias, a saber: a) maioramplido de seu campo de incidncia; b) maior fora jurdica; c)permanncia em vigor em caso de conflito normativo. (p. 31).

    Apoiado em Friedrich Muller, diz o mesmo autor que

    a fora normativa dos princpios muito maior que a dassimples regras de direito, porque estas vigem na exata medidaem que no colidem com aqueles. A funo prpria dos

    princpios consiste, justamente, em dar unidade ao sistema jurdico, direcionando a interpretao e a aplicao de suasnormas e gerando novas regras em caso de lacunas. (idem).

    Naquilo que mais fere o ouvido de quantos idolatram a liberdade

    poltica que o ordenamento jurdico vigente em nosso pas consagra, formalmente -

    ainda que a liberdade econmica, para todos, seja sacrificada - adverte Comparato:

    Na Declarao Universal dos Direitos Humanos, porm, oprincpio da liberdade compreende tanto a dimenso poltica

    como a individual. A primeira vem declarada no art. 21, e asegunda, nos arts. 3 e seguintes. Reconhece-se, com isso, que

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    ambas essas dimenses da liberdade so complementares einterdependentes. A liberdade poltica sem as liberdadesindividuais no passa de engodo demaggico de Estadosautoritrios ou totalitrios. E as liberdades individuais, semefetiva participao poltica do povo no governo, mal escondem

    a dominao oligrquica dos mais ricos. (p. 38).Para o bom uso do poder argumentativo desses testemunhos

    doutrinrios, no ignora a prtica jurdico-popular emancipatria em que medida a

    linguagem do direito, em vez de ajudar, pode atrapalhar.

    3. A linguagem jurdica e sua capacidade de criar o inexistente,

    impedindo, como acontece com o povo, a passagem de uma

    conscincia ingnua da(o)s estudantes para uma conscincia

    crtica.

    No seu O Forum social mundial. Manual de uso, Boaventura de Sousa

    Santos diz o seguinte:

    ...a racionalidade e a eficcia hegemnicas acarretam uma contraodo mundo ao ocultarem e desacreditarem todas as prticas, todos osagentes e saberes que no so racionais ou eficazes segundo os seuscritrios. A ocultao e o descrdito destas prticas constituem umdesperdcio de experincia social, quer da experincia social que j seencontra disponvel, quer da experincia social que, no estando aindadisponvel, contudo realisticamente possvel. (...) A sociologia dasausncias uma pesquisa que visa demonstrar que o que no existe ,na verdade, ativamente produzido como no-existente, isto , comouma alternativa no-credvel ao que existe. O seu objeto emprico considerado impossvel luz das cincias sociais convencionais, peloque a sua simples formulao representa j uma ruptura com elas. Oobjetivo da sociologia das ausncias transformar objetos impossveisem possveis, objetos ausentes em presentes. (So Paulo: Cortez

    Editora, 2005, p. 21).

    Os exemplos desse fato no so raros, no mundo do direito. Basta que

    se compulsem os manuais, especialmente aqueles que estudam o Direito privado e o

    Direito processual, para se concluir que, de fato, conflitos massivos travados hoje no

    pas, em defesa de direitos humanos fundamentais como os de po e casa, por exemplo,

    ainda recebem tratamento jurdico idntico aos reservados para os inter individuais.

    como se a forma processual dos ltimos tornasse inexistentes os primeiros, pois

    evidente que aqueles no podem ser tratados da mesma forma.

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    A linguagem tcnica do direito, ento, consagrada num passado

    longnquo, de regra inacessvel maioria do povo, cai sobre ele quase sempre como

    represso, deixando-o atnito, perplexo e, no raro, profundamente magoado por,

    sequer, ter entendido a razo do constrangimento que sofreu. Da revolta, no de

    admirar que parta para a violncia...

    A substituio dessa verdadeira aculturao imposta por um direito

    estranho e hostil maioria do povo, parece urgente ser substituda por uma

    inculturao que, quando menos, respeite a sua dignidade.

    Esse um dos maiores desafios que as prticas jurdicas

    emancipatrias enfrentam. Elas querem valorizar o fato de que a palavra, como a

    prpria pronncia dela diz, uma p-(que)-lavra. O falar precisa de jeito cuidadoso,

    respeitoso e, quando necessrio, essas prticas tm at de decodificar (cartilhas porexemplo) aquelas palavras com que o ordenamento jurdico, embora prevendo

    liberdades e direitos ao povo, no tem poder para garantir nada disso.

    A reciprocidade da linguagem, que a deve ser observada, no pode

    padecer do vcio to comum da superioridade, da falta de humildade e clareza,

    caractersticas de juristas criadores de um outro senso comum, que de comum pouco

    ou nada tem.

    Em Quem o povo? A questo fundamental da democracia (So

    Paulo: Max Limonad, trad. Peter Naumann, 1998), no captulo destinado ao estudo da

    "excluso", Friedrich. Muller oferece possibilidade, talvez, de se separar uma "espcie"

    de povo, aquela que, embora fisicamente presente no territrio nacional, representa uma

    "disfuncionalidade setorial" de uma sociedade industrial avanada", excluda

    "tendencial e difusamente dos sistemas prestacionais (Leistungssystemen) econmicos,

    jurdicos, polticos, mdicos e dos sistemas de treinamento e educao, o que significa

    "marginalizao" como subintegrao" ( p. 91).

    Com o apoio das lies de Nyklas Luhmann e de Marcelo Neves, a sedenuncia o fato de que por cima das diferenas de classe

    ...no quadro de uma incluso genrica, ainda que muito desigual(...) o esquema incluso/excluso sobrepe-se como umasuperstrutura (grifo do autor) estrutura da sociedade, tambm estrutura da constituio - como uma espcie de metacdigo(...) que mediatiza todos os outros cdigos. (Idem, p.94).

    Nesse contexto se retira aos excludos a sua dignidade pela

    ...no aplicao sistemtica dos direitos humanos fundamentais,perseguio fsica, "execuo" sem acusao nem processo,

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    fundamentais, a possibilidade de o acesso desses aos seus titulares ser feita, inclusive,

    atravs de uma adjudicabilidade processual e judiciria, constitui-se, talvez, no principal

    desafio do moderno Estado Democrtico de Direito e na nica prova de que ele garante

    a eficcia desses mesmos direitos.

    Se isso difcil para o Estado, imagine-se para as prticas jurdico-

    populares emancipatrias. Antes de elas ficarem dispensadas de qualquer explicao ao

    povo, porm, ou do servio a ele devido, essa dificuldade constitui um desafio a mais

    para que a(o)s destinatria(o)s desse trabalho tomem conscincia dela e enfrentem-na

    com o empenho poltico que nela est subentendendido, ou seja, a conquista dos

    poderes indispensveis s garantias devidas aos direitos humanos fundamentais, a ponto

    de os mesmos alcanarem, eles tambm, serem reclamados em Juzo.

    Nunca demais lembrar que comunicar , antes de mais nada, tornarcomum um determinado assunto, e poucos assuntos interessam tanto ao povo como os

    relacionados com os seus direitos. Se isso for impedido pelo tecnicismo da linguagem

    erudita e sofisticada ou pelo pedantismo, as prticas jurdicas de emancipatrias no

    tero feito nada, pois no alcanaro o que mais se espera delas, ou seja, que o povo

    mesmo supere sua conscincia ingnua, substituindo-a por uma conscincia crtica, e

    seja o primeiro sujeito responsvel pela defesa de sua dignidade e a conquista de sua

    cidadania.

    por isso que a interdisciplinariedade prpria dessas prticas deve

    inspira-las em cada tempo e lugar onde elas so executadas. A razo de a linguagem

    da arte, por exemplo, ser to bem compreendida pelo povo, est na beleza que fala por

    si, no desenho, na pintura, no cartaz, no teatro, na msica, etc...

    Lidar com o povo, sabidamente, tambm mais arte do que cincia.

    No de admirar, portanto, o sucesso que as rdios comunitrias, mesmo as

    clandestinas, fazem no meio dele. Religio, culto, liturgia, essa espcie de espao

    mstico que o povo adora em muitas das suas celebraes, em vez de seremconsideradas como coisas estranhas prtica jurdica, merecem todo o cuidado que

    qualquer trabalho junto dele precisa respeitar, pois constituem parte importantssima da

    cultura popular.

    Por que no se pode reservar, ento, um dia por quinzena ou ms, para

    que, na sala de aula, abra-se espao para a(o)s aluna(o)s do Direito, comentarem uma

    apresentao artstica de alguns dos seus colegas, ou algum do povo exibir uma arte

    popular que reflita problemas jurdicos vividos pelo mesmo povo, como ocorre com a

    letra de alguns sambas, por exemplo?

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    4. Os princpios e os valores do formal e do informal, do regular e

    do irregular no direito. Espao desse estudo no ensino e nas

    prticas jurdico-populares emancipatrias.

    A interpretao do direito que s compreende os direitos subjetivos

    patrimoniais, abraa-os juntos, no sentido apregoado por Edgar Morin, como visto

    acima, sem deixar lugar, tempo e cogitao para outros direitos. Quando menos, a eles

    d sempre preferncia mesmo na hiptese de entrarem em conflito com os humanos

    fundamentais, acentuando a criao do inexistente acima analisada.

    As dificuldades opostas, ento, s prticas jurdico-populares

    emancipatrias, por essa circunstncia, impem s ltimas uma dupla e pesada cargacomplementar: por um lado, em posio de ataque hermenutica tradicional anti-

    emancipatria do direito, desvelar a inconstitucionalidade que ela esconde, quando nega

    o carter material, substancial, dos direitos humanos fundamentais sociais prestacionais,

    e por outro, em posio de defesa dos ltimos, como condio garante de vida,

    liberdade, dignidade e cidadania, quando esses so ameaados ou violados.

    que, entre a forma como os direitos patrimoniais podem acumular-

    se em prejuzo dos humanos fundamentais como acontece com a concentrao da

    propriedade privada sobre terra, por exemplo e a forma como os ltimos podem

    alcanar eficcia, h uma extraordinria diferena no que toca visibilidade dos

    primeiros e dos ltimos.

    No momento em que essas linhas esto sendo lidas, a aquisio de um

    grande latifndio de terra urbana ou rural pode estar sendo feita num tabelionato e num

    registro pblicos, sem cincia imediata da grande maioria do povo, mesmo que tal

    aquisio v se destinar a um uso nocivo, anti-social, contrrio aos direitos desse

    mesmo povo, como contedo da funo social da propriedade. Nesse mesmo momento,porm, a ocupao de uma terra rural em vista de garantir comida ou a de um latifndio

    urbano em vista de garantir moradia, quem sabe gestos de desespero efetivados sobre

    aquele mesmo latifndio, no tem como se ocultar.

    A fora da hermenutica jurdica anti-emancipatria, contudo, de tal

    ordem poderosa, que levou o jurista Carlos Frederico Mars de Souza Filho, In Os

    direitos invisveis , estudo publicado na coletnea Os sentidos da democracia. Polticas

    do dissenso e hegemonia global. OLIVEIRA, Francisco de, e PAOLI, Maria Clia

    (orgs). Petrpolis: Vozes, 1999, p. 307 e seguintes:

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    ...os direitos coletivos so invisveis ainda hoje. Cada vez queso propostos ou reivindicados, desqualificado o seu sujeito: opovo indgena, se reivindica um direito coletivo, deve faz-locomo pessoa jurdica, o MST s pode ser visto comoreivindicante de direitos individuais propriedade de lotes de

    terra. Exatamente por isso a extrema dificuldade do PoderJudicirio em entender ou acatar o direito coletivo reivindicadoe, invariavelmente, conceder liminares para desocupaescoletivas de terra garantindo o direito individual do proprietrio.Sendo assim, no universo do direito individual, tudo que sejacoletivo estatal, ou omitido, ou invisvel.(p. 313).

    Com base em Cappelletti, diz o mesmo autor:

    Diversamente dos direitos tradicionais, para cuja proteorequer-se apenas que o Estado no permita a sua violao, osdireitos sociais como o direito assistncia mdica e social, habitao, ao trabalho no podem ser simplesmenteatribudos ao indivduo. Exigem eles, ao contrrio,permanente ao do Estado, com vistas a financiar subsdios,remover barreiras sociais e econmicas para, enfim, promover arealizao dos problemas sociais, fundamentos destes direitos edas expectativas por eles legitimadas. (Idem, p. 318). (...)Estes novos direitos tm como principal caracterstica o fato desua titularidade no ser individualizada, de no se ter ou nopoder ter clareza sobre ela. No so fruto de uma relao

    jurdica precisa mas apenas de uma garantia genrica, que deveser cumprida e que, no seu cumprimento, acaba por condicionaro exerccio dos direitos individuais tradicionais. Estacaracterstica os afasta do conceito de direito individualconcebido em sua integridade na cultura contratualista ouconstitucionalista do sculo XIX, porque um direito semsujeito! Ou dito de maneira que parece ainda mais confusa parao pensamento individualista, um direito onde todos sosujeitos. Se todos so sujeitos do mesmo direito, todos tm deledisponibilidade, mas ao mesmo tempo ningum pode deledispor, contrariando-o, porque a disposio de um seria violar odireito de todos os outros. (idem, pg. 319).

    O autor ainda se dedica, a seguir, em distinguir direito de interesse,concluindo que, para o caso, essa distino nem tem tanta relevncia.

    No preciso estar circunstancialmente sem casa para ter direito moradia, nem ser filiado ao movimento dos sem terras parater direito ao trabalho no campo. (idem 320).Estes direitos so verdadeiro direito real coletivo sobre coisaalheia, com todas as caractersticas dos direitos reais, oponvelerga omnes e diretamente relacionados a um bem jurdico. Nestecaso um bem jurdico especial, que ganhou uma proteo extra,capaz de alterar sua essncia, modificando o regime de

    propriedade, impondo-lhe limitao, tansformando mesmo suafuno social. (idem, p. 322).

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    Posio original do autor relaciona-se com aquilo que, poder-se-ia

    chamar falta de outro termo, de cansao pela espera dos prometidos efeitos juridicos

    da norma constitucional:

    A nova sistemtica constitucional criou um direito de todos emanao da norma jurdica. Quer dizer, exigir que o direitodeixe o espao do sonho e se concretize como norma jurdicapode ser exigido pela cidadania. A concretizao deste direito,quando assume repercusso individual, pode ser atendido pelomandado de injuno e quando coletivo pelainconstitucionalidade por omisso. Para a existncia destedireito necessrio que haja garantia constitucional que nopode ser concretizada pela inexistncia de norma legal. Esparsona Constituio, mas garantido entre direitos individuais, odireito emanao da norma um direito coletivo, embora noclaramente regulamentado. (idem, p. 326)

    Mars se queixa de que no tem sido fcil convencer o Judicirio

    disso.

    Poucas opinies, todavia, so mais contundentes em favor da eficcia

    dos direitos humanos fundamentais, formal ou informalmente, regular ou at

    irregularmente (?) exercidos, do que a de Pontes de Miranda, particularmente

    quando ele distingue a "proteo", da "existncia" de tais direitos:

    Direitos fundamentais valem perante o Estado, e no peloacidente da regra constitucional. So concepes estatais dentrodas raias que aos Estados permite o direito das gentes. Taisconcepes no lhes alteram a essncia: so concepes da

    proteo, e no da existncia de tais direitos. A sua essncia, asua supra - estatalidade (Uberstaatlichkeit) inorganzvel peloEstado; o que organizvel, como demonstrou a cincia decinquenta anos atrs, a proteo jurdica (...) o quesublinhamos em conferncias de 1930 e 1932, em Berlim e naHolanda. Mas, para ns, isso no quer dizer que, evoluindo, odireito das gentes no possa chegar organizao dos direitos

    fundamentais. Os conjuntos de direitos fundamentais olham, defrente, o Estado, constituem (...) "estaes, no eterno processothe man versus the state, em ondas que vo e que vm". Atcnica das declaraes de direitos que muda. Se procedem dodireito natural, ou no, problema que no se deve levantar nodireito constitucional. Antes, no direito das gentes j se ps.Sejam direitos naturais ou no no sejam, j no direitoconstitucional se erguem diante do Estado, pela preeminncia dodireito das gentes que - no obstante a sua imperfeio - odireito humano no mais alto grau de extenso. (Comentrios Constituio de 1967, S. Paulo, RT, 1967, IV, p. 621/622)

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    Concluso

    Os conflitos gerados pela ameaa de violao, ou pela violao

    mesma, dos direitos humanos fundamentais do povo, alguns deles conseguem ser

    levados ao Judicirio. no mbito da jurisdio, justamente, l onde vm procurar

    socorro as vtimas da maior parte das violaes coletivas (ou difusas, se se preferir)

    desses direitos, que a fonte do poder de julgar, desde o mesmo povo, parece ter de ser

    permanentemente reconsiderada:

    Perde-se um pouco a noo (ou talvez, somente a lembrana) dabase popular do poder, quando se trata da jurisdio. Isso devido, especialmente em sistemas como o nosso, em que os

    juzes so recrutados por critrios outros que no o da eleiopopular, independncia dos juzes e seu afastamento das bases.Mas tambm o poder dos juzes "emana do povo e em seu nome exercido". A forma de sua investidura legitimada pelacompatibilidade com as regras do Estado - de - direito e eles so,assim, autnticos agentes do poder "popular", que o Estadopolariza e exerce. Na Itlia, isso constantemente lembrado,porque toda a sentena dedicada (intestata) ao povo italiano,em nome do qual pronunciada." (cfr. Liebman, Manual, n.109, II, p. 243 trad.; cfr. c.p.c., art. 132). (DINAMARCO,Cndido Rangel,A instrumentalidade do processo, RT, S.Paulo,

    1987, p. 195).

    Como se observa pelos testemunhos supra arrolados, a escandalosa

    desigualdade econmica que vitima de maneira annima o povo, em nosso pas, no

    conta com o apoio jurdico indiscutvel que lhe empresta grande parte dos nossos

    doutrinadores e julgados.

    De outra parte, porm, no menos verdade que os ndices dessa

    desigualdade, por repetidos e lamentados at a exausto, pelos advogados defensores

    dos direitos humanos fundamentais, esto "gastos" no ver dos ltimos. No conseguemabalar a indiferena e o bocejo dos poucos com poder poltico, jurdico e econmico,

    capaz de minimiz-los.

    Assim, as razes pelas quais a eficcia desses direitos, as condies

    pelas quais, caso a caso, pode-se reclamar a adjudicabilidade deles aos seus respectivos

    sujeitos, talvez resida no fato de que a indeterminao dos planos da sua existncia e

    validade aumentou de tal forma, modernamente, que a sua defesa - historicamente dbil

    para no dizer ausente do universo jurdico - tem sido pregada como impossvel.

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    Friedrich Hayek, um dos mais autorizados idelogos das teses

    neoliberais, est entre os que assumem esse posicionamento, conforme j denunciamos

    em estudo anterior (Os conflitos possessrios e o Judicirio. Trs reducionismos

    processuais de soluo, in O Direito Agrrio em Debate, P. Alegre, Livraria do

    Advogado, p.275/276).

    Da o questionamento do prof. Antonio-Enrique Prez Luo, feita h

    menos de um quinqunio, em coletnea de estudos por ele prprio organizada sobre se,

    diante do ataque "ps moderno" desfechado contra os direitos humanos, mantm eles

    sua vigncia, ficaram obsoletos, ou, "devem ser objeto de uma reviso que elucide o seu

    sentido atual" (Derechos humanos y constitucionalismo ante el tercer milenio, Madri:

    Marcial Pons, 1996, trad. livre, nossa).

    Nenhuma elucidao mais urgente, talvez, do que a de identific-losjunto quela frao de povo excluda a que faz referncia Friedrich Muller, no estudo

    acima lembrado.

    A ausncia de uma tal aproximao realmente interessada, a ser

    promovida pelo Estado, pela sociedade civil, pela(o)s estudantes de direito, por quem

    quer que nutra um mnimo de respeito pela dignidade humana desse outro, considerado

    descartvel pela economia moderna, acentuar, paradoxalmente, a desumanidade dos

    direitos que se reclamam humanos.

    Norberto Bobbio j demonstrou bastante impacincia com o muito

    estudo e a pouca ao que se tem desenvolvido em torno desses mesmos direitos:

    O problema fundamental em relao aos direitos do homem,hoje, no tanto o dejustific-los, mas o deproteg-los. Trata-se de um problema no filosfico, mas poltico. ( A era dosdireitos, Rio de Janeiro: Campus Ltda., 1992, p. 24.

    O pessimismo e o desespero de quantos discordam dessa postura,

    acaba por sustentar pensamentos antiutpicos do tipo apoiado por Hayek, nos quais a

    chegada do povo excludo terra prometida do livre mercado capitalista, fica tanto

    mais distante quanto mais ruidosa e mistificadora a pregao dessa possibilidade.

    Em tal quadro, para pesar de Hayek, ele "no v nada mais do que

    aquilo que foi possvel ontem", como o afirma Franz J. Hinkelammert (Crtica razo

    utpica. So Paulo: Paulinas, 1988, p.135).

    Ora,

    nunca se sabe com antecedncia aquilo que possvel. S seconsegue sab-lo experimentando, responde o mesmoHinkelammert. (idem).

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    Que sirva como testemunho moderno e promissor desse fato, tudo

    quanto a sociedade civil est organizando hoje, em matria de democracia participativa

    do tipo espao pblico no estatal, tambm chamado de terceiro setor, onde a cidadania

    do povo vem desacreditando, visivelmente, aquela soberania onde ele somente cone,

    para reconhec-lo como povo ativo, instncia concreta de reconhecimento de direitos,

    destinatrio das polticas pblicas emancipatrias de um Estado que se queira

    democrtico e de direito.

    bvio que um estudo resumido como esse, ainda mais sobre um

    tema dessa importncia, est mais do que ciente das suas limitaes e visveis lacunas.

    A sua contribuio para o debate do tema, assim, antes de qualquer outra coisa, fica

    reduzida quase a um simples pedido de acesso ao mesmo, pois se sente contrangida pela

    conscincia de que:A tarefa cognoscitiva e hermenutica do esprito no se esgotanunca; o que lhe pode faltar, isso sim, a energia necessriapara abrasar-se em sua tarefa e resolv-la. (COING, Helmut.Fundamentos de Filosofia del Derecho, Crdoba: AsdeEdiciones, trad. Juan Manuel Mauri, 1995, p. 9. Traduo livre enossa, para o portugus.)

    Quem dera o seminrio que nos rene aqui aumente em toda(o)s ns

    essa energia e esse calor apaixonado. Iniciamos com Brecht. Vale a pena concluir com

    ele:

    O PO DO POVO.

    A justia que nem o po do povo: falta na mesa umas vezes,outras t pode sobrar; umas vezes d gosto com-lo,outras fere o paladar. Toda vez que ele escasseia, a fome que campeia; quando seu sabor no presta,o desagrado geral. Fora com a justia ruim,

    de qualquer jeito amassada, cozida com desamor!Fora com a justia desprovida dos melhores condimentos,de casca grossa, queimada! Fora com a justiadura de to dormida, que chega tarde demais!Quando o po bom e farto, s por si vale um banquete:a poro de tudo mais bem que pode ser menor.Inda mais feliz quem se alimenta do po da justia,porque seu trabalho produz imensa fartura.Tanto quanto o po de cada dia, necessrio ter-se a justianas horas todas do dia. Desde cedo at bem tarde,seja no trabalho ou na diverso,

    ou s no trabalho - pois que o trabalho tambm diverso -nos momentos difceis ou alegres, o povo precisa muito

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    do sadio, reconfortante po da justia de cada dia.Pois muito bem, tendo o po da justia tanta e tantaimportncia, quem deve, amigos, faz-lo? Que nem o poque apetece, satisfaz e robustece, assim o po da justia- saudvel, abundante, sempre novo -

    deve ser feito pelo prprio povo.

    BIBLIOGRAFIA

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