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Revista de Estudos Tributários ANO XVI – Nº 96 – MARÇO-ABRIL 2014 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Supremo Tribunal Federal – Nº 29/2000 Superior Tribunal de Justiça – Nº 42/1999 Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Nº 21/2001 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Nº 1999.02.01.057040-0 Tribunal Regional Federal da 3ª Região – 22/2010 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – Nº 07/0042596-9 Tribunal Regional Federal da 5ª Região – Nº 10/2007 EDITORIAL SÍNTESE DIRETOR EXECUTIVO: Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA: Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL: Cristiano Basaglia EDITORA: Fernanda Figueiredo Reis EDITORIAL IET – INSTITUTO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS DIRETORES Milton Terra Machado Hebe Bonazzola Ribeiro Geraldo Bemfica Teixeira CONSELHO EDITORIAL Domiciano Cunha, Heleno Taveira Tôrres, Hugo de Brito Machado, Humberto Bergmann Ávila, Ives Gandra da Silva Martins, José Mörschbächer, Kiyoshi Harada, Leandro Paulsen, Misabel Derzi, Paulo de Barros Carvalho, Roberto Ferraz, Roque Carrazza, Vittorio Cassone, Walmir Luiz Becker COMITÊ TÉCNICO Adler Baum, Adolpho Bergamini, Carlos Mário da Silva Velloso, Carlos Roberto Lofego Caníbal, Fernando Dantas Casillo Gonçalves, Henrique Tróccoli Júnior, Marcel Gulin Melhem, Paulo de Mello Aleixo, Paulo de Vasconcellos Chaves, Vilson Darós COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Antonio Baptista Gonçalves, Carlos Renato Lonel Alva Santos, Éderson Garin Porto, Ives Gandra da Silva Martins, Kiyoshi Harada, Norma Antônia Gavilãn Tonellatti, Walter Alexandre Bussamara ISSN 1519-1850

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Revista de Estudos TributáriosAno XVI – nº 96 – MArço-AbrIl 2014

reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA

Supremo Tribunal Federal – Nº 29/2000Superior Tribunal de Justiça – Nº 42/1999

Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Nº 21/2001Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Nº 1999.02.01.057040-0

Tribunal Regional Federal da 3ª Região – Nº 22/2010Tribunal Regional Federal da 4ª Região – Nº 07/0042596-9

Tribunal Regional Federal da 5ª Região – Nº 10/2007

edItorIAl sÍntese

dIretor eXecutIVo: Elton José Donato

Gerente edItorIAl e de consultorIA: Eliane Beltramini

coordenAdor edItorIAl: Cristiano BasagliaedItorA: Fernanda Figueiredo Reis

edItorIAl Iet – InstItuto de estudos trIbutárIos

dIretores

Milton Terra MachadoHebe Bonazzola RibeiroGeraldo Bemfica Teixeira

conselho edItorIAlDomiciano Cunha, Heleno Taveira Tôrres, Hugo de Brito Machado,

Humberto Bergmann Ávila, Ives Gandra da Silva Martins, José Mörschbächer,Kiyoshi Harada, Leandro Paulsen, Misabel Derzi, Paulo de Barros Carvalho,

Roberto Ferraz, Roque Carrazza, Vittorio Cassone, Walmir Luiz Becker

coMItê técnIco

Adler Baum, Adolpho Bergamini, Carlos Mário da Silva Velloso, Carlos Roberto Lofego Caníbal, Fernando Dantas Casillo Gonçalves, Henrique Tróccoli Júnior,

Marcel Gulin Melhem, Paulo de Mello Aleixo, Paulo de Vasconcellos Chaves, Vilson Darós

colAborAdores destA edIçãoAntonio Baptista Gonçalves, Carlos Renato Lonel Alva Santos,

Éderson Garin Porto, Ives Gandra da Silva Martins, Kiyoshi Harada, Norma Antônia Gavilãn Tonellatti, Walter Alexandre Bussamara

ISSN 1519-1850

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1998 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE e do IET – Instituto de Estudos Tributários.

Publicação bimestral de doutrina, jurisprudência e outros assuntos tributários.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Capa: Tusset Monteiro Comunicação

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

REVISTA DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS – Porto Alegre: v. 1, n. 1, maio/jun. 1998

Publicação periódica Bimestral

v. 16, n. 96, mar./abr. 2014

ISSN 1519-1850

1. Direito tributário – Brasil 2. Jurisprudência – periódico

CDU: 349.9(05) CDD: 340

(Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851)

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.iobfolhamatic.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

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Carta do Editor

Com grande satisfação apresentamos a você, caro leitor, a edição nº 96 da Revista de Estudos Tributários.

E, nesta edição, trataremos no Assunto Especial do polêmico tema “Elisão Fiscal”.

Para tanto, levaremos a você, leitor, o parecer do Professor Ives Gandra, que esclarece a diferença entre elisão, instituto esse permitido, e parte de um correto planejamento tributário, e evasão fiscal, considerada ilícita; além de Acórdão na Íntegra extraído do Superior Tribunal de Justiça, bem como uma decisão do CARF na Íntegra, e dois artigos sobre o tema.

Na Parte Geral da Revista de Estudos Tributários, selecionamos para você Acórdãos na Íntegra dos principais Tribunais pátrios, além dos seguintes artigos: “A Previdência Social em Âmbito de Antecipação de Distribuição de Lucros e a Ausência de Retirada de Pro Labore por Sócio Administrador”, de Walter Alexandre Bussamara; “As Preocupações Decorrentes do Projeto de Lei do Se-nado (PLS) nº 386, de 2012. Risco de Extinção de Benefício Fiscal Relativo ao ISSQN. Futuros Questionamentos sobre a Constitucionalidade dos Dispositivos Aviltantes de Direitos Municipais”, de Carlos Renato Lonel Alva Santos; e “Por um Conceito Constitucional de Contribuinte: Revisitando as Noções de Sujei-ção Passiva e Solidariedade no Âmbito do Direito Tributário”, de Éderson Garin Porto.

Chamamos a sua atenção, ainda, para a Seção Em Poucas Palavras, intitu-lada “As Intimações no Processo Administrativo Tributário”, de Kiyoshi Harada.

Não deixe de conferir, na seção “Clipping Jurídico”, os principais acon-tecimentos do período na área tributária, bem como as normas que causaram impacto, recentemente, na seção “Resenha Legislativa”.

A IOB, juntamente com o IET, deseja a todos uma ótima leitura!

Elton José DonatoDiretor Executivo da IOB

Arthur Maria Ferreira NetoPresidente do IET

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Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ....................................................................7

Assunto Especial

Elisão Fiscal

Doutrinas

1. O Controle Fiscal, a Elisão Fiscal e o Combate aos Crimes contra a Ordem TributáriaAntonio Baptista Gonçalves .......................................................................9

2. Elisão Fiscal: o Parágrafo Único do Artigo 116 do CTN e o Propósito Negocial na Desconsideração de Atos e Negócios JurídicosNorma Antônia Gavilãn Tonellatti ...........................................................24

ParEcEr JuríDico

1. Elisão e Evasão FiscalIves Gandra da Silva Martins ....................................................................34

acórDãos na íntEgra

1. Acórdão na Íntegra (STJ) ...........................................................................47

2. Acórdão na Íntegra (CARF) .......................................................................55

3. Ementário .................................................................................................79

Parte Geral

Doutrinas

1. A Previdência Social em Âmbito de Antecipação de Distribuição de Lucros e a Ausência de Retirada de Pro Labore por Sócio AdministradorWalter Alexandre Bussamara....................................................................83

2. As Preocupações Decorrentes do Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 386, de 2012. Risco de Extinção de Benefício Fiscal Relativo ao ISSQN. Futuros Questionamentos sobre a Constitucionalidade dos Dispositivos Aviltantes de Direitos MunicipaisCarlos Renato Lonel Alva Santos ..............................................................87

3. Por um Conceito Constitucional de Contribuinte: Revisitando as Noções de Sujeição Passiva e Solidariedade no Âmbito do Direito TributárioÉderson Garin Porto ...............................................................................101

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JurisPruDência

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Supremo Tribunal Federal ......................................................................1252. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1293. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1374. Tribunal Regional Federal da 1ª Região ..................................................1545. Tribunal Regional Federal da 2ª Região ..................................................1616. Tribunal Regional Federal da 3ª Região ..................................................1697. Tribunal Regional Federal da 4ª Região ..................................................1778. Tribunal Regional Federal da 5ª Região ..................................................181ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência ...................................................................1842. Ementário de Jurisprudência Administrativa ...........................................225

Seção Especial

Em Poucas Palavras

1. As Intimações no Processo Administrativo TributárioKiyoshi Harada .......................................................................................227

Clipping Jurídico ..............................................................................................230

Resenha Legislativa ..........................................................................................235

Índice Alfabético e Remissivo .............................................................................236

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Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação

do Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publicações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-

co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelos e-mails [email protected] e [email protected].

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Assunto Especial – Doutrina

Elisão Fiscal

O Controle Fiscal, a Elisão Fiscal e o Combate aos Crimes contra a Ordem Tributária

ANTONIO BAPTISTA GONÇALVESAdvogado, Membro da Associação Brasileira dos Constitucionalistas, Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário, Doutor e Mestre em Filosofia do Direito – PUC/SP, Especialista em International Criminal Law: Terrorism’s New Wars and ICL’s Responses – Istituto Superiore Internazionale di Scienze Criminali, Especialista em Direito Penal Econômico Europeu pela Uni-versidade de Coimbra, Pós-Graduado em Direito Penal (Teoria dos delitos) pela Universidade de Salamanca, Pós-Graduado em Direito Penal Econômico da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Pós-Graduado em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas, Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

RESUMO: A Secretaria da Receita Federal do Brasil sempre teve como objetivo coibir a sonegação fiscal, a elisão fiscal, as fraudes e as omissões. Entretanto, por limitações tecnológicas, não havia um controle eficaz e o processo era lento e, muitas vezes, tardio.

Com a modernidade da cibernética tudo mudou e uma série de softwares com cruzamentos de dados possibilitaram ao Fisco desenvolver um banco de dados com o perfil de cada contribuinte, o que incrementou sobremaneira o processo fiscalizatório. Então, importante é verificar como a união da cibernética com o Fisco modificou o cenário fiscal.

PALAVRAS-CHAVE: Sigilo; fiscalização; mecanismos de controle.

KEYWORDS: Seal; inspection; mechanisms of control.

ABSTRACT: The Internal Revenue Service of Brazil has always aimed to curb tax evasion, fraud, and omissions. However, by technological limitations, there was no effective control and the process was slow and often late.With the modern cybernetics, everything changed and a series of crosschecks with software enabled the tax authorities to develop a database with the profile of each contributor, which increased greatly in the process. So important is to see how the marriage of cybernetics with the IRS changed the tax landscape.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Conceito de crime contra a ordem tributária; 2 Conceitos de elisão e evasão fiscal; 3 A necessidade de controle; 4 A virada fiscalizatória: a tecnologia; 5 O cruzamento das infor-mações; 6 Os novos mecanismos de controle: CPMF, Decred, Dimob, Demed; 7 A intensificação do controle; 8 A armadilha fiscal e a contramedida para o contribuinte; Conclusão; Referências.

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10 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

INTRODUÇÃOA Secretaria da Receita Federal do Brasil sempre criou mecanismos de

controle para coibir fraudes, omissões ou sonegações fiscais e, principalmente, evitar a elisão e a evasão fiscal. Porém, é inegável a contribuição da cibernética em um salto nas formas de fiscalização.

De tal sorte que se faz necessário apresentar o novo cenário e quais as medidas desenvolvidas pela tecnologia no sentido de instrumentalizar os Au-ditores Fiscais em busca de fraudes, omissões ou sonegações fiscais, elisões e evasões fiscais.

No entanto, importante notar que a fiscalização apenas se intensificou e diversificou, pois em momento algum trataremos a cibernética como a tábua de salvação do controle fiscal, mas sim como um incremento de uma política fiscalizatória que já existia desde há muito.

Antes de adentrarmos na necessidade de controle, bem como a moder-nização tecnológica em si, tocaremos, preliminarmente, na definição de crimes tributários, em especial a diferenciação entre elisão e evasão fiscal. Assim, po-deremos nos ater ao cerne de nossa investigação: como o Fisco se modernizou eletronicamente a fim de combater os crimes praticados pelos contribuintes.

1 CONCEITO DE CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIASegundo Manoel Pedro Pimentel, “é delito tributário toda conduta que

viola dispositivo de lei penal editada para proteger a boa execução da política tributária do Estado”1.

A Lei nº 8.137/1990 traz, por meio dos arts. 1º e 2º, a definição do que vem a ser crime contra a ordem tributária:

Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

I – omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II – fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omi-tindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

III – falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qual-quer outro documento relativo à operação tributável;

IV – elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

1 PIMENTEL, Manoel Pedro. Introdução ao estudo do direito penal tributário. Ciência Penal, São Paulo, n. 2, p. 37-59, 1974.

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA �������������������������������������������������������������������������������������������������������������11

V – negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou docu-mento equivalente, relativa à venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Art. 2º Constitui crime da mesma natureza:

I – fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo;

II – deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;

III – exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal;

IV – deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvol-vimento;

V – utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública.

Anteriormente, a matéria era disciplinada por meio da Lei nº 4.729/1965: note que fora criada na vigência do regime militar e sua vigência perdurou até 1990.

O escopo da norma é, segundo a visão de Anabela Maria Pinto de Miranda Rodrigues (a qual nos filiamos), que a incriminação de condutas lesivas pelo Fisco tem a função de formar uma consciência ética fiscal na sociedade, despertando a percepção social acerca das vantagens oriundas do cumprimento dos deveres fiscais e das reais proporções da vitimização causada pelas condu-tas criminosas2.

Assim, a Lei nº 8.137/1990 disciplina quais são os crimes contra a ordem tributária, e logo é possível, por constarem no próprio texto normativo, identifi-car a fraude, a simulação, omissão, como os crimes a serem combatidos pelas autoridades fiscalizatórias. Neste diapasão, importante adentrarmos no debate acerca da elisão e da evasão fiscal. Afinal, ambos os casos se tratam de atos tributários que têm por escopo minorar a carga tributária ou se tratam de meios ilícitos usados a fim de evitar tributos? Para responder a esta e a outras indaga-ções, necessário será conceituar o que vem a ser elisão e evasão fiscal.

2 RODRIGUES, Anabela Maria Pinto de Miranda. Contributo para a fundamentação de um discurso punitivo em matéria penal fiscal. In: Direito penal econômico e europeu – Textos doutrinários: problemas especiais, Coimbra: Coimbra, v. II, 1999. p. 481-489.

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2 CONCEITOS DE ELISÃO E EVASÃO FISCALImportante salientar a diferença entre elisão fiscal3 e evasão fiscal. De

tal sorte que a primeira designa uma conduta lícita por parte do contribuinte. A elisão fiscal é a forma encontrada pelo contribuinte, por meio de brechas nor-mativas, porém lícitas4, de minorar o imposto devido5.

Sacha Calmon Navarro Coelho afirma que a elisão fiscal está calcada em um ato lícito do contribuinte:

Conforme entendimento dominante, elisão fiscal corresponde à prática de atos lícitos, anteriores à incidência tributária, de modo a obter-se legítima economia de tributos, seja impedindo-se o acontecimento do fato gerador, seja excluindo-se o contribuinte do âmbito de abrangência da norma ou sim-plesmente reduzindo-se o montante de tributo a pagar.6

Na mesma esteira, André Portela:

A elisão fiscal trata-se de exercício regular da liberdade de caracterização do fato gerador, pelo qual o agente elege, dentre as formas possíveis de con-figuração da conduta aquela sobre a qual recai um regime tributário mais benéfico, sem que se possa falar em vulneração da normativa jurídica.7

Alguns autores relacionam a elisão com a fraude. Sobre o tema, salienta a diferença Rubens Gomes de Sousa:

3 A expressão elisão fiscal designa a conduta lícita do contribuinte voltada à redução da carga tributária que, eventualmente, incida sobre a sua atividade econômica. Destaque-se que a elisão fiscal constitui atividade lícita, deferida, pela ordem jurídica ao contribuinte a voltada à proteção de seus interesses; diferenciando-se de eventual conduta que viole a ordem jurídica com o mesmo propósito, o que constitui sonegação fiscal. O meio habitual da elisão fiscal é o ingresso em juízo visando ao reconhecimento da inexigibilidade do crédito lançado pelas autoridades fiscais. No planejamento tributário, tanto o governo como o contribuinte escolhem os meios que lhes interessam na atividade fiscal (SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Atualizado por Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 28. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 515).

4 Como a Carta Magma prevê que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei, a existência de lacuna nesta última possibilita ao contribuinte utilizar-se de eventuais “falhas legislativas” para obter economia de tributos. Em regra, o faz mediante a prática dos denominados negócios jurídicos indiretos, assim chamados por terem finalidade atípica (redução do ônus tributário) (YAMASHITA, Douglas (Coord.). Planejamento tributário à luz da jurisprudência. São Paulo: Lex, 2007. p. 354 e 355).

5 O planejamento tributário (ou elisão fiscal) é todo procedimento que busca evitar (ou reduzir) o pagamento de tributos, sempre (i) antes de ocorrido o respectivo fato gerador, (ii) dentro dos estritos limites legais e (iii) sem que tenha havido fraude ou simulação (PRADO, Flávio Augusto Dumont. O planejamento tributário à luz do novo Código Civil. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães; ANDRADE, José Maria Arruda de (Coord.). Planejamento tributário. São Paulo: MP, 2007. p. 328).

6 IN YAMASHITA, Douglas. Op. cit., p. 351. Na mesma esteira temos Hugo de Brito Machado: não se pode negar ao contribuinte o direito de escolher os atos ou negócios jurídicos seja prática lhe permita não pagar menos impostos do que teria de pagar se optasse por outras formas legais de agir. Não é razoável admitir que o contribuinte, geralmente um empresário que sobrevive de lucratividade de suas atividades, seja obrigado a escolher exatamente as maneiras de agir que lhe acarretam maior ônus tributário (idem, p. 109).

7 PORTELLA, André. Garantia fundamental da liberdade em direito tributário com especial referência à norma geral anti-elisão. Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, v. 17, n. 85, p. 64, mar./abr. 2009.

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA �������������������������������������������������������������������������������������������������������������13

O único critério seguro (para distinguir a fraude da elisão) é verificar se os atos praticados pelo contribuinte, para evitar, retardar ou reduzir o pagamen-to de um tributo foram praticados antes ou depois da ocorrência do respecti-vo fato gerador: na primeira hipótese, trata-se de evasão; na segunda trata-se de fraude fiscal.8

E nada obsta que o próprio legislador conceda benefícios por meio de isenções fiscais, como foi o caso dos incentivos relativos à realização da Copa do Mundo no Brasil para empresas que contribuam com a infraestrutura e de-mais requisitos relacionados ao evento.

Já a evasão fiscal9 se trata de um ato ilícito, deliberado com o fim único de não pagar tributo devido.

Novamente, Sacha Navarro Coelho:

Tanto na evasão comissiva ilícita quanto na elisão fiscal existe uma ação do contribuinte, intencional, com o objetivo de não pagar ou pagar tributo a menor. As diferencia: a) a natureza dos meios empregados. Na evasão ilícita os meios são sempre ilícitos (haverá fraude ou simulação de fato, documen-to ou ato jurídico. Quando mais de um agente participar haverá conluio). Na elisão, os meios são sempre lícitos porque não vedados pelo legislador; b) também, o momento da utilização desses meios. Na evasão ilícita a distor-ção da realidade ocorre no momento em que ocorre o fato jurígeno-tributário (fato gerador) ou após a sua ocorrência. Na elisão, a utilização dos meios ocorre antes da realização do fato jurígeno-tributário, ou como aventa Sam-paio Dória, antes que se exteriorize a hipótese de incidência tributária, pois, opcionalmente, o negócio revestirá a forma jurídica alternativa não descrita na lei como pressuposto de incidência ou pelo menos revestirá a forma me-nos onerosa.10

Narciso Amorós: A elisão para nós é não entrar na relação fiscal. A eva-são é sair dela. Exige, portanto, estar dentro, haver estado ou podido estar em algum momento11.

8 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. 3. ed. Rio, 1960. p. 113.

9 Evasão. Na tecnologia do Direito Tributário, quer o vocábulo significar a fuga ou subtração do contribuinte ao pagamento do imposto, que lhe é atribuído, usando para isso de meios que evitem a incidência tributária a seu cargo. A evasão pode ser legítima ou ilegítima. É legítima, quando a pessoa procura evitar o encargo tributário, não praticando o ato que obrigaria ao pagamento do imposto. E assim se subtrai a ele, colocando-se fora da situação e das condições em que a lei o compeliria à obrigação de prestá-lo. É ilegítima, quando a pessoa emprega ou se utiliza de processo ou meios ilícitos ou irregulares, defesos em lei, para fugir ao pagamento dos impostos devidos. A evasão ilegítima objetiva-se no contrabando ou na sonegação. Entende-se evasão criminosa, que leva o faltoso não somente a cumprir o pagamento da contribuição com as multas fiscais, como, em certos casos, a ser levado à punição penal, desde que, além da ilegitimidade de seu ato, mostre-se ele revestido de dolo ou falsidade (SILVA, De Plácido e. Op. cit., p. 572).

10 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria da evasão e da elisão em matéria tributária. Planejamento Fiscal – Teoria e Prática. São Paulo: Dialética, 1998. p. 74.

11 AMORÓS, Narciso. La Elusion y la evasion tributaria. Rev. de Derecho Financiero y de Hacienda Pública, v. 15, p. 573/84, 1965.

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Fabiana Del Padre Tomé aponta as diferenças entre elisão e evasão fiscal:

O critério distintivo entre “elisão” e “evasão fiscal” deve consistir em elemen-to jurídico, atinente à licitude ou ilicitude nos atos praticados com escopo de redução da carga tributária. Se lícitas as práticas, estaremos diante de verdadeiro planejamento tributário; se ilícitas, teremos configurada a evasão fiscal, com possibilidade de desconsiderarem-se os negócios praticados e consequente exigência do tributo que deixou de ser recolhido e seus con-sectários. Nessa segunda hipótese (evasão), tem-se afronta a normas jurídicas tributárias, mediante a prática de atos simulatórios.12

Assim, depois de conceituada a elisão fiscal, iremos adentrar na necessi-dade de controle por parte do Fisco a fim de combater os crimes contra a ordem tributária.

3 A NECESSIDADE DE CONTROLEO Fisco e o contribuinte sempre conviveram em uma relação de descon-

fiança. O primeiro, por considerar a hipótese de desvio de renda e criar meca-nismos de investigação para todo e qualquer contribuinte a fim de descobrir eventuais desvios. E o segundo, que, não em sua maioria, inconformado com a quantidade de imposto a ser pago, cria subterfúgios para minorar artificialmente este imposto.

Com isso, o ordenamento jurídico nacional, por meio da figura do legis-lador, desenvolveu um conjunto normativo com o escopo de coibir e sancionar o contribuinte que desviar, omitir ou sonegar seus rendimentos.

Importante notar que nem a Secretaria da Receita Federal do Brasil dei-xou de fiscalizar, nem o contribuinte deixou de omitir. O problema é que os mecanismos de controle eram escassos e, por conseguinte, a punição não re-primia a conduta, porque o evento danoso não fora descoberto. Assim, com o advento da lei dos crimes contra a ordem tributária, houve um efetivo desenvol-vimento no sentido de coibir os métodos criativos e inventivos do contribuinte brasileiro em ludibriar o Fisco nacional.

E a finalidade precípua do controle fiscal é aflorar os rendimentos es-cusos, omitidos os desviados para que sejam contabilizados e o concernente imposto seja recolhido. Prova cabal de que o interesse primeiro é o financeiro reside no fato de que, apesar de a Lei nº 8.137/1990 prever pena, logo, deter-mina ser crime quem pratica alguma das condutas descritas nos arts. 1º e 2º. Porém, o pagamento da multa elide o crime, ou seja, recolhendo o imposto devido acrescido dos juros legais e da multa, o crime deixa de existir.

12 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Planejamento tributário é direito de todos. Revista Conjur. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-jan-28/fabiana-del-padre-tome-planejamento-tributario-direito-todos>. Acesso em: 2 fev. 2014.

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No entanto, um dos problemas mais comuns enfrentados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil era identificar a fraude para, assim, aplicar a pena-lidade e encaminhar o Auto de Infração para o Ministério Público, com o intuito de que este instaure a ação concernente.

Por muitos anos, a Secretaria da Receita Federal do Brasil padeceu com a perda de arrecadação fiscal em decorrência de uma série de artimanhas e estratagemas dos contribuintes, não apenas na omissão de rendimentos, como na dedução ilegal de despesas médicas, o não recolhimento de imposto por decorrência de lucro imobiliário, etc.

4 A VIRADA FISCALIZATÓRIA: A TECNOLOGIAO marco para a virada paradigmática em termos de fiscalização se ini-

ciou com a união entre a Secretaria da Receita Federal do Brasil e a informática. Logo, tratamos de uma evolução recente, que teve como desenvolvimento fun-damental o final do século XX e o começo do século XXI.

Com o avanço da tecnologia e, principalmente, com o desenvolvimento da Internet e a criação de programas a serem usados no computador, propiciou--se o armazenamento de informações em um banco de dados, as quais seriam de elevado valor para as pretensões futuras do Fisco.

Por meio da tecnologia, o acúmulo de papéis e dados físicos acerca de cada contribuinte simplesmente deixou de existir, pois tudo passou a ser digi-talizado. E, assim, um horizonte inexplorado de possibilidades se desenvolveu para o Fisco nacional. E os anos de problemas em descobrir as fraudes começa-vam a ser reduzidos. Contudo, ainda faltava algo importante: o que fazer com as informações acumuladas?

Afinal, agora, com um direcionamento criado pelos programadores de softwares específicos, o sonho dourado da fiscalização se materializava: a pos-sibilidade de se montar um perfil de cada contribuinte.

E, além disso, propiciava-se igualmente neste acúmulo de dados a cria-ção de um padrão de consumo, de despesas e de renda por parte dos con-tribuintes, sendo possível identificar qualquer curva diferenciada tanto para o acúmulo quanto para a perda. O resultado é que a omissão ou uma eventual fraude era localizada em muito menos tempo.

5 O CRUZAMENTO DAS INFORMAÇÕESAinda sobre essa formação do perfil do contribuinte existiam lacunas

insanáveis por parte da Secretaria da Receita Federal do Brasil, pois não era possível saber quem pagava para quem e, muito menos, o valor pago.

Além disso, os valores gastos por meio das despesas declaradas não eram tão fáceis de checar; logo, as fraudes ainda circulavam em alta escala.

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Com isso, os programadores desenvolveram uma arma valorosa contra os sonegadores: o cruzamento das informações. A outrora “caixa de pandora” a qual estava inserida o contribuinte começou a se abrir.

Assim, a obrigatoriedade da inserção do CPF e do CNPJ nas despesas e nos pagamentos propiciou ao banco de dados da Secretaria da Receita Federal do Brasil cruzar as informações, ou seja, comparar se os valores declarados como pagos também foram declarados como recebidos e, assim, localizar os desvios.

O resultado foi uma série de procedimentos fiscalizatórios que culmina-ram com o deslinde de receitas escusas, as quais eram ignoradas por não terem retenção na fonte.

E o contribuinte que, outrora estava acostumado a omitir informações em busca de um menor recolhimento de imposto, se viu em apuros com a chegada nada amistosa dos autos de infração.

O cruzamento de informações possibilita a descoberta simples de uma omissão de rendimento de uma fonte pagadora, sem a menor necessidade de intimação de alguma das partes, pois o pagamento de Erário por pessoa jurídica obriga o preenchimento de DIRF. Logo, basta a Receita cruzar o pagamento com o recebimento do contribuinte: se os valores não colidirem ou forem omi-tidos, a sonegação estará comprovada.

De um lado, quem paga e o valor, e, de outro, quem recebe e o valor. Essa combinação de valores deve ser exata. Então, ao omitir essa renda, o con-tribuinte força a receita a apenas cobrar o que a fonte pagadora já havia infor-mado, sem nenhum tipo de trabalho investigativo.

6 OS NOVOS MECANISMOS DE CONTROLE: CPMF, DECRED, DIMOB, DEMED

A informática aliou o poder fiscalizatório com o incremento da arreca-dação por parte do Estado. Porém, o Poder Executivo ainda não se mostrava plenamente satisfeito ante a esse novo universo arrecadatório.

O resultado foi o desenvolvimento de novos mecanismos cibernéticos que propiciaram um fechamento ainda maior ao cerco contra os sonegadores e contribuintes que se julgavam, até então, acima da lei.

Em uma nova investida tecnológica, a Secretaria da Receita Federal do Brasil uniu o cruzamento de informações já apresentado com novos mecanis-mos de controle impulsionados por força normativa.

Desta feita podemos notar que o perfil do contribuinte ganhou ainda mais contornos com a criação de uma contribuição que, inicialmente, tinha escopo de arrecadar fundos para a saúde, mas que, de concreto, serviu como forma arrecadatória e de controle fiscal.

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A CPMF, ou Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmis-são de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira, propiciou a verificação, até então inimaginável, de todas as entradas e saídas financeiras na conta de cada contribuinte.

O resultado é a percepção da renda bruta dos contribuintes, um cená-rio inédito em termos fiscais. Contudo, o problema era o próprio ordenamento jurídico, pois não havia legalidade ou permissibilidade normativa por parte do Fisco em violar a intimidade e o sigilo bancário de nenhum contribuinte para fins fiscais, sob pena de infringir o art. 5º, X e XII, da Constituição Federal.

Então, coube ao Poder Executivo desenvolver um mecanismo normativo de controle. E, assim, nasceu a Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001. Ela estabelece a quebra do sigilo bancário para o controle da movimen-tação financeira, como institui o art. 2º:

Art. 2 O dever de sigilo é extensivo ao Banco Central do Brasil, em relação às operações que realizar e às informações que obtiver no exercício de suas atribuições.

§ 1º O sigilo, inclusive quanto a contas de depósitos, aplicações e investi-mentos mantidos em instituições financeiras, não pode ser oposto ao Banco Central do Brasil:

I – no desempenho de suas funções de fiscalização, compreendendo a apu-ração, a qualquer tempo, de ilícitos praticados por controladores, administra-dores, membros de conselhos estatutários, gerentes, mandatários e prepostos de instituições financeiras;

[...].

De início, a quebra de sigilo somente poderia ser feita se autorizada pelo Judiciário, porém, como foi pouco respeitada, a questão suscitou o parecer e julgamento em instâncias superiores, e, por conseguinte, o poder de quebra de sigilo foi minorado e restringido.

Ademais, com a extinção da CPMF como fonte arrecadatória, a Secreta-ria da Receita Federal do Brasil, inicialmente, poderia ter voltado aos tempos sombrios da ignorância das informações. Contudo, em uma rápida contramedi-da, instituiu uma nova forma de controle e acesso às informações sigilosas dos contribuintes.

E como se processa essa verificação na prática? Apesar de ser necessário um procedimento judicial para a autorização da quebra do sigilo bancário, em geral, a Secretaria da Receita Federal do Brasil usa do controle interno a fim de monitorar o controle dos gastos, em especial com os cartões de crédito.

Por meio da Instrução Normativa nº 341, de 15 de julho de 2003, a Se-cretaria da Receita Federal do Brasil instituiu o art. 3º:

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Art. 3º As administradoras de cartões de crédito poderão desconsiderar as informações em que o montante global movimentado no mês seja inferior aos seguintes limites:

I – para pessoas físicas, R$ 5.000,00 (cinco mil reais);

II – para pessoas jurídicas, R$ 10.000,00 (dez mil reais).

A fiscalização do cartão de crédito começou em 2004. Daquele ano em diante, as administradoras de cartão têm de apresentar, duas vezes por ano, a Declaração de Operações com Cartão de Crédito (Decred) para a Receita Fede-ral, em conformidade com o art. 2º da Instrução Normativa:

Art. 2º As administradoras de cartão de crédito prestarão, por intermédio da Decred, informações sobre as operações efetuadas com cartão de crédito, compreendendo a identificação dos usuários de seus serviços e os montantes globais mensalmente movimentados.

§ 1º A identificação mencionada no caput será efetuada, em relação aos titulares dos cartões de crédito e aos estabelecimentos credenciados, pelo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ).

Assim, são enviadas, automaticamente, informações sobre pessoas físi-cas, com gastos mensais superiores a cinco mil reais, e com relação a empresas com movimentações acima de dez mil reais por mês. Esses limites são estabele-cidos com base nos titulares dos cartões (identificados pelo CPF e CNPJ), e não por número de cartões ativos.

Então, se um contribuinte possui três cartões da mesma bandeira, por exemplo, VISA, Master Card etc., o valor considerado é a soma dessa bandeira, ou seja, R$ 5.000,00 divididos por três bandeiras.

Mesmo que, em teoria, a Secretaria da Receita Federal do Brasil não quebre o sigilo fiscal de nenhum contribuinte, o que se vê na prática é o rece-bimento espontâneo das informações por meio de mecanismos acessórios de controle como a Decred.

Ainda a respeito do cruzamento de dados e o incremento nos mecanis-mos de fiscalização sobre o contribuinte, a Secretaria da Receita Federal do Brasil se preocupou com mais dois segmentos muito fraudados: os imóveis e as despesas médicas.

E, assim, como contramedidas de fiscalização, foram desenvolvidas a Dimob e a Demed.

A Instrução Normativa Receita Federal do Brasil nº 1.115, de 28 de de-zembro de 2010, instituiu a Declaração de Informações sobre Atividades Imo-biliárias (Dimob), que prevê, em seu art. 1º:

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Art. 1º A Declaração de Informações sobre Atividades Imobiliárias (Dimob) é de apresentação obrigatória para as pessoas jurídicas e equiparadas:

I – que comercializarem imóveis que houverem construído, loteado ou in-corporado para esse fim;

II – que intermediarem aquisição, alienação ou aluguel de imóveis;

III – que realizarem sublocação de imóveis;

IV – que se constituírem para construção, administração, locação ou aliena-ção de patrimônio próprio, de seus condôminos ou de seus sócios.

§ 1º As pessoas jurídicas e equiparadas de que trata o inciso I apresentarão as informações relativas a todos os imóveis comercializados, ainda que tenha havido a intermediação de terceiros.

§ 2º Nos casos de extinção, fusão, incorporação e cisão total da pessoa jurí-dica, a declaração de Situação Especial deve ser apresentada até o último dia útil do mês subsequente à ocorrência do evento.

§ 3º As pessoas jurídicas e equiparadas que não tenham realizado operações imobiliárias no ano-calendário de referência estão desobrigadas à apresen-tação da Dimob.

E para o caso de não apresentação haverá a penalidade imposta pelo do art. 4º do mesmo diploma:

Art. 4º A pessoa jurídica que deixar de apresentar a Dimob no prazo esta-belecido, ou que apresentá-la com incorreções ou omissões, sujeitar-se-á às seguintes multas:

I – R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por mês-calendário, no caso de falta de en-trega da Declaração ou de entrega após o prazo;

II – 5% (cinco por cento), não inferior a R$ 100,00 (cem reais), do valor das transações comerciais, no caso de informação omitida, inexata ou incom-pleta.

A Dimob foi desenvolvida como forma de controle para as operações imobiliárias que eram transacionadas por um valor abaixo do efetivamente pago/recebido para elidir o recolhimento do imposto concernente em virtude de lucro imobiliário.

Ademais, o mesmo programa obriga o contribuinte a declarar os aluguéis de imóveis que tenham administração de uma imobiliária ou similar. Logo, to-dos os rendimentos advindos de aluguel passaram a ser fiscalizados e as infor-mações, agora, são cruzadas formando mais um item no perfil do contribuinte.

O resultado é que imóveis com escritura transmitida por valor inferior ao real ou aluguel omitido são alvo constante da Secretaria da Receita Federal do Brasil e sua omissão, de acordo com a Dimob, implica em Auto de Infração.

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E o controle fiscal já sabe das informações no dia subsequente ao devido para o recolhimento do ganho de capital (último dia útil do mês subsequente à transação). A imobiliária, por sua vez, não assumirá nenhum tipo de omissão ou risco em decorrência da elevada multa implícita no processo.

Por fim, temos a Declaração de Serviços Médicos (Demed), instituída por meio da Instrução Normativa nº 985, de 22.12.2009, como instrumento de controle do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas – IRPF, especialmente no tocante à dedução de despesas médicas. E, assim, determina, pelo art. 3º, o que são serviços médicos:

Art. 3º Os serviços prestados por psicólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocu-pacionais, fonoaudiólogos, dentistas, hospitais, laboratórios, serviços radio-lógicos, serviços de próteses ortopédicas e dentárias, e clínicas médicas de qualquer especialidade, bem como os prestados por estabelecimento geriá-trico classificado como hospital pelo Ministério da Saúde e por entidades de ensino destinados à instrução de deficiente físico ou mental são considerados serviços de saúde para fins desta Instrução Normativa.

Assim como na Dimob, existe uma penalidade para a não prestação das informações, na mesma monta ali estipulada (R$ 5.000,00 por omissão), disci-plinada por meio do art. 6º da Instrução. O objetivo é controlar e fiscalizar as omissões na prestação de serviços médicos, bem como o não fornecimento de recibo por parte do profissional prestador, como forma de verificar, via cruza-mento de informações, alguma dedução indevida por parte do contribuinte.

7 A INTENSIFICAÇÃO DO CONTROLENão obstante todos os mecanismos já apresentados, a Secretaria da Re-

ceita Federal do Brasil, a cada dia, desenvolve um novo instrumento a fim de controlar, fiscalizar e verificar a movimentação financeira do contribuinte e comparar com sua arrecadação fiscal.

O objetivo é único: arrecadar. O contribuinte sente o impacto destas medidas diretamente no bolso e se vê cada vez mais acuado ante os aparatos tecnológicos que municiam o auditor fiscal.

E não se engane que os anseios fiscais estão saneados, pois, recentemen-te, em convênio com o Governo e a Prefeitura de São Paulo, a Secretaria da Receita Federal Estadual articulou uma forma de aprimorar, ainda mais, o seu já bem atualizado banco de dados acerca dos contribuintes, com a criação da nota fiscal paulista e da nota fiscal paulistana.

Inicialmente, aos olhos do leigo, um desconto ou um abatimento para pagamento de impostos municipais ou estaduais, porém, na prática, o contri-buinte informa para a Secretaria da Receita Federal o seu perfil de gastos, algo que a instituição ainda não tinha acesso.

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Para os que possuem todos os seus rendimentos registrados e contabili-zados, trata-se de um excelente negócio. Porém, para os profissionais liberais, será mais uma forma de cruzamento de informações a ser comparado com a renda declarada.

A sede fiscal parece não ter fim e, somada aos avanços tecnológicos e a um banco de dados extenso e basicamente sem limites, a Receita Federal do Brasil aumentou exponencialmente sua arrecadação nos últimos anos.

E este aumento não se deve à boa vontade do contribuinte em legalizar sua situação fiscal ou à prestação de uma correta cidadania, mas sim à melhoria essencial dos instrumentos de controle e fiscalização por parte do órgão fiscal.

8 A ARMADILHA FISCAL E A CONTRAMEDIDA PARA O CONTRIBUINTE

Diante de tudo o que foi exposto, o contribuinte pode ter a ideia de que não existe mais nenhum tipo de escapatória ante ao forte aparato imposto pela Secretaria da Receita Federal, e que, em verdade, o contribuinte está muito mais vigiado do que imagina.

Porém, esse cenário pessimista somente se confirma em uma única e ex-clusiva situação: se o próprio contribuinte se deixar levar pela armadilha fiscal criada pela cibernética e aplicada pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Note-se que não estamos incentivando, sobremaneira, a sonegação, a omissão ou qualquer tipo de fraude. Todavia, cabe ao contribuinte saber que essa formação de perfil depende, e muito, dele próprio. Afinal, somente o sigilo é invadido se o próprio contribuinte ultrapassa o valor estipulado para gastos com cartão de crédito.

Da mesma maneira se prestam as informações de suas despesas por meio da nota fiscal paulista e paulistana. Logo, o sistema fiscalizatório não é assim tão eficaz se o próprio contribuinte não o alimentar.

Não podemos perder de vista que mesmo as máquinas funcionam com um sistema binário, no qual não existe espaço para nada além de sim ou não. Então, se o contribuinte não contribuiu negativamente para a própria formação de seu perfil, o controle binário não poderá demonstrar qualquer tipo de incoe-rência ou inconsistência que enseje uma maior fiscalização.

O contribuinte está acuado; porém, a verdade é que o cerco reduziu seu campo de ação, contudo, se não existe o que esconder ou se não for feita prova contra si, não há o que temer ou se preocupar.

Faz parte do cenário da Secretaria da Receita Federal do Brasil criar uma atmosfera de terror como forma de pressionar o contribuinte para pagar todo o devido. E os meios escolhidos ficam a critério da entidade, porém, ao contri-buinte resta a alternativa mais bela de todas: A Carta Fundamental.

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Ninguém, nem mesmo a Secretaria da Receita Federal do Brasil, pode quebrar o sigilo indevidamente (art. 5º, X e XII, da Constituição Federal), e nin-guém está obrigado a fazer nada em virtude de Lei (art. 5º, II, da Constitui-ção Federal), e, por fim, tampouco, cabe ao contribuinte fazer prova contra si (art. 5º, LVII, da Constituição Federal). Sendo assim, a legalidade caminha pari passu com o contribuinte, que este, então, não se assuste ante o anteparo fiscal, pois o devido processo legal ainda vigora neste País. A menos, é claro, que o próprio contribuinte forneça, espontaneamente, as informações ao Fisco.

CONCLUSÃOA Secretaria da Receita Federal do Brasil foi uma das grandes benefi-

ciadas com os avanços da tecnologia. Se o computador foi uma invenção que auxilia em demasia as pessoas do século XXI, a Receita Federal do Brasil encon-trou nesta ferramenta algo que não conseguia efetuar com a mesma excelência antes do processamento de dados: o armazenamento de informações com o cruzamento automático destas.

Antes uma verificação ou um processo fiscalizatório levava tempo de-mais e tinha elevadas chances de resultar infrutífero. Agora, com o poder de um clique, o auditor seleciona os parâmetros fiscalizatórios e já encontra os resultados almejados em pouco tempo.

O resultado é que o espaço para sonegações, omissões ou fraudes foi reduzido exponencialmente com a aliança do controle fiscal com a moderni-dade da cibernética, e, para aqueles que ainda consideram o Fisco falível, tem experimentado a força de um auto de infração e o seu peso financeiro.

De sorte que a omissão, sonegação ou fraude passou em um punhado de anos de frequente para rara: um alerta considerável para o contribuinte, em especial para aqueles que ainda se iludem que o Poder Executivo desenvolve benefícios fiscais para a população sem nenhum tipo de ônus.

Sempre existe um objetivo e este sempre foi claro: arrecadar. E cada vez mais e mais... Resta saber se haverá limite para a fiscalização, pois, para a ciber-nética, os limites ainda são desconhecidos ante a simplicidade das ferramentas desenvolvidas para a Secretaria da Receita Federal do Brasil.

O limite nos parece ser o próprio contribuinte, cada vez mais controlado, fiscalizado e sancionado. Nesta relação nada cordial, o controle fiscal manifesta cada vez mais o domínio das relações. Eis a consequência direta da modernida-de. O que não significa que operações lícitas como o planejamento tributário, em especial a elisão fiscal, deixem de existir, pois, se existe uma brecha nor-mativa, cabe ao contribuinte aproveitar da não previsão legal em seu benefício.

Se o contribuinte desejar equilibrar esta relação, a resposta imediata será prestar menos informações espontâneas e deixar que a própria Secretaria da Re-

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ceita Federal do Brasil busque o seu perfil, pois, da forma como está, o trabalho fiscal está cada vez mais facilitado.

REFERÊNCIASAMORÓS, Narciso. La Elusion y la evasion tributaria. Rev. de Derecho Financiero y de Hacienda Pública, v. 15, p. 573/84, 1965.

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria da evasão e da elisão em matéria tribu-tária. Planejamento Fiscal – Teoria e Prática. São Paulo: Dialética, 1998.

PIMENTEL, Manoel Pedro. Introdução ao estudo do direito penal tributário. Ciên-cia Penal, São Paulo, n. 2, p. 37-59, 1974.

PORTELLA, André. Garantia fundamental da liberdade em direito tributário com especial referência à norma geral anti-elisão. Revista Tributária e de Finanças Pú-blicas, São Paulo, v. 17, n. 85, mar./abr. 2009.

PRADO, Flávio Augusto Dumont. O planejamento tributário à luz do novo Código Civil. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães; ANDRADE, José Maria Arruda de (Coord.). Planejamento tributário. São Paulo: MP, 2007.

RODRIGUES, Anabela Maria Pinto de Miranda. Contributo para a fundamentação de um discurso punitivo em matéria penal fiscal. In: Direito penal econômico e eu-ropeu – Textos doutrinários: problemas especiais, Coimbra: Coimbra, v. II, 1999.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Atualizado por Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 28. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

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YAMASHITA, Douglas (Coord.). Planejamento tributário à luz da jurisprudência. São Paulo: Lex, 2007.

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Assunto Especial – Doutrina

Elisão Fiscal

Elisão Fiscal: o Parágrafo Único do Artigo 116 do CTN e o Propósito Negocial na Desconsideração de Atos e Negócios Jurídicos

NORMA ANTÔNIA GAVILÃN TONELLATTIGraduada em Direito pela PUC/PR, Especialista em Direito Tributário pelo IBET, Especialista em Direito Empresarial pela PUC/PR, Graduanda em Ciências Contábeis, Advogada tributarista no Minatel Advogados.

RESUMO: Com o advento da alteração do parágrafo único do art. 116 do Código Tributário Nacional pela Lei Complementar nº 104, de 2001, a discussão fundou-se no alcance e na constitucionalidade de sua pretensão. O recorte metodológico está na análise do enunciado “dissimulação”, uma vez que é este ato que fundamenta a desconsideração dos negócios jurídicos pela Administração Pública. Verificar-se-á os limites de aplicação da desconsideração no campo do direito empresarial e os crité-rios empregados pela Administração Pública diante do propósito negocial.

PALAVRAS-CHAVE: Elisão fiscal; dissimulação; propósito negocial.

ABSTRACT: With the advent of the single amendment to Article 116 of the tax code by Complemen-tary Law 104, paragraph 2001 the discussion was based on the scope and constitutionality of his claim. The methodological approach is the analysis of the sentence “dissimulation”, since it is this act that justifies the disregard of legal business by the Public Administration. The application limits of disregard in the field of corporate law and the criteria employed by the public authorities on the business purpose will be checked.

KEYWORDS: Tax avoidance; dissimulation; business purpose.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Breve elucidação conceitual de elisão fiscal; 1.1 Diferenças e caracterís-ticas de elisão, elusão e evasão fiscal; 2 Inclusão do parágrafo único do artigo 116 do CTN pela Lei Complementar nº 104/2001; 2.1 Conceito de direito privado: dissimulação; 3 Limites de aplicação no âmbito empresarial da desconsideração de ato ou negócio jurídico; 3.1 O propósito negocial como fundamento da desconsideração dos atos ou negócios jurídicos; Considerações finais; Referências.

INTRODUÇÃOO Sistema Tributário Brasileiro é tido como um dos mais complexos

atualmente. Na Constituição Federal é possível encontrar as diretrizes e os pres-supostos que delimitam o poder de tributar – competência – e o dever funda-mental de pagar tributos.

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O dever fundamental de pagar tributos é principado no dever solidário de pagar tributos, sendo destinado a assegurar o exercício dos direitos individuais e sociais. Contudo, a carga tributária que se vivencia é extremamente onerosa à economia. Nesse diapasão, a carga tributária brasileira tornou-se a grande vilã principalmente no mundo empresarial, que busca estruturas na abreviação dos tributos a serem recolhidos, ou seja, aplica o planejamento tributário ou tam-bém chamado de elisão fiscal.

Com a introdução do art. 116 do Código Tributário Nacional, houve, e ainda há, discussões acerca do seu alcance e da própria constitucionalidade da inovação elencada. O grande cerne da questão consiste na possibilidade de a Administração Pública desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular o fator tributário. Ocorre que, como veremos, é necessário, a princípio, analisar, doutrinariamente, o sentido da palavra “dissi-mular”.

Far-se-á um corte metodológico no desenvolvimento deste trabalho, o qual apresentará as limitações impostas para a desconsideração do ato ou ne-gócio jurídico pelo Fisco com o intuito de caracterização da dissimulação, bem como a utilização da ausência de propósito negocial como fundamento daque-la desconsideração.

Assim, o presente artigo tem por escopo demonstrar algumas nuances conceituais que vagam no domínio do direito tributário e empresarial no que tange ao estudo do chamado planejamento tributário.

1 BREVE ELUCIDAÇÃO CONCEITUAL DE ELISÃO FISCALA elisão tributária é uma forma lícita de o contribuinte reduzir a carga

tributária incidente nos negócios jurídicos realizados por ele. Dessa forma, uti-liza lacunas ou imperfeições nas legislações tributárias como fundamento do chamado planejamento tributário.

É possível ressaltar que a elisão fiscal ocorre em momento anterior à realização in concreto da hipótese tributária. A obrigação de pagar tributo é ex lege, tendo em vista que o crédito do Erário somente surge com a ocorrência da hipótese de incidência e, nesse sentido, a elisão impede que o Fisco torne-se credor de uma relação jurídica.

Para melhores esclarecimentos do que venha a ser elisão fiscal pode-se citar o exemplo de advogados que, ao invés de recolherem imposto de renda como autônomos, constituem uma sociedade e pagam imposto de renda, es-pantosamente menor, pela sociedade.

Nesse sentido, a elisão fiscal ou planejamento tributário válido é aquele que visa à economia de tributos de forma legalmente facultada aos contribuin-tes, isto é, inexiste comando de lei que vede um proveito econômico-financeiro da empresa.

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1.1 diferenças e características de elisão, elusão e evasão fiscal

A conceituação ora adotada dos termos elisão, elusão e evasão visam permitir uma diferenciação e caracterização dos atos lícitos ou ilícitos do con-tribuinte.

Primeiramente, como dito no item mencionado, a elisão fiscal é tida como ato lícito – em conformidade com a legislação tributária – para mitigar a carga tributária. Trata-se de procedimento válido perante o Fisco e que busca melhores soluções econômicas e jurídicas1.

A elusão fiscal2 encontra-se entre a elisão e a evasão, pois é uma forma de contorno da norma tributária, realizada anteriormente à ocorrência da hipó-tese de incidência, porém por meios artificiosos praticados com o fim prepon-derante de redução indevida de tributos, violando-se, desta forma, a teleologia da norma e os princípios constitucionais tributários, tais como isonomia, capa-cidade contributiva e justiça fiscal.

Um exemplo claro de elusão fiscal é a incorporação às avessas em que duas sociedades empresárias distintas, uma deficitária e outra lucrativa, cele-bram uma reestruturação societária em que a detentora dos prejuízos incorpora a empresa superavitária. A vantagem nesse ato de concentração está no abati-mento dos prejuízos da empresa deficitária pelos lucros da empresa superavi-tária.

Pode-se observar que os atos ilícitos praticados com o fim de burlar a incidência da norma tributária e esquivar-se do pagamento de tributos carac-terizam-se pela evasão fiscal. Sobre tais atos, há previsão legal que mune a Administração Pública de medidas para combatê-los: por tais meios, a omissão sobre a real situação financeira do contribuinte; falta de pagamento de tributos; contratação de notas fiscais.

Vale salientar o pensamento de Rubens Gomes de Sousa3 acerca da eli-são e evasão fiscal, pois representa um marco no direito tributário nacional. O jurista supracitado explica seu posicionamento em parecer, no qual analisa sobre o Imposto de Renda e expõe que o elemento essencial a ser adotado

1 Marco Aurélio Greco destaca dois assuntos importantes no aspecto jurídico: o da isonomia e o da concorrência. Nesse sentido, a extrafiscalidade do tributo não pode ser considerada como mecanismo de desigualar situações, muito menos elemento de diferenciação entre contribuintes (Planejamento tributário. São Paulo: Dialética, 2004. p 13-14).

2 A elusão fiscal é uma expressão utilizada por Heleno Torres, porém não é toda a doutrina brasileira e o CARF que reconhecem esse instituto. O jurista conceitua a elusão fiscal como sendo ações pelas quais o contribuinte, por meio de atos lícitos, mas desprovidos de razão (fraude a lei), provoca a não subsunção dos atos ou negócios jurídicos à norma (Direito tributário e direito privado: autonomia privada, simulação, elusão tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 189 e 190).

3 SOUSA, Rubens Gomes de. Parecer 3 – Imposto de renda. Edição póstuma. São Paulo: Resenha Tributária, 1976. Apud PEREIRA, César A. Guimarães. Elisão tributária e função administrativa. São Paulo: Dialética, 2001. p. 60.

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pelo intérprete para classificar a conduta como elisiva ou evasiva repousa no momento da ocorrência da hipótese de incidência: se antes, a conduta é elisiva; se posterior, há de ser considerada como evasiva. Nesse ponto, o doutrinador elucida que, mesmo sendo a conduta lícita, se praticada posteriormente à ocor-rência da hipótese, será considerada evasão.

Nesse sentido, conclui-se, por ora, que, enquanto a elisão é revestida de legalidade, a elusão se trata de atos ou negócios jurídicos que, embora não descumpram frontalmente a legislação tributária, são praticados mediante a uti-lização de meios artificiosos e, na evasão, as práticas são, evidentemente, vio-ladoras do sistema tributário. Porém, em verdade, a definição de cada instituto ora apresentado depende da postura de cada intérprete perante o planejamento tributário, pois alguns doutrinadores defendem a ideia de que há conduta frau-dulenta quando realizadas com o fim simples de evitar o pagamento de tributos.

2 inclusão do parágrafo único do artigo 116 do ctn pela lei complementar nº 104/2001Em 10 de janeiro de 2001 foi publicada a Lei Complementar nº 104

(norma antielisiva), a qual introduziu diversas alterações no Código Tributário Nacional. Desde sua publicação, as alterações têm gerado polêmicas entre os intérpretes do direito tributário, em principal, ao acréscimo do parágrafo único do art. 116 do Diploma citado. O presente artigo ficou assim disposto:

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:

I – tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normal-mente lhe são próprios;

II – tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja defini-tivamente constituída, nos termos de direito aplicável.

Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obri-gação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (Parágrafo incluído pela LCP 104, de 10.01.2001)

Em síntese, com o acréscimo em questão, criou-se uma autorização para a autoridade administrativa. Ocorre que nos exames dos intérpretes do Direito Tributário, até então publicados, não há uma posição unânime sobre a consti-tucionalidade e o alcance da regra contido no parágrafo único do art. 116 do CTN.

A doutrina nacional divide-se em quatro posicionamentos acerca do tema, sendo: (a) inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 116 do CTN, uma vez que não coaduna com os princípios da tipicidade fechada e da legali-

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dade4; (b) inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 116 do CTN, tendo em vista que inseriu a interpretação econômica no direito tributário, e a Consti-tuição Federal de 1988 consagra a segurança jurídica5; (c) o parágrafo único do art. 116 do CTN não trouxe inovação ao ordenamento jurídico, somente uma prerrogativa já inerente ao art. 149, VII, do Código Tributário Nacional6; (d) nor-ma favorável de combate à evasão fiscal, mas desde que observados os limites constitucionais do poder de tributar e as garantias dos contribuintes7.

O cerne da questão está na constitucionalidade e no alcance do dispo-sitivo inserido pela Lei Complementar nº 104/2001. Observa-se que o poder conferido à Administração Pública deverá ser exercido na observância dos pre-ceitos constitucionais.

Com a inclusão do parágrafo único pela Lei Complementar nº 104/2001, investiu-se na interpretação econômica dentro do direito tributário. A interpre-tação econômica pode ser entendida como uma forma do exercício da compe-tência administrativa de efetivar o lançamento tributário nas hipóteses de con-cretização de que o negócio realizado pelo contribuinte estava acobertado por forma jurídica inválida.

É cediço que a desconsideração do ato ou negócio jurídico deve ser pau-tada nos estritos termos da lei, sob pena de olvidar os primados legais da tipici-dade fechada, estrita legalidade e reserva formal – princípios cogentes a serem observados pelo Fisco8.

4 XAVIER, Alberto. Tipicidade da tributação, simulação e norma antielisiva. São Paulo: Dialética, 2001. p. 19.

5 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Norma antielisão é incompatível com o sistema constitucional brasileiro. In: O Planejamento Tributário e a Lei Complementar 104. ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). São Paulo: Dialética, 2001. p. 117-128.

6 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 272.

7 TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário. Os Direitos humanos e a tributação: imunidades e isonomia. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 97.

8 Referência se faz à Medida Provisória nº 66/2002, que obteve rejeição dos arts. 13 e 14 sobre o tema em questão, e que dispunham: “Art. 13. Os atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência de fato gerador de tributo ou a natureza dos elementos constitutivos de obrigação tributária serão desconsiderados, para fins tributários, pela autoridade administrativa competente, observados os procedimentos estabelecidos nos arts. 14 a 19 subsequentes. Parágrafo único. O disposto neste artigo não inclui atos e negócios jurídicos em que se verificar a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. Art. 14. São passíveis de desconsideração os atos ou negócios jurídicos que visem a reduzir o valor de tributo, a evitar ou a postergar o seu pagamento ou a ocultar os verdadeiros aspectos do fato gerador ou a real natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária. § 1º Para a desconsideração de ato ou negócio jurídico dever-se-á levar em conta, entre outras, a ocorrência de: I – falta de propósito negocial; ou II – abuso de forma. § 2º Considera-se indicativo de falta de propósito negocial a opção pela forma mais complexa ou mais onerosa, para os envolvidos, entre duas ou mais formas para a prática de determinado ato. § 3º Para o efeito do disposto no inciso II do § 1º, considera-se abuso de forma jurídica a prática de ato ou negócio jurídico indireto que produza o mesmo resultado econômico do ato ou negócio jurídico dissimulado”.

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2.1 conceito de direito privado: dissimulação

Ante a falta do conceito de dissimulação em nosso ordenamento legis-lativo, cabe apresentar o que venha a ser simulação para tecer um possível conceito daquele instituto.

A simulação está disciplinada no art. 167 do Código Civil, vejamos:

Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimu-lou, se válido for na substância e na forma.

§ 1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:

I – aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;

II – contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

III – os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

A simulação traduz uma inverdade do mundo real, isto é, criação de fato jurídico inexistente ou ocultação do fato querido. De acordo com Washington de Barros Monteiro9, a simulação é a “declaração enganosa da vontade, visando a produzir efeito diverso do ostensivamente indicado”.

Como se observa no art. 116, parágrafo único, do CTN, o legislador as-sim utilizou o termo “dissimulação”, porém não cuidou de conceituá-lo ou de-terminar as diretrizes a serem seguidas para aplicação do parágrafo único do art. 116 do CTN.

Como se tem observado na prática tributária, a simples prova de nulidade do negócio ou ato jurídico subverte-se na tributação sobre o sujeito a ser con-siderado passivo. É imprescindível que o ato dissimulado deva corresponder a um fato imponível ou uma hipótese de incidência tributária vinculante à corres-pondente obrigação tributária.

Por esse aspecto, a desconsideração de ato ou negócio jurídico dissimu-lado deve se enquadrar em todos os elementos da regra matriz de incidência tributária sob pena de afronta ao princípio da legalidade ditado no art. 150, I, da Constituição Federal.

Nesse sentido, a dissimulação preceituada no parágrafo único do art. 116 do CTN quer expressar os atos ou negócios jurídicos que tenham por finalidade a inexistência de uma situação, por exemplo, a efetivação de contrato de doa-ção quando na verdade ocorre um contrato, que surtirá efeitos entre as partes, de compra e venda.

9 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil – Parte geral. 31. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 207.

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3 LIMITES DE APLICAÇÃO NO ÂMBITO EMPRESARIAL DA DESCONSIDERAÇÃO DE ATO OU NEGÓCIO JURÍDICO

Dentro da aplicação do âmbito empresarial da desconsideração de ato ou negócio jurídico pela Administração Pública pode-se elencar os limites que devem ser respeitados.

A lei reveste-se de cláusulas disciplinatórias que visam coibir a prática de negócios jurídicos artificiosos, que, manipulando as formas jurídicas, tendem à economia de tributos. Ocorre que, no parágrafo único do art. 116 do CTN, a competência para desconsiderar negócio ou ato jurídico será exercida “obser-vados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária”.

Com efeito, o Código Tributário Nacional transpôs uma norma que não possui uma eficácia plena, ou seja, a plenitude da eficácia da norma lecionada no parágrafo único do art. 116 está condicionada à edição de outra lei – como dito –, uma lei ordinária.

Nesse diapasão, houve uma tentativa de regulamentar o procedimento da desconsideração dos atos ou negócios jurídicos dissimulados por meio da Medida Provisória nº 66, de 29 de agosto de 2002. Porém, no que concerne a matéria dos procedimentos da norma antielisiva, não foi convertida em lei, decaindo o prazo de vigência da MP.

A limitação por lei – determinação dos procedimentos a serem adotados pelo ente público – ainda se encontra sem regulamentação, o que deixa um obs-curo caminho nas análises dos atos e negócios praticados pelos contri buintes.

Ao passo que, nos ordenamentos fundamentados no Civil Law, os limites dos atos dos contribuintes encontram-se nos textos legais, no direito tributário é possível observar a grande influência que os tribunais, por meio das jurispru-dências, acarretam no sistema tributário, nos direitos dos contribuintes e na efetivação do dever fundamental de pagar tributos10.

A Constituição Federal postula a devida apreciação do Poder Judiciário contra ato praticado pela Administração Pública em face dos contribuintes no art. 5º, inciso XXXV. Tal apreciação posterior pelo Judiciário abarca a lógica da separação de poderes, sendo que a função jurisdicional revisa os atos das esfe-ras administrativa e executiva.

No âmbito dos planejamentos tributários analisados pela Administração houve a análise da validade do negócio jurídico com a licitude da operação

10 A expressão “dever fundamental de pagar tributos” possui alicerce no art. 3º, I, da Constituição Federal, bem como da repartição de competências. O dever fundamental de pagar tributos enfatiza o caráter solidário dos encargos, bem como da necessidade estatal de recursos para realização das diversas atividades existentes, como prestações sociais.

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de um modo geral, isto é, o negócio jurídico indireto11 era sinônimo de evasão fiscal. O simples fato de a empresa efetuar um negócio diverso era considera-do como um planejamento tributário. Essa discussão foi travada no CARF até 200312, o qual passou a analisar se os elementos do negócio jurídico típico estavam presentes no negócio, isto é, a vontade, o objeto e a forma.

Além desses elementos, o Conselho Administrativo ditou em suas deci-sões que o planejamento deve possuir compatibilidade entre o tempo dos atos e o objetivo a ser alcançado; implementação da operação realizada; aferição da legalidade do negócio conforme os padrões de mercado; e propósito negocial (que será analisado no próximo tópico).

3.1 o propósito negocial como fundamento da desconsideração dos atos ou negócios jurídicos

Após a introdução do parágrafo único do art. 116 do CTN em nosso ordenamento jurídico, houve a edição da Medida Provisória nº 66, de 29 de agosto de 2002, a qual considerou como fundamento da desconsideração do ato ou negócio jurídico a falta de propósito negocial – não sendo, essa parte, convertida em lei.

O propósito negocial, business purpose13, expressa que os atos ou negó-cios jurídicos praticados pelos contribuintes teriam de estar vinculados à ativi-dade empresarial exercida. A deficiência dessa vinculação poderia ser aplicada pela Administração Pública como fundamento para desconsiderar os negócios ou atos que ensejassem a redução ou supressão de tributos.

De acordo com a jurisprudência brasileira, a doutrina chegou a alguns critérios que evidenciam a carência de propósito negocial, como bem eluci-da Luiz Eduardo Schoueri14. Nas explanações trazidas pelo jurista, podem-se verificar três elementos, sendo: (i) elemento temporal, isto é, o planejamento é realizado em um tempo breve com assinatura de vários documentos em um único momento; (ii) independência das partes, ou seja, as operações são reali-zadas entre grupos de empresas; (iii) falta de coerência do planejamento com a atividade da empresa, ou melhor, transações que não são da rotina societária.

11 Por negócio jurídico indireto pode-se entender como aquele negócio que busca um fim diverso do comum. Nesse sentido é a definição do instituto por Alberto Xavier (op. cit., p. 59) e Marco Aurélio Greco (op. cit., p. 261).

12 Como exemplo, pode-se citar o Acórdão 101-94.127 do CARF, de 28.02.2003, cuja ementa diz: “IRPJ – INCORPORAÇÃO ATÍPICA – A incorporação de empresa superavitária por outra deficitária, embora atípica, não é vedada por lei, representando negócio jurídico indireto”.

13 O business purpose possui origem americana, sendo, primeiramente, empregado no imposto de renda e, após, nos demais tributos.

14 SCHOUERI, Luís Eduardo. O desafio do planejamento tributário. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (Coord.); FREITAS, Rodrigo de (Org.). Planejamento tributário e o “propósito negocial”. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 19.

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É cediço, pelo exposto até o presente momento, que o planejamento tributário é entendido como a busca da empresa, licitamente, pela economia de tributos. A Administração Pública defende que a economia de tributos em nada possui ligação com a atividade da empresa e, por tal modo, desconsideram o ato ou negócio jurídico realizado. O Fisco acaba por utilizar critérios subjetivos para a descaracterização do ato/negócio, ou seja, passa-se a verificar a intenção dos contribuintes e não só a legalidade dos atos.

Diante disso, o propósito negocial no direito tributário brasileiro ainda não é interpretado observando os elementos do negócio e sua finalidade jurídi-ca, tendo em vista que cada negócio se individualizada pela vontade das partes. A exteriorização da vontade abarca sua causa jurídica bem como outros moti-vos que levaram o contribuinte em realizá-la e, por conseguinte, tais motivos não abrangem o conteúdo jurídico do negócio operado15.

CONSIDERAÇÕES FINAISNa sociedade moderna vivida, altamente competitiva, as pessoas, tanto

jurídicas como físicas, organizam seus negócios e atos com o fim de aperfeiçoar os rendimentos com maior lucratividade.

No âmbito empresarial, especificadamente devido à grande carga tribu-tária, ocorre o que se chama de sobrecarregamento de exações sobre as ativi-dades exercidas pelas empresas, o que vem ocasionar, por muitas vezes, seu encerramento.

No empenho pela atenuação de custos e despesas, as pessoas buscam arcar com a menor carga tributária possível, assim, se valem de planejamentos tributários que passaram, com o decorrer do tempo, a serem confrontados pelo Fisco. A chamada elisão ou planejamento tributário foi posta como forma legal de redução da carga tributária, desde que o negócio jurídico, sem abuso de direito, não manipule o cerne da hipótese de incidência tributária.

Contudo, é importante salientar que a norma antielisiva (art. 116, pará-grafo único, do CTN) possui eficácia restringida, porquanto necessita de outra lei (ordinária) para que surta os efeitos finalísticos pretendidos. Neste sentido, as desconsiderações dos atos ou negócios jurídicos antielisivos devem ser fun-damentadas em provas factuais de compatibilização pela norma tributária dis-simulatória designada em lei específica, como determinado pelo dispositivo supracitado do CTN.

Verifica-se que a desconsideração dos atos ou negócios jurídicos com fundamento na intenção dos contribuintes afronta os pressupostos constitucio-

15 THEODORO JR., Humberto. Dos fatos jurídicos: Do negócio jurídico – Artigos 138 a 184. Livro III. In: TEIXEIRA, Sávio de. (Coord.). Comentários ao Novo Código Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. III, t. I, 2006. p. 87 e ss.

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nais fundamentais, como legalidade e tipicidade. No Direito brasileiro não há critérios em lei que prevejam a desconsideração, porém o sistema ao qual se emprega para considerar os atos ou negócios jurídicos como dissimulados e deficientes de propósito negocial tendem a um errôneo ideal de justiça.

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Assunto Especial – Parecer Jurídico

Elisão Fiscal

Elisão e Evasão Fiscal

IVES GANDRA DA SILVA MARTINSProfessor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIP, UNIFIEO, UNIFMU, do CIEE/O Estado de São Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército – ECEME, Superior de Guerra – ESG e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região, Professor Honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia), Doutor Honoris Causa das Universidades de Craiova (Romênia) e da PUC-Paraná, e Catedrático da Universidade do Minho (Portugal), Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomér-cio/SP, Fundador e Presidente Honorário do Centro de Extensão Universitária – CEU-Escola de Direito/Instituto Internacional de Ciências Sociais – IICS.

Princípio apresentando minha interpretação sobre a diferença entre eli-são e evasão.

A compreensão do problema proposto passa necessariamente pela apre-ensão fenomênica da imposição tributária.

Para mim, reside a realidade tributária na província, hoje alargada, das normas de rejeição social, em face da crescente intromissão do Estado – teo-ricamente compositor de uma sociedade organizada e dela representante pelo governo que o empalma – na vida de cada indivíduo, tornando seu campo próprio de atuação livre, cada vez mais limitado e restrito1.

A crescente regulamentação da sociedade – que torna falso um dos prin-cipais fundamentos do Direito, qual seja, o de que ninguém se exime, alegando o desconhecimento da lei, visto que na realidade atual ninguém pode alegar o conhecimento de todas as leis – tende a transformar o homem em prisioneiro de uma ordem legal, que não auxilia a criar e à qual se subordina, por interesses tidos por superiores, mesmo nos autênticos regimes democráticos.

O homem do século XXI é um prisioneiro da regulamentação crescente e sua liberdade de agir mera ficção, posto que só a poderá exercer no cipoal

1 Peter Berger, no livro The capitalist revolution, ao examinar o quadro internacional das economias em crise e daquelas em pleno crescimento, detecta realidade que merece reflexão, qual seja a de que quanto maior a presença do Estado no processo produtivo e na vida de cada cidadão tanto menor o desenvolvimento. Conclui que, apesar de suas deficiências, o sistema capitalista provocou, a partir da década de 1980, verdadeira revolução na economia mundial, com sensível redução dos impostos diretos e adequado remanejamento dos indiretos e dos tributos sociais.

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legislativo que controla sua vida, desde que dentro dos padrões permitidos pelo direito de seu país2.

Daí decorre a elevada interferência do Estado – e a essência da crise do Direito reside nesta interferência na vida do indivíduo – e, portanto, o surgi-mento em escala maior das denominadas normas de rejeição social, ou seja, daquelas normas que só são passíveis de cumprimento por receio das sanções3.

Nas normas de aceitação social, como queria Cóssio, as normas de com-portamento são primárias, visto que aquelas de caráter sancionatório só seriam aplicáveis a casos patológicos, isto é, aos descumprimentos produzidos por pes-soas descompassadas da sociedade4.

As normas de aceitação social quase sempre têm seu ancoradouro nas normas de direito natural, que, por sua inerência à natureza humana, prescin-dem de criação legislativa. Esta, quando surge, surge apenas para reconhecê--las, como é o caso do direito à vida, que o Estado pode reconhecer, mas não criar5.

O desrespeito ao direito à vida é ação que se pune com norma sanciona-tória de caráter secundário, visto que, mesmo sem sua existência, a maior parte das pessoas não se transformaria em assassina.

A crescente interferência do Estado na liberdade dos cidadãos e a camisa de força, cada vez mais complexa, que lhes impõe vai, todavia, levando-o a criar campo próprio de atuação por normas de rejeição social, aquelas que o indivíduo aceita por não ter outra alternativa, e que só cumpre em face da exis-tência de uma sanção à desobediência6.

2 Gerson Pereira dos Santos traduziu o livro de Eduardo Novoa Monreal intitulado O direito como obstáculo e transformação social (Sérgio Antonio Fabris Editor) em que o problema é admiravelmente tratado: Abre o ilustre ex-presidente do Tribunal de Justiça da Bahia o livro com o seguinte gráfico trecho: “Um novo modelo de jurista está em vias de nascer: distingue-se do modelo anterior, antes de tudo, pelo fato de que o seu propósito está no trabalho crítico sobre o Direito e, com ele, na compreensão do político e do social, também na atitude de responsabilidade visando a determinar-lhe a imagem para o porvir” (do informe apresentado pela República Federal da Alemanha e Unesco para a comunicação sobre as ciências sociais no ensino superior, cuja parte relativa ao Direito ficou a cargo de C. Eisenmann).

3 Desenvolvo, em meu livro Teoria da imposição tributária (2. ed. LTr, 1997), o perfil das normas de rejeição social.

4 Teoria egológica del derecho, Ed. Abelardo Perrot, Argentina.

5 O Caderno nº 2 de Direito Natural com estudos de Gustavo Miguez de Mello, Ives Gandra da Silva Martins, José Carlos Graça Wagner, Walter Moraes, foi dedicado ao tema “Direito à Vida” em sua visão de jusnaturalismo não racionalista (Cejup).

6 José Eduardo Faria, no estudo preparado para a Federação do Comércio de São Paulo e distribuído no dia 09.06.1988, escreve: “Se no plano constitucional o recurso à abstração conceitual lhes permitiu ganhar tempo para evitar crises e tentar reduzir as incertezas, no plano da legislação ordinária não se pode ignorar um dado óbvio: a impossibilidade de se organizar uma sociedade dividida e contraditória por meio de leis e códigos caracterizados pela ausência de lacunas e antinomias e em condições de equacionar equilibradamente os aspectos formais e materiais de todos os conflitos. Inerente a qualquer lei ou código existe, de fato, a afirmação de uma vontade política, cuja formulação não se esgota na negociação entre os partidos, mas se estende às questões contraditórias do sistema econômico e do próprio controle das diferentes instâncias do aparelho estatal.

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Nas normas de rejeição social, a norma sancionatória é necessariamente primária, pois representa a própria razão de eficácia da norma de comporta-mento. Por isso, neste particular – e só nele – a teoria kelseniana de normas primárias e secundárias é correta7.

Ao contrário das normas de aceitação social, que ao Estado cabe apenas reconhecer, nas normas de rejeição social, o Estado as cria, sendo regras que ni-tidamente refogem ao direito natural, completando a vida organizada em socie-dade, ao lado daquelas próprias e exclusivamente nascidas no direito natural8.

O crescimento do tamanho do Estado e daqueles que o representam, por meio do Governo no poder, faz da imposição tributária nítida norma de rejei-ção social, pois busca o Estado retirar do contribuinte aquilo que o contribuinte ganhou para suportar suas necessidades tidas por públicas, apesar de, em todos os espaços geográficos e períodos históricos, os interesses da comunidade e os interesses exclusivos dos detentores do poder estarem amalgamados.

Por saber que sempre paga mais do que deveria pagar, a fim de prover aquilo de que a comunidade necessita, por meio do Estado, e aquilo que os governantes almejam com o único intuito de se manterem no governo, indepen-dentemente dos interesses comunitários, é que o indivíduo é levado ao cumpri-mento das obrigações tributárias, em face de temor de uma sanção que lhe pode ser mais onerosa que o próprio tributo.

Em última análise, nem a carga tributária exigida pelo Estado Moderno é “indevida”, como pretenderam os primeiros doutrinadores modernos, nem “sublimada”, como formularam os autores do Estado do bem-estar social, mas é “desmedida” para que se atenda, simultaneamente, os interesses da comunida-de e os exclusivos interesses dos detentores do poder9.

Sob esta realidade se assenta a tendência do pagador de tributos de fugir das leis impositivas, porque as sabe estruturalmente injustas, em sua dimen-são atual. E os fenômenos da elisão fiscal e da evasão fiscal assentam-se nesta

É, esse, portanto, o momento em que estarão sendo decididas a eficácia jurídica (isto é, ‘técnica’) e a eficácia real (isto é, ‘sociológica’) da futura Constituição, uma vez que os grupos e classes sociais derrotados em suas pretensões na ‘batalha regulamentar’ poderão optar pelo descumprimento de parte da nova Constituição, sob o argumento de que ela é ilegítima” (Qual o futuro da nova constituição?, p. 5/6).

7 Teoria pura do direito, Ed. Armênio Amádio, Coimbra.

8 Johannes Messner, em sua monumental obra La ética social, política y económica a la luz del derecho natural (Espanha: Rialp), acentua as áreas de incidência, na vida social, de umas e outras, ou seja, as de direito positivo e as de direito natural.

9 O Caderno nº 4 de Pesquisas Tributárias (Resenha Tributária/CEEU, 1979), com estudos de Dejalma de Campos, Gaetano Paciello, Gaze Assem Tufaile, Hugo de Brito Machado, Ives Gandra da Silva Martins, Joaquim Luiz de Castro, José Carlos Graça Wagner, José Carlos de Souza Costa Neves, Juan Carlos Luqui, Leon F. Szklarowsky, Manuel de Juano, Roberto V. Calvo, Sacha Calmon Navarro e Ylves José de Miranda Guimarães, foi dedicado ao tema da natureza jurídica das sanções tributárias, em perspectiva semelhante ao raciocínio exposto neste trabalho.

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perspectiva de busca de meios para reduzir o tamanho crescente dessa carga desmedida.

A distinção básica entre elisão e evasão reside nos meios adotados para fugir ao peso, sempre injusto, da carga tributária no Estado Moderno, sendo tais meios legais ou ilegais, no que se conforma a elisão ou a evasão fiscal10.

No mês de maio de 1989, realizou-se em Brasília simpósio sobre o tema “elisão fiscal”, a que as autoridades legais de outros países denominavam de “sonegação legal”, sem terem percebido que o que é legal não é sonegação. Ocorre que, moralmente, o Estado tem menos justificativas de cobrar o que cobra, pois que é, sem qualquer exceção, por melhores que sejam os governos, um notório desperdiçador de recursos públicos. Essa constatação é que levou Wagner –, em gráfica afirmação, há mais de 100 anos – a enquadrar tal realida-de na “teoria de expansão irreversíve1 das despesas púb1icas”11.

Do ponto de vista estritamente jurídico, por ser a norma tributária uma norma de rejeição social, o sujeito passivo é protegido por princípios funda-mentais, como o da estrita legalidade, tipicidade fechada e reserva absoluta da lei formal e só pode ser obrigado a fazer o que na lei estiver12.

Desta forma, a procura, dentro da lei, de meios para que se reduza a car-ga tributária, sobre ser procedimento absolutamente legal é, simultaneamente, medida de justiça, visto que busca o pagador de tributos reduzir o peso da carga desmedida e, portanto, da injustiça intrínseca que o excesso termina por causar.

10 O 37º Congresso da IFA de 1983 dedicou um dos temas discutidos à evasão e elisão fiscal, tendo a resolução de plenário obedecido às seguintes sugestões: “Les Congrès, se fondant sur le droit fondamental du contribuable d’organiser ses affaires de manière à minimiser se charge fiscale, dans les limites fixées par la’loi;

Considérant que: a) l’augmentation de la pression fiscale incite les contribuables à essayer d’alléger leur charge fiscale;

b) les gouvernements ont le souci d’empêcher la fraude fiscale et d’éliminer l’evasion fiscale;

Recommande que: la législation soit toujours rédigée de maniere à ce que: 1. l’intention du législateur soit exprimée en termes clairs; 2. les infractions fiscales soient clairement définies et entrainent des sanctions différentes selon qu’il s’agit d’infractions de nature purement administrative ou d’infractions qui peuvent ètre considérées comme frauduleuses; 3. l’evasion fiscale ne soit pas un acte illégal; 4. la libre circulation des personnes, des biens, et des services entre les Etats ne soit pas entravée; 5. les législations destinées à combattre l’évasion fiscale n’aient pas d’effet rétroactif; 6) les contribuables et leurs conseils n’encourent pas de sanctions, à moins d’être convaincus de fraude fiscale; 7) et la charge de la preuve n’incombe pas aux contribuables” (Resolutions Book – IFA. International Bureau of Fiscal Documentation, 1988. p. 316/317).

11 WAGNER, Adolf. Lehr-und Handbuch der politischen Oekonomie. Alemanha, 1893.

12 O tema foi objeto do 6º Simpósio Nacional de Direito Tributário, tendo os trabalhos sido publicados no Caderno nº 6 de Pesquisas Tributárias (CEEU/Resenha Tributária, 1981), de autoria de Aires Fernandino Barreto, Ana Emília Cordelli Alves, Antonio José da Costa, Aurélio Pitanga Seixas Filho, Carlos Celso Orcesi da Costa, Cecília Maria Piedra Marcondes, Célio de Freitas Batalha, Dejalma de Campos, Dirceu Antonio Pastorello, Edda Gonçalves Maffei, Fábio de Sousa Coutinho, Gilberto de Ulhôa Canto, Hugo de Brito Machado, Ives Gandra da Silva Martins, José Eduardo Soares de Melo, Ricardo Mariz de Oliveira, Vittório Cassone, Wagner Balera, Ylves José de Miranda Guimarães, Yonne Dolácio de Oliveira e Yoshiaki Ichihara. O caderno foi intitulado de O Princípio da Legalidade.

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A elisão fiscal, portanto, é procedimento utilizado pelo sujeito passivo da relação tributária, objetivando reduzir o peso da carga tributária, pela escolha, entre diversos dispositivos e alternativas de lei, daqueles que lhe permitem pa-gar menos tributos.

Não o mesmo em relação à evasão fiscal, que adentra o campo da sone-gação ou falta de recolhimento tributário, haja dolo ou culpa, sendo que, na sua faceta dolosa, hão de se considerar as formas previstas no direito pátrio, como de simulação, fraude e sonegação13.

No Direito brasileiro, a elisão é permitida e a evasão, além de represen-tar infração administrativa, muitas vezes implica delito penal, desde que a lei a defina como tal.

Tudo pode o Estado dentro da lei. Nada pode fora da lei. Tudo pode o pa-gador de tributos que não esteja em lei, nada pode contra o que na lei estiver14.

Esta é a razão porque os princípios próprios de direito penal são também de direito tributário, como os de vedação da integração analógica, in dubio pro reo, retroatividade da lei mais benigna, etc.15.

13 Antonio Roberto Sampaio Dória, em seu livro Elisão e evasão fiscal (Bushatsky/IBET, 1977. p. 85/86/87), assim distingue as duas figuras: “Ora, enquanto não se realiza in concreto a hipótese de incidência, enquanto o fato gerador está latente ou potencial, não terá cabimento que o fisco pretenda direito à percepção do tributo. Se pela e1isão o fato gerador não chega a se manifestar, porquanto o contribuinte, que visava certo resultado econômico, foi suficientemente hábi1 na estruturação de seu negócio, afastando-se do protótipo previsto na norma, então a obrigação fiscal não se instaura, por estar ainda em sua primeira etapa, de caráter abstrato.

Se, ao invés, o fato gerador ocorre, pela equivalência entre o pressuposto de incidência legal e a situação de fato, pode o Fisco legitimamente pretender direito à percepção do tributo consequente, pouco importando os artifícios dolosos utilizados para, no ato da verificação do fato gerador ou posteriormente, mascará-lo ou distorcê-lo, de vez que uma situação jurídica já se havia conso1idado em favor do Estado”.

14 Cuidei da matéria, a partir das diversas correntes que conformam o direito penal tributário e o direito tributário penal, no livro Sanções tributárias (Saraiva, 1980).

15 Os arts. 106, 108 e 112 do CTN têm a seguinte dicção:

“Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:

I – em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados;

II – tratando-se de ato não definitivamente julgado: a) quando deixe de defini-lo como infração; b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo; c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática;

[...]

Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada:

I – a analogia; II – os princípios gerais de direito tributário; III – os princípios gerais de direito público; IV – a equidade.

§ 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei.

§ 2º O emprego da equidade não poderá resultar na dispensa do pagamento de tributo devido.

[...]

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Lembro, por fim, que o parágrafo único do art. 116 do CTN ainda não tem eficácia, à falta de legislação procedimental.

Entendo, pois, que, na elisão, o afastamento da imposição tributária se faz pela utilização de mecanismos legais, sendo incensurável a adoção dessa técnica de planejamento tributário, o mesmo não acontecendo com a evasão, em que o afastamento da imposição se obtém pela ruptura da norma legal.

Passo a outro tema relacionado à elisão e evasão fiscal, ou seja, o da interpretação econômica das leis tributárias.

De início, no plano meramente doutrinário, não aceito que possa existir interpretação de conteúdo econômico que supere o comando plasmado na lei.

A discussão acerca da possibilidade de a interpretação de conteúdo su-perar a conformação legal, embora em formulação inadequada, pode ser mais fartamente colocada no direito privado, em que as normas jurídicas são sempre examinadas à luz de uma elasticidade exegética não pertinente ao direito pú-blico.

Por outro lado, uma interpretação do conteúdo relacional além das for-mas é também admissível nos sistemas jurídicos que são plasmados na tradição costumeira ou na elaboração pretoriana, visto que a norma costumeira e aquela legislativa conformam o ordenamento de tais países16.

Nos países, todavia, que adotam a elaboração legislativa como fonte pri-meira e absoluta do Direito, sendo todas as demais decorrenciais, devem os intérpretes do sistema afastar, pelo menos nas normas de relação impositiva, a interpretação de conteúdo superativo da exteriorização formal.

À nitidez, a interpretação do conteúdo não se confunde com aquela apli-cável à teoria da superação da forma, posto que naquela se objetiva afastar con-teúdo diverso ao que a norma poderia exteriorizar, por força de aprofundamen-to de sua percepção, e nesta a forma jurídica é deliberadamente utilizada para se obter efeito diverso daquele que o ato ou situação jurídica deveriam veicular.

Art. 112. A lei tributária que define infração, ou lhe comina penalidades, interpreta-se da maneira, mais favorável ao acusado, em caso de dúvida quanto: I – à capitulação legal do fato; II – à natureza ou às circunstâncias materiais do fato, ou à natureza ou extensão dos seus efeitos; III – à autoria, imputabilidade, ou punibilidade; IV – à natureza da penalidade aplicável, ou à sua graduação.”

16 L. H. Hart, em seu livro The concept of law (Oxford University Press: Clarendon, 1961. p. 138), fixa as bases para uma teoria geral do Direito a partir da experiência inglesa, na qual o poder decorrente dos Tribunais é particularmente relevante: “A supreme tribunal has the last word in saying what the law is and, when it has said it, the statement that the court was wrong has no consequences within the system: no one’s rights or duties are thereby altered. The decision may, of course, be deprived of legal effect by legislation, but the very fact that resort to this necessary demonstrates the empty character, so far as the law is concerned, of the statement that the court’s decision was wrong. Consideration of these facts makes it seem pedantic to distinguish, in the case of a supreme tribunal’s decisions, between their finality and infallibility. This leads to another from of the denial that courts in deciding are ever bound by rules: ‘The law (or the constitution) is what the court say it is’”.

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A interpretação de conteúdo, embora desejável, não pode, como se pre-tende projetar, oferecer desenho legal distinto daquele expresso na norma, risco de se estar ofertando realidade exegética diversa daquela esculpida pelo legis-lador17.

À evidência que as técnicas exegéticas – todas sem exceção – devem ser utilizadas na percepção do texto a ser examinado, ou seja, a histórica, a grama-tical, a lógica, a sistemática, a restritiva ou extensiva, conforme a natureza da norma, a teleológica e até mesmo a integração analógica (não aceito a corrente dos que a fazem conviver com a interpretação analógica), em face também do perfil do texto a ser estudado. Não podem, pois, jamais ser excluídas.

A norma, todavia, não deve ser examinada além de seu conteúdo intrín-seco, posto que ao abordar realidade diversa da configuração mandamental leva necessariamente ou à deturpação da norma ou à criação legislativa pela hermenêutica, em ambos os casos gerando, para os que possam sofrer sua apli-cação restritiva, prejuízo ou benefício indevido18.

Há que se considerar, todavia, que o afastar a interpretação de “conteú-do presumível” não significa adotar técnica meramente formalista, nos ordena-mentos jurídicos em que o processo legislativo é a fonte primeira do Direito. A interpretação de “conteúdo presumível” só pode ser utilizada no concernente às normas referentes à relação de coordenação, em face da maior maleabilidade exegética, que lhes pertinem, sempre nos limites que o próprio procedimento legislativo permite.

No que diz respeito, todavia, ao direito tributário, tal formulação não encontra respaldo, em face dos limites estritos permitidos ao legislador e ao intérprete19.

17 Johnson Barbosa Nogueira, em Interpretação econômica no direito tributário (São Paulo: Resenha Tributária, 1982), oferta, na parte do livro dedicada ao exame das correntes exegéticas, interessante abordagem da polêmica questão.

18 Edda Gonçalves Maffei ensina que: “O CTN apenas insinua a interpretação econômica, mas não a adotou de forma expressa.

Contudo o conteúdo das leis tributárias é de natureza econômica e resulta da aplicação de um princípio constitucional: o da capacidade contributiva; os efeitos que produz também o são.

Mas, esse fato não pode levar à conclusão de que a interpretação econômica é critério que se sobreponha à interpretação jurídica.

A norma tributária tem vida ao lado das demais que integram o mundo jurídico. A especificidade porventura existente apenas traz cuidados especiais na eleição dos instrumentos de hermenêutica que sejam mais apropriados.

Assim, o fator econômico apenas atuará no processo de interpretação, que é único, quando se pesquisar o elemento teleológico. Os outros elementos: lógico, sistemático, 1iteral também devem estar presentes” (Curso de direito tributário. Saraiva, 1982. p. 76).

19 Alberto Xavier (Os princípios da legalidade e da tipicidade de tributação. Revista dos Tribunais, 1976) e Yonne Dolácio de Oliveira (O princípio da tipicidade no direito tributário brasileiro. Saraiva, 1980), ao apreenderem os princípios da tipicidade fechada, estrita legalidade e reserva absoluta de lei formal, próprios do direito tributário, terminam necessariamente por afastar, como decorrência, a interpretação econômica.

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A interpretação de “conteúdo presumível” apenas é admitida no concer-nente à denominada interpretação econômica.

Por esta, o conteúdo econômico da relação é que deve ofertar o perfil, a ser interpretado pelo jurista a partir do texto veiculado. Aqueles que a defendem objetivam, de início, a descoberta do conteúdo de natureza econômica, – visto que sobre tal fato e matéria é que incide o fenômeno impositivo para conforma-rem a norma a tal realidade e não tal realidade à norma.

Para tais intérpretes a teoria do conteúdo presumível é que subordina o texto à sua exegese e não o texto que configura os limites da realidade econô-mica subjacente20.

À evidência, para estes intérpretes os princípios de tipicidade fechada, estrita legalidade, reserva absoluta de lei formal não esculpem o direito tribu-tário, posto que a norma a ser interpretada é mais extensível do que a mera interpretação jurídica parece ensejar21.

Entendo, pois, que a interpretação econômica, enquanto instrumento para acrescentar conteúdo normativo não exteriorizado na lei a favor do sujeito ativo da relação tributária, não foi hospedada pelo sistema brasi1eiro, razão

20 Em Natureza e interpretação das leis tributárias (Financeiras), Ezio Vanoni e Ruy Barbosa Nogueira, em Da interpretação e da aplicação das leis tributárias (Bushatsky, 1974) recebem com reservas a interpretação econômica de superação da forma legal.

21 Escrevi que: “Com efeito, em direito tributário, só é possível estudar o princípio da legalidade, através da compreensão de que a reserva da lei formal é insuficiente para a sua caracterização. O princípio da reserva da lei formal permitiria uma certa discricionariedade, impossível de admitir-se, seja no direito/penal, seja no direito tributário. Como bem acentua Sainz de Bujanda (Hacienda y derecho. Madrid, v. 3, 1963. p. 166), a reserva da lei no direito tributário não pode ser apenas formal, mas deve ser absoluta, devendo a lei conter não só o fundamento, as bases do comportamento da administração, mas – e principalmente- o próprio critério da decisão no caso concreto”.

A exigência da lex scripta, peculiar à reserva formal da lei, acresce-se a da lex stricta, própria da reserva absoluta. É Alberto Xavier quem esclarece a proibição da discricionariedade e da analogia, ao dizer (ob. cit., p. 39): “E daí que as normas que instituem sejam verdadeiras normas de decisão material (Sachentscheidungsnormen), na terminologia de Werner Flume, porque, ao contrário do que sucede nas normas de ação (Handlungsnormen), não se limitam a autorizar o órgão de aplicação do direito a exercer, mais ou menos livremente um poder, antes lhe impõem o critério da decisão concreta, predeterminando o conteúdo do seu comportamento” (grifos nossos).

Yonne Dolácio de Oliveira, em obra por nós coordenada (Legislação tributária, tipo legal tributário. In: Comentários ao CTN. Bushatsky, v. 2, 1974. p. 138), alude ao princípio da estrita legalidade para albergar a reserva absoluta da lei, no que encontra respaldo nas obras de Hamilton Dias de Souza (Direito tributário. Bushatsky, v. 2, 1973) e Gerd W. Rothmann (O princípio da legalidade tributária. In: NOGUEIRA, Ruy Barbosa Bushatsky (coord.). Direito tributário. 5ª coletânea, 1973. p. 154). O certo é que o princípio da legalidade, por meio da reserva absoluta de lei, em direito tributário, permite a segurança jurídica necessária, sempre que seu corolário consequente seja o princípio da tipicidade, que determina a fixação da medida da obrigação tributária e os fatores dessa medida, a saber: a quantificação exata da alíquota, da base de cálculo ou da penalidade.

É evidente, para concluir, que a decorrência lógica da aplicação do princípio da tipicidade é que, pelo princípio da seleção, a norma tributária elege o tipo de tributo ou de penalidade; pelo princípio do numerus clausus veda a utilização da analogia; pelo princípio do exclusivismo torna aquela situação fática, distinta de qualquer outra, por mais próxima que seja; e finalmente, pelo princípio da determinação conceitua de forma precisa e objetiva o fato imponível, com proibição absoluta às normas elásticas” (Resenha Tributária, 154:779-82, Secção 2.1,1980) (Curso de direito tributário. Saraiva, 1982. p. 57/58).

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pela qual, sobre ser uma falsa proposição, representa técnica não pertinente aos sistemas em que a lei é a fonte primeira do Direito.

Poder-se-ia, todavia, alegar que se tal técnica exegética for de utilização a favor do sujeito passivo da relação tributária, poderia ela ser adotada, em face dos princípios elásticos que o Código Tributário Nacional adota em benefício do pagador de tributos.

Ainda aqui discordo, visto que a maior elasticidade permitida ao sujeito passivo, em sua defesa contra as normas impositivas de rejeição social, não lhe pode permitir a adoção de técnica capaz de distorcer o real conteúdo norma-tivo.

Devo lembrar que na minha concepção tridimensional da norma tribu-tária, coloco o fato na Economia e em sua disciplina jurídica macroeconômica, que exsurge no direito econômico; a valoração nas finanças públicas e na sua disciplina jurídica, que é o direito financeiro, e a norma no próprio direito tri-butário22.

De tal concepção decorre que a norma tributária incide sobre uma re-alidade necessariamente econômica, já nascendo com o seu conteúdo real, nos estritos limites de sua veiculação. Ao conteúdo econômico já idealizado pelo legislador ao produzir a norma não se acrescenta qualquer outro conteúdo também de natureza econômica, posto que ou a interpretação da norma se faz de acordo com a realidade que a fez nascer – e é essencialmente interpretação jurídica dentro dos limites dessa realidade – ou se faz acrescentando nova reali-dade não prevista pelo legislador, com o que se adiciona novo comando legal, inexistente nas normas tributárias, em que a reserva é absoluta, violentando-se os princípios da tipicidade fechada e da legalidade estrita23.

Não há, portanto, que se considerar possível a interpretação econômica no direito tributário. O direito tributário incide sobre o fato econômico, mas a interpretação que lhe pertine é necessariamente jurídica.

Por esta razão, entendo que a interpretação econômica, como pretendem determinados autores, não foi hospedada pelo sistema brasileiro, em face do conteúdo de rejeição que as normas tributárias têm e em face dos rígidos princí-pios que plasmam a produção normativa nesta província do Direito24.

22 Teoria da imposição tributária. Saraiva, 1983.

23 O Caderno nº 9 de Pesquisas Tributárias (CEEU/Resenha Tributária, 1984) com trabalhos de Aires Fernandino Barreto, Antonio Alberto Soares Guimarães, Antonio Bianchini Neto, Antonio Manoel Gonçalez, Cléber Giardino, Gilberto de Ulhôa Canto, Hugo de Brito Machado, Ives Gandra da Silva Martins, José Eduardo Soares de Melo, Ricardo Mariz de Oliveira, Roberto Catalano Botelho Ferraz, Vittório Cassone, Wagner Balera, Ylves José de Miranda Guimarães e Yonne Dolácio de Oliveira, abordou a impossibilidade de se acrescentar hipótese impositiva por força de exegese integrativa das normas tributárias. Intitulou-se “Presunções no direito tributário”, tendo servido de base para discussão no IX Simpósio Nacional de Direito Tributário.

24 A. J. Franco Campos escreve, na mesma linha, que: “1. No campo impositivo tributário, a teoria prende- -se, basicamente, aos princípios seguintes: a) somente poderá haver imposição nos limites da lei – estrita

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Examino a teoria desconsiderativa.

As formas jurídicas nem sempre hospedam a materialidade dos fatos, não poucas vezes estando o nomem juris adotado em dissonância com a ordem fática, que se serve da instrumentalização legal para obtenção de soluções di-versas.

O objetivo pretendido pode ser distinto da forma jurídica adotada, ca-bendo ao intérprete a busca da solução mais adequada na apreensão fenomê-nica da norma25.

A teoria da desconsideração da pessoa jurídica alicerça-se em tal disso-ciação de objetos.

Apenas para lançar as premissas da questão, mister se faz, de plano, es-clarecer o tipo de superação da personalidade jurídica adotada, à luz do fenô-meno desconsiderativo conhecido nos direitos pátrio e comparado.

O fenômeno superativo reside na ultrapassagem dos termos formais da relação jurídica, ingressando na própria estrutura do negócio combinado ou proposto. Atinge a finalidade da operação ou da situação jurídica mantida, in-dependente da forma adotada, mesmo que a forma adotada seja sob este pris-ma, absolutamente correta26.

A doutrina estuda a desconsideração da personalidade jurídica sob dois aspectos fundamentais, a saber: à luz da operação realizada (teoria da descon-sideração interna) e à luz das próprias forças da pessoa jurídica atuante (teoria

legalidade; b) o objetivo da interpretação é estabelecer exata correspondência do valor do tributo, exigido segundo os princípios de justiça, e para isso buscam-se ‘regras’ métodos de interpretação; c) o cidadão tem a seu favor direitos constitucionais, que são as garantias decorrentes do Estatuto do Contribuinte, cujo fundamento pode ser resumido – só a lei pode criar imposições (EC 1/1969, art. 153, §§ 2º e 29 e art. 9º do CTN); d) o dever impositivo fixado na norma deve ser interpretado para chegar-se à igualdade jurídica (art. 153, § 1º, EC 1/1969); e. a desigualdade surge quando a interpretação estabelece tratamento “di diverse persone sotto gli stessi pressuposti di fatto; f. a interpretação deve ser conforme com o ‘único sentido possível’, porque, caso contrário, haveria arbítrio” (Direito tributário 3. Bushatsky, 1975. p. 175/176).

25 O Código Tributário Nacional, em seu art. 4º, oferta gráfico exemplo de solução legal sempre que o divórcio se coloca entre os fatos e a forma jurídica adotada, estando o dispositivo assim redigido:

“Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la:

I – a denominação e demais características formais adotadas pela lei;

II – a destinação legal do produto da sua arrecadação.”

26 Henry Tilbery ensina: “Em primeiro lugar, é preciso lembrar uma diferença básica entre o sistema de direito deste país em contraposição com o direito de raízes anglo-saxônicas, onde o juiz pode ‘criar’ o direito conforme o caso concreto. A casuística da doutrina do disregard, desenvolvida pelos juízes norte-americanos, não pode ser aplicada nos países onde o ordenamento jurídico tem suas raízes no direito romano, sem que haja base em norma legal para este procedimento.

Neste país, o primeiro estudo em profundidade desta matéria do qual temos conhecimento, foi elaborado pelo Professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná. Rubens Requião, publicado em 1969, seguido por outro”. Autores, entre eles Fábio Konder Comparato, João Casillo, Egberto Lacerda Teixeira, em coautoria com José Alexandre Tavares Guerreiro (Imposto de Renda – Pessoas jurídicas integração entre sociedade e sócios. Atlas/IBDT, 1985. p. 97).

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44 ��������������������������������������������������������������������������������������������RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – PARECER JURÍDICO

da desconsideração externa), em que a desestimação da pessoa jurídica é tida por inteiro.

Embora alguns autores procurem desconhecer a denominada desconsi-deração interna, por entenderem que a pessoa jurídica não é superada, mas apenas a operação é que deve ser desconsiderada, não me filio a tal corrente, visto que em tais operações, em que o objeto supera a forma, não se pode desconhecer a existência de uma relação jurídica diversa, direta ou indireta, apenas sendo a realidade fenomênica menos abrangente27.

Entendo, haja a figura desconsiderativa tanto em uma singela distribuição disfarçada de lucros (desconsideração interna) como na criação de uma segun-da empresa com o fito de, por meio dela, serem repassados para uma terceira os lucros que não poderiam ser diretamente destinados a esta (desconsideração externa). Prefiro inclusive a adoção de terminologia distinta, denominando a primeira relação de estática e a segunda de dinâmica.

O fenômeno desconsiderativo, todavia, existe nas duas hipóteses, visto que a forma eleita não pode ser aceita, mas sim o objetivo pretendido, que in-troduz forma não utilizada para ser recepcionada pelo direito, na recomposição do perfil jurídico da realidade antes disfarçada28.

O fenômeno da superação da pessoa jurídica ou da operação – para os que não aceitam o espectro abrangente do instituto decorre ou da integração jurisprudencial ou da imposição normativa.

Negam, também, alguns autores, a existência do fenômeno desconsi-derativo na imposição normativa, sob a alegação de que seria hipótese legal

27 Rubens Requião, hospedando a concepção original de Rolf Serick, adota idêntica postura, admitindo para a desconsideração operacional a não negativa da personalidade jurídica de uma maneira geral, mas apenas sua ineficácia para determinado efeito em virtude de abuso do direito e fraude (Abuso do direito e fraude através da personalidade jurídica, Revista dos Tribunais, 1969. p. 410).

28 João Casillo: “A posição doutrinária e jurisprudencial, quase dogmática, que vê a completa separação entre a pessoa jurídica e os membros que a compõem – sócios – sofre, há algum tempo, algumas reações.

Pouco a pouco, em evolução, foi tomando corpo a idéia de que em determinadas situações não é possível manter-se a distinção clássica entre a pessoa jurídica e as pessoas físicas que dela fazem parte.

Este movimento vem-se alastrando, sendo tratado em vários países e destinado a entrar e ficar nos próprios textos legais, como ainda veremos neste trabalho.

Na Alemanha, a posição doutrinária é conhecida como ‘durchgriff der juristischen Personen’, ou, ainda, ‘missachtung der rechtform der Juristischen Personen’. No Direito anglo-americano, ‘disregard of legal entity’, completada pelas expressões ‘to pierce the veil’ ou ‘lifting the corporate veil’; no direito Italiano, ‘superamento della personalità giuridica’; no Direito argentino, ‘teoria de la penetración’; na França, ‘mise à l’écart de la personnalité morale’; no Direito brasileiro, ‘teoria da desconsideração da pessoa jurídica’, ou, ainda, ‘teoria da desestimação da pessoa jurídica’.

Basicamente, os partidários da teoria da desconsideração afirmam que, quando a forma da pessoa jurídica, ou a própria pessoa jurídica, é utilizada com o intuito de fugir às finalidades impostas pelo Direito, deve ser, então, ‘desconsiderada’, ou melhor, não deve ser levada em conta sua existência, para, na decisão do caso que lhe é apresentado, o julgador decidir como se, na espécie, a pessoa jurídica não existisse, imputando as responsabilidades aos seus sócios ou, mesmo, a outra pessoa jurídica de que se tenha utilizado ou, mesmo, se escondido sob a forma daquela primeira” (Desconsideração da pessoa jurídica. Revista dos Tribunais, p. 24, v. 528, out. 1979).

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previsível e a que a desconsideração apenas poderia decorrer de integração pretoriana.

Ainda aqui divirjo de tais autores, posto que a teoria da imposição legal objetiva desconsiderar distorções que só se enquadrariam na hipótese de inci-dência, se a realidade a ser desconsiderada ocorresse, desaparecendo, na apli-cação, a função constitutiva da jurisprudência para restringir-se à sua função interpretativa.

No direito tributário, por exemplo, a desconsideração da pessoa jurídica apenas ocorre, em havendo hipótese legal, como é o caso da distribuição dis-farçada de lucros, visto que tal ramo da lei positiva é regido pelos princípios da estrita legalidade, da tipicidade fechada e da reserva absoluta da lei formal29.

No direito privado, todavia, a desconsideração pode nascer de uma du-pla formulação jurídica, ou seja, a jurisprudencial e a normativa, posto que a integração analógica, a interpretação extensiva e a flexibilidade exegética cons-tituem elementos de utilização do intérprete para buscar o real desenho das realidades ocorridas no universo do Direito30.

De há muito, portanto, está no Direito superada a teoria do formalismo, com a prevalência dos aspectos materiais do ato ou fato jurídico sobre sua con-formação normativa.

Tais considerações fazem-se necessárias, visto que, sem elas, o impasse hermenêutico poderia ocorrer sem solução viável, no plano jurídico, ou com solução diversa das intenções e da justiça, objeto final do Direito no regrar a sociedade.

Não sem razão, Hervada y Izquierdo definiram o Direito como a “ordem social justa”, posto que a vida social é ordenada à luz de um ideal de justiça – mesmo que a prática demonstre o contrário –, visão que supera de muito a concepção restrita e pequena do “mínimo ético” produzido pelo utilitarismo de Jeremy Bentham31.

A materialidade jurídica vale mais do que a forma adotada. É esta que se subordina àquela e não aquela a esta.

Um último ponto deve ser considerado. A superação da pessoa jurídica ou da operação formal não implica necessariamente fenômeno punitivo para

29 Henry Tilbery esclarece: “Manifestamos nossa opinião categórica de que, dentro do princípio da estrita legalidade tributária, a doutrina alienígena da desconsideração da pessoa jurídica não pode ser aplicada no direito tributário brasileiro sem base em norma legal” (ob. cit., p. 98).

30 Marçal Justen Filho, em sua tese para concurso de professor titular de Direito Comercial da Faculdade de Direito da Universidade do Paraná, que tive o prazer de examinar, oferta interpretação semelhante, em face da maior flexibilidade exegética aplicável às normas do direito privado.

31 Izquierdo e Hervada (Compêndio de derecho natural. 2 v., EUNSA, 1980, p. 25 do v. 1) e Jeremy Bentham (Uma introdução aos princípios da moral e da legislação, São Paulo, abr. 1974).

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os que as virem desfiguradas, mas exclusivamente o reconhecimento da real situação, trazendo-a para o mundo aberto do Direito, em face de seu perfil ver-dadeiro. Pode inclusive representar, ao se apresentar como é e não como era, para as partes envolvidas, um benefício maior do que a situação formal anterior. A figura da desconsideração objetiva apenas tornar clara uma realidade oculta, antes posta sob forma diversa da que lhe pertine por natureza32.

Isto posto, em face das colocações anteriormente expostas, entendo que a teoria da desconsideração foi estalajada pelo direito fiscal brasileiro apenas e enquanto decorrente de hipótese normativa, vedada sua aplicação a partir da construção pretoriana, posto que tal concepção implicaria, se adotada, ofertar elasticidade exegética à norma que os princípios da tipicidade fechada, reserva absoluta e estrita legalidade vedam.

O melhor exemplo da figura superativa, por força de imputação legal, é o da distribuição disfarçada de lucros, em todas as formas que assumiu, no direito positivo, após sua introdução no Brasil com a Lei nº 4.604/196433.

Não comento a Lei Complementar nº 104/2001, pois, a meu ver, só apli-cável após a produção legislativa, que ainda não ocorreu, visto que os arts. 13 a 19 da MP 66/2002 foram rejeitados pela Câmara.

São estas as considerações perfunctórias que faço sobre tema de minha permanente reflexão.

32 João Casillo, relembrando a teoria de Serick, escreve sobre as hipóteses superativas, onde haja boa fé, o seguinte: “Outras hipóteses: Além das quatro situações citadas por Serick até aqui (que, por sua vez, baseia-se em J. Maurice Wormser, Disregard of the Corporate Fiction and Allied Corporation Problems, Nova York, 1927), o mestre alemão informa, ainda, que os Tribunais americanos têm ampliado a aplicação da doutrina do disregard também na interpretação das declarações de vontade e outros negócios jurídicos da mesma forma quando o exija a boa-fé. Exemplos vários são trazidos (Fidelity Trust Co. v. Servide Lundry Co., Metropolitan Holding Co. v. Snyder e outros). Também Sweeney mostra a tendência para a desconsideração em casos de sociedade unipessoal (Pepper v. Litton, Dixie Coal Mining and Manufacturing Co. v. Willians, 1930); como, também, em questões onde se discute a nacionalidade da pessoa jurídica, sendo a forma desconsiderada e valendo a nacionalidade dos sócios (Clark v. Ubersee Finanz-Korporation A. G.), bem como em matéria de impostos (Higgins v. Smith).

É de se observar, pelo levantamento que os autores fazem nos casos norte-americanos, que eles vêm de longa data e, mesmo sem uma sistematização mais robusta, a teoria do disregard vem sendo aplicada dia a dia, no interesse coletivo, fruto do desenvolvimento das relações jurídicas, cada vez em maior número e de maior complexidade, como é normal numa sociedade tão ampla como a dos Estados Unidos” (ob. cit., p. 27/28).

33 Com Luciano da Silva Amaro, escrevi estudo para publicação pela Universidade de Buenos Aires em homenagem a Rafael Bielsa, intitulado Distribución Encubierta de Beneficios, em que procuramos, os dois, evidenciar a sua conformação desconsiderativa (v. 1, Revista da Universidade de Buenos Aires, p. 281/309, 1979).

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Assunto Especial – Acórdão na Íntegra

Elisão Fiscal

10798

Superior Tribunal de JustiçaRecurso Especial nº 946.707 – RS (2007/0092656‑4) Relator: Ministro Herman BenjaminRecorrente: Josapar Joaquim Oliveira S/A ParticipaçõesAdvogado: Cláudio Merten e outro(s)Recorrido: Fazenda NacionalProcuradores: Luís Alberto Saavedra e outro(s)

Claudio Xavier Seefelder Filho

ementa

PROCESSUAL CIVIL – OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA – MULTA DO ART. 538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC – INAPLICABILIDADE – INCORPORAÇÃO – APROVEITAMENTO DE PREJUÍZOS – REDUÇÃO DA CSSL DEVIDA – SIMULAÇÃO – SÚMULA Nº 7/STJ – INAPLICABILIDADE – SÚMULA Nº 98/STJ

1. Hipótese em que se discute compensação de prejuízos para fins de redução da Contribuição Social sobre Lucro Líquido – CSSL devida pela contribuinte.

2. A empresa Supremo Industrial e Comercial Ltda. formalmente in-corporou Suprarroz S/A (posteriormente incorporada pela recorrente). Aquela acumulava prejuízos (era deficitária, segundo o TRF), enquan-to esta era empresa financeiramente saudável.

3. O Tribunal de origem entendeu que houve simulação, pois, em realidade, foi a Suprarroz que incorporou a Supremo. A distinção é relevante, pois, neste caso (incorporação da Supremo pela Suprarroz), seria impossível a compensação de prejuízos realizada, nos termos do art. 33 do DL 2.341/1987.

4. A solução integral da lide, com fundamento suficiente, não carac-teriza ofensa ao art. 535 do CPC.

5. Não há controvérsia quanto à legislação federal.

6. A contribuinte concorda que a incorporadora não pode compensar prejuízos acumulados pela incorporada, para reduzir a base de cál-

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48 ���������������������������������������������������������������������������������������RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

culo da CSSL, nos termos do art. 33 do DL 2.341/1987. Defende que a empresa com prejuízos acumulados (Supremo) é, efetivamente, a incorporadora.

7. O Tribunal de origem, por seu turno, não afasta a possibilidade, em tese, de uma empresa deficitária incorporar entidade financeiramente sólida. Apenas, ao apreciar as peculiaridades do caso concreto, en-tendeu que isso não ocorreu.

8. Tampouco se discute que, em caso de simulação, “é nulo o negó-cio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma” (art. 167, caput, do CC).

9. A regularidade formal da incorporação também é reconhecida pelo TRF.

10. A controvérsia é estritamente fática: a recorrente defende que houve, efetivamente, a incorporação da Suprarroz (empresa financei-ramente sólida) pela Supremo (empresa deficitária); o TRF, entretanto, entendeu que houve simulação, pois, de fato, foi a Suprarroz que incorporou a Supremo.

11. Para chegar à conclusão de que houve simulação, o Tribunal de origem apreciou cuidadosa e aprofundadamente os balanços e de-monstrativos de Supremo e Suprarroz, a configuração societária su-perveniente, a composição do conselho de administração e as opera-ções comerciais realizadas pela empresa resultante da incorporação. Concluiu, peremptoriamente, pela inviabilidade econômica da ope-ração simulada.

12. Rever esse entendimento exigiria a análise de todo o arcabouço fático apreciado pelo Tribunal de origem e adotado no acórdão re-corrido, o que é inviável em Recurso Especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ.

13. Aclaratórios opostos com o expresso intuito de prequestionamen-to não dão ensejo à aplicação da multa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC, que deve ser afastada (Súmula nº 98/STJ).

14. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indica-das, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: “A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, deu-

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-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).” Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon, Castro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 25 de agosto de 2009 (data do Julgamento).

Ministro Herman Benjamin Relator

relatório

O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (relator): Trata-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, a, da Constituição da Re-pública, contra acórdão assim ementado (fl. 1.136, anverso e verso):

INCORPORAÇÃO – AUTUAÇÃO – ELISÃO E EVASÃO FISCAL – LIMITES – SIMULAÇÃO – EXIGIBILIDADE DO DÉBITO – HONORÁRIOS ADVOCA-TÍCIOS – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

1. Dá-se a elisão fiscal quando, por meios lícitos e diretos o contribuinte planeja evitar ou minimizar a tributação. Esse planejamento se fundamenta na liberdade que possui de gerir suas atividades e seus negócios em busca da menor onerosidade tributária possível, dentro da zona de licitude que o ordenamento jurídico lhe assegura.

2. Tal liberdade é possível apenas anteriormente à ocorrência do fato gera-dor, pois, uma vez ocorrido este, surge a obrigação tributária.

3. A elisão tributária, todavia, não se confunde com a evasão fiscal, na qual o contribuinte utiliza meios ilícitos para reduzir a carga tributária após a ocorrência do fato gerador.

4. Admite-se a elisão fiscal quando não houver simulação do contribuinte. Contudo, quando o contribuinte lança mão de meios indiretos para tanto, há simulação.

5. Economicamente inviável a operação de incorporação procedida (da su-peravitária pela deficitária), é legal a autuação.

6. Tanto em razão social, como em estabelecimento, em funcionários e em conselho de administração, a situação final – após a incorporação – manteve as condições e a organização anterior da incorporada, restando demonstrado claramente que, de fato, esta “absorveu” a deficitária, e não o contrário, ten-do-se formalizado o inverso apenas a fim de serem aproveitados os prejuízos fiscais da empresa deficitária, que não poderiam ter sido considerados caso tivesse sido ela a incorporada, e não a incorporadora, restando evidenciada, portanto, a simulação.

7. Não há fraude no caso: a incorporação não se deu mediante fraude ao fis-co, já que na operação não se pretendeu enganar, ocultar, iludir, dificultan-

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do – ou mesmo tornando impossível – a atuação fiscal, já que houve ampla publicidade dos atos, inclusive com registro nos órgãos competentes.

8. Inviável economicamente a operação de incorporação procedida, tendo em vista que a aludida incorporadora existia apenas juridicamente, mas não mais economicamente, tendo servido apenas de “fachada” para a operação, a fim de serem aproveitados seus prejuízos fiscais – cujo aproveitamento a lei expressamente vedava.

9. Uma vez reconhecida a simulação deve o juiz fazer prevalecer as conse-qüências do ato simulado – no caso, a incorporação da superavitária pela deficitária, conseqüentemente incidindo o tributo na forma do regulamento – não havendo falar em inexigibilidade do crédito fiscal.

10. Esta Turma tem-se orientado no sentido de estabelecer a condenação em verba honorária no patamar de 10% sobre o valor atribuído à causa, atuali-zado, salvo hipótese em que tal valor afigure-se exorbitante ou ínfimo, o que não ocorre no caso em tela.

11. Inexistindo omissão, contradição e nem obscuridade no julgado, é in-devida a utilização dos declaratórios, que configuram-se, portanto, prote-latórios, ensejando a fixação de multa no percentual de 1% sobre o valor atribuído à causa, nos termos dos arts. 18 e 538 do CPC.

Os Embargos de Declaração foram rejeitados (fl. 1.148).

A recorrente aponta dissídio jurisprudencial e ofensa:

a) aos arts. 165, 458 e 535 do CPC (omissão – fl. 1.158);

b) aos arts. 97, 109, 110, 113, 114, 116 e 149 do CTN; aos arts. 189, 223 e 227 da Lei nº 6.404/1976; ao art. 7º da Lei nº 9.532/1997; ao art. 10 da Lei nº 9.718/1998; ao art. 386 do Decreto nº 3.000/1999; ao art. 33 do Decreto nº 2.341/1987; e ao art. 102 do CC/1916, pois a operação de incorporação realizada foi lícita e não representou simulação para evasão de tributos (fl. 1.166); e

c) aos arts. 17, 165, 458, 535 e 538 do CPC, já que a multa aplicada por litigância de má-fé é indevida (fl. 1.193).

O Recurso Especial foi admitido na origem (fl. 1.303).

É o relatório.

voto

O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator): Discute-se a compen-sação de prejuízos para fins de redução da Contribuição Social sobre Lucro Líquido – CSSL.

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A empresa Supremo Industrial e Comercial Ltda. formalmente incorporou Suprarroz S/A (posteriormente incorporada pela recorrente).

A empresa Supremo acumulava prejuízos (era deficitária, segundo o TRF), enquanto a Suprarroz era empresa financeiramente saudável.

O Tribunal de origem entendeu que houve simulação, pois, em realida-de, foi a Suprarroz que incorporou a Supremo. A distinção é relevante, pois, neste caso (incorporação da Supremo pela Suprarroz), não seria possível a com-pensação de prejuízos realizada, nos termos do art. 33 do DL 2.341/1987.

Para que fique claro, segundo a legislação de regência, se a empresa deficitária (Supremo) fosse incorporada pela Suprarroz, esta última não poderia apropriar-se dos prejuízos acumulados pela Supremo, para fins de redução do CSSL devido.

Por conta da simulação, a Corte Regional reconheceu o crédito tributário correspondente ao recolhimento da CSSL a menor.

Analisarei aprofundadamente os fundamentos do acórdão recorrido, mais adiante. Por ora, saliento que o Tribunal de origem solucionou a demanda fundamentando adequadamente seu entendimento.

É cediço que o julgador não é obrigado a apreciar todos os dispositivos legais suscitados pelas partes. Basta apresentar elementos suficientes para sus-tentar seu arrazoado e resolver a lide, o que se verifica in casu.

Assim, afasto a suposta ofensa aos arts. 165, 458 e 535 do CPC.

No que se refere à questão de fundo, verifico que não há controvérsia quanto à legislação federal.

A contribuinte concorda que a incorporadora não pode compensar pre-juízos acumulados pela incorporada para reduzir a base de cálculo da CSSL, nos termos do art. 33 do DL 2.341/1987 (fl. 1.191). Defende que a empresa com prejuízos acumulados (Supremo) é, efetivamente, a incorporadora.

O Tribunal de origem, por seu turno, não afasta a possibilidade, em tese, de uma empresa deficitária incorporar uma entidade financeiramente sólida. Apenas que, ao apreciar as peculiaridades do caso concreto, entendeu que isso não ocorreu.

Tampouco discute-se que, em caso de simulação, “é nulo o negócio ju-rídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma” (art. 167, caput, do CC).

Não se trata de discutir a regularidade formal da incorporação, como faz a recorrente (fl. 1.179).

O Tribunal de origem não desconhece que os trâmites burocráticos exi-gidos pela legislação foram cumpridos, inclusive com publicidade dos autos (fl. 1.134).

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Para o TRF, entretanto, a incorporação, formalmente regular, implicou simulação de algo que inexistiu, pois, de fato, foi a empresa financeiramente sólida (Suprarroz) que incorporou a Supremo, e não o contrário.

A controvérsia é estritamente fática: a recorrente defende que houve, efe-tivamente, a incorporação da Suprarroz (empresa financeiramente sólida) pela Supremo (empresa deficitária); o TRF, entretanto, entendeu que houve simula-ção, pois, de fato, foi a Suprarroz que incorporou a Supremo.

Eis os fundamentos consignados no acórdão recorrido (fls. 1.132, verso – 1.134, grifos no original):

A incorporadora (Supremo) possuía patrimônio líquido de R$ 3.532.170,97, acumulando, em 28.02.1995, prejuízos fiscais de R$ 3.289.435,23. A incorporada (Suprarroz), por sua vez, possuía patrimônio líquido de R$ 33.383.666,70, totalizando, em 30.03.1995, lucros acumulados de R$ 11.510.746,69.

Ocorre que, juntamente com a incorporação, no mesmo ato, a incorporado-ra (Supremo) assumiu a denominação social da incorporada (Suprarroz), que foi posteriormente incorporada pela ora autora.

Em razão dessa incorporação, os prejuízos acumulados pela incorporadora (Supremo) foram utilizados para fins de aferição da base de cálculo da CSLL devida nos períodos subseqüentes.

[...]

No mesmo ato da incorporação, a incorporadora (Supremo) assumiu a de-nominação social da incorporada, passando o novo grupo a denominar-se Suprarroz, eliminando-se a razão social Supremo. O resultado foi que, no mundo dos negócios, a empresa incorporada, e portanto extinta, “continuou a operar”, já que a nova empresa, resultado da incorporação pela Supremo, prosseguiu com a denominação Suprarroz.

A sede do novo grupo, resultante da operação de incorporação, passou a ser a antiga sede da empresa incorporada (Suprarroz). Cabe salientar, neste pon-to, que a empresa reputada incorporadora (Supremo) sequer possuía sede, tampouco equipamentos industriais ao tempo da incorporação, uma vez que já os tinha vendido.

Até mesmo os membros do Conselho de Administração da incorporadora (Supremo) renunciaram, assumindo os do Conselho da incorporada (Suprar-roz), restando da incorporadora, nada mais que o CGC.

Ao tempo da incorporação (março de 1995), a alegada incorporadora (Su-premo) já havia encerrado faticamente suas atividades, subsistindo apenas juridicamente desde julho de 1994, já tendo sido formalizada a transferência de seu ativo imobilizado para outra empresa em agosto de 1994.

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Como se vê, tanto em razão social, como em estabelecimento, em funcioná-rios e em conselho de administração, a situação final – após a incorporação – manteve as condições e a organização anterior da incorporada (Suprarroz), demonstrando-se claramente que, de fato, esta “absorveu” a deficitária e não o contrário, tendo-se formalizado o inverso apenas com o intuito de aprovei-tar os prejuízos fiscais da empresa Supremo, que não poderiam ter sido con-siderados caso tivesse sido ela a incorporada e não a incorporadora, restando evidenciada, portanto, a simulação.

[...]

No caso, era inviável economicamente a operação de incorporação procedi-da, tendo em vista que a aludida incorporadora existia apenas juridicamente, tendo servido apenas de “fachada” para a operação, a fim de serem apro-veitados seus prejuízos fiscais – cujo aproveitamento a lei expressamente vedava.

Assim, para chegar à conclusão de que houve simulação, o Tribunal de origem apreciou cuidadosa e aprofundadamente os balanços e demonstrativos de Supremo e Suprarroz, a configuração societária superveniente, a composi-ção do conselho de administração, as operações comerciais realizadas pela empresa resultante da incorporação. Concluiu, peremptoriamente, pela “invia-bilidade econômica da operação” simulada (fl. 1.133, verso).

Rever esse entendimento exigiria a análise de todo o arcabouço fático apreciado pelo Tribunal de origem e adotado no acórdão recorrido, o que é inviável em Recurso Especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ.

De modo diverso, quanto à multa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC, a recorrente tem razão.

Os aclaratórios foram opostos na origem com intuito de prequestiona-mento de dispositivos legais (fl. 1.049), o que impede a aplicação da multa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC, nos termos da Súmula nº 98/STJ.

Assim, o acórdão recorrido deve ser reformado, apenas nesse aspecto.

Diante do exposto, conheço parcialmente do Recurso Especial e, nessa parte, dou-lhe provimento, apenas para afastar a multa aplicada com base no art. 538, parágrafo único, do CPC.

É como voto.

certidão de julgamento segunda turma

Número Registro: 2007/0092656-4 REsp 946707/RS

Número Origem: 200471100039659

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Pauta: 25.08.2009 Julgado: 25.08.2009

Relator: Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Antônio Carlos Fonseca da Silva

Secretária: Belª Valéria Alvim Dusi

autuação

Recorrente: Josapar Joaquim Oliveira S/A Participações

Advogado: Cláudio Merten e outro(s)

Recorrido: Fazenda Nacional

Procuradores: Luís Alberto Saavedra e outro(s) Claudio Xavier Seefelder Filho

Assunto: Direito tributário – Contribuições – Contribuições sociais – Contri-buição Social sobre o Lucro Líquido

certidão

Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon, Castro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 25 de agosto de 2009.

Valéria Alvim Dusi Secretária

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Assunto Especial – Acórdão na Íntegra

Elisão Fiscal

10799

Conselho Administrativo de Recursos FiscaisMinistério da FazendaPrimeira Seção de JulgamentoProcesso nº 16327.001331/200961Recurso nº 000.001 VoluntárioAcórdão nº 1401001.059 – 4ª Câmara/1ª Turma OrdináriaSessão de 09 de outubro de 2013.Matéria: Imposto de RendaRecorrente: Banco Mercedes Benz do Brasil S/ARecorrida: Fazenda NacionalAssunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – PJAno‑calendário: 2006, 2007

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO

O planejamento tributário consiste na prática de condutas lícitas, permitidas pelo direito, adotadas pelo contribuinte, e que tem como efeito a redução ou não pagamento do tributo que, caso não tivesse havido o planejamento, seria devido. Nesse sentido, o planejamento tributário é, antes de tudo e nada mais além do que um planejamento. Trata-se de um pensar com antecedência, um se organizar, um plane-jar, tendo em mente que, para se alcançar determinado resultado ne-gocial, existe uma alternativa ou um outro negócio jurídico lícito que, se realizado, levará à redução ou não pagamento de tributo. Neste sentido, quando se está diante de um planejamento tributário, pressu-põe-se a existência de um negócio normal (não planejado) que enseja uma determinada carga de tributação, e um negócio jurídico alterna-tivo (planejado), que tem por efeito a redução ou não pagamento de tributos pelo contribuinte. Constatada a ilicitude do negócio jurídico planejado, ou a falta de realidade e verdade na sua execução, é ne-cessário recompor qual teria sido o fato jurídico tributário, de forma a se atribuir esses efeitos, do negócio jurídico próprio, ao fato tributário.

PROPÓSITO NEGOCIALA existência de propósito negocial não é, por si só, suficiente para validar o negócio praticado como elisão fiscal, mormente quando

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divergentes a realidade extraída a partir dos elementos factuais do negócio e a forma utilizada para registrá-lo.

INCORPORAÇÃO ÀS AVESSAS

Não existe realidade negocial quando uma empresa com registro de prejuízo fiscal, mas sem atividade efetiva e sem operação, incorpora outra empresa operacional, ainda que do mesmo grupo. Hipótese em que todo o ativo operacional da empresa foi transferido por meio de cisão seguida de incorporação, ficando na empresa original apenas o registro de prejuízo.

Assim, não restou justificado ou comprovado qual o sentido e reali-dade negocial em se esvaziar o ativo operacional de uma empresa, deixando-a apenas e tão somente com seu prejuízo fiscal. Na verda-de, ao fazê-lo, criou-se uma empresa fictícia, de fachada, cujo único objetivo era carregar o prejuízo fiscal acumulado.

MULTA QUALIFICADA NO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO

Apesar da nítida intenção do contribuinte em ver reduzida sua tribu-tação, não vejo a presença do dolo relacionado à conduta que levou à pretendida redução de tributo. Nos casos de planejamento tributá-rio, é necessário que seja identificado o dolo relacionado à ilicitude da conduta praticada, e não com relação ao objetivo de redução de tributo. Mesmo porque está no cerne do conceito de elisão fiscal a existência do direito do contribuinte de planejar seus negócios com o objetivo de redução ou não pagamento de tributos.

No entanto, frustrado o planejamento tributário e ausente a evidência de que o contribuinte sabia e queria praticar o ilícito, deve ser afas-tada a multa qualificada. Tem-se, assim que, apesar de o negócio ter sido considerado simulado, afastando-se os seus efeitos para fins de tributação, identificando-se ser o tributo devido, resta evidente que a Recorrente agiu certa de que estaria praticando o chamado negócio jurídico lícito, afastando o dolo apontado.Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

Acordam os membros do colegiado, em dar provimento parcial, nos se-guintes termos: i) Por unanimidade de votos, negaram provimento em relação ao mérito; ii) Por maioria de votos, deram provimento apenas para reduzir a multa qualificada de 150% (cinquenta por cento) para 75% (setenta e cinco), vencido o Conselheiro Fernando Luiz Gomes de Mattos. Os Conselheiros Sérgio Luiz Bezerra Presta e Karem Jureidini Dias votaram pelas conclusões. Ausente justificadamente o Conselheiro Maurício Pereira Faro.

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(Assinado digitalmente) Jorge Celso Freire da Silva Presidente

(Assinado digitalmente) Alexandre Antonio Alkmim Teixeira Relator

Participaram da sessão de julgamento os conselheiros: Jorge Celso Freire da Silva (Presidente), Alexandre Antonio Alkmim Teixeira, Sergio Luiz Bezerra Presta, Antonio Bezerra Neto, Fernando Luiz Gomes de Mattos, Karem Jureidini Dias.

relatório

Trata o presente feito de auto de infração de Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ, decorrente da glosa no aproveitamento de prejuízo de empresa incorporada pela Recorrente, sob a acusação fiscal de ter ocorrido a chamada “incorporação às avessas”. Sobre o crédito tributário apurada, foi aplicada cor-reção monetária e juros calculados pela Selic, além de multa de ofício qualifi-cada no percentual de 150%.

Segundo o Termo de Verificação e Infração Fiscal às fls. 344, o Grupo Daimler-Chrysler é controlado, no Brasil, pela empresa Starexport Trading S/A (XXXX), que tem como acionista majoritário a empresa Mercedes Benz do Brasil Ltda. (XXXX).

No ano-calendário 2005, a Starexport Trading S/A era a controladora de duas instituições financeiras do grupo, a saber: Banco Daimler-Chrysler S.A. (XXXX) e Daimler-Chrysler DC Leasing e Arrendamento Mercantil S/A (XXXX).

Em 07 de janeiro de 2005, o Banco Daimler-Chrysler S.A. adquiriu 100% das ações da empresa Alvorada Leasing (XXXX), que passou a se chamar Daimler-Chrysler Leasing e Arrendamento Mercantil.

Neste momento, o grupo empresarial passou a deter duas empresas de arrendamento mercantil: (i) Daimler-Chyrsler DC Leasing e Arrendamento Mer-cantil S/A (XXXX) e (ii) Daimler-Chrysler Leasing e Arrendamento Mercantil (an-tiga Alvorada Leasing XXXX).

Em 29 de julho de 2005, promoveu-se uma cisão parcial do patrimô-nio da (i) Daimler-Chyrsler DC Leasing e Arrendamento Mercantil S/A (XXXX) para a (ii) Daimler-Chrysler Leasing e Arrendamento Mercantil (antiga Alvorada Leasing XXXX). Ainda esta (ii) passou a ser designada de Mercedes Benz Leasing do Brasil Arrendamento Mercantil S/A.

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Em 30 de setembro de 2005, por meio de assembléia extraordinária, a empresa (i) Daimler-Chyrsler DC Leasing e Arrendamento Mercantil S/A (XXXX) foi transformada em banco múltiplo, o que se concretizou por aprovação do Banco Central do Brasil ocorrida em 28 de abril de 2006. Ainda, alterou-se sua denominação social para Banco Daimler-Chrysler DC S/A (XXXX).

Por fim, em 31 de agosto de 2006, o Banco Daimler-Chrysler DC S/A (XXXX) incorporou o Banco Daimler-Chrysler S/A (XXXX).

Nesse contexto, a Autoridade Fiscal entendeu pela inexistência de reali-dade nas transações societárias apresentadas pela Recorrente, que não teriam outro fundamento senão a redução de tributos mediante a transferência de pre-juízos fiscais acumulados no exercício da atividade de arrendamento mercantil (área deficitária) para a compensação com os lucros advindos da exploração das atividades de banco múltiplo (área superavitária).

Segundo o termo de verificação fiscal, dentro da verificação do planeja-mento tributário estruturado em step transactions (fls. 347/348):

1) Anteriormente à reorganização societária, o grupo Daimler-Chrysler no Brasil, era constituído por uma empresa de leasing a Daimler-Chrysler DC Leasing e Arrendamento Mercantil (XXXX) e pelo Banco Daimler-Chrysler S.A. (XXXX).

2) A reorganização societária inicia-se com a compra da Alvorada Leasing. A partir deste momento, o grupo passa a operar com duas empresas de leasing.

3) Como havia a intenção de continuar a operar com uma única empresa de leasing no grupo (intenção já demonstrada no protocolo de justificativa da cisão parcial, onde se afirma que a cisão será seguida pela incorporação), e feita a cisão parcial, com a transferência das operações de leasing para a Alvorada no mesmo ano.

4) Com a transferência das operações de leasing para a Alvorada, a empresa de leasing remanescente e transformada em banco múltiplo, carreando os prejuízos fiscais gerados em decorrência do benefício fiscal próprio da atividade de leasing.

5) Transformada em banco, passam a coexistir no grupo, dois bancos múlti-plos, com o mesmo objeto social.

6) Tal fato, acarreta a possibilidade de incorporação “As avessas”, com a transferência do saldo de prejuízos fiscais para o banco superavitário.

Após a reorganização societária, o grupo Daimler-Chrysler no Brasil, opera com o Banco Daimler-Chrysler DC Leasing Exxxxxxxxxxxxxxx Arrendamen-to Leasing e Arrendamento Mercantil (XXXX), mesma estrutura anterior A reorganização societária.

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Conclui-se que a intenção era operar da mesma forma anterior, com um banco e uma leasing, mas para viabilizar a utilização de prejuízos fiscais da leasing no banco, e ainda continuar a operar com uma leasing, se tornava necessário a compra de uma outra empresa de leasing, o que ocorreu com a aquisição e transferência de operações para a Alvorada Leasing, seguida da transformação da leasing remanescente em banco.

Chama a atenção, a Autoridade Fiscal, que todas as alterações societárias ocorreram no ano de 2005, finalizando com a aprovação do Banco Central no de 2006. Assim, entende que “todos estes fortes indícios levam à conclusão de que os eventos societários ocorridos no decorrer dos anos-calendário de 2005 e 2006 ocorreram com o objetivo único, de provocar artificialmente a necessi-dade da reorganização societária, dissimulando-se uma realidade já existente, com a finalidade de reduzir o impacto da carga tributária” (fl. 349 – com desta-ques no original).

Cotejando o caso dos autos com a jurisprudência administrativa, a Auto-ridade Fiscal ressalta que “caso o grupo viesse operando com dois bancos, man-tendo duas estruturas com o mesmo objeto social (banco múltiplo), não haveria impedimento legal, que na busca da melhor eficiência, vedasse a incorporação da empresa deficitária pela não deficitária. Neste caso em questão, a empresa de leasing transformada em banco, não operava como tal. No grupo havia um banco e uma leasing, mas não dois bancos que operassem com o mesmo objeto social” (fl. 351).

Aduz, assim, a aplicação do conceito de simulação, forte no § 1º do art. 167 do Código Civil de 2002, e aplica a multa qualificada sob o fundamento do evidente intuito de fraude.

Em sua defesa, a Recorrente apresentou impugnação, em que ratifica, estruturalmente, os fatos apresentados pela Autoridade Fiscal, que podem ser assim resumidos:

Início do ano calendário 2005:

grupo daimler-crysler

Mercedes Benz do Brasil S/A

Starexport Trading S/A

Banco Daimler Crysler

02.831.756/0001-08

Daimler Crysler DC Lesing

60.814.191/0001-57

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Em 07 de janeiro de 2005:

grupo daimler-crysler

Em 29 de julho de 2005, cisão seguida de incorporação com transferên-cia das atividades de arredamento mercantil:

grupo daimler-crysler

Em 28 de abril de 2006, após aprovação, pelo Bacen, da conversão da empresa Daimler-Chrysler DC Leasing em banco múltiplo, com alteração de sua denominação social:

Mercedes Benz do Brasil S/A

Starexport Trading S/A

Banco Daimler Crysler

02.831.756/0001-08Daimler Crysler

DC Leasing 60.814.191/0001-57

Alvorada Leasing 00.162.760/0001-03

(DaimlerChrysler Leasing)

Mercedes Benz do Brasil S/A

Starexport Trading S/A

Banco Daimler Crysler

02.831.756/0001-08Daimler Crysler

DC Laesing 60.814.191/0001-57

Mercedes Benz Leasing

00.162.760/0001-03

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grupo daimler-crysler

Por fim, em 31 de agosto de 2006, o Banco Daimler-Chrysler DC incor-porou o Banco Daimler-Chrysler:

grupo daimler-crysler

Resultado final:

Banco Daimler Crysler

02.831.756/0001-08

Mercedes Benz Leasing

00.162.760/0001-03

Banco Daimler Crysler DC

60.814.191/0001-57

Mercedes Benz do Brasil S/A

Starexport Trading S/A

Mercedes Benz do Brasil S/A

Starexport Trading S/A

Banco Daimler Crysler

02.831.756/0001-08

Mercedes Benz Leasing

00.162.760/0001-03

Banco Daimler Crysler DC

60.814.191/0001-57

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grupo daimler-crysler

Como comprovação da existência de caráter negocial das operações su-pradescritas, a Recorrente alegou o seguinte:

a) que após a aquisição da empresa Alvorada Leasing, cuja denominação social foi modificada para Daimler-Chrysler Leasing (XXXX), com sede em Barueri, e a incorporação patrimonial decorrente da cisão parcial da em-presa Daimler-Chrysler DC Leasing (XXXX), todas as operações de arren-damento mercantil passaram a ser realizadas por aquela empresa;

b) que a parcela objeto de cisão e incorporação na operação supradescrita equivale aos ativos e passivos de arrendamento mercantil, transferidos da empresa Daimler-Chrysler DC Leasing para a empresa Daimler-Chrysler Leasing, antiga Alvorada Leasing;

c) que após a cisão, a antiga empresa de leasing do grupo, Daimler-Chrysler DC Leasing (XXXX), deixou de realizar atividade de arrendamento mercan-til para se transformar em banco múltiplo;

d) que o objetivo da reorganização societária foi a aquisição de uma empresa de arrendamento mercantil no município de Barueri, onde o ISSQN con-ferido às empresas sediadas no Município antes da Emenda Constitucional nº 37/2002 permaneceu em 0,25%, ao passo que as demais se sujeitariam a uma alíquota do imposto municipal de mínimo 2%;

e) que após a cisão da empresa Daimler-Chrysler DC Leasing, essa tornou-se inoperante, razão pela qual deliberou-se a sua transformação em banco múltiplo;

f) ocorre que, após a aprovação da mudança, o Grupo empresarial passou a operar com dois bancos múltiplos, “o que não era interessante, em razão

Mercedes Benz do Brasil S/A

Starexport Trading S/A

Banco Daimler Crysler DC

60.814.191/0001-57

Mercedes Benz Leasing

00.162.760/0001-03

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da multiplicidade de custos e ônus gerados pela manutenção de duas ins-tituições idênticas” (fl. 368);

g) argumenta que, nesse contexto, a Recorrente “tinha duas opções: o Banco Daimler-Chrysler S/A incorpora o Banco Daimler-Chrysler DC S/A ou vice versa” (fl. 369);

h) apresenta justificativa para que o Banco Daimler-Chrysler DC S/A (Recor-rente) tenha incorporado o outro banco do grupo, a saber: “como a Im-pugnante não podia encerrar a empresa de leasing situada em São Paulo e como as operações de arrendamento mercantil praticadas por bancos múltiplos eram tributadas a alíquota zero da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira CPMF, outra opção não restou ao Grupo senão transformá-la em banco múltiplo, com o fim precípuo de uni-la à institui-ção financeira já existente: Banco Daimler-Chrysler S/A”.

i) em resumo, reforça que “o escopo da reorganização societária foi a aber-tura de uma empresa de arrendamento mercantil no município de Barueri, pelas razões já expostas. Para que o Grupo não ficasse com uma empresa de leasing inoperante em São Paulo, sem que pudesse encerrá-la em razão de seu passivo, transformou-a em banco múltiplo para que a instituição financeira já existente absorvesse esta nova. Assim, o Grupo voltaria a ope-rar com uma empresa de arrendamento mercantil e um banco múltiplo, como antes, só que com a primeira empresa situada em Barueri, com cus-tos e carga tributária infinitamente menores, bem como com um banco múltiplo que pode exercer atividades de arrendamento mercantil, as quais ficariam sujeitas à alíquota zero da CPMF”.

j) Apresentou preliminar de nulidade do lançamento e, por fim, questionou a aplicação da multa qualificada.

Em julgamento perante a Delegacia Regional de Julgamento de São Paulo I, a Turma Julgadora entendeu pela manutenção do lançamento, tendo a deci-são sido ementada com o seguinte verbete:

Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ

Ano-calendário: 2006, 2007

NULIDADE – CANCELAMENTO

Satisfeitos os requisitos do art. 10 do Decreto nº 70.235/1972 e não tendo ocorrido o disposto no art. 59 do mesmo decreto, não há que se falar em anulação ou cancelamento da autuação.

INCORPORAÇÃO DE EMPRESA – COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO FISCAL – NECESSIDADE DE PROPÓSITO NEGOCIAL – UTILIZAÇÃO DE “EMPRESA VEÍCULO”

Não produz o efeito tributário almejado pelo sujeito passivo (compensação de prejuízo fiscal da empresa incorporada de fato) a utilização de empresa

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inoperante e deficitária para simular incorporação de empresa lucrativa, sem qualquer finalidade negocial ou societária.

Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário

Exercício: 2006, 2007

SIMULAÇÃO – CARACTERIZAÇÃO

O fato de os atos societários terem sido formalmente praticados, com registro nos órgãos competentes, escrituração contábil, etc. não retira a possibilidade de que a operação em causa se enquadre como simulação, visto que faz par-te da natureza da simulação o envolvimento de atos jurídicos lícitos. Afinal, simulação é a desconformidade, consciente e pactuada, entre as partes que realizam determinado negócio jurídico, entre o negócio efetivamente prati-cado e os atos formais (lícitos) de declaração de vontade.

SIMULAÇÃO – MULTA QUALIFICADA

A prática da simulação com o propósito de dissimular, no todo ou em parte, a ocorrência do fato gerador do imposto caracteriza a hipótese de qualifica-ção da multa de ofício, nos termos da legislação de regência.

ATOS SIMULADOS – ANULAÇÃO – VIA DEMANDA JUDICIAL – DESNE-CESSÁRIA

No campo do direito tributário, sem prejuízo da anulabilidade (que opera no plano da validade), a simulação lesiva ao Erário tem outro efeito, que se dá no plano da eficácia: os atos si não têm eficácia contra o Fisco, que não necessita, portanto judicialmente sua anulação.

Impugnação improcedente.

Crédito tributário mantido.

Inconformada, a Contribuinte apresentou recurso voluntário, por meio do qual agregou, às razões já apresentadas, demonstrativo de que a alteração das operações de arrendamento mercantil do Município de São Paulo para o Município de Barueri promoveram efetiva redução de custos com o ISSQN.

A Fazenda Nacional apresentou contrarrazões ao recurso voluntário, em que rebate os argumentos da Recorrente com fundamento nas razões outrora apresentadas no termo de verificação fiscal e no acórdão recorrido.

É o relatório.

voto

Conselheiro Alexandre Antonio Alkmim Teixeira, Relator:

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O recurso voluntário é tempestivo e, atendidos os demais requisitos de lei, dele conheço.

Antes de adentrar no julgamento do presente caso propriamente dito, permito-me tecer algumas considerações acerca do tratamento dado ao pla-nejamento tributário pelo direito brasileiro, com especial foco na evolução da jurisprudência administrativa.

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO

Não se olvida que o direito entende que o planejamento tributário con-siste na prática de condutas lícitas, permitidas pelo direito, adotadas pelo con-tribuinte, e que tem como efeito a redução ou não do pagamento do tributo que, caso não tivesse havido o planejamento, seria devido. Nesse sentido, o planejamento tributário é, antes de tudo e nada mais além do que um planeja-mento. Trata-se de um pensar com antecedência, um se organizar, um planejar, tendo em mente que, para se alcançar determinado resultado negocial, existe uma alternativa ou um outro negócio jurídico lícito que, se realizado, levará à redução ou não pagamento de tributo. Neste sentido, quando se está diante de um planejamento tributário, pressupõe-se a existência de um negócio normal (não planejado) que enseja uma determinada carga de tributação, e um negócio jurídico alternativo (planejado), que tem por efeito a redução ou não pagamento de tributos pelo contribuinte.

Observando a jurisprudência administrativa reinante no extinto Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, identificamos que a verificação da licitude negocial era feita na análise do negócio jurídico realizado pelo con-tribuinte (planejado), de forma a identificar se o mesmo se coadunava com o direito, sendo certo que “aquilo que não era proibido, era permitido” segundo o princípio da liberdade negocial que rege o mundo privado. Neste prisma, a análise do negócio planejado era suficiente, por si só, para dizer se se estava diante de uma elisão fiscal, cujos efeitos de redução tributária deveriam ser res-peitados pela Fazenda Pública, ou se se estava diante de um negócio jurídico ilícito, cujos efeitos tributários deveriam ser afastados pelo Fisco.

No entanto, com a evolução da jurisprudência administrativa, principal-mente a partir de 2006, cresceu o entendimento de que não basta o negócio jurídico realizado ser tido por lícito. É necessário verificar-se a realidade do negócio praticado pois é dessa realidade (evento) que se extrai o fato jurídico tributário.

Assim, para o direito tributário, forte na doutrina de Paulo Barros Carvalho, o fato jurídico é a qualificação jurídica dada ao evento, e não o con-trário. Não é o evento que dita como o direito deve conhecê-lo, mas sim o di-reito, fixando os pressupostos caracterizadores do fato jurídico em uma hipótese

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geral e abstrata, é que permite juridicizar o evento, tornando o fato jurídico rele-vante para o conhecimento da relação jurídico-tributária individual e concreta.

Neste sentido, este Conselho Administrativo de Recursos Fiscais passou a reconhecer, nas hipóteses de planejamento tributário, a necessidade de co-nhecer o “fato jurídico tributário”, de forma a saber não apenas se o negócio jurídico realizado pelo contribuinte é lícito. Antes disso, é necessário identificar qual o fato jurídico praticado pelo Contribuinte, extraindo-se do mundo dos eventos, o fato jurídico relevante para instaurar a norma individual e concreta de tributação.

Interessante notar que, no percurso de conhecimento adotado em inúme-ros julgados dessa Corte, os votos caminharam por doutrinas diversas para se chegar a este mesmo ponto. Abuso de direito, substancia negocial, ato anormal de gestão, intenção negocial, dentre outros, forma instrumentos jurídicos am-plamente utilizados para se buscar o conhecimento do fato tributável. Eu mes-mo, em posicionamentos precedentes, já me vali destes institutos (caso Klabin 19515.001895/200711):

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO – SIMULAÇÃO – NEGÓCIO JURÍDICO IN-DIRETO

A simulação existe quando a vontade declarada no negócio jurídico não se coaduna com a realidade do negócio firmado. Para se identificar a natureza do negócio praticado pelo contribuinte, deve ser identificada qual é a sua causalidade, ainda que esta causalidade seja verificada na sucessão de vá-rios negócios intermediários sem causa, na estruturação das chamadas step transactions. Assim, negócio jurídico sem causa não pode ser caracterizado como negócio jurídico indireto. O fato gerador decorre da identificação da realidade e dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos, e não de vontades formalmente declaradas pelas partes contratantes ou pelos contribuintes.

[...]

A questão posta em análise perante este Conselho reporta-se a um enfren-tamento doutrinário já bastante experimentado, em que correntes se contra-põem sobre a possibilidade, ou não, de a Fazenda Pública desconsiderar os negócios praticados pelos contribuintes que impeçam a ocorrência do fato gerador ou conduzam à sua ocorrência com o estabelecimento de obrigação tributária economicamente menos onerosa.

Trata-se da definição do estreito liame que separa a organização lícita do particular que, mediante condutas permitidas pelo Direito, consegue a redu-ção do montante do tributo a ser pago, dentro que se convencionou chamar elisão fiscal; e a organização ilícita do contribuinte ilicitude em acepção ampla – que provoca a redução do montante do tributo a ser pago. A pri-meira, elisão fiscal, deve ser respeitada e a segunda, evasão fiscal, deve ser combatida e reprimida.

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No entanto, os critérios adotados para a definição do que seja elisão ou evasão fiscal, apesar das valiosas laudas já produzidas pela doutrina, ainda sofrem, no enfrentamento empírico, da ausência de nítida identificação do que seja permitido e proibido na esfera do planejamento empresarial voltado à redução da obrigação tributária.

[...]

Nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, o contribuinte iden-tifica a ocorrência do fato gerador, identifica os elementos da relação jurí-dico-tributária, apura e recolhe o montante do tributo que entende devido e aguarda a sua homologação por parte da Administração Tributária. Assim, o planejamento tributário é possível pois o contribuinte, mediante condutas que considera lícitas, impede ou retarda a ocorrência do fato gerador e, por consequência, o surgimento da relação jurídico-obrigacional, ou provoca sua ocorrência de forma menos onerosa. Cabe à Administração Tributária, no seu processo de revisão/homologação, aceitar ou rechaçar a conduta que provocou o afastamento da relação tributária mais onerosa.

Retomando a linha de entendimento, a verificação da licitude ou da ilicitu-de deve atender aos aspectos legais, ou seja, somente o que a lei considera como sendo ilícito poderá ser desconsiderado pela Administração Tributária. No entanto, esse conceito de ilicitude deve ser lido em sua acepção ampla, e não estritamente no âmbito da ilicitude penal. Considera-se, no bojo dessa teorização, como sendo ilícita a conduta que se valha de fraude ou simu-lação. No caso, a acusação que paira sobre a Recorrente é de que tenha simulado o negócio realizado.

A simulação, tomada como elemento de desconsideração do auto de infra-ção em análise, no bojo da teoria da licitude do planejamento tributário, reporta-se à disciplina traçada pelo Código Civil.

Diz, o Diploma Material, o seguinte, in verbis:

Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dis-simulou, se válido for na substância e na forma.

§ 1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:

I – aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;

II – contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verda-deira;

III – os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

§ 2º Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraen-tes do negócio jurídico simulado.

No entanto, ao lado da simulação vista sob a ótica civilista, surgiu a figura do negócio jurídico indireto, pelo qual as partes contratantes se utilizam de

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uma formação negocial típica ou atípica para alcançar o mesmo objetivo que uma outra formação negocial típica poderia lhe conferir. Por meio do negó-cio jurídico indireto, licitamente se afasta o regime do negócio típico com a aplicação de estrutura negocial diversa, desde que tal estruturação não sirva para driblar ilicitamente o regime aplicável ao negócio típico.

O Superior Tribunal de Justiça, na esteira da Doutrina do seu Ministro Moreira Alves, esclarece que no negócio jurídico indireto, “as partes recor-rem a um negócio jurídico típico [...] sujeitando-se à sua disciplina formal e substancial, para alcançar um fim prático ulterior [...], o qual não é normal-mente atingido por meio desse negócio jurídico típico” (REsp 28.598/BA). No entanto, “isso supõe a licitude do ajuste celebrado pelas partes”, devendo o negócio jurídico indireto ser desconsiderado quando utilizado com o ob-jetivo de afastar proibição legal aplicável ao regime do negócio formalmente preterido (REsp 56.201/BA).

E o negócio jurídico indireto, nessa perspectiva, deve ser aceito e reconheci-do pelo Direito Privado como válido.

No caso em apreço, para que o negócio travado entre a Recorrente e a Aracruz pudesse ser considerado negócio jurídico indireto, seria necessário que existisse substância negocial que permitisse o atendimento da discipli-na legal em forma e conteúdo pelo negócio típico escolhido (reestruturação societária) que permitisse a transferência patrimonial realizada (compra e venda).

Em verdade, o Código Civil, ao falar da simulação, não se refere à contra-posição de vontades, para contrapor a existência de uma vontade declarada face uma vontade querida, mas sim o dissenso entre a vontade declarada e a situação fática especificamente praticada pelas partes no negócio jurídico.

Assim, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 167, existe simu-lação quando se declara a transferência de direitos a determinadas pessoas, mas que, na realidade, são outras, ou seja, na dicção da própria lei, “apa-rentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem”. Não se fala, nessa hipótese, de con-traposição de vontades, mas sim de contraposição de vontade declarada com a realidade.

Na hipótese do inciso II do mesmo dispositivo, existe simulação quando a vontade declarada, na forma de declaração, confissão, condição ou cláusula, não reflita a verdade dos fatos praticados.

Novamente verifica-se a contraposição de vontade declarada com realidade, de forma a se caracterizar a simulação a ser reconhecida como ilícita pelo aplicador do direito.

Por fim, a hipótese de simulação por estarem os documentos antedatados ou pós-datados também pressupõem uma declaração de uma situação de fato diversa daquela que efetivamente pôde ser observada no plano da realidade.

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Dentro dessa perspectiva, a simulação existe quando a vontade declarada no negócio jurídico não se coaduna com a realidade do negócio firmado.

Para que a aplicação deste entendimento seja possível, é necessário definir, no entanto, critérios para se identificar qual seja o negócio firmado, se é aquele formalmente declarado pelas partes contratantes, ou se é aquele ma-terialmente realizado e implementado, segundo o seu fundamento causal. É dizer, é necessário saber em até que ponto a forma pode ser tomada como elemento definidor da incidência tributária, em contraposição da identifica-ção da realidade praticada pelos particulares.

Isso porque a norma tributária, na esteira do ensinamento de Paulo de Barros Carvalho, descreve uma situação de fato que, se ocorrida no plano da realidade, provoca o nascimento da relação jurídico-tributária, num vínculo obrigacional que coloca o contribuinte como devedor do Sujeito Ativo para o pagamento de determinada quantia em dinheiro. Resta saber se, na esteira deste entendimento, a identificação do fato gerador, ou seja, do fato real-mente ocorrido na subsunção à descrição normativa, se faz pela sua forma, seu nomen juris, ou pela sua materialidade.

É este o ponto fulcral necessário à decisão do presente recurso.

Isso porque, de fato, a aplicação da teoria da simulação como a mera con-traposição de vontade declarada e querida, com a devida vênia, não tem es-paço na primazia da realidade tão querida e buscada pelo direito tributário.

Ora, a vontade não é elemento formador da norma de tributação. A nor-ma tributária, ao descrever a hipótese de incidência teorizada por Geraldo Ataliba, não descreve vontades, mas sim, hipoteticamente, elementos do fato que, se verificado no mundo da realidade, irá desencadear o surgimento de uma relação obrigacional de natureza tributária.

Se o elemento tomado para a tributação é o fato, e não a vontade, não pode esta (a vontade) ser tomada como único critério para se definir o que seja simulação no direito tributário. Falar que a simulação é a contraposição en-tre a vontade querida e a vontade declarada, no direito tributário, impede o reconhecimento da realidade daquilo que foi praticado e que efetivamente pode ser considerado como fato jurídico e, por consequência, fato gerador da relação jurídico-obrigacional tributária.

O tributo, por natureza e definição, não se pode constituir em obrigação (di-retamente) decorrente de ato de vontade. A vontade, na verdade, está presen-te de forma indireta, na medida em que, como a obrigação tributária decorre da prática, por um sujeito, do fato hipoteticamente descrito no antecedente da norma de incidência, a voluntariedade pode se dar na decisão deste su-jeito em realizar, ou não, a hipótese descrita. Assim, tem-se, inicialmente, a pré-disposição de um ato de vontade (mediata): aquela do sujeito em re-alizar, ou não, o fato descrito na hipótese de incidência. Todavia, realizado tal fato, não há como o sujeito livrar-se da obrigação que a norma tributária lhe impõe: a obrigação tributária é compulsória e decorrente de disposição

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da lei, e não da sua vontade (imediata). Ou seja, ainda que o contribuinte não tivesse querido praticar o fato gerador, se de fato o pratica, instaura-se a relação jurídico-obrigacional perante o Sujeito Ativo do tributo.

Para se identificar a natureza do negócio praticado pelo contribuinte, deve ser identificada qual é a sua causalidade, ainda que esta causalidade seja verificada na sucessão de vários negócios intermediários sem causa, na es-truturação das chamadas step transactions.

Assim, pela causalidade poderemos definir qual o negócio efetivamente realizado. Dentro dessa perspectiva, o objeto da tributação será o negócio jurídico causal, e não necessariamente o negócio jurídico formal, principal-mente quando a forma adotada não reflete a causa de sua utilização. E isso está consignado expressamente no art. 118 do Código Tributário Nacional, que dispõe o seguinte, in litteris:

Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se:

I – da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuin-tes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos;

II – dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos.

Ou seja, o fato gerador decorre da identificação da realidade e dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos, e não de vontades formalmente declaradas pelas partes contratantes ou pelos contribuintes.

De fato, é este o entendimento que o extinto Conselho de Contribuintes, sucedido por este Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, con-signou em sua jurisprudência e que tomo como precedente para este julga-mento:

“SIMULAÇÃO/DISSIMULAÇÃO – Configura-se como simulação, o com-portamento do contribuinte em que se detecta uma inadequação ou ine-quivalência entre a forma jurídica sob a qual o negócio se apresenta e a substância ou natureza do fato gerador efetivamente realizado, ou seja, dá-se pela discrepância entre a vontade querida pelo agente e o ato por ele praticado para exteriorização dessa vontade, ao passo que a dissimu-lação contém em seu bojo um disfarce, no qual se encontra escondida uma operação em que o fato revelado não guarda correspondência com a efetiva realidade, ou melhor, dissimular é encobrir o que é.” (Acórdão nº 10194.771)

“SIMULAÇÃO – Caracterizada a simulação, os atos praticados com o objetivo de reduzir artificialmente os tributos não são oponíveis ao fisco, que pode desconsiderá-los.

Se os atos formalmente praticados, analisados pelo seu todo, demonstram não terem as partes outro objetivo que não se livrar de uma tributação espe-cífica, e seus substratos estão alheios às finalidades dos institutos utilizados

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ou não correspondem a uma verdadeira vivência dos riscos envolvidos no negócio escolhido, tais atos não são oponíveis ao fisco, devendo merecer o tratamento tributário que o verdadeiro ato dissimulado produz.

Subscrição de participação com ágio, seguida de imediata cisão e entrega dos valores monetários referentes ao ágio, traduz verdadeira alienação de participação societária.” (Acórdão nº 10195.537)

“SIMULAÇÃO/DISSIMULAÇÃO – Configura-se como simulação, o com-portamento do contribuinte em que se detecta uma inadequação ou ine-quivalência entre a forma jurídica sob a qual o negócio se apresenta e a substância ou natureza do fato gerador efetivamente realizado, ou seja, dá-se pela discrepância entre a vontade querida pelo agente e o ato por ele praticado para exteriorização dessa vontade, ao passo que a dissimu-lação contém em seu bojo um disfarce, no qual se encontra escondida uma operação em que o fato revelado não guarda correspondência com a efetiva realidade, ou melhor, dissimular é encobrir o que é.” (Acórdão nº 10194.771)

“SIMULAÇÃO – CONJUNTO PROBATÓRIO – Se o conjunto probató-rio evidencia que os atos formais praticados (reorganização societária) divergiam da real intenção subjacente (compra e venda), caracteriza-se a simulação, cujo elemento principal não é a ocultação do objetivo real, mas sim a existência de objetivo diverso daquele configurado pelos atos praticados, seja ele claro ou oculto.” (Acórdão nº 10421.675)

Outro ponto que merece destaque acerca do meu entendimento da ma-téria refere-se à necessidade de identificação do negócio jurídico dissimulado, para se atribuir os efeitos tributários próprios desse negócio jurídico.

Essa questão é absolutamente relevante em matéria de planejamento tri-butário, mas muitas vezes ignorada pelos operadores do direito.

Sempre que se está diante de um planejamento tributário, tem-se um negócio jurídico alternativo realizado pelo contribuinte, com o objetivo de al-cançar uma vantagem negocial que seria obtida pela prática de um negócio jurídico original, tributariamente mais oneroso do que o original. Neste sentido, o contribuinte que realiza um planejamento tributário se organiza, planeja e executa um negócio jurídico que lhe dê as mesmas vantagens negociais do que um outro negócio jurídico, mas com a vantagem de redução ou não pagamento de tributos.

Constatada a ilicitude do negócio jurídico planejado, ou a falta de re-alidade e verdade na sua execução, é necessário recompor qual teria sido o fato jurídico tributário, de forma a se atribuir esses efeitos, do negócio jurídico próprio, ao fato tributário.

Explico: no planejamento tributário, o contribuinte poderia chegar a um resultado negocial “R” mediante determinada conduta “C” sujeita a certa carga

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de tributação “T”. Ao promover o planejamento tributário, o contribuinte exe-cuta uma conduta “planejada “P”, para alcançar o mesmo resultado “R”, mas com redução ou não pagamento de tributo “T”.

Identificada a ilicitude na conduta “P”, deve ser afastado o efeito redutor da tributação “T”. Mas para tanto, é necessário identificar a norma individual e concreta de tributação, mediante a individualização da conduta “C” e da tribu-tação original “T” cujos elementos devem ser aplicados na norma individual e concreta de tributação.

Postas essas considerações, e ausente, no recurso, qualquer questiona-mento preliminar, passo à análise dos fatos constantes dos presentes autos.

mÉrito

A questão a ser examinada refere-se à compensação de prejuízos fiscais no caso de incorporação de sociedade lucrativa por outra detentora de prejuí-zos fiscais, sendo ambas do mesmo grupo empresarial.

A referida operação foi considerada pela Autoridade Fiscal como simu-lada, vez que a compensação de tais prejuízos fiscais seria o único objetivo da operação societária realizada. Desta forma, estaria o contribuinte violando, indiretamente, as normas que vedam a compensação de prejuízos fiscais abaixo citadas:

Art. 513. A pessoa jurídica não poderá compensar seus próprios prejuízos fis-cais se entre a data da apuração e da compensação houver ocorrido, cumu-lativamente, modificação de seu controle societário e do ramo de atividade. (Decreto-Lei nº 2.341, de 29 de junho de 1987, art. 32)

Art. 514. A pessoa jurídica sucessora por incorporação, fusão ou cisão não poderá compensar prejuízos fiscais da sucedida. (Decreto-Lei nº 2.341, de 1987, art. 33)

Parágrafo único. No caso de cisão parcial, a pessoa jurídica cindida poderá compensar os seus próprios prejuízos, proporcionalmente à parcela rema-nescente do patrimônio líquido. (Decreto-Lei nº 2.341, de 1987, art. 33, pa-rágrafo único)

Ao analisar o contexto da inserção das normas de limitação à com-pensação de prejuízos fiscais (arts. 513 e 514 do RIR/1999, inseridas pelos arts. 32 e 33 do Decreto-Lei nº 2.341/1987), verifica-se que a intenção era afas-tar a possibilidade de alguma pessoa jurídica adquirir outra apenas com a fina-lidade de compensar os prejuízos fiscais, conforme se depreende da exposição de motivos daquele diploma legal:

O art. 32 dispõe sobre a não compensação de prejuízos fiscais apurados pe-las pessoas jurídicas, quando, após a apuração dos prejuízos tiver ocorrido

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modificação do controle societário e do ramo de atividade da empresa. Essa norma visa restringir a absorção de uma pessoa jurídica por outra com o objetivo de compensar prejuízos fiscais. O art. 33 consolida normas de legis-lação em vigor, relativamente à compensação de prejuízos na ocorrência da incorporação, fusão ou cisão de empresas.

(Diário do Congresso Nacional de 17.12.1987, p. 726)

Segundo Ricardo Mariz de Oliveira1, a preocupação das autoridades fis-cais decorria de que, àquela época, havia se instalado e difundido a prática da aquisição de pessoas jurídicas deficitárias, quase sempre inativas, por ou-tras lucrativas, com o único fito de reduzir a carga tributária destas através do aproveitamento dos prejuízos daquelas. Eram as famosas shell companies que chegavam a ser vendidas até por anúncios em jornais.

Este é, portanto, o espírito que deve seguir a interpretação das normas antielisivas acima citadas que vedam o aproveitamento de prejuízos fiscais.

Deve-se ter em mira, também, que, nos dizeres de Humberto Ávila2, o direito ao abatimento de prejuízos fiscais acumulados em exercícios anteriores não pode ser qualificado como mero instrumento de política tributária expres-sivo de benefício fiscal em favor do contribuinte e, como tal, ser manipulado pelo Poder Legislativo, tanto para ser amplamente concedido quanto para ser totalmente suprimido. Ao contrário, ele é uma imposição constitucional decor-rente das regras de competência para instituição do imposto sobre a renda e da contribuição sobre o lucro, dos princípios da igualdade, da capacidade contri-butiva e da proibição do confisco.

Neste cenário, temos que, no início do ano de 2005, o Grupo Daimler--Chrysler operava no Brasil com duas empresas, Banco Daimler-Chrysler (XXXX) e Daimler-Chrysler DC Leasing (XXXX).

Segundo alegado pela Recorrente e documentalmente comprovado nos autos, o Grupo resolveu adquirir a empresa Alvorada Leasing, com sede em Barueri, e que goza de benefício fiscal de ISSQN; e que foi rebatizada de Daimler-Chrysler Leasing (XXXX).

Até aqui não existe qualquer questionamento acerca dos negócios ju-rídicos realizados. Houve a aquisição, pelo Banco Daimler-Chrysler (XXXX), de uma empresa de leasing operacional (Alvorada Leasing/Daimler-Chrysler Leasing XXXX), com nítido propósito negocial e sem qualquer questionamento acerca da realidade do negócio.

Ainda, está clara a existência de propósito negocial na extinção de uma das empresas de leasing, para que o grupo passasse a operar com apenas uma;

1 Em Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 869.

2 Em Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros Editores, 2011. p. 76 e 77.

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bem como a preferência na subsistência da recém adquirida Alvorada Leasing/Daimler-Chrysler Leasing XXXX, posto que somente ela teria o benefício fiscal de ISSQN no município de Barueri.

A questão posta nos presentes autos é saber se foi lícita a operação de (i) transferência dos ativos da Daimler Chrysler DC Leasing (XXXX) para a Alvo-rada Leasing/Daimler-Chrysler Leasing XXXX; (ii) com posterior transformação da Daimler-Chrysler DC Leasing (XXXX) em banco múltiplo (Banco Daimler--Chrysler DC) seguido de (iii) incorporação, pelo Banco Daimler-Chrysler DC (XXXX), do operacional Banco Daimler-Chrysler (XXXX).

Em suma, resta saber se foi lícita a transferência dos prejuízos acumula-dos no exercício da atividade de leasing (concentradas na originalmente opera-cional Daimler-Chrysler Leasing DC XXXX) para a atividade de banco múltiplo (originalmente concentradas no Banco Daimler-Chrysler (XXXX), mediante (i) a transformação da primeira em Banco múltiplo seguido (ii) da incorporação da segunda pela primeira.

Entendo que a análise dos fatos dos autos dá razão ao lançamento fiscal.

A uma, pois, como bem definido no auto de infração, não existe subs-tancia negocial na cisão da empresa de leasing Daimler-Chrysler DC Leasing (XXXX), com a transferência de todo o ativo operacional para a outra empresa de leasing (Alvorada Leasing/Daimler-Chrysler Leasing XXXX), remanescendo, na empresa cindida, apenas o prejuízo acumulado. Isso porque não restou jus-tificado ou comprovado qual o sentido e realidade negocial em se esvaziar o ativo operacional de uma empresa, deixando-a apenas e tão somente com seu prejuízo fiscal. Na verdade, ao fazê-lo, criou-se uma empresa fictícia, de facha-da, cujo único objetivo era carregar o prejuízo fiscal acumulado no exercício da atividade de arrendamento mercantil;

A duas pois, a partir do momento em que toda a atividade operacional da empresa de leasing Daimler-Chrysler DC Leasing (XXXX) foi transferido para a empresa Alvorada Leasing/Daimler-Chrysler Leasing XXXX, restando nela o pre-juízo fiscal, este prejuízo, que poderia ser registrado como ativo fiscal diferido deveria ser baixado, tendo em vista a ausência de operacionalidade da empresa remanescente e, por consequência, a ausência de previsibilidade de aferição de lucro – requisito essencial para a caracterização do prejuízo fiscal como ativo fiscal diferido.

A três, por não existir realidade negocial alguma em uma empresa não operacional (Banco Daimler-Chrysler DC XXXX), cujo ativo operacional havia sido todo transferido, incorporar uma empresa operacional, ainda que se consi-dere que essas operações se deram entre empresas do mesmo grupo econômico.

Não desconhecemos, nesse particular, o julgamento consolidado no Acórdão nº 10707.596, de 14.04.2004, da lavra do então Conselheiro Natanael Martins, in verbis:

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“Noutras palavras, o fato de a lei permitir a dita ‘incorporação às avessas’, não significa estarem as empresas diante de normas de absoluta permissividade, já que operações da espécie somente se justificam se, realmente, de verda-deiras operações societárias se tratarem. É dizer, operações de incorporação, fusão ou cisão, não se verificam apenas porque ‘contratos’ a tanto assinalam, porquanto se tratam de institutos consagrados no direito societário, cunhados para resolver reestruturações societárias, envolvendo efetivas empresas ou negócios. Aí está, pois, o limite da liberdade atribuída às pessoas jurídicas, ou melhor, aos administradores e controladores de pessoas jurídicas.

[...]

É que, como já assinalei, a operação foi realizada entre empresas que sempre estiveram sob controle comum, em plena atividade operacional. A escolha da denominação comercial que remanesceria ou a sede que se escolheria, não poderia ter o condão, por si só, de caracterizar a operação como simula-da. Aliás, como agiria a fiscalização se a denominação comercial resultasse da fusão dos dois nomes (p. ex., Martins e Marbo, Comércio, Distribuição e Transportes) e não tivesse havido a mudança da sede da empresa incorpo-radora? Por certo que do ponto de vista societário, econômico ou tributário, nenhuma mudança se teria.

Ora, como então caracterizar os atos praticados com simulados, se na forma e no conteúdo das operações nenhuma ofensa ao ordenamento se praticou? Mesmo que se tenha em questão que a incorporação às avessas se realizou para que não se perdessem os prejuízos acumulados e para que também do ponto de vista tributário a operação fosse menos onerosa, ainda assim nenhuma ofensa haveria ao ordenamento, mesmo adotando a corrente inter-pretativa que repugna o abuso no direito, combatendo figuras elisivas a partir desse contexto.”

O que difere o julgamento neste feito daquele acima citado é que, neste processo, a empresa incorporadora Banco Daimler-Chrysler DC XXXX nunca chegou a operar como banco múltiplo, tendo, ainda, o seu ativo operacional como empresa de arredamento mercantil sido transferido para outra empresa do grupo.

Assim, enquanto formalmente era o Banco Daimler-Chrysler DC XXXX quem incorporou o Banco Daimler-Chrysler (XXXX), tem-se que o banco in-corporado (Banco Daimler-Chrysler XXXX) era o único que operava e tinha estrutura própria de funcionamento enquanto banco múltiplo. O Banco Daim-ler-Chrysler DC XXXX (incorporador), por sua vez, só tinha o prejuízo fiscal, e nada mais. Com isso, não houve, na hipótese dos autos, a reunião de atividades operacionais de duas empresas por conta de uma incorporação, mas sim a apre-sentação de estruturas formais sem causa e sem realidade que permitisse a sua efetiva concretização.

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Nessa situação, não há como reconhecer a realidade negocial nas transa-ções levadas a feito pela Contribuinte, com o intuito de transferir os prejuízos da atividade de leasing para a atividade de banco múltiplo, razão pela qual deve ser mantido o auto de infração.

MULTA QUALIFICADA EM 150%

Segundo se extrai do auto de infração, a multa qualificada decorreu da verificação de que “a justificativa de que os atos foram praticados com o intuito de “reorganização societária” não descaracteriza a simulação, evidenciada pe-las ações praticadas em curto espaço de tempo, cujo elemento principal não é a ocultação da operação em sim, revestida de requisitos formais, mais sim a exis-tência de objetivo diverso daquele configurado pelos acordos documentados e apresentados ao Fisco”. Assim, aplicou-se a multa qualificada pela “intenção livre e consciente da contribuinte de evitar a ocorrência do fato gerador do IRPJ mediante simulação, conduta caracterizada no art. 72 da Lei nº 4.502/1964”.

Pois bem. Dispõe, o art. 44 da Lei nº 9.430/1996, o seguinte:

“Art. 44. Nos casos de lançamento de ofício, serão aplicadas as seguintes multas:

I – de 75% (setenta e cinco por cento) sobre a totalidade ou diferença de imposto ou contribuição nos casos de falta de pagamento ou recolhimento, de falta de declaração e nos de declaração inexata;

[...]

§ 1º O percentual de multa de que trata o inciso I do caput deste artigo será duplicado nos casos previstos nos arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964, independentemente de outras penalidades administrati-vas ou criminais cabíveis.” (sem grifos no original).

Já os arts. 71 a 73 da Lei nº 4.502/1964, tomados como base da qualifi-cação da multa pelo indigitado § 1º, dispõem o seguinte:

Art. 71. Sonegação é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, o conhecimento por parte da autoridade fa-zendária:

I – da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natu-reza ou circunstâncias materiais;

II – das condições pessoais de contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tributária principal ou o crédito tributário correspondente.

Art. 72. Fraude é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retar-dar, total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tribu-tária principal, ou a excluir ou modificar as suas características essenciais,

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de modo a reduzir o montante do imposto devido a evitar ou diferir o seu pagamento.

Art. 73. Conluio é o ajuste doloso entre duas ou mais pessoas naturais ou jurídicas, visando qualquer dos efeitos referidos nos arts. 71 e 72.

Da contraposição da “falta de declaração ou declaração inexata” cons-tante do inciso I do art. 44 da Lei nº 9.430/1996, com a “omissão dolosa ten-dente a impedir ou retardar, total ou parcialmente”, o conhecimento do fato gerador, constante do art. 71 da Lei nº 4.502/1964, entendo que, para a segun-da hipótese, a lei demanda a presença de dolo específico, mediante “ação ou omissão dolosa”, que deve ser especificamente provada na investigação admi-nistrativa, com fito à aplicação da multa majorada. Assim, a omissão desqualifi-cada de uma ação tendente a dissimular referida omissão, deve ser enquadrada no disposto no art. 44, I, da Lei nº 9.430/1996.

Assim, “deve ser afastada a qualificação da multa quando ausente a com-provação de fraude. Incabível a aplicação de penalidade por presunção de frau-de, em face de mera omissão de rendimentos apurada no lançamento” (aceita-ção unânime da 2ª Câmara do 1º CC, Relator Conselheiro Alexandre Andrade Lima da Fonte Filho, no Recurso nº 143.280, Acórdão nº 10247397).

Ainda, reforça este posicionamento a constatação de que “a majoração da multa de ofício deve estar suficientemente justificada e comprovada nos autos, já que decorre de casos de evidente má-fé” (aceitação da 6ª Câmara do 1º CC, Relator Conselheiro Wilfrido Augusto Marques, no Recurso nº 147842, Acórdão nº 10615545).

A dúvida é saber se, num caso como o presente, em que todos os atos praticados pela Recorrente, apesar de terem sido considerados sem intenção negocial, no primeiro momento, e com simulação, no segundo momento, mas mediante ampla publicidade de todo o processado, permitiria a identificação do chamado evidente intuito de fraude ou a prática de sonegação fiscal.

Isso por que a simulação importaria necessariamente em práticas de en-cobrir o fato realizado, de forma a que a conduta do Contribuinte tenha neces-sariamente de vir acobertada por um doloso véu de ocultação.

No caso dos autos, vejo que, apesar da nítida intenção do contribuinte em ver reduzida sua tributação, não vejo a presença do dolo relacionado à conduta que levou à pretendida redução de tributo. Nos casos de planejamento tributário, é necessário que seja identificado o dolo relacionado à ilicitude da conduta praticada, e não com relação ao objetivo de redução de tributo. Mes-mo porque está no cerne do conceito de elisão fiscal a existência do direito do contribuinte de planejar seus negócios com o objetivo de redução ou não pagamento de tributos.

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No entanto, frustrado o planejamento tributário e ausente a evidência de que o contribuinte sabia e queria praticar o ilícito, deve ser afastada a multa qualificada. Tem-se, assim que, apesar de o negócio ter sido considerado simu-lado, afastando-se os seus efeitos para fins de tributação, identificando-se ser o tributo devido, resta evidente que a Recorrente agiu certa de que estaria prati-cando o chamado negócio jurídico lícito, afastando o dolo apontado.

Entendo, pois, que não existiu, assim, o dolo específico pedido pelo ca-put dos arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502, de 1964, elemento essencial para se promover a qualificação da multa de ofício, ainda que tenha havido alteração das chamadas circunstâncias materiais ou a modificação das características es-senciais do fato gerador.

Importante ressaltar que o fundamento legal para afastar a simulação (art. 167 do Código Civil) é diverso daquele que respalda a qualificação da multa (arts. 71 a 73 da Lei nº 4.502).

Neste sentido, apresento precedentes do Conselho de Contribuintes, in verbis:

IRPJ – ATO NEGOCIAL – ABUSO DE FORMA – A ação do contribuinte de procurar reduzir a carga tributária, por meio de procedimentos lícitos, legí-timos e admitidos por lei revela o planejamento tributário. Porém, tendo o Fisco demonstrado à evidência o abuso de forma, bem como a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, cabível a desqualificação do negócio ju-rídico original, exclusivamente para efeitos fiscais, requalificando-o segundo a descrição normativo-tributária pertinente à situação que foi encoberta pelo desnaturamento da função objetiva do ato.

MULTA QUALIFICADA – EVIDENTE INTUITO DE FRAUDE – A evidência da intenção dolosa, exigida na lei para agravamento da penalidade aplicada, há que aflorar na instrução processual, devendo ser inconteste e demonstrada de forma cabal. O atendimento a todas as solicitações do Fisco e observân-cia da legislação societária, com a divulgação e registro nos órgãos públicos competentes, inclusive com o cumprimento das formalidades devidas junto à Receita Federal, ensejam a intenção de obter economia de impostos, por meios supostamente elisivos, mas não evidenciam má-fé, inerente à prática de atos fraudulentos. (Acórdão nº 10195.552)

SUBSCRIÇÃO DE AÇÕES COM ÁGIO E SUBSEQUENTE CISÃO – ALIENA-ÇÃO DE PARTICIPAÇÃO SOCIETÁRIA – SIMULAÇÃO – Os negócios jurí-dicos envolvendo as reorganizações societárias de que tratam os fatos, com subscrição de ações com ágio, seguida de imediata cisão e entrega dos valo-res monetários referentes ao aumento de capital, precedida de pacto simula-tório, e sem vivência dos riscos do negócio jurídico, revelam uma verdadeira alienação de participação societária e caracterizam a simulação, nos termos do art. 102, e seu inciso II, do Código Civil de 1916, uma vez que os atos for-mais são apenas aparentes e diferem do negócio efetivamente praticado. Tais

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atos não são oponíveis ao fisco, e nessa situação é devido o tributo incidente sobre o ganho de capital obtido com a alienação do investimento.

MULTA QUALIFICADA – EVIDENTE INTUITO DE FRAUDE – INEXISTÊN-CIA – IMPROCEDÊNCIA – As operações societárias praticadas pela recorren-te, desqualificadas pelo Fisco porque imputadas de dissimuladas (simulação relativa) porém tidas como possíveis em face de parcela da doutrina e de de-cisões ainda recentes deste Tribunal, que sustentam tratar-se de negócio ju-rídico indireto, pelas suas próprias características, não pode ser considerada como praticadas com evidente intuito de fraude, inclusive porque realizadas com toda publicidade que os atos exigiram. (Acórdão nº 10708.837)

INCORPORAÇÃO ATÍPICA – NEGÓCIO JURÍDICO INDIRETO – SIMULA-ÇÃO RELATIVA – A incorporação de empresa superavitária por outra defici-tária, embora atípica, não é vedada por lei, representando um negócio jurídi-co indireto, na medida em que, subjacente a uma realidade jurídica, há uma realidade econômica não revelada. Para que os atos jurídicos produzam efei-tos elisivos, além da anterioridade à ocorrência do fato gerador, necessário se faz que revistam forma lícita, aí não compreendida hipótese de simulação relativa, configurada em face dos dados e fatos que instruíram o processo. EVIDENTE INTUITO DE FRAUDE – A evidência da intenção dolosa, exigida na lei para agravamento da penalidade aplicada, há que aflorar na instrução processual, devendo ser inconteste e demonstrada de forma cabal. O atendi-mento a todas as solicitações do Fisco e observância da legislação societária, com a divulgação e registro nos órgãos públicos competentes, inclusive com o cumprimento das formalidades devidas junto à Receita Federal, ensejam a intenção de obter economia de impostos, por meios supostamente elisivos, mas não evidenciam má-fé, inerente à prática de atos fraudulentos. (Acórdão nº 10321.047)

PENALIDADE QUALIFICADA – INOCORRÊNCIA DE VERDADEIRO INTUI-TO DE FRAUDE – ERRO DE PROIBIÇÃO – ART. 112 DO CTN – SIMULA-ÇÃO RELATIVA – FRAUDE À LEI – Independentemente da patologia presente no negócio jurídico analisado em um planejamento tributário, se simulação relativa ou fraude à lei, a existência de conflitantes e respeitáveis correntes doutrinárias, bem como de precedentes jurisprudências contrários à nova interpretação dos fatos pelo seu verdadeiro conteúdo, e não pelo aspecto meramente formal, implica em escusável desconhecimento da ilicitude do conjunto de atos praticados, ocorrendo na espécie o erro de proibição. Pelo mesmo motivo, bem como por ter o contribuinte registrado todos os atos formais em sua escrituração, cumprindo todas as obrigações acessórias cabí-veis, inclusive a entrega de declarações quando da cisão, e assim permitindo ao fisco plena possibilidade de fiscalização e qualificação dos fatos, aplicá-veis as determinações do art. 112 do CTN. Fraude à lei não se confunde com fraude criminal. (Acórdão nº 10195.537).

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Assunto Especial – Ementário

Elisão Fiscal

10800 – Elisão fiscal – caracterização – limites

“Incorporação. Autuação. Elisão e evasão fiscal. Limites. Simulação. Exigibilidade do débito. 1. Dá-se a elisão fiscal quando, por meios lícitos e diretos o contribuinte planeja evitar ou mi-nimizar a tributação. Esse planejamento se fundamenta na liberdade que possui de gerir suas atividades e seus negócios em busca da menor onerosidade tributária possível, dentro da zona de licitude que o ordenamento jurídico lhe assegura. 2. Tal liberdade é possível apenas anterior-mente à ocorrência do fato gerador, pois, uma vez ocorrido este, surge a obrigação tributária. 3. Elisão tributária, todavia, não se confunde com a evasão fiscal, qual o contribuinte utiliza meios ilícitos para reduzir a carga tributária após a ocorrência do fato gerador. 4. Admite-se a eli-são fiscal quando não houver simulação do contribuinte. Contudo, quando o contribuinte lança mão de meios indiretos para tanto, há simulação. Economicamente inviável a operação de incor-poração procedida (superavitária pela deficitária), é legal a autuação. 6. Tanto em razão social, como em estabelecimento, em funcionários e em conselho administração, a situação final – após a incorporação – manteve condições e a organização anterior da incorporada, restando demons-trado claramente que, de fato, esta ‘absorveu’ a deficitária, e não contrário, tendo-se formalizado o inverso apenas a fim de serem aproveitados os prejuízos fiscais da empresa deficitária, que não poderiam ter sido considerados caso tivesse sido ela a incorporada, não a incorporadora, restando evidenciada, portanto, a simulação. Não há fraude no caso: a incorporação não se deu mediante fraude Fisco, já que na operação não se pretendeu enganar, ocultar, iludir, dificultan-do – ou mesmo tornando impossível – a atuação fiscal, que houve ampla publicidade dos atos, inclusive com registro nos órgãos competentes. 8. Inviável economicamente a operação de in-corporação procedida, tendo em vista que a aludida incorporadora existia apenas juridicamente, mas não mais economicamente, tendo servido apenas de ‘fachada’ para a operação, a fim de serem aproveitados seus prejuízos fiscais – cujo aproveitamento a lei expressamente vedava. 9. Uma vez reconhecida a simulação deve o juiz fazer prevalecer as conseqüências do ato simulado – no caso, a incorporação da superavitária pela deficitária, conseqüentemente incidindo o tributo na forma do regulamento – não havendo falar em inexigibilidade do crédito, razão pela qual a manutenção da decisão que denegou a antecipação de tutela pretendida se impõe.” (TRF 4ª R. – AI 2004.04.01.044424-0/RS – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Dirceu de Almeida Soares – DJU 26.01.2005)

10801 – ICMS – transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular – saída de mercadoria – valor inferior ao de entrada – efeitos

“ICMS. Transferência interna de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular. Saídas de mercadorias com valor inferior ao das entradas. Diferença tributável apurada na conta cor-rente de mercadorias. Ilicitude caracterizada. Acusação fiscal parcialmente procedente Recurso improvido. Acórdão recorrido mantido. No caso dos autos, o contribuinte recebia, em transfe-rência, mercadorias de outro estabelecimento da mesma empresa situado em outra unidade da Federação, por um determinado valor, e se creditava do ICMS com base nesse valor, e remetia as mesmas mercadorias, em transferência, para outros estabelecimentos seus neste Estado, por valor muito inferior ao das entradas dessas mercadorias, e se debitava do ICMS com base nesse valor. Esse comportamento do contribuinte resultou em ‘diferenças na conta mercadorias’ nos exercí-cios de 2007, 2008 e 2009. A base de cálculo na saída interna de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular, é o valor da operação (art. 13, I da LC 87/1996), correspondente ao valor das entradas realizadas mais o ICMS devido na respectiva operação de saída, que, calculado ‘por dentro’, integra a sua própria base de cálculo nessa operação. Como se trata de operação interna de saída de mercadoria de um para outro

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estabelecimento do mesmo titular, e não de venda, os valores correspondentes às rubricas con-signadas no inciso II do referido art. 13 da LC 87/1996 (seguros, juros, etc.), de fato, não integram a base de cálculo no caso concreto, mas não se admite a saída de mercadoria por valor inferior ao das entradas. Aliás, esse é o espírito da presunção contida no art. 76, V, da Lei nº 7.000, de 27 de dezembro de 2001, que, por óbvio, não admite o resultado negativo da conta mercadorias. O comportamento tributário da autuada é ilegal e, portanto, inaceitável, pois essa prática nada tem a ver com o verdadeiro ‘planejamento tributário’ (elisão fiscal), assim considerada a prática de atos lícitos que visa à obtenção de economia tributária. Esta técnica difere diametralmente da evasão fiscal, prática de atos ilícitos que visa à sonegação. Se é certo que o contribuinte tem direi-to de planejar seus negócios dentro dos limites da lei, de forma a pagar menos tributos, também é certo que não lhe é dado praticar atos ilícitos com o mesmo objetivo.” (Cerfes – RVol 49096702 – (004/2013) – Rel. José Adênis Pessin – DOE 08.07.2013)

10802 – IR – arrendamento mercantil – valor de opção – limitação – inexistência – elisão e evasão – diferença

“Tributário e processual civil. Imposto de Renda. Arrendamento mercantil. Valor de opção. Ine-xistência de limitação. Lei nº 6.099, de 12 de maio de 1974, art. 11. Distinção entre elisão e evasão. Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964, art. 72. Obstrução de acesso aos autos. CPC, art. 183, caput e parágrafo único. I – Constitui justa causa, impeditiva da prática de ato proces-sual, a obstrução do acesso da parte aos autos. Preliminar de intempestividade rejeitada. II – A evasão fiscal distingue-se da elisão fiscal pela manipulação dolosa do fato gerador. Nesta última, inocorre fraude, mas economia fiscal. III – A Lei nº 6.099/1974, ao disciplinar o arrendamento mercantil, não regulou o preço das prestações e do valor de opção dos contratos, ensejando a ocorrência de elisão fiscal. IV – A exegese pacificada na Turma é outra, em favor da verificação, caso a caso, da ocorrência de simulação, passível de reparação pelo poder fiscal. Hipótese em que os autos evidenciam a configuração de compra e venda disfarçada. V – Apelação provida. Remessa oficial prejudicada.” (TRF 1ª R. – AC 01250822/MG – 2ª T.S. – Relª Juíza Conv. Vera Carla Nelson de Oliveira Cruz – DJU 01.10.2001 – p. 230)

10803 – IR – pessoa física – serviços jornalísticos – planejamento fiscal – exegese“Apelação cível. Tributário. Sociedade civil. Serviços jornalísticos a terceiros. Imposto sobre a Renda de Pessoa Física (IRPF). Planejamento fiscal. Desconsideração da personalidade jurídica. 1. A Constituição Federal e o Código Civil autorizam, em princípio, a constituição de sociedades destinadas à prestação de serviços de natureza intelectual e o exercício de atividades personalís-simas pelos seus próprios sócios e empregados, o que inclui os serviços de jornalista a terceiros; o disposto no art. 129 da Lei nº 11.196/2005 se presta a afastar a controvérsia sobre a incidência tributária nesses casos. 2. A elisão aceitável ocorre sempre que o planejamento fiscal estiver las-treado, não somente na literalidade da norma, mas sobretudo na sua mens legis; ao contrário, a evasão fiscal se caracteriza pela prática de atos com o intuito de lesar terceiros, mediante dolo, fraude ou simulação. 3. Em um contrato de prestação de serviços entre duas pessoas jurídicas, apenas se houver demonstração (observadas as garantias do devido processo legal) de que na essência desenvolve-se uma relação de emprego regida pela CLT, devem ser desconsiderados o status de ‘sociedade’ do prestador do serviço e a roupagem jurídica atribuída àquele contrato, in-cidindo-se, assim, as exações correspondentes. 4. Com o advento do art. 55 da Lei nº 9.430/1996, revogando o Decreto-Lei nº 2.397/1987, deixou de haver distinção (para o fim de incidência do Imposto de Renda) entre sociedade civil e sociedade de profissionais regulamentados. 5. Redução dos honorários a um valor fixo compatível com as peculiaridades da causa. 6. Remessa neces-sária parcialmente provida. Apelações não providas.” (TRF 2ª R. – Ap-RN 2008.51.01.022319-5 – 3ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Ricardo Perlingeiro – DJe 11.12.2013 – p. 651)

10804 – Medida cautelar fiscal – finalidade – evasão fiscal – existência – análise“Processual civil e tributário. Medida cautelar fiscal. Grupo econômico. Indisponibilidade dos bens. 1. A medida cautelar fiscal visa a assegurar o resultado útil do processo executivo, razão

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pela qual possui caráter instrumental e precário, limitando-se o seu alcance à análise dos seus requisitos autorizadores (fumus boni juris e periculum in mora). 2. Desse modo, as questões de fundo relativas à caracterização de grupo econômico, desconsideração da pessoa jurídica, existência, ou não, de elisão e evasão fiscal, responsabilidade de sócio da empresa, assim como a ocorrência de prescrição e decadência devem ser discutidas nos embargos à execução fiscal, e não na via estreita do processo cautelar. 3. O cerceamento de defesa em razão do não deferi-mento da prova pericial e eventuais vícios praticados no processo de execução – como os que a apelante alega – devem ser resolvidos no próprio processo ou através de ação própria. No âmbito de um processo cautelar, não há espaço para tal tipo de questionamento dada a natural restrição na amplitude da cognição. 4. Havendo indícios claros de grupo econômico, preenchi-dos os requisitos legais do art. 3º, I, da Lei nº 8.397/1992 e observada as hipóteses dos incisos V, VI e IX do art. 2º da Lei nº 8.397/1992 (devedor que deixa de pagar os tributos no prazo legal, que possui soma de débitos superior a 30% do patrimônio conhecido, e que pratica atos que dificultam ou impedem a satisfação das dívidas), a indisponibilidade dos bens de todos os integrantes do grupo econômico é medida que se impõe. 5. Apelação improvida.” (TRF 2ª R. – AC 2010.50.01.001627-3 – 4ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Luiz Antonio Soares – DJe 05.02.2014 – p. 255)

10805 – PIS – incentivo fiscal – dedução de despesas com aquisição de imóvel – evasão fiscal – elisão fiscal – distinção

“Tributário e processual civil. PIS. Tributação reflexa. Incentivo fiscal previsto no Decreto-Lei nº 1.892/1981. Arrendamento mercantil. Dedução de despesa com aquisição de imóvel. Irrele-vância da ocorrência de contrato de lease back. Provisionamento para o IR. Honorários advoca-tícios. Arbitramento equitativo. I – A evasão fiscal distingue-se da elisão fiscal pela manipulação dolosa do fato gerador. Nesta última, inocorre fraude, mas economia fiscal. II – Atendidos os requisitos do direito à fruição do incentivo fiscal previsto no Decreto-Lei nº 1.892/1981, é ilegal a resistência da autoridade fazendária em reconhecê-lo, baseada na ocorrência de contrato de lea-se back. III – Comprovado o provisionamento o IR, através de prova pericial, afasta-se a argüição de violação do art. 189 da Lei das Sociedades Anônimas. IV – Não merece revisão o arbitramento de honorários levado a efeito em consonância com os critérios do art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC. V – Apelações e remessa oficial improvidas.” (TRF 1ª R. – AC 01000531603/MG – 2ª T.S. – Relª Juíza Conv. Vera Carla Nelson de Oliveira Cruz – DJU 22.04.2002 – p. 58)

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Parte Geral – Doutrina

A Previdência Social em Âmbito de Antecipação de Distribuição de Lucros e a Ausência de Retirada de Pro Labore por Sócio Administrador

WALTER ALExANDRE BuSSAMARAMestre em Direito Tributário pela PUC/SP, Advogado em SP, Sócio do Escritório Bussamara e Silveira Advogados.

RESUMO: O presente artigo busca demonstrar o não cabimento de contribuição previdenciária em face de distribuição antecipada de lucros a sócio administrador que não aufere pro labore por deli-beração social regular.

PALAVRAS-CHAVE: INSS; Previdência Social; contribuição; previdenciária; segurado; sócio; adminis-trador; pro labore; distribuição; lucros; antecipação; hipótese; materialidade; incidência.

ABSTRACT: The present article intends to demonstrate the impossibility for the INSS – Social Securi-ty Department, to charge social contribution towards executive share holder’s anticipated and distri-buted profits in a context where any payment of pro labore exists, under a regular social deliberation.

KEYWORDS: INSS; Social Security department; contribution; insured; share holder; executive; pro labore; distribution; profit; anticipation; hypothesis; materiality; incidence.

Muitas são as atuais incertezas no que tange à questão da forma e da operacionalização em face da percepção, em nome de sócio administrador, de valores produzidos em âmbito de suas respectivas sociedades, especialmente em meio a não retirada de pro labore pelo mesmo, que, ato contínuo, esteja se beneficiando da antecipação de divisão de lucros nos termos de regular delibe-ração da própria sociedade.

Este estado de insegurança jurídica cresce de ponto na medida em que potenciais interpretações da Previdência Social diante do tema passam a re-presentar uma séria ameaça contingencial financeira às empresas e aos seus próprios sócios administradores, na medida em que nem sempre veem-se con-vergentes tais interpretações com as políticas administrativas e financeiras então perfiladas por dada sociedade empresarial.

Pois bem. Como se sabe, as receitas auferidas por sócios administradores diante das sociedades das quais participem resultam basicamente de verbas a título de (i) pro labore e/ou (ii) distribuição de lucros na proporção de suas res-

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pectivas quotas sociais, podendo esta, se devidamente formalizada, ocorrer de forma antecipada.

Já adiantamos, para que não pairem dúvidas, que o pro labore, cujo pró-prio vernáculo sugere1, condiz com a remuneração que se faz por conta de existência de “labor” efetivado pelo sócio administrador, vale dizer, associa--se, sempre, à contraprestação “pelo trabalho” com vistas à sua compensação financeira (analogamente, os arts. 3º e 457 da CLT2), ao passo que a distri-buição de lucros (arts. 1.007 e 1.008 do Código Civil3), da qual o pro labore absolutamente independe4, caracteriza-se como uma remuneração de capital, constituindo-se tal rateio, aliás, apenas em uma das destinações passíveis dos lucros nas empresas5.

Conceitos esclarecidos, uma primeira ressalva que julgamos pertinente refere-se à possibilidade de nem toda modalidade de sócio restar atribuída de incumbência laborativa perante a sociedade da qual participe, condição esta que apenas será observada diante de sócio que, de alguma forma, execute ati-vamente a administração empresarial (planejamento, estratégia geral dos negó-cios, ordenação e controle), e que justifica, de per si, uma correspectiva paga, ou seja, um pro labore.

Restando dado sócio alheio às funções administrativas da sociedade, não caberá falar-se, por conseguinte, em seu alcance por meio de pro labore, daí não ser tal contexto o ora objetado neste trabalho. Ficaremos, então, somente com a figura do sócio administrador, laborativo.

1 “[...] sofrimento, dor, fadiga (que se experimenta na realização de um trabalho). TORRINHA, Francisco. Dicionário latino-português. 3. ed. Porto: Marânus, 1945. p. 460. E, ainda: “Diz-se da remuneração que alguém recebe como contraprestação dos serviços que presta ou da função que exerce. (Dir. Com.) – Nas sociedades mercantis, é a remuneração atribuída aos sócios solidários e aos que fazem efetiva prestação de trabalho” (Nôvo Dicionário Jurídico Brasileiro (sic). 5. ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: José Konfino, v. III, 1969, p. 241).

2 “Art. 3º Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Parágrafo único. Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual. [...] Art. 457. Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber [...].”

3 “Art. 1.007. Salvo estipulação em contrário, o sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas quotas, mas aquele, cuja contribuição consiste em serviços, somente participa dos lucros na proporção da média do valor das quotas. Art. 1.008: É nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio de participar dos lucros e das perdas.”

4 Segundo Isaac Halperin, “[...] a existência de perdas ou a ausência de benefícios não é óbice para o pagamento dos soldos dos sócios-gerentes [...], porque se atribuem no sentido de remuneração dos serviços prestados, e não pela mera qualidade de sócio: é um gasto da sociedade, que aumenta os custos de produção, ou as perdas, em seu caso” (Sociedades de responsabilidad limitada. Buenos Aires, 1951 e 1975. In: ABRÃO, Nelson. Sociedade por quotas de responsabilidade limitada. 6. ed. rev., atual. e ampl. por Carlos Henrique Abrão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 147).

5 Conforme Fábio Ulhoa Coelho, “os lucros gerados pela sociedade, em função do que for deliberado pela maioria societária, observadas eventuais disposições contratuais pertinentes, terão uma das seguintes destinações: capitalização, constituição de reserva ou distribuição entre os sócios [...]” (Manual de direito comercial. 15. ed. rev., atual. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 143 – grifo nosso).

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Alcançável que é tal sócio pelo pro labore, acabamos por adentrar dire-tamente no núcleo de nossa presente questão, no sentido de se tentar extrair, agora, uma previsibilidade quanto à obrigatoriedade legal ou não dessa retirada a título de remuneração, vale dizer, quanto a uma eventual facultatividade sua por conta de regular deliberação social da empresa que julgue, de seu turno, bastante e suficiente a existência de uma política de distribuição antecipada de lucros em favor de seus sócios administradores.

Neste ensejo, então, não se vê qualquer determinação expressa na le-gislação previdenciária para que o sócio administrador perceba pro labore em troca dos serviços que presta à sociedade. Há, porém, dispositivos que indire-tamente nos conduzem a tal entendimento, já corroborado, aliás, pela própria Previdência Social.

Com efeito, por se tratar de segurado individual obrigatório, por conta, justamente, de sua atividade laborativa em prol da sociedade empresarial, é de se presumir a existência de respectiva remuneração que possa dar vazão às incidências legais das contribuições previdenciárias do segurado e patro-nal, a teor do art. 9º, V, h, do Regulamento da Previdência Social – Decreto nº 3.048/19996, e art. 22, caput, e inciso III, da Lei nº 8.212/19917, que têm naquele pro labore, justamente, sua hipótese de incidência.

E será neste exato ponto, por sua vez, que surgirão os conflitos previ-denciários diante de sócio administrador que, optando pela dispensa de pro labore, beneficie-se única e tão somente de receitas oriundas de distribuição antecipada de lucros.

Sob uma ótica estritamente decorrente do Órgão Previdenciário, a situa-ção aludida seria satisfatória para que as contribuições do segurado e patronal fossem parametrizadas nos valores distribuídos a título de distribuição de lucros como que de pro labore se tratassem, uma vez que, em sendo presumível uma dada remuneração de trabalho em face do segurado obrigatório, e inexistindo formalmente a retirada de pro labore, estaria aquela distribuição antecipada lhe fazendo, então, necessariamente, as vezes.

Consignamos, de imediato, que com tal interpretação não concordamos, pois, a nosso ver, sempre que a distribuição de lucros puder ser regular e conta-bilmente demonstrada, nenhuma alteração poderá ocorrer em face da natureza jurídica do rateio realizado, natureza esta que não se transfigurará pela simples ausência de percepção de pro labore por dado sócio administrador.

6 “Art. 9º São segurados obrigatórios da previdência social as seguintes pessoas físicas: [...] V – como contribuinte individual: [...] h) o sócio gerente e o sócio cotista que recebam remuneração decorrente de seu trabalho e o administrador não empregado na sociedade por cotas de responsabilidade limitada, urbana ou rural.”

7 “Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de: [...] III – vinte por cento sobre o total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que lhe prestem serviços.”

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De fato, não. Em última análise, caberia a mera exigência de contribui-ções previdenciárias apenas e tão somente nos termos do § 3º do art. 201 do Decreto nº 3.048/19998, mantendo-se aqueles lucros distribuídos inalcançáveis.

Como vimos, realmente, tais contribuições previdenciárias (do segura-do e patronal) apoiam-se e condicionam-se na ocorrência de remuneração do segurado. De seu turno, a distribuição de lucros em nada se confunde com o conceito de remuneração, que está sempre relacionado à contraprestação de um trabalho.

A distribuição de lucros, a bem da verdade, é um direito do sócio por sua simples condição de quotista. Trata-se de inerente direito às quotas. Aliás, de acordo com as lições de Fran Martins,

Assim como assumem obrigações contratuais, estatutárias ou legais, ao en-trar para as sociedades comerciais, os sócios também possuem direitos. O primeiro deles, decorrentes da especialidade de sua posição na sociedade, é o de participar dos lucros auferidos pela mesma.9 (grifo no original)

Portanto, cremos não ser juridicamente adequada qualquer pretensão de cobrança de contribuição previdenciária sobre valores decorrentes de anteci-pação de distribuição de lucros em meio à inexistência de percepção de pro labore por sócio administrador. Sob qualquer hipótese.

É o que, sinteticamente, s.m.j., pensamos.

8 “§ 3º Não havendo comprovação dos valores pagos ou creditados aos segurados de que tratam as alíneas e a i do inciso V do art. 9º, em face de recusa ou sonegação de qualquer documento ou informação, ou sua apresentação deficiente, a contribuição da empresa referente a esses segurados será de vinte por cento sobre: I – o salário-de-contribuição do segurado nessa condição; II – a maior remuneração paga a empregados da empresa; ou, III – o salário mínimo, caso não ocorra nenhuma das hipóteses anteriores.” (grifo nosso)

9 Curso de direito comercial de acordo com a Constituição de 1988. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 231.

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Parte Geral – Doutrina

As Preocupações Decorrentes do Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 386, de 2012� Risco de Extinção de Benefício Fiscal Relativo ao ISSQN� Futuros Questionamentos sobre a Constitucionalidade dos Dispositivos Aviltantes de Direitos Municipais

CARLOS RENATO LONEL ALVA SANTOSEspecialista em Direito Tributário pela PUC/SP, Advogado em São Paulo.

RESUMO: Este trabalho analisa as dificuldades que serão impostas ao gestor municipal caso a le-gislação tributária do ISSQN seja modificada para proibir a concessão de benefício fiscal e apenar o administrador público que praticar tal medida. Sustenta-se que, da forma como projetados, os dispositivos fixadores de alíquota mínima de 2% e de proibição de incentivos fiscais ingressarão no ordenamento jurídico com alta carga de inconstitucionalidade.

PALAVRAS-CHAVE: ISSQN; autonomia constitucional municipal; art. 88 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; Projeto de Lei do Senado (PLS); inconstitucionalidade; vedação de bene-fícios fiscais; alíquota mínima de ISSQN.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Do Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 386, de 2012. Vedação de concessão de incentivo tributário de ISSQN, sob pena de cometimento de ato de improbidade administrativa; 2 A forma como o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 386, de 2012, está sendo tratado por parla-mentares e demais representantes da sociedade brasileira; 3 O alcance da autonomia constitucional municipal; 3.1 Breve estudo a respeito do signo “autonomia”; 3.2 A autonomia dos Municípios es-culpida na Constituição Federal. Imprescindibilidade de suporte financeiro para a sua eficácia; 4 A autonomia municipal, malgrado as transitórias (e inconstitucionais) disposições de alíquota mínima de 2% do ISSQN e de vedação de concessão de benefícios fiscais desse tributo, previstas no artigo 88 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; 5 Concluindo: a aprovação do PLS 386/2012, nos moldes propostos, permitirá a inclusão de dispositivos inconstitucionais no ordenamento jurídico; Referências.

INTRODUÇÃOTramita, já na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei do Senado (PLS)

nº 386, de 2012, de autoria do Senador Romero Jucá, voltado à alteração subs-tancial da vigente Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, que dis-põe a respeito do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN).

O presente artigo, elaborado de acordo com a evolução dos trabalhos legislativos a respeito do PLS em referência consumados até fevereiro de 2014, abordará a mudança concernente à fixação de alíquota mínima de 2%, bem

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como à vedação de concessão de isenções, incentivos e benefícios tributários ou financeiros.

Com efeito, a ideia do projeto parece ser a de evitar a chamada “guerra fiscal”, por meio da qual Municípios, sobretudo lindeiros de metrópoles, ate-nuam a incidência do ISS para atrair a instalação em seu território de estabele-cimentos contribuintes.

Mais. A eventual aprovação do PLS em testilha ensejará a criação de um tipo de improbidade administrativa voltado ao sancionamento do agente públi-co que conceder incentivo fiscal.

Há que se considerar, todavia, que o Brasil conta hoje com 5.5651 Muni-cípios, os quais, caso aprovado o projeto em referência, terão que se adaptar às novas regras, principalmente para encontrar outros meios de atrair investimen-tos e propiciar o desenvolvimento local.

O artigo tem a intenção de incutir questões a respeito da pertinência ou não da vedação prevista no referido projeto (analisado em fevereiro de 2014), sobretudo à luz da autonomia municipal, da necessidade do referido instrumen-to (incentivos fiscais) como realização de política pública e do efetivo combate à chamada “guerra fiscal”.

1 DO PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS) Nº 386, DE 2012. VEDAÇÃO DE CONCESSÃO DE INCENTIVO TRIBUTÁRIO DE ISSQN, SOB PENA DE COMETIMENTO DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

O PLS em referência prevê no seu art. 2º a criação do art. 8º-A da Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, nos seguintes termos:

Art. 8º-A. A alíquota mínima do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natu-reza é de 2% (dois por cento).

§ 1º O imposto não será objeto de concessão de isenções, incentivos e be-nefícios tributários ou financeiros, inclusive de redução da base de cálculo ou de crédito presumido ou outorgado, ou qualquer outra forma que resulte, direta ou indiretamente, em uma carga tributária menor que a decorrente da aplicação da alíquota mínima estabelecida no caput, exceto para os serviços a que se referem os subitens 7.02, 7.05 e 16.01 da lista anexa.

§ 2º É nula a lei ou ato do Município ou Distrito Federal que não respeite as disposições do presente artigo, aplicando-se a regra do § 4º do art. 3º desta Lei Complementar, com a alíquota mínima prevista no caput deste artigo no caso de serviço prestado a tomador ou intermediário localizado em Municí-pio diverso daquele onde está localizado o prestador de serviço.

1 Perfil dos Municípios Brasileiros 2012. Publicado em 2013. Disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv64638.pdf>.

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No art. 4º, por sua vez, o PLS introduz alteração à Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, também conhecida como Lei de Improbidade Administrativa, notadamente para acrescer à Seção II-A e o art. 10-A um novo tipo de improbi-dade, a seguir descrito:

Seção II-A – Dos Atos de Improbidade Administrativa Decorrentes de Con-cessão ou Aplicação Indevida de Benefício Financeiro ou Tributário

Art. 10-A. Constitui ato de improbidade administrativa qualquer ação ou omissão no sentido de conceder, aplicar ou manter benefício financeiro ou tributário contrário ao que dispõe o caput e o § 1º do art. 8º-A da Lei Com-plementar nº 116, de 31 de julho de 2003.

E neste mesmo artigo há o estabelecimento de sanção para o gestor que incidir nesse ato ímprobo, acrescendo o inciso IV ao art. 12 da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, verbis:

Art. 12. [...]

[...]

IV – na hipótese do artigo 10-A, perda da função pública, suspensão dos di-reitos políticos de cinco a oito anos e multa civil de até três vezes o valor do benefício financeiro ou tributário concedido.

Ele também inclui o § 13 no art. 17 da Lei nº 8.429/1992 para legitimar o Município supostamente prejudicado a ajuizar ação por ato de improbidade administrativa em face do agente público que praticar o ato ímprobo de conce-der benefício fiscal:

Art. 17. [...]

[...]

§ 13. Para os efeitos deste artigo, também se considera pessoa jurídica inte-ressada o ente tributante que figurar no polo ativo da obrigação tributária de que trata o § 4º do art. 3º e o art. 8º-A da Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003.

Regressa-se ao início do PLS para consignar que, nos termos do seu art. 1º, um novo § 4º integrará o art. 3º da LC 116/2003, para prescrever que, em havendo concessão de incentivo fiscal, o imposto será devido no local do estabelecimento do tomador/intermediário do serviço ou, na falta de estabeleci-mento, onde ele estiver domiciliado:

§ 4º O imposto será devido no local do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço, ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, na hipótese do descumprimento do caput ou do § 1º, ambos do art. 8º-A desta Lei Complementar.

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Em suma: a alteração sugerida no projeto (i) fixa alíquota mínima de 2%, (ii) veda a concessão de benefício fiscal de qualquer natureza (isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido ou outorgado, etc.), (iii) tor-na nula a lei municipal que conceder incentivo fiscal, (iv) cria um novo tipo de ato de improbidade com o objetivo de apenar o agente público que conceder benefícios tributários ou financeiros e (v) transfere a sujeição ativa do crédito tributário para o Município prejudicado pelo incentivo fiscal concedido pela Municipalidade alheia e também confere legitimidade ativa a esse Município para ajuizar a concernente ação por ato de improbidade.

2 A FORMA COMO O PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS) Nº 386, DE 2012, ESTÁ SENDO TRATADO POR PARLAMENTARES E DEMAIS REPRESENTANTES DA SOCIEDADE BRASILEIRA

O PLS nº 386/2012 foi pauta de audiência pública realizada em 13 de maio de 2013 na 21ª Reunião Extraordinária da Comissão de Assuntos Econô-micos do Senado.

Participaram desse evento senadores, cidadãos, a Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf), a Frente Nacional de Prefeitos, a Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comuni-cação (BRASSCOM) e a Associação Brasileira de Indústria Gráfica Nacional (Abrigraf).

O Senador Lindbergh Farias, Relator do PLS no Senado, ao tratar do as-sunto específico da concessão de incentivos fiscais, arrolou a sua preocupação com a chamada guerra fiscal provocada por Municípios que concedem isen-ções tributárias de ISSQN:

Acho que esse projeto também enfrenta a guerra fiscal. Há três Municípios no Brasil fazendo isenções e prejudicando 99% dos Municípios brasileiros. É um projeto que atualiza a Lei Complementar nº 116, de 2003 – e houve tan-tas mudanças neste País –, que simplifica e separa o que é ICMS, ISS. Então é um projeto muito importante.

[...]

Esse projeto de lei fala de uma alíquota mínima de ISS de 2%. Volto a dizer: hoje, alguns poucos Municípios estão fazendo guerra fiscal e prejudicando todo o País. O Município de Barueri cobra 0,8% de ISS.

Há um ponto interessante, no art. 4º, que, na verdade, fala em responsabili-zação por improbidade do gestor.

[...]

Esse é um ponto extremamente importante neste debate.

Representando o Município de São Paulo, o Secretário Adjunto Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico consignou o apoio ao referido PLS,

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ressaltando a necessidade de se impor comandos normativos para Municí-pios que concedem isenções de ISSQN a determinados setores:

Nós não temos o intuito de tributar quem está trabalhando em outros Muni-cípios ou quem está em outros Municípios. Não. Queremos simplesmente atuar em alguns Municípios que estão descumprindo o que está na Consti-tuição Federal.

Com relação a diversos outros setores que hoje não estão sendo tributados pelo ISS, o que nós gostaríamos é que esses setores fossem tributados, da mesma forma que todos os demais setores da sociedade brasileira.

As preocupações externadas se encontram no plano da elaboração de “proposição normativa”2, valendo lembrar que, portanto, ainda não há coman-do inserido no ordenamento.

Não obstante, tem lá a sua importância o processo de estruturação de ideias que culminam com a elaboração de leis. É que, assim como o conteúdo e a forma do texto legal já inserido no sistema orquestram as condutas sociais, sendo, portanto, ferramenta de trabalho do operador do Direito, o processo pré-vio de elaboração de lei também compõe um relevante elemento, eis que per-mite, posteriormente, interpretar o dispositivo legal de acordo com o contexto que levou a sua criação (além de ter que observar regras para a sua tramitação, sob pena de inconstitucionalidade/nulidade).

Pontifica o Professor Lourival Vilanova3 que

um projeto de Constituição, de codificação, de lei, um texto normativo que carecem de vigência, representam direito possível. Não direito real, efetivo, positivo. Nenhuma fonte (normativa) positivou as proposições que esta tuíam sobre condutas em suas possibilidades de interferência (Del Vecchio). O texto normativo que não chegou a ter vigência pode ser de inte-resse do conhecimento dogmático, mas por via indireta; não por si mesmo, e sim em função da realidade que pretendia normar, ou como dado explicativo para o Direito em vigência.

Firmados os pontos de vista que estão norteando os trâmites do processo legislativo concernente ao PL 386, observemos nos tópicos a seguir elencados

2 O Professor Paulo de Barros Carvalho ensina que, em Lógica, o vocábulo proposição significa a expressão verbal de um juízo. Os estudiosos, entretanto, negaram-se a empregá-lo para designar outros juízos que não os descritivos de situações, subordinados aos critérios de verdade/falsidade. É curioso sublinhar que Kelsen, evitando a palavra para referir-se às unidades do direito positivo, utilizou-a na expressão ‘proposição jurídica’, querendo aludir ao discurso do cientista, em nível de metalinguagem. Daí a distinção que faz entre a norma jurídica e proposição jurídica. O étimo proposição, contudo, serve para denominar qualquer espécie de juízo, seja ele declarativo, interrogativo, imperativo ou exclamativo. E é assim que o encontramos em Lourival Vilanova, que distingue as proposições normativas das proposições descritivas, ambas contidas no conceito mais abrangente de proposições jurídicas (Direito tributário: linguagem e método. 5. ed. São Paulo: Noeses, 2013. p. 42).

3 As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. São Paulo: Noeses, 2005. p. 158/159.

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os vícios que macularão de inconstitucionalidade a futura lei, caso o projeto seja aprovado e sancionado nos moldes em que proposto.

3 O ALCANCE DA AUTONOMIA CONSTITUCIONAL MUNICIPALConforme observação de Aires F. Barreto4, “nenhum estudo rigoroso so-

bre o ISS pode deixar de apoiar-se, sobremodo, na magna diretriz da autonomia municipal, uma das vigas mestras do sistema constitucional e do subsistema tributário”.

Isto posto, analisemos o signo5 “autonomia” no que diz respeito ao seu significado, a fim de que, balizada a sua abrangência, mormente à luz do dis-posto na Constituição Federal, passemos a sopesá-lo com o propósito objeto do PLS 386.

3.1 Breve estudo a respeito do signo “autonomia”O vocábulo “autonomia”, no dicionário Houaiss da língua portuguesa,

significa “1 capacidade de governar a si próprio; 2 direito reconhecido a um país de ser governado segundo suas próprias leis; soberania 3 liberdade, inde-pendência moral ou intelectual; 4 distância percorrida por um veículo sem ser abastecido”.

Percebe-se, tanto da leitura do dicionário da língua portuguesa quanto da observação do uso do vocábulo no cotidiano, que os significados atribuídos ao signo “autonomia” não variam a ponto de se distanciarem uns dos outros, tal como ocorre com o signo “tributo”6. Pontifica o Professor Sacha Calmon Navarro7 que “a palavra tributo é polissêmica”, que doutrinadores e legisladores empregam o termo ora para traduzir o objeto da prestação obrigacional, ora para tratar da própria obrigação, e, às vezes, ainda, para expressar “o valor da prestação (soma monetária)”, outras vezes “como um comportamento humano

4 ISS na Constituição e na lei. 2. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Dialética, 2005. p. 9.

5 Ensina o Professor Paulo de Barros Carvalho que o signo é compreendido “como unidade de um sistema que permite a comunicação inter-humana” e carrega consigo uma relação formada por três pontos, quais sejam, suporte físico, significado e significação. E adiante nos transmite o sentido dessa relação: “um exemplo, porém, terá o condão de consolidar a ideia de signo como relação triádica. A palavra manga (fruta) é o suporte físico (porção de tinta gravada no papel). Refere-se a uma realidade do mundo exterior que todos conhecemos: uma espécie de fruta, que é seu significado. E faz surgir em nossa mente o conceito de manga, variável de pessoa para pessoa, na dependência de fatores psíquicos ligados à experiência de vida de cada um. Para aqueles que apreciarem essa fruta, certamente que sua imagem será de um alimento apetitoso, suculento. Para os que dela não gostarem, a ideia será desfavorável, aparecendo a representação com aspectos bem diferentes. Trata-se da significação” (op. cit., p. 33/34).

6 E com tantos outros vocábulos utilizados pela Ciência do Direito. Nesse sentido, a Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro nos mostra que “o vocábulo [administração] tanto abrange a atividade superior de planejar, dirigir, comandar, como a atividade subordinada de executar” (Direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 53).

7 Teoria geral do tributo, da interpretação e da exoneração tributária. São Paulo: Dialética, 2003, p. 30.

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objetivado pelo legislador: levar dinheiro ao Estado”, e ainda no seu sentido vulgar, para contornar a ideia “de sacrifício (é o tributo que pago por ser fla-menguista)”.

O Jurista José Souto Maior Borges8, ao lançar mão do signo em análise, convida o leitor de seu texto a pensar em “autonomia” como uma opção con-ferida a um ser, no sentido de gerir seus interesses de acordo com seus próprios valores, verbis:

O problema – que deve ser prioritariamente encarado por uma pedagogia séria – da autonomia do pensamento conduz incontornavelmente à escolha individual do próprio caminho do pensar. Autonomia (do grego autos, por si e nomos, lei) é a faculdade de quem se governa por suas próprias leis; não pela “legalidade” do pensar alheio.

Ao estudar o pensamento político de Hegel, notadamente no que diz res-peito à organização dos poderes estatais, o Professor Paulo Bonavides9 atribuiu ao vocábulo “autonomia” a ideia de algo com “vida própria”.

José Afonso da Silva10 ensina que “autonomia significa capacidade ou poder de gerir os próprios negócios, dentro de um círculo prefixado por entida-de superior”.

Em suma, o ser autônomo possui como atributo a liberdade e indepen-dência de atuação, agindo de acordo com os seus interesses e optando pela alternativa que lhe parece mais adequada.

3.2 a autonomia dos municípios esculpida na constituição federal. imprescindiBilidade de suporte financeiro para a sua eficácia

A Constituição Federal11 prevê que a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende também os Municípios e confere autonomia a tais entes.

Essa autonomia político-administrativa dos Municípios caracteriza-se, para José Afonso da Silva12, em

autonomia política (capacidade de auto-organização e de autogoverno), a autonomia normativa (capacidade de fazer leis próprias sobre matéria de sua

8 Ciência feliz. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 10.

9 “Os poderes se distinguem, sim. Mas não de maneira a constituírem unidades autônomas, com vida própria. A idéia de coordená-los de forma orgânica se acha, pois, de todo coerente com o princípio do raciona, em Hegel.” (Do estado liberal ao estado social. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 136 – grifamos)

10 Curso de direito constitucional positivo. 33. ed. rev. e atual. até a EC 62/2009. São Paulo: Malheiros. p. 640.

11 “Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.”

12 SILVA. José Afonso da. Op. cit., p. 641.

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competência), a autonomia administrativa (administração própria e organi-zação dos serviços locais) e a autonomia financeira (capacidade de decreta-ção de seus tributos e aplicação de suas rendas, que é uma característica da auto-administração).

Aires F. Barreto registra em sua doutrina que, “na atual Constituição, o conceito de autonomia deve ser extraído de três características fundamentais: instituição e arrecadação dos tributos e sua competência, eleição dos seus go-vernantes e organização administrativa de tudo quanto seja predominantemen-te de interesse local”13.

Vê-se, portanto, que, com a Constituição de 1988, os Municípios se tor-naram entes federativos, independentes administrativamente, dotados de atribu-tos que lhes permitem trabalhar com autogovernança, gerindo valores e interes-ses relevantes para a organização e o desenvolvimento locais. Essa autonomia, por excelência do sistema jurídico pátrio, encontra limite exclusivamente na Constituição Federal.

Não se nega que a força motriz dessa autonomia municipal consiste, sobretudo, na aptidão conferida pela Carta Magna para a instituição de tributos, sem embargo de outras receitas importantes, também derivadas de receitas tri-butárias, decorrentes de repasses da União e dos Estados. É que as autonomias política, normativa e administrativa são todas extremamente custosas ao ente municipal.

E neste diapasão, um dos notáveis combustíveis financeiros que mantém essa autonomia consiste no Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN. Na magistral exposição de José Eduardo Soares de Melo14,

os Municípios são dotados de privatividade para criar o ISS, o que, por via oblíqua, implica a exclusividade e consequente proibição de seu exercício por quem não tenha sido consagrado com esse direito. Trata-se de matéria de ordem pública, sendo questionável a instituição desse imposto por Muni-cípio localizado em âmbito territorial desvinculado daquele em que ocorrera a efetiva prestação dos serviços.

É, pois, o ISSQN, o tributo cuja receita interessa aos Municípios sobre-maneira, a ponto de manterem incessantes buscas de soluções de conflitos para a chamada guerra fiscal, como a solução que se propõe por meio do PLS 386/2012, o qual fixa a alíquota mínima de 2% e a vedação de concessão de isenções, incentivos e benefícios tributários ou financeiros.

13 Op. cit., p. 9.

14 ISS – Aspectos técnicos e práticos. 4. ed. rev. São Paulo: Dialética, 2005. p. 9.

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4 A AUTONOMIA MUNICIPAL, MALGRADO AS TRANSITÓRIAS (E INCONSTITUCIONAIS) DISPOSIÇÕES DE ALÍQUOTA MÍNIMA DE 2% DO ISSQN E DE VEDAÇÃO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS DESSE TRIBUTO, PREVISTAS NO ARTIGO 88 DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS

A fixação de alíquota mínima de 2% e a vedação de concessão de benefí-cios fiscais pelos dispositivos projetados do PLS 386/2012, a despeito do intuito de se evitar conflito intermunicipal, são inconstitucionais.

A propósito, cuida-se da mesma inconstitucionalidade ventilada pela doutrina pátria quando da edição do art. 88, I e II, do ADCT, introduzido pela Emenda Constitucional nº 37, de 12 de junho de 2002.

A letra do art. 88, incisos I e II, do ADCT reza que enquanto lei com-plementar não disciplinar, as alíquotas máximas e mínimas do ISSQN assim como a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados, e este tributo terá alíquota mínima de 2% (dois por cento), bem como não será objeto de concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais, que resulte, direta ou indiretamente, na redução da referida alíquota mínima:

Art. 88. Enquanto lei complementar não disciplinar o disposto nos incisos I e III do § 3º do art. 156 da Constituição Federal, o imposto a que se refere o inciso III do caput do mesmo artigo:

I – terá alíquota mínima de dois por cento, exceto para os serviços a que se referem os itens 32, 33 e 34 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968.

II – não será objeto de concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais, que resulte, direta ou indiretamente, na redução da alíquota mínima estabe-lecida no inciso I.

A doutrina aponta esse dispositivo agregado ao texto original da Carta Magna como inconstitucional, haja vista a sua incompatibilidade com o valor inerente à autonomia do Município, oriundo do pacto federativo estabelecido pela Constituição Federal. Para ilustrar o raciocínio, lança-se mão novamente da lição de Aires F. Barreto15:

Temos para nós que o estabelecimento de alíquotas mínimas – previstas sob o fundamento de evitar a guerra fiscal entre Municípios – malfere o princípio da autonomia municipal.

[...]

15 Op. cit., p. 147 e 151.

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Ora, é inquestionável que a EC 37/2002 é inconstitucional, porquanto não só tende a abolir, como diminui, restringe a autonomia dos Municípios (sua capacidade de instituição de tributos, arrecadação e aplicação: autonomia financeira), na medida em que atribui competência à lei complementar para fixar as alíquotas mínimas do ISS e prevê sua aplicação imediata, indepen-dentemente de lei municipal, a teor do que dispõe o art. 88 do ADCT (assun-to de interesse local).

Entretanto, observe-se que o art. 88 do ADCT, como o próprio nome elenca, tem caráter transitório. E a disciplina constitucional do ISS prevê, en-tre outras disposições, que cabe à lei complementar definir (inciso I) alíquotas máximas e mínimas e (inciso III) regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. É o que se depre-ende do art. 156, § 3º, I e III, da CF:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

[...]

III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, defi-nidos em lei complementar.

[...]

§ 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar:

I – fixar as suas alíquotas máximas e mínimas;

II – excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior;

III – regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.

A determinação constitucional de que lei complementar deve fixar alí-quota mínima e também estabelecer condições gerais para benefícios fiscais do ISS não tem o intuito exclusivo de equalizar o percentual para fins de se evitar guerra fiscal, até porque, em um país com proporções geográficas continentais, interpretar a finalidade constitucional dessa forma seria negar toda a estrutura municipal calcada no pacto federativo que compreende, atualmente, as pecu-liaridades e complexidades de 5.56516 municípios brasileiros.

Extrai-se da letra constitucional que seu objetivo gira em torno de estabe-lecer um critério quantitativo mínimo, a ponto de haver arrecadação tributária, de forma a não deixar Municípios desprovidos de receitas decorrentes desse tributo. Dito de outro modo, a Constituição Federal deixou para a lei comple-

16 Perfil dos Municípios Brasileiros 2012. publicado em 2013. Disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv64638.pdf>.

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mentar a missão de fixar parâmetros que ensejam a incidência do tributo sobre os serviços municipais, evitando que os Municípios deixem de exercer a sua aptidão constitucional para instituir o ISS.

Portanto, ao editar a Lei Complementar nº 116/2003, que dispõe sobre serviços de qualquer natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, o legislador fixou os parâmetros adequados para o correto exercício constitucional da competência tributária dos entes aptos a instituírem tal tributo.

Não há, no bojo da lei supracitada, a fixação de alíquota mínima. Deve-ras, o legislador deixou a cada ente federativo municipal a análise de quanto cobrar a título de ISS em seu Município, levando-se em conta aspectos econô-micos, sociais e uma gama variável de fatores que influenciam a realidade local.

E nem se alegue que a ausência de alíquota mínima e de fixação de cri-tério para concessão de benefícios fiscais ensejariam a incidência dos incisos I e II do art. 88 do ADCT.

Isto porque tal argumento encontra óbice no caráter transitório do ato constitucional. Nesse sentido, é digna de aplauso a conclusão extraída de jul-gamento do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, prolatado em Ação Direta de Inconstitucionalidade17, a qual sustenta que a Lei Complementar nº 116/2003 veio a regulamentar o art. 156, § 3º, da Constitui-ção Federal de forma a tornar ineficaz o comando – provisório – do art. 88 do ADCT:

Como a própria inicial reconhece e afirma que a Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, publicada no DOU de 01.08.2003, que dispôs sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Muni-cípios e do Distrito Federal, regulamentou o artigo 156, § 3º, da Carta Magna, é óbvia a conclusão de que não mais prevalecem os provisórios regramentos do artigo 88 da ADCT.

Conclui-se, destarte, que no ordenamento jurídico atualmente vigente inexiste disposição constitucional que vede a fixação de alíquota inferior a 2% e a concessão de benefícios fiscais.

Por outro lado, durante o tempo provisório de vigência, o art. 88 do ADCT e seus incisos eram de duvidosa constitucionalidade.

De qualquer forma, quer por um lado, quer por outro, não se perde de vista a autonomia político-administrativa conferida aos Municípios.

17 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 0268691-68.2012.8.26.0053, Des. Rel. Samuel Júnior, J. 23.10.2013.

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5 CONCLUINDO: A APROVAÇÃO DO PLS 386/2012, NOS MOLDES PROPOSTOS, PERMITIRÁ A INCLUSÃO DE DISPOSITIVOS INCONSTITUCIONAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO

Não pode ser outra a conclusão que se extrai do PLS 386/2012 e das mi-nutas de artigos projetados para virarem dispositivos legais: tais como lançados, os dispositivos que (i) fixam alíquota mínima de 2%; (ii) vedam a concessão de benefício fiscal de qualquer natureza (isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido ou outorgado, etc.); (iii) tornam nula a lei mu-nicipal que conceder incentivo fiscal; e (iv) criam um novo tipo de ato de im-probidade com o objetivo de apenar o agente público que conceder benefícios tributários ou financeiros serão letras legais inconstitucionais.

Primeiro, porque, ao fixar alíquota mínima de 2% (dois por cento), a lei complementar arrebatará das mãos do ente municipal a oportunidade de gerir os interesses locais de acordo com a temática pertinente.

Há que ter em conta o fato de que alguns Municípios estimam em pouco mais de mil a quantidade de habitantes, alguns nem mesmo isso, conforme estudo divulgado pelo IBGE18, em 2013. Em contrapartida, outros Municípios albergam milhares e milhões de cidadãos19.

A expressiva diferença populacional entre os Municípios demanda ges-tão personalizada, atenta para as peculiaridades locais e apta a lidar com as variáveis possíveis.

Não é juridicamente viável, destarte, tratar um dos instrumentos politi-camente mais contundentes do Município, qual seja o tributo ISSQN, de forma igualitária.

São as condições econômicas e sociais das polis que indicarão, por exemplo, a razoabilidade na fixação de percentual de alíquota para o tributo em questão.

Pode ser que, para determinadas cidades, em função do poder aquisitivo e do custo do serviço praticado naquela região, a alíquota de 2% seja demasia-damente invasiva a ponto de demandar a readequação para a realidade local, de modo a diminuir o seu percentual.

18 Disponível em: <http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/home.php?lang=>. Alguns exemplos: Serra da Saudade/MG: 825; Borá/SP: 834; Araguainha/MT: 1.024; Anhanguera/GO: 1.082; Oliveira de Fátima/TO: 1.085; Nova Castilho/SP: 1.195; Cedro do Abaeté/MG: 1.227; Miguel Leão/PI: 1.244; Uru/SP: 1.252; André da Rocha/RS: 1.278; Lagoa Santa/GO: 1.377; Chapada de Areia/TO:1.386; Grupiara/MG: 1.414; Santiago do Sul/SC: 1.414; Jardim Olinda/PR: 1.424; Cachoeira de Goiás/GO: 1.436; União da Serra/RS: 1.457; Engenho Velho/RS: 1.462; Serra Nova Dourada/MT: 1.463; Lajeado Grande/SC: 1.488.

19 São Paulo/SP: 11.821.876; Rio de Janeiro/RJ: 6.429.922; Salvador/BA: 2.883.672; Brasília/DF: 2.789.761; Fortaleza/CE: 2.551.805; Belo Horizonte/MG: 2.479.175; Manaus/AM: 1.982.179; Curitiba/PR: 1.848.943; Recife/PE: 1.599.514; Porto Alegre/RS: 1.467.823; Belém/PA: - 1.425.923; Goiânia/GO: 1.393.579; Guarulhos/SP: 1.299.249; Campinas/SP: 1.144.862; São Luís/MA: 1.053.919; São Gonçalo/RJ: 1.025.507; Maceió/AL: 996.736; Duque de Caxias/RJ: 873.921; Natal/RN: 853.929; Teresina/PI: 836.474.

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Também pode acontecer de referido tributo ser minorado como instru-mento de incentivo ao desenvolvimento local.

Para ilustrar o raciocínio, vale citar o caso do Município de Bauru, com Leis Municipais (nºs 3.491/1992 e 3.791/1994) concedendo benefícios fiscais relativos ao ISSQN a prestadores de serviços que, em contrapartida, mantenham no seu quadro funcionários portadores de necessidades especiais ou que patro-cinem o esporte amador.

Por meio dos benefícios concedidos por tais diplomas municipais (per-centuais de descontos sobre o valor do tributo), a incidência tributária sobre o serviço de contribuinte que esteja submetido à alíquota de 2% ainda será diminuída pelo percentual de desconto decorrente do benefício, resultando, consequentemente, em valor inferior à aplicação dessa alíquota sobre o preço do serviço.

Ou seja, há casos em que é mais vantajoso para o Município local obter outras contrapartidas do contribuinte do que a própria prestação pecuniária.

Segundo. O art. 156, § 3º, III, da CF atribui à lei complementar a in-cumbência de regular a forma e as condições como os benefícios fiscais se-rão concedidos. Essa orientação encontra-se muito longe da adotada pelo PLS 386/2012, que carrega no seu texto a proibição de concessão de quaisquer benefícios fiscais.

Veja, portanto, que o dispositivo projetado no PLS 386/2012 é inconsti-tucional porque fere o artigo constitucional supracitado, que prescreve ser ne-cessário regular a forma e as condições dos benefícios fiscais. Não há qualquer comando constitucional proibindo a concessão de tais benefícios. Cuida-se, verdadeiramente, de legislar contra a Constituição Federal, em desfavor da ma-nutenção da autonomia municipal e do desenvolvimento desse ente federativo.

E nem se alegue que a equalização de alíquota mínima e proibição de concessão de incentivos fiscais são medidas albergadas pela Constituição Fede-ral, porquanto voltadas ao combate da chamada “guerra fiscal”.

É que o contribuinte tem o direito de sentar praça no local que lhe for mais conveniente, ainda que sob o aspecto tributário.

E o Município também tem o direito de, por questões de conveniên-cia, oferecer tributação mais em conta para os prestadores de serviços de seu território, seja lá por qual motivo for, como, por exemplo, para fomentar um determinado segmento ou, ainda, para atrair mais investimentos para a sua ci-dade, de forma a desenvolvê-la e ofertar mais condições de empregos e opções empresariais para os seus munícipes.

O que não se admite, obviamente, é a instalação de estabelecimentos fictícios no Município com legislação tributária mais vantajosa, apenas para

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desvirtuar o recolhimento do tributo do local onde o serviço foi realmente pres-tado, ou do local onde o prestador mantém-se clandestinamente estruturado.

Mas isso não se resolve com a uniformização de alíquota, proibição de concessão de benefícios ou responsabilização do administrador por ato de im-probidade administrativa. O combate a essa conduta ardilosa de contribuintes detentores de má-fé deve ser feito por meio de incisiva fiscalização, lançando--se mão das prerrogativas inerentes ao Poder Público.

Aguardemos, portanto, o desfecho do PLS 386/2012, não se esquecendo dessas reflexões e, sobretudo, confiantes da atuação criteriosa do Poder Legisla-tivo, notadamente da Comissão de Constituição e Justiça das Casas legiferantes, a fim de que o PLS possa promover a reforma que a legislação do ISSQN pre-cisa, sem afrontar dispositivos constitucionais e a autonomia dos Municípios.

REFERÊNCIASBARRETO, Aires F. ISS na Constituição e na lei. 2. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Dialética, 2005.

BONAVIDES, Paulo. Do estado liberal ao estado social. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

BORGES, José Souto Maior. Ciência feliz. São Paulo: Quartier Latin, 2007.

CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5. ed. São Paulo: Noeses, 2013.

CÔELHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria geral do tributo, da interpretação e da exoneração tributária. São Paulo: Dialética, 2003.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001

HOUAISS, Antônio. Minidicionário Houaiss da língua portuguesa. 4. ed. rev. e aumentada. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.

MELO, José Eduardo Soares de. ISS – Aspectos técnicos e práticos. 4. ed. rev. São Paulo: Dialética, 2005.

SILVA. José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 33. ed. rev. e atual. até a EC 62/2009. São Paulo: Malheiros.

VILANOVA, Lourival; ATALIBA, Geraldo (Prefácio); CARVALHO, Paulo de Barros (Apresentação). As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. São Paulo: Noeses, 2005.

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Parte Geral – Doutrina

Por um Conceito Constitucional de Contribuinte: Revisitando as Noções de Sujeição Passiva e Solidariedade no Âmbito do Direito Tributário

ÉDERSON GARIN PORTODoutorando em Direito Tributário pela UFRGS, Mestre em Direito Tributário pela UFRGS, Pro-fessor de Direito Tributário da Unisinos, Advogado.

SUMÁRIO: Introdução; I – Da obrigação tributária prevista na Constituição; I.1 Do clássico dualismo entre direito público e direito privado ao status de ramo autônomo atribuído ao direito tributário; I.2 Da relação jurídica obrigacional civil e os conceitos de credor e devedor; I.3 Sobre competência tributária: obrigação tributária definida na Constituição; I.4 A regra-matriz de incidência e seus res-pectivos aspectos; I.5 Sujeito passivo possível. Correlações entre isonomia e capacidade contributi-va; II – Da sujeição passiva insculpida na Constituição; II.1 Do conceito constitucional de contribuinte; II.2 Da definição constitucional de contribuinte e a solidariedade prevista no Código Tributário Nacio-nal; Conclusões.

INTRODUÇÃOPor mais vetusto que um instituto possa parecer, a dinamicidade da exis-

tência humana é sempre capaz promover um contínua e incansável renovação. Faz-se essa afirmação porque o tema objeto deste ensaio é buscar identificar um conceito de contribuinte que não tenha sido ainda apresentado ou que tenha a capacidade de solucionar os problemas atuais.

Este é o ponto de partida desta investigação. Pretende-se, com apoio no sistema constitucional tributário, apresentar um conceito de contribuinte que seja capaz de melhor promover as normas constitucionais aplicáveis à espécie.

Em que pese muito se tenha escrito em torno do aspecto material da hipótese de incidência ou do critério material da regra-matriz para utilizar a nomenclatura de Paulo de Barros Carvalho, pouco se escreveu ou pesquisou sobre uma definição constitucional de contribuinte e adequada às normas cons-titucionais vigentes.

Para que seja possível alcançar esse objetivo, a pesquisa será dividida em duas partes. Na primeira parte do ensaio, observar-se-á a noção de sujeição passiva frente aos conceitos e normas próprias da obrigação tributária, traçando um paralelo entre os institutos de direito privado, analisando em que medida esses conceitos podem ser aproveitados na seara tributária. Na segunda metade do trabalho, será tentado apresentar um conceito de contribuinte haurido da

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Constituição e capaz de promover o estado ideal de coisas protegido pelas nor-mas constitucionais que regem a tributação.

I – DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO

i.1 do clássico dualismo entre direito púBlico e direito privado ao status de ramo autônomo atriBuído ao direito triButário

O direito tributário tradicionalmente se abebera nas fontes do direito privado, haurindo conceitos e institutos há muito tempo. No entanto, cumpre questionar até que ponto esta relação se revela saudável e até que medida é possível utilizar-se dos institutos e conceitos do direito privado indiscriminada-mente1.

Sem pretender realizar um exame histórico profundo, pode-se afirmar que tanto o desenvolvimento do direito privado rumo ao processo codificatório quanto a sistematização do direito público e o constitucionalismo têm em suas raízes os mesmos pressupostos. Assim, no direito público, como no direito pri-vado, os movimentos de sistematização, codificação, dogmatização de concei-tos foram motivados essencialmente pela necessidade de estabelecer segurança jurídica. O anseio de pôr fim ao arbítrio moveu os glosadores, assim como os grandes movimentos constitucionalistas. Escreve Canotilho que as chamadas garantias institucionais (Einrichtungsgarantien), onde estão compreendidas as garantias jurídico-públicas (Institutionnelle garantien) e as garantias jurídico--privadas (Institutsgarantie), são protegidas constitucionalmente para assegurar a proteção dos direitos fundamentais. Refere o constitucionalista que

as garantias institucionais, constitucionalmente protegidas, visam não tanto “firmar”, “manter” ou “conservar” certas instituições naturais, mas impedir a sua submissão à completa discricionariedade dos órgãos estaduais [estatais], proteger a instituição e defender o cidadão contra ingerências desproporcio-nais e coactivas.2

De efeito, a busca por solidez e segurança do Direito desencadeou em cada ramo, cada um a seu tempo, processos de sistematização acima referido. No entanto, essa dicotomia entre público e privado é alvo de severas críticas, bem representadas pela voz de Hans Kelsen. Já em 1925, Kelsen punha em che-que a dicotomia entre os ramos do Direito por não reconhecer segurança nos

1 Em ensaio sobre o tema, examinou-se esta tortuosa relação entre o direito tributário e o direito privado (PORTO, Éderson Garin. Interpretação dos conceitos de direito privado na formação da obrigação tributária. Relações entre normas do sistema jurídico. Uma visita à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Revista Jurídica Empresarial, v. 02, p. 105-143, 2009).

2 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, p. 395. Excerto citado pelo Ministro Gilmar Mendes no voto prolatado nos autos do RE 346.084/PR.

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argumentos que lhes estabeleciam distinção3. Com a perspicácia que lhe era habitual, Alfredo Augusto Becker criticou a chamada “autonomia” do direito tributário afirmando que a proposta de autonomia de qualquer ramo do Direito é um falso problema4. Defende Alfredo Augusto Becker que a separação em ramos “autônomos” tem sentido meramente didático, pois a ideia de segmen-tação das searas jurídicas é contrária à ideia de unidade do sistema jurídico5. Paulo de Barros Carvalho, de seu turno, seguindo a mesma linha de raciocínio, põe em dúvida, inclusive, a proposta de autonomia didática, pois “o caráter absoluto de unidade do sistema jurídico” é contrário à ideia de autonomia. Para o autor, seria como “cisão do incindível, secção do inseccionável”6.

A ideia de unidade da Constituição e, por decorrência, do sistema ju-rídico não é mera proposição doutrinária. O Supremo Tribunal Federal já se pronunciou sobre a ideia de unidade do sistema jurídico, consoante se extrai do voto do Ministro Celso de Mello:

Os postulados que informam a teoria do ordenamento jurídico e que lhe dão o necessário substrato doutrinário assentam-se na premissa fundamental de que o sistema de direito positivo, além de caracterizar uma unidade insti-tucional, constitui um complexo normativo cujas partes integrantes devem manter, entre si, um vínculo de essencial coerência.7

Geraldo Ataliba destaca em sua clássica obra Sistema constitucional tri-butário brasileiro que a compreensão do fenômeno que o estudioso se propõe a examinar será tão melhor quanto maior for a capacidade deste cientista para entender o todo maior no qual o objeto se insere8.

3 KELSEN, Hans. Teoria general del estado. Madrid, 1934, p. 105-106.

4 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2007. p. 31-33.

5 Alfredo Augusto Becker refere que, “pela simples razão de não poder existir regra jurídica independente da totalidade do sistema jurídico, a autonomia (no sentido de independência relativa) de qualquer ramo do direito positivo é sempre unicamente didática para, investigando-se os efeitos jurídicos resultantes da incidência de determinado número de regras jurídicas, descobrir a concatenação lógica que as reúne num grupo orgânico e que une este grupo à totalidade do sistema jurídico” (BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2007. p. 33).

6 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p 13. Afirma Paula de Barros Carvalho que, “com efeito, a ordenação jurídica é uma e indecomponível. Seus elementos – as unidades normativas – se acham irremediavelmente entrelaçados pelos vínculos de hierarquia e pelas relações de coordenação, de tal modo que tentar conhecer regras jurídicas isoladas, como se prescindissem da totalidade do conjunto, seria ignorá-lo, enquanto sistema de proposições prescritivas. Uma coisa é certa: qualquer definição que se pretenda há de respeitar o princípio da unidade sistemática e, sobretudo, partir dele, isto é, dar como pressuposto que um número imenso de preceitos jurídicos, dos mais variados níveis e dos múltiplos setores, se aglutinam para formar essa mancha normativa cuja demarcação rigorosa e definitiva é algo impossível”.

7 RE-AgR 215107/PR, 2ª T., Rel. Min. Celso de Mello, J. 21.11.2006, DJ 02.02.2007, p. 138.

8 Geraldo Ataliba traz útil e precisa definição de sistema: “O caráter orgânico das realidades componentes do mundo que nos cerca e o caráter lógico do pensamento humano conduzem o homem a abordar as realidades que pretende estudar, sob critérios unitários, de alta utilidade científica e conveniência pedagógica, em tentativa do reconhecimento coerente e harmônico da composição de diversos elementos em um todo unitário, integrado em uma realidade maior. A esta composição de elementos, sob perspectiva unitária, se denomina sistema. Os elementos de um sistema não constituem o todo, com sua soma, como uma simples partes,

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Exsurge, portanto, uma primeira constatação. Não se pode partir para uma análise de qualquer problema jurídico com a premissa de ramos autôno-mos e compartimentados, em razão da ideia de unidade do sistema jurídico. Para ilustrar a afirmação, basta trazer o exemplo utilizado por Paulo de Barros Carvalho:

Tomemos o exemplo da regra-matriz de incidência do Imposto Predial e Ter-ritorial Urbano (IPTU), de competência dos Municípios. A hipótese norma-tiva, em palavras genéricas, é ser proprietário, ter o domínio útil ou a posse de bem imóvel, no perímetro urbano do Município, num dia determinado do exercício. O assunto é eminentemente tributário e o analista inicia suas inda-gações com o fito de apreender a descrição legal. Ser proprietário é conceito desenvolvido pelo direito civil. A posse também é instituto versado pelos civilistas e o mesmo se diga do domínio útil. E bem imóvel? Igualmente, é tema de direito civil. Prossigamos. A lei que determina o perímetro urbano do Município é entidade cuidada e trabalhada pelos administrativistas. En-tão, saímos das províncias do direito civil e ingressamos no espaço do direito administrativo. E estamos estudando direito tributário... E o Município? Que é senão pessoa política de direito constitucional interno? Ora, deixemos o direito administrativo e penetremos nas quadras do direito constitucional. Mas não procuramos saber de uma realidade jurídico-tributária? Sim. É que o direito é uno, tecido por normas que falam do comportamento social, nos mais diversos setores de atividade e distribuídas em vários escalões hierár-quicos. Intolerável desconsiderá-lo como tal.9

Se a evolução dos ramos do direito público e do direito privado justifi-cam a aproximação e se os fenômenos jurídicos devem se apreciados na sua inteireza, justamente porque o ordenamento jurídico é uno, faz algum sentido manter a separação dos ramos e por decorrências dos institutos? Parece-nos que a compartimentação em ramos estanques e autônomos só tem justificação acadêmica, porém exatamente porque algumas normas e alguns institutos fo-ram criados em determinado ramo para solucionar determinado problema; não significa dizer que os mesmos instrumentos sirvam para solucionar todos os problemas de todos os ramos do Direito de forma indistinta. É como dizer que basta administrar antigripal para toda e qualquer gripe, pois, no fundo, todos os sintomas provêm de um mesmo vírus (influenza). Ledo engano.

Não obstante a compartimentação do Direito não se justifique com a mesma distância de outrora, é certo que não se pode transplantar conceitos e soluções encontradas num ramo e aplicá-las em outro sem qualquer reflexão. Nesta medida, impõe-se questionar se o conceito de sujeito passivo da relação jurídico-tributária tradicionalmente conhecido e inspirado no modelo privatista

mas desempenha cada um sua função coordenada com a função dos outros” (ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário. São Paulo: RT, 1968. p. 4).

9 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 14.

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é adequado para o direito tributário10. A presente investigação parte de uma hipótese que responde negativamente o problema metodológico levantado. No intuito de iniciar a justificação, importante explicar um dos motivos da dis-tinção. Sacha Calmon, quando em 1980 escrevera sobre as normas jurídicas, identificou cinco grupos de normas: organizatórias, de competência, técnicas, de conduta e sancionatórias. Segundo a visão do autor, as relações cíveis esta-riam sujeitas às normas técnicas e a relação tributária sujeitar-se-ia pela normas de conduta11. O autor prossegue diferenciando as normas que regem o direito tributário daquelas que regem o direito privado, partindo da lição de Kelsen. Segundo o autor, a norma tributária é heterônoma, pois incide independente-mente da vontade do destinatário da norma, enquanto que no plano privado vigora a autonomia12.

Desconsiderar essa distinção entre autonomia e heteronomia traz resul-tados indesejados logo adiante. Não se pode aplicar institutos típicos das re-lações jurídicas autônomas para quem está sujeito a uma norma heterônoma. Da inobservância desse preceito partem inúmeras apreciações inconvenientes sobre certos institutos do direito tributário, notadamente, sobre a noção de con-tribuinte que aqui se pretende aprofundar.

i.2 da relação jurídica oBrigacional civil e os conceitos de credor e devedor

Como dito, o ponto de partida da relação obrigacional cível é, via de re-gra, a manifestação de vontade autônoma e livre que cria vínculo e fazer surgir direitos e deveres13. Para não cometer qualquer impropriedade, vale transcrever

10 Este debate já havia sido suscitado por Norberto Godoy: “Lo que nos interesa a los efectos de este trabajo, es destacar sobremanera que las obrigaciones jurídico tributárias substativas poseen características proporia que permiten diferenciarlas de las obrigaciones jurídicas que reglan las relaciones civiles [...]” (GODOY, Norberto. Diferencias entre las obrigaciones juridcas tributarias sustantivas y las obligaciones jurídicas civiles. Revista de Direito Tributário, n. 43, p. 69, jan./mar. 1988).

11 Escreve Sacha Calmon: “Normas técnicas – prescrevendo como devem ser produzidos os atos adjetivos necessários à vida do direito: como votar, sentenciar, interpor um recurso extraordinário, fazer um testamento válido, celebrar contratos, contrair matrimônio, discutir e votar uma lei complementar da Constituição (todas as normas processuais são técnicas). Normas de conduta – são as normas que obrigam comportamentos, campo de eleição da lógica jurídica. Destinam-se às autoridades e aos particulares (COELHO, Sacha Calmon Navarro. Norma jurídica e obrigação tributária. Revista de Direito Tributário, n. 13/14, p. 121, jul./dez. 1980).

12 Essa distinção é fundamental para o desenvolvimento das ideias que adiante serão defendidas, valendo a pena transcrever a posição de Sacha Calmon: “Ademais, fatos lícitos que não acordo de vontades pois a norma tributária é heterônoma, ou seja, do tipo das que incidem independentemente da vontade do destinatário. Kelsen focaliza o tema com notável precisão: ‘O contrata – criação contratual de obrigações – corresponde ao princípio da autonomia. Na ordem de pagar um imposto, a obrigação do contribuinte está determinada por uma norma secundária em cuja criação não participa o sujeito que resulta obrigado. Este antagonismo entre autonomia e heteronomia é no que se fundamenta a distinção entre direito privado e direito público’” (COELHO, Sacha Calmon Navarro. Norma jurídica e obrigação tributária. Revista de Direito Tributário, n. 13/14, p. 123, jul./dez. 1980).

13 POTHIER, Robert Joseph. Tratado de las obligaciones. Trad. M. Dupin. Buenos Aires: Editorial Heliasta, 1993. p. 12. Pontes de Miranda fala sobre a autonomia: “Autorregramento (dito ‘autonomia da vontade’) e direito das obrigações – O direito é processo social de adaptação, um dos processos sociais de adaptação. A técnica legislativa, desde os costumes das tribos primitivas, ao deixar às pessoas a determinação de certos

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o conceito de obrigação trazido por Pontos de Miranda: “Em sentido estrito, ‘obrigação’ é a relação jurídica entre duas (ou mais) pessoas, de que decorre a uma delas, ao debitor, ou a algumas, poder ser exigida, pela outra, creditor, ou outras, prestação. Do lado do credor, há a pretensão; do lado do devedor, a obrigação”14.

Partindo-se de uma manifestação de vontade, pessoas vinculam-se de forma pessoal, sendo esta pessoalidade um traço marcante da relação obriga-cional15, de modo que, por força da relatividade dos negócios jurídicos, não alcançam terceiros. As obrigações vinculam aqueles que participaram da aven-ça, direcionando a pretensão do credor contra o devedor. Não se pode dizer que a obrigação irradie efeitos contra terceiros, pois se trata de relação jurídica pessoal16.

Destas singelas características pinceladas na mais abalizada doutrina ci-vilista já se observa a inconsistência com certos pressupostos e características da relação obrigacional tributária. A obrigação tributária é ex lege, não se ori-ginando por ato de vontade dos sujeitos. Da mesma forma, pode-se dizer que a obrigação tributária não é pessoal e não tem efeito relativo como caracteriza as obrigações de direito privado. A característica da pessoalidade é tão marcante no direito privado que, durante séculos, o vinculum iuris prendia o devedor ao credor de modo que este poderia exigir até mesmo o próprio corpo do deve-dor em pagamento. Atualmente, a dívida do devedor, uma vez não adimplida, converte-se em perdas e danos. Porém, ainda se pode compelir o devedor à realização da obrigação a que estava obrigado. No direito tributário, de seu turno, a dívida é sempre de natureza pecuniária, sendo convertida em pecúnia até mesmo as obrigações tributárias acessórias quando descumpridas17. Não se pode exigir, tal como no âmbito privado, o cumprimento pessoal da obrigação. Nessa mesma linha, não se pode aplicar no direito tributário o princípio da relatividade, pois sabidamente certas obrigações tributárias vinculam terceiros que não aqueles que realizaram a conduta tipificada como ensejadora da tri-butação.

direitos e deveres, de certas pretensões e obrigações, atende a que a adaptação ainda se tem de fazer por meio de contactos individuais” (PONTES DE MIRANDA, Flavio Cavalcanti. Tratado de direito privado. Parte especial. Rio de Janeiro: Borsoi, t. XXII, 1958. p. 11).

14 PONTES DE MIRANDA, Flavio Cavalcanti. Tratado de direito privado. Parte especial. Rio de Janeiro: Borsoi, t. XXII, 1958. p. 12.

15 Diz Pontes de Miranda: “Os negócios jurídicos de direito das obrigações irradiam pretensões pessoais, isto é, pretensões a que alguém possa exigir de outrem, debitor, que dê, faça, ou não faça, em virtude de relação jurídica só entre eles. A pretensão supõe crédito; a obrigação, a dívida” (PONTES DE MIRANDA, Flavio Cavalcanti. Tratado de direito privado. Parte especial. Rio de Janeiro: Borsoi, t. XXII, 1958. p. 8).

16 PONTES DE MIRANDA, Flavio Cavalcanti. Tratado de direito privado. Parte especial. Rio de Janeiro: Borsoi, t. XXII, 1958. p. 9.

17 “Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. [...] § 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.”

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Entre as diferenças, pode-se identificar também o que Norberto Godoy chama de “princípio orçamentário”, porque a obrigação tributária está dire-tamente ligada com a atividade financeira dos sujeitos ativos, o que não se verifica nas obrigações de natureza civil. O juiz argentino destaca ainda que as obrigações tributárias devem necessariamente ser estabelecidas por expressos mandatos de disposições constitucionais, por meio de atos normativos legislati-vos que não podem ter afastado os efeitos por vontade das partes18.

Portanto, não se está aqui pregando o abandono dos conceitos de direito privado. A investigação permite afirmar que na origem de cada instituto pode--se identificar pontos de ligação e pressupostos compartilháveis19. No entanto, a evolução das duas searas e as opções tomadas pelo ordenamento jurídico pátrio permitem apontar diferenças sensíveis que acarretaram em tratamentos jurídi-cos distintos. A relação jurídica tributária resta expressamente disciplinada no texto constitucional, de sorte que, por mais que se queira retornar à comparação com a relação obrigacional civil, o resultado de tal comparação terá pouca ou nenhuma utilidade20. Para Ricardo Lobo Torres:

A doutrina mais moderna e mais influente estuda a relação jurídica tributária a partir do enfoque constitucional e sob a perspectiva do Estado de Direito, estremando-se das relações jurídicas do direito privado: a sua definição de-pende da própria conceituação do Estado. Assim pensam, entre outros, K. Tipke (op. cit., p. 29), e Birk (op. cit., p. 79) na Alemanha e F. Escribano (op. cit., p. 156) na Espanha.

i.3 soBre competência triButária: oBrigação triButária definida na constituição

Entre os traços marcantes de distinção entre a obrigação tributária e a obrigação civil antes referidos, um sobreleva em importância e merece a abor-dagem em separado. Todas as obrigações tributárias estão na Constituição, podendo-se dizer que constitui condição de validade da obrigação tributária a sua prévia autorização pelo texto constitucional. É que o Sistema Tributário Na-cional é marcado pela rigidez e pela minudência das regras que dispõem sobre a matéria tributária no texto constitucional.

Verifica-se a referida rigidez quando se examinam as competências tri-butárias (arts. 145 a 149-A) e impõem limites ao poder de tributar (arts. 150 e

18 GODOY, Norberto. Diferencias entre las obrigaciones juridcas tributarias sustantivas y las obligaciones jurídicas civiles. Revista de Direito Tributário, n. 43, p. 70, jan./mar. 1988.

19 No sentido de reconhecer proximidade e identidade entre a obrigação na teoria geral e a obrigação tributária: ORRUTEA, Rogério Moreira. Obrigação tributária. Revista de Direito Tributário, n. 37, p. 89-98, jul./set. 1986.

20 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 18. ed. Rio de Janeiro, 2011. p. 237; GONÇALVES, J. A. Lima. Princípios informadores do “critério pessoal da regra-matriz de incidência tributária”. Revista de Direito Tributário, n. 23/24, p. 252-265, jan./jun. 1983.

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152)21. A chamada competência tributária positiva vem detalhada nos arts. 153, 155 e 156, onde se encontram as disposições sobre os impostos da União, Esta-dos, Distrito Federal e Municípios22. A criação e majoração de tributos exigem lei prévia para o seu estabelecimento (art. 150, I) e algumas matérias somente podem ser tratadas através de lei complementar (art. 146). A rigidez constitu-cional tributária é traço genuinamente brasileiro, presente desde a Constituição de 1946, como refere Aliomar Baleeiro ao comentar que “o sistema tributário movimenta-se sob complexa aparelhagem de freios e amortecedores, que limi-tam os excessos acaso detrimentosos à economia e à preservação do regime e dos direitos individuais”23. Nas palavras do Ministro Celso de Mello:

O exercício do poder tributário, pelo Estado, submete-se, por inteiro, aos modelos jurídicos positivados no texto constitucional, que institui, de modo implícito ou explícito, em favor dos contribuintes, decisivas limitações ao poder estatal para impor e exigir, coativamente, as diversas espécies tributá-rias existentes.24

Pode-se dizer, em poucas palavras, que competência tributária é a facul-dade que o constituinte conferiu a cada uma das pessoas jurídicas de direito público25. Sendo a competência tributária uma faculdade assegurada no texto da Constituição aos entes políticos e as regras atributivas de competências a limitação desta faculdade, pode-se dizer que as obrigações tributárias possuem estreita ligação com tais regras, daí a importância de um exame mais detido desta relação26.

Para que se possa falar em obrigação tributária, diante do que foi dito, impõe-se a verificação de três condições impostas pelo sistema constitucional tributário, sob pena de invalidade da própria obrigação. A primeira condição é, portanto, a existência de uma regra de competência outorgando poder ao

21 Ideias já defendidas em ensaio monográfico: PORTO, Éderson Garin. Estado de direito e direito tributário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 91.

22 Luiz Felipe Difini assim define competência tributária: “É a extensão de poder de imposição de tributos deferidos pela Constituição a cada uma das pessoas de direito público interno (União, Distrito Federal, Estados e Municípios). A isto se chama discriminação de rendas, ou discriminação constitucional de rendas tributárias” (DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Manual de direito tributário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 91).

23 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 2.

24 RE 150.764-1, Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Red. p/o Ac. Marco Aurélio, 10.12.1992, DJU 02.04.1993, voto p. 1548.

25 SCHOUERI, Luis Eduardo. Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 237; VELLOSO, Andrei Pitten. Constituição tributária interpretada. São Paulo: Atlas, 2007. p. 9; DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Manual de direito tributário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 91.

26 Humberto Ávila enfatiza no seguinte sentido: “Como já enfatizado, a Constituição brasileira caracteriza-se precisamente pela extensão das regras de competência que prevê para a instituição dos tributos dos entes federados. O sistema tributário nacional, do art. 145 ao art. 162, estabelece regras que delimitam constitucionalmente o poder que cada ente político possui, não deixando, como sói acontecer em outros sistemas jurídicos, liberdade ao legislador para alterar os fatos que podem ou que não podem ser objeto de tributação” (ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 158).

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ente político para instituir determinado tributo. Em segundo lugar, esse ente político em específico precisará editar lei própria para a instituição do tributo. Por fim, verificada a outorga de competência e previamente editada e publicada lei específica para a exigência de determinado tributo, impõe-se a verificação da prática da conduta descrita na norma por parte do contribuinte para que se possa falar em obrigação tributária.

Veja-se a relação entre as condições. A regra de competência, por opção constitucional assumida pelo Brasil, descreve e delimita o comportamento a ser adotado pelo ente federado quando desejar exercer o seu poder num passo seguinte. Equivale a dizer que o ente da federação, quando desejar valer-se de sua prerrogativa prevista na Constituição e propuser lei para instituir um tributo, estará vinculado ao conteúdo mínimo estabelecido na regra de competência. O Poder Legislativo não estará livre para tributar qualquer fato, devendo limitar--se a disciplinar a tributação dos fatos já eleitos pelo constituinte. Como refere Humberto Ávila: “Essa opção pela atribuição de poder por meio de regras im-plica a proibição de livre ponderação do legislador a respeito dos fatos que ele gostaria de tributar, mas que a Constituição deixou de prever”27.

Pode-se dizer que o poder de tributar assegurado pela Constituição aos entes da federação, para que seja validamente exercido deve ter congruência, de modo que a hipótese de incidência a ser editada pelo Poder Legislativo não conflite com a regra de competência que autorizou este mesmo poder a legis-lar. Essa relação de congruência entre a regra de competência e a hipótese de incidência criada pelo legislador foi examinada em diversas oportunidades pelo Supremo Tribunal Federal, podendo-se, apenas para efeito didático, recordar da tributação da receita instituída pela Lei nº 9.718/1998 por meio da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – Cofins. No julgamento do leading case, o Supremo Tribunal Federal verificou se a lei nova respeitava os limites da regra de competência enunciado pela Constituição ou se estava inovando ou ampliando aquele poder. A pesquisa levada a efeito pelo Ministro Cezar Peluso, relator do recurso, na ordem constitucional foi capaz de demonstrar que o con-ceito de faturamento pressuposto pela Constituição não admitia a sinonímia feita pela Lei nº 9.718/1998 com o conceito de receita. Faturamento é um con-ceito mais estreito que a definição de receita. Refere o Ministro que:

Tal atribuição legal de denotação ou significado mais extenso, que compre-ende todos os elementos do gênero ou classe de receitas, seria válida, se não afrontasse o alcance do texto constitucional que usa o termo faturamento, para outorga de competência tributária, com conteúdo semântico mínimo, sem o qual seria impossível observar e controlar os limites dessa mesma com-petência constitucional, assim como seria impossível preservar todo o grave alcance da proibição constitucional de prisão civil por dívida (art. 5º, LXVII),

27 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 159.

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se não fosse compreensível e restrita a condição jurídica de depositário infiel. Apesar de parecer expletivo, ante a própria inteligência do sistema, o qual já não permite a alteração da competência tributária pelo ente federado que a recebe, dada a rigidez constitucional, é, a respeito peremptório, o art. 110 do Código Tributário: “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito priva-do, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias”. É claro que o preceito não serve a interpretar a Constituição, mas tem eficácia enquanto predica a sanção de invalidez às normas tributárias que a contrariem nos aspectos enunciados. E não deixa de confirmar que a Constituição da Re-pública usa, implicitamente, conceitos de direito privado para delimitar ou limitar competências tributárias.28

Este precedente está alinhado como uma tradição do Supremo Tribunal Federal em reconhecer nas regras de competência conteúdo semântico mínimo, como se pode observar no voto mais antigo proferido no julgamento do Recurso Extraordinário nº 71.758/GB. Assim escreve o Ministro Luiz Gallotti:

Sr. Presidente, é certo que podemos interpretar a lei, de modo a arredar a inconstitucionalidade. Mas interpretar interpretando e, não, mudando-lhe o texto, e, menos ainda, criando um imposto novo, que a lei não criou. Como sustentei muitas vezes, ainda no Rio, se a lei pudesse chamar de compra o que não é compra, de importação o que não é importação, de exportação o que não exportação, de renda o que não é renda, ruiria todo o sistema cons-titucional tributário inscrito na Constituição.29

Se é verdade, como se buscou demonstrar, que é necessário verificar congruência entre a regra de competência constitucional com a hipótese de incidência editada pelo Poder Legislativo, é igualmente verdade que a mesma congruência deve ser observada na relação entre a hipótese de incidência e o fato a ser capturado para promover a incidência da tributação. Somente aquele fato que tem a aptidão de preencher todos os elementos da hipótese de incidên-cia é que poderá ser suscetível de tributação.

i.4 a regra-matriz de incidência e seus respectivos aspectos

No direito tributário, cunhou-se uma expressão bastante genuína e que ainda hoje desempenha importante papel prático e didático. Para explicar a importância da hipótese de incidência, Paulo de Barros Carvalho cunhou a ex-

28 RE 346.084/PR, Pleno, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 02.09.2006, p. 24 do voto.

29 RE 71758/GB, Rel. Min. Thompson Flores, Pleno, J. 14.6.1972, DJ 31.08.1973, p. 6310.

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pressão “regra-matriz de incidência”, abeberando-se em lições e Herbert Hart, Norberto Bobbio, Carlos Cossio, Lourival Villanova e Alfredo Augusto Becker.

Paulo de Barros Carvalho explica que “a norma tributária em sentido es-trito será a que prescreve a incidência”30. O professor explica que a “regra-ma-triz de incidência tributária é, por excelência, uma regra de comportamento, preordenada que está a disciplinar a conduta do sujeito devedor da prestação fiscal, perante o sujeito pretensor, titular do direito de crédito”31.

Na intenção de extrair o essencial da noção de regra-matriz de incidência para os estreitos propósitos desta pesquisa, importa explicar de forma sintética a estrutura proposta por Paulo de Barros Carvalho, nas próprias palavras do autor:

No descritor da norma (hipótese, suposto, antecedente) teremos diretrizes para identificação de eventos portadores de expressão econômica. Haverá um critério material (comportamento de alguma pessoa), condicionado no tempo (critério temporal) e no espaço (critério espacial). Já na consequência (prescritor) toparemos com um critério pessoal (sujeito ativo e sujeito pas-sivo) e um critério quantitativo (base de cálculo e alíquota). A conjunção desses dados indicativos nos oferece a possibilidade de exibir, na plenitude, o núcleo lógico-estrutural da norma padrão, preenchido com os requisitos significativos necessários e suficientes para o impacto jurídico da exação.32

Em síntese, a regra-matriz de incidência pode ser desdobrada em duas partes: a primeira chamada de hipótese (descritor) e a segunda chamada de con-sequência (prescritor). É da conjugação dessas duas partes que se pode exibir na sua inteireza o chamado “núcleo lógico-estrutural da norma-padrão de incidên-cia tributária”33. Por óbvio que esta estrutura não se revela perfeita e acabada no sistema constitucional tributário. Como reconhece o próprio autor, a regra-ma-triz de incidência, por vezes, resulta de um “penoso trabalho de composição”34. Porém, o essencial está em reconhecer que a tributação, para que seja exercida com validade constitucional, deve obedecer às regras de competência definidas na Constituição e, notadamente, deve promover a explicitação desta estrutura normativa tão bem descrita por Paulo de Barros Carvalho.

30 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário. Fundamentos jurídicos da incidência. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 80.

31 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 247.

32 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário. Fundamentos jurídicos da incidência. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 81.

33 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 239.

34 O autor reconhece que a identificação desta estrutura nem sempre se revela visível à primeira vista: “Redizemos que as leis não trazem normas jurídicas organicamente agregadas, de tal modo que nos seja lícito desenhar, como facilidade, a indigitada regra-matriz de incidência, que todo o tributo hospeda, como centro catalisador de seu plexo normativo. Pelo contrário, sem arranjo algum, os preceitos se dispersam pelo corpo do estatuto, compelindo o jurista a um penoso trabalho de composição. Visto por esse prisma, o labor científico aparece como um árduo esforço de procura, isolamento de dados, montagem e construção final do arquétipo da norma jurídica” (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 240).

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Este dever de observar e explicitar os elementos da estrutura integrante da regra-matriz decorre da necessidade de promover alguns ideais plasmados na Constituição. A inserção da legalidade entre as limitações constitucionais ao poder de tributar tem justamente este propósito. Entre as diversas funções que desempenha a legalidade inscrita no art. 150, I, da Constituição, pode-se desta-car este dever de aclarar a estrutura normativa da regra de incidência, sob pena inclusive de inconstitucionalidade35.

A chamada tipicidade tributária ou legalidade material é também reco-nhecida em doutrina como “determinabilidade fática” ou especificidade con-ceitual36. Ocorre que a exigência constitucional imposta ao legislador ordinário de uma determinação mais apurada das hipóteses fáticas é mais enfática que a prévia edição de lei, como exige a legalidade formal37. Exige-se, em sede tribu-tária, tal nível de precisão normativa como forma de evitar que a utilização de expressões corriqueiras possam embaralhar o intérprete que, por vezes, não se satisfaz com a existência de lei em sentido formal para satisfazer os preceitos constitucionais. Por essa razão, adota-se a definição “determinabilidade fáti-ca” utilizada por Humberto Ávila38. Aqui, no entanto, está a se sustentar que a Constituição exige mais que lei prévia. Exige a definição clara da hipótese de incidência, sob pena de violação à determinabilidade fática. De nada adiantaria a Constituição exigir simplesmente que houvesse a edição prévia de lei para instituição de um determinado tributo novo em abstrato39. Estar-se-ia, assim, conferindo ao Poder Executivo um “cheque em branco” para estabelecer o su-jeito passivo, fato gerador, base de cálculo e alíquota. O sistema tributário, no

35 As funções eficaciais da legalidade foi defendido em trabalho premiado pela Fundação Escola Superior de Direito Tributário no IV Direito Tributário em Questão, cuja publicação encontra-se no prelo.

36 RIBEIRO, Ricardo Lodi. Legalidade tributária, tipicidade aberta, conceitos indeterminados e cláusulas gerais tributárias. Revista de Direito Administrativo, n. 229, p. 323, jul./set. 2002. O autor critica a ideia oitocentista de tipicidade cerrada ou fechada, apontando como uma das causas do atraso ou “crise axiológica” do direito tributário.

37 Misabel Derzi, na atualização à obra de Aliomar Baleeiro, parafraseando Bühler, identifica a legalidade no sentido material com o Estado de Direito: “Lembra O. Bühler que, segundo a máxima de que nenhuma intervenção se dará sem fundamental legal, a conformidade coma lei e com o pressuposto de fato ‘são manifestações jurídico-tributárias do Estado de Direito’ (Cf. BÜHLER, Ottmar. Princípios de derecho internacional tributário. Trad. Fernando Cervera Torrejon. Madrid: Derecho Financiero, 1968. p. 201)” (BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 116).

38 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 300 e ss. Canotilho reconhece a existência de um princípio da precisão ou determinabilidade das normas jurídicas (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 258).

39 O Tribunal Constitucional Federal da Alemanha aplicou o princípio do Estado de Direito no julgamento do caso que discutia a “Lei dos Preços” e a possibilidade dos órgãos da Administração para regular a matéria por meio de decretos e medidas administrativas. O Tribunal assentou que “os princípios do Estado de Direito exigem que também os poderes delegados ao Executivo para a edição de atos administrativos onerosos sejam, por meio de lei autorizadora, suficientemente determinados e delimitados em seu conteúdo, objeto, propósito e extensão, de tal forma que as intervenções sejam mensuráveis, bem como sejam, em certa extensão, previsíveis e calculáveis para o cidadão” (BVerfGE 8, 274, de 12.11.1958. SCHWABE, Jürgen. Cinquenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal alemão. Trad. Beatriz Hennig et al. Montevidéu: Fundacion Konrad Adenauer, 2005. p. 846).

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entanto, indica o contrário. É possível haurir do sistema constitucional tributário esse dever de precisão, aqui chamado determinabilidade fática, inclusive com supedâneo em precedente do Supremo Tribunal Federal40.

A doutrina de direito tributário é uníssona ao sustentar o dever de pre-cisão normativa, divergindo apenas quanto ao nome a ser atribuído41. Roque Antonio Carrazza, por exemplo, chama apenas legalidade e diz que “para afu-gentarmos, desde já, possíveis dúvidas, é bom dizermos que criar um tributo é descrever abstratamente sua hipótese de incidência, seu sujeito ativo, seu sujeito passivo, sua base de cálculo e sua alíquota”42. De outro lado, Paulo de Barros Carvalho prefere adjetivar o princípio e chamá-lo de estrita legalidade43. O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a extensão e significado da norma constitucional de legalidade, já reconheceu o dever de correta discriminação de sujeito passivo, alíquota e base de cálculo44. No julgamento que apreciou a prática da Administração paulista em legislar sobre matéria tributária por meio de decreto, o Supremo Tribunal Federal referiu que, ainda que a determinação do sujeito passivo constasse das normas federais (decreto-lei), seria necessário constar também na legislação estadual45. Na mesma linha, ao examinar o re-curso extraordinário que discutia a instituição de taxa sem a expressa discrimi-nação da base de cálculo e alíquota, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade da norma46.

40 “[...] o princípio da reserva legal foi concebido para garantir o contribuinte contra o abuso do poder de tributar. Se prevalecer o poder do acórdão impugnado, ficará o executivo paulista com o poder quase absoluto de tributar por meio de decreto regulamentar de lei federal, anomalia que a Constituição rejeita, como se compreende.” (RE 78871/SP, 1ª T., Rel. Min. Antonio Neder, J. 19.04.1977, DJU 06.05.1977, RTJ v. 81-3, p. 787)

41 Importante ressaltar que a mera classificação ou nomenclatura adotada é de somenos importância. Parece-nos mais correto e didaticamente ilustrativo utilizar a expressão determinabilidade fática. Contudo, a despeito da divergência quanto ao nome, convergem os autores quanto aos efeitos e consequências jurídicas da norma.

42 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 216.

43 Refere Paulo de Barros: “O veículo introdutor da regra tributária no ordenamento há de ser sempre a lei (sentido lato), porém o princípio da estrita legalidade diz mais do que isso, estabelecendo a necessidade de que a lei adventícia traga no seu bojo os elementos descritores do fato jurídico e os dados prescritores da relação obrigacional. Esse plus caracteriza a tipicidade tributária, que alguns autores tomam como outro postulado imprescindível ao subsistema de que nos ocupamos, mas que pode, perfeitamente, ser tido como uma decorrência imediata do princípio da estrita legalidade” (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 159).

44 Como destaca o Ministro Aliomar Baleeiro no seu voto: “Nosso sistema jurídico-constitucional, como o de todos Estados-de-Direito, consagra o princípio da legalidade do tributo, que é, doutrinariamente, obrigação ex lege (art. 19, I; art. 153, § 29, da Constituição Federal). E o Código Tributário Nacional, que é lei complementar de normas gerais de Direito Financeiro (art. 6º, XVII, c) da Constituição Federal, estabelece nítida e imperiosamente a regra da reserva de lei para instituição e majoração de impostos, quer do ponto de vista do fato gerador, quer no da base de cálculo (Lei nº 5.172/1966, arts. 97, II, III e § 1º)” (RE 80386/SP, 1ª T., Rel. Min. Aliomar Baleeiro, J. 04.03.1975, DJU 04.04.1975).

45 RE 78871/SP, 1ª T., Rel. Min. Antonio Neder, J. 19.04.1977, DJU 06.05.1977, RTJ v. 81-3, p. 787.

46 Consoante ressalta o Ministro Carlos Velloso: “Posta assim a questão, segue-se a inconstitucionalidade do citado dispositivo legal, dado que ali não está fixada nem a base de cálculo da taxa e nem a sua alíquota. É dizer, a lei não estabelece a base de cálculo da taxa e nem a sua alíquota, delegando à autoridade administrativa a elaboração de tabela anual para ‘ressarcimento de custos incorridos nos respectivos serviço’,

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i.5 sujeito passivo possível. correlações entre isonomia e capacidade contriButiva

Da análise da estrutura da regra-matriz de incidência extrai-se que a identificação do sujeito obrigado ao dever jurídico de adimplir à prestação pe-cuniária deve estar previsto e adequadamente descrito na norma jurídica. Seja porque o anseio de segurança, previsibilidade e calculabilidade a que a lega-lidade visa promover, seja porque se impõe a identificação do obrigado por razões de ordem prática, como a constituição do crédito e exigência do tributo; em qualquer situação, não se pode conceber que a relação jurídica tributária não tenha identificado adequadamente cada um dos polos da relação.

Como dito acima, as regras de competência previstas na Constituição têm como função precípua disciplinar o poder de tributar a ser exercido pelo ente da federação descrito na própria norma. Se de um lado a norma descreve o ente tributante e identifica o fato passível de tributação, não se pode imaginar que igualmente não descreva ou, pelo menos, pressuponha quem deverá su-portar o ônus de adimplir o tributo. Chega-se, portanto, ao ponto central desta primeira parte do ensaio. A relação obrigacional tributária, assim como toda relação obrigacional, pressupõe a existência, de um lado, de um credor, e, de outro, um devedor. Se a regra de competência da Constituição identifica e ou-torga poder a um ente federado para instituir determinado tributo, não se pode pensar que não tenha, ao menos, sinalizado para quem, dentro da sociedade, deverá arcar com tal encargo.

Como já defendeu Roque Antonio Carrazza, a “Constituição aponta o sujeito passivo possível de cada tributo, isto é, a pessoa que poderá ser colo-cada, pela lei, na contingência de efetuar seu pagamento”47. Em que pese não seja possível extrair facilmente de todas as regras de competência inscritas na Constituição o respectivo sujeito passivo da obrigação tributária, não se pode concluir que o texto constitucional delegou ao ente federado a prerrogativa de incluir no polo passivo qualquer pessoa.

É lícito afirmar que a Constituição, ao delimitar a competência tributária, estatuindo regras a serem observadas na instituição dos tributos, amalgamou o critério material da regra-matriz ao critério pessoal, estabelecendo um vínculo de pertinência entre o antecedente com o consequente da regra. Logo, o verbo e seu respectivo complemento devem necessariamente estar relacionados com o sujeito que pratica a conduta descrita no antecedente. É como assinala Roque Carrazza: “As pessoas políticas não possuem total liberdade para elegerem o sujeito passivo dos tributos que criam in abstracto. Pelo contrário, devem ne-cessariamente levar em conta o sujeito passivo possível da exação, assinalado

violando-se, destarte, o princípio da legalidade tributária (CF, art. 150, I; CTN, art. 97, IV).” (RE 188107/SC, Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, J. 21.03.1997, DJU 30.05.1997, p. 23193)

47 CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010. p. 159.

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na Lei Maior”48. Assim, pode-se sustentar que a Constituição oferece um con-ceito constitucional de contribuinte que está estreitamente ligado à definição do aspecto material da regra-matriz de incidência. Nesse sentido, escreve Renato Lopes Becho:

Comungamos com a doutrina que vê na Constituição Federal os dados para se extrair cientificamente o sujeito passivo [...] para nós, o legislador não tem liberdade de escolha nos tributos discriminados. Há uma maior liberdade nos tributos não discriminados, mais na escolha do critério material do que na do critério pessoal. Esse decorre da materialidade eleita, na qual há li-berdade do legislador, nos limites constitucionais. Essa liberdade é reduzida quando deve o legislador apontar quem recolherá o tributo (ou ocupará o polo passivo da relação jurídico-tributária).49

A necessidade de identificação do sujeito passivo da relação obrigacio-nal tributária está intimamente ligada com as normas constitucionais da legali-dade, como já dito, e sobretudo com as normas da isonomia (art. 150, II, da CF) e capacidade contributiva (art. 145, parágrafo único, da CF).

Consoante estabelece a norma que estabelece isonomia no âmbito tribu-tário (art. 150, II, da CF), é vedado aos entes da federação “instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proi-bida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos”. Equivale a dizer que as pessoas que estiverem em situação equiva-lente e praticarem atos equivalentes deverão receber tratamento idêntico, seja para tributar suas condutas, seja para afastar a incidência caso se verifique que a conduta praticada não se subsume ao aspecto material da regra-matriz. Não se pode admitir que determinada pessoa seja considerada contribuinte e outra que está em situação equivalente e praticou conduta idêntica não o seja. Essas considerações parecem extremamente singelas a ponto de se colocar em dú-vida se mereceria a explicitação aqui empreendida. Ocorre que diuturnamen-te a Administração Tributária, abordando de forma equivocada o conceito de contribuinte, considera possível a afastar ou incluir da incidência da tributação pessoas que praticaram rigorosamente a mesma conduta.

O tema é bastante controvertido no âmbito do ICMS, quando, para a in-cidência do referido tributo nas operações de circulação de mercadoria, exige--se a habitualidade da transação. Nesse sentido, somente pode ser chamado de contribuinte de ICMS aquela pessoa que comercializa a referida mercadoria e a negocia como atividade mercantil, de sorte que a venda esporádica ou ocasio-nal não transformará o vendedor daquele bem em contribuinte de ICMS. Veja--se, portanto, que o aspecto material da regra-matriz – circulação de mercadoria

48 CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010. p. 160.

49 BECHO, Renato Lopes. Sujeição passiva e responsabilidade tributária. São Paulo: Dialética, 2000. p. 77.

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com habitualidade – deve guardar pertinência com o sujeito que pratica a con-duta, não se podendo atribuir a quem não desempenha exatamente a conduta descrita na legislação como contribuinte50.

Da mesma forma, a definição constitucional de contribuinte passa pelo conjunto da norma da capacidade contributiva insculpida no art. 145, parágrafo único, da Constituição. Em poucas linhas, pode-se dizer que a capacidade con-tributiva é o critério de avaliação previsto na Constituição para exame do dever de concorrer com as finanças públicas51. Se o dever de pagar tributos é um en-cargos de toda a sociedade, este encargo deve ser repartido de forma equitativa, de modo que aqueles que demonstrem maior possibilidade de contribuir assim o façam. De outro lado, não se pode exigir daquele que nada pode contribuir, assim como não se pode tributar de forma demasiada que possa prejudicar a subsistência do cidadão ou privar-lhe os direitos de propriedade e existência digna. Logo, parece bastante claro que a vinculação do critério material da regra-matriz esteja ligado com o critério pessoal e, sobretudo, esteja graduado em razão das condições particulares de cada indivíduo. Como já defendia o mestre Geraldo Ataliba, o conceito de contribuinte está associado ao princípio da capacidade contributiva. Nas palavras de Geraldo Ataliba: “É a pessoa que revela capacidade contributiva, ao participar do fato imponível, promovendo-o, realizando-o ou dele tirando proveito econômico”52. A tributação somente pode ser praticada sobre situações que representem capacidade para contribuir, de modo que aquele cidadão que não revele esta capacidade, ainda que pratique o fato descrito no antecedente da norma de incidência, por força de mandamento constitucional, não deverá ser tributado.

50 Para ilustrar o debate, vale reproduzir julgado do Superior Tribunal de Justiça que enfrentou a condição de contribuinte como requisito para a tributação do ICMS: “Agravo regimental em recurso especial. Direito tributário. ICMS. Bens do ativo fixo. Venda. Não incidência. Habitualidade. Reexame de prova. Súmula nº 7/STJ. 1. A venda dos bens do ativo fixo da empresa não se constitui em fato gerador do ICMS. Precedentes. 2. Reconhecido no acórdão impugnado que ‘o que foi objeto de leilão foram os bens pertencentes ao ativo fixo da empresa, e não se pode aceitar que a renovação de uma frota de veículos, maquinarias, aparelhos de informática, ou mais o que se queira incluir, e que pertencem ao ativo fixo da empresa possa ser considerado fato gerador de incidência do tributo em questão, isto porque se trata de ato esporádico, sem habitualidade, fora da atividade fim da empresa contribuinte do imposto’, a alegação em sentido contrário, a motivar insurgência especial, requisita exame do acervo fáctico-probatório, vedado na instância excepcional. 3. ‘A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial’ (Súmula do STJ, Enunciado nº 7). 4. Agravo regimental improvido” (AgRg-REsp 1086878/RJ, 1ª T., Rel. Min. Hamilton Carvalhido, J. 17.08.2010, DJe 29.09.2010).

51 A definição está em sintonia com o conceito apresentado pelo Desembargador Luiz Felipe Difini: “O princípio da capacidade contributiva é cada um dever concorrer para com as despesas públicas consoante suas posses e disponibilidades econômicas” (DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Manual de direito tributário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 82).

52 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 80.

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II – DA SUJEIÇÃO PASSIVA INSCULPIDA NA CONSTITUIÇÃO

ii.1 do conceito constitucional de contriBuinte

Partindo das premissas suscitadas na primeira parte dessa exposição, pode-se alcançar uma definição adequada ao sistema constitucional tributário. Se o ponto de partida são as regras de competência insculpidas no texto cons-titucional, pode-se dizer que contribuinte é aquela pessoa (física ou jurídica) que está intimamente ligada ao critério material da regra-matriz de incidência. Em verdade, esse conceito não revela qualquer novidade, pois a definição de contribuinte prevista no Código Tributário Nacional é praticamente idêntica53.

Em verdade, este conceito é o sustentado de forma majoritária pela dou-trina, observando algumas variações de estilo. Hector Villegas, por exemplo, prefere falar em “destinatário legal tributário”54. Geraldo Ataliba, de seu turno, cunhou a expressão “destinatário constitucional tributário”55. De forma bastante enfática, Roque Carrazza utiliza a expressão “sujeito passivo possível” segundo a Constituição, rechaçando a discricionariedade ou arbítrio do legislador para escolher o contribuinte que deseja56.

Alinhando as ideias trazidas neste ensaio, pode-se dizer que, segundo a Constituição, para que alguém seja inserido no polo passivo da relação obri-gacional tributária, devem concorrer os seguintes critérios: (a) a Constituição deve autorizar mediante as regras de competência a tributação por parte do ente federado; (b) a regra de competência autorizativa deve estabelecer mini-mamente o critério material da norma de incidência, de modo que este critério já será definidor da condição de contribuinte; (c) o Poder Legislativo deve editar norma compatível com a regra de competência prevista na Constituição sem que importe em ampliação aos poderes por ela concedidos; (d) o destinatário constitucional tributário deve revelar capacidade para contribuir sem que lhe ofenda sua própria subsistência e sem que importe em comprometimento do seu patrimônio. Observados esses critérios, ter-se-á conceituado o contribuinte de forma consentânea com a Constituição57.

53 “Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se: I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador.”

54 VILLEGAS, Hector. Destinatário legal tributário. RDP, n. 30, p. 294, 1974.

55 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 80.

56 CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010. p. 161.

57 CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010. p. 163. No direito tributário argentino, Dino Jarach estabelece o seguinte conceito: “En otras oportunidades hemos sostenido que el sujeto pasivo principal es aquel que posee la capacidad contributiva que constituye el fundamento del hecho imponible [...]” (JARACH, Dino. Finanzas públicas e derecho tributário. 4. ed. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 2013. p. 377).

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No intuito de ilustrar as definições trazidas, cumpre examinar alguns pre-cedentes das Cortes Superiores que corroboram os critérios aqui trazidos. Um caso emblemático diz respeito à incidência do IPI na importação de produtos estrangeiros por pessoa física. O critério material da incidência do IPI admite a tributação na atividade de industrialização do produto, assim como na im-portação de produto estrangeiro. No entanto, em ambos os casos, haverá a incidência sobre as operações que estejam ligadas à atividades econômicas, não se podendo chamar de contribuinte qualquer pessoas que modifique a na-tureza de um produto (v.g.: artista plástico ou artesão) ou aquele cidadão que importa determinado bem estrangeiro para uso pessoal sem qualquer intenção de comercializá-lo ou utilizá-lo em atividade econômica organizada. Estabele-cendo uma abordagem comparativa do critério material da regra-matriz do IPI com as situações antes referidas é que o Supremo Tribunal Federal decidiu por afastar a incidência do referido tributo nas importações de produtos estrangeiros por pessoa física58.

Da mesma forma, não se pode atribuir a condição de contribuinte do IPTU quem não titule nenhum dos direitos reais descritos no critério material da regra-matriz de incidência, a saber: propriedade, posse ou domínio útil. Como decidiu o Superior Tribunal de Justiça, não se pode considerar contribuinte quem não detenha o bem imóvel com animus domini, pois este é o elemento essencial caracterizador da tributação da propriedade imóvel urbana prevista no art. 156, I, da Constituição59. O Superior Tribunal de Justiça possui jurispru-

58 “Agravo regimental em recurso extraordinário. Constitucional. Tributário. Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI. Importação de veículo por pessoa física para uso próprio. Não incidência. Aplicabilidade do princípio da não cumulatividade. 1. Não incide o IPI sobre a importação, por pessoa física, de veículo automotor destinado ao uso próprio. Precedentes: REs 255.682-AgR, da relatoria do Ministro Carlos Velloso; 412.045, da minha relatoria; e 501.773-AgR, da relaria do Ministro Eros Grau. 2. Agravo regimental desprovido” (RE 255090-AgRg, 2ª T., Rel. Min. Ayres Britto, J. 24.08.2010, DJe-190 divulg. 07.10.2010, public. 08.10.2010, Ement. v. 02418-04, p. 00904); “Constitucional. Tributário. IPI. Importação: pessoa física não comerciante ou empresário. Princípio da não cumulatividade: CF, art. 153, § 3º, II. Não incidência do IPI. I – Veículo importado por pessoa física que não é comerciante nem empresário, destinado ao uso próprio. Não incidência do IPI. Aplicabilidade do princípio da não cumulatividade. CF, art. 153, § 3º, II. Precedentes do STF relativamente ao ICMS, anteriormente à EC 33/2001: RE 203.075/DF, Min. Maurício Corrêa, Plenário, DJ 29.10.1999; RE 191.346/RS, 2ª T., Min. Carlos Velloso, DJ 20.11.1998; RE 298.630/SP, 1ª T., Min. Moreira Alves, DJ 09.11.2001. II – RE conhecido e provido. Agravo não provido.” (RE 255682-AgRg, 2ª T., Rel. Min. Carlos Velloso, J. 29.11.2005, DJ 10.02.2006, p. 00014, Ement. v. 02220-02, p. 00289, RDDT n. 127, p. 182-186, 2006; RIP v. 7, n. 35, p. 247-251, 2006).

59 “Processual civil. Tributário. Violação do art. 535 do CPC. Alegação genérica. Súmula nº 284/STF. IPTU. Contribuinte. Ausência de animus domini. Condomínio. Mero administrador. 1. A alegação genérica de violação do art. 535 do Código de Processo Civil, sem explicitar os pontos em que teria sido omisso o acórdão recorrido, atrai a aplicação do disposto na Súmula nº 284/STF. 2. O fato gerador do IPTU, conforme dispõe o art. 32 do CTN, é a propriedade, o domínio útil ou a posse. O contribuinte da exação é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio ou seu possuidor a qualquer título (art. 34 do CTN). 3. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que somente a posse com animus domini é apta a gerar a exação predial urbana, o que não ocorre com o condomínio, in casu, que apenas possui a qualidade de administrador de bens de terceiros. 4. ‘Não é qualquer posse que deseja ver tributada. Não é a posse direta do locatário, do comodatário, do arrendatário de terreno, do administrador de bem de terceiro, do usuário ou habitador (uso e habitação) ou do possuidor clandestino ou precário (posse nova etc.). A posse prevista no Código Tributário como tributável é a de pessoa que já é ou pode ser proprietária da coisa’ (Curso de direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). 8. ed. Imposto Predial e Territorial Urbano, p. 736/737). Recurso especial improvido” (REsp

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dência pacífica no sentido de considerar solidariamente responsáveis o proprie-tário e o possuidor do imóvel nos casos de promessa de compra e venda. No entanto, devem-se respeitar os elementos essenciais caracterizadores do direito de propriedade, de modo que quem não detenha mais a propriedade porque já realizou a tradição e providenciou a alteração no registro de imóveis, não ostenta posse, tampouco propriedade, não se podendo chamar de contribuinte o ex-proprietário60.

1327539/DF, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, J. 14.08.2012, DJe 20.08.2012). No mesmo sentido, afastando a tributação porque impossível falar em animus domini em se tratando de área pública: “Tributário. Bem público. Imóvel. (Ruas e áreas verdes). Contrato de concessão de direito real de uso. Condomínio fechado. IPTU. Não incidência. Posse sem animus domini. Ausência do fato gerador do tributo (arts. 32 e 34 do CTN). 1. A controvérsia refere-se à possibilidade ou não da incidência de IPTU sobre bens públicos (ruas e áreas verdes) cedidos com base em contrato de concessão de direito real de uso a condomínio residencial. 2. O art. 34 do CTN define como contribuinte do IPTU o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título. Contudo, a interpretação desse dispositivo legal não pode se distanciar do disposto no art. 156, I, da Constituição Federal. Nesse contexto, a posse apta a gerar a obrigação tributária é aquela qualificada pelo animus domini, ou seja, a que efetivamente esteja em vias de ser transformada em propriedade, seja por meio da promessa de compra e venda, seja pela posse ad usucapionem. Precedentes. 3. A incidência do IPTU deve ser afastada nos casos em que a posse é exercida precariamente, bem como nas demais situações em que, embora envolvam direitos reais, não estejam diretamente correlacionadas com a aquisição da propriedade. 4. Na hipótese, a concessão de direito real de uso não viabiliza ao concessionário tornar-se proprietário do bem público, ao menos durante a vigência do contrato, o que descaracteriza o animus domini. 5. A inclusão de cláusula prevendo a responsabilidade do concessionário por todos os encargos civis, administrativos e tributários que possam incidir sobre o imóvel não repercute sobre a esfera tributária, pois a instituição do tributo está submetida ao princípio da legalidade, não podendo o contrato alterar a hipótese de incidência prevista em lei. Logo, deve-se reconhecer a inexistência da relação jurídica tributária nesse caso. 6. Recurso especial provido” (REsp 1091198/PR, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, J. 24.05.2011, DJe 13.06.2011).

60 “Processual civil. Tributário. IPTU. Contrato de promessa de compra e venda de imóvel. Legitimidade passiva do possuidor (promitente comprador) e do proprietário (promitente vendedor). 1. É certo que a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que tanto o promitente comprador (possuidor a qualquer título) do imóvel quanto seu proprietário/promitente vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no Registro de Imóveis) são contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU. Cumpre destacar que no REsp 1110551/SP e no REsp 1111202/SP, de minha relatoria, julgados em 10.06.2009, DJe 18.06.2009, submetidos ao Colegiado pelo regime da Lei nº 11.672/2008 (Lei dos Recursos Repetitivos), que introduziu o art. 543-C do CPC, reafirmou-se o posicionamento acima exposto. 2. No entanto, o acórdão de fls. 141/147, proferido na forma do disposto no art. 543-C, § 8º, do CPC, bem demonstrou a inaplicabilidade desse entendimento ao caso concreto, nos seguintes termos: ‘O acórdão proferido por este Colegiado teve por fundamento não a só existência de contrato de promessa de compra e venda do imóvel gerador do tributo, mas as específicas circunstâncias de haver ele sido firmado em caráter irrevogável e irretratável, com imediata imissão do promitente-comprador na posse, e subsequente averbação no Registro de Imóveis (daí advindo os efeitos jurídicos previstos nos arts. 1.417 e 1.418 do Código Civil), além do manifesto exaurimento do prazo para usucapião do bem. Contornos específicos, que fazem destacar-se um caso particular na massa de demandas repetitivas, reclamam detido pronunciamento jurisdicional, como forma mesmo de aperfeiçoar o regime estabelecido na Lei nº 11.672/2008’. 3. Além disso, no que se refere ao acórdão proferido em sede de apelação (fls. 86/94), o Tribunal de origem, entre outros fundamentos, entendeu que, ainda que o promitente comprador não seja o proprietário em virtude da ausência de registro da escritura de compra e venda no Cartório de Imóveis, ele o tornou em razão da usucapião, explicitando que ‘por força de promessa de compra e venda celebrada em caráter irrevogável e irretratável, com transmissão imediata da posse, lavrada no ano de 1979, devidamente averbada no competente cartório de registro de imóveis’, sendo que, ‘de tão longínqua a data de formação do contrato, já se exauriu, há muito, o prazo da usucapião’, razão pela qual deve ser afastada a responsabilidade do promitente vendedor. Ocorre que, nas razões recursais, o Município do Rio de Janeiro nem sequer atacou o fundamento acerca da aquisição do imóvel pela usucapião, o que atrai a incidência da Súmula nº 283 do Supremo Tribunal Federal, por analogia: ‘É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles’. 4. Recurso especial não conhecido.” (REsp 1204294/RJ, 2º T., Rel. Min. Mauro Campbell Marques, J. 14.06.2011, DJe 21.06.2011)

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No entanto, é preciso estabelecer mais algumas características próprias do direito tributário que tornam ainda mais difícil a corriqueira comparação da obrigação tributária com a obrigação civil. É que a relação tributária possuirá características distintas, variáveis de acordo com a espécie tributária que se esteja examinando.

Quando se está a tratar da espécie “imposto”, a questão relativa à ca-pacidade contributiva e a conduta praticada pelo contribuinte ganham rele-vo especial. Geraldo Ataliba define o contribuinte do imposto como sendo “a pessoa que revela capacidade contributiva, ao participar do fato imponível, promovendo-o, realizando-o ou dele tirando proveito econômico”61. A relação obrigacional tributária está relacionada com o próprio conceito legal de impos-to, insculpido no art. 16 do Código Tributário Nacional, que enfoca a tributação no comportamento do contribuinte recortado pela regra-matriz de incidência. Por outro lado, a definição de contribuinte das taxas necessita sofrer certa adap-tação, pois a tributação não incidirá sobre um comportamento do contribuinte identificado na lei, mas um serviço público utilizado pelo cidadão ou a ativi-dade fiscalizatória desempenhada pela Administração Pública62. Para Ataliba, considera-se contribuinte, “nas taxas, o administrado cuja atividade requeira o ato de polícia ou que provoque, requeira ou, de qualquer modo, utilize serviço público”63. Por derradeiro, há que se identificar que a relação obrigacional é igualmente distinta nas contribuições. Será atribuída a condição de contribuinte aquele que esteja ligado de alguma forma à promoção de alguma finalidade constitucional, recebendo especial atenção estatal ou acarretando especial dis-pêndio ao Estado64.

ii.2 da definição constitucional de contriBuinte e a solidariedade prevista no código triButário nacional

Se as definições trazidas até aqui, alicerçadas nas normas constitucionais e precedentes jurisprudenciais, tinham o propósito de apresentar um conceito de contribuinte compatível com o sistema constitucional tributário, o exame da questão relativa à solidariedade no direito tributário pode parecer lançar um balde de água fria sobre todo o esforço até aqui empreendido. Com efeito, to-dos os esforços empreendidos no sentido de vincular o poder de tributar e suas respectivas limitações no momento de definir o sujeito passivo da relação obri-gacional tributária ambicionavam conferir maior segurança, certeza e previsibi-lidade ao sistema tributário. Como repetido várias vezes, o poder de tributar não

61 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 80.

62 O conceito de taxa está previsto no art. 145, II, da Constituição, assim como no art. 77 do CTN.

63 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 80.

64 Ataliba assim conceitua: “Nas contribuições, o sujeito que receba especial benefício ou cause especial detrimento ao estado” (ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 80).

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pode ser manejado de forma indiscriminada a ponto de tributar pessoa que não estabeleça nenhum vínculo com o aspecto material da hipótese de incidência.

Porém, uma análise apressada do tema pertinente à solidariedade pode conduzir o estudioso a concluir que, em verdade, sob o pretexto de atender o interesse público e promover a satisfação do crédito tributário, toda e qualquer pessoa pode estar solidariamente implicada com a obrigação. A toda evidên-cia que essa compreensão deve ser evitada, seja pelas razões que impuseram estabelecer critérios calcados na Constituição para apresentar uma definição constitucional de contribuinte, seja porque a promoção do interesse público não pode servir de critério para superação das limitações ao poder de tributar.

A solidariedade está prevista no art. 124 do Código Tributário Nacional com a seguinte redação: “Art. 124. São solidariamente obrigadas: I – as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obri-gação principal; II – as pessoas expressamente designadas por lei”. No direito civil, há regra expressa estabelecendo que a solidariedade não se presume, de-vendo ser expressa em lei ou resultar da vontade das partes (art. 265 do Código Civil). Como não há falar em vontade das partes em matéria tributária, a solida-riedade só pode ter origem legal. No entanto, as hipóteses previstas nos incisos I e II antes reproduzidas ensejam uma série de questionamentos, entre eles a possibilidade de ampliação das hipóteses de solidariedade a fim de garantir a satisfação do crédito público.

Essa conclusão equivocada poderia ganhar ainda mais respaldo se o in-térprete se socorrer da tradição civilística sobre solidariedade. Em que pese seja desnecessário incursionar na doutrina civilista, pode-se dizer, em poucas pala-vras, que o instituto da solidariedade no direito civil milita em favor do credor no sentido de assegurar que o crédito seja satisfeito por mais de um sujeito, não necessariamente vinculado pelo negócio jurídico base. Vale reproduzir as pre-cisas palavras de Pontes de Miranda: “A função da solidariedade passiva é de maior vantagem e de maior probabilidade de bom êxito para o credor, inclusive quanto à facilitação da cobrança e da execução”65.

Esse argumento serviria como uma luva para o direito tributário se conce-bêssemos que o crédito tributário veicula a satisfação de uma série de necessi-dades públicas na medida em que se constitui na principal fonte de receita para os entes políticos. Logo, quanto mais pessoas estivessem obrigadas e vinculadas com a satisfação do tributo, poder-se-ia dizer tanto melhor.

Porém, a regra da solidariedade não tem alcance tão amplo, assim como a supremacia do interesse público não se constitui em argumento bastante para afastar as normas constitucionais que orientam a tributação. Em que pese facul-

65 PONTES DE MIRANDA, Flavio Cavalcanti. Tratado de direito privado. Parte especial. Rio de Janeiro: Borsoi, t. XXII, 1958. p. 331.

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te ao Estado, por meio de iniciativa legislativa, definir as espécies de solidarie-dade, não se pode superar um preceito constitucional que serve não só para o contribuinte como para o devedor solidário, a saber: a capacidade contributiva. Essa norma constitucional prevista no art. 145, parágrafo único, da Constituição estabelece que a tributação somente alcançará aquele que revelar condições econômicas de contribuir com o sustento do Estado. Ora, se aquele que pra-ticou determinada conduta, em tese manifestadora de riqueza, pode ter sua condição econômica levada em consideração, por que o devedor solidário não poderia? Parece inegável referir que ao devedor solidário aplicam-se as mesmas limitações constitucionais ao poder de tributar que seriam aplicáveis ao deve-dor principal, neste caso, o contribuinte.

Por fim, não se deve confundir solidariedade prevista no Código Tri-butário Nacional com as espécies de responsabilidade tributária previstas no mesmo diploma. Em que pese seja possível verificar tal confusão na prática, especialmente na jurisprudência, é preciso distinguir as duas situações. A so-lidariedade constitui em forma de garantia do crédito em favor do credor, de modo que, quando verificada pluralidade de devedores (mais de um contribuin-te, contribuinte e responsável ou, ainda pluralidade de responsáveis), o crédito é disciplinado pelas regras da solidariedade em benefício do credor. De outro lado, a responsabilidade constitui-se na inclusão no polo passivo da relação obrigacional tributária de sujeito que não tenha mantido estreita vinculação ao critério material da regra-matriz de incidência, mas a lei o incluiu na condição de devedor.

Assim não se pode, a pretexto de valer-se da solidariedade prevista no art. 124 do Código Tributário Nacional, criar novas hipóteses de responsabili-dade tributária não previstas em lei e não disciplinadas pelo Código Tributá-rio. Essa orientação foi firmada pelo Supremo Tribunal Federal no exame do RE 562276 submetido ao regime da repercussão geral. No caso, afastou-se a pretensão atribuir ao sócio de sociedade, que, mesmo que não tenha exercido cargos de gestão, a responsabilidade pelo crédito66.

66 “Direito tributário. Responsabilidade tributária. Normas gerais de direito tributário. Art. 146, III, da CF. Art. 135, III, do CTN. Sócios de sociedade limitada. Art. 13 da Lei nº 8.620/1993. Inconstitucionalidades formal e material. Repercussão geral. Aplicação da decisão pelos demais tribunais. 1. Todas as espécies tributárias, entre as quais as contribuições de seguridade social, estão sujeitas às normas gerais de direito tributário. 2. O Código Tributário Nacional estabelece algumas regras matrizes de responsabilidade tributária, como a do art. 135, III, bem como diretrizes para que o legislador de cada ente político estabeleça outras regras específicas de responsabilidade tributária relativamente aos tributos da sua competência, conforme seu art. 128. 3. O preceito do art. 124, II, no sentido de que são solidariamente obrigadas ‘as pessoas expressamente designadas por lei’, não autoriza o legislador a criar novos casos de responsabilidade tributária sem a observância dos requisitos exigidos pelo art. 128 do CTN, tampouco a desconsiderar as regras matrizes de responsabilidade de terceiros estabelecidas em caráter geral pelos arts. 134 e 135 do mesmo diploma. A previsão legal de solidariedade entre devedores – de modo que o pagamento efetuado por um aproveite aos demais, que a interrupção da prescrição, em favor ou contra um dos obrigados, também lhes tenha efeitos comuns e que a isenção ou remissão de crédito exonere a todos os obrigados quando não seja pessoal (art. 125 do CTN) – pressupõe que a própria condição de devedor tenha sido estabelecida validamente. 4. A responsabilidade tributária pressupõe duas normas autônomas: a regra-matriz de incidência tributária e a

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Em caráter ilustrativo, vale examinar o precedente do Superior Tribunal de Justiça que afastou a pretensão do Fisco de alcançar pessoa jurídica integran-te do mesmo grupo econômico do contribuinte em dívida. Entendeu-se que a inclusão de pessoa jurídica estranha ao fato gerador encontra óbice nos limites da própria solidariedade, não se podendo presumi-la67.

CONCLUSÕESEm síntese conclusiva, pode-se dizer que é tão essencial quanto definir

o aspecto material da hipótese de incidência é precisar o sujeito que estará obrigado a adimplir a obrigação tributária prevista no referido aspecto. Muito se escreveu e muito se estudou sobre o critério material da regra-matriz, mas pouco se evoluiu e escreveu sobre o critério pessoal da regra-matriz.

A apropriação apressada dos institutos de direito privado tem conduzido a utilização de soluções pensadas para um ramo do Direito que não se revelam adequadas para outro. Como destacado nesta pesquisa, a racionalidade e os bens jurídicos tutelados no âmbito do direito privado não são os mesmos no di-

regra-matriz de responsabilidade tributária, cada uma com seu pressuposto de fato e seus sujeitos próprios. A referência ao responsável enquanto terceiro (dritter Persone, terzo ou tercero) evidencia que não participa da relação contributiva, mas de uma relação específica de responsabilidade tributária, inconfundível com aquela. O ‘terceiro’ só pode ser chamado responsabilizado na hipótese de descumprimento de deveres próprios de colaboração para com a Administração Tributária, estabelecidos, ainda que a contrario sensu, na regra-matriz de responsabilidade tributária, e desde que tenha contribuído para a situação de inadimplemento pelo contribuinte. 5. O art. 135, III, do CTN responsabiliza apenas aqueles que estejam na direção, gerência ou representação da pessoa jurídica e tão somente quando pratiquem atos com excesso de poder ou infração à lei, contrato social ou estatutos. Desse modo, apenas o sócio com poderes de gestão ou representação da sociedade é que pode ser responsabilizado, o que resguarda a pessoalidade entre o ilícito (mal gestão ou representação) e a consequência de ter de responder pelo tributo devido pela sociedade. 6. O art. 13 da Lei nº 8.620/1993 não se limitou a repetir ou detalhar a regra de responsabilidade constante do art. 135 do CTN, tampouco cuidou de uma nova hipótese específica e distinta. Ao vincular à simples condição de sócio a obrigação de responder solidariamente pelos débitos da sociedade limitada perante a Seguridade Social, tratou a mesma situação genérica regulada pelo art. 135, III, do CTN, mas de modo diverso, incorrendo em inconstitucionalidade por violação ao art. 146, III, da CF. 7. O art. 13 da Lei nº 8.620/1993 também se reveste de inconstitucionalidade material, porquanto não é dado ao legislador estabelecer confusão entre os patrimônios das pessoas física e jurídica, o que, além de impor desconsideração ex lege e objetiva da personalidade jurídica, descaracterizando as sociedades limitadas, implica irrazoabilidade e inibe a iniciativa privada, afrontando os arts. 5º, XIII, e 170, parágrafo único, da Constituição. 8. Reconhecida a inconstitucionalidade do art. 13 da Lei nº 8.620/1993 na parte em que determinou que os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada responderiam solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade Social. 9. Recurso extraordinário da União desprovido. 10. Aos recursos sobrestados, que aguardavam a análise da matéria por este STF, aplica-se o art. 543-B, § 3º, do CPC.” (RE 562276, Relª Min. Ellen Gracie, Tribunal Pleno, J. 03.11.2010, repercussão geral – mérito, DJe-027 divulg. 09.02.2011, public. 10.02.2011, Ement. v. 02461-02, p. 00419, RDDT n. 187, p. 186-193, 2011, RT, v. 100, n. 907, p. 428-442, 2011).

67 “Processual civil. Embargos de divergência no recurso especial. Tributário. ISS. Execução fiscal. Pessoas jurídicas que pertencem ao mesmo grupo econômico. Circunstância que, por si só, não enseja solidariedade passiva. 1. O entendimento prevalente no âmbito das Turmas que integram a Primeira Seção desta Corte é no sentido de que o fato de haver pessoas jurídicas que pertençam ao mesmo grupo econômico, por si só, não enseja a responsabilidade solidária, na forma prevista no art. 124 do CTN. Ressalte-se que a solidariedade não se presume (art. 265 do CC/2002), sobretudo em sede de direito tributário. 2. Embargos de divergência não providos.” (EREsp 834044/RS, 1ª S., Rel. Min. Mauro Campbell Marques, J. 08.09.2010, DJe 29.09.2010)

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reito tributário. Em que pese na origem e desenvolvimento do direito tributário tenha se aproveitado muitos institutos e conceitos próprios do direito privado, é chegada a ora de romper o “cordão umbilical” e reivindicar um estatuto próprio e disciplina própria para os institutos de direito tributário.

A noção de contribuinte não pode ser levianamente resumida àquele conceito previsto na lei que instituiu o tributo em questão. As normas constitu-cionais que estabelecem limitações ao poder de tributar devem ser observadas na conformação de um conceito de contribuinte adequado à Constituição em vigor. Desse modo, pode-se dizer que a noção de contribuinte mais adequada é aquela que guarda uma relação de congruência e pertinência com os arquétipos constitucionais de competência. Essas regras de competência conformam não só o âmbito de incidência do tributo, como também precisam e definem quem estará sujeito à exação, de modo que não se pode falar em arbítrio ou discri-cionariedade aos entes da federação na hora de disciplinar os tributos de suas respectivas competências.

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Supremo Tribunal Federal25.02.2014 Segunda TurmaAgRg no Recurso Extraordinário nº 567.216 Rio Grande do NorteRelator: Min. Ricardo LewandowskiAgte.(s): Transportes Guanabara Ltda.Adv.(a/s): Arnaldo Rodrigues Neto e outro(a/s)Agdo.(a/s): Estado do Rio Grande do NorteProc.(a/s)(es): Procurador‑Geral do Estado do Rio Grande do NorteIntdo.(a/s): Secretária de Tributação do Estado do Rio Grande do Norte

ementa

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO – TRIBUTÁRIO – ICMS – SUBS­TITUIÇÃO TRIBUTÁRIA – CONSTITUCIONALIDADE – AQUISIÇÃO DE COMBUSTÍVEL DIRE­TAMENTE DA DISTRIBUIDORA POR CONSUMIDOR FINAL – INEXISTÊNCIA DE OPERAÇÃO PRESUMIDA – VENDA DA DISTRIBUIDORA PARA O VAREJISTA – INAFASTABILIDADE DO RECOLHIMENTO ANTECIPADO DO IMPOSTO – POSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO IMEDIATA E PREFERENCIAL NA FORMA DEFINIDA NA CF E NA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL – AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO

I – A jurisprudência deste Corte firmou-se no sentido da constitucio-nalidade do regime de substituição tributária, inclusive do instituto do fato gerador presumido, seja no período anterior à Emenda Cons-titucional nº 3/1993, seja naquele a ela posterior, bem como já reco-nheceu as vantagens desse sistema nas atividades de fiscalização e arrecadação tributária.

II – A não ocorrência do fato gerador legalmente presumido não afas-ta, por si só, a obrigação do recolhimento antecipado do tributo pelo substituto, apenas assegura a imediata e preferencial restituição da quantia paga, conforme definido na própria Constituição e na legisla-ção aplicável ao tema.

III – Agravo regimental a que se nega provimento.

acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segun-da Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráfi-

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cas, por votação unânime, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes.

Brasília, 25 de fevereiro de 2014.

Ricardo Lewandowski Relator

relatório

O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Relator): Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão que negou seguimento ao recurso extra-ordinário.

A agravante, inconformada, interpõe este agravo regimental pelas razões expostas às fls. 294-302 e requer o provimento do recurso.

É o relatório.

voto

O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Relator): Bem reexaminada a questão, verifica-se que a decisão ora atacada não merece reforma, visto que a recorrente não aduz argumentos capazes de afastar as razões nela expendidas.

Isso porque, conforme consignado na decisão ora agravada,

“A jurisprudência deste Corte firmou-se no sentido da constitucionalidade do regime de substituição tributária, inclusive do instituto do fato gerador presumido, seja no período anterior à Emenda Constitucional nº 3/1993, seja naquele a ela posterior, bem como já reconheceu as vantagens desse sistema nas atividades de fiscalização e arrecadação tributária. Nesse sentido, trans-crevo as seguintes ementas de julgados deste Tribunal:

‘TRIBUTÁRIO – ICMS – ESTADO DE SÃO PAULO – COMÉRCIO DE VEÍ-CULOS NOVOS – ART. 155, § 2º, XII, B, DA CF/1988 – CONVÊNIOS ICM Nº 66/1988 (ART. 25) E ICMS Nº 107/1989 – ART. 8º, INC. XIII E § 4º, DA LEI PAULISTA Nº 6.374/1989 – O regime de substituição tribu-tária, referente ao ICM, já se achava previsto no Decreto-Lei nº 406/1968 (art. 128 do CTN e art. 6º, §§ 3º e 4º, do mencionado decreto-lei), nor-mas recebidas pela Carta de 1988, não se podendo falar, nesse ponto, em omissão legislativa capaz de autorizar o exercício, pelos Estados, por meio do Convênio ICM nº 66/1988, da competência prevista no art. 34, § 8º, do ADCT/1988. Essa circunstância, entretanto, não inviabiliza o instituto que, relativamente a veículos novos, foi instituído pela Lei paulista nº 6.374/1989 (dispositivos indicados) e pelo Convênio ICMS

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nº 107/1989, destinado não a suprir omissão legislativa, mas a atender à exigência prevista no art. 6º, § 4º, do referido Decreto-Lei nº 406/1968, em face da diversidade de estados aos quais o referido regime foi es-tendido, no que concerne aos mencionados bens. A responsabilidade, como substituto, no caso, foi imposta, por lei, como medida de política fiscal, autorizada pela Constituição, não havendo que se falar em exi-gência tributária despida de fato gerador. Acórdão que se afastou desse entendimento. Recurso conhecido e provido (RE 213.396/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão).’

‘TRIBUTÁRIO – ICMS – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA – CLÁUSULA SE-GUNDA DO CONVÊNIO Nº 13/1997 E §§ 6º E 7º DO ART. 498 DO DECRETO Nº 35.245/1991 (REDAÇÃO DO ART. 1º DO DECRETO Nº 37.406/1998), DO ESTADO DE ALAGOAS – ALEGADA OFENSA AO § 7º DO ART. 150 DA CF (REDAÇÃO DA EC 03/1993) E AO DIREITO DE PETIÇÃO E DE ACESSO AO JUDICIÁRIO

Convênio que objetivou prevenir guerra fiscal resultante de eventual concessão do benefício tributário representado pela restituição do ICMS cobrado a maior quando a operação final for de valor inferior ao do fato gerador presumido. Irrelevante que não tenha sido subscrito por todos os Estados, se não se cuida de concessão de benefício (LC 24/1975, art. 2º, inc. II).

Impossibilidade de exame, nesta ação, do decreto, que tem natureza re-gulamentar.

A EC 03/1993, ao introduzir no art. 150 da CF/1988 o § 7º, aperfeiçoou o instituto, já previsto em nosso sistema jurídico-tributário, ao delinear a fi-gura do fato gerador presumido e ao estabelecer a garantia de reembolso preferencial e imediato do tributo pago quando não verificado o mesmo fato a final. A circunstância de ser presumido o fato gerador não constitui óbice à exigência antecipada do tributo, dado tratar-se de sistema insti-tuído pela própria Constituição, encontrando-se regulamentado por lei complementar que, para definir-lhe a base de cálculo, se valeu de critério de estimativa que a aproxima o mais possível da realidade.

A lei complementar, por igual, definiu o aspecto temporal do fato gera-dor presumido como sendo a saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte substituto, não deixando margem para cogitar-se de mo-mento diverso, no futuro, na conformidade, aliás, do previsto no art. 114 do CTN, que tem o fato gerador da obrigação principal como a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.

O fato gerador presumido, por isso mesmo, não é provisório, mas definiti-vo, não dando ensejo a restituição ou complementação do imposto pago, senão, no primeiro caso, na hipótese de sua não realização final.

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Admitir o contrário valeria por despojar-se o instituto das vantagens que determinaram a sua concepção e adoção, como a redução, a um só tem-po, da máquina-fiscal e da evasão fiscal a dimensões mínimas, propi-ciando, portanto, maior comodidade, economia, eficiência e celeridade às atividades de tributação e arrecadação. Ação conhecida apenas em parte e, nessa parte, julgada improcedente (ADI 1.851/AL, Rel. Min. Ilmar Galvão).’

Nesse contexto, ao se considerar a finalidade da substituição tributária pro-gressiva e a legitimidade de se instituir um fato gerador presumido, inviável a pretensão da recorrente no sentido de não se submeter à sistemática desse regime, sob o argumento de que esse fato gerador não se realizará posterior-mente.

Com efeito, ainda que seja certa, a não ocorrência do fato gerador legalmen-te suposto não afasta, por si só, a obrigação do recolhimento antecipado do tributo pelo substituto, apenas assegura a imediata e preferencial restituição da quantia paga, conforme definido na própria Constituição e na legislação aplicável ao tema.”

Isso posto, nego provimento ao agravo regimental.

eXtrato de ata

AgRg no Recurso Extraordinário nº 567.216

Proced.: Rio Grande do Norte

Relator: Min. Ricardo Lewandowski

Agte.(s): Transportes Guanabara Ltda.

Adv.(a/s): Arnaldo Rodrigues Neto e outro(a/s)

Agdo.(a/s): Estado do Rio Grande do Norte

Proc.(a/s)(es): Procurador-Geral do Estado do Rio Grande do Norte

Intdo.(a/s): Secretária de Tributação do Estado do Rio Grande do Norte

Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, os Se-nhores Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes. 2ª Turma, 25.02.2014.

Presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia. Presentes à sessão os Se-nhores Ministros Ricardo Lewandowski e Teori Zavascki. Ausentes, justificada-mente, os Senhores Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes.

Subprocuradora-Geral da República, Dra. Déborah Duprat.

Ravena Siqueira Secretária Substituta

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

10807

Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Agravo em Recurso Especial nº 228.031 – SP (2012/0186964‑9)Relator: Ministro Sérgio KukinaAgravante: White Martins Gases Industriais Ltda.Advogado: Luiz Otávio Pinheiro Bittencourt e outro(s)Agravado: Município de AmericanaAdvogado: José Francisco Montezelo

ementa

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC – NÃO OCORRÊNCIA – ISS – REPETIÇÃO DE VALORES RECOLHIDOS A TÍTULO DE LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS – IMPOSSIBILIDADE – TRIBUTO INDIRETO – AUSÊNCIA DE PROVA DE PAGAMENTO DO TRIBUTO – RESP 1.131.476/RS, FIRMADO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS

1. Não ocorreu ofensa ao art. 535 do CPC, na medida em que o Tri-bunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos presentes autos.

2. A Primeira Seção desta Corte, no julgamento do REsp 1.131.476/RS, firmou a compreensão no sentido de que o ISS é tributo que per-mite sua dicotomização como tributo direto ou indireto e que a pre-tensão repetitória de valores indevidamente recolhidos a título de ISS incidente sobre a locação de bens móveis assume natureza indireta.

3. Na hipótese dos autos, observa-se que o Tribunal de origem ali-nha-se à jurisprudência desta Corte, consignando a ausência de le-gitimidade da parte recorrente para a pretendida repetição, pois não comprovou ter suportado o tributo ou estar autorizado a transferi-lo para terceiro.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Pri-meira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provi-mento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs.

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Ministros Ari Pargendler, Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Filho (Presidente) e Benedito Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 20 de fevereiro de 2014 (data do Julgamento).

Ministro Sérgio Kukina Relator

relatório

O Senhor Ministro Sérgio Kukina: Trata-se de agravo regimental inter-posto por White Martins Gases Industriais Ltda., contra decisão que negou pro-vimento ao agravo em recurso especial, sob os seguintes fundamentos: (I) não ocorrência de violação ao art. 535 do CPC, (II) no mérito, o acórdão encontra--se alinhado a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, firmada no REsp 1.131.476/RS, julgado pelo rito dos recursos repetitivos, no sentido de que não tem direito à repetição do ISS sobre a locação de bens de acondicionamento de gases industriais quem não assumiu o encargo, pois no caso dos autos houve o repasse para o consumidor final.

A parte agravante, em seu regimental, assevera que houve violação ao art. 535 do CPC na medida em que o Tribunal de origem não se pronunciou sobre a natureza jurídica do ISS, bem como a existência de violação ao art. 166 do CTN, sob a tese de que “É impossível verificar se o ISS comporta ou não a transferência de seu encargo econômico sem analisar sua natureza jurídica, que envolve diretamente o princípio da capacidade contributiva e a seletividade pela essencialidade” (fl. 485).

Requer, ao final, a reconsideração da decisão agravada ou a submissão da insurgência ao órgão colegiado.

É o relatório.

voto

O Senhor Ministro Sérgio Kukina (Relator): A irresignação não merece acolhimento, tendo em conta que a parte agravante não logrou desenvolver argumentação apta a desconstituir os fundamentos adotados pela decisão recor-rida, que ora submeto ao Colegiado para serem confirmados:

Trata-se de agravo manejado contra decisão que não admitiu recurso espe-cial, este interposto por White Martins Gases Industriais Ltda., com funda-mento no art. 105, III, a, da CF, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado (fl. 228):

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AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PEDIDOS DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO E TUTELA ANTECIPADA – ISS – Locação de bens móveis. Cilindros, má-quinas e equipamentos. Atividades que não envolvem prestação de ser-viço. Tributação descabida. Repetição, porém, indevida. Súmulas nºs 71 e 546 do e. STF. Sentença reformada em parte. Sucumbência partilhada. Apelo da contribuinte parcialmente provido.

Os embargos de declaração foram rejeitados (fls. 261/265).

Nas razões do recurso especial, a recorrente aponta violação dos arts. 535 do CPC e 166 do CTN, sustentando, em síntese, que: (I) o acórdão recorrido foi omisso, pois, mesmo após a oposição dos embargos de declaração, não hou-ve manifestação sobre as alegações postas; (II) o ISS é um tributo direto, sua incidência relaciona-se ao prestador do serviço, não se sujeita a seletividade pela essencialidade, nem comporta o repasse de seu encargo econômico, de forma que o acórdão recorrido deve ser reformado permitindo a repetição o indébito dos valores indevidamente recolhidos.

Houve contrarrazões (fls. 329/332).

Por força da decisão de fl. 335 do Desembargador Presidente da Seção de Direito Público, ante o disposto no art. 543-C, § 7º, do CPC, por força do jul-gamento do julgamento do REsp 1.131.476/RS, os presentes os autos foram remetidos à Turma julgado para eventual adequação. A Turma, por sua vez, manteve o acórdão recorrido, nos seguintes termos (fls. 346/356):

AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PEDIDOS DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO E TUTELA ANTECIPADA – ISS – Locação de bens móveis. Cilindros, má-quinas e equipamentos. Atividades que não envolvem prestação de ser-viço. Tributação descabida. Repetição, porém, indevida. Súmulas nºs 71 e 546 do e. STF. Sentença reformada em parte. Sucumbência partilhada. Apelo da contribuinte parcialmente provido.

RECURSO ESPECIAL – REPERCUSSÃO GERAL – Art. 543-B, 30, do Có-digo de Processo Civil. Pretensão repetitória de valores recolhidos in-devidamente, a título do ISS. Posição adotada pelo e. STJ a respeito da restituição do indébito relativo à cobrança indevida do referido imposto, sobre locação de bens móveis. Suporte do encargo não provado pela contribuinte, conforme exigência expressa inscrita no art. 166 do Código Tributário Nacional. Acórdão que deu provimento em parte ao recurso mantido.

O recorrente, por meio da petição de fl. 364, reitera o recurso especial ante-riormente interposto.

É o relatório.

Verifica-se, inicialmente, não ter ocorrido ofensa ao art. 535 do CPC, na medida em que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as ques-tões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia pos-ta nos presentes autos. Ressalte-se que não se pode confundir julgamento

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desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional.

A Primeira Seção desta Corte, no julgamento do REsp 1.131.476/RS, firmou a compreensão no sentido de que: (I) o ISS é tributo que permite sua dicotomi-zação como tributo direto ou indireto; (II) a pretensão repetitória de valores indevidamente recolhidos a título de ISS incidente sobre a locação de bens móveis (cilindros, máquinas e equipamentos utilizados para acondiciona-mento dos gases vendidos), assume natureza indireta, porque “contribuinte real é o consumidor (locador) da mercadoria objeto da operação (contribuin-te de fato) e a empresa (contribuinte de direito) repassa, no preço da locação do bem, o imposto devido, recolhendo posteriormente aos cofres públicos o imposto já pago pelo ‘consumidor’ de seus produtos ou serviços. Não assu-me, portanto, a carga tributária resultante dessa incidência”.

Referido julgado restou assim ementado:

TRIBUTÁRIO – RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTRO-VÉRSIA – ART. 543-C, DO CPC – ISS – LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS – REPETIÇÃO DE INDÉBITO – PROVA DA NÃO REPERCUSSÃO – EXI-GIBILIDADE, IN CASU – ART. 166 DO CTN

1. O ISS é espécie tributária que admite a sua dicotomização como tribu-to direto ou indireto, consoante o caso concreto.

2. A pretensão repetitória de valores indevidamente recolhidos a título de ISS incidente sobre a locação de bens móveis (cilindros, máquinas e equipamentos utilizados para acondicionamento dos gases vendidos), hipótese em que o tributo assume natureza indireta, reclama da parte autora a prova da não repercussão, ou, na hipótese de ter a mesma trans-ferido o encargo a terceiro, de estar autorizada por este a recebê-los, o que não ocorreu in casu, consoante dessume-se do seguinte excerto da sentença, in verbis: “Com efeito, embora pudesse o autor ter efetuado a prova necessária, que lhe foi facultada, deixou de demonstrar que absor-veu o impacto financeiro decorrente do pagamento indevido do ISS sobre a operação de locação de móveis, ou que está autorizado a demandar em nome de quem o fez. Omitiu prova de que tenha deixado de repassar o encargo aos seus clientes ou que tenha autorização destes para buscar a repetição, conforme exigência expressa inscrita no art. 166 do CTN.”

3. Precedentes: REsp 1009518/RS, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., Jul-gado em 06.08.2009, DJe 21.08.2009; AgRg-AgRg-REsp 947.702/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 04.08.2009, DJe 17.08.2009; AgRg-REsp 1006862/SC, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., Julgado em 26.08.2008, DJe 18.09.2008; REsp 989.634/PR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, Julgado em 19.06.2008, DJe 10.11.2008; AgRg-REsp 968.582/SC, Rel. Min. Francisco Falcão, DJU de 18.10.2007; AgRg-Ag 692.583/RJ, Relª Min. Denise Arruda, DJU de 14.11.2005; REsp 657.707/RJ, Rel. Min. José Delgado, DJU de 16.11.2004).

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4. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ nº 08/2008.

(REsp 1131476/RS, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Seção, Julgado em 09.12.2009, DJe 01.02.2010)

Nessa linha de entendimento, confiram-se os recentes julgados:

TRIBUTÁRIO – ISS – REPETIÇÃO DE INDÉBITO – ALUGUEL DE BEM MÓ-VEL – TRIBUTO INDIRETO – ART. 166 DO CTN – REPERCUSSÃO DO ENCARGO TRIBUTÁRIO – AUSÊNCIA DE PROVA – SÚMULA Nº 7/STJ – ILEGITIMIDADE ATIVA PARA A QUESTÃO REPETITÓRIA

1. A Primeira Seção desta Corte, no julgamento do REsp 1.131.476/RS, submetido ao rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), consoli-dou entendimento segundo o qual a pretensão repetitória de valores in-devidamente recolhidos a título de ISS incidente sobre a locação de bens móveis, hipótese em que o tributo assume natureza indireta, reclama da parte autora a prova da não repercussão, ou, na hipótese de ter transferi-do o encargo a terceiro, de estar autorizada por este a recebê-los.

2. No caso dos autos, o Tribunal de origem expressamente assenta que as provas contidas nos autos não são hábeis a configurar a legitimidade ativa ad causam, pois não demonstram que o autor assumiu o pagamento da exação. Súmula nº 7/STJ.

3. Em demanda decorrente de repetição de indébito tributário, é impres-cindível apenas a comprovação da qualidade de contribuinte do autor, não sendo necessária a juntada de todos os demonstrativos de pagamento do tributo no momento da propositura da ação, por ser possível a sua pos-tergação para a fase de liquidação, momento em que deverá ser apura-do o quantum debeatur. REsp 1111003/PR, Rel. Min. Humberto Martins, Primeira Seção, Julgado em 13.05.2009, DJe 25.05.2009 – submetido ao rito dos recursos repetitivos.

4. Tal entendimento não exclui o ônus da parte de fazer prova da não repercussão tributária, ainda na fase de conhecimento, pois “não se pode relegar à liquidação a prova de um fato que diz respeito à legitimidade da parte e à própria procedência do pedido formulado na demanda, temas que, portanto, devem necessariamente ficar exauridos na fase cognitiva” (AgRg-REsp 1028031/RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Tur-ma, Julgado em 18.09.2012, DJe 25.09.2012).

Agravo regimental improvido.

(AgRg-AREsp 352.883/SC, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, Julgado em 17.09.2013, DJe 25.09.2013)

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – ISS – LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS – ART. 535 DO CPC – INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO – ART. 166 DO CTN – PROVA DA NÃO REPERCUSSÃO – NECESSIDADE – QUESTÃO DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C

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DO CPC – RESP 1.131.476/RS, REL. MIN. LUIZ FUX, DJE 01.02.2010 – AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO

1. Deve ser afastada a assertiva de omissão e ofensa ao art. 535 do CPC, quando a controvérsia foi solucionada nos seus principais aspectos; como cediço, o julgador não está obrigado a responder um a um todos os argu-mentos utilizados pelas partes, sempre que tiver encontrado fundamento suficiente para alicerçar sua conclusão.

2. A jurisprudência desta Corte, firmada inclusive em recurso representa-tivo de controvérsia, assentou que o ISS é espécie tributária que admite a sua dicotomização como tributo direto ou indireto, consoante o caso concreto; assim, a pretensão repetitória de valores indevidamente reco-lhidos a título de ISS incidente sobre a locação de bens móveis (cilindros, máquinas e equipamentos utilizados para acondicionamento dos gases vendidos), hipótese em que o tributo assume natureza indireta, reclama da parte autora a prova da não repercussão, ou, na hipótese de ter a mes-ma transferido o encargo a terceiro, de estar autorizada por este a recebê--los (REsp 1.131.475/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 01.02.2010).

3. Agravo Regimental desprovido.

(AgRg-AREsp 146.140/MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª T., Julgado em 21.03.2013, DJe 18.04.2013)

Na hipótese dos autos, observa-se que o Tribunal de origem alinha-se à ju-risprudência desta Corte, consoante o seguinte excerto do voto condutor do acórdão recorrido (fl. 232):

[...] no que tange à declaração de inexistência de relação jurídico-tributária envolvendo as partes, no concernente ao imposto sobre os serviços de qual-quer natureza, somente em relação às atividades de locação de bens móveis da apelante, a demanda fica aqui acolhida.

Porém, a intentada devolução da quantia despendida a tal título não merece qualquer respaldo.

Aludida repetição só poderia ser pleiteada por quem tenha legitimidade para tanto, ou seja, aquele que comprove ter suportado o encargo ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por aquele expressamente autorizado a recebê-la, o que não ocorre no presente caso.

Não havendo provas nesse aspecto, em prol da contribuinte que, obrigato-riamente deveria tê-las produzido, a teor do art. 333, inciso I, do Código de Processo Civil, descabida mostra-se sua pretensão [...]

Ante o exposto, nego provimento ao agravo.

Publique-se.

Conforme antes consignado, não há que se falar em negativa de presta-ção jurisdicional no caso dos autos, pois a Corte a quo decidiu a controvérsia de

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������135

maneira completa e fundamentada. O inconformismo da parte com a decisão adotada não caracteriza maltrato ao art. 535 do CPC, tampouco omissão, con-tradição ou obscuridade.

Ressalta-se ainda, no mérito, que, nos termos da jurisprudência do Su-perior Tribunal de Justiça, firmada pelo rito dos recursos repetitivos sob o REsp 1.131.476/RS, na pretensão repetitória de valores indevidamente a título de ISS recolhidos sobre a locação de cilindros, máquinas e equipamentos utilizados para acondicionamento dos gases vendidos, o ISS assume natureza indireta, que “reclama da parte autora a prova da não repercussão, ou, na hipótese de ter a mesma transferido o encargo a terceiro, de estar autorizada por este a recebê--los” (AgRg-AREsp 352.883/SC, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., Julgado em 17.09.2013, DJe 25.09.2013).

No caso dos autos, como bem se verifica do julgado recorrido, ficou consignada a ausência de legitimidade da parte recorrente para a pretendida repetição, pois não comprovou ter suportado o tributo ou estar autorizado a transferi-lo para terceiro, razão do insucesso de sua pretensão. Assim, o acórdão encontra-se alinhado à jurisprudência desta Corte Superior, logo, não merece qualquer reparo.

Em face do exposto, nega-se provimento ao agravo regimental.

É como voto.

certidão de julgamento primeira turma

Número Registro: 2012/0186964-9

Processo Eletrônico AgRg-AREsp 228.031/SP

Números Origem: 1157775820088260000 2102003 8189065 8189065401

Em Mesa Julgado: 20.02.2014

Relator: Exmo. Sr. Ministro Sérgio Kukina

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Ana Borges Coelho Santos

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuação

Agravante: White Martins Gases Industriais Ltda.

Advogado: Luiz Otávio Pinheiro Bittencourt e outro(s)

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Agravado: Município de Americana

Advogado: José Francisco Montezelo

Assunto: Direito tributário – Impostos – ISS/Imposto sobre Serviços

agravo regimental

Agravante: White Martins Gases Industriais Ltda.

Advogado: Luiz Otávio Pinheiro Bittencourt e outro(s)

Agravado: Município de Americana

Advogado: José Francisco Montezelo

certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Ari Pargendler, Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Filho (Presidente) e Benedito Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Re-lator.

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

10808

Superior Tribunal de JustiçaRecurso Especial nº 1.237.400 – BA (2011/0022226‑5)Relator: Ministro Ari PargendlerRecorrente: Estado da Bahia Procurador: Bruno Espineira Lemos e outro(s)Recorrido: Instituto Biochimico Ltda.Advogado: José Eduardo Rangel de Alckmin e outro(s)

ementa

TRIBUTÁRIO – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA – ICMS – MEDICAMENTOS – BASE DE CÁLCULOA situação dos hospitais se assimila à das empresas distribuidoras; a indústria, quando vende medicamentos a estas e aqueles, assume a condição de substituto tributário em relação a última fase do ciclo de comercialização (drogaria/consumidor; hospital/paciente).

Na fase do ciclo de comercialização “hospital/paciente”, considera--se como valor da operação o preço do medicamento divulgado pela revista ABCFARMA.

Recurso especial provido.

acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Sérgio Kukina, por maioria, vencido o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, dar provimento ao recurso especial nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves e Sérgio Kukina (voto-vista) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Não participou do julgamento o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima (RISTJ, art. 162, § 2º, primeira parte).

Brasília, 17 de dezembro de 2013 (data do Julgamento).

Ministro Ari Pargendler Relator

relatório

Exmo. Sr. Ministro Ari Pargendler (Relator):

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Os autos dão conta de que o Instituto Biochimico Ltda. propôs ação ordi-nária contra o Estado da Bahia, cujo pedido foi julgado procedente para anular em parte auto de infração lavrado por agente fiscal do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (e-STJ, fl. 526/542).

O Tribunal de Justiça do Estado da Bahia manteve a sentença, nos termos do acórdão assim ementado:

“TRIBUTÁRIO – ICMS – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA – PRODUTOS FAR-MACÊUTICOS – EMPRESA AUTUADA POR AUSÊNCIA DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO VALOR DO IMPOSTO APURADO DECENDIALMENTE E RECOLHIMENTO A MENOR DO IMPOSTO POR ERRO NA DETERMI-NAÇÃO NA BASE DE CÁLCULO – AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE IN-FRAÇÃO – PROCEDÊNCIA PARCIAL APELAÇÃO – PRESENÇA DOS PRES-SUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE – PRETENSÃO DE FIXAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO ATRAVÉS DE PAUTA DE PREÇOS OU VALORES (REVISTAS ABCFARMA) – INADMISSIBILIDADE – PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS – SENTENÇA PROFERIDA EM CONSONÂNCIA COM ELEMENTOS CARRE-ADOS PARA OS AUTOS E LEGISLAÇÃO EM VIGOR – RECURSO IMPROVI-DO – SENTENÇA CONFIRMADA, EM NECESSÁRIO REEXAME

A presença dos pressupostos de admissibilidade do recurso impõe seu co-nhecimento.

Assentamento consolidado na jurisprudência da 1ª Seção do STJ de que é impossível, segundo as regras do ordenamento jurídico tributário, erigir-se pautas fiscais, pautas de preços ou de valores fixados mediante Portaria do Fisco como contendo elementos materiais determinantes da base de cálculo do ICMS.” (AgRg-Ag 673.905/MG, Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de 08.08.2005, p. 195).

Ilegítima a autuação feita pelo Fisco estadual por recolhimento a menor de ICMS antecipado nas operações feitas com medicamentos destinados a rede hospitalar, baseado em pauta fiscal (preço máximo de venda ao consumidor publicado em Revistas e Informativos de Classes, ABCFARMA), com mani-festo desprezo ao critério natural do valor da operação, admissível apenas quando ficar demonstrado, pelo Fisco, a inidoneidade dos documentos ou a incorreção das declarações prestadas pelo contribuinte sobre os valores efetivamente praticados nos bens tributados. (art. 148, do CTN).

A base de cálculo do tributo só pode ser estabelecida por lei (art. 97, IV, do CTN) e no caso do ICMS corresponde ao valor da operação de que decorra a saída da mercadoria (art. 2º, I, do Decreto-Lei nº 406/1968).

Não merece reforma a sentença proferida com fundamentação adequada em consonância com elementos carreados e legislação em vigor.” (e-STJ, fl. 582).

Seguiram-se embargos de declaração, rejeitados (e-STJ, fl. 616/617).

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������139

Daí o recurso especial, interposto pelo Estado da Bahia com base no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, alegando violação do art. 148 do Código Tributário Nacional e divergência jurisprudencial (e-STJ, fl. 621/642).

voto

Exmo. Sr. Ministro Ari Pargendler (Relator):

O tribunal a quo desconheceu a circunstância de que a tributação da comercialização de medicamentos se processa sob o regime da substituição tributária.

É o que se depreende do seguinte trecho do acórdão recorrido, in verbis:

“Como os produtos comercializados são destinados para rede hospitalar no uso para atendimento de seus pacientes, onde não há incidência de ICMS, e como não existe preço máximo de venda a varejo fixado pela autoridade fede-ral competente, o critério adotado pelo autor foi o preço de fábrica do produto acrescido da margem de valor agregado de 60,07%, procedimento expresso, também, pelo Protocolo 14/85 e Convênio nº 76/1994” (e-STJ, fl. 584).

Ao revés, a situação dos hospitais se assimila à das empresas distribui-doras; a indústria, quando vende medicamentos a estas e aqueles, assume a condição de substituto tributário em relação a última fase do ciclo de comercia-lização (drogaria/consumidor; hospital/paciente).

Na fase do ciclo de comercialização “hospital/paciente”, considera--se como valor da operação o preço do medicamento divulgado pela revista ABCFARMA, que se distingue da hipótese de pauta fiscal na forma da jurispru-dência do Superior Tribunal de Justiça, de que é exemplo o acórdão proferido no RMS 24.172, SE, relator o Ministro Luiz Fux, assim ementado:

“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – TRIBUTÁRIO – ICMS – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PROGRESSIVA – BASE DE CÁL-CULO PRESUMIDA – PREÇO FINAL A CONSUMIDOR SUGERIDO PELO FABRICANTE (DIVULGADO NA REVISTA ABCFARMA) – LEGALIDADE – PAUTA FISCAL – NÃO CARACTERIZAÇÃO

1. O preço final a consumidor sugerido pelo fabricante (divulgado em revista especializada) pode figurar como base de cálculo do ICMS a ser pago pelo contribuinte sujeito ao regime de substituição tributária ‘para frente’, à luz do disposto no art. 8º, § 3º, da Lei Complementar nº 87/1996, verbis:

‘Art. 8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será:

[...]

II – em relação às operações ou prestações subsequentes, obtida pelo soma-tório das parcelas seguintes:

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140 ������������������������������������������������������������� RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributá-rio ou pelo substituído intermediário;

b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço;

c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subsequentes.

[...]

§ 2º Tratando-se de mercadoria ou serviço cujo preço final a consumidor, único ou máximo, seja fixado por órgão público competente, a base de cál-culo do imposto, para fins de substituição tributária, é o referido preço por ele estabelecido.

§ 3º Existindo preço final a consumidor sugerido pelo fabricante ou importa-dor, poderá a lei estabelecer como base de cálculo este preço. [...]’

2. Consoante cediço, ‘é ilegal a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime de pauta fiscal’ (Súmula nº 431/STJ), o que não se confunde com a sistemática da substituição tributária progressiva, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo Plenário do Supremo Tribu-nal Federal (RE 213.396, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgado em 02.08.1999, DJ 01.12.2000; e RE 194.382, Rel. Min. Maurício Corrêa, Julgado em 25.04.2003, DJ 25.04.2003).

3. Assim é que se revela escorreita a conduta da Administração Fiscal que estipula base de cálculo do ICMS, sujeito ao regime da substituição tributá-ria progressiva, com espeque no preço final ao consumidor sugerido pelo fabricante de medicamentos e divulgado por revista especializada de grande circulação.

4. É que o STJ já assentou a legalidade da utilização dos preços indicados na Revista ABCFARMA na composição da base de cálculo presumida do ICMS na circulação de medicamentos em regime de substituição tributária pro-gressiva (REsp 1.192.409/SE, Relª Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, Jul-gado em 22.06.2010, DJe 01.07.2010; e RMS 21.844/SE, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 05.12.2006, DJ 01.02.2007).

5. Recurso ordinário desprovido.” (DJe de 10.05.2011)

Voto, por isso, no sentido de conhecer do recurso especial e de dar-lhe provimento para julgar improcedente o pedido, condenando a autora ao pa-gamento de honorários de advogado à base de dez por cento sobre o valor da causa.

voto

Ministro Napoleão Nunes Maia Filho:

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������141

1. Esta velha questão, já a mencionei de passagem, vou dizer de novo, mas sem me demorar nela.

2. Quando as operações do vendedor destinam, com exclusividade, as mercadorias a quem não é contribuinte, então a antecipação perde um dos pontos de sustentação, pois não haverá como recuperar os valores antecipados, porque aquele outro que comprou não é contribuinte do imposto, quer por não incidência, quer por isenção, quer por imunidade. Essa é a ideia que tenho, Senhor Ministro Ari Pargendler.

3. Vou pedir vênia a V. Exa. para desprover o recurso do Estado da Bahia por causa da convicção que tenho quanto à inexigibilidade do ICMS de hospi-tais. As unidades produtoras farmacêuticas, as indústrias de fármacos, são proi-bidas de vender às farmácias, porque as farmácias são contribuintes.

4. É o meu voto.

certidão de julgamento primeira turma

Número Registro: 2011/0022226-5 Processo Eletrônico REsp 1.237.400/BA

Números Origem: 00343205920038050001 140039780600 201000857351 321662004 5594402009

Pauta: 14.05.2013 Julgado: 14.05.2013

Relator: Exmo. Sr. Ministro Ari Pargendler

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Antônio Carlos Fonseca da Silva

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuação

Recorrente: Estado da Bahia

Procurador: Bruno Espineira Lemos e outro(s)

Recorrido: Instituto Biochimico Ltda.

Advogado: José Eduardo Rangel de Alckmin e outro(s)

Assunto: Direito tributário – Impostos – ICMS/Imposto sobre Circulação de Mercadorias

sustentação oral

Dr. José Eduardo Rangel de Alckmin, pela parte Recorrida: Instituto Bio-chimico Ltda.

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certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Após o voto do Sr. Ministro Relator dando provimento ao recurso especial no que foi acompanhado pelo Sr. Ministro Benedito Gonçalves e o voto diver-gente do Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho negando-lhe provimento, pediu vista o Sr. Ministro Sérgio Kukina.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima.

certidão de julgamento primeira turma

Número Registro: 2011/0022226-5 Processo Eletrônico REsp 1.237.400/BA

Números Origem: 00343205920038050001 140039780600 201000857351 321662004 5594402009

Pauta: 21.11.2013 Julgado: 21.11.2013

Relator: Exmo. Sr. Ministro Ari Pargendler

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Darcy Santana Vitobello

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuação

Recorrente: Estado da Bahia

Procurador: Bruno Espineira Lemos e outro(s)

Recorrido: Instituto Biochimico Ltda.

Advogado: José Eduardo Rangel de Alckmin e outro(s)

Assunto: Direito tributário – Impostos – ICMS/Imposto sobre Circulação de Mercadorias

certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“Adiado por indicação do Sr. Ministro Sérgio Kukina.”

certidão de julgamento primeira turma

Número Registro: 2011/0022226-5 Processo Eletrônico REsp 1.237.400/BA

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������143

Números Origem: 00343205920038050001 140039780600 201000857351 321662004 5594402009

Pauta: 21.11.2013 Julgado: 26.11.2013

Relator: Exmo. Sr. Ministro Ari Pargendler

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Darcy Santana Vitobello

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuação

Recorrente: Estado da Bahia

Procurador: Bruno Espineira Lemos e outro(s)

Recorrido: Instituto Biochimico Ltda.

Advogado: José Eduardo Rangel de Alckmin e outro(s)

Assunto: Direito tributário – Impostos – ICMS/Imposto sobre Circulação de Mercadorias

certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“Adiado por indicação do Sr. Ministro Sérgio Kukina.”

certidão de julgamento primeira turma

Número Registro: 2011/0022226-5 Processo Eletrônico REsp 1.237.400/BA

Números Origem: 00343205920038050001 140039780600 201000857351 321662004 5594402009

Pauta: 10.12.2013 Julgado: 10.12.2013

Relator: Exmo. Sr. Ministro Ari Pargendler

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Darcy Santana Vitobello

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuação

Recorrente: Estado da Bahia

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144 ������������������������������������������������������������� RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Procurador: Bruno Espineira Lemos e outro(s)

Recorrido: Instituto Biochimico Ltda.

Advogado: José Eduardo Rangel de Alckmin e outro(s)

Assunto: Direito tributário – Impostos – ICMS/Imposto sobre Circulação de Mercadorias

certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“Adiado por indicação do Sr. Ministro Sérgio Kukina.”

voto-vista

O Senhor Ministro Sérgio Kukina: Trata-se de recurso especial interposto pelo Estado da Bahia, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Esta-do da Bahia, assim ementado (fl. 582):

TRIBUTÁRIO – ICMS – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA – PRODUTOS FAR-MACÊUTICOS – EMPRESA AUTUADA POR AUSÊNCIA DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO VALOR DO IMPOSTO APURADO DECENDIALMENTE E RECOLHIMENTO A MENOR DO IMPOSTO POR ERRO NA DETERMINA-ÇÃO NA BASE DE CÁLCULO – AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRA-ÇÃO – PROCEDÊNCIA PARCIAL – APELAÇÃO – PRESENÇA DOS PRES-SUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE – PRETENSÃO DE FIXAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO ATRAVÉS DE PAUTA DE PREÇOS OU VALORES (REVISTAS ABCFARMA) – INADMISSIBILIDADE – PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS – SENTENÇA PROFERIDA EM CONSONÂNCIA COM ELEMENTOS CARRE-ADOS PARA OS AUTOS E LEGISLAÇÃO EM VIGOR- RECURSO IMPROVI-DO – SENTENÇA CONFIRMADA, EM NECESSÁRIO REEXAME

A presença dos pressupostos de admissibilidade do recurso impõe seu co-nhecimento.

“Assentamento consolidado na jurisprudência da 1ª Seção do STJ de que é impossível, segundo as regras do ordenamento jurídico tributário, erigir-se pautas fiscais, pautas de preços ou de valores fixados mediante Portaria do Fisco como contendo elementos materiais determinantes da base de cálcu-lo do ICMS”. (AgRg-Ag 673.905IMG, 1ª T., Rel. Min. José Delgado, DJ de 08.08.2005, p. 195).

Ilegítima a autuação feita pelo Fisco estadual por recolhimento a menor de ICMS antecipado nas operações feitas com medicamentos destinados a rede hospitalar, baseado em pauta fiscal (preço máximo de venda ao consumidor publicado em Revistas e Informativos de Classes, ABCFARMA), com mani-

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������145

festo desprezo ao critério natural do valor da operação, admissível apenas quando ficar demonstrado, pelo Fisco, a inidoneidade dos documentos ou a incorreção das declarações prestadas pelo contribuinte sobre os valores efetivamente praticados nos bens tributados (art. 148, do CTN).

A base de cálculo do tributo só pode ser estabelecida por lei (art. 97, IV, do CTN) e no caso do ICMS corresponde ao valor da operação de que decorra a saída da mercadoria (ar. 2º, I, do Decreto-Lei nº 406/1968).

Não merece reforma a sentença proferida com fundamentação adequada em consonância com elementos carreados e legislação em vigor.

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados, nos termos da se-guinte ementa (fl. 616):

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – ALEGAÇÃO, NÃO DEMONSTRADA, DE EXISTÊNCIA DE CONTRADIÇÃO E OMISSÃO NO ACÓRDÃO EMBARGADO – OPOSIÇÃO IMOTIVADA – REJEIÇÃO ADMIS-SÍVEL

A inocorrência, em acórdão embargado, de vícios, obscuridade, contradição ou omissão, impõe a rejeição de embargos de declaração, sob pena de con-trariar o art. 535 do Código de Processo Civil.

A contradição mencionada no art. 535, I, do Código de Processo Civil deve ser a detectável entre as teses adotadas no julgamento da causa.

A omissão de que cuida o art. 535, II, do Código de Processo Civil deve ser concernente a ponto que deveria ter sido mas não foi decidido tornando inexeqüível o julgado.

Não é omisso nem contraditório o acórdão sucinto, fundamentado, esclare-cedor, que examina e decide questões suscitadas pelos litigantes, deixando de acolher argumentos da parte embargante.

Inadmissível em embargos de declaração reexame de matéria já decidida.

No especial apelo, manejado com fundamento no art. 105, III, a e c, da CF, o ente federativo aponta, além de dissídio jurisprudencial, violação ao art. 148 do CTN. Sustenta, em resumo: (I) a possibilidade de autuação fiscal para a cobrança de ICMS tendo por base de cálculo os preços máximos ao consumidor, fixados pelo Governo Federal; (II) distinção entre a cobrança do tributo com base nos preços máximos fixados ao consumidor e cobrança com base em arbitramento.

Requer o provimento da rara súplica para que seja reconhecida a legiti-midade da autuação fiscal.

Contrarrazões do Instituto Biochimico Ltda. apresentadas às fls. 925/942, postulando o desprovimento do apelo.

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O recurso foi inicialmente distribuído ao Ministro Hamilton Carvalhido, que, por decisão fundamentada no art. 557, parágrafo 1º-A do CPC, deu provi-mento ao feito (fl. 1.090).

Já sob a relatoria do Ministro Francisco Falcão, o agravo regimental inter-posto pelo Estado foi rejeitado (fls. 1.155/1.163). Opostos embargos de declara-ção, entendeu a Primeira Turma desta Corte, nos termos do voto do Ministro ora relator, por acolher os embargos para submeter o recurso especial a julgamento colegiado (fls. 1.184/1.187).

Na sessão da Primeira Turma de 14.05.2013, o atual Relator, Ari Pargen-dler, apresentou voto no sentido de conhecer do recurso especial para dar-lhe provimento e julgar improcedente o pedido do contribuinte, condenando-o, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios à base de 10% sobre o valor da causa, sob os seguintes fundamentos: (I) a tributação da comercialização de medicamentos se processa sob o regime da substituição tributária; (II) “a situação dos hospitais se assimila à das empresas distribuidoras; a indústria, quando vende medicamentos a estas e aqueles, assume a condição de substi-tuto tributário em relação à última fase do ciclo de comercialização (drogaria/consumidor; hospitais/paciente); (III) o Superior Tribunal de Justiça já se mani-festou no sentido de que, na fase do ciclo de comercialização hospital/paciente o ICMS é apurado com base no preço do medicamento divulgado pela revista ABCFARMA; e (IV) a Tabela de preços máximos ao consumidor utilizada como base para apuração do ICMS se distingue da hipótese de pauta fiscal.

Após o voto do Relator, votou o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho no sentido de desprover o recurso do Estado da Bahia, ao fundamento de que:

Quando as operações do vendedor destinam, com exclusividade, as merca-dorias a quem não é contribuinte, então a antecipação perde um dos pontos de sustentação, pois não haverá como recuperar os valores antecipados, por-que aquele outro que comprou não é contribuinte do imposto, quer por não incidência, quer por isenção, quer por imunidade. Essa é a ideia que tenho, Senhor Ministro Ari Pargendler.

Vou pedir vênia a V. Exa. para desprover o recurso do Estado da Bahia por causa da convicção que tenho quanto à inexigibilidade do ICMS de hospi-tais. As unidades produtoras farmacêuticas, as indústrias de fármacos, são proibidas de vender às farmácias, porque as farmácias são contribuintes.

É o breve relato.

Passo a decidir.

Discute-se nos autos a forma de tributação da comercialização de medi-camentos.

A empresa recorrida teve contra si lavrado auto de infração para cobran-ça de ICMS, em substituição tributária, considerando-se como base de cálculo

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������147

os preços dos produtos fixados na Revista ABCFARMA. Proposta ação anulató-ria de auto de infração contra o Estado da Bahia, o pedido foi julgado proceden-te. O Tribunal de origem, mantendo a sentença, assim se manifestou (fl. 583):

Ilegítima a autuação feita pelo Fisco estadual por recolhimento a menor de ICMS antecipado nas operações feitas com medicamentos destinados a rede hospitalar, baseado em pauta fiscal (preço máximo de venda ao consumidor publicado em Revistas e Informativos de Classes, ABCFARMA), com mani-festo desprezo ao critério natural do valor da operação, admissível apenas quando ficar demonstrado, pelo Fisco, a inidoneidade dos documentos ou a incorreção das declarações prestadas pelo contribuinte sobre os valores efetivamente praticados nos bens tributados, (art. 148, do CTN).

Sobre o tema, esta Corte já se manifestou no sentido de admitir a substi-tuição tributária “para frente”, relativamente ao ICMS incidente sobre medica-mentos e produtos hospitalares vendidos a hospitais e congêneres.

Nesse sentido, confira-se:

PROCESSUAL CIVIL – MANDADO DE SEGURANÇA – EMBARGOS DE DE-CLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL – FUNGIBILIDA-DE – ICMS – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA “PARA FRENTE” – VENDA DE PRODUTOS MÉDICO-HOSPITALARES – VALIDADE

1. Os Embargos de Declaração não são instrumento para rediscussão do mé-rito da decisão impugnada.

2. Inviável a análise pelo STJ de questão constitucional, ainda que para inter-posição de Recurso Extraordinário.

3. Embargos de Declaração recebidos como Agravo Regimental.

Aplicação do Princípio da Fungibilidade Recursal.

4. É válida a sistemática da substituição tributária “para frente”, no que se re-fere ao ICMS incidente sobre a venda de produtos médico-hospitalares para hospitais e congêneres. Precedentes deste Tribunal.

5. A jurisprudência do STJ prestigiou a eficiência na arrecadação e a mino-ração da evasão fiscal ao analisar a sistemática de substituição tributária. Ressalva-se, no entanto, o direito à restituição na hipótese de o fato gerador presumido não ocorrer (art. 10 da LC 87/1996).

6. Agravo Regimental não provido.

(EDcl-REsp 418541/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, Julga-do em 03.03.2009, DJe 20.04.2009)

Já no tocante à base de cálculo do ICMS nessas operações, necessário o esclarecimento no sentido de que, nos termos da Súmula nº 431/STJ, “É ilegal

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a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime de pauta fiscal”.

Em voto proferido no RMS 18677/MT, o Ministro Castro Meira, diferen-ciou os institutos de pauta fiscal, arbitramento e tabela de preços máximos ao consumidor de forma bastante didática. Confira-se o trecho do acórdão extraído do referido julgado:

A pauta fiscal é valor fixado prévia e aleatoriamente para a apuração da base de cálculo do tributo. Não se pode confundi-la com o arbitramento de valores previsto no art. 148 do CTN, que é modalidade de lançamento, nem com o regime de valor agregado estabelecido no art. 8º da LC 87/1996, que é técnica adotada para a fixação da base de cálculo do ICMS na sistemática de substituição tributária progressiva, levando em consideração dados con-cretos de cada caso.

O art. 148 do CTN somente pode ser invocado para a determinação da base de cálculo do tributo quando, certa a ocorrência do fato imponível, o valor ou preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos registrados pelo contri-buinte não mereçam fé, ficando a Fazenda Pública, nesse caso, autorizada a proceder ao arbitramento mediante processo administrativo-fiscal regular, assegurado o contraditório e a ampla defesa.

Ao final do procedimento, nada impede que a administração fazendária con-clua pela veracidade dos documentos fiscais do contribuinte e adote os va-lores ali consignados como base de cálculo para a incidência do tributo. Do contrário, caso se entenda pela inidoneidade dos documentos, a autoridade fiscal irá arbitrar, com esteio em parâmetros fixados na legislação tributária, o valor a ser considerado para efeito de tributação.

Já o art. 8º da LC 87/1996 estabelece o regime de valor agregado para a determinação da base de cálculo do ICMS no caso de substituição tributária progressiva. Na hipótese, como não há o valor real da mercadoria ou serviço, já que o fato gerador é antecipado e apenas presumido, o dispositivo em tela determina o procedimento a ser adotado, que pode ser resumido nos moldes seguintes.

Preço tabelado: quando o produto tiver preço máximo de venda no varejo, fixado pela autoridade competente ou pelo fabricante, a base de cálculo do ICMS antecipado será esse preço, sem nenhum outro acréscimo (IPI, frete etc.).

Exemplo: um contribuinte (atacadista) vende a outro contribuinte (varejista) um produto “A”, sujeito à antecipação, por R$ 100,00. Esse produto tem preço máximo de venda no varejo fixado pela autoridade competente em R$ 150,00. A base de cálculo do ICMS normal é R$ 100,00, enquanto a do ICMS antecipado é de R$ 150,00.

Preço não tabelado: quando o produto não for tabelado ou não possuir pre-ço máximo de venda no varejo, a base de cálculo do ICMS antecipado é

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determinada por meio de valor agregado. Sobre uma determinada base de partida – geralmente o valor da operação anterior – é aplicado um percentual de agregação, previsto na legislação tributária, para se encontrar a base de cálculo do ICMS antecipado.

Exemplo: um comerciante (atacadista) vende uma mercadoria, sujeita à an-tecipação, a outro comerciante (varejista) por R$ 100,00. Considerando que o percentual específico para essa mercadoria seja de 30%, a base de cálculo do ICMS antecipado será de R$ 130,00. O valor de partida é o preço da mer-cadoria ou serviço praticado na operação anterior, ao qual se adiciona o per-centual de agregação para se chegar à base de cálculo do ICMS antecipado.

O percentual de agregação é listado pela legislação tributária em função de cada produto. A legislação não oferece percentuais específicos para todos eles, mas para alguns, indicando, todavia, o percentual geral para os demais (quase sempre 30%).

Assim, na substituição tributária, hipótese em que a lei estadual atribui ao contribuinte do imposto a responsabilidade pelo seu pagamento, a base de cálculo será, nos termos do art. 8º da LC 87/1996:

8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será:

I – em relação às operações ou prestações antecedentes ou concomitantes, o valor da operação ou prestação praticado pelo contribuinte substituído;

II – em relação às operações ou prestações subsequentes, obtida pelo soma-tório das parcelas seguintes:

a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributá-rio ou pelo substituído intermediário;

b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço;

c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subsequentes.

§ 1º Na hipótese de responsabilidade tributária em relação às operações ou prestações antecedentes, o imposto devido pelas referidas operações ou prestações será pago pelo responsável, quando:

I – da entrada ou recebimento da mercadoria ou do serviço;

I – da entrada ou recebimento da mercadoria, do bem ou do serviço; (Reda-ção dada pela LCP 114, de 16.12.2002)

II – da saída subseqüente por ele promovida, ainda que isenta ou não tribu-tada;

III – ocorrer qualquer saída ou evento que impossibilite a ocorrência do fato determinante do pagamento do imposto.

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§ 2º Tratando-se de mercadoria ou serviço cujo preço final a consumidor, único ou máximo, seja fixado por órgão público competente, a base de cál-culo do imposto, para fins de substituição tributária, é o referido preço por ele estabelecido.

§ 3º Existindo preço final a consumidor sugerido pelo fabricante ou importa-dor, poderá a lei estabelecer como base de cálculo este preço.

4º A margem a que se refere a alínea c do inciso II do caput será estabelecida com base em preços usualmente praticados no mercado considerado, obti-dos por levantamento, ainda que por amostragem ou através de informações e outros elementos fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores, adotando-se a média ponderada dos preços coletados, devendo os critérios para sua fixação ser previstos em lei.

§ 5º O imposto a ser pago por substituição tributária, na hipótese do inciso II do caput, corresponderá à diferença entre o valor resultante da aplicação da alíquota prevista para as operações ou prestações internas do Estado de destino sobre a respectiva base de cálculo e o valor do imposto devido pela operação ou prestação própria do substituto.

§ 6º Em substituição ao disposto no inciso II do caput, a base de cálculo em relação às operações ou prestações subseqüentes poderá ser o preço a con-sumidor final usualmente praticado no mercado considerado, relativamente ao serviço, à mercadoria ou sua similar, em condições de livre concorrência, adotando-se para sua apuração as regras estabelecidas no § 4º deste artigo. (Redação dada pela LCP 114, de 16.12.2002)

Relativamente às hipóteses de substituição tributária, a jurisprudência desta Corte também já se firmou no sentido da possibilidade de se utilizar, para fins de determinação da base de cálculo do tributo devido, do preço final ao consumidor sugerido pelo fabricante de medicamentos e divulgado por revista especializada de grande circulação.

Nesse sentido, confiram-se:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – TRIBUTÁRIO – ICMS – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PROGRESSIVA – BASE DE CÁLCULO PRESUMIDA – PREÇO FINAL A CONSUMIDOR SUGERIDO PELO FABRI-CANTE (DIVULGADO NA REVISTA ABCFARMA) – LEGALIDADE – PAUTA FISCAL – NÃO CARACTERIZAÇÃO

1. O preço final a consumidor sugerido pelo fabricante (divulgado em re-vista especializada) pode figurar como base de cálculo do ICMS a ser pago pelo contribuinte sujeito ao regime de substituição tributária “para frente”, à luz do disposto no art. 8º, § 3º, da Lei Complementar nº 87/1996, verbis: “Art. 8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será: [...] II – em relação às operações ou prestações subseqüentes, obtida pelo so-matório das parcelas seguintes: a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributário ou pelo substituído intermediário;

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b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço;

c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subseqüentes.

[...] § 2º Tratando-se de mercadoria ou serviço cujo preço final a consumi-dor, único ou máximo, seja fixado por órgão público competente, a base de cálculo do imposto, para fins de substituição tributária, é o referido preço por ele estabelecido.

§ 3º Existindo preço final a consumidor sugerido pelo fabricante ou importa-dor, poderá a lei estabelecer como base de cálculo este preço.

[...]” 2. Consoante cediço, “é ilegal a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime de pauta fiscal” (Súmula nº 431/STJ), o que não se confunde com a sistemática da substituição tributária progressiva, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo Plenário do Supremo Tribu-nal Federal (RE 213.396, Rel. Min. Ilmar Galvão, Julgado em 02.08.1999, DJ 01.12.2000; e RE 194.382, Rel. Min. Maurício Corrêa, Julgado em 25.04.2003, DJ 25.04.2003).

3. Assim é que se revela escorreita a conduta da Administração Fiscal que estipula base de cálculo do ICMS, sujeito ao regime da substituição tributá-ria progressiva, com espeque no preço final ao consumidor sugerido pelo fabricante de medicamentos e divulgado por revista especializada de grande circulação.

4. É que o STJ já assentou a legalidade da utilização dos preços indicados na Revista ABC FARMA na composição da base de cálculo presumida do ICMS na circulação de medicamentos em regime de substituição tributária pro-gressiva (REsp 1.192.409/SE, Relª Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, Jul-gado em 22.06.2010, DJe 01.07.2010; e RMS 21.844/SE, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 05.12.2006, DJ 01.02.2007).

5. Recurso ordinário desprovido.

(RMS 24.172/SE, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, Julgado em 10.08.2010, DJe 10.05.2011)

TRIBUTÁRIO – PROCESSO CIVIL – ICMS – BASE DE CÁLCULO – UTILIZA-ÇÃO DE PUBLICAÇÃO RECONHECIDA E IDÔNEA – REVISTA ABC FARMA – POSSIBILIDADE – PRECEDENTES

1. Discute-se nos autos a possibilidade de lei local determinar como base de cálculo presumida de ICMS em regime de substituição tributária valores constantes da Revista ABCFARMA.

2. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de reconhecer a ile-galidade de cobrança do ICMS com base em regime de pauta fiscal, mor-mente pelo fato de que “art. 148 do CTN somente pode ser invocado para a

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152 ������������������������������������������������������������� RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

determinação da base de cálculo do tributo quando, certa a ocorrência do fato imponível, o valor ou preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos registrados pelo contribuinte não mereçam fé, ficando a Fazenda Pública, nesse caso, autorizada a proceder ao arbitramento mediante processo admi-nistrativo-fiscal regular, assegurados o contraditório e a ampla defesa” (RMS 18.677-MT, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 20.06.2005).

3. No presente caso, a conduta da Administração não se trata de pauta fiscal, mas de técnica para a fixação da base de cálculo na sistemática de substitui-ção tributária progressiva, na qual se leva em consideração dados concretos, tudo em consonância com o disposto do art. 8º, §§ 2º e 3º, da Lei Comple-mentar nº 87/1996.

4. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de admitir a utilização dos preços indicados na Revista ABC FARMA na composição da base de cálculo presumida do ICMS na circulação de medicamentos em regime de substituição tributária progressiva. Precedentes: REsp 1.192.409/SE, Relª Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, Julgado em 22.06.2010, DJe 01.07.2010; RMS 21.844/SE, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, Julgado em 05.12.2006, DJ 01.02.2007; RMS 20.381/SE, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, Julgado em 29.06.2006, DJ 03.08.2006.

5. Quanto à alínea c, aplicável o disposto na Súmula nº 83 do STJ, segundo a qual: “Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida”.

6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.

(REsp 1.248.963/SE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, Julgado em 07.06.2011, DJe 14.06.2011)

TRIBUTÁRIO – ICMS – PAUTA FISCAL – SÚMULA Nº 431/STJ

1. Hipótese em que o Estado adotou os preços máximos para venda de me-dicamentos fixados pela Câmara de Regulação de Medicamentos (CMED) para estabelecer a base de cálculo do ICMS na sistemática de substituição tributária.

2. Não se trata, portanto, de adoção dos valores de mercado, baseada nos preços compilados por revistas especializadas, o que é admitido pela juris-prudência do STJ, mas sim de verdadeira pauta fiscal, vedada nos termos da Súmula nº 431/STJ.

3. Agravo Regimental não provido.

(AgRg-AgRg-Ag 1.359.721/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, Julgado em 05.04.2011, DJe 19.04.2011)

Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem reconheceu a nulidade do auto de infração lavrado com base no preço máximo de venda ao consumidor

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publicado em Revistas e Informativos de Classes, ABCFARMA, considerando tratar-se de autuação com base no regime de pauta fiscal, proibido por lei.

Ante o exposto, verificado o equívoco do Tribunal de origem quanto à qualificação do método utilizado para apuração da base de cálculo do ICMS, com as mais respeitosas vênias ao Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, con-cluo por acompanhar o voto do Ministro Relator Ari Pargendler, no sentido de dar provimento ao recurso especial do Estado da Bahia.

É como voto.

certidão de julgamento primeira turma

Número Registro: 2011/0022226-5 Processo Eletrônico REsp 1.237.400/BA

Números Origem: 00343205920038050001 140039780600 201000857351 321662004 5594402009

Pauta: 10.12.2013 Julgado: 17.12.2013

Relator: Exmo. Sr. Ministro Ari Pargendler

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Francisco Rodrigues dos Santos Sobrinho

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuação

Recorrente: Estado da Bahia

Procurador: Bruno Espineira Lemos e outro(s)

Recorrido: Instituto Biochimico Ltda.

Advogado: José Eduardo Rangel de Alckmin e outro(s)

Assunto: Direito Tributário – Impostos – ICMS/Imposto Sobre Circulação de Mercadorias

certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Sérgio Kukina, a Turma, por maioria, vencido o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves e Sérgio Kukina (voto-vista) vota-ram com o Sr. Ministro Relator.

Não participou do julgamento o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima (RISTJ, art. 162, § 2º, primeira parte).

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

10809

Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoAgravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 0042190‑27.2011.4.01.0000/DF (d)Processo Orig.: 0033201‑17.2011.4.01.3400Relator: Desembargador Federal Reynaldo FonsecaAgravante: Fazenda NacionalProcurador: Cristina Luisa HedlerAgravado: Confederal Vigilância e Transporte de Valores Ltda.Advogado: Darcy Maria Gonçalves de AlmeidaAdvogado: Marcelo Martins da CunhaAgravante: Fazenda NacionalAgravada: R. Decisão de fls.

ementa

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – AGRAVO REGIMENTAL – CPD­EN – SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – REQUISITOS DA LIMINAR/TUTELA ANTECIPADA PRESENTES – CPC, ART. 273 – CTN, ART. 151 – AGRG NÃO PROVIDO

1. Estão presentes, no caso concreto, os requisitos necessários à sus-pensão da exigibilidade do crédito tributário com base no art. 151, V, do CTN.

2. “[...] Entre as hipóteses de suspensão da exigibilidade do crédito tri-butário previstas, de forma exaustiva, no art. 151 do CTN, e que legi-timam a expedição da certidão, duas se relacionam a créditos tributá-rios objeto de questionamento em juízo: (a) depósito em dinheiro do montante integral do tributo questionado (inciso II), e (b) concessão de liminar em mandado de segurança (inciso IV) ou de antecipação de tutela em outra espécie de ação (inciso V). Interpretação do CTN, após o advento da LC 104/2001. 3. Nesse diapasão, “as medidas antecipa-tórias, em tais casos, supõem (a) que o contribuinte tome a iniciativa da demanda judicial (mandado de segurança ou ação declaratória ou desconstitutiva) e (b) que demonstre não apenas o risco de dano, mas sobretudo a relevância do seu direito, ou seja, a notória ilegiti-midade da exigência fiscal” (REsp 575002/SC, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, Julgado em 17.02.2005, DJ 26.09.2005, p. 182). 4. Desde que preenchidos os respectivos pressupostos, não há óbice à concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Públi-ca. Precedentes do STJ” (AGA 0055895-63.2009.4.01.0000/DF, Rel. Des. Fed. Reynaldo Fonseca, 7ª T., e-DJF1, p. 355 de 05.02.2010).

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3. Decisão mantida.

4. Agravo Regimental não provido.

acórdão

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas:

Decide a Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por una-nimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 11 de fevereiro de 2014.

Desembargador Federal Reynaldo Fonseca

relatório

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Reynaldo Fonseca (Relator):

Trata-se de agravo regimental interposto pela Fazenda Nacional, impug-nando decisão que negou seguimento ao presente agravo de instrumento, nos termos do art. 557, caput do CPC c/c art. 29, XXIV, RITRF/1ª Região, interpos-to contra decisão que deferiu a liminar pleiteada pela Confederal Vigilância e Transporte de Valores Ltda., para determinar à ora agravante que “forneça à requerente e renove-lhe periodicamente, desde que inexistam outras dívidas além das em execução (de nºs 31.140.018-3, 31.140.019-1 e 31.140.020-5), a certidão positiva de débitos tributários, mas com efeitos de negativa (CTN, art. 206), até que reexaminada, em sede de embargos à execução, a alegada perda do direito de ação executiva”.

Sustenta a agravante que “[...] estando crédito tributário devidamente constituído, necessário o depósito integral do montante para que ocorra a sus-pensão da sua exigibilidade ou qualquer outra causa legal que justifique a sus-pensão da exigibilidade do crédito tributário. O simples ajuizamento da ação anulatória não é suficiente para suspender a exigibilidade do crédito”.

Pugna pelo provimento do agravo regimental.

É o relatório.

voto

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Reynaldo Fonseca (Relator):

1. Em que pese a r. linha de argumentação desenvolvida no Agravo Regi-mental, ora em exame, restou íntegra, data venia, a fundamentação da decisão agravada:

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“Cuida-se de agravo de instrumento interposto pela União (Fazenda Nacio-nal) contra decisão proferida pelo MM. Juiz Federal da 19ª Vara da Seção Judiciária do DF na Ação Cautelar nº 33201-17.2011.4.01.3400/DF, defe-rindo a liminar pleiteada pela Confederal Vigilância e Transporte de Valores Ltda., para determinar à ora agravante que ‘forneça à requerente e renove-lhe periodicamente, desde que inexistam outras dívidas além das em execução (de nºs 31.140.018-3, 31.140.019-1 e 31.140.020-5), a certidão positiva de débitos tributários, mas com efeitos de negativa (CTN, art. 206), até que ree-xaminada, em sede de embargos à execução, a alegada perda do direito de ação executiva’ (fls. 14 e 15 deste recurso virtual).

Entendeu o Juízo de 1º grau haver plausibilidade jurídica nas alegações da empresa executada/agravada aos seguintes fundamentos:

À dívida executada pelo INSS (representado pela União) deveria ser aplicado o prazo prescricional quinquenal, tendo em conta o teor da Súmula Vincu-lante nº 8 que reconheceu a inconstitucionalidade dos arts. 45 e 46 da Lei nº 8.212/1991;

A dívida estaria suspensa em razão do que ficou decidido nos au-tos da Medida Cautelar nº 94.13188-7/DF e no Agravo de Instrumento nº 2004.01.00.039554-5/DF); e

Seria ‘inquestionável que a falta da renovação prejudica o normal desenvol-vimento das atividades sociais da requerente, empresa dedicada à prestação de serviços de manutenção, limpeza e vigilância e de transporte e guarda de valores, eis que, sem a certidão tributária, fica impossibilitada de receber faturas pelos serviços prestados e de participar de licitações públicas. É a configuração, também, da possibilidade de dano irreparável, caso a medida liminar somente ao final seja concedida’ (fl. 15).

Inconformada, a União insiste em que não teria ocorrido a prescrição, dado que, constituído o crédito em 27.10.1994, após verificação de que o tributo havia sido pago pela empresa contribuinte em jul/1993 sem atualização mo-netária, a sua exigibilidade teria sido suspensa em 19.12.1996 por força de liminar concedida à ora agravada nos autos da Ação Cautelar Preparatória nº 94.00.13188-7/DF (cópia às fls. 260/261), na qual o MM. Juiz Federal da 15ª Vara do DF reconhecia à empresa contribuinte o direito à expedição de Certidão Negativa quanto às NFLDs 3226, 3227 e 3228, enquanto o pro-vimento no processo principal (Ação Anulatória nº 94.15577-8/DF) lhe for favorável.

Assim sendo, como a sentença proferida na Ação Anulatória nº 94.15577-8/DF (cópia às fls. 74/88) acolheu o pedido sucessivo da empresa autora para reco-nhecer a inexigibilidade das contribuições pagas em relação a administrado-res e autônomos (art. 3º, I, Lei nº 7.787/1989) – objeto de cobrança na NFLD 3226 –, assim como a impossibilidade de aplicação da TR, a exigibilidade das NFLDs teria ficado suspensa até 29.05.2003, quando, no julgamento da Apelação Cível nº 1997.01.00.030268-5/DF (fls. 277/285), este Tribunal deu

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provimento ao apelo do INSS, para reconhecer a legalidade da incidência da TR como juros de mora.

Assim sendo, suspensa a exigibilidade do crédito tributário entre 19.12.1996 e 29.05.2003, por força de decisão judicial, durante esse período não corre-ria o prazo prescricional. Por consequência, não estaria prescrita a dívida se a execução fiscal foi ajuizada em 14.05.2004 e o crédito foi constituído em 27.10.1994.

Aponta, ainda, o dano irreparável a justificar a antecipação de tutela no fato de que a ausência de arrecadação repercute diretamente sobre todos os ci-dadãos brasileiros, que dependem dos bens e serviços e da estabilidade eco-nômica e social, cujo suporte é a arrecadação da União.

Em contraminuta (fls. 298/307), a empresa agravada defende o acerto da decisão impugnada, ao argumento de que: a) a expedição de CPD-EN não acarreta prejuízo à União, pois não impede o prosseguimento da execução fiscal; e b) ocorreu a prescrição, pois não houve a alentada suspensão da exigibilidade de todo o crédito tributário, mas, unicamente, da NFLD 3226.

É o relatório. Passo a decidir.

Ainda que haja certa plausibilidade na tese da agravante sobre a contagem do prazo prescricional, acredito que a questão deva ser melhor examinada pelo juiz de 1º grau nos embargos à Execução Fiscal nº 52749-28.2011.4.01.3400/DF, opostos pela agravada em 10.10.2011, e que constituem a ação principal à qual se vincula a presente medida cautelar.

Isso porque não houve, propriamente, uma manifestação peremptória do prolator da decisão agravada no sentido de que estaria prescrito o direi-to da Fazenda Nacional de cobrar os valores referentes à Execução Fiscal nº 2004.34.00.016501-0/DF. Mesmo porque, se fosse o caso, teria o magis-trado, após ouvida a exequente, reconhecido tal prescrição, de ofício, nos autos da própria execução, por tratar-se de matéria de ordem pública. No en-tanto, o que se vê, em consulta ao andamento do processo no site da Seção Judiciária do DF, é que a execução prossegue regularmente até o momento.

Além disso, o MM. Juiz Federal de 1º grau entendeu que o crédito exe-cutado estaria suspenso em virtude de decisão proferida na Medida Cau-telar nº 94.13188-7/DF, fundamento não impugnado pela agravante. E, a bem da verdade, até o momento a empresa agravada vem obtendo êxito em relação a pelo menos uma das irresignações postas na Ação Anulatória nº 94.00.15577-8/DF: a inexigibilidade da contribuição cobrada na NFLD 3226 (cópia às fls. 55 e 60) que, sozinha, representa cerca de 70% (setenta por cento) do total cobrado na execução.

De outro lado, não vislumbro, no caso concreto, periculum in mora, na ma-nutenção da decisão agravada, dado que a dívida já está garantida, como se vê da cópia do Termo de Penhora e Nomeação de Depositário à fl. 308 deste recurso virtual. Pelo contrário, acredito que se submeteria a risco maior

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a empresa agravada, se privada da CPD-EN, enquanto discute em juízo os valores que lhe são cobrados. É que, sem a Certidão de Regularidade Fiscal, a atividade comercial exercida pela empresa agravada (dedicada à presta-ção de serviços de manutenção, limpeza, vigilância, transporte e guarda de valores) se verá seriamente comprometida, sem contar que poderá ela vir a ser compelida a pagar tributo indevido, cuja repetição exigirá novo trâmite processual.

Estão presentes, portanto, no caso concreto, os requisitos necessários à sus-pensão da exigibilidade do crédito tributário com base no art. 151, V, do CTN. Corroboram esse entendimento, os seguintes precedentes desta Corte:

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL – TUTELA ANTECIPA-DA – DIPJ – COFINS – CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO – SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE – CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITO DE NEGATI-VA – NÃO INSCRIÇÃO DO DEVEDOR NO CADIN – REQUISITOS DO ART. 273 DO CPC – PRECEDENTES DO STJ E DO TRF 1ª R.

1. Firme é a diretriz desta Corte e do e. STJ no sentido de que o uso das prerrogativas do art. 557 do CPC pelo relator não afronta ao princípio do contraditório, da ampla defesa ou violação de normas legais, pois atende à agilidade jurisdicional, o que não se limita à prévia jurisprudência do-minante ou súmulas das Cortes Superiores.

2. Entre as hipóteses de suspensão da exigibilidade do crédito tributário previstas, de forma exaustiva, no art. 151 do CTN, e que legitimam a ex-pedição da certidão, duas se relacionam a créditos tributários objeto de questionamento em juízo: (a) depósito em dinheiro do montante integral do tributo questionado (inciso II), e (b) concessão de liminar em mandado de segurança (inciso IV) ou de antecipação de tutela em outra espécie de ação (inciso V). Interpretação do CTN, após o advento da LC 104/2001.

3. Nesse diapasão, “as medidas antecipatórias, em tais casos, supõem (a) que o contribuinte tome a iniciativa da demanda judicial (mandado de segurança ou ação declaratória ou desconstitutiva) e (b) que demonstre não apenas o risco de dano, mas sobretudo a relevância do seu direito, ou seja, a notória ilegitimidade da exigência fiscal” (REsp 575002/SC, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, Julgado em 17.02.2005, DJ 26.09.2005, p. 182).

4. Desde que preenchidos os respectivos pressupostos, não há óbice à concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública. Precedentes do STJ.

5. Na dicção do colendo Superior Tribunal de Justiça, no caso de tribu-to sujeito a lançamento por homologação, tendo havido declaração do débito pelo contribuinte, mediante DCTF, sem o respectivo pagamento, o débito é considerado imediatamente constituído, dispensando lança-mento posterior pelo Fisco, iniciando-se na data do vencimento o prazo quinquenal da ação de cobrança.

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������159

6. “Formalizado o pedido de compensação de débito tributário, reputa--se tacitamente homologada a compensação e extinto definitivamente o crédito se não foi ela indeferida no prazo de cinco anos, nos termos do art. 74, §§ 2º, 4º e 5º, da Lei nº 9.430, de 1996, na redação das Leis nºs 10.637, de 2002, e 10.833, de 2003. Demonstrado que já havia ocor-rido a homologação tácita da compensação na data em que foi efetivado o lançamento de ofício do débito e a sua inscrição em Dívida Ativa, cabe a concessão de providência de natureza cautelar, para suspensão da exi-gibilidade desse débito, nos termos dos arts. 273, § 7º, do CPC e 151, V, do CTN.” (Ag 2007.01.00.016790-5/AM, Rel. Des. Fed. Antônio Ezequiel da Silva, 7ª T., DJ p. 109 de 31.10.2007)

7. Suspensa a exigibilidade do crédito tributário, descabe a inscrição do nome do devedor nos cadastros públicos de inadimplência.

8. Requisitos do art. 273 da Lei Adjetiva Civil preenchidos. Agravo Regi-mental improvido.

(AGA 0055895-63.2009.4.01.0000/DF, Rel. Des. Fed. Reynaldo Fonseca, 7ª T., e-DJF1 p. 355 de 05.02.2010 – grifei)

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – MEDIDA CAUTELAR – PRESTA-ÇÃO DE CAUÇÃO IDÔNEA – SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO POSITIVA DE DÉ-BITOS COM EFEITOS DE NEGATIVA – POSSIBILIDADE

I – Embora o art. 151 do Código Tributário Nacional não preveja a cau-ção como uma das formas de suspensão da exigibilidade do crédito tribu-tário, não há ilegalidade na medida, uma vez que, após o advento da Lei Complementar nº 104/2001, que alterou o Código Tributário Nacional, é admissível a suspensão de crédito tributário por meio de concessão de li-minar em Mandado de Segurança, em Ação Cautelar, ou em antecipação dos efeitos da tutela em Ações Ordinárias. Precedentes.

II – Afigura-se possível a expedição de Certidão Positiva de Débito com Efeitos de Negativa (CPD-EN), em casos de garantia do débito mediante caução idônea, por meio de bens imóveis, ofertada em sede de ação cau-telar ajuizada pelo devedor, na espécie.

III – Agravo de instrumento provido. Decisão reformada.

(Ag 0002039-24.2008.4.01.0000/TO, Rel. Des. Fed. Souza Prudente, 8ª T., e-DJF1 p. 556 de 13.05.2011 – grifei)

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – MEDIDA CAUTELAR – SUSPEN-SÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – ART. 151, V, DO CTN – POSSIBILIDADE – REQUISITOS – REEXAME – SÚMULAS NºS 283/STF E 7/STJ

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1. O Código Tributário Nacional possui expressa previsão no sentido de que é possível a suspensão da exigibilidade do crédito tributário median-te a concessão de medida liminar ou antecipação de tutela.

2. Hipótese que não se confunde com compensação, ainda que indireta, pois, tão logo cessada a suspensão da exigibilidade, pode o fisco retomar a cobrança, com todos os consectários legais.

3. Reconhecido, pelo Tribunal de origem, a presença dos requisitos legais para a concessão da medida e não impugnados os fundamentos suficien-tes para manter o acórdão recorrido nesse ponto, o recurso especial não merece conhecimento.

4. Recurso especial conhecido em parte, mas não provido.

(REsp 982.054/CE, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., Julgado em 18.06.2009, DJe 01.07.2009 – grifei)

Ante o exposto, nego seguimento ao presente agravo de instrumento, nos termos do art. 557, caput, do CPC c/c art. 29, XXIV, do Regimento Interno do TRF 1ª R.

Encaminhe-se cópia da presente decisão ao Juízo prolator da decisão agra-vada.”

Com efeito, presentes os requisitos da tutela antecipada requerida, a suspensão da exigibilidade do respectivo crédito decorre da regra expressa no art. 151, V do CTN e do art. 273 do CPC.

2. Sem outras considerações haja vista a clareza e objetividade da funda-mentação acima transcrita, nego provimento ao agravo regimental.

É como voto.

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoIV – Apelação Cível nº 2013.51.01.121527‑0Nº CNJ: 0121527‑90.2013.4.02.5101Relatora: Desembargadora Federal Nizete Lobato CarmoApelante: Companhia Sud Americana de Vapores S/A Rep. p/ CSAV Group Agencies Brazil Agenciamento de Transportes Ltda.Advogado: Suzel Maria Reis Almeida Cunha e outrosApelado: União Federal/Fazenda NacionalOrigem: Segunda Vara Federal do Rio de Janeiro (201351011215270)

ementa

DIREITO ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – APELAÇÃO CÍVEL – DESUNI­ TIZAÇÃO DE CONTÊINER – RESPONSABILIDADE DO INSPETOR DA ALFÂNDEGA DA RECEITA FEDERAL

1. A sentença negou a segurança para desunitizar o contêiner CAXU 800.641-5, entendendo que a questão não pode ser dirimida pela via mandamental, “por tratar de discussão travada no âmbito de uma relação contratual entre a administradora do terminal alfandegário e o dono da unidade depositada”.

2. A autoridade coatora é a que pratica ou ordena concreta e espe-cificamente a execução ou inexecução do ato impugnado. Não se confunde o simples executor material da providência com a autori-dade superior, responsável pelas determinações por ele cumpridas. Inteligência do art. 6º, § 3º, da Lei nº 12.016/2009.

3. Os dirigentes dos terminais alfandegários são depositários e execu-tores das ordens da Secretaria da Receita Federal, órgão despersona-lizado e hierarquicamente vinculado ao Ministério da Fazenda, que administra a destinação das mercadorias apreendidas. A responsabi-lidade pelo esvaziamento do contêiner é do Poder Público e não há como desobrigá-lo da liberação da unidade de carga. Aplicação dos Decretos nº 1.910/1996 e 6.759/2009.

4. A delegação de competência ao recinto alfandegado para o pro-cedimento de desunitização das mercadorias objeto de apreensão (OS 4, de17.10.2006) não exclui a responsabilidade do Inspetor da Alfândega do Porto do Rio de Janeiro de desunitizar contêineres.

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5. A impetrante foi contratada para transporte de mercadorias vin-das do exterior dentro de contêiner, mas o importador abandonou as mercadorias, o que resultou em processo de perdimento. Requereu, sem êxito até o momento, a desunitização das cargas e devolução do contêiner vazio ao Inspetor da Alfândega do Porto do Rio, apontado como autoridade coatora.

6. O contêiner não é acessório da mercadoria transportada, e por isso não se sujeita à pena de perdimento, configurando-se indevida a retenção das unidades de carga de propriedade da empresa de nave-gação marítima, ora apelante, a teor do art. 24, parágrafo único, da Lei nº 9.611/1998. Precedentes da Turma.

7. Apelação provida.

acórdão

Decide a Sexta Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da Segunda Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, para determinar que a autoridade impetrada libere, no prazo de 10 (dez) dias, o contêiner de propriedade da impetrante, nos termos do voto da Relatora.

Rio de Janeiro, 11 de dezembro de 2013.

Nizete Antônia Lobato Rodrigues Carmo Desembargadora Federal

relatório

A Compania Sud Americana de Vapores S/A Rep. CSAV Group Agencies Brazil Agenciamento de Transportes Ltda. apela1 da sentença2 do Juiz Federal Mauro Lopes que denegou a segurança para desunitizar o contêiner CAXU 800.641-5, pois a questão não pode ser dirimida pela via mandamental, “por tratar de discussão travada no âmbito de uma relação contratual entre a admi-nistradora do terminal alfandegário e o dono da unidade depositada”.

Alega, em síntese, que requereu administrativamente a desunitização das cargas e devolução do contêiner vazio, mas a autoridade aduaneira tenta exi-mir-se de sua responsabilidade; o Inspetor da Alfândega da Receita Federal do Brasil do Porto do Rio de Janeiro é o único responsável pelo processo adminis-trativo fiscal desde a apreensão até a efetiva aplicação da pena de perdimento,

1 Fls. 174/202 – autos virtuais.

2 Fls. 164/165 – autos virtuais.

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������163

cabendo a ele promover os atos que lhe competem, para desunitizar a carga e liberar o contêiner; o terminal é o responsável pela operação portuária, contu-do, quem tem a legitimidade para determinar a desova da unidade de carga é a Receita Federal; o contêiner é equipamento autônomo, sem qualquer vínculo de acessoriedade com as mercadorias neles acondicionadas, sendo-lhe inapli-cável a pena de perdimento; e apenas transportou a carga entre os portos de Nimbo (China) e do Rio de Janeiro, encerrando sua responsabilidade contratual com a entrega da carga no porto de destino.

Contrarrazões às fls. 206/209 – autos virtuais.

O Procurador Regional Luis Leivas limita-se a alegar ser “incensurável a r. Sentença”.3

É o relatório.

Nizete Antônia Lobato Rodrigues Carmo Desembargadora Federal

voto

A sentença que reformo relata que Compania Sud Americana de Vapores S/A, representada pelo seu agente, CSAV Group Agences Brazil Agenciamento de Transportes Ltda. impetra Segurança contra ato do Inspetor da Alfândega no Porto do Rio de Janeiro, objetivando a desunitização do container CAXU 800.641-5, que se encontra retido no porto desta cidade devido a procedimen-tos fiscais relacionados às mercadorias em seu interior, sujeitas à pena de per-dimento.

A controvérsia foi assim analisada pelo Juízo de 1º grau:

[...]

A autoridade impetrada cuidou de demonstrar que não assume atribuição legal para realizar os procedimentos operacionais de desunitização da carga para devolução do contêiner ao transportador, tarefa que compete legalmen-te às empresas privadas concessionárias de terminais alfandegados, tendo em vista o disposto nos arts. 1º, §§ 1º e 3º, 2º, inciso XIII e 27, § 1º da Lei nº 12.815/2013.

Os dispositivos legais acima citados, aliados ao disposto no parágrafo único do art. 24 da Lei nº 9.611/1998, que por sua vez estabelece a distinção entre a unidade de carga e o seu conteúdo, impõem a conclusão no sentido de que o proprietário do contêiner é responsável pelo pagamento das taxas de armazenagem devidas não pelo depósito da carga, mas sim pelo depósito da própria unidade de carga.

3 Fls. 04 – autos físicos.

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Feitas essas considerações, conclui-se que a impetrante, na verdade, ciente de que a autoridade impetrada não se opõe à desunitização, não logra êxito em seu intento, obviamente, pela resistência oposta pela empresa privada concessionária de terminais alfandegados, a qual exige como condição para a devolução do cofre de carga o pagamento da taxa de armazenagem deste enquanto bem autônomo.

Tal questão, obviamente, não pode ser dirimida pela via do mandado de segurança, por se tratar de discussão travada no âmbito de uma relação con-tratual mantida entre a administradora do terminal alfandegado e o dono da unidade depositada. [...]

Sucede que a impetrante (transportadora marítima internacional) trans-portou no navio XIN TIAN JIN/01224/S, as mercadorias acondicionadas no container nº CAXU 800.641-5, nos termos do Conhecimento de Embarque B/L nº PBQLXB900. O navio atracou no Porto do Rio de Janeiro em 16.07.2012, e a carga descarregada e removida para o Terminal Libra foi abandonada, sujei-tando-se à pena de perdimento.

Para fins do art. 6º, § 3º, da Lei nº 12.016/2009, “considera-se autorida-de coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática”. E mais: “Coatora é a autoridade que pratica ou orde-na concreta e especificamente a execução ou inexecução do ato impugnado... Não se confunde o simples executor material do ato com a autoridade superior responsável pelas determinações cumpridas por ele”4.

4 1. Coatora é a autoridade que pratica ou ordena concreta e especificamente a execução ou inexecução do ato impugnado. 2. Não se confunde o simples executor material do ato com a autoridade superior responsável pelas determinações cumpridas por ele. 3. O CNJ é órgão de controle da atuação administrativa do Judiciário, devendo suas decisões serem cumpridas, principalmente se resultarem em determinações específicas, concretas e diretas, com previsão de prazo para serem cumpridas. 4. Ato normativo de Tribunal de Justiça cumprindo as determinações de decisão do CNJ configura mera execução administrativa, o que torna parte ilegítima o Presidente do Tribunal para fins de mandado de segurança que, em última análise, insurge-se contra a decisão do CNJ. 5. É competente o STF para julgar mandado de segurança impetrado contra o CNJ, conforme o art. 102, I, r, da CF. 6. Recurso ordinário não provido.

(STJ, ROMS 200900674978, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJe 19.06.2009)

1. A questão preliminar arguida, de legitimidade passiva do Gerente Geral do Terminal Santos Brasil S.A., foi deslindada de forma proficiente pela sentença, porém, como a parte apelante retornou ao tema, insta observar apenas que o gerente de terminal, apontado como autoridade impetrada, foi mero executor da ordem de retenção do container, expedida pelo Inspetor da Alfândega do Porto de Santos, sendo, pois, este parte legítima para figurar no polo passivo do writ, uma vez que é o único detentor de competência administrativa para corrigir o ato impugnado. Precedente do Colendo Superior Tribunal de Justiça. 2. No mérito da causa, a questão posta a deslinde diz respeito ao direito de a impetrante obter ordem judicial para determinar a “desunitização” e consequente devolução de unidade de carga de propriedade da impetrante, um container de nº CCLU 453.774-6, indevidamente apreendido, em razão de o importador ter abandonado as mercadorias nele contidas, estando estas sujeitas à aplicação da pena de perdimento. 3. Acerca da matéria, a jurisprudência já se encontra consolidada no sentido de que inexiste amparo jurídico para a apreensão de containers, não podendo se confundir a unidade de carga com a mercadoria nela transportada. 4. Ademais, o argumento de que se faz necessário apreender o container para a preservação da própria carga que este contém, não merece prosperar, sob pena de privar, de forma arbitrária, a impetrante de seus bens particulares, em razão de omissão de terceiro. Ora, trata-se a apelante de mera transportadora da mercadoria tida por abandonada, sendo certo que sua unidade de carga não pode ser retida por fatos exclusivamente relativos

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O Decreto nº 6.759/2009 que regulamentou a administração das ativida-des aduaneiras (art. 6425), a seu turno, considera abandonada a mercadoria que permanecer em recinto alfandegado sem que o seu despacho de importação seja iniciado no decurso de determinados prazos6, aplicando-se a pena de per-dimento (art. 689, caput e inciso XXI7).

As mercadorias sujeitas à pena de perdimento são guardadas em nome e ordem do Ministro de Estado da Fazenda, como medida acautelatória dos interesses da Fazenda Nacional8, competindo àquela autoridade, nos termos do art. 806 autorizar a sua destinação (art. 7019). As mercadorias referidas no inciso IX do art. 68910 sujeitam-se a procedimento sumário de declaração de abando-no, nos casos em que não é possível identificar o proprietário, e são adminis-

às mercadorias em si ou ao importador. 5. Em suma, merece reparo a sentença prolatada, conquanto a mercadoria tida como abandonada não deve atingir a unidade de carga de propriedade da impetrante, a qual somente foi utilizada para o seu transporte, impondo-se, pois, a parcial reforma da decisão recorrida, para julgar procedente o pedido inicial, concedendo-se a segurança postulada para determinar a “desunitização” do contêiner CCLU 453.774-6, permitindo que a impetrante o retire, por se tratar de bem integrante de seu patrimônio, do qual foi injustamente privado de uso. 6. Apelação a que se dá parcial provimento, para reformar a sentença e conceder a ordem postulada.

(TRF 3ª R., AMS 311165, 3ª T., Rel. Juiz Convocado Valdeci dos Santos, e-DJF3 02.08.2010)

5 Art. 642. Considera-se abandonada a mercadoria que permanecer em recinto alfandegado sem que o seu despacho de importação seja iniciado no decurso dos seguintes prazos (Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 23, incisos II e III): [...]

6 I – noventa dias:

a) da sua descarga; e

b) do recebimento do aviso de chegada da remessa postal internacional sujeita ao regime de importação comum;

II – quarenta e cinco dias:

a) após esgotar-se o prazo de sua permanência em regime de entreposto aduaneiro;

b) após esgotar-se o prazo de sua permanência em recinto alfandegado de zona secundária; e

c) da sua chegada ao País, trazida do exterior como bagagem, acompanhada ou desacompanhada; e

III – sessenta dias da notificação a que se refere o art. 640.

[...]

7 Art. 689. Aplica-se a pena de perdimento da mercadoria nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 105; e Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 23, caput e § 1º, este com a redação dada pela Lei nº 10.637, de 2002, art. 59): [...] XXI – importada e que considerada abandonada pelo decurso do prazo de permanência em recinto alfandegado, nas hipóteses do art. 642.

8 Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 25

9 Art. 701. Os veículos e as mercadorias sujeitos à pena de perdimento serão guardados em nome e ordem do Ministro de Estado da Fazenda, como medida acautelatória dos interesses da Fazenda Nacional (Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 25).

10 Art. 689. Aplica-se a pena de perdimento da mercadoria nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 105; e Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 23, caput e § 1º, este com a redação dada pela Lei nº 10.637, de 2002, art. 59):

[...]

IX – estrangeira, encontrada ao abandono, desacompanhada de prova do pagamento dos tributos aduaneiros;

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tradas e destinadas pela Receita Federal, a quem cabe, inclusive, promover a destruição ou inutilização a que alude o inciso III do art. 803 (art. 80611).

Do Decreto nº 1.910/1996, que dispõe sobre concessão e permissão de serviços em terminais alfandegados, infere-se que os dirigentes dos terminais são depositários e executores das ordens da Receita Federal, órgão despersona-lizado e hierarquicamente vinculado ao Ministério da Fazenda que, nos termos do mencionado Decreto nº 6.759/2009, administra a destinação das mercado-rias apreendidas. A responsabilidade pelo esvaziamento do contêiner, portanto, é do Poder Público e não há como desobrigá-lo de proceder à liberação da unidade de carga.

Noutro viés, é certo que a Ordem de Serviço nº 04, publicada no DOU em 17.10.2006, do Inspetor da Alfândega do Porto do Rio de Janeiro, delega a competência em favor do recinto alfandegado para o procedimento de desuni-tização das mercadorias objeto de apreensão12.

Não obstante a delegação por normatização interna – Ordem de Serviço nº 4 – subsiste a competência do impetrado (Inspetor da Alfândega no Porto do Rio de Janeiro) para proceder à desunitização, força do Decreto nº 6.759/2009.

A jurisprudência do Colendo STJ13 converge no sentido de o contêiner não ser acessório da mercadoria transportada, a teor do art. 24, parágrafo úni-co14, da Lei nº 9.611/199815, não se sujeitando, pois, à pena de perdimento,

11 Art. 806. Compete ao Ministro de Estado da Fazenda autorizar a destinação das mercadorias de que trata este Capítulo (Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 28). (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 15 de junho de 2010)

I – de que trata este Capítulo; e

II – enquadradas na tipificação do inciso IX do art. 689, mediante a adoção de procedimento sumário de declaração de abandono, nos casos em que não for possível identificar o proprietário.

Parágrafo único. Caberá à Secretaria da Receita Federal do Brasil administrar e efetuar a destinação das mercadorias apreendidas, inclusive promover a destruição ou inutilização a que se refere o inciso III do art. 803 (Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 29, § 4º; e Decreto-Lei nº 2.061, de 1983, art. 4º).

12 “Art. 1º A desunitização de mercadorias importadas que tenham sido objeto de apreensão, mediante a lavratura de auto de infração e termo de apreensão e guarda fiscal de mercadorias, independe de prévia autorização desta Alfândega, podendo ser solicitada diretamente ao recinto alfandegado depositário, o qual deverá observar as condições de segurança necessárias à garantia da integridade da carga e atender, conforme a natureza do produto, às determinações emanadas dos competentes órgãos públicos de controle.”

13 1. Pacífico nesta Corte Superior o entendimento segundo o qual não existe relação de acessoriedade entre o contêiner e as mercadorias nele armazenadas/transportadas para fins de pena de perdimento. Neste sentido, confiram-se os seguintes precedentes: REsp 908.890/SP, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJU 23.04.2007, e REsp 526.767/PR, Relª Min. Denise Arruda, Primeira Turma, DJU 19.09.2005.

2. Recurso especial não provido.

(STJ, 2ª T., REsp 200801015814, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 01.09.2010)

14 “Art. 24. Para os efeitos desta Lei, considera-se unidade de carga qualquer equipamento adequado à unitização de mercadorias a serem transportadas, sujeitas a movimentação de forma indivisível em todas as modalidades de transporte utilizadas no percurso.

Parágrafo único. A unidade de carga, seus acessórios e equipamentos não constituem embalagem e são partes integrantes do todo.”

15 A Lei nº 9.611/1998: “Dispõe sobre o Transporte Multimodal de Cargas e dá outras providências.”

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configurando-se indevida a retenção das unidades de carga de propriedade da empresa de navegação marítima apelante.

Nesse sentido esta Turma se manifestou, inclusive em julgado por mim relatado:

[...] 3. Os dirigentes dos terminais alfandegários são depositários e executo-res das ordens da Secretaria da Receita Federal, órgão despersonalizado e hierarquicamente vinculado ao Ministério da Fazenda que administra a des-tinação das mercadorias apreendidas. A responsabilidade pelo esvaziamento do contêiner é do Poder Público e não há como desobrigá-lo da liberação da unidade de carga. Aplicação dos Decretos nºs 1.910/1996 e 6.759/2009.

4. Pela Ordem de Serviço nº 4, de17.10.2006, o Inspetor da Alfândega do Porto do Rio de Janeiro delega a sua competência ao recinto alfandegado para o procedimento de desunitização das mercadorias objeto de apreensão, mas isso não exclui a sua legitimação para figurar no polo passivo desta ação mandamental.

5. A impetrante foi contratada para transporte de mercadorias vindas do ex-terior dentro de contêiner, mas o importador abandonou as mercadorias, que resultou em processo de perdimento. Requereu, sem êxito até o momento, a desunitização das cargas e devolução do contêiner vazio ao Inspetor da Alfândega do Porto do Rio, apontado como autoridade coatora.

6. O contêiner não é acessório da mercadoria transportada, e por isso não se sujeita à pena de perdimento, configurando-se indevida a retenção das unidades de carga de propriedade da empresa de navegação marítima, ora apelante, a teor do art. 24, parágrafo único, da Lei nº 9.611/1998.

7. Sentença reformada. Apelação provida. Julgamento da apelação, com base no § 3º, do art. 515, do CPC. (AC 201351011011365, Desª Fed. Nizete Lobato Carmo, DJe 02.09.2013)

O art. 24 da Lei nº 9.611/1998 é claro ao dispor que o container não cons-titui embalagem, mas sim peça que não se confunde com a mercadoria nele transportada. Assim, não se pode decretar seu perdimento, ou retê-lo sem justificativa legal, com fulcro em questão pertinente ao abandono e perdi-mento dos bens nele acondicionados. Decorrência de tempo suficiente para a Administração providenciar as medidas necessárias para o acondiciona-mento da mercadoria apreendida ou abandonada, e posterior liberação dos containers. Correta a sentença que concedeu a segurança, determinando a desunitização e a devolução dos trinta e cinco containers. Remessa e apela-ção desprovidas. (REOAC 200651010158704, Des. Fed. Guilherme Couto, DJe 02.04.2013)

É ilegal a apreensão de unidade de carga pelo fato de a mercadoria nela condicionada se encontrar abandonada e sujeita à aplicação da pena de perdimento. O container não se confunde com a mercadoria transportada e inexiste relação de acessoriedade entre eles. Correta a sentença que conce-

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168 ������������������������������������������������������������� RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

deu a segurança, determinando a desunitização e a devolução do container vazio. Inteligência dos arts. 24, parágrafo único da Lei nº 9.611/1998 e 3º da Lei nº 6.288/1975. Remessa e apelo desprovidos. (AC 200951010243678, Rel. Des. Fed. Guilherme Couto, e-DJF2R 02.02.2011)

Em face do exposto, dou provimento à apelação para, concedendo a segurança, determinar à autoridade impetrada que libere, em 10 (dez) dias, o contêiner vazio CAXU 800.641-5, de propriedade da impetrante, nos termos da fundamentação.

Sem condenação em honorários advocatícios, a teor da Lei nº 12.016/2009, art. 2516.

É como voto.

Nizete Antônia Lobato Rodrigues Carmo Desembargadora Federal

16 “Art. 25. Não cabem, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé.”

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

10811

Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoAgravo Legal em Agravo de Instrumento nº 0006518‑30.2013.4.03.0000/SP2013.03.00.006518‑7/SPRelatora: Desembargadora Federal Alda BastoAgravante: Caixa Econômica Federal – CEFAdvogado: SP156147 Marcio Rodrigues Vasques e outroAgravado: Prefeitura Municipal de São Vicente/SPAdvogado: SP175542 Isabella Cardoso Adegas e outroOrigem: Juízo Federal da 7ª Vara de Santos > 4ª SSJ > SPAgravada: Decisão de folhasNº Orig.: 00094290720114036104 7ª Vr. Santos/SP

ementa

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – AGRAVO – ART. 557, § 1º, DO CPC – EXECUÇÃO FISCAL – EXCEÇÃO DE PRÉ­EXECUTIVIDADE – IPTU – IMÓVEL AFETO AO PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL – PROPRIEDADE DA UNIÃO – IMUNIDADE – TAXAS – LEGITIMIDADE – CEF

I – O Governo Federal, mediante a edição da MP 1.823/1999 e ree-dições (MPv 2.135-24/2001), convertida na Lei nº 10.188, de 12 de fevereiro de 2001, instituiu o Programa de Arrendamento Residencial – PAR, com o escopo de atender à necessidade de moradia da popu-lação de baixa renda, mediante o arrendamento de imóveis residen-ciais, com opção de compra ao final do prazo contratual fixado.

II – O citado diploma legal delegou à CEF a qualidade Gestora do Pro-grama de Arrendamento Residencial, cujo desempenho do encargo, inclusive, percebe remuneração, fixado o respectivo quantum em ato ministerial conjunto (art. 1º, §§ 1º e 2º).

III – Os recursos direcionados à implementação do PAR, especial-mente os imóveis adquiridos, não se incorporam ao patrimônio da CEF, pois consistem em um “fundo financeiro privado com o fim ex-clusivo de segregação patrimonial e contábil dos haveres financeiros e imobiliários destinados ao Programa” (art. 2º). Em outras palavras, traduzem-se em recursos da União especializados a um Fundo Espe-cial, em poder de administração da Gestora, a CEF.

IV – Diante disso, conclui-se de modo inconteste que os imóveis ad-quiridos pela CEF, para a consecução dos objetivos legais e consti-

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tucionais, além de não integrarem seu patrimônio, como supramen-cionado, conservam-se no patrimônio da União por substituição, ou seja, subrogam-se aos recursos do Fundo constituído pelo Governo Federal para efetivação do PAR.

V – Sendo os bens e direitos da União insuscetíveis de tributação, é esse o regramento aplicável quanto a tais recursos, ainda que rever-tidos na aquisição dos bens imóveis pela Gestora, a CEF, uma vez que em nenhum momento houve seu destacamento do patrimônio da União, como expressamente disposto pela legislação reguladora do tema.

VI – Portanto, quer tais verbas estejam constituídas sob a forma de reserva ao Fundo, quer estejam especializadas em imóveis destina-dos ao PAR, quer retornem sem uso ao patrimônio da União (art. 3º, § 4º), vislumbra-se inequívoca hipótese de imunidade sobre tais bens e recursos, posto constituírem patrimônio da União, apenas desta-cado para afetação à finalidade pública preconizada pela citada Lei nº 10.188/2001, sendo ilegítima a cobrança posta quanto ao IPTU, face à aludida imunidade, nos termos do art. 150, VI, a, da CF/1988.

VII – A taxa é espécie tributária não alcançada pela imunidade recí-proca, cuja cobrança pressupõe o fornecimento de serviços públicos ou o exercício do poder de polícia.

VIII – Os imóveis do PAR, enquanto não alienados são de proprieda-de fiduciária da CEF, razão pela qual se verifica sua sujeição passiva às taxas.

IX – Sucumbência recíproca.

X – Agravo parcialmente provido.

acórdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, de-cide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao agravo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 30 de janeiro de 2014.

Alda Basto Desembargadora Federal

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relatório

A Exma. Desembargadora Federal Alda Basto:

Trata-se de agravo interposto pela Caixa Econômica Federal – CEF, com fulcro no art. 557, § 1º, do CPC, em face da decisão de fls. 50/51 que negou seguimento ao agravo de instrumento.

O agravo de instrumento foi tirado de decisão que rejeitou exceção de pré-executividade oposta pela CEF.

A execução fiscal promovida pela Prefeitura do Município de São Vicente objetivando a cobrança de IPTU e respectiva taxa de sinistro.

Aduziu a CEF que o imóvel sobre qual decorre a cobrança está situado em conjunto habitacional de propriedade da União, construído por meio do Sistema PAR (Lei nº 10.188/2001) – o qual está somente sob sua administração. Destarte, é parte ilegítima para compor o polo passivo da ação, uma vez que não é proprietária ou possuidora do imóvel.

Além disso, sendo tal imóvel de propriedade da União este goza da imu-nidade, nos termos do art. 150, VI, a, da CF/1988.

Contraminuta não apresentada.

Dispensada a Revisão.

É o relatório.

Alda Basto Desembargadora Federal

voto

A Exma. Desembargadora Federal Alda Basto:

A Lei nº 10.188, de 12 de fevereiro de 2001, em seu art. 1º, instituiu o Programa de Arrendamento Residencial para atendimento da necessidade de moradia da população de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com opção de compra.

Dispõe o § 1º do art. 1º que a gestão do Programa cabe ao Ministério das Cidades e sua operacionalização à Caixa Econômica Federal – CEF.

Consoante art. 2º da Lei nº 10.188/2001, para a operacionalização do Programa de Arrendamento Residencial – PAR, fica a CEF autorizada a criar um fundo financeiro com o fim exclusivo de segregação patrimonial e contábil dos haveres financeiros e imobiliários destinados ao Programa, cujo patrimônio será constituído pelos bens e direitos adquiridos pela CEF no âmbito do Programa instituído nesta Lei e pelos recursos advindos da integralização de cotas. Para

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gerir tais atividades a CEF receberá remuneração a ser fixada pelos Ministros de Estado das Cidades.

Para a operacionalização do Programa fica a CEF autorizada a criar um Fundo Financeiro com o fim exclusivo de segregar patrimonialmente e con-tabilmente estes haveres financeiros do Programa, sujeitando-se este fundo à fiscalização do Bacen.

Este fundo será constituído de bens e direitos adquiridos pela CEF e recur-sos advindos da integralização de cotas, pouco importando a origem das cotas, reverterá à União em havendo saldo positivo (art. 2º, § 4º). Estes bens imóveis ficam sob a “propriedade fiduciária da CEF” (art. 2º, § 3º) e não se comunicam com os bens da CEF, configurando-se patrimônio exclusivo do fundo.

Nestes termos dispõe o § 3º do art. 2º da Lei nº 10.188/2001:

“Os bens e direitos integrantes do patrimônio do fundo a que se refere o caput, em especial os bens imóveis mantidos sob a propriedade fiduciária da CEF, bem como seus frutos e rendimentos, não se comunicam com o patri-mônio desta, observadas, quanto a tais bens e direitos, as seguintes restrições:

I – não integram o ativo da CEF;

II – não respondem direta ou indiretamente por qualquer obrigação da CEF;

III – não compõem a lista de bens e direitos da CEF, para efeito de liquidação judicial ou extrajudicial;

IV – não podem ser dados em garantia de débito de operação da CEF;

V – não são passíveis de execução por quaisquer credores da CEF, por mais privilegiados que possam ser;

VI – não podem ser constituídos quaisquer ônus reais sobre os imóveis.” (grifei)

Da legislação em comento, verifica-se que a gestão do programa é de competência do Ministério das Cidades, Órgão desconcentrado do Poder Exe-cutivo Federal e que os bens imóveis, mantidos sob a propriedade fiduciária da CEF, integram o patrimônio da União. Estabelece o § 4º do art. 3º, da Lei nº 10.188/2001 que o saldo positivo existente ao final do Programa será inte-gralmente revertido à União.

Evidentemente o inciso VI do art. 4º da Lei nº 10.188/2001 imputa à CEF representar o arrendador ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente, porque é gestor e operador do fundo formado pelos bens integrantes do patri-mônio da União.

Contudo, não se confunde a legitimidade da CEF em representar em juízo o arrendador ativa ou passivamente e, sua condição de sujeito passivo de

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������173

tributos porque a CEF não é contribuinte do IPTU ou das taxas de lixo e sim o arrendatário, possuidor direto do imóvel.

Advém da expressão “propriedade fiduciária” algumas considerações quanto à possibilidade de ser a CEF sujeito passivo de tributos.

A propriedade fiduciária tem natureza jurídica de arrendamento, não se confundindo com o depósito necessário, motivo pelo o legislador pela Lei nº 10.888/2001 preleciona no prólogo que esta lei “Cria o Programa de Ar-rendamento Residencial, instituiu o arrendamento residencial com opção de compra e dá outras providências”.

Sequer na alienação fiduciária, incidente apenas sobre bens móveis, no qual o fiduciante é credor ele não se configura contribuinte do IPVA, por exemplo e, se for instado a pagar eventual tributo assim o será na condição de responsável tributário quando utilizar a busca e apreensão para rever o bem para si, quando então é parte legítima para figurar no polo passivo de execução fiscal, como se pode inferir da jurisprudência do STJ (REsp 1.133.835-SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe 10.06.2010), porquanto em princípio o fidu-ciante detém apenas a posse indireta e, o fiduciário detém a posse direta, com poderes de uso e gozo, sendo este o contribuinte eleito como contribuinte do IPVA e multas. Outrossim, também se pode verificar pela jurisprudência do STJ que na hipótese de multas sobre veículos arrendados por alienação fiduciária o Banco fiduciário é considerado parte ilegítima para constar do polo passivo (REsp 1095329/SP, Relª Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 05.03.2009).

Na presente hipótese o arrendatário é o contribuinte (em tese), pois de-tém a posse direta e não a CEF, mera gestora, como se infere do art. 2º, § 2º:

§ 2º O Fundo de Arrendamento Residencial – FAR, de que trata o inciso II do caput do art. 2º da Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, terá direito e obriga-ção próprias, pelas quais responderá com seu patrimônio, não respondendo os cotista por qualquer obrigação do Fundo, salvo pela integralização das cotas que subscreverem.

Quando o legislador menciona “sob propriedade fiduciária” apenas quis deixar claro que o patrimônio do fundo e da CEF não se confundem, nem se comunicam. A propriedade fiduciária dá conotação específica a este tipo de arrendamento mas não lhe atribui qualquer obrigação tributária.

Ademais, reitero, como se infere da leitura do art. 3º, § 4º, da referida Lei o saldo positivo existente no final do Programa será integralmente revertido à União Federal, seja de onde vier a composição do patrimônio. Eventual inadim-plemento pelo arrendatário redunda em prejuízo à União e, não à CEF.

Sobre o tema, confira-se julgado desta eg. Quarta Turma:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – TAXA DE COLETA DE LIXO – IMÓVEL PARTICIPANTE DO

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PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL – LEI Nº 10.188/2001 – ILEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF – NULIDADE DA CDA

1. Os imóveis participantes do Programa de Arrendamento Residencial – PAR, instituído pela Lei nº 10.188/2001, integram o patrimônio da União Federal, cabendo, consoante o disposto no art. 1º da referida lei, ao Ministé-rio das Cidades a sua gestão, e à Caixa Econômica Federal tão somente a sua operacionalização.

2. Nulidade da Certidão da Dívida Ativa ante a ilegitimidade passiva da Cai-xa Econômica Federal.

3. Sentença anulada.

4. Apelação a que se julga prejudicada.

5. Honorários advocatícios, em favor da executada, arbitrados em 10% sobre o valor da execução.

(Apelação Cível nº 0004204-71.2009.4.03.6105/S, Relª Desª Fed. Marli Ferreira, J. 22.03.2012, por maioria)

Portanto, seria de rigor o reconhecimento da nulidade da Certidão de Dívida Ativa, em razão da ilegitimidade passiva da CEF, com a consequente extinção da execução fiscal, sem apreciação de mérito, ante a ausência de tal condição da ação.

Todavia, face ao precedente desta e. Quarta Turma relativamen-te à preliminar em comento, por ocasião do julgamento da AC 0035286-20.2008.4.03.6182, sessão de 16.08.2012, quando esta relatora foi vencida sobre este tema, entendendo-se pela legitimidade passiva da CEF na hipótese, passo à análise do mérito recursal.

A cobrança atinente ao IPTU, bem como as correlatas arguições quanto à imunidade e isenção, face à vinculação do bem ao Programa de Arrendamento Residencial – PAR, instituído pela Lei nº 10.188/2001.

De início, ressalto a imunidade tributária recíproca operar como meca-nismo de ponderação e calibragem do pacto federativo, garantindo a consecu-ção dos objetivos definidos pelo sistema jurídico, sendo igualmente uma clara salvaguarda contra o risco de utilização de tributos como instrumento de pres-são econômica entre os entes da federação (STF, ADI 3.089-2/DF).

Assim, a Carta Magna de 1988 assegura a imunidade tributária aos entes federados, vedando sejam instituídos impostos sobre o patrimônio, renda ou serviços uns dos outros, de acordo com o art. 150, VI, letra a, in verbis:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

Omissis;

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������������������������������175

VI – instituir impostos sobre:

Omissis;

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros.”

Considerando tais premissas, verifica-se o presente caso coadunar-se a tal hipótese, incidindo a imunidade constitucionalmente assegurada. Vejamos.

Como exarado inicialmente, relembro, o Governo Federal, mediante a edição da MP 1.823/1999 e reedições (MPv 2.135-24/2001), convertida na já citada Lei nº 10.188, de 12 de fevereiro de 2001, instituiu o Programa de Ar-rendamento Residencial – PAR, com o escopo de atender à necessidade de moradia da população de baixa renda, mediante o arrendamento de imóveis residenciais, com opção de compra ao final do prazo contratual fixado.

Note-se, ainda, o citado diploma legal ter delegado à CEF a qualidade Gestora do Programa de Arrendamento Residencial, cujo desempenho do en-cargo, inclusive, percebe remuneração, fixado o respectivo quantum em ato ministerial conjunto (art. 1º, §§ 1º e 2º).

Portanto, todos os recursos direcionados à implementação do PAR, espe-cialmente os imóveis adquiridos, não se incorporam ao patrimônio da CEF, pois consistem em um “fundo financeiro privado com o fim exclusivo de segregação patrimonial e contábil dos haveres financeiros e imobiliários destinados ao Pro-grama” (art. 2º). Em outras palavras, traduzem-se em recursos da União espe-cializados a um Fundo Especial, em poder de administração da Gestora, a CEF.

Diante disso, conclui-se de modo inconteste que os imóveis adquiridos pela CEF, para a consecução dos objetivos legais e constitucionais, além de não integrarem seu patrimônio, como supramencionado, conservam-se no pa-trimônio da União por substituição, ou seja, subrogam-se aos recursos do Fundo constituído pelo Governo Federal para efetivação do PAR.

Nesse passo, se os bens e direitos da União são insuscetíveis de tributa-ção, é esse o regramento aplicável quanto a tais recursos, ainda que revertidos na aquisição dos bens imóveis pela Gestora, a CEF, uma vez em nenhum mo-mento haver seu destacamento do patrimônio da União, como expressamente disposto pela legislação reguladora do tema.

Note-se, inclusive, ser obrigação legal da Gestora fazer consignar, no título aquisitivo, que o bem constitui patrimônio do fundo (art. 2º, §§ 4º e 5º), o que se depreende não só da letra da lei, como igualmente se comprova pela Certidão do Registro Imobiliário, às fl. 28/29.

Portanto, quer tais verbas estejam constituídas sob a forma de reserva ao Fundo, quer estejam especializadas em imóveis destinados ao PAR, quer retor-nem sem uso ao patrimônio da União (art. 3º, § 4º), vislumbra-se inequívoca hipótese de imunidade sobre tais bens e recursos, posto constituírem patrimônio

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da União, apenas destacado para afetação à finalidade pública preconizada pela citada Lei nº 10.188/2001.

Desse modo, não subsiste a cobrança posta quanto ao IPTU, face à alu-dida imunidade, nos termos do art. 150, VI, a, da CF/1988.

No que concernente à cobrança das taxas (remoção de lixo e sinistro) é de se consignar que tal espécie tributária não é alcançada pela imunidade recíproca, a qual é “circunscrita aos impostos, tributos para cuja incidência é indiferente a prestação de uma atividade estatal específica. Não assim quanto às taxas, atreladas que são ao fornecimento de serviços públicos ou ao exercício do poder de polícia” (AC 200261820363453, Relª Desª Fed. Regina Costa, DJF3 CJ1 de 12.01.2010, p. 211).

Nesse aspecto, considerando do que os imóveis do PAR, enquanto não alienados são de propriedade fiduciária da CEF, verifica-se sua sujeição passiva à referida obrigação (taxas).

Sem honorários, tendo em vista a sucumbência recíproca.

Ante o exposto, dou parcial provimento ao agravo.

Alda Basto Desembargadora Federal

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoAção Rescisória nº 0028310‑18.2010.404.0000/PRRelator: Des. Fed. Jorge Antonio MauriqueAutor: União Federal (Fazenda Nacional)Procurador: Procuradoria‑Regional da Fazenda NacionalRéu: Colapinus Ltda.

ementa

AÇÃO RESCISÓRIA – TRIBUTÁRIO – IPI – CREDITAMENTO RELATIVO À AQUISIÇÃO DE INSUMOS ISENTOS E SUJEITOS À ALÍQUOTA ZERO

Não há direito à utilização de créditos do IPI na aquisição de insu-mos não tributados, isentos ou sujeitos à alíquota zero. Violação aos arts. 153, § 3º, incisos I e II, e 150, § 6º, da Constituição reconhecida. Ação rescisória julgada procedente.

acórdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, deci-de a Egrégia 1ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimi-dade, julgar procedente a ação rescisória, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 06 de março de 2014.

Des. Fed. Jorge Antonio Maurique Relator

relatório

A União ajuizou ação rescisória contra Colapinus Ltda., visando, com fundamento no art. 485, V, do CPC, desconstituir acórdão da 2ª Turma deste Tribunal, que deu parcial provimento à apelação em mandado de segurança para o fim de permitir à impetrante que utilize o crédito equivalente ao IPI, referente ao período de janeiro de 1999 a agosto de 2000, nas aquisições de matérias-primas, insumos e produtos intermediários isentos, não tributados ou reduzidos à alíquota zero, empregados na fabricação dos produtos industriali-zados.

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Alega que o acórdão violou o art. 153, § 3º, I e II, da Constituição, ao autorizar o creditamento de IPI oriundo da aquisição de insumos tributados com alíquota zero, isentos e não tributados, empregados na fabricação de produtos industrializados.

À causa, atribuiu o valor de R$ 1.957,69, que corresponde ao valor da causa na ação originária, corrigido pelo IPCA-e desde a data do ajuizamento.

Citada, a parte ré não apresentou contestação.

Encerrada a instrução, o Ministério Público Federal opinou pela proce-dência da ação.

É o relatório.

voto

Competência da 1ª Seção deste Tribunal. A competência desta Seção para julgar a ação rescisória restou declarada por decisão do Ministro Mauro Campbell Marques (fls. 508 a 510).

Decadência. O prazo decadencial de dois anos para o ajuizamento da ação rescisória tem início a partir do trânsito em julgado da última decisão no processo correspondente. Nesse sentido, os seguintes precedentes do STJ: REsp 544.870/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 06.12.2004; REsp 441.252/CE, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 17.02.2003.

Não se admite o trânsito em julgado de capítulos da decisão rescindenda.

O trânsito em julgado da última decisão proferida no processo originário ocorreu menos de dois anos antes do ajuizamento da ação rescisória, não se configurando a decadência.

Súmula nº 343 do STF. Inaplicabilidade. De acordo com o art. 485, V, do CPC, a sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quan-do violar literal disposição de lei. A expressão “lei”, contida nesse dispositivo, compreende, evidentemente, a Constituição.

Aplica-se, no caso, a orientação consubstanciada na Súmula nº 63 deste Tribunal:

“Não é aplicável a Súmula nº 343 do Supremo Tribunal Federal nas ações rescisórias versando matéria constitucional.”

Decisão rescindenda. Colapinus Ltda. impetrou mandado de segurança, objetivando o reconhecimento do direito aos créditos do IPI, relativos ao pe-ríodo de janeiro/1999 a agosto/2000, nas aquisições de insumos isentos, não--tributados ou tributados à alíquota zero, que originaram a industrialização de

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produtos finais onerados por este imposto. Requereu o reconhecimento do di-reito à correção monetária desses créditos.

A segurança foi denegada.

A impetrante interpôs apelação. A 2ª Turma deste Tribunal deu parcial provimento à apelação da impetrante. O dispositivo do voto condutor do acór-dão tem o seguinte teor:

“Em face do exposto, dou parcial provimento à apelação, concedendo em parte a segurança, para o fim de permitir à impetrante que utilize o crédi-to equivalente ao IPI, referente ao período de janeiro de 1999 a agosto de 2000, nas aquisições de matérias-primas, insumos e produtos intermediá-rios, empregados na fabricação dos produtos industrializados, isentos, não--tributados ou reduzidos à alíquota de zero, para fins de apuração contábil do IPI devido. A apuração desses créditos deve ser efetuada pela aplicação da alíquota do produto final aos insumos isentos ou sujeitos à alíquota zero, apropriando-se do resultado como crédito, ou pela exclusão desses insumos da base de calculo do IPI, aplicando-se então a alíquota respectiva ao saldo.”

Juízo rescidendo. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que não há direito à utilização de créditos do IPI na aquisição de insumos não-tributados, isentos ou sujeitos à alíquota zero (RE 508708 AgR/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Ayres Britto, DJe de 05.12.2011; RE 566819/RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 10.02.2011)

O acórdão rescindendo deve ser desconstituído por violação aos arts. 153, § 3º, incisos I e II, e 150, § 6º, da Constituição.

Juízo rescisório. A apelação da impetrante deve ser desprovida, mantida a sentença que denegou a segurança.

Conclusão. Pelos motivos acima expostos, julgo procedente a ação res-cisória para, em juízo rescindendo, desconstituir o acórdão rescindendo e, em juízo rescisório, negar provimento à apelação da impetrante.

Nesta ação, condeno a ré ao pagamento de honorários advocatícios no montante de R$ 600,00.

Ante o exposto, voto por julgar procedente a ação rescisória.

Des. Fed. Jorge Antonio Maurique Relator

eXtrato de ata da sessão de 06.03.2014

Ação Rescisória nº 0028310-18.2010.404.0000/PR

Origem: PR 200070090031947

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180 ������������������������������������������������������������� RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Relator: Des. Fed. Jorge Antonio Maurique

Presidente: Des. Fed. Luiz Fernando Wowk Penteado

Procurador: Dr. Waldir Alves

Autor: União Federal (Fazenda Nacional)

Procurador: Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional

Réu: Colapinus Ltda.

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06.03.2014, na sequência 6, disponibilizada no DE de 19.02.2014, da qual foi intimado(a) União Federal (Fazenda Nacional), o Ministério Público Federal e as demais Procuradorias Federais.

Certifico que o(a) 1ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A seção, por unanimidade, decidiu julgar procedente a ação rescisória.

Ausente o Des. Fed. Joel Ilan Paciornik.

Relator Acórdão: Des. Fed. Jorge Antonio Maurique

Votante(s): Des. Fed. Jorge Antonio Maurique Juiz Federal Ivori Luís da Silva Scheffer Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona Des. Fed. Rômulo Pizzolatti Juíza Federal Carla Evelise Justino Hendges

Ausente(s): Des. Fed. Joel Ilan Paciornik

Claudia Tonetto Picarelli Diretora Substituta de Secretaria

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

10813

Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoAgravo de Instrumento nº 135404 – CE (0041716‑74.2013.4.05.0000)Agrte.: Mercantil Medeiros Ltda.Adv./Proc.: Nelson Wilians Fratoni Rodrigues e outrosAgrdo.: Fazenda NacionalProc. Originário: 5ª Vara Federal do Ceará (0010653‑78.2013.4.05.8100)Relator: Desembargador Federal Lázaro Guimarães

ementa

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – COMPENSAÇÃO DO INDÉBITO COM OUTROS TRIBUTOS (ART. 3º, § 1º DA LEI Nº 9.718/1998) – NÃO HOMOLOGAÇÃO – NOTIFICAÇÃO PARA RECOLHER OS VALORES AOS COFRES PÚBLICOS

Manifestação de Inconformidade apresentada. Mantida a cobrança dos débitos fiscais. A hipótese dos autos não cuida de declaração de compensação – PER/DCOMP (prevista no § 1º do art. 74 da Lei nº 9.430/1996) distinta, portanto, da não homologação de compen-sação, pois inexiste decisão administrativa impugnável sob os dita-mes do art. 74 da Lei nº 9.430/1996, sendo incabível a apresentação da manifestação de inconformidade prevista no art. 74, § 9º, da Lei nº 9.430/1996, e a atribuição de efeito suspensivo previsto no § 11 do referido dispositivo legal. Agravo de instrumento improvido.

acórdão

Vistos etc.

Decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 11 de fevereiro de 2014 (data do Julgamento).

Desembargador Federal Lázaro Guimarães Relator

relatório

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Lázaro Guimarães (Relator): Trata--se de agravo de instrumento interposto contra decisão proferida pelo MM. Juiz

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182 ������������������������������������������������������������� RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Federal da 5ª Vara da Seção Judiciária do Ceará, Dr. João Luis Nogueira Matias, que, em sede de mandado de segurança, indeferiu o pedido de, através do qual postulava que a autoridade impetrada conhecesse e desse seguimento à defesa administrativa apresentada contra a não homologação da compensação no Pro-cesso Administrativo sob o nº 10380.725218/2013-20 (CDAs 30.7.13.00030067 e 30.6.13.00198939), e se abstivesse de promover a cobrança dos créditos rela-cionados, bem como de restringir a emissão de Certidão Negativa de Débito ou Certidão Positiva com efeito de Negativa.

Alega, em breve síntese, que com base no art. 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/2009, deve a autoridade agravada conhecer e dá seguimento à defesa administrativa apresentada, relativa à cobrança feita por meio do processo ad-ministrativo de nº 10380.725218/2013-20, atribuindo-lhe seu efeito suspensivo nos termos dos art. 151, III do CTN, art. 74, § 9º e 11, da Lei nº 9.430/1996, e art. 66, §§ 4º e 5º, da IN SRF 900/2008.

Pugna também, que a autoridade agravada se abstenha de promover a cobrança relativa aos demais períodos supostamente devidos, até que a ma-nifestação de inconformidade seja definitivamente apreciada pela autoridade competente.

Ao final, requer a atribuição de medida liminar ao presente recurso em face do risco de lesão grave e de difícil reparação às finanças da empresa, ante a impossibilidade de obtenção de Certidão Negativa de Débito ou Certidão Po-sitiva com efeito de Negativa, que são necessárias à continuidade da prestação de serviços a órgãos públicos.

Contrarrazões apresentadas.

É o relatório.

Desembargador Federal Lázaro Guimarães Relator

voto

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Lázaro Guimarães (Relator): Na hi-pótese dos autos, a agravante requer provimento jurisdicional,visando o pros-seguimento da Manifestação de Inconformidade apresenta contra ato admi-nistrativo que não homologou a compensação, e ato contínuo, atribua efeito suspensivo, nos termos do art. 74,§§ 9º e 11 da Lei nº 9.430/1996.

De acordo com o art. 74 da Lei nº 9.430/1996, a operacionalização das compensações efetuadas pelo contribuinte, inclusive de créditos reconhe-cidos judicialmente, após o trânsito em julgado, deve ser processada através da apresentação de declaração de compensação gerada a partir do programa PER/DCOMP.

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No caso, em apreço, no procedimento de auditoria interna na qual se constatou a ocorrência de declaração indevida em DCTF, restou verificada a insubsistência da suspensão da exigibilidade de crédito tributário, em face da utilização de procedimento indevido pela impetrante que mantinha suspensos os créditos tributários na DCTF sem nenhuma decisão judicial, posto que a ação judicial informada pelo contribuinte refere-se a tributo diverso daqueles cuja exigibilidade foi informada como suspensa na DCTF. Conclui-se que o fisco procedeu a regular cobrança dos créditos e após foi apresentada a referida manifestação de inconformidade.

Assim, de acordo com a decisão MM. Juiz a quo, a hipótese dos autos não cuida de declaração de compensação – PER/DCOMP (prevista no § 1º do art. 74 da Lei nº 9.430/1996) distinta, portanto, da não homologação de com-pensação, pois inexiste decisão administrativa impugnável sob os ditames do art. 74 da Lei nº 9.430/1996, sendo incabível a apresentação da manifestação de inconformidade prevista no art. 74, § 9º, da Lei nº 9.430/1996, e a atribuição de efeito suspensivo previsto no § 11 do referido dispositivo legal.

Portanto, sendo constatada a regularidade na cobrança efetuada pela Re-ceita Federal, inviabiliza a expedição da Certidão Negativa de Débito ou Certi-dão Positiva com efeito de Negativa.

Ante tais considerações, nego provimento ao agravo de instrumento.

É como voto.

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Parte Geral – Ementário de Jurisprudência10814 – Benefício fiscal – Tare – invalidação – convênio – exigência“Embargos de declaração. Constitucional e tributário. Ação civil pública. Termo de acordo de re-gime especial. Tare. Invalidação. Invasão de competência legislativa. Matéria tributária reservada exclusivamente à lei complementar. Benefício fiscal. Exigência de convênio. Alteração de alí-quotas. Impossibilidade. Invasão da competência do senado federal. Invalidação do ajustamento. Preliminares. Rejeição. Adequação da via eleita. Interesse de agir. Objeto. Desaparecimento. Omissão. Vício inexistente. Rediscussão da causa. Via inadequada. Rejeição. Prequestionamen-to. 1. Os embargos de declaração consubstanciam instrumento de aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, destinando-se etiologicamente a purificar o julgado das omissões, contradições, obscuridades ou dúvidas que o enodoam, não traduzindo o instrumento adequado para rediscus-são das questões elucidadas nem ao reexame da causa, pois, examinando de modo exauriente as matérias debatidas e entregando a tutela reclamada, esgota sua destinação e o seu alcance. 2. Aferido que as questões reprisadas foram objeto de expressa e literal resolução, ensejando a apreensão de que o julgado não deixara remanescer nenhuma matéria pendente de elucidação, e que a resolução que empreendera é clara o suficiente para viabilizar a assimilação do decidido sem qualquer trabalho exegético ante a literalidade do que nele está estampado, obstando a qua-lificação de vícios aptos a tornarem opaco o desenlace ao qual chegara, denotando que a parte almeja simplesmente rediscutir o decidido, a rejeição da pretensão declaratória consubstancia imperativo legal. 3. Ainda que agitados para fins de prequestionamento, os embargos de decla-ração não estão eximidos da indispensabilidade de se conformarem com as hipóteses de cabi-mento expressamente assinaladas pelo legislador processual, ensejando que, em não padecendo o julgado dos vícios passíveis de serem sanados através de simples complementação, devem ser refutados por não consubstanciarem o instrumento adequado para rediscussão da causa, deven-do o reexame e reforma do decidido ser perseguidos através do instrumento recursal apropriado para esse desiderato. 4. A edição de lei – Lei nº 4.732/2011 – autorizando a remissão do crédito tributário que deixara de ser recolhido ante termo de acordo de regime especial – Tare firmado entre sociedade empresarial e o ente federativo distrital, aliado ao fato de que encerra inovação legal, não afeta o objeto da ação civil pública que tem como objeto justamente a invalidação de aludido instrumento, com os efeitos inerentes a essa resolução, inclusive a imposição de obriga-ção à beneficiada de recolhimento da exação não recolhida, à medida que o favor legal somente poderá ser aferido se reconhecida ilegalidade do negócio e a subsistência da obrigação tributária, devendo a argüição, portanto, ser elucida em momento subseqüente à resolução da pretensão formulada com o escopo de desconstituir o ajustamento levado a efeito. 5. Embargos conheci-dos e desprovidos. Unânime.” (TJDFT – EDcl 20020110860725 – (765284) – Rel. Des. Teófilo Caetano – DJe 07.03.2014 – p. 58)

10815 – Cide – contribuição ao Incra – natureza jurídica – empresas urbanas – exigibilida-de – possibilidade

“Processual civil. Tributário. Contribuição ao Incra. Natureza jurídica. Contribuição de interven-ção no domínio econômico. Não extinção pelas Leis nºs 7.787/1989, 8.212/1991 e 8.213/1991. Exigibilidade de empresas urbanas. Possibilidade. Matéria constitucional. Art. 149 da CF. Aná-lise em recurso especial. Inadmissibilidade. 1. Hipótese em que o acórdão a quo consignou ser cabível a contribuição ao Incra porque esta visa cobrir os riscos aos quais está sujeita toda a coletividade de trabalhadores. 2. A exação destinada ao Incra não foi extinta com o advento das Leis nºs 7.787/1989, 8.212/1991 e 8.213/1991, mas permanece em vigor como Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico. Precedentes do STJ. 3. A 1ª Seção firmou posicionamento de que é legítimo o recolhimento da Contribuição Social para o Funrural e o Incra pelas empre-sas vinculadas à previdência urbana. 4. Orientação reafirmada pela 1ª Seção ao julgar o REsp 977.058/RS, sob o rito dos recursos repetitivos. 5. Ademais, não compete ao STJ, em julgamento de recurso especial, apreciar alegação de violação de matéria constitucional, ainda que para fins de prequestionamento, sob pena de usurpação da competência do STF (art. 102, III, da CF/1988). 6. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 433.203 – (2013/0380104-9) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 07.03.2014 – p. 257)

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10816 – Cofins – corretoras de seguros – alíquota – majoração – inaplicabilidade

“Tributário. Cofins. Empresas corretoras de seguros. Majoração da alíquota de 3% para 4%. Ina-plicabilidade. Precedentes. Entendimento pacífico do STJ. 1. Esta Corte Superior firmou entendi-mento no sentido de que as empresas corretoras de seguros, responsáveis por intermediar a capta-ção de interessados na realização de seguros, não podem ser equiparadas aos agentes de seguros privados (art. 22, § 1º, da Lei nº 8.212/1991), cuja atividade é típica das instituições financeiras na busca de concretizar negócios jurídicos nas bolsas de mercadorias e futuros. Dessa forma, a majoração da alíquota da Cofins (art. 18 da Lei nº 10.684/2003), de 3% para 4%, não alcança as corretoras de seguros. Precedentes: AgRg-AREsp 341.247/RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, Julgado em 22.10.2013, DJe 29.10.2013 e AgRg-AREsp 399.638/SC, Relª Min. Eliana Calmon, Primeira Turma, Julgado em 26.11.2013, DJe 03.12.2013. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AG-REsp 360.056 – (2013/0193081-0) – 1ª T. – Rel. Min. Sérgio Kukina – DJe 14.02.2014 – p. 292)

10817 – Cofins – corretoras de seguro – alíquota de 4% – aplicabilidade

“Tributário. Cofins. Sociedades corretoras de seguro. Rol do art. 22, § 1º, da Lei nº 8.212/1991. Alíquota de 4% prevista na Lei nº 10.684/2003. Aplicabilidade. 1. Cinge-se a controvérsia à apli-cabilidade do rol previsto no art. 22, § 1º, da Lei nº 8.212/1991 às sociedades corretoras de segu-ro, para fins de recolhimento da Cofins na alíquota de 4%, conforme prevê a Lei nº 10.684/2003. 2. Apesar de não se desconhecer a existência de precedentes em sentido contrário, a matéria foi amplamente rediscutida por esta 2ª Turma no julgamento do REsp 555.315/RJ (Rel. p/o Ac. Min. Castro Meira). 3. Na análise do extenso rol do § 1º do art. 22, verifica-se que o dispositivo abarca instituições financeiras (bancos comerciais, bancos de investimentos, etc.), supervisionadas pelo Banco Central, e empresas que atuam no ramo de seguros, reguladas pela Susep. 4. Esforço exe-gético que concluísse de forma diversa quanto à extensão do significado do termo ‘sociedades corretoras’ implicaria criar distinção injusta com os agentes autônomos de seguros privados que realizam atividades de espécie correlata sem o suporte de aparelhamento corporativo. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-EDcl-AgRg-Ag-REsp 342.463 – (2013/0147026-0) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 06.03.2014 – p. 908)

10818 – Compensação – precatório – ente político diverso – impossibilidade

“Tributário. Precatórios judiciais. Compensação. Pessoa jurídica diversa. Impossibilidade. Pre-cedentes. Súmula nº 83/STJ. Precatório e dinheiro. Equivalência inexistente. Precedentes. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de considerar impossibilitada a compensação de créditos tributários federais com precatórios estaduais, ante a inexistência de identidade entre devedor e credor. Precedentes. Súmula nº 83/STJ. 2. A Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.090.898/SP, Rel. Min. Castro Meira, submetido ao rito dos recursos repeti-tivos – art. 543-C do CPC e da Resolução nº 8/2008 do STJ – consolidou o entendimento segundo o qual a penhora de precatórios judiciais é permitida. Todavia, equivale a penhora de direitos e ações, como consta do art. 11, inciso VIII, da LEF e do art. 655 do CPC, e não a dinheiro, logo, lícita a recusa pelo credor, quando a nomeação não observa a ordem legal. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AG-REsp 437.861 – (2013/0388915-5) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 14.02.2014 – p. 372)

Comentário Editorial SÍNTESEÉ possível a compensação de tributos federais utilizando precatório emitido estado?

Em torno dessa questão girou o debate do acórdão ora comentado.

Nessa toada, cumpre trazer à baila os ensinos do constitucionalista Celso Ribeiro Bastos acerca dos precatórios:

“[...] em linhas gerais, o precatório é uma requisição judicial expedida ao Presidente do Tribunal pelo juiz da execução da sentença em que a Fazenda Pública foi condenada a paga-mento de quantia certa, a fim de que sejam expedidas as necessárias ordens de pagamento

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186 �����������������������������������������������������������������������������RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

às respectivas repartições competentes.” (Comentários à constituição brasileira. São Paulo: Saraiva, 4º v., t. III, p. 47)

Define ainda a Professora Maria Helena Diniz sobre a definição de precatório: “A requisição de pagamento ou prestação pecuniária, que é objeto da execução contra a Fazenda Pública, contendo peças obrigatórias exigidas pelo Regimento do Tribunal, pelo juízo da execução ou indicadas pelas partes, tais como: petição inicial, procuração, contestação, sentença de primeiro grau, acórdão do Tribunal, petição inicial da execução, sentença que julgou a liqui-dação, conta de liquidação, firma reconhecida do Magistrado e autenticação das peças que foram juntadas por cópia. A requerimento do autor, o juízo da execução promove o envio do aludido ofício ao presidente do Tribunal para que este, após ouvir o Ministério Público e obter parecer favorável, requisite a verba junto à autoridade administrativa” (Dicionário Jurídico. Atlas, 1998).

Já o instituto da compensação é uma das modalidades extintivas da obrigação tributária, utilizada quando as figuras do credor e do devedor se confundem. Ou seja, caso seja credora de um tributo federal, tenho um precatório para tanto e tenho tributos a pagar para o mesmo ente, posso fazer a compensação do que devo, até o limite do valor que me é devido.

Ocorre que, no caso em tela, entendeu o Ministro Relator pelo não provimento do agravo, pois que o que se buscou foi a compensação de créditos tributários federais com precatórios estaduais, e em um caso como este, embora o emitente do precatório seja ente político, assim como o ente a quem é devido o tributo, são pessoas distintas. Uma é a União Federal, outra, Estado-membro da Federação.

Para finalizar, trazemos à baila ementas no mesmo sentido:

“PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO – RECURSO ESPECIAL – TRI-BUTÁRIO – PRECATÓRIO DEVIDO POR PESSOA JURÍDICA DISTINTA – IMPOSSIBILIDADE DE EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – 1. A orientação de ambas as Turmas integrantes da Primeira Seção desta Corte é firme no sentido de não ser possível a compensação de tribu-to com precatório devido por ente público diverso. 2. Precedentes: AgRg-AREsp 125.196/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 15.02.2013; AgRg-AREsp 115.109/RS, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25.05.2012; e AgRg-AREsp 94.667/BA, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 02.04.2012. Agravo regimental não pro-vido.” (STJ, AgRg-AREsp 338.792/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, Julgado em 13.08.2013, DJe 20.08.2013)

“TRIBUTÁRIO – PROCESSUAL CIVIL – PRECATÓRIO ESTADUAL – COMPENSAÇÃO COM CRÉDITO TRIBUTÁRIO FEDERAL – PESSOAS JURÍDICAS DISTINTAS – IMPOSSIBILIDADE

1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, impossível a compensação de precatórios es-taduais com dívidas oriundas de tributos federais, ante a inexistência de identidade entre devedor e credor, pessoas jurídicas manifestamente distintas. Precedentes: AgRg-AREsp 94.667/BA, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 02.04.2012 e AgRg-AREsp 125.196/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 15.02.2013.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg-AREsp 334.227/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 06.08.2013, DJe 15.08.2013)

“TRIBUTÁRIO – AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC – NÃO OCORRÊNCIA – PRECATÓRIO ESTADUAL – COMPENSAÇÃO COM TRIBUTOS FEDERAIS – IMPOSSIBILIDADE – PRECEDENTES – 1. Caso em que a agravante pretende a compensação de precatórios referentes ao Estado da Bahia com tributos de competência da União. 2. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que o art. 78, § 2º, do ADCT da Constituição Federal é claro ao referir-se ao poder liberatório do pagamen-to de tributos da mesma entidade devedora; o que afasta sua aplicação no caso concreto. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ, AgRg-AREsp 94.667/BA, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, Julgado em 27.03.2012, DJe 02.04.2012)

10819 – Contribuição corporativa – CRC – exercício profissional – anuidade – fato gerador – registro no conselho

“Tributário. Agravo regimental no recurso especial. Conselho Regional de Contabilidade. Exer-cício profissional. Anuidades. Fato gerador. Registro. Agravo não provido. 1. O fato gerador da anuidade dos contabilistas é o registro, nos termos do art. 21 do Decreto-Lei nº 9.295/1946.

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2. A presunção de liquidez e certeza que goza a dívida inscrita na CDA não é absoluta, podendo ser afastada mediante prova inequívoca. O contribuinte que pretende se exonerar da cobrança deverá pleitear o cancelamento e comprovar com eficácia ex tunc que não exercia efetivamente a profissão. 3. Comprovação da parte de que não mais exercia a profissão. A incursão no contexto fático-probatório dos autos a fim de modificar o entendimento firmado pelo Tribunal de origem é defesa em sede de recurso especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.365.711 – (2013/0025628-0) – 1ª T. – Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima – DJe 25.02.2014 – p. 1456)

10820 – Contribuição previdenciária – desconto – contrato de trabalho temporário

“Tributário. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Contrato de trabalho temporá-rio. Contribuição previdenciária. Desconto. Ilegitimidade passiva do Município. Exame de lei local. Súmula nº 280 do STF. Incidência. Divergência jurisprudencial. Não comprovação nos moldes legais. 1. Quanto ao exame acerca da alegada ilegitimidade do Município agravante, tal como enfrentada a questão pelas instâncias ordinárias, exigiria a análise da Lei Municipal nº 3.188/2006, pretensão insuscetível de ser apreciada em recurso especial, conforme a Súmu-la nº 280/STF (‘Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário’). Precedente: AgRg--AREsp 402.917/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, Julgado em 05.11.2013, DJe 12.11.2013). 2. Não se conhece do recurso especial no tocante à alínea c do permissivo constitucional quando a divergência jurisprudencial não é demonstrada na forma exigida pelos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 470.198 – (2014/0021394-0) – 1ª T. – Rel. Min. Sérgio Kukina – DJe 06.03.2014 – p. 844)

Comentário Editorial SÍNTESEO acórdão em comento adveio de agravo regimental interposto por Município brasileiro contra decisão que negou provimento a agravo em recurso especial

Alegou a agravante que “não se aplica ao caso vertente o enunciado da Súmula nº 280 do STF, eis que não se pretende analisar legislação local, é tanto que o Município, nas razões do agravo, persiste em demonstrar que ocorreu violação art. 3º do CPC, na medida em que não foi acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva, pois a lei municipal foi invocada na presente demanda apenas para comprovar a condição de autarquia municipal do Vitória Prev, já que a referida lei foi responsável pela sua criação e regulamentação”.

Alega, outrossim, não ser parte legítima para figurar no polo passivo da lide, e que o dissídio jurisprudencial foi comprovado com a juntada das cópias integrais dos julgados.

Ao analisar o caso, entendeu o Ministro Relator pelo não acolhimento do agravo, por entender que não houve argumentos da agravante aptos a desconstituir os fundamentos da decisão recorrida, e os transcreveu para justificar, conforme segue:

“Trata-se de agravo manejado pelo Município de Vitória de Santo Antão contra decisão que não admitiu recurso especial, este interposto com fundamento no art. 105, III, a e c, da CF, desafiando acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, assim ementado (fl. 238):

EMENTA: ADMINISTRATIVO – CONTRATO POR NECESSIDADE TEMPORÁRIA E DE EXCEP-CIONAL INTERESSE PÚBLICO – DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS REALIZADOS INDEVIDA-MENTE – LEGITIMIDADE PASSIVA RECONHECIDA NA QUALIDADE DE EXECUTOR DOS DESCONTOS – VERBAS SALARIAIS ATRASADAS – ÔNUS DA PROVA DOS FATOS MODIFI-CATIVOS, EXTINTIVOS E IMPEDITIVOS DO DIREITO É DO RÉU, NOS TERMOS DO ART. 333, II, DO CPC – INEXISTÊNCIA DE PROVAS DO ADIMPLEMENTO – RECURSO IMPROVIDO – DECISÃO UNÂNIME.

1. Não merece prosperar o argumento de ilegitimidade passiva, pois conforme apontam as fichas financeiras que instruem os autos, a fazenda municipal realizou os descontos afirmados na exordial em favor da autarquia previdenciária local. Ou seja, o Município é parte legítima na qualidade de executor dos descontos.

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2. Quanto à condenação ao pagamento das verbas trabalhistas, não há que se falar em natu-reza indenizatória, conforme pretendeu induzir o município recorrente, pois estas são verbas salariais devidas como contraprestação dos trabalhos realizados.

3. Em verdade, o não pagamento de tais verbas importa em evidente afronta aos princípios da dignidade da pessoa humana e da moralidade administrativa, e não possui qualquer respaldo no ordenamento jurídico. Entendimento diverso significaria admitir que a municipalidade se locupletasse indevidamente da força de seus funcionários, em evidente enriquecimento ilícito.

4. Recurso de agravo improvido.

5. Decisão unânime.

Opostos embargos declaratórios, foram rejeitados (fls. 256/261).

Nas razões do recurso especial, a parte agravante aponta, além de divergência jurisprudencial, violação ao art. 3º do CPC. Sustenta, em síntese, a ilegitimidade passiva da municipalidade.

É o relatório.

O inconformismo não prospera.

No que se refere à questão da ilegitimidade passiva do Município de Vitória de Santo Antão, destaca-se do acórdão recorrido (fl. 241):

Observo, de início, que não merece prosperar o argumento de ilegitimidade passiva, pois conforme apontam as fichas financeiras que instruem os autos, a fazenda municipal realizou os descontos afirmados na exordial em favor da autarquia previdenciária local. Ou seja, o município é parte legítima na qualidade de executor de descontos.

É imperioso destacar que a Lei Municipal, que rege os contratos temporários, atribui ao Regi-me Geral de Previdência Social (INSS) a competência para o recolhimento das contribuições previdenciárias dos funcionários contratados sob este regime, restando evidente, portanto, a ilegitimidade dos descontos em prol do Vitória Prev.

Por seu turno, o recorrente sustenta (fl. 270):

No caso dos autos, o Município da Vitória de Santo Antão é parte ilegítima para figurar no pólo passivo da demanda, haja vista que, após o repasse, o ganho financeiro da verba debitada em folha foi da autarquia – Vitória Prev.

O Vitória Prev é uma autarquia municipal instituída pela Lei nº 3.188/2006 e que integra a administração indireta, sendo portadora de personalidade jurídica própria em relação ao Município da Vitória de Santo Antão, ora recorrente.

Com efeito, a supramencionada entidade deverá responder em nome próprio e através do patrimônio que lhe é peculiar, tendo em vista sua autonomia administrativa e financeira.

Verifique-se:

[...]

Verifica-se, ao compulsar a Lei nº 3.188, que não há como atribuir ao recorrente o dever de responder pelos valores repassados ao fundo próprio, por simples falta de interesse e legitimidade.

Assim, o exame acerca da alegada ilegitimidade do Município agravante, tal como enfrentada a questão pelas instâncias ordinárias e colocada pelo ora recorrente, exigiria a análise da Lei Municipal nº 3.188/2006, pretensão insuscetível de ser apreciada em recurso especial, conforme a Súmula nº 280/STF (‘Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário’).

Nesse sentido, os seguintes precedentes:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RE-CURSO ESPECIAL – SERVIDOR PÚBLICO – DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS INDEVIDOS – LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO DE VITÓRIA DE SANTO ANTÃO – ANÁLISE DE LEI LOCAL E REEXAME DE PROVAS – SÚMULAS NºS 280/STF E 7/STJ – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CARACTERIZADA.

1. Examinar legislação local é expediente inviável na estreita via do recurso especial, ao qual se aplica, por analogia, a Súmula nº 280 do STF: ‘Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário’.

2. Inviável, também, a análise de pretensão que demanda o revolvimento do conjunto fático--probatório dos autos.

Incidência da Súmula nº 7/STJ.

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3. Não havendo o recorrente demonstrado, mediante a realização do necessário cotejo ana-lítico, a existência de similitude das circunstâncias fáticas e o direito aplicado nos acórdãos recorrido e paradigmas, resta desatendido o comando dos arts. 541 do CPC e 255 do RISTJ.4. Agravo regimental não provido.(AgRg-AREsp 420.525/PE, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, Julgado em 21.11.2013, DJe 29.11.2013)ADMINISTRATIVO – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO – CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO – ILEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO – EXAME DE LEI LOCAL – SÚMU-LA Nº 280 DO STF – INCIDÊNCIA – PRESCRIÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA – PRAZO QUINQUENAL.1. ‘A solução da controvérsia acerca legitimidade do Município de Vitória de Santo Antão para figurar no pólo passivo da demanda depende da interpretação da Lei Municipal 3.188/2006, o que é inviável em sede especial, em razão da vedação presente na Súmula nº 280 do STF.’ (AgRg-AREsp 173.373/PE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª Turma, Julgado em 26.06.2012, DJe 02.08.2012) 2. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que, nos termos do disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, o prazo prescricional para propositura de ação de qual-quer natureza contra a Fazenda Pública é quinquenal.3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg-AREsp 376.194/PE, de minha relato-ria, 1ª Turma, Julgado em 10.09.2013, DJe 17.09.2013)Por fim, o recurso especial não pode ser conhecido no tocante à alínea c do permissivo cons-titucional. Isso porque o dissídio jurisprudencial não foi demonstrado na forma exigida pelos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ. Com efeito, a parte recorrente não procedeu ao necessário cotejo analítico entre os julgados, deixando de evidenciar o ponto em que os acórdãos confrontados, diante da mesma base fática, teriam adotado a alegada solução jurídica diversa.Como consignado na decisão agravada, mostra-se inafastável a incidência da Súmula nº 280/STF (‘Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário’). Com efeito, o exame acerca da alegada ilegitimidade do Município agravante, tal como enfrentada a questão pelas instâncias ordinárias, exigiria a análise de dispositivos da Lei Municipal nº 3.188/2006, pretensão insuscetível de ser apreciada na via do recurso especial.”

10821 – Contribuição previdenciária – IPSM/MG – inconstitucionalidade – repetição do indébito – art. 1º-F da Lei nº 9.494, de 1997 – dívidas de natureza tributária – ina-plicabilidade

“Tributário. Processual civil. Contribuição previdenciária. IPSM/MG. Inconstitucionalidade. Re-petição do indébito. Art. 1º-F da Lei nº 9.494, de 1997. Inaplicabilidade a dívidas de natureza tributária. Decisão mantida. 1. A Primeira Seção do STJ, por unanimidade, na ocasião do julga-mento do Recurso Especial repetitivo nº 1.270.439/PR, pacificou entendimento segundo o qual o art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997 não é aplicável à repetição de indébito tributário, tendo em vista que, esta última, possui regras específicas, as quais prevalecem sobre o disposto no artigo referi-do. 2. A pendência de julgamento no STF de ação em que se discute a constitucionalidade de lei não enseja o sobrestamento dos recursos que tramitam no STJ. É cabível o exame de tal pretensão somente em eventual juízo de admissibilidade de recurso extraordinário interposto nesta Corte Superior. 3. Nos termos da jurisprudência do STJ, para aplicação do art. 543-C do CPC é desne-cessário que o recurso especial representativo de matéria repetitiva tenha transitado em julgado. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1.424.804 – (2013/0408518-2) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 24.02.2014 – p. 470)

10822 – Crédito tributário – fiança bancária – suspensão da exigibilidade do crédito tribu-tário – impossibilidade

“Processual civil e tributário. Agravo regimental no recurso especial. Fiança bancária. Suspensão da exigibilidade do crédito tributário. Impossibilidade. 1. A 1ª Seção deste Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp 1.156.668/DF, submetido ao rito dos repetitivos, firmou compreensão no sentido de que a carta de fiança bancária, por não corresponder ao depósito do montante integral

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do tributo, não suspende a exigibilidade do crédito tributário. Outros precedentes: EDcl-AREsp 173.841/PE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª Turma, Julgado em 01.10.2013, DJe 14.10.2013 e REsp 1.215.750/RS, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, Julgado em 14.05.2013, DJe 20.05.2013. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 985.660 – (2007/0211774-3) – 1ª T. – Rel. Min. Sérgio Kukina – DJe 06.03.2014 – p. 848)

10823 – Empréstimo compulsório – combustíveis – prescrição “Tributário. Empréstimo compulsório sobre combustíveis. Prescrição da pretensão executória. Súmula nº 150/STF. Ausência de vício do julgado. 1. Os embargos declaratórios são cabíveis para a modificação do julgado que se apresenta omisso, contraditório ou obscuro, bem como para sanar eventual erro material na decisão. 2. A jurisprudência tem entendido que a liquidação é ainda fase do processo de cognição, só sendo possível iniciar a execução quando o título, com o trânsito em julgado da sentença de conhecimento, apresenta-se também líquido, e no caso dos autos, o acórdão assentou que os exeqüentes concordaram com os cálculos em 26.06.2002. Tendo ocorrida a citação da Fazenda em 10.10.2005, não há falar em prescrição. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-REsp 1.403.393 – (2013/0300172-0) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 07.03.2014 – p. 336)

10824 – Execução fiscal – ausência de indicação e de assinatura do depositário do bem no auto de penhora – irregularidade sanável – encargo de depositário – nomeação – recusa – possibilidade

“Tributário. Execução fiscal. Agravo de instrumento. Ausência de indicação e de assinatura do depositário do bem no auto de penhora. Irregularidade sanável. Encargo de depositário. Nomea-ção. Recusa. Possibilidade. Recurso parcialmente provido. A falta de indicação e de assinatura do depositário do bem no auto de penhora e depósito constitui mera irregularidade formal e sanável. Precedentes do STJ e desta Corte. No tocante à nomeação do depositário, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de que o encargo de depositário não pode ser imposto coercitivamente ao devedor, podendo ser admitida a sua recusa em aceitar tal encargo. Com efeito, observo não existir nos autos elementos capazes de modificar o entendimento adotado pelo então Relator Juiz Federal Convocado no momento em que deferiu, em parte, a antecipação dos efeitos da tutela recursal, razão pela qual adoto a aludida motivação como fundamento do voto, ora pro-ferido. Agravo de instrumento parcialmente provido. Prejudicados os embargos de declaração e o pedido de reconsideração formulado em sede de contraminuta.” (TRF 3ª R. – AI 0020888-14.2013.4.03.0000/SP – 4ª T. – Relª Desª Fed. Mônica Nobre – DJe 10.02.2014 – p. 953)

10825 – Execução fiscal – CDA – requisitos legais de validade – liquidez e certeza – ausência“Tributário. Execução fiscal. CDA. Requisitos legais de validade. Falta de liquidez e certeza. Sú-mula nº 7/STJ. 1. A verificação da liquidez e certeza da CDA ou, ainda, da presença dos requisitos essenciais à sua validade, demanda o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos, o que é vedado em sede de recurso especial (Súmula nº 7/STJ). 2. Não subsiste negativa de presta-ção jurisdicional, ausência de fundamentação ou omissão, quando o acórdão impugnado aplica tese jurídica regularmente fundamentada, promovendo o desfecho da controvérsia, ainda que de forma diversa ou contrária ao entendimento da parte recorrente, impondo-se afastar eventual ofen-sa ao art. 535, II, do Código de Processo Civil. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1.421.090 – (2013/0390463-3) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 24.02.2014 – p. 463)

10826 – Execução fiscal – honorários advocatícios – 5% sobre o valor da causa – exorbi-tância – inocorrência

“Agravo regimental no recurso especial. Tributário. Execução fiscal. Valor da causa de aproxi-madamente R$ 164.000,00. Honorários advocatícios fixados em 5% sobre este valor. Possibi-lidade. Alegação de exorbitância. Inocorrência. Agravo regimental a que se nega provimento. 1. O critério para a fixação da verba honorária deve levar em conta, sobretudo, a razoabilidade do seu valor, em face do trabalho profissional advocatício efetivamente prestado, não devendo

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altear-se a culminâncias desproporcionais e nem ser rebaixado a níveis claramente demeritórios, não sendo determinante para tanto apenas e somente o valor da causa; a remuneração do advo-gado há de refletir, também, o nível de sua responsabilidade, não devendo se orientar, somente, pelo número ou pela extensão das peças processuais que elaborar ou apresentar. 2. No caso em apreço, o valor dado à causa chega à cifra de aproximadamente R$ 164.000,00, e os honorários advocatícios fixados em 5% sobre este valor não se mostram exorbitantes; ademais, massiva e já pacificada é a jurisprudência de que a exequente poderia – e até deveria – ter sido ponderado an-tes da promoção da iniciativa judicial – e não somente após tal iniciativa. 3. Agravo regimental da Fazenda Nacional a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.393.923 – (2013/0225916-1) – 1ª T. – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – DJe 14.02.2014 – p. 332)

10827 – Execução fiscal – inclusão do sócio – CDA – dissolução irregular após retirada do sócio – efeitos

“Agravo legal. Agravo de instrumento. Inclusão de sócio. Nome na CDA. Inteligência do art. 135 do CTN. Dissolução irregular posterior à retirada do sócio. Bem de família. Lei nº 8.009/1990. Agravo improvido. No que tange à exclusão dos sócios do pólo passivo ação, cumpre dizer que por força de decisão proferida em sede de recurso repetitivo pelo Supremo Tribunal Federal (RE 562.276/PR), foi reconhecida a inconstitucionalidade material do art. 13 da Lei nº 8.620/1993. Também restou decidido que o art. 13 da Lei nº 8.620/1993 é inconstitucional na parte que determinou que os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada responderiam solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade Social. Consoante es-tabelecido no julgado proferido pelo Supremo Tribunal Federal, o art. 135, III, do CTN respon-sabiliza apenas aqueles que estejam na direção, gerência ou representação da pessoa jurídica e tão somente quando pratiquem atos com excesso de poder ou infração à lei, contrato social ou estatutos. Assim, o pressuposto de fato ou hipótese de incidência da norma de responsabilida-de, no art. 135, III, do CTN, é a prática de atos, por quem esteja na gestão ou representação da sociedade, com excesso de poder ou a infração à lei, contrato social ou estatutos e que tenham implicado, se não o surgimento, ao menos o inadimplemento de obrigações tributárias. Ora, ainda que se considere o mero inadimplemento de tributos por força do risco do negócio, bem como o mero atraso no pagamento de tributos, incapaz de fazer com que os sócios com poderes de gestão respondam com seu patrimônio por dívida da sociedade, o mesmo não ocorre quando há dissolução irregular da sociedade, devidamente comprovada por meio de diligência realizada por meio de oficial de justiça, posto que há o descumprimento de deveres por parte dos sócios gerentes/administradores da sociedade (cf. Súmula nº 475 do STF). A admissão da corresponsa-bilidade dos sócios, simplesmente pelo só fato de terem seu nome gravado na CDA, significa reconhecer, ao final, que a CDA é documento dissociado da realidade administrativa ou, por outro lado, decorre do até recentemente aplicado aos créditos tributários-previdenciários art. 13 da Lei nº 8.620/1993. Em conclusão, a falta de pagamento de tributo não configura, por si só, nem em tese, circunstância que acarrete a responsabilidade subsidiária do sócio. É indispensável, para tanto, que tenha agido com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da empresa. O sócio deve responder pelos débitos fiscais do período em que exerceu a administração da sociedade apenas na hipótese de restar provado que agiu com dolo ou fraude e exista prova de que a sociedade, em razão de dificuldade econômica decorrente desse ato, não pôde cumprir o débito fiscal. Na hipótese de o sócio gerente/administrador da sociedade ter pro-vocado a dissolução irregular da sociedade, descumprindo dever formal de encerramento regular das atividades empresariais, é cabível sua responsabilização, por força da aplicação da Súmula nº 435 do Superior Tribunal de Justiça. In casu, restou comprovado que Maria dos Céus Reis Wyatt não pertencia aos quadros da empresa quando ocorreu a dissolução irregular, posto que se desligou da empresa em 15.09.1993 e a dissolução da pessoa jurídica operou-se em 1995. Dessarte, não dando causa à dissolução irregular não pode ser mantido no pólo passivo da execu-ção fiscal, já que tal responsabilidade não é ilimitada. Ademais, ainda que estivesse na gerência ao tempo do fato gerador do tributo, a responsabilidade pessoal do administrador não decorre da simples falta de pagamento do débito tributário, mas da própria dissolução irregular, que não

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pode ser imputada àquele que já não era gerente quando de sua ocorrência. Do exame dos autos, verifica-se que os documentos de fls. 377/383 dos autos da execução fiscal, revelam que tanto a falecida Maria do Céu Reis Wyatt e os herdeiros-filhos William George Wyatt, Madara Wyatt e Évora Reis Wyatt sempre residiram no imóvel penhorado, o qual se encontra protegido pelo que determina a Lei nº 8.009/1990. Agravo legal a que se nega provimento.” (TRF 3ª R. – Ag-Ap-RN 0034116-32.2013.4.03.9999/SP – 1ª T. – Rel. Des. Fed. José Lunardelli – DJe 12.02.2014 – p. 299)

10828 – Execução fiscal – indisponibilidade de bens e direitos – bloqueio de valor irrisório – não demonstração de realização de diligências – impossibilidade

“Processual civil. Tributário. Agravo de instrumento. Execução fiscal. Indisponibilidade de bens e direitos. Bloqueio de valor irrisório. Não demonstração de realização de diligências. Impossibili-dade. 1. A indisponibilidade de bens do executado prevista no art. 185-A do CTN é medida extre-ma e somente deve ser deferida após a demonstração, pela parte requerente, de que as diligências para encontrar bens do devedor passíveis de garantir a execução fiscal foram infrutíferas. 2. O art. 185-A do Código Tributário Nacional, acrescentado pela Lei Complementar nº 118/2005, também corrobora a necessidade de que sejam esgotadas as diligências para localização dos bens penhoráveis, o que pressupõe esforço prévio do credor na identificação do patrimônio do devedor (STJ, AgRg-REsp 1230835/MG, DJe de 30.09.2011). 3. Agravo de instrumento a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – AI 0065358-87.2013.4.01.0000/BA – Relª Desª Fed. Maria do Carmo Cardoso – DJe 07.02.2014 – p. 1365)

10829 – Execução fiscal – penhora – precatório – recusa pelo exequente – ordem de pre-ferência – inobservância – possibilidade

“Tributário. Execução fiscal. Penhora. Precatório. Recusa pelo exequente. Inobservância da or-dem de preferência. Possibilidade. Entendimento firmado em recurso repetitivo. REsp paradigma nº 1.090.898/SP. Aplicação da Súmula nº 83/STJ. 1. O precatório judicial equivale à penhora de crédito prevista no art. 11, VIII, da Lei de Execução Fiscal, e art. 655, XI, do Código de Processo Civil, e não à penhora de dinheiro. Por essa razão, é imprescindível a anuência do credor com a penhora do precatório judicial, sem distinção se decorrente de primeira penhora ou de substitui-ção, podendo a recusa ser justificada por quaisquer das causas previstas no art. 656 do Código de Processo Civil (na espécie, por desobediência à ordem legal). 2. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que é legítima a recusa da Fazenda Pública de bem oferecido à penhora quando não observada a ordem prevista no art. 656 do CPC e 11 da Lei nº 6.830/1980, inclusive em recurso repetitivo (art. 543-C do CPC), no julgamento do REsp 1.090.898/SP, Rel. Min. Castro Meira. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1.421.645 – (2013/0393559-3) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 07.02.2014 – p. 501)

Transcrição Editorial SÍNTESELei de Execuções Fiscais:

“Art. 11. A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem:

I – dinheiro;

II – título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenha cotação em bolsa;

III – pedras e metais preciosos;

IV – imóveis;

V – navios e aeronaves;

VI – veículos;

VII – móveis ou semoventes; e

VIII – direitos e ações.”

10830 – Execução fiscal – penhora on-line – Bacen-Jud – arresto – impossibilidade“Processo civil. Execução por título extrajudicial. Agravo de instrumento. Bacen-Jud. Renova-ção da penhora on-line. Indeferimento. Infojud. Arresto. Impossibilidade. 1. A decisão agravada,

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acertadamente, negou a renovação da penhora on-line, pelo Bacen-Jud, à falta de indícios de alteração da situação econômica do devedor; e negou o arresto preventivo, via Infojud, pois não foram esgotadas as diligências a cargo da exequente na busca de bens penhoráveis. 2. A Lei nº 11.382/2006 privilegiou a penhora on-line como forma de materializar a preferência pelo pagamento da dívida em dinheiro, e a Corte Especial do STJ, em 15.09.2010, na sistemática do art. 543-C do CPC, REsp. 1.112.943/MA, afirmou que ‘após a vigência da Lei nº 11.382/2006, não se faz necessário o esgotamento das vias extrajudiciais dirigidas à localização de bens do devedor para o deferimento da penhora on-line’. Inteligência dos arts. 655, I, e 655-A, ambos do CPC. 3. As ferramentas eletrônicas de localização de bens, para futura penhora e/ou restrição de uso, nos limites da legalidade é medida inequívoca de moralização das execuções em geral e atende aos princípios constitucionais da duração razoável do processo e da efetividade dos direitos postulados em juízo. 4. Frustrado, porém, o bloqueio de valores via Bacen-Jud, cabe ao credor demonstrar uma prognose de sucesso que justifique a renovação da providência, pena de tornar o Juízo mero operador do sistema, sobrecarregando, desnecessariamente o aparato judiciário. Precedentes. 5. O Infojud, que interliga a Justiça à Receita Federal, serve apenas para agilizar a identificação do devedor e seus bens, através do acesso on-line às informações protegi-das por sigilo fiscal – dados cadastrais de pessoas físicas e jurídicas e declarações de Imposto de Renda, de Imposto Territorial Rural (ITR) e de Operações Imobiliárias (DOI) –, não se prestando a qualquer finalidade constritiva ou de indisponibilidade de bens. 6. É ônus do credor a indicação de bens à penhora e o exaurimento das diligências para a sua localização, observada a ordem preferencial do art. 655, com as vantagens oferecidas pelo art. 615-A do CPC, não tendo o juízo atribuição funcional de proceder à pesquisa aberta de bens e/ou o paradeiro do devedor/executa-do. 7. A exequente, instituição financeira centenária, dispõe dos meios necessários à persecução de bens do devedor, nos registros imobiliário, marítimo e de títulos e documentos, e civil das pessoas jurídicas; juntas comerciais, dentre outras iniciativas ao escopo de desincumbir-se do ônus, a cargo do credor, a cujo interesse creditório submete-se todo o patrimônio do devedor, segundo o art. 612 do CPC. 8. A Caixa não esgotou as diligências a seu alcance para localizar bens, e o sigilo fiscal, garantia constitucional assegurada ao contribuinte, só pode ser quebrado pelo Infojud quando houver indiscutível necessidade de intervenção do Judiciário. Precedentes. 9. Nas operações ativas, é um risco da atividade bancária a falta de lastro patrimonial dos seus devedores, cabendo, por economia, também à credora, com a extinção do processo, por fal-ta de pressuposto de desenvolvimento válido e regular, lançar a prejuízo o crédito fracassado. 10. Agravo de instrumento desprovido.” (TRF 2ª R. – AI 2013.02.01.018753-6 – 6ª T.Esp. – Relª Desª Fed. Nizete Antônia Lobato Rodrigues Carmo – DJe 18.02.2014 – p. 679)

10831 – Execução fiscal – penhora on-line – realização antes da citação – impossibilidade“Tributário. Execução fiscal. Penhora on-line realizada antes da citação. Impossibilidade. Afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa. 1. A Corte Especial do STJ, no julgamento do REsp 1.112.943/MA, sob o rito dos recursos repetitivos, decidiu que, ‘após o advento da Lei nº 11.382/2006, o juiz, ao decidir sobre a realização da penhora on-line, não pode mais exigir do credor prova de exaurimento das vias extrajudiciais na busca de bens a serem penhorados’. 339/685 2. Tal medida, contudo, tem como requisito a prévia citação do executado e a não oferta de bens penhoráveis no prazo de 5 dias, nos termos do art. 8º da Lei nº 6.830/1980, sob pena de afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa. 3. Hipótese em que o juiz, cautelar-mente e de ofício, antes da citação, determinou o bloqueio dos valores existentes em nome do agravante, via BacenJud, e a transferência dos mesmos para conta judicial à sua disposição, o que torna imperiosa a reforma do combatido comando judicial. Precedentes desta Corte. 4. Agravo de instrumento provido.” (TRF 5ª R. – AGTR 0043921-76.2013.4.05.0000/PE – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Luiz Alberto Gurgel de Faria – DEJF 12.02.2014 – p. 339)

10832 – Execução fiscal – penhora sobre faturamento – excepcionalidade – exegese“Processual civil e tributário. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Execução fiscal. Ausência de violação do art. 535 do CPC. Penhora sobre o faturamento. Excepcionalidade con-

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signada no voto condutor. Revisão. Impossibilidade. Óbice da Súmula nº 7/STJ. 1. A jurisprudên-cia do STJ é firme no sentido de que ‘é possível, em caráter excepcional, que a penhora recaia sobre o faturamento da empresa, desde que o percentual fixado não torne inviável o exercício da atividade empresarial, sem que isso configure violação do princípio da menor onerosidade para o devedor, posto no art. 620 do CPC’ (AgRg-REsp 1.320.996/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 11.09.2012). De igual modo: AgRg-Ag 1.359.497/RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves, DJ de 24.03.2011, AgRg-REsp 1.328.516/SP, Rel. Min. Humberto Martins, DJ de 17.09.2012. 2. Na hipótese em foco, o acórdão de origem indeferiu a providência almejada pelo ente público (pe-nhora sobre o faturamento da empresa para garantir a execução fiscal), ante a não demonstração da excepcionalidade. Para afastar tal premissa, seria necessário o reexame do conteúdo fático--probatório dos autos, inviável na via eleita, ante o óbice da Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo regimen-tal não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 409.244 – (2013/0336472-8) – 1ª T. – Rel. Min. Benedito Gonçalves – DJe 06.03.2014 – p. 815)

Comentário Editorial SÍNTESENo caso ora comentado, discutiu-se sobre a penhora do faturamento da empresa como ga-rantia em execução fiscal.

No acórdão em tela, restou mantida a decisão de não deferir a penhora sobre o faturamento da empresa para garantir a execução fiscal, pleiteada pelo Fisco, por não ter sido demonstrada a excepcionalidade para o deferimento da referida penhora.

No voto, foi mencionado que “a penhora do faturamento é possível, segundo jurisprudência dominante, em situações excepcionais, quando não existam bens livres, desembaraçados e suficientes à garantia da execução. Objetiva, especialmente, evitar o risco de ineficácia da própria execução. Nesse sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (AgRg--REsp 1085409, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJe 27.03.2009; e REsp 822800, 2ª Turma, Relª Min. Eliana Calmon, DJe 17.02.2009) e também a desta Turma (AI 300202, Processo nº 2007.03.00.047478-6, Relª Desª Fed. Cecília Marcondes, DJF3 13.01.2009, p. 532; e AI 319857, Processo nº 2007.03.00.101401-1, Rel. Des. Fed. Márcio Moraes, DJF3 01.07.2008).

Neste caso, ainda que haja nos autos indicação pelo executado de fração ideal de imóvel rural e a Fazenda Pública tenha se manifestado que não possui interesse por se tratar de imóvel indivisível. Não há nos presentes autos, notícia que a União tenha esgotado todos os meios na tentativa de satisfação do seu crédito”.

Foi mantida a negativa com base no entendimento que a penhora deve ser feita da maneira menos gravosa para o devedor, quando por outros meios o credor puder promover a execução da dívida, de acordo com o disposto no art. 620 do Código de Processo Civil.

Foi afirmado, ainda, que o STJ firmou jurisprudência no sentido de que a penhora sobre o fa-turamento é diferente da penhora de dinheiro, e, somente é admitida em casos excepcionais, desde que atendidos requisitos específicos a justificar a medida.

Neste sentido, colacionamos os seguintes julgados:

“AGRAVO REGIMENTAL – EXECUÇÃO FISCAL – PENHORA SOBRE FATURAMENTO – SI-TUAÇÕES EXCEPCIONAIS – MATÉRIA FÁTICA – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7/STJ – 1. A jurisprudência desta Corte é assente quanto à possibilidade de a penhora recair, em caráter excepcional, sobre o faturamento da empresa, desde que observadas, cumulativamente, as condições previstas na legislação processual (arts. 655-A, § 3º, do CPC) e o percentual fixado não torne inviável o exercício da atividade empresarial. Precedentes. 2. Para afastar a premissa firmada pela Corte de origem, de que a credora não diligenciou suficientemente no sentido de procurar outros bens de propriedade da executada, faz-se necessário o reexame do conteúdo fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula nº 7/STJ: ‘A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial’. Precedentes. 3. Agravo regimen-tal não provido.” (STJ, AgRg-REsp 1.187.671, (2010/0060348-6), 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJe 02.06.2011, p. 986)

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL – INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC – TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – REFORÇO DE PENHORA SOBRE FATURAMENTO DA EMPRESA (5%) – MEDIDA EXCEPCIONAL DEVIDAMENTE JUSTIFICADA, IN CASU, ANTE

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AS CIRCUNSTÂNCIAS DA DEMANDA – REVISÃO DE MATÉRIA FÁTICA – EMBARGOS RE-JEITADOS – 1. A teor do disposto no art. 535, incisos I e II, do CPC, os embargos de decla-ração destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade ou eliminar contradição existente no julgado, o que não se verifica na hipótese. 2. Excepcionalmente o recurso aclaratório pode servir para amoldar o julgado à superveniente orientação jurisprudencial do Pretório Excelso, quando dotada de efeito vinculante, em atenção à instrumentalidade das formas, de modo a garantir a celeridade e a eficácia da prestação jurisdicional e a reverência ao pronunciamento superior, hipótese diversa da apresentada nos presentes autos. 3. Os embargos de declara-ção não se prestam à finalidade de sustentar eventual incorreção do decisum hostilizado ou propiciar novo exame da própria questão de direito material, de modo a viabilizar, em sede processual inadequada, a desconstituição de ato judicial regularmente proferido. 4. Verifica--se que a controvérsia foi solucionada com base no entendimento desta eg. Corte Superior o qual já se posicionou favoravelmente à penhora sobre o faturamento da empresa, em caráter excepcional, e desde que essa constrição não afete o seu funcionamento. 5. Nos autos da execução fiscal movida pelo Estado do Rio Grande do Sul em face da ora agravante, o Juízo a quo determinou o reforço da penhora, a recair sobre 5% do faturamento da empresa, até o limite de 50% do débito, ante a insuficiência dos bens oferecidos para a garantia do débito (precatórios). 6. Embargos de declaração do contribuinte rejeitados, por ausente qualquer dos pressupostos de sua aceitação.” (STJ, EDcl-AgRg-Ag-REsp 52.045, (2011/0143611-3), 1ª T., Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 29.11.2013, p. 476)“AGRAVO REGIMENTAL – RECURSO ESPECIAL – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIO-NAL – INOCORRÊNCIA – PENHORA SOBRE FATURAMENTO – POSSIBILIDADE, DESDE QUE NÃO PONHA EM RISCO A EXISTÊNCIA DO EXECUTADO – 1. Inocorrente a apontada negativa de prestação jurisdicional, porquanto as questões submetidas ao Tribunal a quo foram suficiente e adequadamente apreciadas, com abordagem integral do tema e fundamen-tação compatível. 2. Apesar de possível a penhora sobre faturamento de sociedade empresá-ria, a constrição deve-se dar de maneira excepcional e sem colocar em risco a existência da executada, o que constitui matéria de fato a ser avaliada pelas instâncias ordinárias (Súmula nº 7/STJ). 3. Decisão agravada mantida pelos seus próprios fundamentos. 4. Agravo regi-mental desprovido.” (STJ, AgRg-EDcl-REsp 1.281.500, (2011/0208994-7), 3ª T., Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 03.04.2013, p. 170)Vale destacar que tal discussão encerra-se no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, pois já manifestou-se o Supremo Tribunal Federal sobre o tema, decidindo que lides envolvendo ordem de penhora são discussões infraconstitucionais, conforme ementa a seguir:“DIREITO TRIBUTÁRIO – PROCESSO CIVIL – EXECUÇÃO FISCAL – PENHORA SOBRE FA-TURAMENTO – ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL – OFENSA REFLEXA – PRECEDENTES – ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 09.03.2012 – Ambas as Turmas desta Corte têm-se posicionado no sentido de que controvérsia envolvendo ordem de penhora insere-se no campo infraconstitucional. Assim, no caso, eventual incompatibilidade com a Carta da República, se ocorresse, teria caráter reflexo ou indireto, aspecto a inviabilizar o pro-cessamento do apelo extremo. Agravo regimental conhecido e não provido.” (STF, AgRg-RE-Ag 746.510, São Paulo, 1ª T., Relª Min. Rosa Weber, J. 11.02.2014)

10833 – Execução fiscal – prescrição intercorrente – exegese“Execução fiscal. Incidência de prescrição intercorrente. Ocorrência. I – O lapso de cinco anos, sem causas interruptivas ou suspensivas, dão causa eficiente à prescrição, na forma do art. 40 da LEF. II – Apelação improvida.” (TRF 2ª R. – AC 1993.51.01.047343-1 – 3ª T.Esp. – Relª Desª Fed. Lana Regueira – DJe 12.02.2014 – p. 305)

10834 – Execução fiscal – prescrição intercorrente – inércia do exequente – comprovação – necessidade

“Processual civil e tributário. Execução fiscal. Prescrição intercorrente. Fundamento não impugna-do. Súmula nº 283/STF. Comprovação de inércia do exequente. Revolvimento fático-probatório. Impossibilidade. Súmula nº 7/STJ. Dissolução irregular da empresa. Causa de redirecionamento. Súmula nº 435/STJ. 1. A agravante deixou de impugnar o fundamento de que a prescrição inter-corrente pressupõe paralisação do processo por mais de cinco anos, tendo se limitado a sustentar que entre a citação e a penhora teria transcorrido o aludido lapso temporal. Desse modo, incide o

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óbice da Súmula nº 283/STF: ‘É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles’. 2. Por outro lado, a reforma da conclusão de que a exequente, a todo tempo, provocou diversas diligências, não tendo ficado inerte, exige revolvimento fático-probatório, o que esbarra na Súmula nº 7/STJ. 3. A responsabilização do sócio pela dissolução irregular da empresa causa redirecionamento da execução fiscal, conforme admitido pacificamente pela jurisprudência deste Tribunal Superior, nos termos da Súmula nº 435/STJ: ‘Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente’. 4. Agravo regimental não provi-do.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 211.036 – (2012/0162703-3) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 07.03.2014 – p. 177)

10835 – Execução fiscal – redirecionamento ao sócio gerente – dissolução irregular – indícios “Direito processual civil e tributário. Agravo de instrumento. Execução fiscal. Redirecionamento a sócio-gerente. Certidão de oficial de justiça. Indício de dissolução irregular. Súmula nº 435/STJ. Presunção de responsabilidade. Ônus da prova do executado. Prescrição. Não configurada. Iní-cio do prazo conta-se a partir do redirecionamento da execução. Agravo conhecido e desprovi-do. A certidão emitida pelo oficial de justiça, atestando que a empresa devedora não mais fun-ciona no endereço constante dos assentamentos, é indício de dissolução irregular, apto a ensejar o redirecionamento da execução para o sócio-gerente, de acordo com a Súmula nº 435/ STJ. Precedente STJ: AgRg-REsp 1289471/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, Julgado em 28.02.2012. A prescrição da cobrança do crédito tributário contra os sócios-gerentes fundada na dissolução irregular da sociedade flui da data da sua constatação por força do princípio da actio nata. Precedente do STJ no AgRg-REsp 1.100.907/RS em 18.09.2010. Agravo conhecido e desprovido.” (TJAM – AI 0005986-64.2011.8.04.0000 – 3ª C.Cív. – Rel. Des. Aristóteles Lima Thury – DJe 06.03.2014 – p. 34)

10836 – Execução fiscal – suspensão por um ano – intimação do credor – desnecessidade“Processo civil e tributário. Execução fiscal. Ausência de bens. Suspensão da execução por 01 (um) ano. Desnecessidade de intimação do credor. Inteligência da Súmula nº 314 do STJ. Pres-crição intercorrente. Decretação de ofício pelo juiz. Art. 40, § 4º, da Lei nº 6.830/1980. Possi-bilidade, desde que ouvida previamente a Fazenda Pública. Ausência de causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. Manutenção da sentença. 1. É prescindível a intimação da Fazenda Pública da suspensão da execução por ela própria solicitada, bem como do ato de arquivamento do processo, pois se trata de procedimento automático, conforme dispõe a Súmula nº 314 e precedentes do STJ. 2. O § 4º do art. 4º da Lei nº 6.830/1980, com as alterações introduzidas pela Lei nº 11.051/2004, possibilita ao juiz da execução a decretação de ofício da prescrição, desde que ouvida previamente a Fazenda Pública, a fim de suscitar eventual causa suspensiva ou interruptiva do prazo prescricional. 3. Ouvida a Fazenda Pública, se essa não aponta nenhuma causa interruptiva ou suspensiva da prescrição e, ainda, demonstra a sua desídia em promover as diligências necessárias para satisfação do seu crédito, mantendo-se inerte por mais de 06 (seis) anos, o reconhecimento da prescrição do feito e sua extinção era mesmo de rigor. 4. Recurso conhecido e desprovido.” (TJDFT – Proc. 20130111674626 – (765833) – Rel. Des. Sebastião Coelho – DJe 06.03.2014 – p. 219)

10837 – ICMS – ajuste Sinief – custos da importação na nota fiscal emitida em operação interestadual – publicização das informações – vedação

“Agravo de instrumento. Ação ordinária. Liminar. Obrigação acessória. ICMS. Ajuste Sinief nº 19/2012. Publicização das informações relativas aos custos da importação na nota fiscal emi-tida em operação interestadual. Vedação. Art. 198 do CTN. Violação dos princípios da livre concorrência, livre iniciativa e da liberdade econômica. Recurso conhecido e provido. 1. O Decreto nº 3.145-R/2012, ratificou o Convênio ICMS nº 123/2012 e os Ajustes Sinief nº 19 e 20/2012, celebrados no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária, bem como por

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meio do Decreto nº 3.185-R/2012, introduziu no RICMS/ES normas que estabelecem que as em-presas devem informar na nota fiscal interestadual dados relativos à importação da mercadoria. 2. A regulamentação da questão estabelece obrigações acessórias não previstas na Resolução do Senado Federal nº 13/2013 e muito menos em lei em sentido estrito, ofendendo ao princípio da legalidade, insculpido em vários dispositivos constitucionais e infraconstitucionais. 3. Outrossim, a publicização das informações relativas aos custos de importação na nota fiscal emitida na operação interestadual, inequivocamente, expõe dados comerciais sigilosos da empresa importa-dora, que o Fisco já tem acesso quando da importação, cuja divulgação lhe é proibida (art. 198 do Código Tributário Nacional), afetando, diretamente, os princípios constitucionais da livre con-corrência, da livre iniciativa e da liberdade econômica (art. 170, caput, IV e parágrafo único, da Carta Magna de 1988). 4. Para a fiscalização de cumprimento das obrigações tributárias definidas pela Resolução nº 13/2012, do Senado Federal, é possível instituir obrigação tributária acessória para que se exija do contribuinte documentar e declarar, ao Fisco, as operações de importação. 5. A necessidade de exercício da fiscalização tributária não justifica a instituição de obrigação tributária acessória que, além de inútil, torna acessível ao público dados da escrituração do con-tribuinte, que é sigilosa. 3. Não há prejuízo ao exercício da fiscalização tributária a não inclusão na nota fiscal eletrônica dos dados mencionados na cláusula sétima do Ajuste Sinief nº 19/2012. 6. Não é admissível exigir do contribuinte que inclua na nota fiscal eletrônica pertinente à ope-ração interestadual dados relativos à importação da mercadoria comercializada. 7. Recurso co-nhecido e provido.” (TJES – AI 0035766-92.2013.8.08.0024 – Rel. Des. Álvaro Manoel Rosindo Bourguignon – DJe 06.03.2014)

10838 – ICMS – circulação entre estabelecimentos do mesmo contribuinte – Estados di-versos

“Processual civil e tributário. Agravo regimental. ICMS na circulação entre estabelecimentos do mesmo contribuinte situados em Estados diversos. Não conhecimento. Ofensa aos arts. 480 e 482 do Código de Processo Civil e 166 do Código Tributário Nacional. Ausência de prequestiona-mento. 1. Não se conhece do agravo regimental em relação à incidência de ICMS sobre o deslo-camento de mercadorias de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte, porque esta matéria não se inseriu no âmbito de devolutividade do agravo em recurso especial. 2. A ausência de discussão da matéria inserida nos preceitos legais indicados como violados impede o conhe-cimento do recurso especial, em razão do óbice representado pelas Súmulas nºs 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. 3. Agravo regimental conhecido em parte e não provido.” (STJ – AgRg--AREsp 441.185 – Proc. 2013/0392870-6/RS – 2ª T. – Rel. Min. Og Fernandes – DJe 12.02.2014)

10839 – ICMS – comércio eletrônico – regime de tributação – exegese“Mandado de segurança. Constitucional e tributário. Protocolo ICMS nº 21/2011. Confaz. Comér-cio eletrônico. Operações interestaduais. Direito líquido e certo. Comprovação. 1. O Protocolo nº 21 do Confaz altera unilateralmente o regime de tributação de vendas não presenciais, de modo que o ICMS, que antes era recolhido exclusivamente nas unidades da Federação de origem das mercadorias, passou a ser dividido entre o Distrito Federal e os Estados. Assim, além de esta-belecer nova hipótese de incidência de tributo, fixa sistemática própria de cálculo e aplicação da alíquota interestadual nas operações envolvendo bens que destinam mercadorias ao consumidor final. Tributação diferenciada de bens provenientes de outros Estados da Federação. 2. As alíquo-tas do ICMS para operações interestaduais devem obedecer às disposições insertas no art. 155, § 2º, VII, b, da Constituição Federal. Logo, o Protocolo nº 21/2011 do Confaz contraria o referido dispositivo constitucional, porquanto determina a cobrança do imposto na entrada da mercadoria no estado, ainda que o destinatário seja o consumidor final. 3. Inconstitucionalidade do Decreto Estadual nº 27.505/2011 (expedido como parte do Protocolo ICMS nº 21/2011, do Conselho Nacional de Política Fazendária – Confaz),que dispõe sobre a exigência do pagamento de ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) em operações interestaduais que destinem mercadoria ou bem a consumidor final, quando a aquisição ocorrer de forma não presencial no estabelecimento remetente, ou seja, quando a mercadoria for adquirida por meio de comércio

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eletrônico (Internet, telemarketing ou showroom). TJMA, ADIn 9.845/2012, desta mesma relato-ria. 4. Inexistência, no decreto, de respeito aos princípios de não discriminação, da reserva legal, da legalidade e da anterioridade tributária. 5. Em se tratando de comércio eletrônico, no qual as mercadorias alienadas são remetidas de outro ente federativo, o fato gerador do tributo ocorre tão somente quando da saída do produto do estabelecimento do contribuinte. 6. Segurança concedi-da.” (TJMA – MS 3280-09.2012.8.10.0000 – (141830/2014) – Rel. Des. Lourival de Jesus Serejo Sousa – DJe 18.02.2014 – p. 97)

10840 – ICMS – energia elétrica – cobrança – empresa consumidora final – exegese“Tributário. ICMS. Preliminar de ilegitimidade ativa afastada. Demanda contratada. Energia elé-trica. Fato gerador. Efetivo consumo. Demanda consumida que integra a base de cálculo do tributo. Não incidência do ICMS sobre a demanda de reserva. Súmula nº 391 do STJ. Apelação conhecida e não provida.” (TJAL – Ap 0075866-39.2007.8.02.0001 – Rel. Des. Tutmés Airan de Albuquerque Melo – DJe 25.02.2014 – p. 138)

Comentário Editorial SÍNTESEO acórdão em comento é oriundo de apelação interposta pelo Estado de Alagoas, em face de sentença que deferiu o pedido ajuizado por empresa do ramo médico de assistência à saúde feminina, que contratara os serviços da CEAL para o fornecimento de energia elétrica, e que o Estado de Alagoas vem cobrando ICMS sobre a energia disponibilizada/reservada, quando deveria cobrar apenas a energia efetivamente consumida, fato gerador do referido imposto. Com este argumento, requereu liminar determinando que Estado e a concessionária fossem compelidos a cobrarem o ICMS somente sobre a energia consumida, que as faturas fossem recalculadas, objetivando aferir o ICMS devido, para fins de depósito judicial do valor referente ao efetivo tributo, e, no mérito, requereu a procedência dos pedidos.Alegou o Estado de Alagoas a legalidade da cobrança do ICMS sobre a demanda reservada, sob o argumento que a legislação invocada pela apelada para sustentar sua pretensão fora re-vogada, devendo o caso ser analisado pela lei vigente à época dos fatos. Em sede de apelação, alegou ainda o Estado de Alagoas a ilegitimidade ativa da contribuinte/apelada para requerer a revisão de cobrança do ICMS.Em contrarrazões, a empresa apelada defende o não cabimento da apelação, por não ter ha-vido o depósito da multa arbitrada ao apelante nos embargos de declaração, e que é legítima para o pleito, pois assumira a condição de contribuinte de fato e contribuinte de direito, por ser o sujeito passivo da obrigação tributária. Ao analisar a questão no caso ora comentado, decidiu o Desembargador Relator que a empre-sa é legítima para atuar na demanda e, quanto ao mérito, manifestou-se nos seguintes termos:“O cerne da controvérsia, como visto, cinge-se à legalidade ou não da cobrança de ICMS sobre a demanda contratada de energia elétrica. Para melhor desfecho da lide, cabe analisar o caso à luz do fato gerador do ICMS, qual seja, a circulação de mercadorias. Como lição básica de direito tributário, tem-se que a obrigação tributária surge com a ocorrência do fato gerador.Pois bem, compulsando os autos, vê-se que o tributo em análise vem sendo cobrado sobre toda a fatura de energia, incidindo não somente sobre a energia efetivamente consumida, mas, também, sobre a energia contratada e a demanda de ultrapassagem.O Estado de Alagoas argumenta que, estando a energia à disposição do consumidor, nos pontos de seu estabelecimento ou de sua casa, há de se considerar ocorrida a tradição da mercadoria, fazendo incidir o ICMS.Todavia, dada a natureza sui generis da mercadoria ora analisada (energia elétrica), não se pode concluir, por si só, que estar a energia à disposição do consumidor, nos pontos de sua casa ou estabelecimento, tenha ocorrido a tradição. Pois se assim o fosse, a tradição estaria ocorrendo a todo o instante.No caso em deslinde, é evidente que a tradição somente se completa quando o consumidor de energia ‘vem a transformá-la em outra espécie de bem da vida (luz, calor, frio, força, mo-vimento ou qualquer outro tipo de utilidade), [...] Considerando, então, que a energia elétrica não configura bem suscetível de ser ‘estocado’, para ulterior revenda aos interessados, que seu fato gerador (elementar para caracterizar a obrigação de pagar o tributo) consiste na

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circulação/utilização da mercadoria e não na colocação à disposição do consumidor de deter-minada quota de potência, há de se concluir que somente é devida a cobrança de ICMS sobre o potencial de energia efetivamente consumida.Reza, ainda, o art. 12, I, da Lei Complementar nº 87/1996 que o fato gerador do ICMS realiza-se quando ‘da saída de mercadoria de estabelecimento do contribuinte, [...]’. O diplo-ma legal é claro em considerar o momento de saída de mercadoria, no caso dos autos, a saída da energia elétrica da distribuidora.Ademais disso, tal foi a controvérsia acerca da matéria que o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 391, publicada no DJe de 07.10.2009, para coroar o entendimento já pacificado naquela corte. Confira-se:Súmula nº 391 do STJ: ‘ICMS incide sobre a tarifa de energia elétrica correspondente à de-manda de potência efetivamente utilizada’.Assim, não sendo a demanda contratada fato gerador do ICMS, não há que se falar em dever de pagar tal exação.Para finalizar, confira-se mais um julgado do Ministro Luiz Fux, tratando exatamente da ma-téria ora analisada:‘PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL – RECURSO ESPECIAL – TRIBUTÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – ICMS – ENERGIA ELÉTRICA – DEMANDA RESERVADA DE POTÊNCIA – FATO GERADOR – MATÉRIA DECIDIDA PELA 1ª SEÇÃO, NO RESP 960.476/SC, DJ DE 13.05.2009, SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC – SÚMULA Nº 391/STJ – RESOLUÇÃO STJ Nº 8/20081. A regra matriz constitucional estabeleceu como critério material da hipótese de incidência do ICMS sobre energia elétrica o ato de realizar operações envolvendo energia elétrica, salvo o disposto no art. no art. 155, § 2º, X, b. Embora equiparadas às operações mercantis, as ope-rações de consumo de energia elétrica têm suas peculiaridades, razão pela qual o fato gerador do ICMS ocorre apenas no momento em que a energia elétrica sai do estabelecimento do fornecedor, sendo efetivamente consumida. Não se cogita acerca de tributação das operações anteriores, quais sejam, as de produção e distribuição da energia, porquanto estas represen-tam meios necessários à prestação desse serviço público. 2. Destarte, a base de cálculo do imposto é o valor da operação da qual decorra a entrega do produto ao consumidor, vale dizer, o preço realmente praticado na operação final, consoante estabelecido no art. 34, § 9º, do ADCT. Nesse diapasão, não há falar em incidência da exação sobre demanda reservada ou contratada junto à concessionária, porquanto faz-se mister a efetiva utilização da energia elé-trica, não sendo suficiente a sua mera disponibilização pela distribuidora. Precedentes: REsp 840285/MT, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ 16.10.2006; AgRg-REsp 855929/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 16.10.2006; REsp 343952/MG, 2ª Turma, Relª Min. Eliana Calmon, DJ 17.06.2002. 3. A Primeira Seção, quando do julgamento do REsp 960.479/SC, representativo da controvérsia (art. 543-C do CPC), reafirmou o entendimento de que, ‘para efeito de base de cálculo de ICMS (tributo cujo fato gerador supõe o efetivo con-sumo de energia), o valor da tarifa a ser levado em conta é o correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada no período de faturamento, como tal considerada a demanda medida, segundo os métodos de medição a que se refere o art. 2º, XII, da Resolução ANEEL nº 456/2000, independentemente de ser ela menor, igual ou maior que a demanda contrata-da’ (Rel. Min. Teori Zavascki, DJ de 13.05.2009).4. [...] 5. ‘O ICMS incide sobre o valor da tarifa de energia elétrica correspondente à de-manda de potência efetivamente utilizada’ (Súmula nº 391/STJ).6. Agravo regimental des-provido.” (AgRg-EDcl-REsp 1096119/RN, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, Julgado em 27.04.2010, publicado no DJe em 12.05.2010) (grifei)Com isso, negou provimento ao recurso, mantida a procedência do pedido da autora.Vale destacar que, recentemente, a Primeira Turma do STJ decidiu que só pode incidir o ICMS sobre operações de compra e venda de energia elétrica interestaduais nos casos em que compradora consuma a energia em processo de industrialização e comercialização de outro produto, que não a própria energia.

10841 – ICMS – importação de equipamentos hospitalares – sociedade sem fins lucrativos – não incidência do tributo – admissibilidade

“Tributário. ICMS. Sociedade civil prestadora de serviços médicos, sem fins lucrativos. Importa-ção de equipamentos hospitalares utilizados na consecução de sua finalidade, sem a incidência

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do tributo. Admissibilidade. Art. 150, IV, c, da CF, que não foi revogado pela nova redação do art. 155, IX, a (EC 33/2001). Repercussão geral presumida (art. 543-A, § 3º, do CPC), reconhecida pelo STF. Decisão confirmada. Agravo não provido.” (TJSP – AgRg 0015344-76.2011.8.26.0053 – São Paulo – 7ª CDPúb. – Rel. Coimbra Schmidt – DJe 19.02.2014 – p. 1615)

10842 – ICMS – serviço de transporte aéreo – inconstitucionalidade

“Apelação cível. Tributário. Ação de repetição de indébito. ICMS. Serviço de transporte aéreo. Cobrança declarada inconstitucional pelo STF. Legitimidade ativa por parte da empresa aérea para receber a devolução do valor recolhido, uma vez que não houve repasse do imposto para o contribuinte de fato (consumidor final). Inocorrência de prescrição que tem como marco inicial o trânsito em julgado da ação declaratória de inconstitucionalidade. Recurso conhecido e não provido.” (TJAL – Ap 0008584-57.2002.8.02.0001 – Rel. Des. Tutmés Airan de Albuquerque Melo – DJe 18.02.2014 – p. 77)

10843 – ICMS – simples paulista – desconstituição e reenquadramento – fornecedor inidô-neo – efeitos

“ICMS. Auto de infração e imposição de multa. Desconstituição e reenquadramento no regime tributário do simples paulista. Fornecedora considerada inidônea. Irregularidades constatadas algum tempo depois das operações questionadas. Demonstrados por documentos o pagamen-to das mercadorias, indicando que as operações mercantis efetivamente ocorreram. Não infir-mada a presunção de boa-fé da autora, não cabe negar a tais operações os efeitos tributários correspondentes, quanto ao crédito de ICMS pela entrada das mercadorias no estabelecimen-to da empresa adquirente. Demanda procedente. Recurso não provido.” (TJSP – Ap 0011650-02.2011.8.26.0344 – Marília – 12ª CDPúb. – Rel. Edson Ferreira – DJe 06.03.2014 – p. 1027)

10844 – ICMS – substituição tributária para frente – recolhimento destacado – operações futuras – venda presumida – bonificação – exegese

“Direito tributário. ICMS. Regime de substituição para frente. Recolhimento destacado. Opera-ções futuras dos substituídos. Venda presumida ao longo da cadeia de circulação de mercadorias inicialmente dadas em bonificação. Proporcionalidade da multa. Princípio do não confisco. Im-possibilidade de reapreciação de fatos e provas. Súmula nº 279/STF. Acórdão recorrido publicado em 27.10.2006. A decisão agravada está em harmonia com a jurisprudência desta Suprema Corte acerca do caráter infraconstitucional do debate atinente à inclusão na base de cálculo do ICMS das mercadorias dadas a título de bonificação. A suposta ofensa aos postulados constitucionais só poderia ser constatada a partir da análise da legislação infraconstitucional. Eventual violação oblíqua ou reflexa não viabiliza trânsito a recurso extraordinário. Na esteira da jurisprudência desta Corte, a aferição da natureza confiscatória da multa depende do exame do acervo fático--probatório, insuscetível de revolvimento em sede de apelo extremo. Inteligência da Súmula nº 279/STF. Agravo regimental conhecido e não provido.” (STF – AgRg-RE 631.769 – Minas Gerais – 1ª T. – Relª Min. Rosa Weber – J. 17.12.2013)

Comentário Editorial SÍNTESENos termos da Lei Complementar nº 87/1996, arts. 5º e 6º, o Estado, para consecução de seus fins, pode atribuir de modo expresso a terceiros, vinculados e com interesse no fato gerador do imposto, a responsabilidade pelo cumprimento da obrigação tributária. Esse mecanismo constitui-se na figura da substituição tributária, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo a esse um caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.

Por imposição legal, a substituição tributária consiste em atribuir a determinado contribuinte do ICMS, qualificado como contribuinte substituto, a responsabilidade pela retenção e pelo re-colhimento do imposto devido por outros contribuintes, nomeados contribuintes substituídos.

Ocorre a substituição tributária “para frente” quando a responsabilidade tributária é atribuí- da ao alienante ou remetente da mercadoria na qualidade de sujeito passivo da obrigação,

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mediante convênios celebrados entre as Unidades da Federação. Nessa modalidade, temos a antecipação do imposto incidente sobre a operação subsequente.

No caso trazido à baila, cuja Ministra Relatora foi Rosa Weber, empresa de eletrodomésticos ajuizou agravo regimental contra decisão monocrática, sob o argumento que “o recurso ex-traordinário demonstrou flagrante violação do v. acórdão recorrido ao art. 155, II e ao § 2º, I, da Constituição Federal, na medida em que o ICMS trata-se de um imposto não-cumulativo, o qual incide apenas sobre o valor agregado, a cada operação de industrialização ou a cada operação de circulação econômica do produto ou da mercadoria, sendo evidente que caso não reconhecida a não incidência do ICMS sobre mercadorias concedidas na forma de bo-nificação, tal como negado pelo v. acórdão recorrido, estar-se-á diante da violação direta do referido dispositivo”.

Além disso, alegou que lhe foi aplicada multa de 100%, em afronta ao princípio do não confisco.

Ao analisar o caso, a Ministra Relatora conheceu do recurso e manifestou-se nos seguintes termos:

“Não há falar em afronta aos preceitos constitucionais indicados nas razões recursais, por-quanto, no caso, a suposta ofensa somente poderia ser constatada a partir da análise da legislação infraconstitucional apontada no apelo extremo, o que torna oblíqua e reflexa even-tual ofensa, insuscetível, portanto, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. Dessarte, desatendida a exigência do art. 102, III, a, da Lei Maior, nos termos da remansosa jurisprudência deste eg. Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido: ARE 647.735-AgRg/SP, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 27.06.2012; e AI 739.580-AgRg/SP, por mim relatado, 1ª Turma, DJe 06.02.2013, cuja ementa transcrevo:

DIREITO TRIBUTÁRIO – ICMS – MERCADORIAS DADAS EM BONIFICAÇÃO – EXCLUSÃO – BASE DE CÁLCULO – ART. 38 DO RICMS/SP – DEBATE DE ÂMBITO INFRACONSTITU-CIONAL – VIOLAÇÃO DO ARQUÉTIPO CONSTITUCIONAL DO ICMS – QUESTÃO NÃO PRE-QUESTIONADA – APLICAÇÃO DA SÚMULA STF Nº 282 – INAPTIDÃO DO PREQUESTIONA-MENTO IMPLÍCITO OU FICTO PARA ENSEJAR O CONHECIMENTO DO APELO EXTREMO – INTERPRETAÇÃO DA SÚMULA STF Nº 356 – A decisão agravada está em harmonia com a jurisprudência desta Casa acerca do caráter infraconstitucional do debate atinente à in-terpretação dada pelo Tribunal de Justiça paulista quanto à inclusão na base de cálculo do ICMS das mercadorias dadas em bonificação. A suposta ofensa aos postulados constitucionais somente poderia ser constatada a partir da análise da legislação infraconstitucional local apontada no apelo extremo. Eventual violação oblíqua ou reflexa não viabiliza trânsito a re-curso extraordinário. Por outro lado, a questão atinente à violação do arquétipo constitucional do ICMS sequer foi prequestionada, porquanto não foi analisada pelas instâncias ordinárias e tampouco nos embargos de declaração opostos para satisfazer o requisito do prequestiona-mento. Esta Corte não tem procedido à exegese a contrario sensu da Súmula STF nº 356 e, por consequência, somente considera prequestionada a questão constitucional quando tenha sido enfrentada, de modo expresso, pelo Tribunal de origem. A mera oposição de embargos declaratórios não basta para tanto. Aplicável o entendimento jurisprudencial vertido na Sú-mula nº 282/STF: É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão suscitada. Agravo regimental conhecido e não provido.

Inviável, por seu turno, apreciar o alegado caráter confiscatório da multa fiscal, notadamente porque, segundo a jurisprudência desta Corte, a aferição da natureza confiscatória depende do exame do acervo probatório constante dos autos, insuscetível de revolvimento em sede de recurso extraordinário, tendo em vista os termos da Súmula nº 279/STF. Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:

Nada colhe o agravo.

Conforme já consignado, mantenho o entendimento no sentido de que não há falar em afronta aos preceitos constitucionais indicados nas razões recursais, porquanto, no caso, a suposta ofensa somente poderia ser constatada a partir da análise da legislação infraconstitucional apontada no apelo extremo, o que torna oblíqua e reflexa eventual ofensa, insuscetível, por-tanto, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. Dessarte, desatendida a exi-gência do art. 102, III, a, da Lei Maior, nos termos da remansosa jurisprudência deste eg. Supremo Tribunal Federal. Observe-se:

[...]

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Outra sorte não há nos questionamentos sobre as multas aplicadas. A remansosa jurispru-dência desta Corte se posicionou no sentido de que a aplicação do princípio do não confisco tributário, inscrito no art. 150, IV, da Constituição da República, às sanções pecuniárias, envolve um juízo de proporcionalidade entre o ilícito e a penalidade. Pressupõe, portanto, a clara delimitação de cada um desses elementos. Dentro dessa moldura, para alcançar enten-dimento distinto do agasalhado pela Corte de origem quanto ao efeito confiscatório da multa, necessário se faz revolver fatos e provas, o que esbarra no óbice do enunciado da Súmula nº 279 deste STF.

Corroborando esse entendimento, cito os seguintes precedentes:

[...]”

E com base nos argumentos anteriormente expostos, a Ministra Relatora negou provimento ao agravo regimental.

10845 – Imposto de Importação – PIS/Cofins – importações feitas pelo Senai“Processual civil. Tributário. Ausência de violação ao art. 535 do CPC. Imposto de Importa-ção. PIS-Importação. Cofins-Importação. Isenção das importações feitas pelo Senai. Vigência dos arts. 12 e 13 da Lei nº 2.613/1955. 1. Não viola o art. 535 do CPC o acórdão que decide de forma suficientemente fundamentada, não estando obrigada a Corte de origem a emitir juízo de valor expresso a respeito de todas as teses e dispositivos legais invocados pelas partes. 2. As importações feitas pelo Senai gozam da isenção prevista nos arts. 12 e 13 da Lei nº 2.613/1955. 3. Irrelevante a classificação do Senai como entidade beneficente de assistência social ou não, pois sua isenção decorre diretamente da lei (arts. 12 e 13 da Lei nº 2.613/1955) e não daque-la condição que se refere à imunidade constitucional (art. 195, § 7º, da CF/1988). O raciocí-nio também exclui a relevância de se verificar o cumprimento dos requisitos do art. 55 da Lei nº 8.212/1991 (agora dos arts. 1º, 2º, 18, 19, 29 da Lei nº 12.101/2009), notadamente, a exis-tência de remuneração ou não de seus dirigentes. 4. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp 1.430.257 – (2014/0009314-8) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 25.02.2014 – p. 1570)

10846 – Imunidade – entidade beneficente – IOF – IRPJ – rendimento de aplicações finan-ceiras – não incidência

“Processual civil. Embargos de declaração. IOF e IRPJ. Imunidade. Entidade beneficente, sem fins lucrativos. Não incidência sobre rendimentos de aplicações financeiras. Precedentes do colendo STF. Ausência de vícios no acórdão. Rediscussão da matéria. Descabimento. 1. Os embargos de declaração não são meio próprio ao reexame da causa, devendo limitar-se ao esclarecimento de obscuridade, contradição ou omissão, in casu, inexistentes no acórdão embargado. 2. Matéria do recurso foi devidamente analisada, com motivação clara e nítida. Questões enfrentadas con-forme as legislação e jurisprudência. 3. Deveras apreciado que ‘o colendo STJ, ao julgar o REsp 1189619/PE, Rel. Min. Castro Meira, submetido ao regime do art. 543-C do CPC, decidiu que: ‘O art. 741, parágrafo único, do CPC atribuiu aos embargos à execução eficácia rescisória de sentenças inconstitucionais. Por tratar-se de norma que excepciona o princípio da imutabilidade da coisa julgada, deve ser interpretada restritivamente, abarcando, tão somente, as sentenças fundadas em norma inconstitucional, assim consideradas as que: (a) aplicaram norma declarada inconstitucional; (b) aplicaram norma em situação tida por inconstitucional; ou (c) aplicaram norma com um sentido tido por inconstitucional; em qualquer desses três casos, é necessário que a inconstitucionalidade tenha sido declarada em precedente do STF, em controle concentrado ou difuso e independentemente de resolução do Senado, mediante: (a) declaração de inconsti-tucionalidade com ou sem redução de texto; ou (b) interpretação conforme a Constituição; por consequência, não estão abrangidas pelo art. 741, parágrafo único, do CPC as demais hipóteses de sentenças inconstitucionais, ainda que tenham decidido em sentido diverso da orientação firmada no STF, tais como as que: (a) deixaram de aplicar norma declarada constitucional, ainda que em controle concentrado; (b) aplicaram dispositivo da Constituição que o STF considerou sem autoaplicabilidade; (c) deixaram de aplicar dispositivo da Constituição que o STF considerou autoaplicável; e (d) aplicaram preceito normativo que o STF considerou revogado ou não recep-cionado; também estão fora do alcance do parágrafo único do art. 741 do CPC as sentenças cujo

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trânsito em julgado tenha ocorrido em data anterior à vigência do dispositivo’. Do precedente supra, resultou a edição da Súmula nº 487/STJ: ‘O parágrafo único do art. 741 do CPC não se aplica às sentenças transitadas em julgado em data anterior à da sua vigência’; in casu, a sentença atacada transitou em julgado em data anterior à vigência do art. 741, parágrafo único, do CPC, sendo o referido dispositivo, portanto, inaplicável ao caso em apreço’. 4. Possível erro do julga-mento deve ser sanado por recurso próprio e não nesta via estreita. 5. Embargos de declaração não providos.” (TRF 5ª R. – AC 2006.80.00.005685-2/01 – (406173/AL) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Marcelo Navarro Ribeiro Dantas – DJe 18.02.2014 – p. 129)

10847 – IPI – agravo regimental – ausência de impugnação específica – Súmula nº 182/STJ – incidência

“Processual civil. Tributário. IPI. Agravo regimental. Ausência de impugnação específica. Súmula nº 182/STJ. Incidência. É inviável o conhecimento do agravo regimental que não impugna, espe-cificamente, os fundamentos da decisão agravada. Incidência, por analogia, da Súmula nº 182 do STJ. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-REsp 1.419.454 – (2013/0385020-1) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 07.02.2014 – p. 499)

10848 – IPI – crédito presumido – regime previsto na Lei nº 10.276/2001 – migração ex-temporânea – impossibilidade

“Tributário. Agravo regimental no recurso especial. Crédito presumido de IPI. Lei nº 9.363/1996. Migração extemporânea para o regime previsto na Lei nº 10.276/2001. Impossibilidade. 1. O contribuinte, dentro do prazo legal, pode escolher pela manutenção do sistema original de cál-culo do crédito presumido de IPI previsto na Lei nº 9.363/1996 ou pela migração para o regime alternativo preconizado pela Lei nº 10.276/2001. Entretanto, realizada a opção para determinado exercício, ela não pode vir a ser retificada para atingir esse exercício e os anteriores. Preceden-tes: AgRg-REsp 1.119.893/RS, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, DJe 01.08.2013; REsp 1.002.855/SC, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma, DJe 15.04.2008. 2. Agravo regimental não pro-vido.” (STJ – AgRg-REsp 1.239.867 – (2011/0046206-5) – 1ª T. – Rel. Min. Benedito Gonçalves – DJe 11.02.2014 – p. 1657)

10849 – IPI – importação de veículo – pessoa física – uso próprio – não comerciante – não cumulatividade – análise

“Tributário. IPI. Veículo automotor. Importação. Pessoa física não comerciante. Uso próprio. Não incidência princípio da não cumulatividade. Art. 153, § 3º, II, da CF/1988. Precedentes do STF e do STJ. 1. A sentença denegou a segurança que objetivava que a autoridade coatora se abstivesse de exigir do impetrante o recolhimento do IPI incidente sobre a importação de veículo por pessoa física e para uso próprio. 2. O art. 153, II, § 3º, da CF/1988 dispõe que o IPI ‘será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores’. 3. Impossibilidade de o importador, que não seja comerciante ou industrial, compensar o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores, cabendo a ele o ônus total do tributo, o que tangencia o princípio da não cumulatividade, ao contrário do importador, que é comerciante ou industrial, que pode, na operação seguinte, utilizar o crédito do tributo que pagou no ato do desembaraço aduaneiro da mercadoria. 4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu que, no caso de o importador ser pessoa física, não comerciante ou empresário, que importa produtos para o uso próprio, não é aplicável a incidência do IPI, em face do princípio da não cumulatividade. 5. Apelação provida. Segurança concedida.” (TRF 5ª R. – AC 0001826-69.2013.4.05.8200 – (567584/PB) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Marcelo Navarro Ribeiro Dantas – DJe 24.02.2014 – p. 93)

10850 – IPI – importador comerciante – fato gerador – desembaraço aduaneiro – saída do estabelecimento comerciante – bitributação – não ocorrência

“Tributário. IPI. Importador comerciante. Fato gerador. Desembaraço aduaneiro. Saída do esta-belecimento comerciante. Bitributação. Não ocorrência. 1. No julgamento do REsp 1385952/SC,

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de relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 11.09.2013, firmou-se que ‘não há qual-quer ilegalidade na incidência do IPI na saída dos produtos de procedência estrangeira do esta-belecimento do importador, já que equiparado a industrial pelo art. 4º, I, da Lei nº 4.502/1964, com a permissão dada pelo art. 51, II, do CTN’. Precedentes do STJ. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.409.756 – (2013/0341278-2) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 06.03.2014 – p. 1056)

10851 – IPTU – imóvel construído – redução de alíquota – possibilidade“Juizado especial fazendário. Direito administrativo e direito tributário. Cobrança de IPTU relati-vo a imóvel construído. Redução da alíquota de 3% para 0,30%. Possibilidade. Carta de habite-se requerida há dois anos. Recurso conhecido e desprovido. 1. A homologação de pedido de habite--se do imóvel, junto à Administração Pública faz presumir tratar-se de imóvel construído, fato comprovado pelas contas de luz, que demonstram que o autor já reside no imóvel desde 2012. A demora da Administração Pública no procedimento administrativo para fornecimento do habite--se não pode prejudicar o contribuinte, de forma que deve incidir a alíquota de IPTU relativa a imóvel construído. 2. A demora da Administração Pública para expedir a carta de habite-se não pode prejudicar o contribuinte que envidou esforços para cumprir o que lhe competia, entregan-do a documentação em tempo hábil. Demais disso, a expedição da carta de habite-se apenas vinte e três dias após a ocorrência do fato gerador, não pode prejudicar o contribuinte por todo o ano de 2013. 3. Recurso conhecido e desprovido. Acórdão lavrado por súmula de julgamen-to, consoante determinação do art. 46 da LJE. Condenado o recorrente vencido ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação devidamente corrigido, nos termos do art. 20, § 3º, do CPC.” (TJDFT – Rec 2013.01.1.094132-6 – Ac. 758.304 – 1ª T.R.J.E. do Distrito Federal – Rel. Juiz Leandro Borges de Figueiredo – DJDFTE 12.02.2014 – p. 190)

10852 – IPTU – sociedade de economia mista – imunidade recíproca – aplicabilidade“Agravo regimental no recurso extraordinário. Tributário. Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU. Sociedade de economia mista concessionária de serviço público. Imunidade recíproca: aplicabilidade. Precedentes. Agravo regimental ao qual se nega provimento.” (STF – AgRg-RE 773.131 – Minas Gerais – 2ª T. – Relª Min. Cármen Lúcia – J. 17.12.2013)

Comentário Editorial SÍNTESENo caso ora comentado, questionou-se se à sociedade de economia mista também se aplica a imunidade recíproca, prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal a seguir colacionado:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

VI – instituir impostos sobre:

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;

O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais decidiu que a Companhia Energética de Minas Gerais – Cemig não faria jus à imunidade tributária recíproca, prevista no artigo su-pratranscrito. Diante disso, a entidade interpôs recurso especial, e posteriormente, o agravo regimental que gerou o acórdão ora comentado.

E ao analisar o agravo, manifestou-se a Ministra nos seguintes termos:

‘O Desembargador Relator do caso Tribunal de Justiça de Minas Gerais afirmou: ‘Em sede meritória, com a devida vênia, não obstante reconheça a existência de entendimentos em sentido contrário, tenho que razão não assiste à apelante, não se podendo dar guarida à sua fundamentação de não incidência do IPTU na hipótese, desenvolvida sob a ótica da natureza do uso do imóvel sobre o qual recai a exação, afetado por uma destinação pública, sua titula-ridade e reversão ao patrimônio público da União, bem como pela possibilidade de incidência da imunidade tributária intergovernamental, prevista no art. 150, VI, a, do CPC.

Inicialmente, registro a impossibilidade de que a prerrogativa da imunidade intergoverna-mental recíproca prevista no art. 150, inciso VI, a, da CF, e de interpretação restritiva, que,

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con soante a regra constitucional, recai apenas sobre as pessoas jurídicas de direito público (caput e § 2º do art. 150 da CF), seja estendida à apelante, sociedade de economia mista que explora atividade econômica delegada pelo Poder Público, com ‘sujeição a regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributárias’ (art. 173, § 1º, inciso II, da CF), para efeito de afastar a cobrança do IPTU.

Acrescente-se que, o simples fato de se tratar de prestadora de serviço delegado não torna a regra da imunidade recíproca extensível à apelante, mesmo porque o serviço é prestado pela Cemig a título oneroso e há regra constitucional clara de exceção, prevista no § 3º do art. 150 da CF, estabelecendo a não aplicação da imunidade recíproca ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário’.’

O acórdão recorrido destoa da jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal, que assegu-rou às sociedades de economia mista delegatárias de serviços públicos que não atuem em ambiente concorrencial o direito à imunidade tributária recíproca, nos termos da alínea a do inciso VI do art. 150 da Constituição da República.”

10853 – IPVA – prescrição – ocorrência

“Execução fiscal. Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotivo (IPVA). Prescrição do cré-dito tributário. Ocorrência. A ação para cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da notificação para pagamento, e não da data da lavratura do auto de infração que aplicou a multa por falta de pagamento. Precedentes do STJ. Sentença de extinção. Recurso improvido.” (TJSP – Ap 9003233-24.2011.8.26.0014 – São Paulo – 7ª CDPúb. – Rel. Guerrieri Rezende – DJe 12.02.2014 – p. 1561)

10854 – IR – adicional de produtividade – incidência

“Tributário. Recurso ordinário em mandado de segurança. Oficiais de justiça do Poder Judiciário do Estado de Rondônia. Imposto de Renda. Adicional de produtividade. Verba de caráter remu-neratório. Incidência. Recurso não provido. 1. O fato gerador do Imposto de Renda é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda, proventos de qualquer natureza ou acrés-cimos patrimoniais, nos termos do art. 43 do CTN. 2. Ao discorrer sobre aspectos da hipótese de incidência do Imposto de Renda, Regina Helena Costa leciona que ‘renda é o aumento de riqueza obtido num dado período de tempo, deduzidos os gastos necessários à sua aquisição e manutenção. A renda constitui acréscimo patrimonial, que não se confunde com o patrimônio de onde deriva – o capital, o trabalho ou a combinação de ambos’ (Curso de direito tributário: constituição e código tributário nacional. 2. ed. São Paulo: Saraiva. p. 256). 3. Segundo o art. 22 da Lei Complementar Estadual nº 568/2010, o ‘adicional de produtividade é devido aos analistas judiciários, na especialidade de oficial de justiça, no cumprimento de suas atribuições’. É parcela de natureza remuneratória devida em razão do exercício do cargo público, e não com a finali-dade específica de indenizar despesas inerentes às funções desempenhadas por essa categoria. Não se trata de estipêndio destinado a compensar os gastos realizados pelo servidor público. À míngua de caráter indenizatório, incide o Imposto de Renda. 4. Recurso ordinário não provido.” (STJ – RMS 34.113 – (2011/0089124-2) – 1ª T. – Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima – DJe 07.03.2014 – p. 105)

Comentário Editorial SÍNTESEIncide Imposto de Renda sobre o adicional de produtividade recebido por oficiais de justiça? Esta foi a discussão central do acórdão ora vergastado.

O acórdão foi oriundo de recurso ordinário em mandado de segurança interposto por Oficiais de Justiça do Poder Judiciário do Estado de Rondônia contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia que decidiu que o adicional de produtividade importa em acréscimo patrimonial, e que, portanto, deveria incidir Imposto de Renda na fonte sobre os valores percebidos a esse título.

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Alegaram os recorrentes que os valores recebidos a título de “adicional de produtividade”, criado pela Lei Complementar nº 568/2010, não está sujeito à incidência do Imposto de Renda, pois que “decorre do fato de o oficial de justiça ter custos financeiros que os demais servidores do Poder Judiciário não possuem para o desempenho de suas funções, como utilizar-se de veículo próprio, com todo o ônus decorrente dessa utilização, para a efetiva-ção dos mandados judiciais”, possuindo, portanto, caráter indenizatório; e que antes da LC 568/2010, os oficiais de justiça tinham direito à “gratificação de produtividade” nos moldes do atual “adicional de produtividade”, inclusive com relação aos valores, e sobre esta gratifi-cação não havia retenção de Imposto de Renda Pessoa Física.

Ao analisar a questão, os Ministros da 1ª Turma não foram unânimes em seu posicionamento.

O voto prevalente foi do Ministro Arnaldo Esteves Lima, Relator do acórdão, que manifestou--se nos seguintes termos:

“Como se sabe, o fato gerador do Imposto de Renda é a aquisição da disponibilidade econô-mica ou jurídica de renda, proventos de qualquer natureza ou acréscimos patrimoniais, nos termos do art. 43 do CTN, que dispõe:

Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

I – de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;

II – de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.

Ao discorrer sobre aspectos da hipótese de incidência do Imposto de Renda, Regina Helena Costa leciona, com a proficiência de sempre, que ‘renda é o aumento de riqueza obtido num dado período de tempo, deduzidos os gastos necessários à sua aquisição e manutenção. A renda constitui acréscimo patrimonial, que não se confunde com o patrimônio de onde deriva – o capital, o trabalho ou a combinação de ambos’ (Curso de direito tributário: constituição e código tributário nacional. 2. ed. São Paulo: Saraiva. p. 256).

Com efeito, são oferecidos à tributação pelo Imposto de Renda os ganhos obtidos como re-sultado do trabalho em determinado período de tempo. Se há acréscimo patrimonial, incide o imposto. Essa é a regra.

Todavia, não se enquadra nesse conceito, porquanto desprovidas de ensejar acréscimo patri-monial, as verbas de caráter indenizatório destinadas ao custeio de despesas relacionadas ao exercício do cargo público, tal como ocorre no caso do auxílio-condução.

Nesse sentido, segue a jurisprudência desta Corte:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL – OFICIAL DE JUS-TIÇA – AUXÍLIO-CONDUÇÃO – NÃO INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE RENDA – 1. Não incide Imposto de Renda sobre o auxílio-condução pago aos oficiais de justiça como mecanismo de ressarcimento pelas despesas (combustíveis, veículos próprios) por eles realizadas para o cumprimento de diligências.

Precedentes do STJ.

2. Agravo regimental não provido. (AgRg-REsp 1.385.723/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 04.10.2013)

Com efeito, segundo a pacífica orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, o Imposto de Renda pessoa física incidirá sobre as parcelas de natureza remuneratória. Se indenizatória, não incide o tributo. Nesse sentido:

TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE RENDA – ART. 43 DO CTN – VERBAS: NATUREZA INDENIZA-TÓRIA X NATUREZA REMUNERATÓRIA. 1. O fato gerador do Imposto de Renda é a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica decorrente de acréscimo patrimonial (art. 43 do CTN). 2. A jurisprudência desta Corte, a partir da análise do art. 43 do CTN, firmou entendi-mento de que estão sujeitos à tributação do Imposto de Renda, por não possuírem natureza indenizatória, as seguintes verbas:

a) ‘indenização especial’ ou ‘gratificação’ recebida pelo empregado quando da rescisão do contrato de trabalho por liberalidade do empregador;

b) verbas pagas a título de indenização por horas extras trabalhadas;

c) horas extras;

d) férias gozadas e respectivos terços constitucionais;

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e) adicional noturno;f) complementação temporária de proventos;g) décimo terceiro salário;h) gratificação de produtividade;i) verba recebida a título de renúncia à estabilidade provisória decorrente de gravidez; ej) verba decorrente da renúncia da estabilidade sindical.3. Diferentemente, o Imposto de Renda não incide sobre:a) APIPs (ausências permitidas por interesse particular) ou abono-assiduidade não-gozados, convertidos em pecúnia;b) licença-prêmio não-gozada, convertida em pecúnia;c) férias não-gozadas, indenizadas na vigência do contrato de trabalho e respectivos terços constitucionais;d) férias não-gozadas, férias proporcionais e respectivos terços constitucionais, indenizadas por ocasião da rescisão do contrato de trabalho;e) abono pecuniário de férias;f) juros moratórios oriundos de pagamento de verbas indenizatórias decorrentes de condena-ção em reclamatória trabalhista;g) pagamento de indenização por rompimento do contrato de trabalho no período de estabili-dade provisória (decorrente de imposição legal e não de liberalidade do empregador).4. Hipótese dos autos em que se questiona a incidência do Imposto de Renda sobre verbas pagas espontaneamente pelo empregador e férias convertidas em pecúnia no momento da rescisão do contrato de trabalho.5. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 910.262/SP, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, DJe 08.10.2008)No caso em exame, segundo o art. 22 da Lei Complementar Estadual nº 568/2010, o ‘adicio-nal de produtividade é devido aos analistas judiciários, na especialidade de oficial de justiça, no cumprimento de suas atribuições’.Pela leitura do dispositivo, verifica-se que é parcela de natureza remuneratória devida em razão do exercício do cargo público, e não com a finalidade específica de indenizar alguma das despesas inerentes às funções desempenhadas por essa relevante categoria. Com efeito, nos termos da lei estadual, não se trata de compensação por gastos realizados pelo servidor público, de cunho indenizatório. Daí a incidência do imposto.Outrossim, ao examinar os contracheques que instruem a inicial, constata-se que os impe-trantes auferem, além de auxílio transporte, a verba ‘gratificação indenização de transporte’, que corresponde a 10% (dez por cento) do salário básico do servidor. É certo que aquela verba, conforme sua própria denominação, detém caráter indenizatório, insusceptível, em consequência, da incidência do Imposto de Renda, porquanto visa retribuir os gastos decor-rentes dos deslocamentos necessários aos cumprimentos dos mandados.Nesse contexto, haveria, ainda, evidente bis in idem se se reconhecesse a parcela ‘adicional de produtividade’ também como de natureza indenizatória.”E com esse posicionamento, negou provimento ao recurso interposto.Porém, o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, divergindo do Relator, assim proferiu seu voto:“[...] ouvi atentamente o voto de V. Exa., li o que V. Exa. escreveu, inclusive, a bem lançada ementa.Concordo que a denominação desse adicional parece, realmente, induzir a sua natureza remu-neratória. Entretanto, se V. Exa. examinar com uma lupa, verá que se trata de um adicional variável em função da distância das diligências e em função da complexidade dos mandados.2. Tenho a impressão de que a única justificativa para esse adicional, chamado de produti-vidade, é precisamente ressarcir ou recompor os dispêndios e as despesas realizadas pelos oficiais de justiça no cumprimento dessas diligências; do contrário, seria, na verdade, um salário remuneração e não teria sentido o destaque como verba de produtividade.3. Concordo inteiramente com a lição da Professora e Ministra Regina Helena Costa. Real-mente, o aumento ou incremento patrimonial é o fundamento no Imposto de Renda, mas, no caso, pelo que percebi, esse adicional é de natureza ‘recompositiva’.4. Peço vênia a V. Exa. para divergir, com todo o respeito, do seu bem lançado voto, para dar provimento ao recurso ordinário em mandado de segurança, por entender que se trata de verba destinada a indenizar despesas apresentadas pelos oficiais de justiça.”

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10855 – IR – auxílio pré-escolar – não incidência“Direito administrativo. Direito tributário. Auxílio pré-escolar. Não incidência de Imposto de Renda. Juros de mora a partir do trânsito em julgado. 1. Acórdão elaborado de conformidade com o disposto nos arts. 46 da Lei nº 9.099/1995, 12, inciso IX, 98 e 99 do Regimento Interno das Turmas Recursais. Recurso próprio, regular e tempestivo. 2. Auxílio pré-escolar. A verba paga pelo Distrito Federal a título de auxílio pré-escola (creche), tem natureza indenizatória, não incidindo sobre ela o imposto de renda (REsp 625506/RS, Recurso Especial nº 2003/0237269-2, Relator Ministro João Otávio de Noronha). Precedentes nesta Turma (Acórdão nº 726394, 20130111024354ACJ, Relator Antônio Fernandes da Luz, 2ª Turma Recursal dos Juizados Espe-ciais Cíveis e Criminais do DF, Data de Julgamento. 22.10.2013, publicado no DJe 28.10.2013, p. 254). Deve, pois, a administração restituir as quantias indevidamente retidas a este título. 3. Juros de mora. Termo inicial. Tratando- se de repetição de indébito tributário, a incidência de juros de mora tem como termo inicial o trânsito em julgado da sentença, na forma do art. 167, parágrafo único, do CTN, bem como a Súmula nº 188 do STJ. 4. Recurso conhecido e provido, em parte, apenas para fixar o termo inicial da incidência de juros de mora, a partir do trânsito em julgado. Sem custas e honorários.” (TJDFT – Rec 2013.01.1.119590-8 – Ac. 758.095 – 2ª T.R.J.E. do Distrito Federal – Rel. Juiz Aiston Henrique de Sousa – DJDFTE 12.02.2014 – p. 211)

10856 – IR – isenção – serviços prestados ao programa de desenvolvimento das nações unidas – pessoa jurídica – impossibilidade

“Tributário. Isenção de Imposto de Renda sobre serviços prestados ao programa de desenvolvi-mento das nações unidas. Pessoa jurídica. Impossibilidade. Inaplicabilidade do entendimento acolhido pelo STJ no julgamento do REsp 1.306.393, sob a sistemática dos recursos repetitivos. 1. Caso em que a apelante pretende a reforma de sentença denegatória da segurança, dado que reconhecera a impossibilidade de isenção do Imposto de Renda sobre os serviços prestados pela recorrente ao Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento – PNUD. 2. Não há como conceder isenção de IRPJ sobre os serviços prestados pela recorrente ao PNUD, vez que a legislação de regência do tributo restringiu a outorga do benefício discutido nos autos à pes-soa física e aos servidores vinculados ao organismo internacional. Inteligência do art. 5º da Lei nº 4.506/1964. 3. O entendimento acolhido pelo STJ no julgamento do REsp 1.306.393, sob a sistemática dos recursos repetitivos, não serve a amparar a tese defendida pela apelante, dado que todas as disposições da Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas ali referenciadas são aplicáveis unicamente às pessoas físicas que atuem na qualidade de funcio-nários e peritos de assistência técnica. 4. Apelação não provida.” (TRF 5ª R. – AC 0001281-87.2013.4.05.8300 – (559777/PE) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Roberto de Oliveira Lima – DJe 25.02.2014 – p. 90)

10857 – IR – pessoa física – reclamação trabalhistas – verba salarial recebida judicialmen-te – montante global acumulado – não incidência

“Tributário. Imposto de Renda Pessoa Física. Parcelas remuneratórias atrasadas percebidas judi-cialmente em virtude de reclamação trabalhista. Incidência do ir sobre o montante global acumu-lado. Impossibilidade. Alíquota vigente à época em que o pagamento era devido. Entendimento consolidado pelo STJ em sede de recurso repetitivo. 1. O art. 12 da Lei nº 7.713/1988 deve ser interpretado conforme a Constituição, para que dele não se extraia a determinação de fazer incidir o tributo ainda que os valores pagos acumuladamente, se considerados pelos meses nos quais eram devidos, estivessem dentro da faixa de isenção ou mesmo enquadrados em alíquotas menores, sob pena de se afrontar o princípio da isonomia tributária inserto no art. 150, II, da CF. O recebimento de verbas salariais em atraso não pode significar para o contribuinte sofrer tributa-ção diferenciada em relação àqueles que tiveram o pagamento de seus salários em época própria. 2. A Primeira Seção do STJ, ao julgar o REsp 1.118.429/SP, sob o regime do art. 543-C do CPC, assentou entendimento no sentido de que ‘o Imposto de Renda incidente sobre os benefícios pa-gos acumuladamente deve ser calculado de acordo com as tabelas e alíquotas vigentes à época em que os valores deveriam ter sido adimplidos, observando a renda auferida mês a mês pelo

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segurado, não sendo legítima a cobrança de IR com parâmetro no montante global pago extem-poraneamente’. 3. Considerada a especial eficácia vinculativa do julgado, a teor do que dispõe o art. 543-C, § 7º, do CPC, impõe-se sua aplicação, nos mesmos termos, aos casos análogos, como o dos autos. 4. Apelação improvida.” (TRF 5ª R. – AC 0000602-30.2012.4.05.8201 – (566510/PB) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Roberto de Oliveira Lima – DJe 25.02.2014 – p. 95)

Transcrição Editorial SÍNTESELei nº 7.713/1988:“Art. 12. No caso de rendimentos recebidos acumuladamente, o imposto incidirá, no mês do recebimento ou crédito, sobre o total dos rendimentos, diminuídos do valor das despesas com ação judicial necessárias ao seu recebimento, inclusive de advogados, se tiverem sido pagas pelo contribuinte, sem indenização.”

10858 – IR – juros de mora – verba indenizatória – incidência“Tributário. Agravo regimental no recurso especial. Imposto de Renda da Pessoa Física – IRPF. Regra geral de incidência sobre juros de mora, mesmo em se tratando de verba indenizatória. Art. 16, caput e parágrafo único, da Lei nº 4.506/1964. Caso de juros de mora decorrentes de be-nefícios previdenciários pagos em atraso. 1. Regra-geral, incide Imposto de Renda sobre juros de mora a teor do art. 16, parágrafo único, da Lei nº 4.506/1964: ‘Serão também classificados como rendimentos de trabalho assalariado os juros de mora e quaisquer outras indenizações pelo atraso no pagamento das remunerações previstas neste artigo’. Jurisprudência uniformizada no REsp 1.089.720/RS, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10.10.2012. 2. Primeira exceção: não incide Imposto de Renda sobre os juros de mora decorrentes de verbas trabalhistas pagas no contexto de despedida ou rescisão do contrato de trabalho consoante o art. 6º, inciso V, da Lei nº 7.713/1988. Jurisprudência uniformizada no recurso representativo da controvérsia REsp 1.227.133/RS, 1ª Seção, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Rel. p/o Acórdão Min. Cesar Asfor Rocha, Julgado em 28.09.2011. 3. Segunda exceção: são isentos do Imposto de Renda os juros de mora incidentes sobre verba principal isenta ou fora do campo de incidência do IR, conforme a re-gra do accessorium sequitur suum principale. Jurisprudência uniformizada no REsp 1.089.720/RS, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10.10.2012. 4. Caso concreto em que se discute a incidência do Imposto de Renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de benefício previdenciário. Incidência da regra-geral constante do art. 16, parágrafo único, da Lei nº 4.506/1964. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.420.552 – (2013/0388546-7) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 11.02.2014 – p. 1734)

10859 – IR – pessoa jurídica – execução fiscal – redirecionamento – interventora em uni-dade hospitalar – possibilidade

“Tributário. IRPJ. Embargos. Execução fiscal. Ilegitimidade passiva. Interventora. 1. A função de interventora exercida em unidade hospitalar autoriza o redirecionamento da ação executiva, na forma do art. 135, III, do CTN. 2. Hipótese em que se reconhece a alegação de ilegitimidade pas-siva do executado, porquanto comprovada, de plano, sua ocorrência, haja vista que, no período do fato gerador do tributo, a embargante não exercia qualquer função na instituição devedora.” (TRF 4ª R. – AC 0011189-45.2013.404.9999/RS – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona – DJe 19.02.2014 – p. 56)

10860 – IR – pessoa jurídica – recolhimento – sistemática – compensação de prejuízos“Tributário. Compensação de prejuízos. Lei nº 8.383, de 1991. A partir da Lei nº 8.383, de 1991, o Imposto de Renda devido pelas pessoas jurídicas é recolhido no próprio exercício em que ocorre o fato gerador do tributo. Há, portanto, divergência entre o acórdão embargado e aquele indicado como paradigma a propósito da aplicação da aludida lei: se a compensação dos prejuí-zos apurados só é possível a partir da sua vigência (como decidiu o acórdão paradigma) ou se alcança prejuízos apurados anteriormente (na linha do que decidiu o acórdão embargado). A Lei nº 8.383, de 1991, que passou a vigorar a partir de janeiro de 1992 – ponto a cujo respeito os acórdãos não discrepam –, estabeleceu que ‘o prejuízo apurado na demonstração do lucro real

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em um mês poderá ser compensado com o lucro real dos meses subsequentes’ (art. 38, § 7º), de modo que não há que se falar em compensação de prejuízos apurados em período anterior à sua vigência. Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes para dar provimento aos embargos de divergência.” (STJ – EDcl-AgRg-ED-REsp 465.594 – (2009/0030471-5) – 1ª S. – Rel. Min. Ari Pargendler – DJe 19.02.2014 – p. 930)

10861 – Isenção – estrangeiro – bens de uso pessoal e móveis – requisitos“1. Trata-se de apelação interposta em face de sentença que, em ação mandamental contra ato do Inspetor de Alfândega no Porto de Pecém, confirmou a liminar, deferindo parcialmente a pretensão no sentido de determinar a liberação da bagagem desacompanhada e manter a não isenção do respectivo tributo. 2. O cerne da presente questão é a possibilidade ou não de a auto-ra isentar-se do pagamento de tributo referente ao ingresso de bens de uso pessoal e doméstico, após residir no exterior por período superior a um ano e permanecer no Brasil por tempo superior a 45 (quarenta e cinco) dias nos 12 (doze) meses anteriores ao seu retorno definitivo, sob o ar-gumento de que a IN 1.059/2010, de hierarquia inferior, restringiu direitos previstos no Decreto nº 6.759/2009. 3. A IN 1.059/2010 exige dois requisitos: residentes no exterior que ingressem no País para nele residir de forma permanente tenham lá permanecido por período superior a um ano; e permanência no Brasil por tempo inferior a 45 (quarenta e cinco) dias nos 12 (doze) meses anteriores ao regresso definitivo. O Decreto nº 6.759/2009 exige apenas o primeiro requisito. 4. Hipótese em que a impetrante, brasileira, empresária, não preencheu os requisitos estabele-cidos pela legislação tributária, que não são ilegais nem despropositados, tendo por finalidade evitar fraudes e abusos. 5. Ausência de qualquer documento comprobatório do animus da im-petrante de aqui fixar residência, tais como taxa de condomínio, fatura de cartão de crédito ou contrato de prestação de serviço público de energia elétrica. 6. Verifica-se constantes entradas e saídas por parte da impetrante, desde janeiro/2010 até novembro/2012. A sua justificativa por ter ultrapassado o tempo permitido pela IN RFB 1.059/2010 não merece prosperar, pois o acompa-nhamento do pai por questão de saúde se deu quando da sua última entrada no País (fls. 24/26 e 45). 7. Apelação improvida e manutenção do pagamento de tributo referente ao ingresso de bens de uso pessoal e doméstico.” (TRF 5ª R. – Ap-Reex 00023922720134058100 – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Rogério Fialho Moreira – DJe 21.11.2013)

Comentário Editorial SÍNTESEÉ possível a isenção tributária referente ao ingresso de bens de uso pessoal e doméstico, por pessoa física que após residir no exterior por período superior a um ano e permanecer no Brasil por tempo superior a 45 (quarenta e cinco) dias nos 12 (doze) meses anteriores ao seu retorno definitivo?Preleciona a Instrução Normativa RFB nº 1.059/2010:“Art. 35. Os residentes no exterior que ingressem no País para nele residir de forma perma-nente, e os brasileiros que retornem ao País, provenientes do exterior, depois de lá residirem há mais de 1 (um) ano, poderão ingressar no território aduaneiro, com isenção de tributos, os seguintes bens, novos ou usados:I – móveis e outros bens de uso doméstico; eII – ferramentas, máquinas, aparelhos e instrumentos necessários ao exercício de sua profis-são, arte ou ofício, individualmente considerado.§ 1º A fruição da isenção para os bens referidos no inciso II do caput estará sujeita à prévia comprovação da atividade desenvolvida pelo viajante, e, no caso de residente no exterior que regresse, do decurso do prazo estabelecido no caput.§ 2º Não prejudicam a contagem do prazo a que se refere o caput viagens ocasionais ao Brasil, desde que totalizem permanência no País inferior a 45 (quarenta e cinco) dias nos 12 (doze) meses anteriores ao regresso.§ 3º No caso de estrangeiro, enquanto não lhe for concedido o visto permanente, seus bens poderão ingressar no território aduaneiro sob o regime de admissão temporária.§ 4º O disposto neste artigo não prejudica a aplicação dos tratamentos tributários gerais de isenção e de tributação especial para viajantes procedentes do exterior, referidos, respectiva-mente, nos arts. 33 e 41 desta Instrução Normativa.”

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A Instrução Normativa (IN) nº 1.059/2010 da RFB dispõe sobre os procedimentos de contro-le aduaneiro e o tratamento tributário aplicáveis aos bens de viajante.Entre as disposições da citada IN, é importante destacar o § 2º do art. 35, que dispõe sobre o prazo máximo de permanência no País nos últimos 12 meses, para que o residente no exterior possa ingressar no País para fixar residência com isenção dos tributos sobre sua bagagem.Verifica-se que a IN 1.059/2010 busca evitar fraudes e abusos por parte dos viajantes que, cada vez mais, entram no País com bagagem em caráter temporário.O acórdão ora comentado é oriundo de apelação interposta contra sentença que em mandado de segurança contra ato do Inspetor de Alfândega no Porto de Pecém, deferiu parcialmente pedido determinando a liberação da bagagem com bens de uso pessoal e doméstico e manter a não isenção do respectivo tributo.Recorreu a autora alegando que o art. 35, § 2º, da IN 1.059/2010 extrapolou o conteúdo do art. 162 do Decreto nº 6.759/2009 ao exigir do brasileiro residente no exterior, além da permanência em país estrangeiro por período superior a um ano, estadia em território bra-sileiro por tempo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias nos 12 (doze) meses anteriores ao retorno definitivo.Ao analisar o caso, além de mencionar a IN já transcrita, o Desembargador Relator trouxe à baila o art. 162 do Decreto nº 6.759/2009, que regulamenta a administração das atividades aduaneiras, e a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior:“Art. 162. Sem prejuízo do disposto no art. 157, o brasileiro ou o estrangeiro residente no País, que tiver permanecido no exterior por período superior a um ano, ou o estrangeiro que ingressar no País para nele residir, de forma permanente, terá direito à isenção relativa aos seguintes bens, novos ou usados (Regime Aduaneiro de Bagagem no Mercosul, art. 11, inciso 1, aprovado pela Decisão CMC nº 53, de 2008, internalizada pelo Decreto nº 6.870, de 2009): (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010).I – móveis e outros bens de uso doméstico; eII – ferramentas, máquinas, aparelhos e instrumentos, necessários ao exercício de sua profis-são, arte ou ofício, individualmente considerado.[...]”E manifestou-se conforme segue:“De fato, a IN 1.059/2010 exige dois requisitos temporais, enquanto o Decreto nº 6.759/2009 exige apenas um, o primeiro: a) residentes no exterior que ingressem no País para nele residir de forma permanente tenham lá permanecido por período superior a um ano;b) permanência no Brasil por tempo inferior a 45 (quarenta e cinco) dias nos 12 (doze) meses anteriores ao regresso definitivo. Ao contrário do que alega o recorrente, a regra constante do § 2º do art. 35 da Instrução Normativa RFB nº 1.059/2010, em princípio, não é ilegal nem despropositada.A sua razão de ser reside na fixação de um critério temporal uniforme a orientar o deferimento das isenções nos casos concretos.Tem a finalidade de evitar fraudes ou abusos, a exemplo de quem, para conseguir importar bens sem a incidência dos tributos loca imóvel no exterior pelo prazo de um ano, mas mantém também a residência no Brasil, dirigindo-se ao outro país somente esporadicamente.No caso, a impetrante, brasileira, empresária, divorciada, morou no exterior por sete anos, e resolveu voltar a residir em seu país de origem.Entretanto, não consta dos autos qualquer documento comprobatório de seu animus de aqui fixar residência, tais como taxa de condomínio, fatura de cartão de crédito ou contrato de prestação de serviço público de energia elétrica.Quanto ao segundo requisito exigido no art. 35, § 2º, da IN RFB 1.059/2010, a impetrante permaneceu no País pelo período de 131 dias nos 12 meses anteriores à data de seu regresso definitivo, alegando que o tempo despendido foi para deliberar a respeito de aquisição de imó-vel para residir com seu companheiro e acompanhar seu pai, submetido a uma intervenção cirúrgica (apendicite) em 03.12.2012, em recuperação pós-operatória.Contudo, conforme documento do Sistema de Tráfego Internacional do Serviço Público Fe-deral (fls. 45/46-v), verifico constantes entradas e saídas por parte da impetrante, desde janeiro/2010 até novembro/2012, período anterior, portanto, à intervenção cirúrgica do pai.

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Desta forma, a justificativa da impetrante por ter ultrapassado o tempo permitido pela IN RFB 1.059/2010 não merece prosperar, pois o acompanhamento do pai por questão de saúde se deu quando da sua última entrada no País (fls. 24/26 e 45).”E por entender que não houve o preenchimento de todos os previstos na norma, deveria ser mantida a obrigação de pagamento do tributo referente ao ingresso de bens de uso pessoal e doméstico.

10862 – Isenção – tributos estaduais – aquisição de veículo automotor – portador de ne-cessidades especiais – possibilidade

“Direito tributário. Agravo de instrumento. Isenção de tributos estaduais (ICMS e IPVA). Aquisição de veículo automotor. Possibilidade. Condição de deficiente físico. Convênio ICMS nº 03/2007. Presença dos pressupostos do art. 273 do CPC para a concessão da tutela antecipada. Preceden-tes STJ e TJCE. Decisão recorrida fundamentada. Observância ao art. 93, IX, CF/1988. Recurso conhecido e improvido. Decisão interlocutória mantida. 1. Cuidam os autos de instrumento in-terposto pelo Estado do Ceará contra decisão interlocutória por meio da qual o MM. Juiz de Direito, respondendo da 5ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza deferiu pedido de liminar formulado nos autos de Ação Ordinária nº 0180614-38.2012.8.06.0001, ajuizado pela agravada, no intuito de obter a isenção tributária (IPVA e ICMS) estabelecida pelo § 7º da cláusula primeira do Convênio ICMS nº 03/2007, tendo em vista a condição de deficiente físico, independentemente de possuir Carteira Nacional de Habilitação – CNH ou de que o veículo adquirido seja adaptado. 2. Apesar da decisão recorrida citar norma jurídica revogada sobre a isenção de IPVA, ou indevidamente aplicar a analogia com a isenção do IPI, ainda assim, apre-senta outros elementos jurídicos adequados para validar a isenção tributária para a agravada, na condição de portadora de deficiência física, e ainda, o preenchimento dos requisitos necessários à concessão da tutela de urgência. 3. Analisando-se os documentos acostados pelo agravante, verifica-se que, ao contrário dos argumentos ofertados pelo mesmo, efetivamente a deficiência física da agravada foi comprovada pelo laudo de avaliação assinado por três médicos, sendo portadora de amputação total do membro inferior direito, configurando a prova inequívoca de suas alegações. 4. É anti-isonômico o tratamento existente entre os deficientes que podem dirigir veículos adaptados e aqueles que, pelo quadro da deficiência não podem dirigir mas precisam da locomoção veicular, ou que apesar de deficientes não precisam adaptar os veículos automotores. 5. Destaque-se ainda, que a decisão recorrida está amparada na Lei nº 7.853/1989, que dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência física, sendo importante citar os arts. 1º e 2º, onde se enquadra a necessidade de isenção tributária de ICMS e IPVA para a agravada, indepen-dentemente de possuir CNH ou do veículo adquirido ser adaptado. 6. Agravo de instrumento conhecido e improvido.” (TJCE – AI 0079651-25.2012.8.06.0000 – Relª Maria Vilauba Fausto Lopes – DJe 05.03.2014 – p. 83)

10863 – ISS – atividade notarial – regime de tributação fixa – inaplicabilidade“Tributário. ISS. Atividade notarial. Regime de tributação fixa. Art. 9º, § 1º, do Decreto-Lei nº 406/1968. Inaplicabilidade. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que não se aplica à atividade notarial a sistemática de recolhimento de ISS prevista no art. 9º, § 1º, do Decreto-Lei nº 406/1968. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 425.448 – (2013/0363559-4) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 06.03.2014 – p. 991)

10864 – ISS – prestador de serviço – sede – localização diversa do contratante – pagamen-to – responsabilidade – exegese

“ISSQN. Empresa prestadora de serviços sede em local diverso da contratante tomador de ser-viços responsabilidade pelo pagamento do tributo previsão legal. Apelação cível. Embargos à execução fiscal. ISSQN. Empresa prestadora de serviço com sede em local diverso da empresa contratante. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Precedentes jurisprudenciais. Hipótese em que o tomador do serviço tem o dever de reter e repassar o tributo aos cofres municipais. 1. Con-siste a controvérsia em saber qual Município é titular do crédito de ISS: o Município de Niterói, onde é prestado o serviço desenvolvido pelo contribuinte (limpeza e conservação); ou o Municí-

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pio de Rio Bonito, local de sua sede. 2. A questão preliminar, suscitada pela parte apelante, que diz respeito à nulidade da sentença por cerceamento de defesa, merece ser rejeitada. 3. Está claro nos autos que em todos os momentos foi assegurada a produção de provas às partes e a possibili-dade de manifestação e, no caso específico, restou estabelecido, às 126, que a contratada, Clear Jet Serviços Ltda., deveria apresentar mensalmente todos os comprovantes de recolhimento dos impostos. 4. Percebe-se, assim, que não é necessária a intimação da prestadora de serviço, se o próprio apelante/contratante tem a prova da quitação do tributo ou, pelo menos, deveria ter, conforme o contrato. 5. Além disso, as provas se destinam ao convencimento do Magistrado, que determinará as necessárias ao processo e indeferirá as diligências inúteis ou meramente protelatórias. 6. O apelante busca cancelar os Autos de Infração nºs 69305 e 69304 lavrados pelo Município de Niterói em razão da ausência de retenção e repasse do ISS, referente aos serviços prestados pela Clear Jet Serviços Ltda., no período de janeiro/2002 a dezembro/2003 e janeiro e fevereiro/2004. 7. Da análise do art. 3º da LC 116/2003 vê-se que, em regra, o ISS é devido ao Município onde está localizado o estabelecimento do prestador do serviço, independentemente do Município em que o serviço for prestado. Entretanto, nas hipóteses elencadas nos incisos I a XXII do aludido dispositivo legal, o imposto será devido no Município em que o serviço for pres-tado, ainda que o prestador tenha sede em Município diverso. 8. No caso, conforme consta dos autos, trata-se de prestação de serviço de limpeza e conservação, prestado no período de janei-ro/2002 a dezembro/2003 e janeiro e fevereiro/2004. O serviço foi prestado no estabelecimento da apelante, localizado no Município de Niterói e a empresa prestadora de serviço tem sede no Município de Rio Bonito. 9. Pela regra geral, o ISS seria devido no Município de Rio Bonito, local do estabelecimento do prestador do serviço. Todavia, ante o quadro descrito, verifica-se que a prestação do serviço amolda-se às hipóteses previstas nos incisos VI e VII do art. 3º da LC 116/2003, ensejando, portanto, o recolhimento do tributo no Município de Niterói, local da prestação do serviço. 10. Por outro lado, o art. 6º, caput, da LC 116/2003 faculta aos Municípios e ao Distrito Federal a atribuição, mediante lei, da responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação. Tal responsabilidade vincula o responsável tributário independentemente de ter sido efetuada a retenção do tributo na fonte, quando do pagamento pelo serviço prestado, conforme previsto no § 1º do dispositivo em comento. 11. A atribuição da responsabilidade a terceira pessoa vinculada ao fato gerador também encontra suporte no art. 128 do CTN. 12. O Código Tributário do Município de Niterói – Lei nº 480/1983, vigente à época da ocorrência do fato gerador do imposto objeto da execução embargada, estabeleceu, em seu art. 58, inciso I, a atribuição da responsabilidade pelo pagamento do ISS àquele que permitir em seus estabeleci-mentos ou domicílio a exploração de atividade tributável sem estar o prestador de serviços inscri-to no cadastro fiscal do Município. 13. Diante do disposto no art. 6º da LC 116/2003 e no art. 58, I, do CTMN, vigente à época do fato gerador da obrigação tributária tratada nos autos, e da au-sência de inscrição da prestadora do serviço no cadastro fiscal do Município de Niterói, de fato, o apelante é responsável pelo recolhimento do ISS devido em razão do serviço prestado em seu estabelecimento pela Clear Jet Serviços Ltda., nos períodos de janeiro/2002 a dezembro/2003 e janeiro e fevereiro/2004, conforme consta dos autos de infração de fls. 63 e 121. 14. A existência de um contrato firmado entre as partes, como alega o apelante, não é capaz de afastar a respon-sabilidade do apelante. 15. Também, não se pode falar em bitributação porque a única pessoa política autorizada a exigir o tributo no caso é o Município de Niterói e o eventual pagamento realizado pela prestadora de serviço foi efetuado de forma incorreta, sem observar a legislação aplicável ao caso. 16. Desprovimento do recurso.” (TJRJ – Ap 0017725-84.2006.8.19.0002 – 20ª C.Cív. – Relª Leticia de Faria Sardas – DJe 08.01.2014 – p. 24)

10865 – ISS – serviços bancários congêneres – legitimidade “Tributário. Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Embargos à execução fiscal. ISS. Incidência sobre os serviços bancários congêneres. Legitimidade. Súmula nº 424/STJ. Verificação do correto enquadramento da atividade desempenhada na lista de servi-

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ços. Questão atrelada ao reexame de matéria de fato. Tributo sujeito a lançamento por homolo-gação. Não ocorrência de pagamento antecipado. Aplicação do art. 173, I, do CTN. Prescrição não configurada. Assertivas de nulidade do auto de infração, cerceamento de defesa, atualização indevida do débito, bem como provas suficientes para o provimento dos embargos do devedor. Modificação. Óbice na Súmula nº 7 desta Corte Superior. 1. A orientação da Primeira Seção desta Corte firmou-se no sentido de que, em regra, o prazo para se efetuar o lançamento é o previsto no art. 173, I, do CTN, ou seja, cinco anos contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. Contudo, tratando-se de tributo sujeito a lança-mento por homologação, cujo pagamento ocorreu de modo antecipado, o prazo de que dispõe o Fisco para constituir o crédito tributário é de cinco anos, contados a partir do fato gerador. No caso concreto, não havendo pagamento antecipado, aplica-se a regra prevista no art. 173, I, do CTN (EREsp 413.265/SC, 1ª Seção, Relª Min. Denise Arruda, DJ de 30.10.2006). 2. ‘É legítima a incidência de ISS sobre os serviços bancários congêneres da lista anexa ao DL 406/1968 e à LC 56/1987’ (Súmula nº 424/STJ). 3. ‘O exame do enquadramento das atividades desempenhadas pela instituição bancária na Lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei nº 406/1968 demanda o ree-xame do conteúdo fático-probatório dos autos, vedado pela Súmula nº 7 desta Corte’ (AgRg-REsp 1.130.122/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJe de 30.03.2010; AgRg-Ag 1.293.948/MG, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 05.11.2010). 4. O reexame de matéria de prova é inviável em sede de recurso especial (Súmula nº 7/STJ). 5. Não havendo no acórdão recorrido omissão, obscuridade ou contradição, não fica caracterizada ofensa aos arts. 458 e 535 do CPC. 6. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AG-REsp 438.514 – (2013/0391106-6) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 25.02.2014 – p. 1509)

10866 – ISS – serviços gráficos – suspensão da exigibilidade – cabimento“Antecipação de tutela. ISS. Agravo de instrumento. Serviços gráficos. Insurgência de contribuinte contra o pagamento do tributo em questão, aduzindo que seus produtos industrializados estão sujeitos ao ICMS e que o STF afastou a incidência do ISS em relação às embalagens, nos autos da ADIn 4389. Pedido de concessão de tutela antecipada contra a Prefeitura Municipal de Sorocaba, para o fim de se suspender a exigibilidade do crédito tributário, que é negado em primeiro grau. Agravo interposto contra tal decisão. Posterior reconsideração da mesma. Recurso prejudicado.” (TJSP – AI 2023563-38.2013.8.26.0000 – Sorocaba – 18ª CDPúb. – Rel. Wanderley José Federighi – DJe 12.02.2014 – p. 1598)

10867 – ISS – serviços portuários – embarcações estrangeiras – pagamento por residente no exterior – incidência

“Tributário. Apelação cível em mandado de segurança. ISS sobre serviços portuários em embar-cações estrangeiras. Incidência. Recurso desprovido. ‘Independentemente de os serviços pres-tados pela agravante serem prestados a empresas estrangeiras ou em navios de bandeira estran-geira ou com rota internacional, não há que se negar serem executados em território nacional, incidindo na exceção prevista no parágrafo único do art. 2º da Lei Complementar nº 116/2003, que autoriza a incidência do ISS sobre ‘serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior’. Noutros termos, a recorren-te não exporta serviços, apenas presta serviços no Porto de São Francisco do Sul para empresas ou navios que se dedicam ao transporte internacional’ (TJSC, AI 2006.010605-6, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, J. 06.12.2006).” (TJSC – Ap-MS 2008.047093-3 – 2ª CDPúb. – Rel. Des. Cid Goulart – DJe 03.12.2013)

10868 – ITBI – entidade religiosa – imunidade tributária – alcance “Processual civil. Agravo regimental no agravo. Recurso especial. Tributário. ITBI. Entidade reli-giosa. Imunidade tributária. Art. 333, inciso II, do CPC. Ônus da prova. 1. Tratando-se a recorrida de entidade religiosa, há presunção relativa de que o terreno adquirido para construção do tem-plo gerador do débito é revertido para as suas finalidades essenciais. Assim é que caberia à Fazen-da Pública, nos termos do art. 333, inciso II, do CPC, apresentar prova de que o terreno em co-

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mento estaria desvinculado da destinação institucional. 2. Precedentes: AgRg-AREsp 380.953/ES, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, DJe 14.11.2013; AgRg-AREsp 239.268/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, DJe 12.12.2012; AgRg-Ag 849285/MG, Relª Min. Denise Arruda, 1ª Turma, DJ 17.05.2007; AgRg-REsp 1215119/RJ, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, DJe 04.04.2011. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 444.193 – (2013/0398718-0) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 07.02.2014 – p. 461)

10869 – ITR – competência – foro do domicílio do executado – efeitos“Processual civil. Tributário. Embargos de declaração em agravo regimental. Imposto Territorial Rural (ITR). Competência. Foro do domicílio do executado. Art. 109, § 3º, do Código de Processo Civil. Omissão inexistente. Embargos não providos. 1. Inexistindo no v. acórdão embargado qual-quer ponto omisso sobre que se deva pronunciar esta colenda Turma, mas tão somente o intuito de infringência do julgado, rejeitam-se os embargos de declaração. 2. O acórdão embargado refere-se expressamente: ‘Compete ao juízo do domicílio de devedor de ITR – Imposto Territorial Rural processar e julgar a execução fiscal (art. 109, § 3º, do CPC)’. 3. Embargos de declaração não se prestam a analisar o acerto ou desacerto do julgado a ser questionado em via recursal própria. 4. ‘Não está o juiz obrigado a examinar, um a um, os pretensos fundamentos das partes, nem todas as alegações que produzem: o importante é que indique o fundamento suficiente de sua conclusão, que lhe apoiou a convicção no decidir. De outra forma, tornar-se-ia o juízo o exercício fatigante e estéril de alegações e contra-alegações, mesmo inanes: flatus voci inconse-quente, para suplício de todos; e não prevalência de razões, isto é, capazes de convencimento e conduzindo à decisão’ (RE 97.558-6/GO, Rel. Min. Oscar Correa). 5. O prequestionamento deve pautar-se ao disposto no art. 535, I e II, do CPC; ausente a omissão alegada, não é devida a declaração vindicada. 6. Embargos declaratórios aos quais se nega provimento.” (TRF 1ª R. – EDcl-AgRg-AI 2007.01.00.051809-7/DF – Rel. Juiz Fed. Conv. Rodrigo de Godoy Mendes – DJe 21.02.2014 – p. 533)

10870 – ITR – isenção – APP – averbação da área – necessidade“Processual civil. Agravos regimentais no recurso especial. Tributário. ITR. Isenção. Área de pre-servação permanente. Instituição por disposição legal. Averbação da área da reserva legal no registro de imóveis. Necessidade. 1. Quando do julgamento do EREsp 1027051/SC (Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª Seção, DJe 21.10.2013), restou pacificado que, ‘diferentemente do que ocorre com as áreas de preservação permanente, as quais são instituídas por disposição legal, a caracterização da área de reserva legal exige seu prévio registro junto ao Poder Público’. 2. Dessa forma, quanto à área de reserva legal, é imprescindível que haja averbação junto à matrícula do imóvel, para haver isenção tributária. Quanto às áreas de preservação permanente, no entanto, como são instituídas por disposição legal, não há nenhum condicionamento para que ocorra a isenção do ITR. 3. Agravos regimentais não providos.” (STJ – AgRg-EDcl-REsp 1.342.161 – (2012/0184821-7) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 07.02.2014 – p. 466)

10871 – Mandado de segurança – lançamento tributário – decadência parcial – reconheci-mento

“Direito processual civil e tributário. Mandado de segurança. Preliminar. Lançamento tributário. Decadência parcial reconhecida. Mérito. Caixa de assistência. Modelo de autogestão. Atividade negocial. Inexistência. ISSQN. Não incidência. Recurso improvido. 1. Tendo, os fatos geradores da obrigação tributária, ocorrido no período de junho a dezembro de 1997, e só havendo seu respectivo lançamento no ano de 2003, forçoso reconhecer sua decadência, eis que ultrapassa-do o prazo quinquenal previsto no art. 173 do CTN para a Constituição do Crédito Tributário. Preliminar parcialmente acolhida para reconhecer a decadência do lançamento no que se refere aos fatos geradores ocorridos entre junho e dezembro de 1997. 2. A exegese da roupagem cons-titucional e infraconstitucional acerca da matéria permite concluir que a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) exige que a prestação de serviços se dê de forma remunerada, ostentando conteúdo econômico, de modo que, contrario sensu, caso não detenha

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tal característica, a incidência deste tributo não deverá ocorrer. 3. Seguindo essa linha, a jurispru-dência do c. Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o simples fato de a pessoa jurídica ostentar natureza cooperativa e não possuir fins lucrativos não lhe retira a possibilidade de figurar como sujeito passivo do ISSQN, sendo tal incidência possível na hipótese em que pra-tique atividade genuinamente empresarial. 4. Hipótese concreta em que os elementos carreados aos autos (especialmente a análise do art. 1º do Estatuto Social da Caixa Assistencial apelada e o teor do art. 14 da Resolução RDC nº 39/2000, da ANS) permitem inferir que a recorrida não exerce atividade empresarial, limitando-se, na modalidade de autogestão, a intermediar serviços de saúde, prestados por terceiros, a seus segurados, equiparando-se, portanto, a uma cooperativa de serviços de saúde – estes, sim, tributáveis por meio do ISSQN – o que permite a conclusão de que inexiste fato gerador apto a justificar a cobrança tributária tal como pretende o Município re-corrente. 5. Recurso improvido.” (TJES – REO 0001998-30.2003.8.08.0024 – Rel. p/o Ac. Carlos Simões Fonseca – DJe 06.03.2014)

10872 – Obrigação acessória – DIF papel imune – atraso na entrega de declaração – multa“Tributário. Recurso especial. Obrigação tributária acessória. Declaração especial de informa-ções relativas ao controle de papel imune (DIF-Papel imune). Art. 57, I, da MP 2.158/2001. Arts. 11 e 12 da IN/SRF nº 71/2001. Multa pelo atraso na entrega da declaração. Cálculo por mês--calendário de atraso na entrega. 1. A Declaração Especial de Informações Relativas ao Controle de Papel Imune (DIF-Papel Imune), prevista na Instrução Normativa SRF nº 71, de 24 de agosto de 2001, deve ser apresentada até o último dia útil dos meses de janeiro, abril, julho e outubro, em relação aos trimestres civis imediatamente anteriores (out./nov./dez., jan./fev./mar., abr./maio/jun., jul./ago./set.), sob pena de multa por mês-calendário de atraso, prevista no art. 57, I, da Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001. Precedentes: REsp 1.136.705/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Julgado em 22.06.2010; REsp 1118587/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Julgado em 27.10.2009, DJe 06.11.2009; REsp 1.216.930/PR, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 1º de março de 2011. 2. Recurso especial conhecido e provido.” (STJ – REsp 1.416.895 – (2013/0365583-0) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 11.02.2014 – p. 1721)

10873 – Parcelamento – cancelamento – concessão – requisitos“Administrativo. Tributário. Parcelamento. Cancelamento. Intimação. Postal. Edital. 1. Para a efe-tiva concessão do parcelamento, é indispensável o pagamento do sinal de 5% do valor total da dívida. 2. O parcelamento é instituto que se dá em favor do contribuinte e, como regra em seu benefício, este deve ser zeloso pela observância dos requisitos para garantir o efetivo acesso à benesse fiscal. 3. A recusa do recebimento de intimação via postal, encaminhada para endereço informado pelo contribuinte, legitima a posterior intimação por meio de edital, uma vez que o Fisco não pode ficar à mercê do contribuinte, diante de sua fleuma e negligência. 4. Os correios são também considerados a longa manus do Estado, uma vez que tidas por oficiais suas buscas e respectivas certidões, para efeitos de citação, notificação e intimação dos destinatários. 5. Os administradores de empresas devem estar cientes de que as intimações encaminhadas aos ende-reços da sede de suas empresas são consideradas eficientes e perfeitas, ainda que recebidas por agentes de portaria, os quais devem estar devidamente orientados. 6. Não há qualquer obrigação legal que determine que a intimação para pagamento deva ser encaminhada aos advogados do contribuinte. 7. Recurso conhecido e não provido.” (TJDFT – PADM 20120110113362 – (765666) – Relª Desª Leila Arlanch – DJe 07.03.2014 – p. 60)

10874 – Parcelamento – Refaz – exclusão do programa – quitação da dívida – extinção“Apelação cível. Execução fiscal. Parcelamento da dívida. Exclusão do programa Refaz. Quitação da dívida. Extinção devida. Inovação recursal não admitida. 1. Com a exclusão da dívida do pro-grama de recuperação, o crédito tributário volta a ser exigível, retornando o processo de execu-ção ao Estado em que se encontrava. 2. Não é permitido ao tribunal analisar argumento novo que não foi apresentado ao juiz sentenciante, sob pena de supressão de instância e inobservância aos

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princípios da congruência e adstrição. 3. Recurso conhecido e não provido. Unânime.” (TJDFT – AC 20080111757273 – (765783) – Relª Desª Fátima Rafael – DJe 06.03.2014 – p. 80)

10875 – Parcelamento – requerimento distinto por inscrição – exigência – análise

“Tributário. Mandado de segurança. Parcelamento. Requerimento distinto para cada inscri-ção. Exigência imposta pela Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 15/2009 não prevista na Lei nº 10.522/2002. Motivação per relationem. 1. Consoante já decidiu o Pretório Excelso, ‘não configura negativa de presunção jurisdicional ou inexistência de motivação a decisão do Juízo ad quem pela qual se adotam, como razões de decidir, os próprios fundamentos constantes da decisão da instância recorrida (motivação per relationem), uma vez que atendida a exigên-cia constitucional e legal da motivação das decisões emanadas do Poder Judiciário’ (STF, ARE 657355-AgRg, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., Julgado em 06.12.2011). 2. Com base no entendimento jurisprudencial supra e considerando que a compreensão deste Relator sobre a questão litigiosa em apreço guarda perfeita sintonia com a apresentada pelo Juízo de Primeiro Grau, adotam--se, como razões de decidir, os fundamentos exarados na sentença objurgada que ora passam a incorporar o presente voto. 3. ‘Ao se estabelecer a necessidade de requerimento distinto para cada inscrição, tributo ou outra exação qualquer (art. 6º, II, da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 15/2009), o Fisco extrapolou o poder regulamentar conferido pela Lei nº 10.522/2002, já que acabou criando novo requisito para o parcelamento não previsto na norma-matriz’. 4. ‘O direito tributário tem como princípio basilar a legalidade e não podia ser diferente, porquanto estamos ao julgo de um Estado de Direito. A Lei nº 10.522/2002, ao tratar da matéria, em nada dispôs acerca da necessidade de requerimento distinto para cada inscrição, tributo ou outra exação, logo, inovou a ordem jurídica a Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 15/2009 no ponto, configurando situação mais gravosa para o contribuinte que deverá parcelar os débitos tributários no âmbito da PGFN sobre cada dívida inscrita’. 5. Remessa oficial e apelação improvidas.” (TRF 5ª R. – Ap-Reex 0001070-97.2012.4.05.8102 – (29883/CE) – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Francisco Cavalcanti – DJe 20.02.2014 – p. 28)

10876 – PIS/Cofins – base de cálculo – salário e encargos sociais – serviços terceirizados – incidência

“Direito tributário. Contribuição para o PIS e Cofins. Base de cálculo. Salários e encargos so-ciais. Empresas prestadoras de serviços terceirizados. Incidência. Precedentes. Acórdão recorrido publicado em 04.08.2010. O Tribunal de origem decidiu em sintonia com a jurisprudência fir-mada por esta Corte, no sentido de que, por se tratarem, receita bruta e faturamento, de termos juridicamente equivalentes, significando, ambos, o total dos valores auferidos com a venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços, afigura-se inviável a exclusão dos salários e encargos sociais dos trabalhadores temporários da base de cálculo do PIS e da Cofins devido pelas empresas prestadoras de serviço de locação de mão de obra temporária. Agravo regimental conhecido e não provido.” (STF – AgRg-RE 635.398 – Santa Catarina – 1ª T. – Relª Min. Rosa Weber – J. 17.12.2013)

Comentário Editorial SÍNTESEPara fins de cálculo de PIS/Cofins, os reembolsos recebidos por empresas prestadoras de serviços de mão de obra (temporária ou não) devem integrar ou não a base de cálculo dos referidos tributos? Este foi o questionamento do acórdão ora vergastado.

O acórdão em comento foi oriundo de agravo regimental por negativa de seguimento a re-curso extraordinário, interposto por prestadora de serviços, que alegou, em suma, que deve o Supremo Tribunal Federal pronunciar-se a respeito da questão, de acordo com conceito constitucional de receita/faturamento.

Porém, ao analisar a questão, entendeu a Ministra Relatora pelo não provimento do agravo, alegando respaldo na jurisprudência pátria no sentido da impossibilidade de exclusão dos salários e encargos sociais dos trabalhadores temporários da base de cálculo do PIS e da Cofins devido pelas empresas prestadoras de serviço de locação de mão de obra temporária.

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Disse em seu voto a Ministra: “Nessa perspectiva, para definição da base de cálculo na inci-dência do PIS e da Cofins, receita bruta e faturamento são termos juridicamente equivalentes e consistem na totalidade das receitas auferidas com a venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços”.

Trazemos à baila os seguintes julgados sobre o tema:

“PIS/COFINS – SERVIÇOS TERCEIRIZADOS – RECEITA BRUTA E FATURAMENTO – SINÔ-NIMOS – EFEITOS – ‘Agravo regimental no agravo de instrumento. Tributário. PIS e Cofins. Base de cálculo. Empresas prestadoras de serviços terceirizados. Receita bruta e faturamento. Sinônimos. Precedentes. 1. Esta Corte firmou entendimento no sentido de que a receita bruta e o faturamento, para fins de definição da base de cálculo para a incidência do PIS e da Co-fins, são termos sinônimos e consistem na totalidade das receitas auferidas com a venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. 2. Agravo regimental não provido’.” (STF, AgRg-AI 817.257, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 19.12.2012, p. 20)

“PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO LEGAL – ART. 557, § 1º, DO CPC – FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA INAFASTADOS – PIS – EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇO DE LOCAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA TEMPORÁRIA – VALORES DESTINADOS AO PAGAMENTO DE SALÁRIOS E DEMAIS ENCARGOS TRABALHISTAS DOS TRABALHADORES TEMPORÁ-RIOS – INCLUSÃO NA BASE DE CÁLCULO – 1. Recebido o denominado agravo regimental a fls. 149/163 como agravo inominado, nos termos do § 1º do art. 557 do Código de Processo Civil. 2. Para o manejo do agravo legal, é preciso o enfrentamento da fundamentação da decisão agravada, ou seja, deve-se demonstrar, no caso, que a apelação interposta não estava em confronto com jurisprudência dominante do próprio Tribunal ou de tribunal superior. 3. O STJ consolidou o entendimento de que os valores recebidos pelas empresas prestadoras de serviços de locação de mão de obra temporária, a título de pagamento de salários e encargos sociais dos trabalhadores temporários, integram a base de cálculo do PIS e da Cofins (REsp 1141065/SC, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Seção, DJe 01.02.2010, julgado pela sistemática do art. 543-C do CPC e da Res. STJ 8/2008). 4. A agravante não trouxe qualquer elemento novo que afastasse a conclusão a que chegou a decisão recorrida. 5. Agravo inominado a que se nega provimento.” (TRF 3ª R., Ag-AC 0018319-30.2000.4.03.6100/SP, 3ª T., Rel. Des. Fed. Márcio Moraes, DJe 24.01.2014, p. 444)

10877 – Responsabilidade tributária – empresa – dissolução irregular – ausência de indí-cios – efeitos

“Agravo de instrumento. Tributário. Execução fiscal. Redirecionamento. Dissolução irregular. Au-sência de indícios. Desprovimento. 1. É possível a responsabilização do administrador, no caso de dissolução irregular da sociedade, consoante precedentes do STJ e desta Corte, na medida em que é seu dever, diante da paralisação definitiva das atividades da pessoa jurídica, promover-lhe a regular liquidação. Não cumprido tal mister, nasce a presunção de apropriação indevida dos bens da sociedade. 2. Na hipótese em tela, não constam nos autos indícios aptos a caracterizar a ocorrência de dissolução irregular da empresa devedora. 3. Agravo de instrumento desprovido.” (TRF 4ª R. – AI 0005865-98.2013.404.0000/RS – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona – DJe 08.01.2014)

Comentário Editorial SÍNTESEO acórdão ora comentado é oriundo de agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de redirecionamento ao sócio gerente de empresa devedora em execução fiscal, pelo fato de a executada não ter sido procurada no endereço declinado na inicial.

Especificamente neste caso, a empresa executada não é servida pelos Correios, e, por esta ra-zão, o Cartório procedeu à intimação a ser cumprida pela União, via oficial de justiça, e deter-minou o Magistrado que deveria a exequente recolher as despesas de condução do Sr. Oficial de Justiça para a citação e demais atos executórios no prazo de 5 dias, sob pena de extinção.

Alegou a agravante que a mudança de domicílio fiscal sem comunicação aos órgãos compe-tentes é o suficiente para autorizar o redirecionamento da execução fiscal aos sócios, com base na Súmula nº 435 do STJ, e que a empresa, embora não tenha sido encontrada, foi cita-da na pessoa e na residência de sua sócia gerente, situação que atesta a dissolução irregular.

Nesta toada, vale trazer à baila alguns elementos relacionados ao tema discutido

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O sócio-gerente é aquele responsável pelo direcionamento dos negócios da empresa, levando--a a praticar atos necessários ao atingimento de seu fim social. Via de regra, é ele o detentor de poderes de gerência e quem pode conduzir a sociedade à prática de atos infringentes da lei, do contrato social ou de seus estatutos.O posicionamento prevalente no STJ, embora não único, por tratar-se de tema polêmico e de entendimento ainda não fechado, a responsabilidade do sócio-gerente na hipótese de não recolhimento de tributos é subjetiva, ou seja, há de ser provado que o sócio, ao exercer a administração da sociedade, agiu com dolo ou fraude e que a sociedade, em razão da dificul-dade econômica decorrente desse ato, não pôde cumprir sua obrigação fiscal. De acordo com este entendimento, o mero inadimplemento tributário não ensejaria a execução fiscal contra o sócio administrador.No caso em tela, o Desembargador Federal Relator do caso manifestou-se nos seguintes termos:“É possível a responsabilização do administrador no caso de dissolução irregular da socie-dade, consoante precedentes do STJ e desta Corte. Isso porque é seu dever, diante da para-lisação definitiva das atividades da pessoa jurídica, promover-lhe a regular liquidação. Não cumprido tal mister, nasce a presunção de apropriação indevida dos bens da sociedade.Nesse sentido os precedentes do eg. STJ, bem como os desta Corte, a saber: STJ: AgRg--AgRg-REsp 776.154/RJ, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 19.10.2006; REsp 1.017.732/RS, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJ de 07.04.2008; TRF4: AI 2006.04.00.037195-8/PR, 2ª T., Rel. Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona, DJU 27.02.2007; AC 2000.04.01.127254-5, 1ª T., Rel. Des. Federal Joel Ilan Paciornik, DE 04.03.2008.Refira-se, ainda, a desnecessidade de prova cabal de tal situação, sendo suficiente a exis-tência de indícios para o redirecionamento da execução, tais como a ausência de bens para penhora, abandono do estabelecimento e cessação das atividades.Nos termos da Súmula nº 435 do eg. STJ:‘Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fis-cal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.’Em princípio, basta que a empresa não seja encontrada em seu endereço, com base em pre-cedente do STJ, para justificar o redirecionamento da actio executiva:‘[...] PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – DISSOLUÇÃO IRREGU-LAR – REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO PARA O SÓCIO-GERENTE – MATÉRIA FÁTICO--PROBATÓRIA – SÚMULA Nº 7/STJ – ART. 543-C DO CPC – RESOLUÇÃO STJ Nº 8/2008 – ART. 557 DO CPC – APLICAÇÃO – [...]3. Nada obstante, a jurisprudência do STJ consolidou o entendimento de que ‘a certidão emi-tida pelo Oficial de Justiça atestando que a empresa devedora não mais funciona no endereço constante dos assentamentos da junta comercial é indício de dissolução irregular, apto a ense-jar o redirecionamento da execução para o sócio-gerente, a este competindo, se for de sua von-tade, comprovar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder, ou ainda, não ter havido a dissolução irregular da empresa’ (Precedentes: REsp 953.956/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 12.08.2008, DJe 26.08.2008; AgRg-REsp 672.346/PR, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 18.03.2008, DJe 01.04.2008; REsp 944.872/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 04.09.2007, DJ 08.10.2007; e AgRg-Ag 752.956/BA, Relª Min. Denise Arruda, Primeira Turma, Julgado em 05.12.2006, DJ 18.12.2006). [...].’ (AgRg-Ag 1265124/SP, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, Julgado em 11.05.2010, DJe 25.05.2010)No caso dos autos, todavia, o mero retorno negativo da carta AR de citação (fl. 44) não con-figura indício suficiente a ensejar a presunção de dissolução irregular da executada. Para esse desiderato, seriam necessários outros elementos capazes de comprovar a irregular paralisação das atividades da empresa, tais como a certidão do Oficial de Justiça que, mediante citação ou intimação pessoal, constata a inatividade da executada, ou, ainda, a comprovação de irregularidades na situação cadastral da devedora junto aos registros públicos. Tais situações, contudo, não se encontram patenteadas nos autos, constando a empresa, inclusive, como ativa perante a Junta Comercial do Estado (fls. 63). Frise-se, por fim, que, no tangente ao cadastro cancelado perante a Secretaria da Fazenda do Estado, a Segunda Turma desta Corte já pacificou o entendimento de que a certidão da

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Sintegra não constitui documento hábil a justificar o redirecionamento do feito. Embora o referido documento (acostado aos autos à fl. 66) refira que a situação cadastral seja ‘não ha-bilitado’, na mesma folha consta a observação de que os dados da referida certidão, relativos ao contribuinte cadastrado, ‘não valem como certidão de sua efetiva existência de fato e de direito, não são oponíveis à Fazenda e nem excluem a responsabilidade tributária derivada de operações com ele ajustadas’ (AI 2007.04.00.008516-4/SC, Segunda Turma, Relª Juíza Federal Luciane Amaral Corrêa Münch, J. em 26.06.2007).

Diante desse quadro e à míngua de indícios aptos a caracterizar a ocorrência de dissolução irregular da empresa devedora, entendo não ser cabível, in casu, o redirecionamento da exe-cução fiscal, sem prejuízo de ulterior renovação do pedido.

10878 – Taxa – coleta de resíduos – cobrança – legalidade“Tributário. Embargos à execução. Taxa de coleta de resíduos. LC 16/1998. Município de João Pessoa. Legalidade. Cobrança. Possibilidade. Serviço público específico e divisível. 1. O Supre-mo Tribunal Federal em sede de repercussão geral (art. 543-B do CPC) entendeu que, quando instituída em decorrência de atuação estatal específica e divisível, a Taxa de Limpeza Pública é constitucional (RE 576321). 2. Por sua vez, não se aplica ao caso a imunidade recíproca pre-vista na alínea a do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal, vez que tal regra faz alusão a impostos sobre o patrimônio, renda ou serviços, e não a taxas, como é o caso dos autos. 3. A circunstância de o anexo da Lei municipal que regula a exigência combatida não relacionar a espécie ‘Prédios Públicos’ no dispositivo em que define as várias espécies de bens, com suas respectivas alíquotas, não inibe a cobrança, dado que, subdivididos os imóveis em residenciais e não residenciais (comerciais), nesta última categoria devem ser classificados os públicos. 4. A tese acolhida na sentença termina por afastar a taxa, a despeito de serviço divisível ter sido pres-tado ao recorrido. 5. Apelação provida.” (TRF 5ª R. – AC 2009.82.00.000495-0 – (561118/PB) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Roberto de Oliveira Lima – DJe 25.02.2014 – p. 92)

Comentário Editorial SÍNTESENo caso em tela, duas discussões foram trazidas à baila, a saber: se é possível a cobrança de taxa de limpeza pública por Município e se é aplicável a imunidade recíproca, prevista constitucionalmente, é aplicável a taxa.

O conceito de taxa também está definido na Constituição Federal, mais precisamente no inciso II do art. 145, a seguir colacionado:

É possível perceber, portanto, que trata-se de tributo vinculado à sua hipótese de incidência, qual seja, a atividade estatal especificamente referida ao contribuinte, que deve ser o exercício regular de poder de polícia (taxas de polícia) ou a prestação, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível (taxas de serviço).

O que vem a ser serviço público específico e divisível é nos incisos II e III do art. 79 do Código Tributário Nacional, verbis:

No entanto, leciona o Professor Hugo de Britto Machado:

“Diversamente do que fez em relação a poder de polícia, o CTN não estabeleceu o que se deve entender por serviço público. Os administrativistas, em cujo campo de estudos situa-se esta matéria, não chegaram ainda a um acordo sobre o que seja serviço público.

Para os efeitos da adequada compreensão das taxas, podemos entender por serviço público toda e qualquer atividade prestacional realizada pelo Estado, ou por quem fizer suas vezes, para satisfazer, de modo concreto e de forma direta, necessidades coletivas. Não se confunde com o poder de polícia, porque é sempre atividade prestacional de natureza material.

Para que o serviço público possa servir como fato gerador de taxa, deve ser a) específico e divisível; b) prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição; e, finalmente, c) utilizado, efetiva ou potencialmente, pelo contribuinte.

Não é fácil definir o que seja um serviço público específico e divisível. Diz o Código que os serviços são específicos quando possam ser destacados em unidades autônomas de interven-ção, de utilidade ou de necessidade públicas, e divisíveis quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um de seus usuários (art. 79, incisos II e III). Não obstante estejam tais definições contidas em dispositivos separados, cuida-se de duas definições inse-

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paráveis, no sentido de que um serviço não pode ser divisível se não for específico. Não tem sentido prático, portanto, separar tais definições, como a indicar que a taxa pode ter como fato gerador a prestação de um serviço público específico ou de um serviço público divisível. Aliás, isto decorre do próprio dispositivo constitucional, que se refere a serviço específico e divisível.

Seja como for, certo é que as definições legais em referência praticamente em nada contri-buem para a solução dos problemas práticos relativos às taxas. Constituem, porém, indica-ções úteis, a serem trabalhadas pela doutrina e pela jurisprudência.

Quando se trate de atividade provocada pelo contribuinte, individualmente, como acontece, por exemplo, no caso do fornecimento de certidões ou da prestação de atividade jurisdicional, parece induvidoso o caráter específico e divisível do serviço. Por outro lado, serviço como o de iluminação pública, por exemplo, não nos parece ser específico nem divisível, posto que é utilizável por todos de forma indistinta.

Entende-se como prestado ao contribuinte o serviço que este utiliza efetivamente, e posto à disposição do contribuinte aquele por este apenas potencialmente utilizável. Os serviços consideram-se utilizados pelo contribuinte a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qual-quer título; e b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento.

Se o serviço não é de utilização compulsória, só a sua utilização efetiva enseja a cobrança de taxa. Se a utilização é compulsória, ainda que não ocorra efetivamente essa utilização, a taxa poderá ser cobrada. Em qualquer caso é indispensável que a atividade estatal, vale dizer, o serviço público específico e divisível, encontre-se em efetivo funcionamento. Em outras palavras, é condição indispensável para a cobrança da taxa a efetiva existência do serviço à disposição do contribuinte.” (MACHADO, Hugo de Brito. As taxas no direito brasileiro. Dispo-nível em: online.sintese.com. Acesso em: 26 fev. 2014)

Já quanto à imunidade recíproca, e se ela alcança também as taxas, recorremos mais uma vez aos ensinos do ilustre Professor Hugo de Britto Machado:

“Questão que nem sempre tem sido adequadamente colocada é a de saber se a imunidade recíproca das entidades públicas exclui a possibilidade da cobrança de taxas uma das outras. O dispositivo da Constituição Federal que institui a imunidade recíproca diz ser vedado a tais entidades instituir impostos sobre o patrimônio, a renda ou os serviços uns dos outros.

Daí se poderia extrair a conclusão de que essa imunidade não se aplica às taxas, mas tal conclusão, fundada exclusivamente no elemento literal, é evidentemente inaceitável.

Realmente, o fato gerador das taxas pode ser a prestação de serviços públicos, ou o exercício regular do poder de polícia.

Não é razoável cogitar-se da prestação de um serviço público por um ente público a outro. Muito menos cogitar-se da cobrança de um tributo, no caso a cobrança de uma taxa, por um ente público a outro ente público. Mas isto diz respeito apenas àqueles serviços públicos destinados à satisfação de necessidades que não podem ser atendidas por outros meios, sendo importante retornarmos, aqui, a distinção entre taxa e preço público. O preço público naturalmente pode ser cobrado por um ente público de outro, seja diretamente, seja através de uma empresa que preste o serviço em regime de concessão.

Também não é razoável admitir-se a cobrança, por um ente público a outro, de taxa fundada no exercício do poder de polícia. A própria definição de poder de polícia deixa evidente que este não pode ser exercitado por um ente público em relação a outro ente público. O poder de polícia só existe, por definição, para limitar direitos, interesses ou liberdades, que even-tualmente poderiam ser exercitados contra o interesse público. Não tem sentido admitir-se que um ente público possa, em tese, exercer suas atividades para contrariar o interesse pú-blico. Logo, não tem sentido admitir-se a cobrança de taxa por um ente público de outro ente público, sob o fundamento de que o primeiro estaria regulando, a bem do interesse público, as atividades do segundo.

Exatamente por isto é que o preceito constitucional que consubstancia a denominada imuni-dade recíproca contempla apenas os impostos. A impossibilidade de cobrança de taxas, por um ente público, contra outro ente público decorre da própria natureza dessa espécie tributá-ria, cujo fato gerador consubstancia uma atividade estatal específica relativa ao contribuinte, e não se justifica o exercício dessa atividade estatal específica por um ente público em relação a outro ente público.”

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10879 – Taxa – cooperação e defesa à orizicultura – exegese“Processual civil e tributário. Taxa de cooperação e defesa à orizicultura. Arts. 77, 78 e 119 do CTN. Matéria de índole estritamente constitucional. Análise de direito local pelo STJ. Impossibili-dade. Súmula nº 280/STF. Violação do art. 535 do CPC. Deficiência na fundamentação. Súmula nº 284/STF. 1. Hipótese em que o recorrente insurge-se contra acórdão que julgou extinta a execução por ilegitimidade ativa do Estado do Rio Grande do Sul. 2. No entanto, a controvérsia acerca do conceito de taxa é repetição de dispositivo constitucional e, dessa forma, é insuscetí-vel de apreciação em recurso especial, por se tratar de matéria de índole constitucional. 3. Não se conhece de recurso especial em relação a violação ao art. 535 do CPC quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula nº 284/STF. 4. Ainda que superados esses óbices, verifica-se que a demanda foi dirimida no acórdão recorrido com base em Direito local (arts. 4º e 25 da Lei Estadual nº 533 de 31.12.1948). Logo, é inviável sua apreciação em recurso especial, em face da incidência, por analogia, da Súmula nº 280/STF: ‘Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário’. Pre-cedentes. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 419.386 – (2013/0352110-8) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 06.03.2014 – p. 972)

10880 – Taxa – despesas com oficial de justiça – natureza tributária – caracterização“Agravo de instrumento. Previdenciário. Execução. Despesas com oficiais de justiça. Natureza jurídica de tributo. Taxa. Irretroatividade tributária. 1. As custas processuais caracterizam-se por sua natureza tributária, sendo espécie de taxa. 2. Os valores fixados para as despesas com oficiais de justiça, por caracterizarem taxa de serviço, devem observar o ato normativo vigente à época em que foram realizadas as respectivas diligências legais, porquanto, na ocasião, restou praticado o fato gerador da obrigação tributária.” (TRF 4ª R. – AI 0007629-22.2013.404.0000/PR – 5ª T. – Relª Juíza Fed. Carla Evelise Justino Hendges – DJe 25.02.2014 – p. 220)

10881 – Taxa – Fundaf – natureza jurídica – efeitos“Tributário. Contribuição para o Fundaf. Natureza jurídica. Taxa. 1. Cuida-se, na origem, de Mandado de Segurança Coletivo em que a impetrante busca provimento jurisdicional que deso-brigue as empresas operadoras de serviços e regimes aduaneiros desenvolvidos em terminais de uso público do recolhimento da tarifa ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de fiscalização – Fundaf. 2. Com efeito, não se pode considerar a contribuição ao Fundaf como preço público, uma vez que não se configura o elemento volitivo consistente na liberdade do administrador de escolher a alternativa de não utilizar determinado serviço pú-blico, ante a possibilidade de acesso a essa mesma prestação por outros meios; Mesmo porque a atividade que dá ensejo à exigência da parcela, como visto, é caracterizada como poder de polícia, sendo nítida a sua compulsoriedade. 3. Nesse sentido, a Súmula nº 545 do STF: ‘Pre-ços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu’. 4. Os valores cobrados a título de contribuição para o Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização – Fundaf têm natureza jurí-dica de taxa. Precedentes do STJ. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.412.922 – (2013/0353711-6) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 06.03.2014 – p. 1063)

Comentário Editorial SÍNTESEO pagamento ao Fundaf (Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Ativida-des de Fiscalização) foi instituído no Ministério da Fazenda, pelo Decreto-Lei nº 1.437/1975, com a finalidade de fornecer recursos para financiar o reaparelhamento e reequipamento da Secretaria da Receita Federal, a atender aos demais encargos específicos inerentes ao desenvolvimento e aperfeiçoamento das atividades de fiscalização dos tributos federais e, especialmente, a intensificar a repressão às infrações relativas a mercadorias estrangeiras e a outras modalidades de fraude fiscal ou cambial, inclusive mediante a instituição de sistemas especiais de controle do valor externo de mercadorias e de exames laboratoriais, bem como para fornecer recursos para custear o funcionamento dos Conselhos de Contribuintes e da

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Câmara Superior de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda, inclusive o pagamento de des-pesas com diárias e passagens referentes aos deslocamentos de Conselheiros e da gratificação de presença de que trata o parágrafo único do art. 1º da Lei nº 5.708, de 4 de outubro de 1971; projetos e atividades de interesse ou a cargo da Secretaria da Receita Federal, inclusive quando desenvolvidos por pessoa jurídica de direito público interno, organismo internacional ou administração fiscal estrangeira. E, no caso em tela, discutiu-se qual a natureza jurídica desse tributo, pois entende a Fazenda Nacional que referida cobrança possui natureza jurídica de tributo, enquanto há posiciona-mentos favoráveis à natureza de taxa.O acórdão ora comentado é oriundo de agravo regimental interposto contra decisão que negou provimento a recurso. Alegou a agravante que “foi prevista a destinação ao Fundaf dos valores exigidos dos permissionários, concessionários ou usuários de entrepostos aduaneiros, lojas francas, portos organizados, instalações portuárias e outros recintos alfandegados, a título de ressarcimento das despesas administrativas decorrentes das atividades extraordinárias da fiscalização aduaneira, bem como decorrentes da prestação de serviços aduaneiros relativos a regimes aduaneiros especiais e atípicos e à conferência fora da zona primária”, conforme preconiza o art. 566 do Decreto nº 91.030, de 19857, em vigor à época do ajuizamento da ação, e das Instruções Normativas SRFB nº 14, de 1993 e nº 48, de 1996.Ao analisar a questão, manifestou-se o Relator nos seguintes termos:“O agravo regimental não merece prosperar, pois a ausência de argumentos hábeis para al-terar os fundamentos da decisão ora agravada torna incólume o entendimento nela firmado. Portanto não há falar em reparo na decisão.Conforme consignado no decisum agravado, cuida-se, na origem, de Mandado de Segurança Coletivo em que a impetrante busca provimento jurisdicional que desobrigue as empresas operadoras dos serviços e regimes aduaneiros desenvolvidos em terminais de uso público do recolhimento da tarifa ao Fundaf – Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização.Com efeito, não se pode considerar a contribuição ao Fundaf como preço público, uma vez que não se configura o elemento volitivo consistente na liberdade do administrador de esco-lher a alternativa de não utilizar determinado serviço público, ante a possibilidade de acesso a essa mesma prestação por outros meios, mesmo porque a atividade que dá ensejo à exi-gência da parcela, como visto, é caracterizada como poder de polícia, sendo nítida a sua compulsoriedade. Nesse diapasão, a Súmula nº 545 do STF: ‘Preços de serviços públicos e taxas não se confun-dem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicio-nada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu’.”E alinhado com o posicionamento recentemente proferido, no sentido que os valores cobrados para o Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização – Fundaf têm natureza jurídica de taxa, pois tem como fato gerador a atuação tipicamente estatal decorrente do exercício do poder de polícia, qual seja, a fiscalização exercida nas áreas alfandegárias, e por ser o seu pagamento é compulsório, decidiu pelo não provimento do agravo.Colacionamos a seguir ementa no mesmo sentido:“TRIBUTÁRIO – RECURSO ESPECIAL – CONTRIBUIÇÕES PARA O FUNDAF – RESSARCI-MENTO DOS CUSTOS DAS ATIVIDADES EXTRAORDINÁRIAS DE FISCALIZAÇÃO ALFANDE-GÁRIA EM ENTREPOSTOS DE USO PÚBLICO – NATUREZA JURÍDICA DE TAXA – ATIVIDADE TÍPICA ESTATAL – COMPULSORIEDADE – PODER DE POLÍCIA – 1. Caso em que se discute a legalidade dos valores cobrados a título de contribuição para o Fundo Especial de Desen-volvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização – Fundaf, para ressarcimento dos custos em razão do exercício extraordinário de atividade de fiscalização alfandegária no Porto de uso público do qual a recorrida é concessionária. A Fazenda Nacional defende que a exação tem natureza de preço público, ao argumento de que seu pagamento tem por funda-mento disposições do contrato de concessão. 2. Não se pode conhecer da alegada violação ao art. 481 do CPC, tendo em vista que sobre tal norma não houve emissão de juízo pelo acórdão recorrido, tampouco foram opostos embargos declaratórios para suprir tal omissão, o que atrai a aplicação da Súmula nº 282/STF. 3. Os valores cobrados têm natureza de taxa, tendo em vista que o seu pagamento é compulsório e decorre do exercício regular de típico poder de

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polícia, conforme se afere do art. 22 do Decreto-Lei nº 1.455/1976. 4. Não havendo defi-nição dos elementos constitutivos do tributo em lei, mas em atos regulamentares da Receita Federal, inexigível sua cobrança, em atenção ao princípio da legalidade estrita. 5. Recurso especial conhecido parcialmente e, nessa extensão, não provido.” (STJ, REsp 1.275.858, (2011/0211494-1), 1ª T., Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 26.09.2013, p. 1426)

10882 – Taxa – limpeza e combate de sinistros – inexigibilidade – análise – competência “Tributário inexigibilidade das taxas de limpeza e combate de sinistros. Matéria não afeta a esta 4ª Câmara de Direito Público a partir da Resolução nº 471/2008 do col. Órgão Especial. Não conhecimento do recurso redistribuição determinada.” (TJSP – Ap 9125226-81.2008.8.26.0000 – São Caetano do Sul – 4ª CDPúb. – Rel. Luis Fernando Camargo de Barros Vidal – DJe 06.03.2014 – p. 947)

10883 – Taxa – localização, funcionamento e fiscalização – poder de polícia – constitucio-nalidade – base de cálculo – área de fiscalização

“Agravo regimental no agravo de instrumento. Constitucional e tributário. Taxa de localização, funcionamento e fiscalização. Regularidade do exercício do poder de polícia. Constitucionalida-de. Base de cálculo. Área de fiscalização. Agravo regimental ao qual se nega provimento.” (STF – AgRg-AI 812.563 – São Paulo – 2ª T. – Relª Min. Cármen Lúcia – J. 17.12.2013)

10884 – Taxa – localização, funcionamento e fiscalização – constitucionalidade“Agravo regimental no agravo de instrumento. Constitucional e tributário. Taxa de localização, funcionamento e fiscalização. Regularidade do exercício do poder de polícia: constitucionalida-de. Base de cálculo: área de fiscalização. Agravo regimental ao qual se nega provimento.” (STF – AI-AgR 812.563/SP – 2ª T. – Relª Min. Cármen Lúcia – J. 17.12.2013 – DJe 12.02.2014 – p. 52)

10885 – Taxa – sobre-estadia – consignatária das cargas – procuração – expressos poderes – termo de devolução – assinatura – validade – cobrança – possibilidade

“Legitimidade ad causam. Consignatária das cargas que assina termo de responsabilidade de devolução de contêiner. Assunção da responsabilidade pelo pagamento das taxas. Legitimidade para figurar no polo passivo. Configuração: tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de ação de cobrança de taxas de sobre-estadia de contêiner a consignatária que firmou termo de devolução, assumindo a responsabilidade por sua devolução dentro do prazo estipu-lado, sob pena de pagamento das taxas em questão. Prazo prescricional. Taxa de sobre-estadia de contêiner. Cobrança. Lei nº 9.611/1998. Aplicação exclusiva para as hipóteses de transporte multimodal de cargas. Inaplicabilidade ao caso sob análise. Prescrição regida pelo prazo geral do Código Civil. Revogação do dispositivo específico à matéria anteriormente previsto no art. 449, item 3, do Código Comercial. Inexistência de previsão específica no Novo Codex: o teor da Lei nº 9.611/1998 aplica-se exclusivamente às hipóteses de transporte multimodal de cargas, e, não se tratando de tal situação, o prazo prescricional para a cobrança de taxas de sobre-estadias de contêineres será aquela prevista no prazo geral do Código Civil ante a revogação do dispositivo específico à matéria anteriormente previsto no art. 449, item 3, do Código Comercial. Taxas de sobre-estadia de contêiner. Procuradores que firmam termos de compromisso de devolução de contêiner como representante da importadora. Validade. Responsabilidade da importadora. Procuração que confere expresso poderes para tal conduta: é válida a assunção de obrigação por procurador regularmente constituído, como representante da importadora, quanto ao pagamento de taxas de sobre-estadias por atraso na devolução de contêiner, quando existe procuração que confere expressos poderes para que a despachante assim proceda. Recurso não provido.” (TJSP – Ap 0036064-89.2011.8.26.0562 – 17ª CDPriv. – Rel. Des. Nelson Jorge Júnior – DJe 20.10.2013)

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Parte Geral – Ementário de Jurisprudência Administrativa10886 – Classificação de mercadoria – revisão aduaneira – benefício fiscal – classificação

incorreta – multa“Classificação de mercadorias. Data do fato gerador: 14.01.2005. Revisão aduaneira. Previsão le-gal. A revisão aduaneira é o ato pelo qual a autoridade fiscal, após o desembaraço da mercadoria, verifica a regularidade do pagamento dos impostos e dos demais gravames devidos à Fazenda Na-cional, da aplicação de benefício fiscal e da exatidão das informações prestadas pelo importador na declaração de importação. A reclassificação fiscal de mercadoria submetida a despacho, em decor-rência de revisão aduaneira, não configura mudança de critério jurídico, nem tampouco constitui violação ao princípio do direito adquirido. Reclassificação de mercadorias. Fluido de refrigeração. O fluido de refrigeração contém 5% N-fenil-alpha-naftalamina, além do polialquileno glicol. A quantidade daquela substância não pode ser considerada residual (impurezas) decorrente do pro-cesso de obtenção do composto químico, estabilizantes, corantes ou substâncias antipoeira, sendo correta a reclassificação fiscal adotada pela fiscalização (3820.00.00). Multa por classificação fiscal incorreta na NCM. Mantida a reclassificação fiscal efetuada, é cabível a multa de 1% sobre o valor aduaneiro decorrente da incorreta classificação fiscal na NCM adotada pelo contribuinte na De-claração de Importação – DI. Recurso voluntário negado.” (CARF – 2ª Câm./2ª T. Ord. – 3ª T.Esp. – Proc. 19647.004163/2007-79 – Rel. Thiago Moura de Albuquerque Alves – DJe 05.11.2013)

10887 – Decadência – caracterização – requisitos “Decadência. Tributos sujeitos a lançamento por homologação. Falta de pagamento. Regime adua-neiro de drawback. Por força do que decidiu o eg. STF sob o rito do art. 543-C do CPC, nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, o prazo decadencial rege-se pelo art. 173, inciso I, do CPC, quando o sujeito passivo não antecipa espontaneamente parte da exação devida. Expirado o prazo do drawback, o importador terá o prazo adicional de 30 dias para demonstrar que (i) bene-ficiou e exportou as mercadorias importadas, (ii) devolveu as mercadorias importadas ao exterior, sem beneficiamento, (iii) destruiu as mercadorias importadas ou (iv) beneficiou ou consumiu as mercadorias importadas no mercado interno, com o pagamento dos impostos aduaneiros. Somente depois de expirado esse prazo de trinta dias, e caso o contribuinte não demonstre ter implementado uma das alternativas acima, é que o Fisco poderá, então, lançar de ofício os tributos aduaneiros. Responsabilidade tributária. Importação por ‘conta e ordem’ de terceiro. De acordo com o art. 27 da Lei nº 10.637/2002, a importação realizada com a utilização de recursos antecipados ao impor-tador por terceiro presume-se por conta e ordem deste. E, se é assim, os arts. 32 e 95 do Decreto-Lei nº 37/1966 atribuem ao adquirente a responsabilidade solidárias pelos tributos e infrações aduanei-ras cometidas pelo importador. Multa qualificada. Simulação comprovada. Comprovados o ardil, o prejuízo ao Erário e o benefício aos agentes com a interposição fraudulenta na importação, justifica--se a qualificação da multa de ofício. Multa substitutiva do perdimento de mercadoria importada. Tributos aduaneiros. Por força do art. 1º, § 4º, do DL 37/1966, o imposto de importação não incide apenas na hipótese de aplicação da pena de perdimento da mercadoria propriamente dita, sendo, porém, exigível no caso de imposição ao sujeito passivo da multa que a substitui, nos casos em que o bem é consumido, revendido ou não localizado. Isenção do Imposto de Importação. Prova inexistente quanto à origem das mercadorias objeto da importação. Ausente prova que subsidie o argumento de que as mercadorias objeto da importação provêm de países integrantes do Mercosul, não é possível reconhecer-lhes a isenção relativamente ao Imposto de Importação. Recurso volun-tário negado.” (CARF – 3ª Seção de Julgamento – 3ª T.Esp. – Proc. 10909.001291/2011-44 – Rel. Marcos Tranchesi Ortiz – DJe 06.01.2014)

10888 – ICMS – crédito – aproveitamento indevido – efeitos“Crédito de ICMS. Aproveitamento indevido. Constatado recolhimento a menor de ICMS em face da apropriação de parcela do imposto não cobrado e não pago ao Estado de origem, destacado em notas fiscais de transferência recebidas do estabelecimento sediado em outra Unidade da Federação, Município de Itatiaia/RJ, da mesma empresa, para comercialização, beneficiados com incentivos fiscais em seu Estado de origem, sem amparo em convênios celebrados no âmbito do Confaz. Procedimento fiscal respaldado no art. 155, § 2º e inciso XII, alínea g, da Constituição Fe-

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226 ������������������������������������������������� RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ADMINISTRATIVA

deral, art. 1º, parágrafo único, e art. 8º, inciso I, ambos da Lei Complementar nº 24/1975. Crédito vedado nos termos do art. 62, § 1º, do RICMS/2002. Corretas as exigências fiscais de ICMS, multa de revalidação e multa isolada prevista no art. 55, inciso XXVI, da Lei nº 6.763/1975. Lançamento procedente. Decisão unânime.” (CCMG – Imp. 40.010135209-62 – (20.364/14) – 2ª CJ – Rel. Fernando Luiz Saldanha – J. 18.02.2014)

10889 – IPTU – revisão de lançamento – alteração de destinação e do total de área cons-truída – alíquota aplicável

“IPTU. Revisão de lançamento. É correta a revisão de lançamento de IPTU de imóvel que teve alte-ração de destinação e do total de área construída, devendo ser aplicada a alíquota de 3% (três por cento), tendo em vista o desconhecimento por parte da autoridade administrativa de que a área construída do imóvel estava demolida, nos termos dos arts. 145 e 149 do CTN, dos arts. 32 e 33 da Lei Complementar nº 4/1994 e do art. 15, inciso I, alínea a, do Decreto nº 28.445/2007. Revisão de lançamento efetuada com base em avaliação de imóveis semelhantes. É cabível a revisão de lançamento levando-se em consideração os valores de imóveis vizinhos em situação semelhante e com a mesma destinação de habitação coletiva, além dos valores praticados no mercado imobiliá-rio do Distrito Federal. Recurso que se desprovê.” (TARFDF – RVol 142/2012 (125.001.908/2010) – (02/2014) – 1ª C. – Rel. Cons. Rudson Domingos Bueno – DOE 26.02.2014 – p. 7)

10890 – Multa – recinto aduaneiro – contêiner ou veículo contendo mercadoria“Normas Gerais de Direito Tributário. Data do fato gerador: 18.04.2005. Multa. Fato gerador. Contêiner não localizado. Aplica-se multa por contêiner ou qualquer veículo contendo mer-cadoria, inclusive a granel, ingressado em local ou recinto sob controle aduaneiro, que não seja localizado. Depositária. Recinto alfandegado. Falta de unidade de carga. Caso fortuito. Não comprovação. Responsabilidade. Excludente. Não aplicação. É máxima a responsabilidade da depositária de mercadorias importadas em recinto alfandegado, assim autorizado a funcionar pela Secretaria da Receita Federal após demonstração de sua capacidade operacional. Não com-provada a configuração do fato como caso fortuito, não se cogita de aplicação de excludente de responsabilidade.” (CARF – 3ª Seção de Julgamento – 3ª T. Esp. – Proc. 11128.002445/2005-27 – Rel. Belchior Melo de Sousa – DJe 02.01.2014)

10891 – Obrigação acessória – depósito fechado – inscrição no cadastro fiscal do Distrito Federal – Obrigatoriedade – efeitos

“Depósito fechado. Obrigatoriedade de inscrição no cadastro fiscal do Distrito Federal. Correta é a exigência do ICMS e aplicação de multa principal por sonegação fiscal, bem como a aplica-ção de multa acessória, em relação ao estoque de mercadorias encontrado em depósito fechado sem a regular inscrição no cadastro fiscal do Distrito Federal. Fato gerador do ICMS. Ocorrên-cia. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento da constatação da existência de estabelecimento em situação cadastral irregular, no tocante ao estoque de mercadorias nele encontrado. Alegações recursais. Provas. Ausência. As alegações destituídas de provas válidas e consistentes são insuficientes para ilidir a ação fiscal. Recurso voluntário desprovido.” (TARFDF – RVol 38/2012(128.001.042/2010) – (05/2014) – 1ª C. – Rel. Cons. Gabriel Manica Mendes de Sena – DOE 26.02.2014 – p. 7)

10892 – Obrigação acessória – programa nota legal – cupom fiscal – data de emissão – in-correção – efeitos

“Programa nota legal. Data incorreta da emissão do cupom fiscal no livro fiscal eletrônico. Prévia notificação. Não retificação. Multa acessória. A data incorreta da emissão do cupom fiscal lança-do no livro fiscal eletrônico impossibilitou o adquirente de usufruir o respectivo crédito no pro-grama nota legal. Após prévia notificação pelo fisco, decorrente da reclamação do interessado, a recorrente deixou de efetuar a devida retificação, razão pela qual se negou provimento ao recurso voluntário.” (TARFDF – RVol 98/2012(045.000.092/2010) – (01/2014) – 2ª C. – Rel. Cons. Carlos Daisuke Nakata – DOE 26.02.2014 – p. 7)

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Seção Especial – Em Poucas Palavras

As Intimações no Processo Administrativo Tributário

KIYOSHI HARADAJurista, com 27 obras publicadas. Acadêmico, Titular da Cadeira nº 20 (Ruy

Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas, Acadê-mico, Titular da Cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Aca-demia Brasileira de Direito Tributário, Acadêmico, Titular da Cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direi-to, Sócio Fundador do Escritório Harada Advogados Associados, Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

O princípio da lealdade processual ou das partes nem sempre é observa-do pelo Fisco.

Muitas vezes, os agentes do Fisco dificultam o exercício da ampla defesa dos contribuintes, especialmente quando os autos de infração são lavrados de forma arbitrária. Nessas hipóteses, os autuados não são cientificados do fato de forma correta; outras vezes, precisam recor-rer ao Judiciário para obter vista do processo para a elaboração da defesa; outras vezes, ainda, as decisões administrativas proferidas nãos são levadas ao conhecimento do interessado por meio de in-timação regular.

Examinemos a questão à luz da legislação em vigor.

No âmbito do processo administrativo federal abarcando as administra-ções diretas e indireta vigora a Lei nº 9.784/1999, que incorpora em seu texto alguns dos princípios constitucionais, como os do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, o que faz com que suas normas tenham aplicação em todo o território nacional.

Dispõe em seu art. 26, § 3º, que as intimações são feitas da seguinte forma: a) por ciência no processo; b) por via postal com aviso de recebimento; c) por telegrama ou outro meio qualquer que assegure a certeza de ciência do interessado.

O § 4º prescreve que no caso de interessados indeterminados, desconhe-cidos ou com domicílio desconhecido, a intimação deve ser feita por publicação oficial.

Portanto, a intimação pela publicação no Diário Oficial está reservada para casos de interessado desconhecido, indeterminado ou sem do-micílio conhecido.

O art. 23 do Decreto nº 70.235/1972, que rege, especificamente, o pro-cesso tributário federal, dispõe, também, no mesmo sentido.

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O 1º desse art. 23 prescreve que “quando resultar improfícuo um dos meios previstos no caput deste artigo ou quando o sujeito passivo tiver sua inscrição declarada inapta perante o cadastro fiscal, a inti-mação poderá ser feita por edital publicado:

I – no endereço da administração tributária na Internet;

II – em dependência, franqueada ao público, do órgão encarregado da intimação; ou

III – uma única vez, em órgão da imprensa oficial local.

No âmbito federal a legislação é bem clara no sentido de que o uso da publicação pela imprensa é meio excepcional de intimação do interessado, o que facilita a impugnação judicial na hipótese de inversão da gradação estabelecida em lei.

O problema reside nas legislações estaduais que normalmente contem-plam as três formas de intimação retromencionadas sem, contudo, prescrever de forma clara a hipótese de intimação pela publicação no Diário Oficial.

Normalmente, as legislações estaduais e municipais preveem os seguin-tes meios de intimação, pela ordem:

(a) intimação por termo no livro próprio ou aposição de ciência no auto de infração:

(b) intimação por carta (algumas legislações fazem referência ao aviso de recebimento, outras não);

(c) publicação no Diário Oficial.

Algumas legislações estaduais incorporam a intimação eletrônica. Outras prescrevem que as intimações devem ser dirigidas ao procurador sempre que a defesa ou a impugnação requerer essa providência, como é o caso da legislação do ICMS do Estado de Minas Gerais.

Só que a administração tributária de Minas Gerais apenas na aparência está cumprindo a legislação nos atos de intimação em processos administrativos tributários, pelo menos nos casos sob o patrocínio de nosso escritório.

As intimações têm sido feitas pela publicação no Diário Oficial em nome do contribuinte interessado e não em nome do advogado subscritor da impugnação ou recurso, como determina a legislação mineira.

Manifesta a irregularidade dessa forma de cientificação dos atos pratica-dos pela administração. A intimação do ato processual por meio de publicação no Diário Oficial só pode ocorrer na pessoa do advo-gado, se devidamente constituído nos autos do processo adminis-

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – SEÇÃO ESPECIAL – EM POUCAS PALAVRAS �������������������������������������������������������������������������������������������229

trativo. O contribuinte não tem a obrigação de acompanhar o de-senvolvimento do processo examinando diariamente a publicação oficial. Ao Fisco compete levar ao seu conhecimento por termo no processo, por carta ou outro meio que assegure a certeza de sua cientificação. Somente frustrada a intimação por um desses meios é que se legitima a intimação pela imprensa oficial, a menos que o interessado tenha constituído advogado nos autos do processo, hipótese em que a intimação poderá ocorrer pela publicação no Diário Oficial contendo o nome do profissional subscritor da im-pugnação ou do recurso.

Outras vezes, a intimação por meio da Internet, também, tem sido feita de forma irregular. É que ela vem sendo feita, e com frequência, com data retroativa, talvez, motivada pela demora do digitador, se outra razão mais grave não existir. Seja como for, a intimação é nula, pois reduz o prazo processual do interessado.

Nesse último caso, é difícil a prova da intimação retroativa, a menos que o interessado imprima diariamente as páginas pertinentes a intima-ções referentes aos processos administrativos tributários.

Enfim, os direitos dos contribuintes vêm sendo burlados de todas as for-mas, desde a esfera administrativa, não bastassem a elaboração de legislação subalterna cada vez mais truculenta nas três esferas po-líticas que infringem em bloco os princípios constitucionais tribu-tários.

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Clipping JurídicoPresa pode pagar dívida do Refis com crédito tributário

O contribuinte pode quitar parcelas do Refis da Crise com crédito tributário. Isso porque o Fisco não pode impor o modo de pagamento, devendo ser observada a regra mais be-néfica para a empresa. A decisão é do Tribunal Regional Federal da 4ª Região ao julgar o processo de uma transportadora que buscou a compensação. Segundo o advogado Cezar Augusto Cordeiro Machado, da Sociedade de Advogados Alceu Machado, Sperb & Bonat Cordeiro, que defendeu a transportadora envolvida no processo, a decisão é inovadora, pois desobriga a empresa de compensar créditos tributários apenas do valor total (consolidado) dos débitos parcelados. A empresa de transporte fez vários parcela-mentos tributários na Receita Federal e estava pagando mais de R$ 150 mil em tributos por mês, mas nos últimos meses ficou em atraso no valor R$ 393,6 mil. Para quitar a dívida, afirmou que tinha crédito reconhecido administrativamente no valor de R$ 1,2 milhão, atualizado pela Selic. E queria usar o crédito para quitar as parcelas vencidas dos parcelamentos. Entretanto, a União não aceitou seu pedido alegando que o contribuinte não tem prerrogativa de escolher em qual débito o crédito seria utilizado e que o uso de crédito para compensação está restrita às normas da Receita Federal. Essa resposta da União, segundo a empresa, fere os princípios da boa-fé e da razoabilidade e impede a sua recuperação econômica. A empresa pediu que fosse reconhecido o seu direito de usar o crédito tributário para compensar as parcelas vencidas e vincendas do Refis, até o limite de seu crédito. O advogado defendeu a tese de que cabe ao contribuinte escolher em face de qual débito tributário utilizará seu crédito. Em primeira instância, a empresa teve reconhecido, pela Receita Federal, crédito tributário diante de pagamentos de tribu-tos, mas foi negado o uso dos valores para quitar parcelas vencidas e que iriam vencer do Refis. Já no TRF-4, o relator, Juiz Federal José Jacomo Gimenes, afirmou que Lei nº 9.430/1996 proíbe a compensação de créditos com débitos inscritos em dívida ativa. Entretanto, a vedação é aplicável apenas para o procedimento compensatório feito via Pedido Eletrônico de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Com-pensação (PER/DCOMP). O que não é feito no caso em questão. “Desse modo, havendo crédito da contribuinte a ser repetido pela Fazenda Pública e existindo débito em nome desta mesma contribuinte, o valor da restituição ou ressarcimento poderá ser compen-sado, total ou parcialmente, com o valor deste débito”, afirmou. (Conteúdo extraído do site do Conjur)

Simples bem mais rápido para abrir uma empresa

O governo promete, para junho, a diminuição do prazo para abertura de empresa, da atual média de 150 dias, para apenas 5 dias. De acordo com o ministro da Secretaria da Micro e Pequena Empresa, Afif Domingos, o feito se dará graças à implantação da Redesim – Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios, que irá simplificar o processo de abertura e fechamento de empresas. O assunto será tema da primeira reunião do Conselho Interministerial de Avaliação do Simples Nacional, a ser instalado amanhã pela Presidenta Dilma Rousseff. “Quem pre-sidirá as reuniões normalmente será o ministro da micro e pequena empresa. Mas, nesta primeira, a presidenta fez questão de comandar”, disse o ministro a empresários na reu-nião do Fórum Permanente das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, realizada ontem na Confederação Nacional do Comércio (CNC). De acordo com Domingos, até o dia 30 de junho estará no ar o portal Empresa Simples, que possibilitará a redução do prazo, porque vai unificar todas as etapas necessárias para a abertura da empresa,

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como a das licenças para o funcionamento, a do registro na Junta Comercial e a da ins-crição do CNPJ na Receita Federal. “O portal permitirá que os dados trafeguem dentro de uma só ferramenta, sem que seja necessário o empresário viajar de um órgão para o outro”, disse o ministro. Além de facilitar a abertura e o fechamento das empresas, o site será uma espécie de “portal de negócios”, informou o ministro. “Haverá espaço para a criação de um catálogo empresarial, onde as empresas poderão inserir os seus dados e falar dos seus produtos”, sinalizou o ministro. Também haverá mecanismo de procura e oferta de tecnologia. Para a meta de redução no prazo ser alcançada, o ministro observa que governos estaduais e municipais, em conjunto com empresários, precisam aderir localmente à campanha de desburocratização. Para isso, Domingos está percorrendo o país naquilo que chama de “caravana da simplificação”. Segundo o ministro, o processo hoje é lento porque “cada um (estados e municípios) tem uma exigência, cada um tem uma regra. Agora haverá um balcão único, com registro único, e a nossa meta é diminuir o prazo de abertura e fechamento de empresas. Hoje, são aproximadamente 150 dias, vamos reduzir para cinco dias”. Outro assunto na pauta da reunião de amanhã é a vota-ção, no Congresso, das mudanças no Estatuto da Micro e Pequena Empresa. A matéria preconiza a universalização da entrada das Micro e Pequenas Empresas no Simples, independentemente de sua classificação, e a reformulação das regras de substituição tributária. O projeto foi aprovado por unanimidade na Comissão Especial que tratou do assunto na Câmara no final do ano passado e ainda precisa ser apreciado no Plenário da Casa e no Senado. O ministro afirmou que obteve do presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), a garantia de que o projeto será votado ainda na primeira quinzena de março. Mas o projeto encontra resistência, especialmente na bancada paulista e no Ministério da Fazenda, que tem em perdas de arrecadação. Um dos pontos polêmicos é que o altera o enquadramento no Supersimples, deixando de ser por categoria profissio-nal. O único critério passaria a ser o faturamento. Estaria enquadrada qualquer empresa com receita bruta anual de até R$ 3,6 milhões. Outro ponto controverso é a mudança na forma de cobrança. O projeto propõe extinguir a substituição tributária que, no en-tender de Domingos, faz com que os pequenos paguem mais impostos. Para o ministro, esse modelo de tributação acaba por anular os benefícios do Simples, já que as micro e pequenas pagam o valor cheio do imposto, sema redução a que teriam direito pelo programa. (Conteúdo extraído do site do Brasil Econômico)

Brasil deve ter 30 mil empresas operando no Siscoserv

Em um ano e meio, o Sistema Integrado de Comércio Exterior de Serviços, Intangíveis e Outras Operações que Produzam Variação no Patrimônio (Siscoserv) já computa a adesão de 20 mil empresas. O ambiente de registros, voltado para a declaração de itens que, embora subjetivos, contribuem para a balança comercial do País, é ainda pouco conhecido por muitas empresas, diz Maurício do Val, diretor do Departamento de Po-líticas Públicas de Comércio e Serviços do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). Ainda assim, Val estima fechar o ano com 30 mil companhias operando no Siscoserv. Qualquer operação que interfira no patrimônio das empresas, da contratação de serviços no exterior à prestação de consultoria em outro país, precisa ser notificada no sistema. “É uma obrigação acessória exigida por lei”, define Val. Estão obrigadas a prestar informações todas as pessoas jurídicas e também o poder público. As isenções são para microempreendedores individuais, empresas optantes do Simples e pessoas físicas. Na tarde de ontem, o diretor de Políticas Públicas do MDIC proferiu

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palestra na Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), na qual explicou, para um público composto por representantes de empresas de diversos segmentos, que o Siscoserv também prevê benefícios. As companhias que efetuarem os registros podem obter desonerações tributárias para importação de serviços e acessar dados gerados com as informações inseridas no sistema. O não cumprimento é passível de multa aplicada pela Receita. Em agosto, o Siscoserv completa dois anos. Embora seja um período cur-to, mais de oito manuais já foram elaborados, todos com força normativa. As revisões devem ser menos constantes a partir de agora, prevê Val. O MDIC estima que já foram realizados mais de três milhões de registros até agora. Conteúdo extraído do site do Jor-nal do Comércio

Nova regra contábil prejudica fluxo de caixa das empresas

Especialistas afirmam que os efeitos da Medida Provisória nº 627, que colocou fim ao Regime Tributário de Transição (RTT), devem afetar o fluxo de caixa das empresas, cujas consequências são piores para os negócios de porte menor, por ter menos recursos. O resultado final disso é menos dinheiro para investir, o que leva a estagnação ou dimi-nuição da produção nacional. Outro fator que esta medida prejudica é a intenção de internacionalização das companhias tanto as grandes quanto as médias ou pequenas. O CEO da Sevilha Contabilidade, Vicente Sevilha, explica que antes da medida aquela empresa que obtinha lucro no exterior por meio de um investimento (construção de uma fábrica ou uma participação acionária) pagava tributos sobre esse ganho quando o recebia. Com a norma, o tributo deve ser pago antes de a companhia receber o lucro de fato, quando ele é reconhecido na filial ou onde está o investimento. “Para ter que pagar a tributação, o empresário terá que retirar do seu fluxo de caixa. Em casos de empresas grandes, que têm um lucro em uma filial, pode receber esse ganho antes de ter que pagar o tributo. Mas se uma empresa pequena tiver lucro por conta de uma ação que comprou de outra companhia, fica mais difícil quitar o imposto com o próprio caixa”, exemplifica. O advogado do Diamantino Advogados Associados, Marcelo de Almeida, afirma que esse impacto em pequenas empresas por ter investimento no exterior só irá aumentar a carga tributária se a companhia que recebeu o recurso for também brasileira. Na opinião de Sevilha, não só o investimento na produção ou para o crescimento do negócio, fica comprometido, quanto haverá a necessidade de se analisar melhor a internacionaliza-ção. “Se para abrir uma fábrica na China, uma companhia irá gastar US$ 100 milhões, e a perspectiva de lucro é de US$ 10 milhões, talvez precise de US$ 103 milhões para ter uma reserva e pagar o tributo. Sabendo que essa situação acontece, o investidor pode ficar receoso”, aponta o especialista. O advogado cita ainda que a consequência do aumento da tributação após obter lucro no exterior pode gerar uma diminuição na distri-buição do lucro aos acionistas aqui no Brasil. “Isso pode gerar um descontentamento do investidor, não na empresa, mas sim do governo, o que pode mudar o planejamento em elevar investimentos”, diz. Almeida comenta ainda que há uma chance dessa medida vir a ser revogada. “A MP ainda não foi convertida em lei, o que pode acontecer em maio. Se o artigo que trata dessa tributação [número 74] for retirada, a tributação ocorrerá somente em relação ao período de novembro ao mês que a norma foi convertida. Con-tudo, acredito que essa chance é baixa, porque o governo precisa elevar a arrecadação de impostos, o que a regra possibilita”, entende. Na tramitação normal, a partir de sua publicação, a medida provisória tem força de lei, mas perde a eficácia se não for conver-tida no prazo de 60 dias, prorrogável uma vez por igual período. Especialistas apontam

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ainda que, no caso das pequenas empresas, a MP fere o princípio constitucional de que elas merecem um tratamento diferenciado nas obrigações tributárias. E que deveria criar facilidades para as pequenas cumprirem as regras, mas haverá custos extras para atender a medida provisória. Por outro lado, eles também afirmam que a nova norma, ao impor a adequação às regras internacionais de contabilidade relacionadas ao International Fi-nancial Reporting Standards (IFRS), deve trazer mais governança aos negócios menores, o que atrai investidores. Objetivo: Segundo comunicado da Receita Federal divulgado na publicação da norma, em 11 de novembro, a MP tem como objetivo “a adequação da legislação tributária à legislação societária e, assim estabelecer os ajustes que devem ser efetuados em livro fiscal para a apuração da base cálculo do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica [IRPJ] e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido [CSLL] e, con-sequentemente, extinguindo o RTT. Além disso, traz as convergências para a apuração da base de cálculo da Contribuição para o Programa de Integração Social e o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público [PIS/Pasep], e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social [Cofins]”. Para o advogado do Diamantino, a MP deve gerar ainda mais discussões á medida que os 100 artigos são colocados em prática pelo setor privado. Só para apreciação do Congresso Nacional dos Deputados, existem mais de 500 emendas ao texto. (Conteúdo extraído do site do DCI/SP)

Frente quer aumento da adesão irrestrita ao regime Super Simples

Se o governo não destravar a pauta da Câmara dos Deputados, trancada por medidas provisórias e projetos do Executivo com urgência constitucional, a aprovação da quinta revisão da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas corre o risco de ficar engavetada neste ano. A proposta tramita na casa desde agosto de 2012. A indefinição sobre a votação da matéria foi vislumbrada ontem pelo Deputado Federal Guilherme Campos (PSD-SP), presidente da Frente Parlamentar da Micro e Pequena Empresa. “Com a pauta travada, não podemos votar nada que não tenha sido enviado pelo governo, com sérios prejuízos para os empreendedores de pequenos negócios”, disse ele ao DCI. Ainda não há previsão de reunião que deveria acontecer nesta semana entre o relator da matéria, Cláudio Puty (PT-PA), o ministro da Micro e Pequena Empresa, Guilherme Afif Domingos, e o presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN). Entre as novidades da proposta, está o acesso irrestrito ao Super Simples, regime tributário que reduz em até 40% a carga tributária das micro e pequenas empresas. Atualmente a adesão é limitada por atividade, com a exclusão do setor serviços e das empresas de profissionais liberais. No lugar disso, o acesso seria ampliado pelo critério único do faturamento anual, atualmente fixado em R$ 3,6 milhões. Campos pretende apresentar uma emenda em plenário que aumenta esse teto para R$ 4 milhões. “É tão importante corrigir o teto de faturamento para acesso ao Super Simples quanto reajustar a tabela do Imposto de Renda para aliviar a carga tributária dos contribuintes”, destacou. Outros pontos importantes na proposta são: blin-dagem do Microempreendedor Individual, obrigatoriedade no tratamento diferenciado em licitações públicas, manutenção da competitividade frente a novos incentivos e o disciplinamento da aplicação do regime de substituição tributária aos pequenos negó-cios. Por esse regime, os governos estaduais cobram antecipadamente na indústria. A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São quer uma versão simplificada do e-social para atender à realidade das micro e pequenas empresas. Solici-tação nesse sentido foi encaminhada ao Ministro Guilherme Afif, da Secretaria da Micro e Pequena Empresa. Na avaliação da entidade, o segmento terá novos custos e entraves

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operacionais para se adaptar à complexidade do sistema, principalmente pela quantida-de de dados exigidos e obrigatoriedade de imediato envio de informações trabalhistas. Devem ser exigidas informações sobre 44 diferentes “eventos”, contendo 160 campos sobre funcionários. (Conteúdo extraído do site do DCI/SP)

OAB pede ao STF correção da tabela do Imposto de Renda

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que determine a correção da tabela de incidência do Imposto de Renda (IR). A entidade quer que o STF tome uma decisão ainda neste mês para permitir que os contribuintes utili-zem eventuais novos parâmetros na declaração de rendimentos, evitando desembolsos indevidos. A defasagem na atualização da tabela penaliza, sobretudo, os contribuintes de mais baixa renda, que poderiam “escapar” do Fisco caso a correção acompanhasse a inflação. “A atualização da base de cálculo para não incidência do imposto não acom-panhou a correção monetária no decorrer dos anos. Para o ano de 2013, por exemplo, o referido montante é de R$ 1.710,78, sendo que, se a tabela tivesse sido corrigida até 2013 pelo IPCA, o valor correto seria, pelo menos, de R$ 2.758,46”, sustenta a OAB na ação. O pedido, no qual a OAB sustenta que a não correção da tabela culminou na redução da faixa de imunidade, deverá ser analisado pelo Ministro Luís Roberto Barroso. Para a entidade, um número elevado de contribuintes passou a estar sujeito à incidência do imposto mesmo sem um aumento de salário que superasse a correção da renda pelo índice real da inflação. (Conteúdo extraído do site da Agência Estado)

Fechamento de Edição: 12�03�2014

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Resenha Legislativa

MEDIDA PROVISÓRIA

medida provisória nº 638, de 17.01.2014

Altera a Lei nº 12.715, de 17 de setembro de 2012, que institui o Programa de In-centivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores – Inovar-Auto.

Fechamento da Edição: 13�03�2014

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Índice Alfabético e Remissivo

Assunto Especial

DOUTRINA

Assunto

Elisão Fiscal

• O Controle Fiscal, a Elisão Fiscal e o Combate aos Crimes contra a Ordem Tributária (Antonio BaptistaGonçalves) .................................................................. 9

• Elisão Fiscal: o Parágrafo Único do Artigo 116 do CTN e o Propósito Negocial na Desconsidera-ção de Atos e Negócios Jurídicos (Norma AntôniaGavilãn Tonellatti) ..................................................... 24

Autor

antonio BaPtista gonçalvEs •O Controle Fiscal, a Elisão Fiscal e o Combate

aos Crimes contra a Ordem Tributária ....................... 9

norma antônia gavilãn tonEllatti • Elisão Fiscal: o Parágrafo Único do Artigo 116 do

CTN e o Propósito Negocial na Desconsideraçãode Atos e Negócios Jurídicos .................................... 24

PARECER JURÍDICO

Assunto

Elisão Fiscal

• Elisão Fiscal e Evasão Fiscal (Ives Gandra da Silva Martins) ..................................................................... 34

Autor

ivEs ganDra Da silva martins

• Elisão Fiscal e Evasão Fiscal....................................... 34

ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Assunto

Elisão Fiscal

• Processual civil – Ofensa ao art. 535 do CPC não configurada – Multa do art. 538, parágrafo único, do CPC – Inaplicabilidade – Incorporação – Apro-veitamento de prejuízos – Redução da CSSL devida – Simulação – Súmula nº 7/STJ – Inaplicabilidade– Súmula nº 98/STJ (STJ) ................................10798, 47

• Planejamento tributário. Propósito negocial. A existência de propósito negocial não é, por si só, suficiente para validar o negócio praticado como elisão fiscal, mormente quando divergentes a rea-lidade extraída a partir dos elementos factuais do negócio e a forma utilizada para registrá-lo. (CARF) ......................................................................10799, 55

EMENTÁRIO

Assunto

Elisão Fiscal

• Elisão fiscal – caracterização – limites ...........10800, 80• ICMS – transferência de mercadorias entre estabele-

cimentos do mesmo titular – saída de mercadoria –valor inferior ao de entrada – efeitos .............10801, 80

• IR – arrendamento mercantil – valor de opção – li-mitação – inexistência – elisão e evasão – diferença ......................................................................10802, 81

• IR – pessoa física – serviços jornalísticos – plane-jamento fiscal – exegese ................................10803, 81

•Medida cautelar fiscal – finalidade – evasão fiscal – existência – análise........................................10804, 81

• PIS – incentivo fiscal – dedução de despesas com aquisição de imóvel – evasão fiscal – elisão fiscal – distinção ........................................................10805, 82

DOUTRINA

Assunto

contriBuição PrEviDEnciária

• A Previdência Social em Âmbito de Antecipação de Distribuição de Lucros e a Ausência de Retira-da de Pro Labore por Sócio Administrador (WalterAlexandre Bussamara) ............................................... 83

HiPótEsE DE inciDência

• Por um Conceito Constitucional de Contribuinte: Revisitando as Noções de Sujeição Passiva e Soli-dariedade no Âmbito do Direito Tributário (ÉdersonGarin Porto) ............................................................. 101

iss• As Preocupações Decorrentes do Projeto de Lei

do Senado (PLS) nº 386, de 2012. Risco de Extin-ção de Benefício Fiscal Relativo ao ISSQN. Futu-ros Questionamentos sobre a Constitucionalidade dos Dispositivos Aviltantes de Direitos Municipais(Carlos Renato Lonel Alva Santos) ............................. 87

Autor

carlos rEnato lonEl alva santos • As Preocupações Decorrentes do Projeto de Lei do

Senado (PLS) nº 386, de 2012. Risco de Extinção de Benefício Fiscal Relativo ao ISSQN. Futuros Ques-tionamentos sobre a Constitucionalidade dos Dis-positivos Aviltantes de Direitos Municipais .............. 87

ÉDErson garin Porto • Por um Conceito Constitucional de Contribuinte:

Revisitando as Noções de Sujeição Passiva e Soli-dariedade no Âmbito do Direito Tributário ............. 101

WaltEr alExanDrE Bussamara

• A Previdência Social em Âmbito de Antecipação de Distribuição de Lucros e a Ausência de Retirada de Pro Labore por Sócio Administrador ......................... 83

JURISPRUDÊNCIA

Assunto

cErtiDão DE DÉBitos

• Processual civil e tributário – Agravo regimental – CPD-EN – Suspensão da exigibilidade do crédito tributário – Requisitos da liminar/tutela antecipada presentes – CPC, art. 273 – CTN, art. 151 – AgRg não provido (TRF 1ª R.) ...............................10809, 154

comPEnsação

• Tributário e processual civil – Agravo de instrumen-to – Compensação do indébito com outros tributos

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO �����������������������������������������������������������������������������������������������������������������237 (art. 3º, § 1º da Lei nº 9.718/1998) – Não homo-logação – Notificação para recolher os valores aos cofres públicos ............................................10813, 181

icms• Agravo regimental no recurso extraordinário – Tri-

butário – ICMS – Substituição tributária – Constitu-cionalidade – Aquisição de combustível diretamente da distribuidora por consumidor final – Inexistência de operação presumida – Venda da distribuidora para o varejista – Inafastabilidade do recolhimento antecipado do imposto – Possibilidade de restitui-ção imediata e preferencial na forma definida na CF e na legislação aplicável – Agravo regimental a que se nega provimento (STF).............................10806, 125

• Tributário – Substituição tributária – ICMS – Medi-camentos – Base de cálculo (STJ) .................10808, 137

iPi• Ação rescisória – Tributário – IPI – Creditamento

relativo à aquisição de insumos isentos e sujeitos à alíquota zero (TRF 4ª R.) ..............................10812, 177

iPtu• Processual civil e tributário – Agravo – Art. 557,

§ 1º, do CPC – Execução fiscal – Exceção de pré--executividade – IPTU – imóvel afeto ao progra-ma de arrendamento residencial – Propriedade da união – Imunidade – Taxas – Legitimidade – CEF(TRF 3ª R.) ...................................................10811, 169

iss• Tributário e processual civil – Agravo regimental no

recurso especial – Violação ao art. 535 do CPC – Não ocorrência – ISS – Repetição de valores reco-lhidos a título de locação de bens móveis – Impos-sibilidade – Tributo indireto – Ausência de prova de pagamento do tributo – REsp 1.131.476/RS, firmadosob o rito dos recursos repetitivos (STJ) ........10807, 129

manDaDo DE sEgurança •Direito administrativo – Mandado de seguran-

ça – Apelação cível – Desunitização de contêiner – Responsabilidade do inspetor da alfândega daReceita Federal ............................................10810, 161

suBstituição triButária

• Agravo regimental no recurso extraordinário – Tri-butário – ICMS – Substituição tributária – Constitu-cionalidade – Aquisição de combustível diretamente da distribuidora por consumidor final – Inexistência de operação presumida – Venda da distribuidora para o varejista – Inafastabilidade do recolhimen-to antecipado do imposto – Possibilidade de res-tituição imediata e preferencial na forma definida na CF e na legislação aplicável – Agravo regimentala que se nega provimento (STF) ...................10806, 125

• Tributário – Substituição tributária – ICMS – Medi-camentos – Base de cálculo (STJ) .................10808, 137

taxa

• Processual civil e tributário – Agravo – Art. 557, § 1º, do CPC – Execução fiscal – Exceção de pré--executividade – IPTU – Imóvel afeto ao progra-ma de arrendamento residencial – Propriedade da união – Imunidade – Taxas – Legitimidade – CEF(TRF 3ª R.) ...................................................10811, 169

JURISPRUDÊNCIA JUDICIAL

Assunto

BEnEFício Fiscal • Benefício fiscal – Tare – invalidação – convênio –

exigência .....................................................10814, 184

ciDE

• Cide – contribuição ao Incra – natureza jurídica – empresas urbanas – exigibilidade – possibilidade ....................................................................10815, 184

coFins • Cofins – corretoras de seguros – alíquota – majo-

ração – inaplicabilidade ..............................10816, 185

• Cofins – corretoras de seguro – alíquota de 4% –aplicabilidade ..............................................10817, 185

comPEnsação • Compensação – precatório – ente político diverso

– impossibilidade ........................................10818, 185

contriBuição corPorativa • Contribuição corporativa – CRC – exercício profis-

sional – anuidade – fato gerador – registro no con-selho ...........................................................10819, 186

contriBuição PrEviDEnciária • Contribuição previdenciária – desconto – contra-

to de trabalho temporário ............................10820, 187

• Contribuição previdenciária – IPSM/MG – incons-titucionalidade – repetição do indébito – art. 1º-F da Lei nº 9.494, de 1997 – dívidas de natureza tri-butária – inaplicabilidade ............................10821, 189

crÉDito triButário • Crédito tributário – fiança bancária – suspensão

da exigibilidade do crédito tributário – impossibi-lidade ..........................................................10822, 189

EmPrÉstimo comPulsório • Empréstimo compulsório – combustíveis – pres-

crição .........................................................10823, 190

ExEcução Fiscal • Execução fiscal – ausência de indicação e de assi-

natura do depositário do bem no auto de penhora – irregularidade sanável – encargo de depositário– nomeação – recusa – possibilidade ..........10824, 190

• Execução fiscal – CDA – requisitos legais de valida-de – liquidez e certeza – ausência ...............10825, 190

• Execução fiscal – honorários advocatícios – 5% so-bre o valor da causa – exorbitância – inocorrência ....................................................................10826, 190

• Execução fiscal – inclusão do sócio – CDA – dis-solução irregular após retirada do sócio – efeitos ....................................................................10827, 191

• Execução fiscal – indisponibilidade de bens e direi-tos – bloqueio de valor irrisório – não demonstra-ção de realização de diligências – impossibilidade ....................................................................10828, 192

• Execução fiscal – penhora – precatório – recusa pelo exequente – ordem de preferência – inobservância– possibilidade ............................................10829, 192

• Execução fiscal – penhora on-line – Bacen-Jud –arresto – impossibilidade .............................10830, 192

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238 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

• Execução fiscal – penhora on-line – realização antes da citação – impossibilidade .......................10831, 193

• Execução fiscal – penhora sobre faturamento – ex-cepcionalidade – exegese ............................10832, 193

• Execução fiscal – prescrição intercorrente – exegese ....................................................................10833, 195

• Execução fiscal – prescrição intercorrente – inér-cia do exequente – comprovação – necessidade ....................................................................10834, 195

• Execução fiscal – redirecionamento ao sócio geren-te – dissolução irregular – indícios .............10835, 196

• Execução fiscal – suspensão por um ano – intima-ção do credor – desnecessidade ..................10836, 196

icms

• ICMS – ajuste Sinief – custos da importação na nota fiscal emitida em operação interestadual – publici-zação das informações – vedação ...............10837, 196

• ICMS – circulação entre estabelecimentos do mes-mo contribuinte – Estados di versos .............10838, 197

• ICMS – comércio eletrônico – regime de tributação – exegese ....................................................10839, 197

• ICMS – energia elétrica – cobrança – empresa con-sumidora final – exegese .............................10840, 198

• ICMS – importação de equipamentos hospitalares – sociedade sem fins lucrativos – não incidência do tributo – admissibilidade .............................10841, 199

• ICMS – serviço de transporte aéreo – inconstitu-cionalidade .................................................10842, 200

• ICMS – simples paulista – desconstituição e re-enquadramento – fornecedor inidôneo – efeitos ....................................................................10843, 200

• ICMS – substituição tributária para frente – recolhi-mento destacado – operações futuras – venda pre-sumida – bonificação – exegese ..................10844, 200

imPosto DE imPortação • Imposto de Importação – PIS/Cofins – importações

feitas pelo Senai ..........................................10845, 202

imuniDaDE • Imunidade – entidade beneficente – IOF – IRPJ –

rendimento de aplicações financeiras – não inci-dência .........................................................10846, 202

ioF

• Imunidade – entidade beneficente – IOF – IRPJ – rendimento de aplicações financeiras – não inci-dência .........................................................10846, 202

iPi

• IPI – agravo regimental – ausência de impugna-ção específica – Súmula nº 182/STJ – incidência ....................................................................10847, 203

• IPI – crédito presumido – regime previsto na Lei nº 10.276/2001 – migração extemporânea – impos-sibilidade .....................................................10848, 203

• IPI – importação de veículo – pessoa física – uso próprio – não comerciante – não cumulatividade –análise .........................................................10849, 203

• IPI – importador comerciante – fato gerador – de-sembaraço aduaneiro – saída do estabelecimen-to comerciante – bitributação – não ocorrência ....................................................................10850, 203

iPtu

• IPTU – imóvel construído – redução de alíquota – possibilidade ...............................................10851, 204

• IPTU – sociedade de economia mista – imunidade recíproca – aplicabilidade ...........................10852, 204

iPva

• IPVA – prescrição – ocorrência....................10853, 205

ir• Imunidade – entidade beneficente – IOF – IRPJ –

rendimento de aplicações financeiras – não inci-dência .........................................................10846, 202

• IR – adicional de produtividade – incidência ....................................................................10854, 205

• IR – auxílio pré-escolar – não incidência .....10855, 208• IR – isenção – serviços prestados ao programa de

desenvolvimento das nações unidas – pessoa ju-rídica – impossibilidade...............................10856, 208

• IR – pessoa física – reclamação trabalhistas – verba salarial recebida judicialmente – montante global acumulado – não incidência .......................10857, 208

• IR – juros de mora – verba indenizatória – incidência ....................................................................10858, 209

• IR – pessoa jurídica – execução fiscal – redirecio-namento – interventora em unidade hospitalar– possibilidade ............................................10859, 209

• IR – pessoa jurídica – recolhimento – sistemática – compensação de prejuízos ..........................10860, 209

isEnção

• Isenção – estrangeiro – bens de uso pessoal e mó-veis – requisitos ...........................................10861, 210

• Isenção – tributos estaduais – aquisição de veícu-lo automotor – portador de necessidades especiais– possibilidade ............................................10862, 212

iss• ISS – atividade notarial – regime de tributação fixa

– inaplicabilidade ........................................10863, 212

• ISS – prestador de serviço – sede – localização diversa do contratante – pagamento – responsabi-lidade – exegese ..........................................10864, 212

• ISS – serviços bancários congêneres – legitimidade ....................................................................10865, 213

• ISS – serviços gráficos – suspensão da exigibilidade– cabimento ................................................10866, 214

• ISS – serviços portuários – embarcações estrangei-ras – pagamento por residente no exterior – inci-dência .........................................................10867, 214

itBi• ITBI – entidade religiosa – imunidade tributária –

alcance .......................................................10868, 214

itr• ITR – competência – foro do domicílio do execu-

tado – efeitos ...............................................10869, 215

• ITR – isenção – APP – averbação da área – neces-sidade ..........................................................10870, 215

manDaDo DE sEgurança •Mandado de segurança – lançamento tributário –

decadência parcial – reconhecimento .........10871, 215

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RET Nº 96 – Mar-Abr/2014 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO �����������������������������������������������������������������������������������������������������������������239 oBrigação acEssória

•Obrigação acessória – DIF papel imune – atraso na entrega de declaração – multa .....................10872, 216

ParcElamEnto

• Parcelamento – cancelamento – concessão – requi-sitos .............................................................10873, 216

• Parcelamento – Refaz – exclusão do programa –quitação da dívida – extinção ......................10874, 216

• Parcelamento – requerimento distinto por inscri-ção – exigência – análise .............................10875, 217

Pis/coFins

• Imposto de Importação – PIS/Cofins – importações feitas pelo Senai ..........................................10845, 202

• PIS/Cofins – base de cálculo – salário e encargossociais – serviços terceirizados – incidência ..10876, 217

rEsPonsaBiliDaDE triButária

• Responsabilidade tributária – empresa – dissolução irregular – ausência de indícios – efeitos .....10877, 218

taxa

• Taxa – coleta de resíduos – cobrança – legali-dade ............................................................10878, 220

• Taxa – cooperação e defesa à orizicultura – exegese ....................................................................10879, 222

• Taxa – despesas com oficial de justiça – naturezatributária – caracterização ...........................10880, 222

• Taxa – Fundaf – natureza jurídica – efeitos ....................................................................10881, 222

• Taxa – limpeza e combate de sinistros – inexigibili-dade – análise – competência .....................10882, 224

• Taxa – localização, funcionamento e fiscalização – poder de polícia – constitucionalidade – base de cálculo – área de fiscalização ......................10883, 224

• Taxa – localização, funcionamento e fiscalização– constitucionalidade ..................................10884, 224

• Taxa – sobre-estadia – consignatária das cargas – procuração – expressos poderes – termo de devolu-ção – assinatura – validade – cobrança – possibili-dade ............................................................10885, 224

JURISPRUDÊNCIA ADMINISTRATIVA

Assunto

classiFicação DE mErcaDoria

• Classificação de mercadoria – revisão aduaneira – benefício fiscal – classificação incorreta – multa ....................................................................10886, 225

DEcaDência

•Decadência – caracterização – requisitos ....10887, 225

icms • ICMS – crédito – aproveitamento indevido – efeitos

....................................................................10888, 225

iPtu• IPTU – revisão de lançamento – alteração de desti-

nação e do total de área construída – alíquota apli-cável ...........................................................10889, 226

multa

•Multa – recinto aduaneiro – contêiner ou veículocontendo mercadoria ..................................10890, 226

oBrigação acEssória

•Obrigação acessória – depósito fechado – inscrição no cadastro fiscal do Distrito Federal – Obrigato-riedade – efeitos ..........................................10891, 226

•Obrigação acessória – programa nota legal – cu- pom fiscal – data de emissão – incorreção – efeitos ....................................................................10892, 226

Parte EspecialEM POUCAS PALAVRAS

AssuntoProcEsso aDministrativo triButário

• As Intimações no Processo Administrativo Tributário(Kiyoshi Harada) ...................................................... 227

AssuntoKiyosHi HaraDa

• As Intimações no Processo Administrativo Tributário ................................................................................ 227

CLIPPING JURÍDICO• Brasil deve ter 30 mil empresas operando no

Siscoserv ................................................................. 231

• Frente quer aumento da adesão irrestrita ao regime Super Simples .......................................................... 233

•Nova regra contábil prejudica fluxo de caixa das empresas ................................................................. 232

•OAB pede ao STF correção da tabela do Impostode Renda ................................................................. 234

• Presa pode pagar dívida do Refis com crédito tribu-tário ......................................................................... 230

• Simples bem mais rápido para abrir uma empresa .... 230

RESENHA LEGISLATIVAmEDiDa Provisória

•Medida Provisória nº 638, de 17.01.2014 ............... 235