inundaÇÕes urbanas: propostas para uma gestÃo do …

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI VICE-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA PPCJ CURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA JURÍDICA CMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: FUNDAMENTOS DO DIREITO POSITIVO INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO RISCO COM FOCO NA PREVENÇÃO DE DANOS XIMENA CARDOZO FERREIRA Itajaí-SC, fevereiro de 2017.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI VICE-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA – PPCJ CURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA JURÍDICA – CMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: FUNDAMENTOS DO DIREITO POSITIVO

INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA

GESTÃO DO RISCO COM FOCO NA PREVENÇÃO DE

DANOS

XIMENA CARDOZO FERREIRA

Itajaí-SC,

fevereiro de 2017.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI VICE-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA – PPCJ CURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA JURÍDICA – CMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: FUNDAMENTOS DO DIREITO POSITIVO

INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA

GESTÃO DO RISCO COM FOCO NA PREVENÇÃO DE

DANOS

XIMENA CARDOZO FERREIRA

Dissertação submetida ao Máster Universitario en

Derecho Ambiental y de la Sostenibilidad (MADAS)

da Universidade de Alicante – UA (Espanha) e ao

Curso de Mestrado Acadêmico em Ciência Jurídica

da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do título de Mestre.

Orientador: Professor Doutor Andrés Molina Giménez

Co-orientadora: Professora Doutora Maria Claudia da Silva Antunes de Souza

Itajaí-SC,

fevereiro de 2017.

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3

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a Coordenação do Curso de Mestrado em Ciência Jurídica, a Banca

Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí-SC, fevereiro de 2017.

Ximena Cardozo Ferreira

Mestranda

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4

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANA Agência Nacional de Águas

APP Área de Preservação Permanente

CEF Caixa Econômica Federal

Comitesinos Comitê de Gerenciamento de Recursos Hídricos da Bacia

Hidrográfica do Rio dos Sinos.

CONAMA Conselho Nacional de Meio Ambiente

CONPDEC Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil

DI Diretiva de Inundações

DMA Diretiva Marco de Água

EC Estatuto da Cidade

EIA Estudo Prévio de Impacto Ambiental

EIV Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança

GITECO Grupo de Investigação de Tecnologia da Construção

IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

Renováveis

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPCC Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas

IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano

MMA Ministério do Meio Ambiente

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5

MUNIC Pesquisa de Informações Básicas Municipais

PNDR Política Nacional de Desenvolvimento Regional

PNOT Política Nacional de Ordenação do Território

PNPDEC Política Nacional de Proteção e Defesa Civil

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento para a

América Latina e o Caribe

RD Real Decreto

RDL Real Decreto Legislativo

SEDEC Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil

SINGREH Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

SINPDEC Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil

SNCZI Sistema Nacional de Cartografia de Zonas Inundáveis

SNIRH Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos

SUDS Sistemas Urbanos de Drenagem Sustentável

UNISDR Escritório das Nações Unidas para a Redução do Risco de

Desastres

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ROL DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Leito menor e leito maior de um rio. Ocupação do leito maior

Gráfico 1 Comparativo de ocorrências entre décadas de 1990 e 2000

Gráfico 2 Registros dos desastres mais recorrentes no Brasil (1991-2012)

Figura 2 Registros de enxurradas no Brasil (1991-2012)

Figura 3 Registros de inundações no Brasil (1991-2012)

Figura 4 Registros de alagamentos no Brasil (1991-2012).

Tabela 1 Danos Humanos Relacionados às Inundações em 2012

Tabela 2 Danos Humanos Relacionados às Inundações em 2013

Tabela 3 Danos causados por quatro grandes desastres brasileiros entre

2008 e 2011

Figura 5 Quadro dos “riscos chave” para América Central e do Sul

Figura 6 Exemplos de medidas estruturais (extensivas e intensivas)

Figura 7 Mapa com recorte da área central da cidade de Valencia,

Espanha

Figura 8 Fotografia atual do antigo leito do Rio Turia (Valencia, Espanha)

Figura 9 Componentes de telhados e terraços verdes

Figura 10 Fotografias de exemplos de terraços e telhados verdes (Chicago,

Estados Unidos)

Figura 11 Fotografias de superfícies permeáveis com pisos intertravados

Page 7: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

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Figura 12 Fotografias de superfície permeável de piso intertravado com

gramíneas

Figura 13 Fotografia de faixa filtrante contígua a uma rodovia

Figura 14 Esquema de poço e fotografia de vala de infiltração

Figura 15 Fotografia de dreno filtrante entre duas superfícies impermeáveis

Figura 16 Fotografia de uma vala verde

Figura 17 Fotografia de um depósito de infiltração

Figura 18 Fotografia de um depósito superficial de detenção

Figura 19 Fotografia de material plástico utilizado em depósito de detenção

Figura 20 Fotografia de depósito fabricado em concreto armado

Figura 21 Fotografia de uma lagoa de retenção

Figura 22 Fotografia do Parque Inundável “La Marjal” (Alicante, Espanha)

Figura 23 Esquema do ciclo hidrológico

Figura 24 Mapa de Vulnerabilidade a Inundações – Brasil

Figura 25 Atlas de Vulnerabilidade a Inundações – Rio Grande do Sul

Figura 26 Aproximação para Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos

Figura 27 Legenda (Atlas de Vulnerabilidade a Inundações – Rio Grande do

Sul)

Figura 28 Legenda (Atlas de Vulnerabilidade a Inundações – Rio Grande do

Sul)

Page 8: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

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SUMÁRIO

RESUMO p.

RESUMEN p.

INTRODUÇÃO

1 A REALIDADE BRASILEIRA

2 AS CAUSAS DOS DESASTRES: QUEM SÃO OS VERDADEIROS

RESPONSÁVEIS PELOS DESASTRES CHAMADOS NATURAIS?

2.1 AÇÕES ANTRÓPICAS: MAU USO DOS RECURSOS NATURAIS

2.2 URBANIZAÇÃO E IMPERMEABILIZAÇÃO DO SOLO

2.3 OCUPAÇÃO DE ÁREAS INUNDÁVEIS

2.4 MUDANÇAS CLIMÁTICAS

3 O ENFRENTAMENTO DO PROBLEMA DAS INUNDAÇÕES NO

ORDENAMENTO JURÍDICO ESPANHOL: O DIREITO COMUNITÁRIO E A

EXPERIÊNCIA DA COMUNIDADE VALENCIANA

3.1 A POLÍTICA HIDRÁULICA ESPANHOLA: O ENFRENTAMENTO DOS

FENÔMENOS DE ESCASSEZ E EXCESSO DE ÁGUA E A INSERÇÃO NO

CENÁRIO EUROPEU

3.2 A NORMATIVA COMUNITÁRIA EUROPEIA PARA O ENFRENTAMENTO DO

PROBLEMA DAS INUNDAÇÕES

3.3 AS MEDIDAS ADOTADAS NO ÂMBITO DO DIREITO INTERNO ESPANHOL

3.4 A LEGISLAÇÃO AUTONÔMICA ESPANHOLA: O CASO DA COMUNIDADE

VALENCIANA

4 O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: ENTRE O DÉFICIT DE

ORDENAÇÃO TERRITORIAL E O PANORAMA LEGISLATIVO CORRELATO AO

PROBLEMA DAS INUNDAÇÕES

Page 9: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

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4.1 ORDENAÇÃO TERRITORIAL – DÉFICIT ATUAL E PROPOSTAS DE LEGE

FERENDA

4.2 O ENFRENTAMENTO DO PROBLEMA DAS INUNDAÇÕES NO

ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

4.2.1 PROTEÇÃO E DEFESA CIVIL

4.2.2 URBANISMO

4.2.3 PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE

5 INSTRUMENTOS DE ENFRENTAMENTO DO PROBLEMA DAS INUNDAÇÕES

NO TERRITÓRIO BRASILEIRO: O CONTROLE COM FOCO NA PREVENÇÃO DE

DANOS

5.1 MEDIDAS ESTRUTURAIS INTENSIVAS

5.1.1 RETARDO DO ESCOAMENTO

5.1.2 ACELERAÇÃO DO ESCOAMENTO

5.1.3 DESVIO DO ESCOAMENTO

5.2 MEDIDAS ESTRUTURAIS EXTENSIVAS

5.2.1 COBERTURA VEGETAL

5.2.2 SISTEMAS DE DRENAGEM URBANA SUSTENTÁVEL (SUDS)

5.3 MEDIDAS NÃO ESTRUTURAIS

5.3.1 COMBATE AO DESMATAMENTO E PROTEÇÃO DE ECOSSISTEMAS

5.3.2 PLANEJAMENTO URBANO: MAPEAMENTO DE ÁREAS INUNDÁVEIS,

ZONEAMENTO E COMPATIBILIZAÇÃO DOS PLANOS DIRETORES COM O

PLANO DE BACIA

5.3.3 COMBATE À OCUPAÇÃO DE ÁREAS INUNDÁVEIS

CONCLUSÕES: RUMO A UMA GESTÃO DE RISCO DE INUNDAÇÕES COM

FOCO NA PREVENÇÃO DE DANOS

REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS

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RESUMO

A presente Dissertação está inserida na linha de pesquisa Direito Ambiental,

Transnacionalidade e Sustentabilidade e aborda o tema do controle dos riscos de

inundações. Dividida em cinco capítulos, parte da análise da realidade brasileira no que

concerne à ocorrência de desastres de natureza hidrogeológica (capítulo 1) para em

seguida analisar as causas antrópicas dos chamados “desastres naturais” – notadamente

mau uso de recursos naturais, urbanização e ocupação de áreas inundáveis – e destacar

uma atenção especial ao fenômeno das mudanças climáticas (capítulo 2). Reservou-se

parte especial da pesquisa (capítulo 3) para a apresentação do enfrentamento do tema das

inundações nos ordenamentos jurídicos europeu e espanhol, de modo a colher experiências

de possível aplicação no Brasil. Na sequência (capítulo 4), analisa-se o ordenamento

jurídico brasileiro, apontando suas lacunas e também explorando seu arsenal legislativo

correlato ao tema das inundações. O capítulo 5 é reservado à análise dos diversos

instrumentos que podem ser utilizados, de forma associada, para o controle de inundações,

inclusive ilustrando com exemplos práticos de sua aplicação. Por fim, as conclusões

apontam para o conjunto de ações necessárias a uma efetiva gestão do risco de

inundações. O método utilizado na fase de investigação foi o indutivo, sendo acionadas as

técnicas do referente, da categoria, dos conceitos operacionais, da pesquisa bibliográfica e

do fichamento.

Palavras-chave: Inundações. Desastres. Risco. Gestão.

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RESUMEN

El presente Trabajo de Disertación pertenece a la línea de investigación “Derecho

Ambiental, Transnacionalidad y Sostenibilidad” y aborda el tema del control de los riesgos

de inundaciones. Dividido en cinco capítulos, parte del análisis de la realidad brasileña con

relación a la incidencia de desastres de naturaleza hidrogeológica (capítulo 1) para analizar

a seguir las causas antrópicas de los llamados “desastres naturales” – específicamente el

mal uso de los recursos naturales, la urbanización y la ocupación de áreas inundables – y

destacar una especial atención al fenómeno de los cambios climáticos (capítulo 2). Se ha

reservado parte especial de la investigación (capítulo 3) para la presentación del

enfrentamiento del tema de las inundaciones en los ordenamientos jurídicos europeo y

español, a fin de recoger experiencias de aplicación posible en Brasil. A continuación

(capítulo 4), se analiza el ordenamiento jurídico brasileño, apuntando sus fallas y también

explorando su arsenal legislativo correlato al tema de las inundaciones. El capítulo 5 está

reservado al análisis de los diversos instrumentos que pueden ser utilizados, de forma

asociada, para el control de inundaciones, incluso ilustrando con ejemplos prácticos de su

aplicación. Por último, las conclusiones apuntan para el conjunto de acciones necesarias a

una efectiva gestión del riesgo de inundaciones. El método utilizado en la fase de

investigación fue el inductivo, siendo accionadas las técnicas del referente, de la categoría,

de los conceptos operacionales, de la investigación bibliográfica y del fichaje.

Palabras clave: Inundaciones. Desastres. Riesgo. Gestión.

Page 12: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

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INTRODUÇÃO

Los ríos son documentos que nos aportan información sobre la realidad social en cada momento y en cada contexto. Son también elementos que nos ayudan a comprender y explicar el mundo urbano en el que vivimos. La relación de las diferentes sociedades con los ríos y el proceso de humanización a que estos fueron sometidos, explica muchos aspectos del proceso de rehidratación-deshidratación de las ciudades. A lo largo de la historia, los ríos han pasado de ser parte fundamental en la organización de la vida social, a ser realidades patrimoniales. En su expresión urbana, los ríos son la manifestación de una catástrofe ambiental de consecuencias más o menos imprevistas1.

Numa tradição de ocupação do espaço através da exploração de recursos

naturais que, baseada em sua abundância, sempre pressupôs que seriam infinitos, o

Brasil impactou negativamente seu território e suas espécies durante a imensa

maioria dos mais de 500 anos transcorridos desde o seu “descobrimento”, sem

qualquer preocupação com a transgeracionalidade do direito ao meio ambiente ou

com a própria sustentabilidade de seu desenvolvimento – conceitos cunhados

somente a partir da década de 70 (há menos de 50 anos, portanto).

Com relevante incremento demográfico e nenhum planejamento, o país

atingiu impressionante marca de urbanização da população: mais de 80% dos

brasileiros vivem atualmente nas cidades. Cidades estas que, em considerável

estatística, formaram-se ao longo de cursos d’água ou em suas áreas de influência.

O presente estudo tem por escopo, neste contexto, analisar o fenômeno

das inundações urbanas, diante da constante – e nem sempre harmônica –

interação entre a cidade e as águas fluviais de seu entorno.

Parte-se, para tanto, da apresentação da realidade brasileira no que

concerne aos fenômenos danosos de origem hidrogeológica e de suas implicações

meteorológicas, para situação do problema a enfrentar: o impacto das águas sobre a

vida e o patrimônio.

1 PEIXOTO, Paulo. Los ríos como un factor civilizador en un mundo urbano. In: MELGAREJO, Joaquín; MARTÍ, Pablo; MOLINA, Andrés (eds.) Agua, Arquitectura y Paisaje en Europa. San Vicente del Raspeig: UNE (Publicacions de la Universitat d’Alacant), 2016. p. 103.

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Para uma correta visão que permita a atuação não apenas na

remediação, mas sobretudo na prevenção de danos, pretende-se a desmitificação

do termo “desastre natural”, frequentemente empregado em tais ocorrências, nem

sempre de forma apropriada. Para tal mister, analisam-se as verdadeiras causas dos

eventos hidrológicos extremos – ações antrópicas que, conjugadas com fenômenos

naturais, produzem as ocorrências adversas.

Diante da experiência espanhola e também europeia na seara do controle

de inundações – haja vista serem recorrentes também na Europa – estuda-se o

tratamento normativo emprestado ao tema como forma de colher subsídios para,

inclusive, incremento do ordenamento jurídico brasileiro.

Apontam-se, ainda, os instrumentos legais postos à disposição dos

administradores públicos do país (nas diferentes esferas federativas) – assim como

dos agentes de controle – para o necessário enfrentamento do problema, atacando

desde suas causas (evitando-as ou minimizando-as) e estabelecendo programas de

gestão que reduzam a incidência de danos pessoais e patrimoniais para as

hipóteses de ocorrência dos eventos naturais.

Por fim, indicam-se medidas de distintas naturezas para a adequada

composição de tais planos ou programas: certo é que uma efetiva gestão do risco de

inundações passa pela adoção não de uma solução única, mas de um conjunto de

medidas tendentes a – de forma conectada – controlar o risco de inundações.

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CAPÍTULO 1

A REALIDADE BRASILEIRA

O Brasil não sói ser alvo de terremotos ou tsunamis. Nos últimos anos,

contudo, quiçá também pelo impacto das mudanças climáticas em curso no planeta,

o país tem dado lugar a situações chamadas de “desastres naturais”: notadamente

enchentes, secas, erosões e deslizamentos de terra. No que concerne ao impacto

das águas, objeto do presente estudo, alagamentos, inundações e escorregamento

de encostas tem sido cada vez mais frequentes.

Estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Estatística (IBGE)

entre os meses de março e novembro de 2013 e publicado em 2014 revela que dos

5.570 municípios brasileiros, 2.065 teriam sido atingidos por alagamentos nos cinco

anos anteriores à pesquisa (37,1% do total de municípios, portanto)2.

A mesma pesquisa apresenta também dados relativos a inundações

graduais e bruscas em igual período (5 anos anteriores à coleta dos dados). Nessa

ótica, 1.543 municípios brasileiros foram atingidos por enchentes ou inundações

graduais (27,7% do total) e 1.574 atingidos por enxurradas ou inundações bruscas

(28,3%) – há 948 municípios afetados por ambos eventos.

Segundo o glossário que integra a publicação, o IBGE considera

alagamentos os extravasamentos ou acúmulos de águas relacionados mais

diretamente à deficiência dos sistemas de drenagem e/ou à falta de permeabilidade

do solo, a dificultar o escoamento das águas.

As enchentes (ou inundações graduais) seriam relacionadas à elevação

paulatina e previsível das águas dos cursos d’água. Depois de algum tempo de

situação de “cheia”, a água volta a escoar gradualmente.

2 PESQUISA DE INFORMAÇÕES BÁSICAS MUNICIPAIS. Perfil dos Municípios Brasileiros 2013. Rio de Janeiro: IBGE, 2014. 282 p. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/perfilmunic/2013/default.shtm>. Acesso em: 3 maio 2016.

Page 15: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

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As inundações são classificadas como bruscas, por seu turno, quando

provocadas por chuvas intensas e concentradas em curto espaço de tempo,

ocasionando transbordamento dos canais de drenagem natural – com danos

materiais e humanos mais intensos do que as inundações graduais.

Tucci3 ilustra, esclarecendo que os rios geralmente possuem dois leitos: o

leito menor, onde a água escoa na maior parte do tempo, e o leito maior, que é

atingido pelas águas em momentos de cheias (inundação):

Figura 1 – Leito menor e leito maior de um rio. Ocupação do leito maior.

(Fonte: TUCCI, C. E. M. Águas urbanas, p. 105)

O Atlas Brasileiro de Desastres Naturais – 1991 a 20124 apresenta um

comparativo do número de desastres ocorridos no país nas décadas de 1990 e de

2000, apontando para um assombroso5 aumento das ocorrências de eventos

extremos:

Gráfico 1 – Comparativo de ocorrências entre décadas de 1990 e 2000.

3 TUCCI, Carlos E. M. Águas urbanas. Estudos Avançados, São Paulo, v. 22, n. 63, pp. 97-112, 2008. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/ea/v22n63/v22n63a07.pdf>. Acesso em: 29 dez. 2015. 4 Disponível em: <http://150.162.127.14:8080/atlas/Brasil%20Rev%202.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2016. 5 Em que pese a publicação sustente não ser possível afirmar o aumento de 78% nos últimos 13 anos, diante das conhecidas deficiências dos sistemas de Defesa Civil de atualização de seus registros.

Page 16: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

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(Fonte: Atlas Brasileiro de Desastres Naturais 1991-2012, p. 34)

Estiagens e secas são os fenômenos com maior incidência no país, mas

vem seguidos – em segundo e terceiro lugares, respectivamente – pelas enxurradas

e inundações, como demonstra o presente gráfico:

Gráfico 2 – Registros dos desastres mais recorrentes no Brasil (1991-2012).

(Fonte: Atlas Brasileiro de Desastres Naturais 1991-2012, p. 118)

Segundo o Anuário Brasileiro de Desastres Naturais de 20116, os

alagamentos são fruto da “combinação de precipitações intensas com a superação

da capacidade de escoamento de sistemas de drenagem urbana, gerando

consequentemente acúmulo de água em vias, edificações e outras infraestruturas

urbana”7, entendendo-se por enxurrada o “escoamento superficial de alta velocidade

e energia, desencadeado por chuvas intensas e concentradas”8. As inundações, por

seu turno, estão relacionadas diretamente às cheias dos rios e são intensificadas por

condições meteorológicas de médio e longo prazo.

No Atlas Brasileiro de Desastres Naturais – 1991 a 2012 são

apresentados mapas específicos para visualização das ocorrências, dentre os quais

destacamos os relativos a enxurradas, inundações e alagamentos:

6 Disponível em: <http://www.mi.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=e3cab906-c3fb-49fa-945d-649626acf790&groupId=185960>. Acesso em: 22 jun. 2016. 7 Cf. p. 46. 8 Cf. p. 47.

Page 17: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

17

Figura 2 – Registros de enxurradas no Brasil (1991-2012).

(Fonte: Atlas Brasileiro de Desastres Naturais 1991-2012, p. 46)

Figura 3 – Registros de inundações no Brasil (1991-2012).

(Fonte: Atlas Brasileiro de Desastres Naturais 1991-2012, p. 52)

Page 18: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

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Figura 4 – Registros de alagamentos no Brasil (1991-2012).

(Fonte: Atlas Brasileiro de Desastres Naturais 1991-2012, p. 60)

Tais fenômenos, de ocorrência natural e até certo ponto previsível,

adquirem relevância jurídica na medida em que atingem os bens tutelados pelo

ordenamento nacional, como o patrimônio e a vida humana. De fato, a Tabela 20 da

Pesquisa MUNIC 2013 traz a alarmante cifra de 1.406.713 pessoas atingidas por

inundações graduais no Brasil nos 5 anos anteriores à pesquisa, contabilizando 445

óbitos. Os dados relativos ao mesmo período, mas no que tange a inundações

bruscas (Tabela 21), apontam 777.546 pessoas atingidas no território nacional (108

óbitos).

O Anuário Brasileiro de Desastres Naturais de 2012, por seu turno,

registra que, em comparação com os números de 2011, as inundações foram o

único desastre de natureza hidrológica com ocorrências superiores em 2012:

enquanto no ano anterior cerca de 2 milhões de pessoas haviam sido afetadas por

inundações em todo o país, em 2012 esse número foi da ordem de 5,2 milhões de

habitantes – não apenas óbitos, mas também desabrigados, desalojados, feridos e

enfermos, como se vê da tabela da abaixo9:

9 Extraída da p. 58 da publicação de 2012. Disponível em: <http://www.mi.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=f22ccccd-281a-4b72-84b3-654002cff1e6&groupId=185960>. Acesso em 22 jun. 2016.

Page 19: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

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Tabela 1 – Danos Humanos Relacionados às Inundações em 2012

(Fonte: Anuário Brasileiro de Desastres Naturais de 2012, p. 58)

Já da edição de 2013 do mesmo Anuário10, extraem-se os seguintes

dados:

Tabela 2 – Danos Humanos Relacionados às Inundações em 2013

(Fonte: Anuário Brasileiro de Desastres Naturais de 2013, p. 71)

Dela se depreende que, em que pese o número de pessoas afetadas em

2013 seja inferior ao de 2012, houve incremento do número de óbitos. Nessa edição

há uma especial referência ao município de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul11,

como o local de ocorrência da inundação mais expressiva, registrada em agosto de

2013, com 178.401 afetados12.

Nesse sentir, a realidade brasileira referente ao impacto das águas sobre

a vida humana está a demonstrar a imperiosa necessidade de uma eficiente gestão

que tenha por norte evitar perdas humanas e danos patrimoniais. Por outro lado, a

gestão do risco deve, por evidência, ter em conta suas causas e os fatores de

agravamento, como veremos a seguir, afigurando-se indispensável que as atuações

também busquem respeitar a dinâmica do meio.

10 Disponível em: <http://www.mi.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=fee4007a-ab0b-403e-bb1a-8aa00385630b&groupId=10157>. Acesso em: 30 jun. 2016. 11 No âmbito da bacia hidrográfica do Rio dos Sinos. 12 Op. cit., p. 71.

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20

CAPÍTULO 2

AS CAUSAS DOS DESASTRES: QUEM SÃO OS VERDADEIROS

RESPONSÁVEIS PELOS DESASTRES CHAMADOS NATURAIS?

2.1. AÇÕES ANTRÓPICAS: MAU USO DOS RECURSOS NATURAIS

Sob o estigma de “desastres naturais”13 esconde-se, em realidade, a

imprudência humana. A falta de planejamento ou mesmo a desconsideração das

variáveis ambientais no processo de ordenação do território determina violenta

pressão sobre áreas que deveriam ser objeto de conservação, justamente por suas

funções ecológicas. É o caso das margens de rios (áreas ciliares), que deveriam

estar cobertas de vegetação justamente para a proteção do recurso hídrico e a

sustentação do solo (a fim de evitar a erosão), e também de outras áreas inundáveis

(notadamente planícies de inundação e áreas úmidas).

Tucci14 assim caracteriza as inundações em áreas de margem:

Quando a precipitação é intensa e a quantidade de água que chega simultaneamente ao rio é superior à sua capacidade de drenagem, ou seja a da sua calha normal, resultam inundação nas áreas ribeirinhas. Os problemas resultantes da inundação dependem do grau de ocupação da várzea pela população e da freqüência com a qual ocorrem as inundações.

A população de maior poder aquisitivo tende a habitar os locais seguros ao contrário da população carente que ocupa as áreas de alto risco de inundação, provocando problemas sociais que se repetem por ocasião de cada cheia na região. Quando a freqüência das inundações é baixa, a população ganha confiança e despreza o risco, aumentando significativamente o investimento e a densificação nas áreas inundáveis. Nesta situação a enchente assume características catastróficas. (sic)

13 A propósito, Délton Winter de Carvalho sustenta que não existem desastres puramente naturais, “havendo sempre, para a ocorrência de desastres, fatores combinados de vulnerabilidades físicas e sociais”. CARVALHO, D. W. Desastres ambientais e sua regulação jurídica [livro eletrônico]: deveres de prevenção, resposta e compensação ambiental. Sã o Paulo: Editora dos Tribunais, 2015. 14 TUCCI, Carlos E. M. Inundações e Drenagem Urbana. In: TUCCI, C. E. M. e BERTONI, J. C. (org.). Inundações Urbanas na América do Sul. Porto Alegre: Associação Brasileira de Recursos Hídricos, 2003. pp. 54-55.

Page 21: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

21

Vê-se, pois, que o fenômeno do extravasamento dos cursos d’água é de

recorrência natural – em maior ou menor periodicidade. O problema da inundação

somente ocorre diante da circunstância de que a área que deveria estar reservada

para tal movimento hidrológico está, muitas vezes, ocupada por construções

(residenciais ou não). Ou seja: a inundação não é um desastre natural. O

extravasamento das águas é, sim, um fenômeno natural e previsível, mas a

inundação – o atingimento de bens jurídicos, seja vida ou patrimônio – é uma

consequência da intervenção do homem sobre o meio.

A afirmação contida na página do Ministério Brasileiro do Meio Ambiente15

corrobora tal entendimento:

É importante compreender que as enchentes dos rios são fenômenos naturais, que ocorrem com frequência variável e muitas vezes inesperada. Em muitas situações, o leito maior do rio é ocupado (principalmente em locais onde as enchentes demoram a acontecer novamente), fazendo com que a enchente do rio se transforme em inundação, com perdas humanas e patrimoniais. A enchente é um fenômeno natural, ao passo que a inundação é o resultado da ocupação de áreas que pertencem ao rio e desrespeito aos ciclos naturais dos ambientes aquáticos, mesmo que a inundação se dê de forma pouco frequente e esporádica.16

A pesquisa MUNIC realizada no ano de 2002 e publicada em 2005 já

demonstrava que no Brasil os maiores desastres estavam relacionados a

inundações, a escorregamentos e à erosão, e que tais processos estão fortemente

associados à degradação de áreas frágeis, potencializada pelo desmatamento e

pela ocupação irregular17.

Ramón Martín Mateo já registrava que a ação humana é decisiva para o

desencadeamento de tais fenômenos (ou, melhor, de suas consequências danosas).

Além do crescimento demográfico e da concentração de população em locais muitas

vezes já identificados como de risco, apontava o mau uso do solo como causador

desses danos associados, através da execução de grandes obras públicas

15 MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Controle de Inundações. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/cidades-sustentaveis/aguas-urbanas/controle-de-inunda%C3%A7%C3%B5es>. Acesso em: 12 jan. 2016. 16 Disso se extrai, também a relevante diferenciação entre enchente (extravasamento natural das águas) e inundação (quando as águas atingem pessoas e/ou bens patrimoniais). 17 Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC), referida por MAFFRA, Cristina Q.T. e MAZZOLA, Marcelo. As razões dos desastres em território brasileiro. In: SANTOS, Rozely Ferreira dos. (org.). Vulnerabilidade Ambiental – Desastres naturais ou fenômenos induzidos? Brasília: MMA, 2007. pp. 10-11.

Page 22: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

22

(estradas, pontes), de reservatórios suscetíveis à ruptura, e da ocupação de áreas

inundáveis18, por exemplo.

De fato, assim definia ao se referir ao “elemento humano”19:

Las denominadas catástrofes naturales no lo son por lo general en un sentido estricto. [...] En los desastres el hombre funciona en algunos casos como dinamizador y en otros magnificando y multiplicando los efectos devastadores. [...] Buena parte de las inundaciones se producen por la invasión de los cauces y obturación de válvulas de regulación naturales, como los estuarios y zonas húmedas.

Maria Claudia da Silva Antunes de Souza e Kamilla Pavan também

apontam na mesma senda:

A sustentabilidade tem uma ligação direta com as questões ambientais, após um crescimento de natureza econômica calcada na utilização dos recursos naturais e no acúmulo exacerbado de riquezas, causando uma distinção entre as populações humanas de baixa renda que não possuem o mínimo de dignidade de vida. O uso ilimitado da natureza é um anúncio dos desastres flagrados nos dias atuais. O aquecimento global, a degradação dos recursos naturais e a desigualdade social são reflexos reais que proclamam, que descrevem a crise ambiental.20

Assim como a ação (ou omissão) humana pode ser responsável pela

concretização de desastres ou catástrofes como a recentemente ocorrida pelo

rompimento de barragens contendo rejeitos de mineração no estado brasileiro de

Minas Gerais – que determinou a perda de 19 vidas21 e completa contaminação do

Rio Doce (mais de 600 Km² de curso d’água), de efeitos ainda não completamente

conhecidos22 para os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, além dos impactos

18 MARTÍN MATEO, Ramón. Tratado de Derecho Ambiental. Madri: Editorial Trivium, 1992, p.661. 19 Idem, pp. 660-661. 20 SOUZA, Maria Claudia da Silva Antunes de; PAVAN, Kamilla. SUSTENTABILIDADE, MEIO AMBIENTE E ÁGUA: UMA QUESTÃO DE SOBREVIVÊNCIA. In: CALGARO, C.; REZENDE, E. N. (org.) Direito e sustentabilidade II [Recurso eletrônico on-line]. Florianópolis: CONPEDI, 2016. pp. 319-337. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/publicacoes/y0ii48h0/dzoq9f77/4aF1HOT08DIXm7CI.pdf>. Acesso em: 1 fev. 2017. 21 Segundo notícia de 25 de fevereiro de 2016, com base em dados divulgados pela Polícia Civil de Minas Gerais, seriam 17 vítimas fatais e 2 pessoas ainda desaparecidas. Disponível em: <http://vitorianews.com.br/geral/noticia/2016/02/policia-civil-de-minas-gerais-divulga-detalhes-das-causas-do-rompimento-das-barragens-da-samarco-74135.html>. Acesso em: 15 jun. 2016. 22 Segundo o laudo técnico preliminar do IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), a lama de rejeitos (pelo menos 34 milhões de metros cúbicos) atingiu 663 km de cursos d’água na bacia do Rio Doce e resultou na destruição de 1.469 hectares de vegetação, incluindo Áreas de Preservação Permanente. Disponível em:

Page 23: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

23

no meio marinho23 – também outras decisões antrópicas quiçá menos pontuais e

mais disseminadas no seio social são potencialmente causadoras de danos de

elevada magnitude.

Exemplo também recente foram as perdas decorrentes dos deslizamentos

de encostas ocorridos na região serrana do Estado do Rio de Janeiro no ano de

2011, notadamente pela ocupação indiscriminada de áreas de morro, propensas ao

movimento de terra, que ocasionaram 905 mortes em 7 cidades, afetando mais de

300 mil pessoas24, sendo prontamente considerado o pior desastre brasileiro em

danos humanos. Meio ano antes (junho de 2010), chuvas intensas determinaram

também a perda de vidas e danos patrimoniais nos estados de Alagoas e

Pernambuco. Em 2008 fora o estado de Santa Catarina o atingido por enchentes e

deslizamentos de terra, igualmente vitimando pessoas e patrimônios. Sobre estes

eventos, o Banco Mundial sistematizou os danos25:

Tabela 3 – Danos causados por quatro grandes desastres brasileiros entre 2008 e 2011

(Fonte: Banco Mundial, 2014, p. 15)

No plano das inundações, em que pese a pluviosidade normalmente

funcione como fator desencadeador – sendo certo que se desenvolvem por uma

<http://www.ibama.gov.br/phocadownload/noticias_ambientais/laudo_tecnico_preliminar.pdf>. Acesso em: 15 jun. 2016. 23 Para maiores informações técnicas sobre o desastre de causas nitidamente humanas, ocorrido em 2015, vide: <http://giaia.eco.br/>. Acesso em: 15 jun. 2016. 24 Dados disponíveis no relatório “Avaliação de Perdas e Danos: Inundações e Deslizamentos na Região Serrana do Rio de Janeiro - Janeiro de 2011”, produzido pelo Banco Mundial. Disponível em: <http://mi.gov.br/pt/c/document_library/get_file?uuid=74dde46c-544a-4bc4-a6e1-852d4c09be06&groupId=10157>. Acesso em: 15 jun. 2016. 25 Dados compilados pelo Banco Mundial no documento “Lidando com perdas: opções de proteção financeira contra desastres no Brasil”, publicado em 2014. Disponível em: <http://bibspi.planejamento.gov.br/bitstream/handle/iditem/658/Banco%20Mundial_opcoes_de%20prote%C3%A7%C3%A3o%20financeira%20contra%20desastres%20no%20Brasil.pdf?sequence=1>. Acesso em: 15 jun. 2016.

Page 24: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

24

combinação de fatores extremos meteorológicos e hidrológicos26 – forçoso

reconhecer dentre as verdadeiras causas determinantes da ocorrência de desastres

as ações antrópicas que representam mau uso dos recursos naturais, como as que

interferem fundamentalmente no uso do solo e no ciclo hidrológico, ou determinam a

supressão de vegetação.

Com efeito, o desmatamento (corte de vegetação nativa) em áreas de

preservação permanente (topos de morro ou margens de rios, a título

exemplificativo) contribui de forma nefasta e decisiva aos processos erosivos, haja

vista que a principal função dessa vegetação é justamente a fixação do solo. Além

de abrir mão das funções ecológicas de refúgio de fauna e flora, bem como a

redução da capacidade de infiltração, a perda de solo – em área ciliar, por exemplo

– necessariamente acarretará o assoreamento do recurso hídrico contíguo, com

todas as consequências dele decorrentes: formação de ilhas, aumento da

velocidade das águas, nova configuração (e capacidade volumétrica) do leito

principal. Enfim, dá-se uma completa alteração da dinâmica do rio.

Insta considerar, ainda, que a existência da vegetação ciliar também

pressupõe a função de barreira natural para eventual cheia do curso d’água.

Desaparecida esta, ausente qualquer impedimento para que as águas atinjam as

áreas adjacentes, seja qual for sua ocupação principal.

E, ainda, não apenas a vegetação localizada à margem do recurso hídrico

possui relevância ecossistêmica: a supressão de florestas ou de áreas úmidas a

montante pode ocasionar uma radical e perigosa alteração das características de

uma cheia a jusante, com as pertinentes particularidades de qualidade de água,

velocidade de escoamento e transporte de sedimentos27.

Por outro lado, as intervenções diretas em leitos de rios (canalizações ou

retificações), bem como as alterações promovidas no uso do solo são também

determinantes do aumento da vulnerabilidade a desastres a que estão submetidos

determinados grupos sociais. A canalização de cursos d’água pode representar

simplesmente a transferência do problema de um local ao outro, criando uma falsa

26 BLOCH, Robin; JHA, Abhas Kumar; LAMOND, Jessica. Cidades e Inundações: Um guia para a Gestão Integrada do Risco de Inundação Urbana para o Século XXI. Washington, DC: World Bank Group, 2012. p. 25. 27 Conforme o documento conceitual de Gestión Integrada de Crecidas, p. 16. Disponível em espanhol em: <http://www.apfm.info/publications/concept_paper_s.pdf>. Acesso: 18 abr. 2016.

Page 25: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

25

sensação de segurança que não resiste à primeira cheia. A retificação de um rio, por

outro lado, provoca o aumento da velocidade das águas, sendo potencial indutora de

desastres.

2.2. URBANIZAÇÃO E IMPERMEABILIZAÇÃO DO SOLO

A urbanização sem dúvida é o principal motor das alterações de uso do

solo que terminam por desencadear desastres. Em 2014 aproximadamente 173

milhões de brasileiros viviam em áreas urbanas, estimando-se o incremento desse

número para 210 milhões até 2050 (o que representará 91% da população total)28.

Para além das ações de consequências negativas já referidas, necessário

considerar que a urbanização significa a impermeabilização do solo. Com efeito,

enquanto na área rural existe grande superfície para infiltração das águas, na zona

urbana o solo está compactado e – quase que totalmente, dependendo do porte da

cidade – coberto por estruturas de concreto e/ou asfalto, que impedem que as águas

infiltrem, reduzindo sensivelmente a permeabilidade do solo.

De fato, não bastasse toda ocupação de solo que a “infraestrutura cinza”

pressupõe no que concerne às construções de prédios residenciais, comerciais e

industriais, lança-se mão (em maior ou menor escala, dependendo das

características do núcleo urbano) de vasta impermeabilização do solo restante

através da pavimentação das vias públicas por superfícies não permeáveis,

notadamente asfalto e concreto, alterando sobremaneira as características – em

qualidade e volume – do ciclo hidrológico29.

As ruas da cidade já não são mais de terra (popularmente conhecida

como “chão batido”), sendo pavimentadas para receber o trânsito decorrente do

incremento populacional, bem como de comércio e serviços. Menos impacto haveria

se houvesse utilização de materiais permeáveis, como os antigos paralelepípedos

28 World Urbanization Prospects: The 2014 Revision, United Nations, New York, 2014, apud JUNQUEIRA, Pedro; KRAMER, Kirsten. Da consciência à resiliência: o novo papel do poder público e do cidadão na construção de uma cidade resiliente. Cidades resilientes-Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, v. XVI, nº 2, pp. 57-76, ago. 2015. 29 ARAÚJO, P. R.; TUCCI, C. E. M.; GOLDENFUM, J. A. A Avaliação da Eficiência dos Pavimentos Permeáveis na Redução do Escoamento Superficial, p. 1. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/237471602_AVALIACAO_DA_EFICIENCIA_DOS_PAVIMENTOS_PERMEAVEIS_NA_REDUCAO_DE_ESCOAMENTO_SUPERFICIAL>. Acesso em: 16 jun. 2016.

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26

(blocos regulares de basalto) e outras pedras irregulares ou os mais recentemente

produzidos blocos de concreto intertravados (“bloquetos”). Contudo, os materiais

que mais frequentemente aparecem nas decisões político-administrativas das

cidades são o asfalto e o concreto – que terminam por impermeabilizar

completamente o solo urbano.

A consequência direta é o aumento do escoamento superficial, já que a

água da chuva não infiltra nesse solo (impermeável) e acaba “correndo” pela

superfície das ruas e calçadas. Estudos científicos desenvolvidos no Instituto de

Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul demonstram

que o coeficiente de escoamento superficial de áreas pavimentadas com

paralelepípedos é de 0,60, bastante inferior aos das áreas asfaltadas (até 0,95)30.

Assim, em ruas de paralelepípedo, 60% da água da chuva corre pela superfície e

40% é absorvida, enquanto que nas ruas cobertas de asfalto apenas 5% é

absorvida: 95% da água corre por sua superfície.

É evidente que o aumento do escoamento superficial e a redução da

infiltração de água no solo são causas diretas de alagamentos em zonas urbanas31,

mormente considerando a tradicionalmente deficiente concepção dos sistemas de

drenagem artificial. De fato, Tucci afirma que o aumento na frequência e da

magnitude das inundações é consequência da impermeabilização e do aumento do

escoamento superficial32.

Com as mesmas conclusões, Lechiu, Oliveira Filho e Sousa33:

Quando se substitui a rede de drenagem natural por estruturas artificiais, ocorre aumento na totalidade de áreas impermeáveis provocando o subsequente aumento na velocidade de escoamento das águas, o que é determinado pelo coeficiente de escoamento artificial. [...] A falta de planejamento na ocupação dos espaços urbano, devido ao aumento da taxa populacional e do total de áreas impermeáveis, tem alterado significativamente os parâmetros que dizem respeito à impermeabilização de bacias hidrográficas urbanas. [...] Todos estes fatores, apesar de alguns oferecerem certos benefícios, ocasionam no aumento das áreas impermeabilizadas,

3030 Idem, p. 6. 31 Além do problema associado de contaminação, haja vista que o escoamento superficial carrega poluentes. 32 TUCCI, Carlos E. M. Águas urbanas. Estudos Avançados, p.106. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142008000200007&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 29 dez. 2015. 33 LECHIU, B. C. G.; OLIVEIRA FILHO, P. C.; SOUSA, J. B. de. Utilização de imagens orbitais de alta resolução em superfícies com níveis distintos de impermeabilização do solo urbano: caso Irati-PR, p. 128. Semina: Ciências Exatas e Tecnológicas. Londrina, v. 33, nº 2, pp. 127-140, jul/dez 2012.

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27

interferindo na velocidade de escoamento das águas das chuvas, aumentando a vazão e acarretando no acúmulo de carga hidráulica em certos pontos da rede coletora, isto resulta no aumento da magnitude das enchentes em áreas mais baixas da bacia ocasionando em prejuízos não somente ao poder público, mas também para a população em geral.

Não fosse isso suficiente, estudo realizado pela Universidade de

Campinas associa a impermeabilização do solo decorrente da expansão da área

urbana ao aumento das taxas de precipitação pluviométrica, sustentando que a

utilização de concreto e asfalto acarreta a elevação da temperatura dos centros

urbanos34.

Assim, se (como afirmado no estudo das Nações Unidas já referido35) a

estimativa é de que em 2050, no Brasil, 9 em cada 10 pessoas morarão em centros

urbanos, o impacto da urbanização precisa ser considerado na gestão do território,

bem como buscadas alternativas para a minimização de seus efeitos negativos.

2.3. OCUPAÇÃO DE ÁREAS INUNDÁVEIS

Outro aspecto crucial, entretanto, ainda precisa ser considerado no que

tange ao problema das inundações: a realidade da ocupação de áreas inundáveis.

Como anteriormente exposto, em que pese as cheias e os processos erosivos

possam ser considerados como ameaças naturais, sua frequência e potencialidade

de causar danos são severamente influenciadas por ações antrópicas36, como por

exemplo as ocupações de margens de rios (que integram o “leito maior”) ou

encostas de morro. O grau de vulnerabilidade socioambiental, neste caso, é

determinado pelas decisões humanas equivocadas.

As decisões aqui referidas não se restringem, por evidência, às daquelas

pessoas que efetivamente ocupam as áreas de risco: igualmente responsáveis pelos

desastres são as ações determinantes dessas ocupações, como o conjunto de

ações econômicas, políticas e administrativas que – ainda que por omissão –

34 Estudo referido por Antônio Carlos Zuffo em Drenagem Urbana, p. 115. In: Santos, Rozely Ferreira dos (org.). Vulnerabilidade Ambiental. Brasília: MMA, 2007. 192 p. 35 World Urbanization Prospects: The 2014 Revision, United Nations, New York, 2014, apud JUNQUEIRA, Pedro; KRAMER, Kirsten. Da consciência à resiliência: o novo papel do poder público e do cidadão na construção de uma cidade resiliente. Cidades resilientes-Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, v. XVI, nº 2, pp. 57-76, ago. 2015. 36 Circunstância reconhecida expressamente na pesquisa MUNIC 2013, p. 105.

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28

induzem ou tornam possível a instalação de construções em áreas propensas a

inundações ou escorregamentos de encostas.

O abandono das áreas que deveriam receber cuidados do poder público

em função de suas características especiais (como, no caso em estudo, as áreas

legalmente classificadas como “de preservação permanente”), a falta de políticas

públicas voltadas não apenas à conservação do ambiente natural, mas também ao

enfrentamento dos problemas de moradia das pessoas em situação de

vulnerabilidade social e também a especulação imobiliária provocam – direta ou

indiretamente – nítida pressão sobre tais áreas.

De fato, a ocupação das áreas sujeitas a riscos naturais se dá, no mais

das vezes, por população carente de maiores recursos. Sem condições financeiras

de buscar áreas mais altas e secas, os cidadãos de baixa ou nenhuma renda

encontram nas áreas úmidas e também nas zonas ciliares a alternativa viável de

moradia, seja através da aquisição de lotes (geralmente irregulares ou clandestinos),

seja pela ocupação ilegal desses espaços. Ocupada área que naturalmente integra

zona que deveria ser objeto de conservação, o resultado desastroso não tarda a

chegar: são essas as primeiras a serem alagadas em caso de precipitações

pluviométricas expressivas.

Délton Winter de Carvalho37 compartilha esse pensamento:

Apesar da ocupação de áreas de risco parecer tratar-se de uma decisão privada e individual, esta, na grande maioria dos casos, é delineada por políticas públicas de ocupação do solo, sendo a ausência de planejamento e de controle também um fator de desencadeamento de ocupações irregulares de áreas de risco. Estas decisões de ocupação do solo, por seu turno, são também influenciadas por incentivos (ou falta de) provenientes do poder público. Tal circunstância pode ser facilmente constatada na observação de que o baixo preço ou o abandono de áreas situadas em áreas de risco (de inundação, desmoronamentos ou contaminadas, por exemplo), facilitam e estimulam (tacitamente) a sua ocupação (por aqueles que já se encontram em uma situação de grande vulnerabilidade, potencializando-a).

Cumpre registrar, contudo, que a invasão (clandestina) não é a única

forma de ocupação de áreas de risco. A pesquisa MUNIC 2013, anteriormente

37 CARVALHO, Délton Winter. Desastres ambientais e sua regulação jurídica: deveres de prevenção, resposta e compensação ambiental. Disponível em: <http://www.anppas.org.br/encontro5/cd/artigos/GT3-647-646-20100903160334.pdf>. Acesso em: 30 maio 2016.

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29

referida, obteve percentuais bastante parecidos de incidência de alagamentos e

inundações em áreas de ocupação irregular e áreas em que a ocupação é

perfeitamente regular sob o prisma fundiário (registral)38.

Inúmeros casos existem em que a urbanização se consolidou em área

inundável sob condições de regularidade formal, como nos casos de parcelamentos

do solo urbano constituídos regularmente (com todas as licenças e aprovações dos

órgãos públicos competentes)39 em áreas sabidamente propensas a inundações.

Não raras vezes, ademais, as próprias construções são financiadas com recursos

públicos, através de programas oficiais de habitação popular.

Ademais, é comum vermos a própria legislação (municipal, no âmbito da

ordenação territorial) impulsionando tal conduta insustentável (tanto ambiental

quanto socialmente), a partir da previsão de zonas de expansão urbana justamente

sobre áreas sensíveis: o próprio crescimento das cidades pressiona a ocupação de

áreas que – mais cedo ou mais tarde, em maior ou menor magnitude, com maior ou

menor frequência – estarão cobertas pelas águas.

Urbanizar áreas sensíveis (de risco, sujeitas a inundação ou a

movimentos geológicos) não causa apenas danos ao meio ambiente – direito

assegurado às presentes e futuras gerações pelo artigo 225 da Constituição

Federal40 – mas atinge também um dos princípios fundamentais da República

Federativa do Brasil, segundo o inciso III do artigo 1º do texto constitucional – a

dignidade da pessoa humana.

2.4. MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Impõe-se registrar, no plano da análise das causas das inundações, um

olhar especial ao fenômeno do aquecimento global. Isso porque as chamadas

mudanças climáticas são uma realidade inegável. Embora muito se tenha discutido

já e ainda persistam os denominados “negacionistas”, os dados do Painel

38 PESQUISA DE INFORMAÇÕES BÁSICAS MUNICIPAIS. Perfil dos Municípios Brasileiros 2013, p. 104. 39 Embora proibidos pela Lei do Parcelamento do Solo (Lei Federal nº 6.766/79, como veremos adiante). 40 Texto compilado disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 13 jul. 2016.

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30

Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) não deixam margem de

dúvidas sobre a circunstância de estarmos vivendo uma era de aquecimento global.

Já em 2013 o IPCC afirmava categoricamente:

El calentamiento en el sistema climático es inequívoco y, desde la década de 1950, muchos de los cambios observados no han tenido precedentes en los últimos decenios a milenios. La atmósfera y el océano se han calentado, los volúmenes de nieve y hielo han disminuido, el nivel del mar se ha elevado y las concentraciones de gases de efecto invernadero han aumentado.41

Sobre a ação antrópica, o mesmo documento registra que a influencia

humana sobre o sistema climático é clara, sendo evidente a contribuição dos gases

de efeito estufa para o aquecimento observado. Com relação ao prognóstico, o

Quinto Informe (2014) registra como motivo de preocupação os episódios

meteorológicos extremos:

Los riesgos conexos al cambio climático derivados de episodios extremos, como olas de calor, precipitación extrema e inundaciones costeras, ya son entre moderados (nivel de confianza alto) y altos en caso de producirse un calentamiento adicional de 1°C (nivel de confianza medio). Los riesgos asociados a algunos tipos de episodios extremos (por ejemplo, calor extremo) se intensifican con mayores temperaturas (nivel de confianza alto).42

Do mesmo documento de 2014 consta a figura abaixo, com o que o grupo

de expertos considera os “riscos chave” para a região das Américas Central e do

Sul43, destacando-se o problema das inundações:

Figura 5 – Quadro dos “riscos chave” para América Central e do Sul

41 Extraído do documento Afirmaciones principales del Resumen para responsables de políticas, disponível em espanhol em: <http://www.ipcc.ch/news_and_events/docs/ar5/ar5_wg1_headlines_es.pdf>. Acesso em: 17 jun. 2016. 42 Destacado do Recuadro de evaluación RRP.1 – Interferencia humana en el sistema climático do documento Cambio climático 2014: Impactos, adaptación y vulnerabilidad. Resúmenes, preguntas frecuentes y recuadros multicapítulos. Contribución del Grupo de trabajo II al Quinto Informe de Evaluación del Grupo Intergubernamental de Expertos sobre el Cambio Climático, p. 12. Disponível em: <http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar5/wg2/WGIIAR5-IntegrationBrochure_es.pdf>. Acesso em: 17 jun. 2016. 43 Também para a Espanha é prevista a intensificação de eventos de secas e inundações decorrentes das mudanças climáticas em curso no planeta, como se pode ver da edição monográfica Cambio Climático da Revista de Obras Públicas: órgano profesional de los ingenieros de caminos, canales y puertos. Madri, nº 3545, jul-ago 2013. A Diretiva Europeia de Inundações, que analisaremos a seguir, reconhece o impacto das mudanças climáticas sobre o aumento da probabilidade de ocorrência das inundações.

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(Fonte: IPCC, 2014, p. 24)

Insta considerar, portanto, os efeitos do aquecimento global não como

causadores isolados, mas sim como possíveis (ou prováveis) potencializadores de

episódios de inundações, diante das prováveis alterações meteorológicas

associadas a um clima mais quente44.

44 BLOCH, Robin; JHA, Abhas Kumar; LAMOND, Jessica. Cidades e Inundações..., p.22.

Page 32: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

32

CAPÍTULO 3

O ENFRENTAMENTO DO PROBLEMA DAS INUNDAÇÕES NO

ORDENAMENTO JURÍDICO ESPANHOL: O DIREITO COMUNITÁRIO

E A EXPERIÊNCIA DA COMUNIDADE VALENCIANA

3.1. A POLÍTICA HIDRÁULICA ESPANHOLA: O ENFRENTAMENTO DOS

FENÔMENOS DE ESCASSEZ E EXCESSO DE ÁGUA E A INSERÇÃO NO

CENÁRIO EUROPEU

Independentemente do conceito que se possa acalantar com relação a

outros temas, na seara ambiental é inegável que a adesão da Espanha à então

Comunidade Europeia (hoje União Europeia) representa um avanço substancial em

matéria de proteção. Isso porque os grandes instrumentos de tutela ambiental de

que dispõe atualmente o ordenamento jurídico espanhol são transposições de

normativas comunitárias, a representar que a participação no bloco efetivamente

impulsiona positivamente o Direito Espanhol.

São exemplos as disposições acerca da avaliação de impactos

ambientais, do controle integrado da contaminação e da necessidade de utilização

das melhores técnicas disponíveis, de resíduos sólidos, bem como da própria

regulação da responsabilidade por danos ambientais.

A conclusão não é outra nas matérias atinentes ao objeto do presente

estudo, sendo certo que os adventos da Diretiva 2000/60/CE, do Parlamento

Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000, pela qual se estabelece um

marco comunitário de atuação no âmbito da política de águas (doravante Diretiva

Marco de Água ou DMA), e da Diretiva 2007/60/CE do Parlamento Europeu e do

Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativa à avaliação e gestão dos riscos de

inundação (doravante Diretiva de Inundações ou DI) representaram avanços no

tratamento da questão também no ordenamento interno espanhol.

Impende considerar, contudo, que a legislação espanhola relacionada a

águas remonta ao ano de 1985, sendo expressiva a regulação espanhola nessa

matéria anteriormente à normativa europeia, a saber:

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33

Lei 29/1985 – Águas45;

Real Decreto 849/1986 – Regulamento do Domínio Público Hidráulico;

e

Real Decreto 927/1988 – Regulamento da Administração Pública de

Água e do Planejamento Hidrológico.

Além disso, também na seara da proteção civil já havia robusta legislação

em território espanhol, destacando-se, ademais dos planos territoriais das

Comunidades Autônomas e normas urbanísticas locais, os seguintes textos:

Lei 2/1985 – Proteção Civil;

Real Decreto 1378/1985 – medidas de atuação em situações de

emergência em casos de grave risco, catástrofe ou calamidade pública; e

Real Decreto 407/1992 – Norma Básica de Proteção Civil.

Tamanho desenvolvimento legislativo não é merecedor de

estranhamento: sendo um país árido ou semiárido em quase ¾ do território, com

uma distribuição desigual do recurso natural tanto no plano temporal quanto no

plano espacial46, a forte demanda pela água impulsionou desde sempre a regulação

da matéria em terras espanholas, muito mais focada na garantia do abastecimento e

na equânime distribuição, do que propriamente por preocupações ambientais. De

fato, há regiões em que o regime de chuvas é abundante (Noroeste Peninsular, por

exemplo) e regiões em que praticamente não chove (como na região do

Mediterrâneo), assim como as chuvas estão desigualmente distribuídas durante o

ano hidrológico, sendo muito escassas no verão, justamente quando a demanda por

água cresce substancialmente. Levar água às regiões deficitárias e assegurar a

presença do recurso mesmo em épocas de carência de chuvas foi sempre o desafio

estratégico da gestão e do planejamento hidrológico da Espanha.

45 Depois de mais de 100 anos de vigência da lei anterior, de 1879. Aliás, MOLINA GIMÉNEZ registra que a política hidráulica espanhola remonta ao final do século XIX. MOLINA GIMÉNEZ, Andrés. La disciplina territorial del riesgo de inundaciones en el ordenamiento jurídico español. Revista Aranzadi de Derecho Ambiental, Madri, nº 18, p. 39-72, 2010. 46 ARDILES, Liana Sandra. Los nuevos retos de la planificación hidrológica. Revista Ambienta, Madri, nº 110, pp. 6-16, mar. 2015.

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34

Eis a razão pela qual o país é pródigo em grandes obras hidráulicas, que

vão desde a reservação de água através de represas (embalses e pântanos

artificiais) até a transposição de rios de uma região hidrográfica para outra, sempre

decorrentes da necessidade premente de garantir a presença da água (para

abastecimento humano, para regadio, para outros usos) nas diversas regiões da

“pele de touro”47 durante todas as épocas do ano.

Aliás, a naturalidade com que os espanhóis enfrentam as obras

hidráulicas de expressiva envergadura revela-se surpreendente ao olhar brasileiro,

acostumado muito mais à abundância do recurso do que à sua escassez – que, sim,

existe em expressiva região do Nordeste do país, mas cuja proposta de

enfrentamento com a estratégica da transposição encontra forte entrave por

questões ambientais48. De ressaltar, por oportuno, que as grandes obras hidráulicas

espanholas foram desenvolvidas, se não na totalidade ao menos em grande parte,

durante o período ditatorial encerrado somente em 1975, momento em que as

preocupações ambientais não estavam na pauta das discussões49.

Forçoso reconhecer que, na Espanha, o desenvolvimento das regiões

sempre esteve associado à disponibilidade de água, como pode ser percebido, a

título exemplificativo, na árida região do Mediterrâneo, onde o desenvolvimento do

turismo somente se deu após a implantação de diversas ações de planejamento e

gestão da água – com reservação, transposição de rios e também investimento em

dessalinização.

Equacionado estrategicamente o problema da disponibilidade de água,

não apenas com as já citadas obras, mas com uma política hidráulica focada

também em economia (eficiência), em utilização de recursos não convencionais

47 Piel de toro é uma maneira pela qual os espanhóis se referem ao território do país, em alusão à sua forma. 48 Exemplos são os projetos de transposição dos rios São Francisco e Paraíba do Sul, objeto de ações judiciais promovidas pelo Ministério Público Federal. Com relação ao Rio São Francisco (região Nordeste), notícia disponível em: <http://noticias.pgr.mpf.mp.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_meio-ambiente-e-patrimonio-cultural/Suspensas-as-obras-do-projeto-de-transposicao-do-Rio-Sao-Francisco> Acesso em: 19 maio 2016. Com relação ao Rio Paraíba do Sul (região Sudeste), notícia disponível em: <http://noticias.pgr.mpf.mp.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_meio-ambiente-e-patrimonio-cultural/mpf-rj-move-acao-contra-projeto-de-transposicao-do-rio-paraiba-do-sul/?searchterm=transposi%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 19 maio 2016. 49 Exemplo disso é a transposição Tajo-Segura, obra anunciada em 1968 e concluída uma década após (notícia disponível em: <http://www.iagua.es/noticias/espana/iuaca/16/05/10/37-anos-unidos-trasvase-tajo-segura> Acesso em 10 maio 2016). A Era Franquista também deixou um legado de 515 reservatórios artificiais (chamados pantanos ou embalses), como se vê em: <http://franquistas.blogspot.com.es/2010/08/515-pantanos-de-francisco-franco.html>. Acesso em: 19 maio 2016.

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35

(como dessalinização e reutilização) e até em criação de verdadeiros mercados de

águas, resta suficientemente enfrentado um dos problemas extremos relacionados à

água: o fenômeno da escassez (seca).

Outro fenômeno extremo, contudo, também tem recorrência no território

espanhol, sendo igualmente merecedor de ampla regulação: a incidência de

inundações. A legislação espanhola já havia tratado do tema, tanto na legislação de

águas quanto sob a ótica da proteção civil, desde o ano de 1985. Neste ponto, uma

década depois foi aprovada a Diretriz Básica de Planejamento de Proteção Civil

frente ao Risco de Inundações50, que deu base ao Plano Estatal de Proteção Civil

frente ao Risco de Inundações, este surgido somente no ano de 201151 – já sob a

égide das citadas Diretivas Europeias (Diretiva Marco de Água e Diretiva de

Inundações) e do Real Decreto 903/2010, que operou a transposição da Diretiva de

Inundações ao ordenamento jurídico espanhol, adaptando o conteúdo dos

regulamentos relativos ao Domínio Público Hidráulico, da Administração Pública da

Água e do Planejamento Hidrológico à nova ordenação europeia.

A Diretiva de Inundações veio suprir a carência da Diretiva Marco de

Água, que se preocupa centralmente com a qualidade das águas frente ao problema

da contaminação, apenas tangenciando a questão da quantidade do recurso,

aspecto extremamente caro à realidade espanhola – seja pela escassez, como já

visto, seja pela abundância em períodos e espaços reduzidos.

Efetivamente, o enfrentamento do problema das inundações também é

desencadeador de relevante produção normativa na Espanha. Nesse particular,

aliás, é expressiva a regulação interna anterior à Diretiva surgida no ano de 2007,

não apenas no âmbito da legislação nacional, mas especialmente na normatização a

cargo das Comunidades Autônomas, às quais incumbe a ordenação do território.

50 RESOLUÇÃO de 31 de janeiro de 1995, da Secretaria de Estado do Interior, que publica o acordo do Conselho de Ministros que aprova a Diretriz Básica de Planejamento de Proteção Civil frente ao Risco de Inundações (Boletim Oficial do Estado de 14 de fevereiro de 1995). Disponível em: <https://www.boe.es/diario_boe/txt.php?id=BOE-A-1995-3865>. Acesso em: 10 maio 2016. 51 Resolução de 2 de agosto de 2011, da Subsecretaria, que publica o Acordo do Conselho de Ministros de 29 de julho de 2011, que aprova o Plano Estatal de Proteção Civil frente ao risco de inundações (Boletim Oficial do Estado de 1 de setembro de 2011). Disponível em: <https://www.boe.es/boe/dias/2011/09/01/pdfs/BOE-A-2011-14277.pdf>. Acesso em: 10 maio 2016.

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36

3.2. A NORMATIVA COMUNITÁRIA EUROPEIA PARA O ENFRENTAMENTO DO

PROBLEMA DAS INUNDAÇÕES

Surgida no ano de 2007, a Diretiva 2007/60/CE do Parlamento Europeu e

do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativa à avaliação e gestão dos riscos de

inundação (Diretiva de Inundações) representa relevante marco normativo para o

enfrentamento do problema que é comum aos países que formam parte do bloco.

Com efeito, a preocupação comunitária tem vez após as inundações registradas em

2002 na Europa Central, que causaram graves danos materiais, humanos e

ambientais52, dando início ao estudo do enfrentamento do problema. Cabe destacar

o surgimento de documentos-chave em âmbito comunitário nos anos de 2003 (“Best

practices on Flood prevention, protection and mitigation”53) e 2004 (“Comunicação da

Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comitê Econômico e Social

Europeu e ao Comitê das Regiões – Gestão dos riscos de inundação – Proteção

contra as cheias e inundações, sua prevenção e mitigação”54) – que serviram de

base à configuração da Diretiva de Inundações em 2007.

Partindo da premissa de que as inundações são eventos naturais, mas

que podem ter sua probabilidade de ocorrência aumentada por atividades humanas

(como a urbanização de planícies aluviais e a redução da capacidade de retenção

de água pelo solo) bem como pelas mudanças climáticas, e considerando a

possibilidade de provocarem vítimas fatais e o desalojamento de pessoas, assim

como causar danos ao meio ambiente, comprometendo gravemente o

desenvolvimento econômico europeu55, a Diretiva de Inundações tem por objetivo

reduzir as consequências negativas das inundações para a saúde humana, o meio

ambiente, o patrimônio cultural e a atividade econômica, através do estabelecimento

de um marco normativo para avaliação e gestão do risco de inundações (artigo 1º).

52 “Entre 1998 e 2002, mais de 100 cheias provocaram na Europa grandes prejuízos, nelas se incluindo as cheias catastróficas dos rios Elba e Danúbio em 2002. Desde 1998, as cheias causaram cerca de 700 vítimas, o desalojamento de cerca de meio milhão de pessoas e prejuízos económicos cobertos por seguros que ascenderam, pelo menos, a 25 mil milhões de euros.” (COM/2004/0472 final, Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:52004DC0472&from=ES>. Acesso em: 16 maio 2016). 53 Original em inglês Disponível em: <http://ec.europa.eu/environment/water/flood_risk/pdf/flooding_bestpractice.pdf>. Acesso em: 16 maio 2016. 54 COM/2004/0472 final, versão em português Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:52004DC0472&from=ES>. Acesso em: 16 maio 2016. 55 Exposição de Motivos da Diretiva de Inundações, versão em português. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:32007L0060&from=ES>. Acesso em: 16 maio 2016.

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Para a consecução de tais objetivos, está prevista a implementação das

disposições em três fases distintas e consecutivas. A primeira fase compreende a

avaliação preliminar do risco de inundação em cada região hidrográfica56, que é a

unidade territorial adotada pela Diretiva para a gestão, tal como já operado pela

Diretiva Marco de Água57.

Tais avaliações, que deveriam estar concluídas até 22 de dezembro de

2011, têm por objetivo ou avaliação dos riscos potenciais, tendo por base as

informações disponíveis ou facilmente dedutíveis, incluindo registros e estudos

sobre a evolução a longo prazo e o impacto das mudanças climáticas na ocorrência

de inundações. O conteúdo mínimo vem fixado no item 2 do artigo 4º e consiste em

(a) mapas58 da região hidrográfica, incluindo os limites das bacias e sub-bacias

hidrográficas e das zonas costeiras, com a indicação de dados topográficos e do uso

do solo; (b) descrição das inundações ocorridas no passado que tenham tido

impactos negativos importantes na saúde humana, no ambiente, no patrimônio

cultural e nas atividades económicas; (c) descrição das inundações significativas

ocorridas quando se possam prever semelhantes no futuro; e (d) avaliação das

potenciais consequências prejudiciais das futuras inundações considerando

“questões como a topografia, a posição dos cursos de água e as suas

características hidrológicas e geomorfológicas gerais, incluindo as planícies aluviais

enquanto zonas de retenção natural, a eficácia das infraestruturas artificiais

existentes de proteção contra as inundações, a posição das zonas povoadas e das

zonas de atividade econômica e a evolução a longo prazo, incluindo o impacto das

56 Ou zona costeira ou bacia hidrográfica específica, nos termos do permissivo da alínea b) do nº 2 do artigo 3º da DI. 57 Eis a definição do artigo 2º, item 15, para região hidrográfica: “a área de terra e de mar constituída por uma ou mais bacias hidrográficas vizinhas e pelas águas subterrâneas e costeiras que lhes estão associadas, definida nos termos do nº 1 do artigo 3º como a principal unidade para a gestão das bacias hidrográficas”. A DMA determinou, no artigo 3º, item 1, que os “Estados-Membros identificarão as bacias hidrográficas que se encontram no seu território e, para efeitos da presente directiva, incluirão cada uma delas numa região hidrográfica. As bacias hidrográficas de pequena dimensão podem ser combinadas com bacias de maior dimensão ou, quando aplicável, associadas a outras bacias de pequena dimensão para formar uma única região hidrográfica. Nos casos em que uma massa de águas subterrâneas não corresponda rigorosamente a uma determinada bacia hidrográfica, essas águas subterrâneas serão identificadas e incluídas na região hidrográfica mais próxima ou mais indicada. As águas costeiras serão identificadas e incluídas na região ou regiões hidrográficas mais próximas ou mais indicadas.” Versão em português disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:32000L0060&from=PT>. Acesso em: 16 maio 2016. Cumpre registar que a bacia hidrográfica é a unidade territorial de gestão na legislação espanhola desde o ano de 1926, como se vê em: <http://www.iagua.es/blogs/miguel-angel-garcia-vera/gestion-unidad-cuenca-joya-legislativa-espanola>. Acesso em: 19 maio 2016. 58 A versão portuguesa da Diretiva de Inundações utiliza o termo “carta”, mas aqui preferimos a utilização do termo “mapa”, utilizado na versão espanhola, por se afigurar mais consentâneo com o objeto e o uso frequente no Brasil.

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alterações climáticas na ocorrência de inundações”59. A partir dessa avaliação

preliminar, os Estados Membros deveriam delimitar, em cada unidade de gestão, as

zonas de risco potencial ou provável de inundação significativa (artigo 5º).

Ademais, para cada unidade de gestão, deveriam ser elaborados – até 22

de dezembro de 2013 (segunda fase) – os pertinentes mapas de zonas inundáveis60

e mapas de risco de inundações. Os primeiros devem ter previstos três cenários

possíveis (considerando amplitude da inundação, nível de água e a velocidade da

corrente ou o caudal da cheia correspondente): (a) baixa probabilidade de inundação

ou cenário de eventos extremos; (b) probabilidade média de inundação

(periodicidade igual ou superior a 100 anos); e (c) alta probabilidade de inundação,

quando aplicável61.

Os mapas de risco de inundações, por seu turno, devem apontar as

consequências nefastas associadas a inundações em termos de número de

habitantes potencialmente afetados e a identificação dos tipos de atividades

econômicas desenvolvidas na zona de risco. Além disso, devem ser consideradas

as eventuais existências de áreas protegidas e/ou atividades que possam causar

poluição acidental em caso de inundações, bem como outras fontes importantes de

poluição.

Por fim, a terceira etapa de implantação da Diretiva de Inundações prevê

a elaboração de planos de gestão de risco de inundações: o ápice da normativa

comunitária, cujo conteúdo deve contemplar as medidas para redução da

probabilidade de ocorrência de inundação e minimização de suas consequências.

Os planos deveriam estar concluídos até 22 de dezembro de 2015 e tem sua

composição definida no Anexo da DI. Os nortes, definidos na própria Diretiva, são a

prevenção, a proteção e a preparação (incluindo sistemas de previsão de

59 Citação da versão portuguesa da DI, com livre adaptação ao português utilizado no Brasil, que difere em algumas situações do usado em Portugal. 60 A versão espanhola da Diretiva chama de mapas de peligrosidad por inundaciones a partir da expressão flood hazard maps do original em inglês. 61 BERGA CASAFONT critica a flexibilidade da Diretiva nesse ponto, fixando a periodicidade (“período de retorno”) somente no que concerne à probabilidade média de inundação, deixando aos Estados Membros a decisão sobrea fixação das outras duas periodicidades. BERGA CASAFONT, Luis. La nueva Directiva Europea de inundaciones. Revista de Obras Públicas: órgano profesional de los ingenieros de caminos, canales y puertos, Madri, nº 3520, pp. 7-18, abr. 2011.

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inundações e alertas precoces). Tais conceitos já vinham marcados na citada

Comunicação de 200462, a saber:

- Prevenção: prevenção dos prejuízos causados pelas inundações, evitando para tal a construção de habitações e indústrias em áreas com tendência para inundarem, tanto presente como futuramente, adaptando iniciativas futuras aos riscos de inundação e promovendo práticas de uso dos solos e práticas agrícolas e florestais adequadas;

- Proteção: tomada de medidas, tanto estruturais como não estruturais, para reduzir a probabilidade de cheias e/ou o impacto das cheias em determinados locais63;

- Preparação: informação da população sobre os riscos de inundação e sobre o modo de agir quando as inundações ocorrem;

- Resposta de emergência: criação de planos de emergência em caso de inundações;

- Recuperação e experiência adquirida: regresso às condições normais logo que possível e mitigação do impacto social e econômico sobre a população afetada.

Nesse sentir, os planos de gestão de risco de inundações devem

contemplar os instrumentos para o atingimento dos objetivos traçados de redução

das consequências danosas das inundações para a saúde, o meio ambiente, o

patrimônio cultural e a atividade econômica, bem como, se os Estados Membros

entenderem oportuno, devem incluir medidas para redução da probabilidade de

ocorrência de inundações.

Para tanto, devem ser consideradas inclusive questões financeiras, de

modo a bem avaliar o custo-benefício da adoção de determinada medida, tal como

prevê o item 3 do artigo 7º da DI – que também cita a necessidade de considerar a

existência de áreas de evacuação e de retenção de águas, os usos do solo, a

ordenação do território, entre outros fatores.

Destaca-se, por relevante, a sugestão contemplada no mesmo dispositivo

no sentido de que os planos de gestão incluam “a promoção de práticas de

utilização sustentável do solo, a melhoria da retenção da água e a inundação

controlada de determinadas zonas em caso de cheia”.

62 Item 2.2 “Gestão dos riscos de inundação” (COM/2004/0472 final). Versão em português Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:52004DC0472&from=ES>. Acesso em: 16 maio 2016. Citação da versão portuguesa da DI, com livre adaptação ao português utilizado no Brasil, que difere em algumas situações do usado em Portugal. 63 Molina Giménez exemplifica com a restauração de planícies de inundação ou a proteção de zonas úmidas. Op. cit., p. 43.

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Importante registrar, por fim, a vedação de adoção de medidas que

possam representar risco de agravamento do problema em outra região (a montante

ou a jusante), exceto em caso de coordenação entre as regiões afetadas.

Para cada uma das fases de implantação da Diretiva de Inundações –

avaliação preliminar, mapas e planos – está prevista a revisão a cada seis anos

(artigo 14), de forma a que os instrumentos possam estar constantemente

atualizados (e avaliados) de acordo com a realidade vivenciada em cada região (e

inclusive considerando eventuais mudanças climáticas).

3.3. AS MEDIDAS ADOTADAS NO ÂMBITO DO DIREITO INTERNO ESPANHOL

Antes da efetiva transposição da Diretiva de Inundações ao ordenamento

jurídico espanhol já haviam sido operadas importantes alterações na legislação

espanhola no sentido da adequação à normativa europeia (não apenas com relação

à DI, mas também considerando as exigências da Diretiva Marco de Água), levadas

a efeito mediante o Real Decreto 9/200864, que modifica o Regulamento do Domínio

Público Hidráulico65.

Quiçá a inovação mais significativa introduzida por essa norma seja a

criação do Sistema Nacional de Cartografia de Zonas Inundáveis (SNCZI), descrito

no item 3 do artigo 14 como o conjunto de estudos de inundabilidade realizados pelo

Ministério de Meio Ambiente e seus organismos de bacias hidrográficas, devendo

ser desenvolvido em colaboração com as Comunidades Autônomas e

administrações locais (municipais) afetadas em cada caso.

Ademais das zonas inundáveis, são incluídas no SNCZI as delimitações

de leitos públicos e das zonas chamadas “de servidão” e “de polícia”, que incluem as

denominadas vias de fluxo preferente. Estas últimas, aliás, são criadas por esta

inovação legislativa em exame (RD 9/2008), em cuja exposição de motivos se lê:

64 De 11 de janeiro de 2008 (BOE 16-6-2008), Disponível em: <http://www.boe.es/boe/dias/2008/01/16/pdfs/A03141-03149.pdf>. Acesso em 16 maio 2016. 65 O Regulamento do Domínio Público Hidráulico foi publicado pelo Real Decreto 849/1986, cujo texto compilado está Disponível em: <https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-1986-10638>. Acesso em: 16 maio 2016.

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La zona de policía adquiere su auténtica relevancia en la protección del régimen de corrientes, fijándose criterios técnicos para que esa protección del régimen de corrientes sea eficaz, y se pone un énfasis especial en la posibilidad de ampliar los 100 metros de anchura de dicha zona, cuando sea necesario para la seguridad de las personas y bienes, estableciéndose, asimismo, criterios técnicos precisos para evaluar tal posibilidad. Las zonas que cumplen los dos requisitos anteriores -proteger el régimen de corrientes en avenidas y reducir el riesgo de producción de daños en personas y bienes- se denominan zonas de flujo preferente, y en ellas el Organismo de cuenca solo podrá autorizar actividades no vulnerables frente a las avenidas. De esta manera, se da cumplimiento a las exigencias de la Directiva 2007/60/CE del Parlamento Europeo y del Consejo, de 23 de octubre de 2007, que determina que los Estados miembros deben incorporar políticas sobre gestión del riesgo de inundaciones que garanticen al máximo la seguridad de los ciudadanos, adoptando criterios adecuados de usos del suelo, y que permitan la laminación de caudales y de carga sólida transportada ampliando, en la medida de lo posible, el espacio fluvial disponible. (grifamos) 66

Verifica-se, pois, que a cartografia produzida no território espanhol será

ainda mais minuciosa que o que fora exigido pela norma europeia, integrando à

gestão do risco de inundações as normas internas relativas a águas, a proteção civil

e também à zona costeira.

No que concerne às zonas inundáveis, a mesma Exposição de Motivos

revela:

Las zonas inundables son también de gran trascendencia, dadas las consecuencias dramáticas, en pérdida de vidas humanas y en repercusiones económicas, que las inundaciones han supuesto en nuestro país, sin que las herramientas disponibles en nuestra legislación de aguas para la gestión de inundaciones hayan resultado totalmente eficaces. Aunque las consecuencias de las avenidas están, en muchos casos, directamente relacionadas con la ordenación del territorio, competencia de las comunidades autónomas, la Administración General del Estado debe impulsar la colaboración entre administraciones y desarrollar mecanismos de gestión del riesgo, en línea con lo establecido en la directiva de evaluación y gestión del riesgo de inundación, para incrementar la eficacia en la protección de la población. Por ello, se plantea la elaboración de un Sistema Nacional de Cartografía de Zonas Inundables, a desarrollar en colaboración con las comunidades autónomas, que aportará una información muy valiosa para que se tenga en cuenta por las restantes administraciones en el ejercicio de

66 Impende considerar que há proposta de alteração da regulação relativa à zona de fluxo preferente em processo de consulta pública, podendo ser implementada alteração com relação às limitações de usos em vigor. Disponível desde julho de 2015 em <http://www.magrama.gob.es/es/agua/participacion-publica/Agua_Modificacion_RDPH_julio.aspx>. Acesso em: 17 maio 2016.

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sus competencias sobre ordenación del territorio y planificación urbanística, y que será imprescindible para incrementar la seguridad de los ciudadanos.

Esse mapeamento das zonas inundáveis é ferramenta fundamental para

o planejamento e a gestão dos riscos de inundação, nos termos em que pretendido

pela normativa europeia, tendo operado como uma compilação de dados existentes

nas diferentes esferas administrativas para a posterior elaboração dos mapas e

planos exigidos pela Diretiva Europeia de Inundações. O Plano Estatal de

Inundações (2011), a propósito, determina que o SNCZI atuará como base de dados

sobre zonas inundáveis, tal como preconizado pela Diretriz Básica de Proteção Civil

(1995).

A ausência dessa cartografia com identificação dos riscos para uma

adequada proteção frente às inundações já fora denunciada no Livro Branco da

Água na Espanha67, mostrando-se a instituição do SNCZI um passo acertado rumo à

aplicação não só da Diretiva de Inundações, mas também da legislação espanhola

de águas, proteção civil e ordenação do território 68.

Cumpre considerar, ademais, que já na Lei do Solo editada em 200769

havia a previsão da necessidade de consideração do risco de inundação para fins de

ordenação do território na Espanha.

Para a completa transposição da Diretiva 2007/60/CE do Parlamento

Europeu e do Conselho, relativa à avaliação e gestão dos riscos de inundação, foi

editado no âmbito do ordenamento jurídico interno espanhol o Real Decreto

903/2010, cujo âmbito de aplicação está descrito no artigo 2º. Salta aos olhos,

inicialmente, que a legislação espanhola tenha deixado à margem o problema das

inundações causadas por chuvas torrenciais, juntamente com as causadas por

rupturas de represas (reguladas por normativa específica) e as relativas às redes de

67 Como referido em LÓPEZ DE CASTRO GARCÍA-MORATO, Lucía. El reglamento estatal de inundaciones y el avance en el enfoque holístico para la gestión de los riesgos naturales. Revista de Derecho Urbanístico y Medio Ambiente, Madri, p. 41-88, julho-agosto 2012. O mencionado Libro Blanco del Agua en España, produzido pelo Ministério de Meio Ambiente em 2000, está Disponível em: <https://www.chsegura.es/chs/planificacionydma/libroblancodelagua/>. Acesso em: 18 maio 2016. A referência à ausência da cartografia aprece a partir da página 473 (Capítulo 3). 68 O visor, acessível a qualquer cidadão, está Disponível em: <http://sig.magrama.es/snczi/>. Acesso em: 18 maio 2016. 69 Artigo 10 da Lei 8/2007. Posteriormente, o Real Decreto Legislativo 2/2008 aprova o texto consolidado da Lei de Solo, hoje derrogada pela edição do Real Decreto Legislativo 7/2015, de 30 de outubro, que mantém a condição de solo rural às áreas com risco de inundação.

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drenagem (exclusão possibilitada pelo item 1 do artigo 2º da DI)70. Assim, a

normativa espanhola aplica-se às inundações causadas por transbordamento de

rios, torrentes de montanha e outras correntes de água contínuas ou intermitentes,

bem como às inundações nas zonas costeiras e de transição71.

No que tange ao objeto, explicitado artigo 1º, consiste em, além de obter

adequados conhecimentos e avaliações dos riscos associados às inundações,

também:

2. b) Lograr una actuación coordinada de todas las Administraciones Públicas y la sociedad para reducir las consecuencias negativas sobre la salud y la seguridad de las personas y de los bienes, así como sobre el medio ambiente, el patrimonio cultural, la actividad económica y las infraestructuras72, asociadas a las inundaciones del territorio al que afecten.

De fato, a fim de realizar uma efetiva gestão dos riscos de inundação,

afigura-se imprescindível a coordenação entre as esferas, mormente considerando

que no ordenamento jurídico espanhol diversas competências estão afetas às

Comunidades Autônomas (ordenação do território e meio ambiente, por exemplo) e

aos entes locais (em matéria de urbanismo, entre outras). Assim, várias são as

referências à necessidade de atuação coordenada ao longo do texto legislativo.

Nesse particular, os artigos 14 e 15 do RD trazem importantes previsões

de integração dos planos de gestão de inundações com outros planos, notadamente

os planos hidrológicos (no Brasil denominados planos de gerenciamento de recursos

hídricos ou simplesmente “planos de bacia hidrográfica”), planos de proteção civil e

planos de ordenação territorial e urbanística. Com efeito, os planos setoriais que

tenham influência sobre áreas inundáveis deverão ser compatíveis com o disposto

nos planos de gestão de risco de inundações, assim como planos de proteção civil e

de bacias hidrográficas deverão ser coordenados com aqueles. No mesmo sentido,

está expressamente vedada a inclusão de disposições de ordenação territorial ou

70 Como referido por LÓPEZ DE CASTRO GARCÍA-MORATO (op. cit., p.65). BERGA CASAFONT critica também neste ponto a flexibilidade da Diretiva Europeia: “La Directiva Europea 60/2007 puede clasificarse como una directiva de tipo “blando”, pues puede excluir las inundaciones de las redes de alcantarillado y las inundaciones urbanas (como se ha hecho en la transposición en España), no trata las inundaciones provocadas por roturas de presas o diques en ríos, o costas, y no incide con mucho énfasis en los aspectos de la financiación de las actuaciones de los planes de gestión”. Op cit., p. 12. 71 Artigo 2º do Real Decreto 903/2010, Disponível em: <https://boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-2010-11184>. Acesso em: 18 maio 2016. 72 A inclusão das infraestruturas decorre de preocupação espanhola, haja vista que não contempladas na normativa europeia.

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44

urbanismo que não sejam compatíveis com as previsões dos planos de gestão de

risco73.

3.4. A LEGISLAÇÃO AUTONÔMICA ESPANHOLA: O CASO DA COMUNIDADE

VALENCIANA

Segundo a distribuição espanhola de competências legislativas, enquanto

as questões urbanísticas estão afetas às entidades locais (âmbito municipal)74 e a

gestão dos rios e das respectivas servidões de proteção e de polícia são de

competência exclusiva da Administração Central do Estado Espanhol75, as matérias

afetas relativas à ordenação do território e também ao tratamento dos riscos naturais

(sob a ótica da proteção civil) incumbem à atividade legislativa das Comunidades

Autônomas, por força do disposto no artigo 148 da Constituição Espanhola76.

Assim é que mesmo antes da existência de legislação comunitária ou

nacional sobre a temática das inundações, desse tema já se ocupavam as

Comunidades Autônomas da ordenação de seus territórios, como é mostra a

Comunidade Valenciana, que em 2003 já contava com um plano bastante minucioso

73 Aqui é importante frisar que o artigo 15 do RD 903/2010 reafirma o caráter rural dos solos sujeitos a inundações, como já o fazia a Lei de Solo no artigo 12 do texto consolidado pelo Real Decreto Legislativo 2/2008, Disponível em: <http://www.boe.es/buscar/doc.php?id=BOE-A-2008-10792>. Acesso em: 18 maio 2016. O solo inundável é, portanto, não urbanizável. 74 Segundo o artigo 4, “c”, da Lei 7/1985, reguladora das bases de regime local, com fulcro na autorização constitucional extraída do artigo 149.1, apartado 18, combinado com artigo 148.1, apartado 2.º. Disponível em: <https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-1985-5392>. Acesso em: 7 jun. 2016. Impende considerar, contudo, que os entes locais tem autonomia para definição das questões especificamente urbanísticas (índices de ocupação, por exemplo). Os planos que tenham implicações na ordenação do território (como é o caso de zoneamento) deverão ser compatíveis com os ditames das Comunidades Autônomas, que devem aprovar ou não as propostas apresentadas pelos municípios (procedimento bifásico). 75 Por efeito do item 1.22 do artigo 149 da Constituição Espanhola, disponível em: <https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-1978-31229>. Acesso em: 7 jun. 2016. 76 Disponível em: <https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-1978-31229>. Acesso em: 7 jun. 2016. Com relação à proteção civil, impende considerar que a reserva de competência da Administração Central, conforme a disposição do artigo 149.1.29, não exclui a atuação das Comunidades Autônomas, com base no artigo 148.1.22, conforme reconhecido pelo Tribunal Constitucional na sentença de 18 de dezembro de 1984. Na decisão, afirmou a Corte que a matéria de proteção civil “ha de englobarse con carácter prioritario en el concepto de seguridad pública del artículo 149.1.29 de la Constitución”, reconhecendo a existência de competências concorrentes entre Estado Espanhol e Comunidades Autônomas, afirmando que “debe reconocerse a las Comunidades Autónomas competencia en materia de protección civil, especialmente para la elaboración de los correspondientes planes de prevención de riesgos y calamidades y para la dirección de sus propios servicios en el caso de que las situaciones catastróficas o de emergencia se produzcan”. Vide análise da decisão em artigo de Miguel José Izu Belloso publicado na Revista Española de Derecho Administrativo nº 69, janeiro-março 1991, disponível em: <http://webs.ono.com/mizubel/sistema.pdf>. Acesso em: 7 jun. 2016.

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45

no que concerne ao enfrentamento da questão – que, para a região do Levante

Espanhol, é de vital importância77.

Nesse contexto, pois, surge em 2003 o PATRICOVA (Plano de Ação

Territorial sobre Prevenção de Risco de Inundação na Comunidade Valenciana)78,

cujos objetivos são assim elencados:

1. Obtener un adecuado conocimiento y evaluación de los riesgos de inundación en el territorio de la Comunitat Valenciana.

2. Establecer procedimientos administrativos ágiles y rigurosos para incorporar la variable inundabilidad a los planes, programas y proyectos que tengan una proyección sobre el territorio.

3. Lograr una actuación coordinada de todas la Administraciones Públicas y los agentes sociales para reducir las consecuencias negativas de las inundaciones sobre la salud de las personas y los bienes, el médio ambiente, el patrimonio cultural, el paisaje, la actividad económica y los equipamientos e infraestructuras.

4. Orientar los desarrollos urbanísticos y territoriales hacia las áreas no inundables o, en su caso, hacia las de menor peligrosidad de inundación, siempre que permitan el asentamiento, otorgando preferencia a los modelos urbanos y territoriales más eficientes.

5. Gestionar las zonas inundables dentro del sistema territorial de la Infraestructura Verde, favoreciendo la producción de los servicios ambientales, así como la conservación y mejora de los paisajes naturales y culturales en torno al agua.79

Os princípios pelos quais se rege o Plano, por seu turno, são os

seguintes:

1. Principio de cautela y acción preventiva.

77 Com efeito, estima-se que 600.000 pessoas vivem em zonas submetidas a algum nível de risco de inundação, o que significa 11,7% da população da Comunidade Valenciana, segundo a Memória da Revisão do PATRICOVA, levada a efeito em 2015, página 87. Disponível em: <http://www.citma.gva.es/documents/20551069/162377494/01+Memoria/9938fc0e-3ba8-4829-8524-5d3afa3542eb>. Acesso em: 22 jan. 2016. 78 Aprovado pelo Acordo do Conselho da Generalitat Valenciana de 28 de janeiro de 2003 (Disponível em: <http://www.epyma.es/docs/leyes/CV/Acuerdo_28_01_2003CV.pdf>. Acesso em: 19 maio 2016), com fundamento na Lei 6/1989, de Ordenação do Território da Comunidade Valenciana, vigente até julho de 2004 (revogada pela Lei 4/2004, vigente até agosto de 2014). Hoje a ordenação do território valenciano está disciplinada pela Lei 5/2014, de Ordenação do Território, Urbanismo e Paisagem, Disponível em: <http://www.docv.gva.es/datos/2014/07/31/pdf/2014_7303.pdf>. Acesso em: 19 maio 2016. 79 Memória da Revisão do PATRICOVA, levada a efeito em 2015, página 14. Disponível em: <http://www.citma.gva.es/documents/20551069/162377494/01+Memoria/9938fc0e-3ba8-4829-8524-5d3afa3542eb>. Acesso em: 22 jan. 2016.

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46

2. Protección y mejora del medio ambiente y del paisaje.

3. Internalización del riesgo de inundación por parte de las actuaciones.

4. Integración del desarrollo sostenible en la toma de decisiones.

5. Cooperación y coordinación entre las Administraciones Públicas.

6. Racionalización y simplificación de los procedimientos administrativos.

7. Proporcionalidad entre las medidas y los efectos.

8. Participación pública.

9. Planteamiento estratégico fijando objetivos de sostenibilidad a largo plazo.80

A partir de uma classificação dos riscos, o PATRICOVA propõe a adoção

de distintas medidas de atuação (para diminuição do risco, da vulnerabilidade ou dos

danos), tanto estruturais quanto de ordenação do território e de restauração

hidrológico-florestal, entre outras. Estas medidas, contudo, não tinham caráter

cogente81, mas sim orientativo, não havendo compromisso com seu efetivo

desenvolvimento, razão pela qual muitas delas ainda não deixaram o plano da

previsão, por falta de recursos ou mesmo de vontade política82.

Os resultados da aplicação do plano são assim analisados por ocasião de

sua revisão em 2015:

El PATRICOVA, desde su entrada en vigor en febrero de 2003 ha contribuido, a través de los procesos administrativos establecidos por la Comunidad Autónoma, en la incorporación de la inundabilidad como factor necesario y condicionante para la adecuada localización de nuevos suelos residenciales, industriales y terciarios, así como de cualquier otro proceso de carácter urbanístico.

La Normativa del PATRICOVA ha permitido gestionar desde la Administración Autonómica, en coordinación con la Administración Estatal, la idoneidad o no, desde el punto de vista del riesgo de

80 Idem, p. 14. 81 Ao contrário do catálogo de atuações, a normativa urbanística do PATRICOVA sim é vinculante para as administrações e os particulares, como indica o artigo 3º. Disponível em: <http://www.upv.es/contenidos/CAMUNISO/info/U0686412.pdf>. Acesso em: 19 maio 2016. 82 A previsão de investimento em ações estruturais era, à época, da ordem de 863 milhões de euros, aliados a outros 605 milhões de euros previstos para as medidas de restauração hidrológico-florestal. O balanço realizado por ocasião da revisão do PATRICOVA em 2015 (Memória, p. 108) demonstra um investimento de 440 milhões de euros em medidas estruturais (51% do previsto inicialmente).

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inundación, de los diferentes ámbitos territoriales sobre los que han surgido propuestas de actuaciones por diferentes agentes territoriales.

La aplicación en el ámbito de la Comunitat Valenciana de la Normativa Urbanística prevista en el PATRICOVA ha tenido un papel relevante en la relocalización, reorganización de usos y/o adopción de medidas de adecuación, cuando han procedido, que ha dado como resultado una reducción del riesgo potencial por inundaciones respecto a las actuaciones urbanísticas propuestas si no hubiese existido el PATRICOVA.

Um avanço substancial foi identificado em relação a medidas de

ordenação territorial: com foco na prevenção, a inclusão da variável da inundação no

planejamento do espaço é um dos pilares do PATRICOVA e representou uma

inovação posteriormente albergada (e, portanto, chancelada) pela normativa

europeia e nacional.

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CAPÍTULO 4

O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: ENTRE O DÉFICIT DE

ORDENAÇÃO TERRITORIAL E O PANORAMA LEGISLATIVO

CORRELATO AO PROBLEMA DAS INUNDAÇÕES

4.1 ORDENAÇÃO TERRITORIAL: DÉFICIT ATUAL E PROPOSTAS DE LEGE

FERENDA

Por ocasião da análise acerca das causas das inundações que atingem

as zonas urbanas, levada a efeito no capítulo 2 do prese nte estudo, destacou-se o

impacto das ações humanas sobre a frequência e até mesmo a magnitude das

inundações, diante da alteração antrópica das condições geoambientais83,

notadamente em função da alteração do uso do solo.

O surgimento das cidades e o estabelecimento de centros urbanos é um

fenômeno historicamente não planejado, de um modo geral. Pontuais são os casos

de cidades que já “nascem” através de um planejamento, como ocorreu com a atual

capital federal brasileira (Brasília/Distrito Federal). O hodierno – não apenas no

Brasil, mas no mundo – é que o planejamento surja muito após o estabelecimento

da urbe, na intenção de regular o território restante e mesmo solucionar problemas

já constatados.

Diante dessa realidade inarredável, a atividade de ordenação do território

reveste-se de desafios notáveis: para além da necessidade de regulação da parcela

territorial disponível, de modo a promover o melhor aproveitamento dos recursos

naturais e artificiais localizados naquele espaço e potencializar o uso humano, os

instrumentos de planejamento urbano – seja na faceta de ordenação do território,

seja mais especificamente na matéria urbanística – precisam desincumbir-se da

tarefa de oferecer soluções aos problemas que o crescimento desordenado da

cidade já produziu.

83 MARENGO, José A. Como as pesquisas das universidades podem ajudar na prevenção de desastres naturais? Cadernos Adenauer XVI (2015), nº2. Cidades resilientes. Rio de Janeiro: Fundação Konrad Adenauer, agosto 2015. pp. 44-45.

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49

No que tange particularmente ao enfrentamento do problema das

inundações, como de resto a todas as questões socioambientais, fundamental é o

papel da ordenação do território, sendo certo que o mau uso do solo será agente

causador, catalisador ou, no mínimo, desencadeador de desastres.

Sobre o que se entende por ordenação ou ordenamento territorial,

Antônio Carlos Robert Moraes84 esclarece tratar-se de uma visão macro do espaço,

com olhar sobre todo o território nacional – mas atenção sobre biomas,

macrorregiões, além de espaços estratégicos. A pretensão é de obter um

diagnóstico para posterior compatibilização de políticas públicas setoriais, evitando

conflitos:

A meta do ordenamento territorial é a compatibilização de políticas em seus rebatimentos no espaço, evitando conflitos de objetivos e contraposição de diretrizes no uso dos lugares e dos recursos. Pensa-se o Estado como agente regulador e harmonizador, e não como gerador de impactos negativos (sociais, ambientais e econômicos). O ordenamento territorial é um instrumento de articulação transetorial e interinstitucional que objetiva um planejamento integrado e espacializado da ação do poder público.

A Constituição da República Federativa do Brasil, proclamada a 5 de

outubro de 1988, reservou o Capítulo II do Título VII à política urbana, incumbindo

ao poder público municipal – com base em diretrizes fixadas por lei federal – a

execução da política de desenvolvimento urbano, que deve ter por norte ordenar o

pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus

habitantes85.

A lei federal fixadora das diretrizes, conforme comando constitucional, foi

editada no ano de 2001, sendo conhecida como “Estatuto da Cidade”86. O pleno

desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana deverá ser

buscado mediante as diretrizes ali fixadas, dentre as quais está a ordenação e o

controle do uso do solo, de forma a evitar, entre outras coisas87, o parcelamento, a

84 Artigo “Ordenamento Territorial: uma conceituação para o planejamento estratégico”, publicado nos anais da Oficina sobre a Política Nacional de Ordenamento Territorial, realizada em novembro de 2003 pelo Ministério da Integração Nacional, pp. 46-47. 85 Conforme caput do artigo 182 da Constituição Federal. 86 Lei Federal nº 10.257/2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 19 jun. 2016. 87 Note-se que o objetivo de evitar a exposição da população a risco de desastres somente foi introduzida nesse mesmo artigo em 2012, pela edição da Lei nº 12.608, da qual trataremos a seguir.

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50

edificação ou o uso do solo excessivos ou inadequados em relação à infraestrutura

urbana88; a deterioração das áreas urbanizadas89; a poluição e a degradação

ambiental90.

A par da delegação de competência aos municípios para a política de

desenvolvimento urbano (operada em plano constitucional), o Estatuto da Cidade

previu a possibilidade de os Estados (artigo 4º, I) elaborarem planos de ordenação

do território, a exemplo da reserva de competência à União para elaboração e

execução de planos nacionais e regionais de ordenação do território e de

desenvolvimento econômico e social (artigo 3º, V), decorrente da previsão

constitucional do artigo 21, IX, da Carta Magna.

A despeito, contudo, das previsões constitucionais e legais de distribuição

de competências, o atual panorama nacional na seara da ordenação territorial é

deficitário, sendo campo de atuação quase exclusiva dos municípios que – por

contarem com mais de 20 mil habitantes ou por serem integrantes de regiões

metropolitanas ou de interesse turístico, entre outros91 – foram obrigados a editar

seus respectivos Planos Diretores, classificados pelo Estatuto da Cidade como

“instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana”92. De fato,

embora previsto desde 1988, até o momento o Brasil não conta com um plano

nacional de ordenação do território.

Muito se debateu no início da década passada, é verdade, em torno do

assunto. Com a edição da Lei Federal nº 10.683/03, que redefiniu atribuições da

Presidência da República, a tarefa da ordenação territorial ficou a cargo dos

Ministérios da Integração e da Defesa93. A partir de então, a Secretaria de Políticas

para o Desenvolvimento Regional desencadeou o processo de formulação de uma

Política Nacional de Ordenação Territorial (PNOT), contando com a participação

técnica da Associação Brasileira das Instituições de Investigação Tecnológica

88 Alínea c do inciso VI do artigo 2º. 89 Alínea f do inciso VI do artigo 2º. 90 Alínea g do inciso VI do artigo 2º. 91 Artigo 41 do Estatuto da Cidade. 92 Artigo 40 do Estatuto da Cidade. 93 Texto compilado disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.683compilado.htm>. Acesso em: 21 jun. 2016.

Page 51: INUNDAÇÕES URBANAS: PROPOSTAS PARA UMA GESTÃO DO …

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(ABIPTI) e da Universidade de Brasília, pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável

(CDS/UnB)94.

Fruto desse trabalho foi a publicação da versão preliminar do documento

“Subsídios para a definição da Política Nacional de Ordenação do Território –

PNOT”, em agosto de 2006, no portal do Ministério da Integração Nacional95. Desse

ponto, contudo, não mais se avançou. De fato, as discussões acerca do

ordenamento territorial deram lugar às relativas ao desenvolvimento regional96. Com

efeito, em fevereiro de 2007 foi editado pela Presidência da República o Decreto nº

6.047, criando a Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR)97. Da

PNOT, contudo, o que se sabe é que haveria anteprojeto de lei elaborado pelo grupo

de trabalho e encaminhado no ano de 2007 à Casa Civil da Presidência da

República – de onde até o presente momento não teria saído em direção ao

Congresso Nacional98.

A ausência de uma Política Nacional de Ordenação Territorial não

significa, de forma alguma, que as questões territoriais não tenham recebido

tratamento em terras brasileiras. A legislação setorial tratou de suprir – na medida do

possível – a lacuna deixada pela falta de um plano nacional. Com efeito, diversos

são os textos legais em vigor com impacto no território, seja em escala nacional –

como os relativos ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação e ao Sistema

Nacional de Recursos Hídricos, além das Políticas Nacionais de Meio Ambiente, de

Desenvolvimento Regional, de Desenvolvimento Rural Sustentável, de

Desenvolvimento Urbano, de Defesa Nacional – seja municipal (Planos Diretores e

os respectivos instrumentos de gestão territorial urbana) ou mesmo regional – como

94 Segundo registro de Rita de Cássia Gregório de Andrade no artigo Política nacional de ordenamiento territorial: el caso de Brasil, publicado em espanhol na Revista Espacio y Desarrollo n° 22, p. 126. 95 Disponível em: <http://www.mi.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=45546192-e711-497a-8323-07244ee574ce&groupId=24915>. Acesso em: 20 jun. 2016. 96 Como bem colocado por Sabrina Dhieniffer Sander e Giovane José Maiorki no artigo “ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO: UM TEMA POUCO DISCUTIDO NO BRASIL”, publicado na Revista DRd – Desenvolvimento Regional em debate. Ano 2, n. 1, jul. 2012. p. 232-237. Disponível em <www.periodicos.unc.br/index.php/drd/article/download/217/282>. Acesso em: 20 jun. 2016. Ao contrário do que encontramos no artigo citado de Rita de Cássia Gregório de Andrade, que chega a afirmar a criação do Sistema Nacional de Ordenamento Territorial teria ocorrido em 2007, o que não se verifica. 97 Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/Decreto/D6047.htm>. Acesso em: 11 jul. 2016. 98 Segundo informação apresentada por Renata Bovo Peres e Elisângela de Almeida Chiquito na p. 78 do artigo "MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO REGIONAL: Novas Questões, Possíveis Articulações”, publicado na Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 14, nº 2.

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é o caso dos Planos de Gerenciamento de Recursos Hídricos (conhecidos como

Planos de Bacias Hidrográficas), entre outros com rebatimento territorial99.

Ocorre, entretanto, que a eficácia de todo esse arsenal legislativo fica

comprometida justamente pela ausência de um plano nacional que viabilize a

hierarquização entre todos esses diplomas bem como coordene as diferentes

esferas do federalismo brasileiro no que toca às diversas normas que regulam as

formas de uso, ocupação e proteção do solo urbano e rural. Evidente, pois, o déficit

de ordenação territorial brasileiro, operando atualmente uma diversidade de

instrumentos atuando de forma isolada (desconectada) e, por vezes, conflitante com

outras normas100.

Assim, de lege ferenda, afigura-se recomendável a retomada do processo

em torno da formulação efetiva de uma Política Nacional de Ordenação Territorial

que represente um marco na gestão do território nacional e funcione como

articuladora dos planos e programas setoriais, seja de aplicação nacional, municipal

ou regional, de modo a dissipar os conflitos entre as normas e também definir

claramente a hierarquia entre elas101 (quando não se trate de competências

constitucionalmente já definidas, por evidência).

Tratar-se-á de norma federal; seu âmbito de atuação deverá ser, portanto,

nacional (de observação em todo o território nacional). As ações dela decorrentes,

contudo, hão de desenvolver-se nas mais diversas escalas: também municipais e

regionais (sejam estaduais, por bacias hidrográficas, macrorregionais ou sub-

regionais), dependendo não apenas dos setores de aplicação mas também das

peculiaridades locais que possam ser identificadas102.

99 Rol exemplificativo a partir de PERES e CHIQUITO (op. cit., p.76-77) e SANDER e MAIORKI (op. cit., p. 233). 100 Ocorre, ainda, que as políticas setoriais referidas estão adstritas a Ministérios distintos, havendo assim ainda menos articulação entre as normas. Tal circunstância é referida por Aldomar A. Rückert (Disponível em: <http://www.ub.edu/geocrit/9porto/aldomar.htm>. Acesso em: 20 jun. 2016) e também por PERES e CHIQUITO, op. cit., p. 79. 101 MORAES (op. cit., p. 47) sustenta que a PNOT deve se ocupar também de esclarecer as competências federativas: “A questão do federalismo não pode estar ausente da Política Nacional de Ordenamento Territorial, sob o risco de trazer mais tensão que resoluções neste campo. A PNOT deverá exprimir um pacto territorial que, entre outras coisas, explicite melhor as matérias e tópicos de interesse nacional (logo de competência direta da União) e esclareça mais o âmbito específico de atuação das outras unidades da federação, identificando – sempre que possível – os caminhos institucionais para a ação cooperada e as parcerias entre níveis de governo (um detalhamento de tal matéria constitui parte substancial da própria elaboração da política em tela).” 102 PERES e CHIQUITO (op. cit., pp. 82-83) sustentam a possibilidade de atuação também por “ecorregiões”.

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Além de conter disposições sobre macroestratégias de ocupação do

espaço, instalação de equipamentos e infraestruturas, ações especiais em áreas

críticas ou prioritárias e mesmo sobre a utilização dos recursos naturais103, deve a

futura PNOT tratar dos instrumentos para o seu desenvolvimento, como planos

regionais e locais de ordenação territorial (já previstos na Constituição Federal),

além de contemplar instrumentos como o zoneamento ecológico-econômico, a

avaliação de impactos (ambientais ou de vizinhança), a criação de espaços

territoriais especialmente protegidos, o sistema de informações104.

Somente prever tais instrumentos, contudo, não parece ser o melhor

caminho para o atingimento dos objetivos de integração aqui propostos:

Contudo, não é apenas pela articulação dos instrumentos que se atinge uma gestão territorial integrada. Para que os planos efetivamente cumpram seus objetivos, deve-se pensar o conceito de planejamento como um processo dinâmico em que a constante percepção, interações e concretização das oportunidades e das suas materializações, através de negociações político-institucionais e gestão participativa, constituam importantes estratégias de implementação, acompanhamento, monitoramento e revisão. Os planos não resolvem por si só os problemas regionais ou locais. Dependem, fundamentalmente, da participação política da sociedade, tendo em vista a prática da cidadania e a construção de um pacto social (Peres, 2012). Deve-se, portanto pensar e concebê-los não como aqueles que vão resolver todos os conflitos, mas como uma legitimação democrática de novas práticas municipais e regionais.105

Nessa linha, o papel de cada instrumento também deve ser repensado,

além de ser prevista a constante revisão dos planos e – fundamentalmente – a

participação cidadã no processo de ordenação do território. Cabe lembrar, a

propósito, que em que pese o anteprojeto de lei elaborado pela comissão de

especialistas em 2007 tenha sido encaminhado à Casa Civil para posterior remessa

às Casas Legislativas, tal caminho prescindiu do necessário debate público que a

matéria reclama. Impõe-se, portanto, ao retomar o processo, cumprir a relevante

etapa da mobilização social, sem o que eventual política editada carecerá de

legitimidade.

103 Cf. MORAES, op. cit., p. 47. 104 RÜCKERT, Aldomar A. Disponível em: <http://www.ub.edu/geocrit/9porto/aldomar.htm>. Acesso em: 20 jun. 2016 105 PERES e CHIQUITO (op. cit., p. 83)

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4.2 O ENFRENTAMENTO DO PROBLEMA DAS INUNDAÇÕES NO

ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Ao contrário da normativa europeia e da legislação espanhola, analisadas

no capítulo 3 deste estudo, o ordenamento jurídico brasileiro não conta com normas

específicas para o enfrentamento do problema das inundações. Existe, contudo, a

exemplo do que já se mencionou alhures no que toca ao tema da ordenação

territorial, diversa legislação nacional correlata à matéria – em especial se, em

conformidade com a análise desenvolvida no capítulo 2, dedicarmos o olhar sob o

prisma da prevenção de eventos danosos (ou, melhor: da prevenção da produção de

danos decorrentes dos eventos de inundação).

Antes de iniciar a análise setorial, contudo, convém registrar que o regime

de competências legislativas vem estabelecido pela Constituição Federal de 1988

nos artigos 22, 24 e 30. Da análise desses dispositivos verifica-se que é

competência privativa da União legislar sobre defesa civil (matéria reservada à lei

federal, portanto)106.

Em outro quadrante, urbanismo e meio ambiente são matérias em que

opera a competência legislativa concorrente entre União e Estados (ou Distrito

Federal)107 – nesta, cabe à União o estabelecimento de normas gerais e aos

Estados e Distrito Federal resta a competência legislativa suplementar108. Na

ausência de lei federal fixadora de normas gerais, entretanto, é facultado aos

Estados e ao Distrito Federal a competência legislativa plena (enquanto não

sobrevier lei federal contrária)109.

4.2.1 PROTEÇÃO E DEFESA CIVIL

As mais modernas contribuições advêm da legislação afeta à proteção

civil, já que a normativa nacional sobre tal enfoque é bastante recente. Com efeito, a

Lei Federal nº 12.608, de 10 de abril de 2012, instituiu a Política Nacional de

Proteção e Defesa Civil (PNPDEC), dispôs sobre o Sistema Nacional de Proteção e

106 Inciso XXVIII do artigo 22 da Constituição Federal. 107 Incisos I e VI do artigo 24 da Constituição Federal. 108 Parágrafos 1º e 2º do artigo 24 da Constituição Federal. 109 Parágrafos 3º e 4º do artigo 24 da Constituição Federal.

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Defesa Civil (SINPDEC) e o Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil

(CONPDEC) e autorizou a criação de sistema de informações e monitoramento de

desastres, entre outras disposições110.

Segundo tal marco normativo, a adoção de medidas necessárias para a

redução do risco de desastres incumbe a todos os entes federativos: União,

Estados, Distrito Federal e Municípios, que poderão contar com a colaboração de

entidades públicas e privadas e da sociedade civil (artigo 2º)111.

A lei propugna, já de início, pela adoção de medidas preventivas e

mitigatórias do risco de desastres, mas também se dedica a atividades de

preparação, resposta e recuperação no âmbito da proteção civil (artigo 3º).

A prioridade da prevenção emerge cristalina do novo texto legal. De fato,

ainda que a criação de um sistema de defesa civil remonte no Brasil ao ano de

1988112, o país ainda carece de uma cultura de prevenção113: as ações

desenvolvidas nessa seara sempre estiveram muito mais associadas à remediação

(ou resposta e recuperação, como refere a nova lei) do que à prevenção dos

desastres.

Nesta quadra da história, entretanto, o olhar deve ser outro: em que pese

a atual norma nacional tenha surgido como forma de resposta aos desastres

ocorridos no país entre 2008 e 2011 (elencados na Tabela 3 do capítulo 2 do

presente estudo)114, a tônica preconizada agora é a da prevenção. De fato, a lei

federal destaca dentre as diretrizes da PNPDEC a prioridade que deve ser dada às

110 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12608.htm>. Acesso em: 29 jun. 2016. 111 Exemplo dessa colaboração é a parceria estabelecida entre a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (SEDEC) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) para a América Latina e o Caribe para o “Projeto de Fortalecimento da Cultura de Gestão de Risco de Desastres no Brasil”, que prevê a realização de capacitações, a sensibilização social e o fortalecimento das pesquisas sobre a prevenção de desastres. Notícia de 28 de maio de 2014 disponível em: <http://www.pnud.org.br/Noticia.aspx?id=3878>. Acesso em: 29 jun. 2016. 112 Alguns estados da Federação dispunham de legislação de defesa civil anteriormente à edição da primeira norma nacional, sempre em virtude de necessidades específicas (em resposta a desastres sofridos). 113 Segundo o documento intitulado “DIAGNÓSTICO E ANÁLISE DAS NECESSIDADES DE FORMAÇÃO EM GESTÃO DE RISCO DE DESASTRES – Projeto BRA12/017 – Fortalecimento da Cultura de Gestão de Risco de Desastres no Brasil”, elaborado pelo PNUD, solicitado e revisado pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (SEDEC). Disponível em <http://www.pnud.org.br/arquivos/Diagnostico%20Nec%20de%20Form%20SINPDEC_r.pdf>. Acesso em: 29 jun. 2016. 114 Diante dos trágicos eventos ocorridos na região serrana do Rio de Janeiro em 2011, já referidos alhures, o Governo Federal editou a Medida Provisória nº 547/2011, posteriormente convertida na Lei nº 12.608/2012.

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ações preventivas para a minimização dos desastres115, além de inequivocamente

abrigar no texto o princípio ambiental da precaução, ao registrar que a incerteza

quanto ao risco de desastre “não constituirá óbice para a adoção das medidas

preventivas e mitigadoras da situação de risco” (§ 2º do artigo 2º).

Segundo o Mapeamento de Riscos em Encostas e Margens de Rios116

produzido pelo Ministério das Cidades, a gestão do risco de desastres está centrada

em dois fundamentos: a previsão e a prevenção. A previsão inclui a identificação dos

locais e das circunstâncias em que os desastres podem acontecer (onde e quando),

enquanto que a prevenção tem por escopo impedir a ocorrência dos desastres ou

mesmo reduzir suas magnitudes117.

A PNPDEC possui, ainda, como diretrizes: atuação articulada entre os

entes federativos para redução de desastres e apoio às comunidades atingidas

(inciso I), abordagem sistêmica das ações de prevenção, mitigação, preparação,

resposta e recuperação (inciso II), adoção da bacia hidrográfica como unidade de

análise das ações de prevenção de desastres relacionados a corpos d’água (inciso

IV), planejamento com base em pesquisas e estudos sobre áreas de risco e

incidência de desastres (inciso V) e participação da sociedade civil (inciso VI, todos

do artigo 4º).

Os objetivos vêm delineados no artigo 5º da lei:

I - reduzir os riscos de desastres;

II - prestar socorro e assistência às populações atingidas por desastres;

III - recuperar as áreas afetadas por desastres;

IV - incorporar a redução do risco de desastre e as ações de proteção e defesa civil entre os elementos da gestão territorial e do planejamento das políticas setoriais;

V - promover a continuidade das ações de proteção e defesa civil;

VI - estimular o desenvolvimento de cidades resilientes e os processos sustentáveis de urbanização;

115 Inciso III do artigo 4º da Lei Federal nº 12.608/2012. 116 Documento disponível em: <http://www.cidades.gov.br/images/stories/ArquivosSNPU/Biblioteca/PrevencaoErradicacao/Livro_Mapeamento_Enconstas_Margens.pdf>. Acesso em: 30 jun. 2016. 117 Op. cit., p. 18.

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VII - promover a identificação e avaliação das ameaças, suscetibilidades e vulnerabilidades a desastres, de modo a evitar ou reduzir sua ocorrência;

VIII - monitorar os eventos meteorológicos, hidrológicos, geológicos, biológicos, nucleares, químicos e outros potencialmente causadores de desastres;

IX - produzir alertas antecipados sobre a possibilidade de ocorrência de desastres naturais;

X - estimular o ordenamento da ocupação do solo urbano e rural, tendo em vista sua conservação e a proteção da vegetação nativa, dos recursos hídricos e da vida humana;

XI - combater a ocupação de áreas ambientalmente vulneráveis e de risco e promover a realocação da população residente nessas áreas;

XII - estimular iniciativas que resultem na destinação de moradia em local seguro;

XIII - desenvolver consciência nacional acerca dos riscos de desastre;

XIV - orientar as comunidades a adotar comportamentos adequados de prevenção e de resposta em situação de desastre e promover a autoproteção; e

XV - integrar informações em sistema capaz de subsidiar os órgãos do SINPDEC na previsão e no controle dos efeitos negativos de eventos adversos sobre a população, os bens e serviços e o meio ambiente.

Vê-se, pois, que a norma é ambiciosa. Além de fixar diretrizes e objetivos,

trata de distribuir as competências entre os entes federativos (sem descurar da

necessária articulação entre eles, sem o que não se faz proteção civil).

O texto normativo, a propósito, insere alterações pontuais em outros

dispositivos legais118 – o que o faz muito bem, aplicando desde logo a necessária

conexão que devem manter os diplomas legais para o enfrentamento da questão.

A esse propósito, quiçá a disposição mais relevante do novel diploma

esteja no parágrafo único do artigo 3º, quando afirma que, tendo em vista a

118 Como as que tratam das transferências de recursos entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, imprescindíveis para a recuperação pós-desastre, ou as que dispõem sobre programas de habitação popular, a fim de retirar as pessoas das áreas de risco.

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promoção do desenvolvimento sustentável, a política nacional de proteção e defesa

civil deve integrar-se às seguintes políticas119:

Ordenamento territorial;

Desenvolvimento urbano;

Saúde;

Meio ambiente;

Mudanças climáticas;

Gestão de recursos hídricos;

Geologia;

Infraestrutura;

Educação; e

Ciência e tecnologia

Assim, exige o legislador a interação entre as políticas setoriais e a então

instituída PNPDEC, de modo a tentar resolver os problemas de sobreposições e

conflitos de normas que decorrem da edição desconectada de textos normativos,

como referimos anteriormente.

Como exemplo das conexões diretamente impostas (mediante alterações

introduzidas em outros diplomas legais pela Lei Federal nº 12.608/2012), impende

observar as relevantes modificações sofridas pelo Estatuto da Cidade a partir da

edição da PNPDEC. Com efeito, além de incluir a exposição da população a risco de

desastres dentre os objetivos a serem evitados pela ordenação do solo (diretriz geral

da política urbana)120, torna obrigatório o plano diretor também para as cidades

“incluídas no cadastro nacional de Municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de

deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou

hidrológicos correlatos”121. O plano diretor desses municípios, ademais das

119 Além de uma referência “às demais políticas setoriais” porventura olvidadas no catálogo. 120 Inclusão da alínea h do inciso VI do artigo 2º do Estatuto da Cidade. 121 Inclusão do inciso VI do artigo 41 do Estatuto da Cidade.

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exigências comuns citadas no artigo 42 do Estatuto da Cidade, deve contemplar as

adicionais incluídas pela nova lei no artigo 42-A:

I - parâmetros de parcelamento, uso e ocupação do solo, de modo a promover a diversidade de usos e a contribuir para a geração de emprego e renda;

II - mapeamento contendo as áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos;

III - planejamento de ações de intervenção preventiva e realocação de população de áreas de risco de desastre;

IV - medidas de drenagem urbana necessárias à prevenção e à mitigação de impactos de desastres; e

V - diretrizes para a regularização fundiária de assentamentos urbanos irregulares, se houver, observadas a Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, e demais normas federais e estaduais pertinentes, e previsão de áreas para habitação de interesse social por meio da demarcação de zonas especiais de interesse social e de outros instrumentos de política urbana, onde o uso habitacional for permitido.

Ainda, exige o legislador que a identificação e o mapeamento de áreas de

risco levem em conta as cartas geotécnicas (§1º), bem como que o conteúdo do

plano diretor seja compatível com as disposições dos planos de recursos hídricos

(§2º), disposição fundamental para a harmonia do sistema, como veremos adiante,

mormente considerando que a unidade de análise deve ser a bacia hidrográfica122.

Para tanto, deverão os municípios adequar seus planos diretores aos

planos de bacia por ocasião de sua revisão (dentro dos prazos fixados pelo Estatuto

da Cidade)123. Para os municípios incluídos no cadastro que ainda não tenham

elaborado seus planos diretores, resta fixado o prazo de cinco anos para o seu

encaminhamento pela Administração (Poder Executivo) para aprovação pela

Câmara Municipal (Poder Legislativo)124.

Por fim, cabe acrescentar que a aprovação de projetos de parcelamento

do solo urbano em municípios que venham a ser incluídos no referido cadastro

nacional ficará vinculada ao atendimento dos requisitos constantes da carta

122 Inciso IV do artigo 4º da Lei nº 12.608/2012, já referido supra. 123 Parágrafo 3º do artigo 42-A do Estatuto da Cidade, incluído pela Lei nº 12.608/2012. 124 Parágrafo 4º do artigo 42-A do Estatuto da Cidade, incluído pela Lei nº 12.608/2012.

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geotécnica de aptidão à urbanização, sendo vedada a aprovação em áreas de risco

definidas em lei como não edificáveis, tudo conforme alterações produzida na Lei nº

6.766/79125.

Cumpre registrar, contudo, que o mencionado “cadastro nacional de

Municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto,

inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos” –

decorridos quatro anos de vigência da norma – ainda não foi implementado. Há,

contudo, disponível no portal do Ministério da Integração Nacional126, uma lista com

os 821 municípios brasileiros com o maior número de ocorrências de desastres

naturais, que seguramente dará base ao futuro Cadastro Nacional.

Segundo informação constante na sede eletrônica do Ministério da

Integração Nacional, já teria sido realizado o mapeamento de áreas de risco “nas

regiões urbanas de 538 munícipios, dos 821 prioritários, por apresentarem maior

recorrência de inundação, enxurradas e deslizamentos, número de óbitos,

desabrigados e desalojados”127.

4.2.2 URBANISMO

Não são apenas as contribuições da novel legislação brasileira sobre

proteção e defesa civil, contudo, as únicas com interface com o tema das

inundações. Relevantes instrumentos – até então utilizados para o enfrentamento do

problema, notadamente no que toca à minimização dos riscos de desastres –

provém do direito urbanístico.

Isso porque a legislação nacional de há muito proíbe, por exemplo, a

constituição de lotes em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, como se vê da

Lei do Parcelamento do Solo Urbano (Lei Federal nº 6.766/79)128. O enfoque aqui

no final da década de 70 era notadamente o da prevenção de danos humanos e

125 Artigo 12 da Lei nº 6.766/79 com redação alterada pela Lei nº 12.608/2012. 126 Acesso direto através do enlace <http://www.mi.gov.br/pt/c/document_library/get_file?uuid=51c80bb2-9bf9-4193-9eb2-1ba2cb2937e2&groupId=10157>. Acesso em 30 jun. 2016. Cumpre ressalvar, contudo, que o município de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, não aparece na lista, em que pese tenha sido referido, como já visto, pelo Anuário Brasileiro de Desastres Naturais de 2013 como local de ocorrência da inundação mais expressiva daquele ano, com 178.401 afetados. 127 O documento intitulado “PREVENÇÃO A DESASTRES – AÇÕES DO GOVERNO FEDERAL”, publicado pela Assessoria de Comunicação Social do Ministério de Integração Nacional, não é datado. Disponível em: <http://www.mi.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=c1a36460-d502-4665-b621-0f35b2aed6c6&groupId=10157>. Acesso em 30 jun. 2016. 128 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6766compilado.htm>. Acesso em: 29 jun. 2016.

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patrimoniais, ainda sem qualquer preocupação ambiental129, mormente

considerando que o inciso I do parágrafo único do artigo 3º trazia (e ainda traz) a

ressalva: “antes de tomadas as providências para assegurar o escoamento das

águas”.

Ainda no plano urbano, especial destaque merece a legislação municipal

relativa à gestão do território dentro dos limites municipais – visto que, como dito

alhures, a Constituição Federal incumbiu aos Municípios a execução da política de

desenvolvimento urbano – que, diante da ausência de uma política nacional de

ordenação territorial, tem a missão de ordenar o território com vistas ao pleno

desenvolvimento. Assim, através do plano diretor, que é o instrumento básico, mas

também com auxílio de outras normas locais a ele associadas ou mesmo dele

decorrentes, é tarefa do Município assegurar “o atendimento das necessidades dos

cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das

atividades econômicas”130.

Segundo preconizado no Estatuto da Cidade, o plano diretor é o

principal instrumento de planejamento urbano: obrigatório para as cidades

relacionadas no artigo 41, conforme referido no item 4.1 deste estudo131, tem seu

conteúdo mínimo regulado pelo artigo 42 do mesmo diploma, destacando-se a

exigência de previsão de sistemas de acompanhamento e controle.

E não sem razão: o plano diretor é um instrumento de natureza dinâmica,

que deve estar em constante adaptação às necessidades da cidade. Por isso

também a exigência de revisão periódica – pelo menos a cada dez anos – inserida

no §3º do artigo 40 do EC. Tampouco é desejável, contudo, que as alterações sejam

pontuais, de forma a satisfazer interesses particulares em detrimento do interesse

129 O inciso V do mesmo dispositivo, contudo, veda também o parcelamento do solo “em áreas de preservação ecológica”. 130 Conforme dicção do artigo 39 do Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257/2001), já mencionado. 131 “Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades: I – com mais de vinte mil habitantes; II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4o do art. 182 da Constituição Federal; IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico; V – inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional. VI - incluídas no cadastro nacional de Municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos. [...]”

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público: por essa razão a lei nacional exige ampla informação e participação popular

no processo de elaboração (§4º do artigo 40).

Ademais, é necessária transparência durante sua aplicação, a fim de

garantir, através dos instrumentos de controle, seu efetivo cumprimento. Mais do

que qualquer outra norma, o plano diretor encerra verdadeiro pacto social, haja vista

que para sua elaboração devem ser colhidas as intenções dos habitantes daquele

espaço territorial. Essa é a razão pela qual os sistemas de acompanhamento e

controle devem ser efetivos132.

Além do plano diretor, dispõe o município de outros instrumentos de

planejamento que podem a ele ser associados, como normas de parcelamento, uso

e ocupação do solo (que podem ser locais, respeitadas as regras gerais

estabelecidas na legislação federal), zoneamentos, leis financeiras e

orçamentárias (aqui incluídos o plano plurianual, a lei de diretrizes orçamentárias e

a lei anual de orçamento, sem prejuízo de previsão de gestão orçamentária

participativa), planos de desenvolvimento econômico e social e planos,

programas e projetos setoriais133.

Ademais desses instrumentos de planejamento municipal e também dos

estudos prévio de impacto ambiental (EIA) e de impacto de vizinhança (EIV)134,

prevê a legislação urbanística a possibilidade de uso – para atingimento dos

objetivos da lei – de institutos tributários e financeiros, como o imposto sobre a

propriedade predial e territorial urbana (IPTU) e a contribuição de melhoria, bem

como incentivos e benefícios dessas naturezas.

Também vislumbra o Estatuto da Cidade a possibilidade de utilização de

institutos jurídicos e políticos elencados no inciso V do artigo 4º, dentre os quais

destacamos – por aplicáveis ao enfrentamento do problema das inundações – os

seguintes: desapropriação, servidão administrativa; limitações administrativas;

instituição de unidades de conservação; direito de preempção; outorga

onerosa do direito de construir e de alteração de uso; transferência do direito 132 Importante referir que o Estatuto da Cidade prevê a gestão democrática da cidade, com a instituição de órgãos colegiados e a utilização de debates, audiências e consultas públicas, além da realização de conferências sobre assuntos de interesse urbano e iniciativa popular de projetos de lei e de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano (Capítulo IV da lei, que encerra os artigos 43 a 45). 133 Todos os instrumentos estão elencados no inciso III do artigo 4º do Estatuto da Cidade, juntamente com o plano diretor. 134 Inciso VI do artigo 4º do Estatuto da Cidade.

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de construir; operações urbanas consorciadas. Muitos destes institutos, frise-se,

deverão estar inseridos no próprio plano diretor, por previsão expressa do inciso II

do artigo 42 da lei federal.

4.2.3 PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE

Mas não apenas na área do urbanismo a legislação tem incidência sobre

o tema das inundações: conforme visto no capítulo 2, a origem dos problemas

comumente reside no mau uso dos recursos naturais – água, solo, vegetação – e a

solução, portanto, passa necessariamente por um maior respeito à dinâmica do

meio. Nesse sentir, a legislação ambiental também configura importante instrumento

de atuação, à falta de uma legislação específica sobre inundações.

Com efeito, para uma eficiente gestão de risco de inundações que tenha

por norte evitar perdas humanas e patrimoniais faz-se necessário lançar mão do

arsenal legislativo existente no país para a proteção do meio ambiente. Referências

necessárias da legislação setorial nesse aspecto são os textos normativos

referentes a águas e à vegetação (considerando que sobre uso e ocupação do solo

já foram mencionados), diante da necessária visão de ecossistema.

Assim, a Política Nacional de Recursos Hídricos foi instituída pela Lei

Federal nº 9.433/97, tendo por objetivos assegurar à atual e às futuras gerações

água em quantidade e qualidade adequadas, a utilização racional e integrada dos

recursos hídricos com vistas ao desenvolvimento sustentável e – com especial

relevância em matéria de inundações – “a prevenção e a defesa contra eventos

hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos

recursos naturais”135.

Vê-se, pois, que a ideia defendida no capítulo 2 do presente estudo já

estava delineada desde 1997 pela Política Nacional de Recursos Hídricos,

reconhecendo que os chamados desastres hidrológicos podem ter origem natural

ou, como sustentamos, ser decorrência do mau uso dos recursos naturais.

135 Artigo 2º da Lei nº 9.433/97. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9433.htm>. Acesso em 30 jun. 2016.

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Dentre as diretrizes de ação elencadas no artigo 3º do diploma federal,

destaca-se, por oportuno à presente análise, a integração entre a gestão dos

recursos hídricos com a gestão ambiental136 e com a do uso do solo137, assim como

a articulação entre os planejamentos nacional, regional e estadual138.

Efetivamente, tratando-se de recurso de domínio público139 cuja gestão

incumbe a órgãos federais, estaduais e/ou regionais, imprescindível se mostra a

articulação entre as disposições daí decorrentes e as normativas locais que sobre os

recursos hídricos, indiretamente, tenham incidência. Aliás, há expressa

determinação legal para que as Administrações locais promovam a integração das

suas políticas de saneamento básico, de uso, ocupação e conservação do solo e de

meio ambiente com as políticas federal e estaduais de recursos hídricos140.

Aqui cabe uma consideração muito especial aos planos de recursos

hídricos, que são instrumentos regionais141 de gestão. Aprovados no âmbito dos

comitês de bacias hidrográficas, consubstanciam verdadeiros planos diretores para

o gerenciamento dos recursos hídricos142. Instrumentos supramunicipais, portanto,

frequentemente entram em conflito aparente de normas com os ditames municipais

– em especial no que concerne a questões de zoneamento, sobre o que trataremos

no capítulo seguinte, onde analisaremos os instrumentos de combate ao problema

das inundações.

Cumpre observar que – ao contrário da legislação espanhola – a lei

brasileira de águas, muito embora defina que os recursos hídricos são bens de

domínio público143, não traz qualquer delimitação de faixas marginais de proteção ou

servidão. Como vimos no capítulo 3, constam na legislação da Espanha, desde a

edição do Regulamento do Domínio Público Hidráulico na década de 80, as zonas

136 Inciso III do artigo 3º da Lei nº 9.433/97. 137 Inciso V do artigo 3º da Lei nº 9.433/97. 138 Inciso IV do artigo 3º da Lei nº 9.433/97. 139 Conforme inciso I do artigo 1º da Lei nº 9.433/97. 140 Artigo 31 da Lei nº 9.433/97. 141 Dispõe o artigo 8º da Lei nº 9.433/97 que os planos de recursos hídricos serão elaborados “por bacia hidrográfica, por Estado e para o País”. 142 Conforme dicção do artigo 6º da Lei nº 9.433/97. 143 A disposição, aliás, decorre de comando constitucional: o artigo 20 elenca entre os bens da União “os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais” e o artigo 26 arrola entre os bens dos Estados “as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 1 jul. 2016.

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chamadas “de servidão” e “de polícia”, assim definidas (com redação dada pelo Real

Decreto 9/2008 e grifos nossos):

Artículo 6.

1. Se entiende por riberas las fajas laterales de los cauces públicos situadas por encima del nivel de aguas bajas y por márgenes los terrenos que lindan con los cauces.

2. La protección del dominio público hidráulico tiene como objetivos fundamentales los enumerados en el artículo 92 del texto refundido de la Ley de Aguas. Sin perjuicio de las técnicas específicas dedicadas al cumplimiento de dichos objetivos, las márgenes de los terrenos que lindan con dichos cauces están sujetas en toda su extensión longitudinal:

a) A una zona de servidumbre de cinco metros de anchura para uso público, que se regula en este reglamento.

b) A una zona de policía de cien metros de anchura, en la que se condicionará el uso del suelo y las actividades que en él se desarrollen.

3. La regulación de dichas zonas tiene como finalidad la consecución de los objetivos de preservar el estado del dominio público hidráulico, prevenir el deterioro de los ecosistemas acuáticos, contribuyendo a su mejora, y proteger el régimen de las corrientes en avenidas, favoreciendo la función de los terrenos colindantes con los cauces en la laminación de caudales y carga sólida transportada. [...]144

A essas zonas de proteção o Real Decreto 9/2008 acrescentou as

denominadas vias de fluxo preferente, que se destinam a proteger o regime de

correntes nas chamadas avenidas (enchentes) e reduzir o risco de produção de

danos humanos e patrimoniais, razão pela qual nelas só poderão ser autorizadas

atividades que não sejam vulneráveis ao impacto das águas145.

No Brasil, como vimos, a lei da Política Nacional de Recursos Hídricos

não traz qualquer delimitação de faixas reservadas146. A proteção portanto, dever-

144 Texto consolidado disponível em: <https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-1986-10638>. Acesso em: 1 jul. 2016. 145 Conforme se lê da exposição de motivos do RD 9/2008. O artigo 9 define a zona de fluxo preferente como “aquella zona constituida por la unión de la zona o zonas donde se concentra preferentemente el flujo durante las avenidas, o vía de intenso desagüe, y de la zona donde, para la avenida de 100 años de periodo de retorno, se puedan producir graves daños sobre las personas y los bienes, quedando delimitado su límite exterior mediante la envolvente de ambas zonas”. Disponível em: <https://www.boe.es/diario_boe/txt.php?id=BOE-A-2008-755>. Acesso em: 1 jul. 2016. 146 O Código de Águas da década de 30 (Decreto nº 24.643/34) fixava somente uma servidão de trânsito para os agentes da administração pública, quando em execução de serviço: “Art. 11. São públicos dominicais, se não estiverem destinados ao uso comum, ou por algum título legítimo não pertencerem ao domínio particular; 1º,

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se-á extrair da conjugação com a legislação florestal, que arrola as faixas

marginais ao longo dos cursos d’água dentre as áreas de preservação permanente

(APP), definidas estas como as áreas que, cobertas ou não por vegetação nativa,

têm a “função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a

estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o

solo e assegurar o bem-estar das populações humanas” 147.

Nessas áreas a vegetação deverá ser mantida e, caso tenha sido

suprimida, incumbirá ao proprietário, possuidor ou ocupante a qualquer título (bem

como eventual sucessor, por herança ou negócio jurídico) promover a sua

recomposição148. Nas APPs somente são permitidas atividades de baixo impacto

ambiental, sendo livre o acesso de pessoas e animais apenas para obtenção de

água (artigo 9º), bem como a supressão de vegetação somente poderá ser

autorizada em hipóteses de utilidade pública149 ou interesse social150 (artigo 8º).

os terrenos de marinha; 2º, os terrenos reservados nas margens das correntes públicas de uso comum, bem como dos canais, lagos e lagoas da mesma espécie. Salvo quanto as correntes que, não sendo navegáveis nem flutuáveis, concorrem apenas para formar outras simplesmente flutuáveis, e não navegáveis. [...] Art. 12. Sobre as margens das correntes a que se refere a última parte do nº 2 do artigo anterior, fica somente, e dentro apenas da faixa de 10 metros, estabelecida uma servidão de trânsito para os agentes da administração pública, quando em execução de serviço.” Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D24643compilado.htm>. Acesso em: 1 jul. 2016. 147 Redação do inciso II do artigo 3º do atual Código Florestal, Lei nº 12.651/2012. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/L12651compilado.htm>. Acesso em: 1 jul. 2016. 148 Artigo 7º do Código Florestal de 2012. 149 Definição do inciso VIII do artigo 3º do Código Florestal de 2012: “[...]VIII - utilidade pública: a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitária; b) as obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços públicos de transporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos parcelamentos de solo urbano aprovados pelos Municípios, saneamento, gestão de resíduos, energia, telecomunicações, radiodifusão, instalações necessárias à realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais, bem como mineração, exceto, neste último caso, a extração de areia, argila, saibro e cascalho; c) atividades e obras de defesa civil; d) atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na proteção das funções ambientais referidas no inciso II deste artigo; e) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal; [...]”. 150 Definição do inciso IX do artigo 3º do Código Florestal de 2012: “[...] IX - interesse social: a) as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, tais como prevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies nativas; b) a exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena propriedade ou posse rural familiar ou por povos e comunidades tradicionais, desde que não descaracterize a cobertura vegetal existente e não prejudique a função ambiental da área; c) a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais consolidadas, observadas as condições estabelecidas nesta Lei; d) a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados predominantemente por população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas, observadas as condições estabelecidas na Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009; e) implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e de efluentes tratados para projetos cujos recursos hídricos são partes integrantes e essenciais da atividade; f) as atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho, outorgadas

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67

Neste ponto, entretanto, merece destaque o retrocesso recentemente

sofrido com a edição do novo Código Florestal, no ano de 2012, após longo (mas

não exaustivo151) debate nacional marcado pela forte oposição entre a chamada

“bancada ruralista” e os ambientalistas. A nova codificação não modificou a definição

de área de preservação permanente, mas sim introduziu profunda alteração na

proteção conferida a essas áreas, em especial no que concerne às planícies de

inundação, ao modificar a forma de medição das faixas protegidas. Vejamos.

O texto de anterior152 (vigente até maio de 2012) considerava de

preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação natural

situadas:

a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será:

1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura;

2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais;

c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados "olhos d'água", qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura; [...] (grifamos)

O Código Florestal atualmente em vigor (Lei Federal nº 12.651/2012),

contudo, prevê de forma distinta:

Art. 4º. Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:

pela autoridade competente; g) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional à atividade proposta, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal; [...]”. 151 O debate segue, agora, na via judicial, como veremos adiante. 152 Lei Federal nº 4.771/65, neste particular com redação dada pela Lei nº 7.803 de 18-7-1989. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L4771.htm#art50>. Acesso em: 1 jul. 2016.

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I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros153, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de:

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

II - as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de:

a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros;

b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas;

III - as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais154, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento;

IV - as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes155, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros; [...] (grifamos)

Assim, em que pese pareça não ter havido alteração na metragem das

áreas de preservação permanente, a acurada análise revela redução significativa da

proteção conferida a tais áreas em virtude da mudança da forma de medição: deixa-

se de proteger a área ao longo dos cursos d’água desde o seu nível mais alto e

assegura-se proteção tão somente à área compreendida na metragem definida

desde a borda da calha do leito regular (que vem definido, sem precisão científica,

no inciso XIX do artigo 3º da mesma lei). Evidente, pois, o retrocesso156 da previsão

153 Incluído pela Lei nº 12.727/2012. 154 Com redação dada pela Lei nº 12.727/2012. 155 Com redação dada pela Lei nº 12.727/2012. 156 O princípio de vedação de retrocesso ambiental não é objeto do presente estudo, merecendo tratamento apartado. A esse respeito, v. MOLINARO, Carlos Alberto. Direito ambiental: proibição de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. Registre-se que tal princípio é fundamento da ADI 4903, em trâmite no Supremo Tribunal Federal.

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infraconstitucional, com redução substancial da proteção conferida às áreas de

preservação permanente.

Eis uma das razões pelas quais a nova legislação federal está sendo

questionada no Poder Judiciário: encontra-se em tramitação, entre outras, a Ação

Direta de Inconstitucionalidade nº 4903, promovida pelo Ministério Público

Federal157, na qual se discute justamente a adequação das novéis disposições com

relação às áreas de preservação permanente à ordem constitucional.

Enquanto não julgado tal feito, contudo, o Código Florestal, tal como se

encontra em vigor, é o instrumento fornecido pela legislação ambiental para o

enfrentamento do problema das inundações, haja vista a reserva de faixas

marginais. O fundamento da conservação dessas áreas está evidentemente

associado à proteção dos recursos hídricos e dos ecossistemas nos quais estão

inseridos, funcionando como importante instrumento no enfrentamento do problema

das inundações, considerando que essas são as áreas que serão alcançadas pelas

águas nos momentos de cheia.

Poucas são as referências do Código Florestal ao tema das inundações.

Uma delas está inserida no §14 do artigo 61-A, artigo que também é objeto de

contestação em virtude da inovação representar retrocesso na proteção ambiental.

Por tal disposição, ficou autorizada a continuidade de atividades “agrossilvipastoris,

de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de

2008”. O parágrafo citado, entretanto, ressalva a hipótese de existência de risco de

agravamento de processos erosivos ou de inundações, caso em que o poder público

deverá determinar a adoção de medidas mitigadoras que garantam a estabilidade

das margens e a qualidade da água.

Outra interface com o tema das inundações aparece quando a lei federal

trata da regularização fundiária de situações consolidadas em área de preservação

permanente, exigindo identificação das áreas consideradas de risco de inundações

157 O processo foi autuado em janeiro de 2013. Diversas organizações não-governamentais estão habilitadas como amicus curiae. No que concerne ao inciso XIX do artigo 3º, o pedido é de declaração de inconstitucionalidade ou de interpretação conforme a Constituição, no sentido de que a expressão “leito regular” seja compreendida como “leito maior”, como anteriormente previsto. A tramitação pode ser consultada em <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp>. Além da arguição concentrada de inconstitucionalidade, tramitam nos tribunais pátrios inúmeras ações coletivas com pedidos incidentais de declarações de inconstitucionalidade dos dispositivos do novo Código Florestal.

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(artigo 65) e a proposição de intervenções “para a prevenção e o controle de riscos

geotécnicos e de inundações” (artigo 64).

De registrar, por fim, que o Código Florestal prevê a declaração de outras

áreas como “de preservação permanente”, desde que declaradas de interesse social

pelo poder público com a finalidade de conter a erosão do solo e mitigar riscos de

enchentes e deslizamentos, proteger restingas, veredas ou várzeas, proteger áreas

úmidas ou “assegurar condições de bem-estar público”, entre outras elencadas no

artigo 6º do texto legislativo, revelando-se disposição de especial relevância para a

gestão do risco de inundações.

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CAPÍTULO 5

INSTRUMENTOS DE ENFRENTAMENTO DO PROBLEMA DAS

INUNDAÇÕES NO TERRITÓRIO BRASILEIRO:

O CONTROLE COM FOCO NA PREVENÇÃO DE DANOS

Tucci distingue as medidas que podem ser adotadas para controle das

inundações entre medidas através das quais o homem “modifica o rio” e outras com

as quais ele “convive com o rio”:

As medidas de controle de inundações podem ser classificadas em estruturais, quando o homem modifica o rio, e em não-estruturais, quando o homem convive com o rio. No primeiro caso, estão as medidas de controle através de obras hidráulicas, tais como barragens, diques e canalização, entre outras. No segundo caso, encontram-se medidas do tipo preventivo, tais como zoneamento de áreas de inundação, alerta e seguros.158

Quando o especialista refere que as medidas estruturais “modificam o

rio”, está seguramente se referindo a medidas estruturais intensivas. Safira De La

Sala e Eliane Guaraldo159 precisam:

As medidas estruturais intensivas são as que se referem a alterações que modificam diretamente os corpos d’água, como retificações e canalizações; já as medidas estruturais extensivas afetam o sistema hidrológico como um todo, sem constituir intervenções diretas sobre os corpos d’água – por exemplo, através da captação da água de chuva, criação de áreas verdes e a utilização de pisos permeáveis.

As medidas não estruturais, por sua vez, referem-se àquelas medidas onde “o homem busca uma convivência harmônica com o rio, através da elaboração de planos de uso e ocupação e zoneamentos de áreas de risco à inundação, sistemas de alerta e seguros-enchente” (Botelho, 2011, p. 94), que, perceba-se, dizem

158 Em capítulo de livro denominado “Inundações Urbanas”, p. 20. Disponível em: <http://4ccr.pgr.mpf.mp.br/institucional/grupos-de-trabalho/encerrados/residuos/documentos-diversos/outros_documentos_tecnicos/curso-gestao-do-terrimorio-e-manejo-integrado-das-aguas-urbanas/drenagem1.PDF>. Acesso em: 29 dez. 2016. 159 Na página 363 do artigo “Planos Diretores de Redução de Risco de Desastres: Comentários ao art. 42-A do Estatuto da Cidade”, publicado na Revista de Direito Ambiental, vol. 75, Jul - Set /2014, pp. 355 - 372.

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respeito aos diferentes momentos de gestão de desastres (prevenção, durante e pós-desastres).160

No presente capítulo analisaremos algumas dessas medidas, destacando

desde logo que o rol apresentado não pretende ser exaustivo, bem como que a

escolha entre o elenco de possibilidades não requer exclusividade. Ao contrário,

uma adequada gestão do risco de inundações – com foco na prevenção, como

proposto – pressupõe que, com as pertinentes considerações acerca de tempo,

espaço e orçamento (entre outros fatores), sejam combinadas diversas medidas.

5.1. MEDIDAS ESTRUTURAIS INTENSIVAS

As medidas estruturais intensivas são, por excelência, obras de

engenharia. Agem diretamente nos cursos d’água, servindo para acelerar o

escoamento (no caso de diques, polders e melhoramentos fluviais), retardar o

escoamento (como reservatórios e bacias de amortecimento) ou para desviar o

escoamento (desvios e retificações dos cursos d’água)161.

A figura abaixo registra alguns exemplos de utilização de medidas

estruturais:

Figura 6 - Exemplos de medidas estruturais (extensivas e intensivas)

160 A referência, segundo a bibliografia citada pelas autoras, diz respeito a BOTELHO, R. G. M. Bacias hidrográficas urbanas. In: GUERRA, A. J. T. (org.) Geomorfologia urbana. Rio de Janeiro: Bertran Brasil, 2011. pp. 71-115. 161 PINHEIRO, Adilson. Enchente e Inundação. In: SANTOS, Rozely Ferreira dos. (org.). Vulnerabilidade Ambiental – Desastres naturais ou fenômenos induzidos? Brasília: MMA, 2007. pp. 95-106.

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(Fonte: PINHEIRO, A., op. cit., p. 102)

5.1.1 RETARDO DO ESCOAMENTO

As opções mais tradicionais para retardar o escoamento das águas

fluviais são as barragens (construção de reservatórios de água, com múltiplas

funções). Na Espanha, como já mencionamos no capítulo 3, a construção de

pântanos é uma técnica muito utilizada tanto para reservação de água quanto para o

que os espanhóis denominam laminación de avenidas, que pode ser assim

sintetizada:

La laminación es un fenómeno natural que se produce en los ríos. Si no hay aportaciones o detracciones significativas de caudal en un tramo, se comprueba que las variaciones, tanto en sentido creciente como en decreciente, son menores en la sección aguas abajo que aguas arriba, es decir, se produce una atenuación en las desviaciones respecto al caudal medio. [...]

Si en el tramo hay un embalse, el efecto de la laminación suele ser mayor y depende de la superficie de espejo del agua. Algo similar sucede en las grandes llanuras de inundación en las que las áreas mojadas son mayores y el efecto de la laminación es más notable. [...]

Trabajando con los embalses se pueden disminuir de forma importante los efectos de las avenidas: se pueden aumentar los resguardos en función de las predicciones meteorológicas, desfasar las puntas de las avenidas (con lo que se evita su suma algebraica en las confluencias de varios cauces), e, incluso, convertir unos

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74

caudales perjudiciales por su elevada magnitud en un recurso utilizable cuando hay escasez.

Resumiendo, el efecto natural de atenuación de las avenidas en su circulación por los ríos se ve incrementado en los embalses de forma automática y se puede optimizar con un adecuado uso de las presas y sus embalses. (grifos no original162)

As barragens – chamadas na Espanha de embalses ou pantanos – são

utilizadas, portanto, para a redução dos fluxos de água a jusante.

No Brasil, entretanto, a construção de reservatórios geralmente esteve

associada a atividades de produção de energia, abastecimento de água, navegação

e irrigação, muito raramente apresentando a função de controle de inundações163.

5.1.2 ACELERAÇÃO DO ESCOAMENTO

Diques ou polders são alternativas estruturais intensivas de uso

recorrente no Brasil. Aplicados principalmente em grandes rios, são “muros laterais

de terra ou concreto, inclinados ou retos, construídos a uma certa distância das

margens, que protegem as áreas ribeirinhas contra o extravasamento”164.

Além dos impactos ambientais decorrentes da construção165 e da

circunstância de que muitas vezes os problemas são apenas transferidos por estas

obras de um ponto a outro da bacia hidrográfica166, no caso dos diques ainda é

preciso considerar um fator negativo adicional, que é a necessidade de prever

162 Artigo redigido por Raimundo J. Lafuente, Diretor Técnico da Confederação Hidrográfica do Ebro (Espanha). Disponível em: <http://www.iagua.es/blogs/raimundo-lafuente/%C2%BFque-es-la-laminacion-de-avenidas>. Acesso em: 4 jul. 2016. 163 Segundo TUCCI, C. E. M. Inundações Urbanas na América do Sul, cit., p. 65. O autor refere como exemplos de barragens utilizadas para controle de inundações os reservatórios da bacia do Itajaí-Açú, em Santa Catarina. 164 Descrição de TUCCI. Inundações Urbanas na América do Sul, cit., p. 80. Inundações Urbanas na América do Sul, cit., p. 72. 165 Essas obras, evidentemente, estão sujeitas a estudo prévio de impacto ambiental, conforme Resoluções 01/86 e 237/97 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA). Disponíveis respectivamente em: <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res86/res0186.html> e <http://www.mma.gov.br/port/conama/legislacao/CONAMA_RES_CONS_1997_237.pdf>. Acesso em 13 jul. 2016. 166 MAGALHÃES JR., Antônio Pereira; MARQUES, Cristiano Pena Magalhães. Artificialização de cursos d’água urbanos e transferência de passivos ambientais entre territórios municipais - Reflexões a partir do caso do Ribeirão Arrudas, Região Metropolitana de Belo Horizonte- MG, p. 3. Disponível em: <http://anpur.org.br/app-urbana-2014/anais/ARQUIVOS/GT1-181-36-20140518163550.pdf>. Acesso em 3 jul. 2016.

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mecanismos de operação e manutenção, por vezes inviabilizados (abandonados)

por seu alto custo167. Nesse panorama, o próprio dique representa risco superior ao

da inexistência da construção, já que eventual ruptura causaria danos de maior

envergadura168.

5.1.3 DESVIO DO ESCOAMENTO

Inúmeros são os casos de enfrentamento de problemas pontuais de

inundações (ou de alagamentos e enxurradas) através da execução de grandes

obras de canalização ou de retificação de cursos hídricos. Com efeito, além das

ameaças de extravasamento, também os problemas sanitários (decorrentes da

poluição) serviram muitas vezes para dar fundamento à artificialização de cursos

d’água, com o uso de dessas tipologias de medidas estruturais intensivas, que

aceleram o escoamento das águas169.

Na Espanha há um caso emblemático merecedor de menção: o desvio do

leito do rio Turia, na cidade de Valencia, capital da província de mesmo nome, na

Comunidade Valenciana. O espaço que hoje é um ajardinado que corta o centro da

cidade (com extensão de 8 quilômetros de área verde) é conhecido por antiguo

cauce del río Turia, pela singela razão de que ali, há 50 anos, passava um

importante curso d’água. Uma mostra do atual mapa da cidade:

Figura 7 – Mapa com recorte da área central da cidade de Valencia, Espanha

167 Esse é o caso, por exemplo, do sistema de diques existente no município de São Leopoldo, na bacia hidrográfica do Rio dos Sinos, no estado brasileiro do Rio Grande do Sul. Vide notícia recente em <http://www.jornalvs.com.br/_conteudo/2016/03/noticias/regiao/301554-diques-ameacados-pela-falta-de-manutencao-em-sao-leopoldo.html>. Acesso em: 3 jul. 2016. 168 O que ocorreu em agosto de 2013 na cidade de Porto Alegre, capital do estado do Rio Grande do Sul: o rompimento de um dique desalojou aproximadamente 2000 pessoas, como se vê da notícia publicada em: <http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2013/08/alagamento-deixa-centenas-de-desabrigados-em-porto-alegre.html>. Acesso em: 4 jul. 2016. 169 Segundo TUCCI, C. E. M. Inundações Urbanas na América do Sul, cit., p. 65.

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(Fonte: Internet170)

No ano de 1957 uma grande enchente do rio Turia inundou a cidade de

Valencia, causando 81 mortes e deixando um prejuízo de 10 bilhões de pesetas

(moeda espanhola anterior ao euro171). Oito meses depois, o governo espanhol

anunciava que o curso d’água seria desviado para fora da cidade. As obras tiveram

início em 1964 e conclusão em 1973.

Os terrenos do antiguo cauce del río Turia (antigo leito do rio Turia) foram

entregues pelo Rei Juan Carlos I à cidade de Valencia no ano de 1976172:

Figura 8 – Fotografia atual do antigo leito do Rio Turia (Valencia, Espanha)

170 Disponível em: <http://www.lonelyplanet.com/maps/europe/spain/valencia-city/map_of_valencia-city.jpg>. Acesso em 3 jul. 2016. 171 Equivalentes a 60 milhões de euros. 172 Informações colhidas em interessante artigo escrito por Antonio Esteban, publicado no jornal espanhol El País em 2006, por ocasião dos 30 anos da conclusão das obras. Disponível em: <http://elpais.com/diario/2006/12/15/cvalenciana/1166213896_850215.html>. Acesso em 3 jul. 2016.

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(Fonte: Internet173)

Hodiernamente, essas medidas intensivas têm enfrentado diversas

críticas, tanto por parte da comunidade científica como da sociedade civil. Com

efeito, algumas delas revelam seus interesses fundamentalmente políticos e

econômicos, além de causarem impactos negativos no ambiente (tanto urbano como

natural). A grande obra espanhola referida tampouco é imune a tais críticas174.

Por outro lado, como já referimos, é comum que tais medidas apenas

transfiram os problemas para outro ponto da cidade ou da bacia hidrográfica:

As obras de canalização e retificação visam promover o rápido escoamento das águas, apenas transferindo os problemas de inundação e as águas poluídas para as localidades situadas à jusante. Estas intervenções paliativas mascaram os reais problemas urbanos, apenas minimizando-os e gerando outros impactos negativos.175

173 Disponível em: <http://mural.uv.es/pautoca/pagina%20web%20clase/imagenes/jardin.jpg>. Acesso em: 3 jul. 2016. 174 Como se vê do artigo “La ciudad que perdió su río”, subscrito pelo consultor ambiental e membro da Fundação Nueva Cultura del Agua, citado na nota 152. 175 Op. cit., p. 8.

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78

De fato, toda grande obra de engenharia pressupõe impacto ambiental176,

além de muitas vezes criar uma falsa sensação de segurança – de todo indesejável,

pois pode dar ensejo a ocupações de áreas inundáveis que futuramente resultarão

em danos significativos177.

5.2. MEDIDAS ESTRUTURAIS EXTENSIVAS

Além das medidas estruturais intensivas, existem alternativas de natureza

extensiva (igualmente estruturais) que – ao invés de atuar diretamente nos cursos

d’água – agem em nível de bacia hidrográfica, interferindo de alguma forma no ciclo

hidrológico.

5.2.1 COBERTURA VEGETAL

É preciso reconhecer, por outro lado, que uma eficaz medida estrutural

extensiva para o controle de inundações é a cobertura vegetal: com efeito, a

existência de superfícies vegetadas – assim como de áreas úmidas – ao longo da

bacia (não apenas a montante, como parece mais evidente) tem influência clara no

ciclo hidrológico, em função do amortecimento das águas e da consequente redução

do escoamento. Ademais, a vegetação fixadora afigura-se fundamental para evitar a

erosão do solo, que é fator de agravamento das inundações em virtude do

assoreamento produzido nos cursos d’água.

O reconhecimento da importância das áreas verdes deu ensejo ao

desenvolvimento de estudos para implantação da chamada “infraestrutura verde”

nas áreas urbanas, como forma de recriar os serviços ecológicos (outrora

desempenhados por áreas naturais) perdidos em decorrência da urbanização. A

origem do termo vem do Livro Branco da União Europeia178 (Adaptação às

alterações climáticas: para um quadro de ação europeu), que assim define:

176 Além dos casos já citados em nota de rodapé no capítulo 3, com relação ao tema das transposições de cursos d’água no Brasil, também tramitam no país diversas demandas judiciais decorrentes dos impactos socioambientais da construção de grandes obras de engenharia, como barragens e represas. Emblemático é o caso de Belo Monte, cujas informações estão disponíveis em: <http://arte.folha.uol.com.br/especiais/2013/12/16/belo-monte/>. Acesso em: 7 jul. 2016. 177 TUCCI, C. E. M. Inundações Urbanas na América do Sul, cit., p. 80. 178 Lançado em 2009 pela Comissão Europeia. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX:52009DC0147 Acesso em: 6 jul. 2016.

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79

A Infra-Estrutura Verde é a rede interligada de zonas naturais, incluindo determinados solos agrícolas, nomeadamente corredores verdes, zonas húmidas, parques, reservas florestais e comunidades vegetais indígenas, bem como zonas marinhas que regulam, de forma natural, os caudais de águas pluviais, as temperaturas, o risco de inundação e a qualidade da água, do ar e dos ecossistemas.

Além das funções associadas ao controle da temperatura (redução do

efeito de “ilhas de calor”179 das cidades), à captura de gases de efeito estufa e ao

abrigo de fauna, as árvores também são essenciais para infiltração da água no solo

e para fixação do próprio solo, evitando a erosão e o assoreamento dos cursos

d’água dela decorrentes – razão pela qual a existência de cobertura vegetal é

fundamental instrumento para o controle de inundações.

5.2.2 SISTEMAS DE DRENAGEM URBANA SUSTENTÁVEL (SUDS)

Ao longo das últimas décadas – notadamente na Europa e nos Estados

Unidos – vem sendo desenvolvidos estudos acerca do que se convencionou

chamar “sistemas urbanos de drenagem sustentável”180 – ou SUDS, como doravante

os denominaremos.

Conforme analisado no capítulo 2 do presente estudo, a urbanização

impermeabiliza o solo, reduzindo a capacidade de infiltração da água e aumentando

o volume e a velocidade de escoamento, sobrecarregando os sistemas tradicionais

de drenagem e ocasionando o aumento da temperatura ambiente.

Assim, a filosofia dos SUDS é justamente reproduzir, da forma mais fiel

possível, o ciclo hidrológico natural anterior à ação antrópica: a ideia é minimizar os

impactos da urbanização tanto no que concerne à qualidade quanto à quantidade do

179 Fenômenos evidenciados nos centros urbanos: “Ao contrário de outros fenômenos climáticos, em que a ação do homem apenas interfere ou agrava uma situação preexistente, as ilhas de calor são puramente antrópicas. Elas ocorrem graças à remoção da cobertura vegetal nas cidades e a construção de grandes aglomerados urbanos, formando verdadeiros ‘labirintos’ de refletores, que refletem a luz e a radiação do sol, bem como impedem a circulação do ar, o que proporciona o aumento do calor. Além disso, outro fator determinante para a ocorrência das ilhas de calor é a poluição gerada nas áreas centrais das grandes cidades. Ela inibe a dispersão de calor, o que também contribui para a elevação das temperaturas.” (Disponível em: <http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/ilhas-calor.htm>. Acesso em: 6 jul. 2016). 180 Na Espanha é usada a expressão sistemas urbanos de drenaje sostenible (SUDs), enquanto que em outros locais os mesmos equipamentos se denominam BMPs (Best Management Practices) ou WSUD (Water Sensitive Urban Design), entre outras acepções.

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escoamento. Mas não apenas para isso servem os SUDS: como veremos, os

sistemas tem a dupla função de reduzir os riscos associados ao impacto das águas

e, ao mesmo tempo, promover integração paisagística (com valores sociais e

ambientais, portanto).

Os objetivos dos SUDS podem ser assim elencados181:

Proteger los sistemas naturales: proteger y mejorar el ciclo del agua en entornos urbanos.

Integrar el tratamiento de las aguas de lluvia en el paisaje: maximizar el servicio al ciudadano mejorando el paisaje con la integración de cursos y/o láminas de agua en el entorno.

Proteger la calidad del agua: proteger la calidad de las aguas receptoras de escorrentías urbanas.

Reducir volúmenes de escorrentía y caudales punta: reducir caudales punta procedentes de zonas urbanizadas mediante elementos de retención y minimizando áreas impermeables.

Incrementar el valor añadido minimizando costes: minimizar el coste de las infraestructuras de drenaje al mismo tiempo que aumenta el valor del entorno.

A estes objetivos se poderia acrescentar o da preservação dos sistemas

de drenagem tradicionais, haja vista que a redução do escoamento, com a retenção

de águas através de outras estruturas, evita a sobrecarga do sistema instalado (em

regra geral subdimensionado).

Pode ser esperado, ademais, um impacto positivo em estações de

tratamento de efluentes porventura existentes, haja vista que a implantação de

SUDS pressupõe a redução do carregamento de poluentes, ínsito ao escoamento

superficial182.

181 Como fazem PERALES MOMPARLER, S. e ANDRÉS-DOMÉNECH, I. no artigo LOS SISTEMAS URBANOS DE DRENAJE SOSTENIBLE: UNA ALTERNATIVA A LA GESTIÓN DEL AGUA DE LLUVIA, p. 4. Disponível em: <http://ovacen.com/wp-content/uploads/2015/05/gestion-del-agua-en-el-planeamiento.pdf> Acesso em: 4 jul. 2016. 182 No Brasil, atualmente, muito pouco ou nada se fala sobre a questão da contaminação das águas: o escoamento superficial é visto como problema relacionado a alagamentos e inundações (no que concerne a quantidade de água, portanto), mas ainda não é visto como fator contaminante. Na Europa, entretanto, o tema já é tratado de forma ampla, como se vê da Diretiva Marco de Água e da implantação de SUDS que tem por objetivo primordial a manutenção da qualidade das águas.

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De fato, esclarece Arturo Trapote Jaume183 que em períodos de tempo

seco diversos contaminantes vão se acumulando em pavimentos e telhados

(sedimentos, matéria orgânica, nutrientes, microrganismos patogênicos, metais entre

outros). Com a chuva, são arrastados pelo escoamento superficial até a rede de

drenagem e – direta ou indiretamente – acabam chegando aos cursos hídricos. Os

impactos negativos dessas descargas nos corpos hídricos são importantes:

diminuição do oxigênio dissolvido (risco de mortalidade de espécies aquáticas),

aumento de nutrientes (risco de eutrofização), contaminação por patogênicos e

elementos tóxicos (riscos à saúde e à cadeia trófica), bem como o aumento dos

custos de tratamento da água.

A principal característica dos SUDS, contudo, reside na infiltração: através

da promoção ou maximização da captação da água da chuva é possível reter na

origem (evitando ou reduzindo o escoamento superficial) e também preservar a

qualidade das águas. No últimos anos, portanto, inúmeros sistemas vem sendo

aplicados no mundo (notadamente em países da Europa, nos Estados Unidos, no

Japão e na Austrália) visando justamente o aumento da capacidade de infiltração da

água da chuva.

O GITECO (Grupo de Investigação de Tecnologia da Construção da

Escola de Caminhos, Canais e Portos de Santander), da Universidade de

Cantábria/Espanha184, divide os SUDS segundo suas características em:

Sistemas de infiltración o control en origen:

- Superficies permeables

- Pozos y zanjas de infiltración

- Depósitos de infiltración

Sistemas de transporte permeable

- Drenes filtrantes o drenes franceses

- Cunetas verdes

183 TRAPOTE JAUME, Arturo. SISTEMAS URBANOS DE DRENAJE SOSTENIBLE (SUDS): IMPLICACIONES HIDROLÓGICO-HIDRÁULICAS Y AMBIENTALES. In: BRANDÃO, P. T.; ESPÍRITO SANTO, D. (coord.); SOUZA, M. C. S. A.; JACOBSEN, G. (org.). Direito, desenvolvimento urbano e meio ambiente [recurso eletrônico]. Itajaí: UNIVALI, 2016. pp. 115-137. 184 Artigo SISTEMAS URBANOS DE DRENAJE SOSTENIBLE. SUDS, p. 11. Disponível em: <http://docplayer.es/11160333-Sistemas-urbanos-de-drenaje-sostenible-suds.html>. Acesso em: 5 jul. 2016.

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- Franjas filtrantes

Sistemas de tratamiento pasivo

- Depósitos de detención

- Estanques de retención

- Humedales artificiales

A seguir, analisaremos cada uma dessas tipologias, aportando exemplos

ilustrativos185:

a) Telhados e terraços verdes186: sistemas com cobertura vegetal

aplicáveis a telhados e terraços, de forma a interceptar e reter as águas pluviais,

reduzindo o volume de escoamento. Também tem a função de retenção de

contaminantes e funcionam como isolante térmico, compensando o efeito de “ilha de

calor” decorrente da urbanização.

Figura 9 – Componentes de telhados e terraços verdes

185 Descrições extraídas de MOMPARLER, Sara P. e ANDRÉS-DOMÉNECH, I. LOS SISTEMAS URBANOS..., cit., p. 6-8. 186 Essa é uma tipologia de SUDS que se encontra em utilização – de forma bastante pontual – no Brasil, aliada ao uso – também pontual – de pisos permeáveis em estacionamentos. Além dessas poderíamos citar a construção de “piscinões” (reservatórios de retenção de água) como em Santo André/SP. Vide ZUFFO, A. C. Vulnerabilidade Ambiental..., cit., p. 120.

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(Fonte: Internet187)

Figura 10 – Fotografias de exemplos de terraços e telhados verdes (Chicago, Estados Unidos)

(Fonte: Internet188)

b) Superfícies permeáveis: são obtidas através da implantação de

pavimentos que permitem a infiltração de água ou mesmo a captação de água para

posterior reutilização ou evacuação. Os mais conhecidos no Brasil são os chamados

“bloquetos”, que formam os pisos intertravados. Nestes, a água pode infiltrar pelas

juntas ou mesmo pela presença de gramíneas, conforme o modelo aplicado.

Figura 11 – Fotografias de superfícies permeáveis com pisos intertravados

187 Disponível em: <http://2030studio.com/wp-content/uploads/2015/02/telhado-verde-camadas2.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016. 188 Disponível em: <http://sustentarqui.com.br/wp-content/uploads/2015/08/telhados-verdes-em-chigaco-624x468.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016.

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(Fonte: Internet189)

Figura 12 – Fotografias de superfície permeável de piso intertravado com gramíneas

(Fonte: Internet190)

c) Faixas ou tiras filtrantes: faixas de solo cobertas com vegetação, de

largura variável e com pequena inclinação. São instaladas entre uma superfície

impermeável e o meio receptor do escoamento (curso d’água ou rede de drenagem).

Permitem, além da infiltração e a consequente redução do escoamento, a

sedimentação das partículas contaminantes.

Figura 13 – Fotografia de faixa filtrante contígua a uma rodovia

189 Disponível em: <http://img.olx.com.br/images/22/223528027055348.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016. 190 Disponível em: <http://ecodhome.com.br/blog/wp-content/uploads/produtos_8_4.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016.

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(Fonte: Internet191)

d) Poços ou valas de infiltração: poços e valas pouco profundos (1 a 3

m) recheados de material filtrante, que receberão o escoamento superficial ocorrido

em áreas contíguas impermeabilizadas. A concepção técnica deve prever a

completa absorção do escoamento gerado por um temporal, por exemplo.

Figura 14 – Esquema de poço e fotografia de vala de infiltração

(Fonte: Internet192)

e) Drenos filtrantes: valas pouco profundas recheadas de material

filtrante, com ou sem conduto inferior de transporte, destinadas a captar e filtrar o

191 Disponível em: <http://drenajeurbanosostenible.org/wp-content/gallery/franjas-filtrantes/c-7_-_filtration_-_filter_strips.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016. 192 Disponível em: <http://www.leer-mas.com/lallave/news43/img/biodigestor-percolacion.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016.

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escoamento de superfícies impermeáveis contíguas com a finalidade de transportá-

las a jusante. Podem permitir a infiltração e diminuição dos volumes de escoamento.

Figura 15 – Fotografia de dreno filtrante entre duas superfícies impermeáveis

(Fonte: Internet193)

f) Valas verdes: são canais superficiais lineares amplos e com inclinação,

desenhados para armazenar e transportar o escoamento superficial em baixas

velocidades, permitindo a sedimentação de partículas contaminantes. Também

podem permitir a infiltração para camadas inferiores.

Figura 16 – Fotografia de uma vala verde

193 Disponível em: <http://www.rnlagos.com/dev/wp-content/uploads/2012/01/drenaje-sostenible.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016.

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(Fonte: Internet194)

g) Depósitos de infiltração: depressões vegetadas do terreno,

desenhadas para armazenar e infiltrar gradualmente o escoamento de água gerado

em superfícies contíguas. O fluxo, então, de superficial passa a subterrâneo,

permitindo também a eliminação de contaminantes mediante filtros, adsorção195 e

transformações biológicas.

Figura 17 – Fotografia de um depósito de infiltração

(Fonte: Internet196)

h) Depósitos superficiais de detenção: depósitos superficiais

desenhados para armazenamento temporário de volumes de escoamento gerados a

montante, reduzindo os fluxos de água em momentos de pico197. Também enfrentam

a contaminação mediante sedimentação. Podem ser instalados em “zonas mortas”

ou ser associados a outros usos (recreativos ou esportivos, por exemplo).

Figura 18 – Fotografia de um depósito superficial de detenção

194 Disponível em: <http://www.weetwood.net/_images/services_sw_drainage_2.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016. 195 “Adsorver: adesão (fixação) de moléculas de um fluido (o adsorvido) a uma superfície sólida (o adsorvente). Na adsorção, as moléculas ou íons de uma substância ficam retidos (fixados) na superfície de sólidos por interações químicas e físicas. Um ótimo exemplo de substância adsorvente é o carvão ativado. Ele é usado nas Estações de Tratamento de Água (ETA’s) para retirar impurezas contaminantes como material orgânico, gases e partículas menores. A água, após passar pelos filtros de carvão ativado, sai límpida e sem cheiro.” Disponível em: <http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/quimica/adsorver-absorver-qual-diferenca.htm>. Acesso em: 5 jul. 2016. 196 Disponível em: <http://drenajeurbanosostenible.org/wp-content/gallery/depositos-infiltracion/infiltrationbasin1.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016. 197 Chamados caudales punta na Espanha.

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(Fonte: Internet198)

i) Depósitos de detenção enterrados: na ausência de superfície livre, os

mesmos depósitos de detenção podem ser construídos no subsolo. Também podem

ser aplicados nos casos em que as condições do meio não recomendam a

instalação a céu aberto. Normalmente construídos de concreto armado ou plástico.

Figura 19 – Fotografia de material plástico utilizado em depósito de detenção

(Fonte: Internet199)

Figura 20 – Fotografia de depósito fabricado em concreto armado

198 Disponível em: <https://jsancheztapetillo.files.wordpress.com/2015/08/img_3824.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016. 199 Disponível em: <https://encrypted-tbn1.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcSTYJZXrFwZ0d0cIjHL-XWlswUEQ1BiwqhLNid2FkxKVVw0PJa9dw>. Acesso em: 3 jul. 2016.

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(Fonte: Internet200)

j) Lagoas de retenção: lagoas artificiais com lâmina permanente de água

(de profundidade entre 1,2 e 2 metros) com vegetação aquática, tanto emergente

como submersa. Servem para longos períodos de retenção de escoamento (2-3

semanas) e promovem a sedimentação e absorção de nutrientes pela vegetação.

Preveem um volume adicional de armazenamento para redução dos fluxos em

momentos de pico.

Figura 21 – Fotografia de uma lagoa de retenção

200 Disponível em: <http://www.microsiervos.com/images/estanques-tormentas.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016.

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(Fonte: Internet201)

l) Wetlands (áreas úmidas/banhados): artificialmente instalados como

os anteriores, de forma a substituir uma área úmida natural, mas com menor

profundidade e maior densidade de vegetação emergente. Possuem grande

potencial ecológico, estético, educacional e recreativo.

Neste ponto cumpre referir uma experiência espanhola recente: no

primeiro semestre de 2015 foi inaugurado na cidade de Alicante (Comunidade

Valenciana) o primeiro parque inundável da Espanha202. Localizado no bairro Playa

de San Juan, palco de inundações a cada chuva expressiva, este sistema urbano de

drenagem sustentável – da tipologia wetland – reproduz com perfeição uma área

úmida.

O parque diz-se inundável porque foi projetado para recolher as águas

das riadas otoñales (enchentes de outono) típicas de Alicante. De fato, além de

201 Disponível em: <http://drenajeurbanosostenible.org/wp-content/gallery/estanques-retencion/retention-pond-seattle-high-point-neighborhood.jpg>. Acesso em: 4 jul. 2016. 202 Há notícias de implantação de parques inundáveis em Santiago do Chile (disponível em: <http://www.lacasadejuana.cl/#!INUNDANDO-SANTIAGO-El-agua-en-la-construcci%C3%B3n-de-una-mejor-ciudad/c20ln/57350bca0cf284cf21412071>. Acesso em: 5 jul. 2016) e proposta de implantação de parque inundável multiuso no município de Camboriú, no estado brasileiro de Santa Catarina (disponível em: <http://www.aderbalmachado.com.br/opiniao/2015-11-21/Parque_inundavel_necessario_e_renegado>. Acesso em: 5 jul. 2016).

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contar com lâmina d’água permanente, tem capacidade de acolhimento de 45 mil

metros cúbicos de água. Caso superado o volume, as águas podem ser desviadas

diretamente ao mar. A água recolhida, por seu turno, pode ser encaminhada a uma

estação de tratamento para reutilização ou mesmo direcionada (se de boa

qualidade) para utilização no regadio urbano. Os 30 mil metros quadrados de parque

incluem, além dos tanques, uma cascata de quatro metros de altura, bancos para

sentar, trilhas para passear e miradores para ver o próprio parque ou as montanhas

ao redor. Além disso, está conectado a outra área verde através de uma ponte203.

Figura 22 – Fotografia do Parque Inundável “La Marjal” (Alicante, Espanha)

(Fonte: fotografia da autora, obtida em visita ao local em 20 de maio de 2016)

O mais interessante desse empreendimento é que ele alia a função de

controle de inundações às funções paisagísticas, estéticas e recreativas,

transformando-se num ponto nobre da cidade – inclusive com valorização imobiliária

do entorno204. De registrar que há registro de armazenamento de 3,5 milhões de

litros de água no primeiro outono (outubro-novembro de 2015), bem como notícia de

203 Informações colhidas em: <http://www.porahinoes.es/2015/04/parque-urbano-inundable-la-marjal/>. Acesso em: 5 jul. 2016. 204 Maiores informações sobre o parque, inclusive com vídeos e plantas do projeto, disponíveis em: <http://www.aguasdealicante.es/ParqueLaMarjal>. Acesso em: 4 jul. 2016.

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visualização no parque de exemplares de Martim Pescador, uma ave protegida que

nunca antes havia sido vista nas cercanias de Alicante205.

Da análise das tipologias apresentadas, extrai-se que o que distingue os

SUDS dos sistemas tradicionais de drenagem urbana não é, seguramente, apenas a

estética. Ana Abellán206 assim elenca as diferenças que considera essenciais:

La visión que se tiene del agua de escorrentía. Mientras que en el drenaje convencional ésta se considera como un inconveniente a eliminar, en los sistemas de drenaje sostenible pasa a ser un recurso con varias utilidades (recargar un acuífero, dar valor paisajístico a una zona, etc)

El drenaje sostenible sirve para gestionar no sólo el caudal de escorrentía, sino también la carga contaminante que arrastra, algo de lo que el convencional no se ocupa.

Usa varios medios para la gestión del caudal, aparte de la evacuación, se emplea la infiltración, la filtración o la evapotranspiración, mientras que el drenaje convencional se limita a transportar el agua de escorrentía fuera del lugar de origen.

En general, los sistemas de drenaje sostenible requieren de una inversión inferior a las necesarias en el drenaje convencional.

Algunas de las técnicas incluidas en los sistemas de drenaje urbano sostenible ofrecen una mejora paisajística en el lugar donde se emplazan, lo que nunca ocurre con el drenaje convencional.

Cumpre registrar, por fim, as conclusões do GITECO acerca dos SUDS:

Los SUDS se presentan como un elemento integrador ciudad-naturaleza muy importante que ha de ser considerado como una herramienta más a la disposición de los encargados del diseño urbano.

Con la implantación de SUDS se da solución a los problemas ocasionados por las aguas pluviales relativos a la cantidad; disminuyendo el riesgo de inundaciones localizadas gracias a la laminación ofrecida por estos sistemas, controlando la punta del caudal y aumentado el tiempo de concentración correspondiente.

Los SUDS proporcionan beneficios adicionales a los ofrecidos por los sistemas de drenaje convencional, como el tratamiento natural de las aguas pluviales, obteniendo unas calidades aptas

205 Conforme notícia disponível em: <http://www.laverdad.es/alicante/201601/02/parque-inundable-marjal-almaceno-20160102190253.html>. Acesso em: 5 jul. 2016. 206 Artigo Drenaje urbano sostenible disponível em: <http://www.iagua.es/blogs/ana-abellan/drenaje-urbano-sostenible>. Acesso em: 4 jul. 2016.

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para su vertido directo a los medios receptores, sin necesidad de pasar por las depuradoras y evitando la contaminación difusa de los medios naturales.

Con el uso de SUDS se revaloriza el entorno urbano como consecuencia de la posibilidad de recuperar zonas de frágil equilibrio, como son las que tienen un déficit en recursos hídricos por la sobreexplotación que sufren, mediante la valorización de las aguas de lluvia en la recuperación de acuíferos y humedales en vías de desaparición.

Además, todo lo anteriormente dicho repercute de forma positiva apreciable en los costes económicos de construcción, gestión y mantenimiento del drenaje urbano, aspecto que habría de ser tomado en consideración por todos los participantes en el diseño urbano para una pausada reflexión.

Los SUDS no implican la eliminación de los sistemas de drenaje tradicionales, pueden ser un complemento y nunca una competencia para estos sistemas.

Es fundamental establecer la diferenciación entre tratamiento cuantitativo y cualitativo de las aguas, y asignar costes y beneficios en cada caso para obtener una visión integral de la mejor solución posible.

Un buen funcionamiento requiere un buen mantenimiento, al igual que sucede con todos los sistemas de drenaje convencional.

Los SUDS son sistemas que funcionan en cadena, por esta razón, es necesario integrar el diseño urbano en su globalidad para dar una respuesta correcta a todo el conjunto.207

Assim, da análise do sistema proposto e de suas tipologias, verificam-se

todos os benefícios que podem derivar de sua implantação. A intenção dos SUDS é,

portanto, compatibilizar o desenvolvimento urbano com a natureza, gerando cidades

mais sustentáveis.

5.3. MEDIDAS NÃO ESTRUTURAIS

As medidas estruturais até o momento analisadas, desde as mais

tradicionais (intensivas) até as mais inovadoras (SUDS) – em maior ou menor

escala, de acordo com as peculiaridades de cada tipo e também do contexto em que

estariam inseridas – demandam para sua execução dois fatores fundamentais:

tempo e custo. Algumas delas, aliás, demandam muito tempo e muito custo

207 Cit., pp. 19-20.

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(orçamentário) para execução da obra. Algumas alternativas, ademais, contam com

um complicador adicional: a necessidade de disponibilidade de espaço físico.

Não fosse isso suficiente, impende considerar que a execução dessas

medidas estruturais, seja de natureza intensiva ou extensiva – não afasta de todo o

risco de inundação: servem para amenizar e promover algum controle, mas sempre

haverá um risco residual, haja vista que nenhum sistema é garantia de total solução

para os problemas de inundação – que, como dissemos alhures, são potencializados

por fatores meteorológicos e geológicos, de natureza cambiante (mormente em

realidade de aquecimento global) e em certa medida imprevisíveis.

Como alternativa às medidas estruturais ou – ainda melhor – como

aliadas a estas, existe um gama de medidas não estruturais que podem – e devem –

ser utilizadas para uma eficiente gestão do risco de inundações. Se mais não fosse,

ao menos para administração do risco residual, sempre presente em qualquer dos

sistemas de controle que se possa adotar.

Nesta quadra, convém que tratemos de algumas dessas medidas (ainda

que sem pretensão de exaurimento do tema), de natureza não estrutural, que

merecem especial atenção no enfrentamento do problema das inundações urbanas.

Considerando que o foco do presente trabalho é a prevenção, desde logo

registramos que não serão abordados os temas – sem dúvida relevantes para uma

gestão integral – da implantação de sistemas de alerta e evacuação (afetos aos

planos de proteção e defesa civil) ou mesmo da previsão de outros instrumentos de

remediação, como seguros para recuperação das áreas atingidas (concernentes à

necessária resiliência208 das cidades).

208 Resiliência é um termo que vem sendo empregado para a preparação das cidades para o enfrentamento dos desastres. Com esse foco, o Escritório das Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres (UNISDR) lançou uma campanha chamada “Desenvolvendo Cidades Resilientes” (disponível em: <http://www.unisdr.org/campaign/resilientcities/>. Acesso em 14 jul. 2016), que tem o objetivo de ajudar os governos locais a reduzir o risco e aumentar a resiliência urbana através da aplicação do Marco de Sendai para a Redução do Risco de Desastres 2015-2030 (disponível em: <http://unisdr-cerrd.wikispaces.com/file/view/Sendai_Framework_for_Disaster_Risk_Reduction_2015-2030%20%28Portugues%29%20Versao%2031MAI2015.pdf/552651426/Sendai_Framework_for_Disaster_Risk_Reduction_2015-2030%20%28Portugues%29%20Versao%2031MAI2015.pdf>. Acesso em 14 jul. 2016). Segundo o UNISDR, são consideradas resilientes as cidades que têm capacidade de resistir, absorver e se recuperar de forma eficiente dos efeitos de desastres, assim como prevenir a perda de vidas e bens. Em 2014, o Brasil era o país do mundo com maior representação na campanha, com 282 municípios participantes (disponível em: <http://www.brasil.gov.br/governo/2014/10/onu-aponta-brasil-como-pais-de-maior-numero-de-cidades-resilientes-no-mundo>. Acesso em: 14 jul.2016). Em maio de 2016, 3.123 cidades participavam da

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5.3.1 COMBATE AO DESMATAMENTO E PROTEÇÃO DE ECOSSISTEMAS

Já tratamos no capítulo 2 sobre o impacto do mau uso dos recursos

naturais, dentre outros fatores, para o agravamento do problema das inundações.

No capítulo 4, por seu turno, analisamos a legislação ambiental brasileira no que

concerne às florestas e às águas, restando clara a existência de arsenal legislativo

nacional209 apto à proteção dos ecossistemas naturais.

Impende, portanto, para fazer frente ao problema das inundações, lançar

mão dos instrumentos de tutela ambiental para garantir, tanto quanto possível, a

higidez dos espaços naturais.

Como mencionado no item 5.2.1 supra, a existência de cobertura vegetal

é essencial ao ciclo hidrológico: tanto para garantia da função de evapotranspiração

quanto para a infiltração da água no solo.

Figura 23 – Esquema do ciclo hidrológico

campanha mundial (disponível em: <http://www.eird.org/camp-10-15/sobrecampana.html>. Acesso em: 14 jul. 2016). 209 Não apenas no plano da legislação federal, mas também os estados e os municípios tem competência legislativa em matéria ambiental, tal como preconizado nos artigos 23 e 24 da Constituição Federal.

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(Fonte: Internet210)

Assim, afigura-se fundamental a conservação da cobertura vegetal para o

controle de inundações, exsurgindo imperioso o combate ao desmatamento e a

proteção dos ambientes naturais. Para tanto, a unidade de planejamento, por

evidência, deve ser a da bacia hidrográfica – eleita pela legislação nacional para

gestão tanto dos recursos hídricos (inciso V do artigo 1º da Lei Federal nº 9.433/97)

quanto do risco de desastres (inciso IV do artigo 4º da Lei Federal nº 12.608/2012).

Sob este prisma, no estado brasileiro do Rio Grande do Sul, o Comitê de

Gerenciamento de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos – o

comitê de bacia mais antigo do país, registre-se – desenvolve desde o ano de 2007

um projeto de recomposição de mata ciliar no âmbito da bacia hidrográfica, tendo

por objeto a restauração das margens fragilizadas e preservação da cobertura

vegetal ainda existente.

Através desse projeto, que nasceu como “projeto piloto” e posteriormente

recebeu o nome de “VerdeSinos” em virtude de contemplação em edital do

Programa Petrobrás Socioambiental, já foram recuperados mais de 1.000 hectares

de vegetação ciliar (em mais de 600 km lineares de margens de corpos hídricos)211

ao longo da bacia hidrográfica do Rio dos Sinos, que abrange 3.696,53 km² em

extensão territorial e possui população estimada em mais de 1 milhão e trezentas mil

pessoas212.

5.3.2 PLANEJAMENTO URBANO: MAPEAMENTO DE ÁREAS INUNDÁVEIS,

ZONEAMENTO E COMPATIBILIZAÇÃO DOS PLANOS DIRETORES COM O

PLANO DE BACIA

210 Disponível em: <http://www.midisegni.it/disegni/mondo/ciclo_hidrologico.gif>. Acesso em: 5 jul. 2016. 211 Segundo dados obtidos junto ao Comitesinos – Comitê de Gerenciamento de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos. Na etapa 1 (2011-2013) do VerdeSinos logrou-se a restauração de mais de 330 hectares, enquanto que os números da etapa 2 (2014-2016) já apontam para mais de 880 hectares. Os dados da primeira etapa estão publicados na Revista VerdeSinos: restauração da mata ciliar da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos (1ª edição). A 2ª edição, com os dados de 2014-2016, está no prelo. 212 Segundo o censo de 2010 do IBGE, conforme projeção detalhada no Plano de Gerenciamento de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, páginas 77-78. Disponível em <http://www.comitesinos.com.br/wp-content/uploads/2014/09/SEMA_SINOS_PRHC_RT1.pdf>. Acesso em: 26-1-2016.

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Para promover uma efetiva gestão do risco de inundações, além de

conhecer os instrumentos normativos à disposição do administrador é preciso fazer

uso da ferramenta do planejamento, já muitos dos problemas aqui relatados

decorrem essencialmente da falta de planificação local e regional.

Há razões para essa carência: algumas de natureza técnica (pouco

conhecimento técnico sobre o tema das inundações) e outras de natureza política

(má gestão administrativa em todas as esferas, ausência de conhecimento cidadão

sobre o problema). Dentre estas, contudo, cabe destacar um apontamento de

Tucci213 da maior relevância: “desgaste político para o administrador público,

resultante do controle não-estrutural (zoneamento), já que a população está sempre

esperando uma obra hidráulica”.

De fato, no Brasil ainda contamos com a “cultura” das grandes obras de

engenharia como únicas soluções para os problemas hidrogeológicos, sendo

recorrente a opção por alternativas estruturais (em grande parte intensivas) para a

tentativa de controle das inundações.

Por outro lado, as medidas não estruturais de zoneamento nem sempre

recebem a simpatia dos administrados. A definição dos usos possíveis em

determinado espaço do solo (urbano, de expansão urbana ou rural) normalmente

encontra óbices em interesses econômicos – seja por prévia instalação, seja por

especulação imobiliária.

A ferramenta, contudo, é fundamental à ordenação do espaço urbano. E,

numa pretensa gestão de riscos, além do uso dos demais instrumentos urbanísticos

já mencionados neste estudo, afigura-se essencial o mapeamento das áreas de

risco (de inundações ou de outra natureza) e seu apropriado zoneamento. As ações,

esclareça-se, são distintas: mapear é identificar as áreas; zonear é definir os usos

possíveis, os permitidos e os vedados.

Um exemplo de mapeamento pode ser visto através do desenvolvimento,

a nível nacional, do Mapa de Vulnerabilidade a Inundações pela Agência Nacional

213 TUCCI, C. E. M. Inundações Urbanas, cit., p. 21.

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de Águas (ANA), disponível no portal do Sistema Nacional de Informações sobre

Recursos Hídricos214:

Figura 24 – Mapa de Vulnerabilidade a Inundações – Brasil

(Fonte: ANA)

No mesmo portal está disponível o Atlas de Vulnerabilidade a Inundações

do Rio Grande do Sul, onde se vê a identificação de 1.392 trechos inundáveis no

estado, 473 dos quais (34%) considerados de alta vulnerabilidade a inundações

graduais, 391 trechos (28%) de média vulnerabilidade e 528 (38%) de baixa

vulnerabilidade:

Figura 25 – Atlas de Vulnerabilidade a Inundações – Rio Grande do Sul

214 O Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos (SNIRH) é um dos instrumentos da Lei Federal nº 9.433/97, que estabelece a Política Nacional de Recursos Hídricos no Brasil. Trata-se de um amplo sistema de coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações sobre recursos hídricos, bem como fatores intervenientes para sua gestão. A Agência Nacional de Águas (ANA) é a entidade federal responsável pela coordenação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) e do SNIRH, como determina o artigo 4º, inciso XIV da Lei Federal nº 9.984/00. Disponível em: <http://www2.snirh.gov.br/home/>. Acesso em: 7 jul. 2016.

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(Fonte: ANA)

No que concerne à Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos verifica-se a

seguinte situação:

Figura 26 – Aproximação para Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos

(Fonte: ANA)

Das legendas extraem-se os graus de vulnerabilidade:

Figura 27 – Legenda (Atlas de Vulnerabilidade a Inundações – Rio Grande do Sul)

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(Fonte: ANA)

Figura 28 – Legenda (Atlas de Vulnerabilidade a Inundações – Rio Grande do Sul)

(Fonte: ANA)

Desse mapeamento depreende-se tratar-se a região de local de alto risco

de inundações, razão pela qual imperioso se mostra o mapeamento das áreas

(considerando que o existente diz respeito apenas a trechos de cursos d’água

sujeitos a enchentes, não estando delimitadas as áreas atingidas pelas inundações)

e, em sequência, o zoneamento pertinente.

De observar, por sua absoluta pertinência, que desde a edição da Lei da

Política Nacional de Proteção e Defesa Civil estão os municípios obrigados, por

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força do artigo 8º daquele diploma legal, a identificar e mapear as áreas de risco de

desastres, não havendo qualquer condicionamento desta obrigação à implantação

do cadastro de que trata o artigo 6º ou a regulamentação posterior. Assim, desde a

vigência da PNDEC (abril de 2012) estão os municípios obrigados a realizar o

mapeamento das áreas sujeitas a inundação.

Independentemente das atuações (ou omissões) das municipalidades,

contudo, no âmbito da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, no Rio Grande do Sul,

esse mapeamento já é, em parte, uma realidade. Com efeito, o mapeamento da

planície de inundação da calha principal do Rio dos Sinos está sendo desenvolvido

dentro de um subprojeto215 do mencionado Projeto VerdeSinos.

Através da Deliberação CBHSINOS062/2015, de 12 de novembro de

2015, a Plenária do Comitê de Bacia, decidiu pela validação do estudo e sua adoção

como referência cartográfica, encaminhando-a ao Conselho Estadual de Recursos

Hídricos para que, aprovada, receba força de lei216.

A partir dessa deliberação, por outro lado, e considerando que também

estão em desenvolvimento estudos técnicos para gestão das inundações no âmbito

de toda a bacia hidrográfica217, o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul,

através da Promotoria Regional da Bacia do Rio dos Sinos, expediu

recomendação218 aos municípios integrantes da parte baixa (trecho inferior) da bacia

para suspensão de todos os atos administrativos que interfiram ou possam interferir

na planície de inundação até final validação da conclusão dos estudos em

andamento, que também com participação do Comitê de Bacia.

215 Denominado “Estudos hidro-econômicos para preservação de áreas úmidas na bacia hidrográfica do Rio dos Sinos”, sob coordenação do Dr. Carlos André Bulhões Mendes, Professor Titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul com atuação no ensino de graduação (Engenharia Civil, Engenharia Ambiental e Engenharia Hídrica) e pós-graduação (Mestrado e Doutorado) no Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) e Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional (PROPUR). 216 Vide notícia disponível em: <http://www.comitesinos.com.br/2015/11/mapa-das-areas-inudaveis/>. Acesso em: 22 fev. 2016. Em maio de 2016 foi aprovada em plenária do Comitesinos a segunda etapa do mapeamento, conforme notícia disponível em: <http://www.comitesinos.com.br/2016/05/plenaria-aprova-restante-do-mapeamento-de-areas-umidas/>. Acesso em: 7 jul. 2016. A ferramenta de busca está disponível em: <http://www.comitesinos.com.br/risco/>. Acesso em: 7 jul. 2106. 217 A contratação de empresa especializada, a cargo da METROPLAN e com recursos oriundos do Ministério das Cidades, visa à elaboração de "ESTUDO DE ALTERNATIVAS E PROJETOS PARA MINIMIZAÇÃO DO EFEITO DAS CHEIAS NA BACIA DO RIO DOS SINOS." Ver notícias em <http://www.metroplan.rs.gov.br/busca/?sinos>. Acesso em: 23 fev. 2016. 218 Vide notícia disponível em: <https://www.mprs.mp.br/noticias/id41036.htm?impressao=1>. Acesso em: 20 mar. 2016.

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Isso porque, a partir da edição do Plano de Recursos Hídricos no ano de

2014, devem todos os municípios integrantes da Bacia Hidrográfica do Rio dos

Sinos considerar suas disposições em quaisquer decisões político-administrativas,

bem como adaptar suas legislações municipais à nova regulação regional.

De fato, como referido no item 4.2.2, justamente pela ausência de uma

ordenação territorial supramunicipal (item 4.1), frequentemente identifica-se conflito

entre as disposições municipais de planejamento urbano e uso do solo (legislação

municipal) e as opções regionais adotadas no âmbito da bacia hidrográfica na qual

estão inseridos os municípios (plano de bacia).

O conflito, contudo, como antecipado, é apenas aparente: a legislação

municipal deve observar o plano de recursos hídricos pertinente, ainda que editado

em momento posterior e que não tenha, de per si, força de lei. Isso porque a

compatibilização dos planos diretores com o plano de bacia é exigida pela

legislação federal, tanto pelo artigo 31 da Lei da Política Nacional de Recursos

Hídricos quanto pelo §2º do artigo 42-A do Estatuto da Cidade, introduzido pela Lei

da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil.

Délton Winter de Carvalho219 esclarece que a competência municipal para

regulação do território através do plano diretor não é absoluta, admitindo limitações

oriundas da concorrência de competências:

Administrativamente, a competência dos municípios consiste em “promover no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.” Note-se, uma vez mais, a necessidade de haver interface entre os entes municipais e os entes Estaduais e a União, uma vez que a ação de administrativa municipal de elaboração dos Planos Diretores deve ser realizada observando os zoneamentos ambientais (cfe. art. 9º, IX, da Lei Complementar nº 140/11), estes confeccionados geralmente por Estados e a União.

Assim, os Planos Diretores Urbanísticos e os Municípios sujeitos à sua obrigatoriedade apresentam uma função direta e imediata de ordenação territorial e estabelecimento dos usos do solo. Contudo, como visto, esta autonomia municipal não se faz absoluta, podendo sofrer restrições e limitações indiretas e mediatas, mesmo em matéria territorial e de usos da propriedade. [...]

219 Em artigo denominado “Aspectos normativos dos Planos Diretores de Bacia Hidrográfica e a irradiação de efeitos sobre instrumentos de ordenação territorial”, a ser publicado no livro Gestão de Bacias Hidrográficas: bases legais, publicação do Projeto VerdeSinos (no prelo).

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Assim, tanto a cartografia que sustenta a confecção dos mapas de risco, como os diagnósticos ambientais existentes em Planos de Bacia e suas restrições urbanísticas devem exercer uma influência sobre os Planos Diretores Urbanísticos, mediante uma redução considerável da discricionariedade administrativa do município na elaboração destes Planos Urbanísticos.

Conclui o autor que, após a regulamentação e implantação do cadastro

nacional de que trata o artigo 6º, VI, da PNDEC, eventual ausência de

compatibilização de plano diretor com o plano de recursos hídricos da bacia

hidrográfica a que pertence o município poderá ensejar, além de responsabilização

pessoal do administrador público, demanda judicial para promover as adaptações

necessárias na legislação municipal. Enquanto não executada pela União a

providência reclamada pelo artigo 6º, contudo, alerta para a vedação de

emissão de licenças ambientais e urbanísticas para atividades a serem desenvolvidas em áreas de risco (descritas por Planos de Bacia ou mapas de risco) bem como a possibilidade de responsabilização civil do município por omissão em caso de ocorrência de um desastre. Em ambos os casos, o fator preponderante para tais limitações urbanísticas é o conhecimento antecipado do risco, este trazido por diagnósticos que permeiam quer Planos de Bacia quer mapas de risco de desastres. (original grifado)

5.3.3 COMBATE À OCUPAÇÃO DE ÁREAS INUNDÁVEIS

A ideia que permeia todo este trabalho, no sentido de que as ações

antrópicas são responsáveis em grande parte pelos desastres que comumente

vitimizam pessoas e outros bens jurídicos, conduz ao enfrentamento do problema

das inundações com o necessário foco na prevenção das ocorrências, e não – como

tradicionalmente tem sido levado a efeito – apenas na sua remediação. Nesse

sentido, a partir da identificação das verdadeiras causas e de todos os fatores que

influenciam na ocorrência de eventos hidrológicos extremos, pode-se pautar a

atuação direcionada a uma efetiva gestão do risco.

E, para afastamento do risco, um passo fundamental é o afastamento das

pessoas dos locais de risco (com licença para a didática repetição do termo).

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Como alertam Robin Bloch, Abhas Kumar Jha e Jessica Lamond220:

À medida que a população urbana passa a representar a maior proporção da população mundial, as inundações urbanas representarão uma parte crescente do impacto total de inundação.

Portanto, inundações urbanas estão se tornando mais perigosas e mais onerosas de gerenciar devido ao tamanho da população exposta em assentamentos urbanos.

Com efeito, instrumento fundamental nessa gestão é o combate à ocupação

de áreas inundáveis. O que se depreende da análise da realidade brasileira,

contudo, é a total ausência de preocupação nessa seara: muito embora existam

instrumentos legais suficientes para o impedimento da ocupação das planícies de

inundação (por exemplo), diuturnamente estas são ocupadas de diversas formas,

sem qualquer política estatal de administração dessa realidade que – em maior ou

menor lapso temporal – será um grave problema.

Há quase duas décadas Tucci já alertava para essa carência:

Como se observa, não existe nenhum programa sistemático em qualquer nível para controle da ocupação das áreas de risco de inundação no Brasil. Há, apenas, poucas ações isoladas de alguns poucos profissionais. Em geral, o atendimento a enchente somente é realizado depois de sua ocorrência. A tendência é que o problema fique no esquecimento após cada enchente, retornando na seguinte.221

A ocupação se dá, no mais das vezes, por razões de índole social e

econômica, mostrando-se recorrente a circunstância de que a população ocupante

dessas áreas seja a de menor poder aquisitivo, muita vezes operando-se a

ocupação por mera invasão de áreas. Contado com a omissão das autoridades –

que, se mais não fosse, deveriam zelar pelo ordenamento urbano – essas pessoas

se instalam nessas áreas, aumentando ainda mais sua vulnerabilidade.

Contudo, impende observar – como já fizemos no item 2.3, aliás – que não

apenas a ocupação irregular é realidade no país, havendo uma gama de

empreendimentos regularmente instalados em áreas inundáveis. Neste caso, não

contaram apenas com a omissão do poder público, mas com uma ação deliberada

que lhes outorgou as necessárias autorizações.

220 BLOCH, Robin; JHA, Abhas Kumar; LAMOND, Jessica. Cidades e Inundações..., cit., p.20. 221 TUCCI, Carlos E. M. Água no meio urbano, p. 13. Disponível em: <http://docslide.com.br/documents/aguanomeio-urbano.html>. Acesso em: 6 jul. 2016.

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Renata Bovo Peres Ricardo Siloto da Silva222 sustentam que não se trata de

falta de planejamento, mas sim efetivamente de uma opção político-administrativa

(sic, com grifos no original):

Ao mesmo tempo em que efetivava-se um marco na história do planejamento urbano no país, o período [década de 90] contemplou uma progressão da urbanização que se traduziu em degradação ambiental, ocupação de áreas de risco ou de preservação, sem infra-estruturas mínimas. Não se tratava, entretanto, de ausência de planejamento, mas sim, de opções de planejamento e de uma interação entre processos socioeconômicos e práticas políticas que constituíram um modelo excludente (Brasil, 2005).

Essa pressão é ainda atual: além de muitas dessas áreas já estarem

completamente urbanizadas, inclusive contando com aportes do poder público para

regularização fundiária, revela-se costumeira a previsão de zonas de expansão

urbana sobre áreas sabidamente inundáveis no planejamento municipal223.

Assim, urge que se enfrente a questão com vistas ao impedimento da

ocupação de áreas inundáveis – planícies de inundação ou outras áreas úmidas.

Não por outra razão, no âmbito do já referido Projeto VerdeSinos, através de

mediação realizada pelos Ministério Público Federal e pelo Ministério Público do

Estado do Rio Grande do Sul, pela Promotoria Regional da Bacia do Rio dos

Sinos224, logrou-se promover a firmatura de um Termo de Cooperação entre o

Comitê de Bacia Hidrográfica (Comitesinos) e o agente financiador Caixa Econômica

Federal (CEF), responsável pela execução financeira do programa federal “Minha

222 No artigo “A relação entre Planos de Bacia Hidrográfica e Planos Diretores Municipais: Análise de Conflitos e Interlocuções visando Políticas Públicas Integradas”, p. 7. Disponível em: <http://www.anppas.org.br/encontro5/cd/artigos/GT3-647-646-20100903160334.pdf>. Acesso em: 30 maio 2016. 223 Como recentemente foi levado a efeito no município de Canoas, no estado brasileiro do Rio Grande do Sul, na bacia hidrográfica do Rio dos Sinos: a Lei Ordinária nº 1024/1965 proibia a constituição de loteamentos residenciais em áreas sujeitas a inundação pelas cheias dos rios Gravataí e Sinos (disponível em: <https://leismunicipais.com.br/a1/rs/c/canoas/lei-ordinaria/1965/103/1024/lei-ordinaria-n-1024-1965-proibe-loteamentos-residenciais-em-areas-sujeitas-a-inundacoes-pelas-cheias-dos-rios-gravatai-e-sinos?q=1024>. Acesso em: 6 jul. 2016). O atual plano diretor, contudo, prevê zona urbanizável dentro da planície de inundação do Rio dos Sinos. Mapas disponíveis em: <http://www.canoas.rs.gov.br/site/home/pddi>. Acesso em: 6 jul. 2016. 224 Vide notícia em: <http://mp-rs.jusbrasil.com.br/noticias/222934332/regional-sinos-e-mp-federal-negociam-cooperacao-com-comitesinos-e-cef>. Acesso em: 7 jul. 2016.

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Casa, Minha Vida”225, além de ser importante agente financeiro do setor da

construção civil em geral.

Através da cooperação226, obtém-se o comprometimento do agente

financiador em abster-se de aprovar a destinação de recursos para implantação de

empreendimentos dentro da área da planície de inundação do Rio dos Sinos,

segundo a metodologia disponibilizada pelo Comitê de Bacia (mapeamento referido

no item 5.3.2).

Cabe destacar, finalmente, que a fiscalização para impedimento da

ocupação das áreas inundáveis é tarefa incumbida aos municípios pelo artigo 8º da

Lei Federal nº 12.608/2012, do qual se lê:

Art. 8º. Compete aos Municípios: [...]

IV - identificar e mapear as áreas de risco de desastres;

V - promover a fiscalização das áreas de risco de desastre e vedar novas ocupações nessas áreas; [...]

Nesse sentir, é tarefa precípua das administrações municipais zelar pela

higidez de tais áreas, atuando firmemente para impedir sua ocupação – sob pena,

inclusive, de ser responsabilizada pela omissão diante da futura ocorrência de

desastres. Os meios através dos quais atuará o poder público – seja apenas

fiscalizado, recuperando áreas públicas indevidamente ocupadas, desapropriando

terrenos, criando áreas de lazer etc. – se inserem dentro da discricionariedade

administrativa e devem ser objeto de decisão com base nas peculiaridades locais. O

dever de proteger tais áreas, contudo, mormente considerando o conhecimento

prévio da existência de risco de inundação, é decorrência de imposição da

legislação nacional, sem margem para omissões.

225 Programa federal de habitação popular regulado pela Lei Federal nº 11.977/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/L11977compilado.htm>. Acesso em 11 jul. 2016. 226 Vide notícia disponível em: <https://www.mprs.mp.br/noticias/id39682.htm>. Acesso em: 7 jul. 2016.

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CONCLUSÕES: RUMO A UMA GESTÃO DE RISCO DE

INUNDAÇÕES COM FOCO NA PREVENÇÃO DE DANOS

Ao longo da última década, o Brasil foi palco de eventos danosos de

características hidrológicas que atingiram expressivo número de pessoas (inclusive

com perda de vidas humanas) e patrimônios. Comumente denominados “desastres

naturais”, muito embora sejam efetivamente condicionados por circunstâncias

meteorológicas e geológicas e potencializados pelas mudanças climáticas em curso

no planeta, esses episódios são consequências da forma pela qual o homem ocupa

e gere o espaço: tanto pela excessiva impermeabilização do solo produzida pela

urbanização – aumentando o escoamento superficial das águas, sobrecarregando

os tradicionais sistemas de drenagem e acarretando problemas de alagamentos –

quanto pelo mau uso dos recursos naturais no âmbito da bacia hidrográfica, com

descaracterização de áreas que serviriam para retenção das águas (sejam áreas

úmidas, florestas, planícies de inundação ou outras áreas verdes) e interferência

direta em cursos d’água (por obras de engenharia, contaminação ou assoreamento).

Esses fatores antrópicos se não determinam, certamente agravam (em

magnitude e frequência) a ocorrência das inundações, cujo potencial danoso decorre

da circunstância de que, de regra, a planície de inundação (ou leito maior do rio)

está indevidamente ocupada.

Das normativas europeia e espanhola (tanto estatal quanto autonômica)

colhemos experiências legislativas de enfrentamento do problema das inundações

que poderiam – com as necessárias e pertinentes adaptações à realidade nacional e

respeitadas as peculiaridades locais e regionais, por evidência – ser replicadas em

território brasileiro (proposta de lege ferenda).

O enfrentamento do problema das inundações no ordenamento jurídico

espanhol remonta à década de 80 – no que concerne ao âmbito da defesa civil, haja

vista que o mesmo país que logrou desenvolver uma série de instrumentos para a

gestão dos recursos hídricos de modo a resolver o problema de escassez de água

presente em parte considerável do território, também sofre por vezes com situações

em que o prejuízo advém justamente da abundância. Em aparente paradoxo, as

inundações também norteiam de há muito as decisões administrativas – e, por

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conseguinte, desencadeiam processos legislativos – em território espanhol, diante

da frequência de sua incidência e dos números decorrentes, seja em pessoas

atingidas, seja em dinheiro público investido para a recuperação das regiões

afetadas.

Com competência constitucionalmente delegada para ordenação do

território, as Comunidades Autônomas também tem se ocupado da elaboração de

planos de gestão de riscos de inundação, como é o caso emblemático do

PATRICOVA, desenvolvido pela Comunidade Valenciana, em vigor desde 2003.

A integração da Espanha na Comunidade Europeia (hoje, União)

impulsionou substancialmente a legislação ambiental, representando inegável

avanço protetivo a incorporação das diretivas comunitárias ao sistema jurídico

interno. Tal circunstância é realidade em diversos pontos da legislação ambiental, e

também pode ser sentida no âmbito do enfrentamento do problema das inundações

– notadamente a partir da transposição da Diretiva 2007/60/CE do Parlamento

Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativa à avaliação e gestão dos

riscos de inundação.

O arsenal normativo à disposição dos administradores públicos espanhóis

(estatal, autonômicas e locais) – seja por imposição comunitária, seja por

desenvolvimento normativo das Comunidades Autônomas – afigura-se, pois,

substancial para enfrentamento do problema das inundações.

Sem descurar da possibilidade (quiçá necessidade) de aperfeiçoamento

nalguns pontos específicos, forçoso reconhecer a relevância da experiência

espanhola para subsidiar o tratamento da questão em terras brasileiras, onde a

temática ainda está restrita ao âmbito da proteção civil, ocupando-se a legislação e

as administrações muito mais em prever, comunicar e remediar os danos causados

do que propriamente atacar as verdadeiras causas das inundações, de modo a

efetivamente reduzir sua incidência.

À falta de uma normativa específica sobre o controle de inundações em

território brasileiro, outra proposta de lege ferenda é aqui apresentada: a retomada

do processo de elaboração de uma política nacional de ordenação territorial

certamente contribuiria para o aperfeiçoamento do sistema atual, que carece de

articulação entre diversas normas setoriais com rebatimento territorial.

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Essa norma de caráter nacional – mas com estratégias e ações a serem

desenvolvidas em diferentes esferas (municipais, estaduais, por bacias

hidrográficas, macrorregionais ou sub-regionais) – deve prever os instrumentos para

sua aplicação e constante revisão, haja vista a natureza dinâmica que devem ter

quaisquer planos na seara da ordenação territorial. É fundamental, ademais, a

efetiva participação social desde a formulação da política e durante o seu

desenvolvimento (implantação).

Num cenário de ausência dessa norma (como o atual), em contrapartida,

mister reconhecer a existência de diversos instrumentos legislativos em vigor com

implicação na ordenação territorial e relevância para o enfrentamento do problema

das inundações, como é o caso das normas de direito urbanístico, de proteção

ambiental e também às afetas à defesa civil – que, conjugadas, podem suprir de

maneira bastante satisfatória a necessidade de controle das inundações com foco

na prevenção de danos.

Uma efetiva gestão do risco de inundações – como aqui se propõe –

passa, necessariamente, pela adoção de postura jurídico-político-administrativa que

tenha por norte a redução dos danos e também o respeito à dinâmica do meio – sem

o qual nenhuma estratégia terá o sucesso garantido. O controle do risco de

inundações deve, pois, ser fundado numa gestão adequada do espaço, com

planejamento e integração de todas as políticas setoriais que tenham interferência

na questão.

A partir da identificação das ações antrópicas que contribuem para o

aumento da frequência e da magnitude desses eventos, de forma a corrigir os rumos

das ações e evitar as omissões potencializadoras de danos, impende desenvolver

um programa de ação que preveja diversas alternativas adequadas às

peculiaridades locais ou regionais. Com efeito, nenhuma das medidas apontadas no

presente estudo tem o condão de – por si só – ser a solução dos problemas de

inundação; pelo contrário, é da comunhão entre algumas dessas medidas que será

possível extrair um bom resultado na seara do controle dos riscos.

Ademais, é preciso pensar e gerir o espaço – natural e artificial – de forma

integrada: abandonar a segmentação comum às fronteiras político-administrativas e

adotar uma visão holística que contemple não apenas os fatores que influem na

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ocorrência das inundações (e, consequentemente, nos danos delas decorrentes),

mas também a bacia hidrográfica como unidade de análise e de gestão, como já

determina a legislação federal.

Neste particular exsurge a importância de promover a compatibilização

dos planos e programas municipais com os regionais: os planos urbanísticos

(diretores), ambientais, de gestão de resíduos, de saneamento, de habitação e de

proteção civil dos municípios devem estar conectados (e harmonizados) com os

planos de bacia hidrográfica e, eventualmente, com outros planos supramunicipais

porventura existentes.

Para além das preocupações atinentes à remediação dos danos

causados pelos desastres, bem como a criação de sistemas de alertas para pessoas

que já estejam sob risco iminente – que nos impelem a desenvolver cidades com

capacidade de resiliência – cumpre envidar esforços no sentido da prevenção e

redução do risco de danos causados por eventos extremos. Para tanto, impende

investir em cidades mais sustentáveis, lançando mão das mais modernas medidas

estruturais – como os sistemas de drenagem urbana sustentável (SUDS) aqui

expostos – e ainda utilizar os instrumentos não estruturais em todo seu potencial:

planejando cidades de forma ambientalmente integrada às regiões (ou bacias) nas

quais estão inseridas, prevendo as consequências das ações tanto a montante

quanto à jusante.

Ademais, é de fundamental importância que cada ação administrativa de

planejamento e gestão leve em consideração a variável das inundações: é imperioso

gerar e difundir o conhecimento técnico acerca das condições hidrológicas e

meteorológicas, para o que se afiguram essenciais os mapeamentos, as

cartografias, os estudos de inundabilidade – que servirão de base para os

zoneamentos necessários à correta ordenação do território e definição dos usos

possíveis do solo.

O impedimento da ocupação de áreas de risco, margens de cursos

d’água, planícies de inundação fluvial ou outras áreas úmidas desponta, ainda, como

prioritária medida numa eficiente gestão do risco – sobretudo aquela que tenha por

foco a prevenção dos danos causados pelas inundações, que serão maiores quanto

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mais vidas humanas e patrimônios estiverem sujeitos ao movimento das massas de

água.

De fato, a adoção do conjunto de medidas aqui proposto não pode ter a

finalidade de fazer com que a população conviva melhor com risco: pelo contrário, a

primeira providência deve ser justamente o afastamento das pessoas dos locais de

risco de inundação, de modo a permitir que os fenômenos naturais sigam ocorrendo

sem causar danos a pessoas ou patrimônios.

Os tradicionais instrumentos estruturais de intervenção na malha hídrica,

por fim, devem ser reservados àquelas excepcionais – mas reais – hipóteses em

que a ocupação de áreas inundáveis esteja inexoravelmente consolidada, como nos

casos em que cidades inteiras se estabeleceram às margens de rios e, isto posto,

resta apenas o caminho da mitigação e do afastamento dos riscos de forma artificial.

Nesse sentir, uma eficiente gestão dos riscos de inundação deve envolver

o planejamento e a adoção de políticas, estratégias, instrumentos e medidas com

vistas a prever, controlar e diminuir os efeitos adversos de fenômenos perigosos

sobre a população, os bens e serviços e o meio ambiente. A atuação deve implicar

intervenções sobre as causas da vulnerabilidade a desastres e desenvolver um

amplo programa de adaptação de políticas, estratégias e práticas – tudo de modo a

controlar o risco de inundações (sempre existente, ainda que residual) respeitando a

dinâmica do meio e com foco na prevenção e redução dos danos.

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