interrogatÓrio do rÉu por...

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INTERROGATÓRIO DO RÉU POR VIDEOCONFERÊNCIA: BREVES APONTAMENTOS Suzana Carline Schaedler Acadêmica do Curso de Direito das Faculdades Integradas Machado de Assis/ Fundação Educacional Machado de Assis – FEMA Aline Adams Mestra em Ciências Criminais (PUCRS), coordenadora do Núcleo de Pesquisas e Atividades Complementares e docente do curso de Direito da Fundação Educacional Machado de Assis – FEMA Resumo: Diante das diversas inovações tecnológicas que buscam um melhor atendimento jurisdicional, surge a videoconferência, onde juiz permanece no fórum e réu no presídio de onde serão transmitidas imagens e sons. Palavras-chave: Interrogatório, Videoconferência e Réu Abstract: Given the various technological innovations that seek a better service court, comes to video conferencing, where the judge and defendant in the forum remains in prison where they will be transmitted images and sounds. Keywords: Interrogation, Videoconference and Defendant INTRODUÇÃO O presente artigo tem por objetivo discutir a videoconferência, este novo método de interrogatório do réu, que consiste em um sistema de interrogatório on-line, onde o acusado e o juiz se comunicam por meio de áudio e vídeo, enquanto que um permanece adstrito a casa prisional e outro preside a audiência no fórum. Sendo um método inovador de interrogar, sua análise e estudo mostram-se de extrema importância, já que envolve um ato de grande relevância para a fase da instrução do processo. Entretanto, muito embora este método de interrogatório seja uma exceção à regra, consistente em o réu ser ouvido na presença do juiz, a videoconferência merece especial atenção, em função da problemática que norteia o tema. Além disso, apesar da legislação que já regulamenta o tema, este artigo objetiva colocar as posições doutrinárias acerca da problemática, considerando que há convergências sobre os benefícios e prejuízos trazidos pela utilização do método de interrogatório do réu por meio da videoconferência. Assim, este trabalho primeiramente desenvolverá o interrogatório do réu, e posteriormente, explicitará a videoconferência, com o conceito, seu desenrolar no Brasil e no mundo e as posições que norteiam o assunto. Congresso Internacional de Ciências Criminais, II Edição, 2011 116

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INTERROGATRIO DO RU POR VIDEOCONFERNCIA:

BREVES APONTAMENTOS

Suzana Carline Schaedler

Acadmica do Curso de Direito das Faculdades Integradas Machado de Assis/ Fundao Educacional Machado de Assis FEMA

Aline Adams

Mestra em Cincias Criminais (PUCRS), coordenadora do Ncleo de Pesquisas e Atividades Complementares e docente do curso de Direito da Fundao Educacional Machado de Assis FEMA

Resumo: Diante das diversas inovaes tecnolgicas que buscam um melhor atendimento jurisdicional, surge a videoconferncia, onde juiz permanece no frum e ru no presdio de onde sero transmitidas imagens e sons. Palavras-chave: Interrogatrio, Videoconferncia e Ru Abstract: Given the various technological innovations that seek a better service court, comes to video conferencing, where the judge and defendant in the forum remains in prison where they will be transmitted images and sounds. Keywords: Interrogation, Videoconference and Defendant

INTRODUO

O presente artigo tem por objetivo discutir a videoconferncia, este novo mtodo de

interrogatrio do ru, que consiste em um sistema de interrogatrio on-line, onde o acusado e

o juiz se comunicam por meio de udio e vdeo, enquanto que um permanece adstrito a casa

prisional e outro preside a audincia no frum.

Sendo um mtodo inovador de interrogar, sua anlise e estudo mostram-se de extrema

importncia, j que envolve um ato de grande relevncia para a fase da instruo do processo.

Entretanto, muito embora este mtodo de interrogatrio seja uma exceo regra, consistente

em o ru ser ouvido na presena do juiz, a videoconferncia merece especial ateno, em

funo da problemtica que norteia o tema.

Alm disso, apesar da legislao que j regulamenta o tema, este artigo objetiva

colocar as posies doutrinrias acerca da problemtica, considerando que h convergncias

sobre os benefcios e prejuzos trazidos pela utilizao do mtodo de interrogatrio do ru por

meio da videoconferncia.

Assim, este trabalho primeiramente desenvolver o interrogatrio do ru, e

posteriormente, explicitar a videoconferncia, com o conceito, seu desenrolar no Brasil e no

mundo e as posies que norteiam o assunto.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 116

1 INTERROGATRIO DO RU

Inicialmente, faz-se necessrio realizar uma breve abordagem sobre o interrogatrio

do ru.

FIOREZE1

, ao tecer comentrios iniciais acerca do interrogatrio conceitua-o da

forma que segue:

O interrogatrio um ato judicial, presidido pelo juiz, em que se indaga ao acusado sobre os fatos imputados contra ele, advindo de uma queixa ou denncia, dando-lhe cincia, ao tempo em que oferece oportunidade de defesa.

Ainda, Bonfim2

define interrogatrio dizendo:

Chama-se interrogatrio o ato processual conduzido pelo juiz no qual o acusado perguntado acerca dos fatos que lhe so imputados, abrindo-lhe oportunidade para que, querendo, deles se defenda (incidindo, nesse caso, o direito constitucional ao silncio, que no pode ser tomado como prova contra o ru).

Diante de tais definies, verifica-se que o interrogatrio do ru um meio pelo qual o

acusado conta ao juiz sua verso sobre os fatos, exercendo o direito de autodefesa.

Contudo, o ru tambm possui o direito de permanecer em silncio, direito este

garantido pela Constituio Federal de 1988, em seu art. 5, inciso XIII, onde declara que o

preso ser informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe

assegurada a assistncia da famlia e do advogado.

Por conseguinte, nota-se que o Cdigo de Processo Penal, insere ainda o interrogatrio

do ru como um meio de prova, em seu Ttulo VII, Captulo III. Ou seja, meio pelo qual o

ru pode defender-se frente ao juiz.

Necessrio mencionar, que o interrogatrio do ru realizado perante um juiz e na

audincia a regra. Contudo, diante das mudanas que sofrem a sociedade, principalmente

pela evoluo tecnolgica e pela necessidade do direito de adaptar-se a estas mudanas para

melhor atender s carncias da coletividade, surge a videoconferncia, como uma exceo ao

sistema de interrogatrio ao ru, conforme ser explanado a seguir.

1 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia no processo penal brasileiro. 2 Ed. Curitiba: Juru, 2009, p.109. 2 BONFIN, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. So Paulo: Saraiva, 2009, p. 341 .

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2 VIDEOCONFERNCIA

Inicialmente, mister realizar uma conceituao deste sistema processual de

interrogatrio do ru. Fioreze3

conceitua a videoconferncia dizendo:

Trata-se de um interrogatrio realizado a distncia, ficando o juiz em seu gabinete no frum e o acusado em uma sala especial dentro do prprio presdio, onde h uma interligao entre ambos, por meio de cmeras de vdeo, com total imagem e som, de modo que um pode ver e ouvir perfeitamente o outro.

Neste sentido, nota-se que na videoconferncia se realiza o interrogatrio via on-line,

sendo que o juiz permanece no frum e o ru no ambiente prisional, de onde sero

transmitidas as imagens de um para outro em tempo real.

Na mesma linha, Barros4

, declara:

Num estgio mais avanado do que as tais providncias de comunicao externa de andamento do processo, encontram-se outras iniciativas pioneiras de membros do Judicirio, que pretendem utilizar o avano da informtica para o propsito de oferecer a prestao jurisdicional com maior rapidez e menor custo para o Estado. Trata-se de uma novidade que tem aguado o debate envolvendo o exame de algumas garantias do processo, sendo que muitos advogados, inclusive lderes da nobre classe, j se posicionaram contrrios ao novo mtodo de formalizao de ato processual. Teleaudincia, interrogatrio on-line, videoconferncia so algumas das expresses utilizadas para identificar atos processuais praticados a distncia, presididos por juiz, na presena de defensor.

Verifica-se que este sistema de interrogatrio do ru, foi criado com o intuito de ser a

prestao jurisdicional mais rpida e para a reduo de custos para o Estado.

Contudo, apesar de trazer tais benefcios para o sistema jurisdicional, a

videoconferncia pode trazer prejuzos que vo alm da pretenso do Estado e que podem

afetar diretamente o detento.

3 DA UTILIZAO DA VIDEOCONFERNCIA

O emprego da videoconferncia no Brasil somente foi devidamente regulamentado

pela Lei n 11.900/2009. Contudo, mesmo antes desta legislao, alguns estados brasileiros j

3 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia ... p. 115. 4BARROS, Marco Antnio de. Teleaudincia, Interrogatrio On-line, Videoconferncia e o Princpio da Liberdade da Prova. Revista dos Tribunais, Ano 92, Vol. 818, Dez.2003, p. 426.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 118

faziam uso deste mtodo de oitiva on-line. Alm disso, vrios outros pases, pelo mundo

inteiro, j fazem uso da videoconferncia como meio de ouvir testemunhas ou interrogar

acusado.

Neste processo de implementao da teleaudincia, ocorreu vrios processos que

contriburam para a evoluo do sistema. Veja-se.

3.1 Do Uso do Interrogatrio On-Line no Brasil

O interrogatrio do ru pela videoconferncia passou a ser regulamentado no Brasil,

pela Lei n 11.900, sancionada em 08 de janeiro de 2009, pelo Presidente da Repblica, Lus

Incio Lula da Silva, sendo posteriormente, no dia 09 de janeiro publicada no Dirio Oficial

da Unio.

Contudo, antes do nascimento da referida lei, em determinados estados brasileiros j

havia a utilizao do interrogatrio on-line, e at mesmo por Convenes Internacionais.

Nestes ltimos, verifica-se que o Brasil adotou atravs do Decreto n 5.015/20045

as

Convenes das Naes Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, tambm

conhecida como Conveno de Palermo, que em seus arts. 18, 18 e. 24, 2, determinam o

uso da videoconferncia na oitiva de testemunhas e peritos:

Artigo 18. Assistncia judiciria recproca. 18. Se for possvel e em conformidade com os princpios fundamentais do direito interno, quando uma pessoa que se encontre no territrio de um Estado Parte deva ser ouvida como testemunha ou como perito pelas autoridades judiciais de outro Estado Parte, o primeiro Estado Parte poder, a pedido do outro, autorizar a sua audio por videoconferncia, se no for possvel ou desejvel que a pessoa comparea no territrio do Estado Parte requerente. Os Estados Partes podero acordar em que a audio seja conduzida por uma autoridade judicial do Estado Parte requerente e que a ela assista uma autoridade judicial do Estado Parte requerido. Artigo 24. Proteo das testemunhas 2. Sem prejuzo dos direitos do argido, incluindo o direito a um julgamento regular, as medidas referidas no pargrafo 1 do presente Artigo podero incluir, entre outras: (...) b) Estabelecer normas em matria de prova que permitam s testemunhas depor de forma a garantir a sua segurana, nomeadamente autorizando-as a depor com recurso a meios tcnicos de comunicao, como ligaes de vdeo ou outros meios adequados.

5 Decreto n 5.015/04, disponvel em :< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004 2006/2004/Decreto/D5015.htm>, acesso em 30 de outubro de 2010.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 119

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004

Entretanto, ao que trata sobre a utilizao do interrogatrio on-line pelos Estados

brasileiros, verifica-se que os pioneiros na utilizao deste mtodo de interrogatrio do ru

foram os paulistas, que utilizaram a videoconferncia pela primeira vez no Brasil, no ano de

1996, quando um Juiz de Direito no municpio de Campinas (SP), interrogou o ru pelo meio

audiovisual, como um fator de ordem administrativa judiciria que envolve rus que estejam

presos em presdios distantes da sede do juizado criminal6

Outrossim, a legislao paulista que regulamentava o tema (Lei Estadual n

11.819/05), teve eficcia at 30 de outubro de 2008, quando o Supremo Tribunal Federal

decidiu pela inconstitucionalidade da lei e do uso do interrogatrio por videoconferncia,

tendo por fundamento a competncia exclusiva da Unio para a legislar sobre matria

processual, ou seja, somente o Congresso Nacional poderia legislar sobre o tema, como

mesmo preceitua o art. 22, inciso I, da Constituio Federal. Veja-se o julgado:

. Verifica-se ainda, que a matria

possuiu legislao para o referido Estado a partir da Lei Estadual n 11.819/2005.

Habeas corpus. Processual penal e constitucional. Interrogatrio do ru. Videoconferncia. Lei n 11.819/05 do Estado de So Paulo. Inconstitucionalidade formal. Competncia exclusiva da Unio para legislar sobre matria processual. Art. 22, I, da Constituio Federal. 1. A Lei n 11.819/05 do Estado de So Paulo viola, flagrantemente, a disciplina do art. 22, inciso I, da Constituio da Repblica, que prev a competncia exclusiva da Unio para legislar sobre matria processual. 2. Habeas corpus concedido. (HC 90900, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acrdo: Min. MENEZES DIREITO, Tribunal Pleno, julgado em 30/10/2008, DJe-200 DIVULG 22-10-2009 PUBLIC 23-10-2009 EMENT VOL-02379-04 PP-00747)

Com efeito, mesmo havendo sido julgada inconstitucional a lei estadual que previa o

interrogatrio por meio de videoconferncia, esta matria passou, ento, a ser regulamentada

pela Lei Federal n 11.900/2009, que forneceu nova redao ao art. 185 do Cdigo de

Processo Penal7

6 MADALENA, Pedro. Administrao da Justia Videoconferncia: Interrogatrio. Revista IOB de Direito Penal e Processo Penal, Ano IX, n 53, dez./jan. 2008, 118.

, a partir de seu pargrafo primeiro. Para este pargrafo, observa-se que o

7 Art. 185. O acusado que comparecer perante a autoridade judiciria, no curso do processo penal, ser qualificado e interrogado na presena de seu defensor, constitudo ou nomeado. 1o O interrogatrio do ru preso ser realizado, em sala prpria, no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurana do juiz, do membro do Ministrio Pblico e dos auxiliares bem como a presena do defensor e a publicidade do ato. 2o Excepcionalmente, o juiz, por deciso fundamentada, de ofcio ou a requerimento das partes, poder realizar o interrogatrio do ru preso por sistema de videoconferncia ou outro recurso tecnolgico de transmisso de sons e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessria para atender a uma das seguintes finalidades.

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legislador props como regra a realizao do interrogatrio do ru diretamente no

estabelecimento prisional que o recluso estiver detido, sendo que o juiz se deslocaria at o

referido local para realizar a audincia, momento este, em que ru e juiz estariam frente a

frente, desde que garantida sua segurana.

Entretanto, a referida lei instituiu a utilizao excepcional da videoconferncia,

quando, no art. 185, 2, do Cdigo de Processo Penal, restringiu que o juiz,

excepcionalmente, e de forma fundamentada, utilizasse a videoconferncia no interrogatrio

do ru. Isto dever ser feitos atravs de ofcio ou a requerimento das partes, quando o ru

estiver preso e deste que atendidas s finalidades citadas nos incisos do pargrafo 2 da Lei,

condizentes com a preservao da segurana pblica, risco de fuga do preso quando h sua

participao em organizao criminosa, em casos de dificuldade de comparecimento do ru

em sede judiciria ou em casos de doena, para que no haja qualquer influncia para a vtima

e testemunhas do processo, ou, como mesmo refere o inciso IV, fatos que devem responder

gravssima questo de ordem pblica.

Neste interregno, cinja-se mencionar, que o citado inciso IV, do art. 185 do CPP,

levanta dvidas sobre a questo de ordem pblica, j que este termo pode tomar vrias

formas, o que poder retirar o carter excepcional preconizado pelo 2, do referido artigo.

I - prevenir risco segurana pblica, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organizao criminosa ou de que, por outra razo, possa fugir durante o deslocamento; II - viabilizar a participao do ru no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juzo, por enfermidade ou outra circunstncia pessoal; III - impedir a influncia do ru no nimo de testemunha ou da vtima, desde que no seja possvel colher o depoimento destas por videoconferncia, nos termos do art. 217 deste Cdigo; IV - responder gravssima questo de ordem pblica. 3o Da deciso que determinar a realizao de interrogatrio por videoconferncia, as partes sero intimadas com 10 (dez) dias de antecedncia. 4o Antes do interrogatrio por videoconferncia, o preso poder acompanhar, pelo mesmo sistema tecnolgico, a realizao de todos os atos da audincia nica de instruo e julgamento de que tratam os arts. 400, 411 e 531 deste Cdigo. 5o Em qualquer modalidade de interrogatrio, o juiz garantir ao ru o direito de entrevista prvia e reservada com o seu defensor; se realizado por videoconferncia, fica tambm garantido o acesso a canais telefnicos reservados para comunicao entre o defensor que esteja no presdio e o advogado presente na sala de audincia do Frum, e entre este e o preso 6o A sala reservada no estabelecimento prisional para a realizao de atos processuais por sistema de videoconferncia ser fiscalizada pelos corregedores e pelo juiz de cada causa, como tambm pelo Ministrio Pblico e pela Ordem dos Advogados do Brasil. 7o Ser requisitada a apresentao do ru preso em juzo nas hipteses em que o interrogatrio no se realizar na forma prevista nos 1o e 2o deste artigo. 8o Aplica-se o disposto nos 2o, 3o, 4o e 5o deste artigo, no que couber, realizao de outros atos processuais que dependam da participao de pessoa que esteja presa, como acareao, reconhecimento de pessoas e coisas, e inquirio de testemunha ou tomada de declaraes do ofendido 9o Na hiptese do 8o deste artigo, fica garantido o acompanhamento do ato processual pelo acusado e seu defensor.

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Ainda com relao ao art. 185, verifica-se que as partes devem ser intimadas em 10

(dez) dias, para que tomem cincia da utilizao do sistema de videoconferncia no processo

(3). E, caso outros procedimentos da audincia de instruo e julgamento sejam realizados

por meio virtual, como a oitiva de testemunhas, o preso poder acompanhar tais eventos (4).

Alm disso, de acordo com a lei, o ru, em qualquer tipo de interrogatrio, tem direito

a uma entrevista anterior e de forma privada com seu defensor; j, quando o interrogatrio for

realizado especialmente de forma virtual, pela videoconferncia, ser garantido o contato

telefnico do defensor e do ru, que esto no presdio, com o advogado que permanece no

frum ( 5).

Outrossim, a sala do presdio reservada para a realizao das transmisses virtuais da

videoconferncia, ser fiscalizada, de forma repetitiva, pelos corregedores, pelo juiz que

conduz os atos processuais, pelo Ministrio Pblico e pela Ordem de Advogados do Brasil (

6), para que haja condies mnimas de realizao do evento, bem como, para que se

assegure a liberdade de expresso do ru.

Neste sentido, Fioreze8

refora a idia, de que a sala do presdio reservada para a

realizao da videoconferncia deve ser fora do mbito prisional, para que se garante a

publicidade da audincia, com exceo de o processo ser sigiloso:

(...) Registra-se, ainda, que as salas prprias para a audincia devem situar-se fora das muralhas onde se encontram os presos, a fim de que qualquer pessoa do povo logicamente identificada e com a fiscalizao necessria possa ingressar no prdio e assistir o ato.Salvo, pois, quando o juiz decretar sigilo no processo, o interrogatrio continua a ser, como ocorre no frum, audincia pblica, em respeito ao princpio constitucional da publicidade.

Assim, nota-se que, a videoconferncia possui regulamentao legal que justifique sua

utilizao, fazendo com que o processo seja mais gil e clere, alm de diminuir custos e

proporcionar maior segurana sociedade brasileira.

Entretanto, apesar da disposio legal prevendo a videoconferncia, no se pode

deixar de observar os direitos inerentes ao ru, que so de suma importncia para o devido

andamento do processo.

3.2 O Uso do Interrogatrio on-line no mundo

Vrios pases pelo mundo j utilizam a videoconferncia como modo de interrogatrio

do ru ou como forma de oitiva de testemunhas. So exemplo deles: os Estados Unidos,

8 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia..., p. 304.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 122

Canad, Reino Unido, Espanha, Frana, Austrlia, ndia, Chile, Itlia, Holanda, Portugal,

Timor-Leste e Cingapura.

Nos Estados Unidos, a videoconferncia utilizada desde o ano de 1996, na Justia

Federal. Um dos primeiros casos de utilizao deste sistema no pas realizou-se quando um

criminoso foi levado ao Estado da Califrnia, para responder a vrios crimes de terrorismo.

Contudo possua outro processo de homicdio no Estado de Nova Jersey, que se encontra

muito distante da Califrnia. Assim, utilizou-se do sistema do interrogatrio on-line, como

forma de reduzir custos e prevenir a fuga do criminoso9

J no ano de 1998, no Canad, introduziu-se no Cdigo Criminal e de Processo Penal

a colheita de depoimento de testemunhas por meio de videoconferncia, alm de ser admitida

sustentao oral por meio deste sistema, onde os advogados podem faz-lo diretamente de seu

escritrio de advocacia, como ocorre no Distrito de Colmbia

.

10

No que refere a videoconferncia no Reino-Unido, a coleta de prova por via remota

utilizada desde o ano de 2003, que foi regulamentada pela Lei Geral sobre Cooperao

Internacional em Matria Penal, permitindo que as testemunhas na Inglaterra, Esccia, Irlanda

do Norte ou no Pas de Gales sejam ouvidas pela videoconferncia, por autoridades de outras

pases

.

11

Na Espanha, a videoconferncia foi introduzida pela Lei de Proteo a Testemunhas, a

Lei Orgnica do Poder Judicirio e o Cdigo de Processo Penal, para que sejam realizados os

depoimentos atravs de sistema de udio e vdeo. Estas alteraes foram introduzidas pela Lei

Orgnica n 13/2003

.

12

Ainda, na Frana, verifica-se que a Lei n 1.062/2001, introduziu no Cdigo de

Processo Penal o art. 706-71, que possibilitou o uso da videoconferncia, no que diz respeito

utilizao de meios de telecomunicao para a coleta de depoimentos de testemunhas,

interrogatrio de acusados, acareao de pessoas e concretizao de medidas de cooperao

internacional

.

13

9 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia... p. 366.

.

10 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia..,. p. 379. 11ARAS, Vladimir. Videoconferncia no processo penal. Boletim cientfico Escola Superior do Ministrio Pblico da Unio. Braslia: ESMPU, ano 4, n. 15, abr./jun., 2005, p. 185. 12 ARAS, Vladimir. Videoconferncia no processo ... p. 185/186. 13ARAS, Vladimir. Videoconferncia no processo., p. 186.

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Tambm, na Austrlia, o Tribunal do Estado de Vitria admite o uso do sistema de

videoconferncia quando da realizao de audincias, sempre que o requerente requisite a

utilizao desta forma14

Em Cingapura, a videoconferncia j esta sendo utilizada desde o ano de 2003 para a

realizao dos depoimentos das testemunhas, e a partir de 2005, foi utilizado tambm no

interrogatrio, sendo que as sustentaes orais realizadas pelos advogados podem ser realizas

por este mesmo mtodo. Do mesmo modo, na ndia, que utiliza do mesmo sistema de

Cingapura, pode-se utilizar a videoconferncia para a realizao de depoimentos,

interrogatrios e para as sustentaes orais de advogados

.

15

Outrossim, no Chile, alguns tribunais tem admitido o uso da medida para que seja

evitada situaes constrangedoras para os casos de crimes sexuais

.

16

Igualmente ocorre com os pases Itlia e Holanda. Na Itlia, a videoconferncia passou

a ser utilizada em razo da existncia das organizaes criminosas, sendo utilizada nos

depoimentos e interrogatrios, como uma forma de proteger as vtimas. J na Holanda, a

utilizao da medida, tem evitado o transporte dos detentos at os Tribunais

.

17

Em Portugal, o sistema da videoconferncia foi utilizado para a oitiva das testemunhas

do caso de pedofilia conhecido como Escndalo da Casa Pia, para que as crianas e

adolescentes fossem ouvidas longe dos criminosos. Este sistema on-line passou a ser utilizado

com mais nfase no ano de 2002, quando o Judicirio portugus programou sua rede de

informtica

.

18

Por fim, ainda verifica-se a utilizao da teleaudincia no Timor-Leste, quando se

realizou o interrogatrio de envolvidos em crimes praticados contra a humanidade no ano de

1999

.

19

Portanto, nota-se que muitos pases fazem uso do sistema da videoconferncia,

inserindo em sua legislao dispositivos que permitam seu emprego, seja para a oitiva de

testemunhas, seja como meio de interrogatrio do ru, como medida de evitar

constrangimentos para crimes mais graves, ou como forma de reduzir custos.

.

Contudo, mesmo havendo vrios pases que utilizam a videoconferncia no

interrogatrio do ru, deve-se ter presente tanto os benefcios, quanto os malefcios que este

14 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia... p. 381. 15 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia... p. 382 e 392. 16 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia... p. 388. 17 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia... p. 389/390. 18 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia... p. 392/393. 19 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia...p. 394.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 124

novo sistema de interrogatrio pode acarretar no processo penal, como mesmo ser estudado a

seguir.

4 POSIES DA UTILIZAO DO SISTEMA DA VIDEOCONFERNCIA

Diante da implementao do uso da videoconferncia, surgiu no Direito Processual

Brasileiro duas posies quanto utilizao ou no deste sistema no interrogatrio do ru.

Uma parte entende pelos benefcios da celeridade e economia processual, e outra parte

entende pela supresso das garantias do acusado. Veja-se.

4.1 Posio favorvel

Para aqueles que entendem ser a utilizao da videoconferncia um benefcio para o

sistema processual, este mtodo traria maior segurana, celeridade e economia para o sistema

processual brasileiro.

Refere para o assunto Fioreze20

que:

(...) Quem defende a medida fala em segurana, rapidez, modernidade, economia, lembra de casos de resgate de detentos no caminho ao frum. Diz que, levando em conta o custo do deslocamento das viaturas e das horas de trabalho policial empenhado nas escoltas, at mais barato. Preceitua que com o sistema on-line evita-se o envio de ofcios, requisies, precatrias, rogatrias, economizando, assim, tempo e dinheiro. Afirma que representaria uma economia incalculvel para o errio pblico, e mais policiais nas ruas, mais policiamento ostensivo, mais segurana pblica. Quem defende a medida no encontra qualquer obstculo sua implantao no sistema de garantias processuais.

Percebe-se que o grande objetivo da videoconferncia a reduo de custos nos

transportes de presos, bem como em todo o sistema de segurana que poder se descentralizar

do componente de transporte e escoltamento de presos, para outros setores da sociedade que

tambm necessitam de segurana.

Assim, a sociedade estaria ganhando com a implementao do sistema da

videoconferncia, uma vez que, estando mais policiais nas ruas na garantia da ordem e

segurana pblica, maior ser a segurana conferida a coletividade, alm de no sofrer com o

20 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia..., p. 125.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 125

risco de fuga de detentos perigosos que possam oferecer perigo quando do transporte dos

mesmos at o presdio.

Ainda, defendendo o sistema de interrogatrio on-line, Aras21

declara:

A presena virtual do acusado, em videoconferncia, uma presena real. O juiz o ouve e o v, e vice-versa. A inquirio direta e a interao, recproca. No vetor temporal, o acusado e o seu julgador esto julgados, presentes na mesma unidade de tempo. A diferena entre ambos meramente espacial. Mas a tecnologia supera tal deslocamento, fazendo com que os efeitos e a finalidade das duas espcies de comparecimento judicial sejam plenamente equiparados. Nisso, nada perde.

Neste interregno, nota-se que a distncia conferida pela videoconferncia no estaria

prejudicando ao ru, vez que, este est interligado com o juiz da audincia em tempo real,

atravs de udio e vdeo que no prejudicaria a comunicao entre ambos.

Outrossim, argumenta-se pela constitucionalidade deste mtodo de interrogatrio, em

funo da eficcia do processo, que passa a ter a devida celeridade para atender aos interesses

das partes, para conferir o resultado de uma razovel durao do processo.

Neste sentido, mais uma vez Fioreze22

explica:

Na hiptese do interrogatrio e da audincia a distncia, o valor comparado ampla defesa, notadamente ao direito de presena, a eficincia processual. O art. 5, XXXV, do Constituio Federal, assegura o direito jurisdio enquanto instrumento de proteo contra leso ou ameaa de leso ao direito. O inc. LXXVIII, introduzido recentemente no art. 5 pela Emenda Constitucional 45, assegura o direito razovel durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao. Assim, para que cumpra sua funo constitucional, a atividade jurisdicional deve estar no somente acessvel a todos, mas principalmente ser a mais pronta possvel, a fim de conservar sua utilidade e adequao ao interesse reclamado.

Com efeito, a utilizao do interrogatrio on-line evitaria o deslocamento dos rus do

presdio at o frum, diminuiria o tempo e custos com o transporte e escolta, alm de

aumentar a segurana pblica, no sentido da tentativa de fuga dos detentos, auxiliando at, de

certo modo, na questo da superlotao dos presdios, vez que demandaria mais rapidez na

soluo do litgio.

Ademais, esta constitucionalidade da videoconferncia, no estaria afetando qualquer

direito do ru, tendo por considerao o princpio da proporcionalidade. Neste patamar,

Bonfin23

21 ARAS, Vladimir. Videoconferncia no processo, p. 178.

explica:

22 FIOREZE, Juliana. Videoconferncia ..., p. 127.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 126

a aplicao do princpio da proporcionalidade que assegura a constitucionalidade do interrogatrio on-line. De um lado h o direito de presena do ru, decorrente do princpio da ampla defesa, que garantido na videoconferncia por meio da tecnologia. De outra, a efetiva e clere prestao jurisdicional, a preservao da segurana da sociedade (com reduo de fugas durante o trajeto ao frum e com a diminuio da necessidade de escoltas, possibilitando maior efetivo policial nas ruas) e a reduo dos custos do Estado com o transporte dos acusados.

Observa-se que a ampla defesa e a eficcia do processo andam juntas, quando do

emprego da videoconferncia como um mtodo de interrogatrio do ru, pois alm da reduo

de custos e celeridade, o ru tem assegurado que seu interrogatrio, que ser realizado

virtualmente, sem sofrer qualquer prejuzo, em funo do princpio da proporcionalidade.

Ainda, necessrio mencionar, que na videoconferncia desenvolve-se o Princpio da

Publicidade, no sentido de que propicia um acesso virtual a audincia por qualquer pessoa que

possua acesso a internet, tornando pblico o exerccio jurisdicional, e mais transparente a

atividade exercida pelo juiz.

4.2 Posio contrria

Diferente do visto acima, existem crticas ao uso do interrogatrio on-line. Para estes

que se ope a videoconferncia, o novo sistema ofenderia direitos conferidos ao ru, como o

direito de autodefesa, com restrio aos princpios constitucionais da ampla defesa,

contraditrio e o devido processo legal.

Sobre o tema, Fioreze24

relata:

Os contrrios ao interrogatrio on-line entendem que o sistema ofende os princpios constitucionais do contraditrio, da ampla defesa, e do devido processo legal, violando, ainda, pactos internacionais que impe a apresentao do acusado ao juiz. Preceituam que o interrogatrio do ru no processo penal, como expresso maior de garantia constitucional, pressupe o exerccio do direito de presena e do direito de audincia. Deve ser realizado com a garantia da maior liberdade possvel, para que o acusado possa de dirigir diretamente ao juiz e dizer tudo quanto queria sobre as imputaes que lhe so feitas.

Verifica-se que, o uso da videoconferncia poderia trazer grandes prejuzos ao direito

do ru de presena audincia e da possibilidade de fazer sua defesa frente a frente com o

juiz, afetando vrios princpios constitucionais.

23 BONFIN, Edilson Mougenot. Curso de Processo...p. 344/345. 24 FIOREZE,Juliana. Videoconferncia.,.., p. 126.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 127

De outra banda, o direito de defesa do ru estaria sofrendo supresses, tendo por

considerao, que o advogado do ru, por vezes, no estar ao lado do ru no presdio, mas

sim, ao lado do juiz no frum, no podendo assistir o acusado mutuamente.

Nesta linha, DUrso25

, salienta:

Durante a videoconferncia, o exerccio pleno do direito de defesa sofre comprometimento. As formalidades legais deixam de ser cumpridas com a realizao do interrogatrio em dois lugares distintos. O advogado no conseguir, ao mesmo tempo, prestar assistncia ao ru preso e estar com o juiz, no local da audincia, para verificar se os ritos processuais legais esto sendo cumpridos. Para os rus com maior poder aquisitivo, essa questo pode ser mitigada com a contratao de equipe de advogados. No entanto, 90% dos rus presos no possuem recursos e so atendidos por advogados da assistncia judiciria. A comunicao do advogado-cliente, em que o profissional permanecer na sala de audincias, tambm fica prejudicada, mesmo havendo um canal de udio reservado, pela insegurana natural que sempre haver em saber-se realmente totalmente imune a escutas e gravaes.

Neste patamar, verifica-se que se o advogado no estiver no presdio ao lado do ru,

mas sim no frum ao lado do juiz, seja ele constitudo, seja ele defensor pblico, a defesa do

ru resta prejudicada, vez que no ter a plena assistncia necessria, bem como, o procurador

do ru no ter acesso aos autos. E mesmo que o advogado permanecesse na sala de audincia

com o juiz, a comunicao entre ambos estaria tambm lesionada, em funo da distncia

apresentada entre advogado e cliente.

Neste mesmo sentido, Lopes Jnior26

declara:

O direito de defesa, seja tcnica ou a autodefesa, ferido de morte no interrogatrio on-line. A comear pela pergunta: Onde fica o Advogado? E os autos? Se o advogado est ao lado do ru (de onde nunca deve sair), o processo est com o juiz. Nesse caso, o defensor est impedido de consultar aos autos para perguntar, bem como est o ru impedido de analisar fatos ou laudos para responder ou esclarecer. Por outro lado, caso o advogado abandone o ru para ficar na sala de audincia, ao lado do juiz e do MP, inegvel que seu contato com o acusado e, portanto, a defesa, como um todo, ficam seriamente comprometidos.

Assim, resta dvida quanto a posio do advogado na utilizao do sistema da

videoconferncia, pois remete ao questionamento de at aonde fica estabelecido o direito de

25 DURSO, Luiz Flvio Borges. Videoconferncia: Limites ao Direito de Defesa. Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal. Ano V, n. 27. Dez-Jan./2009, p. 89. 26 LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. Vol. I Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 639.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 128

defesa conferido ao ru, se por vezes no poder estar na presena de seu advogado, nem na

prpria audincia.

Neste diapaso, necessrio mencionar o art. 185, 5, do Cdigo de Processo Penal,

que reflete ao entendimento, de que o ru estaria assistido por dois defensores, um que ficaria

com o mesmo no presdio, e o advogado que permaneceria na sala de audincia com o juiz.

Contudo, questionvel a viabilidade de tal medida, que parece atingir somente aos

rus que possuam maior poder aquisitivo para contratar um conjunto de advogados.

Neste sentido, DUrso27

renega a argumentao dada pelo Estado para apoiar a

utilizao da videoconferncia, asseverando:

Os argumentos utilizados pelo Estado para apoiar a aprovao da videoconferncia no se sustentam. A afirmativa de que evitaria a fuga de presos durante o transporte ao foro representa uma tentativa de convencer por meio do medo da populao, a pior das tcnicas de convencimento, e no compatvel com o nmero de presos que efetivamente conseguiram fugir nesse momento, alm do que seria anulada com a ida do magistrado ao recinto prisional. Tambm no efetiva a afirmao de que haveria reduo de custos com escolta de presos, decorrentes do emprego de policiais, carros, gasolina, etc., seja porque da natureza do poder estatal fazer frente a despesas dessa natureza, como tambm com o prprio aparato segregador do ru-preso (...) Alis, ocorrer o contrrio, por que o Estado precisar investir em todas as Varas Criminais e em todas as dependncias onde houver presos.

Deste modo, a alegao do uso da videoconferncia como forma de prevenir a fuga de

presos, bem como, como forma de reduzir custos, no teria condo algum, tendo por

considerao que a natureza do Estado est voltada para o pagamento de tais despesas, e o que

ocorrer de fato o contrrio, pois gastaria ainda mais o ente estatal com a instalao de tal

sistema.

Outro argumento ainda usado contra a utilizao do interrogatrio on-line o fato de o

ru perder a garantia de jurisdio, vez que estar longe do juiz. Neste sentido, Lopes Jr.28

declara:

Nesse cenrio, surge o interrogatrio on-line ou videoconferncia, que, alm de agregar velocidade e imagem, reduz custo e permite um (ainda) maior afastamento dos atores envolvidos no ritual judicirio, especialmente do juiz. Mas, sem duvida, os principais argumentos so de natureza econmica e de assepsia. A reduo de custos fruto de uma prevalncia da ideologia economicista, em que o Estado vai se afastando de suas funes a ponto de sequer o juiz estar na

27 DURSO, Luiz Flvio Borges. Videoconferncia: Limites... p. 89/90. 28LOPES JR., Aury. Direito processual penal e... p. 638.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 129

audincia. Sob o pretexto dos altos custos e riscos (como se no vivssemos em uma sociedade de risco...) gerados pelo deslocamento de presos perigosos, o que esto fazendo retirar a garantia de jurisdio, a garantia de ter um juiz, contribuindo ainda mais para que eles assumam uma postura burocrtica e de assepsia da jurisdio. Matam o carter antropolgico do prprio ritual judicirio, assegurando que o juiz sequer olhe para o ru, sequer sinta o cheiro daquele que ele vai julgar.

Cumpre esclarecer que, como anteriormente mencionado, o interrogatrio do ru, onde

se insere a videoconferncia, tratado como um meio de prova pelo Cdigo de Processo

Penal. Assim, a utilizao do interrogatrio on-line submete-se ao princpio da prova da

garantia de jurisdio, que o direito conferido ao ru de ser julgado por um juiz e com base

nas provas produzidas no seu processo. Nota-se que, quando o ru ser submetido ao

interrogatrio por videoconferncia, est se retirando dele o direito da garantia de jurisdio

que lhe conferido, acarretando a diminuio dos direitos de defesa e contraditrio.

Neste sentido, Lopes Jr.29

, ainda complementa dizendo:

O direito de defesa e do contraditrio (incluindo o direito a audincia) so direitos fundamentais, cujo nvel de observncia reflete o avano de um povo. Isso se mede no pelo arsenal tecnolgico utilizado, mas sim pelo nvel de respeito ao valor dignidade humana. E o nvel de civilidade alcanado exige que o processo penal seja um instrumento legitimante do poder, dotado de garantias mnimas, necessrio para chegar-se pena. Nessa linha, absurdo suprimir-se o direito de ser ouvido por um juiz, que no pode ser substitudo por um monitor de computador.

Deste modo, necessrio se faz observar que, os direitos fundamentais so de extrema

importncia quando se fala em interrogatrio do ru, vez que, estes direitos devem ser

observados de maneira que refletem ao desenvolvimento da sociedade, o que insere o

interrogatrio frente ao juiz e no por um sistema de vdeo.

Portanto, o entendimento que se posiciona contrrio a utilizao da videoconferncia

remete ao forte argumento da conservao dos direitos que so destinados ao ru, e que so

retirados quando o seu interrogatrio realiza-se por meio de sistema on-line.

CONSIDERAES FINAIS

A partir do exposto, observa-se que a videoconferncia, mtodo de interrogatrio do

ru, um instrumento pelo qual se realiza a oitiva do acusado a distncia, onde juiz

29 LOPES JR., Aury. Direito processual penal e... p. 640.

Congresso Internacional de Cincias Criminais, II Edio, 2011 130

permanece no frum e ru permanece no ambiente prisional, transmitindo-se imagens atravs

de udio e vdeo.

Este mtodo uma exceo a regra de interrogatrio do ru perante o juiz, e somente

pode ser utilizada em situaes excepcionais previstas em lei, e de forma que o juiz

fundamente sua deciso de emprego do interrogatrio on-line.

Neste sentido, sua anlise muito importante para se verificar a eficcia de sua

utilizao, e se esta utilizao no pode trazer algum prejuzo para o ru ou para a sociedade.

Verificou-se que este sistema, amplamente utilizado em outros pases do mundo, e

foi recentemente legislada no Brasil, a partir da Lei n 11.900/2009, apesar de j ter sido

anteriormente utilizada em alguns estados brasileiros.

Estaria a videoconferncia auxiliando na reduo de custos na conduo dos presos, na

segurana, no risco de fuga e celeridade processual. Em seu favor tambm est

regulamentao legal dada ao tema. Contudo, mesmo ante tais benefcios, inegvel a

supresso das garantias do ru. Este tem o direito de ser interrogado perante o juiz, estar

frente a frente com ele, para que seja exercida sua ampla defesa, o contraditrio, e que tenha

assegurada sua dignidade e a garantia de jurisdio.

No se refutam as necessidades do alcance das medidas de maior rapidez da prestao

jurisdicional, reduo de custos, segurana... todos estes fatores so extremamente relevantes

para o desenvolvimento do processo e da sociedade, entretanto, pensar nos direitos do ru e

pensar na modernizao de seu interrogatrio necessita de muito cuidado, pois antes da

existncia do interrogatrio, h a existncia do ru, que um ser humano e que at ento no

foi julgado e condenado, e por isso, ainda considerado inocente, e necessita ter seus direitos

garantidos.

Claro est que a sociedade tambm no pode sofrer prejuzos com a segurana e

prestao jurisdicional, contudo, deve-se pensar em medidas alternativas ao do interrogatrio

on-line, que ofeream benefcios para ambos os lados. Portanto, entende-se que a

videoconferncia deve ser analisada e estudada de forma que possa estar em consonncia com

a sociedade e com o ru, pois ambos necessitam de respostas jurisdicionais positivas, para um

melhor atendimento aos seus direitos

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ARAS, Vladimir. Videoconferncia no processo penal. Boletim Cientfico Escola Superior do Ministrio Pblico da Unio. Braslia: ESMPU, ano 4, n. 15, abr./jun., 2005.

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BARROS, Marco Antnio de. Teleaudincia, Interrogatrio On-Line, Videoconferncia e o Princpio da Liberdade da Prova. Revista dos Tribunais, Ano 92, Vol. 818, Dez.2003. BONFIN, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. So Paulo: Saraiva, 2009. Cdigo de Processo Penal. Vademecum 7 Ed., So Paulo, Saraiva, 2009.

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DURSO, Luis Flvio Borges. Videoconferncia: Limites ao Direito de Defesa. Revista Magister de Direito Penal e Processo Penal. Ano V, n. 27, Dez-Jan/2009. FIOREZE, Juliana. Videoconferncia no processo penal brasileiro. 2 Ed.. Curitiba: Juru, 2009.

LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e sua conformidade constitucional. Vol. I, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

MADALENA, Pedro. Administrao da Justia Videoconferncia: Interrogatrio. Revista IOB de Direito Penal e Processo Penal, Ano IX, n 53, dez./jan., 2008.

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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004