internet potencializa ataques de bullying · perfi s falsos em redes de relacionamentos, e-mails...

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HOJE Terça-feira, 07 de setembro de 2010 6 Estrada Municipal Pr. Walter Boger, s/n Fazenda Lagoa Bonita Engenheiro Coelho CEP: 13165-970 Repórteres Alessandra Guimarães Lóren Vidal Robson Fonseca Expediente (019) 3858-9055 Esta página é uma produção dos alunos de Jornalismo do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp). Professor Responsável Renato Groger Diagramação: No período escolar é co- mum apelidar os colegas com nomes estranhos, tirar sarro dos outros e fazer com que as mínimas imperfeições virem motivo de deboche. No entanto, esse comporta- mento até então considerado uma brincadeira, tem sido encarado de forma diferente por especialistas. Há cerca de 15 anos prá- ticas consideradas ofensivas ou atemorizantes ganharam um novo nome: bullying, que significa “amedrontar” ou “intimidar”. De acordo com a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência (ABRAPIA) o bullying com- preende diversas formas de atitudes agressivas, intencio- nais e repetidas, adotadas por um ou mais estudantes, cau- sando dor e angústia a outro colega, sendo executadas dentro de uma relação desi- gual de poder. Com o avanço da tecno- logia e o livre acesso a ela, o problema ganhou ares virtu- ais. Perfis falsos em redes de relacionamentos, e-mails inti- midadores e fotos adulteradas têm sido caracterizados como cyberbullying. No entanto, a violência no meio online é considera- Internet potencializa ataques de bullying Lóren Vidal Robson Fonseca da ainda mais cruel por três motivos: as provocações e xingamentos que antes eram restritos a escola, agora estão online; os jovens têm usa- do mais a tecnologia como forma de relacionamento; a identificação do agressor é mais difícil. Segundo a psicóloga e autora do livro Face Oculta – Uma História de Bullying e Cyberbullying, Maria Tereza Maldonado, na internet o ata- que acontece de todos os lados em uma perseguição que dura 24 horas por dia nos sete dias da semana. “Muitas vezes o agressor da internet já sofreu bullying antes na escola, en- tão ele represa essa raiva e se transforma em um monstro na internet”, explica. Os ataques do bullying podem causar diversos da- nos para as vítimas tanto do mundo real quanto virtual. “As vítimas têm caracterís- ticas típicas de uma pessoa pouco sociável, o que leva a um ciclo vicioso em que as vítimas tendem a permane- cer anti-sociáveis”, declara o professor Eduardo Shimoda, coordenador de um estudo realizado no Brasil. De acordo com Maria Tereza, além da baixa auto- estima, déficit de atenção e sentimento de angústia, esses ataques podem levar a vítima ao suicídio. Como a jovem americana Megan Meier, que se suicidou após receber mensagens virtuais da vizi- nha Lori Drew, de 49 anos, que criou um perfil falso no MySpace fingindo ser um rapaz de 16 anos para humi- lhá-la. Meses depois, o falso jovem rompeu a amizade vir- tual com Megan dizendo que “o mundo ficaria melhor sem ela”. Em seguida, a jovem de 13 anos se enforcou. No Brasil, casos de inti- midação virtual também são comuns. Um estudo realiza- do pela ONG Safernet indica que 38% dos jovens já foram vítimas de cyberbullying. A estudante universitária Bruna (nome fictpicio) conta que algumas de suas fotos, dispo- níveis em uma rede de rela- cionamentos, foram enviadas para um site com conteúdo pornográfico. A estudante foi classificada como garota de programa e seu e-mail verda- deiro foi disponibilizado para agendamento de encontros. Para a psicóloga Maria Tereza Maldonado, as esco- las e os pais precisam ficar atentos ao assunto e escla- recer sobre o uso respon- sável da internet. “Muitos não tem noção de que isso é crime. Acham que é brinca- deira”, explica. Segundo o advogado especialista em Direito da Tecnologia da Informação, Mauro Martins, não há uma lei específica na legislação brasileira para punir os cri- mes cometidos pela internet. “Se uma pessoa ameaça al- guém pela internet ou pesso- almente será igualmente con- denada a detenção de um a seis meses ou multa, confor- me previsto no artigo 147 do Código Penal”, explica. O diretor do Instituto Brasileiro de Direito da Informática (IBDI), Omar Kaminski, explica que no caso do cyberbullying, os de- litos mais comuns são calúnia, injúria, difamação, ameaça e falsa identidade, sendo que todos estes estão presentes no Código Penal. “95% da legis- lação existente é aplicável à internet”, explica o advogado e autor do livro Internet Legal - O Direito na Tecnologia da Informação. No caso de o in- frator ser um menor de ida- de, as penas serão aplicadas de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente. Para a psicóloga Maria Tereza Maldonado, é preci- so ter cuidado com o que se coloca na rede, pois a grande exposição pode tornar o jovem mais vulnerável. “A primeira coisa a se fazer quan- do se sofre ataques na internet é contar para os adultos confiáveis para que eles tomem uma providência, pois cy- berbullying é crime”, acon- selha. Uma prática que está se tor- nando cada vez mais comum entre crianças e adolescentes, vem preocupando educadores e autoridades brasileiras. A no- vidade perigosa carrega o nome de sexting. A expressão se refe- re ao envio de mensagens, ima- gens e filmes eróticos e sensuais por meios eletrônicos. Essa prá- tica é conduzida principalmente por crianças e adolescentes na faixa etária de 12 a 17 anos. A moda criada por jovens americanos chegou recente- mente ao Brasil e já está re- crutando diversos adeptos. Na maior parte dos casos, a postagem de fotos sensuais é voluntária, sendo uma espé- Exibição online ameaça reputação de crianças e adolescentes Alessandra Guimarães cie de brincadeira virtual. Em outras situações, a postagem é feita por vingança. O caso nacional de maior repercussão aconteceu em Porto Alegre, onde dois menores se insinua- ram diante do sistema de vídeo da rede social Twitter. Foram quase 30 mil acessos ao conte- údo pornográfico transmitido pela internet. Segundo a professora ad- junta de Pediatria e Clínica de Adolescentes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Evelyn Eisenstein, a inseguran- ça e curiosidade sobre a sexua- lidade motivam os adolescentes a se exibirem no meio online. “Na internet, tudo é imediato, ir- restrito, acesso fácil ao proibido e com muitas possibilidades de mentir ou inventar”, argumen- ta Evelyn. Para a pediatra, que também é uma das autoras do livro Geração Digital (Editora Vieira e Lent), “adolescentes que postam fotos nuas são de- sinformados quanto aos riscos que correm”. Doutor em Direito pela USP e profes- sor da FGV, Marcel Leonardi explica que as conseqüências di- retas são danos irre- paráveis à reputação, estigmatização do ado- lescente e problemas de comportamento, que podem exigir tratamento especializado com psicólogos. “O principal problema é que essas imagens dificilmente se- rão completamente removidas da internet e estarão disponí- veis muitos anos depois do fato, causando danos no futu- ro”, completa Leonardi. O sexting já fez uma víti- ma fatal nos Estados Unidos. Em 2008, Jessica Logan, de 17 anos, teve fotos sensuais enviadas pelo ex-namorado para colegas da escola, caso típico de cyberbullying. Não agüentando a pressão, ela acabou se enforcando. Casos de sex- ting que se tornam públicos, sempre pegam os pais de surpresa, já que os mesmos mui- tas vezes estão alienados quan- to às atividades virtuais de seus filhos. Leonardi comenta que medidas preventi- vas podem ser adotadas dentro de casa para que isso não ocorra. “Os pais devem conversar aber- tamente sobre as consequências futuras desses comportamentos e manter o computador com acesso à internet em um local de livre circulação”, aconselha. Já a autora do livro Geração Digital, Evelyn Eisenstein, aponta que os pais e professores precisão considerar que o computador e a internet são ferramentas im- portantes, cujo correto uso deve ser orientado e supervisionado. Os filhos precisam ser conscien- tizados dos perigos da exposi- ção anônima de si mesmos ou de seu corpo. Avanço tecnológico leva violência das escolas para o meio vitual “A violência não é força, mas fraqueza, nem nunca poderá ser criadora de coisa alguma, apenas destruidora.” Benedetto Croce, filósofo italiano Lóren Vidal Página_AB...indd 1 22/9/2010 14:37:03

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HOJEHOJE Terça-feira, 07 de setembro de 20106

Estrada Municipal Pr. Walter Boger, s/n Fazenda Lagoa Bonita

Engenheiro Coelho CEP: 13165-970

RepórteresAlessandra Guimarães

Lóren VidalRobson Fonseca

Expediente(019) 3858-9055

Esta página é uma produção dos alunos de Jornalismo do Centro Universitário Adventista de São

Paulo (Unasp).

Professor ResponsávelRenato Groger

Diagramação:

No período escolar é co-mum apelidar os colegas com nomes estranhos, tirar sarro dos outros e fazer com que as mínimas imperfeições virem motivo de deboche. No entanto, esse comporta-mento até então considerado uma brincadeira, tem sido encarado de forma diferente por especialistas.

Há cerca de 15 anos prá-ticas consideradas ofensivas ou atemorizantes ganharam um novo nome: bullying, que signifi ca “amedrontar” ou “intimidar”. De acordo com a Associação Brasileira Multiprofi ssional de Proteção à Infância e à Adolescência (ABRAPIA) o bullying com-preende diversas formas de atitudes agressivas, intencio-nais e repetidas, adotadas por um ou mais estudantes, cau-sando dor e angústia a outro colega, sendo executadas dentro de uma relação desi-gual de poder.

Com o avanço da tecno-logia e o livre acesso a ela, o problema ganhou ares virtu-ais. Perfi s falsos em redes de relacionamentos, e-mails inti-midadores e fotos adulteradas têm sido caracterizados como cyberbullying.

No entanto, a violência no meio online é considera-

Internet potencializa ataques de bullyingLóren VidalRobson Fonseca

da ainda mais cruel por três motivos: as provocações e xingamentos que antes eram restritos a escola, agora estão online; os jovens têm usa-do mais a tecnologia como forma de relacionamento; a identifi cação do agressor é mais difícil.

Segundo a psicóloga e autora do livro Face Oculta – Uma História de Bullying e Cyberbullying, Maria Tereza Maldonado, na internet o ata-que acontece de todos os lados em uma perseguição que dura 24 horas por dia nos sete dias da semana. “Muitas vezes o agressor da internet já sofreu bullying antes na escola, en-tão ele represa essa raiva e se transforma em um monstro na internet”, explica.

Os ataques do bullying podem causar diversos da-nos para as vítimas tanto do mundo real quanto virtual. “As vítimas têm caracterís-ticas típicas de uma pessoa pouco sociável, o que leva a um ciclo vicioso em que as vítimas tendem a permane-cer anti-sociáveis”, declara o professor Eduardo Shimoda, coordenador de um estudo realizado no Brasil.

De acordo com Maria Tereza, além da baixa auto-estima, défi cit de atenção e

sentimento de angústia, esses ataques podem levar a vítima ao suicídio. Como a jovem americana Megan Meier, que se suicidou após receber mensagens virtuais da vizi-nha Lori Drew, de 49 anos, que criou um perfi l falso no MySpace fi ngindo ser um rapaz de 16 anos para humi-lhá-la. Meses depois, o falso jovem rompeu a amizade vir-tual com Megan dizendo que “o mundo fi caria melhor sem ela”. Em seguida, a jovem de 13 anos se enforcou.

No Brasil, casos de inti-midação virtual também são comuns. Um estudo realiza-do pela ONG Safernet indica que 38% dos jovens já foram vítimas de cyberbullying. A estudante universitária Bruna (nome fi ctpicio) conta que algumas de suas fotos, dispo-níveis em uma rede de rela-cionamentos, foram enviadas para um site com conteúdo pornográfi co. A estudante foi classifi cada como garota de programa e seu e-mail verda-deiro foi disponibilizado para agendamento de encontros.

Para a psicóloga Maria Tereza Maldonado, as esco-las e os pais precisam ficar atentos ao assunto e escla-recer sobre o uso respon-sável da internet. “Muitos

não tem noção de que isso é crime. Acham que é brinca-deira”, explica.

Segundo o advogado especialista em Direito da Tecnologia da Informação, Mauro Martins, não há uma lei específi ca na legislação brasileira para punir os cri-mes cometidos pela internet. “Se uma pessoa ameaça al-guém pela internet ou pesso-almente será igualmente con-denada a detenção de um a seis meses ou multa, confor-me previsto no artigo 147 do Código Penal”, explica.

O diretor do Instituto Brasileiro de Direito da Informática (IBDI), Omar Kaminski, explica que no caso do cyberbullying, os de-litos mais comuns são calúnia, injúria, difamação, ameaça e falsa identidade, sendo que todos estes estão presentes no Código Penal. “95% da legis-lação existente é aplicável à internet”, explica o advogado e autor do livro Internet Legal - O Direito na Tecnologia da Informação. No caso de o in-frator ser um menor de ida-de, as penas serão aplicadas de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Para a psicóloga Maria Tereza Maldonado, é preci-so ter cuidado com o que se

coloca na rede, pois a grande exposição pode tornar o jovem mais vulnerável. “A primeira coisa a se fazer quan-do se sofre ataques na internet é contar para os adultos confi áveis para que eles tomem uma providência, pois cy-berbullying é crime”, acon-selha.

Uma prática que está se tor-nando cada vez mais comum entre crianças e adolescentes, vem preocupando educadores e autoridades brasileiras. A no-vidade perigosa carrega o nome de sexting. A expressão se refe-re ao envio de mensagens, ima-gens e fi lmes eróticos e sensuais por meios eletrônicos. Essa prá-tica é conduzida principalmente por crianças e adolescentes na faixa etária de 12 a 17 anos.

A moda criada por jovens americanos chegou recente-mente ao Brasil e já está re-crutando diversos adeptos. Na maior parte dos casos, a postagem de fotos sensuais é voluntária, sendo uma espé-

Exibição online ameaça reputação de crianças e adolescentesAlessandra Guimarães

cie de brincadeira virtual. Em outras situações, a postagem é feita por vingança. O caso nacional de maior repercussão aconteceu em Porto Alegre, onde dois menores se insinua-ram diante do sistema de vídeo da rede social Twitter. Foram quase 30 mil acessos ao conte-údo pornográfi co transmitido pela internet.

Segundo a professora ad-junta de Pediatria e Clínica de Adolescentes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Evelyn Eisenstein, a inseguran-ça e curiosidade sobre a sexua-lidade motivam os adolescentes a se exibirem no meio online. “Na internet, tudo é imediato, ir-

restrito, acesso fácil ao proibido e com muitas possibilidades de mentir ou inventar”, argumen-ta Evelyn. Para a pediatra, que também é uma das autoras do livro Geração Digital (Editora Vieira e Lent), “adolescentes que postam fotos nuas são de-sinformados quanto aos riscos que correm”.

Doutor em Direito pela USP e profes-sor da FGV, Marcel Leonardi explica que as conseqüências di-retas são danos irre-paráveis à reputação, estigmatização do ado-lescente e problemas de comportamento,

que podem exigir tratamento especializado com psicólogos. “O principal problema é que essas imagens difi cilmente se-rão completamente removidas da internet e estarão disponí-veis muitos anos depois do fato, causando danos no futu-ro”, completa Leonardi.

O sexting já fez uma víti-ma fatal nos Estados Unidos. Em 2008, Jessica Logan, de 17 anos, teve fotos sensuais enviadas pelo ex-namorado para colegas da escola, caso típico de cyberbullying. Não agüentando a pressão, ela acabou se enforcando.

Casos de sex-ting que se tornam públicos, sempre pegam os pais de surpresa, já que os mesmos mui-tas vezes estão alienados quan-to às atividades virtuais de seus fi lhos. Leonardi

comenta que medidas preventi-vas podem ser adotadas dentro de casa para que isso não ocorra. “Os pais devem conversar aber-tamente sobre as consequências futuras desses comportamentos e manter o computador com acesso à internet em um local de livre circulação”, aconselha. Já a autora do livro Geração Digital, Evelyn Eisenstein, aponta que os pais e professores precisão considerar que o computador e a internet são ferramentas im-portantes, cujo correto uso deve ser orientado e supervisionado. Os fi lhos precisam ser conscien-tizados dos perigos da exposi-ção anônima de si mesmos ou de seu corpo.

Avanço tecnológico leva violência das escolas para o meio vitual

“A violência não é força, mas fraqueza, nem nunca poderá ser criadora de coisa alguma, apenas destruidora.”

Benedetto Croce, fi lósofo italiano

Lóren Vidal

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