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Internet e inclusão: otimismos exacerbados e lucidez pedagógica

Eduardo Vieira Corrêa

Este texto é parte de estudos mais amplos realizados na disciplina de

Comunicação e Tecnologias em Supervisão Pedagógica e Formação de

Formadores. Tem no livro Educação e comunicação: O Ideal de inclusão pelas

tecnologias da informação, São Paulo, Cortez, 2006, a base para reflexões e

análises. O objetivo desta produção é introduzir a reflexão sobre a inclusão pelas

tecnologias, suas contradições e as análises que a autora desenvolve. Este tema

relaciona-se com nosso objeto de pesquisa na medida em que oferece

possibilidades de reflexão sobre o papel da tecnologia na educação e, em particular,

na supervisão educacional e na formação de professores.

Introdução

Segundo nossa leitura de Galli Soares (2006), no início eram as estradas as

linhas de comunicação. Evidente que a fala – obra magistral da espécie humana –

revolucionou as conexões entre os indivíduos da espécie. A tecnologia da

informação que ao longo da história vem se desenvolvendo a passos largos quebrou

barreiras nacionais e pessoais. Filosoficamente situa o homem entre o ser real e o

ser virtual. Sociologicamente transmuta as possibilidades de relações e ações

sociais. Observações feitas, ressaltamos o objetivo de Galli que é relacionar a

globalização e a comunicação global iniciando o debate sobre a utilização das

tecnologias informacionais na Educação.

É salutar dizer que a evolução da internet e o acesso a esse meio

comunicacional revolucionou a conservação das informações e conhecimentos. A

nova “Biblioteca de Alexandria” guarda infindáveis tesouros e inúmeras intempéries

morais. O idealismo do acesso para todos encontra eco em programas

governamentais como o do governo brasileiro (programa de banda larga) e do

indiano (tablet a custo baixo para uso escolar). Estudos desnudam o debate que se

avizinha no tocante aos limites éticos, responsabilidades, objetivos sociais e

ausência (ou não) de mercados consumidores. Não obstante, inclusão pelo acesso

aos meios informacionais, EAD, interconexão entre máquina e homem para fins

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médicos (restauração da visão, audição e movimentos) constituem possibilidades já

palpáveis na atualidade. Galli ressalta que:

...pesquisadores de novas tecnologias ditas inclusivas apostam na solução de

problemas como: acesso a localidades distantes suprindo carências de

informação e atendimentos públicos em tempo real; compensação de deficiências

físicas e ou neurológicas com os dispositivos viabilizados pelas tecnologias de

comunicação, promovendo a aprendizagem de portadores de necessidades

especiais das mais diversas ordens; educação a distância em massa para

equacionar a problemática de baixa ou nenhuma escolaridade, reduzindo os

índices de analfabetismo; outras soluções específicas de áreas como a medicina

e a própria engenharia, elétrica, eletrônica e de software.

O futuro está cada vez mais presente e o presente espera cada vez mais pelo

futuro. A questão que se apresenta é até que ponto o processo de evolução das

tecnologias informacionais representarão acréscimo para o desenvolvimento da

humanidade? Quanto dessa simbiose representará proporcionará aos indivíduos

serem melhores? Em que medida, de fato, contribuirá para a construção da

democracia? Será virtual?

Em posse dessas questões prosseguimos nossas análises sobre tecnologias

e as mudanças que elas operam nas atividades educacionais por exemplo.

Tecnologias aplicadas à Educação: possibilidades

Lousa e giz são representantes de tecnologias aplicadas à educação.

Ferramental este pertencente a um passado distante ainda insistente em

permanecer apesar dos avanços em microinformática e internet. Etimologicamente a

palavra tecnologia (do grego téchné + logos) nos remete a pensar sobre a arte do

fazer1 ou aprimoramento do conhecimento das técnicas. Especificamente sobre as

tecnologias informacionais aplicadas à Educação, como essas foram inseridas no

cenário educacional brasileiro e o que mudou com a utilização delas?

A modernização tecnológica trouxe benefícios tanto para a gestão

educacional. O Sistema Nacional de Educação Superior, por exemplo, disponibiliza

no site, para os gestores, subsídios para o desenvolvimento de planos de

desenvolvimento institucionais. O MEC regulamentou os cursos EAD e credenciou

1 http://www.casadaciencia.ufrj.br/Publicacoes/Artigos/EduBytes96/AlgumasReflexoes.htm

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diversos cursos com o objetivo de democratizar o acesso ao conhecimento e formar

contingente populacional em todos os níveis.

A tecnologia aplicada ao ensino também revolucionou pedagogicamente a

sala de aula. O professor não é mais o oráculo do conhecimento e detentor dos

meios de pesquisa avançada. A internet coloca ao alcance do aluno as informações,

os saberes científicos, as produções literárias e artísticas, de modo geral. É

Biblioteca de Alexandria da atualidade. Requer, por parte do docente, conhecimento

do ferramental disponível, traquejo para lidar didaticamente com a tecnologia e

criatividade na utilização para os diversos fins educacionais.

Pretende-se, com efeito, utilizar o ferramental tecnológico como um dos

facilitadores de acesso à cidadania. O Brasil é um país que ainda encobre uma

divida social gigantesca. Os recursos tecnológicos sozinhos não farão milagre. Por

outro lado “ao analisar as perspectivas já expostas, pode-se considerar que se

aposta muito na cidadania pela inclusão digital, ou seja, há mais otimismo do que

pessimismo nas perspectivas da internet em seu potencial de inclusão (GALLI, p.

101).

Portanto, o aprimoramento do uso dos meios comunicacionais modernos se

dará pelo uso e pela constante obra reflexiva que só se dá pelo intelecto humano. O

aperfeiçoamento tecnológico trouxe benefícios para a gestão educacional a partir da

facilitação de processos educacionais e burocráticos e vem revolucionando a sala de

aula com o uso da internet, lousa digital, softwares dentre diversas outras

ferramentas que devem, necessariamente, ser meio para a construção do

conhecimento.

Professor: lousa e giz ou lousa digital?

O desenvolvimento tecnológico das indústrias, a revolução dos mecanismos

de comunicação individual e de massa e o desenvolvimento de programas de

computador que facilitam processos no comércio demonstram a velocidade com que

diferentes ramos da atividade produtiva humana se apropriam de recursos

tecnológicos com vistas à simplificação de processos. Não é o que observamos, de

maneira geral, nas escolas. Pouquíssimas fazem uso criativo e refletido das

ferramentas tecnológicas para a construção do conhecimento. Lousa e giz é

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presença constante e muitas escolas brasileiras. O professorado está preparado

para adentrar neste mundo tecnológico e dele fazer uso consciente?

O atual momento histórico e social nos remete ao questionamento da função

da escola na atualidade e da formação do profissional docente. Se antes este era o

detentor do saber enciclopédico, hoje se encontra em posição de equidade com

relação às possibilidades de acesso ao saber produzido presente no mundo virtual

da internet.

A sociedade atual requer um profissional docente que dialogue

constantemente com o novo que a todo o momento surge. Com efeito, não no

sentido de apropriar-se de todo ferramental tecnológico – o que seria impossível

visto à produção exponencial dos conteúdos e ferramentais tecnológicos – mas no

de atuar criativamente aliando ao ambiente escolar as tecnologias objetivando a

construção do saber significativo. Galli, em seu texto, explicita que “o debate deve

ser levado para os espaços pedagógicos escolares, envolvendo o professor e

reconhecendo sua práxis, como forma de inovação por meio de novos ferramentais,

cuja aplicação com êxito, na sala de aula, poderá elevar o conceito de educação e

qualidade da relação ensino e aprendizagem (...)” (p. 109).

Forçoso dizer que a formação dos professores não favorece, na atualidade, o

debate sobre a utilização de tecnologia na escola. Concordamos com a autora no

que se refere à possibilidade de elevação da qualidade do que se ensina e do que se

aprende a partir da utilização de recursos tecnológicos. Não obstante, enquanto

diversas profissões ganham notoriedade e reconhecimento social, o professorado

vive mergulhado no desprestígio. É a classe dos baixos salários e da visibilidade

deturpada e ambígua que vive entre a importância da existência e a berlinda da

desnecessidade.

A situação sócio-histórica atual não comporta profissionais de educação sem

a devida formação acadêmica e profissionalização que se dá apenas com o exercício

docente, na busca constante por novos conhecimentos. Não se admite hoje – apesar

de existirem muitos – profissionais desconectados da tecnologia. O novo paradigma

da educação relaciona professor à capacidade de lidar com os multimeios

tecnológicos. A facilitação da aprendizagem se dará através da comunicação

eficiente aliada às informações refletidas e mediatizadas pelo profissional docente a

partir da investigação do objeto de estudo. Nesse processo a cidadania se

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completará com o ingrediente das experiências democráticas de acesso e uso dos

meios informacionais para apropriação do conhecimento.

Novas interações sociais a partir das tecnologias informacionais

Mantendo nossa linha de análise, essas experiências de apropriação de

conhecimento podem ocorrer por meio dos sistemas de comunicação, disponíveis

socialmente que integram indivíduos, processos e informações de maneira cada vez

mais veloz economizando tempo e espaço. Galli enfatiza que os contatos e as

interações passam de um universo já ampliado pela telefonia e pelo fax, para outros

que reconfiguram limites profissionais e sociais, modificando as perspectivas de

comunicação e organização das pessoas de qualquer idade, situação e lugar,

redefinindo o envelhecimento e a solidão.

A autora destaca os novos limites das relações humanas a partir dos

processos comunicacionais cada vez mais acessíveis e rápidos estabelecendo

novos conceitos sociais e redefinindo a posição social dos indivíduos em sua

condição humana.

Ação à distância: entendimento e explicações

São muitas as formas de interação criadas a partir do desenvolvimento

tecnológico dos meios de comunicação. Com efeito, vem revolucionando o modo

como as pessoas estabelecem os laços sociais. O uso da tecnologia para alcançar

pessoas nos rincões do país (alfabetização, processos bancários, etc) para

aperfeiçoar profissionais nas mais diversas áreas e para solucionar problemas das

mais diversas ordens (diagnósticos médicos, assessoria jurídica dentre outros)

mostra a tendência da atualidade: encurtamento das distâncias através da tecnologia

e aceleração das transformações sociais e das transações informacionais.

Operações cirúrgicas – efetuadas por robôs – ocorreram à distância graças

aos novos ambientes comunicacionais. Médicos acompanham procedimentos em

tempo real de um profissional à distância. Transações financeiras são efetuadas

instantaneamente movimentando valores de um lado para o outro do planeta.

Correspondências eletrônicas são imediatamente visualizadas pelo destinatário

instantaneamente. Decisões governamentais são tomadas mesmo o mandatário do

país estando num outro, tanto para a paz quanto para a guerra.

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Evidenciam-se, na atualidade, novas formas de interação social propiciadas

pelo uso da tecnologia da informação. A acessibilidade aos ferramentais

tecnológicos está cada vez mais facilitada por conta dos preços cada vez mais

cadentes de computadores, notebooks e telefones celulares com acesso à internet.

Mesmo quem não dispõe de equipamentos pode encontrá-los nas Lan Houses

espalhadas por diversas cidades.

Uma das ações à distância que nos deteremos liga-se à educação.

Historicamente os cursos por correspondência, como por exemplo alfabetização,

profissionalizantes e de conclusão de níveis viabilizavam, de maneira revolucionária,

aquilo que o sistema educacional público estadual ou municipal de educação formal,

de modo geral, não conseguiam dar conta. Nesse sentido, profissionais buscavam

aperfeiçoamento, pessoas intentavam uma profissão e qualificação educacional. As

tele-aulas representaram um avanço extraordinário nesse modelo de cursos à

distância recorrendo à tecnologia televisiva a partir das gravações de aulas por

atores em cenários previamente performatizados. Contudo, a internet veio com um

leque inimaginável de possibilidades.

O acesso à rede mundial de computadores trouxe novas perspectivas

interativas. Cursos on-line de aperfeiçoamento profissional, de graduação, de

alfabetização e de conclusão de níveis de ensino abriram novas oportunidades nos

rincões do país. Não obstante, as diversas possibilidades que se abrem só resultam

em prática positiva na medida em que se faz uso pedagógico do instrumental.

Uma nova filosofia educacional se apresenta na medida em que o ambiente

virtual oferece um leque gigantesco de oportunidades e possibilidades. A autonomia,

o compromisso e a responsabilidade, nesse ínterim, tornam-se valores

indispensáveis nessa forma de interagir. Não obstante, todo o aparato tecnológico

deve favorecer tal interação. Galli afirma que “a interação professor aluno é

favorecida pelo próprio ambiente que, definido no Projeto Pedagógico do curso, é

assegurado pela própria filosofia que embasa a visão de educação e formação, que

o ferramental tecnológico seja apropriado como meio e não como fim nas relações

ensino e aprendizagem” (GALLI. 2006: p.119).

A autora ressalta a preocupação com a qualidade do que se ensina e aprende

na construção das relações virtuais que se estabelecem com esse novo modelo.

Ainda mais porque o ambiente virtual oferece um leque fenomenal de possibilidades.

Nesse sentido, plataformas elaboradas para fins educacionais e a capacitação de

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profissionais para a efetivação do trabalho devem constar da pauta de discussões

educacionais.

Por fim, ressalta-se a tecnologia comunicacional como possibilitadora de

inclusão social a partir da inclusão digital. Os espaços interacionais aperfeiçoaram-se

no tempo e no espaço. A internet trouxe novas possibilidades de alcance de

indivíduos nos cantos mais remotos do país. A significância da palavra cidadania

ganhou novo adendo a partir do momento em que as tecnologias passaram a fazer

parte do cotidiano das pessoas. As ações à distância encurtaram os percursos

através do hiperespaço. No entanto novos conceitos há que se ocuparem desse

novo contexto de aprendizagens, por exemplo, letramento digital.

Letramento digital

Tomamos a reflexão da autora que define letramento como condição de quem

é letrado. A palavra tem origem no inglês leteracy e indica aquele que, além de

alfabetizado, lê, interpreta e analisa as demandas sociais. Logo, vai além do simples

identificar de símbolos grafados e grafar símbolos gerando significados isolados. O

letramento vai além do identificar. Expressa-se na capacidade de entendimento

semântico estruturante e simbólico da língua.

Por letramento digital, em condição análoga ao letramento propriamente dito,

implica na apreensão dos mecanismos de comunicação facilitadores da interação

individuo – máquina – ambiente virtual. Nesse sentido, ressalta-se:

1. O caráter didático para compreensão dos percursos da informação;

2. Potencial de comunicação do site;

3. Interatividade com os usuários;

4. Construção da autonomia de uso.

É imperativo dizer que a compreensão dos processos informacionais está no

cerne do letramento digital no qual a comunicação constitui elemento chave do

processo interativo. O domínio implica na capacidade analítica de explorar os

diversos links, hipertextos, conteúdo imagético e filmográfico ampliando, dessa

forma, o olhar investigativo com vistas à construção do conhecimento.

No caso do Currículo Oculto e internet, caracterizados pela autora como

condição para além da organização de saberes desinteressados, o currículo cumpre

papel social relevante na medida em que materializa o conjunto da sociedade.

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Apresenta-se na dimensão ideológica, política, cultural e histórica. Nesse sentido,

camuflam-se valores e intenções. Nesse sentido, a crítica aos conteúdos torna-se

necessária para desnudar interesses e ideologias. A internet, com viés libertário e

sem censura esconde, nas nuvens de informações e servidores espalhados pelo

mundo, controles sociais sutis e possibilidades de implosão de muros e barreiras de

acesso à informação. A acessibilidade do ciberespaço caracteriza uma sociedade

em constante (e veloz) transformação.

Espaço virtual: das possibilidades de interação ao isolamento social

É interessante notar o quanto, em tão pouco tempo, a tecnologia invadiu lares,

bairros, cidades e países. A revolução dos sistemas de comunicação encurtou

distancias e possibilitou acesso a uma infinidade de conteúdos. A complexidade das

relações reais confunde-se, na essência, com a virtualidade agora presente. O

conceito sociológico de isolamento social merece reconsideração na atualidade.

As configurações dos ambientes virtuais merecem atenção especial do

planejamento analogamente ao que fazem as grandes empresas. Nesse sentido,

pensar estrategicamente um site vislumbrando sua intencionalidade, público-alvo,

conceituação, linguagem, perspectivas de compreensão, objetivos e resultados

esperados.

As demandas veiculadas no mundo virtual fazem emergir a instantaneidade

das respostas fazendo surgir uma geração imediatista e síncrona. Com efeito, urge a

necessidade de um profissional eclético e transdisciplinar que consiga traduzir numa

pagina de web as particularidades de um projeto.

Para a educação as possibilidades são inúmeras. A mudança de paradigma

que situa os atores sociais – professores e alunos – no ambiente de aprendizagem

em pé de igualdade com relação às possibilidades de investigação – não

menosprezando, evidentemente, as experiências do profissional de educação e sua

maturidade – na medida em que ambos acessam os conteúdos de aprendizagem.

É notório que a revolução causada pelo desenvolvimento tecnológico dos

meios de comunicação imprimiu na sociedade atual uma dinâmica de relações

interpessoais fluidas. O encurtamento das distancias e as novas fronteiras

educacionais movimentam o vasto repertorio do saber disposto no mundo virtual.

Não obstante, reiteramos a preocupação causada com a fluidez das relações

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interpessoais possibilitando o isolamento e a virtualidade das relações,

desdobramentos dignos de análise aprofundada.

Essas análises não se esgotam neste estudo, ao contrário, são retomadas e

ampliadas em nossa pesquisa de mestrado sempre que a questão das tecnologias

fizer parte do contexto do fenômeno pesquisado.