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BROMATOLOGIA Introdução Bromatologia é a ciência que estuda a composição química dos alimentos. A palavra é originada do grego: “bromatos” (alimento) e “logia” (estudo). Para os profissionais da área da Saúde, é de extrema importância o conhecimento da composição química dos alimentos, na forma como se apresentam na natureza e depois de sofrerem mudanças pelo processamento na industria de alimentos. Através desse conhecimento podemos entender as influências que possam exercer no organismo. Todos os países adotam normas e padrões para alimentos “in natura” ou processados, reunidos numa Legislação Bromatológica, que se preocupa com a qualidade dos alimentos oferecidos à sua população. Existe atualmente uma conscientização geral ligando a alimentação de uma população com a freqüência de determinadas doenças. Estudos epidemiológicos mostram que existe uma correlação estatística entre os recursos nutricionais disponíveis em determinadas regiões e a freqüência com que certas doenças se manifestam. O conhecimento destas tendências permite prevenir, minimizar seus danos e reeducar o povo quanto à sua alimentação. Doenças cardiovasculares, a maior “causa mortis” nos países desenvolvidos, estão relacionadas com a oferta abundante de alimentos, ricos em calorias e gorduras saturadas e pobres em fibras e ácidos graxos polinsaturados. A vida sedentária ainda agrava esse quadro, pois havendo baixa queima dessas calorias, elas ficarão armazenadas sob a forma de gordura no tecido adiposo, facilitando o aparecimento da obesidade. Vários tipos de câncer estão relacionados com dietas inadequadas, ricas em gorduras e pobres em fibras que seriam evitados pelo consumo de frutas, verduras e cereais integrais. Populações pobres, freqüentemente desnutridas, são muito suscetíveis a infecções do trato gastrintestinal, veiculadas por microrganismos contaminantes de alimentos e que neles encontram um meio de cultura excelente para se multiplicar. Essas afecções estão ligadas à falta de higiene e à ignorância do povo. O controle de doenças metabólicas hoje é possível, graças aos recursos de que dispomos pelos avanços na bromatologia e na tecnologia de alimentos. O diabético pode escolher alimentos não agressores que forneçam carboidratos adequados, fibras abundantes, proteínas de alto valor biológico e ácidos graxos insaturados, de modo a não elevar os índices glicêmicos pós-prandiais. A fenilcetonúria, doença metabólica diagnosticada nos recém-nascidos pelo teste do pezinho, obrigatório nas maternidades, é caracterizada pela incapacidade do individuo de metabolizar fenilalanina, um aminoácido presente em muitas proteínas. O fenilcetonúrico pode optar por uma alimentação em que essas proteínas sejam pouco representativas, sob o risco de desenvolver a doença. Os indivíduos intolerantes à lactose podem optar por produtos lácteos desenvolvidos pela tecnologia de alimentos e que possuem a lactose ausente ou transformada em ácido láctico. Portadores da doença celíaca, incapazes de metabolizar o glúten, são advertidos da sua presença em alimentos que devem ser evitados.

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BROMATOLOGIA

Introdução

Bromatologia é a ciência que estuda a composição química dos alimentos. A

palavra é originada do grego: “bromatos” (alimento) e “logia” (estudo).

Para os profissionais da área da Saúde, é de extrema importância o conhecimento

da composição química dos alimentos, na forma como se apresentam na natureza e depois

de sofrerem mudanças pelo processamento na industria de alimentos. Através desse

conhecimento podemos entender as influências que possam exercer no organismo.

Todos os países adotam normas e padrões para alimentos “in natura” ou

processados, reunidos numa Legislação Bromatológica, que se preocupa com a qualidade

dos alimentos oferecidos à sua população.

Existe atualmente uma conscientização geral ligando a alimentação de uma

população com a freqüência de determinadas doenças. Estudos epidemiológicos mostram

que existe uma correlação estatística entre os recursos nutricionais disponíveis em

determinadas regiões e a freqüência com que certas doenças se manifestam. O

conhecimento destas tendências permite prevenir, minimizar seus danos e reeducar o povo

quanto à sua alimentação.

Doenças cardiovasculares, a maior “causa mortis” nos países desenvolvidos, estão

relacionadas com a oferta abundante de alimentos, ricos em calorias e gorduras saturadas e

pobres em fibras e ácidos graxos polinsaturados. A vida sedentária ainda agrava esse

quadro, pois havendo baixa queima dessas calorias, elas ficarão armazenadas sob a forma

de gordura no tecido adiposo, facilitando o aparecimento da obesidade.

Vários tipos de câncer estão relacionados com dietas inadequadas, ricas em

gorduras e pobres em fibras que seriam evitados pelo consumo de frutas, verduras e cereais

integrais.

Populações pobres, freqüentemente desnutridas, são muito suscetíveis a infecções

do trato gastrintestinal, veiculadas por microrganismos contaminantes de alimentos e que

neles encontram um meio de cultura excelente para se multiplicar. Essas afecções estão

ligadas à falta de higiene e à ignorância do povo.

O controle de doenças metabólicas hoje é possível, graças aos recursos de que

dispomos pelos avanços na bromatologia e na tecnologia de alimentos.

O diabético pode escolher alimentos não agressores que forneçam carboidratos

adequados, fibras abundantes, proteínas de alto valor biológico e ácidos graxos insaturados,

de modo a não elevar os índices glicêmicos pós-prandiais.

A fenilcetonúria, doença metabólica diagnosticada nos recém-nascidos pelo teste do

pezinho, obrigatório nas maternidades, é caracterizada pela incapacidade do individuo de

metabolizar fenilalanina, um aminoácido presente em muitas proteínas. O fenilcetonúrico

pode optar por uma alimentação em que essas proteínas sejam pouco representativas, sob o

risco de desenvolver a doença.

Os indivíduos intolerantes à lactose podem optar por produtos lácteos

desenvolvidos pela tecnologia de alimentos e que possuem a lactose ausente ou

transformada em ácido láctico.

Portadores da doença celíaca, incapazes de metabolizar o glúten, são advertidos da

sua presença em alimentos que devem ser evitados.

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Hipertensos devem reduzir a oferta de sódio na sua alimentação.

A tecnologia de alimentos, utilizando os conhecimentos envolvidos na

bromatologia, se preocupa em desenvolver alimentos seguros e adequados para grupos

específicos de consumidores. Nas áreas da saúde, a bromatologia desempenha um papel

preponderante na prevenção de doenças, na formulação de dietas, na manutenção de

organismos saudáveis, envolvendo profissionais das mais diversas formações: bioquímicos,

farmacêuticos, nutricionistas, dentistas, médicos, engenheiros químicos e de alimentos.

Desde 1991, existe um acordo entre o Brasil, a Argentina, o Paraguai e o Uruguai,

países que formam o Mercosul, cujo objetivo é facilitar e promover o intercâmbio de bens

e serviços entre eles. Os países signatários se comprometeram a incorporar em suas

respectivas legislações nacionais, normas estabelecidas por grupos de especialistas para

unificar os critérios normativos de modo a facilitar a livre circulação de produtos variados,

entre os quais, estão os alimentos.

Dentro das normas de rotulação previstas para alimentos, sob os critérios adotados

pelo Mercosul, podemos definir alimentos como:

Alimento é toda substância que se ingere em estado natural, semi-industrializada ou

industrializada e se destina ao consumo humano, incluindo as bebidas e qualquer outra

substância que se utilize em sua elaboração, preparação ou tratamento.

Outra forma de definirmos alimento é: toda substância extrínseca ao organismo

humano que, após ingestão, digestão e absorção, fornece energia, material plástico para o

crescimento, reposição de tecidos e regula as reações biológicas, ou seja, mantém as

funções fisiológicas originais. A função energética ou calórica é especialmente oferecida

pelos carboidratos, gorduras e proteínas. A função plástica é garantida pelas proteínas

responsáveis pelas estruturas celulares. A função fisiológica ou reguladora é mantida pela

presença das vitaminas e sais minerais, assim como pelas proteínas na forma de enzimas.

Além dessas funções específicas, os alimentos apresentam uma função inerente que

não se enquadra em nenhuma dessas definições e que se relaciona ao nosso instinto de

sobrevivência: o estímulo de saciar a fome, a sensação de plenitude, a manutenção da

imunidade, o estímulo do peristaltismo e o esvaziamento gástrico.

Produto alimentício é aquele que contém ao lado da fração alimento, uma fração

não alimento. Ex: uma massa alimentícia e sua embalagem.

Nutriente é a parcela orgânica ou não, usada para fornecer energia, material

plástico ou para regular as funções biológicas. O nutriente absorvido evita ou reduz os

desgastes dos constituintes do organismo. Exemplos de nutrientes: proteínas, carboidratos,

gorduras, sais minerais, vitaminas, oxigênio. O oxigênio é essencial aos processos de

transformação dos alimentos e concorre para a geração de energia que mantém as funções

vitais.

Nutrição é o aproveitamento do alimento ingerido. A utilização do alimento requer

mudanças físicas e químicas para se transformar em substâncias nutritivas digeríveis e

absorvíveis.

O corpo humano é semelhante a uma máquina. Na máquina, o calor é a fonte de

trabalho, enquanto no corpo humano, o calor é resultado do trabalho. O alimento representa

a satisfação das necessidades orgânicas do homem, no início dos tempos, supridas pelo

instinto frente ao alimento encontrado. Hoje, podemos variar alimentos (lei da isonomia ou

equivalência), pois podemos substituir alimentos desde que tenham o mesmo valor

energético.

Todos os componentes do organismo procedem dos alimentos:

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Uns não sofrem grandes variações

Outros são transformados

Carência alimentar é o quadro em que faltam componentes que normalmente estão

presentes em quantidades maiores (carboidratos, gorduras, proteínas, água) ou componentes

presentes em quantidades imponderáveis (sais minerais, vitaminas) que não apresentam

valor calórico.

A nutrologia se ocupa do estudo de dietas equilibradas para desvios metabólicos,

enquanto a dietoterapia está voltada para suprir indivíduos com doenças específicas.

Dieta é uma palavra de origem grega que significa “gênero de vida” (diaita) e está

relacionada ao emprego racional das coisas úteis da vida, tanto para a saúde como para a

doença. É o conjunto de alimentos sólidos e líquidos prescritos pelo médico e que deve

satisfazer as necessidades orgânicas habituais ou epsódicas (condições especiais) como:

Hábitos alimentares individuais e/ou coletivos

Fatores regionais

Fatores culturais

Fatores econômicos

Fatores psicológicos

Fatores religiosos

O homem é onívoro, se alimenta dos três reinos: vegetal, animal e mineral.

O reino vegetal nos oferece alimentos variados nos aspectos: coloração, parte

botânica utilizável e nutritiva. São raízes, tubérculos, caules, folhas, flores, frutos,

sementes, ricos em óleos, açúcares, amido, celulose.

O reino animal nos oferece a parte muscular, as vísceras, órgãos destacados, leite e

derivados, ovos, gordura, mel, ricos em proteínas animais, lipídeos e carboidratos.

O reino mineral fornece a água, cálcio, cloro, cobre, cromo, fósforo, ferro, flúor,

iodo, lítio, magnésio, potássio, sódio entre os mais importantes.

Introdução à Química de Alimentos

Considerações sobre os alimentos existem em todas as partes do mundo, mas, de

acordo com o lugar, pode ter enfoques diferentes.

Nas regiões subdesenvolvidas, os povos se dedicam à produção de alimentos, mas

não se preocupam com a qualidade e a quantidade adequada dos nutrientes básicos.

Nas regiões desenvolvidas, a produção de alimentos é altamente mecanizada e

apenas pequena parte da população está envolvida nesse tipo de atividade. O alimento é

produzido em abundância, a maior parte é processada e o uso de aditivos químicos é

comum. Nesses lugares privilegiados, as considerações sobre os alimentos são

centradas principalmente no custo, qualidade, variedade, distribuição e nos efeitos do

processamento e da adição de substâncias químicas e, principalmente, no valor

nutritivo.

Todos esses conceitos estão relacionados com a ciência dos alimentos ligada às

propriedades físicas, químicas e biológicas e com a estabilidade, custo, qualidade,

processamento, segurança, valor nutritivo, benefícios à saúde e distribuição.

A ciência dos alimentos é uma ciência multidisciplinar que compreende

bacteriologia, química, biologia e engenharia.

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A química dos alimentos é o aspecto mais importante da ciência dos alimentos e

mexe com a composição e propriedades dos alimentos e as mudanças químicas que ele

sofre durante o manuseio, o processamento e o armazenamento. Está intimamente

ligada à química, à bioquímica, à química fisiológica, botânica, zoologia e biologia

molecular.

O analista de alimentos ou bromatologista se apóia no conhecimento das ciências

acima mencionadas para estudar e controlar as substâncias biológicas como fontes de

alimento para o homem.

O conhecimento das propriedades inerentes às substâncias biológicas e os métodos

de manipulá-las, são interesse comum às duas especialidades: analistas de alimentos e

biólogos.

Os biólogos se ocupam da reprodução, crescimento, mudanças que ocorrem nas

substâncias biológicas sob as condições ambientais compatíveis com a vida ou no limite

de compatibilidade com a vida.

Por outro lado, os bromatologistas estão voltados às substâncias biológicas que

estão mortas ou morrendo (fisiologia das plantas pós-colheita e fisiologia “post

mortem” do músculo) e as modificações que elas sofrem quando expostas a uma grande

variedade de condições ambientais. Como exemplo, temos a manutenção da vitalidade

durante a comercialização de frutas e vegetais.

Os bromatologistas estão ligados às transformações que ocorrem em alimentos

cujos tecidos foram rompidos, injuriados, triturados: farinhas, sucos de frutas e

vegetais, constituintes isolados e modificados e alimentos manufaturados. Também

estão ligados a fontes alimentares provenientes de células únicas (ovos e

microrganismos) e ao fluido biológico mais importante, o leite.

A história da Química de Alimentos

A química de alimentos começou a apresentar contornos próprios no século XX e

está intimamente ligada com a química agrícola. Químicos famosos fizeram

importantes descobertas relacionadas direta ou indiretamente com os alimentos:

Scheele, Lavoisier, Gay-Lussac, Berzelius, Liebig.

Esses químicos e farmacêuticos foram descobrindo aos poucos os ácidos presentes

nas frutas (ácidos cítrico, málico, tartárico, acético), os sais minerais , os ácidos graxos.

Ao mesmo tempo, foram aparecendo as descobertas relativas ao processo digestivo.

O primeiro livro publicado sobre química de alimentos data de 1847, ”Researches

on the Chemistry of Food”, de Justus Von Liebig.

À medida que a química de alimentos estava se desenvolvendo, começavam

também a aparecer as primeiras adulterações e, com isso, havia necessidade de

determinar impurezas em alimentos, o que estimulou o desenvolvimento da química

analítica em geral e da química analítica ligada aos alimentos.

Por volta de 1820, já havia adulteração de alimentos, mas não como um fato

relevante. As adulterações intencionais começaram a ficar freqüentes e sérias, perto de

1920. Nessa época, pressões regulatórias e métodos efetivos de detecção começaram a

reduzir a freqüência e a seriedade das adulterações e melhoraram a segurança dos

alimentos até os nossos tempos.

A partir de 1950, os aditivos começaram a fazer parte dos alimentos industrializados

e surgiram contaminações de alguns alimentos com produtos indesejáveis resultantes da

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industrialização, tais como o mercúrio, o chumbo, os pesticidas e passaram a fazer parte

das substâncias controladas pelas agências regulatórias.

O conhecimento público da segurança e adequação nutricional dos alimentos

oferecidos à população tem passado por modificações. Os alimentos são produzidos,

manipulados e processados e a grande maioria dos procedimentos é inevitável. Deste

modo, foram desenvolvidas técnicas sobre boas práticas de fabricação para minimizar a

presença indesejável de substâncias nocivas, assim como, tem-se estabelecido valores

limites toleráveis exatos para a ingestão dessas substâncias.

Apenas para dar uma idéia das adulterações intencionais em alimentos, podemos

citar:

Pimenta do reino – adulterada com folhas, sementes de linhaça, partes de plantas

moídas.

Vinagre – adulterado com ácido sulfúrico

Suco de limão – adulterado com ácido sulfúrico e outros ácidos.

Leite – adicionado de água principalmente, mas também com gis, amido, gomas,

gelatina, dextrina, glicose. Ao leite, podem ser adicionados conservantes como bórax,

ácido bórico, ácido salicílico, salicilato de sódio, nitrato de potássio.

Vinho – para atribuir cor: pau Brasil, açúcar queimado. Para adicionar “flavor”:

amêndoas amargas, tintura de sementes de uva. Como conservantes: ácido salicílico,

ácido benzóico, sais de chumbo.

Açúcar – com areia, poeira, óxido de cálcio.

Manteiga – excesso de sal e água, fécula de batata e amidos.

Chocolate – amido, argila, óxido de ferro e fécula de batata.

Pão – alúmen (KAl (SO4)2 . 12 H2O) e farinha feita de outros produtos diferentes do

trigo.

O primeiro laboratório público para analisar alimentos foi criado na Alemanha em

1860. Desenvolveram procedimentos de rotina para determinar os constituintes

majoritários dos alimentos. Uma amostra era dividida em várias porções e se

determinava: umidade, gorduras, cinzas e nitrogênio (multiplicando-se por 6,25

obtinha-se o conteúdo de proteínas)

Após digestão com ácido diluído e álcali diluído, obtinham um resíduo ao qual

deram o nome de fibra crua. A porção remanescente à remoção da proteína, gordura,

cinzas e fibra foi chamada de extrato livre de nitrogênio e representa os carboidratos.

Durante a primeira metade do século XX, a maior parte das substâncias essenciais

da dieta foram descobertas e caracterizadas: vitaminas, minerais, ácidos graxos e alguns

aminoácidos.

O desenvolvimento do intenso uso da química para auxiliar o crescimento, a

manufatura e a comercialização dos alimentos, teve um expressivo progresso por volta

de 1950.

Segurança alimentar

A segurança é o primeiro requisito de qualquer alimento. O alimento precisa estar

livre de qualquer produto químico prejudicial à saúde ou de qualquer contaminação

microbiana quando for consumido.

Na indústria de alimentos, utiliza-se a esterilização comercial para garantir que não

haja espóros viáveis de Clostridium botulinum. O processo utiliza o calor sob condições

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adequadas de tempo e temperatura, conforme a acidez do alimento que deve ser

esterilizado.

Algumas reações podem interferir na qualidade ou na segurança dos alimentos.

Essas reações ocorrem entre as diversas substâncias presentes nos alimentos,

dependendo do alimento e das condições de processo e armazenamento. As alterações

mais importantes que podem ocorrer, dizem respeito a:

Textura – resultando em perda de solubilidade, perda da capacidade de fixar água,

amolecimento.

“Flavor” – aparecimento de rancidez (hidrolítica ou oxidativa), aroma de caramelo,

outros aromas indesejáveis ou desejáveis.

Cor – Escurecimento, descoramento, desenvolvimento de cores indesejáveis, ou de

cores desejáveis.

Valor nutritivo – perda, degradação ou alteração da bioavaliabilidade das

proteínas, gorduras, vitaminas e minerais.

Segurança – geração de substâncias tóxicas, desenvolvimento de substâncias

resistentes ao calor, inativação de substâncias tóxicas.

As reações que podem ocorrer entre os componentes dos alimentos processados

podem ser resumidamente apresentadas como:

Escurecimento não enzimático – também chamado Reação de Maillard, ocorre nos

produtos assados ou submetidos ao processamento térmico.

Escurecimento enzimático - ocorre em frutas cortadas.

Oxidação – nos lipídeos, nas vitaminas causando degradação, descoloração de

pigmentos, perda do valor nutritivo de proteínas.

Hidrólise – em lipídeos, proteínas, vitaminas, carboidratos, pigmentos.

Interação com metais – complexação (antocianinas), perda de Mg da clorofila,

catálise de oxidação.

Isomerização de lipídeos – formação de isômero trans na hidrogenação de ácidos

graxos insaturados.

Polimerização de lipídeos – formação de espuma durante o processo de fritura.

Desnaturação de proteínas – coagulação da clara de ovo, inativação enzimática.

Síntese de polissacarídeos – em plantas pós-colheita.

Mudanças glicolíticas – em tecidos animais “post mortem” e em trecidos vegetais

pós-colheita.

Papel do especialista em bromatologia na sociedade

Em vista do privilégio do especialista em bromatologia ter recebido educação

superior, ele tem um alto grau de responsabilidade em relação à sociedade. Ele está

ligado ao suprimento adequado de alimentos, à manutenção da saúde da população, ao

custo dos alimentos, à formação do lixo e seu adequado tratamento, uso da água e da

energia e à natureza das leis que regulamentam os alimentos.

Esse compromisso do bromatologista em esclarecer e proteger a população, precisa

ser assumido para impedir que charlatães e pessoas não qualificadas em assuntos

relativos aos alimentos, dêem seus pareceres, muitas vezes alarmistas, usando os

recursos da mídia para gerar incerteza e desconfianças nos produtos, denegrindo as

indústrias que os fabricam e comercializam.

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Existe atualmente um grande preconceito em relação aos aditivos usados em

alimentos, uma verdadeira “quimicafobia”. Uma parcela da população acredita que os

aditivos representam um risco à saúde e se esquecem que o uso controlado dos mesmos

garante segurança em relação à conservação, atribui propriedades organolépticas mais

agradáveis aos alimentos e impede a formação de substâncias nocivas que, estas sim,

poderiam oferecer riscos ao consumidor. Usados com conhecimento e dentro dos

limites de concentração aconselhados pelos órgãos competentes, os aditivos são seguros

e zelam pela qualidade dos produtos.

Curso de Bromatologia

Os objetivos do curso de Bromatologia são:

Descrever os procedimentos analíticos que envolvem as determinações de

cada componente do alimento.

Discutir análises de alguns alimentos em particular.

Avaliar a quantidade e o tipo de adulteração que possa estar ocorrendo em

um alimento.

Não devemos seguir cegamente um procedimento, devemos ser capazes de fazer as

alterações convenientes quando um método precisa ser modificado.

As adulterações não são a finalidade principal do curso, pois os padrões de

identidade e de qualidade dos produtos alimentícios comerciais estão se transformando e,

desta forma, os conceitos de adulteração também podem mudar com o tempo. Como

exemplo, temos a adição de pectina na fabricação de geléias e compotas, que antes era

proibida e hoje é uma prática recomendada.

Não podemos deixar de comentar a presença de substâncias que não têm a função de

nutrir, mas que servem para melhorar o sabor dos alimentos, sua apresentação, sua

conservação e que, quando usadas dentro de seus limites de segurança, não oferecem riscos

e representam uma garantia de qualidade. Entre elas, podemos citar os edulcorantes

artificiais, corantes derivados das anilinas, antioxidantes, agentes antimicrobianos e tantos

outros aditivos alimentares responsáveis por aumentar a aceitabilidade, a palatabilidade e o

valor nutritivo desses alimentos.

Possibilidades e limitações dos métodos A determinação do conteúdo de frutas nos sucos de fruta e nas compotas é da maior

importância.

O mesmo se aplica à determinação do conteúdo de carne em salsichas..

Às vezes, interessa saber o conteúdo de proteína de leite de cabra em queijos feitos

supostamente só com leite de cabra..

Outra análise que pode ter interesse é a que detecta a presença de vinho de uvas em

vinhos de “berries” (amora, framboesa, morango, etc.).

São importantes também a detecção e identificação de proteínas e de óleos e

gorduras de diferentes fontes.

Os produtores de alimentos estão entendendo o valor do controle rígido da matéria

prima, tanto quanto do produto acabado. Muitos produtos acabados e matérias primas estão

sendo comprados e pagos de acordo com suas análises. Como exemplo, temos a cana de

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açúcar, cujo teor é medido por refratometria na própria plantação, antes da compra da

matéria prima.

Hoje, o que mais interessa são alimentos que conservem o máximo de seu aroma

original, cor e valor nutritivo. O desenvolvimento de produtos novos exige o treinamento

de químicos de alimentos com larga experiência analítica.

Análise de alimentos envolve o desenvolvimento dos métodos de identificação e

qualidade com técnicas adequadas para uso no laboratório de controle para assegurar a

uniformidade do alimento processado e para futuras melhorias no produto.

Existe uma tendência crescente para substituir procedimentos exatos, reprodutíveis

e objetivos pelos critérios subjetivos de sabor, aroma, textura, cor e outras qualidades. Os

métodos de análise sensorial em alimentos estão melhorando com a introdução e o

desenvolvimento de testes sensoriais estatísticos (avaliação de cerveja, vinho, café por

métodos sensoriais). Alguns atributos dos alimentos como cor e textura podem ser medidos

objetivamente, outros, como o aroma, não podem ser medidos por métodos químicos ou

físicos, dependendo de métodos sensoriais. Não há conhecimento suficiente da composição

química dos componentes voláteis ou não voláteis responsáveis pelo aroma, mas novos

métodos de separação por cromatografia gasosa são uma perspectiva futura de se conhecer

a química dos constituintes flavorizantes de produtos lácteos, de vegetais, frutas, carnes,

peixes.

Até hoje, os métodos de manipulação e processamento de frutas e vegetais são mais

baseados na experiência do que no conhecimento científico. Ainda não se controla a

composição do alimento durante o crescimento e depois da colheita. Do mesmo modo,

deveria haver um conhecimento mais detalhado para desenvolver uma alimentação

adequada de animais e aves para controlar a qualidade final da carne. As transformações

“postmortem” nos tecidos cárneos também deveriam ser mais bem estudadas, assim como

no caso dos produtos do mar.

Os métodos para análises de alimentos diferem muito das análises quantitativas

inorgânicas. Carboidratos, gorduras, óleos e proteínas são determinados por reações

características de certos componentes comuns. Muitas vezes a reação usada não tem um

ponto final definido e é complicada por outras reações simultâneas e consecutivas. Quando

há possibilidade de empregar métodos exatos como na determinação do Nitrogênio total

orgânico, um fator arbitrário é usado para expressar o resultado em termos do constituinte

desejado, ou seja, o teor de proteína.

Existem métodos adicionais, bioquímicos, físicos, bacteriológicos e biológicos para

interpretar os resultados de forma acurada. Precisamos conhecer os processos envolvidos.

Para determinados tipos de alimento, existem métodos desenvolvidos empiricamente e que

são mais precisos ou reprodutíveis do que exatos ou corretos. A reprodutibilidade de

métodos desenvolvidos empiricamente, adaptados sob certas condições, tem grande

influência nos resultados.

O conhecimento para a realização das análises é limitado pela complexidade das

reações usadas, pela presença de substâncias interferentes e pela inespecificidade do

próprio método. O preparo de amostras para análise envolve a separação e a concentração

do constituinte a ser determinado e a remoção dos elementos interferentes que são os

maiores responsáveis pela limitação dos métodos. Há necessidade de equipamentos de

laboratório específicos para essas análises.

O analista deve avaliar o que é geral e o que é particular para evitar procedimentos

desnecessários. Análises de alimentos não são receitas culinárias para serem seguidas

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cegamente para obter os resultados desejados. É importante a limpeza do laboratório, a

atenção escrupulosa às técnicas e a precisão dos resultados. Bons analistas são pessoas com

características particulares, pessoas muito nervosas e de temperamento errático não são as

mais indicadas.

Sempre se deve ter em mente a perecibilidade do produto analisado e a sua

suscetibilidade às transformações químicas e às variações das propriedades físicas.

Modificações mais acentuadas ocorrem nos alimentos não processados, animais e

vegetais, alterações rápidas nas atividades das enzimas presentes nos tecidos e deterioração

microbiana. A ação enzimática é responsável por muitas dificuldades inerentes a uma

análise acurada dos tecidos vivos.

Bibliografia Básica Bobbio, F.O. e Bobbio, P.A.; Introdução á química de Alimentos; 2ª edição, Livraria Varela, 1995. ANVISA, Métodos Físico Químicos para Análise de Alimentos; IV Edição; Instituto Adolfo Lutz, Brasília; Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Ministério da Saúde, 2005. Bobbio, P.A. E Bobbio, F.O.; Química do Processamento de Alimentos; 2ª edição, Livraria Varela, 1995. Bibliografia Complementar Bobbio, F.O. e Bobbio, P.A.; Manual de laboratório de Química de Alimentos, 1ª edição, Livraria Varela, 1995. Fennema, O. R.; Food Chemistry; third edition, Marcel Dekker, New York, 1996. Muradian, L.B.A. e Penteado M.V.C.; Vigilância Sanitária: tópicos sobre legislação e análise de alimentos, Rio de Janeiro, Editora Guanabara Koogan, 2007. RIBEIRO, E. P. e SERAVALLI, E. A. G., Química de Alimentos, 2º edição, Editora Blucher, 2007. CECCHI, H. M.; Fundamentos teóricos e práticos em análise de alimentos, 2º edição, Editora UNICAMP, 2007.