instrumentaÇÃo para o ensino: quais os saberes...

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4845 INSTRUMENTAÇÃO PARA O ENSINO: QUAIS OS SABERES ENVOLVIDOS? Taitiâny Kárita BONZANINI, Universidade de São Paulo Eixo Temático 01: Formação inicial de professores da educação básica [email protected] 1. Introdução Inegavelmente, instrumentos de ensino, ou também chamados recursos didáticos, recursos de ensino, materiais pedagógicos, quando bem selecionados e utilizados, contribuem para um ensino mais atual e dinâmico, favorecendo a construção e compreensões de conceitos. Tais instrumentos podem variar, desde o já conhecido giz e lousa, até atividades práticas, jogos didáticos, vídeos e simulações computacionais, dentre outros utilizados em sala de aula. Entende-se que os instrumentos de ensino, ou recursos didáticos, definidos por SOUZA (2007, p.111) como “todo material utilizado como auxílio no ensino e aprendizagem do conteúdo proposto para ser aplicado, pelo professor, a seus alunos”, precisam ser variados e diversificados, para dinamizar o ensino de conteúdos, muitas vezes abstratos, principalmente no ensino de ciências e biologia. A compreensão de termos e conceitos como molécula, proteína, aminoácidos, entre outros, pode ser facilitada dependo da forma didática e dos recursos utilizados pelo professor. No entanto, o que se observa na prática diária da Educação Básica, assim como nas indicações de pesquisas na área de Ensino de Biologia, é que mesmo diante dos crescentes avanços da Ciência e da tecnologia, o ensino de ciências e de biologia comumente e, em algumas escolas, somente, utiliza aulas expositivas, sendo o professor a figura principal e os alunos ouvintes passivos. Lima e Vasconcelos (2006) destacam que alunos do ensino fundamental da rede pública, na maioria das vezes, deparam-se com metodologias que nem sempre promovem a efetiva construção de seu conhecimento. Tal situação, conforme indicado por Krasilchik (2008), contribui para o desinteresse pelo conteúdo por parte do aluno. Além disso, ao utilizar diferentes recursos didáticos existem maiores chances de o professor atingir de forma mais eficaz a heterogeneidade dos alunos, que apresentam características diferentes e aprendem de modos diferentes. Também os recursos didáticos precisam estar adequados aos objetivos educacionais, um determinado instrumento pode ser adequando para o alcance de um objetivo, mas não de todos os objetivos do ensino de ciências e biologia. Dessa forma, o professor precisa conhecer e trabalhar com uma variedade de propostas, para alcançar as mais diversas possibilidades e limitações de uma turma de alunos.

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4845

INSTRUMENTAÇÃO PARA O ENSINO: QUAIS OS SABERES ENVOLVIDOS?

Taitiâny Kárita BONZANINI, Universidade de São PauloEixo Temático 01: Formação inicial de professores da educação básica

[email protected]

1. Introdução

Inegavelmente, instrumentos de ensino, ou também chamados recursos didáticos,

recursos de ensino, materiais pedagógicos, quando bem selecionados e utilizados,

contribuem para um ensino mais atual e dinâmico, favorecendo a construção e

compreensões de conceitos. Tais instrumentos podem variar, desde o já conhecido giz e

lousa, até atividades práticas, jogos didáticos, vídeos e simulações computacionais,

dentre outros utilizados em sala de aula.

Entende-se que os instrumentos de ensino, ou recursos didáticos, definidos por

SOUZA (2007, p.111) como “todo material utilizado como auxílio no ensino e

aprendizagem do conteúdo proposto para ser aplicado, pelo professor, a seus alunos”,

precisam ser variados e diversificados, para dinamizar o ensino de conteúdos, muitas

vezes abstratos, principalmente no ensino de ciências e biologia. A compreensão de

termos e conceitos como molécula, proteína, aminoácidos, entre outros, pode ser

facilitada dependo da forma didática e dos recursos utilizados pelo professor.

No entanto, o que se observa na prática diária da Educação Básica, assim como

nas indicações de pesquisas na área de Ensino de Biologia, é que mesmo diante dos

crescentes avanços da Ciência e da tecnologia, o ensino de ciências e de biologia

comumente e, em algumas escolas, somente, utiliza aulas expositivas, sendo o professor

a figura principal e os alunos ouvintes passivos. Lima e Vasconcelos (2006) destacam

que alunos do ensino fundamental da rede pública, na maioria das vezes, deparam-se

com metodologias que nem sempre promovem a efetiva construção de seu

conhecimento. Tal situação, conforme indicado por Krasilchik (2008), contribui para o

desinteresse pelo conteúdo por parte do aluno.

Além disso, ao utilizar diferentes recursos didáticos existem maiores chances de o

professor atingir de forma mais eficaz a heterogeneidade dos alunos, que apresentam

características diferentes e aprendem de modos diferentes. Também os recursos

didáticos precisam estar adequados aos objetivos educacionais, um determinado

instrumento pode ser adequando para o alcance de um objetivo, mas não de todos os

objetivos do ensino de ciências e biologia. Dessa forma, o professor precisa conhecer e

trabalhar com uma variedade de propostas, para alcançar as mais diversas

possibilidades e limitações de uma turma de alunos.

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Dentre os diversos tipos de recursos didáticos, especialmente no ensino de

ciências e de biologia, atividades de caráter mais prático, como experimentos,

simulações, podem contribuir de forma mais efetiva para a abordagem de conceitos

dessa área do saber que trata de assuntos concretos e, por isso, perdem o sentido

quando observadas somente sob o ponto de vista teórico. Assim, grande parte do saber

científico transmitido na escola é rapidamente esquecida, prevalecendo ideias

alternativas ou de senso comum bastante estáveis e resistentes, identificadas, até

mesmo, entre estudantes universitários (MORTIMER, 1996).

Não se pode admitir que estudantes permaneçam com ideias de senso comum, e

até errôneas, no que diz respeito a conceitos científicos. Boa parte dessa situação pode

ser minimizada com a promoção de uma formação docente que valorize a reflexão sobre

a prática pedagógica e sobre o uso de instrumentos de ensino que favoreçam uma

compreensão adequada da Ciência, abandonando a dependência do livro didático e a

mera reprodução de aulas expositivas. Não se pretende, aqui, negar a importância de

materiais pedagógicos ou das aulas expositivas, que podem ser eficientes em

determinados momentos. O que se discute é o uso excessivo de um único material ou

metodologia durante as aulas de ciências e biologia, da situação de passividade que o

estudante é colocado, e a necessidade de se refletir sobre modelos de ensino que

necessitam ser revistos e deixem de centralizar a memorização de fatos e conceitos, o

que pode provocar um distanciamento entre o aluno e a Ciência.

Concordando com Amaral (2006), todos os recursos didáticos são adequados ao

ensino de ciências e biologia, e todos, dos mais simples aos mais sofisticados, dos mais

modernos aos mais arcaicos, requerem uma metodologia de ensino que deve estar

adequadamente relacionada a forma desse recurso, aplicação, seleção e mediação por

parte do docente. Dessa maneira, o professor precisa de uma formação que o auxilie a

escolher um instrumento, planejar a atividade e relacionar o conteúdo ao cotidiano do

aluno. Conforme Souza (2007, p. 111), “O professor deve ter formação e competência

para utilizar os recursos didáticos disponíveis, e muita criatividade”.

Nesse contexto, cabe refletir sobre os conhecimentos, os saberes docentes

(TARDIF, 2003), relacionados a escolha e uso de materiais didáticos e, concordando com

Fiscarelli (2006), é importante repensarmos que tanto a formação inicial dos professores

quanto as atividades de formação continuada, devem considerar não somente o ideário

pedagógico existente sobre esta utilização dos materiais didáticos como também os

saberes e experiências vividos por esses profissionais na escola.

Dessa forma, não trata, portanto, de discutir os instrumentos ou recursos para o

ensino de ciências e biologia desvinculados da prática pedagógica, é preciso, contudo,

analisar os saberes docentes envolvidos na utilização desses materiais, ou seja, admite-

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se que os instrumentos de ensino têm papel relevante na organização de uma aula de

Ciências, e a análise desses materiais torna-se fundamental no sentido de investigar se

cumprem seu papel de favorecedores e facilitadores da aprendizagem. No entanto, essa

análise precisa ser acompanhada por discussões sobre a formação do professor e seus

saberes.

Nesse sentido, investigações sobre os instrumentos de ensino para as aulas de

ciências e biologia e a relação desses com os saberes docentes mobilizados para sua

utilização justificam-se pela necessidade de promover discussões para a construção de

novas práticas escolares. Sendo assim, vem se realizando uma pesquisa que focaliza

professores em formação, de um curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, e

também professores em exercício. Por tratar de uma pesquisa em desenvolvimento, o

processo de coleta de dados encontra-se em fase inicial e, nesse artigo, serão

apresentadas discussões sobre a formação inicial de professores a partir de duas

questões de pesquisa: 1) Quais saberes docentes são mobilizados pelos professores em

formação quando devem planejar o uso de diferentes instrumentos de ensino? 2) Quais

as necessidades formativas dos licenciandos, relacionadas ao planejamento e execução

de atividades práticas ou experimentais no ensino de ciências e biologia?

2. Objetivo

O objetivo principal desse artigo é discutir os saberes docentes envolvidos na

instrumentação para o ensino de ciências e biologia, durante a formação inicial de

professores, ou seja, focaliza-se o papel dos saberes docentes na escolha, planejamento

de uso e avaliação dos instrumentos de ensino.

3. Procedimentos metodológicos

A pesquisa apresenta um caráter qualitativo, pois a preocupação reside,

principalmente, no aprofundamento da compreensão de um determinado grupo, nesse

caso, os licenciandos de um curso de Ciências Biológicas, e de um determinado aspecto

envolvido com a prática pedagógica, a instrumentação para o ensino (LÜDKE e ANDRÉ,

2012). Dessa forma, os dados são discutidos a partir de reflexões sobre referenciais

teóricos adotados nessa investigação e apresentados a seguir.

A investigação focalizou uma turma de 22 licenciandos em Ciências Biológicas, e

uma disciplina obrigatória, de Instrumentação para o ensino, oferecida no penúltimo

semestre do curso.

Os procedimentos adotados para a coleta dos dados envolveram:

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- Análise de atividades e avaliações produzidas, configurando uma análise

documental (LÜDKE e ANDRÉ, 2012), pois buscou identificar informações factuais nos

documentos a partir de questões de interesse. Primeiramente foi preciso identificar quais

os recursos didáticos eram apresentados pelo estudante e, posteriormente identificar os

saberes docentes envolvidos no preparo da atividade, seleção de um recurso didático e

exemplificação de práticas pedagógicas.

- Análise de anotações realizadas em um diário de campo. Essas anotações foram

realizadas no decorrer de 17 aulas, durante um semestre letivo do ano de 2015 e

envolveram diálogos entre docente da disciplina e licenciandos, questionamentos

levantados, participações em aulas e apresentações de trabalhos pelos alunos.

Para a discussão dos dados buscou-se fundamentação em referenciais que

definem o que são instrumentos de ensino (KARLING, 1991, por exemplo) e referenciais

que discutem os saberes docentes (TARDIF, 2003; MARCELO GARCIA, 1999; PIMENTA,

2000; e outros).

4. Fundamentação teórica

Diante do objetivo desse artigo, cabe realizar uma breve descrição dos

referenciais teóricos que orientam o desenvolvimento da pesquisa.

Para a investigação utilizam-se os termos instrumentos de ensino e recursos

didáticos para fazer referência aos materiais utilizados em aulas de ciências e biologia.

Os instrumentos ou recursos de ensino podem ser classificados como recursos humanos

e materiais que o professor utiliza para auxiliar e facilitar a aprendizagem, “são também

chamados de recursos didáticos, meios auxiliares, meios didáticos, materiais didáticos,

recursos audiovisuais, multimeios ou material institucional” (KARLING, 1991, p. 245).

Segundo Pais (2000), os recursos didáticos envolvem uma diversidade de

elementos utilizados como suporte experimental na organização do processo de ensino e

de aprendizagem, ou seja, o recurso é um mediador que facilita a interação aluno-

professor e o conhecimento.

Souza (2007) define recurso didático como todo material utilizado para o auxílio

no processo de ensino e aprendizagem do conteúdo proposto, para a autora:

Utilizar recursos didáticos no processo de ensino- aprendizagem é importante para que

o aluno assimile o conteúdo trabalhado, desenvolvendo sua criatividade, coordenação

motora e habilidade de manusear objetos diversos que poderão ser utilizados pelo

professor na aplicação de suas aulas (SOUZA, 2007, p.112-113).

A utilização de um determinado instrumento de ensino deve estar ancorada em

uma fundamentação psicológica e pedagógica que sustenta a necessidade de

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proporcionar à criança e ao adolescente a oportunidade de, por um lado, exercitar

habilidades como cooperação, concentração, organização, manipulação de

equipamentos e, por outro, vivenciar o método científico, entendendo como tal a

observação de fenômenos, o registro sistematizado de dados, a formulação e o teste de

hipóteses e a inferência de conclusões.

No entanto, atividades com tais características, ainda, se encontram pouco

presente nas salas de aula, embora permaneça a crença dos professores de que, por

meio delas, é possível transformar o ensino de Ciências (GALIAZZI et. al, 2001).

De acordo com Gonçalves e Marques (2006), a ausência de atividades com um

caráter mais prático no ensino, ocorre, em grande parte, devido à falta de espaço e

condições das escolas como ausência de materiais, por exemplo. Deve-se acrescentar a

esses fatores a formação docente e o saberes que devem mobilizar para selecionar,

utilizar e avaliar os instrumentos de ensino. Sendo assim, discutir instrumentos no ensino

de ciências e biologia requer também uma reflexão sobre a formação do professor e os

saberes docentes.

Diferentes autores apresentam distintas definições para o termo saber e, em uma

tentativa de comparar tais definições, propõe-se a tabela a seguir:

Tabela 1- Definições do termo saber

Autores DefiniçãoAzzi (2000) Saber é uma fase do desenvolvimento do conhecimento, construído

pelo próprio indivíduo. Borges (2004) Gauthier et al(1998)

Consideram que o termo saber é sinônimo de conhecimento.

MarceloGarcia (1999)

Utiliza o termo conhecimento em referência aos conhecimentosteóricos e conceituais, que constituiriam o saber pedagógico, assimcomo ao saber-fazer.

Pacheco(1995)

O termo saber envolveria um conjunto de conhecimentos,contextualizado por um sistema concreto de práticas escolares. Seriauma multiplicidade de saberes, objetivo, subjetivo e comunicacional,ligados às experiências pessoais. O conhecimento do professor seriaresultado de uma prática diária, pela inter-relação com os alunos ecom outros professores, ligado a uma prática que envolve reflexão.

Perrenoud(2002)

Distingue os termos competência e saber, afirmando que ascompetências mobilizam os saberes, e estes não estão ligados a umaúnica competência.

Tardif (2003) O termo saber apresenta um sentido amplo, engloba osconhecimentos, competências e habilidades, construídos ao longo deuma trajetória, e provenientes de fontes diversas: formação inicial,continuada, pontual, experiência, entre outras.

Essas definições orientam as discussões dessa pesquisa e, tomando como

referência a noção de saber adotada por Tardif (2003), como um conjunto de

conhecimentos, competências e habilidades construídos ao longo de uma trajetória,

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pode-se inferir que o educador precisa dominar um conjunto de saberes ou

conhecimentos que contribuam significativamente para seu trabalho, constituindo o

conhecimento profissional docente.

Autores apontam uma série de classificações e tipologias dos saberes docentes

que, conforme Mizukami (2004) apresentam elementos em comum e particularidades. No

intuito de apresentar uma comparação de determinadas definições, e utilizar uma

classificação na discussão dos dados sem, no entanto, ter a pretensão de criar tipologias,

elaborou-se a tabela 2. Considera-se também que tais saberes não são independentes,

mas sim interligados, podendo ser utilizados pelo docente, muitas vezes, em conjunto.

Para elaboração dessa segunda tabela, foram localizados nos referenciais

utilizados os principais saberes docentes e, como os autores definem um mesmo saber

com diferentes termos, em uma mesma coluna da tabela foram alocados os saberes que,

apesar de apresentarem nomenclaturas diferentes, apresentam o mesmo significado.

Tabela 2: Definições de saberes docentes

Autores DefiniçõesSaberDisciplinar

SaberCurricular

Saber das Ciências da Educação

SaberExperiencial

SaberPessoal

Azzi(2000)

_________ Conhecimen-topedagógico:conhecimen-to sobre oscurrículos.

Conhecimentopedagógico:

conhecimentosobre os

conteúdospedagógicos.

Saberpedagógico:envolve os

saberes dasexperiênciasdocentes eos saberes

profissionaisgerais.

Sabercotidiano:envolve os

saberespessoais.

Borges(2004)

Conhecimen-to disciplinar

ou damatéria

ensinada:conhecimen-

to sobre oconteúdo a

serensinado.

Saberensinar:conheci-mento

curricular.

Conhecimentodas Ciências

sociais ehumanas:envolve os

saberes sobre oconteúdo

pedagógico.

___________ Saber ser, terpostura,

saber agir, valores.

MarceloGarcia(1999)

Conheci-mento doconteúdo:

Conhecimento sobre oconteúdo a

serensinado.

Conheci-mento

psicopedagógico:

envolve ossaberes

curriculares.

Conhecimentopsicopedagó-gico: envolveos saberessobre os

conteúdospedagógicos.

___________ _________

Gauthieret al

Conheci-mento do

Conheci-mento do

Conhecimentodo programa:

Saberexperiencial:

Conhecimen-to de si

4851

(1998) conteúdo:saberes

disciplinares (matéria).

programa:saberes

curriculares

Saberes dasciências daeducação

(disciplinaspedagógicas).

jurisprudência individual.

mesmo:saberes

culturais epessoais.

Pacheco(1995)

Conheci-mento

profissional:conhecimen

to dosconteúdos

dadisciplina.

Conheci-mento

profissional:conhecimento curricular(ferramenta

s deensino).

Conhecimentoprofissional:

conhecimentopedagógico

geral;conhecimentodo conteúdopedagógico.

Conheci-mentoprático:

envolve areflexão-em-ação: resultada atividade

cotidiana,adquirido

pela prática,é um

conhecime-nto sobre aprática e, a

partir daprática,

envolve osaber-fazer.

_________

Pimenta(2000)

Saberes doconheci-mento:saberes

relacionados ao

conhecimento

específicodo

conteúdoou

disciplina

__________

Saberespedagógicos:

saberesrelacionados aocomo ensinar,

ou saberensinar

(didática).

Saberes daexperiência:Produzidos

no seucotidianodocente,

através dareflexão

sobre suaprópriaprática.

Saberes daexperiência:construídosdurante suatrajetória devida, envolvea construção

de suapersonalidadeprofissional.

Shulman(1987)

Conheci-mento doconteúdo

específico:envolve os

saberessobre o

conteúdo aser

ensinado.

Conheci-mento doprograma:

envolve umconhecimen

topedagógico

geral.

Conhecimentopedagógico

geral:conhecimento

dos fins,objetivos,valores e

fundamentosfilosóficos ehistóricos.

___________ __________

Tardif(2003)

Saberesdisciplina-

res:saberes

provenientes da

formaçãoinicial dos

professores

Saberescurriculares:provenien-

tes dosprogramasdidáticos,envolvem

um conheci-mento

Saberes daformação

profissional:transmitidos

pelasinstituições deformação deprofessores,

são os

Saberesexperienciais

brotam daexperiência esão por elavalidados.Produzidos

pelosprofessores,

Saberesexperienciaisou saberespessoais:

incorporam-se às

experiênciasindividuais e

coletivas

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sobre osprogramasescolares.

saberes dasciências da

educação e ossaberes daideologia

pedagógica.

baseados emseu trabalhocotidiano e

noconhecimen-

to de seumeio.

através dehabitus e

habilidades,de saber-

fazer e saber-ser.

As definições apresentadas serão utilizadas para análise e discussão dos dados

levantados.

5. Resultados e discussões

A análise das atividades produzidas pelos estudantes investigados revelou que ao

propor o uso de um instrumento de ensino, o futuro professor mobiliza, mais comumente,

os saberes disciplinares, curriculares (pedagógicos) e saberes experienciais.

Com relação aos saberes disciplinares, foi possível identificar, que esses

licenciandos focalizam excessivamente termos técnicos, científicos, nomenclaturas e

classificações, ou seja, mobilizam saberes sobre conteúdos específicos das Ciências

Biológicas e não refletem sobre a necessidade de adaptações que favoreçam o ensino de

ciências e biologia na educação básica, como também de transposições didáticas que

tornem o conhecimento mais compreensível para um estudante que, na maioria das

vezes, depara-se com um termo pela primeira vez. Quando questionados, por exemplo,

sobre o significado de um termo como saturação, o estudante apresentou dificuldades

para encontrar exemplos ou analogias que facilitassem a compreensão do termo citado.

O foco quase que exclusivo no conhecimento disciplinar esteve relacionado ao

uso de atividades didáticas, recursos ou instrumentos que podem ser inacessíveis aos

estudantes da educação básica como práticas de laboratório que carecem de reagentes

e equipamentos sofisticados e de última geração. Práticas que valorizavam o

conhecimento técnico de uma estrutura celular, por exemplo, foram comuns, levando-se a

reflexão sobre a falta de conexão com questões práticas, o que pode favorecer o trabalho

com conceitos abstratos que pouco serão compreendidos pelos estudantes da educação

básica, ou ainda práticas que não poderão ser reproduzidas em situações reais de

ensino. Não se nega o imprescindível domínio do conteúdo específico de uma disciplina,

mas isso, por si só não basta, o professor precisa saber ensinar esse conteúdo,

adaptando termos e conceitos, exemplificando, para facilitar a compreensão.

Observou-se que os licenciandos tendem a reproduzir situações de ensino que

vivenciaram durante sua vida acadêmica, ou seja, copiam os modelos que conhecem.

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Acabam por reproduzir aulas teóricas carregadas de conceitos, esquecendo que na

educação básica o nível cognitivo do estudante é diferente do nível universitário.

A análise das atividades escritas revelou uma constância de propostas

centralizadas em aulas expositivas, nas quais o professor expõe aos alunos, de forma

escrita e verbal, os conteúdos planejados, com alguns momentos de diálogos e

perguntas, por vezes o professor questiona os conhecimentos prévios dos alunos, para

tanto utilizando slides e projetor, instrumentos utilizados para expor a descrição de

conceitos, imagens, simulações ou vídeos. Realizada a exposição, propõem a aplicação

do conteúdo para a resolução de atividades que podem ser exercícios, perguntas,

histórias com situações problemas, jogos didáticos ou uma atividades prática; e, por fim,

a aplicação de uma avaliação.

O principal modelo de aula foi, portanto, o expositivo, seguindo a organização de

aula teórica e em seguida prática ou atividade e ao final uma avaliação. A maioria das

atividades, sugeridas pelos universitários, foram consultadas em sites da Internet,

ocorrendo pouca criatividade e reflexão sobre a prática. Verificou-se que os alunos têm

dificuldades para compreender que em uma atividade prática o professor pode abordar

inúmeros conceitos e estes podem ser construídos em conjunto com os alunos, sem que

sejam apresentados como prontos e acabados.

Para minimizar tal situação, avalia-se a necessidade de as disciplinas de

formação inicial, tanto as relacionadas aos conteúdos das Ciências Biológicas, como as

relacionadas aos conteúdos Pedagógicos, abordarem as diferenças entre o fazer ciência

e o ensinar ciências, indicando que existem linguagens e códigos próprios utilizados em

cada situação, e que o principal objetivo do ensino é contribuir para a aprendizagem que

o estudante irá construir.

O professor universitário também precisa abandonar o modelo que “é

reproduzindo que se aprende”, ou seja, ele expõe o conteúdo e o aluno ouve e aprende,

e questionar atividades elaboradas pelos alunos que não sejam criativas e simplesmente

reproduzam os modelos de sua aula. Nesse sentido, considera-se importante solicitar

que licenciandos elaborem atividades e expliquem como as desenvolveriam em situações

reais de ensino, discutindo e analisando essa proposta, refletindo sobre sua

aplicabilidade, para tanto relacionando as disciplinas pedagógicas e curriculares e os

saberes construídos. Assim, é possível identificar quais saberes são mobilizados, quais

estão ausentes, incompletos ou precisam ser desconstruídos, como podem sistematizar

seus saberes, quais são necessários para a prática docente.

Observou-se, portanto, que os licenciandos costumam mobilizar os saberes

curriculares ou pedagógicos, e menos frequentemente os saberes da didática das

ciências, metodologia de ensino, transposição didática, ciências da educação.

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Durante as aulas, ocorreram discussões sobre as relações dos conceitos com a

história da ciência e relações CTSA (Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente) por

considerar que ao ensinar ciências é preciso discutir o contexto de produção de uma

teoria, como as investigações podem ser influenciadas pela política ou economia de uma

dada época e como um conceito está relacionado a demais questões sociais, científicas,

tecnológicas, por exemplo. Tal fato apareceu em muitos relatos de alunos: “usar relatos

sobre com a penicilina foi descoberta pode ajudar na compreensão de alguns conceitos,

pois quando sei um pouco sobre a história entendo melhor algumas questões.”

Como propostas de avaliações, comumente foram apresentadas provas e

atividades escritas, com pouca preocupação sobre o importante feedback que uma

avaliação pode oferecer tanto para alunos como também para professores.

Os saberes experienciais se mostraram em alguns momentos, quando revelavam

exemplos de atividades que vivenciaram durante a educação básica e/ou formação

acadêmica, seja em disciplinas do curso, estágios, ou cursos extra curriculares; nesses

momento também demonstrando que reproduzem modelos já vivenciados.

Entende-se que um professor da educação básica age na urgência e na incerteza,

portanto reproduzir modelos pouco contribui para um ensino de ciências atual, dinâmico e

com qualidade. Assim, a formação inicial precisa ultrapassar a mera reprodução de

modelos e favorecer a mobilização de diferentes tipos de saberes, através da construção

de espaços para a reflexão sobre práticas de ensino diante de contextos variados e

heterogêneos nos quais se insere a educação básica. Conforme indicado por Tardif

(2003), o aprendizado a partir da prática é a melhor descrição do que se poderia

denominar de aprendizado para ensinar, pois é por meio dele que se tem a oportunidade

de aprender a lidar com a surpresa, dúvida e complexidade, intrínsecas ao microcosmo

do cotidiano da sala de aula

6. Considerações

Instrumentalizar um professor para o ensino de ciências e biologia envolve

reconhecer os saberes que precisam ser mobilizados no exercício da profissão. Para

tanto, a formação inicial, além de proporcionar a construção dos saberes disciplinares,

deve possibilitar um saber-fazer prático, racional e fundamentado para agir em situações

complexas de ensino, nas quais não bastam simples aplicações de modelos. É preciso,

por tanto, que a formação inicial valorize tanto a formação cultural, como a científica,

como a pedagógica, como a disciplinar, articuladas a formação prática. Daí a

necessidade de favorecer vivências e análise de práticas concretas que permitam

4855

constante dialética entre a prática profissional e a formação teórica, evitando-se tanto um

ofício sem saberes como também um saberes sem ofício.

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