inquérito. maioria das mulheres não tenciona ter mais filhos£o-tenciona... · das pessoas deseja...

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inquérito. Maioria das mulheres não tenciona ter mais filhos Inquérito à Fecundidade 2013 mostra que os portugueses não ambicionam ter famílias numerosas. Dinheiro é a principal razão KATIA CATULO Em média têm um filho e no máximo pensam vir a ter dois. A maioria das mulheres (51%) e quase metade (46%) dos homens têm filhos e não planeiam ter mais. Essa é a ambição dos portugue- ses e a principal conclusão do primeiro Inquérito à Fecundidade em quase duas décadas e que agora ajuda a explicar por que razão Portugal, em comparação com os restantes países da União Europeia, está no fundo da lista. O Inquérito à Fecundidade 2013 reali- zado pelo Instituto Nacional de Estatís- tica (INE) em parceria com a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) teve como objectivo analisar os padrões de fecundidade para quem tem filhos e para quem ainda não os tem. A análise foi feita em função do número de filhos tidos, do número que pensam vir a ter e também do número que gostariam de ter. As mulheres e os homens inquiridos têm em média 1,03 filhos, mas pensam chegar aos 1,77 filhos. O número médio desejado, contudo, é de 2,31 filhos e o conceito de família ideal é 2,38 filhos, valor aliás que desejariam para si pró- prios. Os casais a viver em Portugal não ambicionam ter famílias numerosas e para os que têm filhos a principal razão está nos custos financeiros. O inquérito ontem apresentado em Lis- boa mostra que 67% das mulheres e 68% dos homens que decidiram não ter mais crianças apontaram os "custos associa- dos" como a principal razão. A dificul- dade em conseguir emprego foi, por outro lado, o motivo apontado para 48% das mulheres e 59% dos homens. A esma- gadora maioria dos homens e das mulhe- res (94%), aliás, defende mais incenti- vos à natalidade através de benefícios fiscais e apoios à educação ou redução de impostos. O estudo adianta que 74% das mulhe- res e 88% dos homens com idades entre os 18 e os 29 anos não têm filhos, enquan- to 40% das mulheres e 38% dos homens do grupo etário 30-39 têm um filho e, no grupo 40-49 anos, 45% das mulheres e 40% dos homens têm dois filhos. A ida- de média em que tiveram o primeiro filho ronda os 26 anos para as mulheres e os 28 anos para os homens, "reflectin- do a tendência de estes serem pais mais tardiamente", conclui o presidente do conselho de administração da FFMS. Para aqueles que ainda não têm filhos, mas pensam vir a ter, a idade média com que no máximo querem vir a ter o pri- meiro filho é de 31 anos para as mulhe- res e 33 anos para os homens. Para todos os grupos etários, é predominante a pro- porção de pessoas que pensam vir a ter e desejariam ter dois filhos, indepen- dentemente da situação conjugal, do nível de escolaridade ou da condição perante o trabalho. Contudo, 42% das mulheres e 36% dos homens com nível de escolaridade superior desejavam ter três ou mais filhos, valores superiores aos observados nos restantes níveis de escolaridade. Também as pessoas que vivem em áreas densamente povoadas desejam ter, em média, mais filhos (2,4) do que as que vivem em áreas menos povoadas (2,2). Outras tendências, contudo, represen- tam um "sinal de progresso", defende António Barreto. É o caso, por exemplo, das diferenças pouco significativas entre eles e elas que vem retirar às mulheres a culpa pela baixa taxa de fecundidade por "quererem estudar, trabalhar ou ser como os homens". Ou as diferenças tam- bém pouco expressivas entre centros urbanos e Interior, contrariando a ideia de que é nas zonas rurais que existe a "vontade de ter mais filhos".

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Page 1: inquérito. Maioria das mulheres não tenciona ter mais filhos£o-tenciona... · das pessoas deseja ter três ou mais filhos. Amaioria das pessoas até aos 30 anos não tem filhos,

inquérito. Maioria das mulheresnão tenciona ter mais filhos

Inquérito à Fecundidade 2013 mostra que os portugueses já nãoambicionam ter famílias numerosas. Dinheiro é a principal razãoKATIA CATULO

Em média têm um filho e no máximo

pensam vir a ter dois. A maioria das

mulheres (51%) e quase metade (46%)dos homens já têm filhos e não planeiamter mais. Essa é a ambição dos portugue-ses e a principal conclusão do primeiroInquérito à Fecundidade em quase duasdécadas e que agora ajuda a explicar porque razão Portugal, em comparação comos restantes países da União Europeia,está no fundo da lista.

O Inquérito à Fecundidade 2013 reali-zado pelo Instituto Nacional de Estatís-

tica (INE) em parceria com a FundaçãoFrancisco Manuel dos Santos (FFMS)teve como objectivo analisar os padrõesde fecundidade para quem tem filhos e

para quem ainda não os tem. A análisefoi feita em função do número de filhos

tidos, do número que pensam vir a ter e

também do número que gostariam deter. As mulheres e os homens inquiridostêm em média 1,03 filhos, mas pensamchegar aos 1,77 filhos. O número médiodesejado, contudo, é de 2,31 filhos e o

conceito de família ideal é 2,38 filhos,valor aliás que desejariam para si pró-prios.

Os casais a viver em Portugal já não

ambicionam ter famílias numerosas e

para os que já têm filhos a principal

razão está nos custos financeiros. O

inquérito ontem apresentado em Lis-boa mostra que 67% das mulheres e 68%

dos homens que decidiram não ter mais

crianças apontaram os "custos associa-

dos" como a principal razão. A dificul-dade em conseguir emprego foi, poroutro lado, o motivo apontado para 48%das mulheres e 59% dos homens. A esma-

gadora maioria dos homens e das mulhe-res (94%), aliás, defende mais incenti-vos à natalidade através de benefíciosfiscais e apoios à educação ou reduçãode impostos.

O estudo adianta que 74% das mulhe-

res e 88% dos homens com idades entre

os 18 e os 29 anos não têm filhos, enquan-to 40% das mulheres e 38% dos homensdo grupo etário 30-39 têm um filho e, no

grupo 40-49 anos, 45% das mulheres e

40% dos homens têm dois filhos. A ida-de média em que tiveram o primeirofilho ronda os 26 anos para as mulherese os 28 anos para os homens, "reflectin-do a tendência de estes serem pais maistardiamente", conclui o presidente doconselho de administração da FFMS.

Para aqueles que ainda não têm filhos,

mas pensam vir a ter, a idade média com

que no máximo querem vir a ter o pri-meiro filho é de 31 anos para as mulhe-

res e 33 anos para os homens. Para todos

os grupos etários, é predominante a pro-porção de pessoas que pensam vir a tere desejariam ter dois filhos, indepen-dentemente da situação conjugal, donível de escolaridade ou da condiçãoperante o trabalho. Contudo, 42% dasmulheres e 36% dos homens com nívelde escolaridade superior desejavam tertrês ou mais filhos, valores superioresaos observados nos restantes níveis deescolaridade. Também as pessoas quevivem em áreas densamente povoadasdesejam ter, em média, mais filhos (2,4)do que as que vivem em áreas menos

povoadas (2,2).Outras tendências, contudo, represen-

tam um "sinal de progresso", defendeAntónio Barreto. É o caso, por exemplo,das diferenças pouco significativas entreeles e elas que vem retirar às mulheresa culpa pela baixa taxa de fecundidade

por "quererem estudar, trabalhar ou sercomo os homens". Ou as diferenças tam-bém pouco expressivas entre centrosurbanos e Interior, contrariando a ideiade que é nas zonas rurais que existe a"vontade de ter mais filhos".

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Os portugueses têm em média um filho e no máximo pensam vir a ter dois

Números

94%dos homens e mulheresdefendem mais incentivos

à natalidade.

25%disseram ter tantos filhos

quantos os que desejaram ter,

mas 70% dos homens e

mulheres têm menos filhos do

que gostariam.

42%das mulheres e 36% doshomens com curso superior

desejavam ter três ou mais

filhos, valores mais altos queos observados nos restantesníveis de escolaridade.

Inquérito com setemil entrevistas

A amostra• As entrevistas decorreram

entre 1 6 de Janeiro e 1 5 deAbril e foram dirigidas a umaamostra de mulheres comidades entre os 1 8 e 49 anose de homens com idadesentre os 1 8 e os 54 anos.

• O inquérito foi realizado em1 0 mil alojamentos de todo o

país e dele resultaram 7624entrevistas.

As perguntas• "Que motivos indicam para

justificar a decisão de ter ou

não filhos?"; "Consideram as

pessoas que devem existir

incentivos à natalidade?" ou

"Que medidas de incentivoentendem como mais

importantes?" são algumasquestões incluídas no

inquérito.

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35% das mulheresem idade fértilnão têm filhosNATALIDADE Grande parte das fa-mílias deseja ter dois filhos, apesarde se ficar apenas por um. Custos e

dificuldade de emprego são osmaiores entraves. ATUAL PÁGS. 6 E 7

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Mais de um terço das mulheresem idade fértil nâo têm filhosNatalidade. Maioria das pessoas que não tem filhos pretende vir a ter, mas os portugueses não querem famílias nume-rosas. Grande parte deseja ter dois filhos, apesar de só ter um. Custos e dificuldade de emprego são os maiores entraves

ANA MAIA

"Nas férias de verão pensámos no que vempara a frente. Decidimos que, apesar de a

conjuntura ser a mesma do ano passado, es-tamos mais dispostos a arriscar ter um filho

por causa da idade, lá temos 3 1 anos e sabe-mos que mais idade pode vir a trazer maisproblemas de fertilidade", diz ao DN SérgioBernardo, que faz parte do grupo das pes-soas que não tem mas quer ter filhos. Se-

gundo o Inquérito à Fecundidade, realiza-do pelo Instituto Nacional de Estatística(INE) e pela Fundação Francisco Manueldos Santos (FFMS) este ano, 35% das mu-lheres (810 mil) e 40% dos homens (cerca deum milhão) em idade fértil não têm filhos,embora a maioria pretenda ter. A idade má-xima com que pretendem ter o primeiro fi-lho é de 31 anos nas mulheres e 33 nos ho-

mens. Os principais motivos para esta deci-são são os custos financeiros e a dificuldadeem conseguir emprego.

"Revejo-me no retrato feito pelo inquéri-to. Começámos a namorar em 2000 e logono início dissemos que queríamos ser pais.

Mas agora, com esta conjuntura, temos umconflito. Ambos tínhamos idealizado dois fi-lhos, mas agora só quero um", refere Sérgio.O que seria preciso mudar para regressar ao

desejo inicial? "O maior receio para ter maisfilhos são os encargos. Quero oferecer o má-ximo que se pode e com umnão sei se a situação o vai per-mitir, com dois isso seria im-possível. Por outro lado, o dese-

jável seria estar numa funçãoque me permitisse maior dis-ponibilidade de tempo", diz.

Ver os filhoscrescerem é o

principal motivopara ter um bebé

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Segundo o estudo, para 67%das mulheres e 68% dos ho-mens que não têm filhos e nãopretendem ter os custos financeiros são omotivo que mais pesa. A dificuldade emconseguir emprego é a segunda maior razão(48% para elas e 59% para eles) . Em terceiroé não ter idade para ter filhos nas mulheres ea não querer ter a responsabilidade, para oshomens. Para os que querem fazer crescer afamília as principais razões são ver os filhoscrescerem e desenvolverem-se (97%) , a rea-lização pessoal e o desejo de ver a família au-mentar.

O inquérito, realizado a mulheres entre os18 e aos 49 anos e ahomens entre os 18 e os54 anos (num total de 7624 entrevistas),mostra que a maioria dos portugueses só

quer dois filhos. Mesmo assim, mais do quena realidade estão a ter. A fecundidade reali-

zada é de 1,03 filhos em média,que a fecundidade final espera-da (o número de filhos que es-

peram ter até ao final do perío-do fértil e que os deixa satisfei-tos) é de 1,8 e que o númerodesejado de filhos é 2,4 filhos.Um número baixo para voltar a

garantir a renovação de gera-ções. Ainda assim, um terço

das pessoas deseja ter três ou mais filhos.Amaioria das pessoas até aos 30 anos não

tem filhos, mas são estes que mostraram o

maior desejo de ter dois. Quanto aos que já

têm descendência, cerca de 25% dos inqui-ridos disse ter tantos filhos quantos os quedesejaram ter, enquanto que 70% dos ho-mens e 68% mulheres admitiu que tem me-nos filhos do que gostaria.

Seja como for, para Maria João ValenteRosa, diretora da Pordata, fica claro que os

portugueses não querem mais ter famíliasnumerosas. "O facto de decidirem não termuitos filhos tem a ver com fatores associa-dos ao desenvolvimento da sociedade. Des-de o valor da criança- perde valor económi-co, deixa de ser entendida como mais ummembro para trabalhar-, à urbanização, re-

dução da mortalidade, a meios contraceti-vos mais eficazes que fazem que para ho-mens e mulheres a ambição não seja ter des-cendências numerosas", diz a demografia.

Não existem diferenças assinaláveis entremulheres e homens quanto ao número mé-dio de filhos que pensam ter. Para AntónioBarreto, presidente da Fundação FranciscoManuel dos Santos, são resultados que aju-dam a desfazer alguns mitos. "É grande emPortugal a tendência de culpabilizar as mu-lheres pela baixa taxa de fecundidade, por-que querem estudar, trabalhar ou ser comoos homens. Ver que não existem muitas di-ferenças é um sinal de progresso", afirma.

Quer pretendam ou não ter filhos, mais de90% dos inquiridos defenderam que devemexistir incentivos à natalidade, que passamsobretudo por aumentar os rendimentos efacilitar as condições de trabalho.

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Ano deve chegar ao fimcom 80 mil nascimentosbebés Entre janeiro e outubro fize-ram-se 69 683 testes do pezinho,quase menos seis mil em relação a2012. A pior natalidade de sempre.Emigração é um problema

Os nascimentos continuam a cair. Depois de20 12 ter marcado um recorde pela negativacom menos de 90 mil bebés nascidos, esteano vai ficar marcado pela mais baixa nata-lidade de sempre. De acordo com os dadosdo Programa Nacional do Diagnóstico Pre-coce, nos primeiros dez me-ses deste ano realizaram-se69 683 testes do pezinho. Me-nos 5843 fichas que no mes-mo período do ano passado.

Já no primeiro semestre ti-nha ficado clara a tendênciade 2013. Os portugueses es-tão ater cada vez menos filhos. "Não houvenenhum mês que tenha tido mais nasci-mentos que o período homólogo. Nota-seuma baixa acentuada da natalidade, maisnos primeiros meses do ano. Na segundametade a queda continua, mas não é tãoacentuada", refere LauraVilarinho, respon-sável pela unidade de Rastreio Neonatal doInstituto Nacional Ricardo Jorge.

A redução em relação aos primeiros dezmeses de 2012 é de 8%. "Está emlinha com o

que se estimava, de uma quebra que poderá

rondar os 10% no final do ano", acrescenta a

responsável. Março foi o pior mês do ano:menos 1 100 registos em comparação com o

ano anterior. Apenas julho e setembro tive-ram quebras menos acentuadas, com dife-

renças de cem crianças a menos. A conti-nuar assim, Portugal vai fechar o ano com 80mil nascimentos, reforçando a tendência de

quebra que começou nos anos 1980.A saída dos jovens para fora, o regresso aos

países de origem de imigrantes que viviamem Portugal e a idade tardia com que se temo primeiro filho ajudam a explicar o decrés-

cimo da natalidade. O adiardo projeto pode levar a queos casais não tenham tem-po para concretizar o dese-

jo de ter um segundo filho."Os 1,03 filhos que as pes-

soas têm em média é muitolonge do número médio de

filhos que esperam vir a ter até ao final do pe-ríodo fértil e que as deixa feliz, que é 1,8. Aminha expectativa é que se consiga recupe-rar os nascimentos adiados. Mas este núme-ro é muito condicionado com os emigran-tes. São jovens em idade fértil, que ainda nãotêm filhos mas são os que querem ter", expli-ca Maria Filomena Mendes, presidente daAssociação Portuguesa de Demografia. "O

inquérito à fecundidade confirma a suspei-ção de que se está a adiar o primeiro filhopara idades mais tardias", acrescenta.

69683nascimentos

testes do pezinho feitos atéoutubro pelo Programa

de Rastreio Neonatal

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Mulheres querem mãesmais tempo em casa...

cultura Grande parte de homense mulheres partilham da visão de

que papel ideal do pai é trabalhara tempo inteiro e que a mãe deveriaestar mais disponível para a família

Homens e mulheres estão de acordo quan-to aos perfis que pais e mães devem ter. Osresultados obtidos através do Inquérito à Fe-cundidade - o último realizou-se em 1996 -mostraram que 67% dos homens e 64% dasmulheres considera que a opção ideal parao pai é trabalhar a tempo inteiro. Já quantoao papel da mãe, 38% dos homens e 5 1% dasmulheres consideram que devem trabalhara tempo parcial fora de casa e 25% dos ho-mens e 17% das mulheres defendem que amãe não deve trabalhar.

"É um dado interessante que obriga a pen-sar", afirma Maria João Valente Rosa, demó-grafa.Atambémdiretora da Pordata conside-ra que "ainda há longo caminho a percorrerem termos de igualdade de género".

Jorge Ascensão, presidente da Confedera-

ção Nacional das Associações de Pais (Con-fap) , admite que a questão cultural, de que asmulheres têm mais qualidades humanas, e

que a maior ligação delas aos filhos pode ex-

plicar as escolhas tão parecidas entre homense mulheres. "No nosso pensamento, cuidardos filhos é mais um papel das mulheres e porisso parece natural que tenham sido estas as

respostas mais dadas: que os pais possam tra-balhar mais fora de casa e as mulheres a tem-po parcial ou não trabalharem. Acredito quepesa a questão cultural", disse ao DN Jorge As-censão.

O responsável da Confap assume que é en-tendido que "a mulher tem mais qualidadeshumanas do que o homem". Na sua opinião,a próprialigação dos filhos também pode ex-

plicar em parte estas opções, assim como as

diferenças de vencimento existentes entrehomens e mulheres. "A tendência dos filhos,quando precisam de amparo, é procuraremmais o colo da mãe do que do pai. Outro pon-to poderá ser o facto de os homens ganharemmais, muito por questões culturais, do que as

mulheres. É natural que, perante a possibili-dade de um dos pais poder ficar em casa outer mais tempo para acompanhar os filhos,

possa pesar na decisão quem tem maior ren-dimento", explica.

Seja qual for a decisão, para Jorge Ascensão,há um ponto claro que não devia merecer dis-cussão: "Independentemente de quem seja,o que defendemos é que um dos pais deveriater mais tempo para acompanhar os filhos. É

preciso para que as crianças não estejam tão'abandonadas'. Quando dizemos que é preci-so mais oferta a tempo inteiro [escolas e cen-tros de Atividades de Tempos Livres] não é adesresponsabilização das famílias, mas sim

porque os dois membros do casal têm de tra-balhar."

Incentivos parater mais criançasQuase todos os inquiridos (94% das mu-lheres e 92% dos homens) , tanto os quenão querem ter filhos como os que que-rem, defendem a existência de incentivos

Rendimento> Aumentar os rendimentos das famíliascom filhos foi uma das opções defendidas

por quem respondeu ao Inquéritoda Fecundidade 2013. Neste âmbito in-cluíam, por exemplo, a redução de im-postos sobre as famílias com filhos, o au-mento das deduções fiscais ou o aumentodos subsídios relacionados com educa-ção, saúde, habitação ou alimentação.

Impostos> A redução de impostos para as famíliascom filhos é uma das medidas defendi-das. E, recentemente, o Parlamento apro-vou a introdução do princípio per capitanas principais rubricas do modelo de cál-culo do IRS e a redução do ISV (impostosobre veículos) com o nascimento do

quarto filho. Estas alterações foram apro-vadas sem votos contra.

Deduções fiscais> Aumentar as deduções fiscais paraquem tem mais de três filhos tem tam-

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bém sido defendido pelas famílias nume-rosas. Estas pedem o reforço das dedu-ções à coleta das despesas de Educação, auniversalização do abono de família, co-meçando a partir do terceiro filho, ou be-nefícios económicos afixação e amplia-ção das famílias em zonas despovoadas.

Saúde> O facto de apenas serem contadas 10%das despesas de saúde, até um limite de838,44 euros para as deduções fiscais,tem sido contestado pelas famílias, queexigem um valor mais elevado. A isençãonas taxas moderadoras também é outrodos benefícios que têm sido reclamados.É que apenas estão isentas as crianças atéaos 12 anos.

Educação> Na área da Educação faltam medidascomo alargar o acesso a serviços paraocupação dos filhos quando os pais estãoa trabalhar. O que pode ser feito com a

criação de mais centros de atividades de

tempos livres fora dos horários escolarese durante as férias, alargando o acessoa creches e jardins de infância ou garan-tindo o transporte para estas instalações.

Condições de trabalho> Facilitar as condições de trabalho paraquem tem filhos, sem perder regalias, é

algo que os portugueses gostavam deveraplicado. O que inclui, por exemplo, tra-balho a tempo parcial - uma medida estáa ser preparada pelo Governo -, licençasde maternidade e paternidade mais alar-gadas ou a flexibilidade de horários paraquem tem filhos pequenos.

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Portugueses queremter dois filhos masem média sõ têm um

Custos associados são o

principal motivo dos paispara não terem mais filhos,conclui inquérito Pl2/13

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Portugueses só querem ter dois filhosmas em média têm apenas umOs custos associados aos filhos são o principal motivo dos

pais para não terem mais. 0 Inquérito à Fecundidade 2013ajuda a perceber por que não nascem mais crianças no país

Fecundidade

Raquel Albuquerque

Há três realidades a ter em contaquando se fala na fecundidade: osfilhos que um casal já tem, os queespera vir a ter e os que desejariater. Olhar para essas diferenças aju-da a perceber o que está em cau-sa: em 2013, em média, as pessoastêm um filho, pensam vir a ter 1,8filhos, mas desejariam ter 2,3. Essa

é uma das conclusões do Inquéritoà Fecundidade 2013, realizado noinício do ano pelo Instituto Nacio-nal de Estatística (INE) e pela Fun-dação Francisco Manuel dos Santos(FFMS) e que foi apresentado ontem.

0 facto de não haver diferenças sig-nificativas entre os desejos de fecun-didade das mulheres e dos homensvem contrariar um mito. "É grandeem Portugal a tendência de culpabi-lizar as mulheres da baixa taxa de fe-

cundidade, porque querem estudar,trabalhar ou ser como os homens.Ver que não existem muitas diferen-

ças é um sinal de progresso", consi-derou António Barreto, presidente doconselho de administração da FFMS.

A maioria das pessoas sem filhostem menos de 30 anos: são 74% dasmulheres e 88% dos homens (a amos-tra incluiu entrevistas em 10 mil alo-

jamentos - a mulheres entre os 18 e

os 49 anos e a homens entre os 18 e os

54 anos). É até aos 30 anos que está

a maior proporção de quem pensavir a ter dois ou mais filhos. "Ver osfilhos crescerem e desenvolverem-se" é o principal motivo para quemos quer ter. Quanto à conjugalidade,o que importa é uma relação estável,

independentemente do laço legal.Destaca-se ainda que o número de

filhos desejados em áreas urbanas é

superior ao das zonas rurais, umadas conclusões tiradas quase duasdécadas depois do último inquéritoà fecundidade (1996). Desde então,não havia nenhuma análise qualitati-va, apesar de se assistir a um declínio

significativo que colocou Portugal nacauda da Europa (a média da UE a27 é de 1,57 filhos por mulher; emPortugal era de 1,35 em 2012).

Ter de continuar a adiarHá uma razão principal na origemdesses valores em Portugal: o adia-

mento do nascimento do primeirofilho. Outros países europeus tinham

já passado pelo mesmo quando afecundidade começou a descer emPortugal na década de 1980. "Mesmodentro de uma taxa baixa, o nível emPortugal até 2003 era relativamenteelevado comparativamente com ou-tros países", explica Maria FilomenaMendes, professora no Departamen-to de Sociologia da Universidade deÉvora. O que aconteceu foi que, en-tre 2003 e 2008, esses países assisti-

ram a uma recuperação do númerode filhos. Só que isso não aconteceuem Portugal.

As mulheres tiveram de continuara adiar o nascimento dos filhos. "Fo-mos apanhados pela crise económi-ca. Nessa altura a fecundidade [entraem colapso] e passámos a ter umadas taxas mais baixas do mundo",aponta a socióloga.

Em causa estão "velhas e novasrazões", considera Vanessa Cunha,socióloga e investigadora do Institutode Ciências Sociais (ICS). Hoje, aqui-lo que leva os casais inicialmente aadiar é intencional: procuram o mo-

mento certo com emprego, casa, re-

lação estável e condições materiais.Mas há outra parte não intencional

no adiamento. "Os jovens estão comlimitações em termos de mercado de

trabalho, de precariedade, para alémde cortes e despedimentos", apontaMaria Filomena Mendes. Isso leva-os

a ter famílias mais pequenas ou con-tinuar à espera de um futuro melhor.De acordo com o inquérito, para 67%das mulheres e 68% dos homens quedecidiram não ter mais filhos a razão

principal foram "os custos associa-dos". A "dificuldade em conseguiremprego" foi outra razão apontada.

"O custo médio de ter filhos au-mentou significativamente face aosanos 80 ou antes", aponta João Bar-bosa de Melo, professor na Faculda-de de Economia da Universidade deCoimbra. "Ao fim de 20 ou 30 anos,a conta do que custa alimentar, ves-tir, proporcionar instrução, dar um

tecto, garantir a saúde ou transportarum filho assume valores surpreen-dentes."

Segundo o economista, o queacontece em Portugal "em termos es-

tritamente económicos" é os pais ve-rem pouco benefício do investimen-to nos filhos. "Tomemos dois casaisexactamente iguais em tudo, mascom opções de fertilidade diferen-tes - um tem quatro filhos, o outronenhum. 0 casal sem filhos vai podertrabalhar mais, subir mais depressana carreira e sobra-lhe dinheiro parater um 'nível de vida' excelente. Já o

outro acaba por gastar a maioria dos

seus recursos a criar os filhos." Do

ponto de vista fiscal, "acabam porpagar o mesmo". "Quem opta pornão ter filhos acaba por ficar prati-

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camente isento dos custos de gerare educar a geração seguinte, mas vaibeneficiar da geração de valor futurados filhos dos outros." Assim, "ter fi-

lhos, do ponto de vista estritamenteeconómico-financeiro, torna-se umairracionalidade".

Com base no inquérito, "aumen-tar os rendimentos das famílias comfilhos" foi o principal incentivo suge-rido. Para João Barbosa de Melo, a so-

lução está em "sinais concretos" quea sociedade e o Estado têm de dar.Até do ponto de vista simbólico, con-tribuindo para que a sociedade olhe

para os pais com mais filhos comoalgo de "positivo" e não "como umaespécie de aberração social ou comoum sinal exterior de riqueza".

É de acrescentar ainda o efeito da

emigração. E são as gerações maisnovas as que "a emigração colhe",aponta Maria Filomena Mendes. Pelomeio fica a instabilidade das relaçõescausadas pelos casais que se separamquando um sai do país.

Entre os factores sociais e econó-micos, o inquérito evidencia que 58%das mulheres e 55% dos homens não

querem ter filhos ou mais filhos do

que já têm. Do total, 8% das mulhe-res e 9% dos homens não têm filhose não tencionam ter.

Apesar das implicações da baixafecundidade na sociedade, os inves-

tigadores destacam outros pontospresentes quando se fala de fecun-didade, como a mudança radical do

lugar da criança na família e a maior

responsabilização dos pais em rela-

ção ao futuro dos filhos.

A solução está em"sinais concretos"da sociedade e doEstado

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DEMOGRAFIA ¦ 74 POR CENTO DAS MULHERES ATÉ AOS 29 ANOS NÃO SÃO MÃES

Maioria não querter mais filhos

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¦ Questão financeira é o

principal obstáculo das

famílias, diz inquéritosobre fecundidade

• BERNARDO ESTEVES

Maisde metade das mu-

lheres portuguesas quesão mães (51%) não que-

rem voltar a ter filhos, enquanto46% dos homens não desejamvoltar a ser pais. Os dados são de

um inquérito à fecundidade rea-lizado pelo Instituto Nacional de

Estatística, em parceria com a

Fundação Francisco Manuel dos

Santos. O estudo indica ainda

que, entre os 18 eos29 anos, 74%das mulheres e 88% dos homensainda não foram pais. Os "custosfinanceiros associa-dos a ter filhos" ea ¦¦¦¦¦¦"dificuldade paraconseguir empre-go" são os doisprincipais obstácu-los apontados. E

70% dos homens emulheres dizem termenos filhos do quegostariam.

O número de filhos mais de-sejado é dois. "Ter uma famílianumerosa deixou de ser uma

ambição" disse Mana João Rosa,da Pordata. Mais de 90% dos in-quiridos defendem incentivos ànatalidade que aumentem o

"rendimento das¦¦¦ famílias com filhos".A maioria defendeu

que a opção ideal

para a mãe é traba-lhar a tempo parcialou não trabalhar. Já

o pai, defendem,deve trabalhar a

tempo inteiro. Por-tugal tem a quinta

taxa de fecundidade mais baixada União Europeia, com 1,35crianças por mulher. ¦

Portugal tema 5. a taxa defecundidademais baixadaUE