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9300 INDÚSTRIA DE DEFESA E MILITARISMO NO BRASIL MARTA DA SILVEIRA LUEDEMANN 1 Resumo: O desenvolvimento da indústria de defesa no Brasil está associado a quatro áreas de atuação das forças armadas: a formação militar; formação técnica (engenharias) e P&D; a produção de infraestrutura e; fabricação de materiais, equipamentos e meios de transporte e comunicação. No Brasil, a pesquisa nas forças armadas esteve direta ou indiretamente relacionada com o processo de industrialização e com a formação dos principais centros de pesquisa, incorporando tecnologias de ponta e novos ramos da ciência. Contudo, com o fim dos planos nacionais e a abertura de mercado dos anos 1990 a indústria de defesa foi em grande parte sucateada. Há um pouco mais de dez anos, o governo retomou a política de modernização do setor, abrindo uma nova fase de investimentos nacionais em P&D, industrialização e acordos de joint ventures. Palavras-chave: Indústria de defesa brasileira; forças armadas; segurança nacional Abstract: The development of the defense industry in Brazil is associated with the four areas of acting of the armed forces: the military formation; technical formation (engineering) and R&D; the production of infrastructure; and manufacture of materials, equipments and means of transport and communication. In Brazil, the research in the armed forces was directly or indirectly connected with the process of industrialization and with the formation of the main research centres, incorporating leading edge technologies and new branches of science. However, with the end of the national plans and the opening of the market for the years 1990 to the defense industry was in large part scrapped. There is a little more than ten years, the government retook the policy of modernisation of the sector by opening a new phase of national investments in R&D, industrialization and the joint venture agreements. Key-words: 1 Introdução Ao tratar da indústria de defesa, três problemas despontam: o primeiro consiste nas relações e conexões de sua composição que impede de abordá-la como os demais setores industriais, por mais complexo que sejam; o segundo refere-se ao acesso às estatísticas, que muitas vezes disponíveis nas empresas ou nas associações, mas neste caso são geralmente rarefeitos, incompletos ou descontínuos; o último, retrata a situação de disparidade tecnológica inter setorial nesta indústria, que num extremo o sucateamento e noutro a produção de alta tecnologia. Sua posição de vanguarda tecnológica integra P&D, cria externalidades, 1 Docente do programa de pós-graduação da Universidade Federal de Alagoas. E-mail de contato: [email protected]

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INDÚSTRIA DE DEFESA E MILITARISMO NO BRASIL

MARTA DA SILVEIRA LUEDEMANN1

Resumo: O desenvolvimento da indústria de defesa no Brasil está associado a quatro áreas de atuação das forças armadas: a formação militar; formação técnica (engenharias) e P&D; a produção de infraestrutura e; fabricação de materiais, equipamentos e meios de transporte e comunicação. No Brasil, a pesquisa nas forças armadas esteve direta ou indiretamente relacionada com o processo de industrialização e com a formação dos principais centros de pesquisa, incorporando tecnologias de ponta e novos ramos da ciência. Contudo, com o fim dos planos nacionais e a abertura de mercado dos anos 1990 a indústria de defesa foi em grande parte sucateada. Há um pouco mais de dez anos, o governo retomou a política de modernização do setor, abrindo uma nova fase de investimentos nacionais em P&D, industrialização e acordos de joint ventures.

Palavras-chave: Indústria de defesa brasileira; forças armadas; segurança nacional

Abstract: The development of the defense industry in Brazil is associated with the four areas of acting of the armed forces: the military formation; technical formation (engineering) and R&D; the production of infrastructure; and manufacture of materials, equipments and means of transport and communication. In Brazil, the research in the armed forces was directly or indirectly connected with the process of industrialization and with the formation of the main research centres, incorporating leading edge technologies and new branches of science. However, with the end of the national plans and the opening of the market for the years 1990 to the defense industry was in large part scrapped. There is a little more than ten years, the government retook the policy of modernisation of the sector by opening a new phase of national investments in R&D, industrialization and the joint venture agreements.

Key-words:

1 – Introdução

Ao tratar da indústria de defesa, três problemas despontam: o primeiro consiste

nas relações e conexões de sua composição que impede de abordá-la como os

demais setores industriais, por mais complexo que sejam; o segundo refere-se ao

acesso às estatísticas, que muitas vezes disponíveis nas empresas ou nas

associações, mas neste caso são geralmente rarefeitos, incompletos ou

descontínuos; o último, retrata a situação de disparidade tecnológica inter setorial

nesta indústria, que num extremo o sucateamento e noutro a produção de alta

tecnologia. Sua posição de vanguarda tecnológica integra P&D, cria externalidades,

1 Docente do programa de pós-graduação da Universidade Federal de Alagoas. E-mail de contato: [email protected]

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além de produzir desde vestuário de proteção até armas inteligentes, sensores de

comando e veículos balísticos não tripulados, passando por mísseis, aviões,

satélites e defesa cibernética. Por outro lado a indústria de defesa está em simbiose

com a indústria de segurança constituindo o Complexo de Defesa e Segurança que

se sustenta pela integração da indústria, insumos, serviços e distribuição.

Ao pesquisar a indústria militar, verifica-se que a construção de relações

políticas, econômicas, geográficas, sociais e tecnológicas se modificaram ao longo

da história2. Contudo o enfoque aqui será substancialmente da constituição da

indústria e sua inserção na sociedade e economia brasileira, considerando o papel

de incorporadora e difusora de tecnologias, o que faz de sua participação no

processo de desenvolvimento industrial do Brasil um fator relevante. Para

compreender a correlação entre indústria de defesa, Forças Armadas, ciência militar

e sociedade, há necessidade de compreender como estas quatro estruturas se

formaram até alcançarmos as condições reais de existência do complexo industrial

de defesa nacional e os seus produtos.

2 – A indústria de defesa da formação à crise atual

A Abimde (Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e

Segurança) discrimina o Complexo em quatro segmentos: i) segurança privada3, e

segurança pública estadual, segurança pública federal e defesa nacional; ii) a

indústria, que detém seis itens: 1) Máquinas e Equipamentos Mecânicos, inclusive

armas, munições e equipamentos militares; 2) Máquinas e Equipamentos

Eletrônicos e de Informática; 3) Automóveis, Caminhões e Ônibus; 4) Outros

Equipamentos de Transporte; 5) Construção; e 6) Serviços Prestados às Empresas;

iii) os insumos, também no setor de transformação, compreendem os produtos não

enquadrados acima e que abastecem as indústrias citadas; iv) os serviços e

2 Como podemos observar em Antossiak et al. (1987) e Bobbio(1998), ainda que sob concepções

teóricas distintas. 3 Em nota, não será tratado aqui o segmento de segurança particular, ainda que este em certo grau também esteja

integrado

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distribuição constituem: comércio, serviços e transporte associado à todo o setor.

Brick (2014b, p. 93) descreve a característica do mercado e dos segmentos

industriais para produtos finalísticos caracterizam a indústria de defesa por: a)

Armas leves munições e explosivos ; b) Armas não letais ; c) Armas e munições

pesadas; d) Sistemas eletrônicos e sistemas de comando e controle; e) Plataforma

naval militar; f) Plataforma terrestre militar; g) Plataforma aeroespacial militar; h)

Propulsão nuclear.

Da Colônia aos governos de planejamento centralizado no Brasil (de Getúlio

Vargas, Kubitscheck e militares), houve concentração de investimentos públicos em

vários segmentos de tecnologia de ponta, desde engenharia civil e mecânica à

engenharia de telecomunicações, aeroespacial, microeletrônica, energia nuclear,

além de biotecnologia e bioenergia. Dos anos 1980 ao início dos anos 2005, as

forças armadas e a indústria de defesa sobreviveram com a estrutura que se

constituiu até o II PND. Ainda assim, vários setores se mantiveram vigorosos, como

o setor aeroespacial, do qual desponta a EMBRAER, o IEA, e a Marinha cujo

submarino nuclear manteve suas pesquisas durante o período, mesmo desfalcados.

No Exército Brasileiro, a IMBEL se manteve estatal, mas o fechamento da ENGESA

(fabricante brasileira de veículos militares) promoveu um desfalque de 1.100

veículos não entregues ao Exército ao choque econômico dos anos 1990. Depois de

forte sucateamento internacionalização da indústria nacional pelos governos

neoliberais, os governos Lula e Dilma retomaram os investimentos no segmento de

defesa, com importantes políticas e investimentos para o setor, marcando uma nova

fase da indústria de defesa e também das Forças Armadas.

No relatório de Brick (2014b, p. 99-100) observa-se que o mercado de

produtos, insumos e P&D que concerne o Complexo da Indústria de Defesa (CID) e

segurança são regidos igualmente por acordos nacionais e internacionais, dos quais

os EUA tem papel determinante, através do International Traffic in Arms Regulations

(ITAR) e do Bureau of Industry and Security (BIS). Senghaas (1974, p. 122-126)

contribui para compreensão disto porque demonstra que nos EUA a elite econômica

é o universo do complexo de armamento, tendo como pivô a relação entre o

Pentágono e a indústria de armamento, centros políticos. E neste universo há uma

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ordem de importância: o presidente da República, o Pentágono, a indústria de

armamento, a ciência de armamento, o Congresso, os meios de comunicação de

massa, pessoas que vivem da desse complexo, a população em geral – estes dois

últimos fora do universo da elite socioeconômica. A indústria bélica se autonomiza

na condição de mais um setor produtor de mercadorias, como também veículo de

intervenção do capital norte americano no mundo. Galbraith e Sweezy mesmo em

perspectivas diferentes demonstram que as grandes empresas (ou capital

monopolista) norte americanas determinam a intervenção militar no mundo, porque

participam do planejamento. E em períodos de paz, conforme Galbraith, os generais

tem caráter meramente figurativo na sociedade.

No caso brasileiro, a indústria de defesa está diretamente ligada ao Estado

através das Forças Armadas e estes estiveram diretamente associados ao processo

de industrialização do País. Nestes termos, o militarismo no Brasil toma ares ora

nacionalista progressista (tenentismo, período Vargas, governo Geisel), ora se

declara conservador e subserviente aos interesses das potências hegemônicas.

São, então, os elementos nacionalistas das Forças Armadas que contribem

decisivamente para a segurança nacional e para o processo de industrialização e

inovação tecnológica.

Em 2014, o Complexo de Defesa e Segurança movimentou 202 bilhões de

reais que representam 3,7% do PIB brasileiro. Deste montante 110 bilhões de reais

representaram o segmento de segurança e defesa, 71,4 bilhões de reais foram

referentes a comércio, serviços e transportes relacionados ao setor, 12,5 bilhões de

reais para insumos e serviços e 8,1 bilhões de reais às indústrias diretamente

relacionadas ao setor (ABIMDE, 2015).

Formação da indústria de defesa nacional (Vargas, JK, ditadura militar)

A influência francesa no exército ocorrerá até a década de 1920, com a vinda

da Missão Militar Francesa. Nessa mesma década surge a Universidade do Rio de

Janeiro e em 1930, a Universidade do Distrito Federal. Já na década de 1940, a

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influência será norte americana, com acordos instituídos na compra de materiais,

equipamentos, cursos e serviços de manutenção.

Dois importantes institutos se destacam sob o Estado Novo, o Instituto Militar

de Tecnologia (antecessor do IME) e o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA)

ambos com apoio técnico dos EUA. O governo Vargas investiu no aparelhamento de

militar (equipamentos, institutos e centros de pesquisa) e igualmente na política de

industrialização brasileira (Petrobrás, Cia. Siderúrgica Nacional, Fábrica de Motores)

em sintonia com a II revolução industrial.

Nas décadas de 1930 e 1940, a engenharia militar auxiliou na ampliação e

implantação de malha ferroviária de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande

do Sul e Mato Grosso (antigo). Nos anos 1950 e 1960, foi a construção da linha

férrea e as rodovias de integração com Brasília. Nos anos 1970 as rodovias de

grandes extensões também tiveram a participação da engenharia militar, sobretudo

as de integração nacional (Belém-Brasília, Transamazônica, Transpantaneira, etc.),

além de grandes obras como pontes e tuneis (Verde Oliva, 2013).

A indústria de defesa se consolida no início dos anos 1960, quando as forças

armadas começam a receber novos incentivos para a modernização. Já em 1969 é

fundada a EMBRAER, a partir do esforço conjunto da FAB e do ITA/CTA.

A participação da Marinha do Brasil na I e II Guerra Mundial foi com

precariedade de equipamentos. Somente nos governos da ditadura militar foi

possível à Marinha fazer uma política de modernização, apoiada no milagre

econômico vivido pelo Brasil. Na década de 1970 com “Programa de Renovação e

Ampliação de Meios Flutuantes” a Marinha pode adquirir seis fragatas classe Niterói

(MK-10), das quais quatro foram construídos no estaleiro da Vosper na Inglaterra e

os outros dois construídos no Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro, com

transferência de parte da tecnologia. As fragatas foram vendidas com sistema

informatizados com restrições quanto à manutenção e manejo, o que impôs à

Marinha do Brasil a abrir uma licitação junto às universidades públicas paulistas para

a substituição dos computadores das fragatas em virtude da dependência

tecnológica que havia gerado. O primeiro submarino foi comprado da Itália, em

1914. Posteriormente vieram da Inglaterra e EUA. Conforme Goularti Filho (2011) a

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indústria de construção naval do Brasil foi implantada em 1958, na meta 28 do Plano

de Metas. Todavia as atividades de construção e reparos decorrentes da forte

dinâmica da Marinha Mercante brasileira desde o fim do século XIX4 proporcionou a

formação de aglomerados de empresas nacionais, sobre tudo nas cidades do Rio de

Janeiro e Niterói, gerando relações sistêmicas entre as empresas, o que garantiu

parte do sucesso da Meta 28. Nos anos 1980, o setor naval brasileiro era uma dos

maiores do mundo. Ainda, durante a primeira e segunda grandes guerras, foi o

mercado local que abasteceu o Arsenal da Marinha, substituindo importações,

contudo o abastecimento de aço nacional somente ocorreu com a criação da CSN.

Entre o fim dos anos 1970 e início dos anos 1980, a Marinha conseguiu

dominar o ciclo completo do combustível nuclear. No fim dos aos 1980 a Marinha

adquiriu um submarino modelo IKL-209 da Alemanha e construiu outros quatro no

Arsenal da Marinha dos modelos Tupi e Tikuna com transferência de tecnologia

(Defesa Latina, 2009). Neste conjunto de ações, a Marinha projetou um modelo de

submarino nuclear vem desenvolvendo o programa nuclear no Centro Tecnológico

da Marinha em São Paulo (CTMSP), na Cidade Universitária, e no Centro

Experimental Aramar (CEA), em Iperó (SP), desde a criação do primeiro em 1986.

Em conjunto os centros de pesquisa estão integrados em P&D, com um moderno

Laboratório de Geração Núcleo-Elétrica no CEA, cuja função é criar o protótipo do

motor de nuclear, dominar a tecnologia do ciclo de combustível nuclear, e produção

de combustível nuclear para o Programa Nuclear Brasileiro (cf. CTMSP). Em 2008

foi firmado o acordo com a empresa francesa para transferência de tecnologia na

construção de submarinos convencionais e nucleares.

Em 2014 o governo federal inaugurou o complexo Estaleiro e Base Naval da

Marinha do Brasil para a produção de submarinos, em Itaguaí (RJ), em condição de

joint venture entre a francesa Direction des Constructions Navales Services (DCNS)

(49%), a brasileira Odebrecht (50%) e a Marinha do Brasil (1%), acordado para

entregar 100% à Marinha em 20 anos. O programa de Desenvolvimento de

Submarinos (Prosub), com quase R$ 29 bilhões, tem o objetivo de produzir

4 Goularti Filho (2011) demonstra que somente no Arsenal da Marinha alcançou mais de

2.600 trabalhadores em 1877.

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submarinos 100% nacionais para proteger a costa brasileira, a Amazônia Azul e a

extração de petróleo da plataforma continental, com maior velocidade e

equipamentos modernos. A previsão sobre o complexo é promover 9 mil empregos

diretos e 32 mil indiretos, com 600 empresas nacionais, sendo que em 2021 o

complexo estará pronto e entregando quatro submarinos convencionais (SBR) e um

submarino nuclear (SNBR). O primeiro submarino será construído através da joint

venture com a DCNS, sendo uma primeira parte produzida na França. A capacidade

de produção é de um submarino a cada dois anos. Na cidade de Santa Cruz (RJ) foi

inaugurada em 2010 a Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), uma parceira

entre a ThyssenKrup e a Vale, para o fornecimento de aços especiais para o

complexo, com capacidade de produção de 5 milhões de ton de aço ao ano. A

estatal Nuclebrás Equipamentos Pesados (Nuclep) tem duas áreas de atuação,

Nuclep Nuclear e Nuclep Não-Nuclear, ambas com know how reconhecido em

fornecimento de equipamentos nucleares para as Usinas de Angra, tendo criado o

primeiro reator nuclear naval e os cascos dos quatro submarinos produzidos na

década de 1990. A Nuclep também firmou contrato com a Wärtsilä Switzerland, para

a produção de motores de última geração de submarinos e navios de grande porte.

Em anexo ao Estaleiro de Submarinos, o Porto de Itaguaí está sendo reestruturado

para ser o único porto concentrador de carga com capacidade para a atracagem de

navios de última geração (acima de 6 mil TUs), com 4 terminais em operação de

granéis sólidos (especializado em minério de ferro), carvão, contêineres e de

alumina além de transporte intermodal (conforme SEPAC).

Anos 2000

Há mais de vinte anos sem uma política de desenvolvimento e inovação da

indústria de defesa nacional, o governo Lula retomou os investimentos no setor. A

partir de 4 importantes portarias do Ministério da Defesa, uma nova fase das forças

armadas e da indústria de defesa foi iniciada: em 2002 foi instituída a Política e as

Diretrizes de Compensação Comercial, Industrial e Tecnológica do Ministério da

Defesa (Portaria 764/MD, 27/12/02); em 2005, foi criada a Comissão Militar da

Indústria de Defesa (CMID) (Portaria 611/MD, 12/05/05); no mesmo ano o MD

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aprovou a Política Nacional da Indústria de Defesa (PNID) (Portaria 899/MD,

19/07/05); em 2007, foi estabelecida a Comissão de Implantação do Sistema de

Certificação, Metrologia, Normalização e Fomento Industrial (COMISCEMEFA

(Portaria 777/MD, 31/05/07).

Dagnino descreve que no primeiro do governo Lula, durante as rodadas de

debates sobre defesa e segurança 5, promovidas pelo Ministério da Defesa entre

setembro de 2003 a junho de 2004.

Defesa cibernética

A Defesa Cibernética foi implantada pelo Ministério da Defesa em 2009 a partir

da Estratégia Nacional de Defesa (END), ficando sob responsabilidade do Exército

Brasileiro em coordenar em caráter nacional. Em 2012 foi criado o Centro de Defesa

Cibernética do Exército (CDCiber), permitindo capacitar as forças armadas para dar

suporte aos eventos internacionais que o Brasil iria sediar, além de evitar ataques

cibernéticos em órgãos, instituições e setores estratégicos nacionais. O Centro está

estabelecendo acordos com universidades, empresas e outros setores das Forças

Armadas com o intuito de gestar recursos humanos e integrar os esforços.

Em conjunto, o Departamento de Ciência e Tecnologia do Exército Brasileiro

(DCT), criado em 2005, tem a função de dirigir e controlar as atividades científicas e

tecnológicas do Exército, responsável pela inovação da Organização Militar, em

especial o Sistema de Monitoramento Integrado de Fronteiras (SISFRON) e o

CDCiber. Cabe ao DCT o desenvolvimento de produtos de defesa, como por

exemplo: “Família de Blindados Média sobre Rodas-Guarani; Radar SABER-M60;

Simulador do míssil 1.2 AC; Sistema de Protocolo Eletrônico de Documentos

(SPED); e das Medidas de Apoio à Guerra Eletrônica (MAGE) veicular” (cf. Exército

Brasileiro).

O CDCiber também terá uma Escola Nacional de Defesa Cibernética, conforme

portaria do MD em 2014, para formar quadros para as três forças armadas.

Anos 2010 5 Foram lançados quatro volumes sobre os ciclos de debates em uma coleção intitulada “Pensamento brasileiro sobre defesa e segurança”, publicado pela Secretaria de

Estudos e de Cooperação do Ministério da Defesa e acessíveis na web.

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Outro importante marco da indústria de defesa brasileira foi criou a criação em

2011 do Plano de Articulação e Equipamento de Defesa (PAED). O PAED irá nortear

os investimentos em modernização de equipamentos das Forças Armadas e

incentivo à indústria de defesa. O governo federal se compromete em estabelecer

política de compras com o intuito de satisfazer as necessidades das Forças

Armadas, apoiar projetos de setores estratégicos e “fortalecer a cadeias de bens

industriais e de serviços” (Ministério da Defesa). É fundamental ao PAED a

independência tecnológica, permitindo a gestão de recursos humanos e físicos no

País, possibilitando que as estruturas operacionais se distribuam no território

nacional e consonância com os imperativos de “monitoramento/controle, mobilidade

e presença” para satisfazer os objetivos da defesa nacional.

O PAED prevê difusão tecnológica na cadeia de produção satisfazendo setores

da economia que se abastecem de alta tecnologia, gestar externalidades a partir da

indústria de defesa. O PAED e a Lei de Fomento à Base Industrial de Defesa

(Decreto nº 7970, de 28/03/13) são os marcos da nova fase de modernização da

indústria de defesa (Ministério do Desenvolvimento). Os projetos estratégicos de

defesa estão divididos conforme as três forças armadas:

• Projetos estratégicos da Marinha: 1) o Programa Nuclear da Marinha, que consiste

em produzir submarinos nucleares e instituir o Laboratório de Geração Núcleo-

Elétrica (Labgene) para construção, operação e manutenção de gerador nuclear; 2)

o Núcleo do Poder Naval, aquisição e distribuição de material, navios e instalações

da Marinha; 3) Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAz).

• Projetos estratégicos do Exército são: 1) Sistema Integrado de Monitoramento de

Fronteiras (Sisfron); 2) Família de Blindados Guarani, com o intuito de substituir os

blindados Urutu e Cascavel com mais de 30 anos de uso; 3) Proteger, consiste em

ampliar a capacidade do Exército de proteger estruturas estratégicas e grandes

eventos contra ações terroristas e além de ataques cibernéticos.

• Projetos da FAB: 1) Cargueiro militar KC-390, o mais moderno e robusto veículo

produzido pela Embraer para renovação de frota de 28 aeronaves; 2) Projeto FX-2,

modernização de Caças, este item foi acordado com a empresa SAAB, Embraer e

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FAB, constituindo em joint venture denominada GRIPEN, para a renovação da frota

de 21 caças; 3) Vant-FAB, projeto da FAB de veículo não tripulado para fim de

vigilância.

A Estratégia Nacional de Defesa (END) determinou três setores estratégicos,

cada qual desenvolvendo pesquisas e dirigido por um segmento das forças

armadas: a Marinha do Brasil dirige o programa nuclear; o Exército do Brasileiro

coordena a defesa cibernética; e a Força Aérea comanda o programa espacial. O

Programa Nuclear da Marinha concentra-se Centro Experimental de Aramar,

desenvolve tecnologia na geração de energia, industrial, médica e combustível.

Desde 1979 a Marinha participa do Programa Nuclear Brasileiro com a intenção da

construção do reator para o submarino nuclear a ser construído no Estaleiro de

submarinos de Itaguaí. O Setor Cibernético, através do CDCiber do Exército foi

constituído para evitar ataques cibernéticos, garantir o sigilo de informação, por

outro lado evitar terrorismo ou incidentes na rede. O Setor Espacial, da FAB,

enfatiza as pesquisas em inovação e aprimoramento de sistema aeronáuticos e

aeroespaciais como a série de foguetes Sonda, da qual se originou o Veículo

Lançador de Satélites (VLS); trabalhando em conjunto com o Centro Técnico

Aeroespacial (CTA), o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), . Subordinados ao

Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), os Centros de

Lançamento de Alcântara (CLA) e da Barreira do Inferno (CLBI).

Conclusão

A indústria de defesa estará sempre em pauta nas principais economias do

mundo. Afora a função geopolítica de defesa nacional ou de intervenção, há o papel

definido na guerra oligopolista das corporações, cuja importância pode se nivelar

aos sistemas bancário e financeiro ou mesmo dos grandes centros de pesquisa

públicos (universidades e institutos de pesquisa) e laboratórios privados (grandes

companhias ou associações setoriais de empresas) para formação, incorporação e

difusão sistêmica de inovações tecnológicas6. O recente golpe institucional põe em

risco a segurança nacional o a autonomia tecnológica criada até então no País.

6 Como demonstra Chesnais (1996); e, notadamente para o Brasil, a tese de Leske (2013).

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