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Informativo 822-STF (27/04/2016) Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante Processo excluído deste informativo por não ter sido concluído em virtude de pedido de vista: Rcl 22328/RJ. ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL NACIONALIDADE Situação do brasileiro titular de green card que adquire nacionalidade norte-americana. COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS A competência para legislar sobre serviços de telecomunicações é privativa da União. PROCESSO LEGISLATIVO Emenda parlamentar em projeto de lei do Poder Executivo. DIREITO PENAL PRESCRIÇÃO Redução do prazo prescricional para condenados maiores de 70 anos e momento de sua aferição. DIREITO PROCESSUAL PENAL SIGILO BANCÁRIO Validade da utilização do RMF no processo penal. DIREITO CONSTITUCIONAL NACIONALIDADE Situação do brasileiro titular de green card que adquire nacionalidade norte-americana Se um brasileiro nato que mora nos EUA e possui o green card decidir adquirir a nacionalidade norte-americana, ele irá perder a nacionalidade brasileira. Não se pode afirmar que a presente situação se enquadre na exceção prevista na alínea “b” do § 4º do art. 12 da CF/88. Isso porque, como ele já tinha o green card, não havia necessidade de ter adquirido a nacionalidade norte-americana como condição para permanência ou para o exercício de direitos civis. O estrangeiro titular de green card já pode morar e trabalhar livremente nos EUA. Dessa forma, conclui-se que a aquisição da cidadania americana ocorreu por livre e espontânea vontade. Vale ressaltar que, perdendo a nacionalidade, ele perde os direitos e garantias inerentes ao brasileiro nato. Assim, se cometer um crime nos EUA e fugir para o Brasil, poderá ser extraditado sem que isso configure ofensa ao art. 5º, LI, da CF/88.

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Informativo 822-STF (27/04/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante Processo excluído deste informativo por não ter sido concluído em virtude de pedido de vista: Rcl 22328/RJ.

ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL

NACIONALIDADE Situação do brasileiro titular de green card que adquire nacionalidade norte-americana. COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS A competência para legislar sobre serviços de telecomunicações é privativa da União. PROCESSO LEGISLATIVO Emenda parlamentar em projeto de lei do Poder Executivo.

DIREITO PENAL

PRESCRIÇÃO Redução do prazo prescricional para condenados maiores de 70 anos e momento de sua aferição.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

SIGILO BANCÁRIO Validade da utilização do RMF no processo penal.

DIREITO CONSTITUCIONAL

NACIONALIDADE Situação do brasileiro titular de green card que adquire nacionalidade norte-americana

Se um brasileiro nato que mora nos EUA e possui o green card decidir adquirir a nacionalidade norte-americana, ele irá perder a nacionalidade brasileira.

Não se pode afirmar que a presente situação se enquadre na exceção prevista na alínea “b” do § 4º do art. 12 da CF/88. Isso porque, como ele já tinha o green card, não havia necessidade de ter adquirido a nacionalidade norte-americana como condição para permanência ou para o exercício de direitos civis.

O estrangeiro titular de green card já pode morar e trabalhar livremente nos EUA.

Dessa forma, conclui-se que a aquisição da cidadania americana ocorreu por livre e espontânea vontade.

Vale ressaltar que, perdendo a nacionalidade, ele perde os direitos e garantias inerentes ao brasileiro nato. Assim, se cometer um crime nos EUA e fugir para o Brasil, poderá ser extraditado sem que isso configure ofensa ao art. 5º, LI, da CF/88.

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Art. 12 (...)

§ 4º - Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que:

II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos:

a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira;

b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis;

STF. 1ª Turma. MS 33864/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 19/4/2016 (Info 822).

CONCEITO

Nacionalidade é... - o vínculo jurídico-político que une uma pessoa a determinado Estado - do qual se originou ou pelo qual foi adotado, - fazendo deste indivíduo um componente do povo, - e sujeitando-o aos direitos e obrigações oriundos desta relação. DIREITO FUNDAMENTAL

A nacionalidade é considerada um direito fundamental, protegida em âmbito internacional, valendo ressaltar que a Declaração Universal dos Direitos dos Homens proclama em seu artigo XV que “todo homem tem direito a uma nacionalidade” e que “Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade”. NACIONALIDADE X CIDADANIA

Nacional e cidadão não são conceitos coincidentes. • Nacional: é o indivíduo que faz parte do povo de um Estado através do nascimento ou da naturalização (nacionalidade = vínculo marcantemente jurídico). • Cidadão: é o indivíduo que tem direitos políticos, ou seja, pode votar e ser votado, propor ação popular além de organizar e participar de partidos políticos (cidadania = vínculo marcantemente político).

Todo cidadão é nacional, mas nem todo nacional é cidadão. Exs.: o louco e o menor de 16 anos são nacionais, mas não são cidadãos.

ESPÉCIES DE NACIONALIDADE:

1) Nacionalidade ORIGINÁRIA (também chamada de

primária, atribuída ou involuntária)

É aquela que resulta de um fato natural (o nascimento). A pessoa se torna nacional nato. Critérios para atribuição da nacionalidade originária: a) Critério territorial (jus soli): se a pessoa nascer no território do

país, será considerada nacional deste. b) Critério sanguíneo (jus sanguinis): a pessoa irá adquirir a

nacionalidade de seus ascendentes, não importando que tenha nascido no território de outro país.

No Brasil, adota-se, como regra, o critério do jus soli, havendo, no entanto, situações nas quais o critério sanguíneo é aceito.

2) Nacionalidade SECUNDÁRIA (também chamada de derivada, adquirida ou

voluntária)

É aquela decorrente de um ato voluntário da pessoa, que decide adquirir, para si, uma nova nacionalidade. A isso se dá o nome de naturalização. Atenção: esse ato voluntário pode ser expresso ou tácito. A pessoa se torna nacional naturalizado.

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Como o tema é tratado na Constituição Federal

OUTROS CONCEITOS IMPORTANTES

• Polipátrida: indivíduo que possui mais de uma nacionalidade. • Apátrida, apólidos ou heimatlos (vem do alemão e significa “sem pátria”): é o indivíduo que não possui nenhuma nacionalidade. A situação de “apatridia” é indesejável e condenada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, que reconhece, como vimos acima, a nacionalidade como um direito fundamental. Apesar disso, na história já tivemos casos de pessoas famosas que, durante pelo menos algum tempo de suas vidas, tornaram-se apátridas. Foi o caso, por exemplo, de Albert Einstein, Karl Marx e Elke Maravilha. PORTUGUÊS EQUIPARADO (QUASE-NACIONALIDADE)

Aos portugueses com residência permanente no País serão atribuídos os direitos inerentes a brasileiro naturalizado se houver reciprocidade de tratamento em favor dos brasileiros em Portugal. Essa regra dirige-se ao português que não quer a naturalização, mas sim permanecer como português no Brasil. Esse nacional português terá os mesmos direitos do brasileiro naturalizado, mesmo sem ter obtido a naturalização, desde que haja reciprocidade de tratamento para os brasileiros em Portugal. A isso se chama de cláusula do ut des (cláusula de reciprocidade).

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A LEI NÃO PODE ESTABELECER DISTINÇÃO ENTRE BRASILEIROS NATOS E NATURALIZADOS

Como regra, a CF/88 determina que a lei não pode estabelecer discriminação entre brasileiros natos e naturalizados. O Texto Constitucional, no entanto, previu 5 distinções excepcionais e taxativas (só podem existir essas). Assim, os brasileiros natos e os naturalizados são iguais perante a lei, salvo nas seguintes hipóteses:

a) Extradição

Somente o naturalizado pode ser extraditado (o nato nunca!). O naturalizado pode ser extraditado por crime cometido antes da naturalização ou então mesmo depois da naturalização se o crime cometido foi o tráfico ilícito de entorpecentes.

b) Cargos privativos

Há alguns cargos privativos de brasileiro nato. São eles: I - Presidente e Vice-Presidente da República; II - Presidente da Câmara dos Deputados; III - Presidente do Senado Federal; IV - Ministro do Supremo Tribunal Federal; V - de carreira diplomática; VI - de oficial das Forças Armadas. VII - de Ministro de Estado da Defesa.

c) Atividade nociva ao interesse nacional

Somente o brasileiro naturalizado poderá perder a nacionalidade em virtude da prática de atividade nociva ao interesse nacional (art. 12, § 4º, I, da CF/88).

d) Conselho da República

Participam do Conselho da República, além de outros membros, seis cidadãos brasileiros natos, segundo o art. 89 da CF/88.

e) Empresa jornalística e de radiodifusão

Para que o brasileiro naturalizado seja proprietário de empresa jornalística e de radiodifusão no Brasil é necessário que tenha se naturalizado há mais de 10 anos.

HIPÓTESES DE PERDA DA NACIONALIDADE (ART. 12, § 4º, DA CF/88)

SERÁ DECLARADA A PERDA DA NACIONALIDADE DO BRASILEIRO QUE:

I – Praticar atividade nociva ao interesse nacional

II - Adquirir outra nacionalidade

A doutrina denomina de “perda-punição”. A doutrina denomina de “perda-mudança”.

Se um brasileiro naturalizado praticar atividade nociva ao interesse nacional, terá cancelada a sua naturalização.

Se um brasileiro, nato ou naturalizado, adquirir voluntariamente uma nacionalidade estrangeira, perderá, então, a brasileira.

Essa perda ocorre por meio de um processo judicial, assegurado contraditório e ampla defesa, que tramita na Justiça Federal (art. 109, X, da CF/88). A lei não descreve o que seja atividade nociva ao interesse nacional.

Esta perda ocorre por meio de um processo administrativo, assegurado contraditório e ampla defesa, que tramita no Ministério da Justiça. Este processo poderá ser instaurado de ofício ou mediante requerimento (art. 23 da Lei nº 818/49).

Após a tramitação do processo, a perda efetiva-se por meio de sentença, que deve ter transitado em julgado.

Após a tramitação do processo, a perda efetiva-se por meio de Decreto do Presidente da República.

Os efeitos da sentença serão ex nunc. Os efeitos do Decreto serão ex nunc.

Esta hipótese de perda somente atinge o brasileiro naturalizado. Assim, o brasileiro nato não pode perder a sua nacionalidade, mesmo que pratique atividade nociva ao interesse nacional.

Esta hipótese de perda atinge tanto o brasileiro nato como o naturalizado.

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Havendo a perda da nacionalidade por este motivo, a sua reaquisição somente poderá ocorrer caso a sentença que a decretou seja rescindida por meio de ação rescisória. Desse modo, não é permitido que a pessoa que perdeu a nacionalidade por esta hipótese a obtenha novamente por meio de novo procedimento de naturalização.

Havendo a perda da nacionalidade por este motivo, a sua reaquisição será possível por meio de pedido dirigido ao Presidente da República, sendo o processo instruído no Ministério da Justiça. Caso seja concedida a reaquisição, esta é feita por meio de Decreto. Alexandre de Moraes defende que o brasileiro nato que havia perdido e readquire sua nacionalidade, passa a ser brasileiro naturalizado (e não mais nato). Por outro lado, José Afonso da Silva afirma que o readquirente recupera a condição que perdera: se era brasileiro nato, voltará a ser brasileiro nato; se naturalizado, retomará essa qualidade.

Exceções A CF traz duas hipóteses em que a pessoa não perderá a nacionalidade brasileira, mesmo tendo adquirido outra nacionalidade. Assim, será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que adquirir outra nacionalidade, salvo no casos: a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira; Ex: a Itália reconhece aos filhos de seus nacionais a cidadania italiana. Os brasileiros descendentes de italianos que adquirem aquela nacionalidade não perderão a brasileira, uma vez que se trata de mero reconhecimento de nacionalidade originária italiana em virtude do vínculo sanguíneo. Logo, serão pessoas com dupla nacionalidade. b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis; Aqui, o objetivo da exceção é preservar a nacionalidade brasileira daquele que, por motivos de trabalho, acesso aos serviços públicos, moradia etc., praticamente se vê obrigado a adquirir a nacionalidade estrangeira, mas que, na realidade, jamais teve a intenção ou vontade de abdicar da nacionalidade brasileira.

PERDA DA CONDIÇÃO DE BRASILEIRO NATO E EXTRADIÇÃO

Feitas as considerações acima, imagine a seguinte situação adaptada: Maria nasceu no Brasil e era brasileira nata. Em 2000, ela decidiu se mudar para os EUA e lá se casou com um norte-americano. Em 2005, ela conseguiu obter o green card.

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Green card Green card é um visto de residência permanente concedido pelas autoridades a alguns estrangeiros a fim de que possam viver e trabalhar nos EUA. O nome oficial do documento é United States Permanent Resident Card (algo como "Cartão de Residência Permanente nos Estados Unidos"). O estrangeiro titular do green card praticamente não tem limitações, podendo morar e trabalhar nos EUA sem limite de tempo. Talvez a única limitação imposta seja o fato de que a pessoa não poderá ficar muito tempo fora dos EUA, sob pena de perder o visto. Curiosidade: o green card é assim chamado porque ele originalmente era verde; atualmente, contudo, é branco. Vale ressaltar que a pessoa que é titular do green card não possui cidadania norte-americana. Ela não poderá, por exemplo, votar, já que este é um direito restrito aos norte-americanos (natos ou naturalizados). Assim, se um brasileiro consegue o green card, ele continuará sendo brasileiro e não terá adquirido a nacionalidade estadunidense. Terá conseguido apenas um visto permanente para trabalhar e morar livremente nos EUA. Voltando ao nosso exemplo: Maria possuía green card, de forma que poderia trabalhar e morar livremente nos EUA. Ocorre que Maria não estava ainda satisfeita e queria ser cidadã norte-americana. Então, em 2014, Maria requereu e conseguiu obter a nacionalidade norte-americana. Tudo ia bem, até que, em 2015, Maria matou seu marido e fugiu para o Brasil. Os EUA pediram a extradição de Maria. Esta alegou em sua defesa que o Brasil não poderia conceder a extradição em virtude de ela ser brasileira nata, havendo óbice no art. 5º, LI, da CF/88:

Art. 5º (...) LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei;

Perda da nacionalidade Maria, ao adquirir a nacionalidade norte-americana, praticou conduta que enseja a perda da nacionalidade brasileira, nos termos do que determina o art. 12, § 4º, II, da CF/88:

Art. 12 (...) § 4º - Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que: II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos: a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira; b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis;

Em razão disso, o Ministro da Justiça instaurou processo administrativo contra ela a fim de declarar a perda de sua nacionalidade brasileira. Maria alegou em sua defesa que não poderá sofrer esta sanção, considerando que seu caso se enquadraria na letra “b” do inciso II, ou seja, ela afirmou que só adquiriu a nacionalidade norte-americana porque isso era necessário para que ela permanecesse nos EUA e para que pudesse exercer seus direitos civis. A tese de defesa de Maria foi aceita? NÃO. A situação de Maria não se enquadra em nenhuma das duas exceções dos incisos I e II do § 4º do art. 12 da CF/88. Isso porque, como a interessada já tinha o green card, não havia necessidade de ela ter adquirido a nacionalidade norte-americana como condição para permanência ou para o exercício de

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direitos civis. Com o green card, ela já poderia morar e trabalhar livremente nos EUA. Dessa forma, conclui-se que a aquisição da cidadania americana ocorreu por livre e espontânea vontade. Vale ressaltar que Maria não tinha nenhuma relação com os EUA que lhe garantisse o direito de adquirir a nacionalidade originária americana, nos termos da alínea “a” do inciso II do § 4º do art. 12 (ex: Maria não era filha de norte-americanos nem nasceu em solo estadunidense). Perdendo a nacionalidade brasileira, Maria poderá ser extraditada para os EUA? SIM. A partir do momento em que for concluído o processo administrativo e sendo declarada a perda da nacionalidade pelo Ministro da Justiça, Maria deixa de ser brasileira nata e poderá, com isso, ser extraditada. Repare bem: o brasileiro nato não pode nunca ser extraditado. Essa regra não comporta exceção. No entanto, se o brasileiro nato perder a sua nacionalidade, ele poderá ser extraditado normalmente porque, neste caso, deixou de ser brasileiro nato, não havendo, portanto, mais o óbice do art. 5º, LI, da CF/88. Resumindo: Se um brasileiro nato que mora nos EUA e possui o green card decidir adquirir a nacionalidade norte-americana, ele irá perder a nacionalidade brasileira. Não se pode afirmar que a presente situação se enquadre na exceção prevista na alínea “b” do § 4º do art. 12 da CF/88. Isso porque, como ele já tinha o green card, não havia necessidade de ter adquirido a nacionalidade norte-americana como condição para permanência ou para o exercício de direitos civis. O estrangeiro titular de green card já pode morar e trabalhar livremente nos EUA. Dessa forma, conclui-se que a aquisição da cidadania americana ocorreu por livre e espontânea vontade. Vale ressaltar que, perdendo a nacionalidade, ele perde os direitos e garantias inerentes ao brasileiro nato. Assim, se cometer um crime nos EUA e fugir para o Brasil, poderá ser extraditado sem que isso configure ofensa ao art. 5º, LI, da CF/88. STF. 1ª Turma. MS 33864/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 19/4/2016 (Info 822).

COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS A competência para legislar sobre serviços de telecomunicações é privativa da União

A competência para legislar sobre serviços de telecomunicações é privativa da União art. 21, XI e art. 22, IV, da CF/88).

Logo, é inconstitucional lei estadual que determinou às empresas telefônicas que criem e mantenham um cadastro de assinantes interessados em receber ofertas de produtos e serviços, que deve ser disponibilizado para as empresas de telemarketing.

STF. Plenário. ADI 3959/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 20/4/2016 (Info 822).

A competência para legislar sobre telecomunicações é privativa da União, estando prevista nos art. 21, XI e 22, IV, da CF/88 :

Art. 21. Compete à União: XI – explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais; Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: IV – águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão;

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A Lei de que trata este inciso é a Lei n. 9.472/97, que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, a criação e funcionamento de um órgão regulador e outros aspectos institucionais.

Com base no que foi acima exposto, o STF julgou inconstitucional lei do Estado de SP que determinou às empresas telefônicas que criem e mantenham um cadastro de assinantes interessados em receber ofertas de produtos e serviços, que deve ser disponibilizado para as empresas de telemarketing. Resumindo: A competência para legislar sobre serviços de telecomunicações é privativa da União art. 21, XI e art. 22, IV, da CF/88). Logo, é inconstitucional lei estadual que verse sobre este tema, como é o caso de lei estadual que dispõe sobre a instituição de um cadastro com os números das linhas telefônicas dos assinantes do serviço de telefonia interessados no sistema de venda por via telefônica. STF. Plenário. ADI 3959/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 20/4/2016 (Info 822).

PROCESSO LEGISLATIVO Emenda parlamentar em projeto de lei do Poder Executivo

É inconstitucional norma resultante de emenda parlamentar a projeto de lei de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, na hipótese em que a emenda apresentada acarrete aumento de despesa (art. 61, § 1º, II, “a” e art. 63, I, da CF/88).

STF. Plenário. ADI 2810/RS, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 20/4/2016 (Info 822).

REQUISITOS PARA QUE SEJA VÁLIDA A EMENDA PARLAMENTAR A PROJETOS DE LEI DE OUTROS PODERES

O parlamentar poderá apresentar emendas em um projeto de lei que seja de iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo? Em outras palavras, o projeto de lei que trata sobre uma das matérias do art. 61, § 1º da CF/88 e que esteja tramitando no Parlamento poderá ser alterado pelos parlamentares? SIM. É possível que haja emenda parlamentar em um projeto de lei de iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo, desde que cumpridos dois requisitos: a) haja pertinência temática (a emenda não trate sobre assunto diferente do projeto original); e b) a emenda não acarrete aumento de despesas (art. 63, I, da CF/88).

Assim, nos projetos de lei de iniciativa do Chefe do Executivo, o parlamentar pode até propor emendas, mas estas deverão respeitar as restrições trazidas pelo art. 63, I, da CF/88.

Art. 63. Não será admitido aumento da despesa prevista: I — nos projetos de iniciativa exclusiva do Presidente da República, ressalvado o disposto no art. 166, § 3º e § 4º; Obs.: os §§ 3º e 4º tratam sobre os projetos de lei orçamentária e da LDO; nesses dois casos, é possível que a emenda parlamentar acarrete aumento de despesas.

Veja um precedente antigo do Supremo nesse sentido:

(...) A atuação dos integrantes da Assembleia Legislativa dos Estados-membros acha-se submetida, no processo de formação das leis, à limitação imposta pelo art. 63 da Constituição, que veda — ressalvadas as proposições de natureza orçamentária — o oferecimento de emendas parlamentares de que resulte o aumento da despesa prevista nos projetos sujeitos ao exclusivo poder de iniciativa do Governador do Estado ou referentes à organização administrativa dos Poderes Legislativo e Judiciário locais, bem assim do Ministério Público estadual. (...)

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O poder de emendar — que não constitui derivação do poder de iniciar o processo de formação das leis — qualifica-se como prerrogativa deferida aos parlamentares, que se sujeitam, no entanto, quanto ao seu exercício, às restrições impostas, em “numerus clausus”, pela Constituição Federal. (...) Revela-se plenamente legítimo, desse modo, o exercício do poder de emenda pelos parlamentares, mesmo quando se tratar de projetos de lei sujeitos à reserva de iniciativa de outros órgãos e Poderes do Estado, incidindo, no entanto, sobre essa prerrogativa parlamentar — que é inerente à atividade legislativa —, as restrições decorrentes do próprio texto constitucional (CF, art. 63, I e II), bem assim aquela fundada na exigência de que as emendas de iniciativa parlamentar sempre guardem relação de pertinência (“afinidade lógica”) com o objeto da proposição legislativa. Doutrina. (...) STF. Plenário. ADI 2681 MC, Rel. Min. Celso De Mello, julgado em 11/09/2002.

Existem também outros recentes no mesmo sentido: STF. Plenário. ADI 3942/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, jugado em 5/2/2015 (Info 773). Caso concreto julgado pelo STF: O Governador do Estado enviou projeto de lei tratando sobre os servidores de determinada entidade estadual. Durante a tramitação do projeto, um Deputado apresentou emenda criando uma gratificação para os servidores dessa entidade. O projeto foi aprovado e sancionado, convertendo-se em lei. O STF julgou essa lei inconstitucional porque houve aumento de despesa. É inconstitucional norma resultante de emenda parlamentar a projeto de lei de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, na hipótese em que a emenda apresentada acarrete aumento de despesa (art. 61, § 1º, II, “a” e art. 63, I, da CF/88). STF. Plenário. ADI 2810/RS, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 20/4/2016 (Info 822).

DIREITO PENAL

PRESCRIÇÃO Redução do prazo prescricional para condenados maiores de 70 anos e momento de sua aferição

Importante!!!

Cuidado com alguns livros!

Para que incida a redução do prazo prescricional prevista no art. 115 do CP, é necessário que, no momento da sentença, o condenado possua mais de 70 anos. Se ele só completou a idade após a sentença, não terá direito ao benefício, mesmo que isso tenha ocorrido antes do julgamento de apelação interposta contra a sentença.

Existe, no entanto, uma situação em que o condenado será beneficiado pela redução do art. 115 do CP mesmo tendo completado 70 anos após a sentença: isso ocorre quando o condenado opõe embargos de declaração contra o acórdão condenatório e esses embargos são conhecidos. Nesse caso, o prazo prescricional será reduzido pela metade se o réu completar 70 anos até a data do julgamento dos embargos. Nesse sentido: STF. Plenário. AP 516 ED/DF, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 5/12/2013 (Info 731).

STF. 2ª Turma. HC 129696/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/4/2016 (Info 822).

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Redução do prazo prescricional para condenados maiores de 70 anos O art. 115 do CP preconiza:

Art. 115. São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos.

Situação 1. Imagine o seguinte exemplo hipotético: João, com 69 anos, foi condenado, em 1ª instância, no dia 02/02/2010. O condenado interpôs apelação. O TJ julgou a apelação em 03/03/2014 e manteve, na íntegra, a sentença. Nesta data, ele já tinha 73 anos. O réu terá direito ao art. 115 do CP? NÃO. Isso porque, na data da sentença, ele tinha menos de 70 anos. Para que incida a redução do prazo prescricional prevista no art. 115 do CP, é necessário que, no momento da sentença, o condenado possua mais de 70 anos. Se ele só completou a idade após a sentença, não terá direito ao benefício, mesmo que isso tenha ocorrido antes do julgamento de apelação interposta contra a sentença. STF. 2ª Turma. HC 129696/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/4/2016 (Info 822). Este é também o entendimento do STJ:

(...) A Terceira Seção desta Corte, no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 749.912/PR, pacificou o entendimento de que o benefício previsto no artigo 115 do Código Penal não se aplica ao réu que completou 70 anos de idade após a data da primeira decisão condenatória (...) STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 332.735/RJ, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 16/02/2016.

Situação 2. Imagine agora o exemplo um pouco diferente: João, com 69 anos, foi condenado, em 1ª instância, no dia 02/02/2010. O condenado opôs embargos de declaração. O juiz conheceu dos embargos, mas os julgou improvidos em 05/05/2010, mantendo a sentença. Nesta data, o condenado já tinha mais de 70 anos. O réu terá direito ao art. 115 do CP? SIM. O STF admite a redução do prazo prescricional pela metade quando o réu completa 70 anos após a sentença condenatória, mas antes de terem sido julgados os embargos de declaração opostos contra a decisão (se conhecidos). Isso porque se entende que a decisão dos embargos integra a sentença. Em regra, para se beneficiar da redução de prazo prevista no art. 115 do CP, o condenado deverá ser maior de 70 anos no dia da sentença. Existe, no entanto, uma situação em que o condenado será beneficiado pela redução do art. 115 do CP mesmo tendo completado 70 anos após a sentença: isso ocorre quando o condenado opõe embargos de declaração contra o acórdão condenatório e esses embargos são conhecidos. Nesse caso, o prazo prescricional será reduzido pela metade se o réu completar 70 anos até a data do julgamento dos embargos. STF. Plenário. AP 516 ED/DF, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 5/12/2013 (Info 731).

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

SIGILO BANCÁRIO Validade da utilização do RMF no processo penal

Importante!!!

Não é nula a condenação criminal lastreada em prova produzida no âmbito da Receita Federal do Brasil por meio da obtenção de informações de instituições financeiras sem prévia autorização judicial de quebra do sigilo bancário. Isso porque o STF decidiu que são constitucionais os arts. 5º e 6º da LC 105/2001, que permitem o acesso direto da Receita Federal à movimentação financeira dos contribuintes.

STF. 2ª Turma. RHC 121429/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/4/2016 (Info 822).

Imagine a seguinte situação adaptada: Samuel era sócio administrador de uma empresa. A Receita Federal instaurou procedimento fiscal contra a sociedade empresária sob a suspeita de que estaria havendo sonegação de tributos. No curso do procedimento, a Receita, sem autorização judicial, requisitou diretamente do banco os extratos bancários da empresa. A título de curiosidade, essa determinação é chamada de requisição de informações sobre movimentação financeira (RMF). A Receita fundamentou sua requisição no art. 6º da LC n. 105/2001:

Art. 6º As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.

De posse dos extratos, o Fisco constatou que realmente houve sonegação de tributos e, por conta disso, autuou a pessoa jurídica e fez a constituição definitiva do crédito tributário. Ação penal A Receita Federal encaminhou cópia integral do processo administrativo-fiscal, inclusive dos extratos bancários, e o MPF, com base nesses elementos informativos (“provas”), denunciou Samuel como incurso no art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90. Alegação de prova ilícita Ao se defender, Samuel sustentou a ilicitude da "prova" colhida (extratos bancários), alegando que teria havido uma quebra de sigilo bancário sem autorização judicial. Desse modo, essa "prova" não poderia ser utilizada no processo penal. A tese do réu é aceita pela jurisprudência do STF? NÃO. Não é nula a condenação criminal lastreada em prova produzida no âmbito da Receita Federal do Brasil por meio da obtenção de informações de instituições financeiras sem prévia autorização judicial de quebra do sigilo bancário. Isso porque o STF decidiu que são constitucionais os arts. 5º e 6º da LC 105/2001, que permitem o acesso direto da Receita Federal à movimentação financeira dos contribuintes. STF. 2ª Turma. RHC 121429/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/4/2016 (Info 822).

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OUTRAS INFORMAÇÕES

R E P E R C U S S Ã O G E R A L DJe de 18 a 22 de abril de 2016

REPERCUSSÃO GERAL EM ARE N. 953.478-MG

RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. SERVIDORES PÚBLICOS. FUNDAÇÃO EZEQUIEL DIAS

(FUNED). BASES DE CÁLCULO DO DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO E DO ADICIONAL DE FÉRIAS. INCLUSÃO DA GRATIFICAÇÃO DE

INCENTIVO À EFICIENTIZAÇÃO DOS SERVIÇOS (GIEFS). MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. 1. A controvérsia relativa à inclusão da Gratificação de Incentivo à Eficientização dos Serviços (GIEFS) nas bases de cálculo do décimo terceiro

salário e do adicional de férias devidos a servidor público, fundada na interpretação das Leis 869/52, 9.729/88 e 11.406/94, do Estado de Minas

Gerais, é de natureza infraconstitucional.

2. É cabível a atribuição dos efeitos da declaração de ausência de repercussão geral quando não há matéria constitucional a ser apreciada ou quando

eventual ofensa à Carta Magna ocorra de forma indireta ou reflexa (RE 584.608-RG, Rel. Min. ELLEN GRACIE, DJe de 13/3/2009).

3. Ausência de repercussão geral da questão suscitada, nos termos do art. 543-A do CPC.

REPERCUSSÃO GERAL EM ARE N. 954.408-RS

RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI

EMENTA: ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. SERVIDOR PÚBLICO EM

ATIVIDADE APÓS O PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA VOLUNTÁRIA ESPECIAL. CONCESSÃO DO ABONO DE PERMANÊNCIA. LEGITIMIDADE.

1. É legítimo o pagamento do abono de permanência previsto no art. 40, § 19, da Constituição Federal ao servidor público que opte por permanecer

em atividade após o preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria voluntária especial (art. 40, § 4º, da Carta Magna). 2. Agravo conhecido para negar provimento ao recurso extraordinário, com o reconhecimento da repercussão geral do tema e a reafirmação da

jurisprudência sobre a matéria.

C L I P P I N G D O D JE 18 a 22 de abril de 2016

RE N. 837.311-PI

RELATOR: MIN. LUIZ FUX

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.

TEMA 784 DO PLENÁRIO VIRTUAL. CONTROVÉRSIA SOBRE O DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO DE CANDIDATOS

APROVADOS ALÉM DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO NO CASO DE SURGIMENTO

DE NOVAS VAGAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO.

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. IN CASU, A ABERTURA DE NOVO CONCURSO PÚBLICO FOI

ACOMPANHADA DA DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DA NECESSIDADE PREMENTE E INADIÁVEL DE PROVIMENTO DOS

CARGOS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 37, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988. ARBÍTRIO. PRETERIÇÃO.

CONVOLAÇÃO EXCEPCIONAL DA MERA EXPECTATIVA EM DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRINCÍPIOS DA

EFICIÊNCIA, BOA-FÉ, MORALIDADE, IMPESSOALIDADE E DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. FORÇA NORMATIVA DO

CONCURSO PÚBLICO. INTERESSE DA SOCIEDADE. RESPEITO À ORDEM DE APROVAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM

SINTONIA COM A TESE ORA DELIMITADA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O postulado do concurso público traduz-se na necessidade essencial de o Estado conferir efetividade a diversos princípios constitucionais, corolários do merit system, dentre eles o de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (CRFB/88, art. 5º, caput).

2. O edital do concurso com número específico de vagas, uma vez publicado, faz exsurgir um dever de nomeação para a própria Administração e um

direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número de vagas. Precedente do Plenário: RE 598.099 - RG, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJe 03-10-2011.

3. O Estado Democrático de Direito republicano impõe à Administração Pública que exerça sua discricionariedade entrincheirada não, apenas, pela

sua avaliação unilateral a respeito da conveniência e oportunidade de um ato, mas, sobretudo, pelos direitos fundamentais e demais normas

constitucionais em um ambiente de perene diálogo com a sociedade.

4. O Poder Judiciário não deve atuar como “Administrador Positivo”, de modo a aniquilar o espaço decisório de titularidade do administrador para

decidir sobre o que é melhor para a Administração: se a convocação dos últimos colocados de concurso público na validade ou a dos primeiros aprovados em um novo concurso. Essa escolha é legítima e, ressalvadas as hipóteses de abuso, não encontra obstáculo em qualquer preceito

constitucional.

5. Consectariamente, é cediço que a Administração Pública possui discricionariedade para, observadas as normas constitucionais, prover as vagas da maneira que melhor convier para o interesse da coletividade, como verbi gratia, ocorre quando, em função de razões orçamentárias, os cargos vagos

só possam ser providos em um futuro distante, ou, até mesmo, que sejam extintos, na hipótese de restar caracterizado que não mais serão necessários.

6. A publicação de novo edital de concurso público ou o surgimento de novas vagas durante a validade de outro anteriormente realizado não caracteriza, por si só, a necessidade de provimento imediato dos cargos. É que, a despeito da vacância dos cargos e da publicação do novo edital

durante a validade do concurso, podem surgir circunstâncias e legítimas razões de interesse público que justifiquem a inocorrência da nomeação no

curto prazo, de modo a obstaculizar eventual pretensão de reconhecimento do direito subjetivo à nomeação dos aprovados em colocação além do número de vagas. Nesse contexto, a Administração Pública detém a prerrogativa de realizar a escolha entre a prorrogação de um concurso público que

esteja na validade ou a realização de novo certame.

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Informativo 822-STF (27/04/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 13

7. A tese objetiva assentada em sede desta repercussão geral é a de que o surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo,

durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital,

ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da administração, caracterizadas por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo

candidato. Assim, a discricionariedade da Administração quanto à convocação de aprovados em concurso público fica reduzida ao patamar zero

(Ermessensreduzierung auf Null), fazendo exsurgir o direito subjetivo à nomeação, verbi gratia, nas seguintes hipóteses excepcionais: i) Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital (RE 598.099);

ii) Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação (Súmula 15 do STF);

iii) Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos aprovados fora das vagas de forma arbitrária e imotivada por parte da administração nos termos acima.

8. In casu, reconhece-se, excepcionalmente, o direito subjetivo à nomeação aos candidatos devidamente aprovados no concurso público, pois houve,

dentro da validade do processo seletivo e, também, logo após expirado o referido prazo, manifestações inequívocas da Administração piauiense acerca da existência de vagas e, sobretudo, da necessidade de chamamento de novos Defensores Públicos para o Estado.

9. Recurso Extraordinário a que se nega provimento.

AG. REG. NA Rcl N. 21.258-PR

RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI

EMENTA : Agravo regimental na reclamação. Acordo de colaboração premiada (art. 4º da Lei nº 12.850/13). Negócio jurídico processual

personalíssimo. Impugnação por coautores ou partícipes do colaborador. Inadmissibilidade. Possibilidade de, em juízo, confrontarem as

declarações do colaborador e de impugnarem, a qualquer tempo, medidas restritivas de direitos fundamentais adotadas em seu desfavor.

Precedente. Acesso, pelo delatado, a todos os elementos de prova documentados nos autos dos acordos de colaboração, incluindo-se as

gravações audiovisuais dos atos de colaboração de corréus (Súmula vinculante nº 14). Direito que, segundo o juízo reclamado, foi

assegurado. Impossibilidade de, na via estreita da reclamação, questionar-se a veracidade das informações prestadas pelo juízo reclamado.

Possibilidade de o agravante, invocando a decisão recorrida, postular esse acesso ao juízo reclamado. Agravo regimental não provido. 1. Por se tratar de negócio jurídico personalíssimo, o acordo de colaboração premiada não pode ser impugnado por coautores ou partícipes do

colaborador na organização criminosa e nas infrações penais por ela praticadas, ainda que venham a ser expressamente nominados no respectivo instrumento no relato da colaboração e em seus possíveis resultados (HC nº 127.483/PR, Pleno, de minha relatoria, DJe de 4/2/16).

2. A homologação do acordo de colaboração, por si só, não produz nenhum efeito na esfera jurídica do delatado, uma vez que não é o acordo

propriamente dito que poderá atingi-la, mas sim as imputações constantes dos depoimentos do colaborador ou as medidas restritivas de direitos fundamentais que vierem a ser adotadas com base nesses depoimentos e nas provas por ele indicadas ou apresentadas

3. As cláusulas do acordo de colaboração, contra as quais se insurge o agravante, não repercutem, nem sequer remotamente, em sua esfera jurídica,

razão por que não tem interesse jurídico nem legitimidade para impugná-las. 4. O agravante, com fundamento na Súmula Vinculante nº 14 do Supremo Tribunal Federal, poderá ter acesso a todos os elementos de prova

documentados nos autos dos acordos de colaboração - incluindo-se as gravações audiovisuais dos atos de colaboração de corréus – para confrontá-los,

mas não para impugnar os termos dos acordos propriamente ditos. 5. Considerando-se que, segundo o juízo reclamado, o acesso a tais elementos foi assegurado ao agravante, descabe, na via estreita da reclamação,

questionar-se a veracidade dessas informações.

6. Se, como alega o agravante, o juízo reclamado limitou-se a garantir o acesso das gravações audiovisuais a outros acusados, nada obsta que, invocando os fundamentos da decisão recorrida, postule esse acesso diretamente ao juízo reclamado.

7. Agravo regimental não provido.

REFERENDO EM MED. CAUT. EM ADI N. 5.449-RR

RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI

EMENTA: CONSTITUCIONAL E FINANCEIRO. ART. 50, DA LEI 1.005/15, DO ESTADO DE RORAIMA. FIXAÇÃO DE DIRETRIZES

ORÇAMENTÁRIAS LOCAIS PARA O EXERCÍCIO DE 2016. MODIFICAÇÃO DOS LIMITES DE GASTOS COM PESSOAL DOS PODERES EXECUTIVO E LEGISLATIVO. SUPERAÇÃO DO TETO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO FEDERAL, NESTE ÚLTIMO CASO. PLAUSÍVEL

USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO (ART. 169, DA CF). RISCO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO LOCAL COM A

VIGÊNCIA DA NORMA. CAUTELAR PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. Leis orçamentárias que materializem atos de aplicação primária da Constituição Federal podem ser submetidas a controle de constitucionalidade

em processos objetivos. Precedentes.

2. A incompatibilidade entre os termos do dispositivo impugnado e os padrões da lei de responsabilidade fiscal (Lei Federal Complementar 101/00) não se resume a uma crise de legalidade. Traduz, em verdade, um problema de envergadura maior, a envolver a indevida apropriação de competências

da União, em especial a de conceber limites de despesas com pessoal ativo e inativo (art. 169, caput, da CF), controvérsia que comporta solução na

via da ação direta de inconstitucionalidade. 3. Os limites traçados pela lei de responsabilidade para os gastos com pessoal ativo e inativo nos Estados, Distrito Federal e Municípios valem como referência

nacional a ser respeitada por todos os entes federativos, que ficam incontornavelmente vinculados aos parâmetros máximos de valor nela previstos.

4. Ao contemplar um limite de gastos mais generoso para o Poder Legislativo local, o dispositivo impugnado se indispôs abertamente com os parâmetros normativos da lei de responsabilidade fiscal, e com isso, se sobrepôs à autoridade da União para dispor no tema, pelo que fica

caracterizada a lesão ao art. 169, caput, da CF.

5. Liminar referendada pelo Plenário para suspender, com efeitos “ex nunc” (art. 11, § 1º, da Lei 9.868/99, até o julgamento final desta ação, a eficácia da expressão “Poder Legislativo 4,5%”, do art. 50 da Lei estadual 1.005/2015.

*noticiado no Informativo 817

TRANSCRIÇÕES

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais

aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham

despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

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Organização Criminosa - “Lava a Jato” - Denúncia - Controle Prévio (Transcrições)

(v. Informativo 818)

Inq 3.983/DF*

RELATOR: Ministro Teori Zavascki

VOTO DO MINISTRO CELSO DE MELLO

1. “O direito do cidadão ao governo honesto”: a corrupção governamental e o perigo de captura das instituições estatais por organização

criminosa Este caso, Senhor Presidente, revela um dado absolutamente impressionante e, ao mesmo tempo, profundamente inquietante, pois o que

parece resultar dos elementos de informação que vêm sendo coligidos ao longo de diversos procedimentos de investigação penal, todos instaurados no contexto da denominada “Operação Lava a Jato”, é que a corrupção impregnou-se, profundamente, no tecido e na intimidade de algumas

agremiações partidárias e das instituições estatais, contaminando o aparelho de Estado, transformando-se em método de ação governamental e

caracterizando-se como conduta administrativa endêmica, em claro (e preocupante) sinal de degradação da própria dignidade da atividade política, reduzida por esses agentes criminosos ao plano subalterno da delinquência institucional.

O efeito imediato que resulta desses comportamentos alegadamente delituosos parece justificar o reconhecimento de que as práticas ilícitas

perpetradas por referidos agentes tinham um só objetivo: viabilizar a captura das instituições governamentais por determinada organização criminosa, constituída para dominar os mecanismos de ação governamental, em detrimento do interesse público e em favor de pretensões

inconfessáveis e lesivas aos valores ético-jurídicos que devem conformar, sempre, a atividade do Estado.

Convenço-me, cada vez mais, Senhor Presidente, de que os fatos delituosos objeto de investigação e de persecução penais no âmbito da “Operação Lava a Jato” nada mais constituem senão episódios criminosos que, anteriores, contemporâneos ou posteriores aos do denominado

“Mensalão”, compõem um vasto e ousado painel revelador do assalto e da tentativa de captura do Estado e de suas instituições por uma organização

criminosa, identificável, em ambos os contextos, por elementos que são comuns tanto ao “Petrolão” quanto ao “Mensalão”. Penso que se reveste de inteira pertinência fragmento de voto que, por mim proferido no julgamento da AP 470/MG, acentuava que o ato

de corrupção constitui um gesto de perversão da ética do poder e da ordem jurídica, cabendo ressaltar que o dever de probidade traduz obrigação

cuja observância se impõe a todos os cidadãos desta República que não tolera o poder que corrompe nem admite o poder que se deixa corromper. Daí a corretíssima advertência do eminente Professor CELSO LAFER, para quem nenhum cidadão poderá viver com dignidade numa

comunidade política corrompida:

“Numa República, como diz Bobbio num diálogo com Viroli, o primeiro dever do governante é o senso de Estado, vale dizer, o dever de buscar

o bem comum, e não o individual, ou de grupos; e o primeiro dever do cidadão é respeitar os outros e se dar conta, sem egoísmo, de que não se vive em isolamento, mas sim em meio aos outros.

É por essa razão que a República se vê comprometida quando prevalece, no âmbito dos governantes, em detrimento do senso de Estado, o

espírito de facção voltado não para a utilidade comum, mas para assegurar vantagens e privilégios para grupos, partidos e lideranças. (...). …...................................................................................................

Numa República, as boas leis devem ser conjugadas com os bons costumes de governantes e governados, que a elas dão vigência e eficácia. A

ausência de bons costumes leva à corrupção (...), que significa destruição e vai além dos delitos tipificados no Código Penal. (…). A corrupção, num regime político (…), é um agente de decomposição da substância das instituições públicas.

O espírito público da postura republicana é o antídoto para esse efeito deletério da corrupção. É o que permite afastar a mentira e a

simulação, inclusive a ideológica, que mina a confiança recíproca entre governantes e governados, necessária para o bom funcionamento das instituições democráticas e republicanas. (...).” (grifei)

É por isso, Senhor Presidente, que os fatos emergentes da denominada “Operação Lava a Jato” parecem sugerir que ainda subsistiria, no âmago do

aparelho estatal, aquela estranha e profana aliança entre determinados setores do Poder Público, de um lado, e agentes empresariais, de outro, reunidos em

um imoral sodalício com o objetivo perverso e ilícito de cometer uma pluralidade de delitos gravemente vulneradores do ordenamento jurídico instituído pelo Estado brasileiro.

Tais práticas delituosas – que tanto afetam a estabilidade e a segurança da sociedade, ainda mais quando veiculadas por intermédio de organização

criminosa – enfraquecem as instituições, corrompem os valores da democracia, da ética e da justiça e comprometem a própria sustentabilidade do Estado Democrático de Direito, notadamente nos casos em que os desígnios dos agentes envolvidos guardam homogeneidade, eis que dirigidos, em contexto de

criminalidade organizada e de delinquência governamental, a um fim comum, consistente na obtenção, à margem das leis da República, de inadmissíveis

vantagens e de benefícios de ordem pessoal, de caráter empresarial ou de natureza político-partidária. Tais são as razões, Senhor Presidente, que me levam a constatar que as investigações promovidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público

Federal, não obstante fragmentadas em diversos inquéritos e procedimentos penais, têm por objeto uma vasta organização criminosa, de projeção tentacular

e dimensão nacional, estruturalmente ordenada em níveis hierárquicos próprios, que observa métodos homogêneos de atuação, integrada por múltiplos atores e protagonistas e que, operando por intermédio de vários núcleos especializados, com clara divisão de tarefas (núcleo político, núcleo empresarial, núcleo

financeiro, núcleo operacional e núcleo técnico, entre outros), busca obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, notadamente no âmbito

do Estado, mediante prática de infrações penais que abrangem amplo espectro de ilicitudes criminosas, como aquelas que vão do cometimento de crimes contra a Administração Pública, o Sistema Financeiro Nacional, o Estatuto das Licitações e Contratações Administrativas até a perpetração do delito de

lavagem de dinheiro ou de valores, sem prejuízo de outros gravíssimos ilícitos tipificados na legislação penal.

Cabe observar, de outro lado, Senhor Presidente, que a concepção republicana de poder mostra-se absolutamente incompatível com qualquer prática governamental tendente a restaurar a inaceitável teoria do Estado patrimonial.

Com o objetivo de proteger valores fundamentais, Senhor Presidente, tais como se qualificam aqueles consagrados nos princípios da transparência,

da igualdade, da moralidade e da impessoalidade, o sistema constitucional instituiu normas e estabeleceu diretrizes destinadas a obstar práticas que culminem por patrimonializar o poder governamental, convertendo-o, em razão de uma inadmissível inversão dos postulados republicanos, em verdadeira

“res domestica”, degradando-o, assim, à condição subalterna de instrumento de mera dominação do Estado, vocacionado não a servir ao interesse público e ao bem comum, mas, antes, a atuar como incompreensível e inaceitável meio de satisfazer conveniências e ambições pessoais e de realizar aspirações

governamentais e partidárias.

Daí a reflexão doutrinária, impregnada de acentuado componente filosófico, que examina o pensamento democrático à luz das grandes dicotomias, como, por exemplo, aquela pertinente à dualidade público/privado, subjacente à ideia mesma de que o respeito, pelos indivíduos, aos limites que definem o

domínio público de atuação do Estado, separando-o, de modo nítido, do espaço meramente privado, qualifica-se como pressuposto necessário ao exercício da

cidadania e do pluralismo político, que representam, enquanto categorias essenciais que são (pois dão ênfase à prática da igualdade, do diálogo, da tolerância e da liberdade), alguns dos fundamentos em que se estrutura, em nosso sistema institucional, o Estado republicano e democrático (CF, art. 1º, incisos II e V).

Cabe preservar, desse modo, as relações que os conceitos de espaço público e de espaço privado guardam entre si, para que tais noções não se

deformem nem provoquem a subversão dos fins ético-jurídicos visados pelo legislador constituinte.

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Informativo 822-STF (27/04/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 15

A gravidade da corrupção governamental, notadamente aquela praticada no Parlamento da República, evidencia-se pelas múltiplas consequências

que dela decorrem, tanto aquelas que se projetam no plano da criminalidade oficial quanto as que se revelam na esfera civil (afinal o ato de corrupção

traduz um gesto de improbidade administrativa) e, também, no âmbito político-institucional, na medida em que a percepção de vantagens indevidas representa um ilícito constitucional, pois, segundo prescreve o art. 55, § 1º, da Constituição, a percepção de vantagens indevidas revela um ato atentatório ao

decoro parlamentar, apto, por si só, a legitimar a perda do mandato legislativo, independentemente de prévia condenação criminal.

A ordem jurídica, Senhor Presidente, não pode permanecer indiferente a condutas de membros do Congresso Nacional – ou de quaisquer outras autoridades da República – que hajam incidido em censuráveis desvios éticos e em reprováveis transgressões criminosas no desempenho da elevada função

de representação política do Povo brasileiro.

Qualquer ato de ofensa ao decoro parlamentar, como a aceitação criminosa de suborno, culmina por atingir, injustamente, a própria

respeitabilidade institucional do Poder Legislativo, residindo nesse ponto a legitimidade ético-jurídica do procedimento constitucional de cassação do

mandato parlamentar, em ordem a excluir da comunhão dos legisladores aquele – qualquer que seja – que se haja mostrado indigno do desempenho da

magna função de representar o Povo, de formular a legislação da República e de controlar as instâncias governamentais de poder. É por essa razão que o eminente e saudoso Professor MIGUEL REALE (“Decoro Parlamentar e Cassação de Mandato Eletivo”, “in” Revista de

Direito Público, vol. X/89), ao versar o tema em questão, adverte que o ato indecoroso do parlamentar, como aquele que implica percepção de vantagens

indevidas, importa em falta de respeito à própria dignidade institucional do Poder Legislativo:

“O ‘status’ do deputado, em relação ao qual o ato deve ser medido (e será comedido ou decoroso em razão dessa medida), implica, por conseguinte, não só o respeito do parlamentar a si próprio, como ao órgão ao qual pertence (...).

No fundo, falta de decoro parlamentar é falta de decência no comportamento pessoal, capaz de desmerecer a Casa dos representantes

(incontinência de conduta, embriaguez etc), e falta de respeito à dignidade do Poder Legislativo, de modo a expô-lo a críticas infundadas, injustas e irremediáveis, de forma inconveniente.” (grifei)

Impressiona-me a afirmação do Senhor Procurador-Geral da República de que o denunciado ** “(…) se vale, habitualmente, de diversos

Deputados Federais para a realização de requerimentos, solicitações e requisitos, com fins nitidamente ilícitos, transformando o Congresso

Nacional em um verdadeiro ‘balcão de negócios’. Astutamente, os requerimentos aparentavam buscar fins lícitos, mas, em verdade, eram vocacionados apenas para o interesse pessoal de ** e seus comparsas”.

O fato inquestionável, Senhor Presidente, é que a corrupção deforma o sentido republicano da prática política, afeta a integridade dos

valores que informam e dão significado à própria ideia de República, frustra a consolidação das Instituições, compromete a execução de políticas públicas em áreas sensíveis como as da saúde, da educação, da segurança pública e do próprio desenvolvimento do País, além de vulnerar o

princípio democrático.

Daí os importantes compromissos internacionais que o Brasil assumiu em relação ao combate à corrupção, como o evidencia a assinatura, por nosso País, da Convenção Interamericana contra a Corrupção (celebrada na Venezuela em 1996) e da Convenção das Nações

Unidas (celebrada em Mérida, no México, em 2003).

As razões determinantes da celebração dessas convenções internacionais (uma de caráter regional e outra de projeção global) residem, basicamente, na preocupação da comunidade internacional com a extrema gravidade dos problemas e das consequências nocivas decorrentes da

corrupção para a estabilidade e a segurança da sociedade, considerados os vínculos entre a corrupção e outras modalidades de delinquência, com

particular referência à criminalidade organizada, à delinquência governamental e à lavagem de dinheiro. Torna-se importante advertir, neste ponto, Senhor Presidente, que, com a instauração deste e de outros procedimentos de persecução penal,

não se está a incriminar a atividade política, mas, isso sim, a promover a responsabilização penal daqueles que não se mostraram capazes de exercê-la com honestidade, integridade e elevado interesse público, preferindo, ao contrário, longe de atuar com dignidade, transgredir as leis penais de

nosso País, com o objetivo espúrio de conseguir vantagens indevidas e de controlar, de maneira absolutamente ilegítima e criminosa, o próprio

funcionamento do aparelho de Estado.

A conquista e a preservação temporária do poder, em qualquer formação social regida por padrões democráticos, embora constituam

objetivos politicamente legítimos, não autorizam quem quer que seja, mesmo quem detenha altos postos na hierarquia do Estado,

independentemente de sua posição no espectro ideológico, a utilizar meios criminosos ou expedientes juridicamente marginais, divorciados da ordem jurídica e repudiados pela legislação criminal do País e pelo sentimento de decência que deve sempre prevalecer no trato da coisa pública.

Estamos a examinar, nesta fase preambular, Senhor Presidente, imputações penais dirigidas não a atores políticos, mas, sim, segundo

sustenta o Ministério Público em sua denúncia, a protagonistas de supostas tramas criminosas. Em uma palavra: processam-se, aqui e agora, não

atores políticos, mas, sim, possíveis autores de crimes minuciosamente narrados pelo Senhor Procurador-Geral da República.

Não constitui demasia assinalar que a ideia de República traduz um valor essencial, exprime um dogma fundamental: o do primado da

igualdade de todos perante as leis do Estado. Ninguém, absolutamente ninguém, nem mesmo aqueles situados nas mais elevadas posições e nos mais importantes cargos da organização estatal, tem legitimidade para transgredir e vilipendiar as leis e a Constituição de nosso País. Ninguém,

absolutamente ninguém, está acima da autoridade do ordenamento jurídico do Estado.

2. O significado do controle jurisdicional prévio da acusação penal Examino, agora, a questão pertinente à admissibilidade da presente acusação penal, não sem antes estabelecer premissas que considero

essenciais à formulação de meu voto, especialmente em face da situação de evidente conflituosidade que se instaura entre o poder acusatório do

Estado, de um lado, e a pretensão de liberdade dos acusados, de outro. Sabemos todos, Senhor Presidente, que cabe ao Supremo Tribunal Federal, nesta fase preliminar do processo penal de conhecimento,

analisar se a acusação penal formulada pelo Ministério Público revela-se, ou não, admissível para efeito de instauração da persecução penal em

juízo. Esse controle prévio de admissibilidade – que reclama o exame da adequação típica do comportamento atribuído aos acusados – também

exige a constatação, ainda que em sede de cognição incompleta, da existência, ou não, de elementos de convicção mínimos que possam autorizar a

abertura do procedimento judicial de persecução penal. Isso significa, portanto, que, ainda que as condutas descritas na peça acusatória possam ajustar-se, em tese, aos preceitos primários de

incriminação, mesmo assim esse elemento não basta, só por si, para tornar viáveis e admissíveis as imputações penais consubstanciadas na

denúncia. A viabilidade da presente denúncia está a depender, desse modo, da análise de questão – que reputo de inegável relevância – consistente na

identificação, ou não, de justa causa, apta a legitimar a instauração da presente ação penal, considerados os elementos probatórios que,

apresentados pelo Ministério Público, destinam-se, ainda que minimamente, a demonstrar a possível e eventual ocorrência, no plano fático, das condutas narradas pelo “Parquet”.

É preciso ter presente, neste ponto – consideradas as gravíssimas implicações éticas e jurídico-sociais que derivam da instauração, contra

quem quer que seja, de “persecutio criminis” –, que se impõe, por parte do Poder Judiciário, rígido controle sobre a atividade persecutória do Estado, em ordem a impedir que se instaure, contra qualquer acusado (não importando de quem se trate), injusta situação de coação processual,

pois ao órgão da acusação penal não assiste o poder de deduzir, em juízo, imputação criminal desvestida de um mínimo suporte probatório.

Daí a advertência, Senhor Presidente, fundada no magistério jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, que cumpre jamais

desconsiderar:

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Informativo 822-STF (27/04/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 16

“A imputação penal não pode ser o resultado da vontade pessoal e arbitrária do acusador. O Ministério Público, para validamente formular a denúncia penal, deve ter por suporte uma necessária base empírica, a fim de que o exercício desse grave dever-poder não se

transforme em um instrumento de injusta persecução estatal. O ajuizamento da ação penal condenatória supõe a existência de justa causa,

que se tem por inocorrente quando o comportamento atribuído ao réu ‘nem mesmo em tese constitui crime, ou quando, configurando uma infração penal, resulta de pura criação mental da acusação’ (RF 150/393, Rel. Min. OROSIMBO NONATO).”

(RTJ 165/877-878, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

A persecução penal, por isso mesmo, cuja instauração é justificada pela suposta prática de um ato criminoso, não se projeta nem se

exterioriza como uma manifestação de absolutismo estatal ou de voluntarismo particular. De exercício indeclinável, a “persecutio criminis” sofre os condicionamentos que lhe impõe o ordenamento jurídico. A tutela da liberdade

representa, desse modo, uma insuperável limitação constitucional ao poder persecutório do Estado.

A própria exigência de processo judicial já representa, só por si, poderoso fator de inibição do arbítrio estatal, de restrição ao poder de coerção do Estado e de limitação ao poder de acusação do Ministério Público. A cláusula “nulla poena sine judicio” exprime, no plano do processo

penal condenatório, a fórmula de salvaguarda da liberdade individual.

Daí a razão de ser desta fase preliminar de controle jurisdicional da acusação penal, concebida, precisamente, para impedir a instauração de lides temerárias ou para obstar a abertura de procedimentos destituídos de base probatória fundada em elementos mínimos de convicção, os

quais, embora insuficientes para a formulação de um juízo condenatório, mostrem-se aptos a fundamentar um juízo positivo de admissibilidade da

peça acusatória. Não se pode ignorar que, com a prática do ilícito penal, acentua a doutrina, “a reação da sociedade não é instintiva, arbitrária e

irrefletida; ela é ponderada, regulamentada, essencialmente judiciária” (GASTON STEFANI e GEORGES LEVASSEUR, “Droit Pénal Général

et Procédure Penale”, tomo II/1, 9ª ed., 1975, Paris; JOSÉ FREDERICO MARQUES, “Elementos de Direito Processual Penal”, vol. 1/11-13, itens 2/3, Forense), tudo a justificar o ponderado exame preliminar dos elementos de informação cuja presença revele-se capaz de dar consistência

e de conferir verossimilhança às imputações consubstanciadas na denúncia, sob pena de esta fase introdutória do processo penal de conhecimento

transformar-se em simples exercício burocrático de um poder gravíssimo que foi atribuído aos juízes e Tribunais. Dentro desse contexto, e para efeito de recebimento da denúncia, assume relevo indiscutível o encargo processual que, ao incidir sobre o

órgão de acusação penal, impõe-lhe o ônus de descrever com precisão e de demonstrar, ainda que superficialmente, os fatos constitutivos sobre os

quais se assenta a pretensão punitiva do Estado. Daí o voto do eminente Relator, no ponto em que, com inteiro acerto, rejeitou a denúncia em parte, destacando que a peça acusatória não

demonstrou a concreta participação de ** e de ** na fase inicial de negociação da construção dos navios-sonda, havendo aduzido, então, a esse

respeito, o que se segue:

“Com efeito, nada foi produzido, em termos probatórios, que indique a efetiva participação dos denunciados nos supostos crimes ocorridos na já longínqua época da celebração dos contratos, nos anos de 2006 e 2007, ou mesmo que tenham os acusados, no período

imediato, recebido vantagem indevida para viabilizar a negociação ou se omitido em fiscalizar esses contratos, em razão do mandato

parlamentar. Os elementos mínimos de autoria exigidos para o recebimento da denúncia em relação a esses fatos iniciais não se fazem presentes. Pela análise dos elementos colhidos, é possível concluir apenas pela existência de indícios da prática de crimes de corrupção ativa,

passiva e lavagem de dinheiro com a participação de **, ** e **.”

O fato indiscutivelmente relevante, Senhor Presidente, é que, no âmbito de uma formação social organizada sob a égide do regime democrático, não se justifica, sem qualquer base probatória mínima, a instauração de qualquer processo penal condenatório, que deve sempre

assentar-se – para que se qualifique como ato revestido de justa causa – em elementos que se revelem capazes de informar, com objetividade, o

órgão judiciário competente, afastando, desse modo, dúvidas razoáveis, sérias e fundadas sobre a ocorrência, ou não, dos fatos descritos em peça

acusatória.

Como muito bem ressaltado pelo eminente Ministro TEORI ZAVASKI, o Ministério Público demonstrou, no caso, quanto ao segundo

momento descrito na denúncia, mediante referência a elementos mínimos de informação – tal como o exige a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 182/462) –, a existência de dados de convicção que, ao sugerirem a possível ocorrência dos fatos narrados na peça acusatória,

indicam a viabilidade, no ponto mencionado, da acusação penal ora em exame, o que significa registrar-se, na espécie, a presença de um vínculo

informativo minimamente necessário para sustentar, de modo consistente, ainda que em parte, a presente denúncia. Com efeito, o eminente Relator deste Inquérito observou que os argumentos deduzidos pelos acusados, quanto ao segundo momento objeto

da narrativa do Ministério Público, não se revelam suficientes para justificar a rejeição liminar da denúncia, pois existentes, na presente fase

processual, elementos indiciários mínimos, porém relevantes, que autorizam, embora somente para efeito de instauração do concernente processo judicial, a formulação, pelo Supremo Tribunal Federal, de um juízo positivo de parcial admissibilidade da acusação penal:

“24. Em suma, a análise dos autos mostra que há indícios robustos para, nestes termos, receber parcialmente a denúncia, cuja

narrativa, em seu segundo momento, ademais de reforçada pelo aditamento, dá conta de que o Deputado Federal **, procurado por **,

aderiu ao recebimento, para si e concorrendo para o recebimento por parte de **, de vantagem indevida, oriunda da propina destinada a diretor de empresa estatal de economia mista, em função do cargo, por negócio ilícito com ela celebrado. Esse recebimento, porque núcleo

alternativo próprio do tipo, não pode ser descartado como mero exaurimento da conduta de outrem.

Os elementos colhidos confortam sobejamente o possível cometimento de crime de corrupção passiva majorada (art. 317, ‘caput’ e § 1º, do Código Penal), ao menos na qualidade de partícipe (art. 29 do Código Penal), por parte do Deputado Federal **, ao incorporar-se à

engrenagem espúria protagonizada pelo então diretor da Petrobras ** (funcionário público para fins penais por força do art. 327, ‘caput’, do

Código Penal), ** e **, bem como dela se fazendo beneficiário, tal como descrito, não no ‘primeiro momento’ referido na denúncia original (o que configuraria concurso material com outro crime do mesmo teor), mas no ‘segundo momento’ a que aludem a denúncia e o seu

aditamento, que nisso a reforça.

…................................................................................................... Fazem-se presentes, ademais, variados e seguros indícios de que o denunciado, a partir daí, seria destinatário de ao menos parte dos

valores destinados por ** a **, intermediário da propina a **, em operações identificadas no período antes descrito e que se subsumem no

tipo penal descrito no art. 1º, V, VI e VII, Lei 9.613/1998, na redação anterior à Lei 12.683/2012, que, passando a abranger qualquer ‘infração penal’, revogou incisos que já eram notoriamente alternativos.

Os indícios existentes apontam também que ** teria concorrido para a prática do delito de corrupção passiva, nos termos do já

aludido art. 29 do Código Penal (‘Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade’). Assim, não assiste razão à defesa da denunciada, de que a conduta descrita na denúncia seria de outro tipo penal.”

O exame a que procedeu o eminente Relator convence-me da viabilidade da denúncia ora em análise, considerados, para tanto, os

elementos probatórios mínimos produzidos ao longo da investigação penal.

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Informativo 822-STF (27/04/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 17

O que se revela essencial reconhecer é que a formulação de acusação penal, para efetivar-se legitimamente, deverá apoiar-se, como sucede

na espécie, não em fundamentos retóricos, mas, sim, em elementos que, instruindo a denúncia, indiquem a realidade material do delito e apontem

para a existência de indícios, ainda que mínimos, de autoria. Cumpre ter presente, no ponto, que a formulação da acusação penal em juízo supõe não a prova completa e integral do delito e de seu autor

(o que somente se revelará exigível para efeito de eventual condenação penal), mas a demonstração – fundada em elementos probatórios mínimos e lícitos –

da realidade material do evento delituoso e da existência de indícios de sua possível autoria:

“Denúncia – Recebimento – Suficiência da fundada suspeita da autoria e prova da materialidade dos fatos – Inteligência do art. 43 do CPP.

Para o recebimento da denúncia, é desnecessária a prova completa e taxativa da ocorrência do crime e de seu autor, bastando a

fundada suspeita de autoria e a prova da materialidade dos fatos.” (RT 671/312, Rel. Des. LUIZ BETANHO – grifei)

Daí o magistério jurisprudencial firmado por esta Suprema Corte:

“PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE FALSO TESTEMUNHO: CÓD. PENAL, art. 342. DENÚNCIA: CRIME EM

TESE: RECEBIMENTO.

I. – Descrevendo a denúncia fato típico, contendo a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias e a classificação do crime, assim dando notícia da ocorrência de crime pelo menos em tese, deve ser recebida (CPP, art. 41).

II. – Denúncia recebida.”

(Inq 1.622/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – grifei)

Não questiono a afirmação, Senhor Presidente, de que a denúncia deve conter a exposição objetiva do fato delituoso, descrito em seus aspectos essenciais e narrado com a indicação das circunstâncias que lhe são inerentes.

É certo que a peça acusatória ora em exame, ao veicular extensa exposição dos fatos, descreve-os de modo adequado, definindo a

participação individual de cada um dos 02 (dois) denunciados, como resulta claro da denúncia em análise, o que satisfaz, a meu juízo, a exigência

imposta pelo art. 41 do CPP.

Desse modo, e sem qualquer prejuízo para o exercício do direito de defesa – que já se realizou, de modo pleno e competente, nesta fase

preliminar –, tenho para mim que houve, na denúncia, clara menção à existência, no caso, de nexo de causalidade entre o comportamento imputado aos denunciados e as supostas práticas delituosas a eles atribuídas.

3. Conclusão

Todas as considerações que venho de fazer, Senhor Presidente, levam-me a acompanhar o substancioso voto proferido pelo eminente Relator quanto ao recebimento parcial da denúncia formulada contra os ora acusados.

Também excluo da denúncia, Senhor Presidente, a causa de aumento de pena prevista no § 2º do art. 327 do Código Penal, por entender,

na linha de votos que já proferi nesta Suprema Corte (Inq 1.769/DF – Inq 2.606/MT), que essa regra mostra-se inaplicável aos que exercem mandato eletivo.

É o meu voto.

*acórdão pendente de publicação

**nomes suprimidos pelo Informativo

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS 18 a 22 de abril de 2016

Lei Complementar nº 154, de 18.4.2016 - Acrescenta § 25 ao art. 18-A da Lei Complementar nº 123, de 14 de

dezembro de 2006, para permitir ao microempreendedor individual utilizar sua residência como sede do

estabelecimento. Publicada no DOU, Seção 1, Edição nº 74, p. 4, em 19.4.2016.

OUTRAS INFORMAÇÕES 18 a 22 de abril de 2016

Decreto nº 8.715, de 19.4.2016 - Promulga os Estatutos do Instituto Internacional para a Democracia e a

Assistência Eleitoral - IDEA, com sede em Estocolmo, Suécia. Publicado no DOU, Seção 1, Edição nº 75, p. 1, em

20.4.2016.

Decreto nº 8.716, de 20.4.2016 - Institui o programa de prevenção e proteção individual de gestantes em situação

de vulnerabilidade socioeconômica contra o Aedes aegypti. Publicado no DOU, Seção 1, Edição nº 76, p. 1, em

22.4.2016.

Secretaria de Documentação – SDO Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD

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