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Page 1: Indice - estudogeral.sib.uc.ptAmor, Poesia e Sabedoria em A Mid summ er Nighl' Dr am 253 Conocerse a sí mismo: el hábito de sabiduria 273 Edgar Morin, un itinéraire critique: engagement
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,Indice Table des metiêres - Table of contents

EditorialÉditorialEditorial

Ali AR Abdelmalek

Maria Aparecida Nogueira

Alfredo Pena-Vega

Alexis Philonenko

Paulo A_ E. Borges

Emilio Roger Ciurana

André Jacob

Paula Pina

lolanda Freitas Ramos

Izabel Petraglia

Paul Ghilis

Isabel Fernandes

Willem Doise

Oscar Federico Bauchwitz

João da Rocha Pinto

Rita Marnoto

Bernard Piettre

Alexandre Castanheira

António Fournier

Marcelino Agís Villaverde

Michel Faucheux

André Veríssimo

Paulo Alexandre e Castro

José Luís Brandão da Luz

Maria Teresa Schiappa de Azevedo

F. A. Jenner

Adília Martins de Carvalho

Juan A. García González

Antoine Spire

Carlos Couto Sequeira Costa

Maria José Craveiro

Magali Roux-Rouquié

José Trindade Santos

Maria Gabriela Castro

Rui Lopo

Jean-Jõel Duhot

Michel Tibon-Cornillot

Paulo Cavaca

Humberto Mariotti

Michel Bachelet

ResumosRésumés

Abstracts

5

-Edqar Morin, sociologue et théoricien de la complexité: des cultures nationalesà la civilisation européenne- 9

Sísifo Angustiado 29A Complexidade Ecológica. Uma reflexão intempestiva sobre Ecologia,Complexidade e Etica 35

Note sur le mal et la mort chez Platon 47Eros e iniciação em Luís de Camões. A -llha dos Amores. 51

SapiensjDemens. De Platón a Edgar Morin 61

De I'être à un espace-temps humain 67

-Rock & RolI Shakespeare- 75

Ser e não ser - Camões, o Shakespeare português 81

Edgar Morin: Complexidade, transdisciplinaridade e incerteza 91

Inventer la Cité humaine 97'To be, or not to be, is still que question': Da identidade à alteridadena obra de D. H. Lawrence 105

Mise en perspective d'un ensemble de recherches sur les représentationssociales des droits de I'homme 115

Para uma releitura da metafisica de Platão: ontologia e meontologiana filosofia de Escoto Eriúgena 123

Ir: Reconhecer para Ser. Da reflexão à acção, da acção à identidade 133

Camões. A ordem dos clássicos e o ruído de fundo 145Platon et la tragédie 157DOIDOS COM .ioizo (Ópera de cãmara a cinco vozes) 169

Camões, Leopardi e a Natureza: fragmentos de um diálogo interrompido 179La hermenéutica socrático-platónica y su proyección en la contemporaneidad 187

Littérature, histoire des idées et complexité: Les Lusiades de Camões 199

A Utopia do Saber e a da Moral em Edgar Morin e Emmanuel Levinas 207

De Shakespeare a Sartre - O nihilismo como lugar da (im)possibilidade do mundo 219O desenvolvimento da ciência e o homem de hoje 229Da maiêutica socrática à maiêutica platónica 239A Psychiatrist looks at Plato and Heidegger, Appearances or Realities? Thatis the question 245

Amor, Poesia e Sabedoria em A Midsummer Nighl's Dream 253Conocerse a sí mismo: el hábito de sabiduria 273

Edgar Morin, un itinéraire critique: engagement et création 281

FILOSOFIAS COMPARADAS: E/ ENTRE/ ENTRADASMúsica-Cinema-Pintura como Dispositivos Filosóficos 287

Hamlet, Príncipe da Dinamarca, Ser ou não Ser um Senhor Dividido? 297Le concept de Vie chez Edgar Morin - Une biologie pour le XXleme siécle. 303

Há uma filosofia platónica? 313

A função ontológica do discurso poético 321Errantes e áufragos 327

Platon et la genése de la modernité 335

ar précieux, 01' jaune ei luisanU.. Vienspoussiére maudite, putain uniuerselle.pour uniuerselle, pour qui les nations s'entretuent. Remarques sur la monnaieda vie mouvante en elle-même de ce qui est morto 343

A existência inerente ao pensar 357

Os Cinco Saberes do Pensamento Complexo (Pontos de Encontro entre as obrasde Edgar Morin, Fernando Pessoa e outros Escritores 361

Poétique Ecologique et Droit de l'Environnement 375

397

Volume X - N.2 39/40 1

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A. Ania Beaumatin, Alain Baubion-Broye

Ania Baeumatin

Anabela Mendes

Maria Neves

Khalid Fekhari

Silvia Castanheira

Annie Devault, Carl Lacharité,Gilles Forget, et Francine Ouellet

Rita Morgado Gomez

Aubeline Vinay

Odette Lescarret

Alicia Lamia, Pierre Tap,et Florence Sordes-Ader

Antonio Vinhal

Nathalie Oubrayrie-Rousselet Claire Safont-Mottay

Jean-Robert Pelissié

Mathieu Rossignol

Elaine Costa-Fernandez

Brigitte Almudever

Ana Barbeiro

Claire Safont-Mottay,Nathalie Oubrayrie-Roussel & I. Feldmann

Elaine Costa-Fernandez

Marta Antunes Maia

Serge Lacoste et Pierre Tap

Myriam de Léonardis,Colette Laterrasse et Isabelle Hermet

Alexandra Latron-Gorsse,Florence Sordes-Ader, Madorie Poussin

Pauline Dalmon, Florence Sordes-Ader

Marie-Pierre Cazals-Ferré, Patricia Rossi-Neves

Sylvie Esparbês-Pistre, C. Romano et A. Saintes

Pedro Armelim Almiro, Ricardo Miguel Pina,Bruno Henrique Brandão

Rui Da Silva Neves, Mélanie Gourdon,Marylêne Rose et Stéphane Vautier

Stéphane Vautier, Rui Da Silva Neves,Clara Martinot, Robert Ruiz

Rui Tinoco

REVISTA APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO

Índice dos números 41/42Table des matieres des numéros 41/42Contents of the numbers 41/42

Aide à I'insertion des personnes en dif{lculté ei processus de personnalisationApports de la psychologie de la personnalisation aux pratiques sociales d'aideà I'insertion des personnes en difficultés

Criatividade e resolução de problemas, Ana Bela Mendes

O retorno dos emigrantes: atitudes, stress e estratégias de coping

Da gestão das situações de crise nas sociedades lradicionais. Abordagemhislórico-anlropológica da figura hagiológica na cultura marroquina.Identidade e atitudes sociais dos bilingues monoculturais e biculturais na adolescência,Silvia Nennig Castanheira

Conlribution à I'élaboration d'un modele de compréhension de la palernitéen contexte de précarilé.

Palernidade-expeclanle e o síndroma de couvade.

Slress, Coping el Sanlé dans les {amilles adoptives.

Risque dans la famille, mobilisation familiale et engagement scolaire de I'adolescent.

Évo/ution de I'estime de soi el adaplation sociale des en{anls

As variaveis sociais como mediadoras da aprendizagem

Sel{-esleemand risk behaviors o{ French adolescenls aI school

Les murs de la honle.

L'identilé agressive de I'en{anl et son articulation avec I'humiliation.

L'experlise psychologique d'en{anls victimes d'abus sexuels el résilience.

La personnalisation à I'épreuve de I'incarcération : chances el risques pourla réinsertion des délenus.

Psicologia forense e do leslimonho - condições de possibilidade de uma pràticacomunicacional no conlexlo dajusticia

Qualilé de vie des délenus : infiuence de la recherche de soutien socialsur le bien-êue psychologique el physique.Queslões sobre a dimensão inlercultural da pericia p icológica no sislema judiciàrio {rancés.Dif{lcultes des comporlemenls preventi{s dans te conlexle du sida.

Estime de soi ei projel pro{essionnel de I'adolescenl {oolballeur.

Rapporl au savoir el disposili{s d'aide aux éludianls en dif{lculté : Le lutoral à l'Universilé.

Gestion du slress chez les ado/escenls malvoyanls congénilaux.L 'impacl de la maladie sur les projels de vie chez des sujels vielnamiens insuf{lsanlsrénaux chroniques lraités par hémodialyse à I'hópilalSlress pro{essionnel des soignanls : infiuence du slalut, du confiil de rôlesel de la recherche de soutien social sur le bien-êlre psychologique.Eruie représenlations el pratiques: le cas des infirmieres en hémalologie et en géronlologieface au burnouL

Emoção e Razão: O papel das emoções no processo racional; uma reflexão fi/osoficaacerca do corpo e da mente; a inteligencia emocional.

Un modele phylogénétique du rôle des processus de lrailemenl symboliquesdans la régu/ation de I'anxiélé.

Impacl o{ af{ective piciutes on slale and trait anxiely assessed wilh the French STAI-Y

Comunidades lerapêuticas livres de drogas - da inlervenção ideológica à intervençãopsicoterapêulica.

2 Aprendizagem/Desenvolvimento

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INSTITUTO PIAGETAv. João Paulo 11,lote 544, 2.11 - 1900-726 LISBOATel.: 21 831 6500 Fax: 21 8595825

EditorÉditeurPublisher

Instituto Piaget, Cooperativa para o Desenvolvimento da Criança, Humano,Integral e Ecológico, C.R.L.Coopérative pour le Développement de l'EnfantCooperative for Child Development

Director e Chefe de RedacçãoDirecteur et Chef de RédactionDirector and Editor in Chief

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Secretariado de RedacçãoSecrétariat de RédactionRedaction Secretariat

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- As instituições são agravadas em 50% do preço base- Les instituitons ont les prix majorés de 50%- The price for organisations requires 50% extra-fare

ISSN - 0871-5416 - 1.2 e 2.2 trimestre / 2001Depósito Legal: 89009/99

Volume X - N.2 39/40 3

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Camôes. A ordem dos clássicose o ruído de fundo

LAo propor-se definir o que é um clássico, ltalo Calvino, no céle-

bre artigo, -Perche leggere i classici ••1, nota que essa categoria par-tilha de uma dupla condição, na medida em que, por um lado, rele-ga a actualidade para a condição de ruído de fundo, sem que, poroutro lado, possa passar sem ela. Mas mesmo no seio de um con-texto que lhe seja adverso, o clássico persiste, ainda que como res-sonãncia.

Essa dialéctica traduzirá bem a situação perante a qual noscoloca a sublime série de nomes à qual são consagradas estas .s.=Conferências Internacionais de Epistemologia e Filosofia. Se Platão,Camões, Shakespeare e Edgar Morin fazem parte de nossa actuali-dade, é também porque remetem mais de vinte séculos da nossacultura viva para ruído de fundo.

RITA MARNOTO

2.Ler Camões à luz do pensamento de Platão e dos seus seguido-

res, para continuar a utilizar a imagem de Calvino, coloca-nos numasituação semelhante à de quem está no seu gabinete, a ler um autorconsagrado, e de modo algum se pode alhear do rumor do trânsitoque se adensa nas ruas.

A relação entre Camões e o filósofo grego tem vindo a ser pers-pectivada sob diversas angulações. Considerada nos seus aspectosgerais e englobantes, a cosmovisão comoniana reentra, indubita-velmente, no rico filão conceptualizante que se fez herdeiro do seupensamento. Referimo-nos àquele conjunto de princípios essenciaisque sustenta a filosofia de Platão, e que foi retomado por váriasescolas, ao longo dos tempos, ganhando, assim, uma incidênciatrans-histórica, ou seja, o platonisrno-. A distinção entre mundosensível e mundo inteligível, claramente enunciada nas redondilhas«Sôbolos rios ••3, subjaz a toda a sua obra. Em conformidade com a fé

Universidade de Coimbra

Portugal

Volume X - N.Q 39/40 145

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cristã, o plano inteligível abrange a TranscendênciaDivina, ao passo que o empírico, porquanto sub-metido a todo o tipo de contingências, só se podelibertar dessa condição de inferioridade desdeque aspire a um ideal e nele se resolva. Daídecorre a exaltação do pensamento puro, queanseia pelos grandes valores, culminando noalcance de uma verdade, que tanto poderá sersituada para além de todos os tempos e de todosos lugares, como poderá ser descoberta e verifi-cada através dos caminhos da história, medianteum processo de sublimação. Paralelamente, ohomem é considerado união de duas substânciasdistintas, alma e corpo. A alma, que é autónomaem relação ao corpo, por ser espiritual e por serdotada de capacidades intelectivas, é eterna. Deoutra forma, o corpo é mortal. Desta feita, a todaa multiplicidade do plano empírico subjaz umaunidade e uma ordem sobrenaturais cujos funda-mentos o transcendem. Fim supremo da vida éalcançar esse Bem, que é uno. racional e perfei-to. Isso só é possível porque o cosmos é enfor-mado por uma harmonia acabada, de acordocom um princípio sistematizante que articula ouno e o múltiplo. A partir da realidade sensível,pode-se, pois, ascender até ao Bem, através deuma série de mediações dinâmicas - o heroísmo,o amor, o conhecimento, a memória.

Neste quadro, situamo-nos a um nível muitoabrangente. Todavia, a possibilidade de umaaproximação pontual da obra de Camões compassos específicos de Platão, e com os conteúdosneles enunciados, foi objecto de vários estudoscríticos, publicados na primeira metade do sécu-lo xx, por Joaquim de Carvalho", Francisco deAndrade> e Álvaro Júlio da Costa Pímpãov. Essasintervenções centram-se, em particular, sobre ouso dos conceitos de palinódia, memória e remi-niscência, bem como sobre a imagem do cisne.No entanto, já o primeiro dos citados autores, ofilósofo Joaquim de Carvalho, que foi, em tantosaspectos, pioneiro na indagação das fontes pla-tónicas da obra de Camões, se interrogava se••não haveria outra via, não platónica, mas plato-nizante, que o espírito do poeta tivesse percorri-do?~7. De facto, nas páginas que todos essesestudiosos consagraram ao tema, o nome dePlatão cruza-se, a cada momento, com o dosseus seguidores da escola de Alexandria e com odos seus intérpretes medievais, sem esquecer,naturalmente, o lugar reservado ao eminente veioda tratadística italiana do Renascimentoê. Se,como nota Maria Heleno Ribeiro da Cunha'', édifícil conceber que o poeta desconhecesse os

teóricos que faziam parte da cultura intelectualda época, por outro lado, conforme observa JoséV. de Pina MartinslO, no tempo de Camões, o pla-tonismo respirava-se no ar. Com efeito, a amplia-ção de espectro de incidência das pesquisasacerca do platonismo camoniano, conformeocorreu ao longo da segunda metade do século xx,deixou a descoberto um campo de investigaçãociclópico.

3.Por consequência, essa questão de modo

algum poderá ser abordada de forma estática, àmargem do tempo que corre entre o momentoem que o sábio da Academia profere as suaslições, o século de Camões, e o nosso. a itinerá-rio que assim fica traçado é tão rico como com-plexo.

No sentido da sua exploração, primo, é fun-damental identificar, com clareza e exactidão, asedições de Platão, e dos poetas e pensadores quenele se inspiraram, que circulavam no século XVI.

Além disso, nunca se pode perder de vista o factode estarmos perante a tradução de uma lingua-gem filosófica através de uma linguagem deíndole diferenciada, a linguagem literária, com oscódigos periodológicos, genológicos, linguístico--retóricos e idiolectais, que lhe são próprios.Camões vive num contexto cultural imbuído pelosgrandes ideais do Humanismo e do Renascimentoitalianos, e é com os olhos postos em Petrarca,Bembo e Dante, que escreve os seus versos, semque possa ser descurado o papel assumido pelospoetas da vizinha Espanha u

a cardeal Pietro Bembo, Baldassar Castiglione,Mario Equicola, Marsilio Ficino, Pico dellaMirandolla e Leão Hebreu são frequentementeapontados como figuras cuja obra, em virtude dasua grande divulgação epocal, teria sido bemconhecida de Carnõest-. Mais recentemente,porém, a crítica tem vindo a moderar a insistên-cia no influxo do físico hebreu, o qual terá sido,quiçá, demasiado empolado, por se tratar de umjudeu de origem portuguesa exilado em [tália~Na realidade, a grande matriz de todos esses trafsé o pensamento filosófico do erudito da Academiaflorentina de Careggi, Marsilio Ficinol+.

Ficino reunia as condições ideais para ascen-der a figura de proa do renascimento de Platãoque se operou no século XV, e o epíteto que lhe foidado pelos seus contemporâneos faz jus dessefacto - o alter P/ato. Homem dotado de uma eru-dição excepcional, quer enquanto heJenista, querenquanto latinista, profundo conhecedor da filo-

146 Aprendizagem/Desenvolvimento

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sofia, da literatura e das ciências do cosmos,contou com o apoio e a protecção da famíliaMedici.Graças ao seu labor, a Europa pôde, final-mente, conhecer toda a obra de Platão, atravésde traduções para latim que, pela primeira vez,eram directamente elaboradas a partir de origi-nais gregos. Mas, além disso, verteu também aobra completa de Plotino, Porfírio, Atenágoras,lâmblico e Prodo, bem como os escritos hermé-ticos e pseudo-pitagóricos e os hinos órficos.Paralelamente, foi autor de uma obra filosóficaabsolutamente original, onde se destacam aTheologia platonica de immortalitate animorum eo De amore, ambos concebidos a partir do meti-culoso estudo de uma grande variedade de fon-tes, em particular helenistas. Esse último tratado,que teve também uma versão italiana, El libradell'amore, desfrutou, em particular, de umaincomensurável capacidade projectiva, que seespelha em toda a preceituação teórica que foisucessivamente dedicada aos costumes, à línguae à titeratura+>. O seu conteúdo em muito supe-ra, porém, qualquer campo especulativo circuns-crito, porquanto as sete orações que o compõemretomam e refazem os grandes temas da filosofiade Piatão e dos seus seguidores, colocando noseu cerne a questão do amor. Ficino elabora umasíntese bastante edéctica, assente sobre os gran-des princípios do cristianismo, mas onde reen-tram também a tradição hermética e o pensa-mento cosmológico.

Todavia, chegados a este ponto, aproxima-mo-nos daquele domínio que a crítica costumadesignar como neoplatonismo. As inovaçõesintroduzidas pelo sistema filosófico do académicode Careggi são emblematizadas pela expressão-arnor platónico ••, a qual, segundo Kristeller, teriasido cunhada por ele próprio!". Assim se com-preende que o grau de elaboração conceptual deEl libra dell'amore converta essa obra em «[ ... 1primo manifesto della nuova 'filosofia' che ririas-ceva allora a Firenze», conforme escreve SebastianoGentíle!", porquanto verdadeiro cerne do neopla-tonismo renascentista 18.

A teoria do conhecimento de Marsilio Ficinodesenvolve-se através de dois momentos. O pri-meiro é de inquietude, e leva o homem a vol-tar-se para o mundo exterior, em busca de grausmais altos de certeza. O segundo é contemplati-voo Assim se alcança Deus, num único pensa-mento sistemático que, graças ao movimentoascendente da alma, resolve a inquietude tacita-mente pressuposta. Esse processo é sustido pelateoria da vontade e do amor, fundamento da

excelência de interioridade, que sintetiza elemen-tos de ordem platónica e aristotélica. Aliás, é hojeconsensual o facto de o neoplatonismo renascen-tista italiano visar uma conciliação entre essasduas vertentes. O conceito de vontade, queencontra antecedentes em Aristóteles, foi depoisaprofundado por Plotino, em função da relaçãoentre humano e sobrenatural, embora tivessesido Santo Agostinho a valorizá-lo, como formaabsoluta através da qual o homem, ao longo dasua estadia terrena, se pode aproximar de Deus.Para Ficino, a vontade, porquanto determinadapela razão, é desejo do Bem e da Beleza de ori-gem divina, que estão presentes na esfera dascoisas. Nesse ponto, é retomado de Platão o con-ceito de amor, mas em intersecção não só com osentido que Aristóteles dava à amizade, comotambém com a filtragem plotiniana, que o consi-derava tenção para o divino, e com a caritas pau-Iina. Quando, através de amor, o sujeito se unecom o objecto, que comunga da Beleza e daBondade divinas, ascende até Deus. A vontade eo amor são, por isso, aspectos de um mesmofenómeno interior, a inquietude, que concorrempara a sua resolução, graças ao conhecimento.

Consideremos, pois, num quadro geral, aincidência da teoria neoplatónica do amor ficinia-no sobre a poesia de Camões. Em comum, osentido de inquietude que sustenta o posiciona-mento do sujeito face ao plano das coisas. Nouniverso camoniano, é constante o confrontocom o desconcerto, a incerteza e a desordem domundo, quer nos versos do lírico, quer nos versosdo épico. Também em Os Lusíadas, em parti-cular naqueles passos em que aflora a subjectivi-da de do poeta, são tematizados tópicos dessaordem. Tal como a amante da canção nonalamenta a sua condição de "bicho da terra vil etão pequeno ••,

Somente o Céu severo,as Estrelas e o Fado sempre fero,com o meu perpétuo dano se recreiam,mostrando-se potentes e indignadoscontra um corpo terreno,bicho da lerra vil e tão pequeno. 19

Assim o cantor dos feitos dos Portuguesesrecorda que tão insignes sucessos são levados acabo por «[ ... 1 um bicho da terra tão pequeno ••.

No mar tanta tormenta e tanto dano,Tantas vezesa morte apercebida!Na terra tanta guerra, tanlo engano,

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Tanta necessidade avorrecida!Onde pode acolher-se um fraco humano,Onde terá segura a curta vida,Que não se arme e se indigne o Céu serenoContra um bicho da terra tão pequeno?20

Em Camões, essa situação de instabilidaderecebe duas grandes soluções, por via neoplató-nica, que passam ou pela conciliação entre omundo empírico e o plano ideal, ou pela aniqui-lação do primeiro face ao segundo. Essas res-postas são emblematizadas por Os Lusíadas epelas redondilhas «Sóbolos rios» , sem que, de formaalguma, sejam apanágio exclusivo de cada umdos poemas.

A harmonização entre os desígnios divinos eo esforço humano, além de se erigir em caracte-rística fundamental do género épico, é um pontoenunciado logo nos versos iniciais de OsLusíadas, quando o poeta anuncia que cantaráheróis que fizeram «mais do que prometia a forçahumana ••, bem como a memória «daqueles Reisque foram dilatando / a Fé, o Império, e as terrasviciosas / de África e de Ásia andaram devastan-do.21. A multiplicação por tempos e lugares sim-bolizada pelos grandes temas da história e da via-gem é polarizada em torno da concepçãoprovidencialista que rege a sua estrutura concep-tual, integrando o plano da história, concebidoem sentido lato, e o plano divino. Observa justa-mente Eduardo Lourenço que a coerência dopoema assentará num duplo movimento, inspira-do pela literatura neoplatónica, de refracção derealidades divinas e projecção de realidadeshurnanes-ê. A escolha dos caminhos seguidospelos portugueses e a forma como enfrentamtodos os perigos são racionalmente determinadaspela vontade de atingir a perfeição através doconhecimento, da ordem cívica, da fama, da poe-sia, e de um amor que alcança a sua superiordimensão na Fé. No plano da abstracção crítica,daí decorre uma plena consonância com a estru-tura circular do cosmos ficiníano=. na medidaem que esse percurso histórico se consubstancianuma ascensão perfectiva que culmina com oalcance do sobrenatural a partir do plano exte-rior. O movimento cósmico que parte de Deusa Ele regressa. Contudo, no âmbito desse paralelo,e na senda da interpretação de EduardoLourenço, um outro domínio há a assinalar, queacentua a coerência de Os Lusíadas, com notávelsingularidade no contexto do cânone da épicaquinhentista. No sistema filosófico ficiniano, ainquietude nunca é radicalmente anulada, mas

resolvida, na medida em que dela parte o impulso que conduz à perfeição. É à luz de considera-ções dessa ordem que se poderão compreendertodas as contradições que sulcam, efectivamente,o poema, conforme foram explanadas por Jorgede Sena24, Óscar Lopes->, António José Saraiva26,Fernando Gil27, e pelo próprio Eduardo LourençoãA vontade heróica dos portugueses sobrepõe-sea todas as incongruências, convertendo-as emetapas de um itinerário plural que, ao ser caneli-zado através da normatividade épica, corrobora arecondução da inquietude ao sublime transcen-dente.

As redondilhas «Sôbolos rios ••culminam, damesma feita, com a projecção daquilo que pode-ríamos considerar, metaforicamente, a Bondadee a Beleza divinas. Contudo, o u[ ... 1 divino apo-sento, / minha pátria singular ••29, apenas é vis-lumbrado pela imaginação do pecador, que ter-mina o poema bendizendo aquele que partir paraa Eternidade. Aliás, o alheamento da perspectivacamoniana, relativamente à concepção dinâmicado neoplatonismo f1orentino, já foi posto em evi-dência por Vítor Manuel de Aguiar e Silva30.Entre o plano onde é colocada a felicidade e omundo exterior não há solução de continuidade,dado que esse nível superior só poderá ser atin-gido quando a alma se libertar do corpo. Por canosequência, o seu alcance pressupõe a aniquila-ção de todos os elos que ligam o homem aomundo terreno, através de um rigoroso ascetls-mo. O primeiro dos dois momentos que funda-mentam a teoria do conhecimento de Ficino éerradicado, e a comunhão divina é adiada para oEterno Descanso.

Por sua vez, as situações de harmonia comque deparamos, nas páginas do lírico, só tanqen-cialmente podem ser associadas à filosofia doerudito de Careggi. A Bárbora escrava represen-ta a beleza através da qual o amante ascende àserenidade plena que experiencia, conciliandopercepção sensorial e tranquilidade espírítua!".As trovas que lhe são dedicadas marcam, defacto, um dos grandes pontos de equilíbrio, entreanseios de ordem diversificada, que nos são ofe-recidos pela obra de Camôes. No entanto, encon-tra-se ausente do seu j&o qualquer referênciaexplícita de ordem divina. O movimento de trans-formação do amante na amada que nele é des-crito não é determinado por aquele anseio sobre-natural que, segundo Ficino, rege amor. Alémdisso, a felicidade alcançada tem um preço, amarginalização de uma componente essencial dolirismo quinhentista, ou seja, o código petrarquista.

148 Aprendizagem/Desenvolvimento

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Outra composição que não poderá ser esquecida,justamente, a ode yJ32, na qual é apresentado umprocesso de ascensão amorosa de matriz inequi-vocamente ficiniana. O amante deseja uma formado mundo exterior, para, através dela, atingirum grau mais alto de certeza. Esse movimentoascendente eleva, então, o homem até Deus,através de uma dinâmica muito semelhante àque é descrita nas páginas de Ellibra dell'amore.Masse o exemplo literário de Dante e de Petrarcatambém neste caso é marginalizado, os últimosversos da composição parecem sugerir uma certadescrença num processo assim concebido. Ora,para Marsilio Ficino e para o neoplatonismorenascentista, o canto é um dos veículos media-dores ao qual é conferida particular importância,em conformidade com os grandes ideais doHumanismo. À parte alguns textos pontuais, taiscomo o soneto -Leda serenidade deleitosa ••, omundo íntimo que a poesia carnoníana desvelaperante os nossos olhos desconhece a harmoniado universo amoroso ficiniano.

Para além do espaço de equilíbrio representadopor Os Lusiadas e para além da evidente tençãoconciliadora que perpassa alguns momentos dasua lírica, estendem-se, porém, aquelas páginas,marcadas por um agudo sentido de inquietude,que em muitos superam os confins do neoplato-nismo renascentista. Marsilio Ficino concebia odesejo como atracção pelo Bom e pelo Beloracionalmente determinada, ao passo que, emCamões, o sujeito é irremediavelmente atraídopor todos os enganos de amor, e, não obstante,entrega-se aos seus desígnios:

Busque Amor novas artes, novo engenho,para matar-me, e novas esquivanças;que não pode tirar-me as esperanças,que mal me tirará o que eu não tenh033.

Embora possa distinguir com a maior lucidez,por via intelectiva, os caminhos do bem, as suasopções levam-o à imperfeição - «que eu conhecimil vezes na ventura/ o milhor, e pior segui, for-çado»34. Nesse ponto, o amante carece daquelaforça volitiva que, segundo Santo Agostinho, éabsolutamente necessária ao efectivo domíniodas paixões.

Distanciado da sublimidade ficiniana, essetipo de vivência só poderá suportar um paralelocom aquela parte de El libra dell'amore ondesão apresentadas as consequências destrutivasdecorrentes de uma forma muito específica deencarar a experiência amorosa. Referimo-nos, em

particular, às páginas da sexta oração que des-crevem os malefícios decorrentes de um excessivoapegamento aos sentidosê>. Ficino retoma a his-tória da origem de amor, conforme é contada porDiotima, no Conoioio de Platào, para pôr em evi-dência os efeitos nefastos decorrentes da suaascendência materna. Sendo Amor filho dePénia, símbolo da pobreza, irá imergir o apaixo-nado num estado de carência permanente. Mas,nesse domínio, para a análise das alterações psi-cossomáticas que afectam os humores e os espí-ritos, é invocada a autoridade de Aristóteles, naÉtica a Nicómaco. Essa experiência amorosa édesignada como paixão. A diversidade da angu-lação que foca essas duas facetas de amorencontra-se na base da inflexão de percurso emfunção da qual, num passo que se faz directa-mente tributário do Convivio, é retomada a refe-rida fonte aristotélica. De índole diametralmenteoposta, é a dinâmica daquela circularidade divi-na que faz resplandecer no cosmos o verdadeiroamor.

Por conseguinte, o confronto entre a formacomo Carnões tematiza a experiência amorosa,enquanto motivo de instabilidade e desencanto, eo pensamento do filósofo florentino, vale pelanegativa. O nó de contradições através do qual érepresentado o estado de enamoramento exacer-ba um jogo de polaridades que remonta a ummodelo supremo, Petrarca, e ao modo como essepoeta explorou o mundo da intimidade, a partirda intersecção de precedentes literários de váriaordem. Recorde-se, contudo, que o engrandeci-mento do dissídio dificilmente poderá ser com-preendido à margem da mediação de dois grandesprocessos conceptuais. Um deles, diz respeito àrecuperação do pensamento da última fase daIdade Média que é, prototipicamente, caracterís-tica do período rnanelrlstaês. Outro concerne asconsequências de ordem desagregadora decor-rentes da tenção neoplatónica que imbuiu a suapoesia.

A importância conferida às redondilhas-Sôbolos rios » , verdadeira obra-prima do lirismomaneirista, deixou na sombra, em muitas cir-cunstâncias, o lugar ocupado pelo dissídio nouniverso íntimo camoniano. Na verdade, a supe-ração, por via ascética, da instabilidade causadapor todas as paixões que dominam o pecadorque vive à face da Terra, não nulifica a lúcidaanálise que do seu carácter inelutável é feita nou-tras composições dotadas de um alto grau depoeticidade. Foi com grande clarividência que,nos anos trinta, António Sérgio identificou alguns

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dos fundamentais pontos articulatórios que sus-têm o sistema de contra posições da lírica carne-niana, entre plano sensorial e plano íntelectívoê",de acordo com uma linha interpretativa quedepois veio a ser desenvolvida por Jorge deSena38, Jacinto do Prado Coelho-? e AntónioJosé Saraiva-v. Mais recentemente, porém, MariaVitalina Leal de Matos forneceu um contributofundamental a essa vertente interpretativa, aoconsiderar o amor-paixão como algo que excedeo platonismo, enquanto vivência mais complexae menos serena+l. Por sua vez, Maria HelenaRibeiro da Cunha colocou a tónica, justamente,sobre o lugar ocupado pelo neoplatonismo nadialéctica camoniana, ponderando a hipótese deque o seu influxo se erija em modo de exacerbaro erotismo'<.

Com efeito, a enfatização do dissídio petrar-quista de forma alguma é conciliável com ainquietude da filosofia ficiniana. Para o autor deEI libra dell'amore, essa atitude implicava umaorientação racional para a Bondade e para aBeleza divinas que se encontram nas coisas, e àsquais o homem pode aceder através de um actode vontade. De outra forma, no núcleo poéticoem análise, a inquietude carece de resolução,porquanto se afirma através da sua própria nega-ção, num processo em que cada avanço implicaum novo regresso. Por consequência, fica invia-bilizada qualquer espécie de síntese. A dialécticacamoniana é um processo que evolui a partir dassuas próprias contradições, que se vão recom-pondo e desdobrando através de sucessivas trans-formações:

E não cuide ninguém que algum defeito,quando na causa amada s'apresenta,possa deminuir o amor perfeito;

antes o dobra mais; e se atormenta,pouco e pouco o desculpa o brando peito;que Amor com seus contrários s'acrescenta.43

Desta feita, ao distanciar-se da harmonia cir-cular ficiniana, Camões problematiza magistral-mente, como poeta, os grandes pólos de tensãoem torno dos quais se irá desenvolver, nos sécu-los seguintes, todo o pensamento moderno, deDescartes a Hegel - as possibilidades da razão, arelação entre verdade e erro, ou a adaequatiointellectus et rei, para culminar na questão dosaber absoluto.

A concepção de acordo com a qual as oposi-ções não existem fora da unidade, já que ela pró-pria contém em si diferenciações cujo desenvol-

vimento a sustém, é não só uma referência fun-damental da filosofia de Hegel, como tambémum processo indissociável da enorme projecçãodo seu pensamento. «L'Aufhebung, coutumiereet kénotique à la fois, épargne et met à l'abri cequ'elle supprime. Cette sauvegarde dépend duprocessus de simplification. D'une rnaniêre géné-rale, toute conversation est une économie de laperte. Le maintien exige toujours de la perditionpour contredire la déperdition elle-même. Ce rap-port entre maintien, perdition et déperditionceuvre selon Hegel comme réduction et abrevia-tion: le raccourci est la condition paradoxale de lalongévité •., escreve uma conceituada intérpretedo rasto do pensamento de Hegel, CatherineMalabou44. Maintien, perdition et déperdition.Réduction et longévité. Condition paradoxale.

Não há causa a qual natural sejaque não queira perpétuo seu estado;não quer logo o desejo o desejado,porque não falte nunca onde sobeja.45

4.Considerações desta ordem não serão alheias

aos motivos em virtude dos quais a poesia dodissídio é dotada de particular actualidade.Também pela forma como sempre suscitou, econtinua a suscitar, renovadas leituras, esseCamões vai ao encontro do paradiqma traçadopor Calvino para a definição dos clássicos .••Quedo penar a ordem desordeno•.46 .•• Que era razãoser a razão vencíde-s". O ruído de fundo faz-semais intenso, num ponto de viragem dialéctico.

«Les anciennes mythologies savaient quel'univers a besoin d'être régénéré, et leurs ritess'efforçaient de contribuer à cette régénération.L'ordre majestueux de Newton et de Laplace est,nous le savons maintenant, sans cesse généré etrégénéré par les formidables chaudiêres solaires.C'est dire enfin que tout ce qui est génésique,générateur, créateur ne saurait se passer dudésordre. Le désordre est inéluctable, irréducti-ble. De mêrne que l'on ne peut dissocier chezl'homme son visage d' homo demens de son visa-ge d' homo sepiens, de même - et ce n'est pasfortuit - on ne peut dans le cosmos dissocier sescaracteres 'déments' (chaos, hémorragie, gaspil-lages, déperditions, turbulences, cataclysmes) deses caracteres 'sages' (ordre, loi, organisation).Les premiers n'ont peut-être pas besoin desseconds, mais les seconds ont toujours besoindes premiers. Tout ce qui se crée et s'organise

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dépense, dissipe. L'univers est plus shakespea-rien que newtonien .•48 Neste passo, Edgar Morindesmistifica o grande baluarte do monolitismodeterminista ocidental, quando interpreta toda aevolução do conhecimento como um misto desapiênciae de demência, de ordem e de desordem.Em sua opinião, o cosmos é como um grandeteatro, onde são representadas peças de índolemuito diversa, sem que seja possível discernirqual é, efectivamente, o guião principal. Daí queconclua que o universo é mais shakespearianodoque newtoniano. Ao que acrescentaríamos - etambém mais camoniano.

Na base da sua antropologia do conhecimento,Morin coloca o dinamismo de uma série de situa-çõese de condições de ordem física, psicológicae cultural, gerado pelo encontro de contrários.Com efeito, além de nunca se anularem, essasoposiçõescontribuem para a constante regenera-ção do universo. A vida não pode ser remetidapara a simples noção de ordem, já que é dasinteracções entre ordem e caos, descontrole e lei,homo sapiens e homo demens, que o cosmosevolui, na medida em que é a partir dessas impli-cações que se gera o desenvolvimento mútuodos factores em tensão.

Desta feita, ao admitir que a aspiração à tota-lidade e à verdade é tão importante como o reco-nhecimento da impossibilidade de alcançar ple-namente essas metas, Morin situa-se naquelafranja da filosofia hegeliana que se desenvolveu apartir da mediação de Adorno. Uma das asser-ções deste filósofo que é reiterada mente citadaao longo da sua obra, ••a totalidade é a não ver-dade», expõe inexorável e emblematicamente,em seu entender, a condição trágica do pensa-mento, condenado a enfrentar contradições quenunca poderá resolver através de uma sínteseacabada e isenta de fissuras. Conforme o próprioMorin explicita, o que o fascina, em Hegel, 11[ ••. ] éo afrontamento das contradições que se apresen-tam constantemente ao espírito e é o reconheci-mento do papel da negatividade. Não é tanto asíntese, o Estado absoluto, o Espírito absoluto, éa negatividade sem limite»49. A impossibilidadede alcançar essa unidade perfeita tem por corre-lato a admissão inclusiva da incerteza, da desor-dem ou do indizível, mas à margem de qualquertipo de cepticismo ou de triunfalismo. Desta feita,as contínuas contradições que vão sendo geradasconvertem o conhecimento num percurso quedesconhece limites. De acordo com os princípiosexpostos em La méthode, toda a complexidadese traduz, pois, no aumento de variedade no seio

de um sistema. Esse engrandecimento poderá, defacto, criar uma fragmentação dispersiva, masque logo é contrabalançada por um novo modeloorganizativo, ainda mais complexo e elaborado.

O impacto do pensamento de Edgar Morinsobre a teorização de ordem ontológica, episte-mológica, gnosiológica e antropológica, produzi-da nas últimas décadas, decorrerá, em boa parte,da revisão que através dele foi operada de qual-quer sistema unidimensional. A crítica a todo otipo de concepções evolutivas que ignore c1iva-gens, bem como ao carácter estanque de confinsentre domínios diversificados, traduz-se no reco-nhecimento da iniquidade do solipsismo determi-nista. Assim se compreende que a sua obra des-dobre perante os nossos olhos um universo que,sendo mais shakespeariano do que newtoniano,possa ser também o universo do dissídio camo-niano. Profundamente imbuído da inquietude quedomina a cosmovisão maneirista, Camões,enquanto poeta, coloca algumas das grandesquestões que Descartes há-de solucionar por viaracionalista, e que Hegel devolverá à sua dimen-são dialéctica. Por isso, quando Edgar Morinparte da dialéctica hegeliana para penetrar emcontradições que, por nunca culminarem numasíntese absoluta, conferem ao pensamento a suadimensão trágica, oferece-nos a actualidade deCamões, como clássico, e entre os clássicos detodos os tempos.

5.O universo camoniano do dissídio é o espaço

do múltiplo e da diversidade. O amor erige-se ememblema de uma existência repartida entre vicis-situdes de ordem muito diversa, que tem por cor-relato a dispersão fragmentária pelos momentosespaciais e pelos momentos temporais que aenvolvem. Protagonista de «mil vidas, não umasó [... ]50,vítima da 11[ •.• ] importuna / perseguiçãode males em pedaçosõt, o sujeito é um ser deexcepção, que, «antes agora livre, agora atado, /em várias flamas variamente ardia»52.Enfim, é océlebre peregrino de uma vida «pelo mundo empedaços repartida»53.

Mas essa dispersão é ainda enfatizada atravésdo constante confronto com uma série de forçasque lhe são superiores, e que contra ele urde umapérfida trama:

Fortuna, enfim, co Amor se conjuroucontra mim, porque mais me magoasse:Amor a um vão desejo me obrigou,só para que a Fortuna mo negasse.

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A este estado o tempo me achegou,e nele quis que a vida se acabasse;se há em mim acabar-se, que eu não creio;que até da muita vida me receio.54

Como tal, a interioridade do amante é pertur-bada por uma rede de antagonismos e de contra-dições que liga elementos cuja associação trans-cende uma lógica disjuntiva. Também nesseâmbito, a dialéctica assume um papel dinamiza-dor crucial, enquanto catalisador da superaçãode qualquer aut aut, e, da mesma feita, enquan-to fulcro da complexidade que caracteriza o uni-verso do dissídio.

«(Ine telle jonction de notions jusqu'alors dis-jointes nous fait approcher du noyau principalmême de la complexité qui est, non seulementdans la liaison du séparé isolé, mais dans l'asso-ciation de ce qui était considéré comme antago-niste. La complexité correspond, dans ce sens, àl'irruption des antagonismes au cceur des phéno-rnênes organisés, à l'irruption des paradoxes oucontradictions au cceur de la théorie», notaMorin55. É a partir dessa conjunção que a análi-se das vivências íntimas ganha toda a sua pro-fundidade.

Se o corpo segue impulsos de ordem terrena,outros são os anseios do pensamento, votado aobjectivos supremos. Todavia, para o amante,aspirações de índole tão diversa confrontam-se acada passo:

Se, por algum acerto, Amor vos errapor parte do desejo, cometendoalgum nefando e torpe desatino,se ainda mais que ver, enfim, pretendo,fraquezas são do corpo, que é da terra,mas não do pensamento, que é divino. 56

A proliferação de contradições é exploradaem consonância com os pressupostos da retóricamaneirista, tirando o melhor partido da lição esti-lística de Petrarca. Os sonetos, «Tanto do meuestado me acho incerto» e «Amor é um fogo quearde sem se ver»57,ilustram paradigmaticamenteesse processo. Não se trata, porém, de um merogosto conceptualizante e abstractivo. A primeiradessas composições coloca no cerne do estadode incerteza a mulher amada, conforme o expli-cita o seu desfecho,

Se me pergunta alguém porque assi ando,respondo que não sei; porém suspeitoque só porque vos vi, minha Senhora.

Ao passo que a segunda confronta as inexpli-cáveis contradições amorosas com a constataçãoda sua inevitável, conquanto paradoxal, vivência:

Mas como causar pode seu favornos corações humanos amizade,se tão contrário a si é o mesmo Amor?

A questão é tanto mais sintomática quandoperspectivada à luz da crítica de fontes58. Em«Amor é um fogo que arde sem se ver», Camõesretoma um passo do tratado de Petrarca Deremediis utriusque fortunae onde esse sentimen-to é veementemente condenado, em nome de umascetismo purificante. O humanista italiano apre-senta os malefícios de amor, de forma sintética eincisiva, com finalidades dissuasoras, visandoobjectivos de edificação moral - «est enim amorlatens ignis, gratum uulnus, sapidum uuenenum,dulcis amaritudo, delectabilis morbus, iucundumsupplicium, blanda mors». O sentido origináriodesse fragmento textual é, porém, submetido auma operação de inversão. Camões de formaalguma ignora as referidas contradições de amor,que, aliás, enfatiza. Não obstante, admite-as comotal, na sua realidade humana.

«Cerres, le hasard nous impose son irréducti-bilité et son irrationalisabilité fondamentales.Mais, intégré et articulé dans le paradigme ordre/ désordre / interactions / organisation, il devient,sans perdre son inintelligibilité, un principe d'in-telligibilité des phénomenes vivants»59.As resso-nâncias íntimas do antagonismo colocam o sujei-to poético à mercê da desordem que reina nomundo, e na dependência de uma casualidadeque escapa a qualquer lógica explicativa. A inci-siva lucidez à luz da qual é analisado o descon-certo acaba, porém, por agudizar a sua cons-ciência reflexiva. Apesar de assentar no profundodesequilíbrio que entre ele próprio e o inapelávelpoder das entidades que o dominam se estabelece,o erro pode também erigir-se em fonte de conhe-cimento:

Erros meus, má fortuna, amor ardenteem minha perdição se conjuraram;os erros e a fortuna sobejaram,que para mim bastava o amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presentea grande dor das causas que passaram,que as magoadas iras me ensinarama não querer já nunca ser contente.50

«Toute erreur dans la représentation mentaleet dans la stratégie entraine un comportement

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déficient [... 1. La merveille de I'organisationvivante, à la différence de la machine artificielle,est qu'elle puisse fonctionner malgré I'erreur etavec I'erreur [... 1. Elle est capable de faire d'er-reur vertu, puisque I'erreur devient le stimulantd'une réorganisation originale ou d'une découver-te créatrice ••61• É dessa brecha que se abre entreverdade e erro, vontade e sobredeterminação,ordem e desordem, linguagem e referente, quebrota e se perpetua a poesia:

O cisne, quando sente ser chegadaa hora que põe termo a sua vida,música com voz alta e tnui subidalevanta pola praia inabitada.

Deseja ter a vida prolongada,chorando do viver a despedida;com grande saudade da partida,celebra o triste fim destajornada.

Assi, Senhora minha, quando viao triste fim que davam meus amores,estando posto já no extremo fio,

com mais suave canto e harmoniadiscantei pelos vossos disteootesLa vuestra falsa fé, y el amor mio.62

A imagem do cisne moribundo é utilizada porPlatão no Fédoté>. Para além do apuramento dasvias através das quais Camões a teria podidoconhecer, situa-se uma outra questão, que passapela adaequatio intellectus et rei. No referido diá-logo, Sócrates serve-se dessa imagem para mos-trar que, apesar de ter plena consciência de quea sua morte está iminente, de forma alguma seencontra abatido e sem vontade de participar nodebate. É então que coloca a sua situação emparalelo com a do cisne que, quando está prestesa morrer, eleva o seu mais belo canto. Em seuentender, erram quantos pensam que é a dor queo move. Pelo contrário, o canto da ave de Apoioé de plena felicidade, na medida em que, graçasao seu poder divinatório prevê o bem que a espera.

Camões não partilha, rigorosamente, nemtão só a opinião de Sócrates, nem tão só o pontode vista que é contestado por esse pensador. Por

um lado, o canto do cisne é considerado triste,porquanto de despedida. Por outro lado, é tidopor esperançoso, na medida em que exprime odesejo de que a vida se prolongue. Mas se a sau-dade da partida pressupõe uma doce e deleitosalembrança do passado, o desejo de continuar aviver é catalisado pela ameaça da morte. Na ver-dade, Camões retoma o tema do canto do cisnepara o trabalhar à luz de uma dialéctica que, por

desconhecer uma síntese determinante, converteessa imagem em alibi que justifica a própria poe-sia. É quando o sujeito lírico se confronta com oiminente risco de autodestruição que eleva o seumais harmonioso e suave canto, movido pelodesejo da palavra que representa todas as con-tradições e todas as incertezas de amor, la vuestrafalsa fé, y el amor mio.

Por conseguinte, a fissura que assim se abreexpõe, em toda a sua pregnância, a distinção, dematriz platónica, entre mundo sensível e mundointeligível, perfeição transcendente e contingên-cia imanente, multiplicidade do empírico e ordemsobrenatural. Todavia, ao alhear-se da resoluçãoficiniana decorrente da circularidade da harmo-nia divina, essa fractura de não coincidênciaerige-se em fulcro da dialéctica do dissídio. «Cen'est pas seulement une relativisation de ces ter-mes les uns par rapport aux autres; c'est leurintégration au sein d'un méta-systéme qui trans-forme chacun de ces termes dans le preces d'uneboucle rétroactive et récursive,64.

Mas então, é também a própria imagem queCamões constrói de Platâo a integrar-se nummeta-sistema transformativo, de ordem retroacti-va e recursiva, com perfeita coerência entre oplano da poética implícita e da emblematizaçãoconceptual:

Deixo outras obras vãs do vulgo errado,a quem não há ninguém que contradiga,nem doutra cousa alguma é sojugadoque d'uma opinião e usança antiga.Mas pergunto ora a César esforçado,ou a Platão divino, que me diga,este das muitas terras em que andou,estoutro, de vencê-las, que alcançou?

[...]Dirá Platão: - Por ver o Etna e o NUa

fui a Sicília, ao Egipto e a outras partes,só por ver e escrever em alto estiloda natural ciência em muitas artes.- O tempo é breve e queres consumi-loPiatão, todo em trabalhos; e repartestão mal de teu estudo as breves horasque, enfim, do falso Febo o filho adoras?65

Entre o filósofo da Academia que reparte econsome o seu tempo por tantos lugares e portantos trabalhos, e o peregrino de uma vida "pelomundo em pedaços repartida ••, gera-se, pois,uma cumplicidade especular cujas implicações

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só poderão ser cabalmente compreendidas apartir do processo de homologação inerente àsmodalidades da representação poética. Por con-sequência, mais do que ou a Camões, ou aPlatão, ou ao alter Plato florentino, esse processodiz respeito e a Camões, e a Platão, e ao alterP/ato florentino - que é dizer, ao neoplatonismocamoniano.

6.Na cadeia assim constituída, a ordem do

clássico e o ruído de fundo integram-se, tambémeles, num meta-sistema que virá a ser superadopor sucessivos níveis transformativos. Daí decor-re a sua constante actualidade e a sua perma-nente disponibilidade para a releitura, bem comoo sentido do seu convívio com o mundo em quevivemos.

NOTAS

1 -Perché leggere i classici-, inicialmente em Espresso,28-6-1981, e com várias reedições, de entre as quais, ltaloCalvino, Perciiê leggere iclassici, Milano, Mondadori, 1991.

2 Pelo que diz respeito à distinção entre platonismo e neo-platonismo, bem como à sua caracterização conceptuale à sua incidência, vd. os seguintes artigos e a bibliogra-fia específica neles indicada: G. Faggin, -Platonismo. e•Neoplatonismt»: Encic/opedia filoso{Lca. Venezia, Roma,Istituto per la Collaborazione Culturale, vol. 3, 1957, cc.1444-47 e 854-57; Carlos Silva, -Platonísrno-: Logos.Enciclopédia luso-brasileira de filosofia. Lisboa, SãoPaulo, Verbo, v. 4, 1992, cc. 238-67; e M. Antunes,-Platonismo-: ib., v. 3,1991, cc. 1118-21.

3 Essas redondilhas foram objecto de várias leituras, cujoelenco se pode ler nas pp. 671-72 de Rita Marnoto, Opetrarquismo português do Renascimento e doManeirismo. [1994J Universidade de Coimbra, 1997; aacrescentar, id., -Da Arcadia a 'Sôbolos rios'»:Associação Internacional de Lusitanistas. Actas doQuinto Congresso, Universidade de Oxiord, 1 a 8 deSetembro de 1996. Organização e coordenação de T. F.Earle, Oxford, Coimbra, Associação Internacional deLusitanistas, 1998, t. 11, pp. 1023-44.

4 -Estudos sobre as leituras filosóficas de Carnões- [1925],Obra Completa. I. Filosofiae história da filosofia, 1916-1934.Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1978, pp. 299--335.

5 Camàes e o platonismo (um problema de crítica literária).Barcelos, Companhia Editora do Minho, 1926.

6 -Camões leu Platão?: Biblos, 15, 1, 1939, pp. 378-390.7 Op. cit., p. 324.8 Essa questão encontra-se no cerne das dúvidas, expres-

sas por Vergílio Ferreira, face à hipótese, sustentada porJoaquim de Carvalho e por Costa Pimpão, segundo aqual Camões teria tido conhecimento directo da obra dePlatão; vd. Vergílio A. Ferreira, «TeriaCamões lido Platão(notas sobre alguns elementos platónicos da lírica carne-niana)»: Biblos, 18, 1, 1942, pp. 225-47, bem como a

subsequente intervenção de Álvaro Júlio da CostaPimpão, «Teria Camões lido Platão? (nótula a um artigocrítico). [1942]. Escritos diversos. Universidade deCoimbra, 1972, pp. 111-20. Não deixe de se recordarum outro trabalho, também publicado na primeira meta-de do século, onde são valorizadas as mediações do pen-samento de Platão: Abel de Mendonça Machado deAraújo, -Luís de Camões - aspectos filosóficos»: Boletimda Escola de Regentes Agrícolas de Coimbrs, 13, 1946.

9 A dialéctica do âeseio em Camàes. Lisboa, ImprensaNacional-Casa da Moeda, 1989, p. 15.

10 -Camões et la pensée platonicienne de la Renaíssence»[1972]. Humanisme et Renaissance de l'ltalie auPortugal. 'Les deux regards de Janus'. Lisbonne, Paris,Fondation Calouste Gulbenkian, 1989, v. 2, p. 714.

11 Todos esses aspectos são hoje bem conhecidos, em par-ticular graças aos trabalhos de Pina Martins, Aguiar eSilva e Maria Helena Ribeiro da Cunha. Vd. a rigorosapesquisa levada a cabo por José V. Pina Martins, em«Livres du XVI siécle sur I'origine et la nature de I'amour.Aperçu bibllographique- [1969]. bem como o capítulo,-La poésie de Camôes-, que congrega as intervenções,«L'Humanisme dans I'ceuvre de Carnôes- [1980J e-Carnões et la pensée platonicienne de la Renaissance»[1972]. op. cit., v. 1, pp. 355-404; v. 2, pp. 679-745. DeVítor Manuel Aguiar e Silva, é fundamental o artigo,«Amor e mundividência na lírica carnomana. [1980],Camàes: labirintos e fascínios. Lisboa, Cotovia, 1994, pp.163- 77. Por sua vez, A dialéctica do des~o em Camàes,de Maria Helena Ribeiro da Cunha, é exemplo paradig-mático da metodologia baseada no cotejo textual. Peloque diz respeito ao petrarquismo camoniano, vd., RitaMarnoto, O petrarquismo português do Renascimento edo Maneirismo, capo IV.

12 Para uma recolha dos textos básicos da tratadística ita-liana, vd., Trattati d'amore dei Cinquecento. A cura diGiuseppe Zonta [1912], ristampa a cura di Mario Pozzi,Bari, Laterza, 1975; Trattati dei Cinquecento sulla donna.A cura di Giuseppe Zonta, Bari, Laterza, 1913; e Trattatidi poetica e di retorica dei Cinquecento. A cura di BernardWeinberg, Bari, Laterza, 1970-4, 4 v. Sobre a tratadísticadessa época, num plano geral, vd.: Paolo Lorenzetti, «Labellezza e I'amore nei trattati dei Cinquecentc»: Annalidella R. Scuola i'Iormale Superiore Universitaria di Pisa.Filosofia e Filologia, 28, 1922, pp. 1-177; J. Festuqiêre,-La philosophie de I'amour de Marsile Ficin et soninfluence sur la Iittérature française du XVI slêcle- :Revista da Universidade de Coimbra, 8, J 922, pp. 396-

·564 ; John Charles Nelson, Renaissance Theory of Love.The Context of Giordano Bruno's sErcici Furori •. NewYork, Columbia University Press, 1958; Edgar Wind,Pagan Mysteries in the Renaissance. London, Farber andFarber, 1958 [com vv. reed.J; Gioachino Paparelli,-Fentss«, -humsnitss», «divinitas •. L'essenza umanisticadei Rinascimento [1960J. Napoli, Guida, 1973; EugenioGarin, Storia della filosofia italiana [1966J. Torino,Einaudi, 1978, 3~ ed. con una appendice bibliografica, v. 2;Marcello Aurigemma, Lirica, poemi e trattati civili deiCinquecento [1973J. Roma, Bari, Laterza, 1982; e LaCorte e il «Corteggiano•. I. La scena dei testo. A cura diCarlo Ossola. 11.Un modello europeo. A cura di AdrianoProsperi, Roma, Bulzoni, 1980.

13 Os Dialoghi di amore de Leão Hebreu tiveram a sua pri-meira edição italiana em 1535 (Roma, Blado). Nas suas

154 Aprendizagem/Desenvolvimento

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páginas, fica contida uma síntese das concepções amo-rosas dominantes na época, o que em nada diminui o seuvalor. Leão Hebreu dava às boas regras da imitatio amesma resposta que lhes fora dada por Bembo,Castiglione, ou Equicola. Nunca se deverá perder devista, porém, o posicionamento epigonal desses diálo-gos. Sobre Leão Hebreu, vd.: Joaquim de Carvalho,•Leão Hebreu, filósofo (para a história do platonismo noRenasclmento)», op. cii., pp. 149-297; Heinz Pflaum, Die/dee der Liebe Leone Ebreo. Zwei Abhandlungen zurGeschichte der Philosophie in der Renaissance.Tübingen, J. C. B. Mohr, 1926; Raymond Marcel, -Le pla-tonisme de Pétrarque à Léon l'Hébreu- : Conqrês de Toursei Poitiers. 3-9 septembre 7953. Actes du V. Conqrês del'Association G. Budé. Paris, Les Belles Lettres, 1954, pp.293-319 ; Carlo Dionisotti, -Appuntí su Leone Ebreo» :Italia Medioeuale e Umanistica, 2, 1959, pp. 409-28;Manuel Augusto Rodrigues, -Leão Hebreu-: Biblos, 57,1981, pp. 527 -95 ; e Marco Ariani, '/mago fabulosa '. Mitoe allegoria nei 'Dialoghi d'amore' di Leone Ebreo. Roma,Bulzoni, 1984; bem como o aparato da edição bilingue,Diálogos de amor. Texto fixado, anotado e traduzido porGiancinto Manuppella, Lisboa, Instituto Nacional deInvestigação Científica, 1983, 2 v.

14 Sobre Marsilio Ficino, são fundamentais: P. O. Kristeller,11pensiero filosofico di Marsilio Ficino [Firenze, Sansoni,1953J Firenze, Le Lettere, 1988, ed. riveduta con biblio-grafia aggiornata; André Chastel, Marsile Ficiti et l'ett[1954 J. Préface de Jean Wirth, Genéve, Droz, 1996; eJohn Charles Nelson, op. cit., passim.

15 O texto em latim foi redigido em 1469, considerando-sebastante provável que a sua versão em vulgar tivessesido elaborada nesse mesmo ano. O processo translati-vo, típico do labor ficiniano, redunda numa mais deta-lhada explicitação dos temas versados e numa maior cla-reza expressiva. A levar à letra o seu título latinocompleto, Commentarium in Conuiuium Platonis deamore, seria objectivo do seu autor elaborar um comentá-rio ao Conuíuio. Vd. Sebastiano Gentile, «Commeruettumin Conuiuium de emore/ El libro dell'amore di MarsilioFicino-: Letteratura italiana. Direzione Alberto Asor Rosa.Le opere. 1. Dalle origini ai Cinquecento. Torino, Einaudi,1992, pp. 743-67; Maria José Vaz Pinto, .A recepção oua invenção ficiniana do 'amor platónico'»: Philosophica,14, 1999, pp. 51-84; bem como o aparato crítico queacompanha quer a edição, Marsilio Ficino, EI libro dell'amore. A cura di Sandra Niccoli, Firenze, Olschki, 1987,quer as traduções, feitas a partir do texto em latim,Commentaire sur le Banquet de Platon. Texte du manus-crit autographe présenté et traduit par Raymond Marcel,Paris, Les Belles Lettres, 1956 [a considerar ponderada-menteJ, e De amore. Comentario a 'EI Banquete' de Platón[1986J. Traducción y estudio preliminar de Rodo de laVilla Ardura, Madrid, Tecnos, 1994.

16 P. O. Kristeller, op. dL, pp. 306-309.17 Op. dI., p. 743.18 Por consequência, nunca será demais insistir sobre a dis-

crepância que corre entre o alto nível do pensamentoficiniano e a banalização empobrecedora a que a ideia deamor platónico foi sujeita, quando designa um sentimen-to que carece de consecução. Trata-se, na verdade, deuma concepção absolutamente acientífica, apesar demuito coerente, e que, em parte, tem afectado o enten-dimento do platonismo e do neoplatonismo camonianos.

Assim explica Carlos Silva essa falta de precisão con-ceptual: .No vulgo, o Platonismo tem uma outra lem-brança, remete ao 'amor platónico', tomado ainda aquina ironia romântica de uma falta de consecução realista,de uma alienação ideal, confundindo o paradigma plató-nico com a desatenção sistemática de Tales no 'lunatis-mo' filosófico de um esquecimento da situação vivida •(op. cit., c. 240); e d. também P. O. Kristeller, op. cit.,pp. 306-309.

19 Luís de Camões, Rimas [1944J. Texto estabelecido e pre-faciado por Álvaro J. da Costa Pimpão, apresentaçãode Aníbal Pinto de Castro, Coimbra, Almedina, 1994,p.222.

20 Luís de Camões, Os Lusíadas [1972J. Leitura, prefácio enotas de Álvaro Júlio da Costa Pimpão, apresentação deAníbal Pinto de Castro, Lisboa, Instituto de CulturaPortuguesa, Ministério da Educação, 1989, p. 27, 1.106.

21 Ib., p. 1, 1.1-2.22 -Carnões e a visão neoplatónica do mundo. [1972].

Poesia e metsiisice. Camôes, Antero, Pessoa. Lisboa, Sáda Costa, 1983, p. 61 e passim.

23 CL, em particular, Ellibro dell'amore, 2.1-3.24 Vd. os escritos reunidos em Trinta anos de Camôes, 1948-

1978 (estudos camonianos e correia tos). Lisboa, Edições70, 1980, 2 v., em particular, -Aspectos do pensamentode Camôes através da estrutura linguística de Os Lusieds»[1972]. v. 1, pp. 274-86.

25.A grandeza do bicho da Terra tão pequeno. [1980J, 5motiuos de meditação. Luís de Camôes, Eça de Queirós,Raul Brandão, Aquilino Ribeiro, Fernando Pessoa. Porto,Campo das Letras, 1999, pp. 21-39.

26 Luis de Camôes [1959]. Lisboa, Europa-América, 1997,311 ed., capo IV; e Estudos sobre a arte d'.os Lusíadas •.Lisboa, Gradiva, 1992.

27.0 efeito-Lusíadas- : Fernando Gil / Helder Macedo,Viagens do olhar. Retrospecção, uisão e profecia noRenascimento ponuquês. Porto, Campo das Letras,1998, pp. 13-75.

28 Vd. também -Carnões e o tempo ou a razão oscilante.[1972]. Poesia e metafisica. Camóes, Antero, Pessoa, pp.31-49.

29 Luís de Camões, Rimas, p. 114.30 Op. cito31 Estes assuntos foram desenvolvidos em Rita Marnoto,

-Carnôes, Laura e Bárbora escrava. [1997J: Estudos deLiteratura Portuguesa. Jornadas de Formação deProfessores, Viseu, Universidade Católica Portuguesa,Faculdade de Letras, 1999, pp. 75-102.

32 Maria Helena Ribeiro da Cunha elaborou uma leituradessa composição, tendo em linha de conta o pensa-mento de Platão e dos tratadistas italianos, no artigo,.0 neoplatonismo amoroso na Ode VI.: Reuista Camoniana,2,1965, pp. 116-28.

33 Rimas, p. 118.34 Ib., p. 224.35 Vd., especificamente, o capítulo 6.9.36 A essa questão aludiu Rita Marnoto, na comunicação,

-Notas sobre o sentido da poesia camoniana-, apresenta-da ao .VI Encontro de Carnonistasr, realizada emCoimbra no ano de 1996, e em curso de publicação nasrespectivas actas.

37 .Questão prévia dum ignorante aos prefaciadores da líricade Carnões- [1933]. Obras Completas. Ensaios. Lisboa,Sá da Costa, 1972, t. 4, pp. 11-68.

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38 Recorde-se .A poesia de Camões. Ensaio de revelaçãoda dialéctica carnonlana» [1948], Trinta anos de Camàes,1948-1978 (estudos camonianos e correia tos) , v. I,pp. 13-39.

39 Valha por todas a remissão para o artigo -Carnões: umlírico do transcendente. [1952), A letra e o leitor. Lisboa,Moraes, 1970, 2.1I ed., pp. 15-29.

40 Luís de Camões. [1959) Lisboa, Gradiva, 1997. A leiturade Antônio José Saraiva decorre de uma corrente de opi-nião, bastante difundida em Portugal, que acentua a ver-tente espiritualista do amor cantado nos Rerum uulga-rium fragmenta. Sobre esse assunto, no âmbito daintersecção entre petrarquismo e neoplatonismo, é fun-damental o artigo de William Melczer, .Neoplatonism andpetrarchism: familiar or estranged bedfellows in the highRenaissance» : Neohelicon [Budapest], 3, 1-2, 1975, pp.9-27, que chama a atenção quer para a ausência de umaunidade especulativa na obra de Petrarca, quer para adiversidade das vias através das quais se irá processar asua imitação.

41 Op. cii., p. 268 e passim. Aliás, no capítulo 11.11.1 fica con-tido um balanço fundamental acerca das posições críti-cas assumidas por Antônio Sérgio, Salgado Júnior, HernâniCidade e João Mendes.

42 A dialéctica do desejo em Camões, p. 61 e passim.43 Rimas, p. 132.44 L'avenir d'Hegel. Piastici té, temporalilé, dialectique.

Paris, Vrin, 1996, p. 210.45 Rimas, p. 120.46 Ib., p. 127.47 Ib., p. 217.

48 Edgar Morin, La mélhode. Tome 1. La nsture de la nalure.Paris, Seuil, 1980, p. 368.

49 O problema epislemolàgico da complexidade. Participaçãode Antônio Marques, Eduardo Prado Coelho, João ResinaRodrigues, Jorge Correia Jesuíno, José Mariano Gago,Luís Filipe Barreto, Maria Manuel de Araújo Jorge. MemMartins, Europa-América, s.d., 2i1ed., p. 98. Cf. tambéma citação de Hegel que serve de incipit ao capítulo de Laméthode. Tome 11.La vie de la vie. Paris, Seuil, 1980, inti-tulado -La complexité vivante- : -Ce qui est contradictoi-re dans le royaume des choses mortes ne I'est pas dansle royaume de la vie.» (p. 355).

50 Rimas, p. 180.51 Ib., p. 228.52 Ib., p. 166.53 Ib., p. 221.54 Ib., p. 292.55 La méthode. Tome I. La nature de la nature, p. 379.56 Rimas, p. 203.57 Ib., pp. 118-19.58 O assunto foi desenvolvido em Rita Marnoto, O pelrar-

quismo português do Renascimenlo e do Maneirismo,pp.538-41.

59 Edgar Morin, La mélhode. Tome11.La vie de la vie, p. 367.60 Rimas, p. 170.61 Edgar Morin, La méthode. Tome 11.La vie de la vie,

pp.368-69.62 Rimas, p. 143.63 84.d-85.b.64 Edgar Morin, La méthode. Tome I. La nature de la nature,

pp. 380-81 [itálico no original].65 Rimas, p. 288.

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