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IEL I – Profa. Viviana Bosi Nome: Helton Prado de Lima N. USP: 9332998 PRIMEIRAS REFLEXÕES SOBRE A LITERATURA E O POEMA 1) Segundo Antonio Candido em “O direito à literatura” as três categorias constitutivas da literatura são, respectivamente: construção de objetos autônomos como estrutura e significado, forma de expressão e forma de conhecimento. A literatura tem a capacidade de racionalizar a realidade e trascendê-la. Nesse aspecto, o escritor assemelha-se a um arquiteto, igual a concepção de João Cabral de Melo Neto no poema “Fábula de um arquiteto”: “A arquitetura como construir portas/de abrir; ou como construir o aberto;/construir, não como ilhar e prender,/nem construir como fechar secretos;/construir portas abertas, em portas;/casas exclusivamente portas e teto.” (MELO NETO, 2008: p. 220). A liberdade do poeta de criar e dar forma ao pensamento através das palavras faz com que esta construção adquira uma forma autônoma do mundo das ideias para o mundo sensível. A literatura tem um papel essencial como função de dar um significado ao abstrato. A poesia como forma de expressão dos sentimentos e da concepção do indivíduo do mundo é outra função segundo

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Page 1: IEL I Trabalho

IEL I – Profa. Viviana Bosi

Nome: Helton Prado de Lima

N. USP: 9332998

PRIMEIRAS REFLEXÕES SOBRE A LITERATURA E O POEMA

1) Segundo Antonio Candido em “O direito à literatura” as três categorias

constitutivas da literatura são, respectivamente: construção de objetos autônomos como

estrutura e significado, forma de expressão e forma de conhecimento.

A literatura tem a capacidade de racionalizar a realidade e trascendê-la. Nesse

aspecto, o escritor assemelha-se a um arquiteto, igual a concepção de João Cabral de

Melo Neto no poema “Fábula de um arquiteto”: “A arquitetura como construir portas/de

abrir; ou como construir o aberto;/construir, não como ilhar e prender,/nem construir

como fechar secretos;/construir portas abertas, em portas;/casas exclusivamente portas e

teto.” (MELO NETO, 2008: p. 220). A liberdade do poeta de criar e dar forma ao

pensamento através das palavras faz com que esta construção adquira uma forma

autônoma do mundo das ideias para o mundo sensível. A literatura tem um papel

essencial como função de dar um significado ao abstrato.

A poesia como forma de expressão dos sentimentos e da concepção do indivíduo

do mundo é outra função segundo Antonio Candido. O poeta dispõe-se do vazio da

página, do “mudo convite” como no poema de Ana C, e das palavras para expressar-se.

Segundo Hegel a poesia seria a expressão artística mais elevada pois o poeta interpreta a

fenomenologia da realidade, e através das palavras representa o espiritual no real. Este

poder transcendente da poesia (e de todas outras formas de expressões artísticas) dá ao

artista a sensação anárquica de criação, e o poeta tendo a forma mais autêntica de ser

através da poesia.

A última função referida no texto é a de forma de conhecimento. A literatura por

incorporar a realidade ou no termo platônico o “mundo sensível”, é capaz de transmitir

informações e os conhecimentos já desenvolvidos ao longo da história. A literatura da

primeira metade do século XX em nomes como James Joyce, Virgínia Woolf, Stefan

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Zweig entre outros tece influência direta com os estudos psicanalíticos desenvolvidos e

publicados por Sigmund Freud na época; estes escritores apropiaram-se do fluxo de

consciência para retratar o interior das personagens, suas dúvidas, hesitações e

pensamentos revolucionando a literatura de então. A literatura naturalista que teve como

percursor o escritor francês Émile Zola apoiava-se nas teorias positivistas de Auguste

Comte e na teoria evolucionista de Charles Darwin para digredir sobre a sociedade da

época. A literatura ao absorver o conhecimento gerado desde então é capaz de perpetuar

e dar novas abordagens, transmitindo ao leitor inúmeras formas de interpretação,

proporcionando o conhecimento já gerado, e novas possibilidades.

2) Ao definir os gêneros, Anatol Rosenfold vê o lírico como “expressão de

emoções e disposições psíquicas”, sendo uma manifestação imediata de uma sensação

ou observação do poeta. A memória adquire uma importância maior no genêro lírico,

por ser atemporal e inespacial; ou seja, um poema por mais que esteja no presente,

sempre será um presente subjetivo e alterado a partir da visão enebriada ou lúcida do

poeta. Anatol ainda ressalta que teoricamente não haveria traços descritivos ou

narrativos no lírico, por mais que essa pureza absoluta de genêro seja utópico e eles

sofrerem intermitentemente a influência um dos outros.

Emil Staiger segue uma linha mais idealizada acerca do Lírico. Para ele o poema

seria um “balbucio da língua”, o poeta serviria como “cavalo”, apropiando-se da cultura

da umbanda para a analogia, incorporando um espírito (a inspiração) e escrevendo sobre

esse domínio. Tanto é assim que para ele “quanto mais lírica, tanto mais intocável”

(STAIGER, 1972: p. 22), porque o poeta em seu estado normal, não “incorporado” à

inspiração, não tem a capacidade de alterar algo que transcende a própria capacidade.

A musicalidade e o caráter espontâneo e visceral do Lírico confluem na visão

tanto do Anatol quanto a do Staiger. O imediatismo, a urgência são pontos colocados

especificamente no gênero, pois no dramático e no épico há um trabalho mais racional e

metódico comparando ao lírico.

3) No ensaio “Poesia e pensamento abstrato” Paul Valéry aborda a composição

poética desde seu nascimento que é o “pensamento”, a “derradeira inspiração”. As

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palavras que desabrocham ao longo da criação são palavras reflexo de um fluxo do

poeta que somente no conjunto do todo adquire um sentido, não podendo decompô-las

afim de “destrinchar” o poema tal qual um enigma ou uma expressão algébrica isolando

os termos. O pensamento abstrato emana da própria vida, das experiências; o poeta

através do cotidiano e da observação tem que ser capaz de se espantar e refletir acerca

disso para e transubstanciar em matéria poética.

É observado a multiplicidade do ser, a capacidade de emergir inúmeras vozes e

personalidades como vemos na poesia heterônima de Fernando Pessoa ou na prosa

multifacetada e polifônica de Hilda Hilst. “Penso sinceramente que se todos os homens

não pudessem viver uma quantidade de outras vidas além da sua, eles não poderiam

viver a sua” (VALÉRY, 2007: p. 197). O poeta só é poeta estando no êxtase da

inspiração, em estado de transe sendo que este momento é perfeitamente irregular,

inconstante, involuntário e frágil, totalmente acidental.

O poema pode ser enxergado como uma síntese da poesia e do pensamento,

afinal a linguagem por mais limitada que possa se apresentar e todas as dificuldades que

se impõem, a poesia apresenta a capacidade de traduzir isso em palavras, o que Valéry

irá chamar de “uma linguagem dentro de uma linguagem”, ou a “arte da linguagem”.

No final do ensaio, ele faz uma interessante comparação entre a poesia e a dança,

pois ambas partem de coisas fixas e essenciais (o andar e a fala) mas torna-se um

sistema de atos com o objetivo de expressão e beleza, tendo a tarefa de dar a sensação

do leitor sentir-se unido intimamente entre a palavra e o espírito. O poema sempre

vislumbra incitar a epifania, produzir o “estado poético”, mostrando a inferiodade

humana perante o universo, ou seja, o transcendental.

4) No poema “O rio” de Manuel Bandeira o poeta através da recorrência de

palavras semelhantes tanto no ritmo quanto na sonoridade, dá a impressão de um rio que

é sempre o mesmo, porém com as palavras diferentes, nunca é igual. As palavras

reduplicam no poema como um reflexo do rio.

O rio ainda é um ideal de vida, no processo de refletir sem mágoa, e no â,ago,

na “profundidade” tudo estar tranquilo.

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O lirismo está justamente no que Staiger diz em confluir o tema da poesia com

sua forma, sonoridade e ritmo. Bandeira consegue sintetizar todo “pensamento abstrato”

em poema, transubstanciando o abstrato, em forma, mesmo sendo nas palavras,l ainda

um tanto abstratas.

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BIBLIOGRAFIA:

CANDIDO, Antonio. “O direito à literatura”, Vários Escritos. São Paulo: Ouro sobre

azul, 2004. 272 p.

MELO NETO, João Cabral. “Fábula de um arquiteto”, A educação pela pedra. Rio de

Janeiro: Alfaguara, 2008. 296 p.

ROSENFOLD, Anatol. “Teoria dos genêros”, Parte I, O teatro épico. São Paulo:

Perspectiva, 1983. 184 p.

STAIGER, Emil. “Estilo Lírico: a recordação”, Conceitos fundamentais da poética. Rio

de Janeiro: Tempo brasileiro, 1972. 199 p.

VALÉRY, Paul. “Poesia e pensamento abstrato”, Variedades. São Paulo: Iluminuras,

2007. 220 p.