idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

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Projeto Experimental em Cinema GCV 09030 ÍDICHE NOS TRÓPICOS: O CINEMA RESISTÊNCIA, DAS ORIGENS À CINELÂNDIA IÊDA ROZENFELD Projeto Experimental apresentado como requisito final para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social - Habilitação Cinema - sob orientação do Prof. Dr. João Luiz Vieira e do Prof. José Carlos Monteiro Universidade Federal Fluminense Centro de Estudos Gerais Instituto de Arte e Comunicação Social Departamento de Cinema e Vídeo Niterói, Novembro 2002

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Projeto Experimental em Cinema GCV 09030

ÍDICHE NOS TRÓPICOS:

O CINEMA RESISTÊNCIA, DAS ORIGENS À CINELÂNDIA

IÊDA ROZENFELD

Projeto Experimental apresentado

como requis ito f inal para

obtenção do t í tulo de Bacharel em

Comunicação Social - Habil i tação

Cinema - sob orientação do

Prof . Dr. João Luiz Vieira e do

Prof . José Carlos Monteiro

Universidade Federal Fluminense

Centro de Estudos Gerais

Inst ituto de Arte e Comunicação Social

Departamento de Cinema e Vídeo

Niterói , Novembro 2002

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ii

Para minha bobe Riva e minha sheyne meydl Raquel,

passado e futuro, elos da minha vida.

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iii

“Para que um indivíduo tenha identidade é necessário que possua alguma

espécie de memória. Pois a sua forma ou essência de ser só pode ser compreendida na

perspectiva do tempo e com referência a ele; a forma de ser só se concretiza no ser e

estar no tempo”

Cláudia A.P.Ferreira, Professora Assistente de Língua e Literatura Hebraica do

Setor de Hebraico do Departamento de Letras Orientais e Eslavas da Faculdade de

Letras da UFRJ; Doutoranda em Poética na FL/UFRJ; Mestre em Teoria da Literatura

na FL/UFRJ; Bacharel e Licenciada em Letras (Português-Hebraico) na FL/UFRJ;

Licenciada em História na UFF; em seu artigo "Tradição e transmissão: a questão da

interpretação na tradição judaica" publicado em http://www.estudosjudaicos.com

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iv

Agradecimentos,

sem vocês este trabalho não seria possível, meu muitíssimo obrigada a todos :

Inicialmente gostaria de agradecer ao Sr. Sani Gutman, do Museu Judaico do

Rio de Janeiro, que generosamente cedeu cópias de alguns filmes ídiches e

documentários para que eu pudesse realizar o presente trabalho, assim como todas as

facilidades de acesso ao Jornal Israelita, peça chave para minha pesquisa. Devo

muito também à Susane Worcman - do CIEC/UFRJ - que além de me inspirar, foi

fonte fundamental com sua belíssima pesquisa sobre o Teatro Ídiche. Meus

agradecimentos também ao Sr. Abraham Schneider (in memoriam) que gentilmente

me recebeu em sua residência e me concedeu uma entrevista preciosa. Ao jornalista

Henrique Veltman e Sr. Efrahim Meniuk, com seus importantes depoimentos sobre o

Cine São Carlos. Asa – Associação Sholem Aleichem - pela facilidade de acesso ao

jornal Nossa Voz. Kitty Roisman, organizadora de tantas mostras de filmes judaicos,

pela sua atenção e apoio. Alberto Chatovsky do Grupo Estação pela atenção prestada.

Cláudia A.P.Ferreira pelo empenho em divulgar minha pesquisa e contatar as listas de

discussão sobre assuntos judaicos. Aos meus mestres e orientadores, João Luiz Vieira

e José Carlos Monteiro, que sempre acreditaram na importância do meu projeto e me

ensinaram o caminho da pesquisa e a arte na análise crítica e a quem devo grande

parte de minha cultura fílmica. Finalmente, quero agradecer ao meu marido, Marcelo

Ferreira, companheiro de vida e de luta, que com muito amor e envolvimento soube

compreender a importância da dedicação integral necessária para a conclusão deste

trabalho e que junto, mais uma vez, irá compartilhar comigo esta grande conquista.

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v

sumário

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 1 2. O QUE É IDICHE? .......................................................................................................... 6 3. O CINEMA ÍDICHE E O CINEMA JUDAICO ................................................................ 12 4. ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO ........................................................................................ 17

De 1910 à 1a. Guerra Mundial ................................................................................ 22 Declínio do Czar em 1917 `a chegada do som no cinema em 1929 ...................... 29 Declínio do Czar em 1917 `a chegada do som no cinema em 1929 ...................... 29 Do início do cinema falado em 1929, à meados de 1934 .................................... 32 De 1935 à 2a. Guerra Mundial ................................................................................ 38 Período pós-Guerra, 1945 em diante ..................................................................... 46

5. O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA ............................................................... 49 6. A SOBREVIVÊNCIA DO CINEMA ÍDICHE .................................................................. 64 7. Conclusão ..................................................................................................................... 70

Bibliografia .............................................................................................................. 72 Links ........................................................................................................................ 74 Referências iconográficas ....................................................................................... 75 Anexo 1- Filmografia ............................................................................................... 77 Anexo 2 - População falante de ídiche nos EUA (1990 Census) .......................... 85 Anexo 3 - O último judeu do Éden carioca - por Arnaldo Bloch ............................. 87 Anexo 4 – Cinema no Jornal Israelita ..................................................................... 90

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INTRODUÇÃO 1

1. INTRODUÇÃO

família de imigrantes judeus-romenos na praça onze, Rio de Janeiro, década de 40. Todos falavam o ídiche. (álbum familiar da autora)

Entre as duas Grandes Guerras chegaram ao Brasil imigrantes judeus da

Europa Oriental cuja língua materna era o ídiche. Nas principais cidades do país, onde

se estabeleceram cheios de esperanças e ansiosos por refazer suas vidas, eles

reproduziram, como puderam, suas ligações com o passado. Tudo que representasse

um vínculo afetivo com o mundo que deixaram para trás, era válido, confortador.

Mas, além da língua e da religião, foram duas manifestações artísticas - o teatro e o

cinema - que se tornaram as mais valiosas formas de expressão desses imigrantes nas

diferentes comunidades onde se estabeleceram. Na turbulência das décadas de 40 a

60, eles foram ao mesmo tempo participantes e testemunhas de intensas

transformações políticas e sociais na sociedade brasileira. Sem esquecer, em momento

algum, o elo que os ligava à patria comum. De maneira peculiar, pode-se dizer que os

judeus europeus experimentaram no País vicissitudes similares às de seus

compatriotas em outras partes do mundo, principalmente nos Estados Unidos na

virada do século XX.

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INTRODUÇÃO 2

No Brasil, entre as duas guerras, testemunha-se a constante tentativa de se

estabelecer aqui uma indústria cinematográfica, a partir, por exemplo, de experiências

relativamente bem sucedidas como as da Cinédia (1930), Brasil Vita Filme (1934),

Sinofilmes (1937), Atlântida (1941) e a Vera Cruz (1949). Apesar de inúmeros

sucessos de público, entretanto, a atividade cinematográfica se esforça para sobreviver

em um mercado dominado por produções estrangeiras, majoritariamente norte-

americanas. É em Hollywood que se construiu, com o capital e a imaginação de

imigrantes judeus, uma verdadeira usina de sonhos. A maioria desses judeus era

precedente da Europa Oriental. O rico país do Norte parecia oferecer maiores

possibilidades, e desde cedo atraiu milhares de imigrantes. Mas nessa parte das

Américas, a comunidade judaica conquistou seu espaço - e desenvolveu modos

particulares de sobrevivência e enriquecimento cultural. No Rio de Janeiro, a

Cinelândia e a Praça XI foram pontos de referência dessa efervescência cultural,

registrada em documentos da época, incluindo jornais, fotos, cartazes de peças e

filmes.

“O que mais me chamou atenção era o fato de os imigrantes judeus, pobres e

sem preparo, possuírem um centro na Praça Onze e que também, além disso,

realizavam reuniões culturais, publicavam jornais e revistas e ainda por cima, faziam

um teatro amador, com muita categoria e seriedade."1

Com esta pesquisa, procuramos mergulhar no universo ainda muito pouco

conhecido dos filmes em ídiche para, então, retratar um período da história da

comunidade de judeus da Europa Oriental no Rio de Janeiro sob uma perspectiva de

certo modo original - a reação desse grupo a espetáculos fílmicos exibidos em sua

língua original. Pretendemos mostrar, sobretudo, como um grupo de imigrantes que

saiu de uma Europa dizimada por guerras, crises econômicas e intolerância se

reencontrou nas salas de exibição com hábitos e crenças de seu mundo de origem

retratados nos filmes. E, finalmente, vamos mostrar de que maneira esses imigrantes

buscavam identificar-se com um tipo de produto singular que, muito mais do que os

filmes hollywoodianos, os remetia à sua cultura ancestral através da língua, o ídiche.

Para completar, numa tentativa preliminar, identificamos uma relação desses filmes

projetados na Cinelândia e adjacências.

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INTRODUÇÃO 3

Em centros e organizações judaicas dos Estados Unidos, assim como no

âmbito de universidades, pesquisas dessa natureza buscaram dar conta do cinema

ídiche. O caminho foi aberto. Entre nós, as iniciativas praticamente inexistem -

inclusive em relação ao próprio passado cultural da cidade. Mas, pouco a pouco,

investigadores de diferentes campos mergulham na prospecção da instigante e

atraente história do rico panorama social e intelectual do Rio de Janeiro e de São

Paulo. Nossa pesquisa faz parte dessa iniciativa de redescoberta e recriação. No que

nos diz respeito, foi mais do que estimulante percorrer a geografia dos imigrantes

judeus da Europa Oriental instalados na, então, capital do País. E que, tendo em

comum um passado de opressão e uma língua materna - o ídiche - , desenvolveram

uma intensa vida cultural, com destaque para o Teatro e o Cinema.

Essas duas manifestações artísticas funcionaram como meio de aproximação e

promoção. Artistas amadores encenaram dezenas de peças em ídiche no Rio de

Janeiro. E, contrário do que se poderia imaginar, não eram encenações "fechadas",

mas abertas ao público nos melhores teatros cariocas, como o Recreio, o Carlos

Gomes, o Regina (atual Dulcina) e a Maison de France. No coração da Cinelândia,

mais precisamente no antigo Cine São Carlos (atual Orly), a apresentação de filmes

ídiches mobilizava mais de 400 pessoas por sessão. Alguns dos títulos exibidos -

centenas, entre os anos 40 e 50 - foram mostrados para platéias lotadas. Esse dado é

significativo, porque na Cinelândia se concentravam as principais salas exibidoras do

Rio de Janeiro, todas lançadoras dos grandes espetáculos de Hollywood e da Europa.

Embora não figurasse no rol dos "templos do consumo cinematográfico",

como os exuberantes Metro-Passeio, Palácio e Vitória, ou os mais modestos Plaza,

Pathé ou Império, o Cine São Carlos tinha espaço próprio, veiculando boa parte da

produção européia para um público cosmopolita na origem e no gosto fílmico, apesar

da hegemonia hollywoodiana. Em nossa pesquisa, essa sala discreta, mas calorosa,

emerge como um importante território de confraternização de uma comunidade (a

judaica) com sua expressão cinematográfica (o cinema ídiche). Recordar a história

dos filmes falados em ídiche no Rio de Janeiro é, igualmente, relembrar a

contribuição do Cine São Carlos. Ambos inseridos em um contexto generoso,

receptivo, distante daqueles do Velho Mundo, onde os tambores da guerra ecoavam 1 Depoimento de Suzane Worcman em seus estudos sobre Teatro Ídiche no Brasil

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INTRODUÇÃO 4

(re)lembrando uma época e uma mentalidade hostis e opressivas. Este trabalho

pretende dar conta, ainda que inicialmente, de parte desta história.

Na primeira parte faço considerações sobre a semiologia e a natureza da língua

ídiche, com alguns apectos sociológicos e semióticos da comunicação ídiche e seus

componentes estruturais.

Em seguida apresento a filmografia ídiche, desde suas origens, a partir de um

contexto cronológico macro, bem como tento caracterizar seus traços temáticos e

estilísticos mais proeminentes. O objetivo não é analisar detalhadamente os filmes

ídiches em si, mas apresentá-los como ponto de partida fundamental para reflexão

sobre o comportamento de uma nova estrutura social que se formava após a 2a.

Guerra Mundial; composta de imigrantes oriundos pequenas cidades e aldeias rurais

na Europa e chegando às grandes cidades da América. A expulsão de sua terra, o

choque de culturas, as esperanças de uma nova "Terra Prometida", a busca da

identidade, os medos e sonhos diante do desconhecido; todos estão presentes, de certa

forma, nos filmes apresentados.

Todo este contexto apresentado até então, orienta nosso trabalho para seu

objetivo maior: investigar a presença e o significado do cinema ídiche no Rio de

Janeiro, em especial a partir de uma sala de exibição na Cinelândia. Para tal fim,

como metodologia de trabalho, foram realizadas pesquisas na internet, ferramenta que

permitiu localizar arquivos de filmes ídiches no mundo todo e pessoas que prestaram

depoimentos. Também foi feito um levantamento de instituições de guarda e

preservação destes filmes. Foram gravadas algumas entrevistas com pessoas ligadas à

manifestações culturais em ídiche. Através de pesquisas no Museu Judaico do Rio de

Janeiro ( Jornal Israelita ) e na Associação Sholem Aleichem ( jornal Nossa Voz )

foram identificadas as datas e filmes exibidos, e com estes dados foram feitas algumas

checagens na imprensa da época (O Correio da Manhã e A Noite) no Arquivo

Nacional. Os filmes exibidos no Brasil sofreram um trabalho de identificação a partir

dos atores/diretores consultando-se a bibliografia, pois muitas vezes o nome em

português não correspondia à tradução literal. Por fim, foi organizada a filmografia,

cruzando os dados da filmografia publicada em 1975 no livro Laughter Trough Tears,

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INTRODUÇÃO 5

com o Internet Movie Database e com outros bancos de dados provenientes do próprio

processo investigatório.

O resultado concreto da pesquisa é apresentado a partir de documentos e

depoimentos que comprovam a exibição destes filmes no Rio de Janeiro, e que, tão

distantes de suas origens de produção aproximavam pessoas com um passado em

comum. Mais do que isso, significavam sua memória, o registro em película de sua

história. Enfim, esperança que a sua herança, através da imagem de seu povo e suas

tradições, seria preservada.

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O QUE É IDICHE? 6

2. O QUE É IDICHE?

Judias Romenas da cidade de Iedenitz, antes da 2a. Guerra Mundial

Os filmes judaicos que investigamos neste trabalho têm como peculiaridade a

língua: todos são falados em ídiche ou inspirados em temas de cultura ídiche.

A língua Ídiche (Yiddish) constituiu o principal vernáculo dos judeus

Asquenazitas na Europa. Esta comunidade representava cerca de noventa por cento da

população judaica no mundo no final do século XIX. Sendo uma das línguas

germânicas, o ídiche é escrito com letras hebraicas (algumas usadas de forma

diferente das usadas na escrita hebraica). O Ídiche (que significa "judeu") surgiu entre

os séculos IX e XII no sudeste da Alemanha como uma adaptação de dialetos

germânicos, atendendo às necessidades especiais da população judaica. Segundo o

especialista Benjamin Harshav, o ídiche "chegou à maioridade como força cultural

nos últimos quinhentos anos e gerou uma fascinante literatura nos recentes cento e

cinquenta anos". À língua alemã original, foram adicionadas palavras hebraicas que

pertenciam à vida religiosa e ao cotidiano judaicos. Mais tarde, quando grande parte

da população européia judaica migrou para áreas ocupadas predominantemente por

povos de língua eslava, novas influências foram assimiladas. O vocabulário do Ídiche

falado na Europa Oriental durante os tempos mais recentes compreende 85 por cento

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O QUE É IDICHE? 7

de alemão, 10 por cento de hebraico e cinco por cento de eslavo, com traços de

romeno, francês e outras línguas e dialetos.

Na maioria dos filmes falados em ídiche, o público percebia uma inflexão

centro-européia, ainda que em alguns títulos houvesse uma ênfase do ídiche à

americana. Essas diferenças de acentos são perfeitamente explicáveis - e

compreensíveis. E correspondiam a um fenômeno linguístico natural. Assim como

ocorreu nos EUA e em outros países em relação à língua inglesa, o vocabulário ídiche

no Brasil assimilou muitas palavras de origem portuguesa. Essa absorção aconteceu

naturalmente, como resultado do processo de adaptação cultural dos imigrantes à terra

que os acolheu. A despeito dessas mudanças e assimilações ao vocabulário geral, o

ídiche moderno se diferencia do idioma alemão moderno principalmente na

simplificação de inflexões e sintaxes e na aquisição de alguns traços gramaticais

influenciados pelo discurso eslavo. A pronúncia de palavras germânicas obedece a

uma forma menos rígida, mais relaxada, significantemente influenciada pelas línguas

Eslavas. Na sua formação de palavras e utilização de verbos auxiliares, o ídiche é

similar ao inglês, que também é uma língua de origem germânica com uma gramática

simplificada.

Nos filmes europeus e americanos que têm como personagens judeus em

épocas mais ou menos remotas, o ídiche é empregado por vezes quase como

estereótipo, um clichê linguístico e étnico.

O ídiche pode ser classificado em dois grupos de dialetos:

· O dialeto com poucos representantes, baseado nas áreas em que se fala o

Alemão na Europa Ocidental.

· O mais largamente distribuído grupo da parte Oriental se subdivide no

ramo do nordeste e no ramo do sul. O ramo do nordeste inclui o Ídiche falado nos

países Bálticos e áreas do noroeste da Rússia, por judeus imigrantes ou descendentes

destas áreas.O ramo do sul inclui os dialetos falados na Polônia, Romênia e Ucrânia.

O ídiche é uma língua muito plástica, visual e assimilativa, rica na mistura de

idiomas, possuindo muito frescor, essência e pungência. Como era falado por pessoas

comuns, e não por letrados e eruditos, o seu vocabulário é pequeno se comparado a

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O QUE É IDICHE? 8

outras línguas e fraco em abstrações. Pela mesma razão, tem poucas palavras

descritivas da natureza com a qual os judeus da Europa Oriental tinham relativo pouco

contato, porém é rica em expressões e termos descritivos do caráter das pessoas e de

suas relações. As palavras individualmente podem ser muito simples, mas sua

interrelação fazem-no rico, irônico e plurisignificativo. Assim, faz uso deliberado de

diminutivos e termos emotivos, exibindo peculiarmente uma variedade de pragas,

maldições e exconjúrios. O uso de provérbios e expressões oriundas é considerável.

Estes provérbios abordam vários assuntos, pois ao tratar desde os fatos domésticos do

cotidiano até as mais altas aspirações humanas, revelam a filosofia, sabedoria e

cultura que contribuíram para preservar a identidade do povo judeu ao longo de

milênios de sofrimento, aflição, expropriação, expulsão, perseguição e holocausto.

Através de seus provérbios metafóricos (“a beyze tsung iz erguer fun a schtarker hant”

– literalmente “uma língua viperina é pior do que uma mão forte”e adaptando – “A

maledicência é pior do que um tapa”), ou idiomatismos talmúdicos (“es schitn zikh im

perl fun moyl” – literalmente “pérolas que saem de sua boca”) ou poemas rimados

misturando hebraico e ídiche (“bemoken scheyn isch / iz a hering oykh a fisch” –

“Onde não há homens arenque também é peixe”2) realizamos as qualidades e usos que

dão ao ídiche uma característica única, muito pessoal e calorosa.

No começo do século XX o ídiche havia extrapolado o seu status de dialeto em

virtude da emergência dos partidos políticos judaicos. Em 1908, na Conferência de

Czernowicz, as cisões se aprofundaram e as correntes ideológicas se afrontaram,

ficando bem clara a divisão entre os que defendiam o ídiche e os que defendiam o

hebraico, como a língua judaica. A partir dessa conferência, o ídiche passou a ser

considerado como uma língua nacional judaica. Houve um grande renascimento na

literatura escrita neste idioma e um extraordinário desenvolvimento do jornal ídiche.

Em 1925, o linguista Max Weinreich criou o YIVO - Instituto Científico

Judaico (também conhecido como Instituto Científico do Ídiche), que padronizou a

língua, tornando este o idioma de ensino e de cultura judaica, em pé de igualdade com

2 o locutor ídiche não se preocupa com a categoria biológica do arenque, porém com sua função no

costume culinário religioso, pois do arenque não se pode fazer o “guefiltefisch”, prato típico das festas. Socialmente,

o arenque era considerado um alimento de pessoas pobres, assim como o ídiche uma língua popular. Faz-se então

uma ironia, contrapondo o hebraico dos cultos e estudiosos da Torá (bemoken scheyn isch) - com o arenque ídiche

– (iz a hering oykh a fisch) .

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O QUE É IDICHE? 9

os idiomas dos países que acolheram os judeus em sua diáspora. O objetivo era elevar

o idioma, considerado até então como simples dialeto adaptado de germanismos,

eslavismos, hebraísmos e outras influências, ao que ele chamou de “língua de fusão”.

Weinreich fundamentou as estruturas e processos do ídiche que o faziam uma língua

unificada, apesar de aberta. Segundo Harsav, esta abertura da língua a mantinha em

constante mutação “absorvendo maior ou menor número de elementos de seu léxico,

conforme o grupo de falantes, o gênero de discurso e as circunstâncias. Pois o ídiche

era quase por definição, uma língua usada por locutores multilíngues”. 3 Em seu

estudo “O Significado do Ídiche” (1990) , Harshav nos mostra que as oportunidades

de assimilação no século XX, seja nas Américas, seja na então União Soviética, eram

tantas, que dificilmente o ídiche sobreviveria como uma língua de massa: “Em

nenhuma dessas duas dinâmicas sociedades houve base territorial e social para uma

cultura autônoma da minoria judaica e para uma nova cadeia de transmissão à futuras

gerações”.

Estima-se que em 1939 a população judaica chegava a 17 milhões, na Europa,

dos quais quase 10 milhões falavam ídiche. Viviam basicamente nas cidades e nos

vilarejos (os shtetls4) da Europa Oriental e na região da extinta União Soviética,

cercados de intenso yidishkait5. O uso da língua vem diminuindo sensivelmente desde

então. A causa inicial foi o extermínio de comunidades judaicas na Polônia e em

outros países da Europa Oriental durante a 2a. Guerra Mundial. O holocausto, como

sabemos, foi um golpe fatal para para esta língua. Dos 6 milhões de judeus

exterminados, mais de 5 milhões era idichistas. Outro fator que contribuiu para este

declínio de uso foi a adaptação dos judeus às línguas predominantes nas Américas e

na União Soviética. Segundo o censo6 realizado nos Estados Unidos em 1990, estima-

se que existam apenas 213.064 falantes da língua neste país.

3 O Significado do Ídiche. pag. 30. 4 aldeias judaicas da Europa 5 Esta palavra engloba tudo o que significava ser judeu, quer fosse a prática da religião, o estudo dos

textos sagrados, comer a comida judaica tradicional daquela região, viver, sofrer, amar e rir de forma judaica, ou

melhor dito, de "forma idiche". 6 Vide anexo 1. Yiddish in USA (1990 Census). Os dados da utilização do ídiche como língua resultam do

questionário “Idioma falado em casa” do censo Norte-Americano de 1990. Entrevistados nascidos antes de 1º de

Abril de 1985 e que “eventualmente ou sempre falam ídiche em casa” foram computados. Aqueles que falam ídiche

somente na escola ou cujo vocabulário se limita à algumas expressões não foram computados. -

http://www.ibiblio.org/yiddish/library/. Não foi encontrada pesquisa semelhante no Brasil.

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O QUE É IDICHE? 10

Há várias palavras em ídiche que foram completamente integradas ao inglês,

fazendo parte dos dicionários norte-americanos e ingleses, como shlep (arrastar, fazer

algo contra a vontade), shlepper (pessoa desmazelada, mal arrumada, sem posses),

chutzpa (atrevimento), gonef (ladrão), bubeleh (vovozinha, bonequinha, queridinha),

mavin (sábio), shlemazel (um pobre coitado, sem sorte), shmatte (um trapo, uma

porcaria e que, por afinidade, virou sinônimo de roupas baratas, ou confecções, um

ramo do comércio ao qual muitos judeus que falavam ídiche se dedicaram), beatnik7

(onde –nik é um sufixo nominalizador proveniente do eslavo) e muitas, muitas outras.

Ou até mesmo expressões completas , puramente em ídiche, que foram traduzidas ao

inglês, reproduzindo o colorido sarcasmo em que o ídiche é tão rico, e fazem parte do

cotidiano do inglês, como "Big deal!" ("grande coisa...") ou "Get lost!" ("Some

daqui!").

Em 1984, um dicionário ídiche-russo contendo ensaios em etmologia e

gramática foi publicado na Rússia. Desde então alguns livros de escritores judeus

russos têm sido escritos em ídiche. Em Israel o hebraico é a língua predominante, e o

ídiche é a 2a. língua, cultivada largamente pelos membros das gerações mais antigas

que têm um passado euro-oriental; apenas alguns poucos poetas israelenses modernos

escrevem em ídiche. Sosha, de Isaac Basevis Singer, é considerado um ícone da

literatura ídiche moderna e ganhou o prêmio Nobel de 1978.

Em um esforço para garantir sua preservação, a Universidade Hebraica de

Jerusalém leciona o Ídiche, assim como o fazem algumas escolas nas Américas. No

Rio de Janeiro, até a década de 60 aprendia-se o ídiche em escolas tradicionais

judaicas como o Scholem Aleichem. O Instituto YIVO para pesquisas judaicas,

fundado na Polônia na virada do século XIX e transferido para Nova Iorque em 1940,

inclui estudos sobre o desenvolvimento da língua ídiche como parte de seu esforço

para preservar a história da cultura e dos vilarejos da Europa Oriental. Atualmente a

CAT/NYU (New York University's Center for Advanced Technology) desenvolve

um projeto multimídia de biblioteca digital da memória do cinema ídiche, com o

objetivo de disponibilizar música, filmes e um banco de dados via internet.

7 A expressão "geração beat" ficou famosa ao ser usada em um artigo do New York Times.

Nick, que em ídiche significa inho ou zinho, num sentido pejorativo, passou a ser usada pela grande jornal

quando se referia aos beats: beatniks.

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O QUE É IDICHE? 11

Com erudição e amplitude de espírito, Benjamin Harshaw situa a questão da

natureza e da transformação do ídiche dessa maneira:

O ídiche, que não é mais a língua viva de uma sociedade viável e Inteligente, ainda paira sobre o horizonte de ontem e invoca várias ansiedades: temor de identificação, distância depreciativa ou nostalgia. A questão, entretanto, não deve ser vista como a de continuidade ou identidade. A maioria das grandes realizações da cultura ocorreu em idiomas de épocas diferentes da nossa: a língua da tragédia grega e a da poesia hebraica na Espanha medieval não estão vivas hoje em dia; o mundo de Shakespeare não é, por certo, o do nosso mundo contemporâneo. Capítulos encerrados da história, elas oferecem não obstante obras-primas da cultura, importantes para nós como universos ficcionais que alargam nossos horizontes de imaginação e o nosso senso de passado. A cultura ídiche foi um dos píncaros de criatividade judaica nos últimos dois mil anos. Ela pode não ter continuidade no futuro, porém é interessante e gratificante por si própria.

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O CINEMA ÍDICHE E O CINEMA JUDAICO 12

3. O CINEMA ÍDICHE E O CINEMA JUDAICO

Os historiadores mais isentos concordam num ponto irrefutável: o cinema

norte americano, Hollywood em particular, deve muito de sua existência à

contribuição judaica. Em várias frentes, na produção e na distribuição, na confecção e

na ideologia, os imigrantes judeus da Europa Central imprimiram sua marca,

veicularam seu imaginário. Na época silenciosa, os pioneiros que atendiam por nomes

autênticamente judaicos (Yosele Rosenblatt, Sophie Tucker, Eddie Cantor, George

Jessel, Molly Picon) ou, no sonoro, os consolidadores que tentavam disfarçar a origem

adotando nomes americanos (Al Jolson, Sam Warner) não ocultavam sua identidade

judaica. A chamada Meca do Cinema era, também, indisfarçavelmente, uma Canaã

para os judeus que chegaram ao Novo Mundo (a América) em busca de

oportunidades. Muitos tiveram - ou construíram - a oportunidade de oferecer aos

Estados Unidos e ao Mundo a mais espetacular forma de entretenimento do século

XX. Dos estúdios fundados na Costa Oeste, saíram milhares de filmes para levarem às

salas de exibição de todo o planeta um certo ideário judaico - falado em inglês. O

humor ídiche-judaico pode ser identificado em alguns dos maiores nomes

representantivos da comédia norte-americana: Dos Irmãos Marx a Charlie Chaplin, de

Zero Mostel a Mel Brooks, de Gene Wilder a Woody Allen , sem esquecer de Jack

Benny, Danny Kaye, Tony Curtis, Jerry Lewis, Walter Matthau, Marty Feldman e

Sid Caesar, para citar apenas alguns.

Com a chegada do cinema sonoro, em 1927 a Warner lança O Cantor de Jazz

(The Jazz Singer; Alan Crosland, 1927), baseado em história de Samson Raphaelson e

estrelado por Al Jolson, com roteiro semelhante à Baruch de Dupont, que conta a

história de um chazan8 judeu que fica dividido entre a vocação religiosa e a paixão

pelo Jazz. Curiosamente, quase dez anos depois, em 1939 é lançado Der Vilner Shtot

Hazan (Overture to Glory; Max Nosseck,1939), com Moishe Oysher no papel de um

chazan que retorna ao shtetl em busca de redenção após ter abandonado a religião

para ser cantor de ópera em Varsóvia.

8 Cantor religioso das sinagogas

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O CINEMA ÍDICHE E O CINEMA JUDAICO 13

Moishe Oysher em Der Vilner Shtot Hazan (Overture to Glory; EUA, 1939), como um chazan da Sinagoga de Vilna. Ao contrário do The Jazz Singer, ele deixa sua família e religião para se transformar em um famoso cantor da Ópera de Varsóvia. Entre a culpa e o sucesso, resolve voltar para sua comunidade. Considerado o filme com cenas mais realistas sobre os cultos em sinagogas, o filme inicia com o culto do Rosh Hashana 9e termina com o Kol Nidre10, formando uma das mais representativas rimas da cinematografia ídiche.

No documentário Hollywoodismo - Judeus, Cinema e um Sonho Americano

(Hollywoodism: Jews, Movies and the American Dream; Simcha Jacobovici,1998),

Helpern e Jacobovici tentam traçar uma conexão entre os gêneros que se firmavam

nesta época nos grandes estúdios e as origens culturais judaicas de produtores como

os irmãos Warner, Harry Cohen, Carl Laemmle, Louis B. Mayer e Sam Goldwyn,

entre outros. Eles defendem a idéia de que os fundadores dos estúdios que

construíram Hollywood nos primórdios do século XX eram judeus que através de seus

filmes indiretamente tentavam reconstruir uma imagem de seu próprio passado nos

shtetls. Ainda segundo Helpern e Jacobovici, produziram obras que mesclavam suas

origens, preocupações e costumes judaicos , pontuados por temas universais e de

valores de uma classe média Americana aceitos popularmente. Assim obras como

Vinhas da Ira (The Grapes of Wrath; John Ford, 1940) , A Mulher Faz o Homem (Mr.

Smith Goes To Washington; Frank Capra, 1939) e Sangue de Artista (Babes in Arms

(Busby Berkeley, 1939) seriam exemplos que embutiam a história da determinação

judaica, personagens como a ídiche mamme e a luta contra o preconceito. Clássicos

como Frankenstein (James Whale, 1931), O Que a Carne Herda (Pinky; Elia Kazan e

John Ford, 1949), King Kong (Merian C. Cooper e Ernest B. Schoedsack, 1933),

Super Homem (Superman, Spencer Gordon Bennet e Thomas Carr, 1948) e Minha

9 Ano Novo Judaico 10 equivalente à missa de 7o. dia católica

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O CINEMA ÍDICHE E O CINEMA JUDAICO 14

Bela Dama (My Fair Lady; George Cukor, 1964) seriam outros exemplos que

possuíam o sentimento de rejeição e o desejo de aceitação por uma nova sociedade. O

western seria uma referência aos pogroms sofridos nos shtetls da Europa Oriental.

Com o passar do tempo, este distânciamento progressivo entre as produções de

Hollywood e os temas genuinamente judaicos se evidencia. Segundo Goldberg11, os

grandes estúdios de Hollywood foram abandonando as produções de cunho

evidentemente judaico por produções cada vez mais sofisticadas e distantes da cultura

da população de imigrantes judeus.

Mas o auto-retrato do judeu neste cinema hollywoodiano que se articulava,

sempre tendeu ao caricato, à uma tipificação onde os personagens seguiam um clichê

pré-estabelecido. O desejo profundo de aceitação por esta nova sociedade que lhes

acolhia e a crescente assimilação da nova cultura, fizeram com que estas produções

raramente enfrentassem as questões judaicas de forma aberta e vigorosa, inclusive o

anti-semitismo sofrido na própria América. Depois da guerra, o anti-semitismo

americano é examinado em filmes como A Luz é Para Todos (Gentleman’s

Agreement; Elia Kazan, 1947) e Rancor (Crossfire; Edward Dmytryk, 1947).

"Mas o cinema falado integralmente em ídiche, com fisionomia própria e sem

o espírito comercial da produção hollywoodiana, era outra coisa. Havia uma literatura

ídiche, um teatro ídiche, um jornal ídiche - porém, nos primórdios dos anos 30, em

plena ascensão do sonoro, um cinema ídiche parecia ainda inviável, ou invisível. “A

imagem do judeu no cinema americano só é um problema porque ele será sempre,

necessariamente, um tipo enquanto for tratado como judeu.”12 O cinema ídiche não

apresentava este problema, pois todos personagens eram judeus.

Meteórico e misterioso, ignorado e marginalizado, o cinema ídiche se

desenvolveu na primeiras décadas do século XX. Segundo Sadoul13, entre a duas

grandes guerras o cinema ídiche pouco prosperou, sendo os principais polos de

produção a Polônia e os Estados Unidos, realizando filmes para as comunidades

11 Laughter Trough Tears , The Yiddish Cinema , Associated University Presses, 1983 12 Bernardo Carvalho na matéria “Retrospectiva revê a imagem dos judeus em filmes feitos por judeus”,

Seção Ilustrada, Folha de São Paulo, 17/12/1991. 13 História do Cinema Mundial – volume II – Livraria Martins Editora – pag. 486

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O CINEMA ÍDICHE E O CINEMA JUDAICO 15

locais. Com uma produção que se destinava aos últimos judeus que ainda cultivavam

na vida cotidiana aquela língua antiga e minoritária, diferente tanto da linguagem

religiosa (das preces e da Torah14) como da língua oficial dos países que acolheram os

imigrantes.

Mas por outro lado, esse cinema condenado ao esquecimento carregava dentro

dele a força de uma tradição narrativa e de um teatro de extraordinária vitalidade, que

deixaria traços irremovíveis na cultura judaico-americana. E também porque

contribuiu para transmitir a contrastante herança da Haskalá – um movimento que, na

prática, equivalia a uma espécie de iluminismo, ou ao menos às exigências de uma

renovação – e aquelas influências, mais recentes, do socialismo e do sionismo. Mas

esse movimento conservava, ao mesmo tempo, certas formas de religiosidade

profunda, como a do Hassidismo. Isso fica demonstrado no sugestivo A Alma Errante

(Der Dibbuk; Michael Wasynski, 1937) 15, filme realizado em 1937-38 em Varsóvia

por Mikhail Waszynski a partir do drama homônimo de An-Ski e AlKacyzny, que

começa numa sinagoga de um pequeno shtetl com a materialização de um mensageiro

portador de dons, e que funcionava quase como um emblema da transmissão da

herança do passado e dos ecos jamais silenciados do Sagrado. Os filmes tinham uma

linguagem teatral e eram baseados, na sua maioria, em obras literárias já consagradas.

14 Bíblia sagrada, antigo testamento 15 Esta peça também deu origem ao Caso Especial “Dibuk, o demônio” - com Regina Duarte e José

Wilker em 1972

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O CINEMA ÍDICHE E O CINEMA JUDAICO 16

sequência inicial de “Der Dibbuk” (Varsóvia, 1937-38)

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 17

4. ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO

Molly Picon em East and West ( Mazal Tov; Sidney Goldin,1923)

O cinema ídiche nasceu de pessoas que tentavam manter vivos sua cultura,

língua e memórias de um passado de opressão, pobreza e lutas nos shtetls.. Para os

imigrantes que chegavam na América e para aqueles que permaneceram na Europa, os

filmes ídiches preenchiam uma necessidade de diversão e identificação. Segundo

Hoberman, não era apenas um cinema nacional sem uma nação-estado, mas um

cinema nacional que, a cada exibição, criava a sua própria e efêmera pátria.

Nomes de produtores independentes como Joseph Seiden e Joseph Green

deram a esta audiência o que eles buscavam: filmes falados em ídiche que contavam a

história da classe operária de imigrantes lutando por uma vida melhor. Era um cinema

simples para um povo de origem humilde e camponesa. Em sua maioria, os filmes

tinham um público limitado aos imigrantes, que foi diminuindo com o tempo. Razões

que explicam o declínio e as produções de baixo custo. Mas a falta de sofisticação

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 18

técnica e ousadia não se justificavam apenas pela falta de investimento financeiro. Era

uma platéia pouco exigente em matéria de refinamento de linguagem fílmica,

acostumada com o teatro e o vaudeville e que se satisfazia com alguma história

melodramática com final feliz. Eram filmes carregados de ingenuidade e esperanças ,

como seu próprio público. Feitos sob medida para pessoas pouco requintadas, sempre

perseguidas e oprimidas, estrangeiros onde quer que estivessem, com uma

necessidade de aceitação comparável à força de suas tradições.

A composição de imagens e planos é quase sempre teatral; câmera parada, ao

nível do olho, personagens típicos. A edição segue o modelo clássico de

transparência. Os recursos cinematográficos um pouco mais rebuscados, quando

utilizados, são tradicionalmente empregados apenas para conotar passagem de tempo,

mudança de lugar ou sonhos (fusões e fades). Imperam os melodramas familiares e

comédias musicais. Não são filmes elaborados em termos de linguagem fílmica,

porém muito próximos do dia a dia e da cultura de seus espectadores, o que nos dias

de hoje, lhes dá um cunho quase documental de uma época e uma língua que não

existem mais. O cinema ídiche não é algo que se desenvolve na tela: ele acontece no

coração dos espectadores.

A maior parte da produção cinematográfica ídiche foi realizada até a década de

40, basicamente em quatro países: Estados Unidos, Polônia, Áustria e a então União

Soviética. Muitos destes filmes sequer foram catalogados e sua existência se perdeu

juntamente com a memória daqueles que os viram. Apesar de pesquisadores

afirmarem que foram produzidos cerca de 300 filmes, incluindo longa e curta

metragens, atualmente existem apenas 113 listados no IMDB16.

As raízes de uma então modesta indústria de filmes ídiche que se formava

estavam no movimento de teatro ídiche, inovador, ousado e muito vivo nos Estados

Unidos e na Europa Oriental. Seu surgimento data de 1876 na Romênia, então

Bassarábia, e era a principal forma de diversão dos judeus da Europa Oriental. Nos

anos de 1880 durante a grande emigração de judeus da Europa Oriental, muitos atores

e companhias de teatro ídiche se espalharam pelo mundo e era possível identificar

movimentos deste teatro nos Estados Unidos, América do Sul, África e onde quer que

16 internet movie database - http://www.imdb.com

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 19

uma comunidade de imigrantes judeus se fixasse. Nos Estados Unidos, mais

especificamente em Nova Iorque, a primeira apresentação de teatro profissional ídiche

data de 1882. Segundo Worcman, os primeiros documentos que temos de uma

apresentação do teatro ídiche no Brasil são de 23 de julho 1913 em São Paulo, no

teatro São José e um documento de censura de 1916 no Rio de Janeiro.

Eram comuns companhias de teatro ídiche profissonal residentes nas maiores

cidades européias, como a Trupe de Vilna e o VYKT Varsaw Ydish Kunst Theater

(Teatro de Arte Ídiche de Varsóvia). Muitas peças clássicas destas trupes deram

origem à filmes, que preenchiam as lacunas entre suas turnês. Para uma platéia ávida

de diversão que remetesse às suas origens, assistir a um filme que mostrava a

encenação de uma peça era o mesmo que assistir à peça propriamente dita. Para os

atores acostumados com o teatro, estes filmes não tinham o mesmo peso artístico das

peças encenadas; significavam uma renda extra e fácil, a ser ganha entre os ensaios de

uma nova peça ou mesmo no fim de alguma temporada. A maioria era filmada no

próprio teatro em apenas algumas horas. Atores e atrizes de teatro sequer notavam a

presença da câmera, sempre fixa, como é o caso de Ida Kaminska, da famosa trupe

Kaminsky da Polônia, que apesar de ter participado de diversos filmes desde a década

de 1910 - O Pai Cruel (Der Vilder Fater; Alexander Marten, 1911) teria sido o

primeiro - afirmava que sua estréia no cinema tinha sido A Pequena Loja na Rua

Principal (Obchod na Korze; Ján Kadár,1965) ganhador do Oscar de melhor filme

estrangeiro de 1966 e menção honrosa para Ida e Jozef Kroner no Festival de Cannes

em 1965. Ida Kaminska (1899-1980) fez seu debut teatral aos sete anos de idade. Em

1916 já era membro da Trupe de Vilna, que ficou famosa por suas produções teatrais

em ídiche e representações de clássicos de autores europeus. Ela e seu primeiro

marido, Zygmunt Turkow – que juntamente com Ziembinski foi uma personalidade

oriunda do teatro ídiche que teve uma passagem marcante no teatro Brasileiro - ,

criaram em 1923 o VYKT Varsaw Ydish Kunst Theater (Teatro de Arte Ídiche de

Varsóvia). Depois da guerra, ela e seu segundo marido, Meir Melman, fundaram o

Jewish State Theater em Varsóvia.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 20

Esther-Rokhl Kaminska – a Deusa Judia - e Ida Kaminska. Mãe e filha, no cemitério de Vilna em “Tkies Kaf” (Polônia, 1924), dirigido por Zygmunt Turkow.

As vicissitudes dos judeus, seu irriquieto nomadismo, marcam o cinema

ídiche. Der Purimshpiler (Joseph Green e Jan-Nowina Przybylski, 1937) de Joseph

Green, é ambientado em um circo ambulante. Um Bilhete para Mamãe (Brivele Der

Mamen; Joseph Green, 1937/1938), também de Green, mostra uma mulher e seu filho

se reunindo antes da partida do rapaz para encontrar o pai na América. Yidl Mit'n Fidl

(Joseph Green e Jan-Nowina Przybylski, 1937), de Green, musical alegre, que foi o

maior sucesso comercial da cinematografia ídiche, trata igualmente da busca de novas

terras e de uma mulher que precisa se vestir de homem para tocar violino em uma

trupe. Tevie, o Leiteiro (Tevya; Maurice Schwartz,1939), dirigido por Maurice

Schwartz, mostra as agruras de um homem expulso de sua terra natal pelas

autoridades locais.

Mas há outros temas, nas comédias mais fáceis, como a troca de pessoas, pais

que romanescamente reencontram filhos que não conheciam, casamentos acertados a

longa distância por pessoas que, depois, descobrem ser do mesmo sexo - Jewish Luck

(Alexis Granovski,1925/1926). Pensa-se assim que todo o corpus do cinema ídiche

seria uma espécie de inconsciente preparação para revisitações americanas recentes,

como o transformismo sexual de Yentl (Barbra Streisand, 1983) ou o camaleonismo

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 21

triunfal de Zelig (Woody Allen, 1983).17 Neste último, Woody Allen é, com diria

Inácio Araújo18, uma expressão típica do humor ídiche: rápido, cortante, baseado num

uso imaginoso do idioma e, sobretudo, tomando a sí próprio como objeto.

Criado inicialmente para uma platéia que tinha o ídiche como língua nativa, a

gama de filmes ídiches inclui, além dos filmes falados na língua, filmes mudos com

intertítulos em ídiche. Alguns falados em hebraico e inglês são considerados parte

deste acervo, devido às circunstâncias de produção e temas abordados. Todos eles têm

em comum a inspiração clara no teatro ídiche, de onde herdaram muitos temas, atores

e companhias. Cronologicamente, podemos dividir a história da produção

cinematográfica ídiche em cinco períodos distintos, a saber:

De 1910 à 1a. Guerra Mundial,

Decadência do Tsar em 1917 `a chegada do som no cinema em 1929,

Do início do cinema falado em 1929, à meados de 1934,

De 1935 à 2a. Guerra Mundial,

Período pós-Guerra, 1945 em diante.

17 Prof. José Carlos Monteiro 18 Inácio Araújo na matéria “MIS reúne filmes que retratam cultura iídiche”, Folha de São Paulo,

25/04/1990.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 22

De 1910 à 1a. Guerra Mundial

Sala de cinema na Bielorússia em 1914

Até a 1a. Guerra Mundial os judeus eram considerados na Europa cidadãos de

2a. classe. Entre 1881 e a 1a. Guerra Mundial cerca de um terço da população judaica

(aproximadamente 2 milhões) emigrou para a América. Em 1897 a população Russa

somava 126 milhões de cidadãos, dentre os quais apenas 5 milhões eram judeus e

ficavam restritos, por lei, à regiões pré-estabelecidas para sua moradia. Além da

proibição de se estabelecerem em outras áreas eram proibidos também de trabalhar

aos domingos e nos feriados Cristãos. Apenas 3 a 7 por cento de judeus eram

permitidos nos departamentos das universidades. A polícia Russa fiscalizava

rigorosamente estas quotas e determinações e qualquer judeu estabelecido fora da área

pré-determinada era preso ou deportado. Em algumas cidades eram oferecidos

prêmios para quem denunciasse ou fornecesse informações que levassem aos

moradores ilícitos. O anti-semitismo era fortíssimo e desembocava em sanguinários

pogroms onde famílias eram atacadas, casas destruídas e judeus presos e mortos.

Neste contexto emerge um forte sentimento de união e nacionalismo judaicos,

resultando em um renascimento cultural de fortificação das origens. Surgem nomes

como Mendele Mocher Seforim, Isaac Leib Peretz, Sholom Aleichem ( ficção e

teatro) e Chaim Nachman Bialik (poesia). No entanto o teatro ídiche é sufocado em

1883 por uma lei que proibia qualquer performance pública em ídiche. Até 1917,

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 23

quando estas leis foram suspensas, o teatro ídiche conseguiu sobreviver na Rússia

graças às peças germânicas encenadas, que nada mais eram do que um disfarce.

Esta fase do início da produção fílmica ídiche coincide com o próprio

surgimento do cinema como uma mídia de massa e marca a descoberta de um público

segmentado: a população judaica da Rússia Czarista, e num volume menor, nos

Estados Unidos. Embora Varsóvia tenha sido o primeiro centro de produção de filmes

em ídiche, o teatro americano ídiche, então encenado em Nova York, foi a inspiração

de muitos filmes, principalmente aqueles de Jacob Gordin. Ele produziu um

quantidade reconhecível de filmes em ídiche, mas, infelizmente, nenhum deles

sobreviveu.

De acordo com Judith Goldberg em seu livro Laughter trough Tears, The

Yiddish Cinema, até o fim de 1904 o número de salas de cinema em Moscou pulou de

pequenos teatros de rua que comportavam 24 espectadores sentados e 30 de pé para

verdadeiras salas de exibição com até 500 lugares. O cinema era um negócio próspero

e dominado até então na Rússia pelos irmãos Pathé e pela Gaumont, que organizavam

a distribuição, produção e exibição. O Czar controlava a indústria cinematográfica e

até 1905 era determinantemente proibida a saída de qualquer filme da Rússia para

exibição externa. Em 1906 estabeleceu-se a censura propriamente dita, tanto no

cinema quanto no jornal, proibindo a divulgação e citação dos pogroms, recriados

pela Defender Films (norte-americana) no filme Russia, the Land of Oppression

(Edwin S. Porter, 1910). A Pathé, proibida de explorar este tipo de assunto nos filmes

produzidos na Rússia, ficava restrita a um repertório de melodramas e ficções suaves

sobre a vida dos judeus no campo, imagem que o Governo Russo queria passar ao

exterior, mas que nunca chegaram a representar um verdadeiro filme de temática

ídiche (apesar dos intertítulos). Lai Chyeim (Kai Hansen, 1911), dirigido por Kai

Hansen, um dos diretores da Pathé, seria o primeiro de uma série. Sua história é

modelo para a maioria dos filmes sobre judeus desta época. Conta a história da jovem

Raquel que é prometida em casamento contra sua vontade pelo seu pai, o Rabino, à

Abraão. Porém ela se apaixona por Samuel, empregado de Abraão e após uma ano de

casamento abandona sua casa e sua filha para fugir com Samuel. Volta cinco anos

depois para rever sua filha e encontra Abraão entregue à bebida, indo embora

novamente e deixando apenas uma carta de despedida. Em 1907 é fundado o primeiro

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 24

estúdio de cinema Cinematographic Studio, e até 1910 outros 14 seriam criados.

Desta época datam Um Bilhete para Mamãe (A Brivele Der Mamen; A. M.

Smolensky,1911), A Guerra e o Judeu (Milkhokme um Yidn; diretor não identificado,

1914), Kiddish Ashem (diretor não identificado,1914), Melhor a Morte do que a

Vergonha (Beser dem Tot oder aza Shand; diretor não identificado,1914).

A Brivele der Mamen (1911)

Segundo o livro de Hoberman, Bridge of Light - Yiddish Film Between Two

Worlds, na Polônia as dificuldades eram similares. Como país independente, ela

existiu por um breve período de tempo entre a duas grandes guerras.

Quando foi compartilhada entra a Rússia (1795), Áustria (1793) e Prússia

(1772) os judeus que lá moravam submeteram-se às leis daqueles países. Até a 1a

Guerra Mundial, eles sequer podiam caminhar pelas ruas tranquilamente. Apesar

disso o teatro ídiche se desenvolveu, destacando-se o grupo de teatro da família

Kaminsky. Um dos primeiros estúdios de cinema da Polônia foi o Sila Films, fundado

em 1908 por Pawel Goldman, Mojzesz Morak Towbin e Samuel Ginsberg. Towbin

desejava levar para o cinema os clássicos do teatro ídiche, fazendo com que a Sila

realizasse filmes como O Pai Cruel (Der Vilder Fater; Alexander Marten, 1911), Di

Fersztoysene (Stanislaw Sebel, 1912), Mirele Efros (Stanislaw Sebel, 1912).

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 25

Em 1912 o estúdio entra em falência e um ano depois Henryk Finkelstein e

Samuel Ginsber criam a Kosmofilm, que produziu diversos filmes com a trupe

Kaminsky, entre eles: A Filha do Cantor (Dem Chazons Tochter; Stanislaw Sebel,

1913), Castigo de Deus (Gots Sztrof; Stanislaw Sebel, 1913), Der Unbekanter

(Stanislaw Sebel, 1913), Herecle Mejuches (Stanislaw Sebel, 1913), A Madrasta (Di

Sztifmuter; Stanislaw Sebel, 1914 ), Di Szchite (Stanislaw Sebel, 1913). A trupe fez

sua última aparição em filme em Zajn Wajbs Man (diretor não identificado,1916)19, o

último filme ídiche produzido na Polônia por uma década. Estes filmes jamais foram

exibidos fora da Europa Oriental, possivelmente devido à sua falta de sofisticação em

comparação à outras produções da época, como as de países como a Dinamarca ou a

Inglaterra e devido à pequena dimensão da Sila e da Kosmofilm, que não tinham uma

produção regular.

Entre 1901 e 1914 quase dois milhões de judeus deixaram a Europa em

direção às Américas, a maior parte da Rússia, Romênia e Galícia. Em 1905 uma

verdadeira comunidade judaica se estabelecia no Lower East Side em Nova Iorque e

em 1910 formava-se uma cidade dentro de uma cidade, com a população judaica

atingindo uma densidade de mais de meio milhão de pessoas. Como não podia deixar

de ser, estes imigrantes se estabeleceram levando a sua mais popular forma de

entretenimento: o teatro ídiche.

A significativa população judaica da Nova York de então, somada à onda de artistas que imigrou para a América, tornou a cidade um centro de dramaturgia ídiche na virada do século. Historiadores afirmam que, entre 1881 e 1903, cerca de 1 milhão 300 mil judeus que falavam ídiche chegaram a Nova Iorque. O público comparecia aos teatros e aplaudia com o mesmo entusiasmo comédias ou melodramas. O som do idioma da terra natal de quem deixara seu país seja pela discriminação racial ou pela falta de perspectiva econômica constituía um grande atrativo levando centenas de pessoas às casas de espetáculos no Lower East Side, Bronx e Brooklyn. Durante 50 anos, cerca de doze teatros mantiveram em cartaz permanentemente espetáculos em ídiche. Havia uma grande concorrência entre as casas para atrair públicos maiores. As peças tinham uma certa regularidade de estilo: atores declamando em voz

19 Há uma versão de Zajn Wajbs Man de 1913 dirigida por Stanislaw Sebel que deu origem a versão de

1916.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 26

alta, gestos e expressões exagerados e atrizes com gestos dramáticos afetados. A grande diferença entre um espetáculo e outro estava na estrela principal, que acabou se tornando o trunfo de cada uma das companhias.20

Cartaz da peça The Jewish King Lear encenada em Nova Iorque em meados de 1900

Cartaz do filme The Jewish King Lear of Vilna (U.S.A., 1935)

Nos idos de 1900 podiam-se assistir peças em ídiche nos teatros Vaudevilles e

em teatros de rua, conhecidos como nickelodeons, que naturalmente foram sendo

substituídas a medida em que o cinema foi ganhando cada vez mais popularidade. O

futuro astro de cinema Paul Muni (nascido Muni Weisenfreund numa família de

atores ídiches) fez sua primeira aparição no palco em um desses nickelodeons,

tocando violino enquanto seus irmãos entoavam baladas em ídiche para acompanhar

apresentações de lanterna mágica.

Sidney M. Goldin, que futuramente iria dirigir filmes falados em ídiche,

nasceu em Odessa em 1880 e foi contratado em 1913 pela Universal Film Company

20 http://www.morasha.com.br/conteudo/ed32/teatro2.htm

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 27

para dirigir filmes para a Victor Feature Film Company21 e Imp (Independent Motion

Picture Company). Seu primeiro filme para a Imp foi The Sorrow of Israel (Sidney

Goldin, 1913). O filme, rodado em três rolos, narra a história de um jovem judeu e

uma nobre russa, profundamente apaixonados. Para poder frequentar a universidade,

o jovem judeu é obrigado a se converter. É quando o noivo da jovem, um príncipe

russo, organiza uma perseguição religiosa ao rapaz que é salvo pelos niilistas e em

gratidão junta-se ao movimento. Ele se casa com a nobre russa, é preso e salvo

novamente pelos niilistas22. O filme foi tão popular que os produtores pretendiam

exibí-lo na Europa: os planos eram para a Inglaterra, Alemanha e Áustria, mas

obviamente excluíam a Rússia. Seguiram-se Nihilist Vengeance (Sidney Goldin,

1913), The Heart of a Jewess (Sidney Goldin, 1913) e Bleeding Hearts (Sidney

Goldin, 1913).

Seu último filme para a Universal foi o documentário How the Jews Care for

Their Poor (Sidney Goldin, 1913). Depois disso, Goldin trabalhou em diversas

produções de estúdios independentes, destacando-se The Black 107 (Sidney Goldin,

1913), sobre a perseguição do “povo escolhido” na Rússia. A comunidade do Lower

East Side lotou a sala de exibição para assistir ao filme baseado “no recente

julgamento de Kiev”. Outras duas companhias americanas produziram filmes com

intertítulos em ídiche: a Kalem com A Passover Miracle (Shalom Masimon, 1914) e a

Box Office Attraction Company (William Fox) com The Children of the Ghetto (Frank

Powell, 1915).

A chegada da 1a. Guerra Mundial acabou com a tentativa da Kalem, Universal

e Box Office em realizar filmes que atraíssem um público ídiche. Na Polônia este tipo

de produção também foi interrompida. Na Rússia, primeiro a guerra e então a

revolução mudaria totalmente o foco da indústria cinematográfica.

21 formada em 1912 por Florence Lawrence, a Biograph Girl. 22 movimento originário no século XIX, formado durante as décadas de 1860 a 1870, baseado na filosofia

do seticismo e que no século XX simbolizava a luta contra qualquer tipo de tirania.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 28

Willet St. Theater, um nickelodeon no Brooklyn com cartazes em Ídiche e Inglês – 1913. Sentado à esquerda, Joseph Seiden, que iria se transformar num dos primeiros produtores de cinema ídiche em Nova Iorque.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 29

Declínio do Czar em 1917 `a chegada do som no cinema em 1929

Tamara Adelheim em His Excellency (URSS, 1928)

Este período caracteriza-se por produções ídiches esporádicas, porém tem

como ponto marcante as tentativas de realização de filmes judaicos em países recém-

formados como a Áustria, Polônia e União Soviética. Menos dependentes do teatro

ídiche, estes filmes basearam-se em novelistas como Sholom Aleichem, Isaac Babel,

Joseph Opatoshu, e Harry Seckler. Apesar de manter sempre uma conexão com a

tradição judaico-ídiche, curiosamente os filmes deste período apresentam

características progressistas e temas controversos, marcados por traços de influências

de movimentos de vanguarda da época, como o Simbolismo, Expressionismo e

Futurismo – nunca perdendo a conexão com a tradição ídiche. No campo político-

ideológico percebe-se a influência do Comunismo. Na Alemanha Fritz Lang, F.W.

Murnau e Robert Wiene dirigiam seus primeiros filmes, como o Metropolis (Fritz

Lang ,1927), Nosferatu, O Vampiro da Noite (Nosferatu, Eine Symphonie des

Grauens ; F.W. Murnau , 1922) e O Gabinete do Dr. Caligari (Das Kabinett des

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 30

Doktor Caligari; Robert Wiene , 1920). Os intelectuais se mobilizavam e em toda

parte floreciam movimentos de vanguarda. Bertolt Brecht finalizava suas primeiras

peças. Franz Kafka publicava Na Colônia Penal (In Der Strafkolonie). Hollywood,

suplantando Paris como capital cinematográfica, se tranformava no berço da United

Artists, fundada em 1919 por D. W. Griffith, Charlie Chaplin, Douglas Fairbanks e

Mary Pickford.

Esse mesmo ano marca um forte renascimento do movimento de teatro ídiche

e novos grupos são formados em Nova Iorque e Petrogrado. Onde o Czar havia

banido o teatro ídiche, os soviéticos iriam subsidiá-lo. Para esta reconstrução foram

convocados nomes como I. L. Peretz e Alexander Granovsky. Fundador do Jewish

Academic People’s Theater of Moscow (GOSET), Granovsky era um modernista que

convocava atores sem experiência para suas peças. A fundação da GOSET em 1918

coincide com a realização de Signal (Alexander Arkatov, 1918), primeiro filme

soviético dirigido por Alexander Arkatov para a Mos-Kino-Committee. No outono de

1918 em Nova Iorque, a Trupe de Vilna e Maurice Schwartz contituíam o Yiddish Art

Theater, que encenava peças de Shaw, Schiller, Ibsen, Strindberg, Schnitzler e Wilde.

Cartaz do filme Jewish Luck (1925), com Solomon Mikhoels em destaque. Design de Natan Altman. Percebe-se o uso de formas geométricas combinando palavras e imagens, característica da vanguarda Construtivista Russa, da qual fez parte Marc Chagall, Wassily Kandinsky, Alexander Rodchenko, Nikolay Prusakov e os irmãos Stenberg. Chagall, inclusive, elaborou diversos cenários para o teatro ídiche.

Alexis Gramowski, que iria gerenciar a GOSET roteirizou e dirigiu em

1925/1926 Jewish Luck (Yiddishe Glikn; Alexis Gramowski,1925), conhecido

também como The Matchmaker, baseado no conto Menachem Mendel de Sholem

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 31

Aleichem. Nesta adaptação, Menachel Mendel é um personagem típico dos filmes

ídiches. Um luftmench23 que inocentemente se torna um bobo da burguesia, e inimigo

do proletariado mas também uma vítima da velha ordem do capitalismo. O ator

Shlomo Mikhoels fez um Menachel chaplinesco, que vive perdendo “milhões” em

seus vários negócios, e que culmina com seu fracasso total quando arranja um

casamento à distância entre duas mulheres.

Em 1923, Zygmund Turkow e Ida Kaminska iriam formar o Teatro de Arte

Ídiche de Varsóvia (Warsaw Yiddish Art Theater). Turkow iria filmar então, sua

versão de Tkijes Khaf (1924).

Nos Estados Unidos é considerada uma época mais fraca para o filme ídiche,

que com dificuldade competia com os filmes melting-pot de teor assimilacionista dos

estúdios. O destaque fica realmente com a produção Européia, principalmente na

União Soviética, pelo menos até a consolidação do stalinismo em 1928.

Entre os anos de 1924 e 1926, Granovsky, Schwartz e Turkow iriam dirigir, cada um,

seu filme em ídiche: Jewish Luck (Yiddishe Glikn; Alexis Gramowski ,1925), Broken Hearts

(Maurice Schwartz, 1926) e Tkijes Khaf (Zygmund Turkow , 1924).

Zygmunt Turkow, que iria trabalhar no Brasil, em dois momentos de Tkies Khaf (Polônia, 1924), onde foi diretor e ator. No cemitério de Vilna, ele está à esquerda contracenando com Henryk Tarlo.

23 Que vive de vender sonhos, desejos; trapaceiro; malandro

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 32

Do início do cinema falado em 1929, à meados de 1934

Al Jonson reza o Kol Nidre em “The Jazz Singer” (E.U.A., 1927)

Em contrapartida ao período anterior, a produção do começo do cinema falado

é considerada um fenômeno Norte-Americano. O primeiro filme ídiche sincronizado

com som foi produzido em Nova Iorque dezoito meses depois que O Cantor de Jazz

(1927) quebrou a barreira do som com seu drama sobre o dilema de um judeu cantor.

Com a chegada do cinema falado, os imigrantes judeus descobriam uma nova forma

de entretenimento em sua língua natal, que começava a rivalizar com o teatro ídiche e

que gradativamento foi tomando seu espaço como forma de resistência cultural.

Nos cinco anos seguintes, cerca de vinte filmes de longa-metragem, assim

como vários curtas apareceram no contexto das produções independentes. Ao

contrários dos temas mais universais da fase muda, estes filmes apelavam para a

exploração de temas judaicos para atrair a este segmento de público; iam desde

apresentações de cantores virtuoses até temas bíblicos, filmes mudos dublados e

mesmo documentários políticos.

Enquanto na Europa a situação dos judeus deteriorava e a emigração tornava-

se mais difícil, os imigrantes americanos já haviam se assimilado ao novo estilo de

vida. Os imigrantes começavam a sair dos guetos e se espalhar para fora do Lower

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 33

East Side de Nova Iorque, como o Bronx e o Brooklyn. Em outras pequenas

comunidades surgiam publicações e jornais semanais, escritos em inglês e ídiche,

preenchendo a sensação de isolamento da maior e efervescente comunidade judaica na

América. Estas publicações aparecerão também nas comunidades no Brasil, como O

Jornal Israelita e o Nossa Voz da ASA – Associação Sholem Aleichem. Traziam

notícias da comunidade, como casamentos, anúncios e bar-mitzvas, a programação

cultural de teatros e cinema em ídiche, serviços como busca de pessoas desaparecidas

e notícias de israel, Palestina e Europa.

Em 1930, o jornal norte-americano Telegraph elevava Nova Iorque como

centro cultural mundial, reunindo pessoas das mais diversas origens. Não é à toa que

então os irmãos Warner lançam lá algumas produções em espanhol. Porém, Nova

Iorque nunca chegou a ser um centro cinematográfico de filmes estrangeiros que se

pudesse comparar à Hollywood ou mesmo à produção Européia da época. Sem

dúvida, Nova Iorque foi durante a década de 30 à 40 um forte ponto referencial da

produção de filmes em ídiche e principalmente de exibição devido ao grande número

de imigrantes. Neste período foram lá realizados cerca de cinquenta longa-metragens.

O jornal mencionava a criação de uma pequena produtora, a Judea Films,

especializada em filmes em ídiche, prevendo um grande crescimento deste nicho de

produção, especialmente porque em Nova Iorque encontravam-se diversos atores

renomados provenientes de trupes Européias e do Teatro Ídiche. Seria natural que eles

se incorporassem às produções de filmes, como realmente aconteceu. Por trás da

Judea Films estava Joseph Seiden, nascido em 1892 e que se dedicou por toda a vida

ao cinema. Trabalhou como camera na Universal e nos anos vinte filmava lutas de

boxe com sua própria empresa, a Seiden Films, trabalhando mais tarde com Sidney

Goldin. Se uniu à Ivan Abramson, um jovem produtor e diretor me Nova Iorque, para

produzir uma série de noticiários (ainda mudos) em ídiche. O sucesso destes pequenos

noticiários aliado à chegada do som levou Seiden à produção dos filmes falados. Em

Dezembro de 1929 é criada a Judea Films com Seiden como presidente, Sam Berliner

como secretário e tesoureiro, e Moe Goldman , proprietário de quatro salas de cinema

no Bronx, como gerente geral. Para inauguração eles anunciaram quatro curtas,

orçados em $15.000 dólares cada. Seiden focou sua distribuição em 250 cinemas em

cidades-chave, onde reconhecidamente havia uma grande platéia de imigrantes.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 34

As produções se iniciaram em fevereiro de 1930, e três semanas depois

ficaram prontos os dois primeiros curtas: Style and Class (Sidney Goldin , 1930) e

The Shoemaker’s Romance (Schuster Liebe ; Sidney Goldin, 1930). Em 19 de março

os filmes estréiam na R.K.O. Tilyou Teather, em Coney Island. Era sugerido aos

exibidores que vendessem a programação dos dois curtas, como se fosse um longa-

metragem. Porém ao invés dos $15.000 dólares, as produções tiveram que ser

realizadas com apenas $3.000 dólares. Com tão pouco dinheiro, erros não eram

permitidos e os atores, todos profissionais do teatro ídiche, como Joseph Buloff, Leah

Noemi, Marty Baratz e Goldie Eisman, ensaiavam exaustivamente as sequências antes

das filmagens. Uma vez iniciado o take, ele era filmado sem cortes durantes os dez

minutos de filme 16mm. Sendo profissionais, os atores raramente esqueciam suas

deixas, porém qualquer erro apareceria na montagem final. Seiden alugou um

estúdio, um fonógrafo e algumas velhas Kliegs24. A orientação para a fotografia era

simplesmente usar o máximo de luz possível. Duas câmera foram usadas, uma pelo

próprio Seiden. Uma câmera fazia os takes gerais enquanto a outra era utilizada para

os planos médios e closes. O diretor era Sidney Goldin. Todos os primeiros curtas

foram realizados seguindo esta receita.

Em Abril é finalizado o primeiro longa-metragem: Mine Yiddishe Mame

(Sidney Goldin ,1930) 25, com duração de sessenta minutos e estrelando Mae Simon.

O filme começa com um prólogo se referenciado à Abraão e Isaac e enaltecendo a

honra familiar, principalmente os sacrifícios maternos em prol dos filhos. A história

inicia-se com a festa surpresa de aniversário para Eddie Rabinowitz, organizada por

seus pais, David e Mae, por seu irmão Seymour e sua irmã Helen. Quando David

morre, Mae é obrigada a trabalhar para sustentar a família. Os filhos a abandonam,

Seymour gasta todo seu dinheiro e anos depois, já um advogado renomado, aceita

defender a causa de uma mãe que fora abandonada pelos filhos e que necessita ser

sustentada por eles. É quando descobre que é sua própria mãe, que perdoa todos os

filhos e a família é reunida novamente.

24 Equipamento de luz 25 exibido no Brasil segundo o pesquisador Lécio Augusto Ramos

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 35

O Judeu Errante (Der Vanderner Yid; George Roland , 1933) é considerado o primeiro filme Americano a descortinar a situação dos judeus na Alemanha Nazista e único filme de sua época falado em ídiche a explorar o assunto. O filme foi uma resposta dos judeus americanos ao regime nazista. Foi produzido pelo Jewish American Film Arts e Atlas Studio em Long Island, Nova Iorque durante o verão de 1933, alguns meses depois que o refime nazista tomou o poder na Alemanha.

É marcante na temática ídiche a exaltação da figura materna (ídiche mamme),

o tom melodramático e as coincidências levando sempre à um final feliz. Filmes como

Brivele Der Mamen(1937) irão recorrer ao mesmo enredo.

Atrizes como Mildred Block, Jennie Goldstein e Bella Gudinsky fecham

contrato com Seiden que planeja uma adaptação de The Living Corpse de Tolstoy.

Moe Goldman é enviado à Europa para fechar contratos de distribuição na Inglaterra,

Polônia e outros centros com comunidades judaicas. Na volta de Goldman, a

companhia de Tel Aviv Rivling and Company compra cópias de Mine Yiddishe Mame

(1930) para exibição na Palestina e Síria. Em 27 de setembro de 1930 o filme foi

recebido com violência pela platéia de olim26 em Israel, que achava que a língua

ídiche ameaçava o Hebraico. A polícia teve que ser chamada e Seiden foi obrigado a

cortar as cenas faladas e cantadas em ídiche. Até o final da 2a. Guerra Mundial não

seria exibido em Israel nenhum filme falado em ídiche.

A produção de Seiden continua com The Living Corpse (Zhivoj trup; Fyodor

Otsep,1929) e Eternal Fools (Sidney Goldin, 1930), sem muito sucesso. Ao final de

1930, Seiden finaliza A Voz de Israel (The Voice of Israel; Joseph Seiden, 1930),

reunindo os melhores cantores da época, destacando Yossele Rosenblatt, Meyer

Machtengurg e Leibele Waldman. Produzido com $20.000 dólares, era uma sucessão

26 palavra hebraica que denota aqueles que imigraram para Israel considerando-a sua nova pátria mãe;

aqueles que fizeram aliá

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 36

de cenas bíblicas extraídas de filmes mudos, narradas em inglês e unidas pelas

canções dos famosos cantores. Apesar das críticas favoráveis, o filme não atraiu a

audiência esperada e Goldman e Berliner resolvem vender sua parte para Seiden.

De 1930 a 1931 Seiden produziu dezenove filmes: três longas (Eternal Fools,

Mine Yiddishe Mame, Shulamith), sete curtas de um rolo e nove de dois rolos (entre

eles Kol Nidre I 27, Kol Nidre II, Broken Doll, Jewish Melody e Jewish Gypsy).

Uncle Moses (1932)

Apesar de ter sido o mas conhecido, Seiden não foi o único produtor de filmes

em ídiche em Nova iorque em meados da década de trinta. Filmes como East Side

Sadie (1929 - produzido nove meses antes do primeiro curta de Seiden e considerado

tecnicamente amador pela crítica) e The Eternal Prayer (1929) podem ser

considerados filmes falados em ídiche. Este último, produzido pela Metropolitan

Studios e estrelado por Lucy Levin, Anna Appel e o menino cantor “Schmulikel”

tinha uma série de músicas judaicas gravadas em disco, o que foi suficiente para ser

anunciado como o primeiro filme falado em ídiche. Foi considerado pela crítica o 27 Kol Nidre foi exibido no Cine São Carlos em outubro de 1947, no Cine Odeon em junho de 1947 e no

Cine Lux em julho de 1947. Fonte: Jornal "Nossa Voz" da ASA - Associação Sholem Aleichem no Rio de Janeiro

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 37

pior filmes jamais realizado, sem nenhum conhecimento de técnica cinematográfica.

Realmente, tratava-se de uma sucessão de sequências desconexas, com músicas

religiosas, folclóricas, separadas por planos em branco. Joseph and His Brethren

(Adolph Gartner, 1930) foi considerado oficialmente o primeiro grande filmes falado

em ídiche e agraciado pela crítica como “espetacular com um ar tradicional”.

Como toda cinematografia independente, os filmes em ídiche se

caracterizavam por baixos orçamentos e produções pragmáticas. Um exemplo, são os

diversos filmes mudos que eram relançados como filmes sonoros a partir da inclusão

de alguns diálogos e música. Esta prática era muito comum na época e clássicos

mudos eram relançados com a adição de trilha sonora, como O Nascimento de uma

Nação (The Birth of a Nation; D.W. Griffith, 1915) de Griffith, relançado em 1931

em Nova Iorque. Os produtores de filmes ídiches perceberam que filmes antigos,

principalmente épicos bíblicos, poderiam ser uma forma pouco custosa de reciclar a

produção. Estes fatos comprovam a pouca exigência de um público de imigrantes que

se deleitava em tão somente ouvir sua língua natal no cinema.

A despeito das dificuldades técnicas e econômicas, duas grandes realizações

desta época merecem destaque: Uncle Moses (Sidney Goldin e Aubrey Scotto, 1932)

e um dos poucos soviéticos produzidos no período O Retorno de Nathan Becker

(Vozvrashcheniye Nejtana Bekkera; Boris Shpins e R. M. Milman, 1932/1933).

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 38

De 1935 à 2a. Guerra Mundial

Maurice Schwartz como Tevie, o leiteiro, dirige uma cena de O Violinista no Telhado (Tevye der Milkhiker; U.S.A., 1939)

Esta é fase mais popular do cinema ídiche. Inicia com a renovação da

produção polonesa em 1935. Com o primeiro filme polonês falado em ídiche, os

produtores americanos se sentem estimulados com este nicho de audiência e iniciam

um diálogo entre Varsóvia e Nova Iorque que continuaria até a 2a. Guerra Mundial.

Nesta época a produção de filmes falados em ídiche teve seu ponto máximo.

Realizados basicamente na Polônia e nos Estados Unidos, destinavam-se à platéia de

imigrantes e comunidades judaicas da América e Europa. Na sua maior parte, tinham

como inspiração a rica literatura ídiche, como Tevie, o Leiteiro (Tevye der Milkhiker;

Maurice Schwartz,1939) baseado em conto de Scholem Aleichem, filmado

originalmente em 1939 por Maurice Schwartz e que deu origem ao filme consagrado

O Violinista no Telhado (Fiddler on the Roof; Norman Jewison, 1971). Em 1936,

Nova Iorque foi considerada a principal exibidora de filmes estrangeiros da época,

atingindo, segundo o New York Times, uma audiência semanal de, pelo menos,

100.000 pessoas. Curiosamente, os filmes falados em ídiche eram classificados como

filmes estrangeiros tanto pelo público em geral quanto pelos organismos formais de

controle e censura norte-americanos (State Board of Censors) , mesmo quando

produzidos em solo Americano. Criava-se um fenômeno único: os Estados Unidos

não só se transformariam em um grande foco exibidor de filmes étnicos, mas também

um grande centro produtor de filmes estrangeiros.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 39

Considerada a “Bela Época” do cinema ídiche, coincide com o período da luta

contra o fascismo e é marcada pelos filmes que tiveram maior sucesso

internacionalmente, como Yidl Mit'n Fidl (Joseph Green e Jan-Nowina Przybylski,

1937), Verdes Campos (Grine Felder, Edgar G. Ulmer e Jacob Bem-Ami , 1937) e A

Alma Errante (Der Dibbuk; Michael Wasynski, 1937).

A noiva Leah (Lili Liliana) é cercada pelos pobres (muitos recrutados nas ruas de Varsóvia) na “Dança dos Pobres” coreografada por Judith Berg para A Alma Errante (1937)

Não podemos descrever a cinematografia ídiche desta época sem mencionar

com destaque as personalidades empreendedoras de Joseph Green e Edgar G. Ulmer.

Poucos filmes ídiches foram aclamados internacionalmente e fora da comunidade a

que se destinavam. Green e Ulmer conquistaram este status ao trazer uma nova

concepção no enredo dos filmes, onde o sofrimento e a culpa não são mais

glorificados. Os melodramas dão lugar às comédicas românticas e musicais Eles

renovam, então, as temáticas abordadas, sem no entanto romperem com as tradições

ou mesmo cederem às pressões Hollywoodianas. As filmagens em estúdio são

trocadas por belas e significativas tomadas externas, em paisagens líricas e

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 40

românticas, remetendo à vida no campo e nas pequenas aldeias européias. Aclamados

pela crítica e pelo público, Yidl Mitn Fidl de Green e Grine Felder de Ulmer são os

títulos mais bem sucedidos comercialmente dentre os filmes ídiches.

Molly Picon se veste de menino para tocar violino em Yidl Mit'n Fidl, um dos maiores sucessos comerciais da filmografia ídiche

Yidl Mitn Fidl foi acima de tudo um filme heróico. Estrelado por Molly Picon,

então com trinta e sete anos e já consagrada mundialmente no teatro, se torna um hit ,

e é exibido na Europa Oriental bem como na África do Sul, Austrália e, dublado em

hebraico, na Palestina. Ele rompe até mesmo as barreiras do crescente movimento

nazista na Alemanha. Nos conta Green, em seu depoimento registrado por Hoberman

no livro Bridge Of Light28:

um representante da comunidade judaica de Berlim chega à Varsóvia e me procura. Me conta então as condições de vida pelas quais passam os judeus na Alemanha: a eles não era permitido sair do gueto, travar contato com não-judeus, nem mesmo frequentar teatros ou cinemas. Mesmo assim, a fama do filme chega aos judeus berlinenses que pedem ao Governo que permita a exibição do filme nos guetos. Goebbels, então Ministro da Cultura, concorda mas sob uma condição: ele deveria ver o filme primeiro. Uma cópia é enviada e devolvida uma semana

28 Capítulo The Greening of Yiddish Film, pág. 242

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 41

depois. No dia seguinte, recebo uma permissão para exibição do filme em Berlim, mas agora há uma nova condição: o negativo deveria ser enviado para a Alemanha para que as cópias pudessem ser feitas lá. Para não perder esta oportunidade, não tive escolha: o negativo foi enviado. Três semanas depois o negativo retorna. Mais tarde fiquei sabendo, que Yidl Mitn Fidl havia sido a sensação daquele ano entre os judeus de Berlim.

poster de Verdes Campos (USA, 1937) de Edgar G. Ulmer, um dos maiores sucessos comerciais da cinematografia ídiche, estrelado pelo Yiddish art and Artef Theatre

poster de A Curva do destino (1945), dirigido por Ulmer ao ingressar na Producers Releasing Corporation (PRC).

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 42

Edgar George Ulmer nasceu na cidade boêmia de Ulmitz, mudando-se em

seguida para Viena. Lá trabalhou como ator de teatro e diretor de arte em teatro e

cinema29, enquanto estudava arquitetura e filosofia na Academy of Arts and Sciences.

Nos anos 20, juntou-se à legendária companhia de teatro de Max Reinhardt, onde,

através de uma turnê, conheceu a América e teve seu primeiro contato com o cinema,

mas especificamente a Universal Pictures. Ao voltar à Alemanha, trabalhou com F.W.

Murnau em Der Letze Mann (F.W. Murnau , 1924) e Fausto (Faust; F.W. Murnau ,

1926), tornando-se mais tarde seu assistente de direção em todas as suas produções

realizadas nos EUA. Juntamente com nomes como Robert Siodmak, Billy Wilder,

Eugene Shuftan e Fred Zinneman, Ulmer participou de Menschen am Sonntag (Kurt

Siodmak, Robert Siodmak, Edgar G. Ulmer, Fred Zinnemann, 1930) documentário

experimental realizado em Berlim. Ulmer foi o único diretor de filmes ídiches que

conquistou espaço e reconhecimento em obras de outros gêneros. Popularizou-se com

títulos considerados classe B, entretanto era admirado pelos críticos franceses e

produziu obras reconhecidas como O Gato Preto (The Black Cat, Edgar G. Ulmer,

1934), filme de terror com influências expressionistas, estrelado por Bela Lugosi e

Boris Karloff e A Curva do destino (Detour; Edgar G. Ulmer, 1945), espécie de

thriller com toques de filme noir. Eclético e versátil, acostumado com os baixos

orçamentos típicos dos filmes ídiches, Ulmer produziu considerável quantidade de

títulos. Em 1943 ingressa na Producers Releasing Corporation (PRC), produtora de

filmes B, onde realiza Estranha Ilusão (Strange Illusion; Edgar G. Ulmer,1945), A

Curva do destino (1945) e A Esposa de Monte Cristo (The Wife of Monte Cristo;

Edgar G. Ulmer,1946). Entre 1946 e 1949 dirige A Mulher Estranha (The Strange

Woman; Edgar G. Ulmer,1946), Carnegie Hall (Edgar G. Ulmer,1947) e Ambição

(Ruthless; Edgar G. Ulmer, 1949). Em 1960, Ulmer inaugura uma série de filmes

bizarros de ficção científica, à moda de Ed Wood, que o consagraram entre os

amantes do gênero: Além da Barreira do tempo (Beyond the Time Barrier; Edgar G.

Ulmer ,1960), O Incrível Homem Invisível (The Amazing Transparent Man, Edgar G.

Ulmer, 1960) e L'Atlantide - Journey Beneath the Desert (Edgar G. Ulmer ,1961) são

alguns destes ícones. O que poucos sabem é que antes de conquistar sua reputação

internacional, Ulmer dirigira quatro filmes ídiches durante 1937 à 1940, dentre eles

29 Pouco antes de sua morte, em uma entrevista concedida à Peter Bogdanovich, Ulmer afirmou ter

iniciado seu contato com o mundo do cinema construindo os cenários do filme “The Golem” (1920).

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 43

dois dos maiores sucessos desta cinematografia, Verdes Campos (1937) e Os Dois

Amores do Ferreiro (Yankl der Shmid; Edgar G. Ulmer , 1938)30, uma espécie de

interlúdio à carreira que se iniciava. O último filme em ídiche de Ulmer foi The

American Matchmaker (Americaner Schadchen; 1940), estrelado por Leo Fuchs, o

"Fred Astaire Ídiche". Ulmer sequer falava ídiche, apesar de muito familiarizado com

a língua devido ao teatro ídiche.

The American Matchmaker (1940), último filme ídiche de Ulmer.

O cinema ídiche atingiu seu apogeu durantes os dezoitos meses que duraram

entre a anexação da Áustria pela Alemanha em 1937 e a invasão Soviética da Polônia.

Durante este período foram lançados vinte e três filmes em Nova Iorque; um terço

produzido em Varsóvia, e todos os outros (com exceção de sete) na Europa Oriental,

que trilharam caminhos também pela América do Sul, chegando ao Brasil. O útimo

filme ídiche polonês lançado em Nova Iorque foi A Brivele Der Mamen (1939). Em

dois anos, cessaram as produções tanto na Europa quanto nos Estados Unidos.

30 Exibido no Estação Botafogo, Rio de Janeiro, em julho de 2002 na mostra Cine e Arte Judaica.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 44

Moishe Oysher em The Singing Blacksmith. Restaurado pelo National Center for Jewish Film em 1998, The Singing Blacksmith foi dirigido por Edgar Ulmer em 1938, baseado no drama de David Pinski Yankl der Schmid (1906). Roteirizado para o cinema pelo próprio Pinski, o filme é estrelado pelo famoso cantor Moishe Oysher no papel título de um ferreiro mulherengo e beberrão e narra sua luta para resistir às tentações.

Adaptado da peça de Peretz Hirschbein, Verdes Campos (U.S.A., 1937) de Edgar G. Ulmer foi o primeiro filme americano falado em ídiche filmado fora dos estúdios.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 45

Molly Picon é a estrela de Mamele (1938) de Joseph Green

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 46

Período pós-Guerra, 1945 em diante

Longo é o Caminho (“Lang is Der Veg”)- foi realizado na Alemanha ocupada pelos E.U.A em 1948. 77 minutos P&B

De certa forma, o teatro ídiche ajudou a construir a ponte entre o shtetl e a

América e brilhou durante algumas décadas.

Não foi, no entanto, capaz de sobreviver à destruição do idioma e da cultura ídiche pelos nazistas, na Alemanha e na Europa Oriental, enquanto os descendentes dos imigrantes assimilavam-se cada vez mais na América. Assim, na segunda metade do século XX, era incerto o futuro das poucas companhias que ainda funcionavam em Nova York, Londres, Bucareste, Buenos Aires e Varsóvia. O desaparecimento gradativo das platéias levou à redução do número de espetáculos, que passaram a ser substituídos por peças que refletiam, cada vez mais, o dia-a-dia, ou seja, os dilemas e desafios da sociedade americana contemporânea.31

Longe da Polônia e da União Soviética, as Américas ofereciam uma

oportunidade de assimilação sem precedentes. Através do contato com novas formas

de cultura, os imigrantes buscavam a formação de uma nova identidade que os

31 http://www.morasha.com.br/conteudo/ed32/teatro3.htm

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 47

inserisse na estrutura sócio-eocômica-organizacional do novo lar. Com o fechamento

das portas de imigração para os EUA o mundo ídiche ficou dividido em três centros,

com suas forças centrípetas: EUA, Polônia e União Soviética. Embora a imigração em

massa para as Américas, antes da 2a. Guerra Mundial, tenha estimulado o

desenvolvimento e crescimento do jornal, teatro, cinema e instituições sócio-culturais,

sua vitalidade dependia da continuidade deste movimento migratório. Com o cessar

das imigrações, o ídiche como tradição oral entra em declínio.

Joseph Green, numa entrevista na televisão austríaca em 1983 afirmava que

“Seis milhões dos meus clientes estão mortos, como posso continuar a fazer

cinema?”32

Longo é o Caminho (Lang ist der Weg; Herbert B. Fredersdorf e Marek

Goldstein, 1948) é o primeiro filme que mostra o holocausto sob uma perspectiva

judaica. Feito por e contando a história de judeus que ficaram sem lar depois da

guerra, teve como locação Landsberg, o maior campo de concentração na Alemanha

ocupada pelos E.U.A. . Misturando traços neorealistas e expressionistas, o filme conta

a história de um judeu polonês (representado por Israel Becker, um dos fundadores da

primeira companhia de teatro ídiche profissional da Alemanha pós-guerra) e sua

família desde sua vida em uma comunidade judaica de Varsóvia antes da guerra até os

horrores de Auschwitz.

No começo dos anos 60, os últimos distribuidores especializados em cinema

ídiche cederam ao Audio Brandon, fornecedores de filmes 16mm a círculos culturais e

cinemas de arte, as últimas cópias dos filmes à sua disposição. O motivo era a pouca

demanda dos filmes ídiches. Os que foram salvos, acabaram em sua maior parte em

fundações e museus. Segundo Sharon Pucker Rivo, diretora executiva do National

Center for Jewish Film da Brandeis University, no Brasil, um distribuidor paulista,

provavelmente Abraham Goloborotka, comprou alguns títulos para exibição. Em 1989

o próprio National Center for Jewish Film teria comprado dele uma cópia de

Overture to Glory (Der Vilnet Shtot Khazn; Max Nosseck,1940).

32 Das Jiddische Kino, realizado por Ronny Loew, Hans Peter Kocherrath e Walter Schobert para a ZTV

Áustria, 1987.

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ORIGENS E CARACTERÍSTICAS DO CINEMA ÍDICHE: CRONOLOGIA E PRODUÇÃO 48

Atualmente filmes totalmente falados em ídiche são cada vez mais raros. Por

isso, alguns filmes em que um personagem ou trecho é falado em ídiche fazem parte

da filmografia do gênero, assim como documentários sobre o assunto. Dentre alguns

que possuem esta característica, destacamos títulos como Fanny e Alexandre (Fanny

och Alexander; Ingmar Bergman, 1982) de Bergman e Almonds and Raisins (Russ

Karel, 1984) narrado por Orson Welles33.

33 “Almonds and Raisins” foi um dos últimos trabalhos de Orson Welles. Originalmente o filme seria

narrado por George Burns, que não pôde fazê-lo. Chamaram então Woody Allen, que também estava trabalhando

em outro projeto. Foi quando lembraram de Orson Welles – que supostamente havia dirigido uma produção ídiche

de Hamlet e curiosamente falava o ídiche com razoável fluência. Apesar de duramente criticado por Hoberman em

seu livro Bridge of Light, que afirma que datas e nomes estão equivocados, “Almonds and Raisins” nos apresenta

uma rara edição de inúmeros trechos de filmes ídiches.

Page 54: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 49

5. O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA

11-4-1946 – Jornal Israelita anuncia a exibição de “Der Idisher Kenig Lir” no Cine São Carlos

Segundo Judith Goldberg em seu livro Laughter trough Tears, The Yiddish

Cinema , entre 1910 e 1941 foram realizados aproximadamente 130 longa-metragens

e 30 curtas em ídiche. Nomes como Boris Thomashevsky, Maurice Schwartz, Celia

Adler, Yetta Zwerling, Helen Beverly e Isidor Cashier perderam-se na memória de

uma platéia que lotava as salas de exibição do Rio de Janeiro e de São Paulo, para

assistí-los em musicais e dramas falados em ídiche.

Entre os anos de 1940 e 1950, o Cine São Carlos, Atual Cine Orly, situado na

Rua Alcindo Guanabara no. 17 no Rio de Janeiro, foi palco destas exibições,

resultantes da dedicação de seu principal distribuidor Jacob Dvoskin.

Situado no coração da Cinelândia, o Cine São Carlos foi o centro destas

manifestações até o final da década de 50, quando passou a se chamar Rivoli, e, em

1974, Cine Orly (316 lugares). De propriedade da Esplendor Filmes desde 1964,

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O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 50

atualmente o Cine Orly é palco de filmes Gay, mantendo sua característica de

exibição de filmes de um mercado paralelo, voltado para um grupo de minoria.

Inaugurado em 1935 com 510 lugares como Cine Teatro Rio, até 1937 pertencia a

empresa exibidora Cia. Imobiliária Minas Gerais, quando então passou a ser da Cia.

Brasileira de Cinemas. De 19/03/1942 a 31/12/1943 passou a chamar-se Cine OK e

teve o número de lugares reduzido para 465. Em Janeiro de 1944 muda de nome

novamente para Cineac OK para finalmente, em novembro de 1945, se transformar no

Cine São Carlos (422 lugares), através da nova proprietária, a A . Amorim e Filhos.

Segundo o Cine Reporter34, "Alcino dos Reis Amorim, comerciante, arrenda o antigo

Cinema Rio e o rebatiza de São Carlos." Nesta época, tinha como principais

concorrentes o Capitólio e o Cineac Trianon, com suas sessões passatempo e o slogan

"O Espetáculo Começa Quando Você Chega” que fizeram grande sucesso durante a

Segunda Guerra, alimentando o público com notícias dos dois lados do front. Alguns

cinemas na Cinelândia se especializaram em exibir filmes Alemães, como o Cineac

Trianon e o Cine-Teatro Broadway.

Segundo o historiador Francisco Carlos Teixeira, da Universidade Federal do

Rio de Janeiro (UFRJ), o III Reich tratou de montar aqui uma rede de comunicações

cujo objetivo era conquistar a opinião pública brasileira em favor da campanha alemã

no conflito. Pesquisando o Departamento de Organizações de Massa do Arquivo

Federal da Alemanha, em Berlim, Teixeira encontrou documentos inéditos revelando

que no início dos anos 40 o Terceiro Reich montou uma rede de radiodifusão na

América do Sul que chegou a contar com 40 emissoras, 15 delas no Brasil, para

derrotar os aliados na guerra pelo apoio da opinião pública. Além de rádios, jornais e

cinemas foram comprados, alugados ou subvencionados no esforço nazista para se

contrapor à influência americana e britânica. No Rio de Janeiro, controlavam a Rádio

Ipanema, os jornais “Gazeta de Notícias” e “Meio-Dia” e o Cine-Teatro Broadway.

Do outro lado, resistindo ao esquema ofensivo nazista, o cine São Carlos, a exemplo

do cine Odeon, exibia filmes russos (o que era uma raridade) e ídiches. Supõe-se que

a platéia era a mesma para ambos os gêneros. Efrahim Meniuk, que tinha 9 anos na

época, relata: “Lembro-me bem de um com título de Sebastopol e que versava sobre a

34 Cine Repórter, 29/06/1946 - p. 48

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O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 51

batalha travada naquele local e que glorificava o heroísmo do povo e soldados

soviéticos.“

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O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 52

Jornal Israelita 15-09-1945 – anúncios de sessão passatempo no Capitólio

A audiência dos filmes ídiche aguardava os lançamentos russos com a mesma

voracidade da chegada dos filmes em ídiche, pois, em última análise, representavam

um elo com sua região de origem. Assim, verificam-se críticas acaloradas à chegada

destes filmes, como por exemplo, a do jornal Israelita de 22/09/1945 com relação ao

filme Arco Íris (Raduga; Mark Donskoy,1944), que curiosamente destaca a linguagem

deste filme russo com características dos movimentos ditos “realistas” (como o neo-

realismo italiano), em contrapartida à linguagem clássica narrativa de Hollywood :

Sua técnica é muito diferente daquela a que estamos habituados a ver nos filmes de Hollywood e como trabalho de arte a película é, realmente, notável. Mas o que impressiona verdadeiramente é o realismo dados às cenas, através daquelas máscaras de uma expressão intensamente comunicativa, dentro da grandiosidade dramática do argumento. A cena final [...] impressiona de tal modo que o auditório aplaude, calorosamente, como se tratasse de um espetáculo teatral.

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O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 53

Jornal Israelita 22-09-1945 – crítica do filme russo “Arco Íris” no Cine Odeon

Mas Hollywood não ficava fora da programação desta comunidade. Qualquer

filme que fosse identificado com a audiência de imigrantes era repetidamente

anunciado nos jornais da comunidade e seu lançamento acompanhado de matéria com

textos e críticas. Filmes com Paul Muni tinham audiência certa e ganhavam espaço no

chamado grande circuito dos cinemas. Este é o caso de Alma Russa (Counter-Attack

;Zoltan Korda, 1945) exibido nos cinemas de ponta lançadores, do circuito Luiz

Severiano Ribeiro, como o São-Luiz, Rian, Vitória e América.

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O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 54

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O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 55

Jornal Israelita 10-11-1945 – anúncio de “Alma Russa”com Paul Muni

Continua Meniuk: “O mundo estava saindo da 2a guerra e os judeus ainda

traumatizados com o Holocausto, procuravam agarrar-se a tudo o que poderia referir-

se ao judaísmo na época. Além disso, minha familia tinha recém-chegado do interior

de Minas Gerais e meus pais procuravam transmitir para mim e minha irmã a força da

cultura judaica .Acho que por isso estes fatos ficaram marcados na minha mente. Eu

me lembro ter assistido à diversos filmes nas tardes de domingo. E acho que na platéia

só havia judeus. As seções eram esporádicas, porque eu não ia ao São Carlos "todos"

os domingos. Os filmes eram falados em ídiche e lembro-me bem de um

especialmente, que se passava num Shtetl, onde a heroína (bonita para meu senso

crítico), que representava revirando os olhos, ficava esperando pelo herói que tinha

partido para os Estados Unidos e parecia que nunca mais voltaria. O final foi,

logicamente, feliz com o retorno do galã. Os filmes nao podiam ser considerados

como obra-primas. Talvez nem de boa qualidade. Minha mãe, não poupava críticas

aos mesmos. Realmente, a técnica não era das melhores. Podia-se verificar

rapidamente que os cenários eram pintados. Mas tudo estava ótimo, porque as pessoas

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O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 56

podiam se encontrar, fazer um social barato (já que a grana naquela época nao era

abundante entre os imigrantes) e manter um papo em idiche”.

4-4-1946

Em 1948, A Jornal Israelita trazia uma matéria entitulada “Arrojada iniciativa

do Sr. Jacob Dvoskin”, já tornando públicas as dificuldades de distribuição e exibição

destes filmes e o crescente interesse da comunidade judaica por estas exibições.

Também nos mostra a tentativa de realizar uma análise fímica crítica, idependente do

valor cultural e sentimental destas apresentações. Nos diz a matéria:

Comentar cinema não é uma coisa fácil. Porém, quando se trata do cinema ídish aí é que as coisas se complicam muito mais. Apesar disso, pretendemos analisar o filme propriamente dito. Mesmo porque, ainda não o assistimos, e aguardamos ansiosamente, o mometo de fazê-lo. O nosso objetivo é trazer ao público um pouco das dificuldades que cercam qualquer iniciativa neste terreno móvel, que é o cinema. Além de empregados, casa de espetáculos, importação do filme e propaganda, existem mil e um pormenores atrapalhando o bom êxito da

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O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 57

apresentação. [...] Observa-se em nossa colônia um salutar movimento cultural. Parece que o trágico drama dos dias que correm nos fizeram tornar mais judeus. Por isso, qualquer iniciativa, seja teatro, cinema ou conferência, terá êxito.

No Jornal Israelita eram anunciados filmes ídiches lado a lado com apresentações de teatro ídiche. esta edição de 17-6-1948 anuncia o filme Yossef in Mizraim a ser exibido no Cine São Carlos juntamente com peça estrelada por Moishe Oysher no teatro Recreio.

Page 63: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 58

Jornal Israelita de 26-8-1948 anuncia a exibição de Der Idisher Niguen no São Carlos. Acima, anunciada noite de arte ídiche no Teatro Municipal, com obras de Rosenblat, eternizado nos filmes ídiches, mostrando a liberdade de expressão e intensa vida cultural do ídiche na comunidade judaica no Rio de Janeiro de 1948. Em contrapartida, pode-se ter uma idéia do contexto político vivido no pós-guerra na Europa, a partir da notícia sobre o forte anti-semitismo na Alemanha.

Eram trazidas produções exibidas contemporâneamente nos EUA, Europa e

América Latina, destacando-se Buenos Aires. Destacam-se os filmes estrelados com o

famoso cantor da época Moishe Oysher, como o Sublime Melodia (Der Idiche

Niguen; Ilya Motyleff e Sidney M. Goldin, 1937) lançado no Cine São Carlos em 6 de

setembro de 1948 e anunciado como seu primeiro filme produzido em Nova Iorque. O

mesmo Oysher estrela o filme Der Vilner Balebeissel (Der Vilner Schotot

Chazan/Overture to Glory; Max Nosseck, 1940) , anunciado como o maior filme

ídiche do ano, com temporada de um ano no Teatro Embassary de Nova Iorque e seis

meses no Teatro Soleil em Buenos Aires.

Page 64: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 59

Temos uma sugestão de que os preços eram reduzidos para estas exibições,

pois normalmente os anúncios informam que “para que todos possam assistir ao filme

foram fixados os seguintes preços: CR$ 3510,00 (Adultos) e CR$ 5,00 (meia)”,

denotando a importância social dada a estes acontecimentos, de forma como nunca

vimos em exibições de filmes regulares na Cinelândia.

Jornal Israelita 20-10-1947 Exibição de Kol Nidre

Eram comuns exibições de caráter donativo, como a de 1948 de A Ídiche

Tochter (1933) – lançado com o título em português Alma Sofredora - em benefício

do Lar da Velhice Israelita.

35 a moeda da época era (CR$) Cruzeiro

Page 65: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 60

As exibições não continham caráter fechado; uma edição de 1948 do jornal

Israelista destacava que “não somente os judeus poderão assistir tal produção, mas

qualquer pessoa que assim o quiser. Esperamos, por isso, que o filme apresentado seja

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O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 61

realmente uma expressão de arte digno de ser visto por todas as platéias”. Apesar

disto, nem todos os jornais da época, como O Correio da Manhã e A Noite,

anunciavam todas estas exibições.

Page 67: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 62

Os filmes eram anunciados, em ídiche, na Jornal Israelita lado a lado com os

lançamentos Hollywodianos, como Prisioneiro do Passado (Dark Passage; Delmer

Daves, 1947) com Lauren Baccal e Humphrey Bogart, em avant-première aos

domingos, as 10 horas da manhã no São Luiz. Ou mesmo Punhos de Ouro (Killer

McCoy, Roy Rowland, 1947), Sonata de Amor (Song of Love; Clarence Brown,

1947) com Katharine Hepburn , O Segredo de Cynthia (Dark Delusion; Willis

Goldbeck, 1947), A Orquídea Branca (The Other Love; André De Toth, 1947) com

David Niven e Barbara Stanwyck, no Metro Passeio, Metro Copacabana e Metro

Tijuca.

Jornal Israelita de 15-8-1946 anuncia em ídiche a exibição de A Última Porta (The Last Chance; Thomas Bentley,1937)

Havia também uma preocupação em anunciar a qualidade das exibições. Na

segunda semana de Der Vilner Balebeissel, anúncio destaca “Aviso importante:

Foram instalados neste cinema aparelhos sonoros último modêlo HIGH-FIDELITY e

ar condicionado”.

Page 68: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

O CINEMA ÍDICHE CHEGA À CINELÂNDIA 63

Jornal Israelita (19-8-1948) anuncia a exibição de Der Idicher Ninguen

Gradativamente foram cessando as exibições deste filmes, que passaram a ser

cada vez mais esporádicas e a partir da década de 50 eles se incorporaram a festivais e

mostras especiais, o que vem acontecendo até os dias de hoje, em todo o mundo.

Quanto ao São Carlos, Henrique Veltman, em seu depoimento confirma:

"Claro que os filmes ídiches passaram nos cinemas cariocas e paulistas. Ainda

criança, assisti com minha mãe, por exemplo, A Brivele der Mamen, um melodrama

clássico. Foi no Cine São Carlos, que depois mudou de nome e virou concorrente do

Cineac Trianon. Ele pegou fogo no dia em que exibia o Dibuk e hoje não sei se existe

mais, na Rua Alcindo Guanabara, ao lado do antigo Teatro Dulcina."

A Cinelândia, templo cinéfilo, que durante décadas foi conhecida por abrigar o

maior número de salas da cidade, assiste impotente ao fechamento de seus cinemas. O

Metro Boavista, o Capitólio, o Plaza e o Vitória só existem na memória. Daquela

época resistem o Palácio, o Rex, o Íris e o Odeon (agora Odeon BR). O Cine São

Carlos sobreviveu e, atualmente com o nome de Orly, exibe sessões exclusivas de

filmes de sexo explícito.

Page 69: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

A SOBREVIVÊNCIA DO CINEMA ÍDICHE 64

6. A SOBREVIVÊNCIA DO CINEMA ÍDICHE

Regina Duarte em transe ao incorporar o Diabo, em Dibuk, o Demônio, apresentado no programa Caso Especial da Rede Globo em 1972

Goldberg em sua tese Laughter Through Tears levanta uma curiosa questão:

após anos de esquecimento, o interesse pela cultura ídiche chega tarde demais para o

renascimento de seu teatro ou cinema. Os estudiosos recentes se inspiram pela busca

de uma cultura praticamente morta, uma redescoberta de um passado tão casualmente

esquecido. O propósito a que estes filmes se destinavam, o entretenimento de

imigrantes saudosos de suas origens, já não existe mais. Os filmes se tornaram

registros de uma época que se foi. A produção do cinema ídiche está morta e até bem

recentemente foi praticamente abandonada. O que se vê são filmes em que um ou

outro personagem fala a língua, em produções recentes como Solomon and Gaenor

(Paul Morrisson, 1999) - indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro de 2000 - ou

documentários como The Komediant (Arnon Goldfinger, 2000)- vídeo israelense

sobre a vida de Pesachke Burstein, ator da fase áurea do Teatro Ídiche em Nova

Iorque - ou o australiano Mamadrama (Monique Schwartz, 2001). Para a história do

cinema mundial, este movimento não teve uma significância relevante; nem em

termos de linguagem, nem em termos de audiência.

Durante muitos anos o ídiche foi estigmatizado como uma língua inferior,

deliberadamente esquecido até pelos seus descendentes. Alguns nomes como Edgar

Page 70: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

A SOBREVIVÊNCIA DO CINEMA ÍDICHE 65

Ulmer ou Paul Muni 36 ingressaram na indústria cinematográfica e ficaram

conhecidos, porém raramente seus nomes são associados aos primeiros filmes que

fizeram: em ídiche. Fica então a pergunta: qual a importância da preservação e

pesquisa destes filmes atualmente?

Estes filmes possuem um valor inestimável sob o ponto de vista histórico e

etnológico, pois retratam uma experiência passada que inclui não apenas a língua, mas

todo um gestual e expressão que estão registrados em película. A língua ídiche, seus

contos e narrativas, suas nuances de sons, gestos e olhares ficaram eternizados nesta

rica filmografia. Além da cultura, estes filmes registraram as esperanças, alegrias e

tristezas de um povo que estava vivendo intensas transformações em suas vidas.

Torna-se o filme um meio completo de preservação da memória de um povo.

Inúmeras instituições judaicas em todo o mundo, principalmente em Israel e

nos EUA, têm investido na preservação, restauração e divulgação do acervo de filmes

ídiche, como o projeto de filmes online do Steven Spielberg Jewish Film Archive37.

Fundado em 1975 com a aquisição de 30 longa-metragens em ídiche, The National

Center for Jewish Film tem por objetivo preservar e disseminar filmes relevantes para

a história judaica e tem exercido um importante papel na restauração de filmes

ídiches. Inicialmente apoiado por outras duas instituições renomadas nesta área, o

American Jewish Historical Society e a Brandeis University, atualmente trabalha de

forma independente. Sua prioridade tem sido restaurar e conservar adequadamente os

filmes com maior risco de perda: matrizes ou cópias únicas e filmes de nitrato. Seu

trabalho mais recente, foi a restauração do Der Dibbuk, considerado um tesouro da

cinematografia ídiche. Ao todo já foram restaurados 30 longa-metragens realizados

entre os anos 30 e 40 na Europa e nos EUA, entre eles Uncle Moses e Green Fields. O

Moma de Nova Iorque se uniu ao centro para montar uma retrospectiva do Cinema

Ídiche, quando foram restaurados 12 filmes para a exibição.

36 Em sua carreira, Paul Muni recebeu 5 indicações ao Oscar de melhor ator em: The Valiant (1928/1929),

O Fugitivo (I Am a Fugitive from a Chain Gang; 1932/1933), The Story of Louis Pasteur (1936), The Life of Emile

Zola (1937), Last Angry Man (1959) . Ganhou a estatueta em The Story of Louis Pasteur, concorrendo com Spencer

Tracy, Gary Cooper, Walter Huston e William Powell .

37 http://sites.huji.ac.il/jfa/jfa.htm

Page 71: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

A SOBREVIVÊNCIA DO CINEMA ÍDICHE 66

Anualmente diversos festivais sobre a filmografia ídiche/judaica são

organizados, como uma forma de manter vivas as referências à língua e possibilitar às

novas gerações a ao público em geral conhecer um pouco mais desta exuberante

cultura.

No Brasil, em 1989 o Museu de Imagem e do Som de São Paulo apresentava

uma mostra com Der Dibbuk ( 35 anos depois de sua exibição no Brasil, no Cine São

Carlos), Der Vilner Schotot Chazan (1938) e Duas Irmãs (Tzwei Schwester; Ben K.

Blake ,1938). Estes filmes foram encontrados por Claudionor dos Santos Cardoso,

um estudioso do cinema e programador da então produtora paulista Polifilmes.

Originalmente foram trazidos para o Brasil pelo polônes Simon Buchalski, que

trabalhou como ator e empresário no teatro ídiche da Polônia, onde atuou com a atriz

Jennie Goldstein, a atriz principal do Duas Irmãs. “A difusão das salas de cinema

levou o Sr. Buchalski a importar filmes ídiches que eram exibidos no antigo cine

Odeon – em São Paulo38)”. Além dos três filmes acima, ficou no Brasil uma cópia de

Eli, Eli (Joseph Seiden, 1940). Atualmente este filme encontra-se na Cinemateca

Brasileira, juntamente com Der Dibuk, que foi doado por José Mindlin, então

presidente da Metal Leve39. Em 1990 o MIS repetiria a mostra só que desta vez, além

de Der Dibbuk seriam apresentadas outros sete títulos: Tevye, Miscrach un Marew

(East and West; 1923), Uncle Moses, Grine Felder, Wu is Majn Kind (1937) , Jankel

der Schimd, Die Freyleche Kabtsonim (1937,Polônia). No mesmo ano haveria uma

mostra de sete filmes ídiches no Instituto Goethe de Porto Alegre: Tevye (versão de

1939), Miscrach un Marew ,Grine Felder, Wu is Majn Kind, Jankel der Shcmid, Der

Dibuk, Die Freyleche Kabtsonim (Leon Fencke, 1938) com Zygmund Turkow. A

mostra itinerante, iria ser exibida também no Cineclube Estação Botafogo, no Rio de

Janeiro, que em 2002 sediou a Mostra Cine & Arte Judaica, quando foi exibido o

filme ídiche Os Dois Amores do Ferreiro dirigido por Ulmer.

38 José Sachetta Ramos no artigo “MIS apresenta três filmes raros em língua ídiche”, Folha de São Paulo,

07/04/1989. 39 Folha de São Paulo, Seção Ilustrada, página 2, 31/07/1991

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A SOBREVIVÊNCIA DO CINEMA ÍDICHE 67

capa do programa da Mostra de Cinema Ídiche realizada no MIS em São Paulo, no Cineclube Estação Botafogo no Rio de Janeiro e no Instituto Goethe em Porto Alegre. 1990

Mostra no Rio de Janeiro que exibiu “Os Dois Amores do Ferreiro” de Edgar G. Ulmer

Atualmente o cinema ídiche, bem como propriamente a língua, são

encontrados basicamente em documentários e em alguns personagens de ficção. No

Brasil temos alguns raros exemplos de obras audiovisuais com referências ao ídiche.

Em 1972, Regina Duarte incorporava a possuída Leah, no espisódio de Caso especial

Dibuk, o Demônio , contracenando com José Wilker sob a direção de Daniel Filho.

O curta-metragem-documentário Mazel Tov (1990), de Flávia Seligman e

Jaime Lerner, é quase integralmente falado em ídiche e nos conta um pouco da

história da colonização judaica no Rio Grande do Sul. Dois velhinhos contam suas

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A SOBREVIVÊNCIA DO CINEMA ÍDICHE 68

histórias de infância ocorridas em duas colônias agrícolas no início do século. Uma

delas culmina numa animada festa de casamento e a outra num saque, um assalto

violento. As visitas, as roupas, a comida, o banho ritual, a cerimônia, os preparativos

para uma grande festa, entrelaçam-se com a visita ao túmulo, o banho de tina, a sopa,

as velas - os preparativos para receber o shabat, o dia sagrado.

Produção brasileira, Algo em Comum (2000), dos diretores Reinaldo Pinheiro

e Edu Ramos, conta a história de um menino de rua que assiste curioso ao ensaio de

um coral. Mas não se trata de um coral comum. É o Coral dos Velhinhos Judeus do

Bairro do Bom Retiro, que se reúne mensalmente para cantar músicas em ídiche no

Instituto Cultural Israelita Brasileiro. A narrativa do filme chama a atenção e passa,

paralelamente, a história de dois povos diferentes.

Curiosamente neste ano de 2002 duas produções destacam personagens que

viveram esta época e que falam ídiche : o filme Sonhos Tropicais (André Sturm,

2002), com a polaca Ester no Rio de Janeiro e a novela Esperança com a judia

Camille, filha de imigrantes em São Paulo.

Page 74: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

A SOBREVIVÊNCIA DO CINEMA ÍDICHE 69

Matéria sobre Sonhos Tropicais na Revista Veja de abril de 2002.

.

Page 75: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

CONCLUSÃO 70

7. Conclusão

Quando iniciei minha pesquisa, sabia que um mundo novo se descortinaria

para mim. Não só pelo envolvimento íntimo e pessoal com o tema (minha avó é uma

imigrante judia romena cuja língua natal era o ídiche), mas pela possibilidade de

conhecer um pouco mais de nossa história Brasileira, particularmente sob a ótica do

cinema. Mas jamais imaginei que iria passar por tamanho auto-conhecimento e

descobertas. Assistir os filmes ídiches com este olhar especial me fez compreender

muito de nossa sociedade e do mundo em que vivemos. Mas havia uma preocupação.

Como desenvolver um tema tão distante de meu país e de minha realidade cotidiana?

Como fazer este elo, antes feito pelo meus antepassados, entre Europa e América?

Afinal, esses filmes não foram produzidos no Brasil.

Foi quando me dei conta, que apesar de não terem sido produzidos aqui, esses

filmes foram exibidos e muito assistidos aqui. Jamais assistirei a esses filmes, mesmo

no cinema, com a mesma emoção e ansiedade dos imigrantes. Repentinamente

estavam em um pais estranho e distante de sua terra natal, quente e tropical, onde nem

mesmo falavam a língua, mas que através desses filmes realizavam uma verdadeira

viagem no tempo, de encontro às suas origens.

A cada descoberta de jornal, a cada filme anunciado uma grande emoção

tomava conta de mim. Me sentia buscando algo novo, nunca antes explorado sob esta

perspectiva.

Já pela metade do trabalho, constatei que não tinha idéia da dimensão do rico

material que me aguardava. Apesar de pouca, a bibliografia estrangeira existente é

consistente e profunda, e muito ainda há para ser estudado. No exterior várias

universidades e centros de pesquisa vêm investindo no estudo da memória e da

história através da preservação, recuperação, exibiçào e pesquisa de filmes ídiches.

No Brasil, pesquisa do gênero inexiste. É a primeira vez em que, a partir de

entrevistas e pesquisas em fontes primárias, se faz um prévio levantamento dos filmes

ídiches exibidos no Brasil. Buscas ainda deverão ser feitas, cobrindo um maior

número de fontes impressas. Existem pessoas vivas que assistiram a essas sessões.

Page 76: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

CONCLUSÃO 71

Elas deverão ser achadas e entrevistadas, pois o tempo, neste caso, é fundamental,

pois são fontes únicas que se perdem para sempre. Em Hollywood a influência dos

imigrantes judeus na indústria cinematográfica é inegável. E no Brasil? Qual a

influência da cultura ídiche em nossa produção audiovisual? E em nossa cultura como

um todo? O presente trabalho é apenas o início de um caminho para que novas

pesquisas sejam feitas e certamente não encerra o assunto.

Através da pesquisa sobre a exibiçào desses filmes, não só no Rio de Janeiro,

mas no Brasil, poderá ser traçado um panorama da vida cultural dos imigrantes

fugidos da 2a. guerra. E a partir da vida cultural chegaremos à organização social e

política do Brasil em relação a estes imigrantes. São portas de nossa história que se

abrem. São formas de nos conhecermos melhor como nação.

Page 77: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

BIBLIOGRAFIA 72

Bibliografia

Berlitz, Charles. As Línguas do Mundo. Rio de Janeiro, RJ.: Editora Nova Fronteira

S.A., 1982.

Eco, Humberto. Como se faz uma tese. São Paulo, SP.: Editora Perspectiva, 1996.

Evelyn Furquim Werneck. Arquitetura do Espetáculo - Teatros e cinemas na

formação da Praça Tiradentes e da Cinelândia. Rio de Janeiro, RJ. Editora UFRJ

Fink, Guido. No solo Woody Allen. La tradizione ebraica nel cinema americano

Veneza: Marsilio, 2001

Goldberg, Judith N. Laughter Trough Tears: The Yiddish Cinema. East Brunswick,

N.J.: Associated University Presses, 1983.

Goldman, Eric A. Visions, Images and Dreams: Yiddish Film Past and Present. Ann

Arbor, Mich.: UMI Research Press, 1983.

_______________. A World History of Yiddish Cinema. dissertação Ph.D.,New York

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Gonzaga, Alice. Palácios e Poeiras: 100 Anos de Cinema no Rio de Janeiro. Rio de

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Guinsburg, J. O Conto Ídiche. São Paulo, SP.: Editora Perspectiva, 1966.

Harshav, Benjamin. O Significado do Ídiche. São Paulo, SP.: Editora Perspectiva,

1994.

Hurlburt, Allen. Layout: o design da página impressa. São Paulo,SP.:Nobel,1986.

Sadoul, . História do Cinema Mundial – volume II. Livraria Martins Editora,

Sandrow, Nahama. Vagabond Stars: A World History of Yiddish Theatre

Vários Autores, Il cinema jiddisch, Catalogo della rassegna organizzata dal Goethe-

Institut di Genova, Milano, Napoli, Roma, Torino e Trieste, a cura di Roberto

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Page 78: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

BIBLIOGRAFIA 73

Jornais

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Nossa Voz – de de 1947 a 1949

Folha de São Paulo - 07/04/1989;

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Page 79: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

LINKS 74

Links

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Page 80: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

REFERÊNCIAS ICONOGRÁFICAS 75

Referências iconográficas

família de imigrantes judeus-romenos na praça onze, Rio de Janeiro, década de 40. ............ 1 família de imigrantes judeus-romenos na praça onze, Rio de Janeiro, década de 40. Todos

falavam o ídiche. (álbum familiar da autora) ...................................................................... 1 

Judias Romenas da cidade de Iedenitz, antes da 2a. Guerra Mundial .................................... 6 

Moishe Oysher em Der Vilner Shtot Hazan (Overture to Glory; EUA, 1939), como um chazan

da Sinagoga de Vilna. Ao contrário do The Jazz Singer, ele deixa sua família e religião

para se transformar em um famoso cantor da Ópera de Varsóvia. Entre a culpa e o

sucesso, resolve voltar para sua comunidade. Considerado o filme com cenas mais

realistas sobre os cultos em sinagogas, o filme inicia com o culto do Rosh Hashana e

termina com o Kol Nidre, formando uma das mais representativas rimas da

cinematografia ídiche. ...................................................................................................... 13 

sequência inicial de “Der Dibbuk” (Varsóvia, 1937-38) ........................................................... 16 

Molly Picon em East and West ( Mazal Tov; Sidney Goldin,1923) ......................................... 17 

Esther-Rokhl Kaminska – a Deusa Judia - e Ida Kaminska. Mãe e filha, no cemitério de Vilna

em “Tkies Kaf” (Polônia, 1924), dirigido por Zygmunt Turkow. ........................................ 20 

Sala de cinema na Bielorússia em 1914 ................................................................................. 22 

A Brivele der Mamen (1911) .................................................................................................... 24 

Cartaz da peça The Jewish King Lear encenada em Nova Iorque em meados de 1900 ...... 26 

Cartaz do filme The Jewish King Lear of Vilna (U.S.A., 1935) .............................................. 26 

Willet St. Theater, um nickelodeon no Brooklyn com cartazes em Ídiche e Inglês – 1913.

Sentado à esquerda, Joseph Seiden, que iria se transformar num dos primeiros

produtores de cinema ídiche em Nova Iorque. ................................................................ 28 

Tamara Adelheim em His Excellency (URSS, 1928) .............................................................. 29 

Cartaz do filme Jewish Luck (1925), com Solomon Mikhoels em destaque. Design de Natan

Altman. Percebe-se o uso de formas geométricas combinando palavras e imagens,

característica da vanguarda Construtivista Russa, da qual fez parte Marc Chagall,

Wassily Kandinsky, Alexander Rodchenko, Nikolay Prusakov e os irmãos Stenberg.

Chagall, inclusive, elaborou diversos cenários para o teatro ídiche. ............................. 30 

Zygmunt Turkow, que iria trabalhar no Brasil, em dois momentos de Tkies Khaf (Polônia,

1924), onde foi diretor e ator. ........................................................................................... 31 

No cemitério de Vilna, ele está à esquerda contracenando com Henryk Tarlo. ..................... 31 

Al Jonson reza o Kol Nidre em “The Jazz Singer” (E.U.A., 1927) .......................................... 32 

O Judeu Errante (Der Vanderner Yid; George Roland , 1933) é considerado o primeiro filme

Americano a descortinar a situação dos judeus na Alemanha Nazista e único filme de

sua época falado em ídiche a explorar o assunto. O filme foi uma resposta dos judeus

americanos ao regime nazista. Foi produzido pelo Jewish American Film Arts e Atlas

Page 81: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

REFERÊNCIAS ICONOGRÁFICAS 76

Studio em Long Island, Nova Iorque durante o verão de 1933, alguns meses depois que

o refime nazista tomou o poder na Alemanha. ................................................................ 35 

Uncle Moses (1932)................................................................................................................. 36 

Maurice Schwartz como Tevie, o leiteiro, dirige uma cena de O Violinista no Telhado (Tevye

der Milkhiker; U.S.A., 1939) ............................................................................................. 38 

A noiva Leah (Lili Liliana) é cercada pelos pobres (muitos recrutados nas ruas de Varsóvia)

na “Dança dos Pobres” coreografada por Judith Berg para A Alma Errante (1937) ....... 39 

Molly Picon se veste de menino para tocar violino em Yidl Mit'n Fidl, um dos maiores

sucessos comerciais da filmografia ídiche ....................................................................... 40 

poster de Verdes Campos (USA, 1937) de Edgar G. Ulmer, .................................................. 41 

um dos maiores sucessos comerciais da cinematografia ídiche, estrelado pelo Yiddish art

and Artef Theatre.............................................................................................................. 41 

poster de A Curva do destino (1945), dirigido por Ulmer ao ingressar na Producers Releasing

Corporation (PRC). ........................................................................................................... 41 

The American Matchmaker (1940), último filme ídiche de Ulmer. .......................................... 43 

Moishe Oysher em The Singing Blacksmith. ........................................................................... 44 

Restaurado pelo National Center for Jewish Film em 1998, The Singing Blacksmith foi dirigido

por Edgar Ulmer em 1938, baseado no drama de David Pinski Yankl der Schmid (1906).

Roteirizado para o cinema pelo próprio Pinski, o filme é estrelado pelo famoso cantor

Moishe Oysher no papel título de um ferreiro mulherengo e beberrão e narra sua luta

para resistir às tentações. ................................................................................................ 44 

Adaptado da peça de Peretz Hirschbein, Verdes Campos (U.S.A., 1937) de Edgar G. Ulmer

foi o primeiro filme americano falado em ídiche filmado fora dos estúdios. .................... 44 

Molly Picon é a estrela de Mamele (1938) de Joseph Green ................................................. 45 

Longo é o Caminho (“Lang is Der Veg”)- foi realizado na Alemanha ocupada pelos E.U.A em

1948. ................................................................................................................................. 46 

77 minutos P&B ....................................................................................................................... 46 

11-4-1946 – Jornal Israelita anuncia a exibição de “Der Idisher Kenig Lir” no Cine São Carlos

.......................................................................................................................................... 49 

Jornal Israelita 15-09-1945 – anúncios de sessão passatempo no Capitólio ......................... 52 

Jornal Israelita 22-09-1945 – crítica do filme russo “Arco Íris” no Cine Odeon ....................... 53 

Jornal Israelita 10-11-1945 – anúncio de “Alma Russa”com Paul Muni ................................. 55 

No Jornal Israelita eram anunciados filmes ídiches lado a lado com apresentações de teatro

ídiche. esta edição de 17-6-1948 anuncia o filme Yossef in Mizraim a ser exibido no Cine

São Carlos juntamente com peça estrelada por Moishe Oysher no teatro Recreio. ....... 57 

Jornal Israelita de ................................................................................................................... 58 

26-8-1948 anuncia ................................................................................................................... 58 

a exibição de ............................................................................................................................ 58 

Der Idisher Niguen no São Carlos. .......................................................................................... 58 

Page 82: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

REFERÊNCIAS ICONOGRÁFICAS 77

Acima, anunciada noite de arte ídiche no Teatro Municipal, com obras de Rosenblat,

eternizado nos filmes ídiches, mostrando a liberdade de expressão e intensa vida

cultural do ídiche na comunidade judaica no Rio de Janeiro de 1948. ............................ 58 

Em contrapartida, pode-se ter uma idéia do contexto político vivido no pós-guerra na Europa,

a partir da notícia sobre o forte anti-semitismo na Alemanha. ......................................... 58 

Jornal Israelita de 15-8-1946 anuncia em ídiche a exibição de A Última Porta (The Last

Chance; Thomas Bentley,1937) ....................................................................................... 62 

Jornal Israelita (19-8-1948) anuncia a exibição de Der Idicher Ninguen ................................ 63 

Regina Duarte em transe ao incorporar o Diabo, em Dibuk, o Demônio, apresentado no

programa Caso Especial da Rede Globo em 1972 .......................................................... 64 

Mostra no Rio de Janeiro que exibiu ....................................................................................... 67 

“Os Dois Amores do Ferreiro” de Edgar G. Ulmer .................................................................. 67 

Matéria sobre Sonhos Tropicais na Revista Veja de abril de 2002. ....................................... 69 

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ANEXO 1 - FILMOGRAFIA 78

Anexo 1- Filmografia

Filmografia de 1911 a 1916

TÍTULO ORIGINAL TÍTULO ALTERNATIVO PAÍS PRODUTORA ANO DIRETOR COMENTÁRIO

Der Vilder Fater The Cruel Father POLÔNIA Sila 1911 Alexander Marten

A Brivele der Mamen URSS 1911 A M Smolensky

Lai Chyeim Good Luck URSS Pathé Frères Moscow 1911 Kai Hansen

Di Ferztoysene The Disinherited POLÔNIA Sila 1912 Stanislaw Sebel God, Man and Devil POLÔNIA Sila 1912 Stanislaw Sebel

Hasa die Yesome Hasa the Orphan POLÔNIA ? 1912

Nahum Lipovski ou Mark Arenstein? Vilna Circle Theater

Masters and Workers POLÔNIA Mintus Company 1912 ?

baseado em obra de Tolstoy

Mirele Efros POLÔNIA Sila 1912 Stanislaw Sebel

God of Vengeance URSS Pathé Frères Moscow 1912

Alexander Arkatov

Mirele Efros URSS Moscow Gaumont 1912

Vu Iz Meun Hasa? Where is my Khasa? URSS Moscow Gaumont 1912

Bleeding Hearts Jewish Freedom under King Casimir of Poland EUA

Victor Film Co./Universal Imp 1913 Sidney Goldin

How the Jews Care for Their Poor EUA

Victor Film Co./Universal Imp 1913 Sidney Goldin documentário

Nihilist Vengeance EUA Victor Film Co./Universal Imp 1913 Sidney Goldin

The Black 107 EUA Ruby Features 1913 Sidney Goldin

The Heart of a Jewess EUA

Victor Film Co./Universal Imp 1913 Sidney Goldin

The Sorrow of Israel EUA Victor Film Co./Universal Imp 1913 Sidney Goldin

Bigamistka

Zajn Wajbs Man / Malzenstwona Rozdrozu / His Wife's Man POLÔNIA Kosmofilm 1913 Stanislaw Sebel

Dem Chazons Tochter

Córka Kantora e The Cantor's Daughter POLÔNIA Kosmofilm 1913 Stanislaw Sebel

Der Unbekanter POLÔNIA Kosmofilm 1913 Stanislaw Sebel Di Szchite The Slaughter POLÔNIA Kosmofilm 1913 Stanislaw Sebel com H. Kaminska Gots Sztrof God's Punishment POLÔNIA Kosmofilm 1913 Stanislaw Sebel Herecle Mejuches POLÔNIA Kosmofilm 1913 Stanislaw Sebel

Sorrows of Sarah URSS Khanzhonkov 1913 Alexander Arkatov

A Passover Miracle EUA Kalem 1914 Shalom Masimon

Escaped from Siberia EUA

Great Players feature Film Company 1914 Sidney Goldin

Uriel Acosta EUA

Great Players feature Film Company 1914 Sidney Goldin

Der Yeshiva Bocher POLÔNIA Mintus Company 1914 A Slavinski

Di Sztifmuter The Stepmother / Macocha POLÔNIA Kosmofilm 1914 Stanislaw Sebel

Dos Pintele Yid POLÔNIA Mintus Company 1914 A Slavinski

Shma Yisroel POLÔNIA Mintus Company 1914 Avrom Yitskhok Kaminsky

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ANEXO 1 - FILMOGRAFIA 79

TÍTULO ORIGINAL TÍTULO ALTERNATIVO PAÍS PRODUTORA ANO DIRETOR COMENTÁRIO Beser dem Tot oder aza Shand URSS 1914 Kiddish Ashem URSS Reznikov 1914 The War and the Jew Milkhokme um Yidn URSS Mizrakh 1914 ?

The Children of the Ghetto EUA

Box Office Attraction Co./William Fox 1915 Frank Powell

Zajn Wajbs Man POLÔNIA 1916

Com Ida Kaminska. Baseado na versão de 1913.

Yiddishe Fater Jewish Father EUA ? ? Henry Lynn Leybe der Shuster Leybe the Shoemaker POLÔNIA ? Zvay Musicanten Two Musicians POLÔNIA ? com a Warsaw Art Players

Russian Father URSS Ukrainfilm (?) ? ?

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ANEXO 1 - FILMOGRAFIA 80

Filmografia de 1917 a 1928

TÍTULO ORIGINAL TÍTULO ALTERNATIVO PAÍS PRODUTORA ANO DIRETOR COMENTÁRIO

Delo Beilisa URSS 1917 Josef Soifer ou Yevgeni Bauer

Der Blutiken Shpas URSS 1917

Judge, People URSS 1918 Alexander Arkatov

Vem Ich Bin Roytshild URSS 1918

Alexander Arkatov

Das Judenmadel The Jewish Girl ÁUSTRIA Helio Film ou Ekran-Film 1921 Otto Kreisler com Molly Picon

Mazel Tov

Good Luck / Eastt and West / Ost und West / East Side Sadie ÁUSTRIA

Listo-Film/Picon Film 1923 Sidney Goldin com Molly Picon

Evereisk Polk URSS 1923 Gregory Gritcher (?)

Yiskor Thou Shalt Remember ÁUSTRIA Judische-Kunstfilm 1924 Sidney Goldin e George Roland

relançado nos EUA em 1933

Tkijes Khaf The Vow / Vilna Legend POLÔNIA Leo Forbert 1924 Zygmund Turkow remontado nos EUA em 1933

Yom Hachupa The Wedding Day POLÔNIA Mintus Company 1924 A Slavinski

Jeden Z 36 Der Lamedvovnik POLÔNIA Leo-Forbert Films 1925 Henry Szaro Jewish Luck The Matchmaker URSS Goskino 1925 Alexis Granovski

Broken Hearts EUA Jaffe Art Films 1926 Maurice Schwartz

lançado em 1934 musicado como The Unfortunate Bride of Suffolk Street

Benya Krik URSS 1926 Vladimir Vilner

Mabul URSS Sovkino 1926 Yevgeni Ivanov-Barkov

Wandering Stars URSS Vufku 1926 Gregory Gritcher The Jew on the Land URSS 1927 Abram Room His Excellency URSS ? 1928 Grigori Roshal

Motele Shpinder Motel the Weaver URSS Vufku 1928 Vladimir Vilner

Trough Tears Skvoz Slyozy URSS Vufku 1928 Gregory Gritcher Lançado em 1933 nos EUA com Laughter trough Tears

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ANEXO 1 - FILMOGRAFIA 81

Filmografia de 1929 a 1934

TÍTULO ORIGINAL TÍTULO ALTERNATIVO PAÍS PRODUTORA ANO DIRETOR COMENTÁRIO East Side Sadie EUA WorldArt Film Co. 1929 Sidney Goldin Style and Class EUA 1929 Sidney Goldin The Eternal Prayer Ad Mosay EUA Metropolitan

Studios 1929 Sidney Goldin

The Song Writer's Revue

EUA 1929 Sammy Lee

W Lasach Polskich Polish Woods POLÔNIA Leo Forbert 1929 Jonas Turkow Cain and Artem URSS Sovkino 1929 P.P. Petrov-bytov Seeds of Freedom URSS Belgoskino 1929 Grigori Roshal Eternal Fools Eyibke Naronim EUA Judea Films 1930 Sidney Goldin Joseph and his Brethen

EUA 1930 Adolph Gartner

Kol Nidre EUA 1930 Sidney Goldin My Yiddishe Mama Mein Yiddishe Mame /

Mine Yiddishe Mame EUA Judea Films 1930 Sidney Goldin

Oy Doktor Oh, Doctor EUA 1930 Sidney Goldin Sailor's Sweetheart EUA 1930 Sidney Goldin Schuster Liebe Shoemake's Romance EUA 1930 Sidney Goldin The Jewish Gypsy EUA 1930 Sidney Goldin The Voice of Israel Di Shtime fun Yisroel EUA Judea Films 1930 Joseph Seiden Niemandsland No Man's Land ALEMANHA 1931 George Shdanoff

e Victor Trivas

Der Seder Nacht Feast of Passover EUA 1931 Sidney Goldin Khazan afn Probe A Cantor on Trial EUA ? 1931 Sidney Goldin Sulamith EUA Judea Films 1931 Abraham

Goldfadden

The Eternal Jew EUA Jewish Talking Pictures Co.

1931 George Roland

Zein Weibs Lubovnik

His Wife's lover EUA High Art Pictures 1931 Sidney Goldin

A Jew at War URSS Ukrainfilm 1931 Grigori Roshal Joseph in the land of Egypt

EUA Guaranteed Picture Co.

1932 George Roland

The Sacrifice of Isaac

EUA H. Malkin 1932 ?

The Unfortunate Bride

Die Ungluckliche Kale EUA 1932

Uncle Moses EUA Yiddish Talking Picture

1932 Sidney Goldin e Aubrey Scotto

Salon Dora Green ALEMANHA 1933 Henrik Galeen

A Vilna Legend The Rabbi's Power EUA Jewish Film Distributors

1933 George Roland exibido no Brasil

A Yiddishe Tochter A Daughter of Her People / Alma Sofredora

EUA ? 1933 Exibido no Brasil. Com Jennie Goldstein. Remontagem da versão muda com a Vilna Troupe

Live and Laugh Happy Times / Geleb um Gelakht

EUA Jewish Talking Pictures Co.

1933 Max Wilner

The Wandering Jew Der Wanderer Yid EUA Jewish American Film Art

1933 George Roland

The Return of Nathan Becker

Vozvrashcheniye Nejtana Bekkera

URSS Belgoskino 1933 Boris Shpins e R. M. Milman

The Dream of my People

Halome Ami EUA Palestine-Amercan Film Co.

1934 Joseph Fox documentário

The Land of Promise

EUA Keren Kayemet 1934 ? documentário

The Youth Russia EUA Produção Soviética e Americana

1934 Henry Lynn

Yosl Cutler and His Puppets

EUA 1934 Yosl Cutler

Koliivshina Mass Strugle URSS 1934 Ivan Kavaleridze Seekers of Hapiness

URSS Belgoskino 1934 Vladimir Korsh-Sablin

Page 87: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

ANEXO 1 - FILMOGRAFIA 82

Filmografia de 1935 a 1945

TÍTULO ORIGINAL TÍTULO ALTERNATIVO PAÍS PRODUTORA ANO DIRETOR COMENTÁRIO Auditions for the Hebrew Actors' Union

EUA 1935 DOCUMENTÁRIO

Bar Mitzvah EUA S&L Film Company 1935 Henry Lynn com Boris Thomashevsky

Shir Hashirim Song of Songs EUA Globe Pictures 1935 Henry Lynn

Yiddish King Lear Der Yiddishe Kenigen Lir

EUA ? 1935 Harry Tomashevsky

Puppets URSS 1935 curta Land of Promise EUA Urim Palestine Film

Co. 1936 Yehuda Lerman documentário

Love and Sacrifice Liebe um Leidenschaft EUA Jewish Talking Pictures Co.

1936 George Roland

The Black Network EUA 1936 Roy Mack Green Fields Greene Felder EUA Collective Film

producers 1937 Edgar G. Ulmer e

Jacob Bem-Ami

I want to Be a Boarder

EUA 1937 Joseph Seiden

I Want to be a Mother

Ikh vil zayn a Mame EUA Jewish Talking Pictures Co.

1937 George Roland

The Cantor's Son Dem Khazns Zundyl EUA Eron Pictires 1937 Illya Motyleff e Sidney Goldin

com Moishe Oysher. Provavelmente exibido no Brasil com o título Sublime Melodia

The Holy Oath Di Heylige Shvue EUA Cinema Service Corporation

1937 Henry Steward

Vu Is Mine Kind? Where is my child? / Wu is Majn Kind

EUA Menorah Productions

1937 Abraham Leff e Henry Lynn

A Brivele der Mamen

A Little Letter to Mother POLÔNIA Greenfilm 1937 Joseph Green

Der Purimshpiler The Jester / The Purim Player

POLÔNIA Greenfilm 1937 Joseph Green e Jan-Nowina Przybylski

Mir Kumen We Arrive POLÔNIA Sektor 1937 Alexander Ford documentário Yidl mit'n Fidl Yiddle with his Fiddle POLÔNIA Greenfilm 1937 Joseph Green e

Jan-Nowina Przybylski

Der Dibuk The Dibbuk / Der Dibbek POLÔNIA Fencke Films 1937/1938

Michael Wasynski

The Power of Life EUA Lynn Production Inc.

1938 Henry Lynn

Two Sisters Tzwei Schwester

EUA Graphic Picture Productions

1938 Ben K. Blake

Yankel Der Schmidt The Singing Blacksmith / Yankl der Shmid / Jankel der Schimd

EUA Collective Film producers

1938 Edgar G. Ulmer exibido no Brasil

Freyliche Kabtsonim

Jolly Paupers POLÔNIA Sektor 1938 Leon Fencke (?) exibido no Brasil

Mamele Little Mother POLÔNIA Greenfilm 1938 Joseph Green Pietro Wysej Neighbors POLÔNIA Best Films 1938 Leon trystan The Vow POLÔNIA Foreign Cinema

Arts 1938 Henry Szaro com Zygmund Turkow

A People Eternal EUA Six Star Production 1939 Henry Lynn remontagem de The Wandering Jew

Kol Nidre EUA Cinema Service Corporation

1939 Joseph Seiden exibido no Brasil

Mirele Efros EUA Credo Pictures 1939 Joseph Berne Mothers of Today Hayntige Mames EUA Apex Productions 1939 Henry Lynn

My Son Mein Zundele EUA Jewish Talking Pictures Co.

1939 Joseph Seiden relançado em 1950 como The living Orphan

Tevya Tevje / Tevie EUA Mayman Films Inc. 1939 Maurice Schwartz

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ANEXO 1 - FILMOGRAFIA 83

TÍTULO ORIGINAL TÍTULO ALTERNATIVO PAÍS PRODUTORA ANO DIRETOR COMENTÁRIO The Light Ahead Di Klyatshe / Fischke der

krumer / Fischke o Manco

EUA Ultra Films 1939 Edgar G. Ulmer Exibido no Brasil

Ahn a Heim Without a Home POLÔNIA Sektor 1939 Alexander Marten

com Ida Kaminska

Americaner Shadchen

The American Matchmaker

EUA Fame Films 1940 Edgar G. Ulmer

Eli, Eli EUA Cinema Service Corporation

1940 Joseph Seiden

Motel the Operator EUA Cinema Service Corporation

1940 Joseph Seiden

Overture to Glory Der Vilnet Shtot Khazn EUA Elite Productions 1940 Max Nosseck exibido no Brasil

Her Second Mother Ir Tsveyte Mame EUA Cinema Service Corporation

1941 Joseph Seiden

Mazel Tov Yidden EUA Cinema Service Corporation

1941 Joseph Seiden

The Jewish Melody The Jewish Song / Der Yiddisher Nigh

EUA Cinema Service Corporation

1941 Joseph Seiden

What a Mother-in-law

EUA Cinema Service Corporation

1934? ou 1940?

Harry S. Brown e Harry Garson

Al Chet I Have Sinned POLÔNIA Warsaw Art Productions

1935? ou 1938?

Shaul Goskind ou Alexander Marten

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ANEXO 1 - FILMOGRAFIA 84

Filmografia de 1945 até 2002

TÍTULO ORIGINAL TÍTULO ALTERNATIVO PAÍS PRODUTORA ANO DIRETOR COMENTÁRIO Kara Boza Gots Sztrof POLÔNIA ? The Jewish People Live

Mir Lebn Geblibene POLÔNIA 1947 ?

Lang ist der Weg Long Is the Road ALEMANHA 1948 Herbert B. Fredersdorf e Marek Goldstein

Alemanha ocupada pelos EUA

We Live Again FRANÇA 1948 ? documentário Unzere Kinder Our Children POLÔNIA 1948/

1949 Nathan Gross documentário lançado em

1951 Catskill Honeymoon EUA Pictorial Ventures 1950 Joseph Berne

God, Man and Devil Got, Mentsh ,un Tayvl EUA Aaron Films Corporation

1950 Joseph Seiden

Monticello Here We Came

EUA Cinema Service Corporation

1950 Joseph Seiden

The Great Advisor Der Groyseretz Gever EUA Cinema Service Corporation

1950 Joseph Seiden

Jews in Poland POLÔNIA Polish State Film Studios

1957 B. Ladowicz documentário

Three Daughters EUA Cinema Service Corporation

1961 Joseph Seiden

Há Martef The Cellar ISRAEL 1963 Natan Gross Hester Street EUA 1975 Joan Micklin

Silver

Bruxelles-transit Bélgica 1980 Samy Szlingerbaum

Fanny och Alexander

SUÉCIA/ ALEMANHA/FRANÇA

1982 Ingmar Bergman

Almonds and Raisins

EUA 1984 Russ Karel documentário

Há Makah Hashmonim V'Echad

The 81st Blow ISRAEL 1984 David Bergman e Jacques Ehrlich

documentário

Everything's for you EUA 1989 Abraham Ravett Mazel Tov BRASIL 1990 Flávia Seligman

e Jaime Lerner curta-metragem

Nifradnu Kach So We Said Godbye ISRAEL 1991 Jorge Gurvich Moi Ivan, toi Abraham

Ivan and Abraham FRANÇA/ BIELORRÚSSIA

1993 Yolande Zauberman

The Last Klezmer: Leopold Kozlowski, His Life and Music

EUA 1994 Yale Strom Documentário

Aretz Hadasha ISRAEL 1994 Orna Ben-Dor Niv

Too Early to be Quiet, Too Late to Sing

ISRAEL 1995 Nadav Levitan documentário

A Tickle in the Heart ALEMANHA/SUÍÇA

1996 Stefan Schwietert documentário

Chants of Sand and Stars

FRANÇA/ CANADÁ/ BÉLGICA /ISRAEL/ HOLANDA

1996 Nicolas Klotz Documentário

Von Holle zu Holle From Hell to Hell Germany 1996 Dmitri Astrakhan L'Homme Est une Femme Comme les Autres

FRANÇA 1998 Jean-Jacques Zilbermann

Shalosh Achayot ISRAEL/ALEMANHA

1998 Tsipi Reibenbach

TÍTULO ORIGINAL TÍTULO ALTERNATIVO PAÍS PRODUTORA ANO DIRETOR COMENTÁRIO

Page 90: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

ANEXO 1 - FILMOGRAFIA 85

TÍTULO ORIGINAL TÍTULO ALTERNATIVO PAÍS PRODUTORA ANO DIRETOR COMENTÁRIO 2 Koffers Vol Left Luggage HOLANDA 1998 Jeroen Krabbé

Shylock CANADÁ 1999 Pierre Lasry documentário Voyages FRANÇA/P

OLÔNIA 1999 Emmanuel

Finkiel

Great Grandmother - Great Grandfather

ISRAEL 1999 Taliya Finkel

L'Chayim, Comrade Stalin

EUA 2000 Yale Strom documentário

The Komediant ISRAEL 2000 Arnon Goldfinger

documentário

Solomon and Gaenor

REINO UNIDO

1999/ 2000

Paul Morrisson exibido no Brasil

Les Larmes d'um Homme

The Man Who Cried REINO UNIDO/ FRANÇA

2000/ 2001

Sally Potter

El Vestido de Terciopelo

ARGENTINA

2001 Lilián Hebe Morello

Produção para TV

Olivetti 82 Bélgica 2001 Rudi Vandenbossche

Ils Tremblent Devant Dieu

EUA/FRANÇA/ISRAEL

2001 Sandi Simcha Dubowski

Produção da TV Francesa

Mamadrama AUSTRÁLIA 2001 Monique Schwartz

documentário

Ted Allan: Ministrel Boy of the Twentieth Century

CANADÁ 2002 Merrily Weisbord

Se Souvenir des Belles Choses

FRANÇA 2002 Zabou

Kedma FRANÇA/ ITÁLIA/ ISRAEL

2002 Amos Gitai

Page 91: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

ANEXO 2 86

Anexo 2 - População falante de ídiche nos EUA (1990 Census) Estado Pessoas

Alabama: 120

Alaska: 12

Arizona: 921

Arkansas: 72

California: 12691

Colorado: 704

Connecticut: 2188

Delaware: 202

District of Columbia: 113

Florida: 27363

Georgia: 572

Hawaii: 56

Idaho: 0

Illinois: 6751

Indiana: 432

Iowa: 231

Kansas: 77

Kentucky: 157

Louisiana: 137

Maine: 202

Maryland: 3660

Massachusetts: 4126

Michigan: 2550

Minnesota: 843

Mississippi: 27

Missouri: 1250

Montana: 0

Nebraska: 219

Nevada: 515

New Hampshire: 213

New Jersey: 11569

New Mexico: 120

New York: 117323

North Carolina: 316

North Dakota: 15

Ohio: 2907

Oklahoma: 71

Page 92: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

ANEXO 2 87

Oregon: 220

Pennsylvania: 9844

Rhode Island: 494

South Carolina: 193

South Dakota: 17

Tennessee: 251

Texas: 1270

Utah: 57

Vermont: 78

Virginia: 641

Washington: 386

West Virginia: 37

Wisconsin: 835

Wyoming: 16

Total 213064

Page 93: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

ANEXO 3 88

Anexo 3 - O último judeu do Éden carioca - por Arnaldo Bloch

No princípio era uma vila na Praça Onze. No centro, um jardim onde, além de

árvores e frutos, enfileiravam-se tanques de lavar roupa. Seu nome: Éden. À sua volta,

sobrados habitados por imigrantes judeus da Europa Oriental, refugiados do pós-

guerra, que chegaram em massa ao Rio nos anos 20.

- Aqui só tinha iídiche - repete, como um bordão, o biscateiro Maurício

Benkes, vulgo Pinduca, de 65 anos, o último judeu daquela geração que ainda mora na

vila. A palavra "iídiche" - que, além de dar nome ao idioma dos ashkenazis na

Diáspora, significa "judeu" - é das poucas de que se recorda este filho de imigrantes

russos, morador desde menino da casa 49 da Vila

Dr. Alberto Siqueira. Tombado pelo Patrimônio, o quadrilátero fica entre o

quartel da Ceptran e a 6ª DP (Cidade Nova), e já teve como moradores a família do

judeu Senor Abravanel (Sílvio Santos) e a Tia Ciata, matriarca do samba carioca.

- Papai não conversa muito com a gente sobre as suas origens - comenta a

recatada Sheiva, cujo nome em homenagem à avó religiosa soa estrangeiro, ao

contrário da irmã, Ana Carla, e do irmão, Mauro Sérgio. Talvez por isso leve tão a

sério a possibilidade de se converter, como confidencia sua mãe, Celi, que não é judia:

- Quero ajudá-la - comenta Celi, tendo ao lado a amiga Airina (nome alemão),

que sabe mais de judaísmo do que ela e Pinduca:

- Eram tempos bons. Na páscoa judaica, a gente comia aquelas bolachas deles

(o pão ázimo). Lembro-me do shoichale (o açougueiro) que matava galinhas, e da

dona Malke, que fazia a lavagem ritual para os enterros.

Transportado no tempo, Pinduca cita, como autômato, palavras em iídiche.

Michigane (maluco), é a primeira que vem à mente. Schwartze, (negro), a segunda.

- Aqui não tinha preconceito. Casei com a Celi, que é mulata. Uma vez estava

com meu pai no barbeiro e chegou um schwartze com um jornal iídiche na mão. O

Page 94: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

ANEXO 3 89

pessoal ficou curioso: você sabe ler isso? O rapaz começou a ler em voz alta: um

iídiche perfeito, ficou todo mundo de boca aberta.

Pinduca nunca vai à sinagoga e não tem mais o seu kipá(solidéu). A única

conexão que mantém com a tradição - além da circuncisão, atestada por Celi - é a

visita anual ao cemitério de Vila Rosaly, onde estão sepultados os pais, Pedro e

Sheiva. Outra conexão, com a culinária, começa a retomar por vias inesperadas, como

explica a mulher:

- Tenho uma tia, a Isabel, que trabalhou como cozinheira em casa de judeus e

hoje tem um bufê de comida judaica. Uma das clientes é a dona da Rachel Presentes.

De vez em quando ela manda varenique, aquela massinha com cebola.

- Mas da última vez estava meio seca... - protesta Pinduca. - Minha mãe fazia

com gordura de galinha, era mais gostoso! - recorda.

Se Isabel vai bem nos negócios, a sorte sorriu menos para Pinduca e seus oito

irmãos: contrariando o estereótipo do judeu bom-de-loja, seu pai, um antiquário, não

era negociante dos mais bem aquinhoados:

- Papai sabia comprar como ninguém, mas vender que é bom não vendia. E

não queria ouvir os outros. Era só alguém dar conselho que ele reagia: "o que você

sabe da vida"? - lamenta Pinduca, sentado no terraço do sobrado de Armêmio Pereira

da Silva, presidente da Associação de Moradores e Amigos da Vila Dr. Alberto

Siqueira (Amovas).

Faz-se um silêncio, e todos observam o cair da tarde e os sinais da chuva da

última quinta-feira. O contorno das ruínas do Éden - coberto de casas - está sombrio.

Na sexta-feira será o shabat, dia do descanso semanal, celebrado por judeus religiosos

ou tradicionalistas com as rezas do pão e do vinho, das quais Pinduca guarda vaga

lembrança.

- Hoje em dia não deve nem ter mais onde comprar o pão trançado e aquele

vinho doce gostoso, não é?

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ANEXO 3 90

- Engano seu, Pinduca. Ali pertinho, no "balança- mas-não-cai", tem uma

lojinha - garante dona Airina.

- Aqui só tinha ídiche - balbucia Pinduca.

A noite cai.

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ANEXO 4 91

Anexo 4 – Cinema no Jornal Israelita

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ANEXO 4 92

27-10-1945

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ANEXO 4 93

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ANEXO 4 94

22-8-1946

15-7-1948

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ANEXO 4 95

22-7-1948

Page 101: idiche nos tropicos, o cinema judaico na cinelândia

96

* * * F I M * * *