introducao a climatologia para os tropicos - capitulo v - a circulação atmosférica

13
' I ' 1., 'li:' : 11 11 1 '1 ' 1 11 I I '" I" 111II ~l l lii: """" CAPÍTUW 5 A CIRCULAÇÃO ATMOSFÉRICA As escalas dos movimentos atmosféricos A atmosfera está constantemente em movimento. O movimento atmosférico é a soma de dois principais componentes - movimento em relação à superfície da Terra (isto é, o vento) e movimento em conjunto com a Terra, ao girar em torno de seu eixo. Este segundo movimento exerce importantes efeitos sobre a direção dos ventos em relação à Terra (Atkinson, 1972). Há duas dimensões para o movimento da atmosfera em relação à superfície da Terra - a dimensãohorizontal e a vertical. O próprio movimento ocorre em diferentes escalastempo- rais e espaciais. A causa básica e fundamental do movimento atmosférico, hori- zontal ou vertical, é o desequilíbrio na radiação líquida, na umidade e no momentum entre as baixas e as altas latitudes e entre a superfície da Terra e a atmosfera. Outros fatores que influenciam a circulação atmosférica são a topografia, a distribuição das superfícies continentais e oceânicas e as correntes oceânicas. Foram apresentadas anteriormente, na Tabela 1.1, as três princi- pais escalas dos sistemas de movimentos meteorológicos. Dá-se ênfase, na tabela, aos sistemas climáticos dentro da atmosfera e às várias escalas de área e de tempo nas quais ocorrem. Uma classificação similar pode ser feita a respeito do movimento atmosférico ou da circulação. Desse modo, temos circulações atmosféricas primárias, secundárias e terciárias em ordem decrescente de grandeza, tanto em suas escalas de área quanto de tempo. A circulaçã'o primária é a circulação geral da atmosfera, descrita por Barry e Chorley (1976) como sendo os padrões em larga escala,oU 72 73 globaiS, de vento e p~essão que se mantêm ao longo do ano ou se repe- tem sazonalmente. E a circulação geral que realmente determina o adrão dos climas do mundo. Por exemplo, como a circulação geral ~endea se dispor em zonas latitudinais, os climas do mundo também tendema ocorrer em zonas. Inseridos dentro da circulação geral estão os sistemas circulatórios secundários, tais como as depressões e os anticiclones das latitudes médias e as várias perturbações tropicais. Comparadosà circulação geral da atmosfera, esses sistemascirculatórios sãOde existência relativamente breve e se movem muito rapidamente. Ossistemasde circulação terciária consistem principalmente de sistemas de ventos locais, tais como as brisas terrestres e marítimas, as ondas desotavento, os ventos catabáticos e anabáticos. Estes sistemas circula- tórios são precisamente localizados, sendo amplamente controlados porfatores locais, e seus períodos de existência são consideravelmente maiscurtos do que os dos sistemas secundários de circulação. Neste capítulo nós consideraremos os aspectos da circulação geral da atmos- fera. Os sistemas de circulação secundária serão descritos no próximo capítulo.Mas, primeiramente, iremos tratar dos fatores que controlam o movimento do ar sobre a superfície terrestre. A movimentação verticaldo ar, embora importante, é relativamente pequena se compa- rada ao movimento horizontal. Ela será analisada no Capítulo 7, por causa de seu papel nos processos de evaporação -condensação. Leisdo movimento horizontal Há quatro principais fatores que controlam o movimento horizon- tal do ar próximo à superfície terrestre. São esses: 1. a força do gradiente de pressão, 2. a força de Coriolis, 3. a aceleraçãocentrípeta e 4. a força de fricção. A causa primordial do movimento do ar é o desenvolvimento e a manutenção de um gradiente de pressão horizontal, que funciona como a força motivadora para o ar se movimentar de áreas de alta pressão pa.raáreas de menor pressão. Diferenças horizontais na pressão são cr~adaspor fatores térmicos e/ou mecânicos, embora estesnem sempre sejamdistinguíveis.A força do gradiente de pressão é também inversa- ~

Upload: vobis

Post on 25-Jun-2015

1.358 views

Category:

Documents


4 download

DESCRIPTION

Quinto capítulo do importantíssimo livro de Ayoade. Excelente para quem estuda Climatologia.

TRANSCRIPT

Page 1: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

'

I

'

1.,

'li:'

:

11

11

1

'1'1

11I I'" I"

111II~l llii:""""

CAPÍTUW 5

A CIRCULAÇÃO ATMOSFÉRICA

As escalasdos movimentos atmosféricos

A atmosfera está constantemente em movimento. O movimentoatmosférico é a soma de dois principais componentes - movimento em

relação à superfície da Terra (isto é, o vento) e movimento em conjuntocom a Terra, ao girar em torno de seu eixo. Este segundo movimentoexerce importantes efeitos sobre a direção dos ventos em relação àTerra (Atkinson, 1972). Há duas dimensões para o movimento daatmosfera em relação à superfície da Terra - a dimensãohorizontale a vertical. O próprio movimento ocorre em diferentes escalastempo-rais e espaciais.

A causa básica e fundamental do movimento atmosférico, hori-zontal ou vertical, é o desequilíbrio na radiação líquida, na umidadee no momentum entre as baixas e as altas latitudes e entre a superfícieda Terra e a atmosfera. Outros fatores que influenciam a circulaçãoatmosférica são a topografia, a distribuição das superfícies continentaise oceânicas e as correntes oceânicas.

Foram apresentadas anteriormente, na Tabela 1.1, as três princi-pais escalas dos sistemas de movimentos meteorológicos. Dá-seênfase,na tabela, aos sistemas climáticos dentro da atmosfera e às váriasescalasde área e de tempo nas quais ocorrem. Uma classificaçãosimilar podeser feita a respeito do movimento atmosférico ou da circulação. Dessemodo, temos circulaçõesatmosféricas primárias, secundárias e terciáriasem ordem decrescente de grandeza, tanto em suas escalas de áreaquanto de tempo.

A circulaçã'o primária é a circulação geral da atmosfera, descritapor Barry e Chorley (1976) como sendo os padrões em larga escala,oU

72

73

globaiS,de vento e p~essãoque se mantêm ao longo do ano ou se repe-tem sazonalmente. E a circulação geral que realmente determina oadrão dos climas do mundo. Por exemplo, como a circulação geral

~endea se dispor em zonas latitudinais, os climas do mundo tambémtendema ocorrer em zonas. Inseridos dentro da circulação geral estãoos sistemas circulatórios secundários, tais como as depressões e osanticiclonesdas latitudes médias e as várias perturbações tropicais.Comparadosà circulação geral da atmosfera, esses sistemascirculatóriossãOde existência relativamente breve e se movem muito rapidamente.Ossistemasde circulação terciária consistem principalmente de sistemasdeventos locais, tais como as brisas terrestres e marítimas, as ondasdesotavento, os ventos catabáticos e anabáticos. Estes sistemascircula-tórios são precisamente localizados, sendo amplamente controlados

porfatores locais, e seus períodos de existência são consideravelmentemaiscurtos do que os dos sistemas secundários de circulação. Nestecapítulo nós consideraremos os aspectos da circulação geral da atmos-fera.Os sistemas de circulação secundária serão descritos no próximocapítulo.Mas, primeiramente, iremos tratar dos fatores que controlamo movimento do ar sobre a superfície terrestre. A movimentaçãoverticaldo ar, embora importante, é relativamente pequena se compa-rada ao movimento horizontal. Ela será analisada no Capítulo 7, porcausa de seu papel nos processos de evaporação -condensação.

Leisdo movimento horizontal

Há quatro principais fatores que controlam o movimento horizon-taldo ar próximo à superfície terrestre. São esses:

1. a força do gradiente de pressão,2. a força de Coriolis,3. a aceleraçãocentrípeta e4. a força de fricção.

A causa primordial do movimento do ar é o desenvolvimento e amanutençãode um gradiente de pressão horizontal, que funciona comoa força motivadora para o ar se movimentar de áreas de alta pressãopa.raáreas de menor pressão. Diferenças horizontais na pressão sãocr~adaspor fatores térmicos e/ou mecânicos, embora estes nem sempresejamdistinguíveis.A força do gradiente de pressão é também inversa-

~

Page 2: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

-

74

mente proporcional à densidade do ar. A força do gradiente de pressãopor unidade de massa é expressa matematicamente da seguinte forma:

ldp-p dn

em que p é a densidade do ar e dp/dn é o gradiente de pressãohorizontal.Isto significa que quanto menor é o espaçamento das isóbaras, maisintenso é o gradiente de pressão e maior é a velocidade do vento.

Desde que o ar seja obrigado a se mover pela força do gradientede pressão, ele é imediatamente afetado pela força de CorioUsou defle.tora, que se deve à rotação da Terra. A força de CorioUsfoi descritamatematicamente, pela primeira vez, pelo cientista francês Gaspard deCorioUsem 1835 e demonstrada pelo meteorologista americanoWilliamFerreI, em 1856. Por causa da rotação da Terra, há um aparente desviodos objetos que se movem, inclusive do ar, para a direita de sua traje.tória de movimentação, no hemisfério Norte, e para a esquerda, nohemisfério Sul, se olhado por qualquer observador sobre a superfícieda Terra. Essa força defletora, por unidade de massa, é matemati.camente expressa por:

:,i"

illitl

11111~li

til '

I

1

1.

1'

,'

1

,lli

1.1

IIII!!::, ,

-2w V sen ()

em que w é a velocidade angular de rotação da Terra em tomo de seueixo (cerca de 15" por hora ou 7,29 X 10-5 radianos/s), V é a velocidadeda massa e () é a latitude. Assim, a magnitude da deflexão é propor.cional à velocidade da massa e ao seno da latitude. Para uma dada velo-cidade, o efeito de CorioUsé máximo nos pólos e diminui com o senoda latitude, tomando-se zero no Equador. A força de Coriolis sempreatua em ângulos retos com a direção do movimento do ar, para adireita, no hemisfério Norte, e para a esquerda, no hemisfério Sul(Barry e Chorley, 1976).

Se um corpo, durante o movimento, segue uma trajetória curva,deve haver uma aceleração em direção ao centro da rotação. Esta acele.ração centrípeta é matematicamente expressa como:

mV2r

onde m é a massaem movimento,V é sua velocidadee r é o raiodecurvatura.A aceleraçãocentrípetapode tambémserconsideradacorno

75

urna força centrífuga, que opera radialmente para fora. Tal força é deigualgrandeza, mas de sinal oposto à aceleração centrípeta. A grandezada aceleração centrípeta é pequena, de modo que ela somente se tornairnportante onde os ventos em alta velocidade se movem em trajetóriasrnuitocurvas,como num sistema de pressão intensamente baixa.

Finalmente, próxima da superfície da Terra, uma quarta força - a

força de fricção - ajuda a controlar a velocidade e a direção do movi.rnento áereo horizontal. A força de fricção se deve aos obstáculos que asuperfície da Terra oferece ao movimento do ar. A força de fricção atuacontra o vento e reduz sua velocidade. Isto também causa diminuição

101 ooixo

a.I!)li. 1000 mO

::> vento geostrófico

1004mO

Uli.

alto

101 ooixo vento

a.I!)li. 1000 mO

1004mb

alto

FC - Força de Coriol isFF -Força FricionalFGP -Força Gl"Odiente de Pressão

Figura 5.1 - Exemplos de movimentos equilibrados quando as isóbaras são lineares.

I

~........

Page 3: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

76

~:i;111!i11'';'1'!!I'

'rlli!',,11,"

ilill il~"II!I!,II"I'

na força de Coriolis que é, em parte, dependente da velocidade, cornofoi mencionado anteriormente.

Todas as forças descritas acima não operam necessariamenteparacontrolar a direção e a velocidade do vento num dado momento ou erndeterminado lugar. Os exemplos do equilfbrio de forças acerca das isó.baras lineares são mostradas na Fig. 5.1. Na Fig. 5.1 (a) o vento SOpraparalelo às isóbaras, ou melhor, mais ou menos formando ângulos retoscom o gradiente de pressão. Isto ocorre porque a força do gradiente depressão é equilibrada exatamente pela força de Coriolis, que atua nadireção oposta. Tal vento é conhecido como o vento geostrófico e podeser observado na atmosfera livre, onde não exista o atrito. O caso mos-trado na Fig. 5.1 (a) é o hemisfério setentrional. No hemisfério meri-dional, o centro de alta pressão estará à esquerda e o de baixa pressãoàdireita, quando observado da posição direcional do vento.

A velocidade do vento geostrófico (Vg) é dada pela fórmula:

Vj - 1 dpg - 2wsen()p dn

I l

'll

'i~

i']

~ ,llllllli

, '11i'!,. ill:11I1I'

l i,I,

1

1,11'""'",

em que w, (), p e dp/dn já foram definidos nas equações precedentes.Isso indica que a velocidade é inversamente relativa à latitude. Excetonas baixas latitudes, onde a deflexão de Coriolis se aproxima de zero, ovento geostrófico é uma aproximação muito boa dos movimentos obser-vados na atmosfera livre.

Da superffcie da Terra até aproximadamente 500-1.000 metros,a força de fricção é operativa e o vento sopra através das isóbaras nadireção do gradiente de pressão (ver Fig. 5.l-b). O ângulo no qual ovento sopra através das isóbaras cresce com o aumento do efeito defricção criado pela superffcie da Terra. Ele é cerca de 10-20° na super-ffcie marftima e 25-35° sobre o continente. Com o aumento da alturaacima da superffcie, seja sobre a terra ou sobre o mar, o efeito defricção diminui. Um tipo espiral de vento Ekman ocorre com a altura,se considerarmos o perfil teórico da velocidade do vento com a altura,sob condições de turbulência mecânica (ver Fig. 5.2).

Os padrões de fluxo do ar que derivam do equilfbrio de forças,em sistemas de baixa e alta pressão no hemisfério Norte, são mostradasna Fig. 5.3. Num sistema de baixa pressão, o fluxo equilibrado é man-tido numa trajetória curva pela força excessiva do gradiente de pressãosobre a força de Coriolis, dando a aceleração centrfpeta 1fquida.Essevento é conhecido como o vento de gradiente. No caso do sistema de

- r

77VENTO GE08TRÓFICO

Figura 5.2 - Em virtude das variações em altitude, no hemisfério Norte osventos formama espiralde Ekman(conformeBarrye Chorley,1976).

alta pressão, a aceleração para o centro é devida ao excesso de força deCoriolissobre a força do gradiente de pressão. Supondo-se que os gra-dientesde pressão em ambos os sistemas são iguais, então a velocidadedo vento em torno da baixa pressão deve ser menor que o valor geostró-fico (subgeostrófico), enquanto que a velocidade em torno da altapressãoé supergeostrófica, isto é, maior que o valor geostrófico. Esteefeito é, todavia, mascarado pelo fato de que o gradiente de pressãonuma alta pressão é geralmente muito menor do que o mesmo numabaixa pressão. Tanto no sistema de alta quanto no de baixa pressão, oefeito da força de fricção é o de fazer os ventos soprarem em um ânguloatravésdas isóbaras, assimcomo diminuir suas velocidades.

Movimento vertical de larga escala na atmosfera

O movimento vertical dentro da atmosfera ocorre em duas escalas

frincipais - larga escala e pequena escala. O movimento vertical emargaescalaocorre sobre grandes áreas de vários milhares de quilômetrosqUadradosnuma escala de tempo de poucos metros por segundo.,O

8." . REgi ~\f\\USIUEfU-_."..,_..,,"""'~

~

Page 4: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

78

a I MOVIMENTO CICL.ÔNICO

baixa baixavento

.1000mbo.I!)li. gradi ente

do vento

1004mb

1000mb

1004mb

oli.

alta

alta

bl MOVIMENTO ANTICICL.ÔNICO

alta alta

I'II!

1II

! 1,

1

",

,11

. :1

I, illl'

"""'"

1004mb1004mb

1000mb1000 mb

a.I!)li.

baIxa baixa

FC - Força de Corioli. FF- Força Friccional FGP- Força Gradiente de Pressão

Figura 5.3 - Exemplos de movimento equilibrado em torno de isóbaras curvas.

movimento vertical em pequena escala ocorre sobre pequenas áreas depoucas centenas de quilômetros quadrados com uma escalatemporal de1-30 metros por segundo. Os dois tipos de movimentos verticais sãodiferentes porque são causados por diferentes mecanismos. Movimentosverticais de pequena escala são geralmente induzidos diretamente pelasuperfície da Terra e sua continuação é grandemente dependente daestrutura térmica e da umidade da atmosfera sobre ela (Atkinson,1972). O movimento é induzido tanto mecânica quanto termalment~ou por uma combinação de ambos os processos. Como esses moVI-mentos dão origem à condensação na atmosfera, eles serão consideradosno Capítulo 7.

79

por outro lado, a ascensão ou a descida do ar ocorre basicamente

ettl resposta a fatores dinâmicos, que estão relacionados ao fluxo hori-zontal.O movimento vertical de ar em larga escala é somente afetado dettlodo secundário pela estabilidade da massa de ar. A velocidade dovento muitas vezes se desvia do valor geostrófico, devido a aceleraçõesOUdesacelerações locais no fluxo horizontal. Se numa unidade devolume de ar sai mais ar do que entra, devido à aceleração local, háperda de massa naquele volume. Isto é conhecido como divergência.Se,por outro lado, há desaceleração no fluxo horizontal, o ar se acumulano volume e ocorrerá a convergência.Uma vez que a atmosfera é ummeio contínuo, configurações de divergência e convergência estãointerligadas.Como se mostra na Fig. 5.4, se a divergênciasobrepõe-seà convergênciahá elevação, mas se a convergência sobrepõe-se à diver-gência, ocorre a subsidência. Desse modo, se todos os ventos fossemgeostróficos,não haveria convergência ou divergência e nem movimen-tação vertical em larga escala, e, portanto, nenhuma mudança no estadoatmosférico.

A convergência e a divergênciapodem também ser induzidas pelasformas topográficas de larga escala, tais como as Montanhas Rochosas eos Andes, ou até mesmo pelo limite terra/oceano. Este último é conhe-cido como convergência ou divergênciacosteira. Masa convergênciae adivergência são, geralmente, fenômenos dinâmicos da atmosfera livrebem acima da camada basal da atmosfera.

. DIVERG~NCIA ---+CONVERG~NCIA..

Nívelmédio j l ~--_J ""'--------não.divergência .---------------(cerca de 600 mbl

'SCEN~NCt SUrOE:C'i~ .CONVERGENCIA4 4 DIVERGE:NCIA .~E:R~ciE///////////,//////////////////,//'//"/"/

BAIXA AL.TAPRE:SSÃO PRESSÃO

Figura 5.4 - Relação entre padrões divergentes, movimentos verticais e pressãosuperficial.

I

~~

Page 5: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

80

Aspectos principais da circulação geral da atmosfera

I'

lii

11I

1;:

Como se mostrou anteriormente, o movimento em larga escaladaatmosfera no tempo e no espaço é o que nós chamamos de circulaçãogeral da atmosfera. Esta circulação tem tanto componentes vertiCaisquanto horizontais e é controlada por diversos fatores. Basicamente,acirculação geral da atmosfera é dirigida pelo desequilíbrio na radiação,na umidade, no momentum e na massa entre as baixas e as altas latitu-des. Os padrões globais de radiação, considerados no Capítulo 3,mostram que há excesso de energia em baixas latitudes e deficiênciaemoutras partes. No Capítulo 7, o padrão global de umidade será conside-rado. Basta dizer, agora, que há excesso de umidade nas baixaslatitudes,que é transportada em direção a latitudes mais elevadas para nelascompensar a deficiência.

Passemos a considerar o momentum angular da Terra, geralmentereconhecido como o segundo fator mais importante que controla acirculação geral da atmosfera. A atmosfera não somente gira com aTerra mas também movimenta-se sozinha em tomo do eixo da Terra. Aatmosfera, desse modo, possui um momento angular. O momentoangular (também chamado momento de momentum) por unidade demassa de um corpo que gira em tomo de um eixo fixo é proporcional asua velocidade e a sua distância do eixo de rotação. Com a Terra e aatmosfera girando uniformemente, há conservação do momento angular,isto é, o momento angular total permanece constante. Isto significaquese uma massa de ar muda sua posição na superfície da Terra, de modoque sua distância do eixo de rotação seja afetada, sua velocidade angulardeve mudar para a do momento angular a fim de permanecer constante.O momento angular é máximo no Equador e diminui em direção aospólos para se tomar zero no pólo, o próprio eixo de rotação. Daí, umvolume de ar deslocando-se em direção aos pólos adquire progressiva-mente maiores velocidades em direção leste.

As baixas latitudes são geralmente dominadas por ventos predo-minantes de leste, os alíseos, enquanto as latitudes médias são domina-das pelos ventos de oeste. O atrito entre os alísios e a Terra, que giradeoeste para leste, gera momento angular de leste nas baixas latitudes.Este momento adicional é transferido para as áreas deprimidasnas lati-tudes médias, onde por atrito os ventos de oeste continuarnent~possuem momento de oeste para a Terra. Não fosse o momento contI-nuamente alimentado pelas baixas latitudes, os ventos predominantes

'

"

,

'

,/1

'11

: ,r

I I

I111)

ialil:I'1

""",,"

81

deoeste se dissipariam em dez dias devido à dissipação de energiapelafricção.

O momento angular é transferido das baixas para as altas latitudes

dasseguintesmaneiras (Chandler, 1967):

1. pelosmovimentos na "célula de Hadley", nas baixas latitudes;2. pelo deslocamento d,s perturbações atmosféricas, particularmente

na atmosfera superior, da zona subtropical e anticiclônica;3. pelasondas de pressão troposférica de alto nível e pelas perturbações

ciclônicase anticiclônicas superficiaisque as acompanham.

Agorapodemos considerar os principais aspectos da circulação geral daatmosfera.

Os padrões dos sistemas de pressão dos ventos globaispróximos à~uperfícieda Terra são mostrados na Fig. 5.5. Os efeitos do aqueci-mento diferencial das superfícies terrestres e aquáticas são amplamentenegligenciados,mas o efeito de Coriolis foi levado em consideração, demodoque os ventos mostrados no diagrama são desviados para a direitadesuatrajetória no hemisfério Norte e para a esquerda de sua trajetória,no hemisfério Sul. Há zonas de baixa pressão em torno do Equador eemtorno das latitudes de 60° ao norte e ao sul do Equador. As zonasde alta pressão ocorrem em tomo dos pólos e em torno das latitudes de30° ao norte e ao sul do Equador. A zona de baixa pressão em tomo doEquadoré essencialmente de origem térmica, isto é, causada pelo aque-cimentosolar. As zonas de baixa pressão subpolares, em torno das lati-tudes de 60° ao norte e sul do Equador são, essencialmente, de origemdinâmica.Elas são causadas pela rotação da Terra, que provoca um

turbilhãopolar e, assim, uma tendência para a baixa pressão em tornodos pólos. Entretanto, por causa do frio intenso nos pólos, o efeitodinâmicoé mascarado pelo efeito térmico. A pressão é, assim, alta emtomo dos pólos por causa do ar intensamente frio reinante nessas áreas.

As altas subtropicais têm sido explicadas como decorrência dosefeitosde um ou mais dos seguintesmecanismos:1. o acúmulo de ar que se move em direção aos pólos, à medida que

sejadefletido para leste, através da rotação da Terra e da conservaçãodo momento'

2. o mergÚlhode correntes dirigidas para os pólos, por resfriarnentoradioativo'

3. a necessid~dede uma zona de alta pressão, próxima ao paralelo de30°, separar aproximadamente zonas iguais de ventos alísios e ventosde oeste.

~.......

Page 6: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

::",'

'jiim:,ilii

liil'!11il"

1

'1

'1''11, ',~

'!li!,

:r

1;

1I

1

'

1

1

1

'

II i(I,,,,,,,,,,,,

I

II

~

82

o

Figura 5.5 - Zonas de pressão e ventos num globo terrestre homogêneo.

Em resposta a esses padrões de distribuição de pressão, há seissistemas de ventos, três em cada hemisfério. No hemisfério Norte estãoos ventos alísios de nordeste, os ventos dominantes de oeste e os ventospolares de leste, enquanto no hemisfério Sul temos os alísios de sudeste,os ventos predominantes de oeste e os ventos polares de leste. É impor-tante notar que os alísios de sudeste cruzam o Equador para se torna-rem ventos de sudoeste, como na região da África Ocidental, enquantoos de nordeste se tornam os de noroeste no hemisfério Sul, depois decruzarem o Equador.

~

83

Além dos ventos superficiais mostrados na Fig. 5.5, outros

aspectosfundamentais e importantes da circulação da atmosfera são osseguintes(ver Barry, 1967):

1. perturbações instáveis de larga amplitude nos ventos de oeste, nasmédias e altas latitudes;

2. fluxo lento e contínuo dos alísiosnas baixas latitudes, incluindoalgunsvórtices intensos (ver Capítulo 6);

3. correntes de ar fortes e estreitas, chamadas jet streams, na tropos-fera superior, sobre as latitudes médias.

As ondas longas nos ventos de oeste foram primeiramente estu-dadas e descritas por um meteorologista americano, Rossby. Daí asondas serem freqüentemente chamadas "ondas Rossby". Estas ondasocorremna média ou alta troposfera nos ventos de oeste superiores. Asondas se propagam mais lentamente que os ventos que sopram atravésdelas. Às vezes, elas permanecem estacionárias e podem até mesmoretroceder em direção oeste. Quatro ou cinco ondas longas ocorremtipicamente num mapa hemisférico, com comprimento de onda daordem de 2.000 quilômetros. As ondas Rossby são em parte de origemtérmica, em parte conseqüência do efeito de barreiras montanhosassobre o fluxo de ar, pois os talvegues barométricos não parecem variarsazonalmenteem seus locais. Já foi mostrado que as ondas Rossby têmrelaçãocom o tempo das latitudes médias, pois elas exercem influênciasobre as posições das depressões superficiais e dos anticiclones. Asdepressões se formam ou se aprofundam numa área de divergênciasuperior, como sob a vertente direita de um talvegue barométricosuperior. Do mesmo modo, os anticiclones se formam ou se intensi-ficam numa área de convergência superior, como a borda esquerda deum talvegue barométrico superior. Ao contrário, os anticiclones seformam ou se intensificam numa área de convergência superior, comona vertente esquerda de um talveguebarométrico superior.

O jet stream é uma faixa de ar de alguns milhares de quilômetrosde comprimento, centenas de quilômetros de largura e de algunsquilô-metros de espessura,com uma velocidademínima do ar de cerca de 120qUilômetros por hora. Reconhecem-se dois principais tipOS de jetstream: o jet stream subtropical e o da frente polar, sendo que ambosSão encontrados bem abaixo da tropopausa. Acredita-se que o jetstream subtropical seja de origem dinâmica, sendo um produto darotação da Terra. A atmosfera tem seu momento angular máximo no

Page 7: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

84

Equador. O ar ascendente, espalhando-se para o Norte e para o Sul apartir do Equador, move-semais rapidamente que a latitude para a qualele está soprando. O ar é defletido para a direita no hemisfério Norte epara a esquerda no hemisfério Sul e se toma concentrado, como ojet stream subtropical, em torno da latitude de 300 (Riley e Spolton1974). O jet stream subtropical é relativamente constante em POSiÇão:em determinada estação.

Em contraste, o jet stream da frente polar é altamente variávelem posição de um dia para outro sobre uma ampla faixa das latitudestemperadas. O jet stream da frente polar é produzido por uma diferençade temperatura e está intimamente relacionado à frente polar. Dessefato deriva a sua importância meteorológica. Julga-se que o jet streamsubtropical também desempenhe algum papel no desenvolvimento dacirculação da monção asiática. Osjet streams são de grande importânciapara a aviação. Um avião que se mova com o jet stream economizarácombustível e terá sua velocidade aumentada, enquanto um que semova contra um jet stream terá sua velocidade diminuída e gastará maiscombustível. Foi assim que, de fato, se descobriu a existência de jetstreams, durante a SegundaGuerra Mundial, em missões de bombardeiono Extremo Oriente.

Um terceiro jet stream - o jet stream das noites polares - éencontrado na estratosfera, nas altas latitudes, no inverno.

Modelos da circulação geral da atmosfera

Assim, a circulação geral é realmente muito complexa devido aosvários fatores envolvidos.Há complexidades advindas:

1. das diferenças nas propriedades térmicas da superfície da Terra,particularmente entre as superfícies continentais e oceânica,s;

2. das variaçõesna topografia da Terra;3. das transformações de energia de uma forma para outra dentro da

atmosfera;4. das escalasde movimento diferentes e de atuação recíproca.

Essas complexidades e os problemas colocados pelos dados de obser.vação inadequados sobre a atmosfera, tanto no plano horizontal quantono vertical, têm impedido o desenvolvimento de um modelo satisfatórioda circulação geral da atmosfera.

85

Vários modelos conceituais da circulação geral da atmosfera

foram apresentados em várias épocas por diferentes pessoas (verFig.5.6), mas nossa compreensão da atmosfera é ainda incompleta.talvez o primeiro modelo tenha sido apresentado por Edmund Halley,que em 1686 delineou um modelo de circulação térmica com aqueci-mento máximo em baixas latitudes e uma célula termalmente direta,explicando o fluxo dos ventos alísios em direção ao Equador. Essemodelo foi ligeiramente aperfeiçoado por George Hadley, que em 1735

AB

pólONorte

PÓlONorte

J\\S

Fontede calor ~ ;:~

c D

Celu Ia diretaSW

., _NE -- Pólo TROPOPAUSA~,"--!WI NorteH~RTICA

Frente 1\ ,-célula indireta ~ ' -Lato de frentepolar W \ 60." polar

n~1 ~ '~

\\~::;~~~A

~E SW célula TROPICAL.

\diretaI Hadleyl

~

Figura5.6 - Modelos conceituais da circulação geral da atmosfera. A, célulatérmica direta em uma Terra estacionária (modelo de Halley,1686); B, célula térmica direta em uma Terra em rotação (modelode Hadley, 1735); C, modelo tricelular da circulação média(Rossby, 1941); e D, circulação meridional média durante oinverno (Palmen, 1951).

~

Page 8: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

86

"''',j"

incorporou os efeitos da rotação da Terra para explicar os alísios denordeste e de sudeste e concebeu uma contracorrente compensatóriade sudoeste sobre os alísios. Essa circulação meridional plana é aindaválida com relação aos trópicos, sendo atualmente conhecida como a"célula de Hadley".

Foi somente em 1856 que FerreI propôs um modelo muitomelhor que os dois últimos. Pela primeira vez foram introduzidas zonasde ventos de oeste, desprezadas pelos dois modelos anteriores. O mo-delo de células trimeridionais de FerreI foi novamente proposto porBergeron, em 1928, e por Rossby, em 1941, com poucas modificações.O modelo de Palmen, de 1951, é uma modificação maior do modelotricelular, como foi originalmente proposto por FerreI, em 1856.

Por causa da complexidade da circulaçã'ogeral e da necessidadede isolar os processos fundamentais atuantes, métodos matemáticos eexperimentais sã'oagora utilizados. Importantes contribuições têm sidodadas por estudos de laboratório sobre rotações de fluidos para a teoriada circulação geral da atmosfera. O desenvolvimento de modelos mate.máticos da circulação geral tem recebido grandes impulsos advindosdos progressos da tecnologia espacial e da computação. Atualmenteestão sendo obtidas informações de áreas terrestres inóspitas e inacessí.veis do mundo, bem como dos oceanos, graças aos satélites meteoroló-gicos. Tais modelos experimentais e matemáticos melhoraram bastanteo nosso conhecimento da circulação geral da atmosfera.

Sabe-se que os trópicos desempenham um papel vital na circula-ção geral da atmosfera. Tudo o que a circulação geral da atmosferatenta redistribuir - energia, umidade, momentum - está em excessonas baixas latitudes e em deficiência nas médias e altas. Recentesobservações de satélites indicam que a fonte de energia representadapelos trópicos é ainda mais abundante do que anteriormente se estiomara. Como foi mencionado anteriormente, os trópicos ajudam amanter a energia cinética dos ventos de oeste, que se dissipariamemdez dias caso não ocorresse o recebimento de momentum dos trópicos.Como RiehI (1969) oportunamente notou, a circulação tropical não édirigida a partir das latitudes mais altas. Antes, a circulação tropicalajuda a dirigir a circulaçã'onas médias e altas latitudes. Assim, a forçados ventos de oeste proporciona uma medida indireta da própria cirCU-lação geral da atmosfera.

A força total dos ventos de oeste pode ser avaliadamedindo-se00gradiente médio de pressã'ohemisférica entre os paralelos de 35° e 5S ,

87

convertendo-o em vento geostrófico de oeste. Isso é conhecido comoíndice zona! O valor do índice zonal é alto no inverno, quando oscontrastes térmicos entre os trópicos e as latitudes médias sã'omáximos,e baixo no verão, quando os contrastes térmicos sã'omínimos. Quandoa diferença de pressão média entre 35° e 55°N é mais do que 8 mb, oíndice zonal é considerado elevado; quando a diferença de pressão émenor do que 3 mb, o índice é considerado baixo.

Certos padrões sinóticos estão associados com um índice zonalalto e baixo. As seguintes características estão associadas com um altoíndice:

1. movimento rápido de depressões em direção ao leste;2. pequena mudança meridional de massas de ar, mesmo que o gradien-

te de temperatura meridional seja forte;3. intenso desenvolvimento dos anticiclones subtropicais e das baixas

pressões islandesas;4. as baixas pressões islandesas tendem a se localizar a leste de sua

posiçãonormal.

Com baixo índice zonal, as seguintes características são observa-das:

1. o padrão de circulação é fortemente celular;2. o gradiente térmico longitudinal é forte;3. as baixas pressões das Aleutas e da Islândia tendem a se localizar a

oeste de suas posições normais;4. o desenvolvimento de anticiclones bloqueadores (ver Capítulo 6).

Confirmou-se, também, que há variaçõescíclicas no índice zonal.Num período de quatro a seis semanas ocorrem "ciclos de índices". AFig.5.7 mostra os quatro estágios reconhecidos por Namias na mudançado fluxo zonal, de alto índice zonal, para o padrão de circulação celularmeridional de baixo índice zonal. No primeiro estágio, o índice zonalé elevado. O jet stream e os ventos de oeste ficam ao norte de suasposiçõesmédias. Os ventos de oeste sã'ofortes e os sistemasde pressãotêm, predominantemente, uma orientação leste - oeste. Há poucodeslocamento de massa de ar do norte para o sul. No segundo e terceiroestágios,o jet stream se expande e aumenta em velocidade, ondulandoCOmoscilações cada vez maiores. No quarto estágio, caracterizado porbaixo índice zonal, há uma completa quebra e fragmentação celulardosventos de oeste zonais, que então apresentam-sefracos.

~.....

Page 9: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

88

A B

c D

Figura 5.7 - O ciclo indicativo: quatro estágios na modificação do fluxo zonal(A) para um padrão celularmeridional (D).

Variações sazonais na circulaçãO atmosférica

o padrão médio da circulação atmosférica descrito acima estásubmetido a diversas variações importantes. Algumas dessas variações,contudo, ocorrem regularmente em ciclos sazonais e/ou diurnos. Taisvariações são de significadoclimatológico, particularmente nos trópicosque, ao contrário das latitudes mais elevadas, têm relativamente poucasperturbações e sistemas meteorológicos móveis. Mudanças sazonaisnacirculação da atmosfera tropical são muito pequenas sobre os grandesoceanos, mas grandes sobre os continentes e mares adjacentes. Istoocorre porque os continentes, em virtude de suas diferentes caracte-rísticas térmicas (ver Capítulo 3), produzem variações térmicas sazonaiSmuito maiores do que os oceanos. No verão os continentes são transfor-mados em centros de baixa pressão, enquanto no inverno eles são relati-vamente frios, se compara4os com os oceanos quentes. Os continentes

89

tropicais e os oceanos que os circundam experimentam, então, umajJlversãOsazonal na direção do vento, conhecida como "monções". Acausa básica e essencial da monção é o aquecimento diferencial degrandes áreas continentais e oceânicas, variando com a estação. AslI1onções,conseqüentemente, têm sido consideradas por alguns comobrisasterrestres e marítimas, nas escalascontinentais e sazonais.

A Fig. 5.8 mostra que áreas com circulação de monção vão serencontradasnas baixas latitudes, com a notável exceção da América doSul tropical, onde a circulação monçônica é pouco desenvolvida. Opequeno desenvolvimento da circulação monçônica na América do Sulsedevebasicamente ao pequeno tamanho do continente e a sualimitadaextensão em direção ao hemisfério Norte. Por estas razões, baixastérmicas fortes e contínuas não se desenvolvem sobre o continente,durante o verão. Também, por ser a costa oeste do continente influen-ciada por corrente fria, ele é relativamente mais quente do que ooceano, ao longo do ano, impedindo que no inverno haja a formação decélulas de alta pressão sobre o continente. Embora a circulação demonções nas várias partes dos trópicos apresente as principais caracte-rísticasem comum, existem também variaçõesregionais. Estas variaçõessãoproduzidas pela natureza da superfície da Terra, tais como a forma,o tamanho e o relevo dos continentes, bem como pelas condições naatmosferasuperior.

A circulação de monção é mais desenvolvidano leste e sudeste daÁsia,por duas razões. A primeira é o grande tamanho do continenteasiático,o maior do mundo. O segundoé o efeito do Planalto do Tibetesobre o fluxo de ar. O Planalto do Tibete é uma vasta área de terras

elevadas,que se estendem na direção oeste-leste, formando uma barreiraefetiva entre as massas de ar tropicais e polares (Nieuwolt, 1977).Duranteo inverno no hemisfério Norte, as perdas de radiação da super-fície totalmente coberta de neve das porções setentrionais do conti-nente asiático resultam no desenvolvimento de uma zona de pressãomuito alta nesta região. Os ventos se movem para o sul e para o sudeste,a partir desta zona de alta pressão. Ao cruzar o Equador, estes ventosvolvem-seno interior dos ventos de oeste sobre a Indonésia. Enquanto amaiorparte dó sul e leste da Ásia é dominada pela monção de inverno,o norte da índia é raramente afetado, devido ao efeito da barreiramontanhosa do Himalaia, que impede a passagem do ar polar sobre asplaníciesdo Ganges. Em vez disso, o norte da índia recebe, geralmente,Ventosde oeste. O sul da índia, no entanto, experimenta a monção de

~

Page 10: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

90

111

~ o oN

\;1,111"

I

'~i:i

~I ,'iil

ll

!

',11'I!ir

I li ~I "1'

1

1.

'

1

11111,1'

I' li

,

'

,I!

1

1

1'

1

:11111,

II1

~

~"'"~.."'"~>:-:

~

91

du'a<oUo=oe~Uoos'3.guQ)'O

[(jQ)

-<I

QO.,;'"!;

.!!fI~

inverno.Mas esta monção é bastante fraca e suas massas de ar não sãode origem polar. Exceto sobre a lndonésia e norte da Austrália, ondeOSventos de monção modificados são úmidos, quentes e instáveis, asII10nçõesde inverno asiáticas são geralmente secas, frias e estáveis etrazem frio e invernos bastantes secos para a maior parte da Ásia.

No verão, a circulação da monção asiática é mais complexa, masesta circulação é de grande importância, pois é a principal fonte deprecipitaçãoem muitas partes da Ásia. Uma série de baixas térmicas sedesenvolvemsobre o continente asiático e, por este fato, os ventos deII1onçãosopram em direção ao continente. A monção se desenvolveprimeiro sobre o sul da China, avança para Burma e irrompe sobre aíndia mais de um mês depois. Tem-se relacionado esse atraso no inícioda monção sobre a Índia com a circulação do ar s1,lperior,a quase6.000-8.000 metros acima da superfície terrestre (Nieuwolt, 1977).Todas as massas de ar que constituem a monção de verão na Ásia sãoúmidase instáveis, por causa de suas longas travessiassobre os oceanostropicais quentes; elas produzem grandes quantidades de precipitação.

A circulação da monção australiana pode ser considerada comoumaextensão da monção asiática, com as características sazonaisinver-tidas.Durante o inverno no hemisfério Sul os ventos de sudeste sopramda célula de alta pressão sobre o Pacífico Sul. Estes ventos trazemtempo seco para o norte da Austrália. Durante o verão no hemisférioSul, a monção de inverno asiático alcança o norte da Austrália, comomonção de noroeste provocando precipitação e tempo quente e úmido.

A circulação monçônica sobre a África é menor que a monçãoasiáticaem magnitude, tanto em termos de cobertura areal como emespessura da atmosfera envolvida. As monções africanas são, todas,ventossuperficiais, visto que raramente alcançam níveis maiores do que5.000 metros. No oeste da África há notáveis diferenças entre os doisventos de monção, mas na África Ocidental os dois ventos de monçãoSãomuito semelhantes em suas características térmicas e de umidadee somente se diferenciam em suas direções. Esta variação regional nasrnonções africanas deve-se à forma do continente africano. No oestehá uma grande área de terra ao norte do Equador, contrastando com oOceano,ao sul. No leste, por outro lado, o continente se estende emarnbos os lados do Equador, que é mais montanhoso e experimentaalgumainfluência da monção asiática.

- No oeste da África, a precipitação é produzida pelos ventos mon-Çonicosde verão, sendo que os ventos de sudoeste provém do Atlântico

-..+..-lia..

o'c

'" .&"8 1<:'o oU U

IIo o'O o o 8.. " «

'a ::> 'ei'0

'f G '"2 I- 111 I-...z o

Page 11: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

92

e sopram na direção da baixa ténnica criada pelo aquecimento solarnointerior da região. A monção de inverno é fonnada pelos ventos secoseestáveis de nordeste, que vêm do Saara onde, por causa do resfriamentoradiativo, apresenta uma célula de alta pressão localizada no mesmo. Asituação na África Oriental é um pouco mais complexa, por razões apre.sentadas anterionnente (ver Figs. 5.9 e 5.10).

Variações diurnas na circulação atmosférica

"""",

Sistemas de ventos de escala diurna ocorrem com freqüência eregularidade em muitas áreas tropicais. Eles também ocorrem emoutras, mas de forma muito irregular e menos freqüentemente. Issoacontece porque tais sistemas de ventos tendem a ficar encobertos poroutros sistemas meteorológicos, mas nos trópicos os sistemasde ventosdiurnos assumem alguma importância, na ausência de frentes e de fortesdepressões, tão comuns na região temperada.

Há dois principais tipos de sistemas de ventos diurnos - brisasterrestres e marítimas - que ocorrem ao longo da costa, perto degrandes lagos ou de outras grandes massas aquosas e ventos de mon-tanha (catabáticos) e de vale (anabáticos), que ocorrem em áreas derelevo variado.

As brisas terrestres e marítimas não estão limitadas aos trópicos,mas nestas áreas são mais fortes e ocorrem mais regulannente. Sãocausadas pelas diferenças ténnicas entre a superfície terrestre e a super-fície aquática. Durante o dia a terra se aquece mais rapidamente do quea superfície aquática. Uma baixa ténnica local desenvolve-sesobre ocontinente, com ventos soprando do mar para a terra. Essa é a brisamarítima ou lacustre (ver Fig. 5.11). À noite a terra se esfria rapida.mente, enquanto o mar pennanece quente; o gradiente de pressão é,assim, invertido e o vento agora sopra da terra em direção ao mar. Estaé a brisa terrestre. A brisa marítima é, geralmente, mais forte do que abrisa terrestre~ seu efeito é, às vezes, sentido até 60 quilômetros dacosta. A brisa marítima começa poucas horas depois do nascer do sol eé mais intensa durante o início da tarde. A brisa marítima é mais fortequando a insolação é mais intensa. Dessemodo, a brisa marítima desen-volve.se melhor durante a estação seca, nos trópicos, e no verão, naregião temperada. A brisa marítima raramente traz chuva, porém trazagradável alívio ao calor intenso que durante o dia castigamuitas áreas

4:1°H,o,..

30

30

1:1

'30"8

proximidade da super- - Aon{velde 700mb(:t300m1. oo.0.0 fícíe terrestre ......75 90 10:1 120 1!!O

4S0H°N

30

.3:)"8

-+ proxil11idade da super- ')00 Ao nível de !100mb t!!I6Omlflcle terrestre .~ ~ Ao nível de 700mb (:!:300ml Convergências na pl"Oximl

dade da superfície terl"estn

Figura5.9 - A circulaçãoda monção asiática(confonne Nieuwolt, 1977).

~

93

Page 12: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

,I

II

~

94 30° W o 30° E 60

300N

30'N

15

o

15

I

30'S

300S--Pl"óximo da superf{cie ~ a 50 mbol"

tel"l"estl"el&50mbol"l (.S60m o.n.m.1000000 (=1S00m o.n.m.i......

300W o 30°E 60

"""'"'',,

300N

o

1515

300S-30"8

-- ~ a 850 mbol" .. a 500 mbol"00000. 11500m o.n.m.1 0000 o o o I. 560m o.n.m.1

Figura 5.10 - A circulação da monção africana (conforme Nieuwolt, 1977).

~

95

bO ixo pressãoalta pl"essão

Dia

-lsÓbOl"os

tropicais. Os pescadores também aproveitam as brisas terrestres para sairao mar na madrugada e retomar para a terra com as brisasmarítimas, aofinal da tarde.

Ventos de montanha e de vale podem desenvolver-seem qualquerparte onde haja grandes variações no relevo, mas esses são particular-mente fortes e regulares nos trópicos, na ausência de frentes e de fortesdepressões.Tamqém os ventos de montanha e de vale são, em parte, deorigem térmica. Durante o dia, quando a insolação é intensa, as ver-

tentes mo~hosas mais expostas são aquecidas mais do que os fundosdos vales. Um gradiente de pressão relativamente fraco conseqüente-mente se desenvolve, com ventos leves a se movimentarem vertenteacima (ver Fig. 5.12). Estes são ventos de vale ou anabáticos. Esses

ventos se elevam e passam sobre a linha do cume e alimentapt umaCorrentesuperior de retomo para compensar os ventos de vale/Ventosanabáticos são muitas vezes acompanhados pela formação de nuvenscúmulus sobre as montanhas ou perto delas. Sua velocidade alcançaum m~ximopor volta das 14 horas.

À noite, o gradiente de pressão é invertido. Os planaltos esfriam-semuito rapidamente por causa de perdas de radiação terrestre. O ar frio edenso então se desloca vertente abaixo para as depressões e vales. Taisventos frios são conhecidos como ventos de montanha ou ventos cata-báticos. Tais ventos são comumente citados como a causa da incidênciade geada nos vales e depressões de áreas acidentadas e montanhosas.Também contribui para o desenvolvimento de inversões térmicas nofundo dos valesuma condição que favorece a concentração depoluentes

Page 13: Introducao a Climatologia Para Os Tropicos - Capitulo V - A circulação atmosférica

96

cr\ ~--~~~DIA NOITE

Figura 5.12 - Ventos de montanha e de vale.

'"""""

na--at-nwsfera--sobreáreas industri~ Nas regiões temperadas, o esfria.mento radiativo de vertentes montanhosas é intensificado se as encostasestiverem cobertas de neve. Isso estimula o fluxo gravitacionalna massade ar denso e frio para o fundo dos vales. Este fato intensifica a inci-dência de geada e as condições para a ocorrência de inversões térmicas.

As cadeias montanhosas também exercem efeitos sobre os ventosque se movem sobre elas. Ondas de sotavento ou ondas de posição sãoformadas na corrente de ar a sotavento de barreiras montanhosas, se oar é estável. Isto ocorre porque o ar que está estável volta a seu níveloriginal a sotavento de uma barreira,"depois de ser deslocado paracima, sobre o obstáculo. A descida do ar normalmente forma a primeirade uma série de ondas de superfície. Os aviadores têm, naturalmente,interesse por tais fenômenos, visto que as ondas de sotavento, e osmovimentos circulares de ar que lhe são associados, conhecidos comorotors, afetam a aviação. ° desenvolvimento de ondas de sotavento écomumente indicado pela presença de nuvens lenticulares.

Há outros sistemas de ventos, geralmente locais, e portanto deimportância restrita, que são causados pela topografia, com ou semvariaçõesno aquecimentosolar.Estesincluemo Fohn ou chinook e obora. ° Fohn ou chinook é um forte vento seco e quente que se desen-volve a sotavento de uma cadeia de montanhas, quando o ar estávelfoi forçado a passar por sobre a barreira montanhosa. Tais ventos sãocomuns no inverno e na primavera, nos flancos setentrionais dos Alpesemontanhas da Ásia Central, onde são conhecidos como Fohn, e nasporções orientais das Montanhas Rochosas, na América do Norte, ondesão conhecidos como chinook. Em algumaspartes do mundo, como nO

....

97

norte do Adriático, no norte da Escandinávia, na costa setentrional dotUarNegro e no Japão, os ventos que descem as vertentes de montanhaa sotavento são frios, embora em aquecimento adiabático. Tais ventossão conhecidos como bora e ocorrem principalmente no inverno,quando as massas de ar frio continentais são forçadas a passar sobreutUacadeia montanhosa.

'Fica bem claro, no estudo acima, que os movimentos atmos-

féricos ocorrem em várias escalas temporais e espaciais. Todos essestUovimentos também interagem e afetam uns aos outros. Os movi-tUentos atmosféricos em todas as escalas - temporal e espacial - afetamo tempo e o clima em qualquer lugar, embora os padrões mundiais detempo e clima sejam fundamentalmente controlados pela circulação

geral da atmosfera. tas sistemas meteorológicos discutidos no próximocapítulo são, realmente, partes componentes da circulaçãoda atmosfera.São sistemas de circulação caracterizados por tipos particulares detempo.

Referências Bibliográficas

ATKlNSON, B.W. The atmosphere. In: Bowen, D.Q. (Org.), A Concise PhysicalGeography, Londres, Hulton Educational Publications, 1972.

BARRY, R.G. Models in meteorology and c1imatology. In: Chorley, R.J. eHaggett, P. (Eds.),Models in Geography. Londres, Methuen, 1967.

BARRY, R.G. Modelos em meteorologia e climatologia. In: Chorley, R.J. eHaggett, P. (Orgs.) , Modelos Ffsicos e de Informação em Geografia. Rio deJaneiro, Livros Técnicos e Científicos e EDUSP, 1975.

BARRY, R.G. e CHORLEY, R.J. Atmosphere, Weather and Climate. 3\\ 00.,Londres, Methuen, 1976.

CHANDLER, T.J. The Air Around UsoLondres, Aldus, 1967.NlEUWOLT, S. Tropical Climatology. Londres, John Wiley, 1977.PALMEN, E. The role of atmospheric disturbances in the general circulation.

Quart. Journ. Roy. Met. Soe., 77: 337-354,1951.RIEHL, H. On the role of the tropics in the general circulation of the atmosphere.

Weather, 24: 288-308,1969.RILEY, D. e SPOLTON, L. World Weather and Climate. Cambridge, Cambridge

University Press, 1974.ROSSBY, C.G: The scientific basis of modem meteorology. U.S. Department 01

Agriculture Yearbook Climate and Man, pp. 599-655, 1941.

~