Íderes e lideranÇas em escolas portuguesas

842
UNIVERSIDAD DE EXTREMADURA Facultad de Educación Departamento de Ciencias de la Educación LÍDERES E LIDERANÇAS EM ESCOLAS PORTUGUESAS. TRAJECTOS INDIVIDUAIS E IMPACTOS ORGANIZACIONAIS ●●● LÍDERES Y LIDERAZGOS EN ESCUELAS PORTUGUESAS. TRAYECTOS INDIVIDUALES E IMPACTOS ORGANIZACIONALES. José Manuel Carraça da Silva Directora: Dra. Doña Emilia Domínguez Rodríguez 2008

Upload: livroingles

Post on 08-Feb-2016

113 views

Category:

Documents


34 download

TRANSCRIPT

  • UNIVERSIDAD DE EXTREMADURA

    Facultad de Educacin

    Departamento de Ciencias de la Educacin

    LDERES E LIDERANAS EM ESCOLAS PORTUGUESAS. TRAJECTOS INDIVIDUAIS E IMPACTOS ORGANIZACIONAIS

    LDERES Y LIDERAZGOS EN ESCUELAS PORTUGUESAS. TRAYECTOS INDIVIDUALES E IMPACTOS ORGANIZACIONALES.

    Jos Manuel Carraa da Silva

    Directora: Dra. Doa Emilia Domnguez Rodrguez

    2008

  • 1

    Agradecimentos

    Ao Carlos Monteiro e ao Joo Paulo Mineiro, que abriram as suas vidas curiosidade do investigador e partilharam as suas ideias e as suas prticas, sem limitaes nem anonimatos, e se sujeitaram a um duro exerccio de avaliao a que apenas os lderes de excepo so capazes de se expor. Sem a sua abertura, disponibilidade e coragem nunca teriam existido condies para que a investigao se tivesse podido realizar.

    Aos outros entrevistados, que assumiram sem complexos nem receios dar o seu testemunho pessoal, e que ficam como exemplo de cidadania corajosa e de cooperao face s exigncias investigativas, professores (as), Carlos Santos, Odete Albergaria, Fernando Lopes, Ana Branco, Carlos Portela, Helosa Cordeiro, Isabel Cardoso, Lurdes Carvalho, Maria Jos Dias, Maria Paula Feteira, Jorge Pombo, Maria Jos Mugeiro, Celina Vieira, Fernanda Batista, Florinda Santo, Francisco Barata, Guilhermino Fernandes, Maria do Cu Alexandre, Paulo Morais e Regina Wahnon; alunos (as), Pedro Martins, Jos Lopes, Rui Baio, Carlos Martins, Lus Fraga, Pedro Proena, Romo Vieira, Ana Fazenda e Maria Jos Figueiredo; funcionrios (as) no docentes, Anabela ngelo, Fernando Pina e Maria Orlanda Lebre; representantes das Associaes de Pais e Encarregados de Educao, Renato Campos e Albertino Figueiredo; representantes autrquicos, Teresa Machado, Isabel Henriques e Antnio Rebordo; representantes de outros interesses das respectivas comunidades, Antnio Pedrosa e Ana Maria Tom.

    Ao colega e presidente do Instituto Politcnico de Leiria, Luciano de Almeida, que teve a viso de organizar um programa de doutoramentos sem precedentes, no qual esta tese se integra, e tambm pelo estmulo e amizade.

    Universidad de Extremadura e aos seus docentes, desde logo ao Prof. Florentino Blzquez pelo interesse manifestado relativamente a este projecto e pelo estmulo sua concretizao; ao Prof. Enrique Iglesias, Prof. Isabel

  • 2

    Cuadrado, Prof. Jos Luis Ramos, Prof. Ricardo Luengo e Prof. Sixto Cubo, pelo conhecimento partilhado.

    Prof. Emilia Domnguez Rodrguez, que orientou a investigao, o meu profundo reconhecimento pelos seus sbios conselhos, pela exigncia e rigor investigativo partilhados comigo, pela disponibilidade, que ultrapassou em muito as suas obrigaes acadmicas, por ter sido sempre, ao longo do tempo da realizao do trabalho, um porto seguro onde nunca me faltou um gesto amigo de compreenso e estmulo.

    s minhas colegas na direco da Escola Superior de Educao, Graa Fonseca e Isabel Rebelo, pela sua generosidade, compreenso e profissionalismo e porque sem a sua colaborao e incentivo no teria tido as condies mnimas para acumular as minhas funes institucionais com a realizao da tese.

    Ao Joo Paulo Marques e ao Nuno Mangas, vice-presidentes do IPL, com quem foi um prazer partilhar esta experincia, trocando ideias, bibliografia, expectativas e tambm algumas dvidas e frustraes, mas sempre com a confiana de que estvamos no trilho certo.

    Aos colegas Ricardo Vieira, Pedro Silva e Helena Librio pelo estmulo e pela colaborao prestimosa.

    Ao Prof. Joo Barroso, da Universidade de Lisboa, e ao Prof. Jorge Adelino Costa, da Universidade de Aveiro, pelas sugestes oportunas acerca da investigao.

    Alexandra Pereira, ao Alexandre Soares, Alexandrina Costa, ao Armando Duarte, Eunice Almeida, ao Flvio Ramos, Isabel Romeiro, ao Joo Faria, ao Joo Martins, ao Joo Vieira, Licnia Gonalves, ao Nelson Matias, ao Ricardo Lima, Rita Gaivoto e Sofia Sousa pela colaborao em aspectos diversos indispensveis concretizao do trabalho.

  • 3

    Finalmente, e os ltimos so, neste caso, seguramente os primeiros, minha famlia, o meu reconhecimento e gratido pelo apoio permanente, pelo estmulo, pela compreenso para com as minhas ausncias e impedimentos e por partilharem comigo a convico de que vale a pena um sacrifcio quando esto em causa valores e objectivos relevantes.

  • 5

    ndice

    RESUMO.................................................................................................................... 21

    INTRODUO ........................................................................................................... 23 1. A Histria e a vida como fontes inspiradoras................................................. 23 2. O objecto da investigao................................................................................ 26 3. Justificao, interesse e actualidade do tema................................................ 26 4. O contexto da investigao.............................................................................. 30 5. Opes metodolgicas..................................................................................... 34 6. Estrutura da investigao ................................................................................ 37 7. Fontes bibliogrficas e legislativas ................................................................. 39 8. Anexos............................................................................................................... 39

    CAPTULO 1. MARCO TERICO. ORGANIZAES, ESCOLAS E LIDERANA ... 41 1. As organizaes ............................................................................................... 41

    1.1. A vida social e as organizaes ................................................................... 41 1.2. Configuraes organizacionais .................................................................... 54 1.3. A cultura organizacional ............................................................................... 67

    2. As organizaes escolares .............................................................................. 75 2.1. As escolas e as suas singularidades............................................................ 83 2.2. As escolas, a cultura organizacional e o clima ............................................. 89 2.3. As escolas, a qualidade e os resultados....................................................... 97

    3. A liderana nas organizaes educativas..................................................... 108 3.1. Liderana. Conceito e problemtica ........................................................... 108 3.2. Pilares da liderana: A viso, a misso e os valores .................................. 121 3.3. Liderana e direco nas escolas .............................................................. 126 3.4. Liderana e autonomia nas escolas ........................................................... 137 3.5. Liderana e qualidade nas escolas ............................................................ 142

    4. Liderana e investigao nas escolas........................................................... 147 4.1. Presidente do Conselho Directivo. O profissional como administrador....... 147 4.2. Making sense of leading schools. A national study of the principalship ...... 150 4.3. Principled principals? Values-driven leadership: Evidence from ten case studies of outstanding school leaders ............................................................. 151 4.4. Balanced leadership: What 30 years of research tells us about the effect of leadership on students achievement ................................................................. 152

  • 6

    4.5. A especificidade da gesto escolar em Portugal na memria de trs gestores escolares .......................................................................................................... 154 4.6. Evaluacin de la funcin directiva en los centros docentes sostenidos con fondos pblicos ................................................................................................. 157 4.7. La direccin pedaggica en los Institutos de Enseanza Secundaria. Un estudio sobre el liderazgo educacional.............................................................. 158 4.8. How leadership influences student learning ............................................... 160 4.9. Perceptions of leadership A study from two portuguese schools ............. 161 4.10. A trajectria profissional de trs gestores escolares................................. 163 4.11. Lgicas de aco, estratgias de exerccio do poder nas escolas: memrias de gestores escolares ....................................................................................... 166 4.12. Liderana nas escolas, comportamentos docentes e desempenho de estudantes ........................................................................................................ 169

    CAPTULO 2. DIRECO, ADMINISTRAO E GESTO ESCOLARES EM PORTUGAL. ANLISE DOCUMENTAL COMPARADA DOS TEXTOS LEGAIS.... 171

    1. Contexto e problemas .................................................................................... 171 2. A exploso de Abril......................................................................................... 174

    2.1. O ensaio autogestionrio ........................................................................... 174 2.2. A nova governao. O Decreto-Lei n. 221/74 ........................................... 177

    3. Um novo modelo de gesto ........................................................................... 183 3.1. O Decreto-Lei n. 735-A/74 ........................................................................ 184

    3.1.1. rgos de gesto................................................................................ 186 3.1.2. Conselho Directivo .............................................................................. 186 3.1.3. Conselho Pedaggico ......................................................................... 189 3.1.4. Conselho Administrativo...................................................................... 189

    3.2. O incio da normalizao.......................................................................... 190 4. O primeiro governo constitucional e o Decreto-Lei n. 769-A/76................. 195

    4.1. Conselho Directivo ..................................................................................... 197 4.2. Conselho Pedaggico ................................................................................ 203 4.3. Conselho Administrativo............................................................................. 206 4.4. Portarias regulamentadoras ....................................................................... 208 4.5. Termo do perodo revolucionrio ............................................................. 209

    5. Um ensaio para racionalizar a gesto escolar. O Decreto-Lei 172/91...... 213 5.1. rgos de direco, administrao e gesto.............................................. 217

    5.1.1. Conselho de Escola............................................................................. 218 5.1.2. Director Executivo ............................................................................... 218

  • 7

    5.1.3. Conselho Administrativo...................................................................... 219 5.1.4. rea Escolar........................................................................................ 219 5.1.5. Conselho Pedaggico ......................................................................... 219 5.1.6. Estruturas de orientao educativa ..................................................... 220

    5.2. Regime experimental ................................................................................. 220 6. Autonomia das escolas e descentralizao. O Decreto-Lei 115-A/98 ......... 225

    6.1. Contratos de autonomia ............................................................................. 227 6.2. Agrupamentos de escolas.......................................................................... 228 6.3. Conselhos Municipais de Educao........................................................... 229 6.4. rgos de gesto das escolas ................................................................... 229

    6.4.1. Assembleia de Escola ......................................................................... 229 6.4.2. Direco Executiva.............................................................................. 230 6.4.3. Conselho Pedaggico ......................................................................... 232 6.4.4. Conselho Administrativo...................................................................... 232

    6.5. Monitorizao e resultados......................................................................... 232 7. Em nome das roturas com o passado. O Decreto-Lei n. 75/2008............... 236

    7.1. Fundamentos de uma mudana de paradigma .......................................... 236 7.2. mbito e princpios gerais .......................................................................... 240 7.3. Aspectos organizacionais........................................................................... 241 7.4. Regime de autonomia ................................................................................ 243 7.5. Regime de administrao e gesto ............................................................ 244

    7.5.1. Conselho Geral ................................................................................... 244 7.5.2. Director................................................................................................ 246 7.5.3. Conselho Pedaggico ......................................................................... 249 7.5.4. Conselho Administrativo...................................................................... 251 7.5.5. Coordenao de escola/estabelecimento de educao pr-escolar .... 251

    7.6. Organizao pedaggica ........................................................................... 252 7.7. Participao dos pais e alunos................................................................... 254 7.8. Contratos de autonomia ............................................................................. 254 7.9. Os eixos da mudana................................................................................. 256

    8. Uma perspectiva pessoal das continuidades e roturas legislativas e dos novos desafios para a gesto do sistema educativo. ...................................... 259

    CAPTULO 3. METODOLOGIA E ESTRATGIA DA INVESTIGAO................... 273 1. Desenho do estudo......................................................................................... 273 2. Investigao qualitativa.................................................................................. 277 3. Investigao qualitativa e investigao social ............................................. 285

  • 8

    4. Critrios de cientificidade da investigao qualitativa................................. 288 5. Estratgia da investigao ............................................................................. 292 6. Mtodo biogrfico. Entrevistas de tipo qualitativo....................................... 297 7. Estudo de caso ............................................................................................... 304 8. A realizao do estudo ................................................................................... 307

    8.1. A escolha dos sujeitos objecto da investigao.......................................... 307 8.1.1. Os presidentes dos conselhos executivos ........................................... 307 8.1.2. Os representantes dos colectivos escolares........................................ 309

    8.2. As entrevistas aos presidentes dos conselhos executivos.......................... 310 8.2.1. Guio da entrevista ............................................................................. 312

    8.3. As entrevistas aos representantes dos colectivos escolares ...................... 317 8.3.1. Guio da entrevista ............................................................................. 319

    9. Caracterizao das escolas. Anlise documental ........................................ 323 9.1. A escola Dr. Joaquim de Carvalho ............................................................. 323

    9.1.1. O contexto socioeconmico e cultural ................................................. 323 9.1.2. Breve nota histrica da escola............................................................. 324 9.1.3. A escola .............................................................................................. 325 9.1.4. A avaliao externa. Domnios chave do desempenho educativo ....... 337 9.1.5. O Contrato de Autonomia.................................................................... 345 9.1.6. Resultados. Taxas de sucesso e abandono ........................................ 349

    9.2. A escola Quinta das Palmeiras .................................................................. 351 9.2.1. O contexto socioeconmico e cultural ................................................. 351 9.2.2. A escola .............................................................................................. 352 9.2.3. A avaliao interna.............................................................................. 362 9.2.4. A avaliao externa. Domnios chave do desempenho educativo ....... 365 9.2.5. O Contrato de Autonomia.................................................................... 379 9.2.6. Resultados. Taxas de sucesso e abandono ........................................ 387

    CAPTULO 4. CARLOS E JOO, DE VIDAS PARALELAS A HISTRIAS CRUZADAS ............................................................................................................. 389

    1. Carlos............................................................................................................... 390 1.1. Do nascimento ao fim da licenciatura......................................................... 390

    1.1.1. A famlia e a infncia ........................................................................... 390 1.1.2. A escola bsica e secundria .............................................................. 391 1.1.3. O ensino superior ................................................................................ 395 1.1.4. Pessidnio, uma escola de vida .......................................................... 396

    1.2. Do incio da vida profissional a presidente de um rgo de gesto ............ 398

  • 9

    1.2.1. O estgio pedaggico.......................................................................... 398 1.2.2. O incio da carreira .............................................................................. 399 1.2.3. A primeira experincia no Conselho Directivo ..................................... 400 1.2.4. A primeira experincia como presidente.............................................. 408

    1.3. Um presidente experiente .......................................................................... 412 1.3.1. A paixo .............................................................................................. 412 1.3.2. A inquietude ........................................................................................ 412 1.3.3. O clima de escola................................................................................ 412 1.3.4. A Comunidade Educativa .................................................................... 413 1.3.5. As relaes com a poltica................................................................... 414 1.3.6. A prestao de contas......................................................................... 415 1.3.7. A avaliao como prtica para melhorar o desempenho ..................... 415 1.3.8. O enquadramento legislativo da gesto............................................... 416 1.3.9. Os exemplos do exterior...................................................................... 418 1.3.10. Autonomia e representatividade ........................................................ 418 1.3.11. Um sopro de modernizao............................................................... 419 1.3.12. Formao de docentes e funcionrios ............................................... 420 1.3.13. Os alunos no centro das preocupaes............................................. 421 1.3.14. Os desafios ....................................................................................... 424 1.3.15. O desempenho da escola.................................................................. 425 1.3.16. Estrutura de direco ........................................................................ 426 1.3.17. Um homem de dilogo que no toma decises sozinho.................... 427 1.3.18. Autonomia para agir .......................................................................... 428 1.3.19. Representante da escola versus representante do ME ..................... 430 1.3.20. A ocupao do tempo........................................................................ 431 1.3.21. A rotina de um dia replicvel ............................................................. 432 1.3.22. O principal protagonista..................................................................... 433 1.3.23. As relaes com as estruturas do Ministrio da Educao................ 434 1.3.24. As relaes com a Cmara Municipal................................................ 435 1.3.25. As relaes com os vrios actores escolares .................................... 436 1.3.26. A formao dos presidentes .............................................................. 436 1.3.27. Um eleito sem carreira ...................................................................... 437 1.3.28. Uma repblica dos professores ......................................................... 438 1.3.29. Um primus inter pares ou um principal? ............................................ 439 1.3.30. Administrador/gestor ou lder educativo?........................................... 439 1.3.31. Perspectivas para o futuro................................................................. 439 1.3.32. Dicas para um candidato a presidente............................................... 440

  • 10

    2. Joo ................................................................................................................. 441 2.1. Do nascimento ao fim da licenciatura......................................................... 441

    2.1.1. A famlia e a infncia ........................................................................... 441 2.1.2. Influncias dos pais ............................................................................. 442 2.1.3. Os padrinhos....................................................................................... 442 2.1.4. Um mundo que se desmorona ............................................................ 443 2.1.5. O despertar de um lder....................................................................... 443 2.1.6. O jardim-de-infncia ............................................................................ 444 2.1.7. O 1. ciclo ............................................................................................ 444 2.1.8. O 2. e 3. ciclos .................................................................................. 444 2.1.9. O secundrio....................................................................................... 445 2.1.10. A vocao de ser professor ............................................................... 447 2.1.11. A consolidao da aptido para a liderana ...................................... 448 2.1.12. A universidade................................................................................... 449

    2.2. Do incio da vida profissional a presidente de um rgo de gesto ............ 451 2.2.1. O incio da vida profissional................................................................. 451 2.2.2. A primeira experincia no Conselho Directivo ..................................... 456 2.2.3. A primeira experincia como presidente.............................................. 459

    2.3. Um presidente experiente .......................................................................... 464 2.3.1. Motivao para continuar .................................................................... 464 2.3.2. A legislao de enquadramento .......................................................... 465 2.3.3. Uma linha de continuidade .................................................................. 466 2.3.4. Liberdade versus obrigatoriedade ....................................................... 466 2.3.5. As pessoas no centro do processo...................................................... 467 2.3.6. Formao para todos .......................................................................... 467 2.3.7. Um presidente responsvel pelos resultados de aprendizagem .......... 469 2.3.8. Integrar para melhorar......................................................................... 469 2.3.9. Um observatrio de qualidade............................................................. 470 2.3.10. Gerir por objectivos ........................................................................... 471 2.3.11. Os grandes desafios.......................................................................... 471 2.3.12. Ir sempre mais alm.......................................................................... 472 2.3.13. A organizao do Conselho Executivo .............................................. 472 2.3.14. Presidente em acumulao ............................................................... 473 2.3.15. Um impulsionador.............................................................................. 473 2.3.16. Tornar as pessoas felizes.................................................................. 474 2.3.17. O quotidiano do presidente................................................................ 474 2.3.18. Da burocracia ao convvio ................................................................. 475

  • 11

    2.3.19. Uma gesto de proximidade.............................................................. 476 2.3.20. Todos os dias h desafios diferentes................................................. 477 2.3.21. Um protagonista especial .................................................................. 477 2.3.22. A inovao no se decreta ................................................................ 478 2.3.23. Competncia para escolher............................................................... 479 2.3.24. Uma gesto participada..................................................................... 481 2.3.25. Escolha democrtica ......................................................................... 482 2.3.26. Eleito pela escola. Responsvel perante o ME.................................. 483 2.3.27. Um primus inter pares ou um principal? ............................................ 483 2.3.28. Administrador/gestor ou lder educativo?........................................... 484 2.3.29. Balano de uma presidncia gratificante ........................................... 484 2.3.30. Dicas para um candidato a presidente............................................... 484

    CAPTULO 5. OS PRESIDENTES VISTOS PELOS OUTROS ................................ 487 1. Carlos............................................................................................................... 489

    1.1. Foco na aprendizagem e no ensino ........................................................... 489 1.2. Promover relaes interpessoais positivas................................................. 494 1.3. Ter viso estratgica e definir objectivos ambiciosos ................................. 499 1.4. Melhorar a envolvente................................................................................ 505 1.5. Apostar no trabalho colaborativo ................................................................ 510 1.6. Partilhar a liderana, formar equipas.......................................................... 515 1.7. Envolver a Comunidade ............................................................................. 519 1.8. Avaliar e inovar .......................................................................................... 525

    2. Joo ................................................................................................................. 530 2.1. Foco na aprendizagem e no ensino ........................................................... 530 2.2. Promover relaes interpessoais positivas................................................. 537 2.3. Ter viso estratgica e definir objectivos ambiciosos ................................. 542 2.4. Melhorar a envolvente................................................................................ 547 2.5. Apostar no trabalho colaborativo ................................................................ 555 2.6. Partilhar a liderana: formar equipas.......................................................... 560 2.7. Envolver a Comunidade ............................................................................. 565 2.8. Avaliar e inovar .......................................................................................... 571

    CAPTULO 6. LIDERANAS, IMPACTOS E PERSPECTIVAS FUTURAS ............. 577 1. Escola Dr. Joaquim de Carvalho.................................................................... 577

    1.1. O lder versus a equipa .............................................................................. 577 1.2. Lderes e lideranas................................................................................... 581

  • 12

    1.3. Liderana vertical, colectiva, partilhada...................................................... 584 1.4. Reaces liderana................................................................................. 587 1.5. Liderana e atractibilidade da Escola ......................................................... 590 1.6. Liderana e resultados ............................................................................... 594 1.7. Liderana e Comunidade ........................................................................... 599 1.8. Liderana e autonomia............................................................................... 602 1.9. Lderes incontestados ................................................................................ 605 1.10. Administrao e pedagogia. As duas faces da moeda ............................. 609 1.11. Professores versus Comunidade.............................................................. 612

    2. Escola Quinta das Palmeiras ......................................................................... 618 2.1. O lder versus a equipa .............................................................................. 618 2.2. Lderes e lideranas................................................................................... 621 2.3. Liderana vertical, colectiva, partilhada...................................................... 624 2.4. Reaces liderana................................................................................. 627 2.5. Liderana e atractibilidade da Escola ......................................................... 630 2.6. Liderana e resultados ............................................................................... 633 2.7. Liderana e Comunidade ........................................................................... 637 2.8. Liderana e autonomia............................................................................... 640 2.9. Lderes incontestados ................................................................................ 643 2.10. Administrao e pedagogia. As duas faces da moeda ............................. 646 2.11. Professores versus Comunidade.............................................................. 649

    CAPTULO 7. CONCLUSES E POSSIBILIDADES DE DESENVOLVIMENTO DA INVESTIGAO ...................................................................................................... 653

    1. Sntese de duas histrias de vida.................................................................. 654 1.1. Carlos, o acaso e a determinao.............................................................. 655 1.2. Joo, marcado para liderar......................................................................... 660

    2. Os lderes vistos pelos seus olhos................................................................ 667 2.1. Carlos, Acho que sou um lder educativo................................................. 668

    2.1.1. Foco na aprendizagem e no ensino..................................................... 668 2.1.2. Promover relaes interpessoais positivas.......................................... 669 2.1.3. Ter viso estratgica e definir objectivos ambiciosos .......................... 670 2.1.4. Melhorar a envolvente ......................................................................... 671 2.1.5. Apostar no trabalho colaborativo ......................................................... 672 2.1.6. Partilhar a liderana: formar equipas ................................................... 673 2.1.7. Envolver a comunidade ....................................................................... 675 2.1.8. Avaliar e inovar.................................................................................... 676

  • 13

    2.2. Joo, Eu assumo-me como lder educativo ............................................. 678 2.2.1. Foco na aprendizagem e no ensino..................................................... 678 2.2.2. Promover relaes interpessoais positivas.......................................... 679 2.2.3.Ter viso estratgica e definir objectivos ambiciosos ........................... 679 2.2.4. Melhorar a envolvente ......................................................................... 681 2.2.5. Apostar no trabalho colaborativo ......................................................... 682 2.2.6. Partilhar a liderana: formar equipas ................................................... 683 2.2.7. Envolver a comunidade ....................................................................... 684 2.2.8. Avaliar e inovar.................................................................................... 685

    2.3. Dois lderes escolares ................................................................................ 687 2.3.1. Foco na aprendizagem e no ensino..................................................... 687 2.3.2. Promover relaes interpessoais positivas.......................................... 687 2.3.3. Ter viso estratgica e definir objectivos ambiciosos .......................... 688 2.3.4. Melhorar a envolvente ......................................................................... 688 2.3.5. Apostar no trabalho colaborativo ......................................................... 688 2.3.6. Partilhar a liderana: formar equipas ................................................... 689 2.3.7. Envolver a comunidade ....................................................................... 689 2.3.8. Avaliar e inovar.................................................................................... 690

    2.4. Eleio e viso estratgica......................................................................... 691 2.5. Lderes e seguidores.................................................................................. 693

    3. Os lderes vistos pelos olhos dos outros ..................................................... 695 3.1. Carlos, O dilogo a chave para resolver problemas.............................. 696

    3.1.1. Foco na aprendizagem e no ensino..................................................... 696 3.1.2. Promover relaes interpessoais positivas.......................................... 698 3.1.3. Ter viso estratgica e definir objectivos ambiciosos .......................... 700 3.1.4. Melhorar a envolvente ......................................................................... 704 3.1.5. Apostar no trabalho colaborativo ......................................................... 707 3.1.6. Partilhar a liderana, formar equipas ................................................... 709 3.1.7. Envolver a comunidade ....................................................................... 711 3.1.8. Avaliar e inovar.................................................................................... 714

    3.2. Joo, As pessoas esto primeiro ............................................................. 717 3.2.1. Foco na aprendizagem e no ensino..................................................... 717 3.2.2. Promover relaes interpessoais positivas.......................................... 720 3.2.3. Ter viso estratgica e definir objectivos ambiciosos .......................... 723 3.2.4. Melhorar a envolvente ......................................................................... 725 3.2.5. Apostar no trabalho colaborativo ......................................................... 729 3.2.6. Partilhar a liderana: formar equipas ................................................... 732

  • 14

    3.2.7. Envolver a comunidade ....................................................................... 734 3.2.8. Avaliar e inovar.................................................................................... 737

    4. Confirmao de dois lderes marcantes........................................................ 740 5. Lideranas, reaces e impactos .................................................................. 742

    5.1. Escola Dr. Joaquim de Carvalho ................................................................ 743 5.1.1. O lder versus a equipa ....................................................................... 743 5.1.2. Lderes e lideranas ............................................................................ 745 5.1.3. Liderana vertical, colectiva, partilhada ............................................... 747 5.1.4. Reaces liderana .......................................................................... 748 5.1.5. Liderana e atractibilidade da escola................................................... 750 5.1.6. Liderana e resultados ........................................................................ 752 5.1.7. Liderana e Comunidade..................................................................... 755 5.1.8. Liderana e autonomia ........................................................................ 757 5.1.9. Lderes incontestados ......................................................................... 759 5.1.10. Administrao e pedagogia. As duas faces da moeda ...................... 761 5.1.11. Professores versus Comunidade....................................................... 763

    5.2. Escola Quinta das Palmeiras ..................................................................... 766 5.2.1. O lder versus a equipa ....................................................................... 766 5.2.2. Lderes e lideranas ............................................................................ 768 5.2.3. Liderana vertical, colectiva, partilhada ............................................... 770 5.2.4. Reaces liderana .......................................................................... 773 5.2.5. Liderana e atractibilidade da escola................................................... 775 5.2.6. Liderana e resultados ........................................................................ 778 5.2.7. Liderana e Comunidade..................................................................... 781 5.2.8. Liderana e autonomia ........................................................................ 783 5.2.9. Lderes incontestados ......................................................................... 785 5.2.10. Administrao e pedagogia. As duas faces da moeda. ..................... 787 5.2.11. Professores versus Comunidade....................................................... 789

    6. Caractersticas e impactos de lideranas escolares marcantes ................. 791 6.1. Desempenho de um lder ........................................................................... 791

    6.1.1. Ter viso estratgica ........................................................................... 792 6.1.2. Agir de acordo com um quadro de valores fundamentais .................... 792 6.1.3. Considerar a escola no seu contexto................................................... 793 6.1.4. Definir objectivos claros e ambiciosos ................................................. 793 6.1.5. Planear com rigor e flexibilidade.......................................................... 793 6.1.6. Supervisionar e monitorizar as actividades.......................................... 794 6.1.7. Assegurar os recursos e metodologias adequados ............................. 794

  • 15

    6.1.8. Apoiar os alunos de forma personalizada............................................ 795 6.1.9. Promover a formao pessoal e profissional dos quadros................... 796 6.1.10. Envolver a Comunidade .................................................................... 796 6.1.11. Ser inovador ...................................................................................... 797 6.1.12. Cultivar boas relaes interpessoais ................................................. 797 6.1.13. Apostar no trabalho colaborativo ....................................................... 798 6.1.14. Trabalhar em equipa ......................................................................... 798

    6.2. O exerccio e os impactos da liderana...................................................... 800 6.2.1. O lder versus a equipa ....................................................................... 800 6.2.2. Lderes e lideranas ............................................................................ 800 6.2.3. Liderana vertical, colectiva, partilhada ............................................... 801 6.2.4. Reaces liderana .......................................................................... 802 6.2.5. Liderana e atractibilidade da escola................................................... 802 6.2.6. Liderana e resultados ........................................................................ 803 6.2.7. Liderana e Comunidade..................................................................... 803 6.2.8. Liderana e autonomia ........................................................................ 804 6.2.9. Lderes incontestados ......................................................................... 804 6.2.10. Administrao e pedagogia. As duas faces da moeda. ..................... 805 6.2.11. Professores versus Comunidade....................................................... 806

    7. Concluses finais ........................................................................................... 807 7.1. Lderes, lideranas, trajectos e impactos.................................................... 807 7.2. Indicadores de liderana ............................................................................ 809 7.3. Condies de exerccio e impactos de lideranas marcantes..................... 810 7.4. Exemplos inspiradores ............................................................................... 812

    8. Possibilidades de desenvolvimento da investigao .................................. 814

    Fontes...................................................................................................................... 817 1. Bibliogrficas .................................................................................................. 817 2. Legislativas ..................................................................................................... 841

  • 17

    ndice de Quadros

    Quadro 1 Resultados 2005-2008 Escola Dr. Joaquim de Carvalho........................ 350 Quadro 2 Resultados 2005-2008 Escola Quinta das Palmeiras............................. 388 Quadro 3 Guia de Identificao de Condutas de Liderana ................................... 741

  • 19

    ndice de Siglas e Acrnimos

    AE - Assembleia de Escola AE - Associao de Estudantes ANEIS - Associao Nacional para o Estudo e Interveno na Sobredotao ANMP - Associao Nacional Municpios Portugueses APEE - Associao de Pais e Encarregados de Educao ARA - Aulas de Reforo de Aprendizagem BBC - British Broadcasting Company CA - Conselho Administrativo CAA - Conselho de Acompanhamento e Avaliao CAE - Centro de aco educativa CD - Conselho Directivo CD/E - Conselho Directivo / Executivo CE- Conselho Executivo CEB - Ciclo do Ensino Bsico CEE - Comunidade Econmica Europeia CIDOCE - Comportamentos de Cidadania dos Docentes CITEVE - Centro Tecnolgico das Industrias Txtil e do Vesturio de Portugal CM - Carlos Monteiro CNE - Conselho Nacional de Educao CNO - Centro Novas Oportunidades CP - Conselho Pedaggico CRE/RBE - Centro de Recursos/Rede de Bibliotecas Escolares CRSE - Comisso de Reforma do Sistema Educativo DGPA - Direco Geral Pessoal e Administrao DGRHE - Direco Geral de Recursos Humanos da Educao DL Decreto-Lei DRE - Direco Regional de Educao DREC - Direco Regional de Educao do Centro EE - Encarregados de Educao EFA - Cursos de Educao e Formao EPU - Ensino Pr Universitrio GAP - Gabinete de Apoio Psicopedaggico GIP - Gabinete de Investigao de Projectos

  • 20

    IEFP - Instituto do Emprego e Formao Profissional IGE - Inspeo Geral de Educao IGE - Inspeco Geral de Educao INA - Instituto Nacional de Administrao INE - Instituto Nacional de Estatstica IPSS - Instituio Particular de Solidariedade Social ISEC - Instituto Superior de Engenharia de Coimbra LBDQ - Leader Behaviour Description Questionnary LOQ - Leader Opinion Questionnary ME - Ministrio da Educao MEC - Ministrio da Educao e Cultura MecRel - Mid-continent Research for Education and Learning MRPP - Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado NCSL - National College for School Leadership NEE - Necessidades Educativas Especiais OCDE - Organizao para Cooperao e Desenvolvimento Econmico ONG - Organizaes No Governamentais PAA - Plano Anual de Actividades PE - Projecto Educativo PIEF - Programa Integrado de Educao e Formao POC-educao - Plano Oficial de Contas Educao POPH - Programa Operacional do Potencial Humano PPES - Programa de Promoo da Educao para a Sade PREC - Processo Revolucionrio em Curso PS - Partido Socialista PT - Portugal Telecom QZP - Quadro Zona Pedaggica REME - Rede de Escolas para a Modernizao Educativa RI - Regulamento Interno RVCC - Reconhecimento e Validao Conhecimentos e Competncias SASE - Servio de Aco Social Escolar TIC - Tecnologias da Informao e Comunicao TIL - Teorias Implcitas da Liderana UBI - Universidade da Beira Interior

  • 21

    RESUMO

    Com esta investigao visa-se aprofundar o conhecimento sobre presidentes de conselhos executivos de escolas secundrias pblicas estatais portuguesas, reconstituindo os seus trajectos pessoais e profissionais, caracterizando a forma como desempenham os seus cargos, identificando as suas caractersticas de liderana, avaliando os impactos organizacionais da decorrentes e a influncia que esta multiplicidades de factores exercem nos resultados globais dos alunos.

    RESUMEN

    Con esta investigacin, nuestra intencin es progresar en el conocimiento sobre los presidentes de los conselhos executivos de las escuelas secundarias pblicas del Estado en Portugal, reconstituyendo sus trayectos personales y profesionales, caracterizando la manera de desempear sus funciones, identificando sus caractersticas de liderazgo, valorando los consiguientes impactos organizacionales y la influencia que esta multiplicidad de factores ejercen en los resultados globales de los alumnos.

    SUMMARY

    This investigation aims to further the knowledge about Executive Board Directors of Portuguese state secondary schools, reconstituting their personal and professional paths, characterizing the way they deal with their positions, identifying their leadership characteristics, evaluating the organizational impacts resulting from these factors and the influence that this multiplicity of factors has on students global results.

    Palavras chave: Educao, administrao da educao, gesto da educao, organizaes, lderes, liderana.

  • 23

    INTRODUO

    Muito mais do que se pensa, o desempenho do director determina se uma escola se transforma numa organizao dinmica de aprendizagem ou numa empresa falida.

    Gray, Fry e ONeill (2007. p. 5)

    1. A Histria e a vida como fontes inspiradoras

    Esta investigao trata de um tema to antigo quanto a histria da Humanidade os lderes e as lideranas realidades presentes na vida das comunidades humanas desde os tempos mais distantes.

    O tema da liderana transversal a todas as civilizaes, em todas as pocas, e muito da histria dos vencedores, a que mais abundantemente est documentada, estudada e divulgada, construda em torno de personalidades que ganham relevncia e se imortalizam pelas suas qualidades como chefes militares, reformadores, estadistas, tendo todos em comum o facto de se afirmarem pelas suas qualidades como lderes capazes de agregarem em seu torno foras sociais relevantes e concretizarem projectos de grande impacto colectivo.

    Desde muito cedo que o investigador se interessou por personalidades marcantes do passado, primeiro como aluno, depois como professor de Histria, domnio em que se ocupou antes de se dedicar formao de professores. Mais tarde, as experincias cvicas e de gesto em que se foi comprometendo despertaram-lhe o interesse pelo estudo da emergncia dos lderes e das situaes de liderana, nomeadamente, ao nvel poltico, empresarial e escolar.

    Se o estudo da evoluo da Humanidade e dos grandes movimentos sociais transformadores so aliciantes, no menos interessante nem menos importante, aprofundar o conhecimento sobre as personalidades singulares que lhes conferem um rosto e ficam para a posteridade como os grandes

  • 24

    condutores de massas e inspiradores de mudanas que marcam indelevelmente o curso da histria humana.

    Mas nem s de lderes histricos se constri a teia que contribui para a estabilidade das sociedades, das organizaes ou dos grupos, e a cada passo possvel identificar atitudes de liderana, formas do seu exerccio muito dspares, e nem por isso menos importantes, pessoas comuns ou figuras pblicas que inspiram, mobilizam, transformam, numa palavra, lideram.

    Nos tempos actuais, marcados pela globalizao, por uma certa desregulao econmica e social, por profundas alteraes no quadro de valores ticos, morais, religiosos, por incertezas crescentes quanto evoluo expectvel dos mercados, pela emergncia de novas potncias, pelo perigo de novos conflitos armados de dimenso imprevisvel, ganha expresso acrescida a necessidade de lideranas inspiradoras, mobilizadoras e capazes de operarem mudanas significativas nas sociedades actuais com objectivos muito precisos, como defende Blzquez Entonado (2002, p. 30) As mudanas, em si mesmas, no significam muito, a sua mais-valia est na direco e nas metas que se propem alcanar.

    Mas, como afirma Sarramona (2002, p. 11)

    ao falar-se do futuro resulta quase inevitvel misturar o previsvel com o desejvel, especialmente ao fazer referncia vida em sociedade, onde a ausncia de parmetros deterministas, sempre impedir que se faam previses exactas; de outro modo no teria sentido pensar no livre arbtrio.

    E nos tempos que correm, bem como no futuro prximo, se algo certo estar-se a viver um perodo histrico caracterizado pela

    dvida, pela incerteza que originou a morte das utopias. Falamos de progresso mas carecemos de ideias fundamentadoras do mesmo e mais duvidoso ainda parece ser o contributo da educao escolar para esse progresso. (Idem, p. 12)

    Esta ideia est em linha com um conjunto de transformaes que se esto a operar nos sistemas educativos, em geral, e tambm em Portugal, cujo verdadeiro alcance difcil de prever, mas cujos impactos na sociedade

  • 25

    portuguesa tm vindo a gerar apreenses e, nalguns casos, mesmo rejeio por parte de algumas foras sociais e polticas e at de muitos profissionais do ensino, sendo certo que O sistema educativo no pode ficar margem do que caracteriza a sociedade dos nossos tempos: o processo de mudana (Sarramona, 2004, p. 1).

    No sendo objectivo desta investigao entrar aprofundadamente por esse campo, a referncia serve to s para assinalar que o trabalho de concepo, pesquisa e redaco decorreu integralmente num dos perodos mais desafiadores da vida das escolas portuguesas e a temtica objecto de estudo situa-se num dos pontos crticos e decisivos de qualquer reforma do ensino a direco das escolas.

    Se dvidas houvesse sobre a pertinncia do tema, bastaria o facto de a investigao se ter iniciado na vigncia de um quadro legal e terminado j quando est em fase de implementao um diferente que, certamente no por mera coincidncia, mereceu reservas generalizadas por parte de muitos dos sujeitos implicados no estudo, para justificar a sua actualidade.

    No entanto, o que moveu o investigador no foi tanto tomar uma posio crtica face realidade, mas contribuir para que se faa um pouco mais de luz sobre questes insuficientemente estudadas e, ainda que modestamente, contribuir para uma melhor compreenso das lideranas escolares, to desvalorizadas no passado, to discutidas no presente, to decisivas para o futuro, como bem sublinha Domnguez Rodrguez (2005, p. 921)

    Os sistemas de educao desenvolvem-se conforme as necessidades do momento histrico e as expectativas sociais prprias de cada poca, a fim de dar adequada resposta s preocupaes, problemticas e perspectivas das sociedades. As suas funes e as formas especficas como a educao se entrosa com a realidade, obedecem geralmente a decises que correspondem plenamente ao mbito do poltico e prpria poltica, que com as suas decises concretas vai configurando o sistema educativo em concreto.

    Quando os decisores polticos portugueses promovem alteraes profundas no enquadramento jurdico da gesto escolar e a liderana das escolas passa a ser encarada numa perspectiva significativamente diferente da

  • 26

    que fez escola nas ltimas trs dcadas uma das heranas da Revoluo de Abril de 1974, a direco colegial das escolas, substituda pela gesto unipessoal de um director a investigao sobre a temtica das lideranas escolares ganha uma actualidade acrescida e transforma-se numa ponte entre o passado e o futuro, entre o conhecido e o expectvel, entre a rotina e a inovao.

    2. O objecto da investigao

    Esta investigao situa-se no ponto de confluncia entre o pessoal e o social, entre a singularidade de trajectos de vida de personalidades e a emergncia de lideranas e dos seus impactos nas organizaes, neste caso, escolares.

    Com esta investigao visa-se aprofundar o conhecimento sobre presidentes de conselhos executivos de escolas secundrias pblicas estatais portuguesas, reconstituindo os seus trajectos de vida pessoais e profissionais, caracterizando a forma como desempenham os seus cargos, identificando as suas caractersticas de liderana, avaliando a influncia que esta multiplicidade de factores exerce nas organizaes escolares que dirigem, na atractibilidade das respectivas escolas e nos resultados dos alunos, por forma a extrapolar concluses sobre critrios de desempenho ao nvel das lideranas escolares.

    3. Justificao, interesse e actualidade do tema

    A sociedade actual evolui e transforma-se to rapidamente que a instituio escolar tem dificuldade em acompanhar e responder em tempo aos desafios crescentes que lhe so colocados, facto que refora a necessidade de assegurar lideranas estratgicas, capazes de antecipar o futuro e orientar as instituies educativas por forma a satisfazer os interesses dos alunos e as necessidades das comunidades.

    Questes como assegurar a qualidade da escola (Ballion, 1994) ou a eficcia do ensino (Scheerens, 2004) so indissociveis dos modelos de administrao e gesto das escolas e das respectivas lideranas (Sergiovanni e Carver, 1976; Goleman, Boyatzis e MacKee, 2003; Sergiovanni, 2004;

  • 27

    Lorenzo Delgado, 2005; Iacocca, 2007), elementos decisivos para a reconfigurao dos sistemas educativos, para a formulao de novas solues organizacionais nos contextos escolares e para responder com mais rapidez e sucesso s exigncias cada vez maiores das comunidades locais e das sociedades contemporneas.

    A administrao e gesto das escolas e a questo da liderana educacional suscitam hoje um interesse generalizado por parte dos governos, das famlias, dos profissionais do ensino e dos investigadores, e o facto de virem a ser estabelecidas relaes causais entre os modelos de liderana praticados, a qualidade das escolas e o aproveitamento dos alunos (Glatter, 1992; Zeithaml, Parasuranam e Berry, 1992; Alvarez, 2001; Leithood, Louis, Anderson e Wahlstrom, 2004; Beltrn de Tena, Bolvar Bota, Rodrguez Conde, Rodrguez Diguez, Snchez Snchez, 2004; Uribe, 2005) justifica a ateno crescente que o assunto vem merecendo um pouco por todo o mundo.

    Em Portugal, o modelo de administrao e gesto das escolas pblicas estatais1 manteve, no essencial, ao longo das ltimas trs dcadas, as suas caractersticas fundamentais de democraticidade e representao plasmadas na expresso gesto democrtica.

    Legado do ps revoluo do 25 de Abril de 1974, as alteraes que lhe foram sendo introduzidas ao longo dos anos, se permitiram uma maior abertura do sistema representao de actores externos no foram suficientes para modificar a matriz original onde o poder dos professores era soberano na gesto quotidiana dos estabelecimentos de ensino.

    Os rgos de gesto das escolas e, em particular, os presidentes dos rgos executivos2, assumiam-se tradicionalmente, e eram vistos pelos pares, como gestores colegiais, ocupando-se essencialmente da gesto das rotinas, dando a impresso que seguem, sobretudo, instrues da macro estrutura (i.e. Ministrio da Educao), mais do que assumindo-se como lderes proactivos e

    1 Em Portugal as escolas geridas directamente pelo Ministrio da Educao e subvencionadas

    exclusivamente com fundos pblicos so geralmente apenas designadas como pblicas. No mbito desta investigao utiliza-se preferencialmente o termo estatal, uma vez que existem escolas privadas que beneficiam de um denominado contrato de associao com o Estado que as obriga a oferecer um servio pblico gratuito idntico s estatais; no fundo so privadas quanto gesto, mas pblicas pelo servio que oferecem. 2 As designaes variaram entre Presidente de Comisso Instaladora, Presidente de Conselho

    Directivo, Director Executivo, Presidente de Conselho Executivo e, de acordo com a legislao actual Decreto-Lei 75/2008, de 22 de Maio , Director.

  • 28

    inovadores ao nvel da escola (Ventura, Costa, Neto-Mendes, Castanheira, 2005, p. 125).

    Esta situao est em fase de significativa alterao com a aprovao do novo regime de autonomia, administrao e gesto dos estabelecimentos pblicos da educao pr-escolar e dos ensinos bsico e secundrio (DL. 75/2008, de 22 de Abril) que, entre outras alteraes, aumenta a representao externa e retira aos professores a maioria no rgo Conselho Geral, a quem passa a competir seleccionar e eleger o director de cada escola e agrupamento de escolas.

    O tema da liderana tem sido objecto de mltiplas abordagens e abundante produo cientfica e tcnica (Adair, 2006; Alvarez, 1994, 1995, 1998, 2001, 2006; Ballion, 1994; Bass, 1985, 1990 ; Cuban, 1988; Fullan, 1992; Glanz, 2003; Goleman, Boyatzis e McKee, 2003; Greenfield, 1999; Leithwood, Louis, Anderson, e Wahlstrom, 2004; Lorenzo Delgado, 2004, 2005; Mintzenberg, 1995,1999; Northouse, 1997; Sergiovanni e Carver, 1976; Sergiovanni, 2004; Thurler, 2000; Waite, e Nelson, 2005; Yukl, 1998, 2002)3, no apenas no que concerne ao estudo dos diversos modelos de liderana, mas tambm sobre a profissionalizao dos directores, a sua qualificao e as caractersticas desejveis para o exerccio da funo, designadamente na perspectiva do exerccio de lideranas marcantes e, mais recentemente, sobre os impactos da liderana na eficcia das aprendizagens.

    Em Portugal o interesse por esta matria tem vindo a crescer, (Barroso, 2002, 1995, 1995b; Costa, Neto-Mendes, Ventura, 2000; Costa, 2002; Lima, 1999; Sanches, 1996, 1998; Ventura, Costa, Neto-Mendes, Castanheira, 2005), para citar apenas alguns autores com trabalhos mais relevantes, embora no seja muito abundante a produo cientfica especfica sobre questes de liderana escolar.

    No essencial, a pesquisa realizada tem versado mais sobre os aspectos organizacionais do modelo de administrao e gesto, nomeadamente, sobre a questo da centralizao versus autonomia, uma vez que o modelo que tem feito histria nas ltimas trs dcadas encerra uma contradio de fundo por ser democrtico quanto eleio dos directores, mas centralizado e demasiado

    3 Referncias de contexto pois so abundantemente citados ao longo da investigao muitos

    outros autores.

  • 29

    directivista quanto ao exerccio do poder de macro-gesto do sistema, exercido a nvel nacional, pelo prprio Ministrio da Educao.

    Embora formalmente democrtico ao nvel das estruturas de poder nas escolas, pouco mais do que meramente instrumental face s polticas definidas a nvel central e essencialmente respeitador da conformidade burocrtico-pedaggica que lhe est umbilicalmente associada.

    Aos dirigentes das escolas tem sido exigida competncia diversificada e a soluo de problemas complexos que solicitam respostas tcnicas e simultaneamente ticas e morais (Sanches, 1996), mas pouco se fala de liderana e a representao generalizada sobre quem tem exercido a funo de direco de uma escola a de algum que cumpre normativos e no a de quem tem poder de deciso para fazer diferente (Ventura, Costa, Neto-Mendes, Castanheira, 2005, p. 125). As excepes apenas confirmam a regra.

    A diversidade de abordagens no mbito da liderana das escolas significativa e existem divergncias, sobretudo nos percursos e prticas da gesto escolar (Alvarez, 2006; Fullan, 1992; Lorenzo Delgado, 2005; Sergiovanni, 2004), sempre muito influenciadas pelos princpios da poltica geral de cada pas ou mesmo pelas prticas de liderana noutras organizaes (Adair, 2006; Blanchard e Bowles, 2006; Goleman, Boyatzis e McKee, 2003; Hunter, 2006).

    Independentemente das diferenas conceptuais e das diversas formas e expresses prticas que assume, ningum pe em causa a necessidade da liderana, seja de cariz mais individual ou mais colaborativa, seja mais directiva ou mais ressonante.

    O tema da liderana escolar hoje incontornvel e h mesmo quem, como Lorenzo Delgado (2005, p. 367), afirme que se converteu verdadeiramente num tema de moda, um tpico de actualidade, embora em Portugal o interesse, o debate e a investigao especfica sejam ainda relativamente escassos.

    Apesar de objecto de mltiplas abordagens e abundante produo cientfica e tcnica, seja no campo da teoria dos modelos, seja nas suas expresses prticas, nomeadamente sobre o perfil, qualificaes e competncias dos directores das escolas, reflexos organizacionais da sua aco e influncia na eficcia das aprendizagens, a verdade que escasseiam

  • 30

    anlises micro, designadamente, sobre os lderes, os seus trajectos pessoais e profissionais e os impactos provocados pelas suas lideranas.

    4. O contexto da investigao

    A questo da direco das escolas estatais portuguesas um tema recorrente na literatura pedaggica, e embora seja abundante a produo cientfica sobre o modelo de gesto dominante ao longo das ltimas trs dcadas so escassos os estudos sobre liderana escolar e quase inexistentes os que se ocupam dos professores enquanto administradores escolares/directores de escolas4, ou seja, que estudem de uma perspectiva personalizada quem so os homens e mulheres que ao longo dos anos tm governado as escolas, que concepes tm do exerccio do cargo, que atitudes manifestam relativamente ao seu prprio desempenho (Dinis, 1997; Carvalheiro, 2004; Alves, 2005; Matos, 2005).

    O ponto de partida para esta investigao foi a procura de um melhor conhecimento sobre o lado pessoal e profissional de dirigentes de escolas estatais portuguesas, presidentes de conselhos executivos, no na perspectiva de procurar generalizaes nem resultados estatsticos, antes tentando encontrar a singularidade que existe em cada indivduo.

    O desafio apaixonante foi ir para alm do conhecimento superficial, mergulhar na histria de vida de quem exerce o cargo, tentar entrever como se foi construindo um presidente, eventualmente um lder, contextualizar a sua aco directiva num percurso que comeou no bero e se foi construindo fruto do acaso e de decises prprias ou at de terceiros como se sublinha na inspirada expresso de Mrio Soares (2007, p. 89), O destino s em parte se fabrica, o resto produto dos empurres da vida.

    4 Ao utilizar-se o termo director est-se a seguir Barroso (2005, p. 439). Utiliza-se a

    expresso director de escola como designao ampla para se referir o principal responsvel da gesto da escola. Na tradio legislativa portuguesa este termo corresponde aos reitores dos institutos ou directores das escolas preparatrias e tcnicas antes do 25 de Abril de 1974, aos presidentes dos conselhos directivos da legislao de 1976, aos directores executivos da legislao de 1991, aos presidentes dos conselhos (ou directores) executivos da legislao de 1998. Na realidade, ao contrrio do que ocorre noutros pases onde existe uma designao estabilizada, em Portugal, a designao deste cargo tem um forte sentido conotativo e varia em funo dos contextos poltico-administrativos que determinaram as mudanas da gesto escolar a partir de 1974.

  • 31

    Um lder no nasce, faz-se (Goleman, Boyatzis e McKee, 2003, p. 125; Iacocca, 2007, p. 230) e isso que em grande medida explica por que razo com os mesmos instrumentos de regulao legal e com similitudes assinalveis em termos organizacionais, sociais e locais, se encontrem directores que so verdadeiros lderes, que inovam, tm estratgias de sucesso, concitam apoios das famlias e das comunidades, fazem avanar as suas escolas, e outros que se limitam a respeitar conformidades e a executar normativos.

    certo que no h, nem poderia haver, a pretenso de responder a todas as questes que este enunciado de preocupaes coloca, mas pretende-se dar um contributo para que se alargue a janela donde possvel observar, com mais detalhe, quem so algumas das pessoas que governam as escolas em Portugal, como as governam, como se vem a si prprios enquanto dirigentes, como so vistos pelos outros, que impactos resultam da sua aco.

    Depois de mais de trs dcadas de experincia docente, sempre pontuadas pelo exerccio de cargos de administrao intermdia e nas ltimas duas dcadas de gesto de topo, o impulso para aprofundar o conhecimento sobre o percurso que transforma um cidado mais ou menos annimo num lder, neste caso, num lder escolar, constituiu a fora mobilizadora para a realizao desta investigao.

    No regime de autonomia, administrao e gesto dos estabelecimentos da educao pr-escolar e dos ensinos bsico e secundrio5 vigente no momento em que se iniciou a investigao estabelecia-se que a direco executiva assegurada por um conselho executivo ou por um director, que o rgo de administrao e gesto da escola nas reas pedaggica, cultural, administrativa e financeira.

    Embora podendo optar por uma ou outra modalidade, a generalidade das escolas decidiram-se por formas colegiais traduzidas na constituio de conselhos executivos o que, s por si, significativo da forma como a questo foi sempre encarada. A um responsvel individual, preferiu-se um colectivo.

    Apesar disso, ao presidente ou director estavam cometidos os seguintes poderes prprios: a) Representar a escola; b) Coordenar as actividades

    5 Artigo 15., Decreto-Lei n. 115/A de 4 de Maio

  • 32

    decorrentes das competncias prprias da direco executiva; c) Exercer o poder hierrquico, designadamente em matria disciplinar, em relao ao pessoal docente e no docente; d) Exercer o poder disciplinar em relao aos alunos; e) Proceder avaliao do pessoal docente e no docente6.

    Mas no eram apenas os presidentes que estavam em causa, os gestores que conseguem manter simplesmente a organizao nos carris, o que se perseguia eram os lderes, e essa a dura prova a que o pensamento e a aco dos presidentes tm de ser sujeitas, a comprovao da sua liderana.

    O olhar dos presidentes sobre si prprios, passado embora por um crivo construdo para o efeito, importante mas no basta nem definitivo. A liderana no depende de um acto de vontade, nem de uma verificao mais ou menos tcnica, mas sim do reconhecimento por terceiros. No h lderes sem liderados e, sobretudo, no h lderes quando algum os no reconhece como tal.

    Importava, pois, ir em busca do contraditrio, procurar o olhar alheio sobre os presidentes, indagar junto dos seus colaboradores directos e dos outros actores escolares sobre as suas ideias e prticas, identificar sinais que comprovassem a sua liderana ou a pusessem em causa.

    Finalmente, tratava-se de analisar os impactos organizacionais e a forma como estes se traduzem nas relaes entre os actores escolares, nos modos de funcionamento das escolas, no tipo de trabalho realizado, no clima e na cultura escolares, nas relaes com as famlias e com as comunidades e nos resultados das escolas e dos alunos.

    Esta investigao quase intimista na sua abordagem ao estudo dos presidentes das escolas, que abriram as suas memrias ao investigador, lhe permitiram que as revolvesse, as avivasse, as confrontasse com o presente.

    Daqui resultou uma narrativa muito viva, muito expressiva, sobre as histrias singulares de vida de pessoas aparentemente comuns que se vo transformando em gestores e lderes medida que as suas caractersticas excepcionais se vo revelando e consolidando.

    Este intimismo baseado na confiana estabelecida entre o investigador e os presidentes exigiu cautelas metodolgicas acrescidas para que se

    6 Idem artigo 18.

  • 33

    mantivesse bem expressa a diversidade dos papis e o envolvimento necessrio para penetrar no ntimo daqueles no prejudicando a apreciao crtica e a objectividade da anlise do investigador.

    No segundo momento, quando o nmero de sujeitos se alargou substancialmente, j que foram realizadas trinta e nove longas entrevistas, o rigor investigativo foi posto a toda a prova, uma vez que j no se estava a lidar apenas com um dos lados do problema, procurava-se, deliberadamente, o contraditrio, no fundo, avaliava-se a pessoa e o seu desempenho, sem silncios nem anonimatos, como o arquelogo cujo ofcio trazer luz do dia o que se esconde nos estratos milenares, neste caso, nas memrias e opinies individuais sobre colegas e superiores hierrquicos.

    No terceiro momento, foi um trabalho de reconstituio, de pegar nas peas do puzzle e mont-las num todo coerente, como o historiador tem obrigao de fazer, e o investigador tem responsabilidade acrescida por possuir formao de base nesta rea cientfica.

    As fontes tinham falado, a heurstica das ocorrncias dera lugar hermenutica dos comportamentos e agora tratava-se de concluir com o distanciamento e a neutralidade, que sempre se exige, mas cujo relativismo sempre se reconhece como quase inalcanvel, os trajectos e os impactos de lideranas marcantes, amplamente reconhecidas e confirmadas.

    Foi uma paixo que consumiu o investigador durante dois anos, que o levou ao conhecimento de realidades que lhe eram familiares como actor e no como investigador, processo que assumiu tambm caractersticas de auto-avaliao, de confronto de prticas prprias com as alheias, que lhe permitiu descobrir o lado ntimo de pessoas cujo rosto pblico uma marca de qualidade e, em conjunto com eles, traar-lhes o percurso de vida, fazer emergir as suas opinies e prticas de liderana, submet-los ao escrutnio de outros e, finalmente, partir de todo o acervo conseguido para estabelecer um repositrio de critrios de liderana que, se no so generalizveis, podem, com muito proveito, ser seguidos por quem deseja avaliar ou aperfeioar as formas de governar as escolas.

    Esta a marca indelvel desta investigao, feita de rigor e de afectos, relacionando a metodologia e o controlo das fontes com a certeza de que se estava a lidar com o que h de mais precioso em cada pessoa, as suas

  • 34

    memrias e as suas convices, e com o que h de mais exigente nas organizaes, a necessidade de assegurar a eficincia dos processos e a eficcia dos resultados, o que s se consegue com lideranas estratgicas e marcantes. De tudo isto se compe esta investigao.

    5. Opes metodolgicas

    O objectivo desta investigao o estudo do exerccio da liderana tomando como sujeitos de investigao professores que desempenham funes como presidentes de conselhos executivos em escolas estatais portuguesas.

    Partindo dos indivduos, deix-los expressarem-se em discurso directo, peneirar o material recolhido e reconstituir um pedao de uma totalidade. Primeiro os presidentes, depois os outros actores com os quais interagem directamente - colegas de direco, coordenadores de departamentos, representantes dos alunos, do pessoal no docente, das famlias, das autarquias e de outras foras locais com assento em rgos da escola contrastando a forma como os primeiros exercem os cargos com as opinies dos outros actores, aprofundando o conhecimento sobre o exerccio da liderana nas respectivas escolas e os impactos da decorrentes.

    Interessava ir verdadeiramente ao fundo do conhecimento possvel dos actores, ouvi-los, faz-los falar das suas vidas, das suas experincias profissionais, tentar captar os sinais que ajudassem a construir a totalidade, de como se vai construindo um lder e uma liderana e que impactos da resultam. A opo pelo mtodo biogrfico foi natural, Entre a dissoluo do sujeito pelo imprio do objecto e a proclamao do indivduo acima de qualquer contexto e estrutura social, seria prudente explorar os espaos intersticiais que medeiam os dois extremos (Casal, 199, p. 87), pretendendo-se tambm um conhecimento mais prximo das realidades educativas e do quotidiano dos professores (Nvoa, 1992, p. 19). No se est a partir de hipteses, no se visam generalizaes, persegue-se, sim, a singularidade a que s se pode ter acesso pela via da escuta activa dos sujeitos.

  • 35

    Como um fotgrafo recorre ao zoom quando pretende fixar detalhes marcantes de uma paisagem impossvel de abarcar no seu todo, tambm nesta investigao se estuda o pormenor para melhor chegar totalidade da organizao.

    A pretendida aproximao macro aos sujeitos, s poderia ser alcanada atravs de uma metodologia susceptvel de permitir aprofundar a proximidade pessoal aos mesmos, captar o essencial das suas histrias de vida, tentar descodificar emoes e convices.

    A metodologia qualitativa a que melhor se ajusta aos objectivos de um estudo que s pode ser descritivo e se afasta de qualquer preocupao de natureza quantitativa.

    No que se desvalorizem as virtualidades da quantidade, apenas por esta no se ajustar s preocupaes em presena ou, como afirmam Bogdan e Biklen (1994, p 16),

    Ainda que os indivduos que fazem investigao qualitativa possam vir a seleccionar questes especficas medida que recolhem os dados, a abordagem investigao no feita com o objectivo de responder a questes prvias ou de testar hipteses. Privilegiam, essencialmente, a compreenso dos comportamentos a partir da perspectiva dos sujeitos da investigao. As causas exteriores so consideradas de importncia secundria. Recolhem normalmente os dados em funo de um contacto aprofundado com os indivduos, nos seus contextos ecolgicos naturais.

    A entrevista em profundidade, semi-estruturada baseada num guio, mais flexvel no primeiro caso, menos aberto no segundo, espcie de itinerrio tentativo base de uma conversa fluida, aberta possibilidade de inflectir a direco quando justificado, foi o instrumento eleito.

    Banister et al (1994), citado por Szymanski, Almeida e Brandini (2004, p. 10) sustenta que Esse instrumento tem sido empregado em pesquisas qualitativas como soluo para o estudo de significados subjectivos e de tpicos complexos demais para serem investigados por instrumentos fechados num formato padronizado e Kaufmann (2004, p. 10) sublinha, A entrevista compreensiva precisamente o contrrio de um mtodo improvisado.

  • 36

    O estudo de caso, mais propriamente de dois casos, de duas histrias de vida, mas com um vasto conjunto de trinta e nove entrevistas complementares, foi a opo que pareceu mais ajustada aos objectivos visados.

    No estava em causa qualquer preocupao de generalizar concluses, antes procurar singularidades susceptveis de fazerem alguma luz sobre actores privilegiados, sobre os seus trajectos de vida, as suas convices, as suas formas de exerccio da liderana, os impactos da resultantes e a padronizao relativa a comportamentos de liderana passveis de utilizao como elementos de referncia acrescidos na gesto escolar.

    Como afirma Guerra (2006, p. 20), A questo central que se coloca na anlise compreensiva no a definio de uma imensidade de sujeitos estatisticamente representativos, mas sim de uma pequena dimenso de sujeitos socialmente significativos.

    Competindo ao investigador escolher os sujeitos da investigao e estando em causa os marcos conceptuais que balizam o essencial das suas preocupaes a direco e a liderana escolares seleccionaram-se de forma deliberada dois presidentes de conselhos executivos considerados como gestores escolares de referncia e reconhecidos publicamente como verdadeiros lderes educativos, com o objectivo de poder analisar as suas histrias de vida e concepes sobre o exerccio dos cargos, contrastando-as com as opinies dos liderados e extraindo da concluses tambm em termos organizacionais.

    Na seleco consideraram-se o conhecimento pessoal do investigador e as concluses dos relatrios do Grupo de Trabalho para a Avaliao das Escolas7, criado pelo Ministrio da Educao (ME) (Despacho conjunto n. 370/2006 e Despacho n. 5/ME/2006) nomeadamente o desempenho global das escolas que cada um dos sujeitos dirigem e, em particular, o item liderana.

    7 Criado por despacho conjunto do Ministro de Estado e das Finanas e da Ministra da

    Educao, o Grupo de Trabalho para a Avaliao das Escolas tinha como objectivos estudar e propor os modelos de auto-avaliao e de avaliao externa dos estabelecimentos de educao pr-escolar e dos ensinos bsico e secundrio, e definir os procedimentos e condies necessrios sua generalizao, tendo em vista a melhoria da qualidade da educao e a criao de condies para o aprofundamento da autonomia das escolas.

  • 37

    6. Estrutura da investigao

    A investigao desenvolve-se a partir desta introduo e desdobra-se em sete captulos, correspondendo cada um a uma abordagem temtica especfica, embora constituindo o conjunto uma totalidade com racionalidade e sentido prprios.

    Captulo 1. Marco terico - organizaes, escolas e liderana

    No captulo 1 analisam-se em detalhe as questes conceptuais da teoria das organizaes e dos modelos organizacionais; as escolas enquanto organizaes, suas especificidades e caractersticas; a liderana e as suas particularidades nas organizaes educativas, questes conceptuais, contextos, modelos e estudos realizados sobre problemticas prximas das desta investigao.

    Captulo 2. Direco, administrao e gesto escolares em Portugal. Anlise documental comparada dos textos legais

    No captulo 2 faz-se uma recenso alargada, crtica e comparativa de toda a legislao sobre gesto escolar desde 1974 at 2008. Todas as leis ou decretos-lei que enquadraram e enquadram actualmente a gesto escolar, bem como outros instrumentos normativos, so analisados detalhadamente com o objectivo de permitir uma leitura simples mas consistente da evoluo, assinalando-se em cada caso as singularidades e os pontos de continuidade. O ano de 1974 foi definido como o marco mais relevante de rotura com o passado por ter ocorrido a 25 de Abril desse ano a revoluo que ps termo a um perodo longo de governao autoritria em Portugal e institucionalizou a democracia, tendo a gesto das escolas sofrido alteraes de fundo e sendo possvel identificar uma linha de continuidade desde esse ano at ao presente, claramente sinalizadas ao longo do captulo. As roturas ocorridas durante estas trs dcadas tambm so assinaladas e o captulo termina com uma apreciao crtica acerca dos

  • 38

    desafios que a gesto escolar encerra em tempos de mudana e num quadro de crescentes exigncias feitas s escolas.

    Captulo 3. Metodologia e estratgia da investigao

    No captulo 3 descrevem-se as opes metodolgicas, contextualizando do ponto de vista terico as opes feitas, os instrumentos utilizados, a estratgia da investigao, a seleco dos sujeitos, a sua caracterizao e a das respectivas escolas.

    Captulo 4. Carlos e Joo, de vidas paralelas a histrias cruzadas

    No captulo 4 narram-se as histrias de vida, do bero actualidade, de Carlos e Joo, os dois presidentes de conselhos executivos seleccionados, referenciando-se as suas opinies mais relevantes sobre os seus conceitos de liderana, o seu desempenho e as suas prticas como gestores, a partir da anlise das entrevistas em profundidade realizadas com ambos, cuja transcrio integral consta dos anexos.

    Captulo 5. Os presidentes vistos pelos outros

    No captulo 5 faz-se a anlise da primeira parte das entrevistas feitas aos outros elementos de cada escola, seleccionados pela sua representatividade, incluindo-se membros dos conselhos executivos, presidentes das respectivas assembleias de escola, coordenadores de departamentos, alunos, representantes do pessoal no docente, das associaes de pais, das autarquias e das comunidades locais, confrontando as suas opinies com as dos presidentes dos conselhos executivos sobre as respectivas prticas de liderana.

    Na escola presidida por Carlos foram realizadas vinte entrevistas e na de Joo dezanove, cuja transcrio integral consta dos anexos.

  • 39

    Captulo 6. Lideranas, impactos e perspectivas futuras

    No captulo 6 procede-se anlise da segunda parte das entrevistas feitas aos mesmos sujeitos, complementando a anlise anterior com a introduo de temticas relativas a aspectos organizativos, modelos de exerccio de liderana, impactos organizacionais nos resultados da escola e no aproveitamento dos alunos e perspectivas futuras tendo em conta a nova legislao de enquadramento da gesto escolar e a celebrao pioneira de contratos de autonomia destas duas escolas com o Ministrio da Educao.

    Captulo 7. Concluses e possibilidades de desenvolvimento da investigao

    No captulo 7 estabelecem-se as concluses sobre as trs reas em que a investigao se vai progressivamente desdobrando, embora sempre subordinada problemtica da liderana, Carlos e Joo, de vidas paralelas a histrias cruzadas, Os presidentes vistos pelos outros e Lideranas, impactos e perspectivas futuras, e faz-se uma sntese conclusiva onde se aponta um conjunto de indicadores de liderana e se elencam as condies de exerccio e impactos de lideranas marcantes, que resultam das concluses dos trs captulos anteriores.

    Finalmente, sinalizam-se possibilidades de desenvolvimento da investigao.

    7. Fontes bibliogrficas e legislativas

    No final indicada a listagem das fontes bibliogrficas e legislativas utilizadas na realizao da investigao.

    8. Anexos

    Em volume separado, transcrevem-se os textos integrais das entrevistas, a documentao relativa ao processo piloto de avaliao de escolas determinado pelo Ministrio da Educao em 2005, os contratos de autonomia das duas escolas e legislao relevante.

  • 41

    1

    MARCO TERICO ORGANIZAES, ESCOLAS E LIDERANA CAPTULO 1. MARCO TERICO. ORGANIZAES, ESCOLAS E LIDERANA

    O nosso mundo tornou-se para o melhor e para o pior, uma sociedade constituda por organizaes.

    Henry Mintzberg (1990, p. 13)

    1. As organizaes

    1.1. A vida social e as organizaes

    Nasce-se em organizaes, os hospitais, -se educado em organizaes, as escolas, exercem-se funes profissionais em organizaes, as empresas ou os servios pblicos, goza-se o tempo de lazer entregue a organizaes, as agncias de viagem, e at na morte se confiado a organizaes, as agncias funerrias. A vida quotidiana, tal como a conhecemos nas sociedades desenvolvidas, seria impossvel sem a existncia de organizaes. O despertador que marca o incio de um novo dia, a electricidade que alimenta os electrodomsticos, o veculo que assegura o transporte, as cadeias de distribuio que garantem o abastecimento, a polcia que cuida da ordem pblica, os tribunais que aplicam a justia, os hospitais que fornecem cuidados de sade, as cadeias de televiso que propiciam entretenimento, so organizaes ou produtos por elas produzidos, de que todos dependem e se tornaram indispensveis ao modo de vida actual. Como afirma Mintzberg (1990, p. 13), as organizaes ocupam-se ao mesmo tempo das nossas necessidades e dos nossos tempos livres. Governam-nos e atormentam-nos (e, s vezes, simultaneamente). Apesar de indispensveis e facilitadoras, a sua influncia nem sempre positiva levando perda de controle sobre os actos individuais, transferindo a responsabilidade pessoal para autoridades e especialistas e enquanto fontes de poder social,

  • 42

    podem assim subjugar os indivduos e lev-los a fazer coisas a que eles no tm poder suficiente para resistir (Giddens, 2004, p. 350).

    Se as organizaes enquadram a vida social, importa caracterizar os seus aspectos mais importantes, o seu funcionamento e os reflexos da sua existncia; afinal responder pergunta o que so organizaes?

    O vocbulo organizao tem origem no grego organon, que significa instrumento, utenslio, e usado em duas acepes, para designar unidades e entidades sociais, como, por exemplo, as fbricas, os bancos, a Administrao Pblica, mas tambm as suas formas de organizao, a articulao dos meios disponveis aos objectivos perseguidos, a integrao dos membros que as compem num todo coerente.

    Max Weber, que foi o primeiro autor a desenvolver uma interpretao sistemtica da emergncia das organizaes modernas, citado por Giddens (2004, p. 350), considera-as como formas de coordenar as actividades dos seres humanos, ou os bens que produzem, de uma forma constante no tempo e no espao. Mas h diversas formas de definir o que so organizaes.

    Sistemas vivos, que existem numa envolvente mais vasta, da qual dependem para a satisfao das suas diversas necessidades. (Morgan, 1986, p. 39)

    Colectividades orientadas para a procura de objectivos especficos, as quais exibem estruturas sociais com uma formalizao relativamente elevada. (Scott, 1987, p. 22)

    Para mim, a organizao define-se como uma aco colectiva que visa a realizao de uma aco comum, forma de dizer que um grupo de pessoas se junta sob uma bandeira indentificadora (seja a General Motors ou Chez Dupont) para realizar certos produtos ou servios. (Mintzberg, 1990, p. 14)

    Uma organizao um grupo amplo de pessoas, estruturado em linhas impessoais e constitudo para se alcanarem objectivos especficos. (Giddens, 2004, p. 348)

  • 43

    Cunha, Rego, Cunha e Cabral-Cardoso (2005) sintetizam assim as caractersticas das organizaes.

    Impessoalidade Exceptuando nas pequenas organizaes, a maior parte dos membros organizacionais desconhece-se mutuamente. Os papis organizacionais normalmente no dependem das caractersticas individuais, mas sobretudo de um conjunto de atributos tcnicos e profissionais. A burocracia, por exemplo, promete tratar todos os indivduos apenas de acordo com o seu estatuto organizacional, independentemente das suas caractersticas pessoais, como a raa, a religio, as escolhas partidrias, etc. por isso que Perrow considera a burocracia como um projecto moral.

    Hierarquia a hierarquia, mais alta ou mais baixa, que permite coordenar o trabalho de um conjunto alargado de pessoas.

    Dimenso As organizaes tm, no plano terico, potencial para crescer desmesuradamente.

    Objectivos As organizaes perseguem um conjunto de objectivos razoavelmente bem definidos, embora possam existir discrepncias quanto a esses objectivos.

    Eficincia As organizaes procuram usar os recursos de forma eficiente. A eficincia um valor central para as organizaes modernas.

    Fronteiras H marcas de separao entre a empresa e aqueles que lhe so estranhos. Por exemplo,