ibnrushd (averroes) , o homem histórico - nehmaat.uff.br · da escolha do caminho que averroes...

15
Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788 NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 215 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR IbnRushd (Averroes) , o homem histórico Andréa Hamminni Pires da Silva Avila Franquetto 1 Carla Barcelos Nogueira Soares 2 Submetido em 04/2016 Aceito em 05/2016 Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso 3 . RESUMO: Ibn Rushd , latinizado como Averroes, viveu na Idade Média, nasceu na cidade de Córdoba, em 1126 e morreu em 1198 na cidade de Marrakech. Quando Ibn Rushd nasceu, três séculos já haviam se passado desde que a filosofia havia sido apresentada aos árabes por Al-Kindi (ATTIE FILHO, 2002, p.300). Ibn Rushd foi um estudioso das obras Aristotélicas e, graças a seus estudos incessantes,o estagirita é apresentado ao ocidente. Além da filosofia, dedicou-se também ao estudo do direito, da física, da medicina, e da astronomia,entre outras artes do seu tempo, exercendo o cargo de qãdi 4 .Ao tentar ser fidedigno à obra de Aristóles, Averroes, inconscientemente, cria sua própria filosofia Averroísta. Neste trabalho buscamos localizar Abdul-Walid Muhammad Ibn Rushd, o grande homem, em seu contexto histórico. IbnRushd introduziu a filosofia aristotélica ao pensamento ocidental,filosofia que até hoje baliza conceitos éticos e cientificos. Palavras-chave:Averroes Aristóteles Filosofia - século XII Islã-Córdoba ABSTRACT: Ibn Rushd, Averroes in Latin, lived in the Middle Ages, born in the city of Cordoba in 1126 and died in 1198 in the city of Marrakesh. When IbnRushd was born three centuries had passed since philosophy was presented to the Arabs by Al-Kindi. Ibn Rushd was a student of Aristotelian works and, thanks to its incessant studies, the stagirite is presented to the West. Beyond Philosophy, also devoted himself to the study of law, physics, medicine, and astronomy, among other arts of his time, occupying the position of qadi. By trying to be reliable the work of Aristotle, Averroes unconsciously create his own Averroist philosophy. In this work we try to put Abdul-Walid Muhammad IbnRushd, the great man, in its historical context. Ibn Rushd introduced the Aristotelian philosophy to Western thought, philosophy today enlights ethical and scientific concepts Key wordsAverroes Aristotle - Philosophy - XIX century - Islam- Córdoba 1 Mestre em Cognição e Linguagem, Pós-graduada em História Moderna pela UFF, Professora Livre Docente de Islã, da Mística Islâmica, da Filosofia Averroísta, de Psicologia Juguiana, de Psicologia Organizacional, Palestrante da Idade Clássica Média correlacionada ao Islamismo e à Filosofia Árabe (Falsafa), Acadêmica de História. 2 Pós-graduada em Língua Portuguesa pela Faculdade de Filosofia de Campos, ministra aulas de Língua Portuguesa e Língua Inglesa para cursos de Ensino Médio e cursos Técnicos. 3 O texto é iniciado desta forma pelo fato de uma das autoras ser muçulmana. 4 Juiz.

Upload: vothuan

Post on 23-Nov-2018

216 views

Category:

Documents


2 download

TRANSCRIPT

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 215 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

IbnRushd (Averroes) , o homem histórico

Andréa Hamminni Pires da Silva Avila Franquetto1

Carla Barcelos Nogueira Soares2

Submetido em 04/2016

Aceito em 05/2016

Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso3.

RESUMO:

Ibn Rushd , latinizado como Averroes, viveu na Idade Média, nasceu na cidade de Córdoba, em 1126 e

morreu em 1198 na cidade de Marrakech. Quando Ibn Rushd nasceu, três séculos já haviam se passado

desde que a filosofia havia sido apresentada aos árabes por Al-Kindi (ATTIE FILHO, 2002, p.300). Ibn

Rushd foi um estudioso das obras Aristotélicas e, graças a seus estudos incessantes,o estagirita é

apresentado ao ocidente. Além da filosofia, dedicou-se também ao estudo do direito, da física, da

medicina, e da astronomia,entre outras artes do seu tempo, exercendo o cargo de qãdi4.Ao tentar ser

fidedigno à obra de Aristóles, Averroes, inconscientemente, cria sua própria filosofia Averroísta. Neste

trabalho buscamos localizar Abdul-Walid Muhammad Ibn Rushd, o grande homem, em seu contexto

histórico. IbnRushd introduziu a filosofia aristotélica ao pensamento ocidental,filosofia que até hoje

baliza conceitos éticos e cientificos.

Palavras-chave:Averroes – Aristóteles – Filosofia - século XII – Islã-Córdoba

ABSTRACT:

Ibn Rushd, Averroes in Latin, lived in the Middle Ages, born in the city of Cordoba in 1126 and died in

1198 in the city of Marrakesh. When IbnRushd was born three centuries had passed since philosophy was

presented to the Arabs by Al-Kindi. Ibn Rushd was a student of Aristotelian works and, thanks to its

incessant studies, the stagirite is presented to the West. Beyond Philosophy, also devoted himself to the

study of law, physics, medicine, and astronomy, among other arts of his time, occupying the position of

qadi. By trying to be reliable the work of Aristotle, Averroes unconsciously create his own Averroist

philosophy. In this work we try to put Abdul-Walid Muhammad IbnRushd, the great man, in its historical

context. Ibn Rushd introduced the Aristotelian philosophy to Western thought, philosophy today enlights

ethical and scientific concepts

Key words– Averroes – Aristotle - Philosophy - XIX century - Islam- Córdoba

1 Mestre em Cognição e Linguagem, Pós-graduada em História Moderna pela UFF, Professora Livre

Docente de Islã, da Mística Islâmica, da Filosofia Averroísta, de Psicologia Juguiana, de Psicologia

Organizacional, Palestrante da Idade Clássica Média correlacionada ao Islamismo e à Filosofia Árabe

(Falsafa), Acadêmica de História. 2 Pós-graduada em Língua Portuguesa pela Faculdade de Filosofia de Campos, ministra aulas de Língua

Portuguesa e Língua Inglesa para cursos de Ensino Médio e cursos Técnicos.

3 O texto é iniciado desta forma pelo fato de uma das autoras ser muçulmana.

4 Juiz.

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 216 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

Averroes era um homem à frente de seu tempo, por vezes, mal compreendido e

tido como herege. Ele não foi apenas um grande comentador de Aristóteles, mas como

muitos medievalistas muçulmanos, expandiu os princípios da filosofia grega, criando

um pensamento original que transcendeu seu mestre Aristótelesnos campos da razão e

da religião. Segundo Averroes, para penetrar a natureza do entendimento humano,

exige-se um conhecimento perfeito da alma.

Sendo ele um mulçumano sunita do século XII e fazendo parte da corte

Almorada, tinha como responsabilidade social nunca ir contra os conceitos da hadit5 e

valorizar, de maneira coerente, as suras do Corão. Ibn Rushd estava inserido em uma

cultura extremamente rígida que ao mesmo tempo reunia o melhor da erudição de sua

época, amálgama do pensamento grego clássico, islâmico, judeu e cristão, que foi o

berço da civilização intelectual do mundo islâmico.

Naquele período, havia uma influência mística sufista de peso no pensamento

islâmico, na qual a razão não era a via principal para se chegar ao conhecimento divino.

Averroes rema contra a corrente e introduz o pensamento aristotélico,no qual a razão

justifica a fé.

Buscaremos, de forma sucinta e breve, tentar acompanhar e compreender a

evolução deste pensador a partir de sua iniciação aos estudos da filosofia, passando por

sua historiografia, que abrange desde sua inclusão na corte Almorada, sua luta para

defender o que acreditava, a perseguição, o exílio, a morte, e finalmente o legado que

deixou como contribuição de grande importância para a humanidade.

Dados Históricos

Averroes (1126–1198) nasceu em Córdoba, Espanha, em um período de grandes

tensões na Península Ibérica, em uma família tradicional de servidores da corte da dinastia dos

Almôadas. Seu avô, o influente Abdul-Walid Muhammad, falecido em 1126, era o jurista

principal de Córdoba, durante a dinastia dos Almorávidas. O pai de Averroes, Abdul-Qasim

Ahmad, embora não venerado como seu avô, manteve a mesma posição até que os Almorávidas

foram derrubados pela dinastia dos Almoradas em 1146.

Segundo consta, a família Rushdprovavelmente a família de Averroes era de

origem judaica. Não sabemos ao certo quando ocorreu a conversão ao Islamismo de seus

antepassados. O especialista JosepPuig Montada acredita que o nome Rushd foi escolhido

5 Corpo de leis, lendas e histórias sobre a vida do profeta Muhammad.

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 217 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

quando ocorreu a conversão dos antepassados de Averroes ao Islamismo, pois Rushd é um

nome pleno de conotações religiosas. Parece que a escolha desse nome já era uma premonição

da escolha do caminho que Averroes viria a trilhar no decorrer da sua vida, o caminho da razão

e da fidelidade à filosofia aristotélica.

Primeiros movimentos

Miguel Attie Filho, no livro Falsafa, nos relata a passagem pela qual Averroes é

incumbido de tecer comentários sobre obra de Aristóteles:

“...um dia, IbnTufayl o chamou e lhe relatou que escutara o emir se lamentar

pela obscuridade das obras de Aristóteles e de seus tradutores, dizendo que

adoraria encontrar um homem que pudesse comentar esses livros e explicá-

los de modo mais claro, para torná-los mais acessíveis aos homens.

IbnTufayl, já com idade avançada, insistiu que Averroes tomasse para si esse

trabalho, já que possuía grande aplicação nos estudos, clareza, lucidez e

inteligência suficientes para tão importante tarefa. Pela sua própria pena

sabe-se que de 1169 a 1180 d.C., aproximadamente, Averroes já escrevera o

sobre a Física, Comentário sobre os metereológicos, comentário médio sobre

a retórica, comentário sobre a metafísica – dentre outros referentes a

Aristóteles – e uma paráfrase do Almagesto de Ptolomeu”. (ATTIE FILHO,

2002, p. 304)

Em 1182, Averroes foi nomeado primeiro médico substituindo IbnTufayl. Na mesma

época, lhe foi concedido o cargo de Qãdi. Posteriormente, IbnRushd, pelo seu desempenho na

aplicação do silogismo aristotélico em suas sentenças, chegou a alçar o cargo que outrora havia

sido de seu avô e pai, de “Qadial-qudah” (ATTIE FILHO, 2002. p. 304), que significa juiz dos

juizes. Mesmo após a morte do emir, Averroes manteve sua posição e conseguiu permanecer

sob a proteção do novo emir, Al-Mansur, filho de ‘AbūYa’qūbYūsuf.

Averroes escrevia seus trabalhos filosóficos ao mesmo tempo em que se dedicava aos

afazeres jurídicos e religiosos. Suas opiniões em relação ao Corão criavam calorosas discussões

entre as autoridades da época,por discordaremda maneira que ele se pronunciava com relação às

leis corânicas. Os discípulos deixaram de assistir às suas aulas com temor de represálias do

emir. Depois de algum tempo, porém, os teólogos radicais lançaram-lhe ataques e injúrias, de

modo a exigir do próprio Al- Mansur que retirasse a proteção que lhe confiara.

Averroes viveu ainda por 14 anos depois que Al-Mansur assumiu a posição de seu pai.

Nasceu entre os dois uma grande amizade, que passavam horas discutindo sobre filosofia.

Quando Averroes chegava ao castelo, dirigia-se ao emir de uma maneira informal, dizendo:

tasma’ yaahi, que significa “escuta meu irmão” (ATTIE FILHO, 2002, p. 304).

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 218 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

Averroes foi acusado por tentar levar a razão aristotélica, leia-se lógica, para dentro

da interpretação das escrituras sagradas do Corão.

Sendo ele um Qadi, tinha o poder de julgar a partir direito corânico, porém, muitas

vezes, suas interpretações não foram aceitas pelos radicais que o acusavam deherege. Baseava-

se na teologia de IbnTumart (1078-1139), que foi seu precursor, que enfatizava que tanto a

razão quanto a revelação poderiam levar à unidade divina, levando-o a crer que a razão e a

teologia poderiam ter uma convivência harmoniosa.Isto o convenceu de que a lei deveria ser

embasada, acima de tudo, na revelação e não nas tradições jurídicas. A teologia de IbnTumart

sustentava que a existência e a essência divinas poderiam ser firmadas através da razão, ou seja,

o contato do homem com o divino seria possível através do intelecto, por meio da razão e do

silogismo.

O que influenciou muito a sua percepção de filosofia e religião,permitindo que ele

desenvolvesse sua habilidade em unir esses temas diferenciados e controversos, foi a sua relação

com a dinastia Almorada.

Os comentários sobre obras de Aristóteles

Averroes trabalhou e serviu a dinastia Almorada, gozando de uma certa liberdade para

expor o seu aristotelismo, que conciliava revelação, fé, razão e filosofia.

Quando Averroes foi convidado a ler as obras aristotélicas para auxiliar no

aprendizado do emir ‘AbūYa’qūbYūsuf, tentou ser o mais transparente e autêntico possível na

tentativa de compreender as verdadeiras intenções de Aristóteles. Isso só foi possível devido ao

grande interesse do soberano e ao desejo incessante de Averroes para o conhecimento da

Verdade.

Averroes comentou em três momentos as obras do Estagirita. Esses comentários

evoluem da seguinte forma:

- Nos comentários menores sobre o Isagoge de Porfírio, o Organon, a Retórica e a

Poética de Aristóteles, Averroes encontra-se muito influenciado ainda pelas ideias aristotélicas;

- Nos comentários médios, envolvendo a lógica, a filosofia prática, a ética

aristotélica e a política platônica, temos um Averroes mais amadurecido. Averroes não lia em

grego e nem em siríaco. Os textos nos quais ele trabalhou eram escritos em árabe;

- Nos comentários maiores, considerados comentários literais às obras de

Aristóteles, incluindo os livros de física e de metafísica, conseguimos observar um Averroes

mais original, apesar da sua insistência em dizer que era meramente um comentador de

Aristóteles.

Verificamos essa originalidade através de suas obras, tais como Badawi nos

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 219 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

apresenta na Falsafa:

“Noventa e dois títulos que podem ser divididos em seis grandes grupos

temáticos, filosofia, teologia, direito, astronomia, gramática e medicina. Em

filosofia destacam-se 32 comentários, em sua maior parte, referente às obras

de Aristóteles, além de 29 títulos originais. Nove obras sobre teologia e

jurisprudência, três sobre astronomia e 2 sobre gramática. Em medicina,

listam-se 8 comentários, principalmente sobre Galeno e 9 obras originais”.

(ATTIE FILHO, 2002, p.308)

Afirmava que o senso comum não estava preparado o suficiente para dialogar com os

textos teológicos utilizando-se do silogismo. Os teólogos, por sua vez, estavam um pouco mais

preparados para esse embate, mas ainda muito presos a conceitos dogmáticos radicais. Somente

os filósofos eram capazes de utilizar o silogismo aristotélico, sem com isso prejudicar a essência

real da razão filosófica e da revelação. Para ele, somente os filósofos detinham a capacidade

para entender que não havia uma separação entre fé e razão, mas sim uma união na qual

somente mentes brilhantes compreenderiam a sutileza da revelação.

Perseguição, exílio e morte

Averroes, por defender essas ideias tão inovadoras e controversas para sua época, caiu

em desgraça. Sem a proteção de Al-Mansur, tido como herege, suas obras foram queimadas e

sua filosofia proibida.

Exilou-se em Lucena, uma vila judaica fora de Córdoba, junto com outros intelectuais,

filósofos e cientistas. Passa por um período de desonra que não durou muito tempo e seu retorno

foi pleiteado por pessoas influentes da sociedade islâmica de Sevilha.

Assim que pôde, Al-Mansur requer a volta de Averroes, concedendo-lhe o perdão. A

retomada dessa relação dura pouco tempo devido ao falecimento de Averroes no dia 10 de

dezembro de 1198, na cidade de Marrakech aos 72 anos de idade.

Seus restos mortais são transferidos para Córdoba três meses depois, sendo enterrados

no túmulo de sua família, no cemitério de Ibn Abbas.

As dúvidas sobre a ortodoxia de Averroes persistiram, mas com o desinteresse islâmico

por sua filosofia, seus escritos encontraram novos espectadores nos mundos cristãos e judaicos.

Averroes foi um erudito, um sábio para sua época, mas infelizmente não deixou

praticamente nenhum discípulo ou sucessores no mundo islâmico, e nem grandes críticos. Os

maiores apreciadores de sua obra acabaram sendo os judeus e os cristãos. Sua obra teve leitore

ilustres, como Siger de Brabant, Alberto Magno e Tomás de Aquino.

Averroes dedicou três décadas da sua vida ao trabalho junto à Corte Almorada e aos

comentários das obras de Aristóteles, tendo como companheiros fiéis de suas idéias a pena, o

tinteiro e uma crença na possibilidade de deixar um legado filosófico das obras de Aristóteles.

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 220 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

Averroes teve suas ideias e convicções revividas através dos tempos, sendo ora

valorizado, ora criticado pelos estudiosos. Ele foi um islâmico fiel às suas idéias e, segundo

alguns estudiosos, o maior filósofo mulçumano ocidental. No que diz respeito à Falsafa, tinha

uma visão diferenciada, o que o tornava um homem além do seu tempo, formulando uma nova

teoria na qual razão e fé poderiam caminhar juntas. O mesmo caminho foi retomado por Santo

Agostinho, posteriormente, ao tentar utilizar o pensamento filosófico Grego para justificar a

nascente teologia Cristã.

A dificuldade

As obras de Aristóteles e de outros autores, que por vezes já haviam sido

traduzidas para o sírio (e talvez também já do sírio para o persa), sofreram então uma

nova tradução para o árabe.

Convém ressaltar três aspectos da influência árabe sobre a cultura do medievo

ocidental:

- em primeiro lugar, a tradução para o latim de textos científicos antigos, não

diretamente do grego, mas através do árabe, bem como a de textos científicos

produzidos por árabes. Vários tratados de Hipócrates, que Moerbeke traduziu por volta

de 1260, haviam sido traduzidos anteriormente por Gerardo de Cremona e outros, no

século XII, em Toledo. Neste mesmo século, os Elementa de Euclides conheceram três

traduções, todas elas do árabe, através de Adelardo de Barth, de Hermano de Caríntia e

de Gerardo de Cremona. O De mensura circuli de Arquimedes chegou ao Ocidente pela

primeira vez através de tradução de Gerardo de Cremona, o mesmo acontecendo com o

De speculis comburentibus de Diocles. Foi também através do árabe que se traduziu a

obra do Pseudo-Euclides De ponderoso et levi, a Optica de Ptolomeu e o De motu et

tempore de Alexandre de Afrodísias;

As obras científicas, dos autores árabes, que foram traduzidas para o latim são:

os textos de Química de Ibn Hayyan; o Liber Ysagogarum Alchorismi sobre Aritmética;

as Tabulae de Astronomia e a Algebra de Al-Khwarizmi; o De aspectibus e o De

umbris de Al-Kindi; os textos de Química e de Medicina de Rhazes; o Liber regalis;

enciclopédia médica, de Ali Abbas; o Optica Thesaurus de Alhazen; o De mineralibus e

o Canon de medicina de Avicena e o Liber astronomiae de Alpetragius. Sem a

contribuição árabe, a Medicina, a Ótica, a Matemática e a Astronomia ocidentais talvez

não tivessem sido desenvolvidas, por falta de um impulso inicial.

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 221 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

- em segundo lugar, há diversas obras de Aristóteles cuja primeira tradução foi

feita do árabe, ou que a tradução do árabe foi dominante até a chegada dos trabalhos de

Guilherme de Moerbeke. De tais obras podemos mencionar: do Decoelo com as

traduções de Gerardo de Cremona e de Miguel Scotus; dos Meteorologica nas traduções

de Gerardo e de Henrique Arístipo; do De animalibus, na de Miguel Scotus; da

Metafísica, também em tradução de Scotus;

Há também uma série de obras pseudo-aristotélicas, por longo tempo atribuídas

a ele, que chegaram ao Ocidente através de tradução (ou de redação) do árabe. Citam-

se, entre outras: o De plantis (de Nicolau Damasceno); o De proprietatibus; o De

mineralibus (de Avicena); o De pomo;o Secretum secretorum; o De differentia spiritus

et animae; e, acima de todos, o célebre Liber Aristotelis de expositione bonitatis purae,

mais conhecido como De causis: uma compilação, devidamente adaptada, dos

Elementos de Teologia de Proclo.Este livro foi comentado por diversos autores

medievais, citado por quase todos eles e tido como uma das obras mais importantes de

Aristóteles, até que Tomás de Aquino, à luz dos trabalhos de Moerbeke, desvendou-lhe

a autoria.

- em terceiro lugar, ao se tratar da influência do pensamento árabe sobre o

cristão, no que se refere à recepção de Aristóteles no Ocidente, é preciso mencionar o

fator mais importante: a prioridade cronológica do contato da civilização árabe com o

mundo grego forneceu aos ocidentais um modelo de leitura de Aristóteles, modelo este

do qual todos se valeram generosamente.

A obscuridade das Obras

Aristóteles

Aristóteles é um autor difícil de ser lido. Suas obras, nas condições em que

chegaram até nós, são muitas vezes obscuras; algumas delas vistas pelos medievais

como um todo harmônico são, na verdade, um conjunto de diversos textos

independentes cuja ordem de composição não é necessariamente a da sequência tal

como hoje a conhecemos. A Metafísica é exemplo disso, dela chega-se mesmo a

duvidar se o livro XI seja aristotélico. Cedo se percebeu que a obra de Aristóteles

requeria um comentário paralelo a fim de ser compreendida. Surgiu, assim, o gênero das

paráfrases e resumos iniciado por Alexandre de Afrodísias, titular da cadeira de

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 222 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

Filosofia peripatética, instituída em Atenas por Marco Aurélio no ano 180 da nossa era.

Seguiram-se, entre outros: Porfírio, aluno de Plotino, conhecido principalmente pelo

Isagoge; a introdução ao tratado sobre As Categorias; Siriano, mestre de Proclo;

Temístio, professor em Constantinopla por volta de 350; Simplício, imigrado para a

corte persa, após o fechamento da Academia, em 529; João Filopono, cristão

alexandrino do século VI. Árabes, judeus e cristãos prolongaram o gênero dos

comentários e paráfrases até o século XVII, inclusive Averroes. Some-se a isto o fato

de que inúmeras obras, como foi há pouco mencionado, foram atribuídas a Aristóteles,

quando, em verdade, provinham de outros autores quase sempre neoplatônicos.

A fim de facilitar a compreensão do texto, foram traduzidos também os

comentadores de Aristóteles, tanto os gregos, como os árabes. Típico foi o caso da Ética

a Nicômaco cuja tradução de Roberto Grosseteste já vinha acompanhada pelos

comentários de Eustrácio e Miguel de Éfeso. Traduziram-se os comentários de Filopono

e Temístio através de De Anima; da Metafísica, os importantes comentários de Avicena

e Averroes.

Dois pensadores árabes foram de fundamental importância para a recepção de

Aristóteles no Ocidente: Avicena e Averroes. De Avicena, traduzidos, já por Domingos

Gundissalino, os livros De convenientia et differentia, Líber de anima seu sextus de

naturalibus e o fundamental Líber de Philosophia prima seu scientia divina. Mais tarde,

seguiram-se outros textos. Vocação enciclopédica de médico, jurista e, acima de tudo,

de filósofo, seria impossível pensar os séculos XII e XIII sem ele que, na verdade, mais

do que Aristóteles, foi quem iniciou os medievais na metafísica. Com precisão,

percebeu-se que tanto o agostinismo como o aristotelismo receberam, na Idade Média,

um cunho avicenisante.

Averroes

Averroes merece lugar especial entre todos os comentadores de Aristóteles e não

sem razão foi conhecido como O Comentador. Além de inúmeras obras de cunho mais

pessoal, nas quais se refere constantemente a Aristóteles, deteve-se, ao longo da vida, a

manusear os livros aristotélicos. De seu trabalho surgiram três tipos de comentários: os

comentários menores, que são como um epítome ou resumo da obra; os comentários

médios, em forma de paráfrases, tal como o fizera Avicena; e, enfim, os comentários

maiores, nos quais o texto é dividido em pequenas partes, e cada uma delas exposta,

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 223 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

num minucioso trabalho, onde as frases e as palavras são dissecadas, e que serviu de

modelo para o trabalho de Tomás de Aquino.

A influência árabe no pensamento medieval

Durante o século XIII, foi traduzida para o latim boa parte das obras do filósofo

cordobês, tendo mesmo acontecido que, de diversas delas, como, por exemplo, de seu

comentário à República de Platão, perdeu-se o original árabe restando tão somente a

tradução hebraica e a latina que talvez tenha sido feita a partir da hebraica. O fato de

existirem hoje 62 manuscritos latinos de seu comentário maior à Física, 36 ao De

Coelo, 56 ao De Anima, 59 à Metafísica e 24 à Poética (da qual há apenas 2

manuscritos da tradução de Moerbeke), e o fato de que a célebre EdiçãoJuntina da obra

aristotélica realizada em Veneza, no início do século XVI, tenha levado o título de

Aristotelis opera cum Averrois commentariisdispensam maiores comentários a respeito

de sua importância para a Filosofia do medievo ocidental.

Quando os medievais foram ler e comentar Aristóteles, não estavam realizando

um trabalho pioneiro sem precedente histórico, não estavam criando a partir do nada,

tinham diante de si as leituras, interpretações e comentários feitos pelos antecessores

gregos, árabes e judeus. As pesquisas do século XX e as edições latinas de autores não-

cristãos permitem, cada vez mais, que se mensure com maior precisão a importância

destes pensadores na leitura que os ocidentais fizeram de Aristóteles.

RELIGIÃO

O islã

O surgimento do islã tem data e local demarcados: o começo no século VII, na

península árabe. É bem verdade que o lugar já tinha sido palco há séculos da revolução

monoteísta, a fé em um deus único que foi intoroduzida pelo judaísmo e pelo

cristinismo, o que provavelmente facilitou a recepção da nova crença. Contudo, é

incrível e quase impossível compreender a fantástica revolução do islã sem estudar as

condições históricas concretas em que Muhammad e seus seguidores atuaram.

A Arábia do futuro profeta vivia à margem das duas superpotências do oriente

médio da época: a Persia e o Império Bizantino. A capital era Constantinopla (hoje

Istambul), que surgira com a divisão do Império romano em dois, Império Romano do

Ocidente e do Oriente, em 330 depois de Cristo. Como resultado, disputas religiosas

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 224 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

transformaram-se, automaticamente, em conflitos políticos. Com isto, a fé Cristã se viu

envolvida em ásperas disputas, baseadas por exemplona discussão sobre a própria

natureza de Cristo- seria Jesus um ser divino ou um ser humano? Pode parecer sem

sentido e difícil para nós atualmente compreender o alcance e a intensidade de uma

discusão desse tipo, mas, só após vários concílios ecumênicos, ficou determinada a

natureza dual do Filho de Deus: a um só tempo divina e humana, doutrina aceita até

hoje nas Igrejas Ortodoxa e Católica.

A base islâmica

Quando a religião islâmica vinhado deserto árabe, no chamado Crescente Fértil

– religião em forma de meia lua situada entre a costa leste do mediterrâneo e o golfo

pérsico - aproveitou-se da frustração e da insatisfação daqueles perseguidos etnicamente

mais próximos dos árabes do que dos bizantinos. É um povo muito carente

economicamente e com um número grande de mulheres e crianças que acreditavam

encontrar uma harmonia e um lugar melhor na sociedade. É importante ressaltar que o

islã não aceita o escravismo.

Além dos problemas e divergências internas, Bizâncio teve de enfrentar muitos

inimigos externos sofrendo reduções periódicas e significativas de seu território. As

ameaças vieram, em geral, do Oriente: invasões de nômades da Ásia Central e inúmeros

confrontos com os Persas exauriram militarmente os bizantinos. O Império Persa,

herdeiro da velha civilização do zoroastrismo- antigo sistema religioso-filosófico que

teve Zaratustra (Zoroastro ou Zoroaster) como seu profeta-fundador mítico no século VI

antes de Cristo-, constituíra o único estado à altura do Império romano e do Império

Bizantino.

O comércio de trânsito internacional beneficiou essa região semisselvagem, em

particular, a cidade de Meca-tradicional centro de peregrinação, graças à presença de

uma estranha pedra negra- um meteorito de trinta centímetros reverenciado como

sagrado - junto ao qual mais tarde se ergueria uma construção em forma de cubo, a

Caaba, considerada pelos muçulmanos a casa de Deus.

O islamismo foi fundado no ano de 622 na região da Arábia conhecida

atualmente como Arábia Saudita. Seu fundador, o profeta Muhammad, reuniu a base da

fé islâmica num conjunto de versos conhecido como Corão.Segundo ele, as escrituras

foram reveladas a ele por Allah por intermédio do anjo Djebrail.

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 225 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

A revelação

O Islã é uma religião baseada na revelação que Muhammad teve, com a idade de

quarenta anos, através do anjo Djebrail no ano de 610 d.C.Esta revelação aconteceu

enquanto ele se encontrava em meditação, uma prática que realizava desde menino. Na

noite da revelação, a luz divina iluminou sua consciência e, apesar de analfabeto,o

profeta teve condições intelectuais para ditar o Corão, uma obra que versa sobre todos

os detalhes do dia-a-dia do muçulmano, tanto no plano espiritual como administrativo

dos rituais, das celebrações religiosas, da indenização devida à mulher em caso de

divórcio e de um código de ética humana que proibia o assassinato de recém-nascidos

não desejados.

Durante 20 anos, o profeta ditou uma nova lei que foi organizada em capítulos

mais ou menos longos chamados suratas ou sunna. Fez isto sem qualquer hesitação

apesar do impacto da nova religião sobre o cotidiano da sociedade. Como afirmava que

era o Anjo Djebrail quem ditava o texto, nunca se disse autor do Corão.

A fuga do profeta para a cidade de Medina, conhecida como Hégira, dá início ao

calendário muçulmano. Em Medina, a palavra de Deus revelada a Muhammad

conquistou adeptos em ritmo acelerado.

Averroes e a Educação

Ainda sobre sociedade e política, Averroes concebe a sociedade como um

complexo educativo, educacional, uma escola onde o governante é um educador. Para

ele a sociedade tem três canadas: A inferior, onde ficam aqueles que buscam o prazer

cuja virtude deve ser a temperança; acima desta, a camada dos que buscam a honra cuja

virtude deve ser a fortaleza; e a camada superior onde ficam os sábios, aqueles

consagrados à contemplação e guiados pela sabedoria. Para Averroes, o único sinal

externo da legitimidade do governante é a sabedoria. Ele conduz os cidadãos e os educa.

Sobre filosofia e religião, convém dizer que Averroes faz uma distinção entre

filosofia e teologia. Ele determina os territórios da teologia e da filosofia fazendo uma

separação clara entre a teologia (crença) e a filosofia (razão).

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 226 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

A interpretação racional de Averroes

Para Averroes, a filosofia é a religião dos sábios e a religião a filosofia dos

povos simples. A grande massa só pode alcançar a felicidade mediante a verdade

revelada, não sendo conveniente que se envolva em questões filosóficas, visto que não

estão capacitados para isso, não foram dotados para isso. Não se deve permitir a

divulgação de doutrinas que possam suscitar dúvida religiosa nas pessoas simples.

Já os que estão capacitados para isso devem se envolver, ou seja, os que estão

capacitados para buscar a filosofia devem fazê-lo buscando a sabedoria e a verdade

através da filosofia como obrigação imposta pelo próprio Deus, que os dotou com essa

capacidade. Os sábios são minoria e o saber filosófico constitui o cume da ciência e da

felicidade. O sábio e o filósofo alcançam a sabedoria e a verdade, a felicidade pela e

através da Filosofia.

Filósofo original, profundo, crente, muçulmano sincero, Averroes interpreta

racionalmente a religião.O filósofo cordobês entende que deve existir uma concordância

necessária entre o saber racional e a autêntica religosidade, mas não com a religião

popular.

Segundo Averroes, os que negam a licitude e a legitimidade da filosofia

colocam-se contra a própia natureza humana racional e ignoram a verdadeira lei

religiosa, pois Deus, sendo o autor da razão, não quer o seu uso incorreto. Portanto é

não somente lícito mas também obrigatório a busca da verdade através da razão por

aqueles que estão devidamente preparados para fazê-lo, ou seja, os filósofos.

FALSAFA (FILOSOFIA ÁRABE)

Ibn Rushd e a Falsafa

Revendo todo o desenvolvimento das obras deixadas por seus predecessores sob

uma interpretação das obras de Aristóteles para recobrar a doutrina autêntica do

pensador macedônio. Afinal, por volta do século XI d.C/ VH., Ibn Sina- o mais oriental

dos falasifa- era uma alusão à filosofia grega na parte oriental do mundo muçulmano,

inserindo nas teses de Aristóteles um caráter neoplatônico. Reconduzindo o pensamento

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 227 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

da filosofia aristótelica, Ibn Rushd exerceu o pensamento aristolélico original do

mundo muçulmano, no ponto mais ocidental: a Espanha.

Lembrando que, até aquele momento, a especulação filósofica se desenvolve

sobremaneira a partir da ascensão da dinastia Abássida- com capital em Bagdá- que

determinara uma dura queda à dinastia Almorada com capital em Damasco. Entretanto,

há mudança de poder no mundo islâmico na época, os árabes já haviam conquistado o

sul da Espanha, região com muitos governantes Sírios que lá se instalaram e

contribuíram para a arabização de diversas províncias da região ibérica. Anteriormente à

queda dos Omíadas, a região de Al- Andaluz era gerenciada por governadores

dependentes de Damasco que foram derrotados pelos Abassidas. O jovem`Abd Al-

Rahman, salvo do massacre de 750 d.C. com o apoio dos sírios,´Abd Al Rahman

conseguiu impor-se aos chefes locais e, em julho de 750 d.C., foi proclamado emir em

Córdoba e reinou até 788 d.C., ano de sua morte.

Naquele período, sob o domínio dos Omíadas, Al- Andaluz conheceu seu

apogeu e sob suas luzes se fez da Espanha o maoir centro intelectual e artístico do

Ocidente. Apesar de toda a instabilidade política, no campo religioso na Península

Ibérica em Córdoba - Al- Andaluz - conviviam muçulmanos, cristãos e judeus durante

séculos tolerando-se. Nesta época, notava-se uma grandeza política, econômica e

intelectual, na qual a filosofia não podia estar ausente. Esse ressurgimento do califado

Omíada durou aproximadamente cem anos, em 1031d.C., o último califa Hisham III foi

deposto com isso ocorreu uma ruptura em pequenos Estados independentes

denominados de reinos taifas. No séc XI d.C./ VH., e no séc XII d. C./ VI H., AL-

Andaluz já não era uma primazia árabe, mas turca pelo leste e berbere pelo oeste. No

Magreb, ocorreu uma revolução durante o período juvenil de Ibn Rushd: os Almôadas

derrubaram a dinastia Almorávida e se apossaram sucessivamente do noroeste da Àfrica

e da Espanha muçulmana.

Foi nesse contexto que a falsafa inaugurou um novo perfil geográfico com Ibn

Bajja (Avempace), Ibn Tufayl e Ibn Rushd, não mais centrado em Bagdá ou em

Hamadan, mas, também, na Europa- mais precisamente na Espanha. Mesmo tendo

havido um intercâmbio entre as duas partes orientais e ocidentais do mundo islâmico,

não implicou em rivalidade entre os dois cantos do império. Al_Andaluz, sempre que

pôde, disputou com os Abássidas, tanto política como culturalmente. Estruturas

políticas e culturais estão presentes na postura adotada por Ibn Rushd frente aos seus

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 228 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

antecessores do extremo oriente do império. Porém, antes dele, a Espanha muçulmana

inscrevera eruditos de impotância: Ibn Bajja e Ibn Tufayl.

Ibn Bajja, nascido em Saragoza, esteve em Sevilha e Granada e morreu em Fez,

em 1138 d.C. deixou alguns tratados que iniciaram os aspectos próprios da filosofia no

mundo árabe-espanhol. Ele preparou o terreno para a exposição islâmica da doutrina

aristótelica que chegaria ao apogeu com Ibn Rushd. Ibn Tufayl estudou medicina e

filosofia em Córdoba sob a proteção do califa ´Abu Ya ´qub Yusuf- mecenas generoso

das ciências e da filosofia. Foi médico da corte e tinha influência junto a ´Abu Ya qub,

tendo lhe apresentado Ibn Rushd.

Considerações finais

Averroes seguiu os passos de seu pai e seu avô tornando-se um qãdi e um

homem muito respeitado dentro da comunidade islâmica, cristã e judaica.

Na tentativa de ser o mais puro possível no pensamento aristotélico, Averroes

acaba criando a sua própria filosofia que vem em resposta às lacunas do seu mestre,

Aristóteles, que não teve tempo de completar. Desta forma, Averroes teria a mesma

visão de seu mestre, mantém a mesma linha de pensamento de conceber o universo

como uma totalidade sempre em movimento e transformação, na qual todos os seres

formam uma escala de grausde potencialidade e atualidade desde o ato puro, que é

Deus, que é o motor necessário, pois tem em si o princípio de movimento até a pura

potência identificada com a matéria prima.

Averroes superou seu mestre nas questões que dizem respeito à imortalidade da alma e

ao intelecto puro (Deus). Ao estudar mais a fundo as obras traduzidas para o árabe, Averroes

percebeu e questionou a veracidade de tais textos, dos quais muitos eram dados como de

Aristóteles, mas na verdade eram platônicos, pois concebiam a alma separada do corpo, fato do

qual jamais um naturalista poderia conceber.

Sendo Averroes um homem religioso e conhecedor do Corão, tentou de maneira exímia

conciliar fé e razão e, por levar o aristotelismo para dentro do Corão, foi considerado herege,

porque tinhaidéias além de seu tempo, valorizava a mulher e usava o silogismo como forma de

julgamento.Portanto conseguiu ter diversos inimigos políticos e religiosos que não pouparam

esforços para que ele fosse desmoralizado diante de sua comunidade.

Revista Mundo Antigo – Ano V, V. 5, N° 10 – Junho – 2016 – ISSN 2238-8788

NEHMAAT http://www.nehmaat.uff.br 229 http://www.pucg.uff.br CHT/UFF-ESR

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AQUINO, Tomás de – De unitateintellectus contra averroistas, trad. De A. de Libera,

Paris, GF – Flammarion, 1994, p 288.

AVERROES, Compendio de Metafísica, trat. De Quirós, pp. 102-103. Cf. Tahāfut,

pars 432-433; p.340; p. 260.

AVERROES,1126-1198. Discurso decisivo. Martins Fontes, São Paulo, 2005.

BOEHNER, PHILOTHEUS E GILSON, ETIENNE. História da Filosofia Cristã

Editora Vozes – Petrópolis,1991.

COSTA, José Silveira da .Averróis, o aristotelismo radical.editora moderna.

São Paulo 1994.

FILHO, Miguel Attie – Falsafa, a filosofia entre os árabes – Ed. Palas Athena

São Paulo 2002 – pp. 303-304.

GOMES, Pinharanda – História da filosofia portuguesa, afilosofia arábigo-portuguesa

Guimarães editores, Lisboa, 1991, p. 176.

HILLER, H. Chad - www.iep.utm.edu/i/ibnrushd.htm

LALANDE, ANDRÉ. Vocabulário técnico e crítico da Filosofia – Ed. Martins Fontes

SÃO PAULO,1996.

MONTADA, JosepPuig – Averroes, juez, médico y filósofo andalusí. Ed. Junta de Andalucia,

Andalucia – Espanha, 1998.

MONTADA, JosepPuig. Averroes. Edicionesdel Oro. Madrid, 2001.

RUSS, Jacqueline. Dictionnaire de Philosophie. Ed.Bordas, Paris, 1991.

TAYLOR, R. Metafísica. Editora Zahar. Rio de Janeiro. 1969.

TAYLOR, Richard. Metafísica. Editora Zahar. Rio de Janeiro,1969.