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A •. ~EMANÁRIO E nNGOLENS Caixa Postal Sábado, 14 de Novembro de 2009. I 45 Entrevista falsa & vendedores de banha de cobra Somos mesmo um povo muito crédulo. Acreditamos em tudo o que vem de fora do país, acredi- tamos em tudo o que nos dizem e nem nos preocupamos em procu- rar saber se aquilo que nos está a ser dito, e difundido pelos media, tem algum fundamento de verda~ de. E parece que tudo fica mesmo assim ... Isto vem a propósito de dois episódios divulgados recente- mente pelos media. Primeiro, a Rádio 5 difun- diu uma entrevista, apresentada como sendo ao presidente do Bra- sil, Lula da Silva, onde ele enalte- ceu a realização do CAN em An- gola. Dias depois veio-se a saber que, afinal, era tudo uma farsa. A emissora angolana foi completa- mente enganada: o Lula da Silva que fora entrevistado pela Rádio 5 era falso. Tudo não passou de para o serviço de imprensa da Presidência da República do Bra- sil poderia esclarecer a questão? Se assim tivesse procedido Ango- la não estaria a ser motivo de cha- cota internacional. O outro episódio tem a ver com o especialista brasileiro Duda Mendonça, que veio a Lu- anda vender banha de cobra. Des- moralizado em sua própria terra e praticamente sem clientes na área de marketing político depois de quase provocar o derrube do mesmo Lula da Silva que ajudara a eleger, Duda Mendonça falou o que quis e do jeito que quis para à rádio e televisão do país, para o jornal O País e para plateias de estudantes. Mas ele não falou tudo. Esque- ceu de contar como quase derru- bou o presidente Lula da Silva, anos depois. Foi em 11 de Agosto destinas no exterior daquele país, envolvendo uma boa «massa» ile- gal oriunda de fundos não decla- rados (um verdadeiro saco azul). A confissão de Duda Mendon- ça agravou a crise política e a opo- sição brasileira começou a discu- tir abertamente o afastamento do presidente da República. No dia seguinte à confissão do publicitá- rio, Lula da Silva fez um discur- so pela televisão e declarou: «Eu sinto-me traído». A crise política foi superada, Lula da Silva continuou à frente da Presidência brasileira, mas o publicitário acabou constituído arguido num processo em tra- .mitação na justiça, acusado de branqueamento de capital e fuga ao fisco. O caso irá a julgamento nos próximos meses. No Brasil, a punição para esse tipo de crime pode chegar até a cinco anos de numa quinta no Rio de Janeiro, durante uma operação policial de repressão às brigas de galo. Parti- cipar ou organizar brigas de galo no Brasil é crime punido com até um ano de prisão. Tampouco Duda Mendonça contou aos angolanos que está envolvido em outra investigação, conduzida pelo Ministério PÚ- blico de São Paulo, para apurar o suposto enriquecimento ilícito do ex-autarca Paulo Maluf. Publici- tário da campanha de Maluf em 1998, Duda Mendonça é citado na investigação como beneficiá- rio de valores que não terão sido declarados ao fisco. O procurador Sílvio António Marques diz ter provas de que 5,88 milhões de dó- lares terão sido transferidos para uma conta de Duda no Citibank de Nova Iorque, em 1998. Do mesmo modo, o especia- ça, .foi surpreendida tentando levantar todo o dinheiro. Duda Mendonça também não contou que o seu nome consta de uma lista, chamada nos Estados Unidos da América de Watching List, na qual figuram pessoas suspeitas de branqueamento de capital. Ele passou a integrar a re- ferida lista depois que admitiu ser dono de uma conta nas Bahamas, um paraíso fiscal, usada para re- ceber dinheiro de seus clientes brasileiros. Desde então, todas as operações ligadas a ele nos Esta- dos Unidos são obrigatoriamente acompanhadas pelas autoridades daquele país. Uma pesquisa séria no Google (ou num outro motor de busca) e um ou outro telefonema podem ajudar os profissionais que fazem a notícia a clarificar determina- das situações e personagens obs- u ~ ••••• 4 __ c__ ~..- ..- ............... 1 .....lo

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A •.~EMANÁRIO EnNGOLENS

Caixa PostalSábado, 14 de Novembro de 2009.

I

45

Entrevista falsa & vendedores

de banha de cobraSomos mesmo um povo muito

crédulo. Acreditamos em tudo o

que vem de fora do país, acredi­tamos em tudo o que nos dizem enem nos preocupamos em procu­rar saber se aquilo que nos está aser dito, e difundido pelos media,tem algum fundamento de verda~de. E parece que tudo fica mesmoassim ...

Isto vem a propósito de doisepisódios divulgados recente­mente pelos media.

Primeiro, a Rádio 5 difun­

diu uma entrevista, apresentadacomo sendo ao presidente do Bra­sil, Lula da Silva, onde ele enalte­

ceu a realização do CAN em An­gola. Dias depois veio-se a saberque, afinal, era tudo uma farsa. Aemissora angolana foi completa­mente enganada: o Lula da Silvaque fora entrevistado pela Rádio5 era falso. Tudo não passou de

para o serviço de imprensa daPresidência da República do Bra­sil poderia esclarecer a questão?Se assim tivesse procedido Ango­la não estaria a ser motivo de cha­cota internacional.

O outro episódio tem a vercom o especialista brasileiroDuda Mendonça, que veio a Lu­anda vender banha de cobra. Des­

moralizado em sua própria terrae praticamente sem clientes naárea de marketing político depoisde quase provocar o derrube domesmo Lula da Silva que ajudaraa eleger, Duda Mendonça falou o

que quis e do jeito que quis paraà rádio e televisão do país, parao jornal O País e para plateias deestudantes.

Mas ele não falou tudo. Esque­ceu de contar como quase derru­bou o presidente Lula da Silva,anos depois. Foi em 11 de Agosto

destinas no exterior daquele país,envolvendo uma boa «massa» ile­

gal oriunda de fundos não decla­rados (um verdadeiro saco azul).

A confissão de Duda Mendon­

ça agravou a crise política e a opo­sição brasileira começou a discu­tir abertamente o afastamento do

presidente da República. No diaseguinte à confissão do publicitá­rio, Lula da Silva fez um discur­

so pela televisão e declarou: «Eusinto-me traído».

A crise política foi superada,Lula da Silva continuou à frente

da Presidência brasileira, mas o

publicitário acabou constituídoarguido num processo em tra­

.mitação na justiça, acusado debranqueamento de capital e fugaao fisco. O caso irá a julgamentonos próximos meses. No Brasil, apunição para esse tipo de crimepode chegar até a cinco anos de

numa quinta no Rio de Janeiro,durante uma operação policial derepressão às brigas de galo. Parti­cipar ou organizar brigas de galono Brasil é crime punido com atéum ano de prisão.

Tampouco Duda Mendonçacontou aos angolanos que estáenvolvido em outra investigação,conduzida pelo Ministério PÚ­blico de São Paulo, para apurar osuposto enriquecimento ilícito doex-autarca Paulo Maluf. Publici­

tário da campanha de Maluf em1998, Duda Mendonça é citadona investigação como beneficiá­rio de valores que não terão sidodeclarados ao fisco. O procuradorSílvio António Marques diz terprovas de que 5,88 milhões de dó­lares terão sido transferidos parauma conta de Duda no Citibank

de Nova Iorque, em 1998.Do mesmo modo, o especia-

ça, .foi surpreendida tentandolevantar todo o dinheiro.

Duda Mendonça também não

contou que o seu nome consta deuma lista, chamada nos Estados

Unidos da América de WatchingList, na qual figuram pessoassuspeitas de branqueamento decapital. Ele passou a integrar a re­ferida lista depois que admitiu serdono de uma conta nas Bahamas,

um paraíso fiscal, usada para re­ceber dinheiro de seus clientes

brasileiros. Desde então, todas as

operações ligadas a ele nos Esta­dos Unidos são obrigatoriamenteacompanhadas pelas autoridadesdaquele país.

Uma pesquisa séria no Google(ou num outro motor de busca) eum ou outro telefonema podemajudar os profissionais que fazema notícia a clarificar determina­

das situações e personagens obs-u ~ ••••• 4 __ c__ ~..- ..-.....•..........1 .....lo

diu uma entrevista, apresentadacomo sendo ao presidente do Bra­sil, Lula da Silva, onde ele enalte­

ceu a realização do CAN em An­gola. Dias depois veio-se a saberque, afinal, era tudo uma farsa. A

emissora angolana foi completa­mente enganada: o Lula da Silvaque fora entrevistado pela Rádio5 era falso. Tudo não passou deuma malandrice, tão ao gosto dosbrasileiros.

Agora, será que não ocorreu ao

jornalista da Rádio 5 que conver­sou com o falso Lula da Silva quehavia sido muito fácil conseguir aentrevista? Será que não lhe ocor­reu que apenas um telefonema

mesmo Lula da Silva que ajudara

a eleger, Duda Mendonça falou oque quis e do jeito que quis paraà rádio e televisão do país, para

o jornal O País e para plateias deestudantes.

Mas ele não falou tudo. Esque­

ceu de contar como quase derru­bou o presidente Lula da Silva,anos depois. Foi em 11 de Agostode 2005. Publicitário responsávelpela campanha de Lula da Silva,Duda Mendonça procurou a Co­missão Parlamentar de Inquérito(CPI) que investigava as denún­cias de corrupção no governo econfessou que o seu trabalho foipago por meio de operações clan-

Lula da Silva continuou à trente

da Presidência brasileira, mas o

publicitário acabou constituídoarguido num processo em tra­mitação na justiça, acusado debranqueamento de capital e fugaao fisco. O caso irá a julgamentonos próximos meses. No Brasil, apunição para esse tipo de crimepode chegar até a cinco anos deprisão.

Duda Mendonça também es­

queceu de contar que em Outubrode 2004, durante as eleições au­tárquicas brasileiras, quando eraresponsável pela campanha doPT (partido de Lula da Silva) emSão Paulo, foi preso em flagrante,

199~, lJuda Mendonça é citadona investigação como beneficiá­rio de valores que não terão sidodeclarados ao fisco. O procuradorSílvio António Marques diz terprovas de que 5,88 milhões de dó­lares terão sido transferidos parauma conta de Duda no Citibank

de Nova Iorque, em 1998.Do mesmo modo, o especia­

lista em marketing não men­cionou que, no final de 2005, asautoridades americanas desco­briram uma outra ·conta secre­

ta e milionária operada por elenos Estados Unidos. A conta foi

bloqueada depois que a filha dopublicitário, Eduarda Mendon-

operações ligadas a ele nos Esta­dos Unidos são obrigatoriamenteacompanhadas pelas autoridadesdaquele país.

Uma pesquisa séria no Google(ou num outro motor de busca) e

um ou outro telefonema podem

ajudar os profissionais que fazema notícia a clarificar determina­

das situações e personagens obs­curos e evitar que façam papel deparvos, como de facto fizeram osjornalistas da Rádio 5 e do sema­nário O País que se deixaram en­ganar nessas duas situações .•

Manuel Brito

o too_dos mais queridos em· umbundu