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ARESUMO EXECUTIVO
3.1 E 3.2
PRODUTOS
Insumos para Ações Estratégicas Orientadas
ao Fortalecimento da Competitividade Industrial do Brasil
Insumos para Ações Estratégicas Orientadas
ao Fortalecimento da Competitividade Industrial do Brasil
3.1 E 3.2
PRODUTOS
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
Presidente
Michel Temer
MINISTÉRIO DA INDÚSTRIA, COMÉRCIO EXTERIOR E SERVIÇOS
Ministro
Marcos Jorge de Lima
AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL – ABDI
Presidente
Luiz Augusto de Souza Ferreira
Diretor de Desenvolvimento Produtivo e Tecnológico
Miguel Antônio Cedraz Nery
Diretor de Planejamento
Walterson da Costa Ibituruna
Gerente de Desenvolvimento Produtivo e Tecnológico
Cynthia Araújo Nascimento Mattos
Gerente de Planejamento e Inteligência
Jackson de Toni
Coordenador de Planejamento e Inteligência
Rogério Dias de Araújo
Equipe Técnica
Carlos Henrique de Mello Silva (Responsável)
Raphael Lennie Fernandes Ribeiro
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
Presidente
Carlos Ivan Simonsen Leal
Diretoria FGV Projetos
Cesar Cunha Campos
Ricardo Simonsen
Coordenação de Projeto
Luiz Gustavo Medeiros Barbosa
Marcel Levi
Especialista
Paulo Negreiros de Figueiredo
Equipe Econômica e Estatística
Ique Guimarães
Everson Machado
Equipe Técnica
André Meyer Coelho
Erick Lacerda
Fabíola Barros
Luciana Vianna
Saulo Rocha / Pesquisador Convidado
Thays Venturim
Projeto Gráfico
Café.art.br
Ficha Técnica
Resumo Executivo ............................................................................................... 06
01 Introdução ........................................................................................................ 10 02 Base Analítica do Estudo ............................................................................. 16 03 Imperativo do Fortalecimento da Competividade Industrial no Brasil ........................................................................................................................... 22 3.1 Aprisionamento na Armadilha da Renda Média .................................................... 24
3.2 Evolução da Produtividade do Trabalho no Brasil .............................................. 27
3.3 Engajamento do Brasil no Mercado Internacional ............................................... 34
04 Importante Papel da Indústria no Crescimento Econômico ............... 46 4.1 Participação da Indústria no PIB Brasileiro ..........................................................48
4.2 Tipos de Indústria e sua Importância Relativa na Economia ..............................58
4.3 Importância da Inovação Industrial para o Crescimento Econômico ..................62 05 Por Dentro da Inovação: Uma Perspectiva Ampliada .......................... 66 5.1 Algumas Ideias Básicas .......................................................................................68
5.2 A Importância Relativa dos Diferentes Tipos de Inovação ................................. 78
5.3 Interdependência no Processo de Inovação ........................................................84 5.4 Diferenças entre Setores Industriais em Termos da Natureza da Inovação .......88
Sumário
06 Capacidades Tecnológicas: Estoque de Recursos para Inovação e Competitividade Industrial ................................................................................. 92 6.1 Desmistificando o Significado de Tecnologia e de Capacidade Tecnológica .........94
6.2 Mensuração de Capacidades Tecnológicas ....................................................... 108
07 Catch-up Tecnológico: Ideias Básicas ......................................................118 7.1 Empresas de Economias em Desenvolvimento: Principais Características
Tecnológicas ............................................................................................................120
7.2 Perspectivas sobre Inovação em Empresas de Economias em Desenvolvimento .......122
08 Trajetórias de Catch-up Tecnológico: Perspectiva de Ciclos .................130 8.1 Ciclos de Catch-up Tecnológico ..........................................................................132
8.2 Dimensões Técnica e Organizacional da Acumulação de Capacidades
Tecnológicas ............................................................................................................ 141 09 Mecanismos de Aprendizagem Subjacentes às Trajetórias de Catch-up Tecnológico ....................................................................................... 144 9.1 Mecanismos de Aprendizagem Tecnológica: Perspectiva Intraempresarial ....... 147
9.2 Mecanismos Interempresariais de Aprendizagem Tecnológica .........................155
9.3 Transferência de Tecnologia como Mecanismo de Aprendizagem Tecnológica 160
10 Desafios e Recomendações Finais ...........................................................164 11 Referências Bibliográficas ...........................................................................181
6 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
7RESUMO EXECUTIVO
Resumo Executivo
8 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Resumo ExecutivoEste estudo objetiva contribuir para o aprimoramento de ações estratégicas
orientadas ao fortalecimento da competitividade industrial no Brasil. Grande parte
da competitividade industrial pode ser fortalecida por meio da acumulação de
capacidades tecnológicas em nível da indústria e de suas empresas. Por que essas
questões são tão importantes para o Brasil? O Brasil é tipicamente uma economia
de renda média. Está estacionado nesta condição há mais de 50 anos. Países que
estão presos na assim chamada “armadilha da renda média” são países que, de
um lado, possuem custos de produção altos que os impedem de competir com as
economias exportadoras de baixo custo; por outro lado, esses países ainda não tem
uma capacidade tecnológica suficientemente alta para competir contra as econo-
mias avançadas. Países aprisionados na assim chamada “armadilha’ da renda média”
também experimentam um persistente baixo crescimento econômico. Como escapar
dessa armadilha da renda média?
A História nos mostra que países que conseguiram escapar da armadilha da renda mé-
dia, especialmente nos últimos 40 anos, obtiveram, de um lado, considerável aumento
de ganhos de produtividade na economia. Por outro lado, suas
economias também alcançaram forte presença no mercado
internacional. Em outras palavras, esses países fortaleceram
consideravelmente a sua competitividade industrial. Grande
parte do fortalecimento dessa competitividade industrial se
explica pela acumulação de capacidades tecnológicas para
inovação, em nível da indústria e de empresas. Isto porque é
no âmbito da indústria e de suas empresas, juntamente com suas organizações parcei-
ras, que o ocorre a transformação de conhecimento em riqueza. Em outras palavras, é
em nível da indústria e das empresas que o processo de inovação ocorre.
A despeito dos intensos e relevantes esforços de políticas públicas empreendidos
ao longo das últimas décadas no Brasil, tais iniciativas apresentam algumas im-
portantes limitações. A primeira limitação é que o foco dessas iniciativas recai,
em grande parte, no lado da oferta da infraestrutura científico-tecnológica.
Em muitos casos, a ênfase tende a ser mais científica do que tecnológica. Menor
ênfase parece ter sido dada a ações que objetivem a criação e a acumulação de
capacidades tecnológicas para inovação em nível da indústria e de empresas,
ou seja, no lado da demanda. A segunda limitação é que, a despeito do arcabou-
ço robusto de programas de apoio à inovação em diversos setores industriais,
incluindo modalidades variadas de financiamento, muito pouco (ou quase
O Brasil é tipicamente uma economia de renda média.
Está estacionado nesta condição há mais de 50 anos.
Muito pouco (ou quase nada) tem sido feito em termos da avaliação da eficácia desses
esforços em termos da exten-são do aumento da capacida-de inovadora e da competiti-vidade em nível da indústria.
Menor ênfase parece ter sido dada a ações que objetivem a criação e a
acumulação de capacidades tecnológicas para inovação em nível da indústria e de empresas, ou seja, no lado da demanda.
9RESUMO EXECUTIVO
nada) tem sido feito em termos da avaliação da
eficácia desses esforços em termos da exten-
são do aumento da capacidade inovadora e da
competitividade em nível da indústria.
Por outro lado, tem havido no Brasil, tanto no
âmbito de governo, da indústria, da academia,
como de setores da sociedade concernidos com
a problemática do desenvolvimento industrial,
uma profusão de interpretações divergentes
e entendimentos, ora por demais estreitos,
ora equivocados sobre o processo de inovação,
desenvolvimento e competitividade industrial. É
importante mencionar que a proliferação de con-
ceitos, interpretações e terminologias limitadas,
e mesmo equivocadas, deturpa o desenho de es-
tratégias de ação e compromete o alcance de uma
convergência de esforços e de uso de recursos.
Tem havido no Brasil uma profusão de interpretações divergentes e entendimen-tos, ora por demais estrei-tos, ora equivocados sobre o processo de inovação, desenvolvimento e compe-titividade industrial.
Este estudo objetiva oferecer
insumos que contribuam para
aprimorar o debate e as ações, em
nível de governo e da indústria,
orientados ao fortalecimento da
competitividade industrial no Bra-
sil. Chama a atenção para a urgen-
te necessidade do fortalecimento
da competitividade industrial
no Brasil e examina algumas das
principais propriedades da inovação e das capacidades
tecnológicas como fontes essenciais para a competi-
tividade industrial. Este estudo também examina os
processos pelos quais as empresas de economias em
desenvolvimento podem acumular suas capacidades
tecnológicas para o alcance de liderança tecnológica e
comercial (catch-up tecnológico) e o papel dos mecanis-
mos subjacentes de aprendizagem tecnológica.
10 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
01
11RESUMO EXECUTIVO
Introdução
12 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
01 . IntroduçãoEsforços para criação e fortalecimento de um sistema de ciência, tecnologia e
inovação (CT&I) para apoiar o desenvolvimento industrial no Brasil entraram
formalmente na agenda de ação governamental no Brasil no final dos anos
1960. Esses esforços foram materializados por meio da implementação do
Primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento (PND, 1972/74) e do Primeiro
Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PBDCT, 1973/74)
seguidos do PBDCTs II e III.
Esforços dessa natureza foram retomados a partir do início da década de 1990. O
início dos anos 1990 marcou o fim formal das políticas de industrialização à base
substituição de importações (SI), que prevaleceram durante o período de 1940-
1980s. A redução de barreiras comerciais e a abertura da economia à competição
estrangeira, com o aumento resultante do investimento direto estrangeiro (IDE),
funcionou como uma “política implícita” para estimular os investimentos das
empresas em construção de capacidades tecnológicas industriais.
A Política de Comércio Industrial e Externo foi implementada para estimular
o desenvolvimento de capacidades industriais. De 1995 a 2002, o governo
federal se engajou na estruturação dos fundos setoriais por meio da criação
de 17 fundos em nível setorial para complementar os recursos financeiros
tradicionais e apoiar o desenvolvimento industrial. O fortalecimento do sistema
de CT&I permitiu que surgissem novos projetos de pesquisa com importantes
efeitos no desenvolvimento tecnológico de alguns setores industriais relevan-
tes para a economia brasileira. Tais ações contribuíram para a expansão da
infraestrutura tecnológica, promover vínculos entre universidades e indústrias
e fortalecer a competitividade.
Ainda durante a década de 1990, o governo federal, por meio do Ministério da
Ciência e Tecnologia, liderou uma meritória iniciativa de sistematizar, de manei-
ra detalhada e exaustiva, os vários elementos relacionados ao sistema de CT&I
considerados necessários ao desenvolvimento nacional, através da edição do
documento Ciência, tecnologia e inovação: desafio para a sociedade brasileira – Li-
vro verde (BRASIL, 2001). Em setembro de 2001, como resultado da Conferência
Nacional de CT&I, foi gerado o Livro branco da ciência, tecnologia e inovação, cujo
objetivo é “apontar caminhos para que a Ciência, Tecnologia e Inovação possam
contribuir para a construção de um País mais dinâmico, competitivo e socialmen-
te mais justo” (BRASIL, 2002: 21) para o período 2002-2012.
13CAPÍTULO 01 | INTRODUÇÃO
Durante o período de 2003 ao início da década de
2010, o governo federal implementou políticas pú-
blicas caracterizados pela forte participação estatal
no processo de desenvolvimento industrial. Entre
essas ações incluem-se a Lei da Inovação (Lei nº
10.973/2004) e da Lei do Bem (Lei nº 11.196/2005).
A Lei de Inovação buscou estimular a cooperação
para pesquisa conjunta entre empresas e universida-
des e permitiu que pesquisadores das universidades
públicas obtivessem receita adicional de atividades
de consultoria; também criou um programa para
fundos não reembolsáveis para apoiar atividades
inovadoras de nível empresarial. A Lei do Bem criou
incentivos fiscais para empresas que se envolvem
em atividades de inovação tecnológica.
As políticas subsequentes incluíram o Plano de
Desenvolvimento Produtivo (PDP, 2007-2010)
com metas de curto prazo, foco em vários setores
industriais e apoio do Banco Nacional de Desen-
volvimento Econômico e Social – BNDES para
suportar as estratégias de internacionalização
das empresas individuais, juntamente com fusões
e aquisições. O Plano Brasil Maior (2011-2014)
expandiu a cobertura setorial e procurou proteger
certos setores industriais da concorrência inter-
nacional. Porém, tanto o PDP como o Plano Brasil
Maior foram ineficazes na promoção da inovação
e diversificação industrial, como seria de se espe-
rar das “políticas industriais” modernas.1
Em paralelo, especialmente a partir de 2011, o
governo federal lançou a Estratégia Nacional de
Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI), a qual
tem passado por diversas revisões de conteúdo
e de período abrangência, sendo a última versão
cobrindo o horizonte até 2022. Entre as ações
prioritárias da ENCTI destacam o enfrentamento
dos seguintes desafios:
1 Redução da defasagem científica e tecnológi-ca que ainda separa o Brasil das nações mais desenvolvidas;
2 Expansão e consolidação da liderança brasilei-ra na economia do conhecimento da natureza;
3 Ampliação das bases para a sustentabilidade ambiental e o desenvolvimento de uma econo-mia de baixo carbono;
4 Consolidação do novo padrão de inserção internacional do Brasil;
5 Superação da pobreza e redução das desigual-dades sociais e regionais.
A despeito dos intensos e relevantes esfor-
ços de políticas públicas empreendidos ao
longo das últimas décadas, tais iniciativas
apresentam algumas importantes limitações.
A primeira limitação é que o foco dessas
iniciativas recai, em grande parte, no lado
da oferta da infraestrutura científico-tec-
nológica. Em muitos casos, a ênfase tende a
ser mais científica do que tecnológica. Menor
ênfase parece ter sido dada a ações que objeti-
vem a criação e a acumulação de capacidades
tecnológicas para inovação em nível da indús-
tria e de empresas, ou seja, no lado da demanda.
A segunda limitação é que, a despeito do arcabou-
ço robusto de programas de apoio à inovação em
diversos setores industriais, incluindo modalida-
des variadas de financiamento, muito pouco (ou
quase nada) tem sido feito em termos da ava-
liação da eficácia desses esforços em termos da
extensão do aumento da capacidade inovadora
e da competitividade em nível da indústria.
Por outro lado, tem havido no Brasil, tanto no
âmbito de governo, da indústria, da academia,
como de setores da sociedade concernidos com
a problemática do desen-
volvimento industrial, uma
profusão de interpretações
divergentes e entendimen-
tos, ora por demais estrei-
tos, ora equivocados sobre
o processo de inovação,
desenvolvimento indus-
trial e de competitividade
industrial. É importante
Muito pouco (ou quase nada) tem sido feito em termos da avaliação da eficácia desses esforços em termos da extensão do aumento da capacidade inovadora e da competitivi-dade em nível da indústria.
1. Almeida & Schneider (2012).
O foco dessas iniciativas recai, em grande par-te, no lado da oferta da infra-estrutura cientí-fico-tecnológica.
14 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
mencionar que a proliferação de conceitos,
interpretações e terminologias limitadas, e mes-
mo equivocadas, deturpa o desenho de estra-
tégias de ação e compromete o alcance de uma
convergência de esforços e de uso de recursos.
Este documento objetiva oferecer uma contribuição
para superar algumas dessas limitações. Especifi-
camente, o propósito deste documento é oferecer
insumos que contribuam para aprimorar o debate e
ações sobre a realidade da capacidade inovadora e
da competitividade da indústria brasileira. Ao fazer
isso, este documento pode contribuir para a geração
de insumos para ações, em nível de governo e da
indústria, orientados ao fortalecimento da competi-
tividade industrial no Brasil.
Este documento está estruturado da seguinte
maneira. A Seção 2 apresenta a base analítica
deste estudo. A Seção 3 aborda a necessidade do
fortalecimento da competitividade industrial no
Brasil como uma das estratégias fundamentais
para o crescimento econômico do País. A Seção
4 ressalta a importância da indústria para o
crescimento econômico. A Seção 5 examina as
principais propriedades da inovação, enquanto
que a Seção 6 examina a capacidade tecnológica
como recurso essencial para a realização de
atividades inovadoras. A Seção 6 também inclui
o importante tema da mensuração de capacida-
des tecnológicas. A Seção 7 introduz diferen-
tes modos de catch-up tecnológico, enquanto
que a Seção 8 introduz o tema de trajetórias
de catch-up tecnológico. A Seção 9 examina a
importância de mecanismos de aprendizagem
para acumulação de capacidades tecnológicas.
Finalmente, à luz da base analítica deste estudo
e das evidências documentadas em estudos
relevantes, vários deles aqui referenciados,
a Seção 10 dedica especial ênfase a algumas
recomendações práticas orientadas ao fortale-
cimento da competitividade industrial brasileira.
15CAPÍTULO 01 | INTRODUÇÃO
02
Base Analítica do Estudo
18 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
02. Base Analítica do Estudo
A base analítica que dá sustentação a este estudo envolve a relação
entre a acumulação de capacidades tecnológicas, os mecanismos
subjacentes de aprendizagem (fontes para capacidades tecnológi-
cas) e os impactos gerados em termos de competitividade à luz de
mudanças na moldura institucional.
Essa base analítica do estudo está representada na Figura 2.1
abaixo. Este tipo de esquema e estrutura é importante para fornecer
avanços em termos de novo entendimento sobre a relação entre as
questões estudadas, assim como um claro esclarecimento aos gesto-
res públicos e industriais sobre as diferenças e semelhanças entre as
empresas, no que diz respeito às causas e resultados da formação e
acumulação de capacidades tecnológicas para inovação e competiti-
vidade. Isso é importante para adaptar suas políticas e estratégias de
negócios. A seguir, são esclarecidos os significados dos elementos da
base analítica apresentada na Figura 2.1.
19CAPÍTULO 02 | BASE ANALÍTICA DO ESTUDO
FIGURA 2.1
BASE ANALÍTICA DO ESTUDO
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2001, 2003, 2009, 2011, 2015) e de Bell & Figueiredo (2012)
PROCESSOS E ESTRATÉGIAS DE INOVAÇÃO
MECANISMOS INTRA E INTERORGANIZACIONAIS
DE APRENDIZAGEM TECNOLÓGICA
(INVESTIMENTOS EM AQUISIÇÃO E ASSIMILAÇÃO DE CONHECIMENTO)
Investimentos em insumos
para a acumulação de
capacidades tecnológicas em
nível de empresas e indústrias
DACUMULAÇÃO
DE CAPACIDADES TECNOLÓGICAS (ESTOQUE DE
RECURSOS COGNITIVOS)
Direção e velocidade
da acumulação de
capacidades para
atividades tecnológicas
operacionais e de
inovação em nível de
empresas e indústrias
A BCrescimento
econômico
COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
• Implementação de
inovações com graus de
novidades diversas:
novos para a empresa,
para a economia e/ou
para o mundo
• Melhoria de performance operacional (ex. aumento
de produtividade,
redução de custos)
• Melhoria de performance ambiental
• Melhoria de performance comercial
• Melhoria de performance econômica (ex. melhoria
de lucro operacional)
APRIMORAMENTO DE PERFORMANCE INOVADORA E
COMPETITIVA DE EMPRESAS E INDÚSTRIAS:
IMPACTOS DA ACUMULAÇÃO DE CAPACIDADES TECNOLÓGICAS
C
INFLUÊNCIAS INDIRETAS, EM NÍVEL DA INDÚSTRIA E DA ECONOMIA, NA ACUMULAÇÃO DE CAPACIDADES TECNOLÓGICAS:
• Natureza das políticas públicas
• Moldura institucional: estabilidade e clareza das ‘regras do jogo’ relativas a marcos regulatórios
para diversos segmentos da economia da indústria
• Oferta e qualidade de instituições de apoio à inovação (universidades, centros de formação e
treinamento, institutos de pesquisa) e a qualidade dos talentos e pesquisa e
estudos por eles gerados.
E
20 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
A - Acumulação de capacidades tecnológicas:
Capacidades tecnológicas são definidas aqui como
os recursos (base de conhecimento) para gerir
e gerar inovações tecnológicas. Com relação às
capacidades tecnológicas,
faremos uma distinção entre as
capacidades tecnológicas para
produção e para inovação. Em
outras palavras, as capacidades
tecnológicas envolvem o capital
humano (profissionais), que não
se limita a cientistas com PhD, mas inclui engenhei-
ros, técnicos e operadores; o capital físico, represen-
tado por laboratórios, bancos de dados, software,
etc.; e o capital organizacional, que inclui processos
organizacionais, procedimentos e rotinas, além de
unidades organizacionais.
É importante ressaltar que
esse processo de acumula-
ção de capacidades tecnoló-
gicas, tanto para atividades
de produção como para
atividades de inovação,
ocorre em nível de empresas
e indústrias. É no âmbito da
indústria e suas empresas,
apoiadas por sua rede de parceiros, que se dá a
transformação de conhecimento em riqueza. Como
será mostrado mais adiante neste documento, o
processo de acumulação de capacidades inovado-
ras, assim como o processo de inovação dele de-
corrente, são árduos, arriscados e imprevisíveis. As
empresas, por sua vez, são entidades acumuladoras
de conhecimento e de aprendizado. Especificamen-
te, empresas são um repositório de capacidades
tecnológicas em diversas áreas de especialidade²
Tais capacidades são acumuladas de maneira
idiossincrática. Ao mesmo tempo, elas são movi-
das pelo incentivo econômico para transformar
conhecimento em aplicação prática e em riqueza.
Assim, é importante destacar o importante papel
da indústria e das empresas no processo de seu
fortalecimento da competitividade no crescimento
e desenvolvimento econômico nacional³.
Neste estudo o termo indústria é tratado de forma
abrangente, tal como se usa na língua inglesa, e inter-
nacionalmente. Ou seja, compreende-se “indústria”
para além da manufatureira ou de transformação.
Engloba, assim, uma ampla gama de atividades que
vão da indústria agrícola, aeroespacial, automobilís-
tica, petróleo e gás, defesa, serviços de engenharia
entre outros vários setores industriais, até a indús-
tria da gastronomia, indústria de cinema e televisão,
turismo e esportiva.
B - Processo e estratégias de inovação:
Com base nas capacidades tecnológicas acumula-
das, as empresas (e países) podem se engajar em um
processo de inovação. A perspectiva sobre inovação
adotada neste estudo, e em linha com a literatura
relevante, é abrangente e não se limita somente à
alta tecnologia de fronteira ou a atividades de P&D.
A inovação pode derivar de uma forte base de
engenharia nas empresas. Por exemplo, na indús-
tria de máquinas alemães, líderes globais em vários
segmentos, grande parte das atividades inovadoras
deriva, de uma sólida engenharia e ferramentaria
capaz de fazer modificações básicas em produtos e
processos. Inovação é entendida, assim, como um
processo e não como evento isolado.
Essa noção sobre inovação transcende as perspec-
tivas limitadas que a equiparam somente a ativi-
dades altamente complexas derivadas de esforço
científico em sofisticados laboratórios de P&D.
Assim, uma ampla ideia de inovação abrange a im-
plementação de mudanças em produtos/serviços,
processos e sistemas organizacionais e gerenciais –
da adaptação menor para a avançada. As atividades
Capacidades tecnológicas são definidas aqui como os recursos (base de conheci-
mento) para gerir e gerar inovações tecnológicas.
É importante ressaltar que esse processo de acumulação de capacidades tecnológicas, tanto para atividades de pro-dução como para atividades
de inovação, ocorre em nível de empresas e indústrias
A perspectiva sobre inovação adotada neste estudo transcende as perspectivas limitadas que
a equiparam somente a atividades altamente complexas derivadas de esforço científico em
sofisticados laboratórios de P&D.
2. Wang and von Tunzelmann (2000).
3. Dosi (1988); Lall (1992); Bell and Pavitt (1995).
21CAPÍTULO 02 | BASE ANALÍTICA DO ESTUDO
incluem imitação duplicativa, imitação criativa, até
as mais sofisticas ações de design e desenvolvimen-
to à base de engenharia e P&D. Essas atividades
podem ter graus de novidade que variam de novas
para a empresa a novas para a economia, como
também para o mercado internacional.
C - ‘Impactos’ da acumulação de capacidades
tecnológicas:
Referem-se aos impactos das capacidades inovado-
ras e de aprendizagem sobre o desempenho das em-
presas e da indústria. A maneira como as empresas
acumulam suas capacidades tecnológicas impacta
na sua performance competitiva. Especificamente,
o alcance de performance distintiva está associado
aos tipos e níveis de capacidade tecnológica que
as firmas acumulam. Estes permitem às empresas
implementar atividades de produção e, principal-
mente, de inovação. Como a inovação agrega valor
a produtos e serviços, esta possui impacto direto no
crescimento da indústria e da economia. Por meio
da inovação, podem-se ampliar mercados, criar
demandas novas, antecipar-se a demandas do mer-
cado e, consequentemente, conquistar e assegurar
mercados internos e internacionais. Desse modo, a
acumulação de capacidades tecnológicas, especial-
mente as inovadoras, impacta no alcance, sustenta-
ção e ampliação da competitividade industrial. Por
conseguinte, as capacidades tecnológicas, em nível
de empresas e indústrias, constituem insumo funda-
mental para o crescimento industrial e econômico.
D - Mecanismos intra e interorganizacio-
nais de aprendizagem tecnológica (Influên-
cias diretas no processo de acumulação de
capacidades tecnológicas):
Referem-se aos vários mecanismos pelos quais as
empresas formam e acumulam suas capacidades
inovadoras. Em outras palavras, a ‘aprendizagem
tecnológica’ será analisada como insumos ou fontes
essenciais para formação da capacidade de inova-
ção das empresas. Portanto, se as empresas bus-
cam aprofundar suas capacidades inovadoras
para inovar, elas precisarão envidar esforços
na aprendizagem intensiva para adquirir e
assimilar conhecimentos tecnológicos. Neste
estudo, entende-se que a aprendizagem, como
insumo para a formação e acumulação de
capacidades para inovar é um processo cons-
ciente, intencional – não automático e passivo
– que demanda esforços e investimentos deli-
berados por parte de empresas e governos.
E - Influencias indiretas, em nível da indústria
e da economia, na acumulação de capacidade
tecnológica em nível de empresas:
É óbvio o papel exercido pelas estruturas
institucionais no processo de desenvolvi-
mento tecnológico e industrial de uma nação.
Muito embora o processo de inovação ocorra
em nível de empresas, as universidades e
institutos de pesquisa apoiam esse processo
de várias formas: fornecendo capital humano
qualificado, complementando atividades de
pesquisa demandadas pela indústria, gerando
ciência que pode ser utilizada pela indús-
tria – embora não haja linearidade; ou seja, a
produção de ciência nas universidades e insti-
tutos públicos de pesquisa não significa necessa-
riamente a geração de inovação industrial, e em
vários casos a inovação industrial não depende
da ciência produzida em universidades.
Trata-se aqui das políticas em nível federal, es-
tadual e local, desenvolvidas intencionalmente,
isto é, regulamentos, leis, normas, regras do jogo,
instruções de política e programas que possuem
objetivos implícitos e explícitos para influenciar
no desenvolvimento do sistema de CT&I. As
regularidades do comportamento incluídas
nas orientações de política, normas, regras, leis
e rotinas podem criar inventivos positivos ou
negativos que estimulam ou inibem o progresso
tecnológico nas empresas selecionadas e pro-
gresso industrial nas empresas e indústrias.
A maneira como as empresas acumulam suas capacidades tecnológicas impacta na sua performance competitiva.
A ‘aprendizagem tecnológica’ será analisada como insumos ou fontes essenciais para formação da capacidade de inovação das empresas.
Embora o pro-cesso de ino-vação ocorra em nível de empresas, as universidades e institutos de pesquisa apoiam esse processo de várias formas.
22 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
03
23RESUMO EXECUTIVO
Imperativo do Fortalecimento da Competividade Industrial no Brasil
24 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
03. Imperativo do Fortalecimento da Competividade Industrial no BrasilNo contexto deste estudo, competitividade
industrial significa a capacidade que as indústrias
dos países têm de aumentar os seus ganhos de
produtividade e sua participação em mercados
domésticos e, principalmente, internacionais, ao
mesmo tempo que desenvolvem setores indus-
triais e atividades com níveis crescentes de valor
agregado e de conteúdo tecnológico. Competi-
tividade industrial envolve, especificamente, a
habilidade de países em produzir bens e serviços
de maneira a atender e/ou superar os padrões de
competição internacional.4
Aprisionamento na Armadilha da Renda MédiaPaíses que estão presos na assim chamada
“armadilha da renda média” são países que, de
um lado, possuem custos de produção altos que
os impedem de competir com as economias
exportadoras de baixo custo; por outro lado,
esses países ainda não tem uma capacidade
tecnológica para inovação suficientemente alta
para competir contra as economias avançadas.5
Um estudo bem conhecido publicado há alguns
anos mostra que apenas 13 dos 101 países que
eram de renda média na década de 1960 haviam
escapado da “armadilha de renda média” e se tor-
naram economias de alta renda até 2008, entre
eles a Coréia do Sul e Taiwan (ver Figura 3.1).6
Um outro estudo, ainda mais elaborado, argu-
menta que países que continuam presos no nível
de renda média tem crescido muito lentamente
(YE e ROBERTSON, 2016). Considerando que
o crescimento econômico depende do desem-
penho das empresas, o que, por sua vez, reflete
suas capacidades de inovação tecnológica, os
países de renda média devem fechar a lacuna
de capacidades tecnológicas e engajar-se em
4. UNIDO (2013).
5. Gill e Kharas (2007); Lee e Kim (2009).
6. Banco Mundial (2013).
25CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
“catch-up tecnológico”. Com isso, podem reduzir
ou fechar seu hiato de renda com países de alta
renda (“catch-up econômico”).7 Porém, é preciso
lembrar que a noção de “catch-up tecnológico”
adotada e defendida neste estudo transcende a
perspectiva de mero “emparelhamento”, o que
refletiria uma trajetória tecnológica seguidora.
7. Lee (2013).
FIGURA 3.1
PAÍSES QUE ‘ESCAPARAM’ DA ARMADILHA DA RENDA MÉDIA A PARTIR DE 1960
0
1
2
3
4
5
0 1 2 3 4 5 6
20
08
1960
BOTSWANA
CHINA
OMÃ
BRASIL
TAIWAN
RENDA MÉDIA À ALTA
TORNANDO-SE MAIS RICO
RENDA BAIXA À MÉDIA
“ARMADILHA” DE RENDA MÉDIA
TORNANDO-SE POBRE
“ARMADILHA” DA RENDA BAIXA
GRÉCIA
MALÁSIA
CORÉIA DO SUL
BURUNDINIGER
ESTADOS UNIDOS
SUÍCA
KUWAIT
ARGENTINA
ISRAEL
CORÉIA DO NORTE
Fonte: Adaptado de World Bank (2016).
De fato, alguns países que iniciaram seu processo
de industrialização nos anos 1950, conseguiram
escapar da armadilha da renda média obtiveram
significativo aumento de ganhos de produtivida-
de. Grande parte do aumento dessa produti-
vidade se explica pela acumulação de capa-
cidades tecnológicas, em nível de indústrias
e empresas. A Figura 3.2 mostra a evolução da
renda média per capita de um grupo de países. Já
a Figura 3.3 nos mostra que a renda per capita
do Brasil tem crescido a uma velocidade muito
menor que as das economias congêneres.
26 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 3.2
EVOLUÇÃO DO PIB PER CAPITA PARA PAÍSES SELECIONADOS (1960-2011)(US$ DE 2005, MEDIDO PELO PPC)
BRASIL
JAPÃO
CHINA
CORÉIA DO SUL
ALEMANHA
MÉXICO
ÍNDIA
ESTADOS UNIDOS
50.000
45.000
40.000
35.000
30.000
25.000
20.000
15.000
10.000
5.000
0
1960 1963 1966 1969 1972 1975 1978 1981 1984 1987 1990 1993 1996 1999 1902 1905 1908 1911
1981-2013 7,7 4,3 3,0 0,6 1,91,1
1981-1990
1991-2000
2001-2010
2011-2013
ÍNDIA
3,3
4,3
6,3
3,2
CHINA
6,0
6,3
11,0
7,1
CHILE
0,8
4,6
2,9
4,3
MÉDIAGLOBAL
MÉXICO
-1,1
0,8
1,5
1,7 1,9
2,0
2,6
1,40,2
BRASIL
1,1
2,5
0,6
Fonte: Adaptado de World Bank (2016).
FIGURA 3.3
CRESCIMENTO DA RENDA PER CAPITA DO BRASIL FRENTE A OUTRAS ECONOMIAS EMERGENTES
Fonte: Adaptado de World Bank (2016).
27CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
Na Figura 3.2 chama a atenção o significativo e
consistente aumento da renda da Coréia do Sul.
Já na Figura 3.3 chama a atenção a velocidade
do crescimento da renda da China e da Índia. No
caso da Coréia do Sul, vale lembrar que durante a
década de 1950, destruída por uma guerra, iniciou
seu processo de industrialização de modo similar à
do Japão. Similarmente, Taiwan ingressou em pro-
cesso similar de industrialização que se caracteri-
zou, inicialmente, pela construção de capacidades
tecnológicas para operar tecnologias e sistemas
de produção já existentes, por exemplo produzir
certos tipos de produtos já produzidos pelos paí-
ses líderes globais, como por exemplo, automóveis
e produtos eletrônicos. Em paralelo, houve uma
acumulação de capacidades para alterar tecno-
logias e sistemas de produção existentes e até
mesmo, posteriormente, para criar sua própria
tecnologia, como a de design para automóveis.
A história nos mostra que países que
conseguiram escapar da assim cha-
mada armadilha da renda média são
países que obtiveram forte desen-
volvimento industrial. Em paralelo,
países que, nos últimos 40 a 50 anos
obtiveram crescimento sustentável
de sua renda, também obtiveram
significativo aumento de ganhos de
produtividade. Tais países também
intensificaram a presença de suas indústrias e em-
presas no mercado internacional. Por isso, neste
estudo competitividade envolve produtividade e
participação no mercado internacional.
Países que, nos últimos 40 a 50 anos obtiveram crescimento sustentável de sua renda, também obtiveram significativo aumento de ganhos de produtividade.
Evolução da Produtividade do Trabalho no Brasil8 Os ganhos de propriedade podem garantir o au-
mento do padrão de vida das sociedades.9 Basica-
mente, países com a mesma quantidade de fatores
de produção por trabalhador poderão ter padrões
de vida diferentes se diferirem na eficiência com
que combinam esses fatores. Tal eficiência depende
de diversos aspectos da economia: instituições,
disponibilidade e qualidade da infraestrutura, am-
biente macroeconômico e de negócios e, principal-
mente, de capacidades tecnológicas inovadoras em
nível da indústria e suas empresas.
Considerando-se a produtividade como um dos
indicadores de competitividade, é importante
esclarecer como medir a produtividade. Uma das
medidas mais usadas é a produtividade do trabalho.
Do ponto de vista de um país, a produtividade do
trabalho é calculada pelo PIB gerado em média por
cada trabalhador. Fica claro que a mesma métrica
pode ser calculada para uma indústria (setor indus-
trial) ou uma empresa.
A produtividade do trabalho é uma medida muita
próxima do PIB per capita, métrica usada na seção
anterior para auferir o padrão de vida dos países.
A renda per capita e produtividade do trabalho
costumam evoluir de maneira semelhante. A
Figura 3.4 ilustra esse ponto para o caso brasileiro.
Entretanto, a despeito das semelhanças, nota-se
um deslocamento crescente entre a produtividade
do trabalho e o PIB per capita brasileiro ao longo
do tempo. Por exemplo, de acordo com o Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), calcula-se
que mais do que 90% do crescimento da renda
per capita no período de 1992 a 2001 deveu-se à
elevação da produtividade do trabalho.10
8. Baseado em Pinheiro et al. (2016)
9. Krugman (1994).
10. Cavalcante e De Negri (2014).
28 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
No período de 2001 a 2009, apenas pouco mais da
metade foi explicada pelos ganhos de produtivida-
de. O restante foi devido à evolução favorável de
variáveis relacionadas ao ciclo econômico (aque-
cimento do mercado de trabalho) e à demografia.
Assim, a redução dos níveis de desemprego e o
bônus demográfico explicam uma parcela significa-
tiva do crescimento do PIB per capita mais recente.
Considerando que não é possível reduzir indefini-
damente a taxa de desemprego e considerando que
os benefícios demográficos estão se exaurindo, não
será possível contar com esses fatores no futuro.
Dessa maneira, a melhoria do padrão de vida dos
brasileiros dependerá cada vez mais de incremen-
tos na produtividade do trabalho.
FIGURA 3.4
PRODUTIVIDADE DO TRABALHO E PIB PER CAPITA NO BRASIL (1996 = 100)
95
100
105
110
115
120
125
130
135
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
PRODUTIVIDADE DO TRABALHO PIB PER CAPITA
Fonte: Adaptado de IBGE (2015).
Mesmo o crescimento recente de produtividade
não se mostrou muito significativo, principalmente
se comparado com países em estágio similar de
desenvolvimento. De acordo com a Figura 3.5
entre os países em desenvolvimento seleciona-
dos, o Brasil apresenta a segunda menor taxa
para o período mais recente, apenas superior à
do México (0,5%). Não só países emergentes com
conhecidas taxas elevadas de crescimento econô-
mico recente, como a China (9,7%) e a Índia (5,5%),
apresentaram valores superiores aos do Brasil,
como também a Rússia (4,2%), Indonésia (3,7%),
Argentina (4%) e África do Sul (1,8%).
29CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
Adicionalmente, os países desenvolvidos
geralmente apresentam taxas de crescimento
menores do que os países em desenvolvimento.
Chama atenção o fato de que o desempenho do
Brasil foi apenas um pouco melhor do que o de
boa parte dos países em estágios mais adianta-
dos de desenvolvimento. E não se trata de um
fenômeno recente; não é por acaso que o país
não tem conseguido reduzir a distância que o
separa dos países mais ricos.
FIGURA 3.5
TAXAS MÉDIAS ANUAIS DE CRESCIMENTO DA PRODUTIVIDADE DO TRABALHO PARA PAÍSES SELECIONADOS
(A PREÇOS EM US$ CONSTANTES DE 2005) – 1990-2011 (%)
1990-2000 2001-2011
-3 -2 -1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
1,51,2
-2,41,8
3,74,0
9,19,7
2,73,7
3,55,5
1,0
0,5
-2,44,2
1,4
0,6
1,80,2
5,1
2,8
2,21,4
1,30,7
1,6-0,4
0,9
1,0
2,31,0
BRASIL
MÉXICO
ÍNDIA
INDONÉSIA
ARGENTINA
ÁFRICA DO SUL
CHINA
ITÁLIA
ALEMANHA
FRANÇA
RÚSSIA
CANADÁ
ESTADOS UNIDOS
REINO UNIDO
CORÉIA DO SUL
JAPÃO
Fonte: Adaptado de Feenstra, Inklaar e Timmer (2015).
30 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
O fraco desempenho da produtividade do trabalho no Brasil também fica evidencia-
do quando a análise é desa-gregada em nível setorial
O fraco desempenho da produ-
tividade do trabalho no Brasil
também fica evidenciado quan-
do a análise é desagregada em
nível setorial, como pode ser
visto na Figura 3.6. Enquanto a
segunda metade da década de 1990 foi marcada por
um efeito negativo (-0,7%) da taxa média de cresci-
mento da produtividade, a primeira década dos anos
2000 foi marcada por um crescimento modesto
dessa taxa (1,1%). No entanto, verifica-se que, desde
a crise mundial em 2008, principalmente a partir
de 2010, o Brasil encontra-se em um momento de
taxas menores de crescimento e com perspectiva de
quedas ainda maiores diante do fraco desempenho
econômico de 2014 e do começo de 2015, atingindo
uma taxa de crescimento médio da produtividade de
apenas 1,1% entre 2010 e 2014.
FIGURA 3.6
TAXAS MÉDIAS DE CRESCIMENTO DA PRODUTIVIDADE DO TRABALHO NO BRASIL POR SETORES (%)
-4 -2 0 2 4 6 8 10
TOTAL
AGROPECUÁRIA
INDÚSTRIA
EXTRATIVA MINERAL
TRANSFORMAÇÃO
CONSTRUÇÃO CIVIL
SIUP
SERVIÇOS
-0,7
-1,5-0,4
-0,9
-1,32,0
3,1
-1,7
-2,0-0,7
0,9
-1,50,0
-2,9
0,90,0
-1,20,9
0,2
1,2
1,1
2,34,3
9,7
1996-2000 2000-2010 2010-2014
Nota: O cálculo da produtividade do trabalho no período de 1996 a 2014 foi feito com base na razão entre o valor adicionado e o número de pes-soal ocupado, usando deflatores setoriais anuais de acordo com as tabelas de recursos e usos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os valores de pessoal ocupado para os anos de 2012 e 2013 foram estimados com base nas variações publicados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), enquanto, no ano de 2014, com base nas variações publicadas na PNAD Contínua.
Fonte: Adaptado de IBGE (2015).
31CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
Quando a produtividade do trabalho é desa-
gregada pela agropecuária, indústria (total,
extrativa mineral, transformação, construção
civil e Serviços Industriais de Utilidade Pública
– SIUP) e serviços, verifica-se, ainda pela Figura
3.6, o fraco desempenho da indústria total, com
taxas médias muito baixas de crescimento e um
efeito negativo de 0,9% entre 2010 e 2014 e de
-2% para a manufatura no mesmo período. Por
outro lado, a agropecuária e a indústria extrati-
va mineral apresentaram um crescimento signi-
ficativo da produtividade do trabalho nos anos
2000, principalmente no período mais recente
entre 2010 e 2014, com taxas médias de cresci-
mento de 9,7% para a agricultura e de 3,1% para
a indústria extrativa mineral. Já os setores de
serviços e de construção civil apresentaram um
crescimento modesto nos anos 2000, abaixo de
1%, enquanto os SIUP obtiveram um resultado
negativo nesse mesmo período.
Dessa maneira, conclui-se que o crescimento
verificado da produtividade do trabalho após os
anos 2000, ainda que baixo, deveu-se princi-
palmente ao setor agropecuário e à indústria
extrativa mineral, uma vez que a indústria de
transformação teve desempenho negativo e o
setor de serviços pouco variou. Para entender
melhor quais são as atividades econômicas, em
níveis ainda mais desagregados, que afetaram
esse resultado, a Figura 3.7 mostra as taxas
médias anuais de crescimento da produtividade
do trabalho para alguns setores selecionados no
período de 2000 a 2011, último período divulga-
do e atualizado pela nova metodologia de cálculo
do IBGE para esse nível de desagregação.
Pela Figura 3.7, verifica-se que a maioria dos
setores da indústria apresentou uma taxa de
crescimento negativa da produtividade do
trabalho no período analisado. Na manufatura,
apenas os setores automotivo e de fumo apre-
sentaram taxa de crescimento superior ao total
da economia. As indústrias de celulose e papel,
eletrônica, produtos de metal, farmacêutica,
outros transportes e móveis/diversos também
apresentaram taxas positivas, embora os valo-
res sejam pequenos. A agropecuária apresenta
o maior crescimento médio anual no período,
enquanto a maior parte dos serviços, com des-
taque para as intermediações financeiras e de
seguros, apresentou taxas positivas.
32 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 3.7
TAXAS MÉDIAS ANUAIS DE CRESCIMENTO DA PRODUTIVIDADE DO TRABALHO TOTAL POR SETORES, 2000-2011 (%)
-7 -6 -5 -4 -3 -2 -1 0 1 2 3 4 5 6
AGROPECUÁRIA
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA/ SEGUROS
AUTOMOTIVO
ATIVIDADES IMOBILIÁRIAS
FUMO
COMÉRCIO
ALOJAMENTO/ALIMENTAÇÃO
SAÚDE PÚBLICA
OUTROS DA INDÚSTRIA EXTRATIVA
CELULOSE/PAPEL
ELETRÔNICO
SERVIÇOS DOMÉSTICOS
METAL
FARMACÊUTICO
TRANSPORTE/ARMAZENAGEM/CORREIO
CONSTRUÇÃO CIVIL
SERVIÇOS DE INFORMAÇÃO
OUTROS TRANSPORTES
ELETRICIDADE/GÁS/ÁGUA/ESGOTO
MÓVEIS/DIVERSOS
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
IMPRESSÃO/GRAVAÇÃO
CIMENTO/MINERAIS NÃO-METÁLICOS
QUÍMICA (LIMPEZA, TINTAS)
ETANOL
OUTROS SERVIÇOS
TÊXTIL
MADEIRA
QUÍMICA
SERVIÇOS MANUTENÇÃO/REPARAÇÃO
PEÇAS AUTOMOTIVAS
SAÚDE PRIVADA
AÇO E DERIVADOS
ALIMENTOS/BEBIDAS
BORRACHA/PLÁSTICO
EDUCAÇÃO PRIVADA
EDUCAÇÃO PÚBLICA
METALURGIA
CALÇADOS/COURO
MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS
VESTUÁRIO
MINÉRIO DE FERRO
PETRÓLEO/GÁS NATURAL
REFINO PETRÓLEO
5,1
4,2
3,4
2,9
1,9
1,7
1,5
1,5
1,3
1,2
1,1
1,0
0,8
0,7
0,6
0,4
0,3
0,2
0,1
0,1
0,1
-0,2
-0,5
-0,5
-0,6
-0,6
-1,0
-1,1
-1,3
-1,6
-1,6
-1,7
-1,8
-2,1
-2,3
-2,4
-2,5
-2,8
-3,3
-3,5
-3,6
-4,3
-4,3
-6,0
Fonte: Adaptado de IBGE (2015).
33CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
Indústrias importantes como minério de ferro e
petróleo/gás natural, apresentaram taxas de cresci-
mento negativas expressivas no período analisado,
ambos com -4,3%. Isso sugere que o crescimento da
indústria extrativa total apresentado na Figura 3.7
deveu-se a outros produtos, como carvão mineral,
minerais não metálicos e minerais metálicos não
ferrosos (apresentados como outros da indústria
extrativa, com crescimento médio de 1,3%).
Contudo, esse resultado deve ser analisado com
cautela, uma vez que a produtividade do trabalho
não verifica o ganho de eficiência do capital, o que
pode distorcer o resultado devido ao fato de o setor
ser altamente intensivo nesse fator. Alternativa-
mente, deve-se considerar o aumento expressivo
da produção desses produtos verificado nesse
período, principalmente com o minério de ferro, bem
como seu crescente impacto na pauta exportadora
brasileira, deu-se mais pelo fator preço do que pelo
aumento da eficiência na produção. Como as séries
estão deflacionadas, verifica-se que a quantidade de
trabalhadores apresentou uma taxa de crescimento
maior do que o valor agregado nessas indústrias.
Portanto, a produtividade do trabalho (assim como
a produtividade total dos fatores) reflete e interfere
na competitividade e no crescimento industrial. É re-
levante, assim, considerarmos o ritmo de crescimen-
to da produtividade. De acordo
com a Tabela 3.1, enquanto a
produtividade da China cresceu a
uma média anual de 10% durante
o período (2001-2011), a do
Brasil cresceu apenas 1,2% no
mesmo período. Outros indicado-
res de competitividade industrial,
tais como custo da mão de obra, taxa de imposto
corporativo e custo médio da eletricidade para a
indústria, também comprometem a competitividade
industrial no Brasil relativamente a de outros países,
particularmente outros emergentes.
A produtividade do tra-balho (assim como a produtividade total dos fatores) reflete e interfere na competitividade e no crescimento industrial.
PAÍSES
CUSTOS DA
MÃO DE OBRA
(US$/H) 2011
PRODUTIVIDADE DO TRABALHO
(PIB POR PESSOA
EMPREGADA) 2011
TAXA MÉDIA DE CRESCIMENTO
ANUAL DA PRODUTIVIDADE
DO TRABALHO (2001-2011)
TAXA DE IMPOSTO
CORPORATIVO (2012)
CUSTO MÉDIO DA
ELETRICIDADE PARA
INDÚSTRIA (US CENTS POR KWH)
2013
ALEMANHA 46.4 43,3 0,7 33 15.7
CANADÁ 38.3 49,5 0,4 31 7.4
ESTADOS UNIDOS 35.4 68,2 1,4 39,1 6.9
JAPÃO 35.4 44,6 1 38 17.9
CINGAPURA 21.9 50,3 2,9 17 15.6
COREIA DO SUL 17.7 45,2 2,9 24,2 7.3
TAIWAN 9.2 52,9 3,2 17 8.3
CHINA 2.8 14,2 10,8 25 7.4
ÍNDIA 0.9 8,9 5,5 32,4 10.1
BRASIL 12 13,7 1,2 34 15.4
TABELA 3.1
ALGUNS INDICADORES QUE REFLETEM A COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL ENTRE PAÍSES
Fonte: Deloitte (2015).
34 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Engajamento do Brasil no Mercado Internacional Tanto as exportações como as importações bra-
sileiras refletem determinado nível de compe-
tividade industrial do país. Pois, dentre outros
fatores indicam algum grau de integração com o
mercado internacional, com a economia de ou-
tros países, por meio da inserção de produtos.
Engajamento via Exportações
No que diz respeito às exportações, a Figura
3.8 mostra que entre as economias avançadas
a participação das exportações no PIB da Ale-
manha cresceu de menos de 30% em 1995 para
mais de 50% em 2013. No Reino Unido, essa
participação é de mais de 30%, na França é de
menos de 30% e no Japão é de mais de 15%.
FIGURA 3.8
EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DAS EXPORTAÇÕES NO PIB DOS PAÍSES COM ECONOMIAS AVANÇADAS (% 1970-2015)
ESTADOS UNIDOS
ALEMANHA
REINO UNIDO
FRANÇA JAPÃO
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 20150
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
Fonte: World Bank (2016).
35CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
No contexto de economias emergentes, a Figura
3.9 mostra que as participações das exportações
da África do Sul, Índia, China, México e Rússia
variam entre 25% e acima de 30%. Porém, no
Brasil, essa participação é de pouco mais que 10%
e inferior a da Argentina. Essa evolução da partici-
pação das exportações no PIB brasileiro pode ser
examinada com mais detalhe na Figura 3.10.
FIGURA 3.9
EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DAS EXPORTAÇÕES NO PIB DE ECONOMIAS EMERGENTES (%, 1970-2015)
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 20150
10
20
30
40
50
60
70
ÍNDIA
ÁFRICA DO SUL
MÉXICO
ARGENTINA
RÚSSIA
BRASIL CHINA
4
6
8
10
12
14
16
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
Fonte: World Bank (2016)
FIGURA 3.10
EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DAS EXPORTAÇÕES NO PIB BRASILEIRO (%, 1970-2015)
Fonte: World Bank (2016).
36 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
A baixa e decrescente (especialmente a partir de
2005) participação das exportações no PIB do
Brasil reflete-se na evolução do saldo comercial
brasileiro: evoluiu pouco mais do que US$ 40 bi
em 2006 para próximo de zero em 2013 pas-
sando por uma leve recuperação em 2015. Tal
recuperação parece influenciada pela desvalori-
zação do real (Figura 3.11).
FIGURA 3.11
EVOLUÇÃO DO SALDO COMERCIAL BRASILEIRO (US$ BILHÕES, 1980-2015)
-20
-10
0
10
20
30
40
50
1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
Fonte: MDIC (2016).
Por outro lado, a Tabela 3.2 mostra que o volume
das exportações brasileiras de produtos manufa-
turados tem sido inferior à de economias avan-
çadas e economias emergentes. Mais importante
ainda: a sua taxa de crescimento tem sido extre-
mamente inferior a de economias emergentes
como Índia e China.
TABELA 3.2
EVOLUÇÃO DAS EXPORTAÇÕES DE PRODUTOS MANUFATURADOS (2000-2012)
PAÍSES 2000 (US$ BILHÕES)
2012 (US$ BILHÕES)
% TAXA MÉDIA ANUAL DE CRESCIMENTO
ALEMANHA 463,5 1.153,8 7,9
ESTADOS UNIDOS 648,9 974,7 3,4
CANADÁ 177,0 213,7 1,6
JAPÃO 450,4 718,7 4,0
CINGAPURA 118,5 285,8 7,6
CHINA 219,2 1.925,8 19,9
ÍNDIA 33,0 190,5 15,7
BRASIL 31,9 84,9 8,5
Fonte: World Bank (2014).
37CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
Engajamento via Importações Assim como as exportações, as importações
também refletem a competitividade industrial de
um país. Especificamente, um alto fluxo de impor-
tações, associado a um alto fluxo de exportações,
reflete uma integração competitiva de um país
no mercado mundial. As importações oferecem
vantagens a um país, tais como:
1 Podem ser fontes e bases para atividades exportadoras;
2 Refletem a participação de um país em ca-deias globais de produção e de inovação;
3 São fontes de redução de custo e de ganhos de eficiência produtiva;
4 Possibilidade de formação de parcerias com fornecedores internacionais e oportunida-des de aprendizagem tecnológica; e
5 Aumento do conteúdo estrangeiro das ex-portações (o que reflete alta integração com
o mercado internacional).
As Figuras 3.12 e 3.13
mostram, respectivamente, a
evolução da participação de
algumas economias avançadas
e de algumas economias emer-
gentes, no comércio mundial.
Conforme a Figura 3.12, algumas economias avan-
çadas (por exemplo Estados Unidos e Alemanha)
ainda conseguem manter um engajamento com-
petitivo no mercado internacional. No contexto de
economias emergentes, observa-se que o desem-
penho do Brasil está aquém do desempenho de
China, Índia, México e, até mesmo, da Rússia.
FIGURA 3.12
EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DE ALGUMAS ECONOMIAS AVANÇADAS NO COMÉRCIO MUNDIAL
(US$ BILHÕES, 1970-2015)
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
ESTADOS UNIDOS
0,09%
0,10%
0,11%
0,12%
0,14%
0,15%
0,16%
0,18%
US$ 500 bi
US$ 1 tri
US$ 1,5 tri
US$ 2 tri
US$ 2,5 tri
US$ 3 tri
US$ 3,5 tri
0
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
Assim como as expor-tações, as importações também refletem a com-petitividade industrial de um país.
38 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASILV
olu
me
de
expo
rtaç
ões
e im
port
açõ
es Participação
no
com
ércio m
un
dial
3,0%
3,8%
4,6%
5,4%
6,2%
7,0%
US$ 200 bi
US$ 400 bi
US$ 600 bi
US$ 800 bi
US$ 1 tri
REINO UNIDO
0
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
2,0%
3,2%
4,4
5,6%
6,8%
8,0%
US$ 200 bi
US$ 400 bi
US$ 600 bi
US$ 800 bi
US$ 1 tri
FRANÇA
0
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
39CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
ALEMANHA
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
6,0%
7,0%
8,0%
9,0%
10,0%
11,0%
0
US$ 400 bi
US$ 800 bi
US$ 1,2 tri
US$ 1,6 tri
US$ 2 tri
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
0,0%
1,6%
3,3%
5,0%
6,6%
8,3%
10,0%
US$ 200 bi
US$ 400 bi
US$ 600 bi
US$ 800 bi
US$ 1 tri
US$ 1,2 tri
JAPÃO
0
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
Fonte: World Bank (2016).
40 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASILV
olu
me
de
expo
rtaç
ões
e im
port
açõ
es Participação
no
com
ércio m
un
dial
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
0,0%
2,0%
4,0%
6,0%
8,0%
10,0%
12,0%
US$ 500 bi
US$ 1 tri
US$ 1,5 tri
US$ 2 tri
US$ 2,5 tri
US$ 3 tri
0
CHINA
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
0,0%
0,1%
0,2%
0,3%
0,4%
0,5%
0,6%
0
US$ 20 bi
US$ 40 bi
US$ 60 bi
US$ 80 bi
US$ 100 bi
US$ 120 bi
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
ARGENTINA
FIGURA 3.13
EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DE ALGUMAS ECONOMIAS EMERGENTES NO COMÉRCIO MUNDIAL
(US$ BILHÕES, 1970-2015)
41CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
0,0%
0,5%
1,0%
1,5%
2,0%
2,5%
US$ 100 bi
US$ 200 bi
US$ 300 bi
US$ 400 bi
US$ 500 bi
MÉXICO
0
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
ÁFRICA DO SUL
0 0,3%
0,4%
0,5%
1,0%
0,7%
0,8%
1,1%
1,3%
US$ 20 bi
US$ 40 bi
US$ 60 bi
US$ 80 bi
US$ 100 bi
US$ 120 bi
US$ 140 bi
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
42 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
0
ÍNDIA
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
0,0%
0,5%
1,0%
1,5%
2,0%
2,5%
3,0%
US$ 100 bi
US$ 200 bi
US$ 300 bi
US$ 400 bi
US$ 500 bi
US$ 600 bi
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
0,0%
0,8%
1,7%
2,5%
3,4%
4,2%
5,1%
6,0%
US$ 100 bi
US$ 200 bi
US$ 300 bi
US$ 400 bi
US$ 500 bi
US$ 600 bi
US$ 700 bi
RUSSIA
0
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
43CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
Vo
lum
e d
e ex
port
açõ
es e
impo
rtaç
ões P
articipação n
o co
mércio
mu
nd
ial
0,4%
0,7%
1,0%
1,3%
1,6%
US$ 100 bi
US$ 200 bi
US$ 300 bi
US$ 400 bi
BRASIL
0
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015
PARTICIPAÇÃO NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS
PARTICIPAÇÃO NAS IMPORTAÇÕES MUNDIAIS
EXPORTAÇÕES
IMPORTAÇÕES
Fonte: World Bank (2016).
Abertura de Mercado A integração internacional de uma economia refle-
te, em grande parte, a sua competitividade. Empre-
sas e produtos com maior presença no comércio
mundial têm, na maioria dos casos, produtividade
e competitividade maiores. Isso se deve a fatores
variados, tais como:
1 Necessidade da inovação para concorrência no mercado internacional;
2 Grau mais elevado de eficiência produtiva em empresas internacionalizadas.
São várias as medidas de integração internacional
de uma economia. Usualmente analisa-se pri-
meiramente o papel que essa
economia tem no comércio
internacional em termos de
corrente de comércio, tipo de
produtos exportados e impor-
tados e destino das exportações e importações.
Ademais, avalia-se como a economia posiciona-se
em relação às cadeias globais de valor, atual para-
digma do comércio internacional em que empre-
sas ao redor do mundo tornam-se responsáveis
apenas pela produção de uma parte do produto
final – normalmente, aquela em que são mais
competitivas. A economia brasileira é tipicamente
fechada. A Figura 3.14 mostra que o Brasil possui
uma participação no comércio mundial inferior à
sua relevância no PIB mundial.
A integração interna-cional de uma economia reflete, em grande parte, a sua competitividade.
44 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 3.14
PARTICIPAÇÃO NO PIB E NAS EXPORTAÇÕES MUNDIAIS – 2013 (EM MILHÕES DE US$, VALORES CORRENTES)
BRASIL
ÍNDIA
CHINA
ALEMANHA
FRANÇA
CANADÁ
ESTADOS UNIDOS
REINO UNIDO
CORÉIA DO SUL
JAPÃO
RÚSSIA
0%
5%
10%
15%
20%
25%
0% 2% 4% 6% 8% 10% 12%
Par
tici
paçã
o n
o P
IB m
un
dia
l
Participação nas exportações mundiais
Fonte: Adaptado de UNCTAD (2015).
Outro indicador que reflete
a baixa inserção do Brasil no
comércio internacional frente
às outras economias é o índice
de abertura de mercado (open
market index – OMI) elabora-
do pela Câmera Internacional de Comércio11. Esse
índice é composto por quatro categorias:
1 Abertura comercial, que envolve indicadores como proporção do comércio no PIB e impor-tação de mercadorias e serviços per capita;
2 Regime de política comercial, que envolve indicadores de barreiras tarifárias e de efici-ência na administração alfandegária;
3 Abertura para investimento direto estrangei-ro (IDE); e
4 Infraestrutura voltada ao comércio, que envol-ve indicadores como desempenho logístico e de infraestrutura das telecomunicações. Este índi-ce envolve um sistema de pesos, que variam de 1 a 6. Quanto mais próximo de 6 maior é o grau de abertura da economia12. O resultado desse indicador para alguns países selecionados no ano de 2015 é mostrado na Figura 3.15
Outro indicador que reflete a baixa inserção do Brasil no
comércio internacional frente às outras economias é o índi-
ce de abertura de mercado
11. Ver ICC (2015).
12. Para maiores detalhes da metodologia ver ICC (2015).
45CAPÍTULO 03 | IMPERATIVO DO FORTALECIMENTO DA COMPETIVIDADE INDUSTRIAL NO BRASIL
FIGURA 3.15
ÍNDICE DE ABERTURA DE MERCADO (OMI) PARA PAÍSES SELECIONADOS, 2015
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5 5,0
BRASIL
MÉXICO
ÍNDIA
INDONÉSIA
ARGENTINA
ÁFRICA DO SUL
CHINA
ITÁLIA
ALEMANHA
FRANÇA
RÚSSIA
CANADÁ
ESTADOS UNIDOS
REINO UNIDO
CORÉIA DO SUL
JAPÃO
4,3
4,2
4,1
3,9
3,8
3,7
3,6
3,6
3,3
3,1
3,1
3,1
2,6
2,5
2,3
3,0
Fonte: Adaptado de ICC (2015).
De acordo com a Figura 3.15, o Brasil possui o
menor índice de abertura de mercado dentre
os países selecionados, atrás de outros países
emergentes comparativos como Argentina, Índia,
China, Indonésia, México, Rússia e África do Sul.
O Brasil possui o menor índice dentre todos os
países do G20, e de que o seu valor se mantêm
constante desde o primeiro cálculo em 2011,
ao contrário de países como
México e Rússia que vêm
apresentando maiores níveis
no decorrer do tempo13.
O Brasil possui o menor índice de abertura de
mercado dentre os países do G20.
O Brasil possui o menor índi-ce de abertura de mercado dentre os países do G20.
13. ICC (2015).
46 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
04
47RESUMO EXECUTIVO
Importante Papel da Indústria no Crescimento Econômico
48 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
04. Importante Papel da Indústria no Crescimento Econômico Participação da Indústria no PIB Brasileiro Com base em um levantamento realizado pela
Deloitte, a Figura 4.1 mostra a taxa média de
crescimento real do PIB versus a taxa média de
crescimento do produto industrial. Em termos
de proporção da manufatura no PIB nacional, o
Brasil encontra-se em posição inferior a econo-
mias emergentes como a Rússia, México, Polônia,
República Checa, Tailândia e China.
49CAPÍTULO 04 | IMPORTANTE PAPEL DA INDÚSTRIA NO CRESCIMENTO ECONÔMICO
Rea
l Mfg
CA
GR
(20
05
-10
)%
PIB real CAGR (2005-10)%
REPÚBLICA CHECA
CINGAPURA
POLÔNIA
ÍNDIA
CHINA
TAIWAN
CORÉIA DO SUL
MALÁSIA
BRASIL
CANADÁ
REINO UNIDO
FRANÇA
GRÉCIA
JAPÃORÚSSIA
MÉXICO
ESTADOS UNIDOS
TAILÂNDIA
-4,5
-2,0 0,0 2,0 4,0 6,0 8,0 10,0 12,0
-0,5
3,5
7,5
11,5
MGF PIB% DO PIB (2010): < 16%
Cor da bolha indica produto industrial como uma proporção do PIB real
MGF PIB% DO PIB (2010): 16% - 30%
MGF PIB% DO PIB (2010): > 30%
Tamanho da bolha indica o PIB de produção (2010)
US$ 100 BÍLHÕES
US$ 1 TRILHÃO
FIGURA 4.1
TAXA MÉDIA DE CRESCIMENTO REAL DO PIB VERSUS A TAXA MÉDIA DE CRESCIMENTO DO PRODUTO INDUSTRIAL
Fonte: Deloitte (2015).
50 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Com relação ao volume do produto industrial,
a Figura 4.1 mostra que o Brasil encontra-se
em posição melhor do que algumas economias
emergentes e avançadas. Porém, está extrema-
mente inferior à da China.
Tem havido, de fato, uma crescente importância
da indústria de serviços na composição dos PIBs
de países, especialmente do ponto de vista de
valor agregado, em relação à indústria manu-
fatureira e à indústria agrícola. Isso pode ser
observado na Figura 4.2 (contexto de economias
avançadas) e Figura 4.3 (contexto de economias
emergentes, incluindo o Brasil).
Conforme mostra a Figura 4.2, entre as eco-
nomias avançadas, a participação da indústria
manufatureira no PIB (com base no valor
agregado) tem declinado continuamente ao
longo das últimas décadas e anos. Em 2013,
essa participação chegou a menos de 15% nos
Estados Unidos, Reino Unido e França. Porém,
na Alemanha, encontra-se acima de 20%. Nes-
sas economias, a participação da indústria de
serviços chega, em média, a 80%.
Já no contexto das economias emergentes, a Figura
4.3 mostra que, com exceção da China, a parti-
cipação da indústria manufatureira alcança, em
média, menos de 20%. Na China, a participação da
indústria manufatureira e não manufatureira chega
a mais de 40% do PIB. Enquanto que no México e
na Rússia essa participação chega a pouco menos
de 40%. No Brasil essa participação chega a pouco
mais de 20%, tendo sido 40% em 1970. A da indús-
tria manufatureira alcançou em 2013 aproximada-
mente 13%, tendo sido mais de 20% em 1970.
Ainda no contexto das economias emergentes, a
Figura 4.3 mostra que a participação da indústria
de serviços no PIB dessas economias (pelo
valor agregado) tem sido, em média, de 60%.
Na China, essa participação é de cerca de 50%,
enquanto que no México é de 60%. No Brasil, a
participação da indústria de serviços no PIB em
2013 alcançou mais de 70%.
FIGURA 4.2
EVOLUÇÃO DA COMPOSIÇÃO DO PIB – ECONOMIAS AVANÇADAS (% DO PIB, 1970-2015) – PERSPECTIVA DO
VALOR ADICIONADO
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
ESTADOS UNIDOS
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
0
20
40
60
80
100
51CAPÍTULO 04 | IMPORTANTE PAPEL DA INDÚSTRIA NO CRESCIMENTO ECONÔMICO
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
REINO UNIDO
0
20
40
60
80
100
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
FRANÇA
0
20
40
60
80
100
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
52 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
0
20
40
60
80
ALEMANHA
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
0
20
40
60
80
JAPÃO
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
Fonte: Adaptado de World Bank (2016).
53CAPÍTULO 04 | IMPORTANTE PAPEL DA INDÚSTRIA NO CRESCIMENTO ECONÔMICO
FIGURA 4.3
EVOLUÇÃO DA COMPOSIÇÃO DO PIB – ECONOMIAS EMERGENTES (% DO PIB, 1970-2015) – PERSPECTIVA DO
VALOR ADICIONADO
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
CHINA
0
20
40
60
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
ARGENTINA
0
20
40
60
80
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
54 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
0
20
40
60
80
MÉXICO
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
ÁFRICA DO SUL
0
20
40
60
80
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
55CAPÍTULO 04 | IMPORTANTE PAPEL DA INDÚSTRIA NO CRESCIMENTO ECONÔMICO
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
ÍNDIA
0
20
40
60
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
0
20
40
60
80
RÚSSIA
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
56 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
AGRICULTURA INDÚSTRIA
INDÚSTRIA MANUFATUREIRA INDÚSTRIA NÃO MANUFATUREIRA
SERVIÇOS
BRASIL
0
20
40
60
80
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014
Fonte: Adaptado de World Bank(2016).
Com o aumento da participação da indústria de
serviços no PIB (e na criação de empregos) de eco-
nomias avançadas e emergentes, tem-se difundido
uma noção de diminuição da
importância da indústria de
manufatura para os países.
Assim, o padrão de crescimen-
to econômico seria determina-
do pela indústria de serviços.
A importância crescente do
setor de serviços no PIB de
economias em desenvolvimen-
to, como é a do Brasil, não dei-
xa de ser preocupante. Afinal,
ao contrário das economias
avançadas, nas economias
em desenvolvimento (com exceção da China) tem
havido uma diminuição da participação da indústria
de transformação no PIB muito antes de essas
economias terem aumentado seu nível de renda.
De fato, a estrutura da economia também é impor-
tante para determinar a competitividade de um país.
Em particular, relevância tem sido devotada à indús-
tria manufatureira, uma vez que ela poderia gerar:
1 Maior valor agregado do que as outras ativi-dades econômicas;
2 Maior exploração de economias de escala;
3 Maiores efeitos multiplicadores sobre o restante da economia e maiores possibili-dades de engajamento em cadeias globais de valor; e
4 Maiores oportunidades tecnológicas e inovação, além de efeitos de transbordamen-to para outros setores. Por conta disso, o deslocamento de economias em desenvolvi-mento na direção da indústria manufatureira aumentaria a capacidade exportadora dos países, o que poderia puxar seu crescimento de forma sustentável e sem restrições no
balanço de pagamentos.
Ao contrário das econo-mias avançadas, nas econo-
mias em desenvolvimento (com exceção da China)
tem havido uma diminuição da participação da indús-tria de transformação no PIB muito antes de essas
economias terem aumenta-do seu nível de renda.
57CAPÍTULO 04 | IMPORTANTE PAPEL DA INDÚSTRIA NO CRESCIMENTO ECONÔMICO
Porém, há que se ter cautela ao se adotar uma
perspectiva binária sobre a importância da in-
dústria manufatureira e de serviços: um processo
de “desindustrialização” versus um crescimento
vertiginoso dos serviços. É preciso considerar as
seguintes razões e mudanças:
Durante as últimas três décadas, as mudanças advin-
das do processo de globalização, e as consequentes
alterações no processo de inovação, modificaram
drasticamente no mundo a configuração e o fun-
cionamento da indústria (no sentido de transforma-
ção). As empresas têm se tornado cada vez menos
dependentes da geografia. Passaram a realocar não
apenas a sua produção para localidades de custos
mais competitivos, mas também passaram, lideradas
por empresas multinacionais (EMNs) de economias
avançadas passaram a descentralizar suas ativida-
des inovadoras, incluindo a P&D, para economias
emergentes. Por outro lado, as atividades inova-
doras, tanto em empresas locais como em EMNs e
suas subsidiárias, deixaram de se concentrar apenas
no âmbito das empresas individuais. Cada vez mais,
as atividades inovadoras têm sido distribuídas ou
decentralizadas para uma variedade grande de
organizações parceiras, algumas delas em indústrias
distintas. Por isso, não é surpresa que tem havido,
em nível internacional, especialmente nas economias
avançadas, uma diminuição das atividades inovado-
ras internas de pesquisa e desenvolvimento (P&D).14
A natureza das atividades industriais tem se mo-
dificado tanto em nível de atividades de produção
(operacionais) como em termos de atividades de
inovação, muito embora a separação entre essas
duas seja muito tênue. Em termos de atividades
de produção, tem havido uma intensificação do
uso de avançadas técnicas de manufatura e de
produção, em geral, à base de robotização, Inter-
net das coisas, big data e computação em nuvem.
Tais avanços tem proporcionado a emergência de
novos modelos de produção como, por exemplo,
a manufatura 4.0. Esses novos modelos aliam-se
inovações na organização da produção, como
por exemplo, a lean manufacturing, que permitem
consideráveis ganhos de produtividade. A abor-
dagem de manufatura 4.0, representa uma fusão
entre os sistemas físicos com elementos digitais
que transformam as fábricas convencionais em
“smart factories”. Estas podem se comunicar umas
com outras em nível da mesma empresa ou de
diferentes empresas e indústrias. Porém, é preciso
enfatizar que as discussões e esforços em torno
das “smart factories” podem obscurecer a ênfase
em atividades inovadoras. Em outras palavras, é
preciso chamar a atenção que a adoção de ou en-
gajamento em “smart factories” pode conduzir uma
empresa ou setor industrial a operar na fronteira
tecnológica da produção, mas não necessaria-
mente na fronteira tecnológica da inovação.15
Em termos de atividades inovadoras tem havido uma
forte tendência à interdependência das atividades.
Em outras palavras, à medida que o processo de
inovação torna-se cada vez mais fragmentado e de-
composto tanto em nível intra-firma, especialmente
de EMNs, como em nível intra-industrial e inter-na-
cional, as empresas tendem a manter internamente
apenas uma estreita fatia de atividades inovadoras,
especialmente P&D. Assim, o processo de inovação
é crescentemente marcado por esforço colabo-
rativo. Além disso, há o fenômeno da interação da
manufatura com as atividades de serviços no intuito
de agregar valor a produtos e serviços.
Não obstante, é importante mencionar que a in-
dústria de manufatura, especialmente no contexto
de economias em desenvolvimento, serve de base
para o atendimento de demandas correntes e
futuras, para a acumulação de capacidades tec-
nológicas inovadoras e para o aproveitamento de
janelas de oportunidades abertas por novas tec-
nologias. Também é importante considerar que a
produtividade na indústria manufatureira tende a
crescer mais rapidamente do que a produtividade
na indústria de serviços. É importante mencionar
a crescente interdependência que tem ocorrido
entre as atividades de manufatura e de serviços:
14. Laursen & Salter (2006).
15. Bell &Figueiredo (2012).
58 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
1 De um lado, diversas empresas de manufatura têm, cada vez mais, terceirizado as suas ativida-des para empresas de serviços (por exemplo, processamento de dados, logística e outras);
2 De outro lado, diversas empresas de manu-fatura de produtos têm desenvolvido ativi-dades e novas linhas de negócios baseadas em serviços. O intuito é agregar valor aos produtos a partir das atividades de serviços;
3 Adicionalmente, a indústria agrícola gera enormes impactos nas atividades da indústria manufatureira. Isso se dá em termos de de-
manda por máquinas e implementos agrícolas, fertilizantes e estruturas de armazenamento;
4 Também demanda intensamente atividades de serviços: da tecnologia de informação à logística. Por isso, tem-se uma relação muito mais interdependente do que binária ou polarizada; e
5 Desse modo, movendo-se além de uma pers-pectiva binária sobre a importância da indústria manufatureira e de serviços para a economia, é necessário considerar a participação da econo-mia de um país no mercado mundial.
Tipos de Indústria e sua Importância Relativa na EconomiaAs Figuras 4.4 e 4.5 apresentam dados da
evolução das exportações brasileiras desagre-
gadas por tipos de indústria. Como sugere a
Figura 4.4, as exportações do agronegócio têm
superado as da exportação de manufaturas ao
longo do tempo.
FIGURA 4.4
EVOLUÇÃO DAS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS POR SETOR (US$ BILHÕES, 1997-2012)
Fonte: Agrostat Brasil (2014); MAPA (2014); MDIC (2014); World Bank (2014).
50
100
150
250
200
300
0
2011 20122009 20102007 20082005 20062003 20042001 20021999 20001997 1998
EXPORTAÇÃO DO AGRONEGÓCIO EXPORTAÇÃO DO BRASIL
EXPORTAÇÃO DE MANUFATURADOS EXPORTAÇÃO DE DEMAIS SETORES
59CAPÍTULO 04 | IMPORTANTE PAPEL DA INDÚSTRIA NO CRESCIMENTO ECONÔMICO
FIGURA 4.5
EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DAS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS POR INDÚSTRIAS DE ACORDO COM SUA
“INTENSIDADE TECNOLÓGICA” (%, 1997-2017)
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
20172015201320112009200720052003200119991997
PRODUTOS NÃO INDUSTRIAIS INDÚSTRIA DE BAIXA TECNOLOGIA
INDÚSTRIA DE MÉDIA-ALTA TECNOLOGIA INDÚSTRIA DE MÉDIA-BAIXA TECNOLOGIA
INDÚSTRIA DE ALTA TECNOLOGIA
Fonte: MDIC (2017).
Desagregando-se as exportações de acordo com
a assim chamada “intensidade tecnológica” das
indústrias, constata-se que, de fato, tem havido
maior participação das indústrias relacionadas
a recursos naturais na pauta de exportações do
Brasil. Trata-se de um fenômeno presente em
toda a América Latina (Figura 4.6).
FIGURA 4.6
EVOLUÇÃO DOS VALORES DAS EXPORTAÇÕES POR INDÚSTRIAS DE ACORDO COM SUA “INTENSIDADE
TECNOLÓGICA” (US$ BILHÕES, 1997-2017)
0
50
100
150
200
250
300
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
PRODUTOS NÃO INDUSTRIAISINDÚSTRIA DE BAIXA TECNOLOGIAINDÚSTRIA DE MÉDIA-ALTA TECNOLOGIA
INDÚSTRIA DE MÉDIA-BAIXA TECNOLOGIAINDÚSTRIA DE ALTA TECNOLOGIATOTAL
Fonte: MDIC (2017).
60 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Porém, este estudo defende uma perspectiva
mais compreensiva tanto em relação às classifica-
ções convencionais sobre a intensidade tecnológi-
ca das indústrias quanto em relação à participação
das indústrias relacionadas a recursos naturais na
economia e na pauta exportadora:
1 A inovação tecnológica está presente em todos os tipos de atividade industrial e não apenas das indústrias assim-chamadas de “alta tecnologia” (como, por exemplo, aeroespacial, eletrônica, automobilística etc.). Durante as últimas décadas, tem havido avan-ços tecnológicos formidáveis no campo da agricultura alimentar e florestas (genômica, novos materiais), assim como em indústrias como de energia renovável e mineração.
2 A participação de indústrias relacionadas a recursos naturais na economia e na pauta exportadora não deveria ser considerada “ruim” para os países. As indústrias relacio-nadas a recursos naturais, contrariamente ao que se argumenta, oferecem enormes oportunidades para inovação, desenvolvi-mento industrial e impactos positivos no crescimento econômico (ver Boxe 1).
A inovação tecnológica está presente em todos os tipos de atividade industrial e não apenas das
indústrias assim-chamadas de “alta tecnologia”.
Este estudo defende uma perspectiva mais com-preensiva tanto em relação às classificações
convencionais sobre a intensidade tecnológica das indústrias quanto em relação à participação
das indústrias relacionadas a recursos naturais na economia e na pauta exportadora.
61CAPÍTULO 04 | IMPORTANTE PAPEL DA INDÚSTRIA NO CRESCIMENTO ECONÔMICO
BOXE 1
INDÚSTRIAS RELACIONADAS A RECURSOS NATURAIS: CRESCENTE DEPENDÊNCIA DA
AMÉRICA LATINA E DO BRASIL E OPORTUNIDADES PARA INOVAÇÃO
Os países que são ricos em recursos naturais e países de renda baixa e média, entre eles os países latino-amer-icanos de forma destacada, enfrentam continuamente um suposto dilema: se eles devem abraçar uma rota baseada em recursos naturais, especialização, ou diversificar longe dos recursos naturais (NRs). No passado, a escolha tinha se inclinado fortemente para o último. Os países latino-americanos buscavam estimular setores de manufatura através de uma estratégia de substituição de importações às custas de seus setores de recursos tradicionais. Após o boom de commodities da última década e o aumento da dependência das commodities de países ricos em recursos, a questão é mais uma vez importante na agenda política. Há fortes indícios de que países ricos em recursos de renda baixa e média vão continuar a tentar afastar-se de suas vantagens naturais e incentivar o investimento em setores industriais não relacionados a recursos naturais.
No entanto, a evidência histórica alerta para o risco dessa dicotomia simplista. A história está repleta de experiências negativas de países tentando usar indústrias de alta tecnologia para incentivar processos de crescimento e desenvolvimento sustentados sem muito sucesso (por exemplo, Guatemala, Honduras, El Salvador) e de experiências positivas de países que têm sido capazes de usar seus recursos naturais como um motor de crescimento e desenvolvimento (por exemplo, Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Noruega, Suécia e Finlândia). Em suma, não se sustenta a tese simplista de que a exploração dos recursos naturais afeta o desenvolvimento econômico negativamente. O que parece diferir no desen-cadeamento de um círculo vicioso ou virtuoso são as respostas políticas internas para lidar com os riscos e as potencialidades dos recursos naturais.
A dependência de recursos naturais pode promover o desenvolvimento econômico quando sustentada por esforços para acumular capacidades tecnológicas para inovar em torno desses recursos. A exploração da riqueza dos recursos naturais torna-se um caminho viável para o desenvolvimento quando complementada com investimentos em habilidades, aprendizagem, conhecimento, educação e capacidade de inovação. Na verdade, quando combinadas com os esforços de inovação e dinamismo tecnológico, as atividades de recursos naturais podem oferecer a possibilidade de:
1 Crescimento da produtividade comparável à manufatura;
2 Aumento da competitividade vis-à-vis os países produtores com salários muito mais baixos;
3 Aumentos nas dotações de recursos naturais próprios. Por exemplo, as reservas de petróleo e minerais aumentam com a aplicação de técnicas de exploração, produção e de serviços de engenharia avançados;
4 Diversificação para produtos de maior valor e atividades relacionadas de uma base de recursos forte.
Essa interpretação mais ampla é importante para os formuladores de políticas em países latino-americanos. Isto porque as recentes mudanças nas condições mundiais fornecem aos países ricos em recursos uma nova “janela de oportunidades” para usar a abundância de recursos naturais para impulsionar o crescimento e desenvolvimento. Mudanças na demanda por recursos naturais e em bases de conhecimento possibilitam o aumento das oportunidades de inovação nessas indústrias.
62 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Importância da Inovação Industrial para o Crescimento Econômico Os benefícios da inovação para o crescimento
industrial e progresso econômico foram identi-
ficados desde 1776 por economistas e pensa-
dores, como Adam Smith, Stuart Mill, Alexis de
Tocqueville e outros notáveis estudiosos. Porém,
foi Joseph Schumpeter (1883-1950) que, a partir
de 1911, não só trouxe a inovação tecnológica
para o centro do debate sobre desenvolvimento
econômico, como nos forneceu uma perspectiva
ampliada de inovação. Tal perspectiva ampliada
de inovação envolvia imitação, experimentação,
adaptação de processos e de produtos, novos
arranjos organizacionais, novas fontes de energia
e matérias-primas, assim como P&D. Ele também
nos trouxe a noção de inovação como recombina-
ção de conhecimentos ou tecnologias existentes.
Schumpeter contribuiu para ampliar a perspectiva
sobre inovação para além de processo e produto.
Por isso, defendeu que inovação também envolve:
1 Introdução de novos produtos;
2 Introdução de novos métodos de produção;
3 Abertura de novos mercados;
4 Desenvolvimento de novas fontes provedo-ras de matérias-primas e outros insumos; e
5 Criação de novas estruturas de mercado. Defendeu que o conceito de inovação não se restringe a produtos e processos, mas envol-ve, também, novas formas de gestão (para articulação das novas combinações), novos mercados e novos insumos de produção. Porém, após o trabalho de Schumpeter houve muitos avanços nas décadas subsequentes sobre as perspectivas acerca da inovação e sua importância para crescimento econômico.
Assim, tecnologias existentes distintas podem ser
recombinadas para a criação de um novo produto,
processo de produção ou serviço, com grau de
novidade mundial. É o caso do etanol de cana-de-
-açúcar. Trata-se de um exemplo de produto com
grau de novidade mundial que foi criado a partir
da recombinação de tecnologias existentes.16
Schumpeter não se limitou a enfatizar o papel de
empreendedores individuais; na segunda fase de seu
trabalho, ele reconheceu a importância das grandes
empresas inovadoras no desenvolvimento eco-
nômico de países. Ocorre que os empreendedores
continuam a ter enorme importância no processo de
inovação. Atualmente, eles tomam a forma, de um
lado, de proprietários de negócios, de vários tipos e
tamanhos; de outro lado, eles são representados por
engenheiros, técnicos e gestores de empresas (em-
preendedores intra-corporativos). Esses dois tipos
de profissionais, em função de seu talento, criativi-
dade e visão de negócio, têm sido responsáveis por
importantes inovações, de vários tipos, ao longo das
últimas décadas: de produtos eletrônicos a serviços
de saúde para a população de baixa renda.
Schumpeter tornou-se também famoso pelo
desenvolvimento do conceito de destruição
criativa. Segundo Schumpeter, a economia pro-
gride por meio da mutação industrial que, por sua
vez, revoluciona constantemente sua estrutura:
novas tecnologias e novos produtos substituem
constantemente os antigos e desafiam monopó-
lios, indústrias e empresas ícones do mercado.
Deste modo, a emergência de novas tecnologias,
geralmente a partir de inovações radicais, con-
tribuíram para o aparecimento de novas indús-
trias e empresas, as quais abrem caminho para a
emergência de inovações tecnológicas ainda mais
avançadas. Esse processo de renovação influencia
a emergência de novos padrões e direções para o
processo de inovação e desenvolvimento indus-
trial. O aparecimento de novas indústrias e em-
presas, por meio da destruição criativa, aumenta a
16. Fagerberg (2005).
63CAPÍTULO 04 | IMPORTANTE PAPEL DA INDÚSTRIA NO CRESCIMENTO ECONÔMICO
eficiência econômica, permite a constante renova-
ção da economia, gerando novas oportunidades
de trabalho, assim como novas oportunidades de
melhoria do padrão de vida das pessoas. A Figura
4.7 ilustra a dinâmica dessas ondas Schumpeteria-
nas de inovação na economia.
FIGURA 4.7
ONDAS DE INOVAÇÃO COMO “DESTRUIÇÕES CRIATIVAS”
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015)
Inov
ação
• Ferro• Força hidráulica• Têxtil• Comércio
ondaª1• Energia a vapor• Ferrovia• Aço• Algodão
ondaª2
• Eletricidade• Produtos
químicos• Motor de
combustão interna
ondaª3 • Petroquímica• Eletrônica, • Aviação• Aeroespacial
ondaª4
• Redes digitais• Biotecnologia• Tecnologia de
informação• Produtos
complexos
ondaª5 • Sustentabilidade • System integration• Biomimetistmo• Química verde• Ecologia industrial• Energias renováveis• Biotecnologia verde
ondaª6
1785 1845 1900 1950 1980-1990 2000-2020
64 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Assim, o aparecimento da energia a vapor possibi-
litou a emergência das ferrovias que, por sua vez,
possibilitou a criação de novas indústrias e novos
mercados de trabalho, assim como contribuíram
para diminuir os custos dos transportes e acelerar
o acesso das pessoas a produtos. A emergência do
motor à base de combustão interna abriu caminho
para o surgimento da indústria automotiva que,
por conseguinte, eliminou a indústria de transporte
animal. O aparecimento da indústria automotiva não
apenas gerou maior rapidez e conforto na mobili-
dade das pessoas, como também contribuiu para
fomentar outras indústrias como de autopeças, ser-
viços mecânicos, design, petróleo, turismo, entreteni-
mento e varejo, gerando assim novas oportunidades
de trabalho. O aparecimento da tecnologia digital
não apenas suprimiu várias atividades à base de
tecnologia analógica, como também abriu caminho
para inúmeras inovações em uma ampla gama de
áreas desde a manufatura industrial até a agricultu-
ra, fotografia, cinema e medicina.
O aparecimento da lâmpada elétrica, não ape-
nas destruiu a indústria de iluminação à base de
querosene, mas também possibilitou a emergência
de novas tecnologias e indústrias como as de ge-
ração, transmissão e distribuição de eletricidade
e o aparecimento dos produtos eletrodomésticos.
Esses e outros inúmeros exemplos de inovações
advindas do processo de destruição criativa têm,
em sua grande maioria, gerado grandes benefícios
à sociedade e ao crescimento e desenvolvimento
econômico de nações. Como o processo de inova-
ção, em nível macro, é marcado por ondas, a eco-
nomia está, de forma natural e saudável, sujeita a
ciclos de crescimento e crises. A inovação, por sua
vez, tem um importante papel neste processo.
Os motores desse processo são empreendedores
individuais, os empreendedores dentro de organi-
zações (gestores, engenheiros – assim chamados
empreendedores intra-corporativos) as médias e
pequenas empresas, assim como as grandes em-
presas locais e multinacionais. A inovação precisa
de recompensa, daí a economia dinâmica permitir
enormes lucros ao inovador.
No entanto, a perspectiva refletida na Figura 4.7
enfatiza as grandes inovações (as radicais) em de-
trimento de outros tipos de inovação, como as in-
crementais, cujas características serão comentadas
mais adiante neste documento. Durante as últimas
décadas tem havido um considerável interesse no
papel da inovação, sob uma perspectiva ampliada,
na competitividade e no crescimento econômico de
países. Por isso, a inovação industrial – da agricultu-
ra, manufatura e serviços – tem sido formalmente
inserida na agenda de políticas em diversas econo-
mias avançadas. Por exemplo no Reino Unido, mais
60% do crescimento econômico dos últimos anos
tem sido explicado pela inovação (Figura 4.8).
65CAPÍTULO 04 | IMPORTANTE PAPEL DA INDÚSTRIA NO CRESCIMENTO ECONÔMICO
63%
Existem duas fontes de crescimento econômico:
Crescimento econômico
Crescimento econômico anual da produtividade do trabalho no Reino Unido.
2000-2008
valor=2,24%
“A inovação representou 63% do crescimento econômico 2000-2008”
Inovação
Transformando idéias novas em realidade
Mais entradas
FIGURA 4.8
INOVAÇÃO COMO IMPULSIONADORA DO CRESCIMENTO ECONÔMICO – EVIDÊNCIA DO REINO UNIDO
Fonte: nesta.org.uk.
Portanto, a inovação industrial é capaz de desenca-
dear efeitos positivos significativos para o desenvol-
vimento socioeconômico de um país por meio de:
1 Amplas oportunidades para desenvolvimen-to tecnológico e inovação; oportunidades de explorar economias de escala;
2 Oportunidades de engajamento em cadeias globais de valor para produção e inovação industrial;
3 Oportunidades de conectar-se às atividades de produção e de inovação tecnológica nas indústrias agrícolas e de serviços;
4 O conhecimento tecnológico gerado na indústria de manufatura gera efeitos de transbordamento (spillovers) para outros setores da economia; e
5 É importante para a geração e aumento de capacidade exportadora e consequentemen-te de superávit comercial de um país.
A despeito da grande contribuição de J. Schum-
peter para o avanço de nosso entendimento
sobre o papel da inovação tecnológica no
crescimento industrial e progresso econômico de
países, o trabalho de Schumpeter, tem limita-
ções. Por exemplo, Schumpeter não examinou
o processo de inovação em nível de empresas.
Logo, Schumpeter não gerou explicações sobre
as características das organizações inovadoras.
Schumpeter também não se dedicou a estu-
dar atividades inovadoras que envolvem, por
exemplo, imitação, adaptações, aprimoramento
contínuo em processos e produtos – conhecidos
como inovações incrementais – como veremos
a seguir. Por fim, Schumpeter não se preocupou
com o processo de inovação em economias em
desenvolvimento e suas empresas. Tais limita-
ções foram mais tarde superadas por outros
estudos e abordagens, as quais serão exploradas
neste estudo.
66 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
05
67RESUMO EXECUTIVO
Por Dentro da Inovação: Uma Perspectiva Ampliada
68 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
05. Por Dentro da Inovação: Uma Perspectiva Ampliada Antes de apresentarmos uma definição para inova-
ção, é importante clarificarmos as distinções entre
termos correlatos, tais como descoberta e invenção.
Algumas Ideias Básicas17 DESCOBERTAS E INVENÇÕES
Na origem do processo de inovação tecnológi-
ca estão as invenções e as descobertas. Afinal,
descobre-se o que antes existia, embora para
nós desconhecido; inventa-se o que antes não
existia.18 Por exemplo, um pesquisador vai até
a floresta e encontra uma planta com proprie-
dades adoçantes, a stévia (Stevia rebaudiana).
Pesquisadores estudaram as
propriedades da planta em
laboratório e criaram uma
composição química capaz de
transformar as propriedades
adoçantes dessa planta em
um aditivo alimentar substitutivo do açúcar, o
aspartame. Assim, descobriu-se o que já existia (a
propriedade adoçante da planta). Criou-se algo
que não existia (o composto orgânico gerado em
laboratório). A empresa G.D. Searle & Company
transforma esse composto orgânico em um pro-
duto comercializado. Tem-se, portanto, inova-
ção. Porém, não há linearidade da descoberta à
inovação. Nem todas as invenções (ideias novas,
criativas e brilhantes) evoluem para inovação.
Atentemos para a natureza das invenções.
Há milhares de invenções para cada de tipo
atividade humana. Porém, invenção não significa
inovação, assim como nem toda invenção conduz
a uma inovação. Os árabes contribuíram ao
inventar a álgebra e os logaritmos e inventaram
a trigonometria desde os tempos de Hamurábi
(cerca de 1780 a.C.). No século sete, os árabes
inventaram o processo de saponificação, a partir
da fervura combinada de soda cáustica, gordura
animal e óleos vegetais. Mas foi apenas a partir
do século 19 que o sabão foi produzido indus-
trialmente com aplicação comercial. Os chineses
realizaram importantes avanços técnicos e foram
considerados líderes tecnológicos internacionais
durante os séculos cinco a nove, quando reali-
zaram vários inventos como a pólvora, o aço, o
papel, o barbeador, entre outros. Porém, eles não
conseguiram transformar muitas de suas inven-
ções em uso comercial, em progresso econômico.
Inovação ocorre somente quando a invenção atinge a etapa de comercialização e
inserção no mercado.
17. Figueiredo (2015).
18. Oxford (2004); Houaiss (2001).
69CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
DEFINIÇÃO DE INOVAÇÃO
Uma invenção é uma ideia, um esboço ou modelo
voltado para um dispositivo, produto, processo
ou sistema novo ou aperfeiçoado, que pode ser
patenteada, mas que não resulta necessariamen-
te em inovação tecnológica. Já a inovação, em
sentido econômico, emerge apenas quando
ocorre a primeira transação comercial envol-
vendo o novo produto, processo ou sistema.
Inovação ocorre somente quando a invenção
atinge a etapa de comercialização e inserção no
mercado. Portanto, existe uma cadeia não linear
de eventos desde a invenção até sua especificação
ou aplicação como inovação, o que frequentemen-
te envolve um caminho longo e arriscado.19
Por isso, invenções, ainda que envolvendo grande
sofisticação técnica e alto grau de criatividade,
não podem ser confundidas com inovações. Mais
especificamente, para que tenhamos inovação, de
fato, algumas condições precisam ser atendidas:
1 Novidade: A raiz do termo inovação vem do Latim ‘inovatus’ ou ‘inovare’, que significa fazer algo diferente. Porém, essa novidade pode ser relativizada, valendo-se da contri-buição do Manual de Oslo. Esta abordagem à inovação alinha-se com diversas correntes de trabalho, em particular, a pesquisa de longa data em sistemas de inovação em nível nacional, regional e setorial. É também incor-porada no trabalho em métodos de levanta-mento de inovação em sucessivas coletas à base do Manual de Oslo, que tem mostrado distinções entre as inovações que são:
• Novas à empresa ou à organização,
• Novas ao mercado ou à economia locais, e
• Novas para o mundo.
2 Aplicação prática e comercial. Um dos critérios-chave para o sucesso de inovações (tecnológicas) é o sucesso comercial em vez do técnico. Uma inovação bem-sucedida é aquela que retorna o investimento origi-nal em seu desenvolvimento e mais alguns retornos adicionais. Porém, essa aplicação
comercial pode ser relativizada. Há situações nas quais não se pode esperar uma aplicação estritamente comercial que conduz a lucro. Inovações no campo da saúde pública podem significar a criação de uma nova vacina a ser ofertada gratuitamente à população. Neste caso, há ‘lucro’ social em termos dos benefícios econômicos e sociais para o país, em termos da economia de custo advinda da prevenção de doenças, assim como para a produtividade. Nesta mesma linha, é possível termos inovações em serviços públicos, tais como tratamento de esgotos e saneamento básico, tratamento de resíduos, segurança e transporte públicos, sistemas de recolhimento de impostos. É preciso reiterar, portanto, que inovação representa a primeira introdução no mercado ou entrada em plena operação de produtos e serviços (incluindo serviços públicos). Algumas inovações podem ter vida muito curta (de alguns meses), como o Google Glass, por exemplo. Outras podem se tornar centenárias (por exemplo, o clips de papel, a aspirina, o automóvel, etc.).
3 Inovação deve demonstrar agregação de valor. Significa demonstrar diferenciação em relação ao que existe e/ou gerar algum bene-fício que ainda não é entregue por aquilo que existe. Tal valor adicionado pode se refletir em maior grau de satisfação a ser percebido pelos usuários de produtos, serviços e/ou processos industriais em termos de aumen-to de eficiência, produtividade, segurança, conforto, praticidade etc.
4 Atendimento a uma demanda. Associada à aplicação prática, a demanda é uma das prin-cipais diferenças entre invenção e inovação. Embora as invenções possam refletir alto grau de criatividade e sofisticação técnica, podem não estar relacionadas a nenhuma ne-cessidade existente ou potencial. Especifica-mente, uma inovação atende a uma demanda existente ou potencial: cria-se uma demanda para um benefício que ainda não se conhece, como foi o caso, por exemplo, da telefonia móvel, da Internet etc.
Para que tenhamos inovação, de fato, algumas condições precisam ser atendidas.
19. Freeman (1982).
70 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Por isso, inovação implica uma transformação de
uma ideia inventiva em um produto, serviço que
atenda às condições acima descritas. Como afir-
mava Schumpeter, o conhecimento tecnológico,
que dá origem a invenções, é altamente especia-
lizado e intrínseco. Isoladamente, rende muito
pouco. Ou seja, inovação implica unir diferentes
tipos e partes de conhecimento e transformá-los
em novos produtos e serviços úteis para o merca-
do ou para a sociedade. Assim é que ao longo da
história houve um espaço considerável de tempo
entre certas invenções, feitas por certos indiví-
duos, as quais foram transformadas em inovação
por outras pessoas e empresas. Por exemplo,
a lâmpada à base de filamento de carbono foi
inventada por Humphry Davy, em 1800. Porém,
apenas em 1879, após experimentos com milhares
de filamentos, Thomas Edison gerou um filamento
de carbono em lâmpada livre de oxigênio a qual
possuía vida longa e aplicabilidade comercial.
Thomas Edison, no entanto, obteve este feito à
base de intensos esforços e à base de tentativas
e erros. Na Tabela 5.1 a seguir podemos notar
alguns exemplos correlatos.
TABELA 5.1
BRECHAS DE TEMPO ENTRE INVENÇÕES E INOVAÇÕES
EXEMPLOS DE PRODUTOS INVENÇÃOINOVAÇÃO
(ANO QUE SE OBTEVE APLICAÇÃO COMERCIAL)
TURBINA HIDRÁULICA 1824 1880
MOTOR A GASOLINA 1860 1886
RÁDIO 1887 1922
INSULINA 1889 1922
FOGUETE 1903 1935
TELEVISÃO 1907 1936
PENICILINA 1922 1941
ESTREPTOMICINA 1921 1944
FOTOCÓPIA 1934 1950
TRANSISTOR (CHIP) 1940 1950
Fonte: adaptado de Christensen (2002) e Figueiredo (2015).
71CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
Assim, as inovações podem ocorrer em pelo menos
duas grandes esferas:
1 Técnica: quando há criação e/ou modifica-ções em produtos, equipamentos, máquinas e utensílios (hardware) em geral, software, serviços em suas mais variadas formas, assim como em medicamentos, desenvolvimento de novas variedades de sementes agrícolas etc.
2 Organizacional: quando há criação de e/ou modificações nas formas de organização a produção (por exemplo, Just-in-Time, kaizen), assim como novas formas de distribuição de produtos e serviços, novos arranjos orga-nizacionais. As inovações organizacionais também incluem novos modelos de negócio para a produção de um produto (por exemplo, lean manufacturing) ou para a prestação de um serviço (Grameen Bank; Uber).
Portanto, inovação é mais do que criatividade. É
a real implementação de novos produtos, servi-
ços, processos ou arranjos de
organização. Toda inovação
começa a partir de ideias criati-
vas. Assim, definimos inovação
como a implementação de
ideias criativas dentro de uma organização. Desta
maneira, a criatividade de indivíduos e grupos
representa um ponto de partida para a inovação. A
criatividade, portanto, é uma condição necessária,
mas não suficiente para a inovação. A existência de
inovação envolve mais do que a junção de várias
ideias criativas. Ideias devem ser colocadas em
prática para fazer uma diferença genuína, como,
por exemplo, a implementação de uma nova rotina
organizacional, de uma nova técnica de produção,
ou nova maneira de prestação de um serviço. As
diferenciações de tipos de inovação têm aparecido
desde a década de 1960, como nos mostra a Figura
5.1. A Tabela 5.2 contém a descrições dos tipos de
inovações indicadas na classificação apresentada.
As inovações podem ocor-rer em pelo menos duas grandes esferas: Técnica e organizacional.
Liderança mundial
AvançadaIncremental / Intermediária
BasicBELL &
FIGUEIREDO(2012)
Novidade para o mundo
Novidade para o país
Novidade para a empresa
OSLO MANUAL(1990S)
OBMODMOEMHOBDAY
E OUTROS(1995)
Pequenas e sistemáticas inovações (melhorias contínuas)
Grandes Inovações (novas instalações de
grandes equipamentos)
HOLLANDER(1965)
Fase Alpha
FaseBeta
ENOS(1962)
RadicalIncremental
FREEMANE OUTROS(VÁRIOS)
1980S
RadicalModularArquiteturalIncrementalHENDERSON
E CLARK(1990)
FIGURA 5.1
CLASSIFICAÇÕES DE INOVAÇÕES
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
72 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FASES ALFA E BETA
Trata-se de uma das primeiras classificações de inovação e seus impactos econô-micos. Foi sistemática por Enos (1962) a partir de observações de inovações em processo na indústria de petróleo. Ele distinguiu entre fase Alfa (a primeira intro-dução comercial de uma nova tecnologia baseada em princípios originais) e a fase Beta (aprimoramentos sucessivos nos processos que foram criados na fase Alfa).
GRANDES INOVAÇÕES (GRANDES INVESTIMENTOS EM NOVAS UNIDA-DES DE PRODUÇÃO) E PEQUENAS INOVAÇÕES (APRIMORAMENTOS CONTÍNUOS)
Hollander (1965) examinou aspectos da inovação da fase Beta de Enos. Baseou-se em evidencias de mudanças técnicas nos processos de produção nas fábricas da Du Pont durante trinta anos. Durante esse período, a empresa construiu várias novas fábricas. Ele demonstrou que a inovação do processo não dependia neces-sariamente de investimentos substanciais em novas instalações que incorporas-sem avanços tecnológicos. Em vez disso, uma sucessão de pequenas melhorias também poderia ser “projetada” em fábricas existentes. Ele também mostrou que uma proporção considerável de tal inovação poderia basear-se no estoque exis-tente de conhecimento da empresa por departamentos de engenharia e grupos técnicos intimamente associados à produção, e não no desenvolvimento de novos conhecimentos através de P&D formalmente organizados. A pesquisa de Hollan-der também demonstrou que as fábricas que implementaram aprimoramentos contínuos e sistemáticas obtiveram crescimento de produtividade maior do que as fábricas cujas inovações baseavam-se, em grande parte, em instalações de gran-des novos equipamentos.
INOVAÇÕES RADICAIS(BREAKTHROUGHS)
São inovações que estabelecem um conceito novo para o mercado mundial, em que novos componentes e elementos são combinados de uma forma diferente formando uma arquitetura nova, geralmente a partir de P&D. Essas inovações ten-dem a criar mercados e indústrias totalmente novos. De tempos em tempo surgem inovações desse tipo, que refletem grande esforço de P&DExemplos:
Telégrafo (1837); Biblioteca Pública Moderna (1850-1945 dependendo do país);Telefone (1876);Célula solar (1883);Turbina de vento (1887);Rádio comercial (1920); Televisão comercial (1936 Reino Unido, 1948 EUA);Impressora de computador (1938);Forno de micro-ondas (Década de 40);Software de processamento de texto (Final da década de 1960);Software de planilha (1962);Computador e laptop pessoais (1965);Chips microprocessadores (1968);Celulares (1973);Sistemas de posicionamento global (1973);Câmeras digitais (1975);The World Wide Web/Internet (1989);World Wide Web (1991);E-mail (1993);WiFi (1999 mas a tecnologia se origina em aproximadamente 1985);Facebook (2004); eYouTube (2005).
TABELA 5.2
ALGUMAS DEFINIÇÕES DOS TIPOS DE INOVAÇÃO
73CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
INOVAÇÕES ARQUITETURAIS Compreendem as alterações nas relações entre os componentes de um produto, sem alteração na sua tecnologia, design ou conceito. Por exemplo: a transformação de um ventilador de teto em ventilador de pé.
INOVAÇÕES MODULARES OU DE COMPONENTES
Envolvem alterações em componentes específicos de produtos (tecnologias con-tidas no produto), sem alterar o desenho completo nem mesmo a relação entre os componentes existentes. Por exemplo: a troca de uma porta em um computador que antes recebia um disquete 3½ para uma porta para receber uma USB (Uni-versal Serial Bus). Pode-se aplicar essa mesma noção para processos de produção, software, serviços.
INOVAÇÕES INCREMENTAIS Correspondem a melhorias e/ou modificações, em diferentes graus, em tecnolo-gias (produtos, processos, serviços) e sistemas de produção existentes, na forma de melhorias de eficiência, qualidade, velocidade etc.
OEM ODM OBM
Refere-se ao progresso da simples montagem (de tecnologia de terceiros) à con-quista do design e marcas próprios. Na condição de original equipment manufacturer (OEM), ou fabricante do equipamento original a empresa manufatura peças, pro-dutos e/ou subsistemas para uma empresa líder. Na condição de own design manu-facturer (ou fabricante com design próprio), a empresa evolui de simples montador para a sua própria tecnologia de design. Em own-brand manufacturer (ou fabricante com marca própria) a empresa opera no mercado (mundial) com sua própria tec-nologia e marca. Um dos exemplos clássicos desses tipos de inovação, é a empresa Acer que evoluiu de uma simples OEM para uma OBM global.
NOVIDADES PARA A EMPRESA, ECONOMIA LOCAL, E MUNDO
Trata-se de uma relativização do grau de novidade das inovações, elaboradas pelo Manual de Oslo. Aponta como requisito mínimo para se considerar inovação a condição de “nova para a empresa”. Além desse nível, considera o que “nova para o mercado ou economia” e “novo para o mundo”. O Manual de Oslo também con-tribuiu para expandir a noção de inovação para além do âmbito técnico: passou a incluir inovações organizacionais, de marketing, e finanças.
ESCALA DE INOVAÇÕES E CORRESPONDENTES CAPACIDADES TECNOLÓGICAS
A partir de Lall (1992), Bell & Pavitt (1995) e Figueiredo (2001), Bell & Figuei-redo (2012) refinaram uma escala de capacidades tecnológicas inovadoras que varia de nível básico (inovações incrementais básicas) a níveis de breakthrough (liderança mundial).
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
74 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
BOXE 2
INOVAÇÕES DE RUPTURA
As inovações de ruptura implicam a geração de um produto, processo, serviço novo para o mundo geralmente a partir do re-desenho de tecnologias existentes. Com isso, tende a abrir novos segmentos de mercado e pop-ularizar ou democratizar inovações antes de difícil acesso pela grande população. É importante notar que as “rupturas” em certas indústrias não são geradas apenas pelas inovações do tipo radical ou breakthrough. As rupturas também podem advir de inovações que envolvem recombinações de tecnologias existentes, por meio, por exemplo, de inovações arquiteturais combinadas com modulares e/ou incrementais. Por exemplo, o processo de miniaturização do rádio foi realizado por Sony quando licenciava tecnologia da RCA. Com base nesse processo de inovação, Sony evoluiu para o Walk-man, que representou a criação a mobilidade. Isto, por sua vez, levou a uma ruptura na indústria fonográfica. Envolvem o re-desenho no intuito de se obter simplificação e diminuição dos custos de produtos e serviços existentes. Envolvem a abertura de novos segmentos ou nichos de mercado. Com isso, as inovações de ruptura contribuem para a popularização e democratização de certas inovações. Um dos exemplos mais conhecidos, como mencionado por Clayton Christensen, refere-se à enorme popularização dos computadores: dos mainframes, caros e inacessíveis das décadas de 1950 e 1960, aos desktops dos anos 1980 e 1990 e, posteriormente, aos laptops, notebooks e subsequentemente aos smart phones e tablets. Um conceito similar ao de inovação de ruptura refere-se à inovação ‘de custo’ ou ‘frugal’. Refere-se ao re-desenho de produtos e serviços no intuito de barateamento de seu preço para possibilitar o seu consumo pela população de baixa renda. Algumas inovações do tipo ‘frugal’ ou ‘de custo’ podem ser consideradas de ruptura. Um dos exemplos mais con-hecidos refere-se ao NanoCar, da Tata Motors, da Índia e também o eletrocardiograma portátil, criado pela GE da Índia, além do serviço bancário nos telefones celulares, criado pela M-Pesa/Vodaphone, no Quênia.
As classificações apresentadas acima sugerem, por-
tanto, que a inovação deveria ser entendida como
um processo e não como eventos isolados, como
mostra a Figura 5.2. A ideia de inovação transcende
as perspectivas limitadas que a equiparam somente
a atividades altamente complexas derivadas de
esforço científico em sofisticados laboratórios de
pesquisa e desenvolvimento (P&D). Assim, uma
ampla ideia de inovação abrange a implementação
de mudanças em produtos/serviços, processos
e sistemas organizacionais e gerenciais – da
iniciação à adaptação menor para a avançada. As
atividades incluem imitação duplicativa, imitação
criativa, até as mais sofisticas ações de design e
desenvolvimento à base de engenharia e P&D. Essas
atividades podem ter graus de novidade que variam
de novas para a empresa a novas para a economia,
como também para o mercado internacional.
Desse modo, e reiterando, a inovação consiste em
um processo e não em simples episódios. Inovação
não é um ponto de chegada, mas um processo.
Esse processo envolve a resolução de problemas
em torno de tipos diferentes de atividade, os quais
contam com o estoque de capacidades das organi-
zações. Nas economias em desenvolvimento, gran-
de parte das atividades inovadoras não se origina
de P&D, nem se relaciona a atividades patentárias.
Derivam de vários esforços de engenharia, design
e atividades relacionadas (non-R&D innovations).
No entanto, em muitos casos, essas atividades de
inovação podem ser uma base e precondição para
avanços para atividades de P&D de classe mundial.
Essas atividades inovadoras podem ocorrer na
esfera técnica, como, por exemplo, em produtos,
A inovação de-veria ser enten-
dida como um processo e não como eventos
isolados.
É importante esclarecer a natureza e a impor-
tância das inovações de ruptura, conforme
mostrado no Boxe 2.
75CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
serviços, processos de produção de produtos e/ou
serviços, software, máquinas e equipamentos. Tam-
bém podem ocorrer na esfera organizacional, tais
como: novos modelos de negócio, novas maneiras
de organizar a produção, comercializar e distribuir
bens e serviços, novos arranjos e rotinas organi-
zacionais. Como base na perspectiva de inovação
como um processo, e na Figura 5.2, não deveríamos
classificar empresas (ou países) segundo uma pers-
pectiva “binária” de “inovadora” e “não inovadora”.
Tal classificação é limitada e equivocada. Logo, seria
um equívoco tratar a “imitação” como algo separa-
do ou mesmo “inferior” à inovação. Na verdade, a
imitação é parte do processo de inovação.
FIGURA 5.2
INOVAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DE UM ESPECTRO DE ATIVIDADES
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
Aliás, essa perspectiva de inovação como um
contínuo de atividades com crescentes graus
de complexidade e novidade é particularmente
importante para a compreensão do processo de
inovação em empresas que operam em economias
em desenvolvimento e emergentes. Assim, as
atividades relativas ao extremo direito da Figura
5.2 (que são mais convencionalmente associadas à
inovação) representam, de fato, apenas uma fra-
ção da inovação, ou a ‘ponta do iceberg’ (Figura
5.3). Há uma ampla variedade de inovações que
podem ser ocultas (hidden innovations) em função
da ênfase exacerbada em atividades que, de fato,
representam uma fração da inovação.
É desejável a migração dos níveis de imitação duplicativa para os mais
sofisticados níveis de P&D, engenharia e patenteamento
IMITAÇÃO duplicativa
ADAPTAÇÃO relativamente
simples (inovações,
incrementais
básicas/
intermediárias)
MODIFICAÇÃO relativamente
complexa
(inovações
modulares e
arquiteturais)
DESIGN E DESENVOLVIMENTO original - via P&D +
Engenharia (E)
CRIAÇÃO DE NOVAS
TECNOLOGIAS E SISTEMAS
DE PRODUÇÃO
(breakthroughs) -
via P&D +
Engenharia (E)
DESIGN E DESENVOLVIMENTO
não original
via P&D +
Engenharia (E)
MODIFICAÇÃO relativamente
complexa
(inovações
incrementais
avançadas)
IMITAÇÃO criativa
Grande parte das inovações exitosas ao redor do
mundo tem derivado de recombinações de
tecnologias existentes (mudanças incrementais) Contrafações são
cópias que carregam o mesmo nome de marca
ou marca de fábrica que o produto original.
São tentativas de roubar o inovador de
lucros vencidos. Falsificações são
estritamente ilegais.
CONTRAFAÇÕES OU PIRATARIA DE PRODUTOS
ILEGAL
CLONES
Meras replicações de produtos existentes. A
ausência ou expiração de patentes, copyrights e
marca comercial fazem essas cópias serem legais.
Tipicamente, clones vendem os mesmos
produtos básicos que o original, mas por um valor
mais baixo e sem a prestigiosa marca.
LEGAL Porém sem propósito de
aprendizado
ESPECTRO DE ATIVIDADES INOVADORAS
76 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
IMITAÇÃO
ADAPTAÇÃO
MODIFICAÇÃO
DESIGN E DESENVOLVIMENTO
CONTRAFAÇÕES E CÓPIAS
01Falsificações são cópias que carregam o
mesmo nome de marca ou marca de fábrica
que o produto original. São tentativas de
roubar o inovador de lucros vencidos.
Falsificações são estritamente ilegais.
10P&D + patentes
P&D E PATENTES
09Design original e desenvolvido via
P&D + Engenharia (E)
08Design original e não desenvolvido via
P&D + Engenharia (E)
06Modificação relativamente complexa
(Inovação
incremental avançada)
05Adaptação relativamente simples
(inovação incremental
básica/ intermediária)
04Imitação criativa
03Imitação duplicativa
02Meras replicações de produtos existentes.
A ausência ou expiração de patentes,
copyrights e marca comercial fazem essas
cópias serem legais. Tipicamente, clones
vendem os mesmos produtos básicos que
o original, mas por um valor mais baixo e
sem a prestigiosa marca.
Modificação relativamente complexa
(inovação modular
e arquitetônica)
07
FIGURA 5.3
AMPLITUDE DAS ATIVIDADES INOVADORAS
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015)
77CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
Reiterando, as atividades de imitação podem ser
precondições para a implementação de atividades
mais sofisticadas de engenharia e P&D, incluindo
atividade patentária. Por fim, é importante lembrar
que esforços em ciência (atividades realizadas
em laboratórios de universidades e institutos de
pesquisa) não deveriam ser confundidos com
atividades inovadoras. Há muitas atividades tec-
nológicas significativamente inovadoras que não
dependem de ciência. De fato, grande parte das
inovações mais importantes dos últimos 50 anos
teve origem em recombinações de tecnologias
existentes. Essas recombinações foram realizadas
por engenheiros e técnicos especializados em áreas
diversas que não o laboratório de P&D, inclusive no
piso de fábrica.
Consequentemente, um amplo espectro de
diferentes níveis de inovação seria mais realístico,
especialmente levando em consideração a natureza
tecnológica das empresas de economias em desen-
volvimento (como mostrado na Figura 5.2). Cer-
tamente, todas as inovações envolvem um grau de
novidade. Entretanto, atividades inovadoras à base
de avanços consideráveis nem sempre derivam de
sofisticados laboratórios de P&D, realizadas em câ-
maras super limpas por pessoas de jalecos brancos
olhando microscópios ou telescópios ultrassofisti-
cados ou aceleradores de partículas ou envolvidas
com o desenho e a produção de produtos altamen-
te sofisticados, como grandes naves espaciais ou
simuladores de voo.
Tais mitos sobre a inovação
refletem uma ideia limitada
de atividades inovadoras em
todos os tipos de empresa.
Podem também conduzir
a processos de tomada de
decisão errados relativos à
atividade industrial. Reiteran-
do, sabe-se que até mesmo as atividades à base
de P&D e atividades patentárias representam
apenas uma fração do processo de inovação.
Mesmo nas economias avan-
çadas, há um consenso de que
gastos e estruturas de P&D e
atividades patentárias não re-
presentam proxies realistas de
atividades de inovação. Mas,
até mesmo as atividades de
P&D, podem ser consideradas
à base de diferentes estágios
ou graus crescentes de novi-
dade e de complexidade (Tabela 5.3). Mesmo nas
economias avançadas, a maioria das inovações
implementadas não é de natureza “radical”, como
mostrado na seção seguinte.
Grande parte das inovações mais importantes dos últi-mos 50 anos teve origem em recombinações de tecnolo-gias existentes.
Um amplo espectro de diferentes níveis de inovação seria mais realístico, especial-mente levando em conside-ração a natureza tecnológica das empresas de economias em desenvolvimento.
Mesmo nas economias avançadas, há um consenso de que gastos e estruturas de P&D e atividades patentárias não representam proxies realistas de atividades de inovação.
78 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
TABELA 5.3
DIFERENTES GRAUS DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO (P&D)
CARACTERÍSTICASCIÊNCIA
PURA (1)
PESQUISA BÁSICA
(2)
PESQUISA APLICADA
(3)
DESENVOLTIMENTO EXPLORATÓRIO
(4)
DESENVOLTIMENTO AVANÇADO
(5)
PROPÓSITO DA BUSCA/PESQUISA
Descobrir novo princípio científico
Novo conhe-cimento para produto/pro-cesso radical-mente novo e comercializável, com aplicações desconhecidas e difusas.
Identificação e explicação para fenômenos e pro-blemas relaciona-dos a demandas específicas.
Implementar um con-ceito existente, por exemplo um sistema de engenharia.
Redução de custos, reso-lução de problemas em processos de produção.
PRODUTO
Propriedade intelectual (PI) baseada em conceitos (patentes)
PI baseada em produto para transferência para (3) e (4).
Produto diferen-ciado para mer-cados específico.
Design ou protótipo de produto detalhado.
Produto de fabricação.
MEDIDA DE DE-SEMPENHO
PIPI baseada em produto
Produto dife-renciado/nicho com IP.
Resultados do mercado (por exemplo, time-to--market)
Resultados de mercado (por exemplo, redução de número de defeitos ou rejeições)
HORIZONTE TEM-PORAL (TEÓRICO)
Longo prazo Médio prazoMédio/curto prazo
Curto prazo Imediato
QUALIFICAÇÕES E HABILIDADES NE-CESSÁRIAS
Doutorado em ciências fundamentais, matemática e engenharia.
O mesmo que (1) porém com experiência de gestão e super-visão.
Profissionais ba-charéis, mestra-do e doutorado com experiência e sólido treina-mento.
Mesmo que (3), porém doutorado é desneces-sário.
Mesmo que (4), além de habilidades de gestão relacionadas a pessoas, processos de desenvol-vimento de produtos e processos de produção.
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
A Importância Relativa dos Diferentes Tipos de Inovação20 Para fins analíticos e de políticas públicas é relevan-
te abordarmos, ainda que brevemente, a “impor-
tância” relativa de diferentes tipos de inovação.
Para isso, é necessária combinação de dois pontos:
1 O típico “significado” social ou econômico de determinados tipos de inovação (por exem-plo, alinhando-se aos estudos anteriores de Enos e Hollander e
2 A frequência típica com que esses tipos ocor-rem, ou seja, a sua incidência. Mas, na prática, é impossível fornecer essa imagem, mesmo na forma mais incompleta. Apesar do uso fre-quente de distinções entre tipos de inovação por muitos anos, a informação sobre seu “sig-nificado” relativo é rara. Tem havido pouca ou nenhuma evidência sobre a real incidência dos diferentes tipos de inovação.
20. Bell & Figueiredo (2012).
79CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
Essa ausência de evidências tem deixado um espaço
a ser preenchido por especulações. Grande parte da
literatura sobre inovação nas economias avançadas
tem centrado nos tipos de inovação assim chamadas
“de nível superior” (“radical”, “novo para o mundo”,
“breakthrough” e assim por diante) e também tem
concentrado a sua atenção nos tipos específicos de
indústrias (as assim chamadas de “alta tecnologia”),
tais como produtos farmacêuticos ou semicondu-
tores. Muito menos atenção tem sido dada à parte
esquerda do espectro da Figura 5.2 (inovações de
natureza “incremental” e tipos similares).
Estas, e as indústrias nas quais se assume que tais
inovações predominam, passaram a ser vistas, por
acadêmicos e tomadores de decisão de políticas
públicas, como menos importantes. Tais pers-
pectivas também têm influenciado tomadores de
decisão nos países em desenvolvimento. Essas
perspectivas geralmente estão associadas a pontos
de vista sobre uma divisão estrutural clara entre
a inovação em países desenvolvidos e em desen-
volvimento: os primeiros seriam responsáveis por
inovações radicais (breakthrough), enquanto que os
países em desenvolvimento, na melhor das hipóte-
ses, responderiam apenas por inovações incremen-
tais e outros tipos de inovação “inferiores” no outro
extremo esquerdo da Figura 5.2.21
De forma não surpreendente, grande parte da
agenda política de tecnologia e inovação passou a
ser focada na mudança dessa divisão estrutural –
principalmente buscando estabelecer uma maior
presença nos tipos de inovação “mais importantes”
– extremo direito da Figura 5.2. Tal perspectiva tem
sido implementada por meio de uma considerável
concentração de recursos públicos na construção
de tipos particulares de capacidades tecnológicas
(e organizacionais), institucionais e humanas consi-
deradas necessárias. Especificamente, isto é feito
por meio de canalização de recursos para uni-
versidades e institutos de pesquisa. Espera-se
que estes gerem avanços técnico-científicos de
natureza “radical” que fluirão para a indústria.
Ocorre que, como será mostrado adiante, grande
parte das inovações tecnológicas não depende de
ciência. Muito menos atenção tem sido dada ao
fortalecimento das capacidades de inovação no
lado esquerdo do espectro da Figura 5.1.2 e ao
aumento cumulativo das capacidades nessa base.
Esta diferença de ênfase importa, pois envolve
diferentes tipos de recursos organizacionais,
institucionais, humanos e financeiros.
Em grande parte, a primeira abordagem (ênfase em
inovações de natureza “radical”) tem exigido a alo-
cação substancial de recursos para a construção de
capacidades de inovação em organizações públicas
centralizadas, como universidades e institutos de
pesquisa. A segunda (inovações de natureza “incre-
mental”) envolve construir capacidades de inovação
muito mais dispersas em nível de indústrias e em-
presas. Isso não é um contraste entre as alternativas
políticas. Trata-se de um desequilíbrio em comple-
mentos. Em particular, entre as várias formas de
complementaridade, os lócus disperso e centrado
em empresas para acumular capacidades pro-
fundas para os tipos de inovação com variados
graus de novidade e complexidade (incluindo
as “radicais”) é um complemento necessário à
acumulação de tais capacidades em organizações
como universidades e institutos de pesquisa.
Felizmente, com aparecimento dos surveys de
inovação é possível olhar pelo menos um pouco mais
de perto, ainda que de forma não tão adequada, no
aspecto da importância de diferentes tipos de inova-
ção e no aspecto das ações de complementariedade
entre os tipos de inovação, mencionadas acima.
Embora se possa dizer pouco sobre a “significância”
de diferentes tipos de inovação, o crescente número
de dados dos surveys de inovação nos permite fazer
um pouco melhor do que meramente especular so-
bre a incidência relativa de certos tipos de inovação.
Entre esses surveys, o do Canadá é particularmente
útil a este respeito porque as questões do survey se
concentram intensamente nas inovações “mais im-
portantes” em nível das empresas durante o período
do survey. A Tabela 5.4 abaixo mostra resultados
referentes a empresas canadenses da indústria de
manufatura no período 1997-1999.
Grande parte das inovações tecnológicas não depende de ciência.
21. Tal perspectiva é defendida por autores como Viotti (2002).
80 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
TABELA 5.4
INCIDÊNCIA E TIPOS DE INOVAÇÃO ENTRE EMPRESAS CANADENSES
EMPRESAS QUE SE DECLARARAM INOVADORAS (SIM) E NÃO INOVADORAS (*):
DO CONJUNTO TO-TAL DE EMPRESAS PARTICIPANTES DO CENSO
NÃO20%
SIM80%
NOVAS PARA A EMPRESA:
NOVAS PARA O CANADÁ:
NOVA PARA O MUNDO: NÃO SABEM:
DO CONJUNTO DE EMPRESAS QUE SE DECLARARAM ‘INOVADORAS’ (‘SIM, ACIMA) OS GRAUS DE NOVIDADE DE SUAS INOVAÇÕES MAIS IMPORTANTES ERAM
50% 20% 12% 18%
Nota: (*) Uma empresa inovadora foi aquela que implementou algum tipo de mudança significativa em atividades de produto. As modificações menores ou estéticas em produtos foram excluídas.
Fontes: Canada Statistics (2005) e Bell & Figueiredo (2012).
Com relação às evidencias da Tabela 5.4 nos
mostram que:
1 Embora uma “inovação” tenha sido definida de forma bastante abrangente para cobrir a maior parte do espectro de diferentes tipos discutidos acima (Figura 5.2), cerca de um quinto das empresas não introduziu nenhum tipo de inovação de produto ou processo dentro desse espectro durante o período de três anos do survey.
2 Entre os 80% das empresas que o fizeram, cer-ca de metade delas relatou que sua inovação “mais importante” era apenas nova para a própria empresa (natureza incremental), nem mesmo “nova para o Canadá”, muito menos “nova para o mundo”. Somente 12% produziram inovações “novas para o mundo”.
3 Cerca de 60% de todas as empresas manufatu-reiras do Canadá não inovaram, exceto talvez realizaram algumas pequenas modificações, ou produziram como suas inovações mais impor-tantes apenas aquelas que eram “novas para a empresa”. Ou seja, quase dois terços das
empresas canadenses se engajaram apenas nos tipos de atividade inovadora incremen-tal. Tais atividades inovadoras incrementais são comumente consideradas como aquelas que prevalecem nos países em desenvolvimento.
4 Vale ressaltar que, segundo este survey, apenas um décimo das empresas canadenses decla-raram que a sua inovação mais importante era “nova para o mundo”.
No entanto, existem diferenças consideráveis entre
países, em termos da agregação nacional, de diferen-
tes tipos de atividade inovadora. Isto está ilustrado
na Tabela 5.5 com relação a um corte transversal do
survey de países selecionados da União Europeia (UE)
em diferentes níveis de PIB per capita. Esse survey
usa indicadores da incidência de apenas dois tipos de
inovação para o período do survey (2002-2004):
1 A proporção de empresas com “atividade de inovação” e
2 A proporção de todas as empresas que intro-duziram produtos novos ou melhorados, cujo grau de novidade eram “novos no mercado”.
81CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
A incidência de ambas as categorias de atividade
inovadora aumenta mais ou menos em linha com o
aumento do PIB per capita: de 20% e 5%, respec-
tivamente, na Romênia para cerca de 50% e 26%
na Suécia e 65-18% na Alemanha.
TABELA 5.5
INCIDÊNCIA DA ATIVIDADE DE INOVAÇÃO: PAÍSES SELECIONADOS DA UE (2002-2004)
PAÍSES SELECIONADOS PIB PER CAPITA (USD)
MÉDIA DURANTE PERÍODO 2002-2004
EMPRESAS COM ATIVIDADES
INOVADORAS*
EMPRESAS CUJAS ATIVIDADES
INOVADORAS EM PRODUTOS SÃO “NOVAS PARA O
MERCADO”*
ALEMANHA 26,134 65% 18%
SUÉCIA 27,782 50% 26%
FINLÂNDIA 27,586 43% 21%
ITÁLIA 26,240 36% 11%
PORTUGAL 18,849 43% 21%
POLÔNIA 11,608 25% 11%
ROMÊNIA 7,193 20% 5%
* - Como uma proporção de todas as empresas.
Fontes: Eurostat (2005) e Bell & Figueiredo (2012).
Assim, uma noção de “catch-up tecnológico” em ati-
vidades inovadoras (e que reflete o grau de capaci-
dade tecnológica) poderia, portanto, ser vista como
um movimento meramente ascendente através
de diferentes níveis de incidência de vários tipos
de inovação de acordo Tabela 5.5. Neste caso, dos
padrões de incidência da Romênia para os padrões
sueco-alemão. Mas essa interpretação é simplista.
Por trás dessas diferenças entre países (e entre ní-
veis de renda) em termos da incidência de diferen-
tes tipos de inovação, há diferenças consideráveis
dentro de cada país e entre as indústrias.
Isso está ilustrado na Tabela 5.6, que se concentra
novamente no Canadá. As diferenças são espe-
cialmente consideráveis em relação às inovações
“novas para o mundo”. Em algumas indústrias, tais
como serrarias, fabricantes de móveis e confecções
de fabricação de roupas, apenas cerca de 3 a 7%
das empresas introduziram essas inovações. Mas,
no outro extremo do espectro, em indústrias como
maquinaria industrial, instrumentos ou equipamen-
tos de informática, a proporção de empresas que
realizaram inovações “novas para o mundo” era
cinco ou seis vezes maior. A incidência de inova-
ções de tipo “nova para o Canadá” também diferiu
amplamente entre os setores industriais. Por con-
seguinte, apenas cerca de 10 a 20% das empresas
nas indústrias mais maduras introduziram qualquer
um destes dois tipos de inovação, enquanto que
40 a 50% das empresas o fizeram nas indústrias no
outro extremo do espectro.
82 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
TABELA 5.6
INCIDÊNCIA DE ATIVIDADES DE INOVAÇÃO: EMPRESAS CANADENSES POR TIPO DE INDÚSTRIA
INDÚSTRIAS DE MANUFATURA
SELECIONADAS (*)
PROPORÇÃO DE TODAS AS EMPRESAS EM CADA INDÚSTRIA (1997-1999)
INOVADORAS (**) CUJAS INOVAÇÕES MAIS IMPORTANTES ERAM NOVAS
CANADÁ (%)
MUNDO (%)
AMBOS (%)
SERRARIAS E PRESER-VAÇÃO DA MADEIRA
73,6 4,6 3,0 7,6
FABRICAÇÃO DE VESTUÁRIO
69,7 7,0 4,2 11,2
FABRICAÇÃO DE MÓ-VEIS E PRODUTOS
81,9 13,2 6,6 19,7
FABRICAÇÃO DE METAIS PRIMÁRIOS
75,7 16,3 5,7 22,0
FABRICAÇÃO DE ALIMENTOS
80,5 17,7 4,5 22,2
FABRICAÇÃO DE PAPEL
77,9 19,5 5,1 24,6
FOLHEADO, MADEIRA COMPENSADA E PRODUTOS DE MADEIRA PROJETADA
64,9 15,1 12,5 27,6
VEÍCULOS A MOTOR, CHASSIS E AUTOPEÇAS
78,6 19,4 10,8 30,3
FABRICAÇÃO DE MÁQUINAS
86,9 18,5 14,2 32,7
FABRICAÇÃO DE PRODUTOS QUÍMICOS
87,7 19,6 13,3 32,9
TÊXTIL 85,8 23,8 11,6 35,3
AGRICULTURA, MINE-RAÇÃO E MÁQUINAS INDUSTRIAIS
88,0 16,8 26,0 42,8
FABRICAÇÃO DE EQUIPAMENTOS DE COMUNICAÇÃO
91,5 17,1 27,1 44,2
INSTRUMENTOS, MÍ-DIAS MAGNÉTICAS E ÓPTICAS
91,3 14,7 30,8 45,5
COMPUTADORES E EQUIPAMENTOS PERIFÉRICOS
95,6 22,2 27,4 49,6
TOTAL INDÚSTRIA MANUFATUREITA
80,2 16,3 9,6 25,9
Nota: (*) Indústrias selecionadas para ilustrar os tipos de indústria envolvidos em diferentes segmentos da ampla diversidade interindustrial de inovação. (**) Uma empresa inovadora foi aquela que implementou algum tipo de mudança significativa em atividades de produto. As modificações menores ou estéticas em produtos foram excluídas.
Fontes: Canada Statistics (2005) e Bell & Figueiredo (2012).
83CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
Esses padrões de diferenças entre indústrias
em termos da incidência de diferentes tipos
de inovação também são evidentes em outros
países. No entanto, é necessário um cuidado
considerável para criar distinções indevidamente
acentuadas entre as indústrias supostamente
consideradas “de baixa tecnologia”, como aquelas
para o topo da Tabela 5.6 e as indústrias assim-
-denominadas de “alta tecnologia” em direção à
parte inferior da Tabela 5.6. É claro que, por trás
dessas generalizações agregadas, existe uma
diversidade considerável em ambos os tipos
de indústria. Em particular, escondidos por
trás das características médias de “baixa e mé-
dia tecnologia”, esses setores incluem empre-
sas com consideráveis capacidades inovadoras
que realizam novos tipos de inovação.22 O
desenvolvimento de capacidades inovadoras em
tais indústrias de baixa tecnologia pode ser ex-
tremamente importante como parte do processo
de catch-up tecnológico.
No entanto, a ideia catch-up tecnológico para
atividades inovadoras em nível do país não
deve ser vista apenas como uma questão de
aumentar a incidência de inovação “dentro” de
empresas e indústrias na estrutura existente
da economia. Trata-se também de “mudar a
estrutura” da economia para uma proporção
cada vez maior de atividade econômica em seto-
res tipicamente associados a níveis de atividade
inovadora relativamente altos.
Assim, para alcançar a intensidade de inovação
agregada de certas economias avançadas, como
mostrado anteriormente na Tabela 5.5, econo-
mias em desenvolvimento precisariam passar
por dois tipos de processo:
1 Aumentar a proporção de empresas inovado-ras em uma quantidade considerável de indús-trias para os níveis em países como a Suécia e a Alemanha, e
2 Mudar a estrutura da indústria (a transforma-ção e as intensivas em recursos naturais) para a composição que existe nesses países – ou seja, reduzir a participação das indústrias de alto valor agregado. Tal processo envolve, im-plicitamente, a noção de diversificação das atividades industriais, especialmente em indústrias intensivas em recursos naturais.
Este estudo está mais preocu-
pado com o primeiro desses
processos: como as empresas
aumentam o grau de inovação
daquilo que elas produzem.
Mas uma importante ressalva
ou qualificação é preciso ser
feita. Trata-se da maneira como
se explora essa questão neste
estudo. No restante deste documento, será dada
uma atenção e ênfase crescente à acumulação de
capacidades para reduzir e/ou fechar as brechas
com as fronteiras de inovação tecnológicas exis-
tentes ou mesmo abrir novas direções e segmentos
tecnológicos na fronteira internacional de inovação.
É necessário um cuidado considerável para criar dis-tinções indevidamente acen-tuadas entre as indústrias supostamente consideradas “de baixa tecnologia e as in-dústrias assim-denominadas de “alta tecnologia.
Escondidos por trás das ca-racterísticas médias de “baixa e média tecnologia”, esses setores incluem empresas com consideráveis capacida-des inovadoras que realizam novos tipos de inovação.
A ideia catch-up tecnológico para atividades inova-doras em nível do país não deve ser vista apenas como uma questão de aumentar a incidência de ino-vação “dentro” de empresas e indústrias na estrutu-ra existente da economia.
22. von Tunzelmann e Acha (2005), Figueiredo (2010).
84 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Em outras palavras, será dada
ênfase crescente à acumula-
ção de capacidades para os
tipos de inovação “novos para
o mercado” e “novos para o
mundo”. Ao fazê-lo, será im-
portante ter em mente um dos principais pontos
aqui destacados: mesmo nas economias avan-
çadas, os tipos de inovação do tipo “radical’ ou
“breakthrough” são uma proporção bastante
pequena do total. De modo correspondente, a
baixa incidência de inovações incrementais (“no-
vas para a empresa”) está associada ao baixo grau
de desenvolvimento industrial nas economias em
desenvolvimento, assim como a baixa incidência
das inovações do tipo “novas para o mundo”. Estas
últimas (as inovações “novas para o mundo” ou
as “radicais”) podem ser mais glamorosas e mais
contempladas em estudos acadêmicos. Porém,
aumentar a incidência das inovações “novas
para a empresa” e “novas para a economia”
pode contribuir mais para o aumento da renda
média de economias em desenvolvimento.
Mesmo nas economias avan-çadas, os tipos de inovação
do tipo “radical’ ou “break-through” são uma proporção
bastante pequena do total.
Temos constatado em diversos tipos de empresas,
indústrias e países, que o processo de inovação cada
vez mais transcende as fron-teiras da organização.
Aumentar a incidência das inovações “novas para a empresa” e “novas para a economia” pode contribuir
mais para o aumento da renda média de economias em desenvolvimento.
Interdependência no Processo de Inovação23 As atividades inovadoras emergem a partir de
processo de inovação. Segundo o clássico artigo
de Giovanni Dosi24 o processo inovador possui
propriedades típicas. Dentre essas propriedades,
destaca-se à forte interdependência no processo
de inovação. Temos constatado em diversos tipos
de empresas, indústrias e países, que o processo
de inovação cada vez mais transcende as fron-
teiras da organização. Até a
década de 1980, era comum
que várias empresas grandes
(“auto-suficientes” em tec-
nologia) concentrassem suas
atividades inovadoras dentro
de suas fronteiras com base
em grandes e robustas áreas
próprias de P&D e engenharia, em um processo
conhecimento como “inovação fechada”. Grandes
organizações inovadoras, dentre elas destacam-
-se exemplos emblemáticos tais como IBM, AT&T,
Bell Labs e Xerox (no Brasil, a Aços Villares por
exemplo), que durante as décadas de 1970 e 1980
eram consideradas ícones de inovação, objeti-
vavam lucrar a partir de seus próprios recursos
de P&D e engenharia. Mas o processo inovação
também tendia a ser concentrado em nível de
países, especialmente em nível das matrizes de
empresas multinacionais (EMNs). Suas estratégias
de inovação objetivavam lucrar individualmente
a partir de suas próprias atividades consideradas
pioneiras de P&D e sua propriedade intelectual.
Ocorre que a partir dos anos 1990 importantes
mudanças contribuíram para tornar o processo de
inovação menos confinado às fronteiras de uma
organização. Entre tais mudanças destacam-se:
1 Crescente necessidade de incorporar conte-údo tecnológicos mais criativos em produtos, processos de produção, e serviços a uma veloci-dade cada vez maior para atender o mercado global cada vez mais interconectado;
2 Constatação de que empresas, ainda que gran-des e com robustas áreas de P&D não teriam capacidade de realizar inovações sozinhas;
23. Chesbrough (2003); Bell & Figueiredo (2012)
24. Dosi (1988).
85CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
3 A intensificação da mobilidade de cérebros ao redor do mundo, a dificuldade de reter talentos dentro de organizações específicas;
4 A crescente importância de economias emer-gentes e em desenvolvimento que passaram a fornecer um maior contingente de talentos e profissionais qualificados em diversas áreas, assim como instituições habilitadas a apoiar importantes atividades inovadoras em várias economias emergentes; e
5 O fortalecimento dos sistemas de inovação nas economias emergentes, que passaram a atrair atividades inovadoras de EMNs.
Tais mudanças têm contribuído, de um lado, para
uma fragmentação intra-firma e internacional
do processo de inovação. Ou seja, empresas
multinacionais concluíram que é mais inteligente e
lucrativo descentralizar suas atividades inovado-
ras, incluindo as de P&D, além de sua sede para
algumas economias emergentes e aproveitar o es-
toque de criatividade desses países. Por exemplo,
hoje sabemos que várias empresas multinacionais
possuem centros globais responsáveis pelo dese-
nho e desenvolvimento de produtos e serviços em
nível global. Por exemplo, a Unilever possui vários
centros dessa natureza como, por exemplo, no
Brasil e na Índia. A IBM possui centros respon-
sáveis por soluções globais, um deles localizado
no Brasil. Várias EMNs tem descentralizado suas
atividades de P&D para economias emergentes
como a do Brasil, como é o caso
da Whirpool, Fiat e Honda
Motocicletas no Brasil.
Por outro lado, várias empre-
sas têm deliberadamente
envolvido um maior número
de parceiros em seu processo
de inovação, fenômeno que tem
sido conhecido como “inovação
aberta” ou “colaborativa”. Isto
significa que, cada vez mais,
organizações inovadoras reconhecem que não
mais podem realizar atividades inovadoras
sozinhas, mas à base de uma rede de parceiros,
envolvendo usuários, fornecedores, institutos
de pesquisa e universidades. Por exemplo, na Na-
tura, uma das empresas mais inovadoras em nível
internacional, há vários anos, o processo de inova-
ção envolve uma rede de parceiros que contribuem
para o desenvolvimento de novos produtos. Ao
abrir o seu processo de inovação a empresa pode
ter acesso mais rápido a diversos tipos de conhe-
cimento tecnológico que não teria condições de
obter se operasse isoladamente (Figura 5.4).
Empresas multinacionais concluíram que é mais inteli-gente e lucrativo descentra-lizar suas atividades inova-doras, incluindo as de P&D, além de sua sede para algu-mas economias emergentes e aproveitar o estoque de criatividade desses países.
Várias empre-sas têm deli-beradamente envolvido um maior número de parceiros em seu proces-so de inovação.
Organizações inovadoras reconhecem que não mais podem realizar atividades inovadoras sozinhas, mas à base de uma rede de parceiros, envolvendo usuários, fornecedores, institutos de pesquisa e universidades.
86 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 5.4
MUDANÇA NO PROCESSO DE GESTÃO DA INOVAÇÃO: DO MODELO FECHADO AO ABERTO
INOVAÇÃO FECHADA FOCO INTERNO
INOVAÇÃO ABERTA COMBINA IDÉIAS INTERNAS E EXTERNAS
PESQUISA DESENVOLVIMENTO PESQUISA DESENVOLVIMENTO
O mercado
Fronteiras da empresa
Projetos de pesquisa
Fronteiras da empresa
Projetos de pesquisa externos
Projetos de pesquisa internos
Venture capital
Licence-in de tecnologias
Spin-offs Licence-out de tecnologias
Novos Mercados
Aquisição de produtos e tecnologias
O mercado
Fonte: Adaptado de Chesbrough (2003)
A abertura do processo de inovação contribui
para acelerar o processo de desenho, desenvol-
vimento e de introdução no mercado de novos
produtos e serviços. Na Natura, por exemplo,
mais de 70% de seu faturamento advém de pro-
dutos lançados nos últimos
dois anos. Esses 70% signifi-
ca o seu índice de vitalidade,
que reflete, no caso da Natu-
ra, uma gestão competente
de seu processo de inovação
aberta assim como reflete
sua capacidade de renovação de suas linhas de
produto. É importante ressaltar, no entanto,
que a implementação de um processo de
inovação colaborativo ou aberto não significa
abrir mão do P&D interno da empresa. Pelo
contrário, a inovação aberta envolve um P&D
interno robusto. Isto é importante para garantir
uma interação frutífera e produtiva com parcei-
ros como universidades, institutos de pesquisa,
fornecedores e competidores.
Adicionalmente, em função das várias interfaces
estabelecidas com parceiros diversos, faz-se ne-
cessário que a empresa desenvolva e aprimore dois
importantes tipos de capacidades organizacionais.
A primeira é a de coordenação, que envolve indu-
zir e avaliar constantemente a geração de conheci-
mentos, necessários para as atividades inovadoras
na organização, por seus vários tipos de parceiros.
A segunda refere-se à capacidade de integrar
esses diversos tipos de conhecimentos a fim de
gerar os novos produtos, processos de produção e
A implementação de um processo de inovação
colaborativo ou aberto não significa abrir mão do P&D
interno da empresa.
87CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
serviços. Como sugerido em Dantas e Bell (2011),
apenas uma parte das capacidades tecnológicas
inovadoras da Petrobras residem dentro de suas
fronteiras, isto é, dentro de seu robusto centro de
pesquisas, o Centro de Pesquisas Leopoldo Amé-
rico Miguez de Mello (CENPES). Outras partes de
suas capacidades tecnológicas inovadoras encon-
tram-se distribuídas em um conjunto de parceiros
que envolvem desde fornecedores, universidades
e empresas especializadas de engenharia até os
competidores, conforme ilustrado na Figura 5.5.
Por isso, empresas estão mantendo apenas uma
estreita fatia de suas capacidades inovadoras,
incluindo P&D, dentro de casa. Por isso, há que
se ter cautela com o uso de proxies convencio-
nais para se medir a capacidade tecnológica
inovadora de empresas.
Empresas estão mantendo apenas uma estreita fatia de suas capacidades inovadoras, incluindo P&D, den-tro de casa. Por isso, há que se ter cautela com o uso de proxies convencionais para se medir a capacidade tecnológica inovadora de empresas.
FIGURA 5.5
REPRESENTAÇÃO ILUSTRATIVA DAS ATIVIDADES INOVADORAS DISTRIBUÍDAS DA PETROBRAS (E&P)
AS CAPACIDADES TECNOLÓGICAS INOVADORAS
DISTRIBUÍDAS DA PETROBRAS PARA E&P
Institutos de pesquisa e
laboratórios especializados
[Mundo e Brasil (ex., o OceanLab)]
Centro de P&D (CENPES)
• Área de E&P
• Engenharia
• Materiais
Outras organizações locais e
internacionais (ex., associações
técnicas industriais, empresas de
consultoria geral, organizações de
metrologia e certificação etc.)
Companhias de
petróleo concorrentes
Centros de treinamento especializados
em desenvolvimento de habilidades
técnicas, organizacionais e gerenciais
Universidades
(Brasil e mundo)
Empresas de engenharia especializadas
e consultoras técnicas especializadas
para assuntos técnicos, organizacionais,
gerenciais e institucionais.
Fornecedores (sistemas, máquinas
e equipamentos, banco de dados,
serviços e soluções técnicas e
organizacionais, etc.)
Fonte: Adaptado de Dantas & Bell (2011).
88 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Diferenças entre Setores Industriais em Termos da Natureza da Inovação As indústrias (setores industriais) diferem entre
si termos da maneira como inovam.25 Obviamen-
te empresas farmacêuticas possuem um proces-
so de inovação muito diferente de empresas da
indústria de aço, que, por sua vez, são diferentes
das da indústria de software. Deste modo, po-
demos nos valer da clássica taxonomia desen-
volvida por Keith Pavitt, conforme mostrado na
Tabela 5.7 e na Figura 5.6.
TABELA 5.7
CARACTERÍSTICAS DO PROCESSO DE INOVAÇÃO EM INDÚSTRIAS ESPECÍFICAS
TIPOS DE INDÚSTRIA CARACTERÍSTICAS
INDÚSTRIAS DOMINADAS POR FORNECEDORES
As mudanças técnicas ocorrem quase que exclusivamente de fornecedores de máquinas e outros insumos de produção. Isto é tipicamente o caso da indústria de mineração, têxteis, e bens de capital. A maioria das novas técnicas surge em indústrias de máquinas e produtos químicos. A escolha técnica reflete o relativo fator custo, e as oportunidades para acumulação tecnológica são focadas principal-mente nas melhorias e modificações dos métodos de produção e insumos associados, e ocasionalmen-te, no desenho dos produtos.
INDÚSTRIAS INTENSIVAS EM ESCALA
A acumulação tecnológica é gerada pelo desenho, construção e operação de complexos sistemas de produção e/ou produtos. As principais indústrias incluem a extração e processamento de material bruto, automóveis e certos produtos de consumo durável. As tecnologias de produto e processo, por-tanto, se desenvolvem, em grande parte, de maneira incremental à base da experiência precedente de operação, e melhoria nos componentes, máquinas e subsistemas. As principais fontes de tecnologia são desenho e engenharia de produção, experiência operacional, e fornecedores de equipamentos e componentes. A acumulação tecnológica baseia-se na capacidade para desenhar e construir compo-nentes, máquinas e subsistemas, e, eventualmente, na capacidade de desenhar e construir sistemas complexos e de larga escala.
INDÚSTRIAS INTENSIVAS EM INFORMAÇÃO
A acumulação tecnológica em indústrias intensivas em informação abrange o desenho, construção, operação e melhoria de sistemas complexos para o armazenamento e processamento da informação. As melhorias tendem a ser baseadas na experiência e nas inovações incrementais, e suas principais fontes são a experiência operacional e de sistemas em grandes empresas usuárias, e fornecedores de sistemas e software de aplicação. As grandes empresas na indústria de serviços (p. ex. bancos e varejo) têm-se tornado os maiores centros na acumulação da tecnologia da informação.
INDÚSTRIAS BASEADAS EM CIÊNCIA (SCIENCE-BASED)
A acumulação tecnológica emerge principalmente dos laboratórios corporativos de P&D e é pesada-mente dependente de conhecimento, habilidades e técnicas que emergem da pesquisa acadêmica. As principais indústrias envolvem, por exemplo, química (química sintética e biologia molecular), eletrô-nico (descobertas fundamentais, eletromagnetismo, ondas de rádio), farmacêutica e farmoquímica, assim como agricultura. Demandam pesquisadores altamente qualificados com experiência em proje-tos internacionais de pesquisa.
Fonte: Adaptado de Pavitt (1984).
25. Dosi (1988).
89CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
FIGURA 5.6
DIFERENÇAS ENTRE INDÚSTRIAS EM TERMOS DA NATUREZA DA ATIVIDADE TECNOLÓGICA INOVADORA
34%
28%
22%
9%
7%
GRUPO
% DO VALOR AGREGADO GLOBAL DE PRODUÇÃO
INDÚSTRIA
NÍVEL DE INTENSIDADE
DE P&D DE TRABALHO DE CAPITAL ENERGÉTICA COMERCIALDENSIDADE
DE VALORES
INOVAÇÃO GLOBAL PARA MERCADOS LOCAIS
Produtos químicos
Veículos a motor, reboques,
peças
Outros equipamentos
de transporte
Maquinário elétrico
Maquinário,
equipamento, aparelhos
PROCESSAMENTO REGIONAL
Produtos de borracha
e plástico
Produtos metálicos
fabricados
Alimentos, bebidas e
tabaco
Impressão e publicação
PRODUTOS COM ALTO CONSUMO DE ENERGIA E / OU RECURSOS
Produtos de madeira
Petróleo refinado,
combustível sólido, nuclear
Papel e celulose
Produtos à base de
minerais
Metais básicos
TECNOLOGIAS GLOBAIS / INOVADORAS
Computadores e máquinas
de escritório
Semicondutores e
eletrônicos
Médico, preciso e óptico
MÃO-DE-OBRA INTENSIVA NEGOCIÁVEL
Têxteis, vestuário, couro
Móveis, joias,
brinquedos, outros
Intensidade ou densidade de determinado fator
MUITO ALTA ALTA À MODERADA MODERADA À BAIXA BAIXA FATORES MAIS IMPORTANTES PARA O GRUPO
Fonte: McKinsey Global Institute (2012).
90 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Com base na Tabela 5.7 e na Figura 5.6, podemos
concluir que:
1 Empresas de setores industriais diferentes possuem diferentes características e diferentes processos de inovação.
2 Os setores apresentam especificidades e, por isso, não podemos comparar empresas de setores que produzem aço com empresas que produzem software.
3 Essas diferenças acarretam implicações para a natureza do processo inovador dentro de empresas. Isto também significa dizer que há di-ferenças entre o grau de dificuldade e complexi-dade da capacidade tecnológica do processo de inovação. Por exemplo, o grau de dificuldade de uma empresa de confecção de roupas é menos sofisticado que uma fábrica de celulose e papel.
4 O entendimento dessas diferenças interin-dustriais é importante para se obter uma perspectiva mais realista sobre a maneira e dinâmica no processo de inovação industrial. Também é importante para o desenho de estratégias governamentais e industriais de desenvolvimento industrial.
O foco nas atividades inovadoras em si é
importante. Porém, no longo prazo, o que é
importa é a capacidade tecnológica que permite
que empresas e indústrias implementem níveis
crescentes – ou diversificados – de atividades
inovadoras. Assim, para a implementação de
atividades inovadoras faz-se necessária a acu-
mulação de capacidades tecnológicas, cujas
definição, características e mensuração serão
mostradas na Seção 6 a seguir.
91CAPÍTULO 05 | POR DENTRO DA INOVAÇÃO: UMA PERSPECTIVA AMPLIADA
92 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
06
93RESUMO EXECUTIVO
Capacidades Tecnológicas: Estoque de Recursos para Inovação e Competitividade Industrial
94 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
06. Capacidades Tecnológicas: Estoque de Recursos para Inovação e Competitividade Industrial
Neste estudo, interessa-nos a capacida-
de para realizar determinadas atividade
tecnológicas. Como dito anteriormente,
é por meio das capacidades tecnológicas
que empresas e indústrias implementam
níveis crescentes – ou diversificados – de
atividades inovadoras. Logo, as capacida-
des tecnológicas são fundamentais para o
crescimento de longo prazo de indústria e
empresas. Especificamente, a capacidade
A capacidade tecnológi-ca significa um conjunto
de recursos, com forte conotação de conhe-cimento, por meio do
qual empresas e países podem usar, alterar, ou
criar tecnologias e siste-mas de produção.
tecnológica significa um conjunto de recursos,
com forte conotação de conhecimento, por meio
do qual empresas e países podem usar, alterar, ou
criar tecnologias e sistemas de produção. Porém,
como estamos preocupados com a capacidade para
atividades tecnológicas, é preciso primeiro escla-
recer o real significado do termo tecnologia. Por
isso, antes de apresentar o conceito de capacidade
tecnológica utilizado neste estudo é preciso, em pri-
meiro lugar, clarificar o real significado de tecnologia.
Desmistificando o Significado de Tecnologia e de Capacidade Tecnológica O termo tecnologia está presente no dia-a-dia
das pessoas e das atividades empresariais e são
mencionados frequentemente na agenda empre-
sarial e governamental, assim como no discurso de
dirigentes empresariais e políticos e pela imprensa
como fontes de vantagem competitiva para em-
presas e países. Porém, o termo ‘tecnologia’ tende
a ter significados e interpretações diversas, con-
95CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
fusas e/ou equivocadas. Pode, inclusive, parecer
por demais acadêmico ou abstrato tentarmos aqui
apresentar o significado de tecnologia. No en-
tanto, um entendimento limitado ou equivocado
sobre tecnologia pode ter implicações práticas em
termos de gestão de organizações empresariais e
governamentais. Mais ainda: pode deturpar deci-
sões de investimentos em tecnologia e inovação
os quais, normalmente, tendem a ser altos. Por
isso, antes de mostrarmos as experiências de em-
presas relativas à gestão da capacidade tecnológi-
ca e inovação no Brasil, é importante clarificarmos
aqui o seu significado. Tecnologia também tende
a ser confundida com outras noções, conforme
apresentado a seguir.
TECNOLOGIA NÃO É MERAMENTE CIÊNCIA APLICADA
Uma perspectiva equivocada sobre tecnologia é
considera-la como sinônimo de ciência aplicada ou
mera aplicação de conhecimento científico. Isto
implicaria dizer que ciência e tecnologia sempre
caminharam de mãos dadas ao longo da história,
quando, na verdade, esta frutífera união surgiu
apenas a partir do final do século 18. De fato, na
maior parte da história da tecnologia, sua relação
com a ciência foi escassa. Durante séculos, a huma-
nidade fabricou utensílios de ferro sem conhecer
as características químicas deste metal, nem as
causas de diversas mudanças no processo de sua
fundição e forjamento. E, contudo, conseguiram
fabricar objetos, mesmo sustentando falsas teorias
e termos incorretos do processo metalúrgico. As-
sim, ainda hoje, a tecnologia não é, em sua totalidade,
a aplicação da ciência.26 O relacionamento entre
tecnologia e ciência
é, sem dúvida, fértil
para discussões
polêmicas, princi-
palmente quando as
duas variáveis são
associadas ao desen-
volvimento econômico de países. O Boxe 3 contribui
para clarificar distinção entre ciência e tecnologia.
O termo ‘tecnologia’ tende a ter significados e interpreta-ções diversas, confusas e/ou equivocadas.
Um entendimento limitado ou equivocado sobre tecnologia pode ter implicações práticas em termos de gestão de organizações empre-sariais e governamentais.
Uma perspectiva equivocada sobre tecnologia é considera-la como sinônimo de ciência aplicada.
Desmistificando o Significado de Tecnologia e de Capacidade Tecnológica
BOXE 3
TECNOLOGIA NÃO É APENAS APLICAÇÃO DA CIÊNCIA; MAS A RELAÇÃO ENTRE CIÊNCIA E
TECNOLOGIA É INTERDEPENDENTE27
Há um reconhecimento histórico das influências da tecnologia no crescimento do conhecimento científico, como por exemplo:
1 Demonstração por Torricelli do peso do ar atmosférico, um fundamental avanço científico, decorreu de suas tentativas e projetar uma bomba melhorada;
2 Sardi Carnot, ao criar a ciência da termodinâmica, resultou da tentativa (de quase 50 anos depois da inovação de Watt), de entender o que determina a eficiência da máquina a vapor;
3 Criação, por Joule, da lei de conservação de energia, surgiu de seu interesse em fontes alternativas para geração de energia para fábrica de cerveja de seu pai.
26. Kranzberg e Pursell (1981).
27. Baseado no clássico Rosenberg (1982).
PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
De fato, por muito tempo, e ainda hoje, relevante conhecimento tecnológico tem sido acumulado à base de experimentações e tentativa-e-erro sem embasamento científico. Ou seja, ainda hoje, e em grau considerável, há situações relevantes nas quais o conhecimento tecnológico precede o conhecimento científico. Ainda hoje: para certas atividades produtivas ainda não há um conhecimento científico profundo: teorias sobre turbulência e com-pressibilidade para otimização de projetos de aviões são necessários longos testes e consequentes modificações no design baseados nesses testes altos custos de desenvolvimento de aeronaves.
Em função de incentivos econômicos, alguns avanços tecnológicos baseados em conhecimento técnico acu-mulado ocorrem anteriormente ao entendimento científico:
1 Estágio inicial do rádio: ondas curtas para os amadores demonstraram a eficiência das transmissões na faixa de ondas curtas estudos para determinar porque tal desempenho excedia as expectativas levou a entendimentos importantes sobre a ionosfera;
2 Metais: ciência da metalurgia só começa a partir de 1850 quando já eram produtos aços por meio da tecnologia Bessemer;
3 Transistor: antes da Bell Labs apoiar a pesquisa sobre o efeito transistor, em 1947, já existia experiência prática sobre uso dos semicondutores como retificadores de cobre e silício.
O conhecimento tecnológico também desempenha um papel importante na formulação da agenda da ciência:
1 Indústria aeronáutica (turbo jatos): Os melhoramentos tecnológicos nos turbo jatos levavam aeronaves a velocidades cada vez maiores e a limites de desempenho que só poderiam ser ultrapassados por meio de melhor entendimento de fenômenos da física aerodinâmica supersônica aerotermodinâmica;
2 Telefonia: trabalhos para minimizar os ruídos nas transmissões ultramarinas na década de 1930, iden-tificaram três fontes de ruídos: uma delas, o chiado estático, ou ruído estelar, deu origem à radioastro-nomia. Isto levanta a questão de até que ponto podemos então fazer uma distinção tão precisa entre pesquisa básica e pesquisa aplicada?
Assim, seria simplista a noção de que a pesquisa científica apareceria primeiro e levaria posteriormente à apli-cação na tecnologia. Consideremos o exemplo do polietileno: O Bell Labs realizou extensas pesquisas científi-cas sobre o polietileno antes da difusão de seu uso para revestimentos de cabos e isolamento de fios. Porém, muitos problemas apareceram depois de seu uso na indústria. Novas pesquisas, motivadas pelos problemas do uso, levaram a novos entendimentos sobre seu padrão solidificação e morfologia (avanços na ciência dos materiais!). Há mais um exemplo: Após a invenção do transistor, concluiu-se que sua tecnologia não tinha sido construída sobre um vasto esforço de pesquisa. Novas pesquisas demandariam conhecimento em física do estado sólido! Porém, um cientista da indústria ministrou cursos no Bell Labs e para professores de 30 universi-dades sobre o tema. Isso objetivava a criação de cursos de física de transistores nas universidades. Portanto, o fluxo de conhecimento ocorreu da indústria para a universidade.
Assim, mesmo quando um avanço tecnológico é precedido por alguma pesquisa básica, é o estabelecimento de uma vinculação palpável entre a tecnologia e o campo científico específico que é responsável pela intensificação da pesqui-sa nesse campo. Portanto, a ciência vem sendo moldada, direcionada e condicionada por estímulos econômicos:
1 A pesquisa científica é uma atividade dispendiosa;
2 Ela pode ser direcionada de modo que pode gerar grandes retribuições econômicas e bem-estar à sociedade. Economias (hoje) industrialmente avançadas criaram um vasto domínio tecnológico moldado por incentivos econômicos. Esse domínio tecnológico está de várias formas ligado à ciência. A ciência não pode ser consi-dera exógena ao modelo de desenvolvimento econômico. O processo de industrialização inevitavelmente transforma a ciência em uma força endógena, ao aumentar sua dependência em relação à tecnologia.
97CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
TECNOLOGIA NÃO É MERAMENTE PRODUTO
Produtos contêm diferentes tecnologias (Figura
6.1). Uma tecnologia pode estar presente em vá-
rios tipos de produtos (por exemplo, a tecnologia
digital)28 e um produto pode conter um crescente
número de tecnologias. Por exemplo, um refrige-
rador da década de 1960 tinha, no máximo, três
a quatro tecnologias, uma delas o compressor. Os
atuais, principalmente aqueles já desenhados para
conexão com a internet, têm aproximadamente
oito a dez tecnologias. Da mesma forma, um te-
lefone celular da década de 1980 tinha perto de
oito tecnologias, enquanto os mais simples atuais
têm cerca de 15 a 18 tecnologias. Cada vez mais,
produtos, processos de produção e serviços,
como automóveis, software, aviões, extração de
petróleo em águas profundas, serviços hospita-
lares, serviços bancários e de transporte público
envolvem um crescente número de diferentes
tecnologias. Por exemplo, uma inovação modular
significaria a alteração de uma dessas tecnologias
contidas em um determinado produto.
Produtos con-têm diferentes tecnologias.
FIGURA 6.1
PRODUTO E TECNOLOGIA
Fonte: Figueiredo (2009, 2015).
TECNOLOGIAS
A
B
C
DEFG
H I
J
28. Ver também von Tunzelmann (1995).
98 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
TECNOLOGIA NÃO É SOMENTE MAQUINARIA OU EQUIPAMENTOS
É frequente no senso comum a definição de tec-
nologia relacionada estritamente à maquinaria, no
sentido genérico, tais como: equipamen-
tos, ferramentas, aeronaves, satélites,
instrumentos fabris e computadores.
De fato, o artefato ou, mais tecnicamen-
te falando, os sistemas técnico-físicos
(maquinaria, equipamento, bancos de
dados, software, fábricas) são parte de
uma tecnologia e expressam parte dela. Mas não
podem ser tomados como a própria tecnologia.
O entendimento estreito e limitado de tecnolo-
gia como sinônimo de maquinaria e equipamen-
tos pode ter efeitos negativos para empresas
e países. Por exemplo, são comuns os casos de
organizações que adquirem
máquinas e equipamentos
extremamente avançados e
se autodenominam organi-
zações tecnologicamente
avançadas. Porém, faltam-
-lhes pessoas qualificadas
para compreender os
princípios da tecnologia. Por isso, operam-na
de maneira ineficiente ou equivocada levando
a quebras, indisponibilidade e altos custos de
manutenção. Também podem subutilizar a tec-
nologia por absoluta falta de conheci-
mento básico sobre a potencialidade
dos recursos. Em casos mais extremos,
a tecnologia nem mesmo é colocada
em uso, permanecendo, por anos,
na mesma forma como foi entregue
pelo fornecedor por absoluta falta de
conhecimento sobre sua instalação e
operação básica. Em outros casos, a
organização adquire sistemas físicos
de última geração (maquinarias e equi-
pamentos) e recruta engenheiros, técnicos e
gerentes altamente qualificados. A despeito
da existência de capital físico e humano, falta
à empresa um sistema organizacional (pro-
cedimentos, rotinas, normas padronizadas)
capaz de integrar esses dois componentes de
maneira a um uso eficiente da tecnologia e sua
posterior adaptação e aprimoramento.
TECNOLOGIA NÃO É APENAS A CHAMADA ALTA TECNOLOGIA (OU HIGH TECH)
A história da tecnologia confunde-se com a
história da humanidade. Mas tecnologia sempre
teve o mesmo sentido ao longo da história? As
perspectivas contemporâneas convencionais
e populares sobre tecnologia tendem a asso-
ciá-la àquilo que é fantástico e extremamente
sofisticado, normalmente a indústrias como a
microeletrônica, computação, tecnologia da
informação ou indústria aeroespacial. É comum,
por exemplo, observarmos na imprensa em
geral referências às assim chamadas “empresas
de tecnologia”, como aquelas ligadas a essas
indústrias. Trata-se, porém, de uma visão, não
apenas estreita, mas equivocada sobre tecnolo-
gia. Tecnologia está presente nos mais variados
setores industriais e nos mais variados tipos
de organização (empresariais e não empre-
sariais). Existem, por exemplo, tecnologia de
mineração, de pesca, de tratamento de água,
de cultivo agrícola, de pecuária, assim como
tecnologia automobilística, hospitalar, bancária,
de entretenimento e vários outros tipos. Logo,
tecnologia está presente, em graus de sofisti-
cação variados – de rudimentar, baixa, inter-
mediários e avançados – em diversos tipos de
organização. Ou seja, tecnologia está presente
em organizações e indústrias que variam desde
os intensivos em recursos naturais, os baseados
em processos (por exemplo, fabricação de aço,
químicos), os baseados em produto (eletrônica
de consumo, automobilístico), os baseados em
projetos (empresas de engenharia, de consulto-
rias), os intensivos em informação e os intensi-
vos em serviços.
É frequente no senso comum a defi-
nição de tecnologia relacionada estrita-
mente à maquinaria.
Tecnologia está presente nos mais
variados setores industriais e nos
mais variados tipos de organização
(empresariais e não empresariais).
O entendimento estreito e limitado de tecnologia
como sinônimo de maqui-naria e equipamentos pode
ter efeitos negativos para empresas e países.
99CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
O QUE É, AFINAL, TECNOLOGIA? BREVE COMENTÁRIO SOBRE SUA REAL NATUREZA
Depois do que já foi mencionado, começa a
ficar claro que tecnologia é um corpo específico
de conhecimento produtivo. Trata-se de um
tipo específico de conhecimento produtivo.
De fato, como tem sido mostrado em diversos
estudos ao longo das últimas décadas, e clara-
mente argumentado pelo clássico Keith Pavitt,
tecnologia deveria ser compreendida como um
quantum de conhecimento retido por pessoas e
organizações. Este conhecimento, resultante de
sua experiência acumulada em projeto (design),
produção, desenvolvimento de produtos e
aprimoramento de processos é, em sua maioria,
tácito. Isto significa que não está formatado,
em sua totalidade, em nenhum tipo de manual
ou software. Mas é adquirido por pessoas e
organizações por meio de solução de problemas
permanecendo lá dentro em um estado subs-
tancialmente não codificado.29
Apenas parte deste conhecimento está codifica-
da na forma de manuais de operação, produtos,
equipamentos, publicações técnicas e científicas.
De fato, tecnologia é uma forma de conhecimento
(know-how) aberto, no sentido de ter um cará-
ter não proprietário, por exemplo, tecnologia
(conhecimento) sobre energia nuclear, de projeto
e fabricação de aviões, ou de explorar petróleo
no mar. Porém, isto não significa que todas as
empresas teriam fácil acesso a tais conhecimentos
(tecnologias) específicos. Esses conhecimentos
estão armazenados, impregnados e acumulados
em empresas especializadas,
na forma de suas capacidades
tecnológicas para fazer tais ati-
vidades. Mais especificamente,
está armazenado na forma de qualificação das
pessoas, suas experiências e talentos e no tecido
organizacional de uma ou mais empresas. Porém,
grande parte deste quantum de conhecimento
produtivo é tácito, tanto em pessoas, como em
organizações inteiras.
Mas o que é conhecimento tácito? Pela pers-
pectiva individual, é aquilo que certas pessoas
sabem como fazer, mas dificilmente conseguem
contar ou escrever como o fazem. Por exemplo,
se você tentar replicar uma receita culinária
dificilmente conseguirá o mesmo sabor obtido
pela pessoa que criou a receita. Se pedirmos para
uma pessoa descrever como é andar de bicicleta
ou nadar, assim como se perguntarmos a craques
do futebol como eles marcam gol, dificilmente
eles conseguirão descrever essa atividade. Esse
conhecimento (do chef de cozinha ao do jogador
de futebol) é um conhecimento tácito. Reflete
talentos, habilidade e experiências natas e/ou
adquiridas e aprimoradas ao longo do tempo.
Levando-se para o nível organizacional e do
ponto de vista tecnológico e empresarial, o co-
nhecimento tecnológico pode ser subdividido em
tácito (não codificável e codificável) e codificado,
como mostrado na Figura 6.2.
Tecnologia é um corpo es-pecífico de conhecimento produtivo.
Porém, grande parte deste quantum de conheci-mento produtivo é tácito, tanto em pessoas, como em organizações inteiras.
29. Pavitt (1987); Nelson e Winter (1982); Rosenberg (1993); Dosi (1988).
100 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 6.2
DISTINÇÃO ENTRE DIMENSÕES TÁCITA E CODIFICADA DA TECNOLOGIA
DOCUMENTADODocumentos escritos, declarações gramaticais, expressões matemáti-cas, especificações, designs, planos
e manuais, software.
COFIFICÁVELCodificado verbalmente
e não codificado
NÃO CODIFICÁVEL
DIMENSÃO TÁCITA
DIMENSÃO CODIFICADA
TECNOLOGIA
O que é tácito hoje, não é tácito amanhã!
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
Porém, o que é tácito hoje não é tácito ama-
nhã. Por meio de processos de aprendizagem
tecnológica (que será comentado posterior-
mente neste documento), pode-se aprender os
princípios de tecnologia existente e evoluir para
o seu domínio.
De acordo com seu significado contem-
porâneo, tecnologia é definida como
um estoque ou quantum de conheci-
mento sobre certos tipos de eventos
e atividades produtivas (desenvolver
um carro, projetar um avião, desen-
volver um software, construir e operar
uma planta nuclear, lançar um foguete
espacial, reduzir consumo de combustí-
vel de um carro/avião).
1 Trata-se de um estoque ou quantum de conhecimento produtivo;
2 Esse conhecimento é proprietário, intrínseco e específico ao contexto organizacional onde é concebido e desenvolvido;
3 Isto porque esse conhecimento é criado e acumulado por meio de um longo processo de aprendizagem (que envolve desde tenta-tiva-e-erro ad-hoc, imitação criativa aos mais elevados níveis de P&D); e
4 Tal estoque ou quantum possui uma di-mensão codificada (patentes, algoritmos, designs, software, produtos, hardware, etc.) e uma dimensão tácita. É justamente essa dimensão tácita que torna uma tecnologia difícil de ser adquirida, guardadas as devidas proporções relativas aos graus de complexi-dade de seus vários tipos.
Tecnologia é definida como
um estoque ou quantum de co-
nhecimento sobre certos tipos de
eventos e ativida-des produtivas.
101CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
Sendo assim, tecnologia não deveria ser
considerada como um bem público, que se
adquire na prateleira do mercado. Uma parte da
tecnologia pode ser considerada “bem públi-
co”, codificada ou informação. Mas uma parte
importante da tecnologia é conhecimento,
portanto tácito e derivado de um processo
de aprendizagem idiossincrático. Por isso,
é importante que se faça uma distinção entre
informação e conhecimento, que, convencio-
nalmente, tendem a ser tratados como concei-
tos iguais. Informação pode ser representada
pela soma total de “mensagens” geradas ao
redor do mundo de forma geral, algoritmos,
livros, e tudo o que está disponível na internet,
que é, em princípio, comercializável; enquanto
conhecimento é geralmente não-comerciali-
zável e resulta de processos de aprendizagem,
que podem derivar tanto de experiências de
produção passadas, quanto da aquisição de
novas informações. Assim, conhecimento e
informação não são idênticos, mas fortemente
complementares: o que a empresa é capaz de
aprender a partir da quantidade de mensagens
(informações) disponíveis irá depender do
conhecimento que já tenha acumulado (ou seja,
sua base de conhecimento existente).
Logo, tratar tecnologia como informação ou
bem público pode levar alguns dirigentes a
um raciocínio equivocado e a consequên-
cias negativas. Por causa da intensificação da
globalização e a disseminação de tecnologias
de comunicação e de informação (as chamadas
TICs, à base de e-mails e outros meios de comu-
nicação suportados ou apoiados pela televi-
são, telefonia móvel, satélites e pela Internet)
tende-se a assumir que tecnologia está cada vez
mais acessível a todos, principalmente a países e
áreas em desenvolvimento. Trata-se, porém, de
uma perspectiva altamente equivocada.30
ONDE RESIDE ESSE CONHECIMENTO ESPECÍFICO (OU TECNOLOGIA)?
Certamente, não está no vácuo ou solto no ar.
A tecnologia é sempre concebida, desenvolvida
e alterada dentro de contextos organizacionais
específicos. Estes, por sua vez, localizam-se dentro
de contextos regionais e nacionais. Cada empresa é
um lócus onde ocorre uma progressiva acumulação
de conhecimento tecnológico que possui elementos
muito específicos e idiossincráticos da empresa e do
país onde foi concebida, desenvolvida e aprimorada.
Ou seja, a tecnologia
reside, incorpora-se e
acumula-se em recursos
ou componentes específi-
cos. Em outras palavras, a
tecnologia é incorporada
e acumulada em componentes como sistemas
técnico-físicos (máquinas, equipamentos, banco de
dados, software), nos profissionais (que constroem
esses sistemas técnico-físicos e neles depositam seu
conhecimento formal, experiência, habilidades e ta-
lentos), no sistema, tecido organizacional e geren-
cial de empresas (que reflete o conhecimento e
experiências dos profissionais que os construíram e
estruturaram), assim como nos produtos e serviços
da organização (que também reflete o conhecimen-
to tácito de engenheiros, técnicos e operadores,
bem como os vários procedimentos organizacio-
nais e técnicas gerenciais). Ou seja, a tecnologia (de
uma empresa ou país) é um estoque de recursos, à
base de saber tecnológico, que se armazena nesses
três componentes. A relação simbiótica que se
forma entre esses três componentes e que permite
que empresas e países realizem certas atividades
tecnológicas é denominada de capacidade tecno-
lógica. A capacidade tecnológica de uma empresa
ou país, para certa atividade específica, é composta
pelos componentes especificados na Figura 6.3.
Tecnologia não deveria ser conside-rada como um bem público, que se adquire na prateleira do mercado.
A tecnologia reside, incorpora-se e acumula-se em recursos ou componentes específicos.
Mas uma parte importante da tecnologia é conhecimento, portanto tácito e derivado de um processo de aprendiza-gem idiossincrático.
Tratar tecno-logia como informação ou bem público pode levar al-guns dirigentes a um raciocínio equivocado e a consequências negativas.
30. von Tunzelmann (1995).
102 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 6.3
COMPOSIÇÃO DA CAPACIDADE TECNOLÓGICA
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
Capacidade suplementar
Capacidade habilitadora
Capacidade de produção
CAPACIDADE TECNOLÓGICA
SISTEMA ORGANIZACIONAL
• Rotinas organizacionais (o modo proprietário de fazer as coisas” na organização; sequencias confiáveis encontradas pela empresa pararealizar atividades tecnológicas
• Procedimentos técnicos, operacionais e gerenciais
• Estruturas organizacionais e gerenciais
• Sistema institucional (normas, crenças e valores)
• Habilidades
• Conhecimento tácito
• Experiência acumulada
• Talentos
• Criatividade
• Diversas especialidades
• Diversos tipos e níveis de qualificações formais
PROFISSIONAIS E SUAS QUALIFICAÇÕES FORMAIS E INFORMAIS
• Equipamentos
• Banco de dados
• Software/hardware
• Diagramas/design
• Sistemas de produção
SISTEMAS TÉCNICO-FÍSICOS
Capacidade tecnológica para inovaçãoCapacidade tecnológica operacional (não inovadora)
103CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
DEFINIÇÃO ESPECÍFICA DOS COMPONENTES DA CAPACIDADE TECNOLÓGICA
1 Profissionais ou capital humano. Uma parte importante da capacidade tecnológi-ca da empresa é incorporada na mente dos engenheiros, dos gerentes, dos operado-res, dos técnicos, e de outras pessoas na organização. Tal dimensão da capacidade é expressa por meio de sua educação formal e aprendizagem, mas, principalmente, da experiência acumulada, habilidades, destreza e talentos acumulados, em outras palavras, os elementos-chave de seu co-nhecimento tácito.
2 Sistemas técnico-físicos (capital físico). Longe de ser acumulada somente na mente das pessoas, a capacidade tecnológica é tam-bém acumulada e incorporada nos sistemas físicos que as pessoas constroem ao longo do tempo, tal como fábricas, maquinaria, software, base de dados etc.
3 Processos e sistemas organizacionais e gerenciais (capital organizacional). As capacidades são particularmente incorpo-radas e acumuladas no tecido ou sistema organizacional da empresa (ou das empre-sas) do qual se origina. Especificamente, este sistema organizacional (orgânico), que incorpora uma parte substancial de capacidades tecnológicas, envolve as rotinas organizacionais, dos procedimentos, das normas, da produção, dos processos admi-nistrativos da empresa, técnicas de gestão de produção (p. ex., sistemas da qualidade, sistemas automatizados, Enterprise Resource Planning - ERP). O conhecimento flui através das áreas funcionais, das regras gerenciais e das estruturas organizacionais etc.
A ideia de rotinas organizacionais é muito
importante e merece clarificação. São os hábitos
e a maneira que uma organização encontra de
realizar suas atividades da forma que considera
mais confiável possível (seu “jeito de fazer as coi-
sas”). Ou seja, são as habilidades de uma organiza-
ção. Ao longo de sua vida a empresa adquire um
repertório de rotinas que deriva da maneira como
realiza suas atividades. Por exemplo, depois de
experimentar (errar e aprender) várias sequências
de como proceder no processo de armazena-
mento de produtos perecíveis ou de como fazer a
manutenção de equipamentos, a empresa escolhe
uma sequência de ações na qual ela confia. Ao
realizar essa sequência ao longo do tempo, a
empresa não apenas aprimora como deposita nela
o conhecimento de pessoas e a própria maneira
como as coisas são feitas na empresa.
Por isso, as rotinas organizacionais são grandes
armazenadoras do saber tecnológico (ou capa-
cidade tecnológica) da empresa. Representam o
“DNA” da empresa. Os processos, produtos e ser-
viços derivados das rotinas organizacionais, por
serem muito específicos à empresa, dificilmente
são replicados automaticamente por outros. Ou
seja, ao engajarem-se em atividades de busca de
atividades novas e de soluções para problemas
técnicos e organizacionais, as empresas depo-
sitam conhecimento específico e intrínseco em
suas rotinas. Esse conhecimento organizacional é
tácito. Vale lembrar, porém, que existem rotinas
eficientes e ineficientes, pois refletem simples-
mente parte do saber da em¬presa.
PROPRIEDADES DA CAPACIDADE TECNOLÓGICA
Existe um grau de importância e prioridade en-
tre esses três componentes. Isto é importante
principalmente à gestão da capacidade tecnoló-
gica no contexto de economias em desenvolvi-
mento. As empresas nesses países normalmente
começam (ou começaram) o seu negócio a
partir de tecnologia importada de empresas de
outros países (normalmente daqueles que se
industrializaram mais cedo, como, por exemplo,
Reino Unido, França, Estados Unidos, Alemanha
e Japão). Por isso, no contexto de países em de-
senvolvimento, os componentes “profissionais”
(capital humano) e sistemas organizacionais e
104 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
gerenciais (capital organizacional) têm
importância maior do que sistemas
técnico-físicos e produtos e serviços.
Os sistemas técnico-físicos (máquinas,
equipamentos e software) podem ser
adquiridos no mercado com relativa
facilidade. Porém, o sistema organiza-
cional (em função da especificidade das
rotinas organizacionais, como mencio-
nado anteriormente) e os recursos humanos
tem forte dimensão tácita. Eles precisam ser
desenvolvidos internamente. É com base neles
que tecnologias adquiridas de outras empresas
e de outros países serão assimiladas, absorvidas
e, posteriormente, alteradas, aprimoradas e
até transformadas em novas tecnologias. Por
isso, são componentes preciosos que merecem
atenção e esforços diferenciados por parte da
gestão da empresa.
Mais especificamente, esses
dois componentes têm eleva-
do grau de especificidade e
de propriedade tácita. Um
país precisa desenvolver a
sua própria base de recursos
humanos em áreas rela-
cionadas às atividades tecnológicas, tais como
engenheiros, pesquisadores, gerentes, técnicos,
operadores. Assim também as empresas preci-
sam formar os seus próprios recursos humanos.
O sistema organizacional, por sua vez, é ainda
mais específico ao contexto organizacional no
qual é desenvolvido.
Portanto, a capacidade das empresas para gerir
e utilizar o estoque de recursos representados
na Figura 6.3 para a realização de atividades
tecnológicas é denominada capacidade tecnoló-
gica. Existe uma relação inseparável e simbiótica
entre os componentes da capacidade tecnológica.
É essa relação simbiótica que reflete a capacidade
tecnológica que é própria, intrínseca e específica
a uma empresa ou país. Por isso, podemos nos
referir à capacidade tecnológica da Petrobras
para explorar e produzir petróleo, da Usiminas ou
CSN para projetar e produzir aços, da Motorola
para projetar e produzir celulares, da Fibria ou
Votorantim para produzir florestas e celulose e da
Klabin para produzir papel.
A capacidade que essas empresas possuem de
realizar tais atividades com alto grau de eficiên-
cia, mas também de criatividade e de inovação é,
portanto, a sua capacidade tecnológica. Trata-se
de um ativo cognitivo ou base de conhecimento
muito próprio a cada uma dessas empresas e que
reflete o conhecimento tácito de seus engenhei-
ros, gerentes, técnicos e operadores, de seus
conhecimentos codificados e tácitos impregnados
em suas rotinas organizacionais, procedimen-
tos, manuais de instrução, técnicas gerenciais,
estruturas organizacionais e gerenciais, siste-
mas técnico-físicos, instalações, do processo de
projetar, desenvolver e aprimorar seus produtos
e serviços, mas também seus valores e normas
(“jeito como as coisas são feitas”) da empresa.
É preciso também considerar que uma parte da
tecnologia de uma empresa armazena-se em seus
produtos e serviços. Outra parte das capacida-
des da empresa está incorporada nos produtos
e serviços que são desenhados, desenvolvidos,
fabricados, fornecidos e comercializados pela
empresa com base em seus sistemas técnico-físi-
cos, pessoas e sistema organizacional. Produtos
e serviços não devem ser vistos apenas como
resultados dos outros três componentes. Eles
expressam parte da capacidade tecnológica da
em¬presa. É por meio do acesso ao produto que
muitos novos entrantes começaram o processo
de imitação duplicativa por meio de engenharia
reversa. Aqui nos interessa especialmente os três
componentes inicias (capital humano, sistemas
técnico-físicos e sistemas organizacionais), que
são recursos acumulados pelas empresas.
A capacidade das empresas para gerir
e utilizar o estoque de recursos para a realização de ativi-dades tecnológicas
é denominada capa-cidade tecnológica.
A capacidade tecnológica é acumulada e incorporada
no tecido organizacional, nas pessoas, nos sistemas
físicos e nos produtos e serviços da organização.
105CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
Portanto, a capacidade tecnológica é acumula-
da e incorporada no tecido organizacional, nas
pessoas, nos sistemas físicos e nos produtos
e serviços da organização. Esta capacidade
tecnológica é tácita e intrínseca a este contexto
organizacional onde foi concebida, desenvolvida
e fortalecida. Porém, a despeito da natureza
tácita e intrínseca da capacidade tecnológica e
por mais que esta seja protegida por mecanismos
diversos, como propriedade intelectual, patentes
e barreiras de entrada, tal capacidade tecnológi-
ca (ou conhecimento tecnológico) acaba sendo
copiada para outros sistemas organizacionais.
Mas este processo está longe de ser automáti-
co. Isto depende, em primeiro lugar, da avidez e
esforços de absorção e assimilação tecnológica
(aprendizagem) por parte da organização recep-
tora ou interessada em adquirir certa capacidade
tecnológica. Ou seja, o que é tácito hoje pode
não ser tácito amanhã ou para sempre.
Por exemplo, o Brasil conseguiu acumular capaci-
dades tecnológicas para desenvolver para proje-
tar aviões e enriquecer urânio, tecnologias estas
normalmente negadas e cuja difusão é cercada
de mecanismos que variam de técnicos a políti-
cos. O Irã conseguiu acumular capacidade tec-
nológica para enriquecer urânio. Por outro lado,
várias empresas que ocupam liderança absoluta
em seu mercado sabem que a única maneira de
se manter na liderança não é criar barreiras de
entrada ou manipular certas forças competitivas,
mas simplesmente aprofundar sua capacidade
tecnológica inovadora. Um bom exemplo disso
seja talvez a Gillette. Muito embora a empresa
detenha mais de 70% do mercado mundial de
barbeadores, mantém investimentos e esfor-
ços contínuos de pesquisa e desenvolvimento
(P&D) em novas gerações de produtos. Ou seja,
a melhor proteção para o capital intelectual de
empresas é a própria capacidade inovadora. Em
síntese, algumas propriedades adicionais das
capacidades tecnológicas incluem:
1 A capacidade tecnológica é amplamente difusa e espalhada através da corporação;
2 A capacidade tecnológica tem uma forte dimensão tácita e intrínseca;
3 Tal dimensão tácita torna muito difícil ser facil-mente copiada e transferida automaticamente através de empresas, indústrias e países; e
4 O sistema organizacional é um componen-te-chave da capacidade tecnológica que permite que diferentes tipos de conheci-mento tácito dos indivíduos sejam transfor-mados em novos processos organizacionais e de produção e, especialmente, em novos produtos criativos e inovadores para atender a necessidades específicas dos usuários.
TIPOS DE CAPACIDADES TECNOLÓGICAS
A Figura 6.3 sugere diferentes tipos de capacidades
tecnológicas que podem ser caracterizadas como
capacidades de produção e de inovação. As capa-
cidades tecnológicas de produção são as capaci-
dades para usar ou operar tecnologias e sistemas de
produção existentes. As capacidades tecnológicas
inovadoras são as capacidades que permitem a
modificação de tecnologias e sistemas de produção
existentes, assim como a criação de novas tecnolo-
gias e sistemas de produção existentes.
Ambas as capacidades tecnológicas de produção
e de inovação podem ser desagregadas em níveis.
A capacidade tecnológica de produção, por exem-
plo, pode ser desagregada em termos de básica e
avançada. O nível avançado refere-se ao uso ou
operação das mais avançadas técnicas de produ-
ção, que podem variar da automação de proces-
sos de produção aos mais sofisticados sistemas
digitais com base na assim chamada manufatura
4.0 ou “smart factories”. Ao se referir à capacidade
tecnológica de uma empresa ou país é importante
discernir se de mera produção/operação ou se
de inovação, a qual, por sua vez, pode variar de
básica até avançada. Portanto, em se tratando de
capacidade tecnológica para realizar uma ativida-
106 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
de específica (p. ex., produzir
carros ou petróleo), tanto em
nível de empresa como de
país, a pergunta não é se tem
ou não tem, mas qual tipo (se
de produção/operação ou
de inovação) e em que grau
ou nível. Por exemplo, uma
empresa pode ter capacidade
para produzir milhões de uni-
dades de certo produto, com
alto grau de eficiência; mas
pode não ter capacidade para
alterar nenhum de seus com-
ponentes. Ou seja, empresas
poderiam ter capacidade
tecnológica avançada de produção e nenhu-
ma ou limitada capacidade tecnológica para
inovação. Essa distinção entre esses dois tipos de
capacidades tecnológicas é fundamental em ter-
mos de interpretação e de desenho de políticas
públicas e estratégias empresariais relativas à
inovação e desenvolvimento industrial.
As capacidades tecnológicas suple-
mentares adicionam valor às capaci-
dades inovadoras e as de produção.
Envolvem, por exemplo, canais de distri-
buição, técnicas de embalagens e demais
sistemas de logística. As capacidades
tecnológicas habilitadoras são aquelas
que habilitam a empresa a fornecer
certos clientes ou exportar para certos
mercados. Por exemplo, uma empresa
pode obter determinada certificação sanitária
que lhe dá condições para exportar carne e
derivados para certos mercados exigentes. Uma
empresa pode também obter certa certificação
para demonstrar que seu processo de produ-
ção lhe habilita a exportar seus produtos para
determinados mercados. Ambas as capacidades
tecnológicas suplementares e habilitadoras
podem ser imitadas com certa facilidade. São
similares às capacidades de produção. Elas agre-
gam valor às capacidades tecnológicas inova-
doras, mas não podem distinguir a empresa em
termos de performance competitiva.31
AS DUAS FACES DA CAPACIDADE TECNOLÓGICA INOVADORA
As mesmas capacidades tecnológicas que garan-
tem o sucesso de empresas em termos de perfor-
mance inovadora e competitiva, também podem
levar ao seu fracasso. As capacidades tecnológicas
inovadoras podem sofrer enrijecimento e condu-
zir empresas à perda de liderança comercial. Isso
ocorre quando elas exacerbam na acumulação
de capacidades inovadoras – na direção errada
(por exemplo, Digital Equipment, Kodak, Nokia e
Motorola). Por isso, algumas empresas diversificam
suas atividades tecnológicas inovadoras, exploram
novas oportunidades tecnológicas a partir de suas
capacidades (self-discovery) e criam novas linhas de
negócios para explorar tais oportunidades32. Com
isso, podem abrir setores novos para a economia de
um país, contribuindo para a renovação da estrutu-
ra industrial e o crescimento econômico. 33
As mesmas capaci-dades tecnológicas
que garantem o sucesso de empre-
sas em termos de performance inova-dora e competitiva, também pode levar
ao seu fracasso.
31. Leonard-Barton (1995).
32. Ver, por exemplo, Christensen (2002); Bell & Figueiredo (2012); Figueiredo (2015).
33. Ver, por exemplo, Hausmann et al. (2007); Bell e Figueiredo (2012); Crespi (2013).
Empresas poderiam ter ca-pacidade tecnológica avan-çada de produção e nenhu-ma ou limitada capacidade tecnológica para inovação. Essa distinção entre esses dois tipos de capacidades tecnológicas é fundamental em termos de interpretação e de desenho de políticas públicas e estratégias empre-sariais relativas à inovação e desenvolvimento industrial.
107CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
FIGURA 6.4
DUAS FACES DAS CAPACIDADES TECNOLÓGICAS INOVADORAS
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
A face negativa se manifesta a partir das se-
guintes patologias34:
1 Insulamento: isolamento da organização e adoção de ações e estratégias orientadas
para dentro, com limitada interação com congêneres existentes e potenciais;
2 Exacerbação do aprofundamento das capa-cidades tecnológicas existentes (“fazer mais do mesmo”);
31. Leonard-Barton (1995).
32. Ver, por exemplo, Christensen (2002); Bell & Figueiredo (2012); Figueiredo (2015).
33. Ver, por exemplo, Hausmann et al. (2007); Bell e Figueiredo (2012); Crespi (2013). 34. Leonard-Barton (1995).
CAPACIDADE TECNOLÓGICA
SISTEMA ORGANIZACIONAL
• Rotinas organizacionais (o modo proprietário de fazer as coisas” na organização; sequencias confiáveis encontradas pela empresa pararealizar atividades tecnológicas
• Procedimentos técnicos, operacionais e gerenciais
• Estruturas organizacionais e gerenciais
• Sistema institucional (normas, crenças e valores)
• Habilidades
• Conhecimento tácito
• Experiência acumulada
• Talentos
• Criatividade
• Diversas especialidades
• Diversos tipos e níveis de qualificações formais
PROFISSIONAIS E SUAS QUALIFICAÇÕES FORMAIS E INFORMAIS
• Equipamentos
• Banco de dados
• Software/hardware
• Diagramas/design
• Sistemas de produção
SISTEMAS TÉCNICO-FÍSICOS
Capacidades tecnológicas que conduzem à inovação
e liderança mundial
Capacidades tecnológicas que conduzem à perda de
inovação e perda de competitividade
108 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
3 A força do passado: utilizar modelos mentais e metodologias antigas para resolver e inter-pretar problemas e situações presentes;
4 Incapacidade de inovar com base em novos métodos: insistência em usar permanecer com métodos e estratégias que sempre funcionaram (no passado);
5 Experimentação limitada: limitada capaci-dade ou ímpeto para tentar novas aborda-gens e alternativas; e
6 Descarte de conhecimentos externos: exacerbação da “síndrome do não-inventa-do-aqui”.
Mensuração de Capacidades Tecnológicas Um dos princípios básicos de gestão afirma que
somente é possível gerir bem aquilo que se pode
medir bem. Essa máxima da gestão aplica-se ao
processo de desenvolvimento industrial, tanto da
perspectiva de políticas públicas como de estraté-
gias empresariais. Esta seção aborda a mensura-
ção de capacidades tecnológicas.
Abordagens Convencionais para Mensuração de Capacidades TecnológicasNotadamente e, majoritariamente, observamos nos
estudos sobre capacidades tecnológicas a utilização
de diversos indicadores, utilizados com o objetivo
de mensurar capacidades inovadoras. Destacamos,
nesta seção, as abordagens mais utilizadas para esta
finalidade, bem como, a necessidade de avançarmos
na maneira como mensuramos estas capacidades.
MENSURAÇÃO DE CAPACIDADES INOVA-DORAS À BASE DE INDICADORES AGRE-GADOS (SURVEYS DE INOVAÇÃO)
Os indicadores econômicos, em geral, começaram
a aparecer na economia, sobretudo sob a forma de
dados e estatísticas como ferramentas matemá-
ticas, na década de 1930. Variavam entre indica-
dores de crescimento, produtividade, emprego,
inflação, entre outros, de modo a avaliar e diagnos-
ticar a evolução dos principais componentes da
economia dos países. O surgimento e a compilação
de tais indicadores influenciaram, mais tarde, o de-
senvolvimento de estatísticas similares para ciência
e tecnologia. Assim, costuma-se marcar a década
de 1950 como o período onde as discussões sobre
ciência e tecnologia passaram a se dar de forma
mais profunda, analítica e contínua, à medida que
foi confirmada e reconhecida sua importância,
essencialmente para o desenvolvimento econômico
e tecnológico.
A partir da década de 1960, diante da intensifica-
ção e compreensão da importância dos elementos
tecnológicos para o avanço dos países e de suas
economias, os aspectos relacionados à inovação
tecnológica tornaram-se o foco principal de grande
parte dos estudos sobre o tema. Neste sentido, a
mensuração de ciência e tecnologia tem como pre-
cursores a Fundação Nacional de Ciência (National
Science Foundation – NSF) dos EUA, na década de
1950, e organismos intergovernamentais tais como
a Organização para a Cooperação e o Desenvolvi-
mento Econômico (OCDE), nos anos de 1960.
Em 1961, a OCDE foi formada a fim de organi-
zar e coordenar políticas de ciência e tecnologia
entre seus países membros e, em 1962, ocorreu a
primeira conferência dedicada ao desenvolvimento
de indicadores de C&T. Em 1963, foi divulgado o
Manual Frascati, que propunha práticas e metodo-
109CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
logia padronizadas para levantamentos de P&D. A
partir da década de 1990, com o reconhecimento
das limitações presentes em abordagens ante-
riores (como o Manual Frascati) e a necessidade
de padronização de tais relatórios e documentos
(sobretudo para fins de comparabilidade), a OCDE
decidiu preparar e adotar um manual para os seus
países-membros como modelo conceitual para
condução das pesquisas sobre inovação, deno-
minado Manual de Oslo. Foi adotado em 1992,
revisado pela primeira vez em 1996 e publicado em
colaboração com a Eurostat (Statistical Office of
the European Communities) em 1997. O objetivo
era harmonizar metodologias nacionais e coletar
informações padronizadas sobre as atividades
inovadoras das empresas, concentrando-se unica-
mente na inovação tecnológica.
Assim, a OCDE, ao longo de mais de 40 anos,
é responsável pela elaboração de indicadores
voltados para ciência e tecnologia, através da
elaboração de uma série de manuais, conhecidos
como Família Frascati, cada um buscando abor-
dar, de forma mais aprofundada, determinada
vertente da disciplina, tais como P&D (Manual
Frascati), inovação (Manual de Oslo), recursos
humanos (Manual de Canberra), balança de
pagamentos tecnológica e patentes (Manual
de Patentes). De forma semelhante, a Eurostat
publica relatórios anuais sobre financiamento pú-
blico de P&D, apropriação de P&D, distribuição
regional de pessoal voltado para P&D, gastos em
P&D e aplicações de patentes. É co-responsável
por trabalhos metodológicos em diversos domí-
nios, tendo participado ativamente da primeira
revisão do Manual de Oslo. Os levantamentos de
inovação foram, e são, amplamente influenciados
pelos três Community Innovation Surveys (CIS)
preparados e coordenados pela Eurostat.
Com a publicação do Manual de Oslo e o exem-
plo de países da OCDE e da UE (União Européia)
conduzindo suas pesquisas de inovação, diversos
países em desenvolvimento também se lançaram
na medição da inovação. Consequentemente,
passaram a utilizar as bases metodológicas dis-
poníveis, ganhando destaque o Manual de Oslo
como guia de suas pesquisas. Entretanto, grande
parte delas foi formatada e realizada levando
em consideração algumas adaptações, para que
fossem capazes de capturar os elementos e
especificidades característicos de tais contextos.
Assim, inicialmente, este grupo de países passou
a utilizar as abordagens internacionais, mas sob
alguma forma modificada/adaptada, sendo que
cada um o fazia de forma distinta.
Assim, mensuração à base de levantamentos es-
tatísticos é geralmente fundamentados a partir de
grandes amostras de empresas de setores indus-
triais diversos. São conhecidos como os innovation
surveys. Trata-se de uma abordagem em nível
“agregado” baseada na construção e interpretação
de indicadores nacionais, compreendendo milha-
res de empresas em diversos setores industriais.
Com base na experiência da Europa, esses surveys
foram introduzidos na década de 2000 em vários
países em desenvolvimento como Argentina,
Brasil, Uruguai, entre outros. No Brasil esse survey
é realizado por meio da Pesquisa de Inovação
(PINTEC), executada pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE). Abordagem de
surveys de inovação adota uma perspectiva macro
ou agregada de alguns aspectos das atividades
inovadoras de um grande número de empresas.
Por outro lado, os surveys não captam as nuanças
dessas atividades em nível intra-indústria e de
empresas. Outra limitação é que se baseiam em
percepções dos respondentes.
110 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
GASTOS/ESTATÍSTICAS DE P&D
A intensidade de P&D é o indicador mais im-
portante utilizado pela OCDE para classificar
empresas e setores industriais, de acordo com
sua intensidade tecnológica. Assim, grande ênfase
costuma ser dada aos indicadores baseados em
financiamentos e investimentos em P&D nos
levantamentos de inovação. Ocorre que a oferta
e disponibilidade de estruturas físicas e organi-
zacionais de P&D não garantem que inovação
ocorra. Há vários casos de empresas, mesmo em
economias avançadas, que, a despeito de possuí-
rem sofisticadas instalações de P&D, sofrem com
lenta e baixa capacidade inovadora. Ou seja, o seu
problema é muito mais de organização e gestão de
suas capacidades tecnológicas e funcionamento
de seus processos de aprendizagem. Isto reflete-
-se na afirmação de David Teece35:
“Mesmo com grandes orçamentos de P&D, o sucesso em inovação não é automático. Para sustentar uma performance verdadeiramente com-petitiva, a empresa deve fazer mais do que simplesmente alocar grandes gastos em P&D. O processo de ino-vação requer uma orquestração pro-ativa e deliberada de ativos tangíveis e intangíveis por empreendedores e gerentes. Isto serve tanto para pe-quenas como grandes empresas.”
Ainda com relação aos indicadores relativos a
P&D, a análise de cientistas e engenheiros aloca-
dos em P&D em proporção à população também
é bastante utilizada. Porém, sua utilidade é bas-
tante restrita, pois a qualidade dos engenheiros e
cientistas em P&D pode diferir entre países, e seu
valor econômico pode depender do tipo de P&D
em que estão engajados.
Outro aspecto sobre a adoção de estatísticas
de P&D se refere ao fato de que a incidência de
laboratórios de P&D formalmente organizados
nas economias em desenvolvimento é rara, se
comparada a alguns setores industriais de países
tecnologicamente avançados. Nos países em
desenvolvimento, grande parte das atividades tec-
nológicas inovadoras é conduzida dentro das pró-
prias empresas, em suas unidades organizacionais,
nos departamentos de engenharia, de qualidade e
manutenção. Assim, a utilização destas estatísti-
cas não contabiliza algumas das principais fontes
de acumulação de capacidades tecnológicas em
economias emergentes, tais como as atividades
de engenharia (não P&D) e a absorção e adoção
de conhecimento adquirido externamente (de um
competidor, de outra indústria, do governo, de
universidades ou outros países).36
ESTATÍSTICAS DE PATENTES37
Sendo as patentes um dos principais representan-
tes dos direitos de propriedade, referindo-se ao
subconjunto voltado para propriedade industrial
e frequentemente utilizadas pelas empresas para
proteção de seus produtos e processos peran-
te a concorrência, estas passaram a ser outro
parâmetro de inovação e capacidade tecnológica
altamente utilizado, focado no resultado, por
fornecerem detalhes estatísticos altamente quan-
tificáveis, estarem disponíveis para longo período
de tempo e serem documentos públicos. Algumas
limitações referentes às patentes envolvem:
1 Nem todas as invenções são tecnicamen-te patenteáveis (por exemplo, no caso de software, que, em geral, estão legalmente protegidos por direitos autorais);
2 Empresas, muitas vezes, utilizam outros métodos para proteger suas inovações (por exemplo, segredo industrial, lançamento pioneiro no mercado);
3 Elevado custo para patentear uma invenção;
4 As invenções patenteadas realmente se transformam em inovações;
35. Teece (2007).
36. Bell & Pavitt (1993).
37. Figueiredo (2015).
111CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
5 Não capturam as atividades inovadoras das empresas, sendo, somente, indicadores de resultado;
6 Há grande variabilidade entre indústrias em termos de suas propensões a patentear; e
7 Assim como os indicadores de P&D, as estatísticas de patentes estariam captando apenas uma fração das atividades inovadoras (ou a “ponta do iceberg”).
Os documentos de patentes devem conter, como
requisito legal, citações de outras patentes e refe-
rências a outros documentos, tais como artigos, re-
sumos e livros, que representam os conhecimentos
existentes que subsidiaram a invenção, servindo,
portanto, como forma de limitar o escopo de reivin-
dicação de novidade. Assim, a citação de patentes
também costuma ser utilizada como indicador do
fluxo de conhecimento, por representarem uma li-
gação com inovações anteriores ou conhecimentos
preexistentes nos quais o inventor se baseou, pois,
ao indicar uma patente, o inventor está informando
que o conhecimento contido na citada patente foi
útil para o desenvolvimento de sua própria patente.
Entretanto, muitos estudos sobre citações de pa-
tentes não são capazes de identificar precisamente
aquelas citações escolhidas pelo inventor, pelo fato
de o documento de patentes reportar as citações
selecionadas pelo examinador, o que pode incluir
todas, parte ou nenhuma das citações originalmente
selecionadas e efetivamente utilizadas pelo inventor.
Assim, conhecendo o procedimento, as empresas
normalmente fazem as aplicações de patentes
de forma estratégica, muitas vezes com ajuda de
profissionais experientes no assunto, o que faz com
que as citações reflitam a estratégia da empresa, e,
nem sempre, as ligações e redes que foram utilizadas
no desenvolvimento do invento. Ou seja, além de
compartilharem muitas das limitações apresentadas
pelas patentes, estudos que utilizam citações de
patentes podem apresentar um resultado enviesa-
do, pois podem estar interpretando e contabilizando
patentes que nem sequer foram citadas no docu-
mento original do inventor ou que representam uma
estratégia da empresa solicitante e não necessaria-
mente uma fonte de conhecimento utilizada.
Outra restrição à utilização de patentes, de forma
geral e indistinta, como indicador de capacidade
e inovação tecnológica, é sua concentração em
determinados setores. Por exemplo, a indústria far-
macêutica é, tradicionalmente, um setor que investe
de forma considerável em pesquisa, possuindo taxas
elevadas de concessão de patentes e registros de
marcas nos órgãos competentes. As patentes estão
concentradas em grandes empresas: menos de 700
empresas do mundo são responsáveis por cerca de
60% das patentes mundiais. Dessa forma, novamen-
te, a consideração apenas quantitativa das patentes,
sem levar em conta os demais fatores envolvidos,
ou seja, sem concomitante análise do setor e demais
aspectos inerentes, pode fornecer dados incomple-
tos, sem informações relevantes sobre, como, por
exemplo, a concentração industrial e a estrutura de
mercado se relacionam com inovação.
GASTOS COM MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS
A contabilização dos gastos das empresas com
máquinas e equipamentos costuma ser defendida
como um indicador do esforço tecnológico da
empresa no sentido de ampliar sua capacidade,
considerando, sobretudo, as pesquisas que to-
mam a difusão como um componente importante
do processo de inovação. Não obstante o mérito
de buscar capturar tecnologia incorporada em
materiais e componentes adquiridos externamen-
te, este tipo de mensuração deve ser cuidado-
samente realizado e seus resultados analisados
de forma criteriosa, já que a pura consideração
de números representando valores brutos não é
capaz de fornecer informações esclarecedoras.
De um lado, no valor dos equipamentos estão
embutidos uma série de “custos” com os quais
a empresa fabricante incorre, muitos dos quais
112 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
não estão relacionados ao dispêndio de conhe-
cimento e habilidades no desenho, fabricação,
melhorias nos equipamentos adquiridos, bem
como está inserida também a própria margem de
lucro do fornecedor; além daquelas aquisições vi-
sando à reposição de peças ou equipamentos por
desgaste ou simples manutenção. E de outro, é
difícil distinguir entre investimento de capital em
tecnologias antigas e novas, isto é, o montante da
tecnologia incorporada referente a determinado
nível de novidade e aperfeiçoamento conside-
rado inovador. Diante disso, normalmente são
contabilizados os gastos totais, sem separação
ou “qualificação” dos valores efetivos, ou seja,
são mecanismos estáticos.
Portanto, é óbvio que se deseja que a indústria se
mova para níveis intensivos de P&D e patentário.
Porém, grande parte das empresas em economias
em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, ainda
não chegaram a um estágio de intensivas ativida-
des de P&D e de patentes. Ademais, como vimos,
esses indicadores, se considerados isoladamente,
possuem limitações intrínsecas. Por isso, é funda-
mental o uso de metodologias mais compreensivas
que captem a real capacidade tecnológica de forma
compreensiva, e não apenas uma fração dela.
Mensuração à Base de Níveis de Capacidades Tecnológicas Uma alternativa para superar as limitações das
proxies acima mencionadas refere-se à estratégia
de mensuração à base de uma escala que capta ní-
veis de capacidade tecnológica, em nível de em-
presas e indústrias. Trata-se de uma abordagem
que objetiva medir capacidade tecnológica dentro
de empresas de setores industriais específicos.
Ou seja, examina um espectro de capacidades
tecnológicas das empresas, tanto para atividades
de produção, como de atividades de inovação.
Em termos de capacidades inovadoras, alinha-se,
portanto, à perspectiva abrangente de inovação,
como mostrado anteriormente neste documento.
Por oferecer um espectro de capacidades tecno-
lógicas (para produção e inovação), vai muito além
de uma perspectiva binária ou polarizada – em
termos de uma empresa “ser ou não ser inovado-
ra” ou de “ter ou não ter capacidade tecnológica”.
Possibilita, também, um exame mais detalhado
sobre os tipos de níveis de capacidade de diferen-
tes funções tecnológicas (processos, produtos,
equipamentos, gestão de projetos), desenvolvidos
por empresas de setores industriais específicos ao
longo do tempo. Por possibilitar essa cobertura ao
longo do tempo, alinha-se à perspectiva dinâmica
da acumulação de capacidade tecnológica em
empresas de economias em desenvolvimento,
preocupação central neste estudo.
Convém esclarecer que não se está sugerindo
aqui qualquer tipo de superioridade de uma abor-
dagem sobre a outra. A aplicação dos surveys de
inovação adota uma perspectiva macro ou agrega-
da que nos permite, metaforicamente falando,
obter uma visão da “floresta”, enquanto a segunda
(tipos e níveis de capacidades tecnológicas nas
empresas) nos fornece uma perspectiva de “ár-
vores” específicas ou de um grupo ou espécies de
uma floresta. São consideradas neste estudo, por-
tanto, como abordagens complementares. Ambas
são importantes para o desenho e implementação
de estratégias empresariais e governamentais de
inovação industrial, assim como para decisões de
investimentos em inovação.
SOBRE A METODOLOGIA ESPECÍFICA PARA A MENSURAÇÃO DE CAPACIDADES TECNOLÓGICA
A metodologia aqui apresentada baseia-se na
perspectiva de capacidades reveladas. As capaci-
dades são reveladas nas atividades tecnológicas
que as empresas são capazes de realizar individu-
113CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
almente e/ou em parceria com outras organiza-
ções. Alinhando-se a uma lógica típica de estágios
de industrialização e dos modelos de maturidade,
essa metodologia baseia-se em uma escala de es-
tágios de capacidade tecnológica exatamente para
entender se e como empresas e setores indus-
triais como um todo estão se movendo ao longo
deste gradiente. Um dos principais objetivos de
políticas públicas pode perfeitamente ser o de que
o Brasil evolua para um elevado nível patentário e
de concentração de laboratórios de P&D. Porém,
para que se caminhe nesta direção, é indispensá-
vel entender como as empresas acumulam suas
capacidades, ao longo do tempo, para a realização
dessas atividades.
Para a mensuração de capacidades tecnológi-
cas, este estudo utiliza a escala compreen-
siva que se baseia em uma escala de níveis
de capacidades tecnológicas.38 A Figura 6.5
fornece um exemplo ilustrativo dessa esca-
la de capacidades tecnológicas. Essa escala
expressa os níveis de capacidades com base
na natureza das atividades que a empresa é
capaz de realizar tecnologicamente e sugere
que a acumulação das capacidades tecnológicas
ocorre em estágios, que evoluem de básicos
para intermediários a avançados. Para avaliar
os níveis de acumulação de capacidades em
cada uma das principais
funções tecnológicas
da empresa, a metodo-
logia se baseia em uma
estrutura matricial que
diferencia as capacida-
des de produção das
capacidades inovadoras.
A escala distingue dois tipos de capacidade
tecnológica: as de produção e as capacidades
inovadoras. As capacidades tecnológicas de
produção (ou operacional) referem-se àquelas
que permitem às empresas usar ou adotar tec-
nologias e sistemas de produção existentes, ou
seja, são os recursos necessários para realizar
atividades de produção de bens ou serviços
com dado grau de eficiência. Já as capacidades
tecnológicas inovadoras possibilitam às em-
presas implementar diferentes tipos e graus de
atividades inovadoras, estando relacionadas aos
recursos necessários para gerar e gerir mudan-
ças tecnológicas, em termos de inovações em
processos, produtos, sistemas técnico-físicos,
serviços e na organização.
A escala distingue dois tipos de capacidade tecnoló-gica: as de produção e as capacidades inovadoras.
Para a mensuração de capa-cidades tecnológicas, este estudo utiliza a escala com-preensiva que se baseia em uma escala de níveis de capa-cidades tecnológicas.
38. Lall (1992), Bell & Pavitt (1993, 1995), Figueiredo (2001).
114 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 6.5
ESCALA DE NÍVEIS DE CAPACIDADES TECNOLÓGICAS (VERSÃO SIMPLIFICADA)
Capacidade para implementar atividades operacionais básicas que garantem o funcionamento da organização com base no uso das mais avançadas técnicas de produção/operação e de padrões e certificações internacionais de eficiência, qualidade, confiabilidade e segurança
Capacidade para implementar atividades operacionais com base no uso de tecnologias existentes e sistemas de produção e de padrões de eficiência e qualidade.
1CAPACIDADE DE
PRODUÇÃO BÁSICA
2CAPACIDADE DE
PRODUÇÃO AVANÇADA
Capacidade para implementar atividades inovadoras à base de P&D e engenharia avançada, realizadas internamente e/ou em colaboração com universidades e institutos de pesquisa, fornecedores e usuários, relativas à criação e desenvolvimento de tecnologias novas para o mundo e que abrem oportunidades para entrada em novos negócios.
Capacidade para implementar atividades inovadoras próximas àquelas realizadas pelos líderes globais, refletindo uma estratégia de fast follower, à base de P&D aplicado e engenharia, realizadas internamente e/ou em colaboração com universidades e institutos de pesquisa
Capacidade para implementar modificações relativamente complexas em tecnologias (produtos, processos, software, equipamentos, serviços) existente baseadas em engenharia e experimentações, realizadas internamente ou em parceria
Capacidade para implementar pequenas adaptações e melhorias em tecnologias (produtos, processos, software, equipamentos, serviços), realizadas internamente ou em parcerias
6CAPACIDADE INOVADORA DE LIDERANÇA MUNDIAL
4CAPACIDADE INOVADORA
INTERMEDIÁRIA
3CAPACIDADE INOVADORA
BÁSICA
5CAPACIDADE INOVADORA
AVANÇADA
CA
PAC
IDA
DE
S D
E P
RO
DU
ÇÃ
OC
APA
CID
AD
ES
IN
OV
AD
OR
AS
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2001, 2003, 2015, 2017).
115CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
Especificamente, a escala capta atividades tecno-
lógicas de nível mais básico (produção), níveis in-
termediários a avançados de inovação, tais como
aquelas baseadas em atividades de engenharia
e que são de grande relevância até as atividades
de mais sofisticadas de (P&D) e patentárias com
grau de novidade mundial. É importante notar
que a escala inclui P&D e patentes; porém, não os
considera como indicadores únicos, mas os situa
em níveis específicos na escala.
Essa metodologia permite ir além da empresa
como um todo como unidade de observação.
Como foi comentado na Seção 5 e anteriormente
nesta seção, as empresas são uma coleção de
capacidades para áreas ou atividades especia-
lizadas. Por isso, esta metodologia permite
captar níveis de acumulação de capacidades
para áreas ou funções tecnológicas específicas
(por exemplo, produto, processos de produção,
engenharia de software etc.).
Esses níveis de capacidades refletem a diferença,
por exemplo, entre uma empresa capaz de manu-
faturar um celular e outra que, além de fabricar, é
capaz de fazer o software do aparelho móvel. Ou
entre uma empresa que monta aviões ou que é
capaz de projetá-los. Ou entre um país com capa-
cidade tecnológica para lançar foguetes, mesmo
tendo uma renda baixa, como a Índia, e outro que
não tem a mesma capacidade, como o Brasil. É a
diferença entre fabricar um carro, fazer algumas
mudanças nos seus componentes, projetar um
carro ou, na fronteira, projetar e fabricar um carro
elétrico. Por isso, essa metodologia diferencia
as capacidades de produção das capacidades
inovadoras. É importante, como já mencionado,
fazer a distinção entre uma operação avançada
tecnologicamente, como no caso de uma empresa
que adquire maquinário de última geração, e a ca-
pacidade de inovar ou de desenvolver tecnologia.
A fim de evitar avaliações de natureza “subjeti-
va” acerca dos níveis de capacidade tecnológica
alcançados pela empresa em estudo, tal avaliação
precisa ser substanciada por evidências concretas
(fatos) que comprovem que a empresa é capaz
de realizar certa atividade tecnológica, com
determinado grau de novidade e complexidade.
Tal abordagem tem como fundamento a aquisição
direta de informações descritivas com relação às
atividades tecnológicas das empresas. Com rela-
ção a essa taxonomia para medição de capacida-
des tecnológicas, é relevante esclarecer que:
1 A metodologia não pressupõe que todas as unidades de uma mesma empresa necessa-riamente se capacitem em uma sequência linear;
2 A metodologia não pres-supõe que as capacidades sejam acumuladas e sus-tentadas (ou debilitadas) ao mesmo tempo e à mesma velocidade para as diferen-tes funções tecnológicas;
3 Para certa função tecno-lógica, pode-se alcançar uma profundidade de capacidade tecnológica, enquanto que, em outra função, pode-se acumular um nível mais superficial;
4 É possível uma empresa acumular partes de certas capacidades inovadoras sem que a acumulação de suas capacidades operacio-nais esteja consolidada, o que é denominada acumulação incompleta;
5 Permite reconstruir a trajetória de acumulação de capacidades tecno-lógicas e compreender o processo pelo qual em-presas tem se movido na direção inovadora;
6 Permite captar nuanças no processo de acumu-lação de capacidades tecnológicas;
7 Permite captar a dinâmica (ou timing) do processo de acumulação de capacidades
Esses níveis de capacidades refletem a diferença, por exemplo, entre uma empresa capaz de manufaturar um celular e outra que, além de fabricar, é capaz de fazer o software do aparelho móvel.
Essa metodo-logia permite ir além da empresa como um todo como unidade de observação.
É importante fazer a dis-tinção entre uma operação avançada tecnologicamente, como no caso de uma em-presa que adquire maqui-nário de última geração, e a capacidade de inovar ou de desenvolver tecnologia.
116 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
tecnológicas. A noção de tempo de acu-mulação tecnológica é fundamental para decisões de planejamento e de avaliação do processo de inovação industrial.39
8 Especificamente, o uso de métricas para aferir a qualidade e a velocidade o progresso de acumulação de capacidades tecnológicas, especialmente as inovadoras, torna-se de grande importância para as atividades de gestão empresarial e de política pública no que diz respeito à inovação e desenvolvi-mento industrial.
A aplicação desse sistema de mensuração de
capacidades tecnológicas teve grande ímpe-
to a partir de 1999, no âmbito do Programa
de Pesquisa em Aprendizagem Tecnológica e
Inovação Industrial da EBAPE/FGV. Já foram
realizados mais de 20 estudos em empresas de
vários setores industriais ao redor do Brasil. Essas
pesquisas já chegaram a resultados extremamen-
te reveladores sobre capacidades tecnológicas e
de inovação no país. Esse sistema de mensuração
de capacidades tecnológica tem sido amplamente
e internacionalmente aceito na comunidade cientí-
fica. Esse reconhecimento reflete-se na aplicação
dessa mensuração em vários estudos publicados
em prestigiadas revistas científicas internacionais.
Também se reflete em sua aplicação em iniciativas
de desenvolvimento industrial.
Portanto, uma abordagem dessa natureza, ainda
pouco explorada em larga escala no Brasil até
recentemente, permite a captação de nuanças,
especificidades empresariais, setoriais e regio-
nais do processo de acumulação de capacidades
tecnológicas. Considerando que este processo
ocorre dentro de organizações, tal abordagem
torna-se de crucial importância como clarifica-
dora, iluminadora e apoiadora do processo de
desenho, redesenho, implementação, ajustes de
estratégias de desenvolvimento de capacidades
tecnológicas em empresas de economias emer-
gentes. Serve, portanto, como uma perspectiva
complementar à abordagem em nível agregado.
Por sua simplicidade, associada ao seu nível de
detalhe e rigor analíticos e de aplicação, tam-
bém pode ser aplicada pela própria empresa por
meio de iniciativas de seus próprios gerentes,
como um exercício de auto avaliação de sua
capacidade tecnológica.
Por fim, uma perspectiva sobre o processo de
acumulação de capacidades tecnológicas em
empresas específicas de determinados setores
industriais, como feito na abordagem baseada em
níveis de capacidades tecnológicas em empresas,
possibilita a identificação de nuanças e detalhes
altamente importantes para se obter uma visão
com adequado nível de detalhe e profundidade.
Possibilita, também a identificação da velocidade
(medida em número de anos) que empresas levam
para acumular (ou não acumular) capacidades
para funções tecnológicas específicas de produ-
ção e de inovação, como será mostrado adiante.
39. Bell (2006).
117CAPÍTULO 06 | CAPACIDADES TECNOLÓGICAS: ESTOQUE DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL
39. Bell (2006).
118 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
07
119RESUMO EXECUTIVO
Catch-up Tecnológico: Ideias Básicas
120 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
07. Catch-up Tecnológico: Ideias BásicasEsta seção descreve e analisa a literatura sobre
industrialização e desenvolvimento tecnológico
em economias em desenvolvimento, bem como
das perspectivas sobre inovação de empresas
nestas economias.
Empresas de Economias em Desenvolvimento: Principais Características TecnológicasA literatura sobre industrialização e desenvolvi-
mento tecnológico em economias em desenvolvi-
mento denomina as empresas dessas economias
como “latecomers”. Elas entram tardiamente no
mercado e nas indústrias onde operam não por uma
escolha estratégica, mas por razões históricas: os
seus países iniciaram o seu
processo de industrialização
tardiamente. Ou seja, quando
países como Brasil, Índia, Chi-
na, Turquia, México, Malásia,
iniciaram seu processo de
industrialização, já havia uma
fronteira tecnológica definida,
em vários tipos de indústria, e
dominada por empresas das
(hoje) economias avançadas.
Em função de suas características tecnológicas e
levando-se em conta o contexto no qual nascem e
crescem, as empresas de economias em desenvolvi-
mento tornaram-se uma categoria específica de pes-
quisa. Merecem ser estudadas à luz de modelos de
análise específicos. Uma das principais características
tecnológicas distintivas das empresas de economias
em desenvolvimento – daqui em diante denominadas
tecnicamente latecomers – é sua deficiência inicial de
recursos ou de capacidades tecnológicas, especial-
mente as capacidades para inovação. Em geral,
elas iniciam o seu negócio à base de tecnologia que
adquiriram de empresas de outros países. Durante
o início da sua operação faltam-lhes até mesmo
capacidades tecnológicas básicas. Uma vez que
começam sob uma condição de não serem competi-
tivas no mercado mundial, o seu problema básico é a
maturação industrial ou a acumulação de capacidade
tecnológica para tornarem-se internacionalmente
competitivas. Por isso, empresas que miram uma
posição tecnológica e comercial competitiva no
mercado mundial, ainda que tendo nascido e estando
operando em economias em desenvolvimento,
intencionam a realização do catch-up tecnológico.
Nas seções seguintes deste estudo, será apresentada
uma perspectiva ampla sobre catch-up tecnológico.
Empresas que miram uma posição tecnológica e
comercial competitiva no mercado mundial, ainda
que tendo nascido e estan-do operando em econo-
mias em desenvolvimento, intencionam a realização do
catch-up tecnológico.
121CAPÍTULO 07 | CATCH-UP TECNOLÓGICO: IDEIAS BÁSICAS
Adicionalmente, as empresas latecomers são geral-
mente deslocadas das fontes-chave internacionais
de tecnologia – tais como os bem-equipados
centros de P&D e universidades – e também dos
mercados internacionais correntes que desejam
fornecer. Porém, essa característica tem que ser
relativizada. As possibilidades atuais de interação,
de mobilidade e de conectividade internacionais
contribuem para evitar o isolamento das empre-
sas latecomers, ainda que localizadas em áreas
muito longínquas. Não obstante, essas empresas
geralmente operam em um contexto de escassez
de profissionais qualificados e de escassez de
organizações de apoio às suas atividades tecnoló-
gicas (p. ex., metrologia, escolas técnicas, centros
de treinamentos profissionais equipados etc.).
Suas principais características são:
1 Em geral, a sua entrada na indústria ocorre tardiamente, ou seja, muito depois daquelas empresas líderes de países hoje tecnolo-gicamente e industrialmente avançados. Mas essa entrada tardia não decorre de uma escolha estratégica, mas por razões e condicionantes históricos. Ou seja, não se trata de uma entrada tardia derivada de escolhas estratégica (late-entry), como é o caso de várias empresas que optam em en-trar tardiamente no mercado. Ocorre que a inserção de empresas de países em desenvol-vimento na indústria e no mercado depende de condições estruturais como o processo de industrialização em nível nacional, da criação de demanda interna, de condições macroeco-nômicas, os quais, por sua vez, associam-se às condições históricas específicas de desenvol-vimento de cada país.
2 Iniciam o seu negócio à base de tecnologia importada de outras empresas e de ou-tros países (tecnologicamente avançados). Durante os primeiros anos, o seu nível de capacidade tecnológica é muito baixo. Em ge-ral, portanto, capacidade tecnológica inicial é mínima: é capaz apenas de realizar atividade de produção (ou uso/operação de tecnolo-gias de sistemas de produção existentes e, ainda assim, com baixo nível de eficiência).
3 Adicionalmente, as empresas de economias em desenvolvimento operam em um con-texto que, em geral, tende a ser carente de organizações para apoiar suas atividades de produção, de escolas técnicas e de universi-dades para lhes fornecer recursos humanos adequadamente qualificados, de institutos e de laboratórios de pesquisa para apoiar suas atividades tecnológicas mais sofisticadas. Ou seja, a infraestrutura tecnológica que as cercam tende a ser, em geral, precária.
4 Outra característica é que a empresa de eco-nomia em desenvolvimento está normalmen-te distante dos mercados onde deseja inserir seus produtos e serviços. Ademais, depa-ra-se com várias barreiras mercadológicas que envolvem desde a falta de credibilidade inicial, a exigências de certificações especí-ficas até barreiras comerciais (e de natureza política) aos seus produtos e serviços nos mercados que deseja atingir.
No entanto, há exceções. Há empresas que “nas-
cem inovadoras”, como novos empreendimentos
que emergem de empresas tecnologicamente
avançadas, mesmo em países em desenvolvimen-
to, via processos de spin-off por exemplo. Assim
como há emergência de novas indústrias a partir
de novas tecnologias, com as startups. Também
há empresas que, ainda que estejam baseadas em
países em desenvolvimento, perdem a sua condição
de latecomers e ganham condição de empresas
inovadoras em nível internacional, ou seja, empre-
sas que detém posições de liderança tecnológica e
comercial em suas indústrias em nível internacional
(world-leading firms), tais como Hyundai, Samsung,
Embraer, Fibria, Natura, Weg, Vale, Gerdau, Petro-
bras, Cemex, Infosys, Dr. Reddy e outras.
A obtenção, pelas empresas latecomers, de po-
sição de competitiva de liderança tecnológica e
comercial em nível internacional depende de um
árduo processo de acumulação de capacidades
tecnológicas (sua própria base de conhecimento).
Em geral, iniciam as suas atividades na condição
de imitadoras. Ou seja, para que alcancem tal
122 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
posição é necessário um engajamento deliberado
em um processo de catch-up tecnológico. Esse
catch-up tecnológico significa o estreitamento
ou fechamento do hiato (ou gap) de capacidades
tecnológicas inovadoras que separa as empresas
latecomers das empresas líderes globais, cuja maio-
ria está baseada em economias avançadas.
Não obstante, existem diversos tipos de empresas
latecomers. Portanto, as chamadas latecomers não
devem ser interpretadas ou estudadas como uma
categoria única de empresa:
1 As empresas latecomers podem ser empresas locais privadas (grandes, médias ou peque-nas), locais estatais e/ou subsidiárias de empresas multinacionais (EMNs) de econo-mias avançadas operando em economias em desenvolvimento.
2 Elas podem apresentar tipos e níveis diferen-ciados de capacidades tecnológicas, tanto em nível de produção como de inovação.
Ou seja, algumas podem estar operando distantes da fronteira internacional de ino-vação, mas próximas ou mesmo na fronteira internacional de produção40. Especifica-mente, podem ser identificadas empresas que já se encontram em estágios de geração de tecnologia e inovações, que são as empre-sas localizadas na fronteira tecnológica, bem como aquelas que ainda se encontram nos estágios menos avançados, desenvolvendo e aperfeiçoando suas capacidades através de esforços onde dominam as capacidades técnicas, de engenharia e desenvolvimento, em grande parte, relacionadas a tecnologias existentes, buscando se aprofundar para se juntar ao grupo de empresas com capaci-dades tecnológicas mais complexas. Este segundo grupo de empresas encontra-se nos mais diversos estágios, umas ainda focadas no desenvolvimento de capacidades mais básicas, enquanto outras já se encontram em posição mais avançada, com domínio de capacidades um pouco mais complexas, mas ainda abaixo daquelas apresentadas pelas empresas tecnologicamente mais maduras.
Perspectivas sobre Inovação em Empresas de Economias em Desenvolvimento41 Até a década de 1960, as capacidades tecnológi-
cas nas empresas das economias em desenvolvi-
mento eram entendidas como o mero uso passivo
de tecnologias e sistemas de produção gerados
nas economias avançadas. Essa noção negativa
de atividade tecnológica nos países em desenvol-
vimento e suas empresas eram alimentadas pela
teoria ortodoxa do crescimento econômico. Tal
teoria considerava a “tecnologia” como sinônimo
de máquinas e equipamentos ou bens de capital.
“Inovação” significava o desenvolvimento de no-
vos tipos de máquinas e equipamentos, que ocor-
reria em economias avançadas. Essas inovações
seriam posteriormente adotadas ou “difundidas”
nos países em desenvolvimento.
A visão de que o papel tecnológico das empre-
sas e indústrias nos países em desenvolvimento
era passiva e envolvia o mero funcionamento de
tecnologias fornecidas externamente era endos-
sado, pela assim chamada escola da “dependên-
cia tecnológica”. Ao argumentar a dependência
tecnológica perpétua dos países em desenvol-
vimento nos bens de capital e manufaturados
importados das economias “centrais”, os represen-
tantes desta escola de pensamento endossavam
40. Essas definições serão esclarecidas a seguir neste documento.
41. Bell & Figueiredo (2012b); Bell (2006).
123CAPÍTULO 07 | CATCH-UP TECNOLÓGICO: IDEIAS BÁSICAS
a noção de ausência de atividades tecnológicas
criativas em empresas e indústrias de países em
desenvolvimento. Dada a força e a onipresença
de tais pontos de vista nos debates acadêmicos e
de política pública à época, não era surpreenden-
te que houvesse pouco interesse em pesquisar
aspectos de capacidades tecnológicas inovadoras
nos países em desenvolvimento.42
No entanto, nem todos os pesquisadores aceita-
vam essa perspectiva negativa sobre atividade
tecnológica industrial nos países em desenvol-
vimento. No início da década de 1970, Charles
Cooper no Reino Unido procurou entender
como os mecanismos de transferência de tecno-
logia internacional influenciavam a acumulação
de capacidades de geração de mudanças a longo
prazo em empresas e indústrias importadoras
de tecnologia, nas economias em desenvolvi-
mento. Alinhando-se a essa visão, um grupo
latino-americano de pesquisadores, liderado
por Jorge Katz, na Argentina, iniciou o primeiro
programa de pesquisa substancial e sistemático
que contrariou essa perspectiva negativa em
meados da década de 1970.
Com base em evidencias detalhadas, em nível
de empresas, eles demonstraram a existência
de atividades tecnológicas inovadoras signifi-
cativas em uma ampla gama de indústrias. Eles
também examinaram a natureza e a dinâmica
dos vários mecanismos de aprendizagem pelos
quais as empresas construíram suas capacidades
tecnológicas inovadoras ao longo do tempo. Isso
foi demonstrado inicialmente em toda a América
Latina43 e na Ásia44. Com isso, eles revelaram
vários aspectos do dinamismo tecnológico e
da criatividade tecnológica nas empresas das
economias em desenvolvimento. Em particular,
exploraram o papel importante dos mecanismos
de aprendizagem com insumos essenciais para
acumulação de capacidades tecnológicas inova-
doras. No entanto, durante a década de 1980, as
questões de aprendizado e acumulação de capa-
cidades tecnológicas desapareceram da agenda
de pesquisa e do debate de políticas públicas no
contexto de economias em desenvolvimento.
Em meados da década de 1990, surgiu uma nova
geração de pesquisadores e de estudos. Esses es-
tudos buscavam explorar o papel dos mecanismos
de aprendizagem na acumulação de capacidade
das empresas nas economias em desenvolvimen-
to, especialmente nos países de rápido crescimen-
to e rápida industrialização do Sudeste Asiático.
Posteriormente, tais estudos foram realizados na
América Latina. Esses estudos foram fortemente
influenciados pelas bases analíticas de estudos
sobre capacidades tecnológicas e inovação em
empresas de economias avançadas.45
Vários estudos inspiraram-se nas bases analíti-
cas da literatura de gestão da inovação no con-
texto de economias avançadas e adaptaram-nas
para examinar o fenômeno da acumulação de
capacidades tecnológicas e os mecanismos de
aprendizagem como fontes para a performan-
ce competitiva de empresas de economias em
desenvolvimento. Desde então, tem havido um
fortalecimento do campo de estudo sobre capa-
cidades tecnológica e inovação em empresas e
indústrias de economias em desenvolvimento.
Tal campo de estudo está atualmente consoli-
dado na literatura e na comunidade científica
internacional. Ao longo das últimas quatro
décadas, tem havido um considerável progres-
so neste campo de pesquisa. Vários estudos
têm examinado como empresas de economias
em desenvolvimento tem evoluído de níveis
imitadores de capacidades tecnológicas para
níveis de liderança tecnológica e comercial no
mercado mundial.46
42. Lall (1992); Bell & Pavitt (1993); Albu & Bell (1999); Bell (2006).
43. Katz (1976, 1987).
44. Bell et al. (1982); Lall (1987).
45. Hobday (1995); Kim (1997); Dutrènit (2000); Figueiredo (2001).
46. Ver Bell & Figueiredo (2012a).
124 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Catch-up Tecnológico e Fronteiras Tecnológicas O interesse deste estudo por catch-up tecno-
lógico também está relacionado ao catch-up
econômico. É importante
fazer uma distinção entre os
dois tipos de catch-up. Catch-
-up econômico refere-se ao
estreitamento ou fechamento
da brecha entre economias
em desenvolvimento e
economias avançadas em
termos de renda per capita.
Já o catch-up tecnológico
refere-se ao estreitamento
ou fechamento da brecha
(ou gap) entre empresas e
indústrias de economias em
desenvolvimento e suas congêneres em econo-
mias avançadas (ou líderes tecnológicos globais)
em termos de capacidades tecnológicas.
Não obstante, o catch-up econômico
depende, em grande parte do catch-up
tecnológico. O foco deste estudo, como
já anunciado anteriormente, recai sobre
o catch-up tecnológico. Uma segunda
distinção é importante. A noção de
brecha ou gap em termos de capacidade
tecnológica envolve, na verdade, dois
tipos de brecha ou gap: em termos de
capacidades tecnológicas de produção
e de capacidades tecnológicas inovadoras.
As capacidades tecnológi-
cas de produção referem-se
às capacidades para usar ou
operar tecnologias e siste-
mas de produção existentes.
Especificamente, as capaci-
dades das empresas podem
acompanhar os líderes glo-
bais da indústria em relação
às tecnologias que utilizam na produção. Seus
produtos podem vir a incorporar especificações
técnicas e de design e recursos de desempenho
cada vez mais próximos dos mais avançados do
mercado global, talvez eventualmente combi-
nando produtos que estejam próximos ou pró-
ximos da fronteira internacional da tecnologia
de produtos. Da mesma forma, os processos de
produção que eles usam podem vir a incorporar
recursos tecnológicos cada vez mais avançados,
refletidos no aumento da produtividade e ou-
tros aspectos do desempenho competitivo. Isso
pode corresponder aos que estão próximos ou
próximos da fronteira tecnológica internacional
de produção ou manufatura. Esse estreitamen-
to das lacunas tecnológicas entre a prática atual
e a fronteira internacional constitui uma forma
de “catch-up” (o de produção).
As capacidades tecnológicas inovadoras (ou
para inovação) referem-se às capacidades para
alterar tecnologias e sistemas de produção exis-
tentes, assim como para criar novas tecnologias
e novos sistemas de produção. Especificamente,
as empresas e indústrias podem se recuperar em
termos de capacidades para gerar e gerir a mu-
dança em suas tecnologias, passando de posições
de imitação de tecnologia com base em capaci-
dade de inovação muito limitada para níveis mais
profundos de capacidade que lhes permitem
assumir formas mais avançadas de inovação. Isto
pode evoluir para atividades criativas na frontei-
ra internacional de inovação.
Esses dois tipos de capacidade estão, até
certo ponto, relacionados. A acumulação delas
prossegue simultaneamente à medida que as
empresas de economias em desenvolvimento:
1 Reduzem o fosso entre empresas tecnologi-camente “avançadas” na fronteira tecnoló-gica internacional (de produção) em termos das características tecnológicas de suas atividades de produção; e
O catch-up tecnológico refere-se ao estreitamento
ou fechamento da brecha (ou gap) entre empresas e
indústrias de economias em desenvolvimento e suas
congêneres em econo-mias avançadas (ou líderes
tecnológicos globais) em termos de capacidades
tecnológicas.
As capacidades tecnológicas inovadoras (ou para inova-
ção) referem-se às capacida-des para alterar tecnologias
e sistemas de produção existentes, assim como para
criar novas tecnologias e novos sistemas de produção.
As capacidades tecnológicas de
produção referem--se às capacidades
para usar ou ope-rar tecnologias e
sistemas de produ-ção existentes.
125CAPÍTULO 07 | CATCH-UP TECNOLÓGICO: IDEIAS BÁSICAS
2 Aumentam o nível de sua capacidade inovadora.
No entanto, esses dois tipos de capacidades nem
sempre estão intrinsicamente relacionados. Uma
empresa (ou indústria) pode evoluir na acumula-
ção de capacidades tecnológicas de produção,
tornando-se usuárias eficientes de tecnologias
existentes; porém, essa empresa (ou indústria)
pode ter uma acumulação limitada de capacida-
des tecnológicas inovadoras. Numa perspectiva
extrema, uma empresa pode adquirir ou adotar um
novo sistema de produção avançado, que incorpora
as tecnologias mais “avançadas” de produção ou
manufatura, contratando uma série de consultores,
engenheiros de processos e gerentes de projetos
externos para definir e colocar em uso operacio-
nal um conjunto de processos e tecnologias. Tais
tecnologias de produção podem envolver a mais
avançada robotização e digitalização. Isso pode ser
repetido através de várias gerações de tecnologia
avançada, permitindo que a empresa que utiliza a
tecnologia reduza o fosso entre suas capacidades
de produção e as de líderes globais na fronteira tec-
nológica internacional da produção e manufatura.
Porém, a despeito da acumulação de capacidades
tecnológicas de produção altamente avançadas,
pode haver nenhuma ou limitada acumulação de
capacidades inovadoras. Ou seja, uma empresa, in-
dústria, ou mesmo país, pode se tornar, por décadas,
um mero eficiente usuário de tecnologias e siste-
mas de produção existentes, sem desenvolver a
mínima capacidade tecnológica para alterá-los.47
Por isso, este estudo distingue entre esses dois tipos
de catch-up tecnológico: catch-up tecnológico em
termos de capacidades produção e catch-up tec-
nológico em termos de capacidades tecnológicas
de inovação. O interesse central desse estudo é no
segundo tipo, o de catch-up tecnológico. É impor-
tante esclarecer que tanto a fronteira tecnológica de
produção como a fronteira tecnológica de inovação
estão em constante movimento.
CATCH-UP TECNOLÓGICO DE PRODUÇÃO E DE INOVAÇÃO E FRONTEIRA TECNOLÓGICA
Convém, neste estágio um comentário sobre a
fronteira tecnológica de produção. A maneira como
a empresa acumula suas capacidades tecnológi-
cas pode conduzi-la para níveis muito próximos
da fronteira tecnológica de
produção ou mesmo assu-
mindo posições na fronteira
internacional de produção. Por
exemplo, a empresa pode acu-
mular capacidades tecnológicas
avançadas de produção que lhe
permitem realizar, por exemplo,
atividades de manufatura de
classe mundial (world class
manufacturing), conquistando,
assim, posição de liderança
internacional em nível de
produção ou operação de tecnologias e sistemas de
produção existentes. Especificamente, por exem-
plo, uma empresa na fronteira tecnológica de pro-
dução é aquela que, por exemplo, tem capacidade
de manufaturar automóveis, computadores (PC e
laptops) ou telefones celulares em larga escala, com
altíssimo padrão de qualidade e em conformidade
com as mais atuais e rigorosas certificações de
produção, assim como os mais avançados sistemas
de produção. Porém, esta empresa limita-se tão
somente à atividade de produção, sem engajar-se
em atividades de design e desenvolvimento de
computadores ou de seus componentes.
No entanto, interessa-nos aqui, especificamente,
a fronteira tecnológica de inovação. A frontei-
ra tecnológica internacional não é uma linha de
chegada; nem é um alvo que se move constante-
mente. É fluida, é um horizonte a ser explora-
do. Empresas e países que lideram tal fronteira
fazem esforços incessantes e diários em pes-
quisa e desenvolvimento (P&D) para continuar
Uma empresa (ou indústria) pode evoluir na acumulação de capacidades tecnológicas de produção, tornando-se usuárias eficientes de tec-nologias existentes; porém, essa empresa (ou indústria) pode ter uma acumulação limitada de capacidades tecnológicas inovadoras.
No entanto, interessa-nos aqui, espe-cificamente, a fronteira tecnológica de inovação.
47. Esse padrão foi observado na indústria de celulose e papel na Indonésia. Ao longo de décadas a Indonésia foi conhecida por operar ou usar as mais avançadas tecnologias de produção de celulose e papel; porém, sem nenhuma capacidade tecnológica inovadora (ver van Dijk & Bell, 2007).
126 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
movendo esta fronteira adiante, garantindo, assim,
a sua liderança industrial, econômica e, dependen-
do da tecnologia, também relevância política. Na
maioria dos casos, essa fronteira internacional é
dominada por empresas estabelecidas (incumben-
tes), tecnologicamente avançadas e de economias
altamente industrializadas. Não obstante, como
dito anteriormente, empresas de economia em
desenvolvimento podem fazer parte dela, como já o
caso de várias empresas do Brasil, Índia e China.
“ESCADA” TECNOLÓGICA
A fim de compreendermos com mais detalhe as
possíveis trajetórias de acumulação de capacida-
de tecnológica nas empresas de economias em
desenvolvimento vamos introduzir aqui o modelo
da “escada tecnológica”, como mostrado na Figura
7.1. No eixo vertical esquerdo da figura temos a
complexidade de uma tecnologia específica (que
pode ser siderúrgica, eletrônica, automobilística).
No eixo vertical direito temos os tipos e níveis de
capacidade tecnológica. Há uma distinção crucial
entre capacidades de produção (para operar ou
usar tecnologias e sistemas de produção existen-
tes) e capacidades de inovação (capacidades para
mudar, inovar tecnologias e sistemas de produção
existentes) e as respectivas fronteiras tecnológicas.
Estas, por sua vez, variam de básicas até níveis de
fronteira internacional de inovação.
FIGURA 7.1
TRAJETÓRIA DE ACUMULAÇÃO DE CAPACIDADE TECNOLÓGICA EM EMPRESAS DE PAÍSES EM
DESENVOLVIMENTO – MODELO ILUSTRATIVO DE CATCH-UP
Co
mpl
exid
ade
da
Tecn
olo
gia
Tipo
s de capacid
ade tecn
oló
gica
Tempo (anos)50 10 15 20 25 30
Capacidades técnicas e gerencial/organizacional para usar e operar tecnologias existentes.Relacionadas a fronteira internacional de inovação.
Capacidades em desenho, engenharia, gestão e P&D para aprimoramento incremental de produtos/processos e organizacional.
Capacidades em P&D e Engenharia básica/gestão de projetos para copiar, implementar e desenvolver tecnologias existentes.
Capacidades em P&D e Engenharia para desenvolver e implementar novas tecnologias. Relacionadas à fronteira internacional de produção (catch-up tecnológico).
Fronteira tecnológica
internacional
Capacidade tecnológica acumulada
“Profundidade” da capacidade
tecnológica
Fronteira tecnológica da inovação
Fronteira tecnológica da produção
Capacidade tecnológica
acumulada por empresas de economias
emergentes
Fonte: Adaptada de Bell (1997) e Figueiredo (2015).
127CAPÍTULO 07 | CATCH-UP TECNOLÓGICO: IDEIAS BÁSICAS
A Figura 7.1 identifica dois tipos de fronteira
tecnológica internacional: de produção e a de ino-
vação. A trajetória de acumulação de capacida-
des tecnológicas de empresas de economias em
desenvolvimento se inicia, na maioria dos casos,
quando as empresas inovadoras de economias
industrializadas já acumularam estoque substan-
cial de capacidade tecnológica. Ou seja, tende a
haver uma brecha tecnológica (ou gap tecnológi-
co) permanente entre empresas de economias em
desenvolvimento e aquelas de economias tecnolo-
gicamente avançadas. Além de suas desvantagens
naturais (descritas anteriormente), a existência
dessa brecha tecnológica é um dos grandes
desafios à conquista de posição inovadora da em-
presa de economias em desenvolvimento. A linha
tempo que aparece na figura refere-se ao tempo
que se leva para mover-se ao longo da trajetória
de acumulação tecnológica. Nesta figura, essa
escala de tempo (ou velocidade) é genérica. Vale
enfatizar que o que vai dentro de cada degrau
dessa “escada tecnológica” são os componentes
da capacidade tecnológica.
Desenvolver capacidade tecnológica para apro-
ximar-se tanto da fronteira de produção como de
inovação deriva de uma opção estratégica de cada
empresa. Algumas empresas podem optar em
permanecer com níveis baixos de capacidade tec-
nológica de produção ou de inovação. Neste caso, a
empresa pode estar operando em um contexto de
pressão competitiva ausente ou muito baixa ou sim-
plesmente reflete a perspectiva de negócio de seus
dirigentes. Porém, empresas (e países) que fazem tal
opção podem pagar um alto preço em termos de alta
vulnerabilidade do negócio ou da economia a com-
petidores externos, assim como inexorável depen-
dência em relação a fornecedores de tecnologia.
Porém, empresas que operam em contextos de
forte competitividade e, principalmente, que
miram posições competitivas e de lideranças,
tanto no mercado regional, nacional e, mais ainda,
internacional, precisam engajar-se em um esforço
sistemático de busca de acumulação de capacidade
tecnológica tanto em nível de produção como de
inovação. No entanto, o fato de escolher desenvol-
ver capacidades tecnológicas de produção e de ino-
vação, obviamente, não é uma garantia de alcance
da fronteira tecnológica de inovação. Não obstante,
pode ser o ponto de partida para uma trajetória de
acumulação de capacidades inovadoras.
Ocorre que muitas empresas
ficam no meio do caminho,
pois o acúmulo de capacidades
tecnológicas é árduo, leva tem-
po, envolve diversos tipos de
esforços de aprendizagem tec-
nológica e recursos financeiros
e, além de tudo isso, é incerto
e arriscado. Por isso, são poucas as empresas que
alcançam posição de liderança em termos de pro-
dução e de inovação, em nível internacional. Por
exemplo, na Coreia do Sul, mais de 15 empresas
tentaram acumular capacidades tecnológicas
inovadoras – e realizar o catch-up tecnológico de
inovação – na indústria automobilística na Coréia
do Sul. Somente três prosperaram: entre elas
Hyundai, Daewoo e Kia. Dessas, três, somente
a Hyundai foi, de fato, bem-sucedida. Por outro
lado, algumas empresas (e governos) podem
enfatizar apenas a acumulação de capacidades de
produção, em função de incentivos econômicos
advindos de proteção exacerbada do mercado ou
de preços de seus produtos.
Além do desafio do hiato ou gap tecnológico em
si, outro grande desafio é o fato de que a linha da
fronteira tecnológica internacional nem sempre
é retilínea (Figura 7.1). Ou seja, de tempos em
tempos, as empresas que lideram a fronteira
tecnológica podem introduzir uma inovação ra-
dical e, assim, descontinuar a trajetória existente.
Alternativamente, podem surgir empresas novas
no mercado internacional à base de tecnologias
totalmente inéditas para o mercado mundial. Isto
pode aumentar ainda mais a brecha tecnológica
Desenvolver capacidade tecnológica para aproxi-mar-se tanto da fronteira de produção como de inovação deriva de uma opção estra-tégica de cada empresa.
128 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
entre empresas que lideram a fronteira (geral-
mente em países tecnologicamente avançados) e
empresas de economias em desenvolvimento.
Por exemplo, até a década de 1940, o processo de
fabricação de aço era feito a céu aberto segun-
do os processos Bessemer e, posteriormente,
Siemens-Martin. O processo de fabricação do
aço levava em torno de 9 a 12 horas. Em meados
da década de 1950 emergiu na Áustria uma nova
tecnologia de fabricação de aço. A partir desse
novo processo de produção, o aço passou a ser
fabricado em um forno hermeticamente fechado
e à base de sopros de oxigênio – conhecido como
basic oxygen furnace (BOF). Essa nova tecnologia
reduziu o tempo de fabricação do aço para 40 a
50 minutos. O Japão foi o primeiro país a adotar
essa tecnologia em larga escala. Com base em uma
capacidade tecnológica inovadora já acumulada
até então, o Japão passou a modificá-la até tornar-
-se, por volta do início dos anos 1960, um dos líde-
res mundiais no fornecimento dessa tecnologia.
Ora, a emergência dessa inovação tecnológica
radical aumentou, à época, a brecha tecnológica
de empresas de países em desenvolvimento, como
as brasileiras, em relação às dos países industria-
lizados. Por exemplo, a fim de não se tornarem
tecnologicamente obsoletas, empresas então
já estabelecidas no Brasil, como a Companhia
Siderúrgica Nacional (CSN) e a então Belgo-Mi-
neira, tiveram não apenas que adaptar suas usinas
para receber a nova tecnologia, como também
aprender a operá-la.
129CAPÍTULO 07 | CATCH-UP TECNOLÓGICO: IDEIAS BÁSICAS
130 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
08
131RESUMO EXECUTIVO
Trajetórias de Catch-up Tecnológico: Perspectiva de Ciclos
132 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
08. Trajetórias de Catch-up Tecnológico: Perspectiva de Ciclos Nesta seção são mostrados os diferentes tipos de
trajetórias de acumulação de capacidade tecno-
lógica em empresas de economias em desenvolvi-
mento, os quais foram identificados por pesquisa
ao longo das últimas três décadas.
Ciclos de Catch-up Tecnológico O alcance e o fortalecimento da competitividade
industrial de um país implicam desenvolver, inovar
e transformar continuamente a sua estrutura
industrial por meio da acumulação de capacidades
tecnológicas. O desenvolvimento industrial e tec-
nológico, por sua vez, contribui para que os países
avancem para a categoria de alta renda per capita.
De fato, o desenvolvimento industrial e tecno-
lógico não é a cura para todos os males
econômicos e sociais de um país. Não
obstante, a história nos mostra que paí-
ses que se desenvolveram industrialmen-
te, por meio da acumulação de profundas
e sofisticadas capacidades tecnológicas
para inovação industrial, também obtiveram
significativo desenvolvimento socioeconômico.
Tornaram-se países de alta renda e também se
transformaram em líderes no mercado global e
fornecedores de tecnologia em vários tipos de
indústria. Por isso, o catch-up tecnológico é de
grande relevância para o catch-up econômico.
Por exemplo, no início da década de 1800, a Inglater-
ra era uma economia de renda relativamente baixa e,
em grande parte, baseada no trabalho artesanal. O
país possuía problemas tais como esgoto a céu aber-
to e epidemias de doenças como a cólera. As décadas
posteriores a 1830 representaram uma transição de
uma economia baseada em métodos de produção
artesanal para uma economia baseada na atividade
industrial mecanizada. Essa transição envolveu, por
exemplo, a introdução de novos processos químicos
na produção de ferro, o crescente uso da energia a
vapor para a produção de novas máquinas e ferra-
mentas. Além dessas inovações em nível técnico,
houve a introdução na maneira de se organizar a
produção à base de fábricas para produção em larga
escala, ou seja, inovações organizacionais. A indús-
tria têxtil foi a primeira a introduzir as mais avança-
das tecnologias e formas de organização da produ-
ção. A mecanização da indústria texto contribuiu
enormemente para o aumento da produtividade
dessa indústria. As demais indústrias, que posterior-
O catch-up tecno-lógico é de grande
relevância para o catch-up econômico.
133CAPÍTULO 08 | TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: PERSPECTIVA DE CICLOS
mente adotaram tais inovações, obtiveram o mesmo
resultado. Essas inovações marcaram o processo de
industrialização em larga escala na Inglaterra que se
denominou de Revolução Industrial.
Por volta de 1850 o Reino Unido já tinha se tor-
nado uma economia industrializada. Os Estados
Unidos, àquela época, ainda era uma grande
economia predominantemente agrária. Porém, o
país se engajou num intenso processo de indus-
trialização. Esse processo envolveu a acumula-
ção gradual de capacidades tecnológicas. Essas
capacidades tecnológicas inicialmente envolveram
imitação de técnicas de produção adotadas
pelos então líderes globais, como a Inglaterra.
Esse processo gradual de acumulação de capaci-
dades tecnológicas levou os Estados Unidos ao
catch-up em termos das capacidades tecnológicas
mais avançadas, como a da Inglaterra. Por volta
de 1910 os Estados Unidos já dominavam grande
parte da produção mundial, tomando a liderança
da Inglaterra, em diversas indústrias.
Processo similar de industrialização ocorreu
posteriormente com o Japão. O país começou seu
processo de industrialização a partir de tecnologias
produzidas nos Estados Unidos, como a eletrônica
e automobilística. Por volta de 1960 o Japão já tinha
assumido a liderança de indústria antes dominadas
pelos Estados Unidos. E por volta do final da década
de 1990, Coréia do Sul tinha se emparelhado com o
Japão em diversas indústrias. Em um outro contexto
geográfico, a Finlândia e a Noruega, que já foram
um dos países mais pobres da Europa, engajaram-se
em processos de industrialização que envolveu o
desenvolvimento de capacidades para inovação em
diversas indústrias como celulose e papel, óleo e gás,
telecomunicações, serviços e outras.
Por outro lado, países como Coréia do Sul, Taiwan,
Brasil, Índia, China, México, Malásia, Turquia, tam-
bém se engajaram em processos de industrializa-
ção, a partir de 1950. Tendo iniciado seu processo
de industrialização quando líderes globais (Inglater-
ra, França, Suécia, Estados Unidos) já dominavam
a fronteira tecnológica de inovação, esses países
são denominados de países de industrialização
tardia ou “latecomers”. Ainda assim, várias empre-
sas e indústrias desses países tem conseguido
alcançar uma posição tecnológica de liderança na
fronteira internacional de inovação. Por exemplo,
até a década de 1960 era um importador líquido de
alimentos, de celulose para produção de papel, e de
petróleo. Quatro décadas depois o Brasil já tinha se
tornado um dos líderes mundiais nessas indústrias,
tanto em termos tecnológico, como comercial.
Mas qual a diferença entre o que ocorreu no Brasil
em comparação com países como Coreia do Sul,
Finlândia e Noruega? Ocorre que nesses países,
o processo de industrialização se disseminou por
toda a economia, contribuindo para um aumento
generalizado de ganhos de produtividade, para
o aumento da renda da economia como um todo.
Obviamente esse progresso industrial e econô-
mico foi acompanhado por um enorme fortaleci-
mento da infraestrutura científico-tecnológica,
educacional e física do país. No Brasil, assim como
em outras economias congêneres, o processo de
industrialização ainda não irradiou pelo tecido da
economia e não gerou um aumento significativo
de produtividade e da renda nacional. Por isso, o
Brasil, assim como seus congêneres Índia, México,
China, e outros ainda são países ‘presos’ na assim
chamada armadilha da renda média.
CICLOS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
O exposto acima sugere que o catch-up tecnológi-
co é um processo cíclico. O alcance da liderança
tecnológica e comercial, obviamente, não é definiti-
vo. Essa liderança será sempre desafiada por novos
entrantes, tanto de economias avançadas como de
economias emergentes. O catch-up tecnológico se
inicia, de fato, com o alcance da liderança tecnoló-
gica e comercial por uma indústria e país pioneiros/
incumbentes, geralmente de economias avançadas
(Figura 8.1). Esse pioneiro pode ser desafiado por
uma indústria de uma economia em desenvolvi-
mento (latecomer). Ao assumir a nova liderança da
indústria, em nível internacional (Figura 8.2), dá-se
início a um processo que se repete sucessivamente,
na forma de ciclos (Figura 8.3)
134 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 8.1
TRAJETÓRIA DE UM PAÍS LÍDER TECNOLÓGICO (INCUMBENTE)
A0
A1
Tempo
Par
tici
paçã
o d
e M
erca
do
ou
Pro
du
ção
B0
A
B1
Tempo
Par
tici
paçã
o d
e M
erca
do
ou
Pro
du
ção
Fonte: Lee & Malerba (2017)
FIGURA 8.2
CICLO INICIAL DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: INDÚSTRIA INCUMBENTE DESAFIADA POR UMA “LATECOMER”
Fonte: Lee & Malerba (2017)
135CAPÍTULO 08 | TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: PERSPECTIVA DE CICLOS
A
Tempo
Par
tici
paçã
o d
e M
erca
do
ou
Pro
du
ção
BC
Etapa I
Entrada
País B Etapa II
Catch-UpGradual
Etapa III
ForgingAhead
Etapa IV
Falling Behind
FIGURA 5.3
Figura 8.3
SUCESSIVOS CICLOS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
Fonte: Lee & Malerba (2017)
Diferentes Trajetórias de Catch-up Tecnológico De acordo com o senso comum, catch-up
tecnológico seria o mero emparelhamento com
líderes globais ou alcance de uma posição tec-
nológica e comercial por meio de uma trajetória
seguidora ou imitadora. Em outras palavras, na
linguagem econômica comum, e especialmente
no contexto do debate da industrialização tar-
dia, o termo “catch-up” tende a sugerir uma úni-
ca via, com diferentes empresas distribuídas ao
longo dela e uma “fronteira” claramente defini-
da. Especificamente, a noção de fronteira tende
a ser associada com a de todas as empresas que
seguem o mesmo caminho
tecnológico específico (para
o mesmo ponto final) que o
anteriormente seguido pelos
líderes tecnológicos globais.
Na realidade, o processo de
desenvolvimento tecnológico
de empresas de economias
em desenvolvimento (lateco-
mers) não pode ser represen-
tado usando a analogia de
uma corrida ao longo de uma faixa fixa devido à
possibilidade. Afinal, há diferentes oportunida-
des para o surgimento de descontinuidades que
abrem oportunidades para novas direções de
desenvolvimento tecnológico e industrial.49
Na linguagem econômica comum, e especialmente no contexto do debate da in-dustrialização tardia, o termo “catch-up” tende a sugerir uma única via, com diferentes empresas distribuídas ao longo dela e uma “fronteira” claramente definida.
49. Perez & Soete (1988); Lee & Lim (2001); Figueiredo (2010).
136 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Catch-up tecnológico não é mera clonagem ou
reprodução dos mesmos passos tecnológicos
seguidos pelos líderes globais.
Durante as duas últimas
décadas, a literatura de
desenvolvimento tecnológico
em empresas e indústrias de
economias em desenvolvi-
mento realizou avanços subs-
tanciais na identificação de diferentes trajetó-
rias de catch-up tecnológico. Pelo menos três
tipos diferentes de trajetórias de catch-up
tecnológico podem ser identificados.
A primeira refere-se à trajetória do tipo path-
-following (ou seguidor tecnológico). Esse movi-
mento é ilustrado pela Figura 8.4, elaborada por
Linsu Kim50. A parte superior da figura representa
o famoso modelo de James Utterback, conhe-
cido como o modelo de ciclo de vida de
produtos e processos ou da dinâmica
da inovação em produtos e processos.
Segundo este modelo, empresas iniciam
investimentos em novos produtos (curva
superior) à base de P&D. Estes esforços
levam à geração de um novo produto
que, ao tornar-se amplamente aceito
em função de sua viabilidade técnica,
comercial, econômica e, principalmente, maior sa-
tisfação gerada aos usuários, torna-se um projeto
(design) dominante frente aos outros produtos
competidores existentes ou que tenham sido
lançados simultaneamente. Uma vez que esteja
claro que o desenho dominante tenha surgido, a
base da competição se desloca
para a inovação em processo,
a fim de produzi-lo em larga
escala, levando à redução de
custos e adicionando caracte-
rísticas. Em vez de competir através da inovação
em produto ou serviço, as estratégias de sucesso
agora enfatizam compatibilidade com o padrão e a
melhoria na produtividade. Mas o modelo original
de James Utterback reflete um movimento de ino-
vação que tende a ser realizado, em sua maioria,
por empresas líderes que já operam na fronteira
tecnológica internacional e que estão desenvol-
vendo produtos novos para o mercado mundial.
Porém, esse influente modelo de inovação
mostrou-se limitado para expressar a dinâmica
do processo de desenvolvimento tecnológico em
empresas de economias em desenvolvimento.
De modo geral, como comentado anteriormente,
empresas dessas economias não começam o pro-
cesso de inovação em produtos que são inéditos ao
mercado, muito menos à base de P&D. Em função
de sua fraca base inicial de capacidade tecnológica,
empresas de economias emergentes tendem a
iniciar suas atividades através de uma sequência
inversa em relação às empresas inovadoras de eco-
nomias avançadas. Assim, sob essa perspectiva, seu
processo de desenvolvimento tecnológico envolve,
em geral: produção investimento inovação.51
Alinhando-se a essa perspectiva, Linsu Kim52
desenvolveu um modelo de três estágios para
representar a trajetória tecnológica de países em
desenvolvimento: aquisição, assimilação e aprimo-
ramento. Assim, no estágio inicial de industrializa-
ção, tais países são caracterizados pela aquisição
externa de tecnologias maduras de países
desenvolvidos, onde as tarefas de produção são
meramente relacionadas à montagem e cone-
xão de tais tecnologias, resultando em produtos
padronizados e não diferenciados, fazendo com
que os esforços de engenharia sejam enfatizados.
À medida que esforços vão sendo despendidos
para a assimilação de tais tecnologias, itens dife-
renciados e produtos relacionados passam a ser
produzidos (gerando capacidades de engenharia-
-E e desenvolvimento-D), o que, em conjunto com
o aumento de capacidade local, leva a melhorias
na tecnologia (P-pesquisa, D&E), invertendo a
sequência P, D & E de empresas de países tecno-
Catch-up tecnológico não mera clonagem ou repro-
dução dos mesmos passos tecnológicos seguidos pelos
líderes globais.
A primeira refere-se à traje-tória do tipo path-following (ou seguidor tecnológico).
Pelo menos três tipos diferentes
de trajetórias de catch-up tecno-
lógico podem ser identificados.
50. Kim (1997).
51. Ver Dalhman et al. (1987).
52. Kim (1997).
137CAPÍTULO 08 | TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: PERSPECTIVA DE CICLOS
logicamente avançados. O modelo de Kim, bem
como a comparação com a trajetória tecnológica
de empresas de economias industrializadas, é
exemplificado através da Figura 8.4. A Figura 8.5
ilustra, de maneira mais específica, a trajetória
de catch-up tecnológico do tipo path-following ou
seguidor tecnológico. Trata-se de um padrão de
catch-up no qual a empresa de economia em de-
senvolvimento segue os mesmos caminhos antes
percorridos pelos líderes globais. Esse processo
de catch-up tecnológico foi predominante em
várias indústrias do Sudeste Asiático na década de
1980 e 1990, assim como em algumas indústrias
na América Latina, como a de aço e outras.
FIGURA 8.4
TRAJETÓRIA DE CATCH-UP TECNOLÓGICO A PARTIR DA SEQUÊNCIA REVERSA DO CICLO DE VIDA DE
PRODUTO/PROCESSO
Tempo
Tempo
Inovação em produto
EMPRESAS DE ECONOMIAS INDUSTRIALIZADAS
EMPRESAS DE ECONOMIAS EMERGENTES
Inovação em processo
Fluido (surgimento)
Transferência de Tecnologia
Específico (maturidade)
Aprimoramento
Geração
AprimoramentoAssimilação
AssimilaçãoAquisição
Aquisição
Cap
acid
ade
Tecn
oló
gica
Taxa
de
Inov
ação
Transição (consolidação)
Fonte: Kim (1997).
138 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 8.5
TRAJETÓRIA DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: REPRESENTAÇÃO SIMPLIFICADA DO PADRÃO PATH-FOLLOWING (OU
SEGUIDOR TECNOLÓGICO)
Nív
el d
e ca
paci
dade
de
inov
ação
Exemplos de estudos principais:Hobday (1995)Kim (1997)Figueiredo (2002)
Tempo
ETAPA A
ETAPA B
ETAPA C
ETAPA D
Fronteira internacional da inovação
Fonte: Adaptado de Lee & Lim (2001); Lee & Malerba (2017).
Além desses padrões de catch-up tecnológico,
avanços em pesquisa identificaram variações
nas trajetórias de catch-up tecnológico, além
do path-following.53 Um deles refere-se ao
stage-skipping ou “pular etapas”, ou seja, quando
a empresa de economia em desenvolvimen-
to segue o mesmo caminho percorrido pelos
líderes globais, mas “pula” algumas etapas (ver
ilustração na Figura 8.6). Esse tipo de catch-up
foi identificado na indústria de memória de
computadores (D-RAM) da Coreia do Sul.
Um deles refere-se ao stage-skipping ou “pular etapas”, ou seja, quando a empresa de economia em desen-
volvimento segue o mesmo caminho percorrido pelos líderes globais, mas “pula” algumas etapas.
FIGURA 8.6
TRAJETÓRIA DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: REPRESENTAÇÃO SIMPLIFICADA DO PADRÃO STAGE-SKIPPING
(“PULAR ETAPAS”)
Nív
el d
e ca
paci
dade
de
inov
ação
Exemplos de estudos principais:Lee and Lim (2001)
Tempo
ETAPA A
ETAPA B
ETAPA C
ETAPA D
Fronteira internacional da inovação
Fonte: Adaptado de Lee & Lim (2001); Lee & Malerba (2017).
53. Lee and Lim (2001); Lee (2013).
139CAPÍTULO 08 | TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: PERSPECTIVA DE CICLOS
Uma outra modalidade refere-se ao path-creation
ou criação de trajetória própria. Nesta modalida-
de de catch-up, a empresa/indústria de economia
em desenvolvimento se engaja na criação de sua
própria trajetória, depois de ter seguido os
líderes globais por algum tempo (ver ilustração
na Figura 8.7). Esse tipo de trajetória é ilustra-
do pela indústria de telefonia celular da Coreia
do Sul, especialmente com base na tecnologia
CDMA.54 Porém, uma outra trajetória de
path-creation foi identificada, com uma sutil
diferença. É possível engajar-se na criação de
uma nova trajetória, sem ter seguido os líderes
globais, isto é, sem ter passado pela etapa de
imitação. Esse tipo de trajetória foi identificado
na indústria brasileira de celulose e papel, espe-
cialmente no caso da tecnologia de fibra-curta
(eucalipto) – Figura 8.855.
Uma outra modalidade refere-se ao path-creation ou criação de trajetória própria.
FIGURA 8.7
TRAJETÓRIA DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: REPRESENTAÇÃO SIMPLIFICADA DO PADRÃO PATH-CREATION
(CRIAÇÃO DA PRÓPRIA TRAJETÓRIA, DEPOIS DE TER SEGUIDO LÍDERES)
Exemplos de estudos principais:
Lee and Lim (2001)
Choung et al. (2014)
Tempo
ETAPA A
ETAPA B
ETAPA C
ETAPA C’ ETAPA D
ETAPA D’
Nív
el d
e ca
paci
dade
de
inov
ação
(after following)
Fronteira internacional da
inovação
Fonte: Adaptado de Lee & Lim (2001); Lee & Malerba (2017).
54. Lee & Lim (2001).
55. Figueiredo (2016).
140 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
FIGURA 8.8
TRAJETÓRIA DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: REPRESENTAÇÃO SIMPLIFICADA DO PADRÃO PATH-CREATION
(CRIAÇÃO DA PRÓPRIA TRAJETÓRIA, SEM TER SEGUIDO)
Nív
el d
e ca
paci
dade
de
inov
ação
Exemplos de estudos principais:
Figueiredo (2016)
Tempo
ETAPA A
ETAPA B
ETAPA B’ ETAPA C
ETAPA C’ ETAPA D
ETAPA D’ (entrada precoce em
path-creation)
Fronteira internacional da
inovação
Fonte: Adaptado de Lee & Lim (2001); Lee & Malerba (2017); Figueiredo (2016).
Assim, o catch-up tecnológico envolve muito
mais do que o mero emparelhamento ou uma
única via, com diferentes empresas distribuí-
das ao longo dela e uma “fronteira” claramente
definida. Pelo contrário, existem trajetórias
distintas que podem ser trilhadas por empresas
de economias em desenvolvimento para a ob-
tenção de liderança tecnológica e comercial em
nível internacional. Adicionalmente, o catch-up é
um processo cíclico. A Tabela 8.1 contém alguns
exemplos desses movimentos cíclicos em indús-
trias selecionadas. As evidencias da Tabela 8.1
sugerem que, de tempos em tempos, as lideran-
ças tecnológicas e comerciais são conquistadas
por líderes globais (de economias avançadas)
e desafiadas por empresas de economias em
desenvolvimento que, por sua vez, também se
tornam posteriormente desafiadas.
o catch-up tecnológico envolve muito mais do que o mero emparelhamento ou uma única via, com diferen-
tes empresas distribuídas ao longo dela e uma “fron-teira” claramente definida.
141CAPÍTULO 08 | TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: PERSPECTIVA DE CICLOS
EVENTO CELULARES MEMÓRIA DE COMPUTADORES CÂMERA JATOS AÇO VINHOS
EVENTO (I)
1998 1982 MEADOS DE 1960 1995 1980 MEADOS DE
1990*
EUA (MOTORO-LA)
FINLÂNDIA (NOKIA)
EUA JAPÃO
ALEMANHA JAPÃO (CÂMERA
ANALÓGICA SLR)
HOLANDA CANADÁ
(FOKKER BOMBARDIER)
EUA JAPÃO
ASCENSÃO DE (EUA, AUSTRÁLIA,
ETC.)
EVENTO (II)
2012 1993 1980S 2005 1998 MEADOS DE 2000
FINLÂNDIA (NOKIA)
COREIA DO SUL (SAMSUNG)
JAPÃO COREIA DO SUL
NENHUMA MU-DANÇA
(CÂMERA DIGI-TAL SLR)
CANADÁ BRASIL
(EMBRAER)
JAPÃO (AÇO
NIPPON) COREIA
DO SUL (POSCO)
RETORNO DE (ITÁLIA,FRANÇA ETC.)
EVENTO (III)
A PARTIR DE HOJE
MEADOS DE 2010*
LÍDERES ATU-AIS: SAMSUNG,
APPLE
NENHUMA MU-DANÇA.
LÍDER ATUAL = COREIA DO SUL
MUDANÇA PROVÁVEL COM
O AUMENTO DE NOVOS
PARTICIPANTES (CÂMERA MIR-
RORLESS)
LÍDER ATU-AL: BRASIL
LÍDER ATU-AL: CORÉIA
DO SUL
LÍDERES ATUAIS: FRANÇA, ITÁLIA,
CHILE
TABELA 8.1
EXEMPLOS DE CICLOS E TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
Fonte: Adaptado de Lee & Malerba (2017).
Dimensões Técnica e Organizacional da Acumulação de Capacidades Tecnológicas
À medida que as empresas acumulam suas capa-
cidades tecnológicas, maior atenção tende a ser
dada para as dimensões técnicas. Isto envolve por
exemplo, atenção prioritária a aspectos técnicos
das atividades inovadoras em produtos, como
design, assim nos aspectos técnicos do desenvol-
vimento de software e de novos componentes
de processos de produção, de equipamentos e
demais sistemas técnico-físicos. Menor grau de
atenção tende a ser dada à base organizacional
que suporta tais atividades inovadoras. A fraca
ênfase à dimensão organizacional da capacidade
tecnológica pode comprometer a implementação
das atividades inovadoras e o processo de catch-
-up tecnológico. Gabriela Dutrènit foi a primeira
a conectar as dimensões técnica e organizacional
da tecnológica e suas implicações para a eficácia
do catch-up tecnológico56. A ideia básica é que a
Menor grau de atenção tende a ser dada à base organizacional que suporta tais atividades inovadoras.
56. Ver Dutrènit (2000).
142 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
importância relativa de diferentes tipos de arran-
jos organizacionais varia à medida que a empresa
avança para níveis mais sofisticados de atividades
inovadoras. Isto é ilustrado na Figura 8.9 a seguir.
FIGURA 8.9
DIMENSÕES TÉCNICA E ORGANIZACIONAL DA ACUMULAÇÃO DE CAPACIDADES TECNOLÓGICAS
Especialização organizacional
(por exemplo: criação de
áreas dedicadas ao apoio às
inovações incrementais)
Integração e coordenação
(por exemplo: criação de
áreas dedicadas ao
apoio às inovações
relativamente complexas)
Orquestração de áreas
intra- e interorganizacionais de
apoio à inovações em nível da
fronteira internacional
de inovação
Transição para uma posição de liderança tecnológica em nível
internacional
Dimensão Tecnológica
Liderança mundial (Fronteira
da inovação)
Avançado
Básico
Intermediário /Incrementado
Fonte: Adaptado de Bell & Figueiredo (2012a).
Como sugere a Figura 8.9, na fase na qual a
empresa se move de níveis básicos para níveis
intermediários de atividades inovadoras (eixo
vertical) as questões organizacionais referem-se à
especialização organizacional. Isto significa, por
exemplo, criar unidades organizacionais de apoio
a essas atividades inovadoras, como por exemplo,
unidades offline de apoio à produção, unidades
dedicadas ao apoio de melhorias contínuas, tais
como unidades de qualidade, de engenharia de
processos e/ou produtos e unidades correlatas,
assim como comitês interfuncionais de apoio às
atividades inovadoras incrementais. À medida
que a empresa avança para atividades inovadoras
relativamente complexas, a base organizacional
correspondente se refere à estruturação de
áreas dedicadas tais como unidades de design e
desenvolvimento de produtos, de engenharia e
desenvolvimento de processos e de automação
e/ou digitalização, assim como de estágios iniciais
de P&D. Nessa fase, a capacidade organizacional
de integração e coordenação entre essas áreas
técnicas, assim como com as áreas de marketing,
comercial e logística se torna relevante.
No entanto, à medida que a empresa atinge níveis
mais avançados de atividade inovadora, a empre-
sa passa por uma “fase de transição” na qual ela
143CAPÍTULO 08 | TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO: PERSPECTIVA DE CICLOS
não apenas continua a se mover “para cima” para
conquistar níveis de capacidade mais avançados e
globais em termos tecnológicos. Também tem que
se mover “horizontalmente” para estruturar uma
base organizacional mais robusta. É necessário que
tal base organizacional se torne mais robusta tanto
internamente, já envolvendo um P&D estruturado,
e sua integração com demais áreas técnicas e não
técnicas da empresa. Em paralelo, faz-se necessária
a estruturação de uma rede colaborativa de parcei-
ros externos, envolvendo fornecedores, usuários,
consultorias técnicas especializadas, institutos de
pesquisa, e universidades, tanto locais como inter-
nacionais. Por isso, faz-se necessária uma meta-
-competência organizacional de “orquestração” de
uma rede interna e externa para apoio às atividades
inovadoras e performance competitiva na fronteira
global da inovação.
Porém, é justamente na transição da segunda para
a terceira fase, no eixo horizontal, que muitas em-
presas falham em construir essa base organizacional.
Maior ênfase tende a ser dada aos aspectos técnicos
das atividades inovadoras, em detrimento de uma
estruturação e reforço da base organizacional.
Consequentemente, ocorre um “truncamento” do
processo de acumulação de capacidades tecnológi-
cas inovadoras na direção da fronteira tecnológica
global de inovação. Em outras palavras, em função
desse “truncamento” a empresa latecomer falha em
fazer a sua transição para uma posição de liderança
global, em termos tecnológico e comercial.
De fato, a literatura no campo da acumulação
de capacidades tecnológicas em empresas de
economias em desenvolvimento tem dado pou-
ca ênfase à dimensão organizacional da
capacidade tecnológica. Porém, existem
estudos relevantes que demonstram
a consistência do modelo da Figura
8.9 com experiências de empresas na
indústria de vidro no México57, da indús-
tria coreana de semicondutores58 e na
indústria alimentícia na Grécia.59 Tanto
na indústria coreana de semicondutores
quanto na indústria alimentícia grega,
as empresas estavam se movendo para
tipos de atividades inovadoras, em nível técnico,
relativamente avançadas próximas à fronteira
de inovação global.
Ao mesmo tempo, enfren-
tavam questões cada vez
mais complexas sobre a
integração de diversas áreas
de conhecimento e sobre
coordenação de diferentes
atividades inovadoras dentro
e fora da empresa. No caso
da empresa da indústria de
vidro no México, a falha em construir uma
base organizacional capaz de suportar as
crescentes atividades inovadoras técnicas da
empresa, causou um truncamento no proces-
so de catch-up tecnológico. Ou seja, a empresa
não conseguiu realizar a transição para o nível
de liderança tecnológica e comercial em nível
da fronteira global de inovação. As capacidades
tecnológicas inovadoras retrocederam para
níveis inferiores. Esse processo contribuiu para
uma deterioração sistêmica da condição econô-
mica da empresa.
A falha em construir uma base organizacional capaz de suportar as crescentes atividades inovadoras técni-cas da empresa, causou um truncamento no processo de catch-up tecnológico.
É justamente na transição da segunda para a terceira fase, no eixo horizontal, que muitas em-presas falham em construir essa base organizacional.
57. Dutrènit (2000, 2006).
58. Mathews & Cho (1999).
59. Tsekouras (2006).
144 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
09
145RESUMO EXECUTIVO
Mecanismos de Aprendizagem Subjacentes às Trajetórias de Catch-up Tecnológico
146 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
09. Mecanismos de Aprendizagem Subjacentes às Trajetórias de Catch-up Tecnológico
Até aqui este estudo examinou as capacidades tecnológicas, suas
propriedades e modos de acumulação. As capacidades tecno-
lógicas são um estoque de recursos associados a conhecimento
tecnológico. É por meio das capacidades tecnológicas que as
empresas e outras organizações, assim como países, podem rea-
lizar suas atividades relacionadas à produção de bens e serviços
e de diferentes tipos e graus de inovação em bens e serviços. As
capacidades tecnológicas são construídas e acumuladas por meio
de mecanismos de aprendizagem tecnológica. Logo, enquanto
as capacidades tecnológicas constituem um estoque de recur-
sos – também chamado de ativo cognitivo ou estratégico – a
aprendizagem é um processo, constituído por vários fluxos de
conhecimentos externos e internos, que permitem que organizações e
países acumulem suas capacidades tecnológicas. Especificamente:
1 Os mecanismos de aprendizagem são as variáveis mais próximas que contribuem para explicar a variação entre empresas e entre indús-trias em termos da taxa, profundidade e continuidade da acumulação de capacidade inovadora; e
2 Os mecanismos de aprendizagem tecnológica refletem os investi-mentos deliberados e específicos que as empresas fazem para criar essas capacidades tecnológicas. Este estudo se refere a esses investi-mentos como “aprendizagem”.
As capacidades tecnológicas são construídas e acumuladas por meio de mecanismos de
aprendizagem tecnológica.
Enquanto as capacidades tecnológicas cons-tituem um estoque de recursos – também
chamado de ativo cognitivo ou estratégico – a aprendizagem é um processo, constituído por
vários fluxos de conhecimentos externos e internos, que permitem que organizações e pa-íses acumulem suas capacidades tecnológicas.
147CAPÍTULO 09 | MECANISMOS DE APRENDIZAGEM SUBJACENTES ÀS TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
Reiterando, o termo aprendizagem tecnológica
é usado no contexto deste estudo para se re-
ferir especificamente à criação de capacidades
para inovar. Portanto, esta seção baseia-se em
um argumento muito simples: se as empresas
fizerem esforços limitados para investir na
aquisição e criação de conhecimento neces-
sários para inovar (capacidades tecnológi-
cas), isto é, se fizerem esforços limitados ou
ineficazes em mecanismos de aprendizagem,
elas acumularão suas capacidades inovadoras
de maneira muito limitada ou sequer acumu-
larão tais capacidades. Primeiramente, serão
abordados os mecanismos de aprendizagem sob
o ponto de vista intraempresarial. Em seguida,
serão abordados os mecanismos de aprendiza-
gem sob a perspectiva interempresarial.
Se as empresas fizerem esforços limitados para in-vestir na aquisição e criação de conhecimento ne-cessários para inovar (capacidades tecnológicas), isto é, se fizerem esforços limitados ou ineficazes em mecanismos de aprendizagem, elas acumularão suas capacidades inovadoras de maneira muito limitada ou sequer acumularão tais capacidades.
Mecanismos de Aprendizagem Tecnológica: Perspectiva Intraempresarial A construção e acumulação de capacidades
inovadoras nas empresas envolve processos de
aprendizagem e atividades de dois tipos amplos:
1 Aqueles que envolvem a aquisição de conhe-cimento e outros elementos de capacidade tecnológica de fontes externas à empresa; e
2 Aqueles que envolvem a criação e aquisição de conhecimento de fontes internas à empresa.
Mecanismos de Aquisição de Conhecimento Tecnológico Externos à Empresa
São os processos pelos quais os indivíduos ad-
quirem conhecimentos tácitos e/ou codificados
vindos de fora da empresa. Para tanto, pode-se
importar saber externo, recorrer à assistência
técnica e promover treinamento no exterior.
Outros meios seriam a canalização sistemática
de saber externo codificado, o convite a espe-
cialistas para dar conferências etc. A aquisição
de conhecimento externo envolve esforços
propositais, organizados e efetivos para atingir,
selecionar, capturar e obter diferentes tipos de
conhecimento que são necessários para a em-
presa constituir suas capacidades inovadoras. A
Tabela 9.1 detalha ainda mais esses mecanismos
e as atividades relacionadas.
148 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
TABELA 9.1
MECANISMOS EXTERNOS DE APRENDIZAGEM: ALGUNS EXEMPLOS DE ATIVIDADES ENVOLVIDAS
MECANISMOS DE APRENDIZAGEM
EXTERNOSALGUNS EXEMPLOS ILUSTRATIVOS
VÁRIOS TIPOS DE TREINAMENTO
• Treinamento no departamento de design e desenvolvimento de empresas fornecedoras ou de clientes;
• Treinamentos de curta duração em organizações internacionais para desenvolver competências essenciais em rotinas de engenharia e suas bases de conhecimento subjacentes;
• Programas de graduação e pós-graduação;• Participação ativa em reuniões científicas (por exemplo, elaboração e apresentação de trabalhos
técnicos).
EXPERIÊNCIA DE AQUISIÇÃO QUE EXIGE A “PRÁTICA” DE INOVAÇÃO
• O design simulado de plantas de processo químico que não sejam para a construção sob supervisão de empresas de engenharia contratadas.
AQUISIÇÃO DE CONHECI-MENTO CODIFICADO COMO BASE PARA O DESENVOLVI-MENTO DE NOVOS PRODU-TOS OU PROCESSOS
• A busca de documentação de patente para identificar as especificações como base para a inovação • A aquisição de algoritmos de projeto para a elaboração e desenvolvimento de processos;• Acesso a diversas fontes de conhecimento (artigos, teses, livros, padrões, relatórios de pesquisa).
AQUISIÇÃO DE ESPECIFICA-ÇÕES PRÉ-FABRICADAS PARA NOVOS PRODUTOS QUE PODEM SER COLOCADOS EM PRODUÇÃO COM DESIGN, DESENVOLVIMENTO E ENGE-NHARIA ORIGINAIS MUITO LIMITADOS
• A aquisição de detalhes de design completos de produtos de clientes, talvez também com dados de processo, ou o licenciamento de projetos de produtos de terceiros;
• Adquirir conhecimento de consultores altamente especializados sobre como realizar inovações técnicas e organizacionais específicas.
CONTRATAÇÃO DE CAPITAL HUMANO INOVADOR “PRONTO
• A “busca” de engenheiros de desenvolvimento experientes de outras empresas, talvez de líderes em economias avançadas;
• Contratação de profissionais experientes de concorrentes;• Contratação de recém-formados de universidades locais.
ESTABELECIMENTO VIA IED DE INSTALAÇÕES DE P&D EM LOCAIS RICOS EM CONHECI-MENTO EM OUTROS PAÍSES
• Aquisição de empresas de países avançados existentes, para aproveitar o conhecimento e as técnicas de ponta;
• Parcerias com universidades ou institutos de pesquisa avançada.
ARRANJOS ORGANIZACIO-NAIS PARA AQUISIÇÃO DE CONHECIMENTO EXTERNO
• Arranjos organizacionais, tais como procedimentos, equipes, tecnologias específicas que podem dar apoio aos processos de aprendizagem;
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
149CAPÍTULO 09 | MECANISMOS DE APRENDIZAGEM SUBJACENTES ÀS TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
Mecanismos de Aquisição de Conhecimento Tecnológico Internos à EmpresaOs mecanismos pelos quais as empresas absorvem
conhecimento e informação alavancados externa-
mente e os internalizam em suas próprias capa-
cidades de processo e produto são denominados
de mecanismos de aprendizagem internos. Esses
mecanismos envolvem ainda a criação, dentro da
empresa, de conhecimento tácito e codificado.
Especificamente, por meio desses mecanismos de
aprendizagem internos, os indivíduos adquirem
conhecimento para realizar diferentes atividades
dentro da empresa (p. ex., através das rotinas diá-
rias e/ou se engajando de melhorias a processos e
organização da produção existente, equipamentos
e produtos). Quando primeiramente é adquirido
pelo indivíduo, tal conhecimento é tácito. Isto pode
subsequentemente ser codificado, mas a extensão
pela qual isto ocorre está longe de ser dada, e a
codificação é, portanto, identificada aqui como uma
dimensão variável do aprendizado subjacente ao
processo de constituição de capacidade inovadora.
Diferentes tipos de “aprender fazendo” e “apren-
der usando” podem contribuir para a aquisição de
conhecimento tácito adicional por indivíduos ou
grupos dentro da empresa. Assim, o envolvimento
ativo com atividades internas conduz os indivíduos
a entender os princípios subjacentes da tecnologia.
Este entendimento é a chave para as melhorias
nos processos de produção e gerenciamento,
uma vez que uma organização não pode melhorar
aquilo que não compreende. Os indivíduos podem
também adquirir conhecimento tácito dentro da
empresa realizando rotinas e/ou atividades inova-
doras, as quais tomam lugar, não somente dentro
dos laboratórios de P&D, mas também dentro dos
departamentos de engenharia e qualidade, labo-
ratórios e linhas de produção (p. ex., aprender por
pesquisa e aprender por experimentação).
A fim de incorporar o conhecimento tácito e codi-
ficado adquirido externamente para a capacidade
da empresa, é importante realizar um esforço
deliberado e efetivo em compartilhamento e codi-
ficação deste conhecimento. Considerando que as
empresas são baseadas em conhecimento em vez
de simplesmente organizações processadoras de
informação, os mecanismos de compartilhamento
(ou socialização) e codificação de conhecimento
permitem a aquisição de novos conhecimentos
para a organização. Tal criação de conhecimento
organizacional pode tomar lugar em nível de proje-
to ou grupo e, eventualmente, pode ser adquirido
pela empresa como um todo.
Especificamente, os mecanismos de compartilha-
mento de conhecimento são aqueles pelos quais
os indivíduos compartilham seu conhecimento
tácito (modelos mentais e habilidades técnicas), ou
seja, qualquer mecanismo formal e informal, pelo
qual o conhecimento tácito é transmitido de um
indivíduo ou grupo de indivíduos para outros (p. ex.,
encontros informais, comunicação pessoa a pessoa,
seções de brainstorming e briefing meetings). Assim, a
aprendizagem é um fenômeno social e a aprendiza-
gem pelos indivíduos depende do que é conhecido
pelos outros membros da organização.
Adicionalmente, as capacidades da empresa são am-
plamente geradas pelas relações organizadas entre
indivíduos e grupos. Os processos podem envolver
observações, reuniões, solução compartilhada de
problemas, rotação de funções e espaços compar-
tilhados. Diferentes tipos de solução de problemas,
enquadramento de problemas e treinamento interno
podem também trabalhar como mecanismos de so-
cialização do conhecimento [como diversas catego-
rias de treinamento on-the-job (OJT)]. Por exemplo,
durante os programas de treinamento, indivíduos
com diferentes bagagens e experiência podem so-
cializar seu conhecimento tácito com os treinandos
150 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
e instrutores. Neste estudo, são considerados dife-
rentes tipos de treinamento tais como treinamento
interno (baseado em cursos), OJT e a provisão de
treinamento para outras empresas como mecanis-
mos de compartilhamento do conhecimento.
Os mecanismos de codificação do conhecimento
são aqueles pelos quais o conhecimento tácito dos
indivíduos (ou parte dele) torna-se explícito. Ou
seja, o processo pelo qual se articula o conheci-
mento tácito em conceitos explícitos, em formatos
e procedimentos organizados e acessíveis tornan-
do-se de fácil entendimento. Especificamente,
através dos mecanismos de codificação, o conhe-
cimento pode ser transformado em informação,
onde a informação está na forma de mensagens, ou
conjuntos identificáveis de regras e relações, que
podem ser transmitidas para agentes de decisão.
Adicionalmente, a alavancagem de novos
conhecimentos através de mecanismos de
aprendizagem externa, para serem integrados
dentro da empresa e incorporados em suas ca-
pacidades, depende do modo pelo qual diferen-
tes mecanismos de aprendizagem são geridos
para interagir uns com os outros. Esta intera-
ção, que é uma propriedade dos mecanismos
de aprendizagem, foi identificada num estudo
sobre empresas siderúrgicas e refinado em
Tacla e Figueiredo, que examinaram interações
dentro e entre diferentes tipos de mecanismos
de aprendizagem (tais como externo versus
interno; interno versus interno) na indústria
de bens de capital no Brasil60. Por exemplo,
a empresa pode estimular que engenheiros
treinados no exterior (mecanismo de aprendi-
zagem externa) realizem seminários internos,
engajando-se em comunidades de prática e/ou
em principais projetos inovadores (mecanismos
de compartilhamento de conhecimento), mas
também revisando códigos de engenharia exis-
tentes e redesenho de sistemas de automação
e/ou revisão de rotinas de projeto de produtos
(mecanismos de codificação de conhecimento).
A Tabela 9.2 detalha ainda mais esses mecanis-
mos e as atividades relacionadas.
60. Tacla & Figueiredo (2006).
151CAPÍTULO 09 | MECANISMOS DE APRENDIZAGEM SUBJACENTES ÀS TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
TABELA 9.2
MECANISMOS INTERNOS DE APRENDIZAGEM: ALGUNS EXEMPLOS DE ATIVIDADES ENVOLVIDAS
MECANISMOS INTERNOS DE
APRENDIZAGEMALGUNS EXEMPLOS ILUSTRATIVOS
VÁRIOS TIPOS DE TREINA-MENTO PARA ADQUIRIR HA-BILIDADES RELACIONADAS À INOVAÇÃO
• Treinamento em rotinas de design de produto e know-how;• Treinamento interno focado na melhoria dos sistemas de qualidade;• Treinamento técnico avançado para atualizar habilidades técnicas de grupos especializados
(técnicos, engenheiros, pesquisadores e gerentes (incluindo treinamento no local de trabalho, treinamento supervisionado);
• Treinamento de gerenciamento avançado (técnicas de ponta para gerenciamento de projetos, gerenciamento de pesquisa, melhoria de processos, inovação de produtos);
• Treinamento sistemático relacionado a atividades de P&D.
VÁRIOS TIPOS DE COMUNI-CAÇÃO DE CONHECIMENTO DENTRO DA EMPRESA
• A “socialização” do que pode ter sido tácito ou localizado apenas em partes isoladas da organização;• Aprender fazendo atividades com níveis crescentes de dificuldades;• Relatórios de treinamento externo;• Comunicação através de reuniões, workshops, seminários, conversas e interações sociais formais e
informais.
ARTICULAÇÃO E ASSIMILA-ÇÃO DO CONHECIMENTO
• Seminários técnicos internos e de gestão;• Relatórios de treinamento externo;• Aprendizagem coletiva através de sessões de discussões, de-briefing de projetos em andamento,
revisões de desempenho;• Aprender experimentando e testando em oficinas, laboratórios, sítios florestais.
VÁRIAS FORMAS DE AQUISI-ÇÃO DE EXPERIÊNCIA
• Algumas podem ser “passivas”, no sentido de que habilidades ou conhecimentos são adquiridos como subproduto de simplesmente realizar atividades específicas;
• Mas outras, geralmente mais importantes, dependem fortemente de processos geridos formalmente de exposição a oportunidades ricas em experiência, bem como medidas explícitas para “capturar” e incorporar o que está potencialmente disponível em tais oportunidades.
CRIAÇÃO DE CONHECIMEN-TO POR P&D
• Proporcionar uma base de conhecimento para adquirir conhecimento existente, mas relativamente inacessível, de fontes externas;
• Criação de unidades de pesquisa específicas dentro da empresa;• Estabelecer o papel de gerentes ou mediadores de relações e parcerias entre empresas e
instituições de P&D
CODIFICAÇÃO DO CONHECIMENTO
• Documentação de atividades desenvolvidas durante o processo de produção;• Documentação de inovações internas desenvolvidas na área;• Padronização das práticas de engenharia de projetos;• Documentação de procedimentos e instruções básicas da área administrativa.
ARRANJOS ORGANIZACIO-NAIS PARA A ASSIMILAÇÃO DE CRIAÇÃO DE CONHECI-MENTO E CODIFICAÇÃO
• Arranjos relacionados à especialização organizacional em tipos específicos de atividades inovadoras, arranjos para integrar conhecimento em diferentes áreas funcionais da organização e em diferentes campos de especialização e também nos limites da empresa.
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015)
152 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Integração dos Mecanismos Externos e Internos de AprendizagemEstudos relevantes no campo da acumulação de
capacidades tecnológicas e aprendizagem em em-
presas de economias em desenvolvimento destacam
um aspecto importante da gestão nesta área: a
integração dos vários mecanismos de aprendizagem
internos e externos. A importância de integrar a
aprendizagem interna e externa tem sido amplamen-
te discutida em relação à gestão da inovação empre-
endida por empresas em economias avançadas que
já acumularam capacidades inovadoras significativa-
mente profundas. Porém, no contexto de empresas
de economias em desenvolvimento, esse tema ainda
carece de exploração prática.
Uma exceção importante é o trabalho de Linsu Kim
– em particular sua análise da trajetória de acumu-
lação de capacidades tecnológicas e aprendizagem
seguido pela Hyundai na produção automotiva ao
longo de três décadas entre os anos 1960 e 1970.
Kim mostrou como a Hyundai organizou grandes
etapas de aprendizagem em uma sequência circular
de quatro atividades (Figura 9.1):
1 Preparação interna para aquisição de conhe-cimento externo;
2 Aquisição desse conhecimento;
3 Sua assimilação efetiva pela organização; e
4 Sua aplicação, em termos de implementar atividades inovadoras e de criar uma base de conhecimento mais alta para a fase prepara-tória de outro ciclo de aprendizagem.
FIGURA 9.1
INTEGRAÇÃO DE MECANISMOS EXTERNOS E INTERNOS DE APRENDIZAGEM TECNOLÓGICA
Fonte: Kim (1997).
Decisão sobre tecnologia e entrada no mercado
INTERNO
INTERNO
EXTERNO
INTERNO
04.AprimoramentoEngajar criativamente com a tecnologia
• Melhoria incremental• Aplicação mais ampla
Levantar base de conhecimento do pré-projeto
• Treinar equipe experiente• Contratar engenheiros estrangeiros• Organizar equipe de projetos• Revisar literatura técnica• Observar instalações estrangeiras• Socializar o conhecimento tácito• Identificar opções técnicas• Identificar fontes de tecnologia
01. Preparação
Absorver e integrar ativamente a tecnologia
• Aprender fazendo• Conversão de conhecimento• Socialização do conhecimento• Adaptação
03. Assimilação
Obter tecnologia de fontes externas
• Negociar conteúdo e termos• Adquirir especificações• Gerenciar transferência
• Organizar treinamento• Adquirir know-how tácito
02. Aquisição
153CAPÍTULO 09 | MECANISMOS DE APRENDIZAGEM SUBJACENTES ÀS TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
Este ciclo de quatro passos desempenhou o
papel fundamental em levar a Hyundai, por
meio de sucessivas descontinuidades qualita-
tivas do desenvolvimento cumulativo de seu
design, engenharia e capacidade inovadora.
Começando a partir de sua posição como mera
montadora de automóveis da Ford em uma
base completely knocked down (CKD), a primeira
descontinuidade foi a transição em meados da
década de 1970. Envolveu o desenvolvimento e
lançamento de um modelo “coreano” desenhado
localmente com base em um projeto de veículo
simples em uma ampla gama de tecnologias
licenciadas. O segundo, no início da década de
1980, envolveu o aprofundamento e extensão
de capacidades para desenvolver um veículo
mais avançado com o licenciamento de tecno-
logia para componentes-chave selecionados,
mas sem qualquer assistência de engenharia
externa. O terceiro, no início da década de
1990, envolveu a transição para o desenvol-
vimento, o design e a introdução totalmente
independentes de carros subcompactos para
o mercado internacional. O acesso a conheci-
mentos e habilidades externos foi uma questão
chave em cada uma dessas descontinuidades.
Esse aprofundamento das capacidades inovado-
ras das empresas não avançou suavemente ao
longo de um caminho linear. Envolveu uma série
de descontinuidades qualitativas nos tipos de
capacidade necessários para realizar sucessiva-
mente tipos de atividades inovadoras mais com-
plexas. A transição através dessas descontinui-
dades exigiu a mobilização de recursos em larga
escala para lançar novos ciclos de preparação,
aquisição, assimilação e melhoria. Por trás de
cada um desses ciclos, a equipe sênior definiu
os desafios para a construção de capacidades
em um nível alto - construindo deliberadamente
o que Kim descreveu como uma sucessão de
“crises” para a organização.
Principais Características dos Mecanismos Intraempresarias de Aprendizagem Tecnológica As principais características dos mecanismos de
aprendizagem envolvem variedade, intensidade,
funcionamento e interação, assim definidas:
1 Variedade. Em função da multiplicidade de especialidades e de capacidades na empresa, há a necessidade de uma série de processos para garantir não só que os indivíduos adqui-ram um nível adequado de conhecimentos, mas também que estes sejam incorporados no tecido organizacional. A variedade é aqui medida em termos da existência/inexistência de todo um processo (por exemplo, o pro-cesso de codificação do saber) e de outros subprocessos que ele possa acarretar (por exemplo, o processo de padronização). Este último pode envolver diferentes mecanismos (por exemplo, atualização dos padrões ope-racionais básicos, codificação do desenho de projetos). Portanto, a variedade é medida não só entre os quatro processos de aprendi-zagem, mas também dentro deles.
2 Intensidade. Os processos “esporádicos” de aprendizagem provavelmente não levarão a uma efetiva aquisição de conhecimentos nem à sua incorporação no plano organizacional. Com o tempo, certas práticas podem ser roti-nizadas e passar a fazer parte da rotina diária da empresa. Por “intensidade” entendemos aqui a frequência com que se criam, atuali-zam, utilizam e aperfeiçoam os processos de aprendizagem ao longo do tempo. A intensi-dade é importante porque:
• Pode garantir um fluxo constante de saber externo para a empresa;
• Pode fazer com que se compreenda melhor a tecnologia adquirida e os princípios inerentes aos processos de aquisição de conhecimentos internos; e
154 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
• Pode assegurar a constante conversão da aprendizagem individual em aprendizagem organizacional e, logo, sua rotinização.
3 Funcionamento. O modo como as empresas organizam seus processos de aprendizagem é fundamental para criar competência.23 As empresas podem organizar seus processos de aprendizagem de diferentes maneiras. Entendemos aqui por “funcionamento” o modo como os processos de aprendizagem operam ao longo do tempo. Mesmo sendo contínua a intensidade dos processos, seu funcionamento pode ser deficiente. Eles podem começar funcionando bem e deterio-rar-se com o tempo. O funcionamento pode contribuir para aumentar e/ou diminuir a “variedade” e a “intensidade”.
4 Interação. Mais especificamente, a intera-ção dos processos de aquisição e conversão de conhecimentos é importante para criar competência.24 É importante a interação cumulativa entre os mecanismos de apren-dizagem para a acumulação de competência tecnológica. “Interação” é o modo como os diferentes processos de aprendizagem se influenciam mutuamente. Por exemplo, um processo de socialização do saber (programa de treinamento interno) pode ser influencia-do por um processo de aquisição de saber externo (treinamento no exterior).
Grande parte do que conhe-
cemos sobre a natureza dos
mecanismos de aprendizagem
de empresas em economias
em desenvolvimento, deriva
de estudos que observaram as
trajetórias de catch-up tecno-
lógico das principais empresas
do mercado. Esses estudos
apontaram para as seguintes
características adicionais:
1 A relativa importância da grande variedade de processos e mecanismos de aprendiza-gem externos e internos. Embora neces-sário, uma grande variedade de processos e mecanismos de aprendizagem não é
suficiente para constituir progressivamente níveis mais altos de capacidade inovadora. Isto depende de como os mecanismos de aprendizagem funcionam ao longo do tempo e como eles interagem uns com os outros (mecanismos externos versus internos e in-ternos versus internos). Isto tem implicações para os gestores em termos da qualidade de seus esforços que seriam necessários para melhorar tais mecanismos de aprendizagem em bases diárias. Em outras palavras, sim-plesmente trazendo conhecimento externo bem selecionado e bem direcionado para dentro da empresa não garante que isto será automaticamente transformado em capaci-dades da empresa. Novamente, os esforços deliberados e efetivos são necessários para criar uma organização interna para absorver e internalizar diferentes tipos e peças de conhecimento tácito e codificado e internali-zá-los na base de conhecimento da empresa.
2 Esforços para gerir os mecanismos de aqui-sição de conhecimento devem ser feitos em paralelo com esforços para gerir a conver-são do conhecimento tácito dos indivíduos em capacidade da empresa (expresso como novas rotinas, processos de produção, novos produtos e serviços). Por exemplo, enviar engenheiros para treinamento no exterior na ausência de efetivos mecanis-mos de compartilhamento e codificação de conhecimento irá contribuir muito pouco para acelerar a acumulação de capacidade inovadora. Baseando-se em simples meca-nismos, não importam quão poderosos eles pareçam ser (por exemplo, grandes facilida-des e programas de treinamento interno), é improvável que resulte em algum aprendiza-do organizacional efetivo.
3 Mais especificamente, o movimento de um nível para outro na acumulação de capacida-de tecnológica está associado com uma deli-berada e efetiva descontinuidade qualitativa nas características-chave dos mecanismos de aprendizagem (tais como sua quantidade, composição, funcionamento); as característi-cas inalteradas dos mecanismos de aprendi-zagem ao longo do tempo contribuirão muito pouco para a habilidade da empresa em se
O movimento de um nível para outro na acumulação de capacidade tecnológica
está associado com uma deliberada e efetiva des-continuidade qualitativa nas características-cha-
ve dos mecanismos de aprendizagem.
155CAPÍTULO 09 | MECANISMOS DE APRENDIZAGEM SUBJACENTES ÀS TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
mover, por exemplo, da capacidade inovadora básica para níveis intermediário-superior e avançado. Tal descontinuidade qualitativa em um mecanismo de aprendizagem se refere a mudanças em sua variedade e composição (adição e/ou eliminação) e modificação em sua continuidade ou intensidade, reorgani-zação de seu funcionamento e mudanças na maneira como elas interagem com as outras (mudanças em suas sistemáticas relações).
4 Estudos têm encontrado evidências de discre-pâncias entre a formalidade e a realidade dos mecanismos de aprendizagem em empresas que refletem uma lacuna entre declarações racionalizadas dos indivíduos e o que realmente
ocorre na empresa. Isto é particularmente observado quando gestores tendem a superes-timar o bom funcionamento dos mecanismos de aprendizagem durante as entrevistas do trabalho de campo. As discrepâncias ocorrem não somente entre as declarações dos ges-tores e a realidade, mas também através do tempo de vida dos próprios mecanismos de aprendizagem. Em outras palavras, um meca-nismo de aprendizagem pode ser efetivamente constituído e pode funcionar bem durante os primeiros anos, mas nos anos subsequentes seu funcionamento pode deteriorar. Mais tarde, o mecanismo de aprendizagem pode desapa-recer. Realmente, desaprender pode ser tão importante como aprender.
Mecanismos Interempresariais de Aprendizagem TecnológicaLigações Tecnológicas entre Subsidiárias de EMNs e outras EmpresasUm dos objetivos de estratégias de inovação
industrial é o fortalecimento da capacidade tec-
nológica de empresas locais, de pequeno e médio
porte, no intuito de exercerem um papel mais
competitivo na cadeia de fornecedores de gran-
des empresas locais e também de empresas trans-
nacionais. Por isso, é apresentado aqui o modelo
que permite examinar as ligações tecnológicas
interempresariais desenvolvido por Norlela Arif-
fin. Esse modelo permite compreender os vínculos
de saber e aprendizagem tecnológica existentes
entre as empresas, em especial no contexto de
economias emergentes (veja Tabela 9.3).
156 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
TABELA 9.3
TIPOLOGIA DE MECANISMOS INTEREMPRESARIAIS DE APRENDIZAGEM TECNOLÓGICA (LIGAÇÕES
TECNOLÓGICAS ENTRE SUBSIDIÁRIAS DE EMNS E OUTRAS EMPRESAS)
TIPOS DE INDÚSTRIA
VÍNCULOS BASEADOS EM TRANSAÇÕES DE MERCADO DE BENS E
SERVIÇOS
VÍNCULOS DE FLUXOS DE CONHECIMENTO
TECNOLOGIA EXISTENTE (PRODUÇÃO ROTINEIRA)
VÍNCULOS PARA INOVAÇÃO
USO DA CAPACIDADE TECNOLÓGICA
Vínculo MP (Marketing/Pro-duction)
Nesses vínculos de comerciali-zação/produção, a interação das empresas é meramente uma relação comercial envolvendo a venda de bens e serviços de-rivados do uso da capacidade de produção existente, mas não elementos destinados a gerar ou ampliar essa capacidade.
Vínculo I (Inovation)
Nesses vínculos para inovação, a interação é a fonte de inovação. Nesse caso, as empresas já têm capacidade tecnológica inova-dora e colaboram no sentido de utilizá-la para introduzir inova-ções, o que, em geral envolve pesquisa, desenvolvimento e design conjuntos para novos produtos e processos.
DESENVOLVIMENTO DE CAPACIDADE TECNOLÓ-GICA (APRENDIZAGEM)
Vínculo LP (Learning for Pro-duction)
Esses vínculos de aprendizagem para produção permitem às empresas gerar ou ampliar sua capacidade básica de produção. Geralmente uma das empresas recorre à outra para desenvol-ver a capacidade básica para produzir certos produtos, utili-zar certos processos e/ou do-minar certas práticas gerenciais e organizacionais.
Vínculo LI (Learning for Inno-vation)
Através desses vínculos de aprendizagem para inovação, as empresas desenvolvem capaci-dade inovadora básica e inter-mediária. Isso pode envolver treinamento e aquisição de expe-riência a nível formal, juntamente com aprendizagem menos formal através de engenharia reversa e melhoramento incremental.
DESENVOLVIMENTO RE-VERSO DE CAPACIDADE TECNOLÓGICA
Vínculo R-LP (Reverse Learning for Production)
O vínculo de aprendizagem para produção é reverso quando a empresa que deveria estar ab-sorvendo conhecimento passa a auxiliar a outra no desenvol-vimento da capacidade básica para produzir certos produtos, utilizar certos processos e/ou dominar certas práticas geren-ciais e organizacionais.
Vínculo R-LI (Reverse Learning for Innovation)
O vínculo de aprendizagem para inovação é reverso quando a empresa que deveria estar ab-sorvendo conhecimento passa a auxiliar a outra no desenvolvi-mento da sua capacidade inova-dora básica e intermediária, seja através de treinamento formal ou através de engenharia reversa e melhoramento incremental.
Fonte: Adaptado de Ariffin (2000); Figueiredo (2015).
157CAPÍTULO 09 | MECANISMOS DE APRENDIZAGEM SUBJACENTES ÀS TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
Tal método envolve a combinação de duas impor-
tantes distinções. Primeiramente, a distinção entre:
1 As ligações relativas às transações de merca-do de bens e serviços;
2 As ligações relativas aos fluxos de saber.
Em segundo lugar, a distinção entre:
3 As ligações baseadas principalmente no uso da capacidade já existente nas empresas;
4 As ligações que contribuem significativamen-te para gerar essa capacidade.
Ligações (1) e (3) podem existir quando as tran-
sações de mercado em bens e serviços envolvem
pouca ou nenhuma transferência de aptidões e
conhecimentos que ampliem a capacidade tecno-
lógica já existente nas empresas. Por outro lado,
os vínculos entre empresas – (2) e (4) – podem
envolver considerável fluxo de aptidões e conhe-
cimentos que ajudem as empresas a desenvolver
sua capacidade, seja em termos de produção
(como em vários contratos de licenciamento), seja
de capacidade para realizar atividades tecnoló-
gicas inovadoras. Mais especificamente, essa
taxonomia define as seguintes categorias de links
ou interações entre as organizações e os fluxos de
conhecimentos relacionados:
1 Ligações marketing-produção: Estas são as ligações que estão preocupadas princi-palmente com a transação de mercado para bens e serviços. Neste caso, as interações entre as empresas são uma relação pura-mente de marketing envolvendo a venda de bens e serviços derivados do uso de capacidades de produção existentes e não envolvem elementos significativos destina-dos a melhorar ou criar essas capacidades.
2 Ligações fluxo de conhecimento: São ligações referentes a intercambio de conhe-cimento. Existem dois tipos dessas ligações: (a) as que contribuem significativamente para a criação de capacidades tecnológicas, e (b) as baseadas principalmente no uso
de recursos inovadores existentes que as empresas já possuem.
Esse modelo é particularmente útil para exami-
nar vínculos entre empresas em um certo setor
industrial (e cadeia de fornecedores), independen-
temente do seu tamanho e da sua nacionalidade.
A sua aplicação permite capturar não apenas a
existência, ou não, de ligações entre empresas,
mas, principalmente, o que vai dentro de cada
vínculo, em termos de fluxo de conhecimento tec-
nológico. Ou seja, pode-se examinar se as ligações
relacionam-se ao uso de capacidades tecnológicas
existentes ou ao desenvolvimento de capacidades
para realizar atividades tecnológicas inovadoras.
Isso é particularmente importante para aferir o de-
senvolvimento tecnológico em pequenas e médias
empresas. A despeito da fabulosa retórica sobre a
importância das pequenas e médias empresas para
a geração de empregos e de inovação, as medidas
governamentais tendem a considerá-las de manei-
ra isolada (no que se refere, por exemplo, a micro-
crédito, apoio a treinamentos gerenciais, avaliação
de potencialidade para realização de projetos etc.),
sem examinar adequadamente seu processo de
desenvolvimento tecnológico por meio dos víncu-
los e interações que desenvolvem em seus setores
específicos – e seu posicionamento nas cadeias de
fornecedores – em que operam.
Na verdade, tais medidas tendem a ignorar que,
diferentemente das grandes empresas, as peque-
nas empresas inovadoras – quando conseguem
levar à frente suas atividades tecnológicas – são
especializadas em suas estratégias, concentran-
do-se em inovação de produtos específicos como
máquinas-ferramenta, instrumentos científicos,
produtos químicos especializados e software. Sua
força estratégica chave é combinar capacidade
tecnológica com requisitos específicos de clientes.
No contexto de economias emergentes, porém,
essa habilidade de desenvolver capacidades-nicho
é particularmente mais arriscada, apresentando
grandes ocorrências de fracasso.
158 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Por isso, estudos deveriam examinar o seu relacio-
namento com as demais empresas envolvidas nas
diversas camadas de fornecedores, para identi-
ficar como empresas médias e pequenas locais
poderiam beneficiar-se dos vínculos interorgani-
zacionais para consolidarem-se como fornecedo-
res qualificados de médias e grandes empresas
locais e transnacionais. Essa tipologia de vínculos
tecnológicos interempresariais fornece um mode-
lo geral para examinar os fluxos de conhecimento
entre empresas de diferentes setores industriais.
Ligações entre Empresas e Demais Organizações de Apoio ao Sistema de InovaçãoEmbora o desenvolvimento de capacidade tec-
nológica industrial ocorra primariamente dentro
de empresas, as demais organizações do sistema
de inovação (universidades e
seus diversos departamentos,
institutos públicos e privados
de pesquisa, centros de forma-
ção e treinamento, consulto-
rias) podem contribuir para o
processo inovador em nível
de empresas. Por isso, é ponto
comum em documentos de
política tecnológica no Brasil
a recomendação de fortale-
cimento dos vínculos entre empresas e as demais
organizações que compõem os sistemas local,
regional e/ou nacional de inovação.
Mais especificamente, essas organizações de apoio
envolvem um conjunto de arranjos institucionais
organizados com o objetivo básico de facilitar a
disseminação de tecnologia e outros conhecimentos
relacionados, de fontes relevantes para as empresas
e outras organizações, para auxiliá-las no desen-
volvimento de suas capacidades tecnológicas e na
adoção, produção e comercialização de inovações.
Esses arranjos institucionais cobrem uma diversida-
de de mecanismos e processos que servem de apoio
para a provisão de serviços, tais como contratos de
pesquisa, assistência técnica, certificação, consulto-
ria e treinamento. Em geral, tais arranjos são criados
e/ou mantidos através da provisão de recursos
(financeiros) públicos que permitem que a oferta de
serviços antes mencionada ocorra a um preço abaixo
do mercado. Essa perspectiva sobre a infraestrutura
tecnológica transcende a abordagem convencional
de infraestrutura física – baseada somente no capital
físico e humano, mas envolve também elementos
institucionais e organizacionais que apoiam as ativi-
dades inovadoras das empresas.
Adicionalmente, ao longo dos últimos anos, vários
mecanismos de apoio financeiro têm sido imple-
mentados para a formação e consolidação de
infraestruturas de tecnologia e inovação no Brasil.
Porém, muito pouco tem sido feito em termos de
avaliação das reais implicações da construção e
do funcionamento de tais infraestruturas para
o desenvolvimento de capacidade tecnológica
em empresas no Brasil. Neste sentido, a tipologia
na Tabela 9.4 contém elementos que permitem
examinar a natureza das interações que podem ser
estabelecidas entre a indústria e a infraestrutura
tecnológica. Essa métrica considera se as intera-
ções são baseadas, ou não, no estabelecimento de
contatos formais entre os parceiros, no compro-
misso dos vários atores envolvidos, assim como no
pagamento, ou não, de taxas para que as mesmas
se efetivem. As interações que emergem destas
considerações são agrupadas em três diferentes
conjuntos: ligações informais, ligações vinculadas à
formação e aperfeiçoamento de recursos huma-
nos e ligações formais, descritas na Tabela 9.4.
Portanto, o modelo permite capturar as nuanças
das interações entre os diferentes atores do
sistema nacional/local de inovação. A sua aplicação
empírica pode orientar o processo de desenho de
estratégias mais adequadas à realidade e às neces-
sidades dos próprios sistemas.
Muito pouco tem sido feito em termos de avaliação das
reais implicações da cons-trução e do funcionamento
de tais infraestruturas para o desenvolvimento de capacidade tecnológica em
empresas no Brasil.
159CAPÍTULO 09 | MECANISMOS DE APRENDIZAGEM SUBJACENTES ÀS TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
TABELA 9.4
TIPOLOGIA DE MECANISMOS INTERORGANIZACIONAIS DE APRENDIZAGEM (LIGAÇÕES EMPRESAS E DEMAIS
ORGANIZAÇÕES DO SISTEMA DE INOVAÇÃO)
LIGAÇÕES INFORMAIS
Contatos informais com pesquisadores.
Acesso à literatura especializada.
Acesso à pesquisa de departamentos específicos.
Participação em seminários e conferências.
Acesso aos equipamentos da universidade e/ou dos institutos de pesquisa.
Participação em programas específicos (educacionais e de treinamento).
Outras ligações informais.
RECURSOS HUMANOS
Envolvimento de estudantes em projetos industriais.
Recrutamento de recém-graduados.
Recrutamento de cientistas e engenheiros mais experientes.
Programas de treinamento formalmente organizados para atender às necessida-des dos recursos humanos.
Outras ligações relacionadas aos recursos humanos.
LIGAÇÕES FORMAIS
Consultoria desenvolvida por pesquisadores ou consultores.
Análises e teste (ensaios técnicos).
Serviços de atualização de acervo (normas técnicas atualizadas, patentes).
Repostas técnicas (diagnóstico de problemas em termos de processo produtivo).
Estabelecimento de contratos de pesquisa.
Estabelecimento de pesquisa conjunta.
Outras ligações formais.
Fonte: Adaptado de Figueiredo & Vedovello (2005).
160 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
A transferência de tecnologia
é considerada um dos impor-
tantes mecanismos de aquisi-
ção de conhecimento. Ou seja,
é também considerada um
dos mecanismos de aprendizagem tecnológica. O
processo de transferência de tecnologia envolve,
de um lado, a empresa detentora ou fornecedora
de tecnologia e, de outro, a empresa receptora
de tecnologia. É natural que uma empresa que
construiu e acumulou capacidade em nível avan-
çado e liderança tecnológica busque usufruir dos
benefícios dessa liderança em termos de ganhos
comerciais, econômicos e políticos. De outro lado,
empresas e países que objetivam ter acesso à cer-
ta tecnologia e dominá-la tentarão a sua aquisição.
Surge então a relação entre o fornecedor e o com-
prador de tecnologia. Essa relação normalmente
tende a existir mais comumente entre empresas e
países industrializados, como fornecedores, e os
em desenvolvimento, como compradores.
Estes normalmente iniciam suas atividades indus-
triais à base de tecnologia importada de empresas
de outros países (geralmente os industrializa-
dos). Enquanto a empresa fornecedora possui
os componentes da capacidade tecnológica em
nível avançado, na empresa receptora o nível de
capacidade tecnológica é raso ou inexistente,
como ilustrado pela Figura 9.2. Para que a empre-
sa receptora possa adquirir esta nova tecnologia
– ainda que somente para uso – terá que desen-
volver internamente a sua própria capacidade
tecnológica (principalmente os componentes
relativos a profissionais especializados e sistema
organizacional). Para isso, terá que engajar-se em
processos de aprendizagem tecnológica (para
aquisição e assimilação de conhecimento).
Transferência de Tecnologia como Mecanismo de Aprendizagem Tecnológica
A transferência de tecno-logia é considerada um dos
importantes mecanismos de aquisição de conhecimento.
161CAPÍTULO 09 | MECANISMOS DE APRENDIZAGEM SUBJACENTES ÀS TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
FIGURA 9.2
TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA: RELAÇÃO FORNECEDOR VS. RECEPTOR
Necessidade de emgajamento em processo local de
aprendizagem tecnológica e
capacidade de absorção.
?
A B
FORNECEDORES DE TECNOLOGIA RECEPTORES DE TECNOLOGIA(ASPIRANTE)
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
Durante as décadas de 1950 a 1970, o termo trans-
ferência de tecnologia ganhou enorme popularidade
junto a governos, mas também em instituições de
pesquisa, ensino e consultorias. Existiam vários
programas de educação e treinamento – como ainda
existem alguns atualmente – voltados a ensinar
gestores empresariais e governamentais a gerir o
processo de transferência de tecnologia. Ocorre
que normalmente a grande ênfase era dada ao lado
esquerdo da Figura 9.2, ou seja: ao processo de sele-
ção e escolha da tecnologia e, principalmente, do seu
fornecedor. Partia-se da ideia de que, tendo sido
feita uma boa seleção da tecnologia e dos forne-
cedores, a sua assimilação ocorreria automatica-
mente, como uma mera questão de tempo.
Eram adquiridos, portanto, apenas os sistemas
técnico-físicos, ou parte deles, na forma de maquina-
ria, equipamentos, software ou banco de dados ou os
produtos. Sabemos que há, em muitos países em de-
senvolvimento, evidências de casos de “tecnologias”
adquiridas sob esta perspectiva que estão guarda-
das há anos, nas mesmas caixas
entregues pelo fornecedor, pois
a organização receptora não
desenvolveu nenhuma base
organizacional e/ou gerencial,
nem de recursos humanos,
para fazer instalar e usar a
“tecnologia”. Tem-se então uma
aquisição incompleta ou trunca-
da de tecnologia. Ou seja, o lado
direito da Figura 9.2 tendia – e,
em alguns casos, ainda tende – a
ser negligenciado por dirigentes
durante o processo de aquisição
de tecnologia. Especificamen-
te, a real transferência de
tecnologia de fornecedores
para receptores envolve, de
um lado, a gestão da seleção, escolha e compra da
tecnologia importada. De outro, implica assegu-
rar o engajamento da organização recipiente em
A real transferência de tecnologia de fornecedores para receptores envolve, de um lado, a gestão da sele-ção, escolha e compra da tecnologia importada. De outro, implica assegurar o engajamento da organização recipiente em um contínuo e sistemático processo de aprendizagem tecnológica. É justamente essa segunda “metade” que tende a ser negligenciada em estratégias de inovação industrial.
162 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
um contínuo e sistemático processo de aprendi-
zagem tecnológica. É justamente essa segunda
“metade” que tende a ser negligenciada em
estratégias de inovação industrial.
Isto porque a aquisição de tecnologia importada
limita-se tão-somente aos componentes produtos/
serviços e sistemas técnico-físicos, ou fluxos de
conhecimento tipo A, da Figura 9.3. Apenas com base
nesses componentes elas dificilmente conseguem
operar ou mesmo modificar o que adquiriram. E,
como sabemos agora, os outros componentes, os
profissionais especializados e o tecido organizacional
não são transplantados automaticamente. Por isso,
as empresas receptoras de tecnologia precisam trei-
nar seus próprios operadores, engenheiros, técnicos,
pesquisadores, assim como precisam desenvolver
suas próprias rotinas e procedimentos organizacio-
nais. É isso que permitirá que a tecnologia importada
seja de fato realmente assimilada, absorvida e, pos-
teriormente, modificada pela empresa importadora.
Por esta razão, os componentes do lado direito da
Figura 9.2 são prioritários do ponto de vista de de-
senvolvimento de capacidade tecnológica para que a
tecnologia importada seja de fato adquirida.
Portanto, é por meio do desenvolvimento de sua
capacidade tecnológica local que a empresa recep-
tora poderá, inicialmente, usar/operar a tecnologia
importada. Se continuar aprofundando a sua capa-
cidade tecnológica local poderá então modificar,
de várias maneiras e em vários graus, a tecnologia
importada. Dependendo do grau de modificação
que for capaz de fazer, a empresa receptora poderá
evoluir para ser geradora de sua própria tecnolo-
gia. Ou seja, a empresa receptora somente poderá
adquirir plenamente uma tecnologia se engajar-se
em um processo de aprendizagem para construir sua
própria capacidade tecnológica. Assim, há vários mo-
dos de transferência de tecnologia. Pode-se evoluir
e mero usuário à autossuficiência como mostrado
na Figura 9.3. Essa evolução depende dos fluxos de
conhecimento usados nos processos de transferên-
cia de tecnologia, os quais podem ter pelo menos
três tipos (Figura 9.4). É preciso atentar para os tipos
de fluxos de conhecimento envolvidos no processo
de transferência de tecnologia. A natureza desses
fluxos determinará se a empresa de economia em
desenvolvimento ou receptora de tecnologia fará ou
não o percurso da Modo 1 ao Modo 4 da Figura 9.4.
Produção de
fornecedores*,
engenharia, P&D,
capacidades
gerenciais e afins.
Nova
capacidade
de produção
Fluxo A
Fluxo B
Fluxo C
CAPACIDADES DE FORNECEDORES*
FORMAS DE TECNOLOGIA
CAPACIDADES DE IMPORTADORES*
‘Inovação’
Capacidade
inovadora
adicionada
OBJETIVO DE DESENVOLVIMENTO
Bens de capital,
serviços e designs
Habilidades
operacionais e
know-how
Conhecimentos
e competências
para a mudança
tecnológica
?
?
FIGURA 9.3
TIPOS DE FLUXOS DE CONHECIMENTO PROCESSOS DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA
Fonte: Adaptado de Bell (2012).
163CAPÍTULO 09 | MECANISMOS DE APRENDIZAGEM SUBJACENTES ÀS TRAJETÓRIAS DE CATCH-UP TECNOLÓGICO
Desenvolvimento de pesquisa endógena/local,
produção.
Pesquisa conjunta, desenvolvimento e
produção.
Nenhum P&D endógeno/local.
Manufatura endógena.
Nenhum desenvolvimento ou produção
endógena/local.
OFF-THE-SHELF PRODUÇÃO LICENCIADA/ CO-PRODUÇÃO
COLABORAÇÃO AUTO-SUFICIÊNCIA
Auto suficiência
Dependência tecnológica de
outros países
01 02 03 04
FIGURA 9.4
MODOS DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA
Fonte: Adaptado de Dorman et al (2015).
Especificamente, esses fluxos de conhecimento da
Figura 9.3 podem ser definidos da seguinte maneira:
1 Fluxo A: Bens de capital (design, enge-nharia e serviços relacionados que são utilizados na criação de bens de capital) e desenhos e especificações “prontos” para produtos ou processos que podem ser comprados ou licenciados.
2 Fluxo B: Vários tipos de habilidades, conhe-cimentos e know-how para operar novas instalações de produção e para realizar atividades de manutenção associadas.
3 Fluxo C: Um conjunto de variados tipos de conhecimento e habilidades para adaptar, melhorar e desenvolver a tecnologia inicial-mente adquirida.
164 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
10
165RESUMO EXECUTIVO
Desafios e Recomendações Finais
166 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
10. Desafios e Recomendações Finais
À luz da base analítica deste documento e das evidências do-
cumentadas em estudos relevantes da literatura relacionada,
vários deles aqui citados, esta seção comenta alguns desafios
e apresenta algumas recomendações práticas relativos ao
fortalecimento da competitividade industrial do Brasil. A
trajetória do desenvolvimento industrial de países deriva, em
grande parte, da qualidade das decisões estratégicas tomadas
por governos e lideranças industriais em diferentes pontos no tempo. Por isso, as
opções feitas hoje sobre a diretriz de desenvolvimento industrial e tecnológico
no Brasil certamente influenciarão a natureza, o nível e a velocidade do desenvol-
vimento econômico (e social) nas próximas décadas no país. Especificamente, o
fortalecimento da competitividade industrial do Brasil nos anos e décadas seguin-
tes estará fortemente condicionado pela natureza, direção e velocidade das
trajetórias de acumulação de capacidades tecnológicas em nível de empresas
de diferentes setores industriais.
Ainda que as trajetórias tecnológicas estejam sujeitas a influências diversas,
elas dependem, em grande parte, das ações estratégicas em nível de empre-
sas em associação às ações de políticas públicas. Reitera-se aqui a ênfase nas
empresas e indústrias. As empresas e indústrias são o lócus fundamental no
qual ocorre a transformação de conhecimento em riqueza, isto é, o processo
de inovação. Por conseguinte, é no âmbito das empresas e indústrias que se
forma grande parte da produtividade do país. Os demais atores (universidades,
institutos de pesquisa públicos e privados etc.) contribuem para o processo
de inovação em nível das empresas e indústrias. A Figura 10.1 ilustra algumas
dessas possíveis trajetórias e algumas de suas correspondentes implicações.
O fortalecimento da competitividade indus-trial do Brasil nos anos e décadas seguintes
estará fortemente condicionado pela natureza, direção e velocidade das trajetórias de acumu-lação de capacidades tecnológicas em nível de
empresas de diferentes setores industriais.
167CAPÍTULO 10 | DESAFIOS E RECOMENDAÇÕES FINAIS
FIGURA 10.1
POSSÍVEIS TRAJETÓRIAS DE ACUMULAÇÃO DE CAPACIDADE TECNOLÓGICA NA INDÚSTRIA BRASILEIRA
ED
A
C
Básico
Intermediário
Avançado
Liderança Internacional
Tempo (anos)1998 1999 200019971996 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2025
Abertura de novos segmentos tecnológicos na
fronteira internacional e/ou novos segmentos
tecnológicos novos para a economia local.
B
Fonte: Adaptado de Figueiredo (2015).
Com base na leitura da Figura 10.1 podemos
interpretar que:
1 Na trajetória representada pela Curva A, as empresas que acumulam capacidades tecno-lógicas em nível avançado podem continuar aprofundando e fortalecendo essas capaci-dades tecnológicas. Isso lhes permite obter proveito comercial e financeiro da tecnologia existente (core business). Porém, é impor-tante considerar que o aprofundamento das capacidades tecnológicas ao longo dessa curva dependerá da eficácia dos mecanismos de aprendizagem tecnológica.
2 Por outro lado, há o risco de exacerbação no aprofundamento e fortalecimento
da acumulação de capacidades tecnológicas existentes (ou de “fazer mais do mesmo”). Isso pode conduzir à trajetória represen-tada pela Curva B. Incentivadas a fazerem “mais do mesmo”, as empresas podem enrijecer suas capacidades tecnológicas. Isso se reflete na perda de conexão com as reais demandas do mercado (reais e potenciais). Cai-se aqui no parado-xo do “inovar demais” (porém na direção errada). Assim, empresas e indústrias líderes podem ser superadas por competidores inovadores e novos entran-tes mais eficazes, em termos da gestão de seu processo de inovação.
Há o risco de exacerbação no aprofundamento e fortalecimento da acumulação de ca-pacidades tecno-lógicas existentes (ou de “fazer mais do mesmo”).
168 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
3 Uma estratégia de mera manutenção, sem esforços renovados de aprendizagem
tecnológica, pode conduzir a uma trajetória de deteriora-ção de capacidades tecno-lógicas existentes (Curva C). Neste caso, o enfraque-cimento e a possível perda das capacidades tecnoló-gicas inovadoras estariam relacionados à ausência e/ou ineficácia dos esforços de aprendizagem tecnológica. Também estariam relaciona-dos à perda de conexão entre esforços tecnológicos inova-dores internos da empresa e as demandas existentes e potenciais de mercado.
4 No entanto, as empresas podem engajar-se em novas linhas de produtos e linhas de
negócios partir do aprovei-tamento da base existente de capacidades tecnológi-cas inovadoras, como ilus-trado pela Curva D. Precisa-riam, no entanto, reorganizar suas bases de conhecimento via estratégias de aprendiza-gem tecnológica.
5 Mas isso também pode ser feito a partir de um engajamento em trajetória tecnológica alterna-tiva – em atividades diferentes do negócio atual
(Curva E). Ou seja, empresas podem inaugurar um segmento tecnológico novo na fronteira internacional de inovação ou novo para a economia de um país (‘nova indústria’ ou setor industrial). Isso é feito quando são capazes de desenvolver novas tecnologias (de produto, processo, serviço etc.) com grau de novidade internacional. Por
sua vez, isso não significa que tais tecnologias devam ser necessariamente científica e tecnolo-gicamente radicalmente novas. Podem decorrer de recombinações de tecnologias existentes, porém, com grau de novidade internacional.
6 É importante reiterar que a diversificação das atividades tecnológicas das empresas (Curvas D e E), a partir de suas capacida-des tecnológicas inovadoras, é importante tanto para as empresas quanto para o país. É importante para as empresas porque elas podem aproveitar novas janelas de oportunidades para criação de novas linhas de negócio baseadas em novas tecnologias que garantirão o crescimento de longo prazo da empresa. Reiterando, isso é fundamental para a economia do país pois cria setores industriais novos, renovando a estrutura industrial do país e garantindo as bases para um crescimento industrial de longo prazo. Isto porém, implica a criação de capacida-des tecnológicas (Figura 6.3) diferentes daquelas relacionadas às tecnologias exis-tentes. Os componentes capital humano (profissionais e suas qualificações formais e informais) e sistema organizacional devem receber atenção especial.
7 Este estudo chama a atenção para a impor-tância da acumulação de capacidades tecno-lógicas inovadoras como ativo estratégico capaz de contribuir para um aprimoramento consistente na performance competitiva de empresas (Seção 6). É certo que fatores externos, tais como taxas de câmbio, por exemplo, podem afetar a performance com-petitiva da empresa. Porém, é a acumulação de capacidades tecnológicas que garante à empresa a inovação de seus processos, produtos, serviços, sistemas físicos e orga-nização. Como demonstrado por diversos estudos existentes, tais atividades inovado-ras impactam a obtenção de performance competitiva termos operacionais, comerciais, e econômicos. Mais especificamente:
7.1 Mais do que taxas de câmbio, é a ca-pacidade tecnológica de produção e, particularmente, para inovação que garante a performance competitiva de empresas e indústrias. É a capacidade tecnológica que garante à empresa
O enfraquecimento e a pos-sível perda das capacidades
tecnológicas inovadoras esta-riam relacionados à ausência
e/ou ineficácia dos esforços de aprendizagem tecnológica.
É importante reiterar que a diversificação das atividades
tecnológicas das empresas (Curvas D e E), a partir de
suas capacidades tecnológi-cas inovadoras, é importan-
te tanto para as empresas quanto para o país.
As empresas podem enga-jar-se em novas linhas de pro-
dutos e linhas de negócios partir do aproveitamento da base existente de capacida-
des tecnológicas inovadoras.
Empresas podem inaugurar um segmento tecnológico
novo na fronteira internacio-nal de inovação ou novo para a economia de um país (‘nova indústria’ ou setor industrial).
Mais do que taxas de câmbio, é a capacidade tecno-lógica de produção e, particularmente, para ino-
vação que garante a performance competitiva de empresas e indústrias.
169CAPÍTULO 10 | DESAFIOS E RECOMENDAÇÕES FINAIS
melhoramento em seus processos, produtos, sistemas físicos e organiza-ção que têm impactos perenes na me-lhoria de indicadores de performance.
7.2 A capacidade tecnológica pode também contribuir para amortecer os impactos negativos de fatores externos à empresa e abrir caminho para a conquista de novos mercados, à base de novos produtos e serviços. Portanto, esforços para acumulação de níveis progressivamente mais altos de capacidades tecnológicas, apoiados por mensurações sistemáticas de seu progresso ao longo do tempo, deve-riam ocupar lugar central na agenda estratégica de empresas. Estudos existentes baseados em evidências convincentes, também apontam que o aprimoramento consistente de performance competitiva depende da capacidade de gerir uma multiplicida-de de tipos e níveis de capacidade para funções tecnológicas diversas.
7.3 Como sugere a perspectiva subjacente ao modelo nas Figuras 6.5 e Figura 7.1, é importante distinguir dois tipos de desenvolvimento de capacidade tec-nológica: operacional ou de produção (para usar tecnologias) e inovadoras (para gerar e gerir mudanças tec-nológicas). Enquanto governos estão interessados em acelerar ambos os tipos de trajetória de desenvolvimento industrial, diferentes recursos, ações empresariais e políticas públicas são necessários para a acumulação de cada um desses tipos de capacidade tecnológica. Decisões relativas a es-sas duas trajetórias estão no coração das opções estratégicas de desenvol-vimento industrial de um país.
7.4 Especificamente, é sabido que o Brasil tem uma grande proporção das em-presas em níveis mais baixos de capa-cidade tecnológica (os da Figura 6.5). Dessa forma, se a ideia é promover um avanço significativo em termos de capacidade tecnológica e de produti-vidade da economia nacional, é bem
possível que uma estratégia eficaz seja – mais do que tentar incentivar um crescente nú-mero de empresas a chegar ao topo da escala – pro-mover um maciço deslocamento de firmas do primeiro e segundo degraus (capacidade ope-racional básica e capacidade operacional mundial) para níveis progressivamente mais altos de capacidades tecnológicas inovadora. Para tanto, políticas bem desenhadas podem ser uma escolha melhor do que for-tes incentivos a um grupo pequeno de empresas escolhi-das. A experiência internacional indica que é possível haver atividades inovadoras rele-vantes, não neces-sariamente ligada à alta tecnologia, em indústrias que não são tradicionalmen-te vistos como ino-vadores, de acordo com as taxonomias convencionais. Tais setores referem-se àqueles intensivos em recursos natu-rais, fortemente enfatizados neste estudo e em outros no âmbito do Programa de Pesquisa relacionados a este estudo.
7.5 Para economias em desenvolvimento ou emergentes, a questão-chave é não apenas calibrar o grau de incentivos a empresas, como, por exemplo, para compra de máquinas e equipamentos ou exportação (abordagem estática).
Enquanto governos estão interessados em acelerar ambos os tipos de trajetória de desenvolvimento indus-trial, diferentes recursos, ações empresariais e políti-cas públicas são necessários para a acumulação de cada um desses tipos de capaci-dade tecnológica.
A questão-chave é não apenas calibrar o grau de incentivos a empresas, como, por exemplo, para compra de máquinas e equipamentos ou exporta-ção (abordagem estática).
Pode-se estimular que um grande número de empre-sas se mova, com adequada velocidade, para a acumu-lação de níveis inovadores de capacidade tecnológica por meio de um contínuo processo de aprendizagem (abordagem dinâmica).
170 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
Em paralelo, porém, pode-se estimular que um grande número de empresas se mova, com adequada velocidade, para a acumulação de níveis inova-dores de capacidade tecnológica por meio de um contínuo processo de aprendizagem (abordagem dinâmica).
7.6 São necessárias estratégias de aprendizagem diferenciadas para empresas que precisam mover-se para níveis mais próximos da fronteira tecnológica internacional de inova-ção. De novo, isso estará associado a estratégias de gestão de capacidades tecnológicas “distribuídas” ou de inovação aberta ou colaborativa. Essa distribuição – a fragmentação das atividades inovadoras e das corres-pondentes capacidades tecnológicas para implementá-las – tem extrapola-do os muros das empresas: tem sido
fragmentadas ou distribuídas dentro da empresa (corpo-ração e subsidiárias), entre empresas e internacional-mente. Especificamente, elas têm sido distribuídas entre parceiros, como institutos de pesquisa, competidores, fornecedores, usuários, universidades etc. São
necessários esforços de coordenação, integração, orquestração e de indu-ção para a geração de conhecimento, com adequada velocidade, a fim de gerar as inovações necessárias para as empresas.
7.1 Assim, este estudo reitera a atenção para a importância das capacidades
inovadoras acumuladas em ní-vel de empresas e suas redes colaborativas de parceiros para o alcance e sustentação de performance competitiva. Tais capacidades tecnológicas são, em última instância, a microfundação da produti-vidade ou competitividade industrial e do crescimento
econômico. Tais capacidades tecnoló-gicas podem ser construídas e acumu-ladas de forma aberta ou colaborativa (empresas juntamente com outros componentes do sistema de inova-ção, tais como institutos públicos e privados de pesquisa). No entanto, é a empresa/indústria e demais iniciativas empreendedoras que ditam o ritmo e as demandas (existentes e poten-ciais) da acumulação dessas capacida-des tecnológicas inovadoras.
7.2 Portanto, esforços para acumulação de níveis progressivos de capacidades tecnológicas, apoiados por mensura-ções sistemáticas de seu progresso ao longo do tempo, deveriam ocupar lugar central na agenda de ações de desenvolvimento industrial.
8 Adicionalmente, à luz das ideias aqui apre-sentadas, bem como à luz de estudos relevan-tes na literatura recente sobre desenvolvi-mento tecnológico industrial em economias em desenvolvimento, são sintetizadas a seguir algumas recomendações práticas rela-tivas aos desafios do fortalecimento da com-petitividade industrial do Brasil, com base na acumulação de capacidades tecnológicas:
8.1 A partir da década de 1990, diversas economias em desenvolvimento e emergentes criaram e/ou reorgani-zaram programas governamentais de suporte e financiamento a atividades tecnológicas inovadoras no âmbito de empresas industriais. Trata-se, indubi-tavelmente, de esforços meritórios de estímulo e financiamento à inovação industrial. No Brasil, por exemplo, durante as duas últimas décadas tem havido uma profusão de “políticas industriais”. Tais esforços tem sido materializados sob várias combina-ções de abordagens para políticas industriais – como por exemplo a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE); Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP); Brasil Maior, desonerações, conteúdo local e demais medidas protecionis-
São necessárias es-tratégias de aprendi-zagem diferenciadas
para empresas que precisam mover-se
para níveis mais pró-ximos da fronteira
tecnológica interna-cional de inovação.
O debate sobre competi-tividade industrial deveria
enfatizar menos “política industrial” e muito mais “po-líticas de inovação”. O termo
“política industrial” deveria deixar de ser usado.
Tais capacidades tecnoló-gicas são, em última ins-
tância, a microfundação da produtividade ou compe-
titividade industrial e do crescimento econômico.
171CAPÍTULO 10 | DESAFIOS E RECOMENDAÇÕES FINAIS
tas, as quais parecem não mais se alinhar às práticas avançadas e atuais relativas à inovação e competitividade industrial. Não obstante, evidências de estudos existentes sugerem que tais esforços não têm sido suficientemente eficazes, pelo menos no que concerne à inovação e competitividade indus-trial. Também não tem havido esforços sistemáticos para a avaliação das reais alterações, em termos de acumulação de capacidades tecnológicas inova-doras em nível das indústrias que têm sido alvo de tais políticas. Em outras palavras, paradoxalmente, a despeito da ampla oferta de “políticas indus-triais”, tem havido uma preocupante estagnação e enfraquecimento da competitividade industrial brasileira. Por isso, o debate sobre competiti-vidade industrial deveria enfatizar menos “política industrial” e muito mais “políticas de inovação”. O termo “política industrial” deveria deixar de ser usado.
8.2 No entanto, a mera elaboração e publicação (ou oferta) de medidas de políticas públicas, assim como a disponibilização de recursos finan-ceiros (sejam créditos, subvenções e recursos financeiros governamentais em geral), estão longe de produzirem inovação e competitividade industrial. O que importa muito é a qualidade e direção dos investimentos realizados e a aferição constante de seus impactos.
8.3 Mesmo curtos períodos de proteção têm de ser acompanhados por incen-tivos de desempenho e eficiência. No entanto, a gestão dessa forma equili-brada e controlada de proteção exige níveis elevados de competência buro-crática combinados com estruturas po-líticas específicas e relacionamentos. A menos que essas condições possam ser cumpridas, o efeito da competição comercial restrito pode ser negativo no que diz respeito à eficiência opera-cional de curto prazo e investimento
de longo prazo na acumulação de capacidades tecnológicas inovadoras. Qualquer medida protecionista (por exemplo, aumento de tarifas ou con-teúdo local) deve ter datas claras e firmes de começo e de fim.
8.4 Assim, é preciso extrema cautela com os subsídios indiscrimina-dos. Conceder subsídios sem condicionamentos aumenta o risco de seleção ineficaz dos beneficiários e o desenvolvimento de comportamen-tos dependentes da assistência a empresas que, muitas vezes, não são traduzidas em inovação e em aumento de produtividade. No Brasil, em parti-cular, além da ausência de condicionamentos eficazes, há uma grande ausência de avaliação dos impactos gerados pelos benefícios concedidos. Ao mesmo tempo, há que se atentar para os malefícios dos “apoios sem fim”. Ou seja, a ausência de cláusulas de caducidade em programas de apoio às empresas desencoraja os esforços relativos à inovação, aumento de produtivida-de e de enfrentamento da competição internacional. Isso é particularmente válido para políticas como as de conteúdo local, por exemplo. Estipular com clareza as cláu-sulas de começo e de fim do
Qualquer medida protecio-nista (por exemplo, aumento de tarifas ou conteúdo local) deve ter datas claras e firmes de começo e de fim.
No Brasil, em particular, além da ausência de con-dicionamentos eficazes, há uma grande ausência de avaliação dos impac-tos gerados pelos bene-fícios concedidos.
Há que se atentar para os malefícios dos “apoios sem fim”. A ausência de cláusulas de caducidade em programas de apoio às empresas desencoraja os esforços relativos à inovação, aumento de produtividade e de enfrentamen-to da competição internacional.
É preciso extrema cautela com os subsídios indiscrimi-nados.
172 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
suporte é parte da eficácia do desenho e implementação da política pública.61
8.5 A influência do protecionismo de mercado sobre a acumulação de ca-pacidades tecnológicas pode atingir apenas uma gama estreita de capaci-dades. Mas o único tipo de oportuni-dade de aprendizagem que pode ser diretamente atribuível à proteção do mercado é apenas a forma passiva de “aprender fazendo operação” (le-arning by doing operation/production), mesmo assim, com níveis duvidosos de qualidade e eficiência de custo.
8.6 Por isso, o argumento convencional sobre a proteção e aprendizagem
aplica-se apenas para o fortalecimento da capacidade de produção/operacional e aos tipos talvez relativamente simples de capacidade de ino-vação. A proteção industrial não é relevante para os tipos de capacidade significativa de inovação, cuja acumulação depende muito mais de inves-timentos na aprendizagem e criação de capacidades tec-
nológicas para inovação. Na verdade, a redução dos incentivos derivados da competição e a continuidade do protecionismo podem ter um efeito negativo sobre a acumulação de capa-cidades para inovação e na competiti-vidade industrial. Logo, e reiterando, dever-se-ia evitar proteções exacer-badas (substituições de importações, exigências de conteúdo local) e sem data de término e sem contrapartida de aumento (mensurável) de níveis inovadores de capacidades tecnológi-
cas e exportação.
8.7 A política comercial tem influência inerentemente limitada na acumulação de capacidades tecnológicas para inovação. Isto porque a política comercial tem sido principalmente conce-
bida para influenciar as capacidades tecnológicas para produção, e não as capacidades tecnológicas para inovação. Políticas de proteção de mercado têm a intenção de alterar a composição da produção, influenciando a entrada de empresas em novas indústrias e sua sobrevivência. Na melhor das hipó-teses, portanto, a política comercial tem influência apenas parcial e indireta sobre o desenvolvimento das capacidades tecnológicas para inovação.
8.8 O desenvolvimento tecnológico e industrial de países envolve uma complementaridade entre tecnolo-gias importadas e acumulação local de capacidades tecnológicas. Por isso, as restrições à importação de tecnologia é medida contraproducen-te ao desenvolvimento tecnológico. Sob o ponto de vista da acumulação de capacidades tecnológicas, é equivo-cado o argumento de que a impor-tação de tecnologia e a criação local de tecnologia sejam alternativas excludentes. Também não reflete a experiência histórica de economias hoje tecnologicamente avançadas.
8.9 O processo de seleção de empresas e setores (picking winners e apoio aos national champions) pode excluir empresas altamente promissoras, do ponto de vista de acumulação de capacidades tecnológicas inovadoras, do foco de atenção da política pública. Por exemplo, ao se privilegiar determi-nadas empresas (ou empresa) dentro de uma indústria selecionada, descon-sideram-se, por exemplo, empresas médias e pequenas em processo de ascensão tecnológica. Por exemplo, na Alemanha, parte importante de sua significativa competitividade indus-trial, deriva de uma ampla variedade de médias empresas tecnologica-mente inovadoras e exportadoras. Portanto, dever-se-ia evitar a seleção exacerbada de setores industriais. Portanto, e reiterando, a política de
A influência do protecionismo de mercado sobre a
acumulação de capa-cidades tecnológicas pode atingir apenas
uma gama estreita de capacidades.
A política comercial tem influência ine-rentemente limita-da na acumulação
de capacidades tecnológicas para
inovação.
A proteção industrial não é relevante para os tipos de
capacidade significativa de inovação, cuja acumulação
depende muito mais de investimentos na aprendiza-
gem e criação de capacidades tecnológicas para inovação.
O desenvolvimento tecno-lógico e industrial de países
envolve uma complemen-taridade entre tecnologias im-
portadas e acumulação local de capacidades tecnológicas.
61. OCDE (2014).
173CAPÍTULO 10 | DESAFIOS E RECOMENDAÇÕES FINAIS
seleção de setores e empresas especí-ficos exclui da agenda várias empresas e indústrias que estão em processo de acumulação de capacidades tecnológi-cas (degraus intermediários da Figura 7.1) e movendo-se acima na escala de atividades inovadoras (Figura 6.5) e em ascensão tecnológica.
8.10 Muito se recomenda em termos de engajamento de empresas brasileiras em cadeias globais de valor. Porém, o debate e as ações precisam ser aprofundados. Certamente que a par-ticipação nessas cadeias é relevante e necessária. No entanto, é necessário considerar o tipo de governança das cadeias globais de valor. Também é preciso considerar até que ponto e como a participação nessas cadeias contribuiria para o aumento do nível de capacidades tecnológicas inovado-ras em nível de empresas e indústrias.
9 No que concerne a pontos específicos relacionados a perspectivas sobre inovação e suas implicações para uma política de inovação para o fortalecimento da competiti-vidade industrial, convém mencionar:
9.1 É importante avançar no campo de uma reforma estrutural relativa ao balanceamento das atividades de P&D entre o setor público e o setor privado (indústria). Até a década de 1990, o Brasil apresentava a propor-ção de 80% (setor público) a 20% (setor privado). Por meio de uma len-ta transição ao longo dos últimos 20 anos, tem-se obtido uma proporção de aproximadamente 70% (setor pú-blico) a 30% (setor privado). Porém, é importante mencionar que a Coreia do Sul inverteu essa proporção ao longo de aproximadamente 20 anos: de uma distribuição de 80/20% (década de 1970) para 20/80% no início da década de 1990. Isso foi possível a partir de reformas estru-turais em seu sistema nacional de ciência, tecnologia e inovação.
9.2 Por isso, recomen-da-se que algumas atividades de P&D público sejam reorganizadas a fim de aproximarem--se cada vez mais das demandas e necessidades da indústria. Por exemplo, sabe-se que o governo japonês imple-mentou medidas para estimular a pré-entrada de empresas em atividades de pesquisa e apren-dizagem tecnológica. Imple-mentaram também medidas ba-seadas em co-financiamento de atividades de inovação voltadas para descobertas de inovações novas para a economia.
9.3 O ponto acima deveria chamar a atenção de gestores gover-namentais, especialmente daqueles de economias em desenvolvi-mento e emergentes, que se mostram fascinados por “inovações radicais” ou “breakthrough” apenas. Com isso, canalizam grande parte dos investi-mentos públicos para laboratórios de pesquisa, em sua maioria em universidades e institutos de pesquisa, e negligenciam as atividades inova-doras, baseadas em diversos tipos de engenharia, em nível de empresas. Os formuladores e executores de políticas públicas deveriam reduzir sua atração com a criação de parques científicos ou ini-ciativas similares (como financia-mentos a projetos somente em nível
É equivocado o argumen-to de que a importação de tecnologia e a criação local de tecnologia sejam alternativas excludentes.
Recomenda-se que algumas atividades de P&D público sejam reorganizadas a fim de aproximarem-se cada vez mais das demandas e necessi-dades da indústria.
Os formuladores e exe-cutores de políticas pú-blicas deveriam reduzir sua atração com a criação de parques científicos ou iniciativas similares (como financiamentos a projetos somente em nível de labo-ratórios de universidades).
O processo de se-leção de empresas e setores (picking winners e apoio aos national cham-pions) pode excluir empresas altamen-te promissoras.
174 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
de laboratórios de universidades). O investimento em ciência per se não conduz, automaticamente, à inova-ção industrial.
9.4 Especificamente, tem havido uma ênfa-se exacerbada na produção de ciência com objetivos de se obter (linearmen-te) inovações radicais e de ruptura industrial. Consequentemente, tem havido uma negligência da importância de atividades inovadoras incremen-tais, arquiteturais e modulares (várias delas implementadas à base de enge-nharia e menos P&D sofisticado). Tais atividades inovadoras, de natureza imitativa e incremental não apenas tem gerado impactos competitivos re-levantes para empresas e países; elas também são pré-condições para se alcançar a capacidades para inovações mais ambiciosas.
9.5 De forma similar, faz-se necessária a racionalização e focalização de parques tecnológicos (potenciais e existentes) e incubadoras de acordo com as reais demandas existentes e potenciais da indústria. Uma visão
“ofertista” de construção de parques tecnológicos não contribui para o desenvolvi-mento industrial. A proxi-midade geográfica entre empresas e universidades e institutos de pesquisa não conduz, automaticamente, à inovação e ao desenvolvi-mento industrial. As ligações entre esses atores (indústria e universidades/institutos de pesquisa) são determina-
das pela demanda e pela natureza do conhecimento tecnológico dos parceiros, independentemente de sua localização geográfica.
9.6 É importante compreender o processo de inovação em nível de subsidiárias de empresas multinacionais que operam no Brasil e envolvê-las em iniciativas de fortalecimento da com-
petitividade industrial. As subsidiárias de multinacionais em economias emergentes têm cada vez mais se valido do processo de fragmentação internacional da inovação. Muitas delas têm se tornado autônomas para a implementação de inovações para seu grupo corporativo a partir de economias emergentes (exemplo em-blemático da Honda Manaus). Várias delas funcionam como centros globais de inovação. Há muitos estudos demonstrando isso. Estão no Brasil, há décadas, mais de 400 subsidiárias das 500 maiores multinacionais do mundo, várias delas com centros de desenvolvimento de produtos, pro-cessos e equipamentos. Ou seja, não se pode ignorar a alta relevância das empresas multinacionais para o de-senvolvimento e competitividade da indústria brasileira. Por isso, torna-se fundamental envolvê-las no debate e na agenda de políticas públicas.
10 Grande parte da literatura recomenda que economias em desenvolvimento trilhe o seu processo de industrialização à base de indústrias de manufatura tais como, semi-condutores, automobilísticos, eletrônica de consumo e outras, à la Sudeste Asiático. Porém, de um lado, para algumas dessas in-dústrias (como eletrônica, semicondutores) as janelas de oportunidade para o Brasil atuar como um produtor e inovador global já se fecharam. Por outro lado, países tem que aprender a gerir o dilema entre “o que querem ser” e “o que são”.62 Em outras palavras, não se pode ignorar o peso e a relevância das indústrias intensivas em recursos naturais no PIB do Brasil e em sua pauta de exportações. Vale reiterar que em países como Austrália, Canada, Estados Unidos, Noruega, Finlândia grande parte do crescimento e desenvolvimento econômico derivou da combinação inteli-gente do aproveitamento da abundância de recursos naturais com a acumulação de capacidades tecnológicas para inovação em indústrias intensivas em recursos natu-rais. Assim, recomenda-se alguns pontos
Faz-se necessária a racionalização e
focalização de par-ques tecnológicos (potenciais e exis-
tentes) e incubado-ras de acordo com as reais demandas
existentes e poten-ciais da indústria.
As ligações entre esses atores (indústria e universidades/institutos de pesquisa) são
determinadas pela demanda e pela natureza do conheci-mento tecnológico dos par-ceiros, independentemente
de sua localização geográfica.
62. Hausmann et al (2006); Almeida & Schneider (2012).
175CAPÍTULO 10 | DESAFIOS E RECOMENDAÇÕES FINAIS
relacionados a uma agenda política para se obter proveito das novas condições de demanda e oportunidades de inovação nas indústrias intensivas em recursos naturais:
10.1 Valendo-se da noção de necessidade da ampliação do escopo das políticas de desenvolvimento industrial63 , os tomadores de decisão em nível de políticas públicas deveriam evitar medidas simplistas que enfatizam apenas às assim chamadas indústrias de “alta tecnologia”, em detrimen-to das indústrias intensivas em recursos naturais, genericamente consideradas de “baixa tecnologia”. É importante não negligenciar as indústrias intensivas em recursos naturais e inclui-las na agenda política. Deixar a natureza, quase que literalmente, seguir seu curso, conduzirá certamente à perda de ja-nelas de oportunidades oferecidas para um engajamento em trajetórias tecnológicas que podem gerar efei-tos significativos ao crescimento e desenvolvimento econômico do país.
10.2 Um segundo caminho exige o avanço de uma nova agenda de iniciativas políticas para aproveitar demandas potenciais e as condições tecnológicas e aumentar o dinamismo tecnológico de setores de recursos naturais. Rumo a essa agenda, quatro conjuntos de ações podem ser considerados:
• Iniciativas para apoiar o fortalecimen-to dos esforços inovadores em indús-trias intensivas em recursos naturais;
• Iniciativas para promover a diver-sificação a montante, a jusante e lateralmente/horizontalmente a partir de uma base de recursos naturais;
• Iniciativas para apoiar o desenvolvi-mento do capital humano, criando uma massa crítica de gestores competen-tes, engenheiros, técnicos e funcioná-rios públicos;
• Iniciativas para ajudar as empre-sas nacionais a terem conformidade com os regulamentos de Direitos de Propriedade Intelectual (DPIs) e reforçar a proteção dos DPIs de esforços locais.
10.3 Ademais, em termos de iniciativas para apoiar a acumulação de capacidades de inovação em recursos naturais e setores relacionados, recomenda-se:
• Desenho de um conjunto variado de incentivos para estimular os esforços inovadores e a acumulação de capacidades para inovação. Para levar à inovação, ou seja, à introdu-ção operacional de produtos novos ou melhorados e processos, marke-ting e métodos organizacionais em uma economia, os incentivos devem cobrir a ampla gama de atividades inovadoras que compõem todo o processo de inova-ção, muito mais do que P&D. Por-tanto, as iniciativas políticas devem evitar privilegiar alguns elementos do processo de inovação, como a pesqui-sa, em detrimento de outros, como o desenvolvimento, a produção experi-mental, ampliação, design, ferramen-taria e engenharia industrial, sem os quais os resulta-dos da inovação não poderiam ser alcançados;
• Mecanismos de apoio à inovação e à acumulação de capacidades
Deixar a natureza, quase que literalmente, seguir seu curso, conduzirá certamen-te à perda de janelas de oportunidades oferecidas para um engajamento em trajetórias tecnológicas que podem gerar efeitos significativos ao cresci-mento e desenvolvimento econômico do país.
Mas os incentivos para promover a acumulação de capacidades para inovação nas empresas devem rece-ber a maior importância, uma vez que elas são res-ponsáveis pela transforma-ção do conhecimento em novos produtos e serviços.
63. Fleury & Fleury (2005).
176 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
inovadoras precisam conside-rar todos os tipos de organi-zação do sistema de inovação relevante, ou seja, empresas, universidades, institutos de pesquisa, institutos de tecno-logia etc., cujos esforços de inovação são necessários para que a inovação ocorra. Mas os incentivos para promover a
acumulação de capacidades para ino-vação nas empresas devem receber a maior importância, uma vez que elas são responsáveis pela transformação do conhecimento em novos produtos e serviços. Sem a participação efetiva das empresas nos esforços inovadores, dificilmente será possível inovar no sentido da introdução de novas aplica-ções comerciais que contribuam para a geração de riqueza;
• As iniciativas voltadas para a acu-mulação de capacidades de inovação nas empresas podem seguir um ca-minho em duas vertentes. O primeiro caminho relaciona-se à promoção
do aumento dos esforços inovadores de empresas e tecnologias existentes. As ações devem ser centradas, por um lado, na prestação de apoio às empresas na reso-lução de problemas relativos às suas atuais atividades tecnológicas. Por outro lado, as ações também devem criar incentivos para as empresas para migrarem para tipos diferentes de tecnologias. O segundo caminho envolve mecanismos para estimular
a criação de novas empresas inova-doras. Isso irá exigir programas de apoio spin-offs e startups derivados de tecnologias e produtos emergentes, e entrada de novas empresas de apren-dizagem em mercados estabelecidos.
10.4 No que diz respeito a iniciativas para apoiar a diversificação montante, a
jusante e lateralmente/horizontal-mente em indústrias intensivas em recursos, recomenda-se:
• Ações para identificar novas ativida-des tecnológicas inovadoras, além das trajetórias tecnológicas existentes, em empresas de indústrias intensivas em recursos naturais. Isto pode ser apoiado por atividades de “autodescoberta” acompanhadas por aferição de oportu-nidades para inovação e dos níveis de capacidades tecnológicas. Tal esforço deve envolver diferentes intervenien-tes, incluindo empresas existentes, uma vez que elas possuem as informações sobre os obstáculos e potencialidades associadas à exploração das oportuni-dades tecnológicas emergentes;
Esse exercício deve fornecer a base para a elaboração de mecanismos de políticas de apoio ao desenvolvimento de atividades produtivas que estão ligadas a recursos naturais de três ma-neiras diferentes, através de: ligações intensivas em conhecimento ‘para frente’ (indústrias de transformação e beneficiamento, embalagem, comer-cialização e distribuição); ligações intensivas em conhecimento para trás (produção de insumos, bens de capital e serviços de business); e ligações horizontais/laterais (fornecimento de insumos originalmente para os setores de recursos naturais, posteriormente transbordando para aplicações em outros setores). Portanto, as iniciati-vas de políticas públicas devem se con-centrar em todo o sistema de inovação relacionado a indústrias intensivas em recursos. Centralmente importantes são os esforços para aumentar a siner-gia e a coordenação entre as iniciativas políticas que promovem as tecnolo-gias ubíquas, como a biotecnologia, a nanotecnologia, bioeletrônica, novos materiais e as TICs.
• Como demonstrado pela literatura, a acumulação de capacidades para
É importante reiterar que a simples oferta de recursos
financeiros, assim como a oferta de elementos óbvios
de infraestrutura tecnológica (capital físico e capital finan-
ceiro), não são suficientes.
O crescimento industrial – e parte considerável do desen-
volvimento econômico – é explicado pela capacidade
da indústria de implementar atividades tecnológicas inova-doras e aumentar o conteúdo tecnológico inovador de seus
produtos e serviços comercia-lizados no mercado mundial.
177CAPÍTULO 10 | DESAFIOS E RECOMENDAÇÕES FINAIS
inovação, até o nível de liderança internacional, pode envolver décadas. Portanto, os esforços para apoiar a diversificação para atividades inova-dora de alto valor agregado exigem a preparação de gestores públicos e empresarias para atuarem sob um ho-rizonte de longo prazo. Essa aborda-gem deve prever mudanças graduais de produção de recursos naturais para a fabricação intensiva em conheci-mento e prestação de serviços de uso intensivo de recursos.
• São relevantes as iniciativas para ajudar as empresas nacionais a desen-volverem capacidades de gestão de propriedade intelectual em indústrias intensivas em recursos naturais.
11 Finalmente, é importante reiterar que a simples oferta de recursos financeiros, assim como a oferta de elementos óbvios de infraestrutura tecnológica (capital físico e capital financeiro), não são suficientes. Também não são suficientes as ofertas de convencionais ‘medidas de políticas indus-triais’. Torna-se necessário um esforço con-tínuo e sistemático de avaliação, a partir da perspectiva de demanda, principalmente por parte de setores industriais. Ou seja, o cres-cimento industrial – e parte considerável do desenvolvimento econômico – é explicado pela capacidade da indústria de implemen-tar atividades tecnológicas inovadoras e aumentar o conteúdo tecnológico inova-dor de seus produtos e serviços comercia-lizados no mercado mundial.
12 Por isso, este estudo e a literatura relacionada apontam para as potencialidades das meto-dologias e taxonomias existentes, que podem possibilitar uma avaliação mais compreensiva dos impactos dos esforços de estímulos à inovação em nível da indústria e da economia. Afinal, um dos princípios básicos de gestão das empresas é que ‘somente é possível gerir bem aquilo que se pode medir bem’; assim o uso de métricas para aferir a qualidade e a velocidade do progresso de acumulação de capacidades tecnológicas, especialmente
as inovadoras, torna-se de grande importância para as atividades de gestão empresarial e de política pú-blica, no que diz respeito à inovação e competitividade industrial.
13 Especificamente: Os esforços de avaliações independentes tornam--se cruciais para correções e ajustes em ações empresariais e, especial-mente, de políticas públicas relativas ao desenvolvimento de capacidades tecnológicas, inovação e competi-tividade internacional da indústria brasileira. Por isso, os esforços de ava-liação deveriam concentrar-se tanto no lado da oferta de infraestrutura tecnológica (parques tecnológicos, universidades etc.) e, principalmente, no lado da demanda (indústria). Por exemplo, no lado da demanda, os esforços de avaliação baseados em métricas específicas seriam importantes pelos motivos expostos a seguir:
13.1 Permitem clarificar as definições subjacentes ao desenho de estudos empíricos e de estratégias de inovação industrial. A partir de uma noção mais clara do real escopo do tema e das variáveis envol-vidas, é possível calibrar, desenhar ou redesenhar es-tratégias com foco mais coerente com as necessidades do contexto industrial e tecnológico do Brasil e das suas diferentes regiões.
13.2 Permitem auxiliar a condução de novos estudos de inova-ção industrial, baseados fortemente em trabalho de campo – em vez de basear-se somente em análise de estatísticas oficiais –, a fim de coletar evidências, tanto qualitativas quanto quantitativas de primeira mão, no intuito de captar, com adequado nível de detalhe e profundidade, a realidade
Os esforços de ava-liações indepen-dentes tornam-se cruciais para corre-ções e ajustes em ações empresariais e, especialmente, de políticas públi-cas relativas ao desenvolvimento de capacidades tec-nológicas, inovação e competitividade internacional da indústria brasileira.
Os esforços de avaliação deveriam concentrar-se tanto no lado da oferta de infraestrutura tecnológi-ca (parques tecnológicos, universidades etc.) e, principalmente, no lado da demanda (indústria).
178 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
das atividades tecnológicas na indús-tria. Mais especificamente, a aplicação prática das métricas aqui apresenta-das permite:
• Avaliar, identificar e pontuar o nível tecnológico dos setores industriais da economia brasileira;
• Identificar a maneira e a velocidade com que certos setores têm acumula-
do suas capacidades tecno-lógicas ao longo do tempo; ou seja, distinguir os setores mais velozes dos mais lentos em termos de acumulação de capacidades tecnológicas para inovação. Por exemplo, setores mais lentos em ter-mos de acumulação tecno-lógica talvez necessitem de incentivos diferentes e/ou de maior exposição às pressões competitivas internacionais, assim como identificação de barreiras e inibidores às suas atividades inovadoras.
• Identificar trajetórias tecnológicas dentro de cada indústria e as opor-tunidades de desenvolvimento e/ou aprofundamento de capacidades tecnológicas correspondentes para a exploração de tais oportunidades;
• Recomendar políticas específicas para disseminar atividades que condu-zam ao desenvolvimento de capaci-dades tecnológicas para inovação em indústrias mais relevantes para cada uma das regiões do Brasil.
14 Por fim, no intuito de contribuir para faci-litar a materialização de certos objetivos, tanto governamentais quanto empresariais, como, por exemplo, o alcance de alto nível de desempenho inovador e exportador numa perspectiva de 2025 para a indústria no Brasil, sugere-se a criação de metas de desenvolvimento de capacidade tecno-lógica para inovação. Isto significa criar prazos para o alcance de diferentes tipos e níveis de capacidade tecnológica inovado-ra para as indústrias no longo prazo, com avaliação a cada dois anos. Essa medida possibilitaria que ajustes periódicos em ter-mos, por exemplo, de fortalecimento e/ou reorganização da infraestrutura tecnológi-ca e de processos de aprendizagem possam ser implementados, a fim de contribuir para a materialização dos níveis de capaci-dades tecnológica inovadora desejados. O processo de elaboração e implementação das metas de desenvolvimento de capa-cidade tecnológica inovadora poderia envolver lideranças empresariais, governa-mentais, da academia, e de outras organi-zações da sociedade comprometidas com o fortalecimento do desempenho inovador e da competitividade da indústria brasileira.
Sugere-se a cria-ção de metas de
desenvolvimento de capacidade
tecnológica para inovação.
O processo de elaboração e implementação das metas de
desenvolvimento de capaci-dade tecnológica inovadora poderia envolver lideranças empresariais, governamen-
tais, da academia, e de outras organizações da sociedade
comprometidas com o forta-lecimento do desempenho
inovador e da competitivida-de da indústria brasileira.
179CAPÍTULO 10 | DESAFIOS E RECOMENDAÇÕES FINAIS
180 PRODUTO 3.1 E 3.2 | INSUMOS PARA AÇÕES ESTRATÉGICAS ORIENTADAS AO FORTALECIMENTO DA COMPETITIVIDADE INDUSTRIAL DO BRASIL
11
181RESUMO EXECUTIVO
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