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ÁLVARO AUGUSTO DEALCIDES SILVEIRA MOUTINHO BAHLS
HOSTEL: proposta conceitual, análise socioespacial e do panorama
atual em Florianópolis (SC)
BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
2015
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UNIVALI UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
Pró-reitora de Pesquisa, Pós-Graduação, Extensão e Cultura - ProPPEC Programa de Pós-Graduação em Turismo e Hotelaria - PPGTH
Curso de Mestrado Acadêmico em Turismo e Hotelaria
ÁLVARO AUGUSTO DEALCIDES SILVEIRA MOUTINHO BAHLS
HOSTEL: proposta conceitual, análise socioespacial e do panorama
atual em Florianópolis (SC)
Dissertação apresentada ao colegiado do PPGTH como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Turismo e Hotelaria – área de concentração: Planejamento e Gestão do Turismo e da Hotelaria – Linha de Pesquisa: Planejamento do destino turístico. Orientadora: Profa. Dra. Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira
BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
2015
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Dedico esse trabalho à minha amada mãe Magnólia Silveira Moutinho Bahls, sem ela seria nada. À minha amada e eterna namorada Fernanda Bernardes, minha melhor metade.
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AGRADECIMENTOS
Nós gostamos de pensar que temos controle sobre nossas vidas, livre arbítrio.
Decidimos nosso futuro através das nossas escolhas e ações, quando na verdade não
conseguimos decidir nem a hora de ir ao banheiro. Quando a natureza chama, você
responde. Em determinados momentos a vida nos guarda surpresas e até mesmo
armadilhas. De uma situação penosa e adversa, na qual não tive escolha nem
influencia, tive que retornar ao Brasil. Surgiu, então, esse mestrado, que no começo
me parecia uma armadilha, pois a contragosto deixava de viver meu sonho de viver
na estrada e tinha que me adaptar a essa nova fase de vida. Felizmente, tudo muda,
tudo passa. Coisas que antes pareciam obscuras, são agora a luz no fim do túnel.
Hoje, primeiramente, agradeço ao professor Rodolfo Wendhausen Krause, por ter me
incentivado a estar onde estou.
À professora Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira por todas as orientações e,
acima de tudo, pela inspiração, pela lição de vida, por me mostrar que pode existir o
belo dentro de um mundo cinza.
À minha colega Tânia Egert Petry, por toda a delicadeza, honestidade, bom humor,
apoio e companheirismo.
A todos os hostels que aceitaram participar da pesquisa de campo, especialmente aos
que foram particularmente hospitaleiros e me receberam (um estranho “bisbilhotando”
sobre suas vidas), de braços abertos. E, a todos aqueles hostels em que fiquei durante
minhas viagens, onde fui acolhido de maneira que nunca esquecerei. Vocês sabem
quem vocês são.
À professora Maria José Giaretta, por toda a atenção e apoio ao meu trabalho.
Aos professores da UNIVALI, que influenciaram diretamente na formação do
acadêmico que sou hoje.
À CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pela
bolsa concedida.
E, finalmente, aos meus grandes amigos Zezo (José Trombini Duarte) e Bara (Barbara
Pechova), que além de todo o apoio nos momentos difíceis, me mostraram o que um
hostel realmente pode ser.
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“A vida é arte do encontro. Embora haja
tanto desencontro pela vida”.
Vinícius de Moraes (1965).
“O verdadeiro sinal de inteligência não é o
conhecimento, mas a imaginação”.
Albert Einstein.
“É mais fácil ridicularizar as extravagâncias
desse estado de espírito [romântico] do
que fazer justiça a ele”.
Walter Laqueur (1962).
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HOSTEL: proposta conceitual, análise socioespacial e do panorama
atual em Florianópolis (SC)
RESUMO
O turismo é um fenômeno composto do conjunto de interações humanas socioeconômicas e ambientais, que possui na hospitalidade o fio condutor dessas relações. Entender essas interações e seus impactos é de extrema importância para a gestão e ensino do turismo. O turismo da juventude é um segmento desse fenômeno que possui grande importância econômica e socioambiental. Dentro desse segmento reside o tema desse estudo, os hostels independentes e contemporâneos, um meio de hospedagem que se originou através dos albergues da juventude, criados no início do século XX, na Alemanha. A filosofia singular desse meio de hospedagem é traduzida em infraestrutura e serviços diferentes dos propostos pela hotelaria convencional. No exterior, principalmente na Europa, eles se encontram difundidos e até regidos por leis específicas. No Brasil, encontram-se marginalizados e esquecidos pelas classificações oficiais de meios de hospedagem. O objetivo principal desse estudo é propor um conceito abrangente de hostel, que englobe variáveis até então desconsideradas pela academia e poder público turístico nacionais. Esse objetivo é atingido através de uma análise histórica, do esclarecimento etimológico entre as palavras hostel e albergue, da descrição do público alvo, da proposta do trinômio hostel/hospitalidade/espaço, da definição de uma matriz de classificação de áreas físicas e da análise do panorama desse meio de hospedagem em Florianópolis-SC. A abordagem metodológica usada foi a análise socioespacial sob a ótica da dialética materialista. Além de uma pesquisa bibliográfica e documental indireta, foi realizada uma pesquisa de campo com questionário estruturados e entrevistas não-diretivas com 15 empreendedores hosteleiros. Como resultado obteve-se um conceito que traduz a essência desses, o qual propõe os hostels como um meio de hospedagem social e alternativa, que promove, acima de tudo, a interação, o entendimento e união entre as pessoas de diversas culturas. Conclui-se que esse meio de hospedagem pode possuir uma relação exclusiva com o território turístico que ocupa, que é traduzida em uma relação estreita entre ser acolhedor e ser acolhido. Essa relação, que tem seus serviços e infraestruturas representados na hospitalidade, aproxima hóspede e anfitrião. Consequentemente, ambos se aprofundam no destino turístico. Isso tem o potencial de resultar um fenômeno turístico social e sustentável. No entanto, os hostels são extremamente recentes no Brasil, encontram-se em expansão desorganizada que pode resultar em apropriação indevida de conceitos e do território turístico. Isso tem causado estranheza e preconceito por parte da população brasileira perante esse meio de hospedagem. Finalmente, considera-se essencial para o esclarecimento público e acadêmico, assim como para uma classificação oficial desse meio de hospedagem no Brasil, a continuação e aprofundamento de estudos sobre o tema.
Palavras-chave: Hostel. Hospitalidade. Turismo da juventude. Turismo Backpacker.
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HOSTEL: a conceptual proposal, sociospatial analysis and current
overview of Florianópolis (SC)
ABSTRACT
Tourism is a phenomenon that consists of socioeconomic and environmental interactions, the common thread of these relationships being found in hospitality. Understanding these relationships, and their impacts, is of utmost importance for tourism management and teaching. Youth tourism is a segment of this phenomenon that has great economic and environmental importance, and it is within this segment that the theme of this study is situated: independent and contemporary hostels, a means of accommodation that originated with the youth hostels, created in early twentieth century Germany. The philosophy behind this unique type of accommodation takes the form of infrastructure and services that differ from those offered by conventional hotels. In other countries, particularly in Europe, hotels are widespread, and are even governed by specific laws. In Brazil, they are marginalized and forgotten by the official accommodation classifications. The main objective of this study is to propose a wider concept of hostel that encompasses variables previously ignored by academia and the national Brazilian tourism authorities. This goal is achieved through a historical sociospatial analysis, an etymological clarification between the words hostel and albergue, a description of the target public, a proposal of the triad hostel/hospitality/space, the defining of a matrix for classifying physical areas, and an overview of the this type of accommodation in Florianópolis, Santa Catarina. The methodological approach used was a sociospatial analysis from the viewpoint of materialist dialectics. In addition to a literature search and indirect document search, field research was conducted, using a structured questionnaire and unstructured interviews with 15 hostel entrepreneurs. The result is that a new concept was arrived at, that reflects the essence of this form of accommodation, whereby hostels are proposed as a social and alternative form of accommodation, promoting, above all, interaction, understanding and unity among people of different cultures. In conclusion, this type of accommodation has a unique relationship with the tourist space it occupies. It has the possibility to translate into a close relationship between host and guest. This relationship, in which the services and infrastructure are represented in hospitality, brings guest and host closer to each other. Consequently, both are strengthened in the tourist destination. This has the potential to create a social and sustainable tourism phenomenon. However, hostels are very recent in Brazil, and are undergoing disorganized expansion, which could result in misappropriation of concepts and of the tourist territory. This has led to this type of accommodation being viewed with suspicion and prejudice by the population. Finally, public and academic enlightenment are considered essential, as is an official classification this type of accommodation in Brazil, and the continuation and furtherance of studies on the subject.
Keywords: Hostel. Hospitality. Youth travel. Backpacker Tourism.
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LISTA DE ABREVIAÇÕES
CADASTUR Cadastro dos Prestadores de Serviços Turísticos
EMBRATUR Instituto Brasileiro de Turismo
HI Hostelling International
Federação Internacional dos Albergues da Juventude
HI-Brasil Federação Brasileira dos Albergues da Juventude
IPHAN Instituo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
MTur Ministério do Turismo
OMT Organização Mundial de Turismo
PIB Produto Interno Bruto
SBClass Sistema Brasileiro de Classificação de Meios de Hospedagem
TCC Trabalho de Conclusão de Curso
UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
YHA Youth Hostel Association
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LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Valor de mercado do turismo da juventude ............................................ 27
Gráfico 2 – Matriz classificatória de áreas físicas .................................................... 151
Gráfico 3 – Quanto ao gênero dos proprietários ..................................................... 158
Gráfico 4 – Quanto ao estado civil dos hosteleiros ................................................. 159
Gráfico 5 – Quanto à idade dos hosteleiros ............................................................ 159
Gráfico 6 – Quanto à escolaridade dos entrevistados ............................................. 160
Gráfico 7 – Quanto à frequência de viagens dos empreendedores ........................ 160
Gráfico 8 – Meio de transporte mais utilizado em férias .......................................... 161
Gráfico 9 – Meio de hospedagem mais utilizado em férias ..................................... 162
Gráfico 10 – Local de residência do hosteleiro........................................................ 163
Gráfico 11 – Segunda profissão do hosteleiro......................................................... 163
Gráfico 12 – Data de fundação dos hostels de Florianópolis (SC) .......................... 164
Gráfico 13 – Área total construída em m2................................................................ 165
Gráfico 14 – Número total de leitos ......................................................................... 166
Gráfico 15 – Número total de dormitórios ................................................................ 166
Gráfico 16 – Número médio de leitos por dormitório ............................................... 167
Gráfico 17 – Quanto ao uso de beliches nos dormitórios ........................................ 168
Gráfico 18 – Número de quartos privados ............................................................... 168
Gráfico 19 – Número total de funcionários .............................................................. 169
Gráfico 20 – Número de salas de TV ...................................................................... 170
Gráfico 21 – Número de salas de estar ................................................................... 170
Gráfico 22 – Número de cozinhas comunitárias ...................................................... 171
Gráfico 23 – Número de áreas sociais externas...................................................... 171
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Gráfico 24 – Número de sala de jogos .................................................................... 172
Gráfico 25 – Quanto ao tipo dos lockers ................................................................. 172
Gráfico 26 – Quanto à sazonalidade dos hostels .................................................... 173
Gráfico 27 – Existência de estrutura de A&B .......................................................... 174
Gráfico 28 – Quanto ao oferecimento do serviço de café-da-manhã ...................... 174
Gráfico 29 – Quanto ao oferecimento do serviço de lavanderia .............................. 175
Gráfico 30 – Quanto à disponibilidade do serviço de internet ................................. 176
Gráfico 31 – Valor da diária média no dormitório em Reais .................................... 176
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Foto demonstrando uma relação de hospitalidade em um hostel ............ 19
Figura 2 – Foto de hóspedes e recepcionista em atividade extra hostel ................... 20
Figura 3 – Foto de hóspedes e recepcionista dividindo uma refeição ....................... 20
Figura 4 – Foto do recepcionista se despedindo de hóspedes ................................. 21
Figura 5 – Mapa conceitual dos hostels dentro do turismo ....................................... 25
Figura 6 – Problemática de pesquisa ........................................................................ 33
Figura 7 – Mapa conceitual dos objetivos de pesquisa ............................................. 35
Figura 8 – Mapa da localização generalizada da amostra ........................................ 41
Figura 9 – Organograma metodológico ..................................................................... 44
Figura 10 – Foto de Richard Schirrmann (1930) ....................................................... 64
Figura 11 – Mapa da localização geográfica do movimento Wandervogel ............... 69
Figura 12 – Foto dos Wandervogels em viagem (1901) ............................................ 71
Figura 13 – Foto do primeiro albergue da juventude permanente em Altena ............ 76
Figura 14 – Foto do dormitório dos meninos ............................................................. 76
Figura 15 – Foto do café-da-manha servido pela “mãe alberguista” ......................... 78
Figura 16 – Foto de Mary Belle Barclay, é a primeira à esquerda (1910) ................. 82
Figura 17 – Foto do primeiro albergue da juventude canadense (1925) ................... 83
Figura 18 – Foto de voluntários construindo o albergue permanente (1933) ............ 84
Figura 19 – Foto do casal Smith em frente ao Youth Hostel de Northfield (1936)..... 85
Figura 20 – Foto do primeiro youth hostel estadunidense (1963) ............................. 86
Figura 21 – Foto panorama da região de Bragg Creek ............................................. 88
Figura 22 – Foto de Mary Belle Barclay aos 87 anos de idade ................................. 89
Figura 23 – Foto da Residência Ramos, Rio de Janeiro (1969) .............................. 103
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Figura 24 – Foto do Albergue Muxarabi, Cabo Frio (1979) ..................................... 106
Figura 25 – Batalha etimológica Hostel vs. Albergue .............................................. 112
Figura 26 – Representação gráfica do processo turístico ....................................... 124
Figura 27 – Mapa topográfico da localização do Hostel de Altena .......................... 133
Figura 28 – Fotos ilustrando o Hostel do Castelo de Altena ................................... 134
Figura 29 – Foto da entrada do centro histórico, Hostel 99 à esquerda .................. 136
Figura 30 – Fotos ilustrando o Hostel 99 ................................................................. 137
Figura 31 – Mapa topográfico da localização do Hostel 99 ..................................... 138
Figura 32 – Mapa da Estrada Real e localização do Hostel Samambaia ................ 140
Figura 33 – Fotos ilustrando o Hostel Samambaia .................................................. 142
Figura 34 – Mapa conceitual da possível relação socioespacial dos hostels .......... 144
Figura 35 – Fotos ilustrando o Home Lisbon Hostel ................................................ 146
Figura 36 – Mapa da localização dos hostels da matriz classificatória ................... 147
Figura 37 - Mapa conceitual da relação espaço/patrimônio/hostel.......................... 192
Figura 38 – Representação gráfica do conceito hostel ........................................... 195
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Principais destinos hosteleiros dos Brasil ................................................ 39
Tabela 2 – Tipologia dos alberguistas, segundo modelo de Stanley Plog .............. 116
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 17
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 22
Justificativa ................................................................................................................ 25
Problema de Pesquisa .............................................................................................. 30
Objetivos ................................................................................................................... 34
1 MARCO METODOLÓGICO ................................................................................. 37
1.1 Método de abordagem ...................................................................................... 37
1.2 Técnicas e tipologia de pesquisa, geração ou coleta de dados ........................ 37
1.3 Métodos e técnicas da pesquisa de campo ...................................................... 39
1.4 Referencial Teórico ........................................................................................... 45
2 A GÊNESE ALBERGUISTA ................................................................................ 60
2.1 O contexto socioespacial anterior à gênese alberguista ................................... 60
2.2 As raízes alberguistas europeias ...................................................................... 64
2.3 Cruzando o Atlântico, rumo às Américas .......................................................... 81
2.4 Brasil: raízes de uma sociedade hospitaleira ou hospedeira? .......................... 89
2.5 O advento dos albergues da juventude no Brasil ............................................ 100
3 PROPOSTA CONCEITUAL .............................................................................. 109
3.1 Um confronto etimológico: Hostel vs. Albergue .............................................. 109
3.2 Perfil geral do púbico alvo dos hostels ............................................................ 112
3.3 O trinômio hostel-hospitalidade-espaço .......................................................... 117
3.3.1 As relações entre hostels e hospitalidade .................................................... 117
3.3.2 As relações entre hostels e o espaço .......................................................... 123
3.3.3 Caracterização do local de pesquisa ........................................................... 132
3.3.4 Resultados ................................................................................................... 142
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3.4 Denominador comum de áreas físicas ............................................................ 145
3.4.1 Caracterização dos hostels da matriz classificatória de áreas físicas .......... 145
3.4.2 Critérios analisados ...................................................................................... 147
3.4.3 Resultados ................................................................................................... 153
4 PANORAMA ATUAL EM FLORIANÓPOLIS (SC) ............................................ 157
4.1 Perfil dos hosteleiros ....................................................................................... 158
4.2 Perfil dos hostels ............................................................................................. 164
4.3 Reflexões sobre o perfil hosteleiro de Florianópolis (SC) ............................... 177
4.4 A essência dos hostels ................................................................................... 178
5 HOSTEL, UM CONCEITO EM FORMAÇÃO ..................................................... 190
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 200
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 206
APÊNDICES ........................................................................................................... 222
ANEXOS ................................................................................................................. 254
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APRESENTAÇÃO
Antes de começarmos a dissertação propriamente dita, gostaria de lhe contar, de
maneira informal, uma história. O desejo desbravador do ser humano sempre intrigou
e inspirou parte do meu ser. Encanta-me que não consigamos, enquanto civilização,
ficar estáticos. Por que estar em movimento, em constante mudança? Por que
colonizar, descobrir, viajar, conhecer? Para aquietar meu espírito, digo que é de que
a própria marcha da vida do universo nos compele a sermos assim. Nada é
completamente estático. Tudo está em completa revolução, desde o início do tempo.
Esse desejo por expansão é o reflexo da própria vida dentro de cada ser humano.
Sem esse desejo não faríamos parte da dança do universo, que vai sempre em frente
e nunca para. Talvez seja essa expansão continua o motivo pelo qual viajamos,
procriamos, que nos compele a trabalhar, a amar, a odiar, a viver, a ser.
Essa história começa quando a sede pelo desconhecido, pela aventura, se tornou
insuportável e não deixava um grande amigo meu ficar sentado na frente da TV. Ele
decidiu que sua vida não teria sentido se não saísse de casa e conhecesse o mundo
em que vive. Pegou uma mochila, e foi à Europa com a intenção, ou a desculpa, de
fazer um mestrado em filosofia na Alemanha, sobre Nietsche. Eu o encontrei, anos
depois, trabalhando em um hostel. Fim de carreira, diziam alguns dos familiares e
“amigos”. Mal sabiam que a melhor parte da vida dele estava apenas começando.
Ao chegar, foi recebido em um hotel com o cordial bom dia do recepcionista, ganhou
as chaves e nada mais. Foi ao quarto, limpo e frio, e deixou sua mochila. Os
corredores bem decorados, vazios. Na recepção, o homem de meia idade dava
informações com o mesmo entusiasmo que nós brasileiros torcemos pelo críquete.
Tomou, então, a rua. Andando sozinho pela cidade ele avistava, à distância, edifícios.
Trocava breves olhares com pessoas estranhas, passava por museus, ruas estreitas,
mais pessoas estranhas, avenidas e parques. Todos esses lugares e pessoas cheios
de história e de histórias para contar. Ele só imaginava. Ao final do dia comia algo que
considerava que não iria achar em outro local e voltava para o hotel.
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Sozinho ele seguia visitando cidades até o momento em que a grana ficou curta. O
visto de estudante não se concretizou e a decisão de voltar para casa com o “rabo no
meio das pernas” era pior do que continuar tentando sob quaisquer condições. Se
mudou para Praga e decidiu ficar em um hostel, o euro era pesado demais e as diárias
dos hotéis estavam comendo todo seu orçamento. Quando ele chegou no local, uma
mistura de bar, sala de estar, sala de jogos e um resquício de recepção, o ambiente
esfumaçado operava à baixa velocidade, parecia estar de ressaca. Havia algumas
pessoas folheando livros e guias de viagem, outros tomando café no sofá e alguns
debruçados sobre o balcão do bar, bebendo uma grande jarra de cerveja sem espuma.
Dentre esses, alguns pareciam ter passado ali a noite anterior, outros pareciam estar
ali há dias e um deles parecia terem nascido ali e nunca ido a nenhum outro lugar.
Ele se aproximou da figura negra e magra de cabelo loiros que estava atrás do bar e
perguntou: onde é a recepção? “É aqui mesmo” – disse a figura, com um sorriso largo.
Não era um sorriso de boas-vindas, mas um de aceitação e orgulho de que aquele
lugar era diferente. Era um sorriso despido de malicia, era honesto, como se dissesse
“está tudo bem... esse lugar é estranho, mas é bom”. O “medo” estava refletido nos
arregalados olhos do hóspede recém-chegado. “Onde fui me meter” – pensou. Tirou
o passaporte e pediu pelas chaves do quarto. A figura atrás do bar disse, “beba isso”
e serviu, em um copo estilo martelinho, um liquido esverdeado. Pela cor parecia
cancerígeno, era certamente radioativo! Uma dose de absinto foi o seu check-in.
Durante a noite o local se transformou, ganhou vida e velocidade. Todos os hóspedes
se reuniam no bar/recepção. Ele bebeu e conversou com todo mundo. O
“recepcionista” fazia check-in enquanto bebia, conversava, dançava e agia como DJ
da festa. Todos se divertiram, se conheceram e dançaram em cima das mesas até o
sol raiar. Alguns dias depois, lá estava ele, debruçado sobre o bar, tomando um café,
parecendo uma daquelas figuras que havia nascido ali.
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Figura 1 – Foto demonstrando uma relação de hospitalidade em um hostel
Fonte: acervo pessoal do autor (2010)
Em um dia de folga do “recepcionista”, passaram a tarde num parque, de baixo das
árvores, curando a ressaca, contando histórias de suas vidas e relembrando algumas
da noite passada. Foram juntos a um museu e voltaram ao hostel no fim da tarde, para
retomar a festa da noite anterior... e assim seus dias se passaram.
Ele conheceu uma bela garota tcheca e logo começaram a namorar. Um dia seu
“amigo da recepção” sugeriu fossem a uma bela cidadezinha no sul da Boêmia.
Inicialmente, recusou a ideia pois estava com o orçamento curto. “Vá de carona” –
sugeriu o amigo – “e aposto que se você pedir com jeitinho o hostel de lá deixa vocês
dois dividirem a mesma cama no dormitório”. Dito e feito.
Eles foram recebidos de maneira graciosa pela recepcionista, como se fosse em sua
casa. Era, na verdade, pois residia no estabelecimento. No início da tarde foi
organizado um passeio de barco pelo rio que corta a cidade e conheceram os demais
hóspedes. No decorrer do passeio pararam em diversos bares e restaurantes ao longo
do rio, beberam e comeram juntos. Nadaram, se divertiram e voltaram ao hostel
exaustos. Nem tanto a ponto de irem dormir. A recepcionista convidou alguns
hóspedes para jantar no seu restaurante favorito. Depois de experimentarem uma ceia
medieval, foram a um bar onde passaram a noite dividindo drinks, histórias e risadas.
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Figura 2 – Foto de hóspedes e recepcionista em atividade extra hostel
Fonte: www.hostel99.cz
A cidade acolhia o casal. Tomaram vinho sentados sob os arcos da ponte, ao fundo o
a música tocada por um artista de rua, o rio manso refletindo o castelo iluminado, as
estrelas como cobertor. A cada dia descobriam algo novo, um lugar, um parque, um
museu, um restaurante, conheciam hóspedes novos e se aproximavam mais dos que
estavam ficando há mais tempo. Passaram a considerar os hóspedes e a
recepcionista como amigos, sentiam que faziam parte de uma família. A estadia se
estendia e o Brasil ficava cada vez mais longe. Não importava, estava vivendo.
Figura 3 – Foto de hóspedes e recepcionista dividindo uma refeição
Fonte: acervo pessoal do autor (2010)
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Ele não queria voltar ao Brasil. Pediu, então, à amiga do hostel por um emprego. O
casal sentia um carinho e atração por aquele lugar assim como ela. Da noite para o
dia ele deixou de exercer o papel do “ser acolhido” para o de “ser acolhedor”. Com o
tempo, passou a receber os hóspedes como se estivesse recebendo-os em sua
própria casa. Dividiam refeições, os afazeres, sonhos, desilusões e fluidos corporais.
Alguns hóspedes ficavam um curto período, outros pareciam que nunca iriam embora.
Mas eventualmente partiam. Em alguns casos esse momento era doloroso, como se
estivesse vendo um amigo partir sem saber se o encontraria novamente. Alguns
retornavam, outros mantinham contato e os demais ele esperava rever um dia.
Figura 4 – Foto do recepcionista se despedindo de hóspedes
Fonte: acervo pessoal do autor (2008)
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INTRODUÇÃO
Turismo, um fenômeno tão intrigante quanto complexo, de contribuições sociais,
ambientais e econômicas tão importantes quanto os seus, por vezes, devastadores
impactos. Descrevê-lo e analisá-lo em sua totalidade seria uma ambição, no mínimo
audaciosa, devido à sua profundidade. Por conseguinte, é a intenção do presente
trabalho analisar um “pequeno” segmento do turismo, um meio de hospedagem
específico e singular. No entanto, é através do micro que podemos contemplar e
entender o macro. Através desta análise espera-se compreender um fenômeno mais
complexo, que pode nos remeter a uma época em que viajantes necessitavam de
abrigo, onde estranhos acolhiam e eram acolhidos, escolhendo o entendimento entre
pessoas ao invés do embate e formando as demonstrações de hospitalidade que
culminariam no turismo contemporâneo.
O turismo, constitui um campo de estudo ligado às ciências sociais, por corresponder
a uma relação entre pessoas e consequentemente lugares, sendo que essa relação é
inerente ao ser humano, “cuja essência é a sua sociabilidade permanente”
(BRESSAN, 2008, p. 07) e suas características estão diretamente e
indissociavelmente ligadas aos acontecimentos socioespaciais de um determinado
local, em um dado recorte temporal (SANTOS, 1979). As ciências sociais nascem de
um contexto histórico da modernidade e se estendem até a contemporaneidade, onde
a sociedade é “organizada territorialmente em economias nacionais, cuja unidade e
soberania de cada território, é determinada por um poder político e ideológico
igualmente nacional”, por vezes opressoras (BRESSAN, 2008, p. 08). E assim, forma-
se também o turismo, decorrente dos acontecimentos socioespaciais de nossa
sociedade moderna e contemporânea. Pode-se, portanto, considerar o turismo como
“uma prática que carrega consigo um grupo de representações sociais” (NETTO,
2010, p. 14) e espaciais, que influenciam diretamente nosso meio ambiente, nossa
cultura e, consequentemente, nossas vidas.
A relação do fenômeno turístico com a hospitalidade é inseparável, já que sem esse
último fenômeno, também social, não seria possível a realização do turismo. A
hospitalidade constitui um tema complexo que atua como fio condutor das
representações socioespaciais do fenômeno turístico (GRINOVER, 2002). O conceito
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de hospitalidade genuína refere-se ao ato de receber, acolher estranhos e/ou prestar
serviços a alguém sem qualquer expectativa de uma recompensa (GOTMAN, 2011;
MONTANDON, 2011). Pode-se colocar a hospitalidade como o compartilhamento do
espaço, do território, o ato de dar e receber o espaço/serviço privado a um estranho
(DIAS, 2002). A hotelaria, um dos componentes fundamentais do turismo, reside na
hospitalidade, tida também como essencial para esse fenômeno (NETTO, 2010),
tendo em vista que a hotelaria é a materialização da ideia de hospitalidade.
O local de acolhimento do estrangeiro, portanto o local da hospitalidade, se dá na casa
e à mesa do anfitrião (CAMARGO, 2004; CAMPOS, 2005; DIAS, 2002; GRINOVER,
2002; LASHLEY e MORRISON, 2004; MONTANDON, 2011; WALKER, 2002). Nas
primeiras viagens, os meios de hospedagem eram representados pelas casas de
pessoas que viviam nas antigas rotas de comércio (GOELDNER, RITCHIE e
MCINTOSH, 2002). Assim, a história da hospitalidade caminha lado a lado com a da
hotelaria. Na Antiguidade, os meios de hospedagem estavam presentes, em forma de
hospedarias, tavernas, casas de prazer, até requintadas estalagens a fim de abrigar
a realeza (MONTANDON, 2011; WALKER, 2002).
O objeto do presente estudo, os hostels, encontram-se dentro do campo da
hospitalidade, e consequentemente dos meios de hospedagem, mas não dentro da
hotelaria, pois são meios de hospedagem únicos, com filosofia, missão,
características físicas e serviços diferenciados (COBURN, 1950; GIARETTA, 2003;
HEATH, 1962; TROTTA, 1978). O caminho traçado pelos albergues da juventude,
apesar de possuir similaridades com as origens da hotelaria, é na verdade um
caminho distinto. Possui em sua fundação histórica, assim como no âmago de sua
filosofia, os mesmos conceitos da hospitalidade pura e verdadeira, a qual dá origem
ao primeiro meio de hospedagem desta tipologia em Altena, Alemanha, em 1912
(COBURN, 1950). Logo após sua criação, a ideia de um local que pudesse abrigar
jovens viajantes, promover o entendimento entre culturas, a conservação do
patrimônio histórico e do meio ambiente, decolou rapidamente se espalhando pela
Alemanha (HEATH, 1962).
24
A necessidade de criar uma associação que pudesse supervisionar estes
estabelecimentos, proporcionando qualidade1 aos hóspedes e fidelidade aos
conceitos e filosofias propostos inicialmente, parecia óbvia. Assim nasceu o “Comitê
Central dos Albergues da Alemanha”, que com o passar dos anos daria origem à
Federação Internacional dos Albergues da Juventude (COBURN, 1950; HEATH,
1962), atualmente nomeada de Hostelling International (HI)2 (HOSTELLING
INTERNATIONAL, 2014). No entanto, há quem deseje possuir um albergue da
juventude, sem, contudo, se filiar à associação, sem aderir às regras tais como a
delimitação do uso dos albergues da juventude exclusivamente para associados
portadores de carteirinha, assim como o limite de idade. Desejam poder possuir um
meio de hospedagem com a filosofia alberguista, mas poder ditar suas próprias
regras. Nascem, assim, os albergues da juventude independentes, intitulados a partir
daqui como simplesmente hostels. Esses compreendem qualquer meio de
hospedagem que se encaixa na filosofia alberguista estabelecida por Schirrmann, mas
não são associados à HI e confinados às suas regras.
Há quem considere que os hotéis convencionais deram à luz os albergues da
juventude, sendo esses últimos uma segmentação dos primeiros, simplesmente uma
alternativa mais barata e mais rudimentar aos hotéis (CAMPOS, 2005),
desconsiderando sua gênese histórica e os acontecimentos socioespaciais únicos que
determinam suas características. Na verdade, eles nasceram de uma forma
totalmente diferente, em outro contexto socioespacial e histórico, adquirindo
características físicas e serviços singulares, baseados em uma missão específica
(COBURN, 1950; HEATH, 1962; HOSTELLING INTERNATIONAL, 2014). Portanto,
este meio de hospedagem deve ser considerado em uma categoria única, digno de
uma conceptualização oficial também singular, fiel à sua gênese, que pode estar mais
próxima dos conceitos originais de hospitalidade do que os hotéis convencionais. A
figura 5 demonstra a localização temática dos hostels dentro da disciplina acadêmica
do turismo.
1 Qualidade aqui refere-se a um mínimo de conforto, segurança e a criação de um ambiente que
pudesse representar em breves momentos uma sala de aula, promovendo a interação e sociabilidade entre o grupo de alunos e com o meio ambiente local (LAI, 2013).
2 Uma organização não governamental, sem fins lucrativos, contanto com uma rede global de mais de quatro mil hostels três milhões de associados em 90 países, que procura garantir qualidade a seus associados (UNWTO, 2010).
25
Figura 5 – Mapa conceitual dos hostels dentro do turismo
Fonte: Elaborado pelo autor (2015)
Justificativa
O turismo possui grande importância para o desenvolvimento sociocultural e
econômico mundial. O turismo da juventude ocupa uma significante parcela deste
mercado e contribui para o desenvolvimento turístico, para a conservação desse e do
patrimônio histórico e ambiental (UNWTO, 2010).
26
Esse segmento, que engloba o turismo estudantil, de intercâmbio, os viajantes jovens
independentes e os backpackers3, constitui o público alvo dos hostels (NASH, THYNE
e DAVIES, 2006) e, de acordo com a Organização Mundial de Turismo (OMT), têm se
tornado
uma parte cada vez mais significativa da indústria do turismo global [...], pois mais jovens começaram a viajar com mais frequência e por distâncias maiores… [estes são vistos hoje como] valiosos visitantes, que possuem uma contribuição econômica significativa e também desenvolvem habilidades pessoais, laços sociais e vínculos culturais em busca por experiências engajadoras” (UNWTO, 2008, p. ix)
Dentro desse contexto, o meio de hospedagem denominado de hostel também
contribui consideravelmente para essa receita e para o desenvolvimento cultural e
sustentável do turismo. Apesar disso, a produção acadêmico-científica sobre esse
tema é praticamente embrionária no exterior e inexistente no Brasil, a ponto de não
existir uma conceptualização e classificação oficial sobre o mesmo. Referente à
importância econômica do turismo da juventude, a OMT relata que “cerca de 20% dos
940 milhões de turistas internacionais que viajaram o mundo em 2010 foram os
jovens” (UNWTO, 2010).
O gráfico 1 compara o turismo da juventude com o orçamento de grandes empresas
e até mesmo países, mostrando que ele pode ser considerado não apenas um forte
segmento de mercado, mas sim como um mercado independente e de importância
singular para o turismo.
3 Mesmo não havendo uma definição clara e unanimemente aceita do termo backpacker (mochileiro) a
maioria dos estudos enfatiza, pelo menos, algumas características em comum, como “a baixa idade média (Riley, 1988; Murphy, 2000), a independência dos operadores turísticos, flexibilidade de itinerário (Cohen, 1982; Scheyvens, 2001; Hottola, 2005), um período prolongado de viagens (Loker-Murphy e Pearce, 1995; Sørensen, 2003), os baixos orçamentos de viagens e, portanto, a demanda por acomodações baratas e serviços turísticos relacionados (Spreitzhofer, 1995; Murphy, 2001), bem como fazer uso da infraestrutura disponível localmente (Hampton, 1998; Westerhausen e Macbeth, 2003)” (BRENNER e FRICKE, 2007, p. 218).
27
Gráfico 1 – Valor de mercado do turismo da juventude
Fonte: UNWTO (2008).
A magnitude da importância econômica do turismo da juventude e consequentemente
dos hostels, os quais são o meio de hospedagem mais usado por este mercado
(UNWTO, 2010), é quase imensurável, pois tratar-se de um segmento difícil de ser
categorizado, suas definições são diversas, multifacetadas e, às vezes, até
contraditórias. De acordo com Nash, Thyne e Davies (2006), no Reino Unido os
backpackers são responsáveis por 10% do número total de chegadas internacionais
no país, “uma estimativa de 2,5 milhões de passageiros” (p. 525). Em números
mundiais – de acordo com um estudo realizado pela OMT, entre os anos de 2002 e
2010 – este segmento de mercado representa (UNWTO, 2008, 2010):
Um público-alvo mundial de aproximadamente 1,8 bilhões de pessoas;
Uma estimativa de 196 milhões de viagens turísticas internacionais por ano;
Mais de 20% das visitas de turistas internacionais;
Uma duração média mais longa de viagem (10 a 53 dias);
Um viajante que gasta mais do que o turista convencional. O jovem gasta, em
média, USD 2.600 por viagem, onde USD 1.550 são gastos no destino;
Um aumento nas despesas de viagem média total de 39% entre 2002 e 2007;
28
Que o número médio de viagens realizadas ao longo dos últimos cinco anos
por jovens aumentou de 6,2% em 2002, para 7,3% em 2007;
Um mercado que responde por cerca de 300 milhões de pernoites por ano;
Um aumento no número de pernoites para quase 500 milhões até 2020;
Crescimento do volume total de negócios da indústria de quase USD 7,4
bilhões, em 2005, para cerca de USD 12 bilhões, em 2020;
Que os hostels são o mais importante meio de hospedagem do turismo da
juventude, hospedando quase 90% deste segmento de mercado;
No Brasil, o segmento de hospedagem é responsável por no mínimo 12% do Produto
Interno Bruto (PIB) turístico e as empresas de pequeno porte (onde se enquadram os
hostels) representam cerca de 90% de todo os empreendimentos turísticos nacionais
(COSTA, FRANCO e HOFFMANN, 2013).
A importância deste mercado vai muito além da econômica. Culturalmente este tipo
de turista pode ser caracterizado, em sua grande parte, como alocêntrico, podendo
ser relacionado, principalmente, a uma pessoa curiosa, sedenta por aventura, em
busca do desconhecido. Em virtude dessa característica, esse turista realiza um alto
nível de atividades nos destinos visitados, gosta de conhecer pessoas de outras
culturas, além de priorizar o contato com a população e cultura locais. Como um dos
pontos altos de suas viagens, preferem a liberdade e flexibilidade nos locais de
destino, ao contrário dos turistas psicocêntricos (PLOG, 1991). Isso resulta uma
interação cultural de grande valor para o turismo e para as populações dos destinos,
devido à relação entre estes, partindo do enfoque da hospitalidade, da acolhida ao
estrangeiro e interação deste com o visitante (MONTANDON, 2011).
De acordo com a OMT (2010, p. xii), os turistas da juventude possuem algumas
características que devem ser ressaltadas:
Estes viajantes são famintos por experiências – mais de 80% querem explorar
outras culturas, aumentar a seu conhecimento e experiência de vida no destino;
São ansiosos para conhecer moradores locais do destino turístico (45%) e
regularmente sai da rota tradicional do turismo (37%);
29
Os jovens gostam de desenvolver seu próprio estilo de identidade e de viagem
- apenas 23% se veem como "Turistas";
Um número crescente de jovens viajantes quer contribuir de alguma forma para
os lugares visitados – de 27%, em 2002, para 42% em 2007;
Desenvolvem contatos mais diretos com as comunidades locais e reduzem,
assim, a chances de o retorno econômico do turismo sair da comunidade local;
A demanda por viagens de aprendizado, principalmente o de línguas
estrangeiras, vem crescendo;
Quando em curso de línguas, a permanência no destino é, em média, de 5 a 6
semanas, e o tempo de permanência tem aumentando desde 2002;
França, República da Coreia e Brasil foram os mercados emissores de
estudante de línguas estrangeiras, com maior crescimento em 2006;
Outros setores do turismo da juventude são, não somente, a experiência de
trabalho, viagens de aventura, a experiência cultural e voluntariado;
A duração média de uma viagem de experiência de trabalho é em torno de 200
dias ou pouco menos de sete meses;
Outras vantagens socioeconômicas derivam desse perfil específico, como o fato de
que estes turistas viajam o ano todo, não somente nas temporadas de verão. Viajam
por todo o país visitado, e não apenas pelos principais destinos turísticos de uma
localidade. Usam o transporte público de um destino com frequência e permanecem
por longos períodos de tempo em um único local e “tendem a transportar somente
elementos essenciais com eles, podendo assim, gastar em empresas locais” (NASH,
THYNE e DAVIES, 2006, p. 526). Portanto, o turismo da juventude, assim como outros
turistas que usam os hostels como seu principal meio de hospedagem (NASH, THYNE
e DAVIES, 2006), possuem uma relação mais próxima e pessoal com o destino
turístico e a população local, contribuindo com o desenvolvimento do turismo com
ambições sustentáveis e na preservação e promoção dos patrimônios ambos
materiais e imateriais. A relação deste tipo de visitante como o local visitado, com a
comunidade local e meio ambiente é concomitante com a filosofia alberguista como
se constará mais adiante.
30
Problema de Pesquisa
Os hostels estão bem difundidos4 e os conceitos deste meio de hospedagem são
definidos e até mesmo regulados por leis em alguns países5, principalmente no
continente europeu e América do Norte. Nesses locais, possuem características
singulares definidas, diferenciando-os claramente dos demais meios de hospedagem,
como é o exemplo da França, que possui um selo de qualidade aceito pelas
autoridades nacionais como padrão (THE EUROPEAN CONSUMER CENTRES'
NETWORK, 2009). A organização nacional de turismo da Escócia, determina critérios
básicos para um estabelecimento ser denominado de hostel (VISITSCOTLAND,
2012). Por tanto, o público alvo desses locais, espera por determinadas características
ao se hospedar em um estabelecimento divulgado como tal.
No Brasil, o turismo da juventude, que tem os hostels como seu principal meio de
hospedagem, vem ganhando espaço, segundo o Estudo da Demanda Turística
Internacional, pois “o interesse de estrangeiros por albergues, campings e
hospedagem de baixo custo aumentou de 1,6%, em 2004, para 4,3%, em 2010”
(MINISTÉRIO DO TURISMO, 2012). No entanto, em âmbito nacional este segmento
de mercado, por ser relativamente recente, encontra-se em estado de abandono por
parte do Ministério do Turismo (MTur). Além disso, os estudos científicos sobre o tema
no Brasil encontram-se em estágio embrionário (FEDRIZZI, 2008; OLIVEIRA E
REJOWSKI, 2013).
Apesar de sua importância social e crescente participação econômica no turismo, o
MTur, excluiu6 os hostels de sua nova matriz de classificação de meios de
hospedagem, por serem considerados meios de hospedagem coletiva e não
individual. Não há nenhuma menção a eles na Cartilha de Orientação Básica do
Sistema Brasileiro de Classificação de Meios de Hospedagem (SBClass), e muito
4 Na Alemanha o número de hostels em edifícios históricos, principalmente em castelos e palácios
ultrapassa trinta estabelecimentos (GERMAN YOUTH HOSTEL ASSOCIATION, 2014). 5 Países como Inglaterra, Irlanda, França e Alemanha regulamentam as leis e conceitos para que
estabelecimentos sejam intitulados de hostels (THE EUROPEAN CONSUMER CENTRES' NETWORK, 2009).
6 Essa exclusão é recente. Houve no passado, na década de 80, um esforço para divulgar, promover, regulamentar e classificar os albergues da juventude, em uma parceria da EMBRATUR com a associação brasileira de AJ, sob a Deliberação Normativa nº 209/87, que dispõe considerações essenciais sobre o meio de hospedagem Albergues da Juventude.
31
menos uma conceptualização e/ou classificação. Em contato com o MTur sobre a
nova matriz classificatória, a organização simplesmente afirma que no “novo sistema
serão 7 matrizes, para os tipos: Hotel, Resort, Cama & Café, Hotel Fazenda, Hotel
Histórico, Pousada e Flat/Apart-Hotel. Nesse primeiro momento, os albergues não
entraram na classificação” (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2013). Foi solicitado ao
MTur, sob o protocolo de número 72550000271201453, a legislação vigente sobre os
hostels, tendo sido atestado que realmente “não há legislação no âmbito deste MTur
que trate especificamente da questão acerca dos albergues da juventude do Brasil”
(MINISTÉRIO DO TURISMO, 2014).
Aparentemente este tipo de empreendimento encontra-se marginalizado pelas
autoridades e pesquisadores nacionais. Poucos estudos são realizados sobre esse
meio de hospedagem, o qual carece de um maior número de pesquisas e abordagens
conceituais, a fim de que se possa iniciar uma classificação capaz de beneficiar tanto
os empreendedores quanto os hóspedes que procuram pelos mesmos. Além disso,
há no Brasil uma clara deturpação etimológica do meio de hospedagem intitulado
como albergue. Existe uma associação desse termo com a sua tradução literal em
português (albergue: local de refúgio para desabrigados e desprovidos de condições
financeiras), conferindo um caráter, muitas vezes, completamente equivocado quanto
ao seu verdadeiro conceito (CICCIO, TEIXEIRA e SALLES, 2011).
Portanto, é necessária a realização de maiores estudos sobre o tema, para que o
turista perceba os albergues de maneira positiva, fazendo desses uma opção fiel a
suas raízes conceituais e um meio de hospedagem alternativo viável, não somente
para jovens, mas para todos aqueles que se identificam com a filosofia alberguista.
Perguntas de pesquisa
Diante do problema geral apresentado, surgem diversos questionamentos passíveis
de análise. Estas questões, tem por finalidade principal, através de um levantamento
acadêmico e científico de informações, abarcar todos os elementos a serem
verificados no presente estudo (DENCKER, 2007).
As perguntas de pesquisa são:
32
1. Qual é o papel dos hostels no fenômeno turístico, no exterior e no Brasil?
2. Qual era o panorama de sua gênese na Alemanha e no Brasil?
3. Quais variáveis são essenciais para o entendimento e proposta para um
conceito desse meio de hospedagem?
4. Qual é a realidade atual em Florianópolis (SC)?
5. Qual é o perfil das pessoas que frequentam esse meio de hospedagem?
A figura 6 ilustra a problemática da pesquisa, que se resolvida comporia uma proposta
holística de um conceito sobre o meio de hospedagem foco dessa pesquisa.
33
Figura 6 – Problemática de pesquisa
Fonte: Elaborado pelo autor (2014)
34
Objetivos
Objetivo geral
Propor um conceito de hostel abrangente, buscando contribuir em uma futura
classificação do mesmo, junto ao MTur.
Objetivos específicos
Analisar a gênese alberguista internacional e brasileira.
Distinguir etimológica e semanticamente a palavra hostel e albergue.
Identificar o perfil do público-alvo desses estabelecimentos.
Propor a existência do trinômio hostels/hospitalidade/espaço.
Criar uma matriz classificatória de áreas físicas.
Sintetizar a essência desse meio de hospedagem em Florianópolis, SC.
Delimitou-se esses objetivos com base na Taxonomia de Bloom (FERRAZ e BELHOT,
2010). A figura 7 demonstra como cada objetivo específico auxilia na obtenção do
objetivo principal e, consequentemente, na criação do conceito de hostel.
35
Figura 7 – Mapa conceitual dos objetivos de pesquisa
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
36
No intuito de facilitar o entendimento deste trabalho ao leitor, demonstra-se, abaixo,
como a pesquisa foi desenvolvida, a ordem e teor dos capítulos primários:
O capítulo 1, descreve a abordagem metodológica escolhida para chegar-se à
conclusão dos objetivos propostos anteriormente. Na sequência, são apresentadas as
técnicas, tipologias e instrumentos de pesquisa e a descrição do universo e da
amostra. Para finalizar, é acrescentado um resumo do referencial teórico utilizado
como base para o presente estudo. O capítulo 2 começa com a jornada histórica
referente à gênese alberguista na Alemanha, no início do século XX e a posterior
expansão dos albergues da juventude para o Canadá, os E.U.A. e o Brasil. A seguir,
procura-se identificar os elementos de ordem material que originaram esse meio de
hospedagem, os acontecimentos determinantes de suas condições atuais, suas
similaridades socioespaciais e padrões filosóficos.
O capítulo 3 demonstra alguns aspectos que podem ser considerados como
fundamentais para uma futura classificação do meio de hospedagem hostel. Nele são
abordadas as diferenças etimológicas da palavra hostel e da palavra albergue e
demonstrado o perfil do público que utiliza esse meio de hospedagem.
Posteriormente, relacionam-se os albergues da juventude e os hostels à hospitalidade
e ao espaço que ocupam. Por último, se propõe uma matriz classificatória para as
áreas físicas desse meio de hospedagem. O capítulo 4 apresenta e analisa a pesquisa
de campo do presente estudo, as entrevistas e questionários aplicados e a análise de
seus resultados. Procura-se descrever o panorama mercadológico atual dos
empreendimentos intitulados de hostels independentes de Florianópolis, Santa
Catarina, assim como seu histórico. Busca-se, com isso, entender como este meio de
hospedagem adquiriu suas características atuais.
No capítulo 5 propõe-se, em cumprimento ao objetivo principal, um conceito
abrangente de hostel. Nas considerações finais procura-se sugerir outros aspectos
essenciais a cada item analisado pela pesquisa, até então desconsiderados, para uma
futura classificação oficial dos hostels no Brasil. As limitações de pesquisa são
delineadas, abrindo caminho para futuras pesquisas que queiram se aprofundar no
tema.
37
1 MARCO METODOLÓGICO
Nesse capítulo pretende-se esclarecer os principais aspectos metodológicos usados
no decorrer do presente trabalho, as técnicas de pesquisa e amostra da mesma.
Posteriormente, chega-se ao referencial teórico que forneceu as bases para a
fundamentação crítica que permeia toda a estrutura deste estudo.
1.1 Método de abordagem
Tem-se a dialética materialista e a análise da formação socioespacial como principal
fundamentação teórica. A primeira, propõe que a “compreensão da realidade [é vista]
como essencialmente contraditória e em permanente transformação, [e o]
desenvolvimento do mundo em constante mudança, resulta da interação de forças
opostas” (MARTINS, 2009, p. 50). A segunda, considera que os aspectos naturais,
combinados aos eventos sociais, dão resultado a um processo histórico. Esta
abordagem é essencial ao entendimento da gênese alberguista, a qual brota de
conflitos sociais de sua época, da apropriação singular do território e da influência
deste sobre o homem e vice-versa. Assim sendo, considera-se que a apreensão do
passado é fundamental para se compreender e analisar claramente o “hoje”, levando-
se em consideração a relação entre elementos naturais e humanos, pois “a história
não se escreve fora do espaço e não há sociedade a-espacial” (SANTOS, 1979, p.
10). A análise da gênese alberguista, passa por esse “filtro metodológico”
socioespacial e materialista. Dentro dessa ótica são contemplados os principais
acontecimentos históricos, essenciais para a compreensão da atual situação dos
hostels no Brasil (RICHARDSON, 2008). A descrição desses principais elementos
caracteriza o processo histórico das relações socioambientais que resultaram na
criação do Movimento Alberguista, dando origem ao meio de hospedagem,
atualmente, chamado de hostel, suas características físicas, filosofia e serviços.
1.2 Técnicas e tipologia de pesquisa, geração ou coleta de dados
Realizou-se uma revisão bibliográfica e documental na área semântica, etimológica e
histórica do turismo, hospitalidade e meios de hospedagem, resultando em uma crítica
de resultados, através dos documentos bibliográficos disponíveis (LEAL, 2011). A
38
proposta conceitual teórica, é considerada de abordagem indireta, possui caráter
exploratório pois busca “aprimorar ideias e descobrir intuições” (DENCKER, 2007, p.
151). Utilizou-se, também, a técnica de pesquisa comparativa, que estuda as
semelhanças e diferenças entre grupos, povos, países e/ou eventos, para entender
um determinado fenômeno e/ou ampliar o nível de conhecimento sobre um evento
especifico (DENCKER, 2007; MARCONI e LAKATOS, 2003; MARTINS, 2009), pois é
[...] lançando mão de um tipo de raciocínio comparativo que podemos descobrir regularidades, perceber deslocamentos e transformações, construir modelos e tipologias, identificando continuidades e descontinuidades, semelhanças e diferenças, e explicitando as determinações mais gerais que regem os fenômenos sociais (SCHNEIDER e SCHMITT, 1998, p. 01).
Para a definição da relação entre hostels, hospitalidade e espaço, a escolha da
Alemanha como ponto de partida deve-se ao fato da gênese alberguista ter iniciado
nesse país. Além disso, a Alemanha possui nada menos que 37 castelos/palácios
(locais de preservação do patrimônio histórico/cultural edificado) transformados em
modernos albergues da juventude (GERMAN YOUTH HOSTEL ASSOCIATION,
2014).
Outro local de estudo localiza-se em Český Krumlov, República Tcheca. O Hostel 99,
instalado nas fortificações do centro antigo da cidade e protegido pela United Nations
Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) como patrimônio da
humanidade. Em território nacional, foi escolhido, para fins de comparação com o
panorama no exterior, o Samambaia Hostel, no município de Petrópolis, que constitui
um belo exemplo de apropriação do território turístico e preservação do patrimônio
histórico.
Para a criação da matriz classificatória de áreas físicas, três estabelecimentos do
exterior foram selecionados e servirão como base comparativa aos nacionais. Estes
são o Hostel do Castelo de Altena: o primeiro estabelecido na Alemanha (1909) por
Richard Schirrmann, ainda em atividade; o Home Lisbon Hostel: eleito o melhor hostel
de categoria média do mundo, pelos usuários do site Hostelworld em 2014; e o Hostel
99 de Český Krumlov. No âmbito nacional foram escolhidos os 10 melhores
estabelecimentos do estado de Florianópolis, Santa Catarina, através de suas
respectivas avaliações no site Hostelworld.
39
1.3 Métodos e técnicas da pesquisa de campo
Contemplou-se, para esse estudo, o universo de hostels independentes de
Florianópolis, Santa Catarina, que é relativamente grande, com um total de 28
estabelecimentos. Para o levantamento desse universo utilizou-se o site
www.hostelworld.com. Esse site é uma ferramenta de reservas on-line especializada,
criada em 1999 que faz parte do grupo WEB RESERVATIONS INTERNATIONAL,
possuindo mais de uma dezena de outros sites. A empresa Hostelworld é o maior
mecanismo de reservas para esse meio de hospedagem na web, com
aproximadamente 27 mil propriedades em mais de 180 países. Com sede em Dublin
(Irlanda), recebeu em 2012 do guia de viagens Lonely Planet, o prêmio de “Site mais
confiável para reservas on-line em Hostels”, em uma pesquisa com mais de 5600
viajantes (WEB RESERVATIONS INTERNATIONAL, 2013).
No Brasil há, de acordo com o MTur, até o ano de 2014, cerca de 114
estabelecimentos no Cadastro dos Prestadores de Serviços Turísticos – CADASTUR
(LIBÓRIO e OLIVEIRA, 2014). Esse número oficial é ínfimo perto do número real
existente no mercado. Segundo o Hostelworld, somente na cidade do Rio de Janeiro
existem 130 hostels ativos (HOSTELWORLD, 2014). Os estabelecimentos oficiais
representam apenas uma pequena parcela dos atuantes no mercado. Portanto, o
número mercadológico representa a realidade deste segmento que, no momento, se
encontra à margem das classificações e fiscalizações do MTur. Como demonstra a
tabela 1, de acordo com o Hostelworld, os principais destinos no país são:
Tabela 1 – Principais destinos hosteleiros dos Brasil
Posição Destino No de Hostels
1º Rio de Janeiro 130
2º São Paulo 65
3º Florianópolis 28
4º Foz do Iguaçu 22
5º Salvador 21
Total 266
Fonte: Elaborado pelo autor (2014).
40
Agrupando os cinco maiores destinos turísticos tem-se 266 hostels, cerca de 55% do
universo total mercadológico brasileiro (aproximadamente 520), quatro vezes o
número oficial de posse do MTur, portanto um universo considerável. A escolha pela
amostra do Hostelworld em detrimento a do CADASTUR visa eliminar um problema
frequente da pesquisa em turismo, onde “as estatísticas nem sempre são atualizadas,
fazendo com que o universo seja estimado em dados do passado” (DENCKER, 2007).
Delimitou-se Florianópolis (SC) como local de pesquisa, pois ocupa o significativo
terceiro lugar entre os destinos de hostels do país. Além desse fato, deve-se
acrescentar ainda a conveniência temporal e financeira que a cidade oferece ao
pesquisador, viabilizando a coleta de dados. Finalmente, percebe-se, que esse meio
de hospedagem do estado é relativamente mais recente dos que os dois primeiros
destinos do Brasil, Rio de Janeiro e São Paulo. A carência de estudos sobre esse
tema a nível nacional é preocupante, esse panorama fora do eixo Rio-São Paulo é
mais carente ainda. Portanto, os destinos hosteleiros brasileiros marginalizados
clamam por pesquisas científicas sobre o tema. Devido a esse fato o universo da
pesquisa é delimitado como os hostels em Florianópolis (SC), o qual é constituído de
vinte e oito (28) estabelecimentos.
Os participantes foram determinados a partir da amostragem intencional e não
aleatória. Todo o universo foi abordado pessoalmente e convidado a participar da
pesquisa, via e-mail e telefone. Essa técnica define que “todos os componentes do
universo devem ter igual oportunidade de participar da amostra” (DENCKER, 2007, p.
211). A amostra obtida (15 – quinze respondentes) é representativa (53,57% do
universo), e foi obtida de forma não acidental, procurando incluir todas as
probabilidades. A distribuição geográfica da amostra encontra-se ilustrada na figura 8.
41
Figura 8 – Mapa da localização generalizada da amostra
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
42
A pesquisa de campo realizada com essa amostra é composta de duas partes, a
primeira, uma entrevista e a segunda, um questionário. Para identificar a formação
socioespacial, assim como a filosofia dos hostels de Florianópolis (SC), as chamadas
“entrevistas não diretivas ou em profundidade” são consideradas como ideais pois
além de simplesmente compilarem informação, permite a observação participante do
entrevistador (SIN, 2003). Essas entrevistas foram formuladas de forma mais aberta,
permitindo ao entrevistado dissertar sobre o tema,
com base em teorias e pressupostos definidos pelo investigador; o diálogo entre entrevistador e entrevistado é conduzido pelo primeiro sem estruturação do problema. As questões são organizadas para explorar um tema, aprofundá-lo, descrever processos, compreender o passado vivi do papel do entrevistado, identificar problemas, padrões de comportamento, reunir elementos para a compreensão de uma situação ou de um problema (LEAL, 2011, p. 54).
Foram obtidas doze (12) entrevistas válidas, no decorrer dos meses de janeiro a maio
de 2015. Essas entrevistas permitem uma análise qualitativa, dividida em dois
momentos, a coleta de dados e, posteriormente, a análise e/ou interpretação dos
mesmos. Este tipo de abordagem, para Minayo (2002), procura responder às
questões particulares [em um] nível de realidade que não pode ser quantificado [ou seja] ela trabalha com o universo de significados, motivos aspirações, crenças, valores, atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (apud MARCONI E LAKATOS, 2011, p. 271).
A fim de identificar o perfil dos empreendimentos e dos proprietários, uma abordagem
quantitativa foi utilizada através dos questionários estruturados, aplicados momentos
antes do início das entrevistas e de maneira on-line. Foram obtidos quinze (15)
questionários (≈53% do universo). Doze (12) foram obtidos pessoalmente e três (03)
através de e-mails com hostels que não puderam participar da entrevista
pessoalmente. Para tratamento e análise dos dados o método de estatística simples
foi empregado, através de gráficos de frequência construídas no Microsoft Word 365,
no intuito de modo facilitar a organização e compreensão dos dados obtidos. O
questionário é a ferramenta ideal para este momento, pois aqui se pretende realizar
uma análise estatística simples, assim como, “estimar magnitudes, [...] descrever uma
população [e] verificar hipóteses” (LEAL, 2011, p. 55).
43
Mostra-se, na figura 9, que o método da análise socioespacial e materialista funciona
como um filtro, ao qual todas as abordagens e concepções dessa dissertação devem
ser submetidas.
44
Figura 9 – Organograma metodológico
Fonte: Elaborado pelo autor (2014)
45
1.4 Referencial Teórico
Aqui procura-se resumir o quadro de autores, ideias e metodologias que serão
abordadas no decorrer do trabalho. O referencial teórico não se limita somente a esse
subcapítulo, onde é explicitada uma síntese das principais categorias analíticas
utilizadas na investigação, sendo essas a criação de conceitos, a materialismo
histórico, a análise socioespacial, o turismo e o turismo da juventude no contexto das
ciências sociais, a hospitalidade, e por fim, o tema principal desse estudo, os hostels.
Os conceitos nada mais são do que um estágio avançado ou a materialização de uma
ideia, são os constituintes de pensamentos. Consequentemente, eles são cruciais
para os processos psicológicos como a categorização, inferência, memória,
aprendizagem e tomada de decisão (LIZARDO, 2013). Também são
conhecidos também como classes, podendo ser abstratos ou concretos, elementares reais e/ou fictícios. Em suma, um conceito pode ser qualquer coisa sobre algo que é dito, e, portanto, também pode ser a descrição de uma tarefa, função, ação, estratégia, raciocínio, etc. (SMITH, 2004, p. 03).
A formação de um conceito é complexa, mas dentro de princípios básicos é
constituída, primeiramente, pelo uso da memória e categorização das ideias, seguido
da inferência, que consiste no ato ou processo de derivar conclusões lógicas de
premissas conhecidas ou decididamente verdadeiras (MARGOLIS e LAURENCE,
1999; SMITH, 2004). O processo pelo qual uma conclusão é inferida a partir de
múltiplas observações é chamado processo dedutivo ou indutivo. Conclusões
inferidas a partir de observações múltiplas podem ser testadas por observações
adicionais, resultando em conhecimento científico (MARGOLIS e LAURENCE, 1999).
Os conceitos, em sua forma mais básica, são abstrações, formulações lógicas que
pretendem “capturar” um fenômeno desde a comunicação verbal e escrita à ciência
humana. Essas formulações lógicas não podem ser criadas sem um sistema de
referência, um deles nossa herança cultural. Afim de estudar cientificamente
determinados aspectos da vida humana, pode-se, através da análise de conceitos
entender um fenômeno social (LIZARDO, 2013). Consequentemente, “a distinção
entre fato e conceito é a de que o conceito simboliza as inter-relações empíricas e os
fenômenos que são afirmados pelo fato” (MARKONI e LAKATOS, 2011, p. 114). Para
46
Ander-Egg “sem conceitos ou, para ser mais preciso, sem um sistema conceptual, não
é possível o método cientifico e, consequentemente, a ciência” (1978 apud MARKONI
e LAKATOS, 2011, p. 114).
O nível mais concreto de um conceito é refletido na criação quadros conceituais, ou
de estruturas organizacionais. Tais estruturas são criadas para organizar de forma
lógica os conceitos e passar esse conhecimento à diante (CANZIANI, SONMEZ, et
al., 2012). Em um segundo momento, essas estruturas organizacionais devem levar
à cabo as estratégias e ações de uma pessoa, comunidade ou organização,
implantando conceitos já existentes e/ou materializando novos (CHACKO, WILLIAMS
e SCHAFFER, 2012). Para se chegar à formação dessas estruturas deve-se conhecer
à fundo as diversas definições e os diversos aspectos que formam o objeto de estudo,
procurando descobrir sua essência (LUMSDON e MCGRATH, 2011).
O materialismo dialético é uma base filosófica do marxismo – a qual busca
compreender a realidade e analisar as leis sociológicas, muitas vezes contraditórias e
antagônicas, que caracterizam a vida social (PINTO, 1979) – que “comporta um
esforço do pensamento para alcançar a prática social, com o objetivo [...] de
transformá-la” (GLASER, 2008). Esse método descreve, analisa e critica a evolução
histórica e a prática social entre os homens, no decorrer do desenvolvimento da
humanidade (ROBAINA, 2013). A realidade, pode ser considerada como causa da
relação entre forças contraditórias,
pelo senso dos contrastes e mesmo dos contrários – apresentados como condições antagônicas em função das quais se ordena a história dos homens e das instituições [...] o esclarecimento não decorre da opção prática ou teórica por um deles, mas pelo jogo dialético entre ambos. A visão de um determinado aspecto da realidade histórica é obtida [...] pelo enfoque simultâneo dos dois (HOLANDA, 1995, p. 12).
A dialética materialista permite, além de uma concepção de política econômica, uma
análise filosófica e cultural, uma investigação histórica sobre seres humanos
(HARVEY, 2010), que facilita a compreensão de um determinado objeto de estudo e
até mesmo da situação de nossa realidade atual (PORTUGAL, 2013). A análise do
particular retrata em detalhes as concepções gerais sobre um determinado objeto ou
processo, sendo possível uma compreensão da realidade geral através de aspectos
específicos (CURY, 1990; RICHARDSON, 2008; ROBAINA, 2013; TRIVIÑOS, 1987).
47
Essas peculiares eclodem em manifestações individuais, que posteriormente podem
tomar proporções sociais. Assim sendo, o processo inverso se constrói. A partir da
mudança do indivíduo, o social é alterado e o geral se modifica (HARVEY, 1993;
LEFEBVRE, 2009; MARX e ENGELS, 1998). A palavra “crítica” é importante no
contexto do materialismo dialético, e deve ser empregada no seu sentido mais amplo,
pois a política econômica “assim como a religião, [cultural, sociedade e o turismo],
devem ser criticadas para que possam transcender” (LEFEBVRE, 2009, p. xxvii).
Portanto, procura-se encontrar “explicações coerentes, lógicas e racionais para os
fenômenos da natureza, da sociedade e do pensamento”, das quais o conceito de
alienação é um dos importantes constituintes para essa compreensão da realidade
(MARX e ENGELS, 1998). Assim sendo, pode-se determinar, “através do enfoque
dialético da realidade, [que] o materialismo mostra como se transfora a matéria e como
se realiza a passagem das formas inferiores às superiores” (TRIVIÑOS, 1987, p. 51).
Nesse caso, as formas inferiores, por exemplo um segmento alienado de uma
determinada sociedade, ao se afastar da forma e local superiores (parte vigente da
sociedade) dão origem a diversas reações sociais, algumas caracterizadas como
movimentos sociais, por vezes libertários, modificando nosso espaço e sociedade
(LEFEBVRE, 2009; MARX e ENGELS, 1998).
Porém, algumas dessas relações nem sempre são contraditórias ou antagônicas. Em
alguns casos podem, até mesmo, resultarem em relações de cooperação (MARKONI
e LAKATOS, 2011; RICHARDSON, 2008; ROBAINA, 2013; TRIVIÑOS, 1987).
Finalmente, deve-se considerar que antagônica a essa realidade materialista, por
vezes conflitante, existe a possibilidade de nascimento de um pensamento
cooperativista (COSTA, FRANCO e HOFFMANN, 2013), essencialmente idealista, em
alguns casos até mesmo romântico, de cunho social e utópico, como o existente na
própria filosofia alberguista (HEATH, 1962).
Para se analisar o conteúdo das entrevistas e a essência dos hostels, deve-se,
primeiramente, entender que a dialética materialista consiste de 3 premissas básicas
(PORTUGAL, 2013). A primeira é a da
48
materialidade do mundo, isto é, todos os fenômenos, objetos e processos que se realizam na realidade são materiais, todos eles são, simplesmente, aspectos diferentes da matéria em movimento. A segunda peculiaridade do materialismo ressalta que a matéria é anterior à consciência. Isto significa reconhecer que a consciência é um reflexo da matéria [...] e por último, o materialismo afirma que o mundo é conhecível [...] o homem tem a possibilidade de conhecer a realidade que se desenvolve gradualmente (TRIVIÑOS, 1987, p. 52).
De acordo com Richardson (2008, p. 46) o método dialético materialista cria, dentro
das três premissas citadas anteriormente, dois princípios básicos:
1º. O princípio da conexão universal – [...] todos os fenômenos da natureza estão
interligados e determinados mutuamente. O aparecimento, a mudança ou o
desenvolvimento de um fenômeno só é possível em interligação com outros
sistemas materiais;
2º. O princípio de movimento permanente e do desenvolvimento – tudo está em
movimento. [...] A causa do desenvolvimento da sociedade e da natureza está
nelas e não fora delas.
As premissas possuem um conteúdo mais rico e abrangente do que os princípios, os
quais dão, consequentemente, origem às três leis do materialismo dialético que
possuem a capacidade de abordar fenômenos, processos e objetos de forma mais
específica e detalhada (RICHARDSON, 2008, p. 48), sendo essas:
1º. A lei da unidade e luta dos contrários, [Engels baseado em Hegel] ligada ao
princípio da conexão universal: os aspectos, elementos ou forças internas de um
fenômeno ou objeto excluem-se mutuamente, são contrários. Mas não podem
existir uns sem os outros. O movimento é produzido devido a essa contradição;
2º. A lei da transformação da quantidade em qualidade e vice-versa: na natureza,
as mudanças qualitativas só podem ocorrer ou adição ou subtração da matéria
ou movimento (energia). Resulta impossível alterar a qualidade de um objeto
sem somar ou subtrair quantidade do objeto ou fenômeno, isto é, sem uma
alteração quantitativa do objeto;
3º. A lei da negação da negação: a história da natureza e da sociedade mostra que
o desenvolvimento está ligado à morte do velho e ao nascimento do novo. [...] o
desenvolvimento da humanidade é testemunha da morte de civilizações e do
49
nascimento de novas. A negação, a substituição do velho pelo novo, está
presente em tudo.
Dessas leis surgem as categorias de análise materialista, que “possuem
simultaneamente a função de intérpretes [da realidade] e de indicadoras de uma
estratégia [social, sendo assim] o instrumento metodológico da dialética para analisar
os fenômenos da natureza e da sociedade” (CURY, 1990, p. 21). Essas categorias,
de acordo com o autor, são:
1º. Categoria – geral/particular/individual: todo fenômeno do mundo que nos rodeia
tem características específicas, próprias. É impossível encontrar dois objetos
iguais. [...] ao mesmo tempo, não há no mundo objetos ou fenômenos que não
possuam traços comuns com outros;
2º. Categoria – causa/efeito: causa é o fenômeno que produz outro fenômeno.
Efeito é o resultado produzido pela causa. [...] a mesma causa pode provocar
consequências diferentes em função das condições;
3º. Categoria – necessidade/casualidade: necessidade é o que deve ocorrer em
determinadas condições. [...] casualidade é o que pode ocorrer ou não, em
determinadas condições;
4º. Categoria – essência/aparência: ao conhecer um objeto ou fenômeno, o
que primeiro constatamos são seus aspectos exteriores [aparência]. Após
um estudo mais aprofundado, estamos em condições de compreender sua
essência. Aparência é a parte superficial, mutável de um fenômeno ou da
realidade objetiva. É uma forma de expressão da essência e depende dela.
A essência é a parte mais profunda e relativamente estável do fenômeno
ou da realidade objetiva. Está oculta debaixo da superfície de aparências
[grifo nosso];
5º. Categoria – conteúdo/forma: o conteúdo é o conjunto de elementos, interações
e mudanças características de um fenômeno. [...] a forma é o sistema estável de
relações entre elementos de um objeto ou fenômeno;
6º. Categoria – possibilidade/realidade: possibilidade é o que pode surgir pela
uniformidade do desenvolvimento, mas que ainda não aconteceu. Realidade é o
que já aconteceu.
50
Essas categorias estão relacionadas umas com as outras, portanto, a “análise de um
objeto ou fenômeno não precisa ser feita com todas, basta escolher uma delas”
(RICHARDSON, 2008, p. 50). De acordo com Richardson (2008) essas categorias são
essenciais para o entendimento dos fenômenos ou objetos analisados dentro da ótica
do materialismo dialético, portanto, devem fazer parte da metodologia da investigação
cientifica de uma pesquisa que se denomine como tal, lembrando que nem todas as
categorias devem, apesar de possível, serem abordadas simultaneamente, apenas
aquelas pertinentes à análise do determinado objeto ou fenômeno.
Quanto à análise socioespacial, essa nos permite perceber a realidade através de
uma análise histórica e social, onde homem e território são mutuamente
influenciadores e influenciados em um processo que produz interações sociais única
e singulares a um espaço de tempo em um determinado lugar (SANTOS, 1979). Essas
interações, chamadas também de acelerações são pontos e acontecimentos
históricos cruciais
da história, como se abrigassem forças concentradas, explodindo para criarem o novo [...] daí, a cada época, malgrado a certeza de que se atingiu um patamar definitivo, as reações de admiração ou de medo diante do inusitado e a dificuldade para entender os novos esquemas e para encontrar um novo sistema de conceitos que expressem uma nova ordem de gestação (SANTOS, 2013, p. 27).
Dessa forma, numa perspectiva materialista, a análise da formação socioeconômica
utiliza o paradigma de formação socioespacial, reconhecendo que o espaço interior e
a dinâmica econômica e social do país estão atrelados às relações que mantém com
as economias capitalistas centrais (SANTOS, 2012). Especificamente no Brasil, esses
eventos ocorridos no passado, decorrentes da formação socioespacial, que
determinam realidade atual, produzindo dualidades (RANGEL, 1981). A essência
dessas dualidades não é resultante somente das forças e das relações
socioeconômicas internas do país, mas também da evolução das relações que ele
estabelece com a economia e cultura dos países vizinhos, mas principalmente com
os países centrais do capitalismo (MAMIGONIAN, 1987).
Essas dualidades auxiliam na compreensão de uma situação ou problema
contemporâneo, como o fenômeno turístico, composto de um conjunto de ações sobre
51
território em que se realiza (PEREIRA, 2003). Essas ações, “de naturezas diversas,
podem se enquadrar entre mercadológicas e identitárias que, juntas, resultam na
configuração territorial: uma maneira consumada sobre a paisagem ou o conjunto de
formas de um lugar” (TELLES, 2013, p. 01). Esses eventos podem decorrer, dentro
outros motivos, de conflitos entre classes, da vida cotidiana, como a intersecção de
"ilusão e verdade, poder e impotência, a intersecção dos setores que o homem
controla e os setores que ele não controla" (LEFEBVRE, 2004, p. 74)
De acordo com Assunção (2012. P. 115), as “condições naturais de uma região
definiriam o seu desenvolvimento, por que os habitantes seriam capazes de explorá-
los em toda sua potencialidade”, contribuindo para peculiaridades culturais singulares
de cada povo, num determinado espaço/tempo. No turismo, são essas peculiaridades
que compõe os pontos de interesse para os viajantes, o território em formação com o
homem faz brotar uma diversidade de costumes atraentes. A mobilidade humana,
inerente ao turismo, parte do interesse por conhecer o estranho e isso permite a
discussão de novas práticas sociais. Compreender o mundo e absorver a experiência, para garantir a transformação da sociedade, fez parte dos projetos de muitos que se aventuravam [pelo]mundo. [...] A comparação de diferentes práticas sociais possibilitou a construção de novas hipóteses e questionamentos que poderiam conduzir à transformações e ao entendimento das diferenças e das semelhanças [grifo nosso] (ASSUNÇÃO, 2012, p. 02).
O turismo, no contexto das ciências sociais, pode ser considerado como fenômeno
social. Esse tipo de análise histórica e socioespacial, se torna pertinente para se
abordar a problemática atual (SANTOS, 1979, 2013) onde esses fenômenos sociais
irão se disseminar em diferentes países seguindo um padrão de trabalho em princípio universal. [...] enquanto na Europa e nos Estados Unidos, a Sociologia se ocupa de assuntos como divisão de trabalho, urbanização, industrialização, metrópole e racionalização, na América Latina nos encontramos diante de questões como mestiçagem, oligarquias, religiosidade popular, mundo rural. Se para os europeus e norte-americanos o fundamental foi explicar a modernidade, no caso latino-americano era a sua ausência, ou melhor, as dificuldades para construí-la, que chamava a atenção (ORTIZ, 2002, p. 21).
A primeira conhecida descrição da OMT, na publicação intitulada de
Recommendations on Tourism Statistics, coloca o turismo como “as atividades de
pessoas em viagem e sua permanência nos lugares fora de sua residência habitual
por não mais do que um ano consecutivo por lazer, negócios e outros propósitos”
52
(UNWTO, 1994, p. 05). No entanto, essa definição não abraça todas as perspectivas
e problemáticas decorrentes da percepção do turismo como fenômeno social.
A ideia de que o turismo está vinculado a um tour, ainda que simplória, se faz
necessária (UNWTO, 1995). Porém, turismo é muito mais do que deslocamento de
seu habitat, com finalidades específicas, por um espaço mínimo/máximo de tempo.
Além disso, o turismo corresponde de forma holística, como o conjunto de todas as
atividades, relações, fenômenos e impactos socioeconômicos e ambientais entre
visitante e visitado (KRIPPENDORF, 2009; NETTO, 2010, 2011). Ciente disso, a
UNWTO vem tentando ampliar o conceito de turismo colocando-o como um fenômeno
social
cultural e econômico que implica a deslocação de pessoas para lugares fora do seu ambiente habitual para fins pessoais ou profissionais. Estas pessoas são chamadas visitantes (que podem ser turistas ou excursionistas; residentes ou não residentes) e do turismo tem a ver com suas atividades, algumas das quais implicam despesas turismo. Como tal, o turismo tem implicações sobre a economia, sobre o meio ambiente natural e construído, sobre a população local no destino e sobre os próprios turistas (UNWTO, 2010, p. 01).
Essas concepções mais abrangentes permitem uma série de considerações que
possuem maior impacto na vida de visitantes e visitados, pois passam a consideram
aspectos anteriormente ignorados, como a inclusão social da população local
(KRIPPENDORF, 2009; NETTO, 2010, 2011). Essa inclusão social é frequente em
diversos casos nos hostels (SILVA, 2006). Neste momento da história, o governo
brasileiro caminha rumo a uma conceptualização do turismo que procura abarcar os
esses aspectos socioespaciais. O Governo Federal classifica o turismo na Lei 11.771
– Capítulo I – Disposições Preliminares – Artigo 2o (conhecida como Lei Geral do
Turismo), a qual considera esse fenômeno social como as atividades desempenhadas
por pessoas físicas durante viagens e estadas em lugares diferentes do seu entorno habitual, por um período inferior a 1 (um) ano, com finalidade de lazer, negócios ou outras. Parágrafo único. As viagens e estadas de que trata o caput deste artigo devem gerar movimentação econômica, trabalho, emprego, renda e receitas públicas, constituindo-se instrumento de desenvolvimento econômico e social, promoção e diversidade cultural e preservação da biodiversidade [grifo nosso] (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2008).
Os princípios fundamentais do turismo são de grande auxílio a essa fundamentação
teórica. Por princípio fundamental entenda-se tudo aquilo que origina, causa e/ou
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constitui um corpo, local ou fenômeno; aquilo que se faz necessário para a realização
de algo, de uma ação ou conhecimento; que serve de base para algo ainda que de
maneira provisória (FERREIRA, 2004). Portanto, na essência do turismo, os aspectos
fundamentais que devem existir para que o turismo aconteça, são (NETTO, 2010, p.
69):
Sujeito – para haver turismo, é imprescindível a existência do turista. Porém,
esse turista não se desloca sem manter uma interação com o anfitrião;
Deslocamento – é classificado em duas categorias: interno (feito dentro do país
de origem do turista) e externo (fora do país de origem);
Retorno – a ação de sair de casa, de seu lugar de habitual de residência,
pressupõe um retorno a esse lugar. Esse conceito já está na raiz da palavra
turismo (tour);
Motivação – sempre irá existir um motivo pelo qual o turista sairá em viagem,
seja este oculto ou manifestado. Mesmo quando não queremos viajar temos uma
motivação para fazê-lo.
Hospitalidade – quando falamos em sair, partir, viajar, imaginamos que teremos
um lugar para ficar [...] quando o turismo ocorre, é o momento ideal para ver as
ações de hospitalidade (recepcionar, hospedar, alimentar e entreter)
acontecerem [...] onde está o turismo, deve estar a hospitalidade, todavia se
tratam de duas ações distintas;
Experiência – o turismo pode ser composto de uma gama de serviços imateriais
e intangíveis, como o bom atendimento em um hotel, uma comida saborosa na
fazenda, uma viagem segura, tem como consequência experiências sensoriais
e psicológicas;
Comunicação & Tecnologia – fazer turismo envolve comunicação [...] com outros
povos e culturas [...] e qualquer tipo de turismo prescindirá de tecnologia para
ser desenvolvido.
Nota-se que a presença da hospitalidade como a relação entre sujeitos do turismo,
visitante e anfitrião, é inerente. Idem para o deslocamento, pois na gênese do turismo
era um ato fundamental. Percebe-se que além de ser um quesito único e essencial
para o turismo, a hospitalidade também permeia praticamente todos os outros itens
54
tidos como princípios fundamentais (SANTOS e PERAZZOLO, 2012). Alguns autores
preconizam que o turismo é uma disciplina da hospitalidade e não o contrário
(THIRKETTLE e KORSTANJE, 2012). No mínimo, ela age como fio condutor das
relações entre os sujeitos do turismo. A hospitalidade age diretamente nas
experiências turísticas, possui impacto no trato social, tanto para o visitante quanto
para o visitado, interferindo na percepção subjetiva de qualidade desta experiência.
Outros princípios ocorrem ocasionalmente, mas não são essenciais ao turismo,
portanto são considerados como desejáveis ou secundários. Dentre eles encontram-
se a sustentabilidade, igualdade, alteridade, ética e satisfação pessoal. Estes
princípios caracterizam a qualidade de uma experiência turística, mas não a sua
existência (NETTO, 2010), por isso são considerados secundários. No entanto, há um
item que talvez tenha sido negligenciado como essencial ao turismo: o espaço, o
território turístico. Pois, é no território que se constroem todas as representações
materiais e intangíveis do ser humano, onde acontecem todos os fenômenos
socioespaciais, onde a sociedade se constrói, incluindo o fenômeno denominado de
turismo (CRUZ, 2001; SANTOS, 1979, 2013; YÁZIGI, 2002).
Ainda que algumas definições tratem o turismo de uma maneira mais técnica e
econômica, pecando pela ausência de um caráter histórico e socioespacial, pode-se
perceber, em outras, um caráter mais abrangente, nas quais o desenvolvimento
desejado ultrapassa a esfera econômica, transcendendo para o meio social, cultural
e ambiental. Finalmente, o que se propõe com essa discussão, mais do que definir o
turismo em poucas linhas, é refletir e entender a essência desse fenômeno, quem são
os personagens dessa peça, suas interações e impactos na sociedade e meio
ambiente. A identificação deles permite conhecer os seus princípios fundamentais,
como se comportam e interagem, e por fim suas consequências sobre a realidade.
O Turismo da Juventude, no contexto das ciências sociais, é uma expressão bastante
ambígua quanto à sua definição, principalmente devido à discordância entre os
diversos autores sobre sua faixa etária. A fim de categorizar o perfil do público alvo
dos hostels, tomar-se-á como principal definição de turismo da juventude a proposta
pela UNWTO (2008). Estas considerações levam em conta não somente dados
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demográficos, como faixa etária, mas também o perfil, o “espírito” do viajante e como
este se comporta em relação ao fenômeno turístico, pois há diferenças
significativas nas faixas etárias utilizadas para definir o turismo de jovens, que em alguns casos cobrem o grupo de 16-24 anos, por outrora o de 16-29 e 16-35 em outros. Essas diferenças refletem o fato de que o conceito de "juventude" é cada vez mais difícil de conectar-se a idade, [...] Isto ressalta o ponto que viagens para jovens não é apenas uma questão de demografia, mas cada vez mais um estilo de viagem. Os alojamentos para a “juventude” são usados, agora, por viajantes de todas as idades, muitos dos quais procuram manter o estilo de viagem relativamente independente (UNWTO, 2008).
O turismo da juventude tem sido reconhecido pelas Nações Unidas como uma força
importante para o desenvolvimento e mudança social, trazendo uma mudança positiva
no setor, como um mercado importante para o futuro, não só pelos benefícios
econômicos que pode gerar, mas também porque pode fazer uma diferença real para
o destino, em termos culturais, sociais e de desenvolvimento (UNWTO, 2008, 2010).
Trotta (1978) e Giaretta (2003) completam, eloquentemente, essas definições de
turismo da juventude, quando considerarem esse público como aqueles que são
jovens de espírito.
Quanto à hospitalidade, essa pode conter significados extremamente diferentes. A
primeira, refere-se à conotação que pode significar a “indústria” da hospitalidade, que
abraça todos os serviços do turismo, principalmente os de hospedagem e alimentação
(WALKER, 2002). Muitas vezes a hospitalidade pode até tomar o lugar do termo
turismo e há grandes discussões sobre se são industrias independentes, se são a
mesma coisa ou se a hospitalidade merece ser considerada como um campo de
estudo único e não só uma linha de pesquisa dentro do turismo (CAMARGO, 2002).
O conceito original de hospitalidade, aquela desinteressada, pura e genuína, é
complexo e muitas vezes ambíguo (GOTMAN, 2009, 2011). Esse conceito remonta,
assim como a noção mais simples do turismo, também a milênios, sendo reconhecido
desde os primórdios de nossas civilizações, ambas orientais e ocidentais (CAMARGO,
2004; MONTANDON, 2011; WALKER, 2002). Ao contrário de diversas vertentes
acadêmicas que ensinam a hospitalidade como um processo de gestão de
infraestruturas e serviços turísticos voltados exclusivamente bem-estar do cliente,
esse conceito, dentro de uma abordagem holística, é uma via de aprendizado entre o
56
ser acolhedor e o ser acolhido, onde ambos crescem e aprendem mutualmente, pelos
princípios de alteridade de Levinas, os quais propõem
a superação da pedagogia do Eu, fechado, bem como de um Outro que se apresenta possessivo nos relacionamentos. A relação ética, ou melhor, a pedagogia utópica levinasiana é o Eu e o Outro, abertos para o infinito, abrigados pela pedagogia da hospitalidade” (SÍVERES e MELO, 2012).
Para essas vertentes acadêmicas voltadas exclusivamente à gestão de serviços e
infraestrutura turística, pode-se tomar a hospitalidade simplesmente como o ato de
BEM receber, aparecendo no fenômeno turístico quando há uma percepção de “boa
qualidade” na prestação de serviços. Assim, a hospitalidade recebe conotações
qualitativas nas esferas sociais, políticas e religiosas dependendo do seu contexto
cultural. Porém, a hospitalidade permeia todo o fenômeno turístico, a todo o momento,
e não somente se há qualidade nos serviços (KORSTANJE, 2010). A qualidade dessa
hospitalidade é outra questão, relacionada ao teor das relações entre os sujeitos do
turismo.
Para esse estudo adotar-se-á o conceito de hospitalidade de Levinas e Gotman. Deve-
se encarar a hospitalidade como a arte de acolher pessoas, não somente no turismo
como diferencial mercadológico, mas em nosso cotidiano, pode ser a “bandeira de
uma verdadeira cruzada contra a intolerância e o racismo, bem como a base de uma
democracia total” (DERRIDA, 1997, 1999 apud CAMARGO 2002). A noção deste
conceito de hospitalidade incondicional, presente na gênese alberguista, vai
contra todas as variações da noção de nacionalismo, que ele considera um fechamento, uma apropriação de uma demarcação, de uma inscrição demarcatória, uma territorialidade, uma expansão da crença de um “eu” absoluto [...] cria um espaço de compaixão, no sentido de ser possível haver uma paixão convivencial, uma paixão pelo outro, num jogo que tem conflitos, mas que, pouco a pouco, eles possam ser transformados em uma experiência de abertura (p. 07).
A hotelaria caminha lado a lado com a hospitalidade, pois faz-se necessário um local
para acolher o visitante, os hotéis são a materialização dos conceitos de hospitalidade.
Como há diversas interpretações para esse conceito, há também, diversos tipos de
meios de hospedagem. Contemporaneamente, a origem da palavra hotel é francesa
(hôtel), significando a residência do rei da França, generalizando-se posteriormente
para designar grandes edifícios públicos ou privados, os quais eram
57
residências permanentes ou de temporada, de membros da nobreza, que costumavam receber hóspedes sem, no entanto, cobrar por isso. Com o tempo institui-se a prática de hospedar não necessariamente convidados, e sim aqueles que pudessem pagar pela experiência. Naquele momento, então, estabeleceu-se a relação do termo hotel como acomodações com excelência nas instalações e qualidade de serviços oferecidos (ALDRIGUI, 2007, p. 24).
A história do Brasil, de nossa formação social e hoteleira difere da realidade francesa.
É, portanto, de extrema importância para o entendimento do fenômeno turístico
brasileiro e consequentemente da formação das características de seus meios de
hospedagem, fazer um levantamento histórico dentro da ótica socioespacial e
materialista, com foco na hospitalidade, turismo e nos meios de hospedagem, com o
auxílio de Bóris Fausto (2006) e Sérgio Buarque de Holanda (1936). Esses dois
autores permitem uma análise socioespacial crítica que contempla o materialismo na
sociedade brasileira, fazendo jus ao tema desse estudo. No contexto histórico da
hotelaria, esse estudo apropria-se das descrições e análises realizadas por Castro,
Guimarães e Magalhães (2013), Trigo (2002) e Valenzuela (2013), que retratam o
panorama do turismo brasileiro. No entanto, mesmo compartilhando similaridades
com a hotelaria, os hostels nasceram de outro contexto socioespacial e possuem um
referencial teórico diferenciado, como se mostra a seguir.
Os hostels, é o principal tema desse estudo. Em definição básica e rudimentar, sem
contar com suas conotações socioespaciais, filosóficas e culturais, esses são
estabelecimentos
baratos que acolhem diferentes hóspedes num mesmo aposento. Oferecem serviços básicos como camas ou beliches, com roupa de cama modesta e limpa, toalhas e bons chuveiros. Os aposentos são divididos em masculinos e femininos [...] a grande clientela desse tipo de hotel é formada por estudantes que viajam com pouco dinheiro (CAMPOS, 2005, p. 87).
No entanto, quando foi criado o primeiro albergue da juventude, entre seus principais
objetivos estavam o de proporcionar o entendimento entre as pessoas, o ato de viajar
a jovens estudantes e amenizar as mazelas criadas pelo cotidiano da vida em cidades
pós-industriais da Alemanha, no início do séc. XX, com base na filosofia dos
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Wandervogels7. Isto, em uma época em que o turismo dava seus primeiros passos e
uma simples viagem para jovens estudantes era uma grande aventura. Ao mesmo
tempo este tipo de hospedagem tinha o objetivo de prover segurança, conforto,
hospitalidade e o crescimento pessoal e social de seus hóspedes (HEATH, 1962;
COBURN, 1950; TROTTA, 1978; GIARETTA, 2003).
Inicialmente, em sua gênese, este meio de hospedagem agia como viabilizador de
viagens para jovens estudantes. Esses estavam, até então, praticamente
impossibilitados realizar viagens a campo, ou em casos extremos dormiam a céu
aberto, desprovidos de qualquer conforto ou segurança. Schirrmann idealizou um local
que se aproximasse o máximo possível, uma sala de aula e a casa dos alunos, quando
em viagens. Até os dias de hoje, esse meio de hospedagem busca assegurar que as
atividades realizadas nesse local complementem e avancem os elos sociais sobre os
quais ele opera, por exercer a sensibilidade para os assuntos sociais, culturais e de
patrimônio (UNWTO, 2010, p. 26).
No Brasil, este tipo de hospedagem teve seu início no final da “década de 60, década
da geração pé na estrada, do movimento hippie e dos movimentos estudantis no
mundo” e, em 1971, foi criada a Federação Brasileira dos Albergues da Juventude
(HI-Brasil) e nosso país passou a fazer parte do Movimento Alberguista
(HOSTELLING INTERNATIONAL-BRASIL, 2009). Trotta (1978) define os albergues
como um meio viabilizador das viagens para os jovens, que propicia o contato com o
meio ambiente, os valores culturais dos locais visitados, promove a compreensão e
união entre as culturas do mundo, “funcionando um pouco como clube, como colégio
e até mesmo como prolongamento do lar [grifo nosso]” (p. 17).
Sabe-se que os hostels “variam de região para região, mas as características gerais
são as mesmas, ofertam dormitórios, toaletes separadas por sexo, sala de estar e
cozinha, e são regidos por uma filosofia mundial [grifo do autor]” (TROTTA, 1978,
p. 17). Portanto, eles vão além de uma estrutura física e serviços. Esses locais devem
promover o intercâmbio cultural, possibilitando que jovens e adultos conheçam
7 Um movimento popular da juventude alemã estabelecido em 1901 que enfatizava o convívio com a
natureza, a liberdade, a auto-responsabilidade e o espírito de aventura. Este movimento acabaria por influenciar os hippies norteamericanos na década de 60 (COBURN, 1950).
59
culturas diferentes, aprendam a respeitar as peculiaridades de cada povo, o meio
ambiente e a conviver em sociedade. Tendo em vista que a filosofia alberguista é que
pessoas de
todo o mundo conheçam, [lugares e] culturas diferentes e aprendam a respeitar as peculiaridades de cada povo e a conviver em sociedade, contribuindo para formação do jovem. Os hostels prezam pelo espírito de amizade, o sentimento de solidariedade e o desejo de viajar. Ser alberguista é sobretudo amar a liberdade, dignificar a convivência humana e o respeito (HOSTELLING INTERNATIONAL, 2014).
Giaretta, adotando as definições já mencionadas, continua a contemplar a herança
histórico-cultural, e define os albergues da juventude como um meio de hospedagem
alternativo à hotelaria convencional e “associativo8 [...] um ambiente descontraído, no
qual se cria a oportunidade de encontrar pessoas e de formar um maior círculo de
amizades com outras pessoas que viajam o mundo buscando conhecer o máximo e
gastando o mínimo (2003, p. 79). Ainda sobre os albergues da juventude, Fuster
também enaltece o caráter social desses empreendimentos, afirmando que a missão
destes meios de hospedagem é “estimular o espirito de compreensão entre as nações,
especialmente facilitando o turismo internacional” (1974, p. 381) podendo, assim, agir
diretamente na conservação do patrimônio das localidades em que estão situados.
Finalmente, deve-se lembrar que essas definições devem procurar respeitar uma
filosofia, materializada nesse meio de hospedagem.
8 Associativo: dado a associar, agregar, unir, ajuntar (duas ou mais coisas ou pessoas); reunir em
sociedade; estabelecer uma correspondência entre dois conjuntos (FERREIRA, 2004). Essa definição de associativo vem corroborar com as noções de hospitalidade que serão expostas posteriormente, noções essas que fazem parte da essência dos hostels.
60
2 A GÊNESE ALBERGUISTA
Primeiramente, é necessário considerar os movimentos sociais e revolucionários da
Alemanha, entre o período pós revolução industrial até a primeira grande guerra
mundial, influenciaram diretamente a gênese dos albergues da juventude.
Posteriormente, analisa-se a chegada deste meio de hospedagem na América do
Norte e no Brasil, no intuito de traçar suas similaridades, assim como suas diferenças.
2.1 O contexto socioespacial anterior à gênese alberguista
Sobre a época precursora ao movimento juvenil alemão, que inspirou a criação dos
albergues da juventude, é importante saber que grande parte da Europa havia
vivenciado um avanço econômico e tecnológico sem precedentes, entre os anos de
1860 e 1900, em decorrência da Segunda Revolução Industrial (COBURN, 1950;
ENGELS, 2009; HEATH, 1962; LAQUEUR, 1962). Durante essa época, o país
europeu que ocupou a liderança, foi a Alemanha. No entanto, nem todas as classes
sociais experimentaram os mesmos padrões de vida e benefícios oferecidos por essa
nova revolução industrial, gerando grandes tensões sociais e “não faltavam exemplos
de sérios sintomas de declínio cultural naquele mundo de grande e rápido crescimento
e avanço tecnológico” (LAQUEUR, 1962, p. 03).
Antes da mecanização na fabricação de matérias primas, esse processo ocorria sob
a supervisão do trabalhador, sob seu conhecimento e dentro de sua propriedade
(CASTRO, 2012). O trabalhador, que vivia principalmente no campo, dominava o
método de produção e detinha grande parte do lucro do seu trabalho, pois no mundo
Feudal, o meio de produção era a terra, ou seja, o campo. Os feudos eram
praticamente autossuficientes. Como consequência
os trabalhadores viviam uma existência relativamente confortável, levando uma vida correta e pacifica em toda sua devoção e honestidade. Sua posição material era bem melhor do que a de seus sucessores. Eles não precisavam trabalhar em demasia, eles não faziam nada além daquilo que escolhiam fazer e ainda assim conseguiam o que queriam. [...] eles eram, na maior parte, pessoas fortes, bem construídas [...] suas crianças cresciam no ar fresco do campo e se eles pudessem ajudar seus pais isso era feito ocasionalmente [grifo nosso] (ENGELS, 2009, p. 16).
61
As crianças e os jovens dessa época (os quais posteriormente seriam os semeadores
de movimentos sociais na Alemanha) viviam até então, dentro de uma “simplicidade
e intimidade idílicas com seus pais até o casamento [...], frequentavam regularmente
a igreja, nunca falavam de política, nunca conspiravam [e] eram extremamente bem-
dispostos para com as ‘classes superiores’” (ENGELS, 2009, p. 17). Os movimentos
juvenis da Alemanha pregavam uma volta aos modos mais simples de vida, um
contato maior com a natureza. Mas não pregavam um regresso puro ao estado em
que a sociedade se encontrava anteriormente. As ideologias desses movimentos
eram fundamentadas na educação juvenil, no resgate da cultura popular, através da
poesia, teatro e principalmente através da música (COBURN, 1950; HEATH, 1962).
A revolução industrial transformou o jovem camponês em uma simples peça produtora
a serviço das classes superiores, através da desapropriação de suas terras e do
conhecimento sobre o modo de produção. Como consequência, houve “uma rápida
multiplicação do proletariado, a destruição de toda posse de propriedades e da
segurança do trabalho da classe trabalhadora, a desmoralização da mesma e
[consequentemente] insatisfação política” (ENGELS, 2009, p. 20). Essa
desmoralização chega ao ponto de extinguir a moral e os costumes, principalmente
dos jovens camponeses recém-chegados à cidade (MARX e ENGELS, 1998). Agora,
com a centralização da propriedade e dos modos de produção nas mãos das classes
“superiores”, a relação entre os trabalhadores é, principalmente, de rivalidade. Mas
esta condição é mutável, pois através das lutas entre classes, do embate entre
opostos, transcende para algo novo (LEFEBVRE, 2009; MARX e ENGELS, 1998).
À precariedade desse panorama socioespacial, somam-se as péssimas condições de
higiene, saúde, alimentação e segurança dos trabalhadores nas novas cidades recém
industrializadas. As condições de vida eram tão desmoralizantes que o trabalhador
era rebaixado a um estado sub-humano de existência, em prol do desenvolvimento e
bem-estar poucos. Isso se tornou insuportável e as relações interpessoais entre a
grande massa humana era cada vez mais fria e distante, o ser humano se tornava
cada vez mais alienado. Alienado ao modo de produção que ajudava a realizar,
privado dos dividendos resultantes dessa produção, alienado até mesmo da sua terra,
da natureza que agora era vista como empecilho, e alienado do seu semelhante.
62
O homem era impotente, insignificante, apenas uma pequena peça da máquina da
revolução industrial, um mero escravo (MARX e ENGELS, 1998). Por mais que esses
indivíduos estivessem extremamente próximos uns aos outros, fisicamente, “o brutal
interesse [e competição individual], a insensível alienação de cada um em seu próprio
mundo se torna cada vez mais repelente e ofensiva” (ENGELS, 2009, p. 37). A noção
de que somos seres humanos, especiais, parte de um todo, é extinguida. Essas novas
relações humanas resultam na “dissolução da humanidade em mônadas, as quais
cada indivíduo tem um princípio e propósito separado dos demais, o mundo de átomos
é aqui exercido aos extremos” (ENGELS, 2009, p. 37). Dentro do novo contexto social,
o indivíduo, uma vez nascido para labutar, não teria outra opção ou perspectiva
durante o resto de sua existência que trabalhar para manter sua condição atual,
vivendo em permanente estado de dependência patronal e alienação. Dentro desta
nova vigência socioeconômica, o ser humano é privado da possibilidade de mudança,
de superação, de transcendência (LEFEBVRE, 2009).
Engels descreve as desumanas condições de vida na cidade de Manchester,
Inglaterra, afirmando que especificamente, “em um buraco fundo, numa curva do rio
Medlock, cercado nos quatro lados por grandes fábricas e altos taludes, fica um grupo
de aproximadamente 200 casebres, donde vivem cerca de 4000 seres humanos”
(2009, p.72). Estes casebres eram pequenos, extremamente sujo e velhos, alinhados
lado a lado e de fundos conjugados também, davam de frente para ruas desalinhadas,
sem drenagem d’água, esgoto e pavimentação. Como consequência as casas, com o
passar do tempo, começam a apodrecer, e grandes quantidades de resíduos
de carne putrefata, das mais diversas imundícies repugnantes encontram-se em meio a poças de água parada em todas as direções; a atmosfera é envenenada pelas emanações desses resíduos, e carregada e escurecida pela fumaça de uma dúzia das altas chaminés das fábricas. Uma horda de mulheres e crianças [grifo nosso] vaga em meio às ruas, tão suja quanto os porcos que prosperam dos montes de lixo e das poças d’água. A raça que vive nesses casebres em ruinas, [...] vivendo em porões escuros e úmidos, em sujeira e fedor impossíveis de se medir, depositados nessa atmosfera como se tivessem um propósito, essa raça deve realmente ter chego ao nível mais baixo da existência humana (ENGELS, 2009, p.72).
Dentro desse contexto é essencial saber que a burguesia usurpava o trabalhador,
alienava-o e excluía-lo de qualquer consideração socioeconômica. Os salários
semanais eram tão baixos que, após a burguesia ter adquirido sua comida, eram
63
poucos os trabalhadores que possuíam algum capital para convertê-lo em alimento.
Os alimentos adquiridos, após quase uma semana de armazenamentos em condições
imundas, encontravam-se em condições, no mínimo, precárias. As
batatas eram pobres, os vegetais murchos, o queijo era velho e de baixa qualidade, o bacon ranço. A carne é magra e rígida, tirada de gado velho, geralmente adoecido ou de uma carcaça, morto de causas naturais, a qual não estava fresca nem em quando foi encontrada, e as vezes já em estado de decomposição. [Estes eram os ingredientes] que compõem o jantar de Domingo das classes mais pobres (ENGELS, 2009, p. 80).
Consequentemente as condições de saúde da população pobre desse período na
Inglaterra, e similarmente na Alemanha, são tão precárias quanto as descritas
anteriormente. Os médicos de Edimburgo, Escócia, que atendiam em casa as famílias
mais pobres descrevem a Engels (2009) que devido à ausência de um sistema de
esgoto e até mesmo a falta de latrinas nas casas,
todos os resíduos, lixo e excrementos de, no mínimo, 50000 pessoas, são jogados nas ruas todas as noites. Apesar da limpeza feita diariamente, uma massa de lixo seco e vapores repugnantes são criados a partir destes, os quais não somente ofendem a visão e o olfato, mas também ameaçam a saúde dos habitantes em um grau máximo. [Todos] testemunharam que os níveis de doenças, miséria e desmoralização chegaram aos mais altos possíveis (p. 48).
Chega-se à conclusão geral de que as grandes cidades britânicas são habitadas
principalmente por trabalhadores, que vivem sem nenhuma propriedade em seus
nomes, sobrevivendo apenas de baixos salários que são gastos quase que
exclusivamente com comida em condições de consumo inadequadas. A sociedade
que se encontra no poder “composta inteiramente de átomos, não se preocupa com
os demais, [...] e não lhes dispõe as condições necessárias para que estes consigam
se manter de maneira eficiente e permanente (ENGELS, 2009, p. 85). Cada
trabalhador, que se encontra em um estado de alienação e desmoralização, é exposto
frequentemente à perda de seu trabalho, consequentemente à incapacidade de obter
comida, recorrendo ao roubo ou morrendo por inanição ou doenças decorridas do
estado pútrido de suas habitações. Não há colaboração entre trabalhadores, pelo
contrário, o que se nota é a acirrada competição por trabalho e comida. O senso de
humanidade, de empatia é completamente extirpado desses “seres humanos”. De
acordo com Engels (2009), vivem como animais e com os animais, alheios à todas as
regras e benefícios de uma sociedade moderna, “lutando por pela vida, pela
64
existência, por tudo, [...] essa batalha ocorre não somente entre indivíduos de classes
diferentes, mas também entre indivíduos da mesma classe” (p. 87). As mazelas
decorrentes dessa condição, além de algumas já citadas anteriormente, são muitas.
Como alcoolismo, prostituição e altas taxas de criminalidade. Mas é a desmoralização
do ser humano, a alienação, ausência de cultura e educação fazem com que esta
condição se perpetue até a situação torna-se insuportável.
2.2 As raízes alberguistas europeias
O movimento alberguista contemporâneo, possui suas raízes na Alemanha, poucos
anos antes da Primeira Guerra Mundial, quando o professor Richard Schirrmann
percebeu a necessidade de um tipo de acomodação especial para seus estudantes
enquanto em viagens de campo pelo o interior da Alemanha (GRASSL e HEATH,
1982). Para compreender melhor os motivos de Schirrmann (figura 10), deve-se
procurar entender os aspectos socioespaciais de sua época. As condições de vida da
juventude alemã pós revolução industrial (que eclodiram em uma série de movimentos
sociais, dos quais o Wandervogel é o primeiro e mais representativos deles)
influenciaram diretamente Schirrmann na criação dos Jugendherbergen9.
Figura 10 – Foto de Richard Schirrmann (1930)
Fonte: http://hostelliviesti.fi/
9 Em tradução literal para o inglês a palavra em alemão Jugendherbergen significa Youth Hostel, termo
adotado pela HI, que no Brasil foi traduzido como Albergue da Juventude.
65
O termo wanderlust (sede por viagem ou desejo de vagar/percorrer/perambular) é
essencial para o entendimento da filosofia alberguista. Este termo representava uma
tradição entre artistas e estudantes da Europa Central, principalmente na Alemanha,
e significava, entre outras ideais, o desejo por liberdade, a rebelião pacífica contra a
sociedade vigente da época, o regresso e contato íntimo com a natureza, o retorno às
raízes culturais populares e o entendimento entre as pessoas (COBURN, 1950;
GRASSL e HEATH, 1982; HEATH, 1962; LAQUEUR, 1962). Desse desejo por
liberdade – não somente através do contato com a natureza, mas como o que Hegel
propõe, de ir além da sociedade civil, criando-se uma alternativa (CIOTTA, 2007) –
deu origem a um novo movimento juvenil na Alemanha recém-formada, que provocou
uma revolução nos hábitos de um grande número de jovens, deixando suas
influências filosóficas marcadas por toda a Europa e, na sequência, nos E.U.A. e nos
demais países ocidentais, o Wandervogel (COBURN, 1950; GRASSL e HEATH, 1982;
HEATH, 1962; KENNEDY, 1998; LAQUEUR, 1962).
Para Assunção (2012), o ato de viajar, naquela época, representava
um sonho. Novos espaços, culturas, [...] um outro mundo de experiências que se pode compartilhar. A procura por viagens em terras distantes fazia parte de um processo formativo dos homens. Uma ousadia que muitos aventureiros empreenderam na busca de um amadurecimento intelectual e espiritual. Conhecer o estranho e o diferente era uma forma de se educar. Saber olhar o mundo fazia parte de um processo de aprendizagem (p. 77).
As raízes do Wandervogel podem ser traçadas até 100 anos antes desse período, a
uma época chamada de Burschenschaft (Tempestade e Estresse) que provocou uma
revolta artística, expressada principalmente na literatura, contra as regras da
sociedade industrial, do classicismo, contra o governo prussiano e a repressão das
emoções individuais. O movimento nascera do romanticismo (ou romantismo) alemão,
colocando-se deliberadamente contra uma sociedade que via a natureza e seus povos
vizinhos como algo a ser dominado e modificado para se adequarem à nova regra
social e econômica. Eles expressavam uma luta contra a falta de atenção à juventude
e incentivo à cultura popular da época, contra a opressão social vinda, agora, dos
senhores industriais (COBURN, 1950). A crise cultural a qual vivia a Alemanha, um
66
país recém unificado10, dividiu ainda mais sua população, a qual necessitava
drasticamente de um senso de união. O Movimento Juvenil Alemão foi, em sua
essência, “uma forma de oposição apolítica a uma civilização que tinha pouco a
oferecer à geração jovem, um protesto contra a falta de vitalidade, calor humano,
emoção e ideais” (LAQUEUR, 1962, p. 04).
Os Wandervogels possuíam características únicas que o fazem um movimento
altamente idealista e romântico, que lutava contra algumas normas da sociedade
germânica e buscava um retorno a um modo mais simples de vida, uma aproximação
com a natureza, através do folclore e das artes (COBURN, 1950; HEATH, 1962). Em
alguns aspectos o movimento possuía, além de sua essência romântica, nuances
medievais (LAQUEUR, 1962). Em sua primeira fase, entre os anos de 1900 e 1914,
fase essa que é a mais relevante ao presente estudo, os Wandervogels queriam,
primordialmente
serem integrados como seres humanos [...] pois se consideravam como uma parte crítica da sociedade que não estava inserida na condução do seu próprio desenvolvimento. Sentiam fortemente o que uma geração de filósofos chamava de alienação. [...] eles queriam uma mudança nas relações humanas e não havia certeza de que estas mudanças pudessem ser alcançadas através do novo sistema político-social. [...] Os Wandervogels escolheram uma outra forma de protesto, o romanticismo. Sua volta à natureza era romântica, assim como suas tentativas de fugir de uma civilização materialista, sua ênfase era em uma vida simples, uma redescoberta das velhas canções populares e folclore (LAQUEUR, 1962, p. 06).
Os românticos, de acordo com Laqueur (1962), prezavam pelo campesinato e se
opunham ao crescimento da indústria e do comércio. O indivíduo desse movimento,
por rebelião, ao invés de entrar em conflito direto, ou até armado, com a sociedade,
escolhia se isolar na natureza. Além disso, um estado opressor tem como
potencialidade a criação de classes sociais alienadas, onde o indivíduo alienado,
sente-se isolado, separado da máquina social. Em uma situação extrema de alienação
10 A unificação oficial da Alemanha em um estado nação politicamente e administrativamente integrado
ocorreu em 18 janeiro de 1871 no Hall do Palácio de Versailles dos Espelhos na França. Diversos píncipes dos estados alemães se reuniram ali para proclamar Wilhelm da Prússia como Imperador Wilhelm do Império Alemão. Posteriormente, o Tratado de Frankfurt foi assinado em 10 de maio de 1871, ao final da Guerra Franco-Prussiana, estabelecendo as fronteiras entre a Terceira República Francesa e o Império Alemão, que envolveu a cedência de 1.694 aldeias e cidades, até entao sob o controle francês, para a Alemanha (SHEEHAN, 1993).
67
o indivíduo pode ser isolar por completo, criando sua própria realidade, ou uma
sociedade alternativa. A partir do zero, ou do caos completo, algo novo pode florescer.
O estilo do movimento também pode ser comparado ao dos Wandering Scholars (trad.
Acadêmicos Errantes) da Idade Média, os quais eram um grupo de filósofos e parte
do clero de países como a França, Alemanha, Espanha e Itália, que protestavam
contra as crescentes contradições dentro da igreja através da música, da poesia e
performance, muitas vezes dentro de um cenário carnavalesco (WELLBERY e RYAN,
2005). Os primórdios do movimento caracterizavam-se pela informalidade e falta de
uma hierarquia devido à anarquia inerente, faltava também objetivos, além do simples
vagar por vagar. Para os Wandervogels, o vagar
era uma arte, devendo ser intencional, e aqueles que escolhessem engajar nesse ato deveriam aprender a serem observadores, se tornarem mais familiares com a terra mãe e seus povos. Essa educação através do vagar [ou viajar] deveria produzir um novo alemão, o qual tinha um conhecimento melhor e mais completo de seu país, e sua identificação e amor com a esse era profundamente enraizada na sua experiência pessoal (LAQUEUR, 1962, p. 07).
Essa fase inicial do movimento retrata a essência dos Wandervogels, onde sua
filosofia está ligada diretamente à gênese alberguista contemporânea. Os
organizadores do movimento perceberam que uma noite bem dormida, mesmo que
não fosse sob o céu cheio de estrelas, como defendia as raízes do movimento, traria
melhores condições físicas e morais ao grupo, propiciando caminhadas mais
agradáveis no dia seguinte, sem contar quando o tempo era totalmente inóspito.
Percebe-se aqui as primeiras mudanças filosóficas quanto ao modo de pernoitar do
movimento Wandervogel (COBURN, 1950; HEATH, 1962). A filosofia transitava de
uma forma totalmente purista rumo à organização de uma classe social, em busca por
um meio de hospedagem que pudesse suprir as necessidades especiais desse grupo
de pessoas.
Com o tempo o movimento passou a melhor se organizar. Foram desenvolvidos
assobios para identificação de grupos, roupas rudimentares começaram a ser criadas
para diferenciá-los dos demais camponeses e estudantes. Foi na música que o
movimento Wandervogel deixou seu maior legado, ele propiciou um renascimento da
música popular alemã, a qual havia sido negligenciada por um longo tempo, sendo
68
que “[...] as canções compostas pelos Wandervogels são conhecidas e cantadas até
hoje em qualquer lugar onde a língua alemã é falada; estas canções se tronaram as
verdadeiras canções folclóricas da Alemanha” (LAQUEUR, 1962, p. 19). No entanto,
de acordo com Laqueur (1962) toda essa produção cultural era um subproduto do
movimento, e a
autêntica e mais profunda experiência do movimento juvenil é difícil de descrever e talvez impossível de analisar: a experiência de caminha à noite e ao nascer do sol, a atmosfera de uma fogueira em um acampamento, as amizades que afloravam. Profundos acordes emocionais eram tocados; a genuinidade dessa experiência não pode ser duvidada. Para muitos [...] era uma estimada experiência que ainda é lembrada e será por toda a vida (p. 19).
No início do movimento a preparação e planejamento das viagens à natureza eram
bem casuais, pois “não havia, ainda, uma rede de albergues da juventude que
facilitasse o planejamento de estágios sucessivos em um itinerário” (LAQUEUR, 1962,
p. 28). Esse mesmo autor ainda relata que, após retornarem dessas viagens,
relatórios eram preparados, descrevendo as experiências pessoais e os aspectos
técnicos da viagem, como condições das trilhas, tempo de viagem entre um ponto e
outro. Para esses relatórios técnicos, “desenhos, pinturas e fotografias eram coletados
e sua a qualidade do material era satisfatória, esses eram publicados em forma de
livro” (p. 28). Nasce aqui os primeiros guias de viagens para o futuro turismo da
juventude ou turismo backpacker, representados hoje principalmente pelo guia Lonely
Planet. A composição inicial do movimento, que era mais individualista e de certa
forma anárquica, havia mudado para uma forma mais coletiva apesar dos ideais
básicos permanecerem alterados.
Logo o Movimento Juvenil Alemão se estendeu além dos limites de Berlim e entre os
anos de 1904 e 1907, Viena e Praga já possuíam representações da filosofia
Wandervogel entre os jovens de suas escolas. No entanto a composição
predominantemente católica dos Habsburgos11, mudou fundamentalmente as
11 A Monarquia dos Habsburgos é uma denominação não oficial entre os historiadores para os países
e províncias, que eram governadas pelo ramo austríaco da Casa de Habsburgo de 1526 até 1780 e, em seguida, pelo ramo sucessor de Habsburgo-Lorena até 1918. A monarquia era um estado composto composto de territórios dentro e fora do Sacro Império Romano, unidos apenas na pessoa do monarca. A capital dinástica era Viena, exceto 1583-1611, quando foi transferida para Praga. De 1804 a 1867, o Império Habsburgo foi formalmente unificado como o Império Austríaco, e de 1867 a 1918 como o Império Austro-Húngaro (BRITANNICA, 2014).
69
características do movimento na Áustria, tomando uma consciência política mais ativa
e menos voltada ao “paganismo” (LAQUEUR, 1962). Apesar dos maus olhos postos
sobre o Wandervogel pela igreja, monarquia e demais partes da sociedade alemã, o
movimento “agiu como um importante corretivo à personalidade egoísta que, nem a
escola ou a educação parental, poderia, naquela época, provir jovens daquela idade
com a autodisciplina e senso de camaradagem que o movimento juvenil demandada
de cada membro” (LAQUEUR, 1962, p. 30). A filosofia Wandervogel era a porta de
entrada para valores éticos e estéticos negados à juventude alemã daquela época.
O coração geográfico do movimento era a região de confluência dos estados da Baixa
Saxônia, a Turíngia e o Hesse (figura 11). Não é à toa que os praticantes desse
movimento escolheram essa região para suas caminhadas, pois aqui encontra-se a
região de natureza mais bem preservada do país, o começo dos alpes que culminam
na fronteira entre a Suíça e Áustria e, até hoje, o estado de Hesse é o mais bem
preservado ambientalmente, com 42% de seu território coberto por florestas
(HESSEN, 2010).
Figura 11 – Mapa da localização geográfica do movimento Wandervogel
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
70
Em uma sociedade predominantemente protestante e rural, o comportamento dos
Wandervogels ganhou um número razoável de participantes e simpatizantes, ao
contrário de regiões onde havia a presença forte do catolicismo e judaísmo. Aos olhos
das quais estes atos eram vistos como demonstrações perigosas de paganismo. Parte
dos imigrantes alemães que foram povoar a américa do Norte, entre o período de
guerras e após a Segunda Guerra Mundial, provinham dessa região e/ou faziam parte
desse movimento ou outros similares. Estes imigrantes, posteriormente, acharam a
liberdade que procuravam nas terras ainda relativamente virgens e despovoadas do
novo mundo. Não muito tempo após sua chegada eles foram semeadores
fundamentais do movimento hippie norte-americano nos anos 60 (KENNEDY, 1998).
Os albergues da juventude chegaram ao Brasil junto com a o apoio e participação da
geração “pé na estrada”, dos hippies brasileiros e dos estudantes dos anos 70
(HOSTELLING INTERNATIONAL-BRASIL, 2009).
Em um acontecimento marcante da história do movimento, mais de quatro mil jovens
peregrinaram através de toda a Alemanha, muitos deles a pé, até a região
montanhosa de Hoher Meissner e se reuniram para explorar a natureza, cantar e
dançar. Esta reunião marca o fim da primeira fase dos Wandervogels. Inúmeros
discursos, alguns deles altamente inflamados e cheios de caráter social e
revolucionário, incendiaram muitos dos participantes. Deste ponto em diante o
movimento deixa, cada vez mais, seu lado romântico e idealista, adquirindo,
gradualmente, um caráter revolucionário, procurando mudar a sociedade vigente ao
invés de simplesmente proporcionar uma experiência intimista aos seus membros.
Esta fase do movimento, apesar de ser importantíssima para o seu entendimento, não
é relevante para o presente estudo, pois a filosofia inicial, que insemina os albergues,
é aos poucos modificada por outros ideais.
Eventualmente o movimento juvenil tanto na Alemanha, quanto na Áustria e República
Tcheca nunca superou a divisão social existente e nunca se tornou um movimento
capaz de mudar drasticamente a sociedade de sua época. A sociedade ocidental
começou a se tornar cada vez mais individualista e alienada, afastada da natureza e
do entendimento entre seus pares. Além disso, outros motivos contribuíram para a
extinção dos Wandervogels. A Primeira Grande Guerra freou qualquer chance de
71
viagens em meio à natureza e os jovens já aptos foram alistados à guerra. Poucos
anos antes à Segunda Grande Guerra, o partido nazista, praticamente recém fundado
após o termino da Primeira, viu nos Wandervogels a “mão de obra” perfeita. A
juventude Wandervogel, extremamente conhecedora de seu território e em excelentes
condições físicas foi destituída de suas vestimentas, de seus cantos, de sua poesia e
de seus ideais. Foram incutidas em suas mentes, assim como à toda a população
alemã, ideias nacionalistas exacerbadas, onde o estranho agora era visto como
inimigo, um problema a ser extirpado (COBURN, 1950; HEATH, 1962).
De qualquer modo, a essa altura, os albergues da juventude já haviam sido criados e
disseminados por grande parte da Europa. Schirrmann fez com que os ideais originais
dos Wandervogels (figura 12) fossem assimilados aos albergues. Diferente do caráter
revolucionário do movimento juvenil alemão, seu maior objetivo era simplesmente
aliviar a opressão e miséria sentida pelas crianças das grandes cidades germânicas,
através de viagens ao interior do país (HEATH 1962). Ele percebeu que essas viagens
poderiam lhes oferecer muito mais do que um conhecimento científico sobre o assunto
visto em aula, pois a apenas “alguns passos, eles estariam no interior, sob o céu,
livres, à luz do sol e à brisa” (COBURN, 1950, p 10).
Figura 12 – Foto dos Wandervogels em viagem (1901)
Fonte: 100 Anos de caminhadas http://www.nwv.de (2001).
Richard Schirrmann almejava pela aproximação dos indivíduos e desses com a
natureza, antes vista como inimiga. Visionava um retorno à uma vida mais simples e
72
satisfatória, onde, o aprendizado fosse continuo e onde reinasse a felicidade e o
entendimento entre as pessoas, características presentes até hoje em determinados
hostels e no perfil backpacker (PEARCE e FOSTER, 2007). Um local onde
a cada possível momento, em todas as estações do ano [seus alunos] pudessem estar ao ar livre, fora do confinamento espacial da sala de aula. Em caminhadas e aulas “alfresco” (ao ar livre) seus pupilos aprendiam história natural e geografia de uma maneira que nenhuma escola ou livro poderiam lhes ensinar, isto foi a fundação da sua teoria da “Die Wandernde Schule” (The Roaming School), a Escola Itinerante (HEATH, 1962, p. 08).
No início de suas aulas ao ar livre, de sua Escola Itinerante, as viagens duravam
apenas uma manhã ou uma tarde. Com o passar do tempo ele percebeu a
necessidade de estender suas lições, o que passou a exigir locais para pernoitar seus
alunos. Nesse período, esses pernoites eram realizados como os Wandervogels no
início de sua fundação, ao ar livre ou em acampamentos e celeiros de fazendeiros que
decidiam, de boa vontade, atendê-los. Esses pernoites em celeiros representavam
atos similares à hospitalidade genuína experimentada pelos primeiros viajantes de
nossa civilização, o acolhimento desinteressado de estranhos por estranhos
(MONTANDON, 2011).
Nesses casos os anfitriões, seres acolhedores, percebiam a necessidade de ajudar
estranhos, os seres acolhidos, em situação de dificuldade (HEATH, 1962). Na primeira
noite de uma de suas viagens de campo, planejada para se estender por oito dias, “o
grupo foi confortavelmente acolhido em um celeiro, onde o fazendeiro gentilmente lhes
providenciou cobertores e lhes deu leite e ameixas” (HEATH, 1962, p. 13). A
demonstração de hospitalidade materializa-se aqui, através da promoção de abrigo e
da dádiva do alimento dentro das condições do ser acolhedor, por mais simples que
esse possa ser (MONTANDON, 2011). Com o tempo, a culinária torna-se parte
integrante da experiência em um albergue da juventude (HEATH, 1962). Assim é,
também, com o turismo, a culinária e/ou a gastronomia representam a outra face da
hospitalidade, a primeira sendo a acomodação (KRAUSE e BAHLS, 2013).
Próximo ao final de sua viagem o grupo foi surpreendido por uma forte tempestade. O
único lugar que pode acolhê-los foi a pequena escola de uma comunidade local na
vila de Aachen. Desse contratempo surgiu uma ideia, que promoveria uma reforma
73
pedagógica e mais tarde, sem a intenção inicial de seus criadores, se tornaria uma
das maiores cadeias de hospedagem do mundo, a HI (COBURN, 1950; GRASSL e
HEATH, 1982; HEATH, 1962). Schirrmann relata
eu pensei comigo mesmo que as escolas por toda a Alemanha poderiam muito bem serem usadas para providenciar acomodação durante as férias escolares. Vilas na parte boa do país para caminhadas poderiam ter um “Youth Hostel”, situados um dos outros a um dia de distância de caminhada, recepcionando todos os jovens alemães que gostassem de caminhar (HEATH, 1962, p. 14).
Esse evento, no dia 26 de agosto de 1909, na viagem de Altena à Aachen, de acordo
com Heath (1962), marca a fundação do movimento alberguista alemão. Mas,
Schirrmann não procurava somente um lugar para passar a noite, mas um meio de
hospedagem ainda inexistente, para um tipo de viajante que estava começando a “cair
na estrada”. Ele procurava por um santuário, um lugar acolhedor onde seus alunos
pudessem se sentir em casa, bem recebidos e seguros. Acima de tudo ele procurava
manter vivo o “espírito livre dos “das Wandern” (os Vagantes) que parecia ameaçado
de extinguir-se através do crescimento do confortável materialismo da burguesia”, pois
a Alemanha, a partir da segunda metade do século XIX, passava por uma grande
mudança econômica e social, um “milagre que recentemente havia unido o Império
Alemão: a industrialização” (HEATH, 1962, p. 15).
A solução para este problema foi a de usar uma infraestrutura já existente, a das
escolas primárias alemãs, ao invés de criar, do zero, novos meios de hospedagem.
Em 1910, Schirrmann redige as primeiras regras dos albergues da juventude em uma
carta enviada a diversas escolas, pedindo a essas que se unissem em torno da ideia
de que uma rede de albergues era beneficiaria ao ensino da juventude alemã,
marcando o início dos albergues sazonais e os primeiros conceitos sobre este novo
meio de hospedagem. Para convencer as escolas Schirrmann delimitou as
responsabilidades das mesmas, ficando ao cargo dos alunos parte da manutenção e
custo do novo empreendimento. O professor ressalta, em seu pedido às escolas, que
cada criança será exigida a manter seu espaço de dormir limpo e organizado. O zelador de cada escola providenciará lençóis limpos [até hoje uma regra essencial a todo hostel]. Em cada local, um professor agira como diretor/guardião honorário [primeira denominação do papel que hoje é realizado pelo recepcionista], aceitando reservas com antecedência, [...] mantendo o livro de hóspedes, supervisionando a limpeza do hostel e das camas e administrando os recursos financeiros (HEATH, 1962, p. 17).
74
O pedido tocou o coração e as mentes de diversas escolas. Em pouco tempo vários
professores passaram a reconhecer o valor das viagens de campo para a saúde e
aprendizado de seus pupilos. Estes primeiros estabelecimentos improvisavam
colchões de palha e cobertores em uma sala de aula durante as férias de verão
escolares. Ele propôs chamar estes locais de “Jugendherbergen” e em pouco tempo
foi possível equipar o “Jugendherbergen da escola de Nette com camas ao invés de
colchões de palha (COBURN, 1950). Os visitantes vinham de longe, alunos em aula
com seus professores, estudantes independentes e os Wandervogels... E não
somente durante as férias escolares” (HEATH, 1962, p. 18). Uma estudante do colégio
de Nette relembra, a Heath (1962), a experiência de receber um grupo de alunos e
Wandervogels em sua escola como lúdica, mágica e enaltecedora. O impacto dos
Jugendherbergen fazia-se presente não apenas entre aqueles que viajavam, mas
também nos que recebiam os viajantes, o que significa a relação entre ser acolhido e
ser acolhedor, princípio básico da hospitalidade de acordo com Montandon (2011). A
hospitalidade nessa relação também pode ser inversa.
O sucesso desses albergues foi o empurrão necessário para que Schirrmann
construísse o primeiro albergue permanente (ver figura 13), dentro de uma parte do
Castelo de Altena12, em 1912, “com um design próprio, contando com dois dormitórios,
sala social, uma cozinha, lavabos e banheiros. Grandiosos beliches de madeira
harmonizavam com o estilo do castelo” (COBURN, 1950; HEATH, 1962, p. 22). Após
séculos sem uso o castelo passou por uma completa restauração em 1909, para
celebrar o 300º aniversário da incorporação dos Condados de Mark13 à Prússia,
permitindo a Schirrmann usufruir de sua excelente localização e infraestrutura. Ainda
hoje, há quartos do primeiro albergue à mostra e novos quartos foram construídos,
tornando-o o mais antigo e ainda em operação albergue da juventude do mundo. Nota-
12 Altena é uma cidade no distrito de Märkischer Kreis, Renânia do Norte-Vestefália. O castelo da
cidade, situado acima das margens do Rio Lenne, foi edificado pelos Duques de Berg no início do Século XII. Berg era um estado - originalmente um condado, posteriormente, um ducado - na Renânia, Alemanha. Sua capital era Düsseldorf, existindo como uma entidade política distinta do Século XII ao XIX. A unificação do território que viria a constituir a Alemanha, só aconteceu em 1871, sob a hegemonia da Prússia.
13 O condado de Mark (em alemão: Grafschaft Mark) era um município e estado do Sacro Império Romano no Baixo Círculo Reno-Vestefália. Ficava em ambos os lados do rio Ruhr ao longo dos rios Volme e Lenne. Os condes de Mark estavam entre os senhores Vestefália mais poderosos e influentes do Sacro Império Romano.
75
se, aqui, os primeiros princípios de reutilização e conservação do patrimônio histórico
edificado que é inerente à essência dos albergues.
Pela primeira vez na história os estudantes contavam com um tipo de acomodação
própria, adequadamente equipada, um local de encontro hospitaleiro que apesar de
“ter suas raízes no passado, olhava para o futuro” (HEATH, 1962, p. 22). Esta
configuração física está relacionada diretamente com a filosofia proposta por
Schirrmann e, posteriormente, define as características oficiais da cadeia de
albergues que estaria por vir. É neste momento que se definem os requisitos básicos
de um Jugendherbergen, que determinam também seu caráter social que perdura até
os dias de hoje. Portanto, deveria conter essencialmente (COBURN, 1950; HEATH,
1962):
Um grande quarto dormitório (que provesse abrigo, segurança e um mínimo de
conforto aos estudantes, gratuitamente ou sem custos elevados – figura 14);
Um banheiro compartilhado que pudesse servir os alunos (conferindo
condições mínimas de higiene pessoal e local);
Uma cozinha comunitária (conferindo diversas condições de hospitalidade, pois
era nesse espaço que as refeições eram compartilhadas);
Uma área social interna e/ou externa – sala, salão, terraço e/ou qualquer
ambiente amplo e sociável – onde os alunos se reuniam para as mais diversas
atividades (proporcionando um ambiente escolar nas viagens de campo,
substituindo a sala de aula, como uma escola a distância; promovendo convívio
social. Um local onde os alunos, jogavam e cantavam, discutiam os achados
do dia e planejavam a próxima incursão a campo);
A figura do Hausvater ou da Hausmutter: pessoa que residia no albergue, ou
muito próximo a este, e conhece muito bem a região (o destino turístico).
Cuidava da limpeza e, além de providenciar as refeições noturnas, também
entretinha os hóspedes e lhes ensinava sobre a cultura local, exercendo o
papel de anfitrião, mais tarde concebido na figura do recepcionista.
76
Figura 13 – Foto do primeiro albergue da juventude permanente em Altena
Fonte: Ruben Wisniewski (2008).
Estabelecia-se então os primeiros critérios que serviriam como diretrizes para a
criação das estruturas físicas e serviços deste recém-criado meio de hospedagem.
Estes critérios foram adotados na criação dos demais estabelecimentos que
compuseram a primeira associação de Albergues da Juventude na Alemanha, e são,
até hoje, respeitados pela maioria dos hostels contemporâneos (HEATH, 1962;
COBURN, 1950; TROTTA, 1978; GIARETTA, 2003; MATSIS, 2013).
Figura 14 – Foto do dormitório dos meninos
Fonte: fotocommunity © Bernd1959
77
O sucesso do Jugendherbergen Altena, motivou várias pessoas com tal confiança e
dinamismo, que em apenas alguns anos depois, em 1914, os pernoites foram
contabilizados em 17 mil e o número de estabelecimentos passou para 200. Uma
associação foi criada para manter estes albergues e Schirrmann deixou seu emprego
de professor para tornar-se o primeiro Secretário Geral da recém-formada HI da
Alemanha (COBURN, 1950; DEUTSCHE JUGENDHERBERGSWERK, 2014;
HEATH, 1962; INTO HISTORY, 2014; STADT ALTENA, 2008). A Primeira Grande
Guerra (1914-18) freou o crescimento dos albergues alemães. O pai de Schirrmann
assumiu o posto de pai alberguista no castelo de Altena, mas aquele período estava
longe de ser seguro para que jovens estudantes perambulassem pelo interior do país.
Assim, após o término do conflito Schirrmann percebeu que, por razões de
sociabilidade, hospitalidade e segurança, era essencial à existência dos albergues da
juventude que o “Hausmutter ou “Hausvater” (em inglês Houseparent14, em português
o pai alberguista), fosse uma pessoa residente permanente no albergue ou que
residisse muito próximo a esse (figura 15). As principais funções desse anfitrião eram
as de providenciar aos alunos suas refeições, permitir o acesso ao albergue apenas
aos associados, cuidar para que os alunos mantivessem o albergue organizado e
limpo, e supervisionar as demais necessidades dos alunos e do empreendimento
(COBURN, 1950; GRASSL e HEATH, 1982; HEATH, 1962).
Suas responsabilidades iam além dos detalhes técnicos da profissão recém-formada,
pois esses pais e mães alberguistas eram a “alma” do local, zelava pelo engajamento
social do grupo que se hospedava ali e sua personalidade produzia um ambiente
amigável e social que somente um albergue da juventude pode proporcionar.
Percebe-se, então, que os primeiros Jugendherbergen eram, em sua essência, uma
demonstração dos conceitos de hospitalidade de um determinado local e época,
demonstrações estas que eram regidas pelo Houseparent (hoje função exercida pelo
recepcionista) e que estão diretamente associadas ao patrimônio edificado e cultural
de um determinado local (MATSIS, 2013).
14 Em tradução literal do alemão significa “pai ou mãe da casa”. Pode-se entender, em tradução mais
liberal, como “anfitrião”, o qual é hoje conhecido como recepcionista dos albergues contemporâneos.
78
Figura 15 – Foto do café-da-manha servido pela “mãe alberguista”
Fonte: http://www.abendblatt.de/ DHJ (1950)
Grande parte da Alemanha achou uma válvula de escape no movimento alberguista.
Muitos perceberam que as viagens ao campo de forma segura, saudável e barata
eram um meio de escapar da desolação urbana em que se encontrava a Alemanha
no período pós-primeira-guerra, e neste “país dividido religiosamente, socialmente, e
até mesmo em suas atividades de lazer, a HI da Alemanha teve um valor único, ao
unir a juventude alemã de todos os planos sociais e religiosos” (COBURN, 1950, p.
13). O caráter social (integração), filosófico (liberdade) e moral (respeito) eminente na
alma da juventude alemã foi a força motriz para a e proliferação dos albergues da
juventude, os quais possuem, até hoje, esses conceitos incutidos em sua essência.
Em 1926, Schirrmann lança um livreto que marca o início da padronização física dos
albergues da juventude, ressaltando a sustentabilidade como princípio fundamental.
Em traços gerais ele aconselha novos empreendedores a criar acomodações voltadas
à juventude, pois o intuito dos albergues não era o de
construir uma fortaleza medieval sombria [...], os prédios devem acomodar a geração em ascensão, [portanto devem ser] leves, simples e funcionais, facilmente ventilados, mas ainda retendo a beleza e o calor, um local agradável de se viver. O estilo de arquitetura deve sempre ser baseado nas características nativas da paisagem onde se encontram... cada novo edifício deve ser um memorial genuíno ao nosso tempo, uma expressão da forma, um marco do qual a posteridade não se sentira envergonhada” (HEATH, 1962, p. 33).
79
Estas declarações estabeleceram os padrões dos albergues para época na Alemanha
e por consequência no mundo pelas décadas a seguir. Outras recomendações do
livreto, baseado na experiência profissional de Schirrmann, determinavam outros
padrões mínimos de áreas físicas, como um número mínimo de 30 a 40 camas,
podendo, assim, acomodar uma sala de aula inteira (HEATH, 1962). A Europa oriental
aderiu com rapidez e entusiasmo ao movimento alberguista e, em 1927, já havia
relatos de empreendimentos hosteleiros permanentes e criados especificamente com
as recomendações de Schirrmann, na Suíça e Polônia. Logos depois, em 1929, a
Áustria e República Tcheca também aderem ao movimento. No entanto, nos países
ocidentais, com exceção da França, houve um atraso considerável na aceitação
desses novos ideais, como foi o caso da Inglaterra, tão distante geograficamente e
culturalmente, onde os primeiros registros de Jugendherbergen datam de
aproximadamente 1931 (COBURN, 1950).
Também na Inglaterra o ser humano, principalmente os jovens, envolvido no processo
industrial, sentia-se usurpado e, a cima de tudo, alienado. A desapropriação do
homem do campo de sua terra, incumbindo-o de tarefas estranhas ao seu
conhecimento, o rendeu extremamente dependente de um trabalho que agora não lhe
pertencia. Essa sociedade suprimida inicia sua busca por melhores condições de vida,
assim diversas legislações foram implantadas no decorrer do século XIX que
beneficiaram, primeiramente, as crianças, depois as mulheres e, finalmente, os
homens trabalhadores nas indústrias. Estas conquistas são apenas reformas, pois
não visavam a libertação do trabalhador, não buscavam colocar o ser humano acima
do modo de produção, e sim, simplesmente, melhores condições de trabalho
(ENGELS, 2009). Se inicia, então, um processo de glorificação do trabalho ao invés
da tentativa de se sobrepor ou retomá-lo para si próprio (LAFARGUE, 2003).
O conceito de lazer começava a ser traçado e o princípio de férias pagas
gradualmente se tornava o padrão para a época. Segundo Lafargue (2003) esse direto
à preguiça, o direito ao ócio criativo, ao lazer, deveria ser usado pelo trabalhador como
um tempo para ele próprio, o tempo livre. Livre no sentido de não simplesmente estar
desocupado, mas livre intelectualmente e fisicamente do aprisionamento do trabalho,
até então idolatrado por parte da sociedade. Nesse sentido, o trabalhador deveria usar
seu tempo livre para se instruir, se iluminar, gradualmente se libertando de sua
80
condição de oprimido (LAFARGUE, 2003). Uma dessas maneiras de libertação era a
de um retorno a uma vida simples, em contato com a natureza, tomando, assim, as
rédeas de sua própria vida, como pregavam os Wandervogels (HEATH, 1962).
A juventude encontra o refúgio perfeito nos albergues da juventude. No período entre
guerras os jovens britânicos que podiam viajar, estavam redescobrindo a Alemanha e
sua bela paisagem natural, principalmente a região dos Alpes, coração geográfico do
movimento Wandervogel. Eles se hospedaram, em sua maioria, em albergues da
juventude. Ao retornarem à Inglaterra, traziam consigo relatórios exemplares deste
meio de acomodação. Os alunos britânicos imaginaram uma rede similar em seu
próprio país (COBURN, 1950). Em 1929, o Conselho Britânico da Juventude publicou
oficialmente em seu programa anual o “estabelecimento de Youth Hostels, sendo a
primeira vez que estas duas palavras estavam sendo usadas para traduzir
Jugendherbergen” (COBURN, 1950, p. 15), e nasce aqui a Youth Hostel Association
(YHA). Apenas dois anos após a criação da YHA, em 1931, haviam na Inglaterra 73
estabelecimentos em funcionamento, com 1562 camas disponíveis e mais de 6 mil
membros associados, “um ano depois, o número de associados era de mais de 16 mil
para 132 hostels e aproximadamente 80 mil diárias haviam sido registradas”
(COBURN, 1950, p. 39).
Enquanto isso, no entanto, outro movimento social estava brotando na Alemanha, um
país que vinha sofrendo com “anos de desemprego, desespero e rixas políticas,
trazendo a maioria dos alemães a um ponto onde eles seguiriam qualquer profeta que
pudesse oferecer esperança” (HEATH, 1962, p. 44). Através das revoluções
propostas pelo partido Nazista a democracia estava fora do mapa mais uma vez. A
popularidade do movimento alberguista não pôde ser ignorada e ao invés de liquidá-
lo, os nazistas adaptaram a filosofia romântica alberguista, aos princípios nazistas de
alta aptidão física, intelectualismo excessivo e espírito de liderança, rumo à
revitalização e purificação de uma nova e unificada Alemanha. Ainda anos mais tarde,
viajar, segundo Coburn (1950) e Heath (1962), no período pós Segunda Guerra, era
praticamente impossível tanto do ponto de vista econômico quanto moral.
É nesse momento que Monroe Smith, fundador do primeiro Youth Hostel
estadunidense, que já nessa época havia se tornado amigo confidente de Schirrmann,
81
vem socorrer o movimento alberguista alemão. Após 15 meses do término da guerra,
os dois amigos embarcaram numa turnê tentando ressuscitar o movimento alberguista
alemão. Schirrmann com os discursos, Smith com os recursos e lentamente os youth
hostels começam a recuperar seu vigor e entusiasmo, sua jovialidade, seu
romantismo e idealismo. Na última conferência da qual participou, pouco antes de sua
morte em 1961, Schirrmann define os albergues como uma “casa na qual todos os
“andarilhos” podem se encontrar, onde todos têm os mesmo direitos e deveres e todos
pertencem à nação da juventude” (HEATH, 1962, p. 60).
2.3 Cruzando o Atlântico, rumo às Américas
O primeiro albergue canadense teve início “em uma barraca solitária em uma área,
até então deserta, no sopé da fronteira entre a Reserva Indígena Sarcee e a Reserva
Florestal, cerca de 25 km ao sudoeste de Calgary” (EDGELLER, 1988, p. 158). A Sra.
Mary Belle Barclay acreditava que as cordas desta barraca davam suporte não
somente à pequena tenda na floresta. Na verdade, se esticavam do Pacífico ao
Atlântico, oferecendo hospitalidade para todos aqueles que viajavam através do
Canadá no início do século XX, mantendo o movimento, chamado hoje de alberguista,
em constante crescimento.
Mary Barclay, nascida em 30 de julho de 1901, tida como a fundadora do movimento
alberguista canadense, vem de uma família calvinista escocesa que migrou para o
Canadá em meados do Séc. XIX (figura 16). Em 1905 uma das primeiras medidas
parlamentares canadenses era a de abrir novas terras para os colonizadores vindos
da Europa, assim a família recebeu 160 acres na região de Meadowbrook15. A
condição de vida era penosa e árdua, e por volta de 1910 a família se encontrava em
dificuldades financeiras, incapaz de quitar suas dívidas com o governo (EDGELLER,
1988).
15 É um belo distrito de altas colinas ondulantes, vales, riachos, pântanos e bosques de grandes árvores
de álamo, a 30 km noroeste de Lacombe e 10 km a leste do Lago Gull.
82
Figura 16 – Foto de Mary Belle Barclay, é a primeira à esquerda (1910)
Fonte: EDGELLER, 1988.
Em 1921, Mary Belle se forma no ensino médio, conseguindo uma vaga como
professora numa região semidesértica no Distrito de Trinity. Em 1925 ela deixa o cargo
de professora afim de estudar pedagogia na Universidade de Chicago, experiência
esta que posteriormente lhe daria base para os trabalhos com grupos de alunos em
meio à natureza. De volta a Calgary começou a lecionar e como atividade
extracurricular tomou conta do grupo “Canadian Girls in Training”. Em uma das
viagens com este grupo passou a noite em uma reserva indígena, dentro de uma
cabana improvisada com postes de madeira, um pano como cobertura e vários
cobertores que mantiveram as estudantes relativamente confortáveis. Mesmo
inconscientemente Mary Belle estava criando o primeiro albergue da juventude
canadense, figura 17 (EDGELLER, 1988).
83
Figura 17 – Foto do primeiro albergue da juventude canadense (1925)
Fonte: EDGELLER, 1988.
Mary Belle passa a se dedicar à natureza e com um sonho de mandar alguns de seus
alunos ao exterior em intercâmbios de estudos, planejando uma empresa de viagens,
a qual teria como objetivo enviar estudante à França e Inglaterra. As irmãs haviam lido
um artigo no Christian Science Monitor16 sobre Hostels na Inglaterra e Escócia, onde
havia um Houseparent, que cuidava dos alberguistas. Barclay viu nesse tipo de
hospedagem a oportunidade perfeita para realizar o envio de sua estudante ao
exterior, sem possuir experiência com intercâmbios de viagens. A ganhadora, Beth
Laycraft, foi enviada à Inglaterra de navio em 1934.
Enquanto isso as viagens de campo continuaram através da escola de Mary Belle, e
a ideia de montar um albergue definitivo perto da reserva indígena começou a tomar
forma. Após reunir algumas finanças com sua família, alugou um pedaço de terra
16 O Christian Science Monitor (CSM) é uma organização internacional que oferece, atualmente,
notícias de cobertura global através de seu website, revista semanal, e-mail de newsletters, assinatura através do Amazon Kindle e site móvel. Fundado em 1908 por Mary Baker Eddy, também fundadora da Igreja de Cristo Cientista. Apesar do nome, a organização se proclama não-religiosa e suas publicações não promovem a doutrina de sua igreja patrona.
84
pelos 4 meses do verão de julho de 1933, e dirigindo o Ford-T de seu pai, as irmãs e
com ajuda de voluntários, saíram em rumo à floresta, afim de construir o primeiro
albergue canadense, ilustrado na figura 18.
Figura 18 – Foto de voluntários construindo o albergue permanente (1933)
Fonte: EDGELLER, 1988.
Quando Beth Laycraft retornou da Inglaterra havia adquirido vastos conhecimentos
em primeira mão sobre o sistema de albergues da juventude na Europa. Através de
palestras, apresentações e viagens a várias escolas, as irmãs propagaram a ideia e
elevaram o conhecimento e conscientização da população sobre o novo meio de
hospedagem. Elas esclareceram que um youth hostel era muito mais do que
simplesmente um local para se passar a noite depois de um dia de caminhada em
meio a natureza, era um lugar cuidado por uma pessoa que faria com que certas
normas e etiquetas fossem respeitadas e os hóspedes pudessem vivenciar a cultura
local e se relacionar de maneira saudável com os demais alunos de outros países,
trocando experiências e aprendendo uns com os outros (EDGELLER, 1988).
Quase que simultaneamente, o casal de professores Monroe W. Smith e Isabel B.
Smith17 (figura 19), viajam à Europa e conhecem Richard Schirrmann. Munidos dos
ideais e da filosofia alberguista, fundam o primeiro youth hostel estadunidense, em
17 Ele, um ex-escoteiro, professor e empresário. Ela, professora de artes.
85
1934, Northfield, Massachusetts (HI-USA, 2013). O Estabelecimento dos albergues
da juventude no Brasil, como se verá adiante em mais detalhes, se dá muito de modo
muito similar ao processo estadunidense. Dentre algumas similaridades vale destacar
que ambos foram estabelecidos por professores em intercâmbio cultural em um país
onde os albergues já estavam estabelecidos. No entanto, a implantação e
disseminação desses nos E.U.A. acontece com mais antecedência, maior aceitação
e maior abrangência do que no Brasil, pois apenas
um ano após a sua formação a rede de Youth Hostels norte-americana consistia em mais de 30 hostels ao todo. A maioria eram rurais, no estado de New England e foram concebidos principalmente para servir ciclistas e entusiastas do lazer. Seu crescimento recebeu grande atenção, e o aval do presidente dos Estados Unidos. "Fui criado nesse tipo de ambiente e percebi a necessidade do alberguismo", declarou o presidente Franklin D. Roosevelt em 1936, quando ele era presidente honorário da AYH. "Esta foi a melhor educação que eu já tive, muito melhor do que as escolas" (HI-USA, 2013).
Figura 19 – Foto do casal Smith em frente ao Youth Hostel de Northfield (1936)
Fonte: Isabel Smith (arquivo pessoal da família).
86
O primeiro youth hostel estadunidense (figura 20), assim como no caso do primeiro
albergue europeu, nasce em edifícios de grande significado histórico e arquitetônico.
A apropriação desse patrimônio histórico edificado por meio dessa tipologia de
hospedagem é extremamente comum na Europa, principalmente na Alemanha, onde
encontram-se 38 castelos, palácios e edifícios de grande significado cultural, inclusive
alguns tombados pela UNESCO, transformados em albergues da juventude
(GERMAN YOUTH HOSTEL ASSOCIATION, 2014).
Figura 20 – Foto do primeiro youth hostel estadunidense (1963)
Fonte: Gerda Peterich, Historic American Buildings Survey (Library of Congress).
Em 1935 um fato histórico auxilia o desenvolvimento do alberguismo nos E.U.A.
Richard Schirrmann realiza sua primeira viagem fora do continente europeu,
promovendo a ideia dos albergues da juventude. De acordo com Heath (1962), desde
o término da primeira guerra grupos de jovens norte-americanos estavam, assim como
os ingleses, redescobrindo as belezas naturais do interior da Alemanha, geralmente
em viagens de ciclismo ou através das caminhadas. Tais viagens tinham como ponto
alto uma visita à Richard Schirrmann em Altena, com estadia garantida no albergue
do castelo. Dois desses viajantes eram o casal Smith que estabeleceram o primeiro
albergue estadunidense e, posteriormente, convidaram Schirrmann a visitar os E.U.A.
em uma turnê de palestras sobre o alberguismo.
87
Em seu retorno à Alemanha, as autoridades nazistas confiscaram seu passaporte,
destituíram-no do cargo de presidente da HI e desapropriam-no do castelo de Altena,
“o qual havia sido sua casa nos últimos 25 anos, ficando também proibido de entrar
em qualquer albergue na Alemanha” (HEATH, 1962, p. 50). No entanto, rapidamente
o alberguismo cruza o continente norte-americano e o primeiro youth hostel da costa
do pacífico é inaugurado na Califórnia, em 1937, chamado de Hidden Villa (figura 22).
Atualmente o local se transformou em uma organização educacional, com ênfase em
sustentabilidade e sem fins lucrativos. Além de prover acomodação, o local, em seu
período inicial, exerceu um importante papel social para os norte-americanos,
tornando-se
um centro de ativismo social. Os Duvenecks [casal que fundou o hostel] abrigavam refugiados fugindo dos nazistas, ajudaram famílias nipo-americanos que retornavam de campos de internamento e hospedavam grupos para a reforma social e educacional. Afligidos pelo internamento dos nipo-americanos, bem como pelo Holocausto e o racismo que encontraram em sua própria comunidade, os Duvenecks estabeleceram os primeiros acampamentos de verão multiculturais e racialmente integrados no país. Além disso, de acordo com a sua visão de justiça social, os Duvenecks abriram sua casa para o movimento dos United Farm Workers (Trabalhadores Agrários Unidos) na década de 1960, oferecendo um espaço seguro para Cesar Chávez18 organizar os trabalhadores agrícolas da Califórnia em sua primeira greve (HIDDEN VILLA, 2014).
O movimento alberguista norte-americano experimentou dificuldades no período entre
guerras. Estabelecimentos foram fechados, em ambos os continentes, e até mesmo
apropriados pelos governos e convertidos em outros estabelecimentos com fins
militares (HI-USA, 2013). Após a Segunda Guerra Mundial um processo reverso
acontece no Canadá. Os youth hostels, que anteriormente cederam seus espaços aos
militares, agora recebiam do ministro das Minas e Recursos Naturais, através de um
pedido de doação feito por Mary Belle, 20 quartéis abandonados pelo exército. Dos
18 Cesar Chávez (31 de março de 1927 - 23 de abril de 1993) era um trabalhador agrícola norte-
americano, líder sindical, ativista de direitos civis e co-fundador do sindicato United Farm Workers, UFW). Chávez tornou-se o mais conhecido ativista Latino-americano dos direitos civis nos E.U.A e promoveu fortemente o movimento operário norte-americano. Sua abordagem de relações públicas para o sindicalismo e táticas agressivas, mas não violentas, fez da luta dos trabalhadores rurais uma causa moral com o apoio de todo o país. No final de 1970, suas táticas forçaram os produtores a reconhecer o UFW como forte agente de negociação, representando cerca de 50.000 trabalhadores de campo na Califórnia e na Flórida. Ele também é famoso por popularizar o slogan "Sí, se puede" (espanhol para "Sim, se pode"), que foi adotado como slogan de 2008 nas campanhas de Barack Obama. Seus defensores dizem que seu trabalho levou a inúmeras melhorias para os trabalhadores sindicalizados nos E.U.A. (UFW, 2014).
88
vinte mil dólares necessários para renovar e montar os novos albergues apenas três
mil foram angariados. Este dinheiro serviu para estabelecer o Castle Mountain Hostel,
o primeiro albergue da juventude em um Parque Nacional (EDGELLER, 1988).
A vida de Mary Belle é uma linda lição que culminou em algo que hoje auxilia
estudantes, viajantes e qualquer pessoa que esteja procurando um abrigo em um local
desconhecido, esperando encontrar pessoas de confiança e apreender sobre aquela
região com elas. Como disse Mary Belle, ela “estava aprendendo junto com as
crianças. Pode ter parecido um cego guiando outro cego, mas eu tinha um objetivo
claro: a descoberta da nossa relação com o outro e com o meio ambiente”
(EDGELLER, 1988, p. 138). Hoje a região de Bragg Creek, figura 21, é um popular
destino para quem deseja conhecer as Montanhas Rochosas canadenses e o Bragg
Creek Hostel foi nomeado como local de significância histórica pelo governo
canadense, por ser o primeiro albergue da juventude em solo norte americano.
Figura 21 – Foto panorama da região de Bragg Creek
Fonte: Alberta Tourism, Parks and Recreation, 2013.
Em setembro de 2000, Mary Belle (figura 22) faleceu pouco após seu aniversário de
100 anos. Seu legado é medido além de suas conquistas financeiras com os albergues
da juventude. Ela deixou uma visão nobre, de espírito pioneiro, de determinação e
sucesso, de “ajudar a todos, especialmente aos jovens, a ganhar maior entendimento
das pessoas, lugares e culturas através dos albergues da juventude” (HI – CANADA,
2013). Em resumo, o espirito alberguista pode ser visto na alma dessa mulher, a qual
esperava que “o pequeno volume de sua vida e trabalho pudesse inspirar as pessoas
a engajar em seus próprios pioneirismos, a caminho do conhecimento que enaltece,
através da verdadeira educação, do maior entendimento entre as pessoas e da busca
pela paz entre todos os homens” (EDGELLER, 1988, p 164).
89
Figura 22 – Foto de Mary Belle Barclay aos 87 anos de idade
Fonte: EDGLLER, 1988.
2.4 Brasil: raízes de uma sociedade hospitaleira ou hospedeira?
A “cultura, [como meio de adaptação aos diferentes ambientes ecológicos] mais do
que a herança genética, determina o comportamento do homem e justifica suas
realizações” (KROBER, 1950 apud LARAIA, 2014, p. 48). Portanto, um olhar sobre os
primórdios da colonização e da hospitalidade brasileira podem oferecer uma
perspectiva cultural de seus impactos sobre os meios de hospedagem que se
estabeleceram no país. Assim, as raízes do turismo brasileiro também oferecem um
panorama dos aspectos socioespaciais que determinam suas condições atuais. O
histórico de apropriação da terra, dos povos, dos bens e dos meios de produção no
Brasil, por diversas nações estrangeiras, mas principalmente por Portugal, molda a
cultura, a percepção da realidade e a psique brasileira, pois a verdade
por menos sedutora que possa parecer a alguns de nossos patriotas, é que ainda nos associa à península Ibérica, a Portugal especialmente, uma tradição longa e viva, bastante viva para nutrir, até hoje, uma alma comum [...] podemos dizer que de lá nos veio a forma atual de nossa cultura; o resto foi matéria que se sujeitou mal ou bem a essa forma” (HOLANDA, 1995, p. 40).
Contemporaneamente, o que chamamos de “colonização” aliada ao determinismo
geográfico – o qual “considera que as diferenças do ambiente físico condicionam a
90
diversidade cultural” (LARAIA, 2014) – formou nossa cultura e dita a maneira como o
brasileiro se percebe e como percebe o estrangeiro. Isso interfere, até os dias de hoje,
como se recebe as pessoas nos lares e no modo como são administramos nossa
infraestrutura e serviços turísticos, e evidentemente, como percebemos, recebemos e
tratamos o turista em nosso país (ASSUNÇÃO, 2012; CASTRO, GUIMARÃES e
MAGALHÃES, 2013). De um modo geral, as relações antagônicas permeiam a história
brasileira e criam nosso modo de ser, tais como escravidão e liberdade, alienação e
esclarecimento (FAUSTO, 2013). A relação mantida entre binômios antagônicos,
constituintes de nossa realidade, como “trabalho e aventura; [...] rural e urbano; [...]
norma impessoal e impulso afetivo” (HOLANDA apud CÂNDIDO, 2013, p. 13), são
similares aos encontrados na formação socioespacial alemã, correspondente ao
período da gênese alberguista.
A relação de usurpação, caracterizada sobre o território recém descoberto, o qual era
usado exclusivamente para retirada de bens materiais para sustentar o poderio da
coroa portuguesa, (FAUSTO, 2013), dá origem a “um tipo de sociedade que se
desenvolveria, em alguns sentidos, quase à margem das congêneres europeias, e
sem delas receber qualquer iniciamento que já não trouxesse esse germe”
(HOLANDA, 1995, p. 31). A relação de exploração, estritamente comercial, entre
colônia e coroa portuguesa, estabelecida nos primórdios de nossa história, implanta
em nossa psique diversos aspectos que determinam nossa relação entre o indivíduo
hospitaleiro e o estrangeiro (MORAES, 2005). Nossos costumes, e por consequência,
nossa cultura é um fenômeno natural, de causa e efeito, é tudo aquilo que não é
transmitido geneticamente, e sim tudo aquilo que é aprendido, sob múltiplas
influências das pessoas, do território e do tempo (LARAIA, 2014).
Para o turismo no Brasil isso tem impacto direto. O primeiro registro hoteleiro que se
tem conhecimento, acontece na Vila de São Paulo, quando começou a servir de base
para os tropeiros rumo às minas. Bruno e Pilagallo (2004 apud VALENZUELA, 2013,
p. 25) mostram que a gênese da hospitalidade brasileira está voltada diretamente ao
estabelecimento de laços comerciais, onde “em 1599, Marcos Lopes foi nomeado
hoteleiro oficial, responsável pelo fornecimento de carne e farinha, entre outros
produtos” aos forasteiros que passavam pela vila de São Paulo. Apesar de oferecer
acomodação, “não se pode dizer que o seu estabelecimento constituísse uma
91
hospedaria” (VALENZUELA, 2013, p. 25), pois, apesar de ser considerado o primeiro
hoteleiro do Brasil, fornecia principalmente suprimentos para que desbravadores do
interior brasileiro pudessem continuar sua viagem, sem focar seus esforços em
acomodação, hospitalidade e/ou cordialidade.
Somente em 1603 que “teria sido aberto uma estalagem [...] que se transformou na
segunda casa a oferecer pouso” (VALENZUELA, 2013, p. 25). Ainda assim, a
hospitalidade oferecida aos hóspedes era praticamente inexistente, pois as
atenções hospedeiras eram dirigidas primeiro aos animais de carga e, só depois, às necessidades dos viajantes e de passageiros ou acompanhantes. Tanto assim, que a taxa cobrada era medida pelo consumo de pasto pelos animais e não pela permanência na estrebaria, que também servia, em muitos casos, como acomodação para dormir” (VALENZUELA, 2013, p. 25).
Com o passar do tempo, acaba-se por instalar no “modo de ser” do colonizador
brasileiro um comportamento denominado de personalismo19, que descende da
“frouxidão das instituições e da falta de coesão social” (HOLANDA apud CÂNDIDO,
2013, p. 13), impedindo que no início a sociedade brasileira criasse um senso forte de
comunidade e união, em consequência, também, da escravidão que perdurou no país
por séculos (FAUSTO, 2013). Nesse tipo comportamento, todos se preocupam
somente com o aspecto individual, sem fazer parte de um todo, fato esse que reflete
uma forma de alienação e desfavorece as relações hospitaleiras, criando-se uma
apropriação do território de forma totalitária e excludente, que extirpa de parte da
sociedade seus direitos urbanos (PURCELL, 2002).
A “a falta de coesão em nossa vida social não representa, assim, um fenômeno
moderno” (HOLANDA, 1995, p. 35), tendo origem no interesse exclusivamente
pessoal presente desde o início da colonização, incutido até hoje em nossa
personalidade, impedindo ou dificultando a instalação da hospitalidade genuína, sem
fins comerciais, e de qualquer pensamento, ação ou organização que gire em torno
do social. Há, desde o início dos tempos brasileiros, uma segregação socioespacial,
a qual se faz presente também no turismo em diversas outras culturas (ERKUş-
ÖZTÜRK, 2010), onde a classe dominante “consome e controla o espaço [e] o aspecto
19 Conduta de quem refere tudo a si próprio. Doutrina segundo a qual a pessoa é o tema central da
reflexão (FERREIRA, 2004)
92
econômico sobrepõe todos os outros tipos de segregação. A segregação, portanto,
não é simplesmente um fator de divisão de classes no espaço urbano, mas também
um instrumento de controle desse espaço” (NEGRI, 2008).
A hospitalidade em seu sentido mais puro corresponde ao acolhimento, ajuda ao
estranho de maneira desinteressada (MONTANDON, 2011), enquanto que para
Derrida (1997) a “hospitalidade é a bandeira de uma verdadeira cruzada contra e
intolerância e o racismo” (apud CAMARGO, 2002, p. 06). No entanto, é comum
perceber que as demonstrações de hospitalidade nos povos hispânicos venham
acompanhada de uma relação de interesse, pois nessas nações os atos primordiais
de receber indivíduos eram tidos como o objetivo de fazer alianças comerciais ou
políticas (ASSUNÇÃO, 2012; CASTRO, GUIMARÃES e MAGALHÃES, 2013).
Cria-se, então, de acordo com Holanda (1995), a figura do homem cordial. De um
modo geral, o homem brasileiro é visto pelos estrangeiros que visitam o país como
uma figura polida, generosa, simples nos tratos sociais, cordial e até certo ponto
submissa e serviçal, principalmente nos serviços turísticos (OLIVEIRA e MARTINS,
2009). Essas características são inatas da personalidade brasileira, a qual foi
fecundada por uma influência ancestral rural, patriarcal e ibérica (MORAES, 2005).
No entanto, outros aspectos dessa mesma influência ancestral fazem com que a
hospitalidade seja, em sua essência, diferente da hospitalidade pura e genuína. A
herança hospitaleira voltada aos interesses comerciais e políticos, incutida ao ser
brasileiro pela descendência de seus colonizadores, faz com que a hospitalidade
brasileira sirva como uma máscara social voltada aos negócios. Tanto que,
aparentemente, pode parecer que o ser cordial seja genuinamente hospitaleiro. No
entanto, essa condição
pode iludir na aparência – e isso se explica pelo fato de a atitude polida consistir precisamente em uma espécie de mimica deliberada de manifestações que são espontâneas no “homem cordial”: é a forma natural e viva que se converteu em formula. Além disso a polidez é, de algum modo, organização de defesa ante a sociedade. Detém-se na parte exterior, epidérmica do indivíduo, podendo mesmo servir, quando necessário, de peça de resistência. Equivale a um disfarce que permitirá a cada qual preservar inatas sua sensibilidade e suas emoções (HOLANDA, 1995, p. 147).
93
A partir do momento em que o homem empregado torna-se simplesmente uma parte
funcional da máquina de serviços, passa também a deixar de expressar sentimentos
e emoções humanas. Passa a projetar uma caricatura hospitaleira, incutida através
de ensinamentos, treinamentos e exigências. Essa hospitalidade artificial, criada a
partir de uma exigência mercadológica, através da padronização da cordialidade, da
transformação de algo vivo, puro e humano em uma fórmula, é uma hospitalidade
falsa (GOTMAN, 2009). Vale lembrar que em determinadas culturas, como as
localizadas no crescente fértil, o ato de servir é visto com orgulho e felicidade, como
uma dádiva e até mesmo uma benção divina (MONTANDON, 2011). Esse não é o
caso do Brasil, onde o ideal de vida é ser servido e não servir (HOLANDA, 1995).
Portanto, o empregado, o serviçal, em posse dessa mascara hospitaleira e cordial,
desempenha um papel perante o indivíduo que acolhe, um papel muitas vezes não
inato à sua essência, à sua vontade. Consequentemente, em decorrência dessa
interação social forçada e artificial, conflitos surgem com mais frequência do que
quando há uma relação de hospitalidade genuína e espontânea entre ser acolhedor e
ser acolhido (CAMARGO, 2004; GOTMAN, 2011; GRINOVER, 2002; LOUDEN, 2011;
MONTANDON, 2011).
É comum no trato social e nos serviços turísticos que as demonstrações de
cordialidade e hospitalidade deem lugar a um comportamento passivo-agressivo,
quando ocorrem os primeiros desentendimentos entre ser acolhedor e acolhido
(LOUDEN, 2011). Esse tipo de comportamento é caracterizado pela expressão
indireta de hostilidade, como através de procrastinação, teimosia, mau humor
deliberado ou fracasso repetido para realizar tarefas solicitadas por parte de quem é
responsável. Esse traço da personalidade humana pode se manifestar em todos,
porém em alguns com mais frequência, podendo até se caracterizar como distúrbio
psíquico, identificado como uma resistência deliberada em satisfazer expectativas de
determinadas relações interpessoais ou no cumprimento de tarefas, caracterizado por
atitudes negativas indiretas e oposição velada (WETZLER, 1993). Este
comportamento é uma arma de defesa do “serviçal”, uma maneira de expressar, de
modo relativamente educado, sem retirar sua máscara, de que ele, ser acolhido,
devido ao seu comportamento inadequado, não é mais bem-vindo, ou de que está
sendo atendido por obrigação. Como ressalta Holanda, não há nada mais
demonstrativo dessa “aversão ao ritualismo social, que exige, por vezes, uma
94
personalidade fortemente homogênea e equilibrada em todas as suas partes, do que
a dificuldade em que se sentem, geralmente, os brasileiros, de uma reverência
prolongada ante um superior” (HOLANDA, 1995, p. 148).
Sendo assim, segundo Trigo (2002), mesmo após duzentos anos do descobrimento,
a indústria hoteleira no Brasil era praticamente inexistente. Somente em 1776, tem-se
registro de um local que se assemelha com um estabelecimento hoteleiro
contemporâneo, oferecendo hospitalidade ao ser humano, além de transações
comerciais e cuidados com os animais cargueiros. De acordo com Valenzuela (2013),
o “senhor Manuel Pereira Crispim, mais conhecido pela alcunha de “o Hospitaleiro”,
instalou uma “albergaria” [grifo nosso] que, por não ter aparência de senzala ou
mesmo de estrebaria, diferenciava-se das demais” (p. 25). Portanto, os primeiros
indícios de hospitalidade voltada ao ser humano estão ligados à palavra albergue.
Desde essa época vale ressaltar que no panorama catarinense o personalismo
domina as relações socioeconômicas. Esse fator pode explicar o grande número de
pequenas empresas hosteleiras improvisadas na atualidade. Nessa época, a
colonização de Santa Catarina, que tem sua base na pequena produção familiar,
difere das demais regiões brasileiras
onde dominava a monocultora em extensas glebas de terra com mão-de-obra escrava – gerou excedentes que ampliaram as relações comerciais de vários núcleos costeiros, [...] também favoreceu o desenvolvimento das atividades portuárias, estando seus principais comerciantes vinculados aos capitais comerciais tradicionais do Rio de Janeiro pela navegação de cabotagem. Entretanto, apesar de precoce, a pequena produção mercantil açoriana, devido a um conjunto de fatores, não desembocou em relações capitalistas de produção (PEREIRA, 2011, p. 02).
O cunho estritamente exploratório sobre o país continuaria até a vinda da Família Real
Portuguesa ao Brasil em 1807. Somente com a mudança da Coroa Portuguesa para
o Rio de Janeiro é que, efetivamente, a ocupação do território brasileiro muda de
perspectiva, pois as decisões políticas, econômicas e sociais passam a ser tomadas
a partir do Brasil, e, ineditamente, porém ainda parcialmente, para o Brasil (FAUSTO,
2013). Portanto, o Brasil viveu um período de exploração exclusiva de praticamente
300 anos, suficientes para moldar nossa psique e cultura. Enquanto outros países
estavam prestes a mudar completamente a sociedade ocidental, através da
95
Revolução Industrial, o Brasil ainda dava os primeiros passos para a criação de uma
sociedade verdadeiramente brasileira.
Ainda na virada do século XVIII para o XIX, apesar de encontrar-se menções sobre a
palavra pousada, praticamente todos os relatos de viajantes descrevem as pousadas,
ranchos e albergarias como estabelecimentos destinados ao comércio e cuidados
com os animais. Os relatos mostram locais imundos e a cidade de São Paulo como
despreparada para acolher turistas, (TRIGO, 2002). Os meios de transporte públicos
e/ou privados, de extrema importância para a ocorrência do turismo, eram ambos
praticamente inexistentes e precários. Segundo Trigo (2002), somente em 1833 se
cria a Lei No. 60, “que assinalou o início de uma política governamental de incentivo
à implantação de sistemas de transporte no Brasil” (p.81). Até o final do século XIX, a
atitude dos paulistas para com os estrangeiros era de “desconfiança” (VALENZUELA,
2013, P. 28) e o Brasil foi uma colônia de Portugal até o início do século XIX, onde
toda a sua produção era controlada pela metrópole portuguesa: açúcar, ouro, etc. No
século XIX, começa a se destacar a produção de café – no vale do Paraíba,
principalmente – destinado, ainda, à exportação. É somente entre1838 e 1848 que os
primeiros hotéis, propriamente ditos, são inaugurados no Rio de Janeiro e em São
Paulo, com o Hotel Pharoux e o Hotel das Quatro Nações, respectivamente (TRIGO,
2002; VALENZUELA, 2013), sendo que o último chegou a oferecer aos hóspedes um
baile de máscaras que ficaria famoso na cidade.
Outra similaridade entre Brasil e Alemanha, é a existência de meios de hospedagem
para estudantes. No entanto, até então, só se hospedavam nesses novos
estabelecimentos pessoas que estivessem de posse de uma carta de apresentação
e/ou recomendação emitida “por alguma autoridade do Império ou, ainda, por alguma
outra pessoa de reconhecido prestígio” (VALENZUELA, 2013, p. 32). Com a mudança
da situação política e econômica brasileira (Abolição da Escravatura e Proclamação
da República) e mundial (Revolução Industrial), as viagens ao exterior também se
transformam, e cada vez mais o Brasil passa a receber viajantes de outros países
(TRIGO, 2002; VALENZUELA, 2013). A abolição da carta de
recomendação/apresentação gera um impulso em direção à hospitalidade e à
cordialidade. Esta abolição da carta de recomendação está para os hotéis como a
abolição da carteirinha de sócio está para os youth hostels, uma liberdade,
96
flexibilidade e maior abrangência dos níveis de hospitalidade locais. Como
consequência o que se vê no Brasil até o final da década de 1890 é uma diversificação
e crescimento expressivo da movimentação de turistas, dos meios de hospedagem e
dos serviços turísticos, principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo, desde os hotéis
de luxo aos situados nas proximidades das estações de trem (TRIGO, 2002;
VALENZUELA, 2013; CASTRO, GUIMARÃES e MAGALHÃES, 2013).
A implantação de academias, colégios e outras instituições de ensino, as quais
recebiam estudantes estrangeiros, oferecendo-lhes boas condições físicas de
hospedagem e atividades sociais que os inseria no contexto do país, dá início no que
pode se chamar de hospitalidade, propriamente dita, no Brasil. Logo esses locais,
devido à alta concentração de estudantes nacionais e estrangeiros e à jovialidade de
seu comportamento, se tornariam o centro da vida social da cidade de São Paulo
(TRIGO, 2002; VALENZUELA, 2013). Apesar desses estabelecimentos acomodarem
estudantes, como os albergues da juventude, em nada se assemelham, pois no Brasil
havia quartos privados em edifícios ou casas particulares.
Com a nova ordem econômica mundial que nascera da Revolução Industrial, a
sociedade do século XX sofre uma transformação política e cultural que altera,
também, o contexto das viagens mundiais. No século XX, tornaram-se comuns as
viagens individuais e seus relatos através da escrita, de desenhos e de imagens
fotográficas. A presença das cidades brasileiras se torna cada vez mais forte nesses
relatos, e o interior passa a um segundo plano.
Percebe-se que a motivação principal das viagens começa a mudar em direção às
cidades, devido ao frisson causado pelas novas tecnologias da Revolução Industrial.
Porém, similarmente à formação de grandes cidades europeias, no Brasil também se
percebe que as riquezas não são distribuídas de forma homogênea e o avanço
industrial, cultural e tecnológico não alcança toda a população. Especialmente em
Santa Catarina,
a organização do espaço e o crescimento da população no século XX, somada à tendência mundial de esvaziamento do campo (devido à mecanização da agricultura e à uma nova divisão do trabalho) e de expansão do espaço urbano sem a infra-estrutura correspondente, influenciaram no aumento da pobreza, da degradação ambiental e da violência (PEREIRA, 2011, p. 11).
97
O crescimento desenfreado e desordenado das grandes cidades brasileiras começa
a fazer suas vítimas, e as condições de vida de grande parte da população tornam-se
precárias, apesar da grande riqueza do território, da burguesia e do estado. Diversos
cronistas relatam suas viagens durante o final do século XIX, muitos descrevendo a
cidade brasileira como perigosa e “desagradável para o estrangeiro. Na cidade não
há nenhuma sociabilidade” (ASSUNÇÃO, 2012, p. 218).
É prudente argumentar que o turismo nasce no Brasil somente a partir do século XX.
O dia 22 de julho de 1907, pode ser considerado, de acordo com Castro, Guimarães
e Magalhães (2013), como a data de nascimento do turismo moderno internacional no
Rio do Janeiro, e consequentemente, no Brasil, devido à chegada do primeiro navio
Byron, com um grupo de turistas trazidos pela Agencia Thomas Cook, filial de Nova
Iorque, em uma viagem à América do Sul. Muito rapidamente, o Rio de Janeiro torna-
se o principal destino turístico do Brasil, um local onde se encontrava a natureza
exuberante ao lado do desenvolvimento moderno. No entanto, há ausência e
precariedade da infraestrutura e dos serviços turísticos. A principal delas refere-se à
hospitalidade, onde lamenta-se que não houvesse, para os turistas,
cicerones habilitados, que os guiem inteligentemente, ministrando-lhes informações seguras e minuciosas acerca dos acontecimentos mais notáveis, [...] das belezas naturais que a adornam, das nossas tradições, da vida, enfim, de uma grande cidade, sob os múltiplos aspectos por que pode ser encarada no espaço e no tempo (CASTRO, GUIMARÃES e MAGALHÃES, 2013, p. 14)
Após o hiato econômico, político e social mundial em decorrência da primeira guerra,
a década de 1920 representa o período em que nascem as primeiras tentativas de
organização do fenômeno turístico no Rio de Janeiro, consequentemente no Brasil,
mediante o surgimento das primeiras agências de viagens, de hotéis turísticos, como
a inauguração do Copacabana Palace (1923), e iniciativas governamentais para
incrementar a atividade no Brasil, como o lançamento da pedra fundamental do Cristo
Redentor em 04 de Abril de 1922 (CASTRO, GUIMARÃES e MAGALHÃES, 2013). O
panorama de Santa Catarina mostra-se diferente dos principais destinos turísticos
brasileiros. Enquanto esses experimentavam de avanços, para SC o século XX
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imprimiu novas características à formação litorânea catarinense, aprofundando a crise das comunidades fundadas por açorianos, herdeiras de um modelo econômico centrado na pequena produção mercantil oriunda da prática de uma policultura de subsistência [...] O advento da fase depressiva do terceiro ciclo de Kondratieff (1920-1945), entretanto, ao originar um novo pacto de poder no interior da formação social brasileira, expresso pela aliança entre a burguesia industrial – dissidência dos comerciantes – e os latifundiários feudais (RANGEL, 1985), mergulha os núcleos urbanos do litoral catarinense num ritmo lento de desenvolvimento (PEREIRA, 2011, p. 04).
Vale ressaltar que, nessa mesma época, a Associação Internacional Dos Albergues
Da Juventude, gestora de um meio de hospedagem ainda inexistente no Brasil, já
estava totalmente organizada e ativa, produzindo encontros entre empreendedores,
realizando trabalhos de assessoria, determinando regras e leis para a implantação,
operação e divulgação dos Youth Hostels (COBURN, 1950; HEATH, 1962).
Apesar da ocorrência da Segunda Guerra Mundial, é significativa a expansão e
melhoria da infraestrutura e serviços turísticos, principalmente pela criação de uma
série de marcos que acabaram por configurar a paisagem turística do Rio de Janeiro
e, consequentemente, do Brasil no exterior. Um desses marcos é a criação tardia do
primeiro Parque Nacional brasileiro, o de Itatiaia, na Serra da Mantiqueira, fundado
em 12 de outubro de 1937, por iniciativa dos alunos da Escola de Minas de Ouro Preto
(TRIGO, 2002), diferentemente da Alemanha e do Canadá, onde os parques nacionais
desses países foram criados já no início do século XVIII. Na Alemanha esses parques
eram o principal local de retiro dos Wandervogels e, no caso canadense, os albergues
da juventude tiveram influência direta na criação do primeiro deles20 (COBURN, 1950;
HEATH, 1962; EDGELLER, 1988).
No início da década de 1940, em decorrência das imigrações provocadas pela
Segunda Guerra Mundial, a atividade econômica brasileira volta a crescer e o
deslocamento populacional se interioriza. Como consequência, nascem dessa época
20 Banff National Park é o mais antigo parque nacional do Canadá, fundado originalmente como Rocky
Mountains Park em 1885, nas Montanhas Rochosas. O limite e proteção oficial do Parque mudou diversas vezes até que em 1930, o tamanho do parque foi fixado oficialmente em 6.697 km2, com a aprovação da Lei de Parques Nacionais. É sobre esta lei que a associação de albergues da juventude canadense possui influencia em sua criação. A lei também renomeou o parque como Parque Nacional de Banff, localizado 110-180 km (68-112 km) a oeste de Calgary, na província de Alberta. Possui terreno montanhoso, com numerosos glaciares e campos de gelo, densa floresta de coníferas, e paisagens alpinas.
99
“os tradicionais hotéis familiares de cidades de porte médio e as colônias de férias
institucionais, além dos hotéis de lazer em balneários, estancias, serras e litorais”
(TRIGO, 2002, p. 154). Nos anos 50, a hotelaria passa a ser vista como uma atividade
sofisticada e a chegada das redes internacionais oferece um impulso significativo para
o profissionalismo no interior da atividade hoteleira brasileira.
Na década de 60 é criada pelo Governo Militar a o Instituto Brasileiro de Turismo -
EMBRATUR (1966) com o propósito de “levar a mensagem do turismo a todas as
classes sociais, e a imagem da política objetiva do governo Federal, provendo seu
desenvolvimento através da EMBRATUR” (CASTRO, GUIMARÃES e MAGALHÃES,
2013, p. 20). O avanço dos transportes aéreos teve impacto direto no desenvolvimento
do turismo e do Brasil, nas décadas de 1960 e 70, considerada a época do milagre
brasileiro, período em que “o transporte aéreo comercial do país teve um crescimento
médio anual de 20%, o dobro da taxa média do PIB” (TRIGO, 2002, p. 97). Porém,
nem todas as áreas sociais e regiões territoriais se beneficiam igualitariamente dos
avanços econômicos e turísticos brasileiros. Em Santa Catarina, nas primeiras
décadas do século XX,
as comunidades costeiras, apesar das transformações em curso, permanecem à margem do processo de mudanças gerado pela emersão das relações capitalistas de produção, pois a evolução da técnica e do trabalho não se faz uniformemente nos diversos lugares, visto que os lugares são marcados “por uma combinação técnica diferente e por uma combinação diferente dos componentes do capital, o que atribui a cada qual estrutura técnica própria, específica, às quais corresponde uma estrutura própria, específica, do trabalho” (SANTOS, 1997) (PEREIRA, 2011, p. 13).
Os albergues da juventude fazem sua primeira aparição no país, também na década
de 1960, coincidindo curiosamente com a época da ditadura militar, um período de
instabilidade política e social. Enquanto que nas demais regiões centrais o fenômeno
turístico já estava implantado, o estado catarinense passa a experimentar uma
revolução turística somente quando “a estagnação dominante nos núcleos do litoral
[catarinense] só começa a ser rompida, a partir dos anos de 1960, por uma nova
dinâmica sócio-econômica” (PEREIRA, 2011, p. 14). Isso pode explicar o atraso de
praticamente quatro décadas, no aparecimento dos hostels em Santa Catarina, em
comparação ao Rio de Janeiro e São Paulo. Este meio de hospedagem alternativo,
vem propor uma revolução de conceitos no turismo assim como as revoluções sociais
100
propunham uma mudança política. Os Youth Hostels, como foram denominados na
época de seu aparecimento, propunham conceitos diferentes dos impostos pelo
governo daquela época. Representavam, como poucos, um movimento original,
romântico e social, que veio de “baixo para cima”, com raízes históricas
revolucionárias, diferente dos movimentos brasileiros vistos até então. No Brasil,
esses movimentos eram quase sempre impostos pelas classes superiores, partiam
sempre de cima para baixo [...] nossa independência, as conquistas liberais que fizemos durante o decurso de nossa evolução política vieram quase de surpresa; a grande massa do povo recebeu-as com displicência ou hostilidade. Não emanavam de uma predisposição espiritual e emotiva particular, de uma concepção de vida bem definida e específica, que tivesse chegado à maturidade plena. Os campeões das novas ideias esqueceram-se, com frequência, de que as formas de vida nem sempre são expressões do arbítrio pessoal, não se fazem ou desfazem por decreto (HOLANDA, 1995, p. 160).
A dialética materialista nos permite fazer uma análise científica do turismo, o qual
nasce com a consolidação das relações capitalistas de produção e das causas
originárias desse fenômeno (MEDINA, 2012), sendo assim, é somente mais uma
mercadoria a ser consumida. O fato da formação socioespacial brasileira diferir tanto
da época e lugar de onde os youth hostels nasceram, gerou um atraso nas revoluções
acontecidas no Brasil em comparação com o exterior, pois o aparecimento dos
albergues da juventude no Brasil é relativamente tardio. A geração de diversas
dualidades pode explicar a disparidade percebida entre esse meio de hospedagem no
exterior e no Brasil (SANTOS, 2012), pois certas partes da sociedade sentem a
necessidade de se modernizar mais rapidamente para poder estabelecer relações
com os países mais avançados no centro do sistema capitalista. Isso acaba por gerar,
especialmente no turismo, uma desorganização e improvisação na forma como o
espaço é ocupado e como os conceitos, nesse caso de meios de hospedagem, podem
ser mal apropriados ou menos desenvolvidos.
2.5 O advento dos albergues da juventude no Brasil
Conforme Giaretta (2003), somente na década de 1960 o movimento alberguista daria
seus primeiros sinais de vida no Brasil, através do casal de professores Joaquim e
Yone Trotta. Em uma viagem de estudos realizada na França, em 1956, Trotta
conheceu o movimento, e o fascínio foi imediato. Em seu retorno, trouxe a ideia ao
101
Brasil e leva um grupo de brasileiros ao exterior, em uma “excursão cultural [...],
hospedando-se em albergues da juventude” (p. 89). Novamente no Brasil, o casal,
decidido a implantar os albergues, inicia o que a autora supracitada denomina de fase
teórica, consistindo na divulgação do movimento e sua filosofia através de palestras e
colégios e universidades (GIARETTA, 2003). Trotta relembra que os primeiros
contatos com albergues internacionais da juventude foram decorrentes do aproveitamento do tempo vago durante o estágio no Centro Internacional de Estudos Pedagógicos de Sèvres (França), em janeiro de 1956. Em fins de 57 lavamos um grupo de 32 participantes em uma excursão cultural à Europa. [...] lamentávamos ainda que outros estudantes ou professores não tivessem condições financeiras para tal empreendimento, pois a hospedagem tinha sido em hotéis. [...] pensamos em organizar uma nova excursão, desta vez utilizando-nos daqueles albergues [e] em adaptá-los no Brasil. Para tudo isso seria necessário melhor conhecê-los (TROTTA, 1978, p. 20).
Em 1961, Trotta retorna à França e entra em contato com as associações estudantis
e alberguistas da França, mergulhando em sua essência, interagindo com o maior
número de pessoas e albergues possíveis, o que facilitou a compreensão das nuances
e, finalmente, da essência dos albergues da juventude. Isto fez com que ele
percebesse que a juventude que se hospedava nos albergues estava satisfeita, pois
podia com poucos recursos “aproveitar suas férias em excursões culturais, vividas
com boa higiene mental, tão necessárias àqueles que estudam, [formando, assim, a
prova de que vivemos] em um mundo civilizado, sem privilégios para alguns e
dificuldades excessivas para outros” (TROTTA, 1978, p. 21). Nesta fase chamada de
teórica, o prof. Joaquim Trotta, com o objetivo de unir a juventude brasileira em tempos
de ditadura, necessitava tomar ciência profunda da filosofia dos albergues da
juventude, de certos critérios e seus regulamentos, para então, aproveitá-los da
melhor forma possível. O que ele buscava, durante esta fase, era saber e tomar
propriedade da essência dos albergues, antes de abrir o primeiro empreendimento em
terras brasileiras (TROTTA, 1978). O materialismo, enquanto metodologia de estudo,
também busca conhecer a essência do objeto estudado, assim como Trotta com os
albergues da juventude. Pois, somente assim é possível se apropriar desse objeto
com a maior precisão possível. Esta fase teórica “tomou seis longos anos (de 1961 a
1966). Somente em 1966, por condições especiais, conseguimos, afinal, o início das
realizações práticas” (TROTTA, 1978, p. 43).
102
Chega-se, então, à fase de realizações. O primeiro albergue da juventude foi
inaugurado em meados de 1965, na cidade do Rio de Janeiro, e intitulado de
Residência Ramos, em referência ao bairro onde se encontrava. Os primeiros
hóspedes foram um “grupo de estudantes [...] da Escola Evangélica de Porto Alegre
– RS. Eram rapazes e moças [que] preferiram uma excursão recreativa e cultural ao
Rio aos gastos de uma formatura com festas” (TROTTA, 1978, p. 47). A Residência
Ramos, contando com 36 leitos, pode acolher diversos estudantes brasileiros que
viajavam pelo país. Além desses, o casal hospedava “estudantes [...] e mochileiros
vindos do Uruguai, Chile, Alemanha, Suíça e Inglaterra” (GIARETTA, 2003, p. 90),
pois “da Embaixada do Brasil em Santiago do Chile, o jovem diplomata Paulo Dirceu
Pinheiro [...] recomendava a Residência Ramos” (TROTTA, 1978, p. 49). Trotta define
que “os albergues da juventude internacionais existem para ajudar os jovens a viajar,
conhecer e amar a natureza e apreciar os valores culturais de pequenas cidades e
grandes metrópoles” (1978, p. 17). O referido autor ainda lembra que os albergues
variam, mas as características gerais permanecem as mesmas,
oferecem dormitórios, lavatórios e toaletes separados para cada sexo. Dispõem, também, de um local onde usuários podem preparar a própria comida. Há uma sala de estar comum a todos. Cada albergue está sob a responsabilidade de diretores, em geral, um casal denominado “Pai de Albergue” [...] eles recebem os frequentadores, dão-lhes as orientações necessárias sob o ponto de vista cultural, social e educacional e os assistem em casos de doença e qualquer dificuldade (TROTTA, 1978, p. 17).
O primeiro albergue brasileiro é relativamente tardio (ver figura 23). Se comparado à
gênese alemã, são aproximadamente 54 anos de distância e mesmo nossos vizinhos
sul-americanos estavam à frente. Trotta relata que “os estrangeiros, em geral, já
participavam racionalmente [do movimento alberguista, e os] sul-americanos
começaram a aparecer, principalmente da Argentina e Uruguai, onde já existiam
albergues há alguns anos” (1978, p. 49). Por mais que a geração juvenil dos anos de
1960 desejasse viajar, o início do movimento alberguista no Brasil não teve a mesma
expansão rápida que ocorreu na Alemanha, por não ter sido
fácil, no princípio, conseguir clientela para ocupar o prédio durante todo o ano, mesmo nas férias de verão, o que tornava a manutenção sempre deficitária, ficando mesmo, alguns meses seguidos, sem hóspedes na Residência. Conseguimos melhor divulgação de nossas atividades [...] apelando para os representantes de várias cidades brasileiras, do Encontro de Professores de Matemática realizado em Brasília (TROTTA, 1978, p. 49).
103
A construção do movimento alberguista brasileiro contaria, a seguir, com uma peça
muito especial. O segundo albergue brasileiro foi um empreendimento planejado e
construído pelos próprios alunos e membros da recém-criada federação, a exemplo
do Alemanha e Canadá. Trotta relata que
os alunos da Escola T.F.C.S. Fonseca conseguiram uma doação de terreno em Araruama – RJ. Motivados pela causa dos albergues, a conquista do terreno mais os animou para “meter mãos à obra”. Foi feito com concursos de projeto para a construção. [...] o projeto vitorioso foi do aluno José Francisco Tadeu, do Curso de Edificações (1978, p. 50).
O espírito alberguista, de união e entendimento entre as pessoas, de educação da
juventude, havia sido materializado na construção do Albergue da Juventude Prof.
Celso Suckow da Fonseca, nomeado em homenagem “àquele que foi um dos
primeiros a compreender o alcance da iniciativa [...] a tomar as providencias
preliminares [...] desta obra altamente educativa” (TROTA, 1978, p. 51).
Figura 23 – Foto da Residência Ramos, Rio de Janeiro (1969)
Fonte: arquivo pessoal de Maria José Giaretta.
O próximo passo, no intuito de levar a bandeira dos albergues à frente e devido à
ligação dos albergues da juventude com a educação (desde sua gênese através do
professor Schirrmann até a disseminação desses pela Europa em escolas do ensino
fundamental), foi o de procurar por “estabelecimentos estudantis, com o objetivo de
104
estabelecer convênios”, resultando em novos albergues em pouco tempo, assim como
acontecera na Alemanha (GIARETTA, 2003, p. 90). A ideia do um local que
promovesse a união e o entendimento entre os jovens, facilitando o ato de viajar para
a juventude brasileira com segurança e conforto, começou a tomar as grandes
proporções que Trotta idealizava a partir da parceria formada com a Casa do
Estudante do Brasil (TROTTA, 1978). Novos albergues foram instituídos, como a
Pousada da Juventude, na Lapa, Rio de Janeiro, com 300 leitos, e,
em 1970, a Federação Internacional de Albergues da Juventude convidou o casal Trotta para participar da Conferência Internacional de Albergues da Juventude, na Finlândia, o que foi marcado como a primeira participação do Brasil no movimento [alberguista] internacional. No retorno do casal ao Brasil, eles deram entrevistas à mídia brasileira, contribuindo para a divulgação do movimento no país (GIARETTA, 2003, p. 90).
Devido à contatos com a mídia, a Residência Ramos recebe a visita do jornal diário
“O Globo” do Rio de Janeiro, o qual além de retratar a boa índole do movimento, tenta
captar a essência educacional, social e comunitária dos albergues no Brasil. Na
ocasião encontravam-se hospedadas no albergue um grupo de “moças
excursionistas, pertencentes a um colégio de Barretos [...] preparando café quando
foram entrevistadas e fotografadas. Apanhadas de surpresa, com toda a naturalidade,
revelam o ambiente de uma grande família que a Residência oferecia” (TROTA, 1978,
p. 65). Trotta afirma que, após a matéria ganhar notoriedade, em pouco tempo após
sua publicação, uma reportagem da “TV Globo” é realizada na Residência Ramos,
propelindo a imagem dos albergues a “um sem número de cidades brasileiras,
[aumentando] consideravelmente os pedidos de reservas, resolvendo o problema do
tempo ocioso, pelo menos no período de férias” (1978, p. 65).
Os albergues da juventude no Brasil, devido a seu caráter social e educativo, assim
como no exterior, começam a ocupar edifícios de valor universal antes abandonados,
dando novos significados e reutilizando, agindo assim na conservação, do patrimônio
histórico edificado, como é o caso da Casa do Estudante do Rio de Janeiro, em 1974.
Segundo Trotta, este foi um acontecimento muito importante para o local, pois a “casa
ficou fechada e afastada da juventude no período de 1964 a 1971, época da ditadura
militar, quando o movimento ficou estagnado no Brasil” (GIARETTA, 2003, p. 93).
Nesse período da história brasileira, a perseguição a políticos, artistas, movimentos
105
juvenis e estudantis, que ousavam se opor ao sistema político, econômico e social
vigente foi implacável e os albergues da juventude não passaram por ela ilesos, e pela
primeira vez, desde sua fundação, o crescimento de associados e albergues diminui.
Até meados da década de 1970 os conceitos de turismo da juventude e principalmente
o de backpacker estavam em seu estágio embrionário e ainda não eram
completamente difundidos e definidos, portanto os albergues acharam no turismo
social sua melhor moradia, já que o jovem é fundamental em qualquer processo de
renovação social. Assim sendo, procura-se, entre outros aspectos, disseminar e
fomentar o turismo social e os albergues, ao
criar a consciência de que o turismo social [dando] às associações criadas, e em formação, absoluta independência para se organizar de acordo com a realidade socioeconômica do país onde se criam, enquadradas dentro das exigências mínimas da IYHF [...] tratar de complementar a educação dos jovens dentro dos albergues da juventude (GIARETTA, 2003, p. 92).
Em resposta a essas ações, a década de 80 pode ser considerada a época de ouro
dos albergues no Brasil, um período de extrema socialização e interação entre seus
usuários e o meio onde se encontravam. Um período, analisando-o em retrospecto,
considerado como ideal, onde a filosofia alberguista era vivida e experimentada por
todos no albergue, como relembra Giaretta em relatos informais a esse autor21
a minha melhor memória do casal Trotta é como eles seduziam os alberguistas, para Literatura, poesia, história e Geografia. Iam abrindo livros e de fato seduzindo as pessoas à leitura e quando percebíamos estávamos todos lendo algo. Eles nunca aprovaram TV no hostel porque sempre alegaram que a TV cortava o espírito de integração, de cultura no albergue.
Apesar dessa expansão vista por Giaretta (2003), Trotta (1978) lamenta a lenta
progressão do movimento no Brasil em comparação aos nossos vizinhos, Argentina e
Uruguai. Dentro da esfera do poder público, essa época, diferente do que se observa
atualmente, foi caracterizada por uma considerável aproximação entre essas partes.
Devido ao apoio da EMBRATUR, através da criação do Plano Nacional de Albergues
da Juventude, o qual contou com uma equipe treinada para supervisionar a criação
de novos empreendimentos em todo o território nacional, além de fornecer verba
destinada à divulgação deste novo meio de hospedagem (GIARETTA, 2003).
21 Depoimentos fornecidos por Maria José Giaretta através de e-mail no dia 13 de novembro de 2014.
106
Por motivos desconhecidos o casal Trotta fecha a Residência Ramos e abre um novo
empreendimento, o Albergue Muxarabi, em Cabo Frio-RJ (figura 24). Giaretta, em
relatos saudosistas e informais, destaca o caráter familiar, social dos albergues nessa
época áurea, relembrando que “no Muxarabi por exemplo, o último a sair escondia a
chave no esconderijo combinado e todos sabiam onde estava, chegava abria e a casa
era sua”22. Essa essência dos hostels, de serem uma “casa longe da sua casa”, está
presente até hoje na expectativa dos backpackers (WILSON e RICHARDS, 2008).
Figura 24 – Foto do Albergue Muxarabi, Cabo Frio (1979)
Fonte: arquivo pessoal de Maria José Giaretta.
É desse período que nascem as primeiras tentativas de regulamentação legal dos
albergues da juventude perante os órgãos oficiais governamentais do turismo,
apontando os seguintes aspectos a serem considerados (GIARETTA, 2003, p. 94):
1. Os albergues da juventude são destinados à acolhida de jovens associados
em viagens por período de curta duração;
2. Destinam-se a aproximar jovens de todo o mundo e incentivar o turismo da
juventude;
22 Depoimentos fornecidos por Maria José Giaretta através de e-mail no dia 13 de novembro de 2014.
107
3. Os albergues da juventude podem ser temporários ou permanentes, da cidade
ou do campo. São considerados temporários aqueles que só funcionam nas
férias ou em darás especificas, como festivais, congressos, etc.
4. Devem obedecer a requisitos mínimos da federação internacional, sendo: sala
de estar, dormitórios, banheiros com duchas, local para guardar bagagem,
cozinha de alberguista.
Vale ressaltar a similaridade filosófica e conceitual que os albergues brasileiros
possuíam com os europeus, principalmente os alemães, com mais veemência até o
final da década de 1980. Até esse período os estabelecimentos possuíam uma pessoa
que “tomava conta do albergue [...] chamado de pai ou mãe alberguista, e eram
pessoas chave no albergue, por que, além de cuidar do local, tinham como função
desenvolver o espírito comunitário nos usuários e difundir a filosofia do movimento”
(GIARETTA, 2003, p. 97).
O início dos anos 90 foram fundamentais para a consolidação do movimento
alberguista no Brasil, principalmente em razão da modernização decorrente do avanço
dos meios de comunicação eletrônicos. A rede de albergues experimentou também
uma modernização em sua estrutura, uma matriz de procedimentos foi elaborada no
intuito de controlar a qualidade dos albergues. Chamado de “manual de abertura e
operação de albergues da juventude”, essa matriz determinava
os padrões mínimos de qualidade, cursos de capacitação para inspetores de qualidade, gestão de albergues da juventude, participação do Brasil nos encontros internacionais, maior enfoque aos cuidados da natureza [focando na] educação ambiental, implantação do sistema internacional de reservas [e] entrada do alberguismo na era da internet (GIARETTA, 2003, p. 98).
No entanto, em meados da década de 90, o movimento alberguista começa a
apresentar os primeiros sinais de dificuldades. Pela primeira vez, em 1995, o número
de associados decaiu, em consequência, segundo Giaretta, do “plano Real, que
elevou os preços dos serviços e o custo de vida da população, da ausência de
propaganda eficiente, como a de 1987, [...] e a concorrência das pousadas” (2003, p.
100). Ainda se nota, a partir dessa data, um continuo distanciamento entre os
albergues e o poder público. Apesar disso os esforços da IYHF de propagar o
movimento na América do Sul não diminuíram, e o ano de 1996 foi marcada pela
108
primeira conferência da associação a ser realizada no Brasil. Mesmo assim, Giaretta
(2003, p. 100) relata que a “segunda metade da década de 1990 foi marcada pela
entrada de um menor número de albergues da juventude” na associação nacional.
Não foram encontrados registros sobre a gêneses dos hostels no Brasil, mas após a
virada do século percebe-se sua revitalização com o crescimento do número e o
aparecimento de diversas tipologias desse meio de hospedagem (NASH, THYNE e
DAVIES, 2006). Como os hostels Boutique, que oferecem serviços e infraestruturas
de alto padrão, ainda a preços relativamente acessíveis, há clientes que exigem tais
condições para se hospedarem em suas férias, porém não abrem mão de algumas
características singulares que são conhecidos por favorecerem, por exemplo, a
sociabilização entre os hóspedes (MUSA e THIRUMOORTHI, 2011).
O último grande marco histórico é a inserção da HI-Brasil no Conselho Nacional de
Turismo, em 2003. Porém, em uma última pesquisa realizada para averiguação da
condição de participação da entidade no conselho, constatou-se que a HI-Brasil foi
excluída, ou se retirou, da lista de participantes, como consta no DECRETO Nº 6.705,
DE 19 DE DEZEMBRO DE 2008 (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2008), que revoga
o anterior de 2003. Comprovando o distanciamento do poder público, não somente
em relação aos hostels, mas também à HI-Brasil.
Concluindo, as Ciências Sociais tratam, no exterior, da compreensão da modernidade,
no Brasil trata da ausência dessa (ORTIZ, 2002). No Brasil a ausência de
conhecimento sobre esse meio de hospedagem, de trabalhos científicos e de uma
classificação oficial, pode ser explicada pelo atraso ou falta da modernidade no Brasil
em comparação à Alemanha e outros países à época do nascimento dos albergues
da juventude. Espera-se que este resgate histórico, possa esclarecer o leitor quanto
à essência dos albergues da juventude e aproximá-lo de um conceito grande demais
para ser colocada dentro de quatro paredes.
109
3 VARIÁVEIS PARA UMA PROPOSTA CONCEITUAL
Nesse capítulo se inicia a proposta de uma construção conceitual do meio de
hospedagem hostel. Esta proposta é criada a partir de quatro pilares que podem ser
considerados como os de sustentação desse conceito: o primeiro é distinção entre as
palavras hostel e albergue da juventude; o segundo é a análise do público-alvo desse
meio de hospedagem; o terceiro é o trinômio hostels/hospitalidade/espaço; e,
finalmente, a matriz classificatória das áreas físicas.
3.1 Um confronto etimológico: Hostel vs. Albergue
Etimologicamente, de acordo com o Elementary Latin Dictionary [dicionário elementar
de latim] (LEWIS, 2010) e o New Latin Dictionary [novo dicionário de latim], a palavra
hospitalidade tem suas raízes no latim hospes, significando “hospedar, [e até mesmo]
anfitrião e/ou convidado” (LEWIS e SHORT, 1958, p. 371). De acordo com o Novo
Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, a palavra hospitalidade,
contemporaneamente, vem do latim hospitalitate, sendo um substantivo feminino que
se refere ao “ato de hospedar [ao] acolhimento afetuoso” (FERREIRA, 2004, p. 1058).
Outro autor, propõe que a hospitalidade “é tão antiga quanto a própria civilização [...]
e deriva da palavra de origem francesa hospice que significa dar ajuda, abrigo aos
viajantes” (WALKER, 2002, p. 4). Essa palavra e seus significados possuem ligação
direta com a palavra hostel, que de acordo com o American Heritage Dictionary of the
English Language [dicionário do patrimônio americano da língua inglesa] é um termo
proveniente do Inglês Medieval, que possui suas raízes nas palavras provenientes do
Francês Velho e Latim Medieval de hostel e hospitāle ou hospice, respectivamente.
(EDITORS OF THE AMERICAN HERITAGE DICTIONARIES, 2011).
Deve-se, também, ressaltar a relação e similaridade de conceitos que estes termos
possuem com a palavra hospital, pois atualmente o termo hospitalidade “remete a uma
reflexão e estreita relação com esta palavra, que está ligada diretamente ao
atendimento, aos desejos e aos anseios do usuário” (STOLL, 2006, p. 14).
110
A palavra hostel possui, além das ligações etimológicas, também ligações filosóficas
e comerciais diretas com os conceitos de hospitalidade, com o simples ato de
hospedar um estranho ou viajante, com a filosofia de entendimento entre as pessoas.
Suas origens remetem às primeiras excursões gregas e romanas de desbravamento
e descobrimento, onde algumas pessoas eram bem recebidas ao invés de
ameaçadas, às tavernas que ofereciam alimentos e estalagens que proviam
acomodação. Nasce, assim, o conceito moderno de hospitalidade, por volta de 1700
a.C., das primeiras estalagens em casas particulares no início do sec. XVII, as quais
praticavam a hospitalidade em seu sentido mais puro (WALKER, 2002).
Esses conceitos são mutáveis ao passar do tempo, são apropriados de formas
diferentes em locais diferentes, até que, nesse caso especifico do tema desse
trabalho, se transformaram no conceito que temos dos primeiros hostels na
contemporaneidade. Portanto, resumidamente, essa palavra entra no vocábulo do
idioma Inglês através da própria palavra hostel do francês velho, que deriva do latim
tardio hospitale, o que denota um hospice, ou um lugar de descanso, o lugar da
hospitalidade (EDITORS OF THE AMERICAN HERITAGE DICTIONARIES, 2011).
Já, a palavra albergue, de acordo com Ferreira (2004, p. 84) possui outra raiz
etimológica, diferente do latim hospes. Ela deriva do Gótico haribaírgo, e possui
significado de “abrigo, asilo, [...] local em que se recolhe alguém por caridade [e] asilo
onde se recolhem de noite os mendigos”. Portanto, é possível notar a clara distinção
etimológica, filosófica e comercial entre os termos hostel e albergue.
A adoção do termo albergue no Brasil, talvez decorra da época do Brasil Império, onde
as albergarias23, chamadas também de hospedarias, davam abrigo aos primeiros
viajantes, geralmente comerciantes, exploradores e estudiosos, em nosso país. Essas
albergarias eram instalações extremamente precárias, que serviam, a priori, mais para
dar descanso e comida aos animais dos viajantes do que conforto, hospitalidade e
segurança aos seus próprios hóspedes (VALENZUELA, 2013). Provavelmente é aqui
que se inicia a mescla de termos e confusão etimológica que se encontra atualmente.
23 Segundo Ferreira (2004, p. 84) as albergarias eram locais onde se recolhiam “os peregrinos e
viajantes, principalmente os pobres”.
111
Apesar da preferência desse autor pelo termo hostel24, nesse estudo, ainda será
usado o termo albergue da juventude e/ou youth hostel, quando estiver se tratando do
meio de hospedagem associado à HI (HOSTELLING INTERNATIONAL – HI).
O termo hostel será usado para descrever todo e qualquer outro tipo de
empreendimento contemporâneo e independente, não associado à HI. É interessante
notar que a própria HI, no exterior, adota a palavra hostel como nomenclatura oficial
e não, por exemplo, a palavra inglesa shelter, que se traduziria literalmente como
abrigo (que vem da do gótico haribaírgo, dando origem à palavra albergue). Em uma
tradução literal, albergue da juventude seria traduzido como youth shelter. Portanto,
acredita-se que a tradução de Youth Hostel para Albergue da Juventude tenha sido
equivocada, levando à um preconceito e à uma imagem enganosa. Faz-se necessário,
portanto, ou um estudo etimológico aprofundado para se achar uma palavra que
melhor traduza o hostel, ou adotar o termo em original em inglês. Nessa batalha
etimológica (ver figura 25), o vencedor deve ser o hóspede, que ao ver qualquer tipo
de anúncio de um hostel e ao se hospedar em um estabelecimento que se intitule
como tal, saberá o que essa palavra significa e quais infraestruturas básicas ou
serviços serão encontrados nesse local.
24 O termo hostel é o adotado por todos os demais países do mundo para definir este meio de
hospedagem, mesmo os que não são de língua inglesa (HOSTELWORLD, 2015). Apesar de ser um estrangeirismo em nossa língua, faz sentido adotar o termo em inglês pois esclarece e diferencia bem esse meio de hospedagem dos tradicionais albergues da juventude filiados à HI. Além disso, adotando hostel como termo oficial, se estaria, comercialmente, em sintonia com o mercado mundial.
112
Figura 25 – Batalha etimológica Hostel vs. Albergue
Fonte: elaborado pelo autor (2015).
3.2 Perfil geral do púbico alvo dos hostels
O público alvo dos hostels é difícil de ser categorizado pois não representa uma faixa
demográfica e econômica clara e específica (NASH, THYNE e DAVIES, 2006). Este
segmento de mercado, amplo e variado, pode ser considerado e definido, de uma
maneira mais específica, como um turista alternativo e/ou um backpacker/mochileiro
e, de uma maneira mais geral, como as pessoas que compõem o segmento
denominado de turismo da juventude (MUSA e THIRUMOORTHI, 2011). Nash, Thyne
e Davies (2006) e outros autores (OLIVEIRA, 2008), consideram que o turista
backpacker pode englobar as mais diversas definições, desde turista jovem, turista
não institucionalizado, turista econômico ao alocêntrico (COHEN, 2011).
Quanto ao termo juventude, este é amplo, até mesmo ambíguo e controverso, pois
delimitar uma faixa etária (dado quantitativo) para agrupar pessoas que se enquadram
num determinado estado de espírito (dado qualitativo) é como conciliar ciência e
113
religião. De acordo com a OMT, para fins de caracterização demográfica, o turismo
da juventude é aquele praticado por pessoas de uma faixa etária de 15 a 26 anos
(UNWTO, 2008). Além da OMT, diversos autores tentam limitar uma faixa etária para
definir a juventude, colocando, assim um limite quantitativo. Não há, porém, um
consenso quanto à uma faixa definida, variando de 15 a 35 anos. Mas essas noções
quantitativas da juventude pecam por não conseguirem abarcar as exceções à regra,
pois, como a própria OMT adverte, o turismo da juventude “não é apenas uma questão
de demografia, mas cada vez mais um estilo de viagem [e] os meios de hospedagem
designados para a “Juventude”, são agora usados por viajantes de todas as idades”
(UNWTO, 2008, p.01). Essa definição embarca, assim, as diversas pessoas que se
enquadram numa descrição qualitativa de juventude, mas não se encaixam na faixa
etária adequada.
Portanto, a noção que mais se aplica a esse presente estudo é de que juventude é
um conceito muito vago que varia em âmbito geral e pessoal conforme uma
determinada cultura, sociedade e indivíduo, num determinado tempo/espaço,
é um período da vida situado entre a infância e a vida adulta e que expressa todas as ambiguidades de um tempo marcado pela busca da maturidade e identidade sexual, as incertezas de assumir novos papeis sociais, posicionar-se perante a estrutura social e de poder de sua sociedade. [...] a juventude apresenta aspectos típicos do momento “limítrofe” dos ritos de passagem [...] esse esquema se aplica também ao processo de socialização dos indivíduos [...] a juventude deve ser considerada uma fase crucial para a formação e a transformação de cada um, quer que se trate da maturação do corpo ou do espírito, quer no que diz respeito às escolhas decisivas que preludiam a inserção definitiva na vida da comunidade (LEVI e SCHMITT, 1996, p. 11 apud GIARETTA, 2003, p. 02)
Esse período de vida, citado acima, pode variar imensamente para cada indivíduo
dentro de um grupo específico e, também, de sociedade para sociedade, e entre
culturas diferentes. O processo de socialização, de formação e transformação pessoal
e a determinação de uma idade para a maturidade sexual, e principalmente a social,
que irá determinar a posição de um indivíduo perante sua sociedade em um
determinado tempo/espaço pode variar igualmente. Portanto, vale levar em conta que
o conceito de turismo da juventude é definido não somente pela faixa etária de seus
componentes, mas também pelo seu comportamento, que inclui, não somente, a
114
autoafirmação, busca de liberdade, crescimento pessoal e intelectual, o desafio presente no turismo de aventura, a busca da exaltação. O desbravamento, traço característico do mochileiro que acaba trazendo ao turismo o descobrimento de novos destinos, [...] a forma de andar, vestir, o corte de cabelo e até mesmo os hábitos alimentares (GIARETTA, 2003, p. 09).
No caso do Reino Unido, essa faixa etária é considerada oficialmente tão ampla que
pode abarcar pessoas de 15 a 60 anos de idade (NASH, THYNE e DAVIES, 2006),
porém, ainda de acordos com os autores, todos possuem características em comum,
como “a preferência por alojamento barato, uma ênfase em conhecer outros viajantes,
[realizam] uma viagem organizada de forma flexível e com cronograma
independentemente, as férias geralmente são longas ao invés de breves, [e dão]
ênfase para atividades informais e participativas” (p. 526).
Dentro dos aspectos quantitativos pode-se caracterizar o público alvo dos albergues
da juventude conforme o estudo realizado por Giaretta (2003), sobre a demanda deste
meio de hospedagem no estado de São Paulo, com um universo de 400 alberguistas
entrevistados em 07 albergues, dividindo este segmento em “quatro categorias:
demográfica, socioeconômica, de motivação e o tipo psicográfico” (p. 103). Mediante
os dados de Giaretta (2003), a maior parte da faixa etária dos alberguistas de São
Paulo encontra-se acima dos 26 anos, com 56,75% da amostra, contrariando, assim,
diretamente a classificação padrão da OMT que limita esse segmento de mercado até
26 anos. Isso pode provar o quanto a idade é irrelevante se comparado ao estilo de
viagem dos turistas que se consideram jovens e que usam meios de hospedagem
destinados ao turismo da juventude (LARSEN, ØGAARD e BRUN, 2011).
Ainda, tendo como base o estudo realizado por Giaretta (2003), percebe-se que, ao
contrário do que o preconceito popular preconiza, os alberguistas não são turistas de
baixa renda. A maioria dos entrevistados se situam na faixa mais superior de renda
da pesquisa, onde 47,64% possui uma renda mensal superior a nove salários
mínimos. No entanto, isso não significa que esse tipo de visitante relaciona como um
bom meio de hospedagem aquele que cobra mais caro por sua infraestrutura e
serviços, pois utiliza os albergues como meio preferido e o gasto médio de viagem por
dia ainda continua relativamente baixo, até R$ 50/dia, se comparado à alta renda.
115
Talvez o quesito mais importante sobre a definição desse público alvo seja quanto ao
seu tipo psicográfico. Essas características psicográficas tentam expressar a essência
dos frequentadores de hostels, quem eles realmente são e o que buscam quando em
viagens. São essas as características que determinam o tipo de viagem que realizam,
o tipo de transporte que utilizam, assim como os meios de hospedagem, serviços e,
principalmente, quais as relações que mantêm com o destino visitado (AKATAY,
ÇAKICI e HARMAN, 2013).
Para compreender melhor essa tipologia psicográfica deve-se remeter ao modelo
classificatório criado por Stanley Plog em 1974. Esse modelo teórico propõe que a
popularidade de um destino está associada diretamente à personalidade inerente dos
viajantes (PERSONAL, SOCIAL AND HUMANITIES EDUCATION SECTION, 2013).
Plog sugere que os viajantes podem ser classificados, de acordo com suas diferentes
personalidades, em diferentes tipos. Primeiramente, são estabelecidos os tipos de
personalidades opostas, sendo elas a alocêntrica e a psicocêntrica, e posteriormente
a que se encaixa entre as duas anteriores, a mesocêntrica (GIARETTA, 2003).
O turista do tipo alocêntrico (de latim ale, "outro" + grego kéntron, "ponto central"), que
caracteriza a maior parte dos backpackers (PARIS e TEYE, 2010), possui alto nível
de curiosidade, um apelo pelo desejo por aventura, preferem destinos ainda não
desenvolvidos turisticamente, são flexíveis e dão preferência aos atrativos
educacionais, culturais e exóticos (CUNHA, 1997 apud GIARETTA, 2003, p. 104).
Além disso esse tipo de turista quanto ao comportamento, é extrovertido e
autoconfiante. O indivíduo alocêntrico
prefere explorar áreas novas e incomuns antes que os outros o façam [...] gostam de conhecer pessoas de outros países ou diferentes culturas [...] preferem não estar comprometidos com um itinerário estruturado [e] ter a liberdade para explorar uma área, fazer o seu próprio roteiro e escolher uma variedade de atividades e atrações turísticas (PERSONAL, SOCIAL AND HUMANITIES EDUCATION SECTION, 2013, p. 36).
O turista do tipo psicocêntrico tem suas preocupações de viagem direcionadas ao seu
próprio ser, às suas preocupações pessoais, são considerados passivos,
caracterizando um tipo de turismo sedentário, possuindo, assim, um interesse
relativamente limitado no mundo exterior e no destino e pessoas visitados (FIRTH e
116
HING, 1999). Por consequência, acabam por procurar serviços e infraestrutura, como
os meios de hospedagem, tradicionais, viagens organizadas por terceiros e destinos
de fácil acesso e desenvolvimento consolidado (CUNHA, 1997 apud GIARETTA,
2003, p. 104). Além disso, os turistas psicocêntricos possuem a tendência para serem
pessoas
mais conservadoras. Eles tendem a ser inibidos e não-aventureiro. Preferem voltar para destinos de viagens familiares, onde eles podem relaxar e saber quais os tipos de alimentos e atividade que esperar. [...] ao organizarem um pacote turístico, os psicocêntricos preferem um itinerário estruturado de forma que eles sabem o que esperar. A segurança é muito importante para este grupo (PERSONAL, SOCIAL AND HUMANITIES EDUCATION SECTION, 2013, p. 36).
Já, os turistas mesocêntricos encontram-se em uma classificação que se posiciona
relativamente no meio das duas anteriores. Dentro do turismo, essa tipologia abrange,
talvez, o maior número de pessoas/turistas, que resumidamente tendem a não ser
extremamente aventureiros, mas são abertos a novas experiências (PERSONAL,
SOCIAL AND HUMANITIES EDUCATION SECTION, 2013).
Tabela 2 – Tipologia dos alberguistas, segundo modelo de Stanley Plog
Tipo F (n=394) %
Alocêntrico 226 57,36
Cêntrico 146 37,06
Psicocêntrico 22 5,58
Total 394 100
Fonte: Giaretta (2003).
Conforme a tabela 2, Giaretta (2003) mostra, sem generalizar com os demais perfis
de outros estados, que a maior parte do alberguistas do estado de São Paulo, podem
ser classificados como alocêntricos, com 57,36%, seguidos dos indivíduos
mesocêntricos, com 37,06, e somente 5,58 indivíduos da pesquisa foram
caracterizados como psicocêntricos. Esse fato comprova a expectativa de que
pessoas que possuem a tendência a se encaixar com mais facilidade no perfil
psicocêntrico são considerados os principais frequentadores dos hostels (FILHO,
2010), devido às suas características culturais, sociais e de sua relação com o turismo,
população e local onde se encontram (OOI e LAING, 2010).
117
Portanto, os hostels possuem um público alvo de perfil ativo (participa de atividades
intra e extra hostel, com alta frequência) (KHOZAEI, HASSAN e KHOZAEI, 2010),
ambientalmente consciente (preocupado com a cultura e meio ambiente do local
visitado), que prefere a interação com a comunidade, cultura e gastronomia locais,
viaja por mais tempo e preza pelo bem-estar de todas as partes envolvidas no
processo de visitação turística (CICCIO, 2011; FILHO, 2010; FIRTH e HING, 1999;
GIARETTA, 2003; KHOZAE, et al., 2010; NASH, THYNE e DAVIES, 2004; UNWTO,
2010).
Apesar do turismo da juventude estar relacionado “a um produto ou estilo de viagem
particular (como [mas não somente] as viagens independentes, os mochileiros,
viagens de aventura, o estudo da língua, da troca experiências, e intercâmbio de
trabalho”), esse tipo de turismo, assim como os hostels, servem “como um veículo
para o intercâmbio internacional e para a paz e compreensão mundial” (UNWTO,
2008, p. 01).
3.3 O trinômio hostel-hospitalidade-espaço
Mostra-se aqui o tipo de relação que os hostels podem possuir com a hospitalidade e
o espaço que ocupam. É importante ressaltar que nem todos os hostels possuem essa
condição exposta a seguir, isso depende da qualidade da infraestrutura e dos serviços
prestados. No entanto o que se busca é mostrar que desde sua gênese até os dias
de hoje, os hostels podem, com facilidade, se aproximar dos conceitos de
hospitalidade pura/ genuína. Sendo assim podem constituir um meio de hospedagem
voltado ao turismo sustentável, um local voltado às pessoas, muito mais do que um
simples local barato para se pernoitar. Como se mostra nos exemplos a seguir.
3.3.1 As relações entre hostels e hospitalidade
De acordo com o Instituo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN),
patrimônio imaterial é tudo aquilo que diz
respeito àquelas práticas e domínios da vida social que se manifestam em saberes, ofícios e modos de fazer; celebrações; formas de expressão cênicas, plásticas, musicais ou lúdicas e nos lugares, tais como mercados, feiras e santuários que abrigam práticas culturais coletivas. [...] essa definição está em consonância com a Convenção
118
da Unesco [...] que define como patrimônio imaterial "as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas - junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados - que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural. Enraizado no cotidiano das comunidades e vinculado ao seu território e às suas condições materiais de existência, o patrimônio imaterial é transmitido de geração em geração e constantemente recriado e apropriado por indivíduos e grupos sociais como importantes elementos de sua identidade (IPHAN, 2015).
A hospitalidade consiste numa relação social entre o hóspede e o anfitrião. É o
agrupamento dos costumes e simbologias culturais que compõe o ato ou prática de
ser hospitaleiro, mais especificamente, inclui a recepção e entretenimento dos
hóspedes, visitantes ou estranhos, nos âmbitos sociais, rituais e éticos, passados de
geração a geração (CAMARGO, 2008). Se analisarmos as origens de nossa
civilização ocidental, afim de entender a filosofia alberguista, podemos voltar à Grécia
antiga, onde Xênia (em tradução informal do Grego: amizade-hospedeira)
corresponde ao antigo conceito Grego de hospitalidade, da generosidade e cortesia
demonstrada àqueles que estão longe de seus lares (WALKER, 2002). Os antigos
rituais gregos de hospitalidade mostram que esse fenômeno tem origem nos
domicílios ou nas residências e é uma relação recíproca entre anfitrião e convidado,
expressada em benefícios materiais (como a doação de um presente), e também de
uma forma intangível (tal como proteção, abrigo e até mesmo amizade) (ALMEIDA,
2009). Um tema recorrente na mitologia grega é o caso em que os seres humanos
demonstram sua virtude estendendo hospitalidade a um estranho (xenos), que acaba
por ser uma divindade disfarçada, com a capacidade de conceder recompensas
(CHELHOD, 1990). Portanto, “a história da hospitalidade é a história do homem, de
seus encontros, de seus diálogos e de tudo aquilo que ele tem criado para facilitar sua
aproximação com seus semelhantes” (GRINOVER, 2007, p. 20).
Essas histórias ensinam que qualquer hóspede deve ser tratado como potencialmente
uma divindade disfarçada, todos devem ser tratados de forma igualitária, sem
descriminação e recebendo o melhor que o anfitrião tem a conceber (FERRAZ, 2013).
Estas ideias morais ajudaram a estabelecer o conceito contemporâneo de
hospitalidade, que além de ser um costume grego é um ato fundamentalmente
humano, tem até contribuído na definição de questões sócio-políticas e econômicas,
expressas pelos paradigmas de honra, em sociedades antigas (Grécia Antiga e Roma,
119
em particular) onde as regras de hospitalidade foram legalmente e religiosamente
definidas (GOTMAN, 2011; LOUDEN, 2011; MONTANDON, 2011). Portanto, o
acolhimento de um estranho, como fator remanescente da antiga hospitalidade
adaptada ao conceito de hospitalidade moderna
e o conjunto dos comportamentos, das políticas e das técnicas praticadas para ter bom êxito na aproximação do turista (hóspede/estranho), no sentido de uma relação humana de qualidade, com o objetivo de satisfazer sua curiosidade, suas necessidades, gostos e aspirações, na perspectiva de desenvolver um encontro de trocas, de modo a estimular o conhecimento, a tolerância e a compreensão entre os seres humanos” (SEYDOUX, 1983 Apud. GRINOVER, 2006, p. 32).
Como se pode perceber a raiz da hospitalidade dá-se entre duas pessoas: aquele que
recebe e aquele que é recebido. Corresponde a uma relação interpessoal entre o
hóspede e o anfitrião que, além disso, pode ser “uma instituição, uma organização
social, isto é, uma organização integrada em um sistema que pode ser institucional,
público, privado ou particular” (GRINOVER, 2006, p. 31). Seguindo esta ideia de
mudança de paradigmas, vê-se na modernidade europeia um lento declínio do
prestigio da hospitalidade doméstica e o novo símbolo de prestigio transitando para
os hotéis, como lugares ou espaços desejáveis. Esses locais, que se originaram dos
antigos albergues, passaram por um processo de transformação de um reduto de
pessoas que não seriam recebidas em casas particulares para hoje serem novo
símbolo de lazer, hospitalidade e status (CAMARGO, 2008; MONTANDON, 2011).
Atualmente, em um segmento de mercado de competição acirrado, como o da
hotelaria, e diante de um cliente exigente, raro e volátil, (a hotelaria) será obrigada a
restabelecer um contato mais próximo com a demanda por diversos meios, como
através da personalização e formulação comercial da relação pessoal e até mesmo
através da proposta da gestão das emoções dos hóspedes (MANOSSO, GÂNDARA,
et al., 2012). Essa proposta, de personalização e gestão emocional da hospitalidade
com fins estritamente comerciais, é a própria negação da verdadeira hospitalidade
(GOTMAN, 2009). Por tanto, para Gotman (2009), a tentativa de usar a genuína
hospitalidade como alternativa de diferenciação comercial, fracassa antes mesmo de
ser tentada, pois a encenação muitas vezes forçada, a falta de desejo e vocação dos
recursos humanos de atuarem no âmbito da hospitalidade (fazendo-o muitas vezes
120
apenas por necessidade), e o câmbio monetário entre anfitrião e hóspede
determinada uma relação comercial e não um ato de hospitalidade.
As ideias de hospitalidade genuína25, a qual de acordo com Gotman (2009) é
extremamente rara no turismo, devem, a princípio, promover uma quebra de
fronteiras, uma aproximação cultural e, mais importante, uma alteração básica de
consciência tanto do anfitrião como do hóspede (PERAZZOLO, SANTOS e PEREIRA,
2013). O primeiro deve deixar de ver o segundo como uma autoridade/subalterno e o
segundo deixar de percebê-lo como um estranho/cliente, e ambos passarem a terem-
se como seres iguais. Isso acontece através do estranhamento inicial, do
relacionamento interpessoal, e posteriormente da mudança de ideias que produz um
novo significado. Mesmo que haja o ato de pagar pela hospedagem, essa mudança
de consciência, de relacionamento entre anfitrião e hóspede é passível de acontecer,
com mais frequência nos hostels do que nos hotéis convencionais.
Na verdade, o que se vê no turismo em grande número de casos, é uma série de
conflitos entre “anfitrião” e “hóspede”. Se percebe que, nesses casos de conflito, o
receptivo turístico não oferece seu melhor serviço de livre arbítrio e bom intuito
(conceito de dádiva) (CAMARGO, 2004; GOTMAN, 2011; GRINOVER, 2002;
MONTANDON, 2011). O visitante, em seu papel de cliente, exige certo tipo de
tratamento ou serviço simplesmente por que está pagando e é de seu direito. Este
conflito resulta, em parte, ao fato de que a maiorias das pessoas que trabalham com
receptivo turístico, na hotelaria ou em outros segmentos, não possuem o dom do bem
receber, muito menos a intenção de receber e servir alguém estranho, visto que em
diversas culturas o ato de servir é visto como degradante (MONTANDON, 2011).
Parte dos recursos humanos em hospitalidade turística, dedica-se a esse tipo de
trabalho porque não possui outra alternativa socioeconômica. Gotman (2011)
considera a verdadeira hospitalidade como uma virtude, um assunto de real beleza e
um reflexo da filosofia moral antropológica. Talvez se deva abordar a hospitalidade no
25 Para Gotman (2009) existem duas realidades básicas da noção de hospitalidade, a verdadeira e a
fake (falsa). Na genuína, seu sistema de regras e conjuntos de atos que compõe a noção de hospitalidade estão estruturadas no sistema de dádiva, proveniente da hospitalidade doméstica. Já a fake é caracterizada por uma encenação do receptivo turístico.
121
turismo de uma forma mais sincera, não só como uma mimese da verdadeira, mas
como uma honesta demonstração de afeto a um estranho, por pessoas que queiram
realizar estes tipos de atos para com o visitante (ALMEIDA, 2009). Quando se analisa
a hospitalidade no turismo, especialmente nos meios de hospedagem, é prudente que
se tenha em mente que ela constitui um embate entre as relações interpessoais. Cada
nicho cultural de um determinado destino turístico possui, intrinsicamente, suas
próprias maneiras de demonstrar tanto a hospitalidade quanto a inospitalidade. Por
isso é que a hospitalidade, enquanto um atributo ou qualidade, está tão ligada ao
patrimônio cultural da humanidade, pois constitui um reflexo de como cada nação ou
grupo menor de pessoas age em relação ao estrangeiro em diversas situações
domésticas, públicas e comerciais (MONTANDON, 2011).
Portanto, é de fundamental importância considerar hospitalidade como
demonstrações culturais ou de sistemas culturais, os quais são
padrões de comportamento socialmente transmitidos, que servem para adaptar as comunidades humanas aos seus embasamentos biológicos. Esse modo de vida das comunidades inclui tecnologias e modos de organização econômica, padrões de estabelecimento, de agrupamentos sociais e organização política, crenças e práticas religiosas, e assim por diante (KEESING, 1974, p. 75).
Esse modo de vida, para que a hospitalidade seja considerada como parte formadora
do patrimônio cultural de um determinado destino turístico, deve ser analisado como
“uma qualidade social antes de ser uma qualidade individual, um fenômeno que
implica uma organização” (GRINOVER, 2006), e somente assim pode-se atribuir
significado e importância a estas manifestações de hospitalidade como um ato
coletivo, demonstrando o patrimônio cultural de um local.
Adicionalmente, sobre a ideia de hospitalidade como patrimônio cultural, Camargo
(2008) advoga que a perspectiva da verdadeira hospitalidade “coloca seres humanos
como protagonistas de um ritual ancestral, com regras definidas e mantidas
secularmente, sempre renovadas e adaptadas, mas sempre mantidas como leis não
escritas, ainda mais fortes que as leis escritas, a ponto quase de constituir uma
segunda natureza” (p. 42), sendo essa, demonstrada através da hospitalidade.
122
A transformação de costumes em cultura é algo natural e a preservação desses, e
sua consequente demonstração perante estranhos, pode ajudar o turismo rumo à
verdadeira hospitalidade. Gotman (2011) ainda adverte para a diminuição da
hospitalidade no mundo individualista contemporâneo ocidental, dando a verdadeira
hospitalidade como rara. Nas sociedades democráticas onde a igualdade domina as
relações sociais, a privatização da esfera doméstica não prevê um lugar específico
para o estranho. Onde os hostels se encaixam nesse turbilhão de definições
filosóficas, morais e costumes, nessa dicotomia entre a verdadeira e a falsa
hospitalidade? Numa posição privilegiada que pode servir de modelo à hotelaria, em
como agir em direção à hospitalidade sincera, promovendo um contato mais pessoal
e genuíno entre anfitrião e hóspede, uma relação direta entre visitante e patrimônio
cultura local através de demonstrações de hospitalidade. Visto que suas raízes estão
fincadas em atos da mais genuína hospitalidade.
Ainda que estudos mais aprofundados sobre a relação entre os hostels e a
hospitalidade devam ser realizados, algumas análises primordiais podem ser
sintetizadas a partir dessa análise:
1o – As demonstrações de hospitalidade de uma determinada cultura fazem parte do
patrimônio cultural de um destino turístico;
2o – Os hostels possuem, em sua gênese, ligação direta com essas demonstrações
de hospitalidade local, consequentemente com patrimônio cultural de um destino;
3o – A “hospitalidade genuína”, se possível dentro do turismo, é mais provável que
aconteça em estabelecimentos de pequeno porte, empresas familiares e nos hostels,
que nasceram desse conceito e o tem incorporado em sua filosofia desde então;
Considerando o modo como o turismo de massa se organiza “[...] a efemeridade da
relação do turista com os territórios visitados constitui uma barreira cada vez mais
difícil de ser transposta” (CRUZ, 2001, p. 23). Espera-se que tenha conseguido
demonstrar a possibilidade de uma nova relação entre visitante e meio de
hospedagem, consequentemente com o destino turístico, sua cultura e povos locais.
Para aqueles que procuram por uma relação mais pessoal, humana e preocupada
123
ambiental e socialmente com as partes envolvidas no fenômeno turístico, os hostels
podem representar uma opção de combate à “frieza” e à falta de sustentabilidade
constatada em parte hotelaria convencional (OOI e LAING, 2010). Concluindo, a
relação entre a essência da filosofia dos albergues da juventude com o patrimônio
cultural de destinos turísticos, na forma da hospitalidade, se mostra em muitos casos
como evidente e indissociável. A gênese alberguista nos mostra que os alicerces dos
primeiros albergues estavam diretamente relacionados à hospitalidade genuína, à
cultura local, ao relacionamento interpessoal dos seus integrantes e desses com o
meio visitado.
3.3.2 As relações entre hostels e o espaço
Além do exposto anteriormente, ainda de acordo com sua gênese, os albergues da
juventude estão ligados à preservação de edifícios históricos, os quais nos remetem
diretamente ao patrimônio histórico e cultural. Na sequência desse estudo se buscará
estabelecer uma relação entre os hostels e espaço, que pode resultar no fomento ao
turismo sustentável através da conservação de edifícios de interesse histórico. Não é
o propósito desse subcapitulo determinar que todo e qualquer hostel necessite dessa
premissa para ser caracterizado como tal, mas mostra-se que, desde sua gênese,
esse meio de hospedagem favorece a conservação desses locais de interesse
histórico e consequentemente possuem, em sua essência, o potencial de constituírem
um meio de promover a conservação do patrimônio histórico edificado, a hospitalidade
urbana e, consequentemente, o turismo sustentável.
De acordo com o IPHAN, patrimônio material é
composto por um conjunto de bens culturais classificados segundo sua natureza, conforme os quatro Livros do Tombo: arqueológico, paisagístico e etnográfico; histórico; belas artes; e das artes aplicadas. Os bens tombados de natureza material podem ser imóveis como os cidades históricas, sítios arqueológicos e paisagísticos e bens individuais (IPHAN, 2014).
Dentro das definições de turismo já revistas anteriormente, pode-se notar que dois
componentes básicos são necessários para que este fenômeno ocorra: 1) a pessoa,
o viajante, sedento por deixar seu habitat natural, desejando viajar; 2) e o destino, o
objeto, o território ambicionado pelo observador (GOELDNER, RITCHIE e
124
MCINTOSH, 2002; KRIPPENDORF, 2009; LOHMANN e NETTO, 2012;
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2008; UNWTO, 2010). Neste processo, onde o
turismo ocorre, diversas variáveis interagem entre observador e objeto (viajante e
destino, turista e paisagem) dando origem a um fenómeno complexo e extremamente
interativo. De uma maneira básica, desconsiderando inúmeras variáveis desse
fenômeno, vê-se que para chegar ao destino é necessário o transporte. Uma vez no
destino, a acomodação e a alimentação se fazem necessárias, como demonstrado na
figura 26.
Figura 26 – Representação gráfica do processo turístico
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
O observador se debruça sobre esse tripé que contempla o território, apoiado nas
bases do transporte, acomodação e alimentação (sendo que a hospitalidade permeia
todas estas interações). É primordial, no turismo contemporâneo (realizado de forma
organizada e com ambições sustentáveis), que o planeamento do território e
empreendimentos turísticos que o ocupam, seja desenvolvido de maneira que supra
as necessidades de todas as partes envolvidas no processo turístico e preservem
esse território para futuras gerações. Pois, o turismo possui grande potencial de
proporcionar aos destinos uma alternativa de desenvolvimento sustentável que “tem
plenamente em conta os seus atuais e futuros impactos econômicos, sociais e
125
ambientais, abordando as necessidades dos visitantes, a indústria, o ambiente e as
comunidades anfitriãs” (UNWTO, 2005, p. 12).
Quando contemplamos o desenvolvimento do território turístico, a criação do
patrimônio histórico edificado e a apropriação desse patrimônio via meios de
hospedagem, levantam várias questões. Dentre elas, uma atinge certeiramente o
tema deste estudo: Como devemos abordar o planejamento turístico e a utilização do
patrimônio histórico, de forma que estes supram as necessidades dos envolvidos com
o turismo e se mantenha “vivo” para futuras gerações?
Reflexões decorrentes dessa última questão são essenciais ao turismo, pois em sua
gênese esta atividade tem sido concebida quase que exclusivamente como atividade
comercial, com um só objetivo, o da capitalização monetária. O passado não deve
somente ser vendido, como preconizam alguns autores (HENDERSON, 2013), mas
sim lembrado, preservado e usado como fonte rica de conhecimento, de aprendizado.
O turismo possui além dos aspectos econômicos, um viés impactante na vida de
pessoas e lugares. Devemos abordar este assunto de forma holística e sustentável,
considerar a racionalidade das formas de condicionamento, de utilização e de
apropriação do espaço se quisermos assegurar aos lugares26 alguma hegemonia e
competitividade (LAZAROTTI, 1994 apud. CRUZ, 2001), pois o turismo
só pode ser entendido à luz de matrizes conceituais-metodológicas que iluminam o contexto social da modernidade, [que impuseram] um pacto social baseado na redistribuição do excedente material da produção e na distinção bipolar do espaço-tempo, nomeada como esfera de trabalho e esfera do ócio (RODRIGUES, 2006).
Portanto, o turismo possui a vantagem de poder agir como uma alternativa econômica
a ser realizada com foco em resultados que considerem o bem-estar social e
ambiental dos destinos. Apresentar o turismo como um fenômeno sustentável – que
nasce no destino turístico, tem seu processo desenvolvido pela e para a comunidade
local, envolvendo-a e beneficiando-a, assim como o espaço onde este se encontra, e
gerenciado de uma forma que possa ser aproveitado por gerações futuras
indefinidamente – é uma proposta árdua e desafiadora.
26 Entenda-se aqui como lugar um conjunto inseparável de sistemas de objetos, territórios, ações, de
pessoas, culturas e história em um sem fim de interações solidárias, mas contraditórias que se dão em determinado recorte temporal (CRUZ, 2001).
126
O objetivo deste subcapítulo é estabelecer uma relação direta entre:
a) território turístico – como o homem se apropria dos espaços,
consequentemente dos destinos turísticos e como, reciprocamente, o território
influencia nessa apropriação;
b) patrimônio histórico edificado – representado por castelos, fortificações,
palácios e edifícios de valor universal, podendo favorecer essa interação entre
homem e território, da cultura e patrimônio local;
c) hostels – por poderem ocupar tais locais na atualidade, em decorrência de sua
gênese histórico-social e da possibilidade de auxiliar na conservação desse
patrimônio.
É possível apontar os hostels, através de seus conceitos e filosofia, como opção de
renovação conceitual dentro da hotelaria e de desenvolvimento sustentável, através
do potencial de conservação do patrimônio cultural edificado. Propõe-se que quando
essas três partes interagem, produzem estabelecimentos de caráter, utilidade e locais
únicos, e acabam colaborando na interação entre visitantes e anfitriões, na promoção
do patrimônio cultural dos locais onde se encontram e no desenvolvimento do turismo
com ambições sustentáveis.
No trinômio abordado nesse subcapítulo (espaço/patrimônio/hostel) deve-se
considerar como primeiro componente do fenômeno turístico o espaço territorial pois,
este é o elemento receptor do turismo, que produz e mantem os atrativos turísticos. É
o território turístico que sofre os impactos, tanto positivos quanto negativos desta
atividade. Além disso, é nele que o turismo se realiza e é no destino que se percebe
o caráter “imutável27” do fenômeno turístico. É na imutabilidade do território – extensão
considerável de terra [...] base geográfica que abrange o solo, rios, mares, lagos
interiores, golfos, baías (FERREIRA, 2004) – que o turismo se constrói. É com este
território que interagimos e sobre ele que construímos nossos alicerces, ambos
27 Sabe-se que, apesar de hoje o homem conseguir transformar e modelar grande parte do território à
sua conveniência, não obstante, ainda há obstáculos territoriais intransponíveis e inalterados. A base espacial, o território onde vivemos se mantem relativamente perene, enquanto nossas representações sociais, em justaposição, são voláteis e mutáveis.
127
ideológicos e materiais (CARVALHO, 2011). É no espaço que materializamos nossos
conceitos e vivemos o que percebemos por realidade, portanto o território é, em cada
recorte temporal específico, a representação social de sua época e
a localização num dado sítio e num dado momento das frações da totalidade social depende tanto das necessidades concretas de realização da formação social quanto das características próprias de um sítio [...] o local torna-se assim, a cada momento histórico, dotado de uma significação particular (SANTOS, 1979, p. 16).
Cada peculiaridade deste espaço determina as características sociais da população
que o ocupa e vice-versa, produzindo desde o desenvolvimento sustentável à
segregação social (MESQUITA e XAVIER, 2013). Consequentemente, estas
peculiaridades espaciais, essas rugosidades, moldam também o patrimônio histórico,
material e imaterial, no decorrer da formação da sociedade (SANTOS, 2013). Haja
vista que estas edificações são o resultado da interação entre Homem (modos de
produção e interação entre classes sociais) vs. Natureza – aqui tida como
espaço/território/paisagem turística. A função (utilidade), de cada forma material
(edificação), depende do contexto social em que se encontra, o qual muda no decorrer
do tempo (CRUZ, 2001; SANTOS, 1979; 2013), pois “a paisagem oferece pistas
materiais que permitem perceber seu caráter histórico [...] que conduzem ao
entendimento geomorfológico e social da paisagem contemporânea e de suas
sucessivas fisionomias anteriores, ao longo do tempo” (YÁZIGI, 2002).
O turismo tem como seu “principal objeto de consumo o espaço, entendido como o
conjunto indissociável de objetos e de ações, de fluxos e fixos” (CRUZ, 2001, p. 17).
Especialmente, a hotelaria se enquadra no setor terciário, o qual experimentou grande
crescimento com o acúmulo de capital e tempo livre após a Revolução Industrial.
Anteriormente, os bens adquiridos eram de ordem material e atualmente uma parcela
da sociedade pode se dar ao luxo de consumir bens culturais, imateriais, como as
viagens (HARVEY, 1993). Mas, a hotelaria, também pode ser colocada como um bem
material e edificado, quando atua na preservação do patrimônio histórico. Sendo
assim, age em ambas as frentes de encontro entre turista e território. Surge daí a
necessidade de suprir essa demanda por serviços turísticos através do planejamento
do território. Em alguns casos notamos o surgimento desordenado desses serviços,
através de pequenas empresas ou negócios de turismo como meio de sobrevivência,
128
de pessoas ou famílias inseridas nesse novo sistema econômico que impõe
transformações globais como se fossem naturais (SANTOS, 1979).
Nem sempre essa demanda é suprida de forma adequada qualitativa e
quantitativamente, e nem sempre esta relação é benéfica a todas as partes,
acarretando diversos atritos e consequências por vezes desastrosas para visitantes,
comunidade local e meio ambiente de destinos turísticos. O conceito de território
turístico, compila todas as interações sociais e transformações materiais e culturais
do homem no espaço “determinadas por necessidades sociais, econômicas e
políticas; assim, o espaço reproduz-se, ele mesmo, no interior da totalidade, quando
evolui em função do modo de produção e de seus momentos sucessivos” (SANTOS,
1979, p. 18). Para o turismo isso é a fonte de sua criação, pois este fenômeno
ocorre no processo de transformação dos territórios para seu uso, com outros usos do território, bem como com suas formações socioespaciais precedentes a seu aparecimento. Apesar desses confrontamentos, a força do turismo é dada por sua capacidade “de criar, transformar e, inclusive, de valorizar, diferencialmente, espaços que podiam não ter valor no contexto da lógica de produção (Nicolás, 1996)” (CRUZ, 2001, p. 17).
Esta apropriação do território pelo turismo pode ocorrer de forma organizada ou não,
de forma oficial ou marginalizada, e são os acontecimentos históricos, socioespaciais
que determinaram como essa apropriação se realiza, conferindo-lhes características
e qualidades, através do uso e da atribuição de significado aos espaços ocupados
pela sociedade (CRUZ 2001; SANTOS, 1979; YÁZIGI, 2002). Essa relação entre
território e turista muitas vezes é vista como efêmera e transitória, não somente pelo
curto espaço de tempo em que o turista passa em contato com o território, mas
também pela superficialidade, rigidez e pasteurização dos pacotes turísticos. Assim
como, pela personalidade e posicionamento do turista perante o território e vice-versa
(CRUZ, 2001). A percepção visual, componente primário, mas não único da interação
turista/território, é “uma condição fundamental para a existência cultural da paisagem
[e] não há paisagem [território turístico, neste caso efêmero] sem um observador”
(YÁZIGI, 2002). No entanto, confiar apenas no contato visual com a paisagem
turística, proporciona uma interação apenas superficial. O destino consiste-se de
representações e interações pessoais, ambientais e sociais. A relação turista/território,
chamado de fenômeno turístico, ocorre no contato pessoal, em uma paisagem que
129
não é um objeto. Para compreendê-la, não basta saber como se agenciam morfologicamente os componentes do ambiente, nem como funciona a fisiologia da percepção [...] é preciso também conhecer as determinações culturais, sociais e históricas da percepção – isto é, aquilo que constrói a subjetividade humana (BERQUE, 1995).
Essas interações são inseparáveis e criam nossa percepção de realidade
socioespacial e moldam nossas experiências de vida, assim como nossas interações
turísticas. É desta premissa que partimos para a inclusão dos hostels nesse raciocínio.
Esses locais nasceram de uma relação entre sociedade-espaço diferente de outros
estabelecimentos comerciais de apoio ao turismo. Por consequência, possuem uma
filosofia social e cultural que promove a integração entre pessoas e destinos, pois
transmitem importantes mensagens para aqueles que os visitam. A interpretação
desses destinos pode contribuir para a manutenção e reconstrução de uma identidade
cultural (HORVÁTH e NAGY, 2012). A conservação e promoção do patrimônio
histórico em edificações que em outro contexto histórico-social encontravam-se em
estado de abandono, pode se dar pelo meio de hospedagem tema dessa pesquisa,
pois muitos são, agora, ocupados por albergues da juventude.
Os hostels podem agir como uma segunda-residência, onde a “posse do meio de
hospedagem e a reincidência da visita instigam uma relação mais duradoura e menos
fugidia entre turista e território turístico, o que o turismo na hotelaria dificilmente poderá
estimular” (CRUZ, 2001). A relação mais profunda entre e visitante e destino pode,
através de suas características e de sua apropriação do território, dar origem à pratica
de um fenômeno turístico mais sustentável. É dessa interação – entre homem e
território, dos embates sociais, culturais e históricos que ocorrem sobre o território –
que brota o que hoje chamamos por patrimônio histórico edificado. É do convívio, e
muitas vezes da luta, entre homem e natureza que nasce a superação e a construção
de nossos bens materiais e imateriais.
As “faíscas” decorrentes dos atritos dessa relação são as manifestações reais de
nossa civilização, assim como a luta de classes sociais escrevem as leis no decorrer
de nossa história
130
os modos de produção escrevem a História no tempo, as formações sociais escrevem-na no espaço [...] a história da formação social é aquela da superposição de formas criadas pela sucessão de modos de produção28, da sua complexificação sobre o seu território espacial dando-lhe assim novo sentido (SANTOS, 1979, p.15).
Esse “novo sentido” expressado por Santos (1979), dado a todo o território e as
interações acontecidas sobre este, pode ser traduzido como patrimônio. Na verdade,
este conceito é extremamente amplo e complexo. Segundo o Novo Dicionário Aurélio
da Língua Portuguesa (FERREIRA, 2004) a palavra patrimônio em sua raiz significa
“herança paterna”, o que herdamos de nossos pais, esta herança podendo ser as mais
diversas, desde um bem material à uma receita de família. Portanto, em uma análise
mais profunda podemos definir o patrimônio como o conjunto de bens culturais e
naturais, de valor reconhecido para determinada localidade, ou para a humanidade,
que uma pessoa, grupo ou entidade possuem, e que ao se tornarem protegidos ou
tombados, devem ser preservados para o usufruto de futuras gerações (BARRETO,
2001; FERREIRA, 2004; YÁZIGI, 2002).
Podemos dividir o patrimônio em natural e cultural. O natural consiste em todas as
riquezas de valor universal contidas no solo, subsolo, mares e atmosfera de nosso
planeta. O conceito patrimônio cultural vem sendo amplificado com o passar dos
últimos anos. De acordo com Barretto (2001, p. 10), compreende aquilo que “passou
a ser considerado como como um mediador entre o passado e o presente, uma âncora
capaz de dar uma sensação de continuidade [...] de ser um referencial capaz de
permitir a identificação com uma nação”, incluindo, também, os bens imateriais29. A
UNESCO, determina que o patrimônio cultural é constituído dos (UNESCO, 1972):
Monumentos: obras arquitetônicas, de escultura ou de pintura monumentais,
elementos de estruturas de carácter arqueológico, elementos com valor
universal excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da ciência;
28 Os modos de produção são compostos de todos os processos de produção propriamente ditos, além
da circulação de bens e pessoas, distribuição e consumo. São compostos também dos alicerces imateriais, como ideologias e o patrimônio cultural. As caraterísticas peculiares de cada lugar são decorrentes dos diferentes modos de produção, em ambos os níveis qualitativos e quantitativos, e das lutas sociais que os antecederam e os transformam constantemente. Portanto, “tornam-se concretos sobre uma base territorial determinada, [sendo assim] as formas espaciais seriam uma linguagem dos modos de produção” (Santos, 1979, p. 14).
29 Bens imateriais: todas as manifestações artísticas e culturais, todo o fazer humano, não só a cultura elitizada, mas também a popular.
131
Conjuntos: grupos de construções isoladas ou reunidos que, em virtude da sua
arquitetura, unidade ou integração na paisagem têm valor universal
excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da ciência;
Locais de interesse: Obras do homem, ou obras conjugadas do homem, e as
zonas, incluindo os locais de interesse arqueológico, com um valor universal
excepcional do ponto de vista histórico, estético, etnológico ou antropológico.
O conceito evolui e contempla a relação homem/espaço e “a continuidade dos valores
e funções a ela associados, assim como os vínculos afetivos, passaram a ser um dos
referenciais decisivos para o reconhecimento de um valor universal excepcional”
(YÁZIGI, 2002). Sendo assim, dentro do turismo, atualmente a UNESCO propõe que
a paisagem digna de ser considerada de valor universal pode ser categorizada em
três classes (UNESCO, 2013):
1. A paisagem claramente definida, projetada e criada intencionalmente pelo
homem. Essa engloba jardins e parques, paisagens construídas para razões
estéticas, que são muitas vezes (mas nem sempre) associados com edifícios
monumentais religiosos ou outra de outra natureza.
2. A segunda categoria é a paisagem organicamente evoluída, resultante de um
imperativo social, econômico, administrativo e/ou religioso, tendo desenvolvido
sua forma atual por associação com e em resposta ao seu ambiente natural.
Elas se enquadram em duas subcategorias:
a. Uma relíquia (ou fóssil) de paisagem é aquela em que um processo
evolutivo acabou em algum momento no passado. Suas características
distintivas são, no entanto, ainda visíveis na forma material.
b. Uma paisagem contínua é aquela que conserva um papel social ativo na
sociedade contemporânea associada com o modo de vida tradicional, e em
que o processo evolutivo ainda está em andamento [os hostels podem se
encontrar nessa categoria].
3. A última categoria é a paisagem cultural associativa, decorrente de poderosas
associações religiosas, artísticas ou culturais dos elementos naturais, em vez
de provas culturais materiais.
132
Destas definições emerge uma problemática: quem deve cuidar e como deve ser
cuidado este patrimônio? Apesar do debate ser extenso e complexo, este estudo vem
propor que os hostels podem contribuir para a conservação desse patrimônio através
de sua filosofia e conceitos, os quais pregam a sociabilização de pessoas e lugares.
3.3.3 Caracterização do local de pesquisa
Para determinar a que tipo de relação pode existir entre hostels e o espaço que esses
ocupam, são usados três exemplos, a seguir.
Hostel do Castelo de Altena – Alemanha
O Hostel do Castelo de Altena localiza-se na cidade homônima (aprox. 18 mil
habitantes), situado no oeste da Alemanha, no estado da Renânia do Norte-Vestefália,
que faz divisa com a Holanda e a Bélgica (ver figura 27), tem como cidade próxima
mais proeminente Düsseldorf (a capital), além de Colônia e Bonn (antiga capital
alemã, após a Segunda Guerra Mundial). O castelo da cidade foi construído no início
do século 12 e pertencia aos Duques de Berg, até estes dividirem seu império entre
familiares. Depois de 1202, tornou-se uma das várias fortificações da família de
Altena-Mark e em 1609 a última linhagem da família morreu sem deixar sucessores.
Este reinado foi dividido em uma parte católica e uma protestante (STADT ALTENA,
2008; DEUTSCHE JUGENDHERBERGSWERK, 2014).
Durante a ocupação napoleônica Altena foi palco de confrontos e anexada ao Grão-
Ducado de Berg. Após a queda do império de Napoleão, o Congresso de Viena, em
1814, fundou a Confederação Alemã, anexando a região ao novo estado. Durante
anos o castelo esteve abandonado, para somente séculos depois ser utilizado
novamente. Uma restauração completa foi realizada em 1909 para celebrar o 300º
aniversário da incorporação do condado à Prússia. A maior parte do trabalho, no
entanto, não terminou antes de 1914. Em 1912, o primeiro albergue da juventude do
mundo foi criado por Richard Schirrmann dentro do castelo, a fim de utilizá-lo e
conservá-lo. Os antigos quartos ainda estão em exibição e novas salas dentro da área
do castelo fazem parte do hostel ainda hoje (HEATH, 1962; STADT ALTENA, 2008).
133
Figura 27 – Mapa topográfico da localização do Hostel de Altena
Fonte: Elaborado pelo autor (2014).
Atualmente, oferece 36 leitos, em cinco quartos de 4, 13 e 14 camas, a uma diária de
20 a 34 euros, com café da manhã e pensão completa, respectivamente.
Recentemente, foi criada uma pousada, com quartos particulares e o museu do
castelo (ARTEN-MEYER, 2013). O local (figura 28) oferece uma oportunidade ímpar
de mergulhar na história da Alemanha e dos albergues da juventude, proporcionando
uma estadia única em um belo castelo a preços baixos, com conforto, segurança e
muita hospitalidade, mantendo vivo até os dias atuais o sonho de Schirrmann.
134
Figura 28 – Fotos ilustrando o Hostel do Castelo de Altena
Fonte: Montagem do autor (2014). Fotos de Ângela Arten-Meyer (2013).
Hostel 99 – República Tcheca
A pequena cidade de Český Krumlov, localizada no sul da Bohemia, há
aproximadamente 180 km de Praga, capital da República Tcheca, é terceiro maior
destino turístico do país. As primeiras menções escritas sobre a cidade datam do início
do século XIII. Essa região é muito rica culturalmente, tendo sido parte do império
austro-húngaro durante séculos. Český Krumlov possui uma beleza única que atrai
visitantes de todas as partes do globo. Durante o período em que os Senhores de
Rožmberk (1302 - 1602), dominaram a região, Český Krumlov encontrou seu maior
período de prosperidade. Tornou-se, então, a sede de seu reino estando “no
cruzamento entre a República Checa, Áustria, Baviera e terras italianas do Norte e se
percebe a influência dessas diferentes culturas, que deixaram sua marca na cidade e
Castelo com pinceladas do Renascimento italiano” (OIS, 2014). O Imperador Rodolfo
II comprou Krumlov em 1602 e deu-a a seu filho natural Julius d'Áustria. De 1719 até
1945 o castelo ficou sob a guarda da família Schwarzenberg e entre 1938 e 1945 foi
tomada pela Alemanha nazista. Após o término da Segunda Guerra Mundial, a cidade
foi devolvida à Tchecoslováquia (OIS, 2014).
135
Durante o domínio comunista, Krumlov sofreu com o desuso e abandono, mas a partir
da Revolução de Veludo, de 1989, grande parte da antiga beleza da cidade foi
restaurada e, em 1992, a cidade entra para a lista da UNESCO como Patrimônio da
Humanidade (UNESCO, 2013; MĚSTO ČESKÝ KRUMLOV, 2014). Em 1992 Český
Krumlov entrou para a lista do Patrimônio Mundial da UNESCO, por ser uma cidade
cosmopolita, com uma atmosfera única, rodeada por uma paisagem intocada, onde
se sobressai um castelo que se estende ao longo de aproximadamente 01km do
sinuoso Rio Moldava. Dominada por casas patrícias, onde se encontra exposições de
artistas de renome mundial, festivais de música, apresentações teatrais, mas
principalmente por ser ainda uma parte viva da história e cultura da República Tcheca.
A cidade de Český Krumlov, devido à sua condição praticamente de preservação total,
possui grande importância para ilustrar a evolução urbana orgânica medieval e renascentista da Europa central em resposta a acontecimentos políticos, sociais e econômicos, e Český Krumlov é o melhor exemplo sobrevivente desta época, em termos de tanto de seu estado intacto e da qualidade dos seus edifícios e paisagem urbana” (UNESCO, 2014).
Atualmente, a cidade é um importante destino de férias, possuindo um centro histórico
com elementos góticos, renascentistas e barrocos, um excelente exemplo de cidade
medieval centro-europeia (SUNDERLAND, 2013), cujo patrimônio se manteve intacto
graças a sua evolução relativamente pacífica ao longo de mais de cinco séculos
(MĚSTO ČESKÝ KRUMLOV, 2014). Além disso, Český Krumlov é (OIS, 2014):
Uma cidade com 300 prédios tombados, o segundo maior complexo de castelo
na República Checa, e o mais antigo teatro barroco ainda em funcionamento;
Um local de arte e cultura – com o Egon Schiele Art Centrum, sete museus,
lojas de arte, 5 festivais de música e festivais de teatro em um auditório rotativo;
Um conjunto de muitas experiências - festivais medievais, degustação na
cervejaria local, rafting em barcos de madeira históricos ao longo do rio
Moldava, passeios temáticos noturnos e especialidades culinárias singulares;
Uma cidade com áreas naturais protegidas – perfeitos para caminhadas,
ciclismo, equitação, golfe, rafting e canoagem e o Parque Nacional da Šumava,
com lagos remanescentes da última era glacial.
136
Dentro desta paisagem encontram-se diversos meios de hospedagem, do cinco
estrelas Hotel Růže aos campings a beira do rio Moldava. Diversos hostels oferecem
acomodação alternativa para pessoas de todas as idades que procuram um lugar de
baixo custo e padrões decentes de conforto, higiene e segurança, mas principalmente
um lugar de alto nível social, onde possam conhecer pessoas e mergulhar na cultura
local. O Hostel 99 é um albergue familiar localizado dentro do centro histórico de
Český Krumlov, num edifício tombado pela UNESCO que outrora foi utilizado como
parte da muralha de proteção da cidade (início do séc. XIV) e posteriormente
convertido no Hospital Santa Elizabeth (final do séc. XV). Após o fechamento do antigo
hospital, o edifício foi dividido em várias partes tornando-se propriedade privada de
diversas famílias ao longo desses anos. Após a queda do muro de Berlin, o fim do
comunismo na Europa central e, consequentemente, a divisão da Tchecoslováquia
entre República Tcheca e República Eslovaca, a família Pecha adquiriu as demais
propriedades do que hoje se transformou no complexo do Hostel 99 (figura 29).
Figura 29 – Foto da entrada do centro histórico, Hostel 99 à esquerda
Fonte: www.hostel99.cz
O prédio principal do hostel (figura 30) possui quatro dormitórios e dois quartos
privados, os banheiros são comunitários. Ao lado da recepção, encontra-se a sala de
TV, sala de internet e a cozinha comunitária. A cozinha é completamente equipada e
sempre servida de chá e café. Há um grande terraço com vista para o castelo da
cidade, mesas com toldo, churrasqueira, jogo de dardos e mesa de ping-pong. É na
sala de TV, assistindo a filmes, na cozinha dividindo uma refeição, e principalmente
no terraço, saboreando a cerveja local, que os hóspedes interagem, trocam
137
experiências sobre destinos passados, futuros lugares que irão conhecer, informações
sobre outros meios de hospedagem e transporte.
Figura 30 – Fotos ilustrando o Hostel 99
Fonte: Montagem do autor (2014). Fotos de Hostel 99 (2011).
Logo ao lado da parte principal do localiza-se o Restaurante 99, que oferece mais uma
opção de sociabilização aos hóspedes. Além da tradicional cerveja local Eggenberg,
o estabelecimento oferece diariamente opções de refeições de culinária local, e um
extenso menu com diferentes pratos de culinária nacional. Acima do restaurante há
um bar onde acontecem esporadicamente shows de bandas locais. Cruzando a rua
encontra-se a Deli 99, que fornece lanches e bebidas. No subsolo deste local
encontram-se os quartos duplos privativos com banheiros privativos. O Hostel 99
oferece, além de acomodação a um custo médio de 12 euros, serviços de lazer,
gastronomia e hospitalidade, possuindo uma empresa de rafting, restaurante, bar e
café. É o maior da cidade com aproximadamente 60 leitos, divididos em quartos
duplos, triplos, quádruplos e dormitórios de 8 e 12 camas (HOSTEL99, 2013).
138
Figura 31 – Mapa topográfico da localização do Hostel 99
Fonte: Elaborado pelo autor (2014).
Samambaia Hostel – Petrópolis/RJ
Para que se possa compreender esse local é preciso recuar ao período do Brasil
Colônia e caminhar por uma das Estradas Reais que davam acesso o interior do
território colonial português, neste caso às Minas Gerais. A Coroa Portuguesa, por
volta do séc. XVI estimulou o desbravamento do interior (através dos bandeirantes)
em busca de ouro e pedras preciosas. Para acessar a região que deu origem ao atual
estado de Minas Gerais, em meados do séc. XVII fez-se necessária a abertura de
diversos caminhos para escoar a produção desses minerais em direção aos portos no
litoral brasileiro e daí para Portugal. A primeira dessas estradas reais, hoje conhecida
como Caminho Velho, tinha como destino final a cidade de Diamantina e ligava a
cidade porto de Paraty a Vila Rica (atual Ouro Preto). De Paraty, o ouro escoado das
minas era embarcado e seguia por via marítima até o Rio de Janeiro. Posteriormente,
após ser fiscalizado, tomava o rumo de Portugal. Apesar de ser uma rota precária e
perigosa, ainda assim tornou-se a estrada preferida dos tropeiros para atingir a região
das minas. Esta rota (figura 32) possuía uma extensão de aproximadamente 1.200 km
e podia ser percorrida, caso livre de maiores desastres, em cerca de 95 dias
(FAUSTO, 2006).
139
De acordo com Fausto (2006), o Caminho Velho era particularmente perigoso perto
do litoral, já que os indígenas nessa fase da história de nossa colonização não
representavam mais uma grande ameaça, o maior perigo enfrentado pelos viajantes
eram os ataques piratas perto da costa. Portanto, decidiu-se criar uma nova rota mais
segura e rápida que ligasse diretamente o porto do Rio de Janeiro e o sertão das
Minas, evitando ao máximo os ataques perto da costa. Assim, o Caminho Novo foi
trilhado por Garcia Rodrigues Pais, por volta de 1707, e partia direto da baía de
Guanabara até se fundir com o Caminho Velho em Ouro Branco, seguindo até
Diamantina pelo mesmo caminho antigo. Posteriormente, foi utilizado para
escoamento da produção de café do Vale do Paraíba (FAUSTO, 2006).
Ao longo dessas duas estradas reais, nas paradas dos tropeiros, diversas fazendas
foram fundadas, afim de prover abrigo, alimentação e descanso aos tropeiros. Além
disso, serviam como pontos de troca e comércio de mercadorias. Essas “paradas de
tropeiros” tiveram um papel destacado nesse período de nossa história, pois foi no
local dessas paradas que surgiram algumas vilas e posteriormente, as mais prósperas
cidades. Outras, no decorrer do tempo, perderam seu significado, as minas se
esvaíram, a produção de café decaiu e diversas fazendas caíram no desuso e foram
abandonadas. Aqui é que encontramos a Fazenda Samambaia (antiga Belmonte).
140
Figura 32 – Mapa da Estrada Real e localização do Hostel Samambaia
Fonte: Caminhantes da Estrada Real (2012).
As primeiras menções históricas sobre o local datam do séc. XVIII, praticamente 100
anos antes da fundação de Petrópolis, município onde hoje a fazenda se encontra. De
acordo com o Instituo Samambaia de Ciência Ambiental, uma das instituições que
ocupam o casarão da fazenda nos dias de hoje, o sítio estava localizado em uma
variação do caminho novo, e após o desuso dos caminhos reais
141
muitos anos se passaram entre heranças e divisões, até que em 1780, Maria Brígida Goulão legou a Fazenda a seu filho mais velho, o Cônego Luis Gonçalves Dias Correia [o qual recebeu diversas condecorações de Don Pedro II]. No início do século XIX, a Fazenda foi visitada e descrita por muitos naturalistas como Cunha Mattos, Langsdorff, entre outros. [Após abandono] em 1940, a Fazenda foi comprada pela família Leite Garcia e logo foi restaurada (1942-1945) pelo arquiteto Wladimir Alves de Souza, que resgatou o precioso ambiente dos velhos tempos da Fazenda da Samambaia (INSTITUTO SAMAMBAIA DE CIÊNCIA AMBIENTAL, 2014).
O Casarão da fazenda Samambaia foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico
e Artístico Nacional (Nº inscrição: 391; Vol. 1; F. 076) em 29 de Marco de 1951, alguns
anos após a restauração realizada pela família Leite Garcia (IPHAN, 2012). Para que
fosse possível manter a casa ativa, foram escolhidos, não somente um, mas uma
variedade de usos para auxiliar na conservação local, devido ao seu tamanho de
grandes proporções. Atualmente o casarão é sede do Instituo Samambaia de Ciência
Ambiental30, o Borboletário Cores de Samambaia e o Restaurante Taverna do
Cônego. No intuito de retomar a tradição de acolhimento de viajantes, como faziam
os donos do casarão quando recebiam tropeiros no Brasil Colônia, um albergue da
juventude foi o meio de hospedagem escolhido para ocupar parte da casa, pois a
filosofia alberguista coopera com a filosofia do Instituto, ambos pregando a
compreensão de culturas diferentes, sociabilização entre pessoas e conservação do
patrimônio histórico e do meio ambiente, entre outros conceitos.
O Hostel Samambaia (figura 33) conta com aproximadamente 50 leitos em quartos
comunitários, wi-fi, biblioteca, lan-house, lavanderia, cozinha independente e lockers
(armários fechados, geralmente com cadeados, para guardar pertences pessoais dos
hóspedes) individuais dentro dos quartos. O estabelecimento está aberto a grupos
fechados, excursões, escolas, imersões para treinamentos, grupos de estudo e
pesquisa, viajantes e mochileiros em geral, sem fazer distinção de idade, constituindo
um excelente local que proporciona uma experiência turística única, uma completa
imersão no território, história e cultura de nosso país.
30 O Instituto Samambaia de Ciência Ambiental-ISCA tem como principal objetivo a Educação
Ambiental, a aplicação da Agenda 21 Local, a inclusão social e a capacitação, tem por princípios e missão a defesa, preservação e conservação do meio ambiente e das espécies e a promoção do desenvolvimento sustentável na APA (Área de Proteção Ambiental) de Petrópolis; a promoção gratuita da educação ambiental, tendo com diretrizes as indicadas pela Política Nacional de Educação Ambiental, na forma da Lei 9.795 de 27 de abril de 1999 (INSTITUTO SAMAMBAIA DE CIÊNCIA AMBIENTAL, 2014).
142
Figura 33 – Fotos ilustrando o Hostel Samambaia
Fonte: Montagem do autor (2014). Fotos do Instituto Samambaia (2014).
3.3.4 Resultados
Esses locais exemplificam perfeitamente o tema de pesquisa deste capítulo, um
processo complexo e extenso, mas que pode ser basicamente resumido da seguinte
forma:
1. Um território desocupado passa a influenciar pessoas que decidem ocupá-lo.
Com o passar do tempo nasce uma sociedade/nação/civilização com
caraterísticas determinadas pelo território;
2. Os povos interagem com o espaço e com outros povos ao seu redor, constroem
uma fortificação, para garantir a segurança e a dominação do espaço;
3. Isso ocorre em razão das peculiaridades do próprio tempo e espaço, fazendo
com que local e pessoas adquiram características singulares motivadas por
essas interações;
4. Após gerações, o território dito “imutável”, continua relativamente inalterado,
mas os acontecimentos históricos e sociais conferem diferentes significados e
usos ao local – em alguns casos o desuso toma conta de edifícios que eram
importantes e atualmente perderam seu significado original;
143
5. Entram em cena os hostels, criados a partir de um motivo social singular, com
características que representam a materialização de uma filosofia. Os castelos
e fortificações são os locais ideais, do ponto de vista dos idealizadores, para
abrigar os alunos em viagens a campo;
6. Os albergues acabam ocupando estes locais, dando-lhes novo significado
sociocultural, diferente do estabelecido anteriormente, porém não menos
importante, favorecendo a conservação do patrimônio e os empreendimentos
se beneficiam dessa relação, assim como os seus ocupantes. Uma antiga
forma passa a desempenhar novas funções;
7. Finalmente, estes meios de hospedagem acabam por ajudar a disseminar a
cultura de um local e a preservar o patrimônio histórico edificado de uma nação,
caso sigam as premissas filosóficas idealizadas em suas origens.
A filosofia alberguista torna vantajosa essa ocupação, tanto para o patrimônio quanto
para o visitante, enquanto o primeiro é conservado, o segundo interage com o destino
de uma forma mais profunda do que a relação efêmera vista na hotelaria convencional.
Esta é a síntese do pensamento desse capítulo, o qual propõe que hostels, espaço e
hospitalidade podem constituir um trinômio de significativo impacto no fenômeno
turístico, como expressado na figura 34. Deve-se notar que, nem todo o
empreendimento denominado de hostel possui essas características e sua existência
não deve ser vinculada a essas. Porém, o que se demonstra aqui é que esse tipo de
hospedagem pode contribuir para as relações puras de hospitalidade e a conservação
do patrimônio histórico edificado, como tem feito desde sua gênese e ainda o faz, em
diversos casos, com facilidade.
144
Figura 34 – Mapa conceitual da possível relação socioespacial dos hostels
Fonte: Elaborado pelo autor (2014).
145
3.4 Denominador comum de áreas físicas
Pretende-se delimitar um denominador comum das características físicas dos
estabelecimentos selecionados, comparando-os com os três internacionais já
descritos anteriormente. Busca-se saber que tipo de infraestrutura é essencial para
um hostel, do ponto de vista do empreendedor e, consequentemente, do hóspede.
Partindo da hipótese que estes três estabelecimentos são os que possuem grande
similaridade com aspectos presentes na gênese desse meio de hospedagem, é bem
provável que suas características sejam as mais aceitáveis pelos clientes que os
frequentam. A identificação de características comuns nesses empreendimentos
poderá contribuir para o estabelecimento dos primeiros passos para uma delimitação
comum das suas estruturas físicas no Brasil e, num futuro próximo, para a definição
das características físicas oficiais desse meio de hospedagem. Justifica-se a escolha
dos empreendimentos para esse subcapitulo pelo fato desses hostels serem de
fundamental importância mercadológica (HOSTELWORLD, 2015) e histórica
(GRASSL e HEATH, 1982).
Além disso, a inexistência de uma metodologia que aborde esse tema específico, da
denominação de áreas físicas essenciais para hostels, fez com que o autor desse
estudo elaborasse um método inédito. Levando isso em conta, vale notar que essa
matriz é inicial, aberta e provisória, ela pode e deve ser, num futuro próximo,
melhorada e ampliada, considerando outras variáveis e estabelecimentos. O Hostel
de Altena foi duplamente considerado, uma em sua gênese (polo teórico, histórico e
bibliográfico) e em um segundo momento mercadológico (suas estruturas atuais).
Busca-se, contudo, delimitar quais características físicas seriam aceitas como as
mínimas necessárias para que um estabelecimento seja denominado de hostel.
3.4.1 Caracterização dos hostels da matriz classificatória de áreas físicas
Os estabelecimentos que compõem a matriz classificatória de áreas físicas
encontram-se no capítulo anterior, sendo esses o Hostel do Castelo de Altena –
Alemanha; e o Hostel 99 – República Tcheca. Complementada pelo Home Lisbon
Hostel, de Portugal, cuja a descrição é apresentada a seguir.
146
Home Lisbon Hostel – Portugal
O Home Lisbon Hostel (figura 35), localizado em pleno centro histórico de Lisboa, em
um edifício de aproximadamente 200 anos de idade, é considerado um dos mais
antigos de Lisboa – um destino turístico europeu de grande porte e famoso pelo seu
perfil backpacker e grande oferta hosteleira de alta qualidade (HOME LISBON
HOSTEL, 2014; HOSTELWORLD, 2014). Portugal foi escolhido para esta pesquisa
por ser o país com mais empreendimentos premiados na 12ª edição dos Hoscars31.
Na liderança dessa premiação está o Home Lisbon Hostel, o mais premiado do
mundo, com cinco “estatuetas”, incluindo Melhor Hostel do Mundo de Médio Porte,
Melhor Hostel de Portugal, Melhor Hostel de Lisboa, Prémio de Limpeza e Prémio pelo
Conjunto da Obra (DINHEIRO VIVO, 2014).
Figura 35 – Fotos ilustrando o Home Lisbon Hostel
Fonte: Home Lisbon Hostel (2014).
Além de excelentes localização e instalações (diárias médias de 14 euros), o
empreendimento é famoso pelo seu alto grau de hospitalidade, sendo, de acordo com
alguns depoimentos de hóspedes, “uma casa longe de casa”, oferecendo uma
31 Os Hoscars são prêmios atribuídos a hostels de todo o mundo, através das avaliações dos clientes
do site Hostelworld. Durante o ano de 2013, foram efetuados mais de um milhão de comentários no site.
147
atmosfera única e diversas atividades como caminhadas guiadas pelo centro da
cidade, passeios noturnos pelos bares de Lisboa e o famoso “Jantar da Mamãe”,
composto de pratos típicos portugueses, a um custo rateado pelos hóspedes e feito
pela própria mãe do dono do hostel (HOSTELWORLD, 2014). O Home Lisbon é um
típico exemplo da filosofia alberguista e de seus princípios básicos definidos por
Schirrmann, quando este estabeleceu o primeiro do mundo em Altena, 1909. Na figura
36, encontra-se a localização dos estabelecimentos que compõem a matriz
classificatória de áreas físicas que este subcapitulo se propõe a criar.
Figura 36 – Mapa da localização dos hostels da matriz classificatória
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
3.4.2 Critérios analisados
As categorias para a escolha dessa matriz foram determinadas a partir de uma síntese
de fatores com base em três vertentes teóricas e empíricas. A primeira, de acordo
com as principais áreas de um hostel convencional (CÂNDIDO e VIEIRA, 2003), e a
definição de áreas físicas do MTur (2015) para um hotel, através da Cartilha de
Orientação Básica do SBClass. A segunda diz respeito à revisão bibliográfica e
histórica, realizada pela presente pesquisa e, portanto, em consonância com a filosofia
da gênese alberguista estabelecida por Schirrmann – visando a sociabilidade e
vivencia dos hóspedes no local visitado (HEATH, 1962; COBURN, 1950). Finalmente,
a terceira, de ordem empírica e experimental, foi determinada pelas áreas físicas
148
comumente encontradas em hostels no exterior, no decorrer de seis anos de
experiência do autor na área. A partir dessas três bases de conhecimento, foram
delimitadas as principais aéreas a serem avaliadas em 17 itens com três graus de
avaliação (atende totalmente; atende parcialmente; não atende às demandas físicas
estabelecidas), visando determinar o nível de atendimento das áreas físicas. O quadro
1 expressa, em alfabética, as principais áreas físicas esperadas em um hostel.
149
Quadro 1 – Grau de incidência das áreas físicas
H. de Altena
(original) H. de Altena
(atual) Hostel 99
Home Lisbon Hostel
Grau de incidência
Banheiro para cada dormitório 12
Bar 6
Beliche no dormitório 9
Cama solteiro no dormitório 4
Cozinha pública 12
Dormitório 12
Guarda-volumes/locker individual 12
Lavanderia 12
Quarto privado c/ banheiro 3
Quarto privado s/ banheiro 0
Recepção 10
Restaurante 5
Sala de estar ou de TV 12
Sala de internet 7
Sala de jogos 3
Sala de leitura/biblioteca 8
Área social externa 12 Legenda:
Atende totalmente = 3 pontos; Atende parcialmente = 1 ponto; Não atende = 0 pontos;
Fonte: Elaborado pelo autor (2014).
150
O grau de incidência corresponde à quantificação dos itens (áreas físicas) em comum
aos três estabelecimentos (quatro, sendo que o Hostel de Atena conta como original
e atual). Quando uma área física for comum a todos hostels, atende totalmente às
expectativas da pesquisa. Este item atingirá 12 pontos e será então considerado como
área física essencial ou fundamental para um estabelecimento intitulado como tal,
criando-se assim a matriz de avaliação para os demais empreendimentos abordados
nesta pesquisa. As demais áreas físicas que não atingiram a pontuação máxima, mas
ficaram próximas (entre 7 e 10 pontos), serão categorizadas como opcionais básicos,
e as demais áreas (de 6 pontos e abaixo) como opcionais de luxo.
Os resultados dessa matriz classificatória inicial podem ser melhor visualizados
através do gráfico 2:
151
Gráfico 2 - Matriz classificatória de áreas físicas
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
0 0 0 0 0 0
3 3
1
3 3 3 3 3 3 3
0 0 01
01
3 3
3
3 3 3 3 3 3 3
0
3
0
33
3
10
3
3 3 3 3 3 3 3
0
0 3
13
31
33
3 3 3 3 3 3 3
0
3 3
5
6
7
8
9
10
12 12 12 12 12 12 12
Hostel Atena Original Hostel Atena Atual Hostel 99 Home Lisbon Hostel Total
Essenciais Básicos Opcionais
152
Portanto, as áreas físicas que podem ser consideradas como essenciais (com 12
pontos cada, estando presente em todos os estabelecimentos), são as sete seguintes:
Área social externa
Banheiro para cada dormitório
Cozinha comunitária
Dormitório
Guarda volumes
Lavanderia
Sala de Estar
As áreas físicas consideradas como opcionais básicos (7 a 10 pontos) são as quatro
abaixo:
Beliche no dormitório
Recepção
Sala de internet
Sala de leitura
As demais áreas que alcançaram no máximo seis pontos, consideradas como
opcionais de luxo, são as seis listadas abaixo:
Bar
Restaurante
Cama no dormitório
Sala de jogos
Quarto privado com banheiro
O item “quarto individual sem banheiro” não apareceu em nenhuma instância
analisada, não entrando, pois, na matriz classificatória inicial.
153
3.4.3 Resultados
Os dez hostels de Florianópolis aqui analisados e comparados à matriz criada acima,
não serão nominalmente identificados, pois não é intuito deste trabalho delimitar quais
se enquadram nesta matriz, mas quantos estão de acordo com esta nova classificação
proposta. Portanto, eles serão retratados aqui como Hostel 01, 02 e assim
sucessivamente, como demonstrado no quadro 2.
154
Quadro 2 – Adequação dos hostels Top 10 de Florianópolis (SC) à matriz classificatória
Área social
externa
Banheiro para
dormitório
Cozinha
comunitária Dormitório
Guarda-
volumes Lavanderia Sala de Estar
Total de pontos por
hostel
Hostel 01 15
Hostel 02 16
Hostel 03 21
Hostel 04 16
Hostel 05 12
Hostel 06 18
Hostel 07 21
Hostel 08 16
Hostel 09 18
Hostel 10 16
Total de pontos por
área 30 20 24 30 20 18 30 172 169
Legenda:
Atende totalmente = 3 pontos; Atende parcialmente = 1 ponto; Não atende = 0 pontos;
Fonte: Elaborado pelo autor (2014).
155
O quadro 2 permite identificar diversas premissas e suposições, destacando-se como
principais as quatro a seguir:
1 – No Brasil, alguns empreendimentos não se adequam às características essenciais
internacionais deste meio de hospedagem.
Apenas dois estabelecimentos, classificados entre os 10 melhores de Florianópolis
(representando 20% da amostra), apresentaram todas as características
estabelecidas como essenciais pela matriz classificatória original, cunhada a partir dos
3 hostels europeus. Sendo assim, a maioria dos Top 10 do município não apresentam
TUDO o que se espera de um hostel original;
2 – Algumas áreas físicas consideradas como essenciais no exterior, são
negligenciadas por grande parte dos empreendimentos nacionais.
Apenas 03 itens (área social externa; dormitório; sala de estar) considerados como
essenciais, estão presentes em todos os estabelecimentos analisados, significando
que apenas 40% dos requisitos essenciais estão sendo preenchidos pelos
estabelecimentos em questão. Em uma média geral, menos da metade dos requisitos
básicos de um hostel estão sendo oferecidos aos hóspedes que frequentam este tipo
de estabelecimento e em teoria esperam por esses;
3 – Oferecer uma área física do empreendimento para uso do hóspede, sem
supervisão, parece algo desafiador para os empreendedores hosteleiros.
O item com menor pontuação foi o setor de lavanderia, com 18 pontos, de um total de
30. Portanto, aqui no Brasil quase 50% dos estabelecimentos analisados deixam de
oferecer essa área física/serviço aos hóspedes, setor é extremamente comum no
exterior. Lá, os hostels oferecem uma área equipada e aberta aos hóspedes para que
estes lavem suas roupas a um custo reduzido, outros locais cobram uma taxa extra e
fazem a lavação pelos hóspedes; nos EUA é comum uma área equipada com
lavadoras e secadoras de roupa que funcionam, no sistema vending machines
(máquinas de venda automática) com sabão e amaciante. Na maioria dos
estabelecimentos avaliados, este setor sequer é oferecido em nenhuma das formas;
156
4 – Aparentemente alguns empreendimentos nacionais desconhecem a gênese e
filosofia alberguista, deixando de oferecer itens extremamente necessários ao
hóspede frequentador deste meio de hospedagem.
O segundo item com menor pontuação foi o “guarda-volumes” (locker) individual e
dentro do quarto, com 20 pontos, representando que aproximadamente 45% da
amostra não disponibiliza esta ferramenta ao hóspede. Este item é uma das principais
características inerente à gênese dos hostels (que pretendia oferecer aos alunos de
Schirrmann, conforto, segurança, hospitalidade e sociabilidade) e, portanto, uma
característica intrínseca desse meio de hospedagem. Esse item é fundamental por
proporcionar segurança e tranquilidade aos hóspedes que podem trancar seus
pertences em lugar seguro e privado, permitindo que saiam e realizem suas
atividades, sabendo que ao retornar encontrarão seus pertences intactos;
157
4 PANORAMA ATUAL EM FLORIANÓPOLIS (SC)
A formação socioespacial de Santa Catarina influencia diretamente no aparecimento
da rede hoteleira do estado, consequentemente dos hostels e de suas características.
De acordo com Santos (2012, p. 171) “diferentemente do restante do litoral brasileiro
onde a atividade agrícola era monocultora, utilizando-se da mão de obra escrava em
grandes glebas de terra, no Sul se estabeleciam colônias de povoamento alicerçadas
na pequena propriedade familiar”. Como consequência os hotéis e afins podem ser
caracterizados, de uma maneira geral, como empresas familiares, de micro e pequeno
porte. Similarmente ao panorama de São Paulo e do Rio de Janeiro, o aparecimento
dos primeiros hotéis em Florianópolis é tardio, em meados do século XIX e, assim
como as duas grandes cidades brasileiras, esses estabelecimentos eram ainda
voltados, pelo menos em parte, para o comércio de mercadorias e não à prestação de
serviços. Até 1850, data de fundação do primeiro empreendimento intitulado como
hotel, denominado Hotel Comércio (o nome ilustra literalmente o panorama descrito
aqui),
não existiam hotéis para atender aos viajantes, entretanto a presença de tabernas era marcante, pois exerciam uma função comercial com a venda de produtos e uma precária estrutura de hospedagem para receber aqueles que chegavam à cidade. Os empreendimentos hoteleiros ofereciam serviços e produtos diferenciados, além da hospedagem. Como já foi destacado, em alguns deles funcionava no piso térreo um tipo de armazém, denominado de “secos e molhados”, onde se podia encontrar uma diversidade de produtos alimentícios, homeopáticos, bebidas, cigarros, cafés, velas de carnaúba, papéis, além de outros objetos colocados à venda (SANTOS, 2012, p. 175).
Prova disso é que a entrada efetiva das grandes redes hoteleiras internacionais
somente foi estabelecida no estado a partir do ano de 2000 (SANTOS, 2012). Os
hostels não escapam, como é esperado, dessa formação socioespacial. Esses últimos
são extremamente recentes, de cunho familiar e de pequeno porte. Os questionários
e entrevistas aplicados corroboram com essa afirmação e levantam outros dados
interessante que são expostos a seguir. Os resultados estão subdivididos em duas
partes: 1) perfil pessoal dos proprietários/gerentes/responsáveis pelos hostels e; 2)
perfil básico dos meios de hospedagem. Os apêndices A, B, C e D mostram,
respectivamente, os modelos do termo de consentimento livre e esclarecido, o
questionário do perfil pessoal do entrevistado, o questionário do perfil básico do
estabelecimento e a guia das entrevistas não-diretivas.
158
4.1 Perfil dos hosteleiros
Apesar da leve predominância do sexo masculino dos respondentes principais, gráfico
3, havia quase que totalidade dos estabelecimentos, uma figura feminina vinculada à
idealização, fundação, propriedade e/ou gerência dos hostels em Florianópolis.
Gráfico 3 – Quanto ao gênero dos proprietários
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
A ocorrência de que a maioria dos hosteleiros possuem o estado civil de solteiro, pode-
se dever ao fato de que a faixa etária dos gestores é relativamente baixa. Sendo
assim, o casamento é uma fase da vida social ainda por vir. O perfil do gestor parece
estar relacionado a indivíduos que não buscam contatos sociais considerados mais
formais e/ou tradicionais, visto que alguns respondentes declararam ter consciência
de tratar-se de um relacionamento não reconhecido por lei, apesar de estável.
Pressupõe-se, também, que a tipologia do estabelecimento exige uma disponibilidade
integral por parte do gestor, somado ao fato de que, normalmente, o ambiente de um
hostel não é o mais indicado para crianças de baixa faixa etária (ver gráfico 4).
9
6
Masculino Feminino
159
Gráfico 4 – Quanto ao estado civil dos hosteleiros
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
Pode-se considerar a faixa etária dos hosteleiros como baixa, praticamente 30% dos
entrevistados possui menos de 30 anos de idade e nenhum possui acima de 50 anos
de idade. Isso pode ser um reflexo do caráter de novidade deste meio de hospedagem
no Brasil e consequência da exigência de um perfil jovem de gerencia, para lidar com
um público alvo, também, extremamente jovem (ver gráfico 5).
Gráfico 5 – Quanto à idade dos hosteleiros
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
Segundo o gráfico 6, todos os entrevistados cursaram, pelo menos parcialmente, o
ensino superior. O alto grau de escolaridade dos hosteleiros pode facilitar no
5
10
00
Casado Solteiro Divorciado Viúvo
2
2
10
1 00
Entre 18-25 26-30 31-40 41-50 51-60 Acimda de 60
160
entendimento e aceitação de conceitos e/ou medidas gestoras oferecidas pela
comunidade acadêmica e pelo ministério público.
Gráfico 6 – Quanto à escolaridade dos entrevistados
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
Os hosteleiros estão ainda, mesmo se envolvendo comercialmente com um
empreendimento que demanda tempo integral de dedicação, em um constante ritmo
de viagens, que caracteriza o estilo de vida do backpacker. Mostrando que os gestores
podem estar em sintonia com o seu público alvo (ver gráfico 7).
Gráfico 7 – Quanto à frequência de viagens dos empreendedores
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
1 0
4
8
3
Fundamental Médio Superior Incompleto
Superior Completo Pós graduação
1
6
6
2
Não viaja 01 vez por ano 02 vezes 03 ou mais vezes
161
O gráfico 8 mostra que o meio de transporte menos utilizado (navio, 0%) e o mais
utilizado (avião, ≈60%) pode demonstrar que o perfil do hosteleiro, apesar de possuir
renda para viagens com custo relativamente elevado, prefere viagens independentes
e mais flexíveis, de acordo com o próprio perfil do público que frequenta esses
estabelecimentos.
Gráfico 8 – Meio de transporte mais utilizado em férias
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
Quando em viagens, é clara a preferência dos hosteleiros pelo tipo de meio de
hospedagem que administram, quando escolhem um local de acomodação. Isso
pode-se dever ao fato de que procuram ficar nesse tipo de empreendimento para
verificar esses estabelecimentos em outros destinos turísticos. Sendo assim, estar em
sintonia com o mercado, observando pontos limitantes e potencialidades, tendências
mercadológicas e concorrentes indiretos. Além disso, como demonstra o gráfico 9, o
perfil desses empreendedores parece favorecer a escolha de sua acomodação pelos
hostels.
1
5
1
8
00
Não viaja Carro Ônibus Avião Navio Outros
162
Gráfico 9 – Meio de hospedagem mais utilizado em férias
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
É interessante saber que ≈25% da amostra ainda reside no próprio hostel. Mesmo
sendo um número pequeno, é relativamente expressivo. Esse hábito era recorrente
nos Hausvater/Hausmutter (pai/mãe alberguista, figura hoje representada,
principalmente, pelo recepcionista) dos albergues da juventude em sua gênese.
Percebe-se que esses empreendimentos, onde o recepcionista/proprietário/gerente
reside no próprio local, possuem uma atmosfera que se assemelha muito mais à uma
residência do que um empreendimento comercial. Estes locais parecem expressar
melhor o conceito de hospitalidade genuína de uma maneira mais frequente dos
demais estabelecimentos (ver gráfico 10).
3
1
9
2
01
0
2
Hotel convencional Hostel HI Hostel Independente
Pousada Resort Camping
Couchsurfing Outros
163
Gráfico 10 – Local de residência do hosteleiro
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
Nota-se, no gráfico 11, que a maioria dos entrevistados (≈ 65%) possui nos hostels
sua única fonte de renda, onde apenas 5 respondentes possuem outra profissão. Isso,
em uma análise superficial, pode demonstrar que os hostels são autossuficientes
economicamente.
Gráfico 11 – Segunda profissão do hosteleiro
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
3
8
4
0
Imóvel próprio Imóvel alugado Hostel Outro
1
2
1
0
1
00
Hoteleiro Comerciário P. liberalTrabalhador agrícola Professor Funcionário públicoOutro
164
4.2 Perfil dos hostels
Os hostels em Florianópolis podem ser considerados como um meio de hospedagem
de gênese extremamente recente, conforme ilustra o gráfico 12. De acordo com a
pesquisa, até o ano de 2002 não haviam hostels na cidade, fazendo com que o
advento desse meio de hospedagem aconteça de forma efetivamente tardia, cerca de
30 anos depois do primeiro albergue da juventude no Rio de Janeiro, e praticamente
90 anos após o primeiro em Altena, Alemanha. Somente em 2013 se percebe um
crescimento efetivo desse meio de hospedagem. No entanto, essa expansão se dá
de forma desordenada, e até mesmo clandestina, sem a adequação desses hostels à
conceitos, filosofias e leis. Conforme relatam os próprios entrevistados: “tem gente
que coloca uns beliches abre as portas e chama de hostel”.
Gráfico 12 – Data de fundação dos hostels de Florianópolis (SC)
Fonte: elaborado pelo autor (2015)
Os hostels podem ser caracterizados, conforme o gráfico 13, como empreendimentos
de pequeno porte. Apenas ≈25% da amostra possui uma área construída acima de
500 m2. Isso pode significar o baixo poder econômico desses empreendimentos, que
são viabilizados, geralmente, de uma maneira improvisada. Por outro lado, pode
expressar o caráter intimista e familiar que possuem desde sua gênese, assim como
0
1
2
3
4
5
6
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Data de fundação
165
a relação de com a hospitalidade, pois é difícil proporcionar hospitalidade genuína a
um grupo de pessoas em uma área física, ambos de proporções exageradas.
Gráfico 13 – Área total construída em m2
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
Considera-se como “micro e pequenos estabelecimentos hoteleiros aqueles com
menos de cinquenta quartos e empregam menos de 10 pessoas” (WTO, 2000 apud
TEIXEIRA, 2004, p. 02). Porém, o tamanho de um hostel não deve ser delimitado,
exclusivamente, pelo número de quartos, e sim pelo número de leitos, pois os
dormitórios agregam inúmeros leitos e contam somente como um quarto. É errônea a
categorização desses empreendimentos, mediante definições emprestadas de outro
meio de hospedagem.
Não se deve aplicar o mesmo critério para classificar os hotéis e hostels. Portanto, o
número médio de leitos deve ser ponderado na classificação do tamanho de um
hostel, pois é esse número que determina quantas pessoas utilizarão o
estabelecimento num determinado momento. Esse número médio, em Florianópolis
(cerca de 40), em comparação à área física, ao número de quartos e ao número de
funcionários, pode ser considerado de magnitude média (ver gráfico 14).
1
4
3
3
4
Até 200 de 201 a 300 de 301 a 400 de 401 a 500 Acima de 500
166
Gráfico 14 – Número total de leitos
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
Se levada em consideração somente o número de quartos, os hostels poderiam ser
considerados empreendimentos de micro a pequeno porte (ver gráfico 15). Mas, como
argumentado anteriormente, o porte destes empreendimentos deve ser estimado
através do número de leitos, por se tratar de uma predominância de quartos coletivos.
Gráfico 15 – Número total de dormitórios
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
O tamanho dos dormitórios pode ser considerado, de acordo com o gráfico 16, de uma
forma geral, como de pequeno à médio porte, acomodando até dez pessoas, em
média. Diversos hostels, no exterior, principalmente na Europa, de acordo com a
1
3
7
3
1
Até 15 de 16 a 30 de 31 a 50 de 51 a 70 Acima de 70
0
4
6
1
4
Até 01 de 2 a 4 de 5 a 7 de 8 a 10 Acima de 10
167
experiência profissional desse autor, possuem quartos maiores, com 12 a 16 camas,
e alguns casos possuem os megadormitórios, com 30 camas ou mais. Isso pode ser
um reflexo de que o público frequentador desses estabelecimentos, no exterior, está
culturalmente mais acostumado a dividir o ambiente privado do quarto com um maior
número de pessoas sem maiores constrangimentos e problemas. A cultura brasileira
parece dificultar a sociabilização e o compartilhamento do espaço privado com outros,
portanto, se adota quartos com menos camas.
Gráfico 16 – Número médio de leitos por dormitório
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
Segundo o gráfico 17, o uso de beliches é unânime, com apenas dois casos usando
uma mistura de beliches e camas de solteiro em vista do tamanho da unidade
habitacional. Os beliches são um aspecto determinante das características dos hostel
desde sua gênese. Contemporaneamente o uso desse equipamento é considerado
como facultativo em diversos estabelecimentos europeus, onde alguns preferem as
camas de solteiro, por oferecerem aos ocupantes dos dormitórios maior conforto,
tranquilidade e espaço dentro da unidade habitacional.
5
10
000
Até 05 de 06 a 10 de 11 a 15 de 16 a 20 Acima de 20
168
Gráfico 17 – Quanto ao uso de beliches nos dormitórios
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
A preferência por dormitórios é clara através do baixo número de quartos privados
oferecidos pelos empreendimentos de Florianópolis. Isso demonstra que esses dão
preferência às unidades habitacionais compartilhadas ao invés das privadas, uma
característica, também, fundamental dos hostels genuínos (ver gráfico 18).
Gráfico 18 – Número de quartos privados
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
Quanto ao número de funcionários, os hostels se caracterizam, em sua grande parte,
como microempreendimentos. Foi relatado com frequência nas entrevistas não
13
0
2
Sim Não Parcialmente
1
3
11
00
Não possui Até 01 de 02 a 04 de 05 a 07 Acima de 08
169
diretivas, que há um método informal de contratação de backpackers como
recepcionistas. Existem sites que se assemelham a redes sociais como Facebook, os
quais possuem perfis de viajantes e de empreendimentos hosteleiros. Nesses sites
ambos completam seu perfil com diversas informações. Quando há mutua afinidade
de interesses, como local e período onde se encontram a afinidade por um perfil
pessoal/profissional, o viajante é “contratado”. Geralmente, para ajudar em alguns
turnos, ou em outros afazeres, como pequenas obras de manutenção ou até mesmo
exercendo o papel de guia/recreacionista dos hóspedes em atividades intra/extra
hostel, geralmente em troca de acomodação e/ou alimentação (ver gráfico 19).
Gráfico 19 – Número total de funcionários
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
A área social “sala de TV”, em comparação aos próximos itens (salas de estar, cozinha
comunitária e áreas sociais externas), pode ser considerada de baixa incidência.
Apesar disso, ≈ 50% da amostra possui no mínimo duas salas de TV, uma aérea
considerada como não essencial. Na época de gênese, por volta do início do século
XX, mais precisamente em 1912, essa área era inexistente. Os aparelhos de TV, como
são conhecidos hoje, foram inventados na década de 1920 e só se tronaram realmente
populares após a segunda guerra mundial, exclusivamente nos E.U.A. e Reino Unido.
Mesmo depois de sua popularização a nível mundial as TVs não eram parte integrante
das atividades sociais dos albergues da juventude. Acreditava-se que o aparelho
causava a alienação e individualização do grupo dentro do estabelecimento. As
3
5
5
11
Até 02 de 03 a 05 de 06 a 10 de 10 a 15 Acima de 15
170
pessoas que utilizavam a TV acabavam por deixar de participar e/ou interagir em
atividades que envolviam todos os hóspedes e/ou atividades exercidas fora do meio
de hospedagem, como caminhadas e excursões (ver gráfico 20).
Gráfico 20 – Número de salas de TV
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
O gráfico 21 coloca que as salas de estar se mostram presentes em maior número
nos estabelecimentos, porém, a frequência pode ser considerada como média, em
comparação às áreas sociais externas.
Gráfico 21 – Número de salas de estar
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
1
9
5
0
Não possui Até 01 de 02 a 03 Acima de 03
1
7
7
0
Não possui Até 01 de 02 a 03 Acima de 03
171
A cozinha comunitária, uma área física presente desde a gênese alberguista e tida
como essencial, se mostra nessa pesquisa como item também fundamental, com
100% da amostra disponibiliza no mínimo uma cozinha aos hóspedes (ver gráfico 22).
Gráfico 22 – Número de cozinhas comunitárias
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
Conforme o gráfico 23, ≈ 50% da amostra disponibiliza no mínimo duas áreas sociais
externas para seus hóspedes. Isso deve-se ao fato de que Florianópolis, marcada
pelas praias e extensas áreas verdes, proporciona uma melhor sociabilização em
ambientes externos do que internos.
Gráfico 23 – Número de áreas sociais externas
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
0
11
4
0
Não possui Até 01 de 02 a 03 Acima de 03
0
7
5
3
Não possui Até 01 de 02 a 03 Acima de 03
172
A área social voltada aos jogos é a de menor incidência nesse estudo. Os hostels
disponibilizam uma abundante oferta de atividades gratuitas, geralmente realizadas
fora do estabelecimento, como surfe, jogos na praia e trilhas (em função do
determinismo geográfico de Florianópolis), isso não viabiliza a construção de uma
infraestrutura especifica para jogos internos (ver gráfico 24).
Gráfico 24 – Número de sala de jogos
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
Os lockers não estão disponíveis em todos os hostels entrevistados. Um respondente
não disponibiliza o serviço e três não possuem lockers para todos os leitos. Portanto,
≈20% da amostra não cumpre com um item estabelecido como essencial. Isso denota
a falta de preocupação dos gestores com a segurança dentro do estabelecimento ou
a falta de conhecimento desses sobre a gênese alberguista (ver gráfico 25).
Gráfico 25 – Quanto ao tipo dos lockers
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
5
9
1 0
Não possui Até 01 de 02 a 03 Acima de 03
1
11
3
Não possui Individual Coletivo
173
A maioria não fecha suas operações durante o inverno. Apesar das declarações de
que a sazonalidade em Florianópolis é evidente, os hosteleiros preferem ficar abertos
por esse período. Principalmente pelo fato de que há muitos backpackers estrangeiros
viajando fora da temporada. Apesar de serem em número exponencialmente menor,
esses turistas necessitam desse tipo de acomodação, e os hosteleiros reiteraram que
não gostariam de deixá-los sem opção de acomodação (ver gráfico 26).
Gráfico 26 – Quanto à sazonalidade dos hostels
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
Apenas dois respondentes (≈10% da amostra), conforme gráfico 27, possuem um
restaurante disponibilizado aos hóspedes. Isso pode levantar diversas premissas.
Dentre elas, a primeira é de que o poder aquisitivo dos hóspedes limita seus gastos,
principalmente com a alimentação. A segunda, é de que a infraestrutura dos hostels
se mostra simples e reduzida, assim como o poder financeiro dos empreendedores.
Esses constroem, ampliam e restauram em cima de estruturas já existentes, casas
domiciliares e prédios residenciais e/ou comerciais. Poucos tiveram a capacidade de
começar o empreendimento, desde a aquisição do terreno à execução da obra, com
os olhos voltados para o meio de hospedagem que desejavam. Tiveram que se
adaptar uma edificação já existente, portanto a estrutura de A&B ficou em segundo
plano. Apesar de ser uma área física/serviço não essencial, a culinária e/ou a
gastronomia é importante componente da experiência turística do visitante no destino
3
12
Sim Não
174
turístico. Porém, ainda é considerada como de baixa relevância por parte dos
empreendedores.
Gráfico 27 – Existência de estrutura de A&B
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
O café-da-manhã, incluso no valor da diária, é um serviço que não se vê como
essencial. No entanto, para a amostra dessa pesquisa, parece ser um item quase que
obrigatório. Os respondentes que não oferecem o café-da-manhã aos hóspedes estão
pensando seriamente em fazê-lo em breve. Devido, talvez, à execução desse serviço
por parte de todo o restante da oferta hoteleira na região, conforme o gráfico 28.
Gráfico 28 – Quanto ao oferecimento do serviço de café-da-manhã
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
2
13
7
2
Não possui Bar Lanchonete Restaurante
12
3
Sim Não
175
Conforme o gráfico 29, o serviço de lavanderia, essencial na matriz classificatória do
presente estudo, é o que possui a menor taxa de oferta perante à amostra, ≈40% não
oferecendo o esse serviço ao hóspede. Ao contrário da gênese alberguista e das
tendências internacionais, principalmente as europeias e norte-americanas, onde
esse serviço é visto com frequência. Para o viajante backpacker, o serviço de
lavanderia é, especialmente, importante. Muitas vezes esse tipo de viajante não utiliza
de taxis, preferem os meios de transporte públicos. Caminha mais que o turista
convencional, geralmente com sua mochila nas costas. Fica dias, ou até mesmo
semanas, sem poder lavar suas roupas. Há hostels europeus que oferecem uma
maquinada de roupas gratuita aos hóspedes que ficam por mais de 3 noites.
Gráfico 29 – Quanto ao oferecimento do serviço de lavanderia
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
A internet gratuita é o único serviço oferecido com unanimidade e praticamente 100%
da amostra oferece esse serviço em ambas as formas, computadores fixos (PCs) e
em forma de Wi-Fi (ver gráfico 30). Isso demonstra a clara tendência mercadológica
de conexão ao mundo virtual e às redes sociais do perfil do público-alvo. No entanto,
esse foi o fator mais notado no discurso das entrevistas como o que mais cria
empecilhos na sociabilização e interação entre os membros do grupo que se hospeda
em um hostel. A tendência é que as pessoas fiquem conectadas a seus aparelhos
moveis, se comunicando à distância, sem interagir com a pessoa logo a seu lado.
9
6
Sim Não
176
Gráfico 30 – Quanto à disponibilidade do serviço de internet
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
O valor da diária média é R$45, cerca de €14. Esse valor aproxima-se de uma diária
em dormitório nos hostels europeus, principalmente da Europa Ocidental (França,
Itália, Espanha). Em Portugal e na Europa Central e Oriental (Rep. Tcheca,
Eslováquia, Polônia, Hungria, etc.) essa diária baixa significativamente. Portanto
alguns destinos e seus empreendimentos, se tornam mais atraentes economicamente
para os backpackers, para os quais o Brasil é visto como um país caro para se viajar.
Isso pode indicar a tentativa do mercado hosteleiro brasileiro de adequar a diária do
estabelecimento nacional ao preço do mercado internacional, sem levar em conta sua
situação econômica interna e seu lugar no panorama turístico (ver gráfico 31).
Gráfico 31 – Valor da diária média no dormitório em Reais
Fonte: elaborado pelo autor (2014)
0
13
15
Não Em PCs Wi-Fi
0
9
5
1
Até R$ 30 de 31 a 50 de 51 a 70 Acima de R$ 70
177
4.3 Reflexões sobre o perfil hosteleiro de Florianópolis (SC)
Além das análises feitas para cada gráfico, existem algumas considerações gerais e
essenciais que devem ser feitas. É percebido que a maioria dos empreendedores
hosteleiros de Florianópolis possuem uma relação íntima com a essência dos hostels,
principalmente a posição de hospitalidade que estes estabelecimentos devem ter,
apesar de todos desconhecerem completamente sua gênese. É como se a essência
hospitaleira dos hostels tivesse sido transmitida de hostel a hostel, como que
consanguineamente. Nenhum dos hosteleiros havia ouvido falar de Richard
Schirrmann, no entanto as semelhanças eram inúmeras. A busca pela interação e
entendimento entre as pessoas estava presente em quase todos os entrevistados,
mais em alguns menos em outros. Procuravam à sua maneira dispor um local que
acolhesse o viajante. No entanto, há estabelecimentos que parecem iniciar uma
formatação da hospitalidade hosteleira, caminhando no mesmo rumo da HI, da
padronização, da qualidade nos serviços, da lucratividade como meta principal.
Os responsáveis por administrarem os hostels do sul da ilha, assim como seus
estabelecimentos, se mostraram particularmente hospitaleiros, recebendo o autor
com café, bolo, etc. O ambiente e o comportamento lembravam o de uma casa, de
uma família, esses empreendedores normalmente moravam no próprio hostel e
encaravam seu trabalho não como labuta, mas como um estilo alternativo de vida.
Com essas pessoas, a entrevista discorreu de forma mais intima e mais aberta, foi
mais fluida e sem restrições, os entrevistados agiram de forma mais aberta. Os hostels
na região da Lagoa da Conceição, apesar de haver exceções, procuram tratar seus
estabelecimentos e hóspedes com a maior cordialidade e presteza possíveis, porém
de uma maneira mais positivista, com uma visão essencialmente mercadológica.
Visam a qualidade nos serviços como um diferencial, uma ferramenta de marketing
que podes lhe oferecer promoção frente a um mercado tão competitivo.
Vale ressaltar aqui que não é o intuito desse autor fazer qualquer julgamento de valor
quanto a qualidade dos hostels entrevistados. O que se procura aqui é somente relatar
uma distinção percebida em função do determinismo geográfico da Ilha de Santa
Catarina. Somente está se fazendo uma observação que há diferenças essenciais
entre os hostels do sul da ilha e os da lagoa.
178
4.4 A essência dos hostels
Por tratar-se de um meio de hospedagem extremamente jovem, procurou-se descobrir
e relatar, concomitante à história dos estabelecimentos, a história pessoal dos
entrevistados, pois acredita-se que a formação pessoal de cada indivíduo determina
sua personalidade e vários outros aspectos materiais de sua vida, inclusive seu perfil
profissional, como por exemplo a escolha pela gestão de um meio de hospedagem
como o hostel. Essas histórias também contribuiriam em conteúdo, quando a história
do estabelecimento pecava em substância, haja vista que alguns estabelecimentos
possuem apenas uma temporada de verão de existência.
A transcrição do conteúdo de todas as entrevistas não seria viável nessa dissertação,
pois deixaria o conteúdo extremamente extenso. Com a finalidade ilustrativa,
encontra-se o Apêndice D uma das entrevistas realizadas, transcrita de maneira
informal. O entrevistado não é identificado, pois não é o intuito do trabalho colocar
sobre os respondentes nenhuma responsabilidade ética, moral, pessoal ou
profissional, assim como não é o intuito beneficiar ou prejudicar nenhum respondente
quanto ao teor de suas respostas.
Para formular um conceito de hostel analisou-se a essência dessas entrevistas. Pois,
os conceitos nada mais são, em sua forma mais abstrata, do que uma pretensão de
encapsular a essência de um fenômeno e/ou objeto através da comunicação verbal,
escrita à ciência humana. Os quadros conceituais são uma forma de ilustrar essa
essência, pois propõem trazer à tona uma mudança de consciência, uma aceitação
ao novo ou ao desconhecido (ZOPIATIS e CONSTANTI, 2012).
Ainda, para aa formulação desse conceito, a categoria de essência/aparência do
materialismo foi escolhida pois, uma teoria de desenvolvimento conceitual deve
especificar as premissas representacionais inatas [ao objeto], deve caracterizar os
modos em que o estado inicial difere do estado adulto, e deve caracterizar o processo
pelo qual um [objeto/fenômeno] é transformado em outro (CAREY, 2011). Os
indivíduos entrevistados se apropriaram do espaço turístico devido á
179
sua inclinação para exibir respostas frente a um conceito ou objeto (Fishbein & Ajzen, 1975). A afetividade, e os campos da cognição e comportamento humano são considerados os domínios dessas atitudes (Rosenberg & Hovland, 1960) e servem como ponto de partida para as análises mais contemporâneas (Ajzen, 1989, p. 245) (RAMKISSOON, WEILER e SMITH, 2012, p. 259).
Finalmente, um conceito do meio de hospedagem intitulado de hostel, deve
representar as características aparentes, mas principalmente suas características
essenciais. As palavras consideradas como chaves do discurso de cada respondente
forma divididas entre esses dois grupos, essência e aparência. Assim, permite-se
determinar os aspectos superficiais do objeto de estudo, como as características
essenciais dos hostels, ilustradas no quadro 3.
180
Quadro 3 – Análise dos discursos Superficiais vs. Essenciais
ESSENCIAIS SUPERFICIAIS
Hospitalidade Serviços Estrutura física Perfil backpacker Outros
Sujeito 01
“Morei em muitos hostels”
“O que eu gostaria de oferecer, que eu não
ofereço aqui é café da manhã”
“Meu pai tinha comprado essa casa que hoje é o hostel”
“Tu encontras pessoas do mundo inteiro
[...]cada um tem uma história”
“2011 que acabamos dando início”
“Marketing boca a boca”
“O recepcionista é todo o charme da parada”
“Já pensei em aula de surf, em aluguel de
bicicleta”
“Um ambiente assim mais de descontração”
“Tem pessoas que não respeitam, por exemplo,
as tuas coisas”
“Albergue da juventude é [...] para jovem. Hostel dá todos os tipos de pessoas”
“Morei muito tempo na Austrália”
“No HI vai ser difícil tu conhecer o dono, [...] no meu [...] todo dia eu tô
aqui”
“A gente quer aproveitar a Gastronomia, mas
também tem que economizar”
“Um hostel são quartos coletivos”
“Fazer novas amizades, conhecer mais pessoas
né [...] descontrair e conhecer coisas novas”
“Hostel são pessoas diferentes, culturas
diferentes, num ambiente só”
“No começo foi bem difícil, no
inverno também”
Sujeito 02
“Estilo familiar, os donos tomavam conta [...]
sustentável [...] ambiente de harmonia”
“Somos nativos, manézinhos, [...] daqui há
pouco tamo saindo pra fazer uma trilha bem legal
que não tá no mapa”
“Essa casa já estava aqui [...] não dessa
forma [..] um hostel é tudo de uma maneira
informal”
“Mentalidade jovem [...] aspecto econômico pesa,
quer sobrar mais pra conhecer mais”
“Inauguração foi 08 de novembro de 2010. [...]
Os acontecimentos mais marcantes são
todas as pessoas que a gente encontra, as
diferentes culturas”
“Sempre me identifiquei com esse espírito de
aventura”
“Tratava o hóspede com uma hospitalidade
diferente de um hotel comum [...] se aproxima,
senta aqui, vamos conversar”
“O staff ter pessoas da cidade que conheçam a geografia e a história da cidade [...] não só aquilo superficial [...] bilíngues”
“Uma área de lazer [...] de convivência, uma sala, um espaço com material turístico e
informativo da cidade”
“Até hoje recebemos 93 nacionalidades
diferentes [...] choque, conflito entre brasileiros
e outros”
“eu prefiro albergue, por que eu acho que é português e tal, mas
hostel é o que habituou”
“Morei na Nova Zelândia por um ano [...] é difícil trabalhar com
várias culturas”
“Várias nacionalidades fazendo amizade [...] já surgiu até casamento
daqui [...] pessoas que se conheceram aqui e...”
“O recepcionista recepciona em tudo [...]
acolhe, o hóspede se sente em casa [...] é uma
família, se sente abraçado”
“Cozinha de uso comum é fundamental [...] espaço de convívio [...] a ideia é o coletivo [...] mas com uma boa cama, quarto limpo”
“O público de hostel quer cada vez mais esse
contato com a natureza [...] foge dessa coisa de
centro [...] troca de experiências”
Hostel é um estilo de vida mais descontraído,
ambiente familiar, troca de energia, experiências, [...]
interação entre as pessoas”
“Minha mãe é socióloga, sempre viajou muito [...] meu pai conhece quase o mundo
inteiro”
181
Quadro 3 – Análise dos discursos Superficiais vs. Essenciais (continuação)
ESSENCIAIS SUPERFICIAIS
Hospitalidade Serviços Estrutura física Perfil backpacker Outros
Sujeito 03
“Toda a vez que vejo alguém entrar com uma
mochila eu vejo eu mesmo [...] fiz vários
amigos”
“Ordem, organização e sou maníaco por limpeza [...] tudo o que tem aqui é um preço de mochileiro,
não quero fazer um grande lucro sobre isso”
“Área de convivência grande [...]colocar mais
dez camas, oferecer menos conforto [...] eu
nunca fiz isso, quero qualidade”
“O pessoal gosta de ficar conversando [...]
incomodar uma pessoa não existe [...] se vem
aqui só pra economizar tá no lugar errado”
“01 de outubro de 2013 [...] nasceu quase por acaso [...] o sonho de qualquer mochileiro é
abrir um hostel”
“Nasci em Nápoles, cresci perto de Milão,
área industrial [...] morei 06 meses na
Austrália”
“É importante que o recepcionista tenha sido mochileiro, para ter essa vibe [...]para manter essa
atmosfera tem que ser jovem na cabeça”
“Gastronomia é importante [...] se me
colocasse num hostel em qualquer parte do mundo saberia onde estou pelo
café da manhã”
“O hostel do meu sonho é com uma vista
maravilhosa para a praia, com área de
convivência, café da manhã, um barzinho”
“Muitas pessoas que viajam sozinhas [...] se
você conversa sem vontade eles reparam e
fica chato”
“Sem ter sido um hóspede não teria
conhecimento do que é bom num hostel [...]o
ponto negativo é saber lidar com as pessoas”
“Eu estudei o científico e
ciências sociais [...] apaixonado pela
geografia, viagem”
“Recepcionista mora no hostel [...] é importante
que ele conheça a ilha [...] vejo o hostel como a casa
longe de casa”
“Faço mil perguntas pra eles não pra ser
simpático, mas por que sou interessado mesmo”
“Fui criado com minha mão num lugar que era como uma joia, assim
era minha casa, é assim que quero meu hostel”
“Sem frescura, viagem diferente [...] grande
diferença entre o mochileiro brasileiro e o
estrangeiro”
“Hostel é a atmosfera que você cria [...]
hostel é vender uma experiência de vida”
“Muito rebelde até os 18, 20 anos,
muito sonhador”
Sujeito 04
“Recepcionista tem que ser uma pessoa proativa,
sem problemas pra se relacionar com outras
pessoas, bilíngue”
“Wi-fi, limpeza do local e café da manhã [...]
gastronomia faz parte total da experiência [...]
europeus gostam de comer bem”
“Esse hostel era casa de uns amigos [...] muita coisa foi atropelada,
inauguramos de maneira improvisada”
“Necessidade de conhecer lugares que
trazem enriquecimento pessoal [...] contato com
culturas, crenças, geográficas diferentes”
“O hostel tem 04 meses [...] meus amigos tinham receio de
investir nisso [...] viram o sucesso de dois
hostels daqui”
“Nasci em Porto Alegre, trabalhei no Club Meb por
07 anos [...]na Europa”
“Pode ser a segunda casa do hóspede, depende da
sinergia entre a equipe do hostel e os turistas [...]
problemas com segurança nos quartos
coletivos”
“Pessoas capacitadas e que tenha um perfil pra
isso [...] o rapaz da recepção é musico, cada um traz sua bagagem [...]
informalidade”
“Foco nas áreas de convergência, nas áreas sociais, cozinha ampla,
parte de lazer abrangente [...] cozinha
e bar no centro”
“Hóspedes internacionais com conceito de
interagir, conhecer pessoas de outros
lugares [...]
“Língua franca é o inglês, o termo natural
é hostel [...] hostel é um lugar informal de
convergência de pessoas”
“Meu pai é italiano, tenho o passaporte [...]
morei na França, Itália, Turquia,
Suíça e no México”
182
Quadro 3 – Análise dos discursos Superficiais vs. Essenciais (continuação)
ESSENCIAIS SUPERFICIAIS
Hospitalidade Serviços Estrutura física Perfil backpacker Outros
Sujeito 05
“O intuito de um hostel é proporcionar a união das
pessoas que estão viajando”
“Dar conforto, segurança, alegria e amizade para
quem está viajando, num lugar sadio”
“Fizemos uma pesquisa de mercado [...]
pousadas e hotéis fechando [...] decidimos
montar um hostel”
“Não quer se sentir sozinho [...] viajam o ano inteiro, tem tempo livre,
flexível”
“04 de janeiro de 2014. A Lagoa da Conceição respira o público de
hostel [...] Falo diversos idiomas”
“Morei 20 anos nos EUA [...] viajei muito, fiquei em hostels conheci
muita gente legal”
“Receber é participar da história de outras
pessoas [...] fazer ele perceber que está em
casa”
“Eu gosto de receber, o relacionamento é o mais importante pra gente [...] cordialidade, cortesia, de
coração ”
“Uma cozinha bem montada. Boa
habitação, é essencial”
“É um estilo de vida, uma atitude específica, informal, sedento por
cultura”
“Conheço hostels em Amsterdam, Zurique,
Paris [...] proporcionar clima de hostel com qualidade de hotel”
“Viajava sozinho, poderia ficar em hotéis luxuosos, mas procurei um
lugar com alegria”
“Se sentir acolhido, se sentir seguro [...] adora
interagir, importante pra nossa sociedade”
“Limpeza, limpeza. Esses jantares são muito
importantes, é onde eles se conhecem”
“Boa área de convivência”
“Todo mundo é bem pra frente, bem aberto, sem preconceito, todo mundo
se respeita”
“o mais importante não é dinheiro é a amizade
[...] prefiro hostel, albergue um lugar sujo”
“Adoro viajar, faz parte de mim, me
sinto melhor muito haver com hostel”
Sujeito 06
“Aqui é outra proposta, sul da ilha, a gente gosta
de receber gente em casa [...] tem que ser um lugar
aconchegante”
“O contato pessoal, a sensibilidade de perceber
o que ele precisa, tenta passar essa presteza, fora
isso a limpeza”
“A casa era grande, dividi os quartos e
aluguei pra estudantes. Fomos fazendo
reformas de acordo com a necessidade”
“A essência é fazer tudo compartilhado, sem
muita frescura, em união [...] a gente já foi visitar hóspedes na Argentina”
“16 dezembro de 2011, primeiro do Campeche. Tentamos um hostel em
2007, mas não sabíamos direito como
funcionava”
“Sempre gostei muito de viajar,
minha mãe também”
“Quando a pessoa chega aqui pingando no verão eu faço um suco gelado, levo a bolsa pra cima...”
“Todo o final de tarde tem a free popcorn e filme, toda quarta tem free pasta, a gente dá os
ingredientes e eles fazem”
“Deveria construir apenas em 1/3 do
terreno, o resto é área de lazer, convivência”
“Teve um tiozinho que chegou aqui achando
que hostel era hotel em alemão”
“Já tinha essa cultura de que albergue não é
lugar de sem teto [minha mãe é professora]”
“Morei na Europa e lá se dividia a casa, como uma
república”
“Ele ficou 10 dias aqui. Ele falou que conseguia
descansar, se sentir em casa e ficou...”
“Eles não sabem falar Márcio, mas lembram
sempre do churrasco e o café da manhã é nossa cara, nossa filosofia”
“Não tem mesa individual, tudo
compartilhado. O que tem no quarto? Cama”
“Teve uma menina que desceu chorando quando
ela viu o quarto: não sabia que ia ter que ficar
com mais 7 pessoas! ”
“World Packers [troca de acomodação por
trabalho], rentabilidade e interatividade. Prefiro hostel, amizade. Tenho preconceito albergue”
“Fui morar na Inglaterra tinha a minha carteirinha
de albergue da juventude”
183
Quadro 3 – Análise dos discursos Superficiais vs. Essenciais (continuação)
ESSENCIAIS SUPERFICIAIS
Hospitalidade Serviços Estrutura física Perfil backpacker Outros
Sujeito 07
“Aluguei como apartamento, o único
contato era oi e tchau [...] hoje mesmo vamos fazer
pizza aqui no hostel”
“Pegamos onda juntos, tomamos café juntos [...]
eu converso com as pessoas, interagimos”
“O quarto as pessoas não se importam
tanto”
“Vêm atrás da cultura surfe, do ambiente
saudável. Pessoas se conhecem aqui, passam a
viajar juntas, mudam roteiro. Volta ao mundo”
“Foi em fevereiro de 2014. A gente vive
apagando incêndio, não tem como prever”
“Europa (08 anos) pra aprender
inglês. Fizemos uma volta pela
Ásia e ficamos em alguns hostels”
“O dono atua no hostel. Eu quero que as pessoas venham aqui e digam eu conheci o Rodrigo [...] se tronam meus amigos”
“Um apoio às pessoas. Num hostel você é o pai
deles, tem que agir como um pai. O recepcionista é
o elo”
“O principal é ter uma cozinha, sala ou área
de lazer, redes, churrasqueira, um bar”
“O público elitizou, eclético, vegetarianos, de hábitos simples, focado
em economizar por causa das trips longas”
“Pessoas aqui são únicas, tem histórias
pra contar [...] A mola do hostel é entreter,
fazer amizade”
“Ficávamos em hotel, isolados, em
hostels nos comunicávamos”
“Gosto de conversar, com certeza é a segunda casa
do viajante [...] o meu hostel é o local acolhedor,
vai relaxar.
“Tenho regra o preço, sugiro buffet por kg,
barato, prático e bacana. Sequência de camarão,
prato único daqui ostras”
“O principal é a atmosfera e não o
espaço físico”
“Quando você é solteiro sai pra tomar uma
cerveja com o pessoal. Quando você tem uma família já é mais difícil”
“O pessoal estrangeiro não associar a palavra albergue. Hostel é um
local “a fudê” pra encontrar amigos”
“Hostel grande, mas não sei quem era o funcionário, o dono, não podia
interagir”
Sujeito 08
“Sempre gostei de hospitalidade [...] tem
gente que acaba se sentindo em casa, como o
meu marido, pai dos meus filhos”
“A gente tá aqui pra prestar serviços, pra dar
esse apoio. Café da manhã é opcional”
“Não tinha recepção, em 2004 dobramos de 23 para 46 e fizemos a recepção. Era o único
hostel de Floripa”
“Quadro da honestidade, a pessoa vinha pegava o
que queria no bar, anotava no quadro e
deixava o dinheiro. Fazia festa, ”
“Dois australianos trouxeram conceito de
hostel pro Brasil, em 2003. Fiz hotelaria e não conhecia, não
existia isso no Brasil”
“Intercâmbio nos E.U.A. por 2 anos [...] sempre gostei de inglês, coisas
novas”
“É fundamental ter alguém do staff com o
hóspede. Ele é a cara do hostel, tomar uma cerveja
com a galera”
Antigamente tinha muito mais interação, mudou
com a wi-fi”
“Tem que ter dormitórios, uma cozinha ondes as
pessoas possam sentar e comer”
“Brasileiros não tem o costume, acham que é
uma pousada barata, não querem interagir e hostel
é isso”
““Hostels trabalham juntos, no Brasil
ninguém tá nem aí, não tem união”
“Procuro manter certos padrões, aluga privado quarto anual e
chama de hostel”
“O recepcionista faz atividades de passeio,
trilha, que é fundamental, conhecer o hóspede”
“Quando tem essas jantas faz uma grande diferença,
procura fazer pratos brasileiros, tem feijoada”
“Cantinho de TV, onde as pessoas possam ler, fazer pesquisas, uma
área comum”
“Tem o público que não quer gastar com nada, a
gente permuta, perfil jovem, quer relaxar”
“Hostel é uma comunidade que só
tem a agregar experiências”
“É o futuro da hotelaria. Vários
tipos, estrutura de resort...”
184
Quadro 3 – Análise dos discursos Superficiais vs. Essenciais (continuação)
ESSENCIAIS SUPERFICIAIS
Hospitalidade Serviços Estrutura física Perfil backpacker Outros
Sujeito 09
“Relação mais informal que se pode ter com um
hóspede. Fizemos um luau, alguma festa ou até
fazer jantares”
“Troca de experiências, desde fazer trilhas juntos, ou fazer e organizar um
jantar”
“Eu cedo a casa de veraneio que a gente
tem”
“Tão educadinhos, pega ali seu livrinho, não
fazem bagunça. Alguns acham que hostel pode tudo, tudo liberado, dão
trabalho”
“Em maio de 2009. Preconceito que se tem
sobre hostel hoje. A cultura do hostel é o
sair do lugar conhecido, sair do padrão”
“Sempre tive essa coisa de viajar com mochila. Ficava em
hostel porque tinha interação com pessoas”
“A gente vai sentar junto pra comer, pra tomar um drink, jogar sinuca, falar
com o meu hóspede, com a mesma desenvoltura
que com um amigo”
“Serviço de limpeza. Essa informalidade, as vezes
gera também uma distorção, que é essa
perda na qualidade do serviço”
“As áreas de uso comum, jogos, bar
onde vão poder interagir. Cozinha, para
sentar juntos e congregar”
“Sempre tentando buscar formas alternativas de
fazer as coisas, de viajar, de se hospedar, contra um sistema instituído”
“Preferência pelo termo hostel.
Albergue, esse lugar para abrigar gente que
não tem onde ficar”
“Tirei um ano sabático pra viajar um pouco. Acabei
dando aula de vela, num hostel”
“Hostel não é um deposito de viajantes. Não só financeiro, mas
oferecer a melhor experiência possível”
“Todos resolveram cozinhar juntos e eram vinte e cinco pessoas
numa mesa de sete países diferentes”
“Espaços que privilegiem essa
interação entre as pessoas”
“Estão ali pra dividir, pra congregar. Todo mundo
dormindo no mesmo quarto, soa como algo contra as instituições”
“Um lugar de encontros, onde
pessoas se encontram e interagem. Aliás um lugar de encontros
improváveis”
“Gostar de diversidade.
Conhecer coisas diferentes”
Sujeito 10
“Quer oferecer uma experiência e não uma
acomodação. Você trabalha para mudar a
perspectiva da pessoa pra melhor”
“Tenta proporcionar um local ideal pro público”
“Uma sala de TV com muito espaço para sentarem e ficarem
juntos”
“O pessoal de fora procura poupar, por
farra, festa. Brasileiro pra ter uma experiência diferente de viagem”
“Abriu em 2008. Hostel na Polônia parece hotel
de cinco estrelas. O recepcionista é o
coração do hostel, amigo do hóspede””
“Me envolvi com ONG, fui escoteira,
trabalhei por 2 anos na Europa”
“Ela sai daqui sabendo que tem uma família e
não um lugar que hospedou ela”
“Essencial é café da manhã. Todo o domingo a gente faz um churrasco, é
o momento que todo mundo interage”
“Um banheiro por quarto”
“O lema do hostel é sua casa longe de casa. Você e obrigado a falar, a dar
um sorriso”
“Prefiro hostel. Albergue no Brasil é um
grande galpão, pra quem não tem como
pagar. Hostel é sentimento, sensação”
“Fiquei em hostel em todos os
lugares. Prefiro lidar com pessoas
o dia inteiro”
185
Quadro 3 – Análise dos discursos Superficiais vs. Essenciais (continuação)
ESSENCIAIS SUPERFICIAIS
Hospitalidade Serviços Estrutura física Perfil backpacker Outros
Sujeito 11
“Receber pessoas é como se você estivesse
viajando”
“Eventos mais tranquilos, voltado ao ecoturismo,
luau”
“Essa casa meus avós têm quase 40 anos. Foram reformando, como ninguém usa resolveu no hostel”
“A galera mais jovem acaba optando por ser mais barato e oferecer
aquela atmosfera”
“Abriu em maio de 2014. A gente sabe que
é confiável lá fora e aqui é uma tendência”
“Minha mãe resolveu morar no
Havaí”
“O hóspede tem um maior contato com o
recepcionista do hostel. Saímos prum barzinho...”
“É importante o transfer do aeroporto/rodoviária”
“Acho que tem que ter pelo menos uma área
para as pessoas se reunirem,
conversarem, interagirem”
“Disposto a conviver com as outras pessoas,
conhecer, participar de uma comunidade, fazer as coisas pensando nos
outros”
“Começamos a divulgar só com amigos, boca a boca. Conhecer gente do mundo inteiro, mil
culturas, aprendo coisa nova”
“Mudou minha vida, era mais
urbana”
“É legal a interação com os hóspedes”
“Café da manhã é opcional. Limpeza
mínima”
“Quartos compartilhados, e uma cozinha compartilhada é essencial também. E
lockers”
“O brasileiro não tem essa visão. Não estão dispostas a ficar com pessoas estranhas”
“Fala albergue acham que é pra gente de rua. Hostel é interação, sociabilidade, uma viagem diferente”
“Só queria viajar, curtir a vida.
Acabamos indo pra Indonésia...”
Sujeito 12
“Sinta-se em casa, sinta-se da terra. A gente não tá recebendo hóspedes,
tá recebendo amigo”
“Passeio, ainda mais aqui em Florianópolis, trilha,
bicicleta. Serviço de bar”
“Aqui já existia um pub. O pub teve que ser
fechado e resolvemos abrir o hostel”
“Cada hóspede, quem procura o hostel quer um
tratamento diferenciando”
“Abriu dia 27 de outubro de 2014”
“Queria sempre a escapar do sistema”
“A gente não faz check-out são despedidas. Acaba tendo um elo
muito grande”
“Amanhã vai ter um evento de brechó com
foodtruck”
“Tem que ter essa sala de estar, de interação de hóspedes, pra ele conhecer os outros”
“Um casal com mais de 60 anos de SP, vieram
parar aqui e que se identificou muito”
“Eles pegaram uma imagem ruim nossa, gurizada, só querem festa. E começaram a ver com outros olhos”
“Minha essência sempre foi fazer
algo fora do padrão”
“Contato com hóspede, a gente é muito dado, de
conversa”
“Ficamos tri amigo delas, fizemos janta juntos.
Nosso ambiente acaba ultrapassando o
profissional
“A cozinha compartilhada é um
lugar onde tu conhece muitas pessoas”
“Vieram pra ficar dois dias e ficaram uma
semana”
“Hostel é uma experiência que não vai encontrar em nenhum
outro tipo de acomodação. É um
lugar mágico”
“Exterior não, eu fui pro Uruguai e
Argentina”
Fonte: elaborado pelo autor (2015)
186
De acordo com o quadro resumo dos depoimentos dos entrevistados, pode-se deduzir
algumas afirmações quanto à essência dos hostels em Florianópolis. Esses aspectos
essenciais devem ser considerados, juntamente à história desse meio de
hospedagem no Brasil e na Alemanha, local de sua gênese, e ao panorama do
restante do universo de hostels brasileiros, quando se for contemplar a criação de um
conceito desse meio de hospedagem, para a sua futura classificação perante ao MTur.
Portanto, a essência da hospitalidade dentro dos hostels, de acordo com os
entrevistados, pode ser traduzida como uma relação de maior proximidade entre ser
acolhedor e ser acolhido. Esse elo pode ser tão íntimo que a amizade brota dessa
interação, em alguns casos. O hostel pode ser considerado como uma casa longe de
casa para o ser acolhido e em alguns casos é, realmente, a casa do ser acolhedor,
onde seus integrantes compõem uma grande família. O ser acolhido, devido à
informalidade do local e das relações pessoais realizadas nesse último, se sente
seguro e à vontade, confortável não só fisicamente, mas psicologicamente, pois o ser
acolhido é visto como seu par, ambos podem ser quem realmente querem ser e não
uma interpretação de papeis como cliente e empresário. A hospitalidade possui na
figura do recepcionista sua personificação, é através dele que as ideias, o conceito de
hospitalidade se materializa, pois, um hostel é composto de pessoas e suas
interações. O ser acolhedor é a essência desse estabelecimento, devido ao seu
passado como viajante ele projeta sua própria essência pessoal nos seres acolhidos
que adentram seu recinto.
Há, além da relação entre hóspede e anfitrião, uma relação de simbiose entre ambos.
O relacionamento entre essas partes, traduzida aqui como hospitalidade, reside no
âmago da essência de um hostel. Esse relacionamento é traduzido em uma interação
entre essas partes, que possui o intuito de promover a união pessoal e do grupo, união
essa que perdura até os dias de hoje na filosofia dos albergues da juventude. Quando
essa relação produz uma sinergia, a hospitalidade pode ser materializada em sua
forma mais pura e genuína, onde pagamento monetário por serviços é substituído por
outras formas de remuneração, como uma troca de experiências e reconhecimento
pessoal. Verdadeiras amizades são concretizadas que perduram além do período de
estadia do hóspede no estabelecimento. Excepcionalmente, algumas relações
187
pessoais podem ultrapassar o domínio da amizade e tornar-se uma relação intima,
amorosa e até mesmo conjugal.
De uma maneira geral, o serviço tido como essencial, do ponto de vista dos
empreendedores hosteleiros de Florianópolis, é aquele muito próximo ao conceito de
hospitalidade visto no parágrafo anterior, o serviço de acolhimento, informação e
interação entre as pessoas. O papel do recepcionista é o de “abraçar” o hóspede, no
sentido não literal, mas fazer com que ele se sinta em casa, não só “à vontade”, mas
que conheça o lugar da perspectiva de um morador local, para que possa desfrutá-lo
da melhor maneira possível durante sua estadia. Especificamente, o recepcionista
promove essa interação de diversas formas, no caso de Florianópolis, as mais comuns
são a realização de trilhas ou passeios de bicicleta em meio à natureza, atividade essa
que reside na gênese dos Wandervogels e dos albergues da juventude, sendo essa
atividade a geradora desse meio de hospedagem no início do século XX. Outro serviço
tido como essencial é o café da manhã. Além de prover o suprimento alimentar e
satisfazer as necessidades biológicas pessoais, é nesse ato que as pessoas
interagem pela primeira vez no dia, traçam planos de visitar locais fora do albergue, é
onde nascem novos elos pessoais.
Os eventos gastronômicos noturnos, as jantas comunitárias complementam o serviço
de café da manhã. São esses eventos que reúnem as pessoas ao final do dia, é ali
que são concretizados esses elos estabelecidos ao decorrer do dia, nas atividades
diversas realizadas pelo grupo de hóspedes e muitas vezes com a presença do
recepcionista. A congregação em volta da mesa, tendo a gastronomia como pano de
fundo, é uma atividade hospitaleira recorrente à gênese da civilização humana. A
limpeza é tida como outro serviço essencial e vista como uma área de grande
preocupação perante os hosteleiros. Outros serviços recorrentes são as aulas de surfe
ou o aluguel de equipamento para a prática desse, devido à disponibilidade e
popularidade do esporte em toda a ilha de Santa Catarina, assim como internet
disponibilizada em forma de wi-fi, devido ao perfil do viajante mochileiro, do desejo e
da necessidade de estar sempre conectado ao mundo, compartilhando suas
experiências em praticamente tempo real e planejando seus próximos passos.
188
As áreas físicas essenciais são todas aquelas consideradas como áreas comunitárias
ou áreas de convivência. Dentre elas as mais mencionadas são os quartos coletivos
com banheiro dentro desses, as cozinhas comunitárias, salas de jogos, estar e/ou TV,
e os espaços gastronômicos (como áreas de churrasqueira, bares/pubs, lanchonetes
e/ou restaurantes). As áreas sociais e de lazer externas, como varandas, piscinas,
decks e redes, estão entre as principais, de acordo com os hosteleiros, pois o clima
de Florianópolis favorece a interação pessoal em espaços abertos. Os espaços
informativos (de leitura, informação sobre a cidade e outros destinos turísticos),
incluindo-se aqui a recepção completam as áreas físicas essenciais dos hostels do
município.
Quanto ao perfil backpacker, os empreendedores definem esse público alvo
essencialmente como pessoas que são amigáveis, descontraídas, cosmopolitas,
voltadas à natureza, que buscam, acima de tudo uma troca experiências, uma
experiência única em sua viagem, memorias que perdurem por uma vida. De uma
maneira geral, gostam de conversar, interagir com outros hóspedes, pois viajam
sozinhas, mas não gostam de ficarem ou se sentirem sozinhas, preferindo
compartilhar desde refeições, a atividades realizadas fora do meio de hospedagem
como passeios turísticos e atividades esportivas. Congregam, geralmente, em
atividades gastronômicas, mas principalmente em atividades noturnas, como festas,
bares e clubes. Procuram economizar, no intuito de estender sua viagem ao máximo.
São flexíveis quanto ao período de estadia e às atividades que realizam quando em
férias. Geralmente viajam por um longo período, encontram-se em uma volta ao
mundo ou ano sabático. Possuem um perfil informal, priorizam o enriquecimento
pessoal e cultural, através da interação profunda entre pessoas e o destino que
visitam, ao status que o ato de viajar pode oferecer para algumas pessoas e ou
sociedades. Esse público alvo, que pode ser denominado de turista da juventude e/ou
backpacker, não se limita somente a essas categorizações. Ele é constituído de
pessoas ecléticas, de uma grande variedade de nacionalidades e formação pessoal e
socioeconômica.
Quanto à distinção entre o termo albergue e hostel, é clara a preferência dos
entrevistados pela palavra hostel. Mesmo aqueles que não são favoráveis ao
estrangeirismo preferem hostel por que ela reflete melhor a essência filosófica e
189
mercadológica desse meio de hospedagem. O termo albergue da juventude define um
meio de hospedagem diferente, redigido pela HI, com filosofia similar, mas diretrizes
próprias e singulares que não abarcam o ponto de vista dos hosteleiros
independentes. Além disso, é reportado com frequência que existe um preconceito
quanto à palavra albergue, essa refletindo um local para desabrigados, geralmente
sujo e barato.
190
5 HOSTEL, UM CONCEITO EM FORMAÇÃO
Reunindo todo o arcabouço teórico e os resultados da pesquisa de campo, chega-se
ao último capítulo cumprindo o objetivo principal, a proposta de um conceito do meio
de hospedagem denominado de hostel.
Primeiramente, a figura 37, visa expressar a ideia do autor sobre a relação dos hostels
com o território/espaço e a relação do poder público com este meio de hospedagem,
essa última residindo no âmago da problemática desse estudo. O território
(representado na figura 37 como um círculo maior) é o aspecto geral de uma nação,
uma concepção mais ampla e abrangente do espaço em que se vive, podendo conter
toda uma sociedade, nação ou civilização. Por sua vez esse espaço possui partes
territoriais menores, sob seu domínio (representados como os círculos menores).
Esse território pode possuir potencial turístico ou não. Desses territórios apenas
alguns se consolidam como destinos turísticos e, consequentemente, apenas uma
pequena parte destes é considerada como patrimônio histórico. Dentro deste
patrimônio encontram-se alguns meios de hospedagem, dentre eles os hostels, assim
os círculos vão diminuindo.
Essas várias camadas, representadas agora como uma pirâmide, são na verdade uma
única representação socioespacial de nossa realidade, mas que pode ser abordada
de diferentes pontos de vista. Pode-se observar esse fenômeno de cima para baixo
ou de fora para dentro. Nessa abordagem, que é adotada pelo poder público, os
hostels ficam praticamente invisíveis, pois enxergam-se todas as camadas maiores e
ditas “mais importantes”, antes de se chegar ao âmago do território. Assim sendo, o
fundo dessa pirâmide fica inexplorado e desconhecido. Do ponto de vista inverso,
esse meio de hospedagem aparece como parte integrante do patrimônio histórico, e
este patrimônio é parte integrante de um círculo maior e assim por diante. Nessa
concepção, de dentro para fora ou de baixo para cima, nenhuma camada é deixada
de lado, pois todas se complementam e são, na verdade uma só.
Para melhor compreensão dessa concepção poderia se estabelecer uma comparação
com um vaso cheio de terra com flores brotando deste. O vaso seria a hospitalidade,
191
o fio condutor que propicia toda essa relação. As várias camadas de terra são as
várias representações do território e os eventos socioespaciais que acontecem sobre
ele. As flores corresponderiam às diversas manifestações do fenômeno turístico que
brotam do território e da hospitalidade. Para que essas relações turísticas não sejam
completamente efêmeras e produzam flores que perdurem e possam renascer com o
passar do tempo, seria necessário que as raízes fossem profundas e se alimentassem
do patrimônio histórico do território, da boa relação entre turista e anfitrião.
O desenvolvimento dos empreendimentos hoteleiros deve estar conectado ao
desenvolvimento do destino turístico. Deve haver sincronia entre o que é necessário
para o destino e o que é realizado nos empreendimentos. Planejamento turístico pode
significar rejuvenescimento turístico, com novos conceitos, novas abordagens, novas
relações turísticas e novos resultados. Os hostels podem ser considerados como uma
proposta de reforma na hotelaria convencional, pois oferecem a junção de três noções
de hospedagem, a privada, a social e a comercial32. Sendo assim, estes meios de
hospedagem constituem uma síntese destas modalidades, um denominador comum,
podendo contribuir para a reciclagem hoteleira através da colaboração com o
planejamento sustentável dos destinos turísticos.
32 O conceito, na hotelaria, de hospedagem privada aqui abordado, é o de Goeldner, Ritchie, &
McIntosh. Segundo ele, as primeiras acomodações do turismo “eram partes de residências privadas e os viajantes eram hospedados quase como se fossem membros da família” (2002, p. 53) e é nesse tipo de acomodação, que se experimenta a verdadeira hospitalidade. Posteriormente, essa concepção foi levada a esfera comercial onde esses atos de hospitalidade foram inserido na forma convencional de hotelaria ou hospedagem comercial. Os hostels unem essas duas formas e ainda adiciona o fator social à hospedagem, devido aos quartos compartilhados, áreas sociais e promoção da interação entre as pessoas.
192
Figura 37 - Mapa conceitual da relação espaço/patrimônio/hostel
Fonte: Elaborado pelo autor (2014).
193
A figura 38 ilustra a proposta de um conceito de hostel, proposta essa que é o objetivo
principal desse trabalho. Pode-se constatar que os hostels são um meio de
hospedagem social que possuem um grande potencial de constituírem uma opção
viável para os meios de hospedagem no turismo sustentável. Ele se apoia em uma
grande base matricial (1) da qual nascem os três principais pilares de sustentação (2)
para esse conceito. A base dessa matriz está fundada na sua gênese histórica-social
e na relação entre homem e território, a qual não pode ser ignorada, pois é nela que
se encontra todas as interações entre o homem e o espaço, dando início as nossas
representações físicas e culturais e, consequentemente, a esse meio de hospedagem.
Isso, por conseguinte, gera uma filosofia, que é expressada em suas características
físicas e nos serviços únicos. É essencial saber que a hospitalidade (2) permeia esta
filosofia e age como fio condutor de todas as relações entre visitante e meio de
hospedagem. A hospitalidade propõe, entre outros princípios, a união entre pessoas,
povos e culturas, o acolhimento honesto de desconhecidos, oferecendo-lhes auxílio e
amparo e propiciando a troca de conhecimento entre anfitrião e visitante. Essa filosofia
de hospitalidade, que se traduz no tipo de infraestrutura e serviços que serão
oferecidos aos hóspedes, acaba por definir uma nova relação entre sujeito acolhedor
e sujeito acolhido (3). Essa relação, informal e de maior intimidade do que a percebida
na hotelaria convencional, permite ao ser acolhido se aproximar mais facilmente e
profundamente na cultura local e de outros viajantes que se encontram no
estabelecimento. Além disso, o caminho dessa interação também é inverso (4). O
sujeito acolhedor, geralmente representado na figura do recepcionista, participa de
atividades e eventos, intra/extra hostel, junto com o hóspede. Inevitavelmente ele
acaba por absorver a cultura de seus hóspedes, aprende com eles, interagindo na sua
própria viagem, se tornando parte da experiência de vida de outras pessoas, enquanto
cresce na sua própria.
Dessa relação simbiótica, entre hóspede e anfitrião, acaba-se obtendo, em alguns
casos, uma modificação na própria estrutura física do local e nos serviços, com a
influência direta do hóspede (5). O proprietário do hostel procura moldar sua estrutura
física de acordo com o perfil do público alvo, o que ocorre em qualquer ramo da
hotelaria. Mas, no caso dos hostels, os hóspedes, por vezes, acabam interagindo
diretamente nessa transformação. Como relatado pelos entrevistados, e pela
194
experiência profissional desse autor, devido ao cunho comunitário dos hostels, os
hóspedes podem ajudar desde a limpeza à pequenas reformas na estrutura física,
como, por exemplo, em um desenho/pintura interna de uma sala de estar, que acaba
por decorar o local. Nos serviços, essa simbiose é ainda maior. Diversos passeios e
eventos gastronômicos são organizados pelos próprios hóspedes, quando se sentem
à vontade e dispostos para tanto, e o anfitrião participa dessas atividades como
“convidado” do grupo. Ele deixa o papel de “chefe” do recinto e passa a ser mais um
indivíduo dentro do grupo de viajantes. Essa relação de simbiose reside na essência
do entendimento do conceito de hospitalidade, de reconhecer no outro seu valor, de
comunhão cultural e pessoal.
Essa relação única acaba por influenciar diretamente o território turístico (6), pois o
ser acolhedor que fica, absorve parte do ser acolhido que parte. Ele se modifica a
cada hóspede e acaba por modificar seu espaço, sua casa. Cada viajante leva consigo
uma parte daquele local, daquela pessoa. As ações dos hosteleiros perante seu local
de moradia, seu local turístico, serão direcionadas à promoção e conservação desse
último, pois no orgulho da partilha desse patrimônio reside o cuidado com o mesmo.
O turismo sustentável completa seu ciclo de visitação, mas as memórias e amizades
perduram para sempre (ver figura 38).
195
Figura 38 – Representação gráfica do conceito hostel
Fonte: Elaborado pelo autor (2015)
196
A título meramente ilustrativo e lúdico, propôs-se criar mais uma representação visual
do conceito de hostel, em forma de um possível logo desse meio de hospedagem que
traduzisse a essência do mesmo (ver Apêndice F). Esse logo foi idealizado a partir da
letra “H”, inicial da palavra Hostel, e composta das palavras ditas com maior frequência
pelos entrevistados, palavras essas que expressam a essência desse meio de
hospedagem. Essa representação gráfica é chamada de Word Cloud (nuvem de
palavras, em tradução nossa, literal), ou ainda Tag Cloud (nuvem de tags ou
etiquetas/palavras-chave). É uma representação visual de dados de texto,
normalmente usada para descrever metadados de palavras-chave (tags) em sites ou
para visualizar, de uma forma facilitada, um texto livre. Ainda pode ser considerada
uma lista hierarquizada visualmente, uma forma de apresentar os itens de conteúdo
de um texto extenso (HALVEY e KEANE, 2007).
Quanto ao esclarecimento etimológico, os entrevistados, assim como o presente
autor, preferem a palavra hostel à albergue. O termo hostel, apesar de ser um
estrangeirismo, não o é desnecessário. A palavra albergue, no Brasil, possui
conotação e significados diferentes do que a palavra hostel propõe no exterior,
principalmente na Europa, América do Norte e Ásia. Internacionalmente, não somente
em países de língua inglesa, este termo é extremamente difundido e define
claramente um tipo específico de meio de hospedagem. Além disso, é claro o
preconceito que se possui quanto à palavra albergue, que pode ser entendida como
um local para desabrigados.
Adotando a palavra hostel, para designar o meio de hospedagem a que esse estudo
se refere, estar-se-ia evitando um possível preconceito derivado da ignorância quanto
a este novo meio de hospedagem e eventual confusão quanto os abrigos para idosos,
sem teto, entre outros, aos quais a nomenclatura albergue atende no Brasil. Ademais,
ao utilizar-se o termo hostel, propõe generalizar a nomenclatura e oferecer um meio
de hospedagem que atenda a um público alvo variado e abrangente, ao invés de se
referir unicamente a um tipo especifico de hospedagem que aceita somente
associados, jovens e/ou estudantes, como é o caso de alguns albergues da juventude.
A diversidade cultural é um fator tido como essencial, favorecendo o desenvolvimento
pessoal dos próprios administradores, que entram em contato com diversas culturas
197
no seu ambiente de trabalho. Os hosteleiros também discursam que esse fator é um
dos de maior apelo à imagem desse meio de hospedagem para o seu público alvo, os
backpackers procuram, além de um local que seja original ao destino visitado, por um
ambiente culturalmente diversificado, onde possam trocar ideia e experiências com os
hóspedes do hostel onde se encontram.
Em retrospectiva, o primeiro aspecto que se deve considerar para a elaboração do
conceito de hostel é a carga histórica que esse meio de hospedagem possui. Esse
meio de hospedagem é único e diferenciado por que possui na sua gênese história
aspectos que determinaram claramente suas características atuais. As revoltas e
movimentos revolucionários sociais são a explosão do ser humano suprimido à animal
por demasiado tempo. Uma dessas revoltas não buscou o embate direto ou o combate
armado contra a sociedade vigente. Eles preferiram se retirar das cidades, deixando
o opressor impotente, não detentor de seu destino. Decidiram voltar à natureza, à
musica, à uma alimentação saudável, à uma vida simples e em harmonia com os
demais. Por se ausentarem do papel de oprimidos, se tornaram livres. Criaram, na
Alemanha de seu tempo, com este ato de retiro, um impacto tão grande quanto outros
movimentos que foram às armas. Este movimento, que acaba por influenciar a
essência dos albergues da juventude na Alemanha, início do século XX, é chamado
de Wandervogel. O qual criou um meio de hospedagem alternativo, uma válvula de
escape às mazelas do capitalismo do seu tempo.
Em um segundo momento deve ser considerar a clara a presença e grande influência
da hospitalidade na formação e propagação dos albergues da juventude, na Alemanha
e, finalmente, no mundo. A filosofia alberguista promove o contato social; os hostels,
principalmente os privados, são, geralmente, empresas familiares e tem uma certa
autonomia em relação à indústria hoteleira e, consequentemente, conseguem expor,
mais facilmente que os hotéis convencionais, demonstrações de hospitalidade
verdadeira; e o papel do recepcionista num hostel é fundamentalmente o de um
anfitrião.
Diante do exposto, cabe a reflexão para futuras pesquisas: se a hospitalidade e uma
dádiva, portanto desinteressada, e legítima a apropriação do termo pelo turismo? Se
a resposta que se busca é otimista, então demonstrações dessa verdadeira
198
hospitalidade no turismo é possível através dos hostels, com maior facilidade, do que
talvez, nos tradicionais empreendimentos hoteleiros. Haja vista que, de acordo com o
alberguismo contemporâneo, esse meio de hospedagem busca criar elos sociais
através da sensibilidade para os assuntos coletivos e culturais. O Alberguismo busca,
também, além de proporcionar um meio de hospedagem à um público alvo,
proporcionar uma relação turística mais íntima e humanista, aproximando as pessoas,
culturas diferentes através da relação entre ser acolhedor e ser acolhido, e assim,
eventualmente, aproximando os povos. A educação da hospitalidade, privada e nas
instituições de ensino, é assimétrica. Coloca-se que a hospitalidade como a qualidade
na prestação de serviços turísticos, como uma rua de mão única, onde o ser acolhedor
recebe, agrada e ensina, o ser acolhido sobre sua cultura. Porém, a hospitalidade, em
sua essência é uma troca de experiências entre ser acolhedor e ser acolhido.
Quanto à gênese desse meio de hospedagem no Brasil, pode-se considerar que a
ausência de movimentos sociais de origem popular no país, ou a fraqueza com que
estes se manifestam esporadicamente e de maneira breve, sem organização e real
impacto social, dificulta a implantação de novos valores, novas realidades que
favoreçam as camadas sociais alienadas. Essas camadas sociais e os demais
segmentos alternativos da sociedade, atreladas aos velhos conceitos em vigência ou
a novos impostos pelas classes superiores, ficam marginalizados ou excluídos do foco
principal do desenvolvimento social, e em último caso da corrente principal do turismo.
O personalismo, quando prolongado em demasia num determinado espaço/tempo,
torna-se uma oligarquia, e elimina qualquer chance de movimentos liberalistas. Por
um lado, assegura uma estabilidade política aparente, pois a insatisfação popular fica
suprimida e ignorada. Sem poder de união, diversos segmentos da sociedade se
percebem como isolados, incapazes de requisitarem seus desejos e direitos. No caso
especifico dos hostels dentro do turismo, vale notar que este movimento vem
ganhando força constantemente, e o fato desse meio de hospedagem possuir um
caráter revolucionário e social, espera-se que tenha forças, num futuro bem próximo,
de gozar de direitos básicos, assim como outros segmentos já o fazem. Em uma
tentativa de conceituar a essência dos albergues da juventude, deve-se ir além do
simples meio de hospedagem, pode-se dizer que estes fazem parte dos movimentos
sociais juvenis do século XX, que procuram pelo intercâmbio cultural, a troca de
experiências e a união entre grupos.
199
De uma maneira geral, em relação à essência dos hostels, quando questionados
sobre essa, os proprietários/gerentes de Florianópolis declararam que esses meios
de hospedagem são um local de união entre pessoas, entre culturas e de
entendimento entre diferentes povos. Um local de troca de experiências, de energia,
de sentimentos e sensações, de interação entre pessoas, de experiências de vida.
Um ambiente familiar, social e descontraído. Um local de convergência de pessoas,
de encontro de histórias, de amizade, onde as pessoas se sentem em casa.
200
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O turismo da juventude é de extrema importância econômica e social. O perfil dessa
“juventude” é interativo, ambientalmente consciente, sedento por cultura, viaja pelo
destino visitado por mais tempo e em maior profundidade. Esse perfil tem nos hostels
seu maior meio de hospedagem. No entanto, a pesquisa acadêmico-científica sobre
esse tema é recente, assim como o advento dos hostels no Brasil, e carece de
aprofundamento. Essa presente pesquisa não pretende determinar definitivamente a
filosofia, serviços e áreas físicas essenciais desse meio de hospedagem no Brasil,
mas sim iniciar uma investigação, um esboço do que virá a ser essa classificação
oficial. Apresentar um possível caminho a ser trilhado pelas instituições de ensino e
poder público e privado para a construção de conceitos que se traduzam em um meio
de hospedagem original e honesto às suas raízes.
As limitações temporais, financeiras e espaciais do autor quanto à pesquisa
contribuíram para resultados relativamente iniciais/superficiais, mas não menos
esclarecedores e reveladores. Portanto, faz-se extremamente necessário um
aprofundamento da pesquisa bibliográfica, mas principalmente da pesquisa de campo,
fundamental para averiguação dos dados levantados. O fomento à pesquisa sobre
esse tema é essencial para o sucesso e promissor futuro deste meio de hospedagem,
pois somente assim as instituições de ensino estarão munidas de conhecimento
suficiente para ser repassado aos poderes público e privado. Para que, num futuro
próximo, os hostels sejam considerados um meio de hospedagem alternativa, afim de
suprir algumas necessidades do planejamento turístico sustentável, devemos,
primeiramente, conhecer a fundo a essência desse meio de hospedagem. Deve-se
desenvolver, harmoniosamente, novos empreendimentos conectados à visão de
mundo e turismo contemporâneos e sustentáveis, para que empreendedores e
público-alvo possam usufruir de um meio de hospedagem honesto às suas raízes,
digno de uma classificação oficial e ser visto como o meio de hospedagem que
realmente é, e não simplesmente uma sombra do original.
Quando se trata da definição de um público alvo, não é da opinião do presente autor
que a essência do espírito humano quando reduzida à categorias seja totalmente
201
correta e adequada. Porém, o ato de categorização auxilia no entendimento de um
determinado objeto. No entanto, deixa margens para suposições que diferem do
modelo e exceções que fogem à regra. O modelo psicográfico de Plog (1991), apesar
de útil para a compreensão de um perfil de pessoas quando em viagens, não é
necessariamente correto o tempo todo. Há pessoas que não se encaixam em
nenhuma das descrições propostas. Existem indivíduos que em um determinado
momento de vida ou estado de espírito pessoal podem ser classificados como
psicocêntricos, e em outro momento como mesocêntricos. Há indivíduos que variam
de viagem para viagem. Em determinada ocasião procuram por aventura e em outro
a conveniência. O importante é saber que os hostels estão abertos a todos os tipos
de pessoas e que, esse tipo de turismo, assim como os hostels, servem como um
meio de propagação cultural, união e entendimento entre os povos.
Ademais, é importante lembrar que nem todos os hostels possuem esse caráter
extremamente comunitário, solidário, social e hospitaleiro. Há estabelecimentos que
tentam manter o espírito alberguista presente, mas de uma maneira muito mais formal
e sem a interação mutua entre recepcionista e hóspedes. Estes locais geralmente
pertencem a grandes cadeias hosteleiras, como a rede Plus Hostels, que investe
neste meio de hospedagem aliando um pouco de sua filosofia e formatação física a
um modelo hoteleiro tradicional. Estes locais, ainda que pequem pela falta de um
anfitrião atuante, possuem características suficientes para serem caracterizados
como hostel. No entanto, há estabelecimentos, como colocado anteriormente na
problemática deste estudo, que não oferecem as condições mínimas que se espera
desse meio de hospedagem. Como no Brasil não há uma classificação oficial, espera-
se que essa pequena contribuição acadêmica possa abrir ideias e novos conceitos
que determinarão em um futuro próximo o que é um hostel, ou pelo menos parte dele.
Devido à novidade desse segmento de mercado no Brasil, à inexistência de uma
classificação oficial do mesmo por parte do MTur, e à baixa produção acadêmica sobre
o tema, novos caminhos de pesquisa se abriram no decorrer desse estudo.
Na relação dos hostels com o território turístico e o espaço que ocupam, percebe-se
que esses possuem uma relação de conservação, renovação, reutilização e
promoção. Se há algo de fugaz, de transitório e de efêmero na relação entre turismo
e território, isto se dá, indubitavelmente, de forma mais evidente, no chamado turismo
202
de massa e na hotelaria convencional. Se é verdade que poucas pessoas quando em
férias possuem a ousadia e a coragem de se aventurar fora dos rígidos programas e
horários estabelecidos pelos pacotes turísticos, principalmente em território brasileiro,
que procuram meios de hospedagem alternativos, cabe à academia esclarecer certos
conceitos e disponibilizá-los aos visitantes. Assim, esses visitantes estarão munidos
de informação e poderão tomar decisões concisas. Esses meios de hospedagem
podem proporcionar ao turista uma apropriação mais humana e profunda com a
localidade receptora, através da hospitalidade e do patrimônio histórico que este ajuda
a preservar. Vimos como o território age sobre o ser humano e vice-versa, e por
consequência dessa interação, eventualmente, o patrimônio histórico é estabelecido.
Vimos como nasceram os albergues da juventude, da decorrência dessa interação
socioespacial. Vimos como estes estão ligados diretamente, em sua gênese, à
conservação do patrimônio e como, através de sua filosofia, oferecem ao turista uma
experiência menos fugaz com o destino turístico, com o meio de hospedagem, com
outros viajantes e com os moradores locais. Vimos, finalmente, que no exterior este
meio de hospedagem é difundido, respeitado social e economicamente.
No entanto, no Brasil há um certo descaso, falta de conhecimento e até preconceito,
com este tipo de acomodação. Esta situação se deve ao recente advento deste meio
de hospedagem em nosso país, às relações estabelecidas em sua chegada,
diferentes das relações originais e ignorância de sua filosofia. No Brasil, o processo
de industrialização e urbanização foram rápidos e exploratórios em demasia, em
muitos casos a apropriação do território se deu de forma indevida, interferindo
negativamente no turismo e na conservação do patrimônio cultural edificado.
Consequentemente, há apropriação de ambos território e modos de produção –
refletidos na absorção de cultura e conceitos exógenos – também de forma indevida,
como é o caso dos hostels. Há, recentemente, uma expansão do número destes
empreendimentos em um curto espaço de tempo, visando suprir uma nova demanda,
mas não há a preocupação com a delimitação de sua filosofia, missão, suas áreas
físicas, características essenciais e serviços.
Quanto aos serviços hosteleiros, é essencial mencionar, também, que a
disponibilização dos lockers foi um serviço pouco mencionado pelos empreendedores
de hostels em Florianópolis. Apenas um entrevistado mencionou esse serviço como
203
essencial. Vale ressaltar que os lockers são um fator oferecido pelos youth hostels
desde sua gênese e visa a segurança dos pertences pessoais dos ocupantes dos
estabelecimentos. Essa segurança de um patrimônio pessoal físico (bolsa, carteira,
laptop, dinheiro, passaporte) acaba refletindo na segurança psicológica do hóspede e
influencia diretamente no bem-estar de sua estadia. Caso seus pertences estejam
seguros, ele pode relaxar e aproveitar a vida em grupo dentro e fora do hostel. Isso
reflete talvez o estado de desconforto dos hóspedes brasileiros quanto a se
hospedarem nesse tipo de acomodação. Percebendo que seus bens não estão
resguardados, esse viajante pode entrar em estado extremo de desconforto, gerando
medo, separação e insatisfação. A adição desse serviço ao hall dos já existentes dos
hostels, sejam de Florianópolis ou de qualquer cidade brasileira e mundial, é tido como
essencial para a caracterização desse meio de hospedagem e seu sucesso comercial.
A gastronomia é um componente essencial da experiência turística e, por vezes, é o
principal atrativo turístico de um destino e ainda pode agir como a força motriz de uma
viagem. A culinária e/ou a gastronomia representa a hospitalidade e a cultura do
destino de uma maneira única, onde o visitante pode provar, literalmente, do local
visitado, ao invés de somente observá-lo, levando-o a um contato íntimo com o
patrimônio imaterial do lugar visitado. Para os hostels isso não é diferente. Desde sua
gênese há uma ligação entre esse meio de hospedagem e a alimentação, não só
como reposição biológica, mas como forma de hospitalidade. Notou-se no discurso
dos entrevistados que a culinária e/ou a gastronomia representa um fator essencial
da composição de um hostel. O café-da-manhã é tido como um fator crucial na
integração do grupo hospedado.
Mas, a menção de maior importância fica para os eventos culinários/gastronômicos
realizados no período noturno, pelos hóspedes, pelo anfitrião ou ambos. Essas jantas
ocorrem em todos os hostels entrevistados, cada um possui sua maneira de organizar
esse evento, sendo o mais comum os churrascos. Um hostel em particular, fomenta o
que foi chamado de jantar temático. Duas vezes por semana, o proprietário fornece
todos os ingredientes, e cada hóspede ou grupo de hóspedes de um país diferente
ficam encarregados de fazer um prato de seus país de origem. O resultado é diversas
pessoas cozinhado juntas e compartilhando histórias, ideias e comida de diferentes
culturas num mesmo ambiente. Vale ressaltar que todas essas experiências
204
culinárias/gastronômicas são sempre acompanhadas de um fator limitante primordial,
o desejo de economizar, de poupar, enquanto realizam essas atividades.
Aparentemente, o perfil do backpacker demonstra que é na alimentação onde mais se
pode economizar, afim de estender a viagem, assim como a economia na
acomodação, daí, também surgem os hostels como meio de hospedagem favorito.
Há um tom antagônico no discurso coletivo dos hosteleiros, pois a diversidade cultural,
citada como aspecto essencial aos hostels, é apontada, também, como a maior
dificuldade em se administrar um hostel. Administrar dezenas de pessoas de
diferentes formações culturais, línguas e costumes pode ser, em alguns casos,
conflitante e extenuante. O hosteleiro se vê, muitas vezes, fazendo malabarismos
culturais, procurando conciliar um grupo multicultural que ocasionalmente não
consegue encontrar uma harmonia. Haja vista que praticamente tudo em um hostel é
feito coletivamente. De acordo com os hosteleiro, esses conflitos ocorrem, em sua
maioria, quando há um tipo de viajante desinformado, desacostumado ou insatisfeito
com a proposta de sociabilidade e coletividade de um hostel. Essas ocorrências
acontecem com maior frequência quando o viajante brasileiro entre em conflito com o
estrangeiro. Devido à desinformação do brasileiro quanto à filosofia alberguista e o
conceito desse meio de hospedagem, muitos acabam por se hospedar nesse tipo de
meio de acomodação esperando um hostel barato, com privacidade e exclusividade.
Quando se depara com a vida em comunidade, expressa sua frustração se fechando
do restante do grupo e reclamando da gestão com o hosteleiro.
Quanto ao cooperativismo dos hostels de Florianópolis, apesar de o histórico dos
albergues da juventude mostrar um espírito de união e cooperação entre os
estabelecimentos, nessa cidade o panorama é diferente, com a cooperação ainda em
estágio inicial e a concorrência superando-a, assim como em outros destinos turísticos
no Brasil. Em países como República Tcheca e até mesmo em nossos países vizinhos
como Uruguai e Argentina, os hostels se encontram unidos e bem definidos.
Entretanto, em Florianópolis os empreendimentos mostram um grande potencial de
crescimento comercial e estão caminhando em direção à filosofia e conceitos originais
essenciais a esse meio de hospedagem. O poder de cooperação dos hostels, através
de sua filosofia, pode colocá-los como opção de renovação conceitual dentro da
hotelaria e do desenvolvimento do turismo sustentável e para o planejamento de
205
destinos turísticos, através do potencial de conservação do patrimônio cultural e
histórico edificado. Pois, essas partes quando interagem e produzem hostels de
caraterísticas próprias em locais únicos, colaboram na interação entre visitantes e
anfitriões, conservando o patrimônio cultural dos lugares onde se encontram,
auxiliando no desenvolvimento do turismo com ambições sustentáveis. Portanto,
deve-se reunir esforços, dentro do turismo, em nossos lares e em ambientes públicos
afim de propagar a ideia e atos de hospitalidade, no intuito de prover aos nossos
familiares, cidadãos de nosso país e estranhos, um mundo mais cordial e humano.
Em um futuro próximo, quando uma classificação oficial for proposta, o MTur deve
considerar outras categorias, como as propostas por esse estudo, para avaliar um
determinado empreendimento que se intitule como tal. Essas questões podem ter
mais ou o mesmo peso do que os aspectos tradicionalmente considerados para se
caracterizar outros tipos de acomodação, como os hotéis, por exemplo. Esse estudo
não se considera definitivo, muito pelo contrário, apenas abriu algumas poucas
categorias e possibilidades que se devem ser exploradas. Uma classificação oficial
desse meio de hospedagem deve abranger o maior número possível de estudos sobre
o tema, que ainda é embrionário em nosso país.
Diversas limitações de estudo foram observadas, entre elas a temporal e financeira
desse pesquisador. Um questionário mais completo, aplicado à uma amostra mais
abrangente é extremamente necessário para a validação dos resultados preliminares
aqui obtidos. Durante o estudo novas áreas de questionamento, que antes não
haviam sido contempladas, foram levantadas. Como, por exemplo, a questão da
contratação do recepcionista. Como se dá esse processo em detalhes? Haja vista que
essa figura é essencial para a existência desse meio de hospedagem. Outra questão
ainda a ser abordada é uma melhor caraterização do público alvo brasileiro e suas
próprias opiniões e ideias sobre esse meio de hospedagem. Um estudo voltado
especificamente aos backpackers é essencial para o entendimento dos hostels no
Brasil. Somente abordando esses aspectos e outros que ainda poderão surgir é que
um conceito oficial poderá ser lançado. Conceito esse que faça jus à essência desse
meio de hospedagem, para que num futuro próximo a palavra hostel possa ser
compreendida e ser escrita sem a necessidade do grifo itálico.
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222
APÊNDICES
223
Apêndice A – Termo de consentimento livre e esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Você está sendo convidado(a) para participar de uma pesquisa acadêmica. Após ser esclarecido(a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine ao final deste documento, que é apresentado em duas vias. Uma delas é sua e a outra do pesquisador responsável. Não há nenhum custo para a participação, não há nenhuma responsabilidade quanto ao conteúdo das respostas. A qualquer momento, você poderá desistir de participar e retirar seu consentimento.
INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA
HOSTELS: análise socioespacial, proposta conceitual e panorama atual em Florianópolis (SC)
Pesquisador responsável : Álvaro Augusto Dealcides Silveira Moutinho Bahls Professor orientador : Dra. Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira Telefone celular : (47) 8457-2737 Secretaria do mestrado : (47) 3261-1315 E-mail : [email protected] R.G. : 6.154.521 C.P.F. : 033.613.269-74 Assinatura do pesquisador : Esta pesquisa faz parte de uma dissertação de Mestrado em Turismo e Hotelaria da Universidade do Vale do Itajaí. Tem como objetivo delinear as características essenciais e singulares do meio de hospedagem hostel. O conteúdo desta entrevista será gravado e transcrito para a dissertação, sem qualquer identificação do respondente.
CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO
Eu
1. Concordo em participar do presente estudo como sujeito. 2. Declaro que fui devidamente comunicado e esclarecido sobre o teor da pesquisa. 3. Foi assegurado que não haverá nenhuma identificação, ônus, comprometimento legal de minha
pessoa e/ou do estabelecimento, quanto ao conteúdo de minhas respostas. 4. Sei que posso retirar meu consentimento a qualquer momento.
Assinatura do entrevistado: RG.
Data : ........../........../........... Local : ..............................
224
Apêndice B – Questionário do perfil dos empreendedores
PERFIL DO ENTREVISTADO
1. Gênero
1.1 Masculino [ ]
1.2 Feminino [ ]
2. Estado civil
2.1 Casado [ ]
2.2 Solteiro [ ]
2.3 Divorciado [ ]
2.4 Viúvo [ ]
3. Idade
3.1 Entre 18-25 [ ]
3.2 Entre 26-30 [ ]
3.3 Entre 31-40 [ ]
3.4 Entre 41-50 [ ]
3.5 Entre 51-60 [ ]
3.6 Acima de 60 [ ]
4. Escolaridade
4.1 Fundamental [ ]
4.2 Médio [ ]
4.3 Superior [ ]
5. Frequência de viagens
5.1 Uma vez por ano [ ]
5.2 Duas vezes por ano [ ]
5.3 Três ou mais vezes [ ]
6. Meio de transporte utilizado
6.1 Carro [ ]
6.2 Ônibus [ ]
6.3 Avião [ ]
6.4 Navio [ ]
6.5 Outros: ....................................
7. Meio de hospedagem mais utilizado
7.1 Hotel convencional [ ]
7.2 Hostel HI [ ]
7.3 Hostel independente [ ]
7.4 Pousada [ ]
7.5 Resort [ ]
7.6 Camping [ ]
7.7 Couchsurfing [ ]
7.8 Outros: ....................................
225
8. Local de residência
8.1 Imóvel próprio [ ]
8.2 Imóvel alugado [ ]
8.3 No próprio hostel [ ]
8.4 Anexo ao hostel [ ]
9. Profissão
9.1 Hostel [ ]
9.2 Hoteleiro [ ]
9.3 Comerciário [ ]
9.4 Profissional liberal [ ]
9.5 Trabalhador agrícola [ ]
9.6 Professor [ ]
9.7 Funcionário público [ ]
9.8 Aposentado [ ]
9.9 Outros: ....................................
226
Apêndice C – Questionário do perfil dos hostels
PERFIL DO EMPREENDIMENTO
1. Área total (m2)
1.1 Até 200 [ ]
1.2 De 201 a 300 [ ]
1.3 De 301 a 400 [ ]
1.4 De 401 a 500 [ ]
1.5 A cima de 500 [ ]
2. Número total de leitos
2.1 Até 15 [ ]
2.2 De 16 a 30 [ ]
2.3 De 31 a 50 [ ]
2.4 De 51 a 70 [ ]
2.5 Acima de 70 [ ]
3. Número de dormitórios
3.1 Até 01 [ ]
3.2 De 02 a 04 [ ]
3.3 De 05 a 07 [ ]
3.4 De 08 a 10 [ ]
3.5 Acima de 11 [ ]
4. Tipo de dormitório (no de camas)
4.1 Até 05 [ ]
4.2 De 06 a 10 [ ]
4.3 De 11 a 15 [ ]
4.4 De 16 a 20 [ ]
4.5 Acima de 21 [ ]
5. Possui beliches?
5.1 Sim [ ]
5.2 Não [ ]
6. Número de quartos privados
6.1 Até 01 [ ]
6.2 De 02 a 04 [ ]
6.3 De 05 a 07 [ ]
6.4 De 08 a 10 [ ]
6.5 Acima de 10 [ ]
7. Número de funcionários
7.1 Até 02 [ ]
7.2 De 03 a 05 [ ]
7.3 De 06 a 10 [ ]
227
7.4 De 11 a 15 [ ]
7.5 Acima de 15 [ ]
8. Sala de TV
8.1 Não possui [ ]
8.2 Até 01 [ ]
8.3 De 02 a 03 [ ]
8.4 Acima de 03 [ ]
9. Sala de estar
9.1 Não possui [ ]
9.2 Até 01 [ ]
9.3 De 02 a 03 [ ]
9.4 Acima de 03 [ ]
10. Cozinha
10.1 Não possui [ ]
10.2 Até 01 [ ]
10.3 De 02 a 03 [ ]
10.4 Acima de 03 [ ]
11. Área social externa
11.1 Não possui [ ]
11.2 Até 01 [ ]
11.3 De 02 a 03 [ ]
11.4 Acima de 03 [ ]
12. Área de jogos
12.1 Não possui [ ]
12.2 Até 01 [ ]
12.3 De 02 a 03 [ ]
12.4 Acima de 03 [ ]
13. Lockers
13.1 Não possui [ ]
13.2 Individual [ ]
13.3 Coletivo [ ]
14. Empreendimento sazonal
14.1 Sim [ ]
14.2 Não [ ]
15. Estrutura de A&B
15.1 Restaurante [ ]
15.2 Lanchonete [ ]
15.3 Bar [ ]
16. Café da manhã
16.1 Sim [ ]
16.2 Não [ ]
228
17. Serviço de lavanderia
17.1 Sim [ ]
17.2 Não [ ]
18. Internet
18.1 Não [ ]
18.2 PC [ ]
18.3 Wi-Fi [ ]
19. Diária em dormitório (média)
19.1 Até R$ 30 [ ]
19.2 De R$31 a R$50 [ ]
19.3 De R$51 a R$70 [ ]
19.4 Acima de R$70 [ ]
229
Apêndice D – Guia de entrevista com empreendedores
ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS DO EMPREENDIMENTO:
Conte um pouco de sua história de vida
Onde e quando nasceu, infância, adolescência, formação escolar, formação de seus pais, suas
viagens, experiências com hostels. Qual é sua religião? Suas visões políticas. Qual é sua filosofia
de vida? Opiniões sobre a revolução industrial, hippies.
Conte sobre a história do seu hostel
Data de fundação. Descreva os acontecimentos marcantes do seu empreendimento. Porque
abrir um hostel a outro meio de hospedagem? Você é/era mochileiro, fica/ficava em hostels?
Descreva essas experiências. Porque um hostel em SC? Considerou fechar as portas?
Você conhece a história da origem dos albergues da juventude no exterior e/ou no Brasil?
ESTRUTURA FÍSICA:
1. Na sua opinião, quais as áreas físicas que um hostel deve possuir? Por que?
2. Dentre estas, qual é a principal área física de um hostel?
SERVIÇOS:
4. Quais os tipos de serviço que um hostel deve oferecer?
5. Na sua opinião, qual é o serviço mais importante a ser oferecido ao hóspede?
HOSPITALIDADE:
7. Qual é o papel do recepcionista em um hostel?
8. Você acha que um hostel é a 2a casa do viajante? Justifique?
9. Possui amizades com hóspedes do hostel?
10. A gastronomia é importante para a experiência do hóspede no hostel? Por que?
OUTROS ASPECTOS:
11. Na sua opinião, porque as pessoas escolhem se hospedar em um hostel?
12. Quais os pontos negativos de se ter um hostel?
13. Você prefere o termo hostel ou albergue da juventude? Justifique?
14. Como você contrata o recepcionista?
15. Qual é a principal diferença entre um hostel e um hotel?
16. Você poderia definir, em poucas palavras, a palavra hostel?
230
APÊNDICE E – Transcrição da entrevista de número 09 (04 de maio de 2015)
Entrevistador: eu acho que muita da história pessoal tem a ver com o porquê
escolhemos uma profissão, então antes de começar com a história do hostel eu
gostaria que você falasse um pouco sobre você.
Sujeito 09: Eu nasci em Pernambuco, Recife, em dezenove de fevereiro de setenta e
quatro, cresci em Recife e cursei Técnica Agropecuária e depois Zootecnia e trabalhei
muito tempo viajando implantando projetos de inseminação artificial. Trabalhava como
veterinário, fui um dos primeiros a fazer congelamento de sêmen a campo. Então a
gente tava sempre viajando ficando em alojamento, e eu sempre tive essa coisa de
viajar com a mochila, com pouca coisa e se deslocar pra um…talvez isso tenha
influenciado na busca por meio de hospedagens mais alternativos, menos
convencionais do que a gente tem aqui e aí sim eu entrei em contato com hostel.
Depois num outro momento minha vida, quando eu decidi que não gostaria mais de
trabalhar com Zootecnia, com a produção comercial, lidando com animais, eu comecei
a migrar de área. Tirei um ano sabático pra viajar um pouco, migrei um pouco de área,
tive um restaurante por três anos e depois fui trabalhar em hotelaria. Comecei por
indicação de um amigo no Hotel X em Y, Rio Grande do Norte, ali vizinho a praia da
Pipa e entrei como auxiliar da gerencia, porque não tinha experiência dentro da área
de hotelaria, mas tinha várias experiências ali que poderiam me ajudar em coisas
diferentes, então entrei como coringa ali para atuar em várias áreas. Poucos meses
depois, o gerente geral do hotel que também acumulava a função gerente de obras e
manutenção... o hotel estava em um momento de expansão, e ele saiu, se demitiu do
hotel. E o RB, chamou a gerente de A&B, o gerente de hospedagem e a mim que era
o auxiliar da gerencia para informar que ele não contrataria um outro gerente geral no
meio da temporada, que não conhecia o hotel dele, que tinha mais chances de errar
do que acertar. Então automaticamente, eu fui pra função de gerente de manutenção,
pra cuidar de toda essa parte de construção e tal. Porque já tinha dentro do curso de
Técnica em Agropecuária, a gente tem a parte de construções e instalações, e um
pouco de desenho. Então eu tinha uma boa experiência com obras e tal. E no final
da temporada, ele disse “como você, por ser mais coringa, acabou nessa área, então
obviamente não tenho a intenção de contratar um outro gerente geral e você vai ficar”.
Fiquei lá por dois anos e meio, então assim foi meu contato com a parte de
231
hospedagem e hotelaria. Mas na própria Praia da Pipa já tinha um hostel, como o Pipa
Hostel e outros, e a gente já conhecia os proprietários, fazia uns eventos lá fora da
temporada pra quem não era morador e quem era local. Então a partir daí sempre que
podia viajar ficava em hostel porque tinha essa coisa da interação com as pessoas,
porque normalmente como eu viajo sozinho, então pra não ficar ali em uma pousada
ou num hotel pra não ficar ali meio deslocado então o hostel possibilita essa interação
entre as pessoas o que é o mais interessante do hostel. E viajei por algum tempo
ficando em hostel. Acabei dando aula de vela, num hostel na Praia de Jabaquara em
Parati. Eu morei em Parati por três anos, no primeiro ano lá, passei dando aulas de
vela. O hostel tinha uma estrutura de náutica importante e tinha um pequeno veleiro,
um Paturi dezesseis, com cinco metros, quarto hobie cats e caiaques. E como nesse
meio tempo entre a saída do hotel e estado em Parati, eu fiz algumas coisas e uma
delas foi aprender a velejar. E eu trabalhei na construção de um veleiro e tava em
Parati esperando um projeto de construção de outro. Então com já tinha esse vínculo
com hostel, acabei me identificando com essa questão de náutica e trabalhei lá por
um ano inteiro, dois verões ali. E depois com a vinda pra Florianópolis em dois mil e
treze eu tive num hostel com a parte de bar, massagem e também com a parte de
fazendo algumas guiadas porque eu fiz o curso aqui de formação de condutores em
Florianópolis com o pessoal do AdrenaIlha e até chegar ao ponto de o hostel X estar
no processo de fechar como hostel e só alugar os quartos pra mensalistas e ai surgiu
a oportunidade de fazer a proposta pra arrendamento do hostel X. Isso em setembro
do ano passado, foi então a primeira temporada nossa, vamos pegar a primeira baixa
temporada, depois desse processo, mas ele está indo muito bem, tem satisfeito
bastante.
E: esse ano sabático que você tirou como viajante, foi para onde?
S09: Foi uma época que eu tava viajando muito pelo Brasil, que tive a chance de
conhecer bem o Brasil de ficar meses em várias regiões. Algumas eu morei depois.
Mas hoje, de Manaus a Florianópolis, eu conheço quase todas as regiões, ainda me
falta o Rio Grande do Sul, o Acre, Rondônia e Roraima e só. Os outros estados eu
conheço bem assim, capitais e interior, foi uma boa temporada.
E: E chegou a viajar para o exterior em alguma ocasião?
232
S09: Sim pro Caribe por um ano. Então, fomos velejando pro Caribe, pra entregar um
dos veleiros que a gente trabalhou na construção. Fiquei por lá fazendo a reforma de
um outro veleiro, pra trazer de volta pro Brasil e aí surgiu a oportunidade de estar em
algumas regiões, Ilhas Margaritas na Venezuela, San Martin, Curaçao, Porto
Elizabeth, San Vincent Granadino.
E: E você fala algum idioma estrangeiro?
S09: Então, meu inglês tava bem enferrujado, nessa temporada eu pude praticar
bastante, porque eu tava bem enferrujado. Agora eu já bem melhor.
E: E alguma coisa da tua infância e adolescência que fez você, pelo que eu percebo,
ter esse interesse ou até paixão por viagem, por línguas e consequentemente pelos
hostels?
S09: é, eu tive esse desapego na infância por conta do meu pai. Ele trabalhava pra
companhia de energia elétrica do estado, cada vez que ele fazia um curso interno ou
recebia uma promoção, acabava tendo uma transferência de cidade, então a gente
tinha a média de um ano, dois anos em cada cidade, e mudando, então não tinha esse
apego da escola que eu estudei a vida inteira ou aquele amigo de infância que eu
conheço a dez, quinze, vinte anos. Então tinha essa coisa de lidar bem com a
mudança. Fiquei um tempo no litoral pernambucano, uma área que recebia muitos
turistas, onde um dos meus grandes amigos era filho de um francês que tinha um hotel
na Praia de São Jose da Coroa Grande. Então, a gente falava das viagens, do mundo,
trazia quadrinhos na época dos gibis de fora e pude conhecer inclusive alguns
cartunistas que são pouco convencionais e tal e teve algumas coisas que
influenciaram nessa coisa de gostar de uma diversidade, gostar do mar e achar que o
mundo não é tão pequeno assim, dá pra conhecer coisas diferentes.
E: E a formação dos teus pais, qual é?
S09: Meu pai tinha só o ensino médio, minha mãe também. Eles não tiveram formação
superior, mas na época meu pai teve a sorte de indicação, quando eu nasci, no meio
233
da ditadura militar. Então os empregos em empresas públicas não obedeciam essa
lógica atual de concurso tal, tinha muito essa coisa de indicação. Então ele foi
trabalhar numa companhia do estado que fornecia algumas regalias, então a gente
tinha, ele tinha um departamento médico da empresa, medico contratado pela
empresa de energia elétrica, mas tinham tantos médicos na folha de pagamento, que
tinha um departamento médico e ortodôntico pra tratar os funcionários e os familiares.
Estudei nas melhores escolas que cada cidade tinha, porque tinha bolsa integral da
empresa, então apesar de o meu pai não ter uma formação superior, eu pude ter
algumas regalias que outras crianças, no nordeste do Brasil dos anos setenta e
oitenta, não podiam ter.
E: E sua mãe?
S09: minha mãe sempre teve em casa, ao longo da vida ela teve uma loja de plantas,
uma coisa que funcionava mais como uma ocupação, um hobbie do que… mas ela
sempre foi do lar mesmo. Só dona de casa, tinha uma ou outra coisa, mas com quarto
filhos... éramos quatro.
E: E você é?
S09: Era o terceiro. O terceiro de quarto irmãos.
E: você contou um pouquinho dessa viagem que você fez ao Rio de Janeiro e para o
Caribe. Você construiu esse veleiro num hostel que você trabalhava em Parati?
S09: não, eu fiquei o primeiro ano, enquanto aguardava, porque o projeto da
construção de um veleiro não era nada muito imediato, as coisas são com processos
e tudo mais. Nesse primeiro ano, entre dar o orçamento e finalizar a construção de
um veleiro que foi no litoral de Pernambuco, um amigo que sabia que eu tinha curso
de desenho técnico e tal, me convidou pra olhar as plantas de um projeto, que ele
comprou de um inglês, chamado JW. E esse barco ficou pronto. E um amigo meu
espanhol fez umas fotos dele e mandou pra um amigo alemão, meio alemão, meio
português que era dono de uma galeria de artes em Berlim e tinha paixão pelos
projetos do JW, que é considerado um hippie chique na Europa nessa área de náutica.
234
Ele projeta catamarãs desde sessenta e oito, baseado nas canoas polinésias. Tem
um livro e um documentário a respeito dele chamado Duas Mulheres e Dois
Catamarãs. Então o B, esse alemão que é meio português meio alemão, viu as fotos
do projeto e decidiu que queria construir um JW pra ele também. Um catamarã do JW
e nos pediu um orçamento. Então, entre entregar um orçamento, decidir-se pela
construção, decidir em que local construir, avaliar os custos tudo mais, foi um tempo
grande. Então, tinha um ano livre, por isso mudei para Parati porque tá no meio do
caminho entre Rio e São Paulo, as principais fornecedoras de madeira, resina,
ferramentas tal. E por ser uma região que tem uma náutica muito forte, tem várias
marinas, vários iates clubes, dentro de uma baia fechada.
E: Então foi construído em Parati?
S09: Foi construído em Parati.
E: E enquanto isso você trabalhou num hostel?
S09: Até iniciar mesmo a construção do veleiro. E quando começou a construção do
veleiro tive que deixar a náutica do hostel e me dedicar exclusivamente a construção
do veleiro. Quinze meses depois quando ele foi pra água, foi mais um mês testando,
regulando mastreamento. Daí partimos em viagem de Parati, Rio, Salvador, Fernando
de Noronha e depois Porto Elizabeth em São Vicente.
E: Me conta um pouco mais, se tu tiveres disposto, sobre essa viagem?
S09: A viagem foi capitaneada pelo FG, um skipper que me ensinou a velejar, meu
mestre de velas. Então fomos eu ele e o M, um amigo também, um marinheiro muito
experiente. Acho que eu era o menos experiente de todos. Fui aluno do FG, então
confiava muito nele. A escolha de San Vincent Granadino como o primeiro ponto de
parada era uma questão estratégica porque os barcos construídos artesanalmente no
Brasil, eles podem entrar sem problemas na Europa, mas os motores, que daí já
obedece uma outra regra de importação, de produto industrializado. O motor teria que
ser cortado lá, em San Vincent e Granadino há um banco offshore chamado Loyal
Bank que ele faz, ele cuida de todo o processo de transferência de bandeira para a
235
bandeira de San Vincent e Granadino, que é um protetorado britânico, no Caribe.
Então, essa primeira parada foi técnica, foi estratégica. De lá a gente entregou o barco
depois da bandeira mudada, uns dez dias no máximo, para um capitão sueco que iria
transportar o barco para a Europa e de lá ele nos.... e uma coisa sobre donos de
veleiros, iates e coisas assim, eles não velejam e pra isso eles têm os skippers, esses
capitães que transportam as embarcações. Eles passeiam, eles só passeiam. É muito
raro. Normalmente é dono de veleiro pequeno que é capitão do seu próprio veleiro.
Veleiros maiores não, esse tinha, cinquenta e um pés, um barco com uns quinze
metros.
E: Então essa pessoa levou o veleiro até?
S09: de San Vincent e Granadino pra Portugal
E: No próprio veleiro, ou ele usa uma embarcação maior?
S09: Sim, sim é um breacing oceânico, um barco pra cruzar oceanos mesmo, um
barco de quinze metros né? San Vincent e Ilhas Granadinas são um primeiro mundo,
é um protetorado britânico, só que dentro do Caribe, em outras ilhas, você vai ter muito
claro assim: num lado da ilha a face mais voltada assim para as praias mais
paradisíacas, então vão ter os hotéis, as festas. E vai ter o outro lado das ilhas que é
mais da população nativa tal. Ver esses contrastes ali, especialmente, nas Ilhas
Margaritas, na Venezuela, que hoje tá bem pior, mas na época não ia muito bem assim
economicamente, questões de liberdades individuais e tal. Ver esses contrastes ali
quase que na totalidade das ilhas no Caribe é bem interessante, porque normalmente
se fala Caribe, praias paradisíacas, iates, mulher bonita de biquíni e tal. E não falam
da população nativa com a cultura aqueles de dentes coloridos e tal. Há uma
população nativa cheia de culturas ali , normalmente culturas vindas de tudo porque
tem muita influência europeia de várias regiões, as vezes uma mesma ilha já
pertenceu no passado a Inglaterra, a Espanha, a Franca, a Holanda , isto tem lá uma
mescla de influências na arquitetura das influências europeias, mas também muito da
população nativa que vivia lá, que foram mescladas, os povos africanos que foram
levados pra lá. Então, há toda uma cultura, religiosidade forte nesse povo lembra muito
coisas do interior do Brasil, na questão da religiosidade. Havia uma festa do Divino
236
em Goiás, no Mato Grosso, mais para o interior do estado, ver alguns movimentos
dele vai lembrar muito isso. Então o mundo não e tão diferente assim da gente.
E: E você tem religião?
S09: Não
E: Agnóstico poderias dizer?
S09: Sim acho que agnóstico é o que mais se aproxima. Porque eu não consigo
acreditar. Mas por exemplo, não digo que Deus não existe, que uma energia, uma
força não existe. Eu pessoalmente não consigo acreditar, mas pode ser que tudo seja
exatamente como dizem, eu só não consigo crer.
E: e os hostels na sua origem, você conhece um pouco da história? O pesquisador
conta brevemente sobre a origem do primeiro hostel na Europa.
S09: Muito pouco, mas acho que essa fuga de um ambiente que tá se tornando mais
inóspito ali, inadequado pra a maneira que ele acreditava em educação, queria ter
essa vivencia mais de campo, é interessante. Acho que tem bem haver com que essa
cultura do hostel se tornou, sair do lugar conhecido, não necessariamente inóspito,
mas sair do lugar conhecido, padrão, pra ir pra um outro lugar. Estar num ambiente
que lhe possibilite ficar, lhe dá as condições mínimas para estar ali, não privilegia a
um estar com conforto máximo, com exclusividades e luxo e tal, mas lhe oferece o
mínimo para estar ali e lhe obriga a conviver com outras pessoas, num outro local. E
força a interação entre as pessoas né? Não digo nem força, mas possibilita, você tem
que estar vivendo, convivendo com pessoas, assim, no dia a dia. Essa questão da
revolução industrial, nem a vejo assim, necessariamente. como... cara, inicialmente
assim, sempre é traumático as mudanças, mas eu acho sempre desde que os
macacos desceram das árvores e iniciaram a fabricar ferramentas foi disparada uma
flecha do arco que não vai voltar mais, estamos vivendo aí todo um lindo processo,
não tem marcha ré.
237
E: O pesquisador fala um pouco de como se desenvolveram os hostels nos Estado
Unidos e como eram vistos e recriminados por muitos. Eu queria que você falasse o
que você acha. Se existe essa relação ainda hoje, se já existiu enfim?
S09: E eu acho que isso inclusive alavanca um pouco o preconceito que se tem sobre
hostel hoje. Porque, claro, na linha de pensamento dos ricos ou qualquer pessoa que
tem uma visão mais... vamos pegar na época dos anos sessenta, início dos anos
setenta, final dos anos cinquenta, até que tinham essa oposição ao que se estava
colocando como esse é o padrão de vida ideal, o sonho Americano ou o ideal de
progresso e tal. Então quem se contrapôs a isso está sempre, vai sempre estar
tentando buscar formas alternativas de fazer as coisas, de viajar, inclusive de se
hospedar, de viver, de criar os filhos. É claro, eram vistos como “ah não! Esses são
contra um sistema instituído, tão querendo fazer uma revolução, acabar com o que a
gente tem, acabar com essa segurança”. Pelo menos com essa sensação de
segurança que esse mundo organizadinho nos fornece. E a lógica seria claro, pra
essa linha de pensamento buscar meios de você não se hospedar num quarto enorme,
muito maior do que você precisa só pra passar uma noite. Então estar ali dividir,
congregar junto a mesma ideia, ótimo, mas causou e acho que causa até hoje essa
visão de “ah! Muita gente no mesmo quarto”, dividindo e tal. Muito comum ver isso
aqui. Eu tive muitas experiências de pessoas que se hospedaram aqui, que fizeram
reserva, mas chegaram aqui, e que “é a primeira vez que eu vou ficar num hostel,
como é essa coisa de todo mundo dormir no mesmo quarto e tal? ” Soa como algo
meio contra as instituições.
E: Vamos falar um pouco sobre o hostel especificamente. Qual a data de fundação do
hostel?
S09: Ele é acredito de maio de dois mil e nove. De começar a preparar, abrir tudo pra
temporada e tal. E ele nasceu muito parecido com muitos hostels que eu conheci, ou
que eu fiquei sabendo. A VA, que é a proprietária do hostel, largou por um tempo,
trancou o curso de Direito e foi aos dezenove anos pra Austrália. Ela foi passar, o que
seria uma temporada de poucos meses, acabou ficando uns cinco anos por lá. Fez
um bom tour pela Europa e claro, estudante, viajando com pouco dinheiro, foi um meio
de hospedagem econômica, é que muita gente acaba chegando ao hostel pela
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questão de ser um meio de hospedagem mais barato, mais econômico. Que depois
acaba entrando em contato com essa filosofia do hostel, que é mais do que
simplesmente uma hospedagem barata. É um meio de hospedagem, onde você
conhece pessoas do mundo inteiro. Troca experiências, vive ali experiências muito
interessantes. Desde sair pra fazer trilhas juntos, ou fazer e organizar um jantar, como
a gente teve aqui. Todos resolveram cozinhar juntos e eram vinte e cinco pessoas
numa mesa de sete países diferentes juntos e tal. Essa vivência foi o que ela teve,
viajando pela Europa e na própria Austrália. E quando voltou ao Brasil, voltou
encantada com isso e era uma coisa que eu queria ter, que era um negócio que eu
seria feliz era ter um hostel. É claro, a mãe dela tem até uma linha de pensamento
mais maleável, mas o pai dela um gaúcho de pensamento muito tradicional, do interior,
disse “não, isso é um negócio que não vai dar certo, todo mundo ocupando os mesmos
quartos”. Então ele foi meio contra a ideia dela e ele não apoiou e disse “eu não dou
nenhuma ajuda, nem pra alugar um prédio, nem pra comprar um prédio pra fazer isso.
Você quer brincar de ser dona de hostel ali, eu cedo a casa de veraneio que a gente
tem num bairro no sul da Ilha, você vai lá põe seu hostel, cede alguns quartos da
casa”. O andar de cima ficou para uso da família e inicialmente só os quartos do andar
de baixo ela poderia utilizar pro hostel. Mas como ela é muito persistente, foi ali,
levando essa contrariedade dos pais, que ela ganhou inicialmente o apoio ali da mãe.
A mãe dela também se encantou com essa ideia, “ah! Um lugar pra hospedar jovens
estudantes do mundo inteiro e tal”. Ela vendeu essa ideia pra mãe e ela se encantou
com os estrangeiros que vinham pra cá. Ela achava assim tão bonzinhos, tão
educadinhos, pegam ali seu livrinho, sua água, saem pra ir à praia, voltam, não fazem
bagunça. Não era assim aquela ideia de todo mundo junto e bagunça, festa demais e
tal. E assim ela foi levando os três primeiros anos do hostel. Só que chegou um ponto
que ela tem um processo de cidadania, como ela já tem por conta dos avós, a
cidadania italiana, ela deu a entrada no processo de cidadania australiana. E pra isso,
pelas normas, ela teve me explicando uma outra vez, ela tem que voltar a morar na
Austrália por um período e só se ausentar no máximo por três meses por ano. E ainda
assim todo dia que ela passa fora da Austrália atrasa um dia o final do processo de
cidadania. Que seria a cidadania definitiva. Então ela voltou, agora a dois anos já pra
Austrália. E no primeiro ano, ficou a mãe dela com um funcionário, tentando aqui, mas
já é uma senhora de mais idade e eles não tinham o ritmo pro hostel. Depois só com
funcionários, meio que deu uma desandada, pelo que me contaram, ela e a mãe me
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contaram, que o hostel teve três anos bem e dois anos mal. Assim que não deu
dinheiro e que andou ficando muito sujo, muito bagunçado. A casa precisando de
manutenção e no ano passado em dois mil e quatorze, ele funcionou, teve uma
temporada de verão, muito, muito fraca, sem inscrição no Hostelworld. Estavam só
dependendo de quem chegava a porta, procurando hospedagem e eles estavam
alugando quartos fora da temporada. A partir de maio, começaram a alugar para
moradores mensalistas e não foi uma experiência muito boa, porque o funcionário que
tava tocando aqui acabou não se responsabilizando pela cobrança do aluguel, então
muita gente ficou em atraso e também fazendo muita bagunça e depreciando o imóvel.
Daí a intenção delas já tava em começarem a pensar em fechar o hostel. A proposta
já era da mãe da VA, “ou você volta pro Brasil pra tocar seu negócio ou então ele vai
ficar fechado, aguardando quando você resolver voltar”. E aí foi o tempo, que eu já
tinha conhecido o hostel anteriormente, numa festa que fizeram aqui e já trabalhava
com outro hostel e tive aqui pra conhecer e tal. Ele tem um potencial muito grande, só
precisa estar um pouco mais cuidado. E eu fiz uma proposta, “ah não! Não quero uma
relação, que seja de gerente do hostel, não como um funcionário. Então podemos
fazer uma proposta que seria um arrendamento. Vocês entrariam com a estrutura
física que já existe e é muito boa. Tem móveis, estrutura, tudo. Com a marca, me
comprometo a não mudar o nome do hostel, o hostel que a V idealizou, tanto no nome
como nas linhas gerais, o que ela acredita. E a carteira de clientes vai ser sempre em
nome do RH, os contratos que foi firmado com a Booking.com, que foi renovado com
o Hostelworld, foi renovado em nome do, porque se algum momento a gente reincidi
esse contrato de arrendamento, mas a carteira de clientes já é do hostel, já é da
empresa que vai se manter com esse CNPJ que tem, com a marca, com a proposta.
E eu entraria com toda a parte de manutenção, nas instalações, a administração e
operação mesmo do hostel”. E a proposta pra isso é, como ele tem uma sazonalidade
muito grande, sul da ilha, até então seria um arrendamento com aluguel fixo, um
pagamento fixo. Quarenta por cento do lucro líquido pra mim e sessenta por cento do
lucro líquido pagando todas as despesas para o hostel, para a empresa. Onde era a
VA, a mãe dela, é sócia em quinze por cento. Fizeram a mãe dela de procuradora aqui
no Brasil, daí ela cuida de todos os temas ligados a empresa enfim. Então a proposta
foi essa, justo porque se eu tivesse um valor liquido fixo, poderia botar um funcionário,
não me importando se dá lucro ou não. Quando você pensa que o meu lucro é o deles
e baseado sim no lucro líquido, me força a manter os custos operacionais baixos, para
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aumentar a lucratividade e a eficiência do hostel. Tanto é que recebi uma proposta
essa semana do Hostelworld, em função da avaliação do hostel estar em noventa e
três por cento. Muito boa, assim, a avaliação dos hóspedes. Então nesse tipo de
relação, a maneira que foi contratada, como foi concebido é priorizar a eficiência e
lucratividade. Então você é eficiente na operação e eficiente na administração.
E: deixa ver se entendi então, foi fundado por ela VA em dois mil e nove. E você
chegou em Florianópolis quando?
S09: em dezembro de dois mil e onze.
E: e pegou o hostel em dois mil e quatorze. O teu primeiro contato com esse hostel foi
quando?
S09: em dois mil e, final de dois mil e doze. Eles faziam de vez em quando umas
festinhas aqui, uma bandinha de música ou até os próprios hóspedes pegavam uns
instrumentos e tocavam ali. Vinham pessoas de outros hostels, era uma festa aberta,
na área externa, no pátio externo.
E: você residia aonde em Florianópolis nessa época?
S09: nessa época na Lagoa.
E: e qual é a tua primeira impressão, isso e uma coisa que pergunto pra todo mundo,
mas o teu ponto de vista aqui sobre a diferença do sul da Ilha, da Praia da Armação
pra Lagoa da Conceição?
S09: bom, o sul da Ilha ele tem as virtudes, essa vocação mais pra natureza, trilha,
praia. Armação, Pântano do Sul são bairros, que originalmente eram de famílias de
pescadores e nativos. E que se mantem muito com essa cara, apesar do crescimento
que já teve, você vai ver que tem uma população ali de famílias, que todas se
conhecem, que cresceram, conhecem os avós e tal. Apesar de já ter muita gente de
fora também. Então tem sempre esse ritmo, andando pelas ruas, tem sempre esse
ritmo de praiazinha ou... os bairros de Florianópolis parecem pequenos feudos. São
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muito diferentes entre si e tal. E esse tem cara daquelas praias que a gente conhece
de população caiçara, na costa verde por exemplo, litoral entre Rio e São Paulo.
Parece aquelas prainhas pequenininhas que tem por lá. A Lagoa não, já tem aquela
coisa muito de o ano inteiro ter muito estrangeiro por causa dos intercambistas, dos
estudantes que tão frequentando, tem essa coisa mais da vocação artística, cultural.
Também tem uma especulação imobiliária muito forte, os aluguéis são muito altos. Os
pontos comerciais são bem mais cuidados, mais charmosos. Tem aquela coisa mais
cosmopolita mesmo. Acho que o bairro mais cosmopolita de Florianópolis é a Lagoa.
E: e você acha que isso deve influenciar no perfil das pessoas que se hospedam num
hostel aqui e os que se hospedam num hostel na Lagoa?
S09: na verdade não. Assim, quase a totalidade os hóspedes que tiveram aqui, ou
estavam vindo ou indo pra lá. Eles curtiram um tempo mais da Lagoa, mais essa coisa
de ir nas festas lá e circular a noite, ver gente, mais essa badalação. E depois
passaram outra temporada, alguns dias mais pro sul da ilha, pra aproveitar fazer trilha
até as cachoeiras no entorno da Lagoa do Peri, quase todos vêm aqui pra fazer a trilha
da Lagoinha do Leste. Conhecer um pouco a Solidão e tal. Ter esse ritmo, inclusive
tem hóspedes que ficaram aqui uma semana, foram e ficaram na Lagoa um pouco pra
ficar um pouco nessa coisa do agito. ‘Ah não! Pra última semana antes de ir embora
quero ficar aqui de novo no hostel com vocês pra ficar mais tranquilo”. Sair, dar essa
caminhadinha que a cinco minutos já está ali na praia, volta faz um almocinho rápido,
descansa. Vai pro final da tarde de novo na praia, aí já pro Matadero. Então acho que
o público dos hostels na Lagoa é o mesmo público que fica aqui, só que em momentos
diferentes. Eles exploram as diversidades da ilha.
E: e por que abrir um hostel e não outro meio de hospedagem? Por que administrar
um hostel e não uma pousada? Eu acredito que você já respondeu essa pergunta
nesse discurso todo, mas se quiser complementar alguma coisa?
S09: Claro, claro. Eu acredito muito... inclusive eu larguei a minha área de formação,
justamente por conta disso, assim você tem que fazer o que te faz feliz. Trabalho,
independente de qual seja, vai te dar um certo nível de estresse, vai te dar algumas
dores de cabeça, algumas contrariedades. Já que você vai dedicar uma parcela
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grande do teu dia a um trabalho, que seja alguma coisa mais haver com você, com
teu estilo de viver. Então eu gosto muito dessa, digamos, relação mais informal que
se pode ter com um hóspede de hostel. Claro que vou poder estar em algum momento
na cozinha preparando uma refeição, a gente vai sentar junto pra comer, pra tomar
um drink, jogar uma sinuca ali, falar com ele, com o meu hóspede. Falo com o meu
cliente com a mesma desenvoltura que eu falo com um amigo. Claro, esse tipo de
relação me encanta muito, muito mais do que ter uma pousada que digamos, entra ali
pro roteiro de charme de pousadas, que vai me dar uma certa projeção entre os
comerciantes locais, daquela pousada tão boa, que tem ali tal. Então não é o que me
faria feliz. Então as escolhas acho que pra tudo, não só como pra abrir um negócio,
mas como pra carreira, já que você vai dedicar uma boa parcela do teu tempo pra
fazer alguma coisa que tenha a ver com o teu estilo.
E: acho que contamos um pouco da tua história, sobre a história do hostel, tem mais
alguma coisa que você queira acrescentar sobre a história do hostel. Antes de a gente
começar a gravar você falou que essa temporada depois de uma ou duas temporadas
negativas e que essa temporada foi positive né?
S09: Foi bastante positiva, só o Carnaval que assim, na semana do Carnaval, as
chuvas que caíram foram impressionantes. Já alguns dias antes do Carnaval começou
a chover muito, isso deu uma quebrada no ritmo, algumas reservas canceladas, e
gente que não pegou Estrada. Então salvo o Carnaval todos os outros períodos da
temporada estavam ali dentro do esperado e alguns até acima do que a gente
esperava, então...
E: pensa em abrir o ano que vem, vai estar aberto, tens uma previsão de quando
tempo pretende ficar aqui, até ela voltar ou mais que isso?
S09: Bom, o nosso contrato foi de cinco anos, renováveis por mais cinco.
Automaticamente, é um contrato de dez anos com uma revisão pra ver se todas as
partes estão felizes no meio do processo. É muito difícil dizer, eu não faço esses
planos: realmente eu vou ficar os dez anos aqui, os cinco anos aqui, não. A intenção
agora é o que me propus foi deixar o hostel funcionando como uma empresa, redondo.
Toda a parte de documentação, legalização em dia, ter ali os livros caixas e um
243
histórico todo do processo de arrendamento ali todo documentado, até pra você ter
um raio-x de como foram as temporadas se evoluindo. Então, acho que só vou
considerar meu trabalho concluído aqui quando eu deixar tudo isso pronto, tudo isso
andando. Tem a parte física também, a gente está construindo agora um deck pra
piscina, fez algumas modificações na estrutura pra da mais eficiência. Tem algumas
outras coisas ainda a fazer, tem que ver toda a parte elétrica, uma parte, uma coisa
pra fazer aos poucos. Então tem algumas coisas ainda que eu considero missão.
Então não abandonarei o barco antes disso. Mas quanto tempo eu vou ficar aqui eu
não sei, mas acredito que a VA, voltando pro Brasil, acho que não seria o caso de
encerrar a parceria. Por exemplo, ela veio, toda a parte de negociação foi feita com a
mãe dela. O processo de arrendamento foi feito com a mãe dela que é procuradora,
mas pra assinatura de contratos e até pra gente se conhecer ela veio ao Brasil em
dezembro, ficou quarenta dias aqui. A gente ficou juntos ali em dezembro. Isso em
janeiro meio que trocando ideia, trocando figurinha. Era um pouco sobre o que ela
pensava do hostel, o que ela queria dar de roupagem, que cara. E eu passando pra
ela mais dessas impressões do técnico e do administrativo, não só pra um hostel, mas
que qualquer empresa precisa. Então desde gestão de fluxo de caixa, a outras
questões técnicas, até pensar assim nessa relação com os vizinhos, essa inserção no
bairro, essa personalidade do hostel também. Então a gente meio que ajustou muito
ali o discurso e chegamos num patamar que eu acho que faremos uma excelente
parceria quando ela voltar aqui ao Brasil. Então acho que por si só, a volta dela ao
Brasil não seria um final de parceria.
E: e em termos assim de imagem de hostel, de bairro de cara de empreendimento.
Você falou da parte mais técnica ali, mas o que que ela passou pra você assim. Qual
que é a imagem que ela tem de hostel, qual é o ideal dela?
S09: ela já tinha por intuição a ideia de hostel conceito, que foi uma ideia que eu
apresentei pra ela. De ter um hostel não só como um deposito de viajantes. Um hostel
que eu conheço coloca treliches nos quartos, ocupa todos os espaços, com cama,
cama, cama pra onde pode. Acho que não privilegia o hóspede. Já que a estrutura da
casa permite ter bastante área de uso comum, ter espaços diferentes pra quem está
querendo ver uma TV, ou pra quem está querendo só música, ou ficar com área de
bar pra conversar ou quer tirar um cochilo na rede lá fora. Então pensar até nas
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questões dos usos, no volume do som, da música. E também nos quartos não ter
camas fechando janelas. Não ocupar todos os espaços disponíveis. A decoração dos
quartos também. O hostel já tem uma identidade essa ideia do retro. Então ela pegou
toda essa questão de decoração. A decoração como esta tem muito coisas que eu fiz,
mas com todos os elementos que ela já tinha aqui a disposição, onde colocar o
material informativo essas coisas, foram decisões mais minhas. Como estruturar essa
funcionalidade, mas tudo material que ela já tinha escolhido quando veio pra cá. Então
o hostel já tinha essa cara, essa ideia do Retro. Então já tinha uma temática, que e
uma das coisas importantes pro tal do hostel conceito. Você tem uma temática e deixar
essa temática fluir por todos os espaços da casa. É questão de pensar as
acomodações que sejam funcionais não só pra questão financeira do hostel, pra gerir
maior renda possível, mas também que você possa oferecer a melhor experiência
possível pros clientes nos quartos. Então foram ideias que ela já tinha intuitivamente,
apesar de não ter o conhecimento do termo hostel com seu conceito, ter um hostel
mais conceitual.
E: em temos de área física, na tua opinião, qual é a área física essencial pra um
hostel? Se você não pudesse enumerar todas, teria uma que seria essencial pra
estrutura física do hostel?
S09: Um hostel, apesar de muita gente que não conhece, não ter o hábito de viajar,
pensa, “ah não! Uma forma de acomodação barata onde as pessoas vão estar ali
dividindo os espaços”. Mas um hostel não e só uma funcionalidade do bed & breakfast,
do cama e café. Não é isso, então, o que faz diferença num hostel é, além de você ter
os dormitórios, é as áreas de uso comum. Então, área pra jogos, ter um bar
funcionando onde as pessoas vão poder interagir, uma estrutura de cozinha, que
permita não só preparar um alimento rápido ali, mas, se vai cozinhar coletivamente o
espaço de uma mesa grande para que as pessoas possam sentar todos juntos e ali
congregar essa mesma ideia. Então espaços que privilegiem essa interação entre as
pessoas. Que seja na área de jogos ou TV, bar se possível, todos eles... Piscina não
é necessário, mas é um meio de interação muito importante. Verão, alta temporada,
madrugadas quentes, galera quer ficar ali pelo menos tomando um drink, pondo o pé
na agua, trocando uma ideia. Então a questão das áreas de uso comum é que faria a
245
diferença entre o hostel com este conceito de hospedagem onde as pessoas
interagem.
E: e a mesma pergunta só que voltando para o lado do serviço. Qual o serviço ou
serviços que o hostel deve oferecer pro hóspede?
S09: o serviço ainda é um calcanhar de Aquiles assim pra muitos hostels. Tem um
hostel que as vezes tem uma estrutura boa, se pegar a menor nota de quase que a
totalidade dos hostels, é a limpeza. Se vai pegar ali as avaliações, normalmente
limpeza é a nota mais baixa de quase todos os hostels. Então serviço ainda é um
calcanhar de Aquiles porquê é uma coisa que é um pouco complicada, tem as
questões de relação trabalhista, questões legais e muitos hostels também tem essa
coisa de trocar hospedagem por trabalho por acomodação, acomodação por trabalho.
E muitas pessoas também querem trabalhar com hostel, pensa que o trabalho é bem
festa, mas está ali, junto, e tem uma relação também com o proprietário com o
administrador. O que é diferente em um hostel que faz parte de uma rede, de uma
franquia, é que tem obrigação de manter um determinado padrão, mas que não é
como a maioria dos hostels. Então, ainda é um calcanhar de Aquiles esse serviço de
limpeza. Essa informalidade também na relação com o cliente, as vezes gera também
uma distorção, que é essa perda na qualidade do serviço. Isso é uma coisa que eu
acho que todo hostel vai ter que fazer o dever de casa e melhorar isso um pouco.
Esse é um detalhe de quem tem o hábito de viajar em hostel e de quem não tem. Por
exemplo, já chega toma seu café, lava sua louça. Cozinhou a noite não deixa louça
pra lavar no dia seguinte, é na hora tal. Terminou de usar o banheiro pra tomar um
banho, se tiver um pano ali, ou as vezes dentro da recepção, pede um material pra já
deixar tudo seco, limpo. Você tem isso, que é um público muito com essa cara, está
sempre mudando, tem outros que você percebe que deixa uma loucinha ali pra lavar
amanhã, se ninguém perceber que é dele, não lava. Tem um pouco disso também,
mas o hostel obrigatoriamente tem muita área de uso comum, fica difícil, está todo
mundo utilizando ali, vendo um filme, comendo pipoca aqui na sala. Criando até um
dia de tempo ruim, mais feio, a gente criou uma tarde com os filmes, até compra uns
filmes mais recentes no pacote e tal. Faz um uso comum aqui. Então caiu uma
pipoquinha ali, aquela coisa que ninguém, nenhum deles vai fazer isto. Então aqueles
serviços que os hóspedes não vão poder, não vão dar conta ou mesmo que deveriam,
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mas não vão fazer. Então tem que ter alguém pra fazer se não vai ficar sujo e soa mal
até porque há uma troca muito grande. O hóspede que está chegando hoje, não sabe
que a galera se reuniu pra fazer uma festa ontem e ficou uma sujeirinha que ainda vai
ser limpa. Você chegou viu alguma coisa suja e já começa a pensar, “o hostel não
cuida tanto da limpeza”. Então tem que ter alguém pra cobrir o que o hóspede deveria
fazer ou faz, mas não dá conta de fazer tudo. Tem que ter um staff ali pra estar atento
a isto. Se não, a impressão é uma outra coisa que pega em relação a esta coisa da
limpeza e os pequenas detalhes, um fio solto ali que não é necessariamente sujeira,
mas como não tem uma forma de avaliar isto, então os hóspedes acabam sinalizando
como na parte de limpeza. Porque, tem um fio descascado ali, uma tomada solta,
alguma coisa não tão... uma pintura que está caindo, então o cara vai sinalizar isso
na parte de limpeza. Mas entre outros serviços, se a estrutura permite, lavanderia
porque tem gente que está viajando a muito, muito tempo, pegou chuva na mochila.
Então se pode ser um, se a estrutura física permite, lavanderia faz uma diferença
muito grande. Eu tenho um dos quartos que é um dormitório feminino, único quarto
que eu tinha que era uma suíte, com banheiro interno, eu transformei num dormitório
feminino. A maioria dos hóspedes que chegam aqui dizem pra mim “não tem problema
fico em dormitório misto”. Mas ter um dormitório feminino é importante, porque as
vezes tem hóspedes aqui que estão viajando a três, quarto, cinco meses sempre em
dormitórios mistos. Então se pode chegar a ficar três, quarto dias em um quarto só
com mulheres, ficar mais à vontade, com banheiro interno, que dá pra sair só de
toalha, de calcinha pra pegar alguma coisa que esqueceu na bagagem, voltar no
banheiro e tal. A ideia de tê-lo é para agregar esse serviço a quem está viajando a
muito tempo, mulheres viajando muito tempo. Também as vezes um casal viajando
junto em hostel, ficando em dormitório por muito tempo. As vezes o hóspede nem
solicitou mas se eu tenho disponibilidade, se é um casal que já conversei, que está
viajando a muito tempo, fazer um upgrade no último dia, nos últimos dois dias. Então
um upgrade para eles estarem juntos num quarto de casal. Faz diferença pra quem
está viajando a muito tempo de vez em quando ter um pouco de privacidade, se é um
hostel que lhe ofereça isso sem cobrar a mais. Um upgrade, um serviço do hostel.
E: e na tua opinião qual é o papel do recepcionista num hostel?
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S09: é baseado nessa história da informalidade de lidar com as pessoas, seria fazer
essa primeira apresentação do bairro ou da cidade. As vezes está pegando um
hóspede que acabou de chegar em Florianópolis, já conversar bastante com ele da
cidade, ter uma ideia do que eles já pretendem fazer, a impressão que ele tem prévia
do lugar, de onde ele está indo visitar e tal. Apresentar isto antes até do que apresentar
a estrutura física do hostel. Então, já quando entra o check-in bate um papo, descobrir
de onde que é, está chegando em Florianópolis ou estava em outra parte da cidade e
tal. A lógica seria apresentar o bairro, no nosso caso aqui é apresentar o sul da ilha e
da essa ideia de onde se está. Acho que hoje o check-in chega praticamente pronto.
A maior parte das reservas que a gente tem e através do Booking ou do Hostelworld
que já nos forneceu quase todos os dados do cliente. Todos os dados de cartão pra
fazer cobrança de um no-show. Endereço, e-mail, telefone, mas o procedimento de
check-in acaba ficando muito, muito simples. Assinatura numa ficha, pra gente manter
um histórico físico e nada mais. Então antes mesmo de apresentar a casa, este bate
papo, se dá ali sim, enquanto está apresentando o quarto, caminhando pra
acomodação e tendo esse dialogo ali sobre expectativas e sobre o que a gente tem a
oferecer, não só o hostel, mas o bairro ou a cidade.
E: você acha que o recepcionista acaba assim ultrapassando os limites dele da
recepção, interagindo com os hóspedes em outros momentos e de outras formas?
S09: aliás, hoje quem trabalha comigo tem, na minha opinião, a obrigação de sair da
recepção, até mesmo porque o lugar da recepção ali e mínimo ali. Ele vai ali só pra
fazer... a função é tá ali conversando, trocando uma ideia, interagindo. Vendo como
essa funcionalidade, normalmente como eu fico na preparação e reposição do café
da manhã, essa pessoa que tá comigo pela manhã já troca uma ideia, vê quem tá
querendo fazer que passeio. Se precisar ligar pra reservar já faz essa função.
E: os recepcionistas aqui no teu hostel eles costumam fazer algum passeio ou sair
com eles? Vocês chegam a fazer alguma atividade com os hóspedes?
S09: sim, sim. Fizemos algumas de luau, ir em alguma festa ou até fazer jantares no
hostel. O recepcionista que trabalha de manhã vem de noite aqui pra curtir um pouco,
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pra estar junto. Eu próprio vou com eles na praia, quando posso, também faço uma
trilha. Acho que isso é obrigação assim de...
E: você possui ainda alguma amizade com hóspede? Fez alguma amizade com algum
hóspede nesta temporada?
S09: sim alguns. Alguns que a gente mantém sempre contato. Que tão ali sempre
fazendo contato, “na próxima temporada de verão vou aí, quero trabalhar, quero ficar
aí com vocês, foi muito bom”. Outros querem vir pra ficar de novo como hóspedes.
Alguns convites também pra ir visitar. Uma amiga que ficou aqui, tem um hostel na
Patagônia, na Argentina, me mandou foto do hostel dela, dos eventos que tão fazendo,
tem convite pra ir lá visitar. Um casal francês que ficou aqui, que tem um hostel com
restaurante. Então ela toca o hostel, e ele é chef de cozinha, eles têm essa parceria
assim. Aí tem muita gente que ficou que a gente mantém contato, segue falando.
E: e sobre a Gastronomia, você acha que a Gastronomia é uma parte importante da
experiência do hóspede no hostel? Ou até na experiência do turista no local visitado?
Como você vê essa relação da Gastronomia com a experiência do visitante no local?
S09: tem uma coisa bem interessante. O MBD, que é proprietário do Hostel X, aqui
no Campeche, ele viu uma coisa num hostel, não sei se foi na Inglaterra, e ele aplica
lá. Não apliquei aqui ainda, mas eu acho bem interessante, porque eles tinham lá uma
noite da pasta free, ou seja, ele dava o macarrão, a massa pro macarrão crua, deixava
lá na mesa da cozinha e alguns legumes, pra que naquela noite, que ele está
fornecendo os insumos, pra que naquela noite os hóspedes se reúnam e cozinhem
juntos. E eu trabalhei com eles em dois mil e treze com a parte do bar, massagem,
guias e trilhas, com essa parte mais divertida ali, essa parte de recreação do hostel.
E era uma das noites mais animadas, uma das que as pessoas mais interagiam era a
tal da noite da pasta free. Então, foi uma experiência que foi bem interessante
acontecer lá. E ele tinha visto isso num hostel na Inglaterra, ele morou lá por um tempo
e uma coisa assim que vale a pena, uma noite que nós fornecemos o material para
que eles cozinhem. Não está dando o jantar de graça, está dando os insumos pra que
vocês cozinhem juntos. E aqui a gente fez a noite mexicana, uns nachos com
guacamole. Churrasco, umas duas vezes por semana. A gente até pensa, ainda nessa
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temporada, não consegui viabilizar isso, mas ter um buffet de feijoada, porque é uma
coisa bem brasileira e todos querem provar. E nem todo mundo teve a oportunidade
de provar porque muitos vieram da Argentina passa aqui pelos hostels do Sul vai pra
São Paulo pra embarcar de volta. Então aqui o churrasco é muito mais forte, mas
também ter a feijoada um dia na semana ou a cada quinze dias. Ou talvez, cada vez
permitir quando um grupo tiver interessado em viabilizar isso. A gente tem uns
quadrinhos ali de anuncio, as vezes põe “churrasco hoje, quem vai participar?” Quem
vai poder, deixa um recado ali. E os recepcionistas ali também na manhã fazendo
isso. Uma outra que a gente faz é ter uma segunda TV aqui que fica durante a
temporada voltada pro público e a gente coloca imagens em slide show da
programação da semana, o que tem na cidade pra fazer, o que tem aqui pra fazer o
que vai ter no hostel, então tem no quadro ali. E quem trabalha na recepção, na
verdade todo mundo que trabalha no hostel aqui ajuda em tudo, também conversando
sobre o que tem pra fazer, vai ter um luau, vai ter um DJ de for a tocando ali e tem o
Gringo Party nas segundas feiras. A gente pega essas imagens todas, copila e coloca
lá exibindo, na segunda feira, tudo da semana. Passou segunda já tira as imagens
dos eventos, vai colocando outras e vai preparando já pra semana que vem. E a
Gastronomia é uma das coisas que a gente faz bem forte.
E: eu gostaria que você enumerasse alguns ou pelo menos um dos pontos negativos
de se administrar um hostel ou de ficar num hostel?
S09: bom, uma coisa que ainda e negative na minha opinião é quem ainda vem pro
hostel com uma visão não exata do que é, como funciona. Então é muito mais
desafiador aquele cliente que vai te dar mais trabalho. Seja o que vem muito
precavido, “vou ficar porquê e o mais barato que eu encontrei e cabe dentro do meu
orçamento”. Como também quem vem e acha que hostel pode tudo, tudo liberado e
tal. E aí também dão trabalho. Acho que seria um dos pontos negativos de
administrar, esses seriam os desafios maiores. Chegar a educar este hóspede que é
menos informado sobre como deve funcionar um hostel. Os outros desafios, os outros
pontos negativos são de administrar qualquer empresa pequena no Brasil. Então tem
as questões legais. Algumas imposições de como deve funcionar uma cozinha ou
banheiro, que seriam de uma Vigilância Sanitária, de ter que ter isso ou aquilo. Nesse
meio de hospedagem isso não casa, mas é regra. Para um meio tão informal não dá
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para ter um, porque ele é o meio do caminho entre você hospedar alguém em casa,
você está à vontade ali pra você cozinhar. Então não dá pra impor certas regras de
higiene até porque eles não têm, pensam diferente. Cozinham, tem hábitos diferentes
e tal. Então tem algumas coisas que pro hostel especificamente ficam mais difícil de
se adequar a essa norma, essa regra. E no mais seriam desafios comuns para uma
empresa pequena.
E: você tem preferência pelo termo hostel ou albergue da juventude?
S09: hoje considerando que o meu público é o público que vem com a ideia hostel,
teria preferência pelo termo hostel. E até para o público que não conhece, muita gente
tem a ideia do albergue, desse lugar para abrigar gente que não tem onde ficar, então
fica mais difícil ainda mudar. Mas as vezes o cara não sabe, mas o que quer é hostel
mesmo. Trocando e-mail com alguém e falam “o hotel de vocês”, não... é um hostel.
“E qual é a diferença?”. Daí você vai catequisar e tal, então é até melhor um termo
que é menos conhecido nacionalmente e que não vai estar ligado diretamente a uma
ideia. É mais simples pegar um termo menos conhecido, é claro. O estrangeiro que
daí sim... na temporada, acima de noventa por cento da minha ocupação na
temporada é estrangeiro. As vezes cem por cento, as vezes não tem nenhum
brasileiro.
E: geralmente são de que países?
S09: Final de setembro, outubro, começam a chegar aí europeus. Muitos ingleses,
escoceses, franceses, alemães ainda vem um canadense, australiano. Ali pra dar um
contraponto de só Europa, Europa. Americanos vem pouquíssimos. Australiano e
canadense vem bastante, dos não europeus, australianos, mas muito mais
australianos e neozelandeses. As vezes vem de Singapura, reunião, aqueles
hóspedes em lugares menos convencionais, que a gente viu pouco. A gente viu um
ao longo da temporada inteira. Mas em dezembro começam a vir também argentinos
e uruguaios. Depois do dia vinte. Daí janeiro fica cinquenta por cento de argentinos e
uruguaios e cinquenta por cento de europeus, canadenses e australianos. E ali mais
ou menos meio a meio.
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E: se você tivesse que determinar qual seria a principal diferença de um hostel e um
hotel?
S09: seria a experiência de vida no local, é isso que é determinante. Em um você tem
ali pessoas que te servem com toda a delicadeza e presteza porque tem obrigação de
fazer isto e tem inclusive regras, você tem que se aproximar da mesa assim e tal. Um
tratamento assim que é lindo, redondo, que tudo funciona. Mas funciona porque tem
que funcionar. No hostel, normalmente quem trabalha no hostel, pelo menos eu só
agrego pessoas pra trabalhar que gostem de interagir com gente, que gostam de lidar
com isso, que gostem desse clima de manter essa animação, se está um dia mais
chuvoso, se tá uma galera meio de canto ali, vamos reuni, vamos cozinhar. Deve fazer
isso, colocar, manter essa experiência sempre num up. Então, a experiência é o que
determina, independente de questões físicas, de espaço. A experiência é o mais
determinante.
E: defina com poucas palavras a palavra hostel. O que significa hostel para você?
S09: Um lugar de encontros. Um lugar onde as pessoas se encontram e interagem.
Aliás, um lugar de encontros improváveis. Fugindo um pouco agora das poucas
palavras já que seria isso, uma das coisas que converso assim com os hóspedes e
amigos que vem aqui me visitar aqui. Eu digo que outro negócio em qualquer lugar do
mundo que não seja um hostel, você não vai ter, sigo o exemplo do tal do jantar, vinte
e cinco pessoas de sete ou oito países diferentes, sentados numa mesma mesa,
conversando sobre suas coisas. Não tem um lugar que privilegie essa inter-relação
de pessoas de lugares tão diferentes. Esse ponto de encontro, de convergência de
vários países, de lugares diferentes. Essa é uma das maiores virtudes do hostel.
---Fim da transcrição---
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APÊNDICE F – Logo H
Word cloud, em forma de “Logo H”, apresentada em duas versões, cada uma delas
de forma monocromática e colorida. A primeira versão consiste no logo feito com as
palavras ditas com maior frequência pelos entrevistados, onde essas aparecem em
maior tamanho. As palavras ditas com menor frequência parecem em tamanho menor,
sugerindo sua hierarquia. Nenhuma palavra é repetida, os espaços entre elas
permanecem em branco destacando, assim, cada palavra. Na segunda versão, todas
as palavras são repetidas aleatoriamente afim de preencher os espaços em branco
da letra “H”, podendo a letra ser visualizada em uma melhor forma.
Fonte: elaborado pelo autor (2014).
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APÊNDICE G – Ilustrações do Logo H
Esse logo poderia ser empregado no dia a dia dos hostels, em objetos que são
comumente vendidos nesses estabelecimentos, geralmente com o logo do próprio
hostel. Essa ação tem o intuito de divulgar a filosofia, a essência desse meio de
hospedagem, ao invés da imagem de um estabelecimento especifico. Procura-se
difundir esses conceitos, torna-los públicos e acessíveis, para que os hostels sejam
conhecidos pelo meio de hospedagem que realmente são.
Fonte: elaborado pelo autor (2015).
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ANEXOS
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Anexo A – Ata de defesa de dissertação
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Anexo B – Ficha de avaliação de defesa de dissertação