holocausto: nunca mais!?

8

Click here to load reader

Upload: holocausto-nunca-mais

Post on 07-Apr-2016

213 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Holocausto. Um crime contra a humanidade. Fomos criados à imagem e semelhança de Deus. Portanto, livres. Quando qualquer homem tira a vida e a liberdade de outro comete um crime e aí se implanta a desumanidade. Que possamos sempre respeitar e garantir o Direito à Vida pertencente ao outro e lhe deixemos o direito de conduzir a sua vida gozando de vida com dignidade.

TRANSCRIPT

Page 1: HOLOCAUSTO: NUNCA MAIS!?

PROGRAMAEDUCANDO PARA A CIDADANIA

E A DEMOCRACIAII JORNADA INTERDISCIPLINAR PARA O ENSINO DO HOLOCAUSTO

HOLOCAUSTO: NUNCA MAIS ?São Paulo, 12 AGOSTO 2006

I- OBJETIVOS

-conscientizar diretores, professores e pais de alunos da necessidade emergente de incorporamos o debate sobre  racismo e anti-semitismo  como  Temas Tranversais sugeridos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais;

-sugerir conteúdos  e material didático para subsidiá-los na criação de seu planejamento de trabalho e de uma prática educativa coerente com o compromisso que as escolas têm  de favorecer a construção da cidadania;

-eleger  a dignidade  da pessoa humana e  a igualdade de direitos como princípios que devem orientar a educação escolar:      a) Dignidade da pessoa humana:  implica em respeito aos direitos humanos, repúdio à discriminação de qualquer tipo, acesso a condições de vida digna, respeito mútuo nas relações interpessoais, públicas e privadas.      b) Igualdade de direitos: refere-se a necessidade de garantir a todos a mesma dignidade e possibilidade de exercício da cidadania levando-se em consideração o princípio da eqüidade;

- transformar a escola não apenas em um espaço de reprodução de conhecimentos mas também em espaço de transformação social;

- à luz deste debate revelar a fragilidade das democracias que, na contramão da história, se deparam muitas vezes, com sistemáticas violações dos direitos humanos; - insistir na necessidade universal de preservar e afirmar a dignidade do cidadão e do homem, com base nos direitos que lhe são inerentes.COORDENADORES:Dr. Abrahan Goldstein [Presidente da B´nai B´rith do Brasil]Profa. Dra.Maria Luiza Tucci Carneiro [Depto. História, FFLCH-USP]

COLABORADORES: Professores Doutores: Célia M. Antonacci Ramos (UDESC/SC), Helena Lewin (UFRJ), Kênia Maria de Almeida Pereira (UNIT/MG), Pedro Ortiz (ECA-TV USP),Rachel Mizrahi (UNINOVE, SP)

Page 2: HOLOCAUSTO: NUNCA MAIS!?

Pós-graduandos de História Social: Anna Rosa Bigazzi, Eduardo G. de Castro, Erick Reis Godliauskas Zen, Renata Mazzeo Barbosa e Wagner Pinheiro Ferreira. Apoio: CAPH-USP- Centro de Apoio à Pesquisa Histórica, FFLCH-USP; PROIN- Projeto Integrado Arquivo do Estado/USP; Núcleo de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação/USP, Depto. de História, FFLCH/USP; Secretaria Municipal de Educação.

Por que estudar o Holocausto ?

Maria Luiza Tucci CarneiroAOS PROFESSORES,

Discutir estratégias de como transmitir a Shoá para nossos jovens – e principalmente para os não-judeus -- é uma das múltiplas formas de lutarmos contra a intolerância e, principalmente, contra o anti-semitismo. Anti-semitismo este que não desapareceu com a morte Hitler em 1945; a singularidade de Auschwitz não se esgotou com o julgamento de Nuremberg quando dirigentes nazistas foram julgados por crimes contra a humanidade. O nazismo, com certeza, não se esgotou no Holocausto judeu, e as consequências dessa tragédia ainda não foram totalmente avaliadas dada a dimensão da sua monstruosidade, até hoje incompreensível. Aliás, esta é uma das forças do anti-semitismo: de renascer das cinzas e retornar disfarçado de modernidade, de se manter e se propagar conseguindo sempre novos adeptos. E toda vez que o anti-semitismo emerge enquanto fenômeno social e pretexto político, retrocedemos no árduo processo de democratização e reconhecimento dos Direitos Humanos.Haja visto que a crise no Oriente Médio continua a se alimentar da velha tradição anti-semita que inspira a mídia nacional e internacional. Valores anti-sionistas e anti-semitas são empregados por jovens jornalistas confundindo a opinião pública que, nem sempre, interpreta os fatos levando em consideração a perspectiva histórica. Nem todos têm conhecimento para dispor do certo ou do errado. É neste sentido – o da distorção da História e da omissão dos fatos – que insisto sobre o perigo dos discursos que, nos dias atuais, proliferam tanto entre os partidários da extrema-direita como entre os adeptos da “respeitada” esquerda. Neste momento, constatamos que o anti-semitismo não escolhe partido, nem bandeira. Não foi por acaso que, nestes últimos meses, ocorreu uma onda de intolerância na Itália, Bélgica, França, Tunísia e Ucrânia quando sinagogas e cemitérios judaicos foram atacados e danificados. E não devemos aqui ignorar a tradição anti-semita da França que hoje se faz reavivada pelos grupos da extrema-direita.

Poderíamos aqui citar exemplos de candidatos políticos, jornalistas, renomados escritores e intelectuais (alguns dos quais brasileiros) que, em seus artigos e pronunciamentos recentes se apropriaram do discurso nazista para explicar a crise no Oriente Médio ou o problema dos sem-terra no Brasil. Ao invés de informar, desinformam confundindo aqueles que não conseguem distinguir Holocausto de outros genocídios. Daí a necessidade de explicarmos aos nossos jovens (e porque não, também os adultos – professores e militantes políticos, principalmente ?) o significado da Solução Final para as minorias étnicas perseguidas pelos nazistas.

Espinosa, em uma de suas reflexões à respeito das coisas humanas, afirmou: “...devemos procurar sempre não rir, não chorar, não se indignar, mas compreender”. No entanto, sabemos o quanto é difícil ( até mesmo impossível) compreender o que foi o Holocausto. Renomados cineastas escolheram por representá-lo através do humor; outros

Page 3: HOLOCAUSTO: NUNCA MAIS!?

optaram por recriar cenas tão próximas a realidade que conseguiram tocar fundo a alma dos expectadores mais insensíveis. Mas, em qualquer situação, é difícil não se indignar diante do grau de degradação humana vivenciada por aqueles que estiveram em um campo de concentração. E este “ estado de espírito”, cineasta algum conseguirá recriar em filme dada a dimensão de tragédia alcançada pela Shoá. Mas, nada nos impede de reconhecer que cada vítima tem um valor absoluto se considerado o grau de injustiça cometido contra ela.

Portanto, cabe a nós, através da educação formal e informal sensibilizar nosso jovens para a singularidade de Auschwitz e para a capacidade inesgotável do ser humano de fazer o Mal. Não podemos deixar que o mundo fique cego e que a memória se apague. E se isto acontece, o todo se converte em Nada, porque o homem, preocupado em julgar, se abtêm do passado histórico. É quando retrocedemos aos escombros da ignorância. É como se todos procurassem fazer, à moda do escritor Jose Saramago, um “ ensaio sobre a cegueira”.

Às vezes , me parece que o mundo esqueceu-se do que foi o Holocausto enquanto crime hediondo praticado pelo Nazismo. É com esta preocupação – a de não esquecer , de lembrar sempre – que insisto na importância de assumirmos o Holocausto como um tema permanente na educação, formal e informal, dos nossos jovens. E esta questão diz respeito também aos não-judeus, reprodutores incansáveis do anti-semitismo cujos limites devem ser constantemente avaliados.

Rememorar o Holocausto nos coloca em estado de alerta contra uma possível reprodução das circunstâncias históricas que deram origem ao plano de extermínio arquitetado pelos nazistas. Mas é preciso lembrar, ainda que parcelas da sociedade estejam interessadas em silenciar ou então, em distorcer o fatos. Precisamos estarmos atentos a esta produção intencional de silêncios procurando compreender a razão do não-dito pois nem sempre o silêncio é sinônimo de “ implícito” ou de “ não querer lembrar” . O não-dizer está, na maioria das vezes, ligado à história e à ideologia. Portanto, não deve ser interpretado como um mero acidente de linguagem, mas como uma “ato de intenção” . E, para isso, os nossos jovens têm que estar instrumentalizados (sensibilizados) para perceber os silêncios e as deturpações. Muitos estudantes sequer conhecem as verdadeiras dimensões do que foi o nazismo ou as consequências das absurdas teorias racistas de Hitler e seus seguidores para humanidade. E a ignorância conquista espaço em meio a este mundo em que a violência e assassinatos em massa emergem como métodos aceitáveis, e até mesmo, justificavéis.

Aqui está o desafio: em “ quebrar” a corrente do silêncio ajudando a lembrar. Lembrar sempre que foi o Estado nazista que arquitetou, de forma lógica e sistemática, a destruição de um povo: o povo judeu. Que foi a mente maquiavélica e calculista de Hitler que, subsidiado pelo aparelho burocrático do Estado, espalhou o ódio contra os judeus, homossexuais, ciganos, comunistas, testemunhas de jeová e outras tantas minorias. A Ciência, ao invés de apenas salvar os homens da morte, também foi acionada para matar. O primeiro apoio que Hitler recebeu foi das universidades. Foram nos institutos de pesquisa nazistas que antropólogos, psiquiatras, médicos e geneticistas decidiram, através de seus estudos, os limites entre a vida e morte. Portanto, ao rever a história do III Reich, constatamos que as universidades também “ formam monstros” : é nos centros de educação que os nossos jovens aprendem a pensar ( para o Bem ou para o Mal).

Isto nos mostra que a educação só tem sentido se for humanizada. Portanto, cabe a nós educadores – numa ação conjunta com os representantes da sociedade civil – formular políticas públicas de combate as ideologias racistas. Estratégias devem ser adotadas em dois níveis distintos: na infância e na adolescência. Tanto Janusz Korczak como Theodor Adorno enfatizaram a importância de mudarmos a educação; caso contrário não conseguiremos mudar o mundo. O estudo interdisciplinar do Holocausto poderá colaborar para a afirmação de uma série de princípios democráticos que, no seu conjunto, devem reger a vida social e política de toda a nação que valoriza a dignidade humana e a igualdade de direitos.

Iniciativas nesta direção já estão sendo desenvolvidas pela Universidade de São Paulo que, nestes últimos anos, tem oferecido cursos sobre as múltiplas formas de expressão da intolerância. Nos anos 70, Anita Novinsky foi pioneira ao introduzir os estudos inquisitoriais com o objetivo de mudar a visão de mundo de nossos jovens universitários. A partir de 1990, cursos específicos sobre racismo e anti-semitismo começaram a ser ministrados pelo

Page 4: HOLOCAUSTO: NUNCA MAIS!?

Departamento de História e pelo Programa de Pós-Graduação em Língua Hebraica, Literatura e Cultura Judaicas, ambos da FFLCH. Teses inéditas produziram conhecimentos sobre as práticas anti-semitas, o Holocausto, políticas imigratórias e imprensa anti-semita no Brasil. Em junho de 2002, organizamos a I Jornada Insterdisciplinar sobre Holocausto dedicado a orientar professores de I e II graus, e universitários. Em 25 de novembro próximo, será inaugurado na USP o Laboratório de Estudos sobre a Intolerância presidido por Anita Novinsky, projeto pioneiro de incentivo a pesquisa sobre a intolerância, o primeiro na América Latina.

O que mais poderemos fazer, além de incentivar a pesquisa, ministrar cursos e seminários ? Experiências podem ser retomadas e aprimoradas como, por exemplo:

- incentivar os sobreviventes dos campos de concentração a escreverem suas memórias e a publicarem seus diários;

- disponibilizar às escolas e pesquisadores um banco de dados sobre os sobreviventes do Holocausto radicados no Brasil;

- divulgar entre os jovens a produção de Lasar Segall e de outros tantos artistas que , através de suas obras, registraram fragmentos expressivos da perseguição aos judeus empreendida pelos nazistas. Muitos transformaram suas telas em libelos contra a intolerância e a guerra;

- empreender uma revisão dos conteúdos dos livros didáticos que silenciam sobre o anti-semitismo e o Holocausto. Sugerimos a inclusão destes temas nos programas do ensino fundamental valendo-se de “títulos maiores” oferecidos pela História Universal, História da Ciência, História do Brasil Contemporâneo, História da Arte, Literatura, Geografia Humana e Geografia Física e, até mesmo, pela Matemática e Geometria. Lembramos aqui alguns estudos específicos que podem servir de “suportes” (ou estratégias) para a inclusão – em sala de aula -- dos temas INTOLERÂNCIA e DIREITOS HUMANOS, além de outros assuntos correlatos. São muito sugestivos os temas:

- Nazismo, Fascismo, Segunda Guerra Mundial: avaliando o avanço nazista em direção ao Leste (conquista do espaço vital), transformações registradas no mapa da Europa; mapeamento dos guetos, dos campos de concentração e de extermínio; uso da bomba atômica contra as cidades japonesas de Hiroshima e Nagazaki, em 6 e 9 de agosto de 1945, respectivamente.

- Imigração e Intolerância: européia em tempos de guerra e os fluxos emigratórios para o Brasil (através da análise de documentos oficiais do Arquivo Histórico do Itamaraty, da reprodução de passaportes de judeus refugiados do nazi-fascismo e de salvos-condutos arquivados junto ao Fundo DEOPS/SP). Uma interessante estratégia para “abrir o debate” sobre o o tratamento excludente dado pelo governo brasileiro aos estrangeiros radicados no Brasil é a adoção de “identidades simuladas” para cada um dos alunos que, sob a coordenação do professor, assumem o documento de identidade de uma vítimas do anti-semitismo nazi-fascista (por exemplo, de um passaporte familiar, de um salvo-conduto, de uma certidão de nascimento, etc).

O debate em sala de aula pode ter como sustentação inúmeras fontes históricas selecionadas junto aos arquivos brasileiros (Fundo DEOPD/SP, Arquivo do Estado de São Paulo; Arquivo Histórico do Itamaraty/RJ; CPDOC- FGV/RJ, Hemerotecas de Bibliotecas públicas e privadas). Documentos sugestivos nos remetem para a questão judaica que, desde a década de 1937, foi tratada como um “problema político” pelo governo brasileiro. O mito do complô-judaico comunista se desta entre os registros deixados pela Polícia Política do Estado de São Paulo, pelos órgãos da imprensa católica brasileira e por intelectuais identificados com as idéias anti-semitas propagadas por segmentos adeptos das propostas nazistas, integralistas e oficiais (autoritárias).

- Memória coletiva e a memória individual: análise de textos extraídos dos livros de memórias, diários, cadernos de anotações pessoais de escritores reconhecidos e, até mesmo de anônimos. Somam-se aqui os Termos de Declarações de sobreviventes de campos de concentração registrados pela Polícia Política (o DEOPS/SP) e que, pela riqueza de detalhes,

Page 5: HOLOCAUSTO: NUNCA MAIS!?

podem instigar o debate sobre a presença no Brasil de refugiados nazistas e judeus no Brasil, assim como da política anti-semita sustentada pelo governo brasileiro durante o governo Vargas (1930-1945). Uma seleção de fotografias dos álbuns de famílias trazidos pelos alunos (filhos ou não de imigrantes) pode favorecer a reconstituição da memória coletiva e individual a ser apresentada, numa segunda etapa, sob a forma de uma exposição iconográfica.

- ONU: com ênfase no texto da Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948); nos debates sobre genocídio e crime contra a humanidade; na discussão sobre a Partilha da Palestina (1947) que culminou com a criação do Estado de Israel (1948). Uma estratégia pedagógico interessante de ser aplicada é a da simulação de assembléias realizadas pela Liga das Nações ou pela ONU que discutiram a partilha da Palestina. Textos históricos sobre este debate podem preparam os alunos e professores (identificados enquanto representantes dos países membros da Liga ou da ONU, segundo as suas opções partidárias). Um artigo selecionado de algum jornal brasileira que trate da atual desocupação de colonos da faixa de Gaza pode ser um ótimo ponto de partida para se buscar a gênese da questão e estudar a persistência do discurso anti-semita nos dias atuais (o novo anti-semitismo mascarado de antisionismo).

Iniciativas como estas podem (e devem) extrapolar as fronteiras das salas de aulas. Cabe aos professores e alunos ativistas promoverem jornadas educacionais permanentes dedicadas a recuperar o sentido da vida e da morte nos momentos de degeneração do eu. Enfim, a preservação da memória da Shoá -- ainda que uma página triste na história da Humanidade – e os estudos sobre a história do racismo (e do anti-semitismo, em particular), devem ser (re)vistos como formas possíveis de luta e de repúdio as práticas intolerantes. E a educação tem aqui um importante papel a cumprir, como muito bem lembrou um aluno ao seu professor :

“ Caro professor:

Eu sou um sobrevivente de um campo de concentração. Meus olhos viram o que nenhum ser humano deveria testemunhar: câmaras de gás construídas por engenheiros ilustres, crianças envenenadas por médicos altamente esécializados, recém-nascidos mortos por enfermeiras diplomadas, mulheres e bebês assassinados e queimados por gente formada em ginásio, colégio e Universidade. Por isso, caro professor eu duvido da educação.E eu lhe formulo um pedido:--- Ajude seus estudantes a se tronarem humanos. Seu esforço, profesor, nunca deve produzir monstros eruditos e cultos, psicopatas e Eichmans educados.Ler e escrever aritmética são importantes somente se servirem a tornar nossas crianças seres mais humanos” .(Carta publicada por A. Novinsky em “ Janusz Korczak e a esperança perdida”, 2002, p.10).