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“Tara Mohr mostra o caminho para libertar seus talentos, seu potencial e seu poder de fazer a diferença. Garanto que você reconhecerá seus so-nhos e a si mesma nas histórias que ela conta e que tirará grande provei-to de seus insights e conselhos.”

– Rachel Naomi Remen, autora de Histórias que curam e As bênçãos do meu avô

“Se, assim como eu, você já sentiu que tinha muito mais a oferecer para o mundo mas estava incerta quanto ao próximo passo, Ouse crescer será seu mapa do tesouro. A cada capítulo, eu sentia que Tara falava direta-mente à minha alma. Deve ser lido por toda mulher que tem um sonho.”

– Manisha Thakor, CEO da MoneyZen

“Tara desmascara todas as desculpas que estão nos impedindo de ou-sar crescer. Você vai querer dar este livro de presente para todas as suas amigas.”

– Jennifer Louden, autora de The Woman’s Comfort Book

“Se você ainda acha que não possui o que precisa para ter uma vida mais realizada, leia este livro. O objetivo de Tara não é fazer você conseguir ser promovida (embora isso possa acontecer de fato), mas tratar de coi-sas mais duradouras e ilimitadas: empoderamento verdadeiro, de dentro para fora, e capacidade de mudar o mundo.”

– Patty Chang Anker, autora de Some Nerve

“Com clareza, carinho e sabedoria, Tara revela todos os bloqueios que podem estar nos impedindo de manifestar nosso potencial e oferece di-cas certeiras para mudar o jogo. Este livro vai transformar sua trajetória de vida.”

– Tara Brach, autora de Radical Acceptance

“Queremos fazer a diferença no mundo, viver uma vida plena, e sabe-mos que, quando temos paixão por alguma coisa, isso é poderoso. Ouse crescer é como um raio de luz que mostra as crenças que podem estar refreando seu voo.”

– Danielle Laporte, autora de O despertar da autoestima e coautora de Questão de estilo

“Por muito tempo procurei um livro que pudesse recomendar para aca-bar com a epidemia entre as mulheres de acharem que não são boas o bastante. Ouse crescer é este livro.”

– Kate Northrup, autora de Money: A Love Story

Para Harriet e Bill

S U M Á R I O

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO 1

A censora interior 29

CAPÍTULO 2

A voz da sabedoria interior 55

CAPÍTULO 3

Uma nova maneira muito antiga de encarar o medo 82

CAPÍTULO 4

Libertando-se do jugo do elogio e da crítica 102

CAPÍTULO 5

Deixando para trás os hábitos da boa aluna 129

CAPÍTULO 6

Escondendo-se 147

CAPÍTULO 7

Saltando 163

CAPÍTULO 8

Comunicando-se com vigor 175

CAPÍTULO 9

Vocação 191

CAPÍTULO 10

Facilite as coisas 208

CONCLUSÃO

Entrando na equipe de transição 225

POSFÁCIO

A nova maternidade e a atitude de ousar crescer 233

AGRADECIMENTOS 238

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I N T R O D U Ç Ã O

Você conhece esta mulher. É sua amiga ou colega de trabalho. Uma pessoa inteligente e criativa. Ela é incrível: qualquer que seja a situa-

ção na empresa, na comunidade ou nos noticiários, ela tem ótimas ideias sobre o que precisa ser feito. Também é muito íntegra – não é ganan-ciosa, não cede a tentações de corrupção, não tem sede de poder. E é engraçada, calorosa e confiável.

De vez em quando, você a ouve falar e pensa: como seria bom se pessoas como ela estivessem no topo...

Pois saiba que alguém vê você da mesma maneira que você enxerga essa mulher. Na verdade, muita gente. Para nós, você é essa mulher talentosa que não sabe as habilidades que tem. Você é a mulher que poderia criar uma empresa inovadora ou tirar uma firma do atoleiro, contribuir com boas ideias para a escola do seu filho ou escrever um livro que mudaria milhares de vidas. Você é essa mulher extraordinária que gostaríamos que estivesse se manifestando mais e aparecendo para o mundo.

Ouse crescer foi escrito para ajudá-la a transpor o abismo entre o que enxergamos em você e o que você sabe sobre si mesma. É um guia prático para superar as inseguranças e criar o que você deseja com mais intensida-de – na profissão, na comunidade ou em alguma atividade pela qual tenha paixão. Não se trata daquela velha ideia de que vencer na vida significa ter mais dinheiro, cargos de prestígio, grandes impérios ou fama. Ter su-cesso de verdade é viver com mais liberdade para expressar suas opiniões

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e realizar suas aspirações. É se atrever a pensar grande de acordo com o que isso de fato significa para você. E se você ainda não souber o que é, as ideias e ferramentas aqui apresentadas vão ajudá-la a descobrir.

Esse conceito de ousar crescer não se refere a subir na hierarquia dentro de sistemas falidos, mas a aplicar suas ideias para mudar esses sistemas. Não é “aceitar” ou “rejeitar” de acordo com o que a sociedade estabelece. É descartar os rótulos limitadores e reorientar o foco para seus anseios e sonhos, e ousar tentar realizá-los.

• • •

Este livro nasceu de uma frustração e de uma esperança. A frustração? Mulheres brilhantes estão ousando pouco. A esperança? Que o mundo possa mudar – para melhor, para muito melhor – por meio de uma parti-cipação feminina mais ampla e mais ativa.

Nisha foi uma de minhas primeiras clientes de coaching: 30 e poucos anos, cabelos longos ondulados, sempre vestida com cores fortes, que realçavam ainda mais seu rosto bonito. Nisha era uma gerente de nível médio, responsável pela gestão de softwares em uma organização sem fins lucrativos. Era conhecida no ambiente de trabalho como uma gestora orga-nizada e discreta, boa em implementar os planos de outras pessoas.

Em nossas sessões de coaching, porém, vim a conhecer uma Nisha mui-to diferente. Ela se revelou uma aprendiz ávida, que passava boa parte do tempo livre lendo os periódicos e livros importantes relacionados à sua área de atuação. Também era criativa, cheia de ideias sobre como a or-ganização poderia se tornar mais eficaz se incorporasse as descobertas recentes do setor. Por acaso eu conhecia bem os empregadores de Nisha, e bastaram poucas reuniões com ela para eu concluir que suas sugestões sobre o futuro da empresa eram pelo menos tão avançadas e inteligen-tes quanto as do presidente e as do Conselho de Administração, se não mais. No entanto, ninguém no trabalho de Nisha sabia disso. As ideias e os talentos dela estavam ocultos. Não se manifestavam fora da cabeça e do coração dela, não ecoavam na organização.

Com frequência eu encontrava, entre minhas clientes de coaching, mi-nhas amigas e colegas, mulheres como Nisha: profissionais brilhantes, mas

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que mal conseguiam enxergar o próprio brilho, convencidas de que suas ideias precisavam ser mais bem elaboradas antes de serem postas em práti-ca, ou que – por motivos que elas mesmas desconheciam – não avançavam em direção à concretização de seus maiores sonhos e anseios. Isso me in-comodava muito, porque eu queria viver no mundo melhor, mais humano e mais esclarecido que, eu tinha certeza, aquelas mulheres seriam capazes de construir.

Elizabeth, outra cliente, era uma dinâmica ex-editora de revistas que havia adotado quatro crianças no exterior e tinha vontade de escrever so-bre suas experiências com adoção. Ela me disse: “Tara, sinto que aprendi muito sobre o que realmente é a maternidade e sobre o que é a vida. No entanto, não tem ninguém por aí falando dessas coisas. Quando olho para o mundo, é como se a questão da adoção nem existisse.”

Fiz questão de ler o blog de Elizabeth – textos que ela escreveu rapi-damente em meio a seus muitos compromissos. Eles eram fortes, e ela realmente falava sobre maternidade e amor de uma forma nova e im-portante. Minha vontade era ver o ponto de vista dela nas páginas de opiniões dos jornais ou nas estantes das livrarias. Mas, apesar das muitas conexões de Elizabeth no mercado editorial, ela estava paralisada – repri-mida por crises de insegurança, oprimida e confusa quanto às medidas práticas a tomar.

E também havia Cynthia, diretora de vendas de uma empresa de tec-nologia no Vale do Silício. Extremamente astuta e dedicada, destacava-se pela incrível capacidade de mediar conflitos. Mas Cynthia se sentia um pouco entediada no trabalho – atuava na mesma função fazia mais de uma década, sem nunca ter gostado muito, para começar. Entretanto, estava muito interessada em outra área da empresa, a exploração de uma nova linha de negócios que poderia oferecer serviços valiosos para os clientes e ter muito sucesso. Quando conversamos sobre a hipótese de ela propor à alta administração que investisse na inovação e deixasse o novo empre-endimento sob sua supervisão, Cynthia não conseguia acreditar que ela merecesse aquela oportunidade especial.

Cada uma dessas mulheres tinha o potencial de moldar suas organizações e comunidades de maneira muito mais significativa do que vinham fazen-do até então. Todas tinham talento, inteligência e conhecimento suficientes

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para concretizar o sonho que supunham inalcançável. Mas todas estavam deixando escapar um bocado de alegria, realização profissional e sucesso.

Acredito que quase todas nós somos, sob alguns aspectos, como essas mulheres – não percebemos que nossos grandes sonhos são possíveis, não enxergamos nossa capacidade e ainda não construímos carreiras tão bem--sucedidas e vibrantes quanto seria possível.

Eu me sentia pessoalmente frustrada com o que observava em minhas clientes. Nisha tinha ideias e opiniões valiosas que poderiam contribuir para o avanço de sua organização. Cynthia era o tipo de líder dedicada, ética e colaborativa de que tanto precisamos no mundo empresarial. Os textos de Elizabeth sobre adoção e maternidade narravam uma história impressionante, ainda não abordada pela maioria das discussões. Eu que-ria ver mulheres brilhantes como essas e suas ideias impactando o mun-do. Portanto, para mim, conseguir fazê-las soltar a voz era uma questão urgente tanto do ponto de vista pessoal quanto do profissional, afinal elas estavam me procurando em busca de ajuda.

• • •

Meu trabalho de coaching com elas se transformou em um laboratório de descobertas: o que possibilitaria que essas mulheres construíssem a car-reira e a vida que realmente almejavam? Sessões de coaching são a hora da verdade. Não basta dar conselhos que parecem bons; é preciso promover, junto com o cliente, a mudança que ele está buscando.

Eu precisava descobrir o que seria necessário acontecer para que Nisha se tornasse uma líder respeitada em sua organização, para que os textos de Elizabeth alcançassem pessoas além do círculo de parentes e amigos e para que Cynthia realizasse um trabalho que a enchesse de energia todos os dias.

Eu conhecia as respostas convencionais: mais confiança, bons mento-res, compromisso com as etapas para a realização dos objetivos. Mas logo aprendi que nada disso era útil de fato. Táticas e dicas – como elaborar o currículo, como se comportar nas entrevistas, como negociar, como fa-lar em público – não ajudavam muito, pois as mulheres não conseguiriam usar todos esses novos recursos se sua base interior para assumir riscos, superar medos e lidar com a insegurança ainda não tivesse sido construída.

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Auxiliar as mulheres a desenvolver relacionamentos com mentores era ineficaz, porque, sem as ferramentas para confiar nas próprias ideias e para avaliar os conselhos dos mentores, elas se perderiam em meio às opiniões alheias e se afastariam do curso que era realmente o melhor para elas.

Os recursos convencionais não eram profundos o suficiente para iden-tificar o que estava impedindo o progresso das mulheres ou do que elas precisavam para ir adiante.

O que efetivamente ajudaria as mulheres a ousar crescer seria um con-junto de conceitos e práticas capazes de mudar a maneira como se viam e o tipo de atitude que tomavam. Também incluiria uma sequência de ações – abandonar o que as fazia dar ouvidos à voz interior que levan-tava dúvidas sobre si mesmas e passar a escutar a voz da tranquilidade e da sabedoria; libertar-se do perfeccionismo e do excesso de planeja-mento e aprender uma nova maneira de tomar decisões rápidas; calar a preocupação com as opiniões alheias e focar na autorrealização. Todas essas peças se encaixariam para criar uma infraestrutura interior que impulsionaria as mulheres a avançar com ousadia rumo a seus sonhos, ao mesmo tempo superando os obstáculos internos e enfrentando me-lhor os desafios externos.

Esse conjunto de ferramentas e práticas levou diferentes mulheres a ousar em suas carreiras: mulheres jovens e mais velhas, executivas e empreende-doras novatas, profissionais no mundo dos negócios, na área social e nas artes. Depois de alguns anos atuando como coaching para mulheres, siste-matizei o trabalho que vinha realizando com minhas clientes e desenvolvi uma experiência grupal, um programa de liderança chamado Ouse crescer – Playing Big, que, desde a primeira sessão, foi alvo de comentários entu-siasmados. Hoje, mais de mil mulheres de todo o mundo já participaram do programa. Algumas aplicaram as ideias em carreiras dinâmicas e bem-su-cedidas; outras, na realização de objetivos não profissionais, como paixões criativas ou atividades de voluntariado. Sinto orgulho de, como resultado do programa, as participantes relatarem que:

• se sentem mais confiantes;• compartilham suas ideias, dúvidas e críticas com mais frequência e

coragem;

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• têm menos medo de críticas;• comunicam-se de maneira assertiva e poderosa;• são capazes de explorar com mais facilidade sua sabedoria interior;• percebem com mais nitidez que já têm tudo de que precisam para

alcançar o que querem em sua carreira;• veem-se como parte de uma rede global de mulheres que buscam em-

preender mudanças positivas;• estão ousando crescer, de acordo com o que crescer significa para elas.

Todas essas transformações interiores as levaram a implementar as mu-danças profissionais que desejavam, conquistar promoções e aumentos sala-riais, criar e desenvolver os próprios negócios e assumir funções de liderança. Elas começaram a transformar suas comunidades – e o mundo – como sem-pre sonharam. Neste livro, você terá acesso a tudo o que elas aprenderam, de modo que possa descobrir o próprio caminho e ousar crescer.

Minha história

Sob certo aspecto, este livro iniciou sua jornada mais de 20 anos atrás, quando eu tinha 15 anos. No primeiro dia de um novo ano letivo, tolerei o laboratório de química (nada podia ser mais chato que aquilo), a aula de espanhol (até que era razoável, pensei), a de álgebra (simplesmente de-testável) e, a pior, a de educação física, para chegar à Terra Prometida: a aula de inglês. Literatura, reino encantado de personagens e histórias e de poemas e grandes ideias – tudo o que eu amava.

Mal sabia eu, porém, que estava prestes a me decepcionar. O professor de inglês fez seu típico discurso do primeiro dia de aula

encostado em uma velha mesa de metal, os braços cruzados sobre a bar-riga saliente: “Este ano vamos explorar o tema ‘amadurecimento’ – a transição da infância para a idade adulta. Vamos ler histórias diversas sobre essa passagem: Um negro que quis viver, de Richard Wright, Uma ilha de paz, de John Knowles, e O senhor das moscas, de William Gol-ding. Vamos examinar os temas e desafios universais em torno desse rito de passagem.”

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De início, apenas me ocorreu que nenhum daqueles livros me empolgava muito. Não demorou para que eu descobrisse por quê. Nenhum deles era sobre o amadurecimento de uma menina. Aos 15 anos, eu sabia que me-ninas e meninos eram bem diferentes nesse aspecto. Eu ansiava por uma história que tivesse a ver comigo.

Então me dei conta de que nenhum dos livros tinha sido escrito por uma mulher. Pensei comigo mesma: ali estava aquele adulto dizendo que teríamos uma visão completa sobre amadurecimento, quando, na verda-de, estávamos apenas ouvindo vozes masculinas. E, embora ainda fosse uma adolescente, eu já sabia muito bem que isso não acontecia apenas na aula de inglês. Em muitos outros aspectos da vida, as histórias de garotos e homens eram contadas como se fossem a História.

Senti uma espécie de pontada no peito e um surto de energia. Eu sabia que precisava fazer alguma coisa em relação àquela situação. Assim, de-pois da aula, fui até a mesa do professor.

– Sr. Haverson, gostaria de fazer uma pergunta. Percebi que nenhum dos livros foi escrito por uma mulher, e nenhum deles fala do amadureci-mento de meninas. Isso parece... desigual.

– São os livros que temos. Não tenho verba para comprar outros – res-pondeu ele.

– E como podemos levantar esse dinheiro? – indaguei.Em poucos meses, formamos um comitê, levantamos alguns milhares

de dólares e conseguimos introduzir uma novidade no currículo. No ano seguinte, novos livros escritos por mulheres e apresentando protagonistas femininas passaram a ser lidos nas aulas de inglês da escola.

Esse foi o começo do que se tornou a vocação da minha vida: identificar onde não se escutam vozes femininas e fazer o possível para que as mulhe-res se manifestem e sejam ouvidas.

Depois do ensino médio, fui para a Universidade Yale e vivenciei de outras formas o modo como as vozes femininas eram ignoradas. Grandes retratos de líderes da escola adornavam as paredes, mas nenhum deles era de mulher. Os professores titulares eram, na maioria, homens, e nenhum dos livros indicados para os alunos de língua inglesa havia sido escrito por uma mulher. Sempre que alguém era convidado a fazer uma palestra para os alunos, não era alguém que se parecesse comigo. A universidade pas-

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sara a aceitar mulheres havia pouco tempo – fazia apenas 30 anos, sendo que Yale tinha mais de 300 anos de história. Elas haviam tido permissão para ingressar na instituição e participar da vida acadêmica, mas nada fora feito no sentido de adaptar a universidade para que homens e mulheres ali se desenvolvessem em igualdade de condições.

Quando me formei, associei-me a duas outras mulheres para organizar uma antologia de histórias escritas por mulheres judias sobre o Pessach, possibilitando às famílias acrescentar visões femininas a uma liturgia que – embora versasse sobre liberdade e opressão – tradicionalmente não in-cluía vozes femininas.

Poucos anos depois, decidi fazer um MBA. Estava ansiosa por apren-der a usar as ferramentas que promovem o crescimento expressivo de or-ganizações movidas pelo espírito de missão. A Stanford Business School criou condições para que eu alcançasse esse objetivo. Foi como um curso intensivo sobre a cultura em torno das mulheres no mundo empresarial – um ambiente que, com muita frequência, parece o de uma confraria. Tanto em Yale quanto em Stanford, percebi com muita nitidez que não basta que instituições criadas por homens e para homens abram suas portas para mulheres. É preciso mudar muito mais – as normas, as práti-cas e a face de sua liderança – para que se crie um lugar onde as mulheres realmente tenham condições de alcançar o sucesso.

Em todas essas experiências, eu me vi ansiando por um contexto mol-dado de maneira mais igualitária por homens e mulheres. E ainda havia um segundo tipo de mudança que eu também queria ver: que todo o co-nhecimento sobre o mundo exterior que essas instituições tinham a ofe-recer se integrasse com a compreensão sobre nossa vida interior, com a realidade interna que moldava os eventos externos.

• • •

Tive uma infância incomum. Só aos 7 anos descobri que nem todas as crianças analisavam seus sonhos todas as manhãs na mesa do café, com a mãe e o pai, desenhando os arquétipos em um bloco de papel amarelo, ao lado da tigela de mingau de aveia. Quando eu chegava em casa com uma queixa do tipo “Johnny implicou comigo no recreio”, geralmente a

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resposta que eu ouvia era: “O que você acha que está acontecendo na casa de Johnny que o leva a implicar com as outras crianças?”

Meus pais não eram psicoterapeutas, nem fanáticos religiosos, nem mesmo hippies. Eram pessoas comuns, que acreditavam que a compre-ensão de si mesmo e do próximo é essencial para uma vida feliz. Desde a mais tenra idade, fui encorajada a aprender sobre psicologia e espi-ritualidade de tradições orientais e ocidentais, e a aplicar ferramentas de ambas as áreas à vida cotidiana. Nossa casa era repleta de livros sobre esses temas e cresci sob a influência dessas leituras. Na adolescência, participa-va de retiros espirituais e passeava pela seção de psicologia das livrarias nas horas vagas. Praticava meditação, escrevia diários e fazia terapia para tentar sobreviver à tempestade da adolescência – e todas essas coisas me ajudaram de verdade.

De muitas maneiras, meus pais me ensinaram que os acontecimentos da vida interior moldam a realidade externa. Em casa, ensinavam-me que todos os seres humanos eram criaturas milagrosas de Deus, mas, na escola, as crianças eram categorizadas, tendo as turmas dos “gênios” e, consequentemente, as daqueles “nem tanto”. Em casa, eu aprendia que a vida interior das pessoas e suas motivações inconscientes norteiam seu comportamento, mas nas aulas sobre presidentes e primeiros-ministros os professores nunca se referiam à vida interior dos grandes líderes. Eu não compreendia por que, na escola, não falávamos sobre como a infân-cia de Lincoln impactara suas decisões nem por que jamais discutíamos a dinâmica psicológica subjacente que provocava a escalada das guerras.

Durante toda a infância, eu com frequência sentia que estava vivendo em dois mundos, tendo um pé em cada um deles. Um desses mundos era o do raciocínio; o outro, o das emoções. Um era o do conhecimento; o outro, o da intuição. Um era o do que vemos, ouvimos e tocamos; o outro, o da vida interior que criava aquela realidade tangível.

Ao tentar entrelaçar esses dois mundos, eu me movia entre o que hoje denomino “ocasiões de ousar muito” e “ocasiões de ousar pouco”. Du-rante alguns períodos, eu conseguia me lembrar do que realmente amava – literatura, artes, espiritualidade, empreendedorismo, criatividade, em-poderamento das mulheres e participação comunitária – e era capaz de construir uma vida em torno dessas questões. Ao longo de muitos anos,

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porém, vivi alheia a tudo isso. Minha educação contribuiu para o desen-volvimento de meu intelecto, mas a artista em mim se perdeu pelo caminho e eu negligenciei minha vida espiritual. Tornei-me um pouco descrente em relação ao crescimento interior, orientando-me pela cultura acadêmica ao meu redor, em vez de voltar-me para dentro de mim, para o que eu sabia ser verdadeiro. Pior de tudo: desenvolvi algumas habilidades extraordiná-rias de “raciocínio crítico”, mas as apliquei aos meus próprios sonhos para o futuro, bancando a cética, em vez de atuar como minha aliada.

Com 30 e poucos anos, comecei a sentir um desligamento de mim mes-ma que era doloroso demais para que eu o ignorasse, e iniciei um processo de mudanças importantes em minha vida, com o intuito de que ela cor-respondesse às minhas verdadeiras aspirações, tanto em termos pessoais quanto profissionais. Também passei a examinar com a devida atenção minhas inseguranças e autocríticas, em busca de um caminho mais con-fiável pelo mundo. Mais tarde, vim a aplicar muitas das ferramentas que me ajudaram nessa época às atividades de coaching e em meus programas de liderança para mulheres – recursos que incluo agora neste livro.

Ajudando as mulheres a ousar mais

Depois do MBA, fui trabalhar numa grande fundação com 2 bilhões de dó-lares em ativos. Uma das coisas que eu adorava naquela organização – e uma das razões que me levaram a trabalhar lá – foi o grande número de mu-lheres em cargos de liderança. Quase todas as áreas eram dirigidas por uma mulher talentosa e competente. A função mais alta na hierarquia, porém, a de presidente, sempre fora exercida por homens nos 100 anos de existência da instituição.

Enquanto eu estava lá, um novo presidente tomou posse. Era um jo-vem que não tinha experiência em gestão de grandes organizações, mas com bastante talento, carisma e potencial. Nos meses seguintes, a equi-pe recém-empossada lançou com rapidez grandes iniciativas inovadoras, sem muitas pesquisas, testes ou planejamento, e a elas destinou enormes investimentos. As altas executivas que aos poucos vinham escalando a hierarquia, adquirindo mais experiência, foram desautorizadas em suas

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diretrizes e relegadas nas promoções. Em mais de uma ocasião ouvi aque-les executivos ridicularizando as mais diligentes dessas gestoras, como mulheres sem vida pessoal, e tachando de “difíceis” as mais resistentes às decisões deles.

Eu observava perplexa os homens movimentarem grandes somas de dinheiro e verem seus projetos executados – embora não os tivessem ana-lisado muito a fundo – enquanto as mulheres altamente qualificadas, com ideias importantes a compartilhar, ficavam à margem, não só porque não eram ouvidas, mas também porque suas ideias não eram consideradas prontas para execução.

Tendo crescido nos anos 1980 e 1990, eu aprendera que as mulheres agora desfrutavam de igualdade de oportunidades no trabalho, que jovens como eu não tinham com que se preocupar, que, se alguma coisa ainda se interpunha no progresso profissional das mulheres, era só a tensão ine-vitável entre trabalho e família. No entanto, o que via acontecer no meu ambiente profissional era algo inteiramente diferente – algo que tinha a ver com poder, preconceitos, confiança e disposição para correr riscos.

Ao conversar com amigas sobre o que estava havendo em minha orga-nização, ouvi histórias semelhantes sobre o ambiente de trabalho delas: narrativas sobre líderes carismáticos no comando, homens que toma-vam decisões corajosas mas, não raro, apressadas. As empresas em que trabalhavam também estavam repletas de mulheres talentosas e com-petentes, como suplentes de titulares importantes e em outras funções do alto escalão. Essas mulheres trabalhavam mais horas, eram mais de-talhistas e tinham mais experiência e conhecimento. Mesmo assim, não ocupavam os cargos mais altos, seja porque eram preteridas nas promo-ções, seja porque não expunham ideias ousadas nem propunham grandes projetos. Os empregadores exploravam a forte ética de trabalho de que estavam imbuídas, mas não aproveitavam o seu brilho – suas ideias, in-sights e habilidades singulares.

Embora eu adorasse muitos aspectos do meu trabalho em filantropia – meus colegas, as aplicações sociais dos conhecimentos adquiridos no MBA, as interações com filantropos inspiradores –, comecei a sentir, de-pois de alguns anos, que aquilo não era o que eu queria fazer a longo prazo. Percebi que muitos de meus sonhos de carreira – realizar algo altamente

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criativo, empreendedor e no campo do crescimento pessoal – ficaram so-terrados na época da faculdade e da pós-graduação.

Em Stanford, eu havia atuado na área de coaching e ficara fascinada. Era uma maneira de trabalhar com a vida interior das pessoas, mas com foco na ação e no impacto. Era isso que eu buscava. Recebi treinamento como coach e também criei um blog sobre crescimento pessoal. Durante uns dois anos, minha vida consistia em acordar às cinco, escrever posts para o blog, pegar o trem, trabalhar na fundação durante todo o dia, e, então, por volta das 18 horas, ir para o escritório que eu tinha alugado a fim de atender clientes de coaching.

Foi mais ou menos nessa época que passei a conhecer várias mulheres brilhantes que ousavam pouco. Primeiro as descobri entre minhas clien-tes; pessoas como Nisha, Elizabeth e Cynthia. Também as identifiquei en-tre as minhas amigas. Num sábado, enquanto caminhava com três delas, fiquei ouvindo Jessa falar sobre o que achava que precisava ser feito para corrigir os problemas que via na escola dos filhos. Também escutei os co-mentários de Britt sobre algumas práticas questionáveis na empresa em que trabalhava. Vibrei com a história de Abby sobre um jogo que criara para os sobrinhos, no intuito de ajudá-los a aprender sobre a história da família. E observei com atenção enquanto todo o grupo compartilhava esperanças e desesperanças sobre as notícias da semana. Quanto mais as ouvia, mais me surpreendia com a inteligência, as ideias e o caráter delas – a preocupação sincera com os outros e o compromisso de fazer a coisa certa. Fiquei pensando: esse é o tipo de gente que deveria exercer funções de liderança: mulheres e homens trabalhadores, sábios e éticos, que real-mente se importam com o próximo.

Então disse a elas que gostaria que Jessa entrasse para o conselho esco-lar, que Britt assumisse uma posição de liderança na empresa, que Abby escrevesse um livro sobre o papel dos pais na formação dos filhos. Elas riram. As três se viam como amadoras, não como pessoas cujas ideias es-tavam prontas para um palco maior.

Foi nesse momento que um pensamento me ocorreu: naquela manhã de sábado, em todo o país, havia milhares de grupos como o nosso – mulheres conversando sobre o que achavam errado na situação atual, sobre o que era necessário fazer, mulheres compartilhando opiniões sobre como as coisas

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poderiam ser. Essas ideias e críticas estavam sendo deixadas à margem, ouvidas apenas em conversas particulares entre amigas. Voos da imagina-ção, questionamentos, propostas importantes e sugestões de mudança não estavam chegando a um espaço mais amplo onde poderiam ser ouvidos e onde se faziam desesperadamente necessários.

Evidentemente, eu estava muito ligada a esse fenômeno de mulheres que ousavam pouco porque eu também lutava contra o mesmo problema. O apoio, a educação e o sucesso que, de alguma maneira, eu desfrutara não tinham aumentado minha autoconfiança, não me haviam impulsio-nado na busca pelos meus sonhos. Em vez disso, eu me sentia imobilizada pela sensação de fracasso e inibida pela impressão de não ser competen-te o bastante. Como consequência, eu não estava fazendo o trabalho que tanto almejava. Ao longo dos anos, eu observara, em sucessivas ocasiões, como a voz das mulheres era pouco ouvida no mundo, e, agora, percebia o lado de dentro dessa dinâmica – o que levava as mulheres, inclusive eu mesma, a sufocar as próprias ideias e opiniões.

• • •

Depois de alguns anos de malabarismo com o coaching em tempo par-cial e o emprego em tempo integral, resolvi deixar a fundação. Meu blog, que começara com 38 assinantes amigas e parentes, agora contava com um público de alguns milhares de mulheres. Comecei a pensar em esten-der meu trabalho de coaching a esse público mais amplo. Eu queria desco-brir que tipos de seminários ou cursos seriam mais úteis. Assim, em uma pesquisa, perguntei: “Qual é o maior desafio na sua vida?”

Ofereci-lhes uma vasta lista de escolhas, um amplo rol das dificulda-des às quais sempre nos referimos, que parecem cada vez maiores para as mulheres contemporâneas: equilíbrio entre vida pessoal e profissional, estresse, falta de tempo, problemas financeiros, questões de saúde, relacio-namentos. Mas, então, com base no que eu percebia nas clientes, nas ami-gas e em mim mesma, acrescentei mais um desafio à lista: “Estou ousando pouco.”

Quando recebi as respostas à pesquisa, constatei que a opção “Estou ou-sando pouco” foi a que a maioria das mulheres considerava seu principal

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problema – sim, mais do que equilíbrio entre vida pessoal e profissional, estresse ou relacionamentos. Havia, realmente, um fenômeno mais am-plo, que refletia o que eu estava observando: mulheres brilhantes e cheias de potencial ousavam pouco, e elas tinham consciência dessa realidade e estavam insatisfeitas com a situação. Na verdade, muitas consideravam que ousar mais era o principal desafio de sua vida.

Em certo sentido, o que estou fazendo agora é o mesmo que fiz naquele dia na escola, quando resolvi mudar o currículo do curso de língua in-glesa. Estou trabalhando para dar ressonância à voz das mulheres onde elas não são ouvidas, pois acredito que essas vozes contribuirão para um mundo melhor.

Sobre fazer o trabalho interior

Em 2013, fui convidada a participar de um programa de televisão matu-tino. Menos de 10 minutos antes de eu entrar no ar, a produtora surgiu na sala. “Aqui está a apresentação que as âncoras farão de você”, disse. E me mostrou uma folha de papel com o seguinte texto: “Estudos re-centes mostram que, embora as mulheres representem mais de 51% dos gestores de nível médio nos Estados Unidos, elas são apenas 4% dos CEOs que aparecem na revista Fortune 500. Nossa próxima convidada afirma que as únicas culpadas somos nós mesmas... Para ela, as mulhe-res tendem a tomar atitudes que comprometem nossa imagem e nosso trabalho. Bem-vinda, Tara Sophia Mohr!”

Opa!Em nenhum momento do dia eu estaria disposta a enfrentar a produto-

ra, muito menos àquela hora da manhã, minutos antes de entrar no ar ao vivo, nervosa e cansada. Apesar de tudo, ouvi minha voz interior dizendo: Eu não vou ser apresentada assim.

Como se tratava de um programa de notícias, tentei apelar para a exatidão. – Ah, acho que você vai querer mudar isso, pois não é uma informação

precisa – sugeri, em tom casual. – Eu nunca afirmei que as mulheres são as únicas culpadas por essas estatísticas, porque muitos fatores externos, como a discriminação, explicam esses números.

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– Ah, ok... – respondeu ela, relutante. – Posso pedir ao produtor execu-tivo que mude isso, mas duvido...

Eu pude ver que, se quisesse alterar a apresentação nos 10 minutos se-guintes, precisaria propor uma solução fácil.

– Que tal se mudássemos para “Nossa próxima convidada, Tara Sophia Mohr, afirma que as mulheres podem fazer algo para mudar esses núme-ros”? – sugeri.

– Hum, vou verificar – respondeu ela. E eles mudaram. A apresentação inicial que a produtora me mostrou refletia perfeita-

mente nossa confusão coletiva sobre a questão de barreiras “externas” versus “internas” ao progresso profissional das mulheres. Em geral, nos-sa cultura divide o desafio em duas categorias: injustas barreiras externas ao progresso profissional de que as mulheres são vítimas (discriminação, preconceitos, políticas públicas ruins em relação a trabalho-família, desi-gualdade salarial) e barreiras internas psicológicas que as mulheres “im-põem a si mesmas” e das quais elas são culpadas. Segue-se um debate um tanto ridículo: “Quais são as mais importantes: as barreiras internas ou as externas? Isso tudo é responsabilidade das mulheres ou não é ‘culpa de-las’?” A dedução da produtora era que, se estávamos falando sobre o que as mulheres fazem para sabotar a si mesmas, “a culpa é das mulheres”. Era “escolha delas”.

Minha visão é diferente. Séculos de exclusão da vida política, pública e profissional produziram muitos efeitos nas mulheres. Alguns deles fo-ram externos: legislação, políticas formais, desigualdades salariais, falta de proteções jurídicas e negação dos direitos fundamentais das mulheres. A desigualdade entre homens e mulheres, porém, também gerou efeitos in-ternos em nós. Ao longo de gerações, moldou nossas ideias a respeito de nós mesmas e a visão do que consideramos possível na vida e no trabalho. Também forjou nossos medos – medo de expressar opiniões, de mudar as coisas, de aborrecer os outros. Levou as mulheres a desenvolver nume-rosos comportamentos que as tornaram aptas a sobreviver em ambientes onde não tinham respaldo jurídico, financeiro ou político – comporta-mentos como: evitar conflitos, autocensurar-se, agradar aos outros e ado-tar um discurso e uma atitude não assertivos.

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Embora tenhamos realizado muito coletivamente, sobretudo nos últimos 40 anos, para eliminar as barreiras externas ao empoderamento das mulhe-res, não atacamos com a mesma energia o legado interno da desigualdade nem nos empenhamos com tal entusiasmo em mudar essa herança.

As ferramentas que você irá adquirir neste livro se destinam a ajudá-la a ousar crescer da maneira como você mais deseja; no entanto, em um nível mais profundo, elas são meios para desaprender as lições que séculos de marginalização das mulheres incutiram em cada uma de nós.

Sobre o livro

As pessoas costumam me perguntar: “Qual é a origem do material do seu curso Ouse crescer – Playing Big?” Trata-se de um produto híbrido. Parte dele é oriundo do meu MBA. Outra parte provém de 20 anos de aprendi-zado sobre psicologia e crescimento pessoal. Há uma parte que se inspira na sabedoria dos textos espirituais que li na adolescência e na juventude. Outra se baseia ainda nas lições que aprendi em minha jornada pessoal. E, evidentemente, boa parte resulta do que assimilei trabalhando com mulhe-res para ajudá-las a ousar mais.

O que muitas vezes parecia uma cisão desarticulada em minha infância entre coração e mente, intuição e raciocínio, lado direito e esquerdo do cé-rebro, tornou-se um todo, integrado e único, que orienta o meu trabalho. Em mim convivem a pesquisadora acadêmica e a desbravadora espiritual. Uma de minhas facetas ama o rigor intelectual e a outra adora a poesia. Nestas páginas, portanto, você aprenderá recursos tão pragmáticos quan-to técnicas de negociação baseadas em pesquisas e tão idealistas quanto ensinamentos espirituais de 2 mil anos sobre o medo. Adoto essas duas abordagens porque elas se completam.

Começaremos falando sobre os obstáculos mais fundamentais que im-pedem as mulheres de ousar crescer. É a voz da insegurança e da autocrí-tica, que repete o tempo todo “Isso não é para mim” – a voz interior que sempre a considera incapaz de liderar, de escrever um livro, de assumir atribuições mais complexas, de se manifestar nas reuniões. É a mesma voz que lhe assegura que você não é suficientemente qualificada, suficien-

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temente inteligente, suficientemente experiente, suficientemente boa em nada... para ousar crescer. Sei que você conhece essa voz e que provavel-mente tem alguma noção de como a dúvida a respeito de si mesma a tem limitado em seu trabalho e em sua vida pessoal.

No Capítulo 1, você aprenderá o que fazer ao sentir-se insegura e ex-cessivamente autocrítica, de modo que pensamentos não mais retardem o seu progresso. Adoro ensinar isso às mulheres porque, na verdade, é relativamente fácil mudar a maneira como lidamos com a insegurança – basta conhecer bem nossa “censora interior” e ter à mão as ferramentas adequadas no momento em que ela entra em cena.

Quando você deixa de dar ouvidos à censora interior, tem a oportunidade de escutar outra voz muito diferente dentro de si. Depois de trabalhar com milhares de mulheres e de ajudá-las a ousar mais, descobri o seguinte: to-das têm, no íntimo, uma sabedoria profunda, infalível. Ao deparar com um dilema, o seu lado sábio identifica qual o passo certo a dar. Quando você se sente confusa, esse lado sábio vê as coisas com clareza. Quando um proble-ma parece complexo e opressivo, seu lado sábio tem uma resposta simples e elegante. Denomino essa essência de “mentora interior”, porque ela atua como uma conselheira e orientadora na própria mente – e, portanto, está à sua disposição o tempo todo. No Capítulo 2, você aprenderá a acessar e a seguir as diretrizes dessa outra face de si mesma.

Aprender a ouvir a mentora interior, em vez da censora interior, é a primeira grande iniciativa para ousar crescer. Ousar mais não é trabalhar mais, se esforçar mais ou ganhar confiança. É ouvir seu lado mais poderoso e seguro, não a voz da dúvida.

Tratamos, em seguida, dos outros obstáculos que com frequência im-pedem as mulheres de ousar mais. O primeiro: medo. Quer seja medo do fracasso, de se destacar na multidão, do conflito ou de maior visibilidade, os medos impedem a maioria das mulheres de expressar opiniões e ideias. Nem todos os medos, porém, são problemáticos. No Capítulo 3, analisa-remos dois tipos de medo. Um deles nos mantém ousando pouco; outro é um ingrediente essencial para ousarmos crescer. Nossa tarefa é superar o tipo de medo restritivo e cultivar o tipo positivo. Você aprenderá a distin-gui-los e o que fazer ao deparar com um ou com outro.

Em seguida, no Capítulo 4, voltamos a atenção para as maneiras de nos

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libertarmos do jugo do elogio e da crítica. Apegar-se ao elogio e esquivar--se à crítica são atitudes que nos impedem de realizar um trabalho inova-dor e – em termos mais simples – de seguir os caminhos que nos atraem, para os quais temos vocação, não importa se as pessoas à nossa volta apro-vam ou não. E as mulheres poderosas com frequência enfrentam críti-cas hostis, razão por que é necessário aprender a recebê-las, em vez de se sentir paralisada pelos comentários negativos. Também é indispensável saber interpretar o feedback – as informações que recebemos sobre nos-so desempenho –, para nos sentirmos motivadas, em vez de magoadas e imobilizadas.

Analisamos, em seguida, o que aprendemos na escola e como esses ensinamentos podem se interpor no caminho e nos impedir de ousar crescer. No meu trabalho com mulheres, comecei a notar um fenôme-no surpreendente. Eu esperava que as alunas excelentes também fossem excelentes profissionalmente. Afinal, a escola – sobretudo a graduação e a pós-graduação – não é uma preparação para o mundo do trabalho? No entanto, muitas vezes vi mulheres que brilharam na escola darem de cara em muros construídos por elas próprias na carreira. Ao sondar com mais profundidade, compreendi que essas estrelas do passado enfren-tavam dificuldades porque a escola promove e recompensa determina-da maneira de trabalhar que não só pouco contribui para que ousemos crescer, mas também, muitas vezes, atrapalha esse processo. O Capítulo 5 é sobre como deixar para trás os hábitos de boa aluna, para os quais fo-mos condicionadas durante os muitos anos de estudo e que precisamos desaprender na vida adulta.

Na segunda metade do livro, partimos para a ação. Analiso algumas das maneiras mais comuns por que estagnamos e ousamos pouco, ocultando nosso próprio brilho. Em geral, ao lerem sobre essas estratégias de oculta-ção, as mulheres se espantam ao reconhecerem como, inconscientemente, vinham evitando e adiando ousar crescer. Ao descobrir quais está utili-zando, você não poderá reincidir no erro, pois já as terá iluminado com a luz da conscientização.

O antídoto contra toda essa paralisia e reserva é um tipo especial de ação que denomino salto. Um salto é um ato imediato, experimental e simples – o oposto exato da ação perfeccionista, planejada e refletida

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demais com que muitas mulheres brilhantes se sentem mais à vontade. Um salto a leva a ousar muito mais, imediatamente.

Em seguida nos voltamos para a maneira como nos apresentamos por meio de nossas habilidades de comunicação. Sempre que mostro as formas sutis pelas quais nos sabotamos com as palavras, recebo uma reação em massa de mulheres afirmando: “Eu não percebia que isso passava uma imagem de pouca força, mas, agora, para mim, está muito claro!” Mudar os hábitos de comunicação prejudiciais produz efeitos incríveis para que você seja vista como a mulher inteligente e forte que realmente é. Esse esforço de mudança até pode ser divertido, sobretudo quando praticado com uma amiga ou colega. O Capítulo 8 mostra como modificar a maneira de falar e de escrever que compromete sua comunicação e adotar um estilo que transmita confiança, competência e entusiasmo.

No capítulo seguinte, falaremos sobre vocações. Cada uma de nós tem as próprias vocações. Vocação é o impulso que você sente para cuidar de certas necessidades no mundo. Por exemplo, você talvez tenha certo an-seio de entrar na política, ou de ensinar ioga a adolescentes, ou de traba-lhar como voluntária com veteranos de guerra. Ou talvez se veja impelida a mudar de carreira ou a lançar certa iniciativa na empresa. Todas temos vocações, mas, quase sempre, ousamos pouco, ignorando-as ou negando--as. Um dos requisitos mais importantes e realizadores de ousar crescer é deixar de resistir e passar a seguir as vocações.

No último capítulo, discutiremos como sustentar a decisão de ousar cres-cer. Todas já passamos pela experiência de perseguir com gosto um objeti-vo durante algum tempo, achando que a autodisciplina será suficiente para alcançá-lo, mas logo constatando que não demora para que a motivação de-sapareça. Acabamos decepcionadas com nós mesmas e desistimos da ação. Esse capítulo explora uma maneira muito diferente de manter a motivação e alcançar grandes resultados, baseada no cuidado de si mesma.

E, finalmente, na conclusão, vamos falar sobre o panorama geral, a jornada à nossa frente e o que é, para mim, a mudança mais importante que empreendemos quando deixamos de ousar pouco e passamos a ousar crescer: não só conquistar o sucesso nos sistemas existentes, mas também transformá-los para melhor – tornando-os mais humanos, justos, seguros e solidários.

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Ao fim de cada capítulo, você terá a oportunidade de aplicar as ideias à própria vida, por meio de exercícios e de um diário. Como sei que você é ocupada, saiba que os exercícios não duram mais do que alguns minutos; eles apenas lhe fornecem uma nova maneira de considerar e enfrentar os desafios que cruzam o seu caminho.

O diário é uma boa ferramenta para ousar mais porque a mudança co-meça com a autoconsciência. Ao escrever, você se dá conta do que está realmente pensando e realmente sentindo. Muitas vezes descambamos para ruminações e preocupações inúteis quando apenas refletimos sobre um tópico; quando, porém, organizamos as ideias para colocá-las no pa-pel, sistematizamos e impulsionamos o raciocínio. Novos insights emer-gem em três, cinco ou dez minutos, durante o ato de escrever.

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Este livro é para mulheres brilhantes como você. Eu o escrevi para que você avance na busca de suas vocações, quaisquer que sejam, expressando e realizando seus maiores dons. Também o escrevi porque estou cansada de conhecer mulheres com mensagens importantes a transmitir mas cuja insegurança as impede de manifestarem-se. Estou farta de encontrar mu-lheres iludidas pelo mito de que precisam ser mais alguma coisa – mais qualificadas, mais preparadas, mais especializadas – do que são para ex-por suas ideias. Escrevi por lealdade às artes ainda a serem produzidas, às empresas a serem fundadas, aos artigos e livros a serem escritos, às críticas a serem manifestadas. Escrevi porque todas essas expressões de bondade, de criatividade e de beleza ainda estão em aberto. Escrevi este livro porque quero que nosso mundo seja transformado por você.

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C A P Í T U L O 1

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A censora interior

Almocei recentemente com uma colega minha que é coach para exe-cutivos e consultora de negócios. Ela já trabalhou nas mais presti-

giosas empresas de consultoria e mantém uma extensa lista de clientes que consideram seus conselhos indispensáveis. Durante nosso encontro, ela me explicou que queria falar mais em público, compartilhar com audiências muito mais amplas as ideias que desenvolvera na prática de consultoria. Parecia ansiosa e pronta para começar, apenas incerta quanto às medidas práticas a tomar.

Então me ofereci para apresentá-la a alguns agentes, que, em minha opinião, adorariam trabalhar com ela e poderiam ajudá-la a entrar nesse novo campo de atividade, agendando suas primeiras palestras e conferên-cias. De repente, ela começou a falar que ainda precisava passar uns meses dirigindo-se a pequenos públicos, se “aprimorando”. E a partir daí desen-rolou-se outra narrativa, sobre como ela não estava de fato preparada para dirigir-se a um grande público. No entanto, tendo assistido recentemente a um vídeo de uma de suas palestras, eu sabia que esse não era o caso.

Eu já havia escutado esse tipo de desculpa de centenas de mulheres. Era “a voz do ‘não é para mim’” – o palavrório interno que diz à mulher que ela não está pronta para liderar, não é suficientemente especializada, não é boa o bastante nisso ou naquilo. É a voz da dúvida em relação a si mesma, da censora interior. Começaremos nossa jornada aqui, por ser esse o fator que impede a maioria das mulheres de ousar crescer.

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De um jeito ou de outro, todas as mulheres lutam contra essa voz que levanta dúvidas sobre si mesma. Para algumas, ela é mais alta em relação à vida profissional. Para outras, os questionamentos giram em torno prin-cipalmente da competência como mães e parceiras. Também há casos em que o clamor é mais ruidoso quanto à aparência, à imagem corporal e ao envelhecimento. E não faltam aquelas que se debatem sobretudo no campo dos sonhos criativos – compor música, pintar ou escrever. Estamos tão acostumadas a conviver com essa voz que a maioria de nós não imagina que possa ser diferente. Ela se tornou o ruído de fundo com que vivemos. Como as mulheres não conversam entre si sobre as coisas mais cruéis que dizem a si mesmas, não ouvimos os contra-argumentos nem recebemos ou oferecemos apoio, e não sabemos que as outras mulheres, inclusive as que admiramos por parecerem tão autoconfiantes, ouvem na mente as mesmas vozes ásperas e irracionais.

Os custos da insegurança das mulheres são enormes. Pense em todas as ideias não apresentadas, em todos os empreendimentos não iniciados, em todas as dúvidas importantes não levantadas, em todos os talentos des-perdiçados. Pense em todo o potencial não realizado, em todas as alegrias não experimentadas, porque a insegurança nos impede de aproveitar as oportunidades que nos trariam essa felicidade e realização. Essa é a má notícia em relação à insegurança das mulheres: quanto ela se encontra disseminada e quanto já se perdeu por sua causa.

No entanto, há também boas notícias relacionadas a essa insegurança – só que menos conhecidas: embora as “questões de confiança” pareçam complexas e difíceis de tratar, não precisa ser assim. Não é necessário en-contrar a fonte mágica da autoconfiança, nem escavar em profundidade as feridas da infância para trazer à tona as raízes da insegurança, ou descobrir como expulsar para sempre da mente a voz crítica que tanto a aflige. Em vez disso, basta simplesmente aprender a conviver com a insegurança sem se deixar paralisar por ela; ouvi-la mas não se submeter a seus comandos. A melhor notícia de todas? Você pode aprender a agir assim bem rápido, usando ferramentas simples que conhecerá neste capítulo.

Pelo fato de a insegurança ser tão destrutiva quando não combatida, po-rém tão manejável uma vez que se conheçam essas ferramentas, tornei-me obcecada em fazer com que todas as mulheres do planeta recebam o que

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chamo de Curso Básico Sobre a Censora Interior. Você fará esse curso nas páginas seguintes. Acredito que a capacidade de enfrentar com eficácia a insegurança é uma competência fundamental e indispensável na vida, ain-da mais importante que dirigir ou cozinhar. Imagine como o mundo seria diferente se todas as meninas aprendessem a identificar e a silenciar sua voz interior, se não fossem bloqueadas pela insegurança ao atravessar os anos turbulentos da adolescência rumo à idade adulta. Imagine como sua vida te-ria sido diferente se lhe tivessem ensinado o quê e o porquê dessa voz crítica que não se cala em seu interior e você tivesse aprendido a empregar algu-mas técnicas para que ela não interferisse em seu caminho. Neste capítulo, você receberá esse treinamento, para ajudar a si mesma e para transmiti-lo a outras pessoas. Mais importante: você aprenderá o que fazer para que a insegurança não mais a impeça de ousar crescer.

O que é a censora interior?

Quando me refiro à censora interior ou à ladainha do “Isso não é para mim”, estou falando da voz em nossa mente que apresenta as onze características a seguir. Você provavelmente não perceberá todas as onze em tudo o que a voz da insegurança lhe diz, mas pelo menos algumas estarão presentes.

1. Dura, rude, má. Ao escutar uma voz em sua mente dizendo-lhe coi-sas duras que você jamais diria a alguém que ama, você está ouvindo a censora interior.

2. Binária. O pensamento da censora interior é binário: preto ou bran-co. Ou você é admirável ou é detestável. É maravilhosa ou é pavoro-sa. É uma amiga incrível ou é péssima com as pessoas. Seus sonhos são possíveis ou impossíveis. Ao manifestar-se, a censora interior não costuma admitir o meio-termo.

3. Racional, só na aparência. A censora interior parece ser realista, agir com eficácia e defender seus mais legítimos interesses. Por exem-plo: “Se continuar escrevendo o livro, vai arruinar sua reputação. Seu trabalho ainda não está pronto para uma análise tão rigorosa. É melhor esperar um pouco.” Ou: “É melhor estudar as teorias e os

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métodos de outro profissional para esse tipo de consultoria, antes de tentar conquistar clientes. As pessoas não levarão você a sério se não se basear em métodos bem conhecidos. Suas ideias não bastam.”

4. A voz do “Você ainda não está pronta”. A censora interior frequen-temente se manifesta desta forma: “Você ainda não está pronta”, “Deve fazer outra pós-graduação”, “Precisa de mais tempo para se preparar”, “Você ainda é pouco experiente”.

5. A voz do “Você não é boa em matemática/negociação/tecnologia”. Para muitas mulheres, a voz da insegurança se manifesta com mais intensidade em relação às habilidades e atividades associadas à mas-culinidade em nossa cultura. Aí se incluem habilidades em cálculos, negociação, tarefas técnicas, questões financeiras e, infelizmente, às vezes até a liderança em termos mais amplos.

6. A voz do perfeccionismo físico. Outra manifestação comum dessa voz são pensamentos autocríticos em relação a corpo, peso, aparên-cia ou idade. “Você não é mais atraente!”, “Ah, meu Deus, olha es-ses braços flácidos!”, “Você parece gorda com esta roupa!”, “Precisa perder 5 quilos com urgência!”.

7. A gravação. A voz da censora interior com frequência parece uma mensagem gravada que se repete automaticamente em sua cabeça, e não pensamentos que você gera de forma consciente. Às vezes essa gravação depreciativa invade e interrompe o seu raciocínio.

8. Um disco arranhado. A censora interior aparecerá com uma men-sagem nova de tempos em tempos, mas em geral requenta as mes-mas histórias que repete para você há décadas.

9. Irracional, mas persistente. Geralmente sabemos que o que a voz depreciativa diz em nossa cabeça é irracional, mas, mesmo assim, ela ainda nos influencia.

10. O golpe duplo. O ataque da censora interior consiste no seguin-te: primeiro, ela começa a murmurar no seu ouvido que todos na sala são mais competentes que você. Em seguida diz: “Tome uma atitude, faça alguma coisa!” Ou: “Qual é o seu problema? As outras pessoas estão relaxadas e confiantes... Olhe só a Susan...” Em outras palavras, a censora primeiro a ataca com pensamentos críticos, de-pois a envergonha por ter esses pensamentos.

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11. A censora interior pode inspirar-se em críticos da vida real. Tal-vez você escute ecos de um pai, um irmão ou um chefe na voz da censora interior. Ou perceba ressonâncias de importantes forças culturais, como sua religião, empresa ou país. Nossos críticos exter-nos passam a atuar em nossa própria mente.

A censora interior versus a pensadora realista

Com frequência mulheres me dizem: “Mas há coisas para as quais real-mente não sou qualificada, em que não sou boa. Como saber se estou ou-vindo a censora interior ou sendo realista?” Essa é de fato uma pergunta importante porque, evidentemente, não estamos prontas para tudo, e to-das temos deficiências em algumas áreas. Além de usar a lista das onze características da censora interior para identificá-la, veja a seguir como distinguir entre a censora interior irracional e a pensadora realista sensata.

Censora interior Pensadora realista

Faz afirmações categóricas sobre a situação

Faz perguntas amplas sobre a situação

Não se interessa pelos fatos objetivos

Interessa-se pelos fatos objetivos para chegar a conclusões esclarecidas

Pensa e fala em termos de “preto ou branco”

Enfrenta a complexidade e aceita o meio-termo

Levanta questões binárias do tipo sim/não (“É possível? Sim ou não? Sou qualificado? Sim ou não?”)

Levanta questões abertas e elucidativas (“Como seria possível? O que seria viável?”)

É repetitiva Foca no próximo passo

Concentra-se em problemas ou lacunas Busca soluções

Fala em tom ansioso Fala em tom tranquilo

Assume posições radicais de auto-condenação

Assume posições conciliatórias de autoconstrução

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A pensadora realista dentro de nós se preocupa com o próximo passo, anda para a frente. Procura soluções. A censora interior dá voltas e voltas, ruminando sobre os riscos e os piores cenários. Fala em tom ansioso e com grande carga emocional. A pensadora realista se manifesta com base em fatos objetivos, com clareza e tranquilidade. Muitas de nós acredita-mos que o “pensamento realista” é cético, se não pessimista, mas, na ver-dade, o pensamento realista é inquisitivo, explorador e altamente criativo.

Durante duas décadas, Claire trabalhou em empresas de varejo, sempre acalentando o desejo de abrir o próprio negócio. Quando contemplava esse sonho, ouvia uma torrente de pensamentos do tipo:

“Eu adoraria abrir um negócio de varejo. Iria gostar da independência e do desafio. Sinto que nasci para fazer isso... mas não tenho o que é preciso. Necessito de muito mais experiência; não tenho acesso ao capi-tal e me aventurar nisso seria irresponsabilidade. Eu estaria expondo a minha família a um grande risco financeiro.”

Como saber se essa é a voz da censora interior ou se é a manifestação do pensamento realista e sensato? Podemos reconhecer a censora interior de Claire em algumas pistas:

• Ela está fazendo afirmações categóricas sobre o que é verdadeiro: “Não tenho o que é preciso.” Não há intenção exploratória nem coleta de provas. Não há perguntas abertas nem questões amplas sobre a verdade da situação.

• Há uma escalada da preocupação: “Necessito de muito mais expe-riência...” passa, rapidamente, a “Eu estaria expondo a minha famí-lia a um grande risco financeiro”.

• Ela demonstra uma preocupação particular com os aspectos do tra-balho tradicionalmente associados à masculinidade: levantar capi-tal e ganhar dinheiro para sustentar a família.

Eis como se manifestaria o “pensamento realista” sobre o mesmo assunto:

“Eu adoraria abrir um negócio de varejo. Sinto que nasci para fazer

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isso... Não sei se tenho o que é preciso. Como posso descobrir de que forma esse projeto se encaixa na situação em que estou? Vou fazer x para aprender mais sobre isso esta semana... É uma perspectiva em-polgante e um pouco assustadora também. E, evidentemente, também tenho o compromisso de sustentar minha família. De que forma posso fazer isso e garantir o sustento deles?”

Você pode perceber a diferença de tom no segundo exemplo: mais po-sitivo, construtivo, exploratório e, de fato, muito mais racional. Há o in-teresse na coleta real de informações. O foco se volta para o tópico em si, não para distrações egocêntricas sobre estar ou não à altura.

Por que temos censoras interiores?

Por que temos essa voz autodepreciativa dentro de nós? Seria consequên-cia de uma infância dura, de nossa cultura patriarcal, da vida moderna estressante?

Não precisamos ter passado por determinadas experiências na vida para desenvolver uma censora interior contundente. Estamos genetica-mente predispostas a ela. Trata-se de uma manifestação de nosso instinto de segurança, nossa porção que pretende se resguardar de potenciais ris-cos emocionais – do sofrimento, do fracasso, das críticas, das decepções, das rejeições por parte da tribo. O instinto de segurança é astuto. Se essa voz lhe dissesse apenas “Não, nada disso, não componha a canção, não se candidate ao cargo, não mude de carreira, não compartilhe suas ideias – tudo é muito arriscado”, você não lhe daria ouvidos. Provavelmente res-ponderia com algo do tipo: “Estou disposta a correr riscos. Vou nessa!” É por isso que o instinto de segurança recorre a um argumento mais eficaz: “Suas pinturas são horríveis!” “Seu livro não oferece nada de novo – já há tantos sobre esse tema!” “Essa tentativa de mudar de carreira vai fazer com que você acabe desempregada!” A censora interior fala mais alto e é mais veemente quando nos expomos a uma vulnerabilidade real ou percebida – algo que dispara o medo do constrangimento, da rejeição, do fracasso ou da dor.

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Ousar crescer – seguir nossas vocações e nossos sonhos – deixa a todos em posição vulnerável, principalmente no caso das mulheres, em que as apostas são mais altas. Sabemos que ousar crescer pode trazer críticas ou rejeições dolorosas, que talvez nos levem a ser vistas como arrogantes, detestáveis, agressivas, impiedosas, desagradáveis. Já vimos isso acontecer várias vezes. Já lemos comentários violentos, depreciativos, muitas vezes vulgares, sobre mulheres de destaque – em especial na mídia on-line. Nos-so instinto de preservação tenta nos proteger dessas críticas, disparando censuras cruéis (“Você não está pronta para isso, não sabe o que está di-zendo”) que nos impedem de ganhar maior visibilidade e ficar expostas a esse tipo de ataque.

É como se você tivesse subdivisões internas e a censora interior tra-balhasse para o Departamento de Aversão ao Risco. O pessoal de lá não se relaciona bem com o Departamento de Realização Pessoal. Eles ficam satisfeitos quando você se sente relativamente entediada, excluída e triste – desde que se mantenha na zona de conforto.

Por essa razão, o pessoal da Aversão ao Risco não se preocupa se o que lhe diz é verdadeiro ou não. Este é o conhecimento que todas precisamos ter em relação à nossa insegurança. O que a censora interior afirma – “Você não está pronta para isso, não sabe o que está dizendo, essa ideia/pergunta/criação não tem nenhum valor” – simplesmente não é verdade. O propósito da censora interior não é ser exata, mas levá-la a evitar o risco emocional. Quando compreendemos que nosso instinto de segurança usa a censora interior como estratégia e que toda aquela ladainha não reflete a realidade, nós a tornamos impotente. Podemos nos dizer no momento em que a cen-sora interior se manifesta: “Estou ouvindo essa voz, mas sei que não é a voz da verdade, e minha escolha é não seguir sua orientação.”

A insegurança fala mais alto quando...

Muitas mulheres descobrem que a censora interior fala mais alto ao se referir aos sonhos que elas acalentam com mais intensidade na vida pes-soal e profissional, porque nos sentimos particularmente vulneráveis em relação a eles. A insegurança se torna mais forte, assustadora e sufocante

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quando elas tentam avançar na direção de seus maiores anseios. A censora interior é como um guarda na fronteira da zona de conforto. Desde que você não se aventure a transpor os limites do território seguro, a censora interior a deixa em paz – como um vigia tirando um cochilo. Quando, po-rém, você se aproxima da margem da zona de conforto, desafia as velhas crenças, contempla a mudança ou se dispõe a ousar crescer, você desperta o guarda. A censora interior recita sua ladainha na tentativa de fazê-la retornar à zona de conforto do status quo.

Muitas mulheres descobrem que quanto maior a intensidade com que a censora interior se manifesta, quanto mais ruidosa e maldosa é sua voz histérica, mais próximas estão de uma conquista ou maior é a probabili-dade de que estejam em vias de dar um passo muito importante. Assim, ao ouvir um ataque mais violento da censora interior, procure recebê-lo como uma boa notícia: significa que você provavelmente está ousando crescer.

Isso vai contra o que nos foi ensinado: se estamos no rumo certo, de-veríamos nos sentir bem ou animadas, certo? Na verdade, muitas vezes quando começamos a fazer o que mais queremos na vida profissional – ou quando pensamos seriamente em agir para chegar lá – experimentamos uma sensação de desconforto. Várias mulheres equivocadamente inter-pretam essas dúvidas e ansiedades como indícios de que não estão no ca-minho certo, mas não é isso; apenas acabamos de acordar o guarda que dormia na fronteira de nossa zona de conforto.

Mas e se a minha censora interior me motiva?

Agora que você sabe o que é a censora interior, trataremos das ferramen-tas e práticas que podem ser usadas para reduzir a influência dessa voz em sua vida. Antes, porém, vamos falar de uma preocupação que várias mu-lheres mencionam quando abordamos esse assunto. É um receio que eu não havia previsto: muitas mulheres não têm certeza de que querem calar sua censora interior! Afinal, elas me perguntam, não é a censora interior parte do que nos motiva a realizar um trabalho meticuloso e excelente?

Ouvi pela primeira vez essa pergunta há alguns anos, quando me re-

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feri à censora interior durante um workshop em uma grande empresa de contabilidade. Uma mulher na primeira fila levantou a mão. “Com-preendo o que você está dizendo sobre como a censora interior nos re-prime, mas, sinceramente, se eu parasse de ouvir essa voz, acho que seria muito relapsa no trabalho. Minha censora interior é o que me motiva a trabalhar duro e a produzir resultados. Não seria ela, na verdade, uma força positiva?”

Como ocorre com a maioria de nós, a censora interior dela era uma espécie de companheira, com quem ela mantinha uma parceria testada e comprovada: a censora interior gritava palavras de pânico e descrédito, e ela atuava com mais energia, produzindo um trabalho mais cuidadoso e minucioso. Esse ciclo – que se repetia dezenas de vezes por dia – havia produzido resultados profissionais realmente positivos.

Eis minha resposta a ela, que também serve para você, caso lhe ocorra a mesma questão: duvidar de si mesma realmente pode encorajá-la a trabalhar mais e a realizar mais; esse tipo de motivação, porém, tem um custo alto.

• Custo para a qualidade de vida. Até que ponto você se sentirá feliz no trabalho se o medo e pensamentos torturantes sobre si mesma se repetem em sua mente o dia todo?

• Custo para a vida profissional. A censora pode nos levar a nos de-dicar mais ao trabalho, mas com frequência nos orienta para o traba-lho errado. Quando motivadas pela censora interior, atentamos para todos os detalhes (muitas vezes, até excessivos); no entanto, ela não nos encoraja a assumir riscos inteligentes – buscando novas atribui-ções, expressando nossa opinião, desenvolvendo relacionamentos im-portantes – capazes de nos impulsionar na carreira. A censora interior pode nos motivar a ser uma abelha operária, mas não nos estimula a virar a mesa.

• Custo de ousar crescer. Qualquer que seja o significado de ousar crescer para você, pense no seguinte: a censora interior pode real-mente ajudá-la a ser mais ousada, mais rápida e a ter mais prazer com o seu trabalho? Ela pode de fato motivá-la a seguir sua voca-ção? Não.

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• Custo para a saúde. Quando somos motivadas pelo medo do fra-casso, os hormônios do estresse inundam nosso corpo. O estresse prolongado está correlacionado a vários problemas de saúde, desde doenças cardíacas até asma e depressão. O corpo humano não foi projetado para viver em estado de estresse por várias horas todos os dias, e nossa saúde é afetada se isso acontece.

Caso você se importe com seu bem-estar físico, emocional ou espiritual, ouvir a censora interior não é uma maneira viável de manter-se motivada.

Sob certo aspecto, a mulher na empresa de contabilidade que fez a per-gunta estava certa: se ela ignorasse a censora interior, provavelmente teria dificuldade para motivar-se durante algum tempo. Mas, nesse intervalo, surgiria um espaço para ela começar a descobrir a fonte natural de sua motivação. Ou ela encontraria uma razão positiva para empolgar-se com a busca da excelência no trabalho atual, como realizar um projeto incrível com a equipe, expor seus talentos ao mundo e oferecer melhores condi-ções financeiras à família, ou então precisaria explorar papéis alternativos para acender suas paixões.

Identificando e nomeando a censora interior

Vejamos agora o que você pode fazer no dia a dia, a qualquer hora, sempre que lhe ocorrer um pensamento negativo sobre si mesma, para aquietar sua censora interior.

O dia em que você se sentirá imbuída daquela autoconfiança infalível e maravilhosa jamais chegará. A insegurança sempre será o ingrediente ine-vitável de qualquer esforço para ousar crescer. A solução não consiste em eliminar a dúvida em relação a si mesma, mas em aprender a deixar que a censora interior fale à vontade, sem seguir as orientações dela. O objetivo é ouvir a ladainha da censora interior, mas não permitir que ela determine suas escolhas.

A autora Dani Shapiro já teve trabalhos publicados nos periódicos The New Yorker, Elle, The New York Times Book Review e Los Angeles Times. Ela lecionou em programas de produção textual da Universidade Columbia e

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da Universidade de Nova York. Sob qualquer critério, não lhe faltam provas de que é uma escritora bem-sucedida. No entanto, eis o que tem a dizer so-bre as dúvidas que se manifestam em seu processo de escrita:

“Um dia eu estava olhando para o meu computador, para tudo o que eu já tinha escrito nos últimos anos – ensaios, histórias, livros, postagens em blogs, tudo. Percebi que cada um daqueles textos havia começado com as seguintes palavras girando em minha mente: ‘Isso não vai dar em nada. Isso não vai dar em nada. Desta vez não vai funcionar... Sei que já deu certo antes, mas, desta vez, está acima da minha capacidade. Não vou acertar, não vou conseguir fazer. Mas sabe de uma coisa? Vou tentar de qualquer jeito’... São tantos anos passando por isso que já ad-quiri a prática: ouço aquela voz dizer ‘Você não pode fazer isso’, e não dou ouvidos a ela. Todos escutamos essa voz. Eu a denomino meu radar interior. É como se alguém estivesse sempre em nosso ombro, dizendo coisas diferentes a cada um de nós. Por exemplo: ‘Você é burra’, ‘Fulano faz melhor’ ou ‘Como você ousa? Que direito você tem?’... O importante é aprender a silenciar essa voz, não extingui-la.”

Cherry Murray é reitora da Escola de Engenharia e Ciências Aplicadas da Universidade Harvard. Antes disso, liderou alguns dos cientistas e enge-nheiros mais brilhantes do país como executiva na Bell Laboratories e no La-boratório Nacional Lawrence Livermore. Conforme descrito em um artigo na Nature: “Ela publicou mais de setenta trabalhos em periódicos especia-lizados, avaliados pelos colegas, conquistou numerosos prêmios, registrou duas patentes e atuou em mais de oitenta comitês e conselhos consultivos nacionais e internacionais. No entanto, a insegurança ainda a espreita. ‘Se eu ainda acho que não sou qualificada?’, diz ela. ‘O tempo todo.’”

Twyla Tharp, coreógrafa premiada, descreve em The Creative Habit (O hábito criativo) os cinco grandes medos que ainda se manifestam em sua vida artística:

“1. As pessoas vão rir de mim. 2. Alguém fez isso antes. 3. Não tenho nada a dizer. 4. Vou chatear alguém que amo. 5. Uma vez posta em prá-tica, a ideia nunca será tão boa quanto a imagino.”

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Ela acrescenta que, se der rédeas a esses medos, eles travarão seus im-pulsos (‘Não, você não pode fazer isso’) e talvez até fechem totalmente as torneiras da criatividade.

Vejo a coisa da seguinte maneira: se mulheres como essas, que estão no topo dos respectivos campos de atuação, que teriam todos os motivos para se sentirem autoconfiantes, continuam a enfrentar sérias dúvidas so-bre o próprio trabalho, você e eu provavelmente também depararemos com elas. Na verdade, essas mulheres se veem às voltas com a insegurança porque ousam crescer, expondo-se com frequência a críticas e fracassos notórios, expressando suas ideias singulares e exercendo sua liderança no mundo. Suas palavras mostram que são capazes de ousar porque sabem reconhecer a censora interior como apenas uma voz interna – não a auto-ridade definitiva.

Quase parece fácil demais, mas é verdade: não é preciso fazer muito em relação à censora interior. Numa cultura em que o importante é fazer, trata-se de algo que vai contra a intuição. Identificar conscientemente a voz da censora interior em geral é suficiente para nos libertar de imediato do transe.

Por que identificar e nomear essa voz que a faz duvidar de si mesma é um ato tão poderoso? Livrar-se da influência da censora interior depende de uma percepção muito simples. Você não é a censora interior. Você é a pessoa ciente dessa voz crítica. Você é a pessoa que, por causa dela, se sente perplexa ou incomodada, ou é a pessoa que acredita nessa voz. Você é a pessoa que tenta compreendê-la e que se esforça para trabalhar com ela e livrar-se dela. Você é a entidade que ouve a voz. A censora não é a sua essência. Sua essência é o “você” de suas aspirações, de sua sabedoria. A censora interior é uma espécie de intrusa. É a voz que se faz ouvir em sua mente, mas não é quem você realmente é.

A maioria de nós não está preparada para discernir as várias vozes que ouvimos em nossa mente. Imaginamos que são todas “nós” da mesma ma-neira. Ao identificar a voz da censora interior quando ela se manifesta, você começa a soltá-la dos outros fios que se entrelaçam em sua “essência”: sua imaginação, suas aspirações, sua sabedoria. Ao dizer “Ah, estou ouvindo a censora interior neste exato momento”, você pode lembrar-se de que ela não passa disso e avançar, apesar das queixas e ameaças.

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