histórias de au pairs contadas em e-book

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1 Camila Martins Vale de Lucena Amarant HISTÓRIAS DE AU PAIRS CONTADAS EM E-BOOK

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Um livro-reportagem que apresenta o que é e como funciona o programa de intercâmbio para au pair nos Estados Unidos

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Camila Martins Vale de Lucena Amarant

HISTÓRIAS DE AU PAIRS CONTADAS EM E-BOOK

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Camila Martins Vale de Lucena Amarant

Universidade Federal do Rio Grande do NorteCentro de Ciências Humanas, Letras e Artes

Departamento de Comunicação

Livro reportagem apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social – Jornalismo, orientado pela

professora Ms. Maria Aparecida Ramos da Silva.

Natal, RNDezembro 2011

HISTÓRIAS DE AU PAIRS CONTADAS EM E-BOOK

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Este livro reportagem foi escrito em 2011.

A apuração foi feita nos anos de 2010 e 2011.

Todos os personagens são identificados por

pseudônimos, parte deles são apelidos das

pessoas envolvidas. As fotos utilizadas

ao longo do livro são todas da autora.

Os pais das crianças que aparecem autorizaram a

publicação. Os demais entrevistados não

autorizaram publicação de fotos.

Mima é a autora deste livro. O nome é a

maneira como as crianças da segunda

host family chamavam-na.

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Dedico este livro à minha família

Uma longa viagem começa com um único passo.

Lao-Tse

Dedicatória

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Agradecimentos

Agradeço a Deus, por permitir a realização do sonho de viver fora do Brasil e da

formação superior.

À minha família, por todo incentivo, apoio e por serem o que são, referenciais para

mim. Em especial, a minha mãe, que sempre está ao meu lado sejam quais forem

as minhas escolhas; a minha avó Bernadete Vale, maior exemplo de perseverança

e superação da minha vida; as minhas tias Saint-Clair e Suely, por cada uma a sua

maneira, nunca medirem esforços para ajudar; ao meu irmão, Bruno, que é exemplo.

Vocês iluminam a minha vida e merecem o meu respeito!

Ao meu noivo, Romero, pelo amor, apoio e por me levar em seu coração, onde

quer que vá.

Aos meus amigos, pela relação de afeto e confiança.

À minha amiga e orientadora Cida, por acreditar em mim, pela atenção e

disponibilidade. Pelos nossos papos e cafés.

A todos que de alguma maneira, contribuíram com esta realização, MUITO

OBRIGADA.

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INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................11

O PROGRAMA ...................................................................................................................................13

A HOST FAMILY E O MATCH ............................................................................................................16

O TREINAMENTO ..............................................................................................................................21

OS PRIMEIROS DIAS EM FAMÍLIA ..................................................................................................24

A LCC E OS ENCONTROS MENSAIS ................................................................................................28

O REMATCH .......................................................................................................................................30

A HISTÓRIA DE MIMA ......................................................................................................................32

SUMÁRIO

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Aos 15 anos, tive a oportunidade de escolher como presente de aniversário uma viagem. Mais que isso, pude

sugerir o lugar que gostaria de conhecer. As minhas aulas de história e as viagens de uma familiar pelo mundo me

despertaram uma simpatia pela terra de Napoleão. Fui à França um ano depois. Viajei pelo país por 30 dias. Senti

frio na barriga, tive medo, chorei de saudade... e me encantei. Muito pelo país, pela história, pela educação. Mas,

muito mais pela maravilha que é viajar, conhecer diferentes modos de vida, concepções, hábitos, filosofias. Voltei

pra casa com o desejo de poder viver além do que vivi nessa experiência e passei a pesquisar sobre intercâmbio.

Entrei em uma universidade pública. Não satisfeita, mudei de instituição e de curso e vontade de ser

intercambista perdurou. Sempre busquei programas com cursos de idioma. As opções permitiam lugares, tempo e

preços bastante variados. Até aquele momento, não podia arcar com nenhum deles.

Aos 24 anos, descobri o programa de au pair. Como eu gostava e tinha experiência no convívio com

crianças, o programa parecia se encaixar muito bem com o meu perfil. Viver com uma família americana e ajudar

a cuidar das crianças tendo casa, comida, “uma mesadinha” e podendo estudar... Vai dar certo, eu pensei. Arrumei

a mala com uma dose inigualável de coragem e me coloquei disposta a ser intercambista.

Deu certo. Aos 25, eu embarquei para os Estados Unidos. Um ano depois, voltei pra casa. Nesse período, vivi o

que jamais imaginei e senti o que a psicóloga Andréa Sebben, no livro Intercâmbio Cultural – para entender e se

apaixonar, define como intercâmbio cultural. Para ela, quando bem sucedido o programa é a expressão máxima

de nossa humanidade. Mais de que um instrumento de educação, desenvolvimento e novas amizades, é objeto

de entendimento, respeito e tolerância.

Me senti uma cidadã do mundo que começou a compreender novas culturas e viver em paz com elas.

Se você não conhece o programa, esta é uma ótima oportunidade. Caso se encaixe nos pré-requisitos, prepare-

se para embarcar. Eu recomendo!

Com carinho,

Camila Vale.

INTRODUÇÃO

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O termo au pair vem da língua francesa e significa ao par, igual. O conceito da atividade surgiu no século XIX,

na Europa, quando jovens de famílias de classe alta, para melhorarem suas habilidades em um segundo idioma e

descobrirem costumes de outros países, se instalavam na casa de uma família rica estrangeira. Os jovens recebiam

comida e hospedagem e cuidavam de crianças pequenas da família anfitriã.

Após a Segunda Guerra Mundial, o conceito passou a incluir interessados de todas as classes sociais. Na

atualidade, pessoas do mundo todo realizam o desejo de viver em um outro país e aprender uma nova cultura

através do programa. As famílias anfitriãs estão espalhadas por dezenas de países, mas é nos Estados Unidos que

a atividade é regulamentada pelo governo federal e intermediada por agências. O programa envia para o país

mais de dez mil jovens de todo o mundo todos os anos. No Brasil, pelo menos cinco empresas espalhadas pelo

país agenciam a atividade.

Gostar e ter experiência com crianças, ter entre 18 e 26 anos, Ensino Médio completo, ser solteira (o), saber

dirigir e ter habilitação e falar um inglês intermediário são, de maneira geral, os pré-requisitos para participar.

O programa aceita jovens de ambos os sexos. A experiência com crianças deve ser de no mínimo 200h e é

comprovada através do preenchimento de formulário pelos responsáveis das crianças que receberam os cuidados

ou da entidade a que o jovem prestou serviços, como escola, creche e organização não governamental. O inglês é

nivelado por uma prova que as agências fazem no ato da inscrição.

As atividades de um au pair incluem acompanhamento em atividades educacional e recreativa, alimentação,

higiene, levar e buscar na escola entre outras. A rotina tem uma carga horária semanal de até 45h, não podendo

exceder 10h diárias. A idade das crianças varia entre três meses e 12 anos. Para cuidar de crianças menores de

um ano, o jovem interessado em ser au pair precisa ter experiência comprovada com crianças nesta faixa etária. A

duração mínima do programa é um ano.

O valor a ser investido por um brasileiro interessado na atividade corresponde ao pacote de uma agência, as

despesas para tirar o visto americano J1 – específico para a atividade, o envio de correspondências e, para quem

não mora em São Paulo ou no Rio de Janeiro, despesas com a locomoção até estas capitais, de onde partem os

voos internacionais inclusos no pacote das agências. Dependendo da agência e do período do ano, os valores

O PROGRAMA

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variam entre $750 e $980 dólares. Ele costuma ser pago parte no ato da inscrição, quando o interessado recebe

um formulário chamado application – no qual irão constar todas as informações pessoais e de experiência; outra

parte na entrega do formulário, quando o candidato ficará disponível para encontrar uma família anfitriã e o

restante quando encontrar uma família. As agências costumam realizar promoções em função da demanda e do

número disponíveis de au pairs.

O trabalho da agência garante o suporte para encontrar uma família; o documento DS 2019 necessário

para obter o visto; um seguro saúde básico, que é obrigatório; os voos internacionais de ida partindo de São

Paulo ou Rio de Janeiro até New York ou New Jersey, onde acontecem os treinamentos das agências; após o

treinamento, de New York ou New Jersey até a cidade da família anfitriã, e o voo de volta ao Brasil, até São Paulo

ou Rio de Janeiro. No treinamento, realizado nos primeiros dias do jovem nos Estados Unidos, são discutidas as

expectativas e responsabilidades da nova função, hábitos da cultura americana, alimentação, primeiros socorros

e desenvolvimento infantil nas diversas faixas etárias. Além disso, o intermédio da agência assegura um suporte

operacional, social e emocional através de uma coordenadora que organiza encontros mensais com au pairs e

visitas agendadas à família anfitriã. Essa coordenadora costuma ser a referência do intercambista em caso de

dúvida ou dificuldade.

De acordo com a regulamentação americana, o intercambista tem direito a um dia e meio de folga semanal,

um final de semana livre por mês e duas semanas de férias remuneradas a cada 12 meses de trabalho. Todos

estes direitos são discutidos e definidos de acordo com a necessidade e conveniência da família anfitriã. A folga

semanal pode ser concedida em qualquer dia da semana. As férias, durante qualquer um dos 12 meses. O Estado

concede ainda, após o ano de trabalho, a permissão para permanência de mais um mês no país, sendo que este

último não pode ser gasto com atividade remunerada. Normalmente, au pairs aproveitam o período para viajar.

O programa, que exige do au pair pelo menos 75h de estudos, inclui uma bolsa paga pela família anfitriã

de até $500 dólares para atividade educacional. O cumprimento desta carga horária é requisito pra receber

a passagem de volta ao Brasil após os 12 meses. A família anfitriã precisa estabelecer com o au pair uma

programação de trabalho que o possibilite cumprir pelo menos essa carga horária de estudos. Alguns jovens

cumprem apenas o exigido, outros veem a vida nos EUA como uma oportunidade de adquirir conhecimento

e melhorar o currículo e estudam durante todo o período de intercâmbio. Os estudos podem ser em inglês ou

qualquer outra área, a opção é do intercambista.

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Estudar nos Estados Unidos costuma custar caro. As melhores instituições educacionais são particulares. O valor

pago pela família pode não ser suficiente para cumprir a carga horária exigida, no entanto pode ser mais do que o

necessário em função da escola ou universidade escolhida. Em caso da bolsa não ser suficiente para o pagamento

do curso, o intercambista é responsável pelo excedente. Do contrário, a família repassa ao au pair apenas o valor

referente ao pagamento.

Em um grupo de oito au pairs brasileiras entrevistadas dos estados do Ceará, Distrito Federal, Paraíba, Rio de

Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe, que participaram do intercâmbio nos Estados

Unidos entre agosto de 2010 e agosto de 2011, quatro optaram pelo curso mais barato e com duas disciplinas

cumpriram a carga horário exigida pelo programa, o que custou a família aproximadamente $100 dólares. Entre

as que desembolsaram para estudar, o curso que correspondeu às 75h custou $1000 dólares e ela não parou.

Investiu mais $800 dólares para continuar em uma universidade. O primeiro caso foi possível porque o curso

escolhido foi um oferecido a comunidade que recebe apoio do governo americano. O valor pago pelo estudante é

uma taxa única simbólica.

Em caso de problemas com a família anfitriã, a agência – representada por uma coordenadora local, deve ser

contactada. Esta tentará resolver em diálogo com au pair e família anfitriã. Em caso de não haver consenso, au

pair poderá entrar em um novo processo para encontrar nova família. A agência assiste o intercambista durante

o período de troca de família, que dura em média duas semanas. Já se uma das partes descumprir regras de

conduta moral, podem haver punições que chegam ao desligamento do programa.

Para au pairs que cumprem o ano, as agências restituem, na volta ao Brasil, parte do valor investido na

inscrição que representa até $300 dólares. Alguns jovens, antes de embarcar, preferem reverter o valor no

seguro saúde completo – o pacote da agência inclui o básico, que é obrigatório. Este pode ser um investimento

interessante considerando que na terra do Tio Sam o sistema de saúde é privado e tem um valor elevado.

Após os 12 meses, o intercambista pode estender o programa por mais seis, nove ou 12 meses com a mesma

ou com uma nova família. A decisão é do jovem com a família.

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As famílias anfitriãs são diversificadas. Elas podem ser de casais heterossexuais (homem e mulher),

homossexuais (dois homens ou duas mulheres), uma mulher viúva, solteira ou separada ou um homem viúvo,

solteiro ou separado. No momento em que o interessado em tornar-se au pair está preenchendo o seu formulário

de inscrição ele opta por qual tipo de família ele gostaria conviver. Durante todo o processo é importante que o

jovem seja claro e transparente sobretudo por se tratar de relações interculturais.

- Lembro que sempre que conversava com alguém da minha agência sobre o programa me falavam em

relacionamento. Tudo levava a palavra relacionamento. E é verdade. Não é fácil morar no trabalho. Au pair

mora no trabalho. Por mais que você tenha o seu espaço, estará sempre no ambiente deles. Para viver bem é

fundamental que estabeleça mais que uma relação de trabalho, enfatiza Mima, 26 anos.

Viver verdadeiramente um intercâmbio cultural exige um esforço sadio de romper fronteiras, limitações,

inseguranças e barreiras culturais. Durante o processo de conversa e decisão entre fechar ou não com uma família

– match – o futuro intercambista deve levar em consideração as opções sociais, psicológicas, religiosas, políticas e

culturais de ambas as partes.

Mima, explica como foi o momento em que ela conseguiu uma família.

- Mima? Cultural Care… Talk...

- Can you call me in one hour? – Não entendi perfeitamente o que ele falou e a pergunta saiu de imediato.

- Ok, I will. Bye-bye.

23 de julho de 2010. Pouco mais de 3h da tarde de uma sexta-feira. Segundo ela, foram oito meses até esse

momento. Ela estava em um transporte público e não acreditou. Depois de tanto tempo de espera e nenhum

telefonema, já não acreditava que se tornaria au pair. “Será que eu estou entendendo errado ou uma família

americana anfitriã se interessou pelo meu perfil e está me telefonando? Será que ele ligará de volta”? – ela se

perguntou. E ele ligou. Em pouco mais de 1h, aquele número enorme voltou a aparecer no visor do celular dela.

A HOST FAMILY E O MATCH

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Era ele, o pai de uma família. O pai. Um pai que ao se identificar deixou claro: “Sou solteiro, separado e as crianças

moram comigo, podemos conversar”? “Sim”, ela respondeu. Por que não poderia? Foram 50 minutos de conversa.

As crianças eram dois meninos, oito e nove anos, e uma menina, 13 anos. Essa última, segundo ele morava

numa espécie de colégio interno. A cidade era Atlanta, capital do estado da Georgia, sudeste dos Estados Unidos.

As obrigações: Prepará-los para a escola, dirigir, ajudar nas atividades escolares, acompanha-los nas práticas

esportivas, cozinhar. Varrer, lavar e passar? Não. “Eu tenho uma pessoa pra fazer isso”, ele afirmou. “E os finais de

semana”? – ela perguntou. “Livres. Eu trabalho e viajo bastante, mas nos finais de semana eu estou em casa e

fico com eles”, explicou o pai. Para tudo parecer ainda mais interessante, Mima conta que enquanto as crianças

estavam na escola – das 8h às 15h – ela poderia estudar. Ela, então, fez mais alguns questionamentos, na tentativa

de conhecer mais a família e sua rotina, até que ele perguntou: “Então, eu estou interessado em recebê-la em

minha família como au pair, você gostaria de vir”? Ela disse sim.

- Assim como eu não esperava mais que o meu match chegasse, nunca imaginei que ele pudesse acontecer

depois de uma única e simples conversa por telefone. Em oito meses, seis famílias, de norte a sul dos EUA,

haviam passado pelo meu perfil. Todas elas de cidades pequenas. Algumas com duas, outras com três e uma

com quatro crianças. Nenhuma delas com mais de cinco anos. Todas com os pais casados. A minha experiência

com crianças era 90% com meninos e meninas de até cinco anos. Apesar de a maioria das pessoas ao meu redor

acharem mais difícil cuidar de “criança pequena”, eu desejava poder ser escolhida pelos pais de criancinhas com

dois ou três anos. É prazeroso pra mim acompanhar e ajudar no desenvolvimento desta idade. Cuidar de crianças

com mais de cinco anos, morar na capital de um estado americano, ter tempo pra estudar, estar livre nos fins

de semana, não ser responsável por atividades de limpeza, ter carro... Parecia ser perfeito para a maioria das

candidatas ao intercâmbio. O que poderia não ser bom nesta família? Em um primeiro momento, me perguntei

se o fato de morar com um pai solteiro não poderia ser um problema. Mas, pensei, o programa é legal, é

regulamentado pelo Estado americano. Além disso, viajarei com o intermédio de uma agência e de acordo com

todas as informações que já havia recebido, ela me assistiria em qualquer necessidade. Então, deve está tudo

bem. Embarquei no dia 22 de agosto de 2010.

A jovem Danda, 21 anos, viveu uma história diferente.

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- Eu sempre quis morar fora do país, porém não acreditava que tudo poderia acontecer tão rápido. Eu descobri

o programa pela internet e logo localizei uma agência próxima a minha casa. Depois de entregar todos os meus

formulários preenchidos e ficar disponível para as famílias, foram apenas três semanas até o match. O processo

foi rápido e prático, não enfrentei nenhum tipo de problema ou atraso. Eu era professora de inglês e trabalhava

com crianças. Tinha bastante experiência e falava o idioma fluentemente. Na minha primeira semana on line, já

conversei com uma família anfitriã por email. Eram três crianças, uma com três, outra com quatro e a mais velha

com cinco anos de idade. Não passamos de um email. A família precisava de alguém que tivesse habilitação para

dirigir. Mais que isso, queriam uma au pair com experiência na direção. Eu estava apenas começando o processo

pra conseguir a permissão. Na mesma semana, outra família me contactou. Também por email. Apenas uma

menina com seis anos e a mesma necessidade: habilitação para dirigir e experiência na direção. Por alguns dias

pensei que não saber dirigir poderia atrapalhar os meus planos de ser au pair. Não, não vai! Erguia a cabeça e

pensava positivo. E não foi. Todas as pessoas com as quais eu conversavam, minha família, amigos, aspirantes ao

programa e intercambistas diziam que o meu perfil era muito bom. Além disso, já estava nas aulas teóricas de

uma autoescola. A própria agência permitiu que eu ficasse em contato com as famílias antes da minha permissão

sair, o que normalmente não acontece. Na minha terceira semana, fechei com uma família de uma pequena

cidade da Califórnia. Ele enviaram email e me ligaram. Um casal e duas crianças, uma menina com quatro anos e

um menino com um ano e meio. Eu não precisava dirigir. Entre as minhas atividades: acordar as crianças, arrumar

para escola, ajudar a menina nas tarefas, acompanha-los nas refeições e orientá-los quanto a higiene, brincar.

Deixei a autoescola, tirei o visto e arrumei a mala. Embarquei no dia 10 de janeiro de 2010.

Amada, 25 anos, apesar de não ter recebido muito apoio dos pais, não demorou para fechar com uma família.

- Meu pai não gostou nem um pouco. Ele achou um absurdo eu ter feito faculdade de Direito e decidir ir para

os EUA cuidar de criança. Na cabeça dele e da minha mãe, a viagem era só isso. Como eu já era maior de idade

e tinha condições financeira de pagar para tentar o intercâmbio, não desisti. Nunca tive sonho de morar fora

do Brasil, no entanto, depois de dois anos advogando, passei a me perguntar se passaria o resto da minha vida

vivendo em função do trabalho, sem descanso, sem ver e viver além do meu universo de trabalho. Enxerguei

o programa como uma possibilidade de tirar férias por um ano do trabalho, dos relacionamentos, do conflitos

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familiares. Seria um ano meu, pra me dedicar a algo novo que me tornasse uma pessoa melhor. Tinha tudo pra

não dar certo. Além da posição da família, meu inglês era ruim e não tinha experiência com crianças. Não pra

ser responsável por elas. Durante seis meses, me dediquei a estudar inglês e fazer um trabalho voluntário com

meninas e meninos na igreja que eu congregava. Após esse período, passei na prova do idioma e entreguei a

minha papelada. Foram 45 dias de ansiedade entre uma família e outra que acessava o meu perfil. Até que no dia

5 de dezembro de 2010, uma brasileira, casada com um americano, mãe de uma menina com seis anos me ligou

afirmando ter gostado do meu perfil do seu perfil... Foi uma alegria só! Uma criança grandinha, pra arrumar, levar

pra escola, pegar, levar pra o esporte, brincar e com uma mãe que falava português. Como não me sentia segura

com o meu inglês, não pensei duas vezes... Embarquei no dia 9 de janeiro de 2011.

Flor, 22 anos, esperou dois meses até a família aparecer.

- Pai, mãe, uma menina com 9 anos e um casal de gêmeos com 5. Uma família com um padrão de vida

mediano, pais extremamente focados no trabalho e preocupados com a opinião da sociedade. Pouco envolvidos

com as atividades das crianças, os adultos eram cristãos mas nem sempre aplicavam aquilo que pregava a

doutrina seguida. Crianças carentes de atenção e afeto. Eu não precisei estar nos Estados Unidos para chegar

a essas conclusões em relação a primeira família anfitriã que me contactou. Ao ler as informações do perfil da

família, já imaginei que naquela casa os relacionamentos não eram tão saudáveis. A mãe me enviou emails e

depois de uma conversa pelo skype, queria fechar. Eu sugeri que conversássemos um pouco mais e apesar de ela

resistir um pouco e afirmar que precisava decidir logo sobre quem e quando receberia uma nova au pair, aceitou.

Tivemos mais três conversas e fechamos. Eu queria muito estudar fora do Brasil e vi no programa a possibilidade

de realizar esse sonho a um custo que eu poderia pagar. Tinha 21 anos, era recém-formada e por já estar

trabalhando, minha família resistiu um pouco no entanto, não deixou de me apoiar. Já tinha lido e ouvido histórias

de candidatas que levaram meses e meses pra conseguir uma família. Planejei para que tudo acontecesse em

um determinado tempo e tinha medo de não conseguir a minha. Apesar de não me senti segura quanto às

impressões sobre ela, fechei. Embarquei no dia 13 de junho de 2010.

Line, 23 anos, ficou surpresa a pessoa que fez o primeiro contato.

- Diferente do que eu esperava, quem me enviou o primeiro email foi uma jovem brasileira que ao contrário

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de mim, estava querendo deixar os Estados Unidos. Ela era a atual au pair de uma família com pais separados,

cujas crianças – dois meninos, um com 13 e outro com quatro anos e uma menina com 7 – moravam com o pai,

mas dois dias por semana estavam com mãe. As obrigações incluíam atividades além do que eu esperava: todas

as responsabilidades com as crianças e com a casa quando trabalhando. Organizar roupa, casa, preparar comida,

ajudar nas tarefas escolares dos menores, dirigir, fazer compras... Me perguntei se faria tudo isso só nas minhas

45h semanais ou se os deveres me seguiriam todos os dias em todos os momentos que estivesse por perto da

família. Fiz a pergunta a encarregada pela família de encontrar uma nova au pair e a resposta dela foi não. Ela

afirmou que a família era tranquila e liberal. O local era a princípio interessante. Apesar da cidade ser pequena,

pouco mais de 80 mil habitantes, o estado era o mais atraente possível. Adivinha onde. Naquele onde o Lulu

Santos canta que se vive as vida sobre as ondas e se é artista de cinema... A Califa de Los Angeles, San Diego,

San Francisco... A badalada Califórnia. Quando esse email chegou, estava online a um mês. Até lá, algumas

famílias, umas duas ou três, passaram pelo meu perfil, mas só passaram. Não estabeleceram nenhum contato.

Todas as crianças eram menores de 2 anos. O pessoal da minha agência, quando eu conversava sobre minha

insegurança com o inglês, me falava que a responsabilidade com criança pequena era maior e que eu precisava

estar mais segura com o idioma. A família da au pair brasileira não tinha menores de quatro anos. Falei com a

mãe, o pai e as crianças pelo skype. Pensei uma, duas, três vezes... E acreditei que daria certo. Embarquei

no dia 28 de junho de 2010.

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O TREINAMENTO

Todas as semanas, agências espalhadas pelo mundo enviam centenas de novos au pairs para os Estados

Unidos. O programa tem início com um treinamento, no qual os intercambistas participam de atividades – entre

elas palestras, debates, dinâmicas – que orientam os jovens sobre comunicação, segurança, higiene, alimentação,

comportamento e cuidados em cada idade da infância. Esse primeiro momento costuma se estender por toda

a primeira semana de estadia no país. Os locais onde os eventos acontecem são hotéis ou universidades nos

estados de New York ou New Jersey, dependendo da agência. No mesmo lugar, os au pairs ficam alojados. As

despesas com hospedagem, alimentação e transporte são por conta da agência.

Já no desembarque do voo internacional – que costuma ser em dia de domingo, segunda ou mais tardar

terça-feira, a agência é responsável por apanhar o intercambista no aeroporto, onde os primeiros choques culturais

começam a acontecer. Pelo idioma, pelo fuso horário, pela diferença climática – em função da estação do ano,

pelo comportamento, pela alimentação... Nos debates sobre a cultura americana também é natural um certo

“espanto”. Foi o que aconteceu com a cearense July, 26 anos, e a carioca Danda, 21 anos. “Não entendi porque

quando assistindo a um vídeo sobre higiene, em sala de aula, um adulto ajudava uma criança a tomar banho e

na hora de esfregar a pele pra limpar ele usava uma pequena toalha, inclusive nas partes íntimas. Pra mim, aquilo

era novidade”, explica July. “Amanhecer o dia comendo bacon frito, ouvir a recomendação de que as crianças

devem tomar um banho por dia e escovar os dentes duas vezes foi o que mais me chocou. Todas as crianças

com as quais convivi tomam no mínimo três banhos por dia e escovam os dentes pelo menos três vezes”,

exclama Danda.

A quantidade de jovens por treinamento e as suas nacionalidades variam de semana a semana. “Cheguei aos

EUA em agosto de 2010, no meu treinamento foram 289 au pairs de 22 países, mas 190 eram alemães. O México

e o Brasil estavam em segundo lugar em quantidade. Do valor total, apenas 5 eram homens”, afirma Mima,

26 anos. “No meu caso, em janeiro de 2011, tinham 207 intercambistas de 33 países e nós brasileiras éramos

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maioria”, diz Amada, 25 anos.

Nesse período, os quartos são coletivos e a disposição dos grupos fica por conta da agência. Algumas

organizam por nacionalidades, outras evitam esse encontro na tentativa de induzir a prática do inglês e separam

os jovens por localização nos Estados Unidos, por proximidade das famílias anfitriãs.

É comum, nesses dias que antecedem a chegada a nova casa os au pairs manterem contato com as famílias

anfitriãs por telefone ou email. O momento é de muita ansiedade para ambas as partes. Contudo, a prática não é

regra. É natural para os americanos, quando tudo está claro, pouca conversa. “Durante o meu treinamento, fiquei

mais próxima de brasileiras e todas elas falavam diariamente com suas famílias anfitriãs, fosse por email ou por

telefonema. Elas perguntavam pelas crianças, algumas falavam com os pequenos, contavam do dia a dia. No

meu caso, eu tentei. Enviei emails para a minha host family, mas ela não respondeu. Confesso que isso me deixou

ainda mais insegura. Quando já estava na casa, com poucos dias de convívio, percebi que o comportamento era

deles. Eles não eram de muito bate-papo”, afirma Line, 23 anos.

Durante a primeira semana, as agências também organizam um passeio pela famosa área nova-iorquina

chamada Mannhattan. Na ocasião, os meninos e meninas têm a oportunidade de conhecer famosos pontos

turísticos de New York e badaladas lojas. O passeio é uma opção do jovem, que paga para participar.

Em função do cronograma da agência, os intercambistas partem para as suas casas de família na quinta,

sexta-feira ou sábado. Em caso de a família morar na mesma área em que está o au pair, ela vai pegá-lo no local

do treinamento. Sendo em outra cidade, estado ou região, a viagem pode ser feita de metrô, ônibus ou avião. O

deslocamento é organizado pela agência.

Apesar desse momento de preparação está previsto pelo Estado americano no regulamento da atividade, ele

divide opiniões entre as au pairs entrevistadas. Para Danda, o tempo não é bem aproveitado. “Eles não preparam

para o que estar por vir. Houve sim bons momentos e certos pontos positivos, algumas palestras interessantes,

entretanto, acredito que poderia ter sido mais realista em muitos aspectos”. Na opinião de Amada, Flor e Nanda,

valeu. “Foi um período de aprendizagem, de fazer amizades e diversão. Uma experiência inesquecível”, defende

Amada. “O treinamento foi ótimo! Eu adorei! Foi uma experiência maravilhosa para interagir com meninas de

todos os lugares do mundo. Fiz várias amigas e continuo mantendo contato com algumas delas. Éramos quatro

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brasileiras sempre juntas. Mais fácil quando temos alguém do mesmo país por perto para que em caso de aperto

elas possam ajudar”, explica Nanda, 21 anos.

Já para Line, o treinamento poderia ser substituído por um livro. “Pra mim, foi perda de tempo. Meu inglês não

era bom e como as professoras falavam rápido, eu não entendia nada. Com um livro, eu conseguiria. O lado bom

foram as amizades, os contatos que fiz”. Mimi, 27 anos, de São Paulo, sentiu a mesma dificuldade que Line. “Não

fossem as brasileiras que estavam ao meu lado e me ajudaram, não teria entendido absolutamente nada”.

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- Sexta-feira à noite. Cinco horas de voo e duas conexões. Eu estava muito cansada, mas cheia de ânsia para

encontrar a mãe, o pai e as gêmeas. Peguei a minha mala e lá estava ela. Estavam elas, a minha host e a au pair

que estava deixando a família, também brasileira. Não tive como conter as lágrimas, não acreditava que tinha

conseguido. Eu estava começando meu ano como au pair. Como já passava das 9h da noite, as meninas ficaram

em casa com o pai. No caminho da nova casa, torci para que estivessem de pé, gostaria muito de vê-las. Quando

chegamos, elas estavam mais do que acordadas, estavam super animadas, cantando e dançando. Lindas e

simpáticas! Me deram beijos e me apresentaram parte de seus brinquedos. Com a ajuda da antiga au pair, fui me

ambientando. Me senti muito bem e tive uma ótima noite de sono. Foi assim todo o fim de semana.

- Welcome Nanda estava escrito no cartaz que as gêmeas seguravam. Ao lado delas, a mãe, o pai e o

menino. Todos no aeroporto, a minha espera. Não acreditei! Eu os abracei e me emocionei. Era mais de sete da

noite e pelo fuso, pela viagem e pelo treinamento eu estava bem cansada, mas só senti quando fui para cama.

Antes disso, no caminho de casa, eles conversaram bastante perguntando sobre mim, sobre minha viagem, sobre

o que eu gostava de comer. Em casa, um churrasco para o jantar que eles tinham preparado. Como uma boa

gaúcha, me deliciei e fiquei ainda mais feliz.

A história de July, 26 anos, e de Nanda, 21, respectivamente, da chegada a casa de suas respectivas host

family foi como planejado. Antes da viagem delas, a agência contactou os hosts e certificou-se de que o horário

era conveniente para cada uma das famílias e que um dos familiares estaria no aeroporto para pegá-las.

Ambos procedimentos, da agência e das famílias anfitriãs das brasileiras, são comuns. A família é

responsável por receber o intercambista já nos primeiros momentos. Quando nenhum membro por algum motivo

pode, a coordenadora local da agência ou, o antigo intercambista, em caso da família já ter au pair, costumam

desempenhar o papel.

Contudo, é importante que o jovem, antes da viagem, tenha em mãos o nome e os telefones de membros da

OS PRIMEIROS DIAS EM FAMÍLIA

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família e da coordenadora local para contato em caso de emergência. Line e Mima são exemplos de au pairs que

usaram os números. Elas contaram, respectivamente, como foi a chegada.

- A viagem de New Jersey até San Francisco foi tranquila graças a presença de uma outra au pair brasileira que

fez o treinamento comigo e estava indo para uma cidade vizinha a que eu moraria. Conversamos durante todo

o percurso. Após sairmos do avião, levamos um bom tempo pra encontrar nossas bagagens. Ao encontrá-las,

lá estava a família anfitriã da minha colega. Eles a reconheceram de longe e chamaram pelo nome dela. Ela foi

correndo... Quanto a minha, nenhum sinal. Olhei em todas as direções. Ninguém parecido com as pessoas que

me comuniquei pelo skype. Será que eles não vêm? Será que esqueceram? A companheira de voo percebeu

que por enquanto eu estava sozinha e se aproximou. Não os vejo, eu falei. Calma, eles chegarão, ela disse na

tentativa de me acalmar. Me segurei pra não chorar. Se eu ficar sozinha aqui, não saberei o que fazer. Não sei nem

se conseguirei me comunicar com este meu inglês, eu pensei. Não se preocupe, não lhe deixaremos sozinha,

enfatizou a outra au pair segurando a minha mão. Passaram-se 15, 20, 30 minutos e nada. A host da colega

perguntou então se eu tinha o telefone de alguém da minha família americana. Ela ligou e o meu host disse que

estava em um grande engarrafamento, mas que estava a caminho. Me acalmei um pouco mais e sugeri que eles

fossem para casa, que poderia esperar sozinha. E esperei mais 2h no aeroporto até que ele chegasse.

- Na sala de embarque encontrei uma au pair também brasileira de uma outra empresa que tinha o mesmo

destino que o meu. Conversamos um pouco, mas durante a viagem estivemos em assentos separados. Eu estava

muito nervosa. Não tomei uma água durante quase 3h de voo. Minhas mãos estavam geladas e eu suava frio.

Meu treinamento não havia sido uma experiência muito confortável e eu temia viver situação parecida na casa

da família. Após o pouso, eu e a outra intercambista caminhamos juntas em direção ao local onde estariam

nossas malas e nossas famílias. Encontramos as malas, não as famílias. Será que estamos no lugar errado, nos

perguntamos. Se a bagagem está aqui, estamos no local certo, comentei. O meu host, durante o treinamento

tinha me mandado um email afirmando que uma funcionária dele estaria no mesmo lugar da bagagem, com

o meu nome impresso, a minha espera. Além disso, ele comentou que apesar de eu não conhecê-la, ela tinha

visto uma foto minha. Com cinco minutos, o pai da família da outra brasileira apareceu. Ela ficou muito feliz e eu

mais nervosa. Ele percebeu que eu não estava bem e pediu um número de telefone para contactar minha família.

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Enquanto o telefone chamava vi o meu nome com a moça que também me reconheceu. Junto com ela, uma das

crianças. Eu estava tão tensa, que não tive reação diante da criança. No caminho pra casa, conversamos um pouco

e no dia seguinte me senti melhor.

De acordo com as agências, as novas moradoras precisam de atenção e acompanhamento nos primeiros

dias de trabalho, quando tudo ainda é muito novo para elas e para as crianças. Normalmente a mãe, mas

algumas vezes o pai, a antiga au pair ou alguém ligado a família que conhece e participa ou participou da rotina

dos pequenos orienta o intercambista. As orientações vão desde a utilização de itens da casa, os horários, o que

é permitido e o que não é até os cuidados com as crianças. É recomendado que após o descanso da viagem e a

tensão da chegada, o au pair sente para conversar sobre todos os assuntos que envolvem o programa, inclusive o

que já foi inicialmente falado durante o contato que antecedeu o match. Não podem haver dúvidas. Mima conta

como foi sua primeira conversa com o host.

- Já no meu segundo dia na casa nova, depois de eu ter relaxado um pouco, sentei para conversar com

o meu host. Eu não me sentia muito segura em relação ao inglês e para organizar melhor o que gostaria de falar

e perguntar, eu escrevi. Coloquei num pequeno texto o que estava sentindo, que apesar da insegurança estava

feliz e que daria o melhor de mim pra que o programa desse certo. As perguntas que fiz incluíram desde horários,

alimentação dos meninos, tempo livre até possíveis viagens da família e meus planos para férias. Durante a

conversa, pedi para que ele além de falar, escrevesse. Caso eu não entendesse o idioma falado, tentaria o escrito

e quando necessário usei o dicionário. Isso não foi problema pra ele. Claro que ele sabia que o meu nível de

inglês era deficiente. Quando eu ainda estava no Brasil, conversamos por telefone. Não tinha o que esconder, pelo

contrário, precisávamos esclarecer para as coisas se tornarem mais fáceis.

A coordenadora local, também no primeiro ou segundo dia, liga para dar boas vindas ao intercambista.

Sua primeira visita deve acontecer em um dos primeiros dez dias. Na ocasião, ela conversa com au pair e família

sobre direitos e deveres de ambas as partes e lembra a família que como hospedeira ela é responsável por

auxiliar o estrangeiro na aquisição do social security, documento emitido pelo Estado americano obrigatório para

a atividade e permissão para dirigir no país. A habilitação internacional providenciada pelo intercambista no Brasil,

pode não ser aceitável para dirigir nos Estados Unidos por mais que dois meses. A maioria dos 50 estados exigi o

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documento emitido no local, o processo para obtenção é como no Brasil. Ele custa em média $40 dólares.

A reunião, além de ser o momento do intercambista esclarecer toda e qualquer dúvida dos primeiros dias,

é também uma oportunidade do jovem conseguir contatos – seja número de telefone ou email – de outros au

pairs da região. Algumas coordenadora fornecem esses contatos antes do au pair solicitar.

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A LCC E OS ENCONTROS MENSAIS

Uma amiga. Uma ajuda. Um apoio. Uma referência. Entre as oito au pairs entrevistadas, essas eram as

impressões que elas tinham antes de chegarem aos Estados Unidos do que seriam as coordenadoras locais.

Conhecidas como LCCs, essas coordenadoras são funcionárias das agências, responsáveis por acompanhar e dar

assistência local a um grupo de famílias anfitriãs e intercambistas. Cada grupo tem em média 20 au pairs. As LCCs

são milhares e estão distribuidas em todo o país por região de cada estado americano. Algumas delas são ou já

foram host mothers.

Números de telefone e email são fornecidos ao intercambista antes mesmo de seu embarque e em qualquer

necessidade ele pode entrar em contato com sua LCC.

O trabalho das coordenadoras começa antes do match, quando elas esclarecem para as famílias anfitriãs todas

as regras do programa.

Nos primeiros dias do au pair na casa da família, ela se reune com as duas partes e discute os diversos pontos

do novo relacionamento. É papel dela instigar diálogo que deixe claro quanto aos horários de trabalho – que

não pode exceder 10 horas diárias e 45 horas semanais - tempo livre do intercambista, dia de pagamento – o

qual deve ser feito semanalmente – estudos, contatos em caso de emergência, obtenção de social security e

permissão para dirigir, abertura de conta corrente em banco local, uso de carro e celular quando eles existirem,

noites fora de casa, visitas, uso de bebida alcóolica – nos EUA só é permitido a partir dos 21 anos – férias, entre

outros. Após essa primeira conversa, família e au pair assinam termo de compromisso e responsabilidade sobre

as questões conversadas. Já nesse primeiro momento, a LCC também costuma falar sobre o rematch, processo de

troca de família, que é possível em casos justificáveis, mas não recomendável pelas agências.

O acompanhamento aos estrangeiros é contínuo e periódico. Todos os meses, a coordenadora reune o seu

grupo. Nos meetings, ela conversa sobre assuntos gerais do programa com todos os intercambistas e quando

necessário sobre particularidades individualmente. Os eventos acontecem na casa da coordenadora ou em local

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previamente acertado. Algumas vezes, são planejadas atividades culturais ou de lazer que tem custo para os

jovens. A participação dos au pairs é considerada obrigatória sob pena de não receber a passagem de volta ao

Brasil, inclusa nos pacotes comercializados para os Estados Unidos.

No grupo de intercambistas pesquisadas, as opiniões sobre as coordenadoras e os meetings são variadas.

Cacá lembra de sua LCC e de seus encontros mensais de maneira positiva, para ela o momento era uma

oportunidade de aproximar-se das diferentes intercambistas e Nanda concorda. “Achei os meetings importante

para encontrar as outras au pairs e para informar a LCC do que se passava no meu dia-a-dia”.

Já Danda, Flor e Line não aprovaram os encontros. “Não gostei da minha LCC, nem dos meus meetings. Se eles

devem ter o papel de ajudar, não cumpriram quando eu precisei”, diz Danda. “Os meus encontros mensais eram

apenas para seguir o protocolo da agência. Não sentia esforço da LCC para interagir com o grupo bem como fazer

com que o grupo se conhecesse melhor. Ela era uma pessoa que defendia os pontos de vista da agência e não

uma pessoa moderadora, que procurava compreender os dois lados envolvidos no programa”, conta Flor. “Acho

que os meetings não eram válidos porque eu sempre precisei da minha coordenadora quando não tinha encontro

e tudo se resolvia pelo telefone. No momento do encontro, nos víamos por alguns minutos e voltávamos pra casa,

sem muita conversa. Pra mim, aquele não era um momento interessante”, critica Line.

Entre as que tiveram mais de uma LCC, houve experiência positiva e negativa. “Tive duas coordenadoras. A

primeira era simpática, mas não me ajudou tanto quando eu realmente precisei. A segunda também foi simpática

e sempre respondeu meus emails em um curto prazo de tempo”, afirma Amada. “A primeira não era fácil nem

acessível e os encontros serviam quase que exclusivamente, para discutir onde seria o próximo. A segunda era

exatamente o oposto. Se colocava à disposição pra ajudar 24h por dia e tentava tornar os meetings divertidos”,

descreve Mima.

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O REMATCH

A decisão de tornar-se imigrante não é fácil. Imagine jovens como Flor, que aos 21 anos, já graduada e bem

empregada na grande São Paulo, investiu no sonho de estudar fora do país através do programa de au pair e nos

seus primeiros meses nos Estados Unidos se deparou com conflitos familiares que perturbavam os seus estudos e

o seu descanso.

- O que estou fazendo aqui? Será que o meu avô estava certo quando disse que eu não deveria deixar o

meu trabalho e sair do meu país para cuidar e morar com crianças em um país estranho? – Se perguntava a neta

do seu Joaquim.

- Não, eu só estou tentando realizar um sonho e me tornar uma pessoa melhor, eu me respondia. E

fui levando. Durante os seis primeiros meses, conversei com minha host family várias vezes sobre a minha

insatisfação, sobre a paz que eu não estava tendo, sobre as conversas que tivemos quando ela se interessou pelo

meu perfil e me convidou para ser au pair na sua casa e acreditei que tudo poderia melhorar. No entanto, nada

mudou.

Flor decidiu então pedir rematch. Rematch? Mas você sabe o que isso significa? Não conheço quem

recomende, comentavam as pessoas ao redor.

- Se não for possível mudar de família, eu volto pra casa, mas não quero continuar aqui, respondia a jovem.

Após o comunicado à coordenadora, a representante da agência vai até a casa da família e tenta uma

conciliação. A tentativa faz parte do andamento. A troca de família é considerado o extremo. Não havendo

consenso, o caso é apresentado a coordenação geral da empresa e em seguida a au pair fica disponível para

encontrar uma nova família. O processo acontece como o match, só que nesse caso a agência trabalha para que

ele seja rápido. Ele dura em média duas semanas. Durante esse tempo, o intercambista continuará na casa da host

family, quando ambas as partes concordarem, ou na casa da LCC. Quando houver programação de trabalho, haverá

pagamento.

Page 31: Histórias de au pairs contadas em e-book

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A jovem paulistana ficou as duas semanas trabalhando normalmente na casa da família anfitriã. Ela

acompanhou seu processo pela sua página, no site da agência. Três famílias passaram, porém nenhum ficou e ela

voltou para o Brasil.

- Valeu muito a pena. Não me arrependo e recomendo. Alcancei um nível de inglês muito bom além da

autoconfiança, independência e amizades que quero carregar até o final da minha vida. Amadureci bastante e

aprendi a confiar em mim mesma. Para as meninas que forem se inscrever fica a dica: não sinta vergonha de

perguntar TUDO para as futuras famílias, pois essa conversa inicial vai definir o seu ano no exterior. Acredite no seu

sexto sentido e quando você tiver aquela sensação que “essa” é a família correta acredite, não tenha pressa e seja

rigorosa no processo de match. – Explica Flor.

Mima é uma amiga de Flor que também passou pelo rematch,

mas em um contexto diferente. A host family da jovem precisou de

alguém que ficasse com a família também no segundo ano, mas

Mima tinha planos de voltar ao Brasil após o seu décimo segundo

mês de intercâmbio. A host family então encontrou uma americana

para cuidar das crianças e enviou a brasileira para o processo de

troca de família.

- O processo dá uma revirada na nossa cabeça, mas não é um

bicho como eu ouvia falar. Na minha primeira semana, apareceu

uma família que não se encaixava com o que eu queria e eu disse

não. Na segunda, conversei e fechei com uma do estado que eu

tanto queria conhecer, a Califórnia. Lá vivi seis meses inesquecíveis

e hoje, um mês depois de voltar para casa, posso dizer que tenho

uma família nos Estados Unidos.

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A HISTÓRIA DE MIMA

- Não é só no Brasil que as coisas quebram... A porta emperrou, vamos ter que esperar a manutenção vir

consertar.

- Brasileiro, de onde?

- São Paulo, mas estou aqui há três anos. Estudo computação. Você está indo para St Jhon? Vi na sua

mochila. É uma boa universidade.

- Estou. Mas, fico lá apenas esta semana para participar de um treinamento. Vou morar em Atlanta como

au pair.

- Bom. Já ouvi falar desse programa. Boa sorte! Atlanta é uma cidade legal.

- Obrigada! Parece que o problema da porta foi resolvido.

Desembarcamos. Nos corredores do aeroporto JK, indicações de onde deveriam ir os americanos e o

resto do mundo. A fila dos estrangeiros era enorme. Até chegar a minha vez de passar pela polícia eu deveria

esperar uns 40 minutos. E assim aconteceu. Na minha hora, o policial sorriu quando viu a minha nacionalidade e a

atividade que iria desempenhar. Assinou o meu DS e carimbou o meu passaporte.

- Welcome! Where will you live?

- Atlanta. Thank you!

E eu segui. Peguei minha bagagem, passei por um outro policial que olhou meu passaporte e me mandou

seguir. Foram mais 100 metros e lá estava um senhor careca, bem vestido, com o meu nome impresso numa

folha. Foi mais fácil do que eu pensei! Sem muita conversa, ele pegou minha mala e caminhamos até o carro. Do

lado de fora chovia e ventava. O caminho até a universidade durou pouco mais de 1h. Durante esse tempo, ele

me fez três perguntas, de quantas crianças eu cuidaria, a idade e onde moraria.

Depois de quase 10h de voo de São Paulo até New York, me sentia cansada e ao mesmo tempo eufórica

para descobrir como tudo seria daqui pra frente.

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Na universidade, eu e um grupo de colombianas que chegaram poucos minutos depois de mim fomos

recebidas por Anne, uma simpática funcionária da agência. Na sala de entrada do alojamento, ela conversou e

dividiu o conjunto de estrangeira pelos quartos. Eu fiquei com a colombiana chamada Maria.

Naquela hora, senti verdadeiramente que eu estava nos Estado Unidos começando o meu ano como au

pair. Senti que estava sozinha e que a psicóloga Andrea Sebben estava certa ao afirmar que de fato, não se está

preparado para fazer intercâmbio. Meu primeiro choque foi com o idioma. Me segurei para não chorar enquanto

Anne falava. Não estou entendendo o que ela fala, como vou assistir aula, eu me perguntava. A sensação era de

desespero. Até aquele momento, nada de outras brasileiras. Eu sabia que seríamos oito, mas onde elas estavam?

Coloquei minha bagagem no quarto e corri pra o telefone. Liguei pra o meu namorado e já nas primeiras

palavras caí no choro. Por mais que ele me dissesse palavras de apoio e incentivo, não conseguia pensar em

coisas boas. Estava longe de tudo e todos que me eram familiar para quê? Por quê? Por opção. Será que eu de fato

precisava estar ali? Liguei também para uma das minhas tias. Diante de como a minha mãe ficou ao me ver partir

e de como eu estava me sentindo, preferi não falar com ela naquele momento. Não ajudaria. Pedi para que meu

namorado e minha tia dia avisassem a ela sobre a minha chegada.

Voltei para o quarto e tentei dormir. Três horas depois, tomei um banho e fui procurar o que comer.

Nos corredores, cruzei com algumas mexicanas que também iriam até a cafeteria, local indicado por Anne pra

as refeições. No local, o segundo embate cultural. A comida. Batata frita, um sanduiche de pão de forma, uma

salada crua, maçã, coca-cola e água mineral. Eram esses os alimentos disponíveis para o nosso almoço. Comi

uma maçã, chips e me dei por satisfeita. Num bate-papo mais em espanhol do que em inglês, compreendi que a

programação oficial do treinamento teria início naquela noite, na cafeteria.

De volta ao alojamento, encontrei as primeiras brasileiras, uma de São Paulo e a outra do Paraná.

Estivemos juntas conversando até o momento da reunião. Nesta hora, éramos oito diante dos mais de 200

intercambistas dos quais mais de 100 eram alemães. Com a ajuda das conterrâneas, compreendi as informações

da noite, que foi sustentada a base de pizza. Nessa mesma noite, na sala do alojamento, pude começar a sentir os

rigores exagerados das funcionárias da agência. Elas eram rudes e muitas vezes mal educadas na maneira de falar.

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Os dias seguintes começaram as 5h30 da manhã. Como o número de mulheres era grande, a disputa por

uma vaga nos banheiros começava cedo. As 7h, nós brasileiras tínhamos encontro marcado na cafeteria para

tomarmos café da manhã juntas. As 8h, começavam às aulas. Na minha sala, só eu de brasileira. Na minha

mesa, mexicanas, suecas e argentina. A minha professora, diferente da maioria das funcionárias da agência, era

agradável. Nos três dias de sala de aula, ela conversou sobre comunicação, desenvolvimento, nutrição, saúde e

segurança infantil. O momento mais difícil foi quando tive que fazer trabalho com um grupo de alemãs. Eu e sete

alemãs. Não entendia o que elas falavam e sempre tinha impressão de que elas estavam rindo de mim. No fim

do dia, eu chorava e me perguntava se conseguiria concluir o treinamento com êxito. A quinta-feira chegou e eu

consegui, recebi o meu certificado. Neste mesmo dia, participamos de um tour por Mannhattan. Muita correria e

pouca diversão. Na sexta-feira, despedidas das demais au pairs e partida rumo à casa da família.

- Com licença, é impressão minha ou eu ouvi vocês falarem português?

- Brasileira?

- Nordestina!

- Que legal! Au pair também?

- Sim. Estou indo pra Atlanta e vocês?

- Não acredito, eu também vou pra Atlanta e ela vai pra Califórnia. Meu voo é Delta e sai as 12:50.

- Maravilha! O meu também. Não estou mais sozinha...

Na hora marcada, eu e Lene embarcamos com destino à capital da Georgia. Depois de quase três horas

de voo estávamos no aeroporto internacional de Atlanta procurando nossas bagagens e nossas famílias. Trocamos

os números de telefone das nossas famílias e email e ela logo avistou o seu host. No meu caso, houve um

pequeno atraso, mas a pessoa encarregada de me buscar no aeroporto chegou com um dos meninos. Ela era

Dani, a secretaria do meu host e ele James, o filho mais novo. Seguimos para o estacionamento.

- Este é o seu carro. Gosta?

Respondi que sim e tentei disfarçar a minha feição, mas não sei se consegui. Era uma pequena

caminhoneta da Toyota. Se esse é o meu carro, imagine o do pai dos meninos, eu pensei. Antes de partirmos,

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James me entregou uma carta, segundo ele escrita pelo pai. No texto, palavras de acolhimento, afeto e um pouco

sobre cada membro da casa que eu viveria. O pai, Nicholas, o pequeno James, o filho mais velho Jhon e a filha

Ally. Os pais dos meninos são divorciados e o pai tem a guarda das crianças. Gracie, a mãe, mora sozinha na antiga

casa da família. Ally, na verdade, também não mora na casa, ela vive em um colégio interno em outro estado.

Dani conversou durante todo o caminho do aeroporto para casa. Perguntou sobre mim, minha família e

se surpreendeu quando eu disse que tinha namorado. Ela falou um pouco sobre os meninos, sobre a casa, sobre a

rotina do pai e disse que estaria sempre por perto para me ajudar.

- Você gosta de macarronada? Gosta de limonada? Vou preparar o jantar.

Impossível não ter boas impressões!

Na nova residência, um resort com apartamentos residenciais, conheci Jhon e o pai, que me deu as boas-vindas

e saiu. Do telefone de Dani, me comuniquei com minha família. Uma hora mais tarde, jantamos os quatro e ela

também saiu dizendo que voltaria logo. Ficamos eu, James e Jhon sozinhos por cerca de uma hora duas horas

depois de eu ter chegado à família. Dei para cada um deles uma camisa da seleção brasileira de futebol. Kaká e

Ronaldo eram os nomes.

- Conhece esta camisa?

- Não.

- Conhece esses jogadores?

- Não.

- Não acredito!

- Gostamos de futebol americano, Jhon joga. O outro futebol eu não gosto.

E lá se foram as camisas para um lugar no chão da sala de jogos...

- Me desculpe pela demora. A loja estava cheia.

Quando Dani voltou, trouxe com ela um telefone celular. O meu novo telefone. Me informou um pouco sobre o

uso e disse que eu poderia descansar. E eu logo dormi.

No dia seguinte, tive a primeira conversa com o meu host, fui ao supermercado com Dani, assisti ao treino

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de baseball de James e dei uma volta na cidade com Dani e os meninos. No domingo, fomos à missa, eu o pai

e os meninos, almoçamos juntos e dirigi meu carro com Dani. A noite, conheci a mãe dos meninos e a filha do

casal, que chegavam de viagem. Além disso, recebi orientações da secretária sobre como começaria a segunda-

feira, oficialmente meu primeiro dia de trabalho. Para não haver dúvidas de que estava entendendo, ela escreveu

em uma folha desde a hora que eu deveria acordar os meninos, até o que eles comeriam e o horário em que

deveriam estar prontos. As 7h30, ela estaria lá para levá-los à escola comigo. A aula deles começaria as 8h. E

assim aconteceu.

Nesse dia, comecei a entender como era a alimentação dos meninos. Na minha conversa com Nicholas, ele

informou sobre as alergias do pequeno: amendoim, lactose, glúten e ovos, mas não sobre seus hábitos. Eles

não gostavam de frutas nem legumes, em especial o mais velho e levavam para o almoço na escola chips e

sanduiche.

Conheci Maria e suas filhas, responsáveis pela limpeza da casa e das roupas. Elas são do Perú mas estão nos

Estados Unidos há mais de dez anos e a mais de cinco trabalham para Nicholas. São pessoas de confiança para a

família.

Durante toda a primeira semana, fui deixar e buscar os garotos na escola acompanhada de Dani. Enquanto

eles estavam na escola – das 8h as 3h ou 4h da tarde – eu estava em casa lendo, usando o computador ou

providenciando algo para mim ou para os meninos com Dani. Quando James e Jhon chegavam da escola, eu

ajudava-os a fazer os exercícios de casa e íamos para a prática de esporte. Em alguns dias da semana, esta ordem

era invertida. O jantar, que a partir de qualquer dia passaria a ser preparado por mim, naquela semana foi em

restaurantes. Fomos a diferentes lugares, mas o pedido dos meninos era sempre o mesmo, frango ou hambúrguer

com batata frita. Quando Dani pedia, James comia um vegetal, mas Jhon esquivava-se.

No final da primeira semana, recebemos a coordenadora local da agência. Layse conversou comigo, Dani e

Nichola sobre os direitos e deveres de ambas as partes e assinamos um termo de responsabilidade. Ela lembrou

que eles precisavam me auxiliar para retirar o social security e a permissão americana para dirigir.

Nesse mesmo dia, cozinhei para o almoço. Preparei uma lasanha à bolonhesa de maneira que James pudesse

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comer. Ele provou e não gostou. Jhon não comeu. Comemos eu e Nicholas.

Na segunda semana, comecei a desenvolver minhas atividades sozinha e o pai passou a viajar. Acordava os

meninos as 6h30, fazia-os escovar os dentes – as vezes tomar banho – vestirem a farda, aplicar uma loção nos

braços e pernas no mais novo – em função de sua alergias – preparava café da manhã e dirigia até a escola. As

3h, buscava-os na escola. Alguns dias, após a aula, Jhon tinha treino de futebol americano, então passávamos em

casa, eles lanchavam, trocavam de roupa e íamos para um parque, onde acontecia a prática esportiva, que durava

2h. Outros dias, os treinos eram no finalzinho da tarde. Nesse caso, iniciávamos as atividades de casa e só saímos

poucos minutos antes do início do esporte. Na volta pra casa, o jantar – as vezes banho – e cama. Quando tudo

estava feito, já passava das 9h30 da noite.

Com o passar do tempo fui me sentindo mais a vontade e mais próxima dos meninos. A maior parte do

tempo, eles passavam comigo. O pai viajava toda semana. Por um, dois, três dias e as vezes pela semana toda. A

mãe deles continuou algum tempo morando em Atlanta no entanto, pouco encontrava os meninos.

A agenda dos garotos era como a do pai, muito ocupada, principalmente a do mais velho. Ao longo do ano,

Jhon passou a ter aula de piano em casa. Durante a semana, eles quase não tinham tempo de sentar para

brincarem juntos. Era escola, treino, atividades da escola para casa. Nada de televisão ou jogos eletrônicos na

semana. De vez enquanto, eles tinham compromissos com o esporte no sábado e no domingo. Foi assim pela

maioria das semanas em que estive com a família. Aos poucos, sentia o quanto aquelas crianças eram carentes e

percebia que todas aquelas atividades vinham em parte para preencher a ausência da família.

Dani sempre estava por perto. Era ela quem me dava ordens, quem me explicava o que e como deveria

ser feito. Algumas vezes, fazia isso pessoalmente, mas normalmente era por telefone, através de chamadas

ou mensagens de texto. A jovem era quem fazia os meus pagamentos. $195,75 vezes dois, três e até quatro.

Abrimos minha conta no banco, mas ela sempre preferiu me dar cheque e não costumava fazer isso toda sexta-

feira, como estava combinado. Ela sempre se mostrava muito ocupada. Cuidar das crianças não era o trabalho

dela. Na verdade, a jovem aproximou-se muito da família – trabalha com Nicholas há sete anos e hoje é como

uma filha. Ao longo desse período, foi absorvendo os espaços que existiam e que lhe custam tempo mas rendem

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muitas vantagens.

Com menos de dois meses, eu já tinha computador de ponta e cartão de crédito da família. As compras

de alimentos e materiais em gerais para casa era de minha responsabilidade, além de tudo que os garotos

precisassem.

Quanto ao meu social security providenciamos quase dois meses depois da minha chegada. A minha

habilitação nunca procuramos fazer, apesar de eu dirigir todos os dias. O meu curso, que quando eu cheguei ela

falou em me ajudar, saiu dois meses depois e com a ajuda de outra pessoa.

Essa pessoa foi a amiga que tive no período em que morei em Atlanta. Conheci Flor no meu primeiro meeting,

que não aconteceu em função de uma chuva – o local escolhido pela LCC para o encontro do mês de setembro era

a céu aberto. Estivemos todas lá, mas ela nos liberou. Antes disso, me apresentou a brasileira que estava na cidade

há quatro meses. Nos identificamos e não perdemos mais o contato. Ela me levou a Georgia Tech, universidade na

qual estudava e consegui começar dois cursos de inglês em outubro.

- Mima, que tal aquela feijoada hoje?

- Ótima ideia!

Comer era uma dos nossos programas favoritos nos fins de semana. Na região metropolitana de Atlanta,

descobrimos uma cidade com muitos brasileiro, lojas e serviços que os americanos não têm. Guaraná, pão de

queijo, açaí, Nescau, cajá, coxinha, empadinha e várias outras delícias brasileiras nós encontrávamos por lá. Na

padaria de um brasileiro, todos os sábados têm feijoada com direito a couve, farofa e macaxeira.

Algumas das nossas comidas, eu levei para os garotos provarem, mas as que eles provaram, não aprovaram.

Além disso, cozinhei carne, frango, peixe, legumes, sopas, massa e arroz de diferentes maneiras, os únicos

alimentos que eles comiam eram frango e peixe empanado, Jhon, e macarronada, James. O pai, a mãe e Dani

sugeriam vários pratos e eu pesquisava na internet como prepará-los, mas não passava pelo paladar dos meninos

de 8 e 9 anos. Por vezes, me sentia triste, contudo, eu sabia que o problema não era eu. Maria me dizia que eles

nunca foram fáceis quando o assunto é comida. Nicholas chegou a contratar uma chefe de cozinha para preparar

alimentos para James e Jhon, porém não funcionou. Assim como os alimentos que eu preparava, quem comia a

comida da chefe era eu e Dani e Nicholas quando estavam em casa.

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- James e Jhon, Mima me falou que quase chora quando coloca comida no lixo porque vocês não comem,

alguma vezes nem provam, e fica velha. Vocês sabem por que ela quase chora? Perguntem para ela.

- Por quê?

- Enquanto nós jogamos comida no lixo aqui nos Estados Unidos, no Brasil e em vários países ao redor do

mundo, muitas pessoas, muitas crianças, não tem alimento para fazer se quer uma refeição ao dia. Isso é para

mim, muito triste.

- É possível enviar comida para essas pessoas?

- Infelizmente não James.

E tudo continuou. Quer dizer, depois de outubro, a situação ficou ainda mais delicada. A mãe das crianças

que apesar de não manter muito contato morava na mesma cidade, mudou para o estado da Califórnia e o pai

intensificou seu ritmo de viagens. Os meninos sentiram muito pela maior distância dos pais. Chegamos a passar

semana e fim de semana sozinhos. Eram eventos escolares e competições esportivas nas quais eles estavam

acompanhados apenas da au pair. Quando Nicholas voltava, tinha uma enorme dificuldade de cobrar dos filhos

que fizessem algo que eles deveriam, mas não gostavam.

Eu era responsável por acompanhar o andamento das aulas, das notas, as atividades de sala, de casa e todos

informativos que tivessem relacionados com os meninos pelo site da escola, pelas agendas e em contato com

treinadores e professores. No período das mudanças, James e Jhon perderam algumas atividades. Mesmo com o

acompanhamento, algumas atividades passavam porque os filhos de Nicholas omitiam, não escreviam em suas

agendas. Além disso, James e Jhon tornaram-se um pouco agressivos. Cheguei a acordar algumas noites com

James me chamando porque Jhon estava batendo nele.

A situação passou a ficar difícil pra mim também. Dani passou a cobrar ainda mais e meu tempo livre deixou

de ser respeitado. Conversei com Nicholas, com Dani e com minha coordenadora. Um por vez. O pai me ouvia,

dizia que eu tinha razão, mas a situação continuava. Dani não me dava razão e dizia que eu tinha benefícios que

não eram obrigatórios no programa. Eu dizia pra ela e pra ele que tudo que eu tinha fora do comum do universos

dos au pairs era por necessidade deles. Layse sugeria conversa e mais conversa.

Ainda em novembro, Dani me perguntou se eu estava interessada em estender o programa pelo segundo

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ano, disse que a família precisava dessa certeza. Eu respondi que infelizmente, meu objetivo era cumprir apenas

o primeiro ano, que tinha outros planos no Brasil. Então, ela me disse que passaria a procurar alguém para me

substituir no ano seguinte.

Em dezembro, eles trouxeram alguém da família de Nicholas para conhecer a rotina dos meninos. Ela passou

dois dias acompanhando as minhas atividades com James e Jhon. Na duas últimas semanas de dezembro, eu

entrei de férias. Havia combinado previamente a data com Nicholas. Meu namorado foi para os Estados Unidos. A

primeira semana, passamos em Atlanta. Ficamos hospedados em um hotel. Nicholas viajou com os filhos e a filha

para o Texas. Passou natal com seus pais e demais familiares.

- Em função do tempo, da neve, todos os aeroportos da cidade de New York estão fechados. Todos os voos

estão cancelados. Não existe uma previsão de quando a situação será resolvida.

Eu e o meu namorado não acreditamos quando chegamos ao aeroporto de Atlanta. Os planos eram passar

nossa segunda semana de férias e a virada do ano em New York. Para conseguirmos, fomos de avião até uma

outra cidade do estado de New York e depois viajamos de ônibus por mais sete horas até o destino desejado.

Mesmo com toda a neve e frio, a cidade “fervia”. Enquanto as máquinas limpavam Mannhattan, muitas pessoas

de todo o mundo passeavam e consumiam. Lojas, bares, restaurantes e pontos turísticos estavam lotados. Mesmo

vivendo um réveillon bem diferente dos anteriores – sem a família, os amigos, as comidas, músicas e animação

de costume – a viagem foi maravilhosa. O mais me encantou foi, sem dúvida, a Broadway. Os espetáculos são

encantadores.

A volta para Atlanta foi mais tranquila. Nada de ônibus. De lá, meu namorado voltou para o Brasil e eu voltei ao

trabalho na casa de Nicholas.

Duas semanas depois, o tempo fechou. Atlanta parou em função de uma nevasca e eu adoeci. Respirava com

dificuldade, sentia dores de cabeça, moleza e febre. Procurei um médico que após exames diagnosticou uma

bronquite. Eu tinha o seguro saúde completo e ainda assim paguei $35 dólares pela consulta. Numa farmácia,

gastei mais $200 com medicamentos. 24h após o início do uso da medicação, já me sentia bem melhor. Com

sete dias, estava recuperada.

- Amanhã venho tomar café com você.

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- Os meninos também devem esperar por você para comerem?

- Não.

As 11h da manhã, Dani chegou e descemos para o restaurante do hotel onde eu morava com a família. Eu

não imaginava o motivo do café. Na verdade, já tinha me alimentado, mas pedimos uma sopa e enquanto

aguardávamos, a secretária de Nicholas contou histórias sobre os meninos, sobre ela, sobre Nicholas, sobre sua

ex-mulher – algumas que inclusive eu já sabia... e me enviou para o rematch. Dani me disse que em função dos

negócios, o meu host continuaria viajando bastante, ela mudaria a qualquer momento para a Índia e os meninos

precisavam de alguém para cuidar deles por tem indeterminado.

- O mês de janeiro está terminando, agosto (mês que eu retornaria para o Brasil) não vai demorar e a pessoa

que veio conhecer a rotina dos meninos disse que está pronta para começar. Ela chega na próxima semana.

Quanto a você, não se preocupe, poderá ficar conosco o tempo que for necessário para encontrar uma nova

família. Eu já falei com Layse e ela afirmou que a agência está pronta para lhe ajudar na busca por outra família.

Ela disse que não será difícil.

Perdi as palavras. Minha cabeça e meu coração eram uma confusão de ideias e sentimentos. Chorei e liguei

para uma das minhas tias.

- Não sei se quero continuar nos Estados Unidos.

Tentei, durante dois dias, falar com a minha LCC por telefone e email. Só consegui quando contactei o escritório

da agência.

- Fique tranquila, encontraremos outra família. Você quer continuar em Atlanta ou ir para outro lugar? Tem

uma que mora a poucos minutos daqui e está procurando au pair. É uma família que está entrando no programa,

também de pais divorciados, cujos dois filhos moram com o pai, mas a relação da mãe é diferente – ela participa

diretamente da criação dos filhos. Você pode vir para minha casa se preferir ou continuar aí até a situação ser

resolvida. Caso fique aí e trabalhe, receberá normalmente.

Depois que o susto da notícia passou e eu consegui falar com a Layse, refleti sobre as possibilidades que eu

tinha. Poderia me dar uma chance de conhecer o programa de uma nova maneira, com uma família formada

pela figura da mãe e do pai juntos, com outras crianças, conhecer outro lugar, fazer novas amizades e estudar em

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outra universidade ou voltar para a minha família no Brasil. A minha situação não é ruim, eu pensei. Decidi tentar

concluir o meu ano de intercambio, eu ainda não tinha alcançado todos os meus objetivos.

- Mima, meu nome é Amy, moro na Califórnia, tenho duas filhas e estou a procura de uma au pair.

Podemos conversar?

Era o final da minha primeira semana de rematch. Naquele momento, eu estava trabalhando, então

disse que retornaria a ligação logo que possível, e assim o fiz. Duas horas depois eu liguei. A família era formada

por pai, mãe e gêmeas com dois anos e dois meses. A cidade era Livermore, 40 minutos de San Francisco. O

trabalho, brincar com as meninas, ir a parques, alimentar, dar banho e organizar as coisas delas. Fechamos naquele

momento. Cheguei a nova casa no dia 2 de fevereiro.

Vivi nos segundo seis meses, uma experiência completamente nova e diferente. Ela se diferenciou desde

a formação da família, sexo das crianças, idade, cor de pele, classe social até os hábitos, educação, comportamento

e estilo de vida.

Com as gêmeas, Claudia e Jenny, o meu trabalho começava quando a mãe delas ia trabalhar e terminava

quando ela ou o pai, Ray, voltava para casa. As 45h semanais eram preenchidas da segunda a sexta-feira. Em

qualquer trabalho a mais, eu recebia a mais e toda sexta-feira meu pagamento entrava na minha conta bancária.

Eu fui a segunda intercambista da família. A primeira, também brasileira, começou a ensinar português

para as meninas. Amy fala português, conhece e gosta do Brasil e achou interessante que as gêmeas também

vivessem o intercâmbio aprendendo o idioma. Eu cantava, conversava e contava história em português. A cada

dia, elas compreendiam e falavam melhor. Isso não atrapalhou no aperfeiçoamento do meu inglês, era com os

pais que eu tinha diariamente os maiores diálogos, sempre no idioma nativo. Jantávamos juntos e conversávamos

sobre como havia sido o dia e assuntos diversos.

Na semana em que eu cheguei, a minha host me levou a universidade da cidade, fiz prova e ingressei em

um novo curso de inglês. No segundo meu segundo mês na região, tive a oportunidade de estudar em uma das

melhores universidades do mundo.

- Vou fazer um curso em Stanford, vamos?

- Em Stanford? Sério? Não é muito longe?

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- Sim, em Stanford. Palo Alto fica a mais menos uma hora e meia daqui. Estou querendo fazer um curso

de marketing. A aula é apenas uma vez por semana, durante dois meses. Fale com sua host. Vamos no meu carro

e dividimos o combustível. É única esta oportunidade!

A minha host concordou e a experiência foi única.

Em Livermore e cidades vizinhas fiz várias amizades, a maioria com brasileiras. A região tinha muitos

intercambistas, de várias partes do mundo. Conheci uma au pair da Polônia e apesar das nossas diferenças

culturais estivemos muito próximas. Todos os fins de semanas, eu, as brasileiras e a polonesa programávamos

atividades juntas. San Francisco foi um dos lugares onde mais passeamos. A cidade é linda!

Com todo o esforço físico que Claudia e Jenny exigiam de mim todo os dias, para tomar banho, trocar

fralda, trocar de roupa, empurrar carrinho, pegar no braço de vez enquanto... eu vivia mais tranquila, dormia

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mais tranquila. Era divertido e prazeroso estar com elas. Além de mim, seus pais dedicavam tempo para cuidar e

educar as crianças. As regras eram as mesmas, independente de quem estivesse com elas. E com raras exceções –

normal a todas as crianças – elas eram bastante disciplinadas.

- Hora de tomar banho. Um, dois, três e já!

E lá iam elas correndo.

- Hora de escovar os dentes. Um, dois, três e já!

E lá iam elas correndo.

- Hora de trocar de roupa. Um, dois, três e já!

E lá iam elas correndo.

Era assim todos os dias.

-Parabéns pra você, nesta data querida, muitas felicidades, muitos anos de vida.

Foi cantando essa música em português que elas me desejaram feliz aniversário. Amy preparou o bolo,

Ray providenciou as velas e as meninas cantaram e bateram palmas. Começamos a cantar “Parabéns pra você”,

“Atirei o pau no gato”, “Dona aranha”, “O palhaço picolé” e várias outras cantigas infantis desde quando cheguei.

Hoje, elas cantam quase que perfeitamente.

Eu vibrava com cada palavra, número e frase nova que elas pronunciavam em português assim como

cada novo avanço meu no inglês. Me sentia feliz por estar contribuindo com a educação delas e com a minha.

- Você será muito bem vinda em permanecer conosco se quiser estender o programa.

Depois de dois meses, ouvi várias vezes essa frase. Foi difícil dizer que eu não ficaria. Em pouco tempo,

me sentia, de fato, um membro da família e a cada dia, me apegava mais as gêmeas. Abraços, beijos, gestos e

palavras de carinho não faltavam.

- Eu preenchi hoje o requerimento solicitando o meu voo de volta ao Brasil.

Ensaiei para comunicar a Amy e Ray que a minha decisão estava tomada. O desejo de voltar era maior,

mas foi bem mais difícil falar com a host family sobre o retorno, do que com a minha família no Brasil sobre a

decisão de fazer intercâmbio.

Amy, então, me pediu ajuda para encontrar outra au pair brasileira. Assistimos vídeos juntas, ela trocou

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email com algumas e decidiu por Juju, 26 anos. Durante dois meses, passamos a manter contato com também

nordestina para que ela conhecesse melhor a família e se sentisse confortável para o intercâmbio.

- Claudia, Jenny, uma convidada está vindo do Brasil nos conhecer e morar conosco.

Amy sempre me mostrava um texto falando sobre como explicar para as crianças a troca de au pairs. Ela

estava preocupada com a reação das meninas. Quando a primeira intercambista se foi e eu cheguei elas eram

pequenas e não entendiam muito bem. Quando Juju chegou, elas receberam-na muito bem. Após a sua chegada,

passamos uma semana trabalhando juntas. Amy preferiu que fosse assim para que eu ajudasse Juju com a nova

rotina, ela pudesse esclarecer facilmente qualquer dúvida e para que as meninas se sentissem seguras com a

mudança.

Na minha última semana, viajei com uma tia e um

tio pelo estado da Califórnia. Eles foram conhecer os Estados

Unidos, a minha host family e me ajudar com as bagagens,

que aumentaram consideravelmente em um ano. Amy, Ray,

Claudia e Jenny os receberam e acolheram muito bem.

Dois dias antes da minha partida, eles ofereceram

um jantar de despedidas.

- A mãe de Mima, os irmãos, o namorado, todos

estão com saudades. Mima vai para o Brasil, mas ela volta

pra nos visitar.

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ESTA OBRA FOI COMPOSTA COM AS FONTES DAX E BRADLEY HAND ITC, EM FORMATO

E-BOOK, EM DEZEMBRO DE 2011.

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O livro-reportagem “Histórias de au pairs contadas em e-book” é uma

apresentação do que é e como funciona o intercâmbio cultural para au pair

nos Estados Unidos. Relata com base em depoimentos de um grupo de jovens

brasileiras que iniciaram o programa entre agosto de 2010 e agosto de 2011 quais

são as oportunidades e dificuldades da experiência. O termo au pair vem do francês

e significa, ao par, igual. A tradução indica a relação a que se propõe a ou o jovem

entre 19 e 26 anos em um país de língua estrangeira numa família com criança(s),

na qual a ou o jovem tem responsabilidades cuidando das criancas e, em troca,

recebe moradia, uma bolsa de estudos e remuneração semanal.