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Revista Portuguesa de Nefrologia e Hipertensão S 17 Rev Port Nefrol Hipert 2004; 18 (SUPL 1): 17-29 Hiperparatiroidismo Secundário: necessidade de novas abordagens terapêuticas Aníbal Ferreira Serviço de Nefrologia. Hospital Curry Cabral. Lisboa O hiperparatiroidismo secundário (HPTH 2º) constitui uma das patologias mais relevantes no âmbito da patologia óssea associada à urémia, globalmente designada por osteodis- trofia renal (ODR). Apesar das múltiplas alternativas terapêu- ticas desenvolvidas na última década e da par- ticular atenção dada ao desenvolvimento de desequilíbrios do metabolismo fosfo-cálcico desde estadios precoces do desenvolvimento da insuficiência renal crónica (IRC), a preva- lência do HPTH 2º moderado e grave tem-se mantido estabilizada 1 . O recurso à paratiroidectomia cirúrgica, para controlar o HPTH 2º grave e refractário à terapêutica médica, tem sido a única alternativa terapêutica, sobretudo nos doentes com mais de uma década em programa de prótese dialítica. Para além da morbilidade claramente associada à gravidade do HPTH 2º, recentes estudos epidemiológicos têm evidenciado uma forte associação entre o HPTH 2º e a morta- lidade dos doentes dialisados 2 . Os níveis séricos de paratohormona intacta, de calcémia, de fosfatémia e do produto fosfo-cálcico surgem associados com as calcificações extra-esque- léticas (nomeadamente vasculares e valvulares cardíacas) e com o aumento da morbilidade e da mortalidade cardio-vascular 2 . ESPECTRO DA OSTEODISTROFIA RENAL Por osteodistrofia renal entende-se um espectro de alterações ósseas observadas no doente urémico, que se estende da doença óssea de elevada remodelação (frequentemente designada, no passado, como osteíte fibrosa quística) até à doença de baixa remodelação ou adinâmica. Entre estes dois extremos encontram-se ainda as situações com compro-

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Revista Portuguesa de Nefrologia e Hipertensão S 17

HIPERPARATIROIDISMO SECUNDÁRIO: NECESSIDADE DE NOVAS ABORDAGENS TERAPÊUTICAS

Rev Port Nefrol Hipert 2004; 18 (SUPL 1): 17-29

Hiperparatiroidismo Secundário: necessidadede novas abordagens terapêuticas

Aníbal FerreiraServiço de Nefrologia. Hospital Curry Cabral. Lisboa

O hiperparatiroidismo secundário (HPTH 2º)constitui uma das patologias mais relevantesno âmbito da patologia óssea associada àurémia, globalmente designada por osteodis-trofia renal (ODR).

Apesar das múltiplas alternativas terapêu-ticas desenvolvidas na última década e da par-ticular atenção dada ao desenvolvimento dedesequilíbrios do metabolismo fosfo-cálcicodesde estadios precoces do desenvolvimentoda insuficiência renal crónica (IRC), a preva-lência do HPTH 2º moderado e grave tem-semantido estabilizada1.

O recurso à paratiroidectomia cirúrgica, paracontrolar o HPTH 2º grave e refractário àterapêutica médica, tem sido a única alternativaterapêutica, sobretudo nos doentes com maisde uma década em programa de prótesedialítica.

Para além da morbilidade claramenteassociada à gravidade do HPTH 2º, recentes

estudos epidemiológicos têm evidenciado umaforte associação entre o HPTH 2º e a morta-lidade dos doentes dialisados2. Os níveis séricosde paratohormona intacta, de calcémia, defosfatémia e do produto fosfo-cálcico surgemassociados com as calcificações extra-esque-léticas (nomeadamente vasculares e valvularescardíacas) e com o aumento da morbilidade eda mortalidade cardio-vascular2.

ESPECTRO DA OSTEODISTROFIA RENAL

Por osteodistrofia renal entende-se umespectro de alterações ósseas observadas nodoente urémico, que se estende da doençaóssea de elevada remodelação (frequentementedesignada, no passado, como osteíte fibrosaquística) até à doença de baixa remodelaçãoou adinâmica. Entre estes dois extremosencontram-se ainda as situações com compro-

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misso da mineralização óssea em grau variável,como é o caso da “doença óssea mista” e daosteomalácia.

Na avaliação de uma biopsia óssea, e paracaracterização do tipo e gravidade da ODR,têm de ser avaliados 3 parâmetros: a remo-delação óssea, a mineralização do tecidoosteóide e a quantificação de eventuaisdepósitos de metais na superfície trabecular(alumínio, ferro).

A doença óssea de elevada remodelação ouosteíte fibrosa quística caracteriza-se pelapresença de fibrose peri-trabecular (que, emsituações extremas, pode comprometer aeritropoiese), acompanhada de aumento dareabsorção e da formação óssea3 (Figura 1).Estas 2 últimas resultam da actividade dososteoclastos e dos osteoblastos, respecti-vamente, podendo encontrar-se desequilibradasnum ou noutro sentido e assim condicionar“balanços” positivos ou negativos no volumeósseo total4 (Figuras 2 e 3).

Em situações de osteíte fibrosa grave a cor-tical óssea (formada por osso compacto)encontra-se frequentemente com extensas

áreas de porosidade aumentada, resultantes doaumento da reabsorção óssea. Esta alteraçãoda estrutura do osso cortical contribui para oaumento do risco de fractura atendendo àdiminuição da resistência óssea3,5,6 (Figura 4).

A avaliação dos parâmetros dinâmicos érealizada através da análise e quantificação daextensão das marcações pelas tetraciclinas. OHPTH 2º caracteriza-se pela presença deextensas marcações, de tipo duplo, quer no ossocortical, quer no osso trabecular (Figura 5).

A osteíte fibrosa quística constitui a ex-pressão óssea do hiperparatiroidismo secun-dário e surge (com gravidade variável) em cercade 50% dos doentes urémicos na fase prédialítica e início de diálise (IRC fase 5)4,7.

No outro extremo do espectro da osteo-distrofia renal surge a doença óssea de baixaremodelação, ou doença adinâmica. Nestapatologia observa-se uma acentuada de-pressão da remodelação óssea, frequente-mente sem osteoclastos activos evidenciáveis,mesmo com colorações específicas.3,6

A doença adinâmica surge mais frequen-temente nos doentes diabéticos e idosos, com

Figura 1. Biopsia óssea evidenciando extensas zonasde fibrose peritrabecular. A formação e a reabsorçãoóssea estão muito estimuladas. Coloração pelo azulde toluidina, evidenciando a azul mais escuro o tecidoósseo mineralizado e a azul mais claro o tecido osteóide.

Figura 2. Osteoclastos (células rosadas, evidenciadaspela coloração da fosfatase ácida) em processo dereabsorção óssea activa.

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uma prevalência entre 30 a 50% dos doentesbiopsados. Na maioria dos casos é de natu-reza iatrogénica, resultando de paratiroi-dectomia cirurgica prévia ou de excesso deterapêutica com cálcio e/ou vitamina D. Aexposição ao alumínio, ainda que progressiva-mente mais rara, continua a constituir uma

causa de doença de baixa remodelação óssea8.A presença de osso com baixa remodelação

tem sido associada ao aumento da incidênciade fracturas, a algias ósseas e ao incrementodo risco de calcificaçãoes extra-esquelécti-cas2,9.

Num estudo recentemente publicado porLondon e col., evidenciou-se uma associaçãosignificativa entre a presença de calcificaçõesvasculares (avaliadas por ecografia e radiologiaconvencional) e a diminuição da remodelaçãoóssea em 58 doentes hemodialisados. Apresença de calcificações vasculares extensas(em mais de três territórios vasculares) asso-ciou-se ao diagnóstico histológico de ossoadinâmico (incluindo parâmetros dinâmicamediante marcação pela tetraciclina)10.

As situações de osteomalácia são muitoraras na actualidade (menos de 1% na nossaexperiência), desde que foram eliminados riscosde exposição crónica e maciça ao alumínio.Continua a obervar-se, em casos pontuais,após exposição a metais pesados ou emsituações de carência grave em vitamina D. Ahistologia óssea caracteriza-se por um compro-

Figura 3. Lacuna de “howship” ou ninho de osteoclastosactivados. Coloração pela fosfatase ácida.

Figura 4. Aspectos da cortical óssea alterada, com perda doaspecto compacto e aquisição de estrutura “trabeculada”. Estasimagens são características do hiperparatiroidismo secundáriograve e acompanham-se de elevado risco de fractura, pordiminuição da resistência óssea.

Figura 5. Marcações pelas tetraciclinas, extensas e de tipoduplo, traduzindo uma elevada velocidade de aposição óssea ede mineralização, as quais caracterizam o hiperparatiroidismosecundário.

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misso da mineralização, caracterizado por umacentuado aumento da superfície e do volumeosteóide11. A remodelação óssea pode estaraumentada, normal ou deprimida.

Apesar dos níveis séricos de paratohormonaintacta (iPTH) serem relevantes na caracte-rização da remodelação óssea, o acesso aoutros parâmetros bioquímicos (ex: isoformaóssea da fosfatase alcalina; piridinolina e “crosslinks” do colagénio) é, frequentemente, degrande utilidade clínica11,12. Estes marcadorespermitem, de forma não invasiva, repetida eseriada, obter uma informação dinâmica daevolução da remodelação óssea e da eficáciade eventuais intervenções terapêuticas.

Finalmente, o recurso à biopsia óssea comhistomorfometria, conduz ao diagnóstico pre-ciso do tipo de osteodistrofia renal, nassituações em que a avaliação não invasiva nãoé suficiente. Qi e col, por exemplo, não conse-guiram predizer a remodelação óssea em cercade 30% dos seus doentes, apenas com basenos níveis séricos de iPTH. Estes autoresrecomendaram a realização de biopsia óssea,antes de iniciar terapêutica substitutiva comvitamina D, em todos os doentes com níveis deiPTH entre 65 e 450 pg/mL.

Ainda que os nossos critérios para a reali-zação de biópsia óssea sejam menos amplos,pensamos que esta técnica (realizada em re-gime de ambulatório, sob anestesia local) sejustifica, pelo menos: antes da realização deparatiroidectomia; na suspeita de intoxicação pormetais pesados; em doentes sintomáticos ecom hipercalcémia refractária; e na osteodis-trofia renal após transplantação significativa13.Nesta última situação é frequentemente difícilinterpretar os marcadores não invasivos numdoente com ODR de alta ou baixa remodelaçãoantes do transplante, sujeito a imunossu-pressores com diferentes efeitos (frequente-mente antagónicos) sobre a remodelação (ex:

prednisolona, ciclosporina, rapamicina) e comdisfunção parcial do enxerto13.

Com o desenvolvimento de novas terapêu-ticas da ODR, permitindo um controlo maisrápido e eficaz do hiperparatiroidismo secun-dário a técnica de histomorfometria ósseaganhou um interesse crescente na caracteri-zação da osteodistrofia renal e na avaliação daeficácia e segurança das diversas abordagens.

CONSEQUÊNCIAS CLÍNICAS DOHIPERPARATIROIDISMO SECUNDÁRIO

Desde os estadios iniciais da insuficiênciarenal crónica (IRC grau 2) começa a verificar-se uma elevação dos níveis séricos deparatohormona intacta, na ausência de qualquerintervenção terapêutica. Quando o débito dofiltrado glomerular se situa entre 30 e 60 ml/min(IRC grau 3) observa-se igualmente umaelevação, ainda que subtil, dos níveis séricosde fósforo.

O HPTH 2º, sobretudo nas suas formas maisgraves, manifesta-se frequentemente por sinto-mas de fraqueza muscular, algias musculo-esqueléticas, e prurido. Como já foi referido, orisco de fractura está aumentado devido àdiminuição do volume ósseo total e à reduçãoda espessura e da robustez da cortical óssea(Figura 4).

Tendo em conta a evolução lenta do HPTH2º e as co-morbilidades frequentes da popu-lação dialisada, esta patologia instala-se, muitasvezes, de forma incidiosa e os sintomas sãofrequentemente subvalorizados.

Em situações muito avançadas podemobservar-se alterações esquléticas marcadas,com hiperostose e deformações ósseas,nomeadamente dos ossos do crâneo e da face(leontíase facial)14.

Algumas das complicações associadas ao

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HPTH 2º são de grande significado clínico econtribuem, muito provavelmente, para oaumento da morbilidade e da mortalidade quetem vindo a ser descrita, nestes doentes, aolongo dos últimos anos (ver abaixo).

Para além do quadro de osteíte fibrosa, oHPTH 2º tem sido associado a calcificaçõesvasculares e valvulares, disfunção do sistemanervoso central e periférico (anormalidades noEEG e atraso na condução motora), pancreatite,dislipidémia (hipertrigliceridémia e compro-misso da actividade da lipase hepática),alterações endocrinológicas (diminuição dosníveis séricos de testosterona), compromissoda resposta imunitária (depressão da fago-citose, diminuição da produção de imunoglo-bulinas) e redução da vida média eritrocitária15,16.

As calcificações extra-esqueléticas podemsurgir em múltiplas zonas, mas localizam-sefrequentemente nas zonas peri-articulares(joelhos, ombros, cotovelos e interfalângicas),condicionando significativa deformação eimpotência funcional17. Estas calcificações sãohabitualmente constituidas por cálcio amorfo ousob a forma de hidroxiapatite, muito seme-lhantes às observadas na constituição do ossonormal.

A síndroma da calcifilaxia (actualmentedesignada “Calcific Uremic Arteriolopathy-CUA”)caracteriza-se pela calcificação de artérias eveias de médio e pequeno calibre, conduzindoao aparecimento de nódulos sub-cutâneosmuito dolorosos que evoluem para a ulceraçãoe infecção18,19. Histologicamente observam-sedepósitos de cálcio intra-luminais, ocasional-mente proliferação da íntima e necrose da pelee tecido adiposo subcutâneo20.

Esta síndroma surge mais frequentementeem doentes com HPTH 2º grave, habitualmentehá mais de uma década em diálise e associa--se a elevada morbilidade e mortalidade. OHPTH 2º parece ser um factor de risco inde-

pendente de calcifilaxia e nalguns casos oquadro foi revertido após paratiroidectomia.

A calcifilaxia-CUA não é, no entanto, umacomplicação específica do HPTH 2º visto que,ocasionalmente, pode observar-se em doentescom níveis séricos reduzidos de iPTH oumesmo em doentes sem insuficiência renal21.

O processo de calcificação vascular, nomea-damente das coronárias e de artérias de médioe grande calibre, parece começar desde esta-dios precoces do desenvolvimento da insufi-cência renal. Valores elevados de fósforo sérico,do produto fosfo-cálcico, bem como da dosede cálcio ingerida surgem como factores derisco de calcificação vascular nos doentesurémicos9. A calcificação vascular nestesdoentes correlacionou-se ainda com a idade ecom o tempo em hemodiálise22.

Goodman e col. avaliaram a presença decalcificações vasculares em 39 doentes queiniciaram hemodiálise com menos de 30 anos.Nenhum dos 23 doentes com menos de 20anos de idade apresentaram calcificaçõesevidenciáveis por EBCT-“electron beam com-puted tomography”. Pelo contrário, 14 de 16doentes com idades entre os 20 e os 30 anosapresentavam calcificações identificaveis, asquais se associaram positivamente com otempo de permanência em hemodiálise9.

Apesar de não ter sido demonstrada umaassociação entre os níveis séricos de iPTH eos índices de calcificação vasculares (avaliadospor métodos radiológicos convencionais, porEBCT-“electron beam computed tomography”ou por “multi-row helical computed tomogra-phy”) e de se observarem calcificações vascu-lares no contexto de doença óssea de baixaremodelação, nos quadros de HPTH 2º os pro-cessos de calcificação vascular são igualmenterelevantes9.

A frequente presença de hiperfosfatémia, deproduto fosfo-cálcico elevado bem como a

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terapêutica com doses elevadas de vitamina De de cálcio explicam a relevância da calcificaçãovascular nos quadros de HPTH 2º.

Ao contrário das calcificações de naturezaaterosclerótica, as calcificações observadasnos doentes urémicos localizam-se na médiadas atérias (tipo esclerose de Mönckeberg), nãosão habitualmente oclusivas, e condicionam umsignificativo aumento da rigidez vascular que setraduz num aumento da Pressão de Pulso(pressão sistólica-pressão diastólica) e noaumento da velocidade da onda de pulso22.

Em doentes hemodialisados o aumento daPressão de Pulso correlacionou-se com maiormortalidade: cada 10 mmHg de aumento daPressão de Pulso associou-se a um aumentode 12% no risco de mortalidade23.

A calcificação de válvulas cardíacas,também ocorre mais frequentemente nosdoentes hemodialisados. A calcificação destasestruturas cardíacas correlacionou-se com aidade, com o tempo em hemodiálise, com a HTAprévia ao início de hemodiálise e com um

produto fosfo-cálcico elevado. A calcificação doanel mitral foi 5 vezes superior e a do anelaórtico dez vezes mais elevada nos doentesurémicos quando comparada com indivíduos damesma idade e sexo, mas sem insuficiênciarenal24.

HIPERPARATIROIDISMO SECUNDÁRIOE MORTALIDADE

A mortalidade dos doentes dialisados ésignificativamente mais elevada que a dapopulação em geral, ultrapassando inclusiva-mente a observada em muitas patologiasoncológicas (Figura 6).

Apesar dos inquestionaveis progressosobservados nas técnicas dialíticas, na utilizaçãode materiais mais biocompatíveis, na ade-quação dos processos depurativos, bem comona optimização de medidas terapêuticas da HTAe da dislipidémia, a verdade é que a mortalidadedos doentes dialisados se tem mantido estável

Mortalidade CV em doentes em diálisevs. população geral (PG)

Reproduzido, com autorização, de Foley RN et al. Am J Kidney Dis 1998;32(Suppl 3):S112–9

100

Mo

rtal

idad

e C

V a

nu

al (

%)

25–34

Idade (anos)

10

1

0.1

0.01

35–44 45–54 55–64 65–74 75–84 > 85

Homem diáliseMulher diálise

Negro diálise

Cauc. diálise

0

PG Homem

PG Mulher

PG Negro

PG Caucasiano

Figura 6

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HIPERPARATIROIDISMO SECUNDÁRIO: NECESSIDADE DE NOVAS ABORDAGENS TERAPÊUTICAS

em níveis muito elevados (que atingem cercade 20%/ano em muitos países com índices dedesenvolvimento elevados).

O aumento da prevalência de doentes comdiabetes, com patologia cardio-vascular gravee com doenças oncológicas, bem como oenvelhecimento da população em geral e dosdialisados em particular justificam, em grandeparte, estes indíces de mortalidade persisten-temente elevados. A selecção “negativa” dosdoentes em diálise através da transplantaçãodos dialisados com melhores condiçõesclínicas terá igualmente de ser considerada naanálise da mortalidade.

A principal causa de mortalidade nosdoentes dialisados é a patologia cardio-vascu-lar a qual é 10 a 20 vezes mais frequente nosdoentes dialisados que na população em geral,em qualquer idade e independentemente daraça e sexo. De acordo com um estudode Foleye col. baseado no “United State Renal DataSistem” o risco de mortalidade cardio-vascularem doentes hemodialisados com idadecompreendida entre 25 e 34 anos é semelhanteà de indivíduos não dialisados com mais de 85anos25 (Figura 6).

As curvas de relação entre mortalidade emdiálise e os níveis séricos de iPTH apresentamhabitualmente uma formaa em “U” apontandopara um risco de mortalidade aumetada nosextremos (iPTH< 30 pg/mL ou iPTH > 600 pg//mL).

Este tipo de curva foi observado, em 12833dialisados, seleccionados aleatóriamente, nosquais foram correlacionados os níveis séricosde iPTH com a ocorrência de morte súbita(paragem cardíaca ou hiperpotassémia). Noentanto, alguns dos doentes deste estudo comvalores baixos de iPTH (0 a 30 pg/mL) tinhamsido previamente sujeitos a paratiroidectomiapor HPTH 2º grave, o que retirou homogeneidadea este grupo26.

O significado estatístico de curvas demortalidade versus níveis séricos de iPTH têmde ser avaliado apenas após ajustamentos dasdiversas multivariáveis. Por exemplo, osdialisados mais jovens, de raça negra, do sexofeminino e não diabéticos têm habitualmenteníveis de iPTH mais elevados, mas tambémconstituem subgrupos com menor mortalidaeem diálise.

Em 143 doentes espanhois estudadosprospectivamente, ao longo de 6 anos, porMarco e col. observou-se um significativoaumento de mortalidade de causa cardio-vas-cular (RR=3,9; p=0,02) para níveis séricos deiPTH superiores a 476 pg/mL (Figura 7). Nesteestudo, para investigar a relação entremortalidade cardio-vascular e iPTH, foi utilizadoum modelo com ajustamento para: os alelosdo receptor da vitamina D, terapêutica comcalcitriol, níveis de fósforo, de cálcio e de Ca xP, albuminémia, sexo, raça, diabetes, tempo emdiálise, serologia da hepatite C, hipertensão,terapêutica anti-hipertensiva e tabagismo27. Naanálise multivariada, níveis elevados de iPTH(superiores a 476 pg/mL) associaram-se a umrisco 4 vezes superior, de mortalidade cardio-vascular, em comparação com valores de iPTHinferiores.

Num estudo recente efectuado em 40.538doentes americanos integrados na “FreseniusMedical Care North America Patient StatisticalProfile” Block e col. demostraram que níveisde iPTH superiores a 600 pg/ml se associarama um risco significativamente aumentado demortalidade. Esta associação entre HPTH 2º emortalidade evidenciou-se independentementeda idade, sexo, raça ou tempo de permanênciaem diálise2.

Em 1998, Block e col. identificaram associa-ções estatisticamente significativas entrealterações do metabolismo fosfo-cálcico emortalidade global em 2669 doentes, dialisados

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no início da década de 90 nos EUA, erecrutados aleatoriamente a partir do “UnitedStates Renal Data System”28. Estes autoresdemonstraram um aumento de 27% e de 34 %no risco relativo de mortalidade em associaçãocom níveis séricos de fósforo superiores a 6,5mg/dl e um produto fosfo-cálcico superior a 72mg2/dL2.

Na série de 40538 doentes norte americanosdialisados, recetemente publicada pelo mesmoautor, concentrações de fósforo sérico supe-riores a 5,0 mg/dl associaram-se a um riscoaumentado de morbilidade, de internamentoshospitalares e de mortalidade global2.

Uma forte correlação entre entre valoreselevados de calcémia (após ajustamento) erisco de mortalidade foi igualmente observadapara todo o espectro de valores de calcémiamédia dos doentes, independentemente daidade, sexo, raça, fosfatémia, níveis de iPTH,presença de diabetes ou tempo de permanênciaem diálise. De forma consistente verificou-seum aumento de cerca de 20% no risco relativo

de mortalidade por cada aumento de 1 mg/dlda calcémia, acima de 9,0 mg/dL2.

Os mesmos autores compararam, nestapopulação de mais de 40 mil doentes, aimportância relativa de diversas alteraçõeslaboratoriais na atribuição de um risco relativode mortalidade. Considerando hiperfosfatemiavalores > a 5,0 mg/dL, hipercalcémia valores >a 10 mg/dL, HPTH 2º valores de iPTH > 600 pg/ml, diálise insuficiente como URR < 65% ehemoglobina reduzida < 11,0 g/dL o riscorelativo de mortalidade associado às alteraçõesdo metabolismo fosfo-cálcico foi de 17,5%,bastante mais elevado que o aaociado à anemia(11,3%) ou à diálise insuficiente (5,1%)2.

“NKF-K/DOQI GUIDELINES”

Em Outubro de 2003, foram publicadas no“American Journal of Kidney Diseases” as “Kid-ney Disease Outcomes Quality Initiative (K-DOQI) guidelines” elaboradas pela “United

Níveis de iPTH e sobrevida CV

So

bre

vid

a C

V c

um

ula

tiv

a

iPTH 114–476 pg/ml

[iPTH 12–50 pmol/l]

iPTH < 114 pg/ml[iPTH < 12 pmol/l]

iPTH > 476 pg/ml [iPTH > 50 pmol/l]

Tempo (anos)

0 1 2 3 4 5 60.0

0.6

0.7

0.8

0.9

1.0

n = 143p = 0.02(> 476 vs. 114–476 pg/ml)[> 50 vs. 12–50 pmol/l]

Reproduzido, com autorização, de Marco MP et al. Kidney Int 2003;63(Suppl 85):S111–4Figura 7

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HIPERPARATIROIDISMO SECUNDÁRIO: NECESSIDADE DE NOVAS ABORDAGENS TERAPÊUTICAS

States National Kidney Fundation”29. Estasorientações, que resultaram da análise e revisãode milhares de publicações por peritosvoluntários europeus e norte americanos,propõem os seguintes objectivos para os níveisséricos de iPTH, de cálcio e de fósforo:

iPTH 150-300 pg/mLCa x P < 55 mg2/dL2

Fósforo 3,5 a 5,5 mg/dLCálcio “corrigido” 8,4 a 9,5 mg/dL

Desde a sua publicação, estas orientações“baseadas na evidência”, têm vindo a seradoptadas, na generalidade, pela comunidadecientífica nefrológica.

Apesar de algumas propostas poderem serpontualmente discutíveis, as K-DOQI cons-tituem uma excelente proposta para melhoraro diagnóstico e terapêutica dos doentes comIRC, homogeneizar diagnósticos e terapêuticase, desse modo, permitir comparar resultados amédio e longo prazo.

No caso concreto das propostas dos K-DOQI no âmbito do metabolismo fosfo-cálcicoe da osteodistrofia renal, os objectivos am-biciosos acima referidos, apenas serão passí-veis de atingir, em muitos doentes, graças àutilização de novas terapêuticas, nomeada-mente novos captadores do fósforo, análogosda vitamina D e calcimiméticos (ver abaixo).

RESULTADOS DO “DOPPS STUDY”

O “Dialysis Outcomes and Practice PaternsStudy (DOPPS)” constitui um estudo observa-cional, em curso em 12 países: Alemanha,Austrália, Bélgica, Canadá, Espanha, EUA,França, Itália, Japão, Nova-Zelândia, ReinoUnido e Suécia. Desde 2003 têm sidoapresentados os primeiros resultados deste

estudo aberto. Com o alargamento a novospaíses, o aumento da população estudada e olongo período de observação o estudo DOPPSconstitui uma ferramenta fundamental naavaliação da eficácia do diagnóstico e daterapêutica dos doentes dialisados.

A avaliação preliminar dos níveis de iPTH em7 países (Alemanha, Espanha, EUA, França,Itália, Japão e Reino Unido), mostrou que cercade metade dos doentes apresenta níveis infe-riores a 150 pg/mL e que entre 21 e 31% dosdoentes tinha níveis superiores a 300 pg/mL30.

Verificamos assim que, de acordo com osresultados preliminares do DOPPS, quase umterço dos doentes apresentava níveis de iPTHsuperiores ao proposto pelos K-DOQI.

Resultados semelhantes foram evidenciadospor Diaz Corte e col. referentes à populaçãoespanhola. Neste último estudo, verificou-se que37% dos dialisados apresentavam iPTH supe-rior a 250 pg/mL e 17 destes doentes tinhamiPTH superior a 500 pg/mL31.

No que respeita aos níveis séricos de cálcio,49% dos 4665 doentes do estudo DOPPSapresentavam calcémias inferiores a 8,4 ousuperiores a 9,5 mg/dl32. No mesmo estudo,verificou-se que 56% dos doentes tinhamfosfatémias médias inferiores a 3,5 mg/dL, ousuperiores a 5,5 mg/dL32.

Desta avaliação preliminar do estudoDOPPS podemos concluir que cerca demetade dos doentes falhavam os objectivospara a fosfatémia e para a calcémia definidosnos K-DOQI. No mesmo grupo de doentesobservou-se igualmente um produto fosfo-cálcico superior a 55 mg2/dL2 em 38% doscasos32.

Baseados nesta população de doentes queintegram o estudo DOPPS podemos concluirque apenas 8% dos doentes atingiramsimultâneamente os 4 objectivos (para o cálcio,fósforo, P x Ca e iPTH) (Figura 8).

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Resultados similares foram apresentadospor Cannata-Andía et col. em 7512 hemodiali-sados espanhois, dos quais apenas 22%atingiram os objectivos de iPTH definidos nosK-DOQI33. Nesta população apenas 13% dosdoentes tinham níveis séricos de iPTH entre 150e 300 pg/mL e simultaneamente um produtofosfo-cálcico inferior a 55 mg2/dL2.

RESULTADOS DO INQUÉRITO DASOCIEDADE PORTUGUESA DENEFROLOGIA

Em finais de 2001, foi obtida uma imagemmuito aproximada da terapêutica da osteodistrofiarenal no nosso país, através dum inquéritonacional sobre metabolismo fosfo-cálcicoelaborado pela Sociedade Portuguesa deNefrologia, sob a coordenação do Dr. João Pinto

dos Santos. Esta análise envolveu 6344 doentese cerca de 90% das unidades de hemodiáliseportuguesas.

Nesta avaliação verificou-se que 32,5% dosdoentes apresentavam um fósforo sérico médiosuperior a 5,5 mg/dL e em 29,5% dos casos oproduto fosfo-cálcico era superior a 55 mg2/dL2.Cerca de um terço dos doentes apresentavaníveis séricos de iPTH superiores ao limite su-perior de 300 pg/mL proposto nos K-DOQI(Figura 9).

NECESSIDADE DE NOVAS ABORDAGENSTERAPÊUTICAS DOHIPERPARATIROIDISMO SECUNDÁRIO

Os resultados acima analisados ilustram asdificuldades existentes no tratamento daosteodistrofia renal e especificamente do HPTH

Figura 8. Em 3540 doentes que integram o estudo DOPPS, a análise preliminar mostrou queapenas 8% preenchiam correctamente os 4 parâmetros bioquímicos do metabolismo fosfo-cálcico propostos nos K-DOQI.

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2º, o qual mantém uma prevalência estabilizada(em quase todos os registos e grandes estudosobservacionais) em cerca de um terço dosdialisados.

Impõe-se perspectivar alguns dos resultadosacima referidos, em função da exigênciacrescente que tem vindo a ser assumida, nosúltimos anos, para o controlo do metabolismofosfo-cálcico. Na verdade, os K-DOQI foramdefinidos após as avaliações acima referidasdo estudo DOPP e do inquérito da SPN. Élegitimo admitir que caso se tivesse verificadoo inverso os resultados fossem maisanimadores.

Por outro lado, alguns resultados de estudosnorte americanos acima referidos, poderão nãoespelhar, de forma fidedigna, a realidadenacional e europeia, especialmente no querespeita aos níveis séricos de fósforo.

Na verdade, a fosfatémia média é mais baixanos nossos doentes, o que está directamente

relacionado com as diferenças na dieta e coma “quantidade de diálise” efectuada. Num estudorecente, apresentado ao congresso de 2004 daEDTA, baseado em cerca de metade dosdoentes hemodialisados portugueses, (regista-dos na “EuCliD-European Clinical Database daFresenius Medical Care), tivemos oportunidadede evidenciar estas diferenças nos níveis defosfatémia média nos doentes portugueses emcomparação com os observados nos doentesnorte-americanos.

Os estudos observacionais já em curso, (ex:DOPPS study fase 2) e os que serão iniciadosna Europa ainda em 2004, são fundamentaispara avaliar os progressos obtidos no trata-mento da osteodistrofia renal e especificamentedo HPTH 2º.

Importa demonstrar que a “transferência” dedoentes para os objectivos definidos pelos K-DOQI se associa, de forma significativa e comofactor independente, à diminuição da morbi-

PTHi (pg/mL)N=6258

0

500

1000

1500

2000

2500

1940 2291 1190 635 202

< =100 >100<=300 >300<=600 > 600<=1200 >1200

31%

36.6%

10.2%

19%

3.2%

Pg/mL

Nº doentes

Figura 9. Resultados do inquérito nacional realizado em 2001, sob a coordenação da SociedadePortuguesa da Nefrologia (ver texto para pormenores).

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lidade e da mortalidade em diálise.Independentemente destes resultados, e

enquanto eles não estão disponíveis, temos debasear a nossa prática clínica nalgumaspremissas que se nos afiguram relevantes,nomeadamente:

- Os objectivos definidos pelos K-DOQIpara o diagnóstico e terapêutica da ODRe do HPTH 2º fundamentam-se na evidên-cia clínica e merecem o consenso alar-gado da comunidade científica.

- A principal causa de mortalidade dosdoentes dialisados é de natureza cardio-vascular.

- A hiperfosfatémia, o HPTH 2º e a hiper-calcémia, de forma isolada e conjunta-mente, associam-se ao aumento damortalidade cardio-vascular, em diálise.

- Cerca de um terço dos doentes hemo-dialisados apresenta HPTH 2º moderadoou grave e que esta prevalência (sobre-tudo nos doentes há mais tempo emdiálise) tem-se mantido estabilizada, nosúltimos anos.

- A terapêutica não cirúrgica do HPTH 2ºtem tido eficácia reduzida e frequente-mente acompanha-se de efeitos aces-sórios adversos como a hipercalcémia eo aumento do produto fosfo-cálcico.

- A terapêutica cirúrgica do HPTH 2º induzfrequentemente o desenvolvimento deosso adinâmico e hipoparatiroidismo, osquais também se associam ao aumentodas calcificações vasculares e valvularese ao aumento de mortalidade cardio-vas-cular. Nestas circunstâncias o osso perdea sua capacidade “tampão” de cálcio ede fósforo, fundamentais para a manu-tenção da correcta homeostase do meta-bolismo fosfo-cálcico.

- A terapêutica cirurgica do HPTH 2º pode

ter consequências ainda mais negativasnos candidatos a transplantação renal(visto a imunossupressão – nomeada-mente a corticoterapia – ser um factoracrescido de adinamia óssea).

Como reflexão final, continuamos a defenderque a melhor forma de tratamento do HPTH 2ºé a sua prevenção, desde estadios precocesde evolução da IRC, (estadios 2 e 3).

Infelizmente essa prevenção tem sido fre-quentemente impossivel de realizar, e o HPTH2º instala-se com prevalência crescente, àmedida que a sobrevida em diálise aumenta.

As dificuldades de tratamento do HPTH 2ºtêm residido mais nas limitações e efeitosadversos das alternativas terapêuticas existen-tes do que na dificuldade do diagnóstico destaentidade clínica.

A utilização de agentes calcimiméticos podepermitir, pela primeira vez, o controlo gradual ereversível do HPTH 2º, de maior ou menorgravidade. Deste modo, evita-se o desenvolvi-mento de doença óssea adinâmica (tambémela associada a aumento da morbilidade emortalidade), irreversível, em resposta àparatiroidectomia cirúrgica.

Os actuais conhecimentos sobre a fisiopa-tologia do HPTH 2º (alterações cromossómicas,protecção pós-transcricional, papel dos rece-ptores celulares e de citoquinas moduladoras,etc.) bem como as novas alternativas terapêu-ticas colocadas à disposição do nefrologista,(nomeadamente os calcimiméticos, os aná-logos da vitamina D, e os captadores do fósforosem cálcio e sem alumínio), inauguram umafase promissora e entusiasmante da tera-pêutica da osteodistrofia renal.

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