hannah arendt e o conceito de lliberdade

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É através do conceito de liberdade que a autora expôs seu pensamento a respeito da política da ação e a relação entre política e liberdade, relacionando com o poder político e a força utilizada para manutenção desse poder, e como o fenômeno da vontade opera na liberdade política. Assim Arendt mostra o quanto a forma totalitária de governo negou a liberdade com o objetivo de atingir fins específicos. Um movimento percebido ao longo da história e na atualidade. It is through the concept of freedom and the author explained his thinking on policy action and the relationship between politics and freedom, relating to political power and the force used to maintain this power and how the phenomenon of the will operates on political freedom. Thus, Arendt shows how the totalitarian form of government denied freedom in order to achieve specific purposes. A move seen throughout history and today.

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HA

AH ARE DT E O CO CEITO DE LIBERDADE1 Ricardo Gomes Ribeiro*

Resumo

Hannah Arendt conseguiu entender que a inteno nazista era acabar com capacidade do ser humano de ser livre. Assim aniquilaria atravs da fora as capacidades individuais, negando a liberdade e transformando o ser humano em um produto de manipulao e transformao em uma simples coisa. atravs do conceito de liberdade que a autora exps seu pensamento a respeito da poltica da ao e a relao entre poltica e liberdade, relacionando com o poder poltico e a fora utilizada para manuteno desse poder, e como o fenmeno da vontade opera na liberdade poltica. Assim Arendt mostra o quanto a forma totalitria de governo negou a liberdade com o objetivo de atingir fins especficos. Um movimento percebido ao longo da histria e na atualidade. Palavras-chave: Liberdade. Poltica. Totalitarismo Abstract

Hannah Arendt was able to understand that the Nazi intention was to wipe out capacity of humans to be free. So annihilate by force the individual capacities, denying freedom and transforming human beings into a product of manipulation and transformation into a simple thing. It is through the concept of freedom and the author explained his thinking on policy action and the relationship between politics and freedom, relating to political power and the force used to maintain this power and how the phenomenon of the will operates on political freedom. Thus, Arendt shows how the totalitarian form of government denied freedom in order to achieve specific purposes. A move seen throughout history and today. Keywords: Freedom. Policy. Totalitarianism Introduo

A relao dos conceitos a seguir compe a viso do pensamento arendtiano quanto tentativa de explicar o totalitarismo e a poltica ps II Guerra mundial. A formulao de conceitos e concluses, por parte da autora, o resultado da busca da compreenso do que

RIBEIRO, Ricardo Gomes. Hannah Arendt e o conceito de liberdade, in: OLIVEIRA, Kathlen Luana de (Org.), SCHAPER, Valrio Guilherme (Org.). Hannah Arendt: Uma amizade em comum. So Leopoldo: Oikos/EST, 2011, pg 170-182. * Mestre em Filosofia - PUCRS - Bolsista CAPES - Contato: [email protected], [email protected].

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havia se passado naqueles anos do nazismo com os seres humanos. Com a inteno de chegar a um anonimato coletivo e a degradao humana do povo judeu, a ideia era a de anular toda e qualquer manifestao reconhecida como humana dentro de uma sociedade o qual o homem tivesse uma personalidade jurdica e psquica. A impossibilidade de se manifestar dentro do mundo seria impedida pela proposta de aniquilao e extermnio. O regime pretendia acabar com a capacidade de resistncia e chegar ao ponto mximo da insignificncia humana. A perda da liberdade passava pela perda da autonomia e de reconhecimento de si mesmo como algum significante no mundo. Uma sociedade de especializaes, que seriam as suas capacidades de expresso como cultura ou crescimento intelectual. Ali naquelas condies era impossvel ser direto ao seu desejo, pois sofriam as imposies que descaracterizavam a autenticidade humana. O totalitarismo desrespeitava a pessoa no mbito individual, emocional, jurdico e psquico. Sobre o totalitarismo e a

negao da liberdade, Arendt descreve as limitaes de liberdade impostas pelas fronteiras, como sendo uma das tantas barreiras impostas liberdade humana. A limitao da cerca do campo de concentrao e a fronteira do pas, representam um limite para a liberdade, impondo assim um significado de controle e poder sobre a expresso e o direito de ir e vir. Esse controle sobre a vida do outro e a demonstrao de poder, expressa a mais forte carga de dominao e a transformao do ser humano em uma simples coisa. A partir desse cenrio, a tarefa era desprezar os fatos srdidos e terrveis para no enfrentar a realidade. Assim, criaram um mundo fictcio, isolando os internos do campo de concentrao do mundo dos vivos a ponto de empurr-los ao esquecimento. O que Arendt tenta explicar nesse contexto histrico como a negao da liberdade expe a teoria tradicional poltica a um contexto nunca visto, analisando a seguir os conceitos de liberdade, poltica, ao, e relao entre poltica e liberdade para, mais adiante associar esse pensamento s consequncias que o poder poltico trouxe e ainda podem continuar trazendo em relao ao excesso de fora e, consequente ao mal (ARENDT, 2007b, p. 439-493).

O conceito de liberdade

Para Arendt, Em termos conceituais, passa-se da liberdade filosfica liberdade poltica. A autora afirma a respeito desse tema, que a liberdade filosfica consiste em exercer a vontade e a nfase ocorre no eu-quero, que relevante somente para quem vive sozinho.

Alm da liberdade filosfica, o outro tipo de liberdade pertencente ao indivduo a liberdade poltica, que se relaciona com ou outros, e sua efetivao dependente em todos os aspectos dessa relao. Tendo a sua nfase no poder, resultante de leis, hbitos e costumes, o qual o componente segurana, depende de um Estado que lhe garanta essa condio. O Estado, ento, vem a ser o que compe o resultante da instituio que garantir tal condio. O contrrio nisso, que, essas leis e governos so feitos e constitudos por homens que ao estarem na posse do poder, podem chegar a tolher essa prpria vontade livre que o indivduo ajudou a compor dentro da liberdade que o autorizava (ARENDT, 2009, p. 467-468). A vontade est ligada liberdade, uma causa ordenada pelos dados sensoriais, e qualquer natureza originria, torna possvel a experincia. A causalidade interna est ligada vontade e o princpio que rege o mundo exterior. O pensamento no seu entendimento originrio, que tem um entendimento pr-cientfico e pr-filosfico, leva conduta prtica. Porm, o fenmeno da vontade no opera na liberdade poltica, que caracteriza-se pela ao. A autora estabelece um parmetro de relacionamento entre os dois, porm assegura que a poltica se sobrepe sobre a vontade individual. Ao existir a experincia de no-liberdade poltica ir derivar uma liberdade interna inacessvel. A contrariedade entre as duas; liberdade interiormente e liberdade poltica (ARENDT, 2007a). Schio (2006, p.143) sobre esse pensamento de Arendt, afirmou que a liberdade, quanto ao sentido gentico inerente ao ser humano podendo apresentar-se de forma diferente. Tanto no aspecto interior quanto no aspecto exterior no possvel neg-las por pertencerem mesma liberdade. A relevante liberdade interna requer manifestao pblica, Schio confirma a tese de Arendt quando concebe a liberdade interna como uma derivao da liberdade poltica. Na inteno de manter a vida biolgica ou a busca pela proteo, decorre o afastamento vida poltica e o compartilhamento com outros homens. A renncia ao mundo pblico e vida poltica, segundo Arendt, so resultados de fracasso polticos gerados por regimes de governo que restringem ou eliminam a liberdade, que destroem o espao pblico (SCHIO, 2006, p.143). A liberdade poltica autntica imprescindvel vida e deve ser pblica. Nessa perspectiva, a liberdade, como uma representao fundamental na histria sempre identificada sob o ponto de vista da segurana. Arendt tenta expor, definindo a liberdade nesses termos, o quanto a forma totalitria de governo colocou, no mbito pblico, a vida e a necessidade dos interesses imediatos, negando, pois, a condio de liberdade poltica. E acrescenta que na poca moderna h um agente que determina os acontecimentos no mundo, bem como uma separao entre liberdade e poltica. Para a autora, os acontecimentos

no espao pblico sempre tero carter poltico, por conterem elementos de virtuosidade e de liberdade. Considera assim, essa forma de agir em sociedade, no mbito poltico, o elemento principal para a liberdade, e no vontade. O que acontece nesse espao poltico por

definio. O conceito de liberdade, no mbito poltico no, um atributo da vontade. Arendt tambm afirma que, no verdade a afirmao de que a perfeita liberdade no compatvel a sociedade e sua existncia. O pensar no o grande perigo, a ao que deveria ter restries. A vida, como principal motivo de tudo, o que est realmente em jogo e a qual necessita da ao. Para cuidar da ao, necessita-se tanto da vida social como econmica. Nessa perspectiva, Arendt aponta que administrar essa liberdade acaba obscurecendo o mbito poltico desde os primrdios da poca moderna. Para sustentar o pensamento de que a ao e a poltica so subsdios importantes para definir o conceito da liberdade, a autora expressa uma contradio entre este, e o pensamento sobre a forma em que os conceitos da Antiguidade tardia expressavam de que o homem podia se dissuadir do mundo e do conceito cristo do livre arbtrio pois a tradio filosfica defendia o princpio de que a liberdade iniciava com o afastamento da vida poltica, e no se tinha liberdade no plano poltico, ou s existente na convivncia do eu consigo mesmo. Essa afirmao de Arendt pretende sustentar uma posio de que a negao da participao poltica, tanto dos prisioneiros como da sociedade no governo nazista, a forma de restringir a liberdade, partindo que o princpio bsico do conceito estaria centrado na relao com os outros (ARENDT, 2007a, 196-204). Na concepo grega, bem como na romana, o conceito de liberdade era restrito poltica. Em contrariedade a isso, o fator do livre arbtrio do pensamento cristo, como centro da definio de liberdade, visto pela autora, como decisivo para a Histria. Nesse pensamento, a vontade estaria ligada apenas ao homem com o relacionamento consigo mesmo. Quanto ao aspecto do querer, com acesso ao poder sobre as circunstncias, Arendt nos diz que so condies externas que esto interagindo. Como segue:A necessidade que me impede de fazer o que eu sei e quero pode surgir do mundo, ou de meu prprio corpo, ou de insuficincia de talentos, dons e qualidades de que o homem dotado por nascimento e sobre os quais ele tem tanto poder quanto sobre as demais circunstncias; todos esses fatores, sem excluso dos psicolgicos, condicionam exteriormente o indivduo no que diz respeito ao quero e ao sei, isto , ao prprio ego. O poder que faz em face a essas circunstncias, que liberta, por assim dizer o querer e o conhecer de sua sujeio necessidade, o posso. Somente quando o quero e o posso coincidem a liberdade se consuma (ARENDT, 2007a, 208).

Para a autora, o eu posso, no entanto, o ponto fundamental da exterioridade para a efetivao dos atos. A permisso do ser para consigo mesmo, o centro da questo da

liberdade. A negao da liberdade e a restrio do ser humano ao mbito social definem o poder fazer e o no poder fazer. Uma permisso que ela associa ao mundo totalitrio, a forma de governo que ao negar a liberdade do indivduo retira a possibilidade da realizao da vontade ou do querer. Montesquieu tinha conscincia de que o conceito religioso era inadequado para fins polticos, pois a liberdade filosfica no exigia mais do que o exerccio da vontade. A concepo de que a vontade seria ento o fundamento da liberdade filosfica, bem como religiosa em relao ao livre arbtrio, ordena que haja uma vontade. Seria uma vontade que conteria duas vontades presentes no mesmo indivduo. Como o poder de decidir, tambm impotente, pois tem o poder para impedir a prpria vontade, livre e no livre. Segundo Arendt, a autoliberao, como vontade de poder cristo, tinha uma precariedade. Nesse conceito o eu-quero paralisa o eu posso, Como se no momento em que os homens quisessem a liberdade, eles perdessem a capacidade de serem livres nos acirrados conflitos com os desejos e intenes (ARENDT, 2007a, p. 210). Nesse sentido a opresso ocupa o poder e impede a prpria vontade de no liberar o eu. E como analogia, a autora define o poder como opresso que governa os outros, negando a liberdade. A origem da concepo de liberdade no mbito poltico, independente da religio, s quando houve a separao entre Igreja e Estado. O quero permanece sujeito do eu e essa submisso do eu distingue o quero do penso. Arendt entende ser a impotncia, ou a falta de poder, o fato de o quero ter se tornado to vido de poder. A autora afirma ento que a tirania era uma maneira de governar oriunda diretamente do quero, oriunda de um egosmo (ARENDT, 2007a, 208211):Devido ao desvio filosfico da ao para a fora de vontade, da liberdade como um ser manifesto da ao para o liberium arbitrium, o ideal da liberdade deixou de ser virtuosismo no sentido que mencionamos anteriormente, tornando-se a soberania, o ideal de um livre arbtrio, independente dos outros e eventualmente prevalecendo sobre eles (ARENDT, 2007a, p. 211).

Arendt, sobre o fato de a liberdade estar intimamente ligada ao virtuosismo e ao livrearbtrio, na forma da ao, afirma que, a liberdade como soberania, s adquirida atravs da negao da liberdade. Uma consequncia nociva do pensamento filosfico sobre o livre arbtrio. A autora nos mostra que essa capacidade de tentativa de conquista da soberania jamais ser conseguida por carecer de virtuosidade.

A coexistncia entre liberdade e no soberania, no bem compreendida na filosofia tradicional. A autora entende que, os seres humanos receberam a liberdade, apesar de no serem soberanos. O perigo de acreditar que somente sendo soberano como indivduo, ou como grupo poder ser livre, que isso no passa de iluso, e s pode ser mantida atravs da violncia. Os meios essenciais para essa manuteno da soberania devem ser os nopolticos, que desprezam o fato de serem os seres humanos que habitam a terra, e no apenas um ser humano, o que faz da poltica o instrumento de ao e de liberdade. Ento, a liberdade e a soberania dificilmente vivero conjuntamente por no terem semelhanas em suas essncias. Para a autora, a soberania precisa se submeter vontade individual, em detrimento da vontade geral ou de um grupo organizado, e para conquistarem a liberdade devem escolher entre a soberania e a vontade geral, acreditando a autora que a renncia tem de ser soberania. Para a nossa sociedade, acostumada s tradies filosficas originalmente antipoltica e tradio religiosa, temos dificuldade no que diz respeito ao problema da liberdade desvinculada da vontade, e ento percebermos que ela um acessrio do fazer e do agir. Regressemos, pois, Antiguidade, isto , s suas tradies polticas e pr-filosficas, pois a liberdade vivenciada apenas no processo de ao e em nada mais, nunca mais foi articulada com a mesma clareza clssica (ARENDT, 2007a, p. 213). Os processos terrestres naturais cercam a vida humana na Terra, e por sua vez tambm fazem parte da natureza orgnica. Tendem a se tornar automticos de forma inerente a todos os processos, independente de suas origens. Assim os eventos isolados no podem salvar as iniciativas de ao da Humanidade. Os processos naturais histricos automticos, igualmente ao biolgico que conduzem o ser humano do nascimento para a morte podem levar runa civilizaes irremediavelmente decadentes, como uma necessidade biolgica. Esses processos histricos de runa perduraram mais tempo do que a existncia livre do ser humano. O que sempre permanecer intocvel, independentemente das runas inevitveis a faculdade da prpria liberdade. Para a autora, a vontade de recomear constitui a fora e inspira de maneira oculta os grandes feitos. O grande problema que essa fonte, que continua oculta, no concretiza a realidade da liberdade poltica. A vida poltica estagnou-se, mesmo contendo a fonte da liberdade, que no vivenciada na sua fundamentao essencial, pois uma virtude e um virtuosismo que torna-se impotente para interromper a runa ou a petrificao de uma civilizao. Assim a liberdade confunde-se com o fenmeno antipoltico. O ser humano no ir se desenvolver em sua liberdade plena sem o espao concreto para exercer a sua ao, sair da runa e exercer a liberdade. Arendt argumenta sobre o papel

naturalista que tem certos acontecimentos, que chama de trivialidade da vida ordinria. Apesar de aceitar que exista a possibilidade de interpretaes transcendentes, a autora no vai abrir mo do carter objetivo do feito do homem como incio e iniciador. E o dom de realizao do homem o dom da liberdade e da ao, e que com esse dois dons, podem estabelecer uma realidade que lhes pertence de direito (ARENDT, 2007a, p. 212-219). A autora lembra que a vida na Polis tinha como requisito ter liberdade sem dominao. A liberdade grega impunha que para desfrutar da liberdade o indivduo deveria libertar-se de si prprio. A autora coloca ainda que o meio para conseguir esse fim era atravs da escravido que o desonerava das tarefas de sobrevivncia, que para Arendt (2008, p. 172), eram o contrrio das formas capitalistas. Na Grcia antiga, a inteno era a busca da liberdade para exercer as tarefas de discusso na arena poltica. O que a autora nos coloca que apesar da liberdade ser conseguida por meio da fora e da coao, e no por vias polticas, a escravido ento servia como meio para a liberdade; por sua vez, o meio para atingir a poltica que era o fim. No se pretendia a liberdade como tal, mas a libertao pr-poltica para o exerccio na liberdade na polis. Poltica era, ao mesmo tempo, fim e meio para exercer a liberdade entre iguais, discutir e persuadir, obedecer-se mutuamente e dialogar. Para Arendt, a Poltica, no sentido grego da palavra, est centrada na liberdade. Entendida como o estado de que no existe dominao por nenhuma das partes. Os espaos criados so resultados de indivduos que circulam com seus pares. Para que a liberdade se complete so necessrios os iguais. Sem os iguais no haveria a liberdade, ou no haveria necessidade de dominar para ver-se livre de seus afazeres cotidianos. E assim, todos terem o mesmo direito atividade poltica. E na polis grega, a isonomia tem esse sentido, o mesmo que isgoria (igual liberdade de expresso). A autora explica que, o dilogo numa relao de mandar e obedecer no era considerado como concretos. Eram mais um processo do fazer e laborar, e por isso no eram livres. Palavras serviam para o uso da fora e da coao. Essa falta da expresso livre, que brbaros e escravos tinham como caractersticas, tornava-os sem aptido para a expresso livre. A autora aponta o dspota como sendo aquele que s conhece o mandar. Para Arendt ele estaria na mesma situao dos brbaros e escravos, pois por s conhecer o mandar, ele no tem iguais. Uma oligarquia ou aristocracia muito estritamente limitada, com iguais entre si era o suficiente para atingir a liberdade, no sendo necessria uma democracia igualitria no sentido moderno. Isso no est relacionado com a justia e a legalidade, mas com a construo de um espao para uma interao entre si. A perda desse espao, por abandono ou

por ser banido, perde a companhia de seus iguais, portanto, perde a liberdade. Arendt coloca, a respeito da questo do espao pblico e da expresso poltica, que os gregos entendiam que um tirano sensato poderia trazer alguns benefcios materiais para a cidade, porm, trazia consigo o fim da liberdade, quando os cidados eram banidos para suas casas e abandonavam a gora, encerrando assim o espao para a liberdade e o fim da poltica como ela . E assim Arendt diz que a parte vlida do conceito de poltica a liberdade, pois so inseparveis. Arendt afirma que a novidade aterrorizante do totalitarismo que a liberdade humana deveria ser sacrificada em prol da evoluo histrica, mesmo parecendo que o grande prejuzo do totalitarismo seja a negao da liberdade. Para interromper esse processo necessria a interao da liberdade. O problema, que a autora encontra, na questo de como deve ser vista a maneira com a qual se deve interromper o processo autoritrio, que as ideologias ficam distantes desses processos de dilogo livre. Arendt acredita que, as ideologias se formam com processos por trs dos dspotas autoritrios. Realizam trabalhos em segredos, fora da arena de discusso pblica. Ento, a autora critica a forma dos pensamentos ideolgicos difusos, encontrando uma diferena entre os regimes totalitrios, que, interagem com o ser humano envolvendo-os no fluxo da liberdade da histria, que no pode ser obstrudo, uma vez que a sua participao impulsiona a acelerao dessa histria. Uma forma de terror coercitivo externo ao indivduo que impetrado pelo movimento autoritrio, junto com o pensamento ideolgico coercitivo aplicado de dentro espcie de conscientizao pela publicidade e pela mudana de valores associa uma forma de pensar ligando a histria ao seu fluxo normal. O movimento totalitrio passa a ser decisivo para o fim da liberdade no mundo real. Muda o conceito de poltica pelo de histria, e a liberdade j no consta mais no pensamento moderno (ARENDT, 2008). Sobre o atual entendimento da liberdade e da produo, a autora comenta sobre a propriedade e o espao social.O novo fenmeno de um espao social e de energia produtivas j no individuais, mas sociais, ampliou enormemente essa esfera da propriedade pessoal. O que no muda, porm, o fato de que as atividades indispensveis conservao da vida e da propriedade, ou mesmo ao melhoramento da vida e ao aumento da propriedade, so questes de necessidade, no de liberdade. O que o Estado realizou na era moderna, foi a liberao dos homens para desenvolverem suas energias socialmente produtivas, para produzirem em comum os bens necessrios a uma vida feliz (ARENDT, 2008, p. 200).

A necessidade advinda do atual modo de vida e modelo econmico, a qual a atividade indispensvel sobrevivncia, gerou espaos sociais, proporcionou a liberao do homem para interagir nesses espaos. Arendt faz uma distino entre liberdade de participao no governo e liberdade legal garantida pelo Estado para desempenhar suas funes bsicas. Porm, Arendt conecta isso aos fatos da diferenciao entre essa liberdade moderna um mal necessrio vindo dos movimentos totalitrios e os despotismos esclarecidos e a liberdade poltica grega.

Essa moderna concepo de poltica, na qual o Estado visto como uma funo da sociedade, um mal necessrio em prol da liberdade social, tem prevalecido na teoria e na prtica sobre a noo inteiramente distinta da soberania do povo, ou da nao, inspirada pela Antiguidade e tantas vezes manifestada em todas as revolues, da americana e francesa no sculo XVIII hngara no passado recente, estabeleceu-se um vnculo direto entre a ideia de participar do governo e a ideia de ser livre. Mas, pelo menos at agora, essas revolues e a experincia direta das possibilidades inerentes ao poltica por elas proporcionadas se mostraram incapazes de estabelecer um novo sistema de governo (ARENDT, 2008, p. 200).

A partir disso, a opinio que impera aquela que o governo defende a liberdade do cidado contra problemas internos e externos do pas, utilizando a fora, caso isso seja preciso. O que a autora ressalta como mais problemtico, a necessidade da liberdade da sociedade depender da privao dos cidados no governo, pois esse estado deve manter o controle de seus meios de fora. E ainda, a ideia geral de que esse estabelecimento do contexto poltico gera poder e ento a liberdade deve ser garantida e controlada com superviso desse poder. A liberdade ento, nesse contexto, seria o motivo de tal controle da sociedade e do indivduo. Arendt defende ento, que h de ter um limite quanto ao governo para que a liberdade fique acima dessas questes de poder e de controle. A autora no est se referindo especificamente ao fato de tornar isso possvel a liberdade de agir , pois para ela isso deve ser uma prerrogativa do governo. O que a autora salienta que a modernidade trouxe a ideia de que a poltica um meio, e a liberdade o fim mais importante. E isso representa uma mudana considervel e radical (ARENDT, 2008, p. 201). Arendt, a respeito da essncia da fora bruta utilizada pela poltica para exercer seu fim, afirma que o estado era o possuidor dessa fora. E para a autora, isso acontecia tanto no sentido de utilizao da fora com o objetivo de preservar a vida ou pela preservao da liberdade. Porm, na atualidade, essa utilizao da fora percebida pela sua maneira de ser exercida para atingir os fins, adequada ou no. Pois essa fora tornou-se monstruosamente

poderosa que ameaa no apenas a liberdade, mas tambm a vida (ARENDT, 2008, p. 205). Essa ameaadora fora sobre as duas questes a liberdade e a vida torna a poltica duplamente questionvel em seu atual significado. E a autora considera que o espao pblico tornou-se um espetculo de fora monstruoso na sua essncia do mundo moderno. As questes humanas de todas as ordens so atualmente exercidas numa arena dominada pela fora. Poder e fora resultam em significados semelhantes, diferentes de origens conceituais, que Arendt argumenta como no sendo duas definies idnticas, e at considera como opostos. A fora se potencializa quando combinada com o poder, o que s possvel com a maioria. A fora ento cresce derivada desse poder. A ameaa da guerra atmica torna a opinio pblica uma grande fora, que para Arendt no pode ser desconsiderada (ARENDT, 2008). Andr Duarte (2000, p. 215) entende que o aspecto mais importante sobre o que Arendt coloca a respeito da liberdade e de ao, o fato de a autora entender a liberdade como algo no condicionado ou determinado. Assim como a ao livre no est somente voltada aos seus fins, porm, transcender aos fatores determinantes. Importando ento, para Arendt, o sentido que a ao traz consigo. O poder conquistado e mantido atravs da fora e da restrio da liberdade, reduzindo o ser humano a algum sem condies de agir politicamente, constitui algo violento que requer considerao especial. A mente humana, na sua profundidade, pode ter encontrado algo racional para a inteno de um agir malfico, que transformou os prisioneiros em algo sem vida. Porm Arendt, aps suas reflexes, nos faz perceber que a falta de profundidade cognitiva levou aos atores nazistas uma ideologia impregnada do mal. Referncias ARENDT, Hannah. Entre o Passado e o Futuro. Trad. Mauro W. Barbosa. 6. ed. So Paulo: Perspectiva, 2007a. 348 p. ______________. Origens do Totalitarismo: Antissemitismo, Imperialismo e Totalitarismo. Trad. Roberto Raposo. 8. ed So Paulo: Companhia das Letras, 2007b. 562 p. ______________. A Promessa da Poltica. Trad. Pedro Jorgensen. Rio de Janeiro: Difel, 2008. 287 p. ______________. A Vida do Esprito. Trad. Cesar Augusto de Almeida, Antnio Abranches, Helena Martins. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2009. 544 p. DUARTE, de Macedo Andr. O pensamento sombra da ruptura: poltica e filosofia em Hannah Arendt. So Paulo: Paz na Terra, 2000. 392 p. SCHIO, Snia Maria. Hannah Arendt: Histria e Liberdade; da ao reflexo. Caxias do Sul: EDUCS, 2006. 270 p.