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HAMDAN, Camila. Arte Cíbrida: Experimentações Artísticas com Sistemas Interativos. In: III Congresso Internacional em Artes, Novas Tecnologias e Comunicação/CIANTEC, Universidade de Aveiro, Portugal, 2009, p. 237-242. Arte Cíbrida: Experimentações Artísticas com Sistemas Interativos Camila Hamdan 1 [email protected] Universidade de Brasília/UnB Resumo O presente artigo descreve algumas experimentações artísticas transdisciplinares desenvolvidas no Laboratório de Pesquisa em Arte e Realidade Virtual da Universidade de Brasília, que utilizam a realidade aumentada e que contribuem para a criação de espaços mistos sistêmicos, contextualizados no que denominamos de arte cíbrida, uma reinvenção do meio ambiente, dos modos de vida e da percepção dos seres vivos em que fenômenos reais e digitais coexistem e podem interagir a partir de trabalhos artísticos. Palavras-chave: arte cíbrida, tecnologia, transdisciplinaridade, fenomenologia, interatividade. Abstract The following article describes some transdisciplinary artistic developed in Laboratory of Research and Virtual Reality the Brasilia University experiments in augmented reality that contribute to the creation of systemic mixed spaces, contextualized by the so called art cíbrid, a reinvention of the environment, the ways of life and perception of live species that real phenomenal and digitals coexist and can interact since artistic work. Keywords: cybrid art, technology, transdisciplinary, fenomenology, interativity. Introdução A atual produção artística tecnocientífica tem revelado novas possibilidades de ampliar, tocar, simular ou criar fenômenos artificiais através da transferência para a máquina de informações sobre a essência dos sentidos humanos. Esse processo, denomina-se transdução (Plaza; Tavares, 1999), e permite transferir qualquer informação de um sistema vivo para o interior da máquina estabelecendo inter-relações sistêmicas 2 entre o orgânico e o digital como práticas simbióticas que produzem novos fenômenos perceptivos interligados e interdependentes. Entendemos por fenômenos os acontecimentos, as propriedades de uma coisa, que nós experimentamos pela nossa relação com o mundo (Merleau-Ponty, 1999). Assim, os fenômenos naturais são elementos orgânicos que carregam informações sobre os sentidos 3 que são diferenciados conforme o espaço, o tempo e o movimento entre a concepção, 1 Artista Multimídia, professora do Curso de Jogos Digitais pela Universidade do Distrito Federal (UDF), mestranda em Arte e Tecnologia pelo Programa de Pós-Graduação em Arte da Universidade de Brasília (UnB), bolsista de Apoio Técnico a Pesquisa do CNPq 1A, no Laboratório de Pesquisa em Arte e Realidade Virtual da UnB sob coordenação da professora Dra. Suzete Venturelli e colaboração da professora Dra. Diana Domingues. Curriculum Lattes: http://lattes.cnpq.br/2716665336587779 2 Nesse artigo, relacionaremos os termos „sistêmico‟ e „ecológico‟ como sinônimos compreendendo a forma biológica como um fluxo contínuo de matéria do organismo vivo em desenvolvimento e evolução. 3 São pelos nossos cinco sentidos que as formas de descrever, compreender, interpretar, manipular, apreender e trocar os fenômenos, que compreendemos a realidade.

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The following article describes some transdisciplinary artistic developed in Laboratory of Research and Virtual Reality the Brasilia University experiments in augmented reality that contribute to the creation of systemic mixed spaces, contextualized by the so called art cíbrid, a reinvention of the environment, the ways of life and perception of live species that real phenomenal and digitals coexist and can interact since artistic work.

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HAMDAN, Camila. Arte Cíbrida: Experimentações Artísticas com Sistemas Interativos. In: III Congresso Internacional em Artes, Novas

Tecnologias e Comunicação/CIANTEC, Universidade de Aveiro, Portugal, 2009, p. 237-242.

Arte Cíbrida: Experimentações Artísticas com Sistemas Interativos

Camila Hamdan1 [email protected]

Universidade de Brasília/UnB

Resumo

O presente artigo descreve algumas experimentações artísticas transdisciplinares desenvolvidas no Laboratório de Pesquisa em Arte e Realidade Virtual da Universidade de Brasília, que utilizam a realidade aumentada e que contribuem para a criação de espaços mistos sistêmicos, contextualizados no que denominamos de arte cíbrida, uma reinvenção do meio ambiente, dos modos de vida e da percepção dos seres vivos em que fenômenos reais e digitais coexistem e podem interagir a partir de trabalhos artísticos. Palavras-chave: arte cíbrida, tecnologia, transdisciplinaridade, fenomenologia, interatividade. Abstract

The following article describes some transdisciplinary artistic developed in Laboratory of Research and Virtual Reality the Brasilia University experiments in augmented reality that contribute to the creation of systemic mixed spaces, contextualized by the so called art cíbrid, a reinvention of the environment, the ways of life and perception of live species that real phenomenal and digitals coexist and can interact since artistic work. Keywords: cybrid art, technology, transdisciplinary, fenomenology, interativity.

Introdução

A atual produção artística tecnocientífica tem revelado novas possibilidades de

ampliar, tocar, simular ou criar fenômenos artificiais através da transferência para a máquina

de informações sobre a essência dos sentidos humanos. Esse processo, denomina-se

transdução (Plaza; Tavares, 1999), e permite transferir qualquer informação de um sistema

vivo para o interior da máquina estabelecendo inter-relações sistêmicas2 entre o orgânico e

o digital como práticas simbióticas que produzem novos fenômenos perceptivos interligados

e interdependentes.

Entendemos por fenômenos os acontecimentos, as propriedades de uma coisa, que

nós experimentamos pela nossa relação com o mundo (Merleau-Ponty, 1999). Assim, os

fenômenos naturais são elementos orgânicos que carregam informações sobre os sentidos3

que são diferenciados conforme o espaço, o tempo e o movimento entre a concepção,

1 Artista Multimídia, professora do Curso de Jogos Digitais pela Universidade do Distrito Federal (UDF), mestranda em Arte e

Tecnologia pelo Programa de Pós-Graduação em Arte da Universidade de Brasília (UnB), bolsista de Apoio Técnico a Pesquisa do CNPq – 1A, no Laboratório de Pesquisa em Arte e Realidade Virtual da UnB sob coordenação da professora Dra. Suzete

Venturelli e colaboração da professora Dra. Diana Domingues. Curriculum Lattes: http://lattes.cnpq.br/2716665336587779 2 Nesse artigo, relacionaremos os termos „sistêmico‟ e „ecológico‟ como sinônimos compreendendo a forma biológica como um

fluxo contínuo de matéria do organismo vivo em desenvolvimento e evolução. 3 São pelos nossos cinco sentidos que as formas de descrever, compreender, interpretar, manipular, apreender e trocar os

fenômenos, que compreendemos a realidade.

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reprodução e morte de um organismo. Hoje, com o uso das tecnologias esses fenômenos

podem ser transduzidos para os computadores no intuito de criar um sistema artificial de

vida e/ou de novas formas de comunicação pela simbiose entre a natureza e a máquina.

Nosso objetivo no presente artigo é descrever o contexto prático- teórico da nossa

produção atual, desenvolvida no Laboratório de Pesquisa em Arte e Realidade Virtual4 do

Programa de Pós-Graduação em Arte da Universidade de Brasília, com o uso de alguns

dispositivos tecnológicos como forma de comunicação e potencialização dos seres vivos e

que contribuem para a criação coletiva de uma rede simbiótica entre fenômenos

reais/digitais, em tempo real.

Para tanto, buscamos estudar conceitos da filosofia, biologia, física, arte e

computação como partes do conhecimento transdisciplinar o qual, “oferece-nos uma nova

visão da natureza e da realidade” (FREITAS; MORIN; NICOLESCU, 1994) e que contribuem

para a produção, consciência e interação das sensações naturais e artificiais como um todo

integrado. Nesse sentido, descrevemos as obras <Body> e Cybrid Cactus como trabalhos

artísticos que utilizam a tecnologia da realidade aumentada (RA) em sistemas que

aproximam os seres vivos ao desejo de ubiqüidade tecnológica e que contribuem para

novas percepções da realidade embasadas na reflexão de uma arte cíbrida.

Arte Cíbrida

A arte em conexão com as tecnologias tem como característica, uma nova

percepção do ambiente, pelo diálogo do nosso corpo sobre o espaço, pela possibilidade de

interpretar informações geradas a partir de fenômenos naturais e/ou artificiais na interação

sistemas vivos-computador. Assim, dados eletrônicos criados, exibidos ou manipulados em

obras artísticas interativas atuam como fenômenos perceptivos digitais, que estimulam o

nosso cérebro e ao serem interpretados num sistema simbiótico produzem o que

denominamos arte cíbrida. Os sentidos, são meios através dos quais os seres vivos

percebem e reconhecem outros organismos, quando transduzidos possibilitam a descrição

de informações que permitem a máquina criar fenômenos digitais e/ou interpretar

fenômenos naturais.

A conexão entre a realidade que contém os objetos concretos e a virtualidade, que

contém os objetos simulados, permite o surgimento do espaço cíbrido, segundo Peter

Anders, ou do que denominamos constituir de realidade cíbrida. Segundo o autor (apud

4 Laboratório coordenado pela Dra. Suzete Venturelli e professora colaboradora Dra. Diana Domingues. Bolsistas integrantes:

Amanda Moreira (FINATEC), Breno Rocha (Pibic/CNPq), Bruno Braga (FUB), Camila Hamdan (CNPq), Lauro Gontijo (FINATEC), Roni Ribeiro (FINATEC), Pedro Brandão (Pibic/CNPq), Leandro Trindade (Pibic/CNPq), Tiago Franklin (FINATEC). Blog: http://www.artetecnologialab.blogspot.com

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KINSLEY, 2003), cíbrido é a fusão da atualidade e da virtualidade, a conexão entre a

realidade que contém os objetos concretos e a virtualidade, que contém os objetos

simulados. Os objetos concretos são os objetos reais, atualidade do espaço físico que

habitamos, entendido como tendo três dimensões (x, y, z), constituídas por unidades

básicas de existência, os átomos. Já o virtual, é relacionado ao espaço computacional e

suas unidades que o compõem, os bits.

Nesse contexto, a percepção artificial e natural está diretamente relacionada às

características do espaço em que os fenômenos se encontram, já que este necessariamente

se dá pela nossa relação com o mundo. Assim, nossas interações com as tecnologias da

comunicação permitem a construção de espaços dinâmicos a partir das inter-relações entre

a percepção orgânica/digital e o meio ambiente. São combinações sistêmicas, interligadas e

interdependentes de uma realidade conectada. A percepção de um espaço misto artístico

em que elementos orgânicos e inorgânicos coexistem e podem interagir, pode ser tanto,

aquilo que é percebido através de estímulos sensoriais naturais quanto, informações digitais

interpretadas pelo nosso cérebro e/ou máquina.

Primeiramente, a percepção da realidade cíbrida contextualiza uma nova

compreensão científica da vida em todos os níveis dos sistemas, tais como os organismos,

sistemas sociais e ecossistemas, quando associada à tentativa de recriar os fenômenos

biológicos nos computadores em obras artísticas. Esse pensamento embasa a formulação

da categoria arte cíbrida como originária da ciberarte.

A denominação ciber+arte refere-se ao uso do ciberespaço. A Ciberarte insere-se no contexto artístico o uso de tecnologias computadorizadas, resultantes das descobertas científicas da microinformática e da telemática, gerando ambientes interativos que usam a expressividade do ciberespaço, espaço de computadores pessoais ou conectados em redes (DOMINGUES, 2002, p. 59).

De forma semelhante a esse conceito, a arte cíbrida, propõe a conexão da essência

dos objetos concretos, do orgânico, da atualidade, dos átomos, com a essência dos objetos

simulados, do inorgânico, da virtualidade, dos bits, numa realidade conectada à tecnologia

ampliada e invisível em que se predomina o espaço físico que habitamos somada a um

território cibernético de informação.

Esse território pode ser entendido como um sistema informacional cibernético que

compreende a comunicação entre as máquinas e os sistemas vivos, ou seja, das

informações que permitem a interação entre os elementos reais e virtuais em um espaço

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artístico, em que os objetos coexistem e podem interagir conectados em sistemas

cibernéticos e/ou pela Internet5.

De forma a pigmentar tais reflexões a serem abordadas, acreditamos, com bases em

experimentações artísticas tecnocientíficas por nós desenvolvidas, que as interfaces

acopladas aos seres vivos mesclam de forma sutil, o orgânico em diálogo com o inorgânico

através das estruturas sistêmicas criando modelos criativos de espaço para a arte e para a

vida. Nesse sentido, a utilização do corpo orgânico como interface natural configura-se

como uma possibilidade de experimentação artística desenvolvida na obra <Body>.

<Body>: bios cíbrido

Diante das experiências perceptivas ampliadas pela fusão entre arte e tecnologia e a

partir de alguns conceitos desencadeados pela temática da realidade cíbrida,

desenvolvemos a instalação performática interativa denominada <Body>6, que associa o

corpo carnal e o corpo de silício em tempo real. O corpo conectado a um sistema simbiótico

enfatiza a experiência perceptiva a partir do conceito de computação ubíqua proposto por

Mark Weiser e reafirma a biologia corpo/mente proposta por Maturana e Varela no que seria

um quinto bios ou bios cíbrido (DOMINGUES; VENTURELLI, 2008), conceito ampliado de

bios midiático de Muniz Sodré.

Com o objetivo de tornar a interação humano computador invisível, a computação

ubíqua torna imperceptível e onipresente a informática no cotidiano das pessoas ao fazer

uso do virtual em um ambiente físico como forma expandida, complementa a noção de

Maturana e Varela, cuja a mente é situado no comportamento. Assim, o bios cíbrido, parte

do comportamento de interagir, corpo, mente e tecnologia conectados, numa performance

ampliada e invisível (HAMDAN, 2009a).

Em <Body>, o interator tem a impressão de estar vivendo num espaço onde não

existe mais fronteiras entre o real e o virtual, ambos em constante continuum, pois o corpo é

a interface. Com nossa pele podemos receber e transmitir informações de um ambiente,

real/virtual e de certa forma, transformar parte de nosso corpo em um hardware biológico,

pela interação, mistura direta e em tempo real, entre a pele digitalizada por uma webcam e

imagens tridimensionais criadas no computador (HAMDAN, 2009a).

5 A conexão ao qual propomos refletir, na arte cíbrida não é somente associada a rede mundial de computadores, mas pode

estar associada também a um sistema que estipula um espaço de troca de informações. 6 Trabalho apresentado na exposição EnMeio, durante o #7. ART – Encontro Internacional de Arte e Tecnologia, realizado no

Museu Nacional da República em Brasília/DF, Brasil, de 01 à 06 de outubro de 2008. Registro videográfico disponível em: http://www.youtube.com/hamdancamila.

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Na obra, o público participante é simbolicamente tatuado, através do desenho de um

marcador gráfico de RA sobre a pele, que ao ser mapeado através do sistema de visão

computacional do programa7 por uma webcam, projeta na parede do espaço da instalação,

a mistura da pele com o marcador e sobre este, uma tatuagem computacional 3D, com

comportamento de criatura viva. Desta forma, a obra, ao potencializar as tatuagens de

síntese animadas, vivendo sobre a superfície da pele, relaciona o conceito denominado por

Lúcia Santaella (2003) de corpo pós-biológico ou biocibernético a uma das formas de

modificação do corpo mais conhecidas e cultuadas no mundo, a tatuagem.

A arte cíbrida ao reconhecer a interdependência de fenômenos naturais e artificiais

encaixados em processos cíclicos insere-se numa composição ecológica, pela reflexão e

questionamento sobre esse paradigma, com base numa perspectiva “ecocybrid”, ou seja, a

partir da experiência perceptiva dos seres vivos com o uso das tecnologias, num ambiente

cíbrido composto pelo misto entre real e virtual, orgânico e inorgânico de forma conectada.

Cybrid Cactus: ecologia cíbrida

Com base nos conceitos e práticas artísticas, propomos o desenvolvimento de uma

obra artística denominada Cybrid Cactus8, buscando proporcionar novas relações

experienciais dos seres vivos com elementos reais e virtuais, a natureza em simbiose com

as tecnologias. Ao interagir com a obra, o público aciona um sistema complexo composto

por uma webcam, como sensor de presença, que mapeia o movimento do interator no

espaço através de um sistema de visão computacional9. A instalação foi composta por um

jardim de Cactos, planta típica da região do nordeste do Brasil, adicionado de marcadores

de RA em sua superfície (HAMDAN, 2009b).

O interator ao transitar pelo espaço expositivo aciona o programa de RA a partir de

sua presença no ambiente da obra, replicando ad infinitum na parede, uma imagem

sistêmica composta pelos cactos com seus marcadores e plantas geradas artificialmente por

simulação. Imagens de plantas virtuais animadas assumem comportamentos como forma

viva sobre os marcadores em tempo real. A obra questiona a nossa visão do mundo

moldada e reformulada pelas experiências perceptivas da natureza e do corpo humano,

7 ARToolKit é um sistema que viabiliza a construção de interfaces em realidade aumentada disponível gratuitamente para

download no site da Universidade de Washington: http://www.hitl.washington.edu/artoolkit/download/ 8 Exposição coletiva Capital Digital: Arte, Ciência e Tecnologia realizada entre os dias 12 de junho à 12 de agosto de 2009 na

Estação Ciência, Arte Cultura de Cabo Branco na cidade de João Pessoa/PB, Brasil. Blog: http://www.capitaldigitalbsb.blogspot.com. 9 Programa desenvolvido na linguagem Phyton por Leandro Trindade, acadêmico do Curso de Ciências da Computação da

Universidade de Brasília. Bolsista PIBIC/CNPq no Laboratório de Pesquisa em Arte e Realidade Virtual.

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ampliado pelas tecnologias. Cybrid Cactus contribui para a compreensão da realidade com

base na teoria da evolução darwinista numa proposta de ecologia cíbrida, constituída pelo

jogo dos sentidos, em que o orgânico e o inorgânico, os seres vivos e a máquina, são

inoperantes um sem o outro e mutuamente dependentes.

Para a concepção orgânica do ambiente, pesquisamos a classificação científica

dos cactos da região subdividida em classes e espécies. Mandacaru, Palma, Coroa-de-frade

são algumas das 300 espécies encontradas no Brasil das duas mil catalogadas no mundo.

Algumas dessas espécies serão desterritorializadas de seu habitat natural e

reterritorializadas no espaço do Museu para serem cobertas com marcadores de RA, e

assim, a sobreposição das plantas virtuais.

Para a concepção virtual, estudamos a tecnologia da realidade virtual e aumentada

através da utilização de programas que possibilitam a criação tridimensional de imagens.

Plantas, criaturas e organismos artificiais foram modeladas e animadas10. Na obra, os

fenômenos foram experienciados nos níveis da realidade dos elementos reais e orgânicos,

da virtualidade e da simulação em seu desdobramento para a Internet, de modo que a obra

configurou-se como um todo sistêmico. Dessa forma, todo o ambiente da instalação que

inclui a interação do público, a disposição do jardim real com os marcadores e a sua

projeção foi exibida em uma rede social de compartilhamento de conteúdo ao vivo com

vídeo-chat na Internet11.

Ciberconclusão

A inter-relação simbiótica entre as informações orgânicas e digitais em obras

artísticas interativas, promovem a cibercepção ao atribuir significados dos fenômenos

orgânicos/digitais a partir de estímulos sensoriais, interpretados no diálogo com elementos

virtuais em um sistema denominado biofeedback em tempo real.

O espaço artístico torna-se dinâmico oferecendo novas estruturas sociais pela

colaboração entre pesquisas transdisciplinares de artistas e cientistas, em contribuição à

prática de uma arte planetária. Assim, percebemos que o papel da arte com a tecnociência

contribui para a criação de práticas artísticas, sobre a vida e a realidade na cultura pós-

biológica, estabelecendo formas criativas de conectividade social, a serem observadas e

experiênciadas a partir dos conceitos e definições da prática em arte cíbrida.

10

Utilizamos o software de modelagem tridimensional 3Ds Studio que permite a renderização de imagens e animação.

Modelagens realizadas por Roni Ribeiro, acadêmico do Curso de Artes Visuais pela Universidade de Brasília. Bolsista pela

Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos/FINATEC no Laboratório de Pesquisa em Arte e Realidade Virtual, UnB. 11

A rede social chama-se Ustream tv. Criamos um Canal chamado Cybrid Cactus: Exposição Capital Digital, João Pessoa/PB

em Cybrid Reality com transmissão ao vivo.

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Seguindo este pensamento, percebemos que a arte cíbrida é uma transformação de

longa duração a partir da subjetividade coletiva humana em reinventar interações no sistema

vivo-computador, que promovem significativas mudanças em escala planetária, no meio

ambiente, nas relações sociais, comunicacionais pela produção da criação artística

simbiótica.

Trata-se, portanto, de uma complexa teia de relações e inter-relações entre a arte, a

ciência e a tecnologia in continuum, em várias partes do mundo, de criar um espaço

sensível em que coisas, dados, informações reais/virtuais, orgânico/inorgânico não são

elementos distintos aos sentidos dos sistemas vivos, mas interconexões entre estes, entre

outras coisas e assim por diante.

Figura 1: Teste Body. Camila Hamdan, 2008.

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Figura 2: Body. Camila Hamdan, 2008.

Figura 3: Cybrid Cactus. Camila Hamdan, 2009.

Bibliografia

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