graça presente, glória futura

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Os moradores da ilha de Creta tinham uma péssima reputação diante do mundo antigo. Chamar alguém de ¿cretense¿ era uma ofensa moral terrível, pois até os seus poetas escreveram que eles eram ¿sempre mentirosos, feras malignas, glutões preguiçosos¿ (Tt 1:12). O Evangelho chegou nesta sociedade e seu papel inicial foi transformar os cretenses em cidadãos de bem; por meio da graça de Deus eles aprenderiam ¿a renunciar as paixões mundanas e a viver de maneira sensata, justa e piedosa¿ (Tt 2:12). O texto de Graça presente, Glória Futura nos ensina que a primeira salvação recebida pelo ser humano quando aceita a mensagem do Evangelho é a capacidade de viver de forma ética e sensata num mundo que a cada dia perde os referenciais da moralidade. Os verdadeiros cristãos nunca perderam o desejo de estarem de forma definitiva com o seu Salvador. Porém, esta é a glória futura; para o presente, precisamos da graça de Deus para nos ajudar a desviar nossos pés das lamas nojentas deste mundo.

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Hélio klabono jr

GRAÇA PRESENTE GLÓRIA FUTURA

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Hélio klabono jr

São Paulo 2012

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“Sê como o candeeiro que se consome a si mesmo para dar vida aos outros.”

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Creta, os deuses e a sociedade

Uma ilha localizada no mar mediterrâneo, a sudo-este da Grécia, “dominada por quatro cadeias de monta-nhas, mas na metade oriental existem planícies férteis e bacias de planalto que proporcionam pastagens.” (Ten-ney, 2008, p. 1214). “Sede de uma civilização antiga e poderosa, que já no alvorecer da história grega se tornara lendária.” (Halley, 1998, p. 268). A Grécia não era um país uno, mas uma série de cidades-estados independen-tes. Creta era uma dessas cidades-estados com relevante importância comercial e uma geografia que favorecia a rota de navios que cruzavam o mar Mediterrâneo para toda parte do mundo conhecido.

A capacidade para exploração portuária favoreceu o desenvolvimento comercial e a circulação de dinheiro atraiu

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cambistas, comerciantes, ambulantes, ladrões e prostitu-tas cultuais e usuais de toda parte, o que deu à cidade características comportamentais questionáveis no âmbito moral. Por volta do ano 65 d.C., o apóstolo Paulo enviou uma carta a Tito que havia sido deixado em Creta para organizar a igreja que já existia ali; os habitantes dessa fai-xa de terra no meio do mar já há muito tempo possuíam uma cultura mitológica enraizada, fator importante para esses habitantes.

Suas bases religiosas foram lançadas por meio dos deuses mitológicos, uma vez que a cultura grega predo-minava. Em suas conquistas territoriais, os gregos cons-truíam os templos para homenagearem seus deuses, o que passava a definir a vida das pessoas. O panteão de deuses, semideuses, as personalidades intelectuais, seus heróis mortais, os Titãs1 e ainda a busca do corpo perfeito, já que a Grécia é o berço das Olimpíadas, determinavam o comporta-mento social, ético e religioso daquele lugar. Esses personagens endeusados eram “volúveis e amorais por isso não podiam dar orientação à vida; precisavam ser conquistados por oferendas e sacrifícios.” (Wilkinson, 2009, p. 34).

Um importante ser mitológico estreitamente ligado à Creta é Zeus, o deus do Olimpo2; acreditava-se que:

1 “Os Titãs eram gigantes de força incrível que geraram filhos destinados a serem os mais poderosos deuses”, Wilkinson, P.& Philip, N. Guia Ilustrado Zahar: Mitologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.

2 Lugar onde moravam os deuses mais importantes e de lá essas divindades influenciavam quase tudo o que acontecia na Terra.

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[...] Crono, rei dos Titãs, casou-se com a titânida Reia. Logo o casal gerou filhos, mas havia um problema: Cro-no ouvira um oráculo que um de seus filhos o mata-ria. Para evitar a predição, cada vez que nascia um filho, Crono pegava a criança e engolia. Isso se repetiu cinco vezes, mas na sexta Reia decidiu enganar o marido. Es-condeu o recém-nascido Zeus e envolveu nas mantas da criança uma pedra. Crono pegou a pedra e engoliu, e Reia secretamente enviou Zeus a Creta, onde ele recebeu os cuidados de uma fiel ninfa-cabra chamada Amalteia, que o nutriu com mel fornecido pelas abelhas cretenses. Amalteia morreu quando Zeus era quase adulto; com a pele dela, ele fez um escudo mágico extremamente for-te. Zeus sabia de sua origem e do que o pai fizera aos irmãos, e decidiu então retornar à Grécia para se vingar. Lá chegando encontrou Métis, uma titânida esperta, que lhe disse não ser tarde demais para libertar os irmãos. Métis forneceu a Zeus uma droga, sob cujo efeito, Cro-no, que a bebera, acabou por vomitar seus outros cinco filhos: os deuses Posídon e Hades e as deusas Hétia, De-méter e Hera. Depois Zeus libertou Ciclopes, uma raça de gigantes de um olho só, que tinham sido enviados ao Mundo Subterrâneo por Urano e lá mantidos por Cro-no. Também eles desejavam se vingar do Titã.3

Zeus casou-se com sua irmã Hera, além de possuir outras amantes humanas e divinas, o que deixava Hera

3 Wilkinson, P. & Philip, N., op. cit.,p. 38.

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enciumada; várias brigas conjugais marcaram o casamen-to entre o deus Zeus e a deusa Hera, esta o deixou várias vezes, mas sempre voltava seduzida pelo seu irmão-ma-rido. Sem o mínimo de pudor, Zeus usava sua capacida-de em disfarçar-se para seduzir outras mulheres e deusas, certa ocasião “mudou de forma para seduzir a mulher que desejava, sob a forma de seu marido dormiu com Alcme-na gerando o herói Herácles.” (Wilkinson, 2009, p. 43).

A história do Minotauro é outro mito diretamente relacionado à ilha. Antes de assumir o governo de Creta, Minos pediu a Zeus que o fizesse rei de um poderoso reinado. O pedido foi atendido, mas Minos deveria sacri-ficar um animal escolhido por Zeus. Quando já reinava, Minos recebeu de Zeus um enorme e magnífico touro branco que saiu das águas do mar Mediterrâneo e que deveria ser sacrificado conforme combinado. O problema é que Minos admirou de tal maneira o touro branco que resolveu enganar Zeus, oferecendo um touro comum. Ira-do, Zeus resolveu castigá-lo: enfeitiçou sua esposa, que se apaixonou perdidamente pelo touro branco, o que resul-tou no nascimento do Minotauro: um ser meio homem, meio animal que devorava pessoas. O rei Minos prendeu o ser híbrido num labirinto nas montanhas de Creta, “a cada nove anos forçosamente era preciso enviar 14 mo-ças e rapazes como alimento para a besta e um navio de velas pretas zarpava de Atenas com essa carga humana.” (Wilkinson, 2009, p. 62). Teseu, um jovem ateniense, se ofereceu para ser alimento do Minotauro, pois dessa ma-neira teria a oportunidade de matar a criatura.

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[...] O rei Egeu, preocupado com o filho [Teseu] pediu que velas brancas fossem içadas na volta para ele saber imediatamente que seu amado filho estava vivo. Quan-do os atenienses chegaram a Creta, a filha do rei Minos, Ariadne, apaixonou-se por Teseu. Ofereceu-lhe ajuda em troca da promessa de casamento, dando a ele um novelo de cordel. Teseu amarrou uma das pontas na en-trada do labirinto e entrou, liberando a corda enquanto caminhava. No meio do labirinto, lutou contra o Mino-tauro e o matou. Seguindo o cordel, Teseu salvou os jo-vens e partiu para casa, levando Ariadne com ele. Esque-cendo, contudo que devia seu êxito a ela, abandonou-a na ilha de Naxos. Logo foi punido pela crueldade, pois os marinheiros não se lembraram de içar as velas bran-cas, e Egeu, ao avistar da praia velas pretas, concluiu que o filho estava morto e lançou-se de um penhasco ao mar, que desde então passou a se chamar Egeu.4

Outro mito relacionado à Creta é que o herói Teseu, que havia vencido o Minotauro, voltou à ilha e casou-se com Fedra, filha do rei Minos e irmã de Ariadne. O pro-blema desta vez é que Fedra se apaixonara por Hipólito, filho de Teseu com Hipólita, rainha das amazonas. Fedra enviou um bilhete ao filho de seu marido, confessando sua paixão; este resolveu visitá-la para censurar-lhe essa pai-xão incestuosa. Por causa dessa rejeição acusou Hipólito

4 Idem, p. 62.

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de tê-la atacada, e desesperada se enforcou, deixando um bilhete acusando o rapaz de crimes horrendos.

Quando Teseu leu o bilhete, voltou-se contra o filho e pediu que o deus do mar, Posídon, o punisse. Assim, um dia quando Hipólito estava em sua carruagem, Po-sídon enviou uma onda enorme que afogou os cavalos e lançou o jovem à morte, por causa disto nasceu o culto grego de veneração à castidade.5

A vastíssima quantidade de personagens humanos e divinos, filhos de deuses e semideuses da mitologia grega, na sua maioria absoluta, eram personagens trapaceiros, mentirosos, egoístas e profanos. Seres possuidores de po-deres que eram usados para matar indistintamente aque-les que os aborrecessem, quer fossem divinos quer fossem humanos; outras incontáveis histórias de intrigas, casti-gos e relacionamentos sexuais promíscuos faziam parte do comportamento da população religiosa da ilha de Cre-ta. Zeus, o maioral do Olimpo, possuía caráter reprová-vel, vingativo e lascivo, um modelo repetido e por muitas vezes potencializado por todo o panteão.

O evangelho havia chegado nesse lugar e igrejas ha-viam sido instaladas, mas a cultura mitológica estava im-pregnada na sociedade de um modo patente e abrangente. O caráter dos deuses era reproduzido na vida pública de

5 Idem, p. 63.

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cada cidadão. As pessoas eram preguiçosas, abusavam da comida, não havia respeito familiar e menos ainda com outra pessoa fora do ambiente doméstico; o engano, a po-ligamia, a desonestidade e vários outros comportamentos reprováveis e estúpidos estavam na agenda dos cretenses que tinham péssima fama em todo o mundo. Chamar alguém de cretense era uma séria ofensa moral; Epimê-nedes, um profeta cretense, chegou a afirmar: Cretenses, sempre mentirosos, feras malignas, glutões preguiçosos (Tt 1:12). Os habitantes de Creta reproduziam o comporta-mento dos deuses que admiravam. Acredito que a palavra cretino seja uma versão moderna de cretenses!

O caráter do deus que se adora reflete na vida do adorador, por isso as pessoas eram astutas, burladoras e cruéis. Este era o desafio de Tito em Creta: ensinar os cidadãos cretenses, principalmente os membros da igreja, a serem educados, graciosos e diferentes dos deuses mito-lógicos; ensinar que a graça de Deus em Jesus transforma pessoas rudes e selvagens em pessoas educadas pela ação regeneradora do Espírito Santo.

O apóstolo Paulo ensinou em sua carta aos Efésios a sermos imitadores de Deus como filhos amados, a con-sequência disso seria viver em amor, como também Cristo nos amou e se entregou por nós como oferta e sacrifício de aroma agradável a Deus (Ef 5;2); do mesmo modo que o caráter reprovável dos deuses gregos eram assimilados e reproduzidos pelos seus admiradores, os cristãos que fo-ram aconselhados por Paulo a imitarem o Deus bíblico

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também reproduziriam o caráter santo e amoroso do seu Deus, a quem adoravam. A palavra grega usada por Pau-lo, que é traduzida por imitar em Efésios 5:1, é mimetis-mo que é definido pelo dicionário da língua portuguesa como a “Capacidade que têm certos animais e plantas de adaptar-se à cor do ambiente ou de outros seres ou objetos, para passarem despercebidos de seus inimigos ou vítimas”6 Ou seja, imitar ou mimetizar é parecer-se tanto com Deus de modo que sejamos confundidos com Ele próprio. E foi isso o que aconteceu com os irmãos em Antioquia quan-do foram chamados pela primeira vez de cristãos, se pareciam tanto com Cristo que receberam esse apelido (At 11:26). O salmo 115 também nos ajuda a entender que o adorador, à medida que se relaciona com o seu deus, reproduz suas quali-dades ou defeitos:

[...] Os ídolos deles, de prata e ouro, são feitos por mãos humanas. Têm boca, mas não podem falar, olhos, mas não podem ver; têm ouvidos, mas não podem ouvir, na-riz, mas não podem sentir cheiro; têm mãos, mas nada podem apalpar, pés, mas não podem andar; e não emi-tem som algum com a garganta. Tornem-se como eles aqueles que os fazem e todos os que neles confiam (Sl 115:4-8).

Concluímos dizendo que o ser humano se torna pa-recido com o deus que adora. Os que confiam em ídolos

6 Dicionário Barsa da Língua Portuguesa Ilustrado. vol. 2, p. 718.

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perdem as sensibilidades naturais e os imitadores do Deus bíblico reproduzem as excelentes qualidades morais per-tinentes a Ele, deste modo, os habitantes de Creta são moralmente reprováveis por causa dos deuses em que de-positavam sua fé.

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