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GOVERNO DO ESTADO DE PERNAMBUCO SECRETARIA DA CASA CIVIL GOVERNO DO ESTADO DE PERNAMBUCO SECRETARIA DA CASA CIVIL RELATÓRIO FINAL VOLUME I RELATÓRIO FINAL VOLUME I

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GOVERNO DO ESTADO DE PERNAMBUCOSECRETARIA DA CASA CIVIL

GOVERNO DO ESTADO DE PERNAMBUCOSECRETARIA DA CASA CIVIL

RELATRIO FINAL VOLUME I

RELATRIO FINAL VOLUME I

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IVOLUMEVOLUME

IApoio

GOVERNO DO ESTADO DE PERNAMBUCOSECRETARIA DA CASA CIVIL

COMISSO ESTADUAL DA MEMRIA E VERDADE DOM HELDER CMARA

RELATRIO FINAL VOLUME I

Fernando de Vasconcellos CoelhoGilberto Marques de Melo Lima

Henrique Neves MarianoHumberto Cabral Vieira de Melo

Jose ureo Rodrigues BradleyManoel Severino Moraes de Almeida

Maria do Socorro Ferraz BarbosaNadja Maria Miranda Brayner

Vera Lcia Costa Acioli

RECIFE2017

2

COMISSO ESTADUAL DA MEMRIA E VERDADE DOM HELDER CMARARELATRIO FINAL VOLUME I

Governador do Estado de PernambucoPaulo Henrique Saraiva Cmara

Secretrio da Casa CivilAntnio Carlos dos Santos Figueira

COMISSO ESTADUAL DA MEMRIA E VERDADE DOM HELDER CMARAFernando de Vasconcellos Coelho (Coordenador Geral)Henrique Neves Mariano (Secretrio Executivo)Gilberto Marques de Melo LimaHumberto Cabral Vieira de MeloJose ureo Rodrigues BradleyManoel Severino Moraes de AlmeidaMaria do Socorro Ferraz BarbosaNadja Maria Miranda BraynerVera Lcia Costa Acioli

Assessores da CEMVDHCAna Ceclia LimaFernando Jos Pereira de ArajoJacqueline de Arajo FlorncioJoelma de Gusmo LimaLilia Maria Pinto GondimMonike Gabrielle de Moura PintoRafael Leite FerreiraTeresa Cristina Wanderley NevesZlia Maria Pereira da Silva

Consultoria Especial da CEMVDHCJos Almino de Alencar e Silva Neto

Secretaria da CEMVDHCLia MarquesPriscila Gonalves FerreiraRuth Lima de Arajo Coutinho

Digitalizao, Edio e ImpressoCompanhia Editora de Pernambuco CEPE

Diretor PresidenteLuiz Ricardo Leite de Castro Leito

Diretor de Edio e ProduoEdson Ricardo Teixeira de Melo

EquipeIgor Burgos, Ana Cludia Alencar, Dbora Lbo, Denise Vieira, Fabiola Rodrigues, Ftima Pessoa, Luciana Lino, Martiniano Lins, Pedro Souza, Joselma Firmino, Ayrton Poeta, as Pinheiro, Gildson Alves e Valdeito Souza.

A Comisso Estadual da Memria e Verdade Dom Helder Cmara (CEMVDHC) foi integrada por nove membros, por designao do governador Eduardo Henrique Accioly Campos, conforme previsto no art. 2 da Lei n 14.688. Compuseram-na durante todo o seu perodo de funcionamento de 1 de junho de 2012 a 31 de dezembro de 2016 os membros Fernando de Vasconcellos Coelho, Gilberto Marques de Melo Lima, Henrique Neves Mariano, Humberto Vieira de Melo, Manoel Severino Moraes de Almeida, Maria do Socorro Ferraz Barbosa, Nadja Maria Miranda Brayner. Foram designados para a composio inicial, mas se desligaram antes das concluses dos trabalhos, Pedro Eurico de Barros e Silva (renunciou em 28 de dezembro de 2012, para assumir o cargo de Secretrio Estadual da Criana e da Juventude) e Roberto Franca Filho (renunciou em 31 de outubro de 2016, para assumir o cargo de presidente da Fundao de Atendimento Socioeducativo - Funase). Os membros Jos ureo Rodrigues Bradley, em 28 de dezembro de 2012, e Vera Lcia Costa Acioli, em 4 de novembro de 2016, foram nomeados para substitu-los, tendo ambos permanecido nos cargos at a entrega do Relatrio Final da Comisso.

Os trabalhos da CEMVDHC foram desenvolvidos sob a coordenao de seus membros e com a colaborao de nove assessores (conforme previsto no art. 8 da lei acima referida), consultores e colaboradores.

Coordenador geral: Fernando de Vasconcellos Coelho

Secretrio executivo: Henrique Neves Mariano

Organizadores do relatrio: Vera Lcia Costa Acioli, Monike Gabrielle de Moura Pinto, Jos Almino de Alencar e Silva Neto, Lilia Maria Pinto Gondim e Rafael Leite Ferreira.

Relatores: Fernando de Vasconcellos Coelho, Gilberto Marques de Melo Lima, Henrique Neves Mariano, Humberto Cabral Vieira de Melo, Jose ureo Rodrigues Bradley, Manoel Severino Moraes de Almeida, Maria do Socorro Ferraz Barbosa, Nadja Maria Miranda Brayner, Roberto Franca Filho e Vera Lcia Costa Acioli.

Consultoria especial: Jos Almino de Alencar e Silva Neto

3

Equipe da CEMVDHC

Assessoria de Administrao: Fernando Jos Pereira de Arajo (Coordenao) Colaboradores: Ruth Lima de Arajo Coutinho, Samara Ksia (de outubro de 2012 a dezembro de 2013), Ana Ceclia Lima Vasconcelos (de outubro de 2012 a dezembro de 2014), Maria Martha Cavalcante Padilha (de maio de 2013 a fevereiro de 2014), Geraldo Jos Carvalho Cisneiros (de julho de 2014 at agosto de 2016), Maria Nvea dos Prazeres Siqueira Melo Hoepfner (de agosto de 2015 a junho de 2016), Lia Marques (de junho de 2015 a maio de 2016, como voluntria, e a partir de junho de 2016, como contratada).

Assessoria de Audincias: Lilia Maria Pinto Gondim (Coordenao), Joelma de Gusmo Lima. Colaborador: Eduardo Gomes de Figueiredo (de agosto a dezembro de 2012).

Assessoria de Comunicao: Jacqueline de Arajo Florncio (Coordenao) Colaboradores: Dbora Brito (de janeiro a julho de 2013), Maria Nvea dos Prazeres Siqueira de Melo Hoepfner (de agosto de 2013 a agosto de 2015), Rani Mendona (de maro a outubro de 2013), Neide Andrade (de maio a outubro de 2014), Ramone Soraia Ramalho de Souza (de dezembro de 2013 a maio de 2014), Cibelly Melo (a partir de agosto de 2015).

Assessoria de Pesquisa: Rafael Leite Ferreira (Coordenao), Zlia Maria Pereira da Silva, Teresa Cristina Wanderley Neves (a partir de maio de 2013).Colaboradores: Vera Lcia Costa Acioli, Lilia Maria Pinto Gondim, Joelma de Gusmo Lima, Monike Gabrielle de Moura Pinto, Priscila Gonalves Ferreira, Samuel Carvalheira de Maupeou (at maio de 2013), Suzane Batista de Arajo (at junho de 2014), Valria Jos Silva Santos (at agosto de 2013).

Assessoria de Sistematizao da Documentao: Vera Lcia Costa Acioli (Coordenao), Monike Gabrielle de Moura Pinto (de setembro de 2013 a julho de 2014, como voluntria, e a partir de agosto de 2014, como assessora). Colaboradores: Valria Jos Silva Santos (de agosto de 2012 a agosto de 2013), Suzane Batista de Arajo (de setembro de 2013 a junho de 2014), Priscila Gonalves Ferreira (de setembro de 2013 a dezembro de 2014, como voluntria, e a partir de janeiro de 2015, como contratada).

Organizao do Banco de Dados:Vera Lcia Costa Acioli (Coordenao), Monike Gabrielle de Moura Pinto, Priscila Gonalves Ferreira.

Organizao das Fontes Documentais e Testemunhais de Investigao: Vera Lcia Costa Acioli e Monike Gabrielle de Moura Pinto.

FICHA CATALOGRFICA_______________________________________________________________

________________________________________________________________

2017 Secretaria da Casa Civil - Governo do Estado de Pernambuco.

Todos os direitos reservados. permitida a reproduo parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que no seja para venda ou qualquer m comercial.

P452c Pernambuco. Secretaria da Casa Civil Comisso Estadual da Memria e Verdade Dom Helder Cmara : relatrio final : volume I / Secretaria da Casa Civil. Recife : CEPE, 2017. 405p. : il. ISBN 978-85-7858-481-8

Inclui referncias.

1. PRISIONEIROS POLTICOS PERNAMBUCO RELATRIOS. 2. PESSOAS DESAPARECIDAS PERNAMBUCO RELATRIOS. 3. COMISSO ESTADUAL DA MEMRIA E VERDADE DOM HELDER CMARA PERNAMBUCO RELATRIOS. 4. CRIME POLTICO PERNAMBUCO. 5. PERNAMBUCO POLTICA E GOVERNO. 6. BRA- SIL POLTICA E GOVERNO, 1964-1985. 7. DIREITOS HUMANOS. 8. PESSOAS DESAPARECIDAS PERNAMBUCO BIOGRAFIA. I. Ttulo.

CDU 343.22 CDD 364.131

PeR BPE 17-156

1. Os textos que compem este Relatrio Final Volumes I e II so de responsabilidade dos relatores, sub-relatores e colaboradores, nominados no incio de cada Biograa, Captulo e/ou Relatoria Te-mtica.

2. As fontes das Referncias Documentais e Testemunhais de Investigao, relacionadas no m de cada texto, constam do Banco de Dados da CEMVDHC, podendo ser acessadas atra-vs do site: www.comissaodaverdade.pe.gov.br.

Links de acesso:

Para Biograas:Fontes documentais e testemunhais Mortos e desaparecidos

Nome do biografado.

Para Partidos:Fontes documentais e testemunhais Organizaes polticas

Nome da organizao poltica.

Para Relatorias Temticas ou Captulos:Fontes documentais e testemunhais Relatorias temticas Ttulo da Relatoria temtica ou Captulo.

A Comisso Estadual da Memria e Verdade Dom Helder Cmara dedica este relatrio s vtimas da represso e aos seus familiares e amigos que nunca desistiram de lutar pela histria de seus mortos e por seus entes desaparecidos.

Abdias Bastos Le Abdias Pinheiro da Silva Abelardo Andrade Caminha Barros Abelardo Germano da Hora Abissair Vilanova Rego Adalberto Xavier de Paula Ademrio Renaux Leite Aderico Alves de Vasconcelos Airton Corra de Arajo Airton de Albuquerque Queiroz Alanir Cardoso Albano Ferreira da Cruz Albrgio Jos Maria Farias Alberto Vincius Melo do Nascimento Aldrovandi Torreo Marques Alonso Verissimo da Silva Aloysio Gonalves da Costa Aluisio de Oliveira Lins Aluizio Valrio da Silva Amaro Bezerra da Silva Amaro Domingos de Souza Amaro Flix Pereira Amaro Fernandes da Silva Amaro Ferreira Costa Amaro Luiz de Carvalho Amaro Rodrigues Costa Amauri Cavalcanti Caminha Amauri Lins de Melo Ana Maria Santos Rolemberg Crtes Ana Rita de Castro Almeida Ananias Florncio de Lima Barros Anatlia Melo Alves Anderson Lopes Arajo Andreia Serra Azul da Fonseca Anibal de Oliveira Valena Anbal Soares Barbosa Antonio Alves Dias Antnio Avertano Barreto da Rocha Antonio Batista da Silva Antonio Claudino da Silva Filho Antonio Batista de Oliveira Antonio Esperidio Neto Antonio Fernandes Antonio Ferreira da Costa Neto Antonio Ferreira de Lima Antonio Geraldo de Souza Leo Antonio Gomes Soares Antonio Guedes de Queiroz Antonio Henrique Pereira da Silva Neto Antonio Jos dos Santos Antonio Leite Falco Ardigam de Almeida Ferreira Arlindo Felipe da Silva Arnaldo Gomes da Cunha Aroldo Andrade de Morais Arsnio Martins Gomes Athos de Vasconcelos Costa Augusto Acio Mendes Duarte Aurea Santos da Silva Aybire Ferreira de S Artur Geraldo Bonm de Paula Bartolomeu Mendes Cunha Beatriz da Silva Fonseca Belmiro do Nascimento Ferreira Bianor da Silva Teodsio Cndido Pinto de Melo Carlos Alberto Soares Carlos Alexandre Lapa de Aguiar Carlos Elisio de Faria Neves Carlos Fernando da Silva Carlcio de Souza Castanha Junior Carmlio Ferreira de Andrade Carmem de Castro Chaves Carmem Zeferino da Silva Clia Maria Leite Costa Celso Rodrigues da Silva Ccero Gomes da Silva Ccero Jos de Souza Ciro Monteiro Cavalcanti Cludio Limeira da Costa Cladio Roberto Marques Gurgel Cleto da Costa Campelo Neto Cleusa Maria Paim Aguiar Clvis Assuno de Melo Custdio Feitoza Amorim Daniel Lima Santiago Darcy Leite de Oliveira David Capistrano da Costa Filho Dlio Mendes da Fonseca e Silva Filho Delzuite da Costa Silva Denis Jatob Agra Denisson Luiz Cerqueira Meneses Deolindo Mello de Moura Dinaldo Almeida Coutinho Djalma Dutra de Barros Djalma Machado Mota Dulce Chaves Pandol Edgar Jos de Barros Edil da Silva Alves Edilson Freire Maciel Edilson Romariz Machado Edinaldo Miranda de Oliveira Edival Freitas da Silva Edival Nunes da Silva Caj Edmilson Freire Maciel Edmilson Vitorino de Lima Edna Santos Barros Edson de Souza Carvalho Miranda Edson Ezequiel de Souza Edson Pereira da Silva Eduardo Maia Freese de Carvalho Eduardo Martins de Lima Eduardo Menezes

Vtimas de atos de graves violaes de direitos humanos, reconhecidas e indenizadas pelo governo Estado de Pernambuco

Borges Edvaldo Marques de Souza Edvaldo Ratis Elenaldo Celso Teixeira Elias da Costa Lima Elias Ferreira da Silva Elias Ramos Rodrigues Eliphas Levi Elzir Amorim de Morais Emilton Reginaldo T. Cavalcanti Enildo Galvo Carneiro Enoch Mendes Saraiva Erico Dorneles Eridan Moreira Magalhes Erival Mendes Vieira Ernesto Paulino da Costa Euclides de Barros Xavier Evaldo Lopes Gonalves da Silva Ezequias Bezerra da Rocha Fabiano Adalberto de Almeida Leite Ftima Elizabeth Ferreira da Fonseca Fausto de Lima Nogueira Fernanda Gomes de Matos Fernando Augusto Mendona Filho Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira Fernando Barbosa da Silva Fernando Juarez Ramos Fernando Loureiro Marinho Fernando Soares da Silva Flvio Gomes Barbosa Florentino Alcntara de Morais Francisco Clvis Marques do Vale Francisco de Assis Barreto da Rocha Filho Francisco de Assis Claudino Francisco Fernandes Maia Francisco Honorato da Costa Francisco Julio Arruda de Paula Francisco Machado Mota Francisco Pascoal de Oliveira Francisco Peixoto de Carvalho Francisco Pereira da Silva Francisco Sobreira de Moura Neto Francisco Soriano de Souza Nunes Francsico das Chagas Dias Monteiro Frederick Birten Morris Gabriel Barbosa Farias de Paula Gabriel Veloso de Melo Genivalda Melo da Silva Geraldina de Lima Santos Geraldo Cassimiro de Lima Albuquerque Geraldo Magela do Nascimento Geraldo Pereira de Oliveira Gilvan Cavalcanti de Melo Gilvan Pio Hamzi Giovani Baroni Givaldo Gualberto da Silva Glauco Almeida Gonalves Graziela de Moura Cavalcanti de Melo Gregrio Loureno Bezerra Grivaldo Tenrio Guilherbaldo Marques Macieira Guilhermina Bezerra da Rocha Haroldo Ccero de Morais Helena Luis Pessoa Helena Mota Quintela Helena Serra Azul Monteiro Henri Albert Cossart Henrique Roberto Ramires Pinheiro da Silva Herclio Srgio de Melo Hrcules Sidnei Pires Liberal Hiran Fernandes de Menezes Lima Hugo Cortez Crocia Barros Iber Baptista da Costa Incio Jos dos Santos Iracema Serra Azul da Fonseca Isanusis de Castro Cardoso Israel Travassos de Arruda Ivaldevan de Arajo Calheiros Ivan Rocha Aguiar Ivanildo Sampaio Xavier Ivo Carneiro Valena Jair Borin Jarbas Pereira Marques Joacir da Silva Castro Joo Alfredo dos Anjos Joo Alves Farias Joo Alves Gondim Neto Joo Amaro da Silva Joo Barbosa de Vasconcelos Joo Batista dos Santos Joo Bosco Leite Falco Joo Bosco Rolemberg Cortes Joo de Lima Neto Joo Francisco da Silva Joo Francisco de Carvalho Joo Guerreiro de Oliveira Joo Roberto Costa do Nascimento Joo Virgnio da Silva Joo Zeferino da Silva Joaquim Andrade Pinheiro Joaquim Camilo de Santana Jonas Celso Maia de Brito Jonas Jos de Albuquerque Barros Jorge Alves da Silva Jos Adeildo Ramos Jos Almino de Alencar Arraes Jos lvaro Lima Filho Jos Amaro Correia Jos Amaro da Silva Jos Anacleto de Lira Jos Arnaldo Amaral Jos Calistrato Cardoso Filho Jos Cardoso da Silva Jos

Vtimas de atos de graves violaes de direitos humanos, reconhecidas e indenizadas pelo governo Estado de Pernambuco

Carlos de Abreu Prata Jos Carlos Moreira de Melo Jos Costa Neves Jos de Brito Galvo Jos de Oliveira Torres Jos Elidio do Nascimento Jos Emilson Ribeiro da Silva Jos Ernane de Souza Varejo Jos Fernandes Santos de Menezes Jos Francisco de Souza Jos Gomes de Lima Jos Guedes de Andrade Jos Hamilton Suarez Claro Jos Henrique de Souza Filho Jos Honrio da Silva Jos Hugo de Morais Vaz Jos Ivanildo Alves Machado Jos Jordo dos Anjos Jos Leite Falco Jos Leite Filho Jos Lins Pereira Jos Lopes de Albuquerque Jos Luciano Correia de Cerqueira Jos Machado Bezerra Jos Manoel da Silva Jos Marcionilo de B. Lins Filho Jos Maria da Silva Jos Maria Wanderley Lins Jos Matias Lopes Jos Maurlio Serapio da Cruz Jos Moreira Lemos Neto Jos Moura e Fontes Jos Napoleo da Silva Jos Nivaldo Barbosa de Souza Jnior Jos Osvaldo Gomes Jos Oto de Oliveira Jos Pedro da Silva Jos Reginaldo Veloso de Arajo Jos Romualdo Filho Jos Sobreira de Frana Jos Tarcizo Moreira Jos Udalrico dos Santos Jos Walter de Oliveira Josefa Lcia de Andrade Jovenildo Pinheiro de Souza Juarez Jos Gomes Juarez Fernando da Silva Rocha Judas Tadeu de Lira Gabriel Jlio Leocadio Tavares das Chagas Jlio Santana Jurandir Bezerra Jurandir Ferreira da Silva Karl Marx de Almeida Gonalves Karl Marx Guimares Coelho Larcio Ferreira de Frana Laurindo Joo da Silva Leci de Moura Maciel Lda Maria de Oliveira Lima Lia Emlia de Moura Lustosa Lenin de Almeida Gonalves Lenira da Silva de Lima Lenira Maria de Carvalho Lenisia Leite Sobeslavsky Lenito Cncio de Frana Leonardo Mrio de Aguiar Barreto Lilia Maria Pinto Gondim Luciano de Almeida Luciano Roberto Rosas de Siqueira Luiz Alves Neto Luiz Antonio da Silva Luiz Carlos de Almeida Gonalves Luiz Ernesto Serra Azul da Fonseca Luiz Francisco de Souza Arajo Luiz Gomes Correia Arruda Luiz Gonzaga Lopes Pessoa Luiz Seram dos Santos Lylia da Silva Guedes Galetti Manoel Albany omaz Manoel Antonio da Silva Manoel da Silva Teodsio Neto Manoel Dias Fonseca Neto Manoel Gonalo Ferreira Manoel Jos Rodrigues Manoel Vicente da Silva Manuel Messias da Silva Manuel Tertuliano Arruda de Paula Marcello Nogueira da Silva Marcelo Cordeiro Marcelo Mrio Melo Marcelo Srgio Martins Mesel Margarida Serpa Cossart Maria Adozinda Monteiro da Costa Maria Alaceia Morais e Silva Maria Aparecida dos Santos Maria Augusta de Oliveira Maria Betnia Correia Lira Maria Celeste Vidal Bastos Maria Cristina de Castro Maria da Conceio Correia Lira Maria de Lourdes da Silva Maria do Carmo Agra Cardoso de Azevedo Maria do Carmo Silva Maria do Carmo omaz Maria do Socorro Magalhes Maria Inalda da Silva omaz Maria Ins Moreira de Melo Maria Jos Carvalho de Paula Maria Lenita Agra Cardoso Maria Luzinete de Lima Maria Quintela de Almeida Maria Salete Damasceno Weyne Maria Tereza Lemos Vilaa Maria Yvone Loureiro Ribeiro Mario Miranda de Albuquerque

Vtimas de atos de graves violaes de direitos humanos, reconhecidas e indenizadas pelo governo Estado de Pernambuco

Marise Borm Pimenta Homan Martinho Leal Campos Maurcio Ansio de Arajo Maurcio de Figueiredo Formiga Melnia de Almeida Arajo Mrcia de Albuquerque Ferreira Mery Medeiro da Silva Milton Coelho da Graa Milton Emilio dos Santos Moacyr Corts Mozart de Almeida Arajo Mucio Souto Maior Pessoa Nadja Miranda Albuquerque Nade Regueira Teodsio Nancy Mangabeira Unger Natanael de Souza Lima Newton Vieira de Vasconcelos Nilson Lustosa e Silva Nilton Alves da Silva Norton de Moraes Sarnento Filho Odijas Carvalho de Souza Odon Porto de Almeida Oscar Bandeira Coutinho Neto Oscar de Santos Sena Oswaldo Cabral de Lira Otvio Amncio de Lima Otvio Jos do Nascimento Ozana Carlos de Santana Paulo Alberto Almeida Lira Paulo Barros dos Santos Paulo Bezerra Jnior Paulo Fenelon de Barros Paulo Fernando Magalhes dos Santos Paulo Gomes da Silva Paulo Guilherme Moreira de Melo Paulo Marcos de Barros e Souza Paulo Pontes da Silva Paulo Roberto Barbosa Bruscky Paulo Roberto P. Guimares Paulo Rodrigues do Nascimento Paulo Santos Carneiro Pedro Antnio do Nascimento Pedro Bezerra da Silva Pedro Coutinho de Almeida Pedro Jos da Silva Pedro Makovski Clemachuk Perly Cipriano Pery adeu Oliveira Falcon Potiguara Gomes da Silva Raimundo Alves Quintal Raimundo Correia de Oliveira Raimundo Oswald Cavalcante Barroso Ramires Maranho do Vale Reginaldo Gonalves de Lima Reinaldo Travassos de Arruda Renato Gomes da Silva Rholine Sonde Cavalcante Silva Ricardo Zarattini Filho Rildo Jos Mendes de Freitas Rinaldo Ruy de Carvalho Lima Rivadvia Braz de Oliveira Romero dos Santos e Silva Romildo Maranho do Vale Rmulo Raimundo Maranho do Vale Ronaldo Marques Guimares Roque Santos de Carvalho Rosa Maria Barros dos Santos Rosalvo Marinho de Melo Rubens Manoel de Lemos Rchbert Lins Ferraz Rui Frazo Soares Samuel Firmino de Oliveira Sandino de Albuquerque Ferreira Sandoval da Silva Ferreira Sebastio Chagas da Silva Sebastio Cirilo Arruda de Paula Sebastio Gomes Coutinho Sedofas Ferreira de Albuquerque Selma Bandeira Mendes Srgio Murilo Santa Cruz Silva Severino Correia de Lima Severino de Souza Ferraz Severino Gomes da Silva Severino Quirino de Miranda Silvia Lcia Viana Montarroyos Simo Vicente do Nascimento Scrates da Silva Acioli Solange Almeida de Souza Soledad Barrett Viedma Solon Pereira de Arajo Snia Maria de Arruda Beltro Snia Montenegro Tarzan de Castro Tereza Cristina Albuquerque Tibiria de Melo e Silva Ubiraci Silva Barbosa Ulrich Homan Valdir de Arajo Dantas Valdir Peixoto Ferreira Valmir Costa Vanildo Barbosa da Silva Vnya Medeiros Macias Vera Lucia Stringuini Vera Regina Paula Baroni Vicente Pompeu da Silva Walter da Rocha Arajo Water Colao Rodrigues Wilson Alves de Oliveira Wilson Carvalho da Silva Yara Cecy Falcon Lins

Vtimas de atos de graves violaes de direitos humanos, reconhecidas e indenizadas pelo governo Estado de Pernambuco

Homenagem da Comisso Estadual da Memria e Verdade Dom Helder Cmara

aos familiares dos mortos e desaparecidos, ex-presos e perseguidos polticos e a todas as

pessoas que sofreram violaes de direitos humanos praticadas por agentes pblicos.

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Criada pela Lei Estadual n 14.688 de 1 de junho de 2012 e com prazo para concluso do seu trabalho prorrogado pela Lei n 15.813 de 25 de maio de 2016, a Comisso Estadual da Memria e Verdade Dom Helder Cmara, enfrentou todas as di-culdades decorrentes do transcurso de de-zenas de anos entre os fatos investigados e o incio de suas atividades. Situao agravada, sobretudo, pelas circunstncias especiais em que a transio da ditadura para a de-mocracia ocorreu no Brasil, no largo pero-do em que os principais agentes da repres-so, usando a estrutura do Estado, atuaram livremente para destruir provas, ocultar a verdade, alterar cenrios e tentar encobrir suas responsabilidades.

Tendo conseguido, no obstante, eluci-dar casos emblemticos como o sequestro e assassinato do Pe. Antnio Henrique Pe-reira da Silva Neto, coordenador da Pastoral da Juventude da Arquidiocese de Olinda e Recife e boa parte das graves violaes de direitos humanos ocorridas em Pernambu-co ou envolvendo pernambucanos fora do Estado, a CEMVDHC registra o seu reco-nhecimento ao apoio recebido do Governo

do Estado e da Prefeitura do Recife: contri-buio especial de organizaes e familiares de mortos e desaparecidos, s autoridades civis e militares federais, estaduais e muni-cipais; Comisso Nacional da Verdade; s comisses estaduais, municipais e setoriais da verdade; aos arquivos pblicos e parti-culares; aos comits populares da memria, verdade e justia; aos sindicatos e entidades de direitos humanos; s igrejas, universida-des e imprensa.

A CEMVDHC agradece a todos que co-laboraram para o xito da investigao, em especial a todos os depoentes que espon-taneamente prestaram esclarecimentos em sesses pblicas ou reservadas. Consciente da importncia do acervo documental e de multimdia a ser encaminhado ao Memo-rial da Democracia, quando de sua criao, ao Arquivo Pblico do Estado de Pernam-buco e ao Arquivo Nacional, a CEMVDHC reitera a esperana de que os trabalhos desta e das demais Comisses da Verdade possam contribuir para que as graves violaes de Direitos Humanos ocorridas durante a di-tadura civil-militar nunca mais voltem a se repetir.

AGRADECIMENTOS

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Comisses

Comisso da Memria e Verdade do Estado de Minas Gerais; Comisso da Memria e Verdade dos Correios Mrcia Albuquerque Ferreira; Comisso da Verdade do Par; Comisso da Verdade do Rio de Janeiro; Comisso Estadual da Verdade de Ala-goas; Comisso Estadual da Verdade e da Memria do Estado da Paraba; ComissoEstadual daVerda-dePaulo Stuart Wright de Santa Catarina; Comisso Nacional da Verdade; Comisso Nacional de Anis-tia; Comisso Rubens Paiva (So Paulo)

rgos e Entidades Pblicas e Privadas

Arquivo Nacional de Braslia, Arquivo Pblico do Rio Grande do Sul, Arquivo Pblico Estadual do Rio de Janeiro, Arquivo Pblico Estadual Jordo Emerenciano, Associao Docente da Universidade Federal de Pernambuco, Banco Central, Central Sin-dical, Central nica dos Trabalhadores, Comisso de Anistia do Ministrio da Justia, Comit Carlos de R, da Verdade e da Justia, Comit Estadual da Memria, Verdade e Justia de Pernambuco, Com-panhia Editora de Pernambuco, Congresso Nacio-nal, Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil, Em-baixada dos Estados Unidos da Amrica, Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, Faculdade Maurcio de Nassau, Fundao do Patri-mnio Histrico e Artstico de Pernambuco, Fun-dao Joaquim Nabuco, Instituto de Criminalstica do Estado de Pernambuco, Ministrio das Relaes Exteriores, Ministrio Pblico Federal e Estadual, Ordem dos Advogados do Brasil OAB/PB e OAB/PE, Poder Judicirio do Estado de Pernambuco, Prefeitura da Cidade do Recife, Projeto Marcas da Memria, Secretaria de Planejamento Oramento e Gesto, Secretaria Executiva de Justia e Direitos Humanos, Sindicato dos Bancrios de Pernambuco, Sindicato dos Servidores Pblicos de Pernambuco, Superior Tribunal Federal, Superior Tribunal Mili-tar, Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, Universidade Catlica de Pernambuco, Universida-de Federal de Pernambuco, Universidade Federal Rural de Pernambuco

Ao Conselho Cientfico e Editorial dos Cadernos da Memria e Verdade

Aida Maria Monteiro Silva, Antonio Torres Montenegro, Christine Paulette Yves Runo Dabat, Suzana Cavani Rosas, Tnia Bacelar de Arajo - da Universidade Federal de Pernambuco; Giuseppe Tosi, Maria de Nazar Tavares Zenaide - da Univer-sidade Federal da Paraba; Paulo Abro Pires Junior da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Gran-de do Sul; Luiz Carlos Luz Marques da Univer-sidade Catlica de Pernambuco; Marclia Gama da Silva da Universidade Federal Rural de Pernam-buco; Leda Alves da Secretaria de Cultura do Re-cife; Rita de Cssia Barbosa de Arajo - da Funda-o Joaquim Nabuco.

Ao Ncleo Pericial do Instituto de Criminalstica

Carlos Andr de Albuquerque Alvim; Elbson Cavalcanti de Amorim; Joo Csar Ferreira; Jos Zito Pimentel.

Agncia Estadual de Tecnologia da Informao (Gerncia de Arquitetura de Sistemas)

Eduardo Calado Ferreira Pinheiro; Carolina Lima Gomes de Melo; Celso Luiz Agra de Sa Filho; Vanessa Freitas Cndido; Alberto Luis Viegas.

SIGLAS

ACO: Ao Catlica OperriaADPF: Arguio de Descumprimento de Preceito Fundamental Adufepe: Associao dos Docentes da Universidade Federal de Pernambuco AI: Ato Institucional ALN: Ao Libertadora NacionalAMRE: Arquivo do Ministrio das Relaes Exteriores AP: Ao Popular APAP: Associao Pernambucana de Anistiados PolticosAPEJE: Arquivo Pblico Estadual Jordo Emerenciano APERJ: Arquivo Pblico Estadual do Rio de Janeiro APML: Ao Popular Marxista Leninista Arena: Aliana Renovadora Nacional Bacen: Banco Central BNM: Brasil Nunca MaisCBA: Comit Brasileiro pela Anistia CCC: Comando de Caa aos Comunistas Cecon: Centro de Convenes do Estado de Pernambuco CEFAL: Comisso Episcopal Frana-Amrica LatinaCejil: Centro pela Justia e o Direito Internacional Cema: Comando Estadual da Marinha CEMDP: Comisso Especial de Mortos e Desaparecidos Polticos CEMVDHC: Comisso Estadual da Memria e Verdade Dom Helder Cmara Cendhec: Centro Dom Helder Cmara de Estudos e Ao Social Cenimar Centro de Informaes da MarinhaCepe: Companhia Editora de Pernambuco Cfns: Companhia de Fuzileiros Navais CGE: Controladoria Geral do Estado CGT: Confederao Geral dos Trabalhadores CGTB: Central Geral dos Trabalhadores do Brasil

CIA: Central Inteligence AgencyCIDH: Corte Interamericana de Direitos Humanos CIE: Centro de Informaes do ExrcitoCISA: Centro de Informaes da AeronuticaCJI: Comisso Judiciria de Inqurito CMA: Comando Militar da Amaznia CMVJ: Comit Memria, Verdade e Justia CNA: Comisso Nacional de Anistia CNBB: Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil CNI: Conselho Nacional de Informaes CNV: Comisso Nacional da Verdade CODI: Centro de Operaes de Defesa Interna. Colina: Comando de Libertao Nacional Consintra: Conselho Sindical dos TrabalhadoresCoreg: Coordenao Regional do Arquivo Nacional no Distrito Federal CPC: Centro Popular de CulturaCpdoc: Centro de Pesquisa e Documentao de Histria Contempornea do BrasilCPP: Comando de Polcia Poltica CSB: Central dos Sindicatos Brasileiros CSN: Comando de Segurana Nacional CSP: Central Sindical Popular CTB: Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil CZ: Comit Zonal do campo DCE: Diretrio Central dos Estudantes DFSP: Departamento Federal de Segurana Pblica DOI-CODI: Destacamento de Operaes de Informaes do Centro de Operaes de Defesa Interna DOPS: Departamento Ordem Poltica e Social DOU: Dirio Ocial da Unio DPF: Departamento de Polcia Federal DSI: Diviso de Segurana e Informaes

EDAL: Equipe de Docentes da Amrica Latina EMAer.: Estado Maior da Aeronutica EME: Estado Maior do Exrcito EMFA: Estado Maior das Foras Armadas EMM: Estado Maior da Marinha EMPM: Estado Maior da Polcia Militar ESG: Escola Superior de GuerraFAB: Fora Area Brasileira Fare: Faculdade de Filosoa do Recife FDR: Faculdade de Direito do Recife FEB: Fora Expedicionria Brasileira Fundaj: Fundao Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais GAJOP: Gabinete de Assessoria Jurdica as Organizaes Populares IBAD: Instituto Brasileiro de Ao DemocrticaIC: Instituto de Criminalista IEVE: Instituto de Estudos sobre a Violncia do Estado IML: Instituto Mdico Legal IPES: Instituto de Pesquisa e Estudos SociaisIPM: Inqurito Policiai MilitarIPT: Instituto de Percia Tcnica JEC: Juventude Estudantil Catlica JOC: Juventude Operria Catlica JUC: Juventude Universitria CatlicaMCP: Movimento de Cultura PopularMDB: Movimento Democrtico Brasileiro MEB: Movimento de Educao de BaseMepe: Museu do Estado de PernambucoMFPA: Movimentos Femininos pela Anistia MNR: Movimento Nacionalista RevolucionrioMolipo: Movimento de Libertao Popular MPF: Ministrio Pblico Federal MR-8: Movimento Revolucionrio 8 de OutubroMTR: Movimento Revolucionrio Tiradentes MTNM: Movimento Tortura Nunca Mais NCST: Nova Central Sindical de Trabalhadores OAB: Ordem dos Advogados do Brasil Oban: Operao Bandeirante OLAS: Organizao Latino-Americana de SolidariedadeORM: Organizao Revolucionria Marxista PB: Pedido de Busca PC: Partido Comunista PCB: Partido Comunista Brasileiro PCBR: Partido Comunista Brasileiro Revolucionrio PCdoB: Partido Comunista do Brasil PCR: Partido Comunista Revolucionrio PDC: Partido Democrtico CristoPF: Polcia Federal PL: Partido Libertador PM: Polcia Militar PNI: Plano Nacional de Informaes Polop: Organizao Revolucionria Marxista Poltica

Operria PR: Partido Revolucionrio Fundarpe: Fundao do Patrimnio Histrico e Artstico de Pernambuco PSB: Partido Socialista Brasileiro PSD: Partido Socialista Democrtico PSP: Partido Social Progressista PT: Partido dos Trabalhadores PTB: Partido Trabalhista Brasileiro RM: Regio Militar SAPPP: Sociedade Agrcola e Pecuria dos Plantadores de PernambucoSEDSDH: Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos do Estado de Pernambuco Sejudh: Secretaria Executiva de Justia e Direitos Humanos Seplag: Secretaria de Planejamento e Gesto do Estado de Pernambuco SFICI: Servio Federal de Informaes e ContrainformaoSindsep: Sindicato dos Servidores Pblicos Federais em Pernambuco SNI: Servio Nacional de InformaesSSP: Secretaria de Segurana Pblica STF: Supremo Tribunal Federal STM: Supremo Tribunal MilitarSudene: Superintendncia do Desenvolvimento do Nordeste SUNAB: Superintendncia Nacional do Abastecimento TSE: Tribunal Superior Eleitoral TSM: Tribunal Superior MilitarUBES: Unio Brasileira de Estudantes Secundaristas UDN: Unio Democrtica Nacional UEP: Unio dos Estudantes de Pernambuco UERJ: Universidade do Estado do Rio de Janeiro UFF: Universidade Federal Fluminense UFMG: Universidade Federal de Minas Gerais Ufpe: Universidade Federal de Pernambuco Ufrpe: Universidade Federal Rural de Pernambuco UGT: Unio Geral dos Trabalhadores UNE: Unio Nacional dos Estudantes UNESCO: Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a CulturaUPE: Universidade de Pernambuco URSS: Unio das Repblicas Socialistas SoviticasUSAID: United States Agency for International DevelopmentUSP: Universidade de So Paulo VAR-Palmares: Vanguarda Armada Revolucionria - Palmares VPR: Vanguarda Popular Revolucionria

SUMRIO

APRESENTAO .....................................................................................................................................................21PARTE I - A COMISSO DA MEMRIA E VERDADE DOM HELDER CMARA: CRIAO, ATUAO E ANTECEDENTES..........................................................................................................................23

CAPTULO 1. A CRIAO DA COMISSO ESTADUAL DA MEMRIA E VERDADE DOM HELDER CMARA ...................................................................................................................................................................25

Instalao e organizao da CEMVDHC ..........................................................................................................26Composio da CEMVDHC ...............................................................................................................................27

CAPTULO 2. A ATUAO DA CEMVDHC: HISTRICO ...........................................................................29Planejamento Estratgico ...................................................................................................................................29As subcomisses ..................................................................................................................................................30

Subcomisso de Pesquisa .............................................................................................................................30Subcomisso de Audincias .........................................................................................................................34Assessoria de Comunicao ........................................................................................................................36Subcomisso de Sistematizao da Documentao .................................................................................37

Colaborao entre comisses da verdade .........................................................................................................40Parcerias com rgos e Entidades Pblicas e Privadas ..................................................................................41Eventos com Entidades Parceiras ......................................................................................................................41Visitas aos Locais de Tortura ..............................................................................................................................42Relatrio Administrativo ....................................................................................................................................43

CAPTULO 3. A LUTA PELA MEMRIA E VERDADE EM PERNAMBUCO .............................................45A Luta pela Anistia ..............................................................................................................................................45A CEMVDHC e a Lei de Anistia .......................................................................................................................47Movimentos que antecederam a CEMVDHC .................................................................................................47

CAPTULO 4. METODOLOGIA DO TRABALHO............................................................................................49

PARTE II - MORTOS E DESAPARECIDOS IDENTIFICADOS: A histria de vida e as circunstncias das graves violaes cometidas contra 51 mortos e desaparecidos polticos ...............................................51

INTRODUO .........................................................................................................................................................55CAPTULO 5. PERFIS DE MORTOS E DESAPARECIDOS POLTICOS .....................................................57

1. Antnio Henrique Pereira da Silva Neto ..............................................................................................57Biograas Sistematizadas por Organizaes Polticas ..............................................................................67

Histrico ...............................................................................................................................................................67Partido Comunista Brasileiro (PCB) .............................................................................................................69

Biograas dos militantes do PCB .................................................................................................................752. Ivan Rocha Aguiar ...................................................................................................................................753. Jonas Jos de Albuquerque Barros .........................................................................................................764. Luiz Gonzaga dos Santos ........................................................................................................................785. David Capistrano da Costa ....................................................................................................................816. Joo Massena Melo ..................................................................................................................................947. Hiran de Lima Pereira ......................................................................................................................... 101

Ligas Camponesas .......................................................................................................................................... 115Biograas dos militantes das Ligas Camponesas ..................................................................................... 119 8. Albertino Jos da Silva ........................................................................................................................ 119 9. Jos Inocncio Barreto ......................................................................................................................... 12210. Adauto Freire da Cruz ....................................................................................................................... 131

Comando de Libertao Nacional (COLINA) .......................................................................................... 137

Biograas dos militantes do COLINA ....................................................................................................... 13711. Joo Lucas Alves .................................................................................................................................. 13712. Severino Viana Colou ........................................................................................................................ 144

Ao Libertadora Nacional (ALN) ............................................................................................................... 151Biograas dos militantes da ALN .............................................................................................................. 15313. Antnio Bem Cardoso ........................................................................................................................ 15314. Jos Milton Barbosa ............................................................................................................................ 15515. Joo Mendes Arajo ........................................................................................................................... 15916. Luiz Jos da Cunha ............................................................................................................................. 162

Partido Comunista Brasileiro Revolucionrio (PCBR) .......................................................................... 171Biograas dos militantes do PCBR ......................................................................................................... 17517. Odijas Carvalho de Souza ................................................................................................................. 175PCBR - Episdio 1 - Mortos no Acidente Automobilstico na Curva do Adolfo ..................... 182

18. Lus Alberto Andrade de S E Benevides ................................................................................. 18319. Mriam Lopes Verbena ................................................................................................................ 185

20. Ezequias Bezerra da Rocha ............................................................................................................... 193PCBR - Episdio 2 - Mortos na Chacina de Bento Ribeiro e Graja .............................................199

21. Fernando Augusto Valente da Fonseca..................................................................................... 19922. Jos Bartolomeu Rodrigues de Souza ....................................................................................... 20223. Lourdes Maria Wanderley Pontes ............................................................................................. 204

24. Anatlia de Souza Melo Alves........................................................................................................... 211PCBR - Episdio 3 - O Massacre da Praa Sentinela em Jacarepagu ........................................... 222

25. Almir Custdio de Lima .............................................................................................................. 22326. Ramires Maranho do Valle ....................................................................................................... 22527. Ranusia Alves Rodrigues ............................................................................................................ 228

Vanguarda Armada Revolucionria de Palmares (VAR-Palmares) ...................................................... 245Biograas dos militantes da VAR-Palmares ............................................................................................. 24628. Mariano Joaquim da Silva ................................................................................................................ 24629. Raimundo Gonalves de Figueiredo ................................................................................................ 250

Vanguarda Popular Revolucionria (VPR) ................................................................................................ 257Biograas dos militantes da VPR .............................................................................................................. 26230. Jos Raimundo da Costa .................................................................................................................... 262Mortos no Massacre da Granja So Bento ........................................................................................... 264

31. Eudaldo Gomes da Silva ............................................................................................................. 26532. Evaldo Luiz Ferreira de Souza ................................................................................................... 26733. Jarbas Pereira Marques ............................................................................................................... 26934. Jos Manoel da Silva .................................................................................................................... 27135. Pauline Reichstul .......................................................................................................................... 27336. Soledad Barrett Viedma.............................................................................................................. 275

37. Edgar de Aquino Duarte .................................................................................................................... 302Partido Comunista Revolucionrio (PCR) ................................................................................................ 311

Biograas dos militantes do PCR .............................................................................................................. 31538. Amaro Flix Pereira............................................................................................................................ 31539. Amaro Luiz de Carvalho.................................................................................................................... 31840. Manoel Aleixo da Silva ...................................................................................................................... 32541. Emmanuel Bezerra dos Santos ......................................................................................................... 33342. Manoel Lisboa de Moura ................................................................................................................... 338

Partido Comunista do Brasil (PCdoB) ....................................................................................................... 347Biograas dos militantes do PCdoB .......................................................................................................... 34943. Miguel Pereira dos Santos ................................................................................................................. 34944. Antnio Ferreira Pinto ....................................................................................................................... 35245. Rui Frazo Soares ............................................................................................................................... 355

Ao Popular Marxista-Leninista (APML) ................................................................................................ 361Biograas dos militantes da APML........................................................................................................... 36646. Paulo Stuart Wrihgt ........................................................................................................................... 36647. Umberto Albuquerque Cmara Neto ............................................................................................... 36948. Gildo Macedo Lacerda ....................................................................................................................... 37249. Jos Carlos Novaes da Matta Machado ........................................................................................... 37550. Eduardo Collier Filho ........................................................................................................................ 37851. Fernando Augusto Santa Cruz Oliveira .......................................................................................... 382

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APRESENTAO

Criada por iniciativa do governador Eduardo Campos atravs da Lei n 14.688 de 1 de ju-nho de 2012 e instalada na mesma data, com o seu Regimento Interno aprovado pelo Decreto n 38.386, de 29 de junho de 2012 a Comisso Estadual da Memria e Verdade Dom Helder C-mara teve como nalidade examinar e esclarecer as graves violaes de direitos humanos ocorridas contra qualquer pessoa, no territrio do Estado de Pernambuco, ou contra pernambucanos ainda que fora do Estado, praticadas por agentes pblicos es-taduais durante o perodo xado no art. 8 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias, a m de efetivar o direito memria e verdade hist-rica e promover a consolidao do Estado Demo-crtico de Direito. Prorrogada a sua durao pela lei n 15.813 de 25 de maio de 2016, que modicou a redao do artigo 9 da lei de criao da CEMV-DHC, estabelecendo como prazo de concluso dos trabalhos 31 de dezembro de 2016.

A Comisso contou com o apoio de um gru-po de nove assessores providos pelo Governo de Pernambuco, colaboradores voluntrios e o auxlio dos rgos pblicos e entidades privadas mencio-nadas neste Relatrio, pesquisou a documentao alusiva existente, inclusive fora do Estado, tomou centenas de depoimentos, realizou dezenas de audincias, promoveu percias tcnicas, ajuizou aes para reticaes de registros civis de bitos e cumpriu todas as providncias ao seu alcance para esclarecer os fatos e as circunstncias em que ocorreram as graves violaes de direitos humanos identicados a partir de sua instalao.

O princpio que norteou a construo deste Re-latrio foi a defesa dos direitos humanos, vilipen-

diados, no apenas durante a ditadura civil-militar, que se iniciou em 1964, mas tambm antes e depois dela. Planejado em dois volumes, ele foi concebido para ser um estmulo na construo de iniciativas que fortaleam a democracia.

O Primeiro Volume Parte I - captulos de 1 a 4 contm textos informativos sobre como foi plane-jado o trabalho da CEMVDHC, desde sua criao, organizao, planejamento estratgico e metodo-logia; subscrito coletivamente pelos comissiona-dos e assessores. Na Parte II captulo 5 - Mortos e Desaparecidos Identicados a Comisso empe-nhou-se em investigaes criteriosas, que permiti-ram trazer ao conhecimento pblico a histria de vida e as circunstncias das graves violaes come-tidas contra 51 mortos e desaparecidos polticos. Esses indivduos tiveram suas identidades polticas respeitadas: as suas aes na resistncia ditadura e na luta pela construo da democracia, articula-das com seus respectivos partidos, foram devida-mente narradas pelos relatores com a colaborao dos sub-relatores.

O Segundo Volume - Parte III - trata das di-culdades da construo da democracia no Brasil e da repercusso desses fatos em Pernambuco; da in-terveno do capital externo nas eleies de 1962, criando obstculos eleio de lderes comprome-tidos com a sociedade brasileira. Dois captulos, 6 e 7, anunciam a marcha do golpe militar e os cap-tulos 8 e 9, a sua concretude: o desmonte da inter-veno planejada e a represso em Pernambuco.

Na Parte IV, captulos de 10 a 15, o Relatrio expe as graves violaes aos direitos humanos em Pernambuco, desde os poderes executivo, le-gislativo e judicirio, at os movimentos sociais no

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campo, na cidade, nos meios de comunicao, nos meios religiosos e nos meios educacionais e cultu-rais. As narrativas dos fatos abstiveram-se de an-lises por parte dos relatores, procurando oferecer ao leitor o resultado de pesquisas documentais e testemunhais, que comprovam as graves violaes aos direitos humanos praticadas no Estado de Per-nambuco. Textos, assim, embora integrando obra coletiva, so de responsabilidade individual dos comissionados e colaboradores identicados em cada captulo.

Por m, este documento, que tem a expectativa de ser uma referncia sobre os direitos humanos,

aponta na Parte V a responsabilizao por estes atos criminosos e indica suas concluses e reco-mendaes.

E, se verdade que nos estgios nais do totalita-rismo, surge um mal absoluto (absoluto, porque j no pode ser atribudo a motivos humanamen-te compreensveis), tambm verdade que, sem ele, poderamos nunca ter conhecido a natureza realmente radical do Mal. (Hannah Arendt)

Recife, 31 de dezembro de 2016. A COMISSO

Inspira a Comisso o inesquecvel dom Helder Cmara. Por toda sua vida, o Arcebispo de

Olinda e Recife buscou a verdade. A teologia, calcada nos fundamentos da f, mas tambm

a verdade da vida dos homens, na lida pela sobrevivncia e pelo desejo de justia social.

Tentaram calar dom Helder, perseguiram e assassinaram os que lhe eram prximos como

o saudoso padre Henrique. Mas no vergou a verdade que brotava das palavras daquele gigante mido. Ele permanece e agora, mais

uma vez, nos serve de farol e de norte.

(Palavras do governador Eduardo Henrique Accioly Campos em seu pronunciamento durante a instalao da CEMVDHC, em 1 de junho de 2012)

PARTE I

A COMISSO DA MEMRIA E VERDADE DOM HELDER CMARA: CRIAO,

ATUAO E ANTECEDENTES

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CAPTULO 1. A CRIAO DA COMISSO ESTADUAL DA MEMRIA E VERDADE DOM HELDER CMARA

A Comisso Estadual da Memria e Verdade Dom Helder Cmara foi criada pela Lei n 14.688, de 1 de junho de 2012, com a na-lidade de examinar e esclarecer as graves violaes de direitos humanos ocorridas contra qualquer pessoa, no territrio do estado de Pernambuco ou contra pernambucanos ainda que fora do estado, praticadas por agentes pblicos estaduais, durante o perodo xado no art. 8 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias, de 18 de setembro de 1946 a 5 de outubro de 1988, a m de efetivar o direito memria e verdade histrica e promover a consolidao do Estado Democrtico de Direito.

Entre as dcadas de 1980 e 1990, o mundo as-sistiu sob o signo do m da Guerra Fria ao des-moronar de regimes ditatoriais, autoritarismos e despotismos de matizes ideolgicos diversos, mui-tos deles de dcadas e entre os quais alguns haviam sido considerados praticamente indestrutveis ou impermeveis a mudanas. As suas inmeras vti-mas os que foram mortos, os que tiveram seus direitos elementares violados ou as suas dignida-des conspurcadas pereceram ou padeceram na maioria dos casos praticamente no anonimato, para alm do grupo de seus familiares e prximos. Em muitas situaes ainda se desconhece a exten-so das atrocidades cometidas por esses regimes, seus mecanismos de controle, represso e, at mes-

mo, em certos exemplos mais extremos, os motivos que impulsionaram tal furor destrutivo.

Os anos setenta do sculo passado foram o pe-rodo de apogeu das ditaduras militares no Cone Sul da Amrica Latina. No exerccio do poder, es-ses governos eliminaram sicamente seus reais ou supostos adversrios, neutralizaram a chamada classe poltica, impuseram severas restries s or-ganizaes sindicais e s associaes da sociedade civil e organizaram um regime de silncio em tor-no das vozes e dos protestos que os incomodavam.

Muitos desses procedimentos se revelaram des-de a instalao dos novos governantes. No Brasil, como assinala o relatrio da Comisso Nacional da Verdade, o prembulo do Ato Institucional n 1, de 9 de abril de 1964, j expunha o escopo de poder reivindicado pelo regime que formalmente ali se instaurara1. Intitulando-se movimento re-volucionrio, o golpe militar introduzia por inter-mdio daquela medida mudana radical na base da organizao poltica do pas, em verdadeiro ato de fundao no qual atribua a si prprio, poderes constitucionais absolutos:

A revoluo vitoriosa se investe no exerccio do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleio popular ou pela revoluo. Esta a forma mais expressiva e mais radical do Po-

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der Constituinte. Assim, a revoluo vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma. Ela destitui o governo anterior e tem a capacidade de constituir o novo governo. Nela se contm a fora normativa, inerente ao Po-der Constituinte. Ela edita normas jurdicas sem que nisto seja limitada pela normativida-de anterior sua vitria2.

Em Pernambuco, em 1 de abril de 1964, ao mesmo tempo em que se depunha o governador eleito Miguel Arraes, dois jovens estudantes, Jo-nas Jos de Albuquerque Barros e Ivan de Rocha Aguiar eram assassinados durante manifestao popular de protesto pelas foras do exrcito. Dias depois, o lder comunista Gregrio Bezerra foi exi-bido pelas ruas da cidade, sem camisa e com uma corda no pescoo preso por alguns soldados sob o comando do coronel do Exrcito Darcy Ursmar Villocq Vianna. Logo surgiriam notcias conr-madas mais tarde de que se torturava em alguns quartis com a participao de ociais das Foras Armadas. Durante todo esse tempo, perseguiam-se, prendiam-se aqueles identicados como sus-peitos ao novo regime; e, sobretudo, vigorava a mais dura represso sobre os sindicatos rurais na zona da mata, que tiveram as suas modestas sedes destrudas e muitos de seus dirigentes e militantes presos, espancados ou mesmo assassinados, por vezes com a cumplicidade de proprietrios de terra e seus algozes.

No Brasil, como em outros pases vtimas de golpes de Estado e de ditaduras, cabe um lugar de destaque s famlias das vtimas de violaes dos direitos humanos que vieram a se tornar os por-ta-vozes pioneiros e, ao longo do tempo, os mais consistentes na denncia das aes praticadas por rgos de represso do Estado. Esses apelos priva-dos, por longos perodos quase solitrios, foram se unindo durante todo o regime militar, tomando forma associativa e progressivamente sendo aco-lhidos por personalidades e instituies que viriam a lhes emprestar ressonncia pblica e formas de ao mais ecazes.

Ressalte-se aqui a importncia dos religiosos e das igrejas. Essas ltimas vieram muitas vezes a se constituir em espao de abrigo para as vtimas e seus familiares, assim como um lugar de resis-tncia ao arbtrio. Nessa misso, em Pernambuco, durante todo o perodo ditatorial avulta a gura e o exemplo de D. Helder Cmara, cujo nome esta Comisso incorporou a sua prpria denominao como uma homenagem.

O restabelecimento da normalidade democr-tica no pas que veio de par com a democratiza-o de vrios pases latino-americanos e em outras partes do mundo imprimiu vigor aos reclamos de justia: de que se investigassem os crimes cometi-dos contra os direitos humanos, que fosse procla-mada a verdade dos fatos, concedendo-se ao mes-

mo tempo o direito de reparao s vtimas diretas das violncias ou aos seus prximos.

Neste sentido, nos ltimos trinta anos, a co-munidade internacional vem desenvolvendo um paradigma denominado justia de transio que consiste no conjunto de medidas e instrumentos de investigao na busca da verdade, na identica-o de responsabilidades criminosas, nas aes de reparaes s vtimas e na elaborao de reformas institucionais, em resposta ao legado de violncia em massa do passado recente, quando uma parte da humanidade vivia sob o regime do arbtrio e da represso sem controle.

As Comisses da Verdade constituem um dos principais instrumentos que integram a justia de transio. Foram criadas com o objetivo de analisar as violaes aos direitos humanos contra pessoas ou grupos de uma determinada nao e recomen-dar polticas pblicas onde esses mesmos direitos e garantias individuais e coletivas sejam assegurados dentro de um Estado Democrtico de Direito con-solidado.

Em 2011, instituiu-se no Brasil a Comisso Nacional da Verdade (CNV), atravs de Lei n 12.528/2011. Ela foi seguida pela criao de diver-sas comisses da memria e verdade pelo pas, a exemplo da Comisso Estadual da Memria e Ver-dade Dom Helder Cmara (CEMVDHC), primei-ra comisso estadual, instituda pela Lei Estadual n 14.688, de 1 de junho de 2012.

INSTALAO E ORGANIZAO DA CEMVDHC

Em 1 de junho de 2012, nos jardins do Palcio do Campo das Princesas, sede do governo do estado de Pernambuco, procedeu-se solenidade de ins-talao da CEMVDHC. A cerimnia foi presidida pelo ento governador Eduardo Henrique Accioly Campos.

Fizeram uso da palavra: o governador Eduar-do Campos; a deputada federal Luiza Erundina, representando a Comisso Parlamentar Memria, Verdade e Justia da Cmara dos Deputados; a me do desaparecido poltico Fernando Augusto Santa Cruz Oliveira, Elzita Santa Cruz, representando os familiares dos presos e torturados polticos; o ad-vogado Jos Paulo Cavalcanti Filho, representando a Comisso Nacional da Verdade; o advogado Fer-nando de Vasconcellos Coelho, coordenador-geral da CEMVDHC.

Em cumprimento ao disposto no art. 12, da Lei n 14.699, de 1 de junho de 2012, ato contnuo sua instalao, a CEMVDHC elaborou o seu Regimento Interno, publicado no Decreto n 38.386, de 19 de ju-nho de 2013. Entre outras questes, o Regimento In-terno dispe sobre a competncia da Comisso para a consecuo de suas nalidades, as atribuies do seu coordenador-geral e do secretrio-geral e a periodici-dade das reunies ordinrias e extraordinrias.

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Na perspectiva de organizar os trabalhos e de-nir a sua metodologia, em junho de 2012, em sesso ordinria, os membros da Comisso apro-varam, por unanimidade, a criao de trs subco-misses com os seguintes objetivos: A subcomisso de sistematizao da documen-

tao constituda por historiadores, especialistas em arquivstica. Ela foi responsvel no s pela organizao, indexao, classicao e guarda dos documentos, em diferentes suportes, pro-duzidos durante todo o processo de trabalho da CEMVDHC, mas tambm pela composio de um Banco de Dados.

A subcomisso de pesquisa, constituda de his-toriadores, socilogos e outros prossionais de reas ans. Teve a responsabilidade de identicar e delimitar a matria a ser pesquisada, buscando nas fontes primrias e secundrias informaes esclarecedoras e relevantes sobre os aconteci-mentos estudados. So exemplos de fontes pri-mrias: depoimentos, processos judiciais, corres-pondncias de sujeitos histricos, documentos produzidos por partidos polticos, por rgos repressores, por instituies religiosas, legislati-vas. Constituem exemplos de fontes secundrias: material produzido pela imprensa, livros, teses, dissertaes, monograas, fotograas e outros. Ambas as fontes tm a mesma importncia pro-batria desde que analisadas luz da crtica in-terna e externa, ou seja, depois de constatada a sua autenticidade e avaliados a sua acuidade e valor.

A subcomisso de audincias pblicas, formada com o desiderato de organizar as audincias p-blicas da Comisso, identicando local adequa-do para sua realizao, divulgando e convidan-do entidades representativas da sociedade civil e de defesa de direitos humanos, viabilizando o deslocamento e a estadia dos depoentes com do-miclio fora da Regio Metropolitana do Recife e do estado de Pernambuco. Em trabalho conjunto com esta subcomisso, o colegiado da CEMV-DHC examinou caso a caso quem devia e podia ser ouvido em cada processo.

Em seguida, a Comisso elaborou e aprovou o Provimento n 01, de 17 de julho de 2012, o qual disciplinou os procedimentos a serem adotados nos depoimentos realizados por vtimas, familiares ou testemunhas de violncia, sob as funes da re-ferida Lei n 14.688, obedecendo aos preceitos do Regimento Interno, do Protocolo de Istambul 3 e do Cdigo de Processo Penal.

A estrutura de pessoal da Comisso foi estabe-lecida nos art. 2 e 8 da Lei n 14.688. Ela integra-da por 9 (nove) membros, sendo 2/3 (dois teros) da sociedade civil, designados por ato do gover-nador do Estado. Foram reconduzidos uma nica vez, por igual perodo, at o trmino dos trabalhos da Comisso. Foram ainda criados, no Quadro de Cargos Comissionados e Funes Graticadas do

Poder Executivo, os cargos, em comisso, no total de 9 (nove), todos alocados na Secretaria da Casa Civil. Como critrio para as contrataes dos car-gos em comisso, em sesso ordinria realizada em 28 de junho de 2012, pelos valores republicanos da iseno e busca honesta da verdade, cou decidido que nenhum de seus integrantes poderia ter qual-quer grau de parentesco com os desaparecidos ou mortos polticos, cujos casos seriam objeto de in-vestigao e estudo pela CEMVDHC.

Os dispositivos legais citados constituram os objetivos e os fundamentos da Comisso, a qual teve como propsito: (I) esclarecer os fatos e as circunstncias dos casos de graves violaes de direitos humanos vericados no perodo de sua competncia legal; (II) promover o esclarecimen-to circunstanciado dos casos de torturas, mortes, estupros, sequestros, desaparecimento forado, ocultao de cadveres e sua autoria, ocorridos no territrio do estado de Pernambuco, ou contra per-nambucanos, ainda que ocorridos fora do estado; (III) identicar e tornar pblicos as estrutura, os locais, as instituies e as circunstncias relacio-nadas prtica de violaes de direitos humanos, suas eventuais ramicaes nos diversos aparelhos estatais e na sociedade; (IV) recomendar a adoo de medidas e polticas pblicas visando prevenir violao de direitos humanos; (V) encaminhar aos rgos pblicos competentes toda e qualquer in-formao obtida que possa auxiliar na localizao e identicao de corpos e restos mortais de de-saparecidos polticos; (VI) promover a reconstru-o da histria dos casos de violaes de direitos humanos, tendo como fundamento os informes obtidos; (VII) e recomendar a adoo de polticas pblicas que assegurem a efetivao do direito memria e verdade histrica.

COMPOSIO DA CEMVDHC

Originalmente, a CEMVDHC foi composta pelos advogados Fernando de Vasconcellos Coe-lho (coordenador-geral), Henrique Neves Maria-no (secretrio-geral), Humberto Cabral Vieira de Melo, Gilberto Marques de Melo Lima, Roberto Franca Filho e Pedro Eurico de Barros e Silva, e pe-los professores Manoel Severino Moraes de Almei-da, Nadja Maria Miranda Brayner e Maria do So-corro Ferraz Barbosa. Em 28 de dezembro de 2012 foi nomeado pelo governador do estado para com-por o colegiado, o advogado Jos ureo Rodrigues Bradley, em substituio a Pedro Eurico de Barros e Silva que foi empossado como secretrio estadual da Criana e da Juventude. O mesmo ocorreu com Roberto Franca Filho, que foi nomeado para a Pre-sidncia da FUNASE, sendo substitudo pela asses-sora, professora Vera Lcia Costa Acioli, atravs do Ato n 3881, de 5 de novembro de 2016.

A CEMVDHC passou a dispor, desde agosto de 2012, de um grupo de nove assessores em cargos

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de comisso, lotados na Secretaria da Casa Civil 4. Em 3 de abril de 2014, atravs do Decreto n

40.594, o governador Eduardo Campos renovou, por mais 2 (dois) anos, o prazo da Comisso, pas-sando para 1 de junho de 2016, prazo estendido para 31 de dezembro do mesmo ano, para conclu-so do trabalho.

A CEMVDHC sempre procurou operar em conjunto com as foras atuantes da sociedade ci-vil e com rgos e instituies pblicos relevantes para o cumprimento de suas tarefas. No decurso de quatro anos e meio, como rgo da Casa Civil do Governo de Pernambuco, manteve-se especial-mente em contato e colaborao com os arquivos pblicos estaduais e Nacional, a Comisso Nacio-nal da Verdade (CNV), as Comisses Estaduais da Memria e Verdade, as universidades pernambu-canas e algumas de outros estados, a Comisso de Anistia do Ministrio da Justia, o Poder Judicirio do Estado de Pernambuco, o Superior Tribunal Militar, o Ministrio Pblico Estadual e Federal, o Congresso Nacional, o Ministrio das Relaes Exteriores, o Comit Estadual da Memria, Verda-de e Justia de Pernambuco, a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos do Estado de Pernambuco, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Fundao Joaquim Nabuco, a Prefeitura da Cidade do Recife e a Companhia Edi-tora de Pernambuco (Cepe).

Notas - Captulo 1

1 COMISSO NACIONAL DA VERDADE (CNV). Relatrio da Comisso Nacional da Verdade. v. 1. Bra-slia: CNV, 2014, p. 94-95.

2 BRASIL. Ato Institucional, 9 de abril de 1964. Di-rio Ocial [da] Repblica Federativa do Brasil, Poder Executivo, Distrito Federal, DF, 9 abr. 1964, Seo 1.

3 um documento preparado com a coordenao de trs organizaes no governamentais: a Fundao de Direitos Humanos da Turquia, Istambul; Physicians for Human Rights, Boston, Estados Unidos; Action for Torture Survivors (HRFT), Genebra, Sua. Sua redao teve a participao de dezenas de especialistas mdi-cos, psiclogos, prossionais da rea forense, juristas, representantes de organizaes defensoras dos direitos humanos, etc. originrios de diversas partes do mun-do. O Manual recebeu a aprovao do Alto Comissa-riado das Naes Unidas para os Direitos Humanos em nove de agosto de 1999. ALTO COMISSARIADO DAS NAES UNIDAS PARA OS DIREITOS HUMANOS. Protocolo de Istambul: manual para a investigao e documentao ecazes da tortura e outras penas ou tra-tamentos cruis, desumanos ou degradantes. Genebra: Naes Unidas, 2001.

4 ASSESSORES DA CEMVDHC: Eduardo Gomes de Figueiredo (at dezembro de 2012), substitudo por Llia Maria Pinto Gondim; Fernando Jos Pereira de Arajo; Jacqueline de Arajo Florencio; Joelma de Gus-mo Lima; Rafael Leite Ferreira; Samuel Carvalheira de Maupeou (at maio de 2013), substitudo por Tereza Cristina Neves Wanderley; Valria Jos Silva Santos (at agosto de 2013), substituda por Suzane Batista de Ara-jo (at junho de 2014), substituda por Monike Gabrielle de Moura Pinto; Vera Lcia Costa Acioli (at outubro de 2016), substituda por Ana Ceclia Lima; Zlia Maria Pereira da Silva.

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CAPTULO 2. A ATUAO DA CEMVDHC: HISTRICO

A Comisso Estadual da Memria e Verda-de Dom Helder Cmara desenvolveu com comprometimento e perseverana ao longo dos quatro anos e meio de sua existncia aptides de trabalho visando recompor a Histria de um tempo no qual a exceo e as violaes dos direi-tos humanos foram palavras de ordem no Brasil. Conviveu com relatos de parentes e amigos das v-timas da represso que nunca desistiram de lutar pela histria de seus mortos e por seus entes de-saparecidos. E tambm esteve frente a frente com antigos responsveis e membros atuantes dos r-gos de represso que investigaram, monitoraram, controlaram, torturaram e assassinaram muitos de seus concidados, considerados inimigos face es-trutura de represso poltica ento incrustada no Estado brasileiro. Foram horas de relatos frios, me-todicamente articulados, de difcil compreenso a partir da lgica humana.

A efetiva execuo de seu mandato a identi-cao das graves violaes de direitos humanos praticadas pelo Estado brasileiro no territrio do estado de Pernambuco ou contra pernambucanos ainda que fora do estado, praticadas por agentes pblicos estaduais entre os anos de 1946 e 1988 foi penosa e laboriosa. Sobretudo, ela exigiu, desde o incio, circunscritos o objeto de seu trabalho e a sua extenso, a reunio de meios e aptides os mais diversos em um esforo de longo prazo. Com esse propsito, a CEMVDHC realizou contato com a Secretaria de Planejamento e Gesto (Seplag) do Estado de Pernambuco, buscando o apoio na ela-borao de seu planejamento estratgico.

PLANEJAMENTO ESTRATGICO

A primeira reunio entre a CEMVDHC e a Se-plag ocorreu em 19 de outubro de 2012, data consi-derada o incio formal do processo de planejamen-to estratgico da Comisso. As atividades para a sua elaborao se desenrolaram em oito encontros e envolveu toda a CEMVDHC, seus membros e assessores. O exerccio foi nalizado em 11 de de-zembro do mesmo ano.

Na concepo geral de seu planejamento e para a sua estruturao, identicaram-se preliminar-mente as seguintes tarefas: a denio dos objeti-vos principais, secundrios e metas; a identicao do pblico-alvo ou pblico interessado5 de cada ao e objetivo; a declarao de seus valores, viso e misso; e a obteno, monitoramento e controle dos resultados, identicando os responsveis pela execuo e obteno dos objetivos assinalados pelo planejamento estratgico.

O objetivo principal naturalmente o que vem determinado no mandato legal da Comisso: escla-recer as graves violaes de direitos humanos, tais como torturas, mortes, estupros, sequestros, feri-mentos, desaparecimentos forados, ocultao de cadveres e suas autorias, ocorridas no estado de Pernambuco ou contra pernambucanos ainda que fora deste territrio, praticadas por agentes pbli-cos durante o perodo de 1946 a 1988.

Os objetivos secundrios so especicaes in-duzidas pela busca do objetivo principal: (I) iden-ticar e tornar pblicos as estruturas, os locais, as instituies que se relacionam prtica de viola-

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es de direitos humanos, ocorridas no estado de Pernambuco ou ainda fora deste territrio, quando atingiram pernambucanos; (II) estabelecer cone-xes entre rgos repressivos e a sociedade civil, identicando possveis nanciamentos de opera-es criminosas praticados por indivduos ou em-presas; (III) encaminhar s instituies competen-tes informaes obtidas atravs de pesquisa e dos depoimentos orais, para esclarecer a circunstncia, a localizao e a identicao dos mortos e desa-parecidos polticos, do perodo; (IV) recomendar para que seja prestada assistncia s vtimas e fa-miliares; (V) recomendar a adoo de medidas e polticas pblicas para prevenir violaes de direi-tos humanos, assegurando sua no repetio; (VI) esclarecer e tornar pblico o modo como o estado organizou a represso para enfrentar a resistncia ditadura; e, (VII) despertar discusso social sobre a interpretao da Lei da Anistia pelo STF.

A Declarao de Misso foi elaborada com o objetivo de tornar pblica para a sociedade as gra-ves violaes de direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988 em Pernambuco ou contra pernambu-canos em outros territrios, inclusive as circuns-tncias e estruturas em que ocorreram, atuando de acordo com os fundamentos da democracia e do Estado Democrtico de Direito e recomendando a adoo de polticas pblicas que assegurem a efe-tivao do direito memria e verdade histrica.

Os valores da CEMVDHC foram fundados no compromisso com a defesa da democracia, dos di-reitos humanos e do Estado Democrtico de Direi-to; a transparncia; o compromisso com a verdade histrica; a tica pblica; a celeridade e produtivi-dade; e a iseno.

Por m, estabeleceu-se uma sistemtica para o monitoramento da execuo do planejamento estratgico. Primeiramente, foram distribudas as atividades e os prazos para cada etapa dos produ-tos da CEMVDHC. Posteriormente, foram indi-cados os nomes dos responsveis pela conduo do monitoramento. Em terceiro lugar, deniu-se a periodicidade para cada reunio, enumerando os instrumentos para o monitoramento e denindo o padro para cada coleta de informao.

Ao nal dos trabalhos em 2016, a CEMVDHC apresenta os seguintes resultados: Acervo Docu-mental, Site e Link, Transcries das Audincias Pblicas, Cadernos Peridicos e Relatrio Final.

AS SUBCOMISSES

Subcomisso de Pesquisa

Os regimes mais manipuladores produzem docu-mentos que podem voltar para assombr-los 6.

A Comisso Estadual da Memria e Verdade Dom Helder Cmara procurou utilizar a fundo nas suas investigaes, documentos provenientes

do regime instalado pelo golpe de 1964, median-te trabalho meticuloso de levantamento, extrao e checagem de informaes. Esses documentos no testemunham apenas sobre os abusos e crimes cometidos pela ditadura. So tambm elementos essenciais para a compreenso do sistema poltico--administrativo-policial ento constitudo e para que se proceda reconstituio histrica da me-mria sobre as perseguies, as prises, as torturas, os desaparecimentos e as mortes ocorridas durante a sua vigncia. Do voz histria das vtimas do regime militar, homens e mulheres, marcados para sempre pela violncia que lhes foi impingida e que reclamam por reconhecimento, verdade e justia. Figuram, portanto, como um expressivo pano de fundo para o entendimento do longo perodo de arbtrio a que foi submetido o povo brasileiro.

Fontes escritas

As violaes de direitos humanos cometidas pela ditadura no esto simplesmente assentadas nos arquivos. Como bem assinalou o historiador italiano Carlo Ginzburg, esses ltimos trazem apenas os rastros, os indcios 7, o o condutor que deve ser submetido a um rduo trabalho de cruzamento de informaes, um olhar crtico, um distanciamento em relao s fontes e uma correta contextualizao do perodo. Deve-se ter perma-nentemente em vista que esses documentos so permeados por prticas difundidas e legitimadas pelo autoritarismo, como a delao e os falsos tes-temunhos, o que gerava frequentemente verses desencontradas, fabricaes, condutas ambguas, frutos mesmo de um sistema onde imperava a mais brutal violncia.

Na maioria das vezes, as informaes neles con-tidas foram arrancadas das vtimas em situaes de dor, de humilhao, de constrangimento; em ou-tras ocasies, elas foram simplesmente fabricadas pelos servidores do regime, ao sabor dos interes-ses de suas instituies, dos seus chefes ou deles prprios. Ou ainda: muitas das atividades empre-endidas pelo aparelho repressor produziam fre-quentemente falsos documentos, para permitir a inltrao em determinados ambientes, para fun-damentar linhas de investigao e de interrogat-rio, para forjar imagens ou para provocar situaes legitimadoras de sua atuao repressiva 8.

Por isso tudo, na anlise dos documentos pro-duzidos pela ditadura, a CEMVDHC trouxe sem-pre consigo a crtica imperiosa das fontes, questio-nando-se permanentemente sob quais condies aqueles documentos foram redigidos?, com que propsito?, por quem?.

No decorrer de seu trabalho de pesquisa, a CEMVDHC contou com o apoio de diversos ar-quivos pblicos e instituies de guarda de do-cumentos, responsveis pelo armazenamento de material relativo ao perodo visado. Realizaram-se

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pesquisas nos seguintes locais:Arquivo Pblico Estadual Jordo Emerencia-

no (APEJE) vinculado Secretaria de Educao do Estado de Pernambuco, esse arquivo foi criado por Decreto do Governo do Estado, de n 1.265, dezembro de 1945, com a nalidade de guardar, conservar e disponibilizar ao cidado e ao pblico pesquisador a documentao produzida e acumu-lada pelo Poder Executivo Estadual. O conjunto documental da extinta Delegacia de Ordem Pol-tica Social DOPS custodiado pelo APEJE e se encontra atualmente no seu prdio anexo, estabe-lecido rua Imperial, 1069, So Jos, tambm no Recife. Compreende mais de 33.000 pronturios, entre individuais, funcionais e administrativos, dossis organizados pelos agentes da polcia, atra-vs de investigaes de indivduos e instituies (associaes, agremiaes, sindicatos entre ou-tros); informaes que eram disseminadas a todos os rgos de represso.

Aberto para pesquisadores e familiares das vti-mas que sofreram perseguies polticas, inclusive a partir da Lei de Anistia n 10.559 de 13 de no-vembro de 2002, vem sendo utilizado como prova para recebimento de indenizaes de diversas fa-mlias. Tornou-se importante fonte de informao para a CEMVDHC, que digitalizou mais de 350 pronturios. No perodo ps-1964, o DOPS pas-sa a fazer parte da extensa rede do Sistema de In-formao e Represso composta por vrios rgos das diferentes esferas das Foras Armadas (Exrci-to, Marinha e Aeronutica). Os procedimentos de violncia e tortura se tornam rotina na obteno de informaes particularmente dos presos pol-ticos. deste perodo que procede a maior parte da documentao e dos pronturios das vtimas da represso poltica.

Coordenao Regional do Arquivo Nacional no Distrito Federal (Coreg) o arquivo que abriga parte dos documentos classicados como secretos e condenciais do extinto Servio Nacional de In-formao (SNI), criado em 13 de junho de 1964, pela Lei n 4.341, com a funo de coordenar as informaes e contrainformaes em territrio brasileiro e no exterior.

Como sabido, o SNI estabelecia ligao direta com as entidades federais, estaduais e municipais, alm da colaborao de instituies privadas. Pos-sua em seus arquivos informaes sigilosas e dos-sis de cidados brasileiros e estrangeiros referen-tes a assuntos de segurana nacional e de interesses de Estado. Assistia e articulava toda estrutura de represso poltica instaurada no Brasil aps o gol-pe civil-militar de 1964. Nesse arquivo, alm dos referidos documentos, tambm foi trabalhada a documentao secreta produzida pelo extinto Es-tado-Maior das Foras Armadas (EMFA) durante aditaduramilitar.

Arquivo Pblico Estadual do Rio de Janeiro (APERJ) dele faz parte o acervo do DOPS-Rio,

fundo arquivstico da Polcia Poltica. Rene pron-turios do Rio de Janeiro e do estado da Guana-bara. Foram digitalizados 32 pronturios, um to-tal de 1.176 pginas que fazem parte do banco de dados da CEMVDHC. O trabalho de prospeco de pesquisa balizou-se na lista de mortos e desa-parecidos, com nfase aos nomes que interligavam Pernambuco ao Rio de Janeiro.

Arquivo Pblico do Estado de So Paulo o principal acervo pesquisado nesse arquivo foi o do Departamento Estadual de Ordem Poltica e Social de So Paulo (DEOPS-SP), que contm a ao poli-cial cotidiana (chas pessoais, registros, informes, pronturios, depoimentos, dossis, relatrios, in-formaes, ordens de busca e priso, arquivos etc.), os documentos roubados (livros, publicaes, cor-respondncias pessoais, documentos de organiza-es etc.) e as declaraes tomadas em interrogat-rios permeados pelo autoritarismo.

Superior Tribunal Militar (STM) nesse ar-quivo, a CEMVDHC localizou e trabalhou com os processos de ltima instncia que foram instaura-dos no pas pela Justia Militar da Unio, inclusive pelas auditorias militares, contra os militantes pre-sos durante a ditadura.

Instituto Mdico Legal de Pernambuco (IML) fazem parte desse acervo os laudos deexame ta-natoscpico, breve histrico da morte, laudo cada-vrico e fotos correspondentes, feitos pela polcia, das vtimas do regime militar. Esses laudos so de extrema importncia para que a CEMVDHC to-masse conhecimento das marcas de tortura s vti-mas produzidas pela ditadura.

Arquivo do Ministrio das Relaes Exterio-res (AMRE) nesse arquivo buscou-se pesquisar documentos oriundos de misses diplomticas e reparties consulares que tiveram como princi-pal objetivo o monitoramento das atividades dos brasileiros que foram exilados ou que partiram espontaneamente do Brasil. Foram consultados, especicamente, os documentos que continham informaes sobre graves violaes de direitos hu-manos investigadas pela CEMVDHC.

Fontes orais

A busca pela verdade est presente na tarefa de esclarecer os acontecimentos responsveis por graves violaes aos direitos humanos, ocorridos no perodo de 1964 a 1985. Mesmo considerando a ausncia do absoluto no conceito de verdade, se-guindo a orientao de Foucault 9 (1979:5) pode-se distinguir os acontecimentos, diferenciar as redes e os nveis a que pertencem e reconstituir os os que os ligam e que fazem com que se engendrem uns a partir dos outros. Assim as ocorrncias in-vestigadas por esta Comisso podero ser compre-endidas, talvez, no em sua totalidade, mas no que se apresentam.

As fontes orais se constituem de depoimentos

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realizados, tanto por agentes da represso e auto-ridades da poca, quanto por vtimas, militantes sobreviventes da represso, testemunhas e familia-res. Uma parte da reconstruo das biograas est fundamentada nos relatos orais, na narrativa me-morialstica, obtidos atravs dos depoimentos de sobreviventes ou daqueles que de uma forma ou de outra participaram desses acontecimentos.

A documentao, alvo de estudos da CEMVDHC, tanto trata de pessoas pblicas e comuns, quanto dos arquivos que tm igual importncia e guardam esse tipo de informao. Muitos militantes, homens comuns ou no, que participaram da resistncia produziram deliberadamente uma memria de si prprio.

Em geral os registros de memria dos indivdu-os comuns so, por denio, subjetivos, fragmen-tados e ordinrios como suas vidas. No caso dos militantes, mesmo sendo homens comuns esses registros passam a ser extraordinrios como suas vidas.

Os depoimentos orais surpreendem na medida em que o discurso do homem comum, quando es-clarecido sobre poltica, represso, tortura, morte e desaparecimento transforma-se em discurso ex-traordinrio. Por sua vez, este discurso extraordi-nrio, pela sua universalidade exprime e explica a experincia comum 10.

Gravaes, cartas, fotograas no chegam a se constituir fundo orgnico e sim documentos de interesse desse perodo. Grande parte do acervo acumulado pela CEMVDHC, incluindo os docu-mentos escritos, move-se no mundo das institui-es delegacias, justia, exrcito, marinha, aero-nutica, polcia militar, polcia civil, SNI e traz a marca Cenimar, Cisa, IEE, DOPS, SNI. Fazem par-te dessa documentao os depoimentos orais de presos polticos e testemunhas, policiais, investiga-dores, mdicos e peritos criminais que foram reali-zados nas delegacias policiais ou nas dependncias da justia militar ou civil e depois transcritos pelos escrives de planto. Estes depoimentos informam sobre a vida pessoal do investigado, seu cotidiano, prosso, participao poltica na sociedade brasi-leira e no seu partido poltico.

A documentao que traz abordagem pessoal, como cartas, depoimentos escritos, depoimentos orais, considerada uma zona de penumbra mar-cada pela presena de documentos, que a exemplo dos dirios ntimos no teriam a fora probatria dos que decorrem de transaes11, porque sua origem no institucional. Para sustentar o valor probatrio desses documentos algum procedimen-to terico-metodolgico foi aplicado aos referidos documentos, como a crtica interna e externa. Por exemplo, se o autor, o depoente, tem autoridade para relatar o acontecimento. Se o acontecimento conhecido de outros contemporneos. Estes do-cumentos, oriundos de fontes orais, no produzi-dos por instituies, os considerados pessoais, so

igualmente importantes por possibilitarem recu-perar a conexo lgica e formal que liga um docu-mento a outro mediante vnculo de necessidade 12.

Os depoimentos so a pea de resistncia das fontes orais. O dilogo entre o entrevistador e a testemunha complexo pois se situa numa con-tradio permanente entre a cumplicidade e a ten-so13. As informaes baseiam-se na memria. H pontos de referncia estruturantes, que inserem a memria individual na memria coletiva. Toda memria seletiva. Entretanto, h pontos de nego-ciao para conciliar memria coletiva e memria individual. preciso que os dois tipos de memria concordem e que haja pontos de contato entre as duas memrias, para que a lembrana que os ou-tros trazem possa ser reconstruda sob uma base comum.

As fontes orais facilitam a anlise sobre os ex-cludos, sobre as minorias e podem indicar o ca-rter opressor da memria coletiva nacional e da memria ocial. As fontes orais permitem, tam-bm, o aoramento das memrias subterrneas, antes subvertidas ao silncio. Por muito tempo os depoentes permaneceram em silncio. O silncio sobre o passado no signica esquecimento, mas uma forma como a sociedade civil impotente se ope aos discursos ociais.

O silncio sobre o passado pode signicar um modus vivendi com aqueles que participaram de uma forma ou de outra daquela experincia ou uma maneira de conviver consigo mesmo. O si-lncio diculta a culpabilidade das vtimas. Muitas vtimas preferem guardar o silncio. Nem sempre h interlocutores para a escuta. preciso surgir perspectivas polticas e pessoais para quebrar o silncio. H, ainda, uma memria envergonhada, presente na fronteira entre o dizvel e o indizvel, o confessvel e o inconfessvel, substncia da me-mria coletiva subterrnea da sociedade civil do-minada.

A CEMVDHC trabalhou com estas memrias, com estes silncios, com estas zonas de penumbra, que constituem o cerne dos 157 depoimentos orais, gravados e transcritos sob a responsabilidade de comissionados e assessores da Comisso; este con-junto documental o produto de um total de 90 sesses pblicas e reservadas. Acrescente-se a estes depoimentos mais 130 entrevistas, gravadas pelo jornalista Samarone Lima e cedidos Comisso.

Fontes iconogrficas

A CEMVDHC reuniu material iconogrco, registro de manifestaes ideolgicas das foras golpistas, em perodo anterior a 1964 ou, depois do golpe, elementos de propaganda contra todos aqueles identicados como inimigos do regime, quas