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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE DIREITO

GOVERNANA AMBIENTAL GLOBAL

DAIANE HINRICHSEN LOPES

MESTRADO EM DIREITO INTERNACIONAL E RELAES INTERNACIONAISDIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL 2008/2009

UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE DIREITO

GOVERNANA AMBIENTAL GLOBAL

DAIANE HINRICHSEN LOPES

MESTRADO EM DIREITO INTERNACIONAL E RELAES INTERNACIONAISDr. CARLA AMADO GOMES DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL 2008/2009

Aos meus pais que me ensinaram os princpios de uma vida digna e pela dedicao de suas vidas a mim. Ao meu pai Valdir da Rosa Lopes que me ensinou a importncia de ultrapassar as dificuldades e vencer. minha me Rejane Elisabetha Hinrichsen Lopes que sempre me apoiou e deu foras com todo o seu infinito amor. Ao meu irmo Valdir Hinrichsen Lopes que suprimiu a falta que fiz durante todos os anos que estive ausente. Ao Rui Miguel Gonalves Rebelo pela felicidade que me proporciona e por estar sempre ao meu lado. Sofia Neves Cruz pela sincera amizade.

IV

ndice

0. Prembulo .................................................................................................................... 1. Introduo .................................................................................................................... 2. Conceito de Governana ............................................................................................. 2.1. Caractersticas da Governana Global do Meio Ambiente ................................... 2.1.1. Participao ................................................................................................... 2.1.2. Actores Privados ............................................................................................ 2.1.3. Fragmentao ................................................................................................ 2.2. Quadro Actual da Governana Ambiental Internacional ...................................... 2.2.1. Globalizao e Meio Ambiente ..................................................................... 2.2.1.1. A acelerao da actividade econmica global e a demanda por recursos naturais ................................................................................................. 2.2.1.2. Ameaas do processo de globalizao e da degradao ambiental ........ 2.2.1.3. Dever de cooperao dos pases mais prsperos ................................... 2.2.1.4. Padres de consumo e o futuro da globalizao e do meio ambiente ... 2.2.1.5. Interdependncias entre o mercado e o meio ambiente globais ............ 2.3. Passos para a Aco ............................................................................................... 2.3.1. Administrao Institucional da Fragmentao .............................................. 2.3.2. Ampliao do Sistema Estado-Centrista ....................................................... 2.3.3. Coordenao e Coerncia entre as Instituies ............................................. 2.3.4. Actores de Diferentes Nveis Orientados numa Aco ................................. 2.3.5. Interaco entre Polticas Ambientais e Econmicas ................................... 2.3.6. Segurana e Meio Ambiente ......................................................................... 2.3.7. Desenvolvimento Sustentvel como Objectivo Comum .............................. 3. Principais Instituies e Regimes Relacionados com o Meio Ambiente ................. 3.1. rgos da Organizao das Naes Unidas .......................................................... 3.1.1. rgos Principais .......................................................................................... 3.1.1.1. Assembleia Geral .................................................................................. 3.1.1.2. Conselho Econmico e Social (ECOSOC) ........................................... 3.1.1.3. Conselho de Segurana ......................................................................... 3.1.1.4. Tribunal Internacional de Justia .......................................................... 3.1.1.5. Secretariado ........................................................................................... 3.1.2. Agncias Especializadas................................................................................. 3.1.2.1. Organizao das Naes Unidas para Agricultura e Alimentao (FAO) ................................................................................................................. 3.1.2.2. Banco Internacional para a Reconstruo e Desenvolvimento (BIRD) 3.1.2.3. Organizao Internacional do Trabalho (OIT) ...................................... 3.1.2.4. Organizao Martima Internacional (IMO) ......................................... 3.1.2.5. Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO) ............................................................................................ 3.1.2.6. Organizao das Naes Unidas para o Desenvolvimento Industrial

1 2 5 7 7 8 8 9 11 11 13 14 16 16 18 18 18 18 20 20 20 21 22 22 22 22 22 23 23 23 23 24 24 24 24 25

V (ONUDI) ............................................................................................................ 3.1.2.7. Organizao Mundial da Sade (OMS) ................................................ 3.1.2.8. Organizao Mundial de Meteorologia (OMM) ................................... 3.1.3. rgos Subsidirios ...................................................................................... 3.1.3.1. Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) ......... 3.1.3.1.1. Composio ................................................................................... 3.1.3.1.2. Objectivos e funes ..................................................................... 3.1.3.1.3. Profissionais e procedimentos ....................................................... 3.1.3.1.4. Influncia cognitiva ....................................................................... 3.1.3.1.5. Influncia normativa .................................................................... 3.1.3.1.6. Influncia executiva ...................................................................... 3.1.3.1.7. Problemas estruturais .................................................................... 3.1.3.1.8. Poltica .......................................................................................... 3.1.3.1.9. Contribuies ................................................................................ 3.1.3.1.10. Financiamento ............................................................................. 3.1.3.2. Comisso de Desenvolvimento Sustentvel (CDS) .............................. 3.1.3.2.1. Composio ................................................................................... 3.1.3.2.2. Objectivos e funes ..................................................................... 3.1.3.2.3. Problemas estruturais .................................................................... 3.1.3.2.4. Contribuies ................................................................................. 3.1.3.2.5. Financiamento ............................................................................... 3.1.3.3. Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) ......... 3.1.3.3.1. Composio ................................................................................... 3.1.3.3.2. Objectivos e funes ..................................................................... 3.1.3.3.3. Problemas estruturais .................................................................... 3.1.3.3.4. Contribuies ................................................................................ 3.1.3.3.5. Financiamento ............................................................................... 3.1.3.4. O Frum Global de Ministros do Meio Ambiente (GMEF) ................. 3.1.3.5. Grupo de Gesto Ambiental (EMG) ..................................................... 3.1.4. rgos dos Tratados ...................................................................................... 3.1.4.1. Secretariados das Convenes .............................................................. 3.1.4.1.1. Influncia cognitiva ....................................................................... 3.1.4.1.2. Influncia normativa ...................................................................... 3.1.4.1.3. Estrutura ........................................................................................ 3.1.4.1.4. Autoridade ..................................................................................... 3.1.4.1.5. Organizao ................................................................................... 3.1.4.1.6. Liderana ....................................................................................... 3.1.5. Mecanismo de Cooperao Internacional ..................................................... 3.1.5.1. Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF) ........................................ 3.1.6. Participao e Contribuies das Organizaes da Sociedade Civil ............. 4. Propostas de Reforma da Governana Ambiental ................................................... 4.1. Histrico da Discusso .......................................................................................... 4.2. Actuais Iniciativas de Reforma na ONU ............................................................... 4.2.1. Painel de Coerncia do Secretario-Geral da ONU Unidos na Aco (Delivering as One) ................................................................................................. 4.2.2. Processo de Consultas Informais para as Actividades Ambientais da ONU 4.2.3. Discusses durante o Frum Global de Ministros do Meio Ambiente ......... 4.2.4. Paris Call for Action ..................................................................................... 25 25 26 26 26 27 27 28 29 29 30 31 31 33 34 35 35 36 37 38 39 39 40 40 40 41 41 42 43 43 43 44 44 45 46 46 47 48 48 49 51 51 53 53 54 55 56

VI 5. Governana Ambiental Global ................................................................................... 5.1. Panorama acerca do Debate da Reforma da Governana Ambiental Global ........ 5.2. Desafios da Governana Ambiental Mundial ........................................................ 5.2.1. Proliferao e Fragmentao ......................................................................... 5.2.1.1. Diferentes actores .................................................................................. 5.2.2. Duplicao e Conflito de Agendas ................................................................ 5.2.3. Cincia ........................................................................................................... 5.2.4. Cooperao e Coordenao ........................................................................... 5.2.5. Agrupamento de Acordos ............................................................................. 5.2.6. Implementao .............................................................................................. 5.2.6.1. Dificuldades .......................................................................................... 5.2.7. Falta de Liderana ......................................................................................... 5.2.8. Actores No Estaduais e o Sistema Estado-Centrista ................................... 5.2.9. Uso Ineficiente dos Recursos ........................................................................ 5.2.10. Governana Ambiental Global em outras reas .......................................... 5.2.11. Participao ................................................................................................. 5.3. Esforos para Melhorar a Governana ............................................................. 6. Propostas para Fortalecer a Governana Ambiental ............................................... 6.1. Abordagem Vertical ............................................................................................... 6.1.1. Criao de um rgo Principal das Naes Unidas ...................................... 6.1.2. Novo Comit da Assembleia Geral em Desenvolvimento Sustentvel ........ 6.1.3. Nova Agncia Especializada da ONU .......................................................... 6.2. Abordagem Horizontal .......................................................................................... 6.2.1. Revitalizao dos rgos das Naes Unidas .............................................. 6.2.1.1. Assembleia Geral .................................................................................. 6.2.1.2. ECOSOC ............................................................................................... 6.2.1.3. Conselho de Segurana ......................................................................... 6.2.1.4. Secretariado ........................................................................................... 6.2.2. rgos Subsidirios ...................................................................................... 6.2.2.1. PNUMA fortalecido .............................................................................. 6.2.2.2. PNUD revitalizado ................................................................................ 6.2.2.3. Futuro da CDS ....................................................................................... 7. A Organizao Mundial do Meio Ambiente ........................................................ 7.1. Variaes ................................................................................................................ 7.1.2. Competncia Formais ................................................................................... 7.1.3. Fora dos Regimes ........................................................................................ 7.1.4. Estrutura Organizacional ............................................................................... 7.1.5 Problemas de Ajuste ....................................................................................... 7.1.6. Disponibilidade de Recursos ......................................................................... 7.1.7. Envolvimento de Interessados ...................................................................... 7.1.8. Variaes Contextuais ................................................................................... 7.2. Porque a Organizao Mundial do Meio Ambiente? ........................................ 7.2.1. A OMMA para competir com a OMC .......................................................... 7.2.2. A OMMA para ser mais forte que o PNUMA ............................................... 7.2.3. Bases para criar a OMMA ............................................................................. 7.2.4. Sociedade Civil e Agncias Intergovernamentais ......................................... 7.2.5. Proteco Ambiental e Desenvolvimento Sustentvel .................................. 7.2.6. O Sul e a OMMA .......................................................................................... 58 59 59 59 62 62 63 65 66 67 67 70 71 73 76 78 79 81 79 81 82 83 83 84 84 84 85 85 86 86 87 87 89 90 90 91 91 91 91 92 92 92 94 95 95 98 98 100

VII 7.2.7. Agrupamento de Tratados ............................................................................. 7.2.8. Centralizao ................................................................................................. 8. Modelos para a Organizao Mundial do Meio Ambiente ...................................... 8.1. Elevar o PNUMA a Agncia Especializada da ONU ............................................ 8.1.1. Implicaes Polticas e Legais ...................................................................... 8.1.2. Funes Bsicas da Organizao Mundial do Meio Ambiente .................... 8.1.2.1. Coordenao da governana ambiental global ...................................... 8.1.2.2. Desenvolvimento e implementao da lei ambiental internacional ...... 8.1.2.3. Transferncia de tecnologia e recursos financeiros para o Sul ............. 8.1.2.4. Funes cientficas ............................................................................... 8.1.2.5. Desenvolvimento de capacidades a nvel nacional ............................... 8.1.2.6. Monitorizao ....................................................................................... 8.2. Uma Organizao Intergovernamental .................................................................. 8.2.1. Modelos ......................................................................................................... 8.2.1.1. Baseado na fora dos G8 ....................................................................... 8.2.1.2. Baseado na Unio Europeia .................................................................. 8.2.2. Efectividade .................................................................................................. 8.2.3. Consideraes Finais ..................................................................................... 8.3. Perspectiva Institucional da Organizao Mundial do Meio Ambiente ................ 8.3.1. Modelo baseado na OMC ............................................................................. 8.3.1.1. Distino entre regimes e organizaes ................................................ 8.3.2. Processo de Deciso e Delimitao de Matrias .......................................... 8.3.2.1. Negociaes ad hoc versus decises por comits ou por maioria ........ 8.3.2.2. Definio de matrias ............................................................................ 8.3.3. Consideraes Finais ..................................................................................... 9. Propostas para Efectivar a OMMA ........................................................................... 9.1. OMMA acrescentada ao PNUMA ......................................................................... 9.2. OMMA incorporada ao PNUMA .......................................................................... 9.3. Questes Estruturais .............................................................................................. 9.3.1. Papel dos Ministros Ambientais ................................................................... 9.3.2. Liderana ....................................................................................................... 9.3.3 Participao dos Oficiais Eleitos .................................................................... 9.3.4. Participao No Governamental .................................................................. 9.3.5. Composio da OMMA ................................................................................ 9.3.6. Relao da OMMA com os Acordos Multilaterais Ambientais ................... 9.3.7. Poltica e Operaes ...................................................................................... 9.3.8. Criao de Polticas e de Normas Ambientais .............................................. 9.3.9. Resoluo de Disputas .................................................................................. 9.3.10. Cincia e Poltica ........................................................................................ 9.3.11. Coerncia ..................................................................................................... 9.3.12. Financiamento ............................................................................................. 10. Concluso .................................................................................................................... 11. Referncias Bibliogrficas .......................................................................................... 100 101 103 104 105 107 107 108 109 109 111 111 112 112 113 113 114 116 117 118 119 120 120 122 123 125 126 127 128 128 129 129 130 131 131 133 134 134 134 135 135 136 138

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0. Prembulo

Com o presente trabalho propomo-nos fazer uma abordagem sria da Governana Ambiental Global, sua definio, sua evoluo, das instituies existentes e responsveis pela administrao do meio ambiente a nvel internacional. Posteriormente, apresentamos propostas para uma melhoria significativa do sistema actual em matria ambiental, atravs da criao de uma organizao a nvel mundial, a que chamaramos Organizao Mundial do Meio Ambiente (OMMA) e que seria, uma autoridade dotada de mecanismos para o controle da fragmentao, com fortes incentivos cooperao, coordenao e implementao de solues para estas matrias .

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1. Introduo

A necessidade de uma abordagem sria sobre o tema da Governana Ambiental Global torna-se cada vez mais evidente, tendo em conta as causas da degradao ambiental, da existncia de mais de quinhentos acordos multilaterais ambientais, da fraca vontade poltica em matrias relacionadas com implementao e aco em matria ambiental, e por fim, da necessidade de limitar o crescimento econmico de modo a garantir a dignidade de vida humana. Problemas globais exigem responsabilidades globais. A ameaa ao futuro do nosso planeta est cada vez mais clara, com as alteraes climticas, com a degradao da camada de ozono, com a perda da biodiversidade, com a poluio martima, com o comrcio de resduos perigosos... Todos estes factores so cada vez mais bvios. necessrio mobilizar todos os sectores da sociedade para efectivar a implementao dos instrumentos internacionais de proteco ambiental sejam eles governos locais, instituies da ONU, organizaes financeiras, organizaes da sociedade civil em prol da conservao ambiental, do desenvolvimento sustentvel, da qualidade de vida, da democracia e da justia. O sistema actual de proteco ambiental sofre de falta de coerncia, de eficincia, de deficiente informao disponvel e de falta de financiamento adequado. As instituies existentes no so capazes de ultrapassar os problemas ambientais globais actuais. A complexa fragmentao em matria ambiental internacional traduz-se em mltiplas atribuies de responsabilidades distribudas pelas vrias instituies de diferentes esferas e segmentos, ocasionando uma enorme falta de coordenao; por outro lado, a falta de clareza dos acordos ambientais impossibilita a implementao de medidas efectivas; por ltimo, os recursos financeiros atribudos s instituies existentes so diminutos e consequentemente no permitem a realizao dos seus

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objectivos1. A crescente proliferao de acordos internacionais legais e institucionais direccionados aos problemas ambientais especficos, tem preocupado a comunidade internacional. Recentemente o Secretrio-Geral das Naes Unidas, enquanto parte geral num processo de reforma da ONU, notou que um dos maiores desafios que a comunidade internacional enfrenta hoje, diz respeito ao equilbrio sustentvel entre crescimento econmico, reduo da pobreza, igualdade social e a proteco dos recursos do Planeta - sistemas que suportam a vida e os bens comuns2. Por seu turno, a Assembleia Geral das Naes Unidas adoptou uma Resoluo3, baseada nas recomendaes do Secretrio-Geral, no sentido de criar medidas institucionais importantes, como sejam: a criao de um Grupo de Gesto Ambiental, a criao de um Frum Global de Ministros do Meio Ambiente (GMEF) e o apoio para aumentar a ligao entre convenes ambientais co-relacionadas. A Declarao de Malm adoptada em 2000, no primeiro encontro dos GMEF, teve como objectivo o fortalecimento da estrutura institucional da governana ambiental internacional, baseada numa avaliao das necessidades futuras de uma arquitectura institucional com capacidade para lidar com a larga extenso das ameaas ambientais de um mundo globalizado. A Cimeira de Joanesburgo, realizada em 2002, chamou a ateno necessria para os desafios e inadequaes da governana actual do meio ambiente. Porm o nmero de acordos ambientais continua a crescer, e estes no so suficientemente eficientes e esto longe de atingirem os objectivos para os quais foram celebrados4. H um forte consenso que diz que a ONU no tem, actualmente, capacidades para enfrentar os inmeros desafios das alteraes globais e para defender um mundo1 NEUHAUS, Esther - Governana Ambiental Internacional Documento-base para discusso. Frum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS). Braslia/So Paulo, Agosto de 2007. 2 Apud CARPENTER, Chad Strengthening IEG by Reforming Existing UN Bodies. International Environmental Governance (Gaps and Weaknesses, Proposals for Reform) Working Paper, Tokyo, UNU-IAS, 2002.Task Force on Environment and Human Settlements as part of the overall reform of the United Nations, a sustainable equilibrium between economic growth, poverty reduction, social equity and the protection of the Earth's resources, common and life support systems. United Nations University Institute of Advanced Studies. www.ias.unu.edu 3 Resoluo 53/242 Secretary-General's Task Force. 4 ELLIOTT, Lorraine - The United Nations Record on Environmental Governance: An Assessment. A Word Environmental Organization, Solution or Threat for Effective International Environmental Governance? Chapter 2, Edited by Frank Biermann e Steffen Bauer. Ashgate, Aldershot, 2005.

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mais seguro. A exigncia de uma nova instituio surge, em primeira instncia, pelo reconhecimento das deficincias do presente sistema de governana.

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2. Conceito de Governana

A governana global do meio ambiente diz respeito totalidade de organizaes, instrumentos polticos, mecanismos financeiros, regras, procedimentos e normas que regulam a proteco ambiental5. O conceito de governana refere-se ao conjunto de iniciativas, instncias e processos que permitem aos povos, por meio de suas comunidades e organizaes civis, exercer o controlo social pblico e transparente das estruturas estaduais e das polticas pblicas, levando em considerao a dinmica das instituies de mercado, visando atingir objectivos comuns. Governana inclui tantos mecanismos governamentais, como no-governamentais. a capacidade social em geral, ou seja, os sistemas, instrumentos e instituies, que orientam a conduta dos Estados, das empresas, das pessoas, em torno de certos valores e objectivos de longo prazo para a sociedade6. Em matria ambiental, o conceito de governana global desenvolveu-se nos ltimos anos como um conceito que engloba a emergncia de novos actores e de novos mecanismos polticos a nvel global, bem como a maior aceitao da limitao da soberania dos Estados em tempos de interdependncia global7. H quem defenda que a definio de governana do meio ambiente tem efeitos meramente alusivos8. Em termos liberais, isto significa dizer que uma forma mais eficiente de administrao multilateral. A forma institucional apenas mais um5 NAJAM, Adil; PAPA, Mihaela; TAIYAB, Nadaa - Global Environmental Governance: A Primer on the GEG Reform Debate. International Institute for Sustainable Development, Ministry of Foreign Affairs of Denmark, 2007. www.eoearth.org 6 BORN, Rubens H. - Governana e Sustentabilidade: Desafio para Todos. Frum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS), Vitae Civilis. Braslia/So Paulo, Agosto de 2007. 7 BIERMANN F. - A World Environment Organization Solution or Threat to Effective International Environmental Governance? Edited by Frank Biermann e Steffen Bauer. Ashgate. Aldershot, England, 2005. 8 ELLIOTT, Lorraine - The United Nations Record on Environmental Governance: An Assessment, Chapter 2. A Word Environmental Organization, Solution or Threat for Effective International Environmental Governance? Edited by Frank Biermann e Steffen Bauer. Ashgate, Aldershot, England, 2005.

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componente sobre o debate de como melhorar a situao do meio ambiente e a assuno de que melhores instituies iro solucionar o problema. Uma abordagem mais global ou cosmopolita enfatiza que as obrigaes transcendem as fronteiras, que as relaes de poder que condicionam os resultados e prticas relacionadas com a governana global. Nesse contexto h trs dimenses da governana global que so levadas em conta na anlise da Organizao das Naes Unidas, e que so as seguintes: a competncia institucional; a cooperao multilateral e participao diplomtica; e a reforma normativa. Na primeira destas dimenses, ou seja, competncia institucional, o foco maior est relacionado com a necessidade de existncia de um rgo para tratar de todos os assuntos ligados ao meio ambiente, que tenha no s autoridade e capacidade de controlar e de implementar estruturas, mas tambm possua recursos para este efeito. Para a garantia de uma melhoria destas instituies, tambm necessrio que haja uma coordenao efectiva para gerir o crescimento em nmero das instituies e das complexidades que caracterizam a agenda ambiental. Com a cooperao multilateral e participao diplomtica possvel demonstrar que a governana ambiental global e as prticas da diplomacia ambiental requerem necessariamente cooperao e incluso. Por outras palavras, deve ser democrtica9. Como os Estados no podem resolver sozinhos todos os desafios ambientais, a cooperao primordial. A ONU, enquanto base de negociaes e de formulao de polticas, antecipa as formas de cooperao, mesmo as relacionadas com a soberania, em situaes como a degradao ambiental e desenvolvimento sustentvel, onde os Estados j no podem exercer a sua soberania efectivamente por si mesmos. Finalmente, uma reforma normativa tambm necessria para dar resposta a todos os novos desafios ambientais, de forma a aumentar a proteco do meio ambiente. Existem diversas propostas que defendem a criao de uma nova instituio, que cause mais sensibilizao, que crie normas e regulamentaes. O debate normativo tende a envolver-se em torno de temas como o da soberania e sua relevncia num mundo com tendncias para a globalizao e fragmentao, onde a distino entre jurisdio domstica e internacional esto cada vez mais a desaparecer.9 A nvel democrtico, a Agenda 21 fala em democracia e transparncia, como bases da governana ambiental, significa auxiliar e incluir todos aqueles que so mais afectados pela degradao ambiental e que pouca voz tem durante as negociaes.

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2.1. Caractersticas da Governana Global do Meio Ambiente 2.1.1. Participao O sistema da governana global caracterizado pela participao de diferentes actores. A noo de governana global parte inicialmente do conceito tradicional de estado-centrista e avana para um conceito que abarca actores no estaduais enquanto novos actores nas relacionais transnacionais. O campo da poltica ambiental oferece uma ampla ilustrao da evoluo do sistema de governana de mltiplos actores. Dentro dos actores que fazem parte do conceito evoludo de governana, temos as organizaes no governamentais da poltica ambiental; grupos activistas; associaes de empresrios; institutos de pesquisas que fornecem aconselhamentos, monitorizao do cumprimento das obrigaes dos Estados, informam governos e o pblico sobre as aces dos seus diplomatas e dos parceiros de negociaes, bem como oferecem aos diplomatas os resultados dos seus encontros internacionais. A rede de cientistas assumiu um papel de informao tcnica indispensvel para o processo de formao poltica, pois estes peritos assumem uma nova responsabilidade na rea do meio ambiente que se caracteriza por predominantes incertezas. Os empresrios tomaram um papel directo nas decises internacionais. E hoje em dia, muitas corporaes tm um papel visvel nas negociaes internacionais enquanto parceiros directos dos governos10. A influncia das organizaes intergovernamentais uma das marcas da governana global no campo da poltica ambiental, havendo mais de duzentas organizaes em forma de secretariados dos muitos tratados ambientais concludos nas ltimas duas dcadas. Outra caracterstica da governana global so as novas formas de jurisdio supranacionais. O Tribunal Internacional de Justia (TIJ) tem disponvel uma seco para a resoluo de disputas relacionadas com o meio ambiente, porm esta nunca foi utilizada. Em compensao, os novos tribunais que tm sido estabelecidos10 Veja-se o tema Actores Privados a seguir.

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recentemente, tais como os meios de resoluo de disputas da Organizao Mundial do Comrcio (OMC), o novo Tribunal Penal Internacional (TPI) e o Tribunal Internacional de Direito do Mar. 2.1.2. Actores Privados A governana global tambm se caracteriza pelas novas formas de cooperao, que vo para alm das negociaes intergovernamentais do direito internacional. A influncia dos actores no estaduais no est restringida apenas s negociaes. Cada vez mais, os actores privados fazem parte no desenvolvimento de normas e da sua implementao, o que demonstra a mudana do regime intergovernamental para o regime pblico-privado e o aumento da cooperao entre privados ao nvel global. Os actores privados tornaram-se parceiros dos governos na implementao de padres internacionais. At por vezes, os actores privados negociam entre eles os seus prprios padres. As instituies compostas por peritos e cientistas, embora estejam formalmente sob o controlo governamental, tm autonomia privada. E assim, a criao de leis atravs do modo tradicional das conferncias diplomticas, passa a ser substitudo pelas tais redes privadas, que embora muitas vezes sejam mais eficientes e transparentes, tambm podem levantar questes de legitimidade, pois no acatam nenhuma forma democrtica, nem de representao. 2.1.3. Fragmentao A governana global do meio ambiente marcada por uma segmentao vertical (com vrios nveis) e horizontal (mltiplos ao mesmo nvel). A crescente institucionalizao do mundo poltico reflete-se na poltica dos nveis nacionais e subnacionais. Os padres globais precisam de ser implementados e colocados em prtica a nvel local, da mesma maneira que a criao de normas a nvel global precisa de ser transposta para a realidade interna de cada pas. Trata-se da coexistncia entre a poltica subnacional, nacional, regional e global em cada vez mais reas, o que pode ocasionar tantos conflitos, como sinergias entre os diferentes nveis de actividade de regulamentao.

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Do mesmo modo, a crescente institucionalizao do mundo poltico a nvel global no ocorre de modo uniforme, de forma a abarcar com todas as partes da comunidade internacional. Muitas vezes o que ocorre que existe uma multiplicidade de regimes dentro da mesma estrutura normativa11. Podemos ento observar, nesses casos, a emergncia de polticas paralelas em importantes temas da sociedade internacional. As diferentes abordagens de polticas com segmentos horizontais e verticais colocam desafios, pois a falta de uniformidade pode comprometer o sucesso de outras posies adoptadas por grupos individuais de outros pases ou de polticas de outros nveis. Por outro lado, como veremos, a fragmentao pode tambm ter vantagens ou at mitigar os aspectos negativos, trazendo novas polticas que convergem com as abordagens paralelas.

2.2. Quadro Actual da Governana Ambiental Internacional Ao comparar o regime do meio ambiente com outros, tais como o regime do comrcio, da sade, da economia notrio que o primeiro carece de articulao e coerncia. H anos que se debate acerca dos desafios e responsabilidades ambientais em relao questo de uma instituio nica, gil e eficiente a nvel global, vinculada ou no, ONU, com o propsito de conseguir cumprir os objectivos ambientais delineados evitando a situao actual de fragmentao. As responsabilidades ambientais, em vez de se concentrarem dentro do Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), tm-se espalhado por inmeras instituies, sejam elas dentro do sistema da ONU, como a Organizao Mundial de Meteorologia, a Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO); entre programas da ONU, como o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Programa Mundial de Alimentao; comisses econmicas sociais regionais da ONU; instituies do sistema Bretton Woods, a Organizao Mundial do Comrcio (OMC), o Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), e outros. Isto s demonstra a disperso, sobreposio, falta de11 Tal como ocorre com o Protocolo de Montreal de 1987 sobre as substncias que agridem a camada de ozono, que sofreu muitas emendas estabelecendo novos prazos e padres a serem seguidos e que no foram aceitas por todas as partes que faziam parte do acordo inicial.

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articulao e coerncia nestas matrias, acentuando ainda mais as dificuldades para dar resposta aos desafios ambientais12. A fragmentao de que sofre o sistema ambiental actualmente pode ser enfatizada nos casos em que podemos demonstrar actividades ambientais em vrias reas, por exemplo, temos doze reas: agricultura, poluio atmosfrica, biodiversidade, qumicos, alteraes climticas, desertificao, energia, actividade piscatria, florestas, espcies invasivas, comrcio de espcies ameaadas de extino, e por fim, guas 13. Todas estas actividades so coordenadas por diferentes organizaes, localizadas em diferentes locais a nvel global, o que leva a dificuldades de coordenao de actividades e de comunicao. Partindo de apenas um exemplo, podemos identificar claramente tal situao, a matrias das guas objecto de trabalho do PNUMA em Nairobi, da UNESCO em Paris, da Organizao Mundial de Meteorologia em Genebra e do GEF em Washington, sendo que cada uma delas podem ter vises e objectivos diferentes sobre o tema. No centro do sistema econmico de governana global - no campo financeiro est a organizao internacional mais poderosa do mundo, o FMI (Fundo Monetrio Internacional), criado antes mesmo da ONU, quando ainda no havia preocupaes ambientais14. O envolvimento do FMI em programas, planos, ajustamentos estruturais e outras actividades, tem mais impacto do que a OMC em comrcio, investimento, desenvolvimento e economia em muitos pases em vias de desenvolvimento. O FMI participa com a ajuda em casos de emergncias (como tempestades, tornados, etc.), concedendo apoios atravs programas ad hoc durante crises financeiras, bem como ainda concedendo emprstimos sob condies que tragam benefcios ao meio ambiente. Embora outros programas e projectos, como os de reduo da pobreza e de crescimento12 Podemos citar como exemplo: Banco Europeu para a Reconstruo e Desenvolvimento (desenvolvimento de capacidades e desenvolvimento sustentvel); Organizao das Naes Unidas para Agricultura e Alimentao (silvicultura e agricultura sustentvel); Organizao Internacional do Trabalho (agricultura sustentvel); UNICEF (pobreza e o meio ambiente); PNUD (desenvolvimento sustentvel); PNUMA (poltica de coordenao); Comisso para o Desenvolvimento Sustentvel (implementao da Agenda 21); Banco Mundial (capacitao e desenvolvimento sustentvel); Organizao Mundial da Sade (qualidade da gua); Organizao Mundial do Comrcio (comercio e questes ambientais); entre outras. 13 IVANOVA, Maria - Architecture of Global Environmental Governance (Global Environmental Governance - Perspectives on the Current Debate). Center for UN Reform Education, New York, 2007. 14 Criado em 22 de Julho de 1944 / 27 de Dezembro de 1945, com o objectivo de promover a cooperao monetria internacional e facilitar a expanso e o crescimento equilibrado do comrcio internacional.

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econmico, visem conseguir crditos a baixo nvel, com a vertente virada para questes sobre a sade e a educao, em vez de focar em conjunto o meio ambiente. Ao longo do tempo, o Sistema Bretton Woods, o Grupo do Banco Mundial, passou de uma instituio singular de desenvolvimento econmico, para uma instituio de desenvolvimento econmico sustentvel, embora os valores ambientais permaneam em segundo lugar. A partir de 1995 com o GATT transformado em OMC, governando todos os campos comerciais e os relacionados com a matria. No entanto, esta organizao comea a sofrer grande relutncia dos pases do Sul, por ser uma organizao dominada por interesses dos pases do Norte, por isso com a Declarao de Doha15 foram introduzidos mais preocupaes e valores ambientais nas relaes comerciais16. 2.2.1. Globalizao e Meio Ambiente17 Ao explorar as ligaes existentes entre o meio ambiente e a globalizao, encontramos proposies que ligam as duas reas. Esta uma tarefa de primordial importncia para os decisores polticos, pois ambas as matrias tm uma influncia directa a nvel nacional e internacional, ao mesmo tempo que podem ser influenciadas pelas polticas nacional e internacional. 2.2.1.1. A acelerao da actividade econmica global e a demanda por recursos naturais As consideraes ambientais so essenciais para potencializar a globalizao. Sem elas no possvel atingir a prosperidade econmica. Essa noo demonstra que a presso exercida nos recursos naturais restringe os motores do crescimento econmico. A novidade est no desafio maior de atingir a prosperidade econmica contnua com a preservao desses recursos18.15 Realizada em Doha, capital do Qatar, em Novembro de 2001. 16 Na Conferncia Ministerial de Doha os membros da OMC reafirmaram o comprometimento com da proteco da sade e do meio ambiente; concordaram em entrar em uma nova rodada de negociaes comerciais, incluindo negociaes sobre alguns aspectos relacionados ligao entre comrcio e meio ambiente. 17 Em Fevereiro de 2007, Meio Ambiente e Globalizao foi o tema seleccionado pelos Frum Ambiental Global de Ministros do Meio Ambiente (GMEF). 18 NAJAM, A.; RUNNALLS, D.; HALLE, M. - Environment and Globalization, Five Propositions.

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As premissas dessa proposio so as seguintes: em primeiro lugar, os recursos naturais (petrleo, madeira, metais, etc.) e materiais que esto por detrs do crescimento econmico; em segundo lugar, muitos dos recursos naturais disponveis para o uso so finitos; em terceiro lugar, a quantidade de recursos que tem sido usada nos ltimos anos aumentou drasticamente, especialmente tendo em conta o crescimento dos pases em vias de desenvolvimento (como ndia e China), com aumento da prosperidade global; por ltimo, ns j estamos a ser vtimas do aumento da competio pelos recursos naturais. Todos estes factores levam concluso de que a degradao do processo ecolgico, especialmente dos sistemas mais frgeis que so indispensveis para a preservao do nosso essencial sistema de vida, pode causar uma ruptura no crescimento econmico global e tornar-se na maior ameaa a continuao da trajectria da globalizao. O conceito de crescimento um paradoxo no contexto do desenvolvimento econmico. Precisamos de crescimento econmico para ir ao encontro das necessidades dos povos, especialmente daqueles mais pobres, mas o crescimento global permanente impossvel num sistema finito. A partir do momento que a competio por recursos naturais escassos crescem, os preos tendem a aumentar. A perspectiva de aumento da procura, do crescimento dos preos e da diminuio dos stocks, j levam a corridas pelo controlo de alguns recursos principais que hoje no se restringem apenas ao petrleo, mas incluem tambm minerais, madeiras, metais e at mesmo lixo reciclvel. A grande procura aos recursos dos pases em vias de desenvolvimento proporciona uma oportunidade para sair da pobreza e de viabilizar o crescimento econmico. Um desafio paralelo que surge face a esta realidade, diz respeito diminuio dos efeitos adversos que a competio pelos recursos traz aos mais desfavorecidos 19. Como se sabe, existem populaes que dependem da extraco ou explorao de recursos naturais. Ora, se um recurso se tornar escasso devido sua explorao excessiva, estas populaes mais pobres correm o srio risco de ficarem sem o seu meio de sobrevivncia econmico, podendo vir a precisar de assistncia na transio para umInternational Institute for Sustainable Development. Ministry of Foreign Affairs of Denmark, 2007. 19 Apud HOMER-DIXON, T. - The Ingenuity Gap: Can Poor Countries Adapt to Resource Scarcity? Population and Development Review, Volume 21(3), Peace and Conflict Studies Program, University of Toronto, Canada, 1995.

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emprego alternativo. A degradao ambiental pode produzir impactos na produtividade atravs de danos sade20. Ignorar os valores ambientais tem custos elevados, as bacias hidrogrficas so construdas de modo a ser necessrio pagar por um determinado servio, enquanto que poderia ser possvel oferecer gua potvel praticamente sem despesas, se administrado de modo sustentvel, atravs do uso de algas como filtros. A diminuio da estabilidade ambiental gera condies hostis para o crescimento econmico e presses em relao cooperao internacional. A degradao ambiental pode vir a impor custos significantes globalizao e ao crescimento econmico. Porm a globalizao possui a promessa de melhorar o meio ambiente enquanto requisito central para o bem-estar humano em termos ecolgicos e econmicos. 2.2.1.2. Ameaas do processo de globalizao e da degradao ambiental Com a globalizao, a insegurana aumenta, emerge a violncia, a nvel mundial. A fora da globalizao juntamente com a degradao ambiental faz expandir o conceito de ameaa e de insegurana. O reconhecimento de ameaas provocadas por grupos no estaduais e por certos indivduos comeam a ser reconhecidos, assim como a noo de segurana comea a ser definida de modo mais abrangente, passando a incluir guerras entre Estados e dentro de um Estado, o crime transnacional organizado, deslocaes internas e migrao, armas nucleares, pobreza, doenas infecto-contagiosas e degradao ambiental. Por exemplo, a falta de gua potvel um dos maiores problemas dos pases mais pobres; chuvas cidas e oscilaes de temperatura esto associadas s alteraes climticas; evidncias comprovam que o mosquito da malria ir expandir com mais rapidez e facilidade; o aquecimento global ir elevar o nmero de ciclones e tempestades21. Estes factos e muitos outros influenciam a segurana humana, levando muitas vezes violncia. E no contexto da globalizao, violncia e insegurana viajam to rpido quanto as pessoas, os bens e os servios. A segurana visa proteger as pessoas de ameaas crticas e difusas, com o20 2.5 milhes de pessoas morrem todos os anos na sia por razes relacionadas com o meio ambiente, como poluio do ar, gua poluda e falta de higiene sanitria. Worldwatch Institute, 2006. 21 WORLD RESOURSES INSTITUTE et al., Chapter 1, Nature, Power and Poverty, Washington, D.C., 2005.

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objectivo de permitir a indivduos e comunidades a construo de vidas com dignidade. O estresse ambiental e a globalizao podem ameaar directamente a subsistncia das comunidades mais pobres. Para aqueles que ganham com o processo de globalizao ocorre um fenmeno de integrao; j para aqueles que perdem, ocorre um processo de marginalizao, e quanto mais prximos ficam os ganhadores uns dos outros, mais distantes eles ficam das partes perdedoras. Os resultados combinados da globalizao e da marginalizao, por um lado, tem efeitos positivos, tais como as novas tecnologias avanadas, reduo dos custos dos transportes, manuteno de alimentos em boas condies de sade mesmo com as longas distncias (peixes) e a possibilidade de compra de produtos no disponveis no mercado nacional. Por outro lado, essas foras que permitem esse conforto, levam drasticamente a reduo desses bens de consumo, o que pode acontecer, por exemplo, com peixes raros. Podemos afirmar que a globalizao muda os padres da dependncia ambiental. No contexto das alteraes climticas podemos verificar que h desafios em relao s questes de segurana, falta de gua, escassez alimentar e ao acesso limitado a minerais fundamentais como o petrleo. Historicamente estes pontos tm sido causa de gerao de violncia e guerra.22 Estas condies de insegurana e de conflitos impem custos altos para atingir o desenvolvimento sustentvel e criam barreiras globalizao. Ambos os processos exigem uma certa estabilidade. A degradao ambiental leva competio por recursos escassos e consequentemente vitria do mais forte e ainda geram conflitos e tenses sociais. A segurana o pr-requisito para a realizao dos benefcios do desenvolvimento sustentvel, bem como da globalizao. 2.2.1.3. Dever de cooperao dos pases mais prsperos H pontos que definem a trajectria da globalizao, bem como do processo ambiental. Para ilustrar esta situao basta considerar os exemplos das economias emergentes que dominam e dirigem o crescimento global - a China tornou-se o maior22 Tais como o conflito de diamantes entre grupos rebeldes em Angola e Serra Leoa, conflitos sobre a distribuio de lucros sobre a madeira e gs natural na Indonsia e o petrleo como razo da invaso do Iraque no Kuwait.

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exportador custa dos seus recursos naturais e a ndia detm a maior companhia de ao do mundo. O rpido crescimento dos pases em vias de desenvolvimento deveria ser acompanhado de reflexes das economias industrializadas sobre questes de consumo e desenvolvimento. Porque os pases emergentes so usados para ilustrar o rpido crescimento do mundo globalizado. No podemos esquecer que as grandes economias do Norte da Europa so ainda os principais motores de presso globalizao e ao processo ambiental e detm grandes responsabilidades. A maioria dos problemas ambientais que hoje enfrentamos no pertencem aos pases em vias de desenvolvimento, mas sim a uma era de industrializao do passado, que deve servir de exemplo a no seguir para no agravar os problemas ambientais actuais (em relao a sua escala de consumo e uso de recursos naturais). As economias emergentes devem, pelo menos, ter a oportunidade de desenhar o seu prprio futuro de modo a no cometer os mesmos erros do passado, escolhendo diferentes patamares de desenvolvimento em concordncia com as condies que possuem, com uma motivao de crescimento que no tiveram os pases no tempo da industrializao. Para tal, necessrio que os pases do Norte auxiliem os pases em vias de desenvolvimento23. 2.2.1.4. Padres de consumo e o futuro da globalizao e do meio ambiente O desafio central para o futuro do meio ambiente e da globalizao o consumo e no o crescimento. A populao global duplicou entre 1950 e 2004; o uso de madeira cresceu mais do dobro; o consumo de gua triplicou; o consumo de carvo, petrleo e gs natural cresceu em cinco vezes. Quando pensamos em consumo, temos em mente um desafio chamado desigualdade no mundo em que vivemos. Estes temas que so centrais tanto em relao ao futuro da globalizao, quanto ao futuro do meio ambiente. A soluo para resolver esta questo a de desligar o consumo do crescimento excessivo, do crescimento do desenvolvimento, oferecendo aos pases mais desfavorecidos a oportunidade de aumentar o uso dos seus recursos a um patamar que alcance o nvel sustentvel e que a23 FISHER-VANDEN, K.G.; JEFFERSON, H. Liu; Q. TAO - What is Driving China's Decline in Energy Intensity? Elsevier, Resource and Energy Economics, 2004.

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equidade global possa ser alcanada. Tecnologia um dos elementos essenciais para a melhoria do meio ambiente. As decises polticas internacionais ambientais iro influenciar as trajectrias do futuro do desenvolvimento, assim como as decises sobre consumo iro delinear a interaco entre globalizao e meio ambiente global. A tecnologia tornou-se um dos principais motores da globalizao moderna e tambm do processo ambiental; o transporte, por exemplo, tornou as distncias menores e o planeta ainda mais global, mas ao mesmo tempo gera poluio. As tecnologias permitem dispersar a prosperidade e aumentar a extraco de recursos, ocasionando o aumento da presso ao meio ambiente. No podemos esquecer que os avanos tecnolgicos tambm criam meios de diminuir a poluio (solues tecnolgicas que beneficiam o meio ambiente), que inevitavelmente determinam o futuro da globalizao e do meio ambiente global. Porm essa determinao feita dentro da demanda global de consumo. Ora, a tecnologia no pode mudar as demandas globais ou satisfazer todas as demandas, mas pode, atravs da globalizao, ir ao encontro da demanda de um modo amigo do ambiente. 2.2.1.5. Interdependncias entre o mercado e o meio ambiente globais Grande parte da poltica ambiental , de facto, baseada na criao, regulamentao e administrao de mercados. O maior exemplo a Conveno de CITES24 (Conveno sobre o Comrcio Internacional de Espcies da Fauna e da Flora Selvagem Ameaadas de Extino), at mesmo instrumentos menos bvios como a Conveno sobre as Alteraes Climticas25 (Conveno Quadro das Naes Unidas sobre Alteraes Climticas - CQNUAC) ou a Conveno da Biodiversidade26 (Conveno Sobre a Diversidade Biolgica) operam em mercado. Para os gestores dessas interaces de mercado a concluso a de que no se pode separar polticas de mercado das polticas ambientais, pois existe uma sinergia24 O objectivo da Conveno de CITES o de assegurar que o comrcio de animais e plantas no ponha em risco a sua sobrevivncia no estado selvagem e regular a comercializao (exportao) de espcies ameaadas de extino e de outras que possam vir a ser ameaadas de extino como consequncia dessa comercializao. 25 A reduo certificada dos gases de efeito estufa do origem aos "Crditos de Carbono" que podem ser comercializados dentro de um esquema de mercado internacional, compensando as metas no atingidas pelos compromissados. 26 Acordo suplementar Conveno Sobre a Diversidade Biolgica para tratar os riscos em potencial oferecido pelo comrcio transfronteirio e liberaes acidentais de transgnicos.

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entre os objectivos comerciais e o sistema ambiental, visando ambos trabalhar no contexto do desenvolvimento sustentvel. Tendo em conta que o comrcio internacional o principal motor da globalizao, o desenvolvimento sustentvel deveria ser considerado o principal objectivo da globalizao, pois est inserido na meta do sistema comercial internacional. A integrao do meio ambiente na poltica e no comrcio tende a intensificar-se cada vez mais. O objectivo maior que ambas as reas procurem alcanar o desenvolvimento sustentvel atravs da colaborao27. Trata-se de saber como o meio ambiente e as dinmicas de mercado interagem de modo atingir o potencial da globalizao e da melhoria do meio ambiente. O reconhecimento da necessidade da integrao comrcio-ambiente pode ser visto no campo comercial, atravs da Declarao de Doha28 que reafirma o desenvolvimento sustentvel como objectivo da poltica comercial. A seguir, a Conferncia de Joanesburgo29 em 2002 enfatizou, em relao matria ambiental, a conexo entre comrcio-meio ambiente. De qualquer maneira, a mudana que deve ocorrer da forma de declarao para a forma de regulamentao, exige mudanas institucionais no sistema de governana global, pois o quadro que foi institudo visa manter os dois tipos de matrias em contextos diferentes, em vez de inspirar a colaborao para atingir objectivos comuns. O mercado global e o meio ambiente global so realidades intrnsecas e esto cada vez mais prximas atravs de mecanismos de comrcio internacional, de manifestaes de estresse ambiental, da mudana da sobrevivncia das pessoas, das27 Tendo em conta que a preocupao maior aqui, vai alm do futuro da OMC e do PNUMA. 28 Recorde-se que os objectivos da declarao de Doha propunham alcanar so: melhorias substanciais no acesso aos mercados; reduo de todas as formas de subveno exportao, visando a sua eliminao; redues substanciais dos apoios e ajudas internas com efeitos de distoro sobre o funcionamento dos mercados, nomeadamente em relao ao comrcio dos produtos agrcolas; transparncia nas regras de conduo das polticas econmicas e financeiras dos diversos Estados membros; as relaes entre o comrcio e o investimento; interaco do comrcio e da poltica da concorrncia; transparncia dos mercados pblicos; acesso aos mercados para os produtos no agrcolas; polticas do comrcio de servios, envolvendo a Banca e os servios financeiros; comrcio electrnico; comrcio e transferncia de tecnologias; aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comrcio (APDIC); tratamento especial e diferenciado em relao aos pases menos desenvolvidos. 29 Os temas tratados e objectivos fixados na Conferncia de Joanesburgo reflectem, portanto, as actuais preocupaes internacionais mais importantes sobre o Desenvolvimento Sustentvel e revelam as formas que esto a ser postas em execuo (ou que se pretende que sejam postas em aco) para operacionalizar o conceito de Desenvolvimento Sustentvel, aos seus vrios nveis, nas suas diversas dimenses e em diferentes territrios.

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aces de empresrios e da sociedade civil; porm o processo de regulamentao das reas ainda esto separadas e apenas ocasionalmente interagem. Algum avano tem sido feito nesse sentido, na criao de leis em conjunto. Mas para a mudana ser significativa preciso identificar um objectivo comum de desenvolvimento sustentvel, tornando-se esse o condutor principal das polticas ambientais e comerciais ao nvel internacional.

2.3. Passos para a Aco Uma melhor governana ambiental global a chave para administrar a globalizao e o meio ambiente internacional, bem como a relao que existe entre ambas as matrias. O processo de globalizao e as preocupaes crescentes com o meio ambiente no podem estar imunes influncia poltica, a verdade que a direco da globalizao, do meio ambiente global e da interaco de ambos ir levar anos para ser desenhado pelas decises polticas do futuro. Governana ambiental global o ponto central para aco dos governantes de hoje. Em termos de globalizao e meio ambiente, h importantes objectivos a ter em conta quanto o sistema de governana global tal qual ele hoje existe30. 2.3.1. Administrao Institucional da Fragmentao Ainda que hoje em dia existam vrios rgos dentro dos sistemas que tratam de problemas ambientais, os esforos destas instituies carecem de coordenao e coerncia. Os meios que visam o funcionamento organizado dos sistemas ou no existem, ou no so bem utilizados. A arquitectura institucional que temos prende-se em tratar de temas que so caracterizados por serem estresses actuais do meio ambiente, da globalizao e de temas relacionados, como o comrcio, o investimento, a alimentao, a sade, etc. Existe uma necessidade de reforma da governana global de modo realmente significante, atravs da criao de um sistema de mecanismos viveis e que trabalhem30 NAJAM, A.; RUNNALLS, D.; HALLE, M. - Environment and Globalization, Five Propositions. International Institute for Sustainable Development. Ministry of Foreign Affairs of Denmark, 2007.

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em conjunto e em harmonia, de modo mais eficiente e efectivo do que o que se tem apresentado at agora. 2.3.2. Ampliao do Sistema Estado-Centrista A arquitectura do nosso sistema de governana internacional permanece centralizado no Estado, mesmo que os problemas e as solues no o sejam. Em termos de dinmica - meio ambiente, globalizao, sociedade civil, actores de mercado - todos tm papis importantes no estabelecimento, na direco e na sequncia dos eventos. Sejam companhias a criarem normas e padres ou ONGs estabelecendo estruturas voluntrias, o sistema no apenas formado por Estados. A sociedade civil e os empresrios esto a cada dia mais integrados nos mecanismos de governana global. Para alm disso, esse processo necessita de ser aprofundado e acelerado atravs de meios significativos, para poderem ser considerados como verdadeiros parceiros da governana. 2.3.3. Coordenao e Coerncia entre as Instituies Nos ltimos anos houve uma srie de iniciativas para uma reforma institucional internacional e nos prximos outras iniciativas sero apresentadas nessa matria. Algumas focam a necessidade de uma reforma organizacional relacionada com a administrao, a operao, o financiamento, os modos gerais de funcionamento e a estrutura; outras propostas definem que a chave da reforma o fortalecimento de determinadas instituies em reas especficas31. O sucesso dessas iniciativas importante para o sistema ser eficiente e esse processo deveria ser apoiado e fortalecido. Mais coerncia e coordenao deveriam ser uma prioridade em matria ambiental, tal como ocorre com os temas relacionados com o sistema de governana global, com o sistema de financiamento, com o sistema de apoio ao desenvolvimento econmico global, entre outros. Temos que ter em conta os outros elementos do sistema que trabalham em conjunto atravs de uma viso partilhada, pois h ligaes entre instituies que lidam31 Tal como veremos adiante propostas que estabelecem o reforo do PNUMA.

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com questes relacionadas (mesmo que cada uma delas tenha escolhido modalidades diferentes entre elas), como, por exemplo, o que acontece com o meio ambiente e o comrcio. A coordenao ao nvel global entre diferentes instituies poderia aumentar a interaco entre o meio ambiente e o comrcio a nvel internacional e tambm a nvel nacional. 2.3.4. Actores de Diferentes Nveis Orientados numa Aco Para responder efectivamente aos desafios que impe o meio ambiente e a globalizao preciso encontrar um modo novo e efectivo de conciliar actores no estaduais - sociedade civil, empresrios - na governana, em termos de elevar o conceito de parceria a um nvel mais alto. Ou seja, no apenas no sentido de partilhar objectivos e prioridades, mas tambm num sentido de partilhar responsabilidades e aces conjuntas. 2.3.5. Interaco entre Polticas Ambientais e Econmicas Os instrumentos existentes, relacionados com o meio ambiente e com a globalizao, tendem a inclinarem-se numa destas direces, ou para a poltica ambiental, ou para a poltica econmica. De qualquer modo, temos de pensar em instrumentos novos que provenham no de uma das duas dinmicas (poltica ambiental e poltica econmica), mas da interaco das duas. H uma necessidade e oportunidade para uma integrao desse trabalho em mecanismos globais e nacionais, que acolha princpios de responsabilidade global, com valores econmicos e ecolgicos. 2.3.6. Segurana e Meio Ambiente Dentro da governana global h outra rea que tambm merece ateno, e que a da segurana. As instituies a quem hoje compete discutir as questes relacionadas com a segurana, permanecem presas a um conceito muito restrito 32. necessrio alargar o mandato das organizaes em relao segurana global, de modo a incluir32 O Conselho de Segurana, por exemplo, lida com conflitos, mas no actua em matria ambiental.

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neste conceito, questes da segurana ambiental. 2.3.7. Desenvolvimento Sustentvel como Objectivo Comum As discusses sobre o meio ambiente ainda que realizadas a nvel global, pela sua prpria dinmica, levam a implicaes a nvel nacional e local. Para que todos possam tirar benefcios deste processo de globalizao e da minimizao das ameaas de degradao ambiental imperativo saber usar todas as funes que incluem preparao, informao e desenvolvimento das capacidades, como sejam, por exemplo, investimentos realizados, principalmente nos pases em desenvolvimento, que podem trazer benefcios a longo prazo, realizando assim o conceito de desenvolvimento sustentvel33. Por fim, necessrio ainda avaliar melhor o pleno potencial da globalizao, dos custos totais para o meio ambiente e das interaces globais. Para que se torne possvel adoptar qualquer uma das propostas que aqui sero indicadas, ser necessrio mais informaes e mais anlises do que ns temos presentemente34. Embora no seja possvel responder a todas estas questes, vivel obter indicativos atravs de avaliaes. A conduo sistemtica de estudos importante no apenas para responder s questes que surgem e outros temas importantes, mas tambm para encontrar opes que ainda no foram exploradas e criar espaos para a discusso dessas novas opes num enquadramento poltico.

33 Como j foi dito, a globalizao tem um grande potencial de trazer benefcios para a prosperidade econmica dos pases mais desfavorecidos. 34 Millennium Ecosystem Assessment, 2005.

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3. Principais Instituies e Regimes relacionados com o Meio Ambiente

3.1. rgos da Organizao das Naes Unidas35 Os principais rgos da ONU so a Assembleia Geral, o Conselho Econmico e Social, o Conselho de Segurana, o Tribunal Internacional de Justia e o Secretariado, mas as agncias especializadas, os rgos subsidirios e as agncias relacionadas que tm responsabilidades ambientais no seu mandato tm-se tornado cada vez mais importantes. Contudo apenas o Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), a Comisso de Desenvolvimento Sustentvel (CDS) e o Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF) esto directamente relacionados com a governana ambiental internacional. 3.1.1. rgos Principais36 3.1.1.1. Assembleia Geral A Assembleia Geral o principal rgo de definies de polticas do sistema das Naes Unidas. Tem uma composio universal37 e um mandato muito abrangente. Assim sendo, o frum apropriado para discusses nas matrias relacionadas com o meio ambiente, embora os seus poderes sejam limitados a meras recomendaes que no tm fora obrigatria para os Estados-Membros. 3.1.1.2. Conselho Econmico e Social das Naes Unidas (ECOSOC) O ECOSOC est directamente relacionado com as questes ambientais. Este35 IWAMA, Toru - International Environmental Governance, Gaps and Weaknesses, Proposals for Reform, Multilateral Environmental Institutions and Coordinating Mechanisms. United Nations University, Institute of Advanced Studies, 2002. http://www.ias.unu.edu 36 Iremos fazer uma anlise sinttica em relao aos principais rgos da ONU, com o objectivo de facilitar a compreenso sobre as instituies existentes em matria ambiental. 37 Agenda 21 reconhece a Assembleia Geral como the supreme policy-making forum, no captulo 38.1.

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rgo recebe e passa Assembleia Geral os relatrios do Conselho de Administrao do PNUMA. A Comisso de Desenvolvimento Sustentvel foi criada como uma comisso funcional do ECOSOC pela Assembleia Geral para assegurar a efectivao das decises tomadas na Conferencia do Rio, em 1992. 3.1.1.3. Conselho de Segurana O mandato do Conselho de Segurana consiste assegurar a remoo das causas de conflitos, antes que estas se tornem ameaas paz e segurana internacionais. muito difcil conceber a ideia de que ameaas ao meio ambiente, que no envolvem guerra e recursos militares, possam vir a ser consideradas ameaas internacionais. De qualquer maneira, h obstculos polticos e legais que permitem clarificar se uma ameaa ambiental poderia vir a ser interpretada como uma ameaa segurana internacional. E, neste caso, o Conselho de Segurana poderia invocar a violao de regras internacionais. 3.1.1.4. Tribunal Internacional de Justia O Tribunal Internacional de Justia (TIJ), enquanto principal rgo judicial da ONU, tem o poder de decidir legalmente sobre disputas a ele submetidas pelas partes. Essas disputas podem ter cariz ambiental. A partir dos anos 80, a maioria dos tratados e convenes sobre proteco ambiental, passaram a incluir provises sobre a submisso de disputas ao TIJ em relao sua interpretao e aplicao. 3.1.1.5. Secretariado O Secretariado fornece servios administrativos Assembleia Geral e aos seus rgos subsidirios. O Secretario-Geral o rgo executivo do Secretariado, tem pouco poder formal, mas pode ter grande influncia no curso dos eventos relacionados com a matria ambiental. 3.1.2. Agncias Especializadas Algumas agncias, embora no tenham como escopo principal a proteco ambiental, esto de alguma maneira atribudas de responsabilidade e envolvidas com a

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governana ambiental internacional38. 3.1.2.1. Organizao das Naes Unidas para Agricultura e Alimentao (FAO) Trata-se de uma organizao da ONU que visa melhorar os nveis de nutrio e de desenvolvimento rural dos pases em vias de desenvolvimento. As suas actividades esto relacionadas com o meio ambiente porque envolvem alimentos, agricultura, actividades piscatrias, bem como a conservao de recursos naturais e estimulam o uso de energias renovveis. 3.1.2.2. Banco Internacional para a Reconstruo e Desenvolvimento (BIRD) O BIRD oferece assistncia aos pases em vias de desenvolvimento, concedendo crditos para investimentos. Porm condiciona a concesso destes, ao respeito a determinados padres amigos do meio ambiente, visando assim o desenvolvimento sustentvel. 3.1.2.3. Organizao Internacional do Trabalho (OIT) A OIT uma agncia das Naes Unidas especializada nas questes laborais, que visa defender o direito dos trabalhadores. Preocupa-se com as condies de trabalho relacionadas com o meio ambiente em temas como a contaminao do ar, rudos, vibraes, uso de produtos qumicos, segurana e sade na agricultura e nas minas, preveno de acidentes industriais, entre outros temas. Recentemente fomenta os empregos verdes, ou seja, trabalho decente em mundo sustentvel e com baixas emisses de carbono39. 3.1.2.4. Organizao Martima Internacional (IMO) A IMO uma agncia especializada vinculada ONU, tem como objectivo padronizar e controlar as regras de navegao, segurana e meio ambiente marinho, visa ainda a cooperao tcnica e certificao de profissionais e embarcaes; em suma responsvel pela padronizao mundial da indstria martima (navegao, construo naval, pescas e portos).38 No faremos uma descrio pormenorizada, uma vez que esse no o objecto do nosso estudo. 39 Esto relacionados com o uso de tecnologias ambientais adaptadas a reduo de emisso de carbono.

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3.1.2.5. Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO) A UNESCO uma agncia especializada do sistema da ONU, seu objectivo contribuir para a paz e segurana no mundo atravs da educao, cincia, cultura e comunicao. As tarefas compreendem orientar os povos com vista uma gesto eficaz do seu desenvolvimento atravs do uso correcto dos recursos naturais, sem perder a identidade de cada cultura; foca-se ainda em actividades que visam a preservao e defesa do meio ambiente. Para a UNESCO, um dos pilares do desenvolvimento sustentvel a educao das mulheres e dos jovens, a par da formao de professores, educadores, formadores, bem como da sensibilizao dos media. 3.1.2.6. Organizao das Naes Unidas para o Desenvolvimento Industrial (ONUDI) A ONUDI uma instituio cujo foco a promoo e acelerao de oportunidades de desenvolvimento industrial em pases em vias de desenvolvimento, atravs da organizao de encontros de negcios, programas de transferncia de tecnologia e parcerias estratgicas, com respeito ao desenvolvimento econmico sustentvel e ao meio ambiente. 3.1.2.7. Organizao Mundial da Sade (OMS) Trata-se de uma agncia especializada subordinada s Naes Unidas, tem por objectivo desenvolver o melhor nvel de sade de todos os povos40. A OMS desenvolve trabalhos relacionados com a disseminao da informao, programas e matrias relacionadas com o meio ambiente em geral, uma vez que um ambiente saudvel essencial para a sade humana. Algumas temas que a OMS tem desenvolvido relacionam as alteraes climticas e afectao sade41, o risco de epidemias globais, entre outros.40 A sade est definida como um estado de completo bem-estar fsico, mental e social e no consistindo somente da ausncia de uma doena ou enfermidade. 41 A Organizao Mundial de Sade sugere que as alteraes no clima possam causar 160 mil mortes por ano na populao de pases em vias de desenvolvimento. Segundo a organizao, as vtimas sofrem de problemas relacionados ao aquecimento global e este nmero estimado deve dobrar at 2020. As maiores vtimas continuam sendo as crianas, com problemas como a malria, a subnutrio e a diarreia.

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3.1.2.8. Organizao Mundial de Meteorologia (OMM) A OMM uma agncia especializada da ONU que promove a cooperao a nvel mundial de observaes relacionadas com a meteorologia; promove a criao e manuteno de centros destinados prestao de servios meteorolgicos e afins; fomenta trocas de informaes, publicaes e a aplicao das suas matrias em outras reas, tais como a navegao e aeronutica. A OMM incentiva a investigao e pesquisa sobre a poluio, incluindo as alteraes climticas, diminuio da camada de ozono, previses de tempestades tropicais, etc. 3.1.3. rgos subsidirios Embora haja mais de trinta agncias e programas envolvidos com questes ambientais, implementao da Agenda 21 e desenvolvimento sustentvel, apenas algumas destas esto mais ligadas ao meio ambiente. So estas as seguintes: o PNUMA42, a CDS que surgiu de conferncias da ONU com o objectivo de travar a degradao ambiental e de perseguir o desenvolvimento sustentvel (ambas esto sujeitas interesses polticos e sofrem pela falta de efectividade dos seus mandatos)43 e ainda o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). 3.1.3.1. O Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) O PNUMA foi criado em 1972, como resultado da Conferncia sobre Meio Ambiente Humano realizada em Estocolmo, Sucia. Pertence ao sistema ONU e responsvel por catalisar a aco internacional e nacional para a proteco do meio ambiente no contexto do desenvolvimento sustentvel44. Seu mandato promover liderana e encorajar parcerias no cuidado ao ambiente, inspirando, informando e42 De todos os rgos subsidirios vamos dar ateno especial ao PNUMA pois importante saber mais acerca rgos para compreendermos as propostas relativas governana que vamos trabalhar mais a frente. 43 Os rgos subsidirios so estabelecidos pela Assembleia Geral ou por outras subdivises do sistema das Naes Unidas. 44 O mandato e objectivos do PNUMA esto definidos na resoluo 2997 (XXVII) da Assembleia Geral da ONU de 1972, na Agenda 21, na Declarao de Nairobi de 1997, na Declarao de Malm de 2000 e nas recomendaes sobre governana ambiental internacional aprovadas na Cpula de Desenvolvimento Sustentvel de 2002.

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capacitando naes e povos a aumentar sua qualidade de vida sem comprometer a das futuras geraes45. A sede est localizada em Nairobi, no Qunia e ainda possui escritrios regionais em Bancoc (Tailndia), Genebra (Sua), Cidade do Mxico (Mxico), Washington D.C. (Estados Unidos), e Manama (Barm). 3.1.3.1.1. Composio Em 1999, a Assembleia Geral da ONU apoiou a criao de um Frum Anual de Ministros, onde so revisadas as polticas ambientais importantes, chamado Frum Ambiental Ministerial Global (GMEF), que se rene anualmente durante as sesses regulares e especiais do Conselho de Administrao do PNUMA, que por sua vez, responde Assembleia Geral da ONU atravs do Conselho Econmico e Social. Composto por 58 naes que so representadas no Conselho Administrativo do PNUMA, so eleitos pela Assembleia Geral, por um perodo de quatro anos, com respeito pelo princpio da representao regional equitativa. O Director Executivo do PNUMA responsvel pelas actividades do Secretariado e da administrao. 3.1.3.1.2. Objectivos e funes O PNUMA o rgo principal dentro da ONU para a proteco ambiental. Foi estabelecido enquanto rgo subsidirio da Assembleia Geral das Naes Unidas para trabalhar como um catalisador de actividades e de programas dentro da ONU, promove a cooperao ambiental internacional atravs do desenvolvimento de instrumentos de poltica, o ponto principal de aco e coordenao avanada com as convenes ambientais dentro do sistema da Naes Unidas, foca-se ainda na avaliao do meio ambiente, alertas precoces, transferncia de tecnologia e apoio aos pases em vias de desenvolvimento. O PNUMA tem essencialmente as funes de monitorizao, avaliao e relato do estado do meio ambiente global; prepara uma agenda de aco e o estabelece de um processo para a criao de orientaes, padres e polticas ambientais; desenvolve a capacidade institucional com vista a resolver os problemas existentes e prevenir os futuros46. O PNUMA tem o objectivo de funcionar como uma instituio central para o45 http://www.onu-brasil.org.br/agencias_pnuma.php 46 IVANOVA, Maria - Can the Anchor Hold? Rethinking the United Nations Environment Programme for the 21st Century. Yale Center for Environmental Law and Policy, 2005.

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meio ambiente global, porm s parcialmente tem atingido os seus propsitos, quanto a monitorizao, avaliao e lanamento de acordos ambientais. No entanto, tem conseguido ser um frum para os Ministros do Meio Ambiente de todo o mundo e auxilia no desenvolvimento de capacidades institucionais. Todavia, o PNUMA tem falhado na construo das suas polticas de um modo coordenado e coerente e no conseguiu acolher as inmeras convenes sobre o meio ambiente. Sem um rgo central, a governana do meio ambiente s pode crescer de maneira complexa e fragmentada. O Secretariado do PNUMA tem que lidar com uma srie de questes da poltica internacional sobre o meio ambiente e no apenas de uma matria nica. Embora seja o rgo principal em matria ambiental na ONU, um rgo que precisa de dar prioridade a determinadas matrias em detrimento de outras, pois no tem capacidade de resolver todos os problemas vo surgindo no seu mbito. O conjunto de programas do PNUMA inclui pesquisas, colecta e coordenao de dados, publicaes, patrocnio de negociaes para a concluso de tratados e o estabelecimento de rgos para o meio ambiente, bem como a adopo de directrizes e outros tipos de soft law. 3.1.3.1.3. Profissionais e procedimentos Um dos recursos mais fortes do PNUMA a sua composio por profissionais especializados em matrias ambientais e que contribuem para a grande influncia poltica desta instituio. Com base em avaliaes ambientais tm sido identificados muitos riscos ambientais e muitas tendncias ecolgicas. Tipicamente as avaliaes ambientais so conseguidas atravs do prprio PNUMA, com suas capacidades para alertar previamente quando esteja em causa uma ameaa ambiental ou atravs da troca de informao entre profissionais especializados. Em alguns casos, o Secretariado do PNUMA pode criar equipas de peritos/especialistas de modo institucionalizado, tal como ocorre no Painel Intergovernamental sobre as Alteraes Climticas. O sistema realizado atravs de peritagens independentes tem sido um padro adoptado na poltica internacional ambiental, assim como para a realizao de avaliaes ou de monitorizaes (includos nos acordos). O PNUMA est ligado a organizaes no governamentais (ONGs) e a

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instituies de pesquisa, mantm relaes com profissionais especializados dos governos a nvel nacional. Enquanto que a informao dos profissionais sobre a complexidade do sistema ecolgico ser naturalmente mais forte nos departamentos de cincia e nas instituies principais de pesquisa, no PNUMA representa-se um centro de informao global sobre o meio ambiente. O Secretariado do PNUMA adquiriu o estatuto de autoridade intergovernamental no Direito Internacional Ambiental, em virtude da necessidade de ter peritos legais e de criar capacidades no direito ambiental enquanto prioridades de trabalho. Como no campo ambiental faltam meios de execuo, h um forte prevalecimento de soft law, que tem sido usado pelo PNUMA como meio para se conseguir com a cooperao internacional. A combinao dos peritos em meio ambiente e do direito internacional com os peritos do Secretariado do PNUMA (enquanto instituio que visa promover a cooperao internacional em matria ambiental) o maior recurso de que se dispe, embora faltem meios financeiros e autonomia formal. 3.1.3.1.4. Influncia cognitiva O PNUMA tem contribudo fortemente para estabelecer a esfera cognitiva da governana ambiental internacional atravs da administrao e gesto da agenda poltica em matria ambiental47. Alguns exemplos podem ser dados, tais como sejam: as deliberaes tomadas relativas ao empobrecimento da camada de ozono e da perda da biodiversidade; os discursos acerca dos poluentes qumicos e de resduos perigosos; catalisou aco internacional quanto a desertificao; incitou os governos a tomarem aces relativas poluio marinha; juntamente com a Organizao Mundial Meteorolgica, incitou a criao do Painel Intergovernamental sobre as Alteraes Climticas48. 3.1.3.1.5. Influncia normativa O PNUMA tem influncia normativa principalmente em duas reas: em primeiro47 BAUER, Steffen - The Catalytic Conscience UNEP's Secretariat and the Quest for Effective International Governance. Global Governance, Working Paper, N 27, Global Governance Project, 2007. www.glogov.org 48 Veja-se p. 29 em Contribuies.

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lugar, em matria de cooperao intergovernamental, mais especificamente em acordos multilaterais ambientais e, em segundo lugar, tem influncia sobre a arquitectura geral das instituies do meio ambiente. O PNUMA facilita as negociaes internacionais do meio ambiente. De facto, oferece servios de secretariado desde a sua negociao original implementao subsequente, para alm de servir de memria das negociaes que estejam ainda na fase de negociao. A actividade do Secretariado em estimular e sustentar as negociaes intergovernamentais e tambm a cooperao entre agncias, atravs de uma combinao das abordagens cientficas, legais e administrativas, serve de exemplo para a institucionalizao do processo poltico a nvel internacional. Em relao influncia que exerce na arquitectura da governana do meio ambiente, o PNUMA um interessado, demonstra a sua viso nas discusses que esto em fase de negociao. As questes pertinentes em relao ao PNUMA quanto fora que exerce na governana foram enfatizadas no processo de Cartagena49 (Colmbia). Os ministros do meio ambiente adoptaram a deciso SS.VII/1 e o informe do grupo intergovernamental continha recomendaes para o fortalecimento da governana ambiental internacional, para o fortalecimento da coerncia na tomada de deciso de polticas ambientais, para o papel e financiamento do PNUMA. E ainda sobre como melhorar a coordenao entre os acordos ambientais multilaterais e a implementao dos mesmos, sobre desenvolvimento de capacidades, transferncia de tecnologia e coordenao nacional. 3.1.3.1.6. Influncia executiva O PNUMA no foi constitudo para ser uma agncia de implementao. Porm o Plano Estratgico de Bali50 implica uma rara excepo (visa apoio tecnolgico e desenvolvimento de capacidades), pois o PNUMA tem conseguido respostas por parte dos governos. De qualquer modo, o PNUMA no tem mandato, nem recursos para poder inserir-se em projectos de implementao, no uma agncia com o sentido que49 Sobre a deciso SS.VII/1 sobre governana ambiental internacional adoptada em Cartagena em 15 Fevereiro de 2002. 50 Adoptado em Dezembro de 2007, em Bali, Indonsia, em relao ao futuro do regime climtico internacional aps 2012- Plano Estratgico de Bali para Suporte Tecnolgico e Desenvolvimento de Capacidades.

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tm o Banco Mundial e o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento. 3.1.3.1.7. Problemas estruturais O PNUMA sofre de problemas estruturais desde o incio da sua criao, possuindo caractersticas vindas de um sistema internacional ps-colonial e da diviso entre o Norte e o Sul, que tem prejudicado o trabalho de muitas agncias das Naes Unidas. A divergncia de prioridades entre Norte e Sul, so conhecidas e salientadas nos encontros do Conselho Administrativo. Por um lado temos os pases em vias de desenvolvimento (G-77 e China) que clamam pelos seus direitos ao desenvolvimento econmico e pela responsabilidade dos pases do Norte pela poluio global. Os pases desenvolvidos, por sua vez, dizem que o direito ao desenvolvimento no inclui o direito a poluir e que os pases em vias de desenvolvimento no devem repetir os erros dos pases ricos, que no viram a deteriorao do meio ambiente global e as interdependncias ecolgicas que s foram compreendidas muito depois da revoluo industrial. Os pases desenvolvidos visam cooperar com os pases em vias de desenvolvimento no que toca a criar solues de problemas que no podem ser resolvidos dentro da sua jurisdio. O PNUMA no pode seguir apenas os interesses dos pases do Sul, ou ento no poderia contar com o apoio dos pases do Norte nas suas actividades. O problema estrutural requer que o PNUMA faa a governana ambiental conciliando os pases em vias de desenvolvimento com a satisfao das expectativas dos pases industrializados. O problema estrutural da governana internacional do meio ambiente que esses factores restringem a margem de manobra do Secretariado e obrigam a agir com cautela, ao mesmo tempo que criam oportunidades de administrar as suas prioridades de acordo com as suas prprias preferncias e comparar idealmente as vantagens das suas aces.51 3.1.3.1.8. Poltica O PNUMA, enquanto mero programa sob os auspcios do ONU, tem uma51 BAUER, Steffen - The Catalytic Conscience UNEP's Secretariat and the Quest for Effective International Governance. Global Governance Working Paper, N 27, 2007. www.glogov.org

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posio peculiar dentro do sistema das Naes Unidas. Por um lado, designado como a nica agncia para todas as polticas ambientais, enquanto que se o compararmos com Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) vemos que este est rodeado por uma srie de agncias com mandatos relacionados com o desenvolvimento; por outro lado, uma entidade pequena, com autoridade formalmente limitada e com escassos recursos. Torna-se claro que o PNUMA no tem como cumprir o seu mandato numa rea onde a poltica fragmentada e onde a actividade de outras agncias influencia o curso da governana global do meio ambiente. Os constrangimentos do PNUMA exercem influencias ainda sobre o conceito de desenvolvimento sustentvel, pois no claro at que ponto o meio ambiente exerce influncia nessa matria. Em 1987, com a Comisso de Brundtland, em 1992, na Cimeira da Terra e em 2002, na Cimeira de Joanesburgo, ficou clara a existncia de um forte distanciamento entre as competncias das agncias ambientais e as das agncias de desenvolvimento. Para alm disso, o Conselho Administrativo do PNUMA participou na Agenda 21, mesmo sem estar preparado para tal desafio. O PNUMA sofreu fortes mudanas no seu papel na governana global ambiental com a criao da CDS e do Fundo Global para o Meio Ambiente; as actividades dos programas chocam muitas vezes com as de outras agncias de desenvolvimento, como as do PNUD e as do Banco Mundial; a adopo de outras convenes tirou do domnio do PNUMA reas que antes eram da sua competncia, tais como ocorreu com a Conveno Quadro das Naes Unidas sobre Alteraes Climticas e com a Conveno das Naes Unidas sobre o Combate Desertificao, que so administrados por secretariados independentes das Naes Unidas; a emergncia de novos actores, a intervirem no campo de trabalho do PNUMA, diminuiu ainda mais a sua posio dentro da ONU. O PNUMA ainda tem parte da implementao dos Objectivos do Milnio52 e do Plano de Joanesburgo. O seu Secretariado ainda intervm em domnios polticos que pertencem a outras agncias, tais como desenvolvimento scio-econmico, educao e52 Em 2000, durante a assembleia geral da ONU, 189 chefes de Estado e de Governo assinaram a Declarao do Milnio que levou formulao de oito objectivos de desenvolvimento especficos, a alcanar at 2015 que so: reduzir para metade a pobreza extrema e a fome; alcanar o ensino primrio universal; promover a igualdade entre os gneros; reduzir em 2/3 a mortalidade de crianas; reduzir em 3/4 a taxa de mortalidade materna; combater a SIDA, a malria e outras doenas; garantir a sustentabilidade ambiental; e criar uma parceria mundial para o desenvolvimento.

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sade. 3.1.3.1.9. Contribuies O PNUMA tem conseguido sucessos na contribuio para a criao de leis ambientais. J na dcada de setenta estimulou acordos regionais e internacionais sobre o controle da poluio marinha. Uma das suas maiores contribuies foi o Programa dos Mares Regionais que juntou vrios programas e Planos de Aco53. O PNUMA oferece tambm servios de secretariado a seis dos dezoito Programas dos Mares Regionais existentes54. No progressivo desenvolvimento do direito internacional ambiental, o PNUMA incentivou as negociaes internacionais com vista concluso de acordos ambientais multilaterais, tais como: a Conveno de Viena para a Proteco da Camada de Ozono de 1985 (Conveno de Viena); o Protocolo de Montreal sobre Substncias que Empobrecem a Camada de Ozono de 1987 (Protocolo de Montreal); a Conveno da Basileia sobre o Controle dos Movimentos Transfronteirios dos Resduos Perigosos e Sua Eliminao de 1989 (Conveno da Basileia); a Conveno de Roterdo Relativa ao Procedimento de Prvia Informao e Consentimento para Determinados Produtos Qumicos e Pesticidas Perigosos no Comrcio Internacional de 1998 (Conveno de Roterdo); e, por fim, a Conveno sobre Conservao das Espcies Migratrias Selvagens de 1979 (Conveno de Bonn). O PNUMA tambm iniciou a preparao da Conveno sobre a Diversidade Biolgica (CBD) de 1992. E em conjunto com a Organizao Meteorolgica Mundial, patrocinou o Painel Internacional sobre as Alteraes Climticas (IPCC) para a negociao do regime do clima, que culminou na adopo da Conveno Quadro das Naes Unidas Sobre Alteraes Climticas em 199255. Tambm deu apoio concluso da Conveno das Naes Unidas de Combate Desertificao nos Pases Afectados por Seca Grave e/ou Desertificao particularmente na frica de 1994 (Conveno de Combate Desertificao).53 O conselho do PNUMA estabeleceu um programa regional dos mares em 1974 que produziu cerca de 40 acordos que cobrem 10 mares regionais. 54 DESAI, Bharat H. UNEP: A Global Environmental Authority? Environmental Policy and Law Press, German Development Institute, Bonn, Germany, 2006. Published by Cambridge University Press, New York, 2007. 55 United Nations Framework Convention on Climate Change UNFCCC.

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O PNUMA tem um papel significante na administrao de cinco acordos ambientais multilaterais aos quais presta servios de secretariado, e que so os seguintes: a Conveno de Comrcio Internacional de Espcies Ameaadas de Extino de 1973 (CITIES)56; a Conveno sobre Conservao das Espcies Migratrias Selvagens de 1979; a Conveno de Viena; o Protocolo de Montreal; a Conveno da Basileia; e a Conveno sobre a Diversidade Biolgica. Como vimos o PNUMA alcanou grandes objectivos, mas tambm enfrenta enormes dificuldades. Em meados dos anos noventa, houve consenso de que esta instituio estava a enfrentar uma crise. Assim sendo, em 1997, numa Sesso Especial da Assembleia Geral para rever a implementao da Agenda 21, os governos da Alemanha, Brasil, frica do Sul e Singapura submeteram a esta uma declarao, que propunha a reforma do PNUMA e o reforo enquanto conscincia ambiental a nvel mundial, assim como para o estabelecimento de uma organizao central do meio ambiente dentro da ONU57. Porm, esta declarao no foi recebida com grande entusiasmo, pois s se concluiu que era necessrio revitalizar o PNUMA, dando-lhe um papel mais forte e garantindo-lhe um financiamento adequado. Em 1997, Kofi Annan tentou dar prioridade ao PNUMA no sentido de assegurar o estatuto, reforo e recursos necessrios para que funcionasse efectivamente como uma agncia para o meio ambiente a nvel mundial. Depois de muitas promessas de vrios governos em prover o PNUMA com os meios