getulismo e trabalhismo: tensões e dimensões do partido
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PTB
CPOOC
GETULISMO E TRABALHISMO:
tensões e dimensões do Partido "Trabalhista Brasileiro
Angela Maria de Castro Gomes
Maria Celina Soares D'Araújo
FUNOIÇAO GETULIO YlRGIS
CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENT AçAO DE
HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL
RIO DE JANEIRO
1987
� I: J "
FUNOAÇAO G. I ULtO VARGAS L INDIPO I CPOOC
CPDOC
GETULISMO E TRABALHISMO:
tensões e dimensões do Partido Trabalhista Brasileiro
Ângela Maria de Castro Gomes
Maria Celina Soares O'Araújo
FUNDICão GETULIO VIRGIS
CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENT AçAO DE
HISTÓRIA CONTEMPORANEA DO BRASIL
RJO DE JANEIRO
1987
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I Fund;lç?o G'3tuliü varg,-\i:; -----
-------------��
Supervisão edito r ial: Cristina Mary Paes da Cunha
Revisão d e texto: El izabeth Xavier de Araújo
Datilografia: Diva Léa Ribe iro Sylvio
Nota :
Este texto foi concluído em 198 5 e faz parte da l inha d e
pesquisa "Partic ipação po l ít ica e Movimentos Soc ia i s " desen
volvida no Cpdoc .
Ficha cata lográfica
G 6 3 3g
GOMES , Âng e l a Maria de Castro .
Getulismo e trabalhismo : tensões e d imen sões
do Partido Trabalhista B ra s i l eiro/Ânge la Maria de
Castro Gomes , Maria C e l ina Soare s D'Araú j o . Rio de
Janeiro : Centro d e Pesquisa e Documentação d e HistQ
ria Contemporânea do Bra s i l , 1987.
73p.
1. Bras i l -História-Getúl i o Varga s , 1930-1945.
2. Bra s il-História-Getúlio Vargas , 1 9 5 1-19 54. 3. G�
tul i smo . 4 . Traba lhismo . 5 . Bra s i l -História-Gaspa r
Dutra, 1946-1 9 5 1. 6. Partido Traba lhista Bra s i leiro.
I. D'Araúj o , Maria Celina Soare s . 11. Centro de Pe�
quisa e Documentação de·História Contemporânea do
Bra s i l . 111. Título.
CDU 98 1.082
CDD 981.062
SUMÁRIO
Introduçã o / l
A criação d o PTB/ 7
Trabalhismo e queremismo / 14
O PTB e a s e l e ições d e 1 9 4 5 / 2 5
O PTB d e 1 9 4 5 até a volta d e Vargas / 34
O PTB e o Min i s tério do Trabalho/4l
O PTB e a propaganda do trabalhismo / 4 7
O " queremos " volta às rua s / 5 2
O trabalhismo volta a o poder?/ 5 7
O trabalhismo sem Vargas / 6 9
Introdução
No período que vai de 1 9 4 5 a 1964 três grandes parti
dos marcam a cena da pO l í t ica bras i l e ira: o Partido
crático ( PSD ) ; a União Democrá t ica Nacion a l (UDN ) e
Social DemQ
o Partido
Trahalh ista Bra s i l e iro ( PTB ) . Convivendo com outras organ iz§.
ções part idárias de menor porte e de importância e l e itoral mais
reg iona l izada , não há dúvida que PSD , UDN e PTB foram as organi
zações que dominaram o sistema partidár io d o país . Sobre os dois
primeiros já existem alguns excel entes trabalhos publ icados , o
que nao acontece em relação ao PTB .
Este texto pretende ser uma incursão inicial sobre t�
ma a inda tão desconhecido e para tanto , d e l imita claramente dois
e ixos de aná l ise . D e um lado , estuda o PTB em um momento h i s tQ
rico preciso que vai d e suas origens em 1 9 4 5 até o suicídio de
Vargas em 19 54. De outro, e l ege como seu foco um dos temas bási
cos do partido , isto é , as relações do traba lhismo com O getuli§
mo neste período . Esta abordagem enfatiza uma questão marcante
para o desenvolvimento deste partido . A importância da figura
e do carisma de Getúl io Vargas para a con f iguração ideológica
e organizat iva do PTB . Fica claro que outros pontos igua lmen
te relevantes nao serao incluídos aqui , como por exemplo a atu§.
ção parlamentar do partido e sua doutrina concebida por vários
2
ideó logos do traba lhismo .
Liderando o movimento revolucionário de 1 9 3 0 Vargas a�
cende ao poder , para n e l e permanecer por 1 5 anos consecutivos .
No decorrer desse período foi chefe do Governo Provisório ( 1 9 3 0-
1 934 ) ; presidente constituc ional e le ito por via indireta ( 1 9 34-
1 9 37 ) e a inda di tador de uma ordem autoritária conhec ida como
Estado Novo ( 1 937- 1 945 ) . Após um interregno de quatro anos r�
tornará ao poder em jane i ro d e 1 9 5 1 , a través do voto popular di
reto, para nele permanecer até agosto de 1 9 54 quando , a exemplo
de 1 94 5 , rec ebe o veto m i l i tar e opta então pelo suicídio .
Desde o iníc io de sua carreira Vargas se mostrou um
líder in conteste e hábi l . Sua imagem popular , entretanto , sera
f irmada gradat ivamente , só vindo a se conso l idar em definiti
vo a partir do Estado Novo . Ou se ja , o poder nao foi decorrên
cia de sua popular idade e carisma mas , ao contrário , , e no exe!:
cíc io do poder que esses atributos são construídos através de
uma e f ic iente campanha política e ideológica .
A ascensão de Vargas ao pode r em 1 9 3 0 será acompanhada
pela preocupação em definir um novo pacto político , que sanasse
as mazelas da República Ve lha . Inovar po l i ticamente era o gran
de desa f io para a facção vitoriosa dos revoluc ionários . Para
tanto era necessário a busca de apoios d iversif icados que inclui
am forças mil itares , setores da burguesia e também ant igas oli
garquias regionais . As d i ficuldades para t a is composições
marcarao exatamente o c l ima d e tensão pOlítica que o país enfren
tará no pós-30 , particularmente até 1 9 3 7 , período no qua l se
detecta perfe itamente o a c irrado embate entre correntes c en trali
zadoras e autoritárias e outras proponentes de uma rede f in ição
do federa l ismo e da l ibera l-democrac ia , sem que isso impl icasse
a negação desses princípios .
3
Com o golpe de 1 9 3 7 que instaura o Estado Novo consª
gra-se a proposta autoritária e e l imina- s e po liticamente os de
fensores remane scente s do l ibera lismo -- a exemplo do que j á se
fizera com os comunistas , que desde 1935 foram submet idos aos ri
gores da Lei de Segurança Nacion a l e do Tribun a l de Segurança
Naciona l . Margina liza-se e persegue-se também a extrema-d ireita
organizada na Ação I ntegra lista Bra s i l e ira que , apesar de apoiar
ideologicamente a nova ordem , constituía uma organização autônQ
ma e disciplinada que poderia trans formar - s e em força pOlítica
para lela com forte pode r deses tabi l izador . Com o E s tado Novo
e stará também f irmada uma s ó l ida a l iança de Vargas com a corpo
raçao militar e e stabelecido o compromis so por parte do governo
de promover o desenvolvimento econômico do país , o que lhe ga rag
tirá o crescente apoio de s etores da burguesia .
A estabi l idade do E s tado Novo e stava fundamentada ne.§.
ses compromissos e , principa lmente , no uso intens ivo da
repre s siva e da propaganda ideológ ica . Mas seu suces s o
força
depeg
deria também de uma ampla base de legitimação que foi buscada
e f icientemente j unto à c l a s s e traba lhadora . O grande trunfo de
Varga s foi a insistente d e f e sa de que o E stado Novo represeg
tava o momento ótimo para a implementação no país de uma demQ
cracia socia l , para a valorização do trabalho e para o reencog
tro do Es tado com a nação , a travé s da l iderança pessoal do pr�
s idente .
A pregaçao e s tadonovista fundará , como sua ideologia ,
o trabalhismo e criará um movimento de opinião pública favorá
ve l , até mítico , à f igura de Getúlio Vargas: o getul ismo . Trª
ba lhismo e getulismo são t e rmos que se complementam durante a
ditadura , à medida que a defesa e a s conquistas do trabalho sao
diretamente a s sociadas a imagem do che fe do governo .
4
Findo o Estado Novo e restabe l ecida várias prerrogati
vas democrá t icas , o getul ismo será , sem dúvid a , um marco divi
sor na pOl í t ica brasile ira . Vargas h avia se convertido de fato
na l iderança mais expressiva da pol í t ica nacional , nao obstante
a oposição que se acentuava contra a sua permanência no poder .
o processo d e redemocrat ização de 1945 será expressivo d e sua
inf luência. Basta l embrar que o s istema partidário surgido ne§.
sa época , foi concebido dentro do l imitado circuito dos arredQ
res do presidente. Se tomarmos os três principais part idos err
tão criados UDN , PSD e PTB fica claro que uma de suas d i ferenças
mais marcantes se referia ao julgamento que faz iam a respe i to
da influência do getul ismo na pol í t ica naciona l . Resguardando-
se as divergências internas , a UDN representaria a oposição mais
cabal a corrente que trazia em si o v ício de origem do d i tatoriª
l ismo -- a negação d e uma ordem democrát ica , l iberal e plurª
l ista . o PSD e o PTB se caracterizariam como agremiações d e cg
nho getulist a . Seus adeptos viam Vargas sob uma dupla ótica .
Quer como o grande estad ista e moderno administrador , que soube
apreender as reais necessidades do pa í s , quer como o "pai dos PQ
bres " e criador da legislação soci a l . Posto isto , , e importante
sal ientar que o person a lismo po l í t ico oriundo da f igura de Va�
gas foi fundamental na conf iguração d a nova ordem democrát ica .
Enquanto o PSD reunia interventores estaduais que corr
trolavam importantes aparatos administrativos e clientel ísti
cos , o PTB t inha uma proposta mais diretamente dirigida às e l a§.
ses traba lhadoras . o prime iro , de cunho eminentemente conservª
dor , teria por missão precípua garant ir uma transição polít ica
contro lada , que evitasse mudanças abruptas nos rumos pol ít icos
do país; o segundo , estava encarregado de ve icu lar a proposta
traha lhista de Vargas em termos partidários . Ambos traz iam a
5
marca da herança getulista , e i sto o s cont rapunha à UDN .
Não obs tante estas trans formações ao f im do Estado NQ
vo, e importante registrar que a trad ição po l í t ica nacional de
pouca legit imação do s i stema partidário não é substancia lmen te
alterada . Vargas sera n e s s e processo o exemplo maior de apaK
t idarismo e de um e s t i l o pol í t ico que continuava
uma relação sem med iações entre líder e ma s s a s .
priv i legiando
Embora tive s s e
enviado e s forços para o fortalecimento d o PTB e d o PSD , o que
se pode perceber é que acaba ape l ando com mui to mais ênfase pª
ra seu próprio carisma pes s oa l . E s s e e s t i lo de l idar com a
po l í t ica inaugurado por Varga s , f icará profundamente a s sentado ,
fará escola e se trans formará no que veio a ser uma das princi
pais característ icas do popu l i smo bra s i l e iro .
S e o getu l i smo tem a marca inde léve l da person a l i zª
ç a o , o traba lhismo acabou por ganhar novas l ideranças e , por vg
z e s , perfis mais independentes em relação ao seu marco de ori
gem o Sem s e apres entar como um corpo doutrinário suficientg
mente estruturado , o traba lh ismo foi s endo apropriado de d iveK
sas formas e inf luenciou a criação de vários partido s , como , por
exemplo , o Partido Social Trabalhista ( PST ) ; o Partido Trabalhi�
ta Nacional ( PTN) ; o Partido Repub l icano Traba lhista ( PRT) ; o
Partido Orientador Traba lh i s ta ( POT ) ; o Movimento Traba lhista Rg
novador ( MTR ) , a l ém do PTB , sem dúvida o mai s s igni f icativo de
todos e l e s .
Há que reconhecer que a s d i f iculdad e s para a e s t ruty
raçao do PTB foram grande s , principa lmente porque representava
a agremiação que , em princípio , deveria herdar o carisma do ex-
pres idente , o que e s t imulava intermináveis d i s putas internas .
Por todas essas razões o PTB , até o f im da década de 1 9 5 0 , nao
obstante seu cre scimento e l ei tora l , não conseguia se trans foK
6
mar numa organização partidária forte , proporciona lmente ao pre�
tígio de seu chefe . Esse fato , por sua vez , dava a Vargas um
grande espaço de manobra que , se foi por e l e habi lmente explorª
do , também lhe trouxe o incômodo de não proporcionar uma força
suficien temente institucion a l izaoa para garantir o apoio nece�
sário ao seu segundo governo ( 1 9 5 1 - 1 9 5 4 ) .
7
A criação do PTB
Em 3 1 de dezembro de 1 9 4 4 , no tradicional banquete d e
passagem de ano o ferecido pelas forças armadas , Getúlio anun
ciava oficialmente à nação a breve execução da reforma constitg
ciona l , necessária para a igualmente breve real ização das e l ei
çoes que reconduziram o país à norma l idade democrática.
Sua decisã o , tomada nos meses f inais deste ano , rev�
l a os novos problemas que passsar iam a ser enfrentados a partir
daque le momento. A indicação básica de que a pOlítica nacional
iria rea lmente sofrer transformações é dada pelo convite d i ri
gido a Agamenon Maga lhães -- então inte rventor em Pernambuco--
para ocupar a pasta da Justiça . Esta escolha deve ser bem en
tendida, assim como o momento em que foi feita. Agamenon era um
político com inegável experiência e prestígio . Era um interven
tor de ind iscutível l iderança nos meios civis que d ispunha , ta!!!
bém , de fortes con tatos nos me ios m i l itares . Conhecia e manti
nha re lações amistosas com o já conhecido candidato da opos ição
, a sucessao d e Vargas , o brigade i ro Eduardo Gomes.
Agamenon fora dos primeiros a perceber que Getúlio nao
tinha outra solução , senão caminhar para a democracia , e o con
vite para que ocupasse a pasta da Justiça foi-lhe d ir igido a inda
em fins de 1 9 4 4. Contudo , Agamenon só assumiria o cargo em 12
8
de março de 1 9 4 5 , imed iatamente após a promulgação da Lei Consti
tuc iona l n 2 9 ( 28 / 2 / 1 94 5 ) , que f ixava o prazo de noventa dias Pª
ra que fossem marcadas as e l e ições e determinava
de urna lei e leitora l .
Até esse momento o processo pO l ít ico
a
fora
por Al exandre Marconde s F i lho , ministro do Traba lho ,
elaboração
conduzido
Indústria
e Comérc io que acumulava a pasta da Just iça e pos tu lava posi
ções d i ferente s das d e Agamenon Magalhã e s . Marcondes entendi a
que a mudança d o regime deveria t e r início com a s e l e ições pr�
s idenc iais e que a Carta d e 1 9 3 7 -- devidamente reformada
poderia ser submet ida a um plebi sc i to , não havendo nec e s s idade
d e se cogitar sobre urna As sembléia Nac ional Constituinte . SU2
tentava a inda o a l i s tamento ex-officio e natura lmente a pos s ível
candidatura d e Vargas . ( O a l i s tamento ex-officio era um prQ
cedimento que po s s ib i l itava a inscrição e l e i toral em bloco d e
pes soas que per.t:en c e s s em: a organizações corno ,
t itutos previdenc iários e outras a s soc iaçõ e s .
s indicatos , in2
Esse t ipo de a l i2
tamento tornaria mais ágil o proce s so e l ei toral e
incrive lmente o contingente d e e l e i tores . Foi usado
ções de 1 9 4 5 e em seguida revogado . )
aumentaria
nas e lei
Agamenon , por sua vez , propunha que o processo t ive2
se início com a convocação de urna Con s t ituinte que , e stabelecen
do um regime consti tuciona l , pos s ibilitasse a convocação d e e lei
çoes . O e squema sugerido era seme lhante ao d e 1 9 3 4 , nao preven
do qualquer procedimento que consagra s s e a ine l eg ibilidade de
Varga s . Nesse sent ido , o choque entre Marcondes e
não se devia a urna pos iç ão pró ou contra a candidatura
Agamenon
Varga s .
Paral e lamente à d i scus são sobre a hipótese desta candidatura , cQ
locava - s e o problema d a l eg i s lação e l e itora l . Era ponto pac í fi
co que esta seria urna a t r ibuição de Vargas e que sua condução e ra
9
abso lutamente decis iva para o resultado das urna s . A e l aboração
do novo código e leitora l acaba ficando a cargo de Agamenon que ,
a s sumindo o ministério no dia 1 2 de março , j á no dia 9 instala
urna comis são com este ob j etivo .
Quando e s t a s e reuniu pela primeira vez , Agamenon tran.§.
mitiu- lhe urna orientação básica conformada em c inco pontos , en
tre os quai s e stava a adoção do a l i s tamento s imple s e ex-offi-
c io . Os demais eram : o voto secreto ; j u s t iça e l e itoral
ma ; apuração rápida e imediata e partidos nacionais . Este
mo ponto é particularmente significat ivo , porque indica
autônQ
últi
que ,
quando Agamenon a s sume o ministério , a d iscussão sobre a nova
e strutura partidária havia chegado a termos d e finidos . Dada a
tradição regionalista da pOlítica bra s i leira, a s decisões sobre
a que s tão partidária certamente tinham que passar pelo exame
da nece s s idade de se constituírem partidos nac iona i s . Neste a.§.
pecto , apenas Fernando Costa , interventor pau l i s ta e Benedito
Valadares , interventor mineiro , d efenderam a idéia dos partidos
regiona i s . Porém, não era e s ta a única d i f iculdade existente Pª
ra a montagem de novos instrumentos part idários . Certamente hª
via que se decidir sobre o " tipo " d e partido " situacionista'"' que
iria ser formado , ou s e j a , em que bas e s se estruturaria sua fo�
ç a .
Embora s e j a difícil acompanhar o curso dos acontecimen
tos , fica c laro que , quando Agamenon a s sumiu o comando da polí
tica de redemocratização , e stava decid ido nao só que o s parti
dos seriam nacionai s , corno igualmente que e l e a l iado e speci
a lment e aos interventores dos e stados do R io , Minas, são Paulo e
Paraná - partiria para a montagem d e um partido d e interventQ
res . Assim , a natureza do futuro PSD e stava dada desde o s primei
ros mes e s d e 194 5 . t possível s i tuar t ambém que , pelo menos de.§.
10
de març o , e s tava dedic ido que este partido apoiaria o nome do mi
nis tro da guerra general Eurico Gaspar Dutra como candidato , a
pres idência da República .
o mês d e abril é bem ind icativo do avanço das artic.!!
lações e l e itora i s . Dutra fa lara pela primeira vez como candidato
no dia 3 e no dia 5 era organizada a comi ssão que e laboraria o
programa do PSD . Estes preparativos ocorrem simultaneamente ao
lançamento oficial da UDN ( 7/ 5 / 194 5 ) . Portanto , o quadro partidª
rio e sua vinculação com as duas c andidaturas e stava de lineado .
o que não fica imediatamente explicitado é a solução
encontrada para a mobil izaç ão partidária d a s chamadas c la s s e s
trabalhadoras , c laramente identificadas como bases fundamentais
do E s tado Novo . A rigor , pod e - se verificar que o d e s e j o inic ial
do regime era reunir e m um único e grande partido todas a s fo!:
ças pOlíticas " do " presidente . Mas , torna- s e difícil sustentar
que este d e s e j o fosse naque l e momento uma real possibilidad e .
Um dos indicadores desta s ituaç ã o , é a ausência d e Marcondes F i
lho d e todo o con j unto d e reuniões que formulou o PSD . t preciso
nao e squecer que uma série de reflexões e propostas haviam s ido
desenvo lvidas ao longo dos anos d e 1942-44 , apontando todas para
as d i ficuldes concretas de articular, em um mesmo partido , como
se pretendia , a s tradic ionai s e l i t e s do país e a s novas l ideran
ças sindicais .
Certamente Getúlio e o s demais "plane j adores " do proce.§.
so de transição não optariam por uma s olução partidária que pr�
teri s s e , ou minimizasse , a s tão cuidadosamente acalentadas. ba
ses s indicais . O investimento que Varga s real izara , ao longo dos
anos da administração Marcondes F i lho , na formação d e uma ampla
base pol ítica no s e io d a s mas s a s trabalhadora s , quer via �
1 1
d e s indicalização, quer via e s forço doutrinário, é evidência
mais que suficiente para a conc lusão do quanto s e apostava neste
filão pOl ítico . t certo que tal fato nao implicava diretamente na
criação de um partido " trabalh i s ta " , mas a atuação de Marcondes
apontava para a articulação de um grande partido de massas com
bases s indicais .
o exame desse momento permite duas importantes concl11
soes . Primeiramente , o d e senho final dos traba lhos s ituacioni-ª.
tas foi feito sob a evidente pres são d a s oposições , articulad a s em
torno da candidatura do brigadeiro Eduardo Gome s . Em segundo 111
gar , só em inícios de 1 9 4 5 f ica estabe lecido que as forças ligª
das a Vargas se mobilizariam em duas ( PS D e PTB ) e nao apenas em
uma organização partidária . Mais complexo é prec i sa r o tipo de
encaminhamento que esta questão recebeu .
Em relaç ão ao PSD o problema é mais simples . Os inter
ventores estadua i s , representando o que d e mais s ignificativo �
xistia em termos de novas e l ites pOl í t ic a s , reúnem- s e para impl�
mentar o seu partido. Com i s s o , e stavam vetando definitivamente
a idé ia de um grande partido de mas s a s do qual fizessem part e . E-ª.
tabeleciam, igualmente , a c r iação de um partido nacional da cúpu
l a governamenta l e stadonovista gerido em termos de colegiado e
com bases pOlíticas n i t idamente regionai s . Aliás , é esta combinª
tória que provavelmente superou a ques tão do partido nacional /
regiona l . A de f inição d o formato d o PSD praticamente estabelecia
o s contornos do outro part ido " s ituacion i s t a " • Ele deveria re11
nir as novas lideranças s indicai s , que, por sua vez , t ambém vinham
resistindo ao pro j eto de uma só org��o. Rartidária . O PTB , ne-ª. -1-.,
te sentido , "nasce" ao mesmo t empo que o PSD , j á que ambos resul
tam da frustração do pro j eto de " partido único de massa s " , que vi
nha sendo acalentado no seio do E stado Novo . Es t a interpretação ,
1 2
vale registrar , di fere substancia lmente do que vem sendo d ito na
l iteratura sobre o a s sunto . A criação desses dois partidos poli
ticos não resulta de um c á lculo maquiavé lico que buscava distin
guir bases diferenciadas de apoio pOlítico . Ao contrário , o PSD
e o PTB emergem como a s o lução pragmática possível num contex
to em que as presenças de um s ignific3tivo partido de opo s ição
( UDN ) e de uma forte esquerda organizada ( PC ) forçavam a tomada
imediata de decisões pOlític a s . Pode-se descartar , portant o ,
com segurança , a versão corrente d e que a concepçao d o PTB tenha
s ido uma "invenção de última hora " . Não foi concebido exc lus iva
mente para funcionar como um contrapeso à força crescente-- e �
preendente --do Partido Comunista , nem foi imaginado à posterio
ri como a lternativa popular face ao e l it ismo do PSD .
Certamente o PTB foi criado como a melhor opçao parti
dária para o trabalhador bra s i le iro . Nesse sent ido era uma c�
nha entre as mas s a s trabalhadoras e o comunismo , mas nao um pa�
tido cujo móvel e sentido fosse o anticomunismo . Esta
çao, contudo , não implica em minimizar a i,mportância r ea l do Par
tido Comunista na con j untura de 1 9 4 5 - 4 6 . Basta lembrar que Luís
Carlos Prestes era a única personalidade política que podia rivª
lizar com Vargas em carisma e pro j eção nacion a l . Além do mai s
o sucesso e leitoral d o PC nesse período , principalmente nas
grandes capita i s , explic itam bastante que o comunismo era de lon
ge muito mais do que um argumento de retórica pOlític a .
o PTB não deve ser entendido como mera força reativa do c o
munismo . Por i s s o , pode habilmente realizar amplas a l ianças po
l íticas . De um lado , conseguia o apoio de setores conservadQ
res , a lertando para o perigo comunista , e , de outro , podia s e
aproximar d o PC , util izando a força d e seu apelo popular . Seu
destino deveria ser o de um grande partido de mas s a s bra s i l e i
ro. Sua ambiva l ência dentro do espectro de posições
13
pOl ít icas
pos s íveis , nao era um s inal de indef inição . Ao contrário , ela
indicava jus tamente o t ipo de opção que estava sendo ofereci
da.
14
Trabalhismo e queremismo
• A formação de uma Comissão Executiva Nacional para
dar organização ao PTB data de 15 de maio de 1 94 5 , portanto ce�
ca de um mês após o anúncio oficial da criação da UDN e do PSD .
( A comissão era composta por Luís Augusto Franç a , Manuel Fons�
ca , Paulo Baeta Neve s , Ca lixto Ribeiro Duarte, Antônio Franci�
co Carva lhal e Romeu José Fior i . Vale observar que tanto a
UDN , quanto o PTB se organizam a partir de uma comi s são naciQ
na l ; e o PSD foi sendo fundado em cada estado para em seguida
real izar uma convençao nac iona l. ) O provável modelo inspirador
do PTB foi o Partido Trabalhista Ingl ê s , e suas bases foram �
fetivamente montadas a partir da .e s trutura do Ministério do
Trabalho , ou s e j a , com a utilização das l iderança s s indicais e
dos organismos previdenciários .
O PTB nascia sob chancel a governamenta l , mas é int�
res sante observar o tipo de encargo que acabou por a ssumir e , a
partir d a í , o tipo de relação que se construiria entre o PTB e
Vargas . Ela é n i tidamente distinta daque la do PSD , partido que
se articula c laramente tendo como laço d e .uniã o , nao ,
so
do candidato o ficia l -- Dutra como também o nome de
o nome
. , �num�
ras liderança s experimentadas· do E stado Novo . O PTB era um pa�
1 5
tido sem grandes nomes e aparentemente sem candidato .
Na verdade , se Dutra era o cand idato do governo , ele
deveria ter todo o apoio da máquina pOlít ica-admin i s trat iva . Ne§
te sentido , o próprio Marcondes , em uma de sua s falas pp.la Hora
do Bra s il , fez o e logio do candidato e das qualidades
programa socia l . Contudo , f icava claro que Dutra nao
de seu
era o
candidato do Minist�rio do Trabalho e que e ste permanecia voltA
do para o lançamento do nome de Getúl io Vargas às ele ições . Qual
seria então o pro j eto do PTB/Minist�rio do Trabalh o , dentro de§
se novo contexto de meados de 1 9 4 5? Recorrendo ao depoimento de
Segadas Viana , então d iretor do Departamento Nac ional do TrabA
lho , a indicação � de que os traba lhistas de fendiam a instalA
ção de uma As sembl�ia Nacion a l Con sti tuint e , a inda com Getúlio
no poder , para , em seguid a , serem realizadas e le ições d iretas
em que Vargas pOderia ser candidato . Desta forma , a s candida tg
ras mil itares não precisariam ser retiradas ; ela s seriam neutrA
lizadas pe lo nome do pres idente. Esta pos s ibilidade apostava
com segurança no pre s tígio de Varga s e d iagnosticava que nem Dg
tra nem o Brigadeiro e stavam conseguindo ou iriam conseguir real
popularidade. 1
Este pro j eto "Queremos Getúlio" e " Cons t i tuinte
com Getúl io" - remete à s re lações dos trabalhistas com' o chamA
do movimento queremista , que atua , de forma mais art iculada ,
a partir de meados d e 1 9 4 5. Estas relaçõ e s sao c l aras , embora
at� certo ponto evitadas . Não se trata aqui de d iscutir se o
PTB se organizou sob a pressão dos queremistas , como querem a�
gun s , ou se na verdade , o PTB foi o ponto de part ida do movimen
to queremista . O que importa res saltar � que o trabalh i smo como
1 Jos� de Segadas Viana ( depoimento ) . FGV / Cpdoc , His tória Ora l . p . 306.
1 6
uma ideologia política centrada n a f igura de Varga s , em sua obra
social e no t ipo de relação -- d ireta e emoc ional que ele
propoe manter com a massa traba lhadora , v inha sendo construído
dentro do Mini stério do Traba lho desde 1 94 2 . Assim, sem o supo�
te ideo lógico do traba lhi smo , o queremi smo teria s ido pra ticameg
te impo s s íve l .
Traba lhismo e queremi smo bebiam da mesma fonte . Eram ,
ba s icamente , a mesma "idéia" . Mas é certo que do ponto de vi§.
ta organizac iona l , o PTB e o queremi smo não eram a mesma coisa .
O PTB , como partido que procurava seu reg i s tro junto à Justiça �
leitora l , es tava defin ido pe l a s regras do j ogo pOl í t ico . Devia
formalmente ater-se a e la s , e a candidatura de Getúl io nao era
tão s imples de ser lançada . Uma v inculação aberta entre o parti
do e Vargas em termos eleitora i s , comprometeria o minis tro. e
o Mini stério do Trabalho; comprometeria o próprio partido e,
sobretudo , todo o processo de tra n s ição . Já o queremismo era
um movimento soc iàl que , tanto pod ia correr à margem das r�
gras do jogo , como e fetuar todos os t ipos de a l iança , sem qua�
quer comprometimento maior . Este era o caso das vinculações
do queremismo com o Part ido Comun i s t a , que apenas ir iam alimentar
a inda mais a desconf iança e o temor nutrido em relação ao movi
mento , nos meios mil itares e também c iv i s , quer de oposição,
quer de s i tuação . O Ministério do Traba lho , cuidadosamente , prQ
curava gerir seus contatos com o movimento queremista . Na verdft·
de , o s elementos que em todos o s e s tados e mun ic ípios integrft
vam o queremismo -- organizado nos comitês e núcleos Pró-Candi
datura Getú l io Vargas evitavam propos i tadamente ingressar
no PTB . Na maioria absoluta dos estados , esses e lementos
eram l íderes traba lhis tas e quando nao , po l í t icos , " todo s ,
17
porem, obedecendo a uma única linha de conduta" . 2
Um dos jorn a i s oposicion istas da época -- o Correio da
Manhã em a r t igo intitulado " O queremismo , e s sa palhaçada " ,
re sume bem o t ipo de interpretação vigente a respeito das reIª-
ções entre queremi smo , Min istério do Trabalho e Varga s :
"O panorama do queremismo se apresen
ta com duas face s : a organização
na ação pelo Ministério do Trabalho
e a outra dos provocadores de d eso!:
dem que j á são enviados aos e stados
como se tem fe ito nos , . coml.Cl.OS .
pro-
Eduardo Gome s . Vargas aceita e pre2
t igia a s duas alas do queremismo".
( 29 / 8 / 1 9 4 5 )
O clima d a época -- que comportava a a n i s t ia e a legª-
lização do Partido Comun ista -- explica em muito a desenvoltura
dos queremista s , como também sua s nítidas ligações com os comg
n i stas . A propos ta era a mesma -- Cons tituinte com Getúlio
o que , evidentemente , não tornava o queremi smo propriedade do
P C , como de fato nao era . Mas o clima da época .
e insufic i ente
para dar conta da total ausência d e repressao e , ma is a inda ,
da rec eptividade de Vargas que , por d iversas veze s , recebeu e fª-
lou aos queremistas .
Este comportamento ilu s tra o t ipo de relação que v inha
sendo alimentada pelo d iscurso trabalhista . Vargas atento
aos desejos das massas -- recebia pessoalmente os queremistas .
A observação das inúmeras man ifestações queremistas que ocorr�
ram ao longo dos meses d e agosto , setembro e outubro de 1 94 5 ,
demon stra ba s icamente um modelo d e ação . , . Um coml.Cl.O era convocª-
2 Relntório sobre o queremi smo , sem autoria , endereçado a Vargas em 17/ 10/ 1 94 5 . GV 4 5 . 1 0 . 17 . FGV/Cpdoc .
18
do em um certo ponto da c idade -- largo do Russel , Carioca etc
e aí falavam vários oradores. Em seguida , o s grupos presen
tes ao comício até o palácio do Catete , com o obj e tivo de serem
recebidos por Vargas e forçá -lo a aceitar sua candidatura . prati
camente todas a s veze s , Vargas falava a esta massa e/ou a uma
comissão, reaf irmando não ser candidato . Ilustrat ivamente , em a�
, . guns desses com1C10S nao era mencionado o nome de Dutra . Nem me.§.
mo Vargas o cita . A tônica de seus pronunciamentos ,
e o desejo de
a fastar-se da vida pública e de conduz ir o processo de redemocrª
tização , o que era respondido com protestos e aclamações .
Getúlio sustentava dessa mane ira , por todo esse períod o ,
um contato e streito com a população da c idad e , contato que era r�
encenado em todo o território nacional . A convocação queremista
para os comícios que festej ariam a pas s agem do dia 3 de outubro , é
um grande suce s so . As notícias foram de que em todo o Brasil,
e até mesmo em são Paulo , veio para a praça pública "a maior mas s a
1 d ' . ti 3 popu ar e que se tem memor1a . O ocaso do E stado Novo , com o mQ
vimento queremista , trans formava- s e numa ocas ião de grandes apari
ções para Vargas que , insistindo em sua nao candidatura , a ss i st ia
ao desenrolar dos acontec imento s . . . ' . , O mOV1mento era a ss1metr1co:ca�
a o Estado Novo , mas crescia o prestígio do d itador .
O quadro político era complexo e tenso . Diversos r�
latórios enviados a Vargas a s s inalavam que nem a candidatura de
Dutra nem a de Eduardo Gomes gozavam de pro j eção popular , embora a
deste último fosse mais bem aceita pelo eleitorado . A Igreja Cató
lica , em franca campanha contra o c omunismo , parecia nao se defi
nir , e o prestígio de Luís Carlos Pre stes era cada vez maior .
3 Idem .
FUNDAÇAo GETULIO VARGAS' I";CIPO I CPooe , i9
O queremismo era iden t i f icado como o movimento ma i s
forte d o pa í s , " sob o ponto d e vista d e opinião pública e d e cª
pac idade e l e itoral . 4 A crença em que Getúlio a inda viesse a ser
candidato era quas e que tota l , mesmo u l trapas sado o pra zo de dg
sincompat ibil ização ( 2 d e setembro ) . Havia getulistas que d�
c laravarn que votariam em branco ou até n o Brigadeiro , caso Va�
gas não se candidatasse .
cracia de 02/09 / 1 94 5 :
Segundo o j ornal trabalhista A Derno-
" Votarão no genera l ( Dutra ) os agrg
pamentos po l í t icos pro fiss iona i s-
o rebanho que vai pelo cabresto dos
chefe s , com medo d e perder os e�
pregos ou pensando nas prometidas
compensaçõ e s . Votarão no Brigad e iro
( Eduardo Gome s ) os descontentes do
pa s sado da República Velha e o s
que perderam a s propinas de 30 nos
s indicato s pO l ít icos estaduai s . . .
Mas o gros so da popu lação ficará e§.
perando outro cand idato. E se e§.
te não aparecer , nao votará em n in ,
" guem . . .
Por outro lado , face a esta h ipótese , era bem pos s ível
que as ma ssas traba lhadoras se orientas sem pelos e squemas
çados pelos comun i s ta s . O d iagnóstico era de que o PTB -- sem
Vargas -- não t iraria do PC o domínio das ma s s a s prol etárias .
Certamente é por esta razao que Mac i e l F i lho , em carta d irigida
a Varga s , ponderou que o problema ma i s d e l icado do governo , nª
4 Carta de José Soares Mac iel F i lho a Vargas. FGV/Cpdoc . p. l , 2.
GV 4 5 . 1 0 . 00/6 .
20
que le momento , era manter a grande po s ição de prestígio do pr�
s id ente no ambiente das ma ssas traba lhista s , impedindo por todas
as formas a �ontagem da m�quina de Luí s Carlos Prestes . Esta
que stão era muito d e l icada e exigia um traba lho inc e s sante " POK
que a equipe de Prestes e muito boa e mu ito e f ic iente " . Igual
mente por esta razao , era essenc ia I exercer um controle sobre a
imprensa , através da d istribuição da pub l ic idade governamental .
Para Mac i e l , o s "amigo s " d e Dutra andavam de scon f iados , e o s do
Br igad e i ro j� se conduz iam para a preparação do gOIPe . 5
t nesse contexto que s e tornava e s senc ial uma orien
tação para o movimento queremis ta. Este j� a s sumira enorme vul
to , mas inegavelmente não possuía grande organização . A preoc]!
pação b�sica e reve l adora de um relatório env iado a Vargas . a s
vé speras do golpe de 29 de outubro , é c o m o d e s t ino do movimento
queremista . Com incrív e l pode r de mobi l izaçã o , o queremismo
t inha comi tês em pra ticamente todas as grand e s c idades e todos
os municípios do país . o que fazer com toda essa rede quando
a campanha e l e itora l chegas s e ao fim, independentemente de que
f inal fosse este? Em todos os e stados e mesmo no D i s trito Fed�
ral a s i tuação era confusa e prec i sava ser urgentemente e s c lª-
recida . A sugestão f:roposta era de que o s comitês deves sem ser
encõm inhados para o PTB e os d iretórios provisórios do partido
orientados para receber todos os seus integrantes . Neste sen
t ido , nos locais onde não e x i s t i s sem a inda d iretórios do PTB ,
o s c omitês pode riam ser pura e s implesmente t rans formados em
d iretórios , encerrando-se aque l e afastamento entre PTB e movimen
. 6 to quereml.sta .
5 Op . c i to p . 4
6 Relatór io . "Situação geral " . GV 4 5 . 1 0 . 17 . FGV/Cpdoc .
21
Portanto, fica c laro que as linhas d e con fluência eg
tre PTB e queremismo -- sempre existentes -- vinham e s treitag
do-se e que, até às vésperas do golpe, a campanhij " Constituin te
com Get�lio " , com sua decorrente candidatura, era hip6tese cog
sid erada não s6 viáve l politicamente, como a que mais " ernociQ
naval! o povo . Segadas viana referindo-se ao PTB e ao queremi�
mo situa bem a dinâmica que presidia estas relaçõe s . Acentua
que para os orgaos de repressao " PTB era queremismo e queremi�
mo era PTB ". J á para a população em geral esc larec e : " o povo
não distinguia entre queremismo e petebismo, então dizia : é gety
lismo " . 7
Torna-se bem compreensível, assim, o impacto do Decrg
to- l ei n2 8 . 063 que, a l terando o que previa a Lei ConstituciQ
n a l n29, antecipava a s e l eições e s taduais para 2 de dezembro
(data das e l eições federais), deixando trin ta dias de pra zo para
a desincompatibilização dos interventores . A interpretação gg
ral era de que com tal lei G e t�lio poderia e l eger, sob sua égi
de, nao so o Congresso federa l, como também as assembléias e o s
governadores e s taduais . Sua força não encontraria limites, e n a
d a a s segurava que, num � l timo momento, e l e n ã o s e pronunciasse
a seu pr6prio favor .
o c lima po l ítico, naque l e me s de outubro, j á era d e
mo lde a comportar várias reuniões d e pOlíticos civis e militª
res, cuja principal preocupação era a ameaça dos queremistas,a
presença dos comunis ta s, en fim, a gravidade dos acontecimentos
que se anunciavam . Sugestivamente, no mesmo dia em que foi a ssi
nado o Decreto n28 . 063, Vargas fez seu primeiro pronunciamento
p�blico pr6-PTB . No dia 1 0 de outubro, em Santa Cruz, Get�lio
7 José de Segadas viana ( depoimento ) . FGV/Cpdoc, p . 3 l 2 .
Hist6ria Ora l .
2 2
respondia às acusaçoes que lhe lançavam , a firmando que o gove�
no nao cogitava de quaisquer modificaçõe s , atos secretos ou
golpes " com propósitos de d e sordem" . E concluiu , conc l amando
os traba lhadores em gera l - " a s c la s s e s popular e s "
ç a r a s fileiras d o PTB . 8
a refo�
o pronunciamento de Getúlio e ma 1 S ainda o momento em
que é feito sao significa tivo s . As interpretações podem ser vª
riada s, ma s sem dúvida, o conselho de Vargas naque l e instante
podia ser lido como um re forço para a campanha do queremismo/
petebismo .
Mas enfim , o que significava e s s a campanha?
o j ornal A Democracia em dois de seus editores a jg
da a de finir o conteúdo e spectral do queremismo e , exatamente
por isso, sua forç a . Para o jornal são três os "queremo s " :
8
" 12) O 'queremos' ve lado dos c omg
nista s , que descon fiam da democrª
cia do brigadeiro e da democracia
do general; 22) O 'queremos' dos
que estão nas a tuais posições e
'acham me lhor' o sr . Getúlio Va�
gas , do que a renovaçao d e quadros
do general ; 32 ) O 'queremos' do PQ vo que gosta me smo do sr . G e tú lio
Varga s , dentro daque l a quadra popg
lar do cantor d e s erenata , que ha�
pe j ava o vio lão e abria o peito aB.
sim: 'gosto de ti porque gosto po�
que meu gosto é gostar! ' "
( 24/8/ 1945 )
VARGAS , Getúlio Dorn e l l e s . "O em A nova pOlítica do Brasil . vol . XI . p . 1 9 7 - 9 .
Partido Traba lhista Brasileiro" Rio de Janeiro , J . Ol ímpio , 1 947 .
23
E reforçando ainda mais o sentido da mística de Vargas
e de sua plural presença polític a :
"Estão a í , como s e sabe , dois c andi
datos à pres idência , os s enhores
Eduardo Gome s e Eurico Dutra , e um
terc eiro , o s enhor Getúlio Vargas,
que deve ser c andidato de algum gry
po pOl ítico ocu l to , w.as e também,
o candidato popular . Porque há dois
'queremos' : o 'queremos' dos que
querem ver se continuam nas posições
e o 'queremos' popular . . . Afina l o
que é que o s enhor Getúlio Vargas '? e .
É fascista? É comunista? É ª
t eu? É cristão? Quer sair? Quer ficar? O povo , entretanto , parece que
gosta d e l e por i s s o mesmo , porque
e l e é ' à moda da c a sa ' . "
( 1 6 / 9 / 1 945 )
A influência e a s nuance s do queremi smo obviamente nao
escaparam ao diagnóstico dos observadores pOl íticos e speciali
zados da époc a . Em um de s eus editoriais no Correio da Manhã ,
o j ornalista Costa Rego -- um dos analistas mais escolados e
perspicazes -- comentava a situação da candidatura Dutra:
" O gal o Dutra nao pode chegar a uma
conc lusão: o p l eito e l eitoral t ravª
va-se apena s entre duas forças poli
ticas . Estas são , de uma part e , a s
oposições coligadas; e , d e outra
parte , o govern o . A única e sperança
do general e s tava em que sua candi
datura reunisse a s força s do gove!:
2 4
no . Já nao a s reúne . D e fato , j á nao as reunia desde o advento do queremismo , gato de sete fô legos imposs íve l d e a fogar . Agora , a l é m d e não reun i - las morre-lhe nos braços por abandono . " ( 1 6 / 1 0 / 1 9 4 5 ) .
A situação precipitava-se cada vez mais , e a nomeaçao
de Benjamim Vargas para a Chefa tura de Po lícia do Distrito Federal
funcionou como a gota d'água a extravasar as j á ensa iadas con�
pirações . Estas envo lviam, entre outros , O ministro da Guerra
( Gó is Monteiro ) , o candidato do governo ( general Dutra ) , a lém
de contarem com o ava l do emba ixador americano no Brasil . Nada
especificamente , senão todo o processo político rescendendo a
continuísmo conduz ao 29 d e outubro . Getú l io , mais do que o E�
tado Novo , estava saindo do poder .
2 5
o PTB e a s e l eições d e 1945
A deposição d e Vargas trouxe trans formações ao
dro pOlítico da ipoca . De um lado , e la s se manifestam nas a l tg
rações feitas no próprio c a l endá rio e leitora l . o recim-promul
gado decreto que antec ipava a s e l e ições para governador de e�
tado foi revogado e a data original -- maio de 1946 foi rest�
be lecida. Alim,deste decreto , foi revogada tambim a chamada
Lei Ma laia de Agamenon Magalhã e s , que conturbara o cenário e os
interess es econômicos estabe lec idos no país . Com a saída d e VaI
gas ficou igua lmente e s tabe le c ido que s e convocaria urna Asse�
bliia Nac iona l Constituin t e . ( Le i Con s t itucional
1 2 / 1 1 / 1945 ) .
De outro lado , a mudança do quadro po lítico pode ser
s en tida pelo termômetro das candidaturas e da atuação dos parti
dos . Dezoito dias após a queda de Varga s , o Partido Comunista
re formulou suas diretrize s . Sem Getúlio e com urna Con stituinte ,
o PC reso lvia lançar seu candidato a pre s id ente , esco lhendo o
nome de I edo Fiúza . ,
O comparecimento do PC as e l e iç õ es com
candidatos em todos os nív e i s era evidência bastante do vigor
organ izat ivo do partido . Significava tambim, para ana l i stas
pOlít icos do momento , um forte ape l o às massa s trabalhadoras ,
sobretudo porque a a spiração do queremismo de saparecia da s ruas .
2 6
Mas , na verdad e , o queremismo nao desapareceria , e l e apenas se
tran s f iguraria e deixaria patente suas relações com o trabalhi�
mo .
Com o golpe , a expectativa da UDN era a do crescimento
da candidatura do Brigadeiro. Ela não ganha a inda a populari
dade neces sária para uma estrondosa vitór ia, porque Vargas
com seu j ogo continuísta -- interferira em sua natura l evolução.
Não era d iversa a expectativa do PSD e particularmente a de Dg
tra . Embora temendo cada vez mais o Br igade iro , Dutra e sperª
va nao ser mais um " candidato abandonado" , no d i z er de Costa R�
g o . Mesmo o fato de ter part icipado do golpe podia ser capitª
l izado politicamente . Afin a l , Dutra era o cand idato do PSD ,
i sto é , o candidato que representando o s interesses do governo ,
d i z ia não compactuar com sua face d itatoria l .
Neste contexto , tornava-se cruc ial a po s ição do PTB .
De seu apoio poderia depender a e l e ição de Dutra , o fortal eci
mento maior ou menor do Partido Comun i s ta ou , até mesmo , a e l ei
ção do Brigadeiro . E é, de fato, extremamente con fusa a pos ição
do PTB. Para entendê- la e prec iso analisar que fora d i fíc i l o
reconhec imento do registro do partido jun to ao Superior Tribg
n a l E l eitora l . Às vésperas do golpe , o e scr itório do PTB foi in
vadido por pOl ic ia i s e seu material destruíd o , de forma que a s
l istas d e dez mil a s s inaturas necessárias para o reg i s tro , acª
bam sendo conseguidas por um exped iente fraudulento .
ficativo a inda é a poss ibi l idade aventada na ocasião
Mais s ig n i
d o PTB não
conseguir seu reg istro j un to ao STF e a forma como isto acaba
sendo conseguido . Além das l istas de a s s in a tura terem s ido " ti
rad a s " do PSD , os votos do STF favoráve i s ao reg istro do PTB
foram con seguidos por interméd io de Osvaldo Aranha , amigo
27
soa l de Segadas Viana . 9
Imediatamente apos o golpe, aventa-se a possibil idª
d e do PTB concorrer as e l e ições presidenc i a is com cand idato
próprio , mas ava l ia -se também que um outro nome provocaria d i-ª.
persao de forças, o que acabaria por garantir a vitória do Bri
gade iro .
Sendo assim, nas palavras d e João Neves, convinha
"defender o � l t imo reduto que nos restou" . Ma lgré-tout, entre
apoiar Dutra e d e ixar o Brigadeiro ganhar, a prime ira a l ternª
t iva era mais aconselháve l . Contudo, entend ia-se que ta l apoio
teria que ser dado sem o compromet imento aberto
1 0 Era exigir demais d o presidente deposto .
d e Vargas .
Com esse obj e tivo, são estabe lec idas conversaçoes
entre Dutra e o PSD de um lado, e o PTB do outro . Esses ente!l
d imentos , julgados essenc i a is por Dutra e rec ebidos de bom grª
do, acabam por desembocar em um compromisso, formal izado em uma
carta confidenc ial assinada pelo candidato do PSD . O teor da
carta é o seguinte :
9
10
" Prezados senhores :
Respondendo a consul t a
que me foi f e i ta, tenho o prazer
de, com a presente, confirmar no-ª.
sos entendimentos pelos quais ficou
assentado o seguinte:
1 ) Quando e l e i to, escolhere i, para
ministro do Trabalho do meu gove�
no,pessoa de minha conf iança, de cQ
mum acordo com o PTB .
José de Segadas Viana (depoimento ) . FGV/Cpdoc, História Ora l . p . 2 8 6 - 89 .
Correspondênc ia de João Neves . GV 4 5 . 1 1 . 14 . FGV/Cpdoc .
28
2 ) O ministério, com exceçao das
pastas m i l itares, será constituído
por e l ementos que apóiam minha can
d idatura, proporc iona lmente ao , n.!!
mero d e votos que me forem conc�
d idos pelos mesmos .
3 ) As in terventor ias serao d istri
buídas, também n a mesma propOl::
çao .
4 ) Apoiarei o programa do PTB e prQ
curarei fazer com que as j ustas
aspirações dos trabalhadores sejam
postas em prática pelo meu governo .
5 ) Reconheço as atuais l e is trabª
lh istas e d e amparo soc ial e prQ
curarei melhorá - l as e
sua aplicação .
aperfe içoar
Ga l . Eurico Gaspar D.!!
o acordo e ra bem vanta j oso para o PTB, o que reve l a
nao so a posição estratégica em que este part ido se encontrª
va i como, igualmente, suas possibil idades efetivas em fut.!!
ro próximo . Em carta dirigida a Vargas , narrando a reun ião
que resu l tara no acordo Dutra/ PTB, Napo leão d e Alencastro Gui
marães traçou com prec isão a posição do PTB face ao pleito d e
1 945-46 . Ele prognost icava : " Não penso que nas presentes e lei
çoes o PTB se j a bem sucedido e l e i tora lmente . Mas se se a l iar
ao PSD nas e l e ições estaduais, a experiência adquirida lhe dará
inquestionavelmente uma posição mui t íssimo forte " . E adiante ,
balanceando as tendênc ias do PSD , UDN ( partidos "conservadQ
res " ) e PC ( partido "avançado " ) , e l e conc luía : "O PTB pela sua
1 1 A carta é con f id en c i a l e está datilogra fada do do PSD . Está datada de 2 2 / 1 1 / 1 945 e tem próprio punho do general Dutra . GV 45 . 1 1 . 14 .
em pape l t imbrª a assinatura d e FGV/Cpdoc .
•
2 9
posição central tem todas a s probabil idades d e ser a grande
força nacional nos anos a vir" . 1 2
A pos ição a tomar face à questão da candidatura pr�
sidencial era fundamenta l . Mas o acordo com Dutra nao e l imi
nara todas as resistênc ias .
A despe ito d e las , a campanha pró-Dutra c rescia e seus
grandes articuladores eram Hugo Borghi, José Junque ira e Nelson
Fernandes , todos queremistas de prime ira hora . É no bo jo de.ê.
ta situação que é c r iada a campanha do " marmiteiro " , um slogan
que surgiu como resposta a um d iscurso de Eduardo Gomes , no
qua l e l e declarara não prec isar dos votos dessa "ma lta" que vai
, . a coml.C l.Os . Borghi verifica que "malta" é um dos sinônimos
possíveis para " marmiteiro" - termo faci lmente ident i f icado
à cond ição de trabalhador - passando , então , a util izar a e�
pressão para mobilizar a massa trabalhadora, que estaria sendo
considerada como um "bando de desocupados" pelo Brigadeiro . A
campanha das !'marmitas" - impressas e distribuídas aos mi lh-ª
, res pelo pal.s - procurava polarizar as c andidaturas , ident i fi
cando o Brigadeiro com um e le i torado d e grã - f inos e Dutra com
o e le i torado dos " pobres/ trabalhadores " .
Os esforços pró-candidatura Dutra, articulados por
lUlla ala do PTB - aque l a de Hugo Borghi - combinavam entendimen
tos confidenc iais e pactos interpartidários , com movimentadas
campanhas de rua , como essa do marmite iro . Contudo , com o eVQ
luir dos acontec imentos , tornava -se cada vez mais c laro para
todos que a pa lavra de Vargas seria essenc ial . Ou s e j a , se em
iníc ios de novembro considerara-se j u� to o si l êncio de Getúl io,
1 2 Arquivo Getúl io Vargas . GV 45 . 1 1 . 1 9 / I . FGV/Cpdoc .
30
tendo s ido entendido como um s in a l de plena l iberdade de açao
para seus companheiro s , no final do mês a s i tuação se alterava .
Cada vez mais dois temores se con so l idavam : o temor do apelo
comunista e o temor da força do Brigadeiro . Ambos atuavam no
s e io das c l a s s e s traba lhadoras, d e sorientadas pela ausência de
Varga s .
Logicamente a preocupaçao era com a d i spersão dos vQ
tos dessa volumosa e e s treante massa d e e le i tore s , trazida ao
c enário pO l ítico pr inc ipa lmente graças ao a l i stamen to ex-o f f i -
c io . o forta lecimento do PC e uma pos síve l vitória do Brigª
d e iro , que agora contava com o apo io aberto da Liga E l e itora l
Católica (ao menos no Rio) , ameaçavam toda a es trutura construi
da pe lo Es tado Novo . Um curto parec e r d e Luís Vergara , enviado
a Varga s , resume mag istra lmente a tônica das vésperas das e l e1
ç oe s :
13
" O naufrágio sera tota l sem a sua
mao no leme . Da orientação que SQ
breveio tudo se pode e spera r , até
mesmo uma guerra c ivi l . S e do chQ
que das urna s não sair uma vitória
l impa , ind iscutíve l , o reac ionari§.
mo ' comp l e. tará sua obra . Unir a s
forças d o PSD e d o PTB é o ún ico
meio d e garantir a vitória do can
d idato e a maioria da futura a ss em
bléia nac iona l . Mas para i s so , é
ind ispensável a sua
ordem " . 13 pa l avra d e
E f in a lmente é s eu irmão , protá s io Varga s , quem seten
Arquivo Getúlio Varga s . GV 4 5 . l l . 24/2 . FGV/Cpdoc .
3 1
cia sobre a importância e o sentido d a palavra d e Getú lio : " Tg
dos sabemos, os teus amigos , que votar no Dutra ( . . . ) , e o mesmo
que tomar um purgante .
nante " . 14
É necessário fazê-lo ainda que repug
o que é fundamenta l reter deste episódio é a centrali
dade da orientação d e Vargas . Teoricamente o acordo PSD/ PTB
está feito . A campanha pró-Dutra está nas ruas . Ma s nada di.§.
to e condição suficiente para a vitória e, sobretudo, nada di.§.
to garantia que as c lasses traba lhadoras estariam sendo sensi
bilizadas . A condição sine gua non estava na palavra d e Va�
gas, em seu comprometimento pessoal . A campanha do " marmitei
ro ", precisava do " E l e disse : vote em Dutra " . Foi esta a palª
vra de ordem e l eitora l que consagrou a recomend ação pública de
Vargas às vésperas das e l eições, para que os traba lhadores e o
PTB votassem em Dutra . Só assim a possibilidade de vitória
de Dutra se redimensiona no en frentamento com o PC e o Brigadei
ro .
E é exatamente isto que é verificado as
e l eições, após a mensagem sa lvadora d e Getú lio .
, vesperas das
Os , . com�c �os
de encerramento da campanha de Dutra - no largo da Carioca e
em Juiz de Fora são considerados " uma apoteose a Getúlio" .
são verdadeiras mani festações queremistas , com retratos e l�
gendas de Vargas e com o conselho : vote no general Dutra .
O resul tado das urnas de 2 d e dezembro , e inequívoco .
O impacto da vitória d e Dutra é comparado por João Neves ao d e
uma "bomba atômic a " . Não havia margem para dúvidas ou qua.l
quer tipo de gOlpismo . O Brigadeiro aceita sua derrota a l guns
dias apos o pleito . O acerto da composiçã o PSD/ PTB ,
e reafi�
mado . A força do nome d e Vargas é reconhecidamente avassaladg
14 Arquivo Getú lio Vargas . GV 45 . 1 1 . 2 1 . FGV/Cpdoc .
ra . Ele era o grand e - e l e i tor do pleito .
32
A UDN colhera efetivamente uma s ig n i f icativa derrota .
Mas sua espinha ant igetul ista era forte e possuía maiores rª
zões a inda para enri jecer. O PSD vencera como part ido , sem a
menor dúvida . Mas e l e já existia como tal antes e independerr
temente dos resul tados d e 2 d e dezembro . Fora o ún ico parti
do c u j a organ ização não partiu da constitu ição de um d iretório
nac iona l e sim da organ i zação de núc l eos mun ic ipa is e estadg
e xecg
Câmª
a is. Sua estrutura assentava-se nos estados , em seus
t ivos e na representação que poderia ser conseguida na
ra e no Senado . A vitória do Brigadeiro seria certamente um
golpe para esta estrutura , mas possivelmente nao um golpe mo];:
tal .
Já com o PTB a situação era d istinta. Tendo graves
d i f iculdades para conseguir seu reg istr o ; não possuindo nenhum
grande nome da pO l ít i c a nac ional ou estadua l , exceto os de Mar
condes F i lho e Getúl io , o PTB não surgira como partido . As
e l e ições de 2 d e dezembro é que o consagraram como ta l . O PTB
se mostrara abso lutamente essenc i a l para o resu ltado obtido
no ple ito , materia l i zando sua existência e possibi l id ades.
O PTB nascera de e para Vargas , a inda no Estado Novo ,
e se a f i rmara nas e l e ições d e 1945 com Vargas . Formado tendo
como base a máquina sindica l , o PTB ultrapassara o PC devido
basicamente ao " El e disse " .
Em d ezembro de 1945 suas perspect ivas eram a lvissarei
ras o E l egera 2 2 deputados e dois senadores e
ra bancada da Const i tuinte . Tudo indicava que ,
formava a tercei
estando Get!i
l io em a t ividade po l ít ica, o PTB teria uma votação nas e l e ições
estaduais de 1 946 a inda maior do que t ivera nas e le ições fed.!'t
ra is . Neste caso , seria inegável que a grande força do parti
33
do es tava em ter Va rgas como cabeça de chapa . Pois foram os vQ
tos con seguidos pelo " presidente " o s responsáve i s pela e l e ição
de pra ticamente todos os candidatos do PTB em nível federa l .
" Da votação do PTB num total de 6 03 . 00 0 votos nas e l eiç5es de
1 9 4 5 , 318 . 000 foram dados a Varga s , que , concorrendo em vários
e s tados , foi e l e ito para o Senado por são Paulo e Rio Grande
do Sul e para deputado federa l na Bahia, Rio de Jane iro, são
Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul , Minas Gerais e D i s trito Fedg
ra l o Vargas fo i , a s s im , o que se convencionou chamar no l inguª
j a r e l e i toral como um grande puxador de l egenda " . 1 5
o part ido porém encontrava - s e conturbado e c indido .
Se e l e existia através das urnas, era quase uma f icção em teJ;:
mos organizac iona i s . Sua des truição, no entanto , envo lveria
necessar iamente o fortalec imento do pc . Ass im, e l e nao podia
desaparecer, e se " sua tendinc ia natura l era a a l iança com o
PSD", esta s6 poderia ser f e i ta com a s pa l avras " so c i a l i sta" ou
"trabalhista " .
Mesmo j á tendo pa ssado por seu· pr imeiro grande
t e , a s ituação do PTB era precária . J á e x i s t i a como partido
que fundado no nome de Vargas -- con seguia reun ir o voto
das chamadas c la s s e s traba lhadoras . Ma s o PTB era Getúl io,
ou s e j a , e l eitoralmente o traba l h i smo e spe lhara sua face ideQ
l6g ica . Trabalhismo era getu l i smo , pois fora " inventado" ne.ª-
tes termos . Contudo, pensar e e s truturar o PTB como organ izª
çao polít ica e construir um traba lhi smo d i s tinto de Getúl io,
eram desafio s que, até certo ponto , s e impunham para a continui
dAde do partido e d a pr6pr ia l id erança pessoal de Varga s .
1 5 Verbete "Partido Traba lhista Bra s i l e iro ( PTB)" , em I s rael Beloch e A l z i ra Alves de Abreu,Dic ionário h i s t6rico-biográ fico bras i l e i ro . Rio de Janeiro , Forense-Univer s it á r ia ; Cpdoc /Finep, 1984 . Ver também Augusto do Amaral Peixoto ( depoimen to) . FGV/Cpdoc H i st6ria Oral , 1 9 7 5 . p . 345 .
3 4
o PTB d e 1945 a t é a volta d e Vargas
o PTB sai das e l eições de 1 945 e 1946 com prestígio
e l e itoral conso l idado . Sua presença enquanto partido com um
e l e itorado crescente em nív e l nac iona l , seria conf irmada a inda
nas e l e ições de início e f ins de 1 947 . Sem dúvida nenhuma ,
esse sucesso nas urnas era oriundo de dois troncos : a l ideran
ça de Vargas e o traba lhismo . Entretanto , o PTB nao vivia apg
nas da exploração e l e itora l e ideológica desses dois fa tores .
Havia outro e l emento da maior importância para sua performance
pOlítica : suas bases sind icais .
Enquanto partido o PTB estava assentado nos sind icª
tos . Por orientação do próprio Vargas, os organizadores do
PTB deram prioridade a esse t ipo de quadro com o intuito c laro
re dar ro partido um cunho eminentemente sind ica l ista . Segundo JQ
sé Gomes Ta larico, um dos fundadores do PTB em 1 945, as l istas
de assina tura para a c r iação do PTB foram co lhidas I Ino insti
tuto dos comerciár ios, nos industriários , por parte d e assegg
rados , no inst ituto dos marít imos , no IAPETEC , enfim , nas orgª
n i zações em que a pr�sença do traba lhador era permanent e " . E�
sa preocupação esteve também presente na esco lha dos c and idatos
do partido em 1 9 4 5 . o ob j e t ivo de " formar o partido n a base
de líderes sind icais" l evou a que se preterisse candidaturas de
FUNDAÇÃO GETl)L/O VARGAS ' INOIPO I C POOC i 3 S
antigos funcionários d o Ministério d o Traba lho em pro l daquel a s
l ideranças , o que s e buscava era exatamente "dar uma chance
aos representantes s indica i s " e , com i s s o , centrar no parti
d d b Ih d ' d ' I ' d 1 6 o a marca o tra a a or S 1n 1ca 1za o .
Outros exemplos con firmam e s sa orientação , Uma das
ma i s expre s s iva s f iguras d o PTB na Para íba dec lara que neste
estado "não t inha um só pre s idente d e s ind icato , novo ou ve lho ,
que nao fosse , 17 -membro d o d iretorio do PTB " . Em Sao Paulo a
s ituação se repete . Essa s i s temática daria ao partido emergen
te o conteúdo necessário , a s suas apregoadas bandeiras getuli§.
ta e traba l h ista . A presença marcante d e l ideranças s ind icais
operaciona l izar i a , em termos prá ticos , a partic ipação dos s indi
catos na pO l í tica instituciona l e , nesse sentid o , acionaria
diretamente aqu i l o que era a matéria-pr ima por exce lên c ia do
traba lhismo getulista : o traba lhador organizad o .
Discutir a s conotações corpora t ivas dessa organizª
çao foge aos l imites deste traba lho, que tampouco visa ana l isar
acuradamente o pape l do PTB como instrumento de representª
ção po l ítica dos traba lhadore s . O que importa ,
reter aqui e que
o PTB surge como um part ido que tem por função cana l izar os e§.
forços inve stidos pe l o Estado Novo na organ ização s indical dos
traba lhadores , e, n e s tes t ermo s , e l e foi bem sucedido .
Se Vargas não era , n em nunca foi , um homem a f e ito , a
pO l ítica partidária , não deixa de ser verdade que sempre procy
rou as mais adequadas fórmul a s pol íticas no sen t ido de capitª
l izar o apoio popular . O PTB foi um es forço c l aro n e s sa d i r�
çao . Não era e s sa a prime ira tentativa d e s s e teor ; no entan
1 6 Jo sé Gomes Talaric o ( depo imento ) . FGV/Cpdoc , H i stória Oral . p . S .
1 7 Hermano d e S á ( depoimento ) . FGV/Cpdoc , H i s tória Oral . p . 2 8 .
3 6
t o f o i a prime ira que , n o Bras i l , conseguiu chegar a bom termo .
Por tudo isso , o PTB foi o lado ma i s modernamente organ izado da
po l í tica trabalhista : os s indicatos tornavam-se as ba ses efeti
vas de um partido político .
Algumas d e suas seçoes conseguiram s e e s tabe lecer em
ba ses muito só l ida s , como por exemplo Rio Grande do Sul e Di stri
to Federa l . No Rio Grande do Sul o PTB era o part ido hegemôni
co e esta seçao regiona l era a ma i s importante de , todo o pa�s .
Nem o PSD nem a UDN conseguem se articular como forç a s s igni
f icativas de s i tuação ou opos ição n e s s e e stado . A fonte desse
poder era or iunda fundamentalmente da l iderança e do contro l e
que Vargas exerc ia sobre a pOl ítica d e seu e stado nata l . Não
é surpreendente que nasça exatamente no Rio Grande do Sul um
dos e s forços mai s marcantes de construção d e uma doutr in a
traba lh ista para o part ido : Alberto Pa squa l i n i .
Já no D i s trito Federa l , embora igualmente fort e , o
PTB depara-se com uma força riva l . A UDN possuía na capital
federal bases soc i a i s s ó l idas advindas ba s icamente de um ape lo
popular muito bem construído pela l iderança de Carlos Lacerda .
Outras un idadp. s da federação t iveram um PTB expr e s s ivo mas nao
compa ráve l aos dois casos anteriores : Rio d e Janeiro , Amazon a s
e Minas Gera i s .
são Paulo seria um caso notável d e contradições .
Sendo o e s tado que possuía o movimento operário e s indical
ma i s importante do país . tudo l evaria a supor que o PTB pauli�
ta estaria fadado a ser um grande partido . Não é isso que Q
corre . Contud o , e steve longe d e ser um part ido " fraco " . Foi
sempre uma força pol ítica chave nas grandes articu l ações parti
dárias quer a n ível e s tadual , quer a nível federa l . Mas nunca
conseguiu grande suc e s so e l e itoral e teve que compet ir
3 7
mente j unto à s mass a s traba lhadoras mob i l i zadas por outras li
deranças corno a do ademar ismo e sobretudo a do j a n i smo .
natura lment e , sem falar do pape l dos comun i stas .
I s to ,
Não obstante o sucesso da proposta e os resultados
ele itorais favorávei s , o PTB desde muito cedo mergulharia numa
crise abi s s a l de orga n ização . É interessante observar que e.§.
ta crise será maior , em todo o pa í s , a proporção que o seu
sucesso ele itoral aumenta . É i s so exatamente
ca pr inc ipa lmente a partir d e 194 7 , l ogo após
o que se ver i fi
a s e l e ições e s tª
dua i s de janeiro, para se agravar a inda mais nas
c ipais de novembro .
e l e ições muni
Desde sua criação existiu no PTB um grupo que se prQ
pos a apoiar a candida tura Dutra e poster iormente seu governo .
E s s e grupo era l iderado inic ia lmente por Luí s Augusto Fran
ça e depois pelo pau l i s ta Hugo Borgh i , que e ra insis tente d e fen
sor da a l iança do PTB com o novo pre s idente . Mas a s divergên
cias não se restr ingiam apenas ao tipo d e re lação que o parti
do deveria ter com a administração governamenta l . Lideranças
exponenc iais c orno Segadas Viana , Danton Coe lho , Marcondes Fi
lho , Hugo Borghi e Baeta Neve s , dentre outros , v ivenciaram ri
va l idade s constantes que s e traduziam em c r i s e s suc e s s ivas .
Baeta Neve s , pres idente do PTB desde a sua prime ira convençao
( 1 4/ 8 / 4 5 ) , era objeto d e freqüentes críticas por parte de Ma!:
condes F i lho até ser subst ituído em j u lho de 1948 . Ne s s e momen
to , o cargo passa a ser exerc ido pelo próprio Varga s e a vice
pre s id ência por Sa lgado F ilho . O que está s empre em j ogo ne.§.
sas d ivergênc ia s , a l ém das n a turais d i sputas pe lo poder dentro
do partido , é o tipo de compromisso que a agremiação deveria
ter com o movimento popular . Baeta Neve s , por exemplo , seria
acusado várias vez e s d e e squerd i smo e o grupo l igado a Borghi
38
rotulado como o " PTB palac iano " .
De qualquer forma , o que s e observa d e 1 945 a 1 948
e um aprofundamento dos problemas do partido do ponto de vista
organ izaciona l . Essa c r i s e não sign i f icou obstrução ao cresci
mento do PTB em termos de diretórios mun icipa i s . Ao contrár io ,
e s se período foi exatamente o momento de nac iona l i zação do pa!:
t ido no sentido de sua presença em todo o território bra s i l ei
ro . Esse crescimento , porém , tem s eu lado negat ivo , pois permi
te que se a l imentem d i s putas internas . Mas a crise nao se re�
tringe a e s s a expan sao tão rápida quanto de sordenada . E l a era
ba sicamente uma ques tão d e identidade . o PTB e s tava , efetiva
mente , vivenc iando no d ia-a-dia a prob lemática de ser tanto um
partido de traba lhadores e l ideranças s indica i s , quanto um pa!:
t ido de Varga s . Como um partido de bas e s s indica l istas , com
portava d ivergências em nada desprezíve i s . Como um part ido fun
dado na mística de Varga s , atraía muitos inter e s sados em ti
rar proveito dessa incríve l fonte d e votos . Brigava - s e , em sg
ma , pe las formas de conquistar o apoio dos trabalhadore s ,
também pelo controle do prestígio d e Varga s .
como
Se o PTB era em grande parte o partido de Vargas e
i sto lhe trazia ben e f íc io s ímpares , por outro lado ,
va problemas muito sério s . O "don o " do partido era maior do
que o próprio partido . Além do mais , havia muitqs que se autod�
nominavam herde iros n a tura i s e legítimos repre sentantes desse
chefe pOlítico e " patrão " .
Examinando d iversas fontes document ai s , e poss {ve l
e stabe l ecer uma cronologia na traj etória do PTB que i lustra
bem o ponto de vista que está sendo destacado . Até meados d e
1947 a grande preocupação d o s trabalhistas e d e Vargas e ra com
o cresc imento e forta lec imento organ izacional do partido . Mas
39
as d iscussões e confrontos que dominavam o PTB revelam a d ive!:
s idade de grupo s , bem como a inten s idade que a luta interna gª
nhara nesse per íodo . o caso d e são Pau lo é um exemplo paradig
mático desse impa s s e . As e l e ições d e s se ano ocupam bastante a
vida po l í tica do pa í s e o suc e s so e l e itora l do PTB só faz acen
tuar sua s que stões de organização . No início de 1948 e la s s�
rão marcantes e vários e s forços são tentados no s en tido de nQ
vamente reestruturar seus quadros . Um partido sol idamente o!:
ganizado é a palavra d e ordem que busca contornar , sem suc e s so ,
o desentend imento crescente em seu seio .
Em meados d e 1 948 parece que e s sa s ituação e
da . Alz ira Vargas , decepc i onada com o rumo dos acontec imento s ,
cheg� a declarar que o PTB " não existe mai s " . 1 8 t nessa a ltura
que se efetua uma mudança na pre s idência do partido . E l a passa.
a ser forma lmente preenchida por Vargas e de fato ocupada pelo
vice , Sa lgado F i lho . Este era um antigo s eguidor d o ex-presi
den t e , que mant inha as melhores relações com o s diversos
grupos dentro do partido . A mudança na Execut iva Nacional nao
era apenas uma forma l idade para d i s s ipar atritos . Ela coinci
dia com uma fase do PTB . A partir d e s s e momento ,
e fácil oQ
servar que a ênfase nao reca i mais n a questão da organ i zação
do part ido . A preocupação central s erá a d e resgatar a fig�
ra de Vargas no plano nac iona l e trans formar novamente o quer�
mismo na mol a mestra do PTB . Este s e a s sume c laramente como
um partido de Vargas , a s s im como o fora em 1 94 5 . o que e s en
t ido por Alz ira como uma " virada queremista" e , na verdad e , a
retomada do curso anter ior e " natura l " d o partido . Enquanto
1 8
Carta a Getú l io Vargas d e lO/6/ 1 9 4 8 , Arquivo AVAP , FGV/Cpdoc .
40
Vargas exi s t i s s e , o PTB s eria queremi sta e teria que s ê - lo ,
porque Vargas era maior que o partido . o PTB prec isava de VaX
gas , mas a rec íproca não era verdadeira , ao menos na mesma di
men sao .
A súbita morte de Sa lgado Filho , em 3 0 de julho de
1 9 5 0 privava o part ido de um comando que vinha gerindo a corr
tento sua orientação getu l i s ta e traba lh i sta . Sa lgado .
sera
substi tuído por Danton Coe lho, homem d e con f iança d e Vargas e
um dos princ ipa is art iculadores d e sua cand ida tura , mas que nao
contava com o apoio unânime do part ido . Em junho d e 1 9 5 1 , Darr
ton , que era então também min istro do Traba lho, foi pratic.ª-
mente coagido a abandonar a pre s idência do PTB , episódio no
qua l fora improtante a a tuação da seção paul ista . Na l inha
de suce s são de pres identes do PTB , observa - s e que e s s a função
pa s sará a ser exerc ida por pessoas c u j a s l igações com Vargas
sao de ordem fami l ia r ou de profunda a f in idade pessoa l . Darr
ton será subst ituído por Dinarte Dornel l e s , primo do pre s idente
para , exatamente um ano depo i s , n a V Convenção do PTB , pa ssar o
cargo a João Goul art , disc ípulo d i l eto d e Varga s . Goulart pex
manece nesse cargo até maio de 1 9 6 4 , quando j á cassado e auserr
te do país é supstituído pe lo f i lho de Getúlio , Lutero Varga s .
No exercício deste ú l t imo o PTB é extinto por força do· A I - 2 ,
em setembro do ano seguinte .
4 1
o PTB e o Ministério d o Trabalho
Se as questões internas do partido foram problemáti
cas no período que va i de 1 9 4 6 a ) 9 5 0 , o mesmo pode ser dito de
suas relações com o Ministério do Traba lho .
o grande a rquiteto do suporte de mas sa s que o PTB ti
vera fora o últ imo m in i s tro do Traba lho do Es tado Novo , Alexan
dre Marcondes F i lho , que , ao a ssumir e s ta pasta em meados de
1 94 2 , desenvo lveu um amplo e's forço s ind ical e doutrinário no
meio das classes traba lhado ra s . Portanto o PTB , em sua di
nâmic a , nao pode ser entend ido sem um exame .de suas relações
com o Ministério do Trabalho e obviamente com a diretriz poli
t ica aí dominante em re lação ao movimento s indica l .
É muito signi ficativo que , j á nas a rticulações para a
e l eição de Dutra em 1 9 4 5 , a pasta do Traba lho tenha s ido o gran
de prêmio o ferec ido ao PTB por s eu apoio e l e itora l . Em decoJ;:.
rência , a partir d e s s e acord o , a tradição f i rmada é de que dev�
ria caber aos trabalhi stas a condução desta importante ,
area
po l í tica . É compreensíve l , a s s im , que a s aproximações e a fa�
tamentos entre PTB e M in istério do Traba lho s e j am um ind icador
importante para a ava l iação da força d o part ido e de sua trª
dução em termos de presença pO l ít ica governamenta l . Neste sen
tido o período que vai de 1 9 4 6 a 1 9 50 é bem i lustra tivo .
4 2
D e in ício cabe observar que foram quatro os mini�
tros do Trabalho d e Dutra , sendo que nenhum d e l e s pode ser quª
l i ficado como um quadro do PTB . o governo Dutra vai se ca raÇ.
terizar por permanentes tensões no ministério e por uma poli
tica s ind ica l crescentemente repres s iva .
o primeiro nome e scolhido para a pasta do Traba lho
foi o de Otac í l io Negrão de Lima , mine iro que havia part icipª
do da campanha do PTB em seu estad o , mas que certamen te nao
pode ser caracterizado como um traba lhista de " primeira hora " .
Mas os de scontentamentos do PTB es tavam apenas se ini
c iando . A aprovaçao pelo pre s idente da República do Decrg
to-lei n 2 9 . 07 0 , que praticamente cerc eava o d ire ito de greve
e revi via a obriga toriedade do atestado de ideoiogia para os
cargos de d ireção s indica l , provoca grande reação no meio s indi
cal e também no PTB . Neste ponto va le recordar que , pelo mg
nos desde f ins d e 1 9 4 4 , o c l ima po l í t ico �o movimento
rio se a l terara sign i ficat ivamen te . Do ponto de vista expl ici
tamente repressivo , o Estado Novo e s tava morto e a s s i s t ia-
s e , na verdade , a um franco crescimento da l iberdade sind ic a l .
o ano de 1 9 4 5 foi marcado por e l e ições sindicais reconhecidas
pelo Ministério do Trabalho , mesmo quando os novos d irigentes
escolhidos eram iden t i f icados como s impa t izan�es da e squerda .
As relaçõe s e a presença dos comun istas nos s indicatos cre scg
ram e foram habi lmente toleradas pe la orientação ministeri a l .
A anistia para Lu í s Carlos Prestes , a campanha queremi sta , a 19
gal ização do Partido Comun ista e a organização do Movimento Uni
ficador dos Traba lhadores ( MUT ) dão bem uma idéia da nova reª
l idade que se vivia . Não é surpreendente que .
o numero de grg
ves tenha aumentado durante o ano de 1 9 4 6 , a s s im como o poder
mobi l izador dos s indicatos , onde comun i sta s e traba lhistas d i�
4 3
putavam e d ivid iam in fluência e poder .
A nova orientação do governo Dutra e d e seu min i s tro
Negrão de Lima demon strava a c lara intenção de reverter tal
proce sso , aumentando a d ireção tute lar do Ministério do Trab!!
lho sobre o movimento s indica l . Já que esta pasta deixara de
estar sob o contro l e d o PTB e até mesmo d e Varga s , a tentati
va se a f igurava como uma ameaça, não só d irigida aos comunL�
ta s , como também a o s própr ios s ind ica l istas l igados ao trabj!
lhismo .
É nesse contexto que se deve s ituar a real ização do
Congresso S ind ica l dos Trabalh istas do Bra s i l , patroc inado
pelo Min istério do Trabalho e que reuniu no R i o , em setembro
de 1946 , cerca de três m i l d e l egados s indicais de todo o Br!!
s i l o o congre sso é como um teste de forç a , em que a a l a mini�
teria l i s ta s a i amplamente derrotad a , pois sao e lementos do PC
e também do PTB que c on seguem controlar a maioria dos d e leg!!
dos . o resultado é a criação da Confederação Geral dos Trab!!
lhadores , um dos pontos de fendidos pelo MUT , e a ret ir.ada dos
min i st�riali stas do congre s s o . Estes pros seguem sua reun ião
part icularmen te , decid indo pela formação de uma Confederação
dos Traba lhadores do Bra s i l .
Na verdad e , ambas a s confederações sao e fêmeras e a
consequpnc ia mais .
s ign i f icativa d e s s e congre sso e a queda do
ministro do Traba lho Negrão d e L ima , que acabará se l igando ao
Partido Traba lhista Nac iona l ( PTN ) . E l e .
sera subs tituído pelo
empresário paul ista , vice-presidente da FIESP , Morvan Dias Fi
gueiredo . Efe tivamente a entrada d e um empresário tl na.c iong
lista" l igado à pequena e média empresa para a pasta do Trab!!
lho , Indústria e Ccmércio é sugestiva . A década d e 1 9 4 0 a s s in!!
la a forte influência empresarial na formulação das pO l íticas
44
econômica e soc ial do pa í s . Sem dúvida a inqu ietação com o
movimento operár io so crescera apos 1 9 4 5 , e a necess idade do
estabelecimento de novas forma s de con tr o l e sobre e s ta reali
dade era uma tôn ica no meio industrial e comerc ial .
Mesmo que se considere que o nome de Morvan Dias Fi
gue iredo po ssuísse trânsito no PTB , não se tratava obviamente
de um traba lhista . Além do mai s , a s i tuação po l í t ica e inte�
nac ional estava mudando . o c l ima da guerra fria começava a ch�
gar ao Bra s i l , o que c ertamente a l imentou a diretriz repres si
va que vinha sendo articu lada dentro do min istério . Nestes te�
mos , a admin istração de Morvan Figueiredo é crucial . Segundo
Hugo Faria , então d e legado reg iona l do traba lho na Bahia , o nQ
vo minis tro montou um exc e l ente serviço de in formaçõe s , que
funcionava recebendo e transmitindo comun icações para todas a s
d e legacias do trabalho d o pa í s . Dessa forma , uma equipe inst-ª.
lada no Rio reunia dados sobre pra t icamente toda a l iderança
s indica l , ana l i sando suas tendênci a s pO l ít ica s . As re lações
então existentes entre s indicatos e Partido Comun ista eram -ª.
berta s , e muitos d e l e s contribuíam f inance iramente para o MUT ,
que era 1 9 proibido l ega lmente . Vale acrescentar que n e s sa
s i tuação muitos l íderes s ind ica is traba lhistas eram iden t i fi
cados como comun i s ta s , da mesma forma que a lgun s d ir igentes
do próprio partido foram acusados d e e squerd ismo .
A partir de 1 9 4 7 e principa lmente a partir d e ma i o ,
quando o reg istro do P C é cassado , d e senvolveu-se todo u m prQ
cesso de intervençõe s s ind icais que prat icamente conge lou e s ta
área , afa stando-a d o palco pOlít ico por esva z i amento . A retQ
mada da vida s indic a l só seria feita de forma s ign i f icativa
1 9 ' Hugo Faria ( d epo imento ) . FGV/Cpdoc , H i s toria Oral . p . 6 , 1 1 - 4 e
2 6 - 7 .
4 5
após a e le ição de Va rgas e , ma i s prec isamente , com a entrada
de João Gou lart prime iro para a pre s idência do PTB em 1 9 5 2 e em
seguida para o própr io ministério em 1 9 5 3 . O período que vai
de 1 9 4 6 a 1 9 5 3 é como um in terregno que frustra a redemocrati
zaçao na área da po l ítica s indica l . Da ótica que nos intere.2
sa ressalta r , a ausência de cresc imento e d e e fervescêcncia nas
organizações sindicais acaba também por a t ingir o próprio
PTB , que vivia inegavelmente e ambiguamente da força e da in
f luênc ia do s indica l i smo na vida pOl ítica nac iona l .
tura sobre o a s sunto conve rge , ao ass inalar que est iveram em
torno d e 1 4 3 o número de s indicatos sob intervenç ão , num tota l
de 9 4 4 . Também há acordo quanto à a f i rmação d e que d e 1946
a 1 9 5 2 prat icamente não houve cresc imento na organ ização s indi
c a l . Este só foi retomado n e s ta data , para a t ingir seu c l ímax
entre 1 9 6 1 e 1 9 6 3 .
É interessante observar igualmen te o pape l centra l
desempenhado pe l a s d e l egac ias regiona i s do traba lho , que se m0.2
traram tão fundamenta i s para o desmante lamento d e um certo peK
f i l de s ind ica l i smo , quanto o t inham s ido para a sua mon tagem .
Não é dema i s l embrar que os d e l egados reg iona i s , sediados em
todo o país , foram peças bá s icas n a mob i l i zação dos trabalhadQ
res e na montagem dos núc l eos e s tadua i s do PTB . No período
final do Estado Novo muitas d e l egacias regiona i s fun c ionam
como verdadeiras sedes do PTB , que , como partido , u t i l i zava
ampla e l ivremente a e strutura e os recursos do Min i s tério do
Traha lho . Não é d i f ícil imaginar a rede d e . interesses e reI.!!
ções que se cria com t a l d inâmica e o quanto o
o traba lhismo ficam abalados , quando a pOl í t ic a
s indica l i smo e
de interven
çoes subverte e s te pacto , invertendo a orientação inicia l .
�Iorvan Dias F igue i redo permaneceria no cargo de mini.2
4 6
tro até se tembro d e 1 9 4 8 , quando s e retirou para a s sumir a pr�
s idência da F I E SP . Doi s outros ministros a inda ocupariam esta
pasta : o d eputado do PSD , Honório Fernandes Monte iro e o
func ionário de carreira do Ministério do Traba l h o , Marcial
Dias Pequeno . Em ambas a s e scolhas o PTB não fora bene ficiad o ,
permanecendo a f astado d e uma á rea pol í t ica que ,
era seu feudo e sua vocação .
em princípio,
4 7
o PTB e a propaganda d o traba lhi smo
Quando o ministro do Trabalho Marcond e s F i lho rea li
ideólQ zava sua pregaç a o doutrinária a ind a no Estado
gos do traba lhismo pod iam d i spor de todos os
Novo ,
meios
çao e scrita e f a l ad a para propagandear
l idade não ma i s ocorreria a pós 1 9 4 5 .
sua s idé ia s .
A l iberdade
o s
d e in formª
Ta l faci
de imprensa
que pa ssa a vigorar no pa í s terá como um de seus derivantes o
fato d e que tod a a grande imprensa a s sume uma posição nit idª
mente antigetu l i st a e , por conseguinte , omi s sa ou contrá r i a
a o PTB . Enquando o PC mant inha s e u tradic iona l j orna l , a Voz
Operári a , o mesmo não ocorr i a com os traba lhista s . Embora o s
grandes j orna i s nao fos sem porta -vozes d iretos d o PSD e d a UDN ,
é fato pac í f ico que vários d e s s e s periódicos a ssumiam c l a rame.!!
te pos ições ma i s d e f inidas em favor d e um ou d e outro , princi
pa lmente nos momentos e l e itora i s . Além do ma i s , havia sempre
em sua s páginas espaços consagrados à d i scussão d a s or ientª
ções e posições d e s s e s pa rtidos , j á qUe a UDN e o PSD reuniam
o que havia de ma i s signi ficativo em termos das e l ites políti
c a s de s i tuação e opo s ição .
Em relação a o PTB o mesmo nao ocorria , devido à ine�
pre s s ividade de seus quadros pol íticos e à sua declarada vinc),!
lação com o ex-d itador . Ma s a o PTB na o interes sava a pena s a
48
in formação pO lít ica factua l . Na qua l idade d e partido que postg
lava uma identidade doutrinária espec í fi c a , era importante CO!!
tar com um meio de comun icação que lhe permi t i s s e propagar t a l
identidade . I sto será , sem dúvida uma d a s ma i s fortes preocg
pa çoes d a s l ideranç a s do pa rtido no decorrer de muitos anos .
E é fundamental entender que o dese j o d e sustentar e
revivi ficar a doutr ina traba lh i sta , traduz i a a percepç a o poli
t ica de que esta era , e deveria cont inua r sendo, o grande recu�
so de poder do PTB , equipa rando-se e con fund indo-se em termos
de importânc i a apena s com a figura de Varg a s . A impo s s ib i li
dade de veicular e s s e apelo ideológ ico t inha conseque n c i a s grª
ves pa ra o pa rtido . Enquanto o PSD s e definia como s i tua c iQ
n i s ta e a UDN como opo s iç ã o , o PTB carecia d e uma e XP l i c itação
ideológica ma ior que sustenta sse sua · identidad e , e spec i ficamen
te junto às c l a s ses traba lhadora s . Era tido como e s senc i a l
pa ra o PTB manter d esperta a idé ia e a or igem de sua constitu i
ça o . Nesse sentido , a preocupação com a propagand a reun i a numa
mesma moeda funções ideo lóg i c a s e pragmát i ca s . Pretend i a - se
fazer chegar a o traba lhador uma mensagem obj e t iva e a o me smo
tempo lembrar-lhe a importân c i a e e f icácia do pa tr imôn io que já
d i spunha para a defesa de seus intere s s e s . A visão d e Ivete
Varga s a este respeito é um re sumo i lustrat ivo desse modo de
pensa r .
" Na real idade o traba lhador .
e mui
to obj e t ivo ( . . . ) antes de 1 9 3 0
ele n ã o t inha garantia no emprego ,
n a o t inha horá r i o d e traba lho , não
t inha a menor e stabi l idade ,
nha direito a lgum . E l e
nao ti
traba lhª
va dependendo d o s patrõe s , que eram
todo-pod eroso s ( . . . ) Então , o trª
ba lhador tem consc iênc i a de que
4 9
e l e f o i incorporado rea lmente , a
sociedade bra s i l e i ra graças à l�
g i s lação soc ial que Getúlio Vargas
propic iou aos traba lhadores do Brª
s i l o Não emocionava à c l a s s e op�
rária o fato d e ter havido um perío
do de exceçao . Não emoc ionava à c la sse operá r ia o fa to d e , nos
desvãos da exceção , terem acont�
c ido as c o i s a s que s empre acontecem
o que o ,
nos desvãos da exceçao .
traba lhador reg i s trava e que naqu�
l e instante e l e era um homem que ,
quando t inha um emprego , t inha hor�
rio de traba lho , t i nha salário mi
n imo , t inha a previdência
para lhe propiciar uma
c i a méd ica , t i nha seguro
t e , t inha perspect iva d e
doria ; en f i m , e l e
t . ,, 20 1r .
pa ssou
soc ial
a s s i stên
de ac iden
aposentª-
a exil!
Se a marca pr imeira do PTB era ser o d e fensor e con
t inuador da obra social de Varga s , a s va riantes e os ma t i z e s
ideológicos que poderiam derivar d e s sa proposta seriam múlti
pIos . Ta nto é a s s im que até ho j e a d e f i n ição do que s e j a trª-
ba lhismo entre nós é ba stante pOlêmica . E l e tem s ido a ssoe iª-
do indist intamente a s indica l i smo , a Varga s , a nac iona l i smo ,
a soc i a l i smo , a autoritarismo , a popu l i smo a até mesmo a com�
n i smo e a democra cia soc ia l .
Sem fazer uma r e f lexão ma ior acerca do problema , , e
importante reter que o e s forço doutr iná rio foi sempre um cuidª-
do e uma ambição dos d ir igentes traba lh i s ta s . Certamente e l e s
próprios n ã o concordavam entre s i quanto a o conteúdo d o a s sun
to . Em função d i s s o a s iniciativa s eram var iada s e raramen
20 Ivete Varga s ( depoimento ) . FGV/Cpdoc , H i stória Ora l . p . l04 - 5 .
5 0
t e agradavam a todos o s grupo s .
t ponto pac í fico que o part ido contou com a pre sença
de a lguns ide61ogos da maior relev;nc ia . Entre e l e s destacam-
se Alberto pasqua lin i , Lúcio Bittencourt , San Tiago Danta s , PQ
dendo- se incluir também Sa lgado F i lho . Eram todos f igura s de
grande milit;ncia pol í t ica dentro do part ido , que ao mesmo tem
po desenvolviam ampla a t ividade intelectua l visando mo ldar um
corpo doutrinário para o trabalhismo . O conteúdo destas propo.§.
tas é ainda pouco conhec ido e c e rtamente um e s tudo mais apurado
do trabalhismo não pode prescindir dessa anális e .
Mas é importante registrar que a o lado dessa preocu
paçao intelectua l , restr i ta a um pequeno c írculo , o PTB também
esteve muito interes sado na propaganda de s eu ideário e objeti
vos através dos meios de comunicação de mas sa .
Pod e - s e constatar um e s forço cont ínuo entre 1 9 4 6 e
1 9 5 0 no sentido de organizar jornais traba lh i s ta s . Vários peri6
dicos desse teor aparecem n o decorrer do período , mas ao que t�
do indica , apenas um d e l e s pertenceu e fe t ivamente ao PTB . t o
j orna l A Democracia , que reaparece em abri l de 1 9 4 5 com um prQ
grama inic ia lmente popular e sem l igações pOlíticas com parti
dos . Em junho d e 1 9 4 6 o j ornal pas sa para o controle da ,
recem-
c riada empresa SAIGOM - Soc iedade Anônima d e Indústria Grá f ica
o Marmite iro . o nome da organização é uma a lusão d ireta , a cam
panha pres idenc ial d e 1 9 4 5 e ao incidente dos "marmiteiro s " , tão
bem capital izado à época pelos partidários da candidatura Dutra .
Com uma orientação n itidamente getu l i s ta , o j ornal , e comprado
pelo PTB no início de 1 9 4 7 , passando então a fazer uma ampla
propaganda do part ido e a l imentando em suas páginas a expe�
tativa do retorno de Varga s . Convivendo com uma s i tuação
f inance ira extremamente d i f íc i l , A Democracia ,
e fechada em nQ
5 1
vemhro desse mesmo ano .
. � Outros periódicos deram também cobertura as ques tões
do traba lhi smo , embora nao se d e f in i s sem explicitamente como ó�
gãos l igados a qua lquer partido . E s s e era o caso do j ornal
Diretrizes ( 1 9 4 5 a 1 9 50 ) , da Revista Trabalhi sta ( d ezembro de
1 9 49 a agosto de 1 9 5 0 ) e Diretriz Operária ( março a junho d e
1 9 5 1 ) . De sua s páginas brota exc e l ente ma terial para a aná l i s e
a s s im dos traba lhismos , em sua s di ferentes concepçõe s ,
transpa rece claramente a s d i ficuldades para se chegar a
como
uma
l inha mais consensua l , quanto ao que deveria ser o papel e a
pos ição do PTB face à doutrina traba lhi sta .
Se , por um lado , ao fim do governo Dutra ,
nuava enfrentando d i f iculdades organizativa s ; se
o PTB conti
a s relações
com o Minis tério do Traba lho obstacul i zavam sua atuação e , se em
termos doutrinários os en tendimentos eram precário s , por outro ,
pode-se verificar que a l ideraça de Va rgas fora sufic iente para
manter a espinha dor s a l do partido e para garantir sua e leição
pres idencia l em 1950 .
•
52
, O "queremo s " volta a s rua s
No período de 1 9 4 6 a 1 9 5 0 a s forç a s políticas dominan
tes d iagnosticariam, sempre e com muito cuidado , que a poss ibi
l idade do retorno do então senador Varga s ao poder nao era tão
remota . Decididamente , o genera l Eurico Ga spar Dutra fora e l ei
to pres idente da Repúb l ica , gra ças a s eu a poio . Não havia de§.
pon tada nos me ios po l íticos uma l iderança popular capa z de co.!:
roer seu prestígio e a campanha queremi sta , em 1 9 50 j á ganhara
as rua s . Por todo o pa í s são criados comitês pró-candida tura
Getú l io Varga s .
Do ponto de vista de Dutra e dos uden i st a s , deveria
ser formulada uma a l terna tiva viável capaz de impedir a v itQ
ria do ex-presidente . Para tanto ensaiou-se uma a l iança entre
UDN e PSD , visa nd o o l a nçamento de um candidato de união naciQ
na l . Essa fórmu l a , quer por intra nsigênc i a s partidária s , quer
por obstáculos de convivências entre e s s e s partido s , acabou
falhand o , e os dois , a s s im como em 1 9 4 5 , compareceriam ao pIei
to com candidatos própr ios .
Embora ambos os partidos tives s em o mesmo temor quan
to a o retorno d e Varga s , e stavam inscritos em re ferenciais d í§.
pare s : o pre st ígio e l e itora l do PSD pa s sava pela nao hostil izª
5 3
çao a o getulismo ; a o pa sso que com a UDN acontecia exa tamente o
contrário . Ta l incompa t ibil idade f icou expressa em 1 9 4 8 , quarr
do e s s e s partidos ensa iaram um acordo interpart idário v i sando pri!!
c ipa lmente a suc e s são pre s idenc ial e buscando para tanto uma
solução consensual . Neste caso pa rticular , a UDN cogitava de
uma alternativa que , reun indo as principa i s correntes políti
ca s , fosse capaz de marginal izar o getu l i smo . Essa era uma posi
ção extremamente contrad i tória para o PSD , que nao consegue , por
tanto , efetivá - la .
Enquanto os dois partidos re feridos d i scutem, sem sg
c e s s o , fórmulas e h ipóteses para a apresentação d e um cand idª
to d e consenso que excluísse o nome de Vargas e margina l izasse
a s forças popul i s ta s , Vargas entrará em c ena ostentando exatª
mente seu lado popula r , formando j unto a Adernar d e Barros
governador de são Paulo -- urna frente popul ista . Sua candidª
tura é urna resposta à incapac idade do s i s t ema partidário em o f�
recer alternativas s a t i s fatórias a nível das próprias e l i te s
e terá , também, um sentido d e d e s forra daqueles que o haviam d�
posto em 194 5 .
Vargas entrava na d i sputa e l e i tora l com um forte
pa ldo para sua campanha . I sso se dava nao porque viesse
fraldando a bandeira do PTB , part ido do qua l era pa trono v i tª
l ício ; ma s porque se apre sentava corno a ún ica l iderança po l íti
ca capaz de sObrepor-se a intere s s e s particulares e aos pa rtidos
exi stentes . Ta i s cond içõe s eram por e l e enfat icamente
tadas corno habil itação e s senc i a l pa ra o bom desempenho
ções de governo .
res sa.!.
das furr
O que se pode observar de forma n í t ida naquele momerr
to pol í t ico é que , ma i s uma vez , despontava a relação ambígua
entre getul i smo e traba lhi smo . Varga s , se nao era " o " candidª
to do PTB e sim da col igação PTB-PSP -- , vo l tava
pa I pape l da cena pOlítica pelas maOE do trabalhismo ,
54
ao princi
confundi
do por mu itos com O que j á passava c ser nomeado de populismo .
Fora contra esta tendência pol í t ica que PSD e UDN tentaram um
acordo e prova velmente só não foram bem suc edidos porque popy
l i smo , trabalhi smo e getuli smo se mati zavam com tal
que até a s rapos a s do PSD t i veram d i ficuldades para
sut i leza ,
fechar o
lance . No entanto , o cand idato -- desde o pr ime iro momento
nao se ident i fica como uma solução de part ido,
como um nome suprapartidári o . Getu l i smo nesta
mas exa tamente
acepçao excede
traba 2hismo!PTB e não por que stões de acordo interpartidário .
Ge tul i smo!queremismo é uma força po l í t ica centrada na legitimi
dade e popularidade pessoa l d e Varga s , que não reconhece e nao
va lora pos i t ivamente o pape l da organi zação partidária .
Getu l i smo é traba lhi smo , se ne sta a s sociação a d imen
sao privileg iada for a ideológica , ou s e j a , aquela de uma propo�
ta pol ítica fundada na resolução da que s tão soc i a l e na mobi
l ização dos traba lhadores pelo s i s tema s ind ical corpora tivista .
Mas getulisIDo não é traba lhismo em termos part idários e , em d�
corrênc i a , não se ident i f ica com O PTB . Ne ste sentido , talve z
se possa arriscar que getu l i smo fos se ma i s popu l i smo : um e s t i lo
de fazer pO lítica que t inha em Vargas s eu mestre ma ior , ma s que
fazia e scola , como a l iderança de Adernar de Barros demonstrava .
É nesse contexto que Getú l i o , em seu d iscurso e l e itQ
ra l , reflete um acentuado intere sse pela que stão soc ia l . Não
poupa críticas à admin i s tração de Dutra e demonstra uma s ér j a
pr eocupaçao com a defesa dos interes s e s econômicos nac iona i s .
Propugnava por um padrão d e governo cu ja função pOl í t ica bá si
ca fosse representar e expre ssar d iretamente o s interes se s da
nação sem intermed iários . Essa proposta inseria-se dentro d e pa
5 5
râmetros que relegavam para segundo plano o papel d o s i s t ema par
t idário na articulação de intere s s e s , a s s im como l imitava a l�
gítima partic ipação popular à instância corporat iva dos s indicª
tos .
Para Vargas , sua candidatura surgia d e um apelo popu
lar e da incapacidade do s i s tema part idári� gerar
ma i s adequada à s nec e s s idade s nac iona is . Não sendo
uma solução
fruto de um
acordo partidário por. ele ac ionado , Va rgas se apresentava como
solução inevitável d iante das indec i sõ e s e intrans igênc i a s dos
partido s . � e sul tado d e sua i senção frente à d isputa partidári
a em torno de nome s , e s sa candida tura seria também um produto
do seu empenho num programa em d e f e sa da conc i l iação
Frente ao embate pO lítico-partidário em torno
gera l .
d e aI
terna tiva s pres idenc ia i s , o candidato Vargas apresentava como
vantagem o fato de nada ter re ivindicado para s i . I sso o legi
timava d iretamente junto à s ma s sa s , que haviam f icado a l i j adas
ou margina l izadas do debate suce ssório .
O caráter person a l i sta d e uma candidatura que a f irma
nao buscar benefícios pessoa i s , será o principal trunfo para
que Vargas se apre sente ao e l e i torad o . A insi s tência com que
a firma sua cond ição de independência frente a intere s s e s poli
t icos organizados pode ser constatada em d iversos pronunc iamerr
tos . Apresentando-se dessa forma , coloca - s e como o d efensor dª
que l e s que , por suas cond ições precárias d e vida ,
conseguido a inda se fazer representar nem merecer
quer das agremiações pOlítica s , quer do poder
nao haviam
a atençã o ,
e s tabelec ido .
Com e s sa posição, apres enta - s e como o futuro d i rigente que , a
partir d e uma ação desvinculada das instituições po lít ico-paX
t idárias e de grupos de pre s s ã o , irá governar para interesses
não-organizados que a firma v i sua lizar e perceber .
56
o apartidari smo d e Varg a s inc lui a lgumas referênci
as conc retas a mecanismos a l ternat ivos de participação po l í ti
ca . Nesse sentido , sua preocupaçao e a de vivificar a força
do traba lhismo con struído no Estado Novo . Assim, o s s indicatos
são ins trumentos bá s icos para levar adiante sua proposta d e gQ
verno , fortemente ba seada para fins de campanha , na problemáti
ca socia l . Segundo Varga s , o " que a soc iedade moderna aspira
e ao traba lhismo -- ou s e j a , a harmonia entre toda s a s c la s se s ,
a d emocracia com ba se no trabalho e n o bem-estar do povolt •
E a solução apontada pelos pr incípios do traba lhismo indica
nao ser a " predominância desta ou daquela casta que há de tr-ª.
zer a a lme jada felic idade humana .
. . d '1 ' ,, 2 1 r1ado , nem a d1tadura a s e 1tes .
2 1
Nem a d itadura
VARGAS , Getúlio Dorne l l e s . A campanha pre sidencial sos ) . Rio de Janeiro , J . O l ímpio , 1 9 5 1 . p . 4 1 9 .
do pro l e t-ª.
( d i scur
57.
o traba lhismo volta a o poder?
Vitorioso nas eleições -- graça s também ao apoio do
PSD , que " cristianizou " seu próprio candidato ( Cr i s tiano Machª
d o ) -- Vargas levava para o governo uma pauta de procedimentos
pO l í t icos que refletia ba stante seu discurso e l e itora l . PreQ
cupado com a conc i l iação nac ional organizou o prime iro gabin�
t e , denominado " Ministério da Experiinc i a " . Este
se pela presença de várias correntes partidária s ,
UDN , e pela fraca expressão do PTB , ao qua l coube
cara cterizou
inc lusive a
apenas o M i
ni stério d o Traba lho , exatamente como n o governo Dutra . Desen
volvendo uma ampla pO lítica de a l ianças junto a c ivis e m i l itª
res , criou uma situa ção ba stante contradi tória . Sua intenção
dec larada era instaurar um governo traba lh i s ta . Mas , d e um lª
do, não prestig iava devidamente o PTB , part ido que me lhor pod�
r ia expressar e s s e ob j et ivo ; e , d e outro , forta lecia o con junto
das força s conservadora s . A fragil idade d e s sa composição nao
conseguiu ag lutinar o PTB ; de sgostou o s setores m i l i tares e a li
mentou a s desconfianças da UDN . Uma vez que com este pa rtido
Vargas ensa iava , d e sd e o início de s eu governo , uma pol ít ica de
aproximação , a cúpula uden i s ta reagiu , al egando uma crise d e
confiança em relação ao pre s idente , o que impos sibi l i tava o e2
5 8
tabe lecimento d e acordos . Mesmo participando d o min istério , a
UDN colocaria sempre em d�vida a " s inceridade de prop6s ito s " do
governo , postura que evoluiu para a oposição intran s igente .
Essa oposição a inda era mai s s igni fica tiva porque a li
menta da por toda a grande imprensa nac iona l . A única exceçao
foi o j ornal Ú l t ima Hora , criado em j unho de 1 9 5 1 para ser uma
voz favorável ao regime e ao chefe do governo .
� interessante observar que a s primeiras d i ssensões
ministeriais ocorreram exatamente na s e s feras do PTB e da ala na
c iona l i sta militar, tida s , desde a campanha , como pontos e ssen
ciais de sustentação do governo . Em setembro de 1 9 5 1 Danton Co�
lho de ixou a pa sta do Traba lho devido a con f l itos internos do
PTB , sendo substituído por outro petebista , Segadas viana . Em
março seguinte , o general Esti l lac Lea l , repre sentante dos gru
pos nac iona l i stas nos meios m i l itare s , abandonaria a pa sta da
Guerra em função de d ivergênc ias com os termos das negoc iações
efetuadas pelo ministro do Exterior João Neves da Fontoura ( PSD ) ,
para o Acordo M i l itar Bra s i l -Estados Unido� .
A e scolha de Danton Coelho para o M in i s tério do
ba lho t ivera sign i f icado pO lítico bem d e l ineado .
panha suc e s s6ria , fora um e l emento fundamenta l nas
Durante a cam
articulações
com o s meios m i l itare s , vi sando a absorção do nome de Varga s .
Ap6s o pleito fora transformado pe l o pr e s idente recém- e l e i to , e
a inda não empos sado , no re spon sáve l pe l o tra tamento dos a s suntos
de política interna j unto ao governo Dutra , a té que se e fetua�
se a mudança de mandatos , da mesma forma que João Neves da FO!l
toura encarregado das que stões de política externa .
Danton era um e l emento da maior importância
governo e um homem do PTB . Sua ida para a pa sta do
j unto ao
Trabalho
pode ser interpretada como uma tentativa de partidarizar o mini�
59
tério . E , ta lvez por e s sa raza o , sua admini stração inaugura
uma espécie de período de " caça às bruxa s " . Muitos daque l e s
que haviam servido ao governo Dutra e que nao t inham aderido ao
PTB ou s e f i l iado à campanha de Varga s tornaram- s e suspei to s .
Não há puniçõe s , mas a fa s tamento s . A velha guarda de funcioná
rios do ministério ou é substituída ou se retira voluntariE
mente . Esse procedimento de fundo pOlítico tem impl icações admi
n i strativas e desarticula o próprio funcionamento do ministério ,
uma vez que a t inge o corpo de func ionários e stabelecidos de sde
d f · ' o 2 2 o Esta o Novo e que ora mant1do pelo propr10 Dutra .
Sendo o PTB um partido em permanente convu l s ã o , a ori
entação usada para rea lizar a s imbiose entre a pasta do Trabalho
e o partido é duplamente desastrosa : desarticula o ministério
e desorienta a inda mais o PTB .
Danton que acumulava a pre s idência da Executiva Nacio
nal do PTB com a pasta do Traba lho , Indústria e Comércio de ixou
o primeiro cargo em junho de 1 9 5 1 e a f as tou- s e do segundo em s�
tembro , acusando Vargas de lhe impor suces s iva s derrota s . Dan
ton completaria sua tra j etória , no períod o , ameaçando abandQ
nar o PTB e dando apo io a uma convenção na u pião Ferroviária do
Bra s i l , no R io de Janeiro , na qua l s e ob j e tivava a criação da
Frente Trabalh ista Bra s i l e ira . Ou se j a , procurava
mais um partido traba lhista , do qua l seria pre s idente
articular
e cuj o
objet ivo era denunciar o s d e svios e l i t i stas que a proposta trE
ba lhista vinha sofrendo sob o governo Varga s . Embora e s sa ini
ciat iva não tenha s ido levada avante , é um indicador da posição
crítica de Danton em relação à atuação de seu sucessor no mini�
tério e também em relação ao próprio PTB .
2 2 Hugo Faria ( depoimento )$GV/Cpdoc , História Ora l . p . 67 - 8 .
FUNDAÇAQ GETÚLIO VARGAS , 1t-:OIPO I CPOOC I 6 0
Com a saída de Danton , a pasta d o Trabalho ,
e
da por José de Segadas Viana , ex-diretor do Departamento NaciQ
nal do Traba lho ao f im do Estado Novo e um dos
PTB . Sua administração terá um teor ambíguo .
fundadores do
Ao lado de medi
das de cunho l ibera l i zant e , como o retorno dos "antigos func ionª
rios" , o aumento do salário mínimo em 1 9 5 2 ( o primeiro desde
sua criação em 1 94 3 ) e o fim do a te stado d e ideologia para o s
candidatos à s d iretorias s indicai s , Segadas pôs em prá tica medi
das inequivocamente repre s s iva s . Reac ionou o s s erviços d e in
formação do Min i 9tério do Trabalho , visando o controle d ireto
e s i s temático das l ideranças s indicai s . Longe d e superar o s prQ
blema s do ministério , irá , ao .contrário , aprofundá-los , poi s sua
po l ítica não agrada nem ao PTB , nem aos s indicato s , nem à massa
trabalhadora . O aumento do s alário mínimo seria considerado
insuficiente para corrigir as perdas salariais-- o que se expre§
sava nas co nstantes e crescentes greves a partir de 1 9 5 3 . t
no bo j o de uma das mais s ignificativas d e s s a s greves-- a dos m2
rítimos no Rio d e Janeiro -- que s e explicita d e vez o con f l ito
entre o Ministério do Trabalho e João Goulart , presidente nacio
nal do PTB desde junho d e 1 9 5 1 . t nesse momento que Segadas
renuncia , sentindo-se despr e s t igiado em sua orientação pol í t i
ca . A mudança n e s s a pasta é o s ina l mais evidente,
e conhecido
da crise por que passava o governo Varga s .
Uma das saídas para contorná - l a seria exatamente a
reforma ministerial e f e tuada em meados de 19 5 3 . Esta mudança
de gabinete tem s ido interpretada como um marco decisivo , porque
indicaria uma " virada à e squerda " . Não obstante a e scolha d e
João Goulart pos sa s e r vista como uma retomada mais agre s siva
do " populismo trabalhi st a " de Varga s , a re formulação do gabin�
t e , que poupou a s pastas militare s , signif icava principalmente
6 1
uma nova inves t ida junto a o s conservadores , particularmente a
UDN . À exceção do Ministério da Agricultura , que continuou
tendo João C leofas ( UDN ) como seu titular , as outras seis pa�
tas civis foram a l terada s . Dessas apenas uma coube ao PTB-
como sempre a do Trabalho - , enquanto a s outra s c inco foram di
vididas entre a UDN ou simpatizantes udenistas e o PSD .
Em que pese a presença d e Goulart e sua reconhecida
inf luência junto ao movimento s indic a l , é forçoso admitir que
o novo staff não se caracterizava por uma orientação ideol ógi ,
ca a esquerda . As greves que haviam ec lodido entre março e ª
bril de 1 9 5 3 , em são Paulo e Rio d e Jane iro , tornavam c laro o
descontentamento dos trabalhadores com a administração de Vax.
gas . Mesmo que a atuação do novo ministro do Trabalho corrobo
re a tese de uma reativação do movimento s indica l , isso não s ig
nifica que t enha havid o , por parte do governo , um plano d e l ib�
rativo d e benef ic ia r a s forças nac iona l i st a s e de e squerda .
Desde o iníc io o governo adotara uma posição francamente conci
liatória em relação aos d iferentes interesses regionais e parti
dário s , em detrimento até mesmo do próprio PTB . Convivera com
posições e interesses pOl í t ico-ideológicos bastante d í spares ,
ora cedendo à s expectativas nacional ista s , como no caso da PetrQ
brá s , ora a outras de cunho mais internac iona l is t a ou mesmo
imperia l i s ta , como por ocasião do Acordo M i l itar Bra s i l -Estados
Unido s . Este movimento pendul a r foi a tônica d e todo o período ,
ao contrário do que usualmente s e supõ e .
A nomeação d e Goulart para o ministério do Trabalho
é o mais ousado gesto de Vargas para recuperar a confiança dos
trabalhadores . Dentro da perspectiva g e tu l is ta , no entanto , pro
curar a reaproximação com a s c l a s s e s traba lhadoras nao signi
fica abrir um confronto com o patronato ou com os interesses das
6 2
c la s s e s dominantes . M a s t a l inic iativa , a d e s pe ito d e nao s e
confundir com uma proposta e squerdizante , d esperta sérios t emQ
res junto à s força s conservadoras , em particular entre o s mili
tare s .
Como pre s idente d� PTB , Goulart vinha d e senvolvendo
uma orientação pOl ítica de maior aglutinação das forças trabª
lhistas e de maior identidade entre o partido e o s meios s indi
cais . Nesse sentid�, não é difícil perceber o choque de ori
entações dessa nova l iderança , com re lação ao ministro anterior ,
Segadas Viana . Este , s eguindo o figurino e stadonovista , via a
pasta do Trabalho camo o instrumento d e tut e l a do movimento s ig
d ic a l . Jango inaugura uma outra mod a l idade d e fazer pOlítica
traba lhista quer dentro do partid o , quer dentro do ministério ,
quer em suas articulações com o s indica l ismo . Em r e lação aos
dois último s , sua adminis tração permitirá maior l iberdade para
as lideranças s indicais , derrubando na prática
ideologia , que havia terminado , juridicamente ,
o atestado de
um ano antes .
Ao l iberalizar a pOlítica s indic a l , Goulart buscava
uma reaproximação desta com o PTB e ao mesmo tempo abria campo
para a atuação do PC , vis lumbrando a possibi l idade d e trabalhar
a l iado a este partido . Esta a l iança visaria mais explic itª
mente as que stões de pO l ít ic a s indical e de pOlítica econômica
de cunho naciona lista . Pela primeira vez , desde 1 9 4 6 , os cQ
munistas passaram a gozar de uma margem de l iberdade
para atuar naquel e que seria seu meio por excelência :
ses trabalhadoras .
. oficiosa
a s c l a�
Do ponto d e vista administrativo duas outras observa
çoes devem ser feita s . A primeira diz respe ito . a distribuição
partidária na administração das autarquias da previdência entre
func ionários do min istério e d irigentes s indicai s . I sso , e tão
6 :>
mai s importante , à med ida que s e entender que a s l ideranças s in
dicais vão a l ia r a e s s e recurso d e poder uma autonomia políti
ca até então de sconhecid a . A segunda refere-se , a s d iretrizes
traçadas para a fixação d e um novo salário mínimo , o que nao
se l imitava apenas a um aumento c �rcuns tanc i a l . Era uma prQ
po sta que , a l terando a compos ição das comissões regionais que
deveriam e s tudar e e s t ipular os níve i s salaria i s , apontava para
uma pOl ít ica ma i s permanente de acompanhamento e a tuàl ização sª
1 . 1 2 3 arl.a •
Na atuação d e Jango no ministério, nao podem ser mi
nimizadas as inovações que d iz em respeito ao e s ti l o d e r e laciona
mento com a s l ideranças s indicai s e com as mas s a s trabalhado
ras o A maior figura min i s terial até então fora Marcond e s F i lho
que inaugurara , a inda no E stado Novo , uma prática constante
de contatos com o s trabalhadore s . Falando pelo rádio semana.!
mente , comparecendo a s indicatos e recebendo l ideranças , Marcon
d e s criara a imagem do ministro a c e s s ível e a s erviço da c l a�
se trabalhadora . Mas tudo era feito preservando- s e a " aura " d e
autoridade pública . Marcondes portava - s e s empre como um homem
de governo com um verniz pessoa l aristocrát ico .
Goulart avançava n e s s e relac ionamento e em parte rom
pia com e l e . Sua passagem pelo min i s tério é marcada por um e s t i
l o mais informal e f lexível n o tratamento das ques tões socia i s .
Não era somente o ministro que fa lava aos traba lhadores e o s ou
via . Efetivamente e l e e stabe l ecia negoc iações e fazia conce�
soes , praticando uma informa lidade até então inédita . lritens i
ficando seus contatos d iretos com o s s indicato s , recebendo fr,lt
qüentemente suas l ideranças no gabinete mini s terial ou compar,lt
cendo a eventos promovidos por entidades de trabalhadores , Gou
lart não e s tava apenas e s tr e i tando sua s bas e s de apoio . A pro
64
posta era a lcançar i sto , trans formando suas promessas em atos jy
rídicos do ministério . Esta preocupação em fundamentar
r idade e l id erança pOl í t ica em procedimentos lega i s e fetivo s , tem
a nít ida inspiração do modelo de Varga s . Jango , contud o , rei
naugura essa tradiç ã o , ao desmis t i ficar a figura da autoridade ,
aproximando-a do povo e colocando-a à a ltura de sua mao .
Vários depoimentos demons tram muito bem essa imagem
que estamos fixando . Amara l Pe ixoto , por exemplo , d ef ine-o como
" o gaúcho típico , homem de fronteira , de tomar chimarrão no gal
pão com os peões , de dar intimidad e " . Essa intimidade chegava
ao ponto de , quando pres idente da República , lideranças s indi
. d · . . d d · 1 24 ca�s �r�g�rem- s e a e l e na segun a pes soa o s �ngu ar .
Por tudo isso , Goulart inaugura nas
pa lavras d e José Gomes Talarico " uma
nova fase no M i n istério do Trabalho .
t a fase do direito d e greve , da abo
l ição do a testado de ideologia , de
não interferência no processo e l e i
toral d o s s indicatos . Enfim, a s
mudanças s e d ã o a partir da gestão
d e Jang o , que evidentemente a s fez
por orientação do d r . Getúlio" . 2 5
Mas nenhum depoimento é tão r ico quanto o d e Hugo
de Faria :
2 4
2 5
"Quando é que u m d i r igente s indical
ia à casa d e um ministro a qualquer
hora ? Com o dr . João Goulart qual
quer sujei to que quer ia falar com
Ernâni do Amaral Pe ixoto ( depoimento ) . FGV/Cpdoc , Hi s tória Ora l . p . 7 1 2 .
José Gomes Talarico ( depoimen to )PGV/Cpdoc , História Oral . p . 9 8 .
6 5
e l e i a a o Hote l Regente e fa lava .
As aud iênc i a s públicas no Ministérj,
o do Traba lho passaram a ser a s su.là
tadora s . Uma vez por s emana , cente
nas de pessoas chegavam para a s au
d iência s , que começavam à s
horas d a tarde e acabavam , a
quatro
meia-
noite , uma hora da manhã . Enfim , hou
ve rea lmente um renasc imento pelo
i nformal ismo de J ango , pelo e stado
de e sp:í:rito d e l e a t é certo pon
to patern a l i sta de precisar f-ª
lar com todo mundo" . 2 6
A e s tada d e Goulart no m in i s tério , embora curta , foi
sufic iente para causar impactos de várias orden s . Passou-se a
teme r , a i nda mais , a participação pOl:í:tica dos traba lhadores ,
o cresc imento do traba lhi smo e de PTB e , mai s uma vez , a possj,
bilidade de instauração de uma república s indica l ista no Br-ª
s i l o
Por tudo i sto aumentam a s pre ssoes que redundaram na
sa:í:da de Gou lart do min i stério , em fevereiro de 1 9 5 4 . Vargas
dessa feita nao nomeia um novo ministro do Traba lho , que seria
o quarto de sua admini stração . Mantém , até agosto , um mini.là
tro interino : Hugo de Faria , o então d iretor do Departamento
Nacional do Traba lho e homem de confiança de Goulart . Para
a UDN , tal atitude indicava c l aramente a recusa de Vargas em
reorientar sua pol:í:tica traba lhista . S e i s so era verdade ,
era igualmente mu ito d i f :í: c i l e scolher um novo titular para a
pa sta do Traba lho , ponto nevrá lgico da c r i s e pol:í:tica do goveX
no .
2 6
Hugo Faria ( depoimento ) . FGV/Cpdoc , H i s tória Oral . p . B9 .
66
o e s forço de conciliação com o s s etores mais conservª
dores nao domou a opo s ição milita r e udenista . Diferentemente ,
foi interpretada por esta como mais um " trabalho d e sedução"
para atrair a UDN . Este partido continuaria sua ferrenha oposi
çao à pOlítica econômica inflacionária , denunciando o avanço
das massas e o " perigo getulis ta " , a s s im como a crise mora l do
governo e a existência de planos continuístas de Vargas .
Nesse contexto em que s e evidencia uma decisão obse.ll
s iva para depor o presidente , a "denúnc ia João Neves " foi fun
damenta l . o ' ex-ministro das Relações Exteriore s , incompatibi
l izado com Vargas , dec larou à imprensa , no início de 1 9 54 , e star
ciente da existência de um plano secreto entre Getúlio e perón
obj et ivando a formação de um bloco continental de caráter polí
tico e econômico composto por Argentin a , Bras i l e Chile ( Pac
to ABC l . Este plano visaria fazer frente à hegemonia
americana no hemis fério sul . Essa revelação veio
de outra que postulava estar Vargas planejando a
de uma república s indical ista no Bras i l em moldes
norte-
acompanhada
instauraç ão
peronis ta s .
A partir daí , a renúncia do pres idente s eria insisten
temente sol icitada no Congresso e na imprensa . A UDN , em a l iança
com os setores mil itares , participará intensamente dessa j orna
, . da , responsabilizando d iretamente Vargas por todos o s poss 1ve1s
problemas que o país e s t ivesse enfrentando . Contudo, a forte
reação que resultou na s a ída de João Goulart da pasta do Traba
lho , não impediu a aprovação de um aumento de 1 00% no s a l ário
mínimo a 1 2 de maio de 1 9 5 4 . Em meio a uma s ituação tensa o
Congre s so examinaria o pedido de impeachment para Varga s , sob a
a legação formal de irregula ridades administrativas na Comissão
Central de Preço s . A proposta de impeachmen t
1 3 5 votos contra 3 5 voto s , em junho de 1 9 5 4 .
,
e derrotada por
o movimento pela
6 7
depo s ição d e Vargas ganharia , entretanto , novo a lento quando d o
a s sas sinato d o ma jor Rubens Vaz o O crime , ocorrido a 5 de ago�
to , resul tava de um atentado contra o político e j orna l ista
Carlos Lacerda ( diretor da Tribuna da Imprensa , jornal antigetg
l i s ta ) , no qua l ficou constatada a partic ipação da guarda pe�
soa I de Varga s .
A s i tuação de crise que o pa í s atrave s sava t inha dimen
soes ba stante personal izada s . Tratava - se , principalmente , de
um movimento contra a permanência de Vargas no poder e contra
o getu l i smo , para o qua l ocorreu dec ididamente a açao militar
que daria o veto f inal ao governo .
Um balanço do período que vai de 1 9 4 5 a 1 9 5 4 sob a óti
ca do PTB , revel a pontos substanciais . Após um período de r�
pres sao ao movimento s indica l corre spondente ao governo Dutra
é um ministro traba lhista que promove a l ibera l ização deste mQ
vimento . A iniciativa visava não só fort a l ecer as bases de
apoio do governo como também reativar o apelo traba lhista no meio
operário . Entretanto e s sa l iberal ização acaba por aumentar a
compe tição pO l ítica no interior do movimento s ind ical pos sibi
l i tando um novo vigor aos comunsitas que e stavam em franca opo
s ição ao governo . Além d i s s o , abriu e spaço para outras corren
tes como O janismo em são Pau l o , ou s e j a , o PTB tem que divi
dir o s re sultados de sua pOlítica com outras forças que lhe são
riva i s .
Do ponto de vista governamental o s ganhos do PTB fQ
ram inexpres sivo s . Em termos mini steriai s o partido contro lou
apenas a pasta do Traba lho , Indústria e Comércio e mesmo a s s im
de forma e fe t iva , apenas no governo Varga s . Vale l embrar que no
governo Dutra apenas com o ministro Negrão de Lima , pelo curto
e spaço de dez meses , o PTB teve alguma re lação mais próx ima
6 8
com esta pasta .
S e o partido teve fraca partic ipação a n íve l mini.§.
terial também sua atuação no Congresso deve ser considerada .
o PTB , terceira bancada n o Congr e s s o , não se constitui em uma
base parlamentar de apoio ao governo Vargas nem mesmo no epi sQ
dio da criação da Petrobrás . Mais do que isso , sua partic ip-ª
çao nas Comissões Técnicas da Câmara dos Deputados foi pouco sig
n i ficat iva . Das 1 1 4 Comi ssões formad a s a t é 1 9 5 4 o PTB deteve
a pre s idência de apenas 1 2 . Vale ressaltar que este é um n ível
de atuação privi l egiado a travé s do qua l um partido pode inf luen
ciar mais d iretamente o processo de e laboração legisla tivo d�
fendendo a s pos ições de s eu programa .
Por e s s e s indicadore s pod e - s e constatar que o PTB
nao foi um grande partido neste período . Entretanto , como vi�
mos demonstrando , era uma força pO l í t ica do mais a l to s igni
f icado . Sua presença junto aos s indicatos , aos órgãos previ
denciários e no universo de instituiçõe s l igadas , a que stão
do traba lho , a s s im como em certas autarquias federa i s , sugere
uma linha profícua de inve s t igação . Há portanto que , incorp2.
rando estes dados , reinterpretá- lo s ma is detidamente em outra
d imensão .
69
o trabalhismo sem Vargas
A crise que l evaria ao d e sfecho traumático do gover-
no, em agosto d e 1 9 5 4 , t inha a marca da personal ização . Para
seus opositores o que e stava em j ogo era expurgar
da pO lítica bra s i l eira , dando- s e para tanto uma
o getulismo
demonstração
d e força que tornasse imperat ivo e irrever s ível o a fa stamento
de Vargas do poder .
Em 1 9 3 0 e 1 9 3 7 Vargas conseguiu s e e stabelecer no PQ
der graç a s a um esquema mil itar que apoiava . Embora s e tran.§.
formasse numa grande l iderança pOl ít ica , sempre que lhe faltou
e s s e suporte , seu poder esteve compromet id o . Assim foi e m 1 9 4 5
e em 1 9 5 4 . No primeiro c a s o e s tava em j ogo tanto a mudança do
regime , quanto a permanência de Vargas --.-:l itador -no poder . Mas
o golpe de 1 9 4 5 ficaria marcado na história como uma interveg
ção militar contra o Es tado Novo . Em 1 9 5 4 a s ituação é d i fg
rente : o regime não e s t á em questão . É o próprio Vargas- presi
dente constituc ion a l - que está sob j ulgamento . o que ocorre
é francamente uma investida no sentido de l ivrar o regime da
influência de Vargas .
O tom persona l i s ta d a crise reflete nitidamente a prg
cária ins tituciona l ização d a pOl í t ica nac iona l , para a qual mui
70
to havia concorrido _ o e s t i lo de a tuação do próprio Vargas . O
suicídio , em 2 4 de ago s to d e 1 9 5 4 , reforçará e sta percepçao da
política : a população, ao lamentar nas ruas a morte de seu gran
de l íde r , não só reabi l i tava sua figura , como c riava uma s ituª
ção polí tica bastante incômoda para seus opo sitore s . A reaçao
da UDN neste episódio pode ser interpretada como um misto "de
depre ssão e euforia " . Feste j ava o de saparec imento daque l e que
era o a l vo de suas crítica s , mas f icava acuada frente ao movi
mento popular que a condenava pe l a respon sabil idade da morte
do presidente . Por outro lado , com o de saparec imento de Vargas ,
d . . - . 27 o s u en1 s ta s perd1am seu grande e lo de coesao 1nterna .
Em termos pol ítico s , o suicídio , a l ém de i l ibar a l id�
rança do pres idente e criar constrangimentos na oposição , terá
e fe i tos importantes na formação de uma frente antigo lpista ,
v isando a manutenção da ordem constituciona l . D e certa forma , o
contexto gerado pelo suicídio evidencia a fraque za da pO l ítica
institucional , mas propicia o surgimento de uma posição ma j oritá
ria na defesa das instituições e da ordem l ega l .
A revitalização do getul ismo é um ponto alto nessa con
j untura . Mas o getul ismo tornara-se um movimento de massas acé
falo . Desfeita a relação l íder-ma s s a e cons iderando-se que a li
derança persona l izada não poderia ser faci lmente transferid a ,
a sObrevivência hi stórica d o getulismo passaria a depender de
sua absorção pelo s i s tema partidário . De força para l e l a e con
corrente aos partido s , o getul i smo passa a partir de então a ser
componente e stratégico do s i stema partidário da a l iança PSD-
PTB . Va le dizer, o getul ismo s eria a s s imi lado por partidos hete
27 BENEVIDES , Maria Vitória . A UDN e o udeni smo : ambiquidades no l iberali smo bra s i leiro( 1 9 4 5 - 6 5) . Rio de Janeiro , Paz e Terra , 1981 . p . 9 0 .
7 1
� rogeneos , o que l evaria ao e svaz iamento como movimento soc ia l .
I sso porque também não foi pos s ível o surgimento d e outra l id�
rança popul ista , que conseguisse se legitimar n a qua l idade de
herdeira indiscutível do carisma do ex-pres idente e d e suas
obras traba lhista s . O que se observa é a prol i feração d e , . varl.OS
l íderes que d isputam entre s i o comando do movimento de massas
no Bras i l .
I sso foi feito de formas políticas variadas . Havia ,
contudo , uma característica comum . Procurava - s e s empre buscar a
maior proximidade com a grande massa da população identifican
do-se as propostas à figura pessoal do l íder e nao a 3eu parti
do , o que é característico do popul i smo . Nesse ponto , todos
eram herdeiros do g e tul i s mo . D i feriam d e s te , entretanto , no que
d i z respeito ao próprio conteúdo da mensagem popu l i s ta , bem
como no estilo pessoal de sua encenaçao .
Tancredo Neves exprimiu bem e s t e ponto quando s itua
sua versão do a s sunto .
2 8
" A nao s e r a s exibições d e 1 2 d e mal
o , você não tem notícia do Getúlio
freqüentando s ind.icatos ou receben
do l íderes trabalhadore s . Ele os
tratava com mui to respe i t o , mas o s
atendia n a s reivindicações quando
justas e no e ssenc ia l . O populi§
mo no Bras i l realmente foi uma d e fo�
maçao do getul i smo ; foi Adernar d e
Barros , o próprio Jân io,
con j unto de homens que
o getul ismo . O popul ismo
t.odo e s s e
d e formaram
foi 28 caricatura do getulismo " .
GETÚL I O : uma h is tória ora l . Coord . Valentina et a l i i . Rio d e Janeiro , 1 9 86 . p . 2 5 9 .
da Rocha
uma
L ima
7 2
D iscorrendo sobre e s s e mesmo a specto Alz ira Vargas
também marca c larament e o que c on s idera ser a tônica do e s t i lo
pol í tico de seu pa i .
"De urna c erta maneira , eu o compa ,
rava a s vezes ao Rooseve l t , que , em
bora t ivesse nasc ido de urna família
r ic a , e ra um homem que t inha um
grande sentido popu l a r , sem ser PQ
pul ista . Há urna grande d i ferença
entre o popu l i smo e o popular . ,
O populista corte j a o povo , as vezes
d e urna man eira baixa . . . Meu pai
nunca t i rou o paletó para f ingir
que e ra povo " . 2 9
Corno s e pode observar nos depoimentos ac ima , a prese�
vaçao da imagem de Vargas caminha ao lado da d i s t inção entre
populismo e getu l i smo e d a a ssoc iação entre getulismo e traba
lhismo .
Diretamente v inculado aos expedientes populi s tas ,
ma s nao só em função d i s so , o movimento d e massas no Bras i l tQ
mará ímpeto na década d e 1 9 5 0 para s e r violentamente interrompido
com o golpe m i l i tar de 1 9 6 4 . O traba lhismo foi urna das muitas
facetas desse movimento .
Por e s tar ma i s as sociado ao g e tu l i!3mo que ao PTB , o tra
ba lhismo sofreu os e f e itos das trans formaçõ e s que ,
ocorrem apos
a morte d e Vargas . Se ante s não comparece pol i ticamente c orno
movimento integrado i s so s er ia acentuado com o desaparec imento
de s eu l íder maior . O trabalh i smo d i lui-se por
e l ideranças .
29 Op . c i t o p . 2 5 2 .
, . var10S
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partidos
7 3
Sendo ob j eto d e várias leitura s e apropriações , tanto
poderia representar uma ligação f i s io lógica com o Estado , como
ser um instrumento efetivo de emancipação popular .
Seu crescimento e leitoral é inegável a ponto d e s e
trans formar n o segundo maior partido em representação parlamen
tar nas eleições de 1 9 6 2 . Nesse momento o PTB era governo . Mas
sem estabilidade e sustentação . Era um governo i solado pe la 0p2
sição parlamentar e militar . Tinha a bandeira do traba lhi smo .
As massas e stavam nas rua s , mas t inham outras bandeiras a lém
do trabalhismo .
o que ficou das propostas originai s do trabalhismo
nesse PTB bem sucedido eleitora lmente é a inda um ponto d e inte�
rogaçao . As acesas d iscus sões sobre o populismo no Bras i l dei ·
xam isso muito c laro .
De qualquer forma , o prognóstico de Maciel Fi lho ,
, apos os resultados e l e itorais d e 1 9 4 5 , foi confirmado . Segundo
ele , os part idos de futuro no B ra s i l teriam que se dirigir ma
ciçamente ao povo . Em suas palavras : " Eu , francamente não acredi
to no êxito popular dentro de um c l ima democrático de qualquer
partido libera l ou conservador . Estamos no século
no século X I X " . 3 0
xx e
Mac iel Filho , contud o , nao poderia prever que ,
nao
no
tra�nto das questões democráticas , o Bra s i l teria dif iculdades
para ultrapassar o século X I X . Tampouco que nosso país tivesse
tantos problema s em comportar , institucionalmente , um grande pa�
t ido de ma ssas democrátic o .
3 0 Arquivo Getúlio Varg a s . GV 4 5 . 1 2 . 1 1 / 2 . FGV/Cpdoc .
Mônica Pimenta Velloso
Dulce Chaves Pandolfi
e Mário Grynszpan
Ãngela Maria de C. Gomes
e Maria Celina S. o'Araújo
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TEXTOS CPOOC
A brasilidade verde-amarela;
nacionalismo e regionalismo paul ista
Da Revolução de 30 ao Golpe de 37: a depuração das el ites
Getulismo e traballlismo: tensões e dimensões
do Partido Trabalhista Brasileiro
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