gerson lima - uma interpretação da curva de oferta de marshall e a arquitetura de uma moderna...

24
61 Econômica, nº 4, pp. 61-84, dezembro 2000 V.II N.4 DEZ.00 pp. 61-84 1. Introduçªo A Lei da Oferta e Demanda Ø considerada como um dos princípios bÆsicos, quase como um sinônimo da teoria econômica. Apesar disto, permanecem na literatura da economia algumas perplexidades a seu respeito. No contexto microeconômico, Becker (2000, p. 111) oferece um resumo da situaçªo ao afirmar que mesmo quando os estudantes conseguem recitar oferta e demanda em situaçıes de contos de fadas, eles tŒm dificuldades para aplicar o conceito no mundo real. De fato, a teoria neoclÆssica define oferta somente num modelo de concorrŒncia perfeita e, mais ainda, nega sua existŒncia fora desta. Ou seja, quando a vida real apresenta imperfeiçıes e deixa de ser um conto de fadas, entªo nªo existe uma versªo neoclÆssica da Lei da Oferta e Demanda. Complicando o cenÆrio, disseminou-se a idØia de que, se o governo nªo interferir, as forças de oferta e demanda levarªo o mercado neoclÆssico a se auto-regularem no sentido de garantir o pleno emprego e o preço mais justo dos fatores de produçªo. Aparentemente, ao discutir esta idØia, tanto os economistas que a aceitam como os que a rejeitam desconsideram que ela só se refere ao modelo da concorrŒncia perfeita. Caso o mundo real se afaste deste modelo, a teoria neoclÆssica afirma que o governo deverÆ intervir para que voltem a funcionar as forças de oferta e demanda, assegurando assim o retorno da autojustiça do mercado. Ou seja, neste caso, e pelo menos atØ que a imperfeiçªo seja superada, as variÆveis típicas de política econômica tŒm o poder de deslocar as curvas de oferta ou de demanda no sentido de promover um resultado socialmente mais justo. Aqueles nªo sªo poucos que discordam da premissa de que o mercado neoclÆssico pode assegurar a justiça econômica resolveram, por via das dœvidas, colocar tambØm a teoria da oferta e demanda sob suspeita. O mesmo problema surge, ainda, no ambiente macroeconômico. Neste Uma interpretaçªo da curva de oferta de Marshall e a arquitetura de uma moderna Teoria da Oferta e Demanda Gerson Lima

Upload: carlos-augusto

Post on 24-Sep-2015

97 views

Category:

Documents


76 download

DESCRIPTION

artigo sobre oferta e demanda com revisão de temas diversos

TRANSCRIPT

  • 61

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    V. II N. 4 DEZ. 00 pp. 61-84

    1. Introduo

    A Lei da Oferta e Demanda considerada como um dos princpiosbsicos, quase como um sinnimo da teoria econmica. Apesar disto,permanecem na literatura da economia algumas perplexidades a seu respeito.No contexto microeconmico, Becker (2000, p. 111) oferece um resumoda situao ao afirmar que mesmo quando os estudantes conseguem recitaroferta e demanda em situaes de contos de fadas, eles tm dificuldadespara aplicar o conceito no mundo real. De fato, a teoria neoclssica defineoferta somente num modelo de concorrncia perfeita e, mais ainda, negasua existncia fora desta. Ou seja, quando a vida real apresentaimperfeies e deixa de ser um conto de fadas, ento no existe umaverso neoclssica da Lei da Oferta e Demanda.

    Complicando o cenrio, disseminou-se a idia de que, se o governono interferir, as foras de oferta e demanda levaro o mercado neoclssicoa se auto-regularem no sentido de garantir o pleno emprego e o preo maisjusto dos fatores de produo. Aparentemente, ao discutir esta idia, tantoos economistas que a aceitam como os que a rejeitam desconsideram queela s se refere ao modelo da concorrncia perfeita. Caso o mundo real seafaste deste modelo, a teoria neoclssica afirma que o governo dever intervirpara que voltem a funcionar as foras de oferta e demanda, assegurandoassim o retorno da autojustia do mercado. Ou seja, neste caso, e pelomenos at que a imperfeio seja superada, as variveis tpicas de polticaeconmica tm o poder de deslocar as curvas de oferta ou de demanda nosentido de promover um resultado socialmente mais justo.

    Aqueles no so poucos que discordam da premissa de que omercado neoclssico pode assegurar a justia econmica resolveram, porvia das dvidas, colocar tambm a teoria da oferta e demanda sob suspeita.O mesmo problema surge, ainda, no ambiente macroeconmico. Neste

    Uma interpretao da curva de ofertade Marshall e a arquitetura de umamoderna Teoria da Oferta e Demanda

    Gerson Lima

  • 62

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    contexto, a perfeio dos mercados e das pessoas levaria a uma curva deoferta agregada que vertical ao nvel do emprego mximo que a economiapode oferecer, sem que os preos entrem em colapso. A curva de ofertaagregada na viso neoclssica s poderia ser ascendente na presena, denovo, de imperfeies de mercado. Mutatis mutandis, na falta de perfeiono mercado a poltica econmica pode ser usada para aumentar a produoe o emprego. A proposta deste trabalho buscar uma teoria de oferta edemanda que seja geral no sentido de dispensar a hiptese ad hoc da perfeiodo mundo, e que no seja auto-reguladora no sentido da justia ou dopleno emprego.

    Neste artigo apresenta-se uma teoria no-neoclssica sobre a ofertaem nvel microeconmico, descrevendo-se um modelo dinmico de tomadade decises sobre preo e produo que permite construir uma situaoterica de equilbrio na qual pode-se definir a curva de oferta. Este modeloest baseado na exposio feita por Marshall na primeira parte do Livro Vdo seu Principles, onde ele faz um resumo do ento estado da arte em matriade formao de preos e de deciso de produo. Como o objetivo deMarshall era o de apresentar uma contribuio neste tema, ele prope nasegunda parte do Livro V algumas noes novas, como a definio decurto prazo pela constncia da capacidade de produo, o conceito de preonormal e uma curva de oferta na qual o preo, sem ser uma constante, igual aos custos normais de produo. Esta segunda parte do Livro V, aqual pode ser associada ao nascimento da teoria neoclssica, no serconsiderada aqui.

    Adicionando-se ento a curva de demanda, tem-se uma novaarquitetura da teoria de oferta e demanda, na qual no h uma auto-regulao no sentido do timo social. Neste enfoque terico os nveis depreo e produo dependem das posies das curvas de oferta e de demandae, por sua vez, estas posies so determinadas pelos valores das variveisexgenas, por exemplo, as compras do governo e os impostos sobre a rendado consumidor e sobre o produto vendido. O preo e a produo e, porconseqncia, todas as demais variveis endgenas do sistema econmicotero seus valores definidos pela interao entre ofertantes e demandantese pelos nveis das variveis exgenas, dentre elas as variveis de polticaeconmica.

  • 63

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    No item 2 deste trabalho, apresenta-se uma releitura da noo deoferta de Marshall, reordenando-se a argumentao de forma a enfatizar oprocesso decisrio das empresas. Salienta-se que este processo ocorre numambiente de desequilbrio e que o equilbrio antes de tudo uma construoterica, um estado jamais observado na prtica. No item seguinte sugere-se um modelo completo de oferta e demanda, destacando-se suas principaiscaractersticas. Finalmente, o tpico 4 resume o trabalho e indica concluses.

    2. O conceito clssico de oferta, segundo Marshall

    O mtodo marshalliano de anlise econmica pode ser resumidona sua proposio: a teoria geral do equilbrio entre oferta e demanda uma Idia Fundamental (Prefcio da primeira edio dos Principles ofEconomics 1 ). O mundo de Marshall tem dois grupos de agentes, osconsumidores e os produtores, que se relacionam mutuamente de formatal que, dentro de certas condies ambientais concretas, espera-se que umcerto preo faa com que a quantidade demandada seja igual quantidadeproduzida. O sistema ter, pois, que conter ao menos trs variveisendgenas bsicas: o consumo, a produo e o preo. O objetivo final deMarshall , portanto, o de construir, baseado nas relaes entre oferta edemanda, um modelo de mercado para explicar como so determinadosos nveis destas variveis.

    Este o tema do Livro V dos Principles, no qual duas hiptesesessenciais exigem alguns comentrios. Em primeiro lugar, Marshall definea concorrncia como sendo livre. Para alguns especialistas, como Shove(1942), Hague (1958) e Newman (1960), esta proposio significa queMarshall adota a noo de concorrncia imperfeita, enquanto outros, comoafirmaram Gillebaud (1952), Maxwell (1958) e Shakle (1967), consideramque Marshall rejeitou a definio de concorrncia perfeita. A modelizaoda competio entre os produtores importante apenas para a teorianeoclssica, de sorte que sua discusso est fora dos limites deste texto.Para os propsitos deste trabalho suficiente admitir, sem qualquerpretenso de rigor, que competio livre corresponde a uma certacomposio indefinida entre concorrncia e cooperao entre as empresas.

    1. Neste artigo, os nmeros de pginas entre parnteses, quando no for mencionado oautor, referem-se, 8 edio, impresso de 1986 de Marshall (1890).

  • 64

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    Em segundo plano, apesar de supor que os consumidores e os pro-dutores so agentes otimizadores, Marshall cuidadosamente evita oprocedimento neoclssico de maximizar o lucro atravs do clculo diferen-cial. Sua unidade de anlise do lado da oferta um setor industrial de umproduto homogneo como um todo, ao invs do produtor individual, comoexigido pelo paradigma da maximizao. Quando se torna indispensvelexplicar aspectos comportamentais da indstria, ele utiliza a noo deempresa representativa. Este componente do mtodo marshallianotambm no ser contemplado aqui; um estudo abrangente da empresarepresentativa pode ser encontrado em Frish (1950), Hague (1958) e Maxwell(1958), que apresentam concluses contraditrias entre si.

    O objetivo deste artigo apresentar um modelo de decisoconstrudo a partir dos princpios marshallianos de equilbrio e gravitao,modelo este que contm, de forma latente, um componente dinmico quepode ser isolado e formalizado matematicamente. Na sua forma maissimples, o modelo de Marshall, ou o modelo de oferta-e-demanda deMarshall, composto de pelo menos trs equaes simultneas, pois queas variveis endgenas a serem explicadas so pelo menos trs: o consumo,a produo e o preo. Segundo o prprio Marshall, no prefcio primeiraedio dos Principles, o analista tem que estar certo de que ele tem premissassuficientes, e no mais do que suficientes, para suas concluses (ou seja,que ele tem tantas equaes, e nem mais nem menos, quantas so as variveisdo problema).

    Uma destas equaes a curva de demanda, que traduz a relaoentre o consumo e o preo. A segunda relao poderia ser a condio deequilbrio, a igualdade entre a quantidade demandada e a quantidadeproduzida. Porm, considerando que o equilbrio inatingvel no mundoreal, Marshall prope que o mercado de qualquer produto se equilibre apenassob condies normais, definindo como normal uma curva de ofertaterica na qual o preo de oferta de qualquer quantidade daquele produtopossa ser visto como as despesas normais de sua produo (Marshall, p.285). A curva normal de oferta seria assim a terceira relao procurada.Contudo, Marshall vai alm e divide as condies normais em duascategorias: o curto e o longo prazos. No curto prazo, a capacidade industrial

  • 65

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    de produo dada, enquanto que no longo prazo todos os fatores sovariveis e podem ser adaptados ao nvel da demanda. Mas Marshall nocoloca uma linha divisria clara entre o curto e o longo prazos: segundoele, a natureza no conhece uma separao absoluta entre curtos e longosperodos (prefcio primeira edio) e, mais ainda, em qualquer perodode tempo o preo determinado pelas relaes entre demanda e oferta(Idem, p. 314).

    Alm do curto prazo e do longo prazo existe o curtssimo prazo,ou perodo de mercado, que um perodo no qual as condies normaisde Marshall no podem ser observadas. s por acaso que, no perododirio de mercado, a produo pode se igualar ao consumo; o mercado noest necessariamente em equilbrio no dia-a-dia das transaes comerciais.Isto significa que no h curva de oferta no mercado dirio, quando entoa produo dada e os valores de mercado so determinados pela relaoda demanda com os estoques disponveis no mercado (p. 309), com umainfluncia menor dos custos de produo. Note-se a ausncia de umaafirmao no sentido de que todo o estoque vendido no curtssimo prazo.Carece pois de suporte a idia de que Marshall tenha sugerido uma ofertade prazo curtssimo que fosse vertical.

    2.1. O modelo marshalliano de deciso

    Na prtica, as transaes reais de compra e venda so realizadas nomercado dirio, inclusive as contrataes de fatores de produo que seroutilizados no prximo perodo. durante o perodo do mercado dirio quedecises passadas sobre preo e produo so transformadas em transaesefetivas entre os produtores e seus clientes. Os valores observados, aquelesmesmos que so coletados para todos os fins estatsticos, so aquelesrealizados no mercado dirio. Considerando que no mercado dirio o preopode se adaptar s condies vigentes mas a produo no, pois ela sempreleva um certo perodo de tempo para ser obtida, o preo e a produopodem resultar de diferentes modelos de deciso, parcialmenteindependentes entre si. Estas devem ser as razes pelas quais Marshallprope um modelo de comportamento para o mercado dirio, dividido emdois componentes, o processo de decidir sobre o preo de venda e a tomadade deciso sobre a produo. Esta diviso coerente com a mxima anti-

  • 66

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    Say de Marshall: Produo e marketing so partes de um processo nicode ajustamento da oferta demanda (Marshall, 1919, p. 181).

    A formao do Preo de Venda

    A proposta de Marshall pode ser vista como as empresas interagindocom seus clientes no mercado dirio propondo (e no impondo) preosque no so preos de equilbrio. O mercado s estaria em equilbrio se equando todas as variveis exgenas parassem de variar. Em hiptese algumaos preos seriam determinados s pelos custos ou s pela demanda. Emparticular, no mercado dirio, os preos so determinados principalmentepela relao entre a demanda e o estoque disponvel para entrega (Marshall,1890, p. 290) de modo que como regra geral, quanto mais curto o perodoconsiderado, mais a ateno dever ser concentrada na influncia dademanda sobre o valor (Idem, p. 291). Apesar de desempenhar um papelmenos importante, os custos de produo tambm fazem parte do processode deciso dos produtores a respeito dos preos, de acordo com o princpiode que a quantidade que cada agricultor ou outro vendedor oferece venda a um dado preo determinada pela sua prpria necessidade dedinheiro em caixa (Idem, p. 277), dinheiro este que ser utilizado parafinanciar ao menos uma parte do prximo ciclo de produo.

    Marshall lembra que o mercado uma instituio permanente, isto, que o mercado dirio nunca ocorre uma nica vez, e que, portanto, aexplicao do comportamento dos ofertantes no mercado dirio deve serbuscada no longo prazo. Em suas palavras, por detrs dos movimentos decurto prazo, relativamente rpidos, dos preos de venda, h causas que semantm por longos perodos, e o receio de queimar o mercado 2 freqentementefaz com que estas causas tenham efeitos imediatos (Idem, p. 313). Porexemplo, aps uma queda da demanda, o ofertante no reduzir o preo aoponto de vender todo o seu estoque, seja porque cada um receia queimarsua prpria chance de mais tarde obter um preo melhor de seus clientes(p. 311) seja porque um produtor tem um receio maior ou menor de incor-rer no ressentimento de seus concorrentes, o que aconteceria se ele vendessea um preo que queima o mercado que o mesmo para todos (p. 311).

    2. No original, spoil the market.

  • 67

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    O relacionamento entre compradores e vendedores descrito porMarshall como um processo de pechincha e barganha, no qual ambas aspartes tentam mostrar um certo grau de indiferena com relao ao negcio,cada um com a finalidade de reduzir os objetivos do outro. Os ofertantesno mostram de imediato que esto dispostos a aceitar aquele preo(Idem, p. 277), que na verdade eles acabam por aceitar. Os compradoresinsinuam que no esto interessados no objeto da compra, eles fingemque esto menos ansiosos do que eles realmente esto (p. 277). Com relaoao relacionamento entre os ofertantes, o princpio o de que apesar decada um agir em seu prprio interesse, supe-se que o conhecimentoindividual sobre o que os outros esto fazendo seja, em geral, suficientepara evitar que um produtor venda a um preo menor ou compre a umpreo maior do que outros esto praticando (p. 284).

    Este enfoque da formao do preo corresponde exposio feitapor Marshall na parte inicial do Livro V dos Principles, na qual ele relata oestado da arte no momento em que escrevia. De fato, este enfoque podeser encontrado, por exemplo, em Smith (1776, p. 57) ao sugerir que o preodepende da necessidade do vendedor de livrar-se imediatamente damercadoria. Isto significa que, se o vendedor no tem necessidade imediatade dinheiro em caixa, ele no vende (todo) o produto. Em outros termos,ele venderia a qualquer preo apenas a quantidade suficiente para resolverseus problemas imediatos de caixa. Se o produtor no vende toda aquantidade disponvel, ento aumentam os estoques, de sorte que, nomomento da prxima deciso, ter um peso maior o aspecto de livrar-sedo produto, mas sempre sem cortar o preo em excesso para no queimaro mercado. Desta forma, o princpio de no queimar o mercado deMarshall est associado noo de estoques, e o estoque impe uma pressobaixista sobre os preos: altos estoques correspondem a baixos preos.

    Estas noes foram desenvolvidas pelos autores clssicos (nodizer de Marshall) provavelmente com a inteno de explicar porque opreo no mercado dirio no fixado exclusivamente pela demanda. Istoaconteceria, ou seja, os preos seriam determinados pelos consumidoresde modo soberano, apenas se existisse uma curva de oferta no mercadodirio que seria uma linha vertical ao nvel da produo do perodo. Em

  • 68

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    outros termos, para os clssicos descritos por Marshall, no existe curva deoferta vertical: para estes autores os preos no so fixados s pela demanda.

    A mesma inteno de explicar porque o preo no fixado s pelademanda pode ser identificada em outras proposies ps-marshallianas,como por exemplo na idia do lucro conveniente de Kaldor (1939), noestoque normal de Samuelson (1948, p. 268) e no estoque-sombra deBlinder (1982). Todos estes enfoques parecem adequados para explicarporque a curva de oferta no pode ser uma linha vertical, porque osofertantes no oferecem simplesmente toda a produo, aceitando o preoimposto pelos consumidores e equilibrando o mercado de tal maneira queos estoques, se existissem, seriam invariveis.

    Estas noes so equivalentes proposio de que o ajustamentode mercado no instantneo, implicando em que estoques existem e queo estoque uma conseqncia da deciso de no-vender, e nonecessariamente de algum objetivo outro a ser alcanado pela empresa como,por exemplo, um certo nvel ideal da relao estoque/vendas.Diferentemente, a teoria neoclssica moderna sempre associa um papelestratgico proposital aos estoques. Assim, o estoque poderia ser feito como objetivo de amenizar as variaes da produo, evitando flutuaesexcessivas e supostamente indesejveis, ou para manter o preo num certonvel, mesmo que este nvel seja contraditrio com o objetivo de maximizaro lucro. Alternativamente, um estoque temporrio poderia resultar de umprocesso de maximizao do valor presente dos lucros esperados no futuro,conforme sugerido desde Smithies (1939). Segundo esta proposta, se seespera que a demanda cresa, ento ser mais lucrativo estocar agora paravender em alguma data futura.

    Uma sugesto parecida, introduzida por Kirman & Sobel (1974), a do estoque como varivel estratgica na teoria dos jogos. Contrapondo-se noo clssica de que o estoque resulta de uma deciso de no vender,a teoria neoclssica prope que o estoque existe porque haveria uma polticapara ele, ou uma demanda por ele. Por sua vez, a demanda de estoques, ouo investimento em estoques, tm sido teoricamente associados existnciaou de um certo nvel-objetivo, ou de um certo nvel planejado de estoques.Neste sentido, dois enfoques predominam na literatura neoclssica: o

  • 69

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    modelo do estoque amortecedor (buffer stocks) associado ao alisamentoda produo (production smoothing), e o modelo (s, S). Os artigos de Wilkinson(1989) e Blinder & Maccini (1991) apresentam revises abrangentes sobreesta literatura. Todavia, pode-se perceber que, se os produtores tomamdecises quanto a preo e produo, ou se prevalece uma equao resultanteda maximizao do lucro, ento o modelo de mercado tem tantas equaesquantas so as variveis endgenas e, neste caso, a equao neoclssica dademanda de estoques seria redundante ou at mesmo inconsistente.

    No ambiente macroeconmico podem-se destacar dois estoquesem especial. Em primeiro lugar, o fundo de reserva pode ser visto comoum estoque de moeda que seria um corolrio para a demanda especulativade moeda de Keynes, como observado por Arrow, Karlin & Scarf (1958).Em segundo plano, a curva de Phillips uma relao inversa entre o salrioe outro estoque macroeconmico: o desemprego. A proposio original dePhillips (1958, p. 283) a de que a taxa de crescimento dos preos ser tomaior quanto mais intenso for o excesso de demanda: se os estoquesforem pequenos enquanto a demanda estiver crescendo, as flutuaes depreos sero mais sensveis. De modo geral, estoques elevados estorelacionados a baixos preos. Tambm em termos macroeconmicos existeuma relao inversa entre preo e estoques, a qual tem sido objeto de algunstrabalhos empricos, como por exemplo o citado Wilkinson (1989).

    Resumindo:1. s no perodo do mercado dirio, quando ento no h equilbrio

    entre oferta e demanda, que os preos so observados e coletados parafins estatsticos e analticos;

    2. Seguindo os princpios clssicos expostos por Marshall, o preo formado no mercado dirio e uma funo tanto do custo de produoquanto do estoque disponvel;

    3. No incio de cada perodo do mercado dirio, o estoque dado e se ocusto no fosse considerado, o preo seria determinado exclusivamentepela demanda, como se existisse uma curva de oferta perfeitamentevertical.

    Assim, neste enfoque que Marshall define como clssico, nem ocusto nem a demanda, cujo efeito aparece no estoque, so suficientes para

  • 70

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    explicar o preo; ambos so necessrios. Aquele que diz que o preo determinado pela demanda ... no est estritamente correto (Marshall,1890, p. 290). O preo de oferta a cada perodo pode ento ser expressopor uma funo do custo Z e do estoque E existente no momento, isto ,o estoque resultante da interao entre oferta e demanda dos perodosanteriores:

    preo de oferta: Pt = f ( Z

    t, E

    t-1 ) (1)

    onde a derivada em relao aos custos (dP/dZ) positiva, enquanto aderivada relativa aos estoques (dP/dE) negativa.

    A deciso de produo

    No enfoque clssico de Marshall a deciso sobre o quanto produzircomplementa o comportamento da oferta. A produo industrial ou agrcola naturalmente complexa e em geral exige um certo perodo de tempo paraser obtida. Apesar disto, todas as decises sobre produo so transformadasem realidade no mercado dirio, atravs da compra e da contratao defatores, sendo que estas transaes so os nicos eventos observados eregistrados para fins estatsticos. Neste modelo, a margem de lucro, tanto aesperada quanto a obtida no mercado dirio, o principal argumento nadeciso de produo: quanto maior o lucro maior ser o capital alocado nosetor, aumentando a produo no curto prazo e a capacidade instalada alongo prazo. Este relacionamento entre o lucro e a alocao de capital e,portanto, a determinao do nvel de produo, reflete a prpria mobilidadedo capital, sendo esta uma noo de fundamental importncia para a teoriaclssica de Marshall.

    possvel que, durante um certo perodo de mercado dirio, opreo seja tal que a margem de lucro seja insuficiente. Entretanto, numacerta mdia de longo prazo, a margem deve ser considerada no mnimocomo aceitvel pois, se o preo no for suficiente para cobrir, a longoprazo, uma boa parte dos custos totais do negcio, a produo ser reduzidapaulatinamente (Marshall, 1890, p. 313). A margem definida (p. 313)como o excesso do preo sobre os custos diretos, como o retorno sobre ocapital total aplicado, e depende tambm do giro do capital (p. 374). Dentre

  • 71

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    outras alternativas mais complexas, o retorno, ou a margem de lucro Robtida no mercado dirio, pode ser definida como a diferena simples entrepreo de venda P e o custo de produo Z:

    margem: Rt = ( Pt - Zt ) (2)

    Apesar de ser adequada para anlises temporais de um mesmosetor produtivo, esta definio de margem de lucro incorreta quando setrata de fazer comparaes entre diferentes setores. Neste caso de anlisecomparativa, o retorno deveria ser definido de modo a levar em conta ofato de que tanto o capital fixo quanto o giro do capital so diferentes emcada setor, de sorte que, como o relevante o lucro sobre o capital aplicado,o simples excedente do preo sobre a produo uma informaoinsuficiente para se avaliar o desempenho de um setor em relao aos outros. este desempenho relativo que orienta a mobilidade do capital em direodo maior retorno. Em termos tericos, a mobilidade dos fatores, emespecial a mobilidade do capital, que evita a ocorrncia de restriesimpeditivas ao funcionamento do mercado e, portanto, limitantes daproduo. Dado o fundo especulativo de reserva keynesiano, se o capital livre para se mover, ento todos os setores produtivos tm o capitalfinanceiro que eles prprios consideram adequado para tocar a produono nvel em que ela est, obtendo assim uma margem de lucro no restritapor fatores exgenos ao mercado, se bem que no necessariamente uniformeentre todos os setores.

    Adicionalmente, Marshall sugere que a produo depende tambmdos estoques, argumentando que o ato de estocar percebido comoconseqncia de uma queda na demanda do produto. Neste caso, cadaempresa, agindo individualmente ou segundo um acordo de cooperaocom suas concorrentes, reduz a produo com a finalidade de evitar a pressosobre os preos que seria exercida por uma estocagem excessiva. SegundoMarshall, os produtores, agindo de forma a impedir um estoque exagerado,decidem, seja olhando seu prprio interesse, seja em respeito a um acordoformal ou informal com os outros produtores, suspender a produo porreceio de queimar o mercado ainda mais (p. 311).

    Em caso contrrio, se h uma reduo nos estoques, as empresascompreendem que a procura por seu produto aumentou e cada uma delas

  • 72

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    faz planos de investimentos e de aumentos de produo, todas tentandogarantir para si prprias a maior parte possvel do crescimento do mercado.Resumindo, o segundo componente do comportamento da oferta, a decisode produzir a quantidade Q, pode ser proposta como sendo uma funodo lucro R realizado no perodo passado e do estoque E ento disponvel:

    deciso de produo: Qt = h ( R

    t-1, E

    t-1 ) (3)

    onde a derivada em relao aos lucros (dQ/dR) positiva, enquanto aderivada relativa aos estoques (dQ/dE) negativa. A existncia e aimportncia da relao entre a deciso de produo e os estoques tm sidoconsideradas por vrios analistas, sob diferentes enfoques, dentre os quaisdevem ser citados o ajustamento de estoques proposto por Hicks (1965)e o modelo do estoque amortecedor, do qual Wilkinson (1989) apresentauma reviso de literatura compreensiva.

    desta forma que o modelo marshalliano para o mercado diriotem tantas equaes cinco quantas so as variveis endgenas que ocompem: preo, produo, consumo, estoque e lucro. Os produtoresformam o preo P atravs de uma equao de deciso que especifica opreo como uma funo da varivel exgena custo Z e do estoque Eendgeno, para o qual sempre existe uma identidade contbil: o estoque dehoje igual ao estoque de ontem mais a produo Q e menos o consumoD do perodo entre ontem e hoje. Os consumidores decidem, atravs daequao da demanda, qual a quantidade D que ser demandada, dados opreo proposto pelos ofertantes e o nvel da renda e de outros fatoresexgenos que deslocam a curva de demanda. Por sua vez, os produtoresdecidem o volume Q que ser produzido atravs da equao de deciso daproduo, cujos argumentos so o estoque e a margem de lucro R definida,por exemplo pela expresso (2). As equaes so, portanto, a curva dedemanda, o preo de oferta, a deciso de produo, a identidade contbildo estoque e a definio da margem. Neste contexto, no pode existir umacurva de oferta no mercado dirio, pois esta seria uma equao redundanteno modelo.

    2.2. Observaes sobre o modelo de MarshallEm termos tericos, a condio necessria e suficiente para que

    haja equilbrio no mercado que a quantidade produzida seja igual

  • 73

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    quantidade consumida. No modelo clssico do mercado dirio descritopor Marshall, produo e consumo nunca so iguais. Isto significa que nomercado dirio, perodo no qual as transaes comerciais reais so realizadas,no h equilbrio entre oferta e demanda. Coerentemente, no h curva deoferta no mercado dirio. Esta distino entre, por um lado, o mercadodirio desequilibrado e, por outro lado, a noo terica de equilbrio demercado pela igualdade entre as quantidades ofertada e demandada importante tambm porque os dados sobre as transaes no mundo realso coletados para fins estatsticos e de anlise econmica apenas no mercadodirio, quando ento no h equilbrio entre oferta e demanda. Isto significaque os dados reais disponveis so, teoricamente, dados em desequilbrio,isto , eles naturalmente contm um certo erro estatstico que pode serentendido como um erro de medida.

    Segundo o modelo clssico de Marshall, os produtores tomam suasdecises quando o mercado est fora do equilbrio. Contudo, no seriaapropriado dizer que ele adota um enfoque de desequilbrio, pois a ausnciade equilbrio refere-se apenas s transaes reais realizadas no perodo domercado dirio. O equilbrio marshalliano pode ser visto como umaconstruo terica a partir dos dados reais, no sendo necessariamenteuma hiptese ad hoc sobre o comportamento dos dados reais. A dificuldadedo mercado dirio de atingir o equilbrio deve-se ao comportamento dasvariveis exgenas, o custo e os fatores de deslocamento da demanda, quevariam continuamente, sem dar tempo ao ofertante para ajustar a produo.Marshall afirma que o mercado est sempre se movendo em direo aoequilbrio, mas que ele s chegaria a esta situao se as variveis exgenaspermanecessem constantes durante um certo intervalo mnimo de tempo.O equilbrio marshalliano resulta ser uma abstrao, uma construo terica.Referindo-se a Adam Smith, e a outros economistas como ele mesmoescreveu, Marshall mostra que o valor normal ou o valor natural de umproduto aquele que as foras econmicas tendem a gerar a longo prazo ...se as condies gerais da vida ficarem estacionrias durante um perodo detempo suficiente (p. 289).

    A respeito, Robinson (1965) sugeriu que O curto prazo aqui eagora, com os atuais meios de produo concretos. So as incompatibilidades

  • 74

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    intrnsecas da situao presente ... que determinaro o que acontecer emseguida. O equilbrio de longo prazo no est em algum momento no futuro;o equilbrio um estado imaginrio de negcios correspondente a umasituao atual em que no haja incompatibilidades internas, aqui e agora(p. 101). Neste mesmo sentido, Boggio (1987) observa no Palgrave Dictionaryque, em termos clssicos, preo natural um centro de gravitao em direoao qual as variveis endgenas tendem a se mover. Nas palavras de Marshall,as posies de equilbrio so centros ao redor dos quais a quantidade e opreo tendem a oscilar (p. 289).

    Marshall utiliza a imagem de uma pedra pendurada numa mola (p.288) para ilustrar este fenmeno: se um choque exgeno fizer com quea pedra seja puxada de sua posio de equilbrio, a fora da gravidade a farvoltar, aps algumas oscilaes, posio original. Considerando que oschoques exgenos podem ser, e em geral o so, de intensidade, durao,direo e freqncia diferentes, cada um deles ocorrendo antes que os efeitosdos anteriores tenham sido absorvidos, pode-se concluir que os choquesexgenos induzem a movimentos parcialmente rtmicos e parcialmentealeatrios (p. 288). Em conseqncia, a gravitao ao redor das posiesde equilbrio um fenmeno aleatrio. A noo clssica de Marshall sobrea gravitao pode ser associada ao erro de medida encontrado no mercadodirio, quando h um desequilbrio entre a oferta e a demanda. A gravitaopode ser vista como um componente intrnseco das variveis econmicas,componente este que resultaria do processo de constante ajustamento dosprodutores s condies exgenas, instveis e imprevisveis, de custo e dedemanda.

    3. Um modelo dinmico de oferta-e-demanda

    O comportamento dinmico do modelo clssico de deciso sugeridopor Marshall pode ser assim resumido: uma variao ocorrida numa varivelexgena, como, por exemplo, a renda do consumidor, leva a uma alteraona posio da curva de demanda, da ao consumo e da aos estoques. Porsua vez, a variao havida nos estoques induz os produtores a mudar,simultaneamente, o preo e a produo, cada um buscando o maior lucroque a intensidade da concorrncia e o grau de cooperao entre eles lhe

  • 75

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    permite obter. Orientados pelo que ocorre com seus estoques, os produtoresprocedem, independentemente da concorrncia ou da falta de concorrnciaentre eles, ao ajustamento da oferta demanda. Portanto, preo e produoesto ligados aos estoques, e muitos trabalhos de pesquisa dedicam-se auma ou outra relao: preo versus estoques ou produo versus estoques.Na literatura econmica pouco freqente a anlise simultnea de preo eproduo versus estoques, podendo-se citar os artigos de HAY (1970),Kirman & Sobel (1974) e Dumnil & Lvy (1987).

    Adicionalmente, estudos economtricos foram elaborados por Mills(1962) e pelos seus crticos, Steuer & Budd (1968). Particularmenteimportante a contribuio de Kawasaki, Mcmillan & Zimmermann (1982),na medida em que o trabalho desenvolvido por eles baseou-se num mtodoestatstico similar a um modelo reduzido que dispensa a adoo prvia deum modelo estrutural de mercado e poderia, se indispensvel fosse, adaptar-se a vrios modelos alternativos. A concluso de Kawasaki, Mcmillan &Zimmermann a de que as empresas de fato reagem a variaes nos seusestoques, mudando seus preos e seus nveis de produo de tal modo quea convergncia a uma situao terica de equilbrio fica assegurada. Baseadonestes princpios pode-se formalizar um modelo de mercado com a seguinteestrutura geral:

    Modelo analtico dinmico de mercado

    demanda: Dt = g ( P

    t, F

    t )

    preo de oferta: Pt = f ( Z

    t, E

    t-h

    )

    deciso de produo: Qt = h ( R

    t-j,

    E

    t-w

    )

    onde Rt = ( P

    t - Z

    t ) a margem de lucro, e

    Et = E

    t-1 + Q

    t - D

    t o estoque.

    O modelo tem trs equaes, uma definio e uma identidade denatureza contbil, perfazendo cinco relaes para explicar cinco variveisendgenas: a quantidade demandada D, o preo de mercado P, a produoQ, o lucro R e o estoque E. As variveis exgenas so o fator F dedeslocamento da demanda (renda do consumidor, preo de produto

  • 76

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    concorrente, etc.) e o fator Z de deslocamento da oferta (por exemplo atecnologia e o preo dos insumos). A caracterstica principal deste modelo o comportamento da oferta, que aqui uma generalizao do enfoqueclssico descrito por Marshall, composto da deciso sobre o preo de oferta(equao 1 no item anterior) e da deciso de produo (equao 3 no itemanterior), sendo estas decises aparentemente independentes entre si.

    Considerando, como sugeriu Marshall (p. 281), que os valorespresentes so conseqncias de decises passadas, ao invs de basear suasdecises atuais apenas no lucro realizado no perodo anterior e no estoqueento disponvel, neste modelo geral os produtores levam em conta umasrie dos valores anteriores destas variveis endgenas, o que indicadopela estrutura indefinida de defasagens representada pelo conjunto [ h, j, w]. Esta estrutura de defasagem no conhecida a priori; ela pode e deve serdeterminada na fase de ajustamento economtrico do modelo. Excludasas excees curiosas, espera-se que os mercados sejam convergentes, postoque, de outra forma, eles j teriam deixado de existir. De todo modo, acondio de convergncia em direo ao equilbrio pode ser determinadaaps a estimao dos parmetros do modelo estrutural

    Este um modelo dinmico e no um esquema de desequilbriopermanente. Considerando-se uma situao terica de equilbrio, aps umchoque exgeno dado no momento t o modelo levar aos valores de todasas variveis endgenas nos momentos t, t+1, t+2, etc. Se o choque exgenofosse dado uma nica vez, ento os sucessivos ajustes promovidos pelosprodutores fariam com que as variveis endgenas seguissem uma trajetriaamortecida em direo a uma nova posio de equilbrio. Contudo,considerando que no mundo real os choques exgenos so numerosos ealeatoriamente distribudos, de se esperar em termos tericos que estatrajetria seja constantemente perturbada, de modo que o equilbrio seriasempre inalcanvel. Isto equivalente idia de que os valores atuaisgravitam ao redor das posies tericas de equilbrio. Por fim, neste modelono se assumem a priori e nem h a expectativa de que as variveis endgenasvenham a assumir alguns valores notveis. Por exemplo, no se presume adhoc que o estoque seja zero ou que seja invarivel.

    A principal contribuio deste modelo a descrio da oferta, que composta de duas equaes associadas a um comportamento de curto

  • 77

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    prazo: o preo de oferta e a deciso de produo. O comportamento daoferta a curto prazo tal que uma variao nos estoques induz variaessimultneas no preo e na produo, e na mesma direo, posto que ambosos coeficientes respectivos tm o mesmo sinal negativo. Mais ainda, preoe produo so mutuamente dependentes e, adotando o artifcio de umahipottica situao de equilbrio, possvel deduzir uma relao terica,estvel, que pode ser identificada a uma curva de oferta. Para tanto, asequaes do preo de oferta e de deciso de produo podem sercombinadas. Primeiro imagine-se teoricamente que as variveis exgenasesto constantes h tempo suficiente para que o modelo tenha chegado auma situao de equilbrio, e que elas assim permanecem; neste casodesaparecem os ndices relativos ao tempo no modelo. Toma-se agora aequao de deciso de produo:

    Q = h ( R, E

    )

    e substituem-se a margem de lucro, dada por sua definio, e o estoquetirado da equao do preo de oferta, de modo a obter uma expresso

    geral:

    Q = h ( P, Z )

    Ceteris paribus o fator Z, esta equao descreve a linha dos pontosde equilbrio simultneo do preo e da produo; ela o lugar-comum dospontos de equilbrio procurados pelos produtores, podendo por isso serdefinida como uma curva de oferta. A curva de oferta deve ser o resultadodo comportamento dos produtores nas suas decises de preo e produo,o que significa que ela contm todos e apenas os nveis de preo e produoconsiderados interessantes pelos produtores. Comparando, a curva dedemanda uma relao entre preo e quantidade consumida, que pode serdeslocada paralelamente por algumas variveis exgenas tpicas doconsumidor, como a sua renda e o preo dos bens substitutos. Da mesmaforma, a curva de oferta uma relao positiva entre o preo P e quantidadeproduzida Q, que pode ser deslocada paralelamente por algumas variveisexgenas tpicas do lado do produtor, como o preo dos insumos e a

    tecnologia, aqui representadas por Z3 .

  • 78

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    Diferentemente da teoria neoclssica, neste modelo a curva de ofertano uma relao de causalidade. Para que a curva de oferta fosse umafuno na qual uma varivel a causa e a outra a conseqncia, serianecessrio que esta causa fosse imposta ao produtor vindo de fora dosistema, tal qual uma varivel que seja exgena em relao oferta e noinfluencivel pelas decises dos produtores. Ao invs, aqui as empresastm algum poder discricionrio sobre o mercado, admitindo-se que, nabusca do melhor resultado em termos de retorno do capital aplicado, elaspodem influir nos preos variando a produo, e vice-versa. Em qualquercaso, esta influncia est limitada pela posio da curva de demanda, ou darenda do consumidor, de forma que o nvel de equilbrio terico no resultade uma imposio unilateral dos produtores o ponto de equilbrio dependedos consumidores tambm.

    A curva de oferta uma construo terica, a partir do modelodinmico do mercado dirio, que liga pontos imaginrios de equilbrio depreo e produo. Assim, o modelo pode descrever tanto o comportamentode curto prazo, mais prximo realidade do dia-a-dia, quanto a estruturade longo prazo, que uma abstrao terica daquela realidade. A varivelexgena Z determina a posio da curva de oferta, enquanto sua inclinaopode ser derivada de seus dois componentes: o preo de oferta, que dependedo estoque, e a deciso de produo, que depende do lucro e tambm doestoque. Com isso, a inclinao da curva de oferta (dQ/dP) decorre dapropenso a investir de todos os produtores em conjunto e das reaes dasempresas individuais s variaes em seus estoques. Formalmente:

    (dQ/dP) = [(dQ/dR) (dR/dP)] + [(dQ/dE) (dE/dP)]A inclinao da curva de oferta, que uma noo de longo prazo,

    composta de duas partes: a primeira, representada pela derivada composta[(dQ/dR) (dR/dP)] reflete a deciso de produzir em relao ao lucro obtido(dQ/dR), lucro este que depende (dR/dP) do preo de venda. Em outrostermos, esta componente traduz a propenso a investir no setor, ou a medidada mobilidade do capital em direo a este setor, o que no deixa de sertambm um resultado do comportamento concorrencial de longo prazoentre empresas que esto e que pretendem entrar no setor. Por outro lado,observando que o estoque individual de uma empresa uma conseqncia

  • 79

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    no s do nvel da demanda de mercado mas tambm do desempenho dasua concorrncia, pode-se dizer que a segunda componente [(dQ/dE) (dE/dP)] indica o comportamento de competio de curto prazo. Esta parte daoferta combina a deciso de ajustar a produo em resposta s variaesdos estoques (dQ/dE) com a sensibilidade da empresa aos estoques quandoda deciso de propor um preo (dP/dE) aos seus consumidores.

    til lembrar que, na prtica, a estimativa da inclinao da curvade oferta no exige que se explicite o modelo economtrico completo, isto, as equaes separadas do preo de oferta e de deciso da produo. Oteorema da varivel omitida garante que se pode estimar diretamente aequao da curva de oferta, pois, sendo o estoque uma varivel endgenado modelo, seu efeito estar naturalmente includo no valor estimado docoeficiente associado inclinao da oferta. As omitidas no aparecem,mas seus efeitos sim (Johnston, 1986, p. 260). Neste caso, no s ainfluncia do estoque que estar embutida, mas tambm o efeito de qualqueroutra varivel endgena que, por acaso ou convenincia, tenha sido omitida.

    De um modo geral, a inclinao condicionada por alguns aspectosfsicos, como a perecibilidade do produto, a tecnologia de produo, alogstica de distribuio, a capacidade administrativa, a disponibilidade totalde capital prprio, etc. Alm disso, a inclinao depende do perfil pessoaldo administrador, como por exemplo seu conhecimento geral e do mercadoespecfico, sua reao a expectativas, sua averso ao risco, sua agressividadenas vendas, sua disponibilidade de caixa e, muito importante, sua atitudeem relao concorrncia. Por sua vez, a concorrncia est sujeita no sa aspectos psicolgicos, mas tambm a consideraes objetivas como anoo de que no faz sentido que uma s empresa carregue o estoque detodo o setor. Um fato importante sobre estas caractersticas que influemsobre a inclinao da oferta que elas so no-separveis ex post. Talvezseja esta a razo segundo a qual Marshall condensou todas estascaractersticas comportamentais condicionadas que definem a inclinaoda curva de oferta dentro da noo simples do receio de queimar omercado.

    Sendo no-separveis, impossvel identificar empiricamente oefeito individual de cada uma destas caractersticas sobre a inclinao, valedizer, sobre a oferta em si mesma. impossvel isolar uma das outras porque

  • 80

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    no h informao estatstica sobre elas no imaginvel que se possaanalisar um preo de mercado e concluir objetivamente que, do total, tantose deve perecibilidade do produto, tanto agressividade do vendedor,tanto averso ao risco, tanto capacidade financeira da empresa, etc.Blinder (1990) observou que os principais modelos microeconmicosbaseados no paradigma neoclssico do clculo diferencial para amaximizao do lucro adotam ad hoc muitos fatores comportamentais emateriais para descrever o comportamento do produtor. Entretanto,segundo Blinder, estes fatores so no mensurveis em sua quase totalidade.A inclinao da curva de oferta, portanto, resulta de um padro complexode comportamento, mas o que realmente importa para fins de anlise e depoltica econmica que esta inclinao no precisa ser antecipadateoricamente ela pode ser conhecida ex post, empiricamente.

    4. Resumo e concluso

    Tanto quanto a curva de demanda, a curva de oferta uma relaoentre duas variveis endgenas, o preo e a quantidade, relao esta que deslocada paralelamente por todas as variveis exgenas relevantes. Porsua vez, os efeitos de quaisquer outras variveis endgenas que possam serexplicativas, seja do preo seja da quantidade, estaro sempre naturalmenteincludos na estimativa da derivada do preo em relao quantidade. Acurva de oferta derivada do modelo que Marshall chamaria de clssico sua poca, uma abstrao terica, uma equao reduzida, uma construohipottica a partir das equaes de deciso das empresas sobre preo eproduo, dentro do procedimento delas de ajustar a oferta demanda.

    Se este ajuste necessrio porque h, a cada momento em queuma deciso posta em prtica, um desequilbrio entre oferta e demanda,o que significa que os dados coletados para anlise so dados de desequilbrio,inexistindo portanto uma teoria que explique a relao entre eles, naquelemomento. H assim um erro de medida nas variveis econmicas endgenas,erro este que foi identificado por Marshall e seus antecessores, com a noode gravitao. O tratamento economtrico deve, pois, eliminar este erro.

    As decises das empresas so baseadas em valores passados devariveis endgenas que medem o desempenho do empresrio, em especial

  • 81

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    o lucro e o excedente de produo estocado. Neste modelo de oferta edemanda a empresa um ser dinmico, que est sempre retificando seusobjetivos, suas metas e seus mtodos, em funo das expectativas sobre ademanda e de seus prprios erros e acertos passados, ou seja, em funode sua prpria histria. Mas, na prtica, o equilbrio no chega nunca.

    Pode-se dizer, atendo-se equao do preo de oferta, que nestemodelo o preo resulta de uma poltica de mark-up, na qual a margem noseria rgida mas sim varivel de acordo com a intensidade da demanda.Neste caso, o estoque um indicador da intensidade da demanda individual,a qual varia no s em funo da renda do consumidor, mas tambm emconseqncia das polticas de marketing dos concorrentes. O estoquefuncionaria pois como uma espcie de indicador da formao de expectativassobre o estado da demanda individual.

    Este um modelo dinmico que naturalmente tem uma soluomatemtica de equilbrio associada, mas apenas no plano terico. As decisesatuais dependem dos resultados das decises passadas, ou seja, as decisesde hoje dependem das decises de ontem. Por exemplo, a deciso de hojesobre o quanto produzir no curto prazo depende do estoque existente, oqual, por sua vez, resulta da diferena entre a venda efetiva e as decisesanteriores sobre a produo. A quantidade produzida um fluxo, mas oestoque no; por isso, ambos no podem ser simultneos. Eles se sucedemno tempo, criando uma seqncia de causao interminvel produo-estoque-produo-estoque ... e assim sucessivamente. Trata-se, portanto,de um sistema de desequilbrio que tem uma situao de equilbrio associada a cada nvel das variveis exgenas apenas como um centro terico aoredor do qual a realidade gira.

    Nesta situao terica de equilbrio pode-se deduzir uma curva deoferta universal, mais geral do que o mtodo neoclssico e a teoria domark-up rgido poderiam permitir. Nesta curva de oferta a maximizao dolucro no uma imposio matemtica ad hoc, mas tambm no h qualquerhiptese em contrrio. Neste modelo geral, dispensa-se a hiptese da buscado lucro mximo como fator comportamental, mas no se nega que aempresa tente sempre obter o melhor resultado para o capital aplicado;apenas no se adota o princpio de que o clculo diferencial possa ser til

  • 82

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    neste contexto. Basta a este modelo que as empresas sejam coerentes aolongo do tempo, adotando as mesmas decises quando as variveis exgenasretomarem os mesmos valores. Supe-se, neste modelo, que as empresasestejam fazendo o melhor que conseguem, dado o atual estado da arte aoalcance delas.

    A concluso geral a de que possvel construir um modelo que,sendo representativo da teoria da oferta e demanda, no imponha restriesad hoc ao comportamento do produtor e nem admita uma auto-regulaoem direo a um certo timo social. Neste enfoque terico, o preo e aproduo, e assim todas as demais variveis endgenas do sistema econmico,tero seus valores definidos por dois fenmenos de natureza diferente:4. a interao entre ofertantes e demandantes, ou seja, o encontro entre

    as curvas de oferta e demanda, cujas inclinaes dependem de condiesobjetivas, psicolgicas e histricas do lado da oferta e das idiossincrasiasdos consumidores;

    5. os nveis das variveis exgenas, que deslocam as curvas de oferta e dedemanda, deixando claro que h foras extra-econmicas que regemos valores das variveis endgenas econmicas e que, em princpio,nada justifica a expectativa de que estas variveis exgenas sempreassumam ou sejam de algum modo foradas a assumir valores tais queo pleno emprego e a justia distributiva fiquem assegurados. Dentre asvariveis exgenas certamente as mais interessantes so aquelasassociadas poltica econmica, como os gastos do governo num setorda economia (juros, por exemplo) e no em outros (escolas, porexemplo).

    Esta proposio de uma nova arquitetura tem assim o objetivode restaurar a noo de oferta e demanda como pensada pelos clssicos,recuperando sua capacidade de explicar a formao do preo e da produoe, por conseqncia, de todas as variveis endgenas do sistema econmico.

    Referncias bibliogrficas

    ARROW, K. J., KARLIN, S. & SCARF, H. (1958) Studies in the Mathematical

    Theory of Inventory and Production. Stanford University Press.

  • 83

    Gerson Lima

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    BECKER, W. E. (2000) Teaching Economics in the 21st Century. TheJournal of Economic Perspectives, v. 14, n. 1, pp. 109-20.

    BLINDER, A. S. (1982) Inventory and Sticky Prices: More on theMicrofoundations of Macroeconomics. American Economic Review, v. 72,pp. 334-48.

    ____ (1990) Price Stickiness in Theory and Practice. American EconomicReview, Papers and Proceedings, v. 81, pp. 89-99, 1991.

    BLINDER, A. S. & MACCINI, L. J. (1991) The Resurgence of InventoryResearch: What Have We Learned?. Journal of Economic Surveys, v. 5, pp.291-328.

    BOGGIO, L. (1987) Centre of Gravitation, in The Palgrave Dictio-nary of Economics. MacMillan, impresso de 1988.BRESNAHAN, T. F. (1989) Empirical Studies of Industries with Market

    Power, in SCHMALENSEE, R. & WILLIG, R. D. (editores) Hand-book of Industrial Organization, v. II. Elsevier.

    DUMNIL, G. & LVY, D. (1987) The Dynamics of Competition: ARestoration of the Classical Analysis. Cambridge Journal of Economics, v.11, pp. 133-64.

    FRISH, R. (1950) Alfred Marshalls Theory of Value. Quarterly Journal ofEconomics, v. 64, pp. 495-524.

    GILLEBAUD, C. W. (1952) Marshalls Principles of Economics in theLight of Contemporary Thought. Economica, v. 19, pp. 111-30.

    HAGUE, D. C. (1958) Alfred Marshall and the Competitive Firm. TheEconomic Journal, v. 68, pp. 673-90.

    HAY, G. A. (1970) Production, Price and Inventory Theory. AmericanEconomic Journal, v. 60, pp. 531-45.

    HICKS, J. R. (1965) Capital and Growth. Oxford University Press.JOHNSTON, J. (1986) Econometric Methods. McGraw-Hill, 3. ed., 3

    impresso.KAWASAKI, S., McMILLAN, J. & ZIMMERMANN, K. F. (1982) Dis-

    equilibrium Dynamics: An Empirical Study. American Economic Review,v. 72, pp. 992-1004.

    KIRMAN, A. & SOBEL, M. J. (1974) Dynamic Oligopoly with Invento-ries. Econometrica, v. 42, pp. 279-87.

  • 84

    Uma interpretao da curva da oferta de Marshall

    Econmica, n 4, pp. 61-84, dezembro 2000

    LIMA, G. P. (1992) Une Analyse Critique des Fondements Thoriques et Empiriquesde la Courbe dOffre. Dissertao de doutorado, Universidade de Paris.

    MARSHALL, A. (1890) Principles of Economics. MacMillan, 8. ed., impressode 1986.

    ____ (1919) Industry and Trade. Augustus M. Kelley, impresso de 1970.MAXWELL, J. A. (1958) Some Marshallian Concepts, Specially the Rep-

    resentative Firm. The Economic Journal, v. 68, pp. 691-8.MILLS, E. S. (1962) Price, Output, and Inventory Policies. John Wiley.NEWMAN, P. (1960) The Erosion of Marshalls Theory of Value. Quar-

    terly Journal of Economics, v. 74, pp. 587-601.PHILLIPS, A. W. (1958) The Relation between Unemployment and Rate

    of Change of Money Wage Rates in the United Kingdom, 1861-1957.Economica, v. 25, pp. 283-99.

    ROBINSON, J. (1965) The General Theory after Twenty-Five Years.Collected Economic Papers, v. III, pp. 100-2.

    SAMUELSON, P. A. (1948) Foundations of Economic Analysis. HarvardUniversity Press, 9. ed., impresso de 1971.

    SCHMALENSEE, R. (1988) Industrial Economics: An Overview. TheEconomic Journal, v. 98, pp. 643-81.

    SHACKLE, G. L. S. (1967) The Years of High Theory. Cambridge Uni-versity Press.SHOVE, G. F. (1942) The Place of Marshalls Principles in the Develop-

    ment of Economic Theory. The Economic Journal, v. 52, pp. 294-329.SMITH, A. (1776) The Wealth of Nations. The Modern Library, New York,

    1937.SMITHIES, A. (1939) The Maximization of Profits over Time with Chang-

    ing Costs and Demand Functions. Econometrica, v. 7, pp. 312-8.STEUER, M. D. & BUDD, A. (1968) Price and Output Decisions of

    Firms - A Critique of E. S. Mills Theory. Manchester School of Economicand Social Studies, v. 36, pp.1-25.

    WILKINSON, M. (1989) Aggregate Inventory Behavior in Large Euro-pean Economies. European Economic Review, v. 33, pp. 181-94.