geopolítica e interesses nacionais brasileiros · praticamente todas as regiões e povos do mundo...
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CEEEX/UniCEUB – Seminário Estudos Estratégicos
Geopolítica, Defesa e Segurança
da Nação Brasileira
Geopolítica e Interesses Nacionais Brasileiros
Wanderley Messias da Costa
Professor Titular da USP
Brasília
Setembro - 2017
“O renascimento da geopolítica clássica como inspiradora
de estratégias nacionais, rivalidades e conflitos envolvendo,
sobretudo, as grandes potências com impactos em
praticamente todas as regiões e povos do mundo é um dos
aspectos destacáveis da transição em curso em direção a uma
nova ordem nas relações internacionais”.
O reerguimento da Rússia, os EUA/OTAN e a crise da Ucrânia:
a Geopolítica da nova Ordem Mundial, Revista Confins, 2015.
“Ocorre, contudo, que nos processos de transição de um
período histórico para outro, o novo tende a manifestar-se
enredado ao velho, isto é, as típicas modalidades de conflitos e
violência da ordem global, como os atentados terroristas e a
atuação das milícias (a guerra irracional de que fala John Keegan)
têm convivido ou compartilhado a arena da política e da guerra
com os eventos característicos da antiga ordem e os seus
clássicos antagonismos e rivalidades entre Estados-Nações e,
particularmente, as Grandes Potências em suas disputas por
influência e poder travadas nas escalas dos países, das regiões e
do mundo”.
O Brasil na nova Ordem Mundial:
um mundo tripolar?
• Desconcentração econômica e política e a reconfiguração em curso
da geopolítica mundial.
• A China: novo polo de poder global e sua agressiva expansão na
Ásia e na periferia do mundo.
• A Rússia: a vigorosa retomada do poder militar e da “velha
geopolítica” na política internacional.
• Os EUA: a maior potência do globo luta para consolidar suas
antigas posições e conter a expansão chinesa.
Maior desafio do Brasil de hoje: superar
a grave crise política e econômica
Retomar a capacidade do Estado de formular e implementar
políticas públicas e de realizar investimentos em infraestrutura.
Retomar a industrialização nos três setores estratégicos: bens de
produção, bens de capital e bens duráveis.
Avançar no esforço de pesquisa & desenvolvimento e canalizá-la
para os segmentos de ponta da economia.
Assegurar os investimentos no reaparelhamento das Forças
Armadas e aumentar seu poder de dissuasão.
Território, tecnologia e balança de poder
O que há de comum entre Rússia, Canadá, China, Estados
Unidos da América, Brasil, Austrália e Índia?
Eles formam o grupo dos países-baleia, aqueles que possuem as
maiores extensões territoriais do mundo. Nesta segunda década do
século 21, são desse grupo as duas maiores economias (EUA e
China), as duas superpotências militares (EUA e Rússia) e uma
terceira em ascensão (China), três que estão entre as 10 maiores
economias (Índia, Brasil e Canadá) e dois muito próximos disso
(Austrália e Rússia).
Reconheça-se que os atributos de país-baleia per si não são condição
para seu desenvolvimento e ascensão à posição de grande potência
econômica, militar (ou ambas) como demonstram as trajetórias de
Inglaterra, Alemanha, França e Japão.
Além disso, e em atenção ao que alertaram os pais-fundadores da
geopolítica, como F. Ratzel, o fundamental para a geopolítica é a
coesão interna do estado-nação e do território em particular.
Sob esse aspecto crucial e em determinadas circunstâncias, a grande
extensão territorial pode ao contrário, carrear ao país severo desafio
que deve ser enfrentado.
Na história das nações essa particularidade da geografia do estado
impõe políticas territoriais e respectivos programas e projetos
direcionados para a ocupação das regiões remotas, a alocação de
investimentos em complexas e dispendiosas infraestruturas de
circulação, enérgicas e de comunicação e em aparatos militares de
vigilância e controle das fronteiras, dentre outros.
Essa dupla face do poder do território e seus recursos na
evolução histórica dos estados-nações – potencialidades e desafios -
reafirma nossa posição nesse debate que defende e enfatiza que no
mundo contemporâneo ele mantém-se como valor universal para os
povos de todo o mundo em todas as circunstâncias geográficas e
históricas (Costa, 1992, 2005 e 2015).
Sua natureza primordial decorre antes de tudo do fato de que de
um lado ele permanece essencial enquanto o suporte material do
Estado e da nação, e de outro, pelas dimensões imateriais que lhe
são intrínsecas e o revalorizam, sendo uma endógena no plano da
cultura (identidade e valores nacionais) e outra no plano político-
estratégico, isto é, o poder e sua projeção internacional.
Em outros termos, é essa natureza particular e eminentemente
estratégica do território que o faz imprescindível para o progresso das
nações na paz e a defesa da sua soberania na guerra.
Primeiro, porque os territórios, com sua dimensão, configuração,
posição, características físico-naturais e principalmente recursos
naturais, constituem em qualquer circunstância histórica um valioso
atributo para os estados nacionais.
Têm a seu favor ainda os formidáveis avanços da ciência e da
tecnologia que viabilizam a descoberta, o inventário e a exploração das
reservas de matérias-primas e de produtos primários em geral,
incorporando novas regiões produtoras ao circuito mundial de produção.
Segundo, porque os territórios desde sempre possuem a
característica de contêiner que provê abrigo e proteção à nação e
ao estado diante de potenciais ou reais ameaças externas,
especialmente nas conjunturas de tensão internacional e de
conflitos armados e, sob esse aspecto, é inescapável remeter aos
célebres eventos das três invasões seguidas pelas heroicas
resistências sofridas pela Rússia.
Nesse sentido, isto é, do ponto de vista clássico da geopolítica,
o seleto grupo dos países-baleia possui uma incontrastável
vantagem estratégica, não apenas pela sua massa territorial em si,
mas também pela sua particular configuração geopolítica que
expressa essa potência no que A. Mahan conceituou de poder
marítimo (caso dos EUA) e H. Mackinder de poder terrestre
(Rússia) ou, ainda, a potência anfíbia pela combinação de ambos
(China, Brasil e Índia).
Terceiro, porque os territórios e seus atributos físico-naturais ao
lado daqueles construídos pelas sociedades ao longo da história
constituem patrimônio nacional geral que expressa vantagem
estratégica potencial para os projetos de futuro das nações.
Em outros termos, eles formam uma reserva territorial (terras
agricultáveis, petróleo e gás, minerais em geral, mares, rios e
lagos, florestas e flora em geral, biodiversidade, aquíferos e portos
naturais) que por contingências de natureza econômica e
tecnológica, ou por manifesta política do estado nacional, pode ou
não ser plenamente aproveitada em determinadas circunstânciashistóricas.
De uma perspectiva estritamente geopolítico-militar e da Segurança
& Defesa Nacional, entretanto, a detenção e/ou domínio de reservas
e da capacidade tecnológica e industrial de exploração e produção de
petróleo constituem a mais estratégica dentre todas as vantagens
propiciadas pela posse e uso de recursos naturais.
E isso há pelo menos um século, desde a Primeira Guerra Mundial,
especialmente durante a Segunda Guerra Mundial e em todos os
demais conflitos armados de menor proporção. Deste então, a
balança do poder militar definido pelo jogo entre forças e fragilidades
dos reais ou potenciais contendores tem sido fortemente influenciada
pela capacidade de dominar o circuito completo de produção, refino edistribuição de petróleo e de seus derivados.
E é por isso que grandes ou médias e antigas ou novas
potências do mundo tornaram-se produtores, criaram suas
empresas privadas ou estatais e organizaram-se para liderar
as explorações em seus territórios e em regiões e países com
reservas abundantes e hoje controlam parte relevante da
produção mundial.
Em um exercício de cenário mais abrangente sobre o
significado geopolítico dos territórios neste mundo do Século 21
ou da nova Ordem Mundial, pode-se avaliar a disponibilidade de
recursos naturais e as respectivas capacidades tecnológicas e
industriais dos países para explorá-los e agregar-lhes valor,
tomando-os como fatores estratégicos no complexo mosaico de
potencialidades e vulnerabilidades que configuram as evoluções
da balança de poder ou a geometria do poder no interior do
grupo das grandes e médias potências
A posição do Brasil nesse cenário
O Brasil é potência média e dispõe de grandes reservas territoriais
e de recursos naturais estratégicos, com destaque para os minérios de
todo tipo, redes hidrográficas, portos naturais e, mais recentemente,
petróleo e gás natural.
Como foi dito, dispõe também da maior extensão de terras
agricultáveis e de disponibilidade de água doce em forma líquida
(superficial e de aquíferos) do planeta. Além de o maior exportador
mundial de minério de ferro, o país possui grande e diversificado
parque industrial siderúrgico e metalúrgico e capacidade instalada para
atuar em toda a cadeia produtiva desses segmentos.
E é nos setores econômicos mais diretamente relacionados à
exploração dessa base primordial de riqueza material que o país
apresenta seus melhores níveis de desempenho, macrotendência que
foi pioneiramente apontada no excelente estudo sobre a
competitividade da indústria brasileira de iniciativa do Ministério da
Ciência e Tecnologia, sob a coordenação de Luciano Coutinho e João
Carlos Ferraz (MCT, 1993).
Destaque-se que essa liderança internacional tem sido
obtida justamente naqueles setores em que o país soube
promover a exploração dessas riquezas mediante enorme esforço
concentrado em ciência e tecnologia e em pesquisa &
desenvolvimento.
São as suas destacadas conquistas em biotecnologia tropical
que alavancaram e hoje sustentam os elevados padrões de
produtividade nesses segmentos e eles se devem, sobretudo, ao
desempenho durante pelo menos quatro décadas com os bons
resultados obtidos em extensa rede nacional de instituições de
pesquisas liderada pela Embrapa.
Como será visto mais de perto em seguida, também tem sido
graças aos pesados investimentos da Petrobrás em pesquisa &
desenvolvimento nas três últimas décadas, especialmente nas
tecnologias de exploração em águas profundas da Plataforma
Continental nas três últimas décadas, que o país tem conquistado
posição de destaque na prospecção e exploração de petróleo e gás,
estando praticamente toda ela concentrada nos campos de
produção offshore e especialmente, nos últimos anos, nas imensas
reservas do Pré-Sal.
Ocorre, porém, que justamente essa característica essencial do
seu desenvolvimento, que o qualifica como o único país-baleia e
potência média em que o progresso material encontra-se hoje
fortemente ancorado no controle e uso do território e sua base de
recursos naturais, é a que embute também seu mais importante front
de riscos e ameaças.
Daí porque sua principal vulnerabilidade encontra-se, acima de
tudo, na área da Defesa Nacional, decorrente da baixa capacidade
operacional das forças armadas que se deve, sobretudo, à
insuficiência de recursos e à obsolescência do equipamento militar.
São carências que comprometem a defesa da soberania do país
como um todo e especialmente em regiões estratégicas, como as
fronteiras terrestres, a Amazônia e o Atlântico Sul, conforme
enfatizado na Estratégia Nacional de Defesa.
Uma vulnerabilidade do país, de natureza diversa, mas relevante
e conectada à primeira, é o acelerado processo de
desindustrialização nas três últimas décadas, em que a participação
da indústria no PIB passou de 25% em 1990 para 14% em 2016,
fenômeno mais acentuado na Indústria de Transformação (10% do
PIB) e nesta, no setor de Bens de Capital (máquinas e
equipamentos).
Esse é um sintoma de grave retrocesso já que o país é afetado
no hard core das forças produtivas que impulsionam seu progresso
como um todo, comprometendo a inovação tecnológica, a agregação
de valor aos produtos, a competitividade nos segmentos mais
avançados da economia com o consequente rebaixamento dos
ganhos no comércio internacional.
Outro flanco de vulnerabilidade do país, conforme destacado
no início, é o acelerado declínio da indústria nacional de bens de
capital (máquinas e equipamentos).
Em estudos específicos sobre o papel indutor da indústria de
petróleo nesse segmento (Araújo, 2011), fica demonstrado que
apesar dos esforços da parte do governo (como a exigência do
conteúdo local mínimo) e da Petrobrás (pelo uso do seu poder de
compra), à medida que cresciam os desafios das águas profundas
e ultraprofundas e os investimentos na aquisição de bens e
serviços especializados, aumentava a participação do produto
importado.
Segundo um desses estudos, nesse segmento o valor total
dos contratos com empresas internacionais é 23 vezes maior que
aquele com empresas nacionais (Turchi et al, 2013).
No limite, traz consigo a ameaça da maldição dos recursos
naturais pela excessiva dependência nacional das commodities.
Além do mais, a persistente tendência de declínio industrial tem
implicação político-estratégica pelo seu potencial de riscos para
a defesa nacional, pois a indústria nacional competitiva é
imprescindível para alcançar e manter a autonomia estratégica
no vital setor de pesquisa & desenvolvimento e de produção docomplexo industrial-militar.
Última e mais importante questão deste breve exame de
tendências e cenários, a Petrobrás e a indústria de petróleo e gás por
ela liderada tem potencial suficiente para superar a grave crise atual e
retomar a trajetória bem sucedida ao longo desses sessenta anos,
assegurando assim a posição conquistada pelo país como importante
player nessa estratégica área da economia internacional.
Afinal, além de detentor de imensas reservas, o Brasil é hoje o 12°
maior produtor de petróleo e a Petrobrás a 10ª empresa petrolífera do
mundo.
Seja para a antiga ou a nova geopolítica, o essencial é que o
domínio soberano de reservas de petróleo e, sobretudo, da
capacidade tecnológica, empresarial e industrial para convertê-lo
em fonte de riquezas e de reservas de poder nacional mantém-se
firme como objetivo estratégico de todas as grandes e médias
potências do mundo.
Afinal, não é coincidência que os EUA e a Rússia, as duas
superpotências militares da atualidade, possuem grandes
reservas e produzem hoje cerca de 10 milhões de barris/dia de
petróleo cada uma e que dentre o seleto grupo das dez maiores
empresas petrolíferas globais, nove delas pertencem a grandes
potências com assento permanente no Conselho de Segurança daONU.
• No contexto da globalização se fortalece a geopolítica sob uma
nova perspectiva. Não se trata mais tanto da conquista de
territórios, mas sim, da acentuação de múltiplas formas de
pressão que visam influenciar a tomada de decisão sobre o uso
dos territórios dos Estados soberanos.
• A imposição de agendas, ou seja, o poder da agenda, torna-se
um instrumento chave em muitas das formas de pressão
associada à ajuda financeira. Cabe ainda registrar em tão
complexo contexto que, na questão ambiental, onde as limitações
ao exercício da soberania na Amazônia são mais sentidas, há que
discernir a geopolítica ecológica da consciência ecológica e social.
Limitações ao Exercício da Soberania
Na Região Amazônica
Limitações ao Exercício da Soberania
na Região Amazônica
Uma característica do mundo contemporâneo é a imbricação das
práticas e atores que estabelecem ou tentam estabelecer
limitações ao exercício da soberania. Em atenção ao roteiro
solicitado para este trabalho, tais limitações são analisadas
segundo o nível de coerção em quatro seções:
1°) limitações aceitas por ratificação de acordos internacionais;
2°) limitações aceitas pelas restrições de preservação do meio
ambiente e da biodiversidade;
3°) por pressões sofridas de lideranças políticas mundiais,
organismos políticos e comunidades científicas;
4°) por pressões internas/externas de Organizações Não-
Governamentais (B. Becker, p. 139)
Tendências Cooperativas e Movimentos Centrípetos
MERCOSUL - Mercado Comum do Sul (1992)
IIRSA - Iniciativa para a Integração Regional Sul-Americana (2000)
UNASUL - União das Nações Sul-Americanas (2007)
CODESUL - Conselho de Defesa Sul-Americano (2009)
América do Sul: tendências competitivas e movimentos centrífugos
Persistência de doutrinas e políticas de defesa nacional baseadasem cenários de conflitos regionais;
A crise da Venezuela
Acordos bilaterais de comércio com os EUA e China
A Criação da Aliança do Pacífico
Presença militar dos USA e seus movimentos político-estratégicos na região.
• Among the big ticket military
hardware Venezuela
purchased from 2005-2013
were 24 Sukhoi Su-30MK2
multirole fighters; 34 Mi-17V-
5 helicopters and 92 Т-72B1
main battle tanks.
• Venezuela also bought
100,000 AK-103 assault rifles
for the National Bolivarian
Armed Forces, whose active
strength is over 100,000
personnel.
Aliança Militar Venezuela-Rússia